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Artigo JESUS E A FOME

Nos 59 anos da Campanha da Fraternidade, a CNBB, pela terceira vez, aborda a questão da fome (1975, 1985 e 2023).

O trabalho dignifica o ser humano, sendo, também, o primeiro e fundamental meio de autossustento. É uma máxima do Criador: “Com o suor do teu rosto, ganharás o pão de cada dia” (Gn 3,19).

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Catástrofes naturais, ou aquelas que são provocadas pela ação humana, podem levar a uma fome generalizada.

A História da Humanidade registra várias delas e são narradas na Bíblia, como o Dilúvio (Gênesis caps. 6 a 9) e as conhecidas “sete vacas gordas e sete vacas magras” da cultura egípcia. O Egito preparou-se para a carestia, estocando alimentos.

Os outros povos, inclusive Israel, “para não morrerem de fome” (Gênesis, caps. 42 a 46) migram para lá. Quando se esgotaram os recursos, submetem-se à escravidão.

Israel, após “430 anos” (Ex 12,40), regressa ao seu país, passando um longo período no deserto. Ali murmuram contra Javé, pois não tinham nem pão, nem água (caps. 16 e 17).

Estas duas experiências pelas quais passaram, fez com que a Torah inserisse leis sociais que garantissem vida digna aos “órfãos, viúvas e estrangeiros” (Dt 24, 17-18). O objetivo é de que “entre vós, não haja pobres” (15,4-11).

Uma vez estabelecidas no país (Palestina), as assíduas vozes proféticas ecoavam no meio do povo e dos governantes, lembrando-os desse compromisso. Mesmo assim, a fome persistia.

O profeta Elias, por causa da longa estiagem, constata que a “fome era extrema em Samaria” (1Rs 18,2) e que Javé o mandou mendigar um pão a uma viúva de Sarepta (cf. 1Rs 17,8-16).

“A fome dominava a cidade e não havia comida para o cidadão comum”, diz

Jeremias (52,6). Outros profetas constatavam a mesma situação. Mesmo tendo conhecimento desta delicada situação, Amós abre outra perspectiva ao afirmar que “Javé mandará fome sobre a terra – não a de pão, nem de água –mas de ouvir a Palavra de Deus” (Am 8,11).

Os Evangelhos narram que Jesus, por duas vezes, tem "compaixão do povo".

A primeira foi quando viu uma multidão, abatida e desorientada, como “ovelhas sem pastor. E começou a ensinar-lhes muitas coisas” (Mc 6,34). Sua ação imediata é o ensino. Na segunda vez, ficou comovido porque o povo “não tinha o que comer” (Mt 15,32). Sua ação imediata foi providenciar comida.

Os apóstolos sugerem que despeça a multidão “para que fossem ao povoado onde poderiam comprar pão”. Jesus, porém, os compromete, dizendo: “Dai-lhes vós mesmo de comer” (Mt 14,16).

O eixo que move Jesus é a "compaixão". Ver o povo desorientado como ovelhas sem pastor e vê-lo faminto – isto mexe com suas entranhas (= etimologia da palavra compaixão). É como se fosse uma foto impressa em seu coração, do qual nunca sairá. Vira-e-mexe, ela palpita dentro dele numa mútua solidariedade e empatia.

A compaixão ultrapassa, em muito, a um sentimentalismo passageiro. Ela é um “comover-se no mais profundo do ser – as vísceras ou entranhas – que leva Jesus a uma ação concreta de libertação” (CF/2023, Texto Base nº 20).

Para o judeu, 5 pães e 2 peixes, é a quantia de alimento para uma família passar o dia. Por isso, quem apresenta a solução é um menino e não um assalariado adulto que o apóstolo Felipe sugere: 200 denários para que cada um possa receber um bocado. Denário é a diária que um trabalhador recebe por um (01) dia de serviço. As ações que movem a compaixão não são números matemáticos.

Deus realiza milagres no nosso dia a dia. Para tanto, faz-se necessário a partilha dos 5 pães e 2 peixes, e a bênção; ela é o “erguer os olhos” para agradecer o fruto do “suor do rosto”.

O milagre inclui, também, a descentralização do poder: os apóstolos organizam o povo em grupos, distribuem o pão e recolhem as sobras.

“Para combater a falta de alimento é necessário agir sobre as causas que a promovem. Na raiz deste drama estão, sobretudo, a falta de compaixão e uma escassa vontade política e social” (CF/2023, Texto Base nº 09).

Combater a fome não se faz somente com a política social (ver a realidade). Ela tem, também, uma raiz bíblica, a compaixão.

São duas mãos que se entrelaçam em mútua entreajuda. Continuaremos a refletir no próximo mês!

Frei Luiz Iakovacz

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