Revista loguia - 2ª Edição

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EXPEDIENTE A LÓGUIA é uma publicação trimestral da Igreja Batista Ágape. Os artigos encomendados pela revista têm prioridade na publicação. Artigos enviados espontaneamente poderão ser publicados caso sejam aprovados pelo Conselho Editorial. As opiniões expressas nos artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

Participaram dessa edição: André de Sousa Freitas Denise Levi Elenice da Silva Gérson Nascimento Janderson Silvestre

Juliany Tamieh de Oliveira

André de Sousa Freitas Editor Chefe

Marco de Souza Freitas

Priscila Regis Projeto gráfico e Diagramação André de Sousa Freitas Daniel de Freitas Elenice Silva Janderson Silvestre Lucas Vargas Priscila Regis Comissão Editorial e Revisão Rua Sergipe Nº 322 , Parque Paraíso. CEP 06852-080 . Itapecerica da Serra - SP

www.batistaitapecerica.com.br/revista e-mail: agape.publicacao@gmail.com

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Jota Silvestre

Daniel de Freitas Lucila Freitas Nelson da Silva de Souza Marilda de Araújo Lui de Souza Pastores

LÓGUIA

JANEIRO 2016

Márcia Nascimento

Valdete dos Santos Freitas

To d as as im agen s co n tid as n essa ed içã o sã o d e uso l ivr e par a fin s n ão co m er ciais, e fora m r etir ad as d o s sites d escr ito s abaix o. É expr essam en te pr o ibid a a sua r epr o d u çã o com in tuito l ucr ativo , se j a d e fo r m a par cial ou tota l; co n fo r m e l ei 9. 610/98 so br e Dir eito s A u tora i s. pexel s. co m | un spl ash . co m fr eepik. co m | sitebuil d er r epo r t. co m


Índice

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Como está sua autoestima?

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O tempo e a impaciência

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Influências da malformação genética do lábio leporino à personalidade

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Memórias de um paciente

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O tempo na física moderna

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O conhecimento dos moradores de São Paulo sobre produtos de pecuária orgânica

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Panorama histórico de Israel no Período Pré Patriarcal

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O tempo e sua relação com o indivíduo na filosofia ocidental

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Trabalho Ético ou Workaholic

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Retrospectiva Ágape 2016

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Tempo LÓGUIA

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Editorial Prezado leitor,

É com imensa satisfação que vos apresentamos a segunda edição da Revista Lóguia. Nesta edição preparamos abordagens diversas sobre o tema gerador “tempo”, que vão de suas implicações na física, na filosofia, na psiquê humana e nas relações trabalhistas. Além destas reflexões, temos também a publicação de alguns trabalhos acadêmicos, que versam sobre áreas ligadas à saúde e a teologia.

Você terá ainda uma narrativa com as reflexões de um paciente em um ambiente hospitalar, e a retrospectiva dos principais eventos da Igreja Batista Ágape em 2016. Boa leitura e lembrese que a revista é aberta a todos: você também pode submeter sua matéria para nossa avaliação e publicação.

Os Editores

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Como está sua

autoestima?

Fo to : D i v u l g a ç ã o

Por: Denise Levi

É

muitodifícilterumautoconhecimento a ponto de entender nossos sentimentos e comportamentos, na grande maioria das vezes apenas gostamos ou não do sentimento e do comportamento que temos. Alguns sentimentos e comportamentos que não nos agradam podem ser resposta de um complexo de inferioridade, e tomar consciência disso pode nos ajudar a reverter esta situação. Se você não consegue enxergar suas qualidades, sempre acha que o outro é mais bonito, inteligente, capaz,

colocando sempre em cheque as suas competências, é um grande alerta para pensar no complexo de inferioridade. Claro que uma vez ou outra ter estas sensações é saudável, o problema é quando nos domina, então é hora de procurar ajuda. O “complexo de inferioridade” não é nada novo, esse conceito foi criado por Alfred Adler (1870-1937), médico psiquiatra, para nomear sentimentos de insuficiência e até incapacidade de resolver problemas [1], o que faz com que a pessoa se sinta um fracasso em todos, ou em alguns aspectos de

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sua vida. Hoje chamamos de baixa autoestima, quando a pessoa não tem consciência de seu valor. Este tipo de comportamento é nocivo para a própria pessoa e para quem se relaciona com ela, tornando a relação complicada, tanto no âmbito social como no pessoal. Esse complexo geralmente tem origem na infância e se forma através de algumas situações: quando a criança se sente rejeitada, excesso de cuidado, e diferenças orgânicas das demais crianças. A rejeição ocorre quando a criança não encontra nos pais o apoio necessário para seu desenvolvimento emocional. Não que isso seja intencional dos pais, mas pode ser um despreparo, uma gravidez indesejada, desejar que a criança tivesse nascido com outro sexo entre outros. Para que a criança se torne um adulto confiante ela vai precisar receber dos pais amor, carinho, compreensão, limite, atenção e regras, e quando isso não ocorre na medida correta ela não desenvolve uma segurança adequada podendo se transformar em um adulto inseguro que precisa da aprovação e reconhecimento dos outros, incapaz de se sentir amado ou amar, fria ou dura com sentimentos, carente e incapaz de dizer não. Uma gravidez indesejada, por exemplo, pode resultar na falta de amor, na falta de compreensão, na falta de carinho – fatores 6

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essenciais para a criança desenvolver a confiança. Ou seja, se ela não sente confiança em suas habilidades e não se sente digna de receber amor e afeto dos outros, quando adulta, a tendência é que ela venha a se tornar uma pessoa mais fria, dura, ou extremamente carente, dependente da aprovação e reconhecimento de outras pessoas. Esses fatores distanciam a pessoa de quem ela é, o que a faz cada vez mais ser o que o outro deseja, o que reforça o sentimento de menos valia. O contrário da falta de afeto também pode resultar em complexo. Isso porque uma criança excessivamente mimada, que os pais fazem tudo por ela, ficando superprotegida, pode desenvolver um sentimento de insegurança [2], por não sentir confiança em suas próprias habilidades, uma vez que os outros sempre fizeram tudo por ela. Já as diferenças orgânicas ocorrem quando a criança se vê diferente do padrão estabelecido como normal, o âmbito físico que pode ser a obesidade, magreza, falta de membros, cabelo crespo, orelhas grandes ou qualquer motivo de preconceito que a criança sofra, como bullying. Esta situação causa um isolamento gerando sentimento de inferioridade ou incapacidade de competir com os demais. Se você se identificou com qualquer uma das situações saiba que tem solução para melhorar a autoestima, olhando a situação passada com outro olhar, que não mais de


uma criança indefesa, mas de um adulto que tem como modificar sua vivência, ressignificando situações que muitas vezes nem lembramos, mas que nos domina. Se por alguma razão neste momento você não pode procurar um profissional, segue algumas dicas para minimizar os efeitos da autoestima rebaixada.

1) Evite as comparações, e quando perceber que isso está ocorrendo, exercite seu pensamento para ficar no controle. 2) Tente compreender o porquê se sente menos competente que o outro e verifique qual sentimento está te movendo, procure analisar a situação por outro ângulo. 3) Enfrente seus medos, não deixando que eles lhe paralisem, entendendo que estes medos são fantasmas do passado que podem ser vencidos. 4) Perceba suas qualidades e defeitos de forma racional, ressaltando suas qualidades. 5) Não permita que te maltratem ou te desprezem, exija ser respeitado. 6) Valorize tudo que você conquistou.

O que já aconteceu não poderá ser mudado, mas seu futuro depende de você tomar atitudes visando mudança e saiba que se não conseguir sozinho você pode contar com um psicólogo para lhe auxiliar.

___________________________

Denise Levi é psicóloga. deniselevipsico@hotmail.com

Contato:

Referências [1] ZAGO, R. Complexo de inferioridade, o que é isso? Disponível em: http://www. somostodosum.com.br/artigos/corpoe-mente/complexo-de-inferioridadeo-que-e-isso-08985.html. Acesso em Janeiro de 2017. [2] TEIXEIRA, N. L. Alguns aspectos da problemática médico-social do complexo de inferioridade. Disponível em www.revistas.ufpr.br/direito/article/ download/6670/4772. Acesso em Janeiro de 2017.

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Fo to : D i vu l gaçã o

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O tempo

e a impaciência Por: Janderson Silvestre

“Como são pobres os que padecem de impaciência! Que ferida jamais curou-se de outra forma senão aos poucos? Tu sabes que nós operamos através da mente e não pelos espíritos. E a mente depende do lento desdobrar do tempo.” (Otelo, ato II, cena III).

“Como são pobres os que padecem de impaciência!” Com essa lacônica frase Iago interpela Rodrigo na célebre peça de Shakespeare (1999), Otelo. Na continuação de sua fala, Iago diz ainda: “E a mente depende do lento desdobrar do tempo”. Ora, encontramos aqui nesses breves enunciados, três categorias postas em íntima relação: o tempo, a paciência e a pobreza. Nos cabe perguntar: A que pobreza Iago se refere? Talvez as duas frases intermediárias, que se encontram entre as duas antes citadas possam nos oferecer uma resposta. Ele diz assim: “Que ferida jamais curou-se de outra forma senão aos poucos? Tu sabes que nós operamos através da mente e não pelos espíritos.”

Quem conhece o enredo da peça sabe que a “operação” a que Iago se refere é uma obra maquiavélica, perpetrada por ele com intuito de destruir Otelo, seu comandante, por meio de sutis ardis que visavam minar a confiança de Otelo em sua noiva, Desdêmona. Efetivamente, o astuto Iago consegue seu objetivo. Todavia, a despeito de sua trama vil, que grande sabedoria Iago nos mostra! A pobreza a que Iago alude é uma pobreza de espírito, uma fragilidade mental. São pobres aqueles que não podem suportar o adiamento de uma satisfação. São pobres ainda, aqueles que não podem conviver com os momentos de sofrimento. Virou lugar comum dizer que vivemos numa sociedade do imediatismo e

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criticar a chamada geração fast-food, e não quero aqui reforçar velhos jargões e velhas críticas que a nada levam. De fato, vivemos tempos acelerados, em que as informações nos chegam a cada instante de todos os cantos do mundo, em que as nossas possibilidades de obtenção de prazer estão cada dia mais presentes e prementes. Precisamos gozar do prazer imediato para que tenhamos tempo de provar do próximo que está logo adiante. A falta de profundidade de nossas relações e a falta de profunda entrega em atividades cotidianas também faz parte das recorrentes críticas direcionadas à sociedade moderna. Não quero, porém, falar disso tudo, mas do contraponto disso. Não quero falar de nossas relações com as pessoas e com as coisas, mas quero tecer alguns poucos comentários a respeito da relação existente entre o tempo e transformações interiores. “A mente depende do lento desdobrar do tempo”, diz Iago. Podemos expandir aqui o termo Mente, para pensar em todo o nosso mundo interior, em nossas relações intrapsíquicas, na completude de um psiquismo que não se restringe ao que pode ser percebido, mas também, e principalmente, ao que não é percebido. Aquilo que nos move, que nos toma, que influencia as nossas ações, sem que nos demos conta. 10

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Quem de nós nunca olhou para certas ações empreendidas por nós mesmos e perguntamo-nos: “Por que fiz isso? Por que disse isso? Não deveria ter dito. Não deveria ter feito.” Mas no dia seguinte fazemos novamente. Vejamos um exemplo clássico: um rapaz ou uma moça apaixonada. O rapaz (ou a moça) sabe pela experiência que o objeto de sua paixão não o quer como nada mais que um amigo. A moça já deixou isso claro de muitas formas possíveis. Mas o rapaz, ao ouvir uma palavra um pouco mais doce que a moça lhe dirige, enchese novamente de esperança, realiza investidas que são outra vez e mais uma vez frustradas. Aliás, as relações amorosas e as relações, de um modo geral, são exemplos muito pertinentes de situações em que nosso conhecimento consciente do mundo, baseado em reflexões e ponderações, em estudos, em experiências vividas, não bastam para explicar certas ações, certos pensamentos que nos surgem e, muito menos, para modificá-los. Eu poderia citar inúmeros exemplos aqui, mas estou certo que cada um poderá pensar em experiências em suas próprias vidas. Ora, esses exemplos nos mostram que, a despeito de nosso conhecimento, de nossas percepções, daquilo que sabemos e do que está disponível em nossa mente para nossa apreciação e avaliação consciente, há sempre algo que nos


escapa, que nos faz pensar, sentir, dizer coisas que mal sabemos de onde derivam. O Eu não é senhor dentro de sua própria casa, disse Freud (1917-1996) há quase 100 anos. Essa ideia contém em si outro modo de entender o ser humano, diverso da lógica cartesiana: “Penso, logo, existo”. Ora, quando passamos a entender que aquilo a que chamamos Eu, é apenas uma estrutura dentre outras estruturas que compõe a psique humana, isto é, quando entendemos que não somos unos, que o Eu, a sede de nossa consciência, é a apenas uma parte (e, cabe dizer, uma pequena parte) daquilo que chamamos de nossa mente, entendemos então que a existência não pode ser limitada ao pensamento ou ao conhecimento consciente. A lógica poderia, então, ser repensada em outros termos: “Existo também onde não penso”, “onde não penso, onde não sei, ali também existo, ali ainda sou eu”. Uma importante característica dessa outra parte de nosso psiquismo, essa parte que escapa ao nosso conhecimento consciente, é a atemporalidade, o que significa que ele não se desenvolve com base numa lógica evolucionista, em que aquilo que uma vez fez parte dele, é abandonado e substituído por algo de qualidade mais avançada. O desenvolvimento psíquico se dá por uma conservação do passado. Aquilo que foi não deixa de ser e sim continua

sendo, junto com a novidade que agora se apresenta. Isso significa que aquilo que é lembrança para nosso pensamento consciente, isto é, uma abstração pertinente a algo que já não existe mais, para essa outra parte de nós, para o inconsciente, continua existindo. É fato. Não importa se aconteceu há 10, 20 ou 30 anos. O inconsciente é atemporal. Qual a relação desses dois exemplos com o tema O tempo e a impaciência? Bem, retorno à frase de Otelo, que diz: “A mente depende do lento desdobrar do tempo”. Ora, levando em consideração que ao falar de mente, estamos nos referindo a todo esse arranjo que tentei descrever de maneira muito sucinta, a saber, que a mente não é una (O Eu é apenas uma parte de um complexo sistema psíquico) e que uma parte importante de nossa mente (o inconsciente) é atemporal, devemos nos perguntar como é possível proceder a uma verdadeira mudança no nosso mundo mental, que tenha real influência no nosso modo de pensar, sentir e agir? Não pretendo, nesse curto texto, oferecer uma resposta a essa questão, mas apenas apontar que, dada a complexidade de nossa vida mental, não é do dia para a noite que verdadeiras mudanças acontecem. Proliferam-se guias de autoajuda, oferecendo respostas fáceis para problemas complexos. Guias que orientam mudanças rápidas de comportamento e grandes mudanças de vida. LÓGUIA

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Isso me leva ao problema da impaciência, e aqui chamo atenção para a impaciência conosco mesmos. Quanto tempo leva para que possamos mudar ações que são danosas para nós mesmos? Quanto tempo leva para que possamos entrar em contato com conteúdos mentais profundos, proceder a uma verdadeira mudança interior? Não sabemos. Não se trata apenas de vontade ou, como dizem por aí, “força de vontade”. Aquilo que nos constitui, que nos move, é muito mais amplo e mais profundo do que pura e simplesmente vontade ou desejo consciente. E nem tudo pode ser mudado pelo pensamento racional ou pela reflexão pura e simples. O tempo da mudança não é o tempo cronológico. Não é o tempo do relógio, da passagem dos dias, do dia para a noite e novamente da noite para o dia. Verdadeiras mudanças são graduais e seus passos são, muitas vezes, imperceptíveis, pois envolvem alterações profundas e demandam tempo. Às vezes muito tempo. “O lento desdobrar do tempo”, como já disse Iago. ___________________________ Janderson Silvestre é psicólogo.

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Referências bibliográficas Freud, S. (1917/ 1996). Uma dificuldade no caminho da psicanálise. Trad. Jayme Salomão. Ed. Standard das obras completas de Sigmund Freud. Vol. XVI. Rio de Janeiro: Imago. Shakespeare, W. (1999). Otelo. Porto Alegre: L&PM.


Influências da malformação genética do lábio leporino à personalidade

Fo to : D i v u l g a ç ã o

Por: Valdete dos Santos Freitas

Fissuras labiopalatais ocorrem em um para cerca de 650 nascimentos, sendo decorrentes de malformações congênitas entre a quinta e a oitava semana do desenvolvimento embrionário (Carvalho e Tavano, 2000). Além das implicações estéticas, as fissuras labiopalatais também afetam o plano funcional e psicossocial do seu portador. Essa malformação se caracteriza por uma fenda labial unilateral ou bilateral na parte superior da boca, acompanhado ou não de fenda palatina.

Colares e Richman (2002) indicam que as mais significativas influências dessa condição sobre a personalidade do indivíduo portador ocorrem ainda na infância, e se relacionam a reação de aceitação ou rejeição dos pais, o desenvolvimento da fala, que, quando prejudicado, afeta o desenvolvimento da linguagem e por fim, o desenvolvimento intelectual como um todo. Além destes fatores, o comportamento da sociedade diante de deformações faciais também LÓGUIA

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implicam em influências de personalidade ao portador do lábio leporino. Na fase escolar, a inibição à fala decorre de reações negativas dos colegas, irmãos, amigos, pais e professores. A criança portadora da malformação tenderá a evitar expressões faciais que são comuns e tomam parte no processo de construção da linguagem, por se considerar de aparência atípica e de interpretação singular para os outros. Mesmo a linguagem através da fala também tenderá ser inibida, uma vez que o portador entenderá que sua dificuldade de expressão vocal implica em maior dificuldade de ser compreendido pelos colegas. Todo esse processo de inibição pode levar ao desenvolvimento de problemas educacionais e psicológicos. O problema da inibição na fase escolar leva a fatores psicológicos considerados secundários, como a inibição do comportamento como um todo, menor rendimento escolar, baixa autoestima. A adequação dessa criança fica ainda mais complicado com estes fatores psicológicos secundários.

Influências ao comportamento 1.1 Influências paternas A identificação de uma alteração física em um recém-nascido pode ter efeitos 14

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traumáticos para os pais, que respondem a tal circunstância com ansiedade, choque, raiva, depressão ou frustração. A reação dos pais a esse tipo de ocorrência segue um padrão categorizado por Cohen (1982) em cinco estágios: a tristeza, a negação, o equilíbrio e a reorganização. Colares e Richman (2002) mencionam ainda que os pais de crianças com fissuras labiais não encorajam seus familiares e amigos para visitarem a criança logo após seu nascimento. Isso ocorre porque, ainda na gestação, os pais criam uma imagem perfeita para seu filho, e poucas mulheres e homens estão preparados para o choque emocional decorrente da realidade de se ter um bebê com algum tipo de deficiência física. Em um estudo onde se comparou as atitudes dos pais em relação aos filhos com e sem fissuras labiopalatais identificou que crianças do sexo masculino portadoras de fissuras labiopalatais sentem um intenso controle psicológico da mãe, ou seja, as crianças percebem um cuidado que excede o grau de proteção natural materno, sugerindo assim haver uma possível tendência de superproteção por parte da mãe. 1.2 Influências da Aparência Física Sendo a aparência física, em especial a fisionomia, um aspecto importante na socialização do indivíduo, o portador da lábio leporino comumente se


sente desfavorecido socialmente. Por consequência de um complexo conjunto de vícios comportamentais da sociedade, os indivíduos com aparência mais atrativa recebem maior atenção e são atendidos favoravelmente um maior número de vezes que aqueles considerados não atraentes ou com deficiências visíveis. Assim, os portadores de fissuras labiopalatais se sentem em geral em desvantagem social. Essa desvantagem se reflete em várias áreas, como a escolar, e na fase adulta, no trabalho. Verificou-se, também, haver uma relação entre o desempenho escolar e a aparência física de crianças portadoras de deficiências físicas visíveis. Assim, pode-se sugerir que uma deformidade facial pode favorecer uma enorme dificuldade nas interações sociais (Colares e Richman, 2002). As influências da aparência física não se restringem a atenção e cuidado alheio recebidos, mas também, e ainda mais grave, ao julgamento quanto às habilidades e comportamentos da pessoa. Estudos mostram que em ambiente escolar, crianças evitam escolher colegas com deficiência aparente para realizem tarefas escolares (Richman e Harper, 1978). No mesmo estudo, constata-se que mesmo os professores tendem, mesmo sem o perceber, a subestimar a capacidade de alunos portadores de deficiências como fissuras labiopalatais.

Assim, um menor rendimento escolar tem sido identificado nas crianças com fissuras labiopalatais, e o menor grau de coeficiente de inteligência verificado nessas crianças deve ser entendido como consequência de sua dificuldade verbal e falta de estímulo específico por parte dos pais e professores no sentido de o fazer superar tal dificuldade ou compensá-la de alguma forma. De uma forma geral, as crianças com fissuras labiopalatais constituem um grupo de risco para dificuldades de aprendizado e baixo rendimento escolar, como indicam Broder, Richman e Matheson (1998). 1.3 Comportamento e personalidade Além da inibição decorrente da reação alheia a sua deformação, crianças com fissuras labiopalatais apresentam maior grau de ansiedade e estresse, relacionados em grande parte pela dificuldade da fala e seus desdobramentos sociais, consolidando um quadro geral de baixa autoestima. Com o passar dos anos, na juventude, o grau de inibição tende a cair, especialmente nas mulheres. A personalidade do portador de lábio leporino é afetada pelas influências negativas recebidas desde a primeira infância, e na maturidade, pode manter o comportamento marcado por inibição social, mesmo em menor grau se comparado a inibição durante a infância.

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Conclusão

Referências

Os fatores de influências na infância desencadeiam no indivíduo portador de lábio leporino um alto grau de inibição. Decorre principalmente da dificuldade na fala e da aparência os problemas de socialização e dificuldades de aprendizado. Crianças portadoras dessa malformação carecem, em medida especial, atenção de equipe multidisciplinar e intervenção precoce.

[1] Colares, V. Richman, L. Fatores psicológicos e sociais relacionados às crianças portadoras de fissuras labiopalatais. Pedriatr. Mod. 38(11), pág. 513-516 (2002).

__________________________ Valdete dos Santos Freitas é aluna de psicologia. Contato: valdetedossantosfreitas@gmail.com

[2] Carvalho, A.P.B.; Tavano, L.D. Avaliação dos pais diante do nascimento e tratamento dos filhos portadores de fissura labiopalatal, no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo - Bauru. Pediatria Moderna, v. XXXVI, 12 , dez, 2000. [3] Richman, L.; Harper, D. School adjustment of children with observable disabilities. Journal of Abnormal Child Psychology 6:11-18, 1978. [4] Broder, H; Richman, L; Matheson, P. Learning disability, school achievement, and grade retention among children with cleft: a two-center study. Clef PalateCraniofacial Journal 35:127-131,1998.

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Memórias de um paciente

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Por: Marco de Souza Freitas

qui na emergência há muitos pacientes, uns já receberam alta, chegaram outros e a rotina continua. Pena que a minha memória é falha em decorar nomes, mas a “vovó”, uma paciente bem idosa e faladeira incomodava tanto que chegava ser engraçada, ela chamava

por seu neto o tempo todo. Do meu lado, por bastante tempo permaneceu o “Morgan Freeman” baiano. O nome dele é Joaquim (os nomes foram todos alterados). Coitado, ele está num estado mental precário e precisou ser amarrado, ele até me pediu uma faca pra cortar suas amarras, acredita?

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A dona Helena é uma senhora interessante, ela já teve quatro AVC’s e está aqui por causa de sintomas do mesmo problema. Ela é bem familiarizada com os médicos e com o ritmo do hospital. Nos primeiros dias ela estava bem humorada e risonha, simpática e colaborativa. Hoje ela mudou, seu humor foi-se embora, ela arrancou o avental e ficou muda e emburrada feito criança, vai entender? Apesar de tudo ela parece estar voltando ao normal. É sim, é um ambiente estressante e nem te conto as minhas primeiras reações ao chegar na “casa da agonia”. A “casa da agonia” é bem apertada, de um lugar projetado para cinco leitos agora tem dezoito leitos abarrotados e é assim que está agora. Um calor infernal, mas com tudo isso eu me sinto o paciente mais privilegiado daqui, posso caminhar até o banheiro, posso beber água, conversar de boa e tomar banho. O banho aqui é numa garrafa pet de água mineral. Eles amornam a água e fazem vários furinhos na tampa da garrafa, não para por aí, eles dão um frasco de sabonete líquido inodoro, os demais pacientes usam fraldas e sondas. O maior problema aqui é o caos humano ao redor, uns gemendo outros reclamando, outros balbuciando palavras ininteligíveis, outros chiando e às vezes gritando. A casa é acolhedora, hora a hora chega mais um paciente, outros saem. Daqui vejo a sala de choque, ali se vê os 18

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horrores, são os pacientes mais precários e emergentes. Desde que cheguei aqui já presenciei dois óbitos. O primeiro de uma jovem que se acidentou numa colisão de carros e o outro de um jovem por acidente de moto, não exatamente por um acidente, mas foi overdose de drogas, ele caiu da motocicleta por esse motivo. Imagens horríveis. Os técnicos, as enfermeiras e os doutores são verdadeiros heróis, são “pau pra toda obra”, não temem nada, enfrentam tudo, até trocar fralda de idosa. Aplausos, eles são a mão de Deus nesse lugar. No segundo dia que esteve aqui o Doutor Álvaro, um jovem cheio de vida e empolgação, inteligente e atencioso teve a sua tarde completamente ocupada, ele implantou um marcapasso no coração de um paciente, como demorou! Eu notei tensão e pressa no semblante de Álvaro, o paciente está bem e é o mais chato da turma agora. Não sei o nome daquela senhorinha lá do canto, quando deitada ela é a cara do meu finado avô por parte de pai, que Deus o tenha. Isso mesmo, ela se parece muito com ele. Ela é a senhora mais comportada e simpática daqui. Sorri a toa e é bem legal, ela vive lendo uma revista sobre eventos da Igreja em Aparecida do Norte. Afeiçoei-me muito a ela.


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Aqui a equipe médica funciona por plantões, existe o plantão da manhã, o da tarde, o da noite e o da madrugada, o pior é o da madrugada, pelo menos o da segunda noite, um dos técnicos é bruto e arrogante, já a enfermeira desse plantão é um amor de pessoa, uma mulher de meia idade morena alta e séria, muito profissional e teme a Deus. Existe um fato interessante quanto aos doutores, eles parecem clones! Na educação, no jeito de falar, feição sempre séria, mas simpática, falam pouco e ri menos ainda, parecem robotizados. As mais estressadas são as enfermeiras e os técnicos de enfermagem, aff... eles não param um segundo sequer, não sei como aguentam.

O que mais me apavora aqui são as medicações, que não vem em barras de chocolates, mas sempre vem por aquelas agulhadas. O aparelho de medir pressão não para de sufocar o braço da gente. Quando me chama pelo nome eu gelo. Há, como eu poderia me esquecer daquela senhora, a dona Joana, coitada, ela tem bronquite asmática e faz uso de oxigênio entubado, o melhor é que ela já teve alta. Mas ela era um sarro, parecia aquelas bruxas de desenho animado. Mas o fato engraçado era o jeito dela, sabe aquelas pessoas que são engraçadas sendo sérias? Era ela. Ontem aqui teve uma evasão, evasão é

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quando um paciente decide ir embora antes da alta, pois é, um paciente perdeu a paciência, irônico. Cenas engraçadas se veem por aqui também, e acredito serem de preciosa importância aqui. Uma delas é o ciúmes de um dos técnicos por uma técnica, e não são namorados, mas ele tem ciúmes de um doutor que arrasa o coração da pobre carente. O doutor por outro lado é um cara tão sério feito delegado, é o senhor sério. Onde se viu amigos ciumentos? Aqui eu aprendi uma coisa com o doutor Álvaro, que grito demais é sinal de duas suspeitas, a primeira é que pode ser muito grave a situação, e a segunda é pura frescura, e na maioria das vezes é a segunda opção. Mais uma noite passarei aqui, estou louco pra ir embora, mas, sem dúvida está sendo pra mim uma valiosa experiência, uma das piores da minha vida, mas não há dúvidas de que existe mais de que um propósito em tudo isso. Já escrevi o suficiente do que os meus olhos viram por aqui. Hã, é claro, não poderia deixar de dizer sobre as horas mais nobres desses dias, não é a hora de dormir, apesar que sono aqui é aliviador, nem a hora da comida, porque a daqui é horrível ao paladar assim como é horrível seu cheiro. Mas estou me referindo aos preciosismos minutos de visita. 20

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Não tenho muita coisa a dizer por que receio não conseguir expressar a emoção, felicidade e alívio quando vejo entrar na sala aquele rostinho lindo risonho e penetrante da minha cheirosa e amável esposa, ou dos meus queridos pais e irmãos. É simplesmente maravilhoso, é de dar nó no ‘garguelo’. Aqui só não posso pensar demais nelas, os meus amores, e principalmente nela, cagona, chorona, mas gostosa, fofa, linda guria. Ah! Como eu quero te segurar, ver essa boquinha desenhada e minúscula, saudade de você flor, bênção na minha vida. Deus é bom na vida em todas as suas faces, mesmo naqueles momentos indesejáveis mais necessários. Apenas mais uma observação nos dias da minha internação... Dos lados e à frente só se vê pacientes, macas, médicos, e aparelhos, mas acima, além dos aparelhos e dos monitores e suportes para medicações se vê a criatura, horripilante mais intrigante, quase não se mexe, só o vento pode te mover sem o seu consentimento, nunca te vejo comer, mas sempre está, ou pelo menos parece estar à espreita, poderosa e majestosa, aposto que ninguém te viu, mas eu sim te vi e te retratei, pois tu és a rainha dos aracnídeos desse pequeno espaço!


Fo to : D i v u l g ação

O tempo

na física moderna Por: André de Sousa Freitas

Isaac Newton definiu, em 1846, o conceito de tempo absoluto: “O tempo absoluto, verdadeiro e matemático, por si só e por própria natureza, flui uniformemente, sem relação com nenhuma coisa externa, e é também chamado de duração” [1], e sua concepção de tempo absoluto, que já era corrente entre os cientistas de seu tempo, continuou válida até o século XX, quando a teoria da relatividade, proposta por Albert Einstein em 1905,

veio trazer uma nova e revolucionária concepção sobre o tempo.

Tempo relativo A nova concepção relativista sobre o tempo levanta questões intrigantes e mesmo paradoxais. A primeira grande quebra de paradigmas da concepção clássica (aquela do tempo absoluto

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de Newton) é a de que o tempo não é absoluto: ele pode passar de forma distinta para cada observador, e o conceito físico de observador se restringe a uma pessoa ou algo que possa medir o tempo de onde está. A condição para que o tempo passe diferente para dois observadores é bastante simples: basta que eles tenham algum movimento relativo entre si. Se por exemplo, um observador estiver parado (em relação a você, por exemplo) e o outro estiver em movimento, então o tempo passa em ritmo diferente para esses observadores. Mas essa diferença de ritmo do tempo é muito pequena, sendo totalmente imperceptível, e só chega a ser relevante quando objetos viajam em velocidades muito altas, próximas a velocidade da luz no vácuo, que alcança a incrível marca de cerca de 300 mil quilômetros por segundo. Tal conclusão já foi verificada em testes bastante confiáveis, um destes testes consistiu no uso de dois relógios atômicos de alumínio de altíssima precisão – sua marcação de tempo é tal que a possibilidade de acumular 1 segundo de atraso ocorre a cada 3,7 bilhões de anos – onde um deles foi deixado em repouso no laboratório e o outro foi colocado em movimento em relação ao primeiro, e o experimento comprovou a teoria: os relógios mostraram haver diferença no fluxo do tempo entre as marcações dos relógios [2]. Mas não é só o movimento 22

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relativo entre os observadores que afeta a forma como o tempo passa: a ação gravitacional também. Assim, se um indivíduo está na superfície da Terra, como nós estamos, o tempo tem, naturalmente, um compasso; mas estando alguém longe do planeta, ou que seja um pouco mais afastado da superfície da Terra, de modo que a ação da força gravitacional da Terra seja menor para este suposto observador, o tempo passará para este de forma distinta daquele primeiro.

Simultaneidade e causalidade Desse novo conceito de tempo, relativo, advém inúmeros resultados curiosos. Alguns deles se relacionam à análise de dois eventos (considere um ‘evento’ qualquer acontecimento que possa ser definido por sua posição no espaço e instante de ocorrência no tempo): se dois eventos ocorrem em locais distintos, mas exatamente no mesmo momento, então eles não podem estabelecer relação de causalidade. Ou seja, entre dois eventos simultâneos, um não pode ser consequência do outro. E essa conclusão é fundamentada em questões puramente físicas. O fato é que a relatividade do espaço e do tempo quebra o princípio da simultaneidade absoluta: o que é simultâneo para um observador pode não ser para outro, e a causalidade é impossível nesse caso


porque eventos simultâneos podem ser observados de forma não simultânea dependendo do estado de observação, e mais do que isso, se os eventos em questão forem, digamos, duas lâmpadas que piscaram simultaneamente, para algum observador distinto, ele pode ver os eventos de forma não simultânea, por exemplo, a lâmpada A piscar primeiro que a lâmpada B, mas um outro observador poderá ver a lâmpada B piscar primeiro que a lâmpada A. Assim, a conclusão óbvia é a de que o piscar de uma das lâmpadas não pode ser considerado causa do piscar da outra, pois se assim fosse, um dos observadores veria a consequência antes da causa, o que é absurdo. Isso, evidentemente, não vale para quaisquer dois eventos, mas apenas para eventos que possam ser vistos de forma simultânea. Como indica Fleming (1989) [3], por outro lado, se dois eventos ocorrem com uma diferença de tempo entre eles mas exatamente na mesma posição do espaço, digamos, o piscar de uma mesma lâmpada por duas vezes, então esse par de eventos não será jamais visto em ordem temporal inversa. Explicando melhor: digamos que a primeira piscada ocorreu com brilho amarelo e a segunda com brilho azul, não existe qualquer possibilidade desses eventos serem vistos por outro observador em ordem contrária, que

seria a primeira piscada azul e a segunda amarela, e essa impossibilidade garante a existência da causalidade e proíbe, de certo modo, a reversão temporal. Alguns entusiastas da ciência insistem na possibilidade da viagem no tempo (voltar ao passado ou ir ao futuro), mas essa suposição é considerada utópica se analisada friamente e à luz do que realmente é estabelecido como conhecimento científico até o presente.

A estatística e a seta do tempo Uma questão que por muito tempo despertou a atenção dos físicos é a da seta do tempo. A preocupação aqui era a de buscar onde, exatamente, se define porque o tempo flui em uma direção e não na direção inversa. Isso porque até meados do século XIX, todas as leis da física eram simétricas ao tempo, ou seja, a queda de um objeto devido a ação da gravidade é tão bem explicável pela física de Newton quanto seu movimento reverso de subida (se pensarmos no filme voltando da queda do objeto), já que esse objeto, se lançado para cima com a mesma velocidade com que atingiu o solo, faria exatamente o movimento do filme reverso. Isso vale para as leis da mecânica, do eletromagnetismo, dos fluidos e mesmo da termodinâmica da época. Mas foi exatamente nos avanços da termodinâmica que a assimetria da física para com o tempo foi descoberta,

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mais especificamente, na análise estatística dos constituintes da matéria. Feito de átomos e moléculas, um gás se expande quando tem sua temperatura aumentada, isso porque suas moléculas, devido a maior energia térmica do gás, se movem aleatoriamente mais velozmente, fazendo aumentar a distância média entre elas e o volume do gás como um todo. Acontece que as leis da termodinâmica indicam que uma importante grandeza, chamada entropia1, que está associada ao fluxo de calor entre diferentes objetos de um mesmo sistema termodinâmico, sempre aumenta em qualquer processo térmico natural, isso porque um processo onde a entropia diminui corresponde a um processo de fluxo de calor não espontâneo, como se dois corpos com temperaturas inicialmente iguais evoluísse espontaneamente para temperaturas distintas. A busca pela assimetria temporal, ou seja, em qual lei da natureza se distingue a direção do fluxo do tempo, fazendo com que haja diferença entre ir do presente para o futuro ou ir do presente para o passado, está sutilmente escondida na análise estatística da matéria, e o físico escocês James Maxwell propôs um experimento mental para compreendermos a

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questão, trata-se do “demônio de Maxwell”: suponha que um gás está confinado em um recipiente com duas partições, e entre essas partições há um orifício que os liga. A única forma que fazer com que este gás, que está em equilíbrio térmico (temperaturas iguais nas duas partições), entre em desequilíbrio espontaneamente é se um demônio se ocupasse de selecionar, cada molécula, separando-as para cada partição, aquelas com maior energia das menos energizadas, de modo que, em uma das partições ficassem apenas as moléculas mais energizadas e na outra as menos energizadas. Isso resultaria em desequilíbrio térmico “espontâneo” (a menos da ação do demônio), mas não havendo esse demônio, essa separação espontânea é impossível devido a um único favor: sua impossibilidade estatística. Em outras palavras, se a separação entre moléculas mais e menos energizadas (ao acaso) fosse estatisticamente factível, essa lei da entropia não existiria. Assim, a seta do tempo é identificada na física pelo fator da aleatoriedade pertinente a sistemas de muitos corpos. Não fosse por esse fator, seria perfeitamente possível uma pessoa idosa ter um desenvolvimento “natural” no sentido do rejuvenescimento, como

Entropia é uma grandeza física que mede a energia de um sistema termodinâmico destinada

a troca de calor que estabelece o equilíbrio térmico entre diferentes partes do sistema. Na física moderna, entropia tem um significado de medida do grau de desorganização de um sistema físico.

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no filme “O Curioso caso de Benjamin Button” (EUA, 2008), pois em relação a todas as outras leis da física, nenhuma delas proibiria tal coisa.

O tempo e a conservação da energia Por fim, o tempo tem um papel absoluto na construção da física. Uma lei física é, por definição, a descrição de fenômenos que se caracterizam por regularidade, isto é, podem ser verificados experimentalmente. O que diríamos de uma suposta lei física baseada numa observação única que não pode ser reconstruída de forma experimental? Simplesmente que de tal observação não se pode produzir uma lei para a ciência, pois tal observação não pode ser reconstruída nem ter suas constatações confirmadas. Assim, uma lei física provem, necessariamente, de um experimento que, se repetido em condições iguais, produz os mesmos resultados, e o tempo tem um papel completo aqui: se um experimento, ao ser perfeitamente refeito (no mesmo local com todas as mesmas condições) não produzir os mesmos resultados, devemos concluir que, com o único fator discrepante do passar do tempo, uma lei física não pôde ser estabelecida. Resumindo, só são considerados como leis físicas fenômenos que independem do tempo. Essa relação ficou clara na elegante e sofisticada formulação

matemática da chamada mecânica hamiltoniana, numa expressão de um importante teorema da física moderna chamado de Teorema de Noether, onde fica claro que, se um sistema físico tem resultados dependentes do tempo, então a energia desse sistema não se conserva. É um conceito extremamente comum o fato de a energia física, em sentido amplo, sempre se conservar, ou seja, não haver criação ou aniquilação de energia, apenas sua conversão, mas essa conclusão pode ser entendida de uma forma muito peculiar: a energia sempre se conserva simplesmente porque as leis da física são definidas como observações que sempre independem do tempo.

Referências [1] Newton, I. Principia the mathematical principles of natural philosophy. 1St American Ed. 1846. Disponível em https://openlibrary. org /books/OL7089085M/Newton’s_ Principia. Acesso em Janeiro de 2017. [2] Chou, C. W., Hume, D. B., Rosenband, T. e Wineland, D. J. Optical Clocks and Relativity. Science, 24 September 2010, Vol.: 329 pp. 1630-1633. DOI: 10.1126/ science.1192720. [3] Fleming, H. O tempo na física. Revista USP, n. 2, 1989.

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Avaliação do conhecimento de moradores da cidade de São Paulo sobre produtos de pecuária orgânica

Fo to : D i v u l g a ç ã o

Por: Juliany Tamieh de Oliveira

(Reprodução parcial do Trabalho de Conclusão de Curso da autora para obtenção do título de graduação em Medicina Veterinária apresentado à Universidade Paulista – UNIP em 2016).

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om a evolução da espécie humana houve também um aperfeiçoamento na sua forma de caçar. A preocupação de sair à procura de novas caças passou a se basear em conduzir rebanhos domesticados em busca de novas pastagens de alimentos para um posterior abate. O desenvolvimento de técnicas usadas na domesticação e produção animal é denominado pecuária, a qual se originou devido à necessidade de o homem domesticar o gado (bovino, suíno, equino, caprino e ovino) para a obtenção de seus produtos como: carne (pecuária de corte, aonde a criação do rebanho tem por objetivo a produção de carne); leite (pecuária leiteira, rebanhos destinados à produção

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de leite e seus derivados). Atualmente a pecuária é muito mais explorada, tendo por objetivo, além da carne e leite, a obtenção de couro, lã e etc. Apresenta também um maior aproveitamento de seus subprodutos como vísceras e dejetos (CAMARGO et al, 2004). A pecuária pode ser praticada da forma extensiva ou intensiva. O sistema intensivo, de alta produtividade, tem sido o modelo de produção animal mais usado nos últimos anos. Neste sistema há uma alta população de animais por área ocupada e apresenta elevados índices de produtividade (HADDAD, 2014). O consumo de alimentos de origem animal ou vegetal com presença de resíduos antibióticos pode induzir um sério problema de resistência bacteriana (HAESE & SILVA, 2004). Devido a tais danos ambientais e à saúde humana, a preocupação em se desenvolver uma forma produtiva sustentável, que atendesse às atuais necessidades, se tornou fator primordial, e desta forma surgiu a pecuária orgânica (DOMINGOS, 2005). Para que um produto seja considerado orgânico deve-se utilizar os princípios agroecológicos que preservem o uso responsável dos recursos naturais (água, ar, solo, etc.). Deve ser uma produção isenta de resíduos químicos indesejáveis (KEILE, 2014; BRASIL, 2014; HADDAD, 2014).

Apesar de sua importância para a sociedade, é uma alternativa de criação que ainda se encontra em desenvolvimento, não apresentando um grande índice de conhecimento populacional a respeito (CAMARGO et al, 2004). A agropecuária orgânica tem crescido conforme o desenvolvimento tecnológico e a preocupação de se obter formam mais sustentáveis de produção. A produção orgânica muitas vezes é reconhecida somente como um cultivo sem agrotóxico, quando na verdade ela vai muito além, sendo um sistema produtivo que visa garantir a saúde populacional a partir de manejos que mantenham a sustentabilidade do planeta devido aos procedimentos ecologicamente corretos utilizado (IPD, 2010). O crescimento da população aliado a uma melhora no poder aquisitivo impulsionou o mercado de carne no Brasil. Para que esta demanda fosse rapidamente atendida houve a necessidade de uma produção animal mais intensiva e com um maior rendimento de carne. Dessa forma alguns aditivos passaram a ser largamente utilizados para alcançar estas metas como, por exemplo, os antibióticos. O uso indiscriminado de antibióticos em criações animais pode ocasionar vários males, entre eles a resistência bacteriana e com isso a necessidade de se criar novas drogas o que exige investimento

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financeiro. É de extrema importância que este assunto seja considerado relevante perante os órgãos de saúde e pelos meios produtivos, para que assim a população possua maiores informações quanto as causas e efeitos do uso incorreto de antibióticos em criações animais. A resistência bacteriana é um problema de saúde pública, o que torna ainda mais necessário o seu conhecimento. Quando se trata de resistência bacteriana o assunto vai muito além do que realmente pode-se ver, pois os danos que o mesmo nos trás são vistos a longo prazo. O seu controle é essencial e exige a atuação conjunta dos setores da educação, agricultura, saúde e dos meios de comunicação para tornar a população mais informada e consequentemente mais consciente a respeito deste assunto. A sociedade tem se focado em um modelo produtivo de consumo em larga escala, inclusive de medicamentos. Entretanto existe uma parte da população mais consciente e com maior poder aquisitivo que exige mercadorias isentas de produtos químicos e ecologicamente corretos. Dessa forma surgiram algumas criações alternativas como a pecuária orgânica, que se baseia em formas sustentáveis de criações, motivada justamente pelos danos causados por outros modelos de produção animal antes implantado como base, o tema se insere no contexto social, ambiental e econômico da atualidade. 28

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Grande parte da população observa estes produtos nos supermercados e outros comércios, entretanto não tem nenhum conhecimento sobre estes alimentos, ou entende somente como um produto livres de resíduos químicos. A maior demanda por este segmento pode impulsionar um aumento de produção dos mesmos, fato que vem a colaborar para uma maior preservação do meio ambiente, melhor remuneração dos produtores além de garantir o bem-estar animal e social. Dessa forma o objetivo deste projeto é avaliar o conhecimento da população sobre estes produtos e contribuir para direcionar na divulgação das informações sobre o assunto.

Pecuária orgânica O Brasil é mundialmente um dos maiores exportadores de carne bovina, e atualmente é considerado o maior na exportação de frango (BRASIL, 2014). Apesar da sua grande influência sobre a economia do país, a pecuária tem causado grandes impactos ambientais, devido à necessidade de se destruir vegetações para se obter pastagens, compactação de solos causada por deslocamentos de grandes rebanhos, danos à atmosfera causados pelo excesso de gases liberados pelo rebanho bovino, males provenientes de cruzamentos genéticos equivocados, etc. (REGITANO & LEAL, 2010).


Os sistemas de criação visavam alta produtividade e lucro e desta forma quesitos como, bem estar animal, preservação ambiental, qualidade e segurança alimentar não eram considerados itens de fundamental importância. Com o surto de Encefalopatia Espongiforme Bovina (BSE, conhecida como doença da vaca louca) em 1996 na Inglaterra, as prioridades mudaram, houve um interesse internacional com questão a forma em que produtos de origem animal, como a carne, eram produzidos, e a segurança alimentar ganhou maior importância. Desta forma a pecuária orgânica foi ganhando espaço no Brasil como uma forma de criação alternativa que suprisse as novas exigências. O manejo orgânico foi reconhecido como uma produção economicamente viável, socialmente justa e ecologicamente correta em 1997 durante o Fórum Nacional de Pecuária de Corte (DOMINGOS, 2005). A história mundial da saúde pública teve um grande avanço com a descoberta dos antibióticos que devido a sua capacidade de salvar vidas eram vistos como milagrosos. A grande expectativa a respeito dos antibióticos foi destruída quando se notou que as bactérias com o tempo se tornavam resistentes aos mesmos, sendo assim necessário o desenvolvimento de novas drogas mais potentes que as já existentes. Porém, o

processo de produção de antibióticos exige um grande investimento financeiro, além de muito tempo de pesquisas e testes que resultam muitas vezes em compostos iguais ou semelhantes aos já existentes, não possuindo, portanto, a eficácia necessária para combater as bactérias de forma adequada (KORB et al, 2011). O uso de antibióticos na criação animal também pode apresentar risco à saúde humana e ao meio ambiente. O organismo animal muitas vezes não é capaz de realizar o metabolismo total de alguns tipos de antibióticos fornecidos a ele, e estes são excretados via fezes ou urina, que são usados posteriormente como adubo e desta forma estes compostos são disseminados no ambiente aonde podem chegar aos corpos hídricos. Quando estes resíduos de antibióticos se associam ao carbono orgânico dissolvido (COD)1 presente na terra, podem alterar seu transporte e mobilidade ou são absorvidos por vegetais interferindo em seu desenvolvimento e se transferindo aos seres que se alimentam destes (REGITANO & LEAL, 2010). Como solução a estes e outros problemas surgiu a pecuária orgânica. A pecuária orgânica apresenta um bom crescimento com o passar dos anos no país e tem como vantagem o não uso de substâncias químicas entre outros

COD se refere a matéria orgânica que está presente no solo e cuja principal função é a de nutrir os vegetais. 1

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materiais sintéticos, dentre estes os antibióticos, com este tipo de criação há também a possibilidade de se produzir diferentes culturas para enriquecer o solo, aproveitando assim os recursos naturais do ambiente de criação. Há uma maior interação entre agropecuária e meio ambiente, promovendo uma maior sustentabilidade, minimizando os danos ambientais favorecendo o desenvolvimento rural (nova forma de trabalho), preservando o meio ambiente com sua biodiversidade e melhorando a segurança hídrica (HADDAD; DOMINGOS, 2005; SEBRAE NACIONAL, 2015). Os procedimentos proibidos na pecuária orgânica são todos aqueles que promovam desfavorecimento socioeconômico ou ambiental e mal-estar animal (HADDAD, 2014). O boi orgânico, assim como o “boi verde” é um animal criado a pasto, porém estes se diferenciam no manejo alimentar e tratamento veterinário. O manejo do “boi verde” se assemelha ao do boi convencional criado a pasto onde o uso de fertilizantes sintéticos é utilizado e todo tipo de suplementação alimentar realizada são provenientes de alimentos oriundos de sistemas convencionais de produção, além disso, é permitido o uso de medicamentos alopáticos2 e antibióticos além da aplicação de Ureia (substância

encontrada na urina dos mamíferos), o uso de fogo para manejar pastagens também é permitido, assim como a transferência de embriões (DOMINGOS, 2005; SEBRAE NACIONAL, 2015). O pasto em que se cria o boi orgânico é isento de qualquer tipo de adubação química ou uso de agrotóxico, até mesmo rações ou outros alimentos suplementares possuem sua procedência garantida, sendo estas suplementações exclusivamente de origem vegetal, seguindo as normas de certificação, muitas vezes estes alimentos são produzidos pelos próprios pecuaristas (WWF-brasil, 2016). A homeopatia e fitoterapia3 são usadas como forma de tratamento destes animais e não é permitida a transferência de embriões assim como a aplicação de Ureia. Este sistema de criação recebe um certificado garantindo que todas as normas estabelecidas para o sistema de criação orgânico fora seguido adequadamente (DOMIGOS, 2005; SEBRAE NACIONAL, 2015). Estas normas são válidas desde o nascimento do gado, onde estes são rastreados, até o abate, tendo registrado em fichas individuais diversas informações como peso, vacinas e alimentação. O transporte até o abatedouro também é levado em consideração, sendo que este deve se encontrar próximo às fazendas

1 Um medicamento é dito alopático quando trata uma doença causando no indivíduo uma reação contrária aos sintomas causados pela doença. 2 Homeopatia é uma forma de terapia alternativa onde é dado ao paciente doses diluídas do composto considerado causador da doença para que seu corpo seja estimulado a desenvolver a reação restauradora da saúde. Fitoterapia é o estudo das plantas medicinais e suas aplicações na cura das doenças.

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como forma de minimizar o estresse destes animais (WWF-Brasil, 2016). Há certos requisitos importantes a serem seguidos em uma produção pecuária orgânica. o acesso a água fresca e alimento devem sem amplas, de acordo com suas necessidades fisiológicas; possuindo suas necessidades nutricionais saciadas em sua dieta; os animais devem ficar em ambientes onde os proporcione ar fresco, proteção contra chuvas, altas temperaturas e vento excessivo, assim como luz natural; é proibido a exploração excessiva e esgotamentos hídricos locais; os produtos orgânicos, sem exceção, devem ser identificados de forma adequada durante todo o processo produtivo, estes e outros requisitos podem ser conferidos na revista sustentabilidade (SEBRAE NACIONAL, 2015).

sendo que o Brasil se encontra como a quarta maior área orgânica do mundo, com 1 milhão e 800 mil hectares. Porém, considerando a área certificada e não certificada, o Brasil apresenta 4,9 milhões de hectares o que o classifica como a segunda maior área destinada ao cultivo orgânico do planeta (IPD, 2010).

Dados apresentados pelo Organic Monitor mostram que as vendas mundiais de produtos orgânicos em 2008, quando comparado com as vendas em 2003, apresentam um crescimento significativo (IPD, 2010).

De todos os estados brasileiros, a Bahia é o estado com o maior número de estabelecimentos orgânicos, sendo a maior parte desta produção direcionada a criação de bovinos (33% do total da área destinada a orgânica) e galináceos. Minas Gerais possui o maior valor de produção do país tendo a maior área orgânica com mais de 65% da sua área destinada à criação de bovinos e cerca de 14% da área total de apicultura possui manejo orgânico. Pernambuco possui a maior parte de sua área orgânica direcionada a criação de bovinos, ovinos, galináceos e suínos, sendo 40% representada pela criação de bovinos. Com base nestes dados é possível se notar o crescimento da produção orgânica na agropecuária brasileira (IPD, 2010).

O Research Institute of Organic Agriculture (FiBL) e o Internatinal Federation of Organic Agriculture Movements (IFOAM), realizaram um estudo denominado The World of Organic Agriculture (2010), indicando que houve um crescimento da área orgânica em todos os 154 países que realizam esta forma de produção,

Pesquisa realizada com base em entrevistas com representantes de alguns supermercados, restaurantes, churrascarias, frigoríficos e a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, mostrou que o consumidor se encontra disposto a pagar de 10% a 20% a mais pela carne orgânica (FONSECA, 2002). LÓGUIA

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EM 1999, durante um encontro sobre Pecuária orgânica da sociedade de Buiatria que acontecem no Mato Grosso do Sul, foi onde o tema (Pecuária Orgânica) foi abordado pela primeira vez, e então este modo de produção foi apresentado como uma alternativa viável para o Pantanal. Atualmente os únicos produtores oficiais de carne orgânica no país (DOMINGOS, 2005). segundo dados apresentados pelo WWF-Brasil, são pecuaristas do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. São aproximadamente 131 mil hectares em pastagens e cerca de 99 mil cabeças de gado distribuídas em 26 fazendas. A Associação Brasileira de pecuária Orgânica foi criada em 2001 por um grupo de pecuaristas da região que se responsabilizaram em seguir um protocolo interno de processos produtivos e responsabilidade ambiental da ABPO que fora lançado em 2009 juntamente com o WWF-Brasil. Este protocolo vai além de exigências da lei e certificação. Além disso, os projetos são certificados e acompanhados pelo Instituto Biodinâmico (IBD).

Pesquisa realizada Foram utilizados instrumentos de coletas de dados, sendo questionários com respostas fechadas, com 100 moradores da cidade de São Paulo sendo 40 homens e 60 mulheres de idades entre 15 e 90 anos. O atual trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética. FIGURA 1 - Resultado da pesquisa

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Na atual pesquisa pode-se observar que a maioria dos entrevistados conhecia o que é um produto orgânico de origem animal, porém apresentavam conceitos diferentes entre si com relação ao mesmo. 84% dos entrevistados afirmaram saber o que é um produto orgânico. Os principais resultados estatísticos da pesquisa podem ser verificados na Figura 1, sendo que os resultados lá indicados se referem às respostas dadas pelos entrevistados que afirmaram saber o que é um produto orgânico. Muitos dos indivíduos entrevistados alegaram não serem consumidores contínuos de produtos orgânicos, devido a algumas limitações encontradas para a compra destes produtos, tais quais alto preço, má qualidade, difícil localização e pouca variedade de produto, sendo o alto preço a maior queixa tanto por homens quanto por mulheres. A preferência de 46% dos entrevistados foi por consumo de produtos naturais, 27% preferem produtos orgânicos e outros 27% assumem preferência por outros tipos de produtos, sendo que, do total, 37% já consumiram produtos orgânicos de origem animal, dentre eles a carne vermelha, frango, peixe, ovos e outros como manteiga, queijo e leite. O consumo de produto orgânico varia de acordo com a renda mensal em salário mínimo de cada indivíduo, quanto maior a renda do indivíduo, maior a

probabilidade do mesmo consumir um produto orgânico de origem animal, isso é algo facilmente notável ao se comparar a renda dos consumidores à renda do número total de entrevistados.

Discussão A pecuária orgânica é um modelo de criação que tem crescido nos últimos anos, porém de forma lenta (FONSECA, 2002). É um sistema que visa valorizar a sustentabilidade ambiental, baseandose na Legislação Ambiental e do Código Florestal Brasileiro sendo proibido o uso de agrotóxicos entre outros (SEBRAE NACIONAL, 2015). Entretanto o conceito de um sistema ecologicamente correto não é conhecido por grande parte dos consumidores, sendo que apenas 26% dos entrevistados que afirmaram saber o que é um produto orgânico o caracterizam como um produto ecologicamente correto. O conceito geral dos entrevistados referente a diferença existente entre produtos orgânicos e produtos naturais de origem animal é o de que, produtos naturais não possuem o uso de agrotóxico em sua produção o que os torna mais saudáveis, sendo essa a resposta dada por mais da metade dos entrevistados (57%). Com base nos dados do atual trabalho, pode-se observar que dos indivíduos que já consumiram produtos orgânicos de origem animal 43% preferem o consumo

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de produtos naturais. Tendo em vista que uma das limitações citadas para a compra de produtos orgânicos é a má qualidade destes, pode-se concluir que a não preferência por produtos orgânicos se dá pelo fato de não se saber o que é um produto orgânico em sua verdade, além da não ciência de seus benefícios para o homem e para o ambiente. Ao se comparar o consumo de produtos orgânicos de origem animal com a renda mensal em salário mínimo, notouse que o número de consumidores cresce conforme a renda apresentada pelos mesmos. Desta forma a escolha do produto deixa de ser uma opção acessível para todas as classes sociais, o que pode diminuir o seu consumo geral pelos moradores da cidade de São Paulo. Apesar da defasagem de conhecimento existente referente a produtos orgânicos, há um maior entendimento populacional com o decorrer dos anos, isso pode ser observado com base na atual pesquisa, que nos comprova certa disponibilidade, da parte dos entrevistados, em pagar a mais por um produto orgânico de origem animal. Tal disponibilidade varia de acordo coma renda dos mesmos. Para que este sistema cresça é importante que haja fontes de esclarecimento das vantagens do produto para o consumidor, mostrando que seu conceito vai muito além do não uso de agrotóxicos, possuindo critérios ambientais e sociais importantes (SEBRAE NACIONAL, 2015). 34

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O uso indiscriminado de antibióticos em criações animais é mais um dos diversos fatos que devem ser tratados seriamente, a resistência bacteriana é um grande e importante problema relacionado a esse uso indiscriminado e que se observa em longo prazo (REGITANO & LEAL, 2010). É de extrema importância que este assunto seja considerado relevante perante os órgãos de saúde e pelos meios produtivos, para que assim a população possua maiores informações quanto às causas e efeitos do uso incorreto de antibióticos em criações animais. A resistência bacteriana é um problema de saúde pública, o que torna ainda mais necessário o seu conhecimento (HAESE & SILVA, 2004). A ingestão de ração de propriedades não orgânicas, o uso de promotores de crescimento e de drogas veterinárias são práticas comumente tomadas em sistemas de criações convencionais. Sofrem primeiro os animais e depois o homem por estar sendo impelido a consumir alimentos de qualidade duvidosa, podendo adquirir doenças (FONSECA, 2002). O produto orgânico surge então como uma forma alternativa de criação para minimizar os danos causados pelas demais formas de criações implantadas até os atuais dias, as quais não possuem maior preocupação com relação aos danos causados aos animais, ao ambiente e consequentemente ao consumidor, ou seja, a nós mesmos.


Conclusão Com base nos resultados obtidos, pode-se concluir que grande parte da população acredita saber o que é um produto orgânico, porém possuem conceitos irreais com relação ao mesmo. Tais fatos confirmam a importância do esclarecimento do conceito em relação aos convencionais, focando nas vantagens dos produtos como a não utilização de agrotóxicos, mas também a sustentabilidade ambiental e social em sua produção. É necessário que haja a atuação conjunta dos setores da educação, agricultura, saúde e dos meios de comunicação para tornar a população mais informada e consequentemente mais cociente a respeito deste assunto para uma maior demanda por estes produtos, gerando uma maior produção dos mesmos, fato que vem a colaborar para uma maior preservação do meio ambiente, melhor remuneração dos produtores além de garantir o bem-estar animal e social. _____________________________ Juliany Tamieh de Oliveira é graduada em medicina veterinária.

Referências [1] SEBRAE NACIONAL. A pecuária orgânica ganha mercado no Brasil. Disponível em: http://www.sebrae.com.br/sites/ PortalSebrae/artigos/A-pecu%C3%A1ria-org%C3%A2nicaganha-mercado-no-Brasil. Acesso em: 20, fevereiro, 2016.

[2] CAMARGO, A; FILHO, W; CAMARGO, F; ALVES, H. Produção em agropecuária orgânica. Disponível em: ftp://ftp.sp.gov. br/ftpiea/tec2-0704.pdf . Acesso em: 02, julho, 2014. [3] COMISSÕES DE PRODUÇÃO ORGÂNICA. Disponível em: http://www.agricultura.gov.br/desenvolvimentosustentavel/organicos/comissoes-da-producao-organica . Acesso em: 02, julho, 2014. [4] DOMINGOS, I. Pecuária orgânica certificada: uma alternativa sustentável para o Pantanal. Disponível em: http://www.beefpoint.com.br/radares-tecnicos/sistemasde-producao/pecuaria-organica-certificada-uma-alternativasustentavel-para-o-pantanal-24295/. Acesso em: 02, julho, 2014. [5] FONSECA, M. Certificação de sistemas de produção e processamento de produtos orgânicos de origem animal: história e perspectivas. Cadernos de Ciência & Tecnologia, Brasília, v.19, n.2, p.267-297, maio/ago. 2002. [6] HADDAD, C. Fundamentos da Pecuária Orgânica de Corte – Boi Orgânico. Disponível em: http://sna.agr.br/uploads/ AnimalBusiness_03_69.pdf . Acesso em: 02, julho, 2014. [7] HAESE, D; SILVA, B. Antibióticos como promotores de crescimento em monogástricos. Disponível em: http://www.nutritime.com.br/arquivos_internos/ artigos/002V1N1P07_19_JUL2004.pdf. Acesso em: 14, julho, 2014. [8] IPD. Perfil do mercado orgânico brasileiro como processo de inclusão social. 2010. 48 f. Dissertação. IPD - Instituto de Promoção do Desenvolvimento, Curitiba, 2010. [9] KEILE, J. Normas para a produção orgânica agropecuária. Disponível em: http://portal.cnm.org.br/sites/6700/6745/ palestra_mapa.pdf. Acesso em: 07, junho, 2014. [10] KORB, A. et al. Riscos para a saúde humana do uso de antibiótico na cadeia produtiva leiteira. Disponível em: http://esp.saude.sc.gov.br/sistemas/revista/index.php/ inicio/article/viewFile/91/131. Acesso em: 22, dezembro, 2014. [11] PECUÁRIA ORGÂNICA. Disponível em: http://www. wwf.org.br/natureza_brasileira/areas_prioritarias/ pantanal/nossas_solucoes_no_pantanal/desenvolvimento_ sustentavel_no_pantanal/pecuaria_sustentavel_no_ pantanal/pecuaria_organica_no_pantanal/. Acesso em: 20, junho, 2014. [12] REGITANO, J; LEAL, R. Comportamento e impacto ambiental de antibióticos usados na produção animal brasileira. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbcs/ v34n3/02.pdf. Acesso em: 14, julho, 2014.

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Panorama histórico de Israel no Período Pré Patriarcal

Fo to : D i v u l g a ç ã o

Por: Márcia Nascimento e Gérson Nascimento, alunos da Escola de Teologia Ágape

(Este texto é uma versão resumida de uma monografia produzida pelos autores para a disciplina de “Panorama Histórico de Israel” da Escola de Teologia Ágape.)

Introdução Não podemos afirmar com exatidão a cronologia da era Pré Patriarcal, existem duas vertentes sobre o assunto, uma que acredita que a contagem dos anos de vida dos povos antediluvianos era a mesma que a nossa (os 365 dias do ano), e outra que acredita na existência de um gênero literário que compara relatos sobre a cronologia de reis mesopotâmicos que segue uma lógica de 10 gerações. O importante é que a era Pré Patriarcal é o marco zero da história de Israel, e não há como se compreender o motivo pelo qual Deus escolhe Israel como povo “seu” sem antes entendermos o começo de tudo. 36

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Era Pré Patriarcal Diz Henrieta C. Mears que o livro do Gênesis “é a sementeira da palavra de Deus”. A palavra ‘Gênesis’ vem do grego, e significa ‘origem, princípio’; o livro do Gênesis relata o princípio de tudo. 1. O começo do mundo (Gênesis 1:1-25) “No principio criou Deus os céus e a terra”. Através de sua palavra, Deus com grande poder trouxe a existência tudo o que está a nossa volta, céus e terra e tudo o que neles há. “Pela fé entendemos que os mundos pela palavra de Deus foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente” (Heb. 11:3). O Jardim do Éden, um projeto perfeito de um Deus perfeito, tudo encaixado em seu devido lugar seguindo sua ordem natural. A obra de Deus foi progressiva: 1) O mundo da matéria (Gen. 1:3-19); 2) Os seres vivos (Gen. 1:20-25); 3) O homem, a coroa da criação (Gen. 1:26-27). 2. O começo da raça humana (Gênesis 1:26, 2:25) “O homem é distinguido como a mais importante dentre todas as criações de Deus” (Samuel J. Schultz). “Também disse Deus: Façamos o homem a nossa imagem; conforme a nossa semelhança...” Gen.1:26a. O primeiro homem foi “Adão”, do hebraico ‫ אדם‬termo que se

relaciona tanto a Adamá (solo vermelho ou do barro vermelho), quanto a Adom, (vermelho), e Dam (sangue). A primeira mulher Eva do hebraico ‫הָּוַח‬, Havva, (Vivente). Deus criou o homem e confiou a ele a responsabilidade de exercer domínio sobre toda a terra e toda a vida animal do Jardim do Éden. Uma peça arqueológica que ficou conhecida como “O sinete de Adão e Eva” foi descoberto em 1932 pelo Dr. Speiser, do Museu da Universidade da Pensilvânia, em Tepe Gawra, há 19 quilômetros a norte de Nínive, antiga capital Assíria [1]. Os descobridores dataram este sinete de cerca de 3500 a.C. e declarou que o mesmo sugeria nitidamente a história de Adão e Eva: nus, um homem e uma mulher andavam sob um profundo abatimento e de coração quebrantado, seguidos por uma serpente. Encontra-se hoje no Museu da Universidade, em Filadélfia. 3) O começo do pecado no mundo (Gênesis 1:26 2:25) “Onde abundou o pecado, superabundou a graça”. Romanos 5:20. Para nós, esta é uma das passagens mais polêmicas do livro de Gênesis (se é que podemos dizer assim); quem nunca se perguntou do porque da Árvore da Vida e da Ciência do Bem e do Mal no meio do jardim, ou porque Deus permitiu a presença da serpente no Éden; porém o fato mais importante e belo desta passagem LÓGUIA

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é o plano de redenção arquitetado por Deus; o homem fracassou e caiu diante da tentação desobedecendo à ordem divina causando assim a sua queda; julgados e sentenciados foram penalizados como consequência de seus atos: a) A serpente foi amaldiçoada (Gênesis 3:14); b) A mulher foi determinada dor e tristeza no parto. (Gênesis 3:16) e c) Ao homem o peso da culpa pela terra ser amaldiçoada por causa de sua desobediência (Gênesis 3:17). 4) A promessa de redenção (Gênesis 3:8-24) “Porei inimizade entre ti a e a mulher; entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”. Gênesis 3:15. Em consideração a Adão e Eva, Deus antecedeu o Juízo com misericórdia, assegurando a vitória final por meio da semente da mulher, Jesus Cristo, na interpretação cristã, o cordeiro que traz paz ao mundo. 5) O começo da vida familiar (Gênesis 4:1-15) “Coabitou o homem com Eva, sua mulher. Esta concebeu e deu a luz a Caim; então disse: Adquiri um varão com o auxilio do Senhor. Depois deu a luz a Abel seu irmão. Abel foi pastor de ovelhas e Caim lavrador”. Gênesis 4:138

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2. Dentre os filhos de Adão e Eva só três são mencionados por nome: Caim, Abel e Sete. 6) O começo de uma civilização humana (Gênesis 4:16) Em determinada ocasião, Caim e o seu irmão mais novo Abel apresentaram ofertas a Deus. Caim apresentou frutos do solo, do seu trabalho braçal, e Abel ofereceu primícias do seu rebanho (uma ovelha), a que mais amava e que recebeu de Deus. (Gênesis 4:3,4). A oferta de Abel teria agradado a Deus, enquanto que a de Caim não, caindo-lhe o semblante. Deus diz a Caim, após ver o seu semblante caído por ter sua oferta rejeitada: “Se procederes bem, não é certo que serás aceito?” (Gênesis 4.7). Possuído por ciúmes, Caim armou uma emboscada para seu irmão. Sugeriu a Abel que ambos fossem ao campo e, lá chegando, Caim matou seu irmão. Após ter matado Abel, Caim teria partido para a “terra da Fuga (Nod ou Node), ao leste do Éden”, levando consigo a sua esposa, cujo nome não é mencionado na Bíblia. Foi em uma Terra “ao leste do Éden” onde Caim fixou residência. A palavra hebraica Nohdh (fuga) deriva do radical Nudh, uma forma da qual é traduzida por “fugitivo” (Gênesis 4:12,14). A localização dessa terra é desconhecida. Os descendentes de Caim são listados em parte, e incluem homens que se distinguiram pela pecuária nômade,


por tocarem instrumentos musicais, por forjarem ferramentas de metal, bem como alguns conhecidos por praticarem a poligamia e a violência (Gênesis 4:1724). Segundo a Bíblia, a descendência de Caim terminou com o dilúvio dos dias de Noé. “Tornou Adão a coabitar com sua mulher e ela deu a luz um filho, a quem pôs o nome de Sete...” (Gênesis 4:26). “A sete nasceu-lhe também um filho, ao qual pôs o nome de Enos: Daí se começou a invocar o nome do Senhor” (Gênesis 4:26). Adão, Sete, Enos.... Noé (Genesis 5:1-32). O gênero humano se corrompe (Gênesis 6) Nos tempos de Noé a terra estava corrompida a vista de Deus e cheia de violência, Deus então chama Noé, anuncia o dilúvio e o orienta na construção da arca. 7) O começo das nações no mundo (Gênesis 10 e 11) Terminado o dilúvio a civilização começa com oferendas sacrificiais e o pacto de Deus com Noé de que nunca mais a Terra seria destruída por um dilúvio; pacto este firmado com um símbolo perpétuo, o arco-íris. Noé pronuncia benção e maldição (Gênesis 9:20): Ao saber da maldição, Cam e seus filhos Cush (cujos povos habitaram a Etiópia) e Mizraim (de quem viriam os primeiros povos do Egito) e Put (povos da Mauritânia) e Canaan (de quem viriam os primeiros povos da hoje conhecida como Palestina) partiu para longe da presença do pai Noé. Séculos

mais tarde, os cananeus foram sujeitados a um severo julgamento; quando da ocupação de suas terras pelos Israelitas. 8) Torre de Babel e a confusão de línguas (Gênesis 11) Os versículos de 1 a 9 do capítulo 11 de Gênesis narram a história de um grupo de pessoas que, antes do aparecimento das diversas línguas, foram morar no oriente, na planície de Sinear, uma terminologia usada na Bíblia Hebraica para se referir provavelmente à região da mesopotâmia; onde resolvem edificar uma cidade e uma torre denominada de Torre de Babel, o objetivo de tal construção era a de chegar até o céu, a habitação de Deus; e no meu entendimento um símbolo de orgulho e prepotência aos olhos do Senhor. Deus desce à Terra para ver tal obra e decreta o fim deste projeto audacioso, confundindo a língua do povo e os espalha sobre a terra. Assim se conclui a era Pré Patriarcal.

Referências [1] Bíblia Vida Nova traduzida em português por João Ferreira de Almeida. [2] Samuel J. Schultz. A história de Israel no Antigo Testamento. 2a. Edição. São Paulo: Vida Nova, 2009. [3] Enéas Tognini. Geografia das terras bíblicas. São Paulo: Hagnos, 2009. LÓGUIA

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O tempo

e sua relação com o indivíduo na filosofia ocidental Por: André de Sousa Freitas

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as antigas mitologias à filosofia moderna, a discussão sobre a ontologia do tempo tem se manifestado reconstruindo a compreensão sobre a dualidade eternidade/ temporalidade.O autoconhecimento da relação humana com o tempo remete a uma consciência com potencial libertador e autodisciplinar, uma vez que a lucidez de consciência favorece a liberdade da autoconstrução do indivíduo. O estudo filosófico do tempo expõe a variedade e diversidade do pensamento formal ao longo dos séculos. Na Idade Antiga (e mais especificamente na Antiguidade Clássica, entre os séc. VIII a.C. e V d.C.), por exemplo, o conhecimento filosófico relacionado ao tempo se confunde com o entendimento do tempo em seu sentido físico, como se pode verificar em Aristóteles. Antes, porém, a construção da ontologia do tempo é dotada de elementos míticos, como na história do titã da mitologia grega Cronos, filho de Netuno e de Gaia, que, castrando o próprio pai torna-se 40

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rei dos titãs e deus do tempo, numa era onde o mundo teria sido governado pelos titãs. Em tempos posteriores, como em Agostinho de Hipona, o dilema humano em relação a compreensão do tempo deixa o aspecto mítico e físico em favor de uma irrevogável busca filosófica que se foca em compreender a relação entre o tempo e as aspirações ou emoções humanas, ou seja, naquilo que posteriormente veio a ser conhecido por subjetividade humana.

Idade Antiga Platão: Em concordância com o conjunto de sua obra, Platão (? -384 a.C.) distingue a temporalidade da eternidade na mesma medida em que distingue o mundo real do ideal. O homem, enquanto corpo e alma, experimenta a temporalidade em seu corpo assim como experimenta a eternidade em sua alma, ou seja, na porção de seu


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ser pertinente ao mundo perfeito das ideias. O corpo perece, uma vez que está sujeito a temporalidade, mas as ideias, a produção e o significado que o indivíduo constrói para si ou para o mundo, se dirige à eternidade. Por fim, a intuição matemática de Platão não deixou passar a medição e quantificação do tempo desapercebida. Alega ele que o tempo “é a imagem móvel da eternidade movida segundo o número” [1]. Aristóteles: Quanto a Aristóteles (384-322 a.C.), como já mencionado, seus conceitos sobre o tempo se confundem com a busca por sua compreensão física. No livro 4 de sua Física, ele considera aporética a questão do tempo, ou seja, uma questão logicamente insolúvel. A

aporia indicada consiste no fato de que um instante, ou um momento é, por definição, único; porém, cada instante vivido deixa o presente em direção ao passado por uma inevitável substituição por um novo instante. Entretanto, a substituição de um instante por outro só é possível por algum tipo de interação entre os instantes subsequentes, e essa interação necessita, para Aristóteles, de uma coexistência temporal, pois se o instante posterior estiver ainda no futuro, não pode agir sobre o presente, e se o instante anterior estiver já no passado, também não terá ação no presente; mas se nem o instante futuro nem o instante passado têm ação sobre o instante presente, qual força – num sentido amplo do termo – faz remover um instante do presente LÓGUIA

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lançando-o ao passado e trazendo um novo, e até então futuro instante, ao presente? Com tal consideração, Aristóteles propõe uma formulação filosófica sobre o tempo que é considerada das mais complexas [2]. Epicuro: Diferente de Platão e Aristóteles, Epicuro (341-270 a.C.) também contribuiu com uma formulação ontológica bastante peculiar sobre o tempo, formulação essa que ganhou novas apropriações ou adaptações na filosofia moderna. O tempo para Epicuro é um conceito subjetivo. Sua doutrina indica ao homem a busca pelo prazer a partir das pequenas coisas e das simples ações, e seu conceito de tempo traz referência a sensação de prazer, donde se busca extirpar o medo e a dor. Sob essa relação entre o indivíduo e o tempo que parte da percepção interior do ser humano, Epicuro extrai um pensamento que pretende esvair o medo e a imagem aterrorizante da morte: Acostuma-te à ideia de que a morte para nós não é nada, visto que todo o bem e todo o mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações. A consciência clara de que a morte não significa nada para nós proporciona a fruição da vida efêmera, sem querer acrescentarlhe tempo infinito e eliminando o 42

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desejo da imortalidade. (…) Então, o mais terrível de todos os males, a morte, não significa nada para nós, justamente porque, quando estamos vivos, é a morte que não está presente; ao contrário, quando a morte está presente, nós é que não estamos. [3] Com essa concepção, Epicuro contraria a ideia da busca pela imortalidade como um objetivo ou um ideal para o ser humano. Essa busca pela imortalidade – e portanto pela eternidade, tão insistentemente almejada pelos mortais que se dedicavam a vencer os jogos olímpicos para provarem da divina ambrosia e a alcançarem; ou tão almejada pelos cristãos que se dedicam a perder suas vidas por amor do evangelho de Cristo para salválas na eternidade, é simplesmente desconsiderada na particular concepção hedonista de Epicuro: viva os prazeres do presente, busque a felicidade agora e não receies a morte, tampouco desejes a eternidade, uma vez que os prazeres em vida garantem o sentido e o significado da existência humana. Agostinho: Ainda na Idade Antiga, Agostinho (354-430 d.C.), bispo de Hipona, também contribuiu com a questão filosófica do tempo de forma excepcional para a construção do saber humano. Em suas Confissões, ele argui


a Deus, em forma de oração, a respeito do tempo com as palavras: Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicá-lo clara e brevemente? Quem o poderá apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir por palavras o seu conceito? E que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do que o tempo? Quanto dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam. O que é, por conseguinte, o tempo? Se ninguém mo perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei. [4] Em concordância ou sob influência do pensamento platônico, Agostinho distingue a temporalidade da alma da temporalidade do mundo, sendo a temporalidade da alma um fruto de nossa memória, que configura a construção do tempo passado, e nossas perspectivas e aspirações, o que configura a construção do tempo futuro. Essa temporalidade difere da temporalidade do mundo no sentido de que o tempo fora da apreensão de uma mente pensante se restringe ao presente momento. Ainda em suas confissões, expressa ele um inigualável lampejo de iluminação filosófica quando assevera ter entendido o porquê de

nossa ignorância a respeito do tempo: não podemos compreender o tempo por estarmos “imersos” materialmente nele, e essa “imersão” é tão inevitável a qualquer humano quanto a própria experiência da vida. Por outras palavras, apenas o ser Eterno pode compreender o tempo por se excetuar de sua limitação.

Idade Moderna e Contemporânea Pascal: O físico, matemático e teólogo Blaise Pascal (1623-1662) dedicou atenção ao comportamento humano relativo a sua atitude sobre o tempo. Ele adverte que as pessoas costumavam viver no que chamou de escapismo, ou seja, a fuga do presente. Em suas palavras: Cada um examine seus pensamentos, e os encontrará constantemente ocupados com o passado e com o futuro. Dificilmente pensamos no presente, e, se pensarmos nele, é apenas para tirar dele orientação para o futuro. O presente nunca é nosso alvo, e enquanto o presente e o passado são nossos meios, o futuro sozinho é nosso fim. Assim, nós nunca vivemos, mas estamos sempre nos esperando para viver, e constantemente nos preparando

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para sermos felizes, e assim sem dúvida nunca seremos felizes. [5] O pensamento de Pascal se aproxima, em alguns aspectos, do pensamento de Epicuro, principalmente em se preocupar com o comportamento humano relativo a temporalidade, ou seja, sua reação ao presente, passado ou futuro. Epicuro indicava o prazer do momento como a relação ideal entre o indivíduo e o tempo, de modo que esse priorizasse o instante presente em suas satisfações, e paralelo a esse pensamento, Pascal exorta o indivíduo a direcionar seus objetivos e sua felicidade para o presente, uma vez que ocupando o indivíduo seu presente preparando-o para uma felicidade futura, essa felicidade jamais se realizará. Apesar das formulações de Epicuro e Pascal concordarem em contrariar a projeção de felicidade e realização humana para o futuro, a distinção entre elas se apresenta no fato de que Pascal exorta a busca da satisfação presente sem isentar a busca pela imortalidade, uma vez que defende a fé cristã em sua obra.

nem qualquer forma de transcendência à matéria. Ele propõe, em lugar da dualidade tempo da alma e tempo do corpo, a dicotomia entre tempo do corpo (como em Agostinho, mas absorvendo aqui o conceito de tempo da alma) e tempo do mundo. O tempo do corpo remete a toda forma de sensação, percepção e memória que determinado evento produza em alguém. O tempo do mundo, por sua vez, consiste do evento físico em questão. A boa sensação produzida pela audição de uma bela música vai além do tempo efetivo de duração da música. A lembrança e todas as sensações produzidas por essa audição consiste no “tempo do corpo”, enquanto que a duração efetiva da música consiste no “tempo do mundo” do evento físico correspondente a execução da música. A dor produzida por uma pancada vai além do tempo da pancada. Assim, Hume diferencia a imaginação humana das paixões. As paixões seguem a lógica do tempo do corpo, enquanto que as imaginações, o tempo do mundo. Ele compara esses tempos com instrumentos musicais:

Hume: Um outro ponto de vista sobre a relação entre o tempo e o indivíduo foi proposta por David Hume (1711-1776), que volta ao raciocínio de Agostinho, quando discorre sobre o tempo da alma e o tempo do mundo, mas agora com um diferencial: Hume não aceita a dualidade corpo/alma do indivíduo,

Assim sendo, se considerarmos a mente humana, observaremos que, no que diz respeito às paixões, ela não é similar a um instrumento de sopro, que, na execução de todas as notas, imediatamente deixa de produzir som quando cessa o sopro, mas antes se parece mais com um

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instrumento de cordas, no qual, depois de cada toque, as vibrações continuam mantendo algum som que, gradual e insensivelmente diminui. [6] Assim, para Hume, as paixões humanas perduram em temporalidade além do tempo estrito da sensação que as produziram, da mesma forma que o som produzido por um instrumento de cordas perdura além do tempo do toque. Kant: Mas foi Immanuel Kant (17241804) quem deu a mais importante contribuição do pensamento moderno para a questão do tempo. Kant afirma que o tempo é uma das competências inatas do ser humano para conhecer o mundo. Além da competência do tempo, o ser humano conta ainda com a competência do espaço e da causalidade. De uma abstração singular, a concepção de Kant sobre o espaço e o tempo tange os conceitos do transcendental e do empírico, e se guia por uma linha de raciocínio que nos remete a uma contradição aberta, como verificou Koch (2009): se o espaço e o tempo são formas ideais (de geometria linear, euclideana e ortogonal), então pertencem ao campo da estética transcendental, mas se os objetos que existem nesse espaço e no tempo são apercebidos de forma real e empírica, logo o espaço e o tempo que media nossa

percepção a tais objetos também deve ser empírico. A contradição se configura quando por um lado, o conceito ideal e transcendental de espaço e tempo carece herdar a realidade empírica dos objetos que nele subsistem, pois um objeto puramente ideal, conceitualmente concebido a despeito de sua real existência, não pode ser real, mas sendo real, não pode corresponder a uma construção ideal pura. A respeito dessa incompatibilidade lógica, Koch encontra [7], na física moderna, uma saída que Kant não teve acesso em seu tempo: o espaço e o tempo real, segundo a teoria da relatividade, não correspondem ao espaço-tempo ideal euclideano. Segundo a teoria de Einstein, o espaço e o tempo curvamse diante da presença de matéria, e um espaço-tempo real contém um volume ilimitado de matéria. Assim, o espaço e o tempo ideal e transcendental (plano, linear e infinito) não corresponde, como deveria ser, ao espaço e ao tempo real (curvo, não linear e finito). Nietzsche: Finalmente, Nietzsche (1844-1900) também desenvolveu um conceito relativo ao tempo, mas em seu caso, o conceito busca estabelecer um parâmetro de avaliação para a vida. Avesso ao transcendente e a qualquer normatização preestabelecida para a vida, propõe Nietzsche um padrão de verificação distinto de qualquer outro, e seu padrão adota a temporalidade LÓGUIA

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humana como mediador da qualidade da experiência da vida. Eis a ideia nas palavras do seu criador: E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: “Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez, e tu com ela, poeirinha da poeira!”. Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderias: “Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!” Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: 46

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“Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?” pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! Ou, então, como terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela? [8] É nesse princípio, denominado de princípio do “Eterno Retorno” que ele define sua métrica para a vida. A filosofia do Eterno Retorno consiste na proposta de viver a vida de tal forma que, hipoteticamente, cada indivíduo voltará a reviver cada instante de sua vida infinitas vezes. Assim, uma pessoa que viveu muitos momentos de tristeza, mágoas, rancor, ódio, medo ou dor, concluirá que sua vida é avaliada, pela métrica do eterno retorno, como uma vida de infelicidade. Por outro lado, quem viveu de tal forma a colecionar muitos momentos de alegria, felicidade, satisfação e prazer, terá na ideia do eterno retorno uma classificação muito satisfatória para sua vida, pois se sua vida se repetisse exatamente como foi vivida infinitas vezes, essa pessoa estaria certa que reviveria infinitos momentos de alegria e prazer. Apesar de parecer hedonista, a métrica baseada no “momento em que se vive” proposta por Nietzsche é assaz eficaz. Alinha-se com as premissas de Epicuro


e Pascal em dar significado ao tempo e sua relação com o indivíduo no que diz respeito à qualidade do momento vivido. A particularidade dessa concepção de termômetro da qualidade de vida é sua isenção de parâmetros externos: cada indivíduo adota suas escolhas e buscas conforme sua própria satisfação ou realização. Diferente das métricas de outras ideologias ou crenças, onde se atribui valor a vida dedicada a uma missão exterior ao indivíduo, o calibre de Nietzsche atende diretamente aos anseios da pessoa, e não sua função para outrem nem sua contribuição para qualquer realização alheia a seu próprio almejo interior.

Conclusão A ideia de compreender o tempo e sua relação com o indivíduo ocupou as mais brilhantes mentes da filosofia ocidental em toda a história. Desde o pensamento mítico da Idade Antiga, quando a ideia do surgimento do tempo foi relacionada à ação do deus Cronos em castrar o pai Netuno (figurando o celestial) e separá-lo da Gaia (figurando o terreno), dominando o mundo, gerando filhos e os devorando em seguida, o conceito do tempo sofreu as mesmas influências que todos os outros conceitos filosóficos, passando pelo questionamento de sua

essência ou sua ontologia e chegando ao seu significado para o ser humano. Na sua mais moderna e importante concepção, o tempo define a condição humana diante do mundo e valida suas ações perante si mesmo. Não seria exagero dizer que, aquilo que os antigos vislumbraram em suas mitologias ainda segue tão válido em significado quanto em aplicação: o deus Cronos, trazendo à existência um distanciamento entre céus e terra, devora seus filhos até que é sobrepujado pela astúcia de sua mulher Reia, mãe dos deuses, que salva um dos filhos, Zeus, que por fim o destitui; assim também, o homem contemporâneo tem sido subjugado pelo tempo; tempo esse que o assalta quando se vê na maturidade acuado por suas responsabilidades todas dotadas de prazos e validades limitantes. Todas as suas produções são fatalizadas pelo tempo: a ciência e a tecnologia caducam, a filosofia envelhece, o poder passa e nenhum empreendimento humano sobrevive à disposição do tempo em engolir todas as suas próprias crias. O sequestro da vida humana pelo tempo termina, por fim, quando o indivíduo engana a implacável efemeridade da vida descobrindo que é o próprio tempo quem lhe fornece um padrão para calibração de sua felicidade, e como o trunfo de Zeus sobre seu pai Cronos, ele reorganiza sua vida no momento em que, figuradamente, Cronos é LÓGUIA

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lançado no Tártaro. Em suma, enquanto o homem corre contra o tempo, este o devora, mas quando consegue o dominar impedindo que seus projetos e produções pessoais sejam tragados, então a vida ganha uma nova imposição de ritmo, e agora, quem dá o compasso é o indivíduo regendo sua própria vida e usando o tempo para calibrar a qualidade de suas realizações. Este texto foi inspirado na aula do Prof. Clóvis de Barros Filho – vide referência [2], que pode ser acessada e assistida no YouTube, o que deixo recomendado para quem quiser se aprofundar no assunto. ____________________________ André de Sousa Freitas é professor adjunto na Anhanguera Educacional.

Referências [1] Platão in: R. Brague. O Tempo em Platão e Aristóteles. São Paulo: Loyola, 2006. [2] Clóvis de Barros Filho. YouTube. (2015, Dezembro 28). [Video file]. “Tempo e Temporalidade - Clóvis de Barros Filho - Aula 4 (ECF)” Encontrado em https://www.youtube.com/ watch?v=RJ50aepQXT4. Aula ministrada no II Encontro de Filosofia da Unimed BH em 14/08/2010. 48

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[3] Epicuro de Samos. Carta sobre a felicidade (a Meneceu). São Paulo: Fundação Ed. da UNESP, 2002. [4] Agostinho de Hipona. Confissões. 2ª. ed. Trad. Maria Luiza Amarante. Rev. H. Dalbosco. São Paulo: Paulus, 1997. [5] Blaise Pascal. Pascal’s Pensées. Editado por Gertrude Burfurd Rawlings. New York: The Peter Pauper Press, 1900. Tradução livre. Disponível em https://openlibrary. org [6] David Hume. A Dissertation on the passions. The natural history of religion: a critical edition. Tom L. Beauchamp (ed.); Oxford: Oxford University Press, 2007. (The Clarendon Edition of the Works of David Hume, v. 5). Tradução: Jaimir Conte. [7] Anton Friedrich Koch. Espaço e tempo em Kant e Hegel. Revista Eletrônica Estudos Hegelianos, ano 6, n. 11, Dezembro de 2009 – 57-73. [8] Friedrich Nietzsche. A Gaia Ciência. Tradução: Paulo César de Souza. São Paulo: Editora Schwarcz S.A. 2012.


T raba l h o Éti c o o u Workaholic

Fo to : D i v u l g a ç ã o

Por: Elenice da Silva

Mais um ano se inicia e temos a sensação que o tempo corre contra nós e que não conseguiremos dar conta de nossas tarefas. Muita pressão no dia a dia, cobrança, concorrência e a vida passa diante de nós que mal percebemos o que de fato fizemos e onde chegaremos. Nesta corrida contra o tempo encontramos um grupo de pessoas cujo comportamento e qualidade de vida estão totalmente comprometidos, seja nas relações familiares, sociais ou de trabalho. Pessoas que por conta de seus anseios, aspirações, desejos, sonhos, ambições, entre outras, buscam uma dedicação integral e uma vida quase exclusivamente voltada para o trabalho, deixando suas vidas pessoais de lado e consequentemente atingindo pessoas ao seu redor. LÓGUIA

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No filme “Click” (EUA, 2006) do diretor Frank Coraci, Michael, personagem do ator Adam Sandler, vive um fato muito comum por parte de uma população nos tempos de hoje, uma população que se entrega a uma jornada de trabalho extensa deixando a família, amigos e vida social, em nome do sucesso e prosperidade. O filme de ficção, reflete o cenário da correria do mundo atual e as consequências para a qualidade de vida. Uma crítica para as pessoas viciadas no trabalho e que perdem de vista o sentido da frase “ Não viva para trabalhar, trabalhe para viver”. Pessoas viciadas no trabalho se enquadram no que os estudos chamam de Workaholic. Workaholic é uma expressão americana, originou-se da palavra alcoholic (alcoólatra), o nome define a pessoa que é viciada em trabalho. O vício em trabalho, deixando de lado a saúde, tem sido um assunto recorrente nos últimos tempos, motivo de palestras e treinamentos nas empresas, na última década aumentou significativamente e se tornou um fenômeno mundial. Mesmo reconhecida como doença, o workaholismo “não” está listada na Classificação Internacional de Doenças (CID), mas pesquisas sobre o tema, realizada pela Isma (International Stress Management Association), afirma que o workaholic (profissional viciado em trabalho) tem 65% mais chances de 50

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desenvolver doenças cardíacas do que as outras pessoas. Estar tomado intensamente pelo trabalho, com longas jornadas diárias, carga excessiva de tarefas, ritmo acelerado e busca cega por sucesso, tem resultado pessoas viciadas em trabalho. Segundo dados divulgados pela seção brasileira da Internal Stress Management Association (Isma), em 2001 mais de 70% de 556 profissionais consultados sofriam de estresse. Esse índice mantém semelhança com o de outros países: 72% dos gerentes nos EUA e 70% na Inglaterra sofrem do mesmo problema (Valdejão, 2003). Os estudos e pesquisas sobre workaholics apontam para um desiquilíbrio na vida das pessoas , seja nos aspectos físicos e psicológicos, quanto também nos sociais. Para Killinger (1991), os workaholics são os “viciados respeitáveis” do nosso século, pois muitos de nós não estranhamos alguém trabalhando 10, 12 ou 14 horas por dia. São pessoas que não aceitam errar, querem deixar as coisas perfeitas. Que mal há nisso, não é mesmo? Passar mais de 12 horas por dia trabalhando, não querer voltar para casa para não terem que sair do foco do trabalho se manter alienados, pode ser uma fuga para não enfrentar a vida e em pouco tempo, não reconhecer seu papel com as relações humanas que o cercam.


O psicólogo americano Wayne Oates, em 1968, num artigo intitulado “On being a ‘workaholic’”, abordou o fenômeno pela primeira vez, relatando sua própria experiência se comparando a um alcoólatra, o autor afirmava ser também um viciado, mas em trabalho. Já Oates (1971) definiu workaholismo como um vício para trabalhar, compulsão ou a necessidade incontrolável para trabalhar incessantemente. Para reverter este quadro caracterizado de vicioso, os psicólogos orientam que a pessoas devem buscar tratamento, falando sobre o problema, e por mais normal que possa parecer, se você percebe que está com preocupação excessiva com o trabalho, que não consegue se deligar, é um indicio da doença. Lembre-se de sua família, filhos, pais, dos amigos, pessoas que você está trocando por trabalho, elas sentem falta de você, precisam de você. Foi-se o tempo em que os compulsivos por trabalho, eram valorizados no mundo corporativo organizacional. Mesmo com tanta “dedicação”, empresas responsáveis têm se preocupado com a saúde de seus colaboradores, e procurado ajudá-los a equilibrarem a vida pessoal, e profissional com qualidade de vida. Um profissional saudável traz melhores resultados. Nem toda pessoa focada no trabalho é um workaholic, o viciado no trabalho não repousa, não desliga, perde as relações

humanas, troca tudo pelo trabalho e para o trabalho. Uma pessoa comum, mesmo com a carga diária de trabalho e todas as responsabilidades que possui é capaz de gerir seu tempo com a família e vida social, valorizando sua saúde,com intervalos para o repouso e atenção aos que estão ao seu lado. Seja apaixonado pelo seu trabalho, trabalhe com prazer, alegria alcance sucesso e realize seus sonhos. Somos capazes de realizar tudo isso com equilíbrio e consciência ética pessoal. ________________________ Elenice da Silva é psicopedagoga.

Referências VALDEJÃO, R. Carreira executiva: jornada é de dez horas no mínimo. Disponível em: http://www.agr.feis.unesp. br/fsp15062003f.htm. Acesso em: Jan. 2017. KILLINGER, B. Workaholic: the respectable addicts. New York: Simon & Schuster, 1991. OATES, W. Confessions of a workaholic: the facts about work addiction. New York: World Pub- lishing, 1971. SERVA, M. FERREIRA, S. L. O. O fenômeno workaholic na gestão de empresas. Rev. Adm. Pública vol.40 no.2 Rio de Janeiro Mar./Apr. 2006.

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Retrospectiva Ágape 2016

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Tempo... Por: Jota Silvestre

Um amigo, um irmão, um carrasco, um ladrão... a esperança, a ilusão... a saudade, a alegria de estar... a tristeza do ir, o prazer de chegar! És lúcido, sábio, louco desvairado, marcas o meu rosto, me faz feliz, me matas de desgosto! Me faz rir de alegria, virar melancolia, encher o pulmão de ar, deixar de respirar... Correr feito criança, parar porque me cansa... lembrar de tudo enfim, e as vezes esquecer de mim... TEMPO... deixa esse mistério e apareça, não sei se você passa ou se passo por você, se é bom lembrar de ti, ou apenas te viver! Afinal quem é você?

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NO RMA S DE P UB LICA ÇÃ O Proposta da revista: A revista da igreja, ainda sem nome, objetiva a divulgação de matérias produzidas por nossos membros e amigos. A revista terá ISSN (registro de periódico) e será trimestral. As matérias e artigos devem focar na produção de conhecimento, produção artística e literária.

tem algo de novo, ou se apenas repete conhecimento comum e já bem disseminado), a adequação ao público (se não fere os princípios da dignidade humana, se desrespeita opiniões alheias etc) e a correção técnica (se o material traz informação confiável, correta, se não contém equívocos, erros ou se está disseminando informação falsa). Assim, ao enviar sua matéria, ela será avaliada por mais de um membro da comissão editorial. Não se sinta constrangido caso sejam solicitadas alterações para a publicação de seu material. Cabe ressaltar que a avaliação não interfere nem faz juízo de valores das opiniões expressas (não haverá, nesse sentido, censura).

Como outras revistas ensaísticas, o objetivo é levar ao público em geral ensaios sobre temas gerais abordados do nosso ponto de vista. A cada edição, haverá um tema gerador, divulgado antecipadamente, para a produção de um “dossiê”, onde autores (nossos) serão convidados a dissertar sobre aquele tema. Além do dossiê, a revista contará com temas gerais (de livre escolha) enviado por quem se interessar, e material de cunho artístico e literário (poesia, conto, crônica Como submeter: A submissão de uma matéria etc.), música (link para vídeos autorais) e outras ou link para produção artística em vídeos ou imagens produções artísticas como figuras, pinturas e humor. na Internet deverá ocorrer através do e-mail: agape. publicacao@gmail.com Materiais aceitos: Não estamos interessados Atenção para a formatação do arquivo a ser enviado: em: notícias cotidianas, material infantil e juvenil documento do Word (ou similar) com fonte Times (não neste projeto), material devocional (orações, New Roman ou Arial, 12 pontos. Não incluir figuras testemunhos ou sermões – a menos que constitua no documento, lembrando que todas as matérias valor artístico/literário), pensamentos de autoajuda ganharão formatação seguindo o projeto gráfico da ou similar, cópia de material de terceiros. revista. Estamos interessados em: ensaios de produção de Caso seja importante incluir uma figura em sua conhecimentos (com referências bibliográficas) de matéria, envie a figura no mesmo e-mail. Figuras qualquer área do saber. Serve adaptação de trabalho serão aceitas se forem autorais, de domínio público ou de faculdade/seminário. Assuntos centrais: teologia, tiverem autorização para utilização, além de carecer educação e artes. Vídeos de músicas autorais, poesia, de boa resolução, enquadramento correto e a nitidez necessária. A proposta não é uma revista ilustrada, crônica, contos entre outros (sempre autorais). mas informativa, assim, evite figuras desnecessárias. Avaliação das matérias: A revista contará com a equipe da comissão editorial para avaliar todo Maiores infor mações: Procurar André Freitas material submetido. A avaliação consistirá em checar ou envie um e-mail para: a originalidade do material (verificação de plágio), a agape.publicacao@gmail.com relevância do material (se o material é importante, se

AT E NÇÃO: pr ó x im a e d iç ã o se r á e m a b r i l. Fi q ue a te n to a o si te ( b a t i s t a it a pe c e r i c a . c o m .b r /r e v i sta ) e a v i so s da i gr e j a .


Crescendo em Fé, Esperança e Amor

A GENDA D A S E M AN A G P - G r u po s P equ en o s 2 0 : 0 0 Q ua r ta- f e i r a

E B A - E sc o l a Bí bl i c a Ág a pe Aos dom i n gos 9 : 0 0 h C a f é da m an h ã 9 : 1 5 h I n í ci o Cel ebr a ç ã o

1 0 : 3 0h - D om i n gos 1 º Do mi n go - S an ta Ce i a R ua Serg ipe Nº 3 2 2 , Parque P a r a ís o. C E P 0 6 8 5 2 -0 8 0 . I t a p ec er i c a d a S er r a - S P

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