CHAFARIZ DO MUNDÉU

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Emanuel Pinheiro Prefeito de Cuiabá Francisco Antônio Vuolo Secretário Municipal de Cultura, Esporte e Lazer Cely Almeida Secretária Municipal dos 300 anos Viviene Lozi Rodrigues Diretora Geral da Ação Cultural Berenice Pinto da Costa Rodrigues Arquiteta Responsável André Marques de Mello Campos Arquiteto colaborador e responsável pela prospecção Neila Maria Souza Barreto Historiadora Lourivaldo Rodrigues Projeto Elétrico e Iluminação Tadeu Raimundo dos Santos Responsável técnico de obras Associação dos Produtores Culturais de Mato Grosso Coordenação Geral


CHAFARIZ DO MUNDÉU

Prefixo Editorial: 54374 Número ISBN: 978-85-54374-02-0 2019


Pesquisa cedida pela autora Neila Maria Souza Barreto. Livro Bicas, fontes, chafarizes, Caixa d'água Velha e a água de beber no espaço urbano de Cuiabá, 1790 – 1886. Editora Carlini e Caniato - 2016

CHAFARIZ1 DO MUNDÉU2 Por Neila Barreto3 A história da fundação da cidade de Cuiabá nasce junto com as suas águas jorrantes ou invisíveis. Na Praça Alencastro, centro da cidade de Cuiabá, um chafariz de repuxo foi inaugurado em 1882, pelo Presidente Alencastro.

4

Assim, “o mesmo presidente que construiu a Praça Alencastro fartamente arborizada, construiu uma fonte de água dotada com repuxo, canteiros de flores, cercado por muretas e gradil confeccionado com os canos de 2000 espingardas velhas do Arsenal de Guerra, do bairro do Porto” 5, cuja fonte era tradicionalmente usada pela população das ruas centrais para a lavagem do São João, por ocasião das suas festas.

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Índices para catálogo sistemático: 1. Cuiabá: Mato Grosso: Água potável: Abastecimento e uso: História: Bem Estar social 363.610981721 – 07-5614 – CDD-363610981721. 2 Fonte de onde se venera a imagem da Virgem Maria Senhora Nossa – Bom Despacho. 3 Professora, Jornalista e Mestre em História pela Universidade Federal de Mato Grosso. Autora da História dos 50 Anos do Tribunal de Contas de MT; Co-autora da História do Tribunal de Justiça de MT; Autora dos Textos da Barra do Pary e As Lavadeiras; Genealogia do Pe. Ernesto Camillo Barreto e Projetos de História do Grande Oriente do Brasil em MT e Loja Maçônica: Grandes Lojas de MT. 4 - Já em meados do século XX esse chafariz foi destruído durante a administração do prefeito Vicente Emílio Vuolo. 5 - NDIHR – UFMT. Jornal do Comércio de 28 de abril de 1904, Cuiabá, 1904.


 Chafariz da Praça Alencastro no detalhe, lado esquerdo do coreto, no jardim, no chão, construído em 1882, no governo de José Maria de Alencastro. Arquivo particular. Além disso, o Plano de 1777 indica sete fontes contornando a vila: a do Arnesto,6 a de Maria Corrêa, a do Mundéu, a junto de Feliciana Gomes, a junto a Manuel da Silva, a da Mandioca e a detrás da igreja. A do Arnesto, mais ou menos onde hoje está o Morro da Luz; a de Maria Corrêa seria a da (no sentido de rua da margem esquerda do córrego Prainha); a do Mundéu seria na parte leste do atual terminal Bispo; as duas juntas - de Feliciana e Manuel - e a da Mandioca estavam as três no circuito da atual Praça do Conde de Azambuja; e a detrás da igreja, ou da Matriz; era na atual Isaac Póvoas, fronteira à atual Praça Rachid Jaudy (e nos séculos XIX e XX passou a ser a Cacimba do Soldado). 7 Essas sete fontes podem, porém, ter sido oito, pois onde hoje está a Santa Casa da Misericórdia parece ter existido uma oitava fonte que, na segunda metade do século XIX alimentaria o tanque do largo da Conceição. 6

- Corruptela de Ernesto. BARRETO, Neila Maria Souza. Água: gota da vida – abastecimento e uso no espaço urbano de Cuiabá (1790-1886). Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Ciências Humanas e Sociais, 2005. Cuiabá, 25 de julho de 2005. 7


Essa possibilidade decorre de pequenos indícios gráficos do “Plano” de 1777 e da planta de 1786.

IHGMT. “Plano da Villa do Cuyabá...”; 272 – na Capª. De Matto groço... 1777” original manuscrito pertencente à Casa de Ínsua, Coord.: João Carlos Garcia, A Mais Dilatada Vista do Mundo, Comissão Nacional Para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Portugal, Cuiabá, 2004.

Segundo Rosa (1996, pp. 134-135):


As sete Fontes da Vila Real referendam a adequação do sítio urbano às seculares recomendações lusitanas quanto “as boas águas”. O Rossio da Vila era praticamente delineado pelos rios Cuiabá, Coxipó Mirim e Coxipó Açu. (...) Com as sete Fontes ficava a Vila ponteada de aguadas.8

As fontes da Vila Real delimitavam a área mais densamente edificada da vila. Durante cerca de um século e meio elas foram fundamentais, para abastecer com água potável os moradores da vila e da cidade. Os mananciais de água potável da margem esquerda do Prainha, mais escarpada, tornaram-se, a partir de fins do século XVIII, decisivos fornecedores de água potável à vila, inclusive por meio de aquedutos. Do ponto de vista do presidente da Província, as melhorias eram enormes. Em dezembro fez público agradecimento aos empresários por terem à sua custa fornecido água à capital durante três meses, para minorar os males da grande seca que então assolava a Província. A 7 de janeiro de 1883 os empresários Frick e Zanotta foram definitivamente pagos pela Província.9

2 - O Espaço Urbano do Mundéu e da cidade

A palavra Mundéu significa armadilha de caça. No sentido figurado também poder ser qualquer casa ou coisa que ameaça cair. “Dizia-se cair no mundéu; ser apanhado na ratoeira. Havia uma música popular que se cantava antigamente: Na rua do mundéu/ Tem caiaia, E uma veia de cangaia...10

O Mundéu, por exemplo, era, pelo menos desde os anos de 1730, uma parte efetiva da vila: Nos primeiros anos 1730 o Mundéu era bairro da vila, na bocaina, entre os atuais morros Seminário e Luz (ROSA, 2003, p. 29).

8

- ROSA, Carlos Alberto. A Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá. São Paulo, 1996, pp. 134-135. Tese de Doutorado. FFLCH/USP/SP, 1996, pp. 134 – 135. 9 - APMT. Relatório de Presidente de Província, Dr. Joaquim G. Pimentel, Cuiabá, 12.07.1886, p.26, 10 MENDONÇA, Rubens de. Ruas de Cuiabá, Editora Cinco de Março, 1969, Goiânia-Go, p.80.


Sua localização na cidade de Cuiabá foi assim delineada: (..) rasgando a colina da Prainha, para comunicar a cidade com o bairro da Caridade, a antiga Rua da Misericórdia, hoje Rua Coronel Peixoto, desce em declive sinuoso, morrendo no Velho Largo da Conceição, a hodierna Praça do Bispo D. José. Ladeando o início da Ladeira da Misericórdia, defrontam-se bem alto a Santa Casa da Misericórdia, já sesquicentenária e o Seminário da Conceição, cujo primeiro centenário ocorreu a 7 de dezembro de 1958, (...) Na base da rampa do outeiro da Conceição, dominando as cajazeiras ornamentais (...) bela espécie de ximbuveiras

branca,

rico

exemplar

da

mata

mato-grossense,

ostentando frondosa copa rendada, (...) cujas galhadas saltitavam mariquitas amarelas, bem-te-vis e sanhaços (...) ··.

Por que então o Mundéu tinha, cento e cinqüenta anos depois, número tão pequeno de penas domiciliares instaladas? Questão intrigante: 14 anos antes fora construído chafariz na Praça Bispo Dom José, obra que inclusive implicou a construção de condutos (alguns chegam a falar em aqueduto) (MENDONÇA, 1977, p. 28) mais ou menos extensos. Que fatores provocavam essa

diferença

entre

o

abastecimento

de

água

potável

governamental público e o domiciliar? Esse Mundéu – Mundeuzinho que ficava no antigo Largo da Conceição, hoje Praça Bispo D. José embelezava a cidade e nas lembranças era assim descrito: (...) O Largo da Conceição, quadrilátero irregular do URBANISMO garimbeiro,

limitava-se

com

o

ribeirão

Prainha,

cujas

águas

começavam a diminuir com a servidão pública dia a dia aumentada, á não mais se prestando ao consumo da população, tal a sujeira que descia dos quintais das margens habitadas.

11

IBIDEM.

11


Nos anos de 1850 a cidade de Cuiabá cresceu em torno de dois novos eixos de expansão: a sudeste, pelo caminho que ia ao Coxipó; a noroeste, buscando o bairro lava – Pés, no além da Boa Morte (BRANDÃO, 1991, p. 28).

Entre 1853 e 1890, dez espaços de culto católico pontuavam a cidade de Cuiabá: a Matriz ou Sé, a capela de Nossa Senhora do Bom Despacho, a igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, a igreja de São Gonçalo, a igreja de Nossa Senhora da Boa Morte, a capela do Senhor dos Passos, a capela de Nossa Senhora da Misericórdia, a capela de São João dos Lázaros, a capela do Palácio Episcopal e o oratório do Palácio Presidencial (PERARO, 2001, p. 82). No ano de 1860, boa parte das ruas centrais da cidade era descrita nos seguintes termos: (...) quase todas calçadas de pedra cristal, que quando lavadas pelas chuvas tornam-se muito asseadas. Os habitantes, porém, cuidam pouco de sua limpeza e o fiscal da Câmara, relaxando suas obrigações, consente que o córrego da Prainha e seus adjacentes sejam os lugares do despejo público (PERARO, 2001, p. 103).

Durante os anos de 1870 foi instalado o Tribunal da Relação em 1874, na Rua 11 de Julho; no ano seguinte, a Caixa Econômica e Monte de Socorro, em sobrado em frente ao palácio do governo. 12 Com fachada voltada para o largo do Ipiranga, 13 um mercado público do primeiro distrito ou da Sé centralizava o abastecimento da cidade. No porto ou segundo distrito, ou freguesia de São Gonçalo de Pedro II, outro mercado público desempenhava as mesmas funções. Mais tarde esse mercado foi transformado em mercado do peixe, com características arquitetônicas até hoje preservadas, graças ao seu tombamento e à sua revitalização como Museu do Rio Cuiabá.

12

- Atual Rua Pedro Celestino. BRANDÃO, Jesus da Silva. Cuiabá: desenvolvimento urbano e sócio-econômico, citado, p. 79-80. 13 - Depois Praça Marquês de Aracati e hoje Praça Ipiranga.


No Mundéo, bairro da margem esquerda do Prainha referido pelo menos desde 1734, a partir de 1817 a Santa Casa da Misericórdia tornou-se referencial no espaço da ainda vila e logo em seguida cidade de Cuiabá. Cerca de quarenta anos depois, em 1858, teve início a construção do Seminário da Conceição, fronteando a Santa Casa, lugar de ensino secundário laico e de ensino religioso (BRANDÃO, 1991, p. 67). Fontes e Chafarizes sempre foram preocupações dos governos municipais. Em 1831 códigos de posturas já disciplinavam o seu uso e a sua conservação: (...) Artigo 69º - Todo aquelle, que tomar Fonte Pública, fazendo lapada particular, será multado em vinte mil réis pela primeira vez, e o Fiscal a fará restituir ao público pelos meios competentes, agravandose a pena sempre em caso de reincidências. (...) He proibido o uso de lavar-se roupa nos Chafarizes, Bicas e Tanques Públicos

(...). 14

No ano de 1871 no antigo largo da Conceição – Mundeuzinho, no centro da Praça onde havia uma fonte de água foi construído um Chafariz, pelo Presidente da Província – Francisco Cardoso Júnior, com “um reservatório d’água no antigo quintal do Maranhão”, bem como um aqueduto para alimentação do chafariz do largo da Conceição (MENDONÇA, 1973, p. 281), atual praça Bispo Dom José, ou simplesmente Praça Bispo, que custou aos cofres da Província o valor de 7:989$ 630 réis. 15 1872 – (...) fiz confeccionar, dar começo aos dois chafarizes com as respectivas caixas d’água e aquedutos nas imediações do Rosário e na rua da Misericórdia (Mundéu). Encarreguei dos serviços ao Comendador Henrique José Vieira, que iniciou a funcionar a 13 de junho último (dia tomada de Corumbá) cuja despesa não atingirá a seis contos de réis. Também foi cogitada a construção de um terceiro

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APMT. Código de Postura. Lata 1762 a 1888, Cuiabá. BARRETO, Neila Maria Souza. Água: gota da vida – abastecimento e uso no espaço urbano de Cuiabá (1790-1886). Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Ciências Humanas e Sociais, 2005. Cuiabá, 25 de julho de 2005. 15


chafariz na Rua Barão de Melgaço, em frente à chácara de Francisco Alexandre Ferreira Mendes que não foi efetivado. 16

As obras do Chafariz do Mundéu tiveram inicio em 28 de novembro de 1871 sob á orientação dos senhores Henrique José Vieira, Joaquim Alves Ferreira, presidente da câmara municipal de Cuiabá, Antônio Cláudio Soído e Joaquim Felicíssimo de Almeida Louzada e o inicio do seu funcionamento se deu em 13 de junho de 1872, conforme documentação pesquisada e referenciada neste texto.

Foi construído em ARQUITETURA COLONIAL, EDIFICADO TODO EM ALVENARIA, A FORMA DE UM SÓLIDO OTOGONAL DE BASE CIRCULAR, DE VÉRTICE REMATADO EM CONE RETO, TENDO AOS LADOS EM CHANFRADURAS ENTALHADAS NAS PAREDES, COM COLUNATAS ORNAMENTAIS, BICAS QUE MANAVAM FILETES DO LIQUIDO DERIVADO DO RESERVATÓRIO DO ‘MARANHÃO’, JORRANDO CONSTANTEMENTE EM BACIAS SEMICIRCULARES, FEITAS TAMBÉM DE ALVENARIA, ADEQUADAS À SERVIDÃO PÚBLICA. TAL COMO O CHAFARIZ DA CARIOCA, NO RIO DE JANEIRO, e foi orçado em 7:989$630 réis.

Como o valor orçado não era suficiente para a construção do chafariz os senhores responsáveis se cotizaram entre si para complementarem as obras.

Foto: sem autoria, Chafariz do Mundéu, Jornal Folha do Estado, Edição de 28.02.2002, Cuiabá.

16

- APMT. Relatório de Presidente da Província, Francisco José Cardoso Júnior, 1872; mss., Livro 06, fólios 10-11. Era a Cacimba do Soldado, depois Praça Santa Rita, fronteando chácara da família de Alexandre Ferreira Mendes; hoje Praça Rachid Jaudy.


Nesse ano o Chafariz do Mundéu era guardado por sentinela militar, o qual ficava em uma guarita.

17Sobre

o Chafariz do Mundéu,

Firmo Rodrigues (2002) relembra: Ao pé do morro da Igreja Bom Despacho, hoje Santa Casa, outrora vi o Chafariz do Mundéu, freqüentado por grupos de escravos sobrando latas, ou trazendo sobre a cabeça potes de barro para abastecer de água, uma boa parte da população.

As águas potáveis jorrantes do Chafariz do Mundéu eram captadas nas fontes naturais existentes no extenso quintal da Santa Casa de Misericórdia, antes denominado “Quintal do Maranhão”18

O Chafariz do Mundéu era,

(...) um ponto de reunião de escravos que, desde alta madrugada, iam encher de água latas e potes, os quais aproveitavam aqueles momentos para contar uns aos outros as agruras dos dias que viviam naquele regime de escravidão. 19

Para o funcionamento do Chafariz do Mundéu, o Presidente Cardoso Junior construiu no quintal da Santa Casa de Misericórdia, um reservatório circular de mais ou menos 8 metros de diâmetro, com uma cobertura de telha. Esse Chafariz foi recuperado no governo de D. Aquino Corrêa (22.01.1918 – 22.01.1922).

E construção do Chafariz da Conceição, depois chamado do Mundéu se fez passar, por meio de poucas braças de encanamento de barro, a água que de longa data era oferecida à população numa modesta Bica de água na esquina, da atual Santa Casa de Misericórdia.

(...) Tendo de prompeto determinado o NCANAMENTO DE BARRO e, consequentemente, desde logo seccado o Chafariz, que assim ficou reduzido a um monumento attestado a falta d água potáveis nesta capital, e achando-se deste modo o público privado da água deste 17

- APMT. Livro de Registro de Despachos da Presidência da Província (1861-1864), despacho n. º 84, 24-01-1863, fólio 114v, mss. 18 Maranhão, era o nome de um baiano que por muito tempo, ali cultivava o terreno e abastecia de verdura à população cuiabana. 19 MENDONÇA, Rubens de. Ruas de Cuiabá, Editora Cinco de Março, 1969, Goiânia-GO, p.80.


muitos annos seria na referida modesta Bica muito (...) a câmara municipal, como diz em seu relatório, que o povo para prover-se de ágoa d`aquella Fonte no próprio Poço junto a sua nascente – Olho d`água – no lugar da antiga Bica, o qual tendo sido construída de tijolos e coberta de telha por occasião de fazer-se o mencionado Chafariz passou a denominar-se Caixa d`Água.20

Para Aníbal Alencastro, com a abertura da nova estrada na cidade, através das ruas da Caridade e Coronel Peixoto, é: (...) desmantelado o sistema do aqueduto, mas mesmo assim, a população menos favorecida do bairro Mundéu continuou a buscar água na fonte do Maranhão, cujo ‘Vertedouro’ continuou situado atrás da Santa Casa de Misericórdia. Fato que aconteceu até 1950. 21

No chafariz do Mundéu animais também se serviam de água, em meio ao movimento de diversificadas pessoas que lá iam colher água: (...) ali no Chafariz do Mundéu também se reuniam os escravos e a plebe de Cuiabá, sobraçando latas; negros zucas com potes de barro debaixo dos braços e rodilhas na cabeça, aparando ditérios e chufas dos comparsas, o líquido com que abasteciam as vivendas dos senhores. Ali se viam negras descalças, de saias vistosas, com trepamoleques de chita colorida na cabeça, curibocas com gaforinas de meses, molecotes seminus e sujos, com vasilhames, agitando, cantarolando, quando não jogando “cirquinho” na área lateral, dando ao local uma nota colorida, característica de cidade colonial. (...) algazarrante confusão de risos, algaravia e vaias, e não rara pontilhada de lutas, em que lapeana entrava em ação, tingindo de sangue o cenário bizarro.

20 21

APMT. Relatório da câmara municipal, Cuiabá, 1872, p.44. - Professor, geógrafo, cartógrafo, escritor, em Cuiabá, abril, 2005.


Manancial do largo do Mundéu.

Este detalhe, tendo ao lado o número 26, é dado como sendo a “Fonte do Mundéu” e o manancial do largo do Mundéu, claramente representado, não é tido como Fonte.

Chafarizes que, como equipamentos urbanos decisivos, expressavam também complexidades da sociedade escravista: O chafariz, ao tornar a água produto de consumo coletivo sui generis e serviço urbano básico, ao exigir o encontro de classes, cria um lugar especial de construção da identidade, denunciado pelas disputas de preferência. Desconhecia-se o expediente da fila que iguala as diferenças, vivia-se o momento de transição entre o ‘tratamento desigual dos desiguais’ para o ‘tratamento igual dos desiguais (SOUZA, 1993, p. 154).

Os chafarizes sempre foram motivos de prazer e de lazer das famílias cuiabanas:

(...) todas as noites a família se reunia na casa-mãe do Mundéu, na Praça Dom José, emoldurada pelo Chafariz (...) pequeno minadouro no quarteirão da misericórdia. (...) brincávamos na prainha, no chafariz. (...) e ali no Mundéu a gente ia pegar melão de são caetano. Pegávamos alguns lambaris, às vezes alguns cascudos. (...) um dia eu estava na porta da Justiça Federal, onde era a casa da minha avó e vi uma chuva de peixe, que não sei como foi cair ali no Mundéu (...) 22.

COSTA E SILVA, Paulo. Philippeanas – A Produção Intelectual de Luis Philippe Pereira Leite, Cuiabá, Buriti, 1999. 22


A construção de chafarizes e aquedutos foi importante como novo sistema de abastecimento público de água potável, em seqüência ao das fontes e bicas com que coexistiram. Ambos os sistemas resultavam da ação pública das câmaras sediadas nas vilas e cidades. Eram importantes os governos municipais, locais, as Câmaras, Conselhos ou Senados. Suas políticas públicas, seus serviços públicos, marcavam a qualidade possível da vida urbana, em especial o suprimento de água potável. As câmaras produziam e mantinham sistemas municipais de distribuição/suprimento de água potável na América portuguesa (ROSA; JESUS, 2003).

3 - Largos e Praças

Na “Praça Real”, depois denominada largo do Palácio, era realizada a maior parte das festas oficiais e públicas, inclusive durante algum tempo touradas e cavalhadas, depois transferidas para o largo do Ipiranga e, a partir de 1876, deslocadas para o Campo d’Ourique, atual Praça Moreira Cabral. Essa última transferência, ensaiada desde 1873, certamente expressa um dos aspectos das muitas mudanças que ocorreram no ambiente urbano da cidade de Cuiabá, no pós-guerra com o Paraguai. O largo ou Praça do Ipiranga, na época, estava sendo incorporado à parte mais moderna e central da cidade, inclusive já contava com projetos de chafariz para seu formoseamento.


Festejos comemorativos, 15 de novembro de 1906. Cuyabá – Mattogrosso, Jardim Ipyranga, Cartão Postal: Anônimo, In: RAMOS, Maria de Lourdes Figueiredo Bastos da Silva. Um Olhar para Cuiabá de Cláudio e Raimundo Bastos - (1920-1940). Cuiabá, 2002. P. 86.

O Campo d’Ourique, ou Praça do Alegre, por sua vez, ainda não fora alcançado por tal modernização (CAMARGO, 2004, pp. 32-33). Podia, portanto, sem ser muito distante do centro, tornar-se o novo lugar das touradas – que já começavam a ser consideradas incivilizadas, coisas de ibéricos, barbarismos mal vistos dos pontos de vista afrancesados, germanizados, britanicizados. Hoje, esse Campo d’Ourique chama-se Praça Moreira Cabral, onde já foi sede da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso e, no ano de 2005 passou a ser a sede da Câmara Municipal de Cuiabá, com o nome de Palácio Pascoal Moreira Cabral. No pós-guerra do Paraguai a vida urbana da cidade de Cuiabá foi intensificada, incentivada pelo aumento de fluxos de capital e créditos. Inclusive as manifestações artísticas coletivas, tais como: teatro, danças, circos,


ginastas, passaram a ter sua dimensão econômica ressaltada (sociedades por ações rendendo dividendos, etc.). O decreto 4388, de 1869, que na prática isentou de impostos durante dez anos as atividades de importação e exportação, como se viu, certamente foi fator decisivo nessa intensificação. Quando em 1882 foram inauguradas as obras de urbanização e paisagismo na antiga raça Real, que passou a ter o nome de Jardim Alencastro, reafirmava-se esse espaço urbano como espaço do poder. E introduzia-se nele um novo tipo de atualização do poder, a tecnologia, que trazia ao centro da cidade águas potáveis do rio Cuiabá. Mas eram no mínimo sete as fontes da Vila Real, referendando a localização do sítio urbano às seculares recomendações lusitanas quanto às boas águas. Essas fontes como que balizaram a expansão da vila até a virada do século: (...) a Sudoeste, a “detrás da Matriz” ou “da Matriz”, no Vale da Cruz das Almas (atual Generoso Ponce); a Sudeste a do Mundéu, atraindo habitações na costa oriental do Prainha; a Nordeste, a do Tanque do Arnesto, puxando a ocupação (mesmo que rala) pelos aclives da morraria onde depois foi erguida a Capela/Igreja de N. Sra. do Rosário; e a Noroeste, as da Mandioca, favorecendo a ocupação da parte mais central da Vila (ROSA, 1996, p. 136).

Fontes de água potável da Vila Real por vezes recebiam também nomes de pessoas em cujas propriedades estavam suas nascentes, ou de pessoas que por alguma razão se notabilizaram naquela parte do espaço urbano. Como a Fonte de Maria Corrêa, na Paragem chamada a Prainha, em 1781 referida como Bica. Referendando a necessidade de água boa para beber nos espaços das cidades, a historiadora Maria Adenir Peraro (2001) comenta “que as cidades deveriam ser dotadas de uma infra-estrutura urbana de saneamento para


obrigar e, ao mesmo tempo, oferecer meios de levar à população a aceitar os novos hábitos como sinônimos de progresso e de civilização”. Em fins do século XVIII representantes da Coroa portuguesa na capitania eram incentivados a indicar jovens estudantes para cursos universitários, custeados com dinheiro da Fazenda Real. Dentre esses cursos, merece destaque aqui o de engenharia hidráulica (JESUS, 2001, p. 125). Em 1808, há referências a um Chafariz na Mandioca. 23 Em 1872 um relatório da câmara municipal de Cuiabá aponta para a necessidade de reparos no Chafariz do Mundéu, em função do aproveitamento da estrutura existente. Em relatório de província dos anos de 1871 e 1872 o Dr. José de Miranda Silva Reis solicitava a assembléia provincial à necessidade de reparação dos chafarizes existentes na cidade.

Nesse período a câmara

municipal mandar consertar a bica pública da Praça do Rosário.

A cidade de Cuiabá, em 1874 “ressentiu-se de excessiva falta d’água potável desde o mês de julho até o de novembro (...). Os chafarizes secaram”. 24

Com os chafarizes secos e abandonados em 1875, um jornal local denunciava publicamente que no chafariz da Praça de Dom José “existem em putrefação muitas cobras e sapos”. Com o desaparecimento dos escravos e escravas e inaugurado em 30 de novembro de 1882 o abastecimento de água hidráulico, o belo Chafariz do

23

- APMT. Fragmento de livro de Registro de Escrituras, Cartório do 1º Ofício, mss., Escritura de 12-11-1808, Fólio 148, Maço 42B. 24 - APMT. Relatório à Assembléia Provincial (...), Hermes Ernesto da Fonseca, em 05 de julho de 1875. Cuiabá, mss., pasta 08.


Mundéu foi desprezado pelos governos municipais, indo fazer parte das coisas inúteis, uma espécie de artefato que atrapalhava a praça. Em 1959 o Historiador Rubens de Mendonça, então Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso – IHGMT informou, por meio de ofício, ao Prefeito Municipal de Cuiabá – engenheiro Hélio Palma de Arruda, as informações de valorização histórica do Chafariz do Mundéu, por solicitação do munícipe, assim evidenciada: (...) apraz-nos informar-lhe que o referido Chafariz (...) Conservar a tradição é um dever de patriotismo, porque como no dizer de Rui Barbosa “um povo que não defende a sua tradição e o seu solo, entrega a alma ao estrangeiro, autores de ser por ela absorvido” (...) o Chafariz deve ser conservado, como marco de época. 25

E assim como o professor Francisco Alexandre Ferreira Mendes, o cuiabano clama pelo retorno do Chafariz do Mondéu, invocando que a genialidade dos tempos atuais não pode fazer sucumbir com as águas do chafariz, esquecido no coração da cidade do Senhor Bom Jesus de Cuiabá, rogando aos governantes municipais, que o tesouro que resistiu até os nossos dias, representa a recordação da alma de um povo, que viveu olhando para si e para o seu tempo, dando ao homem moderno vivificante de energia dos que souberam lutar e vencer perpetuando o valor de uma grande população. Ainda bem que o professor Wilson Santos não vai deixar esse MONUMENTO HISTÓRICO desprezado, pois se caracteriza em verdadeira obra de arte que faz reviver nas memórias dos cuiabanos e mato-grossenses o cotidiano de vida da cidade de Cuiabá.

25

IHGMT, Ofício nº. 09/1959, 25.02.1959, Cuiabá.


Relatório de restauração e conservação do Chafariz do Mundéu Cobertura Foi realizado o serviço de remoção da praga de “erva de passarinho” que acometia a cimalha e a cobertura. Além da prévia remoção da parte exposta

da

planta

foi

aplicado

produto dessecante em todas as partes

da

estrutura

que

apresentavam sinais da infestação e posteriormente procedeu à remoção das raízes restantes.

Foi executada a remoção completa do reboco

da

cúpula

e

dos

trechos

desagregados da cobertura e da cimalha seguida argamassa

de

sua

recomposição

convencional

para

em a

impermeabilização, foi utilizado o traço de areia, cal e cimento na proporção 3:1:1 respectivamente.


A cimalha foi refeita utilizando-se os tijolos originais que estavam em bom estado, sendo os que não puderam ser reutilizados foram substituídos por tijolos maciços não queimados convencionais.

Estrutura e reboco Não houve a necessidade de intervenção na estrutura, porém sua ligação com o reboco de concreto direcionou a remoção

apenas

degradadas, danos

das

evitando

durante

a

regiões possíveis remoção

mecânica do reboco.

Na parte interna foram refeitos os trechos de reboco que sofreram dano pela infestação de erva de passarinho,


foi constatado também que grande parte do reboco interno ainda é de areia de goma e que os trechos de argamassa de cimento apresentavam boa coesão com a estrutura subjacente.

Para a remoção do reboco de cimento foram

levantados

os

locais

com

descolamento da estrutura, patologias de umidade e fissuras, assim a remoção seguiu a linha das fissuras de maneira a não necessitar uso excessivo de força.

A substituição do reboco foi feita utilizando argamassa de cimento pozolânico, evitando a impermeabilização desses locais. A argamassa foi feita com traço de areia, cal e cimento na proporção 3:1:1 respectivamente.


Foram observadas as posições e direções das fissuras nos portais que indicavam que as estruturas do Chafariz e dos portais trabalhavam de maneira independente levandonos a supor que não eram contíguas e não possuí amarração, hipótese confirmada durante a remoção do reboco.

As fissuras e as trincas tanto interna como externamente foram preenchidas com pasta de cal e areia fina na proporção 1:1.

Foi produzido no canteiro e realizada a aplicação de água de cal nos locais com a presença de argamassa de areia de goma que apresentavam fragilidade, estavam desagregando e no testemunho. A água de cal utilizada foi produzida na obra em uma lata de


18 litros com cal virgem em pó e água em abundância, após a primeira reação foi deixada decantar por 48 horas. A água separada da pasta foi então acondicionada em um borrifador e aplicado.


Pintura Foi executado o serviço de remoção das camadas de pintura anteriores com especial cautela em áreas que apresentavam certa fragilidade, como as bases e capitéis das pilastras e os portais. Além da remoção com a espátula foram utilizadas também lixadeiras.

Foi realizado serviço de pintura, de seis demãos, com cal branca, na parte interna e externa. As demãos foram aplicadas com alternância no sentido de aplicação, horizontal e vertical, e com intervalos de aproximadamente 12 horas entre as aplicações.


Após a pintura com cal branca foi executada a pintura na parte externa do Chafariz. A tinta à cal utilizada, cor ocre, foi feita na obra pela equipe utilizando pigmento a base de oxido de ferro amarelo e vermelho na proporção 3:1 respectivamente, misturados com água morna até ficar líquida, e então deixada decantar por 24h. A pasta decantada no fundo foi então misturada com pasta de cal na proporção de 1:10 respectivamente, depois de bem misturados foi adicionado água à mistura na proporção 2:1 em volume respectivamente.



Esquadrias

Foi executado o serviço de restauro dos portões por empresa contratada e reinstalados nos portais, foram lixados, tiveram as partes soltas ou ausentes recompostas e por fim pintados de cinza escuro. Dos quatro portões existentes anteriormente três foram convertidos em grades e fixados com solda no portal, um permaneceu como portão sendo o único acesso ao interior do monumento.


Piso Foi executado o serviço de recuperação do piso substituindo as peças danificadas e recompondo o trecho que faltava com blocos intertravados novos. Foram assentados sobre areia e tiveram o perímetro cimentado para o travamento definitivo. Após o assentamento foi utilizada “farofa”, mistura de cimento e areia 2:1 respectivamente, para rejuntar, após a aplicação da mistura seca, foi varrido e molhado para a cura do rejunte. O piso interno foi convenientemente limpo com escova de aço, pano de chão e solução de detergente neutro e água na parte de cimento queimado e apenas com pano de chão e solução de detergente neutro e água na parte com o testemunho dos tijolos.


Testemunho

O testemunho foi limpo e recebeu a aplicação de água de cal para a consolidação da argamassa de areia de goma em sua composição. Ao final foi executado uma proteção nos mesmos moldes da anterior com vidro plano convencional 6 mm medindo 100 cm por 60 cm fixados com espaçadores de 2,5 cm.


Instalação Elétrica para iluminação

A instalação elétrica foi executada no

perímetro

do

piso,

com

conduítes cimentados à base e os spots de 320 lumens e 5 watts acoplados a um bloco intertravado furado

com

diamantada

serra

com

copo

diâmetro

de

60mm. Os blocos com os spots foram

então

direcionados

e

cimentados para a iluminação do monumento.


Relatório de prospecção pictórica do Chafariz do Mundéu por André Marques de Mello Campos Arquiteto Urbanista responsável CAU: A119053-9

O presente relatório tem por objetivo a identificação dos tons cromáticos mais antigos do monumento histórico Chafariz do Mundéo, localizado na Praça Bispo Dom José, centro de Cuiabá-MT. O bem foi tombado isoladamente pelo Estado de Mato Grosso em 1980 e encontra-se em área de entorno do Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1987. Como parte do projeto de restauração deste bem cultural, buscou-se resgatar as cores e tipos de tintas que já foram aplicadas ao Chafariz, visando a determinação de uma nova tonalidade mais adequada à sua técnica construtiva e uso atual.


Imagem 1: Localização do Chafariz do Mundéo dentro da área de entorno (cinza claro) da poligonal de tombamento (cinza escuro) federal. Fonte: Google My Maps. O método utilizado foi a prospecção estratigráfica, que consiste na remoção mecânica das camadas de tinta, uma a uma, com auxílio de um bisturi cirúrgico nº 3 e lâmina curva tamanho 10. Após a ruptura da primeira camada, são abertas janelas de aproximadamente 2x2cm em pontos específicos do monumento, como paredes internas, externas e ornamentos. A numeração das prospecções se dá da camada atual até a mais antiga. Na remoção das repinturas, não foi possível identificar a primeira camada ou original, pois segundo o processo de tombamento, na restauração realizada em 1986, todo o reboco foi trocado. Entre algumas camadas houve a aplicação de massa corrida, o que dificultou a identificação das camadas intermediárias, devido à textura mais rígida do material. Foi observada a perda, desgaste e possíveis alterações dos pigmentos, devidos à ação do tempo. Os tons identificados, portanto, são aproximados. Na definição cromática, foi utilizada a referência do Catálogo Universal de Cores Pantone e códigos CMYK. Verificada a remoção do reboco original ou mais antigo e sua substituição recente, as cores e materiais identificadas referem-se às intervenções das últimas décadas. Observa-se a utilização de massa corrida e tintas acrílicas, bem como porções com reboco composto de cimento. O Chafariz do Mundéu foi construído na década de 1870 com o objetivo de abrigar uma bica de água potável para consumo público, sendo portanto, antes de tudo um equipamento urbano destinado às camadas mais populares de Cuiabá: “Ao pé do morro da Igreja do Bom Despacho, hoje Santa Casa, outrora viu o chafariz do Mundéu, frequentado por grupos de escravos sobrando latas, ou trazendo sobre a cabeça potes de barro para abastecer de água, uma boa parte da população.” Rodrigues (2002) apud Barreto. p.70.


O Chafariz do Mundéu foi descrito como: “um ponto de reunião de escravos que, desde alta madrugada, iam encher de água latas e potes, os quais aproveitavam aqueles momentos para contar uns aos outros as agruras dos dias que viviam naquele regime de escravidão” MENDONÇA, R. Ruas de Cuiabá, Ed. Cinco de Março,1969. Goiânia - GO. p.80.

Por registros iconográficos do século XX, é possível identificar que o Chafariz foi da cor branca, muito provavelmente com tinta a base de cal, sem pigmentação. Nas imagens, observa-se que a cúpula e as cornijas na parte superior do monumento possuíam uma tonalidade escurecida, provavelmente por ação da umidade.

Fonte: SIQUEIRA et al, 2006. p. 35. Início do século XX. Paredes, cúpula e ornamentos em branco, com presença de patologias, sujidades e vegetação.

Fonte: FREITAS, 2011. p. 53. Década de 1920. Paredes, cúpula e ornamentos em branco, com presença de patologias e sujidades.


Fonte: Governo do Estado. Chafariz inteiramente branco. Imagem sem data, mas é possível estimar que trata-se da década de 2000, antes da desativação do terminal de ônibus na Praça Bispo Dom José em 2005. Disponível em: http://www.ipatrimonio.org/cuiaba-chafariz-domundeu/

Fonte: http://www.portalmatogrosso.com.br/imprime.php?cid=35178&sid=263. Não foi possível identificar o ano da fotografia, mas é posterior a 2006. Paredes e cúpula em verde e ornamentos em branco.


Fonte: SIQUEIRA et al, 2006. p. 18. Imagem do Chafariz após o último restauro, em 2006. Cor alaranjada nas paredes e branca nos ornamentos e cúpula.

Fonte: Berenice Costa, 2019. Condição atual. Paredes brancas, ornamentos e cúpula azuis.


Localização do Chafariz na Praça Bispo Dom José


Ficha de prospecção n. 1

Junho/2019

Elemento: parede interna Posição: 1,5m de altura, 0,3m da porta Tipo: estratigráfica Método: Mecânico Camadas encontradas: Camada

Tinta

CMYK

1a9

Massa corrida

0, 0, 0, 0

Tonalidade

Obs.: Foram encontradas diversas camadas de massa corrida apresentando sujidade na superfície e coloração amarelada.


Ficha de prospecção n. 2

Junho/2019

Elemento: pilastra Posição: 1,5m de altura, centro da pilastra Tipo: estratigráfica Método: Mecânico Camadas encontradas: Camada

Tinta

CMYK

1

Tinta acrílica

87, 55, 8, 0

2

Massa corrida

0, 0, 0, 0

Massa corrida

21, 17, 20, 0

3

4

Tonalidade


5

Tinta acrílica

Ficha de prospecção n. 3

63, 25, 19, 0

Junho/2019

Elemento: parede externa Posição: 1,5m de altura, 0,4m da pilastra Tipo: estratigráfica Método: Mecânico

Camadas encontradas: Camada 1

Tinta Tinta acrílica

CMYK 44, 22, 13, 0

Tonalidade


2

Tinta acrílica

87, 55, 8, 0

3

Tinta acrílica

56, 21, 59, 2

4

Tinta acrílica

26, 61, 72, 10

5

Tinta acrílica

24, 14, 16, 0

6

Tinta acrílica

33, 35, 52, 0

7

Tinta acrílica

15, 0, 65, 0


8

Tinta acrílica

29, 31, 46, 0

9

Tinta acrílica

30, 28, 12, 0


Ficha de prospecção n. 4

Junho/2019

Elemento: ornamento - arco Posição: 1,4m de altura, 0,1m da porta Tipo: estratigráfica Método: Mecânico Camadas encontradas: Camada

Tinta

CMYK

1

Tinta acrílica

87, 55, 8, 0

2

Massa corrida

0, 0, 0, 0

Tonalidade


3

Massa corrida

28, 27, 34, 0

4

Massa corrida

69, 29, 18, 0

5

Tinta acrĂ­lica

52, 28, 34, 1


Conclusões Na documentação presente no processo de tombamento, identifica-se a atribuição de valores histórico e arquitetônico ao bem. Para o Diário Oficial de 07/01/1980 e Portaria nº 32/1979, seu valor histórico é vinculado à sua utilidade pública enquanto equipamento de distribuição de água e à sua vinculação a personalidades marcantes relacionadas à sua construção, “constituindo uma das mais antigas fontes de abastecimento de água da capital”. Os documentos afirmam que o bem “constitui uma das mais raras e valiosas peças da Cuiabá antiga, eis que sua construção data de 1871”. Seu valor arquitetônico está relacionado ao seu método construtivo, de alvenaria de tijolos maciços e base de pedra canga, em planta octogonal e cobertura em abóbada. Atualmente, é o único chafariz público remanescente na cidade. Buscando a preservação não só do bem, mas também de sua ambiência, enquanto condição de fruição e integração com a paisagem em que está inserido recomenda-se a remoção elementos contemporâneos móveis e fixos na vizinhança do bem, como equipamentos de venda ambulante. Esta medida visa preservar a visibilidade, aqui compreendida para além da apreensão ótica, favorecendo as relações de vizinhança, escala e respeitabilidade do bem (MOTTA, THOMPSON, 2009). No processo de tombamento, há registros de uma restauração realizada em 1986, com recursos da Fundação Cultural de Mato Grosso, onde há a especificação de troca de reboco e pintura com 3 demãos de cal, bem como recomposição de gradil, pisos, molduras danificadas e instalações elétricas. A partir deste documento, afirma-se que o reboco existente é recente, não oferecendo fonte de pesquisa da condição mais antiga do bem. Algumas das cores encontradas são marcas de gestões municipais, como o verde claro e o azul. Não recomendamos a reprodução desta prática, visto que os monumentos históricos e demais patrimônios arquitetônicos são pré-existentes e permanecerão no espaço urbano independente das dinâmicas das gestões locais, devendo ser mantidos em condições dignas de fruição pública. Durante a pesquisa iconográfica, identificou-se a condição mais antiga, datando da década de 1920, com pintura branca (caiação) em todo o monumento. Considerando que as cores encontradas na prospecção pictórica são tonalidades sintéticas, não compatíveis com o método construtivo e linguagem arquitetônica do bem, recomendamos a adoção de tonalidade mais discreta e sóbria. Recomendamos o uso de tinta a base de cal, sem pigmentação nas paredes internas e externas do monumento, e pintura a base de cal com pigmentação ocre nos ornamentos (pilastras, cimalhas e arcos) conforme a escala Pantone código 7412 C, composição CMYK 2 58 96 10.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARRETO, N. M. S. - Bicas, fontes, chafarizes, caixa d’água velha e a água de beber no espaço urbano de Cuiabá (1790-1886). Ed. Carlini e Caniato. Cuiabá, 2015. FREITAS, M. A. - Cuiabá imagens da cidade: dos primeiros registros à década de 1960. Ed. Entrelinhas, Cuiabá, 2011. FUNDAÇÃO CULTURAL DE MATO GROSSO. Portaria nº 32 de 24 de dezembro de 1979. Diário Oficial do Estado de Mato Grosso. Cuiabá MT, 07 jan. 1980. p. 4. MOTTA, L., THOMPSON, A. Entorno de bens tombados. IPHAN, Rio de Janeiro, 2009. ROMANCINI, S. R. – Cuiabá: paisagens e espaços da memória. Cathedral publicações, Cuiabá, 2005. SIQUEIRA et al (orgs.) - Cuiabá de vila a metrópole nascente. Ed. Entrelinhas, Cuiabá, 2006.


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