Carne e concreto

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A lua estava alta naquela noite. Espectros embriagados andavam lentos atr谩s de n贸s, perdidos no escuro do momento. Nossos ombros se tocavam, nos empurrando de forma desajeitada.


O movimento era natural. O flerte, sincero. O sorriso cansado era um acessório de seu rosto rosado. Os infinitos becos acabaram nos isolando do resto, tudo era mais íntimo entre aquela ausência. Erámos eu, você e a noite.








O luar revelou-lhe a pelagem prata, as presas podres, a intenção fatal. Havia cheiro de arrependimento no ar. Naquele último segundo tudo se tornou fúria, bestialidade.



Eu a odiei.

Desprezei-a desde a essĂŞncia.



O silĂŞncio era visceral. Nossos corpos no chĂŁo, nossas almas condenadas.


Pouco se fez necessário para a realização me abater. Lá estava eu, vivo, entre baforadas pesadas, rasgando o ar entre dentes.




Segurava algo pegajoso entre os dedos, pequenos pedaรงos de sua forma dilacerada. Meu corpo banhado em carne maldita.


Urros pecaminosos se desprendiam de minha boca, numa tentativa de escapar da loucura derradeira.






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