Bússola n.º 23 Fevereiro 2014

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N.º 23 FEVEREIRO 2014

EQUIPA PROVINCIAL DE ANIMAÇÃO VOCACIONAL

PROVÍNCIA PORTUGUESA DA SOCIEDADE SALESIANA

bússola em dia > FABRÍCIO LIMA

REFLETIR SOBRE A VOCAÇÃO

ser felizes > MICHAEL FERNANDES

A nossa meta é a santidade

“EU VIM PAR A QUE TENHAM VIDA E A TENHAM EM ABUNDÂNCIA” DIZ JESUS CRISTO NO EVANGELHO DE S. JOÃO (JO 10,10). ESTA FR ASE DOTADA DE GR ANDE PROFUNDIDADE EXISTENCIAL ENCERR A EM SI O PROPÓSITO ÚLTIMO DA MISSÃO DE JESUS. ESTA VIDA EM ABUNDÂNCIA TEM ALGUMA COISA A VER COM SANTIDADE?

Quando se fala em santidade há uma tendência em associar esta palavra com um ideal de perfecionismo, de rigidez, longe do mundo e dos seus problemas. Contudo, os exemplos de santidade que conhecemos mostram-nos exatamente o contrário: os santos eram pessoas simples, abraçaram as dificuldades e nunca fugiram dos problemas que o mundo lhes apresentou. Dom Bosco foi um desses exemplos.

A santidade a que somos chamados encontra a sua origem e a sua meta no nosso processo espiritual, na nossa espiritualidade com Deus. O plano que Deus tem para cada um de nós é a vida em abundância. A santidade é, portanto, um estilo de vida proposto a todo o ser humano: o estilo de Jesus, movido pelo Espírito Santo, que no mundo faz avançar o projeto do Reino de Deus.

Como dizia o Cardeal Bergoglio, hoje Papa Francisco, (El Jesuita, 2010), a vocação é um chamamento de Deus a um coração que está pronto, mesmo que não esteja consciente. Assumir uma vocação com responsabilidade e compromisso é, sem dúvida, assumir a condição de filhos amados do Pai, é Ele que nos chama com amor e para amar. Cada vocação é por natureza digna, isto é, é preciso reconhecê-la e respeitá-la como parte fundamental e necessária de um projeto maior: a construção de um mundo melhor, mais feliz, mais humano e mais divino. Toda a vocação requer da pessoa um valor maior pelo qual orienta o seu agir: SOLIDARIEDADE. Sentir-se chamado a realizar uma missão específica é um ato de profunda sensibilidade e solidariedade para com o mundo e as pessoas mais próximas de si, em particular para com aquelas que mais necessitam. Não podemos deixar que a nossa sensibilidade morra, ficar de braços cruzados diante das necessidades dos outros e do mundo, pensar que terei muito tempo pela frente para pensar como posso contribuir para um mundo melhor, não podemos cair na cultura do “futurismo” presente em muitos jovens: “deixamos para amanhã”, “começamos para a semana”, “não... não... no próximo mês”. Uma vocação acertada é um futuro feliz, assumir a vocação com responsabilidade e compromisso é escolher a verdadeira felicidade.


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papa francisco fala contigo > MENSAGEM PAR A A QUARESMA DE 2014

«FEZ-SE POBRE, PARA NOS ENRIQUECER COM A SUA POBREZA» (cf. 2 Cor 8, 9) Por ocasião da Quaresma, ofereço-vos algumas reflexões com a esperança de que possam servir para o caminho pessoal e comunitário de conversão.

Como motivo inspirador tomei a seguinte frase de São Paulo: «Conheceis bem a bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, Se fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza» (2 Cor 8, 9). O Apóstolo escreve aos cristãos de Corinto encorajando-os a serem generosos na ajuda aos fiéis de Jerusalém que passam necessidade. A nós, cristãos de hoje, que nos dizem estas palavras de São Paulo? Que nos diz, hoje, a nós, o convite à pobreza, a uma vida pobre em sentido evangélico?

A graça de Cristo: Tais palavras dizem-nos, antes de mais nada, qual é o estilo de Deus. Deus não Se revela através dos meios do poder e da riqueza do mundo, mas com os da fragilidade e da pobreza: «sendo rico, Se fez pobre por vós». Cristo, o Filho eterno de Deus, igual ao Pai em poder e glória, fez-Se pobre; desceu ao nosso meio, aproximou-Se de cada um de nós; despojou-Se, «esvaziou-Se», para Se tornar em tudo semelhante a nós (cf. Fil 2, 7; Heb 4, 15). [...]

A finalidade de Jesus Se fazer pobre não foi a pobreza em si mesma, mas – como diz São Paulo – «para vos enriquecer com a sua pobreza». [...] Queridos irmãos e irmãs, possa este tempo de Quaresma encontrar a Igreja inteira pronta e solícita para testemunhar, a quantos vivem na miséria material, moral e espiritual, a mensagem evangélica, que se resume no anúncio do amor do Pai misericordioso, pronto a abraçar em Cristo toda a pessoa. E poderemos fazê-lo na medida em que estivermos configurados com Cristo, que Se fez pobre e nos enriqueceu com a sua pobreza. A Quaresma é um tempo propício para o despojamento; e far-nos-á bem questionar-nos acerca do que nos podemos privar a fim de ajudar e enriquecer a outros com a nossa pobreza. Não esqueçamos que a verdadeira pobreza dói: não seria válido um despojamento sem esta dimensão penitencial. Desconfio da esmola que não custa nem dói. Pedimos a graça do Espírito Santo que nos permita ser «tidos por pobres, nós que enriquecemos a muitos; por nada tendo e, no entanto, tudo possuindo» (2 Cor 6, 10). Que Ele sustente estes nossos propósitos e reforce em nós a atenção e solicitude pela miséria humana, para nos tornarmos misericordiosos e agentes de misericórdia. Com estes votos, asseguro a minha oração para que cada crente e cada comunidade eclesial percorra frutuosamente o itinerário quaresmal, e peço-vos que rezeis por mim. Que o Senhor vos abençoe e Nossa Senhora vos guarde!

contemplar > IR. ALZIR A SOUSA, FMA

WHAT WOULD JESUS DO? Todos nós buscamos na vida algo que nos possa fazer felizes. Contudo, fica-nos sempre uma espécie de dúvida interior, porque nem todos encontram a felicidade. Quando colocamos o nosso coração em Deus, esta lógica muda totalmente, porque Deus não é “algo” que nos faz felizes, não é uma “coisa” que podemos “comprar” e sobre quem passamos a ter direitos de propriedade, com o devido direito a dispensá-Lo. Deus é uma pessoa que, em Jesus, se tornou relação, encontro, descoberta e caminho de vida autêntica. Jesus mudou a vida de muitas pessoas que se encontraram com Ele. É esta vida de santidade que desejamos e que, no fundo do ser, reconhecemos no encontro com Jesus, pela escuta da sua Palavra, nos Sacramentos, no corpo de Cristo que é a Igreja, na oração pessoal, no habituar-nos a dar espaço a Jesus como aquele que nos acompanha e a quem perguntamos nos diferentes momentos do dia: é assim que queres que eu seja, que eu fale, que eu ame, que eu faça? (What Would Jesus Do?)

Arrisca percorrer caminhos de verdade, de justiça e doação, os mesmos que Jesus percorreu e está disposto a fazê-lo com cada um de nós. Deixa-te acompanhar ao longo do dia desta interrogação . What Would Jesus Do? E decide-te a segui-Lo!


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vocações com história > PE. ERNESTO GOMES

“O ERNESTO É QUE CANTA MELHOR” O Pe. Ernesto Gomes é o responsável pela Família Salesiana dos Salesianos de Vendas Novas. Por ser de família pobre e numerosa, nos dias em que não havia escola ia servir, isto é, ajudar numa família que desse trabalho e alimentação. Geralmente levava os bois a pastar, cortava lenha, buscava água ou arrancava ervas. O povo de Covas construiu a escola com data de 1934 e contratou uma professora de Curros, Jou, Murça. Na escola ela tinha quarto de dormir, cozinha e uma acompanhante. O povo alimentava e vestia as duas. Só preparava para a 2ª Classe. Mas pensou um dia: “Vou tentar levar a exame da 3ª Classe”. Gostei da ideia. E foi no dia de exame escrito que a professora régia de Tresminas, Laura de nome, perguntou a quem nos acompanhava: “Quem é que sabe cantar o Hino Nacional e o hino da Mocidade Portuguesa?” Os examinandos de Covas responderam em coro: “O Ernesto é que canta melhor”. (E lá fiz de professor de canto pela primeira vez). Com a aprovação na 3ª Classe terminaria eu o meu curso. Mas a mãe do Inácio Santos veio um dia falar com o meu pai, José Gomes, e perguntou-lhe se deixava que o filho Ernesto (que aprendia bem) acompanhasse o filho dela até Revel onde a professora Luís preparava bem os alunos para a 4ª Classe, mas era má: “Exigia e castigava com a palmatória e a cana”. Meu pai respondeu-lhe

cartoon > DIANA ARROBAS

então : “Veremos no fim das sementeiras”. A partir do mês de novembro íamos todos os dias de Covas a Revel onde eu tinha uns tios. Sem nenhum castigo, lá me preparei para o exame de 4ª Classe a fazer em Vila Pouca de Aguiar. Terminada a escola logo meu pai me mandou para a casa do meu Tio Francisco. Tinha eu 11 anos incompletos. Em Tinhela de Cima (onde nasce o rio Tinhela), terra de boa batata mas terra fria, passei a ser pastor de ovelhas, duas vitelas, uma burra e uma cabra. A mistura dava trabalho ao pastor. Além disso, passava os dias só pelos montes. Tinha muito tempo para pensar no presente e no futuro. O meu mundo era limitado. Conhecia as nove povoações da freguesia, Vila Pouca e Pedras Salgadas. Perguntava como era Val-

paços de onde vinha a carreira. Como seria Chaves onde havia água a ferver e donde vinha o comboio a deitar muito fumo. O comboio, diziam-me, passa em Vila Real e pára na Régua. Aí apanha-se outro comboio que vai até ao Porto, onde desagua o Douro e se pode ver o mar. O gosto de saber mais, de conhecer mais, e estar fora da família e da terra ensombrava-me até os dias claros. O meu Tio Francisco tratava-me bem, gostava do meu trabalho, mas notou o meu descontentamento. Perguntou-me então um dia: “Tu não andas contente, porquê?” “Gostava de estudar mais”. Pensou o meu Tio escrever à irmã Aurélia que “fugira” de casa aos 26 anos e era Irmã de S. Doroteia. Aconselhou-se com ela e estive eu para ir para os Jesuítas, ou para os Franciscanos (por ser mais barato). Afinal o meu Tio levou-me um belo dia (de outubro) até à Régua onde encontrei o Zé Maria (Ribeiro) e o Ramiro Pereira com os seus pais. Dali subimos até Poiares. Puseram-me a dormir no “Paraíso” (no andar mais alto que abanava com o vento forte). O Diretor era o Pe. Luís Rossetti, Moisés Pires era assistente e o Sr. Dário, o despenseiro. Três Salesianos amigos… No ano seguinte o meu Tio levou-me a Mogofores onde estudei e fiz o noviciado e a primeira profissão (Mestre de Noviços era o Pe. Afonso M. Nácher). A minha Tia Aurélia foi alguns anos companheira e amiga da Irmã Lúcia (de Fátima) e por ela tive uma bolsa “para apoiar a formação de um sacerdote”. Era das benfeitoras do Estoril e a bolsa foi administrada pelo Mons. António José Moita, pároco do Estoril. Vi-o pela primeira vez em Fátima. Ao ver-me disse com alegre curiosidade: “Então tu é que és o meu Ernesto?” Aos meus tios, ao bom acolhimento dos Salesianos (e ao meu gosto pelo canto, teatro e jogos) devo a graça de pertencer à Família Salesiana.


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animais ferozes > BRUNO FERRERO/BOLETIM SALESIANO ITALIANO

O CÉU DO PADRE UGO

«Chacas está mais próximo do céu do que qualquer outro lugar da terra. Para lá chegar há que subir pelos glaciares dos Andes, percorrer os cinco mil metros, ultrapassar abismos de vertigem e depois descer por declives alcantilados sobrevoados pelo condor, no vale de Conchucos, no departamento de Ancash. Ali entre torrentes, riachos, lagoas, culturas, pastagens e uma moldura natural onde podem ver-se todas as tonalidades de verde, encontra-se a localidade de 1.500 habitantes, capital de uma província que conta mais de vinte mil. A extraordinária beleza deste lugar não é só paisagística, mas social e espiritual, graças ao padre Ugo de Censi, sacerdote italiano nomeado pároco de Chacas em 1976. Alto, eloquente, simpático, magro e ágil, apesar dos seus quase 90 anos, tem uma energia contagiante e uma fé que pode mover montanhas. Em 37 anos que aqui permaneceu, transformou esta região, uma das mais pobres do Peru, num mundo de paz e de trabalho, de solidariedade humana e de criatividade artística». Quem escreve assim é Mário Vargas Llosa, um dos maiores escritores da actualidade, Prémio Nobel da Literatura em 2010, empenhado na luta pela liberdade e pela justiça, conhecido em todo o mundo.

Um sonhador “de ação”

calidades dela dependentes, além de várias escolas, um hospital com cinquenta camas dotado dos mais modernos equipamentos médicos e cirúrgicos, uma escola de enfermagem, oficinas de escultura, carpintaria e design de mobiliário, quintas agrícolas onde se aplicam os mais recentes métodos de cultura e se respeitam todos os requisitos ambientais, uma escola de guias de escalada em altitude, de canteiros, de restauradores de arte colonial, uma fábrica de vidro e oficinas de vitrais, oficinas de têxteis, queijarias, abrigos de montanha, lares de crianças pobres, casas de cuidados, canais de irrigação. E em agosto deste ano abrirá também uma Universidade para a educação de adultos no Chacas. Todo este trabalho não teria sido possível sem o apoio de muitos voluntários italianos, acerca dos quais Vargas Llosa também escreve: “Atualmente há meia centena de voluntários no Chacas e cerca de 350 em toda a região. Vivem muito modestamente, os solteiros em comunidades, os casais com filhos em casas próprias, misturados com os pobres e, repito, não recebem estipêndio algum”. Muitos deles ficam lá com os filhos, e por isso o Prémio Nobel acrescenta: “É divertido ver aquela nuvem de crianças de olhos claros e cabelo louro na missa dominical, misturadas com os meninos e as meninas do lugar, todos a cantar em quéchua, italiano, espanhol e até latim”. No centro de tudo está ele, o padre Ugo com o seu imenso coração e a sua imensa fé.

Jovens do “Oratório dos Andes”, projeto do Pe. Ugo de Censi, constroem habitação. Os jovens são acolhidos no Oratório, onde nos primeiros anos

Este religioso salesiano sonhador é um grande homem de ação com os meios com que, sem pedir um cêntimo ao Estado, levou a cabo uma verdadeira e autêntica revolução económica e social. Construiu duas centrais elétricas e albufeiras que fornecem água e eletricidade à cidade e a muitas zonas e lo-

aprendem a conviver, recebem instrução, catequese e aprendem a fazer pequenos serviços para os mais pobres, como recados, limpezas, recolher lenha. Três anos depois recebem a Confirmação, e passam a integrar o Oratório Maior. Um dos trabalhos é construir as habitações da população mais pobre. Todos os anos são construídas cerca de 200 casas.

Bússola

Jornal da Equipa de Animação Vocacional

Gostavas de conhecer melhor a vocação salesiana? Contacta-nos! pastoral.juvenil@salesianos.pt

vem aí � 19 A 25 DE FEVEREIRO SEMANA MISSIONÁRIA SALESIANA � 23 DE FEVEREIRO DOMISAL - DOMINGO MISSIONÁRIO SALESIANO NAS PARÓQUIAS SALESIANAS � 5 E 6 DE ABRIL PÁSCOA JOVEM FÁTIMA � 10 E 11 DE ABRIL ENCONTROS COM D. BOSCO ESPECIAL PÁSCOA PORTO

sugestões > PE. LUÍS ALMEIDA O SORRISO DE MANDELA de John Carlin É o retrato do líder sul-africano pelo jornalista John Carlin, correspondente do “The Independent” na África do Sul entre 1989 e 1995. Um dos poucos jornalistas estrangeiros que fizeram a cobertura tanto da libertação de Nelson Mandela como da sua ascensão à presidência, período durante o qual o exlíder sul-africano enfrentou os mais temíveis obstáculos e conquistou os seus maiores triunfos. É do mesmo autor “Playing the Enemy, Nelson Mandela and the game that made a nation” que deu origem ao filme “Invictus, o triunfo de Mandela”. A RAPARIGA QUE ROUBAVA LIVROS de Brian Percival É uma adaptação ao cinema do best-seller de Markus Zusak, australiano, filho de mãe alemã e pai austríaco. Conta a história de uma menina e da sua família adoptiva nos arredores de Munique durante a Segunda Guerra Mundial.


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