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ROCCO BRAVO
QUERIDO DOUTOR Série Querido Doutor Livro Um
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Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra pode ser reproduzida ou transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem autorização escrita do autor. Esta é uma obra de ficção. Os fatos aqui narrados são produto da imaginação do autor. Qualquer semelhança com nomes, lugares, fatos ou situações da vida real deve ser considerado mera coincidência. Título: Querido Doutor Literatura Boyslove/ Homoerótica |Série, volume 01. Copyright © 2017 by Rocco Bravo
Publicação Independente
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Para os meus incrĂveis leitores Amo todos vocĂŞs XXOO
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PRÓLOGO Atlanta, Geórgia O hospital estava lotado naquele dia. Havia doentes e pessoas morrendo. A jovem Victória Spinnet estava para dar a luz ao seu filho. Ela gritava de dor na maca encardida do hospital. — Por favor. - pediu ela. — Alguém me ajude. O Dr. Julian Hubert levou a jovem Victória até a sala de cirurgias. Ela ia ter um parto normal. As enfermeiras corriam de um lado para o outro com compressas e panos. — Respire fundo. — disse Meg à enfermeira chefe. — Assim você ajuda seu filho. Victoria assentiu com a cabeça. Tudo que ela queria era que seu jovem Allen nascesse sem nenhuma complicação. — Preciso de mais panos aqui. — pediu o Dr. Julian. — Anda. Uma enfermeira trouxe os panos correndo, não queria deixar o Dr. Julian mais nervoso ainda. A criança não conseguia sair. — Preciso de soro. — pediu o doutor. As enfermeiras trouxeram o que o doutor pediu. O cordão umbilical havia se enrolado em volta do pescoço da criança. — Ai meu Deus. — pediu Julian. — Essa criança precisa sobreviver. E Deus escutou seu pedido. O pequeno Allen nasceu. Era uma criança pequena. Pele pálida, cabelos louros castanho. Victoria chorava de emoção. — Me deixe pegar meu filho. — pediu ela. O Dr. Julian entregou a criança nos braços de sua mãe. Ela começou a chorar de emoção segurando seu filho. —Meu pequeno Allen. — disse ela. A criança parou de chorar de súbito. Victória Spinnet encarou a criança. 6
— Doutor ele não está respirando. — disse ela desesperada. — Doutor ele não está respirando… ajude meu bebê. O doutor pegou a criança. Justamente o bebê não estava chorando. Era estranho aquilo. Julian começou a fazer os passos de emergência na criança. Ela voltou a respirar… e o choro veio junto. — Essa criança nasceu prematuramente. — disse o médico. — Desculpe mãe precisaremos levá-lo até a incubadora. — O quê? — perguntou Victória. — Essa criança tem complicações no pulmão. É nítido isso. — explicou Julian Hubert. *** Dois meses depois. Victória Spinnet finalmente levou seu filho do hospital infantil de Atlanta para seu apartamento. O pai do bebê havia abandonado Victória assim que soube que ela estava grávida. Foi um sufoco. Mas a avó de Allen, a hilariante senhora Angeli Cornwell Spinnet havia se idealizado a cuidar do jovem Allen. — Que gracinha. — disse Angeli ao ver o neto pela primeira vez. — Parece com… — O pai. — completou Victória. — É. — concordou Angeli. — Nós seremos muito felizes sem o traste do Will. — disse Victória. — Tomara. — disse a Sra. Cornwell. *** Dez anos depois. No dia em que tive o diagnóstico sobre o meu câncer parecia que o mundo estava acabando. Mas não foi tão horrível assim. Fiquei internado durante dois meses… e finalmente depois de duas 7
tomografias pulmonares o Dr. Julian, meu médico desde que eu nasci, disse que eu estava com um simples câncer no pulmão. Minha mãe chorou durante dois dias. Ai as quimioterapias começaram, sorte que meu cabelo não caiu. Mas não fui para a escola aquele ano. Minha vida é digamos… solitária. Mas eu tenho o meu gato, Morango para me ajudar nos dias mais difíceis, apesar de que um dia eu quase morri ao engolir um pelo dele. Agora minha mãe não trabalha mais. Vivemos na casa da minha avó em um bairro nobre. *** Três anos depois. Bom, Dr. Julian Hubert avaliou meu caso e disse que há um tratamento em uma cidade no interior de Dakota do Sul. Minha mãe sonha com minha “cura” total. Estamos em seu Ford Fiesta rumo a essa cidade que contém a cura para minha doença.
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CAPÍTULO 1 A orientação sexual de um adolescente é bem fora do comum. Se você é hétero todos te aceitam. Se você é gay, você é discriminado pela população e até mesmo pelos próprios familiares. No meu pensar, eu não sou gay. Mas já senti fortes atrações por outros homens. Mas com aquele fora diferente. Com o meu doutor foi algo novo. Aí que eu descobri que eu era gay! *** Aquela cidade na Dakota do Sul era algo novo para mim. Pessoas novas. Amigos novos e um tratamento novo. Eu tenho câncer. E pessoas com câncer precisam dormir. Eu sempre achei que minha mãe lê muito A Culpa é das Estrelas. Vendo o drama da personagem Hazel Grace ela acha que eu deva ser igual. Mas eu não sou igual à minha amiga/personagem Hazel Grace. — Você só precisa dormir. — disse minha mãe. E foi o que eu fiz. Toda há minha primeira semana naquela cidade foi dormindo. Dormir era gostoso. Mas quanto mais eu dormia, mais vontade de dormir eu tinha. *** Acordei definitivamente na segunda feira da segunda semana naquela cidadezinha. E minha mãe já me levou até o centro comercial. Lá demos uma volta pelas lojinhas, e parei em uma livraria. Vi que lá tinha a continuação da minha saga literária preferida. O Trono do Sol, de S. L. Farrell. Amo aquela história. Comprei o último livro que faltava para completar minha coleção. E depois eu e minha mãe fomos a uma lanchonete do McDonald's e comemos um hambúrguer. *** 9
Quando chegamos em casa. O namorado da minha mãe. Leonard McCain estava esperando em seu Ford Fusion. — Olá Allen. — disse ele assim que me viu. — Oi Leo. — respondi. E logo abandonei os dois em uma forte pregação. Entrei e fui direto para o meu quarto. Liguei o computador e entrei na minha conta do Facebook. Nenhuma novidade de Atlanta. Desliguei o computador e me deitei na cama. Tinha um livro para começar. Depois de ler uns quatro capítulos peguei meu iPhone e entrei na minha conta do Wattpad. Bom, sou viciado em livros, meus preferidos são aqueles de autores pequenos como os do Wattpad. *** A noite caiu e Leo ficou para jantar. Jantamos e depois eles tiraram a sala só para eles e eu subi para meu quarto e liguei minha TV. Coloquei em um canal que estava passando a série policial Castle. Em certo momento acabei caindo no sono. Leo foi embora apenas no dia seguinte. Minha mãe estava toda feliz com a visita dele. E justamente aquele dia começaria as minhas visitas ao novo doutor. — Filho se arrume daqui a pouco nós vamos O.K.? — gritou minha mãe lá de baixo. — Sim. — respondi em outro grito do meu quarto. Fui até o banheiro e retirei minha roupa, me encarava no espelho, eu sou muito magro, alguns até me chamavam de anoréxico ou bulímico, mas eu tenho certeza que não sou. Bom, psicologicamente falando. Liguei o chuveiro no quente, deixei alguns segundos enquanto fazia um vapor. Tirei o tubo de oxigênio e o coloquei de lado. Jellyborn City é uma cidade de muito frio. A água quente tocou minha pele apavorantemente pálida. Sou uma pessoa bem higiênica e depilo todo o meu corpo, não deixo nenhum pelo se quer. (e naquelas regiões? Sim, lá também.) É bom ter um banheiro dentro do seu quarto, ainda mais se você tem câncer de 10
pulmão e não consegue andar muito longe, então isso facilita muita coisa. Desliguei o chuveiro, coloquei calmamente o tubo de oxigênio novamente. Sai do banheiro pelado, já que sei que ninguém vai me ver ao sair do banheiro. Fui até o guarda-roupa e peguei uma calça jeans preta e uma camiseta estampada com a face do ex-vocalista da Banda Kiss. Fui até uma cômoda do outro lado do quarto e peguei uma cueca box branca. Praticamente todas as minhas cuecas são brancas. Me visto rapidamente. Olho uma última vez no espelho para ver se estou arrumado para uma consulta médica. O resultado até que é bom. Mas não é maravilhoso, estou com umas olheiras horríveis. Ah, para quem tem câncer, olheiras não são nadas. — Allen! — grita minha mãe. — Já estou descendo. — respondo. Quando chego lá embaixo minha mãe está impecável, nem parece uma dona de casa preocupada com a vida “normal” de um filho com câncer e gay. — Que linda. - digo a ela. — Vai dar em cima do médico? — Pare de piadinha Allen, já tenho o Leo. — responde ela. — Tudo bem Senhora Spinnet. - pego o celular e vejo as horas. — Já estamos quase atrasados. — Então vamos. — ela pega meu cilindro de oxigênio e vamos para o carro. Ela abre a porta para mim. — Obrigado. — agradeço. Quando ela liga o carro e partimos vejo os olhares de alguns vizinhos curiosos, sabem aqueles de pele branca, cabelos loiros, feitos de plásticos? Então, são esses olhares que nos perseguem. O hospital de Jellyborn City é algo bem grandinho para a cidade. São três andares, prédio moderno alguns enfermeiros de plantão aqui e ali, uns médicos e algumas empregadas. Tudo muito limpo, plantinhas em cantos de parede. Uns quadros que ninguém entende (o quadro no seguinte é uma risca vermelha com dois pontos azuis em baixo, se você 11
tem uma boa imaginação que nem eu vou olhar para o quadro e ver um pênis, hehe, safadinho, imaginou né?) Sento em uma poltrona enquanto minha mãe vai até o balcão de recepção conversar com uma enfermeira. Depois de (acho) dois minutos de conversa ela olha para trás e diz: — Vamos Allen, Dr. Pietro nos espera. Me levanto da poltrona, já tinha até pegado uma revista de decoração, mas a sessão anticâncer ia começar. Subimos de elevador até o segundo andar, uma subida bem rápida. No segundo andar viramos dois corredores e chegamos a uma anti sala com alguns jovens (aparentemente) com câncer. Minha mãe sorriu para algumas mães e como já tínhamos hora marcada nós só passamos por eles. Minha mãe abre a porta e me deparo com o homem mais bonito que vi na minha vida. Ele tinha olhos azul-piscina, cabelos castanhos claros salpicados de fios loiros, era musculoso, lábios carnudos e ele sorriu ao me ver. — Você deve ser o Allen? — perguntou ele. Confirmei com a minha cabeça – Eu sou Pietro Sullivan. Vamos começar a consulta? Com certeza…
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CAPÍTULO 2 Antes da ansiosa consulta, falarei de um caso que me ocorreu quando eu tinha onze anos e era natal. A neve caia fortemente na casa da minha avó Selena em Massachusetts. Praticamente toda a família estava reunida no duplex dela. Eu ainda era uma pessoa normal e sem câncer. Minha mãe na época estava começando a trocar mensagem com Leo. Naquele natal ganhei de Leo um iPod e fiquei todo feliz da vida. Era a primeira coisa que eu ganhava da Apple (nunca vou esquecer). Esqueça, mas foi naquela noite que eu fiz o mais louco pedido para o Papai Noel em toda a minha vida. Eu pedi um homem; macho; men; guri; menino; jovem; pia… pedi com força, era nessa idade que comecei a aflorar para a região de Massachusetts. — Querido Papai Noel, venho lhe pedir apenas uma coisinha, ele é de carne e osso, respira, tem um coração, é adulto, fortão, tem futuro e que tenha dinheiro. — pedia eu naquele natal. — Também tenha um grande pênis… — Allen? — perguntou minha vovó Selena que sentava ao meu lado. — O que disse? — Que ele traga um grande tênis, vovó. — respondi ficando um pouco vermelho por aquilo que deixei escapar. Mas vovó Selena não desconfiou de nada até que quando eu tinha treze anos e me rebelei que era gay. Vovó Selena só me olhava enquanto eu pedia ao Papai Noel no pé do pinheiro. Pedia com a minha total força… e talvez cinco anos depois ele realizasse meu desejo, por que parado ali na minha frente estava ele… Dr. Pietro. Ou Pietrinho como o apelidei no meu subconsciente. Sou um jovem completamente safadão. Para uma pessoa que tem câncer no pulmão e passa o dia inteiro com um cilindro de oxigênio para lá e para cá, para lá e para cá… — Querido. — ouvi minha mãe chamar de volta a realidade. — Hã? — perguntei feito um bobo. 13
— Dr. Pietro me pediu para que eu me retirasse para uma consulta particular, se incomoda? — perguntou ela. ÓBVIO QUE NÃO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! — Não. — apenas respondi. — Então mamãe já volta tá? — disse ela. Com aquela frase “mamãe já volta” acabou com a minha autoestima dentro daquela sala esterilizada e com o macho que o Papai Noel entregou cinco anos depois do meu pedido. — Sente-se. — disse ele. — Allen você nos últimos dias têm sentido alguma dor ou incomodação estranha em seu corpo? Além do tesão que estou sentido por você? — Não. — respondi. — Você sabe como o tratamento funciona? — Pietro anotou minha última resposta em uma folha de papel. Você ira-me foder? — Minha mãe comentou um fungo ou uma bactéria. Algo do gênero. — respondi. Ele anotou novamente na folha. — É uma bactéria. — disse ele. — Você dorme quantas horas por noite? — Umas oito a nove horas. — respondi. Ele riscou na folha. Sentia seu perfume da cadeira onde eu estava sentado, era forte, era gostoso. Nossa, estou parecendo o cancerígeno gay mais safado dos Estados Unidos. — Você tem uma dieta balanceada? — perguntou ele. — Minha mãe cuida disso, e sim. — respondi. Ele riscou a folha. — Você tem algum hobby ou atividade “anticâncer”? — Escrevo. — respondi. — Só não acho que isso seja “anticâncer”. — Entendo. — ele disse escrevendo na folha. — O que você escreve? — De tudo um pouco. — respondi. Ele sorriu. 14
— Também escrevia quando tinha a sua idade. — ele largou a caneta em cima das folhas de papel. — Escrevia sob um pseudônimo, bem popular aqui em Jellyborn City e na Costa Leste. — Posso saber qual é? — perguntei curioso. — Claro, mas não ria quando ler o que eu escrevo, meu pseudônimo era Ethan McSylver. — respondeu ele. — O gênero que eu escrevia vai te surpreender. — Qual é…? — Surpresa, você vai descobrir. — disse ele pegando a caneta novamente. — Comida favorita? — Humm… acho que é bolo de carne, é o que eu mais comia antes de descobrir o câncer em meus pulmões e atualmente quase não como. — respondi. Ele riscou a folha. — Por que você dispensou a minha mãe? — perguntei. — Por que essas perguntas poderiam ser feitas em frente a ela. — Tenho meu método próprio de fazer as consultas. — respondeu o Dr. Pietro Sullivan. Assenti com a cabeça. — Agora vamos examinar o seu corpo. — disse ele. Oba, o melhor momento da consulta… — Vou pedir que tire a sua camiseta. — pediu ele colocando um par de luvas de látex em sua mão. Obedeci. Coloquei minha camiseta em cima da mesa dele. Senti vergonha naquele momento. Ele estava ali, olhando eu sem camiseta e isso me deixava ruborizado. E o cancerígeno safado, hein Allen? Totalmente morto! — Deite-se em cima daquela cama. — pediu ele. Obedeci novamente. Estava no meu momento de obedecimento. Ele começou a passar a mão pelo meu tórax, puxei o ar forte de dentro do cilindro de oxigênio. Sentia a cada toque dele um calor que irradiava daquele ponto. Senti meu brinquedo se mexer no meio da minha cueca box. Não era hora, ter tesão e imaginar ele te comendo é uma coisa, outra isso acontecer de verdade é completamente outra. 15
Sinceramente acho que sou o único gay dessa idade em Jellyborn City ainda virgem. Sou o “Santo gay Virgem”. — Inspire e expire. — ordenou Pietro. — Tudo bem. — respondi fazendo o que ele pedia. Naquele momento o que aconteceu nunca mais vou esquecer. Ele está a pouco mais dos quinze centímetros do meu rosto passando a mão pelo meu tórax e vi a coisa mais excitante daquela consulta. O pênis dele estava endurecendo a quinze centímetros do meu pálido rosto. Tem situação melhor? Hahaha. Voltou o cancerígeno safado de Dakota do Sul. — Você está bem? — perguntei a ele. — S-sim, por que não estaria? — perguntou ele. — Por que eu acho que… — parei. — Acha o que? — perguntou Pietro curioso. — Nada, não acho nada. — respondi. — Você não consegue mentir mesmo. — disse ele. — Fale a verdade… — A verdade dói, Dr. Pietro. — disse a ele. Era a primeira vez que eu dizia o nome dele. Era estranho dizer: “Dr. Pietro”. Ele parece ser tão novo para ser doutor… — Não me importo se ela dói ou não. — disse ele. — O.K. Então lá vai. — dei uma longa inspirada e disse: — V-você está excitado? — O-o q-que? — a pergunta era retórica, então não respondi. — Não! Da onde você tirou isso? — Estou vendo… Ele virou de costas. — Acho que a consulta terminou por hoje, até semana que vem. - disse ele jogando a minha camiseta na minha direção. — Mais já? — perguntei inocentemente. — Sim. — respondeu Pietro Sullivan grosseiramente. Saí da sala dele e lá estava minha mãe me esperando perto do bebedouro. — E aí? — perguntou ela. 16
— Só umas perguntas, e é para eu voltar semana que vem. — respondi. — Então vamos. — disse ela pegando minha mão. Chegando em casa fui direto para o banho. Queria tirar todo o suor e o cheiro de hospital do meu corpo. Queria tirar o cheiro do Pietro de mim. Depois do banho sentei em frente ao meu laptop e busquei na Internet por Ethan McSylver. Entrei no que seria o site oficial do autor. Ethan McSylver, autor de romances gays. Então Pietro escrevia sobre gays. Hum, me interessei. Sua obra de maior sucesso foi Hommesthels, A Terapia Erótica Gay. Premiado pelo Clube de Autores LGBTs da Dakota do Sul. Também tem outros títulos como: Se (re)descobrindo gay, Amar a noite toda, Mar de sexo e Fúria Escolar. Todos ganharam o Award Geniall's Gay's of South Dakota e o The Gay's Author Discovery. Hum então talvez Pietro também seja gay. “Senti o maior pênis que conheci na minha vida me penetrar naquela noite em Kansas City. Me senti completo, me senti amado.” trecho de Hommesthels, A Terapia Erótica Gay. Não se sabe onde foi parar o grandioso Ethan McSylver, mas ele publica semanalmente histórias em seu site. Clique no botão ao lado para ler essas histórias. Cliquei no botão com a bandeira colorida e lá estava a última história, publicada há dois minutos. Querido Paciente por Ethan McSylver. Seria sobre mim? Será que Pietro teria escrito sobre mim? O melhor a fazer era descobrir se era verdade ou mentira. Cliquei no botão “Leia Mais”.
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CAPÍTULO 3 Não acreditei no primeiro momento em que vi aquela frase. Mas assim que reli, já estava explicado. Surpreendentemente ele havia escrito um pequeno conto sobre mim. Seria eu? Claro que seria, reconheceria minhas atitudes em um texto a qualquer momento. Mas não sou um gênio, era Ethan McSylver que havia escrito aquilo e não Pietro. Mas antes que me julguem eu sei que Ethan e Pietro são as mesmas pessoas. Cliquei no botão: LER. O texto rapidamente se abriu e eu comecei a ler. QUERIDO PACIENTE ETHAN McSYLVER Era mais um dia normal de atendimentos no hospital. O Dr. Peter Sally. […] Um momento Dr. Peter Sally? P de Pietro e S de Sullivan. […] A mesa estava lotada com pedidos de consultas e exames. Ele estava cansado. O dia estava sendo longo. Peter respirou fundo, o próximo paciente seria o último do dia de trabalho e finalmente ele poderia voltar para casa e descansar. Ele olhou na ficha e chamou o nome do paciente. Ele foi até a porta, e a abriu. Olhou novamente o ficheiro e chamou pelo paciente: “Alan Stuart.”[…] Ele nem pelo menos tentou disfarçar a semelhança entre meu nome e o do personagem? A de Allen e S de Spinnet. Grande criatividade que Pietro Sullivan tem. […] Um paciente se levantou. Era o último sentado nas cadeiras 18
acolchoadas do corredor. Ele tossiu. Peter abriu a porta para que o paciente Alan entrasse. Peter fechou a porta e se sentou na sua cadeira indicando a outra para que Alan fizesse o mesmo. “Boa tarde, Sr. Stuart.” disse Peter olhando a suspeita na ficha. “Acho que pode ser rinite atacada.” ele levantou o olhar para Alan que tossiu novamente. “Você tem histórico de rinite?” “Não” respondeu o paciente com uma voz rouca. “Tire a camiseta e deite ali naquela maca.” disse Peter pegando um par de luvas de látex. Alan tirou a camiseta branca revelando seu corpo não muito musculoso e não muito magrinho, uma pessoa normal. Alan levou a mão na boca e tossiu. Peter percorreu os olhos pelo corpo de Alan. Uma curiosidade, em todo o corpo médico do hospital, Peter Sally era o único homossexual, e ele tinha quedas por homens de corpos normais. Ele sentiu seu membro acordar dentro da calça.[…] Meu Deus do céu. O que? Pietro é tão pervertido assim? Preciso ler mais… […]Ele virou de costas para tentar disfarçar a ereção. E enquanto Alan deitava na maca arrumou com sua mão o membro para não ficar desconfortável. Se virou e Alan Stuart já estava deitado sobre a maca com os braços meio que se protegendo do frio do ar-condicionado da sala. Peter mordeu os lábios. “Bom vamos começar então.” disse ele se aproximando do paciente. Alan se sentia desconfortável com o frio da sala e Peter não deu menor esforços para perguntar: “Você está com frio?” “Um pouco.” respondeu Alan. “Quer que eu aumente a temperatura?” perguntou ele indo até a mesa da sala e pegando o controle do ar. “Se você quiser.” respondeu Alan. 19
Peter aumentou a temperatura para 27 Cº. Ele notou que Alan ficou mais relaxado com o aumento da temperatura no ambiente. Peter ficou feliz com aquilo. Ele voltou para perto da maca. Olhando mais de perto o corpo “frágil” de Alan sentiu seu membro de apertar dentro da calça jeans. Alan parecia nem notar a ereção de Peter. Era melhor assim. […] Será que Pietro havia ficado excitado com a minha presença dentro do consultório? […] Peter pegou o estetoscópio e o colocou sobre o peito de Alan. O coração do rapaz batia rapidamente. O médico perguntou inocentemente: “Está preocupado com alguma coisa?” “É-é…” Peter notou que Alan não conseguia responder aquela pergunta tão simples. “Você está sentindo bem?” perguntou ele. “Tirando a rinite.” “Eu-eu…” o coração de Alan acelerou. “Pode falar.” incentivou Peter vendo as bochechas do seu paciente corar. “Eu…” “Vamos.” Peter chegou mais perto para escutar o que Alan iria lhe dizer. A ereção queimando no meio de suas pernas. A tentação do jovem tão perto de si. Ele sentiu a mão de Alan em seu ombro aproximando os ouvidos de Peter para perto de sua boca. Os lábios rapidamente tocaram a orelha do doutor. “Eu sei que você está excitado.” disse Alan. Como ele sabia? Se perguntou Peter. “E-eu?” foi a vez dele gaguejar. “Sim.” respondeu Alan. “Acho que era só uma crise de tosse.” Ele afastou um pouco Peter e se sentou. “Como?” “Já passou a tosse.” respondeu Alan. 20
Peter ia se afastar quando as pernas de Alan entrelaçaram em torno de seu quadril o puxando a centímetros do rosto dele. A poucos centímetros dos lábios de Alan.[…] What? Agora sei que Pietro é verdadeiramente um pervertido. […]A ereção de Peter aumentou, se é que era possível aumentar. Alan se inclinou e puxou Peter para mais perto. Chegando cada vez mais perto. Até que os lábios dos dois se encontraram e a explosão de calor aconteceu. Depois da língua de Alan percorreu a boca de Peter, foi a vez do doutor explorar o seu paciente. “O que…?” tentou dizer Peter mais foi interrompido por Alan. “Vai dizer que não gostou?” perguntou Alan.[…] Quer dizer que Pietro me via como um verdadeiro pervertido? Não era a toa. Talvez eu fosse um pouco, mas se esse personagem é verdadeiramente uma personificação escrita de mim… eu devo ter provocado milhares de pensamentos em Pietro. […]Peter respondeu: “Claro que eu gostei, mas você não estava com rinite?” “Acho que era apenas uma crise de tosse.” disse ele. “Mas os comentários de um médico novo aqui no hospital não saíam da minha cabeça, e ainda ele era gay. Que sorte.” “Como?” perguntou Peter sem intender. “Sabe, você é bem bonito e você ficou com o seu pau duro só por que eu estava a metros de você.” respondeu Alan. As bochechas de Peter coraram. “Imagina se esse pau pudesse entrar de mim?”[…] Como? Eu não sou tão pervertido assim. Nunca pediria a ele que enfiasse o pau duro dentro de mim… talvez. Mas não em uma primeira consulta. Mas… […]Alan colocou a mão sobre o pênis de Peter por cima do jeans. A 21
ereção pulsou. Com e outra mão Alan puxou Peter para outro beijo. A mão que estava sobre o membro ereto de Peter começou a desabotoar a calça e logo a calça caia até os tornozelos deixando Peter apenas de cueca boxer, uma camiseta branca e o jaleco. “Que sexy.” murmurou Alan entre alguns dos beijos. Com a mesma mão que abrira a calça, Alan abaixou um pouco da cueca boxer revelando alguns fios meio loiros do pênis. Ele enfiou a mão dentro da cueca e sentiu as veias pulsarem ao toque gelado da mão de Alan. Peter parou de beijar e gemeu com o toque. “Você gosta?” perguntou Alan. “C-claro.” respondeu Peter gemendo um pouco mais forte. Ainda com a mão masturbando o membro de Peter por dentro da cueca ele levou a outra para abaixar a cueca boxer por inteira até metade da coxa. Alan beijou novamente os lábios rosados de Peter e se abaixou, parou de masturbar o pênis ereto com a mão que estava molhada com um pré-gozo. Com a mão o levou até a boca. Outro gemido veio da boca de Peter. O médico começou a movimentar o pênis dentro da boca de Alan. Os movimentos foram aumentando até um certo ponto que Peter gemeu um pouco mais baixo e Alan sabia que a hora estava chegando. Ele tirou o pênis grande de sua boca. “Só um minuto.” disse Alan começando a retirar a calça jeans. Enquanto isso Peter voltou a se masturbar e a tirar o jaleco e logo depois retirar a camiseta branca. Alan terminou de tirar uma parte da roupa e ficou apenas com a camiseta azul. Ele trouxe novamente Peter com as pernas e as abriu revelando um pênis quase sem pelo e um ânus que certamente seria virgem. “Tem certeza?” perguntou Peter. “Se eu chupei seu pau, é sua vez de me retribuir.” respondeu Alan. “Óhhh, você não presta mesmo.” disse Peter molhando os dedos com um pouco de saliva e levando os dedos até a entrada de Alan. Ele primeiro levou um dedo e ouviu o gemido de prazer e dor de Alan. Peter sorriu com aquele barulhinho. Depois acrescentou um dedo. E o gemido voltou a se repetir. Mais um dedo e o gemido ficou mais alto. Ele 22
olhou para o orifício e chegou mais perto ainda. O pênis de Alan estava ereto quando Peter entrou dele. O gemido aumentou com o toque do pênis grande de Peter. As estocadas começaram devagar e foram aumentando, aumentando…[…] Pietro pensaria que eu era um garotinho indefeso com câncer e gay e queria apenas que ele me fodesse antes de eu morrer? Não era isso. Uma parte disso não era verdade. Não podia negar que a atração era forte, mais não podia dar o luxo de ele querer me comer na primeira tentativa. […]Alan gozou e o seu esperma voou pela barriga dele, alguns respingos acertaram o rosto dele. E não demorou muito até que Peter gozasse também. Mas foi dentro dele. E a sensação do pênis amolecendo dentro de Alan parecia agradá-lo. Depois de se retirar de dentro do seu paciente ele deitou ao lado de Alan na maca. Com uma das mãos começou a passar na goza na barriga e a levou a boca. Olhou para Alan e se inclinou. O beijo aconteceu naturalmente. Peter continuou a passar a mão pela barriga de Alan. A camiseta azul também havia ficado encharcada com o gozo. Peter se levantou de súbito. Já seria muito tarde. O hospital já deveria estar quase fechando. “Acho que nosso tempo acabou.” disse ele se vestindo. “Mais já?” perguntou Alan já sabendo a resposta. “Sim.” respondeu Peter mesmo assim. Alan se levantou e se vestiu também. “Acho que vou precisar de um atestado.” disse ele. “Por que?” perguntou Peter. “Depois dessa vez, a minha primeira vez, aliás, eu não vou conseguir me concentrar amanhã na aula.” respondeu Alan. “Certamente.” disse Peter se curvando e preenchendo um atestado médico. “Aqui.” Ele entregou o atestado para Alan que beijou Peter e disse: “Até a próxima vez.” Abriu a porta e saiu. 23
Peter sorriu e se sentou na cadeira relembrando os momentos de loucura que tornaram seu dia doloroso de trabalho em um dia de prazer. Respirei fundo assim que acabei de ler. Ok. 1. Pietro Sullivan talvez fosse bissexual ou gay. 2. Algumas chances dele ter fetiches me comendo. 3. Eu sou gay e estou doido para dar. 4. Esquece a número três. Cliquei na caixa: DEIXE SEU COMENTÁRIO. E comecei a digitar. Comentário de @AllenHSpinnet: “Conto pervertido esse hein? Apesar de semelhanças entre coisas que acontecem relativamente em um dia de conhecimento. Esse Alan no começo não parecia disposto a ser fodido pelo grandalhão do doutor, mas aos poucos foi amolecendo. Já na vida real, esse ‘Alan’ não quer ser fodido na primeira vez, caro Ethan McSylver. Não sou um jovem formado, mas tenho uma doença a ser tratada. Minha opinião se valesse, esse pequeno conto seria algo romântico e menos hot. Mas ela não conta. Ah, e gostei do jeito como o doutor é pervertido, lembra muito alguém que eu conheço, mas só de primeira visão. Cliquei no botão: ENVIAR. O texto logo abaixo informou: SUA MENSAGEM FOI ENVIADA COM SUCESSO. Minutos depois, eu escutando algumas músicas “gays”, tipo Troye Sivan o autor Ethan McSylver respondeu ao meu comentário. Resposta por @EthanMcSylverOfficial: Caro leitor ávido de busca de prazer, Allen H. Spinnet. Como você disse se sua opinião contasse eu levava em conta, mas quem escreve sou eu, então aproveite a parte hot do conto. Pois sua opinião não conta. E sobre esse médico pervertido, tome cuidado com ele. Ele é mesmo pervertido. Com um imenso carinho ao leitor Allen H. Spinnet de Ethan McSylver. 24
Que resposta hein? Fique parado em frente a tela do notebook. Li a resposta umas catorze vezes. Desliguei o notebook e deitei na minha cama. Escutei ao fundo a minha mãe começando a preparar o jantar. O carro de Leo encostando alguns minutos depois e eu ainda deitado ali. Peguei meu celular e entrei no Facebook. Busquei por Pietro Sullivan, e rapidamente o encontrei. Enviei o pedido de amizade. Esperando que ele me aceitasse logo, mais isso não aconteceu. Deiteime de lado. E o sono me levou. — Querido acorde. — ouvi minha mãe dizer. — O jantar já está na mesa. Passei a minha mão pelos meus olhos e encarei o rosto dela que tinha o mesmo sorriso de sempre. — Já estou indo. — disse a ela. Ela saiu do meu quarto. Voltei a olhar meu celular e ele ainda não tinha aceitado o meu pedido. Triste, mas verdadeiro. Levantei, fui ao banheiro e joguei uma água no meu rosto. O jantar correu como os outros de sempre, minha mente ainda percorria aquelas linhas do texto. Depois que terminou minha mão não quis minha ajuda para lavar a louça, pediu que eu fosse me deitar, que Leo iria ajudá-la. Subi para o meu quarto e em vez de descansar abri o notebook novamente. Abri o editor de texto e comecei a escrever: QUERIDO DOUTOR ALLEN SPINNET
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CAPÍTULO 4 O bloqueio literário vem com o tempo, e comigo não foi diferente. Escrever parecia algo decididamente simples, mais não é nada decididamente simples. O famoso bloqueio de ideias acabou comigo no primeiro parágrafo de meu mais novo best-seller (acho) Querido Doutor. Não tive mais ideias. Era alguma coisa relacionada ao clichê. Então desisti. Coloquei os fones do meu celular e comecei a escutar uma playlist bem original: Quando Acontecer o Bloqueio Me Escute! As seleções de músicas tinham de tudo, desde “Try” da cantora Pink até o “Work From Home” do Fifth Harmony. Então nitidamente imaginando os queridos coleguinhas de classe que terei que enfrentar amanhã, algo surgiu na minha cabeça, algo diabolicamente pervertido, mas não é para ser escrito, e sim refletido. No meu momento de orgasmo profundo anal, sentindo cheiro de sêmen (sêmen imaginário) eu focalizei em meu subconsciente, onde Freud ficaria louco ao imaginar o que acontece nesse lugar do meu cérebro e – acredite se quiser – imaginei uma sala em plena orgia sexual. Um com o outro, três, quatro… Bom, acho que meu nome não era para ser Allen Spinnet e sim Garoto Pervertido Que Imagina a Sala de Aula em Plena Orgia Sexual. Seria um nome grande então seria uma sigla; GPQISAPOS. Totalmente sem sentido. Esqueça a ligação de nomes. Então no momento desisti de escrever meu best-seller. Abri meu notebook novamente e busquei no Google: criação de pseudônimos para escritores iniciantes. Em meio a dezenas de milhares de sites eu entrei em um gerador de nomes. Eis os seguintes nomes que me sugeriram: 1. Al Ka Deick (não sou dos Emirados Árabes Unidos) 2. Bervelly Johnson (não sou uma jovem puta) 3. Kim Kim (parece nome de macarrão instantâneo) 4. Fulano de Beltrão (isso é uma piada) 5. Agaxa e Sente (não é uma letra de funk) 26
E finalmente quase trinta mil nomes sugeridos encontrei um bem legal. Austin Collings Hill, eu abreviei e ficou A.C. Hill. Bonito não? Então voltei ao editor de textos e voie lá. QUERIDO DOUTOR A.C. HILL Agora eu pareço um autor de extrema qualidade a um bestseller. Não queria escrever. O bloqueio continuava. Olhei as horas no notebook. 00:34. Hora de dormir. Dormir é anticâncer. O som do locutor invadiu meus tímpanos. Quase gritei, mais estava indisposto a gritar. Apenas joguei uma de minhas inúmeras almofadas estampadas com alguma coisa. Aquela que eu taquei era do simpático Bob Esponja. Parecia que na noite anterior eu tivera uma bela overdose de uísque e outras bebidas (vodca, vinho esses negócios). Tirei meu pijama – que me esqueci de mencionar – de rostos dos personagens do seriado The Simpsons. Bem infantil, ganhei do meu Tio Andrew, quando eu tinha dez anos de idade. Você fica se imaginando, eu já passei da puberdade era para eu ter crescido, mas eu sou pequeno em relação ao tamanho, praticamente um anão alguns centímetros maiorzinho. Despi-me, troquei o cateter de oxigênio, como eu faço todas as manhãs. Liguei o notebook e lá havia um gracioso e-mail de Pietro, devo dizer Ethan McSylver. De: etahnmcsylver@autor.com Para: allenspinnet@estudante.com Receber comentários de um jovem menor de idade em uma obra considerada para maiores de dezoito anos é bem, pervertido. Mas eu sei que não foi por mal, e sim, você deve estar imaginando que o personagem Alan é você, e essa afirmação está correta, deve também estar 27
imaginando que sou um pedófilo que leva jovens ao seu consultório onde logo em seguida enfia seu grande pau dentro delas. Não, eu não sou esse tipo de médico. E deve estar pensando ainda como eu consegui seu e-mail, sua mãe, a grandiosa mãe de Allen Spinnet preencheu um formulário das coisas básicas do seu dia a dia, e nele estava a pergunta: Seu filho tem email? Sim, ela colocou. Não quero lhe atrapalhar, estou ansioso para a próxima consulta (semana que vem) no hospital. Sou um pervertido em relação a você, posso fazer uma pequena confissão: bati algumas punhetas pensando em você. Com carinho, Ethan McSylver (Pietro Sullivan) Para Allen Spinnet (não penso que você seja um simples ninfeto). Ninfeto? Ainda há pessoas que usam isso? Pensei que usavam apenas como títulos de filmes pornôs. Respirei fundo. Uma pequena confissão: bati algumas punhetas pensando em você. Ele havia dito mesmo isso? Que batia punheta pensando em mim? Que pervertido. (Uma nota mental: parar de falar pervertido, isso já viciou em meu pequeno vocabulário.) Cliquei no lindinho botão: RESPONDER. De: allenspinnet@estudante.com Para: ethanmcsylver@autor.com Querido Doutor, queria ter humildes palavras em um imenso vocabulário para expressar em apenas uma linha minha linda e estranhamente resposta, mas não será possível. Estou esperando a próxima semana loucamente, não sei se aguentarei muito tempo sem te ver. (Ainda mais que agora estamos paquerando um ao outro por e-mail). Não leve isso em consideração. Devo admitir que a sua história Querido Paciente mexeu com os meus hormônios – lembrando que ainda estou na fase final da puberdade e isso é considerado normal. Quero apresentar que o meu hobby anticâncer está começando, pensei que escrever fosse algo fácil, mais é difícil demais. Então em breve você verá histórias (ou 28
contos) meus. Já que conheci pessoalmente Ethan McSylver – fãs seus estariam loucos com isso – e quero ter algo a mais. (talvez essas palavras sejam estranhas, pois eu tomo mais de vinte tipos de remédios apenas na parte da manhã) Você já disse que não aproveitara de mim, então eu creio em suas palavras. Só quero pensar que podemos ter algo junto. Com carinho, Allen Spinnet (futuro A.C. Hill) Para, Ethan McSylver (ou Pietro Sullivan) Enviei o e-mail e meus hormônios pediam pela resposta. Mais não veio. Desci as escadas da casinha em Jellyborn City para ver minha mãe arrumando a mesa. — Pronto para o primeiro dia de aula? — perguntou ela. — Ohh, mais é claro. — disse eu. — São apenas um bando de jovens de catorze a dezoito anos descobrindo as maneiras de uma suruba sexual, as meninas descobrindo sangue vaginal, os meninos a goza em suas inúmeras punhetas. — Allen? Você está bem? — perguntou minha mãe. Eu quase não uso esse tipo de vocabulário na frente dela. Então apenas digo: — Li isso em um artigo. Ela concorda com a cabeça. — Coma seu café. Leo vai passar aqui para levar nós dois, tenho uma reunião com a equipe médica do tratamento. — disse ela. Então ela vai ver Pietro? — Ok. — apenas digo. Término de comer meu cereal com leite e escuto a buzina do carro de Leo. Entrei e tive que esperar enquanto minha mãe e ele se lambuzavam de saliva. Depois de eles dois terem terminado de se beijar, Leo arrancou pela rua indo para a Jellyborn High School, ou simplesmente JHS. A fachada da JHS era algo até que esplêndido. Toda de tijolos vermelhinhos com o nome da escola em uma letra dourada. O símbolo 29
é algo que me deixou irritado. Um cavalo enorme no jardim da escola. O que o cavalo tem com a cidade de Jellyborn? Resposta estranha. — Preparado querido? — perguntou minha mãe olhando para trás. — Claro mãe, são só jovens delinquentes sem câncer. - respondi dando um sorriso e descendo do carro.
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CAPÍTULO 5 As pessoas dessa escola (acho eu) que nunca viram um cateter de oxigênio preso a rodinhas puxadas por um menino com câncer e trejeitos afeminados. Não tenho preconceito com pessoas de cidades pequenas (como essa) na Dakota. Ouvi alguns sussurros. Olhei para onde estavam vindos e não vi ninguém. Será que câncer mexe com o consciente da gente? Nunca ouvi falar de algo parecido antes. Olhei para onde Leo e minha mãe estariam estacionados e nada do carro deles. Nenhum apoio moral deles incentivando eu a me socializar com esses animais que mais tarde em uma universidade seriam amestrados pelas bocetas de uma siliconada ou abririam as pernas para paus muitos menores do que o décimo primeiro centímetro de uma régua. (Desculpe pelo meu palavreado.) — Ei. — alguém gritou. Eba, um doido querendo fazer amizades com outro doido. Me virei e vi uma roda de amigos que certamente seriam do time de futebol da escola. Ou eles tomavam bomba e passavam o dia inteiro na punheta para deixar as veias inchadas. — Oi. — disse ele. Meu primeiro contato. “Oi”. — Chega mais. — disse a mesma voz que disse o “Ei”. Arrastando meu cateter cheguei mais perto. Ele tinha olhos negros, cabelos de um castanho escuro e a pele bronzeada, estava com uma bola de futebol embaixo do braço. — Qual é teu nome, cara? — perguntou ele. — Allen. — disse eu sem estender a mão. Talvez ele bata punheta o dia inteiro e sua mão possa estar cheia de sêmen… (nojento, não?) — Me chamo Trace O'Hara. — disse ele. Trace O'Hara? O'Hara? Para você (leitor) o sobrenome O'Hara é uma das famílias mais ricas de Jellyborn City. Na realidade eles vieram para Jellyborn City no final do Século XX de Mobridge nas margens do Rio Missouri. Como eu 31
sei disso? Pesquiso todos os sobrenomes coloniais de Jellyborn. — Trace, querido. — ouvi uma voz puxada. Olhei e vi uma jovem loira com olhos azuis gelo e lábios abarrotados de gloss. Ela foi até Trace O'Hara e selou a boca dele com o próprio gloss. — Quem é esse? — perguntou ela se referindo a mim como um ratinho branquinho de laboratório. Anotem: aqui nasce a rivalidade entre Allen Spinnet e a branquela de gloss siliconada com a boceta “meia” arronbanda por Trace O'Hara. — Esse é o Allen, querida. — respondeu Trace. — Oi. — disse eu. — Olá. — disse ela. — Me chamo Honda Donnatell. (Começando momento histórico de Jellyborn City com a família Donnatell). (Me ignorem, eu gosto muito de história). A Família Donnatell era das finadas Treze Colônias, e vieram para o Oeste na famosa Marcha Para o Oeste, onde chegou na atual Dakota do Sul com os colonizadores do estado. Vieram da mesma cidade dos O'Hara, Mobridge. E uma coisa “meia” importante (bem importante na realidade), o primeiro prefeito de Jellyborn City se chama Darius Donnatell. (Terminando momento histórico de Jellyborn City com a família Donnatell). — Você já deve ter conhecido o meu namorado, Trace O'Hara. — disse Honda me olhando. — Sim. — respondi me virando. — Aonde você vai? Não lhe devo satisfações. Quase disse a ela. — Vou me apressar está quase na hora do sinal tocar. — falei. Faltava na realidade quase dez minutos para bater o sino. Mais eu não sou muito de ficar com a galera popular. Não mesmo. Passei por um grupo de góticos sentados na beira do corrimão da escada que levava ao interior do JHS. 32
— Ei. Outro “Ei”? Jellyborn City só tem esse tipo de chamar a atenção? Me virei, havia um jovem moreno, de olhos castanhos claro – me lembra mel –, magro e (não sou bom em calcular medida de altura, mais vamos lá) cerca de 1,67. Incrível, se for isso, e é o que parece ele é três centímetros mais alto do que eu. — Oi. — disse eu. — Queria te alertar, não anda com o grupinho do Trace, por favor. - diz ele. — E por que eu não andaria? Não quero mesmo. — Bom, eles vão fazer você de escravo. - disse ele. — Bom, me fazer de escravo eu acho um pouco difícil, já que eu não consigo correr, o ar falta em meus pulmões e eu preciso carregar esse cateter a todo lugar. — respondi. — E quem é você? — Murilo. - disse ele. — Murilo Moraes. Assenti com a minha cabeça me virando. — Ei espere. — disse ele. Parei mais uma vez e me virei novamente. Ele chegou mais perto e perguntou: — Você já pegou o seu horário? — Ainda não. — respondi. — Vem comigo, eu te levo até a diretoria. — Murilo puxou meu braço me levando junto com ele. Sentei na cadeira azul em frente a uma moça de aspecto simpático que usava um grande vestido florido e sorria todo momento. — Olá querido, sou Marta. — disse ela. — Você deve ser o aluno novo, Allen, isso não é, querido? — Sim. — respondi. Murilo ficou esperando no corredor. Será que ele não tem amigos? Ele precisa sair do meu pé. — Então aqui está o seu horário. — ela imprimiu uma folha do computador e me entregou. — Espero que goste do nosso colégio. 33
— Muito obrigado. — disse. Queria mesmo gostar daqui. Já que nos próximos cinco anos eu morarei aqui. Me levantei da cadeira azul e fui para o corredor. Faltava cinco minutos para o sinal tocar e Murilo ainda estava no meu pé. — Qual é a sua primeira aula? — perguntou ele. — É literatura. - respondi. — E depois teatro. — Que pena, a minha primeira é matemática… Graças!!! - … mais a segunda é teatro, aí vamos ficar juntos novamente. disse ele com um enorme sorriso no rosto. Dei um pequeno sorriso. Saco. — Você tem amigos? — perguntei. — Só três. — respondeu ele. Que surpresa. — Bom, agora com você são quatro. O QUÊ?!? — Ah. — apenas disse. — Quais são os outros três? — É a Rebecca Terever, Dylan Montgomery e o Jordan Watson. — disse ele. — E você, Allen Spinnet. — disse ele. — Acho que é melhor a gente ir para as nossas respectivas turmas. — disse. — Não quero entrar atrasado no primeiro dia de aula. — Verdade, preciso ir, o Sr. Smith não tolera nenhum minuto a mais. - respondeu ele começando a caminhar. — Mais você vai gostar da Profª Roosenberg. Concordei com a cabeça. Olhei no meu horário. LITERATURA – PROFESSORA DONNA ROOSENBERG. SALA 45. TEATRO – PROFESSORA ANNE-MARIE LAFAIETE. AUDITÓRIO. Intervalo. MATEMÁTICA – PROFESSOR WILBUR SMITH. SALA 15. QUÍMICA – PROFESSOR IAN YANAKI. SALA 18. FILOSOFIA – PROFESSORA ERMELINA REBENGE. SALA 46. 34
Intervalo. ED. FÍSICA – PROFESSOR WILLIAM DONNAVELL. ESTÁDIO JELLYBORN HIGH SCHOOL. ARTES. - PROFESSORA JÉSSICA CARTHAGE. SALA 41. FÍSICA – PROFESSOR HEITOR SCOTT. SALA 44. Tantas matérias em um dia só. Vou ficar extremamente louco. Eles podiam dar um desconto a um garoto jovem como eu que tem câncer. Aquela voz chata me lembrando do conselho de minha mãe: O câncer não é algo a ser usado para se dar bem, ele é uma terrível desgraça que escolheu você, querido. Por isso não use ele para facilitar a sua vida. Se fosse assim todo mundo vai querer ter algum tipo de câncer. Estou no corredor das salas de número 30 ao número 50. Procurando pela incrível Sala 45 de Literatura da Profª Donna Roosenberg, segundo Murilo Moraes ela é uma boa professora. Sim. A Profª Roosenberg é boa. Ela é uma daquelas mulheres de quarenta anos de idade que tem a famosa dor do “efeito sanfona” vestindo um justo vestido vermelho com micro-coroinhas e batom da cor roxo puro. Uma verdadeira “velha-jovem”. — Falaremos hoje sobre a trajetória de William Shakespeare… E foram uma hora e trinta e oito minutos sobre William Shakespeare. Seriamente. Agora eu terei que voltar a encontrar-me com Murilo Moraes. Eu tenho que chegar até o Auditório para a aula da Profª Lafaiete. Ao longe, quando eu estava saindo vi o grupinho: Trace, Honda e os outros. — Ei Allen. — era a voz de Murilo. “Ei” de novo? Me virei e o vi vindo com os três amigos dele. — Esse é o Allen galera. — ele disse olhando para os amigos. — Allen esses são meus amigos, Rebecca, Dylan e Jordan. Rebecca: garota ruiva, nariz pontudo, sardas embaixo dos olhos 35
e por cima do nariz, olhos de um verde capim, era alta, e tinha um corpo um pouco acima do peso, usava um macacão de jeans lavado. Dylan: garoto loiro, olhos de um padrão estranho, azul e verde, alto, magro e usava uma linda camiseta que tive vontade de arrancar; HOGWARTS. Jordan: garoto de cabelos escuros, olhos castanho escuros, bem alto (sim, alto mesmo) e um sei lá para a moda – talvez ele assine a Vogue ou a Chanel. Usava óculos pretos. — Oi. — eu disse a eles três. — Oi. — responderam eles um atrás do outro. — Vamos então. — disse Murilo. Segui ele. — Murilo não parava dizer sobre você. — disse Rebecca. — Incrívelmente você é o primeiro aluno com câncer em nossa escola. — Sério? — perguntei. — Sim. — respondeu Rebecca. — Acho que é por causa da nossa saúde. Inclusive a nossa saúde é uma das melhores da Dakota do Sul. Isso não me surpreende, querida. — Sério? — perguntei inocentemente. — Sim. — disse ela. — Minha tia é doutora no hospital. Assenti com a cabeça. O Auditório cresceu na nossa frente. Os alunos entravam entediados. Será que a aula de teatro é assim, tão chata? Acho que não, a uma vontade escondida em mim para ser ator. Entrei ao lado de Murilo, Rebecca, Dylan e Jordan. Não acredito que eles também vão fazer a aula… — E ai Allen? — disse Trace O'Hara se aproximando. Soltei um sorrisinho. Honda Donnatell vinha logo atrás dele junto com o pessoal do grupo dele. — Allen. — disse Murilo. — A Prof.ª Lafaiete já está separando as duplas. — Tchau. — disse eu para Trace e os amigos dele. Sentia o olhar de Honda me seguido. A Prof.ª Lafaiete era uma típica francesa de sotaque e biquinho 36
na hora de falar. O cabelo era preso em um coque e usava um vestido cinza, tinha um cachecol azul-marinho. — Bom dia, crrianças. - disse ela. — Bom dia. — alguns alunos disseram, outros apenas resmungaram. (como eu). — Nós irremos fazerr o incrrível esse semestrre. — ela pegou uma caixa repleta de livros finos. — Irremos fazerr o melhorr trreatrro de Jellyborrn City. Irremos fazerr a fabulosa peça de A.J. Baney, O sonhar do sol nascente. Silêncio. Alguns sussurros. — Mais Prof.ª Lafaiete, o Prefeito Ressa-Berth havia proibido essa peça? — perguntou Honda Donnatell. — Sim, Srta. Donnatell, mais a Prrefeita Winterrpath resolveu deixarr a gente fazerr. Até hoje eu não entendo porr que o Prrefeito Ressa-Berrth não deixava a gente fazerr essa peça. — disse a Prof.ª Lafaiete. — Simples. — foi Trace quem disse. — Ele não gosta da peça. Por que? Porque a peça é sobre um amor gay. Simples. — Isso eu já sabia, Srr. O'Harra. — respondeu Prof.ª Lafaiete. — A.J. Baney é um marrco na histórria de Jellyborrn. Ele foi o prrimeirro gay dessa cidade, e apenas escrreveu a linda histórria de amorr que ele viveu. Sério? Uma peça gay? — Vamos começarr. — ela começou a distribuir os livros aos alunos. Bom, o livro é bem grosso. Incrível. O sonhar do sol nascente de A.J. Baney. Abri a primeira página. Este livro pode ter sido escrito no Século XIX, mais a linguagem é mais moderna do que imaginamos. Ethan McSylver, curador do livro. Ethan McSylver? Ou seja, Pietro Sullivan é o curador do livro. 37
Que novidade para mim. — Comecem a lerr. Semana que vem eu separarei vocês parra ver quem irrá fazerr cada perrsonagem. — Prof.ª Lafaiete sentou em uma cadeira e esperou que cada um de nós começasse a ler. Quase duas horas depois, eu na página setenta e quatro de mil trezentos e quarenta e sete, o sinal tocou. A Profª Lafaiete mandou cada um de nós lermos o mais que pudéssemos do livro em nossa casa. Saí do Auditório acompanhado por Murilo e os amigos deles. O primeiro intervalo ali na JHS. Peguei meu celular e vi uma linda notificação: Pietro Sullivan aceitou seu pedido de amizade. Sem querer deixe um sorriso irradiar em meu rosto. — Você está feliz com o que? — perguntou Dylan. — Nada. — menti. — Estou apenas com fome. O lanche? Burrito. Odeio burrito. Resolvi não comer. Apenas sentei na mesa com uma caixinha de leite de 100ml. O dia foi bem estranho. Sr. Smith se revelou um bom professor, melhor do que eu imaginava. Mamãe: Querido, desculpe, não vou conseguir te buscar, tem algum problema voltar para casa caminhando? Beijos. Caminhar? Tudo bem, ela deve estar em algum motel na saída da cidade com o Leo trepando pelas paredes com as estocadas do pênis do meu padrasto. Caminhar não ia fazer diferença… ou ia? Como eu não sou inocente nem nada. Sai da mensagem da minha mãe e fui até o Messenger e procurei por Pietro. Ele estava online. Mandei uma linda mensagem. Sou bem abusadinho. Eu: Pietro, estou muito cansado para voltar a pé para casa, tem como vir me buscar? Se eu não estiver pedindo muito. 38
Ele respondeu alguns minutos depois. Pietro: Não há problema algum. Passo aí daqui uns cinco minutos. Cinco minutos depois o luxuoso carro (um Mercedes) estacionou na minha frente. Pietro Sullivan desceu em um terno Armani cinza claro e sorria, via o reflexo faminto embaixo de seus óculos escuros. Ele abriu a porta do carro. — Isso não é um encontro. - informei. — Acho que não. - disse ele fechando a minha porta. Ele entrou e sorriu para mim enquanto ligava o carro. — Preparado para o passeio? — perguntou ele. — Hã? Você não vai me levar até minha casa? — Óbvio que não. — disse ele acelerando o carro. Ai meu Deus.
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CAPÍTULO 6 Olhei para ele, não sabia o quê fazer. — Aonde nós vamos? — perguntei a Pietro assim que ele acelerou o carro. — Surpresa. — respondeu ele. — Bom, eu sei que não é minha casa, já que você acabou de passar por ela. — digo. — Nosso combinado era você apenas me levar até em casa. — Mais eu resolvi quebrar esse combinado. — respondeu ele sorrindo, vejo covinhas se formando em suas bochechas. A uma sensação estranha dentro do carro. Não consigo entender. Uma leve sensação de que isso é apenas o começo. Enquanto Pietro Sullivan vira uma esquina, eu olho para a paisagem, há várias lojas e alguns restaurantes. — Você vai… — Não, espera. — diz ele. — Antes de você abusar de sua inteligência, deixe eu ser feliz e revelar. — ele respira fundo. Sinto que ele está nervoso. — Nós vamos primeiro almoçar no Oriolli Goumert. — disse ele finalmente. — No restaurante mais caro de Jellyborn City? — perguntei. — Sim, o melhor, para o melhor. — respondeu ele. — Engordarei. — digo a ele dando uma risada. — Não importa como vai ser o ser corpo daqui alguns meses, ou anos, eu sempre quero estar ao seu lado. — diz ele. Será que ele queria mesmo falar aquilo? Será? Será que ele ainda ter olhos para mim se eu ficar gordo? É, talvez ele fique do meu lado. — Pietro. — digo. — Você sente alguma coisa por mim? Ele para no sinal vermelho de um cruzamento. Ele se vira para mim, a um semblante muito sério em seu rosto, como se eu tivesse falado alguma merda. Me arrependi um pouco de ter perguntado aquilo, mais eu precisava tirar a minha dúvida. Precisava mesmo. A mão de Pietro pousou sobre a minha coxa esquerda. Senti um 40
calor subir pela minha pele. Ele também sentia aquilo? Olhei nos olhos dele. Ele estava ainda sério. — Pietro eu não queria… — comecei. — Tudo bem Allen. — diz ele retirando a mão da minha coxa e voltando a dirigir. — Você estava apenas curioso, e a resposta é “sim”. Pietro se vira e encara o caminho. — Me desculpe. — digo. — Tudo bem. — o sorriso volta no rosto dele. — Não foi nada, você apenas queria tirar uma dúvida. — Tem certeza? — pergunto. — Sim, Allen, tenho. — responde ele. Ele para o carro em frente ao restaurante mais chique de Jellyborn City, o Oriolli Goumert. O prédio tem dois andares enormes, com as paredes de frente a Sétima Avenida completamente feitos de vidro. As pessoas são apenas uma classe: a Elite de Jellyborn. Todos ricos ou milionários. Pietro é rico. — Vamos entrar? — pergunta ele. — Aham. — respondo. Antes que eu possa fazer qualquer coisa, Pietro Sullivan pega minha mão e me saí puxando pela Sétima Avenida. Ele não tem medo de alguém ver nós dois juntos? Estou sendo homofóbico? — Você não tem vergonha ou medo das pessoas falarem mal do grande médico dessa cidade? — perguntei. — Não ligo para o que os outros falam. — diz ele. — E você deveria seguir o mesmo método. — Reserva? — perguntou um homem magro de smoking. — Sim. — respondeu Pietro. — Mesa 17. — A melhor mesa que temos. — diz o atendente. Ele nos guia até uma mesa nos segundo andar de vista para a Sétima Avenida. O movimento lá embaixo está forte. Pietro empurra a cadeira para eu sentar. E depois ele se sentou na minha frente. — O que você vai querer? — pergunta ele. — O mesmo que você. — respondo. 41
— Sério? — pergunta ele. — Sim. — respondo. — O.k. — diz ele. Um garçom vem e pergunta: — O que os senhores quererão? — O especial do chefe. — responde Pietro. — Em alguns minutos o prato ficará pronto. — disse o garçom virando-se de costas e indo em direção a uma porta branca. — O especial do chefe é o melhor. — diz Pietro. — Você vai gostar. Concordo com a cabeça. — Como foi seu primeiro dia de aula? — pergunta ele. — Foi legal. — respondo. — Pietro me responde uma coisa. — Qualquer coisa. — diz ele. — Você é curador de uma obra chamada O sonhar do sol nascente? — pergunto. — Sim, porque? — Eu vou fazer ela na escola. — respondo sorrindo. — Sério, Allen? — pergunta ele ansioso pela minha resposta. — Sim. — digo. — Isso é maravilhoso. — responde ele. — Por que? — pergunto. — Você saberá. — responde ele. — O que é isso? — pergunto olhando para o prato “especial do chefe”, mais isso não é especial, isso está na cara de ser sobra de lavagem de porcos. — Isso é tête de veau. — responde Pietro. — Você disse que queria comer o mesmo que eu. Me arrependi. Tem como trocar? Mais não disse isso, apenas: — O.k. vamos ver se é melhor do que o purê de batatas de Tia Anca. — pego o garfo apropriado para aquilo. — O que é isso? — pergunto relando a ponta do garfo no que parece ser um focinho… — É o nariz do porco. — responde Pietro tranquilamente. 42
A resposta veio assim que o focinho estava sendo mastigado pelos meus incisivos. — O q-que? — pergunto. — Nariz de suíno. — responde ele. Pietro começa a pegar os pedaços da cabeça do porco e alguns legumes que enfeitam os cantos do prato. Poderia ser algo mais chique, não? Tipo um caviar, mais cabeça de porco no restaurante mais chique desse fim de mundo? Só acontece comigo mesmo — Gostou? — perguntou ele na saída do Oriolli Gourmet. — Melhor que a comida da minha Tia Anca. — respondi. Ele deu risada. — Agora você vai me levar para casa? — perguntei. — Para que a pressa? — perguntou ele. Gelei. — Nós iremos a minha casa. — responde ele me puxando até seu carro. Lá dentro eu estou absorvendo as últimas notícias. Estou indo para a casa do médico tarado de Jellyborn City, Dakota do Sul. Confere. Com certeza ele quer transar comigo. Confere. E Allen quer? Simmmm, muiiittooooo!!!! Meus hormônios se afloraram com essa possibilidade de uma primeira transa. — Nós transaremos? — pergunto. — O que? — pergunta ele. — Você achou que a gente ia brincar. Não ouve tempo de reparar a fachada da casa (mansão na realidade) de Pietro Sullivan, ele me arrastou direto pela sala rumo ao quarto. Sem nenhum beijo… cadê o cavalheirismo do passado? Ele abre a porta do quarto e vejo um enorme cômodo, com uma cama king size. Ele chega mais perto não deixando eu reparar em mais coisas, ele beijou meu pescoço, o arrepio subiu pela minha pele toda. Fechei meus olhos, ele beijou meu queixo e logo nossos lábios estavam unidos em um só. Foi bom, muito bom mesmo! — Vai doer? — perguntei. Sou burro (me julguem, eu deixo). 43
— Eu vou fazer com carinho. — dito isso, Pietro me joga sobre a cama e pula em cima de mim.
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CAPÍTULO 7 Pietro beijava meu pescoço, mordiscava de vez em quando. Aquilo era gostoso demais. Estou preocupado com uma coisa. Aguentaria todo esse esforço com o limitado oxigênio que vem do cano do meu cateter? Assisti ao filme A Culpa É Das Estrelas um milhão de vezes por causa da protagonista que tem o mesmo tipo de câncer que eu. E bom, se ela aguentou eu também aguento. — Pietro. — disse. — Sim. — ele parou de beijar meu pescoço e me olhou. — O que foi? — Estou preocupado com o oxigênio. — digo. — E se acabar, você sabe que eu posso morrer. — Isso não acontecerá. — diz ele. — Por que? A cura do meu câncer vem com o sexo? — Não. — respondeu ele. — Lembre-se que sou médico. — Mais você não faz milagres, Pietro. — digo. — Confie em mim, Allen. — diz ele. — Se acontecer qualquer coisa eu estarei ao seu lado para lhe proteger. Concordo com a cabeça. Ele volta a beijar meu pescoço. Por que estou deixando isso acontecer, assim, tão fácil? Por que não lhe interessa, eu poderia responder dessa maneira, mais não sou mal educado, apenas respondo: a qualquer momento eu posso morrer, melhor transar hoje do que nunca. — Acho que você vai ter que tirar um pouco o cano de oxigênio. — diz ele. Eu obedeço enquanto ele tira a minha camiseta. Coloco novamente o cano de oxigênio, não quero morrer antes de experimentar o pecado. Ele desabotoou o botão da minha calça jeans skinny e passou os lábios sobre o volume do meu pênis em cima da cueca. Nessa hora, confesso, gemi. Ele sorriu com o meu gemido. — Gostou? — perguntou Pietro. — Muito. — respondi. 45
Ele se levantou e meu puxou, fiquei colado com o corpo dele, minha calça abaixada até metade das minhas pernas. Sem permissão eu comecei a desabotoar os botões da camisa social de Pietro, revelando músculo definidos que fizeram eu segurar um pouco a minha respiração. Ele sorriu. Como ele fez comigo, me aproximei e beijei o mamilo dele, primeiro o esquerdo e depois o direito, enquanto beijava o abdômen dele, com as mãos (graças a minha querida conta no Men.com) fui abrindo a calça de linho dele. A calça Armani era tão macia, que parecia uma segunda pele. Senti o pênis ereto dele em minha mão, era bem maior do que eu imaginava, e bem maior que o meu. Eu enfiei minha mão dentro da cueca boxer dele e senti o pênis quente em minha mão. — Você está pronto? — perguntou ele. — Nunca estive tão pronto em minha vida. — respondi. Ele sorriu. Nunca o vi sorrindo tanto desde que eu o vi pela primeira vez desde a última consulta. Ele me pegou no colo e me sentou na beirada da cama king size. Ele terminou de arrancar a calça Armani e logo em seguida a cueca foi ao chão. O pau enorme dele balançou a poucos centímetros de minha boca que estava desejando aquilo dentro dela. Ele se aproximou e a glande tocou meus lábios. Sorrio. Ele também sorri. — Preparado? — perguntou ele. — Sim. — respondi. Abri minha boca dando passagem para que o pau dele entrasse por ela. Imaginei algo mais normal em um boquete, pois alerta!!! Não é! Nos vídeos da minha conta da Men.com eles fazem aquilo com tanta suavidade, apenas gemendo entre uma lambida e a outra. Bom, eu gemi, gemi bastante. Será que os vizinhos escutaram? Quando eu estava pegando o jeito ele arrancou o pênis de minha boca e voltou a me beijar. Ele beija com mais força do que antes enquanto termina de arrancar a minha calça e retirar minha cueca. Ele me coloca em uma posição, que em todos os lugares em que leio fanfics gays a chamam de frango assado, e agora vejo por que 46
chamam essa posição desse jeito. Minhas penas ficam flexionadas sobre a minha barriga enquanto minha entrada fica exposta e sem nenhuma proteção. Em vez de enfiar logo o pau dele em mim ele se abaixa e fica de joelhos e aproxima língua dele em minha entrada, uma onda gelada passa por todo o meu corpo. Isso é muito gostoso. — Gosta? — perguntou ele retirando a língua da minha entrada. Concordo com um acendo de cabeça. O oxigênio entra mais forte para dentro do meu pulmão. Ele volta a enfiar a língua. Sinto minha entrada contrair espontaneamente. Ele para novamente e vai até o closet e volta com uma pequena caixa. — O que tem aí? — pergunto. — Brinquedinhos. — responde ele. Antes desse “brinquedinhos” ele retira de dentro da caixa um frasco contendo algo parecido com gel de cabelo, que na realidade, descubro que é um lubrificante refrescante, pela embalagem. Ele espalha nos dedos indicador e maior e se aproxima da minha entrada, sem olhar o meu ânus ele fica me encarando sério, esperando as minhas reações. E o que eu faço, se você pensou que eu imaginaria dois galos de brigas, um chihuahua e três gatos xadrezes, você errou. Eu fecho meus olhos e jogo a minha cabeça para trás. Ele enfia primeiramente o dedo indicador, eu dou um enorme gemido, e logo em seguida ele enfia o dedo maior. Gemo mais alto. Ele retira os dedos e pega um pacote preto de dentro da caixinha, é uma camisinha. — Preparado? — Claro. — respondo. Ele coloca a camisa em seu pau ereto e se curva mais um pouco enfiando a ponta dentro de mim. Eu gemo um pouco mais alto, abro meus olhos e vejo um enorme sorriso, com uma mão ele auxilia a entrada do pênis dele dentro de mim, com a outra ele acaricia meu próprio pau e depois sai beijando minha barriga. Eu me arrepio, e grito quando o pênis dele entra dentro de mim. Ele estoca sem parar, as vezes de vagar e as vezes vai fortemente, sinto o pau dele dando contrações dentro de mim. 47
Então ele sussurra no meu ouvido: — Quero sempre estar com você. — Eu também. — respondo sentido o pau dele amolecer dentro de mim, enquanto estamos entrelaçados. Estou nu, sim nu, Pietro Sullivan não deixou eu vestir nem pelo menos minha cueca. Ele justamente está ao meu lado, também nu. Minha cabeça repousa no ombro dele, enquanto passa na TV o primeiro seriado gay que assisti Dante's Cove. Mais na realidade eu nem estou prestando atenção no que está passando naquele episódio. Estou me aquecendo no corpo dele. Meu cateter (antes que algum leitor de a louca) está repousado sobre o sofá, o oxigênio faz coscas em meu nariz, e vai ficando cada vez mais frasco. Sinto meus olhos pesarem. — Pietro. — sussurro. Ele olha para mim e pergunta: — O que foi? — Não estou me sentindo muito bem… — Allen… A música final do episódio toca e tudo fica escuro. As coscas param, o oxigênio para.
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CAPÍTULO 8 Qual é a sensação de morrer? Vocês querem saber? É literalmente horrível, nunca queiram morrer, apesar de não ser uma escolha nossa. Aniversário de 10 anos, Atlanta, Geórgia.14 de maio de 2010. Nosso apartamento em Atlanta era até que bonito um pouco antiquado pelos objetos que minha tia vende na lojinha do andar de baixo: Objetos da Sra. Terefell. Nome estranho? Sempre me perguntei o por que daquele nome. Obs: não estava ainda com câncer no pulmão. — Querido feliz aniversário. — a voz da minha mãe irrompeu o meu quarto, ela trazia uma caixinha decorada na mão. — Queria te dar isso. Ela coloca a caixinha em cima da minha cama, eu não estava dormindo, eu só era preguiçoso. (Ninguém perguntou Allen.) (Tudo bem) (Então continue a narrar) (Tá bom…) — Que isso? — perguntei. — Abra. — disse ela. A caixa era pesada e estava com o carimbo da livraria da esquina. A Atlabooks. — É um livro? — perguntei. — Veja. Abri a caixa e lá dentro estava o livro que eu sempre quis. (Não deem risadas, vai me dizer que vocês não são fãs?) Harry Potter. (Okay me julguem, mais que criança nunca quis ter os livros do Harry? Bom, eu comecei com 10 anos e terminei quando o câncer me atacou, onde, — fiquem com inveja – minha mão, que de alguma forma – talvez macumba – conseguir fazer com que JK Rowling assinasse meus sete volumes de Harry Potter. Okay, estou jogando na cara, outro fato sobre mim, fui na estreia do último filme “Harry Potter e as Relíquias da Morte” no mesmo cinema que a autora. CHUPA!) (Okay, chega). — Muito obrigado mãe. — digo abraçando ela. 49
Escola George Washington, Atlanta, meados do Inverno de 2012. Meu primeiro beijo e um pequeno bônus. (Incrível). Sim, meu primeiro beijo foi com uma menina. Ela se chamava Audrey McQueen. Era bonita, na época que eu não sabia qual dos caminhos seguir, resolvi experimentar os dois. Primeiro chamei Audrey para um lado, ela já sabia o que eu queria, havia pedido para ficar comigo dentro da sala de aula, antes do intervalo. Então o beijo aconteceu, pensei que seria mais normal, que eu me sentiria realizado, mais na realidade foi ruim, bem ruim. E a parte que gostei (já que sou gay) foi quando beijei Zack Drydin uma semana depois do beijo com Audrey McQueen. Zack (acho eu) é gay, mais se mantia um hétero de fachada, mais ele não recusou, já que fui eleito o quarto menino mais bonito do colégio. O beijo rolou dentro do banheiro do ginásio, no quarto tempo, que era pintura ao ar livre, nós demos um jeito de se distanciar da Profª Clay e bum, estavamos juntos se beijando, ele queria avançar o sinal, mais eu só tinha 12 anos e não queria começar minha vida sexual ativa. Depois daquele beijo eu descobri o que eu queria ser, ser gay. Nada iria me impedir. Fleches de uma luz forte estão nos meus olhos, sinto o ar voltando aos meus pulmões, será que a Morte não me quer? Difícil. Ela não deixara carne jovem e recém-pecada assim voltar a vida. — Você está bem? — a pergunta na voz de Pietro mexe comigo. Estou realmente vivo.
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CAPÍTULO 9 ALLEN Minha mãe me olha de soslaio enquanto entramos no carro. — Onde você estava? — perguntou ela. — Vendo a bactéria que vai ajudar a combater o meu câncer. — menti. Não gosto de mentir para a minha mãe. Mas foi necessário. — Allen, não minta para mim. — disse ela. Como não mentir… — Allen, você e Pietro estão… — começa ela. Sinto suor escorrer pela minha nuca em direção as minhas costas. Ela pareceu ter percebido que fiquei tenso por que mudou o tom de voz comigo. — Entenda, não precisa ter medo — ela parou no sinal vermelho de um cruzamento, se virou e olhou para mim. — sei que vai chegar um dia que você vai se apaixonar, mais você não acha Pietro Sullivan muito velho para você? Como a mãe tem esse poder sagaz de descobrir as coisas que o filho faz. Incrível. O sinal ficou verde novamente e o carro voltou a andar pelas ruas de Jellyborn City. — Mãe, se eu falasse que gosto do Pietro, você aceitaria? — minha pergunta já revelava tudo. — Claro, Allen, mas entenda que ele é muito mais velho do que você. — ela me olhou, os olhos refletiam bondade e ao mesmo tempo vitoriosa por saber que estava certa em relação a mim. — Mãe, a idade não atrapalha a forma do amor. — expliquei. — Ele tem mais de 30 anos e você nem se formou no ensino médio. — lembrou ela. — Não se apaixone pelo seu médico, Allen. Suspirei. E se eu quisesse me apaixonar, o que ela faria? — E se eu quiser? — desafiei. Ela suspirou. 51
— O.k. Allen, eu não queria fazer isso, mais serei obrigada. — disse ela. — O quê? — murmurei. — Você está de castigo. — disse ela sem rodeios. Se eu tivesse dirigindo o carro derraparia pela rua e nós provavelmente estaríamos assustados, mas ela mantém a calma, isso deve fazer parte do pacote chamado: Sou Mãe. — Você não pode fazer isso comigo. — praticamente gritei. — Sou sua mãe. — lembrou ela. — Até você estar maior de idade você é responsabilidade minha. Durante o resto da viagem até em casa não disse nada. Ela era a vilã agora. Tudo que havia acontecido de bom comigo parecia ter ocorrido em outra vida. Lembrei como Pietro me olhou no hospital depois que beijei ele. Chegamos em casa e o carro de Leo estava estacionado de frente a garagem. Eu corri e abri a porta. Quase deixando o cateter de oxigênio para trás. Leo estava parado na sala, sentado no sofá. — E aí Allen? — disse ele. Ignorei. Na realidade acabei de ser bem infantil. Leo não tem culpa de nada. Corri escada a cima. O máximo que meus pulmões deixavam. Bati a porta do meu quarto. As lágrimas já desciam pelas minhas bochechas pálidas. Deitei na minha cama. Queria apenas acordar desse terrível pesadelo. E assim acabei caindo no sono. Quando acordei já era noite. Não ouvia nada que indicasse que minha mãe e Leo estavam em casa. Melhor assim. Levantei. Fui até o banheiro tomar um bom banho. Minha mãe estava estranha, não era aquela pessoa que me apoiava em cada passo que eu dava. Estava me segurando mais. Desliguei o chuveiro, me enxuguei e pulei na cama. Sem me vestir, estava com preguiça de ir até o guarda-roupas pegar alguma coisa. 52
Troquei de cateter como era diário. Sentei na frente do laptop e entrei no e-mail. Havia dois e-mails de Pietro. Primeiro: Oi Allen, queria saber se você está bem. Estava pensando em sairmos. Sua mãe não está estranhando nada? Você contou a ela? Como reagiu? Aguardo resposta até as 18 horas. Olhei o relógio, era 19:17. Segundo e-mail: Allen, pelo amor de Deus, aconteceu alguma coisa? Estou indo aí. Olhei a hora do e-mail. 19:05. Ele com certeza já estava perto de chegar aqui em casa. Apertei no botão RESPONDER, mas fui interrompido com uma batida na porta. Antes de descer enfiei rapidamente por minhas pernas uma calça moletom. Desci o mais rápido possível. Senti uma tontura quando cheguei a porta, mais a ignorei. Acendi um abajur por perceber que o resto da casa também estava imerso na escuridão total. Abri a porta e lá estava Pietro Sullivan. Antes que eu pudesse dizer alguma coisa ele entrou e fechou a porta logo atrás dele e tampando minha boca com a dele. Ele parou de me beijar e me olhou. — Tem alguma coisa errada? — perguntou ele. — Minha mãe. — respondi. — O que foi? — ele me abraçou. Sentia seu coração acelerado no meu peito. — Minha mãe acha que não devo me envolver com você. — respondi. — Como assim? — quis saber ele. — Ela acha você velho demais e eu… novo demais. — respondi fitando os olhos deles. Ele olhou para cima. — Tem alguém em casa? — perguntou. — Não. — respondi. Ele me puxou rumo ao andar de cima. — Onde é seu quarto? — Terceira porta. — respondi. 53
Entramos por ela. Meu quarto na escuridão, apenas com as luzes vinda dos postes das ruas. Ele me beijou. — E minha mãe? — sussurrei. — Ela não está aqui. — disse ele. — Vamos aproveitar. Ele me colocou na minha cama pequena demais para nós dois. Olhei para ele enquanto ele tirava a roupa. Era nítido que ele estava tenso. — Desculpe. — disse ele me olhando e ficando apenas de cueca e deitando do meu lado na cama. — Pelo quê? — perguntei. — Talvez — começou — seja nossa última vez antes de você ficar velho, então… — Pietro, pare! — disse abraçando ele. — Minha mãe não tem tanto poder assim sobre mim. Minha saúde está em risco. — lembrei. O silêncio reinou. Suspirei. — Vamos logo com isso. — disse beijando os lábios dele. Ele me puxou, fiquei em cima dele. Nos beijávamos intensamente como se fosse a última vez. Enquanto beijávamos ele tirou minha calça moletom. Ele retirou a apertada cueca boxer e ficamos ali parados nos beijando. Nossos paus tocando um no outro e enrijecendo naturalmente. Era hora de hardcore. Parei de beijar e me abaixei pegando a glande do pau dele com a minha boca. Ele gemeu. Gostei disso. E a partir desse momento, meus problemas sumiram. Ele me colocou embaixo. Sentia seu pau comprimido na minha entrada recém-invadida. Ele chupou meu pescoço. Me contorci e senti a cabeça do pau dele sendo pressionada na minha entrada. — Pronto? — perguntou ele. — Sempre. — respondi. Ele se enfiou dentro de mim. Gemi alto. Meu pau já estava latejando. Ele estocou mais forte e enquanto estocava se curvou e mordiscava minha orelha. Isso me arrepiou. Ele estava cada vez mais forte… — Allen. — a voz da minha mãe estava entrando no corredor do andar de cima. 54
Subitamente Pietro parou, ainda dentro de mim quando a maçaneta virou. Fascinante‌
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CAPÍTULO 10 Olhei nos fundos dos olhos de Pietro. Ele saiu devagar de dentro de mim. — Allen querido você está aí? — perguntou minha mãe já abrindo a porta. — Banheiro. — sussurrei para ele. Ele pegou as roupas e saiu rumo ao banheiro. Coloquei as cobertas para esconder minha nudez e minha ereção. — Sim mãe? — sussurrei em uma voz tentando imitar sonolência. — Desculpe querido se eu te acordei. — ela sentou na beirada da cama. Ouvi barulhos vindos do andar de baixo. Certeza que Leo estava lá. Ela me olhou, parecia arrependida. E se ela soubesse o que aconteceu aqui? — Não precisa se desculpar. — me virei de lado. — Sabe sobre a nossa conversa de hoje mais cedo? A ferida doeu. A rejeição de minha mãe… — Sim. — respondi mesmo sabendo que era uma pergunta retórica. — Então, acho que você tem razão. — disse ela. Seria verdade, ou tudo seria um sonho? Talvez um pesadelo… sacudi a cabeça. — Você não… — começou ela, interpretando mal meu gesto. — Não é isso, mãe. — disse. — Continue. — Você tem razão, não posso ficar me metendo nos seus namorados… — Não somos namorados. — senti algo ao dizer namorados. — Tudo bem, não está aqui mais quem falou. — ela se endireitou. — Fale logo Victória Spinnet. — disse o nome dela ironicamente. Ela sorriu com isso. — Eu conversei com Leo. — Leo, mãe? Fala sério, ele é hétero. Pensei. — E ele discordou completamente de mim. — Pera aí, Leo, é você mesmo? Ponto para Time Leo. — E eu concordei com ele. — Victória vai 56
com as outras. — Acho que você pode começar a ter namorados. — essa história de namorados novamente? — E se cuide se acontecer algo além de um beijo. — ela queria dizer sexo? — Mãe ele é médico. — a lembrei. — Tudo bem, mais existem várias DSTs… — Mãe eu saberei me cuidar. — disse. — Tá o.k. então. — ela se levantou. Graças a Deus. — Desça para o jantar, querido. Ela se curvou e beijou minha testa. Me arrependi de ter dito “Graças a Deus”. Depois disso saiu do meu quarto. Assim que escutei o trinco da fechadura, pulei da minha cama e corri para meu pequeno banheiro, quase esquecendo o cateter em cima da cama. — Você escutou? — perguntei. Ele me beijou antes de me responder. O fogo reacendeu. — Sim. — sussurrou ele em resposta. — Acha que ela está certa? — Sim. — respondi no mesmo tom de voz enquanto o beijava. Nós dois, nus dentro do meu banheiro. Muito loucoooo!!! Para Allen. Senti ele passando a mão em minhas costas e descendo até a minha bunda e a apertando, depois me puxou mais para perto. Senti seu pau ficando duro ao tocar na minha pele. — Só estar com você me excita. — disse ele. Me arrepiei. — Sério? — Sim. — ele mordeu a ponta da minha orelha. Corei. Desde quando eu coro? Desde que você conheceu Pietro Sullivan, lembrei a mim mesmo. — Será que vai dar para eu ir embora? — perguntou ele acariciando o meio das minhas pernas. — Espere minha mãe ir dormir. — ele beijou minha boca. Ele assentiu chupando meu pescoço. Rezei silenciosamente para que não ficasse roxo no local. Ele percebeu minha preocupação. — Relaxe. — disse ele me encarando. — Esqueceu que sou médico. — e sorriu e eu sorri logo em seguida. 57
— Então médico, acho, que preciso me deitar. — disse fazendo carinho no mamilo arrepiado dele. Ele me pegou no colo. Peguei o cateter. Ele me colocou devagar na cama e deitou do meu lado. — Sua mãe não vai escutar? — perguntou ele. — Quando ela está com namorado seus ouvidos se fecham para as coisas exteriores. — disse. Ele sorriu. Passou a mão pela minha coxa que se arrepiou e chegando no meu tornozelo ele o puxou e enganchou em volta de seu quadril. Ele beijou minha boca. Devolvi o beijo. — A janta está pronta. — gritou minha mãe. Olhei para Pietro. Me levantei peguei a cueca dele e a coloquei, depois vesti a calça moletom. E sai. A comida estava posta na mesa de vidro nossa. Leo e minha mãe davam risadas de uma piada interna de casais. Coloquei minha comida no prato raso e comecei a comer. — Credo Allen — começou Leo — está muito quieto. — É filho. — concordou minha mãe. — Não é nada. — respondi. — Confie em mim. — disse mamãe. — Victória tem razão. — concordou Leo com ela. — Nada, só preciso ler umas trezentas páginas do livro para a aula de teatro só isso. — disse. — Mas não esqueça de dormir. — disse Victória. — Dormir é anticâncer. — Com certeza mãe. — disse voltando a minha comida. Comi a macarronada integral – já que para minha mãe eu tinha que ser um jovem cancerígeno saudável, pelo menos na alimentação. Levantei e lavei meu prato. Me despedi de Leo e mamãe e subi para meu quarto. Pietro estava sentado na minha cama, com a coberta mantendo escondida sua nudez. Ele me encarou assim que entrei no quarto. — Foi rápido. — sussurrou ele. — Para uma pessoa com câncer você não pode comer tão rápido assim. 58
— Simples, não é você que está mantendo um cara pelado dentro do seu quarto enquanto sua mãe e o namorado dela pode subir e abrir a porta a hora que quiser e ver você, não sou maior de idade. — lembrei. — Não precisa ficar lembrando toda hora. — pediu ele. Dei de ombros. Estava voltando com essa mania de catorze anos? — Agora — ele me puxou — vem aqui. Pietro me abraçou, senti a pele quente dele contra a minha. Parece um sonho e estou com muito medo quando eu acordar. Acho que é melhor eu desfrutar enquanto há algum tempo. Olho para ele com meus olhos arregalados. Sei que tenho muita coisa para fazer, mais não quero me despedir de Pietro, não agora. Não nesse lugar. — Vou ficar com saudades. — disse ele. — Por quê? — perguntei. — Acho que sua mãe vai sair. — Como você sabe… — Allen, eu e Leo vamos sair, quer vir junto? — gritou minha mãe. Olhei para Pietro, depois me virei para baixo e gritei: — Não! — ouvi passos saindo da sala e fechando a porta, depois trancando-a e o som do motor do carro de Leo sendo ligado. — Como você sabia? — perguntei me virando para Pietro. — Intuição. — ele me abraçou mais forte ainda contra a pele nua dele. Me arrepiei. Arrepiar me excita. Muito! — Acho que vou embora. — disse ele. — Por quê? — perguntei. Ele olhou para mim. — Minha mãe saiu, só estamos nós dois. — disse. — Você tem muito o que fazer, não pode ficar passando todo o seu tempo comigo. — disse ele. — Ah, quanta modéstia. — disse eu, ele me interrompeu com um longo beijo. Me levantou em seu colo, passei minhas pernas pelo quadril dele. Onde vi isso mesmo?… Ah sim em um filme pornô no qual ali eu 59
era o jovem fraco (realmente sou) e ele o homem forte “urso” de minha vida (que realmente é ele). Ele ficou me olhando, não queria desviar o olhar, mas ele me colocou na cama, um último beijo olhou em volta. — Allen por favor, minha cueca. — disse ele. — Ah. — protestei. — Tudo bem. — ele vestiu a calça e depois abotoou a camisa Armani. Ele se curvou e me beijou novamente. — Até qualquer hora meu amor, descanse. E assim ele saiu do quarto, me deixando ali, de olhos fechados e beicinho esperando outro beijo. Abri meus olhos e o quarto estava silencioso, era hora de fazer tudo que estava atrasado. Peguei o livro gay para a aula de teatro no dia seguinte, o dia em que se escolheria os alunos em seus respectivos personagens. Eu passaria no teste? Provavelmente não. Sentei em frente ao meu laptop. Abri a pasta com o meu “livro”, apaguei tudo. E comecei a escrever. Estamos presos a um único mundo, onde a alegria anda de mãos dadas com a tristeza. Quando você sente a tristeza seu mundo acaba, nada sobra, apenas os escombros de um passado distante, aí vem o amor novamente, reconstruindo casa por casa até chegar ao grande palácio – que é seu coração – e facilmente abre a porta sem nenhum protesto do dono – no caso eu –, a nova sensação é estranha, mas confortante. Daí quando menos esperamos vem a tempestade – no caso, minha mãe – e acaba com as casas deixando apenas intacto o palácio, mais eu sei que o amor está comigo, dentro do palácio, e nada além dele vai me fazer feliz. Como diz aquele ditado “Águas passadas não movem moinho”, certamente não, então não posso me prender as coisas que me fizeram felizes e logo em seguida destruiriam essa felicidade. Estou em um novo mundo agora, e nesse novo mundo eu posso amar quem que quiser.
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CAPÍTULO 11 A Professora Lafaiete estava em pé no meio do palco do auditório, o único ponto luminoso no auditório. Eu e os outros quarenta alunos “dispostos” a tentar o papel principal estávamos sentados nas cadeiras de plástico vermelho. Murilo do meu lado estava com as falas que ele escolhera do livro para interpretar, ele era o primeiro a tentar. — Murrilo. — chamou Prof.ª Lafaiete. — Boa sorte. — sussurrei. Ele sorriu e foi para o palco. Prof.ª Lafaiete sentou em uma cadeira com uma prancheta na mão e disse: — Pode começarr estarrei anotando tudo. — ela ergueu a prancheta. — Boa sorrte. E parra contrracenarr com Murrilo, porr favorr Gustav pode virr. Gustav subiu, não sabia o que ele caçava ali na Aula de Teatro já que ele era o líder da equipe de Handebol da escola. Murilo olhou para a plateia e começou: — Essa cena está na página quatrocentos e quinze. — ele ergueu as folhas sulfites. Peguei meu exemplar de O Sonhar do Sol Nascente e abri na página que Murilo disse. E começou — Como posso viver se meu amor está prestes a morrer, se a Morte me levas tudo que mais necessito. — A Morte não precisa lhe levar nada. — Gustava começou. — Basta apenas negociar. — Negociar com quem me roubas? — Sim. Pois a Morte necessariamente não existes. — Gustav olhou para a plateia. — Se é de amor que tu vives então viverás sem ele, caso não me pagues o que deves — ele se virou para Murilo — Vosmecê não pagará com sua vida, pois serão as pessoas que amas que partirão. — Caso sejas assim. — Murilo fez como se tirasse uma espada da cintura. — Não amo você, mais para que os quem eu amo sobreviver lutarei contra você. — E eles começaram uma falsa luta. Murilo perdeu. A parte mais triste da história. A morte do galã sexy e gostoso… voltei minha atenção a peça. 61
— Escolheu morrer, desgraçado. — fingiu guardar a espada na cintura. — Agora quem morres é seu amor. A Prof.ª Lafaiete levantou e aplaudiu. — Brravo. — ela sorria. — Um bom começo parra a peça. Agorra serrão Allen Spinnet e — meu Deus — Trrace O'Harra. Trace? O capitão do time de futebol? Por que os populares estavam aqui? Por que vieram ver minha desgraça atuando? Simmm! Gritava Allen Sincero na minha cabeça. Naaão! Gritava Allen Bonzinho do outro lado. Allen Sincero pulou em cima de Allen Bonzinho e o matou. Allen Sincero tinha razão. Era para zoar mais tarde que eles estavam aqui. Puxei o cateter pelos degraus e estava em cima do palco. Os olhos de trinta e oito alunos estavam sobre mim, tirando claro o povo da última fileira com os celulares ligados. Entre eles Honda. Por que Senhor? — Qual parrte? — perguntou Prof.ª Lafaiete. Me arrependo agora de ter escolhido essa parte, e por que Trace vai fazer o papel do galã. Será um pesadelo agora? Não é muito real. (Vocês verão por que.) — Página trezentas e trinta e sete. — respondi. As pessoas folhearam os livros e olharam para mim com surpresa. Corei com tantos olhares. — Excelente. — disse Prof.ª Lafaiete. Excelente? Tá de brincadeira né? Não pode troncar não? Olhei novamente para a plateia e respirei fundo e comecei. — Que prazer ver lhe aqui, senhor. — disse. — O prazer é todo meu, e não me chame de senhor, chame-me de apenas Math. — disse Trace. — Math. — repeti. Trace se aproximou como dizia a cena. — Noite linda. — disse Trace a quarenta centímetros de mim. Borboletas formigaram dentro de minha barriga. É só uma cena Allen. — Sim. — concordei fingindo olhar o “céu” que é o teto do auditório. 62
Ele passou a mão pela minha cintura e me puxou junto a seu corpo. A pressão fez minha pele queimar onde nossa pele se tocou. Olhei para cima, como pedia a cena – e também por Trace O'Hara ser maior do que eu. Ele se curvou um pouco deixando testa com testa. Ouvi risinhos do fundo do auditório. Ignorei. As folhas sulfites caíram da minha mão rumo ao piso de linóleo. Olhava nos olhos lindos de Trace. Ele me puxou mais um pouco, se aquilo era possível, minhas mãos se espremeram firmemente em seu peito largo. Sentia o coração dele batendo acelerado em minha mão. Sabia aquela parte de decor. — Você é a estrela que caiu do céu. — disse Trace. — Você iluminou a escuridão que havia em meu caminho. — E você é o Sol que ilumina o meu dia. — eu disse. — Eu sei. — sussurrou ele em meu ouvido. Não havia isso no texto. — Vamos firmar nossa marca. — isso havia. Ela passou a mão pela minha bochecha e levantou devagar a minha cabeça e selou nossos lábios. Tudo girou, não era um beijo de peça, era algo real, forte e verdadeiro, não de minha parte, mais sim vinda dele. Ele agarrou minhas bochechas e enfiou a língua dentro da minha boca. Eu pressionei a mão no peito dele para que se afastasse. Mais ele não se afastou. — Excelente meninos. — disse Prof.ª Lafaiete. Trace me soltou e saiu. Olhei para Prof.ª Lafaiete que tinha um sorriso de orelha a orelha. — Achamos Math e Hony. — ela disse. Como? Trace sorriu e sumiu na escuridão rumo aos amigos dele que riam e olhavam o celular. Olhei mais ao fundo ainda e estava Pietro ao lado da porta com uma pequena caixa de chocolates na mão, uma expressão de surpresa no rosto. Que burrada eu fiz.
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CAPÍTULO 12 “Oh meu Deus ele morreu?” o grito vinha de algum lugar ao meu lado, não conseguia respirar apenas sabia que quem perguntava era Murilo. Vi um vulto se aproximar. “Não toquem nele, pode terr quebrrado alguma coisa” era a voz de Prof.ª Lafaiete. “Ligue para a emergência” disse Rebecca. “Vou ligar” disse Dylan. Senti os vultos sumirem. O que estava acontecendo comigo. Eu estava morrendo? Minha alma estava deixando o meu corpo? Era o meu castigo por conta de ter magoado os sentimentos de Pietro…? Pietro! Onde estava ele? Onde estava meu amor? — P-Pietro-o. — sussurrei. Certamente ninguém ouvira isso. Tentei me mexer, mais uma mão forte segurou meu peito. — Fique parado. — eu não conhecia essa voz. Tentei abrir meus olhos, mais eles estavam pesados demais. Apenas escutei o barulho de uma sirene. A ambulância havia chegado tão rápido assim? Senti meu corpo sendo deslocado para cima de algo duro e depois o ar voltar para dentro de meus pulmões. Senti o cano de oxigênio no meu nariz. Senti mãos pelo meu corpo, abrindo meu moletom, algo quente escorrendo pelo meu peito. Depois algo pressionou meu pescoço. Tentei abrir agora os meus olhos, mais ainda não estava tudo nítido. Via apenas vultos e a forte luz do teto da ambulância. Por que minha vida estava sendo tão estranha nas últimas setenta e duas horas? O que eu fiz de errado? Eu havia magoado alguém e agora estava pagando por tudo? Tantas interrogações e quase nada de respostas. Onde eu estava me metendo? A ambulância parou, as portas foram abertas e o vento frio do 64
lado de fora bateu contra minha pele pálida exposta. As rodas da maca rangeram ao ser movimentadas. Ouvia o barulho de pessoas correndo em todas as direções. — Clarice. — alguém gritou. — Chame algum médico. Meu Deus, será que Pietro estaria ali? — O que aconteceu? — não era Pietro, eu não reconhecia a voz feminina que certamente era a médica. — Dra. Lauren ele foi atropelado. — disse um homem a minha esquerda. — Uma análise rápido parece que ele deslocou o ombro, quebrou a clavícula e uma costela. Tudo isso? Só foi ele falar que senti a dor entrando dentro de mim. Era terrível. Uma dor que misturava sentimentos e outras a mais. Não ouvira falar de uma tal de Dra. Lauren? Ela seria nova? Apesar de ser a segunda vez que eu estou entrando no hospital. — Levem ele para a sala de cirurgia. — a voz de Lauren ecoou pela minha cabeça. Cirurgia? Tentei me mexer, mais algum braço me conteve. Eu precisaria mesmo passar por cirurgia? Fora assim tão feio. Então me lembrei das manchas vermelhas na neve em frente ao colégio. O JHS – Jellyborn High School – nunca juntara tantas pessoas. Outras portas foram abertas e fechadas. Passos rápidos estavam ao meu lado. — Onde está o Dr. Sullivan? — era a voz do homem a minha esquerda. Finalmente alguém havia perguntado. — Ele sofreu um mal estar, mais hoje também é o dia de folga dele. — respondeu Lauren. Pontada no peito. Oxigênio saindo de meus pulmões – fracos de mais para inspirarem sozinhos. O homem a esquerda notou isso e colocou uma bomba de oxigênio manual no meu nariz e foi apertando. Então a maca parou, eles retiraram o lençol que cobria minha seminudez. — Anestesia. — disse Dra. Lauren. Senti uma picada no meu braço. — Pegue o estojo… 65
Minha visão ficou embaçada e senti minhas pálpebras pesarem e tudo estava escuro. Ele apertou meu braço. Me virei e encarei Eric Longwater. Ele era lindo, o único do terceiro ano que dava moral para os adolescentes do nono ano. Meu coração acelerou com a pressão que ele infligia em meu braço. Olhei em seus olhos cor de mel e vi que ele gostava de me apertar. Ele tinha o cabelo acaju cortado dos lados e um leve topete em cima. Seus lábios grossos curvaram na hora que chamaram meu nome. Havia um ano que eu descobrira o câncer, e a quimioterapia havia levado meus cabelos. Ele gostava de mim desse jeito. Fraco. Deve parecer estranho, mais quando se está apaixonado você deixa a pessoa do seu lado fazer qualquer coisa com você, mesmo que você sinta dor. — Allen. — ele sussurrou. Não pensei no momento por que ele estava sussurrando em meu ouvido, já que estávamos sozinhos do outro lado da quadra poliesportiva. Um lugar até estranho para mim, que passava o intervalo dentro da biblioteca. — Eric. — disse no mesmo tom de voz. — O que você quer? Ele me apertou contra a parede da quadra. Senti o calor voltar, como das outras vezes que ele ia falar comigo na hora do intervalo dentro da biblioteca, sempre querendo ajuda em alguma matéria, já que eu era considerado o “mais” inteligente da minha turma. — Alguma coisa em álgebra? — perguntei olhando no fundo dos olhos deles. Mais meus olhos questionavam por que eu não olhava para outras partes, para seu enorme corpo definido espremido contra o meu na parede, do outro lado da quadra onde ninguém nos veria? Senti o hálito doce de sua boca contra as minhas bochechas já coradas pelo pequeno espaço entre nós – mais precisamente quinze centímetros (tenho uma régua mental). Todos sabiam que Eric havia se separado de Lygia, a mais popular garota do segundo ano. Ela era linda tenho que admitir, mais sentia inveja por ela ter nas mãos o garoto por quem eu 66
era apaixonado. Mais fora Lygia quem acabara com o namoro, ela dissera que não dava, mais todos sabiam que ela havia ficado com o amigo de Eric, Nathan – outro gostoso… Eu tinha pena de Eric por tudo que havia acontecido com ele, e no dia anterior o time de futebol havia perdido por conta de Eric ter machucado o tornozelo na escada de casa. Era mentira, ele não estava com cabeça para ir ao jogo e ver Lygia toda feliz dançando a coreografia das líderes de torcida. — Não. — respondeu ele a minha pergunta. — Você já sentiu algo por alguém que não retribui seu amor? Pânico. Minhas mãos tremeram, coloquei meu cateter de oxigênio contra a parede pichada e coloquei as mãos no peito largo de Eric. — Sim. — respondi. Admito eu era bem saidinho aos catorze anos. Ele pressionou mais eu contra a parede. Eric passou a mão pela minha cintura. — Que brincadeira é essa? — perguntei tentando voltar ao normal, sentindo meus hormônios reagirem sozinhos. — Não é nenhuma brincadeira, Al. — gostava quando ele me chamava pelo apelido que me dera, apenas Al. — Eric… — sussurrei. Mais meus lábios foram fechados com os deles, não resisti, não era resistir o que eu queria fazer naquele momento. Passei meus braços contra o pescoço dele, e ele me ergueu um pouco, aproveitei e passei minhas pernas pelo quadril dele. Sentia algo enrijecendo. Corei. Mais continuei beijando. Ela passava uma mão em minha cintura e a outra passava pela minha coxa. Uma de minhas mãos estava presa em seu cabelo acaju, enquanto a outra estava passando pelo peito, indo até as costas e voltando ao largo peito. Ele parou d eme beijar, meus olhos fechados se abriram, nossas testas estavam grudadas uma na outra, nossa respiração uma só, mesmo com o oxigênio entrando freneticamente em meus pulmões parecia que eu estava sem ar. Ele sorriu mostrando uma fileira de 67
dentes dignos de um comercial. Eu sorri também. — O que foi isso? — perguntei. — Meu amor por você. — disse ele. Eu corei. Não corava tanto desde o papo sobre sexo que minha mãe dera assim que eu assumi, ela revelava se eu queria ser o ativo, versátil ou passivo, mais vem cá, prefiro… Meu Deus como sou safado! Não tinha palavras para o que ele me dissera. — Eu… — Por favor não fale nada ainda. — ele pousou um dedo levemente na minha boca e continuou: — Eu não sabia se você ia querer também. — ele sorriu. — Mais vejo que você gostou. — ele passou a mão pela minha bochecha. — Adoro quando você cora. Corei. Meu Deus… sério preciso passar em algum especialista em coramento, pois estou em um grave problema. Ele chegou mais perto – se é que era possível – e nossos narizes colaram um no outro, e nossos lábios voltaram a se encostarem, mais quente do que antes. Devo admitir que nós dois começamos algo como bromance, apenas beijando, nada mais. Meu quarto virou uma barraca de beijos e o dele um projetil de futuro motel. Aquela noite era a noite de eu falar tudo para minha mãe, e Eric viria jantar ali. Havia preparado tudo. Mais a noite não foi perfeita. Eu estava com a travessa de legumes indo para a mesa de jantar quando minha mãe atendeu o telefone. A tigela caiu no chão. Eric fora-se aos dezessete anos. Na noite que mudaria nossas vidas. O maldito homem que batera na Harley dele fugira, deixando ele morrendo sobre os flocos de neve que caiam. Sai de casa, correndo embaixo da tempestade, fraco por que ainda não havia trocado o cateter. Não sei como mais acabei chegando até a casa dele, esperando que fosse mentira. Mais não era. A casa estava movimentada pela chegada dos policias. Reconheci a senhora Longwater chorando na varanda ao lado do marido dela. Fui até lá. Sr. Longwater me encarou, com os olhos vermelhos de raiva. — Tudo culpa sua. — gritou ele. 68
As pessoas se viraram e nos olharam. — Se não fosse essa maldita veadagem meu filho não estaria morto! — ele se levantou e apontava o dedo para mim. — Não é culpa dele. — dizia a Sra. Longwater tentando controlar as lágrimas. — Sim, é! — ele se voltou a mim. — Saia daqui! Nunca mais volte aqui! Ele me empurrou, rolei os três degraus da varanda. Todos estavam ali, mais ninguém me ajudou. Ouvi o carro de minha mãe parando. — Allen. — ela gritou vindo em minha direção. — Nunca mais volte aqui! — gritava o Sr. Longwater. Minha mãe me ajudou a levantar enquanto íamos para dentro do carro. — Não quer falar sobre isso né? Neguei com a cabeça enquanto ela fechava a porta dela. Depois disso ninguém mais me chamara de Al. Acordei em uma maca com a luz forte em meu rosto. Minha mãe estava cochilando na poltrona ao lado. Não fiz nenhum movimento para não acordá-la. Olhei para o criado-mudo ao lado. Havia um buquê de flores em um jarro. Peguei o cartãozinho que o acompanhava. Em nome dos alunos da Jellyborn High School. Madame Lafaiete. Quanto carinho. Pousei o cartão. Olhei para porta entreaberta, Murilo, Dylan e Rebecca estavam sentados nos bancos. Rebecca lendo uma revista. Dylan um livro e Murilo mexendo no celular dele. Quanto tempo eu passei desacordado? Muito. Olhei o relógio sobre a porta. 22h14. Lembro que a Aula de Teatro acontecia as 14 horas, ou seja, quase doze horas desacordado. Tentei sentar, senti uma dor imensa no meu peito, ombro e quase perto do pescoço. Olhei para a região e vi tudo enfaixado e com 69
algumas manchas rosas, quase vermelhas – sangue. — Acordou? — a voz familiar encheu meus ouvidos. Me virei para o outro lado que não havia olhado antes. Ali estava Pietro. — Sim. — disse. — Bom. — ele não estava sendo carinhoso, apenas obedecendo as etiquetas médicas. — Sobre hoje cedo… — comecei. — Não precisa explicar nada Allen. — ele olhou nos meus olhos. — Nunca me decepcionei tanto com ninguém. Ele se moveu como se quisesse sair do quarto. — Não. — eu disse. Ele se virou. — Sentido alguma dor? — perguntou ele. — Não. — respondi. Ele se virou e saiu pela porta. *** Recebi alta três dias depois. Praticamente metade do JHS estava me esperando curar. O vídeo viral do YouTube batera quinhentas mil visualizações. Aquilo ainda me corroía. — Finalmente. — disse minha mãe. — É. — respondi. — Querido, eu não queria lembrar, mais… — Eu sei. — disse. Senti meus olhos marejarem. — Faz três anos que Eric morreu. — eu disse. — Três dias atrás, no dia do meu acidente. A lembrança veio, mais eu não queria sofrer mais. Chegamos em casa, Leo como sempre estava lá, havia cuidado da casa durante minha estadia no hospital, e agora ajudava eu a subir os degraus para chegar ao meu quarto. Fui colocado na minha cama, agora com mais almofadas do que antes. Pedi para que me desse o meu laptop, ele me deu e saiu do quarto. Entrei no Facebook e vi que ele… engoli… Pietro estava online. Se fosse para correr atrás eu correria. “Oi” mandei pelo Mensseger. 70
Ele visualizou, apareceu digitando e depois nada. Esperei três minutos. Quatro. Cinco. Seis. Dez. Quinze. Vinte. Nada. Voltei ao Mensseger e cliquei no nome dele. Uma mensagem apareceu, não dele, e sim do próprio Facebook. “Pietro Sullivan lhe bloqueou” Suspirei. Sai do Facebook e entrei no YouTube. Queria apenas ser feliz, mais como isso não era possível vou tentar ir mais um pouco no fundo do poço. Digitei: “Olha como ele gosta” e o vídeo apareceu. 530 mil visualizações. Cliquei nele. Apareceu Trace me agarrando e a voz de Honda narrando: “Ele nunca mais vai sentir isso na vida dele.” E Trace me beijando. “Olha como ele gosta… olha” As lágrimas vieram. Fechei a Internet e abri meu pequeno refúgio. O último rascunho que eu escrevera. E voltei a digitar. Por que sofremos pelas pessoas que amamos? Por que nos damos ao luxo de rastejar e pedir desculpas mesmo sabendo que ela não vai aceitar. Porque somos bobos em um mar de bobos. Temos inúmeras opções e sempre escolhemos aquela que vai destruir nossa vida. Sempre aquela. Viramos ratos em busca do mais delicioso queijo, enquanto tentamos de tudo para sentir pelo menos o mais leve toque da tal pessoa. Agora minha única opção é morrer. Deveria pensar ao contrário. Deveria querer ajuda, mais agora estou prestes a me juntar a quem me amou de verdade. Coloquei o computador de lado. Olhei para meu novo cateter que me prendia aquela vida inútil. Puxei ele para mais perto e fechei a válvula que mandava oxigênio pelo cano que o levava aos meus pulmões. Logo o celular de minha mãe ia tocar, aplicativo de controle oxigenais e ela viria ver o que acontecera e veria meu corpo, ali, gelado e sem vida. Respirei ar puro, meus pulmões protestaram e a dor veio. Aos poucos sentia uma fadiga, meu coração acelerando. E o último toque, olhei o meu celular, não conseguia mover nenhum músculo do meu corpo a não ser as minhas mãos. Era uma mensagem de Pietro, 71
consegui ler apenas o começo antes de apagar sorrindo. “Meu amor…”
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CAPÍTULO 13 PIETRO Sentei em minha poltrona de couro no meu escritório. Há cerca de meia hora eu havia bloqueado Allen nas minhas conversas do Facebook, agora eu me arrependia. Respirei fundo e peguei meu celular, procurei em meus contatos o número de Allen, achei. Percebi que não estava em condições para falar, então mandaria uma mensagem. Mas como começar essa mensagem? Oi? Simples demais. Algo que mexeria com ele e ele ficaria lendo isso em vez de jogar o celular de lado, então comecei. Allen querido. Não. Simples demais. Deletei. Então recomecei. Meu amor Agora sim. Meu amor, se eu pudesse expressar minha forma de amor por você não caberia apenas no planeta Terra, ia ser preciso um Universo inteiro, como estou aqui para pedir desculpas, algo que eu fui infantil de não ter pedido e nem aceitado as de você. Sou um bobo, na realidade mais do que isso, eu sou um idiota. Talvez essa mensagem de texto seja muito longa, não quero deixar você aos prantos ou se deixar culpado. Espero que aceite minhas desculpas, caso aceite, espero lhe encontrar amanhã a noite. Beijos meu amor. Enviei a mensagem. Esperei cinco minutos, tempo suficiente para ele ver minha mensagem. Ele não respondeu. Imaginei ele refletindo sobre minhas bobas palavras, e me encostei mais ainda na cadeira. Lembrei da primeira vez que o vi, nossos olhos se encontrando… balancei a cabeça quando ouvi a cadeira sendo afastada, abri meus olhos e vi Maggie, a minha faxineira. Olhei meu celular e vi que Allen ainda não havia me respondido. Suspirei. Era o dia da faxina. 73
Vinte minutos depois que a mensagem foi enviada eu pensei que Allen nunca mais quer ver a minha cara. Seria raiva? Na realidade o trouxa na história fui eu. Levantei-me, vou tomar um banho. Isso, um banho para relaxar a cabeça. Olhei em volta e vi que Maggie já havia limpado meu quarto e os banheiros. Entrei dentro do que ficava no meu quarto e fechei o box. A água estava fria como eu gostava. Olhava a água descendo pelo ralo e as gotas que escorriam pelo vidro. Desliguei o chuveiro e me larguei na cama, sem me importar em me vestir, sei que Maggie não vai voltar no meu quarto, não antes de me ver sair dele. Peguei meu celular. Bom… Me levantei sobressaltado com uma ideia. Daria certo, escolhi uma calça de caminhada e um moletom a muito escondido atrás dos jalecos, passei os dedos no cabelo, peguei o celular e a chave da garagem. Olhei para a minha velha bicicleta, fazia o que? Cinco anos que eu não andava nela? Talvez menos, talvez mais. Peguei ela, soltou um estalido. Vi que os pneus estavam murchos, revirei a prateleira atrás de um enchedor e vi que eles estavam aos lados dos meus patins de gelo, que eu usava em Montreal no Canadá nas férias de fim de ano. Sai com a bicicleta com os dois pneus enchidos. O vento frio bateu no meu rosto quando comecei a pedalar. Pequenos flocos caiam. O movimento de Jellyborn City estava parado, um verdadeiro surtum, ou um grande cemitério em uma segunda-feira de manhã sem enterro. A casa de Allen não ficava longe, e uns quinze minutos depois eu estava virando na rua da residência dos Spinnets. A rua estava parada a não ser por causa da ambulância na porta da garagem da casa de Allen. Meu coração deu um palpito maior. O que havia acontecido com Allen? Acelerei as pedaladas. Por que eu não viera de carro? Burro! Freei em frente a caixa de correio com o sobrenome da família em vermelho na caixa. Saltei da bicicleta enquanto ela arrancava 74
alguns pedaços de grama. Vi a porta aberta e corri para dentro. — Graças a Deus um médico. — ouvi a voz do paramédico Will. — O que foi Will? — perguntei. — O jovem Allen parece que ficou sem oxigênio. — disse Will passando a mão pelo bigode de morsa. — A Dra. Lauren não pode vir, ela estava no meio de uma cirurgia do Tom, que teve AVC. — Tudo bem. — eu disse indo até a sala onde parecia estar todo mundo, menos Allen. — Onde está ele? — perguntei para a mãe de Allen, Victória. — Dormindo. — disse ela. — Quer velo? É o que mais quero. Mais apenas respondi: — Sim. Ela me acompanhou até a porta do quarto de Allen que eu conhecia muito bem e abriu a porta, ele estava deitado na cama, com o famoso pijama. — Bom preciso ir entregar um café que prometi aos paramédicos. — ela se virou. — Qualquer coisa é só gritar. — ela deu um meio sorriso revelando furinhos na bochecha, como Allen faz. Ela saiu. Me sentei na cama ao lado dele, fazendo de tudo para não acordá-lo. Passei a mão pela pele pálida dele. Senti o fogo em mim, como todas as vezes que nos tocávamos. Passei a mão pelo cabelo dele. Gostava dele, de tudo nele na realidade, não sei o que aconteceria comigo se eu perdesse ele. Me curvei e beijei a bochecha dele. Ele se remexeu, um pouco mais não acordou. Sorri. Olhei pelo cano dele que levava até um enorme cateter, maior do que o que eles carregavam. Vi o antigo, pequeno e cheio de adesivos de bandas de rock em um canto do quarto. Me levantei e fui até onde o celular dele estava. Apertei no botão de ligar e vi que estava na minha triste mensagem. Será que ele vira a mensagem? Será que fora ela que causou isso a ele? Olhei em volta. Um lugar tão familiar e ao mesmo tempo tão longe. Olhei para Allen deitado, seria assim tão difícil nosso amor? Se eu causava dor a ele o melhor que eu podia fazer era ficar longe, então 75
eu sai do quarto dele. — Não quer café? — perguntou Victória vendo eu indo até a porta. — Não obrigado Sra. Spinnet. — disse. — Preciso cuidar de alguns assuntos. — E saí da casa. Peguei minha bicicleta e pedalei o mais rápido que eu pude até minha casa. Maggie já havia indo embora. Senti um alívio com aquilo. Corri para meu quarto e me joguei na cama, parecia um adolescente me jogando nela e chorando. Não me chamem de bobo – odeio ser assim – mais eu estava acumulando muitas coisas em minha cabeça e o melhor a fazer era chorar, isso diminuiria um pouco o efeito do dia seguinte, o dia da próxima consulta com Allen.
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CAPÍTULO 14 Acordei na manhã seguinte com uma forte enxaqueca e uma dorzinha no peito. Respirei fundo. Eu era tão culpado que nem havia conseguido morrer direito. A primeira coisa que fiz foi ler a mensagem de Pietro para mim, na qual eu nem consegui ver. Meu amor, se eu pudesse expressar minha forma de amor por você não caberia apenas no planeta Terra, ia ser preciso um Universo inteiro, como estou aqui para pedir desculpas, algo que eu fui infantil de não ter pedido e nem aceitado as de você. Sou um bobo, na realidade mais do que isso, eu sou um idiota. Talvez essa mensagem de texto seja muito longa, não quero deixar você aos prantos ou se deixar culpado. Espero que aceite minhas desculpas, caso aceite, espero lhe encontrar amanhã a noite. Beijos meu amor. Meu Deus. Respirei fundo absorvendo as palavras de Pietro. Hoje era um péssimo dia para mim. Era dia de consulta. Aos quinze anos no primeiro ano da morte de Eric eu tinha um dever interno de visitar o túmulo de quem eu amei. Apesar do Sr. Longwater não querer me ver ali, nem em qualquer lugar. Peguei o buquê de rosas brancas – Eric gostava de branco – minha mãe me levaria, mesmo relutando e me perguntando se era isso mesmo que eu queria. Eu falava que era. Sim era. Era difícil tirar uma ideia da minha cabeça quando eu queria muito ela. (Nessa época, por que hoje em dia eu era facilmente mudado). Quando entrei no cemitério me senti tonto. Uma onda de tristeza passou pelo meu corpo, eu sabia onde Eric estava enterrado. Caminhei até lá, o cateter enroscando na grama queimada pelo sol. O mausoléu onde Eric Longwater estava enterrado era de mármore negro, com um pequeno anjo no topo. Respirei fundo e me aproximei. Havia um enorme quadro dele, sorrindo como sempre fazia. 77
Dentro havia vários troféus de futebol, camisas de times autografadas e mais fotografias de todas as idades possíveis. Coloquei meu buquê no meio de milhares de outros e me sentei ao lado do túmulo. — Você. — ouvi a voz de raiva. Me virei e vi o Sr. Longwater me encarando, de olhos vermelhos, provavelmente ele havia chorado bastante. — Desculpe. — me levantei. — Não, não. — disse ele. Parei, me virei e ele havia se aproximado mais ainda. — O que foi? — perguntei rispidamente. — Desculpe pelo que aconteceu a um ano lá em casa. — ele colocou a mão no meu ombro. — Eric era bi, mas gostava de você mais do que da outra namorada. Novidade, ele sempre me contara isso. — Tudo bem. — eu disse começando a me caminhar. Ele me acompanhou. — Sério. — eu disse. — O.k. — ele pegou algo dentro do bolso. — Eric havia feito cartas para todos nós, uma para você. Parei e me virei novamente para ele que segurava o embrulho na mão. — Parece que a sua é a que tem mais. — ele disse. Sorri. — Tome. Eu peguei o embrulho e o olhei. Para Allen Spinnet. Estava escrito na letra dele. Sorri novamente, levantei o olhar e vi que o Sr. Longwater estava chorando. — Desculpe Sr. Longwater… — Apenas Phil. — ele disse. — Phil. — repeti. — Isso. — disse ele. — Não quero mais fazer a família de vocês sofrerem. — eu disse. 78
— Já basta a vida do filho de vocês que eu tirei, não quero acabar com mais nenhuma. Ele colocou a mão no meu ombro. — Você virou um filho para mim. — disse ele. Me surpreendi o que ele havia dito. Phil me acompanhou até o portão onde minha mãe esperava com uma revista da Vogue. Ela levantou o olhar e ela encarou Phil. — Tudo bem. — eu sussurrei para que ela lesse meus lábios. Funcionou. — Bom. — disse Phil. — Até qualquer hora. — ele se virou e foi embora. Entrei dentro do carro. — Quer falar sobre isso? — perguntou Victória. — Depois. — disse a ela. Aquela noite eu ainda não havia aberto a carta de Eric, era hora de ver o que ele havia escrito para mim. Com maior cuidado eu abri o envelope. Al amor. Al. Meu apelido a muito enterrado, voltei a ler. Sempre que me ver… Ah esqueça, não serei sentimental. Talvez minha família não aceite nossa paixão, mais caso um dia nós se separarmos, espero pelo menos entregar essa carta. Aqui está algo que quero que veja, não sofra não chora. Tarde demais, eu já estava chorando. Nosso amor foi bom enquanto durou, foi verdadeiro, como nunca antes. Não é um amor que acabe da noite para o dia, é algo mais duradouro, que só a morte ou algo maior que ela possa destruir. Foi a morte. Comecei a soluçar. Em algum lugar, seja o mais distante que for eu sempre vou te amar, espero que seja recíproco. Que seja eterno, que seja lindo, que seja nosso, talvez #Alric (junção de nossos nomes) seja o mais belo casal que possa ter caminhado por essa Terra de pessoas preconceituosas e com mentes paradas no século XIII, mais nós somos 79
atuais o bastante para enfrentar uma simples barreira, quando nós estudávamos juntos na sua casa me controlava para não beijá-lo, era algo difícil de se controlar, e quando apareceu a oportunidade eu a agarrei, e gostei muito que você também tenha gostado. (Estou sorrindo) Sorri. Bom, nosso amor mudará, sei disso, enfrentaremos muitos obstáculos, mais nada irá destruí-lo. A carta acabou, olhei para ela pasmo, como que podia ter acabado assim? Olhei e vi manchas de água nela. Como podia acabar assim? Abri mais o envelope e jogando o que tinha dentro sobre a minha cama. Havia fotos nossas, um pequeno alecrim e um anel. Peguei o anel e o coloquei no dedo anelar da mão direita. Serviu perfeitamente. Ele iria me pedir em namoro? O hospital estava mais movimentado do que o meu primeiro dia. Sentei no banco enquanto via os pacientes entrando e saindo. Quando chegou a minha vez. — Allen Spinnet. — era a voz de Pietro. Estremeci enquanto me levantava. Minha mãe me acompanhou, era dia dela acompanhar. Entrei na sala. — Bom dia Allen, Sra. Spinnet. — ele sorria para minha mãe, parecia se desviar do meu olhar. — Bom dia doutor. — disse minha mãe. — Bom hoje começaremos o tratamento. — disse ele. O inferno ia começar. — Vamos começar internando Allen na Casa Experimental. — Casa Experimental? — perguntei, não sabia dessa parte. — Sim. — respondeu ele. — Fica ao norte de Jellyborn City. Ela foi construída para tratamentos experimentais, é como se fosse uma pequena aldeia com cinco casas, apenas usamos duas. Assenti com a cabeça e me desliguei do resto da conversa, voltei a tona quando minha mãe se despedia e parecia ver a tensão no ar. 80
— Tchau. — eu disse a ele. — Victória por favor deixe Allen um pouco mais. — disse ele. Como? — Claro. — respondeu minha mãe saindo do consultório e dando um último olhar para mim, eu assenti. Me virei para Pietro, antes que eu pudesse falar qualquer coisa ele havia passado as mãos em minha cintura e me beijou, não me bloqueio, apenas apreciei. Ele parou e me olhou. — Desculpe. — disse ele. — Não… Ele foi até a porta e chamou o próximo nome. Olhei para ele. Ele fez um gesto para que saísse da sala. Olhei uma última vez em seu belo rosto e saí da sala. Dentro do carro minha mãe falava sem parar sobre como a Casa Experimental era bonita, as fotos eram de dar inveja em hotéis fazendas. Quando chegamos em casa, minha mãe se entregou aos braços de Leo, que praticamente morava em casa. Subi para meu quarto e vi minha mala em cima da cama. Não estava com cabeça para fazer a mala eu apenas queria parar de pensar. Não ia tentar me matar de novo, aquilo fora muito infantil. Peguei meu laptop e abri o meu e-mail, havia algumas de Dylan, Rebecca e Murilo em um grupo e me surpreendi com uma diferente: Trace O'Hara. Suspirei e abri. Al Como assim, ele estava me chamando de Al, quem me chamava de Al era apenas Eric, quem dera intimidade a ele para me chamar assim. AL AL AL AL AL AL AL… Esse apelido me persegue. Voltei ao e-mail. Al, queria saber se você está disponível na sexta a noite. Queria conversar sobre a peça já que somos o Math e Horny. Bom, se sim, mande uma mensagem, quero te levar para conhecer um sushi-bar 81
incrível. Olhei meu calendário. SEXTA-FEIRA. Que inferno. Apertei para responder. Cara não vai dar, sinto muito. Olhei, depois respirei e apaguei a mensagem, era apenas uma conversa sobre a peça. Claro. Ele respondeu minutos depois. Passo as sete. Eram 18h58 minutos. Olhei para mim, simples até para um sushi-bar. Uma camisa social branca com uma calça jeans meia desbotada azul e tênis Vertus. Penteei meus cabelos rebeldes de lado. Era 19h00 quando a buzina me assustou na varanda de casa. — Boa sorte. — disse minha mãe abraçada com Leo. Assenti. — Olá. — disse Trace abaixando o vidro do Range Rover Evoque. — Olá. — disse. — Pode entrar, eu não mordo. — começou com as piadas. — Claro. — disse entrando. Ele não morde, ele beija. — Gosta de sushi? — perguntou ele pisando fortemente no acelerador. — Mais ou menos. — respondi. — Eu amo. — respondeu ele. Assenti. Ele virou em ruas que eu nunca havia reparado antes e chegamos a uma rua estranha, apertada demais. — Bem-vindo Al a Chinatown de Jellyborn City. — disse ele. Al de novo? Olhei pelo vidro e havia prédios com aspectos orientais. As pessoas tinham olhos puxados e uma cor branca como papel, havia árvores sakuras e tudo mais. Olhei para Trace. 82
— Isso fica mesmo em Jellyborn City? — perguntei. Ele sorriu com a minha curiosidade. — Sim. — ele parou em frente a um prédio parecido com aqueles templos de filme de Jack Chan. — Sushis do Liang. — eu falei. — O melhor. — disse ele. Quando descemos do carro o vento frio fez com que o cheiro de comidas com temperos fortes entrassem pelas minhas narinas. — Bonito prédio. — eu disse. — Arquitetado pelo meu tio. — disse Trace. — Sério? — perguntei. — Sim. — disse ele. Entramos pelas portas de vidro. O ambiente tinha um cheiro adocicado e estava cheio de pessoas. Um homem chegou perto de nós, usava um terno claro e tinha aspectos orientais. — Sr. O'Hara. — disse o homem. — Que prazer. — Claro. — disse Trace. — Young leve eu e meu amigo até a minha mesa. — Por aqui. — disse ele. Nós passamos por outra porta, essa de bambu claro, do outro lado parecia mais requintado, mais quieto. Menos pessoas estavam lá, mas as pessoas que estavam sentadas lá eram de um clima mais ricas, como Trace. Olhei para mim, e vi minha roupa simples. — Aqui. — disse Young. A mesa ficava de frente para um jardim de inverno, cheio de bonsais. Nós nos sentamos e Trace disse: — Por favor traga o cardápio. — Young assentiu e saiu. — O que achou? — perguntou ele. — Bem melhor do que o outro lado. — disse. Ele se sentou na almofada dele e eu o imitei sentando-se na minha. — Com certeza. — disse Trace. Young chegou com o cardápio e entregou um a mim e outro a Trace e se retirou. 83
— O que vai querer? — perguntou Trace. — Acho que um korokke. — disse. — Boa escolha. — disse ele. — Acho que vou querer um unagi. Extremeci. — O que foi? — perguntou ele. — Enguia. — murmurei. — Sou alérgico. — Ah. — ele então pensou por um tempo e depois disse: — Acho que vou trocar por um oma-soba. Young veio, Trace disse nossos pedidos e ele saiu. — Bom, você disse que queria discutir sobre os nossos papéis, Math e Horny. — disse. — Mais eu devo lembrar que estou com essas feridas. — apontei para meu peito. — E vou começar meu tratamento segunda-feira. — Tratamento? Segunda-feira? — Sim e sim. — respondi as duas perguntas. — Acho que quero curar meu câncer. — Ah, claro, claro. — disse ele. Young chegou com nossos pratos. O meu era simples, korokke era purê de batata e vegetais cremosos com recheio de frutos do mar e o de Trace, era um oma-soba, omelete com yakisoba. — Delícia. — disse comendo o segundo korokke. Ele só havia comido uma bolinha do oma-soba dele. — Estava pensando que Math e Horny deveriam passar uma imagem mais delicada do que está escrito no livro. — disse Trace. — Nossa. — disse. — O que foi? — perguntou ele. — Você lendo um livro? — olhei para ele. — Novidades. — eu disse. — Eu gosto de ler. — disse Trace voltando a postura normal. — Claro, e eu sou um ator premiado com cinco Oscars. — ele deu risada. — Tudo bem. — ele colocou o prato de lado e se aproximou. — Não estou aqui para discutir sobre Math e Horny. — Mas no e-mail… 84
— Esqueça o e-mail Allen. — eu o encarei. — Eu preciso falar uma coisa. — Pode falar. — eu disse. — Tudo bem. — ele respirou fundo e me encarou. — Allen estou apaixonado por você. Bum.
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CAPÍTULO 15 — Como? — perguntei encarando Trace. Ele parecia surpreso com a minha reação. — Allen, eu estou apaixonado por você. — disse ele. — Você entendeu agora? Assenti. Como assim? — Trace, isso é alguma piada? — joguei as palavras em uma enxurrada. — Onde está a câmera? Sabia que o vídeo “Olho como gosta” tem mais de setecentos mil visualizações no YouTube, e admiro que minha mãe ainda não tenha visto. Onde está Honda e a sua gangue? — Calma. — disse ele sobressaltado com a minha reação. — Como calma? — pergunta retórica. — Acha que aquilo não destruiu a felicidade que começava a existir dentro de mim? Acha que eu ia fazer o que? Dar em cima de você como você fez comigo. — Não. — sussurrou ele abaixando a cabeça. — Pensei… — Pensou que eu também gostava de você? Isso? Ele assentiu. — Trace entenda uma coisa — me curvei sobre a mesa — Você é bonito e tudo mais, mas existe, na realidade acho que existia alguém na minha vida, mais você ainda vai achar o seu verdadeiro amor, tenha fé nisso, entendeu? Ele ergueu o olhar. — Você não entende. — ele estava com os olhos marejados. Por que tinha que ser assim? Não gosto de ver os outros chorar, então Trace do nada está com os olhos marejados, valeu vida! — Como assim eu não entendo? — perguntei. — Você não é hétero? — Eu pensava que eu era, até conhecer você. — ele colocou a mão dele em cima da minha. — Eu me apaixonei. — Trace, a gente se viu, o que? Umas três vezes, e nossas conversas não passavam de dois minutos, como deu tempo de você se apaixonar por mim. — retirei minha mão da de baixo dele. — Você já ouviu dizer sobre amor a primeira vista? — perguntou 86
ele. — Eu não acreditava, até conhecer você. — Para. — eu sussurrei. Ele parou. O silêncio começou a reinar. Como Trace? Ele tem – tinha, sei lá! – a Honda Donnatell, e ele a deixou? E como assim ele não é mais hétero? Como uma pessoa de dezesseis, dezessete anos não sabe a própria orientação sexual? Que mundo é esse Senhor? Encarei o rosto de Trace, ele estava pensando, talvez com mais dúvidas do que eu. Eu não quero quebrar o silêncio, mais esse clima já está me incomodando, preciso fazer alguma coisa. Eu ia falar, mais lembrei de uma coisa. Pietro. Ele me perdoara? Ou aquele beijo no consultório foi algo que surgiu do nada, como a atração de nossos corpos um pelo outro. Ele acha que eu vou voltar engatinhando até ele? Pode tirar o cavalinho da chuva. Antes que me julguem eu sei que estou errado, não poderia deixar Trace me beijar daquele jeito na aula da Profª Lafaiete, mais Pietro também estava errado ao sair daquele jeito, feito uma criança mimada. E agora eu não sei se ele acabou o nosso namoro ou se ele me deu apenas um tempo? Eu não faço a mínima ideia! Trace se curvou: — Me desculpe. — disse ele. — Desculpe por fazer você passar tudo aquilo, acho que o acidente também é culpa minha… — Não! — eu o interrompi. — Deixe eu terminar Al — novamente Al. — Por favor, não me chame de Al. — eu disse. — Por que? — perguntou ele. — É complicado. — eu disse. — Continuando, o acidente é sim minha culpa. — ele suspirou. — Se eu não tivesse te beijado você não correria daquele jeito para a rua e o Sr. Tronbell não teria te atropelado. Agora eu sabia quem havia me atropelado, não passou pela 87
minha cabeça quem havia me atropelado. Sr. Tronbell? Quem é esse? — Quem é Sr, Tronbell? — perguntei. Ele me olhou e viu minha curiosidade. — É o dono do Tronbell's Market — respondeu ele. Ah, o mercado. Assenti com a resposta dele. — Trace, nada foi culpa sua. — eu disse. — A culpa foi minha, eu sai correndo feito um louco, e não foi nem pelo beijo… — Você gostou? — perguntou ele curioso. — Não. — respondi. — Foi outra coisa. — Pode compartilhar? — perguntou ele se curvando e colocando o prato de oma-soba de lado. Suspirei. Olhei nos belos olhos deles, estavam estranhos, misturava curiosidade e medo. Tudo ao mesmo tempo. — Trace, eu tenho uma pessoa. — disse. Ele assentiu. Tristeza passou pelos olhos dele. — Sei que você vai encontrar alguém legal para você, mais tenho certeza que esse alguém não sou eu. — eu continuei. — Acho você lindo, fofo e ao mesmo tempo tesudo — comentário safado. Ele sorriu com o tesudo. — Qualquer homem ou mulher morreriam para ter você do lado, mais eu já encontrei esse alguém. — lembrei do rosto de Pietro. — E se esse alguém não me quiser mais, talvez a gente possa se conhecer melhor. — não que eu quisesse isso, espero que eu e Pietro tenhamos uma longa vida juntos. — Entendeu? Ele assentiu calmamente. Dentro do carro de Trace na hora da volta ele não havia dito quase nada, apenas perguntava se eu estava bem. Ele estava se preocupando a toa. Estávamos a três quadras da minha casa quando ele quebrou o silêncio novamente. — No final das contas a gente nem falou sobre Math e Horny. — ele riu. 88
Eu ri junto. — É verdade. — disse. O carro reduziu a velocidade. As casas iam ficando mais nítidas e ao longe vi o carro de minha mãe estacionado em frente a garagem. A neve estava caindo em flocos. Bem lentamente. As árvores não tinham mais nenhuma flor, me lembrei que faltava menos de um mês para o Natal. Senti algo em minha coxa. Olhei. A mão de Trace estava lá. — Trace. — disse. O carro parou. Estávamos em frente a minha casa. Ele não tirou a mão. — Por favor, tire a mão da minha coxa. — eu disse. Ele tirou olhando nos meus olhos. As portas do carro ainda estavam trancadas. — Sobre tudo que você disse. — disse Trace. — Preciso de uma despedida para não deixar meu coração tão magoado. Ele se curvou, passou a mão pela minha cintura e me puxou, não tinha como fazer nada, estou em recuperação de um acidente de carro. Ele se curvou, nossos lábios se tocaram levemente e foram ficando cada vez mais obsessivos. Não tinha como lutar, estava muito fraco. Apenas esperei, sem fazer qualquer movimento enquanto ele se afastou uns sete centímetros de minha boca, nossa respiração saindo quente no ar frio – criando aquela fumaça branca. Meu rosto estava vermelho. — O que foi isso? — perguntei empurrando o peito dele. Ele me encarou sem entender. — A despedida. — com a outra mão ele apertou algum botão, e o barulho das portas se abrindo ecoou no silêncio do carro. Eu abri a porta e pulei para fora. Bati a porta do meu quarto e me joguei na minha cama – testemunha de muitas ousadias – e comecei a abrir a mala. Foi mais fácil do que eu imaginei. A não ser que a todo momento o beijo de Trace voltava a minha cabeça. Em breve eu teria que beijá-lo novamente para a peça da Prof.ª Lafaiete. 89
Olhei ao redor, onde estava meu moletom? Revirei meu quarto de ponta cabeça. Não o encontrei. Meu celular apitou tocando Til It Happens To You. Olhei a nota que acompanhava o alarme. Hora de trocar o cateter. Suspirei e senti o ar falhando. Eu nem havia notado diferença. Me arrastei até o armário embaixo da pia do banheiro, além de produtos de higiene pessoal estava ali dois cateteres cheios e um vazio. Minha linda coleção. Abri a válvula e parei de sentir a coscas que o oxigênio faz no meu nariz. Retirei a válvula e mudei para um cateter cheio e girei uma pequena manivela. As coscas voltaram e o ar não falhava mais. Voltei a arrumação da minha mala para a Casa Experimental. — Mãe. — gritei. Ela chegou correndo. — O que foi? — perguntou ela. — Está passando mal? — Não mãe. — eu disse. — A senhora viu meu moletom? Não sei onde deixei. — Dentro do cesto? — perguntou ela. Neguei com a cabeça. — Na cadeira? Neguei com a cabeça. — Na casa de algum amigo? Neguei com a cabeça… Espere aí. Na casa de um amigo não, dentro do carro de Trace. Suspirei. — Obrigado mãe. — eu disse. Ela me olhou. — Sabe onde está? — perguntou ela. — Sim, com um amigo. — respondi. Segunda-feira feira. Maldita segunda-feira, dia de ir para a Casa Experimental e passar uma semana lá e depois voltar para minha casa e depois voltar, uma rotina sem fim? Talvez não. Olhei pela janela do carro. 90
Minha mãe e Leo estavam conversando sobre os Blue Cows of Jellyborn, o time de basquete da cidade, fiquei surpreso por minha mãe estar interessada em basquete. A paisagem estava cada vez mais monótona. Apenas algumas casas de fazendas e silos e mais silos contendo certamente milho e outros cereais da época de colheita. — Estamos chegando. — avisou minha mãe. Vire a direita. Disse a voz da mulher do GPS. Marie como minha mãe e eu apelidamos. Minha mãe virou o SUV em uma estrada de terra. Olhei uma enorme placa que dizia: SEJA BEM-VINDO A VILA EXPERIMENTAL. Ao longe algumas casas em círculo apareceram. Os cedros enormes faziam o caminho da estrada. A neve caia aqui. Mamãe parou o carro na entrada. Havia um arco de pedra que em cima dizia: NÃO HÁ DERROTA QUE DERROTE QUEM NASCEU PARA VENCER. Boa dica. Nota mental: trocar status do WhatsApp. — Chegamos. — disse minha mãe toda entusiasmada. Descemos do carro. Leo pegou minha mala. — Dr. Sullivan. — a voz de Leo feriu meus ouvidos. Me virei. Ele estava deslumbrante vestido casualmente para aquele dia de frio. Um casaco marrom – da Nordstrom, com certeza –, uma calça cáqui marrom clarinha e um cachecol preto. Abaixei meu olhar para mim mesmo. Calça jeans skinny e uma camiseta preta e por cima outro moletom. Não tive coragem de ir atrás de Trace e meu moletom querido. Tomara que ele esteja cuidando bem dele. — Olá senhor Leonard. — disse Pietro. A voz aveludado mexeu com meus hormônios. Como eu ainda podia ser assim depois de tudo. — Bom dia Pietro. — minha mãe estava feliz, não sei se por ver que o clima romântico havia acabado ou se minha cura estava finalmente a caminho. 91
— Bom dia Victória. — disse ele. O silêncio, então eu quebrei. — Olá. — minha voz saiu falhada por conta do frio. Ele assentiu e se virou. Minha mãe e Leo trocaram um leve olhar entre eles. — Por aqui. — disse Pietro. Olhei ao redor. As cinco casas eram todas iguais. Dois andares, janelas enormes, sendo a base completamente de vidro e o telhado de ardósia, apesar de estar quase todo encoberto com a neve. No centro da vila havia uma fonte congelada com um enorme anjo que encarava a entrada. As casas eram todas da mesma cor, um bege claro, quase branco, e com enormes números na caixa de correio, do um ao cinco. Paramos em frente a casa de número três. Era igual as outras mais parecia diferente ao mesmo tempo. Pietro foi na frente com uma chave na mão e destrancou a porta de vidro. Certamente essa casa era maior do que a da minha tia Aggie que morava em Oregon, que é rica. A porta foi aberta e o cheiro de coisas novas entrou pelo meu nariz. Todos passaram, eu ia passar quando a mão de Pietro segurou meu peito. — Precisamos conversar. — disse. Eu ia abrir minha boca, quando: — Depois. Engoli a bile. Ele abaixou a mão e eu passei, ele logo atrás de mim. A sala era enorme, com um sofá de couro branco e uma tevê de plasma gigante. A sala e a cozinha eram separados por um balcão de granito, do outro lado vi uma linda cozinha de revistas de decoração. Olhei ao redor, havia uma escada e vários quadros que acompanhavam a subida, todos sem fotos. Me arrependi de não ter trazido nenhuma de minhas fotos. — Lindo. — disse minha mãe. — Melhor do que as fotos. — É a melhor casa. — disse Pietro. — Quem ocupa as outras duas? — perguntei. 92
— Julian Waterblue e Anne Marie Holley. — respondeu ele. — Julian tem um tumor intracraniano e Anne Marie tem um câncer no útero que está consumindo outros órgãos. — eu fiquei em choque. — Não se preocupe, eles estão quase curados. — Tudo bem. — eu disse. Minha mãe veio até mim. — Desculpe querido, mais eu não posso ficar muito tempo, enquanto você estiver aqui eu e Leo vamos até Chicago fazer compras. — Tão longe. — eu disse. Ele me abraçou. — Sim. — respondeu. — Encare como umas férias. — Para você. — eu disse. — Estarei preso aqui. — lembrei a ela. — Ah claro. — disse ela. — Um spa contra o câncer. — Tudo bem. — disse. — Pode ir tranquilamente, mais compre algumas bugigangas de Chicago para mim. Passe em alguma Barnes & Nobles. — Ah claro querido. — disse ela. — Se cuide. — lançou um leve olhar para Pietro. — Preciso mesmo ir, nós vamos de carro. — Interessante. — disse. — Procure por prima Ashley e de abraços. — Ashley mora no Missouri querido. — disse minha mãe. — Ah é verdade. Ela me abraçou e beijou minha testa. — Eu te amo. — disse ela. — Eu também te amo. — disse. — Eu te amo mais. — disse ela olhando meu rosto. — Não vamos começar uma cena de Enrolados aqui, o.k.? — Sim. — respondi. Leo apertou minha mão. — Se cuida garotão. — disse ele. — Claro. Ele bagunçou meu cabelo. Pietro mamãe e Leo saíram da sala rumo ao jardim, fiquei ali dentro. 93
Me joguei no sofá de couro e tirei meu celular do bolso. Havia um grupo de mensagens da Aula de Teatro, a Prof.ª Lafaiete era a que mais fala nesse grupo. Lafaiete: Queridos estava pensando em algo moderno. Lafaiete: Não pode ser moderno né? É medieval a peça. Lafaiete: Você estão ai, não estão? Joguei o meu celular de lado e fechei os olhos esperando os pneus do SUV de minha mãe sair da Vila Experimental. Eu inacreditavelmente cochilei no sofá. Me curvei senti a dor no meu pescoço por dormir de mal jeito. Abri os olhos. Na poltrona da frente, lendo um livro estava Pietro. Me assustei. — Desculpe. — disse ele. Me arrumei. — Você queria conversar. — lembrei a ele. — É verdade. — ele deixou o livro de lado e se sentou ao meu lado. Olhei para fora e vi que o sol estava se pondo. — Nossa eu dormi tanto assim? — perguntei. — Sim. — disse ele. — Bom, e o que você queria falar comigo? —perguntei. — Amanhã começa o seu tratamento. — ele passou o braço pelo meu ombro. Ele estava me esquentando. — Sim. — eu disse. — Tudo que aconteceu essa semana. — ele disse. — Eu queria pedir desculpa. — Sabe que foi eu que comecei essa história. — eu disse. — Sou eu que tenho que pedir desculpas. — Tudo bem, está desculpado, mas agora me perdoe. — ele me puxou mais para perto dele. — Sempre. — disse. Ele sorriu. 94
— Por que você me beijou na última consulta? — perguntei. — Não consigo ficar perto de você sem me excitar. — ele disse. Abaixei meu olhar. Havia algo enorme pela calça cáqui. Levantei meu olhar, ele sorria maliciosamente.
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CAPÍTULO 16 Pietro “Cavalheiro” Sullivan me pegou no colo e me levou até o segundo andar. O corredor de cima era mais longo e havia mais quadros sem fotos e muitas portas. Sem dizer nada ele me levou até a quarta porta da direita. O ambiente se revelou uma suíte. Uma enorme cama king size com incontáveis almofadas e travesseiros. Ele me colocou na cama e me beijou fortemente. — Estava morrendo de saudade. — disse ele entre mordidas na minha boca. — Não faz nem uma semana direito. — respondi quase sem fôlego. — E isso quase me matou. — disse ele voltando a me beijar e não deixando que eu respondesse. Ele retirou meu moletom e depois minha simples camiseta, deixando-me seminu. O frio fez minha pele pálida se arrepiar. Mais os arrepios não acabaram por aí. Pietro foi passando a língua pelo meu pescoço e descendo pelo meu peito até chegar no fecho da minha calça. Ele sorriu e a abriu deixando visível o volume na minha cueca boxer. Ele passou a boca pelo volume do meu pênis fazendo me curvar de prazer. Um pequeno gemido saiu entre meus dentes. Então ele parou e puxou minha cueca até meus joelhos expondo meu pau já duro a poucos centímetros dos lábios dele. Ele carinhosamente fez um movimento que lembrava uma masturbação e depois se inclinou colocando meu pau dentro da boca dele. Gemi mais uma vez. Ele enfiou tudo e senti seus lábios roçando os pequenos pelos que cresciam na minha base, depois ele retirou tudo e beijou minha barriga, subindo até encontrar minha boca. Nós nos beijamos, mais a mão dele não deixava o meu pau. Depois ele ficou de pé se despindo e revelando aquele corpo que eu já conhecia muito bem. Depois de ficar nu mostrando seu pau – devo admitir que é grande aos curiosos – ele se jogou em mim. Como um submisso eu abri minhas pernas envolvendo a cintura 96
dele. Ele se curvou e senti a minha entrada sendo forçada. Ele enfiou a glande para dentro. Gemi um pouco mais alto. Ele forçou mais um pouco e senti que ele estava mais fundo do que a última vez que transamos. Ele se sentou ainda dentro de mim, eu estava ainda com as pernas passadas pela cintura dele. Eu me movimentei para cima e para baixo, ele gemeu na minha orelha. Ele estocou um pouco rápido e eu comecei a cavalgar. Eu gemia alto, nunca havia gemido tanto – seria falta de sexo? Ele me deitou novamente na cama king size e abriu mais ainda minhas pernas, subindo e descendo com a mão o contorno das minhas coxas e depois voltou a estocar, eu movia meu corpo com o ritmo. Parecíamos duas peças de um quebra-cabeça que se encaixa muito melhor do que quaisquer outras. Ele se curvou, mais não diminuiu o ritmo, chegou perto da minha boca e me beijou, mais voraz do que antes e depois passou a mordiscar minha orelha. Sentia minha entrada pulsando, com uma mão livre passei a me masturbar, com a outra puxava o cabelo dele, o lindo cabelo dele. — Você é tão gostoso. — ele sussurrou na minha orelha. — Poderia passar o dia inteiro comendo você. Eu sorri. — Então passe. — sussurrei sem fôlego. — Não posso. — disse ele. — Mais o quento que eu puder eu passarei. Ele aumentou mais ainda. Se é que era possível, senti o pênis dele bombeando e depois um jato quente encher-me por dentro. Ele continuou a se mexer e depois parou. Olhou minha mão que masturbava o meu pênis e a tocou, eu retirei e ele pegou meu pênis com a mão. Ainda estava dentro de mim. Ele batia punheta mais rápido do que eu e não demorou muito para que eu gozasse, e o gozo caísse na minha pálida barriga. Ele ainda ficou dentro de mim. Fui me levantar, mais ele me segurou. — O que foi? — perguntei. — Ainda não, gosto de ficar dentro de você. — disse ele. Me aninhei no colo dele, o pau dele não amolecia. Estava 97
adormecendo novamente no colo dele quando senti que ele estava estocando devagar novamente. Levantei meu olhar para ele, ele me olhou. — Preparado? — perguntou ele. — Sempre. — respondi. Minha cabeça doía. Olhei para o relógio digital no criado-mudo, eram 01h12 da madrugada. Rolei na cama, sozinho, sem ninguém. Onde estava Pietro? Levantei e catei minha cueca e a coloquei, olhei para o cateter e vi que ele o havia trocado para mim. Que fofo. Me arrastei escada abaixo e vi que havia apenas um abajur da sala ligado, eu estava novamente sozinho. Senti um cheiro gostoso vindo da cozinha. Caminhei até lá e vi que havia um prato em cima da mesa com uma macarronada de aparência deliciosa. Abri cerca de oito gavetas até encontrar onde estavam os talheres. Peguei um garfo e comecei a comer. Me dei conta de que estava com muita fome quando eu olhei o prato brilhando, alguém que não vira o prato antes juraria que estava limpo. Precisava tomar um banho. Subi novamente as escadas e vi que minha mala estava no divã perto da cama. Abri ela e peguei minha toalha e meu novo pijama que Leo me dera domingo a noite. Um conjunto de calça moletom e uma camiseta folgada de um time de basquete do Missouri, a terra natal da família dele. Leo dissera que o avô dele fora técnico do time de basquete. Entrei no banheiro e fiquei empolgadinho ao notar uma bela banheira de granito. Coloquei ela para encher. Voltei ao quarto e peguei meu celular e o levei até o banheiro onde coloquei uma playlist de nome bem original: Hora de Tomar Banho Depois de Encontrar Com o Doutor. A primeira música a tocar foi Eyes Shut. Aquela música me fizera lacrimejar depois de uma briga com a minha mãe. Olhei a banheira e constatei que ela já estava cheia o suficiente. 98
Retirei minha cueca boxer e coloquei o pé direito na água. Pensei que estaria quente, mais estava morna e lembrei de ter ligado as duas torneiras, a de água quente e a de água fria. Não fazeria diferença, eu gostava de água morna. Mergulhei na água e logo retirei minha cabeça de baixo d'água. Retirei o cano que levava oxigênio até meus pulmões e com muito esforço respirei fundo e afundei novamente na água. Depois de cinco segundos não aguentei mais. Sou fraco demais, e não culpo o câncer por isso. Coloquei novamente o cano e a sensação de vida “normal” voltou. Depois de as dez músicas de minha playlist tocar eu saí da banheira e abri o ralo e por alguns minutos vi toda a água descer pelos canos. Sequei-me com a toalha de algodão que minha mãe trouxera de uma viagem as Cataratas do Niágra no qual a toalha dizia, Volte Sempre ao Lugar Mais Bonito dos Estados Unidos, as Cataratas do Niágra. Vesti meu pijama e escovei meus dentes e sai do banheiro. Joguei me na cama e respirando fundo – mesmo que com um pouco de dificuldades – conseguia sentir o cheiro de Pietro. Do meu Pietro.
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CAPÍTULO 17 — Espero que tenha dormido muito bem. — disse Dra. Lauren na minha nova sala de estar. — Como um anjo. — disse, e era pura verdade. Dra. Lauren usava um vestido branco justo que ia até um pouco abaixo dos joelhos e por cima do vestido o jaleco. Os cabelos agora pintados de um castanho claro estavam presos em um coque, ela não usava nenhuma maquiagem, o que meio que destacava as sardas. Eu por outro lado, usava uma calça folgada de um azul-escuro, quase preto e uma camiseta de frio de algodão sem estampas. — O tratamento começa hoje. — ela começou. — E onde está o Dr. Sullivan? — perguntei tentando não mostrar meu absoluto interesse naquilo. — Ele está no chalé de Anne Marie cuidando dela. — disse Lauren. — E Julian? — perguntei. — Dr. Mikail está lá com ele. — respondeu ela. — Decorou rápido hein os nomes dos seus vizinhos. — brincou ela. — Ah sabe são poucos. — eu ri, e ela riu. — Bom, você leu o roteiro? — perguntou ela. — Na realidade minha mãe leu para mim. — admiti. — Que ótimo. — ela disse. — Espero que esteja empolgado. — Vou perder meu cabelo novamente. — disse triste. — Sim, mais não se preocupe, você vai ficar bonito do mesmo jeito. — ela pegou de dentro da bolsa de couro uma prancheta. — Quero que fale do que você é alérgico. — Enguias… Amoras… Acelga e acho que lentilha. — respondi. — Amoras, minha fruta preferida. — disse ela anotando na prancheta. — Tem algum remédio que não pode tomar? — Dipirona. — respondi. Ela assentiu. — Vamos te esperar no Centro Médico as dez da manhã para começar, o.k.? — perguntou ela se levantando. 100
— Claro. — respondi me levantando também e a acompanhando até a porta. — Só são essas perguntas? — perguntei curioso. — Sim. — disse ela. — Na realidade por enquanto. — ela esperou eu abrir a porta e passou e depois se virou para mim. — Desculpe, mais não deixei de notar, mais acho que você usa um perfume parecido com o de Pietro. Eu fiquei sem jeito. — É? — perguntei. — Sim. — ela viu meu desconforto. — Só parecido, acho que não é o mesmo. Ela saiu caminhando rumo a segunda casa. Como ela conhecia o perfume de Pietro? Respirei o cheiro do meu próprio cangote, senti um leve aroma de Pietro. Senti o ciúme brotar. Balancei a cabeça ao entrar novamente para dentro de casa. Estava sentindo ciúmes de Lauren? Sentei no sofá e liguei a tevê. Zapeei pelos canais sem encontrar nada que me agradasse, depois de um tempo eu parei em um canal de músicas e comecei a andar pela casa, ainda tinha praticamente uma hora até eu precisar ir para o Centro Médico. Subi a escada e fiquei um minuto parado no corredor. Queria conhecer mais algum cômodo da minha nova casa, mais por que lado começar. Resolvi começar desde o mais alto, então abaixei a escada do sótão e subi. Havia algumas caixas de papelão. Curioso como sou abri uma. Havia muitas roupas masculinas dentro. Pulei para a próxima, essa revelava papéis, muitos papéis mesmo. Peguei um e li. Arthur O'Hara. O'Hara? O'Hara? O mesmo O'Hara de Trace? Não pode ser! Não aqui. Peguei mais um papel e li a ficha. Nome: Arthur O'Hara Idade: 10 anos. Local de Nascimento: Charlotte, Carolina do Norte. 101
País: Sebastian O'Hara e Geórgia T. O'Hara. Doença: leucemia, estágio três. Obs.: O paciente Arthur O'Hara foi diagnosticado com leucemia aos sete anos, com dez começou o tratamento na Vila Experimental sob os cuidados do médico Mikail Thomas Jr., mais veio a óbito prestes a completar onze anos por conta de uma infecção gerada pelo remédio experimental Esterionazol. Arthur morrera. Olhei ao redor. Aquela casa pertencera a ele antes de mim. A alguém que tem o sangue de Trace. Não que eu tenha algum tipo de preconceito com os O'Hara, mais a partir do momento em que a palavra óbito foi lida eu senti algo ruim. Sai do sótão, não aguentaria ficar ali por mais um tempo. Olhei o relógio era 09h32, eu poderia chegar alguns minutos mais cedo, né? Coloquei meu moletom e saí da Casa 3. O caminho estava com poruca neve, alguém tinha que ter limpado. O Centro Médico era um prédio de três andares – que não sei como não tinha reparado antes – todo branco com janelas imensas de um vidro negro. O movimento parecia bastante ao se aproximar da entrada. A recepção estava movimentada, havia apenas três pacientes e dezenas de médicos e enfermeiras, todos de branco. Havia um sofá de recoberto de um tecido que lembrava seda na cor branca, e também vários quadros mostrando qual era o profissional do mês. Sorri ao ver que daquele mês era Pietro Sullivan o profissional do mês. — Allen. — a voz de Lauren invadiu meus ouvidos. Me virei e a vi ao lado da bancada da recepção. — Dra. Lauren. — disse ao me aproximar. — Sei que está um pouco cedo demais, mais podemos começar? — Quanto mais cedo melhor. — disse ela se virando. — Por aqui. Segui-a até o fim do pequeno corredor que dava para três elevadores. Entramos no primeiro que estava vazio. Senti o estômago revirar ao notar que estávamos descendo em vez de subir. — Estamos descendo? — não consegui segurar a minha pergunta. 102
— Sim. — disse ela. — Empolgante né? Assenti. — Quantos…? — não consegui terminar, pois um dos lados do elevador era de vidro e vinha terra e portas passando rapidamente. — Andares? — completou ela. — Para cima três. — eu já havia visto. — E para baixo são oito. — ela disse calmamente como se desse um carinho em um gatinho manhoso no dia de chuva. — Interessante. — disse. O elevador parou. — Andar de número seis. — disse ela. Eu não fui o único a chegar cedo. — Esse é Julian. — disse Lauren apontando para um garoto de cabelos loiros, olhos verdes, alto e com o corpo um pouco definido, ele usava aqueles pijamas horrorosos de hospitais antes de sermos internados. — Oi. — disse. — Oi. — disse ele, a voz era rouca. — E essa é Anne Marie. — disse Lauren. Anne Marie era uma garota baixa, provavelmente não pela estatura, mais pela idade, que deveria ter uns doze anos, os cabelos negros e cacheados desciam feito cascata pelas costas, a pele era de um bronze bonito, os olhos negros como um buraco de minhoca, e também usava aquela horrorosa camisola de hospital. — Olá. — disse ela. — Oi. — respondi. — Gosto do nome Allen. — disse ela. — Sofria bullying. — disse. — Por quê? — perguntou ela. — Allen King, ator pornô. — respondi. Lauren riu. Anne Marie sorriu e Julian corou. — Viu. — eu disse depois que todos terminaram de rir. — Bom, aqui está. — Lauren me entregou uma camisola igual à de Julian e Anne Marie. — Não é bonita, mais é para o seu bem. — Tudo bem. — disse. 103
— Por ali. — ela apontou uma porta que tinha duas letras na porta: WC., ou Water Closet. Adentrei no WC. Era pequeno, mais bem limpo. Tirei o meu moletom, depois a calça e por último a camiseta. Peguei a camisola e a coloquei, pareceu deixar eu com a aparência mais doente. Sai e vi que tínhamos mais pessoas na sala. Pietro estava lindo no uniforme de médico dele, ele sorriu para mim, enquanto eu corava e devolvia. (Imagens da noite passada voavam pela minha imaginação nesse exato momento). — Allen esse é o Dr. Mikail. — disse Lauren. O Dr. Mikail era um – ursão – homem de uns 50 anos e tinha o cabelo já entrando no grisalho, tem um porte de um verdadeiro atleta, usava a mesma roupa de Pietro, o uniforme padrão. — Oi. — disse. — Olá. — me disse ele, a voz saiu rouca. — Bom. — Lauren se colocou em frente a uma porta — Allen por aqui. Ela abriu a porta. Dou outro lado havia uma maca e vários equipamentos, além de uma grandiosa máquina acoplada na cabeceira da maca, havia tubos saindo da máquina que escorria um líquido azulado. Olhei para ela. — Pode assustar no começo. — explicou. — Mas garanto que é só para o seu próprio bem. — ela sorriu. Assenti. Ela fez com a mão para que eu deitasse. Fui até a maca e me deitei. Um enfermeiro entrou com luvas de látex na mão e um par sobressalente, ele entregou o par a mais para Dra. Lauren. Ela colocou as luvas e se virou para mim. Agora com a postura de médica novamente. Ela pediu meu pulso e com cuidado pegou um cano que era acoplado a grande máquina e enfiou. Senti apenas uma picadinha e depois o líquido azulado começou a entrar na minha corrente sanguínea. Ela retirou o cano de oxigênio e pegou um respiradouro automático. Então eu apaguei. 104
Ali estava ele parado na minha frente. O meu crush que ia todos os dias na lan house. O nome dele era John Fyler. Da minha mesma idade. 12 anos. Aquele anjo que caiu do céu. Olhos azuis. Cabelo cacheado loiro. Boca carnuda (e que boca, hein?). Alto. E de um pé grande. (Antes que me perguntem o que tem a haver o pé ser grande?! Tem tudo, pois podemos saber se o pênis – pau, para os mais íntimos – é grande, não me perguntem como eu sei. Pensando bem acho que vi isso em algum livro, talvez 13 to Life, é acho que é esse). Eu ia só para sentar ao lado dele, ficava as duas horas com ele. Todos os dias da semana, quando eu tinha doze anos, antes de descobrir o maldito câncer no pulmão. — Olá Allen. — disse Phia, a atendente do balcão. — Oi Phia. — disse. — O de sempre, computador seis. — olhei para John Fyler no computador cinco. — Pode ir. — disse ela. Fui todo animadinho até o meu computador. Sentei e fiz o meu login. John Fyler deu uma olhadinha ao lado e sorriu. — Você é o Allen né? — perguntou ele. Meu coração deu uma leve parada antes de voltar a bater. — S-sim. — disse. — Cara acho que errei minha senha. — disse ele. A voz aveludada acariciando os meus ouvidos. Me curvei, havia uma mensagem na tela: Senha incorreta, tente novamente. — Não é nenhuma data importante? —perguntei. — Não. — respondeu ele. Nossos ombros se chocaram quando eu me curvei mais um pouco. Senti um leve choque. — E-então o nome de alguém importante? — perguntei. — Talvez. — disse ele esperançoso começando a digitar. Ele levantou o olhar sorrindo. — É você tinha razão é o nome de alguém importante. — ele apertou o enter e vi que apareceu o perfil dele no 105
sistema da lan house. — Valeu, muito obrigado mesmo! Eu sorri. Ele sorriu mostrando os dentes perfeitos. — Gosto de você. — disse ele. — S-sério-o? — gaguejei. — Sim. — disse ele. — Brother. — ele fez um soquinho esperando que eu batesse também, eu bati. Se era para ser o brother dele, tudo bem, eu seria. Acordei sentido minhas pálpebras pesadas. Olhei em volta, via líquido ainda descendo para dentro da minha corrente sanguínea. — Oi dorminhoco. — a voz de Pietro me despertou. — Argh! — grunhi. — Sei, tudo bem, foi efeito da anestesia para diminuir a dor. — disse ele. — D-dor? — perguntei. — Sim, o Esterionazol causa uma dor irritante. — disse ele. — Ah. — disse tentando me sentar. Ele colocou a mão no meu peito. — Por favor, não faça algum tipo de esforço. — ele disse enquanto eu voltava a me deitar. A porta foi aberta e Dra. Lauren apareceu. Sua face estava pálida ao ver que eu havia acordado, ela passou o olho em mim e depois de volta a Pietro, e retornou a mim. — Pietro. — ela ergueu o olhar. — Você precisa saber de uma coisa. — O que? — perguntou ele. — Acho melhor não na frente dele. — ela apontou o queixo em minha direção. Pietro se virou para mim. Assenti, confirmando que ele poderia ir, mesmo não precisando da minha confirmação. Ele saiu da sala enquanto eu fiquei ali deitado. Não me lembro de quanto tempo passou. Só me lembro de alguns enfermeiros virem e retirarem o tubo e me colocarem em uma 106
cadeira de rodas. E novamente fiquei são quando era deitado em minha cama, na minha casa. Na Casa 3. Devo ter dormindo umas três horas quando senti uma dor no estômago. Me levantei, sentia minhas pernas fracas e corri ao banheiro. Senti algo subindo pela minha garganta. Me abaixei na beirada do vaso sanitário e vomitei. Não era comida, era sangue. Olhei para aquilo e senti meu estômago revirar novamente. Tampei o vaso e dei descarga. Me levantei e fui até o chuveiro. Liguei ele e arranquei minha roupa. Precisava de um bom banho. Por que eu vomitara? Tentei lembrar-me da última vez que comera. Fora no café da manhã. Deve ter sido isso, a falta de alimentação e o começo do tratamento deve ter revirado meu organismo. Peguei meu shampoo e o passei no cabelo. Comecei a esfregar, quando senti alguns tufos soltarem. Sei que é um efeito colateral de se ter câncer, e fazer um tratamento desconhecido pela Organização Mundial da Saúde, na realidade desconhecido não, a palavra certa é novo. Me sentei no chão do banheiro vendo fios do meu cabelo castanho escorrendo pelo ralo. As lágrimas saíram sem permissão. Me levantei. Desliguei o chuveiro e fui até o meu quarto. Coloquei meu pijama, troquei de cateter e peguei o celular. Ligaria para minha mãe, saber onde ela e Leo estariam. No segundo toque ela atendeu. — Alô. — a voz não era de minha mãe. — Oi. — disse formalmente. — Sou Allen, queria falar com a minha mãe. Passe para mim. Ouvi alguém dizer lá no fundo. — Oi Allen. — era a voz de Tio Alberto. — Tio Alberto? — perguntei. — Sim. — disse ele. Pelo que eu sabia Tio Alberto morava em Atlanta, onde eu nasci. — Onde está minha mãe? — perguntei. — Querido, sente-se. — disse ele calmamente. 107
Obedeci. — Tio Beto o que está acontecendo? — perguntei. — Querido sinto muito, mais sua mãe e Leo sofreram um grave acidente.
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CAPÍTULO 18 VICTÓRIA Eu e Leo saímos da Vila Experimental e partimos pela I-170 rumo a Chicago. Ao fundo nosso rádio ligado com o som de Zombie do The Cranberries. Leo está com uma mão encostada na minha coxa. — Acha mesmo que existe uma cura? — perguntei. — Você não acredita? — perguntou Leo com a testa franzida. — Sim, a esperança não é a última que morre? — perguntei. — Ah claro. — diz ele. — E sim, acho que existe uma cura. Leo acreditava em muitas coisas. Dente elas na existência de OVNIs que marcavam o campo de trigo na fazenda onde cresceu no Arizona. O pai dele me confirmou que era apenas uma brincadeira de dia das bruxas adiantado, mais Leonald sempre acreditou naquelas marcas. Saímos da I-170 e passamos para a E-78. A rodovia estava mais movimentada. Olhei ao redor a presença do Inverno estava em todo o lugar, a neve ainda não firmara no solo, mais alguns lugares estavam com muita neve. A música mudou para Alarm da Anne-Marie. Leo começou a acompanhar a música. O céu estava nublado, havia muita neve na estrada, estava dirigindo a 60 km/h em vez do permitido da rodovia, que era de 80 km/h. Não é a toa que eu fui a primeira no teste de habilitação na escola de trânsito. — Estamos perto de Hallperths. — disse ele. — A cidade gêmea de Jellyborn City. — disse. — Depois teremos New Lyank. — disse Leo. — Acho que isso não pode nem ser chamado de cidade, e sim uma encruzilhada. — E depois estaremos sem cidades por cento e cinquenta quilômetros. — respondi. — E chegaremos a North Goldwyn. — diz ele. — A primeira parada para o abastecimento, assim seguiremos direto para South Goldwyn e mais alguns quilômetros, Chicago. — ele sorriu. 109
Quando chegamos em Hallperths, a cidade gêmea de Jellyborn City, havia um pequeno Festival de Abóboras, que reunia região. Leo tirou algumas fotos enquanto passávamos com o carro. Junto com o festival havia a inauguração de um grandioso Walmart, maior do que o River Shopping de Jellyborn. New Lyank era uma verdadeira encruzilhada, havia uma dúzia de casas iguais, uma escola, a prefeitura, e as praxes de uma cidade que definitivamente não era New Lyank. O maior prédio – tirando a escola – era uma fábrica de sapatos e um mini-shopping, o Tall's, bem conhecido na região. Pelos fazendeiros. North Goldwyn, era uma cidade country, a economia local era tudo em cima do gado e da produção de leite. Poderia ter sido cenário para uma das cenas do filme Brokeback Mountain. Allen gostava e odiava esse filme. Lembrar de Allen me deixou com um aperto no coração. South Goldwyn era o oposto de North Goldwyn, SG – como eu e Leo a chamamos – estava parada no século XIX, a única atração da cidade era o XIX Hotel, um hotel temático, com um parque de diversão com coisas de um século esquecido pelos jovens. — Pensei que Jellyborn era única. — disse Leo. — Como assim? — perguntei. Estávamos saindo de South Goldwyn rumo a E-22. — Ah, sei lá, devo ter acostumado com cidades grandes. — disse ele. — E aqui estou eu, rodeado de cidades pequenas. Eu ri, e ele me acompanhou. Havia um enorme arco no meio da rodovia. Sejam bem-vindos ao Estado de Illinois. Estávamos perto de uma cidade chamada St. Joseph, como dizia Marie, minha GPS. Foi quando o meu telefone tocou. Liguei ele e o passei para o alto-falante de Marie. A voz que saiu era rouca. — Ãnh… Olá Vic. Um leve espasmo passou pelo meu corpo. Aquela voz… 110
— Bom, não sei se lembra de mim, mais sou eu, o Joy. — era ele? Não podia ser depois de todos esses anos. Leo parecia notar meu pânico, ele perguntou por mim: — Que Joy? — Vic? — ele procurava por mim. — Sou eu. — disse. — Não me chame de Vic. — eu suspirei não tirando os olhos da rodovia. — Que Joy? — repeti a pergunta de Leo. — Você sabe muito bem, Victória, sou eu o Joy da Gardeners Flowers de Atlanta, na Geórgia. — Joywsk Gardeners Eskarova?! — disse não acreditando naquilo. A última imagem que eu tinha de Joywsk – ou Joy – era quando ele me abandonou grávida em um restaurante ao Norte de Atlanta. O rosto quadrado, o mesmo que o do Allen, ainda me encarava em alguns pesadelos. Os intensos olhos bicolores, de um azul profundo e um verde encantador que fizeram com que eu sofresse a maior parte da minha juventude. E por cima era herdeiro de um império em Atlanta. — Sim. — respondeu ele a minha pergunta. — Quem é? — perguntou Leo olhando minha aflição. — P-pai do Allen. — sussurrei esperando que Joy não escutasse do outro lado da linha. — Pai do Allen? — perguntou Leo em alto e bom som. — Sim. — respondeu Joy do outro lado. — Por que você está ligando depois de tanto tempo, e como conseguiu meu número? — perguntei. — Bom, seu número foi fácil, depois que o império Gardeners Flowers cresceu, milhares de portas se abriram, e só pedi para que minha secretária, Wanessa, encontrasse por uma Victória Spinnet na lista telefônica privada do país. — ouvi o som de freio do outro lado da linha. — E o que eu quero depois de todos esses anos? — era uma pergunta retórica. — Depois de muitas consultas com meu psquiatra, Lyonel McFeely, eu acho que estou pronto para assumir minha paternidade, perante qualquer lei dos Estados Unidos. Mais devo perguntar por que sua casa está fechada? Onde Allen e você estão? 111
Gelei. — Não estou com Allen. — respondi. — Que pena, queria que ele ouvisse isso. — respondeu ele. — Diga logo o que você quer com tudo isso? — perguntei. — A guarda de Allen. — respondeu Joy calmamente. — Depois de todo esse tempo? — perguntei. Não deixei que ele respondesse. — Por que fazer com que ele sofra ainda mais, e se VOCÊ NÃO SABE, NOSSO FILHO TEM CÂNCER!!! — gritei. Leo ficou surpreso com minha resposta. Silêncio do outro lado da linha. Olhei pelo pará brisa, em uma montanha havia algumas luzes se acendendo. Seria St. Joseph? — Eu não sabia. — a voz agora de Joy parecia diferente, parecia que queria entender o que estava acontecendo. Mais meu ego é meio que maior do que a compreensão. — Agora sabe. — cuspi. — E… — Me desculpe, que quero ajudar. O que eu posso fazer? Estou em Jellyborn. Onde eu posso encontrá-lo? — Não, não, não, não, não… — suspirei. — Joy, por favor, não faça mais minha vida um Inferno, o.k.? — Não posso. — disse ele, parecia (pelo tom da voz) que ele estava chorando? — Você, Victória, não fez Allen com o dedo ou com o vento, foi uma besteira da minha parte lhe abandonar quando você e Allen, ainda que não tivesse vindo ao mundo, daquela maneira em Atlanta, queria ter voltado antes, mais meus pais disseram que era uma péssima imagem para a fachada do império Gardeners. Eu tentei ligar para você, mais você mudou de telefone, e eu ainda não tinha Wanessa e as minhas milhares de portas. Você me perdoa? Eu quero ajudar. — Eu… não sei. — disse desviando meu olhar para Leo. — Por favor… — Victória! — o grito de Leo encheu o interior do carro. A traseira do carro se prendeu nos trilhos do trem. O apito vinha forte, e a catraca batia no capô do carro. A batida foi ensurdecedor. Ouvia as perguntas de Joy vindas pelo painel do carro, sangue descia 112
pela minha testa. Sentia dores, mais sentiria mais ainda mais tarde, já que a adrenalina meio que anestesia as dores, pelo menos no momento. A voz de Joy sumiu, e o rádio voltou a tocar uma melosa música, Talk Me Down, do cantor Troye Sivan. Minutos depois a aglomeração de pessoas é tanta que sinto fadiga e a escuridão toma conta. Enquanto – não sei exatamente, mais sei que estou viva, não sei como – eles me carregavam via fleches borrados de inúmeros rostos, e minha boca pronunciava o nome de três pessoas. Allen… Leonald… e… Joywsk.
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CAPÍTULO 19 Caio sentado na minha cama com o que Tio Beto me conta. Acidente? Grave? Não consigo digerir direito as palavras, sou tirado de meus pensamentos pela voz insistente de Tio Beto pelo telefone. — Allen, você ainda está aí? — pergunta ele. — Sim. — respondo. — Em que hospital eles estão? — Hospital Geral de St. Joseph. — responde ele. — Onde fica? — Em St. Joseph, em Illinois. — responde ele. —… — Nem pense. — disse Tio Beto. — Eles vão ficar bem, e você não pode vir para cá, entendeu? — Sim. — tentei mentir, mais eu estava muito nervoso com o que o Destino implicava sobre mim. — Entendeu mesmo? — repete ele. — Você começou agora esse tratamento, e sua mãe e Leo não correm risco de morte. Aquilo me acalmou, pelo menos uma notícia positiva em meio a tantos desastres. — Tio quando minha mãe acordar — com certeza irá, pensei. — Diga a ela que a amo, e peça para que ela me liga, o.k.? — O.k. — diz ele. — Preciso desligar, mais tarde eu ligo. — Tchau. — disse. O telefone ficou mudo. Me levantei e fui até a cozinha. Abri a geladeira em busca de alguma coisa para comer. O que aconteceu direito nesse acidente? Isso me intriga? Peguei um iogurte e algumas bolachas cream crecker. Sentei em uma das cadeiras do meu balcão e comecei a comer. Alguém bateu à porta. — Entre. — gritei. — Estou na cozinha. A porta se abriu e escutei ela se fechando. Pietro apareceu, usava um enorme casaco bege por cima da roupa de médico, havia alguns 114
flocos no cabelo macio dele, e tinha um ar de cansado. — Oi. — disse. — Oi. — respondeu ele. Pietro Sullivan avançou e sentou-se na cadeira ao lado da minha, se inclinou e apertou nossos lábios, e depois se afastou, o olhar de tristeza. — Desculpe pela sua mãe. — disse ele. — Como você sabe? — perguntei. — O hospital onde ela está ligou para cá. — respondeu. — Tenho muitos contatos. Assenti com a resposta. — Algo está errado. — disse. — Como assim? — perguntou ele trazendo o semblante de preocupação em seu belo rosto. — Bom, não sei se é comum, mais meu cabelo já está caindo. — falei. O rosto dele ficou pálido. — O que foi? — perguntei. — Algo mais? — a pergunta dele saiu meia engasgada. Contar sobre o vômito de sangue? — Não. — sussurrei. — Tem certeza? Não!!!!! — Sim. — menti. Ele me puxou, sai da minha cadeira enquanto ele me colocava em seu colo. — Allen. — disse. — Qualquer coisa que acontecer, pode falar, eu sou o seu médico e é meu dever não deixar nada de ruim acontecer com você. — Por que essa preocupação toda? — perguntei me aninhando em seu grandioso colo, parece que estou mais frágil do que antes. — Por que, Allen, você é o amor da minha vida. — respondeu ele se inclinando para me beijar. Aceitei o beijo – mais carinhoso que nós demos até agora – e me 115
afastei. — Quer comer? — perguntei. — Não gosto dessa bolacha. — ele disse apontando para o pacote aberto em cima do balcão. — Ah. — disse. — Podemos nos deitar, me sinto meio cansado. — Eu também. — disse ele. Ele me ergueu em seu colo e me carregou até meu quarto, no segundo andar, seu coração acelerou quando subíamos a escada, mais ele não ofegou e não demonstrou nenhum esforço em me levantar. Ele me deitou devagar na cama e começou a me cobrir, parei segurando uma de suas mãos. — Por favor. — disse. — Deite-se comigo. Ele deitou ao meu lado, me virei, passando a perna em torno das volumosas coxas e ele me abraçou pela cintura, sua respiração quente em meu cangote, notei que ele havia se livrado dos casacos e estava apenas de camiseta e calça. Como eu não vi isso? — Acho que não poderemos transar hoje. — disse ele. — Por que? — perguntei. — Você está muito cansado. — disse. — Talvez. — disse sorrindo, tentando transformar meu sorriso em algo malicioso. Sem sucesso, mas fui compensado com um leve riso de Pietro. Sem dizer nada, passei a mão pelo largo peito dele e desci até chegar onde encontraria o seu pênis. Ele estava rigido, estava pulsando. — Oh… Allen. — disse ele mordiscando minha orelha. — Acho que eu não vou conseguir me controlar. (Antes que me julguem por tentar fazer sexo sabendo que minha mãe estava internada em um hospital a mais de quinhentos quilômetros daqui, eu digo que quero esquecer por um momento todas as tribulações da minha vida. Por um momento.) Ele passou a língua pela minha orelha e desceu até minha boca. Onde me beijou fortemente, quase me tirando o ar. Ele parou e se rolou, ficando em cima de mim. Fechei meus olhos e escutei o barulho do zíper de sua calça sendo aberto. E logo senti a pele quente e 116
pulsante perto do meu membro que estava – fazia tempo – duro. Pietro então abriu minha calça e a arrancou, depois passou a língua pelo meu pescoço e puxou minha camiseta me deixando nu e desceu com a língua até chegar em um dos meus mamilos, ele mordiscou e puxou com os dentes. — I-isso. — gemi baixinho em seu ouvido. Sentia o sorriso em seu rosto. Ele passou para o outro mamilo. E depois parou. Continuou a beijar meu abdômen – que acreditavelmente começara a surgir alguns gomos. Ele passou a língua pelo meu umbigo e depois desceu roçando os pentelhos do meu pau. Ele retirou a cabeça do meu pau de dentro da fina pele e deu uma pequena sugada e se endireitou, me encarando, os olhos pareciam que… me desejavam. Pietro então abriu minhas pernas e senti a cabeça de seu pau roçando minha entrada, ele se curvou e me beijou e parou, ficando ali, nossas respirações se tornando uma só. Ele forçou minha entrada. Gemi. Ele sorriu forçando mais ainda e então deslizou para dentro de mim enquanto arfava em seu lindo rosto. Ele entrou totalmente dentro de mim, então começou o movimento de vai e vem, as vezes acelerando ao ponto que eu dava um leve grito de prazer, nos outros me beijava enquanto enterrava todo o seu pau dentro de mim. Então ele começou mais rápido e mais forte e senti a sua ejaculação me preenchendo. O calor interno me reconfortou, ele ficou dentro de mim, enquanto seu peso estava por cima de mim, eu não sentia nenhum desconforto. Ele abaixou uma mão e me masturbou até que eu gozei em nossos abdômens colados. Ele se curvou e sussurrou em meu ouvido: — Eu te amo. — eu adormeci enquanto sentia ele saindo de dentro de mim.
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CAPÍTULO 20 O Sol entrou pelas persianas do meu quarto. Olhei ao lado em busca de Pietro, ele estava me encarando, quando viu eu acordado sorriu. — Bom dia meu amor. — disse ele. — Bom dia meu amor. — repeti. Ele se inclinou e me beijou. — Acho que você dormiu mais do que eu esperava. — Mais você continua aqui. — argumentei. Ele sorriu. — Sai e voltei, já é meio dia. — disse ele. — Sério? — disse olhando rumo a janela. — Sim. — ele mordiscou meu lábio. — Nossa. — disse tentando assoviar, tentativa fracassada. Pietro caiu na gargalhada. — Pare com isso. — disse. Ele parou. Me olhou então voltou a me beijar, foi então que nossa peles se tocaram e notei que ele estava pelado. — Gostou? — sussurrou ele em meu ouvido, não deu tempo de responder. — Gosto de nossas peles se tocando, isso me excita. — Que bom. — disse me apertando contra o seu corpo. Pietro passou a mão pelo meu cabelo e disse gentilmente. — Sua mãe acordou. Olhei para ele. — Como? — Seu Tio Alberto ligou. — disse. — Sua mãe acordou e está bem, não posso dizer o mesmo do Leo. — O que aconteceu com o Leo? — perguntei em pânico. — Ele vai precisar passar por uma cirurgia, parece que sofreu uma hemorragia interna. — disse. — Isso é grave? — perguntei, rezando para que a resposta fosse “não”. — Um pouco. — respondeu. 118
Meu coração acelerou, ele me puxou para seu peito. — Fique calmo, vai dar tudo certo, Dr. Mikail foi para St. Joseph cuidar deles. — ele continuava acariciando meu cabelo. — Preciso ir ao banheiro. Ele se afastou de mim. Eu sai da cama. Reparei que Pietro havia trocado meu cateter. Ele em um instante estava ao meu lado, passou meu braço por sobre seu ombro e me carregou até o banheiro. — Não estou tão fraco. — disse. — Tudo bem. — disse me soltando. Passei para dentro do banheiro, ele me seguiu. — O que foi? — perguntou ele vendo o meu olhar. — Nunca alguém, além da minha mãe, até os sete anos me acompanhou dentro do banheiro. — respondi. — Tudo tem uma primeira vez. — disse indo até o box e ligando o chuveiro. — Você precisa tomar um banho. — disse. Fui até o box e entrei dentro da água fria. Ela deu um leve choque em minha pele, senti o abraço de Pietro por trás de mim. Foi então que senti uma dor, minhas pernas tremeram e eu não desabei por conta de Pietro me segurar. — Você está bem? — perguntou ele. — Acho que… — a dor voltou. Senti algo quente descendo pelas minhas pernas. Pietro xingou baixinho em minha orelha. Abaixei meu olhar e o sangue escorria pelo piso do box. — Porra. — disse. Pietro me encarou. Se curvou e me colocou em seu colo, parou na cama e vestiu a calça dele e saiu comigo em seus colos. — Onde vamos? — perguntei. — Você está sangrando. — disse ele. — É melhor fazer um exame. Rápido. Mais eu estava nu. Isso não importava? Na realidade não, minha saúde vem em primeiro lugar. O elevador parou no mesmo andar do dia seguinte, as únicas pessoas dentro eram Dra. Lauren e Julian que me olhava, olhava minha 119
nudez. Olhava meu pênis. Lancei um olhar de advertência para ele, ele percebeu e desviou o olhar de mim. — O que ouve? — perguntou Dra. Lauren. Percebi que o sangue voltara a escorrer. Então lembrei de Jessi Jones na aula de natação do sétimo ano, quando teve a primeira menstruação e a escola inteira viu. — Acho que ouve uma ruptura. — disse Pietro me levando para uma sala. — Isso é grave? — sussurrei em seu ouvido. Ele me encarou, e com aqueles olhos soube que era algo grave.
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CAPÍTULO 21 - Vai ficar tudo bem. — a voz de Dra. Lauren quebrou o silêncio da sala de exames. Pietro segurava fortemente minha mãe. Me virei para ele. Ele encontrou meu olhar e logo se desviaram. Ele soltou minha mão e saiu da sala. — Pie… — Ele vai voltar. — Dra. Lauren me interrompeu. — O que é uma ruptura? — perguntei. Dra. Lauren não me respondeu. — Por favor? — pedi. Ela me olhou, parecia haver tristeza e aflição naquele olhar. — Bom… — começou Lauren. A porta foi aberta e vi Pietro novamente, agora ele usava o traje normal de um médico. Todo branco. Olhando para ele, senti a dor voltar, fiz uma careta que ele pareceu notar, desviei meu olhar dele e encarei o teto, a luz me cegou, então fechei os olhos, o silêncio voltou, escutava o barulho de um teclado e alguma máquina sendo ligada. Abri meus olhos, e Pietro estava ao lado de Dra. Lauren, cochichando, eu não conseguia escutar direito o que diziam, apenas escutava um burburinho. Pietro se virou e viu meu olhar, se aproximou e pegou minha mão. — Vai ficar tudo bem, meu amor. — sussurrou ele para que só eu pudesse escutar. — Eu sei que vai. — respondi, comprimindo a careta de dor. Senti o líquido – sangue – descer pelo meio de minhas pernas, Pietro também notou, se virou para Dra. Lauren e disse em voz alta: — Depressa, não podemos mais perder tempo. — se virou para mim. Ele se inclinou e deu um rápido selinho em meus lábios e voltou junto a Dra. Lauren no canto inferior da sala. Depois de uns longos – e intermináveis – cinco minutos, Pietro voltou até a maca e me pegou no colo, dei uma leve olhada por sobre o 121
ombro dele e vi o sangue no lençol branco da cama. Eu me virei (confesso que enojado com o sangue, sim, sim, eu tenho nojo de sangue, pronto falei!). A máquina a minha frente era enorme, havia uma maca e acoplada nela havia uma espécie de cilindro que envolvia metade dela, muitos fios desciam da lateral do cilindro indo direto até o computador, parecia uma máquina de radiografia, mas, no fundo, eu sei que não é o meu cérebro que importa nesse momento. — O que é isso? — minha voz saiu rouca ao perguntar no ouvido de Pietro indicando com o queixo a máquina esquisita. — É um XiTH, uma máquina para avaliar as veias, foi criado aqui no Centro. — explica ele. Se fosse em outro momento ele me explicaria melhor, mais empolgado, mas esse não é o momento, a uma ruptura dentro de mim, seja lá o que isso signifique. Ele me colocou dentro da máquina e surpreendi ao ver que ele puxou o restante do cilindro me fechando dentro da máquina XiTH. Não conseguia ouvir nada do que vinha do lado de fora, só via os lábios de Pietro se moverem enquanto falava com Dra. Lauren e logo depois ela responder. Dra. Lauren se curvou e começou a digitar no computador plugado no XiTH. Uma luz fraca se acendeu dentro do cilindro, girando no formato arredondado da máquina. Sentia a dor voltando conforme a luz se acelerava, fechei os olhos, pois (acho que meu sexto sentido me alertou) de ficar cego pela luz que ficava cada vez mais forte. Tenho medo de raios. Mamãe sabe disso. Tenho certeza que sabe. Há uma luz que não para de piscar do lado de fora. Sei que são os raios. Tenho seis anos. Sei disso. Aprendi a contar nos dedos. Mamãe também sabe que tenho seis anos. Ela sabe disso. Vejo o dia passar. Quando é noite mamãe chega. Ela sempre chega a noite. Ela conversa com vovó. Sei que conversam sobre meu papai. Meu papai abandonou minha mãe. Ninguém fala sobre isso. Ninguém. Ele nunca veio me procurar. Nunca. Magoa. Sei que mágoa. Ele é meu pai. Não importa o que ele fez. Será que fez por querer? Não. Ele não é mal. Ou será que é? 122
A lembrança me assusta. Abro meus olhos. Sou encarado pelos intensos olhos de Pietro. Ele suspira de alívio ao me ver acordar. Olho para baixo, estou usando uma camisola, do mesmo estilo do primeiro dia de tratamento. Olho em volta e vejo que estou em meu quarto, que parece que se transformou em um quarto de hospital. Olho meu pulso, e a uma agulha espetada que leva até um pacote de sangue. Uma máquina que monitora meus batimentos cardíacos. Bip. Bip. Bip. Bip. O som é constante, sinto que meu coração não está acelerado. Sou tirado de minhas observações por um leve beijo de Pietro. Olho para ele. Ele sorria. — Está tudo bem agora. — disse ele. — Deu tudo certo. — O que era? — pergunto com a voz falhando. Quanto tempo passei desacordado? — Você esforçou muito. — respondeu Pietro parecendo culpado. — Não foi culpa sua. — disse. — Sim, foi totalmente minha culpa. — ele abaixou o olhar. — Não consigo me controlar quando estou junto há você, acho que meus hormônios voltaram a viver na adolescência. — ele levanta o rosto sorrindo. — Não poderemos transar por um bom tempo. — Que pena. — disse, e era verdade. — Mas tem outras brincadeiras. — ele disse sorrindo. — Vamos deixar para depois, estou com fome. — disse. — Posso pelo menos sair da minha cama? — Claro, é só levar isso. — ele apontou para o pacotinho de sangue suspenso. — Você perdeu bastante sangue durante a cirurgia. — Cirurgia? — perguntei. — Anestesia geral. — disse Pietro. — Houve um pequeno estrago dentro de você. — Estrago? — perguntei. — Uma veia se arrebentou. — o tom de culpa voltou em sua voz. — Vamos comer. — mudei de assunto, não quero que ele se sinta 123
culpado pelo que está acontecendo comigo. — Claro. — ele me pega no colo enquanto eu agarro a bolsinha de sangue. Pietro me leva até o meu sofá e me deita. Ele vai até a cozinha, e por sobre o encosto do sofá vejo ele se remexer na cozinha. Pietro abre a geladeira e pega um pote de sorvetes e vem até mim. — Sorvete vaia ajudar na recuperação. — diz ele erguendo minhas pernas e se sentado, depois soltando ela sobre as grossas coxas dele. — Só falta um filme meloso. — digo rindo. — Não fica sem. — ele pega o controle da tevê e a liga. Ele zapeia pelos canais e acha um filme meloso. — Podia existir um filme meloso gay. — digo. — Isso seria bom. — diz ele abrindo a tampa do sorvete. Ele estende a mão e pego a colher que ele segura, e nos atacamos o sorvete. Depois de dois filmes melosos – héteros – e assistir dois episódios de Glee – na realidade uma reprise – nós já estamos cansados de tevê. Ele a desliga e olha para mim. — Sabe que nós não podemos foder. — começa. — Mas como lembro bem você não está usando cueca. Ele sorri enquanto sobe com a mão minha coxa e levanta a camisola, logo ele está acariciando as minhas bolas. Tap. Tap. Tap. Alguém bate na porta. Olho para Pietro que abaixa minha camisola e se levanta para abrir a porta. Não olho para ver quem apenas fico escutando. — Ãhn, é aqui que Allen Spinnet está morando? — a voz é meia rouca e tem um leve sotaque, meio russo? Levanto para espiar sobre o sofá, mais o porte grandioso de Pietro tampa o homem. — E quem quer falar com ele? — a pergunta saí ríspida da boca de Pietro. — O pai dele. 124
CAPÍTULO 22 O pai dele. As três palavras que eu nunca ouvira na minha vida. Me levantei rapidamente do sofá, senti uma tontura, mas não liguei. — Allen? — ele perguntou tentando passar por Pietro que era um muro que impedia meu contato com o meu pai. Essa palavra pai, uma nova palavra para meu dicionário. Meu pai tem os olhos azuis, intensos e bonito, talvez seja rico com o estilo de roupa parecido com as de Pietro, o cabelo loiro escuro já estava ficando com alguns fiapos grisalhos, ele sorria ao me avaliar, deveria procurar pontos parecidos entre nós dois. A semelhança era evidente pelo tom de pele, pálido (não só pelo câncer) e os lábios, uma réplica perfeita. — Pai. — disse. A palavra estranha sonhava diferente em minha boca. — Sim. — diz ele, o sotaque talvez russo está bem carregado agora. Pietro entrou na nossa frente novamente. — Pietro. — sussurrei chegando atrás dele e tocando os músculos de sua costa. Ele tombou um pouco a cabeça e perguntou no mesmo tom de voz: — Tem certeza? — Sim. — disse. Ele abriu um pouco o espaço. Segurei com força a bolsinha de sangue em minha mão. Os olhos de meu pai me percorriam de cima em baixo. Então falou com aquele sotaque: — Meu filho. — e entrou na minha casa e me abraçou. O abraço dele era forte. Ele tinha cheiro de amaciante de roupas, e um perfume que não conheço. Ele então parou de me abraçar, e vi as lágrimas em seu rosto. Ele soluçou. Meu Deus ele soluçou? Sim, Allen, ele – seu pai – soluçou! 125
— Não chore. — disse. — Ou não vou me conter. Pietro o puxou deixando um pouco longe de mim – demais. Olhei para ele. — Você ainda não pode passar por fortes emoções. — disse ele rispidamente. — Pietro, eu nunca vi meu pai, e é assim que você o vai tratar? — perguntei no mesmo tom de voz. — Você que sabe. — ele pegou o casaco atrás da porta e saiu da casa. Sem ao menos se despedir. Se despedir, cara! Estou profundamente magoado com ele. Meu pai me abraçou novamente. Depois de me soltar o levei até a sala. Sentei no sofá e ele ao meu lado segurando a minha mão. — Você parece mais com a sua mãe. — confessou ele. — Pensei que você puxaria o lado russo da família. Por isso o sotaque russo. Obrigado Destino pela minha resposta. — Russo? — questionei mesmo assim. — Sim. — disse ele. — Seus avôs, meus pais, vieram direto de Moscou para os Estados Unidos na década de 1980, depois eu nasci, em 1984. — Tenho sangue russo. — disse para mim mesmo. — Sim. — disse ele. — Me perdoe por não ter vindo antes. — disse ele. — Não queria lhe abandonar desse jeito, sem nem ao menos ajudar sua mãe. — Vocês eram muitos jovens. — disse. — Era velho o suficiente para fazer um filho. — disse. Isso é bem verdade. Disse meu lado Ruim. Ele deve ter uma explicação. Disse meu lado Bom. Optei pelo lado Bom. — Você deve ter alguma explicação, não é? — perguntei colocando minha cabeça em seu ombro, ele ficou rígido com minha demonstração de carinho. — Não gosta? — perguntei. — Não é meu forte ficar de grude com outro homem. — disse ele. Trouxa eu sou seu filho. Disse o lado Ruim. Ele está apenas estranhando. Disse o lado Bom. 126
Lado Ruim ganhou. Sai de seu contanto. Retirei minha mão da sua. Ele notou. Então voltou a minha primeira pergunta. — Seus avôs, meus pais, não queriam sujar o nome da família Gardeners Eskarova. — Gardeners Eskarova. Anotei mentalmente o sobrenome paterno. Ele continuou: — Eles estavam começando a se dar bem, e queriam que eu me casasse com alguém do mesmo nível. — E você se casou? — perguntei aflito, mais não devia me preocupar assim, minha mãe encontrara Leo. — Sim. — respondeu ele, parecia triste com a própria resposta. — Teve… — suspirei. — teve outros filhos? — terminei a pergunta. Sinceramente gosto de ser filho único. — Sim. — disse ele. — Joe de 15 anos. — dois anos mais jovem do que eu. — E Thalita de 6 anos. — uma caçulinha que deve ser loira e irritante. — Você podia conhecer eles algum dia. — completou. — E minha… madrasta? — Ela morreu a sete meses. — disse. — Infarto. — terminou. — Eu lamento. — disse. Ele assentiu. Pelo olhar parece que não gosta de tocar nesse assunto. A morte de sua esposa. — E sua mãe? — perguntou ele. Minha mãe? Cara você a abandonou a mais de uma década atrás, com um bebê na barriga e depois de todos esses anos você aparece com a cara de pau e pergunta sobre ela? Discursou meu lado Ruim. Ele está apenas curioso. Apenas disse o lado Bom. — Está… bem. — disse. — Na realidade não. — meus olhos estavam lacrimejando. — Ela e o namorado dela, Leo, sofreram um acidente. — disse. Ele engoliu em seco. — Você já sabia? — perguntei. Ele assentiu. — Sim, eu estava falando com eles na hora do acidente, foi eu 127
que liguei para os bombeiros. — ele abaixou o olhar. — Foi culpa minha. — Talvez não. — disse. — Mais ela está bem? — perguntou erguendo o olhar. Assenti. — E esse tal de… Leo? — Fez uma cirurgia. — disse. — Já deve estar melhor. Hoje é que dia da semana? — Quinta-feira. — disse. Só tenho mais dois dias para ficar na Vila Experimental. — Isso, já deve estar melhor. — repeti. — Me diga mais sobre você. — disse ele. — Bom, o que você quer saber? — perguntei. — Ah sei lá, conte como é você. — pediu ele. — Bom para começar eu queria saber o seu nome. — disse. — Joywsk, mas me chame apenas de pai. — disse. — Joywsk. — repeti. Um nome, bem… russo. — Ou Joy. — disse ele. — Se não estiver preparado para me chamar de pai. Claro que ele não está, nunca te viu na vida. Disse o lado Ruim. Talvez. Concordou o lado Bom. Como? Perguntou o lado Ruim. Afastei esse conflito de minha cabeça. — Bom, pai, eu sou… — respirei fundo. — Não sei por onde começar. — Comece pela escola. — disse. — Tem alguma namorada? Que porra de namorada? Seu filho é gay otário! Gritou o lado Ruim. Que seja. Disse o lado Bom. Está se convertendo para o lado das Trevas, Bom? Perguntou Ruim. É mais realista. Respondeu Bom. Tudo bem, isso é apenas minha imaginação, não existe Ruim, nem Bom. — Não pai. — não vou mentir. — Não posso ter namoradas. 128
— Como não? — perguntou ele arqueando a sobrancelha. — Por que eu sou gay. — respondi. Ele ficou quieto. A pele branca ficou mais branca ainda. Ele estava pensando o quê? — G-gay? — gaguejou ele. — Sim. — disse. — Você é homofóbico? Silêncio novamente. — Pai? — perguntei. — Bom, pensei que meu filho mais velho seria homem, com H maiúsculo. — disse. — Pai, eu ainda sou homem, minha orientação sexual não define minha genitália. — respondi. — Não, você não é um homem, você é um viadozinho. — Pai. — disse magoado. — Aquele que estava aqui era o seu… — ele engoliu a bile, me olhou, os olhos diziam que não gostava do que falaria. — Seu namorado? — Sim. — disse. Silêncio. Ele abaixou o olhar e mexeu as mãos. Aflição. É o que eu sinto não sabendo o que vai acontecer em seguida. Ele ficou em pé e disse: — Acho que me arrependi de ter vindo lhe ver. — ele foi rumo a porta. Peguei a bolsinha de sangue e fiquei em pé. — Não diga uma coisa dessas, pai. — disse. — Não me chame de pai. — disse ele. — Me enganei. Você é a pedra que Deus botou em meu caminho, minha mãe estava certa, não deveria ter revirado a merda que eu fiz no passado. — Como pode? — perguntei. — Como? — ele não entendeu. — Eu não o julguei por ter abandonado minha mãe quando ela estava grávida de mim, e não o julguei por depois de tanto tempo vir atrás de mim. — disse. — E você simplesmente me julgou por eu gostar de pessoas do mesmo sexo que eu. 129
— Isso se chama viadagem. — disse ele. — E acho que esse é o pecado que eu cometi. — Como assim? — agora era eu que não entendia. — De ter criado um… um… sei lá como posso te chamar, mais sei de uma coisa, você é o desgosto que todo pai pode ter. — ele saiu pela porta da frente. Sai atrás, sentia meus pés descalços nas pedras frias. — Pai. — gritei. — Não me chame assim. — disse ele. — Você não é meu filho. Olhei ao redor, senti uma dor, a bolsa de sangue escorregou de minha mão e bateu nas pedras frias e estourou, manchando a neve de vermelho vivo. Meus joelhos estavam fracos, eu não estava bem. — Pai. — disse. Ele olhou para trás e viu todo o sangue e parou por um minuto. — Me ajude. — disse. — Não. — sussurrou ele me dando as costas e partindo. — PAI! — gritei. A dor voltava. Por que eu não tinha minha vida normal de volta? Senti alguém me pegando pela cintura e me erguendo. Olhei para trás e vi Pietro. Ele estava com ira em seus olhos. — Pietro. — sussurrei. — Falta sangue no seu organismo. — disse. — Por isso está tão fraco, venha, você fez muito esforço, eu lhe avisei. Ele me pegou em seu colo. Olhei por sobre seu ombro, e a única pessoa que eu desejei ver até meus oito anos, meu último pedido de natal que eu queria conhecer meu pai, estava indo embora. Deu apenas uma leve olhada para trás antes de entrar no carro e partir. Pietro me levou em silêncio até o quarto, onde engatou outra bolsa de sangue e transferiu o meu cateter para a máquina de oxigênio. — Você precisa descansar. — disse ele. — Me desculpe. — disse. — Não há por que se desculpar. — ele beijou minha testa. — Meu pai é homofóbico. — disse. — Se ele fosse seu pai ele te aceitaria do jeito que você é. — 130
Pietro deitou-se ao meu lado. — Eu vou ficar sempre ao seu lado. Me virei e beijei de leve sua linda boca. — Nisso eu acredito. — disse fechando os meus olhos e pedindo a Deus para não ter um terrível pesadelo pela pessoa que me fez. Meu pai.
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CAPÍTULO 23 PIETRO Allen adormeceu em meus braços. Gentilmente tirei ele dos meus braços e sai da cama. Tinha uma coisa para fazer. E precisava fazer sozinho. Sai da Casa 3 e peguei meu celular. — Alô Sr. Sullivan. — a voz de Ashton invadiu o celular. — Sim Ashton, preciso de um favor. — disse. — Qualquer um. — Ashton estava animado pelo visto. — Bom, sei que você tem controle sobre as câmeras de segurança. — Sim. — concordou ele. — Tem como ver a placa e para que lado foi o último carro que saiu da Vila? — entrei dentro do meu carro dando partida. — Um minuto. —escutei o barulho de teclado do outro lado. — Foi rumo a Jellyborn City, e a placa é de um Ford Mustang, FWS 700. — Obrigado Ashton, fico te devendo mais uma. — desliguei. O desgraçado estava voltando para Jellyborn City. A cidade estava começando a se iluminar para a noite. A neve voltara a cair. Seguia o estiloso Ford Mustang do desgraçado Joy pelas ruas da cidade. Ele parou em frente ao Carmaine Hotel. Um bom hotel, o bicho tem dinheiro. Ele estacionou o carro e desceu. Estacionei logo atrás. — Ei você. — gritei ao descer. Ele se virou assustado ao me ver. — Você!? — parecia incrédulo ao me ver. — Sim. — disse. — Você deve ser o médico viado. Meu sangue subiu. — Você tinha a aparência de ser um homem tão civilizado. — 132
disse. — Mas está se revelando pior do que um assassino. — Como ousa? — perguntou ele. Cheguei mais perto dele, encurralei ele entre seu charmoso carro e uma van do hotel na frente. — Como ouso? — perguntei retoricamente. — Como você ousa desprezar seu filho que você nunca viu? Como ousa abandonar ele daquele jeito? Ele não podia se esforçar fisicamente. — Bom, ele não é mais meu filho. — Ele tem seu sangue. — disse. — Ele não é meu filho e ponto. — disse Joy sem um pingo de remorso em suas palavras. — Eu tenho nojo de ter me deitado com a mãe dele naquela noite e ter criado um viado para esse mundo, e você aí, um homem… um… sei lá, você é bonito, mais estragou sua vida escolhendo ser viado. — A gente não escolhe ser assim. — disse. — Não? — ele deu risada. — Então pare, encontre uma mulher, saia dessa vida nojenta, abandone aquela coisa que eu fiz. — Está falando do seu filho? — Não o chame assim, ele não é meu filho. — disse. Sem pensar dei um forte soco em seu queixo. Ele se contorceu de dor, e devagar levantou o olhar. — Sabe que eu posso te processar. — Processa. — gritei. — Vai lá e processa. Quero ver. Ele parecia não acreditar ainda que eu havia lhe dado um soco no queixo. Ele então – bem rápido, admito – me desferiu um golpe no estômago. A dor passou por todo o meu corpo. Dei um soco nele, acho que foi no olho direito, ele é menor do que eu. Ele me chutou na virilha. Um golpe de mulherzinha, e ainda eu que sou o viado. Mas a dor me deixou cego – fisicamente – por alguns segundos, mas Joy – um burro – não se mexeu, ficou me olhando. Depois que a dor se amenizou desferi um golpe em sua barriga, ele bateu de costas no seu carro. Dei outro e outro. Outro e outro. Ele escorregou pela lateral negra do carro e caiu de joelhos na neve que se manchou com o seu sangue. — Por favor. — disse ele. 133
— Talvez viados não tenham compaixão. — disse, mas é mentira. Dei um chute em seu estômago. As lutas que praticara a seis meses atrás com o meu personal trainner haviam feito uma diferença. Ele grunhiu de dor. — Bom, não vou mais sujar minha mão com você. — disse. — Você não merece toda essa atenção, e um simples aviso, se você voltar a entrar em contato com Allen, eu volto e faço pior, não estrague o resto da vida dele. Me virei e comecei a caminhar até meu carro. — Ac-cha q-que vai escapar? — ele gaguejava. Me virei, e senti a dor. Joy – filho da puta – estava segurando um revólver. — Todos os viados têm que morrer. — disse. Cai na neve, que começava a escurecer com o meu sangue. Olhei para Joy que com muito esforço se levantava e vinha em minha direção. — Espero que o Inferno te aceite, é onde os viados merecem estar. — e senti o chute em minha cara. O céu nublado girou e apaguei.
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CAPÍTULO 24 Meus passos eram lentos na rua esburacada. Não sei onde estou. Sinto as gostas do céu caindo sobre mim. Onde estou? O crepúsculo chegou. Estou com muito medo. Como controlar o medo? A luz ficou mais forte na minha frente. Corri. Meus pés machucavam em contato com as pedras brancas que – acho – enfiavam na minha pele. Olhei para o céu. As nuvens haviam ficado vermelhas como… Como sangue. Olhei para meu corpo, a roupa branca que usava estava encharcada de sangue. O que estava acontecendo? Olhei ao redor, a luz ficava cada vez mais longe. E na luz eu enxergava o rosto de Pietro sorrindo. O sorriso sumiu. Ele sumiu. Onde ele foi parar? Respirei fundo. Olhei ao redor novamente. As árvores estavam ficando cada vez mais longe de mim. Escutava uma risada grotesca. O que estava acontecendo? Meus pés estavam encharcados. O sangue estava formando poças no chão branco por conta da neve. Ali estendido na minha frente eu via um corpo. Meus pés se mexeram sozinhos, me levando até o corpo. Não consegui desviar meus olhos do corpo de Pietro. Acordei assustado na minha cama. Olhei atordoado ao meu redor. — Pietro? — sussurrei. Ninguém respondeu. Talvez ele estivesse lá embaixo. — Pietro? — gritei. Nada. Retirei o cano da máquina de oxigênio e o coloquei em um cateter móvel. Peguei a bolsinha de sangue e amarrei no cateter e saí do quarto. A casa estava toda escura. O crepúsculo entrava por todas as janelas. A neve caia la fora, gelando todo o interior da casa. Onde estava ele? — Pietro. — chamei novamente já desistindo, ele tinha uma vida alheia a minha. Não é? Fui até a sala acendendo o interruptor e iluminando todo o 135
ambiente, vi meu celular no criado ao lado do sofá e fui até lá pegar. Havia dúzias de ligações perdidas de duas pessoas, uma era do meu Tio Beto e o outro número eu não conhecia. Liguei para Tio Beto para ter mais notícias de minha mãe e Leo. — Alô. — a voz do meu tio ecoou estridente pelo celular. — Sou eu, Allen. — disse. — Claro. — disse ele, parecia feliz. — O que houve? — perguntei me sentando no sofá e cruzando as pernas horizontalmente. — Você não vai acreditar. — disse ele. — Sua mãe está melhor, consegue comer e falar sozinha, e o Leo já está no quarto, consegue ficar acordado, mas ele precisa descansar e por isso não fala muito. — Que maravilha! — exclamei feliz da conta. — Posso falar com ela? — Um minuto. — disse. Escutei alguns sussurros de Tio Beto e depois ele falou: — A enfermeira vai levar o celular até ela. Até mais, tchau. — Tchau. — disse. Escutei um barulho e depois passos andando. Um minuto e trinta segundos depois ouvi uma porta se abrindo e a voz da – acho – enfermeira. — É para você, acho que é seu filho, de Jellyborn City, na Dakota do Sul. — mais um barulho. — ALLEN! — gritou minha mãe. — MÃE! — gritei também, não conseguia esconder a minha emoção no meu tom de voz. — Graças a Deus a senhora está bem. — Bem demais. — disse. — Tenho uma novidade. — Eu também. — talvez seja pior. — Quer falar primeiro? — perguntou ela. — Não. — disse. — Primeiro as damas! — Nossa que cavalheiro. — conseguia imaginar um enorme sorriso em sua face. — Sabe Allen, você vai ganhar um irmãozinho. — Meu Deus. — disse. — A senhora está grávida? — Sim. — disse ela. 136
— Não acredito nisso. — disse. — Nem eu, em meio a tantos desastres algo glorioso. — disse. — Leo vai surtar quando descobrir. — Por um bom motivo. — disse. — Vou ter um irmãozinho! — Ou uma irmãzinha. — disse minha mãe. — Ou os dois. — disse. — Difícil. — disse. — Pelo nosso lado familiar não há nenhum gêmeo. — E pelo lado de Leo? — O avô dele. — disse minha mãe. — É, talvez Allen você tenha razão. — de novo imaginei o sorriso. — Bom e qual era a sua novidade. Seria mesmo novidade meu pai ter vindo me ver? Apesar dele ter me desprezado? Não posso ser essa pessoa ingênua no mundo moderno. Esse tipo de pessoa é odiada por todas as outras. — Foi um saco. — disse antes da hora. — O que meu filho? — perguntou ela, voltando a ser a mãe preocupada de antes, não a mãe feliz de antes. — Meu pai veio me procurar. — disse. Silêncio do outro lado da linha. — Mãe? — perguntei. — O que ele disse? — perguntou ela, meia… aflita. — Coisas horríveis. — disse. — Eu contei que sou gay para ele, e ele simplesmente virou o maior homofóbico que eu já vi, disse que tinha desgosto de ter dormido com a senhora, e que fosse por ele ia me esquecer para sempre. A voz dele ainda reverberava em meus pensamentos. Você não é mais meu filho! Afastei essa memória – absolutamente triste – da minha cabeça. — Filho, por favor, pela sua mãe, esqueça esse homem. — disse ela. — Por mim ele que se foda. — disse. — Desculpe. — Não precisa se desculpar. — disse ela, parecia contente com o palavrão que eu dissera. — Preciso desligar a enfermeira voltou, hora 137
do meu jantar. — Claro. — disse. — Tchau mãe, te amo. — Também te amo. — disse ela. — Esqueça esse homem. — De quem a senhora está falando mesmo? — brinquei com ela. — Bobinho. — disse estalando um beijo pelo telefone. Devolvi e ela desligou. Olhei ao redor, e daí me lembrei do outro número. Apertei para chamar. — Alô, Allen? — era a voz da Dra. Lauren. — Sim sou eu. — disse. — Você sabe onde está o Pietro? — perguntou ela. — Não. — disse. — Por quê? — Pensei que ele estava com você. — disse. — O plantão dele aqui no hospital já começou e ele ainda não apareceu. — Não apareceu? — perguntei. — Já tentou o telefone dele? — Sim, cai direto na caixa postal. — respondeu Dra. Lauren. — O meu medo. — ela hesitou. — É que tenha acontecido alguma coisa. — Como assim? — perguntei, meu coração acelerou. — A empregada dele diz que ela não apareceu, o telefone, desligado e ele ainda não está com você. — respondeu ela. Senti um leve arrepio em minha nuca. — Preciso ir. — disse ela. — Tenho paciente para atender. — O.k. — disse. Ela desligou. Onde está você Pietro Sullivan?
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CAPÍTULO 25 PIETRO Minha cabeça dói. Meu peito dói. Tento abrir os olhos, mas eles resistem. Parecem inchados. Esquisito. Tento me lembrar das últimas horas. Elas são enevoadas, parecem cobertas por debaixo de um grosso cobertor. — Será que ele está bem? — escuto uma voz feminina perguntando. Me mexo. As dores voltam mais fortes. — Não se mexa. — a mesma voz fala. — Acho que ele está muito machucado. — a voz está falando com outra pessoa. — Será que ele é perigoso, Cindy? — uma voz masculina pergunta. — Talvez Bill. — responde Cindy. Sinto mãos me tocando. — Consegue ficar de pé? — pergunta Cindy para mim. Faço um gesto negativo com a cabeça. Um par de mãos me ergue do chão. — Me ajude aqui, Bill. — diz Cindy. Outro par de mãos me ajuda. — Vamos levá-lo até o Dr. Gregory. — diz ela. — Tá bom. — responde Bill, meio relutante. Ouço o barulho de portas se abrindo e depois sou colocado dentro, no banco de trás de um carro. As portas se fecham, ruídos vindo do lado de fora. As portas da frente se abrem e o casal entra no carro. — Consegue falar? — pergunte Cindy. Tento abrir meus lábios, saí apenas um fiapo de voz. — Tudo bem. — diz ela. Abro meus olhos, eles estão um pouco ardentes. Pisco várias vezes tentando tirar a ardência, mas é em vão. Tenho um vislumbre de longos cabelos loiros, talvez essa seja Cindy, e um homem – acho – que 139
tem um longo cabelo com uma tiara de miçangas que lembra ser em um estilo hippie. Bill dá a partida no carro. Longos – acho eu – quinze minutos depois, escutando a melodia de The Scientist. Essa música me dá uma tristeza interna, que me faz me lembrar de Allen. O que ele deve estar fazendo agora? Nesse exato momento? O carro para. — Chegamos. — diz Cindy. Depois de descerem e abrirem a minha porta, acho que Bill, me apoia em seu ombro. Escuto o barulho de sirenes. E quando abro os meus olhos, apenas vejo uma placa. Hospital de Sioux City, Iowa. Estou no estado do Iowa? Meu Deus. Bill e Cindy entram comigo no hospital. As enfermeiras estão de um lado para o outro. — Ei. — diz Cindy. — Por favor, alguém pode ajudar esse moço? Uma enfermeira negra chega. Ela está com o cabelo ajeitado e cheira bem, acho que é o começo de seu plantão. — O que aconteceu com ele? — pergunta ela. A voz calma. — Achamos ele no milharal em uma fazenda perto de Storm Lake. — responde Cindy. — Acho que ele levou um tiro. — ela acrescenta. — Drew, Al. — ela chama. Dois enfermeiros chegam com uma maca, eles me erguem e me deitam nela. A enfermeira se vira para Bill e Cindy: — Vocês dois o conhecem? — ela pergunta. — Ah não. — responde Bill e Cindy ao mesmo tempo. — O.k. — diz ela, então se vira. — Consegue falar seu nome? Abro a boca: — Pi-i… — começo, mas a voz se perde. — O.k., vou te chamar de Pi. — ela responde. — Meu nome é Katy, e vou cuidar de você. Tudo bem? Assinto com a cabeça. 140
— Levem ele para a emergência, se a bala ainda estiver alojado ele pode correr algum risco. — diz Katy aos outros enfermeiros, Drew e Al. Ele empurram a maca até o outro lado do hospital, portas duplas se abrem e se fecham atrás de mim. Escuto o barulho de pessoas andando ao meu redor, depois tudo é abafado quando entramos em uma sala mediana. Ela é muito branca e quase não consigo manter meus olhos abertos (eles já não estavam tão abertos mesmo). A maca para. Drew/ou/Al – não sei qual dos dois – fica ao meu lado, pega uma tesoura e corta minha camisa, ele a joga sob um balcão de granito, é ai que noto que ela está toda manchada de sangue seco e terra preta. O mesmo enfermeiro, pega um algodão e o molha em álcool e depois se curva e passa sobre a minha – ou minhas, não sei bem – feridas. Eu meio que escondo um grito de dor quando o algodão com álcool toca minha ferida. — Calma. — sussurra ele. — Sei que dói, mas é para o seu bem. Sou médico. Se eu pudesse falar eu falaria isso. Sei que dói, já fiz isso dezenas de vezes no meu antigo emprega em Des Moines, aqui mesmo em Iowa. O enfermeiro pega um bisturi e olha para meu abdômen. Suspira. — Parece que a bala acertou apenas de raspão. — diz, mas ele se curva para examinar melhor. — É. — confirma. — Foi mesmo de raspão, que sorte você tem. Ele então pega uma pomada e aplica no local, e depois coloca uma gaze em cima e termina colocando esparadrapo. Ele olha para meu rosto. — Vou pegar um saco de gelo. — e saí da sala. Devo estar tão estranho assim? Me pergunto onde está Joy? O enfermeiro volta antes mesmo de eu ter uma pequena resposta sobre o paradeiro do maldito, ele coloca o saco de gelo em uma parte da minha cara, que tampa o lado esquerdo inteiro e um 141
pouco do queixo do lado direito. Umas duas horas de repouso e pareço melhor. Eles me colocaram em uma cadeira no corredor. Tentei falar, mas as palavras se embolavam na minha língua inchada. Eles também me deram um suco diet de uma loja chamada Polly Juice e um sanduíche de pão integral, feito ali mesmo no hospital. Ao meu lado o jornal da cidade está aberto. A data é de mais de um mês atrás, passo o olho pela antiga reportagem. Família Eskarova em mais um escândalo. Já ouvi esse sobrenome antes, mas onde? Continuo a ler. Não é novidade que os Eskarova estão sempre em confusão, no último dia 7 (segunda-feira), a filha mais nova da família, Caterine Eskarova Gardeners Patcher (29) atropelou um jovem ciclista no centro de Atlanta, na Geórgia, e ontem (13), a família está envolvida em mais um escândalo. O filho do meio da família, Joywsk Eskarova Gardeners foi acusado por vizinhos de bater na mulher. Os advogados da família Gardeners não quis falar sobre o assunto, mas um site de fofocas, o TheSpiritOfGossip.com publicou imagens da mulher de Joywsk entrando no hospital junto com um dos filhos, o casamento, segundo o próprio site, já está passando por problemas de saúde, a família diz que são apenas boatos. Joy – Joywsk – batia na mulher? Na madrasta de Allen? O monstro é sempre um monstro, não importa com quem ele usa sua força. — Hum. — levanto o olhar. Bill e Cindy estão parados me olhando. — Bom, a gente vai indo. — diz ela. — Obri-obri… — minha voz não saí. — Não precisa se esforçar. — diz Bill. — Descanse. — De nada. — disse Cindy. — Bom, quando melhorar ligue para nós. Ela estende um pedaço de papel. — Mas acho difícil estarmos em casa, nós somos os incríveis 142
nômades americanos. — ela diz. Sorrio. — Isso aí. — emenda ela. — O espírito da felicidade. Preciso recompensá-lo um dia desses. Eles se despedem e vão embora, logo em seguida Katy chega. — Quer ligar para alguém? — pergunta ela. — S-sim. — me surpreendo que minha voz tenha feito uma palavra sair inteira. — Tome. — ela estende um celular. — Vou deixar você a vontade. Ela saí. Sem pensar duas vezes disco o primeiro número que me vem a cabeça. — Alô. — a voz dele invade minha cabeça, me deixando feliz da vida. — A-Allen. — digo sorrindo.
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CAPÍTULO 26 Um enfermeiro chegou e trocou a bolsa de sangue, o cateter e me passou os remédios. Esse é o último dia meu na Vila Experimental até a próxima semana de tratamento daqui quinze dias, onde eles vão avaliar se o tratamento fez uma leve diferença no meu organismo, se o câncer está regredido. O enfermeiro foi embora e me deixou sozinho, mas não por muito tempo. Um Suburban encostou no portal de entrada e de dentro dele surgiram alguns amigos. Murilo estava usando uma calça jeans preta, uma camisa do Black Sabbath. Rebecca estava com uma calça jeans bege, blusa do seriado Girls In The House – odeio esse seriado. Dylan estava com uma calça jeans preta, camiseta sem estampa preta, e uma jaqueta de couro negra (um típico gótico-nerd). Jordan estava em um canto, com uma calça azul, parecia jeans, mas não era, uma camiseta branca com o rosto de Jimmy Fallon sorrindo. — Oi Allen. — gritou Rebecca ao me ver. Estava apenas de calça moletom, uma camisa fina branca – do Pietro – e o meu outro moletom. — Oi Rebecca. — disse. Ela me abraçou. — Nossa você está mais magro. — disse ela. — Eles estão lhe dando comida? — Claro que estão dando. — disse. — Allen. — disse Murilo. — Quanto tempo. — Uma semana. — disse. — E o que você vieram fazer nesse fim de mundo? — brinquei. — Resgatar alguém. — respondeu Murilo sorrindo. — Eles vão de dar alta lá pela cinco da tarde. — disse. — E tenho muito sangue para tomar. — Sangue?! — não sabia se era uma pergunta vinda de Rebecca. — Eu desmaio ao ver sangue. — O que houve? — perguntou Jordan. 144
— Uma ruptura. — disse. — Nada grave. — acrescentei. — O que eu perdi no Jellyborn High School? — Quase nada. — disse Dylan pela primeira vez. — Uma briga… — Acredita que os amigos do Trace estavam zoando ele ainda com aquele vídeo. — mudei de expressão. — Desculpe Allen. — Tem nada não. — mentira!!! — Pode continuar. — Então, eles estavam zoando o Trace, e ele não é tão paciente assim, acabou socando a cara de alguns meninos na escola, foi o maior barraco. Quase que o coordenador levou um soco de Trace também na hora de apartar a briga. — disse Rebecca. — Vamos entrar? — perguntei. — Ninguém merece ficar morrendo nesse frio. — Caralho! — exclamou Dylan. — O que foi? — perguntei. — Nossa, esse lugar aqui todo compraria o meu bairro. — ele deu risada, nós todos acompanhamos. — Bom, o seu bairro só tem trailers. — disse Murilo. — Talvez tenha como comprar ele inteiro com o dinheiro que colocaram para construir esse lugar. — Tudo bem. — disse. — Sinto minhas orelhas congelando. Quando entramos esperei dez minutos até eles se acostumarem com o ambiente, ofereci água, café ou suco – é proibido refrigerante – e umas torradas industrializadas. Eles aceitaram o suco e as torradas. Eu fui até a cozinha e escutei alguns comentários como “Nossa isso deve ser bem caro”, “Olha o tamanho dessa tevê!”, “Alguém já viu o quadro igual a esse” e “Nunca pensei que era assim… tão chique”. Na sala liguei a grandiosa tevê e coloquei em um filme qualquer, acho que é O Calhambeque Mágico, ou é Christine, não faço ideia. Só sei que as horas passaram, até que eles pediram para ir até o Centro Médico, eu disse que eles podiam ir. Assim que eles saíram a campainha tocou. Abri a porta e Trace O'Hara estava parado lá em pé. Estava cheio de hematomas no rosto. Parecia triste e cansado, visualizei em suas mãos o meu conhecido moletom. 145
— Trace. — digo. — Pelo tom de voz acho que esperava outra pessoa. — ele estendeu o moletom. — Tome, você esqueceu no meu carro. — Não. — disse. — Não queria dizer aquilo, Trace. Quer entrar? — Não. — disse. — Vi o carro de Murilo ali, acho que ele e seus amigos deve estar com você. — Trace. — era uma ordem no meu tom de voz. — Entre. Ele passou por mim. Fechei a porta. — Sente-se. — apontei até o sofá. Ele se sentou e eu sentei na poltrona, de frente para ele. — O que aconteceu com você? —perguntei. — Por que você brigou? — Acho que seus amigos já te contou. — disse Trace abaixando a cabeça. — Acho que seus amigos não estavam te zoando por alguma razão boba. — disse. — Fale a verdade, lembra, nós somos amigos também. Ele assentiu. — Acho. — começou. — Que o vídeo da Honda não afetou apenas você, ele também me afetou. Meu pai viu, e ficou louco, quase me expulsou de casa, mas minha mãe o conteve. Então o Conner, meu melhor amigo, começou a fazer piadinha comigo, como viado, namorado do doente — isso me doeu, “namorado do doente?” — Entre outras coisas, eu não aguentei mais e fui tirar satisfações, e nos últimos dias eu meio que havia abandonado aquele grupo, estava mais sozinho, e assim que perguntei o que eles estavam ganhando com aquilo, eles continuaram a fazer piadinhas, dizendo que a nova margarida não brigava, então eu mostrei que margaridas brigam, mas como vê, eu também sofri um pouco. — ele sorriu apontando para os hematomas no rosto que antes até certo ponto era perfeito. — Eu sinto muito. — disse. — Não precisa bancar esse de mocinho ou santinho, Allen. — disse Trace. — Você não tem culpa de nada, eu precipitei. — disse. — Mas eu já conheci um menino, ele também acabou de chegar em 146
Jellyborn, o nome dele é Lucas. — ele sorriu com o nome. — Mas acho que ele não é gay. A gente tem saído, viramos amigos, e ele gosta de mim, não sei se é daquele jeito, mas vejo que ele meio que me come com os olhos. Desejo. Acho que é isso. Mas ele não se assume comigo. — Você disse para ele que você é gay? — perguntei. — Não. — respondeu ele. — Talvez seja isso. — disse. — É, ele deve achar que eu sou heterossexual. — respondeu Trace, parecia se animar com a ideia de abrir com esse Lucas. — Ele é uma graça, Allen, você precisa conhecê-lo. — O.k. — disse. — Um dia. — acrescentei. — É. — ele concordou. — Bom, acho que eu devo ir. — disse. — Seus amigos já devem estar voltando. Ele se levantou. Eu fiz o mesmo. — Obrigado por trazer o meu moletom. — agradeci. — Não há de que. — ele fez uma pequena reverência. — Exagerado. — disse. — Tudo bem. — ele foi até a porta e se virou. — Allen, obrigado por fazer eu descobrir quem eu era. — disse ele. — Te vejo semana que vem na escola, acho que a peça de teatro está mais perto. — Tomara que esse Lucas não seja ciumento. — disse. — Vou falar com ele. — Trace estava empolgado. — Tchau Allen. — Tchau Trace. Ele saiu. Me joguei no sofá e meu telefone tocou. Olhei o identificador de chamadas. Desconhecido. — Alô. — disse. — A-Allen. — a voz de Pietro invadiu minha cabeça. — PIETRO! — gritei. — Allen. — disse. — O que aconteceu? — perguntei. — Você está bem? Onde você está? — M-muitas perguntas-s, acho que v-você está c-curioso. — ele brincou. — E muito. — disse. 147
— Eu fui imaturo. — Como? — perguntei. — Imaturo. — disse ele. — Eu fui atrás do seu pai depois que ele disse aquilo, queria tirar satisfações, mas acabou saindo fora do controle, e nós brigamos, ele sacou uma arma… — Uma arma!? — não sabia o que falar. — Sim, uma arma, e ele atirou em mim. — Ai meu Deus. Onde? Em que lugar? — A-acho que perto da costela, m-mas foi apenas de r-raspão. — disse Pietro com o tom de voz como se todo dia ele levasse um tiro de raspão perto da costela. — Onde você está? — perguntei. — Em Iowa, numa cidade chamada Sioux City. — respondeu ele. Não ficava muito longe daqui. — Fale para a Lauen vir me buscar. — disse ele. — O.k. — respondi. — Preciso desligar. — disse ele. — Estou ficando melhor, mas a enfermeira p-precisa do telefone dela de volta. Sioux City. Não se esqueça. No Hospital de Sioux City. — Não vou me esquecer. — disse. — Beijo meu amor. — disse ele. — Outro meu amor. — disse. Ele desligou. Sem perder um tempo retornei a ligação para a Dra. Lauren. — Allen? — perguntou ela. — Desculpe Dra. Lauren. — disse. — Pietro ligou. — Pietro? — Sim. — respondi. — Perguntou se você não podia buscar ele em Sioux City, no Iowa. — Claro. — disse ela. — Aonde? — No Hospital de Sioux City. — respondi. — O.k. — Tchau. — disse. — Tchau. — respondeu ela. 148
Desliguei. Olhei para aporta que se abria. — Hora do almoço. — disse ao ver Rebecca, Murilo, Dylan e Jordan entrando. Cinco horas da tarde. Faz duas horas que Dra. Lauren foi para Sioux City atrás de Pietro. Não acredito que meu pai teve a capacidade de tentar atirar em Pietro. Essa ideia ainda me abomina. — Pronto? —perguntou Dylan colocando minhas malas no porta-malas do Suburban. — Sim. — respondi. — Vamos embora desse lugar. — disse Rebecca. — Ir direto para Jellyborn City. — Sim. — disse colocando meu moletom preferido, o que Trace me devolveu hoje. Ele havia lavado, estava com cheiro de pinheiro com orvalho. — Mais pronto que nunca. Mas chegando em casa eu estaria sozinho, e onde estaria meu pai nessa hora?
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CAPÍTULO 27 JOYWSK O Suburban estacionou em frente à casa dele. Eu estou dentro do meu Ford Mustang. Odeio esperar. Mas preciso dar um aviso maior para aquele bicha grandão. Não me importo se ele seja meu filho, ele é um viado, e todo viado merece estar morto. Finalmente o Suburban foi embora. A casa estava silenciosa, estaria apenas aquele ingrato lá dentro. Sozinho. Eu já cuidei da piranha da mãe dele. Do padrasto. E do namorado boiola. Só falta meu filho. Allen Spinnet. Saio do Mustang e caminho em direção a casa que está com a luz da sala acesa. Toco a campainha. Escuto passos vindo do lado de dentro. Ele abre a porta. — Pietro…? — Não esperava por mim, né? — perguntei entrando. — N-não. — gaguejou ele. — Por favor saia da minha casa. — Você não gosta de brincar? — perguntei. — Ahn? — Ué, você não brinca de namorar com outro homem? — perguntei pegando ele pelo braço. — Eu não posso fazer esforço… — Ah é? — meu tom é de ironia. — Mas você vai gostar de brincar.
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CAPÍTULO 28 Tranquei minha porta assim que Dylan, Rebecca, Murilo e Jordan me deixaram em frente a minha casa. Ascendi alguns abajures e liguei o interruptor. Retirei meu preferido moletom e me deitei no sofá. Recebi uma mensagem. Era do Pietro. Estou quase chegando. Sem perder tempo eu respondi: O.k. <3 Ele apenas respondeu: <3 Coloquei meu celular de lado, fechei meus olhos. Sentia o oxigênio passando pelo meu nariz. Fazia cócegas. Fechei meus olhos, esperando que o sono chegasse, mas fui incomodado por uma bater em minha porta. Me levantei e fui até a porta e a abri. — Pietro…? Parado ali estala ele. Meu pai. Joy sorriu. — Não esperava por mim, né? — ele perguntou. — N-não. — gaguejei. — Por favor saia da minha casa. — Você gosta de brincar? — perguntou ele entrando dentro da casa e com um dos pés fechando a porta. — Ahn? — perguntei sem saber o que fazer. — Ué, você não brinca de namorar com outro homem? — perguntou ele pegando no meu braço e apertando. — Eu não posso fazer esforço… — comecei. — Ah é? — o seu tom de voz é de ironia. — Mas você vai gostar de brincar. — Por favor… — choraminguei. — Calma, Allen, acha que vou fazer o que com você? — ele me empurrou até a parede. — Saía daqui! — eu gritei. — O que você vai fazer? — perguntou ele dando uma leve risada. — Saía! — gritei. — Os vizinhos vão escutar e vão chamar a polícia, daí você vai ser preso… 151
— Preso? — ele olhou para o lado antes de voltar a focar em mim. — Essa palavra não existe no meu vocabulário. — Vai começar a existir. — eu disse. — SOCORRO! — berrei o mais alto que eu pude antes que ele tampasse a minha boca com a mão dele. — Você pode gritar. — disse ele. — Mas acho que ninguém vai te escutar mais. PIETRO — Para onde você quer ir? — perguntou Lauren entrando no território de Jellyborn City. — Acho que Allen deve estar sozinho em casa. — disse. — Vamos para lá então. — O.k. — ela trocou a marcha do Ford Ranger preto e acelerou pela rodovia. A casa da família Spinnet estava em uma imensa escuridão. Desci do carro de Lauren. — Tem certeza que tem alguém aí? — perguntou ela. — Acho que sim. —respondi. — Vou ligar para ele. — Faça isso. — disse Lauren acelerando. Caminhei pelo gramado congelado em direção a porta. Ela estava apenas escorada. Estranho, ele sempre trancava a porta quando ia dormir. Abri ela e entrei. A casa não estava em um grande blecaute, a luz fora diminuída para deixar um clima… sombrio? — Allen. — chamei. Ninguém respondeu. Deixei a porta aberta atrás de mim, caso precisasse voltar correndo. — Allen. — chamei novamente. E novamente ninguém respondeu. Onde estava ele? O que está acontecendo. Esperei alguns minutos. Não se ouvia nenhum barulho sequer, nenhum. 152
Talvez ele já estivesse dormindo. Isso. Subi os degraus que rangeram (pela primeira vez) enquanto eu subia. Virei o corredor que dava para o quarto dele. — Allen. — chamei. — Você chegou? — não era a voz de Allen que perguntou. Olhei para a porta aberta do quarto de Allen. Joy estava escorado no portal do quarto, um sorriso estava esboçado em seu rosto. — Onde está o Allen? — perguntou, a raiva já estava impregnada no meu tom de voz. — Acho que ele não aguentou muito e acabou apagando. — ele sorriu mais ainda. — Acho que ele gritava muito o seu nome, pensando bem ele berrava, mas hoje tem uma tal festa na igreja principal, e os vizinhos daqui são muito religiosos, ou seja, ninguém o escutou gritar. — Você é um monstro. — disse cerrando os meus punhos. — Eu vou acabar com a sua raça. — Ah, você vai acabar com a minha raça? —ele deu uma fina risada e me encarou. — Rele um dedo em mim e você nunca mais vai ver Allen. — Onde ele está? — quase gritei dessa vez. — Calma, Dr. Viadão. — ele deu outra risada. — Meu nome é Pietro. — disse. — Tudo bem. — ele sorria, estava gostando de me estressar. — Acho que se a gente conversar racionalmente, Allen Spinnet pode aparecer novamente. — Você é louco. — disse. — Você batia na sua esposa… — Cala a sua maldita boca. — o sorriso de Joy sumiu. — Você não sabe de nada. — Ué, se irritou por que? — perguntei. — Eu não me irritei… — Não? O.k. vamos fingir que eu tenho cinco anos de idade. — suspirei. — Acredito que tenha uma explicação razoável para fazer tudo isso comigo. Ele grunhiu. — Tem ou não tem? — retornei a perguntar. 153
Ele fechou os olhos e os abriu novamente me encarando. — Sabe de uma coisa, acho que levo tudo ao extremo0. — ele sorriu. — Você me bateu aquele dia e hoje eu estou me vingando, apenas isso, ache que está na série Revenge, e pense que eu sou a principal e você é apenas a pessoa que vai pagar pelo seu crime. — Se fosse para se vingar você precisaria fazer isso comigo, e você está descontando em seu próprio filho? — perguntei meio incrédulo. — Por que? Você se importa tanto assim com ele? — Sim, eu me importo! — respondi. — Eu também o amo, ele foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. — Nossa. — ele estava tirando com a minha cara. Panaca! — Seu amor por ele é muito comovente. — ele deu uma fina risada. — Acha que você vai encontrar ele facilmente? Sem minha ajuda você nunca vai encontrá-lo. — Eu vou chamar a polícia. —disse. — Aí eu falo que não tenho nada a ver. — ele sorriu mais ainda. — Acho que eles vão gostar de saber que você bateu em mim ontem. — Você me jogou em outro estado. — rebati. — Onde está as provas? — perguntou ele passando por mim. — Boa sorte com as buscas. — ele parou. — Como diz naquela trilogia famosa: Que os jogos comecem.
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CAPÍTULO 29 PIETRO Revirei o quarto do Allen durante quinze minutos, mas Joy não seria tão burro em deixar ele ali. Ou seria? Mas não custava nada vasculhar um pouco mais o local. Pensei em ligar para a polícia, mais adiantaria alguma coisa? Joy nem mora no estado da Dakota do Sul. Então apenas abria o armário e revirara as roupas de Allen, mas parecia que a voz de Joy não me abandonava. Que os jogos comecem. Tenho que admitir que ele tem um pouco de criatividade em usar essa frase, mas não era um momento certo para elogiar um psicopata. Parei de mexer nas roupas de Allen, ele queria jogar. Que lugar ele levaria Allen? Que lugar? Desci as escadas, em cima da mesinha de centro da sala havia uma folha de papel vermelha. Sem pensar em mais nada corri até o papel. Na realidade era um envelope, eu o abri, havia uma folha amarelada, parecia que fazia parte de um grande mapa antigo de Jellyborn City, olhei para um lugar que estava com um círculo vermelho em cima. Tom's Dinner. Nunca ouvi falar desse local. Tom's Dinner? Uma lanchonete. Corri para fora da casa do Allen, ainda com o papel na mão. Não estava de carro, Lauren havia me trazido mais cedo. Peguei meu – novo – telefone e disquei para um táxi que estivesse aqui por perto. Billy Bexter era o nome do taxista que me levou até a Waterloo Street. A rua antes poderia ter sido alguma coisa glamourosa, mas agora, estava apenas em ruínas, casas e comércios abandonado, um local ideal para esconder alguém. Principalmente um jovem indefeso, fraco e com câncer pulmonar. O Tom's Dinner era – em alguma época do passado – um grande posto de gasolina, mas agora as letras em neon balançavam, as bombas de combustível estavam enferrujadas, os fios que continha as bandeirolas estavam caídos, e havia corvos por todos os lados. Como 155
Joy conhecia esse lugar? — Obrigado. — disse a Billy Bexter e entreguei uma nota de cinquenta. — As ordens. — disse ele. Billy Bexter não era muito de falar. — Quando precisar é só ligar. — O.k. — disse me virando e indo em direção a lojinha de conveniência que tinha o nome de Tom's Dinner. — Alô? — perguntou ao chegar perto da porta de vidro que estava tampada com papelão para não mostrar o que havia do lado de dentro. Ninguém respondeu. Empurrei a porta, estava aberta. Olhei para dentro, estava tudo escuro a não ser pelas partes que a luz do lado de fora entrava pelas frestas no papelão. Olhei mais um pouco enquanto meus olhos se acostumavam a pouca escuridão do local. Havia um balcão, provavelmente o antigo caixa, umas prateleiras contendo alimentos estragados, entre eles pacotes de Doritos Sweet Chili e algumas latas de Dr. Pepper Diet. Havia um forte cheiro que lembrava fezes, o barulho de pequenas patas, ratos na certa, estavam sobre o forro de PVC que em algumas partes havia caído, seria um belo cenário para The Walking Dead. — Allen? — chamei. — Joy? Ninguém respondeu. Será que eles estariam aqui, foi quando olhei em um canto e vi uma porta, mas a porta não me interessava tanto, havia uma frase em vermelho riscada na porta, com marcador, bem possível. Me abra! Dizia a frase. Devo ser a loira do filme de terror, pois não consegui manter meus passos parados. Abri a porta, mais ali era apenas um armário com utensílios de limpeza, mas havia uma coisa pendurada, um gravador e um novo envelope vermelho. Joy é bem criativo. Peguei o gravador e o envelope, primeiro abri o envelope, outro pedaço de mapa. George Washington Ave, 535, Jellyborn City. Era o endereço riscado. Peguei o gravador e vi que a tecla Play estava pintada de vermelho. Apertei. 156
— Vamos ver como ele vai reagir. — era a voz de Joy. — Hein Allen, manda um beijo para teu namorado, acho que ele vai gostar… Hummm… Acorda. Você não vai acordar? — ele mudou o tom de voz. — Devo avisar que o jogo termina a meia-noite do dia 14. Boa sorte. — e a gravação acabou. Não sei bem o que ele queria me mostrar com aquela gravação. E como assim Allen não acordava? — O que ocê tá fazendo aqui? — me virei rapidamente. Parado ali havia três homens, o do lado direito: baixo, cabelo grisalho, faltando alguns dentes no sorriso amarelo, um gorro maltrapilho da Coca-Cola e usava um moletom surrado de um time antigo de basquete. O do lado esquerdo: Alto, magro, loiro, provavelmente usuário de drogas, usava uma camisa da Discovery Channel e tinha uma tatuagem caseira no braço, dizia Bex meu amor <3. O do meio e provavelmente o líder: Alto, musculoso, cabeça raspado estilo presidiário, tatuagem da folha da maconha no pescoço, usava calção no estilo havaiano e uma regata do Chicago Bulls, nas mãos encardidas segurava um taco de beisebol. — Tá mudo é? —perguntou o Alto Magro. — Acho que tá, Delly. — disse o Baixo Grisalho. — Delly e Phin deixe eu falar. — disse o Presidiário. — O que ocê tá fazendo aqui no nosso canto, hein? Perdeu a noção? Tenho que te lembrar que esse lugar pertence a gangue do Seth, que no caso sou eu? — Eu… eu…. — Ué, é gago? —perguntou o Baixo Grisalho, Phin (acho). — Não. — respondi um pouco mais confiante, não daria para lutar com três deles, e um deles ainda usava um taco de beisebol. — Já estava de saída… — O que você roubou? — perguntou Seth gritando. — Eu não roubei nada não. — respondi. — Nem sabia que esse lugar era de vocês… — Não sabia é? — perguntou Delly. — Nóis vai te ensina a sabe o lugar que é de cada um. — eles não falam a língua corretamente. — Não. — respondi. — Olha eu sou o Dr. Pietro do hospital… — Sei quem é ocê. — disse Seth. — Não atendeu minha mãe a um 157
ano atrás e ela acabou morrendo. — Como…? — O nome era Mary. — disse Seth. Não me lembrava de nenhuma Mary. — Quem disse? — perguntei. — Não interessa. — disse Seth. — Delly, Phin segurem esse babaca. — ele balançou o taco de beisebol na mão. — Hora de pagar pela minha mãezinha. — Cara eu não… — comecei, tarde demais. Delly e Phin seguraram meus braços enquanto Seth vinha com o taco na mão. ALLEN — Acorde querido. Abri meus olhos, ali estava Joy, sentado em uma poltrona verde com um café em uma xícara lendo o jornal local. Eu estava em uma espécie de cômodo sem janela e com apenas uma porta, além da poltrona havia o criado-mudo e uma cadeira, onde eu estava amarrado. No teto havia duas enormes lâmpadas fluorescentes, um arcondicionado velho zunia em um canto. Tentei falar, mas minha boca estava com alguma coisa. — Caso grite. — disse ele. — Espero não ter que fazer você sofrer, minha ex-mulher sofreu bastante, pena que ninguém saiba, a impressa acha que foi um acidente de carro. Arregalei meus olhos. Ele planejaria a minha morte? — Não fique assim. — disse ele. — Vou contar a história. — ele colocou o café e o jornal em um criado-mudo. — Bom, ela tinha um amante, uma verdadeira piranha, ela queria se separar para ficar com ele, dizia que eu não a amava mais como antes, e eu não aceitava isso. Não mesmo. Então um dia ela foi se encontrar com ele em uma boutique em Savannah, ao norte da Geórgia, era onde ele morava, eu já havia contratado um detetive para descobrir tudo, então eu fui no lugar dele até a boutique e cheguei até ela. Acho, posso dizer, que sequestrei 158
ela. Levei ela até uma casa da minha família na Flórida, um espetáculo a Flórida, você precisa conhecê-la um dia, mas não vai a Orlando, aquela é a terra dos parques, vá a Miami. Mas continuando a falar sobre ela, eu a tranquei na casa, fiz ela virar uma nova mulher. Ela me obedeceu, não deu nenhum pio, me respeitava, ficamos assim durante três dias até que ela resolveu fugir, mais não foi longe e eu já estava com raiva, pois toda a imprensa postava em blogs e jornais que eu era um candidato corrupto, daí acabei descontando minha raiva em cima dela, espanquei ela e depois a coloquei dentro do carro. Parece até cena de novela mexicana. Coloquei uma simples pedra no acelerador e o carro caiu dentro do rio perto daquela casa. Acham que foi um acidente, mas o amante dela vive tentando me acusar de alguma coisa, ele é um baita mentiroso, deveria cuidar do próprio pinto. Eu olhava para ele chocado com o que ele havia me contado agora. Ele sorriu. — Acho que você deve estar pensando que sou um louco, mas eu não sou. — ele sorriu mais ainda. — Sabe que a vida é um grande jogo, e precisamos saber as táticas dele, então eu apenas me dou bem, não vivo com a sorte, e acho que a sorte também não vive com você. Seu namorado tem cerca de quinze horas para te encontrar, caso não encontre, o xeque mate será meu. Vamos Pietro. Eu pensava. Você precisa me encontrar meu amor.
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CAPÍTULO 30 PIETRO Delly e Phin me seguravam bem forte, mas Seth ameaçava me bater, tenho a leve impressão que ele é bem covarde para me bater. Seth apenas balança o taco de beisebol na mão, insinuando me bater, mas sinto no fundo que ele não vai fazer isso comigo. — Podemos conversar. — disse. — Se vocês precisam de dinheiro eu posso pagar. Eles se entre olharam. — É dinheiro que vocês querem? — perguntei. — Eu sou rico posso pagar muito bem. — Cinquenta mil. — disse Delly. — Só isso? — disse. — Sessenta? — disse Phin. — Vocês vão comprar um carro? — perguntei. — Cento e cinquenta mil. — disse Seth. — Daí a gente não te bate. — Se eu der o dobro vocês me ajudam? — perguntei um pouco esperançoso. — Para quê? — perguntou Seth. ALLEN Joy retirou a mordaça meia hora depois de ter revelado matar a ex-mulher. Mas não durou muito tempo, só foi para eu beber um pouco d'água e comer um pão seco de aveia e um copo de leite azedo. Isso provavelmente estragaria meu intestino. (Mas por que eu estava ligando para o meu intestino uma hora dessas? Era melhor eu me preocupar com os horários dos meus remédios). Ele amarrou-me novamente na cadeira e tirou o telefone do bolso. — Onze horas. — disse ele. — O tempo está acabando. — mexeu 160
mais um pouco e uma música começou a tocar. Não conheço, ele viu minha expressão e disse: — É Grande Amore do Il Volo. E a música preencheu o ambiente, não entendo muito de italiano, mas a música tocou meu coração, e conforme ia entrando no refrão ela ia ficando cada vez mais bonita. O velório do vovô foi terrível. Mamãe e vovó apenas choravam perto do caixão, não sabia muito bem o que estava acontecendo com elas. Vovô Will era a primeira pessoa que eu amava morria, mas eu não entendia muito disso, não tive luto, não chorei, apenas olhava as pessoas chorando e se abraçando. Mais tarde naquele dia a família inteira estava chorando na casa da minha avó, ela não queria ficar ali. Estava buscando online residências que poderia se mudar, para bem longe desse bairro. Ela não queria esquecer o vovô, queria apenas ficar longe da casa, onde as lembranças felizes aconteceram e onde vovô Will infartou e caiu da escada. Cheguei perto do meu primo Matt e perguntei: — O que você acha que vai acontecer? — Não sei pequeno Allen. — disse ele enxugando os olhos vermelhos. — Acha que vovó vai esquecer o vovô? —perguntei (não me julguem tinha apenas seis anos de idade). — Que isso?! — ele parecia quase ofendido, e depois se lembrou que eu era apenas uma criança e disse: — Não Allen, ela não vai esquecer. Acordei meio tonto, não sabia que havia cochilado, a música havia acabado. Olhei ao redor, Joy havia sumido, onde ele fora? JOY A mensagem era clara. 161
O Doutor não caiu na armadilha, ele continua a seguir o mapa. Eu sai do esconderijo e corri para o último lugar, era hora de mudar os planos. A Igreja Protestante estava vazia. Esse era o objetivo. Um lugar vazio. O reverendo Lockwood estava viajando em missão, segundo o meu informante. Bendito informante. Fui até o púlpito da igreja e lá em cima da Bíblia estava o último envelope vermelho. Sem pressa peguei o de dentro do meu casaco e troquei. Ele iria para um lugar errado, bem errado. Me virei e lá estava o informante. — Eu cansei. — disse ele. — Isso é errado. Eu sei quais são as suas intenções e não vou mais te ajudar a fazer o resto. — Como? — perguntei descendo os degraus que levavam ao altar. — Você escutou. — disse ele. — A mãe do Allen chegou, ela está bem, e sabe que ninguém viu o Allen, ele desapareceu… — Essa era a intenção. — disse. — Para quê? — perguntou ele, estava com raiva? — Para minha diversão. — respondi. — Você é louco! — gritou ele. — Onde está ele? — Ele quem? — Você sabe. — ele chegou mais perto. — O Allen? — Trace… — Não quero ouvir meu nome na sua boca. — gritou ele. — Por que você não fala logo o que você é, hein? — E falar o quê? — perguntei. — Que você é um gay enrustido, isso sim, se esconde atrás dessa face de machão, mais adora um pinto… — Cale a sua maldita boca. — gritei e o empurrei. Ele se desequilibrou e caiu no chão da igreja. Ergueu o olhar para mim, parecia… magoado? — Por que você fez isso? — perguntou ele ainda no chão. — Nunca mais fale isso. — responde ríspido demais. — Quando você me comeu não era isso que você dizia. — disse 162
ele. A vontade de bater nele foi crescendo dentro de mim. Ele pareceu notar. — Ué não gosta mais de pintos? — perguntou ele se levantando. — Não é isso… — Então o que você fazia em uma boate gay? —perguntou ele. — Eu… — Você não se aceita né? — disse Trace me encarando. — Acha que o mundo ainda é do tempo das cavernas, que ninguém mais aceita a homossexualidade no mundo, que as pessoas que gostam do mesmo sexo são um pecado. — ele respirou. — Acho que um pecado que você está cometendo não por ser gay, e sim recusar seu filho e ainda o escondê-lo do amor da vida dele e sabe se mais o que você fez com ele. Você também vai matá-lo? Cheguei mais perto dele. — Não eu não vou matá-lo, mais se você sair por aquela porta, você vai ver? Entendeu? — Vai me matar? — perguntou ele. — Talvez. — disse. — Gado ruim tem que ir para o abate. Ele deu um soco na minha cara. Senti o sangue escorrer pelo meu nariz e pingar no piso de granito. Levantei meu olhar e ele ofegava ao me olhar, a névoa saia por nossas respirações. — Isso é por ter me chamado de gado. — e se virou. — Não dê as costas para mim, a gente ainda não acabou! — gritei. Ele ergueu a mão mostrando o dedo do meio. Sem demora peguei a arma que carregava no cós da minha calça e atirei três vezes contra ele. Trace O'Hara tombou no chão de granito. Fui até ele e passei. — Falei que gado ruim merece o abate. Peguei os pés dele e comecei a empurrar o corpo. Teria um longo tempo até limpar todo esse sangue. PIETRO 163
Delly, Phin e Seth me levaram até o carro deles. Um Ford D-20 azul descascado. O carro fungou antes de ligar. Eles aceitaram rapidinho para me ajudar a resgatar Allen das garras daquele “pai” maldito. O endereço na George Washington Ave, 535, Jellyborn City se revelou apenas um terreno vazio, sem nenhuma construção, apenas um antigo Fusca comido pela ferrugem, e não perdi tempo. Saltei do Ford D-20 e corri até o Fusca. Na mosca. Lá dentro havia um envelope vermelho. Peguei ele e abri. Havia a fotografia de uma torre com sino. Quando doze badaladas der. O morrer será o esquecer. No momento estou a apreciar. A sua coragem para enfrentar. E resgatar o amor da sua vida. Não perca tempo. Embaixo havia um endereço. Trentey Beach, 7890, Jellyborn City. Saí do Fusca e perguntei aos três malucos se eles sabiam o que ficava naquele endereço. — Não é aquela Igreja Protestante do Reverendo Lockwood? — disse Phin. — Minha mãe me levava lá todos os finais de semana. — Então vamos para lá. — disse. Estava ficando cada vez mais perto, dessa vez sem nenhum perigo.
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CAPÍTULO 31 PIETRO A Igreja estava vazia, as portas duplas na frente estavam entreabertas, uma coisa estranha, já que o cartaz dizia que o reverendo estava em missão. Delly, Phin e Seth pararam ao meu lado. — O que acham? — perguntei. — Dá para esconder alguém aí dentro? Delly foi o primeiro a falar: — Não sei não, não tem uma pista em todos os lugares em que você vai? Sem perder tempo corri para dentro da Igreja. As luzes do lado de fora irrompiam pelas frestas das persianas, no altar estava o púlpito com um envelope vermelho. Corri a distância que me separava do que seria meu último passo antes de salvar Allen. Parei em frente ao púlpito, o envelope vermelho estava ali, intacto. Peguei-o. Delly, Phin e Seth se separavam. Abri o envelope e não havia nada escrito dentro dele, apenas uma fotografia. Allen desacordado amarrado em uma cadeira em um lugar mofado. ALLEN Pietro conseguiu um bom advogado para limpar a barra toda do Seth, já que ele foi meu herói, e Pietro ainda devia a ele essa ajuda também. Minha mãe estava alegre com tudo, sendo mãe e sonhando com um casamento. Mais deixei claro que casamentos gays são bem diferentes do de pessoas héteros. Mas mesmo assim a animação dela não diminuiu, parecia estar mais empolgada do que nunca. E não sei o que me deu, mas eu fui ao velório do Joy. Ele foi enterrado em Atlanta, foi a primeira vez que conheci meus avós paternos, mas eles pareciam não estarem tão empolgados para me conhecerem. Seria de sangue me odiarem? Na volta minha mãe foi me buscar no aeroporto, Pietro não pode 165
ir, disse que estava planejando uma surpresa para mim, e Leo o estava ajudando. Eu não conseguia esperar para ver o que seria essa surpresa. O SUV novo de minha mãe parou em frente de casa. Na calçada estava carros e mais carros, alguns eu reconhecia, como o da mãe de Trace. Minha mãe também sorria. Aposto que ela sabe de alguma coisa que eu não sei. — Mãe a senhora sabe de alguma coisa? — perguntei enquanto atravessávamos o gramado congelado. — Talvez. — e ela sorriu. — Mas é uma surpresa, né? — Claro. — concordei. Minha mãe foi mais lenta do que o normal para abrir aquela porta. Não acreditei no que vi quando a porta foi aberta. Todos os meus amigos estavam ali, e alguns médicos que eu tinha visto de relance no hospital da cidade. Era uma festa, e havia um banner enorme pregado no portal que liga a sala de estar com a sala de jantar escrito: PARABÉNS PELOS NOIVOS: ALLEN & PIETRO. Antes que eu pudesse fazer qualquer tipo de pergunta fui abraçado por alguém. Me virei e lá estava o amor da minha vida. Pietro sorria. — Surpresa! — disse ele. — Parabéns. — outra voz, Dylan. Me virei e vi Murilo, Dylan, Rebecca e Jordan estavam ali. Recebi um abraço e outros parabéns deles. Estava mil maravilhas. Olhei pelo espaço apertado da minha casa e notei Susie O'Hara e Julian em um canto. Fui até eles. — Olá Sra. O'Hara, Julian. — disse ficando de frente para eles dois. — Olá. — disse Susie. — Oi. — disse Julian. — Trace melhorou? — perguntei. Os médicos diziam que Trace poderia ficar paraplégico. Uma tristeza, mas todos os dias, segundo o que Susie me dizia, Julian ia até o Hospital passar a noite com o namorado, eles haviam assumido o 166
relacionamento para todos, segundo eles, antes de assumirem era apenas uma amizade-colorida e de experiências novas. Mas chega perto, quem é que Trace e Julian querem enganar? — A Dra. Lauren vai fazer uma nova cirurgia sexta-feira, e daí vai ter o resultado, se ele vai perder os movimentos ou se vai voltar o normal. — ela passou a mão pelos olhos que estavam marejados. — Bom, mas se essa é a vontade de Deus, que assim seja né? Assenti me virando para Julian. — Deve ser difícil para você. — disse. Ele assentiu e começou a chorar. — Calma Julian. — disse Susie abraçando o genro. — Desculpa eu não queria… — comecei. — N-não é sua culpa. — disse Julian. — É que está tocando nossa música. Escutei melhor e reparei que ao fundo tocava Mercy do Shawn Mendes. — Nós nos beijamos pela primeira vez escutando essa música no YouTube. — continuou Julian e voltando a chorar no ombro da Sra. O'Hara. — Pode ir Allen. — disse Susie. — Você tem mais pessoas para atender. — Certo. — concordei. A festa estava lotada. Toda hora vinham me parabenizar. Acabei perdendo Pietro de vista. As músicas iam de tristes a superalegres, de farofas as de mil novecentos e bolinha. Quem seria o DJ, descobri que era Leo e dei uma ajudinha nas músicas, queria algo mais moderno, então pedi, Team da Iggy Azalea. — Agora. — a voz de Pietro vinha muito alta. Olhei ao redor e o vi parado em cima de uma cadeira com o microfone na mão. Ele sorria e apontou para mim. — Allen foi a melhor pessoa que apareceu na minha vida. — disse. — Comecei a ser feliz depois que nossos caminhos se cruzaram, devo ser brega ao dizer que sem ele eu não seria nada. Mas é a pura verdade. Por isso. — ele pegou de dentro do bolso dele uma caixinha 167
preta do bolso da calça jeans escura dele. — chamei todos os nossos amigos e alguns familiares para cá, por que a todos que nos conhecem eu quero pedir Allen Spinnet em casamento. Todos os olhares pareciam cair sobre mim. Jesus me dai forças! — Então, Allen Spinnet, você aceita se casar comigo? — ele perguntou. — Depois não há devolução. — brincou ele. — Aceito! — gritei. Ele desceu da cadeira e veio até mim. Se ajoelhou no chão e olhou para cima, nossos olhares se cruzaram, eu sei que vou ser eternamente feliz ao lado dele, não importa as diferenças de idade – que não é muita – e a homofobia por sermos gays. Estou feliz assim, esse é meu jeito, não mudaria nada que aconteceu na minha vida, e agora quero ser mais feliz ainda ao lado de quem pode me fazer feliz. Sei que minha vida não pode ser só um conto de fadas, mas o máximo que durar eu aproveitarei. E espero que comece a partir de agora, pois um príncipe – doutor, sexy, dotado, gentil, honesto e muitos outros adjetivos – não lhe cai da noite para o dia. Pietro pegou minha mão e enfiou uma aliança que ele tirou da caixinha preta. Era de prata – acho que significa compromisso… não, desculpem, noivado – e colocou no meu dedo anelar da mão direita. — Seremos felizes para todo o sempre. — disse ele. — Com certeza. — disse. Ele se levantou. Colocou uma aliança na minha mão, maior do que a minha, e ele estendeu a própria mão direita. — Devo ser cavalheiro também. — disse me ajoelhando. Levantei a mão dele e coloquei o anel. Ele sorria enquanto eu me levantava. Ele passou as mãos pela minha bochecha e parou nos meus ombros e me puxou, um momento eu coloquei minhas mãos em seu forte peito enquanto ele me puxava para um verdadeiro – forte, gostoso… - beijo de verdade. E sei que o nosso final começa a partir de agora.
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CAPÍTULO 32 O dia seguinte foi mais agitado do que qualquer em outro dia de minha vida. E ainda tive que voltar ao Centro Médico para reavaliar se o tratamento estava surtindo efeito. E devo dizer. Estava. Diziam ter reduzido 0,9%. Pode ser pouco, mas já é uma grande vitória para mim. Murilo, Dylan, Rebecca e Jordan trouxeram os deveres de casa que eu havia perdido nos últimos dias. E era muita coisa. E eu ainda tinha que repassar o texto da peça. Tanta coisa para eu fazer que cada passo que eu dava eu sentia que estava esquecendo alguma coisa pelo caminho, mas sei que lá no final do túnel está alguém que me ama, e o nome dele começa com P. Antes deu relatar o meu amor por Pietro tenho que falar sobre minha mãe e Leo. Bom, então, o bebê deles cresce saudavelmente, sim, é apenas um. Queria que essa parte da minha vida fosse que nem uma bela novela melodramática, para que ela tivesse um lindo casal de gêmeos. Mas um irmão – ou irmã – vai ser muito bem-vindo na casa dos Spinnet. (No meu caso futuro Spinnet Sullivan). E agora, voltando a mim e ao Pietro Sullivan [meu amor, meu tudo] … [quanta melação hein, Allen?]. Ele me mandou uma caixa de bombons essa manhã, todos os bombons tinham formato de coração e estavam com tirinhas de morango, formando molduras meio de rendas. Minha mãe comeu metade, eu devo ter comido uns sete e guardado o resto. (Alguns estão escondidos, pois nas últimas horas, minha mãe vem acabando com o estoque alimentício dos Spinnet e comprando um mercadinho inteiro de comida). E agora estou deitado na minha cama com o laptop ligado vendo fotos e mais fotos de casamentos gays. E devo dizer que um é mais bonito do que outro. O meu será… — Allen. — minha mãe chamou. Desci as escadas empurrando o cateter de oxigênio. Ela estava sentada com milhares de panfletos e páginas imprimidas da Internet. 169
— O que é tudo isso, mãe? — perguntei sentando no sofá de frente para ela. — Ideias para o local onde acontecerá a melhor coisa de sua vida. — ela sorria. Estava claramente mais empolgada do que eu. — Mãe, vamos um pouco mais devagar. — disse. — O casamento ainda não tem data. — Não tinha. — corrigiu-me ela. — O que a senhora fez? — perguntei. — Marquei para o próximo mês. — e ela começou a sorrir mais ainda. — Não podia esperar mais, eu não aguentava. — Mãe é o meu casamento… — Já descobri até uma empresa boa nesse estilo de casamento. — ela jogou uma revista em minha direção. — Carples Casamentos. A revista era da tala Carples Casamentos. Na capa havia um uma série de casais, héteros e gays. — E onde fica? — perguntei. — Esse é o diferencial, a equipe vai a sua cidade e faz o casamento na sua cidade. — disse ela. — Mas não é muito caro. — disse. — A família do seu noivo é rica. — disse ela. — Sei que ele vai querer pagar a maior parte em tudo issso, podemos pelo menos pagar o buffet, filho. Respirei fundo. — E o Pietro já sabe disso? — perguntei. — Foi ele quem me entregou todo esse material. — disse. — Para que eu escolha o melhor para o meu filho. Fofo, não? — Sim mãe, muito fofo. — disse me levantando. — Aonde você vai? — perguntou ela. — Sexta-feira. — disse. — Amanhã é sábado, dia da peça teatral lá na escola e eu não posso me atrasar. — Já sabem quem vai substituir o Trace? — perguntei. — Ainda não. — disse ela. — Tenho certeza que a Professora Lafaiete vai arrumar alguém a altura para o espetáculo. 170
— Com certeza. — concordou ela. Meu despertador não tocou no dia seguinte. Pietro havia cochilado comigo na minha cama essa noite, mas ele já se fora e deixara apenas uma rosa branca em cima da minha cômoda. Olhei em meu rádio/relógio e vi que já era tarde. Eu estava uns quinze minutos atrasados para a peça. Me arrumei rapidamente, colocando calça jeans, camiseta de manga longa e um moletom por cima, calcei meu All Stars e desci correndo a escada segurando com força para não cair com o meu cateter de oxigênio. Minha mãe estava sentada no balcão da cozinha, estava comendo um pedaço de torrada e tomando café expresso em uma caneca. — Eu estou atrasado. — disse. — Por que não me acordou? — perguntei sentando na cadeira ao lado dela. — Preciso comer só isso e já partir para a escola e a senhora ainda precisa me levar. — Bom, não te acordei por que Pietro não pediu, disso que você estava cansado e que o novo remédio está deixando você estressado facilmente. — disse ela sorrindo. — Não acredito. — disse. — Minha vida está uma zona, pelo menos zona boa, ultimamente. Olhei para ela. — Come logo, precisamos ir! — disse. A Jellyborn High School estava agitada. Rebecca veio me pegar e me levou até os camarins onde estava a minha roupa. O camarim era uma zona de guerra. Honda – falsa – Donnatell veio me cumprimentar e parabenizar pelo noivado. Eu – falsamente igual a ela – a abracei. — Você sabe quem é o nomo protagonista no lugar do Trace? — perguntei indo até uma arara de roupas que estava meu nome. — Dizem que só a Sra. Lafaiete sabe. — disse Honda. — Preciso voltar para a plateia. Boa sorte. 171
Ela saiu. Não sei por que, mas essa boa sorte não chegou bemvindo da boca dela. Então respirei fundo e entrei dentro de um provador e coloquei a primeira peça de roupa. Calças de couro, camisa de linho marrom suja de terra e um par de botas de couro – bem, mais bem velhos. Olhei no espelho. Eu estaria até bonito para aquela época. Prendi o cateter em uma espécie de mochila em minhas costas. Graças a Dylan eu não precisaria ir de um lado para o outro carregando o pesado cateter. — Acelerrem. — a voz da Professora Lafaiete ecoou pelo camarim. Ela me viu e sorriu. — Ai está nosso prrotagonista. Incrrível. Se o autorr ainda estivesse vivo, ele chorrarria de emoção. — É. — disse sem muita certeza. — Trinta segundos para o começo da peça! — gritou um auxiliar que eu não reparei até que vi que era Julian. — Julian. — disse. Ele me viu. — Você tem que ir, faltam quinze segundos. — ele gritou a última parte para todos que estavam na pressa para terminar o figurino. A escola não deve ter consciência que a peça deveria ser noturna, mas a cidade decretou aquele sábado como “feriado” e a cidade toda não estava trabalhando, e então uma boa parte dos cinco mil habitantes – censo de 1973 – daquela cidade estaria do outro lado da cortina. Meu coração acelerou. — Agora! — gritou Julian. O cenário estava incrível, parecia o centro de uma vila da época da Marcha ao Oeste dos Estados Unidos. Haviam alguns alunos, inclusive Rebecca e Murilo que andavam como se fossem habitantes daquela vila, que futuramente seria Jellyborn City. Mas no cavalo de madeira estava o novo protagonista. Ele sorriu ao me ver. — Pietro. — sussurrei. — Você é o novo lorde? — Sim. — sussurrou ele de volta. — Eu te amo. — Eu também… As cortinas se abriram e um milhão de olhos – hipérbole, okey 172
gente? – estava olhando para nós. Respirei fundo e ação estava começando. Os holofotes estavam em cima de mim. Era a primeira vez que eu atuava. E ele me acompanhava. O cavalo de madeira dele deslizava pelo chão do palco em minha direção. Não sei por que, mas meu coração palpitava só dessa nossa aproximação. Era como se fosse a primeira vez que nos víssemos. Mas eu sei que não era. — Há muito tempo. — começou a voz do narrador que reconheci ser de Dylan, o narrador. — A comunidade se juntava para formar um assentamento, que em breve se tornaria a nossa cidade, Jellyborn City. Mas a um caso curioso nesse meio tempo, a história de Math e Horny, o primeiro relato de um casal homossexual em nossa cidade. A história se oassa no final no começo do Século XIX. E vamos conhecer a história desses dois. A voz de Dylan sumiu. Era hora de interpretar. O cavalo de Pietro parou. — Qual é teu nome, jovem pajem? — perguntou ele. — É Horny, milorde. — respondi fazendo uma reverência de leve a ele. — Tu tens quantos anos? — ele desceu do cavalo e o puxava pelas rédeas. — Dezesseis, milorde. — respondi. — Me chame pelo meu nome, Mathew, ou melhor, apenas Math. — Sim, Math. — disse. E agora para resumir a peça: Math foi falar com o capitão Tyler Osborne e pediu a guarda do jovem Horny, um órfão sem família para ele. Capitão Tyler, inocente como era, passou a guarda para Math. Mas Math havia tido um impacto, se apaixonado por Horny e nesse meio tempo de “guarda fraternal” ele se aproximou do jovem com quem teve um caso e assim as coisas aconteceram, até que no final da peça o Capitão Tyler resolve matar Horny, por iludir o jovem Lorde Mathew, mas Math entra na frente e fala que tudo que aconteceu é culpa sua, que ele merece receber o castigo. E assim é feito. Math é morto no 173
lugar de Horny. Mas o jovem de dezesseis anos, apaixonado pelo lorde morto não consegui mais viver e acaba tirando sua vida com a adaga que pertenceu a seu pai. Em suma, seria um Romeu e Julieta na versão gay. Depois de uns longos quarenta minutos de peça, os bastidores estavam um fervimento. Todos me parabenizavam pelo bom papel enquanto eu limpava o sangue falso do meu peito. Até a - falsa – Honda Donnatell veio me prestigiar e disse que sentia falta do Trace. (Maldita, a mãe dele disse que ela não foi nenhuma vez ver o Trace no hospital. Cobra é assim mesmo.) Quando eu já tinha vestido minha roupa novamente a Sra. Lafaiete veio falar comigo. — Parrabéns Allen. — ela me abraçou. — Obrigado Sra. Lafaiete. — disse. — Esperro que você seja um ótimo atorr futurramente. — ela apertou minha bochecha. — Todos semprre começam de baixo. Ano que vem terremos o Merrcadorr de Veneza, esperro muito que você faça o teste. — Vou fazer Sra. Lafaiete. — disse. — Prreciso irr. — ela sorriu. — O deverr me chama. — Claro. — disse. A Prof.ª Lafaiete sumiu atrás das cortinas que iam ao camarim feminino. Quando virei vi Pietro sorrindo para mim, ele também já havia se trocado. Estava agora usando calça jeans e uma camiseta branca com as letras A&P, e segurava uma sacola preta. Apontei para a camiseta. — O que é isso? — perguntei. — Nossas iniciais. — disse ele. — Que legal. — disse. Ele pegou uma menor que trazia dentro da sacola preta e estendeu para mim. — Para ficarmos iguais. — disse ele. Fui para o provador e voltei. 174
— Amei. — disse. — Eu também. — disse ele. — Vamos. — disse. — Não aguento mais ficar aqui nessa escola. — Claro. Ele pegou na minha mão e saímos da escola. Nem sinal da minha mãe. — Onde está minha mãe? — perguntei. — Ela saiu com o seu padrasto para almoçarem, e eu também quero te levar. — disse ele. — Sério? — perguntei. Ele assentiu me levando para seu carro. Nós não fomos a nenhum restaurante, fomos para a casa dele. Ele havia posto uma mesa em sua varanda, com velas e arranjos florais. — Que lindo. — disse. — Todo esse trabalho só para mim. — Isso é apenas o começo. — disse ele arrastando a cadeira para que eu pudesse sentar. — Assim que vou ficar desacostumado. — alertei. Ele riu. — Mas é assim que eu quero. — Que fofo. — disse. Ele beijou minha bochecha. — Eu já volto. — disse. — Onde você vai? — perguntei. — Fazer nosso almoço. — ele respondeu. — E você vai me largar aqui? — perguntei me levantando. — Ok. — ele disse sorrindo. Eu o acompanhei até a cozinha. Ela estava impecavelmente limpa, os utensílios presos em uma suspensão, o fogão cooktop lustroso e a geladeira de inox em um canto. Peguei um avental e enrolei em volta da minha cintura. — Por onde começamos? — perguntei. — Você já cozinhou? — respondeu ele com outra pergunta. — Queimei alguns ovos. — respondi. 175
— Okay, então você vai cuidar dos legumes. — ele apontou para a geladeira. — Cenoura, batata e brócolis. — Odeio brócolis. — disse. — Brócolis é saudável. — ele disse. — Desculpe doutor, estou apenas querendo comer o que eue quero. — disse indo até a geladeira. Peguei o que ele pediu e voltei para a ilha no meio da cozinha e peguei uma tábua de cortar e coloquei os legumes em cima. — O que você vai fazer? — perguntei. — Um arroz frito com legumes. — disse ele. — Esse arroz poderia não ter o maldito brócolis. — eu disse. — Credo Allen. — ele se virou para mim amarrando o avental dele. — Você tem muito preconceito com o brócolis. Coitado dele, dá uma chance. — Ok. — disse. — É verdade. — disse. — Os brócolis não são tão mal assim. — Viu. — disse Pietro retirando os pratos da mesa. Confesso que comi feito um cavalo, além do arroz frito com legumes, Pietro também fez uma lasanha light, ele disse que eu não posso exagerar muito nos alimentos por causa do tratamento. Mas ultimamente eu ando tão envolvido com os preparativos do casamento que me esqueci de tomar o remédio umas duas vezes. Sei que isso é errado, mas não foi culpa minha. Aconteceu. Pietro levou as coisas para a cozinha. — Quer ajuda? — perguntei. — Eu sei lavar louça. — acrescentei. — Não precisa. — disse ele. — A máquina de lavar louça vai fazer isso. Ah, esqueci ele é mais rico do que eu. Me levantei da mesa e segui ele até a cozinha. O telefone da cozinha tocou. E escutei um pouco. — Eu já disse para não ligar para cá de dia. — ele bufou. — Vai se foder, eu já mandei o dinheiro. — outro bufo. — Não… Entrei na cozinha. 176
Ele se assustou comigo. — Ah, sim Lauren depois eu ligo. — ele desligou. — Atrapalho alguma coisa? — perguntei. — Não. — respondeu ele vindo em minha direção. Ele passou as mãos na minha cintura e me puxou para um longo beijo. — Eu já disse que te amo? — perguntou ele. — Um milhão de vezes. — disse mordiscando o lábio inferior dele. — E eu vou continuar a falar mais um milhão de vezes. — ele jogou a cabeça para trás. — EU TE AMO, ALLEN! — gritou ele. — Shhh. — disse. — Os vizinhos vão ligar para a polícia. Ele riu. — Não temos toque de recolher. Eu sorri. — EU TE AMO, PIETRO! — gritei também. — É com você que eu quero viver o resto do meu infinito. — acrescentei. — Se algo acontecesse agora, eu estaria feliz, pois estou com você. Feliz, sem nada para atrapalhar. — Com certeza. — ele disse. — Jellyborn City nunca vai esquecer de nós dois. Nunca. — Na realidade, ninguém vai esquecer de nós. — eu disse. — Somos diferentes, e o normal é ser diferente. Ele me beijou de novo. — A quanto tempo não transamos? — perguntou ele sorrindo. — Uma semana. — disse. — Antes do sequestro. — Vamos acabar com o jejum. — disse ele. — Só se for agora. — disse. Ele me puxou para seu colo e me arrastou para seu quarto.
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CAPÍTULO 33 Ele me empurrou contra cama king size dele. Sentia o perfume amadeirado dele enquanto ele beijava meu pescoço. Ele arrancou a minha camiseta com a estampa A&P e a jogou no chão, logo em seguida ele se despiu. Ele contraia o quadril dele contra o meu, sentia sua ereção contra a minha que crescia. Ele voltou a beijar minha boca até eu ficar sem ar. Ele arrancou minha calça jeans e passou a mão por sobre minha ereção, massageando o meu pau. Ele puxou o elástico da minha cueca box soltando o meu pau para o livre. Ele balançou. Pietro sorriu. — Eu te amo. — sussurrou se abaixando e créu. Ele lambeu toda a haste do meu pau, chupou a ponta cor-de-rosa e brincou com minhas bolas. Eu gemia de prazer até que ele parou e despiu a calça jeans dele superapertada. Sem a menor paciência eu me ajoelhei e abaixei a cueca dele até os joelhos e abocanhei aquele pau. Ele bombeou na minha boca e com um puf saiu de dentro e me deitou gentilmente na cama novamente. Ele mexeu na mesinha, e ouvi um barulho. Olhei e o vi com um líquido entre os dedos e uma camisinha abocanhada pelos dentes. Ele sorriu vendo o meu olhar. Fechei os olhos e respirei fundo, o ar que saia do cateter fazia cócegas em meu nariz. Abri novamente quando senti os dedos dele massagearem a minha entrada. Ele então colocou a camisinha em seu pau e abriu minhas pernas e calmamente deslizou para dentro de mim. Eu soltei um leve gemido e ele foi aumentando as estocadas. Sentia-me preenchido (literalmente) e satisfeito. Ele gemeu alto antes de gozar. Ele continuou dentro de mim, dando leves empurrões enquanto eu gozava. Devo admitir que ali, foi uma zona total de orgasmos. Ele saiu de dentro de mim e me puxou para um abraço. — Está perto. — disse ele. — Sim. — disse. — Finalmente vou conhecer seus irmãos, minha 178
sogra, meu sogro. Ele deu uma risada enquanto me apertava contra seu peito largo. — Acho que a minha mãe deve ser a sogra mais carrancuda de todas. — ele disse. — Credo. — disse. Dei uma risada. — O que foi? — perguntou ele. — A minha mãe deve ser a sogra mais fora da casinha do universo. Ele riu também da minha piada. — Coitada da Sra. Spinnet. — disse ele. — Sem ela o amor da minha vida não teria nascido. — Ok. — disse. — Isso é bom, mas acho que a gente não pode ser aquele casal meloso que fica se declarando toda hora um para o outro. — Mas eu gosto de me declarar para você. — disse ele. — Se nossa vida fosse um livro, agora os leitores revirariam os olhos por causa dessa melação. — disse. Ele riu. — Pare. — disse. — Preciso ir para casa. — Mas já? — perguntou Pietro me olhando por sobre o ombro. — Sim. — respondi. — A Carples Casamentos vai chegar em casa para arranjarmos tudo que eu quiser. — Escolha do melhor. — Não é por que você está pagando que eu deva zerar sua conta no banco. — eu respondi. — É apenas um casamento, como qualquer outro. — Não. — ele disse seriamente. — Não é qualquer casamento, é o nosso casamento, e não vai se repetir em nenhum lugar essa nossa história louca. — Acho que não. — respondi me virando e beijando-o. — Eu te amo. Ele me beijou. — E o papo da melação? — perguntou ele. E nós caímos na risada. — Hoje é sábado, vamos relaxar. — disse. — Já basta aquela peça. 179
— Ok. — ele se levantou e me ergueu e depois me abraçou. — Acabamos com o jejum de sexo e agora você precisa ser um bom noivo e ir arrumar o casamento, eu te deixo e casa. Eu sorri. — Pode tomar um banho. — ele disse. — Tenho uma jacuse te esperando. — Você tem uma jacuse? — perguntei. — Quem não tem uma jacuse hoje em dia? — ele perguntou. Eu ri. Depois do banho, Pietro me levou para casa, onde uma van branca com uma tulipa e a palavra Carples, indicava que minha mãe já deveria fazer sala para as visitas. — Tenho que entrar. — disse beijando Pietro uma última vez. — Eu tenho que falar mais uma vez que te amo, e nada vai mudar isso. — Com certeza. — disse ele. — Os leitores desse livro devem estar sorrindo bobamente agora. Eu sorri. — Viu. — disse ele. — Ok. — disse abrindo a porta. — A saidera. — ele me puxou e me beijou novamente. — Nada melhor do que o beijo da pessoa que a gente ama. — Melação. — lembrei saindo do SUV. Antes de eu chegar na minha porta ele buzinou. Acenei com a mão e entrei na minha casa sorrindo. Na sala de casa haviam uma mulher e um homem. A mulher era magra, morena e tinha os cabelos cacheados mais sedosos e brilhantes que eu já vi. O homem tinha cara de ser um pouco perfeccionista demais, era moreno também e parecia com a mulher. — Querido. — disse minha mãe. — Esses são os irmãos Carples, Tery e Ruby Carples. — Prazer. — disse. — O prazer é todo nosso. — disse a mulher. 180
— Por onde começamos? — pediu ela. — Pela entrada. — eu disse. — Quero algo fenomenal… Minha mãe terminava de apertar a gravata branca. Ela enxugou uma lágrima que escorreu pela bochecha pálida dela. — Mãe não chore. — disse abraçando-a. — É o seu casamento, eu nem acredito. — ela fungou. — Não posso manchar o seu terno. Não estão entendendo né? Deixe eu voltar algumas semanas atrás. Depois que os irmãos Carples foram embora, minha mãe e eu fomos jantar com Leo e Pietro. Eu e ela fizemos um pacto para manter tudo em um segredo, assim apenas eu e ela sabíamos tudo o que aconteceria no tão aguardado dia. Pietro e Leo saberiam na hora, eles apenas vestiriam os ternos e descobririam a surpresa. — Vocês não vão revelar nada, nem que cor são as flores? — perguntou Pietro. — São brancas. — disse. — Apenas isso, elas simbolizam a paz. — acrescentei. — Paz. — ecoou Pietro enquanto tomava um bom gole do vinho tito. — E minha sogra? — perguntei. — Quando vou conhecê-la? — Ela chegara daqui uns sete dias. — ele respondeu. — Ela, meu pai, meus três irmãos e o resto da família. — Jellyborn nunca vai ficar mais movimentada do que esse mês. — disse. — As famílias Spinnet e Sullivan estão tomando conta. — brinquei. Nós quatro demos risadas. Sete dias depois, a senhora Aileen Tanner Sullivan descia do Mercedes Benz C180 AMG 2015 em frente a minha humilde residência. A neve já estava caindo pouco, mais a Sra. Tanner Sullivan exalava algo sublime, maior que qualquer pessoa de classe da cidade. 181
Aileen Tanner Sullivan deveria estar na casa dos 60, tinha o cabelo levemente grisalho preso em um coque apertado, um vestido até metade da canela de um azul-marinho lindo, um cardigã da mesma cor e um cachecol de raposa em volta do pescoço. Brincos e luvas faziam os adereços. Se estivesse ao lado da Rainha da Inglaterra as duas poderiam ser primas. Logo atrás dela vinha Casper Tanner Sullivan, o pai de Pietro, desceu elegante em uma calça risca de giz bege, uma camisa social branca, por sobre a parte de cima de um terno de tweed e usava óculos Ray Ban. Deveria ter uns 65 anos, os cabelos grisalhos estavam com gel para trás, e ele exalava simpatia. Outro carro chegou, esse um Audi A4 branco brilhou ao parar rente a calçado. Deles desceram o irmão mais velho de Pietro, Aidan Tanner Sullivan Morington e sua esposa Caitlin Sullivan Morington. Aidan deveria estar saindo dos 35, suava uma calça risca de giz escuro, camisa social preta e óculos, os cabelos castanhos estavam penteados para trás. Seria um Pietro mais velho. Caitlin era daquelas bonecas de plástico americana. Loira de doer os olhos, gloss que gritava: “Olhem para essa boca com Botox”. Usava um vestido vermelho justo que ia até os joelhos e sorria por qualquer coisa. Exemplo: Eu: Que gato feio. Caitlin: ha ha ha. Eu: Mãe cadê o copo com a frase “Não tem graça”? Caitlin: ha ha ha. Sacaram? Depois soube que ela também estava grávida, só que de um mês. Outros dois carros chegaram. Uma Ford Ranger azul com a irmã mais velha, Aimee [para rimar com a mãe] Tanner Sullivan Scorn e o marido dela, Scott Scorn Sullivan, e os gêmeos do casal, Cameron e Carter, os dois com catorze anos. Aimee, loira (acho que pintada em salão), bonita, usava um vestido azul – da cor da Sra. Aileen – e uma echarpe daquela cor de nylon. Scott seria ele ou uma réplica do boneco Ken? Ele é loiro, musculoso – provavelmente joga golfe – usava algo parecido com o cunhado e o sogro dele. Cameron, o mais velho por, 182
acho, vinte e sete segundos usava calça jeans, camiseta com o nome da música Worth It do Fifth Harmony e tinha o cabelo loiro ala Justin Bieber. Carter seria o corportado, usava o que o pai usava, só que em miniatura, tinha o cabelo com gel e deixava um perfume enjoativo por onde passava. O outro carro, um Hyundai Azera branco, dele desceu a única irmã solteira e mais nova, Ellen Tanner Sullivan, tinha o cabelo castanho e usava calça jeans azul, blusa de manga longa florida e usava tênis. Não sei o por que, mas fui com a cara dela. — Boa tarde. — disse abraçando cada um deles. Aileen demorou no abraço sussurrando no meu ouvido o seguinte: — Espero que o Pietrinho [ri dessa parte] seja feliz com você. — Eu também espero, Sra. Sullivan. — disse. — Quanta modestia, sou nova ainda, me chame apenas de Aileen, na realidade chame todos nós com os primeiros nomes, okay? — Aham. — respondi. — Muito obrigado Senhora… — ela deu uma leve tossida. — Aileen. Minha mãe não posso dizer nada, ficou tão empolgada que parecia que ia surtar. Ela sorria até quando a mulher bocejava. Pietro estava nervoso com a presença dos parentes. Leo, Pietro, Casper, Scott, Cameron e Carter foram dar uma volta pela cidade, as mulheres ficaram, eu inventei uma dor na barriga e fiquei no meu quarto. Acho que minha mãe deve ter algum senso de pressentir quando algo está errado comigo. Ela bateu na minha porta e a deixei entrar. — O que foi meu anjo? — perguntou ela sentando na beirada da cama onde eu estava sentado. — Sei lá. — disse. — Minha vida até parece essas histórias de escritores inciantes em sites de auto-publicação. — Acho que não. — disse ela. — Mas parece. — disse. — É só minha vida começar a ficar feliz que acontece alguma coisa para estragar esse momento, estou com medo de acontecer algo no casamento. — Fique tranquilo. — ela deu um beijo na minha testa. — Nada 183
vai acontecer. Naquela noite, todos nós jantamos na casa de Pietro, que tinha uma mesa absolutamente maior na sala de jantar dele, ele ficou ao meu lado, e por debaixo da mesa, nossas mãos estavam unidas. O oxigênio vinha pelo tubo, e sentia os olhares de Cameron e Carter no cateter. — Jellyborn é incrível. — disse Scott comendo um pedaço do bolo de carne e logo em seguida tomando um gole do vinho branco. — Há lugares belos, como o campo de golfe, uma pena que estava fechado para manutenção. — ele bufou. — Mas Pietro me mostrou o lugar… — Shhh. — interrompeu Pietro. Olhei para ele. — Que lugar? — perguntei levantando a sobrancelha direita. Ele suspirou. — Não posso revelar ainda, não está pronto, e vai estragar a surpresa. — ele disse. — Sério? — perguntei tentando revelar pelo menos alguma coisa. — Não. — ele disse. — Ok. — disse. — Eu ia revelar mais algumas coisas sobre o casamento. Ele hesitou do meu lado. — Allen, eu não posso. — disse ele. — Mesmo que seja tentador levar você para lá e… — Huf huf. — virei para o ver que o pai de Pietro tossia falsamente sorrindo. — Crianças na mesa. — ele acrescentou quando todos nós olhávamos para ele. E todos rimos. Voltando ao presente. Dylan, Murilo, Rebecca e Jordan estavam me avaliando. — Chique. — disse Dylan. — Bonito. — disse Murilo. — Arrasando. — disse Jordan. — Um gostoso. — disse Rebecca e nós rimos. — Não acredito que 184
você está casando. — ela acrescentou. — Nem eu. — disse me olhando mais uma vez no espelho. Agora vou revelar: eu usava um terno todo engomado branco, em minha cabeça ia uma coroa de rosas brancas, meu cabelo foi cortado e bagunçado de propósito. — Acho que já está quase na hora. — disse Jordan. — Okay. — disse. — Podem ir. Eles quatro saíram. Respirei uma última vez. Minhas mãos soavam frio. — Pare! — disse a mim mesmo. — Vai dar tudo certo. Bateram à porta. — Pode entrar. — disse. Era Tery Carples, ela usava um terninho feminino branco – a cor do meu casamento – e tinha aqueles pontos na orelha, carregava uma prancheta na mão. — Vamos, está na hora. — disse ela. — E a propósito você está um gatinho. — Ah. — disse. — Obrigado. Ela pegou na minha mão. A sorte de Jellyborn City manter casarões para alugar é incrível, a neve caia devagar lá fora, e isso atrapalhou o meu sonho de casar em um ambiente aberto [obrigado neve]. Os corredores pareciam castelos ingleses, me sentia dentro da série Reign. Tery disse para eu apressar o passo. A melodia da música True Love Ways do Buddy Holly ecoava pelos cantos. — Boa sorte. — disse ela ao meu ouvido. — Obrigado. — disse. Meu coração acelerou. Olhei para os lados uma última vez enquanto pegava de um jarro uma rosa branca. As portas duplas brancas da frente se abriram, e True Love Ways ficou mais alta. Os presentes ficaram todos de pé, todos os olhos se focalizaram em mim. Comecei a caminhada até o altar. Todos de branco – uma escolha minha, pois quero paz daqui para frente. Até meu amigo Eduardo e seu marido italiano deram um jeito de 185
vir ao casamento, eles adotaram uma linda menina síria chamada Tefny, gosto dela. Passei meus olhos, Trace e Julian estavam em um canto. Rebecca, Dylan, Murilo e Jordan estavam ao lado deles, Rebecca chorava. Minha mãe e Leo estavam de um lado do juiz de paz, ela chorava aos prantos, eu dei uma piscadinha para ela. A barriga de grávida dela já estava dando aparições. Do outro lado estava Aileen e Casper estavam me olhando, sorrisos bobos na cara. Olhei para quem me esperava. Pietro chorava [vamos gente, #TiFofo no Twitter] não aguentei aquele momento. Meus olhos marejaram. Ele desceu os dois degraus da escada e pegou minha mão. True Love Ways foi diminuído até ser um plano de fundo. — Estamos aqui reunidos hoje, pra celebrar o enlace matrimonial de Allen Spinnt e Pietro Tanner Sullivan. — o juiz de paz, Gunther um conhecido de Tery Carples nos olhava. Depois de uns trinta minutos, ali estavam nossas alianças sendo trazido pelo meu primo mais novo, filho do Tio Beto, Jacob [a mãe dele era fã de Crepúsculo], ele tem uns quatro anos, vinha soltando risadinhas do público. — As alianças. — disse Gunther as pegando. Pietro pegou a aliança menor. — Allen Spinnet, hoje nós tornaremos companheiros. Queria que soubesse que para mim você foi um presente de Deus e, agora que vamos dividir as nossas vidas, meus dias serão cheios de alegria ao seu lado. Diante de Deus e de todos, prometo que serei seu amigo, confidente e companheiro para dividir com você as esperanças e os sonhos. Prometo ser fiel, apoiá-lo nos momentos difíceis e permanecer ao seu lado na alegria e na tristeza, na saúde e na doença por toda a minha vida. Não aguentei, comecei a chorar enquanto ele colocava a aliança em meu dedo anelar na mão esquerda. Depois peguei a aliança e disse: — Pietro Tanner Sullivan, meu amor. A partir de agora dividirei minha vida com você. Eu lhe prometo ser fiel e sincero. Prometo cuidar de você com carinho e me dedicar para que o nosso lar seja um refúgio de paz e tranquilidade. E quando as dificuldades surgirem, estarei 186
sempre ao seu lado para apoiá-lo e confortá-lo. Permanecerei ao seu lado na alegria e na tristeza, na saúde e na doença por toda a minha vida. Levantei a mão esquerda dele e coloquei a aliança no dedo anelar. Gunther sorriu: — Eu vos declaro, diante da lei, companheiros. Podem se beijar. Pietro deu uma risadinha, passou uma das mãos na minha cintura e me jogou de lado me abaixando, segurei a coroa de flores enquanto ele me beijava. Ouvi uma salva de palmas e gritos de comemoração. Finalmente estávamos juntos e além de tudo casados. In The Name of Love tocava em sons altos no salão de festas enquanto eu e Pietro abríamos a pista de dança, assim que ela acabou e Worth It começou, minha mãe e Aileen se jogaram na pista, dançavam alegremente, minha mãe nem parecia que estava grávida. Aileen dava palminhas enquanto rebolava de ladinho no refrão da música. Leo e Casper apenas batiam palmas. Os irmãos de Pietro se jogavam nos drinques, meus parentes iam até o chão na pista, me sentia um pouco envergonhado, mas não ligo para isso, minha família é feliz assim. Mas uma coisa, até minha tia-avó, Rosalie, uma nonagenária estava rebolando. As músicas vieram de Side To Side há Shout Out to My Ex. Dancei, feliz por aquele momento que não se repetiria nunca mais em minha vida. Pietro sumiu, e quando o encontrei novamente estava em cima do palco, pegava o microfone, a música, Shout Out to My Ex virou plano de fundo. — Desculpem, mas terei que levar Allen para nossa lua de mel. — disse ele. — Obrigado a todos e a festa continua. Gritos de comemoração. Pietro desceu do palco e correu até mim, pegou minha mão enquanto os convidados faziam uma caminho e enquanto passávamos eles jogavam arroz em nós. Pietro me levou até os fundos, onde encontrei um helicóptero. 187
Levei uma das mãos a minha boca. — Não acredito. — disse. — O melhor, para o melhor. — disse Pietro me puxando até o helicóptero. Fui prendido no meu banco, o som estava alto The Greatest ecoava pelos fones. Pietro foi prendido ao meu lado. — Eu te amo. — ele disse através do fone. — Eu também te amo. — disse. — Muito. — acrescentei. Se o “forever” fosse agora eu estaria feliz. Muito feliz.
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CAPÍTULO 34 As luzes estavam fortes enquanto o helicóptero pousava em um terreno não muito longe de Jellyborn City. — Onde estamos? — perguntei enquanto a música da Sia acabava. — Bem-vindo ao lar. — Pietro disse. — O quê? — perguntei. — Esse é o local que eu não queria revelar, falta terminar algumas partes, mas dá para viver. — ele sorriu. Pietro me ajudou a descer do helicóptero. Ele me pegou no colo. — Para que isso? — perguntei entre risos. — É a tradição. — ele disse. A casa tinha uma piscina imensa coberta do lado de fora para proteger da neve, dos quatro lados da casa, três eram de vidro e a casa tinha dois andares, o primeiro andar inteiro estava acesso, o segundo estava em total escuridão. Pietro empurrou a porta da casa com o pé. Dentro não havia nenhum móvel, apenas pétalas e mais pétalas de rosas, do branco ao vermelho sangue. Nos degraus da escada várias velas estavam acesas. — Que lindo. — comentei. — Tudo para você. — ele disse subindo os degraus devagar. — A casa ainda não está pronta. — continuou ele. — Mas eu queria que, pelo menos, tivéssemos uma brincadeira antes da viagem. — Que viagem? — perguntei. — Você achou mesmo que a sua lua de mel seria aqui em Jellyborn City? — ele perguntou enquanto entrávamos em um enorme corredor. — Bom… — Achou, né? — Sim. — respondi. — E para onde vai ser a viagem? —perguntei. — Vai ser surpresa. — ele olhou nos meus olhos. — Agora eu só quero me divertir. Ele abriu uma enorme porta de madeira e revelou o que seria no 189
futuro um quarto. Havia apenas uma enorme cama com lençóis de seda branca, as portas da varanda estavam abertas, deixando um vento suave entrar no ambiente. Pietro me levou até a cama e me colocou suavemente. Desenrolei os fios do cateter que estavam atrapalhando meus braços. (Sorte que eu estou conseguido ficar uma meia hora sem o cateter para me ajudar, isso ajudou no casamento). Ele desabotoou meu terno e o retirou. Beijou-me por todo o meu pescoço e retirou a coroa de flores. Depois ele desabotoou a camisa social debaixo e beijou meus mamilos. Ele deu uma mordidinha. Um arrepio trespassou todo o meu corpo. — Com calma. — disse. Ele deu uma risadinha antes de voltar a beijar meu pescoço. Com as mãos livres comecei a desabotoar os botões do terno dele. Retirei o terno e joguei onde ele havia jogado as minhas peças. Ele contraiu o quadril dele contra o meu e pude sentir a ereção dele. Sorri. Ele pegou uma das minhas mãos e levou até o membro ereto. Eu comecei a mexer. — Pietro. — disse. — Sim? — ele perguntou mordiscando minha orelha. — Preciso tomar meu remédio. — disse. — Jura? — perguntou ele meio se desanimando. — Sim. — disse. — Ok. — ele saiu de cima de mim. Levantei pegando o cateter, sorte que ainda estava de calça. — Acho que deixei na bolsa da minha mãe. — disse. Ele deu risada. — O que foi? — perguntei. — Acho que o destino se cansou de deixar nós felizes e resolveu colocar uma pedra no caminho. — ele se apoiou em um dos cotovelos e me observou colocar novamente o terno. — Você fica tão… sexy nesse terno. Sorri. 190
— Para. — disse, mas sei que no fundo eu só queria que ele continuasse. — Vamos então buscar seu remédio. — ele disse. — Mas acho que o sexo vai ter que esperar. — Ah. — disse. — Sim, nosso voo sai a meia-noite. — ele disse. — Que pena. — disse. Ele dez um leve aceno com a cabeça. — Vamos, antes que você perca muito tempo. Olhei para o relógio de pulso dele enquanto descíamos a escada, era 22h32. Dois minutos perdidos para o meu remédio. O helicóptero ainda não havia indo embora, então a volta para a cidade foi bem rápida. Pietro disse que a casa ficava em uma chácara não muito longe da onde eu moro com minha mãe, e que dali mais ou menos um mês ou menos a casa poderia ficar pronta. Nós pousamos em um heliporto perto do centro da cidade, Pietro chamou um táxi 24 horas e nós seguimos para minha casa. A casa continuava escura, minha mãe e o resto das pessoas continuavam na festa de casamento, quero que eles aproveitem mesmo. Subi as escadas, Pietro vinha atrás de mim. Peguei outra cartela de remédio, já que a que eu usava estava na bolsa da minha mãe e tomei. Pietro ficava me observando. — O quê foi? — perguntei. — Nada. — ele disse. — É só que toda vez que eu te olho você muda. Fica mais lindo. — Nossa. — disse. — Que fofo. — Vai ser assim daqui para a frente. — Tá bom, né, mais não precisa exagerar. — eu disse. — Não quero me afogar em melação. Ele riu e depois disse: — Ok. — Então, para onde nós vamos? — perguntei. — Você vai saber no aeroporto. — ele disse. — Ok. — disse. — Posso fazer minhas malas… 191
— Sua mãe já fez. — ele disse. — Minha mãe é cúmplice? — perguntei. — Sim. — respondeu ele sorrindo. — Você acha que vai ser fácil levar ela para o mundo do crime? — perguntei. — Se acha que sim, pode tirar o cavalinho da chuva. Nós rimos. — Vamos? — disse ele. Assenti. O aeroporto de Pierre, capital da Dakota do Sul estava movimentado. Nosso voo saía dali dez minutos, e eu e Pietro já estávamos na fila para o embarque. Agora eu sei para onde vamos. — Não acredito que você está me levando para uma lua de mel na França. — disse. — É praticamente o país do amor. Pietro sorria enquanto entrávamos no avião. Poltronas 70 e 71. Lado a lado, sempre. Me sentei, havia uma aeromoça andando e auxiliando cada passageiro. Olhei pela janela, eu via apenas as luzes dos arranha-céus da capital. Meu coração estava acelerando. — Ai meu Deus. — disse. — Não acredito nisso ainda. — Calma. — Pietro passou a mão pela minha bochecha. — Isso não é o fim do mundo. — acrescentou. — Tá bom. — disse colocando o cinto como a aeromoça explicava. O avião começou a decolar alguns minutos depois, repassava tudo que já tinha acontecido até ali, desde o dia da consulta quando conheci Pietro, até o momento no altar. Quando ele me salvou das garras de Joy no parque aquático e quando ele me mostrou nossa futura casa. Repassei os convidados na minha cabeça. Mandara um convite para os meus avôs paternos, mas eles não vieram, e nem disseram o por que. Talvez eles ainda não vão com a minha cara. Respirei fundo, precisava descansar um pouco. Fechei os olhos e caí no sono. CAPÍTULO 33 192
Paris nasceu aos meus olhos. Era linda demais. Olhei para Pietro, ainda não acreditava que estava ali. — Me belisca. — disse. Ele beliscou. — É uma metáfora. — disse. Ele riu. Estávamos na sacada do Hôtel Amour. (Sim, até o nome do hotel rima). O hotel é basicamente um lindo palacete de sete andares, com coisas mais caras que o carro da minha mãe – desculpa mãe. — Bonjour mon amour. — ele disse me abraçando por trás. — Fale minha língua. — disse. — Bom dia meu amor. — ele disse rindo na minha orelha e fazendo reverberações em meu corpo. — Ah. — disse. — Vamos sair? — perguntou ele. — Mais já? — perguntei. — Vou levar você para comer o melhor croissant de Paris. — ele disse. — Ok. — respondi. — Só preciso me trocar. Fui até o banheiro, um pouquinho maior do que meu quarto e me troquei. Coloquei calça jeans, camisa com a estampa da cabeça do Mickey Mouse, e um moletom cinza ciano, penteei meu cabelo para o lado e sai. Pietro assoviou. — Que isso. — disse. — Estou como um turista americano normal. — acrescentei. — Um turista americano normal e gato. — ele complementou. Ri. — Para de graça e vamos. — disse. O restaurante se chamava Lys Bleu – Lírio Azul, como Pietro me traduziu – e ficava em uma esquina de uma rua com nome estranho e com outra do mesmo jeito. Sou péssimo em francês. Sentamos naquelas cadeiras bonitinhas de madeira embaixo da 193
tenda do restaurante e o garçom, que falava com Pietro anotou nossos pedidos e depois de alguns minutos estava em nossa mesa, café – para o Pietro –, chá – para mim – e alguns croissants e duas enormes baguetes, finas fatias de queijo e presunto defumado. Perto de nós havia um músico tocando uma melodia no teclado, acho que é a 9ª Sinfonia de Bethoven. Minha mãe gosta de música clássica, eu não vou muito com esses negócios. Comi um dos croissant e dei alguns goles no meu chá, olhei para a rua. Senti alguma coisa na minha mão esquerda. Olhei e vi a mão de Pietro em cima dela, ergui meu olhar para ele. — Eu te amo. — ele disse. — Eu também te amo. — disse. — Mas lembra, sem muita melação. — Ok. — ele sorriu. — Daqui para frente não teremos segredos nenhum. — disse. Ele desviou o olhar. — Você tem alguma coisa que precisa me contar? — Não. — ele disse. — Eu preciso revelar uma coisa. — disse. Ele me olhou. — Eu matei meu hamster quando tinha treze anos de idade. — revelei. Ele caiu na gargalhada. — É sério, eu gostava do hamster, mas ele comeu a borda do meu diário, e eu me estressei… o dia também não estava sendo fácil para mim. — respondi. — Eu era uma criança. — Não. — ele disse ainda tentando parar de dar risadas. — Você já era um menino entrando na puberdade. — Ok, tá bom, esqueci que você é doutor e sabe o ciclo de crescimento. — disse. — Sabe, o nosso feliz para sempre podia ser agora, nessa rua, em Paris, os leitores batendo palma e tudo mais. — Seria lindo mesmo. — ele disse. — É, mas eu contei um segredo meu, agora é sua vez de contar um. — eu disse me empinando na cadeira para se aproximar dele. Ele hesitou um pouco. 194
— Acho que minha vida não é tão engraçada assim. — ele disse. — Você não quer me contar né? —perguntei voltando a me sentar normalmente. — Não. — ele disse. — Então o que é? — pressionei. — É… — É…? — Bom, eu… quase quebrei a televisão de casa uma vez, não a minha, a da minha mãe, e na época era a última geração, estava jogando tênis no Xbox com aquele controle maldito e ele voou, por pouco não acertou a tevê. — ele sorriu no final. — Você estava com medo de me contar isso? — disse sorrindo. — É. — ele concordou. — Então vamos ver se tem mais. — eu disse começando a beber um pouco do meu chá. — Eu também tenho um filho. — ele disse. Engasguei com o chá. Pietro se levantou e deu soquinhos naS minhas costas. — O quê? — perguntei. — Eu tenho um filho. — repetiu ele voltando a se sentar. — E como você deixou escapar isso? — perguntei. — Achei que com o tempo viria. — ele disse. — Mas acho que não veio. Emburrei minha cara. — Não fique com raiva. — ele disse. — É claro que eu não preciso ficar com raiva, né? — perguntei dando um riso cínico (mais daqueles bem cínicos, sabe?) — Esse detalhe a gente deixa fora quando está namorando alguém, tipo, oi querida, faz três anos que casamos, e ah, esqueci de te falar, eu tem um filho com dez anos. Ele me encarou, parecia magoado. Mas eu sou a vítima, eu deveria estar magoado. Eu e não ele. — Pietro me leve de volta ao hotel, eu não estou a fim de passear pela cidade do amor com esse clima. — eu sei, sou bem mal nessas 195
horas, baixas cenas de Scream Queens e Pretty Little Liars e eu também rodo a baiana. — Ok. — ele disse chamando o garçom em francês, pagou a conta e olhou para mim. — Vamos? Ele tentou pegar minha mão, mas eu cruzei os braços e no caminho todo da volta eu virei o rosto para ele. Chegamos no Hôtel Amour embaixo de chuva. Pietro tentou inúmeras vezes falar comigo, mas eu invoquei a criança mimada de três anos de idade e fechei minha boca. Entramos no quarto e eu troquei a roupa molhada para o meu pijama e me joguei para debaixo dos edredons. Ele se trocou também, só que vestiu apenas uma cueca e entrou em baixo dos cobertores e se enganchou em mim. Eu não posso reclamar nessas horas de atração, meu corpo age sozinho. — Me desculpe. — ele sussurrou no meu ouvido. — Ok. — disse. — Só me magoou por ter contado tarde demais. — suspirei. — Ele sabe que você é o pai dele? — Sim. — ele respondeu. — Eu pago pensão desde que ele nasceu. — E como isso aconteceu? — perguntei. — A dez anos, antes deu saber minha orientação, eu experimentei namorar com garotas, e uma delas ficou grávida. — ele disse. — Poucas pessoas sabem disso. — E eu não fazia parte dessas pessoas, né? — perguntei. — É. — ele concordou, parecia arrependido. — E até quando você ia esconder isso de mim? — perguntei. — Eu ia contar, só queria que nossa lua de mel fosse a mil maravilhas. — ele beijou minha nuca, amolecendo minhas defesas Me virei e dei um longo selinho nele. — Se você tivesse contado antes eu entenderia. — disse. — Agora fica esse climão entre nós. — disse. — Tem outra parte? — Tem. — ele disse. — Ai meu Deus. — eu disse. — A mãe dele, Catarina Smith está desaparecida, e os avós do 196
menino – (ah é um menino) – não querem o menino e estão mandando ele para mim daqui quinze dias. — Sério? — perguntei. — Sim. — ele disse. — Na alegria ou na tristeza… — Sim, eu entendi. — disse. — Ok. — respirei fundo. — Se vai te fazer feliz, eu prometo ser um bom segundo pai para essa criança. Ele me beijou. — Nossas vidas vão se encaixar no eixo. — ele disse. — Tomara. — sussurrei, mas acho que Pietro Sullivan não me escutou, ou apenas fingiu.
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AGRADECIMENTOS Querido Doutor é meu primeiro livro. Foi um desafio e tanto escrever ele em menos de um ano. E por conta de ser o primeiro, peço desculpas aos erros de escrita ou gramática, tudo tem uma primeira vez. Quero agradecer a todos os leitores que me acompanharam pelo Wattpad na trajetória da história de Allen e Pietro, sem o apoio de vocês, nas leituras, nos votos e nos comentários, não chegaríamos aonde estamos hoje. Eu considero cada um de vocês membros da família Spinnet-Sullivan. Vocês são meus pequenos filhos, e eu agradeço MUITO mesmo, por tudo. E agradeço mais ainda se você (leitor) se interessou tanta pela obra que até adquiriu o livro físico, agradeço você demais. Quero agradecer alguns escritores/leitores que me ajudaram ou influenciaram eu a entrar na vida de escrito. Tom Adams, pelos incríveis conselhos dados via Facebook. Angeli Pietro pelo apoio e motivação. A Sereia Luna (nome de guerra) pela incansável leitura online. A Minah Park (nome de guerra também) pois sua opinião também vale. E por último, mas não menos importante, a todos que ajudaram Querido Doutor a chegar a mais de 100 mil leituras online. Um beijo a todos. Amo demais vocês. Espero todos que me acompanharam até aqui no segundo volume dessa carismática nova família. Em Depois de Querido Doutor teremos novas surpresas que marcarão a vida de Allen e Pietro.
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EXTRA O ENCONTRO DE JULIAN E TRACE Trace O'Hara mandou aquele torpedo no final da tarde. Vamos jantar? Me ligue. Não sabia se aceitava ou não. Que mal isso teria? Seria apenas um jantar. Estava com o meu celular na mão. Não sei o porque, mas eu tremia, e muito. Na minha cabeça já estava rolando um climão entre eu e Trace, mas eu não sabia como oficializar aquilo verbalmente, então, apenas disquei o número dele. Rezei para que caísse na caixa postal, mas, no fundo, queria que ele atendesse. Quando já quase perdia as esperanças, ele atendeu. — Alô Julian. — disse ele do outro lado. — Oi. — disse. — Então, sobre o jantar… — Você já decidiu? — ele parecia ansioso. — Bom, vou aceitar esse convite seu. — disse. Não sei bem o que eu ouvi do outro lado da linha, mas parecia o barulho de comemoração. Sorri com aquela atitude. — Então beleza. — disse Trace do outro lado. — Vou pedir para um carro te buscar na hora certa. — Não precisa… — comecei argumentando. — Faço questão. — disse ele, a voz não queria uma resposta contrária. — O.k. — disse. — Até mais tarde. — disse Trace O'Hara. — Até. — disse. E desliguei. O carro parou em frente a minha casa as 20h00min. Estava usando uma das minhas famosas roupas de “ir à igreja”. Sei que era um pouco de exagero me arrumar tanto, parecia que eu havia esquematizado tudo na minha cabeça, como se a dias eu quisesse ter um encontro com o menino mais bonito da Jellyborn High School. 200
Trace O'Hara. Entrando no carro, senti um peso cair sobre os meus ombros. Nos últimos dias Trace estava fazendo fisioterapia para melhorar a condição dele. E se fosse para ajudá-lo, eu o ajudaria, não seria preconceituoso em questão a ele usar cadeira de rodas, pelo contrário, moveria céus e terra para ajudá-lo. O carro parou em frente ao Oriolli Goumert. Sabia que aquele restaurante estava na lista dos dez mais caros de Jellyborn City. Trace deveria abrir sua carteira – literalmente. Desci do carro, e por um azar dos diabos pisei em uma poça de água marrom, encharcando meu All Star azul – era a primeira vez que eu o estava usando… porra! Xinguei baixo enquanto ia até a porta do restaurante. — Boa noite. — disse o atendente. — Boa noite. — disse, tentando mudar meu humor. Ele sorriu. — Você deve ser Julian…? — Waterblue. — disse. — Julian Waterblue. — Ah sim, o Sr. O'Hara disse que vocês teriam uma mesa reservada. — disse o atendente. — Sou Luke Black. — disse o atendente. — Por favor, me acompanhe. Assim que ele saiu, uma mulher tomou o lugar dele em frente a porta do Oriolli Goumert. Segui Luke Black até uma porta que estava escrito: RESERVADO Nº 11. Luke Black abriu a porta de correr para mim. — Obrigado. — disse. — Por nada. — disse Luke Black fechando Olhei ao redor. O lugar estava em uma meia luz incrível, algumas rosas estavam dentro de copos de cristais, algumas velas estavam acesas pelo chão, a mesa era baixinha, e as cadeiras eram almofadas no chão. Na parede oposta à da porta de correr havia uma imensa janela de vidro que dava para a avenida logo em frente ao restaurante. Sentado em uma almofada e sorrindo, estava Trace O'Hara, ele havia cortado o cabelo e dali eu sentia seu perfume. Ele usava uma 201
calça jeans escura e uma camisa social de um cinza quase branco. Ele estava um verdadeiro… gato. — Olá. — disse. — Olá. — disse ele. — Você está bonito. — Trace apontou com o dedo para a minha roupa. — Você também. — disse fazendo o mesmo gesto que ele. Ele sorriu, covinhas surgiram na sua bochecha. Ficamos em um silêncio por alguns segundos. — Sente-se. — disse Trace apontando para a outra almofada do lado oposto ao dele na mesa. Sentei. — Desculpe não ser cavaleiro o tempo todo… perdi o movimento das minhas pernas… alguns médicos falam que pode ser passageiro. Tomara… Trace falara aquilo como se não acreditasse muito naquilo. — Eu também acho que você vá voltar andar. — disse com um sorriso na cara. — Eu acredito em milagres, você não? Ele ia responder, mas pareceu pensar por alguns instantes. — Pensando bem… acho que eu acredito também. — disse ele com um grande sorriso no rosto. — O que você quer comer? No fim, comemos tanta coisa que não soube nem o que havia vindo de entrada. Só lembro da sobremesa, petit gateau com sorvete – o dele de flocos, o meu de morango. — Está uma delícia. — disse. — Julian você é tão… — O quê? — perguntei parando de comer a sobremesa. — Eu sou tão o quê? — Ah, como eu posso dizer? — ele coçou o cabelo e olhou nos meus olhos. — Você é tão lindo. Aummmmmm…. Meu mundo perdeu o sentido. Não sabia nem como respondê-lo. Nunca havia ganhado um elogio assim, a não ser da minha mãe, da minha vó e de alguns outros familiares, isso quando eu tinhas uns sete anos… mas vindo do Trace? Era outra história. Ele pareceu desconcertado. Olhou para a janela e além dela. — Você parece que não gostou… — disse ele, o ar ficando pesado. 202
— Claro que eu gostei. — disse. Me levantei, caminhei até ele, sentei-me na frente dele, ele olhou nos meus olhos. — Você não é só lindo. — disse a ele. — Você poderia deixar o Sol sem luz, as estrelas sem brilho… você é incrível, Trace. — olhei para minhas mãos. — Mas acho que alguém tão incrível não olharia para mim… Ele colocou as mãos dele sobre as minhas. Levantei o rosto. Covinhas no seu rosto, ele sorria novamente. — Saiba que esse alguém tão incrível olhou para você. — ele se inclinou sobre mim. Me inclinei também. — Esse alguém tão incrível poderia segurar o céu para alguém como você, Julian. — disse Trace. — Esse alguém tão incrível te contempla diariamente sem saber como se aproximar… mas chegou o momento. Esse alguém criou coragem para… — Para? — perguntei, variando meu olhar nos seus olhos ora em seus lábios sedutores. — Acho que não valeria falar. — disse ele. —… — Deveria levar na prática. — disse por fim. E bam. Ele me beijou. Nossas línguas se cruzando em um turbilhão de sentidos e emoções… não sabia mais o que fazer… apenas me entreguei aos braços dele. Me entreguei de verdade. Poderia não ser o meu primeiro beijo de língua, mas todos os que eu havia tido até aquele exato momento acabavam de sumir da memória humana… Trace O'Hara beijava muito bem… e como beijava bem… Não sei quanto tempo se passou, até escutarmos um cof cof. Olhamos para o lado e Luke Black estava parado ali com aqueles caderninhos que vem a conta. — Desculpe atrapalhar os senhores, bom, mas aqui está a conta. — ele se curvou e a colocou sobre a mesa. 203
— Obrigado. — disse Trace. Olhei para ele, os lábios dele estavam… extremamente vermelhos e pareciam mais carnudos… mais gostosos… mais… sedutores… Me controlei, olhei para Luke Black. — Bom, já estou indo. — ele se virou e quase bateu a cara na porta de correr enquanto passava por ela. Olhei para Trace enquanto a porta se fechava e rimos. Rimos como crianças. E do nada eu estava no colo dele, como se fosse a coisa mais normal do mundo. Mas sei que não saí de cima. Ele olhou para mim. — Acho que precisamos ter outros encontros assim. — disse ele. — É. — disse me inclinando para ele. — E mais beijos também. Ele sorriu, covinhas novamente e outro beijo…
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