BNDES: que desenvolvimento é esse?

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que desenvolvimento ĂŠ esse?

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que desenvolvimento é esse?

O atual documento foi elaborado com base na Plataforma BNDES, uma proposta das seguintes organizações:

Amigos da Terra – Amazônia Brasileira Associação de Funcionários do Banco do Nordeste do Brasil Associação para Taxação das Transações Financeiras para a Ajuda aos Cidadãos (Attac) – Brasil Central Única dos Trabalhadores (CUT) Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) Cresol – Sistema de Cooperativas de Crédito Rural com Integração Solidária Esplar – Centro de Pesquisa e Assessoria Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Fboms) Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) Fórum Nacional de Segurança Alimentar Fórum Popular e Independente do Madeira Frente Nacional do Saneamento Ambiental (FNSA) Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) Movimentos dos Atingidos por Barragens (MAB) Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs) Rede Alerta contra o Deserto Verde Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais Rede Brasileira pela Integração dos Povos (Rebrip)

Também contou com a colaboração de membros da Rede Brasileira de Justiça Ambiental

ORGANIZAÇÃO EDIÇÃO

Fabrina Furtado - Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais

Patrícia Bonilha - Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais

PROJETO GRÁFICO

amatraca desenho gráfico - www.amatraca.com.br

Julho de 2008

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O QUE É A PLATAFORMA BNDES? A Plataforma BNDES é um conjunto de reivindicações elaboradas por uma articulação de redes, organizações e movimentos sociais brasileiros sobre o desenvolvimento que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES ) deve promover. Esta articulação reivindica que esse Banco público seja de fato do povo brasileiro e, além de elaborar uma análise dos financiamentos do BNDES, apresenta propostas de mudanças em diversas áreas: transparência; participação e controle social; desenvolvimento de critérios territoriais/regionais, ambientais, climáticos, de gênero, raça e etnia e de trabalho e renda; e políticas setoriais de infra-estrutura social, descentralização do crédito, desenvolvimento rural agroecológico, energia e clima e integração regional. A Plataforma é resultado de um processo de reflexão por parte desta articulação sobre o papel que o BNDES tem hoje e o papel que ele deveria ter. Para chegar nesta proposta, desde 2003 diversas atividades – reuniões com o Banco, mobilizações e oficinas de formação – foram realizadas na tentativa de entender a atuação do BNDES e, em um primeiro momento, cobrar do Banco maior transparência e abertura sobre suas políticas e projetos financiados. Espera-se que, muito além de conseguir que o Banco seja mais transparente e aberto ao público, esta articulação - e outras organizações e movimentos sociais - possa participar, de forma qualificada, da elaboração de critérios e da própria escolha de projetos a serem financiados pelo BNDES , buscando transformar o atual modelo de desenvolvimento em um projeto econômico e socioambientalmente justo. A Plataforma não é um documento acabado, mas sim um processo em construção.

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Algumas atividades realizadas 13 de julho de 2006

20 de setembro de 2007

Seminário na sede do Banco “O BNDES que

Movimentos apresentam documentos de

temos e o BNDES que queremos: o papel do

denúncias sobre a Aracruz Celulose e a Al-

BNDES no financiamento do desenvolvimen-

coa – financiadas pelo BNDES . Durante essa

to nacional democrático”, que resultou em

mesma reunião no BNDES , o Banco assume

uma publicação.

o compromisso de divulgar informações

7 de março de 2007 MST ocupa sede do BNDES no Rio de Janei-

ro, cobrando mais investimentos na agricultura familiar e reforma agrária. 16 e 25 de maio de 2007 Duas oficinas de trabalho para construir a Plataforma BNDES . 19 de julho de 2007 Reunião com o recém-nomeado presidente do Banco, Luciano Coutinho, para reestabelecer o diálogo e apresentar a Plataforma BNDES . Durante a reunião, ele assume o

compromisso de incorporar reinvindicações da Plataforma no planejamento do Banco. 8 de agosto de 2007 Luciano Coutinho participa da VII Assembléia da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, escuta denúncias e questionamentos de movimentos sociais e assume compromisso de incorporar reivindicações da Plataforma no planejamento do Banco.

sobre seus cinqüenta maiores projetos dos seus quatro setores de atuação – inclusão social, infra-estrutura, indústria e insumos básicos - além de incorporar cláusulas sociais nos seus contratos. Dezembro de 2007 BNDES divulga informações sobre os cin-

qüenta maiores projetos dos quatro setores (mencionados acima). 15 de fevereiro de 2008 BNDES realiza um evento para comemorar

a divulgação dos projetos e incorporação de cláusulas sociais nos contratos de financiamento. A Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais divulga uma nota de posicionamento criticando essa comemoração por considerar que o Banco não atendeu as demandas da sociedade civil. A “cláusula social” apenas apresenta o que já existe na lei – rompimento de contrato com as empresas que praticarem atos discriminatórios, trabalho escravo ou infantil – e as informações sobre os projetos não mostram o Banco na sua magnitude

20 de setembro de 2007

em termos de investimento, estratégia e

Reunião de membros da Plataforma para

perspectiva de desenvolvimento.

elaborar estratégias como a realização de oficinas de formação, elaboração de caderno popular e jornal sobre a Plataforma.

9 de julho de 2008 Reunião com o BNDES sobre sua atuação no setor de etanol. A Plataforma questiona critérios de financiamento e inicia um debate sobre os impactos socioambientais do setor.

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POR QUE O BNDES? O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES ) é um banco estatal cujo objetivo é estimular o crescimento econômico e social do Brasil. Desde a sua criação, em 1952 , o Banco tem sido um importante instrumento de política pública, usado para implementar os principais programas do governo federal no País e, cada vez, mais no exterior. Além de repassar recursos, o BNDES também escolhe quais regiões, setores e empresas vão receber mais dos seus empréstimos – o que acaba definindo um determinado tipo de desenvolvimento. O “desenvolvimento nacional” que o BNDES vem financiando não é o mesmo que esta articulação da Plataforma BNDES defende. Se a maior fonte de recursos do Banco (47%) provém dos trabalhadores e das trabalhadoras – através do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT ), o BNDES precisa criar condições para que eles e elas se beneficiem destes

recursos. Isso não ocorre atualmente. O Banco também recebe seus recursos do fundo PIS-PASEP , do fundo da Marinha Mercante, do repagamento dos empréstimos, de rendimentos de aplicações financeiras e de outras instituições financeiras, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID ) e a Corporação Andina de Fomento (CAF ).

BNDES, BID e Corporação Financeira Internacional (CFI) criam fundo de elaboração de projetos de infra-estrutura Em outubro de 2007 , o BNDES , o BID e a CFI , do Grupo Banco Mundial, criaram um fundo para financiar a elaboração de projetos de infraestrutura envolvendo concessões públicas e Parcerias Público-Privadas (PPP s) no Brasil e na América do Sul. O fundo terá aporte inicial de US$3,99 milhões, podendo atingir até US$ 11,99 milhões1. Junto com outros mecanismos já criados pelas Instituições Financeiras Multilaterais (IFM s), esse fundo servirá para acelerar a implementação dos megaprojetos da Iniciativa para a Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) e sua versão nacional, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

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1. BNDES, IFC e BID criam fundo para financiar a modelagem de projetos de infra-estrutura no Brasil. Disponível em http://www.bndes.gov.br/noticias/2007/not244_07.asp. Acesso em 22 de outubro de 2007.


Dados sobre o BNDES2 Atualmente, é o maior financiador de longo prazo do País. Em 2006, participou em 19% de todos os créditos no Brasil. Em 2007 , obteve lucro recorde de R$ 7,3 bilhões, superior em 15,5% ao ano anterior, de R$ 6,3 bilhões. Em 2007 , o BNDES desembolsou R$ 64,9 bilhões - 21% mais que em 2006 .

O BNDES desembolsa mais que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID ) e o Banco Mundial (BIRD ) juntos. Em 2006, enquanto o BNDES desembolsou R$ 51,3 bilhões, o BID desembolsou R$ 11 bilhões, e o BIRD em torno de R$ 33 bilhões para o mundo todo e US$ 8 bilhões para a América Latina. O crescimento dos desembolsos do BNDES foi resultado do aumento de investimentos em infra-estrutura. Em 2007 , os projetos do setor receberam R$ 25,6 bilhões (quase metade de todos os desembolsos do Banco), 62% a mais que em 2006 . Em 2007 , os empréstimos aprovados pelo BNDES para obras de energia eléctrica cresceram 207% em relação ao ano anterior. Foram quase R$ 13 bilhões em empréstimos aprovados. Nos últimos dez anos, o setor de papel e celulose obteve mais de R$ 9 bilhões em financiamento – R$ 2,3 bilhões somente em 2006.

O BNDES não apenas financia como é coresponsável pelas opções de investimento do setor de papel e celulose. Possui, por exemplo, participação acionária de 12,5% na Aracruz Celulose – que possui 50% da Veracel, além de ter 11,4% do capital da Suzano Bahia Sul. 2. BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Estatísticas Operacionais do Sistema BNDES. Disponível em http://www.bndes.gov.br/estatisticas/apresentacao.asp. Acesso em março de 2008.

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Como os R$ 64,9 bilhões desembolsados em 2007 foram distribuídos?

POR SETOR Educação, Saúde, Serviço Social, Arte, Cultura e Esporte

Outros

Infra-estrutura

12% 0,9% 39,4%

Agropecuária

7%

40,7%

Indústria

POR TAMANHO

Grandes empresas

75,5%

24,5%

Micro, pequenas e médias empresas

POR REGIÃO MG 9%

Nordeste ES % Norte % 2 5 8%

RJ Sudeste 58%

9% Centro-Oeste

13%

34% SP

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20% Sul


BNDES financia conflitos socioambientais: o caso da Vale A Vale é um dos maiores símbolos da má administração do patrimônio público brasileiro e de como as privatizações podem ser prejudiciais ao País. Em 1997 , ela foi vendida por R$ 3,3 bilhões. Este é quase o mesmo valor do lucro da empresa apenas no segundo trimestre de 2005 (R$ 3,5 bi)3. Além disso, a Vale provoca a destruição do meio ambiente e conflitos com as comunidades locais. A empresa tem, por exemplo, construído várias siderúrgicas na Amazônia que utilizam o carvão vegetal para a produção do ferro-gusa. São praticamente 300 mil hectares de floresta primária que a cada ano são destruídos para a produção de carvão. Algumas dessas siderúrgicas já foram flagradas e multadas pela fiscalização do Ministério do Trabalho por manter centenas de trabalhadores como escravos, inclusive crianças4. A Vale também esteve envolvida em conflito com quilombolas do Jambuaçu, no município de Moju, no Pará, por causa dos impactos de um mineroduto e de um linhão que afetaram, aproximadamente, 15 km de área. Os quilombolas informaram que essas obras poluíram o rio, o que afetou drasticamente a pesca e tornou a água imprópria para uso. Os militantes das comunidades negras estimam que 674 famílias foram afetadas. Depois de semanas de protesto, inclusive do bloqueio de uma estrada de acesso ao canteiro de obras da empresa, a Vale foi forçada a atender as reivindicações das comunidades5. Em março de 2008, mulheres da Via Campesina ocuparam os trilhos da empresa em Minas Gerais, no município de Resplendor. Elas denunciaram que a construção da barragem de Aimorés, efetuada pela Vale, afetou os municípios de Itueta, Aimorés e Resplendor, e deixou a população sem moradia, segurança, emprego e terra6. 3. BRASILIANO, L. Campanha tenta reestatizar a Vale. Disponível em http://www.jubileubrasil.org.br/azul/popular/news_ item.2006-11-30.2000656387, Acesso em março de 2008. 4. GLASS, V. Vale do Rio Doce financia lançamento e racha Igreja Católica. Disponível em http://www.reporterbrasil.org. br/exibe.php?id=926. Acesso em março 2008. 5. CPT. Quilombolas do território de Jumbuaçu/PA conquistam direitos por terem seu território. Disponível emhttp:// www.justicaambiental.org.br/projetos/clientes/noar/noar/UserFiles/17/File/NotaMoju.pdf . Acesso em março de 2008 6. VIA CAMPESINA. Mulheres da Via Campesina ocupam ferrovia da Vale em MG. Disponível em http://www.mmcbrasil. com.br/noticias/8marco_08/100308_viacampesina.html. Acesso em março de 2008.

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As empresas que mais receberam do BNDES em 2007, por setor Indústria JBS S/A , Carrefour Comércio e Indústria Ltda, Fiat Automóveis S/A ,

Estaleiro Atlântico Sul S/A , Sadia S/A , Aché Laboratórios Farmacêuticos S/A , Bridgesonte Firestone Brasil Indústria e Comércio Ltda, Usina Alto

Alegre S/A Açúcar e Álcool, Usina Boa Vista S/A , Companhia Brasileira de Distribuição

Insumos Básicos Companhia Siderúrgica Nacional, Klabin S/A , Thyssenkrupp CSA Companhia Siderúrgica, Companhia Vale do Rio Doce, Petroquímica Paulina S/A , MMX Amapá Mineração Ltda, Empresa de Cimentos Liz S/A, M&G Polímeros Brasil S/A, Petroquímica União S/A, Solvay Indupa do Brasil S/A , Companhia Nacional de Cimento, Berneck Aglomerados S/A , Votorantim Metais Níquel S/A , CSN Cimentos S/A , Usinas

Siderúrgicas de Minas Gerais S/A , Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, Gerdau Aços Longos S/A , Oxiteno Nordeste S/A , Suzano Papel e Celulose

Infra-estrutura Telecomunicações de São Paulo S/A (Telesp), Petrobrás Transporte, Foz de Chapecó Energia, Vivo S/A , Transportadorera Gasene S/A , Estaleiro Atlântico Sul S/A , Rio Industrial Naval, Companhia Vale do Rio Doce, Cia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista, América Latina Logística do Brasil S/A (ALL) , Light Serviços de Eletricidade

Inclusão Social Companhia de Saneamento de Minas Gerais, Sociedade Beneficente Israelita Brasileira, Hospital Albert Einstein, município de Belo Horizonte, município de Estância Balneária de Praia Grande, Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios Não-Padronizados da CPTM , Fundação São Paulo, município de Caxias do Sul, município de

Itajaí, município de Rio Branco

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O que representam R$ 64,9 bilhões?

13 milhões de casas populares (de alvenaria, com 40 a 50 m2, de acordo com método elaborado pela COPPE/UFRJ , ao custo unitário de R$ 5 mil) - o que eliminaria todo o

déficit habitacional brasileiro que, em 2006, foi de 7,964 milhões de residências em 2006 , segundo estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV ).

2 milhões de famílias assentadas (custo aproximado de R$ 30 mil por família). Mesmo com um custo mais alto, de R$ 180 mil, como foi o caso do assentamento de Aliança, no município de Linhares, no Espírito Santo , daria para assentar 370 mil famílias.

7 milhões de novos empregos na agricultura (R $10 mil por pessoa).

Em 2007 , o governo federal gastou

R$ 40 bilhões com a Saúde, R$ 20 bilhões com a Educação e R$ 3,5 bilhões com a Reforma Agrária.

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E em 2008, nada muda: A expectativa em 2008 é de um crescimento nos desembolsos do BNDES de pelo menos 25% em relação ao ano anterior, fechando o ano com empréstimos superiores a R$ 80 bilhões. O orçamento oficial do Banco para 2008 prevê investimentos, pincipalmente, em infra-estrutura, projetos de energia e hidrovias, que devem atingir R$40 bilhões. O Banco tem R$ 19,7 bilhões para o setor de agrocombustíveis, dos quais R$ 15,4 bilhões são para projetos de produção de açúcar e álcool, R$ 2,3 bilhões para co-geração, R$ 1,8 bilhões para cultivo da cana e R$ 142,5 milhões para pesquisa e desenvolvimento. No início de 2008 , o BNDES liberou aproximadamente R$ 650 milhões para a multinacional estadunidense Alcoa Alumínio S/A , que é acusada pelo Ministério Público do Pará de cometer crimes contra comunidades e o meio ambiente.

O BNDES atua fora do Brasil?7 O BNDES financia a exportação de produtos e serviços brasileiros. Ou seja, faz empréstimos para os países com a condição de que contratem empresas brasileiras. O BNDES financiou o grupo Alstom – um dos maiores do mundo no mercado de infra-estrutura de energia e transporte - para exportar turbinas para a maior hidrelétrica do mundo, “Três Gargantas” na China, que deslocou 1,4 milhão de agricultores e agricultoras. O BNDES desembolsou US$ 2,588 bilhões (R$ 4,373 bilhões) entre 1997 e 2006, para países da América do Sul.

Em 2007 , o desembolso do BNDES para a América do Sul foi o maior já realizado: U$ 380 milhões (R$ 642 milhões). Argentina, Equador e Venezuela são os maiores destinos dos recursos do BNDES na América do Sul. Alguns projetos financiados: dois gasodutos na Argentina, metrôs no Chile e na Venezuela, hidrelétricas no Equador e Venezuela, rodovia no Paraguai. Em dezembro, o BNDES abriu seu primeiro escritório internacional em Montevidéu, Uruguai.

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7. BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL El Apoyo de Brasil a los Proyectos en Sudamérica, junho de 2007. Disponível em www.iirsa.org/BancoMedios/Documentos%20PDF/ fir_montevideo07_bndes.pdf. Acesso em dezembro de 2007.


PORTANTO, O QUE É DESENVOLVIMENTO PARA O BNDES?

1. Crescimento econômico: aumento da quantidade de bens, produtos e serviços produzidos; 2. Inserção competitiva do Brasil no contexto global: aumento na quantidade dos produtos exportados e na quantidade de grandes empresas brasileiras com presença forte no mercado internacional. Para a articulação da Plataforma BNDES , desenvolvimento não pode ser medido pela quantidade do que é produzido nem pela inserção competitiva do Brasil no contexto global. Desenvolvimento tem a ver com a qualidade do que é produzido e consumido. É a qualidade da economia, da área socioambiental, de como produzimos e como consumimos hoje, amanhã e no futuro.

Como deve ser esse desenvolvimento? 1. Baseado nas necessidades das pessoas, comunidades, povos e territórios. 2. Soberano: Quem deve liderar o desenvolvimento são as pessoas, comunidades, povos e territórios. Desenvolvimento não pode ser imposto. 3. Solidário no sentido de que ninguém desenvolve ninguém, e ninguém se desenvolve sozinho. Tem que haver um troca igualitária. 4. Justo: O desenvolvimento precisa considerar todos os custos – sociais, ambientais e financeiros, de hoje, de amanhã e do futuro - e incluí-los na conta dos que promoveram tais custos. Precisa distribuir o acesso à terra, às riquezas produzidas e aos recursos naturais de forma igualitária e considerar que o acesso a um ambiente saudável é um direito humano de todos/as. Precisa ser voltado para superar as desigualdades de gênero, raça, etnia, geracional.

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O BNDES deve ajudar a garantir este desenvolvimento e construir uma capacidade de produção para que o Brasil e a América Latina deixem de ser meros exportadores de matérias primas com baixíssimos valores econômicos, mas com fortes impactos socioambientais negativos e concentração de riquezas. Ou seja, as atividades do agronegócio (soja, gado, cana-de-açúcar), da indústria madeireira, da mineração, da pesca industrial e da indústria pedreira (retirada de granito e mármore).

O BNDES que temos: crescimento econômico e inserção competitiva O BNDES sempre atuou intensamente na industrialização do País, e nos processos de privatização. Recentemente, vem perseguindo a “inserção competitiva” do Brasil no contexto global. Assim, o Banco prioriza o atendimento dos mercados externos: favorecer setores exportadores; atrair investimentos estrangeiros; e internacionalizar empresas brasileiras – transformá-las em multinacionais. Este modelo concentra renda e poder e tem elevados custos socioambientais. O Banco não apenas deve, mas precisa, mudar – antes de ser totalmente capturado pela lógica de mercado capitalista neoliberal.

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Como o BNDES está sendo capturado pelo mercado: A quantidade de recursos que o Banco libera é a única forma de avaliar se está sendo eficiente. O BNDES usa a “eliminação de riscos” financeiros para escolher um projeto a ser financiado. Ou seja, a capacidade de pagamento da empresa que empresta e o lucro que o projeto vai dar. Isso é o que faz um banco privado comercial e não um banco público de desenvolvimento. Falta de transparência. O Banco não torna públicas todas as suas estratégias e ações. O S de sua sigla significa políticas compensatórias e não políticas sociais estruturantes, que podem, de fato, modificar o atual modelo de desenvolvimento. Portanto, o Banco precisa de uma re-orientação política no seu planejamento, liberação de recursos financeiros e do seu pessoal para: 1.atender às necessidades históricas da maioria da população brasileira. Ou seja, superar as desigualdades e priorizar uma produção e distribuição igualitária de bens e serviços sociais; 2.atender questões impostas pela conjuntura, como é o caso das mudanças no clima do planeta; e 3.estabelecer metas claras e justas, social e ambientalmente, para garantir a melhoria do nível de vida da maioria da população brasileira.

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O BNDES QUE QUEREMOS: UMA AGENDA INICIAL EM CONSTRUÇÃO

EIXO 1

Transparência

Um dos passos fundamentais para que o BNDES promova o desenvolvimento justo é a transparência e o controle público. Apesar de ser um banco público que afeta toda a sociedade e de operar recursos públicos como o FAT , o BNDES mantém em segredo a maior parte dos seus financiamentos. Atualmente, o BNDES disponibiliza apenas informações sobre os seus cinquenta maiores

projetos de cada uma das suas quatro áreas de atuação e divulga seletivamente notícias, através de comunicados à imprensa, sobre alguns financiamentos ao setor privado. Esta seleção impossibilita o acesso a informações acerca da sua carteira de crédito como um todo. Por isso, é fundamental que o Banco crie uma Política de Informação Pública (PIP ) para dar publicidade:

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Conselho de Administração O Conselho de Administração do BNDES opina sobre as linhas gerais orientadoras do Banco, examina e aprova as políticas gerais, programas de atuação e o orçamento global. É composto por dez membros, com mandato de três anos, sendo três indicados pelos ministros de Planejamento, Orçamento e Gestão; do Trabalho e Emprego e da Fazenda, e os demais indicados pelo ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e o presidente do BNDES . Atualmente a Central Única dos Trabalhadores (CUT ) e Força Sindical participam do Conselho.

1 ao Relatório de Análise - documento enviado para a diretoria do Banco decidir se financia ou não um projeto; aos Boletins de Medição - documento que analisa se o projeto está cumprindo os objetivos e metas para, a partir disso, liberar o resto dos recursos; e à agenda, pauta e às decisões das reuniões de Diretoria e do Conselho de Administração.

2 à lista de todos os projetos com as seguintes informações: objetivo, executor, área, valor total, valor do empréstimo, contrapartida (o que é oferecido como complemento pelo cliente), taxa de juros, prazo, carência (período que se tem antes de começar a pagar o empréstimo), relatório de impacto socioambiental, recorte étnico-racial e de gênero, responsável pelo acompanhamento do projeto dentro do Banco, critérios e prioridades para acesso e liberação do financiamento e impactos socioeconômicos previstos.

3 à lista das regras, critérios e de quem recebe dos fundos do Banco que não precisam ser devolvidos: Fundo Social – apóia projetos e instituições do campo social - e Fundo Tecnológico (Funtec), que apóia projetos tecnológicos.

4 aos dados sobre a liberação de gases de efeito estufa dos projetos financiados e do próprio BNDES .

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Emissões de carbono, efeito estufa e mudanças climáticas Atualmente, as mudanças no clima do planeta são a ameaça mais grave que a humanidade enfrenta. A temperatura do mundo é mantida sob controle por causa da existência de gases naturais, como o dióxido de carbono, o metano e o vapor d’água. Esses gases formam uma camada ao redor do planeta que mantêm uma parte do calor do sol aprisionado. Sem esses gases a Terra seria muita gelada (em média -17º C), impossibilitando a vida no mundo como a conhecemos. Esse fenômeno é chamado de efeito estufa e, por isso, esses gases são chamados de gases de efeito estufa. Para gerar energia para as indústrias, aviões, ônibus, carros e eletrodomésticos, por exemplo, através do carvão mineral, petróleo e gás natural, muito carbono, metano e outros gases começaram a ser jogados na atmosfera. As florestas armazenam carbono, mas como foram – e continuam sendo – destruídas, mais gases são jogados no ar, fazendo com que a camada (que guarda uma parte do calor do Sol), engrosse, fortalecendo o efeito estufa. O resultado são mudanças extremas nas temperaturas, secas e inundações, que diminuem a produção agrícola, destroem a biodiversidade e criam refugiados ambientais e outros conflitos sociais. A rigorosa seca que atingiu a região Amazônica em 2005 é apenas um exemplo do que a humanidade enfrenta hoje e enfrentará com mais severidade no futuro.

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EIXO 2

Participação e Controle Social

Atualmente, o BNDES não tem nenhum canal de interlocução regular com a sociedade civil, além do Conselho de Administração e a Ouvidoria, que são limitados e não dão conta da diversidade da sociedade brasileira. É preciso conceber diferentes instâncias e instrumentos de participação e controle, tais como:

1 audiências públicas, organizadas com representações das populações ameaçadas por projetos antes da aprovação. A população local precisa ter tempo e informação suficiente para participar de forma qualificada.

2 um Conselho de Administração Ampliado (que reflita a diversidade social e política existente no País) com representação de outros setores da sociedade, além dos sindicatos de trabalhadores/as; que tenha garantidas suas funções estatutárias, sendo ainda o espaço aonde o Presidente preste contas em relação à atuação do Banco.

3 audiências públicas regulares com a sociedade civil, com critério de equilíbrio de raça, gênero, etnia, geracional e regional, para definir prioridades, a formulação de políticas e programas e para prestar contas.

4 uma Comissão Externa de Inspeção, que possa ser formada caso haja denúncia de problemas e/ou desvio nos objetivos e metas do projeto. A Comissão deve sugerir a suspensão do projeto, até que a invetigação seja finalizada. O Relatório da Comissão deverá ser analisado pelo Conselho de Administração, que decidirá como aplicar as recomendações.

5 espaços físicos em todas as capitais dos estados, dotados de equipamentos eletrônicos para o fornecimento de informação sobre as operações do Banco.

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EIXO 3

Critérios

O Banco precisa incluir os critérios apresentados a seguir como cláusulas que devem ser consideradas para a aprovação de projetos. 1. Territoriais e regionais Os investimentos do BNDES são distribuídos de forma desigual nas diferentes regiões do País. A concentração dos financiamentos na região Sudeste, em particular em São Paulo, mostra a incapacidade do Banco em promover a redução das desigualdades regionais. Não se trata de simplesmente aumentar o volume dos empréstimos, mas de garantir que os projetos favoreçam a dinâmica local e regional. Para isso, o Banco precisa:

a observar os impactos dos projetos em relação às populações tradicionais, que enfrentam um processo de desterritorialização e perda de identidade (já que, como consequência de grandes projetos, migram forçadamente à procura de trabalhos temporários e degradantes, e tornam-se vulneráveis a todos os tipos de exploração: tráfico de pessoas, trabalho escravo, contrabando de migrantes, etc. Esses impactos são ainda mais fortes na indústria do turismo).

b financiar um programa permanente de formação em nível municipal e local com a efetiva participação da população - principalmente mulheres e jovens - para implementar uma política de turismo e apoiar o turismo comunitário, de forma a melhorar a qualidade de vida da população, principalmente as comunidades litorâneas e costeiras.

c impedir o financiamento de empreendimentos com conflitos socioambientais ou fundiários.

d adotar critérios de financiamento que considerem, por exemplo, a realização de um zoneamento econômico, social e ecológico (ZESE ) de todo o território brasileiro, com investimentos voltados ao desenvolvimento local.

e cumprir a exigência estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO ), de 2008 , que exige a observância da diretriz de redução das desigualdades – nesse

caso regional - por parte de bancos públicos de fomento.

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2. Ambientais A questão ambiental brasileira é similar à distribuição da renda ou da propriedade da terra: os recursos ambientais são distribuídos de forma profundamente desigual. De um lado, um punhado de empresas controla o acesso e uso das águas, florestas, biodiversidade e demais recursos essenciais à vida. De outro, pequenos agricultores/ as familiares, pescadores/as, indígenas, quilombolas e outras populações tradicionais são excluídos desse acesso. Grandes projetos agro-florestais, mínero-metalúrgicos, pesqueiros, monocultores e de infra-estrutura reduzem os recursos naturais e as populações locais a possibilidades de lucro. Enquanto os lucros são privados – ficam na mão de poucos - os custos são distribuídos socialmente. São as populações mais vulneráveis que mais enfrentam os impactos ambientais negativos: poluição, lixo, rejeitos tóxicos, enchentes e secas resultantes das mudanças no clima, por exemplo. Isso é consequência do modelo de desenvolvimento que busca a “inserção competitiva” do Brasil no mundo através da exportação de produtos que dependem da exploração dos recursos naturais. Apesar disso – ou exatamente por causa disso - a política ambiental do BNDES é limitada ao cumprimento da lei, ou seja, à existência de licenciamento ambiental. Conseqüentemente, o Banco tem apoiado projetos que usam muita energia e recursos naturais com irrecuperáveis impactos ambientais. O Banco precisa:

a exigir o cumprimento de rígidos e eficientes critérios socioambientais antes de liberar recursos e incluir os impactos socioambientais na avaliação dos custos e retornos dos investimentos.

b adotar as sugestões da Comissão Mundial de Barragens – que avaliou os impactos negativos econômicos e socioambientais das barragens.

c negar financiamentos a empresas suspeitas de grilagem de terras públicas, como as identificadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI ) Mista da Grilagem de Terras, bem como às que ferem a legislação sobre a proteção das terras indígenas e de quilombolas.

d ter estatuto especial para atividades potencialmente predatórias como mineração, indústria madeireira, pesca industrial, agroindústria de exportação, carcinicultura, geração de energia (hidrelétricas), indústrias eletro-intensivas e de agroenergia.

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3. Climáticos Os impactos socioambientais e econômicos decorrentes das mudanças climáticas exigem que o combate à suas causas façam parte de todos os processos e produtos relacionados aos financiamentos do BNDES. Assim sendo, o Banco deve:

a considerar, nos pedidos de financiamento, o indicador de emissão de carbono e outros gases. Empresas com altos indicadores não devem receber financiamento do Banco.

b negar financiamento a produtores de combustíveis fósseis ou monocultivos que resultam em grandes desmatamentos (lembrando que no Brasil 75% das emissões de gases que causam mudanças no climam provêm do desmatamento).

c promover uma re-organização da indústria, da produção de energia, do transporte e dos padrões de consumo capitalistas, estimulando o controle público desses setores.

d realizar um financiamento massivo em projetos de energia renovável, eficiência energética, de transporte coletivo de massa e ciclovias.

4. Gênero e Raça/Etnia Dados estatísticos e pesquisas mostram a existência de um grave quadro de desigualdade de gênero, raça e etnia na sociedade brasileira. Vivemos uma verdadeira segregação que afeta toda a sociedade e é sustentada pelas instituições políticas e sociais. É impossível pensar uma política de financiamento do desenvolvimento sem considerar que essas questões são estruturadoras das desigualdades no País. Nesse sentido, o Banco deve:

a apresentar para a sociedade civil as medidas já adotadas, e ainda por tomar, para aplicar a diretriz de redução das desigualdades, conforme determina a LDO de 2008 (observar a diretriz de redução das desigualdades de gênero, raça, etnia, geracional, regional e de pessoas com deficiência, publicar relatório anual do impacto de suas operações de crédito no combate às desigualdades mencionadas acima e não financiar instituições cujos diretores foram condenados por assédio moral, racismo ou trabalho escravo) e criar mecanismos de monitoramento, participação e controle social em relação ao cumprimento dessas diretrizes.

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b vincular a liberação dos empréstimos à avaliação de impactos nas desigualdades e financiar projetos que favoreçam a igualdade.

c estabelecer critérios de gênero e raça na contratação, promoção e política salarial dos seus próprios funcionários, inclusive através de ações afirmativas.

d financiar projetos que fortaleçam os povos e comunidades indígenas e tradicionais nos aspectos econômicos e culturais, em áreas estratégicas, como educação, saúde, e do uso, manejo e conservação dos territórios e dos recursos naturais. Para isso, o Banco precisa criar critérios para garantir que os investimentos não exijam ou resultem em uma transformação cultural desses povos.

5. Trabalho e Renda O BNDES afirma que os projetos que financia geram mais empregos do que os que não recebem empréstimos. No entanto, para ir além disso, o Banco precisa:

a incluir uma avaliação de como a renda média dos trabalhadores muda. b diminuir financiamentos a empresas que contratam outras empresas (subcontratam ou terceirizam) para desenvolver seus produtos e/ou serviços. No caso de empresas do agronegócio, o Banco precisa saber se elas contratam produtos da agricultura familiar e, se sim, garantir que o preço pago seja justo.

c exigir que as empresas que recebem financiamento têm e cumprem metas de criação de empregos formais, respeitam a sindicalização e a organização no local de trabalho, além de controlar a terceirização e a precarização do trabalho.

d considerar as condições de trabalho como critério para a aprovação de novos projetos. Isso é urgente por causa da expansão da produção do etanol.

Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, nos últimos cinco anos, somente em São Paulo, 1.383 trabalhadores do corte de cana morreram por causa das péssimas condições de trabalho.

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EIXO 3

Políticas Setoriais

O BNDES precisa redefinir suas prioridades a partir das políticas apresentadas: 1. Infra-estrutura social O BNDES investiu em dez anos (1997 -2006 ), de um total de R$ 312 bilhões, apenas R$ 1,9 bilhão em saúde e serviço social (0.6%), R$ 1,5 bilhão em educação (0.4%) e R$ 687,5 milhões em saneamento (0,02%). A falta de informações não permite uma avaliação da qualidade dos projetos financiados, nem como as escolhas foram feitas. No entanto, os programas do Banco nessa área devem ser redesenhados com urgência, buscando a solução de problemas estruturais que impedem o desenvolvimento. Neste sentido, o Banco deve:

a privilegiar o fortalecimento das empresas públicas que fornecem bens e serviços sociais e não financiar projetos relacionados à privatização desses serviços e bens.

b ter canais efetivos de interlocução com os órgãos do governo que formulam as políticas públicas de infra-estrutura social para garantir que os investimentos do BNDES seguem suas diretrizes.

c incluir os aspectos sociais - e não apenas os econômicos - na análise dos investimentos. 2. Descentralização do Crédito Atualmente, o BNDES considera mais a capacidade de endividamento do que as garantias de que o projeto será inserido na dinâmica socioeconômica local. Além disso, o Banco trata cooperativas de crédito (que repassam os seus recursos), da mesma forma que trata outros bancos, como o Bradesco – que é hoje o principal agente financeiro do BNDES em termos de volume de recursos. Nestes termos, o BNDES deve:

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a financiar mais projetos de associações e cooperativas de trabalhadores/as, além de oferecer melhores condições de acesso ao crédito.

b fomentar os fundos solidários que apoiam micro-empresas e articular melhor seus créditos com outras iniciativas de crédito do governo.

3. Desenvolvimento Rural Agroecológico Atualmente, o BNDES prioriza o financiamento do modelo agrícola exportador que, centrado na monocultura, desloca e inviabiliza a vida de milhares de pequenos produtores/as rurais e populações indígenas e tradicionais. Para mudar esse modelo, o Banco deve considerar a importância da agricultura familiar a partir do que já existe como prática de desenvolvimento rural e o que poderia existir, caso o Banco mudasse seus financiamentos. O Banco deve, então:

a financiar projetos de agroecologia – objetivando fortalecer a soberania alimentar - combinados com um programa amplo de formação, assistência técnica e extensão rural.

b investir diretamente em cooperativas de produção de agricultura familiar, no âmbito da economia solidária. Esses investimentos devem estar vinculados à produção de alimentos e possibilitar ao produtor a venda direta de seus produtos.

c ampliar e direcionar os recursos do Fundo Social e do Funtec para a população rural.

d reorientar o financiamento a empresas monocultoras – celulose, soja, cana de açúcar - em favor de uma agropecuária social e ambientalmente justa, voltada para o mercado interno, e de projetos de conservação e manejo florestal.

e realizar uma auditoria independente – com participação de organizações sociais – sobre o financiamento para o setor de papel e celulose (responsável por graves confitos socioambientais) realizado pelo Banco.

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4. Energia e Clima Para o BNDES , o investidor em energia é apenas mais um lucrativo tomador de empréstimo, não considerando a relação do setor com o tipo de desenvolvimento que se produz. Transformar o atual modelo de desenvolvimento, demanda que o Banco adote compromissos que respeitem o meio ambiente como herança da humanidade e a vida das suas populações. Neste sentido, o Banco deve:

a se comprometer em não financiar a expansão da energia nuclear. b como já mencionado, considerar, nos pedidos de financiamento, o indicador de emissão de carbono e outros gases de efeito estufa.

c condicionar os financiamentos para novas usinas hidrelétricas à implementação de critérios socioambientais. Dessa forma, empresas envolvidas em conflitos socioambientais pendentes não deverão receber novos financiamentos.

d apostar estrategicamente em energia eólica, solar e biomassa e financiar a sua viabilidade técnica e econômica.

e redefinir os critérios de inscrição de projetos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) para possibilitar o acesso de pequenas empresas aos recursos.

Produtos de exportação e consumo de energia Em 2004 , os setores alumínio, siderurgia, ferroligas e o de papel e celulose consumiram mais de 1/3 do consumo de energia industrial do Brasil, o que representa 17,4% do consumo total de eletricidade no País. No mesmo ano, 71,3 % do alumínio foi destinado à exportação. No caso de ferroliga, 45,3% da produção foi exportada. Siderurgia exportou 63,6%, celulose 51% e papel 22% de suas produções. Essas exportações consumiram

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f financiar a poupança de energia e a produção de equipamentos e eletrodomésticos eficientes.

g financiar projetos de repotenciação e eficiência da geração energética das hidrelétricas já instaladas no Brasil.

h considerar a energia que se gasta para produzir os produtos de exportação. Durante o quase apagão de 2001 , todas as indústrias que dependem de muita energia não tiveram que deixar de produzir ou vender seus produtos. Assim, é preciso reduzir o financiamento a esse tipo de empresa (produtora de alumínio primário; siderúrgica; de ferroligas; e de papel e celulose), em articulação com a política energética nacional. O crédito e as condições de financiamento a essas empresas deverá se coordenar com outras demandas energéticas, com prioridade ao atendimento às necessidades mais básicas da população brasileira e a cadeias de produção intensivas em utilização de mão de obra, desde que respeitados todos os critérios socioambientais.

5. Integração Regional O BNDES é hoje um instrumento de política externa do Brasil, tendo significativa influência política e financeira fora do País através de iniciativas chamadas de “integração regional”. Em vez de estimular a complementaridade entre os países da América Latina e Caribe, as iniciativas do BNDES são, na verdade, voltadas para garantir a forte presença do Brasil no mercado internacional – pois financiam a exportação de produtos e serviços brasileiros - e atender às demandas desse mercado. Como ocorre aqui, os financiamentos do Banco para os outros países nessa área são determinados exclusivamente pelo aumento dos lucros das empresas privadas que tomam o crédito, sem consideração pelos impactos socioambientais e culturais dos projetos.

44,7% da energia total contida nos produtos, ou seja, metade da energia consumida por esses setores é destinada à exportação. Além disso, a geração de emprego e renda nesses setores é muito baixa em relação ao consumo de eletricidade. O setor de alumínio, por exemplo, gera 0,7 emprego por cada GWh de energia elétrica, enquanto o setor de alimentos e bebidas gera 57,9 8. 8. BERMAN, C. A Matriz Energética. In FURTADO, F (org). O BNDES que temos e o que queremos: o papel do BNDES no financiamento do desenvolvimento nacional democrático, São Paulo: Editora Expressão Popular, 2007.

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Assim sendo, a integração que o BNDES deve financiar precisa:

1 promover a conquista de espaços de autonomia e soberania para que cada país possa definir suas próprias políticas públicas.

2 promover valores de igualdade, participação, pluralidade, complementaridade e solidariedade.

3 recuperar e construir outras formas de relação com a natureza que não a considere como um obstáculo a ser superado, explorado e destruído.

4 superar a lógica do endividamento que subordina os países chamados de devedores.

5 ir muito além de uma integração pensada como área de livre circulação de mercadorias. Para tanto, o Banco deve:

a criar mecanismos de participação, monitoramento e controle social, por parte das organizações sociais dos países afetados, para uma discussão coletiva das propostas de financiamento à integração.

b apoiar projetos que fortaleçam a integração regional e intraregional, promovendo o avanço da ciência e tecnologia; intercâmbio cultural; comunicação; e economia solidária, dentre outros.

c basear os projetos de integração física e energética nas necessidades locais e regionais e no respeito ao meio ambiente e às populações locais.

d apoiar a criação de novos instrumentos regionais de financiamento soberano.

e cumprir todas as exigências da Plataforma também para os projetos financiados fora do País.

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PRÓXIMOS PASSOS

Além das reivindicações anteriormente citadas, a articulação Plataforma BNDES também apresentou ao Banco uma agenda de curto prazo, destacada da agenda completa. Essa agenda de curto prazo envolve:

1 a publicação na página eletrônica do Banco da lista de todos os projetos – incluindo os privados - que receberam financiamento direto do BNDES , de acordo com os critérios sugeridos no documento completo (eixo 1). Como já mencionado, o Banco publicou a lista dos cinqüenta maiores projetos dos seus quatro setores do ano de 2007. No entanto, é preciso avançar porque as informações divulgadas não incluem tudo que foi solicitado e não permitem um efetivo controle social.

2 iniciar um debate com o Banco sobre a aplicação das exigências da LDO de 2008 no que diz respeito à redução das desigualdades.

3 a criação de um espaço de interlocução (eixo 2) diretamente vinculado à Presidência do Banco, com superintendentes de todas as áreas, e não somente de uma diretoria, para debater as agendas propostas pela Plataforma. Até o momento, o diálogo vem ocorrendo com o gabinete do presidente Luciano Coutinho, mas ainda não com os superintendentes das diferentes áreas do Banco.

4 debater a atuação do Banco no financiamento às seguintes áreas: saneamento, etanol, papel e celulose, integração regional e hidrelétricas. O setor de etanol já está sendo debatido com o Banco.

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Avanços importantes foram conquistados por esta articulação no que diz respeito ao diálogo com o BNDES . No entanto, o modelo de desenvolvimento promovido pelo Banco continua sendo baseado no crescimento econômico de alguns agentes financeiros privados, com altos custos socioambientais para a maioria da sociedade brasileira e dos outros países onde o Banco, crescentemente, atua. O BNDES continua muito longe de promover justiça socioambiental. Pelo contrário, com seu orçamento gigantesco, serve como instrumento para tornar o Brasil e a América do Sul em um canteiro de obras de infra-estrutura e uma plataforma de exportação de produtos, que dependem da exploração injusta de recursos naturais e mão-de-obra barata. Esse modelo não só inviabiliza a vida de milhões de agricultores e agricultoras familiares, populações indígenas e quilombolas, mas a vida como ela é. No momento em que uma das piores crises ecológicas afeta a humanidade – as mudanças climáticas (resultado direto do modelo capitalista de produção e consumo), o BNDES continua promovendo o financiamento de projetos que dependem da destruição ambiental. Em linhas gerais, o BNDES deve impor rígidos critérios socioambientais, raciais, étnicos, geracionais, de gênero e regionais aos seus empréstimos para superar qualquer tipo de desigualdade e atender às necessidades históricas do País. Ou seja, o BNDES deve promover um novo projeto de desenvolvimento. Por enquanto, o BNDES que temos ainda não é o que queremos. E isso só será revertido com muita mobilização e pressão social.

Para acessar a Plataforma BNDES : www.rbrasil.org.br

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A Rede Brasil é uma rede de organizações, centros acadêmicos, sindicatos e movimentos sociais da sociedade civil brasileira, sem fins lucrativos, não partidária e com finalidade pública. Fundada em 1995, a Rede Brasil reúne atualmente 82 organizações filiadas com o objetivo comum de acompanhar e intervir em questões relativas às ações de Instituições Financeiras Multilaterais no Brasil, tais como o Grupo Banco Mundial (GBM), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Além disso, monitora as ações de outros agentes financeiros, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), buscando um financiamento ao desenvolvimento capaz de superar situações de pobreza e as desigualdades de renda, raça, gênero, etnia, regionais e geracionais. Edifício Venâncio 2000 SCS Qd 08 . Bloco B-50 . salas 415/417 70333-970 . Brasilia . DF . Brasil t +55 61 3321.6108 www.rbrasil.org.br

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Edifício Venâncio 2000 SCS Qd 08 . Bloco B-50 . salas 415/417 70333-970 . Brasilia . DF . Brasil t +55 61 3321.6108 www.rbrasil.org.br

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