de fora para dentro, de dentro para fora

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de fora para dentro de dentro para fora uma investigação visual experimental sobre o edifício copan


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de fora para dentro de dentro para fora uma investigação visual experimental sobre o edifício copan

Ralph Mayer Projeto entregue à disciplina Projeto VI B (PGD fase2), 8º semestre, como parte dos requisitos exigidos para obtenção do grau de Bacharel em Design pela ESPM São Paulo. Orientador: Daniel Trench São Paulo 2014


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agradecimentos Apesar de apresentar esse trabalho sozinho, a minha vontade foi de ter assinado com o nome de todos vocês. Aviso, de antemão, que provavelmente minha memória me trairá fazendo com que eu esqueça de alguém. Minhas sinceras desculpas e muito obrigado. Agradeço primeiramente aos meus pais, pela oportunidade, investimento e crença em todos esses quatro anos de escola, sem eles, nada disso seria possível. Lucas, pela companhia e palpites nas horas difíceis. Daniel Trench por ter aceito entrar nesse projeto, pela paciência, dedicação e por me orientar de uma forma tão fundamental para que o trabalho tomasse o rumo que tomou. Celso Longo e Marcelo Pliger pela conversa, conselhos e avaliação na banca de qualificação. Todos os outros mestres que estiveram presente durante o processo. Eduardo De Jesus, pela conversa e esclarecimento dos caminhos do projeto. Angela Detânico e Rafael Lain, por terem servido de inspiração do nascimento até a entrega desse trabalho. Marlon Brambilla, Eloisa Sudo, Carlos Teles, Ligia Nobre e Andres Sandoval, por terem aberto a porta de seus apartamentos para que o trabalho acontecesse e muito mais do que isso, pela discussão e acréscimo em cada detalhe conversado durante as visitas. Todos as pessoas e funcionários do Edifício Copan com que tive a oportunidade de conversar durante as entrevistas do trabalho. Mel Cerri e Karen Suehiro pela dedicação e apoio na encadernação de todas as publicações. Henrique Smith pelas incríveis fotos de registro desse projeto. Felipe Sabatini pelos palpites e opiniões. Conglomerado Virgílio por toda convivência diária. Flora Canal e Gabriela Schmidt por me acompanharem desde o início dessa jornada. Filipe Abud e Rafael Trabulsi pela amizade. E, por último, Míriam, pela companhia integral, pelo apoio, por me fazer acreditar mesmo nos momentos difíceis e pela incrível capacidade de conseguir revisar todos os meus textos e deixá-los em sua melhor forma.


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resumo Este trabalho tem como objetivo o questionamento das constantes descobertas de um exercício experimental, todo o ambiente em que está imerso, os resultados e influências desse processo no produto final. O curso desse projeto se baseou na análise do Edifício Copan, o objeto de estudo desse trabalho. Toda a trajetória, de um ano, foi documentada aqui com histórias, conversas e registros fotográficos. Após inúmeras visitas, experimentações visuais, testes, que representaram diferentes momentos de envolvimento com o objeto de estudo, o resultado final tomou forma em um livro, um conjunto de 12 postais e mais quatro propostas ideáreas, hipotéticas, que permitiram chegar ao cerne da minha relação com o Edifício Copan, o seu ambiente geográfico e social.

palavras-chave design gráfico – arquitetura moderna – copan – cidade – investigação – espaços – público – privado


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sumário 11 13 14 24 24 47 48 50 56 58 72 82 86 90 94 99 102

1. introdução 2. processo 2.1. caminho 2.2. objeto 2.3. experimentos fase #1 a qualificação fase #2 fase #2 / etapa #1 / reconhecimento fase #2 / etapa #2 / privacidade fase #2 / etapa #3 / materialização livro postais o prédio fala vigia desaparecimento de costas 3. considerações finais 4. referências bibliográficas


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1. introdução A ideia para a escolha deste tema surgiu da tentativa de unir diferentes vertentes de pensamento que permeiam as soluções dos projetos que desenvolvo como designer. Por um lado, racionalidade, precisão e pensamento lógico guiam, fundamentam e justificam as minhas escolhas da parte técnica do projeto. Por outro lado, a sensibilidade e subjetividade potencializam as infinitas possibilidades que o o design pode alcançar. Elas representam, ao meu ver, o lado emocional e poético dos projetos – e tangenciam, de certo modo, o campo da arte. Dessa maneira, o projeto no modelo experimental era o que melhor se encaixava dentro das minhas expectativas e vontades de produzir como projeto final de graduação, proporcionando liberdade para muitas possibilidades e novos rumos com um recorte pré-definido pode proporcionar. Nessa monografia, o leitor encontrará o percurso de minhas experiências. Em um primeiro momento, será apresentada a trajetória teórica e os questionamentos feitos sobre a proposta inicial. As pesquisas e descobertas iniciais são, portanto, relatadas nessa primeira parte. Em seguida, será encontrada a documentação do que foi entregue para a qualificacão. Ao fim desse primeiro momento, a dissertação se foca nos desdobramentos pós-banca. A construção de uma reflexão sobre o Copan, agora em uma dimensão mais profunda, é o que marca a segunda etapa do trabalho. Indagações, crises e resoluções fazem parte da construção do projeto experimental. Por fim, apresento um texto que retoma cada um dos pontos abordados e aponta possíveis desdobramentos futuros para o projeto, e faz aqui as vezes de conclusão.


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2. processo copan O Copan é um dos mais importantes e emblemáticos edifícios da cidade de São Paulo. Conhecido por suas sinuosas e elegantes linhas, foi projetado por Oscar Niemeyer com a colaboração de Carlos Alberto Cerqueira de Lemos. Localiza-se em um dos pontos mais movimentados do centro da capital paulista: Av. Ipiranga, 200 - República, São Paulo SP. É bastante conhecido por sua forma e por sua história de recordes e números estatíscos colossais. Projetado na década de 50, o Edifício Copan surgiu em um período que a cidade de São Paulo passava por transformações e crescimento espantoso. Hoje, o Copan tem 1.160 apartamentos distribuídos em 6 blocos com 2.038 moradores e área comercial no térreo com 72 lojas, além de um antigo cinema que atualmente é ocupado por igreja evangélica – porém sem uso.

3.1. caminho O projeto teve início com a tentativa da definição de um tema. A vontade de trabalhar o código e a linguagem com experimentações visuais já existia, porém a amplitude do tema não sustentava o seu desenvolvimento. Com o começo das orientações, foi preciso repensar a abordagem e maneira como a linguagem seria trabalhada. Não gostaria de limitar o trabalho à definições de termos e conceitos de uma complexidade de extensos significados. Após algumas conversas, percebi a oportunidade de aliviar o trabalho destes obstáculos, assim poderia deixar a pesquisa mais solta e livre para testes e exercícios experimentais. Logo em seguida, parti para uma pesquisa exploratória de autores, designers, arquitetos e principalmente casos correlatos, onde o Copan apareceu como uma possibilidade infinita de estudo. Definido o tema, o recorte que tangencia o assunto se fez necessário. Olhando para a escolha do objeto, o Copan proporciona inúmeros elementos e relações que podem se fazer presente na pesquisa. Primeiramente, o próprio prédio, cenário e representação de uma época e de um estilo que se fez presente no Brasil. Projetado por uma das principais figuras da arquitetura no país – e no mundo – carrega toda a responsabilidade da representação da arquitetura moderna brasileira, assim como Brasília, apesar de pertencer à uma outra escala – a do edifício e não a da cidade. A segunda relação percebida é quanto ao edifício, seus moradores e as maneiras como eles se relacionam com o próprio prédio. Com cerca de dois mil moradores, distribuídos pelos trinta e dois andares do prédio, podemos considerar


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esse complexo um grande retrato da cidade em que ele se encontra: São Paulo. Um microcosmos da população, com uma sistemática específica e característica. A terceira e última relação percebida pelo trabalho é o modo como a cidade observa o Copan. Qual a sua importância, seu impacto e como isso implica no urbanismo da cidade. Uma construção com essas proporções versus uma cidade tão singularizada pelo caos urbano em sua raiz. Para os modernistas, as duas dimensões do urbanismo consistem na comunidade e no indivíduo; entre esses dois termos, não deve haver oposição, e sim harmonia. Com isso, essas três abordagens fecham a tríade de estudo para este trabalho. Elas aproximam os principais fatores e temas que contemplam a ideia original deste projeto e oferecem os dados e informações necessárias para o desenvolvimento experimental proposto.

arquitetura moderna Designação genérica para o conjunto de movimentos e escolas arquitetônicas que vieram caracterizar a arquitetura produzida durante grande parte do século XX, inserida no contexto artístico e cultural do Modernismo. Segundo G. Argan, os modernistas buscavam em suas obras o que seria chamado de ”síntese essencialista”, ideia desenvolvida por eles a partir da crença em uma estruturalidade da linguagem: que por si, seria simultânea e inerente à um sentido originário.

3.2. objeto Escolhi, como objeto de estudo o Edificio Copan dada a amplitude de possibilidades proporcionada por sua forma e história, tanto em seu âmbito estrutural como social. Diante da grandiosidade e importância do prédio, o Copan é capaz de oferecer inúmeras fontes de informações, das mais diversas possíveis. Centenas de apartamentos e milhares de habitantes convivendo em um ambiente comum proporcionado pelo prédio podem representar, em certa medida, um recorte da sociedade brasileira. O Copan é coabitado por diversos extratos sociais e os blocos orientam uma extratificação – reproduzem, de certo modo, a nossa lógica social. Dentro desse mesmo estudo, podemos tirar dados sobre sua estrutura, seus moradores, sua história, sua importância e sobre uma série de outros fatores que se fazem presentes dentro da arquitetura moderna brasileira. A grande escala, a horizontalidade enfatizada pelos brises de concreto, o fato ser um edifício residencial com uma enorme diversidade de plantas-tipo foi, para época, um interessante marco para habitação popular. O arranha-céu, que na prática é uma sobreposição de camadas, um edifício nada comum com forma ondular e sua altura de trinta e dois andares,


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design contemporâneo (e sua relação com o moderno) A busca racional de unidade e coerência são ideias caras ao design moderno. Assim como na arquitetura,síntese e precisão, adequação e funcionalidade, são conceitos caros à essa disciplina. Instituições como a Bauhaus tiveram, no início do século XX, um papel importante na construção desse ideário. Segundo a pesquisadora norte-americana Ellen Lupton, a preferência modernista por formas sintéticas e simplificadas convive agora com o desejo de construir sistemas que produzam resultados inesperados. O impuro, a contaminação e o híbrido nos parecem hoje tão interessantes quanto as formas polidas e perfeitas – tão almejadas pelos modernos.

consequente rompe todas as relações de proporção que estamos acostumados a ver na cidade. O edifício é um organismo unitário, uma “figura” urbana, que apesar de sua estrutura e diferenciação, não rompe a visível continuidade do espaço em que se insere e não interrompe o movimento da cidade. A arquitetura moderna do Copan não fecha nem segrega a paisagem, e sim intensifica o caos em que esta inserido. O prédio, com sua relação de verticais e horizontais, de planos e volumes, ressalta as linhas estruturais do edifício. Dessa maneira, podemos fazer relações e criar justificativas para a releitura de formas proposta aqui. A ênfase da forma e estrutura no modernismo, permitem que o design contemporâneo seja capaz de fazer uma releitura e propor um diálogo entre duas formas.


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conversa com eduardo de jesus A oportunidade de conversar com Eduardo de Jesus*, professor na Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas, foi bastante animadora. A conversa, que me pareceu confusa à princípio, acabou se revelando determinante e me mostrou novos horizontes para dar continuidade à pesquisa. Eduardo rapidamente entendeu o espírito da coisa, e associou minhas ideias ao trabalho da dupla Angela Detanico e Rafael Lain – que já era, para mim, uma grande referência. Expliquei à eles sobre os nove cartazes que já tinha desenvolvido sobre o Copan e, conforme conversávamos, eu constatava as maneiras que os cartazes conversavam – entre si e com a proposta – e o que faltava para amarrá-los como um conjunto: a criação de um “alfabeto”, um sistema de códigos que fosse comum à todos eles, para se relacionarem e se completarem. Quando a conversa chegou nas referências bibliográfias e em o quê eu poderia me embasar teoricamente para fundamentar o projeto, uma enchurrada de elementos e textos vínculados à arquitetura moderna no Brasil foram aparecendo. Ele me sugeriu o texto do Guilherme Wisnik em Arquitetura Moderna Brasileira e o texto de Adrián Gorelik na décima edição da revista Serrote, onde ele trata da frustração diante da impossibilidade de construir Brasília. Nesse momento, várias relações diretas ao modernismo evidenciaram-se nos meus cartazes. Eduardo conseguiu traçar pontos tangentes ao discurso do que lhe mostrei e ao ideário moderno, e como isso poderia se transformar em um dos meus objetos de estudo. No final, a maior contribuição para o trabalho foi a troca de termos que ele propôs. O trabalho, naquela fase e

2.3 experimentos fase #1 Ao escolher o Copan foi preciso, em um primeiro momento, entender, dividir e categorizar o seu contexto e as informações relacionadas à ele – para assim descobrir o que seria mais interessante para para o projeto. Achei que, à princípio, deveria pesquisar alguns dados e números, informações quantitativas sobre o prédio. Números do Copan Bloco A 64 apartamentos de 2 dormitórios cada  84,13 m2  área total 5.834,32 m2 Bloco B 640 apartamentos, sendo 448 quitinetes / 192 de 1 dormitório cada  24,67 m2 / 32,37 m2  área total 17.267,2 m2 Bloco C 64 apartamentos de 3 dormintórios cada 122,48 m2  área total 7.838,72 m2 Bloco D 64 apartamentos de 3 dormitórios cada 161,23 m2  área total 10.318,72 m2 Bloco E 168 apartamentos, divididos entre quitinetes / 1 dormintório cada 27,56 / 28,31 / 30,46 / 38,31 / 38,58 m2 (quitinetes) / 59 - 69 m2 (1 dormitório)  área total 12.181,12 m2 Bloco F 160 apartamentos, divididos entre quitinetes / 1 dormintório cada 25,98 m2 / 29,85 m2 / 36,48 m2 (quitinetes) e 54,43 m2 / 62,15 m2 (1 dormitório)  área total 6.684,48 m2 área total dos apartamentos 59.674,24 m2 porcentagem representativa (A) 9%  (B) 29%  (C) 13%  (D) 17%  (E) 21%  (F) 11%


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momento, não se tratava de uma tradução, nem codificação, muito menos de transcodificação, para não vincular o trabalho à definições específicas. Aqui, ficou claro que o projeto deveria se lançar a criar uma conversa entre o universo do design e o da arquitetura moderna. Para mim, os cartazes rementem com clareza o pensamento e o conceito do que foi o modernismo no Brasil. A maneira como Oscar Niemeyer pensava seus projetos e como isso poderia ser relido da arquitetura para o design. Após a conversa, ficou clara a necessidade do projeto se posicionar de uma maneira diferente: o título inicial de meu experimento deixava de ser “(trans/de) codificação” – o que agora me parece bastante pretencioso – e passa a se chamar “da forma, para forma”, evidencianado assim o diálogo entre dois fazeres. *Eduardo de Jesus é Graduado em Comunicação Social pela PUC Minas, Mestre em Comunicação pela UFMG e Doutor em Artes pela ECA/USP. É professor da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas onde coordena o CEIS – Centro de Experimentação em Imagem e Som. Faz parte do Conselho da Associação Cultural Videobrasil. Coordena e atua como curador dos projetos “Circuito mineiro de Audiovisual” e “Imagempensamento”.

Ao listar uma série de critérios, estabeleci uma associação do prédio em relação ao suporte à ser escolhido para o projeto. O cartaz, peça gráfica clássica de experimentações visuais e íntima do designer, foi definido para esta primeira experiência – com área generosa, 90x60cm – serviu como suporte para elaborar essa associação entre a relação da área total do Copan e a área individual de cada bloco, o diálogo entre o parcial e o total gera um contraste de proporções e valores. Logo de cara, o primeiro estudo que feito para saber se estava em um caminho possível, foi uma relação direta da área total do Copan com a área total do cartaz, chegando assim à área individual proporcional de cada bloco dentro do cartaz. Desse modo, o resultado foram 6 cartazes, cada um correspondente a um bloco do prédio e sua respectiva área. Minhas expectativas foram confirmadas: encontrei um tema rico de possibilidades e que me fornece, em sua própria arquitetura, dados e informações que podem ser interpretados de outras formas. Meu próximo passo foi manter essa mesma informação de área como critério para os cartazes, porém, desenvolver uma série de 10 peças diferentes para representar a relação entre a área total do edifício e a específica de cada um de seus blocos. O desafio era formalizar essa relação de modo que cada cartaz tivesse autonomia.


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visita ao alfabeto infinito Em setembro, surgiu a oportunidade de ir à Porto Alegre para visitar a exposição Alfabeto Inifinito, que expunha trabalhos da dupla Ângela e Lain dentro da Fundação Iberê Camargo. Pude participar do grupo de educadores em uma visita completa à todas as obras expostas, que foi encerrada com uma conversa com Eduardo de Jesus sobre os trabalhos. Foi de extrema importância tudo que eu pude ver por lá, a percepção dos objetivos do trabalho da dupla comparadas ao trabalho que proponho aqui, ficaram claras. No fim da minha visita, Eduardo de Jesus enfatizou o fato de que: “ou o mundo se organiza para que possamos decodificá-lo ou somos nós que inventamos nossos próprios códigos para isso.” Toda a experiência de trabalho de Ângela e Lain foi dividida em 4 aspectos, que dificilmente poderiam ser tratados separadamente. O primeiro deles é a linguagem, território e matéria-prima dos trabalhos expostos, uma fronteira tênue entre o que é decodificável e o que não é. O segundo aspecto é a relação espaço e tempo que nos mostra como as obras se impõem sobre esses termos, sua grandeza e maneira como se comportam e interagem com as pessoas. O tempo gasto na tentativa de interpretar ou decodificar o código cria relações de entendimento e abre espaço para diversas fontes de referência. Exatamente o que trata o terceiro aspecto, a tradução. O quarto aspecto é o próprio nome da exposição, ele revela toda abordagem e essência do trabalho da dupla. O trabalho deles é criar novos alfabetos, ou combinar alfabetos já existentes na intenção de tornar infinito a quantidade de possibilidades de códigos e codificações. Tudo pode ser um código, um sistema, um texto. Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre – Rio Grande do Sul.


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Quando a dupla empilha blocos de granito em “Pilha” ou transforma textos de grandes filósofos em uma infinita combinação de códigos coloridos em “Sobre cor” ou até mesmo quando desenvolvem uma nova tipografia a partir de circunferências em “Infinito”, tudo é texto, tudo é código e pode variar dentro do seu próprio sistema. Para fechar, Eduardo de Jesus mais uma vez traçou um paralelo entre a arquitetura moderna brasileira, a poesia concreta e como toda sua estética parte de decidir a forma de seus trabalhos pela sua função: “O modernismo dita como as pessoas vão viver.” Quando Oscar Nyemayer decide colocar as escadas de incêndio do Copan em suas extremidades, ele não se preocupa com o fato de as pessoas que se encontram no meio do edifício necessitarem de muito mais tempo para ter acesso as escadas. Por isso o modernismo pode até ser considerado utópico, como a tipografia chamada “Utopia de Ângela e Lain”. Os caracteres partem de duas fontes distintas: uma delas (representada pela tipografia em caixa alta) são grandes construções brasileiras modernas e a outra (representada pela caixa baixa) são situações de grande caos urbanos em que vivemos. Esta conversa entre os dois universos tem uma íntima relação de verdade ao percebermos a nossa própria realidade. Toda a organização, grade, contorno, geometria e rigidez do modernismo é quebrada a partir do momento em que a população não se comporta dessa maneira. Toda a ordenação de fatores se perde conforme vemos nas grandes capitais em que são encontradas a maioria dessas obras modernistas. Não há uma relação direta entre o objetivo do modernismo e a atual realidade em que aquilo foi implantado.

Tudo que eu vi lá, extrapolou de alguma forma qualquer pensamento superficial que eu tinha até agora sobre os trabalhos da dupla e a própria dupla em si. A discussão da relação de termos design e arte, por exemplo, se torna praticamente inexistente, a partir do momento que encaramos tudo como código, tudo como linguagem, com diferentes formas de apresentar e interpretar estas informações. O design como estudo, potencializa todas essas estruturas, fazendo com que, por mais abstrato que seja a forma, há sempre uma intenção por trás daquilo.


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O Dia Mais Curto / O Dia Mais Longo, pintura mural. 2013.

Nomes das estrelas, impressĂŁo sobre papĂŠl e acrĂ­lico. 2007


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lain & angela Angela Detanico e Rafael Lain são, respectivamente, linguista e tipógrafo de formação, mas que atuam como designers. Juntos, os dois começaram trabalhando com as ideias de escrita, leitura e tradução, ou de um meio para outro, ou de um código para outro, interessados nos limites da representação do tempo e do espaço. A dupla desenvolve a partir do começo do século XXI trabalhos em que cruzam poesia, som e imagem, atuando tanto como designers, quanto no cenário da arte contemporânea. Detanico e Lain utilizam diferentes suportes em suas criações, elaborando desde projetos gráficos e identidades visuais para cartazes, livros e catálogos, até começarem a se dedicar mais especificamente à produção artística, criando objetos, esculturas, vídeos, performances e instalações. Em seus trabalhos, a dupla sugere novos processos criativos que misturam elementos como música, imagem, literatura, tipografia e até dança, em vários suportes. Esses processos criativos de investigação marcam a produção e apresentam diferentes linguagens e procedimentos, fazendo com que se misturem, se sobreponham e dialoguem. A atenção dada à linguagem verbal e não verbal como processo estrutural da obra é comum aos trabalhos da dupla e dos artistas da vanguarda modernista brasileira, com quem suas obras mais se relacionam.

Alfabeto, letras em neon e cabo. 2013.


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Timewaves, animação, preto e branco, sem som, 24 horas. 2012.

Wave Horizon, 4 projeções simultâneas, animação preto e branca e som. 2012.

Infinito, aço inoxidável. 2013.


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Sobre Cor, serigrafia sobre papel, 60 partes. 2011.


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O primeiro cartaz, que recebeu o nome de “Forma”, relaciona a tipografia com as respectivas áreas de cada bloco do Copan. As letras correspondentes a cada bloco são dadas em um tamanho de corpo que se associa com a proporção da área do bloco em relação à do edifício. Fiz um cálculo, a partir de uma escala matemática, para que fosse possível aplicar as contas de proporção em todas as letras dos blocos. No segundo cartaz desenvolvido, há uma outra relação de proporções. O cartaz foi, inicialmente, dobrado em 6 partes iguais, e por isso recebeu o nome de “Dobra”. As marcas deixadas pelas dobras nos revela como seriam as proporções do prédio se todos os blocos tivessem a mesma área. Sobre o papel amassado foram impressos retângulos que correspondem, em escala, a área de cada um dos blocos. Desse modo, cheguei à uma sobreposição entre uma divisão igualitária de espaço e aquilo que de fato temos no edifício. O terceiro cartaz, nomeado “Pilha”, possui um outro ponto de partida, relaciona a área total do maior bloco do Copan, o “b”, à área total do cartaz. A representação das áreas dos outros cinco blocos se empilham sobre a do primeiro, revelando as diferenças entre cada um dos blocos em relação ao edifício como um todo. No quarto cartaz, o próprio nome, “Área”, enfatiza a relação da área total do Copan e a área total do cartaz. A superfície total do cartaz corresponde a área total do Copan, com seis faixas de preto, impressas com diferentes porcentagens de tinta, cada uma representa quanto cada bloco se representa dentro desse todo. Podemos notar uma relação formal do diálogo da horizontalidade do edifício versus a verticalização da representação feita no cartaz, assim como a verticalização dos blocos em relação ao próprio prédio. O quinto cartaz, “Linhas”, apresenta uma outra forma para a representação das proporções. A peça é dividida em um grid de 32 pontos – o número de andares do Copan – cada bloco é representado por uma linha que percorre o cartaz por inteiro e vai parando em seus respectivos pontos conforme sua proporção em relação ao prédio. “Caracteres”, o sexto cartaz, estabelece uma proporção entre a quantidade de caracteres escritos no cartaz e o valor da área total do Copan, tornando possível a mensuração de quantos


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caracteres dentro deste texto representam cada bloco do prédio. O mesmo se aplica para o sétimo cartaz, chamado “Hachuras”. O próprio nome revela qual a linguagem utilizada para a representação de cada bloco. Trata-se de uma relação proporcional do tamanho da retícula com a área de cada bloco dentro do Copan. O oitavo cartaz, nomeado “Andares” é a redistribuição dos blocos do edifício em seus trinta e dois andares. É uma representação de quantos andares cada bloco ocuparia caso estivéssemos redistribuindo verticalmente suas áreas. Começando com o bloco “a” nos primeiros andares e finalizando com o bloco “f” no topo do prédio. No nono cartaz, há uma intenção um pouco diferente. O nome “10x10m” indica a premissa escolhida para o desenvolvimento da peça. Se uma área de 10m de largura por 10m de comprimento fosse estabelecida, qual seria a altura de cada bloco de suas respectivas torres? Como representação, o cartaz se apresenta em uma forma pautada e graduada, que após definida uma escala, cada bloco ganha o valor de sua altura dentro do cartaz. Por fim, o décimo e último cartaz é uma síntese e uma justificativa de toda a proposta desse primeiro experimento. “Cartazes” é uma metalinguagem do diálogo entre o suporte e a unidade de medida estabelecida entre a área total do Copan com seus blocos. Foram calculados quantos cartazes caberiam em cada andar de cada um dos blocos do edifício. Esses cartazes se apresentam empilhados em perspectiva, de maneira que não temos uma escala entre o cartaz real com a representação do cartaz, porém temos uma escala em relação aos cartazes de cada um dos blocos. Com as dez peças já desenvolvidas, percebi a necessidade e oportunidade de desenvolver um eixo que estabelecesse uma conexão entre os cartazes e fosse universal a todos eles. Um fator ainda não havia sido explorado em nenhuma das peças, ou se havia, não estava diante de um mesmo código para que fizesse parte de um todo, era a cor. Dessa maneira, defini uma quantidade de preto impresso específico para cada um dos blocos, partindo da ideia de que quanto maior a porcentagem de preto, maior era sua porcentagem de representação dentro do edifício.


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Um cartaz ajuda a decifrar o outro, as informações se completam e criam relações entre uma peça e outra. Justamente o que gostaria de realizar no início do trabalho e o que percebi no trabalho do Lain e da Ângela. Foi concebida uma linguagem de leitura em diferentes formas de uma mesma informação. A estética dos cartazes é derivada da transposição de elementos encontrados na arquitetura moderna brasileira. Há uma forte referência à poesia concreta e ao seu modo de pensar, onde a forma deriva da função, todos os elementos são fundamentais para o entendimento da mensagem e não há excessos.


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cartaz #1: forma


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cartaz #2: dobra


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cartaz #3: pilha


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cartaz #4: รกrea


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cartaz #5: linhas


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cartaz #6: caracteres


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cartaz #7: hachuras


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cartaz #8: andares


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cartaz #9: 10x10m


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cartaz #10: cartazes


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a qualificação Projeto fechado, apresentação montada e monografia dispobilizada online via tumblr – pgd.ralphmayer.me. Tudo certo e dentro dos conformes para essa primeira etapa. Diante de uma chuva torrencial, eu e meus cartazes chegamos ligeiramente atrasados e molhados para a apresentação. Apesar do nervosismos, estava muito ciente e confiante daquilo que iria apresentar. Tudo estava bem redondo e justificado. De um modo geral, terminei a apresentação achando que tinha feito um bom trabalho. Como combinado com a banca previamente, não contaríamos tempo nem faríamos uso da formalidade do mecanismo pergunta-resposta. Tudo se desenrolou como uma conversa sobre o que eu havia apresentado ali. A banca começou comentando sobre a frieza que havia no meu trabalho. O Copan como objeto de estudo poderia ser palco de histórias incríveis que poderiam acrescentar ao trabalho. Havia muito para ser explorado das pessoas que ali estavam. Outro ponto que foi questionado, foi o público-alvo do projeto, quem se interessaria pela proposta? Do meu ponto de vista, o que eu havia entregue, não havia atingido as expectativas de quem lia o trabalho. Eu estava em uma zona de conforto com as propostas e não havia sentido necessidade de um maior envolvimento com o prédio, o que foi muito enfatizado pelos comentários. Sai da apresentação com a sensação que havia sido fuzilado pelos professores presentes. Não sabia o que pensar, por onde começar, muito menos o que fazer. Houve um tempo de digestão sobre tudo que havia acontecido diante a apresentação. Após alguns dias, comecei a escrever tudo o que me passava pela cabeça e o que eu precisava esclarecer com o orientador. Qual foi minha real proposta de trabalho? Quais foram os critérios de avaliação? E os cartazes? E a monografia? E a plataforma online? Acertos? Erros? Para onde ir? O que fica? O que sai? Tudo era uma grande névoa. Foram momentos de muita aflição. A espera para a conversa com o orientador nesse momento pós-banca pareceu durar anos.


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diálogo louvre-copan No final de 2013, foi organizada uma conversa com o artista Tuca Vieira. Tuca havia montado uma exposição apenas com fotos do Edifício Copan, um recorte interessante sobre o prédio a partir de uma perspectiva um tanto quanto inusitada. Eram registros da grande imensidão da fachada juntamente com retratos de pessoas em suas janelas. Registros que materializavam uma clara observação sobre o prédio, de um ponto de vista desconhecido. Para comportar essa conversa, nada mais justo do que o próprio local de onde as fotos foram tiradas, o terraço do Edifício Louvre, localizado ao lado do Copan. Para completar esse diálogo, Guilherme Wisnik estava presente também. Ele trazia o conteúdo e as discussões da recém acontecida X Bienal de Arquitetura de São Paulo, que tratava também dessa visão e dessa conversa entre complexos habitacionais e a cidade. Uma projeção das imagens que compunham a exposição V. se encontra na posição da seta, em cartaz na Funarte explicava o olhar e as intenções de Tuca ao assistir o edifício. Foi muito importante e interessante para esclarecer o quão rica aquela, aparentemente, simples investigação traria de resultados. No momento em que meu trabalho se encontrava, era exatamente o que eu precisava para enxergar potencial em algo que eu nem sabia do que se tratava. O simples fato do trabalho tratar das pessoas e das oportunidades que elas oferecem e não apenas do edifício por sua simples função. A combinação X Bienal de Arquitetura, visita ao topo do Louvre e a conversa com Tuca Vieira e Guilherme Wisnik me trouxeram muitas reflexões sobre o trabalho e muitos registros fotográficos incríveis do edifício.

fase #2 Ainda digerindo o feedback da banca na minha apresentação de qualificação, muitos foram os questionamentos que passaram pela minha cabeça. Quais seriam os pontos que eu teria acertado, errado ou deixado de explorar? O quanto o trabalho era relevante e fazia sentido dentro de uma proposta experimental? Em um primeiro momento, a crítica embasada na falta de aproximação com o meu objeto de estudo não fazia sentido, eu não via necessidade de intimidade com o meu objeto de interesse, tudo estava muito claro e declarado na proposta. O quanto eu me colocava dentro do objeto de estudo para que as experimentações acontecessem. Na primeira orientação após a banca, em conversa com o orientador, apesar da relutância, estava disposto a ouvir qual era o real recado da banca, como eles haviam visto o meu trabalho, como minha entrega havia sido vista pelos professores. Quais eram as necessidades e expectativas que estavam presentes que eu acabei não considerando durante o processo. Essa conversa, que a princípio me pareceu muito difícil, se tornou mais leve rapidamente conforme o orientador me colocou diante da situação que estávamos. Nada estava errado, nada estava perdido. Todas as críticas e questionamentos foram choques para me impulsionar, sair da minha zona de conforto e ir buscar o trabalho onde quer que ele se encontrasse. Dessa maneira, comecei a refletir quais abordagens poderiam ser interessantes para o rumo do projeto e como isso implicaria na aproximação com o edifício. Era necessário um movimento de saída de um ambiente controlado, ir para lugares onde as coisas não pudessem ser previstas, onde tudo fosse mais natural, mais orgânico. Sendo assim, dividi o meu processo de exploração do prédio em algumas etapas. Cada uma delas com um nível de penetração diferente, com resultados materiais diferentes.


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visita ao terraço Em uma das minhas muitas visitas exploratórias ao Copan, decidi subir ao terraço. Queria ver como funcionava essa excursão, saber quem eram as pessoas que tinham interesse em subir até lá e para fazer fotos do prédio. As visitas acontecem todos os dias às 10h30 da manhã, mas escolhi uma quarta-feira, dia 22 de janeiro. Cheguei à sala da administradão onde eles concentram o público para a subida e fiquei lá esperando. Aos poucos, algumas pessoas começaram a aparecer e quando me dei conta, haviam estrangeiros de três países diferentes ali. Um casal, um inglês e uma indiana, e um outro casal da Austrália se não me engano, além de outros brasileiros que como eu que nunca haviam subido ao topo do edifício. Era engraçado perceber os motivos e as expectativas pela vista. O acesso ao topo foi feito pelo Bloco B, subimos até o trigésimo segundo andar e depois mais dois lances de uma apertada escada. Chegando lá, a vista não poderia ser melhor. A imensidão e o caos de São Paulo na altura de nossos olhos. A malha urbana de prédios, ruas, sujeira, pessoas. Tudo se misturava, assustava e encantava. Ao pegar a câmera para começar a fotografar o que eu estava vendo, foi simplesmente muito difícil decidir os quadros. Eram muitas informações que estavam acontecendo ao mesmo tempo; o prédio, as pessoas, a cidade. Depois de alguns minutos digerindo aquilo tudo, começaram a sair as primeiras fotos. O ângulo sobre o prédio era priveligiado. Os brises de concreto pareciam posar para as fotos e toda aquela monstruosidade de concreto começou a se mostrar fotogênica.

etapa #1 / reconhecimento Comecei a frequentar o Copan em vários dias da semana, fazia registros dessas visitas, seja por escrito ou em fotos. Tomava café ali embaixo na galeria, no Café Floresta, era atendido sempre pela mesma balconista, Josiane. Era um momento de reflexão, observação, como as coisas aconteciam, quais eram as oportunidades. A monotonia das visitas se contrapunham com as surpresas pontuais que aconteciam durante elas. Cada dia que passava, conforme eu explorava o Copan e seu ecossistema, sentia necessidade de conversar com as pessoas que ali estavam. Saber qual era a relação que elas tinham com o edifício e como isso poderia ser traduzido como material para o trabalho. Pensando em maneiras de extrair essas informações, resolvi de fato entrar em contato com elas. A partir da pergunta: “quando você ouve falar do Copan, qual figura vem em sua cabeça?”, comecei uma biblioteca visual baseada nas respostas. Entretanto, considerando a espontâneidade e a incerteza das respostas, a minha primeira expectativa sobre essa etapa, havia se quebrado. Conforme as pessoas me respondiam, fui percebendo que talvez não tenha sido a melhor pergunta para tirar as informações que eu gostaria. No primeiro dia, pela pequena amostra de pessoas com que conversei no café, tudo indicava que as pessoas poderiam ter muito para contribuir com suas respostas. Foram cinco pessoas que apesar de não certeiras, responderam dentro do universo previsto. Porém, no quinto dia de conversa com as pessoas, cheguei a conclusão de que eu não conseguiria controlar as respostas, nem a maneira como as pessoas respondiam para que fosse válido para o trabalho. Nem o Café Floresta quis mais contribuir para o trabalho. Percebi que as pessoas apenas falariam comigo se estivessem tomando um café, e não em deslocamento de um lado ao outro. Dessa maneira, fiquei plantado praticamente todos os dias, dos dez dias que visitei o prédio apenas para isso, com o meu caderninho atrás de voluntários para me responder uma pergunta, até que o responsável pelo café pediu para que eu “circulasse”, pois minha presença poderia


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Foram quase trinta minutos lá no alto, consegui fazer o perímetro todo do terraço, tentando produzir o máximo de fotos possível. Antes de encerrar a visita, troquei algumas palavras com a senhora indiana, que me perguntava se eu morava lá no prédio. Ela ficou bastante surpresa quando eu disse que não e contei sobre a supervalorização dos apartamentos lá no Copan. Acredito ter sido uma etapa muito importante e de muitos inputs visuais para a o processo como um todo. As premissas exibidas tanto do edifício quanto da arquitetura moderna, se fizeram claras.

estar espantando os fregueses que não gostariam de ser incomodados. Contrariado, mas muito intrigado com essa atitude, achei que era a hora de repensar essa abordagem e como isso poderia ser validado para o trabalho. Ao total, foram quase 30 pessoas com quem conversei. Apesar de só algumas pessoas terem chegado a resposta em que eu esperava, todo o processo de conversa por ali, foi de suma importância.Ficava clara a necessidade da aproximação com o edifício e de tudo que ele poderia me oferecer.


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visita à x bienal de arquitetura De outubro à dezembro de 2013, a cidade de São Paulo recebeu a X Bienal de Arquitetura. A edição deste ano propôs uma reflexão sobre as dinâmicas que constroem, destroem e reconstroem o caos cotidiano. O lado do “fazer” e do “usar” intrínseco ao domínio da cidade, que provoca a participação ativa do cidadão, como também seu envolvimento para a resolução de problemas deste grande complexo urbano em que vivemos. O tema desta Bienal, “Cidade: Modos de Fazer, Modos de Usar”, questiona os ideias modernistas. Discute o espaço que há entre o fazer uma cidade (tarefa do urbanista) e o usar (a do cidadão). Quão distante são esses dois momentos, essas duas realidades e como isso pode ser minimamente aproximado para a construção de uma cidade mais funcional. De que modo os usuários da própria cidade tem se envolvido na construção de um projeto urbano ideal? Como engajar as pessoas pra que isso aconteça? A X Bienal, articulou uma série de discussões dos impasses e das soluções urbanas atuais por meio de projetos, obras e experiências importantes. Foram três temas fundamentais: mobilidade / densidade, espaço público e infra-estrutura urbana. Em 2013, em especial, a exposição fez uso da própria cidade, ao invés de se concentrar em um único edifício dentro do Parque Ibirapuera, como se fazia até então. Era possível visitar todos os pontos expositivos a partir do transporte público: metrô, trem e ônibus, juntamente com o uso de bicicletas. Na unidade do Centro Cultural São Paulo (CCSP), houve uma área dedicada às grandes construções da cidade de São Paulo, com suas histórias, seus problemas e sua atual situação. Uma dessas grandes

construções era o edifício do Copan, e com ele, propostas de leituras das dinâmicas informais que cruzam a vida do edifício, entrevistas com moradores e funcionários e documentação de materiais históricos referentes a sua construção. Uma das curadoras desse recorte da Bienal, foi Ligia Nobre, moradora do bloco B do Copan que além de curadora, também foi responsável pela organização e edição da plataforma exo, investigação e produção transdisciplinar no campo artístico, promovendo debates, palestras, exposições, projeção de filmes, publicações e residências para artistas e autores. Nesse caso, o Copan operou como dispositivo e catalisador de muitos dos projetos, ações e atividades, sendo base para um pequeno escritório e as residências artísticas.


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X Bienal de Arquitetura de São Paulo, unidade Centro Cultural São Paulo.

Publicação “ O Guia Do Copan” exposta na X Bienal de Arquitetura de São Paulo.


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etapa #2 / privacidade Decidi então, aumentar o grau de intimidade com o edifício. Perder a superficialidade apenas do exterior e ir atrás do que o interior do Copan poderia oferecer. Comecei a procurar e entrar em contato com moradores do edifício para que eu pudesse ir até o apartemento deles e fizesse registros fotográficos de cada um dos ambientes. Registrei toda a privacidade e particularidade de cada uma dos apartamentos, e como eles conversavam tanto com o proprietário quanto com o prédio em si. Cada uma das visitas, foi muito mais do que um registro para o trabalho, as pessoas conseguiram contribuir para o crescimento do projeto. Foram experiências, histórias e referências compartilhadas durante as visitas que contribuíram para a materialização do projeto. A primeira visita foi em um apartamento do Bloco A, dividido por Marlon Brambilla e Eduardo Trevisan, foi um ótimo ambiente para começar os registros. O apartamento era muito peculiar em sua decoração. Muitos objetos eram resignificados e integrados a paisagem do lugar. Manequins espalhados pela sala, livros servindo como mesinha de centro, fotos coladas na parede com fita adesiva. Uma canga de praia enorme presa na parede, com o Copan estampado nela, construia uma metalinguagem com o próprio edifício, e a maneira especial com quem aquele prédio é tratado. A segunda visita foi bastante diferente. No bloco B, tive a oportunidade de conhecer o apartamento de Ligia Nobre, uma das curadoras da X Bienal de Arquitetura aqui em São Paulo e responsável por uma residência artística no próprio Copan. Muito intimo e reservado, o apartamento de Ligia era repleto de livros e trabalhos pessoais. Nas paredes, haviam experimentações gráficas, fotográficas, misturado com referências visuais de seu apreço. Um quitinete de 24 m2 porém muito aconchegante. Ligia pediu para que eu contasse tudo sobre o projeto e que mostrasse para ela as fotos que eu gostaria de utilizar no trabalho, para que ela ficasse ciente do quão exposta estaria. Conversamos sobre referências de projetos gráficos e de que maneira todo esse material poderia ser apresentado. No bloco D, a terceira visita foi no apartamento do ilustrador


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Andres Sandoval. Com 161 m2, às 10h da manhã, todos os cômodos se encontravam tomados pela luz do sol. Tudo era muito claro e bem iluminado. Andres divide o apartamento com um companheiro, onde ambos possuem um salaescritório para trabalhar de casa. Pude conversar bastante sobre o projeto e de quais eram as minhas expectativas e ainda pode observar um pouco de seu trabalho de ilustração que estava sendo feito na hora da visita. Andres se entusiasmou com a proposta, questionou o por quê eu havia escolhido esse tema e recorte de estudo, se envolveu com a proposta e questionou alguns pontos, seu entusiamo foi importante para mim naquela etapa do trabalho. Todos os ambientes eram muito divertidos, era visível a intenção bem humorada de certas peças. No bloco C, foi a vez do meu próprio orientador abrir as portas de seu apartamento para o trabalho. A terceira visita foi com Daniel Trench e Fernanda, sua esposa. Com 122 m2 e em formato de estúdio, todos os ambientes recebiam algum tipo de apelo visual. Obras de arte, peças gráficas, cadeiras, objetos de decoração, tudo parecia muito bem harmônico e bem escolhido. Graças a grande janela, tudo era muito bem iluminado, e apesar da sensação de falta de privacidade pela ausência de qualquer tipo de cortina, é possível ver a imensa extensão lateral da ondulação do prédio, a exposição se torna menor e menos importante dentro do todo. Uma das surpresas que tive com relação a visita aos blocos, foi o bloco E de 69 m2. Visitei o apartamento do designer Carlos Teles e somente nesse momento me caiu a ficha na diferença grotesca que há em relação à distribuição do espaço tanto dos apartamentos em relação aos andares quanto aos cômodos dentro do próprio apartamento. Carlos divide o lugar com um colega que conheceu na faculdade. O espaço entre a sala e o quarto, é dividido por um armário e uma parede estrutural, originais do próprio edifício. Com isso os móveis do apartamento se encaixam de acordo com a distribuição de cada um dos ambientes. Posters de filmes e séries de televisão decoram a sala, tudo muito particular, uma vista muito diferente das demais unidades que já havia visitado, sem brises, com janelas cobertas pelos cobogós. O último e mais difício bloco de fotografar foi o F. Eloisa é


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amiga do Marlon (moderador do bloco A) e me passou seu contato para que eu tentasse conversar com ela. Depois de muitas tentativas conseguir visitar a quitinete de 26 m2 do bloco que me faltava. A falta de móveis pela insuficiência de espaço, faz com que boa parte dos livros e objetos se encontrem no chão, empilhados. Apenas uma escrivaninha com alguns papéis em cima, uma cômoda e uma cama. Eloisa é artista plástica, um cavalete com uma tela e seus materiais de pintura dividem o pouco espaço que há para circular. Com o apartamento do bloco F fotografado, eu terminava minha jornada em busca de apartamentos de todos os blocos. Foram muitas conversas, histórias e com toda certeza, cada uma das pessoas que tiveram seus apartamentos registrados para este projeto, tiveram uma participação fundamental em sua forma final.

etapa #3 / materialização livro Com todo o material em mãos, a terceira etapa contava com a difícil missão de materializar o processo que eu havia vivido. De que maneira eu poderia contar e mostrar toda essa investigação visual, dentro da proposta inicial do trabalho de representação e releitura da informação? Sendo assim, vários foram os pontos discutidos durante as orientações. Qual o alcance que gostaria de atingir com o trabalho? Ele seria impresso ou digital? Ou tudo poderia ser resumido em algum tipo de linguagem audiovisual? Depois de analisar os prós e contras das possíveis plataformas, ao meu ver, uma publicação impressa foi a que melhor se encaixou para contar essa história. A materialização de um processo e de um objeto em um suporte físico. Daí em diante, vários foram os testes de linguagem e de montagem dessa publicação, sempre com a intenção de enfatizar e deixar claro como havia sido essa descoberta. O dentro e o fora do Copan, os dois planos que fizeram parte integralmente de todo o trabalho e como foi feita essa investigação. A ideia era traduzir para a pessoa que folheasse a publicação,


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a mesma curiosidade e descoberta do “dentro” do livro – e do próprio prédio, que proporcionaria a quebra da superficialidade, chegando ao íntimo de cada uma das pessoas expostas ali. No primeiro protótipo, a ideia era que a descoberta das informações acontecesse pela visualização das imagens cobertas por um filtro. As informações eram impressas em azul e em vermelho e sobrepostas para a impressão. Dessa maneira, conforme cada um dos filtros azul e vermelho fossem colocados em cima da impressão parte da informação se revelaria, ao mesmo tempo que outra parte se esconderia.


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Teste de impress達o e montagem #1.


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Teste de impress達o e montagem #2.


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O manuseio do livro com filtros não era confortável e, para mim, prejudicava a fluidez da leitura, por isso ainda não me sentia satisfeito com o resultado, o que me levou a pensar em outras alternativas de confrontar o “dentro/fora” e a “forma/ conteúdo”. Com o passar do tempo e dos testes, a materialização da contraposição entre dentro/fora acabou ganhando outras formas de leitura e também de alusão à evolução do desenvolvimento do trabalho. A nova forma que pensei para a publicação funciona a partir da dinâmica de dentro e fora do próprio conteúdo. Todas as informações impressas no papel polén, referem-se às descobertas e investigações feitas dentro do próprio edifício, nesse processo de aproximação e penetração do objeto de estudo. Já as informações impressas no vegetal que revestem o pólen cumprem a função de cobrir e não revelar totalmente o que está por trás, são informações frias e superficiais sobre o prédio. Dessa maneira, o entendimento dessa publicação proporcionará uma experiência do processo simulada nas páginas do livro. Onde sua curiosidade e vontade de ver o que está escondido, decidirá de que maneira ele chegará ao conteúdo. As folhas translúcidas funcionam como janelas, que ao mesmo tempo revelam e escondem o conteúdo dos apartamentos. A costura aparente corresponde às estruturas não escondidas do edifício, característica marcante na arquitetura moderna. A tipografia utilizada, a Fakt, desenhada por Thomas Thiemich e publicada pela OurType em 2010, é coerente à proposta e foi escolhida sem a intenção de interferir no layout ou no conteúdo. Continuando nessa série de alusões, as fotos foram feitas para registrar um momento íntimo e pessoal, tratadas com cores quentes, que gradualmente se tornam mais invasivas, conforme o livro vai sendo descoberto.


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visita à garagem Para a produção das imagens que se apresentam nos postais, foi necessária uma visita à garagem. O que a princípio parecia ser um processo fácil e simples, se mostrou muito intrigante em vários aspectos. A primeira tentativa de fotografar o subsolo foi em um dia de semana normal, estava em conversa com o Daniel quando decidimos ir até lá para tentar fotografar. Ao chegar na garagem, logo quando tirei a câmera para começar a fotografar, o segurança incisivamente me disse que eu não poderia fazer nenhum registro ali, apenas com a autorização do síndico e acompanhamento de um funcionário do próprio Copan. Lá fomos nós, subi com o Daniel até a sala do Afonso Celso, síndico do edifício há vinte e um anos. Afonso é conhecido por todas as melhorias que o prédio vem passando mas também por sua silenciosa tirania. Amor de alguns moradores e ódio de outros. Ele me disse que seria necessário marcar uma data com ele para que eu fosse até o subsolo acompanhado de um funcionário específico e que eu não poderia, de maneira alguma, mostrar as placas dos carros da garagem em nenhuma de minhas fotos. Acordo feito, pegamos o contato com ele e decidi agendar uma visita guiada para que fosse possível fotografar a garagem. Marquei para uma segunda-feira de carnaval, isso mesmo. Como não ia viajar, achei que fosse uma ótima oportunidade para fazer as coisas com mais calma. Cheguei às 9h30 da manhã para encontrar com o Afonso, assim como o combinado. Logo na portaria o porteiro achou muito estranho, falou que não havia ninguém na administradão, que estava tudo fechado. Insisti para que ele tentasse ligar lá para falar com alguém e assim como o combinado, o grande

postais Outro trabalho e materialização que se fez possível para o projeto, foi a criação de uma família de doze cartões postais para o Copan. O conteúdo destes cartões postais tem como objetivo, deixar público aquilo que é privado. São registros fotográficos da garagem do Copan, ambiente onde nem todos os moradores conhecem e os visitantes do edifício muito menos. A intenção, é ligá-los pelas mensagens que as placas da garagem ditam, e como isso se completa com o restante da proposta do prédio. Os postais poderiam ser facilmente vendidos na banca de jornal que há em frente ao Copan, mostraria para os interessados, algo que não consegue se observar apenas do lado de fora, e sim do lado de dentro. Um cartaz contendo a planta baixa da garagem, envolve e enfatiza a relação de dentro e fora objetivada aqui neste trabalho. Dessa maneira, ficam claras as diversas maneiras que podemos contar uma história, representar informações ou desenvolver um novo alfabeto. O código se faz presente e se torna didático, a partir do entendimento das peças apresentadas e como esses elementos se relacionam.


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Afonso estava lá me esperando. Conversei rapidamente com ele e pediu para que eu me dirigisse até o bloco B, lá alguém me acompanharia até o subsolo. Severino é o nome da figura que me acompanhou nas fotos, me levou na copa onde os funcionários fazem as refeições, me contou as histórias por detrás dos carros, a inflação nos preços da vagas e dos apartamentos e me mostrou também o coração do Copan. Sim, de acordo com o Afonso, um cabo de aço que nasce no subsolo e morre no terraço, contínuo e interrupto vibra com o prédio, como se fosse seu coração.


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o prédio fala A proposta “o prédio fala” trata da exposição e da colaboração dos próprios usuários do prédio sob sua estrutura. O edifício ainda é o assunto, mas sua estrutura agora faz o papel de suporte do próprio experimento, o prédio falando sobre o próprio prédio, explicitando essa metalinguagem entre o meio e a mensagem. Com seis projetores localizados nos edifícios próximo ao Copan, as pessoas poderão enviar uma mensagem de texto para um número, respondendo qual imagem vem à cabeça delas quando pensam no prédio – com uma limitação máxima de caracteres, algo em torno de 140. Juntamente com a resposta, as pessoas devem informam o bloco ou região próxima ao bloco que se encontram. De modo que um servidor receba essa mensagem e direcione para o projetor correspondente ao bloco, projetando assim, a mensagem em uma linha de texto que tem origem na base do prédio e que sobe até o topo. Devido à infraestrutura necessária e grandiosidade da intervenção, a proposta é que ocorra em apenas uma única noite, como um grande evento do edifício para/com a cidade. Para ser assistido de inúmeros pontos do centro de São Paulo, bastaria alguns minutos para que as pessoas pudessem se dar conta que o gigante de concreto está de fato se expressando. Muito mais do que tornar pública a manifestação dessas pessoas, a ideia é questionar qual a real fonte dessas mensagens? Do Copan ou de seus usuários? O Copan é definido por seus habitantes ou por sua arquitetura? Com o próprio prédio controlando essa “voz”, a intervenção se torna a literal mensagem que o Copan tem para passar para a cidade. Servindo como suporte da própria proposta, o edifício se faz como emissor, receptor, meio e mensagem. Uma referência do que seria e da dimensão dessa proposta, é o trabalho da artista americana Jenny Holzer, onde o maior foco de seu trabalho é usar palavras – e textos – projetados em grande espaços públicos.


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(1) Peças de comunicação espalhadas pelo prédio informam o evento e suas instruções para a participação. (2) A intervenção terá dia e hora certa para acontecer. (3) Com o aparelho celular, os usuários escreverão as mensagens, assim como, o bloco em que elas se encontram. (4) As mensagens devem ser enviadas para um determinado número, fornecido na comunicação da intervenção. (5) Um servidor receberá todas as mensagens. (6) Será enviado para o projetor do bloco correspondente, a informação com sua mensagem. (7) O projetor daquele receberá a mensagem que será projetada na fachada do prédio.


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Simulação da projeção na fachada (mensagem projetada na região do Bloco B).

A

B

C

D

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F

Divisão da fachada do edifício por regiões de cada um dos blocos.


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jenny holzer Nascida em 1950, é uma artista visual americana que hoje vive e trabalha em Nova Iorque. Holzer é mais conhecida por seus trabalhos em grande escala em locais públicos, incluindo outdoors, projeções em construções urbanas e outras estruturas arquitetônicas. O foco de seu trabalho é o uso de palavras e ideias em espaços públicos. Usa como matéria prima de suas obras; posters na rua, sinalizações em led e aos poucos foi incorporando placas de bronze, painéis pintados, adesivos, camisetas, fotografias, sons, vídeos, luzes, projeções, a própria internet e o carro de corrida Le Mans.

Projeção realizada no rescém restaurado museu de Guggenheim, em Nova Iorque em 2008.


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vigia A referência para essa proposta, é o trabalho de Bruce Nauman, que apresenta em suas instalações o questionamento do que é vivido, do que é gravado e do que é reproduzido. O que acaba ligando os trabalhos, é justamente a reflexão sobre os métodos de autovigilância e autocontrole, dentro de um ambiente indefinido por sua coletividade. Mantendo o questionamento dos espaços de dentro e fora, outra maneira proposta para apurar uma reflexão sobre a auto-imagem do prédio, é colocar a figura do morador do Copan como material de sua própria observação. A ideia é que no momento que os moradores passam no elevador, fosse um momento de reflexão sobre seus próprios hábitos. O elevedor sendo um espaço híbrido entre o público e o privado, serviria de cenário para essa experimentação. Para que isso acontecesse de forma mais impactante e curiosa, monitores colocados em cada um dos elevadores, reproduzem imagens ao vivo do um outro elevador de outro bloco. O que em um primeiro momento, poderia ser estranho e confuso, deixando na dúvida qual seria a origem daquela imagem. Podemos considerar um movimento de observação e de diálogo entre dois eixos. No eixo vertical, os habitantes se deslocam até seus respectivos destinos, para cima e para baixo, por outro lado, observam um outro ambientente que se encontra em um eixo horizontal, em outro bloco. Uma varredura do prédio lida de uma forma virtual e espacial. Dessa maneira, o registro que tangencia o público por ser uma uma área comum a todos e o privado por já estar dentro da área reservada do edifício, o que se torna um ponto de partida para a reflexão. Quem registra? Quem é registrado?


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A

De forma aleatória, a imagem de um determinado elevador de um bloco será reproduzida dentro de outro elevador de um outro bloco. Sem qualquer tipo de identificação da real origem daquela imagem.

Simulação da reprodução das imagens dentro do elevador.

B

C

D

E

F


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bruce nauman Nascido em 1941 nos estados unidos, Nauman é um dos pioneiros do uso do vídeo nas artes plásticas. Algumas de suas video-instalações discutem, por meio de imagens captadas em câmeras usualmente utilizadas em sistemas de segurança, as ideias de representação e deslocamento. A palavra também é matériaprima para o artista, sobretudo nas obras em que usa neon como suporte.


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Going around the Corner Piece, 1970. Instalação de vídeo em circuito fechado com 4 câmeras preto e branco, 4 monitores preto e branco e um cubo branco de 284 x654 x654 cm.


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desaparecimento Partindo da importância e da relevância do edifício, essa proposta questiona o exterior, o lado de fora do Copan. Uma instalação em que toda a sinuosa fachada do grande prédio, fosse tomada por espelhos que só refletissem o que há em sua volta. Fazendo assim, com que o prédio desparecesse para aqueles que o observam apenas de longe. O que aparantemente pode parecer banal, trás a tona a relação o prédio com a cidade. Assim como seu impacto como conjunto habitacional. Como o Copan é interpretado pela rede urbana de São Paulo e qual seria a grande mudança caso isso fosse “limpo” das vistas de quem o vê constantemente. Levanta, novamente a discussão apresentada anteriormente, sobre o que de fato é o Copan, o que o representa, seus habitantes ou sua arquitetura? Nesse caso, a anulação de um desses componentes, trás uma das possíveis respostas. Apesar do prédio “desaparecer” todo o ecossistema que o envolve continuaria existindo. Todos os quase dois mil habitantes ainda fazem parte desse conjunto, porém agora, invisível. Uma experiência que questionaria as soluções do fazer e do usar a cidade – discutido anteriormente na X Bienal de Arquitetura de São Paulo. O que de fato essa perspetiva que há sobre o prédio, interfere na maneira com que ele se relaciona com a cidade? Como exergamos um experimento social com essas proporções dentro de um centro onde tanto se questiona sobre a verdadeira usabilidade da cidade? O projeto Morar do Coletivo Garapa, desenvolveu um experimento parecido, porém com o Edifício Mercúrio. Trata-se de um arco de memória sobre a existência e o desaparecimento do prédio. Toda sua história e a vida de seus habitantes até a hora de sua demolição.


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Simulação da implantação de espelhos na fachada do prédio.


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coletivo garapa A Garapa é um espaço de criação coletiva, fundada em 2008 pelos jornalistas e fotógrafos Leo Caobelli, Paulo Fehlauer e Rodrigo Marcondes. O objetivo do coletivo é pensar e produzir narrativas visuais, integrando múltiplos formatos e linguagens, pensando a imagem e a linguagem documental como campos híbridos de atuação. A tangibilização dos projetos do Garapa acontece de diversas maneiras, em ambientes, clássicos e modernos, desde a fotografia estática à interação multiplataforma, do vídeo à instalação, exposição e plataformas multimídias.

Morar é um projeto que registra a existência e a desaparição dos edifícios São Vito e Mercúrio, que foram demolidos em 2011.


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de costas De acordo com as especulações, ainda em 2014, o Copan iniciará suas obras de revitalização, uma reforma completa de sua fachada com o intuito de reparar os ladrilhos que vem caindo. Com isso, será necessário que o prédio seja inteiro coberto por uma tela protetora durante o período da obra. A intenção aqui, é de inverter os lados do Copan. Para muitas pessoas, a imagem que se tem do Copan é a vista do lado dos brises. Estrutura que caracteriza porém privatiza o conteúdo do prédio, o contrário de seu “verso”. Do outro lado, o Copan é uma grande janela, onde todos os apartamentos são expostos para o lado de fora. Tudo é visível e compõem uma grande fechada de quadros privados dentro dessa imensidão pública. Para a quebra e inversão dessa posição do verso público do prédio, seria impresso nessa tela protetora justamente o lado dos brises, e vice versa. A ideia é que os usuários e própria cidade enfrentem esse lado exposto do Copan e vejam quais são as verdadeiras consequências disso. Apesar de ser um mídia impressa, o que não apresenta interação alguma com o usuário, pode causar estranho ao longe. Seria uma experiência social tanto para o prédio quanto para os próprios habitantes, que teriam seus apartamentos vistos de outra maneira pelas pessoas que ali observam. O grande cartão postal de São Paulo estaria de costas, e poderíamos ver qual o seu âmbito mais importante que o torna essa figura tão importante. Christo e Jeanne-Claude tem como essêncial em seu trabalho, o envelopamento de espaços e estruturas urbanas. Propõem uma nova maneira de ver paisagens comuns, brincam com a escala e todo seu impacto.


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Simulação do envelopamento do edifício com sua tela de proteção impressa. Antes e depois.


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christo e jeanne-claude Nascidos na década de 30; Christo na Bulgária e e JeanneClaude no Marrocos, trabalham com obras em escala ambiental. Seus trabalhos mais conhecidos são aqueles em que prédios, ilhas e pontes são recobertos, ou enlevados, por tecido. São nessas açõe que a dupla nos chama atenção para estruturas que normalmente não nos atemos. Criam, desse modo, instalações vigorosas que nos fazem repensar o modo que vemos as paisagens.

Intervenção no edifício Reichstag em Berlim, na Alemanha.


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3. considerações finais Ao final deste projeto, foi possível perceber algumas questões. A medida que o trabalho se desenvolvia, assuntos que sempre foram do meu interesse e de meu apreço estético, se mostravam cada vez mais presentes. Desse modo, arquitetura moderna, poesia concreta, estilo (tipográfico) internacional parecem ter surgido naturalmente como temas que perpassam essa pesquisa. Ao perceber que todo esse universo fazia parte tanto de quem eu sou pessoalmente quanto profissionalmente, me vi diante de um projeto que poderia dizer muito a respeito das minhas escolhas. No início, vários fatores foram de muita importância para a escolha do tema, porém dois me pareceram mais relevantes: era preciso que esse fosse um trabalho experimental, pois assim seria possível explorar ao máximo a maneira como o design e seus significados são desenvolvidos e aplicados à realidade de hoje e que oferecesse a possibilidade de comportar todas as minhas expectativas de amadurecimento profissional diante das reflexões iniciadas aqui. Conforme eu listava os temas que me interessavam, todos pareciam partir de decisões pré estabelecidas de formato ou formas de leitura. Dessa maneira, conclui que, antes mesmo de decidir em que suporte a linguagem será aplicada, ou se a própria linguagem se coloca no campo da tecnologia ou da poesia, o experimental estaria na maneira em que a informação se apresenta para o usuário e com qual alfabeto ela será interpretada. Apesar de todas essas decisões que pareciam certeiras e firmes, tudo se modificou e se transformou ao longo do processo. O maior entendimento que tive durante o trabalho, não foi do tema escolhido para ser desenvolvido, e sim, do próprio processo de trabalho.


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Aceitar que as coisas fujam de seu controle e trabalhar sem pensar em um fim, foi um processo doloroso e intenso, mas que se mostrou riquíssimo nas possibilidades. Apesar de soar – muito – clichê, digo que a saída da zona de conforto e do ambiente controlado, foi o que tornou esse projeto o que ele é hoje. Poder folhar esses textos e perceber que fiz coisas que não estavam nem nos primeiros rascunhos desse trabalho de conclusão de curso é intrigante. Todas as angústias e desesperos sentidos e o medo pelo qual o rumo do trabalho poderia tomar, são facilmente justificadas, e de certo modo, essenciais para tudo o que foi apresentado aqui. Acredito que a experiência vivida, por conta de toda a proposta deste projeto, encerra muito bem o período acadêmico. Ao final, o resultado gerado por ora não foi algo que pode ser definido por um nome, todo o processo é uma entrega, o projeto é reflexo dos recursos e do modo como o trabalho foi se desenvolveu. Os registros apresentados aqui se esforçam para revelar o processo de uma pesquisa exploratória, fundamental para a enunciação do tema desse projeto e para a definição de seu objeto de estudo, o Edifício Copan. O Copan é apenas uma das infinitas possibilidades, é possível pensar em outros organismos que trazem o mesmo questionamento do espaço público-privado e sua relação com a cidade. Pontos considerados turísticos, mas que sofrem da raza observação e da superficialidade urbana. Esse processo, portanto, tem a capacidade de ser aplicado à outros projetos, o que poderia dar sequência a esse estudo com outros recortes relacionados. Não acredito que esse projeto tenha um fim ou uma conclusão, ele é um processo constante, um exercício do olhar, que está longe de terminar. Tenho a impressão de que essa foi uma grande oportunidade de um projeto experimental, com liberdade de escolhas, desprendimento com o “certo” e o “errado” e um questionamento sobre o papel do Design e do designer.


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4. referências bibliográficas ANDREOLI, Elisabetta; FORTY, Adrian. Arquitetura moderna brasileira. Londres: Phaidon Press, 2004. ARGAN, Carlo Giulio. Arte Modernda: Do iluminismo aos movimentos contemporâneos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia Das Letras, 2007. BOHNACKER, Hartmut; GROSS, Benedikt; LAUB, Julia. Generative design. Nova Iorque: Princeton Architectural Press, 2012. BRINGHURST, Robert. Elementos do estilo tipográfico. São Paulo: Cosac Naify, 2005. CARDOSO, Rafael. Design para um mundo complexo. São Paulo: Cosac Naify, 2012. FARKAS, Solange. Catálogo da exposição: Alfabeto Infinito. Porto Alegre: Fundação Iberê Camargo, 2013. FLUSSER, Vilén. O mundo codificado. São Paulo: Cosac Naify, 2008. FRIEDL, Peter. Trabalhando no Copan. São Paulo: Sternberg Press. 2005-2007


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