MARIA TAQUARA

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apresenta

RESTAURAÇÃO E REVITALIZAÇÃO DOS MONUMENTOS HISTÓRICOS

ESTÁTUA DE MARIA TAQUARA


Emanuel Pinheiro Prefeito de Cuiabá Francisco Antônio Vuolo Secretário Municipal de Cultura, Esporte e Lazer Cely Almeida Secretária Municipal dos 300 anos Viviene Lozi Rodrigues Diretora Geral da Ação Cultural Frede Hortelli Fogaça Restaurador Kawany Stephany da Silva Historiadora Lourivaldo Rodrigues Projeto Elétrico e Iluminação Tadeu Raimundo dos Santos Responsável técnico de obras Associação dos Produtores Culturais de Mato Grosso Coordenação Geral


ESTÁTUA DE MARIA TAQUARA

Prefixo Editorial: 54374 Número ISBN: 978-85-54374-02-0 2019


INTRODUÇÃO A Ação Cultural – Associação dos Produtores Culturais de Mato Grosso, enquanto uma associação civil de direito privado sem fins lucrativos, tem como proposta estimular, difundir e preservar o patrimônio cultural das comunidades mato-grossenses através do desenvolvimento de políticas, mapeamentos, pesquisas, consultorias, ações e projetos nas áreas da cultura, educação, turismo, social, meio ambiente e esporte. A partir desta proposta, a associação tem como um dos principais objetivos apoiar e desenvolver projetos que visam a preservação e o processamento técnico; a conservação e restauração de acervos museológicos, bibliográficos e arquivísticos para museus, bibliotecas, arquivos públicos e congêneres; e a restauração de bens móveis e imóveis, através do reconhecimento e da valorização da sua diversidade cultural, étnica e regional. Nesse sentido, o projeto de restauração e conservação do monumento Maria Taquara é um desdobramento das tentativas de por em prática os objetivos e propostas da associação Ação Cultural. A preocupação com a restauração e preservação do monumento Maria Taquara está indissocialvemente relacionada com a preocupação com os espaços de sociabilidades e locais de memória de Cuiabá. De acordo com Denise Jodelet (2002, p.32), a significação de um espaço é marcada pela cultura e pela história. A relação do sujeito individual ou coletivo com este espaço passa por uma construção de sentidos e significados, baseados na experiência direta, na prática funcional ou subversiva e no valor simbólico conferido ao ambiente constrído pela cultura e pelas relações sociais.1 A Praça Maria Taquara, local em que se encontra o monumento, está localizada no centro da cidade, entre a rua Clóvis Huguenei e a avenida Tenente Coronel Duarte. O espaço, que hoje atende o embarque e desembarque de 11 linhas de transporte público, tem um fluxo de 10 mil pessoas por dia. Através dos projetos em comemoração aos 300 anos de Cuiabá, a prefeitura de Cuiabá instalou novas estruturas nos pontos de ônibus e taxi da praça em formato de containes. Assim, este projeto visa contribuir com as ações de conservação da Praça Maria Taquara, através da restauração e manutenção do monumento.

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JODELET, Denise. A cidade e a memória. In: DEL RIO, V.; DUARTE, C. R.; RHEINGANTZ, P. A. (Org.). Projeto de Lugar: colaboração entre psicologia, arquitetura e urbanismo. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2002. (Coleção ProArquitetura). p. 31- 43.


1. Histórico do monumento Maria Taquara “De dia Maria Taquara, de noite Maria meu bem”. Esse era o jargão que identificava Maria Taquara ao passar pelas ruas de Cuiabá. Assim ficara conhecida e marcada na história popular. De acordo com as memórias narradas por aqueles que viveram na mesma época, a personagem recebera essa fama por conta de seus encontros com diversos soldados do 16º Batalhão de Caçadores, hoje a 44º Brigada de Infantaria Motorizada (BIM). Aníbal Alencastro conheceu Maria Taquara quando servia o Exército no 16º Batalhão de Caçadores. Segundo o escritor, em entrevista ao hipernotícias em 2013, muitos dos soldados que estavam de plantão a noite pulavam o muro para se encontrar com Maria. Quando o oficial fazia as rondas noturnas, recolhia os mosquestões dos soldados que deixavam os fuzis enconstados nos muros para fugir. Mas, para além deste jargão, quem era Maria Taquara? Pouco temos de registros oficiais. Não sabemos seu sobrenome, apenas que ela era Maria. Ganhou o apelido de Taquara por ser uma mulher alta e magra. Aníbal Alencastro conta que a primeira moradia dela nas proximidades de Cuiabá foi na estrada do Ribeirão, que dava acesso à Nossa Senhora da Guia, em um casebre de adobe com folhas de palmeiras 2. Ao se mudar para a capital, Maria Taquara morou em um casebre aos fundos do antigo 16° BC e vivia de lavar e passar roupas para algumas famílias de Cuiabá. Por esse motivo estava sempre com uma trouxa na cabeça. Dunga Rodrigues conta em seu livro Lendas de Mato Grosso que era comum neste espaço ser moradia de lavadeiras. Vejamos como ela relata o cotidiano de uma lavadeira que morava nas proximidades de Maria Taquara: Quando o bairro do Quilombo guardava ainda reminiscência de sua origem, lugar ermo, o matagal crescendo e cobrindo restos de taipas socadas, uma ou outra casa pontilhava alí e acolá, como manchas de caiação semiescondidas pelo cascudo, tinge-língua e carrapicho. Lavadeiras e engomadeiras se aninhavam daqueles lados, com fama de mão no canto no alvejar e passar das roupas. A água era abundante nas cheias. Na seca, faziam longas caminhadas até o ribeirão, desciam ao tanque do Baú, ou aos minadouros do Pito Aceso. Quando iam devolver a trouxa à cidade, levavam um tempão no percurso de ida e volta. A patroa sempre recriminava Siá Joaninha. - Um dia, esta balda de trazer roupa de noitinha lhe sairá caro. Mormente nas noites de segunda e sexta-feira. - Bobagem, siá Dona, replicava a mina. Com meu rosário amarrado no cós da saia e meu cachorro Ventania de meu lado, enfrento até o demo. Siá Joaninha enfiava-se pela cozinha, filava as sobras do jantar, punhase em dia com as novidades, enquanto Siá Dona contava as dúzias de peças, esfregadas à mão e branquinhas, sem auxílio de anil ou de qualquer outro expediente. Quando rumava para casa, levando toquinhos de guaraná e rapadura


para adoçar a bebida das crianças, já ia pra lá das 8. Noite alta para se caminhar naquele mataréu. Ventania caminhava lento, com a barriga cheia das costelas que lhe atiravam para matar-lhe a fome.3

Este cotidiano muito se aproxima à realidade de Maria Taquara, que lava as roupas nas margens do corrego da prainha. Conforme podemos observar no trecho, as lavadeiras faziam parte de um grupo social que estavam à margem da sociedade, sem assistência por parte do governo. Mulher, negra e pobre, Maria Taquara sentiu na pele a desigualdade social e os preconceitos herdados de uma sociedade escravocrata. Contudo, a lavadeira respondeu à altura a esses estigmas estabalecidos a ela e as mulheres que viviam como ela. Sua resposta fora dada na forma que escolheu para viver. Maria era uma mulher livre, escolhia com quem se deitar, com quantos e quando. Não se submetia ao papel da mulher conservadora. Bebia, fumava seu cigarro de palha e andava pelas ruas sem prestar satisfações. Claro que muitas dessas ações eram em respotas às necessidades impostas pelo lugar social que ela ocupava. Segundo José Augusto Tenuta, Maria Taquara era uma mulher esperta, de personalidade forte, que enfrentava os preconceitos de uma sociedade extremamente conservadora da Cuiabá dos anos de 1930 a 1950.4 Por conta de sua forma de viver, a lavadeira ficou registrada na memória cuiabana como uma mulher subversiva, que não seguia os costumes morais e afrontava a ordem social. Uma das características que melhor explica esse imaginário é que Maria Taquara foi uma das primeiras mulheres a usar calça na capital, em meio a uma sociedade conservadora que reservava apenas o uso de saias às mulheres. Muito provavelmnete, ela optara por usar calças por conta de sua profissão. Lavar roupas agachada às margens do rio se tornava muito mais confortável se usando calças. Mas este elemento se tornou um símbolo de subversão eternizado na memória cuiabana. No livro Cuiabá de Outrora, Lenine Póvoas apresenta algumas mulheres que se destacaram na sociedade cuiabana e se tornaram uma figura popular. Entre elas, está Maria Taquara. “Além dessas tivemos ainda a ‘Maria Taquara’, homenageada contemporaneamente com seu nome num dos mais sofisticados restaurantes da cidade, e com um monumento, em ferro, obra do artista cuiabano Tenuta”.5

1.1. Processo construtivo

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RODRIGUES, Dunga. Lendas de Mato Grosso. Cuiabá – Roteiro das Lendas. Cuiabá, UFMT, 1984.

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TENUTA, José Augusto. Cuiabá da tchapa e da cruz: pó dexá, é só uma michidinha no baú da nossa história. Cuiabá-MT: Entrelinhas, 2015. P.82 5

PÓVOAS, Lenine C. Cuiabá de outrora. (testemunha ocular de uma época). Cuiabá-MT: IHGMT e AML, 1983, p.51


O monumento foi encomendado pelo secretário da SEDUC, Hélio Palma de Arruda, já no final do século XX. Quem a produziu foi o artista plástico Aroldo Tenuta, no ano de 1982. De família tradicional, tem obras espalhadas por todo o país. Tenuta foi um especilista na arte de trabalhar com ferro forjado. Durante o processo de produção, o ferro é batido com martelo, enrolado e pintado manualmente. Sua arte retrata a mistura entre o estilo barroco, rococó e moderno. O artista dedicou a estátua “Maria Taquara” em homenagem à Cuiabá e a seus pais Palmira e Antonio Tenuta. Lenine Póvoas relata, em seu livro Cuiabá de Outrora, que conheceu a família Tenuta. Eles eram donos de uma das duas firmas funerárias existentes em Cuiabá no início do século. Das duas lembro-me mais claramente da do sr. Antonio Tenuta, não só pelo fato de ser sua sede em frente ao Liceu Cuiabano, onde estudei, como porque meus pais mantinham relações de amizade e compadresco com a família do proprietário. Italiano radicado em Cuiabá, onde contraiu matrimônio e teve muitos filhos, Antonio Tenuta era a simpatia personificada, tratando com a maior afabilidade a todos que dele se acercavam.6

Aroldo Tenuta fez a estátua de Maria Taquara pois a considerava uma figura popular que simbolizava o labor das mulheres da região. O monumento sustenta cerca de 350 quilos de ferro, tendo a altura de 4,20 metros. Através de um bom domínio de técnica, o artista trabalhou cada fragmento a partir das mais severas normas de composição: os bustos e costas foram repuxados à mão em chapa única. As pernas e os braços forma compostos em aglomerados de fragmentos. Na postura dos braços foi utilizado lâminas de ferro forjado, finalizadas na modelagem à mão.7 Se observarmos os traços expressos na estátua veremos no rosto de Maria Taquara a representação de uma dramaticidade. Sua expressão facial triste representa o cotidiano de labor e luta de uma vida marcada pelas consequencias da desigualdade social. A seguir, uma foto tirada no dia da inauguração do monumento.

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PÓVOAS, Lenine C.Op. Cit., p.44

Jornal O Estado de Mato Grosso, de 21 de maio de 1982. Acervo da Superintendência de Arquivo Público/SEPLAG.


Figura 01: Osmar Cabral, 21 mai. 1982


Relatório de restauração e conservação da Estátua de Maria Taquara

A proposta deste projeto consistiu na intervenção para preservação através da restauração da estátua de Maria Taquara.

Primeiramente houve a remoção da estátua da Maria Taquara por meio de um caminhão munck.


Após passará por jateamento de areia, os pontos de oxidação foram removidos.

Foram aplicados produtos anti-ferrugem para proteção do material


A estátua por ser ocada, recebeu vedações na parte frontal para que a água da chuva não penetre no seu interior.

As parte danificadas foram removidas e posterior restauradas


O último passo foi a pintura completa mantendo as caracteristicas originais das cores da estátua.

O próximo passo do trabalho foi recuperar a base em alvenaria da estátua e o letreiro.


Foram removidas as camadas de tinta e higienização da base e o letreiro, que havia recebido uma pintura inadequada, passou pelo processo de lixamento e solda das partes quebradas.

A base foi toda preenchida com traço de cimento e cal buscando a impermeabilização completa.


Após o procedimento, aplicou-se massa corrida para parte externa uniformizando.

Com a base toda preparada, a primeira demão de tinta acrílica fosca foi aplicada na base. Já no letreiro, foi dada a mão de tinta óleo branca.


Com a primeira demão aplicada, uma nova aplicação de massa corrida para correção das imperfeições da base e imperm.


Recuperação da placa de ferro original que passou por limpeza e polimento


Na proposta de restauro buscou-se evidenciar o monumento no período noturno, por meio de refletores de embutir no solo com sistema LED 10W 2700K com relé fotoelétrico e sensor RDL (resistor dependente de luz) de acendimento das luzes de forma automática ao anoitecer e apagar ao amanhecer, buscando a eficiência energética, evitando desperdício e proporcionando economia.

Estátua devidamente instalada .


6. BIBLIOGRAFIA

D’ELIA, Natalie B; MARQUES, Emerson; NORA, Giseli D. O contexto dos pontos turísticos no processo de evolução urbana de Cuiabá/MT: um olhar sobre sua importância histórica e cultural. VII Congresso Brasileiro de Geógrafos, 2014.

JODELET, Denise. A cidade e a memória. In: DEL RIO, V.; DUARTE, C. R.; RHEINGANTZ, P. A. (Org.). Projeto de Lugar: colaboração entre psicologia, arquitetura e urbanismo. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2002. (Coleção ProArquitetura). p. 31- 43.

LACERDA, Marina D. C. A. O IPHAN e a invenção dos lugares de memória em Cuiabá: as demandas e políticas de preservação do patrimônio histórico (1958-2013)

PÓVOAS, Lenine C. Cuiabá de outrora. (testemunha ocular de uma época). Cuiabá-MT: IHGMT e AML, 1983, p.51

RODRIGUES, Dunga. Lendas de Mato Grosso. Cuiabá – Roteiro das Lendas. Cuiabá, UFMT, 1984.

TENUTA, José Augusto. Cuiabá da tchapa e da cruz: pó dexá, é só uma michidinha no baú da nossa história. Cuiabá-MT: Entrelinhas, 2015. P.8

Imagens utilizadas:

Inauguração da estátua em homenagem à "Maria Taquara" de autoria do artista Aroldo C. Tenuta. Autor: Osmar Cabral. Cuiabá, 21 mai. 1982. 21 arquivos de Negativos de acetato de 35mm, P&B. Acervo da Superintendência de Arquivo Público/SEPLAG. Fundo da Secretaria de Estado de Comunicação Social de Mato Grosso (SECOM-MT). Código de classificação: BR MTAPMT.SCS.500.510.511.9-30092.


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