Pulp Feek #17

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É tarde, é tarde é tarde é tarde. O coelho de Alice está certíssimo. A Pulp tem atrasado, saído tarde. Mas vejam bem: Nós, como o coelho branco, temos feito tanta coisa. Estamos todos preocupados com nossas obras para o National Novel Writing Month. Ao mesmo tempo, estamos preparando a redação, para que a revista possa dar a vocês, apaixonados pela leitura, algo mais. E tudo isso sem esquecer das séries, do one-shot, das colunas. E da nossa vida pessoal (ela ainda existe). Tudo que podemos pedir é que vocês deem para a Rainha Vermelha a lição que ela não aprendeu: paciência. Logo tudo entrará nos eixos, e nós vamos trazer coisas maravilhosas para vocês. A começar pela edição especial de natal, de onde pode sair, quem sabe, o primeiro livro publicado pela Pulp (em e-book, que fique claro). E seguindo para mais entrevistas, mais notícias, mais colunas, mais mais mais. Nessa semana, que é Fantástica, temos mais uma capítulo da Queda de Aqueron, por Marlon Teske, e também de Rixa, por Victor Lorandi. No one-shot, temos a estreia de Edison Petter, mais um autor do nosso grupo de trabalho. E, claro, completando a revista temos a coluna do Lucas Rueles, Fonte de Inspiração, e a minha, Como Escrever Sobre. Agora me deixem ir. Ainda tenho que escrever minha cota de palavras de hoje pra a NaNoWriMo. E é tarde.


PULP FEEK - #17 Séries

A queda de Aqueron - os mártires os escolhidos dão seu primeiro passo rumo a incerteza. Isso e muito mais na incrível história de Marlon Teske - Pág 3

RIXA - PARTE V Marcus testa sua sorte enquanto a Ordem de Ferro tenta cumprir

seu propósito na terra, em mais um eletrizante capítulo de Victor Lorandi -- Pág 11

One-Shot

PROBLEMA Caos e Ordem se misturam na lenda sobre duas irmãs uma guerreira na pureza de seu coração e outra guerreira no ardor de sua alma nesse incrível conto de Philippe Avellar --------------------------------------------- Pag 23

Extra

FONTE DE INSPIRAÇÃO - A ORIGEM DOS TROVADORES Na coluna dessa semana descubra um pouco mais sobre a história dos bardos e poetas. ----- Pág 33

COMO ESCREVER SOBRE - TEMÁTICA entenda mais a fundo o funcionamento desse elemento tão essencial no desenvolvimento de qualquer história -- Pág 41 Na Próxima Semana: Reveja Deckard, e sua amável androide em mais um capítulo de A Falha Steinitz por Rodolfo L. Xavier. Em 4x2, Lady Starbuck continua em mais um fascinante capítulo de Alaor Rocha E as já tradicionais colunas de nossos Editores Chefes, Lucas e Rafael.



A Queda de Aqueron - Os Mártires

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Marlon Teske

ão havia outra maneira. (***)

Quando o Portão dos Santos se abriu, o exército celestial precisou forçar passagem em meio ao povo para que os Nove Mártires pudessem caminhar. Estes seguiam a pé, limpos e asseados através de um caminho de tábuas especialmente colocado ali para este fim, serpenteando pelas ruelas e vias emporcalhadas pela lama, estendendo-se através de toda a cidade até o Portão dos Protegidos. Estavam esplêndidos. Os homens estavam vestidos em armaduras prateadas com o caldeirão símbolo da Sacra Doutrina em ouro estampado nos gorjais, nas ombreiras e no belo peitoral. Seus mantos eram azuis e seus escudos pintados em boa madeira. As mulheres envergavam um vestido de seda azul com bordados de flores, folhas e pequenos caldeirões em fios de ouro, mantos da mesma cor e um véu sobre a face. Mas seja elmo, seja véu, todos tinham os rostos ocultos. O mistério era importante para o povo. E ninguém precisava ver os hematomas ou as lágrimas que brotavam por vergonha ou pela dor. Cânticos soavam ininterruptamente em volta dos Nove, pétalas eram jogadas aos seus pés, assim como também espalhavam comida, água benzida, estendiam bebês para serem tocados e abençoados com uma vida longa e saudável. Algumas pessoas desmaiavam, outras choravam, quase todas apenas erguiam as mãos aos céus em júbilo. Nove mártires, guerreiros que dariam a própria vida para salvarem Aqueron de TerraAlém e o auxiliarem de volta aos céus. Era uma honra indizível. E também, poucos sabiam, uma sentença de morte. O primeiro mártir carregava alto o estandarte da Sacra Doutrina na mão direita. Esvoaçava levemente sob a brisa fraca que conseguia atravessar os altos muros naquela manhã. O dia ainda não havia bem clareado, e muitos ainda perguntavam se as trevas daquela noite não

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seriam eternas. A igreja e um verdadeiro batalhão de diáconos garantia que não. A luz regressaria, pois os Mártires lutariam por Aqueron, e apenas a esperança de deus era suficiente para clarear o dia. Talvez fosse mesmo verdade... (***) Belzequíades despertou num sobressalto e viu Lázarus de pé ao seu lado. Esfregou as mãos sobre a própria face, sentindo a barba que precisava ser novamente aparada e a dor de cabeça atrás dos olhos causada pela falta de sono que vinha lhe atormentando. Não conseguia precisar por quanto tempo dormira, mas tinha certeza de quanto não dormira. Havia passado as últimas setenta e duas horas em claro, completamente absorvido pelos preparativos necessários. Quando enfim convencera os Nove, lembrava-se de ter ido até o Livro, sentado-se nas poltronas do salão apenas por um instante para revisar os textos uma última vez em busca de alguma falha. Deve ter se deixado levar pela exaustão. — Em que ponto estamos? — inquiriu. — Quase no portão dos Protegidos. O povo os amou assim que os viu surgir através dos portões, e nenhum deles parece estar disposto a fazer alguma grande besteira. Você os dissuadiu bem. Não havia outra maneira. — Ótimo. Estes são novos tempos para a igreja. Uma época de milagres e redenção. A fé se fortalece e tudo se encaixa. — Aqueron é bom para nós. — Certamente. E ele sem dúvidas está feliz pelas escolhas que fez, Lázarus. — tornou Belzequíades colocando-se de pé com certo esforço. Estendeu sua mão até a bengala e passou a caminhar dolorosamente em direção à porta com o livro sagrado debaixo do outro braço. Não podia se dar ao luxo de descansar ainda. Não até os Nove terem, enfim, passado os portões.

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— Por que nove? — perguntou o outro num rompante após um breve silêncio — Os desaparecimentos, as prisões. Quanto mais deles mandamos, mais complicado é manter tudo em segredo. Por que não apenas três? Ou um único mártir para morrer pela salvação de todo um povo? — A Sacra Doutrina tem seus motivos — respondeu o mestre dos mistérios — Nove foram os deuses, nove eram os reinos. Hoje, nove são os Santos. É um número mágico, de acordo com o livro. E uma tradição, não vamos esquecer. Não ouso ir contra os mistérios de nossa igreja. Isto seria ir em direção ao desconhecido, e fico muito mais feliz sabendo onde irei pisar em cada instante. O livro indica Nove. Nove partiram. O tempo dirá se estamos certos ou não. — Por falar nisso, precisamos eleger um novo Santo. Com a morte de Alcebíades somos apenas oito… — Que Aqueron o tenha. — respondeu num lamento seguido por um breve suspiro — Sem dúvida há uma nova estrela nos céus hoje. Sabíamos que logo chegaria o dia do acerto de contas para um homem naquela idade. — Ele estava com o pescoço quebrado. — Ossos fracos, talvez — cortou Lázarus virando-se na direção do inquisidor — Ele provavelmente tropeçou. — Você sabe que… — Nós dois sabemos, Lázarus. E isto nos basta, não é? Não houve alteração na voz, nem mudança no semblante. Mas era uma ameaça tão clara quanto o dia que estava raiando. Um aceno único confirmava. Ele sabia o suficiente, e aquilo por hora bastava. Todos tinham segredos, e Belzequíades os tinha em maior número do que a soma de todos os outros juntos. Avançaram em silêncio, ritmados pelos passos lentos e pela bengala do mestre dos mistérios até chegarem à carruagem que lhes aguardava próximo ao pórtico. Rosália já estava lá. — Está linda como sempre, Rosália — cumprimentou Belzequíades.

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Ela corou, envergonhada. Era tão tímida, pequena criança, e escondia em si um dom único. Em torno do pescoço delgado, um cordão com três chaves balançavam suavemente. A chave dourada do Portão dos Santos, a chave de ferro do Portão dos Protegidos e, por fim, a chave branca do Portão dos Penitentes. A Guardiã das Chaves do Enclave. Era um papel simbólico, é claro. Lázarus e seu exército era o que verdadeiramente mantinha o portão fechado. Mas as aparências eram importantes para a Sacra Doutrina. E a beleza infantil de Rosália lhes dava a impressão de que estavam de fato sob a proteção da igreja e não aprisionados atrás de seus muros. — Os Mártires são lindos, Belzequíades — disse ela — Vi a todos, e os beijei a face sob o véu e os elmos. Quis retirar ver seus olhos, mas não me permitiram. — Não é bom para ninguém saber quem são os nove, querida — disse-lhe o clérigo batendo no teto da carruagem com a bengala. No mesmo instante, ela começou a rodar pela via principal em direção ao portão. Enquanto os Mártires em sua peregrinação prosseguissem através dos caminhos sinuosos para serem vistos pelo povo, eles chegariam rapidamente ao seu destino para aguardarem por seu papel na pantomima. Foi Lázarus que concluiu o pensamento de Belzequíades: — Se não souberem quem são, não poderão lamentar sua perda. Poderão sonhar com seu herói, dar-lhe as características que precisarem para que triunfem. Os que sonham com guerreiros poderosos lhes construirão como homens fortes de braços largos. Os que acreditam na força do pensamento os imaginarão como eruditos, sábios, espertalhões… cada um criará seu próprio Mártir na figura dos Nove. — E quem são eles de fato? — perguntou a menina interessada. Belzequíades notou que a garotinha já não era mais tão infantil quanto aparentava. E ela, talvez propositalmente, sorriu-lhe de volta e aguardou mergulhada em seu mutismo habitual. — São nossa esperança — respondeu Belzequíades com um meio

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sorriso. — São aqueles que irão salvar nosso mundo. (***) O Portão dos Protegidos é na verdade um pouco mais do que um mero vão entre duas altas torres que fica na extremidade imediatamente oposta a Catedral dos Puros. Não possui adornos ou nenhum atrativo e como suas grades interiores estão sempre fechadas, é praticamente ignorado pela população por quase todo o tempo. Talvez pela própria curiosidade em relação àquilo que por ventura exista do outro lado ou pela simples fé naquelas nove pessoas destemidas, quase toda a população do enclave enxameava no entorno naquele momento. Rosália desceu com cuidado da carruagem, sendo seguida por Belzequíades e por Lázarus, protegidos por um pelotão. Alguns guardas empurravam as pessoas, exigindo calma e uma certa distância. O frenesi religioso se espalhava através do povo. Algumas pessoas oravam, gritavam e choravam. Muitas caíam ao chão, tendo convulsões e eram carregadas para longe do lugar pela massa de gente. Alheios, os nove mártires aguardavam em silêncio. A menina escolheu a chave, caminhou com cuidado através do estrado até o portão. Com um movimento estudado, inseriu a chave e a girou duas vezes. Um som metálico se ouviu pelo outro lado, e os portões se abriram rangendo. Alguns dos soldados próximos puxaram as pesadas chapas de ferro e madeira até tê-lo todo aberto. Para o desapontamento de muitos, ao fundo do primeiro portão havia apenas um segundo praticamente igual. — A Sacra Doutrina estará com vocês em cada passo — começou Belzequíades caminhando com dificuldade diante dos Nove — Aqueron lhes aguarda. Cumpram seu destino, pois nele repousa a vida de toda a civilização. Que ele os abençoe. E lhes guie até seu encontro em TerraAlém, de onde subirão ao firmamento ao seu lado como santos e heróis.

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As palmas irromperam num crescente, e logo os vivas ultrapassavam até mesmo os cânticos. Os Nove caminharam através do estrado, passando pelos três diáconos. Belzequíades procurava a certeza em seus olhos ocultos sob aço e pano. Sabia o que pensavam naquele momento, por isso não se dava ao luxo de recuar o olhar nem mesmo um instante. Quando, enfim, o último dos mártires cruzou o velho portão os guardas o repuxaram com força e o colocaram novamente trancado. Rosália deu alguns passos e o lacrou novamente. Estavam agora nas mãos de Aqueron. — Descobri mais um motivo para os rostos cobertos — comentou Lázarus murmurando com um meio sorriso — Evita que eles cuspam na sua cara.

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Rixa - Parte V

Victor Lorandi

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a montanha onde o Templo dos Exilados se encontrava algo havia acontecido. Em cada degrau até o topo, sangue fazia das pedras armadilhas traiçoeiras e corvos sobrevoavam os corpos ali. No topo, perto da entrada, um estandarte estalava ao vento, o punho de metal da Ordem de Ferro em seu centro. Ao redor da abertura que levava ao coração do Templo, mais corpos estavam estirados, mas agora, além das figuras em armadura, alguns em vestes longas e mantos podiam ser vistos. Muitos deles tinham flechas cravadas em seus corpos e alguns estavam caído com profundos cortes. Os corredores internos fediam a cinzas, sangue e suor. Muitas passagens haviam sido bloqueadas por pedras pesadas, formando um labirinto. Em alguns pontos, alguns soldados ainda resistiam a seus terríveis ferimentos. Os gemidos dos sobreviventes podiam ser ouvidos pelos corredores. À medida que os corredores se tornavam mais apertados e cheios de corpos, os sons ainda eram de batalha. Gritos de aviso preenchiam o ar. Marcus olhava para a coisa no centro do salão com medo em seus olhos. Ele podia sentir a mão ardendo ainda, mesmo depois que Boller havia arrancado a carne negra e putrefata. Sua cabeça estava leve. Ele engoliu com dificuldade, sentindo a dor no que sobrou de seu braço. Boller e outros cavaleiros estavam rodeando a criatura no centro do salão, um enorme réptil com olhos flamejantes, língua bifurcada e chifres enormes. Ele tinha braços longos com garras afiadas e cuspia um líquido verde que derretia tudo que tocava. Seus rugidos faziam os dentes na boca de Marcus vibrarem. Boller parecia ter a situação sob controle, assegurando os outros cavaleiros que a solução era simples. A criatura, embora grande, não podia cobrir todos os lados de seu corpo. Eles estavam em maior número

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e aquilo contava tanto. — Não se afastem! Ele não pode encarar todos de uma vez! Mantenham seus escudos levantados. — Boller, espero que saiba o que está fazendo. — Um dos cavaleiros berrou do outro lado da sala. Marcus confiava em Boller, mas era óbvio que os outros cavaleiros não. Ele queria gritar a plenos pulmões que Boller era um homem de confiança. Eles tinham de acreditar nele. Enquanto os cavaleiros evitavam os ataques da criatura, Marcus notou algo interessante: ele reparou que sob a criatura, que parecia brilhar com luz verde cintilante, havia algo que parecia uma árvore e perto dela, um objeto estranho. Boller foi arremessado para trás por um golpe da criatura. Os outros cavaleiros se afastaram e começaram a se amontoar para entrar em formação defensiva. Boller gritou para que eles não o fizessem. Ele estava gritando com todas as suas forças, sua cabeça inteira parecia estar em chamas de tão vermelho que ele estava. — Senhor, tem algo embaixo da criatura. — Marcus gritou, agarrando Boller e ajudando o cavaleiro a se levantar. Boller olhou com atenção e pareceu ver aquilo também. — Sim. Posso ver. O que tem em mente, Marcus? — Se puder distrair a criatura, eu posso me esgueirar e tentar destruir aquilo. Boller olhou incrédulo para o escudeiro. — Mesmo se não estivesse ferido, isso seria perigoso demais. Não posso permitir que corra esse risco desnecessário. Podemos destruí-lo sem esse risco! — E se isso custar a vida dos outros cavaleiros? Não temos tempo

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para discutir. Eu posso passar por baixo dele se você desviar a atenção dele por tempo suficiente. Ele lançou um olhar à formação defensiva dos outros cavaleiros para saber que Marcus tinha razão. Uma cuspida daquela criatura e todos morreriam. Ele agarrou seu escudo e sua espada novamente e caminhou até a criatura. — Ei! Ei, sua cria de magos! Aqui! Olhe para mim quando falo com você! Ei! Ainda estou em pé. A criatura virou a cabeça e rosnou para Boller, virando o pesado corpo em seguida. Marcus começou a correr o mais rápido que seu corpo exausto permitia. Ele estava encarando o flanco direito da criatura agora. Boller estava com seu escudo erguido, seus olhos observando sobre a borda. A espada estava estendida atrás dele, preparada para golpear. O escudeiro começou a se mover com cuidado na direção do objeto sob a criatura. — Vamos, sua coisa horrível. Eu vou te esmagar com minhas próprias mãos. A criatura rugiu enfurecida e respingos de saliva atingiram Boller, queimando levemente sua pele, armadura e escudo. Marcus não viu hesitação no rosto do cavaleiro, que respondeu ao rugido com o seu próprio. Marcus voltou seu olhar ao objeto, notando então que era um medalhão do tamanho de um broquel. Ele começou a se rastejar sob a criatura, que parecia manter seu centro sobre o artefato. Ele podia ouvir os rugidos e estrondos das pancadas. Boller urrava de vez em quando e o som de metal sobre pedra soava ocasionalmente. O medalhão estava no chão, virado para cima, uma vibrante luz verde parecia emanar dele. Marcus puxou o espadim que carregava consigo e

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o cravou no medalhão. A criatura desapareceu deixando apenas cinzas para trás. Marcus se viu coberto de cinzas. Ele olhou na direção de Boller apenas para encontrar o cavaleiro coberto por cinzas. Os outros cavaleiros pareciam tão estupefatos quanto ele. — O que aconteceu? — um dos cavaleiros perguntou. — Magia. — Boller respondeu, embainhando a espada. — Acabou? — outro cavaleiro perguntou. — Não vejo mais passagens. Foi apenas então que eles notaram o que a criatura estava protegendo. No centro do salão, sob um facho de luz natural estava uma árvore. Era uma árvore antiga, cinzenta e retorcida. Parecia mais antiga do que qualquer outra coisa que qualquer um deles havia visto. Boller caminhou até a árvore. Em seus galhos secos estavam amarrados linhas de costura de diversas cores. Eles se ligavam, passando de forma harmônica entre elas. Era um trabalho inacreditável. Marcus estava logo adiante da árvore e se sentiu estranho por um instante. Como se a árvore estivesse olhando para ele. — O que é isso, Boller? O cavaleiro demorou a responder. Ele parecia estar analisando a árvore com calma, vendo os padrões intrínsecos dos fios que se entrelaçavam entre os ramos. — Magia. Sempre magia. Cavaleiros, queimem a árvore. Eu tenho de levar meu escudeiro a um curandeiro. Os outros cavaleiros começaram a preparar suas tochas enquanto Boller ajudava Marcus a levantar. — Por quê? — Marcus perguntou, confuso. — Isso é uma criação dos magos. Se destruirmos essa coisa, eles perderão parte de seus poderes, onde quer que estejam.

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Os outros cavaleiros estavam banhando os ramos mais baixos da árvore com óleo. Boller parou para assistir a árvore pegar fogo. Ele só continuou sua caminhada quando a árvore estava completamente consumida pelas chamas. Marcus poderia jurar que os fios, embora finos e delicados, não estavam queimando. O caminho de volta para a base da montanha foi árduo. Ele conseguiu caminhar até as escadas, mas teve de ser carregado por dois cavaleiros até a base. O resto do pequeno exército enviado por Pikkon estava esperando pelos sobreviventes com suprimentos e curandeiros. Marcus foi levado a uma das barracas de cura e Boller o acompanhou. Eles limparam o ferimento do escudeiro e removeram a pele morta do que restara de seu braço esquerdo. Boller parecia apressado em sair dali. Ele se virou ao rapaz e disse: — Descanse, Marcus. Pikkon vai ficar satisfeito com sua performance aqui. Eu vou dar um jeito de te manter. Era uma promessa vazia. Marcus sabia que sua carreira estava acabada. Na melhor das hipóteses, ele acabaria como um escriba no Castelo. Não era aquilo que ele esperava de suas aventuras. Não era aquilo que ele esperava da Ordem de Ferro. Mas era o risco que ele sabia que corria. Ele dormiu depois da operação, descansando tudo que precisava. Ele acordou com o som e cheiro de chuva. Sentou-se e examinou os braços. O direito estava coberto por bandages e ataduras. Ele se lembrava do talho que recebera de um dos magos durante a incursão. O braço esquerdo terminava logo após seu cotovelo. Ele não sentia dor, mas preferia não lembrar como o braço pareceu murchar e cair quando foi tocado pelo líquido verde da criatura na árvore. Ele olhou ao redor, mas não havia ninguém lá. Nem Boller. Tampouco

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esperava que estivesse. Boller era um homem com responsabilidades mais importantes que um escudeiro maneta. Afastando o pensamento depressivo de sua mente, Marcus levantou da cama e caminhou até a entrada da barraca dos curandeiros. O campo estava repleto de fogueiras açoitadas pelas finas gotas de chuva. Muitas conversas preenchiam o ar e o cheiro de comida se espalhava por todo o acampamento. Marcus pegou um casaco de peles que estava jogado sobre uma mesa ao lado da barraca e caminhou até a barraca de Pikkon, imaginando que Boller estaria lá, discutindo o próximo passo para a Ordem de Ferro. Seus pés estavam cobertos de lama quando ele entrou na barraca. O lugar era suntuoso e cheio de luzes fortes de lâmpadas a óleo. O chão era coberto de serragem e seus pés logo ficaram cobertos de raspas de madeira devido à lama. O lugar cheirava a frutas frescas e carne assada. Pikkon e outros cavaleiros estavam sentados a uma mesa com um mapa das regiões próximas, analisando o terreno. Um guarda veio na direção de Marcus. — Alto lá, garoto. Essa é a barraca do Comandante Pikkon. Você está perdido? — Não, eu sou o escudeiro de Boller. Estou procurando por ele. Pikkon notou a presença de Marcus no local e se levantou, pedindo um momento aos cavaleiros. Ele caminhou até o jovem escudeiro e abriu um sorriso amigável quando estava a seu lado. — Meu jovem, seu cavaleiro não está aqui no momento, mas não tenho intenção de expulsá-lo daqui em seu estado. Entre, sente-se àquela mesa e coma o quanto quiser. Marcus não negaria uma oferta como aquela. Ele caminhou em silêncio sob os olhares curiosos dos cavaleiros e sentou à mesa farta.

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Quando ele se virou para agradecer Pikkon, o homem estava com um prato em mãos e servia uma porção de carne e frutas. — Boller me contou sobre sua bravura, mesmo com seus ferimentos. Estou impressionado, jovem. Infelizmente seu cavaleiro está ocupado no momento e deve retornar logo. Até lá, se me permite, tenho de terminar algo. Sinta-se à vontade. Quando Boller retornar, podemos conversar com calma. Marcus não disse nada. Pikkon sorriu novamente e partiu, retornando à mesa rodeada de cavaleiros. Eles voltaram a falar sobre estratégia e problemas nas fronteiras ao norte e leste do Castelo. Enquanto ele comia, ouvia um ou outro comentário preocupado dos cavaleiros. Eles temiam uma guerra civil sem fim, que afundaria os reinos em uma depressão econômica sem igual. Pikkon insistia em manter a calma e dizer que tudo estava indo bem, que eles deveriam permitir que os Reinos se separassem se necessário. Era hora de começar a escolher os territórios onde a Ordem teria uma presença ativa. Apoiar todos os Vinte Reinos seria impossível e Pikkon não tinha intenção alguma de destruir o sonho da Ordem ao torná-la aberta a mudanças internas. Aquele discurso soava estranhamente familiar aos ouvidos de Marcus, mas ele não sabia dizer de onde havia ouvido aquelas palavras antes. Ele comeu tudo que pode até se sentir satisfeito. Após uma longa discussão sobre territórios, economia e outros problemas nas fronteiras, os cavaleiros partiram, deixando Pikkon e Marcus às sós com os guardas. Marcus se levantou e caminhou até a outra mesa, onde um mapa dos Vinte Reinos estava encrustado na face e outros mapas menores e mais detalhados de cada reino estavam espalhados. — Interessado em política, escudeiro?

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— Nem um pouco, senhor. Sou mais interessado em mapas. Sempre os achei fascinante. Pikkon examinou Marcus dos pés à cabeça. — Ninguém esperava aquilo de você, meu jovem. Nem mesmo Boller. Você não era o melhor escudeiro do Castelo, se bem me lembro. Parece que o Senhor Boller é capaz de moldar até a mais bruta pedra. Ele moldou um homem digno. Mas seus testes estão apenas começando. Ainda há muito a se fazer se pretende seguir o mesmo caminho de seu mentor. Marcus engoliu em seco. A pressão que ele sentira ao ouvir pela primeira vez que seria o escudeiro de Boller retornou. Ele ainda lembrava do evento como se tivesse sido ontem. Boller entrou enquanto Marcus sonhava com o dia em que ele conheceu o cavaleiro. — Pikkon. Marcus. Ótimo, estamos todos aqui. — Venha, Boller. Marcus está bem alimentado e a salvo agora. Não tivemos tempo de conversar, mas agora temos todo o tempo que o mundo pode oferecer. Com o fim dos magos, podemos começar a reconstruir os Reinos. Boller foi até a mesa com uma expressão séria em seu rosto. — Ainda não acabou. Pikkon se endireitou na cadeira. — Do que está falando, Boller? Boller sentou e apontou outra cadeira para Marcus. — Os batedores encontraram pegadas. Centenas. Em todas as direções, exceto a nossa. Eles foram avisados. Eles escaparam. Pikkon fechou os olhos e respirou fundo. — Como isso é possível?

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— Eu não sei. Alguém avisou eles, talvez meu irmão. Se você tivesse me mandado atrás dele poderíamos ter evitado isso. Pikkon bateu a mão contra a mesa. — Eu já disse que seu irmão não é importante. Ele não é uma ameaça. Ele não sabe o que fazer com magia. Esqueça ele. — Então como você pode explicar isso tudo? Como pode explicar tantos magos que escaparam? E tem mais, algo está errado aqui. — Do que está falando, Boller? — Estes magos que matamos? Nunca vi magos mais poderosos. Marcus sentiu seu estômago afundar. Pikkon empalideceu. — Como assim? — Marcus perguntou. — Eu enfrentei muitos Reis Magos e seus aprendizes. Eu vi o Rei de Fogo carbonizar um cavaleiro com sua magia. O que eu vi aqui é muito pior. Cada um desses magos era pior do que qualquer Rei, Pikkon. — Isso é impossível. Os Reis Magos eram os poderosos, não? — Marcus perguntou. Mas ninguém respondeu. Pikkon estava com as mãos entrelaçadas diante de seu rosto. As veias em seu pescoço estavam saltando e vibravam regularmente. Ele estava furioso. — Nós vamos encontrar todos os magos e matar todos eles, Boller. Mesmo que isso dure uma vida inteira. Ou até mesmo mais. — Eu preciso encontrar Toras, Pikkon. Deixe-me ir atrás de meu irmão. Eu tenho certeza de que ele esteve aqui. Se eu puder me concentrar no meu irmão, posso eliminar a maior ameaça que temos: um traidor no meio de nossos inimigos. Pikkon começou a esfregar as mãos freneticamente. Ele não sabia o que fazer. Era uma situação nova para ele, ou pelo menos assim parecia para Marcus.

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— Eu vou pensar, Boller. Estou considerando seu pedido seriamente. Mas creio que devemos nos tranquilizar por hora e passar a outro assunto. — O que pode ser mais importante do que caçar meu irmão, Pikkon? Nós já perdemos homens suficientes procurando pelo ninho de magos. Agora eles estão espalhados e aquela árvore maldita está destruída. Tenho certeza de que nenhum deles representa perigo algum para nós. — Talvez. Mas no momento, precisamos decidir o futuro de seu jovem escudeiro. Infelizmente seu ferimento é grave demais para que ele siga em seus passos, Boller. Os dois homens olhavam agora para o pequeno Marcus. Ele estava pálido, seus cabelos ressecados espichavam para todos os lados e suas roupas eram folgadas em seu corpo diminuto. Marcus não era particularmente forte e agora lhe faltava também um braço. O escudeiro não tinha esperanças de sobreviver naquele mundo de guerra. — O que você tem em mente, Pikkon? — Talvez exista uma solução. Ou duas. Marcus sentiu um pouco de esperança naquele momento. Os dois homens ainda o olhavam. — No fim, entretanto, a escolha é de Marcus. Não podemos decidir seu futuro. Jovem, o que você gostaria de fazer? — Pikkon perguntou, apoiando-se sobre a mesa. — Eu gostaria de me tornar um cavaleiro, Senhores. Eu quero lutar contra as injustiças nos Reinos. — Nunca ouvi resposta mais digna de louvor. Boller, você escolheu bem seu escudeiro. — Com isso decidido, podemos voltar ao assunto de meu irmão? Marcus sentiu uma pontada, sentindo-se completamente ignorado por Boller, que parecia mais preocupado do que nunca com seu irmão.

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Pikkon o encarou, medindo o cavaleiro antes de responder. — Muito bem. Prepare-se bem, pegue quantos cavaleiros precisar e parta quando lhe for conveniente. — Eu posso ir sozinho. — De jeito nenhum, você vai levar pelo menos uma tropa com você. Marcus olhou para o toco que antes fora seu braço. Em sua mente, uma imagem apareceu clara como a luz do dia. — Senhor? — ele chamou a atenção dos dois cavaleiros. — Acho que para essa missão, quanto menos pessoas, melhor. Uma marcha demoraria demais e chamaria atenção. Se queremos pegar Toras, devemos ser discretos. Boller pareceu sorrir por um instante. Pikkon, entretanto, pareceu contrariado. — Você tem de levar apoio com você, Boller. Se você encontrar magos com seu irmão, vai precisar de ajuda. — Eu posso levar Marcus. Assim que ele estiver melhor, nós partiremos. Pikkon balançou a cabeça e sentou novamente. — Boller, você não vai parar de insistir nisso, não é? — Não, senhor. — Então eu desejo sucesso em sua busca. Vocês têm minha permissão para a caçada. Vão e voltem em segurança. A Ordem de Ferro conta com vocês. Marcus se sentiu satisfeito. Ele não podia conter o sorriso. Boller, no entanto, tinha um olhar estranho, quase demencial. Marcus se perguntou se era a coisa certa a se fazer, mas era tarde demais para mudar de ideia. Sua preocupação agora era outra. Como ele faria com apenas um braço o que não conseguia com dois?

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Problema

A

Edison Petter

gora já consigo organizar as minhas ideias. Este relato funciona como um exercício mental.

Lembro de Bilvien. Bilvien era um homem que gostava de ter as coisas sob seu controle. Não assistia muitos filmes, nem lia muitos livros, mas quando o fazia preferia os estúpidos e previsíveis; assim reafirmava a sua superioridade. Uma obra de ficção que certamente tinha mais conteúdo e nuances do que ele conseguia perceber o deixava desconfortável. Bilvien não usava o seu primeiro nome porque este era um nome comum (existiam poucos Bilviens no mundo, e encontrar algum deles não era algo que lhe agradasse), e porque “Bilvien” lhe dava a sensação de responsabilidade. Bilvien pensava na corrente de Bilviens que existiram desde as cavernas para que ele existisse, e tinha certeza que nenhum deles havia chegado à diretoria do departamento de contabilidade. Era nisso que ele pensava, esparramado na grande cadeira que ficava sobre um chão ligeiramente elevado, sorridente para o vazio, enquanto eu contava às últimas novidades sobre o Problema. Este homem Bilvien era o meu chefe, e a sua fisionomia voltou à habitual contorção negativa (a sua boca fazia um “n”) quando eu o puxei para o mundo real. O Problema era bastante real. Eu estava contando os acontecimentos recentes em um tom de voz monocromático quando, de olhos fechados e expressão fechada, Bilvien estendeu a mão em um sinal modesto para que eu me calasse. — Você sabe o que eu espero de você. — disse Bilvien, de forma conclusiva, como se aquilo solucionasse tudo, nao só no seu apertado

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Problema

Edison Petter

gabinete (menor do que muitas cavernas), mas também todas as questões existentes fora dele. Esperei um pouco, e quando notei que não havia mais nada, disse: — Assumir responsabilidades. — Exato. — disse ele, desta vez com uma falsa paciência, em tom sólido. Retirei-me, sentindo-me realmente estúpido e inconveniente, o que me pareceu contraditório, quando sabia, em uma verdade paralela (paradoxalmente acreditava em ambas) que eu não era nada disso. Saí do gabinete, passando pela série de mesas que eram a única coisa realmente alinhada no departamento, e fui à rua. Descreverei brevemente o estado da cidade. Não posso mais vê-la, mas agora a imagem me vem nitidamente: penso que o posicionamento das mesas do departamento seja também a única coisa em ordem no país inteiro. Não existe um pedaço de chão desperdiçado, e, não tendo mais terra, o jeito é subir. Os mais ricos moravam em coberturas, e, com o tempo, começaram a criar pontes finas e conexões entre seus apartamentos para que não precisassem descer do Olimpo. Estas conexões entre altos apartamentos se tornaram ruas, e hoje os Altos tem sua própria pequena cidade entre as nuvens. Eu, que lá nunca fui, na época em que se passa esta narrativa, morava sob uma ponte massiva, à beira de um rio — quando a falta de espaço se tornou um claro problema, o rio e as zonas mortas sob as pontes foram preenchidos por blocos de moradia retos e iguais; já não se vê mais o rio; a construção instantânea de prédios no meio das avenidas também acontece, apesar de ser ilegal, o que não significa muito, já que

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a lei aqui não passa de etiqueta. A noite eterna nos bairros sob pontes, além de depressão e suicídio, atrai tudo que não quer ser notado. Talvez por isso o Problema tenha surgido ali. Andei alguns quarteirões sob o sol irritante da tarde e, atravessando a linha entre dia e noite (um terminador solar preso no tempo), por fim cheguei à sombra da ponte 529, no meu bairro, na hora única. O prédio 289 (o número se alonga quase ao infinito, então o cortamos aqui, como o Pi) vermelho era um filete fino de concreto que subia até encostar na parte de baixo da ponte, no breu. Dei uma olhada pra cima, mas não vi topo. Lá dentro, em algum buraco, estava Opin. O porquê de o prédio ser vermelho: alguns séculos atrás entendeu-se que tudo era muito cinza, e que isso poderia amenizar os suicídios, que eram uma epidemia silenciosa (e por isso tão pior). Já que mudar o céu morto de cor seria um tanto complicado e as pessoas se recusavam a usar roupas gritantes, os prédios foram coloridos. A cidade arco-íris durou um tempo, até que uma grande depressão (desta vez econômica; não posso deixar de mencionar a ironia desta palavra estar tão presente em um ambiente tão vertiginoso) transformou a tinta e os problemas da mente em superficialidade (é preciso curar o coletivo antes de pensar no indivíduo, dizem por aqui). Os prédios se tornaram unhas mal cuidadas. Digo isso porque hoje a tinta colorida dos prédios é descascada como o esmalte vermelho antigo em um pé feminino, que acaba parecendo ter pequenas feridas. Voltando a Opin: precisei recorrer a ele pois a polícia é escassa e dificilmente pisa no térreo da cidade. Subi as escadas apertadas, roçando os ombros contra as paredes, pisando nos degraus que de tão gastos que já haviam formado uma concavidade no formato de pés. No escuro, torcia

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para que ninguém viesse na direção contrária. Perto do final, as escadas se tornavam quase um túnel, obrigando o escalador a se agachar; essa posição humilde parecia já preparar quem subisse para uma submissão a Opin. Opin era um dos ratos, o povo que construía tocas ilegais no interior da ponte, como bernies. E como acontecia com a carne invadida por larvas de mosca em excesso, o concreto da ponte já prometia ruir, matando todos que moravam em cima, no meio e embaixo da 529. Bati numa porta de metal. O visor dela foi puxado e, no retângulo, apareceram dois olhos orientais muitos sérios com cílios longos que me atiçaram a curiosidade, mas que nunca mais vi. O visor se fechou novamente e eu esperei. Cada segundo que passava reforçava a impressão de que algo lá dentro estava sendo preparado. Quem abriu a porta foi Opin, miúdo e de rosto pontudo. Recebeu-me com o sorriso largo habitual que poderia significar qualquer coisa. Comia biscoitos. — O que lhe trás à Toca? Sentei-me no sofá com calma, mas com uma provável aparência acanhada. — É o Problema, Opin. Já lhe paguei, inclusive. Se lembra? O sorriso fugiu. Foi até uma escrivaninha e dali puxou uma arma. O meu espanto foi incalculável. Veio até mim. — Tome.

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Recebi a arma sem falar. Guardei-a enquanto via Opin andar de um lado para o outro, pensando antes de falar, o que era algo incomum. Opin tinha uma necessidade de se impor, não só por causa da sua baixa estatura e seu ramo de negócio arriscado, mas também por causa de antigas experiências de subordinações vergonhosas que agora passavam muito rapidamente pela sua mente. — Não pretendo me envolver. Aquilo afeta a cabeça. Dizem, — engoliu mais um biscoito. – Que faz a pessoa escutar coisas. Para demonstrar que não estava sendo fraco, não me deixou ir embora sem antes colocar uma arma na minha boca e exigir discrição. Talvez o que me aconteceu depois tenha algo a ver com o que Opin falava. Envolvi-me em uma briga. Fiquei com a impressão de que um barman me ignorava, atendendo a outros antes de mim (a minha voz não é muito contundente). Em um impulso que depois não entendi, mas que na hora parecia ser a única verdade, lhe dei um soco que resultou em uma convulsão de outros socos e chutes e cadeiras. Vamos então à questão principal. Os problemas são um fenômeno dos mais interessantes: pessoas que surgem sem explicação, muito raramente. Um dia um senhor decide limpar o seu porão e, ao entrar no local, se depara com um homem esquisito, levemente azul: um Problema. Outra vez, alguém tira a lona de uma piscina coberta para o inverno e lá no fundo está mais um deles. Em uma rara árvore, embrenhado entre folhas e galhos, tão imóvel que por um tempo é tomado por parte da paisagem, está outro. (Neste caso em especial, alguns turistas, que nun-

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ca haviam visto uma árvore, pensaram que fosse algo natural a existência de homens azuis dentro de árvores.) Não há solução. Parecem catatônicos, de início. Aos poucos vão recuperando a consciência e o movimento, e inclusive começam a falar, com fragmentos de memória e consciência, de um mundo mágico. As pessoas normais (do nosso mundo) se animam, mesmo que ainda temerosas, e logo querem saber mais. Mas a conexão entre os dois mundos está fadada ao fracasso. Com o retorno da consciência também vem algo mais. A princípio, ao olhar para as criaturas (que parecem homens como nós, exceto pela total falta de pêlos, ornamentos, expressão e globos oculares), temos na visão um desfoque natural, que logo evolui para uma visão cruzada. Com o tempo, junto com o retorno de consciência, as criaturas passam a exercer o efeito disforme sobre os objetos a sua volta. O diâmetro de influência parece aumentar aos poucos, logo deteriorando metros de tudo, e, mesmo que seja triste interromper os relatos de um mundo distante, somos obrigados a sacrificar o Problema. Devo agora dizer que as histórias foram sempre um prazer, mas por isso também um empecilho para mim. Tivesse eu o ímpeto pelos números ou pela política que tenho pelos contos fantasiosos, estaria hoje vivendo nos andares elevados. Caso fosse menos interessado em anedotas alheias, não teria me envolvido em sérios problemas. Arrisco dizer ainda que já me envolvi em situações absurdas e perigosas só para ter o que contar aos outros no futuro. Por isso, custo a acreditar que a criatura de outro mundo tenha me encontrado por coincidência. Foi no lugar que nunca acorda.

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Dentro do meu banheiro. Aproximei-me e vi, mesmo sob a luz fraca, que tinha uma pele levemente azulada. A princípio, devido a pouca luz, pensei que seus olhos estivessem cobertos pelas sombras, mas quando aproximou o rosto sem expressão vi que não existiam. Tranquei-o ali. Pensei em possíveis resoluções, pedi conselhos. Para Bilvien, sempre trabalhei como alguém que resolvia problemas. Agora me via com um que tinha como única aparente solução um fim insatisfatório. Pedi conselhos. Bilvien se mostrou muito interessado em conhecê-lo, mas, quando veio ao apartamento e viu a criatura imóvel, logo perdeu interesse e foi veemente ao afirmar que eu deveria matá-la. Neste tempo, enquanto dormia no quarto ao lado do banheiro, a minha mente também deve ter sofrido uma deformação da realidade, mesmo que eu não a percebesse nitidamente – às vezes me parecia que alguns pensamentos meus tinham um ar de estranheza estrangeira, como se eu roubasse pensamentos alheios sem notar. Só posso dizer que a abóbada craniana já não me parecia mais tão sólida. Agora ele falava um pouco. Havia perguntado o meu nome, mas eu não respondi – não me comuniquei com ele em nenhum momento. Quando as linhas das lajotas do banheiro começaram a se tornar um emaranhado, como uma teia de uma aranha irregular que ignora a sua simetria instintiva, vi que não podia esperar mais. (Só quando vi este efeito entendi a harmonia que existe até em uma cidade como a nossa.) Na manhã seguinte, com arma em mão, ouvi a voz por trás da porta. Ele falava para si mesmo, talvez como parte do processo de recuperação de memória. De certa forma, redescobria a própria história ao mesmo tempo que eu. Disse que a viagem entre realidades era um choque do

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qual ainda não se recuperara por completo, e que seu corpo não sobreviveria a um segundo impulso (ao retorno), mas que mesmo assim precisaria voltar (levando tudo com ele). Escutei contar de um mundo que jamais poderia ter sido, mas que, mesmo assim, era surpreendentemente plausível, na sua própria forma absurda. Não o descrevo aqui porque é como um daqueles conceitos quase abstratos que conseguimos entender (ou acreditamos entender), mas que jamais dominamos por completo ao ponto de conseguir reproduzir quando somos questionados por terceiros. Começou a contar a história de tudo. Relatava em um tom melancólico, como que se descrevendo algo perdido. Continuava, abrangendo seus assuntos: geografia, história milenar, estranhos pensamentos filosóficos. Quando começava a descrever uma biblioteca de estrutura muito peculiar me dei conta de que a desordem dos átomos já havia atingido todo o meu apartamento. Fui à janela: apenas o horizonte se mantinha intacto. Abri a porta do banheiro. Apontei a arma para ele que não tinha olhos nem reação. Neste momento começou a resumir cada um dos livros da biblioteca do seu mundo de forma absurdamente casual. Não pude fazer nada a não ser me sentar ao seu lado e escutar enquanto o mundo se tornava uma série de nós. Quando o caos era total e a única coisa que eu conseguia discernir era a voz, tudo sumiu.

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Bardos e Trovadores são comuns nas histórias medievais. Muitas vezes podendo ser os narradores da história, ou simplesmente um personagem que visa encantar a todo o grupo. Entre os autores que usaram de Bardos para abrilhantar suas histórias temos Tolkien. Mas de onde surgiu a base para estes personagens? Estes personagens remontam os trovadores provençais, músicos-poetas que fundaram as bases da literatura poética e música ocidental.

Origens O Trovadorismo, segundo registros históricos apontam, tem a França como principal polo irradiador dessa cultura, onde apresenta duas vertentes distintas, pela linguagem e por suas características. Na frança do Norte, os “trouvère”, cantando na langue d’oil as primeiras canções épicas (de gesta). No sul occitano o subconjunto “provençal” dos “troubadours”, da langue d’oc, parte para o amor cortês. Um dos grandes mistérios para os historiadores, ainda é o motivo que levou os trovadores provençais a chegarem ao amor cortês. Não existe nenhum consenso entre estes estudiosos, porém, é possível indicar dez teorias mais aceitas.

Hipótese Hispano-árabe: Levanta a tese de que a poesia trovadoresca teria recebido influência dos Mouros através da guerra da reconquista.

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Muitos deles teriam sido feitos prisioneiros por cavaleiros que retornavam da guerra. Trazendo consigo a estética de uma poesia carregada de palavrões e erotismo, registrada no povo árabe a partir da segunda metade do século IX.

Hipótese Mariana ou Cristã: De acordo com esta teoria, foi à teologia defendida por Bernard de Clairvaux e a cada vez maior importância de Maria para os cristãos, que culminou na ocorrência do amor cortês no sul da frança. Principalmente a ênfase sobre o amor espiritual e religioso, desinteresse, misticismo e devoção a Maria explicariam o amor cortês. A ênfase da reforma de Robert de Arbrissel no matrimônio poderia explicar a ênfase no tratamento respeitoso, dos trovadores para com as mulheres. Cronologicamente, no entanto, esta hipótese é insustentável, pelo seguinte motivo: Todos estes fatos tiveram ocorrência e relevância, em um momento posterior ao surgimento dos trovadores provençais. Entretanto não se descarta de maneira alguma esta hipótese, devido aos seus fortes argumentos que poderiam levar a análise de um pensamento se desenvolvendo de maneira uniforme.

Celta ou Cavalaria-matriarcal: A origem do trovadorismo poderia ser explicada pela sobrevivência de valores sexuais, costumes e códigos pré-cristãos. Estes valores oriundos sejam eles de sociedades: Celtas, germâni-

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cas ou pictas (sociedade que deu origem ao povo escocês), explicariam ideia deste amor um tanto quanto mais respeitoso, do que o amor “bruto” medieval.

Latina Clássica:

Enfatiza paralelos entre o poeta Ovídio, especialmente em seus poemas “Amores” e “Ars amatoria”, e a temática provençal. Nesta teoria se acredita que o trovadorismo teria surgido de uma influência do período clássico. Com o “aetas ovidiano” predominando na região de Orléans, o “quasi ciceroniano” dominante na corte imperial, e uma relativa influência de Platão nas outras regiões por onde o estilo se espalhava.

(Cyrpto-) Cátaros: Segundo a tese, a poesia trovadoresca é um reflexo da Doutrina Cathar. A teoria se apoia pelo relato tradicional do declínio dos trovadores, que coincide em período com a supressão do catarismo, durante a “Cruzada dos Albigenses”, na primeira metade do século XII. Entretanto, o significado explicitamente católico da poesia de muitos trovadores trabalha contra a teoria.

Litúrgica:

A lírica trovadoresca seria um desenvolvimento da liturgia cristã e dos hinos. Apoia-se na possível existência de um precedente latino, fundado na igreja, onde muitos trovadores teriam encontrado sua for-

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mação na escrita e na música. Entretanto, não há registro algum de um possível antecessor latino com as mesmas características do trovadorismo. Porém, o registro do forte aprendizado musical dos nobres na igreja, como a exemplo da escola musical da abadia de Saint Martial, em Limoges, sustentam a tese. Feudal-social ou sociológica: Na realidade um conjunto de várias teorias relacionadas, ganhou terreno no século XX. Se apresentando mais como uma abordagem metodológica para questão do que uma teoria. Ela não pergunta de onde vem o conteúdo ou a forma da letra, mas sim em que situação ou circunstância estas surgiram. Sob a influência do marxismo, os cientistas sociais Erich Köhler, Marc Bloch, e Georges Duby sugerem que a “hegemonia essencial” no castelo da esposa do senhor durante sua ausência, funcionou como força motriz para o movimento. O uso das terminologias e tratamento para com a “Senhora” é vista como principal prova para a teoria.

Folclore ou Ritual de Primavera: De acordo com María Rosa Menocal, em 1883, Alfred Jeanroy foi o primeiro a sugerir que o folclore e a tradição oral deram origem à poesia trovadoresca. Esta teoria já foi amplamente desacreditada, devido a ausência de detalhes que a sustentem. Entretanto, a descoberta dos Kharja, gênero lírico da região de Al-Andaluz, levanta a questão da extensão da literatura, no século XI e anteriores.

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Latim Medieval ou Mediolatina (goliárdica): Hans Spanke foi quem analisou a relação intertextual entre vernáculo e latim medieval, como as canções dos clérigos goliardos, que escreviam poesias satíricas medievais. Apoiada por Reto Bezzola, Peter Dronke e o musicólogo J. Chailley, a palavra trobar, significaria “inventar um tropo”, o tropo seria um poema onde as palavras teriam um uso diferente do comum, ou seja, metáfora e metonímia. Estes poemas passariam por uma série de modulações terminando em uma música litúrgica. Em seguida, o tropo se tornou uma peça autônoma organizada em forma de versos. A influência dos poetas do final do século XI da “escola Loire”, como Marbord de Rennes e Hilbdebert de Lavardin, que tinham como principal característica temáticas extremamente próximas da trovadoresca, é enfatizada nesta conexão.

Neoplatônica Esta teoria é uma das que mais enfatizam a intelectualização. Analisando a poesia do amor cortês, como um “efeito enobrecedor do amor” diretamente influenciado pelo pensamento neoplatônico. Neste pensamento, se busca autorrealização, usa-se muito a linguagem simbólica, existe uma conversa indireta entre o homem finito e o ser supremo. Características estas, que após certa reflexão podem ser

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vistas nos poemas trovadorescos. Esta teoria também é muito apresentada em conjunto com a Arabista ou dos Cátaros, uma vez que a filosofia neoplatônica, influência ambos os povos.

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É quase um sonho de todo autor. Mudar o mundo com suas palavras. Em parte, qualquer um que sonhe em ser um autor de sucesso crê que sua visão de mundo deveria ser mais conhecida, mesmo que estejamos falando de autores de fantasia ou de ficção científica. E a forma como os autores de ficção encontram para alterar o que lhes cerca é sutil e poderosa: criando uma temática para suas histórias. A temática profunda e arrebatadora é quase uma instituição da ficção científica. Praticamente todas as histórias do gênero tentam criar um debate, seja sobre o futuro da humanidade ou sobre a ética em torno de uma tecnologia. Ao escrever uma história com foco na tecnologia de clonagem, por exemplo, é quase impossível evitar o debate sobre se isso deve ser feito, se devemos clonar seres humanos, quais seriam as imposições éticas, e é quase impossível evitar o uso da frase “brinca de deus”. Questionar se determinada tecnologia não está além da moral humana e invadindo a divina, aliás, é quase uma constante. Em Blade Runner, o filme baseado na obra “Andróides Sonham com Ovelhas Elétricas?”, o discurso final do vilão deixa bem claro que ele, um ser criado pelos humanos, sente o pesar de sua criação e o fato de ter sido diminuído ao que é naquele momento. Ele diz ter visto coisas magníficas. Não vou me estender muito quanto ao discurso, porque a obra em si merece ser apreciada. Se não viu o filme ou não leu o livro, recomendo que faça ambos. Mas mesmo quando o questionamento é menos do que divino, ele pode ser social. Em Total Recall, que foi nomeado no Brasil como “O Vingador do Futuro”, discute-se as vertentes da memória humana e até onde a tecnologia deve mexer com a implantação destas. A discussão,

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no caso, é social: com a tecnologia disponível, seria mais fácil manipular pessoas? Valeria a pena perder essa autonomia apenas para ganhar uma ilusão que parecesse 100% real? Como eu disse na minha coluna em que apresentei os elementos da ficção, a temática não é uma obrigação do autor. Entretanto, não planejar uma pode apresentar o perigoso efeito de que uma surja fora do nosso controle. Ao contar uma história sobre, por exemplo, uma jovem indefesa que tem que ser salva por um intrépido príncipe, você terá que acatar se algum leitor, eventualmente, decidir que sua obra é uma ode a figura machista de que as mulheres devem ser protegidas e os homens é que tem o poder de as procurar. Talvez sua intenção fosse simplesmente contar uma história de amor. Mas uma vez que suas palavras estejam impressas e publicadas, não cabe mais a você as interpretar. Mas ao contar uma história, você não precisa, necessariamente, doutrinar os leitores. Talvez seja do seu interesse contar uma história que seja uma crítica completa ao sistema bancário mundial. Ou talvez você apenas queira criticar a ganância que vê na maioria das pessoas. A diferença entre uma temática e outra é simplesmente a profundidade temática, que é maior na primeira escolha. A profundidade temática tem como característica limitar as possibilidades da história, o que pode não ser tão ruim assim. Afinal de contas, muitas vezes é mais fácil contar uma história se há poucos rumos a se seguir. Muitas vezes ao se encontrar presos em um momento da história alguns autores preferem aprofundar a temática já estabelecida, de forma que a limitação de possibilidades tome as decisões por eles. Ao contrário do que possa parecer, isso pode melhorar muito a qualidade de uma

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obra. Mas todo autor deve ter cuidado ao selecionar um tema. Aprofundar-se demais ou insistir repetidas vezes no mesmo conceito da temática pode levar o leitor a crer que está sendo doutrinado, e isso é (e deve mesmo ser) repudiado. O trabalho do autor ao decidir contar uma visão sobre algo não é obrigar os outros a crer em sua visão, e sim dividir a sua com outras pessoa, de forma que elas possam somar na delas elementos que pertenciam originalmente ao pensamento do autor. E assim, pouco a pouco, o autor pode mudar algo que não gosta no mundo.

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EDITORES-CHEFES LUCAS RUELES RAFAEL MARX

EDITORES SEMANAIS ERIC PARO JOÃO LEMES LUIZ LEAL DIOGO MACHADO

DIAGRAMADOR JOÃO LEMES

REVISOR ANDRÉ CANIATO

REDATOR ALAN PORTO VIEIRA


AUTORES: SEMANA FANTÁSTICA

SEMANA HORROR

Fantasia Épica: Marlon Teske

Horror: Amanda Ferrairo

Espada e Magia: Victor Lorandi

Noir: Philippe Avellar

Semana Científica

SEMANA FANTASIA MODERNA

Ficção Científica Social (Cyberpunk): Steampunk: Rafero Oliveira Alaor Rocha Ficção Científica Space Opera: Rodolfo Xavier

Fantasia Urbana: Thiago Sgobero



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