ISSN 2176 7785
PÓS EM REVISTA PUBLICAÇÃO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA N.12 | 2016/1 EDITORA Eliana de Faria Garcia Horta
© 2016, by Editor © 2016, by Centro Universitário Newton Paiva 2016
ISSN 2176 7785 INC PÓS em Revista [Periódico]: Publicação do Centro Universitário Newton Paiva / Editora Eliana de Faria Garcia Horta. – Belo Horizonte: Centro Universitário Newton Paiva, 2016. n. 12, 1ª semestre 2016 ISSN 2176 7785 1 Generalidade. 2. Administração. 3. Engenharia. 3. Direito. I. Horta, Eliana de Faria Garcia. II. Centro Universitário Newton Paiva. III. Título.
CDU: 001.891
Ficha Catalográfica: Bibliotecária Kênia Amaral da Silva – CRB/6:2053
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
EDITORIAL Prezado Leitor, Temos a satisfação de divulgar a DÉCIMA SEGUNDA EDIÇÃO da “Pós em Revista”. A cada edição, a Pós em Revista busca maturidade, indo ao encontro da qualificação de cada publicação e do reconhecimento como meio de divulgação de qualidade entre os alunos, professores e profissionais do Centro Universitário Newton Paiva e de outras instituições. Nesta décima segunda edição, por meio da mídia eletrônica, a revista traz dezoito artigos, resultantes de trabalhos científicos, interdisciplinares, de conclusão de curso e de revisão da literatura que possuem relevância em suas respectivas áreas do saber científico: ciências sociais e humanas, ciências da saúde e exatas. Aproveitamos a oportunidade para agradecer aos autores dos trabalhos que abrilhantaram esta edição. Nós, da Equipe Editorial estamos felizes por mais uma edição publicada e desejamos a participação, interação e divulgação de nossos alunos, professores e leitores para seguirmos crescendo no cenário da divulgação do conhecimento por meio da publicação desta revista. Queremos ainda, convidar aos professores e alunos a enviarem seus artigos. Caso os trabalhos se enquadrem em nosso escopo editorial poderão compor a DÉCIMA TERCEIRA EDIÇÃO da “Pós em Revista”, prevista para o MÊS DE DEZEMBRO DE 2016. Boa leitura! ELIANA DE FARIA GARCIA HORTA EDITORA-GERAL
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
EXPEDIENTE ESTRUTURA FORMAL DA INSTITUIÇÃO PRESIDENTE DO GRUPO SPLICE: Antônio Roberto Beldi REITOR: João Paulo Beldi DIRETOR ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO: Cláudio Geraldo Amorim de Sousa SECRETÁRIA GERAL: Jacqueline Guimarães Ribeiro
CORPO EDITORIAL EDITORA Eliana de Faria Garcia Horta ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS Maria do Carmo Resende Teixeira Guerra Fernando Ferreira Dias Filho Iremar Nunes Lima ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS HUMANAS Bruno Luciano de Paiva Silva ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS DA SAÚDE Sérgio Fernando de Oliveira Gomes Roberta Dias Rodrigues Rocha ÁREA DE CONHECIMENTO- CIÊNCIAS DA ENGENHARIA Érika Silva Fabri Luciano Emirich Faria Tereza Cristina Magalhães
APOIO TÉCNICO NÚCLEO DE PUBLICAÇÕES ACADÊMICAS DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA http://npa.newtonpaiva.br/npa EDITORA DE ARTE E PROJETO GRÁFICO: Helô Costa - Registro Profissional: 127/MG DIAGRAMAÇÃO: Ariane Lopes, Marina Pacheco e Pedro de Paula (estagiários do curso de Jornalismo)
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
SUMÁRIO CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS A NOVA LIDERANÇA NA ERA DO CONHECIMENTO ........................................................................................................................................... 7 Giuliano Vitor Xavier, Adriana Gontijo A PROPOSIÇÃO DE UM MODELO DE RELAÇÃO UNIVERSIDADE E EMPRESA BASEADA EM COMUNIDADES DE PRÁTICA ..................... 13 Leonardo Bastos Ávila, Cássia Resende Diniz, Isis Boostel O EMPREENDEDORISMO ACADÊMICO NO CONTEXTO DA INTERAÇÃO UNIVERSIDADE - EMPRESA – GOVERNO ................................... 20 Leonardo Bastos Ávila, Cássia Resende Diniz, Isis Boostel
DIREITO AVISO PRÉVIO: UMA ANÁLISE CRÍTICA DA LEI N. 12.506/2011 E OS SEUS IMPACTOS NA RELAÇÃO DE EMPREGO................................... 28 Gláucio Antônio Oliveira, Roberta Dantas de Mello
COMUNICAÇÃO AS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA O CURSO SUPERIOR DE RELAÇÕES PÚBLICAS E A CONTEMPORANEIDADE NEOLIBERAL .................................................................................................................. 35 Frederico Fonseca Soares O Sensacionalismo Acerca da Morte do Cristiano Araújo nos Portais G1 e R7 ................................................................................................... 41 Amanda Tomaz, Leonardo Barros, Samara Tibúrcio, Thales Santos, Sonia Aparecida Martins Lazzarini O JORNALISMO E A NARRATIVA TRANSMÍDIA: o caso Post CPJ ...................................................................................................................... 48 Izamara Barbosa Arcanjo Ferreira Silva
CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS ANALFABETISMO FUNCIONAL: um quadro passível de ser revertido ................................................................................................................ 55 Matheus Vargas de Souza, Gleides Ander Nonato
CIÊNCIAS DA SAÚDE ODONTOLOGIA ETIOLOGIA MULTIFATORIAL DAS RECESSÕES GENGIVAIS: UMA REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................ 60 Rosimar Solange de Matos Bicalho, Carla Viviane Gomes, Rafael Paschoal Esteves Lima O USO DE CLOREXIDINA PARA DESCONTAMINAÇÃO ORAL COMO FORMA DE PREVENIR A OCORRÊNCIA DE PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA: UMA ANÁLISE E REVISÃO DE LITERATURA ............................................................. 63 Tatiane Luiz de Oliveira,, Annerly Josefina de Oliveira, Andréa Márcia de Souza.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
FARMÁCIA E12 FARM01- DESENVOLVIMENTO DE UM SOFTWARE PARA PADRONIZAÇÃO DAS PRESCRIÇÕES MEDICAMENTOSAS DOS CENTROS DE REFERÊNCIA EM SAÚDE MENTAL (CERSAM) DE BELO HORIZONTE............................................ 67 Ana Flávia Thomaz Lages, Luciane de Abreu Ferreira, Sérgio Ribeiro Cardoso ENFERMAGEM PROMOÇÃO EM SAÚDE E RASTREAMENTO DOS CÂNCERES DO COLO UTERINO E DE MAMA: um relato de experiência ........................ 78 Cristiane Marinho da Silva Costa, Edinéia de Castro Viana, Grace Kelly Portes Bragion, Fernanda dos Anjos Oliveira AÇÕES EDUCATIVAS EM ORTOPEDIA: um relato de experiência ....................................................................................................................... 86 Ana Claudia Moreira Faluba, Edinéia de Castro Viana, Grace Kelly Portes Bragion, Helena Caldeira Marques, Valquíria Fernandes Marques Vieira, Ingrid Pollyanna Brito de Oliveira GRUPO OPERATIVO COM IDOSOS: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA ACADÊMICA A PARTIR DA INTERVENÇÃO EDUCATIVA COM CÍRCULOS DE CULTURA ......................................................................................................................................................... 91 Girleyla Rodrigues dos Santos, Jéssica Normando Duarte, Valquíria Fernandes Marques Vieira RELATO DE EXPERIÊNCIA: IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA INTERDISCIPLINAR ................................ 96 Ana Paula Dias de Menezes; Bárbara Bruna de Almeida Assis; Janaína de Jesus Araújo; Letícia Barbosa Fonseca; Letícia Mendes Evangelista; Lorena de Castro Silva; Luã Augusto dos Santos; Maria Carolina Gomes Inácio; Silvia Moreira Amaral; Valquíria Fernandes Vieira; Virgílio Silva Maximiano.
CIÊNCIAS BIOLÓGICAS IMPORTÂNCIA DO ESTUDO E UTILIZAÇÃO DE PLANTAS MEDICINAIS NO CENTRO DE VIVÊNCIA AGROECOLÓGICO MORRO DAS PEDRAS, BELO HORIZONTE, MG .................................................................................................................. 103 Vera Lúcia Ferreira; Alice Gontijo de Godoy.
CIÊNCIAS EXATAS CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO BUSINESS INTELLIGENCE, BIG DATA E FAST DATA: Análise das tecnologias de tratamento de dados em massa ........................................ 112 Jeferson Eustáquio Rodrigues de Araújo, Iremar Nunes de Lima PRIVACIDADE EM SISTEMAS DE APOIO A DECISÕES: Business Intelligence, Data Mining, Big Data e Fast Data ........................................... 122 Marcela Simão Gomes da Silva, Iremar Nunes de Lima
PSICOLOGIA A URGÊNCIA NA CIDADE E A VIOLÊNCIA DO TRAUMA ...................................................................................................................................... 128 Lucas Fernandes Loureiro
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
A NOVA LIDERANÇA NA ERA DO CONHECIMENTO Giuliano Vitor Xavier1 Adriana Gontijo2
RESUMO: Os diais atuais são marcados pela Era do Conhecimento, que é representada pelo compartilhamento de muitos conhecimentos, informações e constantes mudanças; constituída por uma sociedade interativa e atualizada. Neste novo contexto, a maneira de liderar da Era Industrial, onde o foco e o diferencial competitivo das empresas estavam na gestão da tecnologia, máquinas e estrutura, não se encaixa mais na realidade atual, onde os bons resultados de uma gestão estratégica de pessoas representam o diferencial competitivo das empresas. Assim, é preciso que haja um novo perfil de liderança nas empresas, para lidar com as mudanças e evoluções desta nova era. Logo, o artigo em questão, busca compreender como a liderança deve atuar na Era do Conhecimento e instiga as empresas e líderes a repensarem a maneira de liderar nos dias atuais. A metodologia foi conduzida por pesquisa descritiva e pesquisa bibliográfica. Os resultados encontrados confirmam a importância e necessidade de uma nova liderança na Era do Conhecimento, para que a empresas tenham melhores resultados em seus negócios e vantagem competitiva. PALAVRAS-CHAVE: Liderança. Era do Conhecimento. Gestão. Pessoas. Conhecimento.
1 INTRODUÇÃO O mundo atual tem vivido na Era do Conhecimento, marcada por difusão de muitas informações, tecnologias, troca rápida de conhecimentos, obsolescência rápida de produtos e alta competitividade entre as empresas. Esta nova era é marcada por uma cultura mais rica, onde as pessoas têm acesso a mais informações, muitas tecnologias e vivem no mundo de mudanças e evoluções constantes. Com isso, há uma sociedade interativa, atualizada, totalmente livre, inteligente nas escolhas e com melhor qualidade de vida. As empresas têm chegado a níveis iguais em termos de tecnologias e estrutura, mas há um fator que faz a diferença nas empresas e torna as mesmas competitivas: as pessoas, que representam o capital intelectual de uma empresa e podem contribuir com conhecimentos, habilidades, inovações, ideias e criatividades. Mas não tem sido fácil liderar essas pessoas com o uso de uma liderança tradicional, pois as pessoas tornaram-se mais críticas e seletivas no seu modo de viver, buscando qualidade de vida e profissional. Isso reflete diretamente no desempenho das empresas, pois as pessoas buscam ambientes com os quais elas se identificam, para entregar os melhores resultados. Elas tornaram analíticas quanto às atividades que exercem, não correspondendo a qualquer forma de liderança. Exigem mais respei-
e empresas de uma nova liderança que corresponda às mudanças e
to, autonomia, liberdade e participação. Logo, a maneira de exercer a liderança não pode ser mais a mesma, é preciso que haja um novo perfil de liderança. Conforme uma pesquisa da IBM (2010 apud TEIXEIRA, 2010), realizada em 2010, com um grupo de mais de 1,5 mil CEOs (Chief Executive Officers) de 60 países e 33 setores, apenas 49% sentiam preparados para enfrentar as complexidades dessa nova liderança. Logo, a alta direção tem percebido que há necessidade de mudanças e preparação da liderança atual. Segundo Hamel (2007 apud TEIXEIRA, 2010), as empresas estão sendo administradas por um pequeno grupo de teóricos e profissionais que já morreram há muito tempo e criaram as regras e convenções da gestão moderna nos primeiros anos do século 20. Diante do exposto, justifica-se a realização deste trabalho de pesquisa, devido à necessidade de compreensão por parte de líderes
2.1 Liderança Segundo Hunter (2004, p. 25), “Liderança é a habilidade de influenciar pessoas para trabalharem entusiasticamente visando atingir objetivos identificados como sendo para o bem comum.” De acordo com Krause (1999, p. 45), “Liderança pode ser definida como o desejo de controlar eventos, a sabedoria de indicar uma rota a ser seguida e o poder de fazer com que uma ação seja realizada, usando cooperativamente as capacidades e habilidades de outras pessoas.” Liderança é a realização de uma meta por meio da direção de colaboradores humanos. O homem que comanda com sucesso seus colaboradores para alcançar finalidades específicas é um líder. Um grande líder é aquele que tem essa capacidade dia após dia, ano após ano, numa grande variedade de situações (MAXIMIANO, 2000, p. 388).
evoluções da Era do Conhecimento, questão ainda pouco analisada em muitas empresas. Este artigo busca responder ao problema: como a liderança deve atuar na Era do Conhecimento? Também tem como objetivo geral analisar como a liderança deve atuar na Era do Conhecimento, e quanto aos objetivos específicos, analisar evolução histórica da liderança; verificar importância e necessidade de uma nova liderança na Era do Conhecimento; entender qual o novo perfil da liderança e conscientizar profissionais e empresas para repensarem a liderança. As principais hipóteses a serem verificadas são: a Era do Conhecimento exige uma nova liderança nas empresas e a liderança tradicional das empresas está sendo confrontada pela Era do Conhecimento. A expectativa para este trabalho é poder apresentar importantes conceitos sobre o tema e realizar análises a partir de estudos e opiniões de especialistas e empresas, de modo que permitam aprendizagem, conscientização e aplicação. 2 REFERENCIAL TEÓRICO A seguir será apresentado o referencial teórico, explicitando os principais conceitos:
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 7
2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LIDERANÇA
2.3 ERA DO CONHECIMENTO
A seguir será apresentada a evolução histórica da liderança, baseada nos estudos de Silva (2014). Ao longo dos anos, a liderança passou por diversas fases. Sua existência é desde o começo das civilizações, devido à necessidade de sobrevivência e à competitividade entre os grupos. No início da Revolução Industrial, por volta do século XVIII, o trabalho era realizado por trabalhadores sem as devidas condições, com riscos de acidentes e com total descaso com esses trabalhadores. Devido à necessidade de alta produção, exigindo a contratação de trabalhadores para o “chão de fábrica” e uma liderança para fazer a gestão dos processos e das pessoas, surgem estudos da administração, desenvolvidos na Escola Clássica, que elaborou métodos de produção e administração. O primeiro estudo foi desenvolvido pelo engenheiro Frederick Taylor, chamado de Teoria Científica, visando eficiência dos trabalhadores na linha de produção, baseada em estudos de tempos e movimentos, supervisão e foco na eficiência. O segundo estudo foi desenvolvido pelo engenheiro Henri Fayol, chamado de Teoria Clássica, visando organizar as funções e procedimentos do ato de administrar. Eram definidos deveres e obrigações para os líderes e sua ênfase era na estrutura organizacional. De acordo com Fayol, os líderes coordenam e controlam as atividades, com
O termo Era do Conhecimento é também conhecido como Sociedade do Conhecimento. Drucker (1993, p. 7) afirmou no início da década de 90: [...] estamos entrando na sociedade do conhecimento na qual o recurso econômico básico não é mais o capital nem os recursos naturais ou a mão de obra e sim o conhecimento; uma sociedade na qual os trabalhadores do conhecimento desempenharão um papel central. A sociedade do conhecimento é compreendida como aquela na qual o conhecimento é o principal fator estratégico de riqueza e poder, tanto para as organizações quanto para os países. Nessa nova sociedade, a inovação tecnológica ou novo conhecimento, passa a ser um fator importante para a produtividade e para o desenvolvimento econômico dos países (CALLE; SILVA, 2008, p. 3). Na Sociedade do Conhecimento, as mudanças e as inovações tecnológicas ocorrem em um ritmo tão acelerado que, além dos fatores tradicionais de produção, como capital, terra e trabalho, é fundamental identificar e gerir de forma inteligente o conhecimento das pessoas nas organizações. Esta nova era pressupõe uma imensa oportunidade de disseminar democraticamente as informações, utilizá-las para gerar conhecimento
foco na eficiência da organização, e devem trabalhar de maneira formal ao gerir suas funções. O terceiro estudo foi desenvolvido pelo sociólogo Max Weber, chamado de Modelo da Burocracia, que contribuiu para a formalização de um modelo para se administrar e esquematizou um método de produção considerado eficiente na época. O objetivo dessas teorias era a eficiência na produção, visando alta escala de produção, não importando as pessoas e as condições de trabalho para as mesmas. Por volta de 1927 surge a Teoria das Relações Humanas, desenvolvida pelo psicólogo Elton Mayo, visando uma administração mais humanística e a quebra de procedimentos rígidos, burocráticos e mecanicistas, permitindo aos líderes entenderem melhor a personalidade e comportamento de seus colaboradores, terem uma visão mais humana, criarem um ambiente de trabalho mais adequado, melhor e participativo, e obterem melhores resultados. Em meados da década de 50, surge a Teoria Estruturalista, baseada na Teoria Clássica e na Teoria das Relações Humanas, permitindo que líderes focassem as necessidades dos colaboradores e também da organização. A partir de 1970, surgem no Japão, novas técnicas de gestão dos processos e pessoas, com foco participativo e programas de qualidade, a chamada Produção Enxuta. As técnicas são estudadas e aplicadas até os dias atuais nas empresas. As técnicas da Produção Enxuta permitiram maior participação das pessoas, descentralizações de decisões, oportunidade de crescimento e desenvolvimento, ambiente seguro e confortável, melhor qualidade de vida no trabalho e condições capazes de gerar satisfação. De acordo com as primeiras teorias citadas, constata-se que não existia um líder, mas um chefe. Chefe é sinônimo de autoritarismo, de imposição de regras, mas com a Teoria das Relações Humanas o papel do chefe autoritário passa a ser visto como um líder humanitário, que se preocupa com seus liderados, levando em conta suas emoções (SILVA, 2014). A partir da Teoria das Relações Humanas até os dias atuais, há uma preocupação com a liderança, pois foi percebido que o comportamento do líder influencia no comportamento e desempenho dos colaboradores, nos resultados e no sucesso da organização.
que leve em direção a uma sociedade mais justa (LEAL, 2003). A sociedade do conhecimento é então posterior à sociedade industrial moderna, na qual matérias-primas e o capital eram considerados como o principal fator de produção. Essa nova sociedade é impulsionada também por contínuas mudanças, algumas tecnológicas como a internet e a digitalização, e outras econômico-sociais como a globalização (CALLE; SILVA, 2008, p. 3). A Era do Conhecimento é marcada por grandes transformações e constantes mudanças, onde o conhecimento é o principal fator estratégico para o alcance de vantagem competitiva de uma empresa. De acordo com Lucci, “a humanidade está vivendo na Era Pós -Industrial, um novo mundo, onde o trabalho físico é feito pelas máquinas e o mental, pelos computadores. Nela cabe ao homem uma tarefa para a qual é insubstituível: ser criativo, ter ideias.” 2.4 A NOVA LIDERANÇA NA ERA DO CONHECIMENTO
De acordo com Joaquim Felício Júnior, diretor do Instituto de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas do UNEC (Centro Universidade de Caratinga, em Minas Gerais), não há certeza de qual seria o melhor estilo de liderança para a Era do Conhecimento, pois na Economia do Conhecimento não existe certo e errado, mas existe o que mais se adéqua às organizações. Ele afirma que o estilo gerencial deve contemplar a visão sistêmica, a habilidade de gestão do capital intelectual humano e a visão holística (BISPO, 2004). Segundo Missel (2014), o perfil do antigo Gestor de Pessoas gerou a atual crise de liderança que vivemos nas organizações. Surge um novo perfil de líder que precisa urgentemente atender estas demandas com o objetivo de tornar suas organizações cada vez mais competitivas e inovadoras. Para tanto, conhecimentos técnicos não são mais suficientes. É necessário que um líder hoje desempenhe o mais rápido possível as funções de Gestor de Pessoas. Ele precisa “entender de gente” para obter os melhores resultados para a empresa. O Gestor de Pessoas é aquele profissional que, além de conhecimento técnico, possui uma responsabilidade fundamental para formar novos profissionais, desenvolvendo e colaborando para o cres-
8 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
cimento da instituição e da sua equipe de trabalho. Dentre as novas responsabilidades do Gestor de Pessoas estão: atrair, selecionar e reter talentos; dar e receber feedback; criar estratégias para extrair o melhor de cada profissional; incentivar a equipe; praticar treinamento e desenvolvimento na velocidade das mudanças; servir de exemplo para sua equipe; desenvolver novos líderes; ter equilíbrio emocional; preparar sucessores e monitorar os resultados (MISSEL, 2014). Observa-se que a antiga prática de promover bons profissionais técnicos para funções gerenciais pode trazer consequências catastróficas para as empresas. Nem sempre esses profissionais têm perfil para gerenciar pessoas e motivá-las, e nunca foram orientados a praticar as novas responsabilidades que o mercado demanda (MISSEL, 2014). Neste novo cenário, a Gestão de Pessoas não é mais praticada pelo departamento de Recursos Humanos, mas sim pelos gestores. O departamento de Recursos Humanos ganha um papel estratégico, e os líderes, gestores e diretores devem lidar com as pessoas (MISSEL, 2014). Segundo Joaquim Felício Júnior, na Era do Conhecimento, as condições impostas por um ambiente altamente instável e caracterizado por um volume imenso de mudanças gerou modificações de como liderar no ambiente organizacional. Não há mais, por exemplo, como manter uma relação de comando, controle e subordinação em um ambiente no qual a cada dia exige-se mais um maior comprometimento das pessoas e a capacidade de transferir seus conhecimentos. As pessoas devem ser envolvidas no processo; devem sentir-se parte dele e, principalmente, serem responsáveis por ele (BISPO, 2004).
Como um dos principais agentes de transformação de uma organização, o gestor deve facilitar, alimentar e alavancar o conhecimento das pessoas, maximizando a aprendizagem e incentivando as mesmas a se tornarem pensadores independentes, capazes de julgar a qualidade de suas próprias ideias sem a presença de um chefe ou superior. Para tanto, esse gestor necessita além de características como flexibilidade, criatividade, intuição, trabalho em equipe, entre outras, também deve estar preocupado com o seu aprendizado e com o da organização (BISPO, 2004). Ainda segundo Joaquim Felício Júnior, na Era do Conhecimento, o líder precisa desenvolver competências para acompanhar as mudanças. O líder tem que ser empreendedor, ousado, assumir riscos calculados e deve ter capacidade de mobilização. Ele deve reconhecer o êxito dos outros, estimular as habilidades dos subordinados, ter capacidade de se apoiar nas pessoas, ser inovador, criativo e comunicativo. Deve ainda saber romper paradigmas, estimulando a participação e desenvolvendo talentos, utilizando-se sempre de uma visão sistêmica e trabalhando com uma estrutura flexível (BISPO, 2004). Um dos maiores desafios para os gestores frente às novas condições impostas pela Era do Conhecimento será o estímulo ao verdadeiro compartilhamento, formando espíritos capazes de organizar os conhecimentos individuais, possibilitando a colocação do saber particular ou especializado a serviço da organização, da comunidade e do mundo (BISPO, 2004). Segundo Romani e Dazzi (2005 apud ARANHA et. al., 2009), as ações do líder da Era do Conhecimento são opostas às ações do líder tradicional, como mostra a tabela 1:
Segundo Ruth Malloy, diretora executiva global do departamento de Liderança e Talento do Hay Group e colíder da Pesquisa Melhores Empresas para Liderança no mundo, a pesquisa de 2014 mostra que as principais organizações do mundo estão objetivamente desenvolvendo líderes capazes de promover inovação e transformar suas organizações. E as melhores organizações estão oferecendo planos de carreira mais diversificados e não convencionais e, também, treinando funcionários de grande potencial para lidar com desafios específicos de seus negócios e para desenvolver neles as habilidades necessárias para ajudar suas organizações a competir com sucesso no atual ambiente global, cada vez mais volátil (STISSER, 2014). Segundo Rick Lash, diretor no departamento de Liderança e Talento do Hay Group e colíder da Pesquisa Melhores Empresas para Liderança, as empresas de destaque estão reconhecendo que, para desenvolver líderes estratégicos e conectados globalmente para o futuro, é preciso investir na reunião de líderes para que eles possam
aprender como uma comunidade e, ao mesmo tempo, usar as melhores tecnologias para conectar as pessoas globalmente e trazer o aprendizado de volta para suas equipes e organizações. As empresas estão adotando uma abordagem prática e estruturada para cultivar os talentos e as características de seus líderes e com a maior complexidade dos desafios que as empresas têm de encarar, é visto o desenvolvimento do líder sob encomenda (STISSER, 2014). A Procter & Gamble - P&G foi a primeira colocada na Pesquisa Melhores Empresas para Liderança, em 2014 (STISSER, 2014). A P&G considera as pessoas o bem mais importante e fonte de vantagem competitiva. Afirma que o sucesso depende inteiramente da força de seus talentos, que é construído e administrado com um processo disciplinado liderado pelo CEO (Chief Executive Officers) e pelo time de liderança (PROCTER & GAMBLE - P&G, 2015). A P&G possui planejamento de carreira, como o programa de gerenciamento de talentos P&G no mundo todo - do nível gerencial
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 9
intermediário ao mais alto - para permitir desenvolvimento de carreira e crescimento em todos os negócios e regiões. Ela identifica talentos rapidamente e os desenvolvem por meio de uma série de atribuições variadas e enriquecedoras preparando-os para futuros papéis. A liderança é desenvolvida a partir do propósito, valores e princípios da P&G. Os executivos mais experientes também atuam como mentores e orientadores de gerentes mais jovens, ajudando-os a desenvolver as habilidades necessárias para liderar grandes negócios e organizações (PROCTER & GAMBLE - P&G, 2015). A P&G afirma nunca parar de aprender. Possui diversos treinamentos: na função, técnicos, funcionais e de liderança. Alguns programas são oferecidos em marcos da carreira, como a primeira vez em que o funcionário assume a responsabilidade de gerenciar outras pessoas ou liderar uma organização. Outros programas tiram os gerentes da sala de aula e os colocam em lojas de varejo ou até mesmo em casas de consumidores (PROCTER & GAMBLE - P&G, 2015). 3 METODOLOGIA Baseado em Prodanov e Freitas (2013), são apresentados os métodos e técnicas utilizados para a realização da pesquisa. Quanto ao método de procedimento (meio técnico de investigação): será aplicado o método observacional, pois consiste na observação profissional de fenômenos. Para esta pesquisa são realizadas análises de estudos e opiniões de especialistas e empresas, envolvidos com a liderança, para a observação de comportamentos e atitudes de líderes nos dias atuais; quanto ao método de abordagem (base lógica de investigação): será aplicado o método indutivo, pois partindo das análises de estudos e opiniões de especialistas e empresas, infere-se uma verdade geral, chegando a conclusões importantes. A classificação da pesquisa, quanto à natureza / finalidade: pesquisa básica, pois ela objetiva gerar conhecimentos novos úteis sem aplicação prática prevista; quanto ao seu objetivo: pesquisa descritiva, baseada em dados secundários, pois os fatos são observados, registrados, analisados e interpretados, sem que haja interferência sobre os mesmos; quanto ao procedimento técnico: pesquisa bibliográfica, pois envolve a coleta e sistematização de conhecimentos a partir de materiais já publicados; quanto à forma de tratar o problema de pesquisa: pode ser classificada como uma pesquisa de abordagem qualitativa, pois serão interpretados e registrados fenômenos sem uso de técnicas estatísticas. 4 ANÁLISE 4.1 Análise da evolução histórica da liderança Analisando o contexto histórico, percebe-se que desde o começo da civilização a liderança tem importante papel entre grupos de pessoas, no início visava à sobrevivência e a competitividade. Na Era Industrial, marcada por: mudanças lentas, pelo início do desenvolvimento tecnológico e por profissionais pagos apenas para executar atividades operacionais, a liderança baseava-se no autoritarismo, controle e atendimento da demanda de produção. Não se enxergava nas pessoas um meio de obter melhores resultados. O tempo foi passando e novos estudos sobre o comportamento humano foram aparecendo e sendo percebido que fatores humanos influenciavam nos resultados das empresas e seria necessária uma liderança equilibrada que atendesse as necessidades da empresa e as necessidades das pessoas. O momento atual, conhecido como Era do Conhecimento, é marcado por mudanças e evoluções constantes, difusão de muitos conhecimentos, informações e tecnologias e principalmente valorização de ideias e conhecimentos, que são obtidos através das pessoas. Logo, as empresas podem ter fácil acesso às tecnologias e métodos
de gestão, tendo o mesmo desempenho e resultados que os concorrentes, mas o diferencial competitivo está nas pessoas. É importante observar, que ao longo dos anos, a atribuição de valor aos ativos tangíveis decresce e há um crescimento da relevância e valor dos ativos intelectuais, representados pelas pessoas e contribuições intelectuais, exigindo uma nova liderança que atenda esta nova realidade, com novas características, para obter os resultados e vantagem competitiva necessários à organização. 4.2 ANÁLISE DA NOVA LIDERANÇA NA ERA DO CONHECIMENTO
Atualmente a liderança tem sofrido uma crise, impulsionada por um ambiente de completa instabilidade e constantes mudanças, onde a gestão de pessoas e de seus conhecimentos sobressai ao domínio das técnicas e tecnologias. Na Era Industrial, era possível definir um estilo ideal de liderança, pois o diferencial competitivo das empresas estava na tecnologia, máquinas e estrutura, que deveriam ser superiores aos dos concorrentes. As pessoas eram apenas executoras de rotinas, não importava o que pensavam, eram apenas mais um recurso, o humano. A liderança era composta em sua maioria por pessoas que tinham muito conhecimento técnico; bastava as pessoas serem excelentes tecnicamente para serem promovidos a líderes, não importando outros conhecimentos e habilidades, tais como a gestão de pessoas. Os tempos mudaram e a tecnologia, máquinas e estrutura não são mais os principais elementos para o diferencial competitivo de uma empresa, pois os mesmos são facilmente encontrados e se tornam iguais nas empresas. O principal elemento hoje são as pessoas e seus conhecimentos. As empresas que através da liderança conseguem influenciar as pessoas a participarem efetivamente aplicando seus conhecimentos, habilidades, ideias, criatividade e inovação, materializando nas rotinas, regras, procedimentos, estrutura e na cultura, obtêm os melhores resultados e o diferencial competitivo. Hoje, somente as pessoas possuem capacidade de oferecer contribuições que permitem as empresas terem realmente um diferencial competitivo em relação aos concorrentes. Logo, a tradicional maneira de liderar pessoas não se encaixa à nova realidade, é preciso uma mudança da liderança. As empresas neste novo contexto precisam ter capacidade de entender as mudanças, desafios e evoluções desta nova era e desenvolver estratégias para formar uma nova liderança, capaz de lidar com esta nova realidade e que seja alinhada a cultura, missão, visão e valores da empresa. Na Era do Conhecimento o domínio de conhecimento técnico é um requisito básico, mas são necessárias competências para liderar as pessoas através de uma gestão estratégica, de uma nova liderança, capaz de moldar as pessoas para alcançar os resultados e a vantagem competitiva da empresa. Na abordagem deste artigo, é possível observar que no passado era possível criar um padrão de liderança, pois o foco era os recursos (tecnologia, máquinas e estrutura) e não as pessoas. Nos dias atuais, marcados pela Era do Conhecimento, cada especialista apresenta uma opinião quanto às características da nova liderança, tendo foco na gestão estratégica de pessoas e seus conhecimentos, pois as constantes evoluções, mudanças e as peculiaridades das empresas e pessoas, não permitem criar um perfil padrão. Dentre as diversas competências de um líder, as principais para o líder desta nova era, são as seguintes: Gestão de pessoas: o líder precisa além do conhecimento técnico, saber fazer gestão de pessoas; Mobilização de pessoas: o líder precisa atuar como um mobilizador de pessoas, criando condições e estimulando-as a compartilharem o saber em prol do desenvolvimento da equipe e da empresa. Ele
10 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
deixa de ser um mandante; Reconhecimento e feedback: as pessoas desejam ser reconhecidas e ter retorno de seu desempenho. O líder precisa reconhecer o valor das pessoas e sempre dar retorno às mesmas, apontando pontos fortes e pontos a melhorar; Autodesenvolvimento de competências e capacidade de adaptação: o líder precisa desenvolver sempre novas competências para lidar com as mudanças e desafios atuais e se adaptar rapidamente; Autoconhecimento: o líder precisa conhecer a si mesmo, para administrar suas dificuldades e aplicar seus pontos fortes; Alinhar interesses das pessoas aos da empresa: o líder precisa entender quais os interesses das pessoas e alinhar os mesmos aos interesses da empresa, buscando resultados melhores para ambos; Motivação de pessoas: todas as pessoas são motivadas a contribuir, participar, aprender e crescer profissionalmente e pessoalmente. A motivação não é mais apenas pelo dinheiro e poder; Gerenciamento da aprendizagem e desenvolvimento de pessoas: o líder precisa gerenciar a aprendizagem e desenvolvimento das pessoas, para a aquisição de novas competências, visando que elas sejam analíticas, capazes de reconhecer suas ações, responsabilidades e contribuir com a empresa. Ele deixa de pensar apenas no seu autodesenvolvimento; Comunicação participativa: a comunicação deixa de ser apenas do líder para os colaboradores, e passa a fluir nos dois sentidos, através de diálogos e participações das pessoas; Decisão participativa: valoriza-se a participação das pessoas com suas opiniões e sugestões. As decisões deixam de ser centralizadas na liderança e passam a ser apoiadas pelas pessoas e suas competências; Controle de resultados: o líder passa a fazer um controle pontual, estratégico e focado em resultados, não mais de tudo. As pessoas passam a ter liberdade, autonomia e controle de suas atividades. As competências da nova liderança, abordadas neste artigo, são cruciais para as lideranças atuantes na Era do Conhecimento, para lidar com as pessoas e seus conhecimentos, extremamente úteis às empresas. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa teve seu objetivo geral respondido, ao identificar como a liderança deve atuar na Era do Conhecimento, através de análises de estudos e opiniões de especialistas, e estratégias adotadas por empresas, levando a conclusão que é necessária uma nova liderança para enfrentar os desafios e mudanças da Era do Conhecimento. Através deste artigo, é possível observar que cada especialista apresenta uma opinião quanto às características da nova liderança, mas sempre com o foco na gestão estratégica de pessoas e seus conhecimentos. A pesquisa da Hay Group e a empresa citada P&G, evidenciam que há estratégias diferentes nas empresas, quanto à liderança e a maneira de fazer gestão de pessoas. Portanto, não há um perfil único e ideal de liderança para as empresas na Era do Conhecimento, pois as constantes evoluções, mudanças e as peculiaridades de cada empresa, não permitem criar um perfil padrão, mas é importante ressaltar que todas as características apresentadas devem ser consideradas para formar uma nova liderança e realizar a ruptura do modelo tradicional de liderança. Cada empresa precisa desenvolver a sua liderança de acordo com a sua cultura e seu negócio, criando assim um perfil próprio, para alcançar os resultados e a vantagem competitiva. As hipóteses foram confirmadas, a Era do Conhecimento exige uma nova liderança nas empresas e a liderança tradicional das empresas está sendo confrontada pela Era do Conhecimento. Elas foram observadas nas análises e opiniões dos especialistas e comprovadas através das conclusões da pesquisa da Hay Group e estratégias da
empresa P&G. A dificuldade do estudo foi identificar nas pesquisas realizadas, riquezas de informações que permitissem uma melhor análise da nova liderança na Era do Conhecimento, pois não há um padrão para essa liderança. Para estudos futuros, as sugestões são: identificar quais são as características das lideranças de empresas que se destacam na Era do Conhecimento e realizar estudos de casos para entender quais são as ações estratégicas para desenvolver uma nova liderança na Era do Conhecimento. 6 REFERÊNCIAS ARANHA, Abel Bezerra de Lima; ARAÚJO, Anna Cristina de; CAVALCANTE, Jacqueline Nunes; GOMES, Maria de Lourdes Barreto. O líder como agente de mudanças na Era do Conhecimento: um estudo de caso com diretores de uma rede supermercadista. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO – Enegep, XXIX, 2009, Salvador. Anais eletrônicos... Salvador: Enegep, 2009. p. 1-13. Disponível em: <http://www.abepro.org.br/biblioteca/ enegep2009_TN_STO_091_615_12614.pdf>. Acesso em: 02 jan. 2016. BISPO, Patrícia. Liderar na Era do Conhecimento. RH.com.br, Caratinga, 01 set. 2004. Disponível em: <http://www.rh.com.br/Portal/Lideranca/Entrevista/3893/ liderar-na-era-do-conhecimento.html#>. Acesso em: 02 jan. 2016. CALLE, Guillermo Antonio Dávila; SILVA, Edna Lúcia da. Inovação no contexto da Sociedade do Conhecimento. Revista Textos de la Cibersociedad, Catalunya, n. 8, 2008. Disponível em: <http://www.ngs.ufsc.br/wp-content/uploads/2010/05/ DAVILA-CALLE_SILVA_2008.pdf>. Acesso em: 02 jan. 2016. DRUCKER, Peter F. A sociedade pós-capitalista. 3 ed. São Paulo, SP: Pioneira, 1993. 186 p. HUNTER, James C. O monge e o executivo: uma história sobre a essência da liderança. 21 ed. Rio de Janeiro, RJ: Sextante, 2004. 139 p. KRAUSE, Donald G. A força de um líder. São Paulo, SP: Makron Books, 1999. 169 p. LEAL, Manoel Flávio. Sociedade do conhecimento: impactos para o futuro. Bate Byte, Curitiba, set. 2003. Disponível em: <http://www.batebyte.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1114>. Acesso em: 02 jan. 2016. LUCCI, Elian Alabi. A era pós-industrial, a sociedade do conhecimento e a educação para o pensar. Editora Saraiva. Disponível em: <http://hottopos.com/ vidlib7/e2.htm>. Acesso em: 02 jan. 2016. MAXIMIANO, Antonio Cesar Amaru. Introdução à administração. 5 ed. São Paulo, SP: Atlas, 2000. 546 p. MISSEL, Simoni. Gestão e liderança: transformação global exige atualização e reciclagem constantes. ABRH Itajaí: Associação Brasileira de Recursos Humanos de Itajaí, Itajaí, out. 2014. Disponível em: <http://www.abrhlitoral.com. br/?pg=artigos&id=604>. Acesso em: 02 jan. 2016. PROCTER & GAMBLE - P&G. Construído de dentro. [São Paulo], 2015. Disponível em: <http://www.pg.com/pt_BR/empresa/proposito_pessoas/desenvolvendo_lideres.shtml>. Acesso em: 02 jan. 2016. PRODANOV, Cleber Cristiano; FREITAS, Ernani Cesar de. Metodologia do trabalho científico: métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2 ed. Novo Hamburgo, RS: Feevale, 2013. 276 p. SILVA, Jaqueline de Brito. Evolução de liderança e postura dos líderes atuais. UNOPAR Científica Ciência Jurídica Empresariais, Londrina, v. 15, n. 1, p. 119127, mar. 2014. Disponível em: <http://pgsskroton.com.br/seer/index.php/juridicas/article/viewFile/385/359>. Acesso em: 02 jan. 2016. STISSER, Evan. Nona pesquisa anual do Hay Group identifica as melhores empresas para liderança. Business Wire, Filadélfia, nov. 2014. Disponível em: <http://www.businesswire.com/news/home/20141105005042/pt/#.VhLf8-xViko>. Acesso em: 02 jan. 2016.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 11
TEIXEIRA, Alexandre. Como se tornar um líder do século 21. Revista Época Negócios, São Paulo, jul. 2010. Disponível em: <http://epocanegocios.globo.com/ Revista/Common/0,,EMI152657-16380,00-COMO+SE+TORNAR+UM+LIDER+DO+SECULO.html>. Acesso em: 02 jan. 2016.
NOTAS DE FIM Pós-Graduando do Curso de MBA em Gestão de Equipes e Liderança Estratégica, pelo Centro Universitário Newton Paiva. Belo Horizonte/MG - giulianovitor@hotmail.com 1
Orientadora do artigo e Professora do Curso de MBA em Gestão de Equipes e Liderança Estratégica, Centro Universitário Newton Paiva. Belo Horizonte/MG – adriana@adrianagontijo.com.br 2
12 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
A proposição de um modelo de relação universidade e empresa baseada em comunidades de prática Leonardo Bastos Ávila1 Cássia Resende Diniz2 Isis Boostel3
RESUMO: Este trabalho apresenta a síntese de um projeto de pesquisa a ser aplicado pelo Centro Newton de Empreendedorismo (CNE) do Centro Universitário Newton Paiva cujo objetivo será o de desenvolver um modelo de relação entre universidades e empresas por meio de um ambiente presencial e virtual que promova a difusão da ciência, tecnologia e inovação, baseado no compartilhamento do conhecimento entre membros de uma comunidade de prática. O modelo estimula a construção do conhecimento a partir das tecnologias da Web 2.0, visando a promover o processo de transferência do conhecimento das instituições de ensino/pesquisa ao setor produtivo. A metodologia de construção deste modelo compreenderá cinco etapas: 1) fase decisória: definição do tema e delimitação do problema; 2) revisão da literatura: dividido em três temas - gestão do conhecimento, gestão da inovação e comunidades de prática; 3) diagnóstico: levantamento de informações do cenário empresarial e do núcleo de pesquisa onde se aplicará o projeto-piloto; 4) desenvolvimento do modelo, e 5) aplicação do projeto-piloto. Conclui-se que o trabalho trouxe grandes contribuições, sendo a principal a proposição do desenvolvimento de um modelo que consegue estimular a aproximação do conhecimento universitário com a prática empresarial, criando condições favoráveis à inovação. PALAVRAS-CHAVE: Relação universidade-empresa. Comunidades de prática. Inovação.
INTRODUÇÃO Este artigo apresenta de forma sintetizada proposição de um projeto de pesquisa desenvolvido pelo Centro Newton de Empreendedorismo (CNE) do Centro Universitário Newton Paiva, cujo objetivo será desenvolver um modelo de relação entre universidades e empresas, capaz de envolver pesquisadores, acadêmicos, profissionais de empresas e instituições inovadoras, bem como pessoas interessadas neste contexto. Trata-se de um ambiente interativo, presencial e virtual, denominado Espaço Interativo (EI) de discussões sobre temas específicos, busca de soluções e informações e compartilhamento do conhecimento, baseado nos preceitos de uma comunidade de prática e no âmbito virtual, fazendo uso de tecnologias da Web 2.0. Este projeto resultou de pesquisas dos autores sobre modelos estruturados baseados no modelo da Tríplice Hélice, elaborado por Loet Leydesdorff e Henry Etzkowitz (2008). Na era da modernização tecnológica, torna-se premente a necessidade de recursos humanos com conhecimentos e habilidades para atuar em tal ambiente, visto que o bom exercício da atividade profissional não está vinculado somente aos conhecimentos específicos exigidos pela atividade em si, mas também por conhecimentos e experiências desenvolvidos em alternativas paralelas. O crescente desenvolvimento e a utilização das tecnologias em todos os setores da sociedade pressupõem a importância da inclusão do ser humano em tal processo, pois, segundo Chaves (1999), desde a era primitiva, a relação com o mundo é mediada pelas tecnologias. Gasparetto (2006) ressalta que as organizações que se constituírem como organizações de aprendizagem e que descobrirem como despertar a capacidade de aprender das pessoas em todos os níveis da organização obterão sucesso e conseguirão manter-se no mercado competitivo. Ressalta ainda que o conhecimento é tão importante para o indivíduo, uma vez que reflete seu desejo de progredir, quanto o é para as empresas, dado que o saber ultrapassa fronteiras físicas, rompendo as barreiras da distância e do tempo. A necessidade de disseminação e ampliação do conhecimento humano impôs o surgimento de várias opções de mídias eletrônicas que tornam possível o acesso a um mundo de
informações outrora jamais imaginado, como, por exemplo, o ensino a distância e a internet. Recursos como informação, conhecimento, redes de relacionamento e tecnologias da informação são vitais para o processo de tomada de decisão, tanto no que se refere ao desempenho inovador das empresas como para a melhoria do que oferecem, e as pessoas devem ser envolvidas neste processo. Reforçando essa ideia, recorrese às afirmações de Toffler corroboradas por Drucker (2001) de que o conhecimento é fonte de poder, e por Nonaka e Takeuchi (1997), ao dizer que a criação de novos conhecimentos significa recriar a empresa e todos dentro dela em um processo contínuo. As universidades devem passar por ciclos de transformação e evoluir no sentido de buscar e fortalecer o relacionamento com o setor empresarial e com a sociedade. Precisam caminhar à luz das mudanças recentes, permitindo a transferência de tecnologia, elemento fundamental para a melhoria da competitividade dos processos de inovação nas empresas e, consequentemente, para a qualidade de vida. A premissa que norteia este projeto é a de que a estruturação de uma comunidade de prática - cujo propósito é a difusão da ciência, da tecnologia e da inovação por meio de mídias presenciais e virtuais - possibilita a aproximação do conhecimento universitário com a prática empresarial. Isso favorece a inovação e pode romper possíveis barreiras que existem entre os dois segmentos. A metodologia adotada contemplou a definição do tema e do referencial teórico que fortaleceu o desenvolvimento da pesquisa e da concepção das fases do modelo proposto, que são explicitadas na seção 4 deste artigo. Para verificar a viabilidade de aplicação do espaço, o CNE, constituído por equipe multidisciplinar de pesquisadores, partiu de discussões prévias em reuniões e pesquisas de modelos existentes no meio acadêmico brasileiro. O modelo de relação universidade-empresa, baseado em comunidades de prática, proposto neste estudo, justifica-se por contemplar formas e mecanismos de interação social que possibilitam abrir perspectivas para a transferência de informações científicas e tecnológicas. Esta visão é reforçada por Terra e Gordon (2002) ao afirma-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 13
rem que, numa época em que o aprendizado contínuo é obrigatório e as pessoas são bombardeadas com mensagens e informações irrelevantes, as comunidades de prática oferecem a seus participantes ambientes confiáveis de aprendizado e a oportunidade de contatar outros indivíduos com interesses, projetos, desafios e ou motivações similares. Na mesma linha de raciocínio, Teixeira Filho (2002) pondera que a disseminação das comunidades virtuais vem ao encontro do que é abordado na gestão do conhecimento, ou seja, o compartilhamento de experiências e informações nas organizações. Além disso, o modelo, por meio de ações facilitadoras, permite o acesso à construção do conhecimento pelas tecnologias baseadas na Web 2.0, visando a otimizar a transferência do conhecimento das instituições de ensino, pesquisa ao setor produtivo e geração de inovações disruptivas conforme Schumpeter (1985). Este artigo se estrutura nos seguintes itens: fundamentação teórica, metodologia, o Modelo Espaço Interativo (fases de desenvolvimento e implantação e projeto-piloto), conclusões e referências. REFERENCIAL TEÓRICO A fundamentação teórica tem como propósito enriquecer o modelo desenvolvido e dar mais consistência à pesquisa. A estrutura teórica discorreu sobre três grandes temas: gestão do conhecimento, gestão da inovação e comunidades de prática e Web 2.0. A partir destes pontos, outros subtemas se desdobraram para que questões contemporâneas fossem consideradas no modelo desenvolvido. Gestão do conhecimento: foram apresentados conceitos e características, diferenças entre dados, informação e conhecimento, o processo de conversão e transferência segundo Nonaka e Tackeuchi (1997) e a estreita relação entre a gestão do conhecimento e o processo de inovação nas empresas. O tema foi tratado de forma a evidenciar que o saber ultrapassa fronteiras físicas, rompendo as barreiras da distância e do tempo, e que os avanços das tecnologias, principalmente das mídias eletrônicas, colaboram com processos indispensáveis à transformação de conhecimento em riquezas. Essa ideia é reforçada por Levy apud (GASPARETTO, 2006) ao ressaltar que a informação e o conhecimento passaram a constar entre os bens econômicos e primordiais de uma sociedade, sendo sua principal fonte de riqueza. No entanto, neste trabalho buscou-se a superação da dificuldade em compreender o conhecimento, em especial pelo fato de ele não possuir existência física (intangibilidade) e de se dar a partir da evolução conjunta da prática com a teoria. Gasparetto (2006) afirma que a tecnologia será sempre um resultado complexo de escolhas por sujeitos sociais em situações concretas e que os computadores estão cada vez mais presentes no cotidiano social, interligando milhares de usuários no mundo inteiro. Os acessos aos meios e bens, dentro de uma sociedade, estariam se transferindo de valores materiais para valores abstratos, como o conhecimento armazenado no cérebro. Gestão da inovação: o principal ponto destacado foi a exigência de profissionais com um novo perfil devido às transformações impostas pelo avanço tecnológico conforme Tidd et al (2008). Wouldridg (2012) afirma que a economia centrada na era da inovação e do conhecimento requer um trabalhador capaz de pensar, decidir e de partilhar suas experiências, contribuindo para a geração de ideias e a inovação da empresa. Ainda segundo o mesmo autor o conhecimento humano deixa de ser visto como um produto estanque e passa a ser entendido como algo mais dinâmico. Aqui já se pode salientar a importância de desenvolver modelos que permitam o aprendizado de forma interativa, por meio de novas ferramentas e que sejam capazes de aproximar as empresas da academia. Costa (2009) observa que a base do relacionamento das universidades com empresas está nos aspectos
de inovação e transferência de conhecimento entre instituições de ensino e pesquisa e demais setores empresariais, o que intensifica as inter-relações desses agentes. A capacidade de inovar das empresas é um diferencial necessário para garantir um ambiente que acompanhe as tendências e lideranças que seu segmento de mercado exige. Por isso Mazzucato (2014) dia que a necessidade da transferência de tecnologia a partir da relação entre os setores produtivos e instituições de ensino para auxiliar na previsão de ações que garantam a sobrevivência da organização. A interação universidade-empresa é um processo que pode gerar benefícios bilaterais apesar das dificuldades desse relacionamento. Uma das principais vantagens está no fato de as universidades auxiliarem as empresas na busca por competitividade, apoiando a pesquisa e o desenvolvimento nas empresas e fomentando a inovação tecnológica. Quanto às comunidades de prática, a maior ênfase foi dada a seus estágios de desenvolvimento e sobre o papel da tecnologia da informação, facilitando o processo de transferência de tecnologia. Segundo Wenger (1998), uma comunidade de prática não é apenas um grupo delimitado por alguma característica, mas pessoas que aprendem, constroem e fazem a gestão do conhecimento. Wenger (2002) postula que as comunidades agregam valores às organizações de diversas formas: elas colaboram na direção de estratégias, dão início a novas linhas de negócios, resolvem problemas rapidamente, transferem as melhores práticas, desenvolvem habilidades profissionais, ajudam a organização a recrutar e reter talentos etc. A participação é auto selecionada, pois as pessoas percebem quando e porque devem juntar-se àquela comunidade. Quanto à estrutura, Wenger (2001) ressalta que uma comunidade de prática possui três elementos fundamentais: a) um domínio: tema de interesse do grupo; b) a própria comunidade: interação e construção de relacionamento em torno do domínio, e c) a prática: elemento indispensável para que as pessoas aprendam no grupo como fazer as coisas pelas quais se interessam. Alguns autores relacionam a colaboração com as comunidades de prática, na medida em que são entendidas como organizações que agrupam pessoas em torno de uma temática e objetivos comuns. A colaboração é vista como um processo facilitador para a criação de comunidades e o compartilhamento coletivo do conhecimento. No entanto, para que a colaboração on-line aconteça, o participante deve sentir-se confortável com a mídia e ter segurança nela, sentir-se seguro com relação ao instrutor e aos demais colaboradores, e, por fim, verse inserido numa experiência que lhe proporcionará recompensa social. Tema Web 2.0: focou-se no papel dessas tecnologias no suporte a comunidades de prática e na estruturação de portais de relacionamento. O termo Web 2.0 é utilizado para descrever a segunda geração da World Wide Web, ambiente on-line dinâmico, em que os usuários colaboram para a organização de conteúdo e cuja regra mais importante é o desenvolvimento de aplicativos que aproveitam as colaborações em rede para se tornarem melhores à medida são usados pelas pessoas, aproveitando assim a inteligência coletiva. As principais ferramentas da tecnologia Web 2.0 estudadas foram as seguintes: comunicadores instantâneos, como MSN Messenger e Google Talk, Webmail; redes sociais, como Facebook; softwares de Voip (Voz sobre IP), como o Skype; Blogs e podcasts; Wikipédia; sistemas de escritórios on-line, como o Google Docs; compartilhamento de vídeo, como o Youtube; Mashups, como um site de mapas on-line com um serviço de anúncios de imóveis para apresentar recurso unificado de localização de casas à venda; Tagging [rotulação], isto é uma maneira de vincular palavras-chave a textos ou imagens que consideram interessantes na internet, ajudando a categorizá-las e a facilitar sua obtenção por outros usuários atesta Statdlober (2016).
14 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
METODOLOGIA Os procedimentos metodológicos formam o delineamento da pesquisa, o que - de acordo com Soares, Cosenza e Gomes (2001) - tem como objetivo disciplinar a investigação limitando o campo observando com vistas ao aprofundamento de questões levantadas, atribuindo assim maior consistência aos resultados. No presente estudo, trabalhou-se com procedimentos de análise em uma abordagem qualitativa que, segundo Merrian (1998), envolve a compreensão de um evento em seu ambiente natural - trabalho de campo - e resulta de um ponto descritivo. Pode-se classificar a pesquisa como aplicada, porque tem o intuito de gerar conhecimentos para uso prático e dirigido à solução de problemas específicos, Silva (2006). Qualitativa porque considera haver uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, ou seja, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade que não pode ser traduzida em números Gil (2002). Exploratória porque visa a proporcionar maior familiaridade com o problema, objetivando torná-lo mais explícito, ou a construir hipóteses Gil (1999). Bibliográfica porque foi elaborada a partir de material já publicado Vergara (2003). Há que se ressaltar que o foco da pesquisa é desenvolver um modelo que permita a divulgação e o acesso a ciência, tecnologia e inovação como forma de melhorar a relação universi-
dade-empresa e estimular pessoas interessadas neste contexto. A metodologia adotada para o desenvolvimento do modelo compreendeu cinco fases: 1. fase decisória: buscou-se definir o tema, levantar informações e delimitar o problema de pesquisa; 2. revisão da literatura: tratou-se do referencial teórico dividido em três grandes temas, 1) gestão do conhecimento; 2) gestão da Inovação e comunidades de prática e 3) Web 2.0. Os itens foram trabalhados no contexto da transferência de tecnologia e na relação entre a universidade-empresa com o intuito de fortalecer a troca de conhecimentos entre esses dois segmentos; 3. diagnóstico: trabalhou-se no sentido de busca, levantamento e investigação de informações do cenário empresarial, da sociedade e do próprio Centro Newton de Empreendedorismo (CNE) para chegar-se ao diagnóstico das necessidades empresariais e dos usuários potenciais do modelo; 4. desenvolvimento do modelo: detalharam-se as fases que compõem o modelo; 5. aplicação do projeto-piloto: descreveram-se ações presenciais desenvolvidas no projeto-piloto, e faz se o desenho preliminar do ambiente virtual em desenvolvimento pelo IGTI. A figura 1 sintetiza a metodologia utilizada.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 15
O MODELO ESPAÇO INTERATIVO – EI O modelo foi constituído com base na teoria pesquisada e contempla ações que permitem atender pessoas interessadas em temas específicos e empresas emprenhadas em formalizar parcerias para a solução de problemas por meio da transferência de tecnologia. Com o intuito de balizar a construção do modelo, foram destacados alguns pressupostos tomados como verdadeiros: - Criar um espaço de interação e compartilhamento do conhecimento a partir de experiências presenciais e virtuais (como é o caso do modelo desenvolvido neste artigo) é importante para que o processo de transferência de tecnologia obtenha sucesso. Esta premissa ganha sustentação com os autores Nonaka e Takeuchi apud (Feliciano, 2008) ao apresentarem o conceito de “ba”, ressaltando que o ambiente para criação do conhecimento deve ser visto como um espaço de compartilhamento, que serve como uma base física ou virtual; - Lemos (1999) ressalta a importância da interação de indivíduos no processo de busca de informações e conhecimento. O Espaço Interativo prevê um conjunto de ações que favoreçam o intercâmbio dos atores envolvidos; - Identificar e registrar os processos de criação, armazenamento, disseminação e utilização do conhecimento alinha-se com a concepção do modelo apresentado em quatro fases: diagnóstico, planejamento, desenvolvimento/execução e avaliação, detalhadas a seguir. Nonaka e Takeuchi (1997) destacam a importância do processo de conversão e transferência do conhecimento apresentado em quatro modos: socialização, externalização, combinação e internalização. Nas etapas pode-se identificar as ações que possibilitam o processo de conversão e transferência do conhecimento: - Oferecer um ambiente em que ocorra o relacionamento entre a universidade e as empresas intensifica a contribuição para estas na busca pela competitividade, apoiando a inovação tecnológica Callado (2015); - Possibilitar às organizações o surgimento de grupos ligados informalmente pelo conhecimento permite o aprendizado coletivo, favorecendo a gestão do conhecimento empresarial. Os autores Wenger (1991), McDermott (2000), Wenger e Snyder (2001), Silva (2004), Duarte (2005) entre outros, falam sobre a importância do surgimento das comunidades de prática. FASES PARA CONSTRUÇÃO DO MODELO 1. Fase de diagnóstico: considerada fundamental para dar sustentação às etapas seguintes. Com ela se consegue chegar ao diagnóstico das necessidades das empresas, bem como dos usuários potenciais que terão acesso ao modelo. Além disso, contribui para perceber de que forma instituições de ensino e organizações podem utilizar este modelo. A primeira atividade é estabelecer um cronograma de reuniões com o objetivo de coletar o maior número de informações que permitam fazer um prognóstico para, então, chegar-se ao diagnóstico da realidade social, organizacional e do usuário potencial; a partir dessas atividades pode-se vir a estabelecer as parcerias de acordo com os interesses das partes envolvidas. 2. Fase de planejamento: aqui já é possível traçar as políticas de utilização do Espaço Interativo, bem como definir, parceiros que estejam dispostos a se comprometerem com as políticas adotadas. Isso se faz no primeiro momento da fase, pois é necessário conceber as estruturas do modelo. Em seguida parte-se para delinear os objetivos do projeto. A seguir são detalhados os tópicos que compõem esta fase:
a) Políticas do modelo: são estabelecidas as estratégias e restrições que nortearão os planos e as linhas de ação. É por meio das políticas que se estabelecem as formas de se conduzir as ações pretendidas, assegurando a sustentabilidade do modelo: - Como alocar recursos financeiros e quais as restrições orçamentárias para o desenvolvimento do projeto? - Quais ações de marketing e endomarketing serão utilizadas para a divulgação do modelo junto a empresas, instituições de ensino e outros agentes. - Como articular a fim de adquirir infraestrutura, suporte tecnológico e capacitação da equipe responsável pelas solicitações das empresas e dos acadêmicos? É ainda nesta fase que algumas questões devem ser solucionadas com cada parceria, tais como: Quem coordenará as ações do Espaço Interativo com parceiros potenciais? O modelo pressupõe a indicação de um coordenador que ficará responsável por todas as atividades dos participantes. - Como solucionar as necessidades apontadas pelas empresas? Aqui é fundamental identificar e priorizar informações das necessidades da comunidade que está sendo formada. - Funcionamento do espaço? Aqui já se pode colocar em prática as normas de funcionamentos: marcar datas de início e fim de atividades tanto presenciais quanto virtuais, tais como palestras, fóruns, cadastramento das comunidades no portal. No caso das parcerias com empresas que firmarão convênios, pode-se inserir como a realização de cursos que atendam às necessidades identificadas no diagnóstico. - Como serão desenvolvidas as ações? Presenciais, somente virtuais ou ambos os modos? Ressalta-se que, além das políticas adotadas no projeto, existem as políticas internas das organizações envolvidas que também devem ser alinhadas com as do modelo. b) Objetivos: É fixar os objetivos da comunidade, os quais são decisivos para o sucesso do modelo: perfil e número de usuários cadastrados, de entidades parceiras, de cursos; do nível de aprendizagem e satisfação de usuários e empresas participantes; de horas de treinamento; c) Concepção de estruturas do modelo: Três estruturas devem ser trabalhadas: a de recursos humanos, a estrutura física e estrutura tecnológica. Estrutura de recursos humanos compreende todo capital humano necessário para a gestão e operação das ações demandadas pelo espaço, pois, para atendimento das demandas, fazse necessária a mobilização dos integrantes e das suas funções pela interação com uma tecnologia inserida em estrutura física compatível. Neste cenário encontram-se coordenadores, gestores, monitores, técnicos, entre outros colaboradores. Para cada ator envolvido elaborase um conjunto de ações específicas. No que se refere à estrutura física, há necessidade de que se proporcione conforto e segurança para atuação adequada dos beneficiários e das equipes pedagógica e técnica. Em eventos como palestras, fóruns, workshops, cursos e outros deve-se estar atento para que as condições do ambiente sejam adequadas, pois, do contrário, corre-se o risco do insucesso e do comprometimento de todo o trabalho realizado até então para consolidação da comunidade. Deve-se pensar no mínimo em uma sala com capacidade para que os responsáveis pela manutenção do(s) equipamento(s) possam atuar de modo confortável e em condições propícias ao bom desempenho da equipe. Por fim, para a estrutura tecnológica, propõe-se um portal de relacionamento baseado em Web 2.0, que suporte as atividades típicas de uma comunidade de prática e estimule os princípios e pressupostos descritos na figura 2. Alguns pontos devem ser observados
16 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Figura 2
como, por exemplo, definir o responsável pelas informações que deverão circular entre os usuários, visando a evitar sites que não sejam adequados aos interesses do grupo; identificar e promover o fluxo de informações, mantendo o usuário atento às situações e informações de seu interesse e da empresa por ele representada; organizar o fluxo de informações, apoiando as decisões dos gestores, de forma que, a partir das informações coletadas, sejam criadas novas diretrizes e metas de acordo com as necessidades verificadas. 3. Fase de execução: seu propósito maior é a transferência
de tecnologia e o estímulo à relação universidade e ambiente empresarial. Há de se ressaltar que o Espaço apresenta propostas de natureza presencial e virtual. Como ações presenciais, preveem-se a realização mensal de encontros para apresentação de metodologias, casos, vivências e lançamento de livros ora de experiências. No ambiente empresarial, ora de pesquisas e experiências no ambiente acadêmico; promoção semestral de workshops temáticos, novamente juntando experiências da academia e do ambiente empresarial. Na interação virtual preveem-se as seções descritas na figura 3.
Figura 3
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 17
Ainda não foram concebidas as seções e telas, mas na figura 4 encontram-se sugestão das telas a serem criadas. Figura 4
4. Fase de avaliação: atividade planejada com a finalidade de coletar dados úteis à solução de problemas ao processo decisório. Os processos de avaliação podem otimizar a qualidade das ações e a alocação de recursos. Deve-se considerar o plano de ações com metas e indicadores das ações de interação social, de conteúdo e de pergunta/resposta. Neste caso a avaliação ocorre no desenvolvimento de cada fase, pois se considera que desta forma o modelo é avaliado constantemente e, assim, pode-se verificar possíveis inconsistências e alterá-las quando necessário. Ressaltamos, ainda, que o modelo comporta um ambiente em que as informações e o conhecimento são apresentados de forma que atenda às necessidades de seus usuários com funcionalidades e ferramentas que valorizem a colaboração. Serão utilizados softwares disponíveis na nova concepção de internet, denominada Web 2.0. APLICAÇÃO DO PROJETO-PILOTO Para verificar a viabilidade de aplicação do modelo, necessita-se a aplicação de um projeto piloto pelo CNE. O Centro Newton de Empreendedorismo é também um centro de pesquisa voltado ao tema “inteligência para inovação”, que combina as áreas de inteligência competitiva, inovação, redes sociais e engenharia do conhecimento. Está vinculado ao Departamento de Extensão. Dentro deste último é que se insere este projeto. Vale ressaltar que o modelo apresentado, embora contextualizado para o CNE, pode ser aplicado em outras instituições e para outros tipos de comunidade. Resultados parciais oriundos desta pesquisa Seguindo-se os passos do modelo anteriormente descrito, apresenta-se o seguinte: 1ª - Fase de diagnóstico: inicialmente definiu-se um esquema de reuniões semanais para avaliação dos resultados desta pesquisa. Foram apresentadas também novas ideias e sugestões sobre o desenvolvimento dos trabalhos, de modo a obter-se uma visão mais abrangente do projeto. Igualmente traçaram-se os níveis de relacionamento que seriam desenvolvidos na comunidade, definindo o acesso e a participação dos usuários. Considerada a fase inicial do modelo, a partir das experiências vivenciadas no CNE e também de outros projetos, os autores buscaram identificar as necessidades dos usuários potenciais. Com o levantamento desses dados, foi possível evidenciar o desenho geral do projeto-piloto, apresentado na figura 3. 2ª - Fase de planejamento: sendo possível estabelecer políticas de utilização com base no levantamento das necessidades e alicerçados pelo embasamento teórico, buscaram-se formas de estruturação do modelo. Foram definidas ações de caráter presencial e virtual, visando à interação e cooperação entre a universidade-empresa, foco deste trabalho. Nesta fase, almejando alocar recursos financeiros para
o desenvolvimento do projeto, identificou-se potenciais parcerias com empresas atuantes na área de inovação tecnológica e transferência de tecnologia. Também foram realizadas buscas de apoio e parcerias via editais lançados pelo Ministério da Educação e outras instituições. Por meio do newsletter Gestão on Line, articulou-se a possibilidade de divulgação do modelo para empresas e em eventos da área. 3ª - Fase de avaliação: os usuários, em sua maioria, são pesquisadores interessados nos temas debatidos ou empresários que veem na universidade o acesso ao conhecimento que necessitam, para aplicá-los em sua empresa. Durante esses encontros pretendese promover momentos de interação e compartilhamento do conhecimento, produzindo assim, novas práticas no contexto da comunidade. CONCLUSÃO Neste estudo, registraram-se algumas contribuições dos vários segmentos envolvidos. A principal foi a do próprio desenvolvimento do modelo ESPAÇO INTERATIVO - Modelo de relação universidade e empresa baseado em comunidades de prática, pois entende-se que toda alternativa que tenha o objetivo de encurtar a distância entre a comunidade acadêmica e o meio empresarial deve ser encarada com seriedade para que participantes possam continuar apresentando novas alternativas ao processo de inovação. Além disso, o modelo consegue também estimular a aproximação do conhecimento universitário com a prática empresarial e vice-versa, criando condições favoráveis à inovação e ao encurtamento das distâncias que existem entre esses dois segmentos. No que tange ao ambiente virtual, este encontra-se perfeitamente adaptável ao proposto face a interatividade que a plataforma Blackboard permite. Percebeu-se ao longo da realização desta pesquisa que existe forte receptividade de ambas as partes de ações desse tipo e nossa
estratégia foi sempre aliar competências de diferentes parceiros para obter os resultados desejados, dado que a maior dificuldade persiste na questão financeira e na manutenção da equipe de apoio a uma iniciativa como essa. No entanto, a busca por parcerias mostra-se que muita coisa pode ser realizada com poucos recursos e que a iniciativa de aliar recursos e competências auxilia no processo de interação e de coesão dessa comunidade. Por fim, vislumbram-se estudos que permitirão aprofundar esta pesquisa e a própria aplicação do modelo em outras instituições parceiras como a Facens, bem como colocar em operação do ambiente virtual desenvolvido especificamente para esse fim. Sugere-se também a promoção de um espaço interativo que contemple ações direcionadas para estudantes que buscam informações em área específicas, tendo em vista que os jovens veem na internet um canal de comunicação amigável, acessível e que desperta a curiosidade.
18 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
REFERÊNCIAS CALLADO, A. A. C. et al. Um estudo empírico da significância das relações entre a elaboração de metas estratégicas e o uso de indicadores de desempenho. Disponível em http://www.observatorioiberoamericano.org/RICG/N%BA_21/ Antonio_Cunha,_Eulino_Mendes_y_Aldo_Cunha.pdf Acesso em 22 abril 2016. CHAVES, Eduardo O. C. Tecnologia na educação, ensino a distância, e aprendizagem mediada pela tecnologia: conceituação básica. Revisa da faculdade de Educação da PUC-Campinas, São Paulo, ano 3, n. 7, nov. 1999. Disponível em: <http://chaves.com.br/FRAMESPT/framesp.htm>. Acesso em 15 abril 2016. DRUCKER, P. F. O advento da nova organização. In: HARVARD BUSINESS REVIEW. Gestão do conhecimento. Rio de Janeiro: Campus, 2001. DUARTE, D. C. Metodologia para desenvolvimento de portais de relacionamento de suporte a comunidades de prática: uma aplicação para a área de turismo e para pessoas com necessidades especiais. 2005. 256 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) - Centro Tecnológico, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2005. ETZKOWITZ, H. The triple helix: University-Industry-Government innovation in action. New York and London, Routledge, 2008. ETZKOWITZ, H., Mello J M and Almeida, M. Towards “meta-innovation” in Brazil: The evolution of the incubator and the emergence of a triple helix. Research Policy, 34 (4), p. 411–424. 2005. FELICIANO, A. M. Contribuições da gestão do conhecimento para as ações empreendedoras de inclusão digital. 2008. 158 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia e Gestão do Conhecimento) - Centro Tecnológico, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008. GASPARETTO, N. A. Modelo de inclusão digital para organizações: uma prática de responsabilidade social. 2006. 163 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) - Centro Tecnológico, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006.
SCHUMPETER, Joseph Alois. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1985. SILVA, A.C.R. da. Metodologia da pesquisa aplicada à contabilidade. 2. ed. São Paulo Atlas. 2006. STATDLOBER, Juliano. Gestão do Conhecimento em serviços de TI. Rio de Janeiro: Bradsport, 2016. TEIXEIRA FILHO, J. Comunidades virtuais de prática: como as comunidades de prática na internet estão mudando os negócios. Rio de Janeiro: SENAC, 2002. TERRA, J. C. C.; GORDON, C. Portais corporativos: a revolução na gestão do conhecimento. São Paulo: Ed. Negócio, 2002. TIDD, Joseph; BESSANT, John; PAVITT, Keith. Gestão da Inovação. Porto Alegre: Bookman, 2008. VERGARA, S.C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003. WENGER, E.; LAVE, J. Situated Learning: legitimate peripheral participation. New York: Cambridge University Press, 1991. ______. Communities of practice: learning, meaning and identity. New York: Cambridge University Press,1998. ______.; MCDERMOTT, R.; SNYDER, W. M. Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge. Boston: Harvard Business School Press, 2002. ______.; SNYDER JR., A. W. Communities of practice: the organizational frontier. Harvard Business Review, Boston, v. 75, n.1, jan./feb. 2000. WOULDRIDG, Adrian. Os senhores da gestão: como os gurus de negócios e suas ideias mudaram o mundo para melhor – o pior. Leonardo Abramowicz (trad.). Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.
GIL, A.C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas. 1999. GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas. 2002. LEMOS, J. L. Responsabilidade Social. In: FÓRUM DE RESPONSABILIDADE SOCIAL E BALANÇO SOCIAL, 2001, Porto Alegre. Anais..., Porto Alegre, 2001. MAZZUCATO, Mariana. O Estado empreendedor. São Paulo: Portfolio-Penguin/ Companhia das Letras, 2014. MCDERMOTT, R. Why information technology inspired but cannot deliver knowledge management. In: LESSER, E.; FONTAINE, M.; SLUSHER, J. (Eds.). Knowledge and communities. Woburn: Butterworth-Heinemann, 2000. (Resources for the knowledge based economy series). MERRIAN, S. B. Qualitative research and case study application in education. San Francisco: Jossey-Bass, 1998. NONAKA, I.; TAKEUCHI, H. Criação de conhecimento na empresa: como as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação. 7.ed. Rio de Janeiro: Campos, 1997.
NOTAS DE FIM 1 Leonardo Bastos Ávila - Graduado em Ciências Econômicas, MBA em Administração Estratégica, MBA em Gestão de Pessoas, Mestre em Administração de Empresas, Doutorando em Administração de Empresas. Membro do Centro Newton de Empreendedorismo. Atualmente é Professor e Coordenador de Curso do Centro Universitário Newton Paiva. leonardo.avila@newtonpaiva.br 2 Cássia Rezende Diniz – Mestrado em Educação, MBA em Gestão de Pessoas para o resultado, Graduada em Letras. Analista de Negócios da Empresa Reta Sistemas. Membro do Centro Newton de Empreendedorismo. Coordenadora do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas e Coordenadora do curso de Administração do Centro Universitário Newton Paiva. cassia.diniz@newtonpaiva.br 3 Isis Boostel é graduada em Administração com ênfase em Comércio Exterior pelo Centro Universitário Newton Paiva, especialista em Logística Empresarial pela FGV, e Mestre em Administração pela UNIPEL. Atua no Centro de Empreendedorismo da Newton. Professora dos cursos de Ciências Contábeis, Relações Internacionais e Administração da Newton Paiva. isis.boostel@newtonpaiva.br
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 19
O empreendedorismo acadêmico no contexto da interação Universidade - Empresa – Governo Leonardo Bastos Ávila1 Cássia Resende Diniz2 Isis Boostel3
Resumo: No contexto da cooperação entre o meio acadêmico, empresa e governo exaltam-se os conceitos complementares de “universidade empreendedora” e “empreendedorismo acadêmico”, nos quais uma instituição acadêmica vai além da formação, desempenhando um papel no Sistema de Inovação e no desenvolvimento do país. Considerando essa discussão, este estudo tem como objetivo abordar a questão da capacitação da universidade para promover a cooperação, tendo como base as seguintes questões de pesquisa: Como ocorre a cooperação da universidade com as empresas e o governo e desses com a universidade? Quais as barreiras e vantagens para os entes participantes? Que contratos e arranjos são articulados para a concretização dessa interação? A metodologia de natureza qualitativa foi abordada no caso do Centro Universitário Newton Paiva, localizado em Belo Horizonte capital de Minas Gerais, enquanto instituição situada na fronteira dessas relações. A análise dos dados baseou-se na técnica da análise temática que se insere no conjunto das técnicas da Análise de Conteúdo. A análise evidenciou que há atuação de uma universidade empreendedora, mas, sobretudo, o empreendedorismo acadêmico dá sinais de existência; porém, é preciso ainda percorrer um longo caminho para se consolidar estes conceitos e, em consequência, a complementaridade entre suas respectivas práticas. PALAVRAS-CHAVES: Empreendedorismo acadêmico; Tríplice Hélice; Sistemas de Inovação.
INTRODUÇÃO As discussões sobre a cooperação universidade - empresas governo têm se acirrado desde 1970, principalmente em decorrência do curto ciclo de vida das inovações. Os primórdios desses estudos ocorreram na Alemanha, no século XIX, chegando ao Reino Unido no início do século XX. Entretanto, as práticas concernentes a esse tipo de relacionamento adquirem uma personalidade mais definida nos Estados Unidos, a partir dos anos da década de 1980 (Cf. SCHMOCH, 1999; SBRAGIA, 2006; GARNICA; FERREIRA-JÚNIOR; FONSECA, 2005). Na América Latina, a realidade foi diferente. Ao basear seu desenvolvimento na importação da tecnologia, a universidade, através da criação de núcleos ou reitorias de extensão, dedicou-se às tarefas mais de caráter assistencial e cultural e ao papel preponderante de formação de recursos humanos para a absorção de tecnologia estrangeira. No Brasil não foi diferente. Até a década de 1960, essa era a postura. Foi com o fim da política de substituição de importações nos anos de 1980 e a criação pelo governo de Políticas de Ciência e Tecnologia (C&T) que os brasileiros passaram a despender mais atenção ao desenvolvimento tecnológico, atitude que passou a ser mais cobrada a partir de 1990 com a liberalização dos mercados. Naquele momento, os diversos setores da economia, ao admitirem a importância de se investir em inovação, pesquisa e desenvolvimento, perceberam a influência do conhecimento e das capacidades de diferentes atividades produtivas e áreas científicas, começando a ponderar, como um caminho possível, a aproximação com as universidades e institutos de pesquisa. Para Sbragia (2006), no início havia uma desconfiança mútua, diferença de linguagem ou choque de cultura; resultado da falta de alinhamento de ideias e das imposições feitas pela academia. O incentivo ao estabelecimento desse vínculo foi se intensificando, sobretudo, através da implementação de políticas públicas governamentais, objetivando garantir a excelência em áreas temáticas consideradas
estratégicas em função do seu potencial de contribuição para o crescimento da economia, melhoria da condição de vida da população, para competitividade das empresas, das regiões e das nações nos contextos local e global (SBRAGIA, 2006; LASTRES et al., 2005). Ao reconhecer que a inovação é um processo cumulativo e interativo, vários foram os estudiosos que começaram a pensar a cooperação, em termos de Sistemas de Inovação, como um arranjo organizacional mais evoluído para captar as relações entre as universidades, governo e o sistema de produção - tríplice hélice - e de compreender as distâncias de conhecimento e inovação entre as diferentes realidades (FREEMAN, 1987; LUNDVALL, 1985; SUTZ, 1997; ETZKOWITZ, 2004). No Brasil, durante os últimos 15 anos, tem ocorrido um posicionamento frente às demandas em prol do desenvolvimento e da inserção da economia brasileira no mercado mundial e, desta forma, tem-se trabalhado para estimular o Sistema de Inovação, o qual é entendido como um conjunto de arranjos institucionais, cuja composição é dada por diversas organizações de apoio, levando à proposição de programas de incentivo à parceria (VEDOVELLO; FIGUEIREDO, 2006; SBRAGIA, 2006). Considera-se, portanto, que no contexto da cooperação entre empresas, universidades e governos, existe uma miríade de questões culturais, vantagens e barreiras, políticas governamentais, formas contratuais e arranjos que se baseiam em distintos objetivos e motivações das instituições envolvidas que precisam ser abordados. Essas discussões ressaltam ainda as questões da propriedade intelectual, das formas de licenciamento da tecnologia e dos registros de patentes no âmbito dos processos de transferência de tecnologia; isto porque, centros de pesquisa e universidades de excelência são pouco relevantes quando não ocorre a cooperação com o setor produtivo e governamental. Afinal, quem toma a iniciativa da aproximação? Lima e Fialho (2001) afirmam que, em regra, são as empresas que buscam as universidades para firmarem parcerias de cooperação. Porto (2002) evidencia que não existe doação gratuita de tecnologia nem
20 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
assistencialismo por parte das universidades, mas uma transferência de competências resultante de novos investimentos. Sbragia (2006) realça o papel do governo através dos editais e programas de incentivo à parceria, nos quais a responsabilidade pela implementação recai em geral sobre a universidade. Corroborando com estas ideias, Etzkowitz (2004), Etzkowitz e Klofsten (2005) e Garnica, Ferreira-Júnior e Fonseca (2005) revisam os conceitos complementares de “universidade empreendedora” e de “empreendedorismo acadêmico”. Estes conceitos destacam a existência de uma instituição acadêmica que não está só preocupada em formar profissionais qualificados para o mercado Costa et al (2015), mas também em desempenhar um papel no Sistema de Inovação e no desenvolvimento econômico, tecnológico e social do país, através da criação de estruturas complexas dentro da universidade para abrigar empresas de base tecnológica, e que tem na cooperação com empresários e com os pesquisadores da universidade sua base operacional. Considerando as discussões supracitadas, este estudo tem como objetivo abordar a questão da capacitação da universidade para promover a cooperação, tendo como base os conceitos complementares de empreendedorismo acadêmico e universidade empreendedora. Assim, pretende-se responder as seguintes questões de pesquisa: Como ocorre a cooperação da universidade com as empresas e governo e desses com a universidade? Quais as barreiras e vantagens para os entes participantes? Que contratos e arranjos são articulados para a concretização dessa interação? A metodologia de natureza qualitativa faz uso do caso do Centro Newton de Empreendedorismo do Centro Universitário Newton Paiva, enquanto instituição situada na fronteira dessas relações. Além da compilação de documentos, a coleta de dados teve por base roteiros de entrevista aplicados de forma individual com agentes envolvidos com o CNE. A análise dos dados baseou-se na técnica da análise temática que se insere no conjunto das técnicas da Análise de Conteúdo (BARDIN, 2004). A COOPERAÇÃO UNIVERSIDADE - GOVERNO - EMPRESA E O EMPREENDEDORISMO ACADÊMICO A abordagem de tradição schumpeteriana dos Sistemas de Inovação deslocou o foco da produção para o tema da inovação, considerada como um processo interativo, em vez de linear, enfatizando o processo o qual empresas, em relação umas com as outras, são apoiadas por diferentes organizações privadas e governamentais inseridas em um contexto institucional mais amplo (FREEMAN, 1987; LUNDVALL, 1985; SUTZ, 1997). Segundo Etzkowitz (2004) e Etzkowitz e Klofsten (2005), a triple helix, enquanto arranjo organizacional mais evoluído que postula a interação entre os três principais participantes do Sistema de Inovação (universidade, governo e empresa), foi o evento chave para a criação de uma “universidade empreendedora” e na promoção das condições em prol de uma sociedade baseada no conhecimento. Interessante situar que a literatura disponível no contexto da universidade como agente do desenvolvimento faz uso de duas vertentes complementares de análise. Na primeira, enfoca-se a idéia da Universidade Empreendedora ou Universidade-Empresa no conceito de Marginson e Considine (2004); Etzkowitz (2004); Etzkowitz e Klofsten (2005), como um fenômeno que envolve as dimensões econômicas, acadêmicas e institucionais. Segundo estes autores, a Universidade Empreendedora distingue-se de outras no que diz respeito a
três características básicas: (i) suporte a atividades empreendedoras; (ii) existência de mecanismos de interface, como os escritórios de transferência de tecnologia; e (iii) um número significativo de colaboradores capazes de formar firmas. Etzkowitz (2006) explica ainda que uma Universidade Empreendedora é capaz de transformar resultados de pesquisa, com potencial de comercialização, em empresas inovadoras, tendo as políticas de inovação como suporte e a possibilidade de impacto regional. O conceito de Universidade Empreendedora, desta forma, vincula-se estreitamente ao próprio conceito de empreendedorismo concebido por Schumpeter (1961), sendo que a Universidade passa a ser o lócus de criação e apoio a um sujeito apto a revolucionar um sistema de produção. As mudanças decorrentes de tais inovações seriam a força fundamental de desenvolvimento da economia dos países. Pesquisas sobre Universidade Empreendedora têm sido objeto de estudo de vários pesquisadores nos últimos anos e jornais internacionais (e.g. Journal of Technology Transfer, 2001; Management Science, 2002; Journal of Business Venture, 2004), os quais têm dedicado edições especiais sobre o tema. Entre as questões abordadas estão: (i) a importância das patentes como indicador efetivo de transferência de tecnologia (AGRAVAL; HENDERSON, 2002); (ii) as formas possíveis de comercialização de produtos desenvolvidos dentro da Universidade (BAINS, 2005); e (iii) a associação existente entre os gastos com pesquisa acadêmica e a geração de patentes (COUPE, 2003). Na outra vertente, encontram-se os trabalhos que abordam a cooperação universidade - governo - empresa e sua relação com a inovação (e.g. FRITSCH; SCHWIRTEN, 1999), mais próximo do conceito de Empreendedorismo Acadêmico e que tem nas relações com empresários, agências de fomento governamentais e com os pesquisadores da universidade sua base operacional (GARNICA; FERREIRA-JÚNIOR; FONSECA, 2005). Sobre este último aspecto, a cooperação universidade, governo e empresa é refletida nas palavras de Mancini e Lorenzo (2006), ao interpretarem Ploskin (1998), como algo mutuamente enriquecedor, o qual pode contribuir para que cada participante, dentro da sua realidade, avance na busca pela excelência. Sendo assim, a cooperação é um tipo de interação complexa e ativa para aqueles que estão diretamente envolvidos. Percebe-se que a cooperação é vista como algo em que há troca de interesses, similar a uma via de mão dupla onde carros trafegam indo e voltando (LIMA; FIALHO, 2001), pois tanto empresas como universidades buscam benefícios na parceria para promoção do desenvolvimento. Segundo Sbragia (2006), o processo de cooperação universidade e empresa é dotado de distinção de valores, objetivos e cultura. Desta forma, as relações entre empresas e universidades são motivadas por diversos fatores, mas, ao mesmo tempo, são desestimuladas por outras tantas barreiras. Isso se deve ao fato de que ambas as organizações possuem naturezas distintas, com princípios e valores muitas vezes antagônicos, sendo que um dos principais conflitos apontados nesta relação está no direito de propriedade intelectual e, com base em Streharsky (1993), na questão da divulgação dos resultados das pesquisas. Contudo, já ficou evidenciado que a proteção dos resultados de pesquisa é imprescindível para que as empresas os transformem em inovação, alocando recursos adicionais para o seu desenvolvimento e aplicação no mercado (SBRAGIA, 2006). O Quadro 1 a seguir apresenta as principais barreiras identificadas na literatura à cooperação universidade - empresa.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 21
Se, por um lado, ainda existem resistências e barreiras à cooperação, por outro, são várias as motivações e fatores para buscá-la. Considerando o lado das universidades, alguns fatores podem ser evidenciados que alimentam o desejo pela cooperação. Entre estes fatores ressalta-se que as pesquisas científicas no Brasil estão hospedadas, principalmente, em instituições acadêmicas e, desta forma, essas instituições recebem recursos, normalmente escassos, tão essenciais para o desenvolvimento do conhecimento. Com isso, a busca por novos recursos talvez seja um importante estímulo para que as universidades e os institutos de pesquisa almejem e participem do processo de cooperação com o mundo produtivo. Além da necessidade financeira, outros fatores contribuem para esta postura da universidade; pois a cooperação com as empresas permite uma aproximação com a realidade técnica, econômica e social, e sua incorporação nos currículos dos cursos, bem como a contribuição para a transformação tecnológica e social que se espera dos centros de pesquisa e das universidades (LIMA; FIALHO, 2001). Para Fritsch e Schwirten (1999), a participação das universidades e centros de pesquisa nestas relações está geralmente vinculada à geração e ao desenvolvimento de novas ideias para empresas inovadoras. Geralmente, a cooperação é influenciada por diversos motivos. O principal deles, no caso das universidades, é adquirir inspirações práticas na formulação de projetos de pesquisa. A aproxi-
mação é também uma oportunidade para as universidades buscarem informações sobre como os resultados da pesquisa básica podem ser aplicáveis. Alguns trabalhos apontam ainda a proximidade geográfica entre pesquisadores e empresas como um fator positivamente relacionado com a cooperação entre estes agentes. Outros trabalhos indicam a proximidade da universidade como influência positiva na existência de colaboração (e.g. MANSFIELD, 1995; AUDRETSCH; STEPHEN, 1996). No entanto, em regra, são as empresas que buscam as universidades para firmarem parcerias de cooperação, pois representam a oportunidade de encontrar na universidade respostas para seus problemas tecnológicos e consequentemente a melhoria da qualidade de produtos e processos, a sua modernização e aumento da competitividade (LIMA; FIALHO, 2001). Elas normalmente vêm motivadas a compartir recursos que muitas vezes são difíceis de serem percebidos ou adquiridos no mundo dos negócios em que estão inseridos, além da inviabilidade tanto técnica como econômica de atuarem sozinhas. Alguns desses recursos podem ser mão-de-obra qualificada, infraestrutura laboratorial e solução de problemas de ordem tecnológica (GARNICA; FERREIRA-JÚNIOR; FONSECA, 2005). Muitas vantagens podem resultar da cooperação, tanto para as empresas como para as universidades e centros de pesquisa. As principais estão resumidas no Quadro 2 a seguir.
22 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
A COOPERAÇÃO UNIVERSIDADE - GOVERNO - EMPRESA: ETAPAS E ARRANJOS PARA A TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA A relação entre universidade, governo e empresas pode acontecer através de diversas formas e arranjos, desde a consultoria individual de um professor até a organização de estruturas complexas como centros de pesquisa cooperativos, escritórios de transferência de tecnologia, incubadoras e parques tecnológicos (SBRAGIA, 2006). Faulkner e Senker (1994) registram que, na grande maioria das vezes, a cooperação com a universidade é baseada em contatos pessoais e não institucionais. Fritsch e Schwirten (1999), em um estudo conduzido em três regiões da Alemanha, ratificam este resultado ao demonstrarem que uma das principais formas de cooperação são os contatos informais com as empresas, estabelecidos a partir de motivações individuais de pesquisadores. Projetos de cooperação entre universidade, governo e empresas conforme Nakagawa (2015) normalmente se iniciam pela troca informal de informações, pela prestação de serviços especializados (conferências, consultorias, publicações, etc.), pela organização de cursos e programas de capacitação, especialização, etc. Visto isto, com a percepção dos interesses comuns e estabelecimento de relações de confiança, avança-se para etapas mais evoluídas de cooperação como o intercâmbio de pesquisadores, a difusão e a transferência de tecnologias, através do desenvolvimento de projetos e pesquisas conjuntos entre diferentes organizações no âmbito de Sistemas de Inovação, locais e nacionais, e envolvendo diferentes países (SBRAGIA, 2006; SCHMOCH, 1999; LUNDVALL, 1985; SUTZ, 1997; ETZKOWITZ, 2004). Sbragia (2006) salienta que as parcerias entre empresas, governo, universidades e centros de pesquisa trouxeram para o centro da discussão a gestão da propriedade intelectual e a sua titularidade, bem como as formas de licenciamento da tecnologia quando geradas pela universidade e exploradas pela empresa, entre estas: os contratos através das licenças não exclusivas, sem pagamento de royalties e as licenças exclusivas com pagamento de royalties. Um bom resultado de pesquisa não é suficiente para iniciar o processo de sua comercialização, pois é preciso demonstrar a viabilidade de transformá-lo em inovação. Neste sentido, o registro da patente tornase condição para garantir autonomia no processo de licenciamento, mas é insuficiente para o sucesso da transferência, que pressupõe a absorção do conhecimento gerado na universidade pela empresa e requer o empenho de ambas as partes no processo de comunicação. O processo de transferência de tecnologia é definido como
a troca de tecnologia e de know-how entre parceiros, objetivando aprimorar conhecimento e melhorar a capacidade competitiva dos envolvidos, tendo como foco os resultados da pesquisa científica e os aspectos de licenciamento e comercialização (SCHMOCH, 1999; SBRAGIA, 2006). Em relação aos arranjos para a transferência de tecnologia, consideram-se ainda as discussões sobre os Sistemas de Inovação, enquanto contexto institucional chave para a colaboração entre universidades, empresas e governo – tríplice hélice -, promovendo a transformação do ensino e da pesquisa tradicional para a ideia de universidade empreendedora e integrando o desenvolvimento econômico e social local e regional (LUNDVALL, 1992; ETZKOWITZ, 2004; ETZKOWITZ; KLOFSTEN, 2005). A percepção da natureza sistêmica e complexa da inovação contrapõe-se à noção tradicional característica do chamado “modelo linear”, o qual estabelecia uma sequência bem definida que se inicia com as atividades de pesquisa básica e desemboca na adoção de novos processos e produtos. Na abordagem sistêmica, a inovação passa a ser considerada como o resultado de trajetórias que são cumulativas e construídas historicamente, de acordo com as especificidades institucionais e padrões de especialização econômica, inerentes a um determinado contexto espacial ou setorial (ROTHWELL, 1995). A composição dos Sistemas de Inovação é dada por diversas organizações de apoio, entre as quais: universidades e centros de pesquisa, centros de educação tecnológica (CEFET), empresas de consultoria, laboratórios de pesquisa e desenvolvimento (P&D), agências governamentais de fomento, sistema legal, governos, associações empresariais, agências reguladoras visando à geração, à importação, à adaptação, à difusão e à transferência de inovações. Nesse sistema o governo tem o papel de promotor, regulador, executor e financiador do desenvolvimento científico, da pesquisa e da capacitação tecnológica. As organizações dos sistemas de inovação participam de programas governamentais de incentivo à cooperação, nos quais a responsabilidade pela implementação recai em geral sobre a universidade. Entre estes programas ressaltam-se: o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), gerido pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), que se compõe de 15 fundos setoriais; os instrumentos de incentivo como: Inovar, Progex, Prêmio FINEP de Inovação Tecnológica, e os demais editais das agências de fomento como Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico (CNPq), a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e as Fundações de Apoio a Pesquisas (FAPs) (MOREIRA et al., 2007).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 23
Na abordagem do Sistema de Inovação, reconhece-se que a inovação compreende mais do que P&D; realçando, ainda, o papel das atividades realizadas por pequenas e médias empresas (PMEs), introduzindo uma conotação geopolítica importante, sobretudo, para os países em desenvolvimento e em termos de implementação de políticas públicas (MINTELKA, 1993). Para Vedovello e Figueiredo (2006), as organizações de apoio aos Sistemas de Inovação são organizadas para promover e facilitar a disseminação de informação, conhecimento e tecnologia de fontes relevantes para as empresas e outras organizações, auxiliando-as a desenvolver suas competências tecnológicas e adotar, produzir e comercializar inovações. Segundo os autores, para os diversos atores inseridos nos Sistemas de Inovação, a geração, transferência e uso da informação, conhecimento e tecnologia constituem uma atividade fundamental, sendo as sinergias estabelecidas entre esses atores cruciais para o alcance dos resultados. Este arranjo explora não somente as ligações estabelecidas entre as organizações de apoio ao Sistema de Inovação e às empresas, mas também àquelas que ocorrem dentro das próprias organizações de apoio. Vedovello (1998) afirma que as ligações estão baseadas no compromisso dos atores envolvidos, por meio de contratos, bem como no pagamento, ou não, de taxas para que tais interações ocorram. Estas, segundo os autores, estão classificadas em três categorias principais: As ligações informais: nas quais as empresas, em suas buscas por soluções técnicas ou tentativas de implementar inovações, estabelecem contatos com informações e conhecimentos, expertise e equipamentos disponíveis nas universidades, institutos de pesquisa e centros de formação, que por sua vez, estabelecem contatos com as empresas e suas competências e necessidades tecnológicas. Para os autores o estabelecimento dessas ligações não implica o estabelecimento de contratos formais. As ligações de recursos humanos: estão relacionadas com o recrutamento, com a melhoria e desenvolvimento de competências de recursos humanos qualificados. Estas ligações ampliam as possibilidades de promoção de educação continuada e tecnológica em áreas de interesse específico das empresas. Por outro lado, grupos de pesquisa ou pesquisadores individuais podem fortalecer suas ligações com empresas, no sentido de aumentar a oferta de posições de trabalho para os seus recursos humanos qualificados, e ampliar a base educacional, ou o seu portfólio de pesquisa. As ligações formais: estabelecem-se, quando as empresas cientes dos recursos disponíveis nas organizações de apoio ao Sistema de Inovação (universidades, centros de pesquisa, etc.) - conhecimento e informação, recursos humanos qualificados e equipamentos - contratam a utilização de um equipamento específico ou projetos de pesquisa conjuntos, para apoiar e complementar seus esforços tecnológicos. Por outro lado, as universidades e centros, de pesquisa, após estabelecer familiaridades com o ambiente empresarial e suas competências, podem desejar fazer uso de equipamentos industriais ou oferecer sua expertise científica, ampliando seus portfólios de pesquisa e seus rendimentos financeiros, com o desenvolvimento de contratos de pesquisa ou o desenvolvimento de pesquisa conjunto. Essas ligações pressupõem o estabelecimento de contratos formais entre os parceiros, onde o compromisso e o pagamento de taxas são previamente negociados. METODOLOGIA DA PESQUISA Na operacionalização deste estudo de caráter exploratório-descritivo e natureza qualitativa utilizou-se o escopo metodológico do estudo de caso. Conforme Triviños (1992), o grande valor dessa técnica é fornecer
conhecimento aprofundado de uma realidade delimitada, onde os resultados atingidos podem permitir hipóteses para o encaminhamento de outras pesquisas. No estudo de casos, os instrumentos de coleta de dados podem ser diversificados, dando flexibilidade à análise (YIN, 1994). Com isto, para a obtenção dos dados, serviu-se de roteiros de entrevista temática, aplicados de forma individual com agentes que se relacionam com o CNE (Centro Newton de Empreendedorismo) do Centro Universitário Newton Paiva. As temáticas abordadas nos roteiros de entrevistas foram estabelecidas a partir das categorias teóricas sobre a cooperação universidade - empresa - governo, refletindo, sobretudo, os objetivos deste estudo. Utilizou-se ainda como fonte de evidência o levantamento e compilação de documentos. Na análise qualitativa das informações coletadas foi utilizada a técnica da Análise Temática que se insere no conjunto das técnicas da Análise de Conteúdo (BARDIN, 2004), cujo objetivo é evidenciar os itens de significação a partir da descrição do corpus que foi construído; tendo por base as unidades de codificação recortadas do conteúdo das entrevistas e dos documentos, sendo estas orientadas pelos objetivos desse estudo. Para isto, foram percorridas as diferentes fases de análise: i) transcrição, constituição do corpus e pré-análise; ii) leitura flutuante e a exploração do material com o estabelecimento de categorias e dos itens de significação; iii) tratamento dos dados através da inferência e interpretação; iv) confronto e discussão dos resultados obtidos com a teoria articulada. Conforme explica Bardin (2004), esse diálogo entendido à luz de categorias e informações contextuais variadas faz emergir a interpretação como elemento intrínseco ao processo de pesquisa. Dessa forma, iniciando com as categorias teóricas, esse processo levou, em um segundo momento, à redefinição das categorias analíticas em torno dos seguintes blocos temáticos, a saber: (i) o empreendedorismo acadêmico: motivações e barreiras; (ii) o empreendedorismo acadêmico: arranjos de colaboração e sistemas de inovação. O CASO DO CENTRO NEWTON DE EMPREENDEDORISMO (CNE) DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA O Centro Newton de Empreendedorismo foi criado em 2013 a partir do propósito dos mantenedores do Centro Universitário Newton Paiva de ser uma instituição referência nacional em empreendedorismo. Hoje, o CNE, com 3 anos de fundação, prospera no contexto em que atua em diversos projetos como: projeto educação empreendedora em parceria com SEBRAE/MG, advogado empreendedor em parceria com FIEMG, OAB/MG e SEBRAE/MG, dentre outros projetos. O CNE tem como missão contribuir para o desenvolvimento socioeconômico da região metropolitana de Minas Gerais, através da inovação e do estímulo ao empreendedorismo. Entre os seus objetivos sobressaem-se: (a) estimular a criação de empresas; (b) apoiar o desenvolvimento de processos modernos e inovadores; (c) incentivar o desenvolvimento de novos produtos; (d) prestar assessoramento a empresas para a criação de produtos inovadores e (e) proporcionar maior integração universidade-empresa. O CNE enquadra-se, portanto, na interseção dos conceitos de universidade empreendedora e empreendedorismo acadêmico, já que se caracteriza como uma estrutura a qual foi fundada dentro da universidade para estimular o empreendedorismo. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DO CASO Buscando ressonâncias na literatura articulada na primeira fase deste artigo, expõe-se a seguir a análise final baseada nas categorias empírico analíticas definidas durante o processo interpretativo do estudo.
24 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
O EMPREENDEDORISMO ACADÊMICO: MOTIVAÇÕES E BARREIRAS Segundo Sbragia (2006), as motivações para a busca da cooperação entre universidade e empresa dependem de quem toma a iniciativa. No contexto do CNE e corroborando às afirmativas de Etzkowitz (2004), Etzkowitz e Klofsten (2005), Garnica, Ferreira-Júnior e Fonseca (2005), não somente a universidade é empreendedora, mas, sobretudo, as pessoas ligadas às universidades exercem o empreendedorismo acadêmico, ao tomarem a iniciativa participando de editais e programas de incentivo à parceria. Pelo lado da empresa, temas evidenciaram que as motivações para empreender no contexto da interação universidade - empresa - governo estão baseadas no reconhecimento do papel concedido à inovação, na ideia de que a tecnologia se tornou a mercadoria global para a competitividade e da necessidade de um posicionamento frente às demandas em prol do desenvolvimento (FREEMAN, 1987; LUNDVALL, 1985; SBRAGIA, 2006). Segundo a literatura analisada, a busca por novos recursos humanos, financeiros e tecnológicos é uma importante motivação para que as universidades e também para as empresas (SBRAGIA, 2006; LIMA; FIALHO, 2001). Esta assertiva foi corroborada por agentes ligados a FIEMG, OAB/MG e SEBRAE/MG. O CNE começa a ser visto pelas empresas como centro radiador de tecnologia e a universidade que está associada ao CNE como fonte de mão-de-obra qualificada (Trecho da entrevista dos Gestores do SEBRAE/MG). Segundo Fritsch e Schwirten (1999), além de permitir uma aproximação com a realidade técnica, econômica e social, a participação das universidades e centros de pesquisa nestas relações está vinculada à geração e ao desenvolvimento de novas ideias para empresas inovadoras. Neste sentido, os temas analisados evidenciaram novas convergências de visões: Eu devo parte do que eu sou à universidade, primeiramente por que a universidade tem esta fantástica capacidade de possibilitar a mobilidade social através da transmissão e, sobretudo, da aplicação de conhecimentos visando à geração de negócios [...] assim eu tive a coragem de voltar à universidade em busca de ideias com potencial para serem transformadas em produtos inovadores. Minha formação esta baseada em 100% de conhecimento acadêmico, associado à vontade de empreender (Trecho da entrevista com aluno de administração). As evidências emersas, além de confirmarem, segundo Lima e Fialho (2001), que, em regra, são as empresas que buscam as universidades para firmarem parcerias de cooperação; por outro lado, a descrição do bloco temático abaixo colocado, denota formas diferenciadas de motivações para a aproximação da universidade com a empresa e vice-versa, através da iniciativa interinstitucional: O CNE, através do Sebrae, tem um programa de formação específica para apoio aos alunos para criação de pequenas empresas de base tecnológica, visando montar empresas inovadoras. Estudantes também procuram o CNE no sentido de viabilizar sua empresa (Trecho da entrevista com agentes internos da Instituição de Ensino). Conforme evidenciado nos blocos temáticos anteriores, a existência de uma centro de empreendedorismo atrai para sua órbita de interesse diferentes grupos, entre os quais: empresários, estudantes -empresários-acadêmicos, venture capital e o governo por meio de suas agências de desenvolvimento (SBRAGIA, 2006). Corroborando, itens significativos das entrevistas, salientaram a formação de redes de relacionamento e teias de conhecimento necessárias à iniciativa empreendedora que a relação com a universidade facilita (ETZKOWITZ, 2004; ETZKOWITZ; KLOFSTEN, 2005): A universidade possibilita fazer teias de conhecimentos e teias de relacionamentos visando à aplicação e gerenciamento desses
conhecimentos; ou seja, a universidade te possibilita empreender e inovar - gerenciar recursos humanos, financeiros e tecnológicos ao transformar uma ideia em produtos e serviços (Trecho da entrevista com aluno de engenharia). O incentivo ao estabelecimento desse vínculo foi se intensificando, sobretudo, através da implementação de políticas estruturadas, objetivando garantir a excelência em áreas temáticas consideradas estratégicas em função do seu potencial de contribuição para o crescimento da economia, melhorias das condições de vida da população, para competitividade das empresas, das regiões e das nações no contexto local e global (LASTRES et al., 2005; FRITSCH; SCHWIRTEN, 1999). Nas palavras de gestores da FIEMG e SEBRAE/MG. Hoje, com a nova Lei da Inovação Tecnológica e com a filosofia de que a inovação tecnológica passou a ter importância no cenário internacional, mais ainda do que outros setores, como a mercadoria do futuro que é o conhecimento, as coisas mudaram muito. Em relação às barreiras ligadas aos recursos humanos, os autores salientam que os projetos de cooperação entre universidades e empresas, normalmente se iniciam pela troca informal de informações e pela prestação de serviços especializados (SBRAGIA, 2006). Nas palavras dos gestores da FIEMG e SEBRAE/MG. Outros trechos temáticos evidenciaram as ações que poderão ser implementadas com o objetivo de intensificar as relações entre as universidades, governos e o sistema de produção e de compreender as distâncias de conhecimento e inovação entre as duas realidades (LUNDVALL, 1985; SUTZ, 1997): Da parte do governo, políticas públicas necessitam serem efetivadas no sentido de motivar esta aproximação e garantir a efetividade de ações, como, por exemplo, a ampliação da oferta de bolsas e recursos para o desenvolvimento de pesquisas aplicadas, etc. A universidade também deveria se ocupar do marketing científico em prol da aproximação com os sistemas de inovação e produtivo local (Trecho das entrevistas dos gestores da FIEMG e SEBRAE/MG). O EMPREENDEDORISMO ACADÊMICO: ARRANJOS DE COLABORAÇÃO E SISTEMAS DE INOVAÇÃO Segundo Sbragia (2006), centro de empreendedorismo, parques tecnológicos, incubadoras de empresas são arranjos e estruturas complexas que têm sido criadas na interface entre as universidades, as empresas e o mercado com o intuito de realizar a pesquisa básica, mas com relevância industrial. Neste sentido e conforme temas analisados nos documentos, o CNE é uma entidade sem fins lucrativos, criado em 2013 com a finalidade de ser um centro de pesquisa e negócios ao mesmo tempo, visando à transferência do conhecimento gerado na universidade para o sistema produtivo, através do processo de transferência do conhecimento que é considerado o mais eficiente hoje para fazer esta interligação. Do bloco temático acima descrito, vale ressaltar que, apesar das barreiras enfrentadas, o Centro Universitário Newton Paiva tomou a iniciativa para fundar uma estrutura complexa - o CNE - de suporte para a criação de empresas. Neste sentido e segundo Etzkowitz (2004) e Etzkowitz e Klofsten (2005), a Instituição se enquadra no conceito de universidade empreendedora. A transferência do conhecimento da universidade para a empresa não funciona no sentido da “sociedade” entre universidade e empresa. Por conta das diferentes culturas, existem “mesquinharias” por parte daquele que cria o conhecimento (pesquisador) em confronto àquele que aplica e comercializa a ideia (o empreendedor). Este último é visto pelo primeiro como “ignorante”. No entanto, conhecimento sem prática é inútil, conhecimento precisa ser aplicado. (Trecho das entrevistas dos gestores da FIEMG e SEBRAE/MG).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 25
Baseados no reconhecimento de que a inovação é um processo histórico, interativo e cumulativo, trechos da entrevista do empresário e dos gestores salientaram temas de conteúdo sobre a formação de um Sistema de Inovação envolvendo a interação em tríplice hélice universidade, empresa e governo - denotando etapas já avançadas nas relações cooperativas locais (LUNDVALL, 1985; VEDOVELLO; FIGUEIREDO, 2006; ETZKOWITZ; KLOFSTEN, 2005): Temos que fazer interagir conhecimento com a vontade de fazer, de empreender: quem tem o conhecimento é a universidade, quem tem a vontade de fazer é a empresa, desta forma deveremos encontrar uma intermediação, pois esta aproximação é um processo político: como nós Estado, como nós universidade, como nós empresa tomamos a iniciativa e a coragem de fazer, tem que ter coragem e, sobretudo, articulação política. Neste sentido, o CNE é uma instituição que está na fronteira entre os principais atores desse campo político: empresa, governo e universidade (Trecho das entrevistas dos gestores da FIEMG e SEBRAE/MG). CONSIDERAÇÕES FINAIS Parece claro que tanto as universidades como o governo quanto as empresas se beneficiam de cooperações mútuas. Por outro lado, construir significados para expressões como flexibilidade, efetividade, eficiência, internacionalização e competitividade dentro de instituições acadêmicas parece ser ainda um desafio que se iguala à delimitação de políticas públicas apropriadas a este contexto. O ambiente e os diferentes códigos culturais específicos da universidade e do setor privado (mercado e empresas) devem ser considerados nos modelos de transferência de tecnologia e quando apoiados pelo setor governamental. Neste sentido, o presente trabalho situa a discussão e apresenta evidências empíricas deste relacionamento para um caso específico - O Centro Newton de Empreendedorismo (CNE) ligado ao Centro Universitário Newton Paiva, enquanto instituição situada na fronteira dessas relações de cooperação. Em relação às questões de pesquisa levantadas, foi possível perceber que a cooperação entre universidades, governo e empresas ocorre de maneira que os atores envolvidos percebem as vantagens da interação, embora reconheçam algumas de suas limitações e desafios. Contudo e conforme os blocos temáticos articulados, o Centro Universitário sob análise, ao fundar uma estrutura complexa na fronteira dessas relações - o CNE - parece se colocar como ente empreendedor, mas são, sobretudo, os pesquisadores ligados à universidade que exercem o empreendedorismo acadêmico, ao tomarem a iniciativa, participando de editais e programas de incentivo à parceria divulgados pelo governo e se associando ao CNE. Do ponto de vista da FIEMG e SEBRAE/MG, um conjunto de ações deverá ainda ser implementado, sobretudo, pela parte da universidade no sentido, por exemplo, de se ocupar do marketing científico e em prol da aproximação com os agentes dos sistemas de inovação e produtivo local. Porém, de uma forma geral, os resultados da pesquisa indicam que este processo de cooperação universidade, governo e empresa, sob análise, é avaliado de forma positiva, como reflexo da capacidade das empresas de transformarem conhecimento em inovação e em competitividade. É exatamente a dimensão da inovação a mais percebida como passível de ser impactada por esta interação. Neste sentido, contratos, arranjos e um Sistema de Inovação local “embrionário”, mas em evolução, estão sendo articulados entre as diversas instituições e organizações públicas e privadas locais e nacionais para a consolidação dessa interação e integração. Sobressaise ainda das análises o reconhecimento do papel das atividades realizadas por pequenas e médias empresas (PMEs) de base tecnológica
na composição desse Sistema de Inovação, ao serem consideradas o lócus da inovação, e cuja participação está sendo fomentada através dos editais públicos induzidos que visam sua subvenção econômica, no sentido de inverter a balança dos promotores dos investimentos do governo para estas últimas. Por fim, ressalta-se que a atuação de uma universidade empreendedora, mas, sobretudo, o empreendedorismo acadêmico dá sinais de existência, mas é preciso ainda percorrer um longo caminho para se consolidar estes conceitos e, em consequência, a complementaridade entre suas respectivas práticas. REFERÊNCIAS AGRAVAL, A.; HENDERSON, R. Putting patents in context: exploring knowledge from MIT. Management Science, v.48, n.1, p.44-60, 2002. AUDRETSCH, D.B.; STEPHAN, P. E. Company-scientist locational links: the case of biothechnology. American Economic Review, v.86, p. 641-652, 1996. BAINS, W. How academics can make (extra) money out of their science. Journal of Commercial Techonolgy, v.11, n.4, p. 353-363, 2005. BARDIN, L. Análise do conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004. COSTA, R.; ARAÚJO, M. Formação de empreendedores para a abertura de micro e pequenas empresas: “estudo de caso EMPRETEC-Amapá. Disponível em https://seer.imed.edu.br/index.php/revistasi/article/view/849 acesso em 23 abril 2016. COUPE, T. Science is golden: academic R&D and university patents. Journal of Techonology Trasnfer, v.28, n.1, p.31-46, 2003. ETZKOWITZ, H. The evolution of the entrepreneurial university. Int J. Technological and Globalization. Vol.1, no. 1, 2004, p. 64-77. ETZKOWITZ, H. The new visible hand: an assisted linear model of science and innovation policy. Science and public policy. vol.33, no. 5, 2006, p. 310-320. ETZKOWITZ, H; KLOFSTEN, M. The innovation region: toward a theory of knowledge - based regional development. R&D Management 35, MA, USA: Blackwell Publishing Ltd, 2005. FREEMAN, C. Technology policy and economic performance. Lessons from Japan. London: Pinter Publishers, 1987. FRITSCH, M.; SCHWIRTEN, C. Enterprise-university co-operation and the role of public research institutions in regional innovation systems. Industry and Innovation, v.6, n.1, june, 1999. GARNICA, L. A.; FERREIRA-JÚNIOR, I.; FONSECA, S. A. Relações empresa-universidade: um estudo exploratório da UNESP no município de Araraquara/SP 2005. In: XXV Encontro Nacional de Engenharia de Produção. Anais do XXV Enegep (CD-Rom), Porto Alegre, 2005. LASTRES, H., M.M.; CASSIOLATO, J. E.; ARROIO, A. Conhecimento, sistemas de inovação e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ; Contraponto, 2005. LIMA, I. A.; FIALHO, F. A. P. A cooperação universidade-empresa como instrumento de desenvolvimento tecnológico. In XXIX Congresso Brasileiro de Ensino de Engenharia. Anais do Cobenge 2001. Porto Alegre: Abenges, 2001. Disponível em: <http://www.pp.ufu.br/Cobenge2001/trabalhos/IUE014.pdf>. Acesso em: 15 de abril de 2016. LUNDVALL, B. A. Product innovation and user-producer interactions. Aalborg: Aalborg University Press, 1985. LUNDVALL, B.A. National Systems of Innovation; towards a theory of innovation and interactive learning. London: Pinter Publishers, 1992. MANCINI, R.F.; LORENZO, H. C. Potencialidades e barreiras à cooperação universidade, empresa e governo: o caso das micro e pequenas empresas do
26 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
segmento médico - odontológico do município de Araraquara. In: XXVI Encontro Nacional de Engenharia de Produção. Anais do XXVI Enegep (CD-Rom), Fortaleza, 2006. MANSFIELD, E. Academic research underlying industrial innovations: sources, characteristics, and financing. Review of Economics and Statistics, v.77, p. 5565, 1995. MARGINSON, S; CONSIDINE, M. The enterprise university - power, governance and reinvention in Australia. Cambridge University Press, 272p, 2004. [ Links ] MINTELKA, L. A role for innovation networking in the other two-thirds. Futures, July-Aug. 1993. MOREIRA, N. V.A.; ALMEIDA, F. A, S. de; COTA, M. F. de M.; SBRAGIA, R. A inovação tecnológica no Brasil: avanços no marco regulatório e a gestão dos fundos setoriais. Revista de Gestão USP, São Paulo, v.14, n. especial, p. 31-44, 2007.
STREHARSKY, C.J. Creating ethical university-industry partnerships. SRA Journal / Commentary, Vol. XXXV, pp. 23-30, 1993. SUTZ, J. Innovación y desarollo em América Latina. Caracas: Nueva Sociedad, 1997. TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1992. VEDOVELLO, C. Parques tecnológicos e a interação universidade-indústria: a proximidade geográfica entre os agentes como uma força motora. Estudos de Economia, v.18, n.1, p.61-80, 1998. VEDOVELLO, C.; FIGUEIREDO, P. N. Capacidade tecnológica industrial e sistema de inovação. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006. YIN, R. K. Case study research: design and methods. California: Sage, 1994.
NAKAGAWA, M. Entendendo o ecossistema de empreendedorismo brasileiro: tipos de empreendedores e negócios. Disponível em http://www.inovativabrasil. com.br/leia-o-artigo-do-prof-marcelo-nakagawa-sobre-ecossistema-de-empreendedorismo-no-brasil/ acesso em 22 abril 2016. PORTO, G.S. O que discrimina a decisão empresarial de cooperar com a universidade. In: Anais do XII SIMPÓSIO DE GESTÃO DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, PGT/USP, Salvador,2002.
NOTAS DE FIM Leonardo Bastos Ávila - Graduado em Ciências Econômicas, MBA em Administração Estratégica, MBA em Gestão de Pessoas, Mestre em Administração de Empresas, Doutorando em Administração de Empresas. Membro do Centro Newton de Empreendedorismo. Atualmente é Professor e Coordenador de Curso do Centro Universitário Newton Paiva. leonardo.avila@newtonpaiva.br 1
Cássia Rezende Diniz – Mestrado em Educação, MBA em Gestão de Pessoas para o resultado, Graduada em Letras. Analista de Negócios da Empresa Reta Sistemas. Membro do Centro Newton de Empreendedorismo. Coordenadora do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas e Coordenadora do curso de Administração do Centro Universitário Newton Paiva. cassia.diniz@newtonpaiva.br 2
ROTHWELL, R. Industrial, innovation: success, strategy, trends. In: DODGSON, M.; ROTHWELL, R. The handbook of industrial innovation. Cheltenham: Edward Elgar, 1995. SBRAGIA, R. (Coord.) Inovação. Como vencer esse desafio empresarial. São Paulo: Clio Editora, 2006. SCHMOCH, U. Interaction of Universities and Industrial Enterprises in Germany and the United States - a comparison. Industry and Innovation, v. 6, nº. 1, June,1999.
Isis Boostel é graduada em Administração com ênfase em Comércio Exterior pelo Centro Universitário Newton Paiva, especialista em Logística Empresarial pela FGV, e Mestre em Administração pela UNIPEL. Atua no Centro de Empreendedorismo da Newton. Professora dos cursos de Ciências Contábeis, Relações Internacionais e Administração da Newton Paiva. isis.boostel@newtonpaiva.br 3
SCHUMPETER, J. A. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura S.A., 1961.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 27
AVISO PRÉVIO: UMA ANÁLISE CRÍTICA DA LEI N. 12.506/2011 E OS SEUS IMPACTOS NA RELAÇÃO DE EMPREGO Gláucio Antônio de Oliveira1 Roberta Dantas de Mello2
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo fazer uma análise crítica da Lei nº 12.506/2011, que trata da regulamentação da proporcionalidade do aviso prévio trabalhista, previsto no artigo 7º, inciso XXI, da CR/1988. Desta forma, este trabalho realiza uma análise conceitual e finalística, abordando as questões relacionadas à Lei em comento. A aprovação do texto normativo embora tenha provocado satisfação, trouxe igualmente preocupações em face das diversas lacunas decorrentes dos seus dois artigos e os aspectos controvertidos daí advindos. Logicamente, com o passar dos anos, atos normativos foram instituídos com o afã de minudenciá-la. Entretanto, resta claro a existência de divergências atuais, sendo imperiosa a compreensão das tratativas inerentes ao tema, por meio de abordagens críticas das extensões normativas, aspectos doutrinários e jurisprudenciais, aptos a ensejar um estudo detalhado revelando e reiterando a importância do aviso prévio, suas repercussões e os seus impactos na relação de emprego. PALAVRAS CHAVES: Aviso Prévio. Proporcionalidade. Bilateralidade. Lei n.12.506/11.
1- INTRODUÇÃO Uma relação composta por sujeitos, objeto e negócio jurídico, em que as partes encontram-se vinculadas, é extremamente importante para os distintos ramos do Direito, pois é dessa relação que desencadeará a aplicação das normas jurídicas de forma real, eficaz e hábil a ensejar a construção de princípios, regras e institutos jurídicos. Na seara trabalhista, esse núcleo centra-se na relação de emprego. Portando, para caracterizá-la é necessário o preenchimento de alguns “pressupostos” ou “elementos fático-jurídicos” sem os quais não configuraria a relação jurídica. Os elementos fático-jurídicos componentes da relação de emprego são cinco: prestação do trabalho por pessoa física e com pessoalidade a um tomador, de forma não eventual, com subordinação jurídica e onerosamente. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) dispõe em seu artigo 3º sobre os elementos da relação de emprego: “empregado é toda pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador sob a dependência deste mediante salário”. Entretanto, somente esses preceitos não possibilitam que sejam encontrados todos os elementos constitutivos da relação de empregado, sendo necessário buscar a leitura conjugada com o art. 2º da CLT, que revela o elemento da pessoalidade na prestação de serviços. No que diz respeito à figura do empregador, por correspondência, é definido como pessoa física, jurídica ou ente despersonificado que, assumindo os riscos da atividade econômica e do contrato de emprego, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal do agente. Logo, a conjugação dos pressupostos fático-jurídicos permite auferir a conceituação doutrinária inerente à composição dos sujeitos da relação de emprego (empregado e empregador) que, na esfera trabalhista, encontram-se vinculados por meio de um contrato de trabalho, mediante o estabelecimento de um acordo tácito ou expresso. Estabelecida à relação de emprego, nota-se que o vértice principal das partes envolvidas é justamente a permanência do vínculo empregatício com a integração do trabalhador na estrutura e dinâmica empresarial. Destarte, é patente que na relação de emprego estimula-
se o desenvolvimento de um vínculo jurídico, onde as partes pautam sua relação na confiança, no respeito recíproco e na vontade de ambas em querer mantê-la, viés protetivo consagrado pelo Princípio da Continuidade do Vínculo Empregatício. Entretanto, quando há ausência dos resultados pretendidos pelos envolvidos na relação jurídica estabelecida haverá a extinção do contrato de trabalho, que poderá acontecer de diversas formas, a depender do caso concreto. Nos contratos por prazo determinando, ao seu tempo, destacase a possibilidade da previsão da “cláusula assecuratória de direito recíproco”. Uma vez prevista essa cláusula, se o contrato encerrar antes de expirado o prazo do seu vencimento, haverá a concessão de aviso prévio e as suas consequências jurídicas. Desta feita, em voo breve, impende historiar o aviso prévio no direito pátrio e o avanço normativo daí advindo. 2- BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DO AVISO PRÉVIO No Brasil, o instituto do aviso prévio iniciou com o Código Comercial de 1850 que previa em seu bojo que não havendo um ajuste celebrado entre o preponente e os seus prepostos qualquer dos contratantes poderia extingui-lo, devendo, entretanto, avisar a parte contrária com 1 (um) mês antes da antecipação. O Código de 1916, tratando sobre o tema, disciplinava que nos contratos de prazo indeterminado existem distintos prazos a serem obedecidos, tomando como referência o tempo de fixação do salário, de forma gradual e progressiva, qual seja: antecedência de 8 (oito) dias de aviso prévio, para salário pago por mês, ou mais; 4 (quatro) dias, para pagamento semanal ou quinzenal; e de véspera, quando o salário fosse ajustado por menos de 7 (sete) dias. No âmbito do Direito do Trabalho, noticia-se que uma das primeiras tratativas sobre o aviso prévio ocorreu mediante a edição da Lei nº 62/35 sendo certo que a exigência ocorria apenas em relação ao empregado (MARTINS, 2004). Em 1943 com a edição da CLT o aviso prévio foi disciplinado
28 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
mediante a edição dos arts. 487 a 491, estipulando a exigência mínima de 8 (oito) dias, para pagamento efetuado por semana ou tempo inferior e de 30 (trinta) dias para os que recebem por quinzena ou mês, ou que trabalhem há mais de 12 (doze) meses na empresa. A Constituição Federal de 1988 estipulou o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço de no mínimo de 30 (trinta) dias, in verbis: Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; No entanto, a interpretação constitucional predominante foi no sentido da não autoaplicabilidade deste dispositivo, de modo que, a sua efetividade só ocorreu em partir de 13 de outubro de 2011, em que houve a regulamentação da proporcionalidade do aviso prévio por meio da Lei n. 12.506. Entretanto, a interpretação teleológica e finalística do presente diploma normativo, demanda uma análise sistemática do aviso prévio, o que será enfrentado por este trabalho - sobretudo no que tange aos conceitos inerentes ao tema e a sua aplicabilidade no plano prático, senão vejamos. 3- ANÁLISE DO AVISO PRÉVIO NA EXTINÇÃO DO CONTRATO DE EMPREGO O aviso prévio é um instituto utilizado por uma das partes, quer seja empregado, quer seja empregador, para comunicar e dar ciência à outra da sua decisão em rescindir o contrato de trabalho de forma imediata ou, diuturnamente, ao final de determinado período, sendo que, em caso de cumprimento, continuará exercendo as suas atividades habituais até o decurso do prazo. A finalidade do aviso prévio é evitar a surpresa na ruptura do contrato de trabalho, possibilitando ao empregador o preenchimento do cargo vago, e ao empregado, a recolocação no mercado de trabalho. O instituto apresenta o seu caráter social e, sobretudo, a necessidade na preservação da relação contratual no sentido de pré-avisar a outra a sua intenção de romper as tratativas outrora estabelecidas. A Constituição Federal de 1988 aduz sobre o aviso prévio, em seu art. 7º, XXI, aplicável aos trabalhadores urbanos e rurais, instituindo uma indenização compensatória em face da despedida arbitrária ou sem justa causa e a previsão do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) em caso de resilição do contrato de trabalho. A Consolidação das Leis Trabalhistas aborda o aviso prévio no art. 487 da CLT. Em leitura conjugada com a CR/1988, compreende-se: Art. 487 - Não havendo prazo estipulado, a parte que, sem justo motivo, quiser rescindir o contrato deverá avisar a outra da sua resolução com a antecedência mínima de: II - trinta dias aos que perceberem por quinzena ou mês, ou que tenham mais de 12 (doze) meses de serviço na empresa. (Redação dada pela Lei nº 1.530, de 26.12.1951). § 1º - A falta do aviso prévio por parte do empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao prazo do aviso, garantida sempre a integração desse período no seu tempo de serviço. § 2º - A falta de aviso prévio por parte do empregado dá ao empregador o direito de descontar os salários correspondentes ao prazo respectivo. § 3º - Em se tratando de salário pago na base de tarefa, o cálculo, para os efeitos dos parágrafos anteriores, será feito de acordo com a média dos últimos 12 (doze) meses de serviço. § 4º - É devido o aviso prévio na despedida indireta. (Parágrafo
incluído pela Lei nº 7.108, de 5.7.1983). § 5º O valor das horas extraordinárias habituais integra o aviso prévio indenizado. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.218, de 11.4.2001) § 6º O reajustamento salarial coletivo, determinado no curso do aviso prévio, beneficia o empregado pré-avisado da despedida, mesmo que tenha recebido antecipadamente os salários correspondentes ao período do aviso, que integra seu tempo de serviço para todos os efeitos legais. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.218, de 11.4.2001). Portanto, compulsando as disposições sobre o tema, nota-se que a edição das normas em comento tem por objetivo instituir segurança nas relações de emprego estabelecidas, possibilitando ao empregado ajustar as suas atividades econômicas frente à rescisão do seu contrato de trabalho e permitindo a reoganização da sua vida pessoal para que durante o aviso prévio - indenizado ou trabalhado seja possível a sua realocação no mercado de trabalho. Ao seu tempo, o empregador, em face da dispensa do seu empregado, poderá ter tempo suficiente para buscar no mercado novo obreiro ou, em face da manifestação de resilição imediata, ser indenizado pelo rompimento da relação contratual instantânea, em nítida reparação pecuniária. Amauri Mascaro Nascimento (2001) define o aviso-prévio como um direito potestativo que comporta três acepções: 1) comunicação a parte que quiser, imotivadamente, rescindir deve cientificar à outra; 2) tempo - período compreendido entre a comunicação e o desligamento; 3) pagamento - efetuado em razão desse tempo. Com relação à modalidade de comprimento do prazo do aviso prévio, como já referido anteriormente, a CLT prevê dois tipos de aviso prévio: o trabalhado e o indenizado. O aviso prévio trabalhado poderá ser realizado com a redução da jornada de trabalho do empregado em 2 (duas) horas diárias durante os 30 (trinta) dias de aviso; b) a falta ao trabalho por 7 (sete) dias corridos, sendo estes, ao final do pré aviso, conforme determinação estabelecida no art. 488 da CLT, sendo a presente escolha a cargo do empregado: Art. 488 - O horário normal de trabalho do empregado, durante o prazo do aviso, e se a rescisão tiver sido promovida pelo empregador, será reduzido de 2 (duas) horas diárias, sem prejuízo do salário integral. Parágrafo único - É facultado ao empregado trabalhar sem a redução das 2 (duas) horas diárias previstas neste artigo, caso em que poderá faltar ao serviço, sem prejuízo do salário integral, por 1 (um) dia, na hipótese do inciso l, e por 7 (sete) dias corridos, na hipótese do inciso lI do art. 487 desta Consolidação. (Incluído pela Lei nº 7.093, de 25.4.1983) Já o aviso prévio indenizado é o pago, em espécie, pelo empregador ou indenizado pelo empregado com esteio nas disposições do art. 487, § 2º da CLT, in verbis: “A falta de aviso prévio por parte do empregado dá ao empregador o direito de descontar os salários correspondentes ao prazo respectivo”. Assim, verifica-se que o aviso prévio é instituto jurídico bilateral, aplicável aos componentes da relação contratual, consistente na obrigação de fazer, sendo ato volitivo unilateral e irrenunciável por parte do empregado, com esteio na súmula 276 do TST: Súmula nº 276 do TST AVISO PRÉVIO. RENÚNCIA PELO EMPREGADO (mantida) Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 O direito ao aviso prévio é irrenunciável pelo empregado. O pedido de dispensa de
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 29
cumprimento não exime o empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador dos serviços obtido novo emprego. Entretanto, ainda que as disposições do aviso prévio aparentassem de clareza solar, nota-se que com o advento da lei 12.506/2011, inúmeras controvérsias surgiram tornando imperiosa a análise dos aspectos divergentes da proporcionalidade do instituto. 4- AVISO PRÉVIO: IMPACTOS ADVINDOS DA LEI N. 12.506/2011 É inicialmente mister dispor que já havia previsão constitucional para a edição da proporcionalidade do aviso prévio, destacando, o artigo 7.º, inciso XXI da CR/1988, in verbis: Art. 7.º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) XXI- aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei. (...) Grande controvérsia havia acerca da aplicabilidade do aviso prévio proporcional por meio da hermenêutica constitucional, em outras palavras, de forma autoaplicável. Assim, diante da compreensão de que a efetividade da proporcionalidade do aviso prévio dependeria de regulamentação específica, em 13 de outubro de 2011 foi publicada a Lei n. 12.506/2011, que assim dispôs: LEI N° 12.506, DE 11 DE OUTUBRO DE 2011. Dispõe sobre o aviso prévio e dá outras providências Art. 1 - O aviso prévio, de que trata o Capitulo VI do Titulo IV da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT aprovada pelo Decreto-Lei n° 5 452, de 1º de maio de 1943 será concedido na proporção de 30 (trinta) dias aos empregados que contem até 1 (um) ano de serviço na mesma empresa Parágrafo único Ao aviso prévio previsto neste artigo serão acrescidos 3 (tres) dias por ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 (sessenta) dias, perfazendo um total de até 90 (noventa) dias. Art 2° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Entretanto, logo após a edição da presente lei, surgiram controvérsias pela ausência de disposições que pudessem minudenciá-la aptas a dirimir as dúvidas por elas instituídas, o que ocasionou a divergência de opiniões e posicionamentos no empresariado, e, principalmente, nos sindicatos quando da edição de suas convenções e de seus acordos coletivos. Com o advento da referida lei, vários questionamentos foram apontados: (1) se houve a perda da bilateralidade do aviso-prévio; (2) qual a motivação da lei 12.506/11; (3) quais seriam os marcos temporais do início da contagem de 3 (três) dias e para a sua aplicabilidade; (4) se seria aplicável o aviso prévio proporcional nos contratos de trabalho já extintos; (5) se acordos e convenções coletivas poderiam relativizar o aviso prévio. Compulsando as disposições do aviso prévio proporcional, conforme sistemática aduzida alhures, nota-se que o presente instituto tem por escopo garantir à contagem proporcional dos dias de tempo de serviço em um emprego, para o fim de determinar o número de dias que a parte, quando rescindir, imotivadamente a relação de emprego, terá que pré avisar ou pagar a esse titulo à outra parte.
Tendo em vista o ditame constitucional de que o aviso prévio deve ser considerado de forma “proporcional ao tempo de serviço”, o legislador infraconstitucional editou a Lei nº 12.506/2011 que determina que o aviso prévio seja de 30 (trinta) dias para aqueles empregados que prestaram até 1 (um) ano de serviço ao mesmo empregador, devendo ser o aviso acrescido de 3 (três) dias para cada ano de serviço prestado, até o limite de 90 (noventa) dias. Após a edição da referida lei, muito vem se discutindo acerca do cumprimento do aviso prévio por parte do empregado, observando a proporcionalidade do tempo de serviço prestado, uma vez que o legislador não tratou claramente da matéria. As divergências, tratando sobre o tema, chegaram ao Tribunal Superior do Trabalho, conforme anuário da Justiça do Brasil 2012, principal responsável pelas decisões, súmulas e jurisprudências pátrias, no ano seguinte a edição da presente lei. O primeiro ponto controvertido erigido versa, justamente, sobre a aplicação do aviso prévio. Para tanto, questiona-se se a edição da lei veio para beneficiar aos empregados ou se é aplicável aos empregadores. Mutatis Mutantis, questiona-se a aplicabilidade prática em relação ao aviso trabalhado e indenizado, conforme o tempo do contrato de trabalho, em face da reciprocidade do aviso prévio outrora prevista pela Consolidação das Leis Trabalhistas. Para o Ministro João Oreste Dalazen (2012), o aviso prévio proporcional deve ser cumprido tanto por patrões quanto por empregados. “A pior forma de injustiça é a desigualdade de tratamento na mesma situação”. “Quando o aviso prévio era de 30 dias, ninguém questionava a reciprocidade de seu cumprimento”. Na mesma linha de pensamento, segue o ministro Renato de Lacerda Paiva, presidente da 2ª Turma do Tribunal³. Ao seu tempo, o Ministro Barros (2012) Levenhagen, Corregedor Geral do TST, aduz em avaliação isolada que o empregado seria o único beneficiário do aviso prévio proporcional. Porém, o Ministro coloca que deve ser levado em conta todo o arcabouço que, historicamente, identifica o contrato de trabalho como um contrato de reciprocidade de obrigações e, assim, chega à conclusão de que a proporcionalidade do cumprimento do aviso vale para os dois lados. O Ministro Caputo Bastos (2012) afirma que é preciso considerar que a Lei nº 12.506/2011 não especificou nenhum beneficiário e, por isso, ambos os lados envolvidos no contrato devem seguir o que está determinado.4 Também favorável à aplicação da proporcionalidade para empregados e empregadores, o Ministro Ives Gandra Filho, que preside a 7ª Turma do TST, diz que não poder admitir que uma via que sempre foi de mão dupla passe a funcionar para apenas um dos lados. Ele acrescenta também a informação de que é comum que os empregadores dispensem os empregados do cumprimento do aviso prévio, mas que isso não justificaria sua não cobrança. Com o entendimento de que o aviso prévio proporcional visa a dar maior proteção à parte mais vulnerável da relação de trabalho, o Ministro Lélio Bentes, presidente da 1ª Turma do TST, afirma que a proporcionalidade deve ser levada em conta apenas nos casos em que o empregado é dispensado. O dispositivo constitucional que institui a proporcionalidade, diz o ministro “cumpre a finalidade de desencorajar a demissão”. Concorda com o presente entendimento o ministro Walmir Oliveira da Costa (2012). Questionado sobre a aplicação do aviso prévio proporcional, o ministro explica que a lei regulamenta o artigo 7º da Constituição, que fala dos direitos do trabalhador, mas não alterou a Consolidação das Leis do Trabalho, que seria bilateral. O ministro Alberto Luiz Bresciani (2012) complementa: “Ambos [os lados envolvidos] têm a obrigação do aviso prévio, mas a [obrigação] do propor-
30 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
cional é do empregador que demite”.5 Em uma primeira abordagem, verifica-se que parte da doutrina e jurisprudência entende que a regra da proporcionalidade somente seria aplicada para beneficiar o empregado. Ou seja, somente quando o trabalhador fosse dispensado sem justa causa seria aplicável à proporção e, mesmo assim, para o caso de aviso prévio indenizado, não podendo o empregador exigir, no caso de aviso prévio trabalhado, que o empregado trabalhe além dos trinta dias. Em caso de aviso prévio trabalhado, o que os defensores dessa tese entendem é que o empregado deve se ativar pelos 30 (trinta) dias apenas e receber, como indenização, eventuais dias remanescentes. Para os defensores dessa corrente, também não seria aplicada a proporcionalidade nos casos em que o empregado encerrasse, por iniciativa própria, o contrato de trabalho, também não se poderia exigir que ele cumprisse mais do que trinta dias. A referida corrente embasa tal entendimento na premissa de que a interpretação da norma trabalhista deverá sempre ser realizada de forma mais favorável ao empregado. Assim, na ausência de previsão legal considerando a proporcionalidade, também, para benefício do empregador, não se poderia exigir que o trabalhador trabalhasse além dos trinta dias, e nem requerer dele notificação prévia do distrato além desse período. Por outro lado, há uma corrente pela defesa da proporcionalidade aplicada tanto em benefício do empregado, quanto em favor do empregador. Dessa forma, caso o empregador rescinda o contrato de trabalho imotivadamente, poderá exigir que o empregado preste serviços durante todo o período de aviso prévio, não se limitando somente aos 30 dias, mas também, laborando 3 dias adicionais, para cada ano em que prestou serviço. Do mesmo modo, poderá o empregador exigir do trabalhador, em caso de pedido de dispensa, prévia notificação considerando o tempo de serviço, não se limitando aos trinta dias. Os defensores de tal corrente defendem que a lei nº 12.506/2011 não previu qualquer limitação quanto à observância da regra da proporcionalidade, nem especificou que ela se aplicaria somente ao empregador. Além disso, há de se destacar que a referida lei não alterou ou revogou nenhum dos dispositivos previstos na CLT, tendo a sua edição o intuito de somente regular a aplicação da proporcionalidade ao aviso prévio, previsto na Constituição Federal de 1988. Diante disso, tendo em vista que a CLT é expressa ao afirmar que a parte, independentemente de ser o empregador ou empregado, que rescindir o contrato de trabalho, sem justa causa, deverá informar da resolução do mesmo com antecedência mínima de 30 dias, não há que se falar em alteração prejudicial da norma já estabelecida, razão pela qual deverá ser aplicada ao comando legal tanto para o empregador quanto para o empregado. Tratando sobre a controvérsia, observar-se-á o recente julgamento ocorrido nos autos de nº 0002167-48.2014.503.0015, onde o juiz de primeiro grau determinou a nulidade do aviso prévio concedido pela empresa, nos seguintes termos: Com efeito, o dispositivo legal que estabeleceu a proporcionalidade do aviso prévio teve por escopo conferir um acréscimo pecuniário àquele que, por vários anos, tenha ofertado seus préstimos ao empregador. Assim, em se tratando de norma mais benéfica, não se afigura razoável interpretá-la em desfavor do empregado, com o fito de exigir-lhe o labor em tais circunstâncias. Nesse sentido é o entendimento de nosso Regional: AVISO PRÉVIO PROPORCIONAL - O aviso prévio proporcional foi concedido somente em proveito do empregado, e não do empregador. Nesse sentido, inclusive, a Nota Técnica nº
184/2012/CGRT/SRT/MTE, no seu item 1, tendo em vista o art. 7º, inciso XXI, da CF, estabelecer que (...) o dispositivo acima é voltado estritamente em benefício dos trabalhadores, sejam eles urbanos, rurais, avulsos ou domésticos. Outrossim, não se pode olvidar que o aviso prévio trabalhado restringe-se aos 30 dias, não abrangendo a proporcionalidade fixada Documento autenticado por login e senha em 21/09/2015 07:31hs por Dulcinéia Coelho Guimarães. Doc.: 2008 Pag.: 3 pela Lei nº 12.506/11. (Processo: 01604-2014-020-03-00-5 RO; Relator: Fernando Luiz G. Rios Neto; Data de Publicação: 17/03/2015). AVISO PRÉVIO PROPORCIONAL - APLICAÇÃO DA PROPORCIONALIDADE DO AVISO PRÉVIO EM PROL EXCLUSIVAMENTE DO TRABALHADOR - A proporcionalidade prevista na Lei 12.506/2011 deve ser aplicada somente em benefício do empregado, haja vista que somente assim atenderá aos princípios protetivos que dão suporte ao Direito do Trabalho. Destarte, não se pode admitir que a Lei 12.506/11 foi elaborada para reduzir direito do empregado, mas, sim, para ampliar, mormente nos casos de cumprimento do aviso prévio. Nesse sentido, dispõe a Nota Técnica nº 184/2012/CGRT/SRT/MTE. (Processo: 01837-2013-043-03-00-0 RO; Relator: Luiz Otávio Linhares Renault; Data de Publicação: 07/04/2015). Declaro, portanto, a nulidade do aviso prévio irregularmente concedido e, por conseguinte, condeno a Reclama---da a pagar ao obreiro nova parcela a tal título (36 dias), bem como 01/12 de férias proporcionais com 1/3, 01/12 de 13º salário proporcional e FGTS+40% relativos ao período em questão (vide causa de pedir à fl. 02). Entretanto, quando do julgamento do Recurso Ordinário o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região procedeu a reforma da decisão nos seguintes termos: EMENTA: AVISO PRÉVIO PROPORCIONAL TRABALHADO. O aviso prévio proporcional é uma garantia prevista ao empregado, no caso de dispensa imotivada, sendo irrelevante seja trabalhado ou indenizado, uma vez que a norma que o instituiu não faz qualquer ressalva. A lei fala em concessão e não em indenização. Inexiste, assim, irregularidade na concessão de aviso prévio proporcional de forma trabalhada. Quando do julgamento, aduziu o Tribunal que a lei fala em concessão e não em indenização. Inexistia, assim, irregularidade na concessão de aviso prévio proporcional de forma trabalhada. Ademais, destacou que a empresa não é obrigada a indenizar o período. Tratase de faculdade citando os arrestos: RECURSO DE REVISTA. AVISO PRÉVIO PROPORCIONAL TRABALHADO. LIMITAÇÃO DO PERÍODO DE TRABALHO AOS TRINTA PRIMEIROS DIAS. AUSÊNCIA DE AMPARO LEGAL. 1. A Lei nº 12.506/2011, que regulamentou o aviso prévio proporcional, não impôs a determinação de que o PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – 3ª REGIÃO TRT-RO-02167-2014-015-03-00-1 período correspondente, além dos 30 (trinta) primeiros dias, deva ser pago em pecúnia, é dizer, na modalidade indenizada. 2. No aspecto, permanece em vigor a disposição contida no art. 487, §1º, da CLT, segundo a qual a falta de aviso prévio por parte do empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao prazo do aviso, garantida sempre a integração desse período no seu tempo de serviço. 3. Concedido o aviso prévio na modalidade trabalhada, portanto, não encontra amparo legal a pretensão de que o período que ultrapassar os 30 (trinta) primeiros dias seja indenizado. 4. Não constitui determinação
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 31
prejudicial ao empregado a imposição de que permaneça prestando serviços no período correspondente ao aviso prévio proporcional, uma vez que ocorrerá a percepção de salário nos dias respectivos, os quais serão projetados no contrato de emprego, aliado ao fato de que passará a dispor de mais tempo para procurar novo posto de trabalho, dada a redução da jornada laboral ou, quando inexistente, a equivalente dispensa de dias de trabalho. Violação do art. 7º, caput e XXI, da Constituição Federal não reconhecida. Precedentes. 5. Recurso de revista do Sindicato Autor não conhecido. (RR - 9150058.2013.5.17.0014 Data de Julgamento: 12/08/2015, Relator Ministro: João Oreste Dalazen, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 21/08/2015). Portanto, observar-se-á que trata de uma controvérsia atual e sem pacificação. Em face da lacuna legislativa, resta claro a edição da Nota Técnica do Ministério do Trabalho nº 184/2012/CGRT/SRT/MTE que buscou minudenciar a lei em comento, aduzindo em seu bojo a concepção de que o aviso prévio é apenas para beneficiar o empregado, eis que compulsando a literalidade da lei trata-se de disposições de seu bojo: “O aviso prévio, de que trata o Capitulo VI do Titulo IV da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT aprovada pelo Decreto-Lei n° 5 452, de 1º de maio de 1943 será concedido na proporção de 30 (trinta) dias aos empregados que contem até 1 (um) ano de serviço na mesma empresa. O presente entendimento, em consonância com a sistemática principiológica da Justiça do Trabalho é posicionamento que melhor coaduna aos instituitos e proteções celetistas, em que pese - repiso – a controvérsia estar longe de ser dirimida. O objetivo do Princípio da Continuidade do Vínculo Empregatício é assegurar e estimular a maior possibilidade de permanência do trabalhador em seu emprego, consagrando o contrato de prazo indeterminado, tratando sobre os contratos por prazo determinado, inclusive o contrato de trabalho temporário, como contratos de natureza excepcionais. Portanto, ao acrescer 3 (três) dias a cada ano trabalhado, notase que o legislador busca incentivar ao empregado que se manteve no emprego a cada ano de trabalho, quer seja no tempo para buscar nova alocação, quer seja na auferição de indenização superior. Quanto a este ponto, embora ainda pairam relativas controvérsias, observar-se-á que a análise finalística da lei é clara, pois, estabelece este benefício aos empregados. Realizando uma interpretação sistemática, nota-se que o art. 7º. XXI da CR/1988 disciplina o direito ao aviso prévio proporcional para os contratos de trabalho. Lado outro, entender pela bilateralidade do novo regramento do aviso prévio vai ao encontro as disposições do art. 477, §1º da CLT que estabelece que por ocasião da rescisão contratual do empregado somente pode ser descontado o equivalente a um mês de remuneração, o que seria impossível se fosse aplicado ao mesmo um aviso prévio proporcional, pois não seria permitido o desconto superior a 30 dias. Assim, decorrida a análise da presente disposição, cumpre verificar quando inicia a contagem do aviso prévio. Outro questionamento tem sido com relação após quanto tempo de serviço o empregado passaria a fazer jus aos primeiros 3 (três) dias de acréscimo no aviso prévio, pairando a controvérsia se o mesmo seria devido após 1 (um) ano de contrato de trabalho ou apenas após completar 2 (dois) anos. Perfilhando a parte da doutrina que aduz que o aviso prévio, conforme edição da novel lei nº 12.506/2011 é justamente consagrar
o princípio da continuidade da relação de emprego e, sobretudo, premiar proporcionalmente aos empregados, ultrapassado a marca de 1 (um) ano de serviço fará jus ao aviso prévio proporcional, pois o parágrafo primeiro da Lei estabelece 3 (três) dias a mais por cada ano de serviço. Tratando sobre o tema, a jurisprudência aduz neste sentido: Aviso-prévio: Não se conforma a ré com sua condenação ao pagamento da diferença decorrente do aviso-prévio, argumentando que procedeu corretamente o cálculo da referida verba. O art. 7º, XXI, da Constituição Federal prevê que o aviso-prévio é proporcional ao tempo de serviço. A Lei 12.506/2011 assegura o prazo de 30 dias aos empregados que contem com até um ano de serviço na mesma empresa (art. 1º, caput). O parágrafo único do art. 1º da referida lei assegura a proporção ao aviso-prévio à base de 03 dias por cada ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 dias, num total de 90 dias. Cotejando o art. 1º e o disposto no art. 7º, XXI, da Constituição Federal, a partir do momento em que o trabalhador tem mais de um ano, a proporção de 03 dias deve ser computada independentemente do complemento do segundo ano. Vale dizer, não se deve esperar o implemento de 02 anos para o cômputo dos primeiros 03 dias da proporcionalidade do aviso-prévio. O mesmo raciocínio deve ser aplicado para os anos subsequentes. O contrato de trabalho do autor vigeu de 01/10/2013 a 12/12/2014 (01 ano e dois meses), razão pela qual subsiste para ele o direito ao aviso prévio proporcional indenizado de 33 dias. Nesse sentido, a Ordem Técnica nº 184/2012/SGRT/SRT/MTE. Nada a reparar na sentença, portanto. (PROCESSO nº 0010688-83.2015.5.03.0067 (ROPS), RECORRENTE: AEC CENTRO DE CONTATOS S/A, RECORRIDO: WILSON DE BRITO ITABAIANA E TIM CELULAR S.A. RELATOR: LUCAS VANUCCI LINS). De acordo com o texto legal, em caso de dispensa sem justa causa, o aviso prévio será proporcional ao tempo de serviço no exercício de labor à mesma empregadora. Portanto, para os trabalhadores que laboraram na empresa por até 1 (um) ano nada mudou, eis que o aviso prévio será de 30 (trinta) dias. Entretanto, resta evidenciado que para os empregados que possuem vínculo empregatício por tempo superior a 1 (um) ano, o aviso prévio será acrescido de 3 (três) dias, para cada ano de serviço prestado à empresa, limitados a 60 (sessenta) dias, totalizando o lapso temporal em até 90 (noventa) dias. Outra controvérsia erigida à época estava ligada à possibilidade, ou não, de aplicação da nova regra de cálculo do aviso prévio para contratos de trabalhos extintos antes da edição da referida Lei, uma vez que o aviso prévio proporcional já se encontrava previsto no inciso XXI do art. 7º da CR/88. Tal controvérsia restou superada diante das reiteradas decisões da Justiça do Trabalho reconhecendo que o direito ao aviso prévio proporcional ao tempo de serviço somente é assegurado nas rescisões de contrato de trabalho ocorridas a partir da publicação da Lei consolidada efetivamente em 13 de outubro de 2011, tema ora pacificado diante a edição da Súmula 441 do TST. A divergência no presente caso alberga 2 (duas) correntes, sendo que a primeira defende a retroatividade do aviso prévio para período anterior da lei 12.506/2011, eis que a CR/1988 já previa a admisssibilidade do aviso prévio proporcional, e a segunda que aduz que o direito ao aviso prévio proporcional constitucional não teria aplicabilidade imediata, exigindo lei específica que o instituísse. Hodiernamente, observar-se-á que a lei nº 12.506/2011 somente
32 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
se aplica aos contratos que estavam em vigor na data de sua vigência ou em contratos firmados após a mencionada data. O direito ao aviso prévio proporcional não se resume à contagem de tempo em si, mas sim ao direito do trabalhador de ter recompensados seus anos de dedicação ao empregador. Logo, a referida lei não altera o direito ao aviso prévio proporcional, apenas estipula os critérios para o cômputo da proporcionalidade. Portanto, em consonância com a norma constitucional esculpida no art. 5º, §1º da CR/1988. O texto diz que quando, em um contrato em curso, existir ato jurídico ainda não praticado, ele deverá seguir as regras da lei vigente no momento de sua execução. Quanto à questão da aplicação do aviso prévio em proporcionalidade inferior a 3 (três) dias, resta patente que o ponto encontra devidamente superado, bastando uma simples análise persecutória do art. 1º da lei 12.506/2011. Outro aspecto controvertido encontra-se em voga em relação à aplicação as disposições do art. 487/488 da CLT, no que tange a redução do tempo de serviço no curso do aviso. Compulsando os referidos artigos observar-se-á que é dado ao empregado reduzir 2 (duas) horas diárias ou 7 (sete) dias, sem prejuízo do salário integral do obreiro. Assim, nota-se que não houve qualquer menção a respeito da proporcionalidade, o que deflui que o artigo em comento encontra em vigor, podendo optar o obreiro pela hipótese que lhe for mais favorável. Noutro giro, resta claro que é pacífica a possibilidade de que as convenções e acordos coletivos, na atual disposição do ordenamento jurídico, nos termos do art. 7º, inciso XXVI da CR/1988, elaborem cláusulas normativas, desde que estas não discrimem as garantias mínimas do trabalhador, o que colima para que os diplomas possam estabelecer normas para minudenciar a aplicabilidade legal. Tratando sobre o tema, vejamos os entendimentos da Jurisprudência pátria: RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO BIENAL. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. AVISO PRÉVIO. PRAZO DE 40 DIAS PREVISTO EM NORMA COLETIVA. PROJEÇÃO. NORMA COLETIVA APLICÁVEL. 1. O Tribunal Regional, entendendo aplicável ao caso a Convenção Coletiva de Trabalho firmada entre o Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Paraná e o Sindicato dos Médicos do Estado do Paraná, segundo a qual o aviso-prévio terá duração de 40 dias, rejeitou a pronúncia da prescrição bienal. 2 . Ao registro de que ajuizada a reclamatória em 24.04.2004 , a par de consignada a concessão do aviso prévio em 25.03.2004 , resultam despiciendas maiores considerações acerca do prazo do aviso prévio aplicável, ao menos para efeitos da incidência da prescrição bienal, porquanto ajuizada a reclamatória no último dia do prazo que encerra o biênio que sucede a extinção do contrato de trabalho, considerados a projeção do aviso prévio de no mínimo 30 (trinta) dias, garantido no art. 7º , XXI , da Constituição da República, bem como o entendimento consagrado nas Súmulas 380/TST e OJs-SDI1-82 e 83/TST. Revista não conhecida, no tema. Processo 6927002820065090008, Relator Hugo Carlos Scheuermann, Julgamento 13/09/2013). Logo, resta claro que trata de posicionamento majoritário e amplamente defendido na jurisprudência pátria.
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao proceder a uma análise comedida da Lei nº 12.506/2011, observar-se-á que inúmeros aspectos controvertidos surgiram em face da ausência de regramento que pudessem minudenciar as disposições do aviso prévio. Entretanto, procedendo a uma análise finalística da norma, resta claro que as controvérsias foram, em sua ampla maioria, sanadas pela
jurisprudência, pela doutrina e pela Nota Técnica nº 184/2012/CGRT/ SRT/MTE, embora ainda pairem controvérsias e lacunas jurídicas. Acordamos que a edição da Lei nº 12.506/2011 vai ao encontro com os anseios preconizados pelo Direito do Trabalho que visa a garantir um patamar civilizatório inicial, constante do art. 7º da CR/1988 e efetiva o princípio da continuidade da relação de emprego. Aliás, as alterações foram positivas ao trabalhador, eis que foram previstas indenizações adicionais, pelo tempo de trabalho prestado, sendo preconizado um aumento de 3 (dias) a cada ano trabalhado, em caso de aviso prévio indenizado. Acresça ao disposto que o pagamento de indenizações adicionais desestimula as dispensas dos empregados e evita a desvalorização dos empregados “velhos de casa”, sobretudo quando estes têm dificuldades em se recolocar no mercado de trabalho, dado a sua idade avançada. Ao seu tempo, analisando as disposições dos arts. 487/488 da CLT observar-se-á que no curso do aviso prévio é dado ao empregado o direito de reduzir 2 (duas) horas diárias ou 7 (sete) dias corridos, sem prejuízo do salário integral do obreiro, podendo este optar pela hipótese que lhe for mais favorável. Entretanto, observou-se que não se tem, até a presente data, um posicionamento uníssono em relação ao modus operandi para as reduções legais ávidas no curso do aviso prévio trabalhado. Em português diverso, a controvérsia cinge na obrigatoriedade do empregado dispensado cumprir o aviso prévio trabalhado por até 30 (trinta) dias, devendo reduzir 7 (sete) dias ou 2 (duas) horas diárias, ou se a redução ocorrerá ao final dos 90 (noventa) dias, quando o empregado terá a redução de 7 (sete) dias ou 2 (duas) horas diárias. Considerando as modificações realizadas e o intuito do legislador ordinário em homenagear o princípio da continuidade da relação de emprego, o posicionamento que prevê a redução dos 7 (sete) dias e as 2 (duas) horas a cada 30 (trinta) dias trabalhados – parâmetro mensal - é o que melhor coaduna com os seus anseios, data máxima vênia. A obrigatoriedade no cumprimento do aviso prévio, pelo lapso máximo estabelecido em 90 (noventa) dias, caso haja a mantença na bilateralidade do aviso prévio, mesmo após a edição da lei, inviabiliza que o empregado se aloque no mercado de trabalho, com a brevidade que é necessária. Entretanto, se houver a mantença da bilateralidade, acordamos com um novel posicionamento de que a redução deveria ocorrer com base no parâmetro mensal. Em outas palavras, o cumprimento do aviso prévio de 90 (noventa) dias importaria na redução de 7 (sete) dias ou 2 (duas) horas, o que totalizaria 21 (vinte e um) dias no caso da opção do empregado pela redução dos 7 (sete) dias. Aliás, caso o obreiro opte pelo não cumprimento do aviso prévio, observar-se-á que o desconto impactará diretamente no recebimento de suas verbas rescisórias. Mutatis mutantis, com o advento da presente lei não se sabe se o desconto, quando da rescisão, continua limitado a um salário, conforme evidência o art. 477, §5º da CLT. Destaca-se, ainda, há ausência de normas claras e objetivamente estabelecidas para as empresas que estão situadas em mais de uma base territorial, tendo em vista que quando das homologações há divergências em relação à bilateralidade do aviso, em face das edições de convenções coletivas, que ora admite aviso prévio de forma mista (labor por 30 (trinta) dias e indenização pelo período restante) e ora veda-os. Vale dizer que há entendimento jurisprudencial que não reconhece o aviso prévio misto e orientação do MTE que o compreende, desde que por meio de acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva . Noutro giro, verificando que o aviso prévio indenizado integra ao contrato de trabalho para todos os efeitos, questiona-se se a projeção máxima do mesmo impactará na vedação da dispensa do emprega-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 33
do, em face do dissídio coletivo, sob pena de indenização, nos termos do art. 9º, da lei nº 7.238/84. Face ao exposto, embora a doutrina e jurisprudência avancem no sentido de estabelecer interpretações à lei nº 12.506/2011 e haja portarias/resoluções do MTE, é imperiosa a edição de uma Instrução Normativa pelo TST ou uma Súmula para amparar ou resolver as controvérsias referentes à aplicação do aviso prévio, para que haja a consagração do Princípio da Segurança Jurídica, elidindo as controvérsias que perduram há mais de 5 (cinco) anos.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 15.ed. São Paulo: Atlas, 2002. MORAES FILHO, Evaristo de; MORAES, Antonio Carlos Flores de. Introdução ao direito do trabalho. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: LTR, 2000. 780p. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de direito do trabalho. 2.ed. São Paulo: LTR, 1976 740p. NASCIMENTO, Amauri Mascaro do. Curso de Direito do Trabalho. 17.ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e Regulamentações Especiais de Trabalho: Peculiaridades, Aspectos Controvertidos e tendências. São Paulo: LTR, 2001.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro do. Direito do Trabalho na Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989. RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários a Consolidação das Leis do Trabalho. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1982.
BARROS, Washington Monteiro de. Curso de Direito Civil: parte geral. 15.ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso do Direito do Trabalho. 8.ed. Curitiba: Juruá, 2000.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho; Legislação previdenciária; Constituição federal. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2004. BRASIL. Lei 12.506. 11 de Outubro de 2011. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12506.htm CATHARINO, José Martins. Tratado jurídico do salário. Edição fac-similada. São Paulo: LTR/EDUSP, 1994. 773p. CONSULTOR JURÍDICO, Anuário da Justiça do Trabalho 2012 . Brasília, Ed. 1º/2012, Consultor Jurídico, 360-362p. DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2000. DONATO, Messias Pereira. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Saraiva, 1979.
SANTOS, Aloysio. Manual de Contrato de Trabalho Doméstico. 2.ed. Rio de Janeiro: 1988. SUSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. SUSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 2. ed. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. 518p. SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do Trabalho. 19. ed. São Paulo: LTR, 1996. TEIXEIRA FILHO, João de Lima. Repertório de Jurisprudências Trabalhistas. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1982. VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de Emprego: estrutura legal e supostos. São Paulo: Saraiva, 1975. 308p.
GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
NOTAS DE FIM Gláucio Antônio de Oliveira - Administrador de Empresas – Especialista em Gestão Financeira e Direiro do Trabalho. Gestor de Departamento Pessoal e Recursos Humanos e Professor Universitário em Pós-Graduação lato sensu. 1
GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. v.1, Rio de Janeiro: Forense,2000. MACHADO, Rafael Salles da Mata. O Aviso Prévio Proporcional. Ideias e persectovas para a interpretação constitucional do instituto e da lei 12.506/91. MAGANO, Octavio Bueno, Manual de direito do trabalho. 4.ed. São Paulo: LTR,1991. MAGANO, Octavio Bueno. Manual de direito do trabalho. 4a ed. rev. e atualizada. São Paulo: LTR, 1993. 160p. MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 14.ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1987. MARANHÃO, Délio; CARVALHO, Luiz Inácio Barbosa. Direito do trabalho. 17.ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1993. 614p MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 14. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2001. 795p.
2 Roberta Danta de Mello - Doutoranda Direito Privado com ênfase em Direito do Trabalho. Mestre em Direito Privado com ênfase em Direito do Trabalho (2012). Pesquisadora da CAPES (2010-2012). Especialista em Direito do Trabalho e em Direito Previdenciário (2009). Especialista em Direito Processual Constitucional (2006). Advogada. Pesquisadora. Professora Universitária em Graduação e em Pós-Graduação lato sensu. Autora e Organizadora de livros e artigos científicos.
3 CONSULTOR JURÍDICO, Anuário da Justiça do Trabalho 2012 . Brasília, Ed. 1º/2012, Consultor Jurídico, 360p.
4 CONSULTOR JURÍDICO, Anuário da Justiça do Trabalho 2012 . Brasília, Ed. 1º/2012, Consultor Jurídico, 361p.
5 CONSULTOR JURÍDICO, Anuário da Justiça do Trabalho 2012 . Brasília, Ed. 1º/2012, Consultor Jurídico, 363p.
6 Neste sentido, consultar o entendimento do MTE disponível em: http://www. cnti.org.br/educacao/homol/novotrtc.pdf
34 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
AS NOVAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA O CURSO SUPERIOR DE RELAÇÕES PÚBLICAS E A CONTEMPORANEIDADE NEOLIBERAL Frederico Fonseca Soares1
RESUMO: O presente artigo busca um entendimento sobre a implicação na prática, direta ou indireta, na atuação profissional do futuro bacharel em Relações Públicas, proposta pelas novas diretrizes curriculares nacionais para o curso, que sugere atualizar o perfil dos profissionais da área, criar um curso independente, desmembrado do curso de Comunicação Social para obter uma estrutura própria, independente e diferenciada, formando um profissional mais tecnicista e esquematizado em suas atividades, tendo como pano de fundo a contemporaneidade capitalista e suas questões mais manifestas. PALAVRAS-CHAVE: Curso superior de Relações Públicas; Diretrizes curriculares; Prática contemporânea profissional.
1 INTRODUÇÃO O Ministério da Educação (MEC) promoveu em 2010 a revisão curricular de todas as habilitações dos cursos superiores de comunicação social a fim de delimitar e definir suas atribuições e especificidades. O MEC busca explicações, em específico, para o curso de relações públicas, para que tal demonstre a força que a atividade tem na coletividade em termos de contribuições para o desenvolvimento das organizações constituintes da sociedade, dos valores democráticos, da cultura, da política, da cidadania, etc. Atualmente o curso de Relações Públicas constitui uma habilitação do curso de Comunicação Social, assim como os cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda. Essas novas diretrizes, além de atualizar a profissão, justificará o desmembramento do curso tornando-o autônomo, ou seja, deixará de ser uma habilitação do curso de Comunicação Social e se tornará um curso autônomo de Relações Públicas. Os esforços deste trabalho em questão justificam-se pela urgência de entender o que virá com as novas mudanças no curso superior de Relações Públicas, além de fazer uma análise crítica de tal atividade no mundo do trabalho contemporâneo, onde se envolvem questões de modernidade, tecnologias e as novas habilidades que serão exigidas do profissional nesse contexto. Tendo apreciado tais questões, torna-se mister configurar suas implicações no futuro bacharel, que terá absolvido novas habilidades, tecnologias e percepções de um novo tempo. Pressupõe-se que existem dissonâncias no trato das Relações Públicas pelos profissionais da área com a presente realidade, portanto, antever como se dará esse “trato” no que tange as novas habilidades, percepções de mundo, tecnologias e os novos espaços que serão explorados pela atividade, merece uma atenção e uma comparação com o passado, a atualidade e o futuro para que se possa construir parâmetros mensuráveis de desenvolvimento ou até mesmo de retração dos fins específicos da atividade de relações públicas, que é o de gerir estrategicamente a reputação e a imagem corporativa. Toda essa especulação tem como subsídio de estudo primeiro e primordial a nova estrutura de ensino nos cursos superiores de Relações Publicas, suas propostas para a organização de conteúdos e o mundo neoliberal de trabalho, a “problematização” como recurso metodológico, os “mecanismos ativos” no processo ensino-aprendizagem e o estágio como parte da matriz curricular para o efetivo contato do futuro profissional com o mundo do trabalho e as relações
capitais, finando numa atividade mais atual e adequada ao novo modelo neoliberal econômico e empresarial e suas práticas cotidianas. 2. RELAÇÕES PÚBLICAS 2.1 Conceito Efetivamente não se pode conceituar a atividade de Relações Públicas em apenas uma frase, ou com poucas palavras, as Relações Públicas se apresentam complexas já na sua primeira exposição enquanto atividade profissional. Afirmar que o Relações Públicas é o gestor da imagem e da reputação institucional deixa muitos espaços de interpretação, Andrade (2005) acentua que há tantas definições e conceitos sobre RP2 quanto há estudiosos, professores, profissionais e admiradores dessa atividade. Segundo tal autor, é difícil alcançar a conceituação unívoca ou unânime das Relações Públicas, mas podemos arriscar a definição de que as relações públicas são o esforço planejado e sistemático de manter a boa vontade, compreensão, adesão e cumplicidade dos públicos de interesse da instituição, como exemplo os fornecedores, acionistas, comunidade, clientes, público interno (funcionários) a fim de gerar uma boa imagem e reputação institucional, os resultados de uma instituição credível e respeitada é unânime, ampliação de mercado, estabilidade, facilidade para o enfrentamento de crises, aceitação da marca, redução de conflitos, etc. Porém, o que cria todo desencontro de conceituação por parte dos estudiosos e profissionais da área é a forma de construir e conduzir tais conceitos afirmados acima, talvez nunca se acerte uma conceituação unívoca, pois as organizações são como indivíduos, carregados de uma subjetividade própria, onde não há uma igualdade no trato da cultura ou da comunicação organizacional, assim sendo, para cada organização, uma forma de relações públicas peculiar. Mas como concentrar o amplo e profundo entendimento dessa atividade, acrescido de uma real compreensão da contemporaneidade em um curso superior de 4 anos? Uma pequena retrospectiva do processo de relações públicas no Brasil pode ajudar a compreender a complexidade criada em torno do conceito e aplicação da atividade. 2.2 A profissão de Relações Públicas Segundo Andrade (1970), o surgimento da atividade no Brasil se deu em 30 de janeiro de 1914 na Eletropaulo, com o primeiro setor de Relações Públicas, gerida por Eduardo Pinheiro Lobo, que hoje é
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 35
o “Pai das Relações Públicas no Brasil”. Todavia somente em 1967 a Escola de Comunicação e Artes de São Paulo criou o primeiro curso de Relações Públicas com duração de quatro anos do Brasil e como mais curioso, o Brasil foi o primeiro pais do mundo a regulamentar a profissão de Relações Públicas, pela lei n°. 5.377, de 11 de Dezembro de 1967, contudo, no próximo tópico aprofundaremos um pouco mais na história da atividade profissional e dos cursos RP. Segundo Soares (2009) a primeira produção didática de Relações Públicas, o livro “O curso de Relações Públicas: Relações com os diferentes públicos” de Cândido Teobaldo de Souza Andrade (1970) traz como funções básicas e específicas de Relações Públicas: assessoramento, planejamento, execução (comunicação) e avaliação. Complementado o pensamento de Andrade (1970), Doty (apud Soares 2009), informa que a tarefa de gerenciar é realizada por meio da prática das seguintes intervenções: diagnosticar o processo; prognosticar suas mudanças; assessorar as lideranças organizacionais quanto a decisões sobre políticas organizacionais, para evitar ou resolver os assuntos controversos e crises; produzir programas planejados de argumentação, para justificar e ou promover as decisões e, conseqüentemente, as ações organizacionais, e para complementar essa teorização das atividades básicas, o pesquisador norte americano Gruning (apud Soares 2010), acrescentou: Relações Públicas é uma função administrativa que avalia as atitudes públicas, identifica as diretrizes e a conduta individual ou da organização na busca do interesse público, e planeja e executa um programa de ação para conquistar a compreensão e a aceitação públicas. (p. 37) Através de uma perspectiva legal da profissão, podemos linearizar as atividades de relações Públicas que estão expressas no decreto n.º. 283, de 26/9/1968 que regulamentou a profissão: Consideramse atividades específicas de Relações Públicas as que dizem respeito: a) à orientação de dirigentes de instituições públicas ou privadas na formulação de políticas de Relações Públicas; b) à promoção de maior integração da instituição na comunidade; c) à informação e a orientação da opinião pública sobre os objetivos elevados de uma instituição; d) ao assessoramento na solução de problemas institucionais que influem na posição da entidade perante a opinião pública. e) ao planejamento e execução de campanhas de opinião pública; f) à consultoria externa de Relações Públicas junto a dirigentes de instituições; g) ao ensino de disciplinas específicas ou de técnicas de Relações Públicas. Em qualquer autor que tenha como tema as Relações Públicas como: Margarida Kunsch, Roberto Porto Simões, Cecília Peruzzo, Teobaldo de Andrade, Waldir Fortes, Hebe Wey, e outros, fica indiscutível a inter-relação das atividades de Relações Públicas e o processo de comunicação empresarial, na verdade não fica dúvida que a profissão de Relações Públicas, ensinada e discutidas nas IES, tem como aplicabilidade básica a intenção de sistematizar a comunicação dentro das organizações. Para compreender um pouco melhor a atividade, o profissional e os conceitos, um breve histórico das Relações Públicas poderia ser elucidativo, como forma de entender as novas necessidades acadêmicas para a formação de um profissional adequado para contemporaneidade. (SOARES 2009) 2.3 A trajetória profissional e acadêmica das Relações Públicas no Brasil Margarida M. K. Kunsch (1997) uma das pesquisadoras mais influentes do Brasil em Relações Públicas propõe uma retrospectiva
crítica da trajetória profissional e acadêmica das Relações Públicas no Brasil dividido em cinco décadas. Na década de 50, Kunsch (1997) considera como alavanca para o florescimento da área de Relações Públicas, graças à constituição de 1946 na qual o Brasil entrava em um processo de desenvolvimento com o presidente Getúlio Vargas e, principalmente, Juscelino Kubitschek. Desenhava-se então a nova conjuntura econômica, incentivada por uma política industrial desenvolvimentista, trazendo empresas multinacionais que, conseqüentemente desenvolveram o mercado interno. Com isso surgiram as primeiras transmissões televisionadas, aparece o rádio transmissor, formou-se os conglomerados de jornais, revistas e rádios, os de televisão só ocorreriam a partir da década de 60. As agências de propaganda começaram a se consolidar, nascem os primeiros institutos de pesquisa de opinião e de mercado, e a área de Relações Públicas instala-se como atividade empresarial. As multinacionais trouxeram a cultura de valorização da comunicação, sobretudo das áreas de Publicidade e Propaganda e Relações Públicas. Foi na década de 50 que começaram a sistematizar a aplicação de técnicas Relações Públicas nas organizações, em 1951 constituiu o primeiro departamento de Relações Públicas autenticamente brasileiro na Companhia Siderúrgica Nacional em Volta Redonda, RJ. A primeira empresa prestadora de serviços em Relações Públicas foi fundada em 1952 por Silva Teles & Romildo Simas. E em 1953, instalase o primeiro curso regular de Relações Públicas, promovido pela Escola de Administração Públicas da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro. com patrocinio da Organização das Nações Unidas (ONU). E em 1954, surge a primeira associação, a Associação Brasileira de Relações Públicas (ABRP). A década de 60, que segundo Kunsch (1997), é marcada pela emissão da lei nº 5.377, de 11 de dezembro de 1967, que regulamentada em 26 de setembro de 1968, é aprovada no mesmo dia pelo decreto-lei nº 63.283, tornou a atividade privativa dos bacharéis de comunicação social com habilitação em Relações Públicas. De acordo com Kunsch (1997), trata-se do acontecimento mais importante da década, pois o Brasil foi o primeiro país do mundo a tomar tal iniciativa. Ainda para Kunsch (1997), a partir da revolução de 1964, a área de Relações Públicas sofreu forte influência dos militares, outro marco relevante e positivo foi a realização, Rio de Janeiro, em 1967 do lV Congresso Mundial de Relações Públicas, que entre outras coisas, definiu as funções básicas e específicas da profissão, adotadas por Candido Teobaldo de Souza Andrade (1970) em seu livro “Curso de Relações Públicas”. Segundo Kunsch (1997), um terceiro acontecimento importante foi a criação do primeiro curso superior de Relações Públicas com duração de 4 anos na Escola de Comunicações Culturais da Universidade de São Paulo, hoje conhecida como Escola de Comunicações e Artes. Sobre a década de 70, Kunsch (1997) afirma que, a partir do fato ocorrido em 1967, implanta-se uma série de faculdades ou departamentos de Relações Públicas em todo o país, fazendo as escolas de Jornalismo perderem sua exclusividade. A autora afirma que, no início, os cursos eram improvisados e de muitas adaptações pela falta de professores e profissionais para atender a nova demanda, só em 1978, com a introdução dos projetos experimentais pelo então Conselho Federal de Educação, é que os cursos passariam por uma revolução em sua trajetória, melhorando seu nível de qualificação. Na década de 80, houve muitos acontecimentos importantes para as Relações Públicas, tanto no âmbito acadêmico quanto profissional, isso pelo começo da abertura política no país por causa do novo comportamento constitucional, tanto por parte do governo quanto por parte das organizações em geral. Com o fim do autoritarismo, a sociedade passou a exigir mais transparência das organizações,
36 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
inicia-se então a ampliação dos canais de comunicação empresarial. A década de 90 se caracteriza pelas grandes transformações mundiais, que atingiriam todos os setores de sociedade e as Relações Públicas passariam por um questionamento e por uma redefinição de papel, neste ponto se inicia o que podemos chamar de crise existencial das relações públicas, enquanto profissão e como atividade estratégica, isso marca essa década como a fase de maior “consciência”3 tanto das escolas quanto dos profissionais. (KUNSCH, 1997). O Conrerp 2ª região (Conselho regional de Relações Públicas) e o Conferp (Conselho Federal de Profissionais de Relações Públicas) desencadearam em 1992 um processo de discussão sobre os rumos da profissão, o Conferp produziu um documento com 39 itens, que segundo Kunsch (1997) eram polêmicos, e que se encontram em pauta até hoje, os temas eram, entre outros, a desregulamentação da profissão, o uso de diferentes nomes para as funções e atividades de Relações Públicas, criação de um conselho único de Comunicação Social, a habilitação de professores e ética profissional. Então em 1994, um parlamento nacional foi constituído para conduzir de forma organizada a discussão sobre a realidade e o futuro das Relações Públicas no Brasil, através de fóruns nas sete regiões que têm o conselho de profissionais de Relações Públicas. Kunsch (1997) afirma que as Relações Públicas trilharam por muitos desvios na trajetória que ela deveria ter seguido de forma natural como profissão institucionalmente regularizada, encarregada de uma missão nobre. E em 2010, uma nova reavaliação da atividade e da formação de relações públicas proposta pelo MEC constrói novas discussões e propostas que serão aqui analisadas. 3 AS PROPOSTAS ACADÊMICAS PARA O FUTURO DA ATIVIDADE DE RELAÇÕES PÚBLICAS Como visto no tópico anterior, em todo o percurso das Relações Públicas no Brasil, as mudanças na atividade estão indissoluvelmente ligadas aos acontecimentos econômicos, políticos, sociais e empresariais, ou seja, uma atividade que não se desenvolve isolada de um contexto maior. Foi por este motivo, que o grupo de especialistas, instituída pelo Ministério da educação (MEC), amparado pelo Conselho Federal de Relações Públicas (Conferp), que por sua vez foi ajudado pelo grupo de trabalho que era composto por membros professores de cada Conselho Regional do Brasil (Conrerps), confeccionou o documento propondo a atualização dos parâmetros básicos de organização pedagógica, escorado nestas mesmas premissas, das intensas mudanças sociais, nos devires tecnológicos, nos novos fazeres no campo da comunicação, o relatório com as seguintes ponderações se apresenta da seguinte forma. Na apresentação da atividade, os especialistas4 relatam que: O profissional de Relações Públicas está apto a atuar nas áreas de comunicação nas organizações públicas, privadas e do terceiro setor, por meio do estabelecimento de políticas, estratégias e instrumentos de comunicação e relacionamento. Realiza atividades de pesquisa e análise, de assessoria e consultoria, de planejamento e de divulgação, podendo ser também um empreendedor da área para diversos segmentos. (PROPOSTA DE DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA OS CURSOS DE RELAÇÕES PÚBLICAS, 2010 p. 2) Ou seja, por meio do conceito básico da atividade, de relacionamento com os stakeholders5 por meio da comuicação organizacional, se reafirma a estrutura fundamental da atividade, percebe-se que o profissional de Relações Públicas se encontra entre os interesses da organização e sobre os estudos da sociedade como objeto de pesquisa e trabalho, esse axioma é inexorável, e as mudanças estão
justamente nas organizações e na sociedade, esse deve ser objeto de pesquisa dos propoentes às novas diretrizes curriculares do curso de relações públicas. Segundo o relatório, a formação em Relações Públicas, no Brasil, é feita atualmente por 107 cursos, estimando-se um contingente de 3.200 egressos em todo o país por ano. Desde 2006, o conjunto de cursos superiores de Relações Públicas é avaliado pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE). Segudo o Ministro da Educação, Fernando Haddad (2010), o Brasil tem mais de 300 cursos de Jornalismo, mesmo com a ampla proliferação de IES privadas nos últimos anos, podemos perceber que o curso de Relações Públicas ainda tem uma tímida expressão em comparação a outro curso de Comunicação Social, o que paradoxalmente contraria uma perspectiva ascendente de nível global, como veremos no desenvolver deste trabalho. Segundo o Programa de Estudos do Futuro (Profuturo) da Fundação Instituto de Administração (FIA)6, que confeccionou projeções das atividades mais promissoras num mercado futuro ou “Carreiras do Futuro” como especificado pela FIA, a atividade de “ecorrelações” encabeça o ranking, uma função que é basicamente ações de Relações Públicas voltadas para a temática ecológica, com todos conceitos e atividades presentes na atividade tradicional de RP. Também em sétima colocada no ranking “As profissões do futuro” segundo a Revista Exame de 13 de abril de 2004, as Relações Públicas se destacam frente à sociedade globalizada da informação. A Revista “VISÃO”7 fez uma pesquisa junto a universitários, empresários e especialistas sobre as profissões com “mais futuro”, dentro destas a carreira de “gestor de relações com clientes” figura a segunda posição, mesmo não sendo explicito o posto de relações públicas, podemos afirmar que é um reducionismo da atividade de RP, pois o cliente é um público participante das estratégias de gestão de stakeholders, tão ativo no cotidiano de um profissional de RP. Poderíamos citar pelo menos mais uns 5 rankings sobre profissões de futuro ou do futuro, que certamente encontraríamos, na maioria delas, alguma carreira que tenha alto grau de congruência com as Relações Públicas, ou atividades facilmente geridas por profissionais de Relações Públicas, pois pertencem ao bojo técnico da atividade. Tal abertura confere, no mínino, longevidade a atividade de relações públicas. Porém, o pressuposto básico é perceber os principais símbolos de uma conjuntura contemporânea, a fim de antever o comportamento da atividade de RP, suas futuras ou presentes necessidades técnicas e holísticas, suas novas desenvolturas humanistas ou “anti-humanistas” , sua estrutura formadora, ou seja, seu mix de necessidades técnicas e estruturantes na composição acadêmica que formarão os futuros profissionais, para com isso avaliar com propriedade as coerências, incoerências, insuficiências e utopias das novas diretrizes. No próximo capitulo entenderemos com maior cabimento o que dará a certeza de um lugar ao sol a tal atividade, seu maior empregador e utilizador de suas técnicas. 3.1 Principais indicações para as novas diretrizes no que tange a formação superior em relações públicas No projeto pedagógico, os especialistas propuseram ao MEC a manutenção de um caráter estratégico para a atividade de relações públicas na administração dos processos de comunicação institucional, na interação com os públicos e na política, no planejamento e nas ações da comunicação organizacional, aspectos sociais, culturais e relacionais deverão ser apreciados, contudo sem maiores ressalvas sobre estes aspectos, além de uma imprescindível preocupação com a formação humanista, (o que contraria as intenções neoliberais), crítica e ética com a formação do profissional. Nesse mesmo projeto
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 37
pedagógico, as IES poderão escolher suas linhas de formação específicas, além de adotarem linhas de formação condizentes com as demandas sociais e realidade regionais. Na articulação teórico-prática, o processo ensino aprendizagem se baseará, segundo as propostas do relatório, na pesquisa, a fim de encontrar um meio termo entre teoria e prática, as IES devem oferecer uma estrutura que possibilite o maior contato do aluno com as realidades tecnológicas e digitais mais recentes, além da capacitação docente que promoverá uma renovação cíclica de conhecimentos teórico-práticos, as IES também são incentivadas, segundo esse relatório, a estimular as atividades de iniciação científica e de extensão no âmbito da graduação. O relatório incita as IES a produzirem maior autonomia dos discentes face ao seu próprio processo de aprendizagem e de produção de conhecimento. O relatório propõe uma carga horária de 3.200 horas distribuídas da seguinte forma: • 2.800 horas para as atividades didáticas (teóricas e práticas; obrigatórias e optativas) dos eixos de formação, sendo pelo menos. • 1.400 horas no eixo de formação em Relações Públicas – que inclui a carga de 150 horas destinada ao trabalho de conclusão de curso –, e as outras 1.400 horas nos eixos de formação geral, em comunicação e suplementar. • 200 horas para estágio. • 200 horas para atividades complementares. O Relatório propõe também uma estrutura de laboratório de Relações Públicas que deve servir como elemento de integração entre as atividades de ensino, pesquisa e extensão e com as práticas do mercado profissional. Os especialistas alertam que tal laboratório deve apresentar, além dos espaços específicos, espaços com equipamentos, tecnologia e softwares sistematicamente renovados e atualizados que possibilitem a produção midiática, pesquisas qualitativas e quantitativas. O estágio é proposto como atividade obrigatória com no mínimo 200 horas regulamentado pelos colegiados acadêmicos da instituição, em consonância com a Lei n.º 11.788 de 25/09/2008. Sobre as atividades complementares, pondera-se que pode ser realizado dentro ou fora das IES, com duração de 200 horas e acompanhadas, supervisionadas, orientadas e avaliadas pelo corpo docente da instituição. O relatório ainda propõe que seja realizado o trabalho de conclusão de curso sob duas modalidades, monografia com a temática de relações públicas sob orientação de um professor e um trabalho prático ou projeto experimental que se aplicará a uma organização real acompanhado pelo orientador professor da IES, as duas modalidades deverão se apresentar em banca avaliadora. No relatório os conteúdos são organizados em quatro grandes eixos: Formação geral; Formação em Comunicação Social; Formação em Relações Públicas e Formação suplementar. É indicado para cada eixo um conjunto de conteúdos básicos os quais podem ser contemplados em diversas atividades didáticas (disciplinas, oficinas, atividades laboratoriais, discussões temáticas, seminários etc.). Agora cabe discutir se tais ponderações refletem a real necessidade do futuro egresso tendo em vista a contemporaneidade e as atuais prerrogativas pedagógicas. 4 NEOLIBERALISMO, CONTEMPORANEIDADE E O ENSINO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA O CURSO DE RELAÇÕES PÚBLICAS Pós-modernismo, pós-culturalismo, pós-humanismo, cibercultura, simulacro, devir e modernidade liquida. Ainda se tenta entender a contemporaneidade e a profundidade de suas mudanças, sabemos apenas que a extensão dessas mudanças é global, a tecnocultura e os novos valores aparentemente dividem as discussões mais críticas do pós-modernismo, porém uma coisa pode ser dita com
certeza, o ponto arquimediano que impulsiona tais mudanças é o neoliberalismo, a ideologia totalitária que gerencia o mundo. Buscar maior entendimento sobre essa forma inexorável de controle pode antever quais seriam as exigências que qualificariam o futuro egresso dos cursos de Relações Públicas. Não devemos nos esquecer que, a própria atividade de Relações Públicas nasceu nos moldes da intenção capitalista, e nela se desenvolve com sua máxima força. Foi defendendo a reputação de um dos maiores ícones do capitalismo predatório, o magnata norte americano John D. Rockefeller, que nasceu as relações públicas e os sucessores deste magnata são os maiores defensores do neoliberalismo, como David Rockefeller, neto de John D. Rockefeller, que assumiu publicamente na TV que, o mundo deveria ser gerenciado por organizações privadas. Mais a frente, entenderemos melhor a ligação do neoliberalismo às Relações Públicas, devemos agora pontuar as relevâncias, as necessidades mais urgentes e também as nulidades do futuro egresso de Relações Públicas segundo as proposições do relatório. A Tecnologia da Comunicação e da Informação avança a passos largos, não pela necessidade humana de se comunicar cada vez mais, mas pelos simples interesses capitais de renovar ciclicamente todos os componentes tecnológicos comercializáveis, tal perspectiva deve diminuir efetivamente o objetivo das IES em ensinar o manuseio de determinada tecnologia ou equipamento de informática ou informação, ainda porque tais tecnologias têm como tendência a facilidade de manuseio pelo operador, é mais profícuo o empenho das IES em construir no aluno uma percepção crítica sobre a finalidade destas TICs (tecnologias de Informação e comunicação). Em suma, se prender ao ensino de um determinado software pode limitar o aluno, ensiná-lo em quais ocasiões, quais motivos e para quais fins, deve ter um efeito mais construtivo no futuro egresso, isso elimina o ensino técnico de qualquer TIC específica. A cibercultura, esteira de muitas discussões acerca da comunicação social, da opinião pública e da disseminação de informações, deve receber mais que um olhar técnico, dever ser percebido em sua essência, ou seja, na própria cultura do ciberespaço. Uma perspectiva holística da tecnocultura e dos públicos envolvidos nessa realidade. A contemporaneidade não se limita apenas ao desenvolvimento tecnológico, os aspectos econômicos, culturais e políticos são o cerne do objeto de relações publicas, a tecnologia é um facilitador e amplificador das suas ações. Como visto na trajetória acadêmica e profissional da atividade de relações públicas, a atividade está intrinsecamente ligada aos fatores políticos e econômicos do país, como dito por Edward Bernays (2006) a atividade de Relações Públicas tem seu berço e sua melhor forma de desenvolvimento no capitalismo, e por sua vez, Chomsky (2010) afirma que, o capitalismo se desenvolve melhor num sistema democrático, contudo, para qualquer forma de governo deve se obter o consentimento dos governados, Chomsky (2010) ponderou: “quanto mais livre e popular é um governo, mais necessário se torna o controle da opinião para garantir a submissão dos governados” (p.50). Os governos participantes deste sistema neoliberal, cada vez menos ativos no campo social garantem, subsidiam e fomentam todos seus componentes deste paradigma, como exemplificou Chomsky (2010), das cinco maiores empresas do mundo, todas estariam falidas se não tivessem sido amparadas pelos seus governos em algumas épocas de suas vidas, em suma, empresas e governos comungam dos próprios projetos, projetos arquitetados pelas grandes lideres neoliberais, e para garantir sua “legitimação” ou seu “consentimento sem consentimento” como nomeou Chomsky (2010), é imprescindível o uso das Relações Públicas, ou seja, quanto mais o neoliberalismo se desenvolve, mais deve se usar de Relações Públicas para o “con-
38 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
trole da opinião pública” como nomeiam tantos autores que desenvolvem estudos sobre o neoliberalismo. O estudante de Relações Públicas tem que entender sua posição estratégica de facilitadores de um capitalismo predatório e extremamente agressivo, deve ser discutido abertamente no meio acadêmico a finalidade capital de sua atividade, a ingenuidade e a falta de aclaramento das reais intenções da atividade no trato da profissão é o maior problema que pode haver no ensino de relações públicas, o graduando chega a acredita que sua profissão se assemelha a de um assistente social8, e que suas técnicas e finalidade vão amparar ou proteger a sociedade em geral, não percebem na verdade que, a finalidade é exatamente o contrário, é o de gerenciar a opinião publica a fim de manter resignação e docilidade dos seus públicos e assim manter o status quo tão importante para o neoliberalismo. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O neoliberalismo é o paradigma econômico e político que define o nosso tempo, as relações públicas são a forma única de construir uma estrada confiável para o bom fluxo desse paradigma totalitário, por isso não é e talvez nunca seja visto com bons olhos pelas pessoas comuns. Naturalmente ou normalmente é de se entender que quase ninguém conheça, de fato, as atividades e o profissional de relações públicas, pois na verdade o Relações Públicas cuida dos interesses de quem lhe paga e no cerne de suas funções ele não deve aparecer no cenário dos acontecimentos, sua função é estratégica e funciona nos bastidores, como dito anteriormente. Pela sua atividade, mesmo rentável, mas pouco glamorosa, a profissão vive um paradoxo existencial, ao mesmo tempo que é fundamental nas ações da atual conjuntura neoliberal, é uma atividade cada dia menos conhecida pelo grande público, fruto da soma entre ações planejada da própria atividade e da “rixa” entre jornalistas e ditadores da mídia, que diminuem a atividade de relações públicas num plano de carreira profissional, isso explica o baixo índice de ingressos nas faculdades de relações públicas atualmente. Vivemos a sociedade contemporânea do espetáculo, segundo Soares (2011) o real não tem existência positiva, o que existe é o abstrato, Debord (apud Soares 2011) confecciona a teoria de que o simbólico, o imagético tem mais presença real do que a própria realidade na sociedade do espetáculo, fazendo um paralelo com a atividade de Relações Públicas, que é a manutenção do imagético, ou da imagem institucional, para ser mais pontual, existe toda a congruência da ação e do campo de atuação, são essas as premissas que devem ser incorporadas dentro de uma graduação de Relações Públicas, o livre e desembaraçado abraço ao neoliberalismo que é o movedor maior da existência das relações publicas. Sobre a preocupação dos idealizadores das novas diretrizes acadêmicas, o trato continua quase que sem alterações, a atividade de relações públicas se vê circunscrita a um plano menor, envergonhando-se do seu imo manipulatório, a não ser uma leve preocupação com as novas tecnologias, uma preocupação pífia perto do movimento absoluto que domina o mundo e coloca a atividade de Relações Públicas como a ação mais aplicável de todos os tempos, Pierre Levy (1999) disse: Pela primeira vez na historia da humanidade, a maioria das competências adquiridas por uma pessoa no inicio de seu percurso profissional estarão obsoletas no fim de sua carreira (p. 127) A afirmativa de Levy (1999) não deixa dúvidas sobre o devir e a obsolescência de tudo, inclusive das atuais ferramentas de Relações Públicas, em suma, o que deve prevalecer numa diretriz curricular moderna, é o entendimento da totalidade em constante
mudança com uma consciência real do seu papel profissional nesse mundo neoliberal. Chomsky (2010) afirma que vivemos o estado empresário, e as ameaças a “prosperidade do sistema capitalista mundial” (Ibidem, p.24) devem ser extintas por meio da “construção de consentimento” (Ibidem, p.61) por meio do “controle da opinião pública” (Ibidem, p.61) este é o axioma neoliberal para a manutenção do controle e o do status quo, eis o que o egresso de relações públicas deve ter bem definido nas suas percepções de vida, de realidade e de mundo do trabalho. A academia de Relações Públicas deve estar vivendo sua maior crise existencial da história no Brasil, no início da vida acadêmica e profissional da atividade, suas finalidades estavam claras quando defendiam o sistema político militar, também fomentado pelo neoliberalismo imperialista, neste caso, pois teve o apoio norte americano, e nessa época, como visto no histórico da atividade, teve seu aparecimento nacional, e posteriormente com a entrada das empresas transnacionais seu crescimento e afloramento, e desde os anos 90, quando Kunsch (1997) nomeou de “conscientização” dos profissionais de da sociedade, a profissão não tem na sua vida acadêmica a explicitação dos objetivos capitais exibidos francamente. Relações públicas não foram feitas para o publico, é fruto de uma doutrina dominante, que ficou claramente expressa com a afirmativa do primeiro presidente do congresso continental e primeiro presidente da corte suprema, John Jay “As pessoas a quem o país pertence devem governá-lo”. (in Chomsky 2010, p.52) A academia de Relações Públicas não pode fugir da sua essência no momento da formação dos futuros profissionais, a da proteção dos interesses privados, a essência de uma atividade nascida e feita para o capitalismo, os assuntos e disciplinas que tratam da tecnologia, ou dos paradigmas tecnocratas, devem ser relegados à segunda instância, e o retorno à axiomática e inexorável essência de Relações Públicas deve ser preservada, o dos interesses capitais. Em suma, na atualização das diretrizes curriculares, uma modernização é pertinente, mas do jeito que se estruturou não terá um efeito perceptível, ou seja, mudanças que venham a promover uma mudança de conduta dos futuros egressos, tendo em vista que os problemas existenciais do curso continuam, o desmembramento do curso de Comunicação Social se funda pelo fato de ser muito diferente em seus fins do curso de Jornalismo, por exemplo, e para concluir a problemática do trabalho, a nova estrutura pedagógica que efetivamente produzirá os efeitos positivos esperados para atualizar o futuro profissional de relações publicas, a fim de se inserir num mercado de trabalho, movido pelo devir neoliberal, seria o aprofundamento no próprio mundo neoliberal. Uma resposta efetiva, seria o retorno às raízes das Relações Públicas, com o foco nos públicos e no paradigma do pós-modernismo, nessa temática se desenvolve as mudanças contemporâneas do comportamento coletivo, nas crises do subjetivo e na massificação coletiva, e assim esmiuçado o entendimento dessa nova cultura e dos novos comportamentos coletivos, aprimorar a arte de “gerir”, “gerenciar” ou como preferem os pragmáticos, “manipular” a opinião publica a fim de defender os interesses dos empregadores de Relações Públicas. REFERÊNCIAS ANDRADE, Candido Teobaldo de Souza. Curso de Relações Públicas, São Paulo, Atlas, 1970. BAUDRILLARD, J. Simulacros e Simulação, Lisboa. Relógio D’água. 1991; DOTY, D. I. Divulgação Jornalística & Relações Públicas. São Paulo, Cultura
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 39
NOTAS DE FIM
Editores. Associados, 1995
Frederico Fonseca Soares é mestre em Comunicação Social, possui especializações em Marketing, Filosofia, Metodologia do Ensino na Educação Superior e em Sociologia, é graduado em Relações Públicas e executivo de Relações Públicas da Construtora Veicon Ltda. E-mail frederico@construtoraveicon.com.br 1
FARIAS Luiz Alberto. A Literatura de Relações Públicas, São Paulo, Summus, 2004. FOUCALT, Michael. Vigiar e Punir, Petrópolis, Editora vozes. 1987; FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização, São Paulo, Imago. 1997
2
GRUNIG James. (ed.). Excellence in public relations and communication management. Hillsdale: Erlbaum Associates, 1992
3
Abreviação de Relações Públicas
Terminologia empregada pela pesquisadora em questão, para fins da intenção do trabalho, poderíamos renomear de “crise existencial” segundo a corrente filosófica existencialista.
LEVY, Pierre. Cibercultura, São Paulo, Editora 34. 1999; Compostas pelos seguintes pesquisadores: Margarida Maria Krohling Kunsch – Presidente, Cláudia Peixoto de Moura, Esnél José Fagundes, Márcio Simeone Henriques, Maria Aparecida Viviani Ferraz, Paulo Roberto Nassar de Oliveira, Ricardo Ferreira Freitas 4
LEVY, Pierre. Ciberdemocracia, Lisboa, Epistemologia e Sociedade. 2002; MARTINS, Francisco M. Impressões Digitais, Cibercultura, Comunicação e Pensamento Contemporâneo, Porto Alegre, Editora Sulina, 2008.
Segundo o business dictionary, os stakeholders são um grupo de pessoas ou empresas que tem ação direta ou indireta na organização, como por exemplo, os clientes, comunidade, empregados, governo, etc. Disponível em < http:// www.businessdictionary.com/definition/stakeholder.html> acesso em 21 de dezembro de 2010 às 18h34min 5
KUNSCH, M. M. K. Planejamento de Relações Públicas na Comunicação Integrada. São Paulo: Summus. 2003. _________.Comunicação integrada nas organizações modernas: avanços e perspectivas no Brasil. N: Comunicação para o mercado, instituições, mercado, publicidade. São Paulo: EDICON, 1995. ________. (Org.) Obtendo resultados com relações públicas. SOARES, Frederico Fonseca. O desejo de status para o marketing: uma reflexão filosófica. Brasilia: Filosofia Capital Ed. 6, 2011
6
Escola de negócios do Brasil
Disponível em <http://lista10.org/miscelanea/as-10-profissoes-com-futuro/> acesso dia 14 de fevereiro de 2011 às 18h41min 7
\
Tendo em vista as características neoliberais em relação às massas.
________. Relações públicas: um olhar sobre a inserção do profissional no mercado de trabalho belo-horizontino, Belo Horizonte: Tebas, 2009
40 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
O sensacionalismo acerca da morte do Cristiano Araújo nos Portais G1 e R7 Amanda Vitória Siqueira Tomaz1 Leonardo Coelho de Barros2 Samara Natália Tibúrcio3 Thales Rodrigues dos Santos4 Sônia Aparecida Martins Lazzarini5
RESUMO: O objetivo deste trabalho é questionar a ética no jornalismo sensacionalista e na forma em que foi explorada a morte do cantor sertanejo Cristiano Araújo pela mídia nos portais G1 e R7. Além de analisar as consequências desta abordagem da notícia destacando os meios e estratégias utilizadas para manipular os acontecimentos. Os portais causaram impacto na veiculação repetitiva da informação que acaba por ocupar o espaço de assuntos relevantes para a população. O sensacionalismo que está presente na comunicação há um longo tempo possui um público fiel e movimenta grande lucro. Cabe então a séria reflexão sobre em quem recai a responsabilidade desta transmissão, que busca exclusivamente atingir o maior número de pessoas. PALAVRAS-CHAVE: Sensacionalismo. Portais. G1. R7. Cristiano Araújo.
INTRODUÇÃO. O sensacionalismo é algo recorrente no meio jornalístico. Hoje tornou-se uma maneira de conquistar audiência para os fatos veiculados. Os assuntos se destinam ao público de massa e na maioria das vezes, ocupam o lugar de outras questões mais relevantes a população, como por exemplo, política e a situação econômica do país. O principal objetivo deste trabalho foi refletir as abordagens feitas pelos grandes portais da internet G1 e R7, de maneira sensacionalista na morte do cantor sertanejo Cristiano Araújo. Várias destas matérias continham alto teor de dramaticidade e que buscavam incansavelmente chocar o leitor. Diante da falta de novas informações, o conteúdo apresentado tornou-se em grande parte repetitivo. Cristiano Araújo foi além de cantor, um compositor do gênero conhecido como sertanejo universitário, nascido em Goiás. A sua morte em um acidente automobilístico na cidade de Goiânia, após a realização de um show, foi repercutida nos principais veículos de comunicação. Frequentemente este tipo de notícia é explorada ao máximo, portanto, percebeu-se a importância desse estudo. O objetivo deste trabalho é verificar a forma como os portais utilizaram o sensacionalismo em busca de audiência e repetição exacerbada das notícias para prender o leitor. Avaliar através das notícias que foram veiculadas, se foi ético a forma utilizada para divulgar o ocorrido. Nossas fundamentações teóricas foram principalmente a análise das reportagens dos portais G1 e R7 e de autores que estudam o sensacionalismo e ética. A comparação entre os portais também foi uma preocupação do trabalho, que analisa os estilos do G1 e do R7 na abordagem das notícias. Com isso, o trabalho se mostra de extrema relevância, pois além de abordar um tema importante e comparar dois grandes meios da comunicação analisa o material publicado sobre o cantor Cristiano Araújo e o motivo do assunto ter sido tão discutido. O SENSACIONALISMO NO JORNALISMO O sensacionalismo está presente em diversos veículos midiáticos, principalmente os mais populares. Com o passar do tempo o sensacionalismo tornou-se uma maneira de conquistar audiência
para os fatos veiculados. De acordo com o dicionário Aurélio Buarque “sensacionalismo é a Divulgação e exploração de matéria capaz de emocionar ou escandalizar”. Buarque (2000, p.790) Para Angrimani (1995) o sensacionalismo surge quando a notícia ganha um tom escandaloso, extrapolando a realidade. Todas essas definições convergem para alguns pontos comuns. Sensacionalismo é tornar sensacional um fato jornalístico que, em outras circunstâncias editoriais, não mereceria esse tratamento. Como o adjetivo indica, trata-se de sensacionalizar aquilo que não é necessariamente sensacional, utilizando-se para isso de um tom escandaloso, espalhafatoso. Sensacionalismo é a produção de noticiário que extrapola o real, que super dimensiona o fato. Em casos mais específicos, inexiste a relação com qualquer fato e a ―notícia‖ é elaborada como mero exercício ficcional. (ANGRIMANI, 1995, p. 10) Os assuntos se destinam ao público de massa e em muitas das vezes, ocupam o lugar de reportagens mais relevantes. As notícias são exibidas de maneiras exageradas, para aumentar a audiência dos veículos. Geralmente com temas insignificantes que não influenciam a sociedade em geral, além de envolver abordagens tendenciosas e de maneiras até desrespeitosas. Algumas estratégias utilizadas são abordagens emotivas, polêmicas e a omissão de fatos, quaisquer maneiras encontradas para prender a atenção popular. Assuntos relacionados a celebridades cobrem grande parte do material jornalístico atual. Uma incessante busca em expor a vida íntima de pessoas da mídia produzindo um material sem nenhuma relevância para o público em geral. Quando uma celebridade se envolve em algum tipo de acidente ou em situações trágicas o assunto é explorado de forma exacerbada em um ciclo interminável. A mídia produz celebridades para poder realimentar-se delas a cada instante em um movimento cíclico e ininterrupto. Até os telejornais são pautados pelo biográfico e acabam competindo com os filmes, novelas e outras formas de entretenimento. É uma Disneylândia de notícias, como se os redatores-chefes fossem Mickey Mouse e Pateta. (PENA, 2008, p. 235)
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 41
Acidentes nas estradas e crimes hediondos despertam um estranho interesse na população. De fato, essa forma de se fazer jornalismo movimenta um grande lucro para as empresas de comunicação. Entretanto cabe ao público refletir seriamente sobre o assunto, afinal, se existe quem produz é porque existe público consumidor. Será a população responsável por tais abordagens, ou a mídia que é a influenciadora? Esse era inclusive um dos questionamentos abordados por uma das teorias da comunicação, a chamada Teoria da Agenda Setting ou Agendamento. Formulada na década de 70 por Maxwell McCombs e Donald Shaw, a mesma refletia sobre o papel da mídia em pautar a opinião pública e escolher quais temas serão discutidos. Em consequência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público sabe ou ignora, presta atenção ou descura, realça ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas têm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu próprio conteúdo. Além disso, o público tende a atribuir àquilo que esse conteúdo inclui uma importância que reflete de perto a ênfase atribuída pelos mass media aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas. (SHAW APUD WOLF, 1995, p. 247) Com um jornalismo cada vez mais ágil devido a velocidade exigida pelos consumidores da internet as notícias, muitas das vezes são postadas quase que de forma instantâneas, podendo prejudicar sua qualidade. O primeiro jornal a ter sua versão online foi o The New York times, pois percebeu a necessidade de fazê-lo e atender um público ansioso por notícias mais rápidas e dinâmicas. De acordo com o livro, Deu no jornal do autor Álvaro Caldas o desafio do jornalismo é preservar seus valores, pois com o advento do jornalismo na web, a competição está cada vez mais acirrada. Caldas (2002, p. 27) Conteúdos chocantes promovem a curiosidade e movimenta o jornalismo que acaba por abusar de notícias com alto teor de dramaticidade.Segundo o neurologista André Palmini chefe de neurologia do hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul “Nosso cérebro é formado para se importar com outros seres humanos. É natural se colocar no lugar do outro e somos seduzidos por qualquer circunstância que ofereça essa oportunidade” . A forma que conhecemos hoje do sensacionalismo não é exata e há diferentes afirmações segundo Danilo Angrimani em seu livro Espreme Que Sai Sangue, porém um dos primeiros jornais que se parecem com o sensacionalismo atual são franceses, são os “nouvelles Ordinares” e gazette de France”. Esses jornais continham um teor fantasioso e de cunho sensacional que atraiam leitores. A partir disso até chegar nos dias atuais houve um longo caminho, as notícias foram se modificando e os meios utilizados para atrair público também. Angrimani (1995, p.151) A imprensa sensacionalista não se presta a informar, muito menos a formar. Presta-se básica e fundamentalmente a satisfazer as necessidades instintivas do público, por meio de formas sádicas, caluniadoras e ridicularizadoras das pessoas. Por isso, a imprensa sensacionalista, como a televisão, o papo no bar, o jogo de futebol, servem mais para desviar o público de sua realidade imediata do que para voltar-se a ela, mesmo que fosse para fazê-lo adaptar-se a ela.(ANGRIMANI, 1995, p.151) São diversos os casos em que a mídia abusa do seu poder para realizar matérias sensacionalistas. Nas situações extremas chegam até mesmo a ampliar fatos sem preocupar com a averiguação correta dos mesmos. Tudo isso em busca de público. Quando se trata de notícias envolvendo pessoas públicas a situação tende a agravar.
O leitor tende a se envolver mais com crimes chocantes, pessoas conhecidas, atentados ou quando envolve pessoas indefesas como crianças e idosos. A narrativa (sensacionalista) transporta o leitor; É como se ele estivesse lá, junto ao estuprador, ao assassino, ao macumbeiro, ao sequestrador, sentindo as mesmas emoções. Essa narrativa delega sensações por procuração, porque a interiorização, a participação e o reconhecimento desses papeis, tornam o mundo da contravenção subjetivamente real para o leitor. A humanização do relato faz com que o leitor reviva o acontecimento como se fosse ele próprio autor do que está sendo narrado. (ANGRIMANI, 1995, p. 151) Programas populares são notoriamente reconhecidos por explorar o sensacionalismo ao máximo, mas até mesmo jornais reconhecidos como formais, por vezes se rendem a notícia sangrenta e que causam extrema comoção. Isso ocorre quando fatos que por si só já são chocantes. Carlos Dorneles em seu livro Bar Bodega diz: “Se há uma fantasia maior, uma mentira mais poderosa, um mito mais vulgar, é o de que a imprensa só retrata”. DORNELES (2007, p.263). A morte do cantor e compositor Cristiano Araújo foi matéria principal nos principais veículos de comunicação. Nas semanas que se seguiram a sua morte reportagens apelativas e extremamente emocionais eram veiculadas diariamente, relembrando momentos do cantor, ou repetindo fatos que já não eram novos para o público. “[...] O Jornal sensacionalista transforma a morte em seu assunto de capa como se rendesse um culto diário e fetichizado a morte” Angrimani (1995, p.151) Cristiano Araújo era um cantor e compositor se enquadrava no chamado sertanejo Universitário. Estilo repaginado do já conhecido sertanejo, que mistura elementos country e atuais, como batida eletrônica. O cantor conversava com os jovens, por sua linguagem descontraída e falando sobre temas como festas, bebidas e diversão. Originário de Goiânia, já possuía um bom tempo de carreira e um público fiel ao seu trabalho. O ACIDENTE Na madrugada do dia 24 de junho de 2015, o sertanejo voltava de um show em Itumbiara no estado de Goiás, em direção à cidade de Goiânia onde residia. Durante o caminho, sofreu um acidente automobilístico na BR-153. Ele e sua namorada, Allana Moraes, estavam sentados no banco de trás de um SUV britânico da Range Rover, no carro também estava o motorista e o assessor do cantor. Por volta de três horas da manhã, na altura do KM 613, a solda da roda se rompeu, causando a perda de controle da direção. Araújo e sua namorada não usavam cinto de segurança e foram arremessados com o impacto da batida. O motorista e o assessor que usavam cinto tiveram apenas ferimentos leves. Quase que instantaneamente após o acidente, a notícia tomou conta das principais programações matutinas surgindo primeiro nos portais, informando que a namorada do cantor havia falecido no local e que Cristiano Araújo estava em estado de saúde muito grave. Depois de uma hemorragia interna, o cantor foi a óbito. Assim que declarada a sua morte, de imediato a impressa começou a explorar o fato. Vários meios de comunicação dedicaram grande atenção a tragédia, dentre eles, a internet. O que chama atenção foi a cobertura dos portais G1 e R7, que são derivados de dois canais de TV aberta. O portal de notícias G1 pertence ao grupo Globosat e é o portal de notícia da rede Globo. Já o R7 é o portal de notícias da rede Record, que é concorrente da Globo na TV aberta. É notável que comunicação vem passando por várias transfor-
42 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
mações, uma delas é o avanço cibernético, e nota-se a necessidade que o jornalismo encontrou de acompanhar estes avanços. Esse novo cenário começou na década de 90, quando os primeiros portais de notícias foram criados, mais adiante os blogs foram ganhando espaço entre as mídias de informação e atualmente, as redes sociais refletem de maneira considerável no que tem sido veiculado como notícia, chamado webjornalismo que desde o seu surgimento já passou por diversas mudanças. Após dez anos de webjornalismo e apesar de tratar-se de fenômeno ainda recente, a reflexão sobre a matéria já demanda atualizações em virtude do novo cenário tecnológico. Podese inclusive arriscar dizer que o webjornalismo não é mais o mesmo. (PRIMO, 2006, p. 42) O receptor, público ao qual a informação se dirige, tornou-se um participante mais ativo, auxiliando fundamentalmente na produção da notícia na web. Mais do que nunca o expectador, além de acessar a notícia na internet, ele pode se posicionar facilmente quebrando qualquer dificuldade existente de interação entre o que escrevia no jornal impresso ao que agora está apenas do outro lado da tela. O produtor
nunca esteve tão próximo do consumidor, estabelecendo uma relação direta com o leitor cativando usuários frequentes e participativos. No entanto, o avanço acelerado da tecnologia e da internet, acarretou alguns erros, já que com a rapidez das informações e a pressa que o jornalista tem de soltar a notícia em primeira mão, faz com que não haja uma análise profunda na reportagem. A velocidade com que é noticiado na internet e como são feitas as divulgações nas redes sociais, contribuíram para que os portais fossem o meio que mais publicou sobre a morte do cantor. Visto que, na internet, as postagens buscam principalmente transmitir a informação primeiro que os concorrentes e sempre atualizar essas informações, gerando uma quantidade desnecessária de abordagens, que na maioria das vezes não foram confirmadas, apenas para não deixar o assunto acabar. As reportagens da tragédia de Araújo tiveram um tom sensacionalista tanto na televisão quanto em outros veículos, viés editorial que rende alta audiência. Na guerra pela atenção do público, a internet se destacou reunindo elementos como o uso exagerado de expressões descrevendo a carreira interrompida do cantor, a juventude das duas vítimas, a declaração do noivado ressaltando a relação do casal, as investigações policiais e perícias médicas.
Figura 1: Matéria G1 A Figura 1 exemplifica a exploração do sentimento da família pelo portal G1 em sua notícia publicada no dia 24/06/15. Fonte: http://g1.globo.com/goias/musica/noticia/2015/06/pai-chora-morte-do-cantor-cristiano-araujo-sera-que-deus-existe.html
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 43
Figura 2: Matéria R7 Fonte: http://entretenimento.r7.com/pop/equipe-de-cristiano-araujo-nega-briga-com-a-familia-pela-heranca-do-cantor-07072015
A Figura 2 demonstra o sensacionalismo na utilização de informações paralelas e irrelevantes ao fato pelo portal R7, matéria publicada em 07/07/15 na página de entretenimento. Numa época de transição do jornalismo e exploração de novas maneiras e métodos para fazer notícia, a forma como os portais utilizaram-se para escrever as matérias, continham técnicas simplórias, comuns e até muito repetitivas para manter o acidente de Araújo em pauta. Esta sensação de profundo pesar provocada pelas imagens e pelo texto, não salientavam o ocorrido em si, mas os elementos que permeavam o acidente e a vida pessoal das vítimas. “[...] embrulhou a tragédia em papel de presente, com valores-notícias usados de propósito para configurar o show business e manter o assunto na parada sucesso: romance, poder, dinheiro, fama, violência, destruição e morte.” (JORGE, 2008, p. 73) Estas técnicas usadas há anos são exemplificadas nas imagens e vídeos que compunham as matérias, evidenciado o estado
do veículo após o acidente, cenas dos shows do cantor e trechos de suas músicas, como também os depoimentos médicos detalhando as lesões que levaram a morte de Araújo e o luto das duas famílias. Juntamente menção massiva da morte do cantor nos portais, as redes sociais reforçavam a pauta. Logo os fãs de Cristiano Araújo se expressaram nas redes sociais, principalmente pelo Twitter, desconstruindo até a maneira como alguns veículos apresentaram-no como um desconhecido. Podemos até dizer que aumentou a maneira de nos envolvermos com o noticiário; antes, muitos apenas comentavam em pequenas rodas; hoje, no Twitter, a roda cresce na proporção de quem acompanha as opiniões sobre os fatos noticiados, seja replicando uma informação (seguida de seu link) ou reforçando uma opinião, ou mesmo divulgando um fato como forma de disseminar a informação, principalmente aquele de última hora, ou melhor, de último minuto, própria da internet. (PRADO, 2011, p. 199)
44 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Figura 3: Matéria G1 Fonte: http://g1.globo.com/goias/noticia/2015/07/policia-conclui-inquerito-e-indicia-3-por-videos-do-corpo-de-cristiano-araujo.html
Em meio a comoção, surge um fato novo envolvendo o aplicativo de mensagens WhatssApp. Alguns dias após confirmação da morte de cantor surgiram fotos e vídeos, que no mínimo, eram invasivas e desrespeitosas. Foi compartilhado no aplicativo, fotos de cantor morto no necrotério e um vídeo da autópsia do corpo sendo aparentemente preparado para o funeral. A Figura 3 noticia a conclusão da investigação policial e punição aos autores da filmagem que expõe o cantor. A revolta da massa em torno da divulgação do vídeo foi tão
grande que fez a polícia civil do estado de Goiás iniciar um inquérito para investigação. Os funcionários que gravaram e divulgaram o vídeo foram rapidamente identificados, sabe-se que trabalhavam na clínica oeste de Goiânia e foram indiciados por crime de vilipêndio de cadáver segundo reportagem do G1. Os funcionários identificados através do próprio vídeo foram rapidamente demitidos. A família do cantor entrou com um processo contra os dois funcionários por conta da gravação e veiculação da imagem do corpo de Cristiano Araújo.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 45
Figura 4: Matéria R7 http://noticias.r7.com/videos/tragedia-video-mostra-as-ultimas-palavras-de-cristiano-araujo/idmedia/558c00ca0cf2920f78ea77ad.html
A Figura 4 exibe as ultimas palavras publicadas no portal R7, mostrando o cantor Cristiano Araújo sendo levado pela equipe médica após o acidente. O Código de Ética dos Jornalistas brasileiros, no artigo 6° número 8 diz que “é dever do jornalista respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão”. Mostrar o vídeo dos últimos momentos do Cristiano Araújo, como fez, por exemplo, o R7 na
matéria do dia 25 de junho de 2015 um dia após a sua morte coloca em dúvida princípios básicos da ética jornalística. O vídeo não é de nenhuma relevância ao público, apelando apenas o lado sentimental e não traz informação ou qualquer fato que valha a pena para possíveis investigações do acidente. Nos programas em que foi explorado o vídeo, foram adicionadas técnicas sentimentais e melodramáticas através de músicas de fundo, narração teatral e recursos estéticos que
46 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
aumentam o teor melancólico do fato. O vídeo mostra apenas o socorro sendo prestado ao cantor e suas palavras “Ai, está doendo demais”. “O sensacionalismo exige acesso ao inconsciente. Utiliza todos os recursos das linguagens disponíveis para a fusão do público com a história relatada.” (ANGRIMANI, 1995, p. 108) O Código de Ética de Jornalistas tem em seu conteúdo, no artigo 2 que o “jornalista não pode divulgar informações de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes!”. Nitidamente que não foi respeitada neste contexto. O vídeo foi uma produção caseira, o que mostra a busca constante de registro desse tipo de evento também por parte da população. A imprensa se aproveitou da gravação realizada para desenvolver ainda mais o assunto de forma sensacional. CONCLUSÃO A partir das veiculações dos portais G1 e R7 sobre a morte de Cristiano Araújo, concluímos que há uma extrema banalização na produção das matérias jornalísticas que utilizam do sensacionalismo em busca de audiência. Mesmo tratando-se de empresas diferentes, as notícias foram construídas de maneira idêntica, colocando em dúvida a ética jornalística. Encoberto pelo acidente, outras verdades tornaram-se evidentes, um público cada vez mais inteirado e conectado, capaz de construir seus próprios ícones. Uma sociedade apressada pela vida moderna que se esquece as vezes, de si mesma, mas que acompanha a todo instante as tendências e acontecimento que permeiam o presente momento.
DORNELES, Carlos. Bar bodega: um crime de imprensa. São Paulo: Globo, 2007. 263 p. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Aurélio. 4.ed. RIO DE JANEIRO: Nova Fronteira, 2000. 790 p. JORGE, Taís de Mendonça. Manual do foca: guia de sobrevivência para jornalistas. São Paulo: Contexto, 2008. LOIOLA, Rita. O que atrai nos vídeos violentos? – 2014. Disponível em: <http:// veja.abril.com.br/noticia/ciencia/o-que-atrai-nos-videos-violentos/ >. Acesso em: 28 set. 2015. PENA, Felipe. Teoria do jornalismo. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2008. 235 p. PRADO, Magaly. Webjornalismo. Rio de Janeiro: LTC, 2011. 241 p. PRIMO, A.; TRÄSEL, Marcelo Ruschel. Webjornalismo participativo e a produção aberta de notícias. In: VIII Congresso Latino-americano de Pesquisadores da Comunicação, 2006, São Leopoldo. Anais, 2006. WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. 4. ed. Lisboa: Presença, 1995 247 p.
NOTAS DE FIM Aluna da escola de Comunicação- Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva, email: amanda.vitoria94@yahoo.com 1
Aluno da escola de Comunicação- Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva, email:leo_zetta@hotmail.com 3 Aluna da escola de Comunicação- Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva, email:samara-esmeralda@hotmail.com 2
4 Aluno da escola de Comunicação- Curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton Paiva, email:thalesrdossantos@hotmail.com
REFERÊNCIAS AGRIMANI, Danilo. Espreme que sai sangue: um estudo do sensacionalismo na imprensa. 1.ed. São Paulo: Summus, 1995. 151 p. CALDAS, Álvaro. Deu no jornal: o jornalismo impresso na era da internet. 2.ed. RIO DE JANEIRO: PUC-Rio, 2002. 208 p. Código de ética dos Jornalistas Brasileiros – 207. Disponível em: <http://www. fenaj.org.br/federacao/cometica/codigo_de_etica_dos_jornalistas_brasileiros. pdf>. Acesso em: 28 set. 2015.
5
6
Orientadora do trabalho, email: sonia.martins@newtonpaiva.br http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/o-que-atrai-nos-videos-violentos/
O Código Penal Brasileiro configura vilipêndio como crime em seu artigo 212, o ato de insultar, ofender, difamar o cadáver ou suas cinzas. 7
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 47
O JORNALISMO E A NARRATIVA TRANSMÍDIA: o caso Post CPJ Izamara Barbosa Arcanjo Ferreira Silva1
RESUMO: Este texto relata o trabalho desenvolvido para a criação da plataforma multimídia Post CPJ do curso de Jornalismo, do Centro Universitário Newton e faz reflexões sobre as possibilidades de aplicação do conceito de narrativa transmidia, proposto, por Henry Jenkins, ao Jornalismo experimental praticado ao longo de um projeto de extensão universitária. O trabalho traz algumas conceituações iniciais sobre o jornalismo e a transmedia storytelling ou narrativas transmidiáticas, bem como descreve a trajetória percorrida por alunos e professores durante a elaboração da primeira edição do projeto multiplataformas no segundo semestre de 2015. . PALAVRAS-CHAVE: Narrativa transmidiática. Jornalismo. Extensão
INTRODUÇÃO Este artigo é resultado do projeto de extensão intitulado Post CPJ, realizado pela Central de Produção Jornalística (CPJ) da Escola de Comunicação, em pareceria com o Núcleo de Publicações (NPA), do Centro Universitário Newton Paiva. Os objetivos deste relato são divulgar o trabalho desenvolvido pelo Post e proporcionar algumas reflexões sobre as condições de acesso dos alunos do ensino superior de Comunicação Social à prática exterior à sala de aula por meio da extensão universitária. Também é objetivo discutir o conceito de narrativa transmidiática ou transmedia storytelling, uma vez que foi este quadro teórico que norteou todo o processo produtivo do projeto de extensão ao longo do segundo semestre de 2015. A relevância do projeto de extensão se assenta no fato de que ele é uma das principais estratégias para uma boa formação de nível superior conforme prevê a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. A importância da extensão também é reforçada pelas Diretrizes Curriculares da Comunicação Social, que se apoiam na realização de atividades complementares, voltadas para ações que permitam o alargamento das experiências e da formação profissional e intelectual dos discentes. É nesse sentido, que o projeto pedagógico do Curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, do Centro Universitário Newton Paiva destaca a importância do conhecimento amplificado da realidade social, das questões pertinentes ao campo da Comunicação, sempre de maneira inovadora e por meio da extensão. Pensando neste conjunto de diretrizes é que foi criado no dia 21 de setembro de 2015, o projeto transmidiático Post CPJ. A proposta é proporcionar aos alunos da graduação a discussão e a prática de um novo modelo de Jornalismo, bem como oferecer aos bolsistas e aos voluntários do projeto a oportunidade de participarem e atuarem no processo de produção de conteúdo para as novas mídias a partir do conceito de transmidia. Ao todo, 13 acadêmicos ajudaram a consolidar inicialmente o projeto, sendo 10 estagiários, 02 voluntários e um professora orientadora, além equipe de designer gráfico do Núcleo de Produções Acadêmicas (NPA), do Centro Universitário Newton. A relevância do projeto se justifica por ele representar uma das possibilidades de ampliar as perspectivas de atuação dos alunos do curso, levando-os a uma visão abrangente do Jornalismo, em que tecnologia e teoria se conjugam. Orientados por essa lógica, o grupo passou a coletar dados com profissionais que atuam no mercado de trabalho com mídias digitais
e a fazer pesquisas bibliográficas que ajudaram na reflexão sobre o jornalismo tramidiático. A metodologia de pesquisa e as discussões teóricas culminaram na criação da plataforma digital Post CPJ. Integram a Post CPJ, o jornal The Post, links para Podcasts (áudio), bem como para o YouTube (vídeos) e demais mídias sociais entre elas: Facebook, Twitter, Flicker e Instagram. Uma parte importante e responsável por consolidar o caráter extensionista do jornalismo desenvolvido para a plataforma, é a seção intitulada “Vox Print” dedicada às notícias da regional Noroeste (região da cidade de Belo Horizonte, na qual se encontra localizado o Centro Universitário Newton). O objetivo dessa seção é interagir com a população que vive na região que circunda o campus universitário, ouvir suas demandas e fazer com que os alunos encontrem alternativas de atuação na sociedade, valorizando sempre seu papel de intermediadores das informações que circulam nos vários contextos, a partir de posturas éticas compromissadas com a cidadania. AS TECNOLOGIAS DIGITAIS E O PROCESSO DE PRODUÇÃO JORNALÍSTICA A cultura digital expandiu enormemente as possibilidades de comunicação, sobretudo, aquelas ligadas ao campo do Jornalismo. Já no fim do século passado, os pesquisadores Levi (1999) e Castells (1999) já indicavam uma nova forma de cultura mediada pela internet. Foi o que Lévy denominou inicialmente de cultura do ciberespaço ou cibercultura: O ciberespaço (que também chamarei de “rede”) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo especifica não apenas a infraestrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo “cibercultura”, especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço. (LEVY,1999, p. 17) Castells (1999) também já preconizava a existência de uma cultura da virtualidade real, que ocorre pela integração das novas tecnologias com a comunicação eletrônica, a restrição a uma audiência massiva e o surgimento das redes interativas. Para o autor, o aspecto multimídia das novas tecnologias transforma as experiências humanas de perceber e criar simbolicamente o mundo. “Nossos meios
48 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
de comunicação são nossas metáforas. Nossas metáforas criam o conteúdo da nossa cultura. Como a cultura é mediada e determinada pela comunicação, as próprias culturas, isto é, nossos sistemas de crenças e códigos historicamente produzidos são transformados de maneira fundamental pelo novo sistema tecnológico e o serão ainda mais com o passar do tempo. ” (CASTELLS, 1999, p. 414) Com a cultura digital, surgem novas formas de sociabilidade e novas possibilidades de criação e de modificação de práticas jornalísticas. Mas seria possível aplicar ou incorporar conceitos desenvolvidos para outras áreas, como, por exemplo, os pensados para as narrativas de ficção e voltadas para o entretenimento, à prática da atividade jornalística? E como trabalhar com alunos a informação nas múltiplas plataformas oferecidas pela cultura digital? Nas perspectivas dos estudos de Jornalismo, tal tarefa nos pareceu possível e necessária, principalmente quando levamos em consideração que o jornalismo é, para Lage (2011), uma prática social que decorre da evolução da sociedade e consequente fragmentação de conhecimentos e funções da vida social. Segundo o autor, jornalismo como conhecemos só se torna possível mais de 50 anos depois da invenção da imprensa, quando a burguesia ascendente utiliza periódicos para difundir seu projeto de poder contra a nobreza e os estados aristocráticos europeus. No conceito amplo, que os críticos chamam de neutro, jornalismo é atividade de natureza técnica caracterizada por compromisso ético peculiar. O jornalista deve saber selecionar o que interessa e é útil ao público (o seu público, o público-alvo); buscar a associação entre essas duas qualidades, dando à informação veiculada a forma mais atraente possível; ser verdadeiro quanto aos fatos (verdade, aí, é a adequação perfeita do enunciado aos fatos, e fiel quanto às ideias de outrem que transmite ou interpreta; admitir a pluralidade de versões para o mesmo conjunto de fatos, o que é um breve contra a intolerância; e manter compromissos éticos com relação a prejuízos causados a pessoas, coletividades e instituições por informação errada ou inadequada a circunstâncias sensíveis. (LAGE, 2011, p. 3) O jornalismo, na medida em que acompanha o florescimento de uma sociedade cada vez mais técnica e com economia complexa, coopera com a criação de um repertório sócio-político-econômico que localiza os indivíduos na esfera social. Neste processo, as redes sociais também colaboram, imensamente para a mudança na estrutura e na prática jornalística. Para a pesquisadora Raquel Recuero, “redes essas constituídas por representações de atores sociais e suas conexões, e que podem ser comparadas a um bate papo como canal de comunicação, utilizado para expressão de sentimentos e ideias, manifestações e movimentos no meio digital”. (RECUERO, 2009, p.3) De acordo com Recuero (2009), as redes sociais podem ser definidas como um ambiente onde as pessoas podem se reunir publicamente mediadas pela tecnologia. Para a autora, são características destes espaços: a persistência, uma vez que a informação publicada na rede permanece no ciberespaço; a capacidade de busca, já que as redes sociais permitem que informações e pessoas sejam encontradas; a replicabilidade, que diz respeito ao fato de que as informações publicadas na rede podem ser republicadas por outras pessoas. A PERSPECTIVA TRANSMIDIÁTICA Um dos conceitos que também ajudou a nortear o trabalho com a plataforma Post CPJ foi o de transmidia, desenvolvido inicialmente
por Henry Jenkins. O termo transmídia foi utilizado por Jenkins pela primeira vez em 2003, em um artigo publicado na revista Technology Review. Anos depois, o conceito foi revisado e difundido no Brasil por meio da edição do livro Cultura da Convergência. Uma história transmidiática se desenrola através de múltiplos suportes midiáticos, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal de narrativa transmidiática, cada meio faz o que faz de melhor – a fim de que uma história possa ser introduzida num filme, ser expandida pela televisão, romances e quadrinhos; seu universo possa ser explorado em games ou experimentado como atração de um parque de diversões. Cada acesso à franquia deve ser autônomo, para que não seja necessário ver o filme para gostar do game, e vice-versa. Cada produto determinado é um ponto de acesso à franquia como um todo. (JENKINS, 2008, p. 135). Muitas vezes, o termo transmidia é confundido com convergência, mas para o autor, “a convergência representa uma transformação cultural, à medida que consumidores são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em meio a conteúdos midiáticos dispersos” (JENKINS, 2008, p. 28). De maneira muito embrionária e sucinta, optou-se por adotar neste texto a perspectiva de Jenkins (2008). Para o autor, a narrativa transmidiática é a narrativa fragmentada (ou distribuída) em diversas mídias, porém, não sendo estes fragmentos interdependentes entre si. Assim como Jenkins, o pesquisador Carlos Alberto Scolari em um artigo de 2009, intitulado: Transmedia Storytelling:Implicit Consumers, Narrative Worlds, and Brandingin Contemporary Media Production afirma que a narrativa transmidia é: […] a particular narrative structure that expands through both different languages (verbal, iconic, etc.) and media (cinema, comics, television, video games, etc.). TS is not just an adaptation from one media to another. The story that the comics tell is not the same as that told on television or in cinema; the different media and languages participate and contribute to the construction of the transmedia narrative world. This textual dispersion is one of the most important sources of complexity in contemporary popular culture. (SCOLARI, 2009) De acordo com a citação, Scolari (2009) define narrativa transmídia como uma estrutura que se expande por meio de diferentes linguagens entre elas as verbais, icônicas, textuais e de mídias como o cinema, quadrinhos, televisão jogos, etc. Para ele, a história que o quadrinho conta não é a mesma contada pelo cinema ou pela a televisão. As diferentes mídias e linguagens participam e contribuem para a construção da narrativa. As histórias se complementam em cada plataforma e fazem sentido de maneira distinta. Scolari (2011) defende ainda a utilização do conceito no universo da informação jornalística. “Creio que chegou o momento de expandir a perspectiva analítica e incorporar em nossos estudos transmidiáticos outras tipologias discursivas que vão desde discursos publicitários até o jornalístico, passando pelo político e pelo gênero documental” (SCOLARI, 2011). O autor destaca duas vertentes principais da narrativa transmidia que podem ser aplicadas à prática jornalística. Na primeira, a narrativa é relatada a partir de várias plataformas: ao contrário da narrativa, chamada por ele, monomidiática, ela começa em um meio e continua em um outro ou em vários outros. O enunciado narrado aproveita o melhor de cada meio para se ampliar. Em uma segunda perspectiva, Scolari (2011) revela que a construção da narrativa é co-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 49
laborativa, ou seja, gera a produção de informação de baixo para cima e não apenas de cima para baixo. Podría decirse que el periodismo cumple las dos condiciones que caracterizan a las narrativas crossmedia: estamos en presencia de una historia que se cuenta a través de varios medios (web, RSS, blogs, radio, televisión, prensa impresa, etc.) y a su vez está enriquecido con los aportes de los usuarios (blogs, comentarios, tweets, llamadas telefónicas, cartas al editor, etc.) (SCOLARI, 2011) O CONCEITO DE NARRATIVA TRANSMIDIA APLICADO AO PROJETO POST CPJ As perspectivas teóricas propostas por Jenkins (2008) e Scolari (2009, 2011) foram as adotadas na implantação do projeto de extensão universitária Post CPJ. Ao longo do projeto, os alunos trabalharam com os ambientes jornalísticos tradicionais dentre eles, o telejornalismo, fotojornalismo, radiojornalismo e, com o mais recentemente deles, o chamado jornalismo digital, especialmente aquele que produz e circula informações para blogs, podcasts, e redes sociais, como o Youtube, Facebook, Twitter, Instagram, etc. O projeto de extensão Post CPJ foi desenvolvido juntamen-
te com a equipe de designer do Núcleo de Produções Acadêmicas (NPA), na plataforma WordPress. A WordPress é uma plataforma de conteúdo para publicação pessoal. É ao mesmo tempo um software livre e gratuito. De acordo com informações do site da própria WordPress, “ela é hoje a maior plataforma de gerenciamento de conteúdo do mundo, com quase 70% do mercado”. A perspectiva do grupo de trabalho era que fosse construída uma interface inicial que evidenciasse qual a proposta editorial do Post CPJ: trabalhar com o jornalismo de forma não-linear, de maneira que as informações se complementassem nos múltiplos ambientes midiáticos. Assim, foram criados espaços específicos no topo da plataforma para os variados espaços midiáticos, entre eles o vídeo, áudio, fotos e a linguagem textual. A partir de uma perspectiva visual, pode-se dizer que o portal Post CPJ conta com design clean, navegação intuitiva e responsiva. A navegação responsiva refere-se a uma funcionalidade que vem se tornando obrigatória, dada necessidade dos sites em adaptarem-se às telas de smartphones. Ainda com relação ao visual da plataforma, pode-se ver na Fig.1 que a interface abusa de fotos grandes para chamar a atenção do destinatário da informação.
FIGURA 1 – Foto da página inicial da plataforma Post CPJ FONTE: npa.newtonpaiva.br/post
50 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
FIGURA 2 - Centro da página inicial da plataforma FONTE: npa.newtonpaiva.br/post/
Na Fig.2, percebe-se que os ícones no centro da página inicial tornam a navegação rápida, guiando o visitante às áreas de maior relevância ou às áreas que os produtores de conteúdo desejam destacar. Também foram distribuídas ao longo da plataforma abas que delimitam o tipo de temática com as quais os alunos traba-
lham os conteúdos informacionais. Neste ponto, a divisão temática nos remeteu à separação dos temas por editorias, como ainda é feito no jornalismo impresso. Optou-se por editorias mais genéricas como: cotidiano, cultura, política, ensaio fotográfico, dentre outras.
FIGURA 3 – Editorias utilizadas pela plataforma Post CPJ FONTE: npa.newtonpaiva.br/post/
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 51
Todos os alunos envolvidos na produção dos conteúdos redigem seus textos e postam suas fotos diretamente no blog que faz parte das mídias que compõem a plataforma. Já as reportagens em áudio são todas disponibilizadas na mídia Soundcloud, e os vídeos e reportagens com imagens, no Youtube. O trabalho é desenvolvido integralmente pelos alunos e revisado e editado pela professora orientadora. Para efeito de análise neste artigo, vamos abordar um tema em especial tratado na primeira versão da Post que foi a cobertura jornalística feita pelos alunos estagiários durante o FIQ – Festival Internacional de Quadrinhos de 2015. O FIQ foi realizado na cidade de Belo Horizonte entre os dias
11 de 15 de novembro. Ao todo, foram mobilizados cinco alunos estagiários para a cobertura. Cada um dos alunos tinha uma função distinta no processo, mas ao mesmo tempo, tinham também a tarefa de desenvolverem uma narrativa jornalística que se complementasse ao longo de pelo menos três ambientes midiáticos distintos. Os alunos se concentraram na cobertura para o impresso, vídeo, áudio e material para mídias sociais. Para o impresso, o jornal The Post, optaram para uma matéria curta com cerca de 800 caracteres, na qual destacaram a presença marcante de jornalismo em forma de quadrinhos e os muitos jornalistas presentes no Festival.
FIGURA 4 - Página da reportagem impressa do FIQ FONTE: npa.newtonpaiva.br/post/
52 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Para a reportagem em vídeo, que foi postada em um canal do Youtube acessado via plataforma, foi escolhida uma nova abordagem: a repórter Amanda Vitória abre a narrativa fazendo um convite para que o público visite o festival. No texto, a repórter apela para as personagens em quadrinhos e deixa explícito que vai abordar toda a diversidade cultura presente no festival, conforme revelam os fragmentos da reportagem destacados:
“Batman, Homem Aranha, Mulher Maravilha, todos os heróis reunidos aqui na nona edição do FIQ, em Belo Horizonte, um dos eventos de quadrinhos. Você não vai querer ficar de fora, vai? ”(POST CPJ, 2015) . “ O evento reuniu os amantes de HQ artistas de vários locais do Brasil e do mundo” (POST CPJ, 2015)
FIGURA 5 – Repórter Amanda Vitória na cobertura do FIQ FONTE: npa.newtonpaiva.br/post
Ao longo da matéria, vários outros personagens reais também são mobilizados pela repórter. Podemos destacar entre eles um designer gráfico e um publicitário, além de um quadrinista e um estudante. Todos foram unânimes em ressaltar a pluralidade do festival, bem como o caráter independente da mostra, conforme os fragmentos retirados das falas destes personagens relacionados a seguir: Designer: “Essa parte dos independentes é o coração do evento, a melhor parte de um bom evento de quadrinhos”. (POST CPJ, 2015) Publicitário: “O que mais eu sou fã da produção deste mundo independente é o Marcate, que está aqui também, que sempre apa-
rece em todos estes eventos”. (POST CPJ, 2015) Estudante: “Tô achando que este ano está muito legal, eles aumentaram a mesa dos quadrinhos independentes e eu acho isso muito interessante, porque é o que eu busco hoje vindo ao FIQ”. (POST CPJ, 2015) No podcast, criado pelo repórter Daniel Silva, o estagiário retoma o tema da diversidade e adota como foco central da reportagem sobre o FIQ as dificuldades dos jornalistas em se especializarem no universo dos quadrinhos. Entre os entrevistados de Daniel Silva, estão os jornalistas Thales Rodrigues e o chargista mineiro Duke. Confira a Fig. 6.
FIGURA 6 – Imagem do podcast com entrevista exclusiva para a plataforma Post CPJ FONTE: npa.newtonpaiva.br/post
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 53
A análise da produção nos três ambientes midiáticos (impresso, vídeo e áudio) não reflete nenhuma hibridação ou miscigenação de gêneros jornalísticos. Percebe-se, porém, uma complementariedade entre os conteúdos, mas sem deslocamentos bruscos das principais características dos ambientes estudados. CONSIDERAÇÕES FINAIS No portal Post CPJ, o conteúdo informacional é apresentado de forma complementar no âmbito da televisão, do rádio e do jornal impresso e das mídias digitais. Entretanto, trata-se de um processo integrado no qual cada meio contribui com suas especificidades para a produção conjugada da informação. Concebido para ser um projeto voltado à criação, produção e veiculação de notícias digitais em multiformatos, elaborados a partir de conteúdos variados, a plataforma Post CPJ acabou se transformando em um eficiente instrumento capaz de desenvolver diversas habilidades nos estudantes de graduação em Jornalismo, um dos objetivos propostos pelos projetos de extensão universitária. Percebeu-se que a produção dos textos, as pesquisas realizadas para a elaboração dos conteúdos, o domínio das técnicas de produção, o desenvolvimento da linguagem oral e icônica ampliou o horizonte dos discentes para fora da sala de aula. Percebeu-se ainda que é possível aplicar o conceito de transmidia ao Jornalismo, uma vez que a produção dos textos, a elaboração dos conteúdos e os variados recursos tecnológicos empregados mobilizaram variadas instâncias midiáticas conectadas digitalmente e acabaram por consolidar, o que na versão de Scolari (2011), pode ser considerado o jornalismo transmidia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CASTELLS, M. A Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999. JENKINS, Henry. Transmedia storytelling. Moving characters from books to films to videogames can make them stronger and more compelling. Technology Review, 15 jan. 2003. Disponível em: http://www. technologyreview.com/biotech/13052. Acesso em: 11 jan.2015.
_______. The Aesthetics of Transmedia: In Response to David Bordwell (Part One). Disponível em: http://henryjenkins.org/2009/09/the_ aesthetics_of_transmedia_i.html. Acesso em: 19 de fev de 2015. LAGE, Nilson. Conceitos de jornalismo e papéis sociais atribuídos aos jornalistas. 2011. Disponível em: http://www.revistas2.uepg.br/files/journals/26/articles/6080/submission/copyedit/6080-19133-1-CE.pdf LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. RECUERO, Raquel. Deu no Twitter, alguém confirma? – Funções do Jornalismo na Era das Redes Sociais. In: 9º Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, 2011, Rio de Janeiro, Anais... Rio de Janeiro: UFRJ, 2011. ______ Redes Sociais na Internet, Difusão de Informação e Jornalismo: elementos para discussão. In: SOSTER, Demétrio de Azeredo; FIRMINO, Fernando. (Org.). Metamorfoses jornalísticas 2: a reconfiguração da forma. Santa Cruz do Sul, UNISC, 2009. SCOLARI, Carlos A. Hipermediaciones: elementos para uma teoria de la comunicación digital interactiva. Barcelona, España, Editorial Gedisa, 2008. _______. Narrativas Transmidiáticas: mundos de ficción y prosumidores en la ecología de los médios. 2010. Disponível em: http://www.slideshare.net/cscolari/02-transmedia. Acesso em: 13 mar.2016. _______. Transmedia storytelling: más allá de la ficción. 2011. Disponível em: http://hipermediaciones.com/2011/04/10/transmedia-storytellingmas-allade-la-ficcion/. Acesso em: 14 mar. 2016.
NOTAS DE FIM Mestre em Linguística pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e docente da Escola de Comunicação do Centro Universitário Newton Paiva. Também é pesquisadora da mesma Instituição onde desenvolve, juntamente com alunos bolsistas, o projeto “Jornalismo e Memória Discursiva: a construção de uma narrativa sobre a cidade de Belo Horizonte no acervo “Memória do Jornalismo Mineiro”. Foi a responsável pela criação e implantação do projeto de extensão Post CPJ no segundo semestre de 2015. 1
2
Informação audiovisual disponível em: www.npa.newtonpaiva.br/post
3
Ibdem
_______. Cultura da convergência. Tradução: Susana Alexandria. São Paulo: Aleph, 2008.
54 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
ANALFABETISMO FUNCIONAL: um quadro passível de ser revertido Matheus Vargas de Souza 1 Gleides Ander Nonato2
RESUMO: Este trabalho contempla as definições do analfabetismo funcional e faz sugestões de como reverter este quadro em sala de aula. Objetiva-se por oferecer a articulação e proposição de medidas para os professores de Língua Portuguesa da Educação Básica alguns indicativos de como trabalhar em sala de aula a produção textual. Utilizou-se pesquisa de revisão bibliográfica, tendo como centro principal uma das obras de Foucault (1996) para traçar um paralelo entre a ordem do discurso e o objeto de estudo: as interferências do analfabetismo funcional nos anos finais da Educação Básica. Para as conceituações dos termos analfabetismo funcional, letrado, letramento e literacy, fez-se necessário recorrer aos estudos de Soares (2009) e Kleiman (1995). Notou-se, ao fim desta pesquisa, que a efetivação do processo de analfabetismo pode se dar quando a sociedade se envolve, quando há incentivo à leitura e quando o professor responsável pelo processo inicia o seu trabalho tendo como ponto de partida o conhecimento de mundo que os discentes trazem para a escola. PALAVRAS CHAVE: Analfabetismo funcional. Educação básica. Perspectivas.
INTRODUÇÃO O analfabetismo funcional, amplamente discutido nas principais academias brasileiras, ainda é hoje fato real que exige uma atenção especial da sociedade e, principalmente, dos professores que assumem a responsabilidade de minimizar este problema. Em matéria publicada no jornal Carta Capital, de Suzana Vier (2010), define-se o conceito de analfabetismo funcional por meio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO): Segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura (Unesco), analfabeto funcional é a pessoa que sabe escrever seu próprio nome, assim como ler e escrever frases simples, efetua cálculos básicos, mas é incapaz de interpretar o que lê e de usar a leitura e a escrita em atividades cotidianas, dificultando seu desenvolvimento pessoal e profissional. Ou seja, o analfabeto funcional não consegue extrair o sentido das palavras, colocar ideias no papel por meio da escrita, nem fazer operações matemáticas mais elaboradas (VIER, 2010).
automaticamente. No máximo, os alunos podem ser retidos na quarta série, por um ano, depois eles vão seguir, mesmo sem o conhecimento necessário. Os entrevistados ainda apontam problemas de infraestrutura, de salário e distanciamento das famílias. (VIER, 2010).
O analfabetismo funcional é uma característica crescente. Isso é visto a partir de pesquisas recentes no campo educacional. Em repor-
Percebe-se como a escola está omissa na qualidade educacional do processo de alfabetização das crianças e adolescentes. Por ser um quadro preocupante, que incomoda os professores, tomou-se a decisão de investigar, neste trabalho, maneiras de como o professor de Língua Portuguesa pode amenizar tal situação em sala de aula. Para a execução desta tarefa, foram feitos estudos de teorias de autores expoentes que se destacam por sua busca de investigações e soluções para tão grave situação. Foi necessário o estudo de termos cunhados por Soares (2009) e Kleiman (1995), as quais se debruçam sobre aspectos importantes que explicam o porquê da incidência do analfabetismo funcional ser mais comum nas classes menos privilegiadas. Também foi dedicado estudo de uma das obras de Foucault, que faz uma análise do discurso, de sua função na sociedade e de seu processo comunicativo. Para Foucault (1996), para que o discurso cumpra a sua função, é preciso que alguém tenha uma mensagem
tagem do jornal Estadão, de Luiz Carrasco e Mariana Lenharo (2012), é divulgado que “entre os estudantes do ensino superior, 38% não dominam habilidades básicas de leitura e escrita, segundo o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf), divulgado pelo Instituto Paulo Montenegro (IPM) e pela ONG Ação Educativa”. Isso significa que esses alunos passaram pela Educação Básica, já que ingressaram no Ensino Superior, porém eles não conseguem compreender noções básicas dentro do âmbito educacional. O Jornal Carta Capital, em matéria de Suzana Vier (2010), realizou uma pesquisa com professores da Educação Básica, que atuam na rede pública, em São Paulo. Destacou-se uma das causas primordiais para que tal problema ocorra: O principal motivo para esse tipo de deficiência de aprendizado está, na visão dos docentes ouvidos pela reportagem, no sistema de progressão continuada, em que o aluno precisa apenas se fazer presente em sala de aula para ser aprovado
que possa ser recebida e decodificada por outrem. Se a mensagem está restrita, seu desempenho não se cumpre, pois o discurso está diretamente ligado ao processo comunicativo. Para que essa decodificação ocorra, o professor de Língua Portuguesa tem papel decisivo no auxílio ao combate a essa falha, que se dá através do processo de alfabetização. A alfabetização é um instrumento primordial e essencial na sociedade contemporânea, pois não há praticamente nenhuma profissão ou situação em que a linguagem escrita não seja usada. Ao ler uma notícia, responder a uma carta comercial ou deixar um bilhete para alguém, todas essas situações exigem que o uso da língua seja suficiente para que a mensagem chegue de modo correto ao receptor. Em sua análise sobre este aspecto Ribeiro, Vóvio e Moura (2002) apontam que a preocupação não é mais somente com o analfabetismo. Agora, há também a investigação sobre o analfabetismo funcional. Ribeiro (2006) reforça essa informação, apontando uma séria
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 55
situação gerada a partir da inabilidade de se fazer uma leitura que possa, de fato, levar ao significado. A questão não é mais apenas saber se as pessoas sabem ou não ler e escrever, mas também o que elas são capazes ou não de fazer com essas habilidades. Isso quer dizer que, além da preocupação com o analfabetismo, problema que ainda persiste nos países mais pobres e também no Brasil, emerge a preocupação com o analfabetismo funcional, ou seja, com incapacidade de fazer uso efetivo da leitura e da escrita nas diferentes esferas da vida social (RIBEIRO, p. 01, 2006). Ribeiro, Vóvio e Moura (2002) utilizam-se do conceito cunhado por Soares (2009), o qual busca explicar as diferenças existentes entre letrado e alfabetizado, ou seja, se uma pessoa que concluiu a Educação Básica lê um texto jornalístico, mas não consegue compreender a mensagem, ela não faz uma leitura efetiva. Neste caso, configura-se o analfabetismo funcional, ou seja, a pessoa está alfabetizada, mas não está letrada. O seu conhecimento interpretativo do texto é considerado superficial, já que a compreensão dele está afetada, impedindo que a mensagem seja decodificada adequadamente. Contudo, há uma série de fatores que envolvem este fato, os quais nos levam a considerar que o julgamento precoce desta situação nos induz a um julgamento superficial. Entende-se que, o conceito disponibilizado por Soares (2009) de literacy, que indica o estado ou condição daqueles que aprenderam a ler e escrever, o qual foi estendido ao português, como letrado, implica “a ideia de que a escrita traz consequências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas, linguísticas, quer para o grupo social em que seja introduzida, quer para o indivíduo que aprenda a usá-la”. (SOARES, 2009, p. 17) Entramos em uma questão social, a qual nos oportuniza observar que aqueles que não fazem uso adequado dessa habilidade acabam sendo rechaçados da comunidade em que se encontram. 2 CONCEITOS ANTERIORES À ORDEM DO DISCURSO Matencio (1995, p.242) aborda que, antes de se saber os elementos textuais da composição de um texto escrito, precisa-se compreender que o aluno é um sujeito composto por suas práticas culturais e sociais e que, por isso, já possui seus próprios conceitos a respeito do mundo a sua volta: “A concepção de letramento que adotamos pressupõe ser a construção de sentidos pelo sujeito permeada por suas práticas sociais, culturais e discursivas, constituindo-o como tal no momento mesmo da enunciação” (MATENCIO, 1995, p. 242). Então, o professor de Língua Portuguesa dos anos finais do Ensino Fundamental, em um primeiro momento, deve compreender quais os temas são conhecidos por parte dos estudantes a partir das suas vivências e experiências pessoais. Caso os alunos não conheçam o tema abordado, o docente deverá apresentá-lo para os discentes. Por exemplo, esse professor poderá apresentar o que é a desigualdade social se ele desejar abordar a temática em uma produção de texto. Ou seja, os estudantes saberão, primeiramente, os conceitos do tema para, posteriormente, construírem um texto escrito sobre tal. Não somente na produção efetiva do texto essa atitude funcionaria mas, também, na leitura. Para que o aluno interprete com efetividade um texto, seja no ambiente educacional ou não, primeiramente ele deve conhecer basicamente sobre o assunto. Por exemplo, se o discente desconhece vários termos em um determinado texto, que trata de assunto que não lhe é familiar, a leitura e compreensão textual estariam fadadas ao fracasso. Percebe-se, assim, que é função do professor de Língua Portuguesa, antes de qualquer outra, proporcionar aos alunos o conhecimento de aspectos de diversas áreas. Os temas dos textos
devem ser apresentados e as temáticas devem abranger várias áreas dos saberes. Desta maneira, o estudante poderá “interpretar o mundo ao redor dele”. Ribeiro, Vóvio e Moura (2002, p.05) comentam sobre o assunto, “de fato, o analfabetismo funcional é um conceito relativo, pois depende das demandas de leitura e escrita colocadas pela sociedade assim como das expectativas educacionais que se sustentam politicamente.” O analfabetismo funcional refere-se às pessoas que, mesmo possuindo alguns anos completos na educação básica, não conseguem compreender com efetividade a mensagem passada por um texto. Por exemplo, uma pessoa que lê uma receita de bolo, mas não a compreende bem, poderia ser um caso de analfabetismo funcional. Importante ressaltar que não se pode generalizar a capacidade de compreensão textual de uma pessoa apenas por um fato isolado. Para observar se a pessoa é analfabeta funcional, precisa-se considerar a compreensão dos textos feitos por ela em geral. Até agora, abordaram-se os conceitos de analfabetismo funcional e o que pode ser feito por parte do professor para conter a situação. E, em seus estudos, Kleiman (1995) esclarece que as famílias que possuem diferentes níveis de escolaridade, por exemplo, ao contar histórias, a mediação feita pelo adulto durante a leitura será diferente devido à sua escolaridade. Ou seja, as intervenções apresentadas pelo adulto de maior escolaridade terão teor mais analítico, relacionais de generalização que os adultos com escolaridade menor, os quais se limitam a fazer perguntas simplórias e óbvias, o que acaba por levar as crianças a diferentes tipos de compreensão, níveis de relação, generalização, ou análise simples. Entende-se que o professor que está atento a esses aspectos, certamente terá melhor resultado, pois irá prover melhores ferramentas de trabalho para atingir ao objetivo: a verdadeira face do letramento. Outra face a ser mostrada é a da sociedade. Ribeiro (1997, p. 146) mostrará que não somente os docentes, mas toda a sociedade está inserida nesse conceito da não alfabetização efetiva de uma população: Uma característica marcante desse enfoque é a tentativa de ir além de uma concepção acadêmica da alfabetização, que a limita ao desempenho de tarefas tipicamente escolares. Investigando o nível e o tipo de competências necessárias para que os indivíduos possam se desenvolver no seu contexto sociocultural, tal perspectiva abre, inclusive, a possibilidade de se questionar a adequação dos currículos escolares com relação às demandas da sociedade. Permite ainda que se amplie a compreensão sobre os problemas relativos ao analfabetismo, uma vez que o não-domínio suficiente das habilidades pode ser associado não apenas a deficiências dos sistemas educativos, mas a questões mais amplas como as características do mercado de trabalho e dos meios de comunicação de massa ou a distribuição social das oportunidades de desenvolvimento cultural. Tal perspectiva de análise pode informar, portanto, tanto as políticas de educação formal quanto as de educação não formal de jovens e adultos e as políticas culturais de forma geral. Sendo assim, pode-se questionar, por exemplo, a abrangência dos jornais televisivos e qual é o índice de compreensão que eles atingem. Compreendemos que o não-domínio das habilidades necessárias para a compreensão efetiva, acabará por excluir o falante da língua de uma série de processos da sociedade, deixando visível um processo educacional falho. Somado a isso, compreendemos que se as pessoas não conhecem o mundo ao seu redor, como elas poderão interpretá-lo? Sobre isso, nos esclarece Foucault: O tema da mediação universal é ainda, creio eu, uma maneira de elidir a realidade do discurso. Isto, apesar da aparência.
56 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Pois parece, à primeira vista, que ao encontrar em toda parte o movimento de um logos que eleva as singularidades até o conceito e que permite à consciência imediata desenvolver finalmente toda a racionalidade do mundo, é o discurso ele próprio que se situa no centro da especulação. Mas este logos, na verdade, não é senão um discurso já pronunciado, ou antes, são as coisas mesmas e os acontecimentos que se tornam insensivelmente discurso, manifestando o segredo de sua própria essência. O discurso nada mais é do que a reaverbação de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos; e, quando tudo pode, enfim, tomar a forma do discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso pode ser dito a propósito de tudo, isso se dá porque todas as coisas, tendo manifestado e intercambiado seu sentido, podem voltar à interioridade silenciosa da consciência de si. (FOUCAULT, 1996, p. 48-9.) Vê-se, logo, que o discurso possui um valor muito mais amplo do que somente acreditar que se trata de uma simples sequência de palavras. Para Foucault (1996), o discurso é uma rede de enunciados ou de relações que tornam possível haver significantes. O conceito do discurso pode ser representado a partir do processo em que há a emissão e a recepção efetivas de uma mensagem. Assim, para que o processo de alfabetização seja, de fato, concretizado, é preciso interpretar a mensagem que é anterior ao próprio texto como se pode observar em Foucault (1996). 3 O PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE LINGUAGEM ESCRITA Se for utilizado o pensamento saussuriano, o significante corresponde à parte sonora da palavra e o significado corresponde ao sentido. A junção dos dois conceitos forma o signo que é a unidade de palavra que possui forma, som e sentido. Saussure (2002) mostra que a linguagem humana é um sistema que não acontece somente no passado. Esse sistema se arrasta até o presente, e está em constante transformação. Para Saussure, os elementos da língua têm significado e são definidos por meio de suas relações com os elementos vizinhos. Ou seja, uma palavra isolada pode ter pouca significação. Ela irá mostrar o seu valor, ou sua acepção, a partir de sua relação com os signos que a rodeiam. A escrita, por ser uma das formas superiores de linguagem, requer do aprendiz uma ordenação também superior da sequência e relação entre a ideia que se tem em mente e o objeto. Para escrever é necessário vincular o signo verbal, o qual já é um significado, a um signo gráfico. Ou seja, o ato de escrever envolve um mecanismo e a expressão do conteúdo ideativo. E é nesse aspecto, que encontramos uma das dificuldades do processo de alfabetização. 3.1 Dificuldades encontradas Percebemos, nesse processo, que o analfabetismo funcional ocorre, também, devido ao fato de o leitor ainda não estar preparado para vincular a palavra ao seu contexto e, automaticamente, ao seu significado. Esse fato ocorre com mais frequência entre aqueles que, ainda não possuidores do conhecimento do universo da classe mais privilegiada, que pouco contato têm com a recontação de história de maneira reflexiva. Nota-se que entre esses indivíduos em cujo ambiente familiar a leitura é mais simplória, em que as perguntas não aguçam a investigação mais profunda da compreensão textual, ou seja, exigem somente a localização de informação, sem questionamentos mais densos, a tendência é o reforço de uma análise textual superficial e produção textual que não extrapola o limite do razoável.
Observa-se que a produção textual, por ser um processo mais elaborado da língua, o qual exige uma ordenação superior do pensamento, acaba sendo prejudicada pela leitura pouco explorada feita às crianças cujos pais também possuem certa defasagem da compreensão textual, os quais se limitaram a explorar o texto somente em sua superfície. 4 SOLUCIONANDO O PROBLEMA DO ANALFABETISMO FUNCIONAL Ensinar línguas é, antes de qualquer coisa, lidar com as identidades e crenças dos indivíduos que estão envolvidos no processo de aprendizagem: aluno e professor. Esse ato envolve fatos linguísticos que estão atrelados a um contexto histórico, social e político. Desta maneira, a compreensão que o professor tem sobre a língua, seu contexto social e a sua formação, certamente, irão interferir no modo como ele irá ensinar a língua. Entendemos que este ensino é interacional, visto que os sujeitos do processo são atores e construtores que, de maneira dialógica, constroem e são construídos nos textos que produzem. Isso significa que todo o conhecimento que o discente traz de mundo faz interlocução com a sua produção. A língua se manifesta e se consolida em diversos suportes, tais como conversas, livros, sites na internet, jornais e é utilizando essas vias que o professor pode promover situações em que o aluno poderá interagir. Acrescente, ainda, que a imagem, o som e o sentido podem auxiliar o professor dos anos finais do Ensino Fundamental a lidar com a situação do analfabetismo funcional vivenciado por alguns alunos, cabendo ao docente adaptar o processo de ensino para que todos os discentes possam aproveitar os saberes ministrados para o aprendizado da linguagem e seus elementos. A associação de imagens a palavras pode ser uma ferramenta importantíssima nas mãos do professor. Filmes, peças teatrais, exploração de tirinhas, análise de placas de sinalização, ou quaisquer outras placas, discussões em sala que possam confrontar ideias cada vez mais amadurecidas, e a promoção do desenvolvimento da linguagem oral e da análise interpretativa mais profunda são ações que, sem dúvida, aprofundarão o conhecimento que o discente traz de sua realidade. A confrontação com novos paradigmas fará com que os discentes dos anos finais do Ensino Fundamental tenham um incentivo à participação, a qual deve ser desafiadora e promotora de buscas por palavras, significados e significações mais complexas, proporcionando o desejo de se ampliar horizontes. Levar em consideração a perspectiva sociocultural dos discentes poderá ser um dos segredos do sucesso pela superação do analfabetismo cultural. Essa conscientização faz com que se busquem atividades, jogos e práticas alfabetizadoras que se iniciam em um patamar conhecido e extrapolam o limite do simplório, promovendo análises interpretativas mais densas. A partir de metas bem definidas, o discente participa de acordo com suas capacidades, suas histórias, suas motivações. Neste aspecto, eliminam-se as competições comuns entre os adolescentes e cria-se um ambiente de cooperação que favorece a aquisição do saber, eliminando-se as barreiras para a aprendizagem da língua. Ao ajustar o conhecimento de mundo que os discentes trazem para a sala e o conhecimento que a escola e os ambientes sociais nos fornecem criam-se condições e oportunidades para o desenvolvimento de atividades que permitem ao aluno perceber como os textos funcionam. Cabe ao professor partir do micro para o macro, ampliando o mundo que os discentes trazem para a sala de aula, oferecendo um trabalho que faz com que eles possam compreender os diferentes gêneros textuais, os fatores linguísticos, textuais e não-textuais que
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 57
se apresentam em cada texto analisado e, a partir de cada um deles, promover a prática da construção, seja ela, coletiva, a princípio e individual logo depois, de maneira que o aluno possa conceber e usar a língua de forma criativa, competente e, acima de tudo, consciente de seu uso e produção. É importante relembrar que o ambiente educacional não é o único responsável pelo processo ineficaz de ensino e aprendizagem da aquisição de linguagem escrita. Para Goldin (2003) apud Rosa (2006, p.185): Uma política pública reflete a vontade de diferentes setores da sociedade em avançar para uma determinada direção e representa uma articulação coerente de medidas para transformar uma situação. Sua eficácia se mede por sua sustentabilidade e sua coerência interna, que faz com que nos distintos setores envolvidos tenha repercussão positiva. Uma política pública permite garantir que os problemas não serão crônicos e idênticos aos que sempre existiram. Goldin (2003) apud Rosa (2006) diz que as políticas públicas devem partir dos diversos setores da sociedade para que haja melhorias em uma área determinada. Sendo assim, o setor educacional, de comunicação, entre outros, deve mobilizar-se para que a questão do analfabetismo funcional receba uma atenção especial e políticas públicas próprias, pois se uma parte significante da população não consegue decodificar as mensagens passadas com eficácia, o papel dos veículos de comunicação pode não realizar o trabalho de forma eficiente. Outro aspecto que pode auxiliar demasiadamente no processo de aquisição da linguagem escrita e, consecutivamente, diminuir o número de analfabetos funcionais, é o incentivo à leitura. Sabe-se que o Brasil não é um país com grande número de pessoas que leem. Para Rosa (2006, p.185): Transformar o Brasil em um país de leitores não é tarefa fácil, sobretudo no contexto da sociedade da informação, no qual novos suportes informacionais direcionam as políticas não apenas para as práticas leitoras e para a alfabetização cidadã, mas principalmente para o domínio das novas tecnologias, muitas vezes distantes da formação do cidadão leitor e apenas instrumentalizadoras de habilidades primárias que têm como objetivo incluir o cidadão nessa sociedade. A autora demonstra como as políticas públicas estão voltadas para a inclusão dos discentes no universo digital. Porém, como os estudantes poderão ser inseridos no universo tecnológico se uma parte considerável pode ser analfabeta funcional? Rosa (2006, p. 185) complementa sobre o assunto: o pouco envolvimento da sociedade civil e demais atores sociais contribuíram para que o país chegasse ao século XXI com uma média de leitura por ano equivalente a 1,8 livros por habitante, segundo dados da Câmara Brasileira do Livro (CBL). Rosa (2006) defende que o incentivo à leitura em nosso país está fragilizado. Nas próprias escolas, o objetivo é a síntese do conhecimento para que os alunos estejam preparados para o vestibular. Mas prepará-los para provas como o Exame Nacional do Ensino Médio não garante que o discente consiga interpretar os outros aspectos a volta dele como a notícia jornalística. Rosa (2006, p. 185) sustenta: Quanto aos estudantes do 3º grau, a maioria ingressa na universidade sem habilidades leitoras amadurecidas. Isso fica mais acentuado na cultura de pré-vestibular, já que o ensino médio tem se voltado quase exclusivamente para facilitar o acesso à universidade. O material didático básico utilizado pelos estudantes nesse período é de conteúdo reducionista.
Como exemplo, os módulos e resumos de textos de literatura e de demais disciplinas. Os próprios cursinhos e escolas reproduzem esses materiais didáticos, que são compilações de várias obras, raramente citadas ou referenciadas. Soma-se, a esse quadro, o fato de a relação do estudante com os livros estar sendo fragilizada pelo surgimento de novos suportes de informação propiciados pelo advento das tecnologias de informação e comunicação. A atual sociedade apoia-se cada vez mais na cultura digital, o que também traz implicações para a indústria editorial. Vê-se, então, que, além da parte comprometedora da sociedade, a forma como ocorre o processo de ensino e aprendizagem no Brasil fortalece a formação de analfabetos funcionais, pois não se preparam os alunos para utilizarem os conhecimentos adquiridos na escola na vida cotidiana, o que ocorre é a preparação massiva para o ingresso em universidades através de uma prova. Percebe-se que urge um envolvimento maior de profissionais que assumem a responsabilidade de trazer a alfabetização ao discente de maneira que possa proporcionar uma melhoria do cenário que se nos apresenta: o analfabetismo funcional no Brasil. Cabe ao professor estar atento aos objetivos de cada aula ao realizar o seu plano diário. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir das observações feitas, viu-se que o analfabetismo funcional é a não efetivação do processo de leitura e escrita. Ou seja, a pessoa lê, mas não compreende com clareza a mensagem do discurso. Assim, o que é emitido não pode ser decodificado eficientemente pelo receptor. Essa definição é proposta pela UNESCO e surgiu para verificar o nível de eficácia das pessoas consideradas alfabetizadas. Em reportagens do jornal Estadão, de Carrasco e Lenharo (2012), e Carta Capital, por Vier (2010), observou-se que o nível de analfabetismo funcional existe, também, na população universitária. Isso significa que essa situação não é comum somente na educação básica. Ela perpetua no ensino superior. Posteriormente, analisou-se a importância da alfabetização efetiva. Viu-se que, tanto em situações cotidianas como em acadêmicas, a compreensão da mensagem passada é fundamental e inerente ao convívio em sociedade atualmente. Analisou-se, então, o que poderia ocasionar esta ineficiência no processo de ensino e aprendizagem da interpretação e produção de texto. Viu-se que, para poder compreender um texto com efetividade, deve-se, primeiramente, conhecer ao menos noções básicas sobre o assunto, pois, para quem está na condição de analfabeto funcional, realizar uma pesquisa sobre um tema novo é uma tarefa difícil já que a pessoa não consegue compreender com efetividade o discurso. Propôs-se, então, que o professor de Língua Portuguesa dos anos finais do Ensino Fundamental apresente, para os alunos, temas variados dentro das várias vertentes dos saberes. Durante os anos iniciais da Educação Básica deve ocorrer o processo de alfabetização e letramento de forma efetiva. Na visão saussuriana, observou-se que a aquisição da linguagem escrita é feita por meio da assimilação do significante e do significado na formação do signo. A criança assimilará o som, a imagem gráfica da palavra e o sentido para formar o signo. Quando o processo citado não ocorre efetivamente, a pessoa lerá, contudo não conseguirá compreender o que leu. Para auxiliar o professor de Língua Portuguesa dos anos finais do Ensino Fundamental, orientou-se a utilização de suportes diversos, tais como sites na internet, jornais, livros, discussões orais. Além desses suportes, suge-
58 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
riu-se a utilização de imagens e sons explorados em nossos meios de comunicação, tais como filmes, peças teatrais, tirinhas, sinalizações. Acredita-se que o olhar atento do docente aliado ao saberes que os discentes trazem para a sala de aula, vinculados a um objetivo em comum poderão gerar o resultado esperado. Por fim, notou-se que, para auxiliar no combate ao analfabetismo funcional, há a necessidade de várias esferas da sociedade, visto que não é somente o ambiente escolar o único responsável por sanar o problema do analfabetismo funcional. Assim, com professores altamente comprometidos, com escolas responsáveis, com o envolvimento de vários setores da sociedade, aliados a uma política de incentivo à leitura, é possível, também, alterar o quadro do analfabetismo funcional no Brasil. Entende-se que existe um cenário favorável para extinguir este fato, resultando em uma pátria consciente e igualitária para os cidadãos. REFERÊNCIAS CARRASCO, Luís; LENHARO, Mariana. No Ensino Superior, 38% dos alunos não sabem ler e escrever plenamente. ESTADÃO, São Paulo. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,no-ensino-superior-38-dos-alunosnao-sabem-ler-e-escrever-plenamente-imp-,901250>. Acesso em: 04 out. 2015. FOCAULT, Michael. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola, 1996. GOLDIN, Daniel. En torno a las políticas públicas del libro y la lectura. In: PASAJES de la edición: hablan los profesionales. Guadalajara: Cerlalc: Universidad de Guadalajara, 2003. p. 162-168. KLEIMAN, Angela. Modelos de letramento e as práticas de alfabetização na escola. In: KLEIMAN, Angela (org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado de Letras,1995. MATENCIO, Maria de Lourdes. Analfabetismo na mídia: conceitos e imagens sobre o letramento. In: KLEIMAN, Angela (org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado de Letras,1995.
LETRAMENTO NO BRASIL: ALGUNS RESULTADOS DO INDICADOR NACIONAL DE ALFABETISMO FUNCIONAL. Educação e Sociedade, Campinas, v. 81, n. 23, p.49-70, dez. 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/ v23n81/13931.pdf>. Acesso em: 04 out. 2015. RIBEIRO, Vera Masagão. Analfabetismo e alfabetismo funcional no Brasil. Boletim INAF. São Paulo: Instituto Paulo Montenegro, jul.-ago. 2006. RIBEIRO, Vera Masagão. Alfabetismo funcional: Referências conceituais e metodológicas para a pesquisa. Educação e Sociedade, Campinas, v. 60, n. 18, p.144-158, dez. 1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v18n60/ v18n60a8.pdf>. Acesso em: 04 out. 2015. ROSA, Flávia Goullart Mota Garcia; ODDONE, Nanci. Políticas públicas para o livro, leitura e biblioteca: UM BREVE PANORAMA DA LEITURA NO BRASIL, CENÁRIO CONTRADITÓRIO E DESIGUAL. Ciência da Informação, Brasília, v. 35, n. 3, p.183-193, dez. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ci/v35n3/ v35n3a17.pdf>. Acesso em: 04 out. 2015. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 3 ed. – Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009. SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de linguística geral. Organizado por Charles Bally e Albert Sechehaye. Prefácio de Isaac Nicolau Salum. 24. ed. São Paulo: Cultrix, 2002. VIER, Suzana. Progressão continuada alastra analfabetismo funcional em SP, afirmam professores. Carta capital, São Paulo. Disponível em: <http://www. cartacapital.com.br/sociedade/progressao-continuada-alastra-analfabetismofuncional-em-sp-afirmam-professores>. Acesso em: 04 out. 2015.
NOTAS DE FIM Ator, diretor, professor de teatro, artes e graduando o Curso de Letras pelo Centro Universitário Newton Paiva. Contato: falecommatheusvargas@yahoo.com.br 1
Graduada em Letras pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Belo Horizonte (1989). É pós-graduada, especialista em Língua Inglesa. Professora do Centro Universitário Newton Paiva, e membro do Núcleo Docente Estruturante dos cursos de Pedagogia e Letras do Centro Universitário Newton Paiva. Contato: gleidesander.prof@newtonpaiva.br. 2
RIBEIRO, Vera Masagão; VÓVIO, Claudia Lemos; MOURA, Mayra Patrícia.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 59
ETIOLOGIA MULTIFATORIAL DAS RECESSÕES GENGIVAIS: UMA REVISÃO DE LITERATURA Rosimar Solange de Matos Bicalho ¹ Carla Viviane Gomes ¹ Rafael Paschoal Esteves Lima ²
RESUMO: A recessão gengival é uma condição clínica indesejada que resulta na migração apical da margem gengival e, concomitantemente, ocorre a exposição da superfície radicular no meio bucal. Diante disso, ocorrem comprometimentos estéticos e funcionais. A literatura apresenta vários fatores relacionados à etiologia das recessões gengivais, dentre estes se destacam: predisponentes e precipitantes. Como prevenção de tal evento é fundamental a identificação dos mesmos. Portanto, este trabalho tem por objetivo relacionar evidências científicas disponíveis nas bases de dados, as quais forem relacionadas com as recessões gengivais, possibilitando o profissional identificar tal etiologia precocemente, no intuito de controlar a evolução e prevenir a migração apical da margem gengival. PALAVRAS-CHAVE: Recessão. Gengiva. Retração.
1- NTRODUÇÃO Segundo a Academia Americana de Periodontologia, a recessão gengival é definida como a migração apical da margem gengival. O que faz com que a superfície radicular se apresente exposta ao meio bucal. Com a evolução da recessão pode ocorrer comprometimento estético, visto que o dente apresenta-se mais longo. Adicionalmente, a mesma pode estar ainda associada a significativo comprometimento funcional, pois estruturas importantes do periodonto de proteção (gengiva) e do periodonto de sustentação (ligamento periodontal, cemento e osso alveoloar) são perdidas (AAP, 2001). Marinho et al. (2007) relata que devido à exposição do cemento, a recessão gengival pode ocasionar consequências como, por exemplo: maior susceptibilidade à cárie radicular e hipersensibilidade dentinária. Sendo que em 5% dos indivíduos costuma estar exposta na área da junção amelocementária. Consequentemente, o quadro de hipersensibilidade pode levar o paciente a negligenciar o controle do biofilme, e desse modo há aumento da predisposição de doenças de origem bacteriana, como a cárie e a doença periodontal (MARINHO et al. 2007). A recessão gengival apresenta-se numa etiologia multifatorial e, corriqueiramente, é vista como resultado de uma combinação de fatores (LAPA, 2012). Fatores locais como: periodontite, posição dentária, oclusão traumática, inserção alta dos freios, bridas ou fibras musculares, deiscências ósseas, pressão labial e reduzida faixa de gengiva inserida, têm sido objeto de estudo sobre a etiologia das recessões gengivais (MARINHO et al. 2007). Este trabalho tem por objetivo avaliar os vários fatores que atuam na etiologia da recessão gengival. Possibilitando ao profissional identificar tal etiologia precocemente, no intuito de controlar a evolução e prevenir a migração apical da margem gengival. 2- METODOLOGIA O presente estudo trata-se de uma revisão literária de objetivo exploratório na qual foram avaliados, por meio da literatura pertinente, os fatores etiológicos relacionados à ocorrência de recessões gengivais, analisando e discutindo a importância da relação existente entre os mesmos e seu impacto periodontal. Desse modo, pretende-se compreender as medidas possíveis para sua minimização. Foram realizadas pesquisa nas bases de dados da internet, tais como LILACS
e SCIELO, utilizando os termos: recessão gengival, etiologia das recessões gengivais e fatores etiológicos das recessões gengivais. Os artigos foram selecionados por relevância após análise do título, do resumo e/ou do texto integral, incluindo ainda os trabalhos clássicos que agregam conteúdo ao tema. 3- REVISÃO DE LITERATURA 3.1- Fatores etiológicos A recessão gengival é uma condição frequentemente vista como sendo multifatorial e, normalmente, é vista como resultado de uma combinação de fatores (LAPA, 2012). Os fatores etiológicos que influenciam o desenvolvimento da recessão gengival são classificados em fatores precipitantes e fatores predisponentes. Os fatores precipitantes incluem a placa bacteriana, o trauma mecânico relacionado com a escovação, a terapia ortodôntica e o trauma químico relacionado como, por exemplo, o tabaco. Os fatores predisponentes incluem características anatômicas locais que favorecem a ocorrência das recessões gengivais como, por exemplo, quantidade e qualidade insatisfatória de gengiva inserida, deiscência óssea, vestibularização, inserção alta do freio e oclusão traumática (LAPA, 2012). Marinho et al. (2007) relataram que a recessão gengival apresenta etiologia multifatorial e ressaltam que a periodontite, a posição dentária, a oclusão traumática, a inserção alta dos freios e bridas ou fibras musculares, as deiscências ósseas, a pressão labial e a reduzida faixa de gengiva inserida tem sido considerados os principais fatores locais. De acordo com Yaredes et al. (2006) a recessão gengival corresponde à perda de inserção, resultando em uma posição mais inferior da margem gengival livre, em qualquer parte da superfície da raiz exposta. Pode estar presente em ambos os arcos, nas faces vestibular e lingual e em quaisquer dentes. Alguns fatores têm sido propostos como participantes na etiologia da recessão gengival como o biofilme bacteriano dentário e sua consequente inflamação gengival, a oclusão traumatogênica, o trauma proveniente da escovação ou da inserção alterada do freio labial e características anatômicas locais relacionadas ao posicionamento dentário, espessura da gengiva marginal, altura da faixa de mucosa ceratinizada e tecido ósseo subjacente.
60 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
3.2- TRAUMAS POR ESCOVAÇÃO
Determinados fatores podem contribuir para o desenvolvimento da recessão gengival diante da presença de traumas durante a escovação, como forma do arco, posicionamento do dente, deficiência alveolar, rigidez das cerdas e movimento da escovação. Quanto mais acentuada a convexidade do contorno do arco dental maior a pressão causada na área e, consequentemente, maior o risco de recessão na presença de escovação traumática. Adicionalmente, dentes vestibularizados recebem mais pressão, assim como apresentam uma tábua óssea mais fina (PERET E COSTA, 1999). Segundo Yaredes et al. (2006) o trauma durante a escovação dentária contribui para o desenvolvimento e progressão da recessão gengival, sendo que este tem sido abordado de forma constante em estudos epidemiológicos. Em estudo realizado, Araújo et al. (2007) concluíram que a prevalência de recessão gengival é alta e que a escovação traumática é um dos principais fatores etiológicos para essa perda de inserção. Lapa (2012) enfatiza que o fator escovação traumática é bastante amplo, incluindo a duração da escovação, a frequência de escovação, a força exercida durante a escovação, a dureza das cerdas da escova, a técnica de escovação e a frequência de mudança de escova. 3.3- PLACA BACTERIANA E PRESENÇA DE INFLAMAÇÃO
Os resultados da investigação de Goutoudi et al. (1997) sobre recessão gengival revelaram que a recessão da margem gengival estava associado com altas taxas de inflamação decorrente da presença do biofilme, com diminuição de espessura de gengiva inserida e queratinizada e com a dureza das cerdas das escovas dos indivíduos. Grissi et al. (2000), ressaltam que o processo inflamatório representa o principal fator para o desenvolvimento das recessões gengivais, uma vez que é o único responsável pela destruição das fibras colágenas com consequente migração do epitélio juncional. Segundo Lapa (2012), com a exposição radicular, é frequente um maior acúmulo de biofilme, propiciando a piora do quadro inflamatório e consequente progressão da recessão gengival. Este acúmulo de biofilme pode ocorrer devido a uma hipersensibilidade promovida pela exposição dentinária e consequente dificuldade de escovação. Adicionalmente, o desnivelamento da margem gengival provocado pela recessão dificulta o posicionamento da escova e compromete a efetividade da remoção do biofilme. Em um estudo que envolveu 49 pacientes com idade entre 20 e 60 anos, Paredes et al. (2008) observaram que os dentes mais afetados pelas recessões gengivais são os incisivos inferiores e que a maior ocorrência das recessões gengivais é na face vestibular. A presença de biofilme foi o principal fator etiológico associado às recessões gengivais e houve um aumento da gravidade das recessões gengivais com o avanço da idade. 3.4- POSIÇÃO DENTÁRIA
O mau posicionamento dentário tem sido referido por vários autores como fator que pode estar associado ao desenvolvimento de recessão gengival. A posição na qual o dente vai erupcionar na arcada dentária está diretamente associada à quantidade de gengiva em torno do dente. Se o trajeto de erupção resultar numa posição próxima da linha mucogengival haverá pouca ou nenhuma gengiva queratinizada, predispondo à recessão (LAPA, 2012). Maccomb (1994) observou que a maioria dos dentes com recessão estavam associados a irregularidades como rotação ou deslocamento vestibular e que dentes posicionados vestibularmente tinham menos gengiva inserida em relação aos dentes posicionados lingualmente. Yared et al. (2006) defendem que dentes que se encontrem ves-
tibularizados ou que tenham sofrido rotação têm maior probabilidade de apresentar recessões gengivais. 3.5- INSERÇÃO DO FREIO
De acordo com Duarte (2004), os freios podem ser considerados como fatores predisponentes, já que sua presença próxima da gengiva marginal ou com inserção profunda na papila gengival permite a persistência da inflamação gengival por dificultar a higiene da região. De acordo com Yaredes et al. (2006), quando o freio labial apresentar inserção alta no processo alveolar poderá ocorrer uma redução na largura da faixa de mucosa ceratinizada. Essa condição poderá interferir no processo de escovação, favorecendo o acúmulo de biofilme e a instalação de um processo inflamatório e consequente recessão gengival. Peacock (1998) afirma que a inserção do freio próximo ou na margem gengival promovendo uma tração excessiva deve ser corrigida cirurgicamente. 3.6- ESPESSURA DA GENGIVA INSERIDA
Segundo Miller et al. (1998), um dos fatores mais importantes no aumento do risco de recessão gengival é a presença de uma margem gengival fina. Alguns autores ressaltam que a espessura da gengiva marginal é um fator significativo no desenvolvimento da recessão, ao contrário da altura da mucosa ceratinizada. O tecido gengival fino e a presença de raízes dentárias proeminentes em relação à cortical óssea alveolar podem contribuir para o agravamento da resposta periodontal ao movimento ortodôntico, dependendo da direção do mesmo (YARED et al., 2006). Segundo Grissi et al. (2000), o principal fator predisponente à recessão gengival é a espessura da mucosa ceratinizada. A mucosa delgada está associada á uma faixa fina de tecido conjuntivo e um processo inflamatório neste, aumentando a susceptibilidade à degeneração. 3.7- TRAUMA OCLUSAL
De acordo com Novaes et al. (1978), não existe evidência que implique o traumatismo oclusal como causador direto da recessão gengival, mas é possível que o trauma associado ao processo inflamatório possa contribuir para a perda de inserção. Segundo Grissi et al. (2000), o trauma oclusal representa um fator que pode predispor a recessões gengivais, principalmente quando associado à má posição do dente no arco e à presença de tábua óssea e mucosa delgadas, tornando a área mais suscetível à disseminação do processo inflamatório provocado pelo acúmulo de placa bacteriana. 3.8- TERAPIA ORTODÔNTICA
Viazis et al. (1990) realizaram o relato de um caso clínico abordando a recessão gengival no tratamento ortodôntico. Foi concluído neste relato que o movimento ortodôntico é contra indicado se a má higienização for evidente no paciente, já que uma dentição inferior proeminente e uma higienização pobre contribuem para uma recessão gengival generalizada que aparece mais tarde no tratamento. Manschot (1991) declarou que a partir do momento que o tratamento ortodôntico envolve movimento dentário, uma área localizada de recessão pode ocorrer se esta movimentação for além da tolerância do periodonto. A recessão gengival associada ao tratamento ortodôntico não ocorre apenas devido à ação de forças. Existem relatos de recessões gengivais criadas por iatrogenia na utilização de bandas ortodônticas de borracha que migram apicalmente para o sulco gengival, promovendo um processo inflamatório, perda óssea e subsequente recessão gengival.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 61
4- DISCUSSÃO A retração da margem gengival com subsequente exposição da superfície radicular é uma condição comumente diagnosticada e, portanto, o aprimoramento do conhecimento sobre os fatores envolvidos na etiologia dessa alteração periodontal é crucial (AAP, 2001). Além da identificação da etiologia faz-se necessário a avaliação da extensão, gravidade e características do defeito para o melhor estabelecimento de uma previsibilidade no tratamento e recobrimento radicular. A classificação de Miller et al. (1985) tem sido amplamente utilizada para esse propósito. A recessão gengival apresenta uma etiologia multifatorial, onde a associação de fatores anatômicos ou iatrogênicos (fatores predisponentes) e patológicos (fatores primários) culmina na condição clínica citada anteriormente (Grissi et al. 2000). Além disso, outros fatores como: frequência e técnica de escovação e dureza das cerdas, apresentam impacto no desenvolvimento da retração juntamente com a escovação traumática (Lapa 2012). Não só a escovação traumática, mas também os processos inflamatórios induzidos pelo biofilme estão fortemente associados à recessão gengival. Portanto, a periodontite está claramente associada à perda óssea, migração apical do epitélio juncional e perda de inserção. Do mesmo modo que a gengivite também se relaciona à retração, isso quando fatores predisponentes tais como: tecido gengival delgado, presença de deiscência óssea e inserções de freios e/ ou bridas, se fazem presentes. De acordo com Paredes et al. (2008), esses fatores não estão associados diretamente à retração, entretanto favorecem a instalação do processo inflamatório e o desenvolvimento da recessão indiretamente. Complementarmente, a recessão gengival pode estar associada a um quadro de hipersensibilidade dentinária, dificultando a correta higienização e favorecendo a instalação e manutenção de um processo inflamatório e gerando agravamento da retração devido à exposição do cemento (Marinho et al. 2007, Furlan et al. 2007). Lapa (2012) e Maccomb (1994) acreditam que o mau posicionamento dentário além de favorecer o acúmulo de biofilme e o desenvolvimento de um processo inflamatório gengival, pode influenciar na espessura do mesmo tecido ao redor dos dentes. Sendo que este mesmo tecido quando delgado e de tábua óssea fina tende a predisposição de recessão sempre que houver processo inflamatório instalado. Segundo Novaes et al. (1978) e Grissi et al. (2000) ressalta-se que o trauma oclusal não está associado diretamente à recessão gengival, ou seja, o trauma sozinho não tem capacidade de causar perda de inserção. Entretanto, quando associado a um processo inflamatório pode apresentar impacto na destruição dos tecidos periodontais. Logo, os fatores etiológicos associados à retração atuam de forma crônica nos tecidos periodontais. Assim, a prevalência e a gravidade das retrações gengivais tendem a aumentar com a idade. 5- CONCLUSÃO A recessão gengival é uma condição atribuída a uma soma de fatores, tais como: inflamatórios, anatômicos e/ou iatrogênicos. O processo inflamatório decorrente da presença do biofilme bacteriano é uma constante na etiologia das recessões gengivais, sendo o único fator que por si só pode levar a essa condição clínica abordada ao longo deste trabalho.
6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS American Academy of Periodontology. Glossary of periodontal Terms. 4ª ed. Chicago. 2001. ARAÚJO et al. Avaliação dos Níveis Gengival em Estudantes de Odontologia da Universidade Federal de Pernambuco, RGO, Porto Alegre, v.55, n.2, p.139-142, abr./jun. 2007 DUARTE, C. A. Cirurgia Periodontal Pré-protética e Estética. 2ª ed. SP: Santos, 2003. FURLAN et al. Incidência de Recessão Gengival e hipersensibilidade na clínica de Graduação da Fop-Unicamp. Revista Periodontia v.17-n 01 Março 2007. GOUTOUDI, P.; KOIDIS, P. T.; KONSTANTINIDIS, A. Gingival recession: A cross sectional clinical investigation. European Journal of Prosthodont. Rest. Dent, Larkfield, v. 5, n2, p.57-61, 1997 GRISI, M.F.M.; SOUZA, S.L.; GRISI, D.C.Atualização na clínica odontológica: módulos de avaliação. Cap. 9, São Paulo, ed. Artes Médicas, 2000 LAPA, J. G. P. Prevalência da recessão gengival nos pacientes consultados na clínica universitária da UCP-Viseu, set/2012 MANSCHOT, A. Orthodontics and inadequade oral hygiene compliance as a combined cause of localized gingival recession: a case report. Quintessence International, New-Malden-Gurrey, v.22, n.11, p.857-864, Nov. 1991 MARINHO et al. Recessão Gengival na Infância. International Journal Of Dentistry, Recife, p: 113-116, Out./Dez. 2007 MCCOMB, J.L. Orthodontic treatment and isolated gingival recession: A review. British Journal of Orthodontics, Oxford, v.21, n.2, p.151-159, 1994 MILLER, P.D. A classification of marginal tissue recession. International Journal of Periodontics Restaurative Dentistry, v.5, n.2, p.9-13, Feb.1985 PAREDES et al. Estudo das Recessões Gengivais em Pacientes Adultos Atendidos na Faculdade de Odontologia da UFMA: Etiologia, Prevalência e Severidade, Revista Periodontia- p:85-91, Março 2008 PEACOCK, M.E. Frenotomy and Keratinized tissue augmentation – case report. General Dentistry, v.46, n.2, p.194-196, Apr.1998 PÉRET; AMEDÉE, C.A.; COSTA, J.E. Recessão gengival-etiologia. Revista de CROMG, Belo Horizonte, v.5, n.2, p.122-127, Maio/Ago 1999. NOVAES, A.B.; KON, S.; NOVAES JR., A.B. Retração gengival localizada. Estudo clínico e histopatológico. Revista da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas, São Paulo, v.32, n.6, p. 444-449, Nov/Dez 1978 VIAZIS, A.D.; CORINALDESI, G.; ABRAMSON, M.M. Gingival recession and fenestration in orthodontic treatment. Journal of Clinical Orthodontics, v.24, n.10, p.633-634, Oct.1990 YARED, G.F.K.; ZENÓBIO, E.G.; PACHECO, W. Projeção Ortodôntica de incisivos inferior: Um risco a recessão periodontal.Revista Dental Press Ortodon Facial,Maringá,v.11,n.5,p.35-41,set\out.2006.a YARED, G.F.K.; ZENÓBIO, E.G.; PACHECO, W. Etiologia Multifatorial da Recessão Periodontal.Revista Dental Press Ortodon Ortop Facial,Maringá,v.11,n 6,p,45-51,nov.\dez.2006.b
NOTAS DE FIM Alunos do curso de graduação em odontologia do Centro Universitário Newton Paiva. carlavivianeacd@gmail.com 1
2
Professor do curso de odontologia do Centro Universitário Newton Paiva, espe-
cialista, mestre e doutor em periodontia. rafael.lima@newtonpaiva.br
62 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
O USO DE CLOREXIDINA PARA DESCONTAMINAÇÃO ORAL COMO FORMA DE PREVENIR A OCORRÊNCIA DE PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA: UMA ANÁLISE E REVISÃO DE LITERATURA Tatiane Luiz de Oliveira1 Annerly Josefina de Oliveira1 Andréa Márcia de Souza2
RESUMO: A pneumonia associada à ventilação mecânica é uma das infecções hospitalares mais frequentes nas Unidades de Tratamento Intensivo e está associada a um prolongamento no período de internação do paciente, acarretando um aumento de custos hospitalares e das taxas de morbidade e mortalidade. O mecanismo mais comum de aquisição da infecção é através da aspiração de microrganismos presentes na orofaringe. Por isso, a higienização da cavidade oral com o uso de antissépticos, principalmente a Clorexidina, tem sido alvo de investigação por diversos autores, que buscam determinar sua eficácia como forma de prevenir a ocorrência dessa doença. O objetivo deste trabalho é fazer uma revisão da bibliografia disponível sobre o impacto da descontaminação oral, pelo uso de CHX, em pacientes adultos entubados quanto à incidência de pneumonia associada à ventilação mecânica. PALAVRAS-CHAVE: Clorexidina. Pneumonia. Respiração artificial.
1 – INTRODUÇÃO A pneumonia é uma doença respiratória caracterizada pela inflamação dos pulmões devida a uma infecção por uma variedade de agentes, incluindo fungos, bactérias, parasitas ou vírus, sendo a forma bacteriana a mais comum e tratável da doença. A Pneumonia Associada à Ventilação Mecânica (PAVM) é definida como aquela que se desenvolve 48 h a partir do início da ventilação mecânica (VM), sendo considerada até 48 horas após a extubação (BERALDO e ANDRADE, 2008). A PAVM é a segunda infecção mais frequente em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) dos Estados Unidos e a mais frequente em UTIs europeias e brasileiras (ABUABARA, WEINZIERL e WEINZIER, 2014; NETO e CONCEIÇÃO, 2010). Está associada a um prolongamento no período de internação do paciente, acarretando um aumento de custos hospitalares e aumento das taxas de morbidade e mortalidade (ABUABARA, WEINZIERL e WEINZIER, 2014; NETO e CONCEIÇÃO, 2010; CHLEBICKI e SAFDAR, 2007). O mecanismo mais comum de aquisição da PAVM é através da aspiração de microrganismos presentes na orofaringe. Dessa forma, em pacientes críticos, a microbiota da cavidade bucal representa uma séria ameaça à saúde dos mesmos (BERALDO e ANDRADE, 2008). De modo a reduzir a proliferação de bactérias na cavidade oral, duas principais intervenções têm sido utilizadas. Uma das estratégias consiste na administração de antibióticos não absorvíveis por via oral ou através do tubo nasogástrico. A outra estratégia consiste na descontaminação da cavidade oral através da aplicação tópica de antibióticos ou antissépticos (CHAN et al. 2007). A utilização de antibióticos tópicos não absorvíveis para descontaminação da cavidade oral, apesar de apresentar bons resultados no que diz respeito à prevenção da PAVM, aumenta o risco da indução e seleção de microrganismos resistentes (BERALDO e ANDRADE, 2008; CHAN et al. 2007). Dessa
forma, o uso dessa estratégia não tem sido recomendado. A higienização da cavidade oral com o uso de antissépticos, principalmente a Clorexidina (CHX), tem sido alvo de investigação (BERALDO e ANDRADE, 2008; CHLEBICKI e SAFDAR, 2007; KOEMAN et al. 2006; GNATTA et al. 2013; FOURRIER et a., 2005). A CHX é um agente antimicrobiano de amplo espectro de atividade contra microrganismos Gram-positivo e é absorvida pelos tecidos, ocasionando um efeito residual mesmo após 5 horas da aplicação. Em baixas concentrações a CHX é bacteriostática e em altas concentrações, bactericida. Entretanto, sua atuação contra microrganismos Gram-negativo está aquém do desejável, por isso, o uso tópico de Colistina (COL), uma polimixina de grande atividade contra microrganismos Gram-positivo e também contra os Gram-negativo, tem sido analisada em conjunto com a aplicação de CHX (KOEMAN et al. 2006). Dentre os estudos encontrados que abordam o uso de CHX para descontaminação oral, percebe-se que há uma variação quanto à concentração deste antisséptico utilizada. Alguns autores abordam o uso de CHX a 0,12% (ABUABARA, WEINZIERL e WEINZIER, 2014; CHAN et al, 2007; GNATTA et al, 2013), outros fizeram uso de CHX a 0,2% (CHLEBICKI e SAFDAR, 2007) e um terceiro grupo de autores avaliaram a eficácia de seu uso a 2% (KOEMAN et al. 2006; GNATTA et al. 2013; FOURRIER et al. 2005). Deste modo, este trabalho se propõe a fazer uma revisão da bibliografia disponível sobre o impacto da descontaminação oral, pelo uso de CHX, em pacientes adultos sob VM quanto à incidência de PAVM. 2 – MÉTODO Foi realizada uma busca no Portal de Periódicos da CAPES utilizando-se os descritores: “pneumonia”, “prevenção”, “clorexidina”, “nosocomial” e seus respectivos termos em língua inglesa. Uma bus-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 63
ca no portal Google Acadêmico, utilizando-se dos mesmos termos também foi realizada, tomando o cuidado de não incluir novamente artigos que já haviam sido obtidos através do Portal da CAPES. Foram incluídos em nossa revisão os artigos que estavam disponíveis na íntegra e que abordam o uso tópico de CHX na higiene bucal de pacientes adultos hospitalizados em UTI para prevenir a PAVM. Artigos publicados em português e inglês foram selecionados e publicações anteriores a janeiro de 2005 foram excluídas. 3 – REVISÃO DE LITERATURA Alguns estudos têm indicado que, além dos benefícios na prevenção da PAVM, pode haver uma relação entre a higiene bucal e a diminuição do tempo de permanência na UTI, redução nos custos hospitalares, diminuição de taxas de mortalidade e a melhoria da qualidade de vida desses pacientes (FOURRIER et al. 2005; KOEMAN et al. 2006; ABUABARA; WEINZIERL e WEINZIER, 2014; NETO e CONCEIÇÃO, 2010). A utilização de CHX para descontaminação da cavidade oral, como método de prevenção da PAVM em pacientes adultos é um tema muito abordado na literatura científica. Eom et al. (2014) relataram que a higiene bucal de pacientes adultos internados em UTI é uma prática deficiente. Segundo Fourrier et al. (2005) há um significante aumento da colonização microbiana da orofaringe e da placa dental durante a permanência do paciente na UTI sob VM. Dessa forma, a higiene oral em pacientes sob VM tornase relevante e é foco de diversas pesquisas científicas. Segundo Fourrier et al. (2005) a CHX tem se mostrado o antiséptico de escolha em protocolos de higiene oral em UTIs, por se tratar de um antimicrobiano potente, de amplo espectro de ação, alta substantividade, mecanismo de ação não-específico, não possuir toxicidade sistêmica e, além do mais, a descontaminação com a CHX diminuiu substancialmente a colonização da cavidade oral. Apesar de o uso de antibióticos ser muito comum dentro das UTIs, a aplicação de antissépticos tópicos tem sido o método de escolha na higienização da cavidade oral desses pacientes internados em UTI sob VM por não apresentarem o risco de desenvolvimento de resistência microbiana (BERALDO e ANDRADE, 2008; CHAN et al. 2007). O estudo clínico realizado por Koeman et al. (2006) diferenciase dos demais incluídos nesta revisão de literatura porque além de analisar o uso de CHX a 2% de forma isolada, também foi analisado o uso de uma associação de CHX a 2% com Colistina a 2% para a descontaminação da cavidade oral dos pacientes adultos internados em UTI sob VM. Como resultado do estudo clínico, foi observada uma redução no risco diário de aquisição de PAVM da ordem de 65% para os pacientes tratados com CHX e de 55% para os pacientes tratados com CHX/COL, comparando-se com o grupo de controle. Esses resultados são apoiados também pela redução significativa da colonização da orofaringe, inclusive por organismos gram-negativos, no caso dos pacientes que receberam CHX/COL. Por fim, os autores relatam que em ambos os grupos efetivamente tratados, a descontaminação da cavidade oral provocou um aumento considerável no tempo médio de aquisição da PAVM. Nos demais estudos clínicos incluídos nesta revisão de literatura, Grap et al. (2011) relataram uma redução da taxa de ocorrência de PAVM de 55,6% no grupo de controle para 33,3% para o grupo de pacientes tratados com CHX. Tantipong et al. (2008) obtiveram uma redução de 50% no número de casos de PAVM no grupo de pacientes sob tratamento, em relação ao grupo de controle. Fourrier et al. (2005) relataram que o uso de CHX na descontaminação da cavidade oral é eficaz para retardar a aquisição da PAVM e que, portanto, é de grande importância para pacientes que não necessitam de longos períodos de internação em UTI sob VM. Tanto Tantipong et al. (2008) quanto
Fourrier et al. (2005) relataram que nos pacientes efetivamente tratados com CHX houve uma diminuição considerável da incidência de colonização da cavidade oral. Em seu trabalho de revisão, Chan et al. (2007) analisaram quatro estudos clínicos que abordavam o uso de antibióticos para descontaminação da cavidade oral de pacientes adultos internados em UTI sob VM e em nenhum desses estudos houve redução estatisticamente significativa da ocorrência de PAVM. Neste mesmo trabalho, também foram analisados outros sete estudos clínicos que utilizaram a CHX como agente descontaminante e uma redução significativa da incidência de PAVM foi detectada. No entanto, Chlebicki e Safdar (2007) revisaram e analisaram em conjunto sete estudos clínicos quanto ao uso de CHX para descontaminação da cavidade oral em pacientes adultos internados em UTI sob VM e, apesar de dois destes sete estudos apresentarem dados estatisticamente significativos quanto a redução da ocorrência de PAVM no grupo de pacientes sob tratamento, quando os autores analisaram o conjunto total dos pacientes dos sete estudos, foi constatada uma redução de apenas 2% de casos de PAVM. Os autores destacam, entretanto, que havia muita disparidade entre os estudos quanto à forma de utilização da CHX e quanto à concentração utilizada. Essa mesma heterogeneidade quanto ao modo de utilização e concentração do uso de CHX foi reportada na meta-análise de Gnatta et al. (2013), entretanto, os autores analisaram os dados dos estudos clínicos subdividindo-os quanto à concentração da CHX. Nos grupos de pacientes tratados com CHX a 0,12% não foi possível detectar nenhum fator de proteção da CHX quanto à aquisição de PAVM. Já para os pacientes tratados com CHX a 0,2% os autores afirmam que as pesquisas analisadas não levam a um resultado conclusivo, o que eles atribuem a uma variedade de estados clínicos dos pacientes analisados nos estudos. Por fim, nos pacientes tratados com CHX a 2% detectou-se uma redução significativa na ocorrência de PAVM, no entanto os autores destacam que esse resultado deve ser encarado com cautela, pois apenas dois estudos clínicos que utilizaram essa concentração foram incluídos no trabalho. Em contraste ao trabalho de Chlebicki e Safdar (2007), Gnatta et al. (2013) relatam que, quando analisado todo o conjunto de pacientes incluídos nos trabalhos analisados, o uso de CHX para descontaminação da cavidade oral se mostrou efetivo como forma de prevenção à PAVM, mesmo que em ambos os trabalhos não haja uma definição clara sobre qual a melhor forma de utilização (solução, gel, spray) e nem quanto à concentração de CHX utilizada. Apesar dos resultados consolidados por Gnatta et al. (2013) quanto à não-eficácia da aplicação de CHX a 0,12% como forma de prevenir a PAVM, Souza, Guimarães e Ferreira (2013) avaliaram o uso de CHX a 0,12% para descontaminação da cavidade oral de pacientes adultos internados na UTI sob VM em conjunto com a adoção de um novo protocolo de atendimento, aderente ao bundle de prevenção à PAVM e também a inclusão de um profissional cirurgião-dentista na equipe de atendimento. A adoção de todas essas práticas, em conjunto, levou a uma redução do índice de desenvolvimento de PAVM de 33% para apenas 3,5% e, segundo os autores, a PAVM deixou de ser a infecção de maior ocorrência na UTI do hospital onde o estudo foi realizado. Similarmente, Eom et al. (2014) realizaram uma avaliação da implementação do bundle de prevenção à PAVM em conjunto com a adoção da prática de descontaminação da cavidade oral dos pacientes com CHX a 0,12%. Os autores analisaram os dados de pacientes internados em UTIs sob VM de 6 hospitais universitários. Após 8 meses da implantação do novo protocolo de atendimento, os autores relataram que houve uma redução da taxa de ocorrência de PAVM de
64 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
4,08 eventos a cada 1000 dias de VM para 1,16 eventos a cada 1000 dias de VM no período do estudo. Resultado semelhante foi obtido no estudo de Cutler e Sluman (2014) onde foi avaliada a adoção do bundle de prevenção à PAVM em combinação com a prática de higienização da cavidade oral com CHX a 1% em pacientes hospitalizados por pelo menos 48 horas na UTI sob VM em um hospital inglês. Em relação ao grupo de controle, o número de ocorrências de PAVM caiu de 13,6 para cada 1000 dias sob VM para 6,9 no grupo tratados de acordo com o novo procedimento adotado. Hutchins et al. (2009) compararam dados obtidos em seu estudo clínico com informações históricas de ocorrência de PAVM na UTI do hospital onde o estudo foi realizado de modo a mensurar o impacto que a implantação do bundle de prevenção à PAVM em combinação com a descontaminação da cavidade oral ocasionaria na taxa de ocorrência da infecção. Inicialmente, a descontaminação era feita utilizando-se cloreto de cetilpiridínio. Apenas no último ano do estudo que passou-se a utiliza a CHX para descontaminação da cavidade oral. Durante o período em que o cloreto de cetilpiridínio foi utilizado, os autores relatam que houve uma taxa de ocorrência de PAVM de 3,57 casos a cada 1000 dias de VM. Após o início da utilização da CHX, essa taxa caiu para 1,3 casos a cada 1000 dias de VM. Os dados históricos disponíveis sobre o período anterior ao início do estudo indicavam que havia uma ocorrência de 12,6 casos de PAVM a cada 1000 dias de VM. Em comparação com o período anterior ao início da adoção do bundle, os autores encontraram fortes indícios de que esse novo protocolo de atendimento é um importante aliado na redução da ocorrência de PAVM. Os resultados ainda sugerem, segundo os autores, que a CHX desempenha papel de destaque como medida de prevenção à PAVM, uma vez que a partir de sua adoção como agente descontaminante da cavidade oral, os demais procedimentos permaneceram inalterados, ou seja, grande parte da expressiva redução dos casos no último período do estudo se deve à sua utilização. Morris et al. (2011) ao comparar os resultados obtidos em seu estudo clínico com os dados históricos da UTI do hospital onde foi realizado o estudo, além de obterem resultados semelhantes na redução da taxa de ocorrência de PAVM acrescentam que os maiores índices de redução de ocorrência de PAVM foram percebidos entre os pacientes que necessitaram de um tempo maior de internação sob VM. É importante ressaltar que, com base apenas nos estudos clínicos selecionados, não é possível quantificar separadamente qual o impacto que cada medida teve na redução da ocorrência de casos de PAVM. Entretanto, os autores destacam que essa abordagem de somar os esforços de higienização da cavidade oral com as práticas recomendadas pelo bundle de prevenção à PAVM se mostra muito promissora. Por isso, reduzir os riscos associados à VM em pacientes críticos é complexo e exige uma equipe multidisciplinar para o cuidado desses pacientes (SOUZA, GUIMARÃES e FERREIRA, 2013). Dessa forma, a adoção das práticas recomendadas pelo bundle de prevenção à PAVM e a descontaminação da cavidade oral com o uso de CHX direcionado aos pacientes sob VM, contribui de forma efetiva para a prevenção da PAVM e esta alternativa além de ser barata (pois se atua no nível primário de prevenção), é simples, viável e de extrema importância e necessidade. A integração do cirurgiãodentista nas equipes interdisciplinares das UTIs é indispensável, pois através da descontaminação bucal, além da prevenção da PAVM, pode ocorrer a diminuição do tempo de internação, contribuindo para saúde, conforto e bem-estar do paciente hospitalizado e, em consequência, uma redução significativa dos custos hospitalares. Para contextualizar o impacto que uma medida eficaz de prevenção à PAVM pode ter no que se refere a custos de internação, Abuabara, Weinzierl e Weinzier (2014) realizaram uma comparação
entre os custos estimados provocados por cada caso de PAVM e o custo profilático do uso de CHX no Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo os autores, o desenvolvimento da PAVM está associado a um prolongamento de, em média, 10 dias no tempo de internação do paciente. Com base nas tabelas de valores de diárias de internação em UTI adulta do SUS (consultadas em 2013 pelos autores), chegouse a um valor médio de aproximadamente R$ 375,00 por paciente, por dia de internação. Sendo assim, o valor médio gasto com o tempo adicional de internação, por paciente, é de R$ 3750,00. Além dos custos de internação, existem os custos com a medicação para combater a infecção. Segundo os autores, o antibiótico mais utilizado no tratamento da PAVM é o piperacilina-tazobactan, a um custo aproximado de R$ 3730,00 por paciente (valores consultados também em 2013). Portanto, o custo médio de internação e medicamento por episódio de PAVM desenvolvido em UTIs do SUS atinge R$ 7.480,00, aproximadamente. Em contraste a esse valor, os autores estimam que o custo médio da antissepsia bucal com CHX em R$ 2,32 por paciente por dia. É importante ressaltar que, mesmo utilizando valores do ano de 2013, ou seja, valores desatualizados, essas estimativas se mostram relevantes para evidenciar a grande economia que pode ser obtida através da utilização da CHX como medida preventiva à PAVM. 4 – CONCLUSÃO O uso de CHX para realizar a descontaminação oral de pacientes adultos internados em UTI sob VM tem se mostrado um importante e eficiente mecanismo para prevenção à PAVM, particularmente quando adotado em conjunto com as práticas definidas pelo bundle de prevenção à PAVM. Não é possível definir, entretanto, qual a melhor concentração de CHX a ser utilizada, visto que houve uma grande variação nos resultados encontrados pelos autores. Além disso, como consequência da diminuição da ocorrência de PAVM, a descontaminação oral com CHX também se mostra uma grande aliada na redução do tempo médio de internação e na redução dos custos hospitalares. REFERÊNCIAS ABUABARA, Allan; WEINZIERL, Greici; WEINZIER Werner Artur Jorge. Antissepsia bucal com clorexidina para prevenir a pneumonia associada à ventilação mecânica: revisão e estudo de custos. Revista Eletrônica Gestão e Saúde. v.5, n. 3, p. 2195-219, 2014. AMARAL, Simone Macedo; CORTÊS, Antonieta de Queiróz; PIRES, Fábio Ramôa. Pneumonia nosocomial: importância do microambiente oral. J Bras Pneumol, v. 35, n. 11, p. 1116-1124, 2009. BERALDO, Carolina Contador; ANDRADE, Denise de. Higiene bucal com clorexidina na prevenção de pneumonia associada à ventilação mecânica. J Bras Pneumol, v. 34, n. 9, p. 707-714, 2008. CHAN, Ee Yuee et al. Oral decontamination for prevention of pneumonia in mechanically ventilated adults: systematic review and meta-analysis. Bmj, v. 334, n. 7599, p. 889, 2007. CHLEBICKI, Maciej Piotr; SAFDAR, Nasia. Topical chlorhexidine for prevention of ventilator-associated pneumonia: a meta-analysis. Critical care medicine, v. 35, n. 2, p. 595-602, 2007. COSTA, Beneceli; ZAGO, Maria Angélica Borges da Silva; GIARETTA, Vania Maria de Araujo. Pneumonia associada ao ventilador mecânico. Revista Eletrônica de Enfermagem do Vale do Paraíba, v. 1, n. 06, 2015. CUTLER, Lee R.; SLUMAN, Paula. Reducing ventilator associated pneumonia in adult patients through high standards of oral care: a historical control study. Intensive and Critical Care Nursing, v. 30, n. 2, p. 61-68, 2014. EL AZAB, Samia Ragab et al. Combination of ventilator care bundle and regular oral care with chlorhexidine was associated with reduction in ventilator associa-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 65
ted pneumonia. Egyptian Journal of Anaesthesia, v. 29, n. 3, p. 273-277, 2013. EOM, Joong Sik et al. The impact of a ventilator bundle on preventing ventilator-associated pneumonia: a multicenter study. American journal of infection control, v. 42, n. 1, p. 34-37, 2014.
NOTAS DE FIM Alunas do curso de graduação em odontologia do Centro Universitário Newton Paiva. tatianeluizoliveira@gmail.com 1
2 Professora do curso de odontologia do Centro Universitário Newton Paiva. Graduada em ciências biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais, com licenciatura plena e bacharelado com ênfase em microbiologia. Mestre em microbiologia e doutora em ciência animal, ambos pela Universidade Federal de Minas Gerais. andrea.souza@newtonpaiva.br
66 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
DESENVOLVIMENTO DE UM SOFTWARE PARA PADRONIZAÇÃO DAS PRESCRIÇÕES MEDICAMENTOSAS DOS CENTROS DE REFERÊNCIA EM SAÚDE MENTAL (CERSAM) DE BELO HORIZONTE Ana Flávia Thomaz Lages1 Luciane de Abreu Ferreira2 Sérgio Ribeiro Cardoso3
RESUMO: Um dos fatores que pode contribuir para propagação e produção de erros relacionados a medicação é a prescrição medicamentosa. Dessa forma, técnicas podem ser empregadas e desenvolvidas para otimização desse processo, como por exemplo, o uso de tecnologia. O presente trabalho apresentou uma proposta de um software informatizado para padronização das prescrições dos Centros de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte. A metodologia utilizada foi baseada nos métodos ágeis, amplamente utilizados na área de engenharia de software. Este software representará um grande avanço dentro das estratégias utilizadas para minimizar erros decorrentes de prescrições mal formuladas, melhorando assim, a segurança da terapêutica e a qualidade do atendimento aos pacientes dessas unidades. PALAVRAS-CHAVE: Erros de medicação. Prescrição medicamentosa. Software.
INTRODUÇÃO O enfoque da loucura como doença e da psiquiatria como especialidade médica é recente na história da humanidade, aproximadamente 200 anos. Foi a partir do século XVIII que o homem inventou uma nova maneira de se perceber e vivenciar a condição humana (GONÇALVES e SENA, 2001). Nos anos 70 iniciou-se a crise do modelo de assistência centrado no hospital psiquiátrico que eclodiu nos esforços dos movimentos sociais pelos direitos dos pacientes psiquiátricos. O processo de Reforma Psiquiátrica é um conjunto de transformações, práticas, saberes, valores culturais e sociais em torno do “louco” e da “loucura”, mas especialmente em torno das políticas públicas para lidar com a questão (BRASIL, 2007). A loucura sempre existiu, bem como o lugar para se tratar dos loucos: templos, domicílios e hospitais, mas a instituição psiquiátrica, propriamente dita, é uma construção do século XVIII (GONÇALVES e SENA, 2001). A práxis da reforma psiquiátrica faz parte do cotidiano de um bom número de profissionais de saúde mental e, através da Reforma Psiquiátrica no Brasil, mudou-se o atendimento aos pacientes com transtornos mentais garantindo o acesso dos usuários aos serviços de saúde, respeitando seus direitos e liberdade (GONÇALVES e SENA, 2001; ROMAN e WERLANG, 2010). Para isso, foram criados os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que, entre todos os dispositivos de atenção à saúde mental, têm valor estratégico para a Reforma Psiquiátrica Brasileira. É o surgimento destes serviços que passa a demonstrar a possibilidade de organização de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico no país (BRASIL, 2005). Em Minas Gerais, os CAPS foram criados e denominados como Centros de Referência em Saúde Mental (CERSAM) que dispõem de serviços regionalizados, destinados ao atendimento de urgências psíquicas, bem como o acompanhamento de pacientes
de saúde mental em crise, ou seja, psicóticos e neuróticos graves, egressos ou não do sistema hospitalar tradicional (OLIVEIRA et al., 2007; CUNHA e MACIEL, 2008). Nos CERSAM, para cada paciente é elaborado um plano de tratamento específico onde o uso de psicofármacos constitui um importante aliado para a terapêutica dos mesmos. Visto isso, a preocupação com problemas de saúde relacionados aos medicamentos tem aumentado entre os profissionais de saúde (CRUCIOL-SOUZA et al., 2008; ROMAN e WERLANG, 2010). Estudos em Harvard Medical Practice Study, marcantes e pioneiros na área de segurança do paciente, mostraram que os eventos adversos relacionados à assistência prestada nas unidades e aos erros de medicação são comuns e inesperadamente altos em hospitais norte-americanos, acarretando danos permanentes e mortes (PERINI et al., 2009). A prescrição medicamentosa, quando em não conformidade com a Lei 5991/73, que determina que somente “será aviada a receita que estiver escrita à tinta, em vernáculo por extenso e de modo legível, observados a nomenclatura e o sistema de medidas atuais”, pode ser um desses fatores capaz de interferir na segurança da terapêutica do paciente e contribuir para propagação e produção de erros relacionados a medicação do mesmo (BRASIL, 1973) Sendo assim, técnicas podem ser empregadas e desenvolvidas para otimização dessa prática, como por exemplo, o desenvolvimento de softwares para realização das prescrições medicamentosas (SILVA, 2009). A prescrição médica eletrônica aumenta a segurança da terapia medicamentosa, melhora a legibilidade, não permite utilização de siglas e abreviaturas, elimina chance de haver rasuras, facilita a utilização dos nomes genéricos ao invés dos comerciais, enfim, simplifica e torna o software de medicação mais eficiente e seguro (PLANELLS et al., 2002; GOBBO et al., 2007; RIPOLI, 2008).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 67
Com base nos estudos relacionados aos erros de medicação que envolve, principalmente, o processo da prescrição medicamentosa, esse trabalho desenvolveu um software para padronização das precrições medicamentosas dos Centros de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte (CERSAM). Esse visa facilitar o controle, registro, análise e dispensação de medicamentos; permitir agilidade no preenchimento da prescrição bem como a legibilidade da mesma; auxiliar o planejamento, programação e a distribuição mensal dos medicamentos; possibilitar o acompanhamento farmacoterapêutico dos pacientes e minimizar os erros de medicação. METODOLOGIA O levantamento da necessidade do desenvolvimento de um software para padronização das prescrições medicamentosas foi realizado pelos farmacêuticos, enfermeiros e psiquiatras que atuam nestas unidades. A metodologia utilizada para desenvolvimento do software SISPRESC foi baseada nos métodos ágeis, amplamente utilizados hoje em dia para desenvolvimento de aplicações desse porte. As metodologias ágeis, hoje, são de interesse de boa parte da comunidade de produção de software, uma vez que suas práticas são bem difundidas principalmente em pequenas configurações. Software de menor custo, de mais rápido desenvolvimento, menos burocrático e com melhoria de resultados em curto prazo são atrativos para pequenas organizações (SANTANA et al., 2006). Uma característica dessas metodologias é que elas são adaptativas ao invés de serem preditivas. Com isso, se adapta a novos fatores decorrentes do desenvolvimento do projeto. Outro ponto positivo é a entrega constante de partes operacionais do software (SOARES, 2004). O método não rejeita os processos e ferramentas, a documentação, a negociação de contratos ou o planejamento, mas simplesmente mostra que eles têm importância secundária quando comparado com os indivíduos e interações, com o software estar executável, com a colaboração do cliente e as respostas rápidas a mudanças e alterações (GONÇALVES e FILHO, 2008). Essas metodologias pregam que o sucesso de um projeto depende única e exclusivamente das pessoas envolvidas e do esforço por elas realizado para o término do projeto. O enfoque é nas pessoas e não em processos ou algoritmos. Além disso, existe a preocupação de gastar menos tempo com documentação e mais com a implementação (SOARES, 2004; SANTANA et al., 2006). Sendo assim, os processos para o desenvolvimento do software SISPRESC foram: Especificação de Software: definiu as funcionalidades e as restrições do software. Realizou-se o delineamento do software, das definições de entradas, saídas e das consulta dos registros de dados do usuário. Modelagem do Banco de Dados: definiu-se a estrutura dos arquivos que favoreçam a eficiência no compartilhamento, no gerenciamento, recuperação e armazenamento dos dados. Projeto e implementação de software: o software foi produzido
de acordo com as especificações solicitadas pelos enfermeiros, psiquiatras e farmacêutico do Centro de Referência em Saúde Mental da Pampulha. Nesta fase foram propostos modelos através de diagramas, e estes modelos foram implementados em linguagem de programação PowerBuilder. Validação do Software: o software será validado, pelos profissionais de saúde do Centro de Referência em Saúde Mental da Pampulha, para garantir que todas as funcionalidades especificadas e solicitadas tenham sido implementadas. Implantação do Softtware: O software será implantado em todos os Centros de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte. No banco de dados, foram criadas tabelas, que armazenam informações relativas ao cadastro de medicamentos, profissionais de saúde, médicos, pacientes e seus respectivos sistemas posológicos. Para o desenvolvimento do software, foram utilizados programas para edição de textos (Microsoft Word 2010), projeto de banco de dados (Oracle Sql Data Modeler), edição de imagens (Corel Photo Paint), criação e gerenciamento de banco de dados (Microsoft Access 2010). Este software é multiusuário e funciona em sistema operacional Windows XP e Windows 7, em microcomputadores com configuração mínima de 1 GB de RAM, 2 GB de Hard Disk, processador Pentium ou superior a este. A validação do software será realizada no Centro de Referência em Saúde Mental da Pampulha para garantia de que todas as especificações tenham sido implantadas e que o software esteja de acordo com o que o usuário deseja. Para etapa de validação serão analisados: número de falhas do software, tempo de execução, tempo de resposta, facilidade de uso e conformidade com as especificações solicitadas. O software será testado através da execução das ações com dados de teste e o seu comportamento operacional será analisado juntamente do seu desempenho e confiabilidade. Nessa etapa serão descobertos os erros inerentes à utilização do sistema. O presente estudo visou à apresentação de uma proposta de modelo de software, já o processo de validação será um trabalho posterior. RESULTADOS E DISCUSSÃO O software desenvolvido para a padronização das prescrições medicamentosas dos Centros de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte possui como tela inicial o desenho realizado por uma paciente do Centro de Convivência Pampulha, ex-interna do CERSAM Pampulha, como forma de reconhecimento da arte e do artista portador de doença mental (Figura 1). O software recebeu o nome de SISPRESC (Sistema de Prescrição) e funciona somente com utilização de senha individual. O software possui doze menus principais, conforme mostra a Figura 1. A primeira barra horizontal de menus possui chaves para registro, exibição, cadastros, processos, consultas, ferramentas e dúvidas. A segunda barra horizontal contém ícones que são mais utilizados e que podem ser visualizados diretamente na tela inicial: prescrição, cadastro de pacientes, impressão da prescrição, configuração da impressora e sair do sistema.
68 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Figura 1 – Tela inicial do “SISPRESC” e menu principal. Fonte: Arquivo pessoal.
Antes de iniciar a utilização do SISPRESC é necessário realizar cadastros referentes aos medicamentos padronizados pela unidade, aos médicos e a outras ocupações. No caso da Figura 2, temos o cadastro de ocupações onde deverão ser informados ao sistema quais as especialidades dos profissionais de saúde que estão disponíveis na unidade, uma vez que este banco de dados será utilizado posteriormente no cadastro individual desses profissionais.
Após cadastrar as especialidades dos profissionais pertencentes ao CERSAM (Figura 2), há uma chave para cadastro dos funcionários (Figura 3) onde são solicitados o nome do funcionário, o CRM (se o mesmo for médico) e a ocupação. Esta última aparece em forma de filtro e, estão disponíveis para escolha, todas as ocupações já cadastradas anteriormente. Também é possível discriminar se o funcionário está ativo ou inativo por motivos diversos através do campo “Status”.
Figura 2 – Cadastro de ocupação. Fonte: Arquivo pessoal.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 69
Figura 3 – Cadastro de profissional de saúde. Fonte: Arquivo pessoal.
Além de realizar o cadastro das ocupações e dos funcionários é necessário realizar o cadastro dos medicamentos e dos pacientes, que funciona basicamente do mesmo modo já mencionado acima. Todos os cadastros são realizados apenas uma única vez, pois o software é capaz de armazenar todos os dados em um sistema banco de dados. Sendo assim, após todos os cadastros necessários, poderá realizar a prescrição medicamentosa por meio da chave: “Processos”, “Prescrever” ou diretamente através do ícone “Prescrever” onde abri-
rá uma prescrição em branco para preenchimento das informações (Figura 4). De acordo com a Figura 5, as prescrições são cadastradas com código sequencial numérico como chave principal, gerado pelo próprio sistema, sendo assim, qualquer prescrição pode ser recuperada através deste número. O campo “Médico” está interligado ao usuário além da senha utilizada para acesso ao sistema, dessa forma, seu preenchimento é automático.
Figura 4 – Prescrição medicamentosa em branco. Fonte: Arquivo pessoal.
70 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
O paciente e o profissional de saúde responsável já foram previamente cadastrados bastando clicar nesses campos para aparecer um filtro de escolha dos mesmos. A data e hora da prescrição são provenientes do próprio computador em utilização. A tabela de permanência e frequência do paciente no CERSAM deve ser completada selecionando os dias da semana e os horários que o usuário frequenta a unidade. A prescrição é realizada através de filtro para busca dos medicamentos, que aparece com um clique no campo. Abaixo do campo de cada um deles existe um espaço para digitar algum cuidado espe-
cífico com relação à utilização, reação adversa ou interação. À frente é indicada a posologia no horário padrão dos CERSAM, 8h, 14h, 17h e 20h e no campo de “observação” poderá colocar algum cuidado geral com relação ao paciente ou à terapia medicamentosa. Existem ícones localizados na tela principal da prescrição onde estão disponíveis funções para: realizar uma nova prescrição, ou seja, o sistema limpa todos os campos para que o médico inicie; recuperar algum cadastro que já se encontra no banco de dados; incluir uma nova prescrição baseada na última que foi realizada para cada paciente consultando seu histórico; excluir medicamentos da prescrição após o mesmo ser prescrito e até mesmo excluir todo o documento.
Figura 5 – Prescrição medicamentosa preenchida. Fonte: Arquivo pessoal.
Após o preenchimento da prescrição deve-se salvar e solicitar a impressão (Figura 6). O SISPRESC foi desenvolvido para que ocorra impressão simultânea de duas vias diferentes através de uma única forma de preenchimento pelo médico. Assim, no momento da impressão são gerados dois documentos (Figura 7): a prescrição que será encaminhada para farmácia do CERSAM e a prescrição que será encaminhada para o posto de enfermagem. O software SISPRESC também é capaz de emitir relatórios individuais e coletivos através da chave “Consultas” (Figura 8). Na emis-
(Figura 9), médicos, funcionários e pacientes cadastrados. Nas consultas por paciente (Figura 8), o software gera relatórios de todos os usuários por utilização de determinado medicamento (Figura 10); do tipo de permanência/frequência pelos dias da semana ou pelo horário; pelo médico e pela referência técnica responsável, em determinada data ou período. Os relatórios originados a partir das prescrições (Figura 8) fornecem listas das mesmas por data, por médico e por paciente. A emissão do relatório de prescrição por paciente irá demonstrar o histórico medi-
são de catálogos é possível imprimir listas de todos os medicamentos
camentoso deste usuário.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 71
Figura 6 – Solicitação de impressão de prescrições. Fonte: Arquivo pessoal.
Figura 7 – Prescrições encaminhadas à farmácia e ao posto de enfermagem. Fonte: Arquivo pessoal.
72 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
pelo horário; pelo médico e pela referência técnica responsável, em determinada data ou período. Os relatórios originados a partir das prescrições (Figura 8) fornecem listas das mesmas por data, por médico e por paciente. A emissão do relatório de prescrição por paciente irá demonstrar o histórico medi-
camentoso deste usuário. O SISPRESC também possui relatórios com a descrição do esquema terapêutico por paciente; previsão do encerramento do tratamento de forma individualizada e totalização do quantitativo de medicamento por usuário.
Figura 8 – Consultas e Relatórios disponíveis. Fonte: Arquivo pessoal.
Figura 9 – Relatório de catálogo de medicamentos. Fonte: Arquivo pessoal.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 73
O SISPRESC também possui relatórios com a descrição do esquema terapêutico por paciente; previsão do encerramento do tratamento de forma individualizada e totalização do quantitativo de medicamento por usuário. O software desenvolvido é capaz de facilitar o registro, a análise, o controle e a dispensação de medicamentos nos Centros de Referência em Saúde Mental; permitir a agilidade no preenchimento da prescrição bem como a legibilidade da mesma; auxiliar o planejamento, a programação e a distribuição mensal dos medicamentos e possibilitar ainda, a realização do acompanhamento farmacoterapêutico dos pacientes. Dessa forma, o desenvolvimento deste software visou à redução dos erros advindos do processo de prescrição medicamentosa e, consequentemente, a melhora na qualidade do atendimento aos portadores de doença mental dessas unidades. CONCLUSÃO Esse trabalho apresentou uma proposta de um software informatizado para padronização das prescrições dos Centros de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte. A validação do software e a implantação desse modelo em todos os CERSAM de Belo Horizonte são trabalhos futuros que acontecerão após implementação desse sistema no CERSAM – Pampulha, onde serão realizados testes para garantir que todas as funcionalidades especificadas e solicitadas tenham sido implantadas. Este software representará um grande avanço dentro das estratégias utilizadas para minimizar erros decorrentes de prescrições mal formuladas uma vez que a segurança do paciente e a melhoria da qualidade do serviço de saúde são metas que os profissionais têm e acredita-se que a prescrição eletrônica pode contribuir no alcance das mesmas. Todo profissional de saúde tem contribuições a dar na assistência ao portador de saúde mental e um bom trabalho em equipe deve contar com a participação efetiva e constante de todos os profissionais. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n° 5.991, de 17 de dezembro de 1973. Dispõe sobre o Controle Sanitário do Comércio de Drogas, Medicamentos, Insumos Farmacêuticos e Correlatos, e dá outras Providências. Disponível em:<http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/L5991.htm> Acesso em: 22 Abril 2012. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. Documento apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. OPAS. Brasília. Nov. 2005. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Relatório de Gestão 2003-2006: Saúde Mental no SUS - Acesso ao tratamento e mudança do modelo de atenção/Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2007. 78p. :il. – (Série C. Projetos, Programas e Relatórios) ISBN 978-85-334-1338-2. CRUCIOL-SOUZA, J. M; THOMSON, J. C; CATISTI, D. G. Avaliação de prescrições medicamentosas de um hospital universitário brasileiro. Rev. bras. educ. med., Rio de Janeiro, v. 32, n. 2, Junho 2008. Disponível em: <http://www.scielo. br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S01005502 2008000200006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 14 Março 2012. CUNHA, G. A. de M. e A.; MACIEL, S. C. Saúde Mental - Luta Antimanicomial, Reforma Psiquiátrica e CERSAMs: Campo de Atuação das Políticas Públicas. 2008. Disponível em <http://www.webartigos.com/ articles/11430/1/saude-men-
tal---luta-ntimanicomial-reforma-psiquiatrica-e-cersams/ pagina1.html>. Acesso em: 14 Abril 2012. GOBBO, A. I. M. et al. Erros de medicação: condutas e propostas de prevenção na perspectiva da equipe de enfermagem. Revista Eletrônica de Enfermagem, v. 09, n. 03, p. 712 - 723, 2007. Disponível em:<http://www.fen. ufg.br/revista/v9/ n3/v9n3a11.htm> Acesso em: 12 Abril 2012. GONCALVES, A. M; SENA, R. R. de. A Reforma psiquiátrica no Brasil: contextualização e reflexos sobre o cuidado com o doente mental na família. Rev. Latino-Am. Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 9, n. 2, abr. 2001. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_a rttext&pid=S0104 11692001000200007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 07 Maio 2012. GONÇALVES, E. dos S; FILHO, H. B. dos R. Ferramenta para Gerenciamento de Requisitos em Metodologias Ágeis. Hífen, Uruguaiana, v.32. n° 62. II Semestre. 2008. Issn 1983-6511. Rio grande do sul. Disponivel em:<http://revistaseletronicas.pucrs.br/fo/ojs/index .php/hifen/article/viewFile/4593/3480> Acesso em: 13 Maio 2012. OLIVEIRA; G.L. et al. Perfil dos pacientes atendidos e encaminhados a centros de saúde por um centro de referência à saúde mental em Belo Horizonte/MG. REME – Rev. Min. Enf.;11(2):119-125, abr./jun., 2007. Disponivel em:http://www. enf.ufmg.br/site_novo/modules/mastop_ publish/files/files_4c0e3c640d7c9. pdf> Acesso em: 18 Maio 2012. PERINI, E. et al . Erros na prescrição hospitalar de medicamentos potencialmente perigosos. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 43, n. 3, June 2009 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script= sci_arttext&pid=S0034-89102009000300013&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 24 Maio 2012. PLANELLS, C. et al. Desarrollo e implementación de un sistema de prescripción eletrónica asistido en un hospital de tercer nível. In: VII Jornadas sobre Tecnologías de La Información para La odernizaión de Las Administraciones Públicas, 2002. Disponível em: <http://www.csi.map.es/ csi/tecnimap/tecnimap2002/ pdfs/c4.8-117.pdf.> Acesso em:12 Abril 2012. RIPOLI, F. H. L. Um modelo de segurança para o sistema de prescrição eletrônica do HUSM. Trabalho de graduação n° 273. Universidade Federal de Santa Maria. Centro de Tecnologia. Rio Grande do Sul, 2008. p.53. ROMAN, G; WERLANG, M. C. Faculdade de Farmácia. O uso de psicofármacos na atenção primária à saúde. Rev de graduação. v. 4, n.1, 2010. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/ graduacao/article/ view/8687/6137. Pouso alegre,2010> Acesso em: 26 Maio 2012. SANTANA, C. A; TIMÓTEO, A. L; VASCONCELOS, A. M. L. Mapeamento do modelo de Melhoria do Processo de Software Brasileiro (MPS.Br) para empresas que utilizam Extreme Programming (XP) como metodologia de desenvolvimento. Centro de Informática. Universidade Federal de Pernambuco . V Simpósio Brasileiro de Qualidade de Software – SBQS´2006. Disponível em: < http://www. lbd.dcc.ufmg.br/colecoes/sbqs/2006/009.pdf> Acesso em: 13 Maio 2012. SILVA, A. M. S. Erros de prescrição médica de pacientes hospitalizados. Einstein. 2009; 7(3 Pt 1):290-4. SOARES, M. dos S. Comparação entre Metodologias Ágeis e Tradicionais para o Desenvolvimento de Software. Journal of Computer Science. v. 3. 2004. Disponível em: <http://www.lbd.dcc.ufmg.br/bdbcomp/servlet/ Trabalho?id=5350> Acesso em: 16 Abril 2012.
NOTAS DE FIM 1 Discente do curso de Farmácia do Centro Universitário Newton Paiva 2 Docente do Centro Universitário Newton Paiva. luabreu@newtonpaiva.br 3 Farmacêutico do Centro de Referência em Saúde Mental Pampulha
74 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
PROMOÇÃO EM SAÚDE E RASTREAMENTO DOS CÂNCERES DO COLO UTERINO E DE MAMA: um relato de experiência Grace Kelly Portes Bragion1 Edinéia de Castro Viana1 Cristiane Marinho da Silva Costa1 Fernanda dos Anjos Oliveira2
RESUMO: Objetivou-se relatar a experiência vivenciada pelas acadêmicas do curso de enfermagem referente ao estágio curricular supervisionado do 8° período, em uma Unidade Básica de Saúde na região leste de Belo Horizonte, no contexto da Prevenção dos Cânceres de Colo Uterino e Mama com intuito de sensibilizar as mulheres entre 25 e 64 anos sobre a importância dos cuidados relacionados à Saúde da Mulher priorizando o rastreamento do Câncer de Mama e Colo Uterino. Nas atividades realizadas foram utilizados vários métodos instrucionais tais como: convites, roteiro de anamnese, questionários, sala de espera, instrumento controle, intervenções lúdicas, folders, cartazes e vídeos. Foi possível observar diferentes motivos causais para a baixa adesão ao exame citopatológico, mas o principal foi a incompatibilidade de horário entre o funcionamento da Unidade Básica de Saúde e a jornada de trabalho das usuárias. Diante disso faz-se necessário e essencial o enfoque na Saúde da Mulher, já que o Câncer de Colo de Útero e de mama representam causas de morbidade de suma importância epidemiológica no cenário brasileiro. PALAVRAS – CHAVE: Enfermeiro. Câncer do Colo Uterino e de Mama. Estratégia Saúde da Família.
INTRODUÇÃO O Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva, em sua grade curricular apresenta estágios supervisionados em diferentes níveis de atenção, dentre eles o do 8° período cujo foco é a assistência de enfermagem na prevenção de agravos e promoção à saúde em unidades de atenção básica, com o objetivo de apresentar aos acadêmicos a realidade profissional e o importante papel desempenhado pelo enfermeiro atuante na Estratégia Saúde da Família (ESF), em especial a atribuição de educador em saúde. O estágio permite ao acadêmico identificar novas e variadas estratégias para solucionar problemas que muitas vezes os alunos nem imaginavam encontrar em sua área profissional. O fato de o estágio ser supervisionado por um docente torna-o um treinamento e uma forma de profissionalização, na qual o estudante vivencia o conteúdo aprendido na Universidade e elabora estratégias eficientes que contribuem com a assistência prestada, tanto na melhoria da qualidade quanto na eliminação ou minimização de falhas. É uma ferramenta que pode fazer a diferença para aqueles que estão adentrando no mundo de trabalho e que tem o poder de mudar a lamentável realidade da educação brasileira então observada (DANIEL, 2012). Segundo a Lei nº 11788, de 25 de setembro de 2008, Art.1º, estágio é o ato educativo escolar supervisionado, parte integrante do projeto pedagógico do curso, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa a preparação para o trabalho produtivo de educandos, o aprendizado de competências próprias da atividade profissional e a contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho (BRASIL, 2008). A Saúde da Mulher é uma importante vertente e para que a assistência seja efetiva é primordial priorizar ações preventivas que interfiram no número de novos casos de câncer do colo uterino e de mama e na resolutividade e recuperação das mulheres que precisarão de atendimento nas atenções secundária e terciária (OLIVEIRA, 2015).
A partir de 1980 o interesse pelo tema Saúde da Mulher cresceu no país não apenas nos espaços acadêmicos, mas também na maioria dos movimentos sociais organizados. No processo de abertura política, feministas e profissionais da saúde iniciaram uma parceria com o Ministério da Saúde para elaboração de propostas de atendimento à mulher que garantissem o respeito a seus direitos de cidadã, resultando em uma proposta concreta do Estado como resposta às reivindicações, o Programa de Assistência Integral à Saúde da MulherPAISM (SEPÚLVEDA, 2001). A qualidade do atendimento deve ser boa e adequada. Deve, ainda, proporcionar a realização de atividades educativas que permitam às mulheres deterem maior conhecimento sobre o seu próprio corpo – inclusive para melhor vivenciarem a sua sexualidade, alertando-as acerca dos problemas mais comuns de saúde e como viverem melhor (REDE SAÚDE, 2002). O enfermeiro é um dos profissionais responsáveis pelo processo educativo da comunidade, sendo de sua competência divulgar informações a respeito dos fatores de riscos, desenvolver ações de prevenção e detecção precoce, orientar modelos de comportamentos e hábitos saudáveis para a saúde da mulher. Além disso, este também deve estar apto a detectar situações de risco durante o acolhimento ou durante a consulta ginecológica (BEGHINI et al, 2006). Segundo a resolução COFEN Nº 381/2011, no âmbito da equipe de Enfermagem, a coleta de material para colpocitologia oncótica pelo método de Papanicolau é privativa do Enfermeiro, observadas as disposições legais da profissão. O Enfermeiro deverá estar dotado dos conhecimentos, competências e habilidades que garantam rigor técnico científico ao procedimento, atentando para a capacitação contínua necessária à sua realização (COFEN, 2011). Como docentes e discentes, acreditamos que trabalhar a temática Prevenção dos Cânceres do Colo Uterino e Mama, se faz necessário na atenção primária de forma a garantir a equidade e a
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 75
humanização da assistência. É imperioso como as intervenções em saúde focadas na prevenção e na educação em saúde permitem um trabalho mais efetivo e coerente às recomendações descritas nos protocolos, manuais e programas do Ministério da Saúde (MELO, 2012). Dessa forma nota-se a relevância do papel realizado pelo enfermeiro no desenvolvimento de práticas educativas com planejamento, gerenciamento, coordenação e avaliação das ações e dos programas desenvolvidos nas unidades de atenção básica, visando tanto à saúde individual quanto à coletiva, obtendo a transformação da realidade e a participação da comunidade nesse processo. No contexto da saúde da mulher é essencial desenvolver práticas educativas que abordem a prevenção do câncer ginecológico e de mama, detecção precoce e a promoção da saúde e assistência ao tratamento. O objetivo é relatar as experiências em relação à assistência à saúde da mulher e destacar a importância em sensibilizar o público feminino entre 25 e 64 anos sobre a importância do rastreamento do câncer de mama e colo uterino além de apontar os principais motivos da não adesão das mulheres ao exame citopatológico e ressaltar a importância do exame clínico das mamas para favorecer o diagnóstico precoce. SAÚDE DA MULHER: CONTEXTUALIZANDO O PROBLEMA O câncer (CA) no Brasil tem sido considerado uma questão de saúde pública devido a sua elevada morbimortalidade, causando impactos sociais, econômicos e epidemiológicos e é uma das principais causas de morte na população feminina que aliada a mudança de hábitos, ao estresse gerado pelo estilo de vida do mundo moderno, contribuem diretamente na incidência dessa doença (CARVALHO, 2008). O CA de mama e o CA de colo de útero são as neoplasias ginecológicas mais frequentes entre as mulheres brasileiras (INCA, 2015). Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que ocorram mais de 1.050.000 casos novos de câncer de mama em todo o mundo a cada ano, sendo que 15.590 novos casos no Brasil, o que o torna o câncer mais comum entre as mulheres (INCA, 2014). A Atenção Básica caracteriza-se por desenvolver um conjunto de ações que abrangem a promoção, a prevenção, o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação e constitui como o primeiro contato do usuário com o Sistema Único de Saúde (SUS). Dentre alguns desafios para se alcançar integralidade na assistência à saúde da mulher na Atenção Básica, estão as ações de controle dos cânceres do colo do útero, da mama e DST´S (BRASIL, 2006). Apesar do câncer de mama ser considerado um câncer de bom prognóstico, se não diagnosticado e tratado oportunamente, as taxas de mortalidade permanecem elevadas no Brasil, muito provavelmente porque a doença é diagnosticada em estádios avançados (BRASIL, 2004). Em relação à saúde da mulher, as metas nacionais propostas são: aumentar a cobertura de mamografia entre mulheres de 50 e 69 anos; ampliar a cobertura de exame citopatológico em mulheres de 25 a 64 anos; tratar 100% das mulheres com diagnóstico de lesões precursoras de câncer. Já as ações para o enfrentamento são: aperfeiçoar o rastreamento dos canceres do colo uterino e da mama e universalizar os exames à todas as mulheres (DCNT, 2011). Contudo, é importante salientar que o diagnóstico precoce do câncer de mama está ligado ao acesso à informação para as mulheres, conscientizando-as sobre a realização do autoexame das mamas, do exame clínico e da mamografia (HACKENHAAR, 2006). O câncer de colo de útero representa uma morbidade de suma importância epidemiológica no cenário brasileiro, uma vez que causa impacto social e econômico, pois os custos cada vez mais elevados na alta complexidade refletem a necessidade de reestruturação das
redes de serviços regionalizadas e integralizadas com garantia de acesso a atenção integral dos usuários (BRASIL, 2013). No Brasil, existem cerca de seis milhões de mulheres entre 35 a 49 anos de idade, e que nunca realizaram o exame citopatológico do colo do útero (Papanicolau), faixa etária onde mais ocorrem casos positivos de câncer do colo do útero. Como consequência surgem milhares de novas vítimas a cada ano. Isso ocorre na maioria das vezes em função da falta de informação da população acerca da importância da realização do exame preventivo e por medo ou vergonha visto a exposição corporal. A detecção precoce desta neoplasia ou das lesões precursoras é muito importante já que a cura pode chegar a 100% e na maioria dos casos a detecção ocorre ainda em nível ambulatorial (BRASIL, 2002). Apesar da melhora na cobertura do exame citológico no Brasil, está ainda é considerada insuficiente para reduzir a mortalidade de câncer do colo do útero no País. Ademais, a qualidade dos exames e o estadiamento nos quais os casos são diagnosticados são outros fatores que podem influenciar esse cenário (BRITO-SILVA, 2014). O diagnóstico tardio dificulta o acesso aos serviços e revela, sobretudo, carência na quantidade e qualidade de serviços oncológicos fora das grandes capitais. Outros aspectos que podem contribuir para o diagnóstico tardio são: a baixa capacitação profissional na atenção oncológica, a incapacidade das unidades de saúde em absorver a demanda e as dificuldades dos gestores (BRITO-SILVA, 2014). Visto os elevados índices de incidência e mortalidade por câncer do colo do útero e da mama no Brasil justifica-se a implantação de estratégias efetivas de controle dessas doenças que incluam ações de promoção à saúde, prevenção e detecção precoce, tratamento e de cuidados paliativos, quando esses se fizerem necessários, pois acarretam custos cada vez mais elevados na alta complexidade (BRASIL, 2006). A prevenção do câncer cervical também é possível, pois sua evolução em geral ocorre de forma lenta, com fases pré-clínicas detectáveis, exibindo expressivo potencial de cura relativamente aos demais tipos de câncer. Entretanto, no Brasil, uma grande parcela das mulheres já se encontra em fase avançada da doença na ocasião do diagnóstico, limitando a possibilidade de cura. Este problema pode, em parte, ser explicado pela cobertura irregular dos exames em países sem programas de rastreamento organizados. Enquanto um segmento da população feminina se submete várias vezes ao rastreamento, outros nunca foram rastreados (RAMA, 2008). A prevenção dos agravos à saúde pode ser primária ou secundária. O papel da prevenção primária é o de modificar ou eliminar fatores de risco, enquanto na prevenção secundária enquadram-se o diagnóstico e tratamento precoce do câncer (ROBERTO, 2007). Novas estratégias de rastreamento factíveis para países com dificuldades orçamentárias têm sido estudadas, uma vez que até o momento é recomendada a mamografia apenas para mulheres com idade entre 50 e 69 anos como método efetivo para detecção precoce. Já para o câncer cérvico-uterino, a abordagem mais efetiva para o controle continua sendo o rastreamento por meio do exame preventivo de Papanicolau (MARTINS, 2005). PERCURSO METODOLOGICO Trata-se de um relato de experiência descritivo, acerca da vivência das acadêmicas do curso de enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva, no estágio supervisionado do 8° período durante o primeiro semestre de 2015, no contexto da prevenção dos Cânceres de Colo Uterino e Mama. A metodologia “Relato de experiência” associada ao alicerce advindo do referencial metodológico permite a aplicação do conhecimento teórico na prática profissional a fim de
76 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
possibilitar a compreensão de uma determinada situação por meio de uma análise do pesquisador. Além disso, trata-se de uma modalidade que contribui para o avanço científico, uma vez que o desenvolvimento só será possível diante da existência de indagações e questionamentos (LÉO, 2010). Para embasar as ações educativas propostas e consequentemente sensibilizar o público alvo em relação ao grave problema de saúde pública abordado neste relato de experiência, foi empregado o Planejamento Estratégico Situacional – PES. A partir do PES é possível explicar um problema fundamentado pela visão do ator que o declara, identificar as possíveis causas e buscar diferentes modos de abordar e propor soluções. Logo, processar problemas implica em explicar como ele nasce e como se desenvolve, fazer planos para atacar as suas causas, analisar e construir a viabilidade política do plano, o que corresponde a ter uma visão real dos problemas locais, sem generalizá-los na descrição e nas propostas de solução (MELLEIRO, 2005). O Planejamento Estratégico Situacional foi estruturado pelo economista chileno Carlos Matus nos anos 70. Para ele é possível aperfeiçoar os conceitos de espaço de governabilidade do pesquisador e propor um plano de intervenção em que haja associação entre as causas dos problemas percebidas pelo pesquisador e as demandas e/ou variáveis geradas por outros atores como, por exemplo profissionais de saúde e a população de uma determinada região (ARTMANN, 2010). Quando adotado como ferramenta de gestão em saúde coletiva, o PES possibilita a organização do trabalho, com base nos princípios do SUS, pois promove a participação da comunidade, requer a divulgação de informações sobre o potencial dos serviços de saúde e sua utilização pelo usuário, exige a utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática, e tem como finalidade a resolutividade dos serviços (KLEBA, 2011). Após a atualização do diagnóstico situacional da unidade de saúde, verificou-se que o indicador da saúde da mulher, disponível na intranet da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), possui metas não alcançadas pela SISREDE 2015, pois a relação da população feminina de 25 a 64 anos atendida pelo Centro de Saúde versus a porcentagem de exames citopatológicos de colo de útero esperados e exames coletados no ano de 2015 está abaixo da meta esperada, evidenciando a baixa adesão das usuárias no rastreamento do câncer do colo uterino e a necessidade de planejar uma estratégia para abordagem e sensibilização das mesmas. Posteriormente à detecção das fragilidades e das prioridades foi construído um Planejamento Estratégico Situacional (PES) que subsidiou a implementação das intervenções propostas. O local de desenvolvimento do planejamento estratégico situacional (PES) bem como todas as ações educativas propostas, foi em uma Unidade Básica de Saúde pertencente ao Distrito Leste do Município de Belo Horizonte. Após inúmeras reuniões entre a gestora e os
profissionais da enfermagem atuantes na Unidade Básica de Saúde, os acadêmicos e a enfermeira orientadora do estágio, foi possível planejar as ações a serem realizadas a fim de conhecer o motivo da não adesão das mulheres da área de abrangência do serviço ao exame citopatológico. Com o intuito de disseminar informações acerca dos problemas de saúde relacionados à mulher foram realizadas salas de espera e cartazes foram afixados em pontos comerciais estratégicos ao redor da Unidade Básica de Saúde, a fim de divulgar o dia da realização de um mutirão da saúde da mulher. Concomitante, foram elaborados questionários, como instrumento de coleta de dados, a serem aplicados às usuárias do serviço e às enfermeiras das equipes de saúde. O questionário direcionado às usuárias (ANEXO I) era composto por 10 (dez) perguntas com respostas fechadas e abertas, que foram aplicados à 60 (sessenta) usuárias. Já o questionário direcionado às enfermeiras (ANEXO II) era composto por 8 (oito) perguntas, sendo que somente 1 (uma) pergunta era fechada; este questionário foi aplicado à 2 (duas) enfermeiras sendo que outras 2 (duas) não se dispuseram em responder. Além disso, ofereceu-se a sala de espera três vezes por semana durante todo o mês de maio, na qual reproduziam vídeos com os temas: câncer de mama, câncer do colo de útero e doenças sexualmente transmissíveis (DST´S), com duração total de quinze minutos. Paralelamente às ações descritas acima foram agendados exames citopatológicos àquelas usuárias que estivessem em atraso com o exame e, para finalizar as atividades propostas, realizou-se um mutirão de saúde no turno da noite a fim de acolher e atender as mulheres que não poderiam comparecer às consultas médicas e de enfermagem em horário comercial. O mutirão aconteceu no dia 10 de junho de 2015, entre as 19 e 22 horas. Houve a participação de uma equipe multiprofissional: enfermeiros, técnicos em enfermagem, médicos, dentistas, agentes comunitários de saúde, entre outros. Durante o mutirão as acadêmicas realizaram, com auxílio de um instrumento em forma de roteiro, consultas de enfermagem com coleta de dados, exame clínico das mamas e o exame citopatológico (ANEXO III). Contouse com a presença de 29 usuárias. Dentre as usuárias atendidas, 4 (quatro) foram encaminhadas à médica da ESF (Estratégia da Saúde da Família) pois apresentaram secreção vaginal abundante, com aspecto não fisiológico, odor acentuado e prurido. Não houve encaminhamentos referentes a suspeita de câncer do colo uterino ou de mama. Toda a atividade foi acompanhada pela enfermeira orientadora do estágio. Por se tratar de um relato de experiência, não houve a necessidade da aplicação do Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE). Entretanto, foi solicitada uma autorização prévia do gerente da Unidade Básica de Saúde (UBS) para realização da intervenção. Além disso, não será divulgado nenhum dado que possibilite identificar a UBS e seus pacientes, respeitando o preconizado pela Resolução 466/2012 do Conselho de Ética em Pesquisa.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 77
78 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 79
80 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 81
82 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
RESULTADOS E DICUSSÕES Os materiais didáticos utilizados (sala de espera, vídeos e cartazes), contribuíram para estimular as usuárias a vivenciar relações, conceitos e princípios de forma a auxiliar no processo de aprendizagem. Desta maneira, acredita-se que o recurso audiovisual proporciona uma maior compreensão do conhecimento e da informação a ser transmitida, por meio de conteúdos trabalhados a fim de visualizar situações e representações não observáveis, o que contribui a tomada de decisões do profissional da saúde (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 2007). De acordo com o Censo Demográfico de 2000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, a Região Administrativa Leste de Belo Horizonte possui uma população de 254.573 habitantes, sendo 136.493 mulheres. Dessas, 5.986 mulheres são atendidas na unidade de saúde referida. De acordo com a SISREDE 2015, observou-se que a razão de coleta de exames citopatológicos de colo de útero (25 a 64 anos) possui metas não alcançadas, evidenciando a baixa adesão das usuárias ao serviço de saúde (Tabela 1).
Das 60 mulheres de 25 a 64 anos entrevistadas, a maioria relatou que havia mais de um ano que não realizava o exame citopatológico, alegando o fato do horário de atendimento da unidade de saúde ser incompatível com o horário de trabalho (Tabela 2). Com isso questionou-se qual melhor horário de atendimento às essas usuárias, que informaram ser no período noturno (Tabela 3), corroborando com o
questionamento anterior. Nesse mesmo sentido, as usuárias que realizaram o exame citopatológico, avaliaram o atendimento dos profissionais médico e enfermeiro da sua respectiva área de abrangência como ótimo, por fim interrogou-se sobre a efetividade de comunicação entre as usuárias e os ACS, constatando que a maioria das usuárias possui uma boa relação além de considerarem os ACS acessíveis.
Segundo um estudo recente publicado na revista médica The Lancet, a inatividade física aumenta o risco de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT´S), como doenças coronárias, diabetes tipo II e câncer de mama e cólon, devido a isso indaga-se a circunferência abdominal, índice de massa muscular (IMC) e antecedentes familiares com câncer (Tabela 4).
de saúde, devido a incompatibilidade de horário de funcionamento das unidades e a jornada de trabalho das usuárias, fato esse que fora confirmado com os dados obtidos no questionário aplicado às usuárias frequentadoras da unidade de atenção básica, resultando na elaboração de ações no período noturno. Com isso, o enfermeiro inserido nas unidades básicas de saúde possui papel fundamental no processo educativo, sendo de sua competência divulgar informações de fatores de riscos, desenvolver ações de promoção a saúde e prevenção do câncer do colo uterino, orientar em relação ao exame clinica das mamas, planejar atividades extramuros, realizar busca ativa das mulheres faltosas e manter
CONSIDERAÇÕES FINAIS A crescente participação das mulheres na população economicamente ativa (PEA) dificulta a realização de algumas atividades no que refere ao vínculo do público feminino com a unidade básica
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 83
comunicação efetiva com os demais membros da equipe da ESF. As ações desempenhadas pelas acadêmicas de enfermagem facilitaram a sensibilização das mulheres em relação à busca de informações e a importância da prevenção do câncer do colo de útero e de mama. Todo trabalhado planejado e executado destacou o importante papel do enfermeiro atuante na atenção básica à saúde bem como os benefícios de uma atividade baseada em recursos metodológicos com enfoque educativo. O enfermeiro possui uma essência profissional que direciona seu cotidiano de trabalho para a promoção da saúde e prevenção de agravos a fim de priorizar uma assistência humanizada e sustentada pela qualidade do serviço prestado, reduzir impactos na atenção secundaria ou terciária e reconhecer e enfrentar as fragilidades existentes nos serviços de saúde e na comunidade. REFERÊNCIAS ARTMANN E. O planejamento estratégico situacional no nível local: um instrumento a favor da visão multissetorial. Cadernos da Oficina Social 3: Série Desenvolvimento Local. Rio de Janeiro: Coppe/UFRJ; 2000. BRASIL, Caderno de Atenção Básica. Prevenção do Câncer do Colo do Útero. Profissionais de Saúde. Brasília-DF 2002. Disponível em: <http://bvsms.saude. gov.br/bvs/publicacoes/inca/manual_profissionaisdesaude.pdf>. Acesso em: 06 de abril de 2015. BRASIL, Cadernos de Atenção Básica. Controle dos Cânceres do Colo do Útero e da Mama. 2° Ed. Brasília-DF 2013. Disponível em <http://bvsms.saude.gov.br/ bvs/publicacoes/controle_canceres_colo_utero_2013.pdf>. Acesso em: 05 de abril de 2015. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer (INCA). Controle do câncer de mama: documento de consenso [texto na Internet]. Brasília; 2004. Disponível em: <http://www.inca.gov.br/publicacoes/ Consensointegra.pdf>. Acesso em: 28 de julho de 2015. BRASIL, Cadernos de Atenção Básica- N 13 Controle dos cânceres do colo do útero e da mama / Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Brasília-DF 2006. Disponível em <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/controle_cancer_colo_utero_mama.pdf>. Acesso em: 05 de abril de 2015. BRASIL. Manual técnico para promoção da saúde e prevenção de riscos e doenças na saúde suplementar / Agência Nacional de Saúde Suplementar. Rio de Janeiro, 4. ed. rev. e atual, p. 40 2011. Disponível em: <http://www.ans. gov.br/images/stories/Materiais_para_pesquisa/Materiais_por_assunto/manual_promoprev_web.pdf.>. Acesso em: 28 jun. 2015.
BRITO-SILVA, K. et al. Integralidade no cuidado ao câncer do colo do útero: avaliação do acesso. Rev. Saúde Pública 2014;48(2):240-248. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rsp/v48n2/0034-8910-rsp-48-2-0240.pdf>. Acesso dia: 29 de julho de 2015. CAMPOS et al Atenção Primária à Saúde e a Estratégia da Saúde da Família. Cap. 25 do Tratado de Saúde Coletiva. (Orgs) São Paulo:Hucitec; Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2006. CARVALHO ALS, NOBRE RNS, LEITÃO NMA, VASCONCELOS CTM, PINHEIRO AKB. Avaliação dos registros das consultas de enfermagem em ginecologia. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2008;10(2):472-83. Disponível me: <http://www.fen.ufg.br/ revista/v10/n2/v10n2a18.htm>. Acesso em: 05 de abril de 2015. COFEN. RESOLUÇÃO COFEN Nº 381/2011. Publicado Portal do Cofen– Enfermagem, e no DOU nº 140, pág. 229 - Seção 1.
de
FONTANESI, DANIEL. A importância do estágio supervisionado. ETEC de Tiquatira. São Paulo, 1° de março de 2012 Disponível em: < http://www.etectiquatira. com.br/estagio.pdf >. Acesso em: 29 de julho de 2015. HACKENHAAR AA, César JA, Domingues MR. Exame citopatológico de colo uterino em mulheres com idade entre 20 e 59 anos em Pelotas, RS: prevalência, foco e fatores associados à sua não realização. Rev Bras Epidemiol. 2006;9(1):103-11. INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER. Estatísticas do câncer: vigilância do câncer e de fatores de risco. Disponível em: <http://www1.inca.gov.br/vigilancia>. Acesso em: 09 de julho de 2015. KLEBA, M.E.; KRAUSER, I.M.; VENDRUSCOLO, C. O planejamento estratégico situacional no ensino da gestão em saúde da família. Texto Contexto Enferm. Florianópolis, 2011 Jan-Mar; 20(1): 184-93. Disponível em: < http://www.scielo. br/pdf/tce/v20n1/22.pdf>. Acesso em: 30 de julho de 2015. LÉO, C.C.C; GONÇALVES, A. Modalidades metodológicas em pesquisa científica, a partir de recortes da experiência de saúde coletiva, epidemiologia e atividade física da unicamp. Maringá, v. 21, n. 3, p. 411-441, 3. trim. 2010. MARTINS LFL, Thuler LCS, Valente JG. Cobertura do exame de Papanicolau no Brasil e seus fatores determinantes: uma revisão sistemática da literatura. Rev Bras Ginecol Obstet. 2005;27(8):485-92. MARTINS RS, CECILIA IMS, APARECIDA RR. Ensino de Enfermagem: Reflexões Sobre o Estágio Curricular Supervisionado. Revista Práxis, ano 1, n°1 - janeiro de 2009. Disponível em: <http://web.unifoa.edu.br/praxis/numeros/01/37.pdf >. Acesso em 30 de agosto de 2015.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil: 2011-2022. Brasília, 2011.
MELLEIRO, M.M. O planejamento estratégico situacional no ensino do gerenciamento em enfermagem. Acta Paul Enferm. 2005; 18(2):165-71. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ape/v18n2/a08v18n2.pdf>. Acesso em: 08 de julho de 2015.
BRASIL. Casa Civil. Lei nº 11.788 de 2008, Artigo1º, incisos 1 e 2. Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11788.htm#art22>. Acesso em 29 de julho de 2015.
MELO, M.C.S.C., VILELA, F., et al. O enfermeiro na prevenção do câncer do colo do útero: o cotidiano na atenção primária. Revista brasileira de cancerologia 2012; 58(3): 389-398.
84 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Referências para elaboração de material didático para EaD no Ensino Profissional e Tecnológico. 2007. Disponível em: <http://mecsrv04.mec.gov.br/encontro/materiais/distancia/2.2_referenciais_material_didatico.pdf>. Acesso em 05 de abril de 2015. OLIVEIRA FA, PEDRONI LCBR. O enfermeiro e a importância da prevenção do câncer do colo uterino na atenção à saúde da mulher e no contexto da estratégia saúde da família. Pós em revista – Newton Paiva 2015. Edição 10. Disponível em: <http://blog.newtonpaiva.br/pos/e10-enferm01-o-enfermeiro-e-a-importanciada-prevencao-do-cancer-do-colo-uterino-na-atencao-a-saude-da-mulher-e-nocontexto-da-estrategia-saude-da-familia/>. Acesso em 30 de agosto de 2015. PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE: Protocolo de Atenção à Saúde da mulher. Prevenção e Controle do Câncer de Colo de útero. Belo Horizonte – MG 2008. Disponível em <http://www.pbh.gov.br/smsa/biblioteca/atmulher/ prot_cancer_colo_prot_cancer_colo.qxd.pdf>. Acesso em: 05 de abril de 2015.
produtivos. Disponível: < http://redesaude.org.br/html/body_ct-sm.cap1.html>. Acesso em: 29 de julho de 2015. ROBERTO NETTO A, Ribalta JCL, Focchi J, Baracat EC. A Prevenção do câncer do colo do útero e seu conhecimento por educadores de ensino fundamental. Femina. 2007;35(10):643-9. SEPÚLVEDA, M. A. C. Breve Histórico dos Programas Nacionais de Saúde Materno-Infantil. Disponível em: < http://www.hospvirt.org.br/>. Acesso em: 29 de julho de 2015
NOTAS DE FIM Acadêmicas do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva. Discente do estágio supervisionado do 8° período. E-mails: gracebragion@ yahoo.com.br; edineia.viana@hotmail.com; tiane.marinho@gmail.com. 1
Bacharel em Enfermagem. Atua como enfermeira do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva responsável pelo acompanhamento e orientação de estágios curriculares, bem como orientação de projetos com foco em educação em saúde. E-mail: fe.anjosoliveira@gmail.com. 2
RAMA C, Roteli-Martins C, Derchain S, Longatto-Filho A, Gontijo R, Sarian L, et al. Rastreamento anterior para câncer de colo uterino em mulheres com alterações citológicas ou histológicas. Rev Saúde Pública. 2008;42 (3):411-9. REDE SAÚDE. Cartilha Saúde Materna: Componente Essencial dos Direitos Re-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 85
AÇÕES EDUCATIVAS EM ORTOPEDIA: um relato de experiência Grace Kelly Portes Bragion¹ Edinéia de Castro Viana¹ Helena Caldeira Marques¹ Ana Claudia Moreira Faluba¹ Ingrid Pollyanna Brito de Oliveira 2 Valquíria Fernandes Marques Vieira 3
RESUMO: O objetivo deste trabalho é descrever a experiência das acadêmicas em enfermagem em estágio supervisionado, no setor de ortopedia acerca do desenvolvimento de atividades educativas destinadas a equipe de enfermagem e a pacientes em período pós-operatório com Fixador Externo. As atividades foram realizadas no período de agosto a dezembro de 2015, em um Hospital Público que realiza atendimento eletivo em trauma ortopédico de média e alta complexidade em todas as suas subespecialidades ortopédicas. As atividades educativas foram implementadas em uma perspectiva dialógica e emancipatória. Para tanto, elaborou-se um folder informativo e uma apresentação com recurso áudio visual como estratégia de ensino-aprendizagem, além da realização de sala de espera com abordagem participativa e problematizadora. O desenvolvimento de práticas educativas no âmbito hospitalar contribuiu para que os profissionais possam aperfeiçoar a qualidade dos cuidados prestados além de empoderar os pacientes quanto ao autocuidado. PALAVRAS – CHAVE: Fixador Externo. Cuidados de Enfermagem. Ações Educativas.
INTRODUÇÃO As lesões ortopédicas representam uma das condições que mais impossibilitam o indivíduo, comprometendo sua função, sua participação econômica na sociedade e sua interação familiar e social (JUNIOR, 2011). Dentre essas lesões, a literatura aponta que a fratura exposta está entre as mais predispostas à infecção, em função do tempo da exposição ao ambiente externo ou a cavidade contaminada, além de afetar as partes moles (PARDINI, 2003). Um dos métodos de tratamento dessas fraturas é a osteossíntese, que pode ser classificada em interna ou externa. A fixação externa é indicada principalmente nos casos de politraumatismo ou de fraturas graves, sendo utilizado para contenção de fraturas, alongamento ósseo, sustentação e locomoção do membro acometido para mobilização precoce, estabilização de partes moles de modo que facilita a redução de edema e aumenta a nutrição das superfícies articulares (TASHIRO, 1995; CRUZ, 2013). De acordo com Giordano et al. (2000), o cuidado com o Fixadores Externos (FE) é de extrema importância, pois consiste em um tratamento prolongado e com alto índice de infecção dado o potencial invasivo do procedimento que culmina com o rompimento de pele no trajeto dos fios e dos pinos servindo como porta de entrada para microrganismos, o que a torna uma das complicações mais importantes e prevalentes do uso do FE. Estudos evidenciam que durante todo o processo de tratamento, o paciente pode expressar diversas reações e sentimentos em relação à situação em que se encontra. Fato este relacionado principalmente a necessidade de instalação de um aparelho juntamente ao seu corpo. No entanto, o desenvolvimento de ações educativas que possam ajudá-lo a compreender e a se cuidar durante o seu tratamento pode ser essencial para sua reabilitação. Desta forma, o enfermeiro deve estar preparado para apoiar, educar e cuidar do paciente como parte fundamental neste processo, juntamente de uma equipe multidisciplinar, capacitada para dar suporte às diversas demandas que possam emergir em função desta nova situação (LOPEZ; GAMBA; MATHEUS, 2013).
A educação deve contribuir para autoconhecimento do indivíduo, a fim de proporcionar mudanças em relação ao modo de pensar e agir das pessoas em relação a si mesmas e aos outros (MORIN, 2003). A educação em saúde deve ser compreendida como uma proposta que pretende desenvolver no indivíduo a capacidade de analisar de forma crítica a sua realidade, como também, de decidir ações para resolver os problemas e modificar as situações que são conflituosas (FIGUEIREDO, 2010). O objetivo de reforçar o modelo de Educação em Saúde é ampliar ações que promovam a autonomia, a responsabilidade e a capacidade de intervenção das pessoas sobre o cuidado com sua própria saúde, proporcionando qualidade de vida e bem estar não apenas para o individuo, mas também para a sociedade (MAIA, 2014). Tendo em vista que a educação em saúde está intrinsecamente relacionada ao conceito de promoção da saúde, a mesma atua numa perspectiva de transcender os preceitos básicos do cuidado. Assim, ao educar, o enfermeiro potencializa a sua capacidade de cuidar, num sistema cíclico de relações interpessoais, dentro de uma realidade histórica cultural, possibilitando articular o saber e o aprender dentro do campo ético e humanístico, exercendo um papel crítico e transformador na educação. As intervenções e práticas devem acontecer de forma construtiva e dinâmica, permitindo sua reflexão, para que ocorra a troca de experiências de aprendizagem a fim de delinear e facilitar o planejamento de ações voltadas para a saúde (FERRAZ, 2005). Em função do perfil assistencial, buscou-se a partir da percepção do acompanhamento ambulatorial e na unidade de internação, evidenciar as lacunas no atendimento a fim de estabelecer um projeto de intervenção, tornando pertinente a descrição da experiência acadêmica no desenvolvimento de atividades educacionais. Portanto, o presente artigo tem como objetivo descrever a experiência das acadêmicas em enfermagem no setor de ortopedia acerca do desenvolvimento de atividades educativas destinadas a equipe de enfermagem e a pacientes em período pós-operatório com FE.
86 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
PERCURSO METODOLÓGICO Trata-se de um estudo descritivo, tipo relato de experiência com o foco no desenvolvimento de ações de educação em saúde implementadas para a equipe de enfermagem e os pacientes em pós-operatório acerca dos cuidados com o FE. A vivência aconteceu durante o estágio curricular supervisionado do curso de enfermagem, no período de agosto a dezembro de 2015, em um Hospital Público que realiza atendimento eletivo de trauma ortopédico de média e alta complexidade em todas as subespecialidades ortopédicas. Para a efetivação proposta de trabalho, houve uma reunião inicial com a coordenação de enfermagem e a coordenação médica do respectivo hospital. Nesta oportunidade, apresentamos e discutimos as impressões do grupo de acadêmicas acerca das precárias condições higiênicas dos fixadores externos percebidas. Refletimos sobre o autocuidado ineficaz ou ausente por parte dos pacientes. Além disso, tomamos nota de como se dava a prestação dos cuidados pela equipe de enfermagem e como eram realizadas as orientações aos pacientes em uso de FE na unidade de internação e no ambulatório. Após a elaboração do diagnóstico administrativo e situacional e autorização da instituição de saúde, a proposta foi discutida juntamente a docente responsável pela disciplina de Estágio Supervisionado e à preceptora de campo. Tendo em vista a magnitude da proposta de trabalho, a experiência acadêmica contribuiu para a formação de profissionais com capacidade proativa e reflexiva das práticas assistências, dada a proximidade com o problema detectado, assim como a vivência de tomadas de decisões gerenciais assertivas e contextualizadas (ALMEIDA, 2011). Em uma revisão da literatura, Montanha e Peduzzi (2010), descrevem que a Educação Permanente em Saúde (EPS) é utilizada como processo político pedagógico cujo objetivo é o desenvolvimento crítico e ponderado de ações a partir da análise de necessidades da saúde, que interfira não apenas nos trabalhadores e serviços prestados, mas em toda comunidade, de acordo com seus interesses. Desta forma, após identificarmos uma situação problema dentro do ambiente hospitalar planejamos ações que objetivavam melhorar o desempenho pessoal, capacitar a equipe de enfermagem a partir das falhas e limitações detectadas. Os profissionais da área foram estimulados e encorajados a construírem coletivamente o conhecimento, a partir das suas experiências e conhecimentos prévios. Assim, com foco na EPS, buscou-se conhecer o nível de entendimento prévio da equipe de enfermagem sobre os cuidados com Fixador Externo, para então iniciar a implementação das atividades. Paralelamente a EPS, Souza (2013), cita que a Educação em Saúde tem o objetivo de desenvolver a capacidade e responsabilidade do autocuidado do indivíduo com sua saúde, não sendo necessário impor o saber técnico dos profissionais da área, mas sim a compreensão da real situação do seu problema. Desta forma optamos em trabalhar junto aos pacientes, em uso de FE, a importância do seu empoderamento e a autonomia durante o tratamento/reabilitação, como meio de transmissão de conhecimentos e experiências entre os envolvidos. A partir deste momento, optamos por construir alguns instrumentos e estratégias de ensino-aprendizagem, tais como convites para a divulgação da capacitação “Cuidados com o Fixador Externo”; oficina para a capacitação da equipe de enfermagem; folder informativo; realização de sala de espera na unidade de internação e no ambulatório. As atividades propostas foram pautadas pelo Método Construtivista. Para Heimann et al. (2013), a promoção deste processo no âmbito da enfermagem ocorre quando há uma assimilação do novo com o antigo saber, se baseando nas experiências e vivências dos
profissionais, sendo que no final o resultado irá intervir tanto no ambiente quanto em si mesmo. Dessa forma, propôs-se aos profissionais do hospital uma oficina de capacitação intitulada “Cuidados com o Fixador Externo”, com o objetivo de dispor novos conhecimentos, agregar experiências/vivências e sensibilizá-los acerca dos cuidados prestados aos pacientes em uso deste aparelho. Destarte, as acadêmicas de enfermagem elaboraram um convite em tamanho A4 e os afixamos nos quadros de avisos de cada setor. Contamos ainda com o Núcleo de Ensino e Pesquisa (NEP) que colaborou enviando os convites via e-mail na semana anterior ao evento a toda equipe de enfermagem. Além disso, no dia da oficina, realizou-se contato por telefone aos setores lembrando-os da atividade. As oficinas ocorreram nos dias, 13 e 14 de outubro com duração em média de 30 minutos, o que garantiu continuidade da assistência e a presença de todos os profissionais da equipe de enfermagem. Para a realização da oficina elaborou-se uma apresentação no formato de PowerPoint, intitulada “Cuidados com o Fixador Externo”. Os slides continham informações objetivas, estruturado em tópicos e com vários recursos visuais, tais como figuras, ilustrações e fotos. Durante esta atividade os integrantes da equipe de enfermagem receberam o folder informativo e puderam discutir os conteúdos e contextualizar a prática executada nos setores. Os discentes salientaram a importância da orientação sobre o tratamento e os cuidados indispensáveis aos pacientes em uso do FE na unidade de internação e o reforço das mesmas no acompanhamento ambulatorial e após a alta hospitalar, contribuindo assim, para um tratamento e uma reabilitação mais efetiva e eficaz. Ao término da oficina, foi oferecido um coffee break. Quanto às ações desenvolvidas junto aos pacientes e acompanhantes, as mesmas foram realizadas com o auxílio do folder informativo. Atualmente, os materiais impressos têm sido utilizados como estratégias educativas para ampliar o conhecimento e auxiliar no tratamento de pacientes, tendo uma melhor aderência e favorecendo o autocuidado dos mesmos (OLIVEIRA; LOPES; FERNANDES, 2014). Deste modo, o folder foi escolhido por conter uma linguagem clara e objetiva. O folder elaborado e intitulado “Guia de Cuidados com o Fixador Externo”, foi desenvolvido após pesquisa bibliográfica e sob orientação docente e da Coordenação de Ortopedia da instituição de saúde. O material estava disposto no formato A4, com impressão frente e verso, ilustrativo, contendo informações como: o que é o Fixador Externo, a técnica do curativo, dicas de vestuário, a importância da movimentação do membro com o aparelho, instruções de rodagem do aparelho, como encarar o medo e a dor. Para a sala de espera, foi planejada uma apresentação expositiva com o tema: “Cuidados com Fixador Externo”, no mês de novembro em todas as segundas-feiras, pela manhã, na unidade de internação e no ambulatório todas as quintas-feiras, no período da tarde, com duração total de 15 (quinze minutos) e intervalos de 30 (trinta) minutos entre uma apresentação e outra, intercalados entre as acadêmicas de enfermagem, por meio de uma escala. Após a demonstração e entrega do folder informativo, era realizada uma breve explicação sobre o autocuidado com o Fixador Externo. A sala de espera tornou-se uma ótima estratégia de ensino-aprendizagem, o que corroborou com a proposta da temática trabalhada, possibilitando a troca de informações, conhecimentos e experiências entre pacientes, familiares e os profissionais. Vale destacar, que o atendimento ambulatorial é o primeiro contato do paciente em uso de FE com os médicos após a alta hospitalar, e que neste momento de avaliação, muitas vezes o esclarecimento de dúvidas, compartilhamento de sentimentos e anseios do usuário se perdiam em função do longo período de espera anterior a consulta.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 87
Face ao exposto, à realização das salas de espera supriu esta necessidade, onde ao final muitos expressaram opiniões e perguntas sobre o aparelho. Ressalta-se que inúmeras foram as reuniões com as equipes médicas e de enfermagem a fim de obter uniformidade das informações coletadas e discussões quanto às estratégias que seriam utilizadas com vistas a garantir a aplicabilidade do produto criado. Assim, a troca de saberes e conteúdos forma imprescindíveis para a construção de um material instrucional simples e prático para o público alvo atendido pela instituição. Após a aprovação das coordenações de enfermagem e médica, o folder foi disponibilizado ao hospital no intuito de que possa ser reproduzido e permanentemente utilizado. RESULTADOS E DISCUSSÃO As oficinas “Cuidados com o Fixador Externo” aconteceram nos dias 13 e 14 de outubro, participaram da atividade proposta 26 profissionais, estes técnicos de enfermagem, auxiliares e enfermeiros. Percebeu-se durante a apresentação com recurso áudio visual (PowerPoint) que grande parte já demonstrava um bom conhecimento sobre as funções do FE, bem como os cuidados, por meio de relatos quando interrompiam o facilitador da atividade. Ao entregar e explicar o folder informativo foi observado que alguns participantes ficaram um pouco dispersos discutiam entre si e apresentavam dúvidas em relação à operacionalização das ações educativas pela equipe ao paciente. As dúvidas foram esclarecidas e problematizadas quanto à rotina de trabalhos dos profissionais da enfermagem. Ao término da oficina, elogiaram a forma como foi tratado o tema, relataram que o folder informativo e o conteúdo foram muito bem construídos e julgaram o material de fácil entendimento para os usuários. Portanto, as estratégias utilizadas estão em concordância com a proposta de enriquecer o saber dos atores envolvidos, a EPS considera importante trabalhar o conhecimento novo e aquele que já está inserido como forma de melhorar a qualidade dos serviços prestados pelos profissionais aos usuários, por meio de subsídios oferecidos para que possam resolver os problemas apresentados e reduzir as necessidades apresentadas pela comunidade envolvida (SILVA, 2010). Neste contexto, o profissional deve ter autoaprimoramento direcionado na busca pela competência, conhecimento contínuo e atualização. Assim, a educação permanente direciona o profissional nesta busca e impulsiona a ter um autoaprimoramento para transformação pessoal e no exercício da profissão como meta para toda a vida (JESUS, 2011). Nesse sentido, compreendemos que demos o passo inicial para complementar o saber dos profissionais, mas que para o sucesso dos resultados é necessário que cada um esteja disposto a aplicar o que foi passado. Nesta perspectiva, Fernandes (2010), considera que a visão emancipadora da educação pressupõe o processo de conscientização, assume um papel reconstrutivo e crítico em relação aos conhecimentos e aos valores existentes. Nas semanas seguintes a capacitação, percebeu-se que os participantes aderiram ao que foi passado e com auxílio do folder a abordagem aos pacientes com FE se tornou mais simples, objetiva e prática. A realização da sala de espera oportuniza ao enfermeiro desenvolver atividades que ultrapassam o fazer/executar procedimentos técnicos, implica na construção de vínculos entre os envolvidos, na identificação das necessidades de saúde e problemas dos usuários. Desta forma, há espaço para a prestação de uma assistência humanizada, com melhora na qualidade do serviço prestado, abrindo espaço para diálogos e construção de saberes e estabelecimento de respon-
sabilidade e co-responsabilidade entre profissionais e usuários. Além disso, a sala de espera ocupa o tempo dispendido para aguardar pelo atendimento, diminuindo o estresse e ansiedade nos pacientes (RODRIGUES et al., 2009). No mês de novembro de 2015, participaram da sala de espera 37 pessoas. Durante a realização da atividade, pudemos constatar a carência de informações que os pacientes apresentavam durante o período de internação e até mesmo aqueles que retornavam para o acompanhamento ambulatorial. Após a explicação do folder informativo e da dialogicidade com as acadêmicas do curso de enfermagem, era notória a gratidão pelo conhecimento e empoderamento adquirido pelos pacientes. Encontramos algumas dificuldades para a realização das salas de espera, como ruídos, movimentação dos pacientes e acompanhantes para consultas e/ou procedimentos, recusa em participar da atividade, e distração. Contudo, não foram significativas em relação às vantagens advindas da experiência proporcionada pela interação entre as alunas e os pacientes. Em relação a isso, Rosa e Germani (2011), asseguram que a sala de espera é utilizada como recurso na promoção da saúde, por se tratar de um local com grande fluxo, onde os pacientes aguardam para serem atendidos por profissionais, o que a torna favorável nas práticas educativas devido à provável interação e troca de saberes entre os profissionais e os pacientes que ali se encontram. Assim, Janella (2014), destaca que a sala de espera possui uma peculiaridade em ocupar o tempo ocioso de forma benéfica com a conversão do período de espera em momento de ocupação e de troca de experiências entre os pacientes, propiciando a troca de informações do conhecimento popular com o saber dos profissionais de saúde. Portanto, o desenvolvimento de práticas educativas em saúde é importante para a construção de saberes em conjunto tanto para o educador quanto para o educando, onde se valoriza a troca de experiências, a interação, novas formas de pensar e agir dentro do âmbito da saúde, proporcionando conhecimento não só para os pacientes, mas também para os profissionais da saúde, principalmente da enfermagem, o que acarreta novas formas de prestação da assistência humanizada e melhorias nos serviços prestados à população (CERVERA; PARREIRA; GOULART, 2011). Nessa perspectiva, percebe-se que as ações desenvolvidas na enfermagem obtêm um papel significativo e substancial na busca de uma efetuação segura e eficaz da execução de procedimentos de enfermagem, abrangendo não apenas as ações assistenciais, mas também a orientação e educação preventiva prestada. CONSIDERAÇÕES FINAIS Visto que o profissional enfermeiro possui um importante papel no processo de trabalho quanto à reabilitação do paciente durante o seu tratamento, ele torna-se responsável por desenvolver ações de educação e promoção à saúde. Assim, as atividades desenvolvidas em campo de estágio proporcionaram as acadêmicas uma visão da importância do profissional de enfermagem nos cuidados aos pacientes em período pós-operatório com FE. A elaboração de um folder como recurso didático e instrucional foi fundamental para a implentação das intervenções educativas junto aos paciente e de Educação Permanente aos profissionais da enfermagem. Conclui-se que o desenvolvimento de práticas educativas no âmbito hospitalar contribuiu para que os profissionais possam aperfeiçoar a qualidade dos cuidados prestados, além de, empoderar os pacientes quanto ao autocuidado.
88 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
REFERÊNCIAS ALVES, Viviane Saggin et al. Cuidados com a pele de adultos em uso de fixador externo em membros inferiores: Série de casos. Revista Estima .São Paulo, v.11, n.3, p.35-42, 2013. Disponível em: < http://www.revistaestima. com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=458%3Arelato-decaso&catid=45%3A2014-11-24-15-16-11&Itemid=103&lang=pt>. Acesso em: 24 jan. 2016. CERVERA, Diana Patrícia Patino; PARREIRA, Bibiane Dias Miranda; GOULART, Bethania Ferreira.Educação em saúde: percepção dos enfermeiros da atenção básica em Uberaba (MG). Ciênc. saúde coletiva, Uberaba, v. 16, n.1, p.1547-
1554, 2011. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1413-81232011000700090>. Acesso em: 03 nov. 2015. CRUZ, Marco José Andrade. Os impactos dos acidentes de trânsito por lesão corporal na vida dos vitimados em face ao controle social do Estado. 2013. 102 f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano) Universidade da Amazônia, Belém, 2013. Disponível em: <http://www.unama.br/ mestrado/desenvolvimento/attachments/article/pdf>. Acesso em: 05 set. 2015. FERNANDES, Maria Clara Porto; BACKESI Vânia Marli Schubert. Educação em saúde: perspectivas de uma equipe Estratégia Saúde da Família sob a óptica
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 89
de Paulo. Rev Bras Enferm, Brasília, v. 63, n.4, p. 567-567, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reben/v63n4/11.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2015. FERRAZ, Fabiane et al. Cuidar-educando em enfermagem: passaporte para o aprender/educar/cuidar em saúde. Rev Bras Enferm. 2005 Set-Out; 58(5):607-10. FIGUEIREDO, Maria Fernanda Santos; NETO, Jose Felício Rodrigues; LEITE, Maísa Tavares Souza. Modelos aplicados às atividades de educação em saúde. Rev Bras Enferm, Brasília 2010 jan-fev; jan-fev; 63(1): 117-21. Disponivel em: < http://www.scielo.br/pdf/reben/v63n1/v63n1a19.pdf>. Acesso em: 25 jan. 2016. GIORDANO, Vincenzo et al. Infecção no trajeto dos fios e pinos do fixador externo de Ilizarov: estudo bacteriológico. Revista Brasileira de Ortopedia, Rio de Janeiro, v.35, n.1/2, p.29-34, jan/fev. 2000. Disponível em: < http://bases. bireme.br/cgi-bin/wxislind.exe/iah/online/?IsisScript=iah/iahc=google&base= ADOLEC&lang=p&nextAction=nk&exprSearch=335746&indexSearch=ID>. Acesso em: 15 jan. 2016. HEIMANN, Candice et al. A construção do conhecimento da enfermagem baseada no método construtivista. Revista Esc Enfermagem USP, São Paulo, v.47, n.4, p.997-1000, 2013. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/reeusp/ v47n4/0080-6234-reeusp-47-4-0997.pdf>. Acesso em: 16 jan. 2016. HUNGRIA, José Octávio Soares. Fratura exposta da diáfise da tíbia. Tratamento com osteossíntese intramedular após estabilização provisória com fixador externo não transfixante. Tese de Doutorado. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde. São Paulo, 2011. Disponível em: <http://www.fcmsantacasasp.edu.br/news/teses-edissertacoes/2011_Jose_Octavio_Soares_Hungria>. Acesso em: 27 jan. 2016. JANELLA, Edson. Educação em saúde na sala de espera da unidade básica de saúde 2 de abril em Ji-Paraná/RO. Universidade Federal do Mato Grosso do Sul - Pós Graduação em Saúde da Família. Campo Grande, 2014. Disponível em: <https://ares.unasus.gov.br/acervo/handle/ARES/3385>. Acesso em: 16 nov. 2015. JESUS MCP, et al. Educação permanente em enfermagem em um hospital universitário. Rev Esc Enferm USP 2011; 45(5):122936. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0080-62342011000500028>. Acesso em: 13 jan. 2016. JUNIOR, Mauricio Kfuri. O trauma ortopédico no Brasil. Rev. bras. ortop. vol.46 supl.1. São Paulo, 2011. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rbort/ v46s1/03.pdf>. Acesso em: 13 jul. 2016. LOPES, Sara Regina Souto et al. Potencialidades da Educação Permanente para a transformação das práticas em Saúde. Com. Ciências em Saúde 18(2):147-155, 2007. LOPEZ, Cátia Cristina; GAMBA Mônica Antar; MATHEUS Maria Clara Cassuli. Significado de conviver com fixação externa por fratura exposta grau III em membros inferiores: o olhar do paciente. Revista Gaúcha de Enfermagem, Rio Grande do Sul, v.34, n.2, p. 148-153, 2013. Disponível em: <http://www.scielo. br/pdf/rgenf/v34n2/v34n2a19.pdf>. Acesso em 20 set. 2015. LUCK, Heloísa. Metodologia de projetos uma ferramenta de planejamento e gestão. Petrópolis: Editora Vozes, 2003.142p. MAIA, Janize Silva et al. Educação em saúde e qualidade de vida. São Paulo: Revista Recien. 2014; 4(11):5-9. Disponível em: <http://www.recien.com.br/ online/index.php/Recien/article/view/70>. Acesso em: 13 jul. 2016. MONTANHA, Dionize; PEDUZZI, Marina. Educação permanente em enfermagem: levantamento de necessidades e resultados esperados segundo a concepção dos trabalhadores. Revista da escola de enfermagem da USP, São Paulo, v.44, n.3, p. 597-604, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ reeusp/v44n3/07.pdf>. Acesso em: 23 jan. 2016.
MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento / tradução Eloá Jacobina. - 8a ed. -Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003. Disponível em: < http://www.uesb.br/labtece/artigos/A%20 Cabe%C3%A7a%20Bem-feita.pdf>. Acesso em: 25 jan. 2016. OLIVEIRA, Sheyla Costa de; LOPES, Marcos Venicios de Oliveira; FERNANDES, Ana Fátima Carvalho. Construção e validação de cartilha educativa para alimentação saudável durante a gravidez. Revista Latino-Am. Enfermagem, vol.22, n.4, pp. 611-20, 2014. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/rlae/ v22n4/pt_0104-1169-rlae-22-04-00611.pdf>. Acesso em: 30 dez. 2015. PARDINI & SOUZA, G. Clínica ortopédica: Infecção em ortopedia. ed. MEDSI, v.4, n.4, dez. 2003. RODRIGUES, Andréia Dornelles et al. Sala de espera: um ambiente para efetivar a educação em saúde. Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, v.5, n.7, p.101-106, maio, 2009. Disponível em: <http://www.reitoria.uri.br/~vivencias/ Numero_007/artigos/artigos_vivencias_07/Artigo_13.pdf>. Acesso em: 30 dez. 2015. ROSA, Jonathan; BARTH, Priscila Orlandi; GERMANI, Alessandra Regina Müller. A sala de espera no agir em saúde: espaço de educação e promoção à saúde. Perspectiva, Erechim. v.35, n.129, p. 121-130, 2011. Disponível em: <http://www.uricer.edu.br/site/pdfs/perspectiva/129_160.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2015. SILVA, Luiz Anildo Anacleto et al.Educação permanente em saúde e no trabalho de enfermagem: perspectiva de uma práxis transformadora. Rev. Gaúcha Enferm, Porto Alegre, v. 31, n. 3, p.557-561, 2010. Disponível em: <http://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-14472010000300021>. Acesso em: 22 out. 2015 SOUZA, Ilana Vanina Bezerra et al. Educação em saúde e enfermagem: revisão integrativa da literatura. Rev. Ciênc. Saúde Nova Esperança, Joao Pessoa, v.11, n.1, p. 112-121, 2013. Disponível em: <http://www.facene.com.br/wpcontent/uploads/2010/11/Educa%E2%94%9C%C2%BA%E2%94%9C%C3%B Ao-em-sa%E2%94%9C%E2%95%91de-e-enfermagem.pdf>. Acesso em: 07 out. 2015. TASHIRO, Marisa Toshiko Ono; SOUZA, Mariana Fernandes de; OLIVEIRA Sandra Denise de. Autocuidado no tratamento pelo método de ilizarov - um estudo de caso. Revista Brasileira de Enfermagem. Brasília, v.48, n.1, p.4650, jan/mar. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reben/v48n1/ v48n1a07.pdf >. Acesso em: 19 nov. 2015. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Global status report on road safety: time for action. Geneva: WHO; 2009. Disponível em: <http://www.who.int/ violence_injury_prevention/road_safety_status/2009>. Acesso em: 18 jan. 2016.
NOTAS DE FIM 1 Acadêmicas do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva. Discentes da disciplina Estágio Supervisionado de Assistência de Enfermagem ao Indivíduo Enfermo em Cuidados Intermediários. E-mails: gracebragion@ yahoo.com.br; edineia.viana@hotmail.com; lenamarques4@hotmail.com; aninhamf91@hotmail.com. 2 Bacharel em Enfermagem. Atua como enfermeira preceptora de estágio do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário Newton Paiva. E-mail: ingridbrito1601@hotmail.com. 3 Docente do Instituto de Ciência Biológicas e da Saúde do Centro Universitário Newton. Mestre em Saúde Coletiva (FIOCRUZ/CPqRR). Especialista em Formação Pedagógica para Profissionais da Saúde (UFMG). Especialista em Nefrologia (UNA). Professora da disciplina: Estágio Supervisionado de Assistência de Enfermagem ao Indivíduo Enfermo em Cuidados Intermediários. E-mail: fernandes.valquiria@gmail.com.
90 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
GRUPO OPERATIVO COM IDOSOS: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA ACADÊMICA A PARTIR DA INTERVENÇÃO EDUCATIVA COM CÍRCULOS DE CULTURA Girleyla Rodrigues dos Santos¹ Jéssica Normando Duarte¹ Valquíria Fernandes Marques Vieira2
RESUMO: O objetivo deste estudo foi descrever a experiência de acadêmicos de enfermagem de uma instituição de ensino superior privado diante da realização de atividades de educação em saúde com idosos da comunidade. Trata-se de um relato estruturado a partir das vivências junto a um grupo operativo para idosos da comunidade, com encontros quinzenais, com intervenções embasadas na metodologia Círculo de Cultura. Foram realizados seis encontros, no período de março a junho de 2015. As ações educativas propostas partiram do desenvolvimento coletivo do saber e da valorização do conhecimento prévio de cada participante. Foram utilizadas diversas estratégias, tais como, roda de conversa, teatro e dinâmicas para trabalhar temas relacionados à prevenção de doenças e agravos, a promoção da saúde e qualidade de vida. As atividades de educação em saúde pautada na metodologia do Círculo de Cultura contribuíram amplamente para o processo de ensino-aprendizado dos acadêmicos e dos idosos. Além disso, ações educativas que utilizam recursos didáticos ilustrativos e palpáveis possibilitam maior interação, interesse, motivação e participação dos idosos. A extensão universitária contribuiu efetivamente para a formação acadêmica reflexiva, crítica e transformadora.
PALAVRAS-CHAVE: Educação em saúde. Envelhecimento da população. Envelhecimento. Educação em Enfermagem.
INTRODUÇÃO A população mundial está envelhecendo, esse fenômeno resulta da mudança demográfica que está relacionada com a queda da taxa de fecundidade e mortalidade e o subsequente aumento da expectativa de vida. A esse respeito, o processo de evolução tecnológica e as mudanças do cenário global também contribuem para o aumento da longevidade da população, sendo fortemente influenciado pelos fatores socioeconômicos e ambientais (BRASIL, 2006; CIOSAK et al., 2011). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio do último Censo realizado no ano 2010, identificou que o Brasil tem 20,6 milhões de pessoas idosas, o que corresponde a 10,8% da população nacional. As projeções estimam que em 2060, o país terá 58,4 milhões de pessoas idosas, o que representará 26,7% do total da população brasileira. Diante deste contexto, o envelhecimento populacional contribui para o aumento da incidência das doenças crônico-degenerativas, dentre elas, as demências, doenças do aparelho circulatório, cerebrovasculares e isquêmicas. No que se refere às principais causas de internações hospitalares dos idosos, as doenças crônicas e complicações decorrentes da Hipertensão Arterial Sistêmica, do Diabetes Mellitus e das doenças do aparelho respiratório são as mais prevalentes. Desta forma, torna-se imprescindível o investimento de órgãos públicos em políticas e estratégias de prevenção de doenças e agravos, além de ações para a promoção da saúde (VICTOR et al.,2007). Neste cenário, os programas destinados à prevenção de doenças são cada vez mais necessários. Contudo, para que um programa
de assistência à saúde do idoso seja considerado eficaz, é imprescindível que ele considere as questões relacionadas à saúde física, mental e social do idoso. Partindo desta premissa, a formação de grupos de convivência de idosos, bem como, a formação de grupos operativos torna-se cada vez mais necessários (ARAÚJO et al., 2011; SIMÕES; STIPP, 2006). A formação destes grupos em ambiente acadêmico contribui para o bem-estar, a aprendizagem, o convívio com a sociedade e o crescimento mútuo por meio de ações educativas e interativas entre os participantes (DALMOLIN et al., 2011). As ações educativas desenvolvidas em grupo permitem a integração com a comunidade, norteia o cuidado e permite que os integrantes participem de forma ativa no processo de educação e aprendizado. Além disso, trata-se de uma ferramenta de baixo custo e efetiva quanto ao empoderamento dos sujeitos (SIMÕES, STIPP, 2006; MEIRELES; VERAS 2009). A inserção de acadêmicos do curso de enfermagem na realização dos grupos operativos contribui para o desenvolvimento de habilidades e competências indispensáveis para a capacitação teórico -prática do fazer profissional (SASSI, 2014; VICTOR, 2007; CAMPOS, 2008; SIMÕES; STIPP, 2006). Assim, a Extensão Universitária atua de forma a complementar a formação acadêmica por meio dos serviços prestados a comunidade e ao convívio com diferentes culturas (RODRIGUES et al., 2013). A partir do panorama exposto, o presente estudo tem como objetivo descrever a experiência de acadêmicos de enfermagem de uma instituição de ensino superior privado diante da realização de atividades de educação em saúde com idosos da comunidade.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 91
MATERIAIS E MÉTODOS Trata-se de uma pesquisa descritiva, do tipo relato de experiência vivenciada em um Projeto de Extensão Universitária, por acadêmicos do Curso de Graduação em Enfermagem, de uma instituição privada de Ensino Superior de Minas Gerais, no período de março a julho de 2015. A vivência descrita aconteceu na Zona Oeste de Belo Horizonte, em uma instituição de assistência social, parceira da instituição de ensino há três anos. O curso de Enfermagem firmou esta parceria com a finalidade de realizar atividades educativas que visam promover melhoria da qualidade de vida. Os encontros do Projeto de Extensão “EnvelheSER”, eram realizados quinzenalmente pelas acadêmicas e pela coordenadora do projeto e tinham duração de duas horas. Foram realizados 6 encontros ao longo do 1º semestre de 2015. Para a operacionalização da proposta, institui-se a técnica de grupos operativos. O grupo operativo é composto por pessoas de ideias e objetivos em comum. Trata-se de um grupo onde ambas as partes, o educador e o educando aprendem e ampliam seus saberes e competências, valorizando as capacidades e a troca de experiências em prol do aprendizado (MAZZUCHELLO et al., 2014). O referencial teórico utilizado para as atividades foi o Círculo de Cultura. Trata-se de uma ferramenta educativa onde todos os participantes formam a figura geométrica do círculo, para que todos os envolvidos se olham e realizem as atividades de forma conjunta. Nesta abordagem, não há professor ou alunos e sim a figura do facilitador ou animador que incentiva a dialogicidade e a troca de conhecimentos. Deste modo, o aprendizado parte das vivências individuais, respeitando-se os valores éticos, morais e culturais (MONTEIRO; VIEIRA, 2010). Para desenvolver as ações educativas, utilizou-se de dinâmicas, rodas de conversa, teatro e demonstração de peças anatômicas e álbum seriado como recursos didáticos. Os temas abordados ao longo dos encontros foram previamente selecionados e problematizados pelos próprios idosos inseridos no grupo, a saber: Diabetes Mellitus, colesterol, doenças osteomusculares, hipertensão arterial, depressão, labirintite e vertigem. Estes RESULTADOS Participaram do estudo 40 idosos, destes, 36 eram do sexo feminino e 4 do sexo masculino, na faixa etária de 60 a 80 anos de idade. Foram realizados seis encontros no período de fevereiro a julho de 2015, com duração média de duas horas. Primeiro Círculo de Cultura No primeiro encontro, realizado em fevereiro de 2015, houve a apresentação dos extensionistas e dos participantes do grupo. A fim de promover interação entre os idosos e equipe, realizou-se a dinâmica “Procurando um Coração”. A s figuras de corações foram cortadas e entregues para cada indivíduo, estes, deveriam procurar pela outra (metade) do coração. Assim, todos que encontraram seus pares eram convidados a apresentarem o (outro pedaço do coração) para os demais. Nesta oportunidade, levantamos junto aos idosos as demandas por temas norteadores que pudessem ser explorados nas próximas atividades. Os idosos se mostraram contentes com o prosseguimento do Projeto de Extensão “EnvelheSER” e sugeriram os respectivos temas: “Colesterol, diabetes, glicose e glicemia; dores musculares, osteoporose, gota, dormência, câimbra, dor na cintura, movimentos limitados; pressão alta; depressão; tonteira, labirintite e vertigem”. Assim, a fim de organizar os Círculos de Cultura e contribuir para a execução dos temas, os extensionistas agruparam os temas por
eixo e elaboraram um cronograma que foi seguido durante o semestre letivo. Desta forma, os temas Diabetes Mellitus e Colesterol foram abordados no segundo encontro. Os distúrbios osteomusculares e a Hipertensão, depressão e labirintite/vertigem foram abordados, respectivamente, no terceiro, quarto, quinto e sexto encontro. Segundo Círculo de Cultura O segundo Círculo de Cultura aconteceu no dia 20 de março de 2015, os extensionistas problematizaram o tema Diabetes Mellitus (conceito, fisiopatologia, fatores de risco e complicações, bem como, a abordagem do colesterol e suas alterações). Inicialmente foram espalhadas sobre a mesa figuras diversas relacionadas à alimentação (saudável e inadequada), atividade física e sedentarismo. Os idosos foram convidados a selecionarem três imagens e eram encorajados a dialogar sobre a imagem e suas representações. Essa atividade visou valorizar o conhecimento prévio, individual e coletivo, bem como sua forma de pensar e agir diante do mundo. Percebe-se que houve ótima interação entre os idosos e equipe, o que possibilitou a troca de experiências e saberes. Os extensionistas analisaram a implementação do planejamento e constataram que a proposta metodológica e as ações de prevenção e promoção em saúde pautadas no diálogo contribuiu para o interesse dos participantes pela atividade, entretanto, grupos menores são mais indicados pois minimizam a probabilidade de dispersão dos envolvidos com conversas paralelas. Ressalta-se que as atividades que propiciam a interação dos idosos e que permitem a expressão individual e coletiva funcionam como mecanismo norteador para educador uma vez que, ao valorizar o conhecimento prévio sobre o assunto, os participantes podem contribuir e construir de forma conjunta o conhecimento. Terceiro Círculo de Cultura Em abril de 2015, realizou-se o terceiro Círculo de Cultura. Foram abordados os distúrbios osteomusculares. A atividade teve como objetivo geral, esclarecer as dúvidas em relação ao tema, enquanto que os objetivos específicos consistiram em debater a influência de cada patologia na qualidade de vida; orientar sobre as consequências relacionadas ao risco de queda e relacionar a queixa de dores no sistema osteomuscular com as limitações das Atividades de Vida Diária (AVD). A ação proposta foi uma adaptação da dinâmica “Batata Quente”. Os idosos foram dispostos em círculo, onde cada um passa um objeto para o participante da direita. Dentro do objeto repassado, havia escrito os temas que seriam discutidos. A fim de tornar o momento descontraído, utilizou-se uma música para embalar a brincadeira. No decorrer da música, interrompemos o som e o idoso que estivesse com o objeto nas mãos teria a oportunidade de expor seu conhecimento prévio acerca do tema norteador e sanar suas dúvidas. Posteriormente, os extensionistas empregavam a dialogicidade como recurso de ensino-aprendizado. A fim de enriquecer as exposições, confeccionaram-se materiais didáticos com recursos simples, tais como, isopor e bucha vegetal a fim de demonstrar como acontece a redução de massa óssea na osteoporose. Além disso, propomos que os idosos realizassem, através de simulação, atividades cotidianas com limitação de movimentos em função das doenças. A imobilização dos movimentos foi realizada com atadura, logo após, solicitamos que o participante tentasse realizar alguma atividade diária, como pentear os cabelos, varrer a casa e escrever. A estratégia teve como objetivo demonstrar como as doenças osteomusculares comprometem a realização das atividades cotidianas. A avaliação formativa da atividade proposta demostrou que esta
92 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
foi efetiva. Percebemos a satisfação dos participantes em relação às estratégias de ensino-aprendizagem utilizadas. Os idosos se mostraram interessados, foram participativos, ativos e curiosos quanto à temática abordada. Alguns participantes chegaram a relatar que conseguiram identificar os distúrbios trabalhados por meio dos recursos utilizados, o que possibilitou uma maior compreensão e assimilação do conteúdo. Quarto Círculo de Cultura Durante este Círculo de Cultura, realizado em Maio de 2015, os participantes puderam interagir, trocando experiências acerca da Hipertensão Arterial. O desenvolvimento desse Círculo de Cultura consistiu de três momentos: simulação, uso de materiais didáticos e roda de conversa. No primeiro momento, aconteceu um teatro abordando as crises hipertensivas e como deve ser realizado o atendimento de urgência. A simulação dos sintomas e da atuação do profissional de saúde frente a uma crise hipertensiva foi executada por duas idosas que se prontificaram a atuar como voluntárias (uma era a paciente e a interpretava o papel de médica). Posteriormente, utilizamos um sistema de canos como recurso didático. Este sistema foi preparado pelas acadêmicas do curso de enfermagem e tinham como objetivo demonstrar como funciona o sistema circulatório e explicar a fisiopatologia da hipertensão. Finalizou-se a atividade com uma roda de conversa onde tiveram a oportunidade de expor as reflexões advindas da ação educativa e compartilhas os conhecimentos e experiências individuais. Verificou-se que a intervenção que emprega métodos ou recursos visuais parece ser mais atrativa para o público alvo, além disso, contribui para o desenvolvimento do tema pelo facilitador da atividade. Quinto Círculo de Cultura Nesta atividade, ocorrida em junho de 2015, as facilitadoras resgataram os conhecimentos dos idosos sobre a depressão. Alguns idosos foram convidados a protagonizarem uma cena que abordava a depressão no contexto da saúde dos idosos. A ação superou as expectativas das extensionista, pois os idosos demonstraram-se cooperativos e motivados a participar, foram criativos e puderam representar em uma cena seus sentimentos, conhecimentos, medos e tabus relacionados à depressão. A roda de conversa posterior à simulação trouxe discursos pessoais marcados pelos preconceitos e estigmas sociais atrelados à depressão. Percebemos nos discursos a importância do grupo operativo para os idosos, principalmente por se tratar de um local de extravasamento de emoções, funcionando como um ambiente de interação social e canal de comunicação e cooperação entre idosos e os profissionais de saúde. Sexto Círculo de Cultura O último encontro aconteceu no mês de julho de 2015. Nesta oportunidade, abordamos os temas: labirintite e vertigem. Para tanto, utilizamos uma peça anatômica do pavilhão auditivo para demonstrar as estruturas do ouvido e a fisiopatologia da labirinte. A atividade possibilitou o diálogo e discussão de muitos mitos relacionados à temática. Para o enceramento, preparamos um momento de relaxamento, como música e massagem. Os idosos participaram ativamente das atividades, demonstrando-se críticos, reflexivos e agradecidos pelas vivências proporcionadas durante o semestre. Em relação às experiências, muitos participantes descreveram mudanças e transformações quanto aos cuidados com a saúde. Alguns mencionaram que conseguem realizar orientações e auxiliar os familiares, amigos e vizinhos em muitas demandas de saúde após a participação das atividades educativas do grupo operativo.
A experiência com um Círculo de Cultura para a realização das intervenções educativas contribuiu para a inserção dos participantes na situação problema, para a troca de experiências e saberes, o que corroborou para a construção conjunta do conhecimento. Diante deste cenário, constatou-se que houve grande interesse pelas atividades propostas e grande satisfação quanto às estratégias de ensino-aprendizagem empregadas. Os métodos ativos, pautados na problematização, na dialogicidade são importantes para o empoderamento dos indivíduos. Diante deste contexto, é importante ressaltar que a crença empírica acerca das doenças e tratamentos são fatores dificultadores no processo de educativo. Entretanto, como fatores facilitadores, está a busca e valorização dos saberes prévios sobre os assuntos à serem tratados, pois estes contribuem de forma positiva para a formação do conhecimento, ao mesmo tempo em que são consideradas as necessidades e expectativas do público, a difusão de conceitos e práticas corretas torna-se mais suave. DISCUSSÃO A formação de diferentes estilos de grupos, entre eles os grupos educativos e operativos, é uma realidade mundial e apresenta uma tendência crescente. O enfermeiro é um profissional capacitado para atuar na perspectiva da educação em saúde e apresenta papel de destaque para a formação e manutenção de grupos operativos. Diante da relevância do enfermeiro no campo da promoção da saúde, torna-se necessário a vivência deste profissional, desde a academia, no contexto da comunidade (CORRÊA; SOUZA; SAEKI, 2005; SASSI et al., 2014). Assim, os projetos de extensão universitária contribuem sobremaneira para o desenvolvimento de habilidades e competências inerentes ao ensino e a pesquisa (SILVA et al., 2013). As atividades educativas implentadas foram embasadas na metodologia Círculo de Cultura, proposta pelo educador Paulo Freire. A escolha se deu em função do caráter participativo para as práticas de promoção da saúde e por se tratar de um método que valoriza a troca de conhecimentos e experiências a partir dos diálogos do grupo (MONTEIRO; VIEIRA, 2010). Tendo em vista que a formação de grupos viabiliza o aprendizado e ínsita a formação de vínculo entre o educador e o educando, torna-se necessárias algumas considerações acerca da estrutura e a manutenção do grupo. Para o sucesso do grupo, é necessário dispor de tempo, evitar a formação de grupos com elevado número de pessoas, utilizar de recursos didáticos visuais e de um espaço onde os participantes possam estar confortáveis. Além disso, é fundamental que todos os participantes estejam voltados para um objetivo comum (BASTOS, 2010; SASSI et al., 2014). Desta forma, as estratégias educativas devem encorajar os idosos para a promoção da saúde (VICTOR et.al, 2007). Portanto, entender o processo de envelhecimento nas suas múltiplas dimensões auxilia o enfermeiro na condução das práticas educativas e subsidia uma assistência humanizada e individualizada em prol da valorização das vivências do idoso e suas necessidades (PATROCÍNIO; PEREIRA, 2013). Monteiro e Viera (2012), relatam que o idoso traz em sua história de vida, muitas transformações biopsicossociais e que necessitam de atividades prazerosas e de mais atenção dos profissionais de saúde. Portanto, para o sucesso do grupo é fundamental que se preserve a identidade do idoso e respeite seu espaço, suas limitações, seus anseios, medos e sua trajetória. Desta maneira, o processo de ensino-aprendizado é uma troca recíproca de saberes entre o educador e o educando e parte do pressuposto de que cada indivíduo carrega consigo uma bagagem (MELO FILHO, 1997; VICTOR, 2007; CAMPOS, 2008).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 93
Neste cenário, as estratégias utilizadas no grupo operativo derivam de uma concepção emancipatória e transformadora no contexto da aprendizagem. Tal abordagem é contrária à chamada educação bancária, tão criticada pelo educador Paulo Freire (1996) onde os indivíduos eram passivos ao processo de ensino. Destarte, o processo de ensino-aprendizagem é compreendido como instrumento de educação para a liberdade, numa concepção andragógica pautada na autonomia para aprender, na valorização das experiências de vida e na iniciativa para alcançar o que deseja (ROCHA, 2012). CONSIDERAÇÕES FINAIS A experiência com o método de Círculo de Cultura contribui de forma significativa para o aprendizado dos participantes (idosos e acadêmicas). Além disso, foi notório o envolvimento e a postura ativa dos participantes nas atividades educativas. A inserção de alunos neste projeto de extensão universitária corroborou para uma formação acadêmica crítica e reflexiva, a partir do estimulo a novos questionamentos, ao convívio e a interação com os problemas da comunidade externa. A extensão disponibiliza ao meio externo às dependências da instituição de ensino o conhecimento teórico e científico na perspectiva de transformar a realidade social, atuando sobre suas deficiências. Assim, a experiência relatada foi enriquecedora, levando em consideração o desenvolvimento de atividades educativas nos Círculo propostos. As reflexões sobre promoção em saúde, qualidade de vida e prevenção de doenças e agravos contribuíram para o empoderamento e autocuidado dos idosos. Diante das vivências é possível concluir que o adulto aprende com o que ele vivência e se interessa. Portanto, é imprescindível que o profissional/educador utilize do conhecimento preexistente do indivíduo e trabalhe com base nas necessidades de aprendizado expostas pelos participantes dos grupos. Com isso, ressalta-se a importância da realização de mais projetos de extensão que contemplem a Promoção da Saúde no processo de envelhecimento humano. REFERÊNCIAS ARAÚJO, Larissa Fortunato et al. Evidências da contribuição dos programas de assistência ao idoso na promoção do envelhecimento saudável no Brasil. Rev. Panam Salud Publica 30(1), 2011. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/ rpsp/v30n1/v30n1a12.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2015 BASTOS, Alice Beatriz B. Izique. A técnica de grupos-operativos à luz de Pichon-Rivière e Henri Wallon. Rev. Psicólogo in Formação, ano 14, n. 14, jan./ dez. 2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/ v14n14a10.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2016 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Envelhecimento e saúde da pessoa idosa / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica – Brasília : Ministério da Saúde, 2006. 192 p. il. – (Série A. Normas e Manuais Técnicos), (Cadernos de Atenção Básica, n. 19) CAMPOS, Cássia Noele Arruda et al. Reinventando Práticas de Enfermagem na Educação em Saúde: teatro com idosos. Esc Anna Nery (impr.)2012 jul -set; 16 (3):588-596. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452012000300023>. Acesso em: 11 abr. 2015
8. Disponível em:< http://revistaenfermagem.eean.edu.br/detalhe_artigo.asp?id=73>. Acesso em: 11 jul. 2016 DALMOLIN , Indiara Sartori et al. A importância dos grupos de convivência como instrumento para a inserção social de idosos. Revista Contexto & Saúde, Ijuí v. 10 n. 20 Jan./Jun. 2011. Disponível em: < /www.revistas.unijui.edu.br/ index.php/contextoesaude/article/viewFile/1594/1340>. Acesso em: 11 jul. 2016 I encontro de pró-reitores de extensão das universidades públicas brasileiras (FORPROEX). Brasília, 1987. Disponível em: <http://www.renex.org.br/documentos/Encontro-Nacional/1987-I-Encontro-Nacional-do-FORPROEX.pdf>. Acesso em: 01 set. 2015 FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa/Paulo Freire. - São Paulo: Paz e Terra, 1996 (Coleção Leitura) IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010. Disponível em:<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/>. Acesso em: 01 jul. 2015 MAZZUCHELLO, Francielle Rosso et al. A atuação dos enfermeiros nos grupos operativos terapêuticos na estratégia saúde da família. O mundo da Saúde, São Paulo – 2014;38(4):462-475. Disponível em: <http://www.saocamilo-sp.br/ pdf/mundo_saude/155566/A11.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2015 MEIRELES, Rosana Cunha. Estudo da aplicabilidade da estratégia de grupo operativo de idosos em um centro de saúde de Belo Horizonte. Universidade federal de Minas Gerais, 2009. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/BUBD-97JJUX/rosana_silva_da_ cunha_meireles.pdf?sequence=1>. Acesso 01 jun. 2015 MELLO FILHO J. Grupo terapia com pacientes somáticos: 25 anos de experiência. In: Zimerman DE et al. Como trabalhamos com Grupos. Porto Alegre: Artes Médicas; 1997.p.185-204 MONTEIRO, Estela Maria Leite Meirelles; VIEIRA, Neiva Francenely Cunha. Educação em saúde a partir de círculos de cultura. Rev Bras Enferm, Brasília 2010 maio - jun; 63(3): 397-403. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reben/ v63n3/a08v63n3.pdf>. Acesso em: 02 jul. 2015 PATROCÍNIO, Wanda Pereira; PEREIRA, Beltrina da Purificação da Côrte. Efeitos da educação em saúde sobre atitudes de idosos e sua contribuição para a educação gerontológica. Trab. Educ. Saúde, Rio de Janeiro, v. 11 n. 2, p. 375-394, maio/ago. 2013. Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/tes/v11n2/ a07v11n2.pdf>. Acesso em: 16 abr. 2015 PELICIONI, Maria Cecília Focesi; PELICIONI, Andréa Focesi. Educação e promoção da saúde: uma retrospectiva histórica. O MUNDO DA SAÚDE São Paulo: 2007: jul/set 31(3):320-328. Disponível em: <http://bases.bireme.br/cgi-bin/ wxislind.exe/iah/online/?IsisScript=iah/iah.xis&src=google&base=LILACS&lang=p&nextAction=lnk&exprSearch=495027&indexSearch=ID>. Acesso em: 01 set. 2015 ROCHA, Enilton Ferreira. Os dez pressupostos andragógicos da aprendizagem do adulto: um olhar diferenciado na educação do adulto. Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) 2012, 5p. Disponível em:<http://www.abed. org.br/arquivos/os_10_pressupostos_andragogicos_ENILTON.pdf>. Acesso em: 01 jun. 2015 RODRIGUES, Andréia Lilian Lima et al. Contribuições da extensão universitária na sociedade. Cadernos de Graduação - Ciências Humanas e Sociais | Aracaju | v. 1 | n.16 | p. 141-148 | mar. 2013. Disponível em: <https://periodicos.set. edu.br/index.php/cadernohumanas/article/viewFile/494/254>. Acesso em: 23 ago. 2015
CIOSAK, Suely Itsuko et al. Senescência e senilidade: novo paradigma na Atenção Básica de Saúde. Rev Esc Enferm USP 2011; 45(Esp. 2):17638. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342011000800022>. Acesso em: 01 jul. 2015
SANTOS, Nayane Formiga dos; SILVA, Maria do Rosário de Fátima e. As Políticas Públicas voltadas ao idoso: melhoria da qualidade de vida ou reprivatização da velhice. Revista FSA, Teresina, v. 10, n. 2, art. 20, pp. 358-371, abr./jun. 2013. Disponível em: <http://www4.fsanet.com.br/revista/index.php/fsa/article/ view/130/97>. Acesso em: 30 jul. 2015
CORRÊA, Adriana Katia; SOUZA, Maria Conceição B. de Mello e; SAEKI, Toyoko. Transição para o exercício profissional em enfermagem: uma experiência em grupo operativo. Esc Anna Nery R Enferm 2005 dez; 9 (3): 421 -
SASSI, Marcelo Machado et al. Grupos de idosos e a inserção de acadêmicos de enfermagem: relato de experiência. Rev enferm UFPE on line, Recife,
94 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
8(5):1394-9, maio, 2014. Disponível em: <www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/.../9191>. Acesso em: 20 jul. 2015 SILVA, Antonio Fernando Lyra da; RIBEIRO, Carlos Dimas Martins; SILVA JÚNIOR, Aluísio Gomes da. Pensando extensão universitária como campo de formação em saúde: uma experiência na Universidade Federal Fluminense, Brasii. Interface (Botucatu), v.17, n.45, p.371-84, 2013. SIMÕES, Fabiana Verdan; STIPP, Marluci Andrade Conceição. Grupos na enfermagem: Classificação, terminologias, e formas de abordagem. Esc Anna Nery R Enferm 2006 abr; 10 (1): 139 - 44. Disponível: <http://www.scielo.br/pdf/ean/ v10n1/v10n1a19.pdf>. Acesso em: 15 abr.2015 VERAS, Renato. Envelhecimento populacional contemporâneo: demandas, desafios e inovações. Rev Saúde Pública 2009;43(3):548-54. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/rsp/v43n3/224.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2015 VICTOR, Janaína Fonseca et al. Grupo Feliz Idade: cuidado de enfermagem para a promoção da saúde na terceira idade. RevEscEnferm USP 2007; 41(4):724-30. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v41n4/25.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2015
NOTAS DE FIM 1
Acadêmicas do curso de Enfermagem do Centro Universitário Newton.
Bacharel em Enfermagem. Mestre em Saúde Coletiva (FIOCRUZ/CPqRR). Especialista em Formação Pedagógica para Profissionais da Saúde (UFMG). Especialista em Nefrologia (UNA). Docente do Instituto de Ciência Biológicas e da Saúde do Centro Universitário Newton. E-mail: fernandes.valquiria@gmail.com 2
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 95
RELATO DE EXPERIÊNCIA: IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA INTERDISCIPLINAR Ana Paula Dias de Menezes 2 Bárbara Bruna de Almeida Assis 1 Janaína de Jesus Araújo 1 Letícia Barbosa Fonseca 1 Letícia Mendes Evangelista 3 Lorena de Castro Silva 1 Luã Augusto dos Santos 3 Maria Carolina Gomes Inácio 2 Silvia Moreira Amaral 2 Valquíria Fernandes Vieira 4 Virgílio Silva Maximiano 3
RESUMO: O objetivo deste trabalho foi relatar a experiência vivenciada por um grupo de acadêmicos da área de saúde acerca da implementação de um Projeto de Extensão Universitária interdisciplinar. A experiência aconteceu em uma clínica escola, de uma instituição de ensino superior privado, em Minas Gerais, no período de julho a dezembro de 2015. Foram realizados estudos para a elaboração do projeto, seleção de instrumentos para coleta de dados e proposta de pesquisa científica, bem como a realização de atendimentos individuais e em grupos. Os resultados alcançados demonstraram que a integração multiprofissional e interdisciplinar contribuiu para o desenvolvimento de competências e habilidades inerentes ao trabalho em equipe. A experiência possibilitou a crítica, a reflexão, a criatividade e inovação, além disso, articulou e ampliou os conhecimentos o que contribuiu para a abrangência do cuidado em saúde e a transformação da práxis dos futuros profissionais da saúde. PALAVRAS-CHAVE: Pesquisa Interdisciplinar. Envelhecimento. Educação em Saúde.
INTRODUÇÃO A extensão universitária é entendida como um processo educativo, cultural e científico que integra o ensino e a pesquisa e visa complementar a formação acadêmica. Trata-se de uma ação contextualizada entre o ambiente acadêmico e a sociedade que possibilitam ao aluno experimentar, em seu processo formativo, a interlocução entre a teoria e a prática, contribuindo assim, para a apropriação, a construção e reconstrução do conhecimento (SILVA et al., 2013). Desta forma, o aluno inserido em projetos de extensão beneficiam-se com as práticas que favorecem uma reflexão sobre questões éticas, de solidariedade, caráter, cidadania e responsabilidade social, possibilitando ainda, a abertura de caminhos para o mercado de trabalho, o desenvolvimento de novas habilidades, o questionamento e o convívio com diferentes culturas, enquanto proporciona a comunidade apoio especializado e gratuito (MARTINS, 2008). O ensino de graduação na área da saúde, especificamente no campo de saúde coletiva, carece de projetos de extensão com foco multiprofissional e interdisciplinar, uma vez que a integração da equipe de saúde desde a sua formação universitária, amplia as possibilidades de colaboração dentre as várias especialidades. Assim, o atendimento e o cuidado prestado aos pacientes tendem a transcender a visão biológica, centrada na doença e no modelo clínico hegemônico (AMPARO, 2013). O trabalho multiprofissional é caracterizado como uma relação mútua entre as variadas mediações técnicas e a ação interdisciplinar dos profissionais envolvidos. Em uma equipe multiprofissional, os integrantes têm a oportunidade de trocarem experiências e informações
relacionadas aos pacientes, estabelecer vínculos, objetivando assim, o atendimento das necessidades globais dos indivíduos por meio das interações somáticas e psicossociais considerando-se a humanização da assistência numa prática integradora e holística dos indivíduos (MALDONADO; CANELLA, 2009; FOSSI; GUARESCHI, 2004; PEDUZZI, 1998). Várias iniciativas têm contribuído para que as universidades brasileiras estimulem a formação em saúde focada nas relações multiprofissionais harmônicas. Dentre essas, destacam-se, a articulação com os espaços de ensino, pesquisa e extensão, além do compromisso social, vivências diversificadas e singulares que vem de encontro ao perfil contemporâneo esperado ao ensino superior (AMPARO, 2013). No que se refere às linhas de pesquisa, trabalhos com idosos ganham relevância em função da transição epidemiológica, demográfica e o subsequente envelhecimento populacional (GUIMARÃES, 2008). No Brasil, são definidos como idosos, os indivíduos com idade igual ou superior a 60 anos (BRASIL, 2003). O Relatório Mundial de Saúde e Envelhecimento elaborado pela Organização Mundial de Saúde evidenciou que o número de pessoas com mais de 60 anos no país deverá crescer muito mais rápido do que a média internacional. Até o ano de 2050, estima-se que seu contingente quase triplicará (OMS, 2015). Estudos apontam que o envelhecimento das populações acelera-se em todo o mundo. Em 2015, a população de brasileiros idosos atingiu 23 milhões de pessoas, correspondendo a 12,5% da população total. Projeções apontam que em 2050, existiram 64 milhões de pessoas acima de 60 anos, o que corresponderá a 30,0% da popula-
96 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
ção mundial (OMS, 2015). A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) define envelhecimento como um processo cronológico e imutável, inerente a todos os membros de uma espécie, não sendo patológico, entretanto, este processo contribuiu para a diminuição das capacidades de enfrentamento do indivíduo e aumenta a possibilidade de morte (OPAS, 1993). Considerando que a perspectiva multiprofissional, corrobora para que haja ampliação do campo de competência por meio da articulação do conhecimento (HENNINGTON, 2005), a importância do projeto de Extensão “EnvelheSER” reveste-se nas atividades de prevenção de doenças e agravos, na promoção do autocuidado, na educação em saúde e na prática clínica geriátrica interdisciplinar. Desta maneira, é notória a necessidade de articular iniciativas que possam contribuir a preservação da funcionalidade, da qualidade de vida, do estímulo social, a revalorização e o reconhecimento da pessoa idosa. O presente estudo tem por objetivo relatar a experiência vivenciada por um grupo de acadêmicos da área de saúde de uma instituição de ensino superior privada acerca da implementação de um Projeto de Extensão Universitária interdisciplinar com foco na saúde do idoso. MATERIAIS E MÉTODOS Características do Estudo Trata-se de uma pesquisa descritiva, do tipo relato de experiência que objetivou relatar a experiência vivenciada por acadêmicos dos Cursos de Enfermagem, Fisioterapia, Odontologia, Psicologia e Farmácia de uma instituição de ensino superior privado acerca da implementação de um Projeto de Extensão Universitária que oferece atendimento individual e atividades em grupo aos idosos da comunidade. As vivências descritas ocorreram no período de julho a dezembro de 2015. Segundo Gil (2008), o relato de experiência pertence ao domínio social da memorização e documentação das experiências humanas, situando-as no tempo, permitem ainda a descrição das vivências e a contextualização com a literatura. Zamberlan e Siqueira (2005) descrevem ainda, que o relato de experiência propõe tornar visível e compartilhar com outros profissionais e estudantes uma vivência prática. Neste sentido, será relatado como ocorreu à implementação do Projeto de Extensão Universitária intitulado “EnvelheSER”. A trajetória percorrida e o contexto da experiência A ideia inicial do projeto surgiu em uma disciplina do Curso de Odontologia, onde os alunos deveriam elaborar um projeto viável para implementação no campo da saúde coletiva. A fim de alcançar este objetivo, os alunos buscaram estabelecer outras parcerias. Desta forma, o curso de Enfermagem foi então contatado por já desenvolverem um projeto voltado para a promoção da saúde de idosos. Buscou-se, portanto, a partir desta parceria, reformular a proposta de trabalho e incorporar a perspectiva interdisciplinar ao atendimento dos idosos. Dessa forma, realizou-se uma ampla revisão da literatura para substanciar a proposta, elaborou-se o cronograma de trabalho, o orçamento e foram preenchidos todos os formulários institucionais necessários à aprovação interna do projeto. Posteriormente, o projeto foi enviado para o setor de extensão e pesquisa para avaliação e aprovação do requerimento. Após a aprovação do projeto, solicitou-se aos coordenadores de cursos, indicações de alunos para integrarem a equipe multiprofissional. Inicialmente, estipulou-se um quantitativo de três alunos por curso (Odontologia, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Psicologia,
Estética, Ciências Biológicas e Medicina Veterinária). Além disso, os extensionistas dos cursos de Enfermagem, Fisioterapia e Odontologia elaboraram um projeto de pesquisa de acordo com as normas exigidas pela Plataforma Brasil e pelo Comitê de Ética, respeitando-se a Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, que dispõe das diretrizes e normas regulamentadoras para pesquisas envolvendo seres humanos sendo aprovado em Outubro de 2015, conforme o parecer CAAE n° 49786915.3.0000.5097. O cenário desta investigação será a Clínica Escola de uma instituição de ensino superior que conta com uma ótima estrutura física e moderna aparelhagem para que os alunos da área de saúde possam realizar atendimentos a comunidade. Coleta de dados Para fins de estudo, determinou-se os critérios de seleção dos participantes. Foram incluídos no presente trabalho, todos os idosos com idade igual ou superior a 60 anos, em atendimento na Clínica Escola, além dos idosos residentes na comunidade adstrita as mediações da Instituição de Ensino que demonstraram interesse e concordaram em participar do estudo, mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre Esclarecido. Foram excluídos os idosos que apresentavam déficits cognitivos e déficit visual ou auditivo severamente limitante e não compensado por uso de óculos ou aparelho de amplificação sonora, dificultando ou impedindo a realização dos testes de avaliação propostos. Para a realização das avaliações e a organização dos atendimentos individuais dos idosos pela equipe interdisciplinar algumas etapas foram sistematizadas. As consultas individuais consistiam na avaliação global, composta pela anamnese, o exame físico, a avaliação por meio de testes e escalas que objetivavam detectar as incapacidades e as necessidades de saúde de cada idoso. A partir das demandas levantadas, procederam-se os encaminhamentos dos demais serviços da Clínica Escola ou Unidade Básica de Saúde de referência do idoso a fim de estabelecer o planejamento terapêutico e de reabilitação. Para tanto, elaborou-se um instrumento de coleta de dados que contemplava a Anamnese (Queixa Principal, História da Moléstia Atual, História Médica Pregressa, História Familiar, História Medicamentosa, Hábitos Sociais) e o Exame Físico completo (céfalo-podal). Concomitantemente, realizou-se um levantamento bibliográfico a fim de identificar e selecionar os instrumentos mais utilizados para avaliação da dimensão de estado funcional do paciente idoso. Dentre as dimensões mais estudadas e utilizadas para a avaliação geriátrica, o estado funcional é um marcador importante e contempla a avaliação dos fatores físicos, psicológicos e sociais que afetam a saúde dos pacientes idosos. As avaliações sociais e cognitivas também são imprescindíveis na avaliação geriátrica, uma vez que interagem diretamente com o estado funcional e pode comprometê-lo consideravelmente (PAIXÃO; REICHENHEIM, 2005; COSTA; MONEGO, 2003). Desta forma, os testes de desempenho, as escalas e os questionários concebidos para entrevistas face a face com alta confiabilidade adaptados e validados para o contexto brasileiro foram selecionados. Primeiramente, os idosos foram avaliados quanto as suas capacidades cognitivas através do Mini Exame do Estado Mental (MEEM), um questionário composto por 11 itens, sendo eles: orientação espacial e temporal, memória imediata, cálculo, evocação de palavras, nomeação, repetição, comando, leitura, construção de frase e reprodução de um desenho, sendo considerada a pontuação de corte, para classificação de déficits cognitivos, conforme a escolaridade do idoso entrevistado (BERTOLUCCI et al., 1994).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 97
Para avaliação de um possível estado depressivo aplicou-se a Escala Geriátrica de Depressão, composta por 30 perguntas com possibilidades de respostas dicotômicas (sim e não), sendo que a classificação, em caso de pontuação maior que 10 pontos, é interpretada como suspeita de depressão (SOUSA et al., 2007) Dentre os instrumentos utilizados para avaliar o estado funcional, a Medida de Independência Funcional (MIF) foi selecionada. Trata-se de um instrumento de avaliação funcional, com objetivo primordial de avaliar de forma quantitativa a carga de cuidados demandadas pelo indivíduo para a realização de uma série de tarefas motoras e cognitivas da vida diária. As atividades avaliadas são autocuidado, transferência, locomoção, controle esfincteriano, comunicação e cognição social que inclui memória, interação social e resolução de problemas (RIBERTO et al., 2004; RIBERTO et al., 2001). Após a realização da MIF, os idosos que apresentaram dependência modificada, necessitando de ajuda para executar as atividades, foram avaliados para Atividades Instrumentais de Vida Diária (AIVD), por meio do questionário das Atividades Funcionais de Pfeffer. Tal questionário é composto por perguntas relativas à capacidade do idoso em administrar o ambiente onde vive tais como controlar finanças pessoais, preparar refeições, fazer tarefas domésticas, lavar roupas, manusear dinheiro, usar o telefone, tomar medicações, fazer compras e utilizar os meios de transporte. O questionário é composto por dez questões, pontuadas de 0 a 3 pontos, contabilizando, no máximo 30 pontos. A dependência do idoso será considerada se ele obtiver uma pontuação maior ou igual a cinco pontos e se associados a outros testes de função cognitiva alterados, propõe-se encaminhamento para avaliação neurológica (ANGELINI, PAVARINI, 2011). A fim de avaliar a mobilidade funcional e o equilíbrio, utilizou-se o teste Timed Up and Go (TUG) que consiste em mensurar o tempo gasto para o idoso levantar-se de uma cadeira, percorrer três metros e retornar, assentando-se novamente na cadeira. A capacidade de cumprir a tarefa em menos de 10 segundos indica status funcional sem alterações, até 20 segundos - pode apresentar algum declínio funcional, porém, ainda é independente para transferências e mobilidade, e mais que 30 segundos para cumprir a tarefa, já é considerado um sugestivo quadro de dependência para AVD e mobilidade (JACOBS, FOX, 2008). A partir do resultado do TUG, os idosos que demandarem mais que 30 segundos para execução da tarefa, responderam ao questionário Escala de Eficácia de Quedas Internacional (FES-I) para avaliação do medo de quedas, realizando 16 atividades diferentes. A pontuação de cada um dos itens varia de um a quatro pontos, com um escore total mínimo de 16 pontos (ausência de preocupação) e no máximo de 64 pontos (preocupação extrema) (CAMARGOS et al., 2010). Além dos atendimentos individuais, os idosos também foram convidados a participarem dos grupos operativos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Primeiro momento: Elaboração da proposta para a Instituição de Ensino A concepção do projeto de extensão “EnvelheSER” deu-se a partir de um trabalho acadêmico na área da Saúde Coletiva, inicialmente idealizado pelos alunos do curso de Odontologia, denominado “Envelhecer Sorrindo” que apresentava como diretriz básica, a multidisciplinariedade no atendimento de pacientes hipertensos e visava sua implementação dentro da própria instituição. Posteriormente, houve uma articulação junto ao curso de Enfermagem e optou-se por reestruturar o projeto inicial, permitindo atender à terceira idade de uma forma multiprofissional e integral, contando com participação dos
demais cursos da área de saúde da instituição de ensino. Assim, após a elaboração do projeto o submetemos ao setor de pesquisa e extensão e à reitoria para aprovação. A importância da equipe multiprofissional na saúde é referida por diversos autores e justificada de várias formas. Colomé, Lima e Davis (2008) afirmam ser preciso desenvolver um trabalho conjunto no qual todos os profissionais se envolvam em algum momento na assistência, de acordo com seu nível de competência específico, e possam conformar um saber capaz de dar conta da complexidade dos problemas de saúde, o que ampara, justifica e estimula a proposta multiprofissional deste projeto. Segundo momento: Seleção de alunos extensionista Após a aprovação do projeto pela instituição, solicitou-se aos coordenadores do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde que indicassem três alunos para comporem o corpo de extensionistas. Entretanto, não obtivemos êxito. Posteriormente, divulgamos as vagas ao corpo docente e solicitamos que repassem o convite a toda à comunidade acadêmica. Alguns discentes manifestaram interesse em participar e foram convidados a conhecer melhor a extensão idealizada e contribuírem para a formatação final da proposta de trabalho. A literatura aponta que a formação das diversas profissões na área da saúde ainda é pautada em disciplinas fragmentadas e valorizam as especializações em detrimento da integração com as demais áreas envolvidas. Um dos principais fatores que dificultam a prática da interdisciplinaridade é a formação de profissionais que valoriza o trabalho individual em detrimento do coletivo, o que prejudica a integração da equipe. A prática interdisciplinar busca, portanto, a superação da fragmentação do conhecimento, reconhecendo e respeitando as especificidades de cada área profissional (LOCH-NECKEL et al., 2009). O saber interdisciplinar dá condições ao profissional de saúde de perceber o homem como um todo, necessitando, assim, de uma visão mais ampla, que ultrapasse a sua especificidade profissional, e que caminhe na direção da compreensão das implicações sociais decorrentes de sua prática, visando à abrangência do cuidado em saúde (GELBCKE et al., 2012; LOCH-NECKEL et al., 2009). Desta forma, ressalta-se a relevância da implementação de um projeto com o foco na interdisciplinaridade o que possibilita o contato com diferentes referenciais e estruturas, enriquecendo o saber e trazendo novas formas de cooperação e comunicação entre os profissionais e entre estes e o usuário. Nesta prática, o desafio de lidar com as próprias diferenças e com as diferenças dos outros está presente a todo o instante, o que traz, em vez de barreiras, estímulo e riqueza ao trabalho realizado (SOUZA, 2005). Terceiro momento: Início dos atendimentos individuais Inicialmente as avaliações individuais aconteceram por área, sendo conduzidas por um aluno de cada curso. Entretanto, após a primeira reunião e discussão com os alunos e professores participantes do projeto, levantou-se a necessidade de realizar as avaliações em conjunto, permitindo que todas as áreas interagissem entre si, observando, compartilhando e vivenciando todas as etapas da avaliação com o paciente. Assim, aconteceu nos dias de avaliação subsequentes, aonde todos os integrantes do trio composto por alunos dos cursos de Fisioterapia, Odontologia e Enfermagem reuniam-se para a avaliação multiprofissional dos idosos previamente agendados. Os alunos de Odontologia iniciavam a abordagem apresentando o TCLE, ratificando a garantia do anonimato e privacidade das informações e dos participantes considerando os princípios éticos que envolvem a pesquisa com seres humanos. Somente após a anuência e consentimento livre e esclarecido dos idosos, realizavam a avaliação clínica.
98 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Os alunos do curso de enfermagem realizavam a anamnese e exame físico, e finalizava-se com as avaliações e os testes da fisioterapia, conduzidos pelos acadêmicos deste curso. Ressalta-se que os respectivos cursos possuíam tarefas previamente definidas, entretanto, as avaliações específicas, mesmo sendo realizadas pelos cursos de “referência” eram acompanhadas pelos demais alunos. Os atendimentos realizados de forma interdisciplinar que ocorreram neste estudo foram marcados pela interação multidimensional entre vários aspectos da saúde física, mental e social dos idosos. Andrade et al. (2011) ressaltam que o trabalho multiprofissional e interdisciplinar integra em um mesmo plano de avaliação e raciocínio as considerações e pensamentos dos diferentes profissionais envolvidos no processo. A importância destas atividades interdisciplinares para os alunos, assim como o desenvolvimento de práticas na formação dos profissionais, possibilita o aperfeiçoamento de indivíduos, tornando-os capazes de enfrentar os desafios da área da saúde que muitas das vezes apresentam-se de forma complexa e multidimensional entre vários aspectos da saúde física, mental e social (MOTTA e AGUIAR, 2007). O atendimento voltado para a integralidade do idoso permite então, conhecer, de uma forma completa as características dos idosos e a interação das enfermidades com o processo fisiológico do envelhecimento que se mostra única para cada indivíduo. Assim, os atendimentos feitos de forma interdisciplinar que ocorreram neste estudo, tornam se válidos. Uma vez que, muito mais que uma abordagem multiprofissional aonde agrega diferentes profissões, procurou-se integrar num mesmo plano de avaliação e raciocínio as considerações e pensamentos dos diferentes profissionais envolvidos no processo. Quarto momento: Grupos Operativos Os grupos operativos abordaram temas relacionados à saúde e ao processo de envelhecimento, permitindo a interação entre os idosos. Segundo Meireles (2009), a sistematização dos grupos operativos foi feita por Pichon Riviére em 1945, que os definiu como um conjunto de pessoas com um objetivo em comum. Esses grupos seriam espaços onde as pessoas teriam liberdade para falar sobre seus problemas com os profissionais, e buscar soluções, multiplicando informações e conhecimentos. Para Pichon-Riviére (1982), o trabalho em grupo favorece a criação de vínculo entre as pessoas, propiciando sua interação, durante a qual, os indivíduos tanto aprendem quanto ensinam, através de seus conhecimentos e experiência de vida. Os grupos operativos realizados abordaram temas relacionados à saúde e ao processo de envelhecimento, permitindo a interação entre os idosos. A divulgação foi realizada por meio de cartazes afixados em pontos estratégicos da comunidade, distribuição de convites individuais. Os idosos participaram juntamente com discentes e docentes, de dois grupos operativos que proporcionaram trocas de vivências. No primeiro encontro, os seis idosos participantes e os nove extensionistas ficaram organizados em um círculo. Houve a apresentação de todos os presentes a partir da dinâmica do chapéu que objetivou ressaltar a auto percepção dos indivíduos sem relação à autoestima e o processo fisiológico e patológico do envelhecimento. Para fomentar a discussão, uma roda de conversa foi instituída. Utilizou-se de peças anatômicas para demostrar o funcionamento do corpo humano e suas respostas frente ao processo de senilidade. A partir desta demonstração, foi notório o interesse do público alvo em manusear e compreender as alterações do próprio corpo em situações fisiológicas e até mesmo diante das doenças que os acometiam. A curiosidade e a participação foram predominantes neste encontro. Ao final da atividade, disponibilizamos um lanche.
Participar de uma roda de conversa possibilita ao idoso, melhora do raciocínio ativo, seja na fala, na escuta ou diálogo com os demais participantes. A troca de experiências favorece a aquisição de conhecimentos e melhora sua autoestima e a partir de então começa a vencer barreiras do isolamento, impostos pela família e sociedade (OLIVEIRA et al., 2013). Esse tipo de dinâmica tem sido utilizado para atrair a atenção dos idosos. Consiste de atividades lúdicas para despertar nos idosos, lembranças do seu passado, com o intuito de estimular o pensamento, a memória e a autoestima, além de levá-los a se sentirem mais à vontade para falar sobre suas experiências, e com isso tornarem sujeitos ativos do processo de aquisição e transmissão de conhecimento, fazendo com que o processo de aprendizado se torne mais sólido (TAJRA, 2015). Para Metzner e Camolesi (2012), a participação de atividades lúdicas favorece melhora na qualidade de vida, bem-estar físico, social e emocional das pessoas, seja, elas sedentárias ou não. Isso se justifica pelo fato de tais atividades proporcionarem a essas pessoas, que buscam exercitar o corpo e ocupar a mente, o aflorar de sentimentos de alegria e prazer. Já para Silva et al. (2012) é de grande relevância a participação de idosos em vivências que proporcionam o aumento da autoestima e elevação dos níveis de bem-estar físico e mental. Tudo isto tende a gerar como consequência uma melhoria da qualidade de vida, um aumento da autonomia funcional e o prazer pela vida, sendo que uma possibilidade para alcançar tais propósitos possa ser a participação em atividades recreativas. Treze idosos compareceram ao segundo encontro, no qual foram realizadas oficinas temáticas ofertadas pelos cursos de Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Odontologia e Medicina Veterinária. Os quatorzes extensionistas foram distribuídos por curso para participaram das atividades propostas em cada oficina temática. Os alunos de Enfermagem realizaram uma oficina sobre Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e Diabetes Mellitus (DM) Tipo 2, abordou-se a fisiopatologia e as possíveis complicações das patologias mais prevalentes na população idosa. Para tanto, utilizou-se uma ilustração do corpo humano, em tamanho real para demonstrar a disposições dos órgãos, suas funções e algumas das principais complicações decorrentes da HAS e do DM tais como, lesões em órgão -alvos: coração (risco de cardiopatia como a insuficiência cardíaca ou infarto do miocárdio), cérebro (Acidente Vascular Encefálico), vasos e rins (Insuficiência Renal). Salientou-se, na oportunidade, a importância da aferição da pressão arterial e da glicemia capilar no controle, tratamento e prevenção das complicações do HAS e do DM, pois conforme afirmam Gusmão et al., (2011), há um consenso de que os procedimentos de medida da pressão são fundamentais para o diagnóstico e a avaliação do tratamento da hipertensão arterial e devem ser realizados em toda avaliação de saúde por profissionais devidamente treinados; enquanto a aferição da glicemia capilar que é um exame sanguíneo que oferece resultado imediato acerca da concentração de glicose nos vasos capilares da polpa digital, é indicada para controlar a glicemia de portadores de diabetes, ou de pessoas que estejam sob alguma terapia que interfira no metabolismo da glicose (insulinoterapia, uso de nutrição parenteral) (SILVA; PEREIRA; MESQUITA, 2005). Os extensionistas prepararam juntamente com os idosos o “Sal de Ervas”, contendo alecrim, salsinha seca, manjericão, orégano e sal. A finalidade desta atividade era demonstrar o preparo do tempero com o uso de ervas frescas ou secas que agregam sabor às preparações e que pode ser utilizado diariamente no preparo dos alimentos, diminuindo e até mesmo substituindo o sal de maneira saudável (MAGALHÃES, 2015). Segundo estudo elaborado pela Associação
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 99
Brasileira das Indústrias da Alimentação (ABIA) com base em dados da última Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF (2008-2009) e da Pesquisa Anual de Serviços (2009), ambas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o sal de cozinha é responsável por 71,5% da ingestão de sódio pelo brasileiro. A alta ingestão de sódio já é conhecida como fator para o aumento da pressão arterial, risco para a ocorrência de doenças cardiovasculares, dentre essas, a doença cardíaca e acidente vascular. Os idosos demonstraram grande interesse em aprender como preparar e utilizar o “Sal de Ervas” e ao final da atividade foram presenteados com o composto e com uma cópia da receita para prepararem em casa. Posteriormente, procedeu-se a aferição da pressão arterial e da glicemia capilar, com finalidade de mensurar os valores e detectar possíveis alterações a fim de fornecer as informações necessárias de acordo com a alteração apresentada. A maioria dos idosos apresentou pressão arterial e glicemia capilar dentro dos valores considerados normais pela Sociedade Brasileira de Cardiologia (2010) e Sociedade Brasileira de Diabetes (2014), respectivamente - Pressão Arterial sistólica <130 mmHg e pressão arterial diastólica <85 mmHg; Glicemia Capilar entre 70 e 126 mg/dl. Cada idoso recebeu um cartão com a anotação do valor da PA e da glicemia capilar, identificado com seu nome e data. Os idosos frequentemente convivem com doenças crônicas. Conforme afirmam Marin et al. (2008), por conviver com problemas crônicos de saúde, os idosos são consumidores de grande número de medicamentos, que apesar de necessários, quando não utilizados da forma correta podem desencadear complicações sérias para sua saúde. Dentre os dificultadores para o uso de medicamentos por idosos, está a complexidade dos esquemas terapêuticos, a falta de entendimento associada ao analfabetismo, o esquecimento, diminuição da acuidade visual e destreza manual que ocorrem no idoso. Diante dessa realidade, os discentes do curso de Farmácia realizaram uma oficina sobre o uso de medicamentos por idosos, com objetivo de orientar quanto o uso racional dos medicamentos, a efetividade e segurança do tratamento medicamentoso, além da importância do armazenamento correto. Para tanto, os idosos foram orientados e receberam um kit para organização dos medicamentos, facilitando seu manuseio e favorecendo uso correto das medicações. Acredita-se que a educação dos usuários, principalmente, a respeito da automedicação, dos riscos da interrupção do tratamento, da substituição ou inclusão de medicamentos sem conhecimento dos profissionais da saúde, bem como o uso da dose correta em horário correto seguindo a prescrição ou receita médica sejam algumas estratégias que podem auxiliar na prevenção e minimização dos agravos à saúde dessa população (SECOLI, 2010). O processo de envelhecimento biológico determina alterações no aparelho locomotor, que causam limitações às atividades da vida diária e, assim, comprometem a qualidade de vida da pessoa que envelhece (PEDRINELLI et al., 2009). As alunas do curso de Fisioterapia realizaram um momento de alongamento e deram recomendações sobre cuidados domiciliares envolvendo medidas para a prevenção de quedas ou desequilíbrios que causem danos à saúde. Elaboraram e disponibilizaram para todos os participantes um folder informativo com muitas ilustrações. O material de apoio foi construído de forma objetiva e explicativa podendo ser facilmente compreendido, até mesmo pelos idosos com baixa escolaridade ou analfabetos. Uma das oficinas mais movimentadas foi a de Cinoterapia - terapia facilitada por cães para fins terapêuticos ou educacionais realizada pelo curso de Medicina Veterinária. A abordagem terapêutica com o uso de cães possibilitou a relação e estabelecimento de vínculo en-
tre os idosos e o animal. A literatura aponta que o convívio com cães melhora a autoestima, facilita a ação terapêutica e até mesmo induz um melhor desenvolvimento social (PEREIRA et al., 2007). Os discentes de Odontologia realizaram uma intervenção lúdica sobre a técnica de escovação dos dentes, cuidados com as próteses dentárias e auto avaliação para a percepção do câncer de boca. Para tanto, foram utilizados três macros modelos simulando arcadas dentárias e uma escova dental, demonstrando a técnica de escovação. Procedemos às orientações quanto aos cuidados com aparelho protético total e/ou parcial. Os idosos puderam manusear as peças e que sanarem as eventuais dúvidas que pudessem surgir durante a apresentação. Utilizou-se ainda o recurso audiovisual, disponibilizados em PowerPoint, para abordar o tema autoavaliação e com fotos da cavidade oral ideal e outras que apresentavam alterações, ressaltando a importância de sabermos distinguir o fisiológico do patológico em nosso organismo. Foi observado que a utilização de recursos táteis e visuais para a apresentação, despertou o interesse dos envolvidos, resultando na participação ativa com perguntas e atenção dos idosos. A assistência odontológica à população idosa brasileira inserese em um panorama desfavorável, com indivíduos com precárias condições de saúde bucal, altos índices de perdas dentárias e demanda crescente por próteses, comprometendo a qualidade de vida desse grupo etário. Dados do último levantamento epidemiológico realizado no país revelou que a condição de saúde bucal da população idosa apresenta-se fora das metas preconizadas pela OMS e pela Federação Dentária Internacional (FDI), que preconiza que no mínimo 50,0% dos idosos entre 65 e 79 anos devem possuir pelo menos vinte dentes funcionais na cavidade bucal (RODRIGUES et al., 2012; COSTA et al., 2010). Entretanto, no Brasil, apenas 10,0% dos idosos possuem mais que o mínimo recomendado, demonstrando assim, o predomínio do edentulismo (com uma média de 25,8 dentes extraídos, de um total de 32 dentes) (RODRIGUES et al., 2012; COSTA et al., 2010). As avaliações realizadas até o momento permitiram evidenciar que o público alvo do presente estudo apresenta alta prevalência de edentulismo e a maioria faz uso de próteses dentárias parciais ou totais. Nesse sentido, destaca-se a necessidade de incluir atividades que visem à proteção da saúde bucal dos idosos, que estimule a realização do autoexame bucal e os empodere para a incorporação de hábitos e comportamentos saudáveis. A realização dos grupos operativos foi muito satisfatória. Tais atividades permitiram a articulação entre os saberes técnico e popular. Percebemos que os participantes se sentiram motivados e interessados nas atividades de educação em saúde. Ressalta-se que a utilização do lúdico, das ilustrações e das oficinas com grupos menores de pessoas foram facilitadoras ao desenvolvimento de novas capacidades, procurando desenvolver neles o autocuidado, à melhoria na qualidade de vida, bem como o resgate de sua cidadania, traduzida em responsabilidade social. Dentre os fatores facilitadores encontrados para a realização do estudo incluem-se infraestrutura adequada e material disponível por estarmos em um ambiente acadêmico, uma equipe grande de alunos composta por diferentes cursos e períodos que traziam para o projeto diferentes visões e experiências, contribuiu para o desenvolvimento das atividades educativas. Contudo, algumas barreiras foram encontradas, destaca-se a infrequência dos idosos da comunidade nos dias agendados para os atendimentos individuais. Outro aspecto dificultador foi à realização das atividades educativas com um grupo tão heterogêneo em relação aos conhecimentos prévios, nível de escolaridade, diversidade de doenças entre os participantes.
100 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
CONSIDERAÇÕES FINAIS Este projeto de extensão universitária possibilita reconhecer a complexidade dos aspectos envolvidos no cuidado integral e busca pela qualidade de vida dos idosos em atendimento na Clínica Escola e da comunidade. No decorrer de todo o processo de aplicação das atividades propostas (atendimentos individuais e coletivos), a equipe de alunos desenvolveu o seu papel de educador em saúde. Destaca-se o papel da extensão universitária frente à formação acadêmica, profissional e humana dos discentes, principalmente, em relação à integração multiprofissional, interdisciplinar e desenvolvimento de competências e habilidades inerentes ao trabalho em equipe. Além disso, houve importante contribuição do projeto na construção de saberes articulado e não meramente estabelecido dentro de uma disciplina ou componente curricular específico, pois se buscou romper com o modelo hegemônico de formação pautado nas disciplinas biológicas, na valorização da doença, nas especialidades e nas técnicas. Assim, a experiência possibilitou a crítica, a reflexão, a criatividade e inovação. Permitiu ainda, a oportunidade de ampliar os conhecimentos, associar os saberes e incorporá-los na perspectiva de transformação da práxis dos futuros profissionais da área da saúde, visando à abrangência do cuidado. REFERÊNCIAS ABIA. Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação. Cenário do consumo de sódio no Brasil. Estudo elaborado com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Disponível em <www.abia.org.br/ sodio/Sodio2.pdf> Acesso em 13 de dez. 2015. AMPARO, Liliane Peixoto. Aprender fazendo: a interdisciplinaridade na formação em saúde coletiva. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro. v. 18, n. 5, p. 1511-1512, 2013. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232013000500037&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 13 de janeiro de 2016. ANDRADE, et al. As características do cuidar em gerontologia na ótica da equipe multiprofissional do Centro de Referência à Assistência Social do Idoso (CRASI) do município de Montes Claros (MG), Brasil. 2011. Revista Kairós Gerontologia, v. 14, n 4. 14(6). ISSN 2176-901X. São Paulo (SP), Brasil, dezembro: 53-71. ANGELINI, Ariene Santos dos; PAVARINI, Sofia Cristina Lost. Funcionalidade de idosos com alterações cognitivas em diferentes contextos de vulnerabilidade social. Acta Paulista de Enfermagem. 2011. 24(4):520-6. BERTOLUCCI, P. H. F., et al. O Mini-Exame do Estado Mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, v.52, n.1, p.01-07, 1994. BRASIL. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466 de 12 de dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília, 2013. BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Brasília, 2003.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Envelhecimento e saúde da pessoa idosa. 2007. CAMARGOS, et al. Adaptação transcultural e avaliação das propriedades psicométricas da Falls EfficacyScale – International em idosos brasileiros (FES-I-BRASIL). Revista Brasileira de Fisioterapia, São Carlos, v.14, n.3, p.237-43, 2010. COLOMÉ, Isabel Cristina dos Santos; LIMA, Maria Alice Dias da Silva; DAVIS, Roberta. Visão de enfermeiras sobre as articulações das ações de saúde entre profissionais de equipes de saúde da família. Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 42, n. 2, 2008.
CORDONI JUNIOR, Luiz. Elaboração e Avaliação de Projetos em Saúde Coletiva. Londrina: Eduel, 2013. COSTA, E.F.A; MONEGO, E.T. Avaliação Geriátrica Ampla. Revista da UFG, 2003. Disponível em: < http://www.proec.ufg.br/revista_ufg/idoso/aga.html>. Acesso em: 20 de dezembro de 2015. COSTA, E.H.M; SAINTRAIN, M.L; VIEIRA, A.P.G.F. Auto percepção da condição de saúde bucal em idosos institucionalizados e não institucionalizados. Ciência & Saúde Coletiva, 15(6):2925-2930, 2010. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2013-2014. Sociedade Brasileira de Diabetes, São Paulo: AC Farmacêutica, 2014. FOSSI, L. B.; GUARESCHI, N. M. de F. A psicologia hospitalar e as equipes multidisciplinares. Revista. SBPH, v. 7, n. 1, Rio de Janeiro, jun., 2004. GELBCKE, Francine Lima; MATOS, Eliane; SALLUM, Nádia Chiodelli. Desafios para a integração multiprofissional e interdisciplinar. Tempus Actas de Saúde Coletiva, [S.l.], v. 6, n. 4, p. Pág. 31-39, dez. 2012. ISSN 1982-8829. Disponível em: <http://www.tempusactas.unb.br/index.php/tempus/article/view/1202>. Acesso em: 19 set. 2015. GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2008. GUIMARÃES, R.M. Brasil: país de cabelos brancos. Revista A Terceira Idade. 2008;19(43):49-58. GUSMÃO, Josiane Lima de. Fontes de erro na medida da pressão arterial: papel do esfigmomanômetro e do observador. Revista Hipertensão, v. 14, n. 2, 2011, p. 33- 44. Disponível em: http://www.sbh..org.br/pdf/2012_2.pdf. HENINGTON, E.A. Acolhimento como prática interdisciplinar num programa de extensão universitária. Caderno de Saúde Pública, 2005. Fev. 21(1): 256-65. ISSN 0102-311X. JACOBS, Mimi; FOX, Tim. Using the “Timed Up and Go/TUG”Test to Predict Risk of Falls. Assisted Living Consult March/April. 2008. LOCH-NECKEL, Gecioni et al . Desafios para a ação interdisciplinar na atenção básica: implicações relativas à composição das equipes de saúde da família. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro , v. 14, supl. 1, p. 1463-1472, Oct. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232009000800019&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 20 ago. 2015. MAGALHÃES, Ana Beatriz. Aprenda a substituir o sal por temperos frescos e saudáveis. Blog da Saúde. Ministério da Saúde. 2015. MALDONADO, M. T.; CANELLA, P. Recursos de Relacionamento para Profissionais de saúde: a boa comunicação com clientes e seus familiares em consultórios, ambulatórios e hospitais. Ribeirão preto, SP: Editora Novo Conceito, 2009. MARIN, Maria José Sanches, et al. Caracterização do uso de medicamentos entre idosos de uma unidade do Programa Saúde da Família. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, 2008. MARTINS, Eliecília de Fátima. Extensão como componente curricular: oportunidade de formação integral e de solidariedade. Ciências & Cognição. v. 13, 2008. MEIRELES, Rosana Cunha. Estudo da aplicabilidade da estratégia de grupo operativo de idosos em um Centro de Saúde de Belo Horizonte. 2009. METZNER, A. C.; CAMOLESI, D. R. Atividades lúdicas na terceira idade: benefícios para um grupo de mulheres da cidade de Jaborandi. Revista Fafibe On-Line, v. 11, n.5, 2012. Disponível em: <http://www.unifafibe.com.br/revistasonline/ arquivos/revistafafibeonline/sumario/21/21112012211527.pdf.>. Acesso em 20 de dezembro de 2015. MOTTA, Luciana Branco da; AGUIAR, Adriana Cavalcanti de. Novas competências profissionais em saúde e o envelhecimento populacional brasileiro: integralidade, interdisciplinaridade e intersetorialidade. Ciência e saúde coletiva [online]. 2007, vol.12, n.2, pp. 363-372. ISSN 1678-4561.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 101
OLIVEIRA et al. Entre rodas de conversa, reflexões e esclarecimentos: idosos em uma extensão universitária sobre plantas medicinais. Congresso Internacional de Envelhecimento Humano. Campina Grande, 2013.
SILVA, Antonio Fernando Lyra da; RIBEIRO, Carlos Dimas Martins; SILVA JÚNIOR, Aluísio Gomes da. Pensando extensão universitária como campo de formação em saúde: uma experiência na Universidade Federal Fluminense, Brasil. Interface (Botucatu), v.17, n.45, p.371-84, 2013.
OMS. Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. Organização Mundial de Saúde: Genebra/Estados Unidos, 2015. Disponível em: < http://apps.who.int/ iris/bitstream/10665/186468/6/WHO_FWC_ALC_15.01_por.pdf >. Acesso em: 16 set. 2015.
SILVA, Lolita Dopico Da; PEREIRA, Sandra Regina Maciqueira; MESQUITA, Ayla Maria Farias De. Procedimentos de enfermagem: semiotécnica para o cuidado. Rio de Janeiro: Medsi, 2005.
OPAS, Organização Pan-americana de Saúde. Enfermagem Gerontológica: Conceitos para a Prática. Série Paltex. Washington, 1993.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arquivo Brasileiro de Cardiologia. 2010.
PAIXAO JR., Carlos Montes; REICHENHEIM, Michael E. Uma revisão sobre instrumentos de avaliação do estado funcional do idoso. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 21, n. 1, p. 7-19, Feb. 2005 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2005000100002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 19 set. 2015.
SOUSA, Rilva Lopes de et al . Validade e fidedignidade da Escala de Depressão Geriátrica na identificação de idosos deprimidos em um hospital geral. J. bras. psiquiatr., Rio de Janeiro , v. 56, n. 2, p. 102-107, 2007 .Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0047-20852007000200005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 20 de dezembro de 2015.
PEDRINELLI, André; GARCEZ-LEME, Luiz Eugênio; NOBRE, Ricardo do Serro Azul. O efeito da atividade física no aparelho locomotor do idoso. Revista Brasileira de Ortopedia. São Paulo, v. 44, n. 2, p. 96-101, Apr. 2009. Disponível em: <http:// www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-36162009000200002&ln g=en&nrm=iso>. Acesso em: 19 de dezembro de 2015. PEDUZZI, Marina. Equipe multiprofissional de saúde: conceito e tipologia. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 35, n. 1, 2001. Disponível em: <http://www. scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S003489102001000100016&lng=pt&nrm=iso>. PEREIRA, et al. Os benefícios da Terapia Assistida por Animais: uma revisão bibliográfica. Saúde Coletiva [online]. 2007, 4 (abril-maio). Disponível em: <http:// www.redalyc.org/articulo.oa?id=84201407> Acesso em: 16 set. 2015. PICHON-RIVIERE, Enrique. O processo grupal. São Paulo: Martins Fontes, 1982.
TAJRA, Ingrid. Roda de conversa como instrumento para criação de grupos de interação social e educacional em saúde: relato de experiência. Trabalho de Conclusão de Curso Especialização Latu Sensu- TCC Educação Permanente em Saúde em Movimento – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2015. ZAMBERAN, C.; SIQUEIRA, H.C.H. A terceirização nos serviços e consequências no cuidar em Enfermagem. Revista Brasileira de Enfermagem. 2005;58(6):727-30.
NOTAS DE FIM Acadêmicas do curso de Enfermagem do Centro Universitário Newton. Discentes do Projeto de Extensão EnvelheSer: uma abordagem multiprofissional.E-mail: barbarabruna07@hotmail.com; jani.araujo@hotmail.com; leticiabarbosa.f@hotmail.com; lorena.castrosilvafunec@gmail.com 1
Acadêmicas do curso de Fisioterapia do Centro Universitário Newton. Discentes do Projeto de Extensão EnvelheSer: uma abordagem multiprofissional.E-mail: apdmenezes@gmail.com; mariacarolinagi@hotmail.com; silviamoreiraamaral@yahoo.com.br 2
RIBERTO, et al. Validação da Versão Brasileira da Medida de Independência Funcional. Acta Fisiátrica. 2004; 11(2): 72-76. RIBERTO, et al. Reprodutibilidade da versão brasileira da Medida de Independência Funcional. Acta Fisiátrica. 8(1): 45-52, 2001. RODRIGUES, et al. Fatores associados à satisfação com serviços odontológicos entre idosos. Revista de Saúde Pública. Montes Claros, 2012.
Acadêmicos do curso de Odontologia do Centro Universitário Newton. Discentes do Projeto de Extensão EnvelheSer: uma abordagem multiprofissional. E-mail: le.m.e@hotmail.com; lsantos-2@hotmail.com; virgiliomaximiano@gmail.com 3
Bacharel em Enfermagem. Mestre em Saúde Coletiva (FIOCRUZ/CPqRR). Especialista em Formação Pedagógica para Profissionais da Saúde (UFMG). Especialista em Nefrologia (UNA). Docente do Instituto de Ciência Biológicas e da Saúde do Centro Universitário Newton. Coordenadora do Projeto de Extensão EnvelheSer: uma abordagem multiprofissional do idoso.E-mail: fernandes.valquiria@gmail.com 4
SECOLI, Silvia Regina. Polifarmácia: interações e reações adversas no uso de medicamentos por idosos. Revista. Brasileira de Enfermagem, vol.63, no.1, Brasília. 2010. SILVA, A.L.B.; TAHARA, A.K.; CARNICELLI FILHO, S. A participação de idosos em atividades recreativas em Itabuna/BA. Licere. Belo Horizonte, v.15, n.3, 2012. Disponível em: < http://www.anima.eefd.ufrj.br/licere/pdf/licereV15N03_ a1.pdf> Acesso em: 20 de dezembro de 2015.
102 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
IMPORTÂNCIA DO ESTUDO E UTILIZAÇÃO DE PLANTAS MEDICINAIS, NO CENTRO DE VIVÊNCIA AGROECOLÓGICO MORRO DAS PEDRAS, BELO HORIZONTE, MG Vera Lúcia Ferreira1 Alice Gontijo de Godoy2
RESUMO: O uso de espécies vegetais com fim terapêutico é uma prática milenar, importante ainda nos dias de hoje como alternativa na cura e prevenção de doenças e como fonte de matéria prima para a fabricação de fármacos. O registro do uso popular dessas plantas torna-se cada vez mais importante, num contexto em que a transmissão informal do conhecimento torna-se comprometida pelos hábitos da sociedade contemporânea. Com esse objetivo, realizou-se nesse trabalho um levantamento etnobotânico no Centro de Vivência Agroecológico (CEVAE) Morro das Pedras, em Belo Horizonte, espaço de uso comum para a prática de agricultura urbana. Através dos questionários aplicados constatou-se que a maior parte dos frequentadores do espaço, em maioria mulheres, faz uso regular de plantas medicinais. O conhecimento a esse respeito é passado entre gerações principalmente no âmbito familiar, a partir de pessoas mais velhas. Foi relatado o uso de 35 espécies vegetais, pertencentes a 17 famílias botânicas, sendo as mais utilizadas Lamiaceae e Asteraceae, principalmente no tratamento de afecções do sistema respiratório e digestório. A convivência em um espaço de uso comum com disponibilidade de espécies medicinais, como os CEVAEs, favorece a de troca de saberes, atuando na propagação do conhecimento tradicional. Palavras-chave: Plantas medicinais. Etnobotânica. Conhecimento tradicional.
1. INTRODUÇÃO A utilização de plantas com finalidades curativas é uma prática milenar repassada entre as gerações de forma empírica e verbal, construída por meio de experimentações e observações dos recursos vegetais disponíveis, sendo comumente utilizada no tratamento de moléstias e na manutenção da saúde (LORENZI & MATOS, 2008). O uso de plantas com fins curativos constitui um recurso natural valioso, embora o número de espécies de plantas medicinais in natura conhecidas atualmente seja pouco caracterizada cientificamente (NEVES, 2001). Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), uma espécie com uso medicinal precisa ser validada, ou seja, é necessário confirmar suas propriedades farmacológicas e ausência de toxicidade a fim de evitar riscos à saúde. Muitas espécies ditas medicinais não possuem informações científicas acerca das suas propriedades, acarretando preocupação à saúde publica (BRASIL, 2011). A etnobotânica é o estudo da interação entre o conhecimento botânico e sua utilização popular, desenvolvida pelos mais diversos grupos sociais, abrangendo tanto a maneira como os indivíduos classificam as plantas como as utilidades das mesmas (AMOROZO et al., 1996). O uso terapêutico das espécies vegetais é a categoria predominante, auxiliando a comunidade científica em novas descobertas farmacológicas e na caracterização de possíveis efeitos colaterais associados (ELIZABETSKY, 2003). Na tentativa de promover uma política voltada para o meio ambiente e alimentação alternativas em Belo Horizonte, foram criados os Centros de Vivência Agroecológicos (CEVAEs). (BRASIL, 1999; PBH, 2007). Espaços públicos, os CEVAEs trouxeram elementos de desenvolvimento da agricultura sustentável aos seus frequentadores, valorizando a troca de experiências entre as comunidades do meio urbano e rural, através da metodologia cooperativa (BARBOSA, 2002). O CEVAE Morro das Pedras, inaugurado em 1995, atende à comuni-
dade do Morro das Pedras e seu entorno, contando com uma área de 6.000m2. Oferece oportunidade á comunidade de produzir e consumir produtos provenientes da agricultura familiar através de hortas comunitárias e individuais, sendo as espécies vegetais cultivadas sem utilização de insumos não industrializados, tais como inseticidas e adubos sintéticos. O viveiro de plantas medicinais é oferecido como alternativa aos cuidados com a saúde. Este trabalho teve como objetivo realizar um levantamento etnobotânico no CEVAE Morro das Pedras, caracterizando a utilização de plantas medicinais e o perfil socioeconômico dos frequentadores deste espaço. 2. METODOLOGIA 2.1 Área do estudo. O CEVAE Morro das Pedras está localizado no bairro Nova Granada, nas coordenadas 19° 56’ S, 43° 57’ W e a 920m de altitude, adjacente ao aglomerado Morro das Pedras. Está inserido na região oeste de Belo Horizonte, caracterizada como uma área em expansão urbana e que abrange uma população de 285.005 habitantes, com densidade demográfica de 8.591 habitantes por km² (IBGE, 2010). 2.2 DESENHO E POPULAÇÃO DE ESTUDO.
O estudo foi caracterizado como uma pesquisa descritiva, onde todos os dados foram coletados simultaneamente através de um questionário semiestruturado previamente definido (ALMEIDA et al., 2006), em entrevistas realizadas com os frequentadores do CEVAE entre Julho e Agosto de 2015. O critério de exclusão adotado foi a opção do entrevistado em consentir a participação ou não através de assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (BRASIL,1996), ser menor de 18 anos ou incapacitado mentalmente.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 103
2.3 VARIÁVEIS E ANÁLISES DOS DADOS.
O questionário elaborado para coleta das informações (ANEXO 1) foi dividido em variáveis socioeconômicas e dados etnobotânicos. Nas questões objetivas a respeito do uso de plantas medicinais foram utilizadas medidas escalares nominais, com cinco atributos de respostas psicométricas (LIKERT,1932). Por ser um estudo de caráter descritivo, os dados coletados foram convertidos em tabelas e gráficos utilizando-se os valores relativos, absolutos e porcentagem obtidos, utilizando-se o programa Microsoft Excel® (Microsoft Office 2010).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Exemplares das espécies citadas nas entrevistas foram coletados no CEVAE e herborizados, sendo as exsicatas adicionadas ao herbário BHNP do Centro Universitário Newton Paiva. As espécies citadas foram agrupadas em famílias, conforme o sistema de classificação Angiosperm Phylogeny Group III (APG III, 2009). As espécies citadas foram conferidas na lista de espécies registradas pela ANVISA (BRASIL, 2014).
3.1 Variáveis socioeconômicas Durante o período de avaliação foram entrevistados 52 frequentadores do CEVAE. Do total amostrado, a maior parte (73%) é do sexo feminino, resultado comum em levantamentos etnobotânicos, em que o gênero feminino se destaca (PIRES et al.; 2014). Alguns autores defendem que a mulher geralmente é mais ativa na busca por tratamento e prevenção de moléstias da família, tendendo a se interessar mais pelo conhecimento acerca de plantas medicinais (LÖBLER et al.; 2014). Embora todos os entrevistados residam em Belo Horizonte, 46% deles são de origem rural e 54% de área urbana. Assim como em outros trabalhos, não foi observada influência da origem dos entrevistados no nível de conhecimento das plantas medicinais (SILVA & PROENÇA, 2008). A maior parte deles possui o ensino médio completo (38%) e encontra-se acima dos 61 anos (40,3%), sendo esses os responsáveis pelo maior número de citações de espécies com uso medicinal (61%) (Gráfico 1). A classe senil é detentora de elevado conhecimento das
plantas medicinais e suas utilizações (PHILLIPS & GENTRY 1993), já que, com o passar dos anos, os indivíduos mais velhos tendem a acumular mais conhecimento tradicional (HANAZAKI et al., 2000). O conhecimento sobre plantas medicinais da maioria dos entrevistados é de origem materna (37%) (Gráfico 2), assim como no estudo de CALÁBRIA et al. (2008). Ainda nos dias de hoje, em muitos casos, as mães são as principais responsáveis pelos afazeres domésticos e cuidados com os filhos, passando mais tempo com os familiares, o que contribui para o repasse do conhecimento que possuem acerca do uso de plantas medicinais (OLIVEIRA & NETO, 2012).
Dentre os entrevistados, 40% aconselham com frequência o uso de plantas medicinais aos mais jovens (Tabela 1), atestando a essencialidade da propagação desse saber empírico e a transmissão do conhecimento entre gerações (SILVA et al. 2015). A importância da figura feminina no ensinamento aos mais jovens é reforçada nos dados amostrados, em que 32% do total de entrevistado é composto por mulheres que frequentemente aconselham o uso de plantas medicinais aos mais jovens, contra 8% de homens que o fazem na mesma frequência (Tabela 1). LIPORACCI & SIMAO (2013) descrevem resultado semelhante, em que mães e avós são as principais responsáveis pela transmissão
2.4 HERBORIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DO MATERIAL COLETADO.
104 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
desse conhecimento para as gerações que as sucedem. As residências dos frequentadores do CEVAE são habitadas, em sua maioria (36,5%), por 4 moradores (Tabela 2-A). O número reduzido de componentes familiares pode influenciar o conhecimento sobre plantas medicinais, dada a importância de sua transmissão oral no ambiente doméstico (Oliveira et al., 2010). A renda familiar predominante entre os entrevistados variou de dois (34,5%) a três salários mínimos (30,8%) (Tabela 2- B), indicativo de baixa estabilidade financeira (IBGE, 2010). Esse dado evidencia a importância do consumo de alimentos e plantas medicinais produzidas no CEVAE na subsis-
tência dessas famílias, assim como da complementação da renda pela comercialização da produção excedente. Do total de entrevistados, 34% confiam totalmente no poder das plantas medicinais, e 20% concordam ou concordam parcialmente (19%) que sua utilização seja melhor que a de medicamentos sintéticos (Tabela 3 - A, B). Esse tipo de observação é de grande importância na busca por novos fármacos, já que indica a satisfação dos usuários dessas plantas no tratamento e prevenção de moléstias. Dessa forma, as espécies citadas em maior consenso seriam candidatas a testes farmacológicos que avaliem a eficácia de seus princípios ativos
desse conhecimento para as gerações que as sucedem. As residências dos frequentadores do CEVAE são habitadas, em sua maioria (36,5%), por 4 moradores (Tabela 2-A). O número reduzido de componentes familiares pode influenciar o conhecimento sobre plantas medicinais, dada a importância de sua transmissão oral no ambiente doméstico (Oliveira et al., 2010). A renda familiar predominante entre os entrevistados variou de dois (34,5%) a três salários mínimos (30,8%) (Tabela 2- B), indicativo de baixa estabilidade financeira (IBGE, 2010). Esse dado evidencia a importância do consumo de alimentos e plantas medicinais produzidas no CEVAE na subsistência dessas famílias,
assim como da complementação da renda pela comercialização da produção excedente. Do total de entrevistados, 34% confiam totalmente no poder das plantas medicinais, e 20% concordam ou concordam parcialmente (19%) que sua utilização seja melhor que a de medicamentos sintéticos (Tabela 3 - A, B). Esse tipo de observação é de grande importância na busca por novos fármacos, já que indica a satisfação dos usuários dessas plantas no tratamento e prevenção de moléstias. Dessa forma, as espécies citadas em maior consenso seriam candidatas a testes farmacológicos que avaliem a eficácia de seus princípios ativos (ELISABETSKY & SOUZA 2004).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 105
106 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 107
Em sua maioria (56%), os frequentadores do CEVAE fazem uso das plantas medicinais somente em caso de desconforto (Gráfico 3). Também foi constatado o uso sistemático, uma vez ao dia (17%) e uma vez por semana (17%). A crença popular de que o uso de produtos naturais está associado à menor ocorrência de efeitos colaterais faz com que, em muitos casos, a utilização de plantas medicinais seja a primeira alternativa no tratamento das doenças de menor gravidade, assim como seu uso diário como uma medida de prevenção (OLIVEIRA & NETO, 2012).
3.2 Dados etnobotânicos Foi relatado o uso de 35 espécies vegetais, distribuídas em 32 gêneros, pertencentes a 17 famílias botânicas (Tabela 4). Dentre as espécies citadas, Plantago major (tansagem), Phyllanthus niruri (quebra pedra) e Bidens pilosa (picão) são consideradas de crescimento espontâneo (FRANCO & BARROS, 2006), sendo as demais cultivadas no CEVAE. A frequência relativa das dez principais espécies medicinais utilizadas no CEVAE perfaz 76,5% do total de citações (Tabela 5). Essas espécies são frequentes em outros estudos etnobotânicos no
estado de Minas Gerais (CALÁBRIA et al., 2008; KFFURI, 2008). Do total de espécies identificadas, 57,1% tem o uso medicinal regulamentado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (BRASIL, 2014), inclusive as mais citadas, o guaco (Mikania glomerata), a camomila (Matricaria recutita) e o capim-cidreira (Cymbopogon ci-
tratus). O uso de espécies validadas acarreta em menores riscos de maleficio ou intoxicação, visto que as mesmas têm a comprovação científica de seus efeitos medicinais, assim como a descrição de seu uso tradicional, indicações, modo de preparo e interações com outros medicamentos (OLIVEIRA & LUCENA, 2015). Torna-se impor-
108 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
tante, portanto, a divulgação de tais informações para a população, a fim de viabilizar o uso seguro de espécies vegetais medicinais e inibir o consumo de plantas que acarretem em riscos à população. Com esse propósito, deve-se também ressaltar a importância de trabalhos científicos junto às comunidade para evitar identificações errôneas de espécies e possíveis interações dos princípios ativos
das plantas entre si e com medicamentos (BATTISTI et al., 2013). As famílias botânicas com maior riqueza de espécies foram Lamiaceae e Asteraceae (Gráfico 4), com oito e sete representantes, respectivamente, confirmando a importância dessas famílias em estudos de plantas medicinais e como fornecedoras de matéria prima para produção de fármacos (PILLA et al., 2006).
A forma de preparo predominante nesse estudo foi infusão/chá (63%), resultado comum em levantamentos etnobotânicos (CUNHA
os CEVAE’s, favorece a de troca de saberes, atuando na propagação do conhecimento de origem familiar trazido por seus frequentadores.
& BORTOLOTTO, 2011 e BATTISTI et al., 2013). A parte vegetal mais utilizada foram às folhas (92% de citações), cujo uso predominante, segundo CASTELLUCCI et al. (2000), é devido à facilidade em encontrá-las no ambiente e à sua disponibilidade durante todo o ano. Dos 52 entrevistados, 94% utilizam plantas medicinais, no tratamento de moléstias como gripe/resfriado, ansiedade/insônia, problemas digestivos, tosse, infecção urinária e cólica intestinal/gases (Gráfico 5). A prevalência do uso do guaco (Mikania glomerata), camomila (Matricaria recutita) e capim-cidreira (Cymbopogon citratus) pode ser explicada por seus efeitos comprovados no tratamento de afecções do sistema respiratório e digestório, que compõem a maior parte das moléstias citadas pelos entrevistados (LIPORACCI & SIMAO, 2013). 4.CONSIDERAÇÕES FINAIS O uso de plantas medicinais está incorporado aos hábitos da maior parte dos frequentadores do CEVAE Morro das Pedras, tanto no tratamento como na prevenção de doenças. A importância das mulheres nesses espaços é evidenciada pela sua presença majoritária, sendo identificadas como as principais responsáveis pela transmissão desse conhecimento. A alta riqueza de espécies medicinais nos CEVAEs é fruto do cultivo em canteiros e da manutenção de plantas úteis de crescimento espontâneo. O guaco, a camomila e o capim-cidreira, foram as espécies relatadas de uso mais frequente, são empregadas no tratamento de doenças comuns, como resfriados, gripes e problemas digestivos. Assim como a maior parte das espécies citadas nos questionários, têm seu uso validado pela ANVISA, podendo ser usadas sem riscos à saúde, desde que se sigam as recomendações. Em contrapartida, as espécies citadas ainda não submetidas à validação representam uma fonte potencial de informações a serem exploradas em estudos farmacológicos, ao mesmo tempo em que evidenciam a necessidade de testes para a produção de informações que orientem seu uso seguro pela população. Acredita-se que a tendência à redução do número de habitantes por residência tenha impactos negativos no repasse do conhecimento etnobotânico. Nesse contexto, a convivência em um espaço de uso comum com disponibilidade de diversas espécies medicinais, como
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, C.F.C.B.R., AMORIM, E.L.C., ALBUQUERQUE, U.P., MAIA, M.B.S. Medicinal plants popularly used in the Xingo region - a semi-arid location in Northeastern Brazil. Journal of Ethnobiology and Ethnomedicine, v.2, n.15, p.1-9, 2006. AMOROZO, M.C.M., REIS, M.S., FERRI, P.H. A Abordagem etnobotânica na pesquisa de plantas medicinais. In: DI STASI, L.C. (Org.). Plantas medicinais: arte e ciência - um guia de estudo interdisciplinar. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1996. p.47-68. APG III. An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orders and families of flowering plants: APG III. Botanical Journal of the Linnen a Society, v.161, 2009. p.105-21. BARBOSA, M. T. Educação ambiental popular: estudo de caso sobre a experiência do Centro de Vivência Agroecológica - CEVAE/Taquaril. 2002. 151p. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Instituto de Geociências, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais. BATTISTI, C., et al. Plantas medicinais utilizadas no município de Palmeira das Missões, RS, Brasil. Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 11, n. 3, p. 338-348, 2013. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Formulário de Fitoterápicos da Farmacopéia Brasileira / Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Brasília: Anvisa, 2011. 126p. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). RDC N° 26, DE 13 DE MAIO DE 2014. Dispõe sobre o registro de medicamentos fitoterápicos e o registro e a notificação de produtos tradicionais fitoterápicos. Diário Oficial da União: Brasília, 2014. BRASIL. Conselho Municipal do Meio Ambiente - COMAM. Conselho municipal do meio ambiente estabelece as normas de gestão e funcionamento dos Centros de Vivência Agroecológica / CEVAE-PBH, enquanto instrumentos de política pública de meio ambiente e segurança alimentar do Município de Belo Horizonte. Deliberação Normativa do n. 023, 1999. Diário Oficial do Município, Belo Horizonte, p. 5-6, 09 de abril de 1999. BRASIL Ministério da Saúde (MS). Conselho Nacional de Saúde. Resolução 196 de 10 de outubro de 1996. Declarações e diretrizes sobre pesquisas que envolvem seres humanos. Brasília, 1996. CALÁBRIA, L., et al. Levantamento etnobotânico e etnofarmacológico de plantas
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 109
medicinais em Indianópolis, Minas Gerais, Brasil. Revista Brasileira de Plantas Medicinais.v.10, n.1, p.49-63, 2008.
2ª edição. Nova Odessa, Brasil: Instituto Plantarum de Estudos da Flora Ltda, 2008.p.576.
CASTELLUCCI, S., LIMA, I.S., NORDI, N., MARQUES, J.G.W. Plantas medicinais relatadas pela comunidade residente na estação ecológica de Jataí, município de Luís Antônio/SP: uma abordagem etnobotânica. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, v.3, n.1, p.51-60, 2000.
NEVES, M.C.M. Plantas medicinais: diagnóstico e gestão. Série meio ambiente em debate. n 35. Brasília: Ed. IBAMA. 2001. 52p.
CUNHA, S. A., BORTOLOTTO, I. M. Etnobotânica de Plantas Medicinais no Assentamento Monjolinho, município de Anastácio, Mato Grosso do Sul, Brasil. Acta Botanica Brasilica. v. 25, n. 3, p. 685-698, 2011. ELISABETSKY, E. Etnofarmacologia. Ciência e Cultura. v.55, n.3, p.35-36, 2003. ELISABETSKY, E., Souza, G.C. Etnofarmacologia como ferramenta na busca de substâncias ativas. In: SIMÕES, C.N.O., et al. Farmacognosia: da planta ao medicamento. Porto Alegre/Florianópolis. 5ª ed. Editora da UFRGS/UFSC. 2004. p. 107-122. FRANCO, E.A.P; BARROS, R.F.M. Uso e diversidade de plantas medicinais no Quilombo Olho D’água dos Pires, Esperantina, Piauí. Revista Brasileira de Plantas Medicinais. v.8,n.3, p. 78-88, 2006. HANAZAKI, N. et al. Diversity of plant uses in two Caiçara communities from the Atlantic Forest coast, Brazil. Biodiversity and Conservation, v.9,N.6, p.597-615, 2000. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE. Censo populacional do Brasil: dados demográficos. Brasília, DF: IBGE, 2010. KFFURI, C.W. Etnobotânica de plantas medicinais no município de Senador Firmino, Minas Gerais. 2008. 88p. Dissertação (Mestrado em Fitotecnia) - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. LIKERT, R. A technique for the measurement of attitudes. Archives of Psychology, v.140, p.1-55, 1932. LIPORACCI, H.S.N., SIMAO, D.G. Levantamento etnobotânico de plantas medicinais nos quintais do Bairro Novo Horizonte, Ituiutaba, MG. Revista brasileira de plantas medicinais.vol.15, n.4, pp. 529-540. 2013. LÖBLER, L., SANTOS, D., RODRIGUES, E. S., ZAMBERLAN, N. R. S. Levantamento etnobotânico de plantas medicinais no bairro Três de Outubro da cidade de São Gabriel, RS, Brasil. Revista Brasileira de Biociência, Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 81-89, 2014. LORENZI, H., MATOS, F.J.A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas.
OLIVEIRA, G. L., OLIVEIRA, A. F. M; ANDRADE, L. H. C. Plantas medicinais utilizadas em comunidades rurais de Oeiras, semiárido piauiense. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Botucatu, v.12, n.3, p.282-301, 2010. OLIVEIRA, E.R., NETO, L.M. Levantamento etnobotânico de plantas medicinais utilizadas pelos moradores do povoado de Manejo, Lima Duarte - MG. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Botucatu, v.14, n.2, p. 311-320, 2012. OLIVEIRA, D.M. S., LUCENA, E.M.P. The use of medicinal plants to habitants from Quixada, Ceara. Revista brasileira de plantas medicinais. Botucatu, v. 17, n. 3, p. 407-412, 2015. PHILLIPS, O., GENTRY, A.H. The useful plants of Tambopata, Peru: I. Statistical hypotheses tests with a new quantitative technique. Economic Botany. v. 47,n. 1, p 15-32. 1993. PILLA, M.A.C.; AMOROZO, M.C.M.; FURLAN, A. Obtenção e uso das plantas medicinais no distrito de Martim Francisco, Município de Mogi-Mirim, SP, Brasil. Acta Botanica Brasilica, v.20, n.4, p.789-802, 2006. PIRES, I.F.B., et al. Plantas medicinais como opção terapêutica em comunidade de Montes Claros, Minas Gerais, Brasil. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, v.16, n.2, p.426-433, 2014. PREFEITURA DE BELO HORIZONTE PBH. Secretaria Municipal de Abastecimento. Projeto Centro de Vivência Agroecológica - CEVAE. Belo Horizonte, 2007.<http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=20526&chPlc=20526> Acessado em: 30 Set.2015. SILVA, C. S. P., PROENÇA, C. E. B. Uso e disponibilidade de recursos medicinais no município de Ouro Verde de Goiás, GO, Brasil. Acta Botanica Brasilica, v. 22, n. 2, p. 481-492, 2008. SILVA, C.G., et al. Levantamento etnobotânico de plantas medicinais em área de Caatinga na comunidade do Sítio Nazaré, município de Milagres, Ceará, Brasil. Revista Brasileira de Plantas Medicinais. v.17, n1, p.133142, 2015.
6. ANEXOS
110 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
NOTAS DE FIM 1 Bióloga pelo Centro Universitário Newton Paiva. E-mail: veralfbio@gmail.com
2 Bióloga, MSc. e DSc. em Fisiologia Vegetal pela Universidade Federal de Viçosa, professora titular do Centro Universitário Newton Paiva. E-mail: aliceggodoy@gmail.com
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 111
BUSINESS INTELLIGENCE, BIG DATA E FAST DATA: ANÁLISE DAS TECNOLOGIAS DE TRATAMENTO DE DADOS EM MASSA Jeferson Eustáquio Rodrigues de Araújo1 Iremar Nunes de Lima 2
RESUMO: Os sistemas de tratamento de dados em massa, também denominados Sistemas de Apoio Decisão (SAD), são cada vez mais importantes para as organizações, ajudando no processo de tomada de decisão e definição de estratégias competitivas. Com a evolução da tecnologia, da postura e comportamento das pessoas em meio a essa nova realidade que permite acesso rápido e fácil a praticamente toda forma de informação, tem sido gerado nos últimos anos, uma quantidade imensurável de dados (estruturados ou não) nos bancos de dados organizacionais e junto com eles a possibilidade de se extrair muita informação de valor estratégico para tomada de decisões. Se a evolução natural e inevitável da tecnologia trouxe esta demanda para nossa realidade, a própria evolução tecnológica nos proporciona ferramentas para interagir e reagir em tempo hábil a este novo momento. É o que se propõem a fazer as ferramentas apresentadas neste artigo. PALAVRAS-CHAVE: Banco de Dados. Business Intelligence. Big Data. Fast Data.
1- INTRODUÇÃO Desde a criação de computadores e do início da proliferação de sistemas computacionais, a participação da tecnologia de banco de dados sempre foi crucial para a manutenção dos dados e obtenção das informações. Com o crescimento da quantidade de dados armazenados nos bancos de dados e surgimento da internet, a informação evoluiu para o conhecimento e sabedoria, apoiando os gestores das organizações na tomada de decisão mais precisa e rápida.O mundo dos negócios está cada vez mais competitivo e acirrado, e as organizações que querem se destacar procuram por diferenciais que as qualifiquem em meio a seus concorrentes. Para isto, é essencial conhecer a fundo o próprio negócio, saber reconhecer e trabalhar sobre os pontos fracos e fortes da organização, fazer um bom planejamento estratégico e ter disposição para a usar a tecnologia como aliada da empresa no processo decisório. Além de armazenar, ao longo dos últimos anos obter e analisar dados gerados pelos sistemas de informação tornou-se peça chave para uma boa estratégia organizacional. Isso porque, em meio a uma enorme quantidade de dados, a capacidade de extrair informações de relevância estratégica tornou-se um diferencial competitivo. De forma
2- O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÕES NAS ORGANIZAÇÕES No dia a dia de uma organização decisões são tomadas o tempo todo e em todos os seus níveis hierárquicos, aplicando-se desde a situações rotineiras do cotidiano operacional, até questões estratégicas envolvendo números, perspectivas, projeções, conhecimento de mercado e negócio do ponto de vista dos gestores. A tomada de decisão tem por objetivo traçar os passos da organização, seja para obter vantagem sobre seus concorrentes, reduzir gastos, evitar investimentos desnecessários ou até mesmo identificar os pontos fracos da empresa. A constante evolução do mercado exige que o gestor esteja atento a tudo o que está acontecendo ao seu redor. Diante desse cenário, é preciso que o administrador permaneça atento ao mercado, bem como ao ambiente interno e externo de sua organização pois, uma vez tomada a decisão, a mesma poderá impactar em todos os níveis operacionais da empresa. Desta forma, quanto maior a integração do gestor com o ambiente em sua volta melhor e mais eficaz será a sua escolha. A organização é um sistema de decisões em que cada pessoa participa consciente e racionalmente, escolhendo e decidindo entre alternativas mais ou menos racionais que são apresenta-
genérica, este é o conceito por trás das tecnologias de tratamento em massa de dados que, uma vez bem implementada, possibilita aos gestores tomadas de decisões mais precisas e rápidas. As tecnologias de tratamento de dados em massa surgem para atuar no âmbito organizacional, auxiliando e possibilitando a seus detentores uma visão poderosa (se bem utilizada) de seu negócio, por meio de análises, diagnósticos, detecção de padrões e respostas em tempo real a ações de clientes. O restante deste artigo visa apresentar as tecnologias atuais de tratamento de dados em massa como Business Intelligence (BI), Big Data e Fast Data. Será descrito os conceitos, características e problemas relacionados ao processo de tomada de decisões nas organizações e como estas tecnologias podem ser aplicadas nas empresas. Também, será avaliado as principais tendências, dados de mercado, problemas e desafios relacionados à implementação destas tecnologias no mercado atual.
das de acordo com sua personalidade, motivações e atitudes. Os processos de percepção das situações e o raciocínio são básicos para a explicação do comportamento humano nas organizações: o que uma pessoa aprecia e deseja influencia o que se vê e interpreta, assim como o que vê e interpreta influencia o que aprecia e deseja. Em outros termos, a pessoa decide em função de sua percepção das situações. Em resumo, as pessoas são processadores de informação, criadoras de opinião e tomadoras de decisão (CHIAVENATO, 2003, p.348). Segundo Valero (2012, p. 25), “a administração é o processo ou atividade dinâmica que consiste em tomar decisões sobre objetivos e recursos”. Lima (2012) relata que “a habilidade em tomar decisões é a chave para o planejamento bem-sucedido em todos os níveis da gestão. Isto envolve mais que uma simples seleção de planos de ação que assume pelo menos três fases: diagnóstico; descobertas de alternativas e análises”.
112 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Outro ponto importante é que não se pode atribuir o processo de tomada de decisão apenas ao nível estratégico. Os caminhos que a organização almeja seguir, evitar, mapear realmente estão presentes ali, e irão moldar o comportamento dos níveis inferiores como supracitado, o que não quer dizer que os níveis inferiores não disponham de tal necessidade. Desta forma, o processo de tomada de decisão está presente nos três níveis hierárquicos de uma organização. Freitas (1995) estabelece a seguinte classificação: Nível operacional: Significando o uso eficaz e eficiente das instalações existentes e de todos os recursos para executar as operações. A decisão no nível operacional é um processo pelo qual se assegura que as atividades operacionais sejam bem desenvolvidas. O controle operacional utiliza procedimentos e regras de decisões pré -estabelecidas. Uma grande parte destas decisões é programada e os procedimentos a serem seguidos são geralmente muito estáveis. As decisões operacionais e suas ações geralmente resultam em uma resposta imediata; Nível tático: Englobando a aquisição genérica de recursos e as
táticas para a aquisição, localização de projetos e novos produtos. As decisões no nível tático são normalmente relacionadas com o controle administrativo e são utilizadas para decidir sobre as operações de controle, formular novas regras de decisão que irão ser aplicadas por parte do pessoal de operação e designação de recursos. Neste nível são necessárias informações sobre o funcionamento planejado (normas, expectativas, pressupostos), variações a partir de um funcionamento planejado, a explicação destas variações e a análise das possibilidades de decisão no curso das ações; Nível estratégico: Englobando a definição de objetivos, políticas e critérios gerais para planejar o curso da organização. O propósito das decisões no nível estratégico é desenvolver estratégias para que a organização seja capaz de atingir seus macros objetivos. As atividades deste nível não possuem um período com ciclo uniforme. Estas atividades podem ser irregulares, ainda que alguns planos estratégicos se façam dentro de planejamentos anuais ou em períodos pré-estabelecidos. Presente em todos os níveis da organização, a tomada de decisão pode ser representada pela imagem abaixo:
Figura 1 - Modelo da pirâmide para tomada de decisão Fonte - Adaptada de Valero (2012, p.32).
A hierarquia entre os três níveis está representada na imagem da pirâmide organizacional e as setas representam a abrangência nas decisões dentro da organização, que sobe à medida que a decisão ocorre em seus níveis superiores, e desce quando se trata de uma decisão tomada em seu nível operacional. A racionalidade das decisões é tratada como uma seleção de alternativas que se encaixam em algum sistema de valores e são, até certo ponto, uma aceitação do razoável. A alternativa escolhida, normalmente, representa, apenas, a mais adequada entre as disponíveis, portanto, não representam a intenção de se atingir os objetivos em toda sua plenitude (VALERO, 2012, p. 174). Um gestor em dado momento tem seu trabalho facilitado quando os problemas que requerem uma decisão são considerados previsíveis, conhecidos pelo gestor, devido ao fato de estarem sempre presentes na rotina da organização, enquanto outros são imprevisíveis e ocorrem inesperadamente: são elas as decisões programadas e não programadas. Existem dois tipos básicos de decisão: as programadas e as não-programadas. As decisões programadas são repetitivas e rotineiras e fornecem estabilidade, aumento de eficiência e redução de custos. As decisões não-programadas são novas e desestruturadas, cujas soluções são encontradas à medida que os problemas aparecem, por isso, requerem mais ativida-
des de pesquisa dos gerentes para encontrar a solução; elas permitem adaptação a mudanças do ambiente, ao encontrar soluções para novos problemas e ao lidar com situações imprevisíveis (CARDOSO, 2006). 3- TECNOLOGIAS ATUAIS PARA TOMADA DE DECISÃO NAS ORGANIZAÇÕES A Tecnologia da Informação (TI), presente na rotina das organizações há muito tempo vem auxiliando os gestores e profissionais de modo geral, em processos operacionais considerados básicos e que surte efeito apenas na área de em que é aplicada. Grande parte das organizações usa a tecnologia da informação de forma essencialmente transacional aliada aos seus processos operacionais básicos - como sistemas administrativos, financeiros, recursos humanos, produção; enfim, sistemas que melhoram de forma significativa o processo operacional (FERNANDES,2004). Utilizar o recurso da TI, em processos operacionais e rotineiros de uma empresa, apesar de útil, não explora o real potencial que a mesma pode oferecer a favor de uma organização. Percebe-se que o papel da TI, no dia a dia das organizações pode e deve ir muito além de meras automatizações em processos repetitivos. A evolução da tecnologia, do mercado e da sociedade que o compõe como um
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 113
todo, fizeram com o que a TI inevitavelmente evoluísse e expandisse seu papel nas organizações, de forma que o que antes era apenas uma “variável” a ser considerada no dia a dia das organizações se tornasse um fator imprescindível para o crescimento, manutenção e alcance dos objetivos da mesma. Por muito tempo, a tecnologia da informação foi considerada um mero item de suporte à organização, um “centro de custo” que a princípio não gerava qualquer retorno para o negócio. As aplicações da TI foram crescendo dentro das organizações - se antes a tecnologia era usada apenas para automatizar tarefas e eliminar o trabalho humano, aos poucos começou a enriquecer todo o processo organizacional, auxiliando na otimização das atividades, eliminando as barreiras de comunicação e assim por diante. Dentro, desse novo cenário, a TI começou a assumir um papel muito mais importante nas organizações: o de fator de crescimento de lucros e de redução de custos operacionais (FERNANDES,2004). Uma vez implementada na organização, a TI precisa estar relacionada ao objetivo de negócio ao qual pretende atuar afim de se evitar que tal investimento atenda apenas aos processos operacionais e deixe de executar seu enorme potencial no auxílio ao processo de tomada de decisão. Conforme sugere Fernandes (2004) “se não houver a preocupação de se relacionar investimento de TI com objetivos de negócio, incorre-se no grande risco de se implementar tecnologia cara e inútil, capaz de executar o que os técnicos esperam, mas não o que a empresa precisa”. Inúmeras tecnologias foram surgindo ao longo do tempo afim de auxiliar o gestor no processo de tomada de decisão e três delas serão abordadas a seguir: Business Intelligence, Big Data e Fast Data. 3.1 Business Intelligence (BI) Há muito percebeu-se que uma análise bem-feita, do emaranhado de dados produzidos por uma corporação permite elaborar estratégias, identificar o comportamento de mercado e até mesmo pontos fracos da organização. É neste âmbito que atua a tecnologia BI propondo-se a auxiliar os gestores. O conceito de Business Intelligence surgiu para resolver estes problemas e consiste de uma vasta categoria de tecnologias e programas aplicativos utilizados para extrair, armazenar, analisar e transformar grandes volumes de dados, produzindo um ambiente de conhecimento, onde há produção sistemática de informação gerencial, veloz e consistente, capaz de auxiliar empresas a tomarem as melhores decisões nos negócios, baseado em fatos reais, com profundidade suficiente para descobrir as causas de uma tendência ou de um problema (TRONTO, 2016). O BI é um conceito que já estava presente na rotina de civilizações antigas, auxiliando-as no processo de tomada de decisão relevantes para aquele tempo. Ao contrário do que se possa imaginar, o princípio de Business Intelligence não é recente. Fenícios, persas, egípcios e outros povos do Oriente utilizavam esse princípio há milhares de anos, quando cruzavam informações obtidas junto à natureza em benefício próprio. Observar e analisar o comportamento das marés, os períodos de seca e de chuvas, a posição dos astros, entre outras, eram formas de obter informações que eram utilizadas para tomar as decisões que permitissem a melhoria de vida de suas respectivas comunidades (BARBIERI, 2001). Business Intelligence é um conjunto de ferramentas, voltado para o tratamento e análise de dados, que permite ao seu gestor
obter informações estratégicas e a partir das mesmas definir um caminho a ser seguido pela organização (TRONTO, 2016). Conforme Ramos (2009, p.78): As tarefas normalmente associadas ao Business Inteligence são: Elaborar previsões baseadas em dados históricos nos desempenhos passados e actuais da organização; Criar cenários que evidenciem o impacte de alteração de diversas variáveis; Permitir o acesso ad-hoc aos dados para responder a questões que não estão predefinidas Analisar detalhadamente a organização, obtendo um conhecimento mais profundo da mesma “As primeiras ferramentas de BI surgiram por volta dos anos 70 e se caracterizavam por usar intensa e exaustiva programação, o que exigia altos custos de implementação” (TRONTO, 2016). Dentre as ferramentas de BI, pode se encontrar: [...]desde simples planilhas eletrônicas, geradores de queries (consultas) e relatórios, sistemas de apoio à decisão (DSS - Decision Support Systems), EIS (Executive Information System), ferramentas OLAP (Online Analytical Processing), até soluções mais sofisticadas, como as ferramentas de back end (retaguarda) como os ETLs (Extract, Transform and Load - extração, transformação e limpeza/carga), metadados, BPM (Business Performace Monitoring) e Data Mining (TRONTO, 2016). Qual destas ferramentas utilizar? Segundo Tronto (2016), isto depende de fatores como, a necessidade que a corporação possui e o quanto a mesma estará disposta a investir. Ainda segundo Tronto (2016), a evolução da tecnologia provocou mudanças na maneira como algumas ferramentas se apresentassem no mercado À medida que a tecnologia da informação evolui, as ferramentas de BI vão sendo rebatizadas e reagrupadas. Soluções anteriormente denominadas EIS e DSS acabaram sendo incorporadas em outras ferramentas e, mesmo quando oferecidas em separado, recebem outras denominações dos fornecedoras para ganhar um ar de modernidade. Para melhor entendimento da diversidade de conceitos e ferramentas associadas a um sistema de Business Intelligence, algumas serão conceituadas. São elas: Data Mart, Data Warehouse, OLAP (On-Line Analytic Processing) e Data Mining. DATA WAREHOUSE E DATA MART Segundo Inmon (1996, apud Panegassi, 2009), o Data Mart é uma coleção de dados relacionados a um tema importante da empresa, como vendas ou compras, organizados para dar suporte à decisão e baseados nas necessidades de um determinado departamento ou processo, podendo ser de uma determinada área da empresa. Já o Data Warehouse é um repositório de dados orientado por assunto, e neste caso é natural que surja então uma comparação entre Data Warehouse e Data Mart. Tronto (2016) explica que as diferenças entre data Mart e data Warehouse são apenas com relação ao tamanho e ao escopo do problema a ser resolvido. Portanto, as definições dos problemas e os requisitos de dados são essencialmente os mesmos para ambos. Nos próximos parágrafos será visto que um Data Warehouse é orientado por diversos assuntos, e que um Data Mart representa somente um assunto. Segundo Ramos (2009, p.78) um “Data Warehouse é um repositório construído especificamente para a consolidação da informa-
114 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
ção da organização, num formato válido e consistente, permitindo aos seus utilizadores uma análise de dados numa forma seletiva”. Panegassi (2009) define Data Warehouse como: O Data Warehouse é um banco de dados contendo dados extraídos do ambiente de produção da empresa, que foram selecionados e depurados, tendo sido otimizados para processamento de consulta e não para processamento de transações. Em geral, um Data Warehouse requer a consolidação de outros recursos de dados além dos armazenados em banco de dados relacionais, incluindo informações provenientes de planilhas eletrônicas, documentos textuais, etc. Panegassi (2009) explica que “a função do Data Warehouse é tornar as informações corporativas acessíveis para o seu entendimento, gerenciamento e uso”. A consulta realizada pelo gestor ao Data Warehouse, não gera concorrência ou tem qualquer relação direta com o banco de dados dos sistemas operacionais da empresa, isto porque “como o Data
Warehouse está separado dos Bancos de Dados operacionais, as consultas dos usuários não impactam nestes sistemas, que ficam resguardados de alterações indevidas ou perdas de dados” (PANEGASSI, 2009). Um Data Warehouse (DW) é orientado por assunto, integrado, catalogado temporariamente e não volátil. Quando se diz orientado por assunto, quer dizer que em um DW os dados são organizados com base nos principais assuntos da empresa podendo-se citar como exemplo clientes, fornecedores, loja, vendas, etc. A integração de um Data Warehouse se dá pelo fato do mesmo poder ser alimentado a partir de diversas fontes de dados distintas. Baseia-se em dados históricos e que podem variar tipicamente entre 5 e 10 anos. Quando se diz sobre a característica de ser não volátil, um DW permite apenas duas operações que são o carregamento inicial e posteriormente incremental dos dados e as consultas sobre os mesmos (RAMOS ,2009 p.80). A Figura 2, mostra de maneira simplificada, o conceito de Data Warehouse, o que permite entrar no próximo tópico, a ferramenta ETL.
Figura 2 – O conceito de data Warehouse Fonte - http://www.devmedia.com.br/extract-transformation-and-load-etl-ferramentas-bi/24408
ETL (EXTRAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO E CARGA) Ferramentas ETL são as responsáveis por alimentar o DW: é nesta fase, que ocorre o processo de extração, transformação e carga dos dados em um DW. O processo de ETL (Extract, Transform and Load) é o processo mais crítico e demorado na construção de um Data Warehouse, pois consiste na extração dos dados de bases heterogêneas, na transformação e limpeza destes dados, e na carga dos dados na base do DW (ABREU,2008). Além dos conceitos já apresentados, Abreu (2008) diz que dos três processos base de uma ferramenta ETL, o processo de transformação e limpeza é opcional
O processo de ETL (Extract, Transform and Load) destina-se à extração, transformação e carga dos dados de uma ou mais bases de dados de origem para uma ou mais bases de dados de destino (Data Warehouse). A extração e carga são obrigatórias para o processo, sendo a transformação/limpeza opcional. A etapa de extração, é onde ocorre a extração dos dados contidos nos sistemas OLTPs (OnLine Transaction Processing). Estes dados são inseridos na staging área. Na fase de transformação e limpeza dos dados, são retiradas inconsistências, adequando os dados de acordo com a área de negócio. Na terceira e última etapa, os dados são inseridos no DW (ELIAS, 2014). A Figura 3 exemplifica o processo de ETL.
Figura 3 – Processo ETL Fonte - Elias (2014)
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 115
OLAP (ONLINE ANALYTICAL PROCESSING) OLAP é uma tecnologia de processos utilizados para a exploração e consulta dos dados em um DW, permitindo a criação de visões dos dados em diferentes perspectivas (RAMOS, 2009 p.94) “A característica principal dos sistemas OLAP é permitir uma visão conceitual multidimensional dos dados de uma empresa. A visão multidimensional é muito mais útil para os analistas do que a tradicional visão tabular utilizada nos sistemas de processamento de transação” (PANEGASSI, 2006). Na ferramenta OLAP os dados são dispostos em uma estrutura chamada cubo. Um cubo contém várias dimensões que nada
mais são do que representações dos componentes estratégicos do negócio da empresa, como por exemplo cliente, produto e fornecedor. No momento em que ocorre a interseção entre das dimensões, a célula que representa tal interseção é chamada de medida. As medidas sempre são representadas por valores numéricos como lucro, unidades vendidas e total de venda. Um outro aspecto deste modelo é a sumarização dos dados, partindo do princípio que dados sumarizados (agrupados), do ponto de vista de análise, são mais uteis para exibir uma visão consolidada de determinada área do negócio (PANEGASSI, 2006), conforme mostrado na Figura 4.
Figura 4 - Visão de um cudo de dados OLAP Fonte - http://www.plottingsuccess.com/beginners-guide-to-bi-software-1113011/
DATA MINING: Tronto (2016) explica o Data Mining como “um processo que se utiliza de diversos algoritmos (muitos deles desenvolvidos recentemente) que processam os dados e encontram padrões válidos, novos e valiosos”. O autor explica que apesar da grande capacidade do processo Data Mining na busca desses padrões ainda se faz necessária a interação humana no processo, o tocante ao “valor” dos padrões ali identificados É preciso ressaltar que embora os algoritmos atuais sejam capazes de descobrir padrões «válidos e novos», ainda não temos uma solução eficaz para determinar
padrões valiosos. Por essa razão, Data Mining ainda requer uma interação muito forte com analistas humanos, que são, em última instância, os principais responsáveis pela determinação do valor dos padrões encontrados (TRONTO, 2016). “E encontrar padrões requer que os dados brutos sejam sistematicamente ‘simplificados’ de forma a desconsiderar aquilo que é específico e privilegiar aquilo que é genérico” (TRONTO, 2016). A Figura 5 exemplifica a posição conceitual do Data Mining no processo de geração de conhecimento
Figura 5 - Posição do Data Mining do processo decisório Fonte - Tronto (2016)
116 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
Por fim, a Figura 6, demostra o conceito por trás do BI de maneira generalizada, como pode ser visto abaixo
Figura 6 - Estrutura geral de um Business Intelligence Fonte - https://pentahos.wordpress.com/category/pentaho-business-intelligence/
Elias (2014), explica que a corporação que deseja implantar a tecnologia de Business Intelligence, necessita de uma sequência de atividades. Para o autor “essas atividades estão intimamente ligadas e são imprescindíveis para o êxito da solução de BI”. O processo é composto de várias etapas e seus elementos compreendem as atividades de mobilização dos participantes (diretos e indiretos), levantamento das necessidades organizacionais, mapeamento da origem dos dados, construção da solução e, por fim, a disponibilização para os consumidores das informações (usuários). Mobilização das partes interessadas: para início do projeto de BI, todos os stakeholders devem ser mobilizados. Sem a participação dos interessados, e principalmente do patrocínio da alta gestão, o BI provavelmente fracassará; Levantamento das necessidades informacionais: na atividade de levantamento das necessidades procuramos entender quais as informações exigidas pelos gestores. Nessa etapa estamos procurando listar todas as solicitações sem nos preocupar, neste momento, com a existência “real” dos dados; Mapeamento das fontes dos dados: o mapeamento da origem dos dados é feito após o levantamento das necessidades. Aqui é confrontando a viabilidade das solicitações efetuadas na etapa anterior. Caso afirmativo, são mapeadas as fontes dos dados para a posterior extração na construção do sistema de BI;
Construção da solução BI: nessa etapa é iniciada a construção propriamente dita da solução. Se trata, sem dúvida alguma, da maior etapa do processo. Todas as atividades de extração, qualidade dos dados, carga e teste das informações são realizadas nesta etapa; Disponibilização aos usuários: depois de percorrido todas as etapas anteriores, chegamos, enfim à última etapa: disponibilização. Esta é uma etapa muito delicada, pois se trata do momento onde é entregue o produto de todo o esforço ao usuário final. Se a etapa de mobilização realizada no início do processo tiver êxito, dificilmente teremos problemas na disponibilização. Nesta etapa, além de entregar a solução, será feito toda a capacitação aos gestores e analistas que utilizarão a ferramenta no dia a dia para a consulta de informações de apoio às decisões. “Para o completo entendimento, é importante conhecer o processo macro por trás do desenvolvimento do sistema de apoio a decisão” (ELIAS , 2014). O fluxo das atividades fornece esclarecimento e a abstração do funcionamento da solução de BI. A Figura 7 mostra a sequência de passos que precisam ser compreendidos e executados afim de se chegar a solução ideal para a corporação. “Precisamos compreender cada uma dessas atividades, que seguem um ordenamento lógico e de fluxo simples para construção do BI dentro da organização” (ELIAS, 2014). A Figura 8 mostra o conceito de implementação de um BI
Figura 7 – Implementação de um BI Fonte - Elias (2014)
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 117
3.2 Big Data Para Elias (2014) Big Data é definido como um “conjunto de tecnologias capaz de tratar grandes volumes de dados, estruturados ou não, de diferentes formatos, com velocidade muitas vezes em tempo real”. Baseando-se neste conceito, é normal que surjam comparações entre o Big Data e o BI e antecipando-se a estas dúvidas Elias (2014) explica: O BI e Big Data são distintos e possuem objetivos diferentes. De certa forma são complementares. As duas soluções podem trabalhar conjuntamente, de forma não excludente, para melhor analisar e entender os dados. A solução de BI tem foco na coleta, organização, transformação e disponibilização de dados estruturados para a tomada de decisão, além de permitir a análise preditiva de forma rápida e assertiva às organizações. Fornecem insights e tendências aos gestores, para assim poderem criar diretrizes eficientes e eficazes para o alcance dos resultados empresariais almejados. Já o Big Data, em geral, pouco se preocupa com a exatidão que é fornecida em um sistema de BI (exceto em casos específicos ou onde a utilização de sensores se faz presente). O Big Data foca no processamento dos dados em busca de correlações e descobertas. Por isso, no Big Data nem sempre saberemos os motivos para as correlações existentes, pois poderá ser algo jamais concebido ou estudado. E está aí o diferencial do Big Data: mostrar caminhos e correlações antes desconhecidos nos grandes volumes de dados, em tempo hábil, para que as empresas obtenham vantagens competitivas. Pozzebon (2014) define o Big Data como os conjuntos de dados de grande volume e que necessitam de ferramentas especiais para lidar com grandes quantidades, de forma que todas as informações possam ser encontradas, analisadas e também aproveitadas no tempo necessário. Ainda segundo a autora, o Big data tem seu conceito atrelado a 5 V’s, conforme descrito por Pozzebon, (2014): Volume: é considerada a quantidade de dados de grande escala, que crescem exponencialmente.
Velocidade: Para conseguir obter o resultado desejado na solução de problemas, por exemplo, o tratamento de dados deve ser feito de forma rápida, em tempo real. Assim, uma empresa, caso detecte algum empecilho, necessita que os seus dados estejam todos dispostos e ainda que possam atender a demanda em tempo hábil. Variedade: O grande volume de dados que temos atualmente é resultante da diversidade de informações. Sabemos que é possível encontrar dados em vários formatos, como os estruturados, isto é, armazenados em bancos como PostgreSQL e Oracle, e outros dados localizados em outras várias fontes, como documentos, imagens, vídeos, etc. Assim, a variedade precisa ser lidada como um todo, talvez um determinado dado não seja útil se não for associado a outro. Veracidade: Os dados precisam ser confiáveis, lidar com os outros fatores, como volume, velocidade e variedade pouco adianta se não forem reais. Assim sendo, é necessário que haja o máximo possível de consistência dos dados. Valor: O valor, em questão, é resultante da combinação de todos os aspectos citados acima. Assim, o resultado não terá sentido algum se não trouxer benefícios significativos e que compensem todo o investimento. Assim como o BI, a tecnologia Big Data é a somatória de várias ferramentas com fins específicos que se completam e relacionam em prol de um objetivo em comum. Grandes volumes de dados podem ser analisados com ferramentas de software comumente usados como Predictive Analytics, Data Mining, Text Analytics e Statistical Analytics. Com relação a visualização dos dados, ferramentas como Mainstream BI e Data visualization3. A autora ainda explica que os dados semiestruturados e não estruturados não se encaixam bem em Data Warehouse’s baseados em bancos de dados relacionais. Desta maneira, muitas organizações que procuram recolher, processar e analisar Big Data voltaram-se para uma nova classe de tecnologias que inclui Hadoop e outras ferramentas relacionadas, tais como FIO, MapReduce, Faísca, Hive e Pig e NoSQL4. Essas tecnologias compõem uma estrutura de software que suporta o processamento de grandes volumes de dados. A Figura 8 exibe a diversidade de uma estrutura Big Data.
Figura 8 - Ecossistema de um Big Data Fonte - http://www.clearpeaks.com/blog/big-data/big-data-ecosystem-spark-and-tableau
118 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
3.3 Fast Data O Fast Data é uma tecnologia que permite o tratamento de um grande volume de dados em tempo real e assim permitir a tomada de decisão de maneira rápida. O Fast Data é uma tecnologia complementar ao Big Data, e para a Oracle, o desafio das empresas de hoje é gerir o aumento de volume, a velocidade e variedade de todos os dados, sejam eles dados acerca do negócio da organização ou dados da própria organização. Até então pouco se falava em relação a velocidade em tempo real quando se trata de um Big Data. O conceito de Fast Data não é novo, mas o avanço da tecnologia, a relação preço versus desempenho de equipamentos permitem que aplicações Fast Data fiquem disponíveis a um número maior de organizações (ORACLE, 2013) Se comparado ao Big Data o Fast Data se destaca pela velocidade em que análise acontece. [...]um dos grandes desafios da tecnologia na atualidade é coletar e analisar, de forma inteligente e rápida, a grande quantidade de dados que podem ser úteis e ajudar as empresas a entenderem melhor o comportamento e os desejos de seus consumidores. E nesse quesito, o Fast Data é muito mais eficiente que o Big Data, pois proporciona uma análise em tempo real e uma tomada de decisões praticamente instantâneas no sistema (LEME, 2015). As ferramentas de Fast Data devem, muito em breve, se tornar essenciais para empresas de setores bastantes diversificados. Imagine por exemplo as operadoras móveis, lojas de roupas e até mesmo bancos analisando em tempo real o que você está postando nas redes e definir o que exatamente você precisa. Isso permitiria que fossem desenvolvidas ofertas específicas para o determinado indivíduo. Essa análise se dá em dois momentos: o primeiro, o sistema entende o contexto da informação, e cria uma análise comportamental com base nas
informações da sua solução de Big Data, em seguida, aplica-se essa análise comportamental em uma informação Real Time (COMBA, 2015). Como ferramentas utilizadas para a solução Fast data, pode-se citar 5Oracle Event Processing, Oracle Data Integrator Enterprise Edition, Oracle Golden Gate, Oracle Business Analytics, Oracle Real-Time Decisions e Oracle BPM. A corporação Oracle (2013) afirma que: Com várias tecnologias que trabalham lado a lado para criar valor a partir de alta velocidade, dados de alto volume, soluções rápidas de dados da Oracle são projetadas para otimizar a eficiência e escala para o processamento de eventos de alto volume e transações. Filtrar e correlacionar. Com o Oracle processamento de eventos, você pode usar regras pré-definidas para filtrar e correlacionar dados através de fontes de dados grandes. Quando integrado com o Oracle Coherence, ele pode ser executado na memória para otimizar o desempenho e escala. Mover e transformar. Com o Oracle Data Integrator Enterprise Edition e Oracle GoldenGate, você pode capturar dados (estruturados ou não) e imediatamente mover informação onde ela é necessária e no formato para melhor tomada de decisão de apoio à direita. Analisar. Oracle Business Analytics permite realizar análises em tempo real e expandir o que é possível para o seu negócio. Oracle Real-Time Decisions, em conjunto com o Oracle BPM, ajuda a apoiar tanto a fazer, bem como interações mais complexas, humanos baseada para gestão de processos empresariais inteligente automatizada decisão. Abaixo, a Figura 9 mostra o conceito do Fast Data
Figura 9 - Ecossistema de um Fast Data Fonte - Adaptação de Falsarella (2015).
4- TENDÊNCIAS E DESAFIOS DAS TECNOLOGIAS ATUAIS DE APOIO A DECISÃO Para Lopez (2011) existe uma tendência de que o uso do Business Intelligence cresça nos próximos anos, isto porque, a evolução da tecnologia e da demanda por informações fará com que as empresa se adaptem a esta realidade A tendência é de uma explosão do uso do BI nos próximos anos. Segundo pesquisas, o conteúdo de informações armazenado digitalmente irá ser 44 vezes maior em 2020 do que
era em 2009. Para as empresas isso significa um tremendo impacto no BI, com uma demanda muito maior por informações, e, consequentemente, no custo de propriedade do BI, criando um cenário altamente desafiador para as empresas (LOPEZ, 2011). Para Elias (2014) os próximos anos apontam uma melhora na estrutura do BI, a fim de se melhorar a aplicabilidade aos seus utilizadores. Tal fato se dá muitas vezes pelos próprios usuários, que forne-
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 119
cem feedbacks sobre o uso do produto. Algumas destas tendências podem ser contempladas abaixo: BI nas nuvens: Começam a aparecer soluções nas nuvens para a utilização de BI. Contudo, o fator segurança anda sendo muito questionado e discutido no que diz respeito a confidencialidade da informação. [..]” BI móvel: Trata-se de uma realidade que será cada vez mais presente no mundo empresarial. Hoje usuários/gestores necessitam de mobilidade para a tomada rápida e eficiente de decisões. In-memory: Com o barateamento dos hardwares de memória RAM (Random Access Memory), tornou-se possível a manipulação de quantidades relevantes de dados de forma muito mais rápida do que o tradicional HD (Hard Disk). Nessa tecnologia, os dados são carregados na memória RAM e são manipulados de acordo com os desejos do usuário. Apesar da memória RAM ser volátil, técnicas cada vez mais sofisticadas estão permitindo que o dado seja atualizado e disponibilizado ao usuário de forma transparente, rápida e segura. Self-Service BI: Essa abordagem vem ganhando força. Vem da possibilidade do usuário de negócio acessar e trabalhar com informações corporativas sem o envolvimento direto do profissional de BI. No âmbito do Big data, Elias (2014) atribui a capacitação dos usuários, um desafio a ser superado: “uma estratégia de gestão de dados só terá sucesso se os colaboradores estiverem devidamente treinados para reconhecer e agir corretamente” O Big Data hoje já é uma tecnologia presente nas grandes organizações a nível mundial, porém sabe-se que há a necessidade de investimentos em mão de obra analítica. Uma recente pesquisa da Avanade com 500 executivos de TI de 18 países indicou que se por um lado 84% deles acredita que o Big Data ajuda a melhorar a tomada de decisões, 95% apontam o papel do analista de dados ou cientista de dados como fundamental para o sucesso nos negócios. O Brasil aparece na pesquisa como uma das localidades com a maior necessidade de desenvolver competências para lidar com o Big Data, já que apenas 30% dos entrevistados afirmaram que suas empresas possuem os recursos necessários (ELIAS, 2013). Já a tecnologia Fast Data ainda é tratada como uma forte tendência para os próximos anos (OLHAR DIGITAL, 2011): Ferramentas de Fast Data devem se tornar fundamentais para as estratégias de marketing de empresas de diferentes setores; para citar alguns exemplos, não é difícil imaginar ações utilizando informações sobre o comportamento de seus clientes em tempo real para empresas de telecomunicação, operadoras móveis, call centers e e-commerces. Porém, ao redor do mundo, inclusive no Brasil já existem empresas que aplicam o conceito do Fast Data em suas estratégias: “a tecnologia ainda é extremamente nova, mas a gente deve começar a ouvir falar cada vez mais sobre Fast Data; e, ainda assim, já existe uma série de soluções sendo usadas mundo afora” (OLHAR DIGITAL, 2011). No país já existe exemplo de utilização do Fast Data por uma grande corporação de E-Commerce conforme relatado a seguir: Um dos maiores e-commerce do Brasil já usa o Fast Data há algum tempo; o usuário navega na loja online e consulta diversos modelos de tênis. Em um segundo momento, quando ele retornar ao site, a solução de Big Data já sabe quem é aquele usuário e quais produtos ele procurou da última vez. A ação de
Fast Data entra quando – em questão de segundos, enquanto a página ainda carrega, o site mostra ofertas de pelo menos três modelos que provavelmente vão interessar àquele cliente (OLHAR DIGITAL,2011). 6- CONCLUSÃO Neste artigo foi realizado a análise de 3 tecnologias de tratamento de dados em massa, cujo o objetivo é auxiliar os gestores no processo de tomada de decisão em uma organização: Business Intelligence (BI), Big Data e Fast Data. Foi apresentado os conceitos e caraterísticas das tecnologias e de que maneira elas podem agregar valor para a organização, permitindo aos gestores desde decisões com base em dados sólidos e históricos (BI), identificar tendências e encontrar valores e correlações em dados não estruturados (Big Data) e sobre esta enorme quantidade de dados e suas possíveis tendências e correlações, analisar, encontrar padrões e reagir a situação em tempo real (Fast Data). Foram apresentados desafios e tendências para estas tecnologias que de certa forma se complementam e dão às organizações uma infinidade de possibilidades como diferencial competitivo. REFERÊNCIAS ABREU, Fábio Silva Gomes da Gama e. Desmistificando o conceito de ETL. 2008. Disponível em < http://www.fsma.edu.br/si/Artigos/V2_Artigo1.pdf >. Acesso em 09 nov. 2015 BERTONCINI, Cristine et al. Processo Decisório: A tomada de decisão. Disponível em: <http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/QjxDDqGcS5r3dHL_2013-5-3-12-8-34.pdf>. Acesso em 17 out. 2015 COMBA TELECOM BRASIL. Telecomuncações: Conheça a Fast Data, a tendência mais recente em tecnologia de dados. Disponível em: < http://www. comba-telecom.com.br/noticias/2015/08/28/conheca-a-fast-data-a-tendencia -mais-recente-em-tecnologia-de-dados/>. Acesso em 13 Jun. 2016. CARDOSO, Andreia. Analise de gestão pública na produção de equipamentos urbanos. Disponível em: <http://www.repositorio.ufpa.br/jspui/bitstream/2011/1681/ 4/Dissertacao_AnaliseGestaoPublica.pdf>. Acesso em 19 out. 2015 ELIAS, Diego. Oque é BI. 2014. Disponível em :<http://www.binapratica.com. br/#!o-que-e-bi/cho4>. Acesso em 29 ago. 2015 FALSARELLA, Douglas. O que é fast data? 2013. Disponível em: <http://imasters. com.br/infra/cloud/get-it-up-o-que-e-fast-data/?trace=1519021197&source=single> Acesso em 14 nov. 2015 FERNANDES, Luciano. Tecnologia, estratégia e tomada de decisões. Disponível em <http://www.administradores.com.br/noticias/negocios/tecnologia-estrategia-e-tomada-de-decisoes/1915/>. Acesso em 10 nov. 2015 FREITAS, Henrique. O Processo decisório: modelos e dificuldades. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/gianti/files/artigos/1995/1995_028_rev_decidir.pdf>. Acesso em 18 out. 2015 INMON, William H. Como construir o Data Warehouse. 2ª ed. New York: Editora Campus, 1997. Apud PANEGASSI, Fernando Luiz. Data Warehouse. Disponível em <http://bibdig.poliseducacional.com.br/document/?view=98 >. Acesso em 03 nov. 2015 LIMA, Josimara. Liderança e tomada de decisão na organização. Disponível em:<http://www.uniedu.sed.sc.gov.br/wp-content/uploads/2014/01/Josimara -Alves-de-Lima.pdf>. Acesso em 17 out. 2015 LOPEZ, Fabio Munize. O Desafio do Business Intelligence. Disponível em:<http://www.metaanalise.com.br/inteligenciademercado/index.php?option=com_content&view=article&id=4699:o-desafio-do-business-intelligence&catid=1:ponto-de-vista&Itemid=353> Acesso em 14 nov. 2015 OLHAR DIGITAL. Fast Data: a mais recente tendência da tecnologia de dados.
120 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
2011. Disponível em:<http://olhardigital.uol.com.br/pro/video/fast-data-a-mais -recente-tendencia-da-tecnologia-de-dados/47485>. Acesso em 14 nov. 2015
gócios. Acesso em <http://mtc-m16c.sid.inpe.br/col/lac.inpe.br/worcap/2003/ 10.31.15.48/doc/ArtigoWorkap3.pdf>. Acesso em 16 Jun. 2016.
ORACLE. Introduction to Oracle Fast Data. Disponível em: <http://www.oracle. com/us/solutions/fastdata/fast-data-solution-brief-1913701.pdf >. Acesso em 14 nov. 2015
VALERO, Simone. O Processo Orçamentário e a Tomada de decisão no setor siderúrgico: Um estudo com base na neurociência. Disponível em:<http:// www.mackenzie.br/fileadmin/PUBLIC/UP_MACKENZIE/servicos_educacionais/ stricto_sensu/Ciencias_Contabeis/Dissertacoes/Simone_Valero.pdf>. Acesso em 14 out. 2015
PANEGASSI, Fernando Luiz. Data Warehouse. Disponível em <http://bibdig.poliseducacional.com.br/document/?view=98 >. Acesso em 03 nov. 2015 POZZEBON, Rafaela. O que é Big Data? Disponível em: <https://www.oficinadanet.com.br/post/13252-o-que-e-big-data > Acesso em 14 nov. 2015 RAMOS, Isabel; SANTOS, Maribel. Business Intelligence. 2. ed. Lisboa: FCA – Editora de Informática, 2009. 78-94 p.
NOTAS DE FIM Graduando do curso de Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva (jheffbhz@gmail.com). 1
Professor do Centro Universitário Newton Paiva (iremar.prof@newtonpaiva.br).
2
Termo geral que descreve qualquer esforço para ajudar as pessoas a compreender o significado dos dados, colocando-o em um contexto visual. 3
ROSA, Guilherme. A ciência do Big Data. Disponível em: <http://www.unesp.br/ aci_ses/revista_unespciencia/acervo/55/big-data>. Acesso em: 28 ago. 2015 ROUSE, Margaret. Big data Analytics definition. Disponível em: <http://searchbusinessanalytics.techtarget.com/definition/big-data-analytics>. Acesso em: 13 nov. 2015 TRONTO, Iris F. de Barcelos, et al. Business Intelligence: Inteligência nos Ne-
Segundo Nascimento (2010) NoSQL são diferentes sistemas de armazenamento que vieram para suprir necessidades em demandas onde os bancos de dados tradicionais (relacionais) são ineficazes 4
Todas as ferramentas apresentadas são oferecidas pela Oracle Corporation
5
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 121
PRIVACIDADE EM SISTEMAS DE APOIO A DECISÕES: Business Intelligence, Data Mining, Big Data e Fast Data Marcela Simão Gomes da Silva1 Iremar Nunes de Lima2
RESUMO: Sistemas de apoio a decisão têm sido cada vez mais utilizados como diferencial competitivo nas organizações. O artigo discute a privacidade de dados nesta categoria de sistemas de informações, avaliando como ocorre a violação da privacidade de dados nos diferentes tipos de sistemas de apoio a decisões como Sistemas de Business Inteligence, Data Mining, Big Data e Fast Data. São relatados também alguns casos de violação de privacidade nestes tipos de sistemas de informações. PALAVRAS-CHAVE: Privacidade. Sistemas de Apoio a Decisão. Business Intelligence.
1- INTRODUÇÃO A privacidade dos dados em informática é sempre um tema relevante e atual: Lins (2000) cita que o assunto ganhou novas facetas, em virtude da disseminação das tecnologias de tratamento da informação. Se antes privacidade era apenas relacionado com o direito de estar “só”, hoje a mesma está ligada também com a disseminação de dados pessoais por meio da tecnologia. Além disso, o que antes poderia ser visto como violação do direito à privacidade hoje é visto como algo normal na sociedade. Segundo Bruno (2008), nos últimos 40 anos viu-se crescer vertiginosamente a capacidade de monitoramento e coleta de dados sobre indivíduos em diversos setores: trabalho, habitação, segurança, entretenimento, vida social, vida privada, etc. Diante do crescimento exponencial dos dados armazenados pelos modernos sistemas de informações, o presente estudo torna-se importante, pois a privacidade dos mesmos deve ser um fator primordial de discussão. A obtenção e gerenciamento das informações sobre os mais variados temas tornam-se cada dia mais fácil. Sabe-se também que, nem todas as empresas praticam de forma adequada a proteção dos dados pessoais no processamento dos dados em sistemas de apoio a decisão (SAD), e na maioria das vezes as pessoas não têm ciência de como esses dados são tratados, analisados e divulgados sem que a privacidade de seus dados seja garantida. Este artigo tem por objetivo discutir e avaliar o termo privacidade no âmbito da tecnologia da informação e, em particular, nos sistemas de apoio a decisão. É avaliado como os dados obtidos de sistemas de apoio a decisão podem violar a privacidade dos indivíduos, empresas ou órgãos públicos. O artigo também aborda o tema privacidade de dados nas tecnologias atuais de sistemas de apoio a decisão como Business Intelligence (BI), Data Mining, Big Data e Fast Data, além de apresentar casos reais de violação de privacidade em sistemas de apoio a decisão. A justificativa do estudo em questão se dá devido à explosão dos dados armazenados pelos sistemas de informação hoje existentes. Segundo Breternitz e Silva (2013), o ambiente em que atuam as organizações vem sendo moldado pela disponibilidade de dados: a velocidade e o volume com que estes vem sendo criados são alucinantes. São criados 5 exabytes de dados a cada dois dias, e isso vem fazendo com que as organizações alterem a forma pela qual planejam, operam e divulgam estes dados. Carloni (2013) cita que quanto maior a capacidade de armazenamento e processamento de dados, maiores as chances de análise
e geração de informações. Assim, o titular dos dados pode ter suas informações usadas sem seu consentimento, autorização ou mesmo conhecimento. Carloni (2013) também destaca que até mesmo o simples fato de a coleta ou o tratamento de dados pessoais ser feita sem o consentimento do titular pode gerar problemas jurídicos relacionados ao seu direito à privacidade. 2- PRIVACIDADE EM INFORMÁTICA E SISTEMAS DE APOIO A DECISÃO O conceito de privacidade tem sofrido mudanças com o tempo. O que era entendido como privacidade no final do século XIX, quando o assunto começou a ser debatido, já não é suficiente para definir a privacidade na sociedade atual (CARLONI, 2013). De acordo com Pinto (2010): As novas tecnologias midiáticas a partir dos anos 70 têm modificado nossa interação na esfera da comunicação virtual. O conceito de privacidade a partir da teoria de Warren e Brandeis, que alertou sobre os perigos no campo fotográfico e da bisbilhotice da mídia, exaltando o direito de ser deixado em paz, se alterou sensivelmente. A visão de abandono e isolamento, inicialmente aceita, se tornou primordialmente uma visão de escolha pessoal da hora de exibir-se, eis a essência da verdadeira liberdade. Segundo o dicionário Michaelis (2015), privacidade é definido por: 1 Vida privada; intimidade. 2 Privatividade. O Dicionário Informal (2016) define privacidade como a habilidade de uma pessoa em controlar a exposição e a disponibilidade de informações acerca de si. Andrade (2008) menciona que o direito à intimidade e à vida privada se configura como uma tutela assegurada ao indivíduo para que ele possa repelir a interferência de terceiros em sua esfera íntima de vida, bem como ter controle das informações sobre ele divulgadas. O avanço e o surgimento de novas tecnologias em informática proporcionam cada vez mais um maior número de informações disponíveis, o que possibilita o rastreamento, coleta e análise de informações pessoais. A Internet, hoje, caracteriza-se como uma das mais importantes ferramentas para a comunicação e troca de informações, incluindo-se aí, uma nova rota de comercialização de bens e serviços (NOJIRI, 2005). Estão constantemente acessando a internet por meio de nossos computadores, smartphones ou tablets para checar emails, ler o jornal, fazer pesquisas, pegar direções geográficas, realizar tran-
122 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
sações bancárias, postar nossa localização, atividade, fotos e vídeos em redes sociais, ler sobre a vida de conhecidos, fazer compras e vendas de todo tipo, organizar eventos, participar de manifestações e protestos, buscar indicações de restaurantes, filmes, empregos, etc. Enfim, a vida hoje é digital, e isso ocorre de forma natural para muitas pessoas (CARLONI, 2013). O problema pode surgir quando para usufruir de alguns serviços disponibilizados por meio da internet, em sua maioria “gratuita”, o usuário deve concordar com seus termos de uso, elencados a uma política de privacidade, que descreve as diretrizes que regem a empresa e a privacidade das informações extraídas dos usuários. Porém, a grande maioria dos usuários não tem o hábito de ler os termos de uso e suas políticas de privacidade e, consequentemente, não sabem a que estão se sujeitando ao aceitar esse termo (CARLONI, 2013). Andrade (2008) menciona: Na maioria das vezes as pessoas não percebem que ao preencherem um simples questionário para se cadastrar em um site, ou para participarem de um sorteio pela Internet ou pelo simples fato de visitar determinadas páginas da web, estão fornecendo, inocentemente inúmeros dados pessoais. Esses dados são colhidos, armazenados e transmitidos uma infinidade de vezes e por vezes até vendidos. Todas essas informações disponibilizadas pelos usuários, após serem tratadas, servem como dados para serem analisados e organizados com outros dados, de maneira que podem gerar novas informações que não eram preditas. Esse tratamento de dados quando feito sem o consentimento do usuário pode levar a violação do direito à privacidade. Segundo Andrade (2008), uma vez compilados os dados pessoais, gostos e preferências de inúmeros usuários de Internet é possível traçar um perfil pessoal de cada pessoa, agrupando-a por determinados interesses e essas informações são extremamente valiosos para empresas que atuam na área de marketing e publicidade, pois assim, estarão cientes das preferências de cada público e de seus hábitos. Nada impede também que a comercialização de dados coletados na web sirva para formar verdadeira listagem para determinadas empresas, que poderão ter a sua disposição inúmeros perfis pessoais e consultá-los quando na hipótese em que necessite contratar empregados. 3- LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ENVOLVENDO A PRIVACIDADE DOS DADOS A constituição brasileira diz que todos têm direito à privacidade e o Brasil declarou expressamente no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, a proteção ao direito à privacidade: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (GUERRA, 2005). Lins (2000) relata que, O direito à privacidade nasceu da mudança de hábitos e costumes decorrente da ascensão da burguesia no século XVIII. Com a modernização do espaço urbano e a criação de várias facilidades domésticas, inúmeras atividades que eram exercidas comunitariamente, ou ao menos sem qualquer intimidade, passaram a fazer parte da vida particular das pessoas, dando a noção de um direito à privacidade. Na era agrícola o poder era a terra, na era industrial o poder era o capital e agora na era digital o poder é a informação. Espera-se
que o direito tenha que sofrer uma adequação para ter abrangência também na área digital. De acordo com Pezzi (2007), o direito à privacidade evoluiu juntamente com a mudança histórica de um Estado Liberal para um Estado Social. O que antes tinha um enfoque negativo, o direito de estar só, agregou um enfoque positivo. Em razão do impacto informático, esse duplo aspecto está relacionado, de um lado, com o resguardo dos dados e, de outro, pelo direito de acesso, retificação e esquecimento. Conforme Carloni (2013), os dispositivos infraconstitucionais que tutelam de forma direta na legislação brasileira a privacidade e os dados pessoais são o Código Civil, o Código de Defesa do Consumidor, a Lei de Cadastros Positivos e o Marco Civil da Internet. Entretanto, segundo Magalhaes et al (2014), o ordenamento jurídico brasileiro ainda não tem regulamentos específicos capazes de proteger a privacidade, intimidade e a vida privada relacionada aos dados digitais pessoais de todos os cidadãos do país. O Marco Civil da Internet de acordo com Magalhaes et al (2014), estabelece uma série de princípios, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil, e trata de questões como neutralidade, armazenamento de dados, fim do marketing dirigido, sigilo e, principalmente, privacidade. Se tratando de dados pessoais existe um anteprojeto que se encontra em consulta pública na web. Cardoso (2015) relata que: O anteprojeto prevê que as pessoas sejam informadas de forma clara e ostensiva, no momento mesmo da coleta, sobre como seus dados serão utilizados e processados. Será exigido consentimento por escrito para a coleta. Os dados não poderão ser utilizados para outros fins e a negativa de coleta de dados não pode impedir o acesso a produto ou serviço, ao menos que eles sejam essenciais para sua efetivação. Ou seja, o projeto de lei dá poder ao cidadão para controlar seus dados pessoais. Será proibido ainda formar bancos de dados que possam levar à discriminação de usuários, algo fundamental. Além disso, o anteprojeto prevê que os órgãos públicos ficam proibidos de transferir dados pessoais para entidades privadas, exceto em casos de execução terceirizada ou mediante concessão e permissão de atividade pública que o exija, e exclusivamente para fim específico e determinado. Carloni (2013) cita que o Marco Civil da Internet e o Anteprojeto de Lei de Proteção de Dados Pessoais são duas alternativas úteis e muito importantes no sentido de estabelecer princípios gerais de proteção da privacidade e dados pessoais. 4- TECNOLOGIAS DE SAD E PRIVACIDADE DOS DADOS Os Sistemas de Apoio à Decisão (SAD) são sistemas baseados em computadores que através de informações e modelos especializados ajudam a resolver problemas organizacionais para suporte às decisões organizacionais: a função é apoiar o processo de tomada de decisão em áreas de planejamento estratégico, controle gerencial e controle operacional, sendo isso o que os diferenciam dos demais tipos de sistemas de informações (SANTANA, 2007). Segundo Power (2007), um dos primeiros registros históricos sobre SAD foi de 1971, quando Michael S. Scott Morton analisou como os computadores poderiam ajudar ou apoiar os gestores em tomadas de decisão. Não é objetivo de um SAD substituir decisões do ser humano. O objetivo do SAD é ajudar o gestor na manipulação de grandes volumes de dados. Quase sempre os SAD atuam na solução de problemas mais complexos e menos estruturados; tentam combinar modelos ou técnicas analíticas com as funções tradicionais do processamento de dados; devem ser interativos, fáceis de usar e possuir
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 123
interfaces amigáveis; incorporam outras atividades, além do auxílio à tomada de decisão, como meios mais eficientes de distribuição dos resultados (SCHREINER, 2001). Com o aumento do volume de dados estruturados e não estruturados armazenados nos bancos de dados atuais e a necessidade empresarial de tratá-los para suporte a decisão estratégica nas organizações, têm surgido nos últimos anos novas tecnologias de SAD. Dentre elas, destacam-se Business Intelligence, Data Mining, Big Data e o Fast Data, analisadas a seguir. 4.1- Business Intelligence Segundo Turban (2009) o termo BI foi criado pelo Gartner Group em meados da década de 1990. Contudo, o conceito surgiu muito antes, com suas raízes nos sistemas de geração de relatórios também denominados Sistemas de Informações Gerenciais (SIG) dos anos 1970. Os sistemas de geração de relatórios nesse período eram estáticos, bidimensionais e não possuíam recursos de análise. Já na década de 80, surgiu o conceito de sistemas de informações executivas (EIS - Enterprise Information Systems), que expandiu o suporte computadorizado aos gerentes e executivos de níveis superiores. Estes sistemas introduziram recursos de relatórios dinâmicos multidimensionais, prognósticos e previsões, análise de tendências, detalhamento, acesso a status e fatores críticos de sucesso. Esses recursos apareceram em diversos produtos comerciais até metade da década de 90 (TURBAN, 2009). Turban (2009) cita que hoje se presume que todas as informações que um executivo necessita podem estar em um bom sistema de informações empresariais, baseados em BI. Contudo, a evolução da tecnologia fez com que o conceito original de EIS fosse transformado em sistema de BI. O principal papel dos sistemas de BI, de acordo com Sperb e Neto (2006), é agrupar os dados gerados em outros sistemas para dar apoio ao gestor na tomada de decisão estratégica na organização, transformando dados em conhecimento. Ainda cita que um sistema de BI utiliza-se de variadas fontes de informação para estabelecer estratégias de competitividade nos negócios da empresa, com a definição de regras e técnicas para a formatação adequada de grandes volumes de dados. Sperb e Neto (2006) resumem que o conceito de BI pode ser entendido como a utilização de várias fontes de informação para definir estratégias de competitividade nos negócios. 4.2- DATA MINING
Turban (2009) cita que Data Mining é formado por um conjunto de técnicas para análise de informações, baseada em banco de dados, a qual procura padrões ocultos em uma coleção de dados geralmente usados para identificar padrões ou prever comportamentos futuros. As ferramentas de Data Mining são usadas para substituir ou aprimorar a inteligência humana devido a sua capacidade de analisar enormes quantidades de dados. Desta forma, elas descobrem novas e significativas correlações, padrões e tendências através de tecnologias de reconhecimento de padrões e métodos estatísticos avançados (TURBAN, 2009). Enquanto BI usa técnicas para geração e análise das informações, o Data Mining usa técnicas para a descoberta de informações e conhecimentos que estão ocultos nas bases de dados (RODRIGUES, 2013). 4.3- BIG DATA
Segundo Lorentz (2013), a cada minuto, 48 horas de vídeo são carregadas no YouTube, 204 milhões de mensagens de e-mail são enviadas e 600 novos sites gerado. Além disso, 600.000 peças de conteúdo são compartilhadas no Facebook, e mais de 100.000 tweets são enviados. Existem ainda outras fontes de geração dos dados,
que se estendem aos sensores, registros médicos, bancos de dados corporativos, entre outros. O Big Data, segundo Breterniz (2013), é um conjunto de tecnologias que permite uma nova abordagem para o tratamento e exploração desses grandes conjuntos de dados (estruturados como em tabelas de banco de dados e não estruturados como em textos, fotos e vídeos) para fins de tomada de decisões, o qual permite analisar a dinâmica de uma sociedade sob perspectiva da informação. Taurion (2013) destaca cinco fatores para caracterizar o Big Data: Volume, velocidade, variedade, veracidade e valor. Infere-se, então, que Big Data é uma grande massa de dados/metadados aos quais gerão todos os dias, com características estruturadas (armazenados em banco de dados) e não estruturados (fotos, vídeos, e-mails) e que, na maioria das vezes, é analisada para atender a eventos em tempo real, buscando a partir da autenticidade dos dados dar sentido as informações relevantes passíveis de agregar valor tanto para empresas que buscam estratégias para seu negócio como para governos que buscam entender as demandas e características da população 4.4- FAST DATA
De acordo com Ferreira (2014), Fast Data é conjunto de ferramentas que possibilita análises e tomada de decisões online (em tempo real). Segundo a Locaweb (2015) o Fast Data combina três fatores: dados, tecnologias e pessoas. Uma grande quantidade de dados é gerada a cada minuto e o desafio da tecnologia é estudá-la com eficiência e inteligência, proporcionando uma análise e tomada de decisões instantâneas. E é nisso que consiste o Fast Data: tirar conclusões enquanto tudo está acontecendo (LOCAWEB, 2015). Portanto, conclui-se que para analisar esses dados em tempo real, há uma mistura entre Fast Data e Big Data. Quando um cliente navega em uma loja online e procura por um produto específico, a solução de Big Data sabe quem é ele e quais são as últimas buscas. Já o Fast Data oferece outras opções que possam interessar ao usuário enquanto ele ainda navega pela página. Outro exemplo de aplicação de Fast Data foi utilizado durante muito tempo pelo governo dos Estados Unidos. Com uma base de dados de Big Data sobre dados telefônicos após os atentados de 2001, uma ferramenta de uso exclusivo do FBI analisava em tempo real milhares de dados telefônicos e emitia um alerta caso aquela chamada fosse identificada como suspeita de terrorismo (OLHAR DIGITAL, 2015). Diante do conjunto de ferramentas e tecnologias para suporte a decisão disponíveis para as organizações atualmente, emerge o questionamento sobre como a privacidade dos dados são tratados nestes sistemas. 4.5- PRIVACIDADE DE DADOS EM SAD
O crescente uso dos novos sistemas SAD como: BI, Data Mining, Big Data e Fast Data têm revelado que existe uma brecha a respeito da privacidade dos dados pessoais. Antes de explanar sobre a privacidade em sistemas SAD considera-se importante definir dados pessoais e diferenciá-los de dados, dados sensíveis e dados anônimos. Segundo Vit, Longo e Duca (2008, apud OLIVEIRA, 2005, p. 36) “o dado é base para uma futura informação: é qualquer elemento identificado em sua forma bruta que, por si só, não conduz a uma compreensão de determinado fato ou situação”. De acordo com o anteprojeto de Lei de Dados Pessoais no artigo 5º incisos (BRASIL, 2015): I - dados pessoais são dados relacionados à pessoa natural identificada ou identificável, inclusive números identificativos, dados locacionais ou identificadores eletrônicos quando estes
124 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
estiverem relacionados a uma pessoa. III - dados sensíveis são dados pessoais sobre a origem racial ou étnica, as convicções religiosas, as opiniões políticas, a filiação a sindicatos ou organizações de caráter religioso, filosófico ou político, dados referentes à saúde ou à vida sexual, bem como dados genéticos ou biométricos; cujo tratamento pode desencadear a discriminação do seu titular. IV - dados anonimizados: dados relativos a um titular que não possa ser identificado. Baroni (2015) exemplifica: dados pessoais são informações que podem ser ligadas a uma pessoa, ou seja, nome completo, RG, CPF, e-mail, endereço, telefone, conta bancária, entre outros. A anonimização dos dados antes vista como a solução da preservação da privacidade hoje já não garante privacidade: tecnologias avançadas onde ocorrem cruzamentos de dados podem levar a identificação do usuário ou fato analisado. Teixeira (2015) menciona que o aprimoramento das técnicas de cruzamento dos dados pode levar na identificação de dados pessoais ou dados sensíveis, em banco de dados anonimizado. Teixeira (2015) ainda cita: Dados aparentemente inócuos podem ser combinados para identificar uma pessoa e que um estudo que ocorreu nos Estados Unidos onde foi descoberto que 87% (216 milhões de 248 milhões) da população dos Estados Unidos têm características relatadas que provavelmente as tornam únicas com base somente em (código ZIP de 5 dígitos [equivalente ao CEP brasileiro], gênero, data de nascimento}. Cerca de metade da população dos EUA (132 milhões de 248 milhões ou 53%) devem ser unicamente identificáveis somente por {local, gênero, data de nascimento}, onde o local é basicamente a cidade ou município onde a pessoa reside. De acordo com uma pesquisa feita um grupo de pesquisadores do Media Lab do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT) divulgado no jornal El Pais (2015), quatro compras com o cartão bastam para identificar uma pessoa: os padrões de uso dos cartões permitem descobrir a identidade de 90% de uma amostra de 1,1 milhão de pessoas anônimas. Os resultados obtidos pelos SADs podem levar a identificação de características individuais dos fatos analisados (como a sexualidade de um consumidor), sendo possível juntar dados fragmentados que levam a quebra da privacidade. Com a quebra de privacidade dos dados pessoais em SADs a questão ética torna-se relevante: as pessoas muitas vezes não estão cientes do destino dos seus dados arquivados em bancos de dados. Inúmeros atos da vida civil necessitam de fornecimento de dados pessoais – quando se quer ir ao médico; retirar dinheiro de um caixa eletrônico; fazer compras por meio do cartão de crédito; contratarmos um provedor de acesso à internet ou mesmo para poder navegar no interior de um website – sem sabermos para onde essas informações estão indo, quem as receberá, onde e por quanto tempo ficarão armazenadas, quais os fins a que elas se destinam e, de modo geral, quais serão as consequências (MATOS, 2005). Martinelli (2015) indica que quando você assina um serviço como TV a cabo, internet ou celular, por exemplo, disponibiliza todos os seus dados (RG, CPF, endereço, telefone) a uma empresa. Pressupõe-se que essas informações serão utilizadas para uma única finalidade: a prestação de serviço. Mas, nem sempre é o que acontece.
Matos (2005) complementa que a maioria dessas pessoas, entretanto, mal sabe para que servem essas informações, algumas absolutamente impertinentes. A verdade é que muitas empresas, a fim de atrair clientes, oferecem prêmios, ofertas ou até mesmo serviços gratuitos em troca de dados pessoais e hábitos de consumo, visando obter informações estratégicas a partir dos dados agrupados para tomada de decisão. Para usar determinados serviços, as empresas pedem que elas leiam termos de concessão, entretanto muitas pessoas não realizam a leitura e muitas das vezes eles contêm explicitamente que os dados obtidos serão usados de maneira a proporcionar melhorias para os usuários ou comercializados. Matos (2005) informa que as políticas de privacidade devem de forma bastante clara, informar o usuário sobre o tipo de informações que serão coletadas, o modo como será realizada a coleta dos dados, igualmente, como eles serão gerenciados, os motivos pelos quais os armazenam em seus bancos de dados e a possibilidade de cruzamento das informações coletadas junto a terceiros, entre outros. A falta de ética existe exatamente no ponto onde a empresa está vendendo ou comprando dados pessoais e os proprietários dos mesmos não estão cientes disso. Se a empresa usa os dados pessoais, os proprietários devem estar cientes e a qualquer momento, poder consultá-los, modificá-los ou pedir a exclusão dos dados. No anteprojeto de Lei de Dados Pessoais (BRASIL, 2015) capitulo III: Art. 17. O titular dos dados pessoais tem direito a obter: I – confirmação da existência de tratamento de seus dados; II – acesso aos dados; III – correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados; IV – dissociação, bloqueio ou cancelamento de dados desnecessários, excessivos ou tratados em desconformidade com o disposto nesta Lei. 5- ESTUDO DE CASOS ENVOLVENDO PRIVACIDADE DE DADOS EM SAD Carloni (2013) menciona que a análise de grandes bases de dados com uso de modernas técnicas de tomada de decisões pode gerar benefícios até pouco tempo inimagináveis para a sociedade, e em particular para as empresas. Porém, a privacidade dos dados em SAD não está garantida conforme descrição dos relatos a seguir, mesmo entendendo que os dados nestes sistemas são tratados de forma agrupados. Mombelli (2014), relata o caso da empresa Netflix: Em outubro de 2006 o Netflix lançou o “Prêmio Netflix”, em que disponibilizava informações sobre hábitos de 500 mil consumidores, oferecendo US$ 1 milhão para quem desenvolvesse uma solução capaz de melhorar em 10% o sistema de recomendação de filmes. Ainda que os dados pessoais tivessem sido omitidos – anonimizados – as informações lançadas na rede para análise no concurso levaram à identificação precisa de pelo menos um usuário: uma lésbica não assumida na conservadora região do Meio Oeste dos Estados Unidos, que, tendo a privacidade ameaçada, processou o Netflix sob o pseudônimo de “Jane Doe”. O caso do Netflix ilustra o problema que começa a existir quando a informação se torna acessível ilimitadamente. Na era dos sensores, em que tudo pode ser monitorado, nem a anonimização protegerá a privacidade. Cidadãos podem ter hábitos e comportamentos expostos. Assim, empresas responsáveis pela coleta e análise de dados devem ter atenção redobrada, principalmente após a aprovação do Marco Civil da Internet no Brasil (Lei nº 12.965/2014).
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 125
Um exemplo considerado benéfico para a população que utiliza a tecnologia de processamento enorme massa de dados é o aplicativo para celular chamado Ginger.io2 que pode ter acesso a informações extraídas de chamadas telefônicas, mensagens, localização, movimentação e formulários que são preenchidos periodicamente pelo usuário: o aplicativo é capaz de prever, por exemplo, que o mesmo não está se sentindo bem, ou que está prestes a ter problemas de ansiedade (CARLONI, 2013). Carloni (2013), ainda menciona que esse aplicativo é disponibilizado principalmente para uso entre pacientes e médicos, possibilitando acompanhamento mais preciso da condição de saúde dos primeiros e das causas diárias que podem ocasionar problemas, mas que nem sempre são lembradas nas consultas médicas. Nem sempre o uso dos dados obtidos com o preenchimento de formulários na internet pode ser usado para fins benéficos como o exemplo supracitado, infringindo a privacidade dos dados pessoais. Nos Estados Unidos, existe um serviço chamado Spokeo: um site com um mecanismo de busca especializado em encontrar informações sobre determinadas pessoas, por meio de seu nome, email, telefone, cidade ou seu login, caso a pessoa tenha realizado o cadastro. Nesse site a base de dados não é desenvolvida pela empresa e sim por um software de BI que organiza as informações obtidas de dados disponíveis publicamente, encontrados em listas telefônicas, redes sociais, pesquisas de marketing, anúncios imobiliários, entre outros (CARLONI, 2013). Carloni (2013) afirma que: Essas informações vão desde seu endereço residencial exato, até sua renda média anual. Outras dizem respeito ao valor de seus imóveis passados e presentes, árvore genealógica, idade, números de telefone, gênero, ocupação profissional, etnia, religião, nome do cônjuge, quantidade de pessoas que vivem em sua casa, entre outros. Ao utilizar o sistema de mapeamento do Google Maps diariamente (o qual consegue prever o local aproximado de residência ou trabalho sem que o usuário tenha o informado diretamente), ou seu gênero e data de nascimento para uma rede social, ou seu emprego para o Linkedin, o titular dos dados não consentiu expressamente com o fato de que os mesmos fossem processados em conjunto por outra empresa e que, a partir dessa análise, qualquer pessoa pudesse ter acesso, por exemplo, à sua renda anual ou ao valor venal de seu imóvel. As informações secundárias não foram fornecidas pelo titular dos dados pessoais, mas sim extraídas de uma análise de Big Data. Ainda, observe-se que as informações obtidas por meio do Spokeo, vinculadas a uma pessoa específica, nem sempre são corretas ou atuais, o que também pode vir a gerar problemas relacionados à privacidade e à proteção dos dados pessoais. Outro caso de violação de privacidade aconteceu nos Estados Unidos: como prática comum de distribuir cupons para seus clientes, a loja de departamento Target decidiu aprimorar essa prática por meio da customização dos cupons com o que ela assumiu serem as preferências de seus clientes (CARLONI, 2013). A empresa desenvolveu um software de análise de Big Data, onde identificava padrões de compra, inclusive de gravidez, a partir de uma grande base de dados formada por todas as compras realizadas no território norte-americano. Foi após receber um cupom com descontos para artigos de bebês endereçado à sua filha adolescente que um pai se dirigiu indignado a uma das lojas da Target para reclamar que a mesma estava induzindo a gravidez de sua filha e encorajando-a a engravidar, o que considerava ser uma prática
abusiva por parte da empresa. O gerente que lhe atendeu pediu desculpas e, dias depois, voltou a ligar para o cliente para se desculpar novamente, quando recebeu a resposta de que quem lhe devia desculpas era o pai, já que, ao conversar com sua filha, “tomou conhecimento de algumas atividades que ocorriam em sua casa das quais não tinha ciência” (CARLONI, 2013). É possível concluir que tal violação pode ocorrer tanto de maneira direta, por meio da criação de dados pessoais novos e sua disponibilização a terceiros, como indireta e não intencional, como ocorreu no caso Target. 6- CONCLUSÃO No decorrer do artigo, foram abordadas questões sobre privacidade em SADs. Pode-se concluir que a maioria das empresas não têm o devido cuidado com os dados pessoais dos usuários e que os mesmos precisam de conscientização, pois ao usar alguns serviços necessitam questionar sobre qual será o fim dos dados que estão fornecendo. Com a grande quantidade de dados disponíveis atualmente, empresas buscam tê-los para uma maior vantagem diante dos seus concorrentes. Os dados quando processados por SADs ajudam as empresas saírem na frente de seus adversários, mas necessitam de tratamentos para que não ocorra a violação de privacidade. Empresas estão também comprando dados por causa da acirrada competitividade que existe no mercado, porém, de acordo com o anteprojeto de lei dos dados pessoais esse comércio não poderá ser mais realizado e o usuário titular dos dados deverá estar ciente de qualquer tramitação que possa ocorrer com seus dados. Nota-se que o Brasil avança a respeito do tema privacidade no âmbito da legislação com a criação do Marco Civil, onde um dos seus pilares é a privacidade na internet e com o atual anteprojeto de Lei dos dados pessoais que se encontra em tramitação. Mesmo com o direito à privacidade sendo garantido pela constituição, ainda existe a dúvida se os dados estão ou não protegidos, incluindo dados manipulados pelos sistemas de apoio a decisão. Como o tema é novo e de extrema importância, torna-se necessário novas pesquisas sobre o tema. REFERÊNCIAS ANDRADE, Allan Diego Mendes Melo. O direito à intimidade e à vida privada em face das novas tecnologias da informação. Ano.5, n.1 (2008) - Teresina: FAETE, 2008. Disponivel em: <http://www.faete.edu.br/revista/ODIREITOAINTIMIDADE_E_%20A_VIDA_PRIVADA_EM_FACEDASNOVASTECNOLOGIASDAINFORMACAO-Allan%20Diego.pdf>. Acesso: 17/09/2015. BARONI, Larissa Leiros. Entenda melhor a lei que pretende proteger os dados pessoais no país. 2015. Disponível em: <http://tecnologia.uol.com.br/noticias/ redacao/2015/05/11/entenda-mais-sobre-a-lei-que-pretende-proteger-os-dados-pessoais-no-pais.htm>. Acesso: 11/11/2015. BRASIL. Ministerio da Justiça. Anteprojeto de Lei para a Proteção de Dados Pessoais. 2015. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/noticias/mj-apresenta-nova-versao-do-anteprojeto-de-lei-de-protecao-de-dados-pessoais/apl. pdf>. Acesso: 11/11/2015. BRETERNITZ Vivaldo José; SILVA, Leandro Augusto. Big data: um novo conceito gerando oportunidades e desafios. Revista RETC – Edição 13ª, outubro de 2013, página 107. Disponível em: <http://revista-fatecjd.com.br/retc/index.php/ RETC/article/viewFile/74/pdf>. Acesso em: 19/08/2015. BRUNO, Fernanda. Monitoramento, classificação e controle nos dispositivos de vigilância digital.Revista FAMECOSPorto Alegre, nº 36. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/ view/4410/3309>. Acesso em: 19/08/2015.
126 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
CARLONI, Giovanna Louise. Privacidade e Inovação na Era do Big Data. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10438/12664>. Acesso em: 19/08/2015. DICIONARIO Informal. 2016. Disponível em: <http://www.dicionarioinformal. com.br/ privacidade/>. Acesso: 13/06/2016. EL PAIS. Quatro compras com o cartão bastam para identificar qualquer pessoa. 2015. Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2015/01/29/ciencia/1422520042_066660.html>. Acesso: 12/11/2015. FERREIRA, Wanise. Oracle quer incentivar o Fast Data nos bancos. 2014. Disponível em: <http://www.momentoeditorial.com.br/inovacao/2014/06/oraclequer-incentivar-o-fast-data-nos-bancos/>. Acesso: 24/08/2015. GUERRA, Sidney. A tutela constitucional da privacidade. Revista do Curso de Direito da UNIABEU. Disponível em: <http://www.uniabeu.edu.br/publica/index. php/rcd/article/view/531>. Acesso em: 27/08/2015. INFORMAL, Dicionario. Privacidade. São Paulo: 2015. Disponível em: <http:// www.dicionarioinformal.com.br/privacidade>. Acesso: 17/09/2015.
OLHAR DIGITAL. Fast Data: a mais recente tendência da tecnologia de dados. 2015. Disponível em: <http://olhardigital.uol.com.br/pro/video/fast-data-a-mais -recente-tendencia-da-tecnologia-de-dados/47485>. Acesso: 13/10/2015. PEZZI, Ana Paula Jacobus. A necessidade de proteção dos dados pessoais nos arquivos de consumo: em busca da concretização do direito â privacidade. Disponível em: <http://www.repositorio.jesuita.org.br/bitstream/handle/ UNISINOS/2400/necessidade%20de%20protecao.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 17/09/2015. PINTO, Augusto Eduardo Miranda. A formação da cidade digital e o direito a privacidade informática. Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3259.pdf>. Acesso: 17/09/2015. POWER, D.J. A Brief History of Decision Support Systems. 2007. Disponível em: <http://dssresources.com/history/dsshistory.html>. Acesso: 15/10/2015.
LINS, Bernardo F. E. Privacidade e internet. Publicações da Consultoria Legislativa. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/documentos-e-pesquisa/ publicacoes/estnottec/arquivos-pdf/pdf/001854.pdf>. Acesso em: 19/08/2015.
RODRIGUES, Aderlan. Data Warehouse, Business Intelligence e Data Mining: qual a diferença?. 2013. Disponível em: <http://www.administradores.com.br/ artigos/tecnologia/data-warehouse-business-intelligence-e-data-mining-qual-adiferenca/70465/>. Acesso: 13/10/2015.
LOCAWEB. Fast Data: a informação que vale ouro. 2015. Disponível em: <http://blog.locaweb.com.br/tecnologia/fast-data-a-informacao-que-vale-ouro/>.Acesso: 10/10/2015.
SANTANA, André Gomes et al. Sistema de Apoio a Decisão. 2007. Disponível em: <http://www.devmedia.com.br/sistema-de-apoio-a-decisao/6201#ixzz3ojyldCSd>. Acesso: 16/10/2015
LORENTZ ,Alissa. Big Data, Fast Data, Smart Data. 2013. Disponível em: <http://www.wired.com/insights/2013/04/big-data-fast-data-smart-data/>. Acesso: 13/10/2015.
SCHREINER, Júnior. Sistema de Apoio à Decisão para o Controle do Tráfego em Interseções Isoladas. UnB. 2001. Disponível em: <http://www.ceftru.unb.br/ arquivos/sigeti_artigo.pdf>. Acesso: 15/10/2015.
MICHAELIS. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. 2015.
SPERB, Chaiana Christine; NETO, Hercio Menegotto Ferraro. A importância dos sistemas de informação na Gestão de empresas. 2006. Disponível em: <http:// www.administradores.com.br/artigos/tecnologia/data-warehouse-business-intelligence-e-data-mining-qual-a-diferenca/70465/>. Acesso: 13/10/2015.
MAGALHAES et al. O uso do Big Data na violação da privacidade dos usuários para estratégias de negócios. 2014. Disponível em: <http://redes.caninde.ifce. edu.br/images/artigos/7.pdf>. Acesso: 17/09/2015. MARTINELLI, Andréa. Seus dados pessoais estão seguros? A confusão do público e privado na era digital. 2015. Disponível em: <http://www.brasilpost. com.br/2015/06/10/seguranca-dados-pessoais_n_7498992.html>. Acesso: 13/11/2015. MATOS, Tiago Farina. Comércio de dados pessoais, privacidade e Internet. Revista de Doutrina da 4ª Região, n. 7. Disponível em: <http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao007/tiago_matos.htm>. Acesso em: 28/08/2015. MOMBELLI, Elisa. O Marco Civil e o Big Data. 2013. Disponível em: <http://cio. com.br/opiniao/2014/07/21/o-marco-civil-e-o-big-data/>. Acesso: 13/10/2015. NOJIRI, Sergio. O direito à privacidade na era da informática algumas considerações. R. Jur. UNIJUS, Uberaba MG, V.8, nº 8, p. 99106, maio 2005. Disponível em: < http://myrtus.uspnet.usp.br/pesqfdrp/portal/professores/nojiri/pdf/privacidade_inform%E1tica.pdf>. Acesso: 17/09/2015.
TAURION, Cézar. Big Data. Rio de Janeiro: Brasport, 2013. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=GAVLAgAAQBAJ&printsec=frontcover&hl=pt-BR#v=onepage&q&f=false>. Acesso: 13/10/2015. TEIXEIRA, Lucas. Teoricamente impossível: problemas com a anonimização de dados pessoais. 2015. Disponível em: <https://antivigilancia.org/pt/2015/05/ teoricamente-impossivel-problemas-com-a-anonimizacao-de-dados-pessoais/>. Acesso: 12/11/2015. TURBAN, Efarim. Tecnologia da informação Para Gestão - 8 Edição. Bookman. 2009. VIT, Antônio Rodrigo Delepiane de; LONGO, Gilson Luis Palma; DUCA, Fábio Vidal Pinheiro Del.sistema de apoio a decisão nas organizações: transformando dados em informações. 2008. Disponível em: <http://www.administradores. com.br/producao-academica/sistema-de-apoio-a-decisao-nas-organizacoestransformando-dados-em-informacoes/2562/>. Acesso: 09/11/2015.
NOTAS DE FIM Graduanda do curso de Sistemas de Informação do Centro Universitário Newton Paiva (marcelasilvagomes@hotmail.com). 1
OLIVEIRA, Djalma de Pinho Rebouças de. Sistemas de informações gerenciais: estratégias, táticas, operacionais. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
Professor do Centro Universitário Newton Paiva (iremar.prof@newtonpaiva.br).
2
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 127
A URGÊNCIA NA CIDADE E A VIOLÊNCIA DO TRAUMA Lucas Fernandes Loureiro1
RESUMO: Nesse trabalho, nos valeremos desse conceito – estado de urgência – para descrever o fenômeno para o qual pretendemos encontrar a causa. Partimos da hipótese de que a internet e a violência sejam duas maneiras distintas de responder ao fenômeno, sendo que a primeira, contra a expectativa, funcionaria como um agravante. De posse do conhecimento desses efeitos agravantes e sem confundi-los com a causa, encontramo-la na doutrina freudiana das pulsões que nos revelará que o estado de urgência é antes de tudo um fenômeno da particularidade de um sujeito; fruto de um distúrbio estrutural da experiência com a linguagem que faz com que a demanda pulsional não encontre jamais uma resposta plenamente satisfatória. Para lidar, então, com o estado de urgência resta saber em que ponto a experiência com a linguagem permite ao sujeito criar a falta que há entre demanda e reposta. PALAVRAS-CHAVE: estado de urgência, violência, pulsão.
O ESTADO DE URGÊNCIA NAS CIDADES: VIOLÊNCIA E INTERNET Vive-se hoje, nos aglomerados urbanos, o que podemos chamar de estado de urgência. Nos valeremos desse conceito – estado de urgência – para descrever o fenômeno para o qual pretendemos encontrar a causa. Este é um conceito cunhado por esse autor cuja noção é extraída da literatura psicanalítica concernente a clínica da urgência. Ao longo desse trabalho trataremos, portanto, de desenvolvê-lo. Partimos da hipótese de que a internet e a violência sejam duas maneiras distintas de responder ao fenômeno, sendo que ambas, contra a expectativa, funcionariam como agravantes. De posse do conhecimento desses efeitos agravantes, encontramos a causa na doutrina freudiana das pulsões que nos revelará que o estado de urgência é antes de tudo um fenômeno da particularidade de um sujeito; fruto de um distúrbio estrutural que faz com que a demanda pulsional não encontre jamais uma resposta plenamente satisfatória. Em torno dessa questão sobre a demanda e sua reposta é que iniciaremos nossa argumentação. Se partimos do pressuposto de que os propósitos econômicos, políticos, sociais e militares da existência de uma cidade é o encurtamento do tempo e espaço entre demanda e resposta, chegamos hoje ao seu extremo, até mesmo em sua quase anulação. Mal se emite a demanda e prontamente deve-se obter uma resposta. A história conta que o advento da agricultura de subsistência fez com que os nômades se estacionassem por muito tempo em uma mesma região, tornando-os alvo fácil de catástrofes naturais, violência animal, invasões de outros povos, e doenças contagiosas. Os aglomerados precisavam ser protegidos e a necessidade da concentração demográfica ignorava suas consequências desastrosas. Quanto mais o homem obtinha sucesso em se proteger da natureza, mais descobria que seu maior inimigo era ele mesmo. Isso é o que revela a convivência humana nas cidades de hoje. Ao contrário do que fora no passado, hoje não temos tanto que temer a natureza, mas estamos constantemente nos protegendo de nós mesmos. Se viver aglomerado permitia o benefício da proteção contra ameaças externas, hoje estas ameaças já são bem controladas, nos fazendo questionar qual ainda seria a necessidade de se viver tão próximo, empilhados, abarrotados. Vivemos juntos para nos proteger de que? De nós mesmos? Por incrível que pareça no final das contas constatamos que vivemos de maneira individualista e violenta, ou
seja, vivemos amontoados em concentrações urbanas, com pouca distância entre os corpos, mas com uma distância emocional imensa; o que nos leva a temer o próximo e muitas vezes violenta-lo. O cúmulo desse paradoxo se dá com o advento do espaço virtual. A world wide web produz exatamente essa proximidade distante. Estamos mais conectados, mas cada vez mais distantes. As relações humanas encontram na virtualidade a promessa de mais conectividade e compartilhamento de experiências, desde que as partes envolvidas estejam seguras atrás de suas respectivas telas, responsabilizando-se o mínimo possível pelo que dizem e pelo que fazem, deletando, desaparecendo e bloqueando assim que algo pareça um pouco mais ameaçador. Trata-se de um recurso que tenta solucionar, de maneira equivocada, o impossível das relações humanas. Quando o homem descobre que seu maior inimigo é ele próprio e que viver em sociedade tenha sido talvez um engano, a internet surge prometendo encurtar distancias que já eram curtas demais, promete a comunicação plena, a interatividade extrema e a quase anulação da dimensão temporo-espacial que há entre uma demanda e sua resposta. Quanto mais se conectam à rede, mais possibilidades de se produzir demandas e, consequentemente, tentativas de resposta. Há uma virulenta multiplicação do número de trocas de mensagens nos últimos tempos. Esse bombardeio frenético de demandas somado a exigência imperativa por uma resposta rápida é o que tem amplificado no convívio urbano a tensão dos laços sociais que, vez ou outra só irá encontrar alívio na violência. É importante que fique claro isso: o ato violento não é a causa da perturbação, na verdade é a tentativa de solucionar uma perturbação precedente. Essa perturbação que identificamos como algo presente no espírito de nossas cidades, na tensão dos laços urbanos é o que chamamos de estado de urgência. Se apontamos a violência como uma das tentativas de solucionar esse estado de urgência, uma outra tentativa seria a intensificação da comunicação em vigor atualmente através da internet. Como a segunda tentativa é um equívoco, já que supõe a possibilidade do encontro pleno entre a demanda e sua resposta satisfatória, a primeira tem se tornado mais frequente. De repente, a única resposta ao estado de urgência torna-se a morte, o apagamento, o desligamento, o desaparecimento; tentativas radicais e violentas de solucionar algo que a aceleração das trocas de comunicação e o encurtamento têmporo-espacial entre demanda e resposta tem prometido, mas não tem podido solucionar.
128 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785
O pensamento lacaniano nos ensina algo quase irrefutável: “toda demanda é demanda de amor.” (1998) O que seria a cidade, então, senão o lugar da tentativa do encontro da resposta para essa demanda. Encurta-se os espaços e o tempo entre a demanda e sua resposta e como consequência tem-se uma crescente aceleração nas tentativas de realização da satisfação pulsional. O problema é que, paradoxalmente, quanto mais se tenta acelerar e fazer encontrar a demanda com sua resposta adequada, mais se depara com o fato de que não há resposta suficiente e totalmente adequada para uma demanda. Por isso ao multiplicarmos as tentativas de encontro entre demanda e resposta, multiplica-se também, na mesma medida, a frustração e a insatisfação que, em alguns casos, só encontrarão saída na violência. A URGÊNCIA UNIVERSAL E A SUBJETIVAÇÃO DA URGÊNCIA Mesmo se os tempos fossem outros e se os meios de comunicação não nos permitisse tamanho volume de troca de informações, ainda assim haveria o estado urgência, porém não do mesmo modo. Para nosso trabalho, o que podemos extrair de mais importante de Os instintos e suas vicissitudes (1915) é que toda pulsão apresenta uma demanda de satisfação urgente. O estado de urgência a que nos referimos, antes de se tornar um fenômeno da coletividade, é uma condição particular de cada sujeito. Trata-se de uma premissa fundamental: todo sujeito está em estado de urgência, devido a tensão psíquica causada pelas constantes exigências da pulsão. Ora, se isso é verdadeiro porque então não estamos todos enlouquecendo e passando ao ato? Certamente porque gozamos de mecanismos psíquicos de defesa que trabalham a favor do apaziguamento da urgência dessa demanda pulsional. Diríamos, então, que a experiência com a virtualidade proposta pela internet tem afetado a eficácia desses mecanismos de defesa. Desde o início da vida de um bebê não encontramos ali outra coisa senão pulsões desorganizadas, manifestando-se anarquicamente nas perturbações tão evidentes dessa fase da vida. Esse estado de urgência se conserva na vida adulta, mas passa também, em parte, a ser alvo de mecanismos de defesa que regulam, ordenam e orientam o caos pulsional anteriormente predominante. A passagem do ser vivo para o ser falante consiste exatamente em fazer o sentido se sobrepor a experiência. Quando o caos pulsional se estabiliza em uma representação semântica tem-se a implementação desses mecanismos de defesa que irão, ao longo de toda vida do sujeito, orientá-lo quanto a suas experiências pulsionais. Além da ideia de que a pulsão demanda satisfação urgentemente, precisamos evocar uma outra característica da pulsão. Além da urgência de sua demanda, a pulsão só pode ser satisfeita parcialmente. Destacamos, portanto duas ideias caras à compreensão da teoria das pulsões: 1. Demanda urgente 2. Resposta parcial Isso significa que a ferocidade e a urgência com que uma pulsão demanda satisfação sempre encontrará adiante uma porção considerável de insatisfação. Esse é, portanto, o estado em que um sujeito se encontra; tendo de lidar com constantes demandas de satisfação que invariavelmente permanecerão insatisfeitas. Se essa é a condição universal do sujeito, o que faz com que esse estado de urgência tenha se tornado o espírito de nosso tempo, ou seja, o estado que descreve o laço social? Refazendo a pergunta de uma outra forma: como é que um fenômeno estritamente individual tal qual o estado de urgência universal, torna-se um fenômeno da civilização?
Este é um ponto importante – houve sim uma virada desde a época de Freud. Ali o estado de urgência permanecia em uma experiência individual, interna que se externava em alguns casos pontuais. De um modo geral a externalização do estado de urgência ocorria – em forma de demanda – para que fosse estabelecido o laço social, que geralmente exercia sua função apaziguadora. Época pretérita ao liberalismo, em que a busca pelo ideal do Outro organizava e impunha limites as experiências pulsionais de um indivíduo para com o outro. Assim, na medida em que a demanda pulsional urgente se endereçava a seu suposto objeto de gozo, o fazia mediado pela palavra do Outro. Essa mediação exercida pelo Outro diz respeito aos mecanismos de defesa de um sujeito que laçam mão de ferramentas simbólicas a fim de lhe organizar a experiência com o mundo. Vale lembrar que Lacan (1985), em seu segundo seminário, introduz a noção de Outro com maiúscula para designar, ao mesmo tempo, a capacidade psíquica de estabelecimento do laço social e o lugar simbólico da alteridade que recebe e organiza para o sujeito suas demandas pulsionais. Em nossos dias, o estado de urgência não se limita mais a uma experiência individual interna, mas permeia toda a coletividade. Tratase de uma projeção no mundo externo de um fenômeno interno; algo que fora abolido internamente e que retorna no mundo externo. Um mecanismo semelhante ao da foraclusão ou, quem sabe, uma maneira de entender a foraclusão generalizada de Miller (1998). Dentro desta lógica, a expressão de qualquer demanda pulsional torna-se uma precipitação da crise sempre de responsabilidade do outro e não mais do sujeito. Quando o estado de urgência que paira os ares de nossa civilização se manifesta em eventos catastróficos, não haveria um sujeito disposto a responder por ele perante o Outro, o que, por fim, privaria este sujeito da possibilidade do efeito apaziguador do laço social. O TRAUMA É DO OUTRO O trauma também poderia ser compreendido a partir dessa suposta transformação pela qual passou nossa civilização desde a época da clínica freudiana. Época em que as ideologias, as crenças, as filosofias ainda ofereciam munição para o exercício individual da interpretação e elaboração subjetiva do trauma. Na época da clínica freudiana, do mesmo modo que o estado de urgência era reconhecidamente algo pertencente ao sujeito, o trauma, possível causador desse estado de urgência, também era algo do sujeito. Custou para que Freud percebesse isso: que o trauma não era simplesmente relacionado ao encontro do sujeito com um fato disruptivo, com algo estranho vindo de fora que viria abalar a suposta integridade e normalidade mental. Nas primeiras teses de Freud, o sofrimento psíquico era sempre atribuído a um evento traumático, ao encontro com um fato da realidade, algo proveniente do outro e que poderia ser datado. Em seguida, o trauma se torna algo fundante da subjetividade. Todo sujeito é traumatizado na medida em que aquilo que demanda nunca pode obter uma resposta completamente satisfatória. O trauma se torna algo do sujeito e não mais da alteridade. Isso significa que tudo o que da vida pulsional não pode ser compreendido e bem organizado simbolicamente é traumático. Sobre essa mudança de perspectiva Lacan (1986, p. 46) afirma que Freud [...] se apercebe de que o trauma é uma noção extremamente ambígua, porque parece, segundo toda evidencia clínica, que sua face fantasmática é infinitamente mais importante do que sua face de evento. Desde então, o evento passa para o segundo plano na ordem das referências subjetivas.
PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785 | 129
Se o trauma pôde ser compreendido clinicamente na época de Freud como algo do sujeito é porque a clínica freudiana apostava que o sujeito dispunha de recursos simbólicos para decifrar os enigmas de suas experiências sexuais infantis, podendo se responsabilizar por elas. O que tentamos localizar aqui é o momento histórico em que essa aposta se torna inviável e os movimentos de contracultura irão todos tentar inverter a direção do tratamento freudiano. Desde então, o trauma existe não pela impossibilidade de ordenação simbólica da vida pulsional, mas porque a vida pulsional é ordenada e consequentemente reprimida por agentes externos de uma suposta cultura opressora. A partir daí o sujeito é eximido de sua reponsabilidade sobre o trauma, sendo privado de tratar-se, sendo levado a crer que tudo o que lhe causa sofrimento vem de fora. Para uma compreensão mais ampla de nosso argumento devemos por fim relacionar a noção de trauma a ideia que vimos construindo desde o início: o estado de urgência. No momento em que o trauma se projeta no exterior do sujeito, assim também o faz o estado de urgência. Este é o ponto de virada, o sujeito deixa de se implicar com aquilo que lhe causa mal-estar como sendo algo próprio e passa a enxergar fora de si as causas de seu sofrimento. Isso vai de acordo com a ideia de trauma generalizado que Laurent (2005) nos apresenta. Se o estado de urgência são os termos que descrevem nosso tempo – não o sujeito – o trauma também passa a ser algo sempre vindo de fora, não pertencente a subjetividade. Isso nos elucida a questão sobre a violência, nos permitindo por fim responder a questão sobre a necessidade de um intervalo temporo-espacial entre a emissão da demanda e sua resposta com a finalidade de defesa contra a pulsão. Quanto mais um sujeito se torna incapaz de subjetivar o que vem de fora, o que é forasteiro ou estrangeiro, mais violenta se torna a ação disso que vem de fora. A quantidade e a qualidade da violência é diretamente proporcional a incapacidade de subjetivação do trauma, ou do reconhecimento do trauma como algo que diz respeito ao gozo do sujeito e não do outro. Sendo assim, a quase anulação têmporo-espacial entre uma demanda e sua resposta é o que gera a incapacidade de subjetivação do trauma, que por sua vez magnifica a percepção psíquica da violência. Nos tornamos mais violentos e violentados porque não temos obtido recurso simbólico para tratar a violência das demandas pulsionais. Para esse perigo que se apresenta internamente, não temos encontrado outra solução senão a de projetá-lo na alteridade, criando assim um Outro violento e ameaçador, a quem só se pode retribuir com igual violência. Daí a importância de haver um intervalo entre a demanda e a resposta. Emitir uma demanda de amor e ficar um tempo sem a resposta pode vir a ser uma bela oportunidade de se perceber que nunca
haverá uma resposta totalmente adequada a essa demanda. A capacidade de assimilação subjetiva poderia estar aí – no ponto em que o sujeito não tem resposta imediata, no lugar em que o sujeito tem de se haver com a falta sem poder atribuí-la ao Outro. Se nos últimos tempos temos sidos coagidos a acreditar que é possível uma demanda encontrar sua reposta totalmente adequada através dos recursos virtuais de comunicação é porque de certa forma sempre tivemos essa esperança. O problema é que essa crença, na medida em que é frustrada, convida o sujeito a tomar medidas radicais e muitas vezes violentas contra o outro. Poderíamos concluir em uma frase que articule as ideias centrais desse trabalho, quais sejam: intervalo temporo-espacial entre demanda e respotosta; violência, trauma e demanda pulsional urgente. Eis então a frase: Se a demanda pulsional urgente é o que traumatiza o sujeito em sua constituição, esse trauma projeta-se na alteridade e se torna generalizado na medida em que a capacidade de responsabilização subjetiva da falta - oriunda de uma experiência temporo-espacial entre demanda e resposta mais dilatada – falha; fazendo com que ao outro seja sempre atribuido ameaça e violência, não podendo oferecer-lhe outra retribuição que não seja também a violência. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FREUD, S. Os instintos e suas vicissitudes. In: ______ Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1915. p. 115-144. LACAN, J. O simnário: o eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zarhar, 1985. LACAN, J. O siminário: Livro 1: Os escritos técnicos de Freud. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986. LACAN, J. A subversão do sujeito e dialética no inconsicente freudiano. In: LACAN, J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. p. 807 a 842. LAURENT, E. El tratamiento de la angustia postraumática: sin estándares, pero no sin principios. In: ______ La urgencia generalizada 2: Ciencia, política y clínica del trauma. Buenos Aires: Grama Editiones, 2005. p. 13-32. MILLER, J. A. Os casos raros, inclassificáveis da clínica psicanalítica: a conversação de Arcachon. São Paulo: Escola Brasileira de Psicanálise, 1998.
NOTA DE FIM 1 Psicólogo Clínico, Mestre em Psicanálise pela Universidade Paris VIII, Professor de psicanálise do Centro Universitário Newton Paiva e Responsável pelo NAP (Núcleo de apoio psicossocial) das Faculdades Milton Campos. Contato: cabeica@gmail.com.
130 | PÓS EM REVISTA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO NEWTON PAIVA - 2016/1 - NÚMERO 12 - ISSN 2176 7785