Economia Alternativa

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Bruno Toranzo • Carolina Vertematti • Cintia Potelecki

ECONOMIA ALTERNATIVA UMA NOVA MANEIRA DE ORGANIZAR O MUNDO

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ECONOMIA ALTERNATIVA UMA NOVA MANEIRA DE ORGANIZAR O MUNDO

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Bruno Toranzo • Carolina Vertematti • Cintia Potelecki

ECONOMIA ALTERNATIVA UMA NOVA MANEIRA DE ORGANIZAR O MUNDO

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Alunos / Autores

Bruno Victor Dela Páscoa Toranzo Carolina Vertematti Gonçalves Cintia Roberta da Silva Potelecki Orientador do Projeto Experimental

Prof. Rodolfo Carlos Bonventti Coordenadora dos Projetos Experimentais

Profa. Dra. Verónica Aravena Cortes Ilustração e design gráfico

Raoni Felix Impressão

GB Print T63e Toranzo, Bruno Victor Economia alternativa : uma nova maneira de organizar o mundo / Bruno Victor Toranzo, Carolina Vertematti Gonçalves, Cintia Roberta Potelecki. 2009. 198 p.: 21cm Monografia (graduação em Jornalismo) --Faculdade de Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2009. Orientação : Rodolfo Bonventti 1. Economia alternativa 2. Reciclagem 3. Plástico (Reciclagem) 4. Meio ambiente I. Gonçalves, Carolina Vertematti II. Potelecki, Cintia Roberta III. Título. CDD 070.4

Projeto Experimental apresentado em cumprimento parcial às exigências do Curso de Jornalismo da Faculdade de Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social Habilitação Jornalismo.

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Agradecimentos Aos nossos pais Aos nossos mestres Aos nossos amigos Aos nossos colaboradores

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I´ndice Apresentação

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Parte 1 • Velha e nova economias 15 - O mercantilismo origina a economia industrial 21 - A reformulação do pensamento econômico 25 - Os britânicos dominam o mundo 27 - As distâncias ficam cada vez mais curtas 29 - O recém-formado mercado financeiro vive a primeira grande crise econômica 30 - O liberalismo de mercado sofre sua maior derrota 35 - A formação de uma nova organização econômica e política 37 - A especulação financeira se fortalece 42 - O liberalismo de Milton Friedman faz suas vítimas 44 - O perigo de deixar os agentes financeiros atuarem livremente 48 - O florescer de uma nova economia 54

Parte 2 • Crédito 59 - A injusta lógica do curto prazo: ou míseros ou pobres 64 |7|


- A nova economia está no crédito solidário 68 - O crédito solidário no Brasil 73 - O governo abriu os olhos para os benefícios do microcrédito 73 - Os bancos brasileiros só pensam em lucro 79 - A Reforma Agrária no Brasil 83 - Getúlio Vargas ignora os trabalhadores rurais 85 - A industrialização cria grandes cidades 85 - Estatuto da Terra: uma nova maneira de organizar as relações 87 - Fim dos militares no poder 89 - Propriedade Familiar 90 - Modelo Agro-Exportador 91 - Propriedade Familiar versus Modelo Agro-Exportador 92 - Conflitos envolvendo a terra 93

Parte 3 • Consumo 95 - A formação da sociedade de consumo brasileira 100 - O consumidor nacional aumenta seu poder de compra 102 - Uma breve história das classes sociais 104 - Os estudos que detalham as classes sociais do país 105 - O consumo com responsabilidade é tarefa de todos 108 - O exagero leva ao desperdício 112 - As pessoas jogam no lixo 1/3 dos alimentos que compram 115

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Parte 4 • Meio ambiente 119 - Nasce o conceito de desenvolvimento sustentável 123 - O Protocolo de Kyoto naufragou 125 - Copenhague: esperança ou desilusão? 129 - A Floresta Amazônica é uma riqueza ainda gigantesca 132 - Brasil: o país da energia renovável. Até quando? 134 - O fim da importação dos pneus usados 137 - A construção que respeita o meio ambiente 139 - O privilégio de receber o selo LEED 140 - A campanha “One Degree Less” quer reduzir a temperatura 143 - Os projetos arquitetônicos a serviço do meio ambiente 145 - O mundo já enfrenta problemas trazidos pela falta de água 148 - A água do chuveiro pode ser reutilizada 149 - A água da chuva pode ser utilizada 151 - O óleo de cozinha tem de ser reciclado 152 - A ONG que vai atrás do óleo 155 - As sacolas plásticas não são boas quanto parecem 156 - As padarias adotam o projeto “Sacola Vai e Volta” 158 - Os supermercados também estão dentro 159

Parte 5 • Dicas e ideias 161 Notas

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˜ Apresentacao

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hora de mudança. Passamos por um momento de transição. Aquela tradicional economia, dependente dos combustíveis fósseis como o petróleo e o carvão para produzir em escala crescente, tem de ser substituída. Essa subs­tituição não se trata de um capricho. Na verdade, o meio ambiente dá sinais de que não aguenta mais. Uma das grandes razões da alteração, motivo de discussão no encontro de quaisquer líderes de governo, chama-se aquecimento global, causado pelos gases-estufa advindos, entre outras fontes, da queima das termoelétricas e da combustão do motor dos veículos. A recente crise econômica nascida no mercado imobiliário dos Estados Unidos, considerada a mais grave desde a quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1929, mostrou que, ao contrário do defendido pelos figurões de Wall Street, o mercado precisa de uma fiscalização rígida de suas atividades. Enquanto os contribuintes americanos, cuja quantidade de desempregados permanece crescendo, arcavam com as consequências da irresponsabilidade daqueles que deveriam administrar o dinheiro com sapiência, os executivos continuavam, apesar do estrago causado, recebendo bônus lucrativos das empresas que, por sua vez, se encontravam em processo de salvamento pelo governo. O resultado de um mercado desregulado, motivo da enorme instabilidade econômica, foi o aumento da miséria no mundo. Com a piora das condições de vida devido ao período de crise, a projeção de um órgão da ONU apontou que, até o fim de | 11 |


2009, um bilhão de pessoas vão passar fome todos os dias. Um triste recorde negativo, já que as Nações Unidas jamais registraram esse número, está prestes a se confirmar. O quase colapso do sistema financeiro, desencadeado pelos créditos de risco concedidos pelas agências hipotecárias que foram transformados em ativos para serem negociados nas bolsas de valores internacionais, serviu, pelo menos, para abrir os olhos da sociedade a respeito dos graves problemas do capitalismo radical defendido pelos ferrenhos liberalistas. Antes dessa acentuada queda das atividades, a sociedade já sabia das características negativas do modelo fundamentado na busca de resultados positivos no lucro prazo para atender a fome insaciável por resultados dos acionistas, mas quase não manifestava, salvo movimentos isolados, sua insatisfação. Agora, de maneira urgente, o objetivo deve ser a completa adoção de uma nova estrutura. Além de os governos incentivarem, por meio de práticas de apoio, como os subsídios e a isenção fiscal, a substituição da matriz energética suja, concentrada no uso dos combustíveis fósseis, pela renovável, com destaque para os recursos naturais que não passam por nenhuma interferência humana para gerar energia, as empresas, sob pena de multa e arranho da credibilidade, precisam contabilizar os gastos sociais e ambientais em seus negócios. O papel do consumidor é fundamental nesse processo. Através da escolha das marcas responsáveis na hora das compras, ele tem a capacidade de deixar de lado os produtos de determinada empresa que não esteja cooperando. A internet também possibilita que as pessoas comuns façam suas reclamações para um público expressivo, conectado à rede quase o dia inteiro, e exijam transparência e práticas sustentáveis das poderosas multinacionais. Aliás, o poder dessas gigantes­ cas empresas, presentes em praticamente todos os lugares, é comprovado pelo faturamento superior ao PIB (Produto Interno Bruto) de muitos países. | 12 |


Para complementar essas grandes ações da nova economia, destacamos como fator de inclusão social o empréstimo a juros reduzidos por possibilitar que os pobres tenham uma chance de melhorar seu modo de vida. O Banco Grameen, criado pelo economista bengalês Muhammad Yunus, foi a instituição de crédito popular que serviu de exemplo para o surgimento de projetos similares no mundo. Quase 50% da população de Bangladesh, país onde o banco atua, vive abaixo da linha de pobreza. A carteira de clientes já chega a quase 8 milhões. Depois de conceder oportunidade para muita gente, Yunus ficou conhecido como “o banqueiro dos pobres”. Só que nada disso adianta se as pessoas não colocarem em prática aquilo que estão cobrando dos empresários e do próprio governo. As atitudes do dia a dia, como a responsabilidade com o gasto comedido da água, além do comprometimento com a separação dos materiais que possam ser reciclados, são tão importantes quanto as mudanças protagonizadas pelos setores produtivos. Nosso pensamento, antes acostumado com o desperdício, precisa se adaptar aos novos tempos, dias que conside­ram fundamental a racionalidade, através do uso cons­ ciente da natureza para o desenvolvimento. No final deste ano, os países vão se reunir em Copenhague, capital da Dinamarca, para discutir um novo acordo do clima. Para combater o aumento da temperatura do planeta, os países desenvolvidos devem se comprometer a reduzir suas emissões de gases, como o dióxido de carbono, que retenham o calor dentro da Terra. Mesmo que as negociações estejam em ritmo muito lento, a expectativa é a de que possamos, finalmente, fechar um verdadeiro plano global de proteção do meio ambiente.

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Parte 1 velha e nova

economias

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A General Motors criou o modelo ˜ frequente de insatisfacao

A

s mudanças nos novos modelos precisam ser extremamente atrativas para criar um certo grau de insatisfação com os carros antigos”, afirmou no século passado Alfred P. Sloan Jr., executivo-chefe da General Motors. Essa preocupação em inovar nas características de cada auto­ móvel, criando uma insatisfação constante no consumidor, fez com que Sloan Jr. levasse a General Motors para o topo do mercado automobilístico mundial, posição que ocupou até pouco tempo atrás. Quando chegou à vice-presidência de operações da montadora, no ano de 1920, a GM tinha uma participação de menos de 20% nas vendas de automóveis no mercado estadunidense. Ao deixar o cargo de executivo-chefe do grupo em 1956, a liderança já havia sido conquistada, com uma participação de 52%. Mais do que os resultados impressionantes, Sloan Jr. criou um estilo de vida relacionado à empresa, uma identidade própria, que se confunde com a história dos Estados Unidos. Pode-se dizer que a ascensão da empresa no cenário automobilístico e o domínio americano do contexto geopolítico mundial ocorreram praticamente ao mesmo tempo. Ao final da Segunda Guerra Mundial, na contramão de outros países e empresas, ambos estavam em franco crescimento. Certa vez, um amigo de Sloan Jr., que já ocupava o cargo exe­cutivo mais alto da GM, sugeriu que ele comprasse um iate, símbolo de status da época. Depois de alguma hesitação, não muito certo a respeito do conselho, meio a contragosto, comprou o objeto de luxo por cerca de US$ 1 milhão.

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Ao final de algumas viagens, com uma tripulação de 43 pessoas, a um custo anual de pouco mais de US$ 140 mil de manutenção, o industrial resolveu vender o iate. O prejuízo estava consolidado, já que negociou o barco a um preço muito menor do que pagou. A venda foi sacramentada por US$ 175 mil. No final das contas, Sloan Jr, que raramente bebia e não fumava, concluiu que as viagens de iate, assim como a prática de qualquer esporte, eram notáveis perdas de tempo. Com a palavra trabalho na cabeça, sujeitando-se a rotinas cada vez mais estressantes, ele ficou quase vinte anos à frente da General Motors (1937-1956). Como presidente, durante os complicados anos 20 e começo dos 30, conquistou sua mais importante vitória para cima da grande rival, a Ford. As vendas de carros da GM saltaram dos US$ 698 milhões para US$ 1,5 bilhão ao ano. Isso significou ultrapassar a montadora do magnata Henry Ford nos modelos populares, lucrativos por serem uma opção barata para o consumidor. Como resultado, as ações da companhia se valorizaram 480% durante esse período. Através da inovação, com carros diferentes uns dos outros a cada lançamento, Sloan Jr. conseguiu deixar para trás a hegemonia da Ford. Ao contrário da GM, Henry Ford produzia sempre o mesmo automóvel. Não se preocupava em mudar o desenho ou estilo de cada carro. Um dos slogans da campanha de vendas dizia exatamente o seguinte: “você pode ter o Ford que quiser, desde que seja na cor preta”. Por essa razão, perdeu o controle do mercado e embarcou em uma curva decrescente de resultados. A origem do sistema de produção e comercialização praticado em nossos dias veio da indústria automobilística. Evidente­ mente que a maneira de produzir um carro é muito diferente daquela verificada ao confeccionar um sapato, por exemplo. Só que o modo de produzir, sempre voltado para o público de massa, em um sistema de larga escala, foi criado pelos figurões | 18 |


dos automóveis. Nesse tipo de produção, as máquinas são mais importantes que os próprios trabalhadores. A rapidez do trabalho maquinário multiplica a produção e aumenta os ganhos dos industriais. Quem introduziu essa mudança no ambiente corporativo foi Henry Ford com o modelo Ford T. Lançado em 1908, o carro custava US$ 850. Para aqueles que não se lembram das suas características, reparem a presença quase absoluta desse automóvel nos filmes antigos. Foram vendidos 15 milhões de unidades em apenas vinte anos. Conhecido no Brasil como “Ford de Bigode”, era totalmente feito de madeira. O Ford T se mostrava muito resistente, apto a sobreviver às terríveis condições das estradas da época. A velocidade máxima não passava dos 55 km/h, bem atrás das máquinas de Fórmula 1 dos nossos tempos, que voam acima dos 300 km/h nos circuitos da categoria. Ao oferecer o carro, a partir da metade da década de 1910, em apenas uma cor, a preta, o que diminuía os custos de produção, ao longo de 19 anos, a Ford cometeu um terrível engano. Muito estrategicamente, como discutimos nos parágrafos anteriores, a General Motors apostou em um conceito fundamental no ambiente de negócios. A publicidade avançou no sentido de criar mecanismos de sedução do consumidor para a compra dos seus carros. Ou seja, a cor, ao lado da variedade de desenhos, mesmo que essa diversidade consuma um investimento maior, adquiriu importância no processo de atração dos consumidores. Os publicitários tinham como meta inovar. O objetivo era produzir de maneira diferente. A publicidade teve que se virar para se comunicar com um número crescente de pessoas, de diferentes classes sociais e preferências, um público diversificado que surgiu após a Segunda Guerra. A forma de propagar os benefícios de adquirir uma coisa ou um serviço tenta, em primeiro lugar, convencer de que se você | 19 |


não comprar aquilo, estará fazendo um negócio ruim, mas muito ruim mesmo. Para isso, de maneira indireta, a propaganda tenta estimular a incontrolável vontade de comer, beber ou fazer algo. É mexer com o instinto humano. O projeto de propaganda mais famoso da história enaltecia o estilo de vida americano, o american way of life. Essa expressão, desenvolvida pelo governo dos Estados Unidos na década de 20, aproveitava-se do bom momento econômico do país para incentivar o consumismo, materializado na compra exagerada de eletrodomésticos e de veículos. As famílias americanas, antes da quebra da Bolsa de Nova Iorque de 1929, viviam uma febre de consumo. Sem pensar duas vezes, gastavam as economias em produtos supérfluos. Não havia preocupação em poupar. O restante do mundo queria imitar o modo de levar a vida dos americanos. “Se eles obtiveram tanto sucesso, nós também podemos”. Era assim que os outros pensavam, especialmente os latino-americanos. A evolução e popularização dos meios de comunicação em nível global deixaram a publicidade ainda mais poderosa. Atualmente, qualquer empresa dedica um bom dinheiro para convencer as pessoas a comprar seus produtos. Como disse Sloan Jr., “o sucesso corporativista está em criar uma permanente sensação de insatisfação nos clientes”. Em outras palavras, acostumar as pessoas a trocar de carro cons­ tantemente. Para a General Motors superar continuamente seus resultados, os consumidores precisam comprar automóveis com frequência cada vez maior. Esse ciclo de produção/negociação sustenta o modelo de negócios. A produção ocorre em larga escala, voltada para atender o desejo consumista de uma infinidade de pessoas, respeitando os interesses e gostos dos diferentes grupos de consumidores. Para que as novidades atraiam essa parcela imensa disposta a consumir, a publicidade desenvolve uma | 20 |


série de mecanismos de convencimento da necessidade, mesmo que efetivamente não exista, o que geralmente ocorre, de adquirir tal produto.

O mercantilismo origina a economia industrial Muito antes da ascensão da indústria automobilística e da criação do modelo de produção/negociação descrito, o mundo assistiu ao desenrolar de uma revolução que alterou radicalmente a vida das pessoas. O ápice das transformações data de 1760 quando os ingleses completaram o processo de substitui­ ção do trabalho manual pelo trabalho das máquinas na atividade têxtil. Ao mesmo tempo, a energia vinda do vapor, originada pela queima dos poluidores combustíveis fósseis, com destaque para o carvão, permitiu que a revolução se concretizasse. Essa fonte de energia foi e continua sendo vastamente utilizada pela facilidade de extração da matéria-prima da queima dos combustíveis. A abundância de carvão, além do processo de geração energética ser barato, tornou a fonte extremamente popular no mundo inteiro. Além da produção em massa na atividade industrial, uma nova forma de transporte, muito mais rápida do que qualquer força animal, foi instituída. Os barulhentos trens, que cortavam os campos e assustavam os humildes moradores, possibilitaram que os produtos fossem comercializados bem longe de onde eram produzidos. A construção de linhas férreas se tornou prioridade. Uma delas, a mais espetacular do período, levou o nome de Ferrovia Transiberiana. Ao longo dos seus 9.288 quilômetros, abrangendo oito fusos horários diferentes, a linha russa, cons­ truída nos anos soviéticos, vai de Moscou, a capital, a Vladivostok, cidade que fica no extremo oriente do país. O inventor da locomotiva se chamava Richard Trevithicks. | 21 |


Em 1797, o britânico anunciou a criação de uma engenhoca que não se movia nos trilhos férreos. A primeira locomotiva produzida no mundo andava na mesma superfície do carro. Ela puxava os vagões sobre o asfalto. Como se sabe, o invento não foi para frente. Só que os fundamentos, a maneira de cons­ truir daquela que viria a ser a verdadeira locomotiva nos anos poste­riores, estavam lançados. Com as distâncias reduzidas pelas linhas férreas, a consequência imediata foi o surgimento de grandes cidades. As pessoas passaram a se reunir em um pedaço de terra reduzido. Nas cidades, a população tem ao seu dispor uma série de facilidades, como acesso aos serviços básicos disponibilizados pelos governantes. O convívio social, através da interação entre as pessoas da comunidade, é outro atrativo. A cidade de Londres, por exemplo, capital da Inglaterra, atingiu rapidamente meio milhão de habitantes em 1800. Para os padrões de hoje, é realmente muito pouco. Mas em uma sociedade que tinha acabado de sair da organização feudal, em que as pessoas viviam em pequenos vilarejos distantes uns dos outros, com pouca comunicação entre eles, a transformação, na verdade, mostrou-se imensa. No meio do caminho, entre os tão opostos feudalismo e revo­ lução industrial, as sociedades viveram um curto espaço de adaptação denominado mercantilismo. O fim do controle árabe sobre a rota comercial do Mar Mediterrâneo, possibilitando a reabertura do comércio entre a parte ocidental e oriental do mundo, pode ser considerado o grande fator responsável pelo esfacelamento da estrutura feudal, o que preparou o terreno para a chegada do capitalismo industrial. É possível dizer que o mercantilismo nasceu para intervir na realidade econômica da época, através de uma série de receitas para superar os obstáculos que dificultavam a expansão da economia de mercado, regime adotado pela imensa maioria dos países do mundo atual. | 22 |


Dentro dessa estrutura, o desenvolvimento das cidades talvez tenha sido o maior símbolo. O simples agrupamento em unidades territoriais, ainda recém-formadas, estimulava a expansão do mercado e o crescimento das atividades de troca. Era o começo do comércio cujos moldes, o modo de fazer, permane­ cem até hoje. Nessa nova organização, os mestres enriquecidos tornavam-se capitalistas ao mesmo tempo em que os mais pobres transformavam-se em assalariados. Não demorou muito para que o continente europeu sofresse um fenômeno conhecido como especialização regional da produção. Isso significa que áreas inteiras, já adequadas ao regime mercantilista, passaram a produzir gêneros exclusivos, sendo que procuravam nas outras o que não produziam, além de oferecerem ao mercado seus produtos. As regiões europeias, antes completamente separadas, foram interligadas pelo incessante fluxo de mercadorias. Uma imensidão de rotas comerciais surgiu no Velho Continente. O feu­ dalismo não pôde resistir ao ascendente comércio. O isolamento dos feudos contrastava com o desenvolvimento dos mercados. Ao lado da integração comercial, o período conhecido como mercantilismo fez com que regiões europeias se organizassem em Estados nacionais. Um governo central foi criado para representar os interesses, principalmente econômicos, de uma determinada região. Os ingleses, por exemplo, foram os responsáveis pela formação do primeiro complexo industrial, porque o governo soube incentivar a produção manufatureira, através de uma rígida política alfandegária. Por consequência, houve a formação imediata de uma rica burguesia industrial, disposta a pagar seus trabalhadores e a investir nos meios de produção, como as custosas máquinas. Com o fim do feudalismo, em meio à nova realidade trazida pelo mercantilismo, grandes levas populacionais foram para as cidades. O ambiente urbano chamava a atenção. As pessoas | 23 |


se sentiam atraídas pela possibilidade de mudança. Quando a industrialização avançou a todo vapor na Inglaterra, entre os anos de 1760 e 1860, havia um excedente de trabalhadores que possibilitava aos industriais oferecer condições degradantes de trabalho. Para início de conversa, eram horas e horas de jornada. Dezoito por dia. Uma rotina estafante. Muitos foram contratados para atuar ao lado das barulhentas máquinas. Esses operários, como o próprio nome diz, operavam as máquinas e fiscalizavam o andamento do trabalho desempenhado por elas. As crianças viviam com a fuligem do carvão no rosto. Elas, assim como as mulheres e os idosos, não eram poupadas. Trabalhavam como se fossem adultos. As minas de carvão destruíam a saúde. Os pulmões viravam pedras. Como resultado, doenças graves respiratórias faziam parte da infância, problemas que as acompanhavam para o restante da vida. Na indústria têxtil, a situação era tão ruim quanto. Os acidentes ocorriam com frequência. Os diferentes tipos de ácido usados na produção dos tecidos escapavam das enormes caldeiras e atingiam o pescoço, os braços e as mãos dos trabalhadores. A pele não resistia, e a ferida fazia com que o osso ficasse à mostra. Com o passar dos anos, o trabalho deixou de ser livre para virar controlado. Até o período medieval, os produtos eram feitos de forma artesanal. As corporações de ofício, grupos de artesãos em que todos realizavam o mesmo produto, estabeleciam normas coletivas de fabricação e distribuição das mercadorias. Ao fim da Idade Média, o controle sobre a forma de produção transformou o artesão em empregado de outra pessoa. O artesão fabricava a cadeira e vendia sua força de trabalho para outra pessoa, dona das ferramentas e do material utilizado. Tal processo é denominado manufatura. O produtor deixa de ser proprietário do que fabricou. Os ingleses alteraram as características do trabalho. O ope­ | 24 |


rário era obrigado a trabalhar de acordo com o regime da fábrica. Ele passava quase o dia inteiro nela, desempenhando tarefas repetitivas, quase sem parar. Cada um ficava responsável por uma etapa do produto. Além de não ser proprietário das máquinas e da matériaprima, o trabalhador vendia sua força de trabalho e seu tempo ao dono da fábrica. E ainda pior: o pagamento do seu trabalho não era determinado por ele, mas pelo patrão. Geralmente, a remuneração não era justa, bem abaixo do que deveria ganhar pelo seu esforço.

A reformulação do pensamento econômico Ao escrever o livro Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações, mundialmente conhecido como A Riqueza das Nações, no ano de 1776, o economista escocês Adam Smith tinha como objetivo mostrar que o po­ der de um Estado é medido pela capacidade de produzir e de comer­cializar seus produtos com outras nações. Essa habilidade de conquistar parceiros comerciais faz toda a diferença. Antes da teoria liberal formulada por Smith, os países procuravam acumular um estoque enorme de ouro e prata. As importações eram vistas com maus olhos, porque o pagamento envolvia parte desses minérios acumulados. Por outro lado, as exportações eram muito bem-vindas, já que havia a incorporação da riqueza de outras nações. Os governantes não conseguiam enxergar a essência do comércio internacional, fundamentado na compra e venda cons­ tante de produtos e serviços. Para se defenderem dos vizinhos, os países adotavam uma política protecionista, resguardando a própria economia da livre concorrência, através de impostos sobre a compra de produtos estrangeiros, subsídios para os produtores nacionais e outros tipos de proteção da nascente indústria doméstica. | 25 |


A teoria de Adam Smith mostrou que o livre mercado faz com que os dois lados, vendedor e comprador, ganhem. Ele justificava com simplicidade: “ninguém trocaria qualquer coisa se soubesse que perderia com o negócio”. No livre mercado, sem qualquer interferência estatal, os compradores lucram, assim como os vendedores acumulam ganhos. Com as trocas beneficiando ambos os lados, a prosperidade só aumenta. O raciocínio pode ser resumido da seguinte maneira: “As importações que fazemos são tão valiosas para nós quanto nossas exportações são para os outros”. O estudioso discordava da presença de reis e rainhas, refutava o estado monárquico, como forma de atingir o desenvolvimento, pensamento que vigorou por muito tempo no período anterior à revolução industrial. Como um produto da natureza humana, para Adam Smith, a riqueza e o desenvolvimento são frutos de um mercado competitivo, livre de qualquer amarra protecionista e sem qualquer tipo de repressão de seus membros. Para finalizar, Smith escreveu que os governos não são bons em administrar uma companhia de seguros ou salvar qualquer outra corporação. Não cabe aos governantes interferir na independência do livre mercado. A responsabilidade estatal está em prover bem-estar aos seus cidadãos. Uma das preocupações do governo, por exemplo, deve ser a de reintegrar as pessoas à força de trabalho para que elas voltem a se sustentar. Treze anos após a publicação da obra, uma revolução liderada pela burguesia estourou na França. O ano de 1789 marcou o início de uma grande mobilização contra a figura dos reis que representava uma estrutura antiga e injusta, fundamentada na cobrança de impostos sobre o povo e sobre a ascendente classe burguesa. A Tomada da Bastilha, uma fortaleza usada pelos reis como prisão, mostrou aos outros países europeus que o Absolutismo estava com os dias contados. Com essas novas ideias em ebulição, o modelo liberal foi | 26 |


gradualmente adotado em boa parte do mundo. Nos anos que se seguiram, apesar da resistência de alguns estados monárquicos, a estrutura de liberdade dos mercados encontrou caminho livre para se fortalecer, especialmente na sociedade daquela que viria a ser a primeira grande potência industrial da história, a Grã-Bretanha. A burguesia deve ao comércio sua ascensão na sociedade da época. Os burgueses, por meio das atividades comerciais, acumularam riqueza, o que trouxe representatividade política para a classe social.

Os britânicos dominam o mundo Para se ter uma ideia da influência da Grã-Bretanha naquele mundo do século XIX, vale a pena dar uma olhada em alguns números de comércio internacional e capacidade de consumo de sua população. Apesar de ocupar um território modesto do ponto de vista da extensão, os britânicos, até a década de 1880, compravam a maior parte do algodão cru e 35% da lã nas transações internacionais. Eles consumiam a metade de todo o trigo e de toda a carne, bem como a maior parte do chá, vendidos no comércio internacional. Os ingleses eram os americanos de hoje. Na economia, como vimos, gozavam do mais completo domínio. Com muito capital em mãos, emprestavam para os países próximos. Os portugueses, por exemplo, foram grandes tomadores de empréstimos. Sem ter como pagar, D. João VI perdeu a proteção dos navios ingleses e escapou das garras do conquistador francês Napoleão Bonaparte ao fugir para o Brasil. Por falar em navios, seu arsenal de guerra também se assemelhava nas devidas proporções, é claro, ao americano. O gove­rno inglês mantinha respeitáveis navios prontos para entrar em combate a qualquer momento. A instabilidade dominava cada minuto daquele mundo. A hegemonia também estava presente nas manifestações cul| 27 |


turais. Por ter as cidades mais importantes do mundo, o lado cultural fervilhava. No campo da literatura, quem nunca leu um livro do escritor inglês Arthur Conan Doyle, criador das deliciosas histórias do detetive Sherlock Holmes? Na música, o compositor Ralph Vaughan Williams, conhecido simplesmente como Vaughan Williams, que partiu como voluntário para os campos de batalha da Bélgica durante a Primeira Guerra Mundial, foi um dos melhores que o país já presenciou. O pintor Joshua Reynolds morreu em 1792. Mesmo assim, teve tempo para acompanhar as profundas transformações que ocorriam na sociedade. Como grande nome da arte inglesa nesse período, Reynolds influenciou as gerações posteriores retratistas, gênero da pintura que representa a aparência do sujeito nas pinturas. Com tanta influência, os britânicos desenharam a geografia política e econômica do mundo. Ao se industrializarem, deixa­ ram claro como funcionava a relação de comércio entre os países. Esse processo já ocorria, as metrópoles controlavam suas colônias como bem entendiam, de tal maneira que a exclusividade do comércio, através da exploração das matériasprimas, ficava com os colonizadores. Agora, no lugar das metrópoles, as nações industrializadas passaram a ter o controle do comércio global. Portanto, de um lado, estavam os povos, ainda sob colonização, que forneciam matéria-prima a preços baixos cuja importância era crescente para abastecer a nascente indústria. De outro, encabeçadas pela Grã-Bretanha, estavam as poderosas nações industrializadas que ditavam as regras do comércio internacional. O Brasil, ao obter a independência de Portugal, permaneceu preso, do ponto de vista do comércio, aos interesses de um ou­ tro país. Em vez de comercializar concedendo benefícios em cada transação com os portugueses, os brasileiros passaram a depender do comércio com os britânicos. Para piorar, os portugueses cobraram milhões de libras para reconhecer a inde| 28 |


pendência brasileira. Como não tinha essa quantia, D. Pedro I foi obrigado a pegar dinheiro emprestado da Grã-Bretanha.

As distâncias ficam cada vez mais curtas Quando a Segunda Revolução Industrial, ocorrida entre 1860 e 1900, terminou, os fundamentos da era contemporânea, o mundo que conhecemos, estavam sacramentados. Portanto, pode-se dizer que o sistema econômico que cultivamos hoje é fruto direto dos acontecimentos daquele período. Na realidade, a segunda revolução foi consequência da primeira. A Inglaterra lançou, no final do século XVIII, as bases da industrialização e foi seguida à risca, no decorrer do século XIX, por outros importantes países, como Estados Unidos, França, Alemanha, Itália, Holanda, Japão e Bélgica. A preocupação do segundo período de corrida pela industrialização foi desenvolver máquinas capazes de reduzir ao máximo os custos e o tempo de fabricação dos produtos para que pudessem ser consumidos em escalas cada vez maiores. Ou seja, em uma breve explicação, gastar pouco para produzir muito e ganhar ainda mais, com esse aumento da escala, na hora de vender. Um modo de pensar predatório, porque não considera os fatores que envolvem a produção como respeito ao meio ambiente e ao ser humano. O importante está apenas na geração consecutiva de recorde de lucro. Essa foi a maneira de pensar desenvolvida nos primórdios da formação da economia de livre mercado aplicada ainda nos tempos de hoje. Uma das mais importantes invenções veio em 1879. O americano Thomas Alva Edison desenvolveu a lâmpada elétrica incandescente, estabelecendo um marco nos sistemas de iluminação dos grandes centros urbanos e industriais. Suas habilidades geniais não foram reconhecidas em seu primeiro invento. Aos 21 anos de idade, criou uma geringonça de votar, uma máquina que possibilitava às pessoas exercerem seu | 29 |


direi­to democrático, mas não obteve sucesso. Por ser um inventor dos Estados Unidos, bem distante da influente Grã-Bretanha, pode-se perceber que o centro do poder mundial começava a mudar. Livres dos britânicos e recuperados de uma guerra civil, os americanos caminhavam a passos largos para o desenvolvimento. Durante a Segunda Revolução Industrial, o petróleo passou a ocupar posição de destaque. A invenção do motor à combustão adotou o petróleo como combustível cuja serventia anteriormente se limitava ao uso para o funcionamento de sistemas arcaicos de iluminação. Ao mesmo tempo, os transportes resolveram a equação discutida anteriormente. A preocupação de diminuir o custo e o tempo de produção para que o consumo aumentasse, elevando, assim, os lucros, encontrou nos trens parte da solução. As novas fontes de energia, com destaque para o petróleo, e o início da produção do aço permitiram a concepção de meios de locomoção mais ágeis e baratos. As estradas de ferro cresceram de maneira assustadora. Somente nos dez primeiros anos da nova revolução, mais de dois milhões de pessoas estavam empregados na manutenção do único transporte existente até então. A velocidade de transporte dos produtos multiplicou os ga­ nhos dos industriais. Os mercados vizinhos passaram a fazer parte da estratégia de venda dos produtos. A derrubada das fronteiras nacionais, em nome do livre comércio, estava longe de ser consenso. Mas o processo de adequação dos mercados, independentemente do governo ali presente, para o livre trânsito das mercadorias, já estava em curso.

O recém-formado mercado financeiro vive a primeira grande crise econômica

A rivalidade entre os países europeus, que também lutavam | 30 |


pelo atrativo mercado consumidor das colônias para seus produtos industrializados, além, é claro, do fornecimento contínuo de matéria-prima barata do Terceiro Mundo, talvez tenha sido o maior motivo do estouro da Primeira Guerra Mundial. Ainda não se sabe ao certo qual foi o motivo da erupção de uma guerra de tamanha proporção. O que os estudiosos consideram certo é o enfraquecimento das nações europeias. Em quatro anos de confrontos, os europeus gastaram muito dinheiro para financiar o aparato militar ao mesmo tempo em que deixaram de produzir ou diminuíram sensivelmente a produção industrial. Paralelamente, os Estados Unidos, que desempenharam o papel de grande investidor na guerra, viviam dias de prosperidade. Os americanos não demoraram para superar o trauma trazido por uma guerra civil. A parte capitalista do norte, contrária à escravidão e favorável ao desenvolvimento industrial, venceu os latifundiários atrasados do sul cujas economias dependiam da exportação de algodão e de tabaco para sobreviver. Comandado pelo ex-presidente republicano Abraham ­Lincoln, ferrenho defensor do fim da escravidão, o objetivo do norte era modernizar a estrutura econômica dos estados para que pudessem desenvolver complexos industriais cuja mão-deobra, claro, fosse assalariada. A vitória nortista abriu caminho para que o país assumisse alguns anos depois a posição de supremacia no contexto geopolítico mundial. Outro importante fator para o domínio americano estava na paz interna durante os anos da Primeira Guerra Mundial. Em suas terras, não houve nenhuma invasão. A guerra ocorria bem longe, completamente fora dos seus domínios. Sem se preocupar com a movimentação do inimigo no continente americano, os Estados Unidos mais financiaram os países durante a guerra do que efetivamente foram à luta. Se lembramos da Inglaterra pelo pioneirismo da indústria, relacionamos de maneira automática os americanos ao mer| 31 |


cado financeiro. As bolsas de valores são lugares voltados para a negociação de ativos financeiros, também chamados de ações, papéis que representam a participação proprietária em uma empresa. Cada investidor tem o direito de comprar e vender essa fração que possui na hora em que desejar. Ele pode comprar uma quantidade de ações em um dia fraco, de queda de valor dos ativos, de determinada empresa. No dia seguinte, com o mercado em alta, se arrumar comprador, esse mesmo investidor tem a opção de vender para embolsar o lucro gerado pela diferença. A lógica, portanto, é simples, baseada na compra e venda constantes. Diariamente, é negociado um grande volume financeiro em todas as bolsas do mundo. Para os donos das empresas com capital aberto, a vantagem de oferecer uma parcela de sua empresa para os acionistas está na arrecadação de um bom dinheiro para investir na modernização da estrutura atual ou na aquisição de outras empresas do setor. Além das ações, existe a negociação de outros tipos de investimento como commodities, produtos primários transformados em ativos financeiros, debêntures, uma espécie de título de crédito, e muitos mais. A Bolsa de Nova Iorque, conhecida como “New York Stock Exchange”, viveu momentos de pânico no dia 29 de outubro, uma terça-feira, de 1929. Foi a quebra da bolsa americana. Ondas de falência atingiram os principais bancos e as maiores indústrias do país. Os investidores comuns foram à loucura, muitos foram tomados pelo mais completo desespero e deram fim à própria vida. Essa onda de otimismo que levou ao colapso financeiro começou logo após a Primeira Grande Guerra. Quebrados ao gastar muito com seus exércitos, com o território dilace­ rado pelos confrontos, os países europeus se voltaram para os ameri­canos em busca de manufaturas e alimentos. Durante quase toda a década de 20, o aumento da produção das indústrias americanas, com o objetivo de suprir a demanda europeia, | 32 |


trouxe um otimismo exagerado. Os latino-americanos, com destaque para os brasileiros, aproveitaram-se do período de ausência do controle europeu sobre seus territórios. Sem ter de onde comprar os produtos industrializados, o Brasil passou a desenvolver, no modelo chamado de substituição de importações, durante os anos de governo do gaúcho Getúlio Vargas, sua infraestrutura industrial. Com a prática liberal, o governo americano facilitava a ocorrência das atividades comerciais e financeiras, reduzindo, inclusive, os impostos incidentes sobre a cadeia de produção. No mercado interno, motivados pela forte propaganda que estimulava o consumo, os americanos não poupavam nem um centavo sequer. Muito pelo contrário: a população tomava empréstimos, financiamentos de longo prazo, para comprar carros novos e eletrodomésticos. Ao mesmo tempo, o investimento em ações virou moda. As grandes empresas abriam o capital para lucrar ainda mais com o nunca antes visto comportamento econômico americano. Até mesmo pessoas comuns, pequenos investidores como professores, garçons e datilógrafos, passaram a apostar no lucrativo mercado de renda variável. O problema é que a situação de decadência da Europa, como já era esperado, não perdurou. Na metade da década de 20, as indústrias europeias voltaram com força ao mercado internacional. A primeira medida dos governantes europeus foi cortar as importações que vinham dos Estados Unidos. Como resultado, a produção americana ficou superaquecida. Não havia consumidores para tamanha demanda industrial. A valorização das ações, em 1928, passou a ser muito maior do que o valor que as companhias americanas efetivamente gozavam. Ou seja, uma bolha estava se formando, prestes a explodir a qualquer momento. Os economistas chamam de bolha a supervalorização dos ativos financeiros, muito longe | 33 |


da situação econômica que as empresas vivem. Uma ação da Radio Corporation of America, que pertencia ao setor de radiodifusão, por exemplo, estava valendo 57 vezes mais do que o preço de sete anos atrás. Em setembro daquele ano, o índice Dow Jones, que avalia as ações negociadas no mercado, registrou seu pico máximo no ano, bem distante dos resultados da economia real americana. Os especialistas sentiam que o estouro se aproximava. No dia 24 de outubro, o pregão fechou em queda, e as ações registraram desvalorização. A situação perdurou até o dia 29. O desespero tomou conta dos acionistas, fossem eles grandes, médios ou pequenos. Os recepcionistas do luxuoso Hotel Ritz, localizado próximo à bolsa, perguntavam aos hóspedes que chegavam se queriam realmente um quarto para ficar ou para se matar. As pessoas literalmente perderam tudo o que tinham. O preço de alguns papéis chegou praticamente a zero. Após dois anos, o produto interno bruto americano, a soma das riquezas e serviços produzidos por um país, caiu 60%. Pela primeira vez na história, ficou claro que a economia financeira, estruturada no valor das ações e de outros ativos, anda de mãos dadas com a economia real, formada pelo comércio entre as empresas, dentro e fora dos países. Não há como apresentar bons resultados acionários sem que os balanços das empresas estejam em situação saudável. As ruas de Nova Iorque deixaram o luxo para trás. A pobre­ za dominava cada canto da cidade. O número de engraxates de sapato aumentou. Não só crianças pobres, como na época de ouro americana, exerciam esse trabalho. Os ex-acionistas tiveram de se contentar em trabalhar com a flanela na mão e com os pratos na pia. A população não tinha o que comer. O governo passou a organizar com frequência maiores filas de distribuição de comida, como a famosa sopa, nas grandes cidades. No campo, a situação era pior. Não é exagero dizer que muitos habitantes de | 34 |


vilarejos morreram de fome. Em meio ao caos, com 13 milhões de desempregados, o democrata Franklin Delano Roosevelt foi eleito presidente em 1933. Agiu rapidamente com o lançamento do New Deal, um novo acordo na tradução literal, plano de combate aos efeitos perversos da grave crise econômica que se instalou.

O liberalismo de mercado sofre sua maior derrota Diferentemente do que dizia a teoria liberal de Adam Smith, a equipe de Roosevelt adotou um plano ambicioso de recuperação econômica com o uso de dinheiro público na construção de grandes obras, voltadas para a melhora da infraestrutura e capazes de gerar grande número de empregos. O contraponto das ideias de livre mercado está na teoria do economista britânico John Maynard Keynes. Sua teoria, o keynesianismo, refuta a ausência do governo nas atividades desempenhadas pelo mercado, como defende o liberalismo. O governo deve estar presente para controlar os excessos cometidos pelos agentes privados. Através de medidas fiscais, como a cobrança de impostos, e monetárias, como o controle da taxa de juros e da inflação do país, os governantes podem controlar os efeitos adversos, como a concentração de renda, trazidos pela atividade econômica. Para o estudioso, o Estado tem o direito e dever de oferecer aos cidadãos políticas sociais que melhorem as condições de vida dos mais pobres. Em momentos de crise econômica, como a que viviam os Estados Unidos de Roosevelt, é obrigação dos governantes gastar e gastar muito para colocar a economia de volta ao caminho do crescimento. Caso seja necessário, como forma de se prevenir de outras crises parecidas, o governo tem total liberdade de criar uma série de regras para controlar a ambição desmedida dos agentes financeiros. Em compensação, quando a economia estiver novamente em | 35 |


um ótimo momento, ainda segundo Keynes, o Estado deve parar de gastar em incentivos para o capital privado, acumulando um colchão de segurança que servirá para investir nas soluções da próxima crise. Os estímulos do New Deal surtiram resultados. A recuperação da economia pode ser explicada pelo decrescente déficit público, causado pelo aumento dos impostos sobre os mais ricos, o que criava um mecanismo de transferência de renda dos ricos para os pobres. Além de elevar os impostos sobre a elite, a equipe econômica do presidente aumentou o controle sobre as empresas estatais, forneceu um importante programa de ajuda financeira para os desempregados e instituiu uma enorme reforma na sociedade, conhecida como seguridade social. Consequentemente, os empresários se voltaram contra o presidente. Na política externa, seu grande feito foi manter os Estados Unidos fora de qualquer conflito, por meio de uma legislação de neutralidade, sem tomar partido de ninguém, e, ao mesmo tempo, adotou uma política de ajuda indireta aos países ameaçados ou atacados. De nada adiantaram os protestos do empresariado. Roosevelt foi reeleito por elevada margem de votos em 1936, 1940 e 1944. A população americana aprovou o governo daquele que tirou os Estados Unidos da maior crise econômica de sua história. Os americanos voltaram a caminhar em direção ao progresso. Tal sucesso só foi possível pela adoção de uma política econômica bem diferente daquela anteriormente praticada. O keynesianismo, ao contrário do liberalismo de Adam Smith, tem como preocupação os fatores sociais, não permitindo que os agentes privados façam da economia o que bem entenderem. Esse modelo econômico resultou em um governo consciente, praticado principalmente pelos países europeus, da responsa­bilidade de oferecer aos seus cidadãos serviços de | 36 |


qualidade, como saúde, educação e proteção. O capital para manter essa rede de seguridade social vem dos impostos cobrados da população.

A

formação de uma nova organização econômica e

política

Da mesma maneira que ocorreu no primeiro grande conflito que envolveu as poderosas nações do mundo, os Estados Unidos se aproveitaram da situação de estarem fora do continente europeu para servirem como fonte de recursos financiadora da guerra. Dessa vez, é verdade, a participação dos soldados americanos foi muito maior. Ao lado dos combatentes da Uni­ ão das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a URSS, que viria a ser o grande inimigo nos anos posteriores, os americanos derrotaram o imperialismo nazista, centralizado na figura do seu maior líder, Adolf Hitler. Ao final da Segunda Guerra Mundial, os países europeus estavam novamente em frangalhos. O maior perdedor, a Alemanha, teve de pagar uma dívida astronômica nos anos que se passaram aos vencedores. Sem falar da divisão de seu território entre os países ganhadores. De uma forma resumida, a parte oriental do país ficou com os soviéticos e a ocidental foi parar nas mãos dos americanos. Aliás, antes de terminar a guerra, os líderes de 45 países se encontraram no estado de New Hampshire, nordeste dos Estados Unidos, para discutir quais seriam as características de uma nova ordem econômica global. O encontro ficou internacionalmente conhecido como Conferência de Bretton Woods. Durante três semanas de julho de 1944, os 730 dele­ gados traçaram a nova fronteira da organização política e econômica global. Com os Estados Unidos, mais uma vez, como nação mais poderosa do planeta, ao lado dos soviéticos, ficou estabelecido | 37 |


que o dólar se tornaria a principal moeda da reserva mundial. Os países também decidiram pela criação de duas instituições, voltadas para a ajuda financeira e social, com atuação global. O FMI (Fundo Monetário Internacional) surgiu como uma proposta de instituição, que conta com recursos financeiros dis­ponibilizados pelos países-membros, encarregada de dar estabilidade ao contexto financeiro. Ao mesmo tempo, os repre­sentantes definiram que o Banco Mundial ficasse responsável pelo financiamento da reconstrução dos países atingidos pela destruição e pela ocupação durante a guerra. Hoje, a ins­ tituição tem como meta promover políticas sociais nos países pobres. No ato de configuração da nova estrutura, ficou combinado que a presidência do FMI fosse sempre ocupada por um europeu, enquanto que o cargo mais importante do Banco Mundial ficasse com um americano. Um pouco depois, em 1945, em outra reunião nos Estados Unidos, os países criaram a ONU (Organização das Nações Unidas), uma entidade que tem por responsabilidade promo­ ver a paz em todos os cantos do mundo. Seu maior objetivo é colocar em prática mecanismos que possibilitem a segurança internacional. Fica muito claro o poder americano quando pesquisamos a cidade sede de cada uma dessas instituições. Duas delas, o FMI e o Banco Mundial, estão sediadas em Washington, capital dos Estados Unidos. A ONU escolheu Nova Iorque para instalar sua base. Portanto, é possível perceber que a ascensão americana ocorreu com força ao final da Segunda Guerra Mundial. A organização de uma nova ordem econômica, sob sua lide­ rança, foi fundamental para que assumissem a condição de superpotência. Os outros países enfraquecidos pelo conflito não viam a hora de investir o dinheiro advindo dos empréstimos do Plano Marshall, plano de recuperação econômica oferecido pelos americanos na reconstrução de suas principais cidades. Dentro dessa estrutura, o capitalismo viveu o mais longo | 38 |


período de crescimento contínuo. Durante os trinta anos que se seguiram ao conflito, o valor da produção econômica quadruplicou e as exportações quase sextuplicaram no seleto grupo dos países desenvolvidos. O espírito empreendedor americano se espalhou pelo mundo. A utilização do dólar como moeda internacional para transações comerciais e financeiras facilitou a disseminação da estrutura capitalista pelos países, com exceção dos Estados socialistas que se converteram ao capital depois da dissolução da União Soviética. O livre mercado, que considera as fronteiras dos países inexistentes para o capital, criou uma maneira universal de se fazer negócios. Utilizando-se das maravilhas tecnológicas que surgiam, como o desenvolvimento e a popularização dos computadores, a criação de diversas rotas aéreas comerciais, a automatização do mercado financeiro e o aprimoramento das técnicas de produção feitas pelas máquinas, o capitalismo se fortaleceu para combater o sistema socialista, visto como ameaça para os interesses liberalistas. A globalização aproximou os mercados na medida em que os mesmos produtos e serviços são oferecidos em praticamente o mundo inteiro. Até 1973, data do primeiro choque do petróleo, o mundo viveu a época de ouro do capitalismo. O crescimento econômico registrado, apesar de a riqueza não ter sido distribuída de maneira justa, permitiu que uma parte da população vivesse em um estilo de vida muito acima daquele vivenciado pelos antepassados. As decisões da Conferência de Bretton Woods, que culminaram na adoção de uma nova ordem econômica, favoreceram a formação de enormes empresas, chamadas de corporações, que dominam o mercado internacional. Pela capacidade de estarem em praticamente todos os países ao mesmo tempo, receberam o nome de multinacionais. Hoje em dia, elas talvez estejam fora apenas da Coréia do Norte e de Cuba, dois países | 39 |


que mantêm um regime comunista. Acumular recordes seguidos de faturamento é o maior objetivo delas. Assim, elas ficam cada vez mais indispensáveis. Vale a pena dizer que muitas delas movimentam um capital maior do que o PIB (Produto Interno Bruto), a soma dos bens e serviços disponibilizados por um país, das nações mais pobres. A petrolífera americana ExxonMobil apresentou um resultado espetacular para seus acionistas no ano passado. Foi o maior lucro da história de uma empresa americana. No terceiro trimestre, a Exxon lucrou US$ 14,83 bilhões, enquanto que os nove primeiros meses somados registraram ganhos de US$ 37,4 bilhões. Muito dependente da exportação de gás natural, a Bolívia é um dos países mais pobres do mundo, cerca de 60% da população está abaixo da linha de pobreza, de acordo com estimativa retirada do The World Factbook, vinculado a CIA, agência americana de inteligência. Para efeito de comparação com a ExxonMobil, a soma de toda a riqueza e produzidos pelos bolivianos em um ano inteiro é menor do que o lucro alcançado em nove meses pela companhia de petróleo. Em 2008, ainda segundo a CIA, a Bolívia apresentou um PIB cerca de vinte bilhões de dólares menor que o resultado recorde obtido nos três primeiros trimestres pela ExxonMobil. Com tamanha participação na geração de riquezas em nível global, o poder de barganha das corporações faz com que até mesmo os países maiores se sintam na obrigação de conceder alguns agrados. Elas estão em situação privilegiada, ocupando posição de destaque nas conversas com os governantes, algo nunca antes visto na história. O lobby, ato de levar os políticos por meio de ajuda financeira para a realização da campanha a fazer o que as empresas desejam, é ferramenta de manipulação largamente utilizada. Os congressistas americanos são conhecidos por aceitarem esse tipo de contribuição. | 40 |


Os empresários, principalmente os que ocupam os cargos de chefia, têm condições de oferecer seus produtos a um preço abaixo do mínimo. Eles podem trabalhar com uma margem de lucro reduzida por um algum tempo. Em um mercado cujo domínio seja de uma empresa local, com presença forte nacional, mas longe da internacionalização, as corporações utilizam a tática de oferecer muito barato para quebrar, levar à falência, os concorrentes locais. Tal processo faz parte da prática monopolista cujo objetivo é fazer com que o controle do mercado fique nas mãos de uma empresa ou, no máximo duas, situação conhecida como duopólio. Nesse período da história econômica mundial, as economias das nações que haviam acabado de conquistar a independência, os africanos, por exemplo, só se livraram das metrópoles com o enfraquecimento pós-guerra dos europeus durante a década de 50. Elas apresentavam um mercado virgem, livre de qualquer regra estatal, cenário perfeito para as intenções comer­ciais das empresas de Primeiro Mundo. A independência, no final das contas, não serviu para criar uma economia genuinamente local. Muito longe disso. As multinacionais invadiram o mercado e não deram outra oportunidade de crescimento para os países pobres. Claro que houve progresso. Não se pode negar que o estilo de vida da população melhorou. O dinheiro passou a circular livremente, o que fez aumentar a renda média da população. Os centros das capitais foram completamente modificados. Prédios altos e imponentes foram construídos. Largas avenidas saíram do papel. Os homens engravatados, vestidos de maneira elegante, passaram a ser vistos em quantidades maiores nas ruas. A política, com exceção de quase todos os países afri­ canos, passou a ser levada um pouco mais a sério. Mas uma pequena parcela das pessoas conseguiu melhorar efetivamente de vida. A desigualdade social invadiu a cena. As diferenças de ganho são enormes nos países pobres e em desen| 41 |


volvimento. No Brasil, por exemplo, cujos agentes financeiros internacionais esperam muito de sua economia nos próximos anos, existem 60 milhões de pessoas que ainda vivem na linha da pobreza. Mesmo com a diminuição da distância entre os mais ricos e os mais pobres nos últimos anos, os brasileiros ainda aparecem nas primeiras colocações nos índices de concentração de renda. Um relatório da entidade Análise sobre Nutrição e Segurança Alimentar (em inglês, a sigla é FSNAU), divulgado no final de agosto deste ano, mostra que metade da população da Somália precisa de ajuda humanitária urgente. Em um ano, esse número de necessitados aumentou 17,5%, chegando a 3,76 milhões de pessoas. O aumento da violência entre o governo e os insurgentes é a grande causa do aumento da extrema pobreza. Desde o início de 2007 até hoje, os conflitos mataram 18 mil somalis e desalojaram mais de 1 milhão de pessoas. Os africanos vivem em um clima de barril de pólvora prestes a explodir devido à partilha arbitrária do continente realizada pelos europeus no final do século XIX. Essa divisão nos estados políticos que conhecemos juntou grupos étnicos tradicionalmente rivais no mesmo território. Com o fim do tráfico de escravos, o objetivo da Europa era garantir mercado consumidor e matéria-prima para a nascente indústria.

A especulação financeira se fortalece Em 1952, um australiano chamado Alfred Jones, que escolheu os Estados Unidos como sua casa, criou uma maneira perversa de opção de investimento. Ao investir grandes somas de dinheiro em um determinado comportamento do mercado, esses investidores têm a capacidade de prejudicar a economia real dos países. Quando a revista Fortune publicou, no ano de 1966, um artigo dizendo que um tipo de investimento obscuro no mercado | 42 |


financeiro havia dobrado os ganhos em relação ao ano passado e registrado desempenho ainda maior nos últimos cinco anos, nascia ali a indústria dos fundos de risco. Em 1968, cerca de 140 fundos já estavam em operação. Os “hedge funds”, como são conhecidos em inglês, são formados por um grupo de especuladores, detentores de um imenso capital disponível para investimento imediato, que se aproveitam da liberdade das transações do mercado financeiro para acumular uma fortuna crescente. A indústria do risco se expandiu rapidamente. As recentes estimativas apontam para um mercado de US$ 1 trilhão, muito acima dos US$ 100 mil usados por Jones no primeiro fundo de risco, cinquenta e sete anos atrás. Eles foram responsáveis por verdadeiras catástrofes da economia a partir de pouco mais da metade do século XX. O caso mais emblemático é representado pela figura do bi­ lionário investidor George Soros. Considerado um dos maiores personagens do mercado financeiro, ao lado do americano ­Warren Buffet, o húngaro foi responsável por derrubar a cotação da libra esterlina, moeda utilizada na Grã-Bretanha, considerada uma das mais fortes do planeta. Através de seu fundo de investimento Quantum, em setembro de 1992, Soros apostou US$ 10 bilhões na desvalorização da libra, o que levou a uma corrida ao mercado para vender o dinheiro britânico. Isso porque os outros investidores levam em conta a opi­ nião dos megainvestidores. Eles pensavam que George Soros contava com uma informação privilegiada, um grande acontecimento que poderia mudar os rumos da política monetária britânica nos dias seguintes. Como, na época, o maior fundo de risco do planeta estava vendendo suas posições, os outros envolvidos no mercado passaram a fazer o mesmo, por menor que fossem suas reservas. A investida especulativa trouxe instabilidade para a economia de todo o continente europeu. Em uma tacada só, o movimento de Soros aumentou sua riqueza em US$ 2 bilhões, mas quase | 43 |


fez naufragar a estabilidade econômica. A saída em massa dos investidores, vendendo o estoque pessoal da moeda britânica, trouxe preocupação com os rumos da política econômica de uma nação inteira. E não foi qualquer economia. As economias menores, vítimas do capital especulativo que viaja de bolsa para bolsa sem nenhuma regulamentação internacional, foram e continuam sendo as mais afetadas com esses movimentos. “Eu tenho uma fascinação pelo risco”, afirmou Soros em uma entrevista, utilizando um inglês sofrível. “O risco me faz sentir vivo. Não consigo deixar de ficar entediado apenas vivendo”, completou. O fundo Quantum não investe apenas no câmbio. Outros instrumentos financeiros são vítimas da especulação, realizada minuto a minuto, como as commodities, produtos primários negociados na bolsa de valores, as ações e os títulos de dívida do governo, papéis que negociam a dívida de determinado Estado no mercado internacional. Nos últimos anos, talvez como forma de se redimir dos danos causados às economias reais, Soros passou a investir muito dinheiro na filantropia. O investidor aplica parte de sua fortuna nos institutos Open Society, voltados para o patrocínio de projetos educativos e culturais nos países pobres. Ele mesmo resumiu da seguinte maneira o que os fundos de risco costumam fazer: “Parte do que aprendi foi a futilidade de fazer dinheiro a partir do sofrimento que esse mesmo dinheiro traz”, admitiu. “A riqueza pode ser um peso morto”, completou.

O liberalismo de Milton Friedman faz suas vítimas A queda do Muro de Berlim, em 1989, resultou em um contexto econômico inédito. A divisão da Alemanha em duas grandes partes chegava ao fim. O lado oriental, a Berlim Orien­ tal, estava sedento em vivenciar o avanço tecnológico que os vizinhos de muro atingiram muito antes. Essa vontade de integrar a economia capitalista, vista com certo romantismo, pas| 44 |


sou a fazer parte da política de governo de muitas ex-nações socialistas. Em 1992, a União Soviética, sob o comando de Mikhail ­Gorbachev, anunciava seu fim. Aquele império hegemônico, rival direto dos Estados Unidos na guerra por influência após o término da Segunda Guerra, vivia tempos econômicos perversos. As profundas transformações fizeram o sociólogo americano Francis Fukuyama afirmar que o fim da história havia chegado. Assim, para Fukuyama, não há alternativa ao modelo capitalista. O sistema provou ser o mais adequado para os interesses de nossa sociedade. O fanfarrão Boris Yeltsin, substituindo Gorbachev, foi eleito o primeiro presidente da Rússia. Desde o princípio, a intenção de Yeltsin era promover o capitalismo dentro das fronteiras do país. Um grande plano de choque saiu do papel nos anos em que esteve no poder. Essas diretrizes econômicas seguiam à risca o que a escola de Milton Friedman, o maior liberalista contemporâneo, dizia. A Escola de Chicago formou uma série de economistas adeptos da teoria do livre mercado radical. Para esses profissio­nais, o caminho do desenvolvimento estava na privatização dos ativos estatais, até mesmo a água chegou a ser vendida para o capital privado na Bolívia. Outras medidas defendidas eram redução do tamanho do Estado, através de cortes profundos na seguridade social e nos programas de socorro aos mais pobres, e abertura completa da economia, deixando a cargo dos agentes financeiros e econômicos o desenvolvimento do país. A preocupação do governo deveria ser a de abolir instrumentos fiscais ou monetários que fossem capazes de gerar qualquer amarra para o desenvolvimento. Não se pode esquecer que o Banco Central, de acordo com o pensamento liberalista, precisa ter uma atuação independente, sem influência dos governantes, cujos cargos, principalmente a presidência, sejam ocupados por antigos executivos de multinacionais. | 45 |


Alguns países, como a Rússia, logo após o fim do socialismo, adotaram como política o controle dos preços dos alimentos considerados básicos para a dieta de qualquer ser humano. Isso evitava que a inflação aumentasse demais o preço desses produtos. Pelo menos, as pessoas tinham o que comer, já que a inflação, ao menos nesses alimentos básicos, não corroía o poder de compra do salário. O economista americano Milton Friedman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1976, falecido em 2006, é consi­ derado um dos grandes nomes da história do liberalismo. Ele esteve por trás da arquitetura de praticamente todos os planos de conversão da macroeconomia, o sistema econômico de um país, para um tipo de capitalismo liberal extremista, sem ne­ nhuma preocupação com o bem-estar dos cidadãos. Três anos depois de ganhar a honraria, Friedman estava em busca de outros países, maiores que o Chile do ditador Pinochet, para colocar em prática aquilo que entendia ser o modelo ideal econômico. Conhecida como “dama de ferro”, a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher não ficou convencida dos benefícios do livre mercado proposto pelo libera­ lista nas primeiras conversas. Mas, a exemplo do que ocorreu posteriormente com o governo do presidente americano Ronald­ Reagan, a influência de Friedman fez com que Thatcher ado­ tasse à risca a teoria liberal, através do corte dos gastos sociais e da organização de privatizações em larga escala. Com a assistência do FMI (Fundo Monetário Internacional), instituição criada para ajudar as economias a sair do verme­ lho, a política econômica friedmanista rapidamente se alastrou pelo planeta, especialmente nos países latino-americanos. Em uma época de grande instabilidade para os países da região, com a inflação anual na casa dos milhares, a cartilha para tomar dinheiro emprestado do fundo envolvia a adoção das regras citadas anteriormente, como a opção pela privatização, diminuindo o tamanho do Estado, o corte dos gastos sociais e | 46 |


a ausência de interferência do governo no mercado. Sem opção de escolher um verdadeiro modelo de desenvolvimento, os países pobres, inclusive o Brasil, obedeceram ao conjunto de regras imposto. Essa conduta econômica recebeu o nome de neoliberalismo, expressão condenada em qualquer país latino-americano. O dinheiro recebido não era suficiente para colocar a economia de volta aos trilhos. Uma dependência constante do capital dessas instituições praticamente quebrou as economias por um longo período. A década de 80 e parte da de 90 são consideradas, do ponto de vista do crescimento econômico e da distribuição da renda de maneira justa, perdidas. Na Rússia, durante a presidência, Yeltsin colocou em prática a perversa receita sugerida por Friedman e seus ex-alunos da universidade de Chicago, provocando uma onda de manifestações da furiosa população. Eleito com a plataforma de estruturar um novo modelo econômico, aberto para as empresas capitalistas, mas que se preocupasse com a qualidade de vida da população, Yeltsin alterou completamente seus planos ao chegar ao poder. Como resultado da política de choque econômica, os russos viveram em um período de pobreza absoluta. A desigualdade social chegou a um nível sem antecedentes. Não havia o que comer. Grandes filas se formavam nas cidades para receber um prato de sopa. O frio intenso, característica peculiar do país, matava um número crescente de russos que não tinham como se proteger, porque passaram a morar na rua. Em 1996, quase 37 milhões de pessoas, o equivalente a um quarto dos russos, eram classificadas como pobres. Os ativos estatais, como a Norilsk Nickel, que produzia um quinto do níquel mundial, foram negociados a preço de banana. A petrolífera Yukos, cujo controle das reservas de petróleo é maior do que a do Kuwait inteiro, vendida por meros US$ 309 milhões, gera uma receita, nos dias de hoje, de mais | 47 |


de US$ 3 bilhões por ano. Portanto, o que se viu no modelo liberalista, idealizado por Friedman, foi uma transferência muito clara, já que a imprensa local noticiou os esquemas com insistência, da riqueza pertencente ao Estado para as mãos dos grandes capitalistas russos, como Roman Abramovich, dono do inglês Chelsea, um dos maiores clubes de futebol do mundo, e de uma infinidade de outros empreendimentos.

O

perigo de deixar os agentes financeiros atuarem

livremente

Em meio ao ambiente de que o livre trânsito do dinheiro, sem qualquer interferência do governo, vista como política protecionista, contrária à ideia de progresso, os personagens financeiros e econômicos continuaram livres e soltos para atuar da maneira que quisessem. Recentemente, o apetite pelo risco deflagrou uma crise de proporções gigantescas cujos efeitos ainda estamos sentindo. Foi a maior instabilidade financeira do século XXI. No começo, quando os bancos centrais não sabiam ao certo o que fazer, a crise do “subprime”, o chamado crédito de risco, chegou a ser comparada com a Grande Depressão de 1929. A intensidade do baque deixou as autoridades em estado de inércia, esperando para ver quem viraria a próxima vítima. As origens remontam há algum tempo. Nos últimos anos, como tentativa de recuperar a atividade econômica depois da bolha da internet que estourou em 2001, o FED (Federal Reserve), o banco central dos Estados Unidos, diminuiu os juros básicos da economia e os manteve em nível baixo. Em 2003, por exemplo, a taxa chegou a cair para 1% ao ano. Como as taxas de juros cobradas nos financiamentos de um carro ou uma casa são baseadas nos juros básicos da economia, houve um grande crescimento do mercado imobiliário. A fa| 48 |


cilidade para honrar os compromissos financeiros da hipoteca popularizou o mercado. As famílias viam as hipotecas como oportunidade de investimento. Era comum adquiri-las como forma de apostar no mercado imobiliário. O problema, no entanto, estava na modalidade de crédito conhecida como “subprime”. As agências hipotecárias, com destaque para a Fannie Mae e a Freddie Mac, as maiores do setor, emprestavam para pessoas de ganhos salariais muito baixos, não exigiam comprovação de renda nessas operações e faziam vistas grossas para aqueles que apresentavam histórico de inadimplência. Por representarem significativo risco de inadimplência, esses empréstimos ofereciam taxa de retorno, obtenção de lucro, maior para as instituições. Até esse momento, em que o crédito de alto risco era concedido pelas empresas de hipotecas, o estrago na economia não seria grande. Os problemas ficariam centralizados no setor imobiliário, algo que o governo poderia resolver de maneira muito mais simples. O problema surgiu com a contaminação do sistema financeiro internacional. A tragédia veio com um mecanismo chamado carinhosamente pelos economistas de securitização. Apesar de a palavra parecer complicada, o termo securitização nada mais é do que transformar uma dívida, normalmente imobiliária, em um ativo financeiro, passível de ser negociado entre os agentes envolvidos nas transações diárias das bolsas de valores. Isso significa que as dívidas imobiliárias daqueles créditos considerados de alto risco foram transformados em ativos financeiros e vendidos para os investidores. Esses ativos não foram negociados apenas uma vez. Eles podem ser comprados e vendidos dezenas, centenas ou milhares de vezes. Após atingir o pico em 2006, os preços dos imóveis passaram a cair. É impossível manter um setor da economia eternamente aquecido. As instituições envolvidas na atividade imobiliária, bancos, agências hipotecárias e outros agentes financeiros, | 49 |


também financiadoras do crédito, passaram a faturar muito menos. As vendas das casas já não traziam o mesmo lucro de antes. O crédito de alto risco já não valia mais a pena, porque os preços dos imóveis estavam em baixa. Houve, portanto, um desinteresse geral pelo “subprime”. O impulso para a instalação de um ambiente de caos veio com a decisão do BC americano de aumentar a taxa de juros. Sem enxergar necessidade de continuar apoiando o aquecimento da economia dos Estados Unidos, o que poderia causar um cenário de inflação fora do controle, uma decisão oportuna, mas que veio de forma tardia, as autoridades mudaram o rumo da política monetária, optando por uma sequência de aumento dos juros. Os economistas perceberam que a qualquer momento a taxa de inadimplência, especialmente no setor imobiliário, poderia explodir. O aumento dos juros fez com que as hipotecas ficassem mais caras. Os americanos, que se sujeitaram às atrativas condições do empréstimo de risco, não tinham como arcar com a subida das prestações. A inadimplência veio com força. Ao correr para o mercado financeiro tentar se desfazer dos ativos de crédito de alto risco, os agentes financeiros criaram um ambiente de desespero nos negócios. Imediatamente, em meio às incertezas, a concessão de crédito secou. O temor de outros calotes fez com que as institui­ ções praticamente parassem de emprestar. Pode-se considerar o crédito mecanismo fundamental para o funcionamento da economia. É o dinheiro emprestado que possibilita ao cidadão comprar um bem mais caro, o que movimenta a indústria para produzir. O empresário, dono da fábrica, também toma um capital para aumentar seus negócios de maneira que consiga produzir o suficiente para o aumento da demanda. Para se ter uma ideia da gravidade do problema, a Fannie Mae registrou prejuízo, no segundo trimestre de 2008, de US$ 2,3 bilhões, enquanto que a Freddie Mac perdeu US$ 821 mi­ | 50 |


lhões. Essas duas empresas possuem quase a metade dos US$ 12 trilhões em empréstimos para o setor habitacional americano. Um prejuízo dessa magnitude é de se assustar quando levamos em conta qualquer período de comparação. Em ape­ nas três meses, durante abril, maio e junho do ano passado, ambas as empresas foram internadas na unidade de tratamento intensivo, respirando por aparelhos. Em setembro de 2008, uma segunda-feira, a falência do banco de investimentos Lehman Brothers, instituição americana de 158 anos de tradição, representou o pior momento da crise econômica. Ao investir pesadamente nos títulos de alto risco imobiliários, o Lehman assinou seu atestado de óbito. Uma escolha errada dos altos executivos do banco que pôs fim à trajetória de negócios de uma instituição centenária. Entre os meses de junho a agosto do ano passado, o banco perdeu incríveis US$ 7,8 bilhões, o maior prejuízo líquido de sua longa história. Como resultado, o valor das ações, desde o início da crise imobiliária até o momento da quebra, caiu de US$ 82 para pouco mais de US$ 4, um tombo de 95%. Para surpresa do mercado, o FED não socorreu o lendário banco de investimentos. Consequentemente, o pessimismo tomou conta do ambiente de negócios. Os bancos pararam de emprestar para outros bancos. Se o próprio sistema americano e, posteriormente, mundial não se entendia, imagine o que aconteceu com o crédito para as pessoas e empresas. Os fundamentos da economia real caminhavam para a ruína. O lado financeiro não demorou para contaminar o negócio de um pequeno empreendedor americano. A saída encontrada por Ben Bernanke, presidente do banco central americano, foi abrir o cofre público na tentativa de recuperar a confiança dos agentes financeiros no funcionamento da economia. O secretário do Tesouro Timothy Geithner e seu antecessor Henry Paulson aprovaram planos bilionários de estímulo econômico. O mercado tinha de voltar a emprestar, pelo | 51 |


menos entre as instituições financeiras, o que naturalmente faria com que o crédito para pessoas e empresas voltasse de maneira gradual. Pouco mais de um ano depois da bancarrota do Lehman, os planos de salvamento do sistema financeiro surtiram resultado. O dinheiro voltou a fluir de mercado para mercado. As bolsas ensaiaram um movimento de recuperação. O cenário de incerteza deixou de reinar entre os agentes financeiros. As ações da NYSE (New York Stock Exchange), a bolsa de valores americana, voltaram a apresentar índices positivos. A cor predominante dos índices financeiros deixou de ser a vermelha, e o azul e o verde passaram a figurar com mais frequência. Mas a economia real está longe de ter recuperado terreno. Já são quatro trimestres seguidos de recessão nos Estados Unidos. O desemprego continua em um patamar muito alto, distante dos tempos de ouro de um passado recente, época lembrada com saudade pelos americanos. Um diretor do Fede­ ral Reserve, em entrevista concedida no final de agosto aos profissionais da France-Presse, agência de notícias francesa, afirmou que a taxa real de desempregados era de 16%. Isso porque a medição oficial, calculada em 9,4%, não considera os americanos que gostariam de ter um emprego, mas pararam de procurar em razão da dificuldade de encontrar uma ocupação, e aqueles que estão trabalhando menos horas por dia do que gostariam. Outra grave dor de cabeça para o presidente Barack Obama é o crescente déficit fiscal, o prejuízo na arrecadação do governo. Devido aos espalhafatosos gastos para afastar a possibilidade da crise virar uma depressão econômica, a Casa Branca e o Comitê Orçamentário do Congresso preveem que o déficit no orçamento deve ficar em US$ 1,6 trilhão em 2009, valor nunca antes registrado, muito acima do atual recorde verificado no ano passado, também causado pelos efeitos da crise, de US$ 455 bilhões. | 52 |


Na Europa, a situação é tão ruim quanto. O PIB (Produto Interno Bruto) da zona do euro, que engloba os 16 países que adotam o euro como moeda, apresentou um desempenho pífio nos primeiros três meses do ano. A baixa recorde chegou a 2,5%, a maior recessão desde o fim da Segunda Guerra Mundial, o que deixa economias, como Espanha e Grã-Bretanha, com uma considerável massa de desempregados. Na União Europeia, em julho, o desemprego atingiu 9%. O economista Jim O´Neill, chefe da área de pesquisas econômicas do banco de investimentos Goldman Sachs, criou o termo BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) para reunir em uma sigla as economias que possuem potencial para se tornarem potências até 2050. Foram elas, com exceção da Rússia, cuja economia encolheu 9,5% no primeiro trimestre devido à queda livre do preço do petróleo, que sofreram com menor intensidade os efeitos da crise econômica. “Os maiores mercados emergentes estão se recuperando rapidamente e começando a acreditar que a recessão possa marcar mais um momento da mudança global que vê o Ocidente perdendo poder econômico”, disse o texto de uma das revistas do último mês de junho do renomado título britânico The Economist. Esse fortalecimento dos emergentes pressiona os países poderosos, que estão no grupo das nações desenvolvidas, a alterar o ambiente de discussão política e econômica global. Do final da Segunda Guerra, com a realização da Conferência de Bretton Woods, oportunidade em que foi definida a geopolítica ainda em vigência, até os dias de hoje, muita coisa mudou. Encabeçado pela força das economias de Brasil, Rússia, Índia e China, o grupo dos países emergentes reivindica espaço. Não se pode mais pensar o sistema econômico sem a participação decisiva desses quatro importantes países no comércio internacional. O Brasil encontra no comércio das commodities, sejam elas | 53 |


agrícolas ou minerais, sua especialidade. A Vale, por meio da extração dos minérios, principalmente o de ferro, e a Petrobras, especialista na exploração do petróleo em águas profundas e ultra-profundas, representam muito bem os interesses do país no mercado internacional. Ressalta-se que o aproveitamento da riqueza de sua natureza é uma especialidade, porque os brasileiros possuem uma economia diversificada, exportando produtos industrializados, capazes de competir em pé de igual­dade com as grandes empresas dos países desenvolvidos. A Embraer, por exemplo, já se consolidou como uma grande fabricante de aviões, concorrendo com empresas gigantes do setor, como a americana Boeing e a canadense Bombardier.

O florescer de uma nova economia A vertente econômica conservadora, adepta à falta de regras do livre mercado, tratou de diminuir o significado dessa grave crise econômica pela qual ainda passamos no momento em que o pior havia sido superado. Em decorrência da discussão que se formou a respeito da formulação de um conjunto de regulamentos para evitar a ambição desmedida dos atores financeiros, os figurões de Wall Street, seguidores do pensamento radical da Escola de Chicago, alertaram para o prejuízo de uma fiscali­ zação rígida do governo. O FED pode ficar responsável pela tarefa nos Estados Unidos, sobre o trânsito do capital, o que afetaria a sagrada liberdade de opção por um investimento. Esse discurso de manter o governo longe dos mercados financeiros vai de encontro aos pedidos de socorro, a exemplo de outras oportunidades, feitos pelos mesmos liberalistas durante os momentos de pânico da crise econômica. Para salvar as instituições financeiras que se atolaram na lama por apostarem em empréstimos de extremo risco de inadimplência, como a seguradora AIG, que recebeu cerca de US$ 180 bilhões de ajuda do governo, esses economistas não titubearam em pedir | 54 |


a interferência estatal, vinda do dinheiro do contribuinte. Com a tímida melhora do mercado, as instituições, principalmente os bancos, estão de volta para atuar no “cassino financeiro”, conforme escrevem críticos do governo em sites especializados como o zerohedge.com e algumas outras publi­ cações da grande imprensa americana. Mesmo com a taxa de inadimplência em 7% e subindo, os empréstimos, por incrível que pareça, voltaram a ser feitos para a carteira de clientes classificada como de alto risco ou “subprime”. O estranhamento ocorre quando analisamos o desempenho econômico de um dos maiores bancos de investimento dos Estados Unidos. Mesmo com os efeitos da crise ainda causando apreensão nos mercados, o Goldman Sachs registrou o maior lucro de sua história. Um recorde de US$ 13,8 bilhões obtidos somente no segundo trimestre deste ano. Entre os meses de abril e junho, em um total de 46 dias úteis, o banco conseguiu lucrar mais do que US$ 100 mi­lhões por dia. A marca anterior, ultrapassada de longe, era de 34 dias. Esses números espetaculares ocorrem alguns meses depois de o banco ter sido socorrido com US$ 10 bilhões advindos do tesouro americano. Pelo menos, o empréstimo foi quitado com o governo. Para piorar, bancos e “hedge funds” se valem dos recursos dos poderosos computadores em operações de ações em alta velocidade para sair na frente em relação aos outros investidores. Chamados de “High Frequency Trading”, esse sistema possibilita aos grandes investidores, através do uso de potentes máquinas, agilidade na compra e venda de ações. Por essas razões, as regras sobre o mercado financeiro precisam efetivamente sair do papel. O governo do democrata Barack Obama está decidido em controlar o famoso excesso cometido pelo mercado. Se tudo der certo com os americanos, o restante do mundo optará pelo mesmo caminho. Mesmo que não se forme um sistema financeiro ideal, longe do controle | 55 |


exercido pelo alto risco, um veneno conhecido pela perigosa rentabilidade a curto prazo, teremos, ao menos, um controle maior sobre as atividades que estejam sendo realizadas dentro desse mundo virtual, dominado por números extravagantes e negócios tidos como complexos. Diferentemente dos períodos conturbados anteriores, a crise do “subprime” serviu para que o mundo discutisse a validade do modelo econômico em que vivemos. Por ter ficado claro o papel lastimável dos agentes financeiros, com destaque para bancos, fundos de risco e agências de crédito, em toda essa bagunça que se formou, além da utilização do dinheiro público para salvar essas empresas, mesmo que não tenham merecido um centavo sequer, as pessoas pararam para pensar em qual sociedade querem para seus filhos. Os cidadãos comuns, aqueles que estão fora de qualquer mesa de negociação política e nunca participaram de uma reu­ nião de acionistas, perceberam e estão se dando conta cada dia mais que as multinacionais, ao lado dos personagens do mercado financeiro, não podem fazer o que bem entenderem de nossa sociedade. Aos poucos, essas pessoas, como eu e você, vão perceber que são mais poderosos do que qualquer investidor, governante ou diretor de multinacional. A mudança só depende da atuação individual, através da transformação de seu próprio universo, mesmo que seja uma pequena comunidade de alguns tantos indivíduos. A instabilidade da economia serviu também como impulso para o aumento das discussões em torno de um pacto ambiental, em nome do combate aos efeitos devastadores do aquecimento global, que obrigue os países a diminuir a emissão de gases-estufa nos próximos anos. Para que o meio ambiente seja respeitado, as indústrias não mais poderão produzir sem se preocupar com questões como reutilização da água, reflorestamento da área devastada e recuperação das áreas degradadas | 56 |


por suas atividades. No âmbito social, o respeito ao ser humano, por meio do combate às formas escravistas de trabalho ainda registradas em muitos lugares, como a região norte do Brasil, precisa virar prioridade. E não só isso. O respeito à dignidade de uma pessoa passa pela criação de um número adequado de empregos, com uma remuneração justa, que possa trazer esperança de dias ainda melhores. O acesso à cultura tem de ser universalizado. Através do saber, oferecendo uma formação rica na diversidade de opiniões, um número crescente de pessoas cuidará do planeta como se fosse a sua própria casa e tratará as pessoas em sua volta com respeito e consideração. Sem falar das medidas urgentes que deveriam ser levadas a sério para diminuir a pobreza. As doenças típicas da falta de recursos financeiros suficientes, como a cólera, podem ser facilmente extirpadas se houver vontade política. O fundo de ajuda às nações pobres tem condições de receber muito mais dinheiro. Vale lembrar que o capital gasto para arrumar a bagunça gerada pelos irresponsáveis do setor financeiro poderia acabar com a fome que assola o cotidiano de uma infinidade de pessoas. Como disse o secretário-geral da ONU, o tailandês Ban ­Ki-moon, em encontro realizado no último dia 24 de junho sobre a crise financeira: “Certamente, se o mundo pode mobilizar mais de US$ 18 trilhões para manter o setor financeiro em funcionamento, pode encontrar mais US$ 18 bilhões para cumprir seus compromissos com a África”. O objetivo das conversas foi o de aumentar a ajuda aos países pobres para que conseguissem sobreviver aos efeitos da instabilidade econômica. Principal motivo da crise, o lucro imediato, por meio de apostas em investimentos de alto risco, é uma estratégia de ganhar dinheiro que não pode ser permitida. A qualquer momento, a incerteza quanto ao potencial real dos ativos, já que a inadim| 57 |


plência pode estourar, vira fator de extrema preocupação. Na verdade, o ganho a curto prazo, no final das contas, prejudica até mesmo os investidores que optaram por esse caminho. Muitos deles, assim como as instituições financeiras, acabam falidos. A consequência para a vida das pessoas comuns, o bem-estar da sociedade, então, como constatamos ao longo desta apresentação, é catastrófica. O cotidiano das pessoas é rapidamente atingido, causando prejuízo para o perseguido bem-estar da sociedade. Não há dúvida de que o sistema econômico, mais uma vez, vai se recuperar. A principal característica do capitalismo é cair e levantar, mesmo que o tombo seja doído. Os movimentos de declinar e ascender, bem como o tempo de permanência em cada um deles, são definitivamente impossíveis de se prever. Quando reúne forças para ficar novamente de pé, a economia oferece oportunidades extraordinárias, possibilidades desafiadoras de novos negócios, para os investidores que souberem enxergar além de seu tempo. Esse modo de olhar para frente vê em uma nova economia a possibilidade de continuar ganhando dinheiro, registrando bom desempenho financeiro, condição inerente ao capitalismo, de forma que o lucro não seja realizado em um modelo de negócios predatório que destrói nossa rica diversidade ambiental e relega o valor das relações humanas para o segundo plano. A economia do futuro passa pela preservação do meio ambiente, pela adoção de práticas que respeitem as pessoas, pelo oferecimento de oportunidade, como crédito mais barato, para aqueles que pouco têm e pela reformulação da atitude consumista para evitar, por exemplo, o desperdício de alimento.

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Parte 2 ´ credito

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Enquanto os famintos aumentam, os ˆ executivos recebem bonus generosos

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té o fim de 2009, um bilhão de pessoas vão passar fome no mundo todos os dias, um número jamais regis­trado ao longo da história. A projeção foi feita em junho deste ano pela FAO, órgão da ONU (Organização das Nações Unidas) responsável pelas políticas voltadas para a agricultura e alimentação. O Brasil está em nono lugar na lista dos países cuja incidência de fome na população é maior. Mais de 14 mi­ lhões de brasileiros consomem alimento em qualidade e quantidade insuficientes. De acordo com o INED, instituto francês de pesquisas demográficas, a Terra possui 6 bilhões e pouco mais de 800 mi­ lhões de habitantes. A cada segundo, quatro mulheres dão a luz no mundo. Se pararmos para calcular, sem se importar para a exatidão da comparação, descobrimos que, a partir de 2010, um sexto dos seres humanos vão sofrer com a falta de ter o que comer. É um número realmente assustador. Para efeito de comparação, apenas no último ano, a ajuda do governo às instituições financeiras cambaleantes por causa da crise chegou a US$ 18 trilhões, um valor nove vezes superior aos US$ 2 trilhões em doações advindas dos países ricos nos últimos cinquenta anos para combater a miséria nos países pobres. Uma solução para engordar o fundo de combate à pobreza está na taxação das operações realizadas no mercado financeiro. No final de agosto deste ano, o presidente da Financial Services Authority (FSA), agência reguladora do sistema financeiro britânico, propôs a criação de uma taxa global sobre as transações financeiras, como forma de diminuir os nefastos | 61 |


impactos sobre a sociedade do capital irresponsável chamado de especulativo. Adair Turner disse que as atividades financeiras estão superdimensionadas, já que os executivos, mesmo em tempos de crise econômica, continuam recebendo altos salários e premia­ ções generosas, situação que exige uma resposta adequada dos governos. “Se queremos coibir as remunerações excessivas no mercado financeiro, precisamos reduzir o tamanho desse setor ou aplicar impostos especiais sobre os lucros”, disse Turner em entrevista à revista inglesa Prospect. O diretor-presidente do banco de investimentos Goldman Sachs, Lloyd Blankfein, recebeu uma remuneração total de mais de US$ 70 milhões em 2007, uma das mais elevadas grati­ficações da história de Wall Street. Passado o período pior da crise, o executivo defende que as bonificações multianuais devem ser proibidas e a maior parte do salário dos funcionários mais graduados das instituições financeiras deve ser paga com ações, em vez de dinheiro, durante os momentos de instabilidade financeira. “O setor permitiu que o crescimento e a complexidade dos novos instrumentos superassem sua utilidade econômica e social, assim como a capacidade operacional de administrá-los”, admitiu o diretamente envolvido Blankfein em um seminário realizado pelo jornal alemão Handelsblatt. Outro banqueiro que reviu seus conceitos é o presidente do conselho de administração do banco britânico HSBC ­Holdings, Stephen Green. Ao defender uma reforma cultural nos bancos, com direito ao fim do regime de “bônus excessivos”, Green admitiu que “os mercados financeiros podem ser os motores de excessos destrutivos”. Para ele, os bancos, nos últimos anos, na ânsia de buscar o lucro a curto prazo, criaram produtos complexos sem serventia para a humanidade. “Alguns produtos e serviços fracassaram nos testes de utilidade e transparência”, disse durante uma conferência re| 62 |


alizada na cidade alemã de Frankfurt. Sobre os polêmicos bônus, remuneração extra generosa paga para os executivos, Green disse que a volta rápida da gratificação, que é “muitas vezes maior do que a remuneração do trabalhador médio, está alimentando a raiva do público”. Por fim, como forma de resumir a atuação do setor, o executivo, assim como fez Blankfein, disse: “Nós precisamos reconhecer a dimensão moral do nosso fracasso”. A ideia de taxar a atividade financeira não é nova. Há mais de trinta anos, o americano James Tobin, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1981, um ferrenho crítico do capitalismo sem a presença de regras criadas por organismos estatais, propôs a criação da Taxa Tobin. Por meio dela, o governo cobraria imposto sobre 1% do valor das transações financeiras. Levando em consideração o tamanho do sistema financeiro dos nossos dias, a arrecadação poderia atingir cerca de US$ 170 bilhões por ano. Esse dinheiro, de acordo com a proposta de Tobin, seria remetido ao fundo mundial de combate à pobreza. Os franceses, ao lado dos partidos de esquerda portugueses, sempre concordaram com a proposta. Como consequência, a indústria financeira lança, vez ou outra, palavras de ataque aos dois países. Agora, com a economia sofrendo os reflexos da ambição desmedida dos agentes financeiros responsáveis pela bolha do mercado imobiliário americano, outros países estão um pouco mais simpáticos à ideia da taxação. A contração do PIB (Produto Interno Bruto), soma das riquezas geradas pelos serviços e produtos disponibilizados por um país, da Grã-Bretanha no segundo trimestre, em relação ao mesmo período do ano passado, foi de 5,5%, a pior taxa da série histórica iniciada em 1955. Por incrível que possa parecer, o próprio diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn, em entrevista para a influente revista semanal alemã Der Spiegel, defendeu a necessidade de | 63 |


uma participação maior do Estado na fiscalização do sistema financeiro. “A crise financeira foi um acontecimento catastrófico, mas um acontecimento criado pela ação do homem. A lição que todos precisamos aprender é que mesmo uma economia de livre mercado precisa de alguma espécie de regulação, caso contrário o seu funcionamento é comprometido”, afirmou.

A injusta lógica do curto prazo: ou míseros ou pobres Existem muitas diferenças entre o conceito de pobreza e de miséria. Uma pessoa pobre não passa fome, possui os alimentos de uma dieta alimentar básica, mas vive de maneira extremamente simples, fora do ambiente de consumo no qual estamos acostumados. Geralmente, o pobre nas grandes cidades vive em favelas, moradia considerada ilegal por estar à beira de córregos e em encostas de morros, locais de preservação da natureza, e nos cortiços, muito mais populares no passado. O miserável não tem o que comer. Ele vive em busca de restos de comida, porque passa literalmente fome. Nas grandes cidades, a rua é moradia da miséria, embaixo de pontes e viadutos. O nordeste do Brasil, apesar da melhora de vida dos últimos anos, é um exemplo da perversidade de viver como um miserável. As secas castigam a população. Com a plantação destruída pela falta de água, ao lado dos animais que não aguentam as inóspitas condições climáticas, o nordestino passa enormes dificuldades, uma luta para sobreviver diariamente. Nos municípios da região, que fazem parte do polígono da seca, 6,6% das crianças até cinco anos estão desnutridas. O escritor Graciliano Ramos retratou na obra ­Vidas Secas, um clássico da literatura brasileira, a vida de uma família que se desloca frequentemente atrás de comida e de dias menos sofridos. O mundo, como alertou as Nações Unidas, vai atingir o primeiro bilhão de pessoas famintas. Portanto, estamos falando | 64 |


apenas do universo de miseráveis, aqueles que vivem, segundo os critérios da ONU, com um ou dois dólares por dia. Isso significa que essas pessoas ganham, após o trabalho de um mês inteiro, no máximo, 60 ou 62 míseros dólares. Ao analisar o último relatório de desenvolvimento humano das Nações Unidas (“Ultrapassar barreiras: mobilidade e desenvolvimento humanos”), que analisa o ano de 2007, percebemos que existem 83 países, sendo que o Brasil é o septuagésimo quinto, com índice de desenvolvimento humano (IDH) elevado. Como o IDH não considera apenas a renda das pessoas, já que leva em conta também a educação e longevidade, esses números do primeiro grupo, incluindo o Brasil, com exceção dos países desenvolvidos europeus, dos Estados Unidos e de algumas nações asiáticas, podem ser perfeitamente contestados. A cada cem brasileiros, por exemplo, vinte e um estão abaixo da linha da pobreza, superior a um quinto da população, mas, mesmo assim, estamos no primeiro escalão de desenvolvimento. Panamá, um país da América Central cheio de história, está algumas posições à frente de nós. Só que por lá tem mais gente considerada miserável. Pouco mais de 37% da população amarga um rendimento de, no máximo, dois dólares por dia. Exatamente 24% dos argentinos considerados mise­ ráveis estão inseridos nessa mesma faixa de rendimento. Se as primeiras posições podem ser questionadas, imagine os outros 99 países. O que se percebe, de maneira geral, é o predomínio de condições lamentáveis de vida. Na verdade, o que essas pessoas fazem todos os dias é sobreviver. A todo momento, a preocupação gira em torno da existência do dinheiro para comprar os alimentos básicos para não desfalecer. Em alguns momentos tidos como desesperadores, simplesmente não há dinheiro. Nessas horas, o estômago insiste em roncar, e o silêncio dos famintos pode ser considerado uma maneira de poupar a energia que ainda resta. Os últimos colocados são todos do continente africano. Níger, | 65 |


localizado na parte ocidental do continente africano, com 80% do território coberto pelo deserto do Saara, tem o pior índice de desenvolvimento humano. Mais de 85% da população vive com apenas dois dólares por dia. A taxa de analfabetismo dos nigerinos, todas as pessoas acima de 15 anos, está em 71%, praticamente três quartos da população. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial até hoje, os países desenvolvidos dão alguma ajuda para os países pobres e em desenvolvimento. É uma forma de se livrarem de uma responsa­ bilidade muito maior. O desenvolvimento da economia das nações poderosas se deu na exploração de boa parte do planeta. Vimos no capítulo anterior que o desenvolvimento da indústria e do mercado financeiro encontrou nas nações pobres seu suporte. Através da matéria-prima barata e do mercado consumidor para seus produtos, os europeus, liderados pelos britânicos e, posteriormente, em outro período histórico, os americanos controlaram o comércio internacional. De certa maneira, o grupo dos países desenvolvidos continua mandando e desmandando na política e na economia, mas sem a mesma hegemonia do passado, já que os países de potencial crescimento econômico, como China, Brasil, Índia, além do retorno da Rússia, estão, felizmente, metendo o bedelho cada vez mais nos assuntos. Os países ricos têm uma grande dívida para com os outros povos e o meio ambiente. Eles acumularam a riqueza e, por consequência, a influência de hoje pelo passado nebuloso que possuem. Como forma de mostrar ao mundo sua preocupação com o desenvolvimento dos países necessitados, o mundo desenvolvido criou um fundo de ajuda que se mostra irrisório. Na prática, como mostrou o começo deste capítulo, os recursos disponibilizados são insuficientes para combater qualquer mazela ocasionada pela miséria. A verdade é que não existe interesse dos países poderosos em acabar com a fome no mundo. Outros problemas, como a AIDS no continente afri| 66 |


cano, também ficam em segundo plano. As políticas adotadas, como a insuficiente ajuda financeira, jamais criarão melhores condições de vida para a população miserável e pobre. Autor do livro A Humanidade e Suas Fronteiras – do Estado Soberano à Sociedade Global, o doutor em direito internacional pela Universidade de São Paulo, Eduardo Felipe Matias, é um especialista no estudo do prejudicial sistema econômico, controlado pelas poderosas multinacionais, no qual estamos inseridos. O capitalismo moderno, para ele, está voltado para a geração de bons resultados no curto prazo. A última grande crise econômica, por exemplo, foi causada pelo apetite dos investidores pelos ativos financeiros, advindos do crédito imobiliário de alto risco americano, que concediam, nos bons tempos, retorno financeiro quase instantâneo. “A sociedade está estruturada com mecanismos de incentivo e punição para atender o interesse imediato”, afirmou. A preocupação em obter recordes consecutivos de faturamento na atividade desempenhada por uma companhia, sem se preocupar com as consequências de sua produção para determinada comunidade e para o meio ambiente, é característica nociva desse capitalismo. “Só vamos conseguir construir uma nova sociedade, verdadeiramente responsável social e ambientalmente, quando os executivos e acionistas valorizarem a sequência de um trabalho em detrimento do lucro imediato”, analisou Matias. O advogado exemplificou essa obsessão pela rapidez da obtenção de bons resultados por meio da utilização do PIB como exemplo. “A China apresenta crescimento espetacular da economia todos os anos. Mas sabemos que o crescimento dessa riqueza não leva em conta, entre outros fatores, o prejuízo humano que está causando”. Ou seja, para Matias, a medição do PIB tem de levar em conta os fatores humanos e ambientais utilizados para gerar aquela determinada riqueza. “Quando um terremoto destrói a | 67 |


economia de boa parte de um país, a reconstrução faz com que o PIB do ano seguinte cresça consideravelmente. À primeira vista, parece que esse país registrou um crescimento espetacular. Porém, na verdade, esse resultado ocorreu devido à catástrofe do ano anterior, o que resultou em enorme perda humana”, finalizou. Esse modo de agir fundamentado no lucro imediato faz com que as políticas de ajuda para os países pobres não obtenham os resultados esperados. Os investidores, salvo algumas exceções, simplesmente não estão interessados em colocar seu dinheiro em projetos sociais. Ao mesmo tempo, eles não enxer­gam o potencial, em termos de capacidade de crescimento, que existe nos países pobres. Com uma economia dilacerada pelos europeus no passado e por guerras civis no presente, esses países estão parados no tempo, completamente esquecidos. Em vez de contribuir para o florescer de uma nova economia, os capitalistas modernos, formados pelos grandes investidores e pelos proprietários das influentes marcas, preferem continuar explorando, seja pela especulação do mercado financeiro, seja pela adoção de práticas selvagens de negócios, os países pertencentes ao grupo pobre e em desenvolvimento. Tudo isso é feito, como discutimos, em nome da obtenção do retorno financeiro o mais rápido possível.

A nova economia está no crédito solidário Diferentemente do que é feito, na contramão do comportamento do mercado, Muhammad Yunus criou o chamado crédito solidário, empréstimos voltados para os pobres, a taxas de juros pequenas, com uma rede de benefícios para essas famílias necessitadas. Conhecido como O Banqueiro dos Pobres, o ex-professor de economia passou a emprestar dinheiro para gente que, a princípio, não oferecia nenhuma garantia de pagamento. Para isso, criou o banco Grameen em 1976, uma insti| 68 |


tuição direcionada para os interesses dos pobres. Os primeiros passos foram dados em Bangladesh, seu país natal. Com a fragmentação da Índia, após confrontos em nome da formação de um território próprio, surgiu o Estado de Bangladesh. Os bengaleses, as pessoas que nascem em Bangladesh, são, em sua imensa maioria, pobres. A miséria, como em qualquer lugar onde esteja, produz imagens desconcertantes em todo o território. Quase 50% da população vive abaixo da linha da pobreza, o que coloca o país entre os piores índices de desenvolvimento humano. Transtornado com as imagens de sofrimento presenciadas todos os dias, Yunus resolveu apostar naquela que sempre acreditou ser a solução para aumentar a renda das pessoas. O maior desafio está em criar condições para as famílias se sustentarem sozinhas. Em vez de adotar políticas de distribuição de dinheiro e comida aos pobres e miseráveis, o ex-professor acredita que o caminho é emprestar um capital inicial pequeno para que as famílias possam desenvolver sua própria fonte de renda. Ao honrar o primeiro pagamento, a confiança do banco de atuação solidária na seriedade do tomador do crédito faz com que outros mais, gradualmente maiores, sejam concedidos. No prefácio do seu livro O Banqueiro dos Pobres, o vencedor do Prêmio Nobel da Paz em 2006 diz que acredita na criatividade dos seres humanos manifestada quando a vida lhes oferece alguma chance. Só que as pessoas que podem ofere­ cer essa oportunidade desviam os olhos do problema. “Estou profundamente convencido de que poderemos livrar o mundo da pobreza se estivermos determinados a isso. Essa conclusão não é fruto de uma experiência crédula, mas o resultado concreto da experiência que adquirimos em nossa prática de microcrédito”, escreveu Muhammad Yunus. Em um dos textos disponíveis no site pessoal, ele compara a maneira de enxergar os pobres dos bancos comerciais e do Grameen Bank. Para começo de conversa, uma pessoa com | 69 |


renda baixa não consegue empréstimo em qualquer banco comercial do mundo. Isso porque o princípio que rege o mercado diz que quanto mais a pessoa tem, mais crédito ao seu dispor ela possui. Em outras palavras, se você tem pouco ou nada, você vai ter nada. Como resultado, mais da metade da população global é descartada dos serviços financeiros prestados pelos bancos convencionais. Por outro lado, o Grameen considera que o crédito precisa ser visto como um direito do ser humano. Por essa razão, o sistema privilegia quem não possui nada para conceder os empréstimos. A aposta do banco está na potencialidade das pessoas, porque acredita que todos, ainda que sejam extremamente pobres, têm vontade e capacidade de crescer, o que possibilita caminhar com as próprias pernas. Outra diferença está no perfil dos dirigentes. Os bancos convencionais são geridos por pessoas ricas, geralmente do sexo masculino, completamente distantes da realidade do Terceiro Mundo. No banco Grameen, as mulheres pobres formam o conselho de administração. O objetivo dos bancos convencionais é gerar recordes de lucro todos os trimestres. Os resultados positivos não podem parar. A meta do Grameen é levar serviços financeiros para os pobres, particularmente as mulheres e os miseráveis, ajudando-os a lutar contra a pobreza, e, ao mesmo tempo, mantendo o banco lucrativo e financeiramente viável. É um objetivo composto formado pela responsabilidade social e a necessidade de apresentar resultados satisfatórios. Ao contrário dos bancos convencionais que são direcionados para os homens, o banco solidário bengalês dá prioridade às mulheres. Dos que emprestam do banco, 97% são do sexo feminino. O banco trabalha para aumentar o status das mulheres pobres nas suas famílias dando a elas a propriedade dos bens. As agências do Grameen estão em áreas rurais, porque o | 70 |


campo tem condições de vida piores que a cidade, ao contrário das agências dos bancos comerciais que estão o mais próximo possível das lucrativas áreas de negócio, ou seja, dos enriquecidos centros urbanos. Um dos fundamentos do Grameen é que os clientes não devem procurá-lo. A obrigação é dos trabalhadores do banco solidário saírem em busca das pessoas. Toda semana, os pouco mais de 23 mil funcionários do Grameen vão até a porta dos quase 8 milhões de clientes, distribuídos nos 84.573 vilarejos de Bangladesh, prestar os serviços bancários. Ao comparar os dois tipos de banco, percebemos que o atraso nas parcelas de pagamento dos empréstimos é encarado de maneira completamente diferente. Os bancos convencionais criam um sistema de punição quando o cliente não cumpre o que havia acordado. Eles fazem com que a pessoa sinta que come­ teu algo muito errado. A metodologia do Grameen permite a esses clientes em atraso renegociar o prazo de pagamento do empréstimo. Acima de tudo, o banco solidário toma cuidado para não causar constrangimento em seus clientes durante as negociações. O sistema de cobrança dos juros igualmente difere. No mode­ lo do banco solidário, ao contrário do comercial, sob nenhuma circunstância, os juros totais cobrados em um empréstimo podem exceder o valor original do crédito concedido, não importando quanto tempo o cliente ficou sem pagar. A taxa de juros para de ser cobrada quando o valor dos juros iguala o montante original. Todas as diferenças apontadas colocam o Grameen em uma posição de exemplo. Se todos os bancos adotassem metade das políticas do banco de Yunus, como bem disse o ex-professor, não existiria pobreza e, muito menos, fome. A obsessão pelo resultado de curto prazo, característica do capitalismo de nossos tempos, dá lugar ao enriquecedor planejamento de dias melhores para um número cada vez maior de pessoas. Por fim, existe uma característica que o torna ainda mais especial: a | 71 |


preocupação com o bem-estar das famílias. O sistema do banco solidário presta muita atenção a tudo o que acontece com a família daquele que pegou emprestado. Os agentes monitoram a educação dos filhos, fiscalizando o desempenho em sala de aula, as condições da casa onde a família mora, o que inclui a infraestrutura sanitária, o acesso à água potável, enfim, tudo que possibilite viver com dignidade. Para completar a responsabilidade social do Grameen, há o encorajamento da família a adotar algumas práticas sociais, educacionais e na área de saúde, conhecidas como “As De­ zesseis Decisões”. São elas: 1| Nós devemos seguir e avançar nos quatro princípios do banco Grameen: disciplina, unidade, coragem e trabalho, em todas as caminhadas de nossas vidas; 2| Devemos levar prosperidade para nossas famílias; 3| Nós não devemos morar em casas dilapidadas. Nós devemos reformar nossas casas e trabalhar juntos para construir novas casas o mais rápido possível; 4| Nós devemos plantar vegetais o ano inteiro. Nós devemos comer muitos deles e vender o excedente; 5| Durante o período de plantação, nós devemos plantar o máximo possível de mudas; 6| Devemos manter nossas famílias pequenas para reduzir os gastos. Nós devemos cuidar da nossa saúde; 7| Nós devemos educar nossos filhos e ter certeza de que eles podem ganhar para pagar a educação deles; 8| Nós devemos manter sempre nossos filhos e o meio ambiente limpos; 9| Nós devemos construir e usar fossas; 10| Nós devemos beber água advinda de tubulações. Se uma rede de canos não estiver disponível, devemos esquentar a água ou usar sulfato de alumínio para eliminar as impurezas; 11| Nós não devemos cobrar dote no casamento dos nossos | 72 |


filhos nem devemos pagar dote no casamento das nossas fi­ lhas. Devemos ficar longe da maldição do dote. Não devemos praticar o casamento de crianças; 12| Nós não devemos ser injustos com as pessoas nem devemos permitir que alguém seja; 13| Nós devemos realizar grandes investimentos de maneira coletiva para alcançarmos maiores rendimentos; 14| Nós devemos em qualquer ocasião estar prontos para ajudar um ao outro. Se alguém está em dificuldade, nós devemos todos ajudá-lo ou ajudá-la; 15| Se nós soubermos de algum ato de indisciplina, nós devemos ir até lá e ajudar a restaurar o ambiente de disciplina; 16| Nós devemos participar em todas as atividades sociais de forma coletiva. Não é preciso dizer que os bancos convencionais não dão a mínima importância para o que os tomadores de empréstimo vão fazer com o dinheiro. O importante, como já dito, é que a dívida seja paga no prazo estipulado. Essa preocupação com o bem-estar da sociedade, ao emprestar qualquer quantia, está limitada aos bancos solidários.

O crédito solidário no Brasil Quando surgiu em 1998 em uma comunidade pobre de Fortaleza, capital do Ceará, o banco solidário Palmas mal tinha dinheiro para emprestar. “Começamos com um capital voltado para o crédito de apenas R$ 2 mil”, lembrou João Joaquim de Melo Neto Segundo, coordenador-geral da instituição. A dificuldade ficou para trás. O período de incerteza quanto à continuação dos trabalhos virou passado. Claro que não sobra dinheiro. Na verdade, tudo é muito bem administrado para que o trabalho de desenvolvimento da comunidade continue sendo feito. Hoje, todos os bairros de Fortaleza, por volta de 116, | 73 |


estão atrás de uma iniciativa parecida em seus domínios. Nos moldes do banco bengalês Grameen, o Palmas mudou a vida dos moradores do Conjunto Palmeiras, bairro que era considerado um dos mais pobres da capital cearense alguns anos atrás. Com o objetivo de retirar as famílias que se instalaram em áreas de preservação ambiental, o governo municipal remanejou as pessoas para um espaço disponível, distante do centro da cidade, de 118 hectares. Os novos moradores nomearam a região de Conjunto Palmeiras pela quantidade de carnaúbas encontrada por lá. O processo de deslocamento de uma população pobre, habitante de propriedades ilegais, para uma região em que vai receber seu pedaço de terra, devidamente reconhecido pelo governo, é chamado de assentamento. Só que o governo da cidade fez pouco para melhorar a infraestrutura do lugar. A água, por exemplo, era trazida em caminhão-pipa. Em volume insuficiente para dar conta da crescente população, as pessoas muitas vezes não tinham água para beber. Por essa razão, eram obrigadas a se deslocar para um poço a quilômetros de distância do bairro. Insatisfeitos com a situação, a partir de 1977, os moradores montaram mutirões para alterar a situação precária do bairro. Assim, construíram suas casas, participaram do processo de instalação da rede elétrica e da água encanada, lutaram para que a prefeitura agilizasse a instalação da escola e do posto de saúde e realizasse o asfaltamento das ruas. Apenas em 1988, houve a implantação da rede de água no Conjunto Palmeiras, porque os residentes, cansados de esperar pela água encanada, ameaçaram explodir parte da tubulação que abastecia Fortaleza inteira. Essa força do trabalho em grupo, ajudando e apoiando uns aos outros, em nome do benefício coletivo é, com certeza, a regra número um da transição para uma economia mais humana. Sem falar do poder de reivindicação quando se organiza um grupo, consciente e | 74 |


unido em torno das suas propostas. As melhorias, depois de muita manifestação, ficaram prontas. O bairro passou a ter outra cara. No entanto, essas mudanças geraram um custo insustentável para as famílias. As contas de energia, telefone e água encareceram o orçamento. O imposto mais caro sobre o terreno deixou a situação financeira das pessoas ainda pior. “Quando o bairro finalmente ficou bom para morar, os antigos moradores, por falta de dinheiro, estavam partindo”, disse Neto Segundo. Nesse momento, a comunidade parou para pensar no que poderia fazer para continuar naquele bairro tão querido. “Percebemos que tínhamos dinheiro, mas não sabíamos aproveitar nossa riqueza”, admitiu o coordenador-geral que diz ser formado no curso acadêmico de economia do povo. A fórmula mágica encontrada foi estimular a produção local para que o consumo não precisasse ocorrer fora do bairro. Para realizar esse processo de estímulo da produção e consumo locais, houve a criação do Banco Palmas. “A moeda própria, o palmas, foi importante na criação de incentivos em nossa comunidade para o consumo na extensão territorial do bairro”, afirmou. Ao comprar com palmas, em vez do real, o morador, além de contribuir para o crescimento do Conjunto Palmeiras, tem direito a um desconto de 5% a 10% nos produtos. O transporte oferecido pelas vans legali­ zadas fica dez centavos mais barato se a pessoa comprar com palmas. A paridade de valor é um para um, ou seja, um real vale uma palma. Para realizar a viagem de van mais comum do bairro, o morador gasta um real e cinquenta palmas. Em real, essa viagem sai por um real e sessenta centavos. E os integrantes da comunidade não pagam mais barato somente para se locomover. No mercadinho ou na quitanda, o que não falta é produto com o preço mais em conta em palmas do que em reais. Muita coisa pode ser consumida no próprio bairro. As pessoas podem comprar alimentos, abastecer o carro, | 75 |


adquirir roupas, sempre utilizando as notas de palmas para pagar. “De acordo com nossa última pesquisa, 95% dos residentes consomem localmente”, disse o orgulhoso Neto Segundo. As notas de palmas, assim como as de reais, possuem componentes de segurança, tais como marca da água, código de barras e número de registro. A intenção é evitar a ação dos falsários. Mesmo que a moeda tenha esse forte cunho social, existem espertinhos com outros objetivos nada nobres. Os comerciantes, por serem moradores da comunidade, sabem da importância de se gerar riqueza no próprio bairro. Eles só trocam as palmas por reais quando precisam pagar algum serviço prestado na parte de fora do Conjunto Palmeiras. Nessas situações, o banco troca sem maiores problemas a quantia. Com o sucesso da iniciativa, os moradores não precisaram deixar suas casas. A comunidade, hoje com 32 mil pessoas, mostrou, mais uma vez, a importância de atuar em conjunto. Em 2005, o banco Palmas fechou uma parceria com o Banco do Brasil. Os dirigentes da instituição solidária pegam di­ nheiro com juros de 1% e emprestam para a população do bairro cobrando 1,5%. Essa diferença de 0,5% fica no caixa do banco para cobrir os custos de manutenção e garantir uma reserva de emergência. O crédito a juros baixíssimos, concedido pelo banco solidário, foi responsável pelo aumento da produção local. As opções de consumo só aumentaram, porque o Palmas, como faz o Grameen, pioneiro em microcrédito, incentiva o empreende­ dorismo. A tabela de juros sobre os empréstimos se divide da seguinte forma: Palmas

Juros

Até 1000 palmas de empréstimo

o juro incidente é de 1,5% ao mês

De 1001 a 2000 palmas de empréstimo

o juro cobrado é de 2% ao mês

De 2001 a 3000 palmas de empréstimo

o juro incidente é de 2,5% ao mês

De 3001 a 10000 palmas de empréstimo

o juro cobrado é de 3% ao mês

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Portanto, o menor valor de crédito para a produção é de mil reais. Por outro lado, o maior valor de empréstimo garantido pela instituição é de 10 mil reais. Para o consumo, as regras são diferentes. O tomador de empréstimo pode pegar, no máxi­ mo, 600 palmas/600 reais sob juros de 1,5% ao mês. A taxa de inadimplência em todos os tipos de empréstimos listados acima mantém um patamar praticamente nulo há muito tempo. Para os atrasos de pagamento acima de 90 dias, a taxa de ina­ dimplência é de apenas 0,2%. Para a aprovação do crédito, o banco envia um agente, uma espécie de avaliador da possibilidade de empréstimo, para conversar com os vizinhos sobre a honestidade do interessado. Ele procura saber se o futuro tomador de crédito não tem a ficha suja com as pessoas que moram próximo. “Não pedimos nenhum tipo de garantia, não fazemos análise de crédito com a Serasa”, confirmou Neto Segundo. “A idoneidade da pessoa é verificada através da conversa com as pessoas da vizinhança”, completou.

O governo abriu os olhos para os benefícios do microcrédito

Boa parte dos governantes utiliza o microcrédito, a juros facilitados, como parte integrante de sua política de governo. A iniciativa do Banco Grameen se espalhou para o restante do mundo. Não apenas outros bancos, sem nenhuma filiação política, seguiram seus passos, como os próprios governos perceberam a importância de oferecer à população uma instituição estatal que conceda empréstimos baratos. No começo de setembro deste ano, o Banco do Povo do Estado de São Paulo reduziu a taxa de juros cobrada nas operações de empréstimos. Antes, o banco paulista cobrava 1% ao mês. Agora, passou a cobrar 0,7% ao mês. No primeiro semestre de 2009, a instituição estadual emprestou cerca de R$ 40 milhões, | 77 |


montante financeiro que ajudou 10 mil pequenos negócios. Em relação ao mesmo período do ano passado, o valor dos empréstimos cresceu 18,38%. De acordo com o cadastro do banco do governo paulista, quem busca empréstimos, geralmente, tem entre 30 e 49 anos, trabalha principalmente no comércio (13%), em funções como motorista (12%), costureira (10%), vendedor (8%) e cabeleireiro (5%). Os empreendedores são estimulados a promover a melhora da qualidade de vida de toda a comunidade onde estão inseridos. O comerciante Alberto Souza Silva tem uma lojinha de produtos oriundos das regiões Norte e Nordeste em Osasco, município que faz parte da região metropolitana de São Paulo. No começo, tinha uma barraquinha para trabalhar. Depois de tomar vários empréstimos, conquistando a confiança dos agentes de crédito do banco, conseguiu dar uma boa entrada em uma casa para abrigar seu comércio. “O primeiro empréstimo foi de R$ 250. Como sempre paguei direitinho, hoje tenho direito de pegar R$ 4 mil”, disse com orgulho. A metodologia é a mesma daquela utilizada no banco bengalês Grameen e no cearense Palmas. O que difere é a necessidade de um avalista até o terceiro empréstimo. “Eles (o banco) mandam uma pessoa aqui em casa. Vêm para conferir, perguntando para os vizinhos, se temos um histórico de honestidade”, descreveu. Recentemente, uma instituição bancária comercial concordou em financiar um carro para Alberto. “Com a força do meu trabalho, consegui um financiamento para comprar um carro. Já me considero um microempresário”, finalizou. Já Ana Judite Moura, também de Osasco, uma das cidades mais pobres do estado, abriu um comércio de produtos diversos, como papelaria, roupas e outros presentes, em 2004. “Procurei o banco do povo para comprar a mercadoria da loja”, disse. Depois de um orçamento, a senhora, sob os olhares atentos da filha que cuida da parte financeira, pediu ao banco | 78 |


um crédito de R$ 2 mil para que a loja ficasse com o estoque completo. “Após uma assembleia feita pelo pessoal do banco, realizada em pouco tempo, consegui o empréstimo”, afirmou. No fim do ano, Maria Moura Mendes, a filha da Dona Ana, sempre pede o empréstimo. O aumento do consumo da loja, motivado pelas compras do Natal e Ano Novo, faz com que a família inteira trabalhe em ritmo alucinante. “A vantagem de tomar emprestado do banco do povo é pagar juros pequenini­ nhos em doze parcelas iguais”, completou Maria.

Os bancos brasileiros só pensam em lucro Se você precisar de um empréstimo no Brasil, pense muitas e muitas vezes antes de solicitá-lo. Ao contrário do que ocorre no âmbito solidário, os bancos comerciais e outras instituições de crédito cobram juros muito altos. Considerado o paraíso dos banqueiros, o sistema financeiro brasileiro, apesar de o Banco Central ter diminuído a taxa básica de juros para um patamar nunca antes visto, de 8,75%, acumula significativos ganhos todos os trimestres. Os especialistas do mercado culpam os altos impostos pela necessidade dos bancos manterem o “spread bancário” nas alturas. Como forma de esclarecer as coisas para o leitor, explicamos esses termos mais complicados utilizados pelos economistas. O “spread bancário” é a diferença entre a taxa de juros paga pelos bancos na captação do dinheiro e aquilo que a ins­tituição bancária cobra, nos diversos tipos de operações de empréstimo, dos seus clientes. O resultado da subtração está no lucro dos bancos. Quando o Banco Central, também conhecido simplesmente por BC, considerado o banco mais importante de um país, res­ ponsável pela condução da política monetária, diminui a taxa básica de juros, também conhecida como Selic, as instituições bancárias comerciais, privadas ou estatais, têm condições de | 79 |


diminuir os juros cobrados nas modalidades de empréstimos. E por que isso não ocorre como deveria? Voltamos para a afirmação do começo do parágrafo anterior. Além dos economistas apontarem a carga tributária como um problema, existe, segundo eles, outro fator que emperra a diminuição, a inadimplência. “Em tempos de crise econômica, um número maior de pessoas fica sem condições de arcar com seus compromissos”, explicou Marcos Crivelaro, professor de finanças da Faculdade de Informática e Administração Paulista (FIAP). Na verdade, os bancos veem na inadimplência uma chance de aumentar seus lucros, já que podem aumentar os juros co­ brados dos seus clientes e, por consequência, os ganhos de cada transação. “Quanto maior for a incidência de pessoas sem ter como pagar, melhor para os bancos. Para os banqueiros, é melhor que a taxa de inadimplência fique em um patamar ele­ vado”, acrescentou Crivelaro. Ao culpar aqueles que não têm como pagar pelo aumento generalizado dos juros, os bancos prejudicam todos os tomadores de empréstimos, sejam eles bons ou maus pagadores. Os que não conseguem honrar seus compromissos em dia, geralmente devido às dificuldades momentâneas pelas quais passam, são condenados como se fossem verdadeiros criminosos. “Nossos bancos estão entre os mais lucrativos do mundo, mesmo que tenham a menor carteira de crédito do planeta. Ga­ nham muito em cima de pouco. A situação se inverte lá fora. Os bancos de outros países ganham pouco (cobram menos juros) em cima de muito (emprestam para um número muito maior de pessoas)”, finalizou o professor Crivelaro. É importante deixar claro que a obtenção do lucro é fundamental no sistema capitalista. Os bons resultados precisam ser almejados pelas empresas de todos os setores econômicos. O problema está quando o lucro vira tão somente a única meta do negócio. A imagem dos bancos no Brasil e nos outros países não é positiva. Ao lado do restante do mercado financeiro, a | 80 |


reputação ficou ainda pior com a recente crise econômica. Até porque, como já dissemos, em meio à turbulência, alguns deles registraram um excelente faturamento. No caso brasileiro, os bancos não sofreram nenhum hematoma sequer. Isso porque nossos banqueiros não apostaram no setor imobiliário americano. Não foram feitos investimentos nesses ativos. Só que, em termos de organização do setor bancário, percebe-se, como o professor Crivelaro ressaltou, uma enorme dificuldade na obtenção de crédito, com taxas de juros muito caras, em qualquer modalidade de empréstimo. Uma pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), divulgada em abril deste ano, analisou a indústria bancária no Brasil, comparando-a com o restante do mundo. A informação mais interessante do estudo diz respeito aos juros cobrados sobre as pessoas físicas e jurídicas. Acompanhe a tabela: Taxa anual real de juros sobre empréstimos pessoais em ins­ tituições bancárias segundo países selecionados na primeira semana de abril de

2009

Instituição HSBC Países Reino Unido Brasil

Países

Juro Real*

Juro Real*

6,60

Espanha

10,81

63,42

Brasil

55,74

Instituição Citibank Países

Instituição Santander

Juro Real*

Instituição Banco do Brasil Juro real cobrado no Brasil: 25,05*

Estados Unidos

7,28

Instituição Itaú

Brasil

60,84

Juro real cobrado no Brasil: 63,25*

* O juro real é obtido descontando a inflação registrada no período. FONTE: Dados fornecidos pelas instituições bancárias para os juros e OCDE e BCB para inflação nos países selecionados e no Brasil.

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Os juros cobrados pelas instituições estrangeiras, HSBC, Santander e Citibank, foram comparados entre aqueles incidentes sobre a população do país de origem desses bancos e a população brasileira. Como se percebe, a diferença é realmente assustadora. Mesmo considerando o tamanho da economia dos países ricos em relação à do Brasil, o que, teoricamente, possibilita que os juros sejam menores, não se pode negar que existe um problema grave no sistema financeiro brasileiro, já que somos obrigados a arcar com juros quase dez vezes maiores que os cobrados nas nações de origem dos bancos estrangeiros. O levantamento realizado pelos funcionários do Ipea também mostra um histórico da taxa de juros cobrada pelos Estados Uni­dos, países da Zona do Euro e pelo Brasil. Veja na tabela: Taxa média anual de juros no Brasil, Estados Unidos e Zona do Euro para pessoas físicas e jurídicas - % Estados Unidos PF (Pessoal)

PJ (C. Giro)

15,23

9,5

2004

13,92

5,15

2008

13,96

4

Zona do Euro Ano

PF (Pessoal)

PJ (C. Giro)

2000

Não há

Não há

2004

5,88

Não há

2008

6,38

5,45

Brasil Ano

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PF (Pessoal)

PJ (C. Giro)

2000

67,7

32,5

2004

60,3

41

2008

60,4

38,1

FONTE: FDIC; BCE e BCB (elaboração Ipea)

Ano 2000


Com condições tão caras de crédito, a distribuição das operações de empréstimos bancários, durante o período que vai de 1997 a 2006, aumentou apenas no Sudeste. Como região mais rica e desenvolvida do país, o Sudeste concentra 70,6% dos empréstimos concedidos. As regiões Norte, com apenas 1,7%, e Nordeste, com somente 6,1%, aparecem nas piores posições. A população dessas duas importantes regiões brasileiras, cujo crédito exerceria papel fundamental no desenvolvimento, simplesmente não tem condições de arcar com os juros cobrados. As outras duas regiões, Centro-Oeste, com 8,5%, e Sul, que ocupa a segunda posição com 13,1%, também estão muito distantes do Sudeste. A conclusão do estudo diz que “grandes parcelas da sociedade brasileira contam com escassa inclusão bancária”. São 505 municípios brasileiros sem uma única agência, e “é pa­ tente a desigualdade na oferta de serviços entre regiões, estados, municípios e no interior, quando existe comparação com as capitais de estados”. Nas últimas linhas do capítulo de finalização, os economistas do Ipea concluem que as condições bancárias, de exclusão de boa parte da população, vão prejudicar o crescimento da economia brasileira nos próximos anos. Para eles, “o crédito é caro, e o atendimento é precário em vastas regiões do Brasil”.

A Reforma Agrária no Brasil Terra é sinônimo de confronto. Em qualquer país do mundo já houve conflito em função dela. Todos, independentemente da classe social, querem controlá-la. Não se trata de dominar alguns alqueires. A hegemonia da terra dá a possibilidade de influenciar nas decisões importantes de uma comunidade, região ou nação. Para ficar só nos dias que vivemos, podemos citar a família do ex-presidente José Sarney. O estado do Maranhão é controlado pelo atual presidente do Senado. Várias mãos seriam | 83 |


necessárias para contar as propriedades da polêmica família Sarney. Todo esse poder brotou da terra. A história do Brasil pode ser explicada do ponto de vista da terra, tamanha a sua relevância nos acontecimentos. No período de colonização, a divisão por capitanias hereditárias, lotes doados pela Corte Portuguesa a quem tivesse coragem de vir para cá, inaugurou a divisão desigual cujo controle sobre enormes propriedades ficava a cargo de uma pessoa ou um pequeno grupo de fazendeiros. Mas foi na República do Café com Leite, quando os presidentes se revezavam entre os estados de São Paulo e Minas Gerais, durante a República Velha, que a relevância da terra aumentou. Essa época provocou o aparecimento com força do setor agrário no cenário político. Como maior produtor de café, São Paulo organizou suas terras de modo com que conseguisse plantar a maior quantidade possível do produto. Para isso, eram necessários grandes lotes de terra, conhecidos como latifúndios. Os mineiros, com o controle da produção de leite, utilizavam do mesmo sistema paulista. Tais propriedades utilizavam mão-de-obra mal remunerada, praticamente em sistema escravo, como forma de maximizar os lucros. Mesmo que a abolição da escravatura tenha ocorrido em 1888, os trabalhadores vindos da Europa, principalmente da Itália, viviam sob regime de escravidão. Esses imigrantes vie­ ram ao Brasil para trabalhar nos cafezais. O sistema de trabalho era cruel, já que prendia essas pessoas às fazendas. Os trabalhadores acabavam se endividando. Com uma remuneração baixíssima e tendo de comprar os alimentos no armazém do latifundiário, as dívidas se multiplicavam. Para piorar, os cafeicultores eram também chamados de coronéis. Eles controlavam algumas áreas. Em época eleitoral, forçavam seus trabalhadores a votar nos nomes que indicavam. Não havia como escapar: ou votava naquele candidato | 84 |


ou a vida ficaria ainda pior. Entre 1894 e 1930, ao longo de trinta e seis anos, esse sistema de poder vigorou. No entanto, a influência coronelista permanece até os dias de hoje. Principalmente no Norte e Nordeste do Brasil, longe dos estados ricos, as pessoas de poder aquisitivo menor são obrigadas a votar em certos candidatos. Os aspirantes a políticos oferecem algo em troca do voto, normalmente uma cesta básica, de importância enorme para os eleitores pobres.

Getúlio Vargas ignora os trabalhadores rurais O golpe de 1930 levou o gaúcho Getúlio Vargas ao poder. A queda do presidente Washington Luís representou o fim da supremacia dos paulistas e mineiros no cargo de maior representação do país. O novo presidente, a exemplo dos anteriores, era fazendeiro e tinha muitas propriedades em seu nome. Assim, ao considerar seus interesses, os mesmos do restante da classe política, Vargas deixou de fora os trabalhares rurais de qualquer obrigação patronal. As leis trabalhistas, com salário mínimo, semana de trabalho de 48 horas, férias remuneradas, entre outros direitos, serviram apenas para os trabalhadores da cidade. A CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) previa os direitos para a classe trabalhadora urbana. A ideia de que Getúlio Vargas representa o pai dos trabalhadores não corresponde à verdade. Como destacado, Vargas mostrou-se um pai relapso cujos filhos tinham tratamentos distintos. As condições de trabalho do rural eram desumanas, enquanto as do urbano passaram a ser reguladas por uma série de novas regras.

A industrialização cria grandes cidades O final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, elevou os | 85 |


Estados Unidos e a URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) à condição de superpotências mundiais. Em um mundo relativamente mais calmo, sem a ameaça de Hitler­, a preocupação dos países passou a ser o desenvolvimento econômico. Existiam duas maneiras de organização: a capita­ lista, representada pelos Estados Unidos, e a socialista, com a liderança da URSS. Os brasileiros rapidamente escolheram o capitalismo. A opção foi pelo capital internacional e a livre concorrência. Com o modelo de desenvolvimento escolhido, o processo de industrialização se intensificou. Até então, vivíamos sob o modelo industrial de substituição de importações. As guerras prejudicaram o fluxo de produtos estrangeiros para o Brasil. Esse problema fez com que o país começasse a desenvolver sua própria indústria, como forma de substituir aqueles produtos comprados lá fora. A industrialização trouxe a urbanização, ou seja, as pessoas saíram, em uma velocidade estupenda, do campo para tentar a sorte na cidade. O campo traz a imagem de vida sofrida cujas dificuldades aumentam todos os dias. Na cidade, ao contrário, principalmente na época da intensificação do processo urbano, os brasileiros cultuavam uma imagem de progresso e prosperidade para todos. Essa mudança de pensamento influenciou as decisões políticas. O capitalismo exige, em primeiro lugar, um regime democrático. Só existe democracia se forem feitas leis que re­ gulem as atividades. A cidade apresentava condições para receber os investimentos trazidos pelos investidores. Já o campo, sem legislação definida, precisava mudar. Como consequência, no final dos anos 50, durante a presidência de Juscelino Kubitschek, as discussões do Congresso começaram a incluir a questão agrária. A participação popular, de forma organizada, surgiu durante esse período, clamando por mudanças nas relações trabalhistas do campo. | 86 |


Um dos movimentos, a Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de Pernambuco (SAPPP), surgiu em 1955. A SAPPP chegou a reunir 140 famílias, cerca de 500 pessoas, no engenho Galiléia, localizado no município pernambucano de Vitória de Santo Antão. Através do pagamento de aluguel, as famílias podiam viver no engenho. Tudo corria bem até que o filho do proprietário, herdeiro do local, resolveu tomar o lugar. Comandada por José dos Prazeres, um experiente ex-militante do PSB (Partido Socialista Brasileiro), a sociedade, além de lutar para permanecer com o engenho, tinha economia própria e buscava desenvolver a região, mesmo sem a presença atuante do governo.

Estatuto

da

Terra:

uma nova maneira de organizar

as relações

O ano de 1964 criou novos mecanismos de relação com a terra. Uma legislação abrangente passou a vigorar. Em plena ditadura militar, no primeiro ano do governo do general Castelo Branco, o Estatuto da Terra foi finalmente aprovado. Como definiu Osvaldo Russo, ex-presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em 1993 e 1994, atualmente diretor da ABRA (Associação Brasileira de Reforma Agrária), em artigo para o Jornal do Brasil, no dia 15 de dezembro de 2008: “Uma lei avançada para a época e que ainda hoje guarda contemporaneidade civilizatória, ao dispor sobre o cumprimento da função social da propriedade, que inclui, além do conceito econômico de produtividade, o respeito ao meio ambiente, à legislação trabalhista e ao bem-estar social, sob pena de desa­ propriação por interesse social de reforma agrária”. Com a aprovação desse conjunto de leis, o Brasil criou condições para avançar sua agricultura, a ponto de se tornar grande produtor de diversos produtos primários, com destaque | 87 |


para a laranja e a soja. A modernização da agricultura transformou o ineficiente latifúndio do passado em uma grande propriedade de terra geradora de riqueza para o país. Seis anos depois da aprovação do Estatuto, os militares cria­ ram o Incra, uma autarquia ligada ao governo federal responsável por fiscalizar o bom uso da terra. A máxima do órgão é redistribuir as terras obtidas pelo atributo constitucional da desapropriação. De acordo com o Estatuto, cujas leis ainda não sofreram atualização desde a época de criação, uma propriedade pode ser desapropriada ao não cumprir sua função social. Tal comprometimento com a sociedade é cumprido quando são obedecidos os seguintes aspectos: - favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; - mantém níveis satisfatórios de produtividade; - assegura a conservação dos recursos naturais; - observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem. Essas profundas mudanças fizeram com que os movimentos de reforma agrária aflorassem. O principal deles é a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), que surgiu em dezembro de 1963, no Rio de Janeiro. Ao lado do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), fundado em 1984, ambos lutam, até os dias de hoje, pela divisão justa das terras e por melhores condições para o trabalhador rural. Não bastavam novas leis que regulassem o uso da terra. Era preciso uma reforma ampla e consistente que garantisse um pedaço de terra às famílias necessitadas. O objetivo era instituir a propriedade familiar, um modelo que garantia o sustento interno dos membros da família, sem preocupação em exportar | 88 |


qualquer quantidade de alimento. Entre 1970 e 1984, a média de assentamentos ou, em outras palavras, a transferência de terras que não cumprem a função social para as pessoas necessitadas, chegou a 11.870 famílias por ano. Todos os números de assentamento têm como fonte o Incra. A reforma agrária, mesmo tímida, começava a sair do papel. Ainda havia muito a fazer para torná-la uma política obrigatória dos governantes.

Fim dos militares no poder Em 1985, os militares entregam o poder aos civis. As Diretas Já queriam o fim da presença militar no poder. O caminho para as eleições diretas, através do voto da população, estava aber­ to. No entanto, o primeiro presidente após a era dos militares veio da escolha dos próprios congressistas em uma votação fechada. Com a morte de Tancredo Neves, eleito de forma indireta, o maranhense José Sarney assumiu o poder. No governo do atual presidente do Senado, houve a criação do Plano Nacional de Reforma Agrária, que, pela primeira vez, organizava o processo de assentamento, com metas a cumprir. A partir daí, cada presidente, em seu mandato, passou a ter o objetivo de assentar determinada quantidade de famílias. A promessa de Sarney era transferir as propriedades ilegais para 1,4 milhão de famílias ao longo de cinco anos. O objetivo passou longe de ser alcançado. Foram assentadas apenas 89.950 famílias, aproximadamente 6,5% do estipulado. O primeiro presidente eleito democraticamente, Fernando Collor de Mello, entre os anos de 1990 e 1992, assentou 38.425 famílias. Ao sofrer impeachment, afastado do poder por causa de corrupção, quem assumiu foi Itamar Franco. Com a meta de atender 80 mil famílias, Itamar só conseguiu assentar 21.763 famílias nos anos de 1993 e 1994. Entre 1995 a 1998, período do governo tucano de Fernando | 89 |


Henrique Cardoso, os assentamentos cresceram muito. Foram 280 mil famílias assentadas em seu primeiro mandato. A reeleição fez com que FHC se tornasse o primeiro presidente, no regime de eleições diretas, a conseguir o privilégio de go­ vernar por duas vezes seguidas o país. No segundo mandato, o número de famílias que conseguiu acesso à terra caiu para 157.305. No final das contas, sua média como presidente foi superior a 54 mil famílias por ano. A chegada de Lula ao poder trouxe esperança para os movimentos da terra. O MST e a Contag, filiada à CUT (Central Única dos Trabalhadores), esperavam o aumento dos assentamentos pelo passado militante do ex-sindicalista. Como me­ talúrgico, influente personagem das greves operárias no ABC paulista, Lula conhecia bem as reivindicações dos diferentes movimentos populares. No primeiro mandato, a expectativa foi retribuída pelo go­ verno petista. Entre 2003 e 2006, foram assentadas 381.420 famílias, com um gasto em desapropriações de terra de R$ 4,1 bilhões. A média de Lula, nos primeiros quatro anos de go­verno, foi superior aos dois mandatos de FHC, atingindo 95.355 famílias.

Propriedade Familiar A reforma agrária adota o modelo da propriedade familiar. O governo concede um pedaço de terra para uma família. Através de financiamentos, com taxas de juros facilitadas, oferecidos pelos bancos públicos, ocorre a viabilização daquela propriedade para o sistema produtivo. O investimento inicial cria as condições para que a propriedade seja inserida no ambiente de produção. O mercado interno, formado pelas comunidades próximas ou pela região como um todo, é o destino dos produtos. Essa dinâmica contribui para gerar uma riqueza local, já que a movimentação do dinheiro fica restrita ao alcance de | 90 |


alguns quilômetros. A regularização fundiária talvez seja o aspecto mais poderoso desse tipo de agricultura. Aquele lote de terra, transferido pelo governo, passa por todos os trâmites legais de cadastramento da terra. Além disso, recebe, pelo menos na teoria, visitas cons­tantes dos órgãos fiscalizadores para atestar o contínuo bom uso da terra. Outro diferencial está no emprego de práticas agronômicas sustentáveis. Pode-se dizer que esse tipo de agricultura funciona como os materiais artesanais. Os homens são os responsáveis por toda produção dos alimentos, passando pela aragem da terra, plantio das sementes e colheita dos frutos. Em termos de desenvolvimento das comunidades, criando condições para que as pessoas possam se sustentar, o mode­ lo familiar é extremamente aconselhável. Ele faz com que a riqueza, da mesma maneira como ocorreu com a comunidade do Banco Palmas, permaneça em uma região.

Modelo Agro-Exportador Por outro lado, o modelo agro-exportador visa, em primeiro lugar, o lucro. O importante é exportar a produção para conseguir financiar as próprias atividades e ainda gerar recorde constante de faturamento. Para conseguir a máxima eficiência da terra, os produtores estão dispostos a usar o solo, de maneira intensiva, esgotando seus recursos, além de aplicar constantemente insumos industriais, como agrotóxicos. Com a utilização de tecnologia maciça, por meio do uso de máquinas agrícolas potentes, capazes de substituir a mão-deobra no plantio e colheita, o campo sente o impacto da falta de emprego. O objetivo é eliminar qualquer barreira que impeça obter a máxima eficiência. Mas não só de pontos negativos vive o modelo agro-exportador. A gestão profissionalizada, dividida por vários especialis| 91 |


tas, possibilita que esse tipo de agricultura tenha conhecimento necessário para, pelo menos na teoria, aplicar as melhores práticas. Como já discutimos antes, a ganância pelo lucro constante fere esse domínio sobre as técnicas agrícolas. Ao produzir em alta escala, esse modelo diminui os custos ao longo da cadeia de produção, o que reduz também o preço final. A mesma tecnologia que elimina empregos possibilita uma produtividade elevada, outro fator que diminui o preço dos produtos para o consumidor.

Propriedade Familiar versus Modelo Agro-Exportador O grande desafio está no governo conseguir conciliar os dois tipos de agricultura. No Brasil, percebe-se o predomínio absoluto da agricultura voltada para o mercado externo. Apesar de a reforma agrária ter crescido nos últimos anos, nos governos FHC e Lula, a agricultura familiar continua reduzida a uma parcela ínfima das terras. Deve-se ressaltar, no entanto, que existem pequenos empresários espalhados pelo Brasil, fora de qualquer programa de reforma agrária, que se utilizam das ferramentas do modelo familiar. A agricultura brasileira colocou o país no papel de prota­ gonista na agricultura internacional. Isso só foi possível pela conquista dos mercados estrangeiros. A importância do agronegócio, tradicionalmente voltado para a exportação, está na porcentagem que representa do PIB, por volta dos 20%. Ao mesmo tempo, a agricultura familiar dá oportunidade de vida para as famílias que estejam desamparadas. Os movimentos sociais, encabeçados pelo MST, desejam um pedaço de terra onde possam melhorar as condições de renda e, por consequência, desenvolver determinada comunidade. É a ve­ lha história de permitir que as pessoas possam conquistar seu próprio sustento, situação que traz dignidade, em vez de o Es| 92 |


tado financiar eternos programas de distribuição de dinheiro. Não só como finalidade social, a agricultura familiar é a chance de muitos pequenos empresários se destacarem. Ao produzir exclusivamente para o mercado interno, esse grupo tem condições de se aproveitar do recente momento da economia brasileira. Mesmo que a crise econômica ainda assole boa parte do mundo, o Brasil vai retomar o crescimento. Essa situação, como já comentamos, seria inimaginável há pouco tempo, ainda durante a década de 90.

Conflitos envolvendo a terra Em março deste ano, o STF (Supremo Tribunal Federal), ins­ tância máxima do direito constitucional responsável por proteger a Carta Magna, tomou uma decisão histórica. Os onze ministros da corte suprema foram favoráveis à permanência da demarcação das terras da reserva indígena Raposa Serra do Sol, localizada no estado de Roraima. Com a decisão, o STF deu um prazo máximo para que os produtores de arroz se retirassem do local, 30 de abril. Esse conflito se originou na primeira década do século XX. Pela lei, os arrozeiros não poderiam ter entrado na reserva indígena, de uso exclusivo dos índios. A decisão entrou para a história por privilegiar o grupo de índios, cerca de 19 mil pessoas, em detrimento dos interesses comerciais dos rizicultores. Foi uma sinalização de que os direi­ tos da terra precisam ser respeitados, mesmo que, por muitas vezes, isso não aconteça no Brasil, principalmente na região Norte. Paralelamente, no dia 22 de abril, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) concedeu liminar que libertou o fazendeiro Vitalmiro­Bastos de Moura, conhecido como Bida, da acusação de ser o mandante da morte da missionária americana Dorothy Stang. Em fevereiro de 2005, a freira foi assassinada na cidade | 93 |


paraense de Anapu. Os fazendeiros e madeireiros da região se sentiram ameaçados com o projeto de Stang de realizar, por meio da agricultura familiar, um modelo de exploração sustentável da floresta. O caso obteve repercussão internacional. Depois de mais de três anos, dentro de um moroso processo de julgamento, a justiça brasileira colocou nas ruas, mesmo que temporaria­ mente, o provável mandante do crime. Em estados como Pará, Maranhão e Amazonas, os grandes donos de terra não medem as consequências para fazer valer seus interesses. Se houve ameaça aos seus negócios, chamam os capangas para, no mínimo, intimidar. Depois de anos de esforço, os avanços da regularização da terra parecem não ter chegado aos lugares distantes do Brasil. Fora do eixo agrícola desenvolvido, representado por alguns estados da região Centro-Oeste, as relações com a terra ocorrem de maneira primitiva. A arbitrariedade, através do uso da força, domina o cenário. Os latifundiários, longe do eficiente modelo agro-exportador, e ainda mais distante dos preceitos humanos da agricultura familiar, desrespeitam as leis para manter o domínio e a influência sobre toda a região.

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Parte 3

consumo

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ˆ Ser humano: de nomade na origem a ´ ´ o planeta sedentario que destroi

L

evando em consideração a história da civilização, ressaltamos que o Homem, em tempos remotos, era nômade. A principal característica do nômade é estar cons­tantemente em movimento. Ele busca novas terras para se alimentar, por meio da caça, da pesca e da colheita dos frutos das árvores. Basta que coma o suficiente para o estômago parar de roncar, já que não há como estocar os alimentos. Ou seja, pode-se dizer que consumia, porque retirava da natureza apenas aquilo que realmente usava. Na verdade, os riscos que o ambiente reservava faziam com que fugisse com frequência dos animais ferozes. O deslocamento era vital para permanecer vivo, já que as ameaças naturais eram significativas. Ao partir, nossos antepassados não podiam levar consigo muitos objetos. O caminho era cansativo, não havia proteção adequada contra as mudanças brus­ cas de temperatura, e não podiam carregar peso para que conseguissem escapar das feras. Em uma situação hipotética, compare essa forma de vida com a de hoje. É óbvio que os contextos são completamente diferentes. A raça humana evoluiu. Gozamos do privilégio de contar com facilidades trazidas pela tecnologia. Criamos uma complexa estrutura em nossa volta. Os animais que nos deixavam alerta muito tempo atrás, hoje podem ser observados nos zoológicos. As crianças adoram vê-los nos fins de semana. Alguns desses mesmos bichos são criados em gigantescas quantidades para servirem de alimento. Aliás, em vez de sairmos em busca de comida, temos uma extensa cobertura de sinal telefônico cujo aparelho pode nos ligar com alguém que faça, | 97 |


por exemplo, uma deliciosa pizza no outro canto da cidade. O prato chega algum tempo depois. Acostumadas com a comodidade, as pessoas que têm condições financeiras de participar do chamado ciclo do consumo, criaram em suas casas verdadeiros centros de entretenimento e conforto. O sedentarismo tomou conta. Quanto menos se mexer para fazer o que quer que seja, tanto melhor. A utilização do controle remoto, apertando o botão correspondente, talvez seja a figura que sintetiza melhor nossos tempos. Essa realidade, a do mundo em que vivemos, estimula o consumismo, uma vontade incontrolável de comprar, comprar e comprar. O salário suado tem parte reservada para pagar aquele eletrônico recém-lançado. Sem falar do financiamento do automóvel, comprado a perder de vista. A verdade é que somos levados a consumir o que não vamos usar ou o que utilizaremos muito raramente. O tempo de renovação das coisas passou a ser cada vez menor. Mas esse mecanismo, apesar de prejudicial para o meio ambiente e para as próprias relações humanas, é responsável por sustentar o modelo lucrativo de negócios das grandes empresas que atuam nas diferentes atividades comerciais em âmbito internacional. A primeira grande compra dos que estão en­ trando no universo adulto é o carro. Para quem conseguiu uma promoção, sem que possuísse um carro antes disso, o dinheiro extra será usado para realizar o sonho de ter seu automóvel. Como já dissemos, em termos de emissão de dióxido de carbono, considerado um dos principais gases-estufa, os escapamentos são terríveis para o futuro do planeta. Caso você pare para pensar, perceberá que existem produtos característicos para cada etapa da vida. O modo de organização da sociedade está atrelado ao consumo. Existem regras e costumes em torno dele. Tradicionalmente, compramos para satisfazer os interesses de nossa família, um grupo de poucas pessoas que divide o mesmo teto. É um consumismo privado, | 98 |


compartilhado com os familiares e, no máximo, amigos próximos. A ideia da coletividade, um grupo que tenha os mesmos interesses e objetivos, está enfraquecida. “Precisamos encontrar um novo modelo de desenvolvimento, uma nova maneira de definir o que é qualidade de vida que pese menos sobre os recursos, mas, ainda assim, propicie dignidade e todos os tipos de oportunidade para as aspirações humanas”, disse o biólogo e ambientalista Thomas Lovejoy durante entrevista para o documentário Zugzwang. Diferentemente da época nômade, a civilização moderna, através do modelo econômico em prática, utiliza os recursos naturais para outro motivo. O salivar da boca das multinacionais começa quando são apresentadas as expectativas de lucro que pode ser gerado em algum nicho de mercado. Essas poderosas empresas definitivamente não costumam usar com parcimônia os elementos advindos da natureza. Algumas regiões de rica diversidade de espécies sofreram consideráveis perdas. No dia 12 de agosto de 2009, na Indonésia, 660 toneladas de petróleo inundaram o Parque Nacional de Kutai, afetando milhares de animais ameaçados. Essa reserva florestal é um santuário de espécies que correm o risco de extinção como o orangotango de Bornéu e o urso malaio. Só que nenhum acidente com petróleo se compara ao desastre do Exxon Valdez, nome do petroleiro da multinacional americana ExxonMobil. No dia 23 de março de 1989, o navio partiu do porto de Valdez, localizado no Alasca. Nas primeiras horas do dia seguinte, o choque com um recife provocou o rompimento do casco, o que levou ao derramamento de 41 milhões de litros de óleo no mar. A área atingida chegou a 1.200 quilôme­ tros quadrados. A região onde ocorreu o crime ambiental contava com uma espetacular vida selvagem. Milhares de animais foram mortos. Os números apontam para a morte de 250 mil aves marinhas e 2.800 lontras, sem falar dos outros animais. Em 1991, a petrolífera, após recorrer da primeira sentença | 99 |


que aplicava uma multa de US$ 5 bilhões, foi condenada a pagar US$ 1 bilhão por ter sido considerada culpada ao infringir inúmeras leis ambientais. Mesmo após uma série de trabalhos de limpeza, vinte anos depois do vazamento, a região ainda está contaminada, porque testes realizados recentemente mostraram a presença de substâncias tóxicas advindas do óleo. “A empresa (ExxonMobil) conduz campanhas organizadas para minar as constatações científicas sobre as mudanças climáticas. Em uma época em que o mundo sofre as consequências do aquecimento global, como inundações e secas, a ExxonMobil defende que são necessários mais estudos antes de se iniciar uma ação efetiva de combate às causas do pro­ blema. A versão da empresa para o derramamento de óleo de seu navio é uma história cheia de mentiras. Uma herança que a empresa mantém em suas atividades até os dias de hoje”, afirma um trecho do texto sobre o desastre publicado pelo Greenpeace em seu site.

A formação da sociedade de consumo brasileira Partindo de uma análise detalhada da história do Brasil, podemos descobrir como se formou nossa sociedade de consumo. Ao olharmos para o passado, podemos encontrar respostas para o presente e alternativas para os dias futuros. Na época em que o país era colônia de Portugal, foram estabelecidas bases mercantilistas de comércio e monopólio que favoreceram a elite e influenciaram, de maneira negativa, as formas de fazer negócio e de consumir. A primeira delas foi o escambo, técnica de troca utilizada pelos colonizadores lusitanos que presenteavam os índios com produtos manufaturados como espelhos, escovas de cabelo, facões, talheres e outros, em troca da exploração das riquezas naturais que a terra oferecia. Os produtos mais desejados foram o café, o pau-brasil, a mineração e a cana-de| 100 |


açúcar. Esse tipo de relação, estabelecida entre dominador e dominado, permaneceu ao longo de mais de três séculos da nossa existência. Nessa fase, os tropeiros e os mascates, espécie de desbravadores que conduziam o gado mata adentro, e os vendedores ambulantes foram os responsáveis pela inicialização do comércio interno, comercializando joias, tecidos e quinquilharias roubadas dos índios, advindas da terra, para as ricas senhoras da cidade. Pouco a pouco, o comércio da colônia era formado. Só que o escravismo andava na contramão do desenvolvimento, de forma que a estagnação econômica barrou o processo de industrialização, o que fortaleceu a agricultura e abriu feridas sociais que ainda não foram apagadas. Em plena fase industrial vivida pelos principais países da época, o Brasil ainda estruturava sua economia para servir aos interesses agrários. Isso possibilitava que fizesse fortuna com a mão-de-obra escrava. Essas foram consequências das medidas tomadas pelos portugueses em relação à exploração das nossas terras. O território era rica fonte de recursos naturais para saciar os desejos de consumo da classe dominante europeia. A população que residia por aqui demorou muito para transformar a riqueza em capital para produção, já que as primeiras fábricas só começaram a surgir no final do século XIX. Na Europa, como dissemos anteriormente, as indústrias apareceram na metade do século XVIII. A sociedade de consumo brasileira só veio a se formar na fase republicana entre 1889 e 1930, ano do início da Era Vargas. Ainda assim, a população tinha pouco poder de compra. Infelizmente, o tempo de colônia, monarquia e República Ve­ lha serviu para o País caminhar no sentido contrário do resto do mundo, acumulando juros elevados, inflação alta, pesados impostos, sonegação e contrabando, monopólio, concentração de riquezas, sistema de ensino fraco, corrupção na política e ausência de cidadania. | 101 |


O consumidor nacional aumenta seu poder de compra

Após a crise mundial de 1929, o Brasil começou a se adequar à nova ordem econômica. Com a industrialização, a oferta de produtos para o consumo foi largamente ampliada. Para isso, a exemplo do que ocorria em outros países, com destaque para os Estados Unidos (conforme já explicamos no primeiro capítulo), a publicidade se desenvolveu enormemente para incitar e convencer o público a comprar determinado serviço ou produto. Houve uma mudança significativa. Ao lado dos primeiros imigrantes que desembarcaram em terras tupiniquins, na virada do século XX, estavam as multinacionais. A urbanização crescia em ritmo forte, e os centros de comércio se agigantavam. Após a consolidação da indústria, junto com o fortalecimento das marcas e dos produtos nacionais, o que trouxe a variedade de opções para o consumidor, os brasileiros passaram a ser considerados consumidores com potencial. Em um primeiro momento, não existiam facilidades para a compra, como os cartões de crédito e o parcelamento das dívidas. Havia o costume de guardar o dinheiro debaixo do colchão. As classes sociais eram divididas em alta, média e baixa. Poucos consumiam muito do que era oferecido, e muitos consumiam quase nada. Somente depois da consolidação do Plano Real a partir de meados da década de 90, as taxas de inflação, antes monstruo­ sas, caíram, cenário de estabilidade que possibilitou que o consumidor brasileiro passasse a consumir com fervor. Enfim, ele descobriu o valor real das coisas, e quanto era merecido desembolsar para obter cada produto. Antes disso, em 1991, foram estabelecidas leis do Código de Defesa do Consumidor, que obrigaram os empresários a investir na abertura de um canal eficiente de comunicação com os consumidores. A duras penas, as empresas perceberam que, com a concorrência e a | 102 |


diversidade de produtos, era preciso mais para encantar o comprador e sobreviver à competitiva realidade do mercado. Hoje em dia, os investimentos em publicidade e marketing significam cerca de 60% do custo do produto final e têm a função de despertar o desejo, ou seja, criar necessidades que, na realidade, não existem. A televisão foi também responsável pela propulsão do consumo de massa e auxiliou a publicidade na tarefa de invadir os lares brasileiros. O que dizer do que era consumido meio século atrás? Muitos dos produtos que surgiram no século XX foram essenciais para melhorar a qualidade de vida, como o fogão a gás, o ferro de passar roupa, o elevador e a geladeira. Os medicamentos, por exemplo, evoluíram tanto que conseguiram combater uma série de doenças. As pessoas conquistaram o acesso à energia elétrica, à água encanada, às maravilhas tecnológicas, com destaque para o computador, que hoje são indispensáveis para nossa sociedade. A tecnologia melhorou a vida de todos. Não se pode duvidar disso. Temos a capacidade de prever o futuro. A meteorologia, por exemplo, consegue estabelecer, com relativo sucesso, quais serão as condições climáticas dos dias seguintes. Isso faz com que os agricultores tenham condições de traçar sua estratégia de negócio. O problema está no consumo desenfreado de recursos naturais para atender uma sede consumista que parece não ter fim. As descobertas foram, são e sempre serão importantes na trajetória humana. O erro está na produção que não se preocupa com as variáveis ambientais. É impossível retirar da natureza mais do que ela consegue fornecer. As florestas são alvos de derrubada ilegal para alimentar alguns industriais irresponsáveis do papel e dos móveis; a água limpa dos rios serve para receber os dejetos residenciais e industriais em áreas que poderiam contar com um eficiente sistema de tratamento de esgoto; o petróleo, considerado matéria-prima para uma infinidade de | 103 |


produtos, pode emitir, como já dissemos, enorme volume de dióxido de carbono na atmosfera, além dos graves acidentes envolvendo navios petroleiros que já causaram a morte de muitos animais marinhos. Vamos considerar a fase de montagem de um automóvel pequeno (um Gol, Celta ou Corsa). Para realizar essa atividade, são gastos de 100 a 120 quilos de plástico (material advindo do petróleo), mais 600 quilos de ferro e aço. Isso sem contar o vidro e os componentes indiretamente usados, como o gasto de energia elétrica e o consumo de água, bem como as substâncias químicas comprovadamente tóxicas aplicadas no processo de fabricação do veículo. Se somarmos a quantidade de material gasto para a produção dos 1,8 milhão de veículos fabricados somente no período de janeiro a julho de 2009, segundo dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), foram utilizadas mais de 22 mil toneladas de plástico e 126 mil toneladas de ferro e aço. Independentemente desses números, ainda devemos somar o volume de combustível diário para mover os veículos pelas ruas da cidade. Outro dado importante é que são gastos 500 litros de água para produzir 1 litro de álcool combustível. Se um automóvel médio consome 1 litro de álcool para rodar 8 quilômetros, em uma viagem de São Paulo a Santos, um percurso de cerca de 80 km, serão gastos 10 litros de álcool, volu­ me produzido com o uso de 5 mil litros de água. É realmente muito. Por mais absurdos que possam parecer, os números relacionados ao consumismo nunca chegam ao fim.

Uma breve história das classes sociais Para criticar o sistema capitalista, que seleciona e classifica as pessoas segundo o poder aquisitivo, o marxismo fez adeptos no mundo inteiro. A teoria diz que a socie| 104 |


dade do capital se divide em classe dominante, que controla o Estado, e classes dominadas, que são a fonte de renda dos poderosos. Nessa estrutura, a humanidade se criou baseada na sucessão das lutas de classes, de modo que uma pequena parcela abastada detém o poder e a influência sobre a maior parte da população explorada pelo opressor sistema capitalista. Seja como for, desde a Idade Média, período que as pessoas viviam bem separadas, os grupos eram divididos em senhores feudais, representando a classe alta, o clero, que possuía um poder gigantesco, e os servos, conside­ rados a classe baixa. Com a Idade Moderna, não houve mudanças na estrutura da sociedade, pois uma classe dominante gozava de amplo controle político e fazia o que bem entendia com a classe trabalhadora. Só a partir da Idade Contemporânea, as classes foram divididas em alta, média e baixa, de acordo com o poder de compra e a qualidade de vida. No início da década de 50, com o “boom industrial” vivido pelo mundo, a classe média surgiu. Hoje, sem res­ peitar a diferença de renda que existe de um país para o outro, ela representa cerca de metade da população mundial. As subdivisões das classes em A, B, C, D e E vieram com a proposta de organizar e detalhar o padrão de consumo. Com essa divisão, é possível mostrar a representativa desigualdade de renda no mundo e as disparidades entre a minoria rica e a maioria miserável e pobre.

Os estudos que detalham as classes sociais do país

Antes de entender a forma como os brasileiros consomem, é preciso compreender como são divididas as classes sociais e | 105 |


qual a participação de cada uma no total consumido. Com base na pesquisa realizada pelo CPS (Centro de Políticas Sociais), vinculado à Fundação Getulio Vargas, realizada em abril de 2009, o Brasil está dividido nas seguintes classes, levando em consideração a renda familiar média: Classes A1 A2 B1 B2 C1 C2 D E

Renda média mensal familiar (R$) % da população de até 1% 2,6% 5% 7,73% 33,80% 23,01% 20,20% 6,66%

9.733,47 6.563,73 3.479,36 2.012,67 1.194,53 726,26 484,97 276,70

Acima 9.733,47 6.563,73 3.479,36 2.012,67 1.194,53 726,26 484,97

Classe Média (renda aprox.) 1.500,00 a 2.600,00 FONTE: CPS (FGV)

De acordo com o Instituto Análise, especializado em estudos sobre consumo e opinião pública, as classes A e B não almejam grandes compras. No máximo, as pessoas incluídas nessas faixas de renda pretendem trocar o automóvel, viajar nas férias, reformar a casa ou substituir os eletrodomésticos por modelos mais modernos, como a TV convencional por um aparelho de tela LCD. Já a classe C, considerada a renda média do Brasil, almeja todos os itens que as classes superiores possuem. É, por essa razão, a que mais se endivida, porque não mede esforços para comprar o carro novo, o computador de última geração e a televisão moderna. Normalmente, ainda segundo o Instituto, os trabalhadores dessa classe compram por impulso, sendo facilmente influ| 106 |


enciados por campanhas de marketing e pelas supostas facilidades do crediário. Ao consumir esses tipos de produto, eles investem pesado em lazer para proporcionar bem-estar à família. A classe C quer rapidez na melhora do padrão de vida, não vê a hora de subir no ranking de rendimento da sociedade. As classes D e E, definidas como as mais pobres, colocam na lista de prioridades de compra eletrodomésticos como máquina de lavar roupa, fogão, geladeira e dificilmente deixam de pagar as dívidas já contraídas. Outra característica da classe C, apontada em uma pesquisa formulada pela ABRE (Associação Brasileira de Embalagem), é a customização, ou seja, os integrantes estão dispostos a comprar desde que de forma parcelada em muitas prestações. Para as classes D e E, o importante, independentemente de como vão pagar, é ter acesso (condições financeiras) aos produtos. Como se percebe pelos dados dos levantamentos, as pessoas querem consumir. O consumo faz parte do aumento da renda. Se o modo de vida melhora, os sonhos consumistas imediatamente são realizados. Essa é a dinâmica. De acordo com o WWF-Brasil, em parceria com o IBOPE (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), 16,33% da população nacional consome o equivalente à produção de dois planetas Terra. Se a totalidade dos brasileiros consumisse da mesma forma que as classes A e B, seria necessária a produção ininterrupta de três planetas. Em outras palavras, seria preciso multiplicar em três nossa morada para fornecer os produtos e serviços em quantidade suficiente para abastecer a demanda. Esses números exor­ bitantes não significam que o brasileiro seja o povo que mais consome. Muito pelo contrário. A mesma pesquisa revelou que se a população mundial consumisse como os estadunidenses, teríamos que utilizar cinco planetas para concentrar a produção. Os estudiosos do WWF-Brasil e do IBOPE fizeram um outro alerta. O de colocar em prática o consumo sustentável, uma forma de racionalizar o uso dos recursos naturais e de abusar das tec| 107 |


nologias limpas em todas as atividades do cotidiano. O primeiro passo é compreender o mecanismo da necessidade de consumir. Já o segundo é aprender a enviar o lixo produzido em casa, no trabalho e na rua para os lugares adequados de tratamento.

O consumo com responsabilidade é tarefa de todos Não confunda consumir com o ato de comprar. A qualquer momento do dia, estamos consumindo. Quando escovamos os dentes, por exemplo, usamos a pasta de dente e a escova, dois itens que compramos no supermercado, mas também utilizamos a água da torneira cujo valor da conta só virá depois. Para não destruirmos o verde ao nosso redor, é importante que o sistema econômico altere a forma de produção, que as pessoas comuns tenham responsabilidade para consumir, e o governo crie incentivos para o desenvolvimento de caminhos sustentáveis. Hoje, o chamado consumo consciente pode ser praticado no dia a dia, por meio de gestos simples que considerem os impactos ambientais das atitudes que tomamos. Preocupados em conscientizar e mobilizar o cidadão brasileiro para ser um agente transformador, rumo ao desenvolvimento da sustentabilidade, surgiu o Instituto Akatu pelo Consumo Consciente, um braço do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, em 2000.

É consumir diferente: tendo no consumo um instrumento de bem-estar e não um fim em si mesmo; É consumir solidariamente: buscando os impactos positivos do consumo para o bem-estar da sociedade e do meio ambiente; É consumir sustentavelmente: deixando um mundo melhor para as próximas gerações. | 108 |

FONTE: Akatiu

Consumo consciente


O Akatu se desvencilhou do Instituto Ethos e está realizando um trabalho importante para que o consumo responsável faça parte da vida das pessoas. “A palavra Akatu vem do tupi. Ela significa, ao mesmo tempo, semente boa e mundo melhor, traduzindo a ideia de que uma sociedade superior será formada pelas ações de cada indivíduo. Para colocarmos em prática o que defendemos, nosso trabalho funciona em parceria com um grande número de empresas privadas, organizações nãogovernamentais, escolas e meios de comunicação”, explicou o diretor-presidente Helio Mattar. Segundo a gerente de operações do Instituto Akatu, ­Heloisa Torres de Mello, “adotar o consumo consciente é praticar a liberdade de escolha, ter consciência na hora de consumir é definir uma posição clara, democrática e ética. O consumo consciente fatalmente gerará uma reflexão, e tal reflexão, levantada pelos consumidores, resultará em uma cadeia de estímulos que vão contagiar as empresas e seus funcionários”, afirmou. Por meio de propostas simples e baratas, o Akatu presta uma espécie de assessoria ambiental para o consumidor. Antes de comprar o que quer que seja, por exemplo, é preciso fazer três perguntas básicas a si mesmo. Esse processo evita que depois bata um arrependimento do tipo “não sei por qual motivo comprei isso”. 1º| O que vou comprar? Comprar por impulso é gastar o dinheiro de forma desnecessária. Faça uma lista antes de ir ao mercado para levar para casa somente o que falta para repor a despensa. 2º| Quando vou comprar? Essa pergunta tem ligação com o planejamento financeiro. Não é difícil comprar produtos desnecessários que satisfaçam tão somente o prazer momentâneo. Por isso, antes de decidir, faça a pergunta se aquilo é para agora ou se pode esperar um pouco mais. | 109 |


Quem sabe você pode aproveitar as tradicionais liquidações de fim de ano? 3º| De quem vou comprar? Essa resposta deve estar na ponta da língua. Só compre de empresas responsáveis social e ambientalmente. Certifique-se que a fabricante respeita consumidor, meio ambiente e trabalhador, se possui programas de res­ ponsabilidade social (RSE) e se está trabalhando para reduzir os impactos para a natureza de sua produção. Essa pesquisa envolve qualquer coisa que for comprar. Para saber exatamente quem são essas indústrias e onde encontrá-las, o consumidor deve se informar. Algumas organizações no Brasil e no mundo, como o Instituto Ethos, a ABRINQ (Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos) e o Greenpeace, ajudam a checar se determinada empresa está em ordem com as suas obrigações para com a sociedade. E tem ainda o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), PRO TESTE (Associação Brasilei­ ra de Defesa do Consumidor), Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) e Procon (Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor) que ajudam a desmascarar o mau fabricante e/ou irresponsável comerciante. Se mesmo depois das três perguntas citadas acima ainda houver necessidade de comprar, o Instituto Akatu ensina algumas medidas para você não desperdiçar: - Conheça os direitos do consumidor. O Código de Defesa do Consumidor é a lei que protege o consumidor do abuso de seus fornecedores; - Pesquise os preços e a qualidade dos produtos. Escolha tudo que possa ser durável e que evite a formação de mais lixo; - Dispense embalagens e sacolas sempre que possível. Sacos | 110 |


plásticos, papéis e caixas, usados no transporte das compras, vão parar no lixo. Esses materiais causam problemas ambientais, como a poluição do solo, dos mares e lençóis freáticos, entopem os bueiros e exigem recursos naturais para a fabricação. Se for impossível recusar embalagens de transporte, prefira as reutilizáveis e as sacolas de pano. Outra preocupação é a maneira como as pessoas descartam o lixo produzido. De acordo com o Akatu, cada brasileiro produz por dia cerca de 500 gramas de lixo, mas apenas 2% disso vai para a reciclagem. Todo o material é enviado para os aterros sanitários, sendo que cerca de 50% têm condições de ser reaproveitado. Não basta reciclar aquilo já usado, é preciso reduzir tudo o que possa prejudicar o meio ambiente. Com esse intuito, o Ins­tituto Akatu, em parceria com a agência Lew’Lara\TBWA, lançou no Dia Mundial sem Carro, comemorado em 22 de setembro de 2009, a campanha Mais é menos. - Quanto mais frequente uso do carro, menos recursos dis­ poníveis no planeta; - Quanto mais extenso o trânsito, menor qualidade do ar; - Quanto maior os índices de poluição, menor a capacidade de viver. A ideia da campanha surgiu da constatação da necessidade de ampliar a compreensão dos conceitos e das práticas que envolvem o consumo consciente, convidando as pessoas a refletir sobre seu padrão de consumo. A linguagem utilizada para disseminar a iniciativa escolheu peças teatrais, ilustrações, cartilhas explicativas, palestras e oficinas educativas que retratam as consequências para a natureza do exagero no consumo, principalmente no universo das residências, de energia elétrica e água. | 111 |


O exagero leva ao desperdício Segundo dados da ONU, o consumo médio diário de água por pessoa nas metrópoles brasileiras varia de 250 a 400 litros. Esse número é considerado mais que o dobro dos 110 litros recomendados pelas Nações Unidas. Foi também constatado que em algumas cidades do Brasil, como é o caso de Brasília, o consumo de água por habitante ao longo de um dia ultrapassa os mil litros, enquanto que a população da Namíbia tem menos de um litro do recurso natural. Atualmente, somente cinco países no mundo estão dentro do nível ideal de consumo de água segundo a ONU. São eles: Alemanha, Bélgica, República Tcheca, Hungria e Portugal. Para o engenheiro Paulo Costa, especialista em programas de racionalização do uso da água, os resultados desses países são fruto de uma política educacional, que deveria ser empregada no Brasil. Em entrevista à Agência Brasil, Costa indicou a necessidade de se introduzir uma disciplina nas escolas de educação fundamental que mostre as consequências do consumo exagerado para as crianças. “Tecnologia para reduzir o desperdício e gerir a demanda considerada ideal de água, o Brasil tem de sobra. Falta mesmo a adoção de programas de racionalização do consumo e de educação para a população”, disse o engenheiro. Cuidados básicos, como fechar a torneira para escovar os dentes, lavar a louça com pouca água, não deixar a mangueira ligada quando lavar o quintal ou o carro e diminuir o tempo do banho são fundamentais para reduzir o consumo. Dados da ONU indicam que cerca de quatro bilhões de pessoas sofrerão com a falta de água em 2050. A fome e o desperdício de alimentos ainda é uma preocupação. O último Relatório Mundial sobre a Fome, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, na sigla em inglês), revelou que 800 milhões de | 112 |


pessoas estão desnutridas no mundo. No Brasil, cerca de 14 milhões não têm alimentação em abundância em contrapartida, ainda conforme o documento, nosso país é um dos maiores produtores de alimento. Impressionantes 11 milhões toneladas de tudo o que é plantado por aqui todos os anos vão parar no lixo. “Por que o preço dos alimentos dobrou da noite para o dia? A primeira razão, claro, é que os alimentos foram parar nas mãos dos especuladores globais. Especulação só pode estar ligada ao monopólio. A globalização e a OMC (Organização Mundial do Comércio) criaram sistemas monopolistas, em que cinco gigantes do comércio passaram a controlar o sistema de alimentos. Quando eles resolvem, empurram os preços para cima, ao mesmo tempo em que atraem mais investimentos. E agora existem os “fundos hedge”, os bancos de investimento, todos querendo obter um lucro de 25% sobre os investimentos em itens de alimentação. Mas um lucro de 25% para os investidores significa alimentos 25% mais caros para os pobres, o que resulta na redução do direito à alimentação”, disse a ambientalista e filósofa Vandana Shiva durante participação no documentário Zugzwang. O armazenamento e o transporte são fatores que ajudam a aumentar o desperdício. As feiras-livres e os centros de abastecimento são os responsáveis por 30% de tudo o que é desperdiçado. “Por dia, chegamos a vender 12 toneladas de legumes e verduras. No entanto, aproximadamente uma tonelada não pode ser aproveitada, não sendo vendida, porque esses alimentos sofrem machucados durante o transporte. Minha banca manda para o lixão do CEAGESP (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo) de 10 a 12 caixas de legumes por dia. Desse material, uma parte, por volta de três caixas, vai para o Banco de Alimentos, que cadastra entidades filantrópicas para organizar as doações de alimentos em condições de consumo. O restante, que não pode ser consumido, tem como | 113 |


destino os depósitos de lixo da cidade”, resumiu Antonio Reis, dono de uma banca de tomates e legumes do CEAGESP. A prefeitura de Santo André foi a primeira a colocar em prática a ideia americana do Banco de Alimentos. Atualmente, com o sucesso obtido pelo município andreense, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome difunde o projeto em âmbito nacional. De maneira resumida, o programa funciona da seguinte maneira: o governo responsável arrecada alimentos em centros de distribuição, supermercados e estabelecimentos como restaurantes e lanchonetes. Todo o alimento arrecadado passa por um processo de triagem e, rapidamente, antes que possa estragar, é doado para entidades cadastradas. No entanto, uma série de dificuldades impede que os alimentos tenham um destino justo sem que haja desperdício. “A doação de alimentos só não é maior no nosso país, porque o governo exige que os fabricantes paguem impostos sobre tudo o que é doado, sem receber nenhum tipo de incentivo fiscal pelo ato voluntário”, reclamou Raquel Rodrigues Silva, proprietária de um restaurante de São Bernardo do Campo. Para Julia de Albuquerque e Silva, gerente de uma rede de churrascarias paulista, a vontade de contribuir com os bancos de alimentos é grande, mas o risco que os proprietários correm não compensa o prazer de ser voluntário. “Temos muita vontade de doar as sobras das refeições que não vão à mesa dos clientes. Entretanto, corremos o risco de sermos processados, caso a comida doada cause algum mal-estar a quem recebeu. Mesmo assim, eles (governo) não dizem que os locais de armazenamento e transporte são inapropriados. Levamos a culpa pelo desperdício. Quando temos a intenção de doar, sofremos com a arbitrariedade pública”, desabafou. Contudo, desde 1999, a Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Câmara dos Deputados estuda o projeto de lei de incentivo chamado “Estatuto do Bom Samaritano”. Ele consiste na isenção dos impostos daqueles empresários do setor | 114 |


alimentício que tenham interesse em fazer doações das sobras de alimentos. Caso o projeto seja aprovado, teremos uma pequena parte da solução.

As

pessoas jogam no lixo

1/3

dos alimentos que

compram

Ao lado dos produtores e revendedores, os consumidores têm enorme parcela de culpa no desperdício. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Akatu, um terço de todas as compras de comida vai para a lixeira. Com a intenção de diminuir esse número, a ONG lançou, em março de 2009, a campanha “1/3 de tudo que você compra vai direto para o lixo”. Conforme analisou o diretor presidente do Instituto Akatu, Helio Mattar, as pessoas só passarão a ter mais consciência quando perceberem que a maior perda reflete diretamente no bolso. “Nosso objetivo é chamar a atenção dos consumidores para os impactos desse desperdício. Eles precisam ter consciência que o primeiro impacto é gerado no próprio bolso. Para se ter uma ideia, uma família média brasileira, composta de quatro pessoas, que não desperdiça alimentos faz uma economia de cerca de R$ 800 mil ao longo da vida”, disse. Como forma de apoio aos seus projetos, a organização tem parceria com diversas empresas. “Alguns empresários nos ajudam desenvolvendo atividades voltadas à divulgação do consumo consciente para os funcionários, consumidores, clientes e fornecedores. Aos poucos, estamos entrando em mais lares e nossas ideias estarão dentro de mais cabeças”, afirmou Heloisa Torres de Mello, Gerente de Operações do Instituto Akatu. Um levantamento mostrou que o brasileiro está se preocupando mais com a preservação do meio ambiente. A pesquisa, realizada em 2006, constatou que houve um aumento de 7% na proporção de consumidores que usam seu poder de compra e capacidade de comunicação para premiar empresas que | 115 |


tenham práticas adequadas de responsabilidade social e ambiental. “O que mostra que a consciência no consumo é também levada à apreciação das empresas sob critérios sociais e ambientais e não apenas de acordo com os tradicionais critérios de preço, qualidade, inovação e design. O cenário indica uma clara tendência, resultado que felizmente veio para ficar”, comemorou Heloisa. Com a filosofia de aproveitar os alimentos, apreciar uma boa comida sem se incomodar com o ritmo frenético das grandes cidades, a ONG Slow Food (em português: Comida Lenta), fundada em 1986 por Carlo Petrini na Itália, está presente no mundo inteiro. Ela prega a ideia da ecogastronomia, ou seja, a gastronomia sem exageros que apoia um novo modelo de agricultura, menos intensivo e muito mais saudável, com base no conhecimento das comunidades locais. A culinária local é uma forma das comunidades pobres e afastadas contarem com um emprego. A Slow Food tem a proposta de proteger os alimentos, a maneira como são feitos e as técnicas tradicionais de cultivo. Segundo o Slow Food, “proteger o nosso patrimônio de grãos, vegetais, frutas, raças de animais e produtos alimentícios, que correm o risco de desaparecer devido ao predomínio das refeições rápidas e do agronegócio, é um dever de todos. Por meio de palestras, cursos, cartilhas e grupos de discussão, a ONG ajuda a redescobrir o prazer de degustar um alimento natural e na concepção de conhecer sua origem, quem o produz e como é feito”. Um de seus projetos é a “Educação do Gosto”, que objetiva educar os jovens a entender a importância do alimento na sociedade para defender, assim, a alimentação de qualidade. Praticante da filosofia e vegetariana há quatro anos, a esteticista Luiza Melo Vaguem trabalha como voluntária da ONG para ajudar a expandir os conceitos. Ela mostra os benefícios de se alimentar devagar e de evitar a invasão dos gordurosos | 116 |


fast foods no corrido dia a dia. “Virei vegetariana, adepta à alimentação devagar, depois que os meus filhos de cinco e sete anos viciaram em McDonald´s. Eles deixaram de comer frutas, legumes e verdura. Assisti à palestra da ONG e percebi o quanto nossos hábitos alimentares influenciam na qualidade de vida. Agora, sou mais humana e tomo cuidado para não desperdiçar os alimentos, já que aprendi a importância de cada um deles em nosso planeta”, declarou.

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Parte 4

Meio Ambiente

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˜ A julgar pelo ritmo, os governantes nao ˜ perceberam a gravidade da situacao

O

meio ambiente está na pauta internacional de discussão. As autoridades não cansam de se encontrar para conversar a respeito. Os alertas constantemente emitidos pela comunidade científica a respeito das perigosas consequências do aquecimento global estão fazendo com que a sociedade, incluindo governos, empresários e pessoas comuns, revejam seus conceitos. O problema está no ritmo moroso das reconsiderações. A emissão descontrolada dos chamados gases-estufa, com destaque para o dióxido de carbono e o metano, está fazendo com que a temperatura média da Terra suba. Caso nada seja feito para reverter essa situação, o planeta ficará mais quente. Os países precisam se mexer para evitar que a temperatura ultrapasse a barreira dos 2°C de aumento nos próximos anos. Acima disso, os problemas serão muitos. O derretimento das geleiras, a grande reserva de água doce, aumentará o nível dos oceanos em um metro, de acordo com as estimativas dos me­ lhores cientistas. As cidades costeiras e ilhas serão varridas do mapa. Em um ambiente natural desordenado, as catástrofes, como tsunamis e tempestades, serão ainda mais constantes. “Se nós falharmos em agir, a mudança climática vai intensificar as secas, as enchentes e outros desastres naturais”, disse o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), Ban Ki-moon, em um fórum sobre mudanças climáticas pró­ ximo de Seul, capital da Coreia do Sul, em setembro. Os especialistas do centro de pesquisas britânico Hadley, voltado para o estudo das mudanças climáticas, destacaram que a elevação da temperatura média terrestre pode chegar aos 4ºC em | 121 |


apenas 50 anos. Já o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), órgão cientifico da ONU, estimou, no ano de 2007, que a elevação pode ficar entre 1,8ºC e 4ºC até o fim deste século. No período que vai de 1906 a 2005, ainda segundo o IPCC, a temperatura média da Terra subiu 0,74°C. A situação ambiental exige rapidez na resposta global. Para os cientistas britânicos, em um cenário de continuação das altas emissões, o derretimento de gelo e neve no Ártico elevará a absorção dos raios solares. A temperatura da região pode aumentar em até 15,2º C. Em outras palavras, a paisagem fria pode literalmente sumir do mapa. Ainda segundo o centro Hadley, caso nenhuma medida importante seja tomada, o nível de chuvas cairá sensivelmente na América Central, na região do Mediterrâneo, e em partes da costa australiana. Ao mesmo tempo, o índice de precipitação da Índia se elevará em 20% ou até mais, facilitando a ocorrência de enchentes. “O rápido aquecimento do Ártico pode levar ao desaparecimento de 90% da camada próxima à superfície do “permafrost”, solo formado por terra, rochas e gelo que permanece congelado, no final deste século, e isso tem o potencial de liberar na atmosfera grande volume de carbono em forma de dióxido de carbono e metano”, disse o assessor para a mudança climática do WWF (World Wildlife Fund), Martin Sommerkorn, ao apresentar o relatório Feedbacks do Clima do Ártico: Implicações Globais durante a Terceira Conferência Mundial do Clima. É importante ressaltar que o efeito estufa é o responsável pela vida terrestre. Os gases chamados de estufa retêm o calor em nosso planeta. O problema está no aumento da concen­ tração desses gases em função da atividade do Homem. A humanidade corre o risco de pagar muito caro pelo crescimento desordenado que ocorreu anos a fio, sem se preocupar com os reflexos negativos das suas atividades para a natureza. Como vimos nos capítulos anteriores, as revoluções industriais elegeram matrizes energéticas extremamente poluidoras, ape| 122 |


sar de baratas, para sustentarem a economia. O carvão, ao lado do petróleo, é considerado combustível fóssil cuja queima leva enorme quantidade de poluentes, com destaque para os gasesestufa, para o meio ambiente. Os escapamentos dos nossos carros soltam diariamente dió­ xido de carbono, o CO², na atmosfera. Os bilhões de veículos contribuem, de maneira decisiva, para o agravamento do aquecimento global. Movidos a diesel, os caminhões, por exemplo, são verdadeiros vilões na luta para evitar o aumento da temperatura do nosso planeta.

Nasce o conceito de desenvolvimento sustentável Um mundo sem se preocupar com a preservação dos recursos naturais. Há alguns anos, não havia plataforma de governo que considerasse as questões referentes à proteção ao meio ambiente importantes. As indústrias não levavam em conta o impacto para a natureza de suas atividades. Os consumidores estavam longe de ter a consciência verde que parte de nós adquiriu nos dias de hoje. A primeira reunião internacional para falar do meio ambiente só ocorreu na década de 1970. O lugar escolhido para a conversa, em 1972, foi Estocolmo, capital da Suécia. As autoridades perceberam que deixar as empresas atuarem como bem quisessem não era definitivamente uma boa ideia. “Passados 37 anos do encontro de Estocolmo, pouco se alcan­ çou. Ao contrário, a realidade se agrava em quase todas as fren­ tes: 400 milhões de hectares de florestas tropicais desapareceram desde 1972 (o equivalente a aproximadamente metade do Brasil ou dos Estados Unidos, ou a toda a Amazônia); 70% dos recifes de coral estão degradados ou destruídos devido à pesca de arrasto (feita por gigantescas redes lastradas em uma técnica que esmaga os seres vivos habitantes do fundo do mar) que devasta o fundo dos oceanos; o CO² tem aumentado na atmosfera, causando elevação das temperaturas e efeito-estufa; o de| 123 |


clínio das espécies se confirma com 23% dos vertebrados em perigo de extinção, 58% dos invertebrados, 70% das plantas, ou seja, uma em cada duas espécies encontra-se ameaçada”, escreveu, em artigo na internet, a presidente do IPE (Ins­tituto de Pesquisas Ecológicas), Suzana Pádua, levando em consideração uma aula do biólogo Don J. Melnick, professor da Universidade de Columbia. Vinte anos depois, entre os dias 3 e 14 de junho de 1992, na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), conhecida como ECO-92 ou RIO-92, criou um conceito que está em moda nos dias atuais, o desenvolvimento sustentável, ou seja, o modo de produzir com respeito ao meio ambiente. O encontro, dessa vez, deu resultado. Estiveram presentes inú­ meros chefes de Estado, o que obrigou o presidente da época Fernando Collor de Mello a transferir temporariamente a capital do país para o Rio de Janeiro, como forma de aumentar o aparato de segurança disponibilizado para o evento. Ao fim das discussões, os líderes chegaram ao consenso de que as nações desenvolvidas eram as maiores responsáveis pelos danos provocados ao meio ambiente. Já os países em desenvolvimento precisavam de apoio financeiro e tecnológico para colocar em prática a ideia do desenvolvimento sustentável. Para que cada país cumpra seu papel, a CNUMAD criou a Agenda 21. Nesse documento, o órgão das Nações Unidas, além de explicar o que significa desenvolvimento sob práticas sustentáveis, mostra como os países devem fazer para alcançar a sustentabilidade. Como não obrigava os 156 países que participaram do RIO92 a adotar o modelo verde, não se pode dizer que a Agenda 21 foi um sucesso. Muito longe disso. Por essa razão, em 1997, o Protocolo de Kyoto adotou outro sistema. Em vez de deixar a cargo dos países a adoção voluntária da sustentabilidade, o novo acordo do clima estipulou metas para que os signatários | 124 |


diminuíssem suas cotas de poluição do ar. Na reunião realizada na cidade japonesa de Kyoto, os representantes dos 84 países concordaram em controlar suas emissões de gases-estufa.

O Protocolo de Kyoto naufragou Os países da União Europeia se comprometeram a reduzir em 8% suas emissões anuais. Já os Estados Unidos ficaram comprometidos com 7%, enquanto que o Japão fechou com 6%, sempre em relação ao que emitiam em 1990. Os países em desenvolvimento, como Brasil, Índia, México, Argentina e até mesmo China, não receberam metas de redução. Vale lembrar que China e Estados Unidos juntos são responsáveis por mais de 40% das emissões de dióxido de carbono, considerado, ao lado do metano, o gás que mais contribui para o aumento da temperatura terrestre. Alegando que as novas regras de controle das emissões afetariam o crescimento econômico, os americanos, no governo do presidente George Walker Bush, decidiram abandonar o acordo pouco tempo depois. Além do suposto prejuízo para a economia, o presidente americano disse que não concordava com a ausência de compromisso dos países em desenvolvimento nos esforços para o controle das emissões. Na verdade, os países desenvolvidos são culpados pelo aumento da concentração dos gases do efeito estufa na atmosfera. Para financiar o desenvolvimento da economia, o Primeiro Mundo não poupou esforços e recursos naturais. Já os pobres e em desenvolvimento, salvo raras exceções, contribuíram e contribuem muito pouco na questão climática. O conceito da responsabilidade histórica leva em conta essa situação. Por isso, os desenvolvidos, com destaque para os Estados Unidos, a Europa e o Japão, ao contrário dos emergentes, são obrigados a formular um plano de comprometimento de redução. Mesmo sem os Estados Unidos e a China, o Protocolo de | 125 |


Kyoto entrou em vigor em fevereiro de 2005 com a participação de mais de 180 nações. O acordou previu que os resultados sejam colhidos entre 2008 e 2012, o último ano de vigência. Com a ausência dos principais poluidores, o Protocolo está longe de cumprir seu objetivo. Os números mais recentes, referentes ao ano de 2006, dis­ ponibilizados pela Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), evidenciam a responsabilidade maior que recai sobre os países ricos pelo aquecimento global. Adaptamos a tabela para mostrar as emissões anuais per capita (por pessoa) dos principais países e de todos os continentes. Destacamos cinco anos, 1980, 1990, 2000, 2005 e 2006, para efeito de comparação. Os pesquisadores da agência de energia trabalharam com a relação de uma pessoa para uma tonelada de dióxido de carbono. Ou seja, para fins de medição, uma pessoa é responsável pela emissão de, pelo menos, uma tonelada de CO² por ano. Emissões anuais per capita de dióxido de carbono (CO²) Países

1980

1990

2000

2005

2006

Canadá

18,64

17,09

18,17

19,51

18,81

Estados Unidos

21,03

20,10

20,76

20,27

19,78

México

3,52

3,56

3,84

3,83

4,05

América do Norte

17,11

16,00

16,47

16,19

15,85

Argentina

3,27

3,11

3,69

3,84

4,06

Bolívia

0,82

0,77

1,14

1,31

1,38

Brasil

1,51

1,57

1,96

1,99

2,01

Haiti

0,17

0,12

0,20

0,21

0,21

170,01

71,70

90,62

126,70

118,30

Ilhas Virgens

(território que pertence aos Estados Unidos)

| 126 |


Países

1980

1990

2000

2005

2006

América do Sul e América Central

2,15

2,01

2,36

2,48

2,51

França

8,89

6,33

6,58

6,58

6,60

Holanda

14,24

14,18

15,82

16,62

15,79

Itália

6,59

7,33

7,77

8,13

8,05

Luxemburgo

32,16

28,12

20,57

26,87

26,28

Reino Unido

10,94

10,52

9,43

9,67

9,66

Europa

8,88

8,20

7,76

8,01

7,99

URSS

11,63

13,29

-

-

-

Ucrânia

-

-

6.67

7.45

7.05

Rússia

-

-

10,79

11,90

12

Eurásia

11,63

13,29

8,16

9,10

9,11

Arábia Saudita 17,69

12,95

12,64

15,35

15,70

Irã

2,96

3,57

5,07

6,89

7,25

Israel

6,29

7,84

9,92

10,25

9,80

Oriente Médio

5,24

5,48

6,56

7,86

8,04

África do Sul

7,82

7,84

8,89

9,87

10,04

Burundi

0,02

0,05

0,06

0,05

0,05

Líbia

10,58

10,24

8,19

9,33

9,07

Uganda

0,06

0,05

0,05

0,06

0,06

África

1,14

1,17

1,12

1,19

1,16

Austrália

13,78

15,85

18,77

20,75

20,58

China

1,48

2,00

2,34

4,16

4,58

Índia

0,43

0,70

1,01

1,09

1,16

Indonésia

0,55

0,83

1,28

1,14

1,21

Japão

8,12

8,53

9,50

9,80

9,78

Ásia e Oceania 1,44

1,80

2,17

2,92

3,07

Mundo

4,11

3,96

4,42

4,48

4,16

| 127 |


Ao se deparar com a tabela, o leitor não está entendendo por que a China apresenta um número tão baixo. O cálculo é feito através da divisão do total de CO² emitido pela população do país. Como os chineses estão na casa do bilhão, o resultado per capita mostrou-se baixo. Com as Ilhas Virgens, território de controle americano, ocorre exatamente o contrário. Sua população está na casa do milhar, o que faz com que as emissões sejam superiores a 118 toneladas por pessoa. Quando falamos em números absolutos, a China está prestes a assumir a liderança do ranking, como o país mais poluidor do planeta. De acordo com os números fornecidos pela ONG Trees for the Future e pelo Energy Information Administration, órgão do governo americano que acompanha o setor de energia, referentes ao ano de 2005, os chineses emitem pouco mais de 5 bilhões e trezentos milhões de toneladas, enquanto que os americanos estão perto de emitir 6 bilhões de toneladas de dióxido de carbono por ano. Como o último levantamento já tem algum tempo, os estudiosos dizem que a China passou, ou está muito próximo disso, os americanos. Os países africanos praticamente não emitem carbono. Na verdade, os pobres liberam um volume muito baixo de dió­ xido de carbono na atmosfera. Em contrapartida, como a tabela mostra, os ricos, com destaque para os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália e a Holanda, possuem uma taxa de emissão alta. As nações em desenvolvimento, com potencial para se tornarem ricas, como China, Índia e Brasil, têm, apesar dos números não mostrarem essa situação, uma responsabilidade cada vez maior no aumento das emissões. Mesmo assim, se considerarmos o passado, esses três países, a exemplo do mundo pobre, emitiam pouco. O desafio dos emergentes está na capacidade de estruturar a economia de uma maneira verde, aproveitando as lucrativas oportunidades de negócio trazidas pela sustentabilidade. O mundo se organizou em torno da emissão de CO². A riqueza, portanto, ainda | 128 |


está diretamente ligada ao volume despejado desse gás no ar. Aqueles países que mais gastam energia são os que mais produzem, os que mais geram produtos e disponibilizam serviços. O desafio é fazer com que essa relação se inverta, por meio da utilização de opções de energia renováveis, como as hidrelétricas, as eólicas e as solares.

Copenhague: esperança ou desilusão? A expectativa em torno da próxima reunião internacional do clima só aumenta. Todos querem saber quais serão as decisões tomadas na cidade de Copenhague, capital da Dinamarca. Entre os dias 7 e 18 de dezembro, as autoridades de praticamente todos os países vão se reunir para discutir um novo acordo. Por enquanto, o que se sabe é que, mais uma vez, as negociações entre os líderes políticos, em torno da redução das emissões, estão travadas. Cada governo possui sua própria meta e seu próprio ano de comparação. Os Estados Unidos, por exemplo, querem diminuir as emissões em relação a 2005, quinze anos depois de 1990, data sugerida pelos especialistas do clima. Isso porque as taxas de emissão de 2005 são maiores do que aquelas registradas no começo da década de 90. “O ritmo está muito lento. Existem indefinições significativas na etapa preliminar de conversas. Acredito que Copenhague resultará em um acordo genérico, deixando muitas coisas para serem resolvidas apenas no próximo ano”, disse Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza, superintendente de Conservação de Programas Temáticos da WWF-Brasil. Ele destacou que a ONU pede US$ 60 bilhões para criar um fundo que combata os efeitos do clima. Os países não estão dispostos a ajudar. Enquanto isso, os Estados Unidos gastam todos os anos US$ 1 trilhão para fins militares. Os organismos internacionais que estudam o clima, com destaque para o IPCC, aconselham que os países cortem suas | 129 |


emissões de gases-estufa de 80% a 90% até 2050, tomando como base de comparação o ano de 1990. “O problema é que os líderes estão dispostos a diminuir, de maneira geral, apenas 15% em relação a 2005”, lamentou Scaramuzza. Os chineses, cuja matriz energética do país está baseada no carvão, têm dificuldade de adotar fontes limpas de energia. “A China é um grande obstáculo para a conclusão das negociações”, completou o representante da WWF-Brasil. Além da emissão descontrolada por si só, advinda das matri­ zes energéticas poluentes e dos veículos, o desmatamento das florestas, com destaque para a Amazônia brasileira, contribui para o agravamento da situação. “A região amazônica necessita de ações internacionais para que a floresta tenha chance de sobreviver. Segundo o IPCC, de 15% a 20% das emissões globais dos gases-estufa vêm do desmatamento”, enfatizou o professor Paulo Eduardo Artaxo Netto, chefe de departamento do Instituto de Física da Universidade de São Paulo. Para o especialista da USP, o satélite que fiscaliza a área é apenas mais uma ferramenta de política pública para controlar o processo de ocupação desordenado. “O satélite não controla as ações prejudiciais. Precisamos de uma política de uso e implantação do solo para controlarmos o desmatamento”, opinou. “O atual modelo de ocupação é predatório. Pode-se dizer que o único beneficiário é o agropecuarista. A transformação da floresta em pastagem é lamentável. Esse processo prejudica, em nome da riqueza de poucos, a sociedade brasileira”, finalizou Artaxo Netto. As florestas funcionam como grandes reservatórios de carbono, componente básico da matéria orgânica (biomassa). O carbono está embutido na vegetação. As queimadas fazem com que o carbono da área seja liberado para a atmosfera na forma de gás. Se a área é convertida em pastos ou plantações, não há o retorno da vegetação. Sem a cobertura vegetal, o carbono não é reabsorvido. Caso ocorra o inverso, com o proces| 130 |


so de reflorestamento, o carbono será reabsorvido pela vege­ tação, transformando-se novamente em biomassa. Somente a derrubada de árvores da Amazônia brasileira, de acordo com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), contribui com aproximadamente 2,5% das emissões de gases-estufa em todo o planeta. E pior: a devastação de nossa cobertura vegetal é responsável por 75% das emissões de CO² brasileiras. Essa dinâmica do carbono mostra o quanto é importante criar um mecanismo que motive ou obrigue os países a protegerem suas florestas. Além da importância na manutenção do regime de chuvas e na preservação da diversidade da fauna e flora, elas estão intimamente ligadas ao futuro da temperatura global. Quando a cobertura vegetal mantém-se preservada, o estoque de carbono permanece na forma de biomassa. Ao desmatar, surge o problema, já que deixa de ser matéria orgânica para virar gás-estufa. Para evitar essa transformação, o acordo de Copenhague deve criar um mecanismo chamado REDD (Reduce Emissions for Deforestation and Degradation) ou, em português, Redução de Emissão para o Desmatamento e Degradação que cria incentivos para que a floresta permaneça em pé. A exemplo do que ocorre com o mercado de carbono, aquele que polui poderá compensar suas emissões comprando créditos de quem ainda pode conservar. Ao mesmo tempo, caso os países detentores de florestas mantenham as motosserras longe da cobertura vegetal, receberão uma compensação financeira. Esse dinheiro vai cobrir os custos da fiscalização intensa nas áreas de rica diversidade natural. A polêmica do REDD fica por conta da compensação. Os críticos dizem que o momento não é de transferir responsabilidades. Segundo esses estudiosos, o ato de comprar o direito de emitir um volume maior de gases-estufa, por meio do financiamento da proteção de uma floresta, não resolve o problema. A hora é de todos centralizarem os esforços na | 131 |


máxima redução das emissões. Uma forma de controlar a substituição é a de estabelecer um limite para o investimento na preservação das florestas. Se o dispositivo sair do papel, a Fundação Amazonas Sustentável estima que as florestas do mundo inteiro vão receber, levando em conta apenas o fluxo de mercado dos Estados Unidos, de US$ 10 bilhões a US$ 20 bilhões por ano.

A Floresta Amazônica é uma riqueza ainda gigantesca A Floresta Amazônica tem uma extensão superior a 6 mi­lhões de km², quase o tamanho da Austrália, maior do que a Europa Ocidental, dividida ao longo de nove países, Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. Os brasileiros são privilegiados por contarem com a maior parte, cerca de 60%, da cobertura ve­getal nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Essa região é conhecida como Amazônia Legal. Entre os anos de 2000 e 2008, uma área equivalente a pouco mais da metade do estado do Rio de Janeiro, que ocupa 43,7 mil quilômetros quadrados, da Floresta Amazônica, ou seja, 22,5 mil km², some do mapa anualmente. No ano passado, foram devastados 13 mil km². Esses cálculos foram realizados pelo Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia) com o auxílio das imagens de satélites feitas pelo Inpe no período. Para o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o Brasil registrará a menor extensão de mata amazônica devastada na história em 2009. No final do ano, a expectativa do governo é que a retirada da cobertura vegetal equivalha a 9 mil quilôme­ tros quadrados. “Vamos ter um papel determinante de protagonismo (em Copenhague), um papel de quem está fazendo seu dever de casa. O Brasil pode falar alto e exigir dos países ricos, | 132 |


que são os grandes poluidores”, disse Minc em uma entrevista coletiva no último mês de setembro. Em um relatório de autoria do Greenpeace, a ONG afirma que apenas 1/5 das florestas nativas do planeta continuam intocadas. Dessa proporção, aproximadamente 1/3 está concentrada na Amazônia. Os defensores da natureza escreveram que, mesmo após pelo menos 30 anos de destruição da Amazônia, é surpreendente constatar que mais de 60% da cobertura original da floresta ainda seja virgem. “A Bacia Amazônica é o maior reservatório de água doce do planeta. Quase 1/5 de toda a água do globo flui através dos seus rios. O Rio Amazonas tem 6.868 quilômetros de extensão (a mesma distância que separa a cidade de Nova Iorque da capital alemã Berlim). O ponto mais profundo do Rio Amazonas chega a 120 metros, o que é suficiente para mergulhar a Estátua da Liberdade inteira (que tem 91,5m de altura)”, segundo o documento. “A Amazônia é uma das áreas mais ricas em diversidade natural e vegetal de todo o mundo. Existem mais espécies de plantas em apenas um hectare de floresta amazônica do que em todo o continente europeu. Mais de 200 espécies de árvores podem ser contadas em um único hectare e já foram identificadas 72 formigas diferentes vivendo em apenas uma árvore. Nos rios que cortam a floresta, existem 30 vezes mais espécies de peixes do que em todos os cursos d’água da Europa”, continuam os autores do texto. “A quantidade de espécies animais e vegetais que vivem na Amazônia ainda é, em grande parte, desconhecida. Os cientistas estimam que apenas 40% dos insetos foram identificados até hoje. Mais de 30 mil tipos de plantas já foram catalogados, mas suspeita-se que outros 20 mil permaneçam desconhecidos. Durante a década de 90, sete novas espécies de macacos, duas de pássaro e dúzias de espécies de sapos e peixes foram descobertas”, de acordo com o relatório. | 133 |


Brasil: o país da energia renovável. Até quando? A necessidade de alterar as opções energéticas comumente utilizadas pela humanidade é o maior desafio que o aquecimento global oferece para a construção de uma nova economia. Sem energia, como já vimos, não é possível produzir. Na verdade, o mundo depende da energia para funcionar. As ati­ vidades desempenhadas pelo Homem são geradas pelas mais variadas fontes energéticas. O problema está na dependência das matrizes sujas, extremamente poluentes, nocivas para o meio ambiente. A China, por exemplo, utiliza o carvão em grande quantidade para mover sua pujante economia. Para se ter uma ideia, exatos 70% da energia são advindos do carvão. As termoelétricas, durante o processo de queima do mineral, emitem no ar um volume preocupante de carbono. A poluição é tamanha que o céu das grandes cidades chinesas permanece, na maior parte do ano, cinza, obrigando a população a usar máscaras nos dias de grande concentração de partículas tóxicas. No mundo, de acordo com números de 2007 divulgados pela Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), pouco mais de 26% da energia vem do carvão. A hidrelétrica, uma opção desejável por reduzir os danos à natureza, tem uma média ínfima. O uso da fonte é de apenas 2,2%. As opções estão divididas em dois grandes grupos: renováveis e não-renováveis. Como os nomes dizem, as renováveis são aquelas em que o meio ambiente tem a capacidade de fornecer os recursos naturais ao ser humano novamente, e quantas ve­ zes forem precisas, desde que a fonte de energia não seja pre­ judicada pela ação do Homem. São exemplos a energia solar, vinda do Sol, a eólica, advinda dos ventos, a biomassa, como a lenha e o bagaço da cana-de-açúcar, e, apesar dos protestos, a hidrelétrica, gerada pelas águas. Alguns estudiosos dizem que as hidrelétricas vêm de um recurso finito, a água, e que, por | 134 |


essa razão, não podem integrar o grupo das renováveis. Já as não-renováveis são aquelas que, independentemente da ação predatória do Homem, um dia vão acabar. O ser humano precisa adaptar esses recursos para que virem fontes de energia. Diferentemente das renováveis, o Homem utiliza o que vem da natureza para transformar em energia. Existe, portanto, uma ação direta. Citamos como exemplo o carvão, queimado para obter energia e o petróleo, que sofre o processo de transformação para gasolina, fundamental para fazer com que nossos carros andem. Com 45% de participação na geração da energia elétrica nacional, as fontes renováveis, com amplo destaque para as hidrelétricas, colocam os brasileiros, na comparação com os ou­ tros países, em uma posição de liderança. “Enquanto a China gera 40.000 GW pela queima de carvão, nós geramos 100.000 GW através de nossas hidrelétricas”, comparou, durante um evento realizado em São Paulo, o presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), Maurício Tolmasquim. Mesmo assim, os especialistas que se reuniram para conversar sobre energia concordam que o Brasil ainda está longe de aproveitar a totalidade dos recursos hídricos existentes no território. “O Brasil possui o maior volume de água do mundo. Mas, em termos de hidrelétricas construídas, está atrás de outros países”, disse o diretor da Coppe, instituto voltado para pesquisa na área de engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Luiz Pinguelli Rosa. O professor da UFRJ se baseou em dados de 2005 da Agência Internacional de Ene­rgia para enfatizar que o Brasil aparece apenas na quarta posição em capacidade instalada, atrás de Canadá, Estados Unidos e a líder China. Ainda segundo a agência, conforme números baseados em 2007, o planeta utiliza pouco mais de 10% de fontes reno­ váveis, também chamadas de limpas. Ao somarmos petróleo, gás natural e carvão, temos o desconfortável resultado de | 135 |


81,4% de energia que contribui para a elevação da temperatura da Terra. Em pouco tempo, se quiser atenuar os efeitos do aquecimento global, o mundo terá de reverter esse quadro. Em vez de muita energia não-renovável, as autoridades terão de se esforçar para, finalmente, colocar em prática projetos de energia renováveis. Na contramão da corrente mundial, no leilão de energia rea­ lizado pelo governo brasileiro em 2008, diversas críticas foram feitas em relação à fonte de energia privilegiada. As termoelétricas foram as grandes vencedoras. Para o presidente da EPE, o que ocorreu foi um caso único, mas necessário. “Um país não pode depender exclusivamente da chuva. As termoelétricas vieram em um momento anterior à crise financeira, cuja expectativa de crescimento da economia, com aumento do gasto energético, era maior”, justificou Tolmasquim. Antigamente, as usinas hidrelétricas estocavam água para utilização em momentos de emergência, de ausência de chuvas. Hoje em dia, depois da aprovação de determinações ambientais, não se pode mais estocar. As novas usinas, que não guardam determinado volume de água, são chamadas de fio d’água. “Se não chover, não tem água. A partir do momento que os administradores percebem um leve esvaziamento do reservatório de uma usina hidrelétrica, eles imediatamente ligam as termos. Não se pode deixar o reservatório esvaziar por completo”, concluiu o presidente da EPE. O físico José Goldemberg, presidente do Conselho Consultivo do Centro Nacional de Referência em Biomassa ­(CEN­BIO), um dos maiores especialistas brasileiros no setor, discorda que houve necessidade de contratar as termoelétricas. “Está ocorrendo uma mudança do perfil energético brasileiro. Os contratos com as termos já foram fechados. Caso elas sejam construídas até 2017, a participação das hidrelétricas cairá para um patamar nunca antes visto”, lamentou. A construção de uma usina termoelétrica leva apenas dois | 136 |


anos. As hidrelétricas precisam de seis a sete anos para ficar pronta. Por essa razão, ao lado do fator político, Goldemberg, vencedor do Prêmio Planeta Azul, considerado o Nobel do Meio Ambiente, acredita que o governo optou pelas termos. “A perspectiva de o país ficar sem energia pode decidir uma eleição. Os tucanos perderam as eleições presidenciais também por causa do apagão (crise nacional que afetou o fornecimento e distribuição de energia elétrica nos dois últimos anos do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso). É um risco político considerável”, argumentou.

O fim da importação dos pneus usados No dia 24 de junho de 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou de forma quase unânime, por oito votos a um, a constitucionalidade das leis brasileiras que proíbem a importação de pneus usados para o Brasil, inclusive os advindos do Mercosul. “Todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Incumbe ao Estado e à coletividade a obrigação de defender e preservar em benefício das presentes e futuras gerações esse direito”, disse, ao emitir seu parecer, o ministro Celso de Mello. De acordo com números divulgados pela ministra Cármen Lúcia durante o julgamento, já entraram no País cerca de 100 milhões de pneus usados. A Advocacia Geral da União (AGU) disse que, entre os anos de 2002 e 2005, entraram no Brasil 40 milhões de pneus. Dessa quantidade, cerca de 30% já chegavam como lixo ambiental, não podendo ser reaproveitado, ainda segundo a AGU. Para o também ministro Carlos Ayres Britto, os pneus importados “não passam de um lixo ambiental que se exporta, fazendo do Brasil uma espécie de quintal do mundo”. Ele ainda afirmou que os pneus vão contra o princípio da responsabilidade ecológica. “Ocupam, depois de usados, um espaço con| 137 |


siderável. São altamente combustíveis. Sem nenhuma dúvida poluem os rios, lagos, correntes de água, e se tornam vetores de doenças transmitidas por insetos, a partir da dengue, tão temida entre nós”, completou. A Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (ANIP) estima que a União Europeia descarte 3 milhões de toneladas de pneus usados por ano, dos quais 140 mil toneladas são exportadas. Até a decisão do Supremo, metade desse número tinha como destino o Brasil. O assessor técnico da Associação Brasileira do Segmento de Reforma de Pneus (ABR), Carlos Thomaz, disse que a decisão do STF já repercutiu no setor. “Houve queda de 20% a 30% da produção nas unidades reformadoras de produção. Muitas empresas, por falta de matéria-prima, deixaram de operar no segmento de automóveis”. No país inteiro, 25 milhões de pneus de passeio novos são vendidos por ano na linha automóvel. Em torno de 30%, o que resulta em sete milhões e meio, de acordo com Thomaz, podem ser reaproveitados. Ele defende que o setor possa importar as carcaças de pneus dentro de um regulamento apropriado. “Não concordamos com a proibição das nossas atividades. O governo poderia simplesmente regular a atividade dos recauchutadores”, avaliou. O diretor-executivo da Associação Nacional das Empresas de Reciclagem de Pneus e Artefatos de Borracha (AREBOP), José Carlos Arnaldi, chama a atenção para a quantidade de pneus descartada no Brasil. De 360 mil a 380 mil toneladas se tornam inservíveis, ou seja, não têm mais serventia, todos os anos. Ao considerar que cada pneu pesa em média 10 quilos, temos o resultado de 36 milhões de pneus que precisam ser descartados ao fim de cada ano. “Temos capacidade para dar um destino apropriado para parte deles. As empresas conseguem reciclar por volta de 260 mil toneladas”, concluiu Arnaldi. A forma mais comum no país de se aproveitar os pneus desgastados pelo tempo é como combustível alternativo para a in| 138 |


dústria do cimento. As fabricantes de solados de sapatos também utilizam os recursos dos pneus velhos. Eles ainda podem se transformar em borrachas de vedação, dutos pluviais, pisos para quadras poliesportivas, pisos industriais e tapetes para automóveis. É preocupante quando os pneus inservíveis são queimados ao ar livre. Além das substâncias tóxicas liberadas, os gases-estufa são lançados na atmosfera.

A construção que respeita o meio ambiente Uma nova geração de edifícios, o que inclui residências e empreendimentos comerciais, busca na tecnologia uma maneira ecologicamente correta de uso comedido dos recursos naturais. Trata-se dos “green buildings”, os chamados prédios verdes, cujas características foram baseadas na concepção, construção e operação com uso de conceitos e procedimentos sustentáveis que proporcionam economia para o bolso e bemestar aos ocupantes. Nos anos 70, com a crise do petróleo, quando o aumento dos preços da energia levou a sociedade a buscar alternativas mais baratas para mover a economia, surgiu o conceito de construção sustentável. Os primeiros prédios verdes foram construídos na Holanda e na Alemanha. Eles trouxeram como novidade um gerador, movido a combustíveis renováveis, que produzia a própria energia. Só anos mais tarde, os Estados Unidos e a Ásia desenvolveram construções inteiras com características verdes. O principal motivo para a mudança de pensamento da cons­ trução civil é a discussão que envolve o aquecimento global, assunto principal das rodas de negociação entre os países. Recentemente, um estudo da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, mostrou as principais fontes consumidoras de energia elétrica dos prédios comerciais. Por volta de 65% da energia consumida em um edifício vem do funcionamento do ar-condicionado. No Brasil, esse índice está em 50%. | 139 |


A montadora General Motors, a rede de supermercados WalMart e a fabricante de software Adobe adotaram instalações sustentáveis. A varejista reservou a quantia de US$ 500 mi­ lhões para fazer com que as 2074 lojas espalhadas pelos Estados Unidos gastem pouca energia elétrica, já que possui o maior gasto empresarial nesse item do país. Em 2010, esperase que 75% desses milhões investidos retornem aos cofres da empresa. A estimativa dos executivos do Wal-Mart é de economizar, somente no ano que vem, US$ 300 milhões com a economia de energia.

O privilégio de receber o selo LEED Existem, atualmente, perto de 5 mil edifícios verdes em países como Alemanha, Inglaterra, Índia e Estados Unidos, reconhecidos com o selo LEED (Leadership in Energy and ­Environmental Design), sigla em inglês que significa “Lide­ rança em Energia e Design Ambiental”. Essa certificação é a única aceita no mundo inteiro. Com uma filial no Brasil, a Green Building Council Brasil (GBC Brasil) é responsável pela certificação em nosso território. Dez construções receberam o chamado selo verde, sendo que outras 150 foram registradas e estão em processo de certificação. Esse número parece pouco em relação às milhares de construções em andamento. Mas é preciso prestar atenção para aquilo que existe por trás do selo LEED. Na América Latina, os brasileiros são os que mais colocam em prática essa iniciativa. Atualmente, ocupamos a quinta posição mundial no processo de certificação, atrás dos Estados Unidos, Emirados Árabes, Canadá e China. A GBC Brasil estima que, no final de 2009, outros 200 empreendimentos entrarão no processo de certificação. A mensagem do presidente do Green Building Council Brasil, Thassanee Wanick, mostra o que motivou o setor a adotar | 140 |


um padrão de construção. “No começo do novo milênio, encontramos nosso planeta em uma encruzilhada. De um lado, uma sociedade consumista. Do outro lado, os esforços para reduzir os impactos negativos que ela produz. É nosso dever minimizar os impactos do nosso setor no mundo”, definiu. O significado do selo LEED é muito mais que um título internacional. Ele representa parte da preocupação ambiental e do bem-estar social, pois, além da redução nas contas de água e luz, a certificação leva em conta características que melhorem a qualidade de vida daqueles que trabalham nos locais. Uma delas é permitir que as pessoas possam ver o ambiente externo. Para isso, gigantescas fachadas envidraçadas embelezam os projetos.

Aumento de eficiência: • Energética; • Uso de água; • Utilização de materiais. Redução do impacto ambiental: • Redução das emissões de carbono; • Redução dos custos operacionais. Melhoria da qualidade do ambiente interno: • Maior satisfação dos usuários; • Redução dos problemas de saúde; • Maior produtividade; • Educação ambiental dos usuários. Associação da marca ao conceito de sustentabilidade Os projetos de uma edificação verde são de 5% a 10% mais caros do que aqueles da construção convencional. No entanto, o retorno financeiro é rápido para as construtoras, porque a demanda do setor está crescendo. Para os que compram, a | 141 |

FONTE: GBC

Vantagens do prédio verde


economia nas contas de água e luz faz o gasto maior inicial valer a pena. De acordo com o gerente de operações da GBC Brasil, Felipe Faria, o barateamento dos materiais será consequência da certificação. “A diminuição dos custos virá com a economia de escala de produção pelo aumento da demanda. O crescimento dos interessados virá quando os materiais ficarem mais em conta. Como já ocorreu em outros países, esse ciclo de consumo pode ser estimulado com a redução, mesmo que temporária, da carga tributária e da disseminação dessas ideias pelos líderes de mercado”, afirmou. Os valores para conseguir a certificação representam de 1% a 2% do custo total do empreendimento, além de US$ 600 para registrar o projeto na matriz americana da Green Building Council. Segundo Roberto de Souza, diretor do Centro de Tecnologia de Edificações (CTE), empresa que presta consultoria aos interessados na construção sustentável, os custos da obra verde, de cinco anos para cá, caíram de 2% a 3%. “Graças ao aumento da procura e ao desenvolvimento de novas tecnologias de produção, os custos ficaram menores. Mesmo que o imóvel seja mais caro, esse valor adicional é compensado pela economia gerada depois que o edifício entra em operação”, informou. O gerente de operações da GBC Brasil, Felipe Faria, disse que existem várias categorias de certificação e níveis do selo LEED. Qualquer tipo de construção pode tentar obter o selo, desde residências até hospitais, passando por edifícios comerciais e imóveis que estejam em reforma. “No entanto, é aconselhável buscar a certificação de um empreendimento na fase inicial de projeto, porque a chance de aumentar a eficiência é maior, alcançando pontuação superior no processo de certificação e maior viabilidade de implantação”, analisou. O comitê LEED está dividido em cinco subcomitês temáticos, que abordam os cinco critérios de avaliação para receber a ferramenta LEED: Materiais e Recursos (MR), Energia e At| 142 |


mosfera (EA), Espaço Sustentável - Site (SS), Qualidade Ambiental Interna (EQ) e o Uso Racional da Água (WE). Depois que o empreendimento registra o interesse de conseguir o selo, recebe a análise dos subcomitês segundo os critérios acima. A certificação é recebida em escalas, conforme forem sido atendidas as exigências. Uma obra pode receber o selo ­silver, gold ou platinum, que significam respectivamente, prata, ouro e platina. Para a GBC Brasil, o primeiro passo para a conscientização na construção civil é sensibilizar e capacitar consultores de vendas, arquitetos e profissionais de projeto, incorporadoras e construtoras, administradores prediais, estabelecimentos de ensino e representantes de órgãos públicos, para que os conceitos de edificações sustentáveis formem um padrão nos lançamentos futuros do setor. Entre as muitas atividades, a função da organização GBC Brasil é trabalhar com a educação dos profissionais do setor de engenharia e arquitetura. “Temos parceria com as maiores faculdades de engenharia e arquitetura do Brasil para o desenvolvimento de cursos de pós-graduação e mini-cursos lecionados nas próprias universidades. Por exemplo, em São Paulo, temos parceria com a FUPAM, USP, Mackenzie e Belas Artes; no Rio de Janeiro com a UFRJ e, por fim, no Nordeste com o INBEC”, afirmou Felipe Faria. Até o início de 2010, a GBC Brasil pretende lançar uma cartilha, que será entregue ao cidadão comum, para explicitar todas as práticas da construção sustentável, bem como colocar as listagens do LEED para difundir as ideias para mais pessoas.

A

campanha

“O ne D egree L ess ”

quer reduzir a

temperatura

Com o objetivo de diminuir a temperatura dos grandes centros urbanos em pelo menos 1ºC, o grupo GBC Brasil criou um | 143 |


caminho simples e barato. Por meio da campanha institucional “One Degree Less”, ou Um Grau a Menos, a organização orienta a população a pintar de branco os telhados das casas. Segundo os pesquisadores americanos do Environmental Energy Technologies Division (Divisão de Tecnologias de Energia Ambiental), grupo que liderou a campanha, esse tipo de cobertura reflete em até 75% a energia do sol, o que resulta na diminuição da temperatura interna das residências. Como resultado, o conforto térmico no local gera menos gasto de energia elétrica para ligar aparelhos de ventilador ou ar-condicionado. Os especialistas apontam economia de 20% na conta de luz. Outra saída sugerida foi a construção de telhados verdes, ou “Green Roofs”, que criam jardins e pequenas plantações. Por absorverem o gás carbônico do ar, as plantas reduzem as ilhas de calor, minimizando os reflexos da poluição. As plantas também têm a capacidade de umidificar o ambiente, o que traz sensação de temperatura agradável em qualquer parte do ano. A simulação da Environmental Protection Agency (EPA), Agência de Proteção Ambiental, mostrou que se a quantidade de áreas verdes de uma cidade grande aumentasse em 5%, a temperatura no verão cairia em média 4°C, e a poluição se reduziria em 10%. No Canadá, a prefeitura de Toronto incentiva os munícipes a instalar o teto de vegetação nas residências. Isso porque um estudo realizado pela universidade da cidade, a de Ryerson, indicou que a cobertura verde em 8% dos telhados da cidade geraria uma economia de mais de US$ 300 milhões em manutenção da rede pluvial e de esgotos, diminuição da produção de energia e redução das ilhas de calor. Sem se esquecer de mensurar que os telhados verdes embelezam a arquitetura local e trazem bem-estar à população. No Brasil, as pessoas se interessam cada vez mais por essas inovações. É preciso ressaltar, no entanto, que a adaptação | 144 |


dos telhados para a construção de jardins precisa ser feita por mão-de-obra especializada. Já a pintura dos telhados de branco pode ser feita sem nenhum risco à segurança das pessoas e sem gastar de maneira excessiva.

Os

projetos arquitetônicos a serviço do meio

ambiente

Em São Paulo, empreendimentos privados como o Eldorado Business Tower, o Rochaverá Corporate Towers, a unidade do laboratório de análises clínicas Delboni Auriemo – Dumont Villares e algumas agências do Banco Real são exemplos de construções que seguiram todas as normas sustentáveis e adequaram seus projetos para reutilizar a água da chuva e dos banheiros. Essas construções também contam com sistema de aquecimento solar, janelas que priorizam a luz e a ventilação naturais, sistema de gerenciamento de resíduos, que tratam o esgoto do prédio antes de ser despejado nos coletores públicos. O escritório Aflalo&Gasperini, de São Paulo, é responsá­ vel pelo desenvolvimento de mais de dez projetos de arqui­ tetura de acordo com esse padrão ecológico. “O projeto do Eldorado Business Tower nasceu há bons anos, mas quando a Gafisa resolveu realmente construir o empreendimento, introduzimos os conceitos verdes para que o edifício se tornasse economicamente e usualmente viável”, afirmou o arquiteto Roberto Aflalo. Enquanto a iniciativa privada se preocupa em diminuir os impactos negativos da construção para o meio ambiente, o governo parece não ter acordado para o mesmo. “Nós estamos trabalhando ao lado dos órgãos públicos para disseminar esses conceitos. A implantação de alternativas corretas não traz necessariamente custos adicionais à obra. Os edifícios sustentáveis podem reduzir em 30% o consumo de energia, 50% o | 145 |


consumo de água, 35% as emissões de gás carbônico e até 70% o descarte de resíduos. Essa economia é muito interes­sante para qualquer orçamento”, analisou Marcos Casado, gerentetécnico da GBC Brasil. É impossível executar uma obra sem cimento. A indústria desse produto responde por 5% das emissões de dióxido de carbono no mundo. Há quase 60 anos, as fabricantes de materiais de construção desenvolveram uma fórmula que contém menos clínquer, o principal componente do cimento, mas os engenheiros e arquitetos não a viam com bons olhos. A utilização de restos de materiais industriais criava uma resistência na adoção do produto pelos profissionais do setor. O CPIII, tipo de cimento que substitui parte do clínquer por restos de ferro, coque e calcário vindos das sobras das indústrias siderúrgicas, é um exemplo. “As principais vantagens do cimento ecológico são a durabilidade e o preço menor, além de ser menos nocivo ao meio ambiente”, disse Arnaldo Forti Battagin, chefe dos laborató­ rios da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), em entrevista ao portal Planeta Sustentável. Atualmente, as principais cimenteiras, como Votorantim, Holcim, Camargo Corrêa, Lafarge e João Santos, fabricam esse tipo de cimento. Outro item indispensável para um “green building” é o tratamento do esgoto. Com instalações feitas por empresas especializadas, é possível, por meio de um biofiltro, composto de raízes de bananeiras, tratar o esgoto. A água resultante desse processo não é apropriada para o consumo, mas pode ser devolvida ao meio ambiente sem riscos de contaminá-lo. O aquecimento solar é um equipamento já conhecido no mercado. Mesmo assim, muitos profissionais ainda não têm o hábito de utilizá-lo em suas obras. O seu uso é aconse­ lhável para qualquer tipo de construção. Com ele, existe uma economia de até 20% na conta de luz, por isso ele é um item obrigatório para que o empreendimento seja ecologi| 146 |


camente elogiável. Permitir uma boa luminosidade dentro do edifício faz com que exista economia de iluminação artificial. O mesmo resultado é obtido pelas janelas de vidro sem abertura, porque impedem a troca de calor com o ambiente externo. Isso faz com que o ar-condicionado resfrie o local muito mais rápido e reduza a entrada de sujeira proveniente da poluição vinda da rua. Já o vidro esverdeado tem outra explicação. Por ter uma única camada em sua composição, o vidro verde permite a passagem de 70% da luminosidade e, por ser espelhado, deixa entrar somente 30% do calor advindo dos raios do sol. Assim, o calor fica retido no próprio vidro, só liberado quando a temperatura interna resfria. O uso racional de água precisa ser fator de preocupação nos prédios verdes. Para isso, acessórios que controlam o consumo de água são instalados nos banheiros, cozinhas e áreas de limpeza. Torneiras com fechamento automático, válvulas de descarga com caixa acoplada (mini-reservatório que armazena a água usada para dar a descarga), entre outras ideias, não faltam nos novos projetos, assim como os sistemas de reaproveitamento da água das chuvas e dos chuveiros. Com um sistema de calhas, que transporta a água para os reservatórios, e com dispositivos de filtragem e tratamento adequados, a chuva poderá ser usada nos chuveiros, tanques e pias. Na hora de escolher pelos materiais de construção e itens de acabamento, como pisos, azulejos, louças, lâmpadas e tintas, o consumidor precisa estar atento para saber se a empresa fabricante participa dos programas de responsabilidade social. Ele também precisa verificar se os produtos são confeccionados com material reciclado, poupam energia elétrica e não agridem o meio ambiente. Ao que tudo indica, os “green buildings” vieram para ficar e podem se tornar modelo obrigatório para aqueles que tenham a intenção de construir ou reformar. | 147 |


O

mundo já enfrenta problemas trazidos pela falta

de água

O 5º Fórum Mundial da Água, o maior evento internacional sobre esse tema, realizado em Istambul no começo de 2009, mostrou a divisão dos países em se comprometer a garantir o acesso à água como um direito essencial de todo ser humano. Ao contrário do que exigiam ecologistas, movimentos sociais e vários países latino-americanos, o encontro terminou sem decretar o recurso hídrico como um direito de todos nós. Apesar disso, 25 países assinaram uma declaração em que reconhecem o acesso à água e ao saneamento um direito e se comprometeram a colocá-lo em prática. O segundo ponto da declaração, assinado por 16 países latino-americanos, asiáticos e africanos, pede à comunidade internacional que o debate seja realizado pela Organização das Nações Unidas, ao invés do Conselho Mundial de Água, já que este tem caráter privado. Além das discussões diplomáticas, o fato é que o mundo passa por mudanças globais, a população não para de crescer, há migrações, expansão das cidades, desertificação, mudanças climáticas, os rios e as águas subterrâneas estão cada vez mais poluídos, e o desenvolvimento industrial colabora para o aumento do consumo dos recursos hídricos. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef, na sigla em inglês), menos da metade da população mundial tem acesso a água potável. São quase sete bilhões de pessoas, o dobro do que havia em 1965, com um aumento médio de 75 milhões por ano. Projeções da ONU estimam que possa haver um aumento de 2 a 4 bilhões até 2050. Esses dados levantam a seguinte questão: como produzir alimentos para uma população cada vez maior, uma vez que a agricultura é um dos setores que mais utilizam água? De acordo com a 1ª edição do Relatório de Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil, apresentado pela Agência Nacio| 148 |


nal de Águas, a atividade de irrigação é responsável por 47% do consumo. O Relatório usou como base informações que vão até o final de 2007. Ainda de acordo com o documento, 26% são destinados para o abastecimento urbano, enquanto que 17% estão direcionados para a indústria, 8% para a pecuária e apenas 2% para o abastecimento rural. Um dos estados mais ricos dos Estados Unidos, a Califórnia, está no terceiro ano consecutivo de seca. Segundo informações veiculadas nas agências internacionais, o governador Arnold Schwarzenegger não se mostrou esperançoso quanto a futuras soluções e declarou que a população americana deve se preparar para o quarto, o quinto ou até o sexto ano seguido. Para os países que possuem déficit hídrico, ou seja, falta de água, como a região norte da África e o Oriente Médio, uma das maneiras mais eficazes de evitar o gasto é por meio da importação de grãos, já que são necessárias mil toneladas de água para produzir uma tonelada de grãos. Portanto, à medida que o déficit hídrico nesses países se torna maior, aumenta também a falta de grãos. Pode-se concluir que, ao enfrentarmos um cenário de ausência de água, teremos necessariamente de lidar com a escassez de alimentos. De acordo com a ONU, cada pessoa precisa de 110 litros diários. Para se ter ideia de como gastamos, o consumo médio de cada habitante, só na cidade de São Paulo, é de 220 litros por dia. Supondo que 10,8 milhões de paulistanos economizassem o suficiente para alcançar a recomendação da ONU, pouparíamos mais de um bilhão de litros de água todos os dias.

A água do chuveiro pode ser reutilizada Diante desse cenário, fica evidente a necessidade do consumo consciente e, mais do que isso, o desenvolvimento de projetos que adotem o reaproveitamento desse valioso recurso. O sistema de reaproveitamento da água da chuva e do chu| 149 |


veiro, criado pelo professor Luiz Campestrini, por exemplo, possibi­lita a uma família com 10 pessoas pagar somente a taxa mínima de água e esgoto, sendo que o custo da energia elétrica chega a aproximadamente cinco centavos mensais por morador. A ideia do ex-professor de Desenvolvimento Pessoal e Criatividade, ex-oficial especialista da Aeronáutica, rendeulhe o prêmio Paraná Ambiental 2000. O modelo se caracteriza por um reservatório instalado no piso do chuveiro, que capta, filtra e clorifica, através de um dispositivo, a água do banho. Depois de passar por esse processo, ela fica armazenada em um reservatório com capacidade para 200 litros. Há também uma entrada suplementar para o caso de falta de água no reservatório. Ela pode vir de banheiras, lavatórios e até mesmo da chuva. Nos dias chuvosos, depois de passar pelo clorificador, fica armazenada no reservatório. Essa água acumulada é reutilizada no vaso sanitário, através de uma moto-bomba silenciosa, acionada pela válvula de descarga, que permite que o recurso natural chegue ao vaso. De acordo com a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), os vasos sanitários representam 50% do consumo de água em uma casa que possua caixa de descarga de 9 a 12 litros. Os sistemas de descargas mais modernos gastam 6 litros a cada aperto. Considerando que em uma casa tenha quatro pessoas e cada uma dê cinco descargas ao longo do dia, podemos dizer que 120 litros são gastos diariamente somente nessa residência. Ainda segundo dados da Sanepar, cada pessoa consome de 40 a 50 litros de água em um banho normal. Ou seja, na família que serviu de exemplo, são mais 160 litros gastos no banho. Esse volume pode, portanto, suprir o que é gasto nas caixas de descarga dos vasos sanitários, o que garante uma economia de aproximadamente 33% no que diz respeito ao consumo diário. Para Campestrini, essa economia é fundamental para a preservação da vida no planeta. “Gastar com consciência ao receber | 150 |


a água é ter amor pela vida. É saber economizar o maior te­ souro da Terra”, definiu o pesquisador.

A água da chuva pode ser utilizada “Para criar esse sistema, levei em consideração São Paulo, uma cidade que cresce de forma acelerada e desorganizada, prejudica o solo e, assim, provoca problemas, como as enchentes”, disse o professor Campestrini ao explicar o sistema que aproveita a água da chuva. O invento consiste em um equipamento simples, de implantação barata, o que permite o uso de boa parte das pessoas. Em seu sistema, a água da chuva é coletada dos telhados e, por isso, pode ser considerada mais limpa do que aquelas que correm nas ruas. “Quando vem direto do telhado, a água ainda não entrou em contato com bactérias advindas, por exemplo, do lixo, o que pode torná-la imprópria para o uso humano”, afirmou o pesquisador. Coletada diretamente do telhado, através de um tubo adaptado nas calhas da casa, as primeiras águas são descartadas de forma automática pelo ressalto hidráulico e pela filtradora automática. “Esse volume inicial que lava os telhados e as calhas contém impurezas, como aquelas encontrada na chuva ácida. Por essa razão, não pode ser aproveitado”, destacou Campestrini. Com a continuação da chuva, em um intervalo de cinco a dez minutos, o telhado já pode ser considerado limpo. Portanto, a água que cai depois desse período pode ser utilizada. Assim, duas bóias entram em movimento, puxam o pêndulo e fecham automaticamente a saída de água suja e descartável. Isso obriga o restante aproveitável a sair por um tubo lateral. Com o sistema automático, a água passa pelos processos de filtração e cloração orgânica. A aplicação do cloro é feita na quantidade ideal para que possa ser possível o consumo doméstico. No fim desse processo, ela passa pelo filtro mestre, | 151 |


tornando-se potável. Essa etapa de tratamento é realizada por quatro filtros com areias especiais. Finalmente, a água está preparada para ser utilizada até mesmo para beber. O que não for usada fica armazenada em uma cisterna. Quando chover novamente, o ciclo desenvolvido pelo ex-professor se reinicia. Analisada por engenheiros químicos, órgãos governamentais e pela Sanepar, a água cumpriu todas as obrigações técnicas. “Quando dei início aos projetos, as pessoas falavam que eu era louco. Mas mexer com água sempre foi minha paixão. Aos 16 anos, sonhei com ações sustentáveis, mas não sabia que essa palavra era o que definia meu sonho. Hoje, eu me dedico a isso. Trabalho os lugares para que os lugares respeitem o meio ambiente, de modo que as pessoas tenham comida e trabalho”, contou o inventor. O sistema obteve tanto sucesso que se transformou em lei municipal. Em vigência desde 2004, ela determina o reaproveitamento da água em novas construções, o que incluem residências, comércio e indústrias de Curitiba. Os projetos apresentados à prefeitura da cidade para obtenção de alvará seguem a determinação.

O óleo de cozinha tem de ser reciclado O que fazer com o óleo usado? A opção para muitas pessoas é jogá-lo no ralo da pia. Escolha errada. Essa atitude pode provocar entupimentos e refluxos que aumentam os custos de tratamento na rede de esgoto em até 45%, além de causar danos irreparáveis ao meio ambiente. As plantas, por exemplo, não absorvem o óleo. Por essa razão, quando entra em contato com a natureza, ele impermeabiliza o solo, dificultando a absorção da água. Esse processo favorece a ocorrência de enchentes. Ao parar nos rios, por ser mais leve, o óleo fica na superfície, o que impede a entrada de oxigênio e luz. Sem esses elementos naturais, a vida marinha corre sérios riscos. | 152 |


Para piorar, o professor Alexandre D’Avignon, do Centro de Estudos Integrados sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, destacou, em entrevista à Agência Brasil, que a decomposição do óleo de cozinha resulta no lançamento do gás-estufa metano na atmosfera. Estima-se que 1 litro de óleo contamine cerca de 1 milhão de litros de água, volume que representa o consumo de uma pessoa durante 14 anos. Caso uma família consuma 1,5 litro de óleo por mês, uma casa comprometerá o equivalente a 18 milhões de litros de água ao final de um ano. Se levarmos em conta todas as residências do país, somadas ao número de estabelecimentos comerciais, como restaurantes e lanchonetes, teremos ideia da dimensão do problema. Segundo uma pesquisa realizada pelo Departamento de Nutrição da Universidade de Brasília (UnB), se o óleo for reaproveitado várias vezes em um comércio, por exemplo, ele pode comprometer a saúde dos consumidores e causar desde o envelhecimento precoce a doenças degenerativas e cardiovasculares. O estudo mostra que 10 dias de uso aumenta a acidez do produto em quatro vezes, e o índice de gordura saturada fica três vezes maior do que aquilo estabelecido pela lei. Durante o estudo, o pesquisador Márcio Antônio Mendonça encontrou lugares que usavam o mesmo óleo por 20 dias. Mas o óleo de cozinha não é um vilão, desde que tenha um destino apropriado. Ele pode ser usado, por exemplo, na produção de biodiesel. Os integrantes do Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas do Departamento de Química da USP, em Ribeirão Preto, criaram em 2007 o projeto “Biodiesel em casa e nas escolas”. Para conscientizar a população a respeito dos efeitos pre­ judiciais do óleo na natureza, os pesquisadores distribuíram um material didático nas escolas públicas. Além disso, os alunos levavam o óleo usado em casa para a escola. Esses | 153 |


produtos eram juntados com os arrecadados em restaurantes da cidade. No laboratório de química da USP, os pesquisadores transformaram o óleo recolhido em biodiesel, que, quando misturado ao álcool etílico, pode ser usado como combustível. Outro caminho para o óleo de cozinha usado é a transformação em sabão ecológico. Esse é o destino da maioria das coletas, já que pode ser feito até mesmo em casa. Siga a simples receita e faça você também.

Sabão feito com óleo de cozinha usado Ingredientes 2 litros de óleo de cozinha usado; 350 g de soda cáustica em escama; 350 ml de água.

Importante: Cuidado no manuseio da soda cáustica, pois é um material corrosivo. Utilize luvas e óculos de proteção para evitar qualquer acidente. Deixe o sabão em descanso depois de pronto por alguns dias antes de utilizá-lo. Esse intervalo é importante para que a soda cáustica se dissolva. | 154 |

FONTE: ONG Triângulo

Preparo Dissolva a soda cáustica na água em um balde reforçado ou em uma lata de tinta de 18 litros. Reserve. Coloque o óleo, já coado, em um recipiente e leve ao fogo até aquecer em temperatura aproximada de 60º. Apague o fogo e, em seguida, acrescente a soda, já dissolvida, e mexa até engrossar (de 20 a 30 minutos). Após esse tempo, despeje o conteúdo em recipientes e aguarde a secagem.


A ONG que vai atrás do óleo Mas para quem não tem tempo ou disposição de transformar o óleo em sabão, guarde-o, em vez de jogá-lo na pia ou no lixo, para entregá-lo em pontos de entrega voluntária. Em Santo André, cidade do ABC Paulista, um grupo de amigos começou a coletar a substância para reduzir os impactos ao meio ambiente. “A falha no processo de criação das ONGs é que elas não levantam uma bandeira. Podemos dizer que a nossa bandeira é o desenvolvimento sustentável. Apesar de o tema já estar em discussão em seminários, organizados por empresas e universidades, ele não estava presente entre as pessoas comuns, como as donas de casa”, explicou Fabrício França, diretor da ONG Triângulo. Para conscientizar essas pessoas, eles foram de casa em casa promover a campanha “Limpe sua Casa, Recicle Óleo de Co­ zinha”. Na ação, eles escolheram o bairro Santa Terezinha para divulgar o projeto e explicar os danos do óleo descartados de maneira indevida na natureza. A intenção era a de despertar a consciência da necessidade de reciclar. Como forma de prolongar o trabalho, eles produziram a Revista Planeta Cidade, que mais tarde passou a se chamar Revista Mente Urbana, com reportagens que falam do meio ambiente. “O conceito sustentável eleva a importância da participação social e ambiental ao mesmo patamar dos resultados econômicos”, resumiu o diretor. A etapa seguinte é enviar o óleo de cozinha para uma usina, que fica na sede, onde é transformado em sabão por jovens carentes. Uma forma de gerar trabalho para a comunidade. Cada litro de óleo dá origem a seis pedras biodegradáveis de sabão de 200 gramas. Elas são vendidas para as empresas e as pessoas comuns. A venda objetiva que as equipes de agentes coletam o óleo de casa em casa e levam as informações sobre o processo de reciclagem, possam cobrir os | 155 |


custos de suas atividades. A ONG ainda trabalha com a reciclagem de papéis doados por empresas. Esse papel é usado para embalar os produtos. As baterias de celular e pilhas usadas são também recolhidas pelos agentes e, prontamente, encaminhadas para os fabricantes. Depois de alguns anos de atuação, já são 170 postos de entrega voluntária espalhados pela região do ABC, Osasco e Baixada Santista. O trabalho, que tem como fundamento a mobilização para uma cidade mais responsável ecologicamente, conta com divulgação em empresas, escolas, eventos, teatros e arrecada por volta de 15 toneladas de óleo por mês. “Um projeto leva ao outro. A curiosidade, buscando outras formas de organizar a sociedade, resulta em pressão popular. É preciso mudar, e alterações políticas só acontecem com participação das pessoas”, concluiu Fabrício. De acordo com o diretor, é preciso forçar o mercado a se adaptar às questões sociais e ambientais.

As sacolas plásticas não são boas quanto parecem Inventados pelo inglês Alexander Parkes, em 1862, os sacos plásticos alavancaram o impulso consumista e reduziram os custos comerciais da época. Hoje, o uso das sacolinhas, distribuídas em supermercados e lojas, é costume. Práticas para levar produtos e embalagens a qualquer lugar, elas facilitam nossa vida. Em casa, possuem uma série de utilidades, como carregar o lixo, por exemplo. Apesar do sucesso de gerações, essa aparente comodidade traz malefícios para o ambiente que nos rodeia. As sacolas plásticas comprometem o meio ambiente e o futuro do planeta. No Brasil, o lixo é o destino de um bilhão delas todos os meses. As de supermercados, por exemplo, são feitas a partir de um material chamado plástico filme. No país, estima-se que são produzidas 210 mil toneladas de | 156 |


plástico filme. Isso representa quase 10% de todo o lixo do território nacional. Essas sacolinhas, depois de usadas, vão parar em aterros, praias, rios e mares, o que impede a passagem da água, dificulta a decomposição dos materiais biodegradáveis, sufoca animais, entope esgotos, enfim, agride a flora e fauna. Infelizmente, cerca de 90% delas não têm um destino correto. Não se sabe exatamente quanto tempo o plástico leva para se decompor, o que se pode garantir é que demora mais do que 100 anos. Alguns países adotaram medidas para conter o consumo. Em 2002, a Irlanda criou o PlasTax, um imposto cobrado pelo consumo de cada sacola plástica. A iniciativa rendeu bons resultados, porque houve diminuição de 90% do consumo e arrecadação de quase 23 milhões de euros. O di­nheiro foi revertido em projetos ambientais. Já em Bangladesh,­ as medidas foram mais radicais. A produção, a compra e o uso de sacolas de polietileno foram proibidos por lei. O descumprimento da legislação pode resultar em multa ou, até mesmo, em prisão. Uma pesquisa realizada pela Faculdade de Engenharia Mecânica e Instituto de Biologia da UNICAMP, em 2007, nos mercados de Campinas, monitorou a preferência do consumidor. De acordo com a pesquisa, 76,3% dos entrevistados acham que o fato do supermercado oferecer ou não sacola plástica é essencial na hora de escolher onde farão as compras; 90,6% fazem questão que as sacolas sejam de plástico e 11,9% das pessoas não sabem quais problemas elas podem acarretar para o meio ambiente. No Brasil, existem alguns projetos que tentam, ao menos, reduzir o uso. Em julho de 2009, por exemplo, o Rio de Janeiro aprovou uma lei que prevê a substituição das sacolinhas no comércio pelas bolsas de material reutilizável. O prazo estipulado para a troca é de três anos. | 157 |


As padarias adotam o projeto “Sacola Vai e Volta” As padarias brasileiras contam com cerca de 40 milhões de visitas diárias, ou seja, 1,2 bilhão de visitas mensais, o que equivale de 700 a 800 consumidores por dia em cada padaria. Supondo que seus clientes deixassem de usar uma sacola plástica por visita, isso representaria uma redução diária de 40 milhões. Para alcançar essa meta, a Associação das Padarias, ao lado do Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria de São Paulo, lançou em 2007 o projeto “Sacola Vai e Volta”. Segundo o levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria, 27% das pessoas vão à padaria mais de uma vez ao dia. São 16 visitas mensais por consumidor. “Com o número de visitas que temos por dia, ao lado da constatação do grande prejuízo provocado pelas sacolas de plástico ao meio ambiente, surgiu a ideia do projeto Sacola Vai e Volta”, explicou Antônio Rodriguez, responsável pelo departamento de marketing da Associação das Padarias do Estado de São Paulo. Além de reduzir o número de sacolas plásticas, o objetivo da campanha é incentivar a substituição delas por outras formas de embalagens, como as sacolas de tecido, por exemplo. “Só na Grande São Paulo, cerca de 300 padarias aderiram à campanha. Como o projeto foi adotado pelo ABIP (Associação Brasileira da Indústria de Panificação e Confeitaria), que é nossa associação nacional, o projeto está em quase todos os estados”, contou Rodriguez. Outra meta do “Sacola Vai e Volta” é conscientizar os pani­ ficadores a usar materiais que possam ser reciclados, como sacos de papel, nas lixeiras. “O papel pode ser obtido através da reciclagem e de florestas plantadas para o fim específico de produção. O descarte do papel é infinitamente menos agressivo à natureza que o de plástico”, comparou Rodri| 158 |


guez. O saco de farinha também deve ser reaproveitado para confecção de sacolas permanentes, distribuídas e vendidas durante a campanha. A substituição das sacolas plásticas traz também benefícios financeiros. A Associação das Padarias calcula que, com o fim das embalagens plásticas, a redução de custos para os estabelecimentos é de, no mínimo, 20%.

Os supermercados também estão dentro A rede Wal-Mart conta com 345 unidades, entre elas o WalMart Supercenter, Sam´s Club, Bompreço, Hiper Bompreço, Todo Dia, Maxxi, Mercadorama, Big e Nacional, espalhadas pelo Brasil desde 1995. Com tantas lojas construídas e clientes para atender, a rede consumiu, somente em 2008, 1,4 bilhão de unidades de sacolas plásticas. Isso corresponde a 5,32 mil toneladas de resina plástica. “O nosso objetivo é reduzir 50% do consumo das sacolas plásticas até 2013”, definiu Paulo Roberto Roitberg, responsável pelos assuntos corporativos do Wal-Mart Brasil. Para evitar o desperdício, a empresa lançou um projeto piloto nas filiais de Curitiba. A intenção era mostrar alternativas para a substituição das sacolas plásticas. O resultado foi que caixas e sacolas de papel apresentaram um alto índice de rejeição. A sacola de tecido, por outro lado, foi a opção mais aceita pelos clientes. A partir dessa constatação, as sacolas de algodão passaram a tomar conta das lojas brasileiras do Wal-Mart. “Mais de 70 mil funcionários receberam as sacolas, e 838 mil já tinham sido vendidas até o final de 2008”, destacou o executivo. As cidades de Recife e Salvador também foram palcos de projetos que visam a sustentabilidade por meio da redução desse material. A iniciativa foi implantada nas lojas do Bompreço e Hiper Bompreço no fim do ano passado. Cada cliente, que opta por | 159 |


não usar uma sacola plástica, ganha R$ 0,03 de desconto nas mercadorias, valor referente ao custo de produção de uma unidade. O desconto só é dado a cada cinco itens comprados. O projeto teve um ótimo resultado: em dois meses, houve uma redução de um milhão de sacolas plásticas em circulação. Elas deixaram de ser usadas pelos consumidores. Em algumas lojas da rede, há um porta-sacola no caixa, o que evita o consumo exagerado, já que só uma sacolinha por vez é liberada. A advogada Nadir Fachin Pereira usou sacolas plásticas por mais de duas décadas. Há um ano, resolveu substituílas pelas de tecido nas compras, por exemplo, de mercado. Apesar de considerar as plásticas mais práticas do que as de tecido, Nadir decidiu deixar para trás o costume para apos­ tar em um comportamento responsável. “Resolvi alterar o hábito para diminuir o consumo das sacolinhas. É uma tentativa de frear a produção de plástico para garantir o futuro do nosso planeta”, disse. Há dois anos, a psicóloga Solange Matilde da Silva ganhou uma sacola de tecido. A partir daí, parou de usar as de plástico. Para ela, aquelas feitas de tecido são resistentes, espaçosas e fáceis de pendurar no ombro, o que facilita o transporte dos produtos. No entanto, Solange chama a atenção para o preço das sacolas ecológicas que ainda se encontra em um patamar elevado. “O preço está alto, impedindo que as pessoas de menor poder aquisitivo possam comprar. É preciso realizar campanhas promocionais que incentivem a aquisição das novas sacolas”, opinou.

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Parte 5

dicas e ideias

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Dicas de economia alternativa para voceˆ adotar no seu dia a dia

em Casa Não deixe que seu lixo reciclável tenha contato com a água Muita gente já se conscientizou a respeito da necessidade de separar o lixo para a reciclagem. Certifique-se que o material está protegido da água, porque, se estiver úmido ou mofado, estraga e impossibilita o reuso. O ideal é manter o lixo em local seco e coberto. Se não for possível, utilize tampas ou forros para cobrir as latas de lixo.

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Prefira a vassoura e o balde Quando for lavar a calçada ou o quintal, evite usar a mangueira. Prefira a vassoura e o balde. Antes de jogar água, varra o local para retirar a sujeira mais grossa e, depois, use o balde para jogar água. Encha o balde quantas vezes forem necessárias, mas não use a mangueira. Ao fazer isso, você economizará até 250 litros de água na limpeza. O mesmo pode ser feito para lavar o carro, já que, com uma mangueira semiaberta, são gastos 560 litros na ação. Se o serviço for feito com um balde, o consumo cai para 40 litros.

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Tenha plantas dentro de casa A poluição das cidades faz com que a qualidade do ar que respiramos seja lastimável. Com uma medida simples, você pode melhorar a qualidade do oxigênio dentro do seu lar. Tenha plantas que absorvam o gás carbônico e purifiquem o ar. Elas ainda minimizam o efeito do cigarro, dos escapamentos dos

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veículos e dos produtos tóxicos, como os artigos de limpeza, a gasolina e as tintas de parede. Espécies de plantas, como Gérbera, Jibóia, Babosa, Espada de São Jorge, Crisântemo, Lírioda-paz e Lírio Amarelo, possuem em suas raízes bactérias que transformam os poluentes, com destaque para o monóxido de carbono, o benzeno e a fumaça do cigarro em nutrientes para a planta. Elas ainda embelezam o ambiente e proporcionam a você e sua família contato com um pouco de natureza. Diminua o volume de água para regar suas plantas Preste atenção no clima. Se a chuva estiver ameaçando, espere e não molhe com a mangueira as suas plantas. Use o que a natureza oferece: a água da chuva. Caso o dia continue ensolarado, sem indicação de nuvens pesadas, prefira regar as suas plantas no início da manhã ou à noite. Com menos calor, as plantas ficarão, por mais tempo, molhadas. Não se esqueça, a água é um recurso finito e já está em falta em algumas regiões do mundo.

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Tenha lâmpadas fluorescentes Trocar as lâmpadas comuns ou incandescentes pelas fluorescentes pode ser uma alternativa para economizar energia, reduzindo, assim, o uso dos recursos naturais. De acordo com um estudo realizado pelo IDEC (Instituto de Defesa do Consumidor), as lâmpadas fluorescentes chegam a ser 79% mais econômicas e produzem 70% menos calor que as incandescentes. Como resultado, há uma redução da necessidade do uso do ar-condicionado e do ventilador. Isso representa uma redução de 20% a 30% na conta de luz de uma residência. Além de mais econômica, a lâmpada fluorescente tem maior durabilidade, já que sua vida útil pode ser até dez vezes maior que a incandescente. Com a ideia de incentivar as pessoas a diminuir o consumo de energia, o movimento 18seconds.org foi criado nos Estados

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Unidos. Segundo os idealizadores, o tempo que se leva para trocar uma lâmpada comum por outra fluorescente é de apenas 18 segundos. A economia de energia gerada pela simples mudança evitou, naquele país, a queima de 3,3 milhões de toneladas de carvão. Isso significa que 14,2 milhões de toneladas de dióxido de carbono deixaram de ser lançados na atmosfera. Outra maneira de economizar energia elétrica é abusar da iluminação natural. Facilite a entrada de luz natural com janelas altas e cortinas abertas, assim você estará aproveitando o que a natureza lhe proporciona. Use garrafa térmica para manter a água gelada Como a geladeira é um dos eletrodomésticos que mais consomem energia elétrica, nada melhor que evitar o abrefecha da porta. Com o calor se aproximando, para ter água gelada sem precisar abrir a porta muitas vezes ao dia, compre uma garrafa térmica para abastecê-la com água gelada e muitos cubos de gelo logo pela manhã. Você terá água refrescante até a noite sem gastar energia de forma exagerada.

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A – Como

cuidar da limpeza de suas roupas sem agredir o meio ambiente

Junte várias peças antes de ligar as máquinas Acumule roupas e louças quando for usar a máquina de lavar, secadora e lava-louças. Evite usar os eletrodomésticos quando houver poucas peças. Com esse cuidado, você estará economizando água e energia utilizadas por esses equipamentos, além de contribuir para diminuir a produção dos nocivos, do ponto de vista ambiental, produtos químicos.

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Use água fria para lavar as roupas Para quem lava as roupas na máquina, escolha um ciclo de lavagem que utilize água fria. Engana-se quem imagina que

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o resultado da lavagem será diferente se apenas utilizar a água quente. A maior vantagem está na queda do consumo de luz. Para aquecer a água, a máquina precisa gastar mais energia. Você ainda pode reaproveitar a água da máquina de lavar roupa para lavar o quintal. Faça o teste. Seque as roupas no varal Após a lavagem das roupas, pendure-as em um varal, em vez de secá-las na secadora. Usar esse tipo de máquina, ao longo de seis meses, pode significar a emissão de 317 quilos de gás carbônico na atmosfera, além de consumir muita energia. A dica é deixar por conta da natureza, um processo barato, e que não danifica as roupas, como pode acontecer se você utilizar em excesso a máquina de secar.

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Retire manchas das roupas com produtos naturais A primeira reação, quando aparece uma mancha de vinho ou tinta de caneta nas roupas, é procurar os alvejantes comuns para limpar. Se você quer ser responsável com o meio ambiente, aqui vai uma dica: misture amido de milho com leite até formar uma pasta. Aplique na mancha, deixe a roupa secar e lave. O resultado é satisfatório. A mancha desaparecerá sem precisar aplicar nenhum produto químico. Se a sua mancha for escura ou feita em tecidos grossos, como carpetes e tapetes, sem que seja eliminada em uma única lavagem, você pode repetir a operação quantas vezes precisar.

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Tome cuidado para passar as roupas Um dos eletrodomésticos que mais consomem energia elétrica é o ferro de passar, mas você pode reduzir a conta de luz com algumas recomendações básicas. Só ligue o ferro quando tiver uma quantidade razoável de roupas para passar. Enquanto o ferro esquenta, comece passando as peças mais de­ licadas. Esse cuidado é suficiente para resolver o amassado sem

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danificar o tecido com o calor. Preste atenção na temperatura. Não há necessidade de deixar o ferro em alta temperatura o tempo todo. Outra dica é desligar o ferro no final, aproveitando o calor que ainda resta, para passar as roupas leves. Evite também ligá-lo nos horários que outros aparelhos, como máquina de lavar e secadora, estiverem em funcionamento pelo risco de causar sobrecarga elétrica.

B – Economize e poupe o meio ambiente na cozinha e no banheiro

Não deixe a torneira da pia aberta Muita gente tem o costume de deixar a torneira aberta enquanto escova os dentes ou lava a salada. Isso pode significar até 80 litros de água desperdiçados por escovação e limpeza. Uma alternativa é deixar um copo para ajudá-lo a enxaguar a boca e usar bacias para lavar a salada. De acordo com dados do portal Ecodesenvolvimento, uma torneira aberta gasta de 12 a 20 litros de água por minuto. Caso ela fique pingando, serão 46 litros jogados literalmente fora todos os dias. Ao fazer a barba em 5 minutos, com a torneira meio aberta, gastam-se até 12 litros de água. Se usar a pia como um tanquinho, o consumo cai para 2 litros.

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Reduza o tempo no banho Você não precisa tomar um banho demorado para que esteja cheiroso. Em, no máximo, dez minutos, qualquer sujeira do corpo é removida. Um banho de 15 minutos gasta cerca 240 litros de água. Economizar no banho significa evitar desperdício de água e de energia elétrica. Vale pres­ tar atenção no tipo de chuveiro que você tem em casa. Os modelos movidos a aquecedor solar ou a gás gastam menos energia, mas consomem duas vezes mais água no processo de aquecimento.

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Não use produtos químicos para desentupir a pia Não se desespere. Se o ralo da pia ou o vaso entupir, não é preciso jogar produtos químicos nem chamar a desentupidora. Você mesmo pode usar o bom e velho desentupidor, seguindo algumas dicas: 1. Solte a gordura com água fervendo na pia ou no vaso entupido; 2. Se isso não resolver, encha com água a pia e o vaso. Pressione o desentupidor para baixo. Faça movimentos para cima e para baixo até a saída abrir para levar toda a água bloqueada.

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Nunca jogue óleo na pia Muitos cozinheiros costumam jogar o óleo de co­ zinha usado no ralo da pia. O problema é que a gordura do óleo tem a infeliz capacidade de entupir o encanamento, o que atrapalha o tratamento do esgoto. Sem contar que muito desse esgoto sem tratamento contamina a água de rios e represas, causando a morte dos animais de diferentes espécies que vivem nesses locais. A solução para que o óleo de cozinha usado não vá para a rede fluvial de esgoto está no envio para os locais apropriados de descarte. Basta armazená-lo em um recipiente de vidro fechado e levá-lo para diversos centros especializados que recolhem esse material para reutilizá-lo, por exemplo, na fabricação de sabão. Essa é uma ideia sustentável, bem como solidária, já que muitas comunidades estão se sustentando com o dinheiro da venda de sabão fabricado com o óleo de cozinha.

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C – Gaste menos energia com os eletrodomésticos Programe sua TV para desligar sozinha e reduza o brilho da tela Tem muita gente que não consegue dormir sem a luz acesa ou o televisor ligado. Para que você não os deixe funcionan-

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do no restante da noite, adquira o hábito de utilizar o “timer”, mecanismo que desliga os aparelhos automaticamente após o tempo programado. O resultado será comprovado no final do mês quando a conta de luz chegar. Você vai perceber como essa pequena atitude valeu a pena. Agora faça o teste, tente desligar a TV ao menos uma noite por semana. No lugar do seu programa preferido, leia um livro, brinque com as crianças, pratique algum esporte ou até mesmo durma mais cedo. Você se sentirá muito bem no dia seguinte. Segundo o portal Planeta Sustentável, reduzir a opção de brilho do seu aparelho de TV também é uma forma de diminuir o consumo de energia em até 50%. Essa iniciativa fará com que a vista fique menos cansada. Desligue seus aparelhos mesmo quando estiverem em “stand by” Desligar os eletrônicos até mesmo quando estão no modo de espera (“stand by”) parece algo sem importância, mas se engana quem pensa que aquela “luzinha vermelha” do DVD, do micro-ondas, monitor de computador, TV, home theater e dos outros aparelhos não consome energia. É verdade que eles estão programados para consumir o mínimo. Mesmo assim, toda ação é bem-vinda na hora de fazer economia. Portanto, assim que terminar de usar o seu equipamento, tenha o hábito de desligá-lo da tomada. Não deixe a insistente luzinha acesa. Isso faz com que você não gaste sem necessidade, principalmente quando for passar alguns dias longe de casa. Por fim, esse cuidado evita que durante as suas férias, por exemplo, uma forte descarga elétrica queime os aparelhos. Veja a seguir uma tabelinha que o PRO TESTE (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor) criou para mostrar o quanto os eletrodomésticos gastam quando permanecem ligados no modo “stand by”.

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Aparelho

Potência (W)

Gasto mensal (R$)

Gasto anual (R$)

Televisão

7

1,49

17,88

Videocassete

12

2,55

30,60

DVD

17

3,61

43,35

Rádio relógio

2

0,43

5,16

Micro-ondas

5

1,06

12,72

Recarregador de bateria

3

0,64

7,68

Secretária eletrônica

3

0,64

7,68

Telefone sem fio

4,5

0,96

11,52

Micro system

6

1,28

15,36

Som portátil

2,5

0,11

1,32

-

12,77

153,27

TOTAL

Evite abrir a porta do forno Sabe aquela “aberturinha” que damos para olhar o bolo que está assando? Ela é responsável pela dissipação do calor interno, ou seja, o equipamento vai trabalhar mais para conservar o calor. Isso significa um gasto maior de energia no processo. Evite, portanto, abrir a porta do forno antes que o prato esteja pronto para comer. Para os que não conseguem ficar sem dar uma “olhadinha”, acenda a luz interna, uma vez que a maioria dos fornos dispõe desse recurso.

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Não deixe a porta da geladeira aberta Tenha cuidado para não deixar a porta aberta da geladeira quando você for abri-la para pegar ou guardar algo. Isso faz com que a temperatura interna do eletrodoméstico suba, o que obrigará o motor a consumir mais energia para mantê-lo frio. Como resultado, sua conta de luz virá mais cara. Se a sua geladeira, mesmo que esteja fechada, dissipar calor, significa que a borracha de vedação perdeu sua função. Mantenha seu

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equipamento com a manutenção em ordem. Sempre que for preciso, não hesite em trocar a borracha de vedação. Faça o teste para saber se a borracha precisa ser trocada: prenda uma folha na porta, feche-a e puxe o papel. Se a folha sair sem rasgar, está na hora de trocar. Descongele em temperatura ambiente Lembre-se de retirar os alimentos que estão congelados no freezer pelo menos três horas antes de consumi-lo. Ao fazer isso, você evita utilizar o forno de micro-ondas para descongelar. Outro caminho é descongelar em banho-maria no fogão. O micro-ondas é um dos eletrodomésticos que mais consome energia elétrica, portanto, sempre que puder, deixe de utilizá-lo.

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Use despertadores de corda Se você faz parte do grupo de pessoas que vive perdendo a hora para levantar e ainda sofre com os inoportunos blecautes da madrugada, dias em que o despertador simplesmente apaga, relaxe! Você pode utilizar um despertador movido à corda. Ele é mais sustentável que os digitais por não precisa de eletricidade nem baterias para funcionar. E, acima de tudo, nunca vai te deixar na mão, já que só depende de você mesmo para funcionar.

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D – ­Economia com os alimentos Coma antes de ir ao mercado Um estudo mostra que as pessoas com fome compram mais comida, consequentemente levam para casa produtos em exagero, que normalmente serão jogados no lixo. A ideia, mais uma vez, é simples: alimente-se para ir ao supermercado. Faça um lanche e nunca vá às compras de barriga vazia, assim ficará mais fácil comprar somente o necessário.

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Faça compras toda semana ou a cada 15 dias Existe uma grande chance nas compras mensais de levar para casa produtos desnecessários. O hábito de estocar os alimentos faz você comprar o que acha que precisará, não aquilo que realmente vai consumir. A probabilidade de suas compras saírem mais caras no final do mês é gigante. Muitos produtos têm um prazo de validade curto e, se não forem consumidos até a data certa, vão parar na lata do lixo. Prefira realizar as compras do mercado semanalmente ou a cada 15 dias. Dessa maneira, você compra produtos sempre fres­quinhos e só leva para casa o que for realmente consumir.

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Vá à feira livre Pode parecer antiquado, mas ir à feira livre é um hábito consciente e econômico, uma vez que os alimentos são comprados frescos. Como a feira está montada no mesmo lugar em um determinado dia da semana, suas compras de legumes, frutas e vegetais podem ser feitas toda semana, sem a necessidade de comprar demais, além da conta, para manter alimentos na dispensa.

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Não toque nos alimentos quando for escolher Quando for ao mercado ou à feira, não toque nos alimentos expostos, como frutas, legumes e verduras. Toda vez que eles entram em contato com a nossa mão, aumentam as chances de apodrecerem de maneira mais rápida. Quando estão podres, não há outra opção a não ser jogá-los no lixo. O desperdício não pode ocorrer. Decida antes o que vai levar e somente toque nos seus produtos.

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Prefira frutas e legumes da época Algumas frutas, como morango e caqui, não são cultivadas o ano inteiro. São as chamadas frutas da época. A natureza trabalha em fases, de acordo com as estações do ano.

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Por essa razão, alguns alimentos estão disponíveis no verão e outros, no inverno. Mas como temos todos eles o tempo inteiro no mercado e nas feiras livres? Por meio do cultivo em um processo chamado de inseminação, que utiliza maior volume de água, além de grande quantidade de agrotóxicos, os consumidores, à custa da contaminação do solo, têm acesso a todas as frutas no momento que desejarem. Se você quer entrar para o time dos conscientes, compre hortaliças, legumes e frutas na época correta. Dessa forma, você estará levando para casa somente vegetais frescos, mais saudáveis e, geralmente com o preço mais em conta, devido ao aumento da oferta. Se puder, prefira os orgânicos, ou seja, que não utilizam agrotóxicos no seu cultivo. Não compre ovos em embalagens plásticas ou de isopor Toda vez que for comprar ovos, preste atenção na embalagem que você vai levar para casa. Algumas marcas utilizam emba­ lagens plásticas ou de isopor para transportar os ovos. Esse tipo de material é prejudicial para o meio ambiente. Quando for ao mercado ou à feira livre, compre os ovos que estiverem em embalagens de papelão, já que o material é 100% reciclável. Outra dica, algumas barracas de ovos da feira livre costu­mam dar descontos aos clientes que trazem a própria embalagem para levar os ovos. Vale a pena guardar a sua embalagem de papelão e levá-la quando for à feira. Além da preocupação com o meio ambiente, você estará economizando uns bons trocados.

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Evite embalagens individuais Lembre-se, quando for comprar algum produto pronto para comer, como um pacote de biscoito ou até uma refeição congelada, prefira as embalagens maiores. O processo de produção e de empacotamento dos produtos traz reflexos ruins para o meio ambiente, como o esgotamento dos

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recursos naturais. Se você for comprar um pacote de papel higiênico, por exem­plo, escolha a embalagem chamada econômica, que além de trazer mais unidades a um custo unitário menor, ainda ajuda a reduzir a quantidade de embalagens sendo produzidas todos os dias. Não deixe suas panelas destampadas Essa dica vai para os cozinheiros de plantão. Quando colocarem em prática as habilidades culinárias, evitem deixar as tampas das panelas abertas, porque, enquanto as panelas estão tampadas, o aproveitamento do calor interno é maior. Dessa forma, com um cozimento mais rápido, você economiza nos gastos com gás.

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Prepare várias refeições em um dia e congele todas elas Reserve um dia para preparar as refeições para o restante da semana. Deixe os alimentos no congelador. Quando for comer, você só precisa aquecê-los. Essa ideia economiza água, os ingredientes que compõem cada prato, energia elétrica, gás de cozinha, e o seu tempo, porque você não precisa cozinhar todos os dias. O processo de congelar e esquentar no microondas é mais econômico para o bolso que o de utilizar o fogão diariamente para preparar algo novo.

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Adoce com mel Usar o mel para adoçar sucos, chás, cafés, bolos e do­ ces é uma prática saudável. Escolher essa maneira de adocicar, em substituição ao açúcar e adoçante, faz bem à saúde por não contar com quase nenhum produto químico no processo de fa­ bricação. Ao contrário dos produtos industrializados, principalmente o adoçante, que possuem muita química na sua fórmula. Através de uma pesquisa realizada pela Fundação Ramazzi-

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ni, na cidade italiana de Bolonha, os cientistas provaram que as cobaias, submetidas a uma alimentação com excesso de aspartame (adoçante sintético), apresentaram aumento no risco de contrair câncer. De acordo com os pesquisadores, foram misturadas doses diferentes de aspartame na ração de 1800 cobaias por três anos. O resultado indicou que uma em cada quatro cobaias fêmeas (25%) teve leucemia. Elas consumiram apenas a metade do que é permitido aos seres humanos. Em outra pesquisa realizada pela Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, o consumo em grande quantidade do adoçante pode ocasionar efeitos maléficos no cérebro, como perda de memória, dependência do produto e, até mesmo, insônia. Assim, prefira o mel, um produto natural, amigo, portanto, do meio ambiente. Normalmente, o produto é embalado em potes de vidro, bem distante do terrível plástico, que leva muito tempo para se decompor. Não use o plástico filme De acordo com uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCCRUZ), o plástico filme, bastante utilizado para cobrir os alimentos, pode transferir substâncias cancerígenas para os alimentos, principalmente aqueles mais gordurosos. Para piorar, eles demoram centenas de anos para serem eliminados do planeta. Seja consciente, evite o uso do plástico, utilizando embalagens reaproveitáveis ou travessas de vidro com tampa para guardar a comida.

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Reduza o uso de descartáveis em festas Toda vez que você for dar uma festa, lembre-se de não comprar copos, talheres e pratos descartáveis. Eles são muito procurados para evitar acidentes com a sua louça e o trabalho de ter de lavar tudo no final, mas pense na quantidade de lixo não degradável que a sua festa produzirá. Seja mais “ecofriendly”, ou seja, “amigo da natureza”, e compre utensí-

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lios de plástico duro. Eles são baratos, não quebram e podem ser usados várias vezes, você só terá que lavar as peças usadas. Nada que não possa ser feito em nome de um mundo agradável para as futuras gerações. Não use guardanapos de papel Antigamente, era comum a utilização dos guardanapos de pano nas refeições. Hoje, associado a ambientes sofisticados, esse tipo de guardanapo é muito pouco utilizado nas residências. Substituído pelo guardanapo de papel, que facilitou a vida das pessoas por ser descartável, esse modelo gera muito lixo. Para produzi-los, árvores são derrubadas aos montes. Prefira os guardanapos de pano, que podem ser reutilizados após a lavagem. Por outro lado, os guardanapos de papel são positivos, do ponto de vista sustentável, se forem fabricados com papel reciclado e com celulose de florestas reflorestadas. Nesse caso os de pano ficam para trás por consumirem água, produtos químicos e energia elétrica em abundância.

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COM HIGIENE PESSOAL Deixe os cabelos secarem naturalmente As mulheres, normalmente, são as que mais utilizam o secador de cabelo em casa. Pode não parecer, mas o equipamento consume muita energia e ainda danifica os fios do cabelo se usados com muita frequência sem nenhuma aplicação de produtos específicos voltados para a hidratação. Para evitar que as suas madeixas ressequem e a sua conta de luz estoure, deixe os seus cabelos secarem naturalmente.

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Troque o desodorante spray Pode parecer estranho, mas alguns desodorantes spray têm componentes que potencializam o aquecimento global.

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Na bombinha que libera o perfume, o gás CFC, igualmente chamado de clorofluorcarbono, também sai. O CFC contribui para a destruição da camada de ozônio cuja responsabilidade é de proteger plantas, animais e seres humanos dos perigosos raios ultravioletas. Essa força do sol pode causar o aumento, por exemplo, da incidência de câncer de pele. Fique atento, prefira os modelos de desodorante roll-on, se não encontrar um modelo que agrade ou não puder utilizá-lo por outro motivo, certifique-se que estará comprando uma marca de desodorante spray que não provoque danos à camada de ozônio. Observe com atenção o rótulo. Se não vier nenhuma informação desse tipo na embalagem do produto, entre em contato com o SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) e exija explicações. Você também é responsável pela fiscalização dos fabricantes que não seguem as regras em vigência. Diga não à acetona Caso alguma manicure queira tirar o esmalte das suas unhas com acetona, diga não! O produto representa um risco para sua saúde e para o meio ambiente, porque contém su­bs­ tâncias tóxicas que evaporam rapidamente. Consequentemente, a acetona pode irritar a pele, enfraquecer as unhas, machucar a cutícula e trazer desconforto respiratório para quem é alérgico ao produto. Em casos mais graves, a ingestão acidental da substância química pode levar à morte. Por isso, prefira remover os esmaltes com óleo de banana. O processo de remoção é um pouco mais demorado, mas, você protege a sua saúde e contribui com o meio ambiente.

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Use esponja vegetal É comum nas casas e restaurantes usar as buchas verdes e amarelas para lavar a louça. Saiba que elas não são

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nem um pouco sustentáveis, porque são fabricadas com produtos derivados do petróleo. Sem falar da agressão ao meio ambiente quando são descartadas. Para alterar essa situação, o caminho é utilizar as buchas ve­ getais, compradas em feiras livres e mercados. Além de baratas, elas são feitas com fibra 100% naturais, são biodegradáveis, higiênicas, duráveis e podem ser reutilizadas várias vezes depois de serem fervidas ou mergulhadas em uma solução de água com cloro por cerca de 30 minutos. Elas também podem ser utilizadas durante o banho, ajudando a eliminar as células mortas e deixando a pele mais macia e saudável. Só não exagere nos movimentos para não machucar sua pele.

COM TRANSPORTE Dê e peça carona Hoje em dia, um dos maiores problemas dos grandes centros urbanos são os congestionamentos intermináveis. Com um sistema de transporte público ineficiente, as pessoas não desgrudam de seus veículos. Nos horários de pico, é praticamente impossível se locomover na cidade, fato que deixa, claro, as pessoas estressadas. A poluição do ar nas principais cidades está em níveis alarmantes. Infelizmente, a maioria dos carros circula com apenas um ocupante. A carona solidária pode mudar essa situação. Ou seja, um grupo de colegas, com trajetos parecidos, estabelece um revezamento para retirar o carro da garagem. Cada dia da semana é reservado para o carro de um dos amigos. Para facilitar o encontro de pessoas com caminhos seme­ lhantes, alguns portais foram criados, com destaque para o ECarona (www.ecarona.com.br), que cadastra o usuário interessado em pegar e oferecer caronas. Essa iniciativa consciente

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mostra a preocupação dos cidadãos com os problemas do trânsito, da poluição e da economia em combustível e no uso do estacionamento. Passe a fazer o mesmo. Evite sair no horário de ‘rush’ Nem sempre é possível sair nos horários que não sejam de pico. Se você puder escolher, saia de seus compromissos em horários considerados tranquilos, de menor circulação, quando as ruas estão mais vazias. Assim, você estará poupando o seu tempo, resguardando a sua saúde, economizando no combustível e, o mais importante, deixando o estresse para trás.

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Deixe o carro em casa Você já pensou que pegamos o carro para comprar pão ou remédio na esquina de casa? O que você acha de começar a utilizar mais as suas pernas para roteiros curtos? O hábito de caminhar traz uma série de benefícios para você e sua cidade, a começar pelo desafogamento do trânsito. Com menos automóveis nas ruas, ocorre a diminuição da emissão de gases-estufa, como o dióxido de carbono, além de economizarmos na gasolina. Acima de tudo, criamos o costume de praticar constantemente exercícios físicos, fundamentais para nosso bem-estar. Certamente, a cultura do carro não desaparecerá de uma hora para outra, mas é fundamental um começo. Se cada um utilizar menos o seu veículo, espalhando essa ideia, quem sabe mais pessoas passem a fazer o mesmo e percebam que nossas vidas poderão melhorar com menos automóveis nas ruas. Quando o seu trajeto for mais longo, por que não pegar uma bicicleta? Andar de bike é ótimo para exercitar as pernas. Uma enorme contribuição para o meio ambiente. A ONG Rodas da Paz faz um trabalho de conscientização da população, principalmente dos motoristas, para aderir à bicicleta. É importante também que as pessoas respeitem os

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ciclistas no trânsito. Vale a pena conhecer o projeto no site http://www.rodasdapaz.org.br Troque o elevador pela escada Deixe a preguiça de lado e experimente trocar o ele­ vador pela escada se você tiver que subir ou descer poucos andares. Isso fará bem à saúde, economizará eletricidade e ainda reduzirá a procura pelo equipamento nos edifícios muito movimentados. De acordo com uma pesquisa realizada por cientistas do Hospital Universitário de Genebra, na Suíça, abandonar o uso de elevadores e escadas-rolantes ajuda a melhorar o condicionamento físico, diminuir a gordura corporal e os riscos de infarto. Outra informação interessante mostra que existe uma queda de 15% nas chances de morrer prematuramente por qualquer que seja a doença. Incentive os seus familiares, amigos e colegas de trabalho a subir escadas.

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E – Cuide da manutenção do seu carro Calibre sempre os pneus É sua obrigação cuidar da manutenção do seu carro. A começar pela calibragem dos pneus. Uma calibragem errada pode comprometer a segurança dos usuários do automóvel e ainda prejudicar o desempenho do carro, ou seja, gastar mais combustível. Confira a cada 15 dias se os pneus do seu veículo estão com a calibragem correta. Para saber o volume ideal de ar para cada pneu, consulte o manual do proprietário.

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Faça revisão periódica em seu veículo Caso você regule o motor do seu carro, estará poluindo menos o ar, pois reduzirá a emissão de dióxido de carbono, gás poluente que sai do escapamento. O CO² aumenta a tempera-

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tura global, sendo um dos causadores do aquecimento global, grande preocupação ambiental dos nossos dias. Lembre-se de marcar a revisão do motor de acordo com as orientações do fabricante, que estão no manual do proprietário. Desligue o motor durante os congestionamentos Uma forma fácil e consciente de diminuir um pouco a fumaça que sai dos veículos nos congestionamentos é desligar o motor enquanto o trânsito está parado, principalmente dentro dos túneis. Dessa maneira, você economiza combustível e ainda diminui a fumaça emitida na atmosfera.

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Evite ligar o ar-condicionado do carro Naqueles dias em que o calor na rua está insuportá­vel, aliado ao trânsito lento, você entra no carro e, prontamente, agradece por ter escolhido um modelo com ar-condicionado. Sem demora, não hesita em ligar o equipamento na temperatura mínima para sentir o corpo resfriar o mais rápido possível. O desconforto dá lugar ao alívio. Esse privilégio oferecido pelo ar frio, entretanto, tem seus riscos. Visivelmente inofensivo, o ar-condicionado pode causar sérios problemas à saúde e ao meio ambiente, por isso evite ligá-lo sem necessidade. Um das doenças mais comuns causadas pelo choque térmico do gelado ar-condicionado com o corpo quente é a nevralgia, um tipo de derrame que paralisa um lado do rosto, enfermidade comum em pessoas que sofreram um choque de temperatura muito grande. Com fisioterapia, massagens, injeções de botox no músculo e sessões de acupuntura, é possível reverter, em alguns casos, o efeito da paralisia. Para determinadas pessoas, a doença pode ser irreversível. A melhor forma de evitar o choque é reduzir, aos poucos, a temperatura do aparelho, sem permitir que as paletas emitam o vento direto no ocupante do veículo. Quem abusa do ar-condicionado também é mais suscetível

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a gripes, resfriados, dores de cabeça, problemas respiratórios e rinite, a famosa alergia. Para evitar as dores no corpo e os resfriados, mantenha a temperatura dentro o carro numa dife­ rença máxima de 5Cº em relação à temperatura externa. Faça revisões periódicas no equipamento para garantir um produto de qualidade. O meio ambiente também sofre com os efeitos do ar-condicionado, principalmente dos veículos fabricados até 1994. Eram utilizados os gases CFC, R12 ou freon para alimentar o ar-condicionado. Esses gases são um dos responsáveis pelo aumento do buraco da camada de ozônio, como explicamos em uma das dicas anteriores. Após essa data, os veículos fa­ bricados já utilizam os gases 134A ou HFC, chamado de gás ecológico, que não causam danos à camada de ozônio. Fique atento, exija que o seu carro tenha o gás ecológico no ar-condicionado e, sempre que possível, desligue o aparelho para poupar combustível. Abasteça seu carro flex só com álcool Se você tem um carro flex, que pode ser abastecido tanto com álcool quanto com gasolina, prefira a primeira opção. O álcool continua sendo menos poluente que a gasolina, proveniente do petróleo, fonte de energia longe de ser renovável. Além da vantagem ambiental, o álcool é mais barato que a gasolina. O rendimento do combustível no motor se mostra tão bom quanto com gasolina.

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NO GERAL Não use saquinhos plásticos para recolher o cocô do seu cachorro É cada vez maior o número de animais de estimação em nosso país. Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Ali-

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mentos para Animais de Estimação, a Anfal Pet, a estimativa é de que há 32 milhões de cachorros, quase a população de idosos brasileira ou, caso prefira, a população total do Canadá. Isso significa que o Brasil tem a segunda maior população de cães do planeta, inferior apenas à existente nos Estados Unidos. Ainda de acordo com a Anfal Pet, em 2008, os cachorrinhos devoraram mais de 1,6 milhão de toneladas de ração, o que resultou em uma montanha superior a 1 milhão de toneladas de cocô. Agora, imagine isso tudo nas ruas, ou melhor, dentro dos saquinhos plásticos. Talvez seja melhor deixar para lá. Parece muito? É mesmo. Quando levar seu bichinho para fazer cocô nas ruas, praças e até dentro de casa, recolha as fezes usando algum material biodegradável, como papel, jornal e sacolas biodegradáveis. Algumas sacolinhas, que ainda não são ecológicas, demoram muito tempo para se decompor na natureza, enquanto que o cocô, em apenas uma semana, vira adubo. Se em cada passeio for gasto um saquinho, ao final do ano o acúmulo de plástico será de milhões de toneladas nos lixões do país. E também fere o conceito de cidadania deixar o cocô espa­ lhado nas ruas. Aposto que você não gostaria de ser premiado com um carimbo na sola de seu sapato novo. Então, recolha o cocô do seu cãozinho, por meio de uma solução ecológica, para jogá-lo no vaso sanitário do banheiro de casa. Evite jogar nas lixeiras comuns. Conheça seu próprio país Nós, orgulhosos brasileiros, temos à disposição um lindo e atrativo país. Fomos abençoados com uma diversidade incrível de paisagens, povos, culturas e climas. Podemos aproveitar durante o ano o frio das serras e o calor do extenso litoral, além das matas, dos mangues, da paisagem do serrado, sem falar do cenário urbano das grandes metrópoles. Para completar, existe uma infinidade de lugares não explorados

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pelo turismo comercial, que trazem uma enorme riqueza natural para qualquer um de nós. Para que queremos mais? Nada como valorizar o próprio país. Claro que devemos, ao longo de nossas vidas, conhecer o maior número de países, mas primeiro vamos explorar o que natureza nos ofereceu aqui. Ao priorizar o Brasil, desenvolvemos o comércio local, economizamos com viagens longas, emitimos menos gases poluentes como ocorre em uma viagem intercontinental. Se, por incrível que pareça, os destinos brasileiros não lhe agradam, procure conhecer os países vizinhos latino-americanos. Viaje, sempre que possível, de trem, navio, ônibus ou, se não sobrar outra escolha, com seu próprio carro. Os imponentes aviões são também responsáveis pela poluição. Diga não: só aceite as coisas que realmente precisa Essa dica vale para tudo o que lhe oferecerem sem necessidade. Aprenda a consumir o que realmente precisa. Essa iniciativa conscientiza as pessoas a só consumir o essencial. A fabricação em larga escala, como sabemos, consome em excesso água, energia e outros recursos naturais, além da poluição que emite. Um exemplo simples é o uso de guardanapos e sachês de mostarda ou de ketchup nas lanchonetes. Se o vendedor lhe oferecer, sem que você vá utilizá-los, devolvaos imediatamente. Pense que aquilo que poderá virar lixo de maneira quase instantânea significa que não é imprescindível para você. Esse é o primeiro passo para evitar o desperdício, o vilão do consumo desenfreado dos recursos naturais. Seja consciente, diga não.

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Pare de fumar Com a aprovação da nova lei antifumo em São Paulo, que proíbe o fumo em ambientes fechados públicos ou privados, em fase de aprovação em outros estados, você tem um excelente motivo para parar, de uma vez por todas, de fumar. O

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cigarro causa uma série de doenças graves, como o câncer de pulmão, o câncer de boca e o enfisema pulmonar. Por ano, uma fortuna é direcionada para o tratamento dos doentes vítimas dos efeitos prejudiciais do cigarro nos hospitais públicos. Imagine como seria positivo se todo esse dinheiro fosse empregado na educação, no transporte e na segurança. Vale lembrar que o fumante passivo, a pessoa que inala a fumaça do cigarro por estar próxima ao fumante, tem a saúde prejudicada da mesma maneira. A indústria do tabaco ainda traz perdas irreparáveis para o meio ambiente. Portanto, pare de fumar o quanto antes. Use cravo, café e fumo para espantar formigas Ao contrário do que muita gente pensa, o uso de inseticidas e outros produtos químicos, como o sabão em pó (dizem que ajudam a matar formigas), pode, na verdade, aumentar a incidência de formigas. Além de poluentes e tóxicos, esses produtos causam sérios danos à saúde das pessoas, principalmente das crianças que estão em fase de aprender a andar. Como colocam as mãos muitas vezes no chão, elas correm sério risco de contaminação. A melhor saída para os locais tomados pelas formigas é recorrer a produtos naturais que espantam desde a operária (formiga que trabalha) até a rainha (formiga que bota o ovo). Substâncias como café, cravo e fumo são ótimas inibidoras desses insetos. Para evitar que o bichinho acabe com o seu jardim, pique alguma pessoa da sua família ou procure qualquer lugar que tenha açúcar, coloque, no caminho da casa das formigas, borras de café diluídas em água. Tente também espalhar cravos e fumo pelos locais que apresentam maior quantidade delas. O cheiro desses produtos afasta as formigas e não causa danos à saúde nem ao meio ambiente.

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Compartilhe jornais, revistas e livros Se você tem o costume de comprar toda semana re| 185 |


vistas e jornais para se informar, compartilhe os títulos com seus vizinhos e colegas de trabalho. Ao emprestar os exemplares, vocês estarão sempre bem informados, economizarão alguns trocados e estarão salvando a vida de algumas árvores utilizadas para a produção do papel dos produtos. Deixe para comprar apenas aqueles exemplares que valem a pena guardálos para o restante da vida. Se você também gosta de ler livros, faça o mesmo. Empreste e pegue emprestado o maior número de obras. Não jogue lixo na rua Algumas pessoas jogam o que bem entendem nas ruas na maior “cara de pau”. O excesso de lixo causa entupimento dos bueiros e suja a água dos rios. Com os bueiros entupidos, o lixo vai parar nas galerias subterrâneas, local onde escoa a água da chuva, para chegar, por fim, nos rios da cidade. Qual o problema disso tudo? As inúmeras enchentes. O governo gasta uma grana todos os anos no complicado processo de limpeza dos rios, em alternativas para o combate às enchentes, mas de nada adianta se a população não se cons­ cientizar de que lugar de lixo é no lixo. Seja um cidadão res­ ponsável com o futuro da sua cidade, porque os maiores afetados, no final das contas, somos nós mesmos.

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Use mais a internet O mundo está cada vez mais conectado à internet. É praticamente impossível viver sem ela. Crianças e até mesmo idosos se renderam aos atrativos da rede mundial de computadores e adaptaram as suas atividades cotidianas a ela. Então por que não utilizá-la ainda mais para facilitar o dia a dia? Navegue ainda mais para descobrir a infinidade de coisas que podem ser feitas na rede. Uma das possíveis atividades é pagar contas e fazer transações bancárias pelos sistemas on line dos bancos. A vantagem

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é que você não precisa se deslocar até uma agência. Assim, não retira o carro da garagem, o que significa economia nos gastos com combustível. No computador de casa, não existem aquelas enormes filas tão comuns nas agências. Sem pegar o carro para pagar seus compromissos, o escapamento do seu veículo deixa de poluir o ar da cidade com aquela fumaça preta, rica em dióxido de carbono. Na internet, você ainda pode ler jornais e revistas, muitas vezes sem gastar nada. Nesse processo, quando as empresas disponibilizam o conteúdo na internet, há economia de água, de árvores derrubadas e de utilização de energia, recurso tradicionalmente usados para a produção de papel. O melhor é deixar para comprar nas bancas de jornal apenas os títulos favoritos. Outra função da internet é fazer compras sem se dirigir à loja física. Pela web, você escolhe o produto, passa o cartão de crédito ou débito e recebe, passados alguns dias, a mercadoria no conforto de sua casa. A vida escolar das crianças também foi otimizada com a popularização da internet, já que elas têm fácil acesso ao conteúdo de educação e pesquisas, antes função exclusiva das enciclopédias. É importante não se esquecer de estimulá-las a frequentar bibliotecas, sentindo o prazer de tocar as páginas de um livro. Os livros eletrônicos ainda estão longe de virar realidade. As pessoas preferem ter as obras em mãos para realizar a leitura. Essas e outras características positivas só têm a somar para que você se torne adepto ao uso da internet. Não tenha medo de se conectar e descobrir todo o conteúdo que existe gratuitamente à disposição! No entanto, tenha cuidado para não expor demais a vida pessoal. Não temos como saber quem está do outro lado do monitor.

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Diga não aos panfletos desnecessários Quem não se incomoda com aqueles panfletos en­ | 187 |


tregues em faróis e calçadas? Alguns podem até ter utilidade, mas aqueles que não terão serventia para você devem ser recusados. Contribua para que não se produza tanto papel sem necessidade. Por essa razão, caso estejam lhe oferecendo algo que não é de seu interesse, não pegue. Não se preocupe com a indelicadeza. Você está sendo somente consciente. Economize na impressão Não desperdice tinta de sua impressora à toa. Configure-a para imprimir no modo econômico ou rascunho, que ajuda a economizar tinta e energia. Outra dica é reduzir o consumo de papel usando os dois lados da folha. Basta configurar a impressão para frente e verso. Se não for possível imprimir nas opções em preto e branco ou cinza, no sistema frente e verso, faça o seu trabalho normalmente, lembrando-se da necessidade de racionalizar o uso de manufaturas.

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Use baterias recarregáveis Você já deve ter ouvido falar que as pilhas e baterias possuem produtos químicos altamente tóxicos. Por isso, após o uso, não se pode descartar esse material no lixo comum sob pena de causar a contaminação do solo, das águas, dos recursos do meio ambiente. Procure comprar pilhas e baterias recarregáveis, com vida útil de aproximadamente 1000 pilhas descartáveis. Dessa maneira, você economiza dinheiro, porque não terá de adquirir pilhas novas constantemente, além de reduzir o descarte de resíduos tóxicos na natureza. Quando a bateria e a pilha perderem a vida útil, não as descarte em lixo comum, entregue o material para um órgão competente responsável pelo descarte apropriado.

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Diga não à pirataria A vantagem do produto pirata sobre o original está no preço inferior. No primeiro momento, o consumidor desatento

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é seduzido pela economia. As pessoas não pensam no prejuízo que está causando para a arrecadação do seu próprio país. Os produtos piratas entram no território nacional de maneira escusa. Obviamente, eles não pagam impostos, não passam pela fiscalização de segurança, sem que obtenham os selos que atestam a qualidade para o consumidor. Alguns objetos, como pilhas, CDs e DVDs, possuem substâncias tóxicas, extremamente nocivas à saúde, em sua composição. Como não passam pelos exames de segurança, oferecem grandes riscos ao consumidor. Não compre esse tipo de mercadoria. Veja se os produtos, mesmo aqueles que parecem originais, receberam o selo de qualidade do INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), órgão que regulamenta os artigos nacionais e importados que circulam no país. Não use isqueiros Os bons e velhos palitos de fósforo tradicionais, feitos de madeira, são uma ótima opção para fazer fogo. Não use isqueiros, porque esses produtos são feitos, em sua maioria, de plástico, material que demora muito tempo para se decompor. Eles ainda possuem gás butano, conhecido como gás de co­ zinha, na composição. Em vez de usar os acendedores artificiais, use os palitos de madeira, porque geralmente são feitos da madeira obtida pelo reflorestamento. Algumas empresas têm a consciência de reparar os danos causados para o meio ambiente. O ato de replantar é uma excelente maneira de contribuir com a natureza.

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Notas Parte 1: Velha e Nova Economias BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Mundo. São Paulo: Editora Fundamento Educacional, 2009. 342p. HOBSBAWM, Eric. Globalização, Democracia e Terrorismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. 182p. KLEIN, Naomi. A Doutrina do Choque. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2007. 590p. ADAM Smith Org. Estados Unidos: Official Site of Adam Smith. Disponível em www.adamsmith.org. Acesso em 18 de setembro de 2009. ARMITSTEAD, Louise. Hedge fund of funds’assets fall by $200bn. Reportagem publicada pelo jornal britânico Telegraph United Kingdom. Disponível em www.telegraph.co.uk/finance/ newsbysector/banksandfinance/6082978/Hedge-fund-of-fundsassets-fall-by-200bn.html. BYDLOWSKI, Lizia. Os apuros do senhor megatudo. Reportagem publicada pela revista Veja na edição de 13 de agosto de 1997. Disponível em http://veja.abril.com.br/130897/p_040.html. CHACRA, Gustavo. Bancos reabrem cassino global. Reportagem publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo no dia 16 de agosto de 2009. Disponível em http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090816/ not_imp419457,0.php. DEURSEN, Felipe Van. Quebra da Bolsa em 1929: Tragédia em Wall Street. Reportagem publicada pela revista Aventuras na História no dia 14 de julho de 2008. Disponível em http://historia.abril.com.br/economia/quebra-bolsa-1929-tragedia-wallstreet-454593.shtml. DONNELLY, Sally. The man with the Midas touch. Reportagem publicada pela revista americana Time na edição de 31 de maio de 1993. Disponível em http://www.time.com/time/magazine/ article/0,9171,978621,00.html.

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