Universidade Federal de Pelotas Centro de Artes Bacharelado em Design Gráfico Trabalho de Conclusão de Curso
A interdisciplinaridade na pesquisa brasileira em design: os TCCs do curso da UFPEL e o Congresso P&D Rafael Peduzzi Gomes
Monografia apresentada ao Centro de Artes ao curso de Bacharelado em Design Gráfico da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Design Gráfico. Orientador: Prof. Ms. Guilherme Carvalho da Rosa Pelotas, 2012
Banca examinadora Alexandre Vergínio Assunção Carla Schneider João Fernando Igansi Nunes
Agradecimentos À minha família, pela segurança e pelo estarsempre-ali em qualquer momento. À música, por ter sua parcela de culpa em cada letra deste trabalho. Aos amigos, os quais vi pouco nesse semestre, mas me desvirtuaram em horas necessárias. Ao Guilherme, meu orientador, pela atenção, pelas conversas, e sobretudo pela inspiração. Aos membros da banca, que aceitaram o convite e me ajudaram mais do que imaginam. Em especial ao Fernando, que eu diria ter sido um mestre para mim durante a graduação. Aos professores, dos quais talvez haja uma parcela da paixão de cada um nesse trabalho. Ao Rafael, meu amigo, colega, backup e companheiro nessas madrugadas de TCC. Aos que eu conheci no design e se fizeram mais do que colegas de aula, de CADe, de EJ. Ao Marcos Beccari, por ter me inspirado sem saber e me instigado em e-mails gigantes. Aos velhos amigos Bob e Laguna, que me ajudaram no inglês que eu apenas arranho.
[...] digo é o fim, amigos está próximo o incerto (o fim do poema-epifania necessário ao finalizar e às considerações finais)
Resumo
Abstract
O presente trabalho observa o desdobramento de pesquisas que se propõem a lançar um olhar interdisciplinar sobre o design a partir de dois âmbitos específicos de produção científica sobre design no contexto brasileiro. É definido como ponto de partida um instrumental teórico advindo da área chamada de filosofia do design e de sua divisão em filósofos de design e filósofos do design, feita a partir de Marcos Beccari (2010). Dentro deste cisma, são observados autores de fora do design, como Vilém Flusser (2002, 2007), Jean Baudrillard (2006), Giulio Argan (1993) e Pierre Bourdieu (2007), e autores pertencentes ao campo, como Terence Love (2000) e Per Galle (2002). O interesse recai sobre a produção de um mapeamento da investigação brasileira em design, buscando identificar os esforços desta produção em cruzar os autores do instrumental teórico com a área específica do design e contextualizar as ideias dos autores com a prática projetual do designer. Para isso, são observadas duas fontes de pesquisa: o Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design – P&D, através dos três mais recentes anais; e um mapeamento dos Trabalhos de Conclusão de Curso produzidos nos cursos de Design da Universidade Federal de Pelotas a partir de 2009 até 2011.
This paper observes the unfolding of texts that proposes an interdisciplinary approach to design from two specific sides of the scientific production about design in Brazilian context. As starting point, it’s taken a theoretical repertory from the area called philosophy of design and its division in design philosophers and philosophers of design, observed in Marcos Beccari (2010). On this schism, authors foutside the area of design were taken, like Vilém Flusser (2002, 2007), Jean Baudrillard (2006), Giulio Argan (1993) and Pierre Bourdieu (2007), and also authors from the field, as Terence Love (2000) and Per Galle (2002). The interest of our research is to produce a mapping about the brazilian investigations on design and looking forward to identify the efforts of it’s national production, contextualizing the ideas of those authors with the design practice. It covers two research sources: the Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design – P&D, though its three more recent annals; and a mapping of final papers produced on the Design courses from Universidade Federal de Pelotas since 2009 to 2011.
Palavras-chave: interdisciplinaridade em design; filosofia do design; teoria do design; pesquisa em design no Brasil.
Keywords: interdisciplinarity in design; philosophy of design; design theory; design research in Brazil.
Sumário
Apresentação 1. Repertórios da interdisciplinaridade para o design 1.1 Filósofos de design como interdisciplinaridade 1.1.1 Vilém Flusser
1.1.2 Jean Baudrillard 1.1.3 Giulio Argan
12
20 24 25 36 40
1.1.4 Pierre Bourdieu
46
1.2.1 Terence Love
53
1.2 Filósofos do design como autores do campo 1.2.2 Per Galle
2. Opções teórico-metodológicas 3. Mapeamento:
as interdisciplinaridades e o design no corpus de pesquisa
51
58
62
68
3.1 P&D 2006
69
3.3 P&D 2010
93 105
3.5 Os Trabalhos de Conclusão de Curso dos cursos
106
3.2 P&D 2008 3.4 O Congresso P&D e a interdisciplinaridade no design de design da UFPEL
81
Considerações Finais
116
Referências bibliográficas
124
A monografia aqui apresentada pretende observar o desdobramento de textos identificados com pesquisas que se propõem a lançar um olhar interdisciplinar sobre o design a partir de um recorte na produção científica sobre design no Brasil. Algumas das motivações deste trabalho partem de um movimento que, em um primeiro momento, pode ser observado pela difusão de textos que tendem a cruzar o design com a cibercultura1, a filosofia, o imaginário, as práticas culturais e outros temas. Tal interesse por essas áreas diversas parece recorrente não apenas em âmbito mais amplo na investigação brasileira, mas também a partir da temática de alguns trabalhos de conclusão dos cursos de Design da UFPEL nos últimos três anos.
Apresentação
Os estudos que relacionam design e filosofia, com os quais houve um contato inicial por meio do blog Filosofia do Design2, fazem parte de um ensejo teórico/analítico que, num primeiro olhar, encontra-se em ascensão no contexto brasileiro. Uma das potências desse foco, no sentido dos referenciais teóricos, pode ser observada a partir de Vilém Flusser, filósofo tcheco radicado no Brasil por 32 anos, que 1 “[...] a forma sociocultural que emerge da relação simbiótica entre a sociedade, a cultura e as novas tecnologias de base micro-eletrônica que surgiram com a convergência das telecomunicações com a informática na década de 70” (LEMOS, 2003, p.11). 2 http://filosofiadodesign.wordpress.com, acesso em 09/09/2011 13
foi um dos primeiros a cunhar uma possível aproximação entre filosofia e design a partir do próprio termo filosofia do design em uma publicação originalmente editada em alemão (FLUSSER, 1993)3. O livro “O Mundo Codificado”, lançado no Brasil em 2007 pela editora Cosac Naify, trouxe à língua portuguesa diversos textos do autor que até então eram apenas disponíveis em outras línguas4. Flusser procura ampliar os significados da palavra design, buscando não somente seu contexto histórico. O autor busca descartar a consulta por onde e quando se iniciou o uso da palavra com o seu significado como é visto hoje, assim pensando-a sob uma perspectiva semântica e cruzando suas definições em diversos idiomas (FLUSSER, 2007, p. 181-182). Vemos, em um primeiro momento, que a maioria dos sites que abordam o cotidiano do design tende a fechar a área em si mesma, apenas tratando sumariamente da prática projetual e das disciplinas estritamente técnicas da profissão – com uma predominância de tutoriais, repasse de conteúdo e culto a imagens para “inspiração”, sendo tal palavra inclusive uma delimitadora de seção em sites 3 Termo visto primeiramente no livro “Vom Stand der Dinge: Eine kleine Philosophie des Design”, publicado em 1993. 4 Um dos livros de Flusser que possui textos traduzidos em O Mundo Codificado é The Shape of Things: A Philosophy of Design. 14
como Abduzeedo5 e Choco la Design6. A emergência de um foco mais teórico e abrangente na web em geral pode ser exemplificada pelos sites FOROALFA7 e Filosofia do Design, focados em discussões sobre design, relacionando-o com diversos repertórios teóricos, dentre eles o imaginário, a filosofia, a cultura, dentre outros. Em um primeiro olhar, a pesquisa sobre design dá indícios da necessidade de ser pensada por meio de outros pontos de vista. Há de se considerar que, segundo Lucy Niemeyer (2007), em um determinado momento havia a necessidade de os trabalhos da área explicarem a atividade (NIEMEYER, 2007, p. 23). Entendemos neste trabalho que as abordagens interdisciplinares do campo do design são formadas pelos repertórios propostos por questões presentes em um instrumental teórico da filosofia do design e também por uma série de cruzamentos com outros campos específicos das ciências humanas como a filosofia, a sociologia, a antropologia e os estudos em comunicação8.
Aproximamos em nosso trabalho o entendimento de
5 Disponível em http://abduzeedo.com, acesso em 02/04/12 6 Disponível em http://www.chocoladesign.com, acesso em 02/04/12 7 Disponível em http://foroalfa.org, acesso em 02/04/12 8 Reiteramos aqui nosso interesse apenas nestas áreas, sendo estas as que buscaremos posteriormente nas nossas investigações no corpus de pesquisa. 15
interdisciplinaridade pelas definições de Maria Immacolata Lopes (2004) e Rogério Almeida (2010). No texto de Immacolata, vemos a relação da interdisciplinaridade com a pesquisa em comunicação, quando a autora diz que a prática interdisciplinar “exige o domínio de teorias disciplinares diversas integradas a partir de um objeto-problema” (LOPES, 2004, p. 28); prossegue então abordando que “não se trata de ‘dominar tudo’, mas de um ‘uso útil’ de teorias e conceitos de diversas procedências, [...] que seja sobretudo bem fundamentado e pertinente à construção do objeto teórico” (idem, p. 29). Em Almeida, vemos a adoção das definições de Morin, que vê “no esgotamento do saber especializado, que não consegue mais dialogar com os outros saberes, a necessidade de uma busca inter-multi-politransdisciplinar para se chegar a um conhecimento não mais do específico, do detalhado, do minúsculo, mas abrangente, global, complexo” (ALMEIDA, 2010, p. 154). Cientes das diferenciações entre as diferentes disciplinaridades – multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade – procuramos considerar aqui, como abordagens interdisciplinares do Design, todas aquelas que pretendem lançar a ele olhares advindos de outras áreas, ou mesmo cruzamentos metodológicos. Assim, nossa busca é por abordagens que poderiam se encaixar nas alcunhas de multi ou 16
interdisciplinares, segundo Basarab Nicolescu (2005)9.
De maneira mais definida, a produção científica citada anteriormente será observada a partir da sugestão de abordagens feitas por esses textos para estudo do objeto e também na busca por relacionar esses repertórios teóricos com a prática projetual. Para isso, será feito um mapeamento da pesquisa em alguns âmbitos particulares do campo brasileiro, procurando identificar quais as abordagens de repertórios teóricos podem estar presentes e os possíveis esforços dessa produção em contextualizar as ideias dos autores com a prática projetual, observando se isso realmente está sendo feito e de que maneira isso se dá. Apesar de a pesquisa estar situada no campo brasileiro, consideramos que esta investigação não possibilita um relato amplo desse campo, mas uma amostra parcial que, acreditamos, possa somar-se a outras discussões da área neste sentido. Como recorte da pesquisa, deve-se focar em comunicações científicas, produzidas no Brasil a partir de dois contextos distintos, que se propõem a observar interdisciplinarmente o design. Em um contexto mais amplo serão observados os anais das três últimas edições 9 Algumas informações sobre o assunto estão disponíveis também em http://www.ufrrj.br/leptrans/arquivos/conhecimento.pdf e http://www. engenheiro2001.org.br/artigos/Nicolescu.DOC - acesso em 10/06/2012 17
(2006, 2008 e 2010) do Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design – P&D. O contexto local será representado pelo mapeamento dos Trabalhos de Conclusão produzidos nos cursos de Design da Universidade Federal de Pelotas a partir de 2009. Dessa maneira, pretendemos abarcar sob um viés aprofundado esse corpus, procurando enfatizar o âmbito local, devido à proximidade dos TCCs ao autor da pesquisa, e também atingindo um olhar mais amplo a partir do contexto brasileiro, em textos de um congresso nacional, como o P&D.
O presente projeto trata-se então de uma pesquisa com características qualitativas (SEVERINO, 2000, p.145), tendo como base do estudo a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental (MARCONI; LAKATOS, 1992, p. 43). O caminho a ser seguido no trabalho é, primeiramente, mapear textos nas fontes de pesquisa já citadas e produzir uma análise aprofundada de algumas interdisciplinaridades encontradas nestes trabalhos; em uma segunda etapa, o foco será observar, a partir desse mapeamento, como esses saberes são apresentados em relação à prática projetual. Pretende-se então, como estrutura básica, dividir o trabalho nos seguintes capítulos: Apresentação do Objeto; Revisão Teórica; Opções Teórico-Metodológicas; Mapeamento; e, por fim, Considerações Finais. Mesmo em uma proporção 18
menor, o foco desse roteiro de pesquisa passa por questões epistemológicas – ou seja, do campo – que podem ser adotadas para o exercício do pensamento na área. O trabalho, assim, se configura sobre a opção de uma investigação de cunho teórico10.
10 Cabe ressaltar essa opção, tendo em vista diferenciar nosso trabalho dos que possuam cunho teórico/prático, estando tais categorias especificadas nas normas para os Trabalhos de Conclusão de Curso do Design/UFPEL, disponíveis em http://cearte.ufpel.edu.br/design/grafico/tcc/normas_ tcc_design.pdf - acesso em 20/05/2012. 19
Neste capítulo, fazemos um inventário de repertórios teóricos que irão auxiliar a perspectiva analítica da pesquisa, buscando os autores que apresentam convergência com o foco do trabalho, dentro das áreas já citadas. Segundo Marconi & Lakatos (1992, p. 110), pesquisa nenhuma parte da estaca zero e por mais desconhecido que seja o objeto, alguém ou algum grupo já deve ter explorado temas correlatos ou complementares. Em comum, estes repertórios fornecem elementos para um olhar sobre os objetos localizados no campo do design. Alguns deles oferecem caminhos mais definidos, falando especificamente de design, e outros tangenciam o tema a partir, por exemplo, de uma abordagem que permita pensar a relação entre forma e função.
1. Repertórios da interdisciplinaridade para o design
Algo a ser observado neste início, para que se possa estabelecer consonância com os objetivos propostos, é a necessidade de estabelecer diferenças e taxonomias iniciais entre o conjunto de teorias que são integrantes da interdisciplinaridade que pretendemos estudar. Algumas são definidas pelos autores como pertencentes a uma Filosofia do Design. Dentro disso, é um ponto de partida o estudo de Marcos Beccari (2010), em seu artigo Uma Abordagem Epistemológica acerca da Filosofia do Design. Para abordar o tema, Beccari utiliza as definições de Terence Love (2000), que especifica Teoria do Design como a disciplina que 21
investiga questões voltadas à sua Metodologia, seus Métodos e sua História, entre outros estudos que atribuem um papel, uma coerência e uma validade ao Design enquanto área de pesquisa (idem). Já a Filosofia do Design é tratada como uma disciplina à parte que procura investigar a Teoria do Design como objeto de estudo, podendo também ser considerada uma meta-teoria (idem).
Em seu artigo, Beccari diz que se constatou, no que se refere a uma Filosofia do Design, três movimentos distintos: filósofos do design, filósofos de design e filósofos do design no Brasil (BECCARI, 2010, online11). O primeiro grupo consta, majoritariamente, de autores do periódico Design Studies12 a partir de uma abordagem pós-positivista, criticista e progressista. O segundo grupo seria formado por autores não pertencentes à área do design, como, por exemplo, Vilém Flusser, Jean Baudrillard e Giulio Carlo Argan, apesar de falarem a respeito - no caso de Flusser e Argan - ou mesmo nem mencionar a palavra design a partir das obras vistas aqui, no caso de Baudrillard. Beccari (2010) ainda acrescenta que esse segundo grupo enxerga o design
11 Disponível em http://filosofiadodesign.wordpress.com/2010/12/20/ abordagem_epistemologica - acesso em 03 abr. 2012. 12 Periódico internacional de pesquisa em design, engenharia, arquitetura, produtos e sistemas. Disponível em http://www.journals.elsevier.com/ design-studies/. Acesso em 11/04/2012 22
“como um indício para uma suposta crise pós-moderna que, por sua vez, estaria associada a teorias pessimistas contra o utilitarismo e o pragmatismo” (BECCARI, 2010, online). Quanto ao terceiro grupo, o autor conclui que não foi possível identificar uma unidade clara de pensamento no seu contexto, existindo em âmbito nacional apenas propostas emergentes e não sistematizadas relacionadas às mais diversas linhas filosóficas como alternativas à predominância cientificista e pragmatista nas teorias do design.
Apresentados tais conceitos relacionados à filosofia do design, nossa revisão teórica se baseia a partir deste momento apenas nos dois primeiros movimentos - filósofos do design e filósofos de design - como divisões de subcapítulos, partindo do princípio de que o terceiro grupo - filósofos do design no Brasil - é integrante, em parte, especificamente do objeto de estudo desta pesquisa, focado justamente na pesquisa brasileira em design. Abordamos estes dois grupos devido a se constituir um itinerário teórico que vai ao encontro da questão da interdisciplinaridade, no caso dos filósofos de design, e o uso de um viés filosófico para questionar um campo no qual se está inserido, no caso dos filósofos do design. Será feita agora, portanto, uma breve revisão a partir dos dois núcleos mencionados. 23
1.1 Filósofos de design como interdisciplinaridade Dentre as três categorias distintas apontadas por Beccari, a dos filósofos de design é formada por autores que não pertencem ao design, ou seja, “pensadores de áreas externas ao Design, como Filosofia, História e Sociologia, que também têm procurado analisar o Design enquanto objeto de estudo” (BECCARI, 2010, online). Ainda assim, alguns tratam de questões concernentes à área apenas indiretamente. No artigo já citado, é dito sobre o movimento que intitula este capítulo que o grupo dos filósofos de design é aparentemente ignorado pelo movimento dos filósofos do design, algo que se apresenta como curioso quando consideramos que boa parte dos autores que formam a “filosofia de design” são de um movimento que emerge num período histórico anterior à filosofia do design proposta por Love (2000). Podemos pensar que isso ocorre tendo em vista a identificação destes autores com a episteme da pesquisa em design e a necessidade de legitimá-la. Ainda no artigo em questão, constata-se que os principais autores filósofos de design são Vilém Flusser, Jean Baudrillard e Giulio Argan. A essa lista, pretendemos acrescentar o sociólogo francês Pierre Bourdieu, devido a importantes contribuições para a área do design, como os 24
conceitos que giram em torno do poder simbólico e adentram um diálogo com Baudrillard.
Consideramos natural que, além dos autores já citados, utilizemos também bibliografias correlatas e diversificadas que tratem do tema ou se relacionem com os filósofos de design, devido a sua colaboração para a interpretação e compreensão dos autores já citados e também a uma possível ampliação de repertório teórico que não se detenha exclusivamente na base abarcada pelo artigo de Beccari. Faremos a seguir uma apresentação dos autores citados, a partir de um roteiro regular de apresentação dos autores e das principais ideias que são correlatas ao pensamento do design. 1.1.1 Vilém Flusser Flusser foi um filósofo tcheco, nascido em 1920, que morou no Brasil de 1940 a 197213; morreu em 1991, num acidente de carro em Praga14. Autodidata, em sua autobiografia assumiria sua condição de eterno migrante, de sujeito desenraizado de 13 Informações disponíveis em http://flusser-archive.org/aboutflusser/ biography - acesso em 19/04/2012 14 Informações disponíveis em http://www.flusserstudies.net/pag/ flusser.htm - acesso em 20/04/2012 25
pátrias e de quaisquer sistemas (FERREIRA, 2011, p.150151). Cabe destacar que Flusser foi um autor que, em boa parte de sua obra, referiu-se diretamente ao design, e talvez por ser fluente em vários idiomas, como alemão, francês, checo, português, inglês, e por possuir conhecimento em vários outros (PAWLEY, 1999, p. 14), o autor tenha chegado a uma maneira de observar o design tendo um ponto de vista, por exemplo, de análise etimológica, pensando através do significado das palavras e elaborando outros, na medida em que reescrevia suas obras em diversos idiomas. Arlindo Machado (2008) diz que o que chama atenção em Flusser, num primeiro momento, é sua posição divergente tanto à posição tecnófila quanto à corrente tecnófoba (MACHADO, 2008, p.38). Ainda em Machado, podemos ver a significativa passagem de Flusser pelo Brasil, quando é abordado que “foi, possivelmente, o principal mentor intelectual de várias gerações de artistas brasileiros que enfrentaram o desafio da tecnologia” (MACHADO, 2008, p. 38).
Rafael Cardoso, organizador do já citado livro O Mundo Codificado (FLUSSER, 2007), assina também sua introdução. Nela, Cardoso aborda que Flusser não hesita em ultrapassar limitações metodológicas necessárias ao pensamento de cunho histórico e contraria a maioria dos filósofos modernos, dedicando suas reflexões não à linguagem 26
verbal e aos códigos matemáticos, mas sim às imagens e aos artefatos, elaborando bases de uma filosofia do design e da comunicação visual (CARDOSO, 2007, p. 10). Flusser, como já dito, busca pensar o design através da semântica do termo, e também através de vários outros termos. Em sua visão do mundo em transformação, diz que “os novos meios, da maneira como funcionam hoje, transformam as imagens em verdadeiros modelos de comportamento e fazem dos homens meros objetos” (FLUSSER, 2007, p. 159). No mesmo raciocínio, diz que os meios podem ainda funcionar de maneira diferente, tornando as imagens em portadoras e os homens em designers de significados. O olhar do designer, segundo o autor, é baseado num olho-sentinela que o faz deduzir e manejar eternidades (FLUSSER, 2007, p.192). Podemos propor, para um melhor entendimento, a divisão histórica na definição de Flusser: primeiramente pelo pré-histórico, ou seja, antes da invenção da escrita linear, a época das imagens bidimensionais tradicionais, da consciência mágica, da idolatria e dos instrumentos; após a invenção da escrita, surge o histórico, da escrita linear unidimensional, da conceituação e linearização, da consciência histórica e da textolatria. Então, Flusser propõe o pós-histórico como o momento atual, das imagens técnicas, com zero dimensão, advindas da criação de aparelhos, que as 27
produzem por meio de textos científicos. Convém ressaltar que esses conceitos históricos definidos não são excludentes, mas apenas resumem o paradigma predominante de cada época segundo Flusser. A seguir, vamos abordando cada um desses conceitos citados.
Em Filosofia da Caixa Preta (2002), Flusser trata de imagens como superfícies com a pretensão de representar algo que se encontra lá fora no espaço e no tempo, ou seja, resultados do esforço de se abstrair duas das quatro dimensões – altura, largura, profundidade e tempo – do espaço-tempo. As imagens, bidimensionais, são mediações entre o homem e o mundo, e se originam da capacidade de abstração que podemos chamar de imaginação. Assim como a imaginação pode abstrair as duas dimensões dos fenômenos, ela também pode reconstituir as duas dimensões abstraídas na imagem, ou seja, é a capacidade de codificar fenômenos de quatro dimensões e decodificar as mensagens assim codificadas, podendo ser definida como “a capacidade de fazer e decifrar imagens” (FLUSSER, 2002, p. 7). O autor ainda aborda as relações entre imagens e textos, quando diz que em certo ponto, o homem passa a viver em função das imagens, em vez de utilizá-las para melhor compreender o mundo, assim tendo a realidade como 28
um reflexo das imagens. Tal homem é chamado de idólatra, e quando tal idolatria atingiu seu apogeu, no segundo milênio A.C., foi quando se inventou a escrita linear, dando início também à consciência histórica, que se opunha à consciência mágica criada pelas imagens. Os textos devem explicar as imagens significadas pelos conceitos; a escrita, então, é um metacódigo da imagem. Logo, numa luta dialética, os textos se tornam cada vez mais imaginativos, e as imagens se tornam cada vez mais conceituais. Assim, imagens passam a ser metacódigos de textos, que por sua vez, enquanto mediações, podem acabar por obscurecer as imagens as quais abstraem, fazendo o homem não mais viver para utilizá-los, mas sim em sua função. Surge assim a textolatria, com textos inimagináveis como o são no universo das ciências exatas (FLUSSER, 2002, p. 11); tendo imagens como o significado dos conceitos, os textos tornam-se vazios. É após esse ciclo histórico de desmagicização e conceituação, num mundo da atualidade, que são inventadas as imagens técnicas. As imagens técnicas são definidas por Flusser como “imagem produzida por aparelhos” (FLUSSER, 2002, p. 13). O aparelho, por sua vez, é um brinquedo que simula o pensamento, um produto da técnica, sendo a aplicação de textos científicos. Logo, é isso que diferencia a imagem técnica da imagem tradicional: ela é produto indireto de 29
textos, ou seja, em vez de somente imaginar o mundo como as imagens, ela imagina textos que concebem imagens que imaginam o mundo (FLUSSER, 2002, p. 13). O autor ainda diz que a função das imagens técnicas é emancipar a sociedade de pensar conceitualmente, substituindo consciência histórica por consciência mágica de segunda ordem, tendendo então a eliminar os textos (FLUSSER, 2002, p. 16), fazendo com que textos científicos, imagens, e todo e qualquer ato científico, artístico e/ou político vise ser fotografado, filmado, gravado, ou seja, tenha como meta as imagens técnicas, assim estabelecendo seu universo como plenitude dos tempos (FLUSSER, 2002, p. 16). Quanto aos aparelhos, Flusser analisa-os sob a ótica do aparelho fotográfico simulando o olho humano, por ser talvez o primeiro e mais elementar. Porém, podemos estender o conceito para todo tipo de aparelho que possa produzir imagens técnicas, como o computador simulando o cérebro, por exemplo. Voltando à dita pré-história, vemos que Flusser define como instrumentos os objetos culturais que são bons para produzirem bens de consumo, dizendo que são eles prolongamentos de órgãos do corpo – o martelo simula o punho, a enxada simula o dente, etc. Com a revolução industrial, os instrumentos tornam-se máquinas, e se antes os instrumentos cercavam os homens, depois os 30
homens cercam as máquinas, vivendo em função delas. Os aparelhos diferem dos instrumentos por não trabalharem, não possuírem a intenção de modificar o mundo, mas sim modificar a vida dos homens; logo, quem os manipula não trabalha, mas sim age, torna-se um informador: produz, manipula e armazena símbolos, como o fotógrafo, escritores, pintores, contadores e administradores (FLUSSER, 2002, p. 22). Todo aparelho possui um programa, que define as suas potencialidades – o fotógrafo estará sempre limitado ao programa da máquina fotográfica, que por mais rico que seja, acabará por sempre definir os limites da ação de quem o manipula. Assim, o fotógrafo mais brinca com o aparelho do que trabalha com ele, procurando esgotar seu programa, descobrir potencialidades ignoradas; como um funcionário do aparelho, o fotógrafo se mistura a ele, de maneira que não esteja nem o dominando, nem sendo dominado. Para não ter seu programa esgotado, o aparelho deve sempre possuir potencialidades que superem a capacidade do fotógrafo de esgotá-las; assim, o sistema nunca é totalmente penetrado, e por isso Flusser o define como caixa preta (FLUSSER, 2002, p. 24): o fotógrafo pode dominar o aparelho no sentido de utilizá-lo para fazer fotografias, mas não conhece e não necessita para isso conhecer todos os processos que se passam no interior da caixa, sendo isso uma imposição do 31
próprio aparelho.
Entre hardware e software15, o que interessa para o fotógrafo é a virtualidade de realizar fotografias, ou seja, o aspecto duro dos objetos, seu material, não é o que dá seu valor, mas sim o símbolo que o representa, valorizando a informação como o poder que pode ser exercido através dele, em detrimento do objeto em si. Assim, o fotógrafo programa quem vê suas fotografias, e é programado pelo aparelho fotográfico, que por sua vez é programado pela indústria fotográfica, num sistema complexo sem fim. Os aparelhos, então, são caixas pretas que “brincam de pensar” e “simulam o pensamento humano” (FLUSSER, 2002, p. 28).
Pensando etimologicamente, Flusser trata de definir e diferenciar forma e material: são estes o continente e o conteúdo, a forma como eterna e imutável, como o conceito de mesa, e a matéria como algo amorfo, sendo o conteúdo 15 Hardware é a parte física de um computador; é formado pelos componentes eletrônicos como, por exemplo, circuitos de fios e luz, placas, utensílios, correntes, e qualquer outro material em estado físico que seja necessário para fazer com o que computador funcione. Para o bom funcionamento do hardware, é também necessário o software, que é a parte lógica da informática. É no software que está toda a parte eletrônica que tem o poder de fazer todas as operações que um eletrônico realiza. Software é qualquer programa de computador que possa ser utilizado, copiado e etc [...] Informações disponíveis em http://www.significados. com.br/hardware/ - acesso em 24/05/2012 32
da mesa independente de sua forma. O carpinteiro informa a madeira quando lhe dá a forma de mesa e deforma a ideia de mesa quando a distorce na madeira; evidentemente é impossível se fazer uma mesa ideal. Com o exemplo da fórmula da queda livre dos corpos, Flusser esclarece que a informação “queda livre” possui um conteúdo (corpo) e uma forma (uma fórmula matemática); logo, a forma é o “como” da matéria e a matéria é “o quê” da forma. A matéria só se manifesta como fenômeno quando informada, sendo o modo como as formas aparecem (FLUSSER, 2007, p. 28). Às informações imateriais, inapreensíveis e apenas decodificáveis, como imagens eletrônicas/artificiais, dados armazenados no computador, hologramas e programas, Flusser dá o nome de “não-coisas”. Sendo o hardware a coisa e o software a não-coisa, o autor destaca que nossa cultura se torna cada vez mais imaterial, na medida em que as coisas são menos valorizadas e se tornam mais baratas e as não-coisas vão se tornando cada vez mais caras. Esses são conceitos também vistos em Filosofia da Caixa Preta, quando se percebe que pagamos apenas pelas virtualidades e potencialidades simbólicas dos aparelhos, e não por seu material ou forma: “Nosso interesse existencial desloca-se, a olhos vistos, das coisas para as informações. Estamos cada vez menos interessados em possuir coisas e cada vez mais querendo consumir informações” (FLUSSER, 33
2007, p. 55).
Segundo Flávio Shimoda (2008), Flusser foi um filósofo que contribuiu com seu legado teórico para a percepção e compreensão do significado da força que o termo Design vem adquirindo no mundo contemporâneo (SHIMODA, 2008, p. 9). Ainda em Shimoda, vê-se que além do conceito de design como especialização de trabalho ou disciplina do conhecimento, Flusser nota um significado mais vasto e complexo, que deve ser entendido como a revelação de uma autoconsciência humana que opera os conhecimentos na fabricação dos significados das realidades (SHIMODA, 2008, p. 9). O filósofo dedica um ensaio apenas à palavra design, pensando o termo semanticamente; como substantivo, Flusser encontra alguns significados como “propósito”, “plano”, “intenção”, “meta”, “esquema maligno”, “conspiração”, “forma” e “estrutura básica”, abordando que todos esses se relacionam a “astúcia” e “fraude”, concluindo que “o designer é, portanto, um conspirador malicioso que se dedica a engendrar armadilhas” (FLUSSER, 2007, p. 181182). Pelo menos desde a Renascença, negou-se uma conexão interna entre o mundo da arte e o mundo da técnica e das máquinas, de modo a dividir a cultura em um ramo científico, quantificável, “duro” e o ramo estético, qualificador, “brando” (FLUSSER, 2007, p. 183). A partir do século XIX, tal separação 34
tornou-se então insustentável, tendo a palavra design entrado nessa brecha como uma ponte entre os dois mundos, significando “aproximadamente aquele lugar em que arte e técnica (...) caminham juntas, com pesos equivalentes, tornando possível uma nova forma de cultura” (FLUSSER, 2007, p. 184). Assim, o design se verifica pela milenar intenção de “enganar a natureza por meio da técnica, substituir o natural pelo artificial e construir máquinas de onde surja um deus que somos nós mesmos” (FLUSSER, 2007, p. 184). Caise assim na chamada “dialética interna da cultura”, na medida em que qualquer objeto que projetemos para satisfazer uma necessidade acabará por acarretar em outras, sendo o design um “obstáculo para a remoção de obstáculos”: quanto mais longe se vai através de um objeto de uso como, por exemplo, um carro, mais se está limitado a ele. Logo, Flusser conclui que uma criação - ou um processo criativo em design, por exemplo - de maneira mais responsável faria uma cultura com mais liberdade, onde os objetos de uso seriam cada vez menos obstáculos e mais veículos de comunicação, enfatizando mais os aspectos comunicativos, intersubjetivos e dialógicos do que os aspectos objetivos, objetais e problemáticos, e dessa maneira adequando-se a sua definição como mediações da relação dos homens entre si e com o mundo. 35
1.1.2 Jean Baudrillard Em paralelo às ideias de Flusser, no mesmo sentido do grupo dos filósofos de design, porém, sendo um autor que não aborda diretamente o design, observamos o papel de Jean Baudrillard (1929 - 2007)16, um sociólogo e filósofo francês, que é referido no posfácio de uma de suas principais obras, O Sistema dos Objetos, como “a primeira sombra de dúvida ou negação em face da inexorabilidade racional e afirmativa do desenho industrial” (TAVARES, 2008 p. 230). Baudrillard trata de questões como as relações de consumo e simbólicas dos objetos, bem como seus discursos quando consumidos, numa perspectiva sistemática e estruturalista. O autor perpassa por diversas facetas dos objetos, abordando de maneira específica a função e funcionalidade, mas também tratando de seus aspectos econômicos e socioculturais, a partir do consumo. Cabe apontar que, mesmo partindo da semiologia e do estruturalismo como perspectiva teórica, Baudrillard reconhece o risco de cair numa análise forçada, na qual o foco de estudo passe de motivo a mero pretexto frente ao instrumental adotado (BECCARI, 2011, online17).
16 Informações sobre o autor foram retiradas de http://educacao.uol.com. br/biografias/jean-baudrillard.jhtm - acesso em 24/05/2012 17 Disponível em http://www.esocite.org.br/eventos/tecsoc2011/cdanais/arquivos/pdfs/artigos/gt009-odesign.pdf – acesso em 05/05/2012 36
Baudrillard descarta a possibilidade de uma análise dos objetos a partir da função em detrimento de saber como os objetos são vividos, em que necessidades além das funcionais eles podem ser adequados, que estruturas mentais podem se mesclar às funcionais, enfim, sobre que sistema cultural, infra ou transcultural é fundada a vivência de seu cotidiano. Não se trata pois dos objetos definidos segundo sua função, ou segundo as classes em que se poderia subdividi-los para comodidade da análise, mas dos processos pelos quais as pessoas entram em relação com eles e da sistemática das condutas e das relações humanas que disso resulta (BAUDRILLARD, 2008, p. 11).
Segundo Beccari (2011), em Baudrillard “parte-se do pressuposto de que os objetos de Design estão ligados de maneira direta ao homem e são portadores de significados que mediam as relações humanas” (BECCARI, 2011, online). Vemos na obra já citada do autor que os objetos se tornam mais complexos do que o comportamento do homem em relação a eles, na medida em que seu enfoque dentro de um sistema cultural passa a ser simbólico em vez de funcional. A partir da 37
funcionalidade, Baudrillard fala do mito funcionalista, galgado na virtualidade de um mundo totalmente funcional, absoluto na eficácia dos signos; o gestual, o esforço humano é assim reprimido, e torna-se apenas mito, projeção, transcendência (BAUDRILLARD, 2008, p. 63). Em outras palavras, podemos dizer que quando o homem idealiza um mundo perfeito através da funcionalidade absoluta, ele verá desaparecer sua própria humanidade, não sendo mais necessário seu gesto e esforço para a significação do mundo, tornando-se disfuncional, irracional. Ainda sobre a funcionalidade dos objetos, Baudrillard conclui mais adiante na obra citada que “‘funcional’ não qualifica de modo algum aquilo que se adapta a um fim, mas aquilo que se adapta a uma ordem ou a um sistema: a funcionalidade é a faculdade de se integrar em um conjunto” (BAUDRILLARD, 2008, p. 70).
(BAUDRILLARD, 2008, p. 82). Assim, tais objetos antigos fazem-se presentes apenas para um propósito de significação, tendo perdido seus fins práticos. Por mais autênticos que sejam eles, acabam tornando-se falsos em meio a um sistema onde a relação calculada e a abstração do signo se tornam a questão central, em vez da autenticidade. Logo, difere-se o objeto antigo do funcional por sua relação com o tempo; o antigo torna-se mitológico e perfeito na medida em que “ocorre no presente como se tivesse ocorrido outrora” (BAUDRILLARD, 2008, p. 83), sendo então fundado sobre si e suprimindo um conceito de tempo; o funcional ocorre apenas na atualidade, tendo um tempo apenas indicativo e imperativo prático, onde se esgota em seu próprio uso. Tal diferenciação pode ser vista numa comparação entre um livro antigo e um jornal, por exemplo.
define como historicidade. “[...] a funcionalidade dos objetos modernos torna historicidade do objeto antigo [...] sem todavia deixar de exercer uma função sistemática do signo”
discurso cada vez mais coerente” (BAUDRILLARD, 2008, p. 206). Por possuir um sentido, o consumo “é uma atividade de manipulação sistemática de signos” (BAUDRILLARD,
Baudrillard aborda o objeto antigo de maneira mais específica, intitulando-o como um objeto marginal. Sendo os objetos antigos “uma categoria de objetos que parece escapar ao sistema que acabamos de analisar” (BAUDRILLARD, 2008, p. 81), considera que mesmo diferentes, fazem parte também da modernidade, tendo um valor de ambiência que o autor
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Também abordando o consumo especificamente, Baudrillard define-o como um modo ativo de relação com os objetos, com a coletividade e com o mundo, uma atividade sistemática e de resposta global na qual se funda todo o nosso sistema cultural. É ele “a totalidade virtual de todos os objetos e mensagens constituídos de agora então em um
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2008, p. 206). Para um objeto transformar-se num objeto de consumo ele precisa se tornar um signo, ou seja, uma relaçãoabstrata, uma substituição do objeto em si pela mediação. O consumo também pode ser definido como uma “prática idealista total, sistemática, que ultrapassa de longe a relação com os objetos e a relação interindividual para se estender a todos os registros da história, da comunicação e da cultura” (BAUDRILLARD, 2008, p. 209). Logo, se explica que não há limites para o consumo, e justamente por ele fundar-se sobre uma ausência é que se torna irreprimível (BAUDRILLARD, 2008, p. 211). 1.1.3 Giulio Argan Ainda no grupo dos filósofos de design, deparamo-nos agora com Giulio Carlo Argan (1909 – 1992)18, um historiador e teórico da arte italiano que primeiramente ficou conhecido por seus estudos de arte medieval e renascentista, mas também publicou livros com proximidade em relação ao design como a obra Walter Gropius e a Bauhaus19 (1951) e 18 Informações sobre o autor foram retiradas de http://editora.cosacnaify. com.br/Autor/673/Giulio-Carlo-Argan.aspx - acesso em 24/05/2012 19 Walter Gropius foi o fundador e primeiro diretor da Bauhaus, escola de design, artes plásticas e arquitetura que funcionou na Alemanha de 1919 a 1933, sendo uma das primeiras escolas de design no mundo (NIEMEYER, 2007, p. 40-44). 40
outros que tratam diretamente do design. O que traz Argan a este estudo no campo do design é principalmente sua abordagem de conceitos recorrentes na área como projeto, destino, programação, sujeito, objeto, imaginação, dentre outros.
Argan inicia um de seus ensaios que tratam mais diretamente do design com a frase “Existe uma crise profunda do design” (ARGAN, 2005, p. 251). Não sem motivos, o ensaio é intitulado A Crise do Design. Nele, o autor continua as relações já elaboradas no livro que o abriga, História da Arte como História da Cidade, colocando que a cidade pode também ter sua história explicada por meio da arte – sendo essa não só um reflexo dos aspectos econômicos, sociais e políticos. Argan pontua que a causa dessa crise do design – que, logo, faz parte de uma crise maior, advinda da arte, das classes sociais e das cidades – pode ser percebida em fatores como a qualidade da tecnologia industrial, o progresso da cultura de massa, a difusão do consumismo e a contradição entre conservação política e o rápido desenvolvimento das ciências e das técnicas (ARGAN, 2005, p. 251). Além disso, a manifestação de tal crise é dita como uma divergência crescente entre os conceitos de programação e projeto; os quais seriam, por sua vez, opostos. Programação 41
remonta a uma preordenação calculada, mecânica que não mais somente precede o projeto, mas tende a substituí-lo frente às contradições que se postam na sociedade. Sendo o projeto um processo que se integra numa concepção histórica do desenvolvimento da sociedade e a programação uma superação da história como princípio de ordem da existência social (ARGAN, 2005, p. 251), conclui-se que, à medida que essa substituição de um pelo outro cresce, apagamos toda forma de existência histórica da sociedade. Argan também contrapõe, em seu livro Projeto e Destino, os conceitos que intitulam a obra, de maneira semelhante ao recorte de Vilém Flusser, que os aborda sob uma ótica de natural versus artificial: destino é aquilo sobre o que o homem não tem controle; já projeto seria a própria tentativa de controlar seu futuro, ou seja, seu destino. Toma-se então o ato de projetar, de fazer design, como um meio de o homem aplicar sua consciência histórica para dominar, prever e moldar seu futuro.
Voltando à crise do design, Argan ainda propõe a dualidade de sujeito e objeto como o eixo da cultura ocidental, estruturalmente dualista (ARGAN, 2005, p. 252). Dessa maneira, coloca os conceitos como dependentes, sendo o sujeito legitimado por considerar a realidade como outra, distinta de si; e o objeto é validado justamente por ser 42
assumido e pensado pelo sujeito. Assim diz que a realidade, ou um fragmento dela, torna-se objeto quando adquire a singularidade do sujeito que a pensou. Logo, concluise o design não apenas como um processo que formata a sociedade, mas como o que promove a realidade e as coisas ao grau de objeto, manifestando a finalidade da existência humana (ARGAN, 2005, p. 252). Argan, portanto, considera a crise global:
[...] o mundo moderno tende a deixar de ser um mundo de objetos e sujeitos, de coisas pensadas e pessoas pensantes. O mundo de amanhã poderia não ser mais um mundo de projetistas, mas um mundo de programados (ARGAN, 2005, p. 252).
Tomando o pensamento ocidental como estruturalmente objetivador e objetificador das coisas, das pessoas e da realidade, Argan vê, além da crise do objeto e do sujeito, a crise da cidade como agregação histórica da sociedade e a crise da natureza como configuração histórica da realidade (ARGAN, 2005, p. 253). A objetificação como um movimento na mudança do século XIX para o século XX tem ideais reformistas, de transformar os produtos de perspectivas artesanais para industriais, individuais para 43
coletivas. Porém, em vez de produzir objetos de valor estético, o industrialismo produzia séries de objetos idênticos, o que acabou, posteriormente na Bauhaus e ainda após, em Ulm20, por anular o valor do sujeito e transformar o objeto na imagem do projeto, consequentemente desequilibrando e acabando com a simetria entre a dualidade sujeito e objeto.
Segundo Argan, “desde que se formou uma teoria do design, esta teve como objetivo o bem estar social” (ARGAN, 2005, p. 262), porém, tal bem-estar se torna irrealizável quando os aparatos técnicos que deveriam proporcioná-lo obtêm efeitos contrários. Ou seja, a espiral do consumismo, que sempre provoca o consumo e o descarte rápido dos produtos independente da necessidade, gera um sentimento contínuo de insatisfação. O autor propõe então que a recuperação do equilíbrio entre necessidades e produção só pode ser atingida por meio de “uma nova maneira de projetar a existência” (ARGAN, 2005, p. 263), traduzida num design em função das necessidades em vez do bem-estar. Sendo assim, considera a crise dos objetos irreversível (ARGAN, 2005, p. 263), tornando não mais possível um design de produto, mas
20 A Escola de Ulm (Hochschüle Für Gestaltung) foi uma escola de design fundada na cidade de Ulm, na Alemanha, em 1951, com o propósito de continuar o trabalho a partir de onde a Bauhaus havia parado (NIEMEYER, 2007, p. 45-48). 44
apenas um design dos circuitos de informação, na medida em que os produtos perdem seu antigo status de objetos e passam a ser informação, dados. Argan então diz que no primeiro estágio do design, na Bauhaus, o objetivo era criar objetos com o valor dependente da forma, e não da matéria, e que pudessem ser utilizados por classes economicamente não-privilegiadas (ARGAN, 2005, p. 263). Porém, tais objetos exigiam nível cultural elevado, e o problema persistia e provavelmente continuará a persistir, só que “a cultura necessária para se utilizar o novo design não será mais uma cultura de classe, mas sim uma cultura de massa. Essa cultura será produzida, obviamente, pelo próprio design” (ARGAN, 2005, p. 263). A cultura de massa citada por Argan deverá ser projetada por um design que organiza os circuitos da informação, começando pela cidade e pelo ambiente, e que procura definir um novo modo de se relacionar com a ciência, a economia e a política, acabando por determinar a forma, o espaço, o ritmo e o tempo da vida na massa. Sucede ao design dos objetos, portanto, o design das imagens (ARGAN, 2005, p. 265), porém, deve-se evitar que a informação e comunicação de massa manipulem os indivíduos e impeçam a sua comunicação entre si e com o ambiente. Argan então aborda a imaginação, “faculdade que nos permite pensar em 45
nós mesmos de forma diferente do que somos e, portanto, propor uma finalidade além da situação presente” (ARGAN, 2005, p. 266), como um instrumento para projetarmos de maneira que proporcione finalidade a nossa existência. Por conseguinte, sem imaginação, que num viés político e eticamente intencionado é a ideologia, e que possui um conhecimento ligado ao fazer e a técnica ao invés do abstrato, não há projeto, ou seja, a “predisposição dos meios operacionais para pôr em prática os progressos imaginados” (ARGAN, 2005, p. 266).
1.1.4 Pierre Bourdieu Agora abordando um autor que dialoga, em certa medida, com Jean Baudrillard, seguimos nossa revisão com Pierre Bourdieu (1930 - 2002), que foi um sociólogo e filósofo francês21 do qual podemos extrair para o design conceitos como habitus22 21 Bourdieu é reconhecido por seu trabalho como sociólogo, porém, é filósofo de formação. Informações sobre o autor foram retiradas de http:// educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/pierre-bourdieu-307908. shtml - acesso em 25/05/2012 22 “é o que faz com que o conjunto das práticas de um agente – ou do conjunto dos agentes que são o produto de condições semelhantes – são sistemáticas por serem o produto da aplicação de esquemas idênticos – ou mutuamente convertíveis – e, ao mesmo tempo, sistematicamente distintas das práticas constitutivas de um outro estilo de vida” (BOURDIEU, 2007, p. 163) 46
e capital simbólico. Segundo García Canclini (2005), Bourdieu analisou “a construção das diferenças socioculturais no consumo” (CANCLINI, 2005, p. 70), fator que na atualidade pode ser considerado como uma das funções inerentes ao design. Sendo o autor um sociólogo que aqui é considerado um filósofo de design, deve ser esclarecido que Bourdieu não fala diretamente de design, não utiliza o termo para suas reflexões. Ainda em García Canclini, vemos que Bourdieu trata de assuntos que “tornam a cultura fundamental para entender as diferenças sociais” (CANCLINI, 2005, p. 70), procurando entender como a reprodução e diferenciação social se estrutura de forma econômica e simbólica, e como se articulam esses conceitos para a construção do poder.
Em sua obra A Distinção – Crítica Social do Julgamento, Bourdieu concentra-se nas práticas culturais; García Canclini aborda que o autor, além de descrever a estrutura dos campos e mostrar classes, grupos e sujeitos sociais operando a correlação e complementação entre os campos, também amplia para três os níveis culturais, denominando-os como “gostos” (CANCLINI, 2005, p. 78). Vê-se então a utilização de divisões abarcando o aspecto subjetivo dos comportamentos nesse sentido: “gosto legítimo”, “gosto médio” e “gosto popular” (CANCLINI, 2005, p. 78). Sendo essa divisão estabelecida através da composição dos seus públicos, da natureza das 47
obras produzidas e pelas ideologias político-estéticas que os expressam, os três sistemas coexistem na mesma sociedade capitalista, que organiza, mesmo que de maneira desigual, a distribuição dos bens materiais e simbólicos. Através dessa desigualdade, pode-se logo constatar que os mesmos bens são, em muitos casos, consumidos por distintas classes sociais (CANCLINI, 2005, p. 78) – logo, o que se conclui é que a diferença entre os três grupos citados se estabelece mais no próprio modo de usar os bens do que nos bens específicos apropriados por cada classe.
Assim, Bourdieu aborda a estética dominante, através de sua experiência pesquisando em museus. Diz-se que nos séculos XIX e XX as vanguardas artísticas acentuaram a predileção da forma pela função, da maneira de dizer sobre o que se diz. Exige-se então um repertório cada vez maior de um observador para o entendimento das obras, quando o modo dominante de produzir e consumir a arte organiza simbolicamente as diferenças entre as classes. Portanto, só terá acesso a tal capital artístico ou científico quem contar com os meios econômicos e simbólicos para dele se apropriar. As práticas culturais da burguesia acabam por simular uma justificativa de seus privilégios como algo mais nobre que a acumulação material; ela então coloca o motivo da diferenciação social no simbólico, e não no econômico, 48
no consumo e não na produção, fora do cotidiano, criando a ilusão de que desigualdades não se devem àquilo que se tem, mas àquilo que se é (CANCLINI, 2005, p. 81).
Da estética dos setores médios, diz-se que é constituída pela indústria cultural e por certas práticas, como a fotografia, caracterizadoras do chamado gosto médio. O sistema da produção de massa diferencia-se do já citado campo artístico de elite por sua falta de autonomia, e por submeter-se a demandas externas como a competição pela conquista do mercado. As classes médias, assim como as populares, praticam a cultura por meio de atos metafóricos, deslocados, como através de adaptações – filmes inspirados em obras de teatro, ou arranjos populares de música erudita e vice-versa – sendo referenciadas pelo gosto dominante em “obras menores das artes maiores” (CANCLINI, 2005, p. 82). García Canclini então pontua em Bourdieu a abordagem específica da prática fotográfica, como uma “atividade familiar destinada a consagrar o não-familiar” (CANCLINI, 2005, p. 84), sendo necessária para as classes médias como um modo de provar a visitação a locais de lazer, centros turísticos, dentre outros privilégios. Envereda-se então numa definição precisa da fotografia como nem elitista nem plenamente popular servindo ela às camadas médias para “diferenciarem-se da classe operária, exibindo-se junto a paisagens e monumentos 49
os quais esta não chega, consagrando o encontro exclusivo com os lugares consagrados” (CANCLINI, 2005, p. 84).
Quanto à estética popular, é vista em Bourdieu como baseada na afirmação da continuidade da arte e da vida, implicando na subordinação da forma à função, ou seja, na recusa da recusa que se encontra na própria origem da estética erudita (BOURDIEU, 2007, p. 35). As classes populares então são guiadas por uma estética pragmática e funcionalista, de uma maneira que pessoas “simples” e “modestas” são condenadas, por necessidade econômica e social, a gostos da mesma forma simples e modestos. Logo, García Canclini aponta que para Bourdieu “pertencer às classes populares equivaleria ‘a renunciar aos ganhos simbólicos’ e reduzir as práticas e os objetos à sua função utilitária: o corte de cabelo deve ser ‘limpo’, a roupa ‘simples’, os móveis ‘sólidos’” (CANCLINI, 2005, p. 85). Sendo assim, a estética popular é sempre abordada em Bourdieu com referência à hegemônica, sendo incapaz de ser como a classe dominante e de construir um espaço próprio, não possuindo uma problemática autônoma. García Canclini então conclui ser esse o motivo de Bourdieu afirmar que “o lugar por excelência das lutas simbólicas é a própria classe dominante” (CANCLINI, 2005, p. 86). 50
1.2 Filósofos do design como autores do campo Partindo para outros referenciais, encontramos aqui os filósofos do design, grupo de autores que estão efetivamente inseridos na área do design, referido por Beccari (2010) como “referente aos autores da Design Studies” (BECCARI, 2010, online23). Sobre o já citado fato curioso de os filósofos de design serem ignorados por este grupo, verificamos, nos trabalhos destes autores que aqui serão tratados, a inexistência de citações dos autores previamente abordados, de maneira a confirmar a observação de Beccari. Da dissertação de mestrado de Beccari (2012) extraímos uma imagem que nos mostra um panorama da história da filosofia do design, a partir do qual vamos retirar alguns autores para uma abordagem mais aprofundada a seguir:
23 Disponível em http://filosofiadodesign.wordpress.com/2010/12/20/ abordagem_epistemologica - acesso em 03/04/2012 51
A partir de tais abordagens, e tendo em vista a relevância e o material disponível ao acesso, optamos por subdividir as considerações de autores entre dois deles: Terence Love e Per Galle. Adentramos a partir de agora um pouco do pensamento de cada um destes autores. 1.2.1 Terence Love
Figura 1: panorama cronológico do desenvolvimento da Filosofia do Design
Fonte: Articulação Simbólica: uma abordagem junguiana aplicada à Filosofia do Design (BECCARI, 2012, p. 107).
Começamos pelo autor que talvez possa ser considerado o mais relevante deste grupo, sendo justamente quem propôs, num primeiro momento, a Filosofia do Design. Terence Love é um designer, professor e pesquisador envolvido com a área desde a década de 1970. Love envolve-se de maneira multidisciplinar na pesquisa em design, tratando de diversos campos dentro da área, além de ser especialista em “análise e otimização de complexos sistemas socio-técnicos, otimização de processos de design, design de sistemas de informação e websites, simulação e modelagem, pesquisa de complexos ambientes técnicos e sociais”24. Love (2000) propõe um método meta-teórico para analisar e validar uma teoria do design, dizendo que “se considerarmos a ‘teoria do design’ como um artefato a ser
24 Informações disponíveis em http://www.isepp.org/Pages/08-09%20 Pages/Love08.html - acesso em 05/05/2012 52
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projetado, esse artigo se encaixa na etapa do processo de design chamada frequentemente de ‘análise do problema’” (LOVE, 2000, p. 293) 25. O autor aborda que, a partir de tal método, pode-se chegar a uma solução para o problema que detecta, quando diz que há uma confusão, fusão e multiplicidade de teorias de design que confunde a área (LOVE, 2000, p. 294). Outra contribuição do autor é a diferenciação entre Philosophy of Design e design philosophy26, quando diz que a primeira seria a disciplina equivalente a outras como Filosofia da Ciência e Filosofia da Tecnologia, enquanto a segunda é mais associada ao estudo filosófico do método de design; Love continua dizendo que questões apropriadas à Filosofia do Design são, por exemplo, “O que, em geral, é design?”, “Quais são as características de uma teoria de design válida?”, “Qual é a característica de uma teoria de objetos sendo projetados?”, “Como um conceito teórico de design pode ter testada sua coerência com outros conceitos?”, “Uma teoria dos objetos deve ser parte da teoria do design?” (LOVE, 2000, p. 293). 25 A fim de otimizar a leitura, todas as citações de obras em língua estrangeira foram livremente traduzidas para este trabalho. 26 Nesse caso, foi mantida a língua original, por conta de que uma tradução forçada possivelmente fosse distorcer os conceitos apresentados. Beccari (2012), ao se deparar com tais termos, apropriou-se de uma tradução livre, transformando Philosophy of Design em Filosofia do Design e Design Philosophy em Filosofia Projetual. 54
O autor diz que a análise crítica é o que provém as ferramentas básicas para a compreensão da teoria em design, pois seu propósito é entender os relacionamentos entre conceitos e teorias individuais (LOVE, 2000, p. 295). Porém, na medida em que os termos e direcionamentos das teorias em design divergem, causando a confusão já citada na área, Love propõe o método meta-teórico, sendo ele uma abstração da já abstrata teoria do design:
Figura 2: Estrutura meta-teórica para a teoria do design
Fonte: Articulação Simbólica: uma abordagem junguiana aplicada à Filosofia do Design (BECCARI, 2012, p. 92).
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Numa breve explicação a respeito de cada um dos dez itens vistos na imagem, percebe-se (LOVE, 2000, p. 301-302): (1) Percepção Direta de Realidades é o nível em que “sentamos em cadeiras”, “assistimos o pôr-do-sol”, “ouvimos o canto de um pássaro”, ou seja, o marceneiro sente o movimento do martelo enquanto o prego é martelado; (2) Descrição dos Objetos é o nível que engloba simples descrições de objetos, processos e sistemas, como “uma máquina de lavar”, “uma base de dados” – o marceneiro usa um martelo em vez de um cinzel;
(3) Comportamento dos Elementos é o nível no qual se incorpora o comportamento de objetos, processos e sistemas em sua descrição, como “a melodia retorna para a tônica”, “o martelo é feito de duas partes: a cabeça e o cabo – o correto ângulo entre o cabo e a face da cabeça do martelo é necessário para os pregos serem corretamente pregados”; (4) Mecanismos de Escolha é o nível de descrições sobre a maneira com que as escolhas são feitas entre diferentes objetos, processos ou sistemas e como as soluções são atingidas, por exemplo, “por quê o marceneiro escolhe um martelo em vez de uma marreta para martelar um pequeno prego?”; 56
(5) Métodos de Design é o nível no qual teorias e propostas para métodos e técnicas em design são descritos, como as teorias sobre projetar artefatos de madeira, em “como alguém projeta uma cadeira?”; (6) Estrutura de Processos de Design é o nível que inclui as teorias sobre a subjacente estrutura do processo de design e as influências de domínio, cultura e tipo de artefato e outros atributos e circunstâncias similares, como, por exemplo, “quais são os processos subjacentes ao design de catamarãs polinésios?”;
(7) Teorias sobre Processos Internos dos Designers e Colaborações é um nível que inclui as descrições de teorias sobre as razões e cognição de designers individuais, sobre negociação em design em grupos de design colaborativo, e sobre efeitos culturais do design na produção dos designers, por exemplo, “como a Mackintosh projeta mobiliário?”; (8) Teorias Gerais do Design é o nível concernente aos detalhes dessas teorias gerais que buscam descrever a atividade de projetar e sua relação com os objetos envolvidos, como, por exemplo, “a atividade de projetar um barco, uma turbina, ou uma história em quadrinhos, pode ser descrita a seguir...”;
(9) Epistemologia da Teoria do Design e da Teoria dos Objetos é o nível que contém as análises e discussões a respeito do 57
estudo crítico da natureza, fundamentos, limites e critérios ou validade do conhecimento em design, por exemplo, “o que é uma teoria do design?”, “o que ela inclui e exclui?”, “em que suposições essa teoria se baseia?”;
(10) por fim, Ontologia do Design é o estudo filosófico das bases ontológicas para a teoria do design e da atividade de projetar. É nesse nível que os valores humanos e os valores das suposições fundamentais dos pesquisadores são inclusos na crítica da teoria, como em “Os métodos de avaliação utilizados para fazer escolhas entre diferentes alternativas de design são consistentes com as proscrições éticas dos órgãos profissionais?”, “o que é a realidade?”, “o que é a existência?”. 1.2.2 Per Galle Per Galle é um pesquisador e professor dinamarquês envolvido nos cursos básico e avançado de design – teoria e método – na Royal Danish Academy of Arts, tendo como ênfase particular as relações entre teoria e prática, focando nos problemas da pesquisa em design, tendo como uma questão “Em qual base filosófica pode ser construída uma fundacional e instrumental teoria do design?”27.
27 Disponível em http://re-ad.dk/dkds/en/persons/per-galle(399c066fe561-4e6b-b9a3-6a35283886b5).html – acesso em 06/05/2012 58
Galle (2002), em Philosophy of design: an editorial introduction, procurando responder a pergunta “O que é filosofia do design?”, diz num primeiro momento apenas que “a filosofia do design é aquilo que os filósofos do design fazem” (GALLE, 2002, p. 212). Galle afirma que a filosofia do design possui a característica essencial de ser multidisciplinar, baseada nas múltiplas bases teóricas dos autores que compuseram o corpo do periódico, especialmente destinado à área (GALLE, 2002, p. 212). O autor ainda faz um apanhado dos temas mais recorrentemente tratados dentro da filosofia do design no periódico: conceituações em design; metodologia do design; critérios de qualidade em design; a fenomenologia no design; designers preenchendo as lacunas entre função e estrutura de um artefato; negociação e persuasão em design colaborativo; quebras de paradigmas e história do design thinking; e, por fim, meta-teoria do design (GALLE, 2002, p. 212-215). Abordando o uso da filosofia do design, Galle diz que ao concordarmos em ver o insight como um fim em si mesmo, tal utilidade se torna óbvia, sendo simplesmente por oferecer-nos insights a respeito da área do design os quais não conseguiríamos obter de outra maneira a não ser através deste pensamento filosófico. Sendo assim, sugere, como uma razão de ser, que “a filosofia do design serve para ajudar, 59
guiar, sugerir como o designer vem a entender o que ele está fazendo, e não simplesmente como ele vem a fazer o que está fazendo” (GALLE, 2002, p. 216).
A respeito de uma questão intrínseca à existência da filosofia do design, a dúvida sobre se o conhecimento de tal desdobramento da área pode fazer com que um designer produza projetos melhores, Galle considera que não há uma relação causal direta entre as duas coisas, porém, sugere que o insight filosófico na profissão pode tornar os designers capazes de terem um pensamento crítico bem fundado a respeito do que estão fazendo, e possivelmente proporcionar a eles um instrumental verbal e conceitual útil para se pensar em como melhorar a prática da sua profissão (GALLE, 2002, p. 216). Assim, conclui que a filosofia do design pode funcionar como um conhecimento também interessante aos estudantes das profissões ligadas ao design, como engenharia e arquitetura.
Em outro artigo, Candidate worldviews for design theory, Galle (2008) propõe, apoiado na ideia de C. S. Peirce28 28 “Considerado como um dos mais profundos e originais pensadores norte-americanos, Peirce deixou contribuições em múltiplas áreas do conhecimento: lógica, semiótica, astronomia, geodésia, matemática, teoria e história da ciência, econometria e psicologia” Disponível em http:// educacao.uol.com.br/biografias/charles-sanders-peirce.jhtm - acesso em 26/05/2012 60
de que uma teoria deve partir de bases metafísicas básicas das quais todo teórico deve estar consciente, “um método pelo qual a filosofia do design pode desenvolver sólidas bases metafísicas”, baseado em seu conceito de visões de mundo (GALLE, 2008, p. 267). Para tanto, o autor propõe uma definição de design como “a produção de um designer de representações de acordo com uma ideia com o fim de produzir um artefato que o designer reconhecerá como estando de acordo com tal ideia” (GALLE, 2002, p. 272).
Fazendo um paralelo com a estrutura meta-teórica proposta por Love, Galle pretende que seu conceito de visões de mundo seja um modelo semelhante. Fazendo uma metáfora com hardwares e softwares, ele aborda que tais estruturas meta-teóricas como a proposta por Love e como a que propõe a seguir seriam como sistemas operacionais, validando e proporcionando um correto e coerente funcionamento para os softwares, que seriam as teorias em design; tudo isso devendo, portanto, funcionar dentro do hardware, ou seja, a própria realidade (GALLE, 2002, p. 273).
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Marconi e Lakatos (1992) definem a pesquisa como um procedimento formal com um método reflexivo de pensamento que requer um tratamento científico, constituindo num caminho para se conhecer a realidade o descobrir verdades parciais. A seguir, diz-se que toda pesquisa implica levantamentos de dados de diversas fontes, independentemente dos métodos e técnicas utilizados, dividindo em dois os processos de obtenção de dados: documentação direta e documentação indireta (MARCONI; LAKATOS, 1992, p. 43).
2. Opções teórico-metodológicas
O presente projeto, então, se adequa à categoria de documentação indireta, na medida em que possui como base do estudo a pesquisa documental (de fontes primárias) e a pesquisa bibliográfica (de fontes secundárias). As fontes primárias constituem-se de documentos de primeira mão, provenientes dos próprios órgãos que realizaram as observações; já as fontes secundárias consistem no levantamento de toda a bibliografia já publicada nas mais diversas formas escritas – livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita –, e sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto (MARCONI; LAKATOS, 1992, p. 4344). Sendo assim, podemos definir a pesquisa como sendo de caráter qualitativo – por não basear-se em levantamento 63
quantitativo de dados – e como uma investigação de cunho estritamente teórico.
Nossa pesquisa trata então de um mapeamento do campo do design, a partir de alguns recortes específicos. A intenção é investigar no corpus de pesquisa (1) se é possível perceber a presença de interdisciplinaridades nas investigações; (2) quais são as interdisciplinaridades, ou seja, de que campos são os principais autores utilizados e (3) se existe um direcionamento destes textos em contextualizar os autores com a prática projetual do design e, caso sejam evidentes tais esforços, de que maneira isso está sendo realizado. Cabe esclarecer que, como uma monografia tratase “de um estudo sobre um tema específico e particular” (MARCONI; LAKATOS, 1992, p. 151), pretendemos não fazer um amplo levantamento bibliográfico na área do design, mas sim escolher recortes que estejam inseridos no tema da pesquisa. O recorte, e por consequência o corpus, da pesquisa se configura, então, a partir de duas direções específicas. A primeira delas será constituída pelos Anais do Congresso Brasileiro de Desenvolvimento e Pesquisa em Design – P&D, devido a sua relevância para o contexto da pesquisa científica no Brasil, sendo, a partir de um olhar crítico, um 64
dos congressos mais representativos nesse sentido no país. Destes anais vamos extrair textos publicados em suas três últimas edições, ocorridas nos anos de 2006, 2008 e 2010. E, em uma segunda parte da observação, será feito um mapeamento dos Trabalhos de Conclusão de Curso produzidos nos cursos de Design da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) a partir de 2009 até 2011. Esta escolha tem lugar devido aos próprios TCCs dos estudantes na universidade terem sido exemplos de referência nas orientações deste trabalho para temas na área do design em cruzamento com os estudos culturais, o imaginário, a cibercultura, a filosofia, etc. A forma de mapeamento das pesquisas, nos dois locais, será feita a partir da consulta direta ao título e ao resumo de todas as publicações, em um primeiro momento, para posteriormente uma observação mais detalhada do texto completo dos trabalhos que forem considerados como parte do levantamento. Quanto aos períodos a serem analisados nas duas direções de pesquisa definidas, pensamos como um ponto de partida a proximidade com o ano de 2007, devido a ter acontecido em seu período o lançamento do já citado livro O Mundo Codificado, que trouxe para a língua portuguesa diversas das questões concernentes ao tema geral da pesquisa, em especial a recorrência do que foi classificado 65
como filósofos de design. Desta maneira, também o mapeamento se configura num contexto atual da pesquisa brasileira, sendo específico e restrito, como já fora antes determinado, e buscando atingir um âmbito local – através das monografias da UFPEL, por sua proximidade ao autor da pesquisa – e um âmbito nacional – através do P&D, congresso já citado como um dos mais representativos na pesquisa brasileira em design.
partir de uma retomada de todos os textos analisados, sendo esse o objetivo final desta pesquisa.
Portanto, para uma análise do mapeamento do campo do design a ser feito nesta pesquisa, podemos elencar o modelo de análise de texto proposto por Antônio Joaquim Severino (2000, p.87-98), o qual abrange cinco itens: análise textual, análise temática, análise interpretativa, problematização e síntese. Assim, através da análise textual adquirimos uma visão conjunta dos textos elencados; pela análise temática compreendemos e determinamos suas ideias centrais e secundárias; pela análise interpretativa situamos e interpretamos os textos a partir dos contextos da obra dos autores e de sua cultura, tanto do ponto de vista histórico como teórico, exercendo uma atitude crítica para aproximar e associar suas ideias com outras relacionadas às mesmas temáticas. Na problematização, levantamos e debatemos questões explícitas ou implícitas nos textos e; por fim, na síntese discutimos e refletimos posições tomadas a 66
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Dadas as especificações teórico-metodológicas que norteiam esta pesquisa, partimos, então, para o que podemos chamar de parte “prática” da nossa investigação, mesmo que se configure num caráter teórico. Fazemos aqui um mapeamento dos textos selecionados nas fontes de pesquisa já citadas, a partir das nossas intenções de perceber as possíveis interdisciplinaridades encontradas, buscando os campos que são abordados e suas relações com o design e sua prática projetual. Numa perspectiva mais ampla, começamos pelos artigos do Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design (P&D), em sua ordem cronológica de 2006 até o ano de 2010, portanto três edições considerando que o evento é bienal. Além deste recorte, na perspectiva de um olhar para o local, seguimos para uma
3. Mapeamento: as interdisciplinaridades e o design no corpus de pesquisa
abordagem dos Trabalhos de Conclusão dos cursos de Design da UFPEL, a partir dos três últimos anos de trabalhos dos cursos de design gráfico e design digital. No entanto, diferente do P&D, a ordem adotada não será cronológica: o olhar será sobre trabalhos significativos para a pesquisa no período. 3.1 P&D 2006
O Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em 69
Design do ano de 2006 ocorreu na cidade de Curitiba, no Estado do Paraná, numa parceria entre as universidades UTFPR, UFPR, UNICENP, UTP e PUC-PR29. De acordo com os anais (P&D DESIGN, 2006), a marca principal do evento foi a elevação do número e a qualidade da produção científica. Do total de 1098 resumos submetidos na primeira fase do processo de revisão, foram submetidos 648 artigos na segunda fase sendo que destes foram aprovados para publicação nos anais 408 e outros 172 trabalhos foram aprovados para apresentação na forma de pôster.
Na busca nos artigos do P&D 2006, podemos dizer que encontramos alguns trabalhos que atendiam o interesse desta pesquisa. Dentre esses artigos selecionados para uma leitura mais aprofundada, podemos constatar o consumo como um dos principais temas, sendo abordado e tangenciado através de algumas ideias como posse, sociedade de consumo, consumo e sustentabilidade, cultura material e consumo de luxo. Outros conceitos vistos no corpus foram, por exemplo, alguns já presentes na revisão teórica desse trabalho, como as noções de imagem, imaginação, sujeito e objeto, mesmo que não necessariamente embasados nos mesmos autores. 29 Informações disponíveis em http://www.design.ufpr.br/ped2006 acesso em 15/06/h 70
No trabalho Desejo de posse, objeto de posse: as relações de consumo no design de moda, de Denise Portinari e Luciana Freitas, vemos uma abordagem advinda da sociologia, considerada como multidisciplinar pelas autoras, onde se busca a partir de autores de origens variadas, como a psicologia, a sociologia e o marketing, “uma compreensão sobre a prática do consumo de objetos que possa ser aplicável ao campo do design de moda” (FREITAS; PORTINARI, 2006, p. 3)30. Assim, é trilhado um caminho a partir de diversos autores, numa trajetória histórica da moda e, de forma interligada, das práticas de consumo. Veem-se então algumas ideias que se destacam como a questão das motivações do consumo na contemporaneidade. Vemos o status como um desses principais fatores, sendo uma emulação, um fazer-parecer o estilo de vida ideal, remetendo, “nos autores pesquisados, às questões da padronização versus individualização, da regra versus liberdade de escolha” (FREITAS; PORTINARI, 2006, p. 3). Dessa maneira, considera-se uma estetização da vida cotidiana, sendo as imagens suscitadoras dos sonhos do consumidor, tendo nos meios de comunicação a tradução de objetos em objetos de desejo através do design e da 30 Não tivemos acesso aos anais do evento em sua publicação integral, então numeramos as páginas a partir da organização interna dos artigos. Neste caso, por exemplo, destacamos um trecho na página 3 de 12 do artigo. 71
publicidade. Coloca-se os aspectos simbólicos e os conteúdos imaginários como os valores que agregam transcendência aos objetos consumidos ou desejados; dá-se o exemplo do vestuário, onde o valor simbólico e imaginário, através de códigos que regem as atitudes e opções de consumo, superam questões ditas como de usabilidade, que seriam mais relacionadas à função. Nessa via estética, o consumo é utilizado mais para cultuar a si do que para ofuscar o outro, e, sendo assim, os objetos da moda – e aqui poderiam ser ditos como os objetos de design em geral – devem evocar o prazer, o conforto e a beleza, tornando-se objetos não só de distinção social, mas mais de distinção estética e individual. Trata-se então da determinação de Gilles Lipovetsky (1989), presente na obra O Império do Efêmero31, para a moda, sendo operada nas articulações da efemeridade – necessidade da obsolescência das tendências, feitas para serem imediatamente substituídas por outras –, da sedução – que alia o hedonismo ao imaginário – e da distinção, sendo esta descrita como ambivalente, já que se vê um desejo vigente de apropriação das mais diversas
31 Em termos de mapeamento teórico, iremos fazer referências às opções teóricas a partir do texto original utilizado nas pesquisas, tendo em vista que um dos objetivos centrais da investigação é justamente o de identificar essas teorias. 72
aparências, e mesmo quando se valoriza um estilo ou classe em especial, faz-se de forma superficial e mutável. Podemos destacar também a utilização do conceito de habitus, de Pierre Bourdieu (1974), para designar o novo conjunto de preferências da classe dominante, que sugere um prazer estético na experiência superficial das intensidades, e na falta de procura por significados no duradouro. Outro autor a ser levantado na pesquisa foi Michel Maffesoli (2002), e seu conceito de tribalismo, designando a agregação de pessoas em comunidades emocionais temporárias, que unindo os ideais de seus estilos de vida criam uma cultura comum e afrontadora dos gostos das pessoas cultas. Ao fim do artigo, conclui-se esse levantamento bibliográfico como uma ênfase à importância de incorporar os diversos aspectos do consumo aos estudos de moda na contemporaneidade. Mantém-se, dessa maneira, uma posição de revisão bibliográfica; abordase o design sob um ponto de vista da moda e das práticas de consumo, num referencial teórico advindo de diversas áreas como a sociologia e psicologia.
Em outro artigo, O Design no Divã, também da autora Denise Portinari – advinda da área da Psicologia –, vemos a intenção de utilizar o campo da psicanálise para um questionamento epistemológico do design. A autora 73
define seu trabalho como o “relato de um encontro, [...] o relato de algumas reflexões derivadas de uma experiência de encontro entre esses dois campos aparentemente tão distantes entre si” (PORTINARI, 2006, p. 3). Percebemos também que a intenção da autora em buscar conexões entre psicanálise e design seria diferente de uma atuação clínica, mas sim uma problematização, algo assemelhado a questionamentos filosóficos. É utilizado Michel Foucault (1968), com suas proposições de que a psicanálise ocuparia uma função epistêmica, de crítica permanente em relação aos conhecimentos produzidos pelo homem. Após um levantamento do papel epistemológico da psicanálise, a autora considera alguns autores a contribuir de maneira epistemológica para o campo do design. A autora supõe que a constituição de uma epistemologia do campo do design só poderia ser entendida na acepção de epistemologia de Japiassu (1991), como um estudo metódico e reflexivo do saber de uma maneira ampla. São abordados alguns autores pertencentes ao periódico Design Studies: Terence Love (2000; 2002), e Findeli (2001). Dentre estes, já vimos alguns dos propósitos de Love, relacionados a uma sistematização meta-teórica do campo do design; Já Findeli é referenciado como um crítico às noções de arte “aplicada” ou ciência “aplicada”, questionando assim as relações estabelecidas 74
entre o design e outros campos do saber, sendo desta maneira um autor que se encaixaria na noção ampla de epistemologia dita anteriormente.
Vemos também algumas noções de Gustavo Bomfim (2005), que elucida o design como um campo que não é fundado sobre uma teoria própria, e consta como uma práxis que procura agregar princípios de diversas ciências para determinar figuras de objetos. A autora prossegue, após esse levantamento, descrevendo sua abordagem psicanalítica não como uma tentativa de constituir uma epistemologia, mas sim um estímulo a uma atividade permanente de crítica epistemológica no campo, sendo essa recomendação válida especialmente para os saberes das ciências humanas incorporados ao design. Essa postura seria adequada a uma problematização constante de generalizações e pressupostos a respeito de conceitos de nossa área, como o usuário ou o receptor. Nesta investigação, pudemos ver algumas relações com nossa pesquisa, quando é abordada a relação do design com outros saberes. A autora busca, num trabalho de levantamento bibliográfico que contribui para seus questionamentos, alguns autores das ciências humanas, propondo uma abordagem psicanalítica para questionar o design. 75
Em A importância do design nos significados da cultura material, de Kátia Faggiani e Vera Nojima, podemos perceber algumas relações de propaganda e design, focadas nos significados e componentes simbólicos cada vez mais determinantes para o consumo de luxo. Numa extensa revisão bibliográfica, as autoras introduzem diversos aspectos influenciadores do consumo na atualidade. Vemos nestes autores alguns já conhecidos em nosso trabalho, como Baudrillard (1981, 2006) e Bourdieu (1974). Dentre algumas definições no artigo, destacamos as de McCracken (2003), que considera os bens de consumo como portadores não só de características utilitárias e comerciais, mas de um significado cultural, manifestado a partir do século XX com uma intensidade sem precedentes na história. Vemos em Baudrillard (1981) que esses significados assumidos pelos produtos não se manifestam isoladamente, mas na relação de uns com os outros – assim, a sociedade assimila sua cultura através do consumo. Através de Bourdieu (1974), vê-se que o consumo não está somente sujeito aos recursos financeiros dos indivíduos, mas também às suas relações e ao contexto onde está inserido: seu estilo de vida, seu capital social.
As autoras então abordam que os bens de prestígio têm a capacidade de transportar e comunicar significado 76
cultural, sendo “carregados de poder e valores simbólicos” (FAGGIANI; NOJIMA, 2006, p. 6). Definem-se então a publicidade, o marketing, o sistema de moda e o design como os instrumentos que transferem o significado do mundo culturalmente em tornam-no inerente aos bens de consumo, deslocando-o para o objeto. Vemos nas considerações finais que o valor de cada produto depende de seu contexto na sociedade de consumo, sendo os produtos de prestígio meios de criação de identidade. Assim, o designer tem um papel de “investir aos objetos significados que não lhe são inerentes” (FAGGIANI; NOJIMA, 2006, p. 9), baseados no contexto cultural e social dentro do qual se vive. O luxo, então, é visto como desdobrável em diversos meios, porém, estará sempre em função do desenvolvimento cultural e do contexto social dos povos e dos indivíduos. Dentre as pesquisas que abordam o consumo no P&D 2006, percebemos nesta a mais extensa bibliografia. Numa abordagem do design como um agente da cultura material e um fator que configura algumas práticas de consumo, vemos autores advindos da antropologia, da sociologia e da filosofia, num caráter de revisão bibliográfica, para olhar o consumo e a cultura, com a intenção das autoras de abordar o design a partir destes olhares. Ainda falando em consumo, vemos no artigo 77
O Industrialismo e a Sociedade de Consumo Industrial. Um panorama fragmentar nessas terras brasileiras uma perspectiva antropológica com um foco também voltado à história. Segundo o autor Ronaldo Corrêa, a pretensão é “disponibilizar aos pesquisadores do campo do design industrial, uma interpretação, também fragmentários, sobre os motivos e/ou motivações que proporcionaram a demanda de designs por parte da sociedade nacional” (CORRÊA, 2006, p. 2). Desde uma abordagem das origens da cultura material brasileira, advindas do artesanato indígena segundo Niemeyer (2000), até a modernidade no país. Vemos novamente a contribuição de Baudrillard (1981), e também de Rafael Cardoso (1998), ao abordar que o design deve rechear os projetos de significados que reforcem a tese de que este seja o melhor dos mundos. A partir de seu panorama da modernidade brasileira, o autor evidencia “uma sociedade impregnada de desejos e impulsos ao consumo, altamente fetichista em relação aos produtos da cultura material industrial” (CORRÊA, 2006, p. 12). Assim, conclui esse desejo de objetos que comuniquem/simbolizem – “um sentimento de ‘modernizar-se’” (CORRÊA, 2006, p. 12) – como um elemento característico do momento em que se encontra a sociedade de consumo contemporânea. O design então, como campo, imprime marcas aos artefatos a partir 78
da intencionalidade humana. Percebemos neste artigo mais uma abordagem específica do consumo, já citado como um dos aspectos principais desta edição do Congresso P&D. Seu diferencial é o foco num panorama da modernidade nacional, num apanhado de teorias não apenas antropológicas e filosóficas, mas também históricas.
Em Sobre Relações entre Sujeitos e Objetos: a Proxemia Aplicada ao Design, Alexandra de Almeida aborda as relações entre sujeito e objeto, tempo e espaço, numa discussão da Proxemia aplicada ao campo do design. A autora cita que a Proxemia alcança o design quando a compreendemos como “o estudo das relações entre sujeito e objeto em contextos de espaço e de tempo bem definidos” (ALMEIDA, 2006, p. 2). Na medida em que o campo do design se faz por essas relações entre diferentes sujeitos e diferentes objetos, a Proxemia pode se adequar como um repertório diferente de estudo, quando compreende o objeto como portador de significados apenas quando inserido em um contexto histórica e socialmente real. Delimitam-se então, a partir de Bomfim (2001), quatro níveis para analisar estas relações entre necessidades do usuário e funções do produto: análise objetiva – investigando a função prática, que predomina sobre a forma; análise bio-fisiológica – busca também padrões antropométricos e bio-mecânicos 79
do usuário para compor a forma; análise psicológica – acrescenta a subjetividade do sujeito, questões estéticas, para compor a forma e a análise sociológica – busca também compor a forma enquanto signo no processo de comunicação, acrescentando a função simbólica ao conjunto de funções práticas e estéticas. O termo proxemia é dito como criado pelo antropólogo Edward Hall (1977), designando um conjunto de teorias e observações relativas ao comportamento do homem e de como ele faz uso do espaço no contexto da cultura. Os estudos relacionados às análises proxêmicas são ditos pelo autor como derivados da história social, da estética e da psicologia. Vemos nesta pesquisa mais um possível olhar para o campo do design. O autor constrói uma revisão bibliográfica galgada principalmente na antropologia, por meio de Hall e, além de Bomfim, inserido no campo do design, percebemos algumas perspectivas etimológicas e estéticas.
Ainda no P&D 2006, vemos alguns outros artigos com abordagens relacionadas à cultura material e consumo. Nesse sentido, podemos citar Reflexão sobre o sistema de significações: do moderno ao contemporâneo, de Teresa Riccetti, que trata das relações de sujeitos com sua moradia e seus objetos domésticos numa perspectiva que perpassa 80
a modernidade até a contemporaneidade, dentro de um viés sociológico e antropológico, no qual vemos novamente a presença de Baudrillard (2006). Também destacamos O consumo (in)sustentável: Uma reflexão no campo do Design, de Leila Queiroz e Denise Portinari – sendo esta autora de três artigos destacados –, é uma investigação que aborda o consumo e o design dentro de algumas perspectivas sociológicas e psicológicas, na qual vemos novamente os autores Baudrillard (1981) e Bourdieu (2001). Também se destaca a abordagem de Freud (2002), sendo esse um dos principais referenciais teóricos do artigo. 3.2 P&D 2008 O Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design do ano de 2008 ocorreu na cidade de São Paulo, sediado no Centro Universitário Senac e promovido pela AEND|Brasil – Associação de Ensino/Pesquisa em Design no Brasil. De acordo com os anais do evento (FARIAS; PFUTZENREUTER; TORI, 2008), o P&D possui uma temática abrangente que congrega pesquisadores das mais diversas especialidades, contribuindo de forma decisiva para o avanço do conhecimento no campo, influenciando o ensino, 81
a pesquisa e a prática do design. O evento reuniu um total de 548 trabalhos, sendo 240 artigos completos, 236 artigos resumidos e 72 artigos de iniciação científica, de autores filiados a instituições de 10 países diferentes.
Dentro de nossa investigação no P&D 2008, encontramos ainda o consumo como um dos temas recorrentes, porém, com menos predominância. Percebemos aqui uma maior abertura para abordagens filosóficas, epistemológicas e derivadas dos estudos culturais, onde pudemos identificar algumas possíveis palavras-chave a serem relacionadas ao design, como multiculturalismo, fenomenologia, identidade e epistemologia. Elencamos a seguir alguns artigos que podem representar esse corpus. Vemos novamente o consumo em discussão no artigo Consumo e estilos de vida: reflexões sobre a representação simbólica dos móveis artesanais, de Mariuze Mendes. A abordagem advinda dos estudos culturais, da sociologia e da antropologia nos mostra alguns autores já identificados como recorrentes nestas pesquisas, como Baudrillard (1995) e Bourdieu (2007). Dentre alguns outros autores, vemos Stuart Hall (2003) e Mike Featherstone (1995). Estes já haviam sido citados em alguns dos trabalhos anteriores, porém, percebemos aqui mais intensamente seus conceitos. 82
Com o objetivo de refletir sobre o processo de reconceituação do móvel artesanal em meio a novos estilos de vida e analisar o papel dos designers, arquitetos e mídia – mediadores na transformação do significado destes artefatos –, a autora deixou clara a sua intenção de refletir nesse sentido partindo para uma questão referente a como os mecanismos da moda e gosto podem significar, ressignificar e valorizar o móvel artesanal em ambientes para consumidores desejosos de um contato simbólico com o meio-ambiente, mediado pelos móveis e objetos artesanais que remetem à natureza e sustentabilidade. Segue-se um levantamento teórico, onde se buscam entendimentos sobre cultura, consumo e estilos de vida. A autora aborda as definições de Karl Marx (1998) de valor-de-uso – capacidade de alguma coisa de ser útil para satisfazer necessidades humanas, sendo próprio da materialidade; e valor-de-troca – sendo abstrato e fetichizado, somente realizado através do consumo, mediado pelas mercadorias enquanto objetos úteis. Essa fetichização das mercadorias é dita como aproximada da ideia de mitologização de Roland Barthes (2003), que aponta uma linguagem mercadológica dos objetos a ser desvendada. Dentre os autores já citados, Featherstone (1995) problematiza a intermediação da arte ou a estetização da cultura como dimensões integrantes dos bens simbólicos de 83
consumo, propondo a lógica do consumo dentro da cultura pós-modernista, onde se trabalha em função dos excessos, e prazer, desejos, desordem e provocação parecem ser mais importantes do que habitus e estrutura. García Canclini (2007), já visto anteriormente nesta pesquisa, aponta Bourdieu e Baudrillard como os que acrescentaram à teoria marxista outros valores, além de uso e troca dos artefatos. Bourdieu fala de uso e troca como os valores que representam relações de força, e as significações representando as relações de sentido, sendo elas entrelaçadas. Baudrillard aponta quatro valores da sociedade: de uso, de troca, de signo e de símbolo. Assim, segundo a autora, ele acaba focando só nos significados, deixando de lado as práticas sociais quando diz que a realidade já está dissolvida na ordem do simulacro. Sendo pós-estruturalista, critica Bourdieu, estruturalista que, através dos conceitos de habitus e campo, funda suas teorias da distinção social; diz que o habitus faz as pessoas agirem de determinada forma, produzindo então estilos de vida, que se expressam por sinais distintivos ou classificatórios – os gostos, já abordados anteriormente em nossa revisão teórica. Já para Zygmunt Bauman (2001), os objetos são constituidores de práticas e de um imaginário social e 84
contribuem para a constituição de identidades sociais, não representando necessariamente status, mas sim condições de pertencimento a uma comunidade por sua mediação. Hall (2003) relativiza essas identidades, postulando que há múltiplas identidades sendo construídas e descontruídas ao longo de nossa trajetória de vida. No caminho destas conexões de autores, a autora diz que a trajetória desses móveis artesanais “vai escrevendo uma biografia relacionada ao contexto social, cultural e temporal atual” (MENDES, 2008, p. 235), sendo este um momento onde há necessidade de convívio com a natureza e retorno à tradição como forma de suportar a frieza da modernidade. Em suas considerações finais, aponta que a escolha e aquisição de bens estão ligadas a processos criativos, que aproximam os objetos e a cultura em uma relação de interdependência e interação. Define-se a investigação como uma breve e preliminar reflexão, com considerações parciais por não terem ainda sido colocadas à prova por uma etnografia do consumo – um processo de entrevistas com os ditos mediadores, pretendido pela autora. Em Multiculturalismo: a diferença como chave para um design híbrido no Brasil, de Tatiana Roizenbruch, discutese possíveis saídas da massificação cultural dos dias atuais para atividades artísticas e tecnológicas como o design. 85
Percebemos aqui Hall (2005) como o autor mais relevante na investigação. A autora usa também Cardoso (2004), quando este aborda a pós-modernidade, dizendo que talvez pela primeira vez desde a industrialização, a sociedade ocidental esteja se dispondo a conviver com a complexidade em vez de combatê-la. Hall considera as nações modernas como híbridos culturais, sendo o pluralismo, a abertura para posturas novas e a tolerância para posições divergentes marcas registradas da pós-modernidade. A autora faz um panorama do design brasileiro, propondo uma mudança do design mimético – de imitação europeia – das décadas de 60-90 para um design múltiplo e próprio da pósmodernidade. O dito multiculturalismo seria o “jogo das diferenças, quando diversos elementos culturais se juntam dentro de um mesmo espaço, forjando as características de uma sociedade” (ROIZENBRUCH, 2008, p. 3174); Andrea Semprini (1999) enfatiza a diferença como um dos pontoschave do multiculturalismo, podendo este ser analisado como um sintoma, um indicador de uma mudança social importante. Numa segunda interpretação, ainda aborda sua dimensão cultural, apontando grupos que se juntam não necessariamente por uma base étnica, mas por valores comuns, estilos de vida homogêneos, sentimentos de pertencimento coletivos. 86
Assim, a autora postula que o design dentro dessa cultura múltipla só se torna possível com o equilíbrio e a união dos seus diferentes elementos. Prossegue então comentando que o design acaba podendo capturar diversas possibilidades em meio a essa hibridização cultural, podendo resgatar a cultura nacional, olhar para seu interior, para as diferenças, que constituiriam um design local, favorecedor da cultura de seu país. Vemos uma visão otimista da autora, quando diz que o design no Brasil, com as influências da pós-modernidade, começa a se afastar dos modelos europeus, racionalistas e funcionalistas, para tornar-se mais livre, expressivo, com sua identidade múltipla. Desta maneira concluímos um olhar sobre este artigo, formado por uma revisão bibliográfica e voltado principalmente aos estudos culturais.
Vemos uma abordagem ainda não encontrada nos artigos anteriormente citados em Design e fenomenologia: pensando o método por meio de uma leitura sobre experiência, vivência e intuição, de Rodrigo Santos. Segundo o resumo, o artigo ilustra e enfatiza a fenomenologia como base filosófica de um possível método projetual em design. O autor aborda em sua introdução que “A dedicação à teoria do design significa ocupar-se também das noções que sirvam de suporte ao proceder metodológico ou ao conceito criador, enfim, 87
implica em ocupar-se de filosofia” (SANTOS, 2008, p. 4247). Faz então um panorama breve das bases metodológicas no design ao longo da história, para prosseguir à fenomenologia. Segundo o autor, a fenomenologia estuda as essências, sendo todos os problemas resumidos na definição de essências. Assim, faz-nos indagar “o que é a coisa?” em vez de afirmar “o que a coisa é”; repõe as essências na existência e compreende o homem como um ser-no-mundo, considerando o homem e o mundo como um no outro. O autor utiliza as definições de Maurice Merleau-Ponty (1999), quando este coloca que o ser humano sabe no mundo a partir de uma visão sua ou de uma experiência do mundo sem a qual os símbolos da ciência não poderiam dizer nada, ou seja, todo o universo da ciência é construído sobre o mundo vivido, e se quiser pensar a própria ciência, deve-se antes despertar a experiência do mundo da qual ela é expressão segunda. Dessa forma, deduz-se que se o homem e o mundo são um no outro, ambos se relacionam através de mediadores, ou seja, os objetos. O autor propõe então que podemos considerar a metodologia como base filosófica de um possível método que visa a percepção de um objeto na sua globalidade, como ele se apresenta fisicamente à consciência. Juntamente, propõese um método intuitivo, onde se substitui a resolução de 88
exigências funcionais pela expressão pessoal, originada da criatividade de cada indivíduo, destacando a importância de sua vivência, da sua experiência de vida em olhar as coisas em sua essência. Assim, conclui um projetar pela indagação, como uma atitude fenomenológica, que pretende ir às essências das coisas, com questões como: “Como o usuário vê o produto? O que é o usuário? O que é ver o produto? O que é projetar? O que é satisfazer? O que é necessidade? O que é ser humano?” (SANTOS, 2008, p. 4249). Dessa maneira, vemos neste artigo a primeira aproximação mais intencionada de um trabalho em nosso corpusà prática projetual, numa proposição, ainda que teórica, de um método com bases filosóficas. No artigo Identidade e Alteridade no Design Latinoamericano, de autoria de uma professora da UFPEL, a pesquisadora Lúcia Weymar, vemos novamente um foco dos estudos culturais, apoiado em autores como Hall (2003, 2005) e Bauman (2005). A investigação se foca na América Latina, e abrange algumas áreas diversas, sendo a pedagogia do design tida como a área onde mais se encaixa. A autora faz um paralelo entre as semelhanças das concepções de identidade por Hall e Bauman, focando o recorte de sua pesquisa na identidade compreendida como algo a ser inventado, e não algo a ser descoberto – a que integra 89
ambos os autores. Assim, são tratados alguns dos princípios documentados por uma comissão de professores latinoamericanos para o II Encuentro Latinoamericano de Diseño32. Após a apresentação desses princípios, a autora busca em Hall e Bauman alguns conceitos de identidade que possam ser levantados para discutir o documento. Bauman (2005) diz que as identidades fixas não funcionam mais atualmente, onde as batalhas de identidade dividem e unem ao mesmo tempo, sem ser possível incluir sem segregar, excluir. A autora propõe que o documento não se configura como um discurso que possa produzir novas identidades em design a partir da crise das antigas, dada pela fragmentação e descentramento de seus sujeitos – conceitos de Hall (2005) – e assim, diz que o documento parece estar escavando o passado.
A seguir, a autora propõe a ideia de alteridade como um suplemento dos significados de identidade, sendo uma expressão que remete à qualidade do que é outro e que não se torna doutrinante, trazendo à tona uma teoria mais aberta e mais suscetível à mudança, ao provisório e às identificações sucessivas propostas por Michel Maffesoli. Dessa maneira, diferencia os designs moderno e pós-moderno, na medida 32 Encontro de design que ocorre anualmente na Argentina. Mais informações em http://fido.palermo.edu/servicios_dyc/encuentro2010/ - acesso em 18/06/2012 90
em que estes provêm de identificações mais fragmentadas, enquanto aqueles resultam de identificações fixadas em um eu autoral centrado. As codificações dos projetos da pósmodernidade, então, consideram as diferenças profundas que nos constituem culturalmente e a presença do outro que também nos forma e estrutura: “São designs que se pluralizam, que apelam ao racional e ao emocional, ao saber e ao prazer, aos distintos pólos sem dualizá-los. São designs que incluem e também excluem, que sustentam projetos políticos bem como os ignoram” (WEYMAR, 2008, p. 124). A autora então fala de Hall, que chama de identidades os posicionamentos e identificações sedimentados durante nossa vida; para Maffesoli, isso é chamado de estilo; para Weymar, é a alteridade, já que nosso posicionamento em relação ao design será sempre resultado de interlocuções e da presença do outro; sendo assim, conclui que nossos designs só são autorais na medida em que dialógicos. Assim, vemos nesse artigo uma abordagem do design a partir dos estudos culturais, que permitem a proposição, em meio a um levantamento bibliográfico, de alguns conceitos relacionados a identidade e aos discursos do design, procurando dessa maneira olhar principalmente para a América Latina. Dentre outros trabalhos encontrados no P&D 91
2008, podemos citar um diálogo entre técnica e filosofia, A produção de design e suas relações com as imagens técnicas, de Fabrizio Poltronieri. Essencialmente ligado à produção de Flusser, já visto nesta pesquisa, o autor faz algumas reflexões a respeito do modo de produção do design contemporâneo buscando, num levantamento bibliográfico, alguns outros autores para contribuir às hipóteses flusserianas. Em Design e Resignificação do Imaginário no Jogo, de Adriana Sato, vemos um levantamento bibliográfico para pensar a imaginação como resultada das interpretações humanas do seu universo simbólico e a ressignificação que o design propõe quando elabora novos projetos de jogos como sistemas simbólicos. Vemos aqui alguns autores já conhecidos, como Giulio Argan (1993, 2000), Gustavo Bomfim (1997) e Rafael Cardoso (1998). Em Limites e relações do campo do design, de Gabriela Mager e Alberto Cipiniuk, vemos algumas relações de delimitação do campo do design a partir das teorias sociais de Bourdieu (1974), acrescentando nesse sentido algumas noções de hierarquia ao campo do design. No trabalho Epistemologia e Superfícies Projetadas, Sérgio Sudsilowsky se propõe a fazer uma análise epistemológica das superfícies projetadas, partindo de alguns conceitos de Foucault (1985), como o de arqueologia, e outros autores que irão lhe proporcionar bases para reflexões filosóficas e algumas 92
ideias de etimologia. 3.3 P&D 2010 O Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design do ano de 2010 teve lugar na cidade de São Paulo, sediado na Universidade Anhembi Morumbi. De acordo com os anais do evento (SILVA; ZUANON, 2010, p. 2), o P&D 2010 ganhou ainda mais relevância após a divulgação de mudanças no panorama da pós-graduação stricto sensu no país, tendo crescido o número de cursos de doutorado e mestrado em design. O evento reuniu um total de 529 apresentações de artigos listadas na programação.
Em nossa investigação aos artigos do P&D 2010, percebemos aqui já uma diferença considerável quanto aos outros P&Ds; verificamos uma ocorrência muito maior de trabalhos que se propõem abordagens filosóficas do design, com pouco material relacionado ao consumo, tão abordado em 2006 e também adentrado em 2008, mesmo que em menor escala. Aqui, vemos uma profusão de textos com revisões de Flusser e de algumas intenções epistemológicas; algumas das palavras que poderiam ser destacadas como caracterizadoras deste recorte são realidade e subjetividade, 93
imaginação, epistemologia e investigações filosóficas.
Em Da sombra projetada ou sobre o caráter tenebroso do design, de Raphael Dall’Anese, pudemos perceber a abordagem de um método dialético e um estudo etimológico, baseado nas ideias de Vilém Flusser. A pesquisa parte da premissa de que o design está conseguindo alcançar seu propósito último de projetar programas, automatizando nosso aspecto individual. Nossa atividade tem por finalidade enganar, iludir e refletir a realidade através de produtos feitos para trair os homens a contemplar ideias projetadas. Dall’Anese procura examinar alguns problemas contemporâneos e implicações culturais do caráter tenebroso do design. Interessando-se pelos aspectos programáticos e reflexivos da área, buscam-se as noções de projeto, programa e reflexo. O autor faz alguns percursos etimológicos para esclarecer tais termos; chega-se num vislumbre de programa como um termo que “pode representar simbolicamente o fenômeno paradoxal de avançar a favor do sujeitamento; caminhar na direção do padecimento passivo” (DALL’ANESE, 2010, p. 17), concluindo a nossa situação cultural de existência de funcionários programados como rumando a favor do cultivo de estruturas mecânicas e inerciais, pneumáticas e entrópicas. Já o termo projeto é sugerido como tudo aquilo 94
pelo qual o sujeito tende a modificar a si e o que o rodeia numa incerta direção, com uma incerta definição. O ato de lançar-se, derivado da própria etimologia da palavra, poderia justamente propor um jogar-se para fora do programa, abertamente ao incerto e indefinido, tendo por meta a sombra invertida, ou o espelho: o reflexo. Caracterizado pela oposição entre projeto e programa, e transitando entre as palavras espelho e sombra, o reflexo assumiria uma função estética, simbólica, de enganador malicioso, um espaço de passagens para realidades imaginárias, opondo-se aos limites reais, possibilitando pensamento e reflexão.
O autor então utiliza a noção do termo vortex como uma possibilidade para definir a oposição entre projeto e programa, sendo o movimento de vórtice o de espirais ao redor de um centro de rotação, surgido a partir de uma tensão inicial, e inicialmente tendo um propósito de equilibrá-la. Propõe dois movimentos como exemplos, sendo o primeiro o das espirais para o centro, definindo o rumo de todas as coisas, concentrando seus interesses focados na emergência de novos centros emissores, em energia e poder. O segundo exemplo é o movimento inverso, do centro para os limites, indo na direção oposta ao movimento natural e devorador do aparelho, buscando novos limites. O autor faz 95
essas considerações percebendo a relação difícil da mente com a sombra, sendo dificultada pela nossa percepção e sentidos. Desse ponto, aborda que devemos organizar e tentar distinguir entre o uso automático e o uso consciente dessas sombras, que requer uma noção delas; diz dessa afirmação – ou inversão – como baseada em Flusser (2002), quando este diz que a filosofia da fotografia urge para uma conscientização da práxis fotográfica, necessária para podemos captar as aberturas para a liberdade na vida dos funcionários dos aparelhos. Assim, o autor baseia seu estudo numa abordagem filosófica com estudos etimológicos, tendo como única bibliografia a obra de Flusser. Pensamos como um possível acréscimo para tais noções a utilização de noções semelhantes de projeto e programação já vistas em Argan (1993).
O artigo Realidade e Subjetividade em Design: um paradigma subjetivo complexo, de Frederico Breslau, Olympio Pinheiro, Dorival Rossi e João Winck, busca fazer considerações a respeito do modo de produção de objetos sensíveis, tentando assim gerar novas propostas sobre a construção projetual. Percebemos aqui um viés de autores da filosofia, da comunicação e da educação. Dentre algumas reflexões, podemos destacar a abordagem do 96
mundo que sentimos como criado através de interações, sendo um infinito sensível, num infindável reagente, tendo a impermanência como única constante. Enquadra-se a noção de subjetividade em Deleuze (1996, 2000), sendo um estado criativo e efêmero, que gera estruturas constituídas de relações; um estado ativado no movimento e na sintonia entre dois atores, quando se percebem e se fundem, gerando um estado poético por um momento intenso e insustentável. Chamam-se de virtualidades – realidades existentes em potência – às questões de brincadeiras entre coisas dentro e fora do real. São elas “latentes em forma de conceitos, elucubrações, projetos, designs que formam e atualizam o universo do fora” (BRESLAU et al., 2010, p. 599). Pensando esse design como produtor através de subjetivações, trata-se de um design de relações e de um design de signos, criador de pensamentos e relações sobre todas as coisas, operando na ordem da produção de realidades. Considerando esse designer que se volte para a subjetividade para a produção de coisas, o autor pensa então numa nova configuração de realidade, aberta a subjetivações, objetos de natureza ebuliente, em trânsito. Esses objetos ditos como sensíveis seriam então criados num processo interativo, não mais passivo como o designer que 97
resolve problemas de projeto numa concepção racionalista. Usando algumas concepções do brincar como uma dessa construções sensíveis, ele é proposto como uma possível lógica de se construir objetos de design, na qual se articula signos sobrepostos sobre qualquer superfície brincando com possibilidades que parecem emergir de dentro das próprias coisas. Chega-se assim em algo como um metamétodo, que pretende segundo Rossi (2003) compreender as dinâmicas que extraem e fazem emergir estruturas com um método particular a cada objeto. Essas realidades possíveis são ditas como uma nova necessidade projetual graças a adventos modernos, como extensões de nossos próprios sentidos, a partir de Levy (1997). Diz-se do papel do designer, então, como “projetar sob um método transdisciplinar de relações e proliferação de leituras concomitantes, colapsando simultaneamente para gerar uma produção de outra ordem, sensível-reagente, agregando novas entradas de informação para gerar novos construtos” (BRESLAU et al., 2010, p. 601). Vemos então a constatação de alguns autores que o planeta se volta para a transdisciplinaridade, num processo irrefreável de sobreposição dos saberes humanos. Abordam os autores que necessitamos compreender mais profundamente as possibilidades projetuais de um designer que pode orquestrá-las em universos múltiplos e ampliar as 98
habilidades de atualização do real; essa nova configuração do real pode redefinir noções de projeto, processo e produto, reacendendo questões além dos questionamentos metodológicos convencionais do design, chegando mesmo a uma problematização do existir. Percebemos nesse artigo um referencial teórico advindo de múltiplas áreas como as já citadas anteriormente, tendo como ponto de conexão o fato de serem pensadores que leem as realidades múltiplas abordadas. Os autores procuram, nesta investigação, propor a partir destas teorias algumas posturas para serem possivelmente tomadas como métodos de projetos e processos em design.
No trabalho A Transdisciplinaridade e o Pensamento do Design, de Claudia Facca, vemos algumas discussões semelhantes a nossa própria pesquisa, voltadas às relações entre o design e outras áreas. A autora reflete a respeito do design como um campo que pode caracterizar uma possível transdisciplinaridade, quando somado a arquitetura e a engenharia; comenta que o campo está se distanciando de uma definição inicial do Internacional Council of Societies of Industrial Design (2009), de design como uma disciplina que simplesmente elabora projetos de produtos que serão produzidos em série. Assim, baseada em Nicolescu (2003), 99
já abordado antes nesta pesquisa, diferencia abordagens multi, inter e transdisciplinares, focando nessa última como a que está entre, através e além das disciplinas. A autora questiona se o design poderia ser um hospedeiro dessa nova abordagem, estando ele atualmente ampliando seus horizontes ao absorver, na prática, profissionais com outras formações projetuais.
São descritas então algumas percepções destas passagens de conhecimentos entre algumas áreas, descrevendo algumas obras de artistas, arquitetos e designers como Leonardo da Vinci, Phillipe Starck, Le Corbusier e Irmãos Campana. A autora conecta então, em suas considerações finais, essas novas abordagens do design ao conceito de design thinking, que vê o design hoje sendo solicitado a “gerar ideias que melhor traduzam as necessidades e desejos desses consumidores” (FACCA, 2010, p. 764). Percebemos aqui alguns de nossos interesses de pesquisa, numa abordagem do design relacionando-o justamente a pontos de vista advindos de outras áreas. No artigo O Designer na Sociedade: Investigações Filosóficas, de Susana Vieira e Leo Staudt, vemos um referencial teórico advindo da filosofia, sendo este próprio trabalho um recorte de um Trabalho de Conclusão de Curso 100
da área da Filosofia, desenvolvido na Universidade Federal de Santa Catarina. Sob esse viés, trata-se do conceito de design e de suas relações com a sociedade; faz-se uma revisão bibliográfica de algumas conceituações de design, tendo elas como definindo o campo na posição de facilitação da vida humana. Sendo nenhuma das definições necessariamente correta, abordam-se os aspectos estéticos, econômicos e éticos do designer. Dentre os econômicos, vemos algumas noções de Argan (2000) e principalmente de Adorno e Horkheimer (1985), onde se sugere que o design poderia se encaixar como uma ferramenta da racionalidade técnica para a dominação, para a manutenção do caráter compulsivo da sociedade alienada de si mesma. Nesse contexto, vemos também as ideias de Pierce (1974), quando o consumidor é cidadão, o Estado é prestador de serviços, e tudo vira mercadoria e/ou objeto, até mesmo o indivíduo e a sua própria alienação. Nos aspectos éticos, os autores abordam a ação do designer na indústria cultural, sendo manipulado enquanto indivíduo, e mesmo tendo capacidade de raciocinar, refletir e distinguir o que é certo e errado, “opta por seguir um código de ética que visa à prestação de serviços” (VIEIRA; STAUDT, 2010, p. 775). O designer então exerce dois lados na 101
indústria cultural, usando tecnologias e ciências para poder desenvolver produtos que solucionam necessidades básicas dos seres humanos, mas também criando produtos apenas para manter ativo o mercado e aumentar assim desigualdades sociais. Fazem-se assim necessárias uma razão e consciência do ato irracional e manipulado, para propiciar ao ser humano imerso na indústria cultural a reflexão e a crítica acerca da sua realidade. Desta forma, em suas considerações finais os autores encerram comentando que suas reflexões não pretendem determinar ações ou acusar alguém pela falta de esclarecimento dos indivíduos, mas sim permitir autoreflexão, encorajamento e diferentes leituras das coisas, que são apontadas como necessárias, e talvez sejam ainda mais cruciais aos designers. Percebemos aqui uma abordagem
do design advinda da filosofia, tanto pelo referencial teórico abordado quanto pela área dos autores. No trabalho “Tudo o que não invento é falso”: por uma epistemologia da imaginação criadora no design, de Paulo Reyes, percebemos o foco no conceito de imagem, advindo de um referencial teórico de Bachelard (2007) e seus conceitos de imaginação e tempo descontínuo. O autor configura algumas críticas ao modelo positivista racionalista de design, comentando a posição de alguns teóricos sociais 102
sobre um estágio da contemporaneidade que aponta para uma sociedade mais fluida; assim deveriam ser também os processos de design, mais flexíveis, que deem conta da dinamicidade e da imaterialidade. Busca-se então uma flexibilização na abordagem metodológica, apostando na dimensão da criação, que justamente não é linear. “Se o modelo positivista teve supremacia por quase todo século XX, hoje se enfrenta um desafio de pensar o design por diversas perspectivas” (REYES, 2010, p. 2165), diz o autor, completando que pretende uma trajetória epistemológica que dê conta da dimensão criativa do design, com a intenção de verticalizar o pensamento na área, porém, longe de acreditar em um único caminho. Através da fenomenologia da imaginação de Bachelard, no rompimento da dicotomia sujeito-objeto, propõe-se um modelo fenomenológico da imagem; o teórico propõe a realidade como resultado de uma criação, um artefato intelectual, uma problemática sobre o real, aproximada e provisória sendo que teorias e métodos são abertos a retificações. Baseado nestas e em algumas outras premissas, busca a construção de um método projetual, numa inspiração bachelardiana que mostra a imaginação como construção criativa, a imagem como operadora da 103
realidade. Nomeia-se esse resultado “como modelo dinâmico e sistêmico do método de design estratégico aplicado ao território” (REYES, 2010, p. 2172). Vemos neste trabalho uma busca pela aplicação imediata de uma abordagem filosófica, advinda da fenomenologia e da epistemologia, à prática projetual do designer, através da proposição de um método projetual estruturado justamente para permitir uma perspectiva aberta e flexível do processo do projeto.
Dentre alguns outros artigos do P&D 2010 que podem ser considerados pertinentes para nosso mapeamento, podemos citar alguns nomes dentro de algumas temáticas: representando o consumo, temática pouco recorrente nesta edição do congresso, vemos Design, produção e consumo no contemporâneo: notas para uma investigação. Percebemos também uma representatividade em relação a questões epistemológicas no design, vistas com Bomfim (1997) como destaque, em Interação Entre Teoria e Práxis por Meio dos Métodos Projetuais, uma Hipótese para uma Teoria do Design e também em Perspectiva para uma Epistemologia do Design: a abordagem de um design para a sustentabilidade como manifestação paradigmática. Outra área que pudemos notar como recorrente foi a da filosofia, representada por três artigos: primeiramente, num viés fenomenológico, vimos O 104
Design e a Apropriação da Hermenêutica como Metodologia Projetual. Além deste, vimos mais dois trabalhos que se baseiam de maneira predominante na obra de Flusser: Reflexões sobre a filosofia de Vilém Flusser e possíveis inspirações de seu trabalho para pesquisas voltadas ao design e a emoção; e também Ferramentas, Máquinas e Aparelhos. Designer Gráfico & Indústria Gráfica.
3.4 O Congresso P&D e a interdisciplinaridade no design Ao fim de uma observação dos P&Ds, percebemos algumas temáticas destacadas ao longo das três edições analisadas. Em 2006, víamos o consumo e abordagens advindas da antropologia e sociologia como predominantes nos textos selecionados para nossa pesquisa. Em 2008, percebemos o que poderíamos observar como certa transição temática entre 2006 e 2010, com ainda algumas abordagens de consumo advindas da sociologia e antropologia, mas também com alguma recorrência de abordagens advindas dos estudos culturais, da filosofia e algumas voltadas à epistemologia. Já em 2010, vemos uma predominância de abordagens filosóficas, sendo já recorrentes abordagens de Flusser, talvez 105
corroborando com nossa observação inicial a partir do ano de lançamento do seu livro O Mundo Codificado. Ainda em 2010, vimos vieses epistemológicos e fenomenológicos como destaques da maioria das investigações, sobrando já pouco espaço para as abordagens antes recorrentes do consumo, agora representadas apenas por um artigo.
Lançando um olhar para o P&D observado numa perspectiva total, constatamos como recorrente a utilização dos autores utilizados na revisão teórica feita em nossa pesquisa. Além do já citado Flusser – recorrente em 2010 – vemos Baudrillard e Bourdieu como predominantes nas abordagens do consumo, principalmente em 2006. Já Argan é uma referência menos utilizada, porém, percebida como mais presente, de forma geral, em todas as edições.
3.5 Os Trabalhos de Conclusão de Curso dos cursos de design da UFPEL Partimos agora para a nossa perspectiva local, na qual analisamos alguns dos Trabalhos de Conclusão produzidos nos cursos de design gráfico e design digital da UFPEL. Tivemos acesso a 34 destes trabalhos, apresentados a partir do ano de 2009 até o presente momento; dentre 106
eles, selecionamos nove que julgamos irem ao encontro das temáticas pretendidas em nossa pesquisa. A partir destes nove trabalhos citados, percebemos de imediato a recorrência do imaginário como o principal referencial teórico da grande maioria dos trabalhos. A saber, vemos a temática como predominante em sete das monografias, e como presente no referencial teórico em mais uma delas. Partimos agora para um olhar mais detalhado sobre estes trabalhos.
Estudando as relações entre design gráfico e imaginário a partir da analogia com o design editorial e a fotografia, o trabalho Design e imaginário: as relações entre design editorial e fotografia aplicada à moda na revista Nylon, de Ana Dacol em 2010, buscou associar o referencial teórico da sociologia compreensiva, das teorias do imaginário, com observações formais oriundas das teorias do design, tendo como objeto para estudo de caso a revista Nylon, uma publicação norte-americana sobre a moda e cultura pop. Seu referencial teórico se baseia principalmente em Gilbert Durand (2010), Juremir Machado da Silva (2006) e Michel Maffesoli (1988, 2001), tendo contribuições também de Flusser. Na prática projetual, a autora propôs um projeto gráfico editorial composto por fotografias de sua autoria, para uma hipotética publicação na revista Nylon. Para este projeto, 107
a autora observa que suas opções formais foram estabelecidas de acordo com as matérias observadas, ligadas diretamente a imaginários específicos. Conclui então que “O designer faz as escolhas e atua como um tradutor destes imaginários ao combinar propostas oriundas de repertórios estéticos diferentes e conectá-los traduzindo essas informações em imagens” (DACOL, 2010, p. 36). Já em O imaginário no design gráfico autoral: um estudo a partir de coleções literárias, de Carolina Marchese em 2010, o interesse pelo imaginário se direciona a uma pesquisa sobre o objeto livro e seu projeto gráfico, propondo também a criação de capas para uma coleção autoral de livros. Vemos aqui o uso dos mesmos autores – Silva e Maffesoli – para estudar o imaginário, inclusive com contribuições de Flusser. Os estudos do imaginário são aplicados nesta prática quando é exercitado o próprio ponto de vista da autora para a sua proposta prática, a partir das referências e imaginário no qual está inserida. Por serem estes contextos de caráter permanentemente mutável, cita-se Silva (2006), quando diz que este imaginário é uma aura em constante mutação. Design, Cinema e Imaginário: Um Olhar Sobre Créditos de Abertura no Cinema Hollywoodiano Contemporâneo, de Romina Sivolella em 2010, propõe a construção de 108
aproximações entre design e cinema a partir de um olhar advindo das tecnologias do imaginário, utilizando como um recorte a análise dos créditos de abertura de dois filmes hollywoodianos. Como resultado prático, opta-se pelo desenvolvimento projetual dos créditos para um curtametragem. Além de um referencial teórico advindo do cinema, vemos aqui o uso dos autores já citados anteriormente: Silva, Maffesoli e Flusser. Destacamos neste trabalho uma descrição da interpretação de Silva dos temas de Durand, quando se diz que o imaginário é o trajeto antropológico de um ser que bebe numa bacia semântica – ou um reservatório/motor – e estabelece o seu próprio algo de significados.
No trabalho Imaginário Projetual: As Capas e Contracapas dos Filmes de Tim Burton, de Gabriele Bentos em 2010, vemos como referencial teórico os já citados autores do imaginário – Durand, Maffesoli e Silva –, além de Flusser e Edgar Morin (1983). Nesta monografia, o interesse nos estudos do imaginário é relacioná-lo com o design gráfico, na medida em que se propõe o redesign das capas e contracapas dos DVDs de dois filmes do diretor Tim Burton – a tentativa, então, é a de refletir o imaginário fílmico no gráfico. Vemos no texto que o imaginário coletivo se dissemina através de algumas tecnologias, sendo uma delas o cinema. Estando o 109
imaginário inserido na cultura ao mesmo tempo em que a influencia, o cinema é então uma mídia que atua no vivido e também o considera. Em Design e Imaginário na criação de personagens para Animação 3D, de Fabiana Biazotto em 2010, percebemos o uso dos mesmos autores já citados para os estudos do imaginário – Maffesoli, Durand e Silva, além das contribuições de Flusser e Baudrillard. Neste trabalho, foca-se em alguns conceitos desses estudos, como os de bacias semânticas, trajeto antropológico e reservatório/motor. A partir destas pesquisas, buscaram-se razões pelas quais o Imaginário influenciasse na concepção e na assimilação de algumas personagens da animação A Era do Gelo, propondo como prática o desenvolvimento de um concept de uma possível nova personagem para a trama. Observando uma citação de Silva encontrada neste trabalho, podemos apontar que o imaginário surge da relação entre memória, aprendizado, história pessoal e inserção no mundo dos outros, sendo sempre uma biografia, uma história de vida.
No trabalho de Robes Rocha em 2010, intitulado Design e imaginário: o futebol e o mito na prática projetual, vemos a relação do imaginário com a prática do design gráfico dentro de um recorte específico, que é a questão 110
do mito em torno do esporte e de seus atletas, sendo mais focado no futebol. Para compreender esta questão, observase uma campanha estratégica da empresa Nike. Desta forma, a proposta prática é apropriar-se deste imaginário no esporte local para criar uma peça gráfica com a temática das questões míticas na rivalidade entre os clubes Grêmio Esportivo Brasil e Esporte Clube Pelotas.
No trabalho Design digital e modelagem tridimensional: o cenário 3D como interface de interação, de Violeta Schuch em 2011, percebemos um referencial teórico além dos estudos do imaginário e dos já recorrentes autores Maffesoli, Silva e Flusser: a cibercultura. Já conceituada na primeira página da nossa pesquisa, nesta monografia ela é representada pelos autores Pierre Lévy (1999, 2003) e André Lemos (2007). A intenção deste trabalho é analisar como se dá a construção de cenários 3D para interfaces de interação em cruzamento com as tecnologias do imaginário. Para isso, é feita uma análise do website de uma cervejaria a partir das teorias do imaginário e alguns autores do campo do design de interface. Como resultado prático, propõe-se então o desenvolvimento do protótipo de uma interface de interação que considere o cenário 3D.
Em Design e tendências: a forma como os designers 111
transformam tendências em visualidades, de Paula Thofehrn em 2010, percebemos não só a abordagem das teorias do imaginário – através de Silva, Maffesoli, Durand – como também o cruzamento com algumas outras áreas, como a de identidade e cultura e o consumo, com referenciais da antropologia e da sociologia. Alguns autores que podemos destacar aqui são: Gilles Lipovetsky (2006), Adrian Forty (2007), Stuart Hall (2005), Jean Baudrillard (1981, 1990) e Edgar Morin (1977, 1986). A partir desta base teórica, propõe-se alguns estudos de caso e uma prática que consiste na produção de um catálogo apontando os principais resultados do texto: o apontamento de algumas das tendências contemporâneas em vigência, elementos estilísticos encontrados por designers para representar visualmente posturas adotadas por empresas. E, por fim, vemos alguns outros temas, além do imaginário, que interessam para nossa pesquisa, também no trabalho Cultura da convergência no design: Aproximações entre narrativas transmidiáticas e design de interfaces, de Marina Reis em 2011. Aqui, observamos o referencial abordado a partir dos conceitos de cibercultura e convergência, a partir de André Lemos (2002), Levy (1999), Henry Jenkins (2009), Marshall McLuhan (2002) e Lucia Santaella (2003, 2009). A 112
proposta deste trabalho é investigar maneiras pelas quais o design de interfaces pode ser integrante de narrativas transmidiáticas. Observando um exemplo de transmídia ocorrido em torno de um filme, são buscadas indicações para a construção de caminhos narrativos a serem percorridos por usuários; essas indicações, então, embasam a construção projetual de uma narrativa transmidiática.
Em nosso olhar sobre os Trabalhos de Conclusão dos cursos de design da UFPEL, vimos de imediato a recorrência dos estudos de imaginário como referencial teórico, além de algumas contribuições da cibercultura e de uma pequena amostra de referenciais dos estudos culturais, da sociologia e da antropologia. O cruzamento destas teorias culminando numa prática foi visto em todos os trabalhos, porém, isso pode ser compreendido tendo em vista que nos cursos de design da UFPEL há a obrigatoriedade de esses Trabalhos de Conclusão possuírem um caráter teórico-prático33. Percebemos como presente também a temática dos filmes, quando abordada em quatro trabalhos, sob perspectivas diferentes: a partir dos créditos de abertura; a partir das capas e contracapas de 33 Norma do curso que mudou a partir deste semestre de 2012/1, quando são permitidos Trabalhos de Conclusão com caráter teórico, se (devidamente) justificados. Apontamos aqui a opção por esse cunho teórico em nossa pesquisa. 113
DVD; a partir de personagens para animação 3D; e a partir de narrativas transmidiåticas.
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Considerações Finais
É evidente que o campo do design, assim como tantos outros, se configura como interdisciplinar, tendo uma práxis e uma teoria que se apropriam de outras diversas ciências para o seu exercício. Nossa pesquisa nunca teve como propósito apresentar esse panorama como novidade, mas apenas mapear algumas destas abordagens em algumas fontes específicas, observar se estão sendo recorrentes nas pesquisas, como estão se configurando, e como estão se relacionando estes olhares com a prática projetual. A partir destas observações pretendemos acrescentar algum corpo a estas discussões na pesquisa em design, e também tangenciar os possíveis âmbitos de compreensão que podemos atingir do design. Nossas considerações aqui partem de questionamentos e reflexões advindas de todas as partes da pesquisa, desde a apresentação e o levantamento bibliográfico de alguns repertórios teóricos até o nosso olhar direto ao corpus. Ainda nos Trabalhos de Conclusão da UFPEL, onde se vê a grande recorrência das teorias do imaginário como referencial teórico, vemos como possível causa dessa recorrência, por parte dos alunos, um possível maior interesse nessa área como um recurso ou uma base para projetar. Poderíamos dizer que o imaginário acaba por parecer mais 117
“acolhedor” enquanto objeto de estudo, na medida em que dá mais espaço, em suas teorias, para se exercer a subjetividade – e no contexto de alunos de design, parece um caminho flexível para se compreender algumas questões estéticas que tanto permeiam a área. Por parte dos professores, poderíamos citar a formação de alguns destes na PUC-RS, onde se tem contato com estes estudos do imaginário, como outro dos possíveis propulsores deste movimento que observamos. Aliado a um interesse dos alunos por certos temas, o contato dos professores com estas teorias abriria espaço para sugeriremnas como referencial para seus orientandos.
Num ponto de vista mais amplo, em um caráter de suposição, podemos pensar o imaginário como um caminho natural para o fazer design, na medida em que pode ser considerado como uma analogia ao repertório34 – tanto do designer quanto do público-alvo – a ser considerado como base para os projetos, dando também mais espaço à emoção e à subjetividade nessas relações sujeito-objeto e sujeitointerface pensadas pelo designer. Questionamos aqui se não poderiam ter as teorias do imaginário uma conexão – não 34 O repertório de conhecimento do usuário, sua vivência e sua experimentação simbólica são alguns dos diversos aspectos sócio-culturais aos quais está subordinada a função estética dos produtos, segundo Gomes Filho (2004, p. 43). 118
somente de raízes etimológicas – com a imaginação vista em Argan, quando aquelas podem ser meios para trazer ao design projetos mais imaginativos, ou que pensem em nós mesmos de forma diferente do que somos. É interessante notarmos não só aqui, mas também nos outros autores de nosso referencial teórico, como Flusser, Baudrillard e Bourdieu, o conceito ou os diferentes conceitos de imagem, como um dos pontos centrais onde podemos traçar paralelos destes com o design.
Nos textos do P&D, vimos como latente a multiplicidade de abordagens do design, perpassando alguns diversos campos, como a sociologia, a antropologia, a filosofia e os estudos culturais. Em contraponto aos TCCs previamente abordados, não percebemos aqui o recorrente estudo das teorias do imaginário. Uma das finalidades de nossa pesquisa, que seria observar as relações estabelecidas nestes textos com a prática projetual do design, acabou por revelar-se ofuscada pela própria intenção predominante nos artigos, que não se direcionava nesse sentido. A fim de diferenciar alguns resultados, apropriando-nos de uma dicotomia não muito segura entre teoria e prática, poderíamos pensar poucos dos trabalhos vistos como textos que efetivamente proponham alguma sugestão específica 119
para a prática projetual. Dentre estes, podemos citar, do P&D 2008, Design e fenomenologia: pensando o método por meio de uma leitura sobre experiência, vivência e intuição, que propõe uma abordagem fenomenológica como base filosófica para um possível método de projeto em design, procurando um retorno às essências por meio da indagação. Neste mesmo sentido, podemos resgatar do P&D 2010 o texto “Tudo o que não invento é falso”: por uma epistemologia da imaginação criadora no design, que constrói em sua trajetória um método de design que pretende privilegiar a imagem como elemento gerador da criatividade, a partir de campos semânticos, num referencial de Bachelard e seus conceitos de imaginação e tempo descontínuo. Quanto à interdisciplinaridade no design, pensamos também sobre o assunto a partir de Bomfim (1997). Vemos nesse autor que uma possível Teoria do Design deveria ser igualmente interdisciplinar ou transdisciplinar, assim não se enquadrando em nenhum dos grupos clássicos da ciência e não tendo campo fixo de conhecimento, sendo, portanto, instável. Destacamos aqui a interdisciplinaridade como justamente o que poderia ao mesmo tempo dificultar e solidificar a construção de um corpo teórico próprio do design, na medida em que a tarefa se torna cada vez mais complexa em meio à 120
multiplicidade e multiplicação de conhecimentos, como os contidos nestes textos que observamos, mas também pode construir a partir disso um centro teórico de espectro mais plural e inclusivo para nossa área. Dentro desse sentido de um corpo teórico próprio do design, de caráter transdisciplinar, vemos tentativa semelhante justamente na disciplina da Filosofia do Design, proposta por Love, onde se tem por intenção uma sistematização das teorias de design. Numa perspectiva ampliada por Beccari, vemos que essa área da filosofia do design pode ser pensada de forma mais aberta, também a partir de pensadores de outras áreas, como Flusser, Baudrillard e Argan, descritos como filósofos de design. Pensamos, dentro dessa perspectiva, também Bourdieu, que acrescentamos a esse grupo em nosso referencial teórico. O que pudemos observar no corpus é um uso mais rico para pensar o design destes autores – os filósofos de design – do que dos ditos filósofos do design – os autores do Design Studies, aqui abordados a partir de Love e Galle –, na medida em que se vê uma abordagem que não se funda apenas a partir do campo. Inclusive podemos postular como extremamente recorrente o uso destes filósofos de design em nossas fontes de pesquisa. Ao fim de nossa pesquisa, podemos dizer de imediato 121
que é este um final provisório, como acreditamos que ocorra nos textos científicos. Tivemos nossos objetivos alcançados, e algumas respostas para nossas questões de pesquisa; percebemos significativas abordagens do design advindas de outras áreas nas fontes observadas, pudemos cruzar nosso referencial teórico nestas abordagens e obtivemos uma perspectiva amplificada da área, tendo contato com diversos conhecimentos. Não encontramos no P&D uma recorrente aplicação destas abordagens à prática projetual do designer, o que, de certa forma, não nos desaponta nem surpreende; pode sugerir apenas uma tendência, uma naturalidade de estes campos serem vistos apenas a partir do ponto de vista teórico. Podem urgir desta forma alguns questionamentos sobre uma prática mais teórica ou uma teoria mais prática, mas não cabem a nosso propósito. Tangenciamos alguns pontos de como estas interdisciplinaridades podem nos ajudar a compreender o design, e acreditamos ser um possível direcionamento para futuras pesquisas. Neste sentido, configuramos nossa investigação como um olhar sobre um repertório cheio de ramificações a serem aprofundadas. Portanto, ainda que num caráter de graduação, pensamos somar nosso trabalho às mais recentes discussões e pontos de vista sobre o design nos tempos atuais da pesquisa na área. 122
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