Lester Brown - Plano B

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PLANO B 2.0


Earth Policy Institute, Washington DC www.earth-policy.org Câmara Municipal de Trancoso, Portugal Tribunal Europeu doAmbiente, Londres www.eeft.org/eeft.html Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias - Observatório www.asa-art.com/facto.html


PLANO B 2.0 Resgatando um Planeta sob Stress e uma Civilização em Apuros

Lester R. Brown tradução: Emanuel Cerveira Pinto

Earth Policy Institute Tribunal Europeu do Ambiente Câmara Municipal de Trancoso Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias Observatório


Copyright © 2006 by Earth Policy Institute Copyright desta edição © Câmara Municipal de Trancoso, Tribunal Europeu do Ambiente, Fundação para as Artes Ciências e Tecnologias - Observatório Os direitos autorais dos textos de introdução são reservados aos seus respectivos autores. Impresso em Portugal, 2006 capa: de Emanuel Dimas de Melo Pimenta, 2006, utilizando imagem de pormenor da abóbada da Capela Sixtina (1508-1512), A Criação de Adão, de Michelangelo Buonarroti e fragmentos da partitura virtual da composição musical intitulada VAC (1994), de sua autoria. Primeira Edição em Língua Portuguesa Tradução: Emanuel Cerveira Pinto Conselho Editorial: Emanuel Dimas de Melo Pimenta e António Cerveira Pinto A marca Earth Policy Institute está registada sob o US Patent e Trademark Office As opiniões expressas neste livro são dos seus autores e não representam necessariamente aquelas do Earth Policy Institute, da Câmara Municipal de Trancoso, da Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias - Observatório, ou do Tribunal Europeu do Ambiente, dos seus directores, adminsitradores, funcionários ou colaboradores, ou mesmo dos seus fundadores. A arte final deste livro ficou a cargo da ASA Art and Technology, de Londres. Brown, Lester Russel, 1934 Plano B 2.0: Resgatando um planeta sob stress e uma civilização em apuros 1. Política Ambiental - Aspectos Económicos. 2. Recursos Naturais - Gestão. 3. Desenvolvimento Económico - Aspectos Económicos.


Lester Brown conta-nos como construir um mundo mais justo e salvar o planeta de mudanças climáticas numa forma prática e directa. Deveríamos todos seguir os seus conselhos Bill Clinton



O artista Alemão Joseph Beuys costumava dizer que o valor que damos a uma coisa, a uma obra de arte por exemplo, nada mais é que a energia nela acumulada. Essa misteriosa energia era, para ele, a atenção, a dedicação conferida pelo acto humano. Sabemos bem o que ele defendia, todos os dias, em nosso quotidiano, quando diferenciamos até mesmo os mais simples objectos. Segundo o seu pensamento, esta edição do PLANO B 2.0 estaria plena de energia. Apesar da total falta de recursos, gradualmente, as pessoas foram envolvendo-se nela, de forma gratuita e generosa, tornando-a possível. Cabe agradecer o inestimável apoio da INAPA Portugal – Distribuição de Papel SA, que gentilmente ofereceu o papel para esta edição; à INOVA Artes Gráficas, que ofereceu a impressão e a tinta; à ASA Art and Technology, de Londres, pelas artes finais e divulgação; ao António Cerveira Pinto, que, para além de ter indicado a obra para tradução e ter feito todos os contactos iniciais com o Earth Policy Institute de Washington, não apenas acompanhou o processo de publicação, como também contribuiu com a sua sempre dedicada e criteriosa supervisão; ao Earth Policy Institute e a Lester Brown pela cedência dos direitos de autor para esta edição; à Reah Janise Kauffman pela sua atenção e entusiasmo; à Câmara Municipal de Trancoso e, em especial, ao seu presidente, Dr. Júlio Sarmento, sem cujo apoio esta edição seguramente não teria sido possível. Mágica onda que sedimenta a esperança num futuro mais seguro para toda a Humanidade.

Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias Observatório 2006



Conteúdo

Breve introdução por Júlio Sarmento Simbiose Planetária por Emanuel Pimenta FuturoAnterior porAntónio Cerveira Pinto

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Sobre o Autor Prefácio por Lester Brown

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1. Entrando num Mundo Novo

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A Natureza do Novo Mundo Aprendendo com a China Aprendendo com o Passado As Políticas Emergentes da Escassez Obtendo o Preço Certo Plano B - Um Plano de Esperança

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I. UMA CIVILIZAÇÃO EM APUROS 2. Para Além do Pico do Petróleo O Próximo Declínio do Petróleo A Intensidade do Petróleo nos Produtos Alimentares A Queda da Taxa de Câmbio Trigo-Petróleo Alimentos e Combustíveis Competem pela Terra As Cidades e os Subúrbios Depois do Pico do Petróleo O Mundo Depois dos Picos do Petróleo

59 60 65 69 71 78 80


3. Emergência da Falta de Água

85

O Abaixamento dos Níveis Freáticos Rios que Secam Lagos que Desaparecem Agricultores em Perda Face às Cidades A Escassez Atravessa as Fronteiras Nacionais Uma Economia de Bolha Alimentar

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4. Temperaturas mais Altas e Subida do Nível do Mar

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O Aumento da Temperatura e os Seus Efeitos O Efeito da Produção Agrícola Reservatórios no Céu Gelo que Derrete e Mares que Sobem Tempestades Mais Destrutivas Subsidiando a Alteração Climática

5. Sistemas Naturais em Stress Diminuição das Florestas: os Custos Solo que se Perde Pastos que se Deterioram Desertos que Avançam Bancos de Pesca em Colapso Plantas e Animais que Desaparecem

6. Sinais Precoces do Declínio O Nosso Mundo Dividido Socialmente O Crescente Desafio à Saúde A Economia do Desperdício em Apuros Conflitos da População e dos Recursos Refugiados do Ambiente no Horizonte Estados Falhados e Terrorismo

107 111 114 116 123 127

129 130 135 138 141 144 148

153 154 158 164 166 171 175


II. A RESPOSTA - PLANO B 7. Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População

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Educação Básica Generalizada Estabilizando a População Melhor Saúde Para Todos Controlar a Epidemia do HIV Reduzindo os Subsídios e as Dívidas da Agricultura Um Orçamento para a Erradicação da Pobreza

183 187 191 195 198 201

8. Restaurando a Terra Protegendo e Restaurando as Florestas Conservando e Reconstruindo os Solos Satisfazendo as Necessidades de Água da Natureza Regenerando os Bancos de Pesca Protegendo a Diversidade de Plantas e Animais O Orçamento de Restauração da Terra

9.Alimentar Bem Sete Mil Milhões Repensando a Produtividade da Terra Aumentando a Produtividade da Água Produzindo Proteínas de Forma Mais Eficiente Novos Sistemas de Produção de Proteínas Descer na Cadeia Alimentar Acção em Muitas Frentes

10. Estabilizando o Clima Aumentando a Produtividade Energética Dominando o Vento Carros Híbridos e Energia Eólica Convertendo a Luz do Sol em Electricidade Energia da Terra Reduzir Rapidamente as Emissões de Carbono

205 206 214 218 220 223 225

231 232 236 240 245 249 252

255 258 261 267 270 275 278


11. Concebendo Cidades Sustentáveis A Ecologia das Cidades Redesenhando o Transporte Urbano Agricultura na Cidade Reduzindo o Consumo de Água Urbana O Desafio dos Guetos Urbanos Cidades para Pessoas

283 286 289 294 298 302 304

III. UMA NOVA E EXCITANTE OPÇÃO 12. Construindo uma Nova Economia Mudando os Impostos Mudando os Subsídios Eco-Rotulagem: Votando com as Nossas Carteiras Uma Economia de Novos Materiais Novas Indústrias, Novos Postos de Trabalho A Revolução Ambiental

311 313 319 322 326 333 336

13. Plano B: Construindo um Futuro Novo Ouvindo os Sinais de Despertar Uma Mobilização de Tempo de Guerra Mobilizar Para Salvar a Civilização Um Apelo à Grandeza de Espírito Você e Eu

339 341 345 347 354 358

RecursosAdicionais

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As notas deste livro estão disponíveis em http://www.earth-policy.org/Books/PB2/pb2notes.pdf


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O Município de Trancoso associa-se à primeira edição em língua Portuguesa da notável obra do Professor Lester Brown, com o claro propósito de contribuir para a divulgação de uma das mais lúcidas reflexões intelectuais do nosso tempo acerca das ameaças ambientais que pairam sobre o planeta, e a necessidade emergente de políticas que apontem caminhos novos e ajudem a construir um mundo melhor. Júlio Sarmento Presidente da Câmara Municipal de Trancoso Portugal, 2006



Simbiose Planetária O imperativo da metamorfose deve exigir que os universos mineral e orgânico tornem-se Mente com a sua mais avançada forma, como a verdadeira e vívida “memória” de si mesma, nenhum detalhe ignorado. O resgate total da totalidade da evolução, um estado de ressurreição. Paolo Soleri

Contrariamente ao que geralmente se diz, desde há muito as questões ambientais têm exercido um imenso fascínio sobre o ser humano. Diz-se que terá sido uma reacção à emergência das primeiras cidades, há mais de dez mil anos, em pleno Neolítico, que terá produzido a ideia de paraíso – palavra que surge do Persa paridaiza, significando recinto do senhor... e que seria um jardim. Algum tempo mais tarde, em cerca de 2.700 anos antes da era comum, surgem na Mesopotâmia, mais precisamente em Ur, os primeiros decretos legais que se conhece destinados especificamente à protecção das florestas que ainda não tinham sido destruídas. Os Gregos encantaram-se com aqueles magníficos paraísos artificiais designados pelo paridaiza e transformaram a expressão Persa em paradeisos. A pa-


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lavra Grega transformou-se, quase sem alterações, no Latim paradisus, que passou a ser usada para traduzir livremente o Hebraico edhem – que era o jardim onde Adão e Eva teriam vivido, no texto Bíblico, em perfeita harmonia com a Natureza. Em Hebraico, edhem significa simplesmente “deleite”. O deleite implica o envolvimento sensorial directo e acústico, em termos lógicos, da pessoa com o ambiente. É a escala tribal. Na misteriosa e encantadora Índia, em 256 a.C. o legendário rei Ashoka estabelecia o Edital dos Sete Pilares, um dos quais protegia especificamente os mais diversos tipos de animais como papagaios, patos selvagens, morcegos, para além de vários tipos de peixes, tartarugas e formigas entre outros. Em Roma Antiga, as críticas à poluição do ar e à poluição sonora eram comuns e encontravam repercussão no grande poeta Horácio quando dizia da “fumaça, da prosperidade e do ruído de Roma...”. Muito mais tarde, já nas fronteiras do Renascimento, cunhado pela fusão do papel e do alfabeto fonético, Petrarca anunciava uma nova era. Do alto do Monte Ventoso, escrevia uma tumultuosa carta ao seu grande amigo Dionisio da Borgo San Sepolcro onde destilava o seu espanto e atordoamento face ao indivíduo que ele subitamente descobria em si mesmo, face à comunidade que tornava-se pequena e distante vista do alto do monte.


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Imagem que seria fabulosamente sublimada por Shakespeare, no Rei Lear, quando Edgar diz ao cego Gloucester – “Vinde, sir, este é o lugar. Ficai quieto. Como é horrível e como entontece lançar os olhos àquelas profundezas! Os corvos e as gralhas que por lá voam são do tamanho de besouros; à meia encosta alguém está pendurado a colher uvas – que horrível ofício! Diria que não é maior que a sua própria cabeça. Os pescadores que agora caminham pela praia parecem ratos... Não vou olhar mais. Receio que a vertigem ou alguma perturbação na vista faça-me cair de cabeça para baixo”. Shakespeare lançava no texto, como conteúdo, a nova tecnologia que surgia – aquilo que desenharia a sociedade visual dos séculos seguintes. Para o universo visual, mecânico e literário o ambiente não mais é o envolvimento total que projectou a palavra edhem, nem o deleite que levou o Rei Ashoka a proteger várias espécies de animais, ou mesmo aquilo que levou Horácio a tratar da prosperidade, da poluição sonora e do ar como signos da urbis. Uma urbis ainda não suficientemente visual para ser plenamente dividida em departamentos. O mundo da literatura e da visão divide, selecciona e classifica – tornando o ser humano em algo diferente de onde está, em todos os sentidos. Mas isso acontece enquanto um fenómeno localizado, individual. Para a visão, raramente há grandes e complexas totalidades, mas bolsões de totalidade, peças completas,


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departamentos de um sistema maior – como o mecanismo de um relógio. Desencadeado pelo Sputnik em 1957, e mais especialmente após a década de 1970, o ambiente global foi tornando-se, gradualmente, no principal objecto do mundo – depois que os sistemas planetários de telecomunicação tornaram o planeta Terra no seu próprio conteúdo, símbolo. É aí que surge James Lovelock e a hipótese de Gaia – tomando a Terra como um superorganismo, expressão tomada da genial Lynn Margulis. Hipótese duramente criticada por Richard Dawkins e Ford Doolittle, para quem o facto das mutações evolutivas acontecerem em termos locais e individuais condenaria a hipótese de um planeta vivendo sob um processo de homeostase global. Foi necessário um processo de profunda desencarnação, primeiro com o telefone, depois com a rádio e a televisão, para que o planeta se tornasse, ele todo, num símbolo, em algo destacável, tangível, algo separado de nós, como determinaria a cultura literária, aqui também tornada conteúdo de uma nova explosão civilizatória. Isto porque o mundo visual tornou-se conteúdo do universo virtual. Assim, mesmo lidando com o planeta como um todo, muitas pessoas ainda defendem tratar a Terra como um conjunto de departamentos estanques, isolados uns dos outros.


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Normalmente não percebemos como isso acontece. Somos iludidos pelo nosso pensamento, que é como conhecemos. Ou seja, aquilo que conhecemos é a nossa forma de conhecer. Por essa via, vamos lidando com símbolos e articulando elaborações metafóricas de todo tipo, acreditando estarmos tratando da coisa em si. Mas, a coisa em si somos nós. Assim, a ideia de Margulis emerge com todo o vigor sob uma nova lógica, segundo a qual o princípio do terceiro excluído, defendido por Aristóteles, deixa de fazer sentido. Somos e não somos – tudo confluindo para uma verdadeira simbiose planetária, tudo interagindo todo o tempo, como H. G. Wells tão habilmente intuiu na Guerra dos Mundos. O Tribunal Europeu do Ambiente visa a questão ambiental como elemento antropológico, cultural e total. Não mais as estratégias visuais, nem as antigas estruturas tribais. Uma abordagem transdisciplinar, descontínua e permanentemente criativa. Foi assim que o artista e pensador, crítico do mundo, António Cerveira Pinto, sugeriu a tradução – pela primeira vez para a língua Portuguesa – da célebre obra de Lester Brown PLANO B 2.0. Uma indicação mais que apropriada de um livro que tem girado o mundo, provocando todo o tipo de discussões.


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António Cerveira Pinto tem dedicado parte dos últimos anos à permanente reflexão acerca dos destinos planetários. Uma das suas obras mais interessantes nesse sentido é O Grande Estuário, em Lisboa – que já previa, desde a sua origem, muitas das ideias defendidas por Lester Brown. Esta edição histórica do PLANO B 2.0 apenas foi possível pelo apoio, sempre entusiástico, do Dr. Júlio Sarmento, Presidente da Câmara Municipal de Trancoso. E é, tanto para o Tribunal Europeu do Ambiente como para cada um de nós, um momento de excelência quando podemos reflectir livremente sobre as ideias de Lester Brown. Um momento de liberdade e descoberta, conferindo a cada ser humano a responsabilidade de desenhar mudanças num mundo em permanente metamorfose.

Emanuel Dimas de Melo Pimenta Tribunal Europeu do Ambiente Londres 2006


Futuro anterior Foi depois de ler, em 2002, Beyond the Limits (1992), de Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows e Jürgen Randers, os mesmos que em 1972 publicaram Limits to Growth sob o patrocínio do Clube de Roma, cuja edição actualizada viria a ler em 2004, que o meu espírito entrou em alerta laranja relativamente aos horizontes do nosso futuro colectivo. As leituras sobre este tema sucederam-se e não pararam mais: o célebre e premonitório relatório de M. King Hubbert Nuclear Energy and Fossil Fuels (1956), The Long Emergency, de James Howard Kunstler (2005), Peaking of World Oil Production: Impacts, Mitigation and Risk Management, de Robert L. Hirsch (2005), Collapse, de Jared Diamond (2005) e Plan B 2.0, de Lester R. Brown (2006)...

Calcula-se que a população mundial crescerá em duzentos anos (1850-2050), período que corresponde grosso modo à duração da era industrial, de 1,26 para cerca de 9,1 mil milhões de habitantes. Esta explosão demográfica, que acabará inevitavelmente por regredir, entrou a partir da década de 70 do século 20 num quadro ecológico ameaçado pela escassez de vários factores essenciais à sua própria curva de crescimento: água


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potável, água para regar os cultivos destinados à alimentação (mas também à produção de bio-combustíveis!), terra arável, combustíveis fósseis baratos (carvão, petróleo, gás natural) e boa parte dos metais que alimentaram até hoje o nosso hiper-desenvolvimento: ferro, cobre, alumínio, níquel, estanho, zinco, prata, platina e ouro. Por outro lado, o crescimento actual gera uma poluição letal, sobretudo nos países emergentes e em vias de desenvolvimento, de que a tonelagem de resíduos tóxicos dificilmente recicláveis e as emissões de carbono para a atmosfera são dois alarmantes indicadores. Do ponto de vista do paradigma actual do desenvolvimento (crescimento contínuo do PIB, concentração financeira e globalização), estamos mergulhados numa crise energética e num dilema sem precedentes.

As energias renováveis de que se tem falado muito ultimamente (eólica e solar) são caras, tendo um EROEI (“Energy Return On Energy Invested”) relativamente baixo, ou mesmo negativo, razão pela qual têm dependido de subsídios estatais em todo o mundo. O mais provável é que estes custos venham a ser suportados pelo consumidor através de adicionais às facturas que lhe são apresentadas. Por outro lado, o aumento da procura e a diminuição-encarecimento das reservas de combustíveis fósseis (sobretudo líquidos), não só elevará os respectivos custos, como continuará a repercutir este encarecimento nos custos de produção das próprias energias e combustíveis alternativos, deitando por


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terra a possibilidade de encontrarmos uma alternativa efectiva (em termos de quantidade, qualidade, potencial, versatilidade e preço) ao uso do petróleo, do gás natural e das centrais hídricas e nucleares na produção de energia. Não nos esqueçamos que 50-60% do petróleo consumido no mundo vai direitinho para o sector dos transportes. Seja como for, pela via da expansão das energias renováveis, complementando, mas nunca substituindo, pelo menos para já, as não-renováveis, assistiremos a um aumento acentuado e contínuo do preço dos combustíveis, sejam eles quais forem. A consequência deste aumento progressivo do preço da energia será a inflação e o aumento das taxas de juro em todo o mundo. A que se seguirá inevitavelmente a destruição de muitas economias nacionais e privadas, decréscimos dramáticos do consumo e do emprego e uma diminuição acentuada da procura de energia. Só não sabemos quanto é que tudo isto vai custar em vidas humanas. No outro extremo do dilema temos a criação e desenvolvimento de novas modalidades de energia nuclear: reactores de quarta geração (Gen IV), cujas primeiras versões comerciais poderão funcionar a partir de 2030, e centrais de fusão nuclear, cujo primeiro reactor experimental deverá prestar provas em 2016. Tudo somado, pode dizer-se que uma nova alternativa nuclear, mais segura e de altíssimo rendimento, poderia começar a substituir as actuais centrais nucleares a partir de 2050, perfilando-se assim esta forma de energia hipertecnológica como o elo de continuidade entre a civiliza-


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ção carbónica e a civilização nuclear. Sucede porém, que esta alternativa, em vez de empurrar a humanidade para uma espécie de idade média tecnológica, corre o risco de acelerar ainda mais o processo de exaustão dos recursos disponíveis, a não ser que até lá consigamos resolver o problema demográfico (sobretudo em África e na Ásia), o problema da fome e o problema da poluição, revertendo de vez o paradigma económico actual. Por fim, no que à alternativa nuclear (GEN IV e de fusão) se refere, apenas produzirá electricidade, não resolvendo o problema da infinidade de produtos derivados do petróleo e do gás natural absolutamente essenciais ao actual estilo de vida dos países: combustíveis líquidos, plásticos, pesticidas e fertilizantes, tintas, vernizes, decapantes e remédios, entre outros.

Para além da emergência energética que acabamos de descrever sumariamente, num tom mais dramático que o de Plano B 2.0 (que é, antes de mais, um desafio à criatividade e uma aposta na sobrevivência da nossa civilização), as alterações climáticas que têm vindo a ser detectadas pela esmagadora maioria dos observadores científicos de todo o mundo ameaçam lançar o planeta Terra num período de aquecimento global-arrefecimento local catastrófico. A possibilidade de um colapso da civilização, precedido de crises energéticas agudas, de crises sociais gravíssimas, de crises militares brutais, de uma recessão económica mundial de longa duração, da queda em dominó dos sistemas financeiros e da paralisia de boa parte das ci-


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dades e redes urbanas existentes deixou de ser um cenário de ficção cinematográfica. Todos os ingredientes da tragédia estão já no terreno. Haverá um Plano B? O livro de Lester R. Brown é uma excelente e urgente resposta a esta pergunta. Por isso recomendei a sua tradução para a língua portuguesa ao Emanuel Dimas de Melo Pimenta, assim que aceitei colaborar com ele na organização do Encontro As Origens do Futuro, do Tribunal Europeu do Ambiente, que terá lugar em Trancoso no mês de Outubro de 2006. António Cerveira Pinto 2006



Sobre o Autor Lester R. Brown é Presidente do Earth Policy Institute, uma organização não lucrativa de investigação interdisciplinar baseada em Washington, D.C., fundada por si em 2001. O objectivo do Earth Policy Institute é fornecer uma visão da economia sustentável do ponto de vista ambiental e um roteiro para chegar até lá. Há cerca de 30 anos, Brown esteve entre os pioneiros na concepção do desenvolvimento ambiental sustentável, usando actualmente este conceito no seu projecto de eco-economia. É Fundador e foi Presidente do Worldwatch Institute durante os primeiros 26 anos. Ao longo de uma carreira que começou com a produção agrícola de tomate, Brown foi autor ou co-autor de inúmeros livros e recebeu mais de 20 graus honorários. Os seus livros estão editados em mais de 40 idiomas. Brown é um MacArthur Fellow e recebeu um grande número de prémios e distinções, incluindo o Prémio para o Ambiente das Nações Unidas em 1987, a Medalha de Ouro do World Wide Fund for Nature em 1989, e o Blue Planet Prize em 1994 pelas suas “contribuições excepcionais para a solução dos problemas do ambiente global.” Em 1995, a publicação Marquis Who’s Who, na sua décima quinta edição, seleccionou Lester Brown como um dos 50 americanos mais importantes. Mais recentemente foi-lhe atribuída a Medalha Presidencial de Itália e o Prémio Borgström, pela RealAcademia Sueca da Agricultura e Florestas, e foi nomeado professor honorário daAcademia Chinesa das Ciências. Lester Brown vive em Washington, D.C.



Prefácio

O Plano A, business as usual, mantém o mundo num caminho ambiental que está a conduzir ao declínio económico e a um eventual colapso. Se a nossa meta é assegurar o progresso económico, não temos alternativa senão colocarmo-nos num outro caminho – o Plano B. Esta é a razão pela qual escrevi o Plano B original, em 2003. Há muitas razões para termos actualizado e expandido esta edição de 2003, apresentando o Plano B 2.0. A mais importante é que ainda não há uma consciência suficientemente difundida e partilhada de que temos que construir uma nova economia – e, ainda menos, uma visão sobre como será essa economia. O objectivo deste livro é fazer uma defesa convincente da necessidade de construir a nova economia, dar uma visão mais detalhada sobre como ela será e oferecer um roteiro que nos indique o caminho para lá chegar. Há muitas outras razões para esta nova edição. Um, há novas provas seguras de que o modelo económico ocidental não funcionará com a China. Dois, o fornecimento cada vez mais escasso de petróleo levanta novas e inquietantes questões que merecem atenção. Três, uma vez que a pobreza não pode ser erradicada se os sistemas naturais de apoio continuarem a deteriorar-se, incluímos também aqui um orçamento de restauração da Terra em complemento do orçamento de erradicação da pobreza incluído na primeira edição. Quatro, os avanços tecnológicos dos últimos anos perspectivam novas e excitantes possibilidades de inverter as tendências ambientais que estão a


30 pôr em causa o nosso futuro. E, cinco, queríamos simplesmente fazer uma nova edição devido à inesperada resposta entusiástica que a primeira teve. Para desenvolver o primeiro destes pontos, a China já alcançou os Estados Unidos no consumo dos recursos mais básicos. Entre os principais bens essenciais do sector alimentar (grãos e carne), do sector energético (petróleo e carvão) e da economia industrial (aço), a China já está à frente dos Estados Unidos no consumo de todos menos do petróleo. Que acontecerá se a China alcançar os Estados Unidos no consumo per capita? Se a economia da China continuar a crescer 8 por cento ao ano, o seu rendimento per capita atingirá o nível actual dos EUA em 2031. Se assumirmos que os níveis de consumo per capita chinês em 2031 serão os mesmos que os dos Estados Unidos hoje, então a população de 1.450 mil milhões de habitantes prevista para o país consumiria uma quantidade de grãos igual a dois terços da colheita mundial actual, o seu consumo de papel seria o dobro da actual produção mundial e o consumo de petróleo seria de 99 milhões de barris por dia – muito acima da produção mundial actual de 84 milhões de barris. O modelo económico ocidental não poderá funcionar na China. Nem funcionará na Índia, que em 2031 se prevê que venha a ter uma população ainda maior que a da China, nem para os outros três mil milhões de pessoas dos países em vias de desenvolvimento que também sonham o “sonho americano”. E numa economia mundial cada vez mais integrada, onde todos os países competem pelo mesmo petróleo, grãos e recursos minerais, o modelo económico existente também não funcionará para os países industrializados. A economia baseada nos combustíveis fósseis, centrada no automóvel e no desperdício, tem os dias contados. Relacionado de perto com o crescimento do consumo de recursos na China está a situação, em rápida mudança, do petróleo e as novas questões que isso levanta. Por exemplo, temonos vindo a preocupar há muito com o efeito da subida dos preços do petróleo nos custos da produção alimentar, mas o efeito é ainda mais preocupante na procura de bens essenciais alimen-


31 tares. Uma vez que praticamente tudo o que comemos pode ser convertido em combustível automóvel, quer em destilarias de etanol quer em refinarias de biodiesel, os preços altos do petróleo estão a abrir um novo e vasto mercado para os produtos agrícolas. Os compradores de bens essenciais para os produtores de combustíveis estão a competir directamente com a indústria alimentar pelos fornecimentos de trigo, milho, soja, canade-açúcar e outros produtos alimentares. De facto, os supermercados e as estações de serviço competem agora pela obtenção dos mesmos bens essenciais. O preço do petróleo está a determinar o preço da alimentação simplesmente porque se o valor para combustível de um bem essencial exceder o seu valor para a alimentação, então esse bem será convertido em combustível. À medida que cada vez mais destilarias de etanol e refinarias de biodiesel são construídas, os proprietários afluentes de automóveis deste mundo estarão a competir com os pobres do mundo pelos mesmos bens essenciais. No Plano B original, tínhamos um orçamento para erradicar a pobreza, mas se os sistemas ambientais de suporte da economia entrarem em colapso, a erradicação da pobreza não será possível. Se as terras de cultivo estiverem em erosão e as colheitas a diminuir, se os níveis dos lençóis freáticos estiverem a baixar e os poços a secar, se as terras de pasto se estiverem a transformar em desertos e o gado estiver a morrer, se os bancos de peixe estiverem em colapso, se as florestas estiverem a encolher, e se o aumento das temperaturas estiverem a queimar as colheitas, um programa de erradicação da pobreza – por muito bem que seja concebido e implementado – não terá sucesso. Por esta razão, acrescentámos um orçamento de restauração da Terra para recuperar a sua saúde produtiva da e viabilizar o orçamento para a erradicação da pobreza. Ele inclui os custos de proteger e restaurar solos, florestas, terras de pasto e bancos de peixe oceânico, para além da conservação da diversidade biológica no planeta. Também contempla a necessidade de parar o avanço dos desertos que ameaça deslocar milhões de pessoas.


32 E finalmente, as boas notícias – e outra razão para actualizar o Plano B – são que as novas tecnologias dão uma esperança quanto à forma como lidar com os crescentes desafios com que nos deparamos na frente ambiental. Por exemplo, os avanços nos carros híbridos a gasolina e electricidade e na concepção de turbinas eólicas criaram as condições para a evolução de uma nova economia do combustível automóvel. O uso de híbridos a gasolina e electricidade com uma bateria extra de armazenamento com capacidade de ligação à rede eléctrica permite-nos fazer deslocações de automóvel em distâncias curtas essencialmente à base de electricidade. Se combinarmos isto com o investimento em parques eólicos para fornecer electricidade barata à rede, podemos fornecer, em grande medida, energia aos automóveis com energia do vento. Usar electricidade barata gerada pelo vento para recarregar as baterias durante as horas de menor consumo de electricidade custa o equivalente à gasolina a 50¢ por galão! Este é apenas um exemplo das possibilidades para construirmos uma nova economia que possa sustentar o progresso económico e, ao mesmo tempo, poupar dinheiro, reduzir a dependência do petróleo e reduzir as emissões de carbono. Também nos inspirámos para o Plano B 2.0 com a resposta extraordinária que teve a primeira edição. Olhando para a nossa base de dados de vendas vários meses após a publicação, verificámos que muitas pessoas que tinham encomendado inicialmente uma cópia voltaram a encomendar 5, 10, 20, até 50 ou mais cópias para oferecerem a colegas, a líderes de opinião, líderes políticos e outros. Em resposta a isto, formámos uma Equipa do Plano B com pessoas que encomendaram 5 ou mais cópias. Essa equipa tem agora cerca de 650 pessoas. Ted Turner, que comprou 3.569 cópias para distribuir a Chefes de Estado, ministros, CEOs das empresas da Fortune 500, Congresso dos EUA e outros, foi designado capitão da equipa. Com a Equipa do Plano B agora constituída, na altura em que surge esta revisão expandida, contamos aumentar o seu número de membros de modo a que em breve haja milhares de pessoas a promover activamente este plano para salvar a nossa civilização.


33 Há uma crescente onda de público preocupado com a direcção que o mundo leva e uma crescente consciência de que temos que mudar o rumo. O aumento do preço do petróleo e a crescente competição por este recurso estão a alimentar esta preocupação. O mesmo acontece com as várias manifestações da alteração climática, tais como a fusão do gelo e o aumento do nível do mar. Quando o furacão Katrina deixou no seu rasto uma conta de 200 mil milhões de dólares – quase sete vezes mais que qualquer outra tempestade anterior – isso enviou uma mensagem para o mundo inteiro. É o aumento da preocupação pública que em breve pode começar a virar o processo de criação de políticas na direcção certa, uma direcção que ponha o mundo num caminho ambiental que sustente o progresso económico. Pode ser feito o download gratuito deste livro a partir do nosso Web site. Para obter autorização para imprimir ou extrair partes do manuscrito, contactar Reah Janise Kauffman no Earth Policy Institute. Lester R. Brown Outubro de 2005

Earth Policy Institute 1350 Connecticut Ave. NW Suite 403 Washington, DC 20036 Telefone: +1 202 496-9290 Fax: +1 202 496-9325 E-mail: epi@earthpolicy.org Web site: www.earthpolicy.org



Plano B 2.0



1 Entrando num Mundo Novo

A economia global está a ter um crescimento para além do que a Terra pode suportar, levando a nossa civilização do início do século vinte e um para um ponto cada vez mais perto do declínio e do possível colapso. Enquanto nos preocupamos com relatórios de ganhos trimestrais e com o crescimento económico em cada ano que passa, perdemos a perspectiva da dimensão que adquiriu a empresa humana face aos recursos da Terra. Há um século, o crescimento anual da economia mundial era medido numa escala de grandeza de mil milhões de dólares. Hoje é medido em milhares de milhões de dólares. Como resultado, estamos a consumir recursos renováveis a uma velocidade superior à que levam a regenerar-se. As florestas estão a encolher, as pastagens a deteriorar-se, os níveis freáticos a afundarse, os stocks de pesca estão em colapso, e os solos em erosão. Estamos a usar o petróleo a um ritmo que nos deixa pouco tempo para planear para além do pico do petróleo. E estamos e emitir para a atmosfera gases que provocam efeito de estufa mais rapidamente do que a natureza os consegue absorver, criando as condições para um aumento da temperatura da Terra muito para além do que alguma vez aconteceu desde que a agricultura começou.


Plano B 2.0 A civilização do século vinte e um não é a primeira a seguir numa direcção económica que não é ambientalmente sustentável. Muitas civilizações anteriores também se encontraram em apuros ambientais. Como Jared Diamond nota em Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed, algumas conseguiram mudar de rota e evitar o declínio económico. Outras não. Estudamos os locais arqueológicos dos Sumérios, dos Maias, da Ilha de Páscoa e de outras civilizações antigas que não conseguiram fazer os ajustamentos necessários a tempo.1 38

Felizmente, está a nascer um consenso entre cientistas sobre as linhas mestras das mudanças necessárias. Se queremos um progresso económico que seja sustentável, temos que substituir a economia baseada em combustíveis fósseis, centrada no automóvel, e de desperdício, por um novo modelo económico. Em vez de se basear em combustíveis fósseis, a nova economia será alimentada por fontes abundantes de energia renovável: eólica, solar, geotérmica, hídrica e biocombustíveis. Em vez de se centrarem em torno dos automóveis, os futuros sistemas de transportes serão muito mais diversificados, com emprego generalizado de carris leves, autocarros e bicicletas, a par dos carros. O objectivo será maximizar a mobilidade, não a propriedade de um automóvel. A economia de desperdício será substituída por uma economia abrangente de reutilização e reciclagem. Produtos de consumo, desde carros a computadores, serão concebidos de modo a poderem ser desmontados em peças e completamente reciclados. Produtos de desperdício, como embalagens de bebidas individuais, deixarão de ser usados. As boas novas são que já podemos ter algum vislumbre, aqui e ali, de como esta nova economia será. Temos as tecnologias para a construir – incluindo, por exemplo, carros híbridos a gasolina e electricidade, torres aerogeradoras de última geração, frigoríficos altamente eficientes e sistemas de irrigação de consumo eficiente de água. Podemos ver, tijolo a tijolo, como construir a nova economia.


Entrando num Mundo Novo 39 Com cada parque eólico, painel solar, instalação de reciclagem de papel, trilho de bicicletas e programa de reflorestação, ficamos mais perto de uma economia que possa sustentar o progresso económico. Se, pelo contrário, permanecermos no mesmo caminho económico, a pergunta a fazer não será se a deterioração ambiental conduzirá ao declínio ambiental, mas sim, quando. Nenhuma economia, por mais desenvolvida tecnologicamente que seja, pode sobreviver ao colapso dos seus sistemas de suporte ambiental.

A Natureza do Novo Mundo Entrámos recentemente num novo século, mas estamos também a entrar num novo mundo em que as colisões entre as nossas necessidades e a capacidade da Terra para as satisfazer estão a tornar-se acontecimentos diários. Pode ser mais uma onda de calor de graves consequências nas colheitas, mais uma aldeia abandonada devido à invasão das dunas de areia, ou mais um aquífero que secou. Se não agirmos rapidamente para inverter as tendências, estes eventos aparentemente isolados tornar-se-ão cada vez mais frequentes, aumentando de número e combinando-se para determinar o nosso futuro. Recursos que se acumularam ao longo de uma quantidade enorme de tempo geológico estão a ser consumidos apenas no tempo de uma vida humana. Estamos a ultrapassar limites naturais que não podemos ver e a violar prazos que não conseguimos reconhecer. Estes prazos limite, determinados pela natureza, não são politicamente negociáveis. A natureza tem muitos limites que descobrimos apenas quando já é demasiado tarde. No nosso mundo acelerado, apenas descobrimos que os ultrapassámos depois de o termos feito, restando pouco tempo para ajustes. Por exemplo, quando excedemos a pesca sustentável num banco de peixe, os stocks começam a diminuir. Uma vez ultrapassado este limiar, temos um tempo limitado para arrepiar caminho e aliviar o esforço de pesca. Se não o fizermos neste prazo, a capacidade de alimentar as populações onde a pesca já não é viável diminui, e esta entra em colapso.


Plano B 2.0 Sabemos a partir de civilizações mais antigas que os indicadores principais de declínio económico foram de carácter ambiental, não económico. Primeiro foram-se as árvores, depois o solo e, finalmente, a própria civilização. Para os arqueólogos, esta sequência é demasiado familiar. A nossa situação é bastante mais inquietante porque para além da diminuição das florestas e da erosão dos solos, temos que lidar com abaixamento dos níveis freáticos, com ondas de calor de severos efeitos nas colheitas, stocks de peixe em colapso, desertos em expansão, pastos em deterioração, bancos de corais moribundos, glaciares que se derretem, mares que sobem, tempestades mais poderosas, espécies em extinção e, em breve, fontes de petróleo que se esgotam. Embora estas tendências ecológicas destrutivas sejam evidentes há já algum tempo, e algumas tenham sido invertidas ao nível nacional, nenhuma o foi à escala global. A verdade é que o mundo está no que os ecologistas designam por modo “além dos limites-e-em colapso”. A procura excedeu inúmeras vezes no passado a produção sustentável dos sistemas naturais. Agora, pela primeira vez, isso está a acontecer à escala global. As florestas estão a ver diminuir a totalidade da sua área à escala mundial. O colapso nos stock de peixe espalha-se por toda a parte. As pastagens estão a deteriorar-se em todos os continentes. Os níveis freáticos estão a baixar em muitos países.As emissões de dióxido de carbono (CO2) excedem, por toda a parte, a capacidade da sua absorção e processamento pelo ambiente. Em 2002, uma equipa de cientistas liderada por Mathis Wackernagel, que dirige actualmente o Global Footprint Network, concluiu que as procuras colectivas da humanidade ultrapassaram por volta de 1980 a capacidade regenerativa da Terra. O seu estudo, publicado pela U.S. National Academy of Sciences, estimou que as procuras em 1999 excederam essa capacidade em 20%. Esta diferença, que cresce cerca de 1% ao ano, é agora muito maior. Estamos a satisfazer as procuras actuais delapidando as riquezas naturais da Terra e criando as condições para o declínio e colapso.2 Numa abordagem bastante engenhosa para calcular a presença física humana no planeta, Paul MacCready, fundador e Presidente da AeroVironment e criador do primeiro avião a energia solar, calculou 40


Entrando num Mundo Novo 41 o peso de todos os vertebrados existentes na terra e no ar. Ele refere que quando a agricultura começou, os humanos e o seu stock de animais de criação e domésticos em conjunto constituíam menos de 0,1 por cento do total. Hoje, estima que este grupo constitua 98 por cento da biomassa vertebrada total da Terra, restando apenas 2 por cento para a porção selvagem, que inclui todos os veados, bois-cavalos, elefantes, grandes gatos, pássaros, pequenos mamíferos, etc.3 Os ecologistas estão muito familiarizados com o fenómeno “além dos limites-e-em colapso”. Um dos seus exemplos favoritos começou em 1944, quando a Guarda Costeira introduziu 29 renas na ilha remota de St. Matthew, no Mar de Bearing, para servirem de reserva alimentar aos 19 homens que ali operavam uma estação. Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, um ano mais tarde, a base foi encerrada e os homens deixaram a ilha. Quando o biólogo do U.S. Fish and Wildlife Service, David Kline visitou St. Matthew em 1957, descobriu uma população em expansão de 1.350 renas que se alimentavam de um manto espesso de líquenes que cobria a ilha de 332 quilómetros quadrados. Na ausência de quaisquer predadores, a população estava em explosão. Por volta de 1963, tinha atingido 6.000 unidades. Regressado a St. Matthew em 1966, descobriu uma ilha coberta de esqueletos de rena e não muitos líquenes.Apenas 42 renas tinham sobrevivido: 41 fêmeas e um macho não muito saudável. Não havia animais jovens. Por volta de 1980, as renas restantes tinham morrido.4 Como as renas na ilha de St. Matthew, também nós estamos a consumir em excesso os nossos recursos naturais. Ultrapassar os limites leva, por vezes, ao declínio e, outras vezes, ao colapso completo. Nem sempre é claro qual destes acontece. No primeiro, sobrevive um remanescente da população ou actividade económica num ambiente de recursos depauperados. Por exemplo, à medida que a base dos recursos ambientais da Ilha de Páscoa, no Pacífico Sul, se deteriorou, a população declinou de um máximo de 20.000 pessoas, há alguns séculos, para uma população actual de menos de 4.000. Em contraste, a população de Vikings, da Gronelândia, com 500 anos de existência, entrou em colapso nos anos 1400, desaparecendo completamente face à adversidade ambiental então verificada.5 Desde 2005, cerca de 42 países têm populações que estabilizaram ou diminuíram ligeiramente como resultado da quebra das taxas


Plano B 2.0 42 de natalidade. Mas agora, pela primeira vez, os demógrafos estão a projectar decréscimos populacionais nalguns países devido ao aumento das taxas de mortalidade; entre esses países estão o Botswana, o Lesoto, a Namíbia e a Suazilândia. Na ausência de uma mudança acelerada para um modelo de famílias pequenas, esta lista de países poderá crescer bastante nos próximos anos.6 As mais recentes projecções demográficas de nível médio das Nações Unidas apontam para um aumento da população mundial de 6,1 mil milhões em 2000 para 9,1 mil milhões de pessoas em 2050. Mas um tal aumento parece altamente improvável, se considerarmos a deterioração dos sistemas de suporte da vida actualmente em curso na maior parte do mundo. Será que não alcançaremos os 9,1 mil milhões porque seremos capazes de erradicar a pobreza global e baixar as taxas de natalidade? Ou antes por não o conseguirmos fazer e as taxas de mortalidade começarem a subir, tal como já acontece em muitos países africanos? Enfrentaremos, assim, dois grandes desafios urgentes: reestruturar a economia global e estabilizar a população mundial.7 Ao mesmo tempo que os sistemas económicos de suporte ambiental se deterioram, o mundo está a extrair petróleo com total impunidade. Reconhecidos geólogos pensam que a produção de petróleo pode atingir o seu pico em breve e começar a diminuir. Esta colisão entre a sempre crescente procura do petróleo e os recursos finitos da Terra não é senão a última de uma longa série de colisões. Embora ninguém saiba quando se atingirá o pico da produção de petróleo, o fornecimento já é inferior à procura, conduzindo à subida dos preços.8 Neste novo mundo, o preço do petróleo começa a estabelecer o preço dos alimentos, não tanto devido aos custos crescentes do combustível para a agricultura e indústria alimentar mas mais porque quase tudo o que comemos pode ser convertido em combustível para carros. Neste novo mundo de preços altos do petróleo, os supermercados e as estações de serviço competirão por preços de bens como o trigo, milho, soja e cana-de-açúcar. O trigo que vai para o mercado pode ser convertido em pão para os supermercados ou em etanol para as estações de serviço. O óleo de soja pode ir para as prateleiras dos supermercados ou para as estações de serviço para


Entrando num Mundo Novo 43 ser usado como biodiesel. De facto, os donos dos 800 milhões de carros existentes no mundo irão competir pelos recursos alimentares com os 1,2 mil milhões de pessoas que vivem com menos de 1 dólar por dia.9 Confrontados com uma tão insaciável procura de combustível para automóveis, os agricultores irão querer devastar cada vez mais as florestas tropicais que ainda existem para produzir cana-de-açúcar, palmeiras, e outras culturas de alta rentabilidade para produção de fuel. Estão já em movimento milhões de dólares de capital privado nesta direcção. De facto, o preço crescente do petróleo está a gerar uma nova e enorme ameaça para a diversidade biológica da Terra. À medida que aumenta, a procura de bens agrícolas está a fazer virar o foco das preocupações do comércio internacional do objectivo tradicional de assegurar o acesso aos mercados para o de assegurar o acesso aos fornecimentos. Os países fortemente dependentes da importação de cereais para a alimentação começam agora a preocupar-se com a possibilidade dos compradores para as destilarias de combustível poderem oferecer mais dinheiro pelos fornecimentos. À medida que a segurança face ao petróleo se deteriora, também a segurança alimentar se deteriora. Com o recuo do papel do petróleo, também o processo da globalização será invertido de forma significativa. Com a viragem para o petróleo durante o século passado, a economia da energia tornouse cada vez mais globalizada, com o mundo a depender pesadamente de uma mão cheia de países no Médio Oriente para o fornecimento de produtos energéticos.Agora, neste século, com o mundo a voltarse para o vento, células solares e energia geotérmica, assistimos a um processo de localização na economia mundial da energia. A globalização da economia alimentar mundial também será invertida à medida que o preço do petróleo aumenta o custo do transporte internacional de alimentos. Em resposta, a produção alimentar e o seu consumo tornar-se-á mais localizada, conduzindo a dietas mais baseadas em alimentos produzidos localmente e na sua disponibilidade sazonal. O mundo está confrontado com a emergência de uma geopolítica da escassez, que já é altamente visível nos esforços da China, Índia e outros países em desenvolvimento para garantir o acesso aos forne-


Plano B 2.0 44 cimentos de petróleo. No futuro, vamos querer saber quem terá acesso não só ao petróleo do Médio Oriente, mas também ao etanol do Brasil e aos cereais da América do Norte. As pressões sobre a terra e fontes de água, actualmente já excessivas na maior parte do mundo, intensificar-se-ão na medida em que a procura de biocombustíveis subir. Esta geopolítica da escassez é uma manifestação antecipada da civilização em modo de “além dos limites-e-em colapso”, muito à semelhança daquela que emergiu nas cidades Maias que competiam por alimentos nos anos de declínio daquela civilização.10 Não é preciso ser ecologista para ver que se as tendências ambientais recentes continuarem, a economia global acabará por se desmoronar. Não é de conhecimento que temos falta. Está na ordem do dia saber se os governos nacionais conseguem estabilizar a população e reestruturar a economia antes que o tempo se esgote. Olhar para o que acontece actualmente na China ajuda-nos a perceber a premência de agir rapidamente. Aprendendo com a China Há muitos anos que os ambientalistas apontam os Estados Unidos, onde 5 por cento da população mundial consome quase um terço dos recursos terrestres, como o maior consumidor mundial de recursos. Embora isso fosse verdade por algum tempo, não o é mais. A China substituiu os Estados Unidos como líder no consumo dos recursos básicos.11 Dos cinco bens básicos, alimentares, energéticos e industriais – cereais e carne, petróleo e carvão, e aço – o consumo na China eclipsou o consumo americano de todos, excepto o petróleo. A China lidera no consumo dos cereais, com 380 milhões de toneladas em 2005 contra 260 milhões dos Estados Unidos. Ds três principais cereais, a China lidera o consumo de trigo e arroz e apenas está atrás dos Estados Unidos no milho.12 Embora comer hambúrgueres seja um elemento definidor do estilo de vida dos EUA, em 2005, o consumo de 67 milhões de toneladas de carne na China está acima das 38 milhões de toneladas consumidas nos Estados Unidos. Enquanto nos EUA o consumo de carne está distribuído de forma bastante equilibrada entre carne de vaca, porco e aves, na China o porco domina totalmente. Na verdade, só na China existem actualmente metade


Entrando num Mundo Novo 45 13 dos porcos do mundo. No caso do petróleo, os Estados Unidos estavam ainda solidamente à frente em 2004, consumindo três vezes mais do que a China – 20,4 milhões de barris por dia versus 6,5 milhões de barris. Mas o uso do petróleo pelos EUA apenas cresceu 15 por cento entre 1994 e 2004, enquanto na China mais que duplicou. Tendo recentemente eclipsado o Japão como consumidora de petróleo, a China está agora logo atrás dos Estados Unidos.14 O consumo de energia na China inclui obviamente também o carvão, que fornece cerca de dois terços da energia do país. A queima anual da China de 960 milhões de toneladas excede facilmente os 560 milhões de toneladas nos Estados Unidos. Com este nível de utilização do carvão e com o uso de petróleo e gás natural também a crescer rapidamente, é apenas uma questão de tempo até que as emissões de carbono na China igualem as dos Estados Unidos. O mundo terá dois grandes países a conduzir a mudança climática.15 O consumo de aço da China, um indicador básico do desenvolvimento industrial, é actualmente quase duas vezes e meia o dos Estados Unidos: 258 milhões de toneladas contra 104 milhões, em 2003. Com o incremento da construção civil na actual fase de desenvolvimento da China, edificando centenas de milhar de fábricas e altos prédios para apartamentos e escritórios, o consumo de aço subiu a níveis nunca vistos em nenhum país.16 Nos bens de consumo, a China lidera no número de telemóveis, aparelhos de televisão e frigoríficos. Os Estados Unidos ainda lideram no número de computadores pessoais, embora provavelmente não por muito tempo, e de automóveis.17 O facto da China ter ultrapassado os Estados Unidos no consumo de recursos básicos autoriza-nos a colocar a seguinte questão. E se a China apanhar os Estados Unidos no consumo per capita? Se a economia da China continuar a crescer a um ritmo de 8 por cento ao ano, em 2031 o consumo per capita atingirá o nível verificado nos Estados Unidos em 2004. Se formos mais além e assumirmos que os padrões de consumo da afluente população chinesa em 2031, então cifrada em 1,45 mil milhões, vão ser aproximadamente similares aos dos americanos em 2004, obteremos uma resposta inquietante para a nossa questão.18


Plano B 2.0 Ao ritmo actual de consumo de cereais nos EUA de 900 quilos per capita, incluindo o uso industrial, o consumo de cereais da China em 2031 será aproximadamente igual a dois terços da colheita mundial actual. Se o consumo de papel per capita na China atingir em 2031 o nível americano actual, isto traduzir-se-á em 305 milhões de toneladas de papel – o dobro da produção actual de 161 milhões de toneladas. Lá se vão as florestas mundiais. E se o consumo de petróleo per capita atingir em 2031 o nível do dos Estados Unidos, a China estará então a usar 99 milhões de barris de petróleo por dia. O mundo produz actualmente 84 milhões e pode não ser capaz de produzir muito mais. Isto ajuda a explicar porque é que o rápido crescimento do consumo de petróleo na China está já a contribuir para uma situação de escassez.19 Consideremos agora os automóveis. Se a China alguma vez tiver três carros para cada quatro pessoas, como têm actualmente os Estados Unidos, a sua frota totalizará 1,1 mil milhões de veículos, muito mais do que a actual frota mundial de 800 milhões. Ter estradas, auto-estradas e estacionamentos para uma frota destas requereria a pavimentação de uma área similar à ocupada pela cultura do arroz na China, o seu principal alimento.20 46

A inevitável conclusão a tirar face a estas projecções é que não há recursos suficientes para a China alcançar os níveis de consumo dos EUA. O modelo económico ocidental – a economia baseada em combustíveis fósseis, centrada no automóvel, e de desperdício – não poderá funcionar para os 1,45 mil milhões de pessoas na China em 2031. Se não funciona para a China, também não funcionará para a Índia, onde as projecções mostram que em 2031 terá mesmo mais pessoas que a China. Nem funcionará para os outros 3 mil milhões de pessoas dos países em vias de desenvolvimento, que também sonham o “American dream”. E numa economia mundial cada vez mais integrada, onde todos os países competem em toda a parte pelos mesmos recursos – o mesmo petróleo, cereais e minérios de metal – o modelo económico existente não funcionará nem para os países industrializados.21


Entrando num Mundo Novo Aprendendo com o Passado

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A civilização do século vinte e um não é a primeira a encarar a perspectiva de um declínio económico induzido por razões ambientais.A questão é saber como vamos responder. Sem dúvida, temos à nossa disposição um património único – um registo arqueológico que nos mostra o que aconteceu a civilizações anteriores que entraram em apuros ambientais e não conseguiram dar uma resposta. Como Jared Diamond salienta em Collapse, algumas das sociedades antigas que estiveram em situação de apuro ambiental conseguiram mudar as suas condutas ao longo do tempo, evitando o declínio e o colapso. Há seis séculos atrás, por exemplo, os Islandeses aperceberam-se de que o excesso de gado nas pastagens verdes das terras altas estava a conduzir a uma grande perda de solo numa área caracterizada por solos muito pouco profundos. Em vez de perderem as terras de pastagem e enfrentarem o declínio económico, os agricultores juntaram-se para determinar qual o número de ovelhas que as terras altas podiam aguentar e, de seguida, impuseram quotas entre si, preservando assim as suas pastagens e evitando aquilo a que Garrett Hardin chamou mais tarde a “tragédia dos comuns”22 Os Islandeses compreenderam as consequências do excesso de gado nas pastagens e reduziram o número de ovelhas para um nível que podia ser sustentado. Nós compreendemos o resultado de queimar combustíveis fósseis e do consequente acumular de CO2 na atmosfera. Ao contrário dos Islandeses que conseguiram restringir o número de cabeças de gado, nós não conseguimos restringir as emissões de CO2. Nem todas as sociedades foram tão bem sucedidas como os Islandeses, cuja economia continua a produzir lã e a prosperar. A antiga civilização suméria do quarto milénio a.C. era uma civilização extraordinária, tendo evoluído muito para além de qualquer outra até aí existente. O seu sistema de irrigação cuidadosamente concebido deu origem a uma agricultura muito produtiva, permitindo aos agricultores a obtenção de um excedente, o que veio a suportar a formação das primeiras cidades. Gerir o sistema de irrigação requeria uma organização social sofisticada. Os sumérios tiveram as primeiras cidades e a primeira língua escrita, a escrita cuneiforme.23


Plano B 2.0 Foi definitivamente uma civilização extraordinária, mas havia uma fraqueza na concepção do seu sistema de irrigação, a qual veio a reflectir-se no fornecimento alimentar. A água que se acumulava a montante das barragens construídas no Eufrates era desviada para as terras de cultivo através de uma rede de canais que funcionavam por gravidade.Alguma água era usada pelas sementeiras, alguma evaporava-se, e alguma infiltrava-se no solo. Nesta região, onde o escoamento do subsolo era fraco, a infiltração lenta provocou a subida do nível freático. Quando a água começou a subir para níveis a centímetros da superfície, começou a evaporar-se para a atmosfera, deixando para trás sal. Com o tempo, a acumulação do sal na superfície do solo baixou a produtividade.24 48

Com a acumulação de sal e a diminuição das produções de trigo, os sumérios mudaram para a cevada, uma planta mais tolerante ao sal. Esta medida adiou o declínio sumério, mas tratava apenas dos sintomas e não da causa da queda da produção das sementeiras. Com a continuação da concentração de sal, as produções de cevada diminuíram também.Aconsequente diminuição do fornecimento de alimentos minou os fundamentos económicos desta grande civilização antiga. Com o declínio da produtividade da terra, também a civilização entrou em declínio. 25 O arqueólogo Robert McC. Adams estudou a área da antiga Suméria na planície aluvial do rio Eufrates, agora uma zona vazia e desolada, fora das fronteiras de cultivo. Ele faz a seguinte descrição: “dunas desordenadas, diques de canais há muito sem uso e montes de destroços de antigos agrupamentos habitacionais oferecem apenas algum relevo incaracterístico.Avegetação é esparsa, e em muitas áreas é quase totalmente ausente… No entanto, em dado momento na História, aqui existiu o centro, o coração da mais antiga e letrada civilização urbana do mundo.”26 O equivalente à Suméria no Novo Mundo é a civilização Maia que se desenvolveu nas terras baixas do que é hoje a Guatemala. Floresceu a partir de 250 d.C. até entrar em colapso em 900 d.C. Como os Sumérios, os Maias tinham desenvolvido uma agricultura sofisticada e muito produtiva, a qual se baseava em lotes elevados de terreno circundados por canais de fornecimento de água.27


Entrando num Mundo Novo 49 Tal como a Suméria, a queda dos Maias esteve aparentemente ligada a uma falha no fornecimento de alimentos. Para esta civilização do Novo Mundo, foi a desflorestação e a erosão dos solos que enfraqueceu a agricultura. Mudanças no clima podem também ter tido um papel. A escassez de alimentos esteve aparentemente na origem dos conflitos internos entre as várias cidades Maias que competiam por comida. Hoje, esta região está coberta por floresta, reclamada pela natureza.28 Durante os últimos séculos da civilização Maia, uma nova sociedade estava a evoluir na distante Ilha de Páscoa, uma terra com cerca de 166 quilómetros quadrados no sul do Pacífico, a uns 3.200 quilómetros a oeste da América do Sul e 2.200 quilómetros da Ilha de Pitcairn, a zona habitada mais próxima. Instalada em cerca de 400 DC, esta civilização floresceu numa ilha vulcânica com solos ricos e vegetação luxuriante, com árvores com cerca de 25 metros de altura e troncos com 2 metros de diâmetro. Os registos arqueológicos indicam que os habitantes da ilha se alimentavam principalmente de produtos do mar, especialmente golfinhos – um mamífero que só podia ser capturado com arpão em grandes canoas que sulcavam o mar.29 A sociedade da Ilha de Páscoa floresceu ao longo de vários séculos, atingindo uma população estimada de 20.000 pessoas. Com o aumento gradual da população, o corte de árvores excedeu a produção sustentável das florestas. As grandes árvores necessárias para construir as robustas canoas acabaram por desaparecer, privando os habitantes da ilha do acesso aos golfinhos e diminuindo drasticamente o seu fornecimento alimentar. O registo arqueológico mostra que a certa altura aparecem misturados ossos humanos com ossos de golfinhos, o que sugere uma sociedade desesperada que teve que recorrer ao canibalismo. Hoje a ilha tem uns 2.000 habitantes.30 Uma questão para a qual não há resposta sobre estas civilizações antigas é saber se elas tinham conhecimento daquilo que estava a causar o seu declínio. Será que os Sumérios compreenderam que o crescente aumento do sal, resultante da evaporação de água, na composição do solo estava a reduzir as suas culturas de trigo? Se sabiam,


Plano B 2.0 50 será que foram simplesmente incapazes de obter o apoio político necessário para baixar os seus níveis freáticos, tal como o mundo hoje se debate sem sucesso para baixar as emissões de carbono? Estas são apenas três das civilizações antigas que seguiram um caminho económico que a natureza não podia sustentar. Também nós estamos no mesmo caminho. Qualquer uma das várias tendências de degradação ambiental poderia enfraquecer a civilização como a conhecemos. Tal como o sistema de irrigação, que definiu que a antiga economia Suméria tivesse uma falha, também o sistema de energia à base de combustíveis fósseis, define que a nossa economia possa falhar. Para eles foi a subida do nível freático que enfraqueceu a economia; para nós é a subida dos níveis de CO2 que ameaça perturbar o progresso económico. Em ambos os casos, a tendência é invisível. Quer tenha resultado da acumulação de sal na terra de cultura, no caso da Suméria, da desflorestação e erosão do solo, no caso dos Maias, ou da delapidação das florestas e perda de capacidade de pesca em águas longínquas, no caso dos ilhéus da Ilha de Páscoa, o colapso destas civilizações antigas parece ter estado associado ao declínio do fornecimento alimentar. Hoje em dia, o acrescento anual de mais de 70 milhões de pessoas a uma população que ultrapassa 6 mil milhões numa altura em que os níveis freáticos estão a descer, as temperaturas a aumentar e os fornecimentos de petróleo vão em breve diminuir, sugere que mais uma vez voltará a ser o fornecimento alimentar a ligação vulnerável entre o ambiente e a economia.31 As Políticas Emergentes da Escassez O primeiro grande teste à capacidade da comunidade internacional para gerir a escassez pode surgir com o petróleo ou com os cereais. No caso dos cereais, isso pode acontecer quando a China – cuja colheita caiu cerca de 34 milhões de toneladas, ou 9 por cento, entre 1998 e 2005 – se voltar para o mercado mundial para fazer importações maciças de 30 milhões, 50 milhões ou possivelmente até 100 milhões de toneladas de cereais por ano. Uma procura desta escala poderá rapidamente dominar os mercados mundiais. Quando isto acontecer, a China terá que olhar para os Estados Unidos, que controlam mais de 40 por cento dos cerca de 200 milhões de toneladas de exportações mundiais de cereais.32


Entrando num Mundo Novo 51 Isto criará uma fascinante situação geopolítica. Mais de 1,3 mil milhões de consumidores chineses, que tiveram um superavit comercial de 160 mil milhões de dólares com os Estados Unidos em 2004 – o suficiente para comprar duas vezes a produção americana de cereais – estarão a concorrer com os americanos pelos cereais dos EUA, levando ao aumento dos preços da alimentação neste país. Numa situação destas, há 30 anos atrás, os Estados Unidos simplesmente refrearam as exportações. Mas a China é agora banqueira dos Estados Unidos, subscrevendo grande parte do deficit fiscal deste país com compras mensais dos seus títulos do Tesouro.33 Em anos próximos, os Estados Unidos poderão estar a carregar um ou dois navios por dia com cereais para a China. Esta longa linha de navios estendendo-se através do Pacífico, como um cordão umbilical a fornecer nutrientes, ligará intimamente as duas economias. Gerir este fluxo de cereais assim como simultaneamente satisfazer as necessidades alimentares dos consumidores dos dois países, numa altura em que as destilarias de combustíveis de etanol estarão a tomar para si uma parte cada vez maior da colheita de cereais dos EUA, pode tornar-se um dos principais desafios de política externa deste novo século. A forma como o mundo conseguir acomodar as vastas necessidades previstas de cereais, petróleo e outros recursos por parte da China, Índia e outros países em desenvolvimento ajudará a determinar a forma como o mundo vai lidar com as tensões associadas ao facto de se estar a crescer para além das capacidades da Terra. A forma como países importadores e de baixos rendimentos vão lidar com esta corrida pelos cereais também nos irá dar alguma informação sobre a futura estabilidade política. E, finalmente, a resposta dos EUA à crescente procura de cereais por parte da China, que elevará os preços da alimentação para os consumidores americanos, irá dizer-nos bastante acerca da capacidade dos países para gerir as políticas emergentes da escassez. O risco mais iminente é o da entrada da China no mercado mundial, combinada com o crescente desvio da utilização de produtos agrícolas para biocombustível, elevar de tal modo os preços dos cereais que muitos países importadores e de baixos rendimentos, em vias de desenvolvimento, não consigam importar cereais em quanti-


Plano B 2.0 52 dade suficiente. Isto, por sua vez, poderia conduzir à escalada dos preços da alimentação e à instabilidade política a um nível que perturbaria seriamente o progresso económico global. As civilizações antigas que seguiram por numa via económica ambientalmente insustentável fizeram-no em grande medida de forma isolada. Mas na economia mundial de hoje, cada vez mais integrada e interdependente, se tivermos que enfrentar um declínio civilizacional, é em conjunto que o faremos. Os destinos de todos os povos estão interligados. Esta interdependência só pode ser gerida em benefício de todos se reconhecermos que a expressão “no interesse nacional” está em muitos aspectos obsoleta.

Obtendo o Preço Certo A questão com que se deparam os governos é a de saber se conseguem responder de forma suficientemente rápida para evitar as ameaças de catástrofes iminentes. O mundo tem uma pequena mas preciosa experiência na resposta à degradação dos aquíferos, ao aumento das temperaturas, à expansão dos desertos, à fusão das calotes de gelo polar e à diminuição da oferta de petróleo. Estas novas tendências colocarão desafios totais à capacidade das nossas instituições e lideranças políticas. Em tempos de crise, as sociedades às vezes têm um Nero como líder e às vezes têm um Churchill. O desafio central, a chave para construir a nova economia, é pôr o mercado a contar a verdade ecológica.Aeconomia disfuncional de hoje foi moldada com preços de mercado distorcidos que não incorporam custos ambientais. Muitos dos nossos problemas ambientais são o resultado de severas distorções de mercado. Uma destas distorções tornou-se muito clara no verão de 1998 quando o vale do rio chinês Yangtze, onde habitam 400 milhões de pessoas, foi destruído por uma das maiores inundações da história. Os estragos de 30 mil milhões de dólares excederam o valor da produção anual de arroz da China.34 Depois de várias semanas de inundações, o governo de Pequim anunciou em meados de Agosto a proibição do corte de árvores na bacia doYangtze. Justificou a proibição referindo que as árvores plantadas valiam três vezes mais do que as árvores cortadas. Os serviços


Entrando num Mundo Novo 53 de controlo de inundações prestados pelas florestas eram três vezes mais valiosos que a madeira das árvores. De facto, o seu preço de mercado baixou para cerca de um terço! Com esta análise, ninguém podia justificar economicamente o corte de árvores na bacia.35 Uma situação semelhante existe com a gasolina. Nos Estados Unidos, o preço da gasolina nas bombas estava um pouco acima dos 2 dólares por galão em meados de 2005. Mas isto reflecte apenas o custo de extrair o petróleo, refiná-lo para gasolina e fornecê-la nas estações de serviço. Não inclui os custos dos subsídios fiscais à indústria do petróleo, tais como o crédito para a escassez de petróleo, os subsídios à extracção, produção e uso do petróleo, os custos de saúde no tratamento de doenças respiratórias, que vão da asma ao eczema, e, mais importante, os custos da alteração climática.36 Se estes custos, que em 1998 o International Center for Technology Assessement calculou em cerca de 9 dólares por galão da gasolina queimada nos Estados Unidos, fossem acrescentados aos 2 dólares de custo da gasolina por si só, os automobilistas pagariam nas bombas cerca de 11 dólares por galão. Encher um depósito de 20 galões custaria 220 dólares. Na verdade, queimar gasolina tem um alto custo, apesar do mercado nos dizer que ela é barata, o que conduz a graves distorções na estrutura da economia. O desafio aos governos é incorporar esses custos nos preços de mercado, calculando-os de forma sistemática e incorporando-os na forma de uma taxa sobre o produto para assegurar que o seu preço reflecte todos os custos para a sociedade.37 Se aprendemos alguma coisa nos últimos anos é que os sistemas contabilísticos que não reflectem a verdade podem sair caros. Sistemas de contabilidade que não funcionam correctamente e deixam os custos fora dos livros levaram algumas das maiores empresas à bancarrota, custando as poupanças de uma vida, as reformas e os empregos a milhões de pessoas. Preços distorcidos do mercado mundial que não incorporam grandes custos na produção de vários produtos e na oferta de serviços podem ser ainda mais custosos. Eles podem levar à bancarrota global e ao declínio económico.


54 Plano B – Um Plano de Esperança

Plano B 2.0

Apesar da situação extremamente inquietante com que estamos defrontados, há muitos aspectos que nos podem dar esperança. Em primeiro lugar, praticamente todas as tendências ambientais destrutivas são da nossa própria responsabilidade. Todos os problemas que enfrentamos podem ser encarados usando tecnologias já existentes. E quase tudo o que temos de fazer para redireccionar a economia mundial para uma rota ambientalmente sustentável já foi feito por um ou mais países. Podemos ver os componentes do Plano B – a alternativa aos business as usual – nas novas tecnologias já existentes no mercado. Na frente energética, por exemplo, uma torre aerogeradora de última geração consegue produzir tanta energia como um poço de petróleo. Engenheiros japoneses conceberam um frigorífico fechado a vácuo que usa apenas um oitavo da energia dos frigoríficos que eram comercializados há uma década.Automóveis híbridos a gás e electricidade, que gastam 4,35 litros aos 100 quilómetros, são duas vezes mais eficientes do que o veículo médio nas estradas.38 Inúmeros países estão a apresentar modelos dos vários componentes do Plano B. A Dinamarca, por exemplo, obtém hoje 20 por cento da sua electricidade a partir do vento e planeia aumentar a produção para 50 por cento em 2030. Igualmente, o Brasil está a caminho da auto-suficiência em combustível de automóveis. Com etanol altamente eficiente obtido a partir da cana-de-açúcar a fornecer 40 por cento do seu combustível para automóveis em 2005, poderá pôr de parte totalmente a gasolina dentro de alguns anos.39 Com a alimentação, a Índia – usando um modelo de pequena escala na produção de leite que tem, como fonte de alimentação quase total, os resíduos de colheitas – mais que quadruplicou a sua produção de leite desde 1970, ultrapassando os Estados Unidos para se tornar no líder mundial. O valor da produção de leite da Índia em 2002 excedeu o da colheita de arroz.40


Entrando num Mundo Novo 55 Noutra frente, avanços na cultura piscícola na China, centrados no uso de uma policultura de carpas ecologicamente sofisticada, tornaram a China no primeiro país em que a produção de peixe em aquaculturas excede a pesca oceânica. De facto, os 29 milhões de toneladas de peixe de cultura produzidos na China em 2003 foram equivalentes a cerca de 30 por cento da captura mundial de peixe no oceano.41 Vemos, nas montanhas reflorestadas da Coreia do Sul, a que é que um mundo do Plano B se poderia assemelhar. Os 65 por cento da Coreia do Sul agora cobertos por florestas, outrora território árido, quase sem árvores, controlam as inundações e a erosão do solo, devolvendo um alto grau de estabilidade ambiental aos campos Coreanos.42 Os Estados Unidos – que colocaram fora de uso um décimo das suas terras de cultura, a maior parte altamente erosiva, e mudaram para formas de preparar a terra que a ajudam a conservar – têm uma redução da erosão do solo de cerca de 40 por cento ao longo dos últimos 20 anos.Ao mesmo tempo, os seus agricultores aumentaram em mais de um quinto a colheita de cereais.43 Alguma da liderança mais inovadora veio para as áreas urbanas. Amesterdão desenvolveu um sistema de transporte urbano alternativo; hoje, 35 por cento das viagens dentro da cidade são feitas de bicicleta. Este sistema amigável de transporte reduziu muito a poluição do ar e a congestão do tráfego ao mesmo tempo que oferece um exercício diário aos residentes da cidade.44 Não só estão a tornar-se disponíveis novas tecnologias, mas algumas destas tecnologias podem ser combinadas para criar soluções totalmente novas.Automóveis híbridos a gasolina e electricidade com uma segunda bateria de armazenamento e capacidade de ligação à rede eléctrica, combinados com o investimento em parques eólicos que forneçam electricidade barata à rede, poderiam fazer com que a maior parte da nossa condução diária pudesse ser feita à base de electricidade, ao custo da electricidade gerada pelo vento em horas


Plano B 2.0 56 baixas, equivalente a 50 centavos de dólar por quase 4 litros de gasolina. A energia do vento nacional pode substituir a importação do petróleo.45 O desafio é construir uma nova economia e fazê-lo à “velocidade de tempo de guerra” antes que falhemos tantos prazos da natureza que o sistema económico comece a falhar. Este capítulo introdutório conduz a cinco capítulos que salientam os principais desafios ambientais que se colocam à nossa civilização global. No seguimento destes, há sete capítulos que apresentam o Plano B, que descreve para onde queremos ir e oferece um roteiro para lá chegarmos. Participar na construção desta nova economia do futuro é exaltante. Igualmente exaltante é a qualidade de vida que ela trará. Poderemos respirar ar puro. As nossas cidades serão menos congestionadas, menos barulhentas e menos poluídas.Viver num mundo onde a população estabilizou, as florestas se expandem e as emissões de carbono diminuem é uma perspectiva excitante.


I UMA CIVILIZAÇÃO EM APUROS



2 Para Além do Pico do Petróleo

Quando o preço do petróleo subiu acima dos 50 dólares por barril no fim de 2004, o mundo começou a questionar-se sobre se os fornecimentos mundiais de petróleo são os adequados – e, especificamente, sobre quando será o pico da produção e o início do seu declínio. Os analistas estão longe de concordar sobre este assunto, mas alguns dos mais conceituados acreditam agora que o pico do petróleo está iminente.1 O petróleo moldou a civilização do século vinte e um, afectando todas as facetas da economia, da mecanização da agricultura ao transporte aéreo a jacto. Quando a produção começar a cair, isso será um acontecimento económico de proporções sísmicas que dará origem a um mundo muito diferente daquele que nos habituámos a ver ao longo da nossa vida. De facto, quando os historiadores escreverem sobre este período da história, poderão mesmo ter que distinguir entre antes do pico do petróleo (APP) e depois do pico do petróleo (DPP). O pico da produção de petróleo aproxima-se numa altura em que o mundo se depara com muitos desafios, tais como o aumento das temperaturas, o abaixamento dos níveis freáticos e inúmeras outras tendências ambientais negativas. O ajustamento à diminuição do


Plano B 2.0 60 fornecimento de petróleo faz parte da necessidade duma reestruturação económica que coloque a economia num caminho de apoio ao progresso. O Próximo Declínio do Petróleo As perspectivas em relação ao petróleo podem ser analisadas de muitas maneiras.As companhias petrolíferas, as consultoras e os governos nacionais confiam essencialmente em modelos de computador para projectar a produção e os preços futuros do petróleo. Os resultados apresentados por estes modelos variam muito conforme a qualidade da informação e o que neles é assumido. Consideramos aqui vários métodos analíticos. Uma abordagem – utilização da relação reservas/produção para se saber quais as tendências da produção futura – foi pela primeira vez feita há várias décadas pelo lendário King Hubbert, um geólogo da U.S. Geological Survey. Dada a natureza da produção do petróleo, Hubbert teorizava que a diferença de tempo entre o pico de novas descobertas e o pico da produção era previsível. Ao notar que a descoberta de novas reservas nos Estados Unidos tinha atingido o pico por volta de 1930, ele previu que o pico da produção de petróleo dos EUAseria em 1970.Acertou em cheio. Como resultado deste exemplo e de exemplos mais recentes de outros países, a base do seu modelo é agora usada por muitos analistas do petróleo.2 Uma segunda abordagem, que separa os principais países produtores de petróleo em dois grupos – aqueles onde a produção está a cair e aqueles onde está a subir – é bastante reveladora. Nos 23 principais produtores de petróleo a extracção parece ter atingido o pico em 15 e ainda estar a subir em 8. Os países pós-pico vão dos Estados Unidos (o único país, para além da Arábia Saudita, que já extraiu mais de 9 milhões de barris por dia) e Venezuela (onde o pico foi atingido em 1970) até aos dois produtores de petróleo do Mar do Norte, Reino Unido e Noruega, onde a produção atingiu o pico em 1999 e 2000 respectivamente. A produção de petróleo dos EUA, que chegou ao seu pico ao atingir 9,6 milhões de barris por dia em


61 Para Além do Pico do Petróleo 1970, caiu para 5,4 milhões de barris por dia em 2004 – um decréscimo de 44 por cento. A produção da Venezuela caiu 31 por cento desde 1970.3 Os oito países pré-pico são dominados pelos maiores produtores mundiais, a Arábia Saudita e a Rússia que, no Outono de 2005, estão a produzir aproximadamente 11 milhões e 9 milhões de barris por dia. Outros países com um grande potencial de aumento da produção são o Canadá, em grande medida, devido às suas areias de alcatrão, e o Kazakistão, que ainda está numa fase de desenvolvimento dos seus recursos petrolíferos. Os outros quatro países prépico são a Argélia, Angola, China e México.4 Amaior dúvida em relação a estes oito países é aArábia Saudita. Tecnicamente, a sua produção chegou ao pico em 1980 quando atingiu 9,9 milhões de barris por dia e a sua extracção actual está cerca de 1 milhão de barris por dia abaixo disso. Inclui-se no grupo de países onde a produção está em crescimento apenas na base das afirmações dos responsáveis sauditas segundo as quais o país pode produzir muito mais. No entanto, alguns analistas duvidam que os sauditas possam aumentar a extracção muito para além da sua actual produção.Alguns dos seus poços de petróleo mais antigos estão bastante deteriorados, e está por provar que a extracção em novos campos venha a chegar para mais do que apenas compensar as perdas verificadas nos antigos.5 Esta análise vai ao ponto de tentar saber se, nos oito países prépico, a produção irá de facto aumentar o suficiente para compensar o decréscimo dos 15 países onde a produção chegou ao pico. Em volume de extracção, os dois grupos têm mais ou menos a mesma capacidade total de produção. No entanto, se a produção começar a cair nalgum dos oito, isso pode fazer com que o nível de equilíbrio global também diminua.6 Uma terceira forma de equacionar as perspectivas de produção de petróleo é olhar para as acções em bolsa das maiores companhias de petróleo.Ao mesmo tempo que alguns CEOs parecem muito confiantes no crescimento da produção futura, as suas acções sugerem uma visão menos confiante.


Plano B 2.0 Uma pequena evidência disto está na decisão, por parte das principais companhias de petróleo, de investirem em força na compra das suas próprias acções.AExxon-Mobile, por exemplo, com o maior lucro trimestral de todas as empresas registadas - 8,4 mil milhões de dólares no último trimestre de 2004 – investiu quase 10 mil milhões de dólares para comprar de volta das suas próprias acções.AChevron Texaco usou 2,5 mil milhões de dólares dos seus lucros para comprar acções próprias. Com pouco petróleo por descobrir e a procura mundial a crescer rapidamente, as empresas parecem dar-se conta de que as suas reservas se irão tornar ainda mais valiosas no futuro.7 62

Directamente relacionada com este comportamento está a ausência de quaisquer aumentos substanciais na exploração e desenvolvimento em 2005, mesmo quando os preços do crude se mantêm bem acima dos 50 dólares por barril. Isto sugere que as empresas estão de acordo com os geólogos do petróleo que afirmam que 95 por cento do petróleo existente no mundo já foi descoberto. “Todo o mundo foi já sistematicamente pesquisado e experimentado”, diz o geólogo independente Colin Campbell. “O conhecimento geológico desenvolveu-se enormemente nos últimos 30 anos e é agora quase impossível pensar que haja ainda grandes reservas por descobrir”. Isto também quer dizer que irá ser necessária muita e dispendiosa exploração e perfuração para encontrar os restantes 5 por cento.8 Esta diminuição das reservas é muito evidente na relação entre as descobertas de petróleo novo e a produção das principais companhias de petróleo. Entre as que relataram que a sua produção de petróleo de 2004 excedeu em muito as novas descobertas estão a Royal Dutch/Shell, a Chevron Texaco e a Conoco-Phillips. O essencial é que as reservas de petróleo das principais empresas estão a diminuir todos os anos. Numa escala global, o geólogo Walter Youngquist, autor de GeoDestinies: The Inevitable Control of Earth Resources Over Nations and Individuals, nota que em 2004 o mundo produziu 30,5 mil milhões de barris mas descobriu apenas 7,5 mil milhões de barris de petróleo novo.9


63 Para Além do Pico do Petróleo A influência que é mais difícil de medir na produção de petróleo dos próximos anos é aquilo que eu chamo “psicologia da deterioração”. Uma vez que as empresas de petróleo ou os países exportadores se apercebam que a extracção está a chegar ao seu pico, eles começarão a pensar seriamente em como esticar as suas reservas remanescentes. À medida que se torne claro que mesmo um pequeno corte na produção pode fazer com que o preço mundial do petróleo duplique, o valor a longo prazo do seu petróleo tornar-se-á muito mais óbvio. A evidência geológica sugere que a produção mundial de petróleo chegará ao seu pico mais cedo e não mais tarde. Matt Simmons, dirigente do banco de investimento de petróleo Simmons and Company International e líder da indústria, afirma em relação aos novos campos de petróleo: “Os bons projectos acabaram-se. Não é uma questão de dinheiro… se as empresas petrolíferas tivessem projectos fantásticos, estariam a desenvolvê-los”. Kenneth Deffeys, um geólogo muito respeitado e antigo empregado da indústria de petróleo, agora na Universidade de Princeton, diz no seu livro de 2005, Beyond Oil, “sou da opinião que o pico ocorrerá no final de 2005 ou nos primeiros meses de 2006”. Walter Youngquist e A.M. Samsan Bakhtiari, da Companhia Nacional de Petróleo Iraniana, ambos projectam o pico do petróleo para 2007.10 Sadad al-Husseini, recentemente retirado das suas funções de responsável da exploração e produção na Aramco, a companhia nacional de petróleo dos sauditas, analisou com Peter Maass, no New York Times, as perspectivas do petróleo mundial. O seu tópico principal era que o novo petróleo tinha que ser suficiente para cobrir tanto o crescimento anual da procura mundial, de pelo menos 2 milhões de barris por dia, como o decréscimo anual da produção dos campos existentes, de cerca de 4 milhões de barris por dia. “É como precisar de uma novaArábia Saudita de dois em dois anos”, afirmou Husseini. “Não é sustentável”.11 Onde andam as empresas a procurar mais petróleo? Para além do petróleo convencional, que pode ser facilmente bombeado para a superfície, há quantidades enormes de petróleo armazenadas nas areias


Plano B 2.0 64 de alcatrão, e pode também ser produzido a partir de rochas sedimentares com petróleo. Os depósitos de areia de alcatrão de Athabasca, em Alberta, Canadá, podem totalizar 1,8 biliões de barris. Deste total, no entanto, pensa-se que não mais de 300 mil milhões podem ser extraídos. AVenezuela também tem grandes reservas de petróleo extra pesado, estimadas em 1,2 biliões de barris. Talvez possa ser extraído um terço. Se o petróleo pesado da Venezuela for desenvolvido numa escala suficientemente grande, a sua produção pode exceder um dia o seu pico histórico de 1970. O petróleo em rocha sedimentar concentrado no Colorado, Wyoming e Utah, nos Estados Unidos, tem também grandes quantidades de querogénio, uma substância orgânica que pode ser convertida em petróleo e gás.12 Quanto petróleo será economicamente viável produzir a partir das rochas sedimentares? Na década de 1970 os Estados Unidos empreenderam um esforço significativo para explorar o petróleo das rochas sedimentares no declive ocidental das Montanhas Rochosas do Colorado. Quando os preços do petróleo baixaram em 1982, a indústria de petróleo das rochas sedimentares entrou em colapso. A Exxon abandonou rapidamente o seu projecto de $5mil milhões do Colorado, e as restantes empresas em breve lhe seguiram os passos. Uma vez que este tipo de extracção requer vários barris de água por cada barril de petróleo produzido, a escassez de água na região pode limitar as possibilidades da sua retoma.13 O único projecto que se mantém é o das areias de alcatrão na província canadiana deAlberta. Esta iniciativa, que teve início no princípio da década de 1980, está neste momento a produzir um milhão de barris de petróleo por dia, o suficiente para fornecer 5 por cento do consumo actual dos EUA. Este petróleo das areias de alcatrão, contudo, não é barato e espalha uma desordem ambiental de grandes proporções. Aquecer e extrair o petróleo das areias assenta no uso generalizado de gás natural, cuja produção atingiu o pico naAmérica do Norte.14 Portanto, embora estas reservas de petróleo em areias de alcatrão e em rocha sedimentar possam ser grandes, desencadear a sua produção é um processo caro e moroso. Na melhor das hipóteses, a exploração das areias de alcatrão e das rochas sedimentares poderá apenas retardar o declínio da produção mundial de petróleo.15


Para Além do Pico do Petróleo A Intensidade do Petróleo nos Produtos Alimentares

65

A agricultura moderna depende fortemente do uso da gasolina e do gasóleo em tractores para lavrar, plantar, cultivar e colher. As bombas de irrigação trabalham a gasóleo, gás natural ou electricidade gerada a partir do carvão. A produção de fertilizantes é também de energia intensiva: a mineração, fabrico e transporte internacional de fosfatos e potassa, todas dependem do petróleo. O gás natural, no entanto, é utilizado para sintetizar a amónia, constituinte básico nos fertilizantes de nitrogénio.16 Nos Estados Unidos, onde a informação acumulada é fiável, o uso combinado de gasolina e gasóleo na agricultura caiu do seu ponto mais elevado de 7,7 mil milhões de galões em 1973 para 4,6 mil milhões em 2002, um decréscimo de 40 por cento. Para se ter uma ideia geral da tendência da eficiência do combustível na agricultura dos EUA, veja-se a queda do número de galões usado por tonelada de cereais produzida, de 33 em 1973 para 13 em 2002, um impressionante decréscimo de 59 por cento.17 Uma razão para este facto está na mudança que foi feita para práticas de cultivo de sementeira directa ou com uma lavra mínima em cerca de dois quintos das terras de cultura dos EUA. As práticas de sementeira directa são actualmente utilizadas em cerca de 95 milhões de hectares em todo o mundo, quase todas concentradas nos Estados Unidos, Brasil, Argentina e Canadá. Os Estados Unidos – com 25 milhões de hectares com lavra mínima ou sem lavra – lideram este campo, logo seguidos pelo Brasil.18 Enquanto o uso de gasolina e gasóleo tem vindo a diminuir nos EUA, em muitos países em vias de desenvolvimento está a subir à mesma velocidade com que se faz a mudança dos animais de tiro para os tractores. Há uma geração, por exemplo, na China, as terras de cultivo eram preparadas em grande medida por animais. Hoje, a maior parte da lavra é feita por tractores.19 Os fertilizantes são responsáveis pelo consumo de 20 por cento da energia agrícola consumida nos EUA. No resto do mundo este número pode ser ligeiramente superior. Em média, o mundo produz 13 toneladas de cereais por cada tonelada de fertilizantes usada. Mas isto varia muito entre países. Por exemplo, na China, uma tonelada de fertilizante produz 9 toneladas de cereal, na Índia produz 11 toneladas e nos Estados Unidos, 18 toneladas.20


Plano B 2.0 66 Aeficiência dos fertilizantes nos EUAé alta porque os agricultores testam regularmente os solos para determinar com precisão as necessidades de nutrientes das culturas e porque os Estados Unidos são também os líderes na produção da soja, e a sementeira desta leguminosa fixa o nitrogénio no solo.Asoja, que rivaliza com o milho em área plantada nos Estados Unidos, é normalmente cultivada rotativamente com o milho e, numa menor medida, com o trigo de Inverno. Uma vez que o milho tem um apetite voraz por nitrogénio, o alternar da soja com o milho numa rotação de dois em dois anos reduz substancialmente as necessidades de fertilização do milho com nitrogénio.21 A urbanização aumenta a procura dos fertilizantes. Com a migração rural para as cidades, torna-se mais difícil reciclar os nutrientes dos dejectos humanos devolvendo-os ao solo. Além disto, o crescente comércio internacional de produtos alimentares pode separar por milhares de quilómetros o produtor do consumidor, perturbando ainda mais o ciclo dos nutrientes. Os Estados Unidos, por exemplo, exportam cerca de 80 milhões de toneladas de cereais por ano – cereais que contêm grandes quantidades de nutrientes básicos para plantas: nitrogénio, fósforo e potássio.Aactual exportação em curso destes nutrientes faria escoar a pouco e pouco a inerente fertilidade das terras de sementeira dos EUA se os nutrientes não fossem repostos pela via química.22 As explorações agrícolas industriais, assim como as cidades, tendem a separar o produtor do consumidor, tornando difícil a reciclagem dos nutrientes. De facto, os dejectos animais contendo nutrientes são uma mais valia para os agricultores, mas tornam-se num problema para as grandes explorações pecuárias, onde os custos do seu escoamento são muitas vezes elevados. À medida que o petróleo e, portanto, os fertilizantes se tornam mais caros, a economia das explorações agrícolas industriais pode tornar-se menos atractiva. A rega, outro grande sorvedouro energético, gasta cada vez mais energia em todo o mundo. Nos Estados Unidos, quase 19 por cento da energia usada na agricultura é usada no bombeamento de água. Nos outros dois grandes produtores de alimentos – China e Índia – o número é sem dúvida muito maior, dada a importância que a irrigação assume nestes países.23


67 Para Além do Pico do Petróleo Desde 1950, a área irrigada no mundo triplicou, subindo de 94 milhões de hectares para 277 milhões em 2002. Além disso, a mudança das grandes barragens com sistemas de canais de irrigação por gravidade, que dominou o terceiro quartel do século passado, para poços perfurados que retiram do subsolo os recursos de água, fez também disparar o consumo de combustível para irrigação.24 Algumas tendências, como a mudança para o sistema de sementeira directa, estão a tornar a agricultura menos intensiva em petróleo. Mas o aumento da utilização de fertilizantes, a disseminação da mecanização das explorações agrícolas e o abaixamento dos níveis freáticos estão a tornar a produção de alimentos mais dependente do petróleo. Isto ajuda a explicar porque é que os agricultores começam a envolver-se na produção de biocombustíveis, tanto o etanol em substituição da gasolina como o biodiesel para substituir o gasóleo. (O interesse renovado nestes combustíveis é analisado mais à frente neste capítulo). Embora se dê normalmente mais atenção à energia usada na exploração agrícola, esta apenas representa um quinto do total da energia consumida no sistema alimentar nos Estados Unidos. O transporte, processamento, embalagem, comercialização e preparação da comida nas cozinhas representa quase quatro quintos da utilização de energia no sistema alimentar. De facto, a minha colega Danielle Murray nota que a economia do sistema alimentar dos EUA utiliza tanta energia como a que a França usa em toda a sua economia.25 Os 14 por cento de energia usados no sistema alimentar para deslocar as mercadorias do agricultor até ao consumidor é mais ou menos igual a dois terços da energia usada para as produzir. E cerca de 16 por cento da energia gasta no sistema alimentar é usada no processamento – enlatar, congelar, e secar alimentos – de tudo, desde o concentrado de sumo de laranja congelado até às ervilhas em lata.26 Alimentos básicos, como o trigo, têm tradicionalmente sido deslocados a longas distâncias de barco, viajando dos Estados Unidos para a Europa, por exemplo. O que é novo é o transporte de frutos frescos e legumes a longas distâncias por via aérea. Poucas actividades económicas são mais intensivas em energia.27


Plano B 2.0 As milhas por alimento – distância percorrida do produtor ao consumidor – aumentaram com o petróleo barato. Entre as maiores distâncias percorridas estão os voos, durante o Inverno do hemisfério norte, que transportam produtos frescos, como os mirtilos da Nova Zelândia para o Reino Unido. No supermercado da zona onde vivo, na baixa de Washington D.C., as uvas frescas no Inverno vêm normalmente do Chile, de avião, viajando mais de 3.000 quilómetros. Às vezes também vêm da África do Sul, caso em que a distância entre o local de colheita das uvas até à sala de jantar é de 5.000 quilómetros, quase um terço da viagem à volta do mundo.28 Um dos movimentos de rotina de produtos frescos a longa distância faz-se da Califórnia para a densamente povoada Costa Leste dos EUA. A maior parte destes produtos é transportada em camiões refrigerados. Ao reflectir sobre o futuro do transporte de produtos a longa distância, um analista de petróleo observou que a época da salada Caesar a 5.000 quilómetros de distância pode ter os dias contados.29 O embalamento, surpreendentemente, é também muito intensivo em energia, respondendo por 7 por cento do uso de energia no sistema alimentar. Não é invulgar que a energia investida na embalagem exceda a dos alimentos que esta contém. E pior, quase todas as embalagens de um supermercado moderno estão concebidas para se deitarem fora depois de usadas.30 O segmento mais intensivo em energia da cadeia alimentar é a cozinha. É usada muito mais energia para refrigerar e preparar a comida em casa do que na fase anterior da produção. O grande consumidor de energia no sistema alimentar é o frigorífico da cozinha, não o tractor agrícola.31 Enquanto o uso de petróleo domina no lado da produção de alimentos, a electricidade (normalmente produzida a partir do carvão ou gás) domina no lado do consumo. O moderno sistema alimentar intensivo em petróleo que evoluiu quando este era barato não sobreviverá já que ele se estrutura hoje com base em preços mais altos de energia. Entre os principais ajustamentos que se irão verificar estará a produção de alimentos a nível mais local e a descida na cadeia alimentar à medida que os consumidores forem reagindo ao aumento dos preços dos alimentos, passando a comprar menos produtos de origem animal demasiado caros. 68


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Para Além do Pico do Petróleo A Queda da Taxa de Câmbio Trigo-Petróleo

Olhando para o petróleo usado na produção de alimentos, percebemos que a quantidade de petróleo que pode ser comprada pelos alimentos está a cair rapidamente. A mudança dos termos da troca entre o trigo e o petróleo é tão dramática como contínua. De 1950 a 1973, os preços do trigo e do petróleo mantiveram-se assinalavelmente estáveis, tal como a relação entre os dois. Em qualquer altura deste período de 23 anos, um bushel (pouco mais de 27 quilos) de trigo podia ser trocado por um barril de petróleo no mercado mundial. (Ver Quadro 2 – 1).32 No entanto, a partir de 1973, os valores relativos do trigo e do petróleo mudaram drasticamente. Em 2005, eram precisos 13 bushels de trigo para comprar um barril de petróleo. Os dois países mais afectados por esta viragem dramática são os dois maiores exportadores de cada um desses dois produtos: os Estados Unidos e a Arábia Saudita.33 Quadro 2-1. A Taxa de Câmbio Trigo/Petróleo, 1950-2005 Ano

Bushel de Trigo

Barril de Petróleo (Dólares)

1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005*

1,89 1,81 1,58 1,62 1,49 4,06 4,70 3,70 3,69 4,82 3,10 3,90

1,71 2,11 1,85 1,79 1,79 11,45 35,71 27,37 22,99 17,20 28,23 52,00

Bushels por Barrril (ratio) 1 1 1 1 1 3 8 7 6 4 9 13

*Os números de 2005 são estimativas do autor baseadas na informação de JaneiroAgosto


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Plano B 2.0

Os Estados Unidos, os maiores importadores de petróleo e exportadores de cereais, estão a pagar caro por esta viragem na taxa de câmbio trigo-petróleo. A mudança deste ratio para um valor 13 vezes superior desde 1973 está a contribuir para o maior deficit comercial da história dos EUA e para uma dívida externa recorde. Em contraste, a Arábia Saudita – o maior exportador de petróleo e um grande importador de cereais – está a beneficiar enormemente.34 Enquanto a taxa de câmbio entre os cereais e o petróleo se deteriorava, as importações de petróleo dos EUA continuavam a aumentar. No início da década de 1970, antes das subidas do preço do petróleo da OPEC, os Estados Unidos podiam em grande medida pagar a conta das importações de petróleo com as exportações de cereais. Mas em 2004, as exportações de cereais apenas cobriam 13 por cento da enorme factura de 132 mil milhões de dólares, de importações de petróleo, para os Estados Unidos.35 O primeiro grande ajustamento entre o petróleo e o trigo surgiu quando a OPEC triplicou o preço do petróleo no fim de 1973.Ao longo de 1974-78, eram necessários aproximadamente três bushels de trigo para comprar um barril de petróleo. Depois, após a segunda subida da OPEC, que levou o petróleo de 13 dólares por barril em 1978 para 30 dólares por barril em 1980, eram necessários oito bushels de trigo para comprar um barril de petróleo.36 Este enorme aumento do poder de compra do petróleo levou a uma das mais abruptas transferências de riqueza da história. Os cofres da Arábia Saudita, Kuwait, Iraque e Irão começaram a encherse de dólares, enquanto que os cofres dos países importadores de petróleo se esvaziavam. Ninguém sabe exactamente o que acontecerá à taxa de câmbio trigo-petróleo nos próximos anos, mas ela poderá vir a ser estabilizada pela rentabilidade de converter cereais em combustível à medida que aumente o número de destilarias de etanol extraído do trigo para alimentar automóveis.


Para Além do Pico do Petróleo

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Os Estados Unidos estão a pressionar os sauditas para aumentarem a produção de petróleo. Entretanto para estes, a resposta não está em produzir mais, mesmo que o possam fazer, mas sim na diminuição do consumo por parte dos Estados Unidos. A menos que os Estados Unidos assumam o papel de líder, a Arábia Saudita irá continuar a ditar não só a taxa de câmbio entre petróleo e cereais mas também os preços da gasolina nos EUA.

Alimentos e Combustíveis Competem pela Terra Historicamente, os agricultores de todo o mundo produzem alimentos, rações e fibras. Hoje começam também a produzir combustível. Uma vez que quase tudo o que comemos pode ser convertido em combustível automóvel, o preço alto do petróleo está a transformarse em preço de suporte para os produtos agrícolas. E está também a determinar o preço da alimentação. Num dia normal há agora dois grupos de compradores nos mercados mundiais de bens essenciais: um representando os produtores de alimentos e outro representando os produtores de biocombustível.Alinha divisória entre as economias da alimentação e dos combustíveis esbateu-se repentinamente e assistimos à competição entre estações de serviço e supermercados pelos mesmos bens essenciais. Desencadeada primeiro pelos choques petrolíferos da década de 1970, a produção de biocombustíveis – principalmente etanol da cana-de-açúcar, no Brasil, e milho, nos Estados Unidos – cresceu rapidamente durante alguns anos para de seguida estagnar durante a década de 1990. Depois de 2000, com a subida dos preços do petróleo, começou a ganhar um novo impulso. (Ver Figura 2-1). A Europa, entretanto, liderada pela Alemanha e França, começava a extrair biodiesel do óleo das sementes.37 A produção de biocombustíveis em 2005 foi igual a cerca de 2 por cento do consumo de gasolina. De 2000 a 2005, a produção de etanol em todo o mundo aumentou de 4,6 mil milhões para 12,2 mil


Plano B 2.0 72 milhões de galões, um salto de 165 por cento. O biodiesel, começando de uma pequena base de 251 milhões de galões em 2000, subiu para uns estimados 790 milhões de galões em 2005, mais do que triplicando.38 Governos apoiam a produção de biofuel devido às preocupações com a alteração climática e a possível diminuição dos fluxos de petróleo importado. Uma vez que a substituição da gasolina por biocombustíveis reduz as emissões de carbono, os governos vêem nisto uma forma de atingirem as suas metas de redução do carbono. Os biocombustíveis têm também um atractivo para as economias nacionais, em parte porque o combustível produzido localmente cria empregos e mantém o dinheiro no país.

Figura 2-1. Produção Mundial de Etanol e de Biodiesel, 19802005


73 Para Além do Pico do Petróleo O Brasil, usando a cana-de-açúcar como fonte para o etanol, produz cerca de 4 mil milhões de galões por ano, satisfazendo 40 por cento das suas necessidades de combustível. Os Estados Unidos, usando o milho como base, produziram 3,4 mil milhões de galões de etanol em 2004 para fornecer um pouco menos que 2 por cento do combustível usado pela sua enorme frota automóvel. Previsões para 2005 mostram a produção de etanol dos EUA a ultrapassar a do Brasil, pelo menos temporariamente. A Europa está em terceiro na produção de combustível de etanol, pertencendo a fatia de leão à França, Reino Unido e Espanha. As destiladoras da Europa usam principalmente a beterraba, o trigo e a cevada.39 O interesse nos biocombustíveis disparou quando os preços do petróleo atingiram os 40 dólares por barril em meados de 2004. O Brasil, o maior produtor mundial de cana-de-açúcar, está a emergir como líder mundial na produção agrícola de combustível. Em 2004, metade da sua colheita de cana-de-açúcar foi usada para a produção de açúcar e metade para etanol. Se expandir a área de cultivo de cana-de-açúcar de 5,3 milhões de hectares em 2005 para uns 8 milhões de hectares, será auto-suficiente em combustível para automóveis em poucos anos, ao mesmo tempo que mantém a sua produção e exportação de açúcar.40 Mesmo tendo acabado os subsídios ao etanol, o sector privado no Brasil, em meados de 2005, tinha projectado aplicar 5,1 mil milhões de dólares de investimento em moinhos de açúcar e destilarias nos cinco anos seguintes. Pensando para além das suas modestas exportações actuais, o Brasil está já a negociar contratos de fornecimento de etanol com o Japão e a China. Produzindo etanol a cerca de 15 centavos de dólar por litro, o Brasil apresenta-se com uma forte vantagem competitiva num mundo com o barril de petróleo a 60 dólares.41 A produção de etanol dos Estados Unidos, quase toda de milho, beneficia de um subsídio do governo de 51 centavos de dólar por galão. O etanol produzido a partir do milho a 3 dólares o bushel custa nos Estados Unidos cerca de 1,40 dólares por galão, mais do


Plano B 2.0 74 dobro do custo do etanol produzido da cana-de-açúcar no Brasil. Embora tenha levado cerca de uma década para desenvolver os primeiros mil milhões de galões de capacidade de destilação e outra década para os segundos mil milhões, os terceiros mil milhões foram atingidos em dois anos. Os quatro mil milhões serão mesmo atingidos, provavelmente, em menos tempo. Para além das grandes empresas, os grupos agrícolas americanos estão também a investir fortemente nas destilarias de etanol.42 AÍndia, segundo maior produtor mundial de cana-de-açúcar, tem 10 fábricas de etanol em operação e espera ter mais 20 fábricas no final de 2005. Prevê-se que a China ponha em funcionamento quatro fábricas produzindo mais de 360 milhões de galões de combustível de etanol até ao final de 2005, principalmente a partir do milho e trigo.43 A Colômbia e os países da América Central representam outro ponto quente dos biocombustíveis.AColômbia está a lançar-se rapidamente, abrindo uma nova destilaria de etanol por mês de Agosto de 2005 até ao fim do ano. O desafio está em coordenar o crescimento na construção de destilarias com o crescimento da área de terra plantada com cana-de-açúcar.44 Nos biocombustíveis usados nos motores a diesel, a Europa é líder.AAlemanha, que produziu 326 milhões de galões de biodiesel em 2004, cobre nesta altura 3 por cento das suas necessidades de diesel. Apoiando-se quase por completo na canola (principal fonte de óleo alimentar na Europa), planeia expandir a produção em mais metade nos próximos anos.45 A França, onde a produção de biodiesel totalizou 150 milhões de galões em 2004, planeia duplicar a produção até 2007. Como aAlemanha, usa a canola como base. Em ambos os países o ímpeto para produzir biodiesel vem da meta da União Europeia de cobrir 5.75 por cento das necessidades de combustível automóvel com biocombustíveis até 2010. Os biocombustíveis na Europa estão isentos das altas taxas impostas à gasolina e ao gasóleo.46 Nos Estados Unidos, um retardatário no biodiesel, a produção está a crescer rapidamente desde a adopção em 2003 de um subsí-


75 Para Além do Pico do Petróleo dio de 1 dólar por galão, que teve efeito em Janeiro de 2005. O Iowa, líder na produção de soja e entusiasta do combustível produzido a partir desta leguminosa, tem agora três fábricas de biodiesel em operação, outra em construção, e mais cinco em fase de planeamento. Responsáveis estimam que as fábricas de biodiesel, dentro de alguns anos, estarão a extrair óleo de 200 milhões dos 500 milhões de bushels colhidos anualmente no estado, produzindo 280 milhões de galões de biodiesel. Os quatro quintos de feijão de soja que restam após a extracção do óleo, constituem um suplemento de ração para o gado rico em proteínas, ainda mais valioso que o próprio óleo.47 Outros países que já estão a produzir biodiesel ou que o planeiam fazer, são a Malásia, a Indonésia, e o Brasil. A Malásia e a Indonésia, os maiores produtores de óleo de palma, irão certamente usar plantações altamente produtivas de palmeiras como base da sua produção. O Brasil, que tem planos ambiciosos para aumentar a produção de biodiesel, provavelmente também se voltará para o óleo de palma.48 Há dois indicadores chave na avaliação das colheitas para a produção de biofuel: a produção de combustível por acre e a energia líquida usada tanto na produção como na refinação. No etanol, as produções maiores por acre são de 714 galões na beterraba em França e 662 galões na cana-de-açúcar no Brasil. (Ver quadro 2-2) O milho dos EUA produz 354 galões por acre, cerca de metade da produção da beterraba e cana-de-açúcar.49 Na produção de biodiesel, as plantações de palma estão claramente em primeiro lugar, com uma produção de 508 galões por acre. Depois vem o óleo de coco, com 230 galões por acre e a canola, com 102 galões por acre.Asoja, cultivada principalmente devido ao seu conteúdo de proteínas, apenas produz 56 galões por acre.50 No que respeita à produção de energia líquida, o etanol da canade-açúcar no Brasil destaca-se claramente, produzindo mais de 8 unidades de energia por cada unidade investida na produção de cana e na destilação do etanol. Depois de ser retirado da cana o xarope açucarado, a fibra remanescente, o bagaço, é queimado para fornecer o calor necessário à destilação, eliminando a necessidade de uma


Plano B 2.0 76 fonte exterior de energia adicional. Isto ajuda a explicar porque é que o Brasil pode produzir etanol da cana a 60 centavos de dólar por galão.51 Quadro 2-2. Produção de Etanol e Biodiesel por Acre em Colheitas Seleccionadas Combustível

Colheita

Produção de Combustível (galões)

Etanol Beterraba (França) Cana-de-açúcar (Brasil) Cassava (Nigéria) Sorghum doce (Índia) Milho (EUA) Trigo (França) Biodiesel Óleo de palma Coco Canola Amendoim Girassol Soja

714 662 410 374 354 277

508 230 102 90 82 56*

*Estimativa do autor

Nota: As produções das culturas podem variar muito. As produções de etanol mostradas são as de regiões onde a produção é óptima. As estimativas de biodiesel são conservadoras. O conteúdo energético do etanol é cerca de 67 por cento da gasolina. O conteúdo energético do biodiesel é cerca de 90 por cento do gasóleo. Fonte: Ver nota final 49

O etanol da beterraba, na França, tem 1,9 unidades de energia por cada unidade de energia investida. Entre as três principais bases usadas actualmente na produção de etanol, o milho dos Estados Unidos, que depende muito da energia do gás natural para a destilação, está num distante terceiro lugar no que respeita à eficiência energética líquida, produzindo apenas 1,5 unidades de energia por cada unidade gasta.52 Outra opção talvez mais promissora para a produção de etanol


77 Para Além do Pico do Petróleo é o uso de enzimas para desfazer os materiais de celulose, tais como a switchgrass, uma erva perene de crescimento vigoroso, ou árvores de crescimento rápido, tais como os álamos híbridos. Actualmente está a ser produzido etanol a partir de celulose numa pequena fábrica experimental no Canadá. Se a switchgrass se mostrar uma fonte económica para produzir etanol, como alguns analistas pensam ser, será um grande passo em frente, uma vez que ela pode crescer em terra muito erosiva ou, em todo o caso, não indicada para sementeiras anuais. No competitivo mercado mundial de etanol produzido de sementeiras, o futuro pertence à cana-de-açúcar e à switchgrass.53 Calcula-se que a quantidade de etanol produzido por acre a partir da switchgrass seja de 1.150 galões, mais alta mesmo que a da cana-de-açúcar. A energia líquida produzida, no entanto, é cerca de 4, muito acima dos 1,5 do milho, mas abaixo dos 8 da cana-deaçúcar.54 Para além da possível utilização da celulose, as operações actuais e planeadas de produção de etanol usam plantações como a de cana-de-açúcar, beterraba, milho, trigo e cevada. Os Estados Unidos, por exemplo, em 2004, usaram 32 milhões de toneladas de milho para produzir 3,4 mil milhões de galões de etanol. Embora isto nem chegue a 12 por cento da enorme cultura americana de milho, é suficiente para alimentar 100 milhões de pessoas aos níveis médios do consumo mundial de cereais.55 Num mundo onde o petróleo é escasso, quais serão os efeitos económicos e ambientais da emergência da agricultura como produtora de combustíveis para transporte? O papel da agricultura na economia global será claramente reforçado à medida que for enfrentando o vasto e praticamente ilimitado mercado de combustíveis para automóvel. Os países tropicais e subtropicais que podem produzir cana-de-açúcar ou óleo de palma serão capazes de explorar plenamente as suas condições para produzir o ano inteiro, o que lhes dá uma vantagem comparativa forte no mercado mundial. Com a produção de biocombustível a espalhar-se, o preço mundial do petróleo será, de facto, um preço de suporte para os produtos agrícolas. Se os preços das culturas para alimentação e rações estiverem fracos e os do petróleo estiverem altos, aqueles bens es-


Plano B 2.0 78 senciais irão parar aos produtores de combustíveis. Por exemplo, os óleos vegetais transaccionados nos mercados europeus num determinado dia podem ir parar tanto aos supermercados como às estações de serviço. O risco que existe é que as pressões económicas para desmatar terras para a expansão da produção de cana-de-açúcar no cerrado brasileiro e na bacia do Amazonas e a plantação de palmeiras para óleo em países como a Indonésia e a Malásia venham a colocar uma nova e grande ameaça à diversidade de plantas e animais. Na ausência de restrições governamentais, o aumento do preço do petróleo poderá facilmente tornar-se na principal ameaça à biodiversidade, garantindo que a onda de extinções que ocorre actualmente se torne de facto a sexta grande extinção. Com os preços do petróleo agora suficientemente altos para estimular potenciais investimentos maciços na produção de culturas para combustível, a economia agrícola mundial - que já se debate em dificuldades para alimentar 6,5 mil milhões de pessoas – enfrentará muito maiores exigências. A forma como o mundo vai encarar esta nova e incrivelmente complexa situação vai dizer-nos muito sobre as perspectivas que se abrirão no século vinte e um a uma civilização sedenta de energia.56 As Cidades e os Subúrbios Depois do Pico do Petróleo As cidades modernas são um produto da era do petróleo. Desde as primeiras cidades, que aparentemente tomaram forma na Mesopotâmia há 6.000 anos, até 1900, a urbanização foi um longo e pouco perceptível processo. Quando o último século começou, havia apenas umas poucas cidades com um milhão de pessoas. Hoje há mais de 400 cidades com essa dimensão, e 20 megacidades têm 10 milhões ou mais de habitantes.57 O metabolismo das cidades depende da concentração de grandes quantidades de alimentos e materiais e, depois, do escoamento do lixo e dos dejectos humanos. Com o alcance e capacidade limitados das carroças puxadas a cavalos, era difícil criar grandes cidades. Os camiões alimentados a petróleo barato mudaram isso tudo. À medida que as cidades crescem cada vez mais e os aterros próximos atingem o limite da capacidade, o lixo tem que ser empurrado para depósitos a uma distância cada vez maior. Com os preços


79 Para Além do Pico do Petróleo do petróleo a subir e os aterros disponíveis a afastar-se cada vez mais da cidade, o custo do escoamento do lixo aumenta também. Chegará uma altura em que muitos produtos descartáveis atingirão um preço que os fará deixar de existir. Os custos da vida urbana tenderão a subir à medida que a produção de petróleo diminuir e os seus preços escalarem. Uma das intrigantes questões que isto levanta é se a urbanização vai continuar DPP, depois do pico do petróleo. Será que o processo pode até ser invertido quando as pessoas procurarem estilos de vida menos dependentes do petróleo? As cidades vão sofrer um grande impacto com a diminuição próxima da produção de petróleo, mas os subúrbios serão atingidos ainda mais. As pessoas que vivem em subúrbios mal concebidos não dependem só da importação de tudo, elas estão também muitas vezes isoladas geograficamente dos seus empregos e das lojas. Têm que usar o carro para quase tudo o que precisam. Viver em empreendimentos urbanos dos subúrbios significa frequentemente usar o carro até para comprar um pouco de pão ou leite. Os subúrbios criaram uma cultura de deslocação para os empregos, com a viagem a durar, em média, perto de uma hora por dia nos Estados Unidos. Ao passo que as cidades europeias amadureceram em grande medida antes da investida do automóvel, as dos Estados Unidos, um país muito mais jovem, foram moldadas pelo carro. Enquanto que os limites das cidades são normalmente muito mais claros na Europa, e enquanto os europeus só com relutância convertem terra agrícola produtiva em empreendimentos habitacionais, os americanos têm poucos problemas acerca disso devido ao seu espírito colonizador [NT — a expressão frontier mind, no original, refere-se à especificidade da identidade americana definida em 1893 por Frederick Jackson Turner) e porque as terras de cultivo sempre foram vistas como um bem excedentário. Esta mancha deplorável e esteticamente desagradável de subúrbios intermináveis e centros comerciais não é algo exclusivo dos Estados Unidos. Pode ver-se naAmérica Latina, no SudesteAsiático e, cada vez mais, na China. Quando se voa de Xangai para Pequim tem-se uma boa vista deste amontoado de edifícios, tanto casas como fábricas, ao longo das estradas novas e auto-estradas. Isto oferece


Plano B 2.0 80 um grande contraste com a construção ordenada das aldeias que caracterizou o uso residencial da terra ao longo de milénios na China. Centros comerciais e enormes armazéns de preços baixos, simbolizados aos olhos do público pela Wal-Mart, foram todos subsidiados artificialmente pelo petróleo barato. Isolados pelos preços elevados do petróleo, os subúrbios poderão tornar-se insustentáveis ecológica e economicamente. Thomas Wheeler, editor da Alternative Press Review, observa que “haverá provavelmente uma grande luta para sair dos subúrbios quando a crise do petróleo se intensificar e os valores da habitação suburbana se afundarem”.58 O Mundo Depois dos Picos do Petróleo O pico do petróleo é descrito como o ponto em que a produção de petróleo pára de subir e se inicia o seu inevitável e longo declínio. Perante uma procura em rápido crescimento, isto quer dizer subida dos preços do petróleo. Mas mesmo que a produção de petróleo se limite a abrandar ou a estabilizar, as consequentes restrições ao fornecimento terão o mesmo efeito de provocar o aumento dos preços, embora mais lentamente. Poucos países planeiam reduzir o consumo de petróleo. De facto, as projecções de uso do petróleo feitas tanto pela Agência Internacional de Energia como pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos mostram que o consumo mundial de petróleo aumentará dos actuais 84 milhões de barris por dia para 120 milhões de barris em 2030. De acordo com estas análises, o consumo de petróleo nos diversos países aumentará em média cerca de metade durante os próximos 20 anos. Como é que eles apresentam estas “lindas” previsões? Para citar mais uma vez Thomas Wheeler, estarão muitos dos analistas e líderes simplesmente “desatentos ao sinal vermelho que alerta para a falta de combustíveis na Terra?”59 Mesmo com a possível eminência do pico do petróleo, muitos países estão a contar consumir muito mais petróleo nas próximas décadas. De facto, estão a construir fábricas de montagem de automóveis, estradas, auto-estradas, parques de estacionamento e empreendimentos habitacionais de subúrbio como se o petróleo barato fosse durar para sempre. Novas empresas aéreas surgem na expectativa de que as viagens e o transporte de carga aérea crescerão indefinidamente. No entanto, num


81 Para Além do Pico do Petróleo mundo com a produção de petróleo em declínio, nenhum país pode usar mais petróleo a não ser à custa de outros.60 Alguns segmentos da economia global serão mais afectados que outros simplesmente porque consomem petróleo mais intensivamente. Entre estes estão as indústrias automóvel, alimentar e de linha aérea. Problemas na indústria automóvel americana foram já evidentes antes dos preços do petróleo começarem a subir em meados de 2004. Agora a General Motors e a Ford, ambas apanhadas numa forte dependência das vendas de carros de alta cilindrada e alto consumo de gasolina, viram os ratings de crédito da Standard and Poors baixar, reduzindo as suas acções ao estatuto de junk bonds. Em Junho de 2005, a General Motors anunciou que em 2007 planeava reduzir 25.000 unidades da sua força de trabalho de 110.000 trabalhadores nos Estados Unidos.61 Embora sejam os fabricantes de automóveis em apuros que aparecem nas letras gordas da imprensa à medida que os preços do petróleo sobem, as indústrias de apoio também serão afectadas, como por exemplo os fabricantes de peças e de pneus. O sector alimentar será afectado de duas maneiras. A alimentação tornar-se-á mais cara à medida que os preços mais elevados do petróleo fizerem subir os custos de produção. Com o aumento do petróleo, as dietas serão alteradas à medida que as pessoas descem na cadeia de produção e passam a consumir mais alimentos sazonais e produzidos a nível local. Os regimes alimentares ficarão, portanto, mais em sintonia com os produtos locais e de estação. Ao mesmo tempo, o aumento dos preços do petróleo também arrastará os recursos agrícolas para os cultivos especializados na produção de combustíveis, como o etanol ou biodiesel. A alta dos preços do petróleo está, assim, a estabelecer uma competição pelos recursos alimentares entre automobilistas afluentes e consumidores de alimentos sem recursos, colocando o mundo perante um novo e complexo problema ético. As companhias aéreas, tanto de passageiros como de carga, continuarão a sofrer à medida que o combustível para jactos sobe, simplesmente porque o combustível é o seu maior custo operacional. Embora as previsões da indústria apontem para um crescimento das viagens aéreas de passageiros de cerca de 5 por cento ao ano na


Plano B 2.0 82 próxima década, isto parece muito pouco provável. As viagens aéreas de baixo custo poderão, em breve, passar à história.62 A carga aérea pode ser atingida ainda com mais força, conduzindo talvez a um declínio absoluto. Uma das primeiras baixas provocadas pela subida dos preços do petróleo pode bem ser o uso dos grandes jactos no transporte de produtos frescos do hemisfério sul para os países industrializados do norte durante o inverno. O preço dos produtos frescos fora da estação tornar-se-á simplesmente proibitivo. Durante o século do petróleo barato, foi construída uma enorme infra-estrutura automóvel nos países industrializados a qual requer grandes quantidades de energia para se manter. Os Estados Unidos, por exemplo, têm 4,2 milhões de quilómetros de estradas pavimentadas, na maioria cobertas com asfalto, e 2,3 milhões de quilómetros de estradas não pavimentadas para manter apesar de a produção mundial de petróleo estar a diminuir. A subida dos preços da energia poderá criar uma crise nas áreas da manutenção.63 Para além da necessidade de utilizar o petróleo de forma mais eficiente, o mundo olha também para outras fontes de energia. Embora a energia nuclear tenha tido alguma atenção da imprensa, como alternativa aos combustíveis fósseis, a electricidade gerada por centrais nucleares é cara. Numa competição justa sem subsídios fiscais, o nuclear está morto. Se o serviço a prestar incluir todos os custos relativos ao tratamento e depósito de resíduos, a seguros contra acidentes, e ao desmantelamento das centrais desactivadas, então o preço real da energia nuclear colocá-la-á fora da corrida. Com o terrorismo internacional em ascensão, a vulnerabilidade das centrais nucleares a ataques combinada com a sua utilização por países que pretendem obter armas nucleares elimina na prática a fissão nuclear como fonte de energia. 64 A abundância relativa de carvão torna-a uma fonte de energia atractiva em alguns lugares, mas é provável que em breve se torne vítima da crescente preocupação pública com as alterações climáticas. Há, por conseguinte, futuro nas fontes renováveis de energia, tais como a energia eólica, as células solares, os painéis térmicos, as cen-


Para Além do Pico do Petróleo

83 trais térmicas de energia solar, a energia geotérmica, hídrica, das ondas e os biocombustíveis. Na próxima transição energética, haverá vencedores e vencidos. Os países que não conseguirem planear com antecedência, que não invistam em tecnologias mais eficientes no uso do petróleo e em novas fontes de energia, podem vir a experimentar um declínio nos seus níveis de vida. A incapacidade dos governos nacionais para gerir a transição energética poderá conduzir à falta de confiança nos líderes e ao falhanço dos estados. Os líderes políticos nacionais parecem relutantes em encarar a próxima queda da produção de petróleo e em planear em função dela, mas isso poderá vir a ser uma das maiores falhas não só da recente história económica como da história da civilização. Tendências que agora são tidas como certas, como a urbanização e a globalização, podem ser invertidas quase do dia para a noite assim que o petróleo se torne escasso e caro. Os países em vias desenvolvimento serão atingidos a dobrar quando as populações ainda em expansão se confrontarem com um fornecimento de petróleo a diminuir, que reduza em definitivo o consumo de petróleo por pessoa. Um tal declínio poderá traduzir-se rapidamente numa queda dos níveis de vida. Se os Estados Unidos, o maior consumidor e importador mundial de petróleo, conseguir reduzir rapidamente o seu consumo de petróleo, poderá dar tempo ao mundo para fazer uma transição mais suave para a era pós-petrolífera. Hoje, o que o mundo mais precisa não é petróleo, mas liderança.


Plano B 2.0


3 Emergência da Falta de Água

O Lago Chade, na África, em tempos um ponto de referência para os astronautas em órbita da Terra, é agora um sítio que eles têm dificuldade em localizar. Rodeado pelo Chade, pelo Níger e pela Nigéria – três dos países do mundo com um maior crescimento populacional – o lago encolheu cerca de 95 por cento desde a década de 1960. A enorme procura de água para rega nessa área está a secar rios e ribeiros de que o lago depende para a sua existência. Em resultado, o Lago Chade pode desaparecer completamente em breve, tornandose a sua localização um mistério para as futuras gerações.1 Estamos sempre a ler notícias sobre lagos que desaparecem, poços que secam ou rios que já não conseguem chegar ao mar. Mas estas histórias descrevem, em geral, situações locais. É só quando começamos a compilar os numerosos estudos nacionais – tais como uma análise da situação da água na China de 824 páginas, um estudo do Banco Mundial sobre a situação da água no Iémen ou um detalhado relatório do Departamento da Agricultura dos Estados Unidos (USDA) sobre as possibilidades de irrigação no oeste do país – que a dimensão da emergência das faltas de água pode ser percebida. Só então podemos perceber a verdadeira dimensão do uso excessivo de água e o declínio que isso pode trazer.2


Plano B 2.0 O mundo está a entrar numa situação de grande deficit de água – que é em grande parte invisível, historicamente recente e cresce rapidamente. Muitas vezes não é visível porque muito deste deficit provém do excesso de extracção de água dos aquíferos por bombeamento. Ao contrário do que acontece com os incêndios das florestas ou a invasão das dunas de areia, o abaixamento dos níveis freáticos só é muitas vezes descoberto quando os poços começam a secar. Este deficit global de água é recente, e é o resultado da procura ter triplicado ao longo do último meio século. A perfuração de milhões de poços para rega levou as extracções de água para além da capacidade de reposição de muitos aquíferos. A incapacidade dos governos manterem o bombeamento de água dentro dos limites da produção sustentável dos aquíferos determina que os níveis freáticos estejam agora a baixar nos países que têm mais de metade da população mundial.3 Entre as manifestações mais visíveis de escassez de água estão os rios que secam e os lagos que desaparecem. A discussão pública sobre a escassez de água está a surgir entre reclamantes a montante e a jusante dos cursos de água dentro dos países e entre países. A escassez de água está agora a atravessar fronteiras através do comércio internacional de cereais. Os países que estão a pressionar os limites da sua capacidade de fornecimento de água satisfazem normalmente as crescentes necessidades das cidades e da indústria desviando da agricultura a água de rega, e importando depois cereais para compensar a perda de capacidade produtiva. A ligação entre água e alimentação é forte. De uma forma ou de outra, nós bebemos em média cerca de 4 litros de água por dia, enquanto que a água necessária para produzir a nossa alimentação diária ascende a 2.000 litros – 500 vezes mais. Isto ajuda a explicar porque é que 70 por cento do uso total da água se destina a um objectivo - irrigação. Outros 20 por cento são usados pela indústria, e 10 por cento destinam-se a uso doméstico. Com a procura de água a crescer nestas três categorias, a concorrência entre sectores está a intensificar-se, com os agricultores a perderem quase sempre.4 86


Emergência da Falta de Água 87 O Abaixamento dos Níveis Freáticos Muitos países estão a bombear água dos aquíferos em excesso na tentativa de satisfazerem as suas crescentes necessidades de água, entre eles, os três grandes produtores de cereais – China, Índia e Estados Unidos. Estes três, juntamente com um número de outros países em que os níveis freáticos estão a baixar, albergam mais de metade da população mundial. (Ver Quadro 3-1).5 Há dois tipos de aquíferos: renováveis e não renováveis (ou fósseis). A maior parte dos aquíferos na Índia e os aquíferos próximos do nível do solo na Planície do Norte da China são renováveis. Quando estes entram em quebra, o nível máximo de bombeamento é automaticamente reduzido para o nível de recarga. Quadro 3-1. Países com Bombeamento Excessivo de Água dos Aquíferos em 2005 País

População (milhões de habitantes)

China

1.316

Índia Irão Israel Jordânia

1.103 70 7 6

México Marrocos Paquistão Arábia Saudita Coreia do Sul Espanha Síria Tunísia Estados Unidos

107 31 158 25 48 43 19 10 298

Iémen Total

21 3.262

Fonte: Ver nota final 5.


Plano B 2.0 No caso dos aquíferos fósseis, tais como o grande aquífero de Ogallala nos Estados Unidos, o aquífero profundo na Planície do Norte da China, ou o aquífero saudita, a sua degradação já determinou o fim do bombeamento. Os agricultores que perdem a sua água de rega têm a opção de regressar à produção de baixa intensidade, de sequeiro, se a quantidade de chuva o permitir. Em regiões mais áridas, no entanto, como no sudoeste dos Estados Unidos, ou no Médio Oriente, a perda de água de rega significa o fim da agricultura. O abaixamento dos níveis freáticos está já a afectar negativamente as colheitas em alguns países, como a China, o maior produtor mundial de cereais. Uma prospecção de água no solo divulgada em Pequim em Agosto de 2001 revelava que o nível freático na Planície do Norte da China, que produz mais de metade do trigo do país e um terço do seu milho, estava a descer mais rapidamente do que tinha sido relatado anteriormente. O bombeamento excessivo deteriorou muito o aquífero de baixa profundidade, forçando a abertura de poços para aceder ao aquífero fóssil profundo da região, que não é renovável.6 A prospecção, levada a cabo pelo Instituto de Monitorização GeológicaAmbiental (IMGA) de Pequim, revelou que no subsolo da província de Hebei, no coração da Planície do Norte da China, o nível médio do aquífero profundo estava a baixar quase 3 metros por ano. Em redor de algumas cidades nessa província, estava a cair duas vezes mais depressa. He Qingcheng, o director da equipa de monitorização da água no solo do IMGA, refere que à medida que o aquífero profundo se vai deteriorando, a região vai perdendo a sua enorme reserva de água – isto é apenas um sinal de alarme.7 As suas preocupações estão espelhadas num relatório do Banco Mundial: “A evidência sugere que os poços profundos em redor de Pequim têm agora que ser perfurados até aos 1.000 metros para se encontrar água, o que aumenta muito os custos de fornecimento”. Numa linguagem invulgarmente forte para o relatório de um Banco, prevê “consequências catastróficas para as gerações futuras” a não ser que a utilização e o fornecimento da água possam regressar rapidamente a uma situação de equilíbrio.8 A embaixada dos Estados Unidos em Pequim relata que os produtores de trigo de algumas áreas estão agora a bombear água de uma profundidade de 300 metros. Extrair água desta profundidade 88


Emergência da Falta de Água 89 aumenta os custos do bombeamento de tal forma que os agricultores são muitas vezes forçados a abandonar a irrigação e a regressar a uma agricultura de sequeiro menos produtiva.9 O abaixamento dos níveis freáticos, a conversão de terras de cultura para usos não agrícolas, e a perda de mão-de-obra agrícola em províncias que se estão a industrializar rapidamente, são factores que se combinam para diminuir a colheita de cereais da China. A cultura de trigo, que cresce especialmente em zonas semi-áridas do norte da China, é particularmente vulnerável às faltas de água. Depois de atingir um máximo de 123 milhões de toneladas em 1997, a colheita caiu em cinco dos últimos oito anos, chegando a 95 milhões de toneladas em 2005, uma queda de 23 por cento.10 A embaixada americana relata também que a recente queda na produção de arroz é em parte resultado das faltas de água. Com um máximo de 140 milhões de toneladas em 1997, a colheita caiu em quatro dos oito anos seguintes, para cerca de 127 milhões de toneladas em 2005. Apenas o milho, o terceiro cereal da China, conseguiu até agora evitar a queda. Isto acontece porque os preços do milho são favoráveis e porque esta cultura não é tão dependente da irrigação como o trigo e o arroz.11 Ao todo, a produção de cereais da China caiu do seu pico histórico de 392 milhões de toneladas em 1998 para cerca de 358 milhões de toneladas em 2005. Para se ter uma ideia, estes 34 milhões de toneladas de queda excedem a colheita anual de trigo do Canadá. A China cobriu a queda na produção reduzindo até 2004, altura em que importava 7 milhões de toneladas de cereais, o que eram os seus enormes stocks.12 Um estudo do Banco Mundial indica que a China está a bombear água em excesso de três bacias hidrográficas no norte – o Hai, que corre através de Pequim e Tianjin; o Amarelo; e o Huai, o rio imediatamente a sul do Amarelo. Uma vez que são necessárias 1.000 toneladas de água para produzir uma tonelada de cereais, a diminuição na bacia do Hai de quase 40 mil milhões de toneladas de água por ano (1 tonelada é igual a 1 metro cúbico de água) quando o aquífero se esgotar, significa que a colheita de cereais cairá cerca de 40 milhões de toneladas – o suficiente para alimentar 120 milhões de chineses.13


Plano B 2.0 Até agora, entre os maiores produtores de cereais, só a China já experimentou uma diminuição substancial na produção. Mesmo com uma crise mundial nos cereais e uma subida de preços que incentiva o aumento da produção, será difícil para a China voltar a ter os níveis anteriores de produção cerealífera, devido à perda de água para irrigação.14 Por séria que seja, no entanto, a emergência das faltas de água na China, ela é ainda mais séria na Índia simplesmente porque a margem entre o consumo actual de alimentos e a sobrevivência é muito precária. Num estudo sobre a situação da água na Índia, no New Scientist, Fred Pearce relata que os 21 milhões de poços furados neste que é o epicentro global da actividade de furar o solo para obter água estão a baixar os níveis freáticos na maior parte do país. A norte de Gujarat, o nível freático está a cair cerca de 6 metros por ano.15 Em Tamil Nadu, um estado com mais de 62 milhões de pessoas no sul da Índia, os poços estão a secar em quase toda a parte. De acordo com Kuppannan Palanisami da Universidade de Agricultura de Tamil Nadu, o abaixamento dos níveis freáticos secou 95 por cento dos poços possuídos por pequenos agricultores, reduzindo para metade a área irrigada no estado ao longo da década passada.16 Com a descida dos níveis freáticos, os perfuradores de poços estão a usar uma tecnologia modificada de perfuração com óleo para encontrarem água, chegando a atingir 1.000 metros de profundidade em alguns locais. Nas comunidades em que as fontes de água subterrânea secaram completamente, toda a agricultura é alimentada pela chuva e a água para beber é fornecida em camiões. Tushaar Shah, que chefia a estação de águas subterrâneas do Instituto Internacional de Gestão da Água em Gujarat, diz sobre a situação da Índia em relação à água: “Quando o balão estoirar, a anarquia total tomará conta da vida da Índia rural”.17 Nesta altura, as colheitas de trigo e arroz, os principais cereais indianos, estão ainda a crescer. Mas nos próximos anos, a perda de água de rega pode ultrapassar o progresso tecnológico e começar a diminuir a colheita em algumas áreas, tal como já acontece na China.18 Nos Estados Unidos, o USDA relata que em partes do Texas, de Oklahoma e do Kansas – três estados líderes na produção de cereais 90


Emergência da Falta de Água 91 – o nível da água subterrânea baixou mais de 30 metros. Como resultado, os poços secaram em milhares de quintas nas Grandes Planícies do sul. Embora esta exploração da água subterrânea esteja a sair cara à produção de cereais dos Estados Unidos, a área irrigada representa apenas um quinto da sua produção de cereais, em comparação com quase três quintos na Índia e quatro quintos na China.19 O Paquistão, um país com 158 milhões de pessoas e onde a população aumenta 3 milhões por ano, está também a explorar a sua água subterrânea. Na parte paquistanesa da planície fértil do Punjab, o abaixamento dos níveis freáticos parece ser idêntico ao da Índia. Poços de observação perto das cidades gémeas de Islamabad e Rawalpindi indicam uma descida do nível freático entre 1982 e 2000 que vai de um a quase 2 metros por ano.20 Na província do Baluchistão, os níveis freáticos à volta da capital, Quetta, estão a baixar cerca de 3,5 metros por ano. Richard Garstang, um especialista em água do World Wildlife Fund que participou num estudo sobre a situação da água no Paquistão, disse em 2001 que “dentro de 15 anos Quetta ficará sem água se os níveis de consumo actual se mantiverem”.21 A falta de água no Baluchistão é geral. Sardar Riaz A. Khan, antigo director do Instituto de Investigação da Zona Árida do Paquistão, em Quetta, relata que seis bacias já esgotaram as suas fontes de água subterrânea, deixando improdutivas as suas terras irrigadas. Khan prevê que dentro de 10 a 15 anos praticamente todas as bacias fora das áreas irrigadas por canais terão esgotado as suas fontes de água subterrânea, privando a província de grande parte da sua produção de cereais.22 Os futuros cortes de água para regas como resultado da degradação dos aquíferos irão reduzir a colheita de cereais do Paquistão. Em termos do país, a colheita de trigo – o principal recurso alimentar – continua a crescer, mas mais lentamente que no passado.23 O Irão, um país de 70 milhões de pessoas, está a sobreexplorar os seus aquíferos em cerca de 5 milhões de toneladas de água por ano, o equivalente em água a um terço da sua produção anual de cereais. Na pequena mas agricolamente rica Planície de Chenaran, no nordeste do Irão, o nível freático estava a baixar cerca de 2.8 metros por ano nos finais da década de 1990. Os novos poços aber-


Plano B 2.0 92 tos para rega e para fornecer a cidade próxima de Mashad são os responsáveis. As aldeias no leste do Irão estão a ser abandonadas à medida que os poços secam, gerando um fluxo de “refugiados da água”24 A Arábia Saudita, um país de 25 milhões de habitantes, é tão pobre em água como rica em petróleo. Com um grande apoio de subsídios, desenvolveu uma agricultura de irrigação extensiva com base, em grande medida, no seu aquífero fóssil profundo.Após vários anos a usar o dinheiro do petróleo para suportar os preços do trigo cinco vezes acima do nível do mercado mundial, o governo foi forçado a enfrentar a realidade fiscal e a cortar nos subsídios. A sua colheita de trigo caiu de um pico de 4,1 milhões de toneladas em 1992, para 1,2 milhões em 2005, ou seja, 71 por cento.25 Craig Smith escreve no New York Times, “Do ar, os campos de trigo circulares do celeiro desta terra árida parecem uma floresta de fichas de poker verdes espalhadas no deserto castanho. Mas eles são ultrapassados em número pelas silhuetas fantasmagóricas dos campos deixados a desaparecer na areia, lugares onde o jogo do reino na agricultura secou preciosos aquíferos”.Alguns agricultores sauditas estão agora a bombear água de poços com 1.200 metros de profundidade.26 Uma prospecção nacional saudita em 1984 referenciou reservas fósseis de água de 462 mil milhões de toneladas. Metade, refere Smith, provavelmente já desapareceu. Isto sugere que a agricultura irrigada pode durar talvez mais uma década e depois grande parte desaparecerá, remanescendo uma pequena área que pode ser irrigada com água dos aquíferos superficiais que são repostos pela pouca chuva que cai no reino. É um exemplo clássico de uma economia alimentar de “sobreexploração-e-colapso”.27 No vizinho Iémen, uma nação com 21 milhões de habitantes, o nível freático da maior parte do país está a baixar cerca de 2 metros por ano à medida que o uso da água ultrapassa a produção sustentável dos aquíferos. Na Bacia de Sana’a, no oeste do Iémen, calculase que a extracção anual de 224 milhões de toneladas de água excede cinco vezes a recarga anual de 42 milhões de toneladas, fazendo baixar o nível freático 6 metros por ano. As previsões do Banco Mundial indicam que a Bacia de Sana’a – onde se situa a capital


93 Emergência da Falta de Água nacional, Sana’a, e onde residem 2 milhões de pessoas – ficará seca por volta de 2010.28 Na procura da água, o governo iemenita fez furos de teste na bacia com uma profundidade de 1.900 metros – profundidade normalmente associada à indústria de petróleo – mas não conseguiu encontrar água. O Iémen terá que decidir em breve se deve trazer água a Sana’a, possivelmente através de um pipeline vindo das centrais dessalinizadoras da costa, se puder suportar o custo, ou se tem que mudar a capital para outro sítio. Qualquer das alternativas será onerosa e potencialmente traumática.29 Com a população a crescer a 3 por cento ao ano e com os níveis freáticos a descer em toda a parte, o Iémen está a tornar-se rapidamente num caso de estudo. Para além do efeito de bombear em excesso água para a capital, o responsável do Banco Mundial, Christopher Ward observa que “a água subterrânea está a ser explorada a um tal ritmo que partes da economia rural podem vir a desaparecer no espaço de uma geração”.30 Israel, embora seja pioneiro no aumento da produtividade da água de rega, está a deteriorar ambos os seus aquíferos principais – o aquífero da costa e o aquífero das montanhas que partilha com os palestinianos. A população de Israel, cujo crescimento é acelerado não só naturalmente mas também devido à imigração, está a crescer para além das suas capacidades de fornecimento de água. Os conflitos entre israelitas e palestinianos pela disputa da água na área referida atrás são permanentes. Devido a severas falhas de água, Israel baniu a rega do trigo.31 No México – onde vive uma população de 107 milhões de pessoas atingirá os 140 milhões em 2050 – a procura da água está a exceder a oferta. Os problemas de água da cidade do México são bem conhecidos.As áreas rurais também são atingidas. Por exemplo, no estado agrícola de Guanajuato, o nível freático está a descer 2 metros ou mais por ano.Anível nacional, 51 por cento da água extraída do subsolo provém de aquíferos que são sobreexplorados.32 Uma vez que o bombeamento excessivo de água dos aquíferos ocorre em muitos países mais ou menos em simultâneo, a deterioração dos aquíferos e as consequentes reduções nas colheitas podem também chegar mais ou menos ao mesmo tempo. E a acelerada dete-


Plano B 2.0 94 rioração dos aquíferos mostra que este dia pode estar a chegar, criando potencialmente uma escassez alimentar impossível de gerir. Rios que Secam Enquanto o abaixamento dos níveis freáticos é, em grande medida, escondido, os rios que secam antes de atingirem o mar são perfeitamente visíveis. Dois rios onde este fenómeno pode ser visto são o Colorado, o principal rio no sudoeste dos Estados Unidos, e o Amarelo, o maior rio do norte da China. Outros rios de grande dimensão que, ou correm secos ou estão reduzidos a um caudal mínimo durante a estação seca, são o Nilo, a linha da vida do Egipto, o Indo, que abastece a maior parte da água de rega do Paquistão, e o Ganges, na densamente povoada bacia indiana do Ganges. Muitos rios mais pequenos desapareceram completamente.33 Com a procura mundial de água que triplicou no último meio século e com o crescimento ainda mais rápido da procura de energia hidroeléctrica, as barragens e desvios de água levaram vários rios à seca. Tal como os níveis freáticos baixaram, as fontes que alimentam os rios secaram, tornando o seu caudal mais reduzido.34 Desde 1950, o número de grandes barragens, com mais de 15 metros de altura, aumentou de 5.000 para 45.000. Cada barragem priva um rio duma parte do seu caudal. Os engenheiros gostam de dizer que as barragens construídas para gerar electricidade não retiram água aos rios, apenas a sua energia. Mas isto não é totalmente verdade, uma vez que as albufeiras aumentam a evaporação.Aperda anual de água de uma albufeira em regiões áridas ou semi-áridas, onde os níveis de evaporação são altos, é, em geral, igual a 10 por cento da sua capacidade de armazenamento.35 O rio Colorado actualmente raras vezes consegue chegar ao mar. Com os estados do Colorado, Utah, Arizona, Nevada e, mais importante, Califórnia, a dependerem muito da água do Colorado, o rio é simplesmente levado à secura antes de chegar ao Golfo da Califórnia. Esta enorme procura de água está a destruir o ecossistema do rio, o que inclui a respectiva população piscícola.36 Uma situação similar existe na Ásia Central. OAmu Darya – que, em conjunto com o Syr Darya, alimenta o MarAral – está agora seco devido aos produtores de algodão uzbeks e turkemanos a montante


Emergência da Falta de Água 95 do rio. Com o curso do Amu Darya cortado, só o caudal limitado do Syr Darya impede o Mar Aral de desaparecer totalmente.37 O rio Amarelo da China, que corre ao longo de cerca de 4.000 quilómetros através de cinco províncias antes de chegar ao MarAmarelo, tem estado sob uma pressão crescente há várias décadas. Secou pela primeira vez em 1972, e desde 1985 já várias vezes não conseguiu chegar ao mar.38 O Nilo, local de outra grande civilização, actualmente mal consegue chegar ao mar.A analista da água Sandra Postel, em Pillar of Sand, nota que antes da barragem de Aswam ser construída, chegavam ao Mediterrâneo cerca de 32 mil milhões de metros cúbicos de água por ano. Depois da barragem estar concluída, no entanto, o aumento da rega, a evaporação e outras procuras reduziram a sua descarga para menos de 2 mil milhões de metros cúbicos.39 O Pakistão, como o Egipto, é essencialmente uma civilização baseada num rio, dependendo em larga escala do Indo. Este rio, que nasce nos Himalaias e corre a oeste para o Oceano Índico, não só fornece água de superfície, mas também recarrega os aquíferos que abastecem os poços de rega que pontuam os campos do Paquistão. Face à crescente procura da água, também o Indo começa a estar seco nos seus níveis mais baixos. O Paquistão, com uma população que se prevê alcançar 305 milhões de habitantes por volta de 2050, está em apuros.40 No Sudoeste Asiático, o caudal do Mekong diminui devido às barragens que estão a ser construídas nos seus níveis mais elevados pelos chineses. Os países a jusante, como o Camboja, o Laos, a Tailândia e o Vietname – países com 168 milhões de pessoas – queixam-se por causa do caudal reduzido do Mekong, mas isso não é suficiente para alterar os esforços da China na exploração da energia e da água do rio.41 O mesmo problema existe nos rios Tigre e Eufrates, que nascem na Turquia e se dirigem para o Golfo Pérsico, passando pela Síria e Iraque. Este sistema de rios, onde floresceram a Suméria e outras civilizações, está a ter uma utilização excessiva. Grandes barragens levantadas na Turquia e Iraque reduziram o caudal de água do que foi o “crescente fértil”, ajudando a destruir mais de 90 por cento das terras húmidas que enriqueciam a região do delta.42


Plano B 2.0 Nos sistemas hidrográficos mencionados, praticamente toda a água das bacias está a ser utilizada. Inevitavelmente, se as pessoas que estão a montante retirarem mais água, os que estão a jusante terão menos. 96

Lagos que Desaparecem À medida que os caudais dos rios são reduzidos ou mesmo eliminados totalmente e os níveis freáticos baixam devido ao excesso de bombeamento de água, os lagos vão também encolhendo e, nalguns casos, desaparecendo. Como a minha colega Janet Larsen nota, os lagos que estão a desaparecer são alguns dos mais conhecidos – incluindo o Lago Chade, na África Central, o MarAral, na Ásia Central e o Mar da Galileia (também conhecido por Lago Tiberíades).43 Muitos lagos dos Estados Unidos, também não estão bem. Na Califórnia, o Lago Owens, que cobria 518 quilómetros quadrados quando o último século começou, desapareceu. Depois de o rio Owens ter sido desviado para a sedenta LosAngeles, em 1913, o lago durou pouco mais de uma década.44 O Lago Mono da Califórnia, geologicamente o lago mais antigo da América do Norte, e paragem de aves aquáticas migratórias em busca de alimento, é a vítima mais recente da sede imparável de Los Angeles. O Lago Mono teve uma queda do nível de água de 11 metros desde 1941, altura em que o desvio de água dos seus afluentes para Los Angeles começou.45 A repórter da Reuters Megan Goldin escreve que “andar sobre o Mar da Galileia é uma proeza que qualquer mortal pode realizar”, devido à terra que avança sobre o mar. Quando vi pela primeira vez o rio Jordão, na zona onde entra em Israel vindo da Síria, a sua fragilidade era óbvia. De facto, em muitos países podia dizer-se que era um ribeiro. E no entanto, tem a grande responsabilidade de fornecer água ao Mar da Galileia, onde entra a norte para sair a sul, continuando a dirigir-se para sul cerca de 105 quilómetros até desaguar no Mar Morto.46 Com o caudal do Jordão mais reduzido devido à passagem por Israel, o Mar Morto está a diminuir ainda mais rapidamente que o Mar da Galileia. Ao longo dos últimos 40 anos, o seu nível de água


Emergência da Falta de Água 97 desceu cerca de 25 metros. Como resultado dos desvios do rio Jordão no seu curso para sul em Israel e da rápida descida dos níveis freáticos no lado jordano, o Mar Morto pode desaparecer totalmente por volta de 2050.47 De todos os lagos e mares interiores que estão a desaparecer, nenhum chamou mais à atenção do que o Mar Aral. Os seus portos, antes centros de comércio na região, estão agora abandonados, parecendo-se com as cidades mineiras fantasma do oeste americano. Outrora um dos maiores corpos de água doce do mundo, o Aral perdeu quatro quintos de seu volume desde 1960. Os navios que sulcavam regularmente as suas águas estão agora retidos na areia do antigo fundo do mar – sem água à vista.48 A origem da morte do Mar Aral está em 1960, quando os planeadores centrais soviéticos em Moscovo decidiram que a região que abraça as bacias do Syr Darya e do Amu Darya passaria a ser uma vasta área de cultivo de algodão que forneceria a indústria têxtil do país. Com o crescimento da plantação de algodão, cresceu também o desvio de água dos dois rios que alimentavam o Mar Aral. Com a redução do tamanho deste mar, as concentrações de sal subiram até que os peixes morreram. O próspero banco de peixe, que em tempos produziu 50.000 toneladas por ano, desapareceu, tal como desapareceram os empregos nos barcos de pesca e nas fábricas de peixe.49 Com o caudal anual de 65 mil milhões de metros cúbicos de água dos dois rios reduzido agora a 1,5 mil milhões de metros cúbicos, as perspectivas de inverter a redução do mar em curso não são boas. Com a linha de costa agora a mais de 250 quilómetros das cidades portuárias originais, há uma enorme área de fundo do mar exposto. Todos os dias o vento levanta milhares de toneladas de areia e sal do fundo do mar seco, distribuindo as partículas vindas do ar pelas terras de pastagem e de cultura, danificando-as.50 No decurso de uma conferência em 1990 na Academia das Ciências soviética sobre o futuro do Mar Aral, fez-se uma volta aérea para convidados estrangeiros. Voando sobre esta área num monomotor de duas asas da segunda guerra mundial a poucas centenas de metros do fundo do mar seco e coberto de sal, reparei como a paisagem se assemelhava à superfície lunar. Não havia vegetação


Plano B 2.0 98 nem qualquer sinal de vida, apenas uma desolação total.51 O desaparecimento de lagos é talvez mais pronunciado na China. Na província ocidental chinesa de Quinhai, através da qual corre o braço principal do rio Amarelo, havia antes 4.077 lagos. Ao longo dos últimos 20 anos, mais de 2.000 desapareceram. A situação é muito pior na província de Hebei, que circunda Pequim. Com os níveis freáticos a descer rapidamente em toda a região, Hebei perdeu 969 dos seus 1.052 lagos.52 Também estão a desaparecer lagos noutros países asiáticos, como a Índia, o Paquistão e o Irão. Por exemplo, desapareceram muitos lagos no vale indiano de Caxemira. O Lago Dal, que em tempos cobria 75 quilómetros quadrados, encolheu para 12 quilómetros quadrados. Com uma tão grande descida dos níveis freáticos na Índia, muitos lagos estão a desaparecer e outros a diminuir de tamanho rapidamente.53 A população está também a crescer para além da capacidade de fornecimento de água no México. O Chapala, o maior lago do país, é a principal fonte de água de Guadalajara, que alberga 5 milhões de pessoas.Airrigação crescente na região reduziu o volume de água no lago em 80 por cento.54 Os lagos estão a desaparecer em todos os continentes e pelas mesmas razões: desvio excessivo de água dos rios e extracção exagerada dos aquíferos subterrâneos. Ninguém sabe exactamente quantos lagos já desapareceram ao longo do último meio século, mas sabemos, isso sim, que agora milhares deles apenas existem nos mapas. Agricultores em Perda Face às Cidades Os conflitos entre países por causa da água dominam os títulos dos jornais. Mas dentro dos países é a luta pela água entre as cidades e o campo que preocupa os líderes políticos locais. Os aspectos económicos relacionados com o uso da água não favorecem os agricultores nesta competição, simplesmente porque a água necessária para produzir alimentos é muita. Por exemplo, enquanto para fazer uma tonelada de aço no valor de 550 dólares são necessárias 14 toneladas de água, para produzir uma tonelada de trigo no valor de 150 dólares são necessárias 1.000 toneladas de água. Nos países


Emergência da Falta de Água 99 preocupados com a expansão da economia e a criação de empregos, a decisão política de transformar a agricultura num reclamante residual não é uma surpresa.55 Muitas das maiores cidades do mundo situam-se em bacias hidrográficas onde toda a água disponível é utilizada.As cidades com esta localização, como a cidade do México, o Cairo e Pequim só podem aumentar o consumo através da importação de água de outras bacias ou retirando água à agricultura. O facto é que centenas de cidades em todo o mundo estão agora a satisfazer as suas necessidades crescentes retirando água de rega à agricultura. Entre as cidades americanas que o fazem estão San Diego, Los Angeles, Las Vegas, Denver e El Paso. Um estudo da USDA em 11 estados do oeste apurou que as vendas anuais de direitos de água durante 1996 e 1997 rondaram 1,65 mil milhões de toneladas, o suficiente para produzir 1,65 milhões de toneladas de cereais.56 Cálculos do Banco Mundial para a densamente povoada Coreia do Sul, um país com uma boa capacidade relativa de água, indica que o crescimento do uso doméstico e industrial de água pode reduzir o fornecimento disponível para a agricultura de 13 mil milhões para 7 mil milhões de toneladas em 2005. O banco prevê também que entre 2000 e 2010, a procura de água urbana aumente de 50 mil milhões para 80 mil milhões de toneladas, ou seja, 60 por cento. Aprocura de água para fins industriais, entretanto, passará de 127 mil milhões para 206 mil milhões, 62 por cento mais. Várias centenas de cidades estão a virar-se para o campo para satisfazerem as suas necessidades futuras de água. Na região de Pequim e arredores, esta viragem está em curso desde 1994, quando os agricultores foram proibidos de se abastecerem nos reservatórios que fornecem a cidade.57 À medida que a China tenta acelerar o desenvolvimento económico da bacia mais elevada do rioAmarelo, as indústrias emergentes a montante do rio têm prioridade no uso da água. E quanto mais água é usada a montante, menos chega aos agricultores a jusante. Em anos invulgarmente secos, o rioAmarelo não consegue chegar a Shandong, a última província no caminho para o mar.58 Os agricultores de Shandong, que tradicionalmente recebem cerca de metade da água para rega do rio Amarelo e metade de poços, estão agora a perder água destas duas fontes. A perda de água para


Plano B 2.0 100 rega numa província que produz um quinto do milho da China e um sétimo do seu trigo ajuda a perceber porque é que a produção de cereais da China está a diminuir.59 Centenas de cidades de outros países estão a satisfazer as suas necessidades crescentes de água apropriando-se de alguma da água com que os agricultores contam. Na Turquia ocidental, por exemplo, a cidade de Izmir depende agora muito dos campos de poços do distrito agrícola vizinho de Manisa.60 Nas Grandes Planícies do sul e sudoeste dos Estados Unidos, onde praticamente toda a água é já utilizada, o aumento das necessidades de água para as cidades e para milhares de vilas só pode ser satisfeito retirando água à agricultura. Uma revista mensal da Califórnia, The Water Strategist, apresenta uma lista de várias páginas com um conjunto de vendas de água no oeste dos Estados Unidos feitas no mês anterior. Quase nenhum dia passa sem uma venda. Oito em cada dez vendas fazem-se dos agricultores individuais ou dos seus distritos de irrigação para as cidades e municipalidades.61 O Colorado, com uma população em rápido crescimento, tem um dos mercados de água mais activos do mundo. As cidades em crescimento e vilas de vários tamanhos, num estado com uma imigração elevada, estão a comprar direitos de água para rega a agricultores e rancheiros. Na bacia elevada do rio Arkansas, que ocupa o quarto a sudeste do estado, Colorado Springs eAurora (um subúrbio de Denver) já compraram direitos de água a um terço dos terrenos agrícolas da bacia. Aurora comprou os direitos da água que antes irrigava 9.300 hectares da terra de cultura do vale do Arkansas.62 Compras ainda maiores estão a ser feitas pelas cidades da Califórnia. Em 2003, San Diego comprou os direitos anuais de 247 milhões de toneladas de água aos agricultores vizinhos do Imperial Valley – a maior transferência de água rural/urbana na história dos Estados Unidos. Este acordo estende-se aos próximos 75 anos. Em 2004, o Metropolitan Water District, que fornece água a 18 milhões de californianos do sul em várias cidades, negociou a compra de 137 milhões de metros cúbicos de água por ano a agricultores ao longo dos próximos 35 anos. Sem água para rega, a terra altamente produtiva destes agricultores é terra desperdiçada. Os agricultores que estão a vender os seus direitos de água gostariam de continuar a traba-


Emergência da Falta de Água 101 lhar na agricultura, mas os responsáveis das cidades estão a oferecer muito mais pela água do que os agricultores podem obter ao usá-la na rega das culturas.63 Em muitos países, no entanto, os agricultores não são compensados por perdas de água de rega. Em 2004, por exemplo, os agricultores Chineses ao longo do rio Juma, a jusante de Pequim, descobriram que o rio tinha parado de correr. Tinha sido construída perto da capital uma barragem para desviar a água do rio para a petroquímica de Yanshan, uma unidade de produção estatal.Apesar dos agricultores terem protestado com vigor, foi uma batalha perdida. Para os 120.000 aldeões da área a jusante da barragem de desvio, a falta de água poderá danificar a capacidade de viverem da agricultura.64 Quer seja por expropriação imposta pelo governo, ou por os agricultores serem colocados fora de mercado pelas cidades ou por as cidades perfurarem mais poços de água do que conseguem suportar, os agricultores deste mundo estão a perder a guerra da água. Estão confrontados não só com a diminuição do abastecimento de água em muitas situações mas também com o facto de terem uma parte mais pequena desse fornecimento menor. Lenta mas seguramente, as cidades estão a retirar a água aos agricultores do mundo, mesmo quando eles tentam alimentar mais de 70 milhões de pessoas em cada ano que passa.65 A Escassez Atravessa as Fronteiras Nacionais Historicamente, a escassez de água foi um assunto local. Eram os governos nacionais que tinham que assegurar o equilíbrio da oferta e da procura de água. Agora a situação está a mudar à medida que a escassez atravessa os limites nacionais através do comércio internacional de cereais. Uma vez que produzir uma tonelada de cereais requer 1.000 metros cúbicosde água, importar cereais é a forma mais eficaz de importar água. Os países estão, de facto, a usar os cereais para equilibrar a sua contabilidade da água. Igualmente, negociar em futuros de cereais é, de certo modo, negociar em futuros de água.66 Logo a seguir à China e à Índia, há uma segunda linha de países com grandes deficits de água – Argélia, Egipto, Irão, México e Paquistão. Três destes – Argélia, Egipto e México – já importam a


Plano B 2.0 102 maior parte dos seus cereais. No entanto, numa orientação idêntica à da China, o Paquistão, onde a água é escassa, voltou-se abruptamente para o mercado mundial em 2004 para importar 1,5 milhões de toneladas de trigo. A sua necessidade de importar cereais deve aumentar nos anos que aí vêm.67 O Médio Oriente e o Norte de África – de Marrocos, a oeste, ao Irão, a leste – tornaram-se no mercado de importação de cereais com o crescimento mais rápido a nível mundial.Aprocura de cereais é motivada tanto pelo crescimento rápido da população como pela crescente riqueza, sendo que a maior parte da última deriva das exportações de petróleo. Com praticamente todos os países da região a pressionar os limites das suas capacidades, a crescente procura de água só pode ser satisfeita retirando à agricultura a água das regas.68 O Egipto, com cerca de 74 milhões de pessoas, tornou-se um grande importador de trigo nos últimos anos, competindo com o Japão – tradicionalmente o principal importador de cereais – pelo primeiro lugar.Actualmente importa 40 por cento do seu consumo total de cereais, um número que tende a subir rapidamente à medida que a sua população cresce para além da capacidade dos cereais produzidos com a água do Nilo.69 AArgélia, com 33 milhões de pessoas, importa mais de metade dos seus cereais, o que quer dizer que a água contida no cereal importado excede a quantidade de todos os tipos de água usada proveniente de fontes nacionais. Devido à sua grande dependência das importações, aArgélia é particularmente vulnerável a perturbações como os embargos à exportação de cereais.70 Em geral, a água requerida para produzir os cereais e outros produtos agrícolas importados pelo Médio Oriente e Norte de África no ano passado foi igual ao caudal anual do rio Nilo em Aswan. Com efeito, o deficit de água desta região pode ser imaginado como outro Nilo a correr para ela na forma de cereais importados.71 Diz-se muitas vezes que as futuras guerras no Médio Oriente serão mais em torno da água do que do petróleo, mas a competição pela água está a dar-se nos mercados mundiais de cereais. Os países que são financeiramente mais fortes, não necessariamente os mais fortes do ponto de vista militar, são os que terão mais sucesso nesta competição.


Emergência da Falta de Água

103 Para saber onde é que as necessidades de importação de cereais se concentrarão amanhã, temos que olhar para os locais onde os deficits de água se desenvolvem hoje. Até agora, os países que têm vindo a importar a maior parte dos cereais de que necessitam são os mais pequenos.Agora, estamos a ver crescer rapidamente os deficits de água tanto na China como na Índia, cada um com mais de mil milhões de pessoas.72 Cada ano a diferença entre o consumo mundial e o fornecimento sustentável de água é maior. Cada ano o abaixamento do nível freático é maior que o ano anterior. Tanto a deterioração dos aquíferos como o desvio de água para as cidades contribuirão para o deficit crescente de água de irrigação e, por essa via, para um deficit cada vez maior de cereais em muitos países onde a água é escassa. Uma Economia de Bolha Alimentar Como referido antes, o excesso de bombeamento de água é uma forma de satisfazer o crescimento da procura de alimentos que causa, na prática, uma queda futura na produção alimentar, quando os aquíferos se esgotarem. Muitos países estão, em essência, a criar uma “economia de bolha alimentar” – em que a produção de alimentos é artificialmente inflacionada pela exploração não sustentável da água do subsolo. Os efeitos de exceder o saldo não eram óbvios quando os agricultores começaram a bombear água do solo em larga escala há algumas décadas. O grande atractivo de tirar água do subsolo, em contraste com os sistemas de água de grande dimensão à superfície, é que os agricultores podem aplicar a água nas culturas exactamente quando é necessária, maximizando assim a eficiência do seu uso. A água do solo está também disponível na estação seca, permitindo que muitos agricultores de regiões de clima ameno dupliquem as sementeiras. Para ilustrar, as produções de cereais no Punjab em terra irrigada a partir de poços foi de 5,5 toneladas por hectare, enquanto as produções em terra irrigada a partir de canais atingiu cerca de 3.2 toneladas por hectare. Informação idêntica relativa ao estado do sul, Andhra Pradesh, mostra também que há uma grande vantagem da


Plano B 2.0 104 irrigação bombeada a partir de poços, com produções de cereais de cerca de 5,7 toneladas por hectare em comparação com 3.4 toneladas em terra irrigada por canais. 73 Nos Estados Unidos, 37 por cento da água de rega vem do subsolo; os outros 63 por cento vêm de fontes de superfície. No entanto, três dos maiores estados produtores de cereais – Texas, Kansas e Nebraska – obtêm cada um 70-90 por cento da água de rega a partir do aquífero de Ogallala, que é essencialmente um aquífero fóssil com pouca renovação.Alta produtividade da irrigação com água do subsolo significa que os prejuízos da produção alimentar serão desproporcionadamente grandes quando essa água se esgotar.74 Em que ponto é que a escassez de água se traduzirá em escassez alimentar? Em que países as perdas de água de rega motivadas pela deterioração dos aquíferos se traduzirão numa queda da produção de cereais? David Seckler e os seus colegas no Instituto Nacional de Gestão da Água, a principal organização mundial de investigação sobre a água, resumiram bem este assunto: “Muitos dos países mais populosos do mundo – China, Índia, Paquistão, México e quase todos os países do Médio Oriente e Norte de África – têm literalmente abusado nas últimas duas ou três décadas da degradação das suas fontes de água no subsolo. A penalização para a má gestão deste valioso recurso está-se a aproximar e não é exagero dizer que os resultados podem vir a ser catastróficos para estes países e, dada a sua importância, para o mundo como um todo”.75 Uma vez que a expansão da irrigação mecanizada ajudou a triplicar a produção mundial de cereais entre 1950 e 2000, não será surpresa se as faltas de água reduzirem as colheitas. No que respeita à água para rega, muitos países estão numa situação de “sobreexploraçãoe-declínio”. Se os países que estão a bombear água em excesso não agirem rapidamente para reduzir o uso da água e estabilizar os níveis freáticos, então uma eventual queda da produção alimentar é quase inevitável.76


4 Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar

Em 2004, Sir David King, o principal Consultor Científico do governo do Reino Unido, relatou uma nova investigação científica bastante reveladora que confirma a relação entre os níveis de dióxido de carbono (CO2) e a temperatura nos últimos 740.000 anos. A análise de um cilindro de gelo perfurado até três quilómetros de profundidade feita por cientistas britânicos mostrou que as concentrações atmosféricas de CO2 flutuaram consistentemente entre 200 partes por milhão (ppm) durante as idades do gelo e 270 ppm durante os intervalos de temperatura mais amena. Esta viragem da idade do gelo para um período mais ameno ocorreu muitas vezes e sempre entre estes limites de concentração de CO2.1 Quando a Revolução Industrial começou, o nível de CO2 na atmosfera era cerca de 270 ppm. As 377 ppm registadas em 2004 não só estão muito acima de qualquer nível nos últimos 740.000 anos, mas podem mesmo aproximar-se de um nível a que nunca se chegou nos últimos 55 milhões de anos. Há 55 milhões de anos a Terra era um planeta tropical. Não havia gelo nos pólos; o nível do mar estava 80 metros acima dos níveis de hoje.2 Os efeitos destrutivos de uma temperatura mais alta são visíveis em muitas frentes. Ondas de calor destruidoras das culturas baixaram as colheitas de cereais nas principais regiões de produção de alimentos nos últimos anos. Em 2002, temperaturas recorde e a seca asso-


Plano B 2.0 106 ciada reduziram as colheitas de cereais na Índia, nos Estados Unidos e no Canadá, o que fez a colheita mundial cair 90 milhões de toneladas, ou 5 por cento abaixo do consumo. A onda de calor europeia recorde em 2003 contribuiu para uma queda na colheita mundial de 90 milhões de toneladas. O calor intenso e a seca na cintura do milho dos Estados Unidos em 2005 contribuíram para uma queda mundial de 34 milhões de toneladas.3 Ondas de calor tão intensas têm também um preço em vidas humanas. Em 1995, morreram 700 habitantes de Chicago numa onda de calor. Em Maio de 2002, numa onda de calor na Índia que atingiu os 50 graus Celsius, morreram mais de 1.000 pessoas só no estado de Andhra Pradesh.4 Em 2003, a onda de calor extremo que bateu recordes de temperatura em toda a Europa reclamou 49.000 vidas em oito países. Só a Itália perdeu mais de 18.000 pessoas, enquanto em França morreram 14.800. Morreram na Europa nesta onda de calor mais de 15 vezes o número de pessoas que morreram nos ataques terroristas ao World Trade Center e ao Pentágono em 11 de Setembro de 2001.5 Entre as várias consequências do aumento das temperaturas, a fusão do gelo e o respectivo efeito no nível do mar estão a chamar a atenção dos cientistas. Com a subida do nível do mar, países em ilhas de baixa altitude como o Tuvalu e as Maldivas e cidades costeiras como Londres, Nova Iorque e Xangai estarão entre os primeiros a sentir as consequências.6 A indústria de seguros está particularmente consciente da relação entre as temperaturas mais elevadas e a intensidade das tempestades. Com o aumento dos pedidos de pagamento relativos a danos relacionados com as condições atmosféricas, verificou-se nos últimos anos uma queda nos rendimentos e uma repentina baixa nos ratings de crédito tanto das companhias de seguros como das suas resseguradoras. Empresas, que usavam os registos históricos como base para calcularem as tabelas dos seguros para futuros danos por tempestades, apercebem-se agora de que o passado já não é um guia seguro para prever o futuro.7 Isto é um problema não só para a indústria de seguros, mas para todos nós. Estamos a alterar o clima da Terra, pondo em marcha tendências que nem sempre compreendemos, com consequências que não conseguimos prever.


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar O Aumento da Temperatura e os Seus Efeitos

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Os cientistas do Instituto Goddard para Estudos do Espaço, na Administração Nacional daAeronáutica e Espaço, recolhem informação de uma rede global de 800 estações de controlo do clima para medirem as alterações da temperatura média da Terra. Os seus registos abrangem os últimos 125 anos, desde 1880.8 Desde 1970, a temperatura média da Terra aumentou 0,8 graus Celsius. Durante o período de tempo estudado, o aumento da temperatura em cada década foi maior do que o da década anterior. (Ver Figura 4-1). Os meteorologistas referem que os 22 anos mais quentes registados são os posteriores a 1980. E os seis anos mais quentes desde que começou a recolha de dados em 1880 são os dos últimos oito anos. Três destes seis – 2002, 2003 e 2005 – foram anos em que as principais regiões produtoras de alimentos viram as suas culturas desaparecer devido às temperaturas recorde.9 A quantidade de CO2 na atmosfera aumentou substancialmente desde a Revolução Industrial, com os aumentos mais significativos a surgirem, desde que o registo de dados se iniciou, em 1959. Desde então, tem subido todos os anos, fazendo desta uma das tendências ambientais mais previsíveis do mundo. Como se vê na Figura 4-2, os níveis de CO2 começaram a subir rapidamente a partir de 1960. Cerca de uma década depois, em 1970, também a temperatura começou a subir.10 Com este pano de fundo de aumentos recorde, as previsões do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC) de que a temperatura média da Terra irá subir ao longo deste século entre 1,4 e 5,8 graus Celsius parecem bastante plausíveis. As recentes informações sobre o aumento da temperatura em certas regiões do norte – como o Alasca, o Canadá ocidental e a Sibéria – conjugadas com a rápida fusão do lençol de gelo da Gronelândia, a fusão dos glaciares nos topos das montanhas em todo o mundo, e a probabilidade, na altura em que escrevo, de que a temperatura global para 2005 venha a bater um novo recorde, todas sugerem que o aumento global da temperatura venha a ficar próximo do limite superior da previsão do IPCC. Um tal aumento – de 5,8 graus Celsius cerca do ano 2100, um aumento comparável ao verificado entre a última Idade do Gelo e os dias de hoje – criará um mundo muito diferente do que conhecemos.11


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Plano B 2.0

Figura 4-1. Temperatura Global Média, 1880-2005

Figura 4-2. Concentrações Globais de Dióxido de Carbono na Atmosfera, 1760-2004


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 109 O aumento da temperatura previsto pelo IPCC é uma média global, simplificada. Na realidade, o aumento será irregular. Será muito maior em terra do que nos oceanos, nas latitudes mais altas do que no equador, e nos interiores continentais do que nas regiões costeiras.12 As temperaturas mais altas diminuem a produção das colheitas, derretem as reservas de neve/gelo das montanhas que alimentam os rios do planeta, causam tempestades mais destrutivas, aumentam a área afectada pela seca e originam com mais frequência grandes e destrutivos fogos florestais.13 Num estudo apresentado no encontro anual da American Meteorological Society em San Diego, Califórnia, em Janeiro de 2005, uma equipa de cientistas do Centro Nacional para a InvestigaçãoAtmosférica referia ter havido um aumento drástico da superfície da Terra afectada pela seca nas últimas décadas. Notava que as terras que sofreram condições de seca extrema aumentaram de menos de 15 por cento da área total de terrenos da Terra nos anos 1970 para cerca de 30 por cento em de 2002. Atribuía parte desta mudança a um aumento da temperatura e parte à redução da precipitação, sendo as altas temperaturas progressivamente mais importantes durante a última parte do período. O autor de referência Aiguo Dai refere que a maior parte da seca se concentra na Europa e na Ásia, Canadá, África ocidental e austral e Austrália oriental.14 Investigadores do U.S. Department of Agriculture’s Forest Service referem que apenas um aumento de 1,6 graus Celsius na temperatura de Verão pode duplicar a área de grandes fogos nos 11 estados do oeste. O estudo, publicado na edição de Agosto de 2004 da revista Conservation Biology, debruçou-se sobre os registos de 85 anos de fogos e temperaturas.15 A National Wildlife Federation (NWF) refere que se as temperaturas continuarem a subir, por volta de 2040 um dos cinco rios do noroeste do Pacífico será demasiado quente para que o salmão, a truta prateada e a truta comum possam sobreviver. Paula Del Giudice, Directora da Federation’s Northwest Natural Resource Center,


Plano B 2.0 110 afirma que “o aquecimento global acrescentará uma enorme pressão sobre o que resta do habitat principal dos peixes de água doce da região”.16 Os ecossistemas serão afectados em toda a parte pelas temperaturas mais elevadas, por vezes de formas que não conseguimos prever facilmente. O Pew Center for Global Climate Change patrocinou um mega-estudo que analisa cerca de 40 relatórios científicos que relacionam a temperatura com as alterações nos ecossistemas. Entre as muitas alterações relatadas estão a chegada da Primavera quase duas semanas mais cedo nos Estados Unidos, o início da nidificação das andorinhas nove dias mais cedo do que há 40 anos, e uma mudança para norte do habitat da raposa vermelha que ameaça a área da raposa do Árctico. Os esquimós ficaram surpreendidos pelo aparecimento de tordos, pássaros que nunca tinham visto antes. De facto, nem sequer há uma palavra na língua esquimó para designar “tordo”.17 Hector Galbraith, da Universidade de Colorado-Boulder, co-autor do estudo do Pew, revelou que “os efeitos desta mudança estão a ocorrer muito mais rapidamente do que… se esperava”. Disse também “que os ecossistemas são muito mais sensíveis à alteração climática do que se acreditava há uma década”. Um estudo patrocinado pela Conservation International previu que a alteração contínua do clima pode levar mais de um quarto dos animais terrestres e plantas à extinção.18 Douglas Inkley, principal consultor científico do NWF e autor principal de um relatório à Wildlife Society, nota, “Enfrentamos a perspectiva de que o mundo da vida selvagem que conhecemos hoje – e muitos dos sítios onde investimos décadas de trabalho para que se conservassem como refúgios e habitats para a vida selvagem – deixe de existir tal como o conhecemos, a menos que consigamos impedir que esta previsão se confirme”19


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar O Efeito da Produção Agrícola

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Uma das áreas económicas mais sensíveis ao aumento das temperaturas é a das produções agrícolas. As culturas em muitos países são desenvolvidas à sua temperatura ideal ou próximo, o que as torna vulneráveis a qualquer subida da temperatura. Mesmo um aumento relativamente pequeno durante a estação de crescimento de 1 ou 2 graus Celsius pode fazer baixar a colheita de cereais em importantes regiões de produção alimentar, como a Planície do Norte chinesa, a Planície do Ganges indiana ou a Cintura do Milho dos Estados Unidos.20 As temperaturas mais altas podem reduzir ou mesmo parar a fotossíntese, impedir a polinização e conduzir à desidratação das culturas. Embora as elevadas concentrações de dióxido de carbono na atmosfera que aumentam a temperatura também possam aumentar a produção agrícola, o efeito prejudicial das temperaturas altas nas culturas ultrapassa o efeito fertilizante do CO2 na maior parte dos casos. Num estudo sobre a sustentabilidade do ecossistema local, Mohan Wali e os seus colegas na Ohio State University afirmam que com o aumento das temperaturas, a actividade de fotossíntese das plantas aumenta até a temperatura atingir os 20 graus Celsius. O nível de fotossíntese atinge então um limite em que permanece até a temperatura atingir 35 graus Celsius, altura em que começa a baixar, até que, aos 40 graus Celsius, a fotossíntese pára completamente.21 A parte mais vulnerável do ciclo de vida de uma planta é o período de polinização. Dos três bens alimentares básicos no mundo – arroz, trigo e milho – o milho é o mais vulnerável. Para o milho se reproduzir, o pólen tem que cair das flores situadas no topo da planta sobre os fios da barba que emerge na ponta de cada espiga. Cada um dos fios está ligado a um ponto do talo onde cresce o grão. Para este se desenvolver, tem que cair um grão de pólen no fio, que depois viaja até ao encaixe do grão. Quando as temperaturas são demasiado altas, as barbas de milho secam rapidamente e ficam castanhas, incapazes de desempenhar o seu papel no processo de fertilização.


Plano B 2.0 112 Os efeitos da temperatura na polinização do arroz foram estudados em detalhe nas Filipinas. Os cientistas relataram que a polinização do arroz cai de 100 por cento a 34 graus Celsius para quase zero a 40 graus, levando ao fracasso da plantação.22 As temperaturas elevadas podem também desidratar as plantas. Enquanto pode ser necessária uma equipa de cientistas para compreender como é que as temperaturas altas afectam a polinização do arroz, quando um campo de milho está a sofrer o stress do calor, qualquer pessoa repara. Quando uma planta do milho enrola as suas folhas para reduzir a exposição ao sol, a fotossíntese é reduzida. E quando os estomas na parte inferior das folhas se fecham para reduzir a perda de viscosidade, a absorção de CO2 diminui, reduzindo assim a fotossíntese. Com temperaturas altas, a planta do milho, que em condições ideais é tão extraordinariamente produtiva, entra em choque térmico. Nos últimos anos, os ecologistas especializados em colheitas de vários países têm vindo a concentrar-se na relação precisa entre temperatura e produção de colheitas. Numa época em que as temperaturas estão a subir, as suas conclusões são perturbantes. Um dos mais abrangentes destes estudos foi efectuado no International Rice Research Institute (IRRI) nas Filipinas, a principal organização mundial de investigação do arroz. A equipa de eminentes cientistas de culturas agrícolas salientou que de 1979 a 2003, a média anual da temperatura no local de investigação aumentou cerca de 0,75 graus Celsius.23 Usando a informação da produção das culturas dos campos experimentais de arroz irrigado, onde as práticas de gestão são óptimas, dos anos 1992-2003, as conclusões da equipa confirmaram a mnemónica que se generaliza entre os ecologistas de culturas – que 1 grau Celsius de subida da temperatura acima da norma faz baixar as produções de trigo, arroz e milho cerca de 10 por cento.Aconclusão do IRRI foi consistente com as de outros projectos recentes de pesquisa. Os cientistas concluíram que “os aumentos da temperatura motivados pelo aquecimento global tornarão cada vez mais difícil alimentar a crescente população da Terra”.24


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 113 Ao mesmo tempo que este estudo das produções de arroz se processava, era feita nos Estados Unidos uma análise histórica empírica do efeito da temperatura nas produções de milho e soja. Ela concluiu que as temperaturas mais altas tinham tido um efeito ainda maior nas produções destas colheitas. Utilizando a informação disponível referente a 1982-98 de 618 condados para o milho e 444 condados para a soja, David Lobell e Gregory Asner concluíram que por cada grau Celsius de aumento da temperatura, as produções baixavam cerca de 17 por cento. Dadas as previsões de aumento de temperatura na Cintura do Milho dos Estados Unidos, onde é feita grande parte da produção mundial de milho e soja, estas conclusões deveriam preocupar os responsáveis pela segurança alimentar mundial.25 Dois cientistas na Índia, K.S. Kavi Kumar e Jyoti Parikh, mediram o efeito do aumento das temperaturas nas produções de trigo e arroz. Baseando o seu modelo em informação relativa a 10 locais, concluíram que no norte da Índia a subida de 1 grau Celsius na temperatura média não diminuía significativamente as produções de trigo, mas uma subida de 2 graus Celsius baixava as produções em quase todos os locais. Ao olharem para a alteração da temperatura, verificaram que uma subida de 2 graus Celsius levava a uma diminuição das produções de trigo irrigado que variava entre 37 por cento e 58 por cento. Combinando os efeitos negativos da temperatura mais elevada com os efeitos positivos da fertilização pelo CO2, verificaram que a diminuição nas produções dos vários locais variava entre 8 por cento e 38 por cento. Para um país que prevê ter mais 500 milhões de pessoas a meio deste século, esta é uma perspectiva perturbadora.26 Reservatórios no Céu As massas de neve e gelo nas montanhas são os reservatórios de água doce da natureza – a forma da natureza armazenar água para alimentar os rios durante a estação seca do Verão. Agora estão ameaçadas pela subida da temperatura. Apenas um grau de aumento na temperatura das regiões montanhosas pode reduzir acentuadamente a parte da precipitação que cai como neve e aumentar muito a


Plano B 2.0 114 que cai como chuva. Isto, por sua vez, aumenta as inundações na estação das chuvas e reduz a água derretida da neve como fonte de alimentação dos rios durante a estação seca. Em algumas regiões agrícolas, estes “reservatórios no céu” são a fonte principal de água para rega e para beber. No sudoeste dos Estados Unidos, por exemplo, o rio Colorado – a principal fonte de água para rega – depende dos campos de neve das Montanhas Rochosas para garantir a maior parte do seu caudal. A Califórnia, para além de depender fortemente do Colorado, depende também da neve derretida da Sierra Nevada na parte leste do Estado. Tanto a Sierra Nevada como a costa montanhosa fornecem água para rega ao Vale Central da Califórnia, o grande fornecedor mundial de frutos e legumes. Resultados preliminares de um estudo sobre os efeitos do aumento da temperatura em três dos principais sistemas hidrográficos no oeste dos Estados Unidos – o Columbia, o Sacramento e o Colorado – indicam que o manto de neve que cobre as montanhas no Inverno e os alimenta será drasticamente reduzido e que a pluviosidade de Inverno e as inundações aumentarão de forma correspondente.27 A manter-se a inércia actual da política energética, os modelos climáticos prevêem que, em meados deste século, haverá uma redução de 70 por cento na quantidade de neve nas montanhas do oeste dos Estados Unidos. Um estudo detalhado do Vale do Rio Yakima — uma vasta região de produtos frutícolas no Estado de Washington — feito pelo U.S. Department of Energy’s Pacific Northwest National Laboratory, revela perdas sucessivamente maiores à medida que a neve desaparece do topo das montanhas e se reduzem os fluxos de água para rega. Um aumento de 2 graus Celsius da temperatura reduziria o rendimento das explorações agrícolas do vale em 92 milhões de dólares; um aumento de 4 graus Celsius reduziria os rendimentos em 163 milhões de dólares, quase um quarto do valor da actual colheita.28


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 115 Na Ásia Central, a agricultura de muitos países – Uzbequistão, Turquemenistão, Kyrgistão, Kazaquistão, Tajiquistão e Afeganistão – depende fortemente da fusão das neves dos sistemas montanhosos do Hindu Kush, Pamir e Tien Shan para ter água de rega. O vizinho Irão obtém a maior parte da água da neve derretida das Montanhas Alborz de 5.700 metros de altitude, entre Teerão e o Mar Cáspio.29 A vasta massa de neve e gelo dos Himalaias, a maior de todas, é a que preocupa os agricultores. Todos os grandes rios da Ásia, onde vive metade da população do mundo, têm origem nos Himalaias, a saber, o Indo, o Ganges, o Mekong, o Yangtze e o Amarelo. Uma vez que as temperaturas mais quentes aumentam a queda de chuva e reduzem a queda de neve nos Himalaias, haverá mais inundações durante a estação das chuvas e menos neve derretida para alimentar os rios durante a estação seca.30 Uma diminuição do manto de neve que alimenta o caudal do rio Amarelo fará diminuir a colheita de trigo da China, a maior do mundo. Alterações no caudal do rio Yangtze afectarão directamente a colheita de arroz da China – também a maior do mundo. E a colheita de trigo da Índia, a segunda depois da China, será afectada pelos caudais tanto do Indo como do Ganges. Qualquer coisa que diminua o caudal de Verão do Mekong afectará a colheita de arroz do Viet Nam, um grande exportador.31 A retracção dos glaciares nos Himalaias pode afectar o fornecimento de água a centenas de milhões de pessoas. Em países como a Índia e a China, a água armazenada durante a estação das chuvas como neve e gelo para ser libertada na estação seca, seria reduzida ou, nalguns casos, desapareceria completamente. O resultado seria mais inundações demolidoras alternando anualmente com mais severas faltas de água no início do Verão.32 Há muitos mais sistemas montanhosos onde os regimes de neve e gelo estão a mudar, entre eles os Alpes e os Andes. As massas de neve e gelo nos principais sistemas montanhosos do mundo e a água que elas armazenam são tomadas como certas simplesmente porque


Plano B 2.0 116 estão lá desde antes da agricultura ter começado no mundo. Agora isso está a mudar. Se continuarmos a aumentar a temperatura da Terra, arriscamo-nos a perder os reservatórios no céu de que as cidades e os agricultores dependem.33 Gelo que Derrete e Mares que Sobem No seu terceiro relatório, um relatório de referência, publicado no início de 2001, o IPCC previu que o nível do mar subiria neste século entre 9 e 88 centímetros como resultado da expansão térmica e da fusão do gelo. Vários estudos novos elaborados nos quatro anos que se seguiram indicam que a cobertura de gelo da Terra está a derreter ainda mais depressa do que os cientistas do IPCC previram.34 Um estudo de 2002 de dois cientistas do Instituto de Investigação Árctica e Alpina da Universidade do Colorado mostra que a fusão dos grandes glaciares na costa oeste do Alasca e no norte do Canadá se está a acelerar. Informação anterior indicava já que esta fusão estava a aumentar o nível do mar cerca de 0,14 milímetros por ano, mas os novos dados, da década de 1990, mostram que uma fusão mais rápida está agora a fazer subir o nível do mar cerca de 0,32 milímetros por ano – mais do dobro da velocidade.35 Este estudo é reforçado por outro estudo do U.S. Geological Survey (USGS) que indica que os glaciares estão agora a encolher em todos os 11 sistemas montanhosos com glaciares do Alasca. Um estudo anterior do USGS referia que o número de glaciares do Parque Nacional de Glaciares dos Estados Unidos tinha reduzido de 150, em 1850, para menos de 50 nos dias de hoje. Os restantes glaciares prevê-se que desapareçam dentro de 30 anos, deixando as futuras gerações de visitantes confusas quanto à razão para o nome do parque.36 Outra equipa de cientistas do USGS, que usou dados de satélite para medir alterações na área coberta por glaciares em todo o mundo, descreveu a fusão acelerada dos glaciares de muitas regiões montanhosas, incluindo os Andes sul-americanos, os Alpes suíços e os Pirinéus franceses e espanhóis.37 Afusão de glaciares está a ganhar dimensão em todos os Andes.


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 117 Especialista em glaciares, Lonnie Thompson, da Ohio State University, refere que a diminuição do tamanho do glaciar Qori Kalis, no lado oeste da cobertura de gelo designada por Quelccaya, nos Andes peruanos, foi três vezes mais rápida em cada ano entre 1998 e 2000 do que entre 1995 e 1998. Thompson prevê que a cobertura de gelo do Quelccaya venha a desaparecer totalmente entre 2010 e 2020. No vizinho Equador, o glaciar Antisana, que fornece metade da água consumida em Quito, recuou quase 100 metros nos últimos oito anos.38 Bernard Francou, director de investigação do Instituto de Investigação e Desenvolvimento do governo francês, acredita que 80 por cento dos glaciares da América do Sul desaparecerá nos próximos 15 anos. Para países como a Bolívia, Peru e Equador, que dependem dos glaciares para a obtenção de água para uso doméstico e para rega, estas não são boas notícias.39 Os Alpes europeus estão também a sofrer um processo de descongelação. Cientistas da Universidade de Zurique referem que os glaciares na Suíça encolheram 1 por cento de 1973 a 1985, mas que a área coberta diminuiu 18 por cento entre 1985 e 2000. Eles salientam que “as mudanças podem também ter um impacto no turismo, pilar crucial da economia Suíça, à medida que os idílicos cenários dos vales glaciais se tornem improdutivos e rochosos”. Com o desaparecimento dos glaciares e o recuo dos limites da neve para níveis mais altos, a estação do ski, no Inverno, ficará mais curta.40 Os estudos de Lonnie Thompson sobre o Kilimanjaro mostram que entre 1989 e 2000, a montanha mais alta de África perdeu 33 por cento do seu campo de gelo. Ele previu que a cobertura de gelo pode desaparecer por completo cerca de 2015. Em Março de 2005, o Guardian em Londres escrevia: “A montanha mais alta de África, com o seu pico branco, é um dos locais mais facilmente reconhecíveis do mundo. Mas, como esta fotografia aérea mostra, a cobertura de neve que é a imagem de marca do Kilimanjaro, situada a 5.895 metros (19.340 pés), desapareceu totalmente – 15 anos antes do previsto pelos cientistas.41 A imensa massa de neve e gelo nos Himalaias está também a


Plano B 2.0 118 recuar. A Union International des Associations d’Alpinisme refere que o glaciar que terminava no campo base donde Edmund Hillary e Tenzing Norgay lançaram a sua histórica subida ao Everest, em 1953, recuou cerca de 5 quilómetros. O Geólogo Jeffrey Kargel, que estuda os Himalaias, não está surpreendido com isto. “Isso encaixa-se com o quadro geral do que está a acontecer no Nepal, Índia, Botão e, numa menor medida, no Tibete”, diz ele.42 Um estudo recentemente concluído por uma equipa de mais de 50 cientistas americanos e chineses, realizado ao longo de 26 anos, mediu a fusão acelerada dos glaciares na China ocidental. O estudo relata que o volume dos 46.298 glaciares da China diminuiu cerca de 5,5 por cento nos últimos 24 anos.Afusão dos glaciares nesta região, como em muitas áreas do mundo, acelerou repentinamente desde o início da década de 1990.43 Yao Tandong, um importante estudioso de glaciares que contribuiu para este estudo, prevê que em 2060 dois terços dos glaciares da China podem ter desaparecido. A fusão dos vastos campos de gelo dos Himalaias, que contêm mais gelo que qualquer outra região fora dos pólos, pode elevar drasticamente o nível do mar. Yao Tandong resumiu a situação: “O encolhimento enorme dos glaciares na região do planalto acabará por conduzir a uma catástrofe ecológica”.44 Um outro estudo recente, Impactos de um Árctico a Aquecer, conclui que o Árctico está a aquecer quase duas vezes mais depressa do que o resto do planeta. Conduzido pela equipa do Arctic Climate Impact Assessment (ACIA), um grupo internacional de 300 cientistas, o estudo apurou que nas regiões que circundam o Árctico, nomeadamente, o Alasca, o Canadá ocidental e o leste da Rússia, as temperaturas de Inverno já subiram cerca de 3 a 4 graus Celsius ao longo do último meio século. Robert Corell, presidente do ACIA, observa, “Os impactos do aquecimento global estão já a afectar as pessoas no Árctico”. Esta região, diz, “está a experimentar uma das mais rápidas e severas alterações climáticas ao cimo da Terra”.45


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 119 Em declarações ao Comité para o Comércio do Senado dos Estados Unidos, Sheila Watt-Cloutier, uma esquimó falando em nome dos 155.000 esquimós que vivem no Alasca, Canadá, Gronelândia e Federação Russa, descreveu a luta dos esquimós para sobreviver no clima do Árctico em rápida mutação como “uma fotografia daquilo que está a acontecer ao planeta”. E foi mais além dizendo: “a Terra está literalmente a derreter”.46 O relatório do ACIA descreve como o recuo do gelo do mar tem “consequências devastadoras para os ursos polares” cuja sobrevivência pode bem estar em risco. Também ameaçadas estão as focas que vivem no gelo, uma fonte alimentar essencial para os esquimós.47 As temperaturas mais altas estão também a descongelar o que eram os solos perpetuamente congelados da região. À medida que a tundra descongela, desestabiliza e danifica edifícios, pipelines e estradas. O descongelamento da tundra tem efeitos muito para além dos problemas estruturais locais. Um relatório na Science afirma,” Ninguém sabe exactamente quanto carbono há no permafrost boreal e alpino, mas as estimativas variam entre 350 e 450 gigatoneladas [mil milhões de toneladas] – talvez entre um quarto e um terço de todo o carbono do solo. A grande questão é saber o que acontecerá se mesmo só uma pequena parte deste enorme armazém de carbono for libertada.” Isto pode comparar-se aos 7 mil milhões de toneladas de carbono que é emitido pela queima de combustíveis fósseis todos os anos.48 Os cientistas que monitorizam o aquecimento do Árctico estão porventura mais concentrados sobre o efeito na Gronelândia. Se todo o gelo do mar Árctico derreter, isso não afectará o nível do mar porque todo esse gelo já está na água. Mas se o aquecimento do Árctico derreter o lençol de gelo da Gronelândia, que tem a espessura de uma milha e meia em alguns locais, o nível do mar subirá cerca de 7 metros. A possibilidade do lençol de gelo da Gronelândia derreter mede-se em séculos, não em anos. No entanto, mapas recentes mostram que os limites exteriores do lençol estão a derreter rapidamente, particularmente na costa leste.49


Plano B 2.0 120 Os cientistas estão preocupados com a fusão do lençol de gelo da Gronelândia não só devido ao efeito óbvio que a mesma terá no nível do mar, mas também porque poderá perturbar a circulação oceânica, em particular o fluxo da Corrente do Golfo. Nas condições actuais, a Corrente do Golfo, que transporta água quente à superfície em direcção ao norte, a partir do Atlântico Sul, suporta o clima ameno da Europa ocidental. À medida que a água quente com elevada salinidade se dirige para norte, arrefece em resultado da perda de calor e da evaporação, tornando-se mais densa e salgada. Isto acaba por fazer com que vá para o fundo e corra para sul como água de profundidade. Um influxo de água doce do lençol de gelo da Gronelândia a derreter-se ou do gelo do mar Árctico poderia perturbar este padrão de circulação, o que resultaria em temperaturas algo mais baixas no nordeste dos Estados Unidos e Canadá oriental e uma queda forte da temperatura na Europa. A evidência histórica sugere que mudanças destas surgiram por vezes de forma rápida — numa questão de anos ou décadas.50 Com o derreter do mar Árctico, abre-se a possibilidade de o utilizar como uma via marítima entre os oceanosAtlântico e Pacífico. A procura de uma passagem a Noroeste, sonho de antigos exploradores obrigados navegar torneando o Cabo da Boa Esperança, poderá tornar-se num pesadelo para a sociedade do século vinte e um. As companhias de navegação andam já em busca de atalhos possíveis.Aviagem da Europa para a Ásia via Canal do Panamá percorre cerca de 12.600 milhas náuticas, de acordo com um artigo no Globe and Mail, do Canadá, enquanto que a passagem a Noroeste seria encurtada para 7.900 milhas náuticas. O risco é que os danos ambientais de qualquer acidente, tal como um derramamento de petróleo no mar Árctico, poderiam perdurar durante décadas senão mais, neste ambiente frígido.51 No outro extremo da Terra, o lençol de gelo com 2 quilómetros de espessura da Antártida cobre um continente cerca de duas vezes maior que aAustrália e tem 70 por cento da água doce do mundo. Os bancos de gelo que se estendem do continente até aos mares que o rodeiam estão a começar a partir-se a um ritmo alarmante.52


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 121 Os bancos de gelo que rodeiam a Antártida são formados pela deslocação dos glaciares do continente para níveis mais baixos no mar em redor. Esta deslocação do gelo, alimentada pela contínua formação de gelo novo em terra e que culmina na quebra dos bancos de gelo no limite exterior e na criação de icebergues, não é nova. O que é novo é o ritmo a que se processa. Quando Larsen A, um enorme banco de gelo na costa leste da península antárctica, se partiu em 1995, foi um sinal de que não estava tudo bem na região. Depois, em 2000, um enorme icebergue com uma dimensão próxima da de Conecticut – 11.000 quilómetros quadrados – separou-se do banco Ross Ice.53 Depois do Larsen A se partir, era apenas uma questão de tempo, dado o aumento da temperatura na região, até que o mesmo acontecesse ao Larsen B. Em Novembro de 2001, foi emitido um alerta para a comunidade científica por um investigador do Instituto Antártico Argentino, que reparou na temperatura invulgarmente quente que fazia na primavera e na aceleração de 20 por cento da deslocação do banco de gelo. Assim, quando a parte norte do banco de gelo Larsen B entrou em colapso e caiu no mar em Março de 2002, não foi uma surpresa total. Mais ou menos ao mesmo tempo, um enorme bocado de gelo separou-se do glaciar Thwaite. Com 5.500 quilómetros quadrados, este icebergue tinha o tamanho de Rhode Island.54 Até mesmo veteranos observadores de gelo estão admirados com a rapidez com que a desintegração está a ocorrer. “A velocidade é chocante”, diz o Dr. David Vaughan, um estudioso de glaciares na Britsh Antarctic Survey, que tem vindo a monitorizar de perto o banco de gelo Larsen.Ao longo da penínsulaAntárctica, na vizinhança do banco de gelo Larsen, a temperatura média subiu 2,5 graus Celsius durante as últimas cinco décadas. A subida da temperatura leva o gelo a derreter-se na superfície dos bancos de gelo. Os cientistas teorizam que à medida que a água derretida da superfície penetra nas fracturas, torna o gelo mais fraco, tornando-o vulnerável a mais fracturas.55 Quando os bancos de gelo já na água se partem e separam da massa continental de gelo, isto, em si mesmo, não tem um efeito muito grande no nível do mar. Mas sem os bancos de gelo a travarem a deslocação do gelo glacial, que normalmente se move de 400 a 900 metros por ano, o movimento do gelo do continente pode acelerar,


Plano B 2.0 122 conduzindo à diminuição da espessura do lençol de gelo nos limites do continente antárctico. Se isto acontecer, o nível do mar sobe. O Dr. Neal Young do Antarctic Cooperative Research Center da Universidade da Tasmânia, naAustrália, salienta que depois do Larsen A se ter partido, a velocidade de afastamento do glaciar duplicou, no mínimo.56 A fusão acelerada do gelo, consistente com o acelerar do aumento da temperatura desde 1980, é motivo de grande preocupação nas regiões baixas dos países costeiros e nos países- ilha de baixa altitude. Talvez o efeito da subida do nível do mar mais facilmente medido seja a inundação das áreas costeiras. Donald F. Boesch, do Centro para as Ciências Ambientais da Universidade de Maryland, estima que por cada metro de subida do nível do mar, a linha de costa recuará cerca de 1.500 metros.57 Em 2000, o Banco Mundial publicou um mapa que mostra que a subida de um metro do nível do mar inundaria metade da terra de arroz do Bangladesh. Se a previsão da subida do nível do mar até um metro, neste século, se confirmar, dezenas de milhões de habitantes do Bangladesh serão forçados a emigrar. Num país com 142 milhões de pessoas – já um dos mais densamente povoados da Terra – isto seria uma experiência traumática. Planícies aluviais onde cresce o arroz noutros países da Ásia seriam também afectadas, como a Índia, a Tailândia, o Viet Nam, a Indonésia e a China. Com a subida de um metro do nível do mar, mais de um terço de Xangai, uma cidade com 13 milhões de pessoas, ficaria debaixo de água.58 Uma tal subida custaria aos Estados Unidos 36.000 quilómetros quadrados de terra, a maior parte no meio dos Estados do Atlântico médio e do Golfe do Mississipi. Com um surto de 50 anos de tempestades, grandes porções da baixa de Manhattan e do National Mall, no centro de Washington, D.C., ficariam inundadas com água do mar.59 Enquanto a atenção pública se concentra no efeito da fusão do gelo na subida do nível do mar, a expansão térmica dos oceanos como resultado do aumento da temperatura está também a fazer subir o nível do mar.Actualmente, os cientistas calculam que as contribuições relativas da fusão do gelo e da expansão térmica para a subi-


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 123 da do nível do mar é mais ou menos a mesma. Em conjunto, estão a provocar a elevação do nível do mar a um passo mensurável. Tornou-se, pois, num indicador a ter em conta – uma tendência que poderá vir a forçar uma migração humana de dimensões inimagináveis. Levantando também questões de responsabilidade perante as gerações futuras que a humanidade jamais enfrentou.60

Tempestades Mais Destrutivas A subida do nível dos mares não é a única ameaça que surge com as temperaturas globalmente elevadas. As temperaturas mais altas da água de superfície nos oceanos tropicais significam mais energia irradiada para a atmosfera susceptível de accionar os sistemas de tempestades tropicais, conduzindo a mais frequentes e mais destrutivas tempestades. A combinação da subida dos mares com tempestades mais poderosas e épocas de temporal mais intensas pode ser devastadora.61 No Outono de 1998, o Furacão Mitch – uma das mais poderosas tempestades que alguma vez surgiu do Atlântico, com ventos próximos dos 320 quilómetros por hora – atingiu a costa leste da América Central. Como as condições atmosféricas atrasaram a progressão normal da tempestade para norte, foram despejados cerca de 2.000 litros de chuva por metro quadrado em algumas zonas das Honduras e Nicarágua durante alguns dias. O dilúvio destruiu casas, fábricas e escolas, deixando tudo em ruínas. Destruiu também estradas e pontes. Foram levados pelas águas setenta por cento das colheitas e a maior parte do solo de superfície – acumulado ao longo de um largo período de tempo geológico. Enormes aluimentos de terras destruíram aldeias, por vezes enterrando as populações locais.62 A tempestade deixou 11.000 mortos. Milhares deles nunca foram encontrados. A infra-estrutura básica – as estradas e pontes das Honduras e Nicarágua – ficaram, em grande medida, destruídas. O Presidente Flores das Honduras resumiu tudo deste modo: “Ao todo, tudo o que foi destruído em alguns dias levou-nos 50 anos a construir”. Os danos provocados por esta tempestade, cujo valor excede o produto anual bruto dos dois países, fizeram retroceder o seu desenvolvimento económico cerca de 20 anos.63


Plano B 2.0 124 Em 2004, o Japão experimentou um número recorde de 10 tufões (furacões) que colectivamente causaram 10 mil milhões de dólares de perdas. Durante a mesma estação, o Estado da Florida foi atingido por 4 dos 10 furacões com maiores custos da história dos Estados Unidos. Estes 4 furacões em conjunto deram origem a pedidos de indemnização às seguradoras no valor de 22 mil milhões de dólares.64 Um ano mais tarde, estas tempestades pareciam pequenas quando o furacão Katrina chegou à costa na região do Golfo dos Estados Unidos, com uma subida do nível do mar de mais de 6 metros, destruindo muitas povoações costeiras. A tempestade também inundou Nova Orleães, deixando-a, na maior parte, inabitável. Ao todo, resultaram centenas de milhares de refugiados provenientes doAlabama, Mississippi e Louisiana. Esta poderosa tempestade, alimentada pelas temperaturas elevadas das águas superficiais do Golfo, deixou no seu rasto uma factura calculada por baixo em 200 mil milhões de dólares. Uma vez que serão necessários anos para que a região recupere totalmente, o custo pode ser ainda superior.65 Contra este revés, as companhias de seguros e de resseguros têm dificuldade em calcular um valor adequado dos prémios, uma vez que o registo histórico usado tradicionalmente para calcular os preços dos seguros já não pode ser um guia para o futuro. Por exemplo, o número de grandes inundações em todo o mundo cresceu em todas as últimas décadas, subindo de 6 grandes inundações nas décadas de 1950 e 1960 para 8 na década de 1970, 18 na década de 1980 e 26 na década de 1990.66 As seguradoras estão convencidas de que com temperaturas mais elevadas e mais energia a criar sistemas de tempestades, as perdas futuras serão ainda maiores. Elas estão preocupadas sem saber se a indústria conseguirá permanecer solvente sob um impacto de danos sempre crescentes. O mesmo acontece com o Moody’s Investors Service, que em 2002 reavaliou em baixa o rating de crédito de várias das principais companhias resseguradoras do mundo. Desde então, uma destas firmas – a Munich Re – informou que 2004 foi um ano recorde de pedidos de indemnização à indústria de seguros em todo o mundo, mesmo contando com a inflação.67 Thomas Loster, especialista de clima da Munich Re, disse no


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 125 final de 2004: “Tal como em 2002 e 2003, o balanço global das catástrofes naturais é de novo dominado claramente pelos desastres relacionados com o clima, muitos deles excepcionais e extremos… Temos que acabar com esta experimentação perigosa que a humanidade está a levar a cabo na atmosfera da Terra”. A indústria de seguros está particularmente preocupada com os novos riscos relacionados com o clima que podem estar a surgir, tais como o furacão Catarina, que se desenvolveu em 2004 no Atlântico Sul, onde as temperaturas da água não são, em geral, suficientemente altas para gerar um furacão. Se o Catarina, que chegou à costa sul do Brasil, é apenas um evento anómalo ou o início de uma nova e perturbante tendência, isso ainda está por saber.68 A Munich Re publicou uma lista de tempestades com perdas seguradas de mil milhões de dólares ou mais. O primeiro desastre natural com estas dimensões ocorreu em 1983, quando o furacão Alicia assolou os Estados Unidos, custando mais de 1,5 mil milhões de dólares em perdas seguradas. Das 49 catástrofes naturais com mil milhões de dólares ou mais de perdas seguradas registadas até ao fim de 2004, 3 foram terramotos, incluindo o devastador tsunami asiático de 2004; as outras 46 estiveram relacionadas com o clima – tempestades, inundações, furacões e grandes fogos. Durante a década de 1980, houve 3 eventos destes; na década de 1990, houve 26; e durante a primeira metade da década actual, de 2000 a 2004, houve 17.69 Antes do furacão Katrina, os dois maiores eventos em termos de danos totais foram o furacãoAndrew, em 1992, que derrubou 60.000 casas e causou danos de mais de 30 mil milhões de dólares, e as inundações na bacia do rio Yangtze, na China, em 1998, que também custou um valor estimado de 30 mil milhões de dólares, uma soma comparável à do valor da colheita chinesa de arroz. Parte do nível crescente dos danos deve-se ao maior desenvolvimento urbano e industrial em áreas costeiras e leitos de cheias dos rios. Mas a outra parte deve-se a tempestades mais frequentes e mais destrutivas.70 Actualmente, as regiões mais vulneráveis às grandes tempestades são são a Costa Atlântica e Golfo dos Estados Unidos e os países das Caraíbas. Na Ásia, é o leste e sudeste asiático, incluindo as Filipinas, Taiwan, Japão, China e Viet Nam, que provavelmente irão


Plano B 2.0 126 sentir o efeito das poderosas tempestades que cruzam o Pacífico. Mais a oeste, a Baía de Bengala, o Bangladesh e a costa leste da Índia são especialmente vulneráveis. A Europa ocidental, onde há uma tempestade de Inverno muito destruidora talvez uma vez em cada século, teve a sua primeira tempestade de Inverno que excedeu mil milhões de dólares em 1987 – a qual causou uma destruição avaliada em 3,7 mil milhões de dólares, 3,1 mil milhões de dólares dos quais estavam cobertos pelos seguros. Desde então, teve oito tempestades de Inverno com perdas seguradas entre 1,3 mil milhões de dólares e 5,9 mil milhões de dólares.71 Andrew Dlugolecki, responsável sénior do grupo de seguros CGMU, a maior companhia de seguros do Reino Unido, nota que os danos de eventos relacionados com a situação atmosférica têm aumentado cerca de 10 por cento ao ano. “Se este aumento se mantiver indefinidamente”, refere, “por volta de 2065 os danos por tempestades excederão o produto mundial bruto. Obviamente, o mundo entraria em bancarrota muito antes disso”. No mundo real poucas tendências de crescimento se mantêm numa percentagem fixa ao longo de décadas, mas o ponto principal de Dlugolecki é que a alteração climática pode ser destrutiva, perturbadora e muito cara.72

Subsidiando a Alteração Climática Num tempo de grande preocupação pública com a alteração climática criada pela queima de combustíveis fósseis, a indústria destes combustíveis está ainda a ser subsidiada pelos contribuintes em mais de 210 mil milhões de dólares por ano. Os subsídios aos combustíveis fósseis pertencem a outra era, um tempo em que o desenvolvimento das indústrias de petróleo e carvão era visto como a chave para o progresso económico – não como uma ameaça à civilização do século vinte e um. Uma vez instalados, os subsídios conduzem à formação de lobbies especializados que lutam com unhas e dentes contra o seu fim, mesmo daqueles que não se justificavam desde o início.73 Nos Estados Unidos, as companhias de petróleo e gás são agora, talvez, os mais poderosos lobistas em Washington. Entre 1990 e 2004, elas juntaram 181 milhões de dólares em contribuições para


Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 127 campanhas visando proteger subsídios fiscais especiais que montam a milhares de milhões. Em declarações à House Ways and Means Commitee em 1999, Donald Lubick, Sub-Secretário do Tesouro dos Estados Unidos para a Política de Impostos, disse, referindo-se às companhias de petróleo e gás: “Esta é uma indústria que, face à sua dimensão, tem provavelmente mais incentivos fiscais que qualquer outra indústria do país”. O facto de investimentos tão lucrativos serem possíveis mostra a corrupção do sistema político dos Estados Unidos, e em particular, a capacidade daqueles que têm dinheiro para moldarem a economia aos seus interesses.74 Os subsídios permeiam e distorcem todos os aspectos da economia global. NaAlemanha, por exemplo, o subsídio à indústria mineira do carvão foi inicialmente justificado, em parte, como uma medida de protecção dos empregos. Quando atingiu o pico, a subsidiação do governo à indústria atingiu quase 90.000 dólares por ano, por cada trabalhador. Em termos económicos puros, teria feito mais sentido fechar as minas e pagar aos mineiros para não trabalharem.75 Muitos subsídios estão em grande medida escondidos dos contribuintes. Isto é especialmente verdade no caso da indústria dos combustíveis fósseis, cujos subsídios, nos Estados Unidos, incluem coisas como o crédito à diminuição da extracção de petróleo. Mais dramático ainda são as despesas de rotina das forças armadas dos Estados Unidos para proteger o acesso ao petróleo do Médio Oriente, que foram calculadas pelos analistas da Rand Corporation, antes da mais recente guerra do Iraque, num valor entre 30 mil milhões de dólares e 60 mil milhões de dólares, enquanto que o petróleo importado da região tinha um valor de apenas 20 mil milhões de dólares.76 Um estudo de 2001 feito pela Redefining Progress mostra que os contribuintes dos Estados Unidos subsidiam a utilização dos automóveis num valor de 257 mil milhões de dólares por ano, cerca de 2.000 de dólares por contribuinte. Para além de subsidiar as emissões de carbono, isto quer também dizer que os contribuintes que não têm automóveis, nomeadamente os que são demasiado pobres para isso, estão a subsidiar aqueles que têm.77


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Plano B 2.0

Um dos aspectos positivos em relação a estes subsídios aos combustíveis fósseis é que eles constituem um reservatório potencial para subsídios fiscais que poderão vir a ser reorientados numa direcção ambientalmente benigna, para fontes de energia renovável, tais como a energia eólica, solar, e geotérmica. Redireccionar estes subsídios aos combustíveis fósseis para o desenvolvimento de fontes renováveis seria uma situação duplamente ganhadora, como é descrita no Capítulo 12. Subsidiar o uso de combustíveis fósseis é subsidiar ondas de calor que asfixiam as colheitas, derretem o gelo, fazem subir o nível do mar e geram tempestades cada vez mais destrutivas. Talvez tenha chegado o momento de os contribuintes de todo o mundo perguntarem a si mesmos se esta é a forma como querem que o dinheiro que ganham com esforço seja gasto.


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5 Sistemas Naturais Em Stress

Em 1838, Walter Lowdermilk, responsável do Serviço de Conservação do Solo do U.S. Department of Agriculture (USDA), saiu do país em busca de terras que tivessem sido cultivadas há milhares de anos, com o objectivo de perceber como tinham estas antigas civilizações lidado com o problema da erosão do solo. Verificou que algumas cuidaram bem das suas terras, mantendo a fertilidade por longos períodos da história, e eram ainda prósperas. Outras não o conseguiram fazer, deixando apenas restos dos seus passados ilustres.1 Numa secção do seu relatório entitulado “As Cem Cidades Mortas”, descreveu um local no norte da Síria, perto de Aleppo, onde antigas edificações se mantinham ainda de pé, destacando-se num relevo isolado, talvez devido ao facto de serem construídas na rocha. Durante o século sétimo, a próspera região foi invadida inicialmente por um exército persa e, mais tarde, por nómadas do Deserto Arábico. No processo, as práticas de conservação do solo e da água que tinham sido usadas ao longo de séculos foram abandonadas. Lowdermilk assinalou, “Aqui a erosão tinha feito o seu pior…, se os solos se tivessem mantido, mesmo tendo sido destruídas as cidades e dispersas as populações, a área poderia ter sido repovoada de novo e as cidades reconstruídas, mas agora que os solos desapareceram, tudo desapareceu”.2


Plano B 2.0 130 Avancemos agora até à actualidade, para uma deslocação feita em 2002 por uma equipa das Nações Unidas com o intuito de avaliar a situação alimentar no Lesoto, um pequeno país de 2 milhões de pessoas incrustado no seio da África do Sul. As conclusões foram claras: “A agricultura no Lesoto enfrenta a possibilidade de uma catástrofe no futuro; a produção das culturas está a cair e pode acabar pura e simplesmente em grandes áreas do país se não forem dados passos para inverter o processo de erosão e degradação dos solos e do declínio da sua fertilidade”. Michael Grunwald refere no Washington Post que quase metade das crianças do Lesoto com menos de cinco anos é subnutrida. “Muitas”, refere, “estão demasiado fracas para conseguirem caminhar para a escola”.3 Quer a terra esteja no norte da Síria, no Lesoto ou em qualquer outro lado, a saúde das pessoas que vivem dela não pode ser separada da saúde da própria terra. Uma grande fatia dos 852 milhões de pessoas com fome no mundo vive em terras com solos gastos devido à erosão.4 As impiedosas necessidades humanas estão a criar nas florestas, nas terras de pasto e nos bancos de peixe do mar um stress com o qual não conseguem lidar. Estamos também a destruir muitas das espécies de animais e plantas com as quais partilhamos o planeta. Em toda a parte, estão agora a desaparecer espécies a uma velocidade 1.000 vezes superior à velocidade com que se desenvolvem novas espécies: acelerámos o relógio da extinção.5 Diminuição das Florestas: os Custos No princípio de Dezembro de 2004, a Presidente filipina Gloria Macapagal Arroyo, de acordo com notícias publicadas “ordenou ao exército e à polícia que pusessem fim ao abate de árvores, depois de inundações repentinas e deslizamentos de terra, motivados pela desflorestação crescente, terem morto cerca de 340 pessoas”. Quinze anos antes, em 1989, o governo da Tailândia anunciou a proibição do corte de árvores a nível nacional, depois de ter havido grandes inundações e perda de muitas vidas devido a deslizamentos de terras. E em Agosto de 1998, no seguimento de várias semanas de inundações recorde na bacia do rio Yangtze com uns arrepiantes 30 mil milhões de dólares em prejuízos, o governo chinês proibiu todos os


Sistemas Naturais Em Stress 131 cortes de árvores na bacia onde vivem 400 milhões de pessoas. Cada um destes governos tinha aprendido, depois do mal ter acontecido, uma dura lição: nomeadamente, que os serviços fornecidos pela floresta, como o controlo de cheias, pode ser muito mais valioso para a sociedade do que a extracção da madeira.6 No início do século vinte, a área florestada da Terra era calculada em 5 mil milhões de hectares. De lá para cá, a área encolheu para 3,9 mil milhões de hectares – distribuindo-se as florestas que restam de forma bastante regular entre florestas tropicais e subtropicais, em países em vias de desenvolvimento, e florestas de climas temperados/boreais nos países industrializados.7 A diminuição da floresta a nível mundial concentra-se nos países em vias de desenvolvimento. Desde 1990, as perdas nestas nações rondaram uma média de 13 milhões de hectares por ano, uma área próxima da do Kansas. Ao todo, o mundo em vias de desenvolvimento está a perder 6 por cento das florestas por ano. O mundo industrializado está, por outro lado, a ganhar cerca de 3,6 milhões de hectares de terra florestada por ano, que resulta essencialmente de terras de cultura abandonadas que se voltam a cobrir por si sós de floresta, como acontece na Rússia, e também da disseminação da plantação comercial de floresta.8 Infelizmente, nem mesmo os dados oficiais da FAO (Food and Agriculture Organization), organização da ONU, reflectem a gravidade da situação. Por exemplo, as florestas tropicais que são arrasadas ou queimadas raramente voltam a recompor-se. Transformam-se simplesmente em terras abandonadas ou, na melhor das hipóteses, em mato – e, no entanto, continuam a ser incluídas nos números oficiais da floresta. Do mesmo modo, as plantações de árvores contam como área florestal. No entanto, também elas estão muito longe do que eram as florestas maduras que por vezes substituem. O World Resources Institute (WRI) refere que das florestas que permanecem em pé, “a grande maioria não são mais que exemplos pequenos ou muito danificados dos ecossistemas em perfeito funcionamento que antes eram”. Apenas 40 por cento da cobertura florestal mundial que resta pode ser classificada como floresta de fronteira, que o WRI descreve como “grandes sistemas intactos de floresta relativamente não afectados pelo homem e suficientemente vastos para


Plano B 2.0 132 manter toda a sua biodiversidade, incluindo populações viáveis da vasta gama de espécies associada a cada tipo”.9 As pressões sobre a floresta continuam a aumentar. O uso da lenha, do papel e da madeira para construção está em expansão. Dos 3,34 mil milhões de metros cúbicos de madeira cortada em todo o mundo em 2003, mais de metade foi usada para combustível. Nos países em desenvolvimento, a lenha representa quase três quartos do total. 10 A desflorestação para fornecimento de combustível é generalizada na África saheliana e no subcontinente indiano. À medida que a procura urbana de madeira para lenha ultrapassa a produção das florestas próximas, estas vão-se retirando lentamente da proximidade da cidade num círculo cada vez maior, num processo que é claramente visível em fotografias de satélite tiradas ao longo do tempo. Com o aumento destes círculos, os custos de transporte da lenha aumentam, fazendo disparar o desenvolvimento da indústria do carvão, uma forma de energia mais concentrada, com custos de transporte mais baixos. March Turnbull escreve no Africa Geographic Online: “Cada uma das grandes cidades sahelianas está cercada por uma estéril paisagem lunar. Dakar e Cartum procuram agora carvão a mais de 500 quilómetros, por vezes em países vizinhos”.11 O corte de árvores para construção é também um grande responsável pela desflorestação, e isso é mais evidente no SudesteAsiático e em África. Em quase todos os casos, o abate é levado a cabo por grandes empresas estrangeiras mais interessadas em cortes definitivos do que em gerir uma produção que se perpetue de forma sustentável. Uma vez desaparecida a floresta de um país, as empresas deslocam-se, deixando para trás apenas devastação. Tanto a Nigéria como as Filipinas perderam o que foram em tempos indústrias florescentes de exportação de madeira tropical, sendo actualmente importadores líquidos de produtos florestais.12 As perdas de floresta para a criação de explorações agrícolas ou de pastagens, normalmente através da queima, concentram-se na Amazónia brasileira, na bacia do Congo, e no Bornéu. Depois de ter perdido 97 por cento das suas florestas de chuva atlânticas, o Brasil está agora a destruir a floresta de chuva da Amazónia. Esta enorme


Sistemas Naturais Em Stress 133 floresta, com o tamanho aproximado da Europa, estava em grande parte intacta até 1970. Desde então, 20 por cento já se perdeu.13 O crescimento rápido da procura de óleo de palma gerou um crescimento anual de 8 por cento da área de plantação de palmeiras no Bornéu malaio (Sarawak e Sabah) entre 1998 e 2003. Em Kalimantan, a parte indonésia do Bornéu, o crescimento das plantações de palmeiras de óleo é maior: cerca de 11 por cento. Agora que o óleo de palma está a surgir como fonte principal de biodiesel, o crescimento do cultivo de palmeiras deverá ser ainda mais rápido.A procura quase ilimitada de biodiesel ameaça agora o que resta das florestas tropicais no Bornéu e onde quer que elas estejam.14 O Haiti, com 8 milhões de habitantes, foi um país em grande parte coberto por florestas. Actualmente há apenas florestas em 2 por cento do seu território, isto devido principalmente ao corte para lenha. Em Setembro de 2004, a tempestade tropical Jeanne deixou um rasto de 1.500 mortos e mais de 1.000 desaparecidos e presumidos mortos. Sem as árvores que antes tinha, o solo escoara-se com a água e o que restava era pouco para aguentar a intensa queda das chuvas. Em tempos um paraíso tropical, o Haiti é hoje um caso de estudo de um país em vias de cometer o suicídio ecológico e económico. Com a diminuição das florestas e a erosão dos solos, o Haiti foi apanhado numa espiral ecológica/económica descendente à qual não foi capaz de escapar. É um país mantido por sistemas internacionais de ajuda alimentar e assistência económica.15 O Haiti é um caso clássico de “sobreexploração e colapso”. Primeiro vão as árvores, depois o solo e, finalmente, a própria sociedade. Sem a assistência alimentar do exterior, a população do Haiti poderia estar agora a diminuir devido à fome. O Haiti é um microcosmo do que poderá vir a ser grande parte da Terra se a desflorestação continuar. Uma série de países estão a sofrer com cheias desastrosas em resultado da desflorestação. Em 2000, Moçambique ficou parcialmente inundado quando o Limpopo transbordou das margens, ceifando milhares de vidas e destruindo casas e colheitas numa escala sem precedentes. A bacia do rio Limpopo, que perdeu 99 por cento da sua cobertura arbórea original, irá provavelmente sofrer muitas mais cheias.16


Plano B 2.0 134 A floresta de chuvas biologicamente rica de Madagáscar está também a desaparecer rapidamente. À medida que as árvores são cortadas para produzir carvão ou para desbravar terreno destinado a culturas agrícolas para alimentar a crescente população da ilha, a sequência de eventos torna-se demasiado familiar. Os ambientalistas avisam que Madagáscar se pode transformar em breve uma paisagem de mato e areia.17 Ao mesmo tempo que a desflorestação acelera o fluxo de água que volta ao oceano, também pode reduzir a reciclagem da chuva nas terras do interior. Há cerca de 20 anos, dois cientistas brasileiros, Eneas Salati e Peter Vose, chamaram à atenção na revista Science para o facto de que quando a chuva vinda das nuvens que se deslocam doAtlântico caía na floresta de chuvas da Amazónia, um quarto escoava-se e três quartos evaporava-se na atmosfera sendo levada mais para o interior, aí gerando mais chuva. Quando a terra é desbravada para a agricultura ou para pastagens, no entanto, a quantidade que se escoa e regressa ao mar aumenta drasticamente enquanto que a que é reciclada nas terras do interior diminui perigosamente.18 O ecologista Philip Fearnside, que passou a sua carreira a estudar o Amazonas, observa que a parte central do sul do Brasil, muito importante do ponto de vista agrícola, depende da água que é reciclada para o interior através da floresta de chuvas da Amazónia. Se a Amazónia for convertida numa pastagem para gado, diz ele, haverá menos queda de chuva para suportar a agricultura.19 Uma situação similar pode estar a desenvolver-se em África, onde a desflorestação e o desbravamento de terras progridem rapidamente com o aumento do uso da madeira para lenha e a limpeza de grandes porções de floresta virgem feita pelas empresas de serração. No Malawi, um país de 13 milhões de pessoas no leste de África, a cobertura de floresta diminuiu em poucos anos de 47 por cento da área de terra do país para cerca de 28 por cento. O corte de árvores para produzir carvão e para fazer a cura do tabaco está a conduzir a uma sequência de eventos que se assemelham aos do Haiti.20 Com o desaparecimento das árvores, o escoamento da água da chuva aumenta e a terra fica privada de água para a evapotranspiração. O consultor e hidrogeólogo JimAnscombe refere: “devido à energia do sol, as árvores puxam a água do solo, através das raízes, tronco e


Sistemas Naturais Em Stress 135 folhas, até ao processo de transpiração. Colectivamente a floresta extrai milhões de litros de água diariamente para a atmosfera,” Dadas as condições climáticas locais, esta evapotranspiração traduz-se em queda de chuva estival, ajudando a manter as culturas. Quando as florestas desaparecem, esta queda de chuva diminui seguindo-se a queda da produção das colheitas.21 Cada vez mais países começam a reconhecer os riscos associados à desflorestação. Entre os que têm presentemente proibições totais ou parciais de corte de árvores em grandes florestas, estão a China, a Nova Zelândia, as Filipinas, o Sri Lanka,a Tailândia e o Viet Nam. Infelizmente, é frequente que uma proibição num país apenas faça deslocar a desflorestação para outros países ou leve ao corte ilegal. Por exemplo, a proibição na China em 1998, que se seguiu às cheias do Yangtze, esteve na origem dos aumentos drásticos dos cortes de madeira em Myanmar (antiga Birmânia) e na Rússia, a maior parte deles ilegal.22 Solo que se Perde A fina camada de solo de superfície que cobre a terra do planeta é o que está na base da civilização. Este solo, medido em polegadas em grande parte da Terra, formou-se ao longo de grandes períodos de tempo geológico à medida que a formação de solo novo excedia o ritmo natural de erosão. O acumular do solo ao longo dos tempos, providenciou um meio no qual as plantas podiam crescer. Por sua vez, as plantas protegem o solo da erosão. A actividade humana está a comprometer esta relação. Algures no século passado, a erosão começou a exceder a formação de solo novo em vastas áreas. Em talvez um terço ou mais de toda a terra de cultura o solo superficial está a perder-se a uma velocidade superior àquela em que se forma solo novo, reduzindo-se assim a produtividade inerente da terra.Actualmente, a base da civilização está a desfazer-se. As sementes do colapso de algumas civilizações antigas, tais como os Maias, podem ter surgido com a erosão do solo que pôs em causa o fornecimento de alimentos.23 A erosão do solo, em aceleração no último século, pode ser vista nas bolsas de poeira que se formam à medida que a vegetação é destruída e a erosão do vento avança sem controlo. Entre as que se


Plano B 2.0 136 destacam estão a Bolsa de Poeira nas Grandes Planícies dos Estados Unidos, durante a década de 1930, as bolsas de poeira nas Terras Virgens soviéticas na década de 1960, a enorme bolsa que se alastra-se actualmente no noroeste da China e a que vem tomando forma actualmente na região da África saheliana. Cada uma está associada a um padrão conhecido de excesso de uso para pastagens, de desflorestação e de expansão agrícola para terras marginais, seguidos da interrupção quando o solo começa a desaparecer.24 O crescimento da população do século vinte empurrou a agricultura para terrenos muito vulneráveis em muitos países. O lavrar excessivo da terra nas Grandes Planícies dos Estados Unidos durante o final do século dezanove e início do século vinte, por exemplo, conduziu à Bolsa de Poeira da década de 1930. Esta foi uma época trágica na história dos Estados Unidos, que forçou centenas de famílias ligadas à agricultura a abandonar as Grandes Planícies. Muitas migraram para a Califórnia à procura de uma vida nova, num movimento humano que foi imortalizado em As Vinhas da Ira, de John Steinbeck.25 Três décadas mais tarde, a história repetiu-se na União Soviética. O Projecto das Terras Virgens entre 1954 e 1960, consistiu no desbravar duma área de prados para produzir trigo que era maior que as terras de trigo do Canadá e Austrália em conjunto. Inicialmente este projecto traduziu-se numa impressionante expansão da produção soviética de trigo, mas o sucesso foi de pouca dura já que também lá se desenvolveu uma bolsa de poeira.26 O Kazaquistão, no centro deste Projecto das Terras Virgens, viu a sua área semeada de cereais atingir o máximo ao ultrapassar os 25 milhões de hectares por volta de 1980 e, depois, encolher para os 14 milhões de hectares de hoje. Mas na terra que resta, no entanto, a produção média de trigo é inferior a 1 tonelada por hectare, o que fica a uma grande distância das quase 8 toneladas por hectare que os agricultores conseguem produzir em França, o líder da produção de trigo da Europa ocidental.27 Uma situação similar existe na Mongólia, onde nos últimos 20 anos metade das terras de trigo foram abandonadas e o número de produções deste cereal também caiu para metade, reduzindo a colheita em três quartos. A Mongólia – um país quase três vezes maior


Sistemas Naturais Em Stress 137 que a França, com uma população de 2,6 milhões de habitantes – é agora obrigada a importar quase 60 por cento do seu trigo.28 As tempestades de poeira que têm origem nas novas bolsas de poeira são agora fielmente registadas nas imagens de satélite. Em 9 de Janeiro de 2005, a NASA (National Aeronautics and Space Administration) mostrou imagens duma grande tempestade de areia que se dirigia da África central para oeste. Esta enorme nuvem de poeira acastanhada estendia-se por 5.300 quilómetros. ANASA referiu que se a tempestade fosse reposicionada nos Estados Unidos, cobriria o país estendendo-se aos oceanos das duas costas.29 Andrew Goudie, Professor de Geografia na Universidade de Oxford, relata que as tempestades de poeira do Sahara – antigamente raras – são agora uma coisa comum. Ele estima que elas aumentaram dez vezes no último meio século. Entre os países da região mais afectados pela perda de solo de superfície causada pela erosão do vento estão o Níger, o Chade, a Mauritânia, o norte da Nigéria e o Burkina Faso. Na Mauritânia, no extremo ocidental africano, o número de tempestades de poeira saltou de 2 por ano no início da década de 1960 para 80 por ano actualmente.30 A Depressão Bodélé, no Chade, é a fonte de cerca de 1,3 mil milhões de toneladas de solo trazido pelo vento por ano, o que corresponde a 10 vezes mais do que em 1947, quando os registos começaram. Os 2 a 3 mil milhões de toneladas de partículas finas de solo que saem de África todos os anos nas tempestades de poeira estão a acabar lentamente com a fertilidade do continente e, consequentemente, com a sua produtividade biológica. Além disso, as tempestades de poeira que saem de África viajam para oeste através do Atlântico, sendo tanta a poeira depositada nas Caraíbas que a água fica turva e os bancos de corais são danificados.31 Na China, os excessos no cultivo da terra tornaram-se comuns em muitas províncias à medida que a agricultura se estendeu a norte e a oeste, para a zona de pastos, entre 1987 e 1996. No interior da Mongólia (Nei Monggol), por exemplo, a área cultivada aumentou 1,1 milhões de hectares, ou 22 por cento, durante este período. Outras províncias que expandiram a sua área cultivada em 3 por cento ou mais durante este período de tempo são Heilongjiang, Hunan, Tibet (Xizang), Quinghai e Xinjiang. Uma erosão severa do solo nesta nova


Plano B 2.0 138 terra lavrada tornou claro que o seu único uso sustentável é o pasto controlado. Em resultado, a agricultura chinesa está agora envolvida numa retirada estratégica destas províncias, voltando às terras que são capazes de manter uma produção agrícola sustentável.32 A erosão pela água também é significativa nos solos. Isto pode ser visto no assoreamento dos reservatórios e nos rios que correm assoreados e lamacentos para o mar. Os dois maiores reservatórios do Paquistão, o Mangla e o Tarbela, que retêm a água do rio Indo para a vasta rede de rega do país, estão a perder cerca de 1 por cento por ano da sua capacidade de armazenamento à medida que vão ficando assoreados devido à desflorestação dos solos das bacias de drenagem.33 A Etiópia, um país montanhoso com solos muito erosivos em terras com grandes declives, está a perder cerca de mil milhões de toneladas de solo de superfície por ano, arrastado pela chuva. Esta é uma das razões porque a Etiópia parece estar sempre no limiar da fome, não sendo nunca capaz de acumular reservas de cereais suficientes para garantir um nível mínimo de segurança alimentar.34 Pastos que se Deterioram Um décimo da superfície de terra do planeta é ocupado com culturas agrícolas, mas o dobro desta área é ocupada com terras de pasto – terra demasiado seca, com muitos declives, ou que não é suficientemente fértil para aguentar uma produção agrícola. Esta área – um quinto da superfície de terra do planeta, em grande parte semi-árida – suporta os 3,2 mil milhões de cabeças de gado bovino e caprino do mundo. Estes animais são ruminantes, com um sistema digestivo complexo que lhes permite digerir fibras, convertendo-as em carne de vaca, de carneiro e leite.35 Em todo o mundo, cerca de 180 milhões de pessoas vivem da pastorícia, criando gado bovino, ovelhas e cabras. Muitos países em África dependem fortemente das economias ligadas ao gado, tanto para a alimentação como para o emprego. O mesmo é verdadeiro para grandes populações no Médio Oriente, Ásia Central, Mongólia, noroeste da China e grande parte da Índia. A Índia, com a maior manada de gado do mundo, depende do gado bovino não só para o leite mas também para tracção animal e combustível.36


Sistemas Naturais Em Stress 139 Noutras partes do mundo, as terras de pasto são exploradas por fazendas ou ranchos comerciais de grande escala.AAustrália, onde a terra é dominada por prados, tem um rebanho de 95 milhões de ovelhas, cinco vezes a sua população. As economias baseadas em animais que se alimentam de pasto também predominam na Argentina, Brasil, México e Uruguai. E nas Grandes Planícies da América do Norte, as terras semi-áridas que não servem para semear trigo são usadas para criar gado bovino que se alimenta de erva.37 Embora a atenção pública se concentre muitas vezes no papel dos currais com ração na produção de carne de bovino, os animais que, a nível mundial, se alimentam nestes currais é uma pequena parte, comparada com os grandes números que se alimentam de erva. Mesmo nos Estados Unidos, que tem a maior parte destes currais com ração existentes no mundo, um novilho permanece normalmente aí durante apenas alguns meses. A carne de bovino e carneiro tende a dominar o consumo onde os pastos são abundantes em relação à dimensão populacional. Entre os principais consumidores de carne de vaca está a população da Argentina, Brasil, Estados Unidos e Austrália. A carne de carneiro assume grande importância na dieta da Nova Zelândia e do Kazaquistão.38 Os mesmos ruminantes que são particularmente eficazes a converter fibra em alimento fornecem também couro e lã. Os bens fabricados em couro e as indústrias de lanifícios, sustento de milhões de pessoas, dependem das terras de pasto para as suas matérias-primas. Em todo o mundo, quase metade dos prados estão leve ou moderadamente degradados e 5 por cento estão severamente degradados. O problema é claramente visível em toda a África, no Médio Oriente, na Ásia Central e na Índia, onde o número de cabeças de gado acompanha o crescimento da população humana. Em 1950, 238 milhões de africanos dependiam de 273 milhões de cabeças de gado. Em 2004, havia 887 milhões de pessoas e 725 milhões de cabeças de gado. Apressão sobre a indústria pecuária, um problema da economia africana praticamente em todo o continente, excede muitas vezes em metade ou mais a capacidade de produção das terras de pasto.39


Plano B 2.0 140 O Irão, um dos países mais populosos do Médio Oriente - com 70 milhões de habitantes – ilustra as pressões com que esta região se defronta. Com mais de 90 milhões de cabeças de gado bovino e 80 milhões de gado caprino – a fonte de lã para a sua afamada indústria de tapetes – as terras de pasto do Irão estão a deteriorar-se devido ao excesso de criação. Num país onde há mais ovelhas e cabras do que pessoas, o consumo de carne de carneiro é generalizado. No entanto, com os prados a serem explorados para além dos limites o actual stock de cabeças de gado deixa de ser sustentável.40 A China enfrenta desafios igualmente difíceis. Depois das reformas económicas de 1978 que transferiram a responsabilidade da agricultura das equipas de produção organizadas pelo Estado para equipas familiares, o governo perdeu o controlo do número de cabeças de gado. Em resultado, a população chinesa de gado bovino e caprino subiu em espiral. Enquanto os Estados Unidos, um país com uma capacidade de pastos comparável, tem 95 milhões de cabeças de gado bovino, a China tem 107 milhões. E enquanto os Estados Unidos têm 7 milhões de ovelhas e cabras, a China tem 339 milhões. Concentradas nas províncias a oeste e a norte da China, as ovelhas e cabras estão a destruir a vegetação de protecção das terras. O vento, depois, faz o resto, removendo o solo e convertendo a produtiva terra de pasto num deserto.41 As necessidades de forragens para o gado em quase todos os países em vias de desenvolvimento excedem já a produção sustentável dos prados e outras fontes de forragem. Na Índia, a procura de forragens excede em muito a oferta, o que deixa milhões de cabeças de gado bovino num estado de subnutrição e fraqueza improdutiva.42 A degradação da terra devido à produção excessiva de gado está a ter um papel cada vez mais importante na diminuição da produtividade das explorações de gado. Nas fases iniciais, os custos da exploração excessiva aparecem na forma de uma menor produtividade da terra. Mas com a continuação do processo, a vegetação é destruída conduzindo à erosão e à eventual criação de terras abandonadas e de deserto. A certa altura, o crescimento da população de gado começa a fazer decrescer a área biologicamente produtiva e, consequentemente, a capacidade da Terra para manter a civilização.43


Sistemas Naturais Em Stress 141 Desertos que Avançam A desertificação, processo que converte terras produtivas em terrenos abandonados através da utilização excessiva e da má gestão, é infelizmente muito comum. Tudo o que retira a erva ou as árvores protectoras deixa o solo vulnerável à erosão causada pelo vento e pela água. Nas fases iniciais da desertificação, as finas partículas de solo são removidas pelo vento, criando-se as tempestades de poeira descritas anteriormente. Uma vez removidas as partículas finas, as partículas menos finas – a areia – são também levadas pelo vento em tempestades de areia localizadas. A desertificação em larga escala está concentrada na Ásia e em África – duas regiões que em conjunto contêm quase 4,8 mil milhões dos 6,5 mil milhões de pessoas que existem no mundo. As populações dos países do norte de África estão a ser esmagadas pelo avanço para norte do Sahara.44 Na vasta área de terra da semi-árida África situada entre o deserto do Sahara e as regiões florestadas do sul fica o Sahel, uma região onde a agricultura e a pastorícia se sobrepõem. Em países que vão do Senegal e Mauritânia, a oeste, até ao Sudão, Etiópia e Somália no leste, as necessidades geradas pelo número crescente de pessoas e de cabeças de gado estão cada vez mais a converter a terra em deserto.45 A Nigéria, o país africano mais populoso, está a perder 351.000 hectares por ano de terras de pasto e de culturas que se desertificam. Enquanto que a população humana da Nigéria crescia de 33 milhões em 1950 para 132 milhões em 2005, uma expansão que multiplica a população por quatro, o número de cabeças de gado aumentava de cerca de 6 milhões para 66 milhões, ou seja, 11 vezes mais. Com as necessidades de forragem para 15 milhões de cabeças de gado bovino e 51 milhões de gado caprino a excederem a produção sustentável das pastagens da Nigéria, a parte norte do país está a transformar-se lentamente num deserto. Se a Nigéria continuar a crescer até 258 milhões de pessoas em 2050, a deterioração apenas se irá acelerar.46 O Irão também está a perder a batalha contra o deserto. Mohammad Jarian, que chefia a OrganizaçãoAnti-Desertificação do Irão, relatou em 2002 que as tempestades de areia tinham enterrado


Plano B 2.0 142 124 aldeias na província a sudeste do Sistão-Baluchistão, forçando ao seu abandono. As areias em movimento cobriram pastagens, levando a fome ao gado e privando os aldeões dos seus meios de subsistência.47 O vizinhoAfeganistão enfrenta uma situação similar. O Deserto do Registão está a migrar para oeste, cobrindo gradualmente cada vez mais áreas agrícolas. Uma equipa do Programa Ambiental da ONU (UNEP) relata que “chegaram a ficar submergidas 100 aldeias pela poeira e areia sopradas pelo vento”. No noroeste do país, as dunas de areia estão a mover-se para a terra agrícola nos níveis mais altos da bacia do Amu Darya, sendo o seu caminho facilitado pela perda da vegetação estabilizadora devido aos cortes para lenha e à exploração pastorícia excessiva.Aequipa do UNEP pôde verificar a existência de dunas de areia com 15 metros de altura que bloqueavam estradas, forçando os residentes a estabelecer novos caminhos.48 A China está a ser afectada pela desertificação mais do que qualquer outro grande país. Wang Tao, Director do Instituto de InvestigaçãoAmbiental e Engenharia das Regiões Frias e Áridas, descreve a desertificação que se intensifica. Ele relata que desde 1950 até 1975 se perderam para o deserto cerca de 1.560 quilómetros quadrados de terra todos os anos. Entre 1975 e 1987, o número subiu para 2.100 quilómetros quadrados por ano. Daí até ao final do século, saltou para 3.600 quilómetros quadrados de terra que se somam ao deserto anualmente.49 A China está agora em guerra. Não são exércitos invasores que reclamam o seu território, antes os desertos em expansão. Os velhos desertos estão a avançar e desertos novos estão a formar-se como forças de guerrilha que atacam de surpresa, forçando Pequim a lutar em várias frentes. Wang Tao refere que ao longo do último meio século, cerca de 24.000 aldeias do norte e oeste da China foram total ou parcialmente abandonadas por terem sido engolidas pelas areias em movimento.50 As pessoas na China estão muito familiarizadas com as tempestades de poeira com origem na área noroeste e oeste da Mongólia, mas o resto do mundo normalmente só sabe desta catástrofe ecológica em rápido crescimento quando se depara com as maciças tempestades de poeira que viajam para fora da região. Em 18 deAbril de


Sistemas Naturais Em Stress 143 2001, a parte oeste dos Estados Unidos – da fronteira do Arizona para norte até ao Canadá – ficou coberta de poeira. Esta poeira veio de uma enorme tempestade de poeira com origem no noroeste da China e Mongólia em 5 deAbril. Medindo 1.800 quilómetros depois de sair da China, a tempestade transportou milhões de toneladas de solo de superfície, um recurso vital que levará séculos a restabelecerse através dos processos naturais.51 Quase exactamente um ano depois, em 12 de Abril de 2002, a Coreia do Sul foi engolida por uma enorme tempestade de poeira vinda da China que deixou as pessoas em Seoul literalmente sem respiração. As escolas fecharam, os voos foram cancelados e as clínicas encheram-se de pessoas com dificuldades respiratórias.As vendas a retalho caíram. Os coreanos começaram a temer a chegada daquilo a que agora chamam a “quinta estação”, as tempestades de poeira do fim do Inverno e início da Primavera.52 Estas duas tempestades de poeira, entre as 10 maiores tempestades de poeira que ocorrem todos os anos na China, são os indicadores visíveis da catástrofe ecológica que se desenvolve no norte e oeste da China. A utilização excessiva das terras para pastagem é a culpada.53 Um relatório da Embaixada dos Estados Unidos intitulado “Fusões e Aquisições dos Desertos” descreve imagens de satélite que mostram dois desertos em expansão do centro norte da China a fundirem-se num só deserto maior que se estende para além das províncias da Mongólia Interior e do Gansu. A oeste, na província de Xinjiang, dois desertos ainda maiores – o Taklimakan e o Kumtag – estão também a encaminhar-se para uma fusão.As auto-estradas que atravessam as regiões que encolhem entre os dois desertos são regularmente inundadas por dunas de areia.54 NaAmérica Latina, os desertos expandem-se tanto no Brasil como no México. No Brasil, onde cerca de 58 milhões de hectares de terra são afectados, as perdas económicas devidas à desertificação estimam-se em 300 milhões de dólares por ano, a maior parte concentrada no nordeste. O México, com uma parcela muito maior de terra árida e semi-árida, está ainda mais vulnerável. A degradação de terras de cultura leva já cerca de 700.000 mexicanos a abandonar as terras todos os anos e a procurar trabalho nas cidades próximas ou nos Estados Unidos.55


Plano B 2.0 144 Num número crescente de países, o excesso de uso da terra para alimentação do gado, de cultivo da terra e de abate de árvores que estão a conduzir ao processo de desertificação está a intensificar-se à medida que o crescimento do número de pessoas e de cabeças de gado continua. Fazer com que o processo de desertificação deixe de reclamar mais terra produtiva pode vir a depender apenas da paragem do crescimento da população humana e do gado. Bancos de Pesca em Colapso Depois da Segunda Guerra Mundial, a aceleração do crescimento da população e o aumento permanente do rendimento disponível fez subir a procura de alimentos do mar a um ritmo nunca visto.Ao mesmo tempo, os avanços nas tecnologias ligadas à pesca, nomeadamente as enormes embarcações com capacidade de refrigeração em alto mar que permitem a exploração de oceanos distantes, possibilitaram que os pescadores respondessem à crescente procura mundial. Em resposta, a pesca oceânica de peixe subiu de 19 milhões de toneladas em 1950 para o seu pico histórico de 93 milhões de toneladas em 1997. Esta multiplicação por cinco – mais do dobro do crescimento da população no mesmo período – aumentou o consumo de pescado selvagem per capita em todo o mundo de 7 quilos, em 1950, para um máximo de 17 quilos, em 1988. De lá para cá caiu para 14 quilos.56 À medida que a população cresce e os sistemas modernos de comercialização dos alimentos permitem o acesso de um maior número de pessoas a estes produtos, o consumo de produtos do mar cresce. De facto, o apetite humano pelos alimentos do mar está a crescer para além da produção sustentável dos bancos oceânicos de peixe. Hoje, 75 por cento dos bancos de peixe estão a ser explorados ou na exacta medida ou para além da sua capacidade sustentável. Em resultado disso, muitos estão em declínio e alguns já entraram em colapso. Nalguns bancos, os stocks de progenitores foram em grande parte destruídos.57 Um estudo de referência feito por uma equipa científica Germano-Canadiana, publicado na revista Nature, concluiu que 90 por cento dos grandes peixes dos oceanos desapareceu nos últimos 50 anos. Ransom Myers, biólogo de pesca marítima na Dalhousie University do Canadá e principal autor deste estu-


Sistemas Naturais Em Stress 145 do, diz: “Do espadarte gigante ao grande atum azul, das garoupas tropicais ao bacalhau da Antártida, a pesca industrial limpou o oceano global.Afronteira azul já não existe”.58 Myers continua, “desde 1950, com o aparecimento da pesca industrial, nós reduzimos rapidamente a base deste recurso para menos de 10 por cento – não somente em algumas áreas, não somente nalguns stocks, mas em comunidades inteiras destas espécies de grandes peixes, dos trópicos aos pólos”.59 Os bancos de pesca estão em colapso em todo o mundo. O banco de pesca do bacalhau do Canadá, com 500 anos, entrou em falha no início da década de 1990, acabando com o trabalho de cerca de 40.000 pescadores e preparadores de peixe. Os bancos da costa da Nova Inglaterra não ficaram muito atrás. E na Europa, os bancos de bacalhau estão em declínio, aproximando-se de uma queda a pique. Tal como aconteceu no banco de bacalhau canadiano, a deterioração dos bancos europeus pode já ter atingido um ponto sem retorno. Os países que não conseguem cumprir os prazos impostos pela natureza para acabar com a pesca excessiva ficam confrontados com o declínio e o colapso dos bancos de pesca.60 Os stocks atlânticos do atum azul, pescado intensivamente, em que um espécimen de grandes dimensões destinado aos restaurantes de sushi em Tóquio podia valer 50.000 dólares, tiveram a impressionante queda de 94 por cento. Levará muitos anos até que estas espécies de vida longa se venham a recompor, mesmo que a sua pesca pare completamente. A pesca do esturjão no Mar Cáspio, fonte do mais apreciado caviar do mundo, caiu de um máximo de 27.700 toneladas, em 1977, para 461 toneladas, em 2000. A pesca excessiva, grande parte dela ilegal, é a responsável pela queda drástica.61 A pesca excessiva não é a única ameaça ao fornecimento mundial de alimentos do mar. Cerca de 90 por cento do peixe do oceano depende das terras húmidas das costas, dos pântanos de mangue ou dos rios, como áreas que servem de viveiros. Bem mais de metade da área original das florestas de mangue em países tropicais e subtropicais perdeu-se. O desaparecimento das terras húmidas costeiras nos países industrializados é ainda maior. Em Itália, cujas terras húmidas da costa são viveiros para muitos bancos mediterrânicos de peixe, a perda é de uns avantajados 95%.62


Plano B 2.0 146 O dano nos bancos de corais, bases de alimento para peixes de águas tropicais e subtropicais, também é significativo. Entre 2000 e 2004, a percentagem de bancos destruídos em todo o mundo expandiu-se de 11 por cento para 20 por cento. À medida que os bancos de corais se deterioram, o mesmo acontece com os stocks de peixe deles dependentes.63 Independentemente dos bancos oceânicos de peixe serem ameaçados de várias formas, é o excesso de pesca que directamente ameaça a sua sobrevivência.As capturas oceânicas aumentaram com a evolução das novas tecnologias, que vão desde o sonar, para a detecção de cardumes, até às enormes redes que, em conjunto, têm um comprimento suficiente para dar muitas vezes a volta à Terra. Actualmente, a pesca comercial é, em grande medida, uma economia que confronta o que hoje existe com o que existirá amanhã. Os governos procuram proteger as capturas de amanhã, forçando os pescadores a manterem os seus navios inactivos; as comunidades piscatórias estão dilaceradas entre a necessidade de terem receitas hoje, e de garantirem o futuro. Ironicamente, uma razão para o excesso de capacidade da frota está nos empréstimos subsidiados a fundo perdido concedidos pelos governos para investimento em novos barcos e equipamentos de pesca.64 Os subsídios à pesca basearam-se numa crença infundada de que as tendências passadas nas capturas oceânicas podiam ser projectadas para o futuro – que o crescimento passado significava crescimento futuro. O conselho dos biólogos marinhos, que há muito avisava que um dia as capturas marítimas atingiriam o limite, foi em grande medida ignorado.65 Mesmo em países habituados a trabalharem em conjunto, tais como os da União Europeia (UE), a tarefa de negociar limites de pesca a níveis sustentáveis pode ser difícil. EmAbril de 1997, depois de negociações prolongadas, chegou-se a acordo em Bruxelas no sentido de reduzir a capacidade de pesca das frotas da UE em 30 por cento nas espécies ameaçadas tais como o bacalhau, o arenque e o linguado no Mar do Norte, e 20 por cento nos stocks com excesso de pesca, tais como o bacalhau do Mar Báltico, o atum azul e o espadarte da Península Ibérica. O lado positivo foi que a UE chegou finalmente a acordo sobre a redução das capturas. O lado negativo é


Sistemas Naturais Em Stress 147 que estes cortes não foram suficientes para suster o declínio dos bancos de pesca da região.66 Em Janeiro de 2004, a UE foi mais além, anunciando a proibição completa da pesca do bacalhau, do haddock e da pescada durante o período de 12 semanas de fertilização na primavera. Com uma captura anual de bacalhau que caiu de 300.000 toneladas nos meados de 1980 para 50.000 toneladas em 2000, este passo foi um esforço desesperado para salvar o stock de pesca. Responsáveis da UE têm uma consciência clara de que o banco de bacalhau da vasta Terra Nova do Canadá não recuperou desde o colapso em 1992, apesar da proibição total de pesca imposta então. Em Dezembro de 2002, a União Europeia adoptou um plano ainda mais apertado para a gestão dos bancos de peixe.67 Quando há bancos de peixe que entram em colapso, isso coloca mais pressão naqueles que permanecem.As faltas de peixe a nível local transformam-se em faltas globais. Com as restrições das capturas nas águas exploradas em excesso da UE, a sua frota de pesca fortemente subsidiada voltou-se para a costa oeste de África, comprando licenças para pescar nas costas do Senegal, Mauritânia, Marrocos, Guiné-Bissau e Cabo Verde. Competem lá com frotas do Japão, Coreia do Sul, Taiwan, Rússia e China. Para países empobrecidos como a Mauritânia e a Guiné-Bissau, a receita proveniente das licenças de pesca podem valer até metade das receitas governamentais.68 Infelizmente para os africanos, também os seus bancos de peixe estão a entrar em colapso. No Senegal, onde antes os pescadores locais conseguiam encher de peixe os seus pequenos barcos, agora, em muitos dias, nem conseguem sequer peixe suficiente para cobrir os custos do combustível. Como uma vez disse um ancião senegalês, “A pobreza veio para o Senegal com estes acordos de pesca”.69 Como os oceanos não conseguem suportar uma captura de mais de 95 milhões de toneladas, se a população continuar a crescer como previsto, a pesca oceânica per capita tenderá a cair num futuro próximo.Ageração que atingiu a idade adulta durante a Segunda Guerra Mundial viu as capturas de peixe per capita duplicarem durante as suas vidas. Os seus netos, as crianças de hoje, experimentarão um declínio constante no consumo de produtos do mar.70


Plano B 2.0 148 A questão essencial é que o aumento mundial da procura de alimentos do mar já não pode ser satisfeita expandindo as capturas oceânicas. Se puder ser satisfeita, será através do aumento das culturas de peixe. Mas quando os peixes são postos em lagos ou gaiolas têm que ser alimentados, o que intensifica a pressão sobre os recursos em terra.

Plantas e Animais que Desaparecem O registo arqueológico mostra que houve cinco grandes extinções desde que a vida começou, cada uma representando um retrocesso evolutivo, um completo empobrecimento da vida na Terra.Aúltima destas extinções em massa ocorreu há cerca de 65 milhões de anos, possivelmente devido a uma colisão de um asteróide com o nosso planeta, que espalhou grandes quantidades de poeira e detritos na atmosfera. O consequente arrefecimento abrupto extinguiu os dinossáurios e pelo menos um quinto de todas as outras antigas formas de vida.71 Estamos agora na fase inicial da sexta grande extinção. Ao contrário das extinções anteriores, que foram causadas por fenómenos naturais, esta tem uma origem humana. Pela primeira vez na longa história da Terra, uma espécie evoluiu, se é que essa é a palavra adequada, ao ponto de poder pôr fim a grande parte da vida. À medida que as várias formas de vida desaparecem, os serviços fornecidos pela natureza, tais como a polinização, a dispersão de sementes, o controlo dos insectos e a reciclagem dos nutrientes, diminuem. Esta perda de espécies está a enfraquecer a teia da vida e, se continuar, pode fazer grandes buracos no seu tecido, conduzindo a mudanças irreversíveis no ecossistema da Terra. Os habitats de espécies de todos os géneros estão ameaçados de destruição, principalmente devido à perda das florestas tropicais. À medida que queimamos a floresta húmida da Amazónia, estamos de facto a queimar um dos maiores repositórios de informação genética. Os nossos descendentes poderão um dia assistir à queima total desta biblioteca genética tal como nós assistimos à queima da biblioteca de Alexandria em 48 a.C. A alteração do habitat devido ao aumento da temperatura, à po-


Sistemas Naturais Em Stress 149 luição química ou à introdução de espécies exóticas pode também dizimar espécies tanto vegetais como animais. Com o crescimento da população humana, o número de espécies com as quais partilhamos o planeta encolhe. Não podemos separar o nosso destino do destino de toda a vida na Terra. Se a rica diversidade da vida que herdámos continuar a ser empobrecida, também nós acabaremos por ficar empobrecidos.72 A percentagem mundial de aves, mamíferos e peixes que estão vulneráveis ou em risco imediato de extinção é agora medida em números de dois dígitos: 12 por cento das quase 10.000 espécies de pássaros; 23 por cento das 4.776 espécies de mamíferos; e 46 por cento das espécies de peixe analisadas.73 Entre os mamíferos, as 240 espécies conhecidas de primatas, para além do homem, estão em considerável risco. A World Conservation Union-IUCN relata que quase metade destas espécies está ameaçada de extinção. Cerca de 95 por cento das espécies de primatas vivem no Brasil, onde a destruição do habitat é uma ameaça importante. A caça, também, é uma ameaça, particularmente na África Ocidental e Central, onde a deterioração da situação alimentar e a construção de novas estradas de acesso aos locais de corte de árvores se combinam para criar um mercado activo de “carne do mato”.74 Os bonobos da África ocidental, grandes símios que são mais pequenos que os chimpanzés da África oriental, podem ser os nossos parentes vivos mais próximos, tanto a nível genético como do comportamento social. Mas este facto não impede de serem objecto de comércio da “carne do mato” ou vítimas da destruição do seu habitat pelos cortadores de árvores. Concentrados na densa floresta da República Democrática do Congo, o seu número caiu de cerca de 100.000 em 1980 para apenas 3.000 nos dias de hoje. No tempo de uma geração humana, 97 por cento dos bonobos desapareceram.75 As aves, devido à sua grande visibilidade, são um indicador útil da diversidade da vida. Das 9.775 espécies conhecidas de aves, cerca de 70 por cento estão a decrescer em número. Destas, cerca de 1.212 estão em perigo iminente de extinção. A perda e degradação do habitat afectam 86 por cento do total de espécies de aves ameaçadas. Por exemplo, 61 espécies extinguiram-se localmente com


Plano B 2.0 150 a perda de grandes áreas da floresta tropical nas terras baixas de Singapura.Algumas espécies antes abundantes podem já ter diminuído o número de unidades até um ponto sem retorno. A grande abertada, em tempos espalhada pelo Paquistão e países vizinhos, está a ser caçada até à extinção. Dez das 17 espécies de pinguins existentes no mundo estão ameaçadas ou em perigo, vítimas do aquecimento global. O biólogo da Universidade de Stanford, Çagan Sekercioglu, que dirigiu um estudo sobre a situação mundial das aves disse “Estamos a mudar tanto o mundo que nem as aves se conseguem adaptar”.76 Um evento recente particularmente perturbador é o declínio abrupto da população de aves canoras da Grã-Bretanha. Nos últimos 30 anos as populações de espécies bem conhecidas como a felosa musical, o tordo cantor e o taralhão cinzento caíram 50-80 por cento; ninguém parece saber porquê, embora se especule que a destruição do habitat e os pesticidas estejam a desempenhar o seu papel. Sem se saber a origem do declínio, é difícil tomar medidas que parem o decréscimo no número de exemplares.77 A ameaça aos peixes pode ser a maior de todas. As causas principais são a pesca em excesso, a poluição da água e o excesso de extracção da água dos rios e de outros ecossistemas de água doce. Cerca de 37 por cento das espécies de peixe que outrora habitavam os lagos e ribeiras da América do Norte estão extintos ou em perigo de extinção. As espécies de peixe de água doce da América do Norte desapareceram durante a última década. Nas regiões semi-áridas do México, 68 por cento das espécies de peixe nativas e endémicas desapareceram. A situação pode ser ainda pior na Europa, onde 80 espécies de peixe de água doce, de um total de 193, estão ameaçadas, em perigo ou são objecto de preocupação especial. Dois terços das 94 espécies de peixe na África do Sul precisam de protecção especial para evitarem a extinção.78 A tartaruga carapaça de couro, uma das espécies animais mais antigas, que pode atingir o peso de 360 quilos, está também a desaparecer rapidamente. Os seus números caíram de 115.000 em 1982 para 34.500 em 1996. Na colónia de ninhos da Playa Grande, na costa oeste da Costa Rica, o número de fêmeas que fazem ninhos caiu de 1.367 em 1989 para 117 em 1999. Escrevendo na revista Nature, James Spotila e colegas avisam que “se queremos salvar


Sistemas Naturais Em Stress 151 estas tartarugas, é necessário agir imediatamente para minimizar a mortalidade devida à pesca e maximizar a produção de filhotes”.79 Um relatório do World Resources Institute sobre bancos de corais nas Caraíbas refere que 35 por cento dos bancos das Caraíbas estão ameaçados por descargas de esgotos, sedimentos depositados na água e poluição por fertilizantes, e que 15 por cento estão ameaçados pela poluição das descargas de navios cruzeiro. Em ternos económicos, os bancos de corais das Caraíbas fornecem bens e serviços no valor anual mínimo de 3,1 mil milhões de dólares.80 O espectacular recife de coral do Mar Vermelho, uma das mais belas barreiras coralíferas em todo o mundo, está ameaçado de extinção devido à práticas de pesca destrutivas, apanha de coral, sedimentação e descargas de esgotos. Tudo o que reduza a penetração da luz do sol no mar prejudica o crescimento dos corais, levando-os à morte. Os bancos de corais têm uma função importante como viveiros de muitas formas de vida marítima, incluindo numerosas espécies comerciais de peixe.81 Uma das ameaças à diversidade da vida vegetal e animal em mais rápido crescimento hoje é a expansão extraordinária da agricultura no Brasil, onde a terra é desbravada para plantar soja e, mais recentemente, cana-de-açúcar para produzir etanol.Agricultores e criadores de gado estão a abrir vastas áreas na bacia do Amazonas e no cerrado, uma região de savana com a dimensão da Europa, a sul da bacia do Amazonas. Embora estejam instalados mecanismos destinados a proteger a rica diversidade biológica daAmazónia, tal como a obrigação de os proprietários não desbravarem mais dum quinto da sua terra, falta ao governo capacidade para fazer cumprir a lei.82 Tal como aAmazónia, o cerrado é também biologicamente rico, com milhares de espécies endémicas de plantas e animais. Contém muitos mamíferos de grande porte, como o lobo-guará, o tatu gigante, o tamanduá-bandeira, o veado e vários grandes felinos – jaguar, puma, jaguatirica, jaguarundi. O cerrado contém 837 espécies de aves, como a ema, prima da avestruz, que atinge 1,80 metros de altura. Mais de 1. 000 espécies de borboletas foram identificadas. A Conservation International relata que o cerrado tem também cerca de 10.000 espécies de plantas — pelo menos 4. 400 das quais são endémicas, não se encontrando em nenhuma outra parte.83


Plano B 2.0 152 Uma das mais recentes ameaças mundiais às espécies, muitas vezes subestimada, é a introdução de espécies alienígenas que podem alterar os habitats e as comunidades locais, levando as espécies autóctones à extinção. As espécies não autóctones podem assim ser responsáveis por 30 por cento das espécies ameaçadas de aves constantes na Lista Vermelha da IUCN. No caso das plantas, as espécies alienígenas estão implicadas em 15 por cento de todas as listagens.84 Os esforços para salvar a vida selvagem têm-se centrado tradicionalmente na criação de parques ou reservas de vida selvagem. Infelizmente, esta aproximação pode ser agora menos eficaz, já que se não conseguirmos estabilizar o clima, não haverá um ecossistema na Terra que possamos salvar. Tudo mudará. À medida que o número de espécies com que partilhamos o planeta diminui, o mesmo acontece com as perspectivas para a nossa civilização. No mundo novo em que estamos a entrar, proteger a diversidade da vida na Terra já não é uma questão de simplesmente escolher algumas porções de terreno, colocar-lhes uma cerca e dar-lhes o nome de parques e reservas. O sucesso deste esforço depende sobretudo da estabilização do clima e da população. Olhando pelo lado positivo, temos agora mais informação que nunca sobre o estado da Terra e da vida ao cimo dela. Embora o conhecimento não seja um substituto da acção, é um pré-requisito para a salvação dos sistemas naturais da Terra – e da civilização que eles suportam.


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6 Sinais Precoces do Declínio Nos últimos anos, os demógrafos da ONU espantaram o mundo ao anunciarem que a esperança de vida dos 750 milhões de habitantes da África subsariana caiu de 61 para 48 anos. Esta queda vertiginosa deveu-se fundamentalmente ao falhanço dos governos no controlo do vírus HIV. Enquanto os países industrializados mantiveram as percentagens de infecção pelo HIV em adultos abaixo de 1 por cento, em alguns países africanos elas subiram até mais de 30 por cento.1 Pela primeira vez na era moderna, a esperança de vida, um importante indicador de desenvolvimento, caiu num grande segmento da humanidade. Para as pessoas da África subsariana, um falhanço das lideranças está a inverter literalmente a marcha do progresso. Será que este falhanço do sistema político é uma anormalidade? Ou será que é um sinal precoce de que a escala dos problemas que estão a surgir pode derrotar as nossas instituições políticas? Durante as décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, a esperança de vida subiu em todo o mundo devido aos avanços na saúde pública, às vacinas, aos antibióticos e à produção alimentar. Mas ao terminar o século vinte, a epidemia do HIV ditou o fim desta tendência em muitos países.2 Hoje a variação da esperança de vida entre países é maior do que alguma vez na história, indo de tão baixo como os 33 anos na


Plano B 2.0 154 Suazilândia e 37 no Botswana até tão alto como os 82 anos no Japão e 81 na Islândia. Não é surpresa que a esperança de vida esteja normalmente relacionada com os níveis de vida nos países, excepto quando a distribuição de riqueza é muito desigual. Nos Estados Unidos, onde os rendimentos se concentram nos ricos e onde cerca de 24 milhões de americanos não têm segurança social, a esperança de vida é menor que em países como a Suécia, a Alemanha ou o Japão. De facto, a esperança de vida nos Estados Unidos, de 77 anos, situase agora atrás dos 78 anos da Costa Rica, um país em vias de desenvolvimento.3 As tensões na nossa civilização do início do século vinte e um tomam muitas formas. Economicamente, vemo-las no fosso cada vez maior entre os ricos e os pobres deste mundo. Socialmente, elas tomam forma no fosso cada vez maior existente entre a educação e cuidados de saúde de um lado e um fluxo crescente de refugiados ambientais resultantes da transformação da terra produtiva em deserto e da seca dos poços de água, do outro. Politicamente, vemo-las manifestar-se na forma de conflito a propósito de recursos básicos tais como terras de cultura, terrenos de pasto e água. E talvez mais fundamentalmente, vemos as tensões com que o mundo se debate no número crescente de Estados falhados ou que para lá caminham. O Nosso Mundo Dividido Socialmente O fosso social e económico entre os mil milhões de pessoas mais ricas do mundo e os mil milhões de pessoas mais pobres não tem precedente na história. Este fosso não só é grande como está a aumentar. Os mil milhões mais pobres estão encurralados num nível de subsistência e os mil milhões mais ricos tornam-se cada ano mais ricos. O fosso económico pode ser visto nos contrastes a nível da nutrição, da educação, dos padrões de doenças, da dimensão das famílias e da esperança de vida. Os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que cerca de 1,2 mil milhões de pessoas são subnutridas, têm peso a menos e passam frequentemente fome. Ao mesmo tempo, cerca de 1,2 mil milhões de pessoas são sobrenutridas e têm excesso de peso, a maioria delas sofrendo do excesso de ingestão de calorias e da falta


Sinais Precoces do Declínio 155 de exercício. Portanto, enquanto mil milhões de pessoas se preocupam em saber se vão ter que comer, os outros mil milhões deveria preocupar-se em não comer tanto.4 Os padrões das doenças também reflectem o alargamento deste fosso. Os mil milhões mais pobres sofrem na sua maioria de doenças infecciosas – malária, tuberculose, disenteria e SIDA.Amá nutrição deixa os jovens e as crianças de tenra idade mais vulneráveis a essas doenças infecciosas. A água não potável tem um efeito ainda pior naqueles que têm o sistema imunitário enfraquecido devido à fome, o que resulta em milhões de mortes por ano. Em contraste, entre os mil milhões no topo da escala económica, são as doenças relacionadas com o envelhecimento e os excessos do estilo de vida, incluindo a obesidade, o fumo do tabaco, as dietas ricas em gordura e açúcar e a falta de exercício físico que causam o maior número de mortes.5 Os níveis de educação reflectem a divisão profunda entre ricos e pobres. Nalguns países industrializados – por exemplo, o Canadá e o Japão – mais de metade da população jovem atinge um nível universitário de formação, em cursos de dois ou quatro anos. Em contraste, nos países em desenvolvimento, 115 milhões de jovens em idade de frequentar a escola básica, pura e simplesmente, não vão à escola. Embora tenham passado cinco séculos desde que Gutenberg inventou a imprensa, quase 800 milhões de adultos são analfabetos. Sem saberem ler, são também excluídos da utilização dos computadores e da Internet. Sem programas de alfabetização para adultos, as possibilidades que têm de escapar à pobreza não são boas.6 Quase mil milhões vivem em países onde a dimensão da população está essencialmente estável. Mas outros mil milhões vivem em países onde se prevê que a população aumente para o dobro até 2050. Os analfabetos do mundo estão concentrados numa mão cheia dos países mais populosos, a maior parte na Ásia e em África. Destacam-se entre estes a Índia, a China, o Paquistão, o Bangladesh, a Nigéria, o Egipto, a Indonésia e a Etiópia, mais o Brasil e o México naAmérica Latina. Entre 1990 e 2000, a China e a Indonésia tiveram grandes avanços na luta contra o analfabetismo. Outros países onde também houve progressos significativos são o México, a Nigéria e o Brasil. No entanto, noutros quatro populosos países – Bangladesh, Egipto, Paquistão e Índia – o número de analfabetos aumentou.7


Plano B 2.0 156 O analfabetismo e a pobreza tendem a reforçar-se mutuamente porque as mulheres analfabetas têm em geral famílias muito maiores do que as mulheres alfabetizadas e porque cada ano de escola aumenta a capacidade de melhorar o nível de rendimentos em cerca de 10 a 20 por cento. No Brasil, por exemplo, as mulheres analfabetas têm em média mais de seis filhos cada; as mulheres alfabetizadas têm apenas dois.Além disso, as mulheres analfabetas estão encurraladas em grandes famílias e por uma pequena capacidade de obter rendimentos.8 Ser pobre significa muitas vezes estar doente. Tal como com o analfabetismo, a pobreza e a falta de saúde estão intimamente ligadas. A saúde está ligada de perto ao acesso à água, algo de que 1,1 mil milhões de pessoas têm falta. As doenças nascidas do consumo da água reclamam mais de 3 milhões de vidas todos os anos, a maior parte vítimas da disenteria e da cólera. Estas e outras doenças ligadas ao consumo da água causam o maior número de danos entre as crianças.Amortalidade infantil em sociedades afluentes é cerca de 8 em cada 1.000 nascimentos bem sucedidos; nos 50 países mais pobres, anda próxima das 97 mortes em cada 1.000 nascimentos bem sucedidos – quase 13 vezes mais.9 Os pobres sem educação muitas vezes não compreendem os mecanismos de transmissão das doenças infecciosas e, portanto, não conseguem dar os passos necessários para se protegerem.Além disso, os que têm os sistemas imunitários enfraquecidos pela fome são mais vulneráveis às doenças infecciosas comuns.Apobreza também significa muitas vezes que as crianças não são vacinadas contra as doenças infecciosas mais comuns, mesmo que o custo dessas vacinas seja apenas de alguns cêntimos por criança.10 A ligação entre pobreza e doença é forte, mas foi quebrada para a maior parte da humanidade pelo desenvolvimento económico. O desafio agora é quebrar esta ligação para aquela minoria que resta, que não tem acesso à água potável, às vacinas, à educação ou aos cuidados de saúde básicos. A fome é a face mais visível da pobreza. A FAO (Food and Agriculture Organization), organização da ONU, calcula que 852 milhões da população mundial sofrem de fome crónica. Não têm acesso à comida suficiente para atingirem um pleno desenvolvimento físi-


Sinais Precoces do Declínio 157 co e mental e para manterem níveis adequados de actividade física.11 A maioria das pessoas mal nutridas e com falta de peso concentram-se no subcontinente indiano e na África subsariana – regiões que contêm 1,4 mil milhões e 750 milhões de pessoas, respectivamente. Há vinte e cinco anos atrás, a situação nutricional dos gigantes asiáticos em população, a Índia e a China, era similar. Mas desde essa altura a China eliminou a maior parte da fome no país, ao passo que a Índia fez apenas um progresso limitado nesse sentido. No último quarto de século, a China acelerou a viragem para famílias pequenas. Enquanto os ganhos na produção alimentar na Índia conseguidos neste período foram absorvidos em grande parte pelo crescimento populacional, na China, foram essencialmente absorvidos pelo aumento do consumo individual.12 A má nutrição afecta principalmente os jovens, que estão mais vulneráveis durante o seu rápido desenvolvimento físico e mental.Tanto na Índia como no Bangladesh, quase metade das crianças com menos de cinco anos tem falta de peso e são mal nutridas. Na Etiópia, 47 por cento das crianças são mal nutridas, enquanto que na Nigéria o número é 31 por cento – e estes são dois dos países africanos mais populosos.13 Embora não seja surpreendente que aqueles que são mal alimentados e têm falta de peso se concentrem nos países em vias de desenvolvimento, já surpreende talvez mais que a maioria deles viva em comunidades rurais. Muitas vezes, os subnutridos ou não têm terra ou vivem num pedaço de terra tão pequeno que, de facto, não têm mesmo terra.Aqueles que vivem nas planícies bem irrigadas são normalmente mais bem nutridos. São os que vivem em terrenos marginais – terrenos com grandes declives ou semi-áridos – que passam fome. 14 As penalizações por se ser subnutrido começam ao nascer. Gary Gardner e Brian Halweil, do Worldwatch Institute, citam um relatório da ONU que calcula que 20 milhões de crianças nascem todos os anos com falta de peso, de mães que sofrem também de má nutrição. O estudo indica que estas crianças sofrem efeitos duradouros na forma de “sistemas imunitários enfraquecidos, danos neurológicos, e crescimento físico retardado”. David Barker, da Universidade de Southampton, Grã-Bretanha, observa sobriamente “que 60 por cen-


Plano B 2.0 158 to dos recém-nascidos na Índia teriam que permanecer nos cuidados intensivos se nascessem na Califórnia”.15 O Crescente Desafio à Saúde Os desafios à saúde estão a tornar-se cada vez mais numerosos à medida que novas doenças infecciosas como o SARS, o vírus do Nilo Ocidental e a gripe das aves começam a aparecer.Além disso, a acumulação de poluentes químicos no ambiente começa a fazer os seus efeitos. Enquanto algumas doenças infecciosas, como a malária e a cólera, existem há bastante tempo e são doenças com as quais as autoridades de saúde estão bastante familiarizadas, os efeitos na saúde de muitos poluentes do ambiente só agora estão a ser descobertos. Entre as principais doenças infecciosas, a malária é responsável por mais de 1 milhão de mortes todos os anos, 89 por cento em África. O número de pessoas infectadas, e na maior parte dos casos sofrem com ela a maior parte das suas vidas, é muitas vezes superior. O economista Jeffrey Sachs, chefe do Instituto da Terra da Universidade de Columbia, Estados Unidos, calcula que a redução da produtividade no trabalho e outros custos associados à malária estão a cortar um ponto percentual no crescimento económico dos países com populações fortemente infectadas.16 Embora as doenças como a malária e a cólera tenham um peso grande, não há precedentes face ao número de vidas afectadas pela epidemia do HIV. Para se encontrar alguma coisa parecida com uma tamanha e potencialmente devastadora perda de vidas, temos que recuar à disseminação da varíola nas comunidades nativas americanas no século dezasseis ou à peste bubónica que ceifou a vida a cerca de um quarto da população europeia no século catorze. O HIV deve ser visto pelo que é – uma epidemia de proporções épicas que, se não for controlado em breve, pode tirar mais vidas neste século do que as que foram ceifadas em todas as guerras do século passado.17 Desde que o vírus da imunodeficiência foi identificado, em 1981, esta infecção espalhou-se pelo mundo inteiro. Em 1990, estavam infectadas com o vírus cerca de 10 milhões de pessoas. No final de 2004, o número de pessoas infectadas subiu para 78 milhões. Deste total, 38 milhões já morreram; 39 milhões vivem com o vírus. Vinte e cinco milhões de pessoas HIV-positivas vivem hoje na África


Sinais Precoces do Declínio 159 subsariana, mas só cerca de 500.000 estão a ser tratadas com medicamentos anti-retrovirais. Sete milhões vivem no sul e sudeste da Ásia, cinco milhões dos quais na Índia.18 As taxas de infecção pelo vírus estão a subir. Na ausência de um tratamento eficaz, as áreas da África subsariana com mais altas taxas de infecção enfrentam um número enorme de vidas perdidas. Somando a alta mortalidade causada pela epidemia à mortalidade normal dos adultos mais velhos, isso quererá dizer que países como o Botswana e o Zimbabué perderão metade das suas populações adultas no espaço de uma década.19 A epidemia do HIV não é um fenómeno isolado. Está a afectar todas as facetas da vida e todos os sectores da economia. A produção alimentar per capita, que já é baixa na África subsariana, está agora a cair rapidamente, à medida que o número de trabalhadores desta área diminui. Com a queda da produção alimentar, intensificase a fome entre os grupos dependentes, como as crianças e os velhos. A espiral descendente no bem-estar familiar começa normalmente quando o primeiro adulto cai vítima da doença – um desenvolvimento que perturba duplamente a família, já que por cada pessoa doente e incapaz de trabalhar, há outra que tem que cuidar dela.20 A perda maciça de jovens adultos para a SIDA já começa a fazer diminuir a actividade económica.Asubida dos custos dos seguros de saúde na indústria está a encolher ou até a eliminar as margens de lucro das empresas, levando algumas para o vermelho. Além disso, as empresas enfrentam o aumento das faltas por doença, o decréscimo da produtividade e o fardo de ter que recrutar e formar novos trabalhadores para substituir os que morrem.21 A educação também é afectada. Grandes quantidades de professores estão a ser dizimados pelo vírus. Em 2001, por exemplo, a Zâmbia perdeu 815 professores primários que morreram de SIDA, o equivalente a 45 por cento dos novos professores formados nesse ano. Quanto aos estudantes, quando um ou ambos os pais morrem, mais crianças são forçadas a ficar em casa simplesmente porque não há dinheiro suficiente para comprar livros e pagar as propinas escolares. As universidades também estão a sentir os efeitos. Na Universidade de Durbin, na África do Sul, por exemplo, 25 por cento do corpo de estudantes é HIV-positivo.22


Plano B 2.0 160 Os efeitos sobre o sistema de saúde são igualmente devastadores. Em muitos hospitais no leste e sul de África, a maioria das camas estão agora ocupadas por vítimas da SIDA, deixando menos espaço para doentes com outras doenças. Médicos e enfermeiros já extenuados são muitas vezes levados até a um ponto de ruptura. Com os sistemas de cuidados de saúde agora incapazes até de oferecer os serviços básicos, os problemas criados pelas doenças tradicionais estão também a aumentar. A esperança de vida está a cair não só devido à SIDA, mas também devido à deterioração do sistema de saúde.23 A epidemia está a deixar milhões de órfãos entregues à sua sorte. Prevê-se que na África subsariana haverá 18,4 milhões de “órfãos da SIDA” em 2010 – crianças que perderam pelo menos um dos pais devido à doença. Não há um precedente para milhões de meninos da rua em África.Afamília alargada, que antes absorvia as crianças que ficavam órfãs, está agora, ela própria, a ser dizimada devido à falta de adultos, deixando as crianças, muitas vezes pequenas, entregues a si mesmas. Para algumas raparigas, a única opção é o que se tornou conhecido como “sexo de sobrevivência”. Michael Grunwald, do Washington Post, escreve da Swazilândia, “Na província, as raparigas adolescentes swazis estão a vender sexo – e a espalhar o HIV – por 5 dólares o encontro, exactamente o que custa alugar um boi para um dia de lavra”.24 A epidemia de HIV em África é agora um problema de desenvolvimento, um assunto que questiona a sociedade sobre se consegue ou não continuar a funcionar de modo a poder apoiar sua população. É um problema de segurança alimentar. É um problema de segurança nacional. É um problema do sistema de educação. E é um problema de investimento estrangeiro. Stephen Lewis, o Enviado Especial da ONU para o HIV/SIDA em África, diz que a epidemia pode ser vencida e as tendências de infecção podem ser invertidas, mas será necessária a ajuda da comunidade internacional. A incapacidade de financiar adequadamente o Fundo Global para Combater a SIDA, a Tuberculose e a Malária, diz ele, é “assassínio em massa” por complacência.25 Escrevendo no New York Times, Alex de Waal, consultor da Comissão Económica da ONU para a África e da UNICEF, resume


Sinais Precoces do Declínio 161 bem os efeitos da epidemia: ”Da mesma forma que o vírus do HIV destrói o sistema imunitário do corpo, a epidemia do HIV e SIDA incapacitou o corpo político. Como resultado do HIV, o pior que aconteceu aos países africanos chega agora a um novo patamar: a capacidade das sociedades africanas para resistir à fome está a desaparecer rapidamente. A fome e a doença começaram a reforçar-se uma à outra. Por assustadora que esta perspectiva seja, temos que começar a lutar contra ambas ao mesmo tempo, ou não teremos sucesso com nenhuma.26 Enquanto a epidemia do HIV está actualmente concentrada em África, os poluentes do ar e da água estão a danificar a saúde das pessoas em toda a parte. Um estudo conjunto da Universidade da Califórnia e do Centro Médico de Bóston mostra que cerca de 200 doenças humanas, que vão da paralisia cerebral à atrofia testicular, estão ligadas aos poluentes. Entre outras doenças que podem ser causadas por poluentes incluem-se o espantoso número de 37 formas de cancro, a doença cardíaca, problemas do rim, tensão arterial alta, diabetes, dermatose, bronquite, hiperactividade, surdez, danos no esperma, e doenças de Alzheimer e Parkinson.27 Em Julho de 2005, o Environmental Working Group em colaboração com a Commonweal publicou uma análise ao sangue do cordão umbilical de 10 recém-nascidos seleccionados aleatoriamente em hospitais dos Estados Unidos. Detectaram um total de 287 químicos nestes testes. “Dos 287 químicos que detectámos… sabemos que 180 causam cancro em humanos ou animais, 217 são tóxicos para o cérebro e o sistema nervoso e 208 causam defeitos à nascença ou um desenvolvimento anormal em testes animais”. Toda a gente no planeta partilha este “mal do corpo” que são os químicos tóxicos, mas as crianças estão sujeitas a um risco maior porque se encontram no estágio inicial altamente vulnerável do desenvolvimento humano.28 A OMS relata cerca de 3 milhões de mortes por ano em todo o mundo motivadas por poluentes do ar – três vezes o número de mortes por acidentes de tráfego. Um estudo na Lancet concluiu que a poluição do ar é responsável por 40.000 mortes por ano em França, Áustria e Suiça. Metade delas devem-se a emissões de gases de ve-


Plano B 2.0 162 ículos. Nos Estados Unidos, a poluição do ar é responsável por 70.000 mortes por ano, quase o dobro das 40.000 mortes por acidentes de tráfego.29 Uma equipa de investigação do Reino Unido relata um aumento surpreendente das doenças de Alzheimer, Parkinson e doenças neuromotoras distribuído por dez países industrializados – seis na Europa, mais os Estados Unidos, o Japão, o Canadá e a Austrália. Na Inglaterra e no País de Gales, as mortes motivadas por estas doenças do cérebro aumentaram de 3.000 por ano no fim da década de 1970 para 10.000 no fim da década de 1990. Ao longo de um período de 18 anos, as taxas de mortalidade devidas a estas demências, principalmente a de Alzheimer, mais que triplicaram nos homens e quase duplicaram nas mulheres. Este aumento da demência está ligado a uma subida na concentração de pesticidas, efluentes industriais, exaustão de carros e outros poluentes no meio ambiente.30 Histórias de horror sobre os efeitos na saúde da poluição industrial descontrolada na Rússia são um lugar comum. Por exemplo, na cidade industrial de Karabash situada na região montanhosa na base dos Montes Urais, as crianças sofrem com frequência de envenenamento com chumbo, arsénico e cádmio, queproduzem defeitos congénitos, desordens neurológicas e cancro. Os poluentes também enfraquecem os sistemas imunitários.31 Os cientistas estão a ficar cada vez mais preocupados com os vários efeitos do mercúrio, uma potente neurotoxina, que agora permeia o meio ambiente em praticamente todos os países com centrais de energia a carvão e em muitos dos que têm minas de ouro. Os mineiros das explorações de ouro libertam cerca de 90 toneladas de mercúrio no ecossistema daAmazónia todos os anos, e as centrais de energia a carvão libertam mais de 45 toneladas de mercúrio no ar nos Estados Unidos. A Enviromental Protection Agency (EPA), dos Estados Unidos, relata que “o mercúrio proveniente das centrais de energia instala-se nos cursos de água, poluindo rios e lagos e contaminando o peixe”.32 Em 2004, 48 dos 50 Estados dos Estados Unidos (todos menos o Alasca e o Wyoming) emitiram um total de 3.221 alertas à pesca contra a ingestão de peixe dos lagos e ribeiras locais devido à sua


Sinais Precoces do Declínio 163 contaminação com mercúrio. A pesquisa feita pela EPA indica que uma entre cada seis mulheres em idade de procriar nos Estados Unidos tem mercúrio no sangue suficiente para prejudicar o feto em desenvolvimento. Isto significa que 360.000 dos 4 milhões de bebés nascidos no país todos os anos podem sofrer danos neurológicos devido à exposição ao mercúrio antes do nascimento. Num estudo feito em 2005 pelo Mt. Sinai Center for Children’s Health and the Environment, uma equipa de médicos calculou que os níveis mais baixos de Q.I. resultantes da exposição ao mercúrio no útero custam aos Estados Unidos 8,7 mil milhões de dólares por ano em rendimentos potenciais perdidos.33 Ninguém sabe exactamente quantos produtos químicos são fabricados hoje em dia, mas com o advento dos químicos sintéticos, o número de produtos químicos em uso subiu para mais de 100.000. Uma análise aleatória ao sangue dos americanos mostrará quantidades mensuráveis de, no mínimo, 200 químicos que não existiam há um século atrás.34 A toxicidade da maior parte destes produtos químicos não foi testada. Os produtos conhecidos por serem tóxicos estão incluídos numa lista de 667 químicos cuja descarga pela indústria no meio ambiente tem que ser participada ao EPA. O Toxic Release Inventory (TRI), agora disponível na Internet, fornece também informação comunidade a comunidade, armando os grupos locais com os dados necessários para avaliar as potenciais ameaças à sua saúde e ao ambiente. Desde que o TRI foi inaugurado, em 1988, as emissões químicas tóxicas relatadas diminuíram de forma consistente.35 Embora tenhamos notícia dos efeitos carcinogénicos dos pesticidas desde que Rachel Carson lançou a era ambiental com o seu livro Silent Spring, não estamos ainda a lidar adequadamente com esta ameaça. Desde então aprendemos muito sobre os efeitos na saúde dos químicos libertados para o ambiente, particularmente os obstrutores endócrinos descritos por Theo Colborn e suas colegas em Our Stolen Future. Esta família de produtos químicos coloca obstáculos aos processos reprodutivos e de desenvolvimento não só em humanos mas também em muitas outras espécies.36


164 A Economia do Desperdício em Apuros

Plano B 2.0

Uma outra tendência económica claramente pouco saudável tem sido a emergência, ao longo do último meio século, duma economia do desperdício. Começando por ser concebida na sequência da Segunda Guerra Mundial como forma de tornar os produtos acessíveis aos consumidores, em breve passou a ser vista também como um meio de criar empregos e manter o crescimento económico. Quanto maior a quantidade de bens produzidos e descartados, era o que se defendia, mais empregos haveria. O que vendia os produtos descartáveis era a facilidade de os usar e deitar fora. Por exemplo, em vez de ter que lavar toalhas de pano ou fraldas, os consumidores deram as boas vindas às versões descartáveis. Assim, substituímos os lenços por toalhetes faciais, as toalhas de mão por toalhas de papel descartáveis, fraldas de pano por fraldas descartáveis, e embalagens de bebidas reutilizáveis por embalagens de deitar fora.Até os sacos de compras em que levamos os produtos descartáveis para casa se tornam parte do fluxo de lixo. Esta economia de sentido único depende da energia barata. É também facilitada por aquilo que é conhecido nos Estados Unidos por sistemas municipais de gestão dos desperdícios sólidos. Helen Spiegelman e Bill Sheehan, do Product Policy Institute, escrevem que estes sistemas “tornaram-se num subsídio público perverso à Sociedade do Descartável. A mais abundante e melhor gestão de desperdícios à custa da despesa pública está a transformar-se numa licença ilimitada para a proliferação dos descartáveis. Hoje em dia, estes sistemas recolhem 1,5 quilogramas de desperdícios por dia por cada homem, mulher e criança americana – duas vezes mais que em 1960 e dez vezes mais que há 100 anos atrás. É altura de reformular o sistema de modo a que deixe de apoiar o hábito de deitar fora.37 A economia do desperdício está em rota de colisão com os limites geológicos da Terra. Para além de se estarem a esgotar os locais para aterros próximos das cidades, o mundo está também a ficar rapidamente sem o petróleo barato que é usado para fabricar e transportar os desperdícios. E talvez mais fundamentalmente, não há suficiente chumbo, estanho, cobre, minério de ferro ou bauxite facilmente acessíveis para manter a economia do desperdício para além de mais duas ou três gerações. Considerando um crescimento de 2 por


Sinais Precoces do Declínio 165 cento na extracção anual, os dados do U.S. Geological Survey sobre as reservas actuais economicamente recuperáveis mostram que restam ao mundo 18 anos de reservas de chumbo, 20 anos de reservas de estanho, 25 anos de cobre, 64 anos de minério de ferro e 69 anos de bauxite.38 O custo de arrastar o lixo para fora das cidades aumenta à medida que os aterros enchem e o preço do petróleo sobe. Uma das primeiras grandes cidades a esgotar os seus aterros de lixo locais foi Nova Iorque. Quando o aterro de Fresh Kills, destino local para o lixo de Nova Iorque, fechou definitivamente em Março de 2001, a cidade teve que arrastar o lixo para aterros em Nova Jersei, Pensilvânia, e até para a Virgínia – ficando alguns locais a 300 quilómetros de distância.39 Dadas as 12.000 toneladas de lixo produzidas por dia em Nova Iorque e assumindo um carregamento de 20 toneladas por cada camião articulado usado no transporte a longa distância, são necessários cerca de 600 camiões para remover todos os dias o lixo da cidade de Nova Iorque. Estes camiões de lixo formam um comboio de quatorze quilómetros e meio de comprimento – impedindo o tráfego, poluindo o ar e aumentando as emissões de carbono. Este comboio diário levou o Presidente da CâmaraAdjunto Joseph J. Lhota, que supervisionou o fecho das instalações de Fresh Kills, a dizer que para se libertar do lixo da cidade tem agora que recorrer a “uma operação diária ao estilo militar”.40 Sem receitas fiscais suficientes, as comunidades locais de outros Estados estão na disposição de receber o lixo de Nova Iorque – se lhes pagarem o suficiente.Algumas vêm nisso um factor de prosperidade económica. Os governos estaduais, no entanto, estão a braços com o aumento dos custos de manutenção das estradas, com a congestão do tráfego, o aumento da poluição do ar, o barulho, a possibilidade de poluição da água devido ao escorrimento dos aterros, e as queixas das comunidades vizinhas. O Governador da Virgínia, Jim Gilmore, escreveu ao Presidente Rudy Giuliani em 2001 queixando-se do uso da Virgínia como local de despejo do lixo. “Eu compreendo o problema com que Nova Iorque se depara”, disse ele, “mas o Estado a que pertencem Washighton, Jefferson e Madison não tem intenção de se transformar na lixeira de Nova Iorque”.41


Plano B 2.0 166 Os problemas com o lixo não se limitam à cidade de Nova Iorque. Toronto, a maior cidade do Canadá, fechou o último aterro que lhe restava em 31 de Dezembro de 2002, e agora envia o seu 1,1 milhão de toneladas anuais de lixo para Wayne County, Michigan. Ironicamente, o Estado de Nova Jersei, que recebe alguns dos desperdícios de Nova Iorque, está agora a enviar até 1.000 toneladas de detritos de demolições a 600 milhas de distância – também para Wayne Council, no Michigan.42 O desafio é substituir a economia de desperdício por uma economia de redução-reutilização-reciclagem. Para cidades como Nova Iorque, o desafio deveria ser menos o que fazer com o lixo e mais como evitar, desde logo, produzi-lo.

Conflitos da População e dos Recursos À medida que a terra e a água se tornam escassos, podemos esperar que uma disputa destes recursos vitais se intensifique no seio das sociedades, particularmente entre os ricos e os que são pobres e nada têm.Adiminuição dos recursos de suporte à vida per capita motivada pelo crescimento populacional ameaça fazer cair os níveis de vida de milhões de pessoas abaixo do nível de sobrevivência. Isto pode levar a situações de tensão social impossíveis de gerir, que se traduzirão em conflitos de largas dimensões.43 O acesso à terra é uma das principais fontes de tensão social. O aumento da população mundial reduziu à metade a área das terras de cultivo por pessoa de 0,23 hectares em 1950 para 0,1 hectares em 2004. Um décimo de hectare (NT: mil metros quadrados) é metade de um lote de construção num subúrbio afluente dos Estados Unidos. Esta diminuição da área agrícola per capita torna ainda mais difícil para os agricultores mundiais a tarefa de alimentar adequadamente um mundo que todos os anos tem, no mínimo, mais 70 milhões de pessoas.44 A diminuição da terra de cultivo per capita não ameaça apenas os níveis de vida; nas sociedades essencialmente de subsistência, ameaça a própria sobrevivência. As tensões nas comunidades começam a crescer quando as terras disponíveis encolhem para áreas tão pe-


Sinais Precoces do Declínio 167 quenas que não permitem a sobrevivência.Azona saheliana de África, com uma das populações do mundo em mais rápido crescimento, é também uma zona de generalização de conflitos.45 No agitado Sudão, 2 milhões de pessoas morreram e mais de 4 milhões foram deslocadas durante o longo conflito de mais de 20 anos entre o norte muçulmano e o sul cristão. O conflito na região do Darfur, Sudão ocidental, iniciado em 2003, ilustra as tensões crescentes entre dois grupos muçulmanos – criadores de camelos árabes, por um lado, e pequenos agricultores negros africanos, por outro.As tropas governamentais apoiam as milícias árabes, que se dedicam à matança total de africanos negros num esforço para os expulsar das suas terras, enviando-os para campos de refugiados no vizinho Chade. Até à data, foram mortas no conflito 140.000 pessoas e morreram de fome e doença 250.000 nos campos de refugiados.46 Na Nigéria, onde 132 milhões de pessoas se amontoam numa área não muito maior que o Texas, o excesso de consumo de erva dos pastos pelo gado e o excesso de cultivo da terra estão a converter as pastagens e as culturas em deserto, atirando os agricultores e pastores para uma guerra pela sobrevivência. Como Somini Sengupta relatou no New York Times em Junho de 2004, “nos últimos anos, com o deserto a espalhar-se, as árvores a serem cortadas e as populações de agricultores e pastores a aumentar, a competição pela terra só se intensificou”.47 Infelizmente, a divisão entre agricultores e pastores é também muitas vezes entre muçulmanos e cristãos. A competição pela terra, amplificada pelas diferenças religiosas e combinada com a existência de um grande número de jovens adultos frustrados com armas, criou o que o New York Times descreveu como a “mistura combustível” que “alimentou a recente orgia de violência neste Estado central fértil da Nigéria [Kebbi]. Igrejas e mesquitas foram arrasadas. Vizinhos virados contra vizinhos.Ataques de represália espalharam-se por toda a parte, até que finalmente, em meados de Maio, o governo impôs o estado de emergência”48 Divisões idênticas existem entre agricultores e pastores no norte do Mali, notava o New York Times, onde “espadas e paus foram substituídos por Kalashnikovs, à medida que a desertificação e o cres-


Plano B 2.0 168 cimento populacional foi endurecendo a competição entre, na sua maioria, agricultores africanos negros, por um lado, e pastores de origem Tuareg e Fulani, por outro. Os ânimos estão exaltados de ambos os lados. A disputa, afinal, é pela capacidade de subsistência e, mais do que isso, por uma forma de vida.49 O Ruanda tornou-se num caso de estudo clássico sobre como uma crescente pressão demográfica se pode traduzir em tensão política e conflito. James Gasana, que era o Ministro da Agricultura e Ambiente do Ruanda em 1990-92, dá-nos algumas abordagens. Como presidente de uma comissão nacional de agricultura em 1990, ele avisara que sem “transformações profundas na agricultura, [o Ruanda] não será capaz de alimentar adequadamente a sua população se esta mantiver a taxa de crescimento actual”. Embora os demógrafos do país previssem um crescimento importante na população, Gasana disse em 1990 que não estava a ver como o Ruanda poderia atingir 10 milhões de habitantes sem desordem social “a não ser que fossem atingidos importantes progressos na agricultura e em outros sectores da economia”.50 O aviso de Gasana sobre uma possível desordem social foi profético. Ele descreveu ainda como os irmãos de uma família herdavam a terra dos seus pais e como, com uma média de sete filhos por família, os lotes de terreno que já eram pequenos eram ainda mais fragmentados. Muitos agricultores tentaram encontrar novas terras, deslocando-se para montanhas com declives acentuados. Em 1989, quase metade da terra do Ruanda era cultivada em declives de 10 a 35 graus, uma condição universalmente considerada como incultivável.51 Em 1950, a população do Ruanda era de 2,4 milhões. Em 1993, era de 7,3 milhões, tornando-o no país mais densamente povoado de África. Com o crescimento da população, cresceu também a procura de madeira para lenha. Em 1991, a procura era mais do dobro da produção sustentável das florestas locais. Com o desaparecimento das árvores, a palha e outros resíduos das colheitas foram usados como combustível para cozinhar. Com menos matéria orgânica no solo, a fertilidade da terra diminuiu.52


Sinais Precoces do Declínio 169 À medida que a saúde da terra se deteriorava, também a saúde das pessoas que dela dependiam piorava. Por fim, pura e simplesmente, não havia alimento que chegasse para sobreviver. Desenvolveu-se um desespero surdo. Como uma terra atingida pela seca, podia ser incendiada por um simples fósforo. Esse fósforo acendeu-se com a queda de um avião no dia 6 de Abril de 1994, abatido quando se aproximava da capital, Kigali, matando o Presidente Juvenal Habyarimana. O desastre provocou um ataque organizado dos Hutus, conduzindo a cerca de 800.000 mortes de Tutsis e Hutus moderados num período de 100 dias. Em algumas aldeias, famílias inteiras foram chacinadas de modo a não subsistirem sobreviventes que pudessem reclamar o direito à terra da família.53 Muitos outros países africanos, em grande medida rurais, por natureza, estão numa rota demográfica parecida com a do Ruanda.A população da Tanzânia, de 38 milhões em 2005, deverá aumentar para 67 milhões até 2050. A Eritreia, onde a família média tem seis filhos, deverá crescer de 4 milhões para 11 milhões até 2050. Na República Democrática do Congo, prevê-se que a população triplique, passando de 58 milhões para 177 milhões.54 A África não está só. Na Índia, a tensão entre hindus e muçulmanos não está nunca muito abaixo da superfície. À medida que cada nova geração continua a subdividir os terrenos já pequenos, a pressão sobre a terra intensifica-se. A pressão sobre os recursos de água é ainda maior. Com a população da Índia a prever-se que crescerá de 1,1 mil milhões em 2005 para 1,6 mil milhões em 2050, uma colisão entre o crescente número de pessoas e os recursos de água cada vez mais limitados parece inevitável. O risco é o de a Índia poder ter que enfrentar conflitos sociais relativamente aos quais os do Ruanda parecerão insignificantes. Como nota Gasana, a relação entre a população e os sistemas naturais é um assunto de segurança nacional, que pode dar origem a conflitos em torno de questões geográficas, tribais, étnicas ou religiosas.55


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As dissensões sobre a posse de água entre países que partilham os mesmos sistemas hidrográficos são uma fonte comum de conflito político internacional, especialmente onde as populações crescem para além da capacidade dos caudais dos rios. Em nenhum outro lado este conflito potencial é mais claro do que entre o Egipto, o Sudão e a Etiópia, no vale do rio Nilo.Aagricultura no Egipto, onde raramente chove, é totalmente dependente da água do Nilo.Actualmente o Egipto recebe a parte de leão da água do Nilo, mas prevê-se que a sua população de 74 milhões atinja os 126 milhões até 2050, aumentando assim muito a procura de cereais e de água. O Sudão, cujos 36 milhões de pessoas também dependem fortemente da alimentação produzida com a água do Nilo, deverá ver aumentar a sua população para 67 milhões até 2050. E o número de etíopes, no país que controla 85 por cento dos cursos de água que alimentam o rio, deverá crescer de 77 milhões para 170 milhões.56 Uma vez que já há pouca água no Nilo na altura em que chega ao Mediterrâneo, se tanto o Sudão como a Etiópia retirarem mais água, o Egipto ficará com menos, tornando cada vez mais difícil a tarefa de alimentar um adicional de 52 milhões de pessoas. Embora exista um acordo sobre direitos da água entre os três países, a Etiópia recebe só uma minúscula parte da água. Atendendo às suas aspirações a uma vida melhor, e com os afluentes do Nilo como um dos seus poucos recursos naturais, a Etiópia quererá certamente para si uma parte maior. Com uma renda per capita de menos de 860 dólares por ano na Etiópia comparada com quase 4.300 dólares no Egipto, será difícil defender que a Etiópia não possa ter mais água do Nilo.57 Anorte, a Turquia, a Síria e o Iraque partilham a água do sistema hidrográfico do Tigre e do Eufrates. ATurquia, que controla os afluentes, está a desenvolver um projecto enorme no Tigre para aumentar a água disponível para rega e energia. A Síria e o Iraque, onde as populações de 19 milhões e 29 milhões de habitantes deverão crescer para o dobro, estão preocupadas já que também elas irão precisar de mais água.58


Sinais Precoces do Declínio 171 Na bacia do Mar Aral, na Ásia Central, há um acordo instável entre cinco países sobre a partilha dos dois rios, oAmu Darya e o Syr Darya, que desaguam no mar.Aprocura de água no Kazaquistão, no Kyrgistão, no Tajiquistão, no Turquemenistão e no Uzbequistão excede já o caudal dos dois rios em 25 por cento. (Ver Capítulo 3) O Turquemenistão, que se situa a montante noAmu Darya, planeia desenvolver mais meio milhão de hectares de agricultura de regadio. Atormentada por insurreições, a região não encontra a cooperação necessária para gerir os seus escassos recursos de água. Ainda por cima, oAfeganistão, que controla os afluentes doAmu Darya, planeia usar parte da água para o seu desenvolvimento. A geógrafa Sarah O’Hara, da Universidade de Nottingham, que estuda os problemas da água da região, diz, “Falamos muito do mundo em desenvolvimento, mas este é um mundo em deterioração.59

Refugiados do Ambiente no Horizonte Com a deterioração dos sistemas naturais, as pessoas são forçadas a migrar, por vezes para outros países. Em meados de Outubro de 2003, as autoridades italianas descobriram um barco que trazia refugiados da África para Itália. À deriva há mais de duas semanas e sem combustível, comida ou água, muitos dos passageiros tinham morrido. Num primeiro momento, os mortos foram atirados para fora de bordo pelos demais passageiros. Mas ao fim de algum tempo, os sobreviventes que restavam não mais tinham forças para mover os cadáveres.Apartilha do barco entre mortos e vivos parecia o que um socorrista descreveu como “uma cena do Inferno de Dante”.60 Pensa-se que os refugiados eram somalis que embarcaram na Líbia, mas eles não revelaram o seu país de origem. Não sabemos se eram refugiados políticos, económicos ou ambientais. Estados falhados como a Somália produzem os três tipos. Sabemos sim que a Somália é um caso de insucesso ecológico, com o excesso de população, o excesso de utilização de pastagens e a desertificação a destruírem a sua economia pastorícia.61


Plano B 2.0 172 Para os países da América Central, como as Honduras, a Guatemala, a Nicarágua e El Salvador, o México é muitas vezes uma passagem para os Estados Unidos. Em 2003, as autoridades mexicanas prenderam e deportaram cerca de 147.000 imigrantes ilegais, contra os 120.000 do ano anterior.62 Na cidade de Tapachula, na fronteira da Guatemala com o México, jovens à procura de empregos esperam ao longo da linha de comboio por uma composição de carga que se desloque através da cidade a baixa velocidade com destino ao norte.Alguns conseguem saltar para o comboio. Outros não. O refúgio Jesus el Buen Pastor alberga 25 amputados que falharam o salto e foram apanhados debaixo do comboio quando tentavam entrar. Para estes jovens, diz Olga Sanches Martinez, a directora do refúgio, isto é o “fim do seu sonho americano”. Uma religiosa local, Flor Maria Rigoni, chama aos emigrantes que tentam apanhar os comboios em movimento “os kamikazes da pobreza”.63 Os refugiados ambientais vêm também para os Estados Unidos do Haiti, um desastre ambiental reconhecido por muitos. Numa economia rural em que a terra está despida de vegetação e o solo se escoa para o mar, as pessoas não se deixam ficar para trás. Muitas afogam-se nas águas revoltas ao tentarem fazer a viagem para a Florida em pequenos barcos não concebidos para navegar em alto mar.64 Hoje em dia, corpos que dão à costa na Itália, Espanha e Turquia são uma ocorrência diária, resultado de actos desesperados de pessoas desesperadas. E cada dia que passa há mexicanos que arriscam as suas vidas no deserto do Arizona, tentando aceder a postos de trabalho nos Estados Unidos. Cerca de 400 a 600 mexicanos deixam todos os dias as suas áreas rurais, abandonando lotes de terra demasiado pequenos ou em estado de erosão demasiado adiantado para deles poderem viver. Ou se dirigem para as cidades mexicanas ou tentam atravessar ilegalmente a fronteira com os Estados Unidos. Muitos dos que tentam atravessar o deserto do Arizona morrem sob o calor impiedoso. Todos os anos são encontrados muitos corpos ao longo da fronteira doArizona.65


Sinais Precoces do Declínio 173 Embora o mundo moderno tenha bastante experiência com refugiados políticos e económicos, o que vemos agora é um fluxo crescente de refugiados retirados às suas casas pelas pressões do ambiente. Isto é tão só uma repetição da era da Nuvem de Pó, de há 70 anos, quando quase 3 milhões de americanos foram deslocados das suas terras.66 Os Estados Unidos estão de novo a ter que lidar com refugiados ambientais, mas agora por diferentes razões. No Alasca, cujo aumento da temperatura de 2 a 4 graus Celsius é talvez o maior no mundo, milhares de indígenas certamente serão forçados a sair das suas aldeias como resultado da fusão do gelo e de inundações. Newtok, uma aldeia de 340 esquimós Yupik na costa oeste doAlasca, está a ser avassalada por uma torrente de água de gelo derretido vinda do rio Ninglick. Um estudo de engenharia calcula que o custo de deslocar a aldeia será no mínimo de 50 milhões de dólares – ou 150.000 dólares por habitante. Se os índios de Newtok não se mudarem, correm o risco de se afogarem na água das cheias. Embora deslocar aldeias não seja uma questão simples, há mais de 23 aldeias do Alasca aguardando para serem deslocadas.67 Com a grande maioria dos quase 3 mil milhões de pessoas que serão acrescentadas ao mundo até 2050 a viverem em países onde os níveis freáticos já estão a baixar, os refugiados da água irão provavelmente tornar-se num lugar comum. Eles serão mais comuns em regiões áridas e semi-áridas onde as populações estão a crescer para além da capacidade de fornecimento de água e a afundar-se na pobreza hidrológica. As aldeias no noroeste da Índia estão a ser abandonadas à medida que os aquíferos se degradam e as pessoas já não conseguem encontrar água. Milhões de aldeões no norte e oeste da China e em partes do México podem ter de se deslocar devido à falta de água.68 Os desertos em progressão estão também a desalojar pessoas, apertando populações em crescimento em áreas geográficas cada vez menores. Enquanto que a Nuvem de Pó dos Estados Unidos desalojou alguns milhões de pessoas, o abandono ou o despovoa-


Plano B 2.0 174 mento parcial de 24.000 aldeias das províncias da Nuvem de Pó na China está a desalojar dezenas de milhões.69 No Irão, o número de aldeias abandonadas devido à expansão dos desertos ou à falta de água atinge já os milhares. Nas proximidades de Damavand, uma pequena cidade a cerca de uma hora de viagem de Teerão, foram abandonadas 88 aldeias. E à medida que o deserto assume o controlo na Nigéria, agricultores e pastores são forçados a deslocar-se, esmagados por área de terra produtiva cada vez menor. Os refugiados da desertificação acabam normalmente por ir parar às cidades, grande parte deles, aos bairros de lata. Um número muito maior emigra.70 Uma outra fonte da onda crescente de refugiados, com enorme potencial, é a subida do nível dos mares. A maior das deslocações humanas potenciais poderá surgir nas terras baixas do Bangladesh, onde a subida de apenas 1 metro do nível do mar não só inundaria metade da terra de arroz do país como forçaria também o realojamento de pelo menos 40 milhões de pessoas. Num país densamente povoado, com 142 milhões de pessoas, o realojamento interno não seria fácil. Mas para que outro lado podem elas ir? Quantos países aceitariam mesmo só um milhão de refugiados do Bangladesh desalojados devido ao aumento do nível do mar? Outros países asiáticos com deltas de rios e planícies aluviais onde crescem arrozais, como a China, a Índia, a Indonésia, o Paquistão, as Filipinas, a Coreia do Sul, a Tailândia e o Viet Nam, podem também vir a sofrer êxodos maciços devido à subida dos mares.71 Os fluxos de refugiados motivados pelo abaixamento dos níveis freáticos e pela expansão dos desertos estão apenas a começar. Que dimensão estes fluxos e os que são motivados pela subida dos oceanos virão a ter, é algo difícil de prever. Mas os números podem vir a ser enormes, o que é mais um motivo para se estabilizar o clima e a população.


Sinais Precoces do Declínio Estados Falhados e Terrorismo

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Depois de meio século em que se formaram novos Estados a partir das antigas colónias e do desmoronar da União Soviética, a comunidade internacional está agora a dirigir a sua atenção para a desintegração dos Estados. O termo “Estados falhados” é agora parte do nosso vocabulário de trabalho, descrevendo países onde já não existe um governo central. Como se observa num estudo, “Os Estados falhados fizeram uma extraordinária odisseia da periferia para o plano central da política global”72 Reconhecendo este fenómeno cada vez mais comum, vários grupos dedicados ao desenvolvimento económico e assuntos internacionais começaram a identificar os Estados em falência ou falhados e os indicadores associados ao seu falhanço. O Banco Mundial, por exemplo, construiu uma lista de 30 “países de baixo rendimento em situação de tensão”. Com a mesma preocupação, o Departamento para o Desenvolvimento Internacional do Reino Unido identificou 46 Estados “frágeis”. A CIA (Central Intelligence Agency) dos Estados Unidos construiu uma lista de 20 Estados em falência. Mais recentemente, o Fundo para a Paz e o Carnegie Endowment for International Peace fizeram um trabalho conjunto em que identificaram uma lista de 60 Estados, ordenando-os segundo a “sua vulnerabilidade ao conflito internacional violento”.73 Esta análise, publicada na Foreign Policy, baseia-se em 12 indicadores sociais, económicos, políticos e militares. Coloca a Costa do Marfim no topo da lista dos Estados falhados, seguindo-se a República Democrática do Congo, o Sudão, o Iraque, a Somália, a Serra Leoa, o Chade, o Iémen, a Libéria e o Haiti. Logo abaixo na lista, estão três países que têm aparecido muito nos noticiários nos últimos anos: Afeganistão, Ruanda e Coreia do Norte.74 Cinco países exportadores de petróleo integram esta lista de 60, incluindo os dois maiores exportadores e produtores –Arábia Saudita (quadragésimo quinto) e Rússia (quinquagésimo nono) – mais a Venezuela (vigésimo primeiro), a Indonésia (quadragésimo sexto) e a Nigéria (quinquagésimo quarto). Da lista constam também países com arsenais nucleares: o Paquistão e a Rússia.75


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Os três indicadores principais usados na construção da tabela da Foreign Policy são o desenvolvimento desigual, a perda de legitimidade dos governos e a pressão demográfica. Desenvolvimento desigual significa normalmente que um pequeno segmento da população acumula riqueza enquanto a maior parte da sociedade pode estar a sofrer uma deterioração nas suas condições de vida. Esta desigualdade, muitas vezes associada à corrupção política, cria tensão social e pode conduzir à guerra civil.76 Os governos que não conseguem gerir eficazmente os problemas emergentes nem garantem os serviços básicos são vistos como inúteis. Isto dá muitas vezes origem a que segmentos da população manifestem a sua lealdade e apoio aos senhores da guerra, chefes tribais ou líderes religiosos.Aperda da legitimidade política é um sinal precoce do declínio do Estado.77 O terceiro indicador principal é a pressão demográfica. Todos os 20 primeiros países da lista da Foreing Policy têm populações em crescimento rápido. Em muitos dos países que experimentaram crescimentos populacionais rápidos ao longo de várias décadas, os governos sofrem de fadiga demográfica, incapazes de lidar com a permanente diminuição das terras de cultivo per capita e dos fornecimentos de água doce, ou de construir escolas com rapidez suficiente para abarcar o número crescente de crianças.78 A falta de investimento estrangeiro e o consequente crescimento do desemprego são também parte da síndroma de declínio. Um estudo anterior da Population Action International mostrava que um dos principais indicadores da instabilidade política numa sociedade é o número de jovens desempregados, número que é alto nos países do topo da lista do artigo da Foreign Ploicy.79 Outra característica dos Estados em falência é a deterioração da infra-estrutura física – estradas e sistemas de água e esgotos. A protecção dos sistemas naturais é também negligenciada quando as pessoas lutam pela sobrevivência. Florestas, prados e terras de cultura deterioram-se, criando uma espiral de declínio económico.80


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Entre as indicações mais flagrantes de um Estado falhado destacam-se o colapso da lei e da ordem e a correspondente perda de segurança pessoal. No Haiti, gangs armados mandam nas ruas. Raptar habitantes locais que tenham a sorte de pertencer aos 30 por cento de empregados para obter um resgate, é uma coisa normal. No Afeganistão são os senhores da guerra locais, não o governo central, que controlam o país fora de Cabul. A Somália que agora apenas existe nos mapas, é governada por líderes tribais, cada um reclamando um pedaço daquilo que foi em tempos um país.81 Alguns destes países estão envolvidos em conflitos que duram há muito.ARepública Democrática do Congo, que ocupa uma grande parte da bacia do rio Congo no coração da África, tem sido o palco de um conflito permanente há já seis anos, um conflito que já ceifou 3,8 milhões de vidas e desalojou de suas casas muitos mais milhões de pessoas. De acordo com o International Rescue Committee, por cada morte violenta neste conflito, há 62 mortes não violentas relacionadas com ele, incluindo mortes devido à fome, doenças respiratórias, diarreia e outros males.82 Algumas fontes potenciais de instabilidade estão a conduzir o mundo para uma situação completamente nova. Na África subsariana, onde as taxas de infecção pelo HIV excedem os 30 por cento dos adultos, haverá milhões de órfãos nos anos que vêm, como referi antes. Com o número de órfãos a ultrapassar a capacidade da sociedade para cuidar deles, muitos tornar-se-ão meninos da rua. Crescendo sem orientação paternal e modelos de comportamento adequados, e com o seu comportamento moldado pelo desespero da sobrevivência, estes órfãos tornar-se-ão numa nova ameaça para a estabilidade e o progresso.83 Os estados em falência são uma preocupação internacional crescente porque são uma fonte de terroristas, drogas, armas e refugiados. O Afeganistão não foi só uma base de treino para terroristas, tornou-se também rapidamente, sob a ocupação aliada, no maior fornecedor mundial de heroína. Os refugiados do Ruanda, entre eles,


Plano B 2.0 178 milhares de soldados armados, contribuíram para a desestabilização do Congo. Como adverte o The Economist, “À semelhança de um indivíduo severamente perturbado, um estado falhado é um perigo não só para ele próprio, mas para todos os que o rodeiam, e não só”.84 Em muitos países, as Nações Unidas ou outras forças internacionais organizadas de manutenção da paz tentam manter a paz, muitas vezes sem sucesso. Entre os países onde encontram-se forças de manutenção da paz das Nações Unidas, estão a República Democrática do Congo, a Serra Leoa e a Libéria. Outros países com forças multinacionais de manutenção da paz são oAfeganistão, o Haiti e o Sudão. Não raras vezes estas forças têm um carácter simbólico, não sendo nem de perto suficientes para assegurar a estabilidade.85 Países como o Haiti e o Afeganistão sobrevivem hoje porque estão integrados em sistemas internacionais de cuidados intensivos.A assistência económica – como, vale a pena referir, a ajuda alimentar – está a ajudar a mantê-los. Mas não há assistência suficiente para contrariar as tendências crescentes de deterioração e substitui-las pela estabilidade do Estado e o progresso económico sustentado.86


II A Resposta – Plano B



7 Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População O novo século começou com uma nota inspiradora quando os países que fazem parte das Nações Unidas estabeleceram a meta de reduzir para metade o número de pessoas que vivem na pobreza até 2015. E, desde 2005, o mundo está adiantado no cumprimento deste objectivo. Há duas grandes razões para isto: China e Índia. O crescimento económico anual da China de 9 por cento ao longo do último quarto de século e a aceleração da Índia para os 6 por cento por ano na última década estão a retirar centenas de milhões de pessoas da pobreza.1 Na China, o número de pessoas que vivem em situação de pobreza desceu de 648 milhões, em 1981, para 218 milhões, em 2001, a maior redução da pobreza da história. A Índia está também a fazer um progresso impressionante na frente económica. Sob a nova e dinâmica liderança do Primeiro-Ministro Manmohan Singh, que chegou ao poder em 2004, e da sua hábil equipa, a pobreza está a ser atacada directamente através da melhoria das infra-estruturas ao nível das aldeias. Investimentos direccionados são feitos a pensar nos mais pobres dos pobres. Se a comunidade internacional reforçar activamente o esforço desta Índia com ímpeto reformador, outras centenas de milhões poderão ser retiradas da pobreza.2


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Plano B 2.0

Chegou a hora da comunidade internacional dar à Índia a garantia de que terá os recursos necessários para manter este ímpeto que criou. Com a Índia a movimentar-se economicamente, o mundo pode agora começar a concentrar-se decididamente na pobreza que persiste na África subsariana e em alguns países mais pequenos daAmérica Latina e Ásia Central. Vários países no Sudeste Asiático, nomeadamente a Tailândia, o Viet Nam e a Indonésia, estão também a conseguir grandes progressos. Caso não se verifiquem atrasos económicos significativos, estes ganhos na Ásia asseguram só por si que o Objectivo de Desenvolvimento do Milénio, da ONU, de reduzir a pobreza até 2015, será atingido.3 Estas são as boas notícias. As más notícias são que a África subsariana – com 750 milhões de pessoas – se está a afundar cada vez mais na pobreza. A fome, o analfabetismo e a doença estão em marcha, ofuscando em parte os ganhos da China e da Índia.AÁfrica, escolhida como tema de discussão na reunião do G-8 de Julho de 2005, precisa de uma atenção especial.4 Num mundo cada vez mais integrado, erradicar a pobreza e estabilizar a população são questões de segurança nacional. Fazer abrandar o crescimento da população ajuda a erradicar a pobreza e os seus sintomas mais perturbadores e, inversamente, erradicar a pobreza ajuda a abrandar o crescimento populacional. Com o tempo a esgotar-se, a urgência de se actuar em ambas as frentes é clara. Para além do objectivo de reduzir a metade o número de pessoas que vivem na pobreza até 2015, os outros Objectivos de Desenvolvimento do Milénio da ONU são cortar para metade o número de pessoas com fome, assegurar a educação primária generalizada, garantir o acesso à água potável para todos, e contrariar a disseminação das doenças infecciosas, especialmente o HIV e a malária. Estreitamente relacionados com estes estão os objectivos de reduzir em três quartos a mortalidade à nascença e em dois terços a mortalidade infantil (até aos cinco anos de idade).5


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População

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Enquanto a meta de reduzir a pobreza para metade até 2015 parece estar a ser atingida ligeiramente antes do esperado, o mesmo não acontece com a intenção de diminuir para metade os que padecem de fome. O número de crianças com educação primária parece estar a aumentar substancialmente, embora este número se baseie principalmente na força do progresso verificado na Índia. E a mortalidade das crianças com menos de cinco anos caiu de 15 milhões em 1980 para 11 milhões em 2003, esperando-se que continue a cair.6

Educação Básica Generalizada Uma forma de diminuir o fosso entre ricos e pobres é assegurar a educação para todos. Isto significa garantir que 115 milhões de crianças que não têm escola passem a tê-la.As crianças sem qualquer tipo de educação formal começam as suas vidas com uma grande desvantagem, que faz com que, quase sempre, elas se mantenham na mais abjecta das pobrezas e o fosso entre os pobres e os ricos continue a aumentar. Num mundo cada vez mais integrado, este fosso cada vez maior torna-se numa fonte de instabilidade. O Prémio Nobel da economiaAmartya Sen refere-se a este ponto com esta singeleza: “o analfabetismo e o inumerismo são uma ameaça maior para a humanidade que o terrorismo”.7 Reconhecendo como central o papel da educação no progresso humano, as Nações Unidas estabeleceram a educação básica generalizada até 2015 como um dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. O Banco Mundial tomou a dianteira com o seu plano Educação para Todos, que garante que qualquer país com um plano bem feito para garantir a educação básica generalizada é elegível para apoio financeiro. As três condições principais são que os países submetam um bom plano para a educação básica generalizada, que atribuam uma parte significativa dos seus próprios recursos a esse plano e que tenham práticas orçamentais e contabilísticas transparentes. Caso seja implementado a cem por cento, todas as crianças dos países pobres terão educação primária até 2015.8


Plano B 2.0 184 As vantagens da educação são muitas, particularmente para as mulheres. O nível de realização das crianças está intimamente relacionado com o nível de educação das suas mães. As crianças de mães com educação são mais bem nutridas, não necessariamente porque os rendimentos familiares são mais elevados, mas porque os melhores conhecimentos de nutrição das suas mães leva a uma melhor escolha dos alimentos e à adopção de melhores métodos na sua preparação. Educar as mulheres é a chave para quebrar o círculo da pobreza.9 A educação das raparigas conduz a famílias mais pequenas. Em todas as sociedades em que há informação disponível, a fertilidade desce à medida que a educação das mulheres sobe. E as mães com pelo menos cinco anos de escola perdem menos crianças à nascença ou devido a doenças de infância do que as mães com menos educação. Entre outras coisas, estas mulheres conseguem ler as instruções dos medicamentos e têm uma melhor compreensão sobre a melhor forma de cuidarem de si durante a gravidez. O economista Gene Sperling concluiu, num estudo de 72 países feito em 2001, que “a expansão da educação secundária das mulheres pode ser a melhor alavanca para se conseguirem reduções substanciais na fertilidade”.10 A educação básica aumenta a produtividade agrícola. Os serviços de extensão agrícola que não podem usar textos impressos para disseminar informação sobre as boas práticas agrícolas estão severamente limitados. O mesmo acontece com os agricultores que não conseguem ler as instruções de um saco de fertilizante.Aincapacidade para ler as instruções numa embalagem de pesticida pode pôr a vida em risco. Numa altura em que o HIV se espalha pelo mundo, as escolas fornecem o meio institucional para educar os jovens sobre os riscos de infecção.Aaltura de informar e educar as crianças sobre o vírus e sobre os estilos de vida que potenciam a sua disseminação é quando elas são pequenas, não quando já estão infectadas. Os jovens podem também ser mobilizados para levarem a cabo campanhas no próprio meiojuvenil.


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 185 A formação de professores é uma grande necessidade nos países em desenvolvimento, especialmente onde muitos destes profissionais estão a ser dizimados pela SIDA. Oferecer bolsas de estudo a estudantes promissores provenientes de famílias pobres para frequentarem escolas de formação em troca do compromisso de se dedicarem ao ensino por um determinado período de tempo, digamos cinco anos, pode ser um investimento muito rentável.Ajudaria a garantir a necessária disponibilidade de recursos humanos para se atingir a meta da educação primária generalizada, e também abriria a porta a que se desenvolvesse o talento nos segmentos mais pobres da sociedade. Gene Sperling acredita que qualquer plano deve assegurar que se chega aos segmentos da sociedade mais difíceis de atingir, especialmente raparigas pobres de áreas rurais. Salienta que a Etiópia foi pioneira nisto com os Comités de Aconselhamento para Raparigas. Representantes destes grupos dirigem-se aos pais que pretendem casar prematuramente as suas filhas e encorajam-nos a mantê-las na escola. Alguns países, entre eles, Brasil e Bangladesh, chegam mesmo a oferecer pequenas bolsas de estudo para raparigas quando necessário, ajudando assim as jovens de famílias pobres a obterem a educação básica.11 À medida que o mundo se torna mais integrado economicamente, os seus quase 800 milhões de adultos analfabetos estão em situação de grande desvantagem. Este deficit pode talvez ser melhor debelado lançando programas de alfabetização para adultos, assentes fundamentalmente no voluntariado.Acomunidade internacional poderia oferecer algum dinheiro de arranque que ajude a obter material de educação e consultores exteriores onde seja necessário. O Bangladesh e o Irão, ambos com bem sucedidos programas de alfabetização de adultos, podem servir como modelo.12 O Banco Mundial calcula que será necessário um financiamento de cerca de 12 mil milhões de dólares por ano para se atingir a meta da educação primária generalizada em mais de 80 países onde essa meta, provavelmente, não conseguirá ser atingida até 2015. Numa altura em que a educação dá às crianças o acesso não só aos livros mas também aos computadores pessoais e ao enorme potencial de informação da Internet, ter crianças que não vão à escola é algo que já não se pode aceitar.13


Plano B 2.0 186 Poucos incentivos para levar as crianças à escola são tão eficazes como o programa de almoço escolar, especialmente nos países mais pobres. Desde 1946, as crianças da escola pública dos Estados Unidos têm todas acesso a um programa de almoço escolar, que garante uma boa refeição por dia. São inegáveis os benefícios deste programa nacional que se tem mantido sem interrupção ao longo de todos estes anos. George McGovern e Robert Dole, ambos antigos membros do comité de agricultura do Senado norte-americano e antigos candidatos à Presidência, querem oferecer programas de almoço escolar a todos os países mais pobres do mundo.14 Crianças doentes ou com fome faltam muitos dias à escola. E mesmo quando conseguem assistir às aulas, não aprendem tão bem. Jeffrey Sachs refere, “As crianças doentes têm muitas vezes uma perspectiva de menor produtividade para a sua vida futura devido não só às interrupções da frequência escolar mas também aos impedimentos cognitivos e físicos”. Mas quando são implementados programas de almoço escolar nos países de baixos rendimentos, a inscrição nas escolas dispara. A capacidade de estarem atentas durante mais tempo aumenta. O seu desempenho académico melhora. Menos dias são perdidos, e as crianças passam mais anos na escola.15 As raparigas beneficiam especialmente. Atraídas pelo almoço, permanecem mais tempo na escola, casam mais tarde e têm menos filhos. Esta é uma situação triplamente ganhadora. Adoptar um programa de almoço escolar nos 44 países com rendimento mais baixo custaria cerca de 6 mil milhões de dólares por ano, para além do que as Nações Unidas já gastam no esforço para reduzir a fome.16 Para que possam absorver o benefício dos almoços escolares mais tarde, são também necessários esforços maiores para melhorar a nutrição mesmo antes das crianças chegarem à idade escolar. George McGovern nota que “um programa para mulheres, jovens e crianças (MJC), que ofereça suplementos nutricionais às mulheres grávidas e em aleitação que deles necessitem”, deveria também estar disponível nos países pobres. Tendo em conta a experiência de 25 anos, é claro que o programa (MJC) dos Estados Unidos foi muitíssimo bem sucedido na melhoria da nutrição, saúde e desenvolvimento das crianças em idade pré-escolar das famílias de baixos rendimentos. Se isto se alargasse às mulheres grávidas e em aleitação e às crianças dos 44


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 187 países mais pobres, seria uma ajuda na erradicação da fome entre milhões de crianças de tenra idade numa altura das suas vidas em que isso poderia fazer uma grande diferença.17 Estes esforços, embora tenham custos, não são demasiado caros quando comparados com as perdas anuais em produtividade devido à fome. McGovern e Dole pensam que esta iniciativa pode ajudar a “secar os pântanos da fome e do desespero que servem de base ao recrutamento potencial de terroristas”. Num mundo onde uma enorme riqueza se acumula entre os ricos, faz pouco sentido que as crianças vão para a escola com fome.18

Estabilizando a População Cerca de 42 países têm agora populações que estão essencialmente estáveis ou a decrescer lentamente. Nos países com as taxas de fertilidade mais baixas, como o Japão, a Rússia, a Alemanha e a Itália, as populações tenderão a baixar ao longo do próximo meio século.19 Um grupo maior de países reduziu a fertilidade para o nível de reposição ou ligeiramente abaixo.Atingirão a estabilidade populacional à medida que grandes grupos da população mais jovem forem passando pela idade reprodutiva. Neste grupo incluem-se a China, o país mais populoso do mundo, e os Estados Unidos, o terceiro mais populoso. Num terceiro grupo de países, onde se incluem a Etiópia, a República Democrática do Congo e o Sudão, prevê-se que a população aumente para mais do dobro até 2050.20 As projecções da ONU mostram o crescimento populacional mundial de acordo com três pressupostos de níveis de fertilidade. A projecção média, a que é normalmente mais usada, aponta para que em 2050 haja 9,1 mil milhões de pessoas. A mais elevada atinge os 10,6 mil milhões. A previsão por baixo, que assume que o mundo mudará rapidamente para valores de fertilidade abaixo dos níveis de reposição - para 1,6 filhos por casal - aponta para um pico da população mundial de 7,8 mil milhões em 2041, com um decréscimo posterior. Se o objectivo é erradicar a pobreza, a fome e o analfabetismo, a nossa escolha está limitada à necessidade de tentar atingir a previsão mais baixa.21


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Plano B 2.0

Abrandar o crescimento da população mundial significa que todas as mulheres que desejem planificar as suas famílias possam ter acesso aos serviços de planeamento familiar de que necessitem para limitarem o seu tamanho. Preencher a lacuna do planeamento familiar pode ser o assunto mais urgente na agenda global. Os benefícios são enormes e os custos mínimos.22 O aspecto positivo é que os países que quiserem ajudar os casais a reduzirem as suas famílias podem fazê-lo rapidamente. A minha colega Janet Larsen escreve que apenas numa década o Irão fez descer a taxa de crescimento da sua população, passando de uma das maiores para uma das menores do mundo em desenvolvimento. Quando o Ayatollah Khomeini subiu ao poder no Irão em 1979, desmantelou imediatamente os programas de planeamento familiar que o Xá tinha posto em prática em 1967, advogando, em contrapartida, as famílias grandes. Em guerra com o Iraque entre 1980 e 1988, Khomeini queria famílias grandes para aumentar o exército do Islão.Asua meta era um exército de 20 milhões. Em resposta a este apelo, os níveis de fertilidade subiram, levando o crescimento populacional do Irão até ao limite de 4,2 por cento no início da década de 1980, um nível que se aproximava do máximo biológico. À medida que este enorme crescimento começou a pesar na economia e no ambiente, os dirigentes do país aperceberam-se de que o sobrepovoamento, a degradação ambiental e o desemprego estavam a pôr em causa o futuro do Irão.23 Em 1989 o governo fez uma viragem e o Irão restaurou o seu programa de planeamento familiar. Em Maio de 1993, foi aprovada uma lei nacional de planeamento familiar. Os recursos de vários ministérios, como o da educação, cultura e saúde, foram mobilizados para o objectivo da redução das famílias. Foi dada à rádio e televisão a responsabilidade de aumentar a divulgação dos problemas populacionais e da disponibilidade dos serviços de planeamento familiar. Cerca de 15.000 “casas da saúde”, ou clínicas, foram criados para prestar às populações rurais serviços de saúde e planeamento familiar.24


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 189 Os líderes religiosos envolveram-se directamente naquilo que chegou a ser uma cruzada em favor da diminuição das famílias. O Irão introduziu uma panóplia completa de medidas contraceptivas, incluindo a esterilização dos homens – uma novidade nos países islâmicos. Todo o tipo de controlo de natalidade, nomeadamente contraceptivos como a pílula e a esterilização, eram gratuitos. Na realidade, o Irão tornou-se num pioneiro – o único país a exigir aos casais que tivessem uma aula sobre contracepção moderna antes de receberem uma licença de casamento.25 Para além das intervenções directas a nível do sistema de saúde, foi lançado um esforço em grande escala para aumentar a alfabetização das mulheres, fazendo-a crescer de 25 por cento, em 1970, para mais de 70 por cento, em 2000 – um resultado impressionante. A inscrição das mulheres nas escolas aumentou de 60 para 90 por cento. Tirando partido dos 70 por cento de habitações com aparelhos de TV, a televisão foi utilizada para difundir informação sobre o planeamento familiar em todo o país. Como resultado deste impressionante esforço feito a partir de 1989, o tamanho das famílias no Irão caiu de sete crianças para menos de três. De 1987 a 1994, o Irão cortou para metade a sua taxa de crescimento populacional. Em 2004, a sua taxa geral de crescimento populacional, de 1.2 por cento, é apenas ligeiramente superior à dos Estados Unidos.26 Se um país como o Irão, com uma forte tradição de fundamentalismo islâmico, consegue mudar rapidamente para uma situação de estabilidade populacional, outros países também conseguirão. Aos países em toda a parte, não lhes resta outra hipótesese não apontar para a meta de dois filhos por casal. Não há alternativa verdadeira para esta questão. Nenhuma população que aumente ou diminua de forma contínua e a longo prazo é sustentável. Chegou a altura dos dirigentes mundiais – incluindo o Secretário-Geral das Nações Unidas, o Presidente do Banco Mundial e o Presidente dos Estados Unidos – reconhecerem publicamente que a Terra não pode suportar facilmente mais de dois filhos por família.


Plano B 2.0 190 Os custos de oferecer serviços de saúde reprodutiva e planeamento familiar não são elevados. Na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento realizada em 1994 no Cairo, foi calculado que um programa totalmente subsidiado de população e saúde reprodutiva para os próximos 20 anos custaria cerca de 17 mil milhões de dólares por ano em 2000 e 22 mil milhões de dólares em 2015. Os países em desenvolvimento concordaram em cobrir dois terços deste valor, enquanto que os países industrializados pagariam um terço. Embora já tenha passado o 10º aniversário da conferência do Cairo, os países em desenvolvimento estão aquém da sua promessa em cerca de 20 por cento, enquanto que os países doadores se ficaram por metade, deixando conjuntamente um fosso de cerca de $6 mil milhões por ano.27 As Nações Unidas calcularam que, se forem satisfeitas as necessidades dos 201 milhões de mulheres que não têm acesso a uma contracepção eficaz, podem ser evitadas em cada ano 52 milhões de gravidezes involuntárias, 22 milhões de abortos induzidos e 1,4 milhões de mortes infantis. Cerca de 142.000 mortes relacionadas com a gravidez podem também ser evitadas. Os custos para a sociedade de não se combater esta falha no planeamento familiar são inaceitavelmente altos.28 A reforçar estes cálculos das Nações Unidas estão os dados recolhidos no seio das populações que mostram como o acesso aos serviços de planeamento familiar ajudam os casais a atingir o tamanho familiar desejado. Inquéritos nas Honduras, por exemplo, mostram que as mulheres pobres (a maior parte das vezes sem acesso a serviços de planeamento familiar) têm duas vezes mais filhos do que desejariam, enquanto as mulheres de grupos socioeconómicos altos conseguem ter o número de filhos que desejam.29 A mudança para um padrão de famílias mais pequenas traz dividendos económicos generosos. No Bangladesh, analistas concluíram que $62 gastos pelo governo para evitar um nascimento indesejado poupavam $615 de despesas em outros serviços sociais. Investir na saúde reprodutiva e no planeamento familiar liberta mais recursos fis-


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 191 cais por criança para a educação e saúde, ajudando assim a fuga à pobreza. Para os países doadores, preencher a totalidade do fosso dos 6,6 mil milhões de dólares necessários para garantir que os casais tenham em toda a parte acesso aos serviços que pretendem e de que necessitam produziria retornos sociais importantes em melhor educação e serviços de saúde.30

Melhor Saúde para Todos Enquanto a doença cardíaca e o cancro (em grande medida, doenças do envelhecimento), a obesidade e o vício de fumar dominam as preocupações de saúde nos países industrializados, nos países em desenvolvimento são as doenças infecciosas que dominam as questões da saúde. Além da SIDA, as doenças de principal preocupação são a diarreia, as doenças respiratórias, a tuberculose, a malária e o sarampo. Muitos países já não conseguem suportar o preço das vacinas para as doenças da infância, tais como o sarampo, e deixam de cumprir os seus programas de vacinação. Sem fundos para investir hoje, eles irão pagar um preço bem mais elevado amanhã. Não há muitas situações em que gastar apenas alguns cêntimos por criança possa fazer uma diferença tão grande como nos programas de vacinação.31 Juntamente com a erradicação da fome, garantir o acesso a fontes de água seguras e de confiança aos mil milhões de pessoas que não dispõem dessas fontes é essencial para melhorar a saúde de todos. Em muitas cidades, agora, a opção mais realista pode ser prescindir de sistemas caros de remoção e tratamento de esgotos à base de água, optando antes por sistemas de remoção de esgotos sem utilização de água e que não espalham patogénios causadores de doenças (ver descrição dos sistemas de wc de composto seco no Capítulo 11). Esta mudança ajudaria simultaneamente a aliviar da falta de água, a reduzir a disseminação de agentes de doença nos sistemas de água e a contribuir para fechar o ciclo dos nutrientes – outra oportunidade triplamente ganhadora.


Plano B 2.0 192 Um dos ganhos de saúde mais impressionantes surgiu de uma campanha da UNICEF para tratar sintomas de diarreia com uma terapia oral de rehidratação. Esta técnica espantosamente simples, que consiste em beber uma solução com uma leve concentração de sal, foi extremamente eficaz - reduzindo as mortes de crianças motivadas por diarreia de 4,6 milhões em 1980 para 1,5 milhões em 1999. Poucos investimentos salvaram tantas vidas com um custo tão baixo. Em Millions Saved, Ruth Levine descreve como o Egipto usou a terapia de rehidratação oral para reduzir as mortes infantis por diarreia em cerca de 82 por cento entre 1982 e 1989.32 Algumas das principais fontes de morte prematura estão relacionadas com o estilo de vida. Os cigarros são um dos primeiros responsáveis.AOrganização Mundial de Saúde (OMS) calcula que 4,9 milhões de pessoas morreram em 2000 devido a doenças relacionadas com o tabaco, mais do que devido a qualquer doença infecciosa. Hoje conhecem-se cerca de 25 doenças ligadas ao consumo de tabaco, como a doença do coração, trombose, doença respiratória, várias formas de cancro e impotência masculina. O fumo do cigarro mata mais pessoas todos os anos do que o conjunto dos outros poluentes – quase 5 milhões versus 3 milhões.33 É impressionante o progresso que se está a fazer no que respeita à redução do fumo de cigarros.Após um século de aumento crescente do vício do tabaco, o mundo está a afastar-se dos cigarros, sob a liderança da Tobacco Free Initiative da OMS. Esta ganhou um novo impulso com a Framework Convention on Tobacco Control, o primeiro acordo internacional a abordar de forma completa um assunto de saúde, adoptado unanimemente em Genebra em Maio de 2003.34 Ironicamente, o país onde o tabaco teve origem está agora a liderar o mundo na luta contra ele. Nos Estados Unidos, o número de cigarros fumados por pessoa baixou de um máximo de 2.872 em 1976 para 1.374 em 2003 – uma queda de 52 por cento. A nível mundial, onde a descida tem um atraso de cerca de uma década em relação aos Estados Unidos, o consumo baixou de um máximo histó-


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 193 rico de 1.035 cigarros fumados por pessoa em 1986 para 856 em 2003, uma queda de 17 por cento. A cobertura mediática dada aos efeitos do tabaco na saúde, a publicidade obrigatória nos maços de tabaco e o rápido aumento dos impostos sobre a venda de cigarros, todos contribuíram para o decréscimo sustentado.35 De facto, o consumo de cigarros está a decrescer em quase todos os principais países, incluindo os mais renitentes como a França, a China e o Japão. O número de cigarros fumados por pessoa caiu 22 por cento na França desde o pico do consumo em 1984, 5 por cento na China desde 1989 e 20 por cento no Japão desde 1991.36 Após a aprovação da Framework Convention on Tobacco Control, vários países deram passos decisivos em 2004 para reduzirem o fumo de tabaco. AIrlanda impôs, a nível nacional, a proibição de fumar nos locais de trabalho, nos bares e nos restaurantes; a Índia proibiu o fumo nos locais públicos; a Noruega proibiu os cigarros nos bares e restaurantes; na Escócia passou a ser proibido fumar nos edifícios públicos. O Butão, um país dos Himalaias com 1 milhão de pessoas encurraladas entre a Índia e a China, proibiu completamente a venda de tabaco.37 Em 2005, passou a ser proibido fumar nos locais públicos no Bangladesh, nos bares e restaurantes da Nova Zelândia e em locais públicos na Itália. Nos Estados Unidos, que já têm rigorosas restrições ao consumo de tabaco, a Union Pacific Corporation deixou de contratar fumadores em sete estados como uma medida económica para reduzir os custos de saúde. A General Mills impõe uma sobretaxa de 20 dólares por mês nos prémios dos seguros de saúde dos empregados que fumam. Cada uma destas medidas ajuda o mercado a reflectir com maior fidelidade o custo do fumo de tabaco.38 A guerra contra as doenças infecciosas está a ser travada numa larga frente. A actividade de protecção da vida que é talvez mais subsidiada actualmente por fundos privados é o programa de imunização da infância. Num esforço para preencher as lacunas deste programa global, a Fundação Bill and Melinda Gates investiu 1.5 mil milhões de dólares em 2005 na protecção das as crianças face às doenças infecciosas.39


Plano B 2.0 194 Um dos melhores momentos da comunidade internacional veio da erradicação da varíola, esforço que foi levado a cabo pela OMS. Esta erradicação bem sucedida de uma temida doença, que obrigou a um plano de imunização global, não só salva milhões de vidas como poupa centenas de milhões de dólares por ano em programas de vacina da varíola e milhares de milhões de dólares em despesas de saúde. Este sucesso justifica por si só a existência das Nações Unidas.40 Da mesma forma, uma coligação internacional liderada pela OMS, que inclui o Rotary International, a UNICEF, os Centros de Controlo e Prevenção da Doença dos Estados Unidos e a Fundação Ted Turner das Nações Unidas, conduziu uma campanha mundial para erradicar a poliomielite. Desde 1988, o Rotary International contribuiu com a avultada verba de 500 milhões de dólares para este esforço. Sob o efeito da Iniciativa Global de Erradicação da Polio apoiada por esta coligação, o número de casos de poliomielite em todo o mundo diminuiu de cerca de 350.000 por ano em 1988 para apenas 800 em 2003.41 Em meados de 2003, permaneciam apenas bolsas de poliomielite na Nigéria, Níger, Egipto, Índia, Paquistão eAfeganistão, mas então, alguns dos estados do norte da Nigéria dominados pelo Islão pararam a vacinação devido a um rumor de que a vacina tornaria as pessoas estéreis ou causaria SIDA. No fim de 2004, após os rumores terem sido corrigidos, a vacinação da polio foi retomada no norte da Nigéria. No entanto, no período de paragem, a poliomielite tinha regressado a vários países, ajudada aparentemente pela peregrinação anual dos muçulmanos nigerianos a Meca. Apareceram novas infecções naArábia Saudita, Iémen, Costa do Marfim, Burkina Faso, República Centro Africana, Chade, Mali, Sudão, Indonésia e Somália.42 Estes países, que chegaram a estar livres da doença, voltam agora a debater-se para conter e erradicar um novo surto que desde Setembro de 2005 cresceu para 1.260 casos. Com dois casos recentemente confirmados na Somália, um estado falhado, existe agora o receio de que o vírus se espalhe não só neste país, onde não existe um governo com quem seja possível trabalhar, mas também a outros países, tornando extraordinariamente difícil a sua erradicação.43


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 195 Um estudo da OMS sobre os aspectos económicos relacionados com os cuidados de saúde nos países em vias de desenvolvimento, concluiu que prestar os serviços mais básicos de saúde, aqueles que podem ser prestados por centros de saúde nas aldeias, produziria enormes benefícios económicos para os países em desenvolvimento e para o mundo como um todo. Os autores calculam que prestar cuidados de saúde básicos generalizados nos países em desenvolvimento irá requerer um total de financiamentos de 27 mil milhões de dólares em 2007, que deverá crescer até 38 mil milhões de dólares em 2015, o que dá uma média anual de 33 mil milhões de dólares. Para além dos serviços básicos, estes 33 mil milhões de dólares incluem financiamentos para o Fundo Global para a Luta Contra a SIDA, Tuberculose e Malária e para a vacinação infantil obrigatória.44 Controlar a Epidemia do HIV A chave para o controlo da epidemia da SIDA, que tem prejudicado tanto o progresso social e económico em África, está na educação sobre a prevenção. Sabemos como a doença é transmitida; não é um mistério médico. Em África, onde chegou a haver um estigma associado ao simples facto de se mencionar a doença, os governos estão a começar a implementar programas eficazes de educação para a prevenção. O primeiro objectivo é reduzir rapidamente o número de novas infecções, colocando-o abaixo das mortes causadas pela doença, reduzindo assim o número de pessoas com capacidade de infectar outras. Concentrar a atenção nos grupos de uma sociedade que têm mais probabilidade de espalhar a doença é a atitude mais eficaz. Em África, os camionistas que viajam para longe, ausentando-se por períodos de tempo relativamente elevados, envolvem-se com frequência em sexo comercial, levando o HIV de um país para outro. Eles são, portanto, um grupo-alvo na luta para reduzir infecções. Os trabalhadores do sexo estão também envolvidos directamente na disseminação da doença. Na Índia, por exemplo, os dois milhões de trabalhadoras do sexo do país têm uma média de dois encontros por


Plano B 2.0 196 dia, o que as transforma num grupo chave para a educação sobre os riscos do HIV e o valor imprescindível do uso do preservativo para salvar vidas.45 Outro grupo-alvo é o dos militares. Depois de infectados, normalmente, por se envolverem em sexo comercial, eles regressam às suas comunidades de origem espalhando aí o vírus. Na Nigéria, onde a taxa de infecção de adultos pelo HIV é de 5 por cento, o Presidente Olusegun Obasanjo instituiu a distribuição gratuita de preservativos a todo o pessoal militar. Um quarto grupo-alvo, os consumidores de drogas intravenosas que partilham seringas, assume grande importância na disseminação do vírus nas antigas repúblicas soviéticas.46 Lidar com o HIV ao nível mais básico requer cerca de 10 mil milhões de preservativos por ano para o mundo em vias de desenvolvimento e a Europa de Leste. Para efeitos de contracepção são necessários mais 2 mil milhões. Mas se são necessários 12 mil milhões de contraceptivos, apenas 2,5 mil milhões estão a ser distribuídos, o que se traduz na falta de 9,5 mil milhões. Ao preço de apenas 3 centavos de dólar por unidade, ou 258 milhões de dólares, o custo das vidas salvas pelo fornecimento de preservativos é minúsculo.47 A lacuna na distribuição de preservativos é enorme, mas os custos para acabar com ela são pequenos. No excelente estudo Condom Count: Meeting the Need in the Era of HIV/AIDS, a organização Population Action International refere que “os custos de colocar preservativos nas mãos dos utilizadores – que envolvem a melhoria do acesso, a logística e capacidade de distribuição, o aumento da divulgação e a promoção do uso – multiplicam por muitas vezes os custos do produto em si”. Se assumirmos que estes custos são seis vezes mais altos que o dos preservativos propriamente ditos, colmatar esta lacuna custará, mesmo assim, só 2 mil milhões de dólares.48 Infelizmente, embora os preservativos sejam a única tecnologia disponível para prevenir a disseminação do HIV, o governo dos Estados Unidos está a menosprezar o seu uso, insistindo em dar uma grande prioridade à abstinência. Mesmo que seja importante encorajar a abstinência, uma campanha eficaz para debelar a epidemia do HIV não pode funcionar sem os preservativos.49


197 Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População Um dos poucos países africanos que baixou com sucesso a taxa de infecção pelo HIV depois da epidemia se ter estabelecido é o Uganda. Sob a forte liderança pessoal do PresidenteYoweri Museveni, a percentagem de adultos infectados caiu de um máximo de 13 por cento no início dos anos 1990 para 4 por cento em 2003. Mais recentemente, a Zâmbia também parece estar a fazer progressos na redução das taxas de infecção entre jovens como resultado de uma campanha nacional concertada levada a cabo por grupos religiosos. O Senegal, que agiu a tempo e de forma decisiva para controlar a disseminação do vírus, tem hoje uma taxa de infecção entre adultos de menos de 1 por cento. É um modelo para outros países africanos.50 Os recursos financeiros e pessoal médico actualmente disponíveis para o tratamento de pessoas que são já HIV-positivas são muitíssimo limitados atendendo às necessidades. Por exemplo, dos 4,7 milhões de pessoas com sintomas de SIDA na África subsariana em Junho de 2005, apenas 500.000 estavam a receber o tratamento com anti-retrovirais que é comum nos países industrializados. No entanto, este número é o triplo do ano anterior. O aumento resulta de um esforço mundial levado a cabo pela Organização Mundial de Saúde para chegar a 3 milhões de pessoas em países de baixo e médio rendimento até ao final de 2005, conhecido por Iniciativa 3 por 5.51 Há uma evidência crescente de que a perspectiva de tratamento encoraja as pessoas a fazerem o teste do HIV. Também aumenta a divulgação e compreensão da doença e de como é transmitida. E se as pessoas souberem que estão infectadas, podem tentar evitar infectar outras. Uma vez que o tratamento prolonga a vida, e o prolongamento médio nos Estados Unidos é cerca de 15 anos, ele não só é um acto humanitário como faz todo o sentido do ponto de vista económico. Uma vez que a sociedade investe nos cuidados de infância, na educação e na formação no local de trabalho do indivíduo, o valor de prolongar o tempo de vida torna-se grande.52 O tratamento das pessoas infectadas com o HIV é caro, mas ignorar a necessidade do tratamento é um erro estratégico simples-


Plano B 2.0 198 mente porque o tratamento fortalece os esforços de prevenção. A África está a pagar um alto preço pela resposta tardia à epidemia. Noutros países, como a Índia e a China, poderá vir a acontecer o mesmo, se não forem tomadas medidas urgentes para conter o vírus que já claramente instalado no interior das suas fronteiras.53

Reduzindo os Subsídios e as Dívidas da Agricultura Erradicar a pobreza requer muito mais que os programas de ajuda internacional. Para muitos países em vias de desenvolvimento,os subsídios à agricultura nos países prestadores de ajuda e o alívio das dívidas podem ser mesmo mais importantes. Um sector agrícola voltado para a exportação – tirando partido dos baixos custos de mão de obra e das riquezas naturais da terra, água e clima para potenciar as receitas da agricultura e a entrada de divisas estrangeiras – é muitas vezes um bom caminho para fugir à pobreza. Infelizmente, para muitos países em desenvolvimento este caminho está bloqueado pelos apoios à agricultura nos países ricos. Ao todo, os subsídios à agrícolas nos países ricos, perto dos 279 mil milhões de dólares, correspondem a cerca de quatro vezes os fluxos de assistência financeira que vêm destes países.54 O valor do orçamento para a agricultura na União Europeia (UE) é enorme, correspondendo a mais de metade do orçamento total anual. Em termos internacionais, também parece grande. Como salienta o Financial Times, o subsídio monetário a uma vaca leiteira na UE excede o valor da assistência ao desenvolvimento por pessoa prestada pela União Europeia na África subsariana.55 Em 2004, a UE a 25 gastou 133 mil milhões de dólares do total de 279 mil milhões de dólares gastos nos países ricos em subsídios à agricultura. Os Estados Unidos gastaram 46 mil milhões de dólares. Estes factos encorajam a produção excessiva de bens agrícolas, que são depois enviados para o estrangeiro com o apoio de mais subsídios à exportação. O resultado disto são preços mundiais de mercado depreciados, particularmente no açúcar e algodão, os dois bens em que os países em vias de desenvolvimento têm mais a perder.56


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 199 Embora a União Europeia seja responsável por mais de metade dos 78 mil milhões de dólares da assistência ao desenvolvimento prestada pela totalidade dos países, a maior parte dos ganhos relacionados com esta assistência no passado foi anulada pelo despejo de 6 milhões de toneladas de açúcar no mercado mundial. Este é um bem agrícola em que os países em desenvolvimento têm uma forte vantagem competitiva e devia ser-lhes permitido lucrar com isso. Felizmente, em 2005 a UE anunciou que iria reduzir os apoios ao preço do açúcar no produtor em cerca de 40 por cento, desencorajando assim o excesso de produção que, ao ser exportado, depreciou o preço no mercado mundial. O mundo rico não pode continuar com políticas que encurralam permanentemente na pobreza milhões de pessoas, cortando-lhes a principal via de fuga.57 A ajuda na subida dos preços mundiais do açúcar pode surgir de um lado inesperado. Embora seja demasiado cedo para ter a certeza, a subida dos preços do petróleo pode fazer subir os preços do açúcar à medida que são construídas cada vez mais refinarias de etanol produzido a partir da cana-de-açúcar. De facto, o preço do açúcar pode seguir a subida do preço do petróleo, dando um forte impulso às economias dos países em desenvolvimento onde quase toda a canade-açúcar do mundo é produzida.58 Desenvolvimentos recentes podem também fazer subir os preços mundiais do algodão. Embora o governo dos Estados Unidos não aplique subsídios explícitos à exportação, os subsídios à produção dados aos agricultores permite-lhes exportarem o algodão a preços baixos. Os subsídios a tão só 25.000 produtores de algodão excederam a ajuda financeira dada pelos Estados Unidos a todos os 750 milhões de pessoas da África subsariana. E uma vez que os Estados Unidos são o maior exportador mundial de algodão, os seus subsídios depreciam os preços de todos os países exportadores de algodão.59 Os subsídios dos Estados Unidos ao algodão tiveram de fazer face ao desafio determinado de quatro países produtores de algodão da África Central: o Benin, o Burkina Faso, o Chade e o Mali. Além disso, o Brasil desafiou com sucesso a política de subsídios ao algodão dos Estados Unidos no âmbito da Organização Mundial do Co-


Plano B 2.0 200 mércio (OMC). Para defender o seu ponto de vista, o governo brasileiro contratou um reconhecido economista de agricultura americano. Usando informação do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o Brasil convenceu o painel da OMC de que os subsídios dados ao algodão pelos Estados Unidos estavam a depreciar os preços a nível mundial e a prejudicar os seus produtores de algodão. Em resposta, o painel determinou que os Estados Unidos tinham que eliminar os subsídios.60 Para além de eliminar subsídios agrícolas prejudiciais, o perdão da dívida é outro componente essencial do esforço mais vasto para erradicar a pobreza. Por exemplo, com a África subsariana a gastar quatro vezes mais com o serviço da dívida do que gasta com a saúde, o perdão da dívida pode contribuir para aumentar o nível de vida neste último grande reduto da pobreza.61

Em Julho de 2005, os líderes dos países industrializados do G-8, em reunião em Gleneagles, Escócia, concordaram em cancelar a dívida multilateral de alguns dos países mais pobres ao Banco Mundial, ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco de Desenvolvimento Africano. Esta iniciativa, que afecta imediatamente 18 dos países mais pobres e afogados em dívidas (14 em África e 4 naAmérica Latina), dá-lhes um novo alento. Mais cerca de 20 destes países muito pobres poderão beneficiar desta iniciativa se conseguirem preencher os requisitos necessários.Acombinação entre a pressão pública de grupos não-governamentais que têm feito nos últimos anos uma campanha pelo perdão da dívida e a forte liderança do governo do Reino Unido foi a chave para este sucesso na luta pela redução da pobreza.62 Embora este tenha sido um passo de gigante na direcção certa, apenas eliminou uma parte menor da dívida total dos países mais pobres às instituições de crédito internacionais. Para além dos 18 países que conseguiram o perdão da dívida até agora, há pelo menos mais 40 países com rendimentos per capita baixos que necessitam desesperadamente de ajuda. Os grupos que fazem lobby a favor do per-


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 201 dão da dívida, como a Oxfam International, acreditam que é desumano obrigar aqueles que têm rendimentos que mal chegam a um dólar por dia a usarem uma parte desse dólar para pagarem a dívida. Estão por isso empenhados para manter a pressão até que a dívida destes países pobres seja cancelada.63

Um Orçamento para a Erradicação da Pobreza Muitos países que tiveram um rápido crescimento populacional ao longo de várias décadas estão a mostrar sinais de fadiga demográfica. Países que se debatem com o desafio simultâneo de educar um número crescente de crianças, de criar empregos para um número cada vez maior de jovens à procura de emprego e de lidar com os efeitos ambientais do crescimento populacional estão a ser postos à prova até ao limite. Quando uma nova grande ameaça surge – como a epidemia do HIV – os governos muitas vezes não conseguem aguentar. Problemas que são geridos de forma rotineira nas sociedades industrializadas estão a transformar-se em crises humanitárias de grande escala nos países em vias de desenvolvimento. O aumento das mortes em muitos países africanos marca um novo desenvolvimento trágico na demografia mundial. Na ausência de um esforço concertado entre os governos nacionais e a comunidade internacional no sentido de acelerar a mudança para um padrão de famílias mais pequenas, os acontecimentos em muitos países podem ficar fora de controlo, conduzindo a mais mortes e espalhando a instabilidade política e o declínio económico. Há uma alternativa a esta perspectiva sem esperança, e essa é ajudar os países que querem abrandar o crescimento populacional a fazê-lo rapidamente. Isto terá como consequência o que os economistas chamam de bónus demográfico. Quando os países mudam rapidamente para famílias mais pequenas, o crescimento do número de dependentes jovens – que necessitam de cuidados e de educação


Plano B 2.0 202 – diminui em relação aos adultos que trabalham. Nesta situação, a produtividade aumenta, as poupanças e o investimento sobem e o crescimento económico acelera-se.64 O Japão, que reduziu para metade o seu crescimento populacional entre 1951 e 1958, foi um dos primeiros países a beneficiar do bónus demográfico. A Coreia do Sul e a Formosa seguiram-se e, mais recentemente, a China, a Tailândia, o Viet Nam e o Shri Lanka beneficiaram também dos efeitos das recentes reduções drásticas nas respectivas taxas de natalidade. Este efeito apenas dura algumas décadas, mas normalmente é o suficiente para lançar o país na era moderna.65 Os passos necessários para erradicar a pobreza e acelerar a mudança para famílias mais pequenas são claros. Eles incluem o colmatar de várias lacunas no financiamento, como as necessárias para se conseguir a educação primária para todos, para combater as doenças infecciosas, como a SIDA, a tuberculose e a malária, para garantir serviços de saúde reprodutiva e para conter a epidemia do HIV. No seu conjunto, as iniciativas apontadas neste capítulo têm um custo estimado de 68 mil milhõesd de dólares por ano. (Ver Quadro 7-1).66

Os investimentos mais pesados neste esforço concentram-se na educação e saúde, que são as pedras de toque tanto do desenvolvimento do capital humano como da estabilização da população. A educação abrange tanto a educação primária generalizada como uma campanha global para acabar com o analfabetismo de adultos. Os serviços de saúde abrangem as intervenções básicas de controlo das doenças infecciosas, começando pela vacinação das crianças.Aadopção do programa básico de saúde mencionado no Relatório da Comissão sobre Macroeconomia e Saúde, apresentado à Organização Mundial de Saúde em 2001, salvaria cerca de 8 milhões de vidas por ano até 2010. Estas são as chaves para quebrar a armadilha da pobreza.67


Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 203 Quadro 7-1. Financiamento Anual Adicional Necessário para Atingir Metas Sociais Básicas

Meta

Financiamento (mil milhões de dólares)

Educação primária generalizada

12

Erradicação do analfabetismo em adultos

4

Programas de almoço escolar para os 44 países mais pobres

6

Assistência a crianças em idade pré-escolar e mulheres grávidas nos 44 países mais pobres

4

Planeamento de saúde reprodutiva e familiar

7

Cuidados básicos e universais de saúde

33

Colmatar a lacuna dos preservativos

2

Total

68

Fonte: Ver nota final 66.

Como Jeffrey Sachs nos recorda regularmente, pela primeira vez na história temos as tecnologias e os recursos financeiros necessários para erradicar a pobreza. Como referido atrás, nos últimos 15 anos houve ganhos impressionantes. Por exemplo, a China não só reduziu drasticamente o número de pessoas a viver em pobreza no interior das suas fronteiras mas, com as suas iniciativas de comércio e investimento, está a ajudar países mais pobres a desenvolverem-se.AChina está a investir quantias substanciais em África, investimentos muitas vezes relacionados com a ajuda ao desenvolvimento dos enormes recursos minerais e energéticos deste continente, algo de que a China necessita.68


Plano B 2.0 204 Ajudar os países de baixo rendimento a quebrar a armadilha demográfica é um investimento altamente rentável para as nações ricas do mundo. Investimentos dos países industrializados em educação, saúde e almoços escolares são, em certo sentido, uma resposta humanitária à difícil situação dos países mais pobres do mundo. Mas mais do que isso, são investimentos que moldarão o mundo em que os nossos filhos viverão.


8 Restaurando a Terra

A saúde de uma economia não pode estar separada da saúde dos seus sistemas de suporte. Mais de metade da população mundial depende directamente das terras de cultivo, das terras de pastagem, das florestas e dos bancos de pesca como subsistência. Muitas outras pessoas dependem das indústrias de produtos florestais, das indústrias do couro, das indústrias de têxteis de algodão e lã e da indústria de produção alimentar, como fontes de emprego.1 Uma estratégia para erradicar a pobreza não terá sucesso se os sistemas de suporte ambiental de uma economia estiverem em colapso. Se as terras de cultivo estiverem desgastadas pela erosão e as colheitas a diminuir, se os níveis dos lençóis freáticos estiverem a descer e os poços de água a secar, se as terras de pastagem se estiverem a transformar em desertos e o gado estiver a morrer, se os bancos de pesca estiverem a entrar em colapso, se as florestas estiverem a encolher e se as temperaturas a subir estiverem a queimar as colheitas, um programa de erradicação da pobreza – independentemente do cuidado com que seja preparado e da forma como seja implementado – não terá sucesso.


Plano B 2.0 206 No Capítulo 5 analisámos a desflorestação, a erosão do solo e a enorme devastação do ambiente rural do Haiti. Depois de olhar para a situação desesperada do Haiti, Craig Cox, Director da U.S.-based Soil and Water Conservation Society, escreveu: “eu fui recentemente alertado para o facto dos benefícios da conservação dos recursos – ao seu nível mais básico – estarem ainda fora do alcance de muitos. Os colapsos ecológicos e sociais reforçaram-se mutuamente numa espiral descendente em direcção à pobreza, à degradação ambiental, à injustiça social, à doença e à violência”. Infelizmente, a situação que Cox descreve já não é uma raridade. Mostra o que está para vir num número cada vez maior de países se nós não lançarmos uma iniciativa de restauração da Terra.2 Restaurar a Terra obrigará a um enorme esforço internacional, maior e mais exigente do que o muitas vezes citado Plano Marshall, que ajudou a reconstruir a Europa e o Japão, desfeitos pela guerra. E uma tal iniciativa terá de ser executada à velocidade de tempo de guerra se não quisermos que a deterioração ambiental se traduza em declínio económico, tal como aconteceu nas civilizações antigas que violaram os limites da natureza e ignoraram os seus prazos.

Protegendo e Restaurando as Florestas Proteger os 3,9 mil milhões de hectares de floresta que restam e replantar os que se perderam, são dois passos necessários para restaurar a saúde da Terra e uma base importante para a nova economia. A redução do aumento da queda de chuva e das consequentes cheias e erosão dos solos, a reciclagem da queda de chuva para as terras do interior, e a restauração das recargas dos aquíferos dependem simultaneamente da diminuição da pressão sobre as florestas e da reflorestação.3 Há um potencial enorme por realizar em todos os países de diminuição da pressão da procura que está a fazer encolher a cobertura florestal da Terra. Nas nações industrializadas, a maior oportunidade está na redução da quantidade de madeira usada para fabricar papel; nos países em vias de desenvolvimento depende da redução do seu uso para combustível.


Restaurando a Terra 207 As taxas de reciclagem de papel nos 10 principais países produtores variam muito, desde a China e a Itália, reciclando uma menor quantidade, de 27 e 31 por cento do papel usado, à Alemanha e Coreia do Sul, que reciclam muito mais, cerca de 72 e 66 por cento. A taxa de reciclagem na Alemanha é alta porque o governo tem enfatizado de forma consistente a reciclagem do papel como forma de reduzir o fluxo para os aterros. Se todos os países reciclassem tanto papel como a Alemanha, a quantidade de pasta de papel usada em todo o mundo diminuiria cerca de um terço.4 Os Estados Unidos, os maiores consumidores mundiais de papel, estão muito atrás daAlemanha mas estão a fazer alguns progressos. Há vinte anos, cerca de um quarto do papel usado nos Estados Unidos era reciclado. Em 2003, o número atingiu os 48 por cento.5 O uso de papel, talvez mais do que qualquer outro produto isolado, reflecte a mentalidade de usar e deitar fora que evoluiu ao longo do século passado. Há uma enorme possibilidade de reduzir o consumo de papel simplesmente substituindo os toalhetes de papel, guardanapos de papel, fraldas descartáveis e sacos de compras de papel por alternativas de tecido reciclado. O objectivo para que as árvores são mais procuradas – para satisfazer necessidades de combustível – é responsável por mais de metade de toda a madeira retirada das florestas. Algumas agências internacionais de ajuda, como a Agency for International Development (AID), dos Estados Unidos, começaram a patrocinar projectos de eficiência no uso da madeira como combustível. Um dos projectos nacionais daAID mais promissores é a distribuição no Quénia de 780.000 novos fornos de cozinha a madeira altamente eficientes. Investir recursos públicos na substituição de velhos fornos ineficientes pode dar óptimos dividendos no que respeita à protecção e regeneração da floresta, como a restauração dos serviços florestais.6 A longo prazo, desenvolver combustíveis alternativos para uso culinário é a chave para reduzir a pressão sobre a floresta nos países


Plano B 2.0 208 em desenvolvimento. À medida que o mundo for mudando de uma economia baseada nos combustíveis fósseis para uma economia baseada na energia eólica, solar e geotérmica, será muito mais fácil para os países em desenvolvimento sem combustíveis fósseis desenvolverem fontes indígenas de energia renovável. Substituir a lenha por fornos solares, com discos eléctricos alimentados a electricidade gerada pelo vento, ou com outra fonte de energia, aliviará o peso sobre as florestas. É também no Quénia que corre um projecto de fornos solares patrocinado pela Solar Cookers International. Estes fornos baratos feitos de cartão e folha de alumínio, com um preço de 10 dólares cada, cozinham lentamente, muito à maneira de uma panela eléctrica de cozinha lenta. Requerendo três horas de sol para cozinhar uma refeição completa, eles podem reduzir muito o uso da lenha e a um baixo custo. Também podem ser usados para pasteurizar a água, ajudando assim a salvar vidas.7

As definições anteriores da actividade florestal sustentável concentravam-se apenas na produção sustentada dos produtos florestais, mas agora incluem serviços florestais de sustentação como o controlo de inundações. Apesar do grande valor para a sociedade das florestas intactas, apenas 290 milhões de hectares da área florestal global são protegidos legalmente em relação ao corte de árvores. Outros 1,4 mil milhões de hectares não estão economicamente disponíveis para corte devido à inacessibilidade geográfica ou ao baixo valor económico da madeira. Da restante área disponível para exploração, 665 milhões de hectares estão ainda imunes à acção do homem e quase 900 milhões de hectares são semi-naturais e não estão integrados em plantações.8 As florestas protegidas por leis nacionais são salvaguardadas não tanto para preservar o fornecimento de madeira a longo prazo mas mais para garantir que a floresta possa continuar a fornecer serviços. Os países que protegem legalmente as florestas fazem-no muitas vezes depois de terem sofrido as consequências da desflorestação ge-


Restaurando a Terra 209 neralizada. As Filipinas, por exemplo, proibiram o corte de madeira em todas as florestas de árvores de grande porte e virgens que ainda possuem principalmente porque o país se tornou muito vulnerável às inundações, à erosão e aos deslizamentos de terra.As Filipinas foram em tempos cobertas por ricas florestas tropicais de madeira rija, mas após muitos anos de devastação, perderam tanto os produtos da floresta como os serviços prestados por ela, tornando-se um importador líquido de produtos florestais.9 Reed Funk, professor de biologia das plantas na Rutgers University, acredita que as vastas áreas de terra desflorestada podem ser usadas para plantar biliões de árvores geneticamente melhoradas para alimento, especialmente frutos oleoginosos, também para combustível. Funk vê nos frutos oleoginosos um complemento da carne, como fonte de proteínas de alta qualidade nas dietas dos países em desenvolvimento. E vê ainda a possibilidade de plantar árvores nesta terra desflorestada, em grande parte abandonada, para serem aproveitadas na conversão em etanol para combustível automóvel.10 Embora as organizações não-governamentais (ONGs) tenham trabalhado durante anos para impedir que as florestas sejam devastadas, o Banco Mundial só recentemente começou a preocupar-se de forma consistente com a sustentabilidade da floresta. Em 1998, o banco juntou forças com o World Wide Fund for Nature para formar a Alliance for Forest Conservation and Sustainable Use; em 2005 ajudaram a identificar 50 milhões de hectares de áreas protegidas de nova floresta e a certificar 22 milhões de hectares de floresta. Em meados de 2005, a Alliance anunciou o objectivo de reduzir para zero as taxas de desflorestação global até 2010.11 Há vários programas de certificação de produtos da floresta que ligam os consumidores com preocupações ambientais à gestão sustentável da floresta onde têm origem esses produtos. Alguns programas têm um âmbito nacional enquanto outros são internacionais; alguns têm origem em países importadores e outros em países exportadores.


Plano B 2.0 210 O programa internacional mais rigoroso, certificado por um grupo de ONGs, é o Forest Stewardship Council (FSC). Cerca de 57 milhões de hectares de florestas em 65 países são certificados por corpos acreditados do FSC como sendo geridos com responsabilidade. Entre os líderes em área de floresta certificada estão a Suécia, com 10 milhões de hectares, a Polónia, com 6 milhões de hectares, os Estados Unidos, com quase 5 milhões de hectares, e o Brasil e a África do Sul, com 3 milhões e 2 milhões de hectares respectivamente.12 As plantações de floresta podem reduzir a pressão que existe sobre as florestas que restam na Terra desde que o seu objectivo não seja substituir as florestas de árvores maduras. Em 2000, o mundo tinha 187 milhões de hectares de florestas plantadas, uma área de menos de 5 por cento do total de 3,9 mil milhões de hectares de floresta e cerca de um quarto dos 700 milhões de hectares semeados com cereais.As plantações de árvores produzem fundamentalmente madeira para fábricas de papel ou de reconstituição de madeira. À medida que a indústria se adapta à diminuição do fornecimento de grandes troncos das florestas naturais, cada vez mais a madeira reconstituída substitui a madeira natural no mercado mundial.13 A produção de troncos de madeira em plantações é estimada em 414 milhões de metros cúbicos por ano, representando 12 por cento da produção mundial de madeira. Isto quer dizer que a parte de leão, cerca de 88 por cento do corte mundial para a construção, vem das florestas naturais.14 Cinco países são responsáveis por dois terços das plantações de árvores. AChina, onde resta pouco da floresta original, é o maior, seguida da Rússia e dos Estados Unidos. A Índia e o Japão são quarto e quinto. O Brasil está mais atrás, mas está a expandir-se rapidamente. À medida que cresce, a agricultura florestal desloca-se geograficamente para a humidade dos trópicos.Ao contrário das produções de cereais, que aumentam com a distância em relação ao equador e com os dias de Verão maiores, asplantações de árvores aumentam com a proximidade do Equador e com as consequentes condições de crescimento ao longo de todo o ano.15


Restaurando a Terra 211 No leste do Canadá, a produção média de um hectare de floresta é de 4 metros cúbicos por ano. No sudeste dos Estados Unidos, onde se concentram as plantações americanas, a produção é de 10 metros cúbicos. Mas na Indonésia, é de 25 metros cúbicos; e no Brasil, as plantações mais recentes podem estar perto dos 30 metros cúbicos. Enquanto que as produções de milho nos Estados Unidos são o triplo das do Brasil, as produções de madeira para a construção são o inverso, favorecendo o Brasil numa relação de 3 para 1. Para satisfazer uma determinada procura de madeira, o Brasil apenas requer um terço da terra que é usada pelos Estados Unidos, o que ajuda a explicar porque é que o crescimento da capacidade de produção de polpa se concentra nas regiões equatoriais.16 As projecções de crescimento futuro mostram que as plantações estão limitadas pela escassez de terra. Elas podem por vezes ser feitas de forma rentável em terras já desflorestadas, muitas vezes degradadas, mas o mais natural é que surjam à custa das florestas existentes. Há também uma competição com a agricultura, uma vez que a terra que é boa para semear também é boa para as árvores crescerem. Aescassez de água é ainda outra limitação. O crescimento rápido das plantações requer grande humidade. No entanto, a FAO (Food and Agriculture Organization), organização da ONU, prevê que à medida que a área de plantações cresça e as produções aumentem, o corte de árvores possa vir a ser mais do dobro ao longo das próximas três décadas. É perfeitamente concebível que um dia as plantações florestais possam satisfazer a maior parte da procura mundial de madeira industrial, ajudando assim a proteger as florestas que restam no mundo.17 Historicamente, uma parte da terra agrícola em situação de grande erosão nos países industrializados foi reflorestada pelo crescimento espontâneo. Por exemplo, a Nova Inglaterra, uma região geograficamente bravia dos Estados Unidos, começou a ser reflorestada há um século. Ocupada inicialmente pelos europeus, esta região sofria com a perda de produtividade das terras de cultivo porque os solos eram finos e a terra era rochosa, com declives e vulnerável à erosão.


Plano B 2.0 212 Com o início da actividade nas terras agrícolas de grande produtividade do Midwest e das Grandes Planícies ao longo do século dezanove, a pressão sobre a terra agrícola da Nova Inglaterra diminuiu, permitindo que a terra de cultivo voltasse a ser floresta. A cobertura de floresta da Nova Inglaterra aumentou de, apenas, cerca de um terço há dois séculos para, talvez, três quartos hoje, retomando lentamente a sua saúde e diversidade original.18 Uma situação algo similar existe hoje em partes da antiga União Soviética e em muitos países do leste europeu. Quando o planeamento central foi substituído pela agricultura baseada no mercado, no início da década de 1990, os agricultores das terras marginais foram forçados a procurar formas de sustento noutros lados. É difícil adiantar números precisos, mas há milhões de hectares de terrenos agrícolas que estão agora a voltar a ser floresta.19 A Coreia do Sul é, de muitas maneiras, um modelo de reflorestação para o resto do mundo. Quando a Guerra da Coreia acabou, há meio século atrás, o país de montanhas estava em grande medida desflorestado. Com início por volta de 1960, sob a liderança dedicada do Presidente Park Chung Hee, o governo sul coreano deu início a um esforço de reflorestação nacional. Com base na criação de cooperativas de aldeias, centenas de milhar de pessoas foram mobilizadas para cavar trincheiras e criar terraços para suportar as árvores nas montanhas estéreis.ACoreia do Sul não só recuperou áreas desnudadas, como também apoiou o esforço para criar florestas de madeira para combustível. Se-Kyung Chong, investigador no Instituto de Investigação da Floresta da Coreia, escreve, “O resultado foi o ressurgimento quase miraculoso das florestas nos terrenos estéreis”.20 Hoje as florestas cobrem 65 por cento do país, numa área de cerca de 8 milhões de hectares. Quando viajava ao longo da Coreia do Sul em Novembro de 2000, foi para mim gratificante ver o conjunto luxuriante de árvores nas montanhas que há uma geração atrás eram estéreis. Podemos reflorestar a Terra!21 Na Turquia, um país montanhoso desflorestado em grande escala ao longo de milénios, um reconhecido grupo ambientalista, TEMA (Türkiye Erozyona Mücadele,Agaclandirma), fez da reflorestação a


Restaurando a Terra 213 sua principal actividade. Fundado por dois proeminentes homens de negócios turcos, Hayrettin Karuca e Nihat Gokyigit, o TEMA lançou em 1998 uma campanha de 10 mil milhões de bolotas para restaurar a cobertura de árvores e reduzir a erosão do solo. De então para cá, foram semeadas 850 milhões de bolotas de carvalho. Este programa está também a chamar à atenção do país para os serviços que as florestas oferecem.22 A China está empenhada no seu próprio esforço de reflorestação. Para além da plantação de árvores para controlo das cheias nos níveis mais elevados da bacia do rio Yangtze recentemente desflorestados, a China está a plantar uma cintura de árvores para proteger a terra da expansão do deserto de Gobi. Esta muralha verde, uma versão moderna da Grande Muralha, deverá ter um comprimento de 4.480 quilómetros (2.800 milhas), estendendo-se desde os arredores de Pequim até ao interior da Mongólia. Espera-se que este ambicioso plano de longo prazo leve 70 anos a completar e custe 8 mil milhões de dólares.23 Redireccionar os subsídios à construção de estradas de acesso aos locais de abate para a plantação de árvores ajudaria a proteger a cobertura de floresta de todo o mundo. O Banco Mundial tem a capacidade administrativa para dirigir um programa internacional que siga o exemplo bem sucedido da Coreia do Sul na cobertura de montes e montanhas com árvores. Além disso, a FAO e as agências de ajuda bilateral podem trabalhar com os agricultores individuais em programas agro-florestais nacionais para integrar árvores onde possível nas operações agrícolas. Árvores bem escolhidas, bem colocadas, oferecem sombra, servem como barreiras ao vento controlando a erosão do solo, e podem fixar o nitrogénio, reduzindo a necessidade de fertilizantes. Reduzir o uso de madeira desenvolvendo fornos a lenha mais eficientes e meios alternativos de cozinhar, reciclar o papel de forma sistemática, e acabar com o uso de produtos descartáveis de papel, tudo isto diminui a pressão sobre as florestas da Terra. Um esforço global de reflorestação não pode ter sucesso a não ser que seja acompanhado pela estabilização da população. Com um plano integrado deste tipo, coordenado país a país, as florestas do planeta podem ser restauradas.


214 Conservando e Reconstruindo os Solos

Plano B 2.0

Ao rever literatura sobre a erosão do solo, encontramos constantes referências à “perda de vegetação de protecção”. No último meio século, removemos tanta dessa cobertura de protecção, cortando árvores indiscriminadamente, usando pastagens em excesso e cultivando intensivamente a terra, que o solo acumulado ao longo de grandes períodos de tempo geológico está a desaparecer rapidamente. Eliminar estes excessos e o consequente declínio da produtividade biológica da Terra depende de um esforço mundial para restaurar a sua cobertura vegetal, esforço que está já em marcha nalguns países. A Nuvem de Pó (“Dust Bowl”) da década de 1930, que ameaçou transformar as Grandes Planícies dos Estados Unidos num vasto deserto, foi uma experiência traumática que conduziu a mudanças revolucionárias nas práticas agrícolas americanas, como a construção de cinturas de abrigo com árvores – filas de árvores plantadas ao lado dos campos para protecção do vento, reduzindo a erosão – e a cultura em faixas alternadas (trigo semeado em faixas de terra que alternam anualmente com faixas em pousio). Esta cultura em faixas alternadas facilita a acumulação de humidade nas faixas em pousio, enquanto que as faixas semeadas fazem reduzir a velocidade do vento reduzindo desse modo a erosão da terra em repouso.24 Em 1985, o Congresso norte-americano, com o forte apoio da comunidade ambientalista, criou o Conservation Reserve Program (CRP) para reduzir a erosão dos solos e controlar a produção excessiva de bens alimentares básicos. Em 1990 havia cerca de 14 milhões de hectares de terra altamente erosiva com uma cobertura vegetal permanente, ao abrigo de contratos de 10 anos. Com este programa, os agricultores eram pagos para plantarem erva ou árvores nos terrenos de cultivo mais frágeis. A colocação de 14 milhões de hectares sob os auspícios do CRP, juntamente com o uso de práticas de conservação em 37 por cento das terras de cultivo, reduziu a erosão do solo de 3,1 mil milhões de toneladas para 1,9 mil milhões de toneladas durante os 15 anos entre 1982 e 1997. A abordagem dos Estados Unidos ao controlo da erosão do solo, tanto através da conver-


Restaurando a Terra 215 são de terras de cultivo altamente erosivas ao seu estatuto anterior de prados verdes ou de terrenos arborizados como da adopção de práticas de conservação do solo, é um modelo para o resto do mundo.25 A conversão de terrenos de cultivo para usos não agrícolas escapa muitas vezes ao controlo dos agricultores, mas as perdas de solo e de terra desgastada devido à erosão severa não. Fazer com que as perdas de solo causadas pela erosão do vento e da água sejam menores que os ganhos de novo solo formado por processos naturais, é algo que vai requerer um enorme esforço mundial. Para preservar a produtividade biológica de terras de cultivo altamente erosivas há que plantar nelas erva ou árvores antes que se transformem em terra abandonada. O primeiro passo para interromper o declínio da fertilidade inerente da terra é recuar nesta margem em rápida deterioração.26 A construção de terraços, um método testado pelo tempo para lidar com a erosão causada pela água, é comum nos campos de arroz das regiões montanhosas de África. Em terrenos com menor declive, a agricultura em faixas em torno das encostas, como se encontra no Midwest dos Estados Unidos, funciona bem.27 Outra ferramenta – relativamente nova – da caixa de ferramentas da conservação do solo é a lavra de conservação, que consiste em não lavrar o solo ou lavrá-lo minimamente. Para além de reduzir a erosão do vento e da água, esta prática ajuda a reter a água, aumenta o conteúdo de carbono no solo e reduz a energia necessária para o cultivo. Em vez das práticas tradicionais de lavrar a terra, revolvendo-a com o arado de aiveca ou de discos para preparar a cama das sementes, e depois usando uma cultivadora mecânica para controlar as ervas daninhas no terreno, os agricultores limitam-se a enterrar directamente as sementes por entre os resíduos das colheitas no solo não lavrado, controlando as ervas daninhas com herbicidas.Aúnica perturbação é o ligeiro golpe na superfície onde as sementes são inseridas, ficando o restante solo sem ser alterado, coberto por resíduos da colheita e sendo assim resistente à erosão tanto da água como do vento.28


Plano B 2.0 216 Nos Estados Unidos, onde, na década de 1990, se pediu aos agricultores para implementarem um plano de conservação do solo nas terras de cultivo erosivas, elegível para apoios aos preços dos bens essenciais, a área de solo de sementeira directa passou de 7 milhões de hectares em 1990 para 25 milhões de hectares em 2004. Usada agora de modo generalizado nos Estados Unidos na produção do milho e da soja, esta prática espalhou-se rapidamente no hemisfério ocidental, cobrindo 24 milhões de hectares em 2004 no Brasil, 18 milhões de hectares na Argentina e 13 milhões de hectares no Canadá. AAustrália está próxima dos cinco principais países, com 9 milhões de hectares.29 Uma vez que os agricultores dominem a técnica da sementeira directa, o seu uso pode espalhar-se rapidamente, especialmente se os governos derem incentivos económicos ou exigirem planos de conservação dos solos agrícolas aos agricultores que se queiram candidatar aos subsídios de colheitas. Relatórios recentes da FAO descrevem o início do crescimento desta prática agrícola, nos últimos anos, na Europa, África e Ásia.30 AArgélia, tentando parar o avanço a norte do deserto do Sahara, anunciou em Dezembro de 2000 que está a concentrar os seus pomares e vinhas na parte sul do país, na esperança de que estas plantas perenes consigam parar a desertificação das suas terras de cultivo. Em Julho de 2005, o governo marroquino, respondendo à seca severa, anunciou que iria destinar 778 milhões de dólares para cancelar dívidas dos agricultores e converter as áreas semeadas de cereais em olivais e pomares menos vulneráveis.31 Há também preocupações idênticas com a expansão do Sahara no limite sul do deserto. O Presidente Olusegun Obasanjo, da Nigéria, propôs plantar uma Grande Muralha Verde de árvores, uma banda de cerca de cinco quilómetros de largura prolongando-se por 7.000 quilómetros através da África, num esforço para parar o avanço do deserto. O Senegal, que fica no extremo oeste deste muro agora proposto e está a perder 50.000 hectares de terra produtiva por ano, apoia fortemente esta ideia. Ninguém sabe quanto tempo levará este


Restaurando a Terra 217 projecto a concretizar-se, mas o ministro do ambiente senegalês, Modou Fada Diagne observa, “A pobreza e a desertificação criam um ciclo vicioso… Em vez de esperarmos que o deserto venha até nós, temos que o atacar”.32 Como referido antes, a China está também a tentar parar o avanço dos desertos com a sua Grande Muralha Verde. Além disso, está a pagar aos agricultores das províncias ameaçadas para plantarem árvores em 10 milhões de hectares de terra de cereais, cerca de um décimo da área actual de terra de cultivo de cereais da China.33 Na Mongólia interior (Nei Monggol), os esforços para parar o avanço do deserto e recuperar terra para usos produtivos assentam na plantação de arbustos do deserto para estabilizar as dunas de areia. E em muitas situações, as ovelhas e cabras foram banidas totalmente. No distrito de Helin, a sul da capital provincial de Hohhot, a plantação de arbustos do deserto em terras de cultivo abandonadas está agora a estabilizar o solo nos primeiros 7.000 hectares dos terrenos recuperados da província. Baseado neste sucesso, o esforço de recuperação está a ser alargado.34 A estratégia da província de Helin centra-se na substituição do grande número de ovelhas e cabras por gado produtor de leite, aumentando o número de cabeças de 30.000 em 2002 para 150.000 em 2007. O gado é mantido em áreas circunscritas, alimentando-se dos talos das espigas de milho, da palha do trigo e da colheita duma forragem tolerante à seca semelhante à alfalfa, que é feita numa área recuperada. Os responsáveis locais calculam que este programa duplicará as receitas dentro do país ao longo desta década.35 Para aliviar a pressão sobre as pastagens, a China está a pedir aos pastores para reduzirem os seus stocks de ovelhas e cabras em cerca de 40 por cento. Mas em comunidades onde a riqueza é medida em número de cabeças de gado e onde as famílias vivem na pobreza, tais reduções não são fáceis ou, de facto, prováveis, a menos que sejam oferecidas formas de ganhar a vida alternativas aos pastores, na linha do que foi proposto na província de Helin.36


Plano B 2.0 218 A única forma viável de eliminar o excesso de gado nos dois quintos da superfície da Terra classificados como pastagens é reduzir o tamanho dos rebanhos e o número de pastores. Não só o número excessivo de cabeças de gado, e em particular ovelhas e cabras, removem a vegetação, como os seus cascos pulverizam a crosta protectora do solo que se forma com a queda de chuva e que evita a erosão pelo vento. Em algumas situações, a única opção viável é manter os animais em cercas, levando-lhes a forragem.AÍndia, que adoptou com sucesso esta prática para a sua próspera indústria de lacticínios, é um modelo para outros países.37 Proteger o que resta da vegetação da Terra é também uma garantia contra a devastação das florestas e a favor dos cortes selectivos, já que em cada corte indiscriminado de árvores há perdas de solo até que a floresta se regenere. Portanto, a cada novo corte, a produtividade diminui. Restaurar a cobertura de erva e árvores da Terra protege o solo da erosão, reduz as inundações, e retém o carbono. É uma forma de restaurar a Terra de tal modo que seja ela a suportar os nossos filhos e netos.

Satisfazendo as Necessidades de Água da Natureza Há muitas razões para equilibrar a procura de água com a oferta. A incapacidade de o fazer significa que os níveis freáticos vão continuar a descer, mais rios vão correr secos, e mais lagos vão desaparecer. Se os níveis dos lençóis freáticos estão a descer enquanto os preços da energia sobem, os custos da água para regas podem subir até um ponto em que os agricultores já não os possam suportar. (Formas de aumentar a eficiência da rega são discutias no Capítulo 9. O Capítulo 11 descreve formas de reduzir o desperdício urbano da água). Em Rivers for Life: Managing Water for People and Nature, Sandra Postel e Brian Richter citam o South Africa’s 1998 National Water Act como modelo para outros países. O documento concentra-se em duas grandes necessidades. A primeira são as necessidades básicas de água para todos beberem, cozinharem, para a higiene


Restaurando a Terra 219 e outros fins essenciais, que a legislação descreve como uma atribuição não negociável. A segunda é a água necessária para suportar as funções dos ecossistemas dos rios “a fim de conservar a biodiversidade e assegurar os valiosos serviços de ecossistema que eles fornecem à sociedade.38 Assegurar caudais mínimos que satisfaçam as necessidades específicas dos ecossistemas aquáticos do curso dos rios, nomeadamente, as planícies aluviais, os deltas dos rios e as terras húmidas, não é necessariamente fácil. Por exemplo, por vezes é necessário um caudal forte para satisfazer as necessidades de água doce num estuário. Outras vezes, as necessidades dos peixes na desova podem determinar as necessidades ecológicas da água. Um estudo da World Conservation Union – IUCN, na Austrália, nota que o aqueduto Mowamba tem estado permanentemente fechado após 100 anos de uso, com o objectivo de aumentar o caudal do rio Snowy. Esta acção inicial, que faz subir o caudal do rio de 3 por cento do nível natural para 6 por cento, é a primeira duma série de passos para fazer regressar o caudal do rio aos 28 por cento do nível natural e assim restaurar as suas funções naturais. Na bacia do Murray-Darling, na Austrália, o aumento do caudal de um rio com fornecimentos duma instalação de armazenamento da bacia ajudou a restaurar a população natural selvagem. O relatório do ICUN referia, “a grande garça proliferou pela primeira vez desde 1979, nove espécies de sapos desenvolveram-se, assim como o peixe nativo”.39 O mais conhecido e maior exemplo de como fazer regressar os caudais de água para restaurar e apoiar os habitats marinhos talvez seja o da Califórnia, quando o Congresso americano aprovou legislação, em 1992, que se destinava a restaurar a saúde geral do habitat dos peixes e da vida selvagem, incluindo a desova do salmão, no sistema hidrográfico de Sacramento-San Joaquin. Inicialmente, como Sandra Postel relata em Pillar of Sand, o Congresso autorizou o uso de quase mil milhões de metros cúbicos, ou cerca de 10 por cento do fornecimento anual de água do Central Valley Project, para este efeito. Os agricultores que perderam parte da sua água de rega puseram em causa a lei.40


Plano B 2.0 220 Depois de vários anos de luta contra a lei e de negociações envolvendo grupos ambientalistas, agricultores, responsáveis do governo estadual e outros, chegou-se a um acordo mais ou menos consistente com a intenção original do Congresso. O aumento do caudal dos dois rios, que confluem antes de desaguarem na baía de São Francisco, também ajudou a proteger o rico ecossistema aquático da baía, onde habitam 120 espécies de peixes.41 Variações deste esforço para restaurar os caudais dos rios e dar aos sistemas naturais a água de que necessitam são agora uma coisa comum. Nos Estados Unidos, literalmente centenas de pequenas barragens estão a ser demolidas para que os caudais dos rios e os sistemas naturais sejam restaurados, incluindo a desova do salmão.42 Em situações em que o aumento da procura de água excede a oferta num número cada vez maior de bacias hidrográficas, o desafio é estabelecer linhas de orientação através das quais as várias necessidades de água sejam satisfeitas, reconhecendo embora que poucas serão satisfeitas na totalidade. O sucesso depende de haver instituições e um processo que garanta que a água pode ser atribuída a usos concorrentes entre si de modo a maximizar a contribuição para a sociedade como um todo e não o interesse de um pequeno número de participantes, com prejuízo de outros.

Regenerando os Bancos de Pesca Ao longo de décadas os governos tentaram salvar bancos de peixe específicos restringindo a captura de espécies individuais. Em certos casos isto funcionou; noutros falhou e os bancos de peixe entraram em colapso. Nos últimos anos, tem ganho importância uma outra abordagem – a criação de reservas marinhas ou parques marinhos. Uma rede de reservas marinhas é definida como “um conjunto de reservas marinhas dentro de uma região biogeográfica, ligada por uma dispersão larvar e uma migração juvenil ou adulta”. As reservas servem como áreas naturais de cultura, ajudando a repovoar a área circundante.43


Restaurando a Terra 221 Em 2002, na Cimeira Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, em Joanesburgo, as nações costeiras comprometeram-se a criar redes nacionais de parques marinhos, que em conjunto, poderiam constituir uma rede global. No Congresso dos Parques Mundiais, em Durban, 2003, os delegados recomendaram a protecção da pesca de 20 a 30 por cento de cada habitat marinho. Isto seria um aumento em relação aos 0,5 por cento dos oceanos que são actualmente incluídos em reservas marinhas de uma grande variedade de dimensões. Este número pode ser comparado com os 12 por cento da área de terrenos que é abrangida por parques em todo o mundo.44 Uma equipa de cientistas do Reino Unido liderada pelo Dr. Andrew Balmford, do Conservation Biology Group da Universidade de Cambridge, analisou os custos de operação de reservas marinhas em larga escala baseando-se em informação de 83 reservas relativamente pequenas mas bem geridas. Concluíram que gerir reservas abrangendo 30 por cento dos oceanos custaria 12 a 14 mil milhões de dólares por ano. Isto não entrou em linha de conta com o provável aumento de receitas resultante da recuperação de bancos de pesca, o que reduziria o custo.45 Em causa, na criação de uma rede global de reservas marinhas, está a protecção ou o possível aumento da captura oceânica anual de peixe, no valor de 70 a 80 mil milhões de dólares. Balmford disse, “O nosso estudo sugere que será possível conservar os mares e os seus recursos de forma perpétua, e por menos do que estamos a gastar actualmente com subsídios para os explorar de forma não sustentável”.46 O co-autor do estudo britânico, Callum Roberts, da Universidade de York, referiu: “Nós ainda mal começámos a tarefa de criar parques marinhos. Aqui, na Grã-Bretanha, apenas um quinto de um por cento dos nossos mares está abrangido por reservas marinhas naturais e apenas um quinto da sua área conjunta está interdito à pesca”. Até agora, os mares estão a ser devastados pela pesca não sustentável, pela poluição e pela exploração mineral. A criação da rede global de reservas marinhas – “os Serengetis dos mares”, como al-


Plano B 2.0 222 guns lhes chamam – criará mais de um milhão de empregos. Roberts prosseguiu, “se não houver limites de pesca, deixará de haver um meio eficaz de permitir que os seres vivam mais, cresçam mais e se reproduzam mais.47 Jane Lubchenco, antiga Presidente da American Association for the Advancement of Science, reforçou o ponto levantado por Robert quando divulgou uma declaração assinada por 161 cientistas marinhos de referência apelando à acção urgente no sentido da criação da rede global de reservas marinhas. Referindo-se à investigação feita em dezenas de parques marinhos, afirmou: “Há muitas experiências em todo mundo, mas a mensagem principal é a mesma: as reservas marinhas funcionam, e funcionam depressa. Não se trata já de saber se devem ou não ser criadas áreas do oceano completamente protegidas, mas sim quais os locais onde se devem criar”.48 Os subscritores salientaram a forma rápida como o mar melhora, uma vez criadas as reservas. Um case study de um banco de pargos na costa da Nova Inglaterra mostra que os pescadores, embora inicialmente se tenham oposto violentamente à criação da reserva, são agora totalmente a favor, já que viram a população local de pargos crescer 40 vezes. Num estudo do Golf of Maine, todos os métodos de pesca que punham as espécies principais em risco foram banidos nas três reservas marinhas que abrangem 17.000 quilómetros quadrados. Inesperadamente, as vieiras floresceram neste ambiente resguardado, e a sua população aumentou cerca de 9 a 14 vezes em cinco anos. Este crescimento da população dentro das reservas foi também responsável pelo aumento da população de vieiras fora das reservas. O grupo de 161 cientistas referiu que passado um ou dois anos da criação de uma reserva marinha, as densidades populacionais aumentaram 91 por cento, o tamanho médio dos peixes aumentou 31 por cento e a diversidade de espécies subiu 20 por cento.49 Apesar da criação de reservas marinhas ser claramente a primeira prioridade no esforço de longo prazo para proteger os ecossistemas marinhos, há, no entanto, outras medidas necessárias. Uma é reduzir o fluxo dos nutrientes dos fertilizantes e esgotos não tratados. O au-


Restaurando a Terra 223 mento do fluxo de nutrientes dá origem ao florescimento de algas que depois morrem e, no processo da sua decomposição, absorvem todo o oxigénio livre da água, conduzindo à morte da vida marinha local. Hoje há cerca de 146 zonas mortas, sazonais ou crónicas, espalhadas pelos oceanos, do Golfo do México ao mar Báltico, à costa leste da China.50 A zona morta do Golfo do México, perto da boca do rio Mississipi, é uma das mais conhecidas. Esta área, do tamanho de Nova Jersey, reduz substancialmente a diversidade e produção marinha deste corpo de água historicamente produtivo. A melhor forma de controlar o escoamento de nutrientes é a adopção de práticas agrícolas como a da sementeira directa e a da sementeira semi-directa, a aplicação rigorosa das quantidades de fertilizantes necessárias às culturas e a plantação de faixas de protecção e filtragem ao longo do rio Mississipi e dos seus afluentes.51 Por fim, é necessário que os governos eliminem os subsídios à pesca. Há agora tantos barcos de pesca que o seu potencial de captura é o dobro de qualquer produção que o oceano possa sustentar. Gerir uma rede de reservas marinhas que governe 30 por cento dos oceanos custaria apenas 12 a 14 mil milhões de dólares – substancialmente menos que os 15 a 30 mil milhões de dólares que os governos distribuem hoje em subsídios aos pescadores.52

Protegendo a Diversidade de Plantas e Animais Os dois passos essenciais para proteger a extraordinária diversidade biológica da Terra são a estabilização da população e do clima. Se a população mundial aumentar para 9 mil milhões a meio do século, muitas mais espécies de plantas e animais podem ser simplesmente impedidas de crescer no planeta. Se os níveis de dióxido de carbono e as temperaturas continuarem a crescer, todos os ecossistemas se alterarão.


Plano B 2.0 224 Apontar para a trajectória baixa prevista pela ONU, que aponta para um pico da população mundial nos 7,8 mil milhões em 2041 e um posterior declínio gradual, é a opção mais eficaz para proteger a rica diversidade da vida da Terra. À medida que se torna mais difícil aumentar a produtividade, a continuação do crescimento populacional obrigará os agricultores a deitar abaixo cada vez mais florestas tropicais na Amazónia e na bacia do Congo, bem como nas ilhas exteriores da Indonésia.53 A gestão da água numa época de crescente escassez deste recurso é uma chave para a protecção das espécies marinhas. Quando os rios se esgotam até à seca para satisfazer as necessidades humanas de irrigação e de água urbana, as espécies marinhas não podem sobreviver. Talvez a mais conhecida e mais popular maneira de tentar proteger as espécies vegetais e animais seja a criação de reservas. Milhões de quilómetros quadrados foram incluídos em parques. De facto, cerca de 12 por cento da área terrestre do planeta está agora integrada em parques e reservas naturais. Com mais recursos, alguns parques deste tipo, que agora existem apenas em papel, podem tornar-se realidade nos países em desenvolvimento.54 Há cerca de 15 anos, Norman Myers e outros cientistas conceberam a ideia de “pontos quentes” de biodiversidade – áreas que eram especialmente ricas biologicamente e que por isso mereciam protecção especial. Isto ajudou as organizações World Wide Fund for Nature, Conservation International, The Nature Conservancy e muitos outros grupos e governos a concentrarem os seus esforços de preservação. Os 34 “pontos quentes” identificados chegaram a cobrir quase 16 por cento da superfície terrestre, mas devido principalmente à destruição dos habitats, cobrem agora só 3 por cento. Concentrar esforços de preservação nestas regiões biologicamente ricas foi um passo na direcção certa.55 Há cerca de 30 anos, os Estados Unidos criaram o Endangered Species Act. Esta legislação proibia quaisquer actividades, tais como desbravar novos terrenos para a agricultura e empreendimentos imobiliários ou drenar terras húmidas, que pudessem pôr em risco alguma espécie ameaçada. Há muitas espécies nos Estados Unidos, tal como a águia careca, que estariam já extintas se não fosse este corpo de legislação.56


Restaurando a Terra 225 Como espécie, os humanos têm uma enorme influência na habitabilidade do planeta para os milhões de outras espécies com quem o partilhamos. Esta influência traz consigo uma responsabilidade sem precedentes.

O Orçamento de Restauração da Terra Embora nalguns casos não tenhamos informação detalhada, podemos calcular por alto quanto custará reflorestar a Terra, proteger o solo de superfície, restaurar as terras de pastagem e os bancos de peixe, estabilizar os níveis freáticos e proteger a diversidade biológica. Onde há falta de informação basear-nos-emos em hipóteses. O objectivo não é ter um conjunto de números precisos, mas um conjunto de estimativas razoáveis para um orçamento de restauração da Terra. (Ver Quadro 8-1).57 Calcular o custo da reflorestação é complicado usando quaisquer das muitas aproximações possíveis. Como referido, a grande história de sucesso é a Coreia do Sul, que ao longo das últimas quatro décadas reflorestou as suas montanhas e montes antes desnudados com mão-de-obra mobilizada localmente. Outros países, incluindo a China, tentaram a reflorestação extensiva mas, na maior parte dos casos, em condições de maior aridez e com muito menos sucesso. ATurquia tem um ambicioso programa popular de reflorestação dirigido por ONGs, que se baseia muito no trabalho voluntário. O mesmo acontece com o Quénia, onde grupos de mulheres dirigidas pela Prémio Nobel da Paz, Wangari Maathai, plantaram 30 milhões de árvores.58 No cálculo dos custos da reflorestação, o foco está nos países em vias de desenvolvimento, uma vez que a área florestada já está em expansão nos países industrializados do hemisfério norte. Para conseguir responder à procura crescente de madeira para combustível naqueles países serão necessários mais cerca de 55 milhões de hectares de área florestada. Ancorar os solos e restaurar a estabilidade hidrológica requer cerca de mais 100 milhões de hectares em milha-


Plano B 2.0 226 res de bacias de drenagem nos países em vias de desenvolvimento. Reconhecendo que há alguma sobreposição entre estes dois, reduziremos o total de 155 milhões para 150 milhões de hectares. Para além disto, serão necessários mais 30 milhões de hectares para produzir madeira para construção, papel e outros produtos da floresta.59 Tabela 8-1. Orçamento anual para o Restauro da Terra Actividade

Financiamento (mil milhões de dólares)

Reflorestar a Terra

6

Proteger o solo de superfície nas terras de cultivo

24

Restaurar as pastagens

9

Restaurar os bancos de peixe

13

Proteger a diversidade biológica

31

Estabilizar os níveis freáticos

10

Total

93

Só uma pequena parte desta plantação de árvores virá das plantações industriais. A maior parte da plantação será feita nos arredores das aldeias, ao longo dos limites dos campos, nas bermas das estradas, em pequenos lotes de terra marginal e em colinas descampadas. A mão-de-obra para isto será local; alguma será paga, outra voluntária. Quase toda será mão-de-obra fora de estação. Na China, os agricultores que plantam árvores onde antes semeavam cereais são compensados com cereais dos stocks estatais durante um período de cinco anos, enquanto as árvores se vão instalando.60 A reflorestação é uma batalha difícil porque a terra desflorestada é muito erosiva e está desgastada de nutrientes. Mesmo o maior dos cuidados não consegue garantir taxas altas de sobrevivência no meio de condições marginais.


Restaurando a Terra 227 Se os rebentos custam 40 dólares por milhar, como calcula o Banco Mundial, e se a plantação típica é de 2.000 rebentos por hectare, então os rebentos custam 80 dólares por hectare. Os custos de mão-de-obra para plantar árvores são altos, mas uma vez que grande parte da mão-de-obra consistiria em voluntários mobilizados localmente, assumimos um total de 400 dólares por hectare, incluindo rebentos e trabalho. Com um total de 150 milhões de hectares a serem plantados na próxima década, isto totalizaria cerca de 15 milhões de hectares por ano a 400 dólares por hectare e uma despesa anual total de 6 mil milhões de dólares.61 Conservar o solo de superfície da Terra através da redução da erosão até à taxa de formação de novo solo, ou abaixo, envolve dois passos principais. Um é deixar de explorar a terra muito erosiva que não consegue suportar o cultivo – cerca de um décimo da terra de cultura a nível mundial representa talvez metade de toda a erosão. No caso dos Estados Unidos, isso significou deixar de explorar 14 milhões de hectares. O custo de manter esta terra fora de produção é perto de 125 dólares por hectare. No total, os pagamentos anuais a agricultores para plantarem erva ou árvores com base em contratos de 10 anos aproximaram-se dos 2 mil milhões de dólares.62 A segunda iniciativa consiste em adoptar práticas de conservação na restante terra que é objecto de erosão excessiva - ou seja, erosão que excede a taxa natural de formação de novo solo. Esta iniciativa inclui incentivos que encorajem os agricultores a adoptar práticas de conservação como a agricultura de contorno, as culturas em faixas e, cada vez mais, a sementeira directa ou semi-directa. Estas despesas nos Estados Unidos totalizam cerca de 1.000 milhões de dólares por ano.63 Ao alargar estas estimativas de forma a cobrir o mundo inteiro, assume-se que cerca de 10 por cento das terras de cultivo mundiais é altamente erosiva e que, portanto, devia ser plantada com erva ou árvores antes que o solo de superfície se perca e se transforme em terra estéril. Tanto nos Estados Unidos como na China, os dois principais produtores de alimentos, que representam um terço da colheita mundial de cereais, o objectivo oficial é retirar da exploração um


Plano B 2.0 228 décimo da terra de cultivo. Na Europa, provavelmente, será um pouco menos de 10 por cento, mas em África e nos países andinos pode ser substancialmente mais do que isso. No mundo em geral, converter 10 por cento das terras de cultivo muito erosivas em erva ou árvores parece um objectivo razoável. Visto que isto custa cerca de 2 mil milhões de dólares nos Estados Unidos, que representam um oitavo da área mundial de terra de cultivo, o total mundial anual seria cerca de 16 mil milhões de dólares.64 Assumindo que a necessidade para práticas de controlo da erosão no resto do mundo é idêntica à dos Estados Unidos, multiplicamos de novo a despesa dos Estados Unidos por oito para obter um total de 8 mil milhões de dólares para o mundo inteiro. Os dois componentes juntos - 16 mil milhões de dólares para retirar da exploração terras muito erosivas e 8 mil milhões de dólares para a adopção de práticas de conservação – dão um total anual mundial de 24 mil milhões de dólares.65 No que respeita à informação sobre o custo de protecção e restauração de terras de pastagem, voltamo-nos para o Plano de Acção de Combate à Desertificação dos Estados Unidos. Este plano, que se concentra sobre as regiões secas do mundo de que fazem parte quase 90 por cento da totalidade das terras de pastagem, estima que rondaria os 183 mil milhões de dólares ao longo de um período de recuperação de 20 anos – ou 9 mil milhões de dólares por ano. As principais medidas de recuperação são a melhoria da gestão das terras, os incentivos financeiros para acabar com os stocks excessivos e a revegetação com períodos apropriados de repouso em que a pastagem não seja permitida.66 Isto é um empreendimento caro mas cada dólar investido na recuperação das terras de pastagem produz um retorno de 2,50 dólares de receita em aumento de produtividade do ecossistema das terras. Do ponto de vista da sociedade, os países com grandes populações de pastores, onde a deterioração das terras de pastagem se concentra, estão invariavelmente entre os mais pobres do mundo. A alternativa à acção – ou seja, ignorar a deterioração – conduz não só a uma perda de produtividade da terra, mas também, em última análise, a milhões de refugiados, alguns migrando para as cidades vizinhas e outros movendo-se para outros países.67


Restaurando a Terra 229 A recuperação dos bancos de peixe centra-se principalmente na criação de uma rede mundial de reservas marinhas, que cobririam cerca de 30 por cento da superfície do oceano. Para este exercício usamos os cálculos detalhados feitos pela equipa britânica citada anteriormente neste capítulo. Asua estimativa de despesas ronda os 13 mil milhões de dólares por ano.68 Para a protecção da vida selvagem, a conta é um pouco mais alta. O World Parks Congress calcula que o deficit no financiamento necessário para a gestão e protecção das áreas existentes designadas por parques é de cerca de 25 mil milhões de dólares por ano. Áreas necessárias adicionais, como as que abrangem os “pontos quentes” de biodiversidade ainda não integrados em parques, custariam talvez outros 6 mil milhões de dólares por ano, produzindo um total de 31 mil milhões de dólares.69 Há uma actividade – a estabilização dos níveis dos lençóis freáticos – para a qual não temos uma estimativa, apenas uma suposição. A chave para estabilizar os níveis freáticos é aumentar a produtividade da água, e para isto temos a experiência acumulada ao longo do último meio século quando o mundo começou a aumentar sistematicamente a produtividade da terra. Os elementos necessários para um modelo de referência são a investigação para o desenvolvimento de práticas e tecnologias de irrigação mais eficientes, a disseminação dos resultados desta investigação pelos agricultores, e incentivos económicos que encorajem os agricultores a adoptar e usar estas práticas e tecnologias melhoradas de rega. A área onde há que aumentar a produtividade da água é muito menor que a área para aumento da produtividade da terra. De facto, só cerca de um quinto das terras de cultivo do mundo são irrigadas. Para disseminar os resultados da investigação sobre irrigação há actualmente duas opções. Uma é trabalhar através de serviços de extensão agrícola, que foram criados para levar a informação aos agricultores sobre um grande variedade de assuntos, incluindo a irrigação. Outra possibilidade é trabalhar através das associações de utilizadores da água que têm sido formadas em muitos países.Avantagem destas é que se concentram exclusivamente na água.70


230

Plano B 2.0

Efectivamente, gerir os fornecimentos de água subterrânea exige o conhecimento da quantidade de água que é bombeada e das taxas de reposição dos aquíferos. Em muitos países esta informação pura e simplesmente não está disponível. Saber quanta água é bombeada poderá obrigar à instalação de contadores nas bombas dos furos de irrigação, como foi feito na Jordânia e no Japão.71 Nalguns países, o capital necessário para financiar um programa de aumento da produtividade da água pode vir de subsídios cancelados que, agora, encorajam o uso desregrado de água para regas. Por vezes, estes subsídios têm um papel fundamental, como na Índia; outras vezes são subsídios que permitem a obtenção da água a preços muito inferiores ao seu custo, tal como acontece nos Estados Unidos. Em termos de recursos adicionais necessários a nível mundial, incluindo os incentivos económicos a agricultores para a utilização de práticas e tecnologias de água mais eficientes, assumimos que serão necessárias despesas adicionais de 10 mil milhões de dólares.72 Em conjunto, restaurar a Terra requererá despesas adicionais de 93 mil milhões de dólares por ano. Muitos perguntarão: será que o mundo pode assumir uma despesa destas? Mas a única pergunta apropriada é: pode o mundo dar-se ao luxo de não fazer estes investimentos?


9 Alimentar Bem Sete Mil Milhões

Em Abril de 2005, o Programa Mundial para a Alimentação e o governo chinês fizeram o anúncio conjunto de que os carregamentos de ajuda alimentar à China terminariam no fim desse ano. Para um país onde centenas de milhões de pessoas na geração anterior sofriam de fome crónica, esta foi uma grande realização. O sucesso da China ao erradicar em grande medida a fome pode ver-se na grande redução da pobreza associada à expansão da sua economia, que cresceu oito vezes desde as reformas económicas de 1978, e no salto de 50 por cento na sua colheita de cereais entre 1977 e 1986.1 Enquanto na China a fome tem vindo a desaparecer, na África subsariana e em partes do subcontinente indiano tem-se generalizado. Assim, o número de pessoas com fome aumentou do recente nível historicamente baixo de 820 milhões em 2000, para 852 milhões em 2002.2 Uma chave para a multiplicação por três da colheita mundial de cereais desde 1950 foi a rápida adopção pelos países em desenvolvimento do trigo e arroz de grande produtividade produzido no Japão e do milho híbrido dos Estados Unidos. A generalização destas


Plano B 2.0 232 sementes altamente produtivas, combinada com o aumento da área irrigada para o triplo e a multiplicação por nove no uso mundial dos fertilizantes, fez com que a colheita mundial de cereais triplicasse. Essencialmente, o crescimento da irrigação e do uso de fertilizantes removeu os impeditivos da falta de humidade e de nutrientes no solo das produções agrícolas na maior parte do mundo.3 Mas agora os agricultores mundiais enfrentam um enorme acréscimo da procura de produtos agrícolas motivado pelo previsto aumento de cerca de 70 milhões de pessoas por ano, pelo desejo, por parte de 5 mil milhões de pessoas, de consumir mais produtos de origem animal e pela viragem potencial, por parte de milhões de automobilistas, para as colheitas de produtos agrícolas produtores de combustível como suplemento dos fornecimentos cada vez mais escassos de gasolina e gasóleo. Do lado da oferta, os agricultores estão confrontados com a diminuição dos fornecimentos de água para rega, com o aumento das temperaturas, com o abandono de terras de cultivo para usos não agrícolas, com o aumento do custo dos combustíveis, e a diminuição das expectativas nas tecnologias de aumento da produtividade das colheitas. Para aqueles que gostam de desafios, esta é uma boa altura para se ser agricultor ou agrónomo.4 Repensando a Produtividade da Terra Os esforços para aumentar a produtividade das terras de cultivo estão a diminuir à medida que as opções disponíveis de utilização da tecnologia agrícola vão diminuindo.Aperda de impulso nos esforços para aumentar a produtividade das terras de cultivo verifica-se a nível mundial. Entre 1950 e 1990, a produção mundial de cereais por hectare subiu cerca de 2,1 por cento ao ano. De 1990 a 2000, no entanto, apenas subiu 1,2 por cento ao ano. Isto acontece, por um lado, porque a resposta da produção à aplicação adicional de fertilizantes está a diminuir e, por outro, porque os fornecimentos de água para rega são limitados. Ao longo da década actual, o aumento da produtividade da terra poderá abrandar ainda mais.5 Isto requer um pensamento novo sobre como aumentar a produtividade da terra. Uma forma simples de o fazer, onde a humidade do solo o permitir, é aumentar a área de multiculturas – terra que produz


233 Alimentar Bem Sete Mil Milhões mais do que uma colheita por ano. Na América do Norte e Europa Ocidental, que no passado restringiram a área de cultivo para controlar excedentes, há algum potencial para culturas duplas que ainda não foi explorado. De facto, a multiplicação por três da colheita mundial de cereais desde 1950 deve-se, em parte, ao aumento impressionante das culturas múltiplas na Ásia.Algumas das combinações mais comuns são o trigo e o milho, no norte da China, o trigo e o arroz, no norte da Índia, e a as culturas duplas ou triplas de arroz, no sul da China, sul da Índia e quase todos os países produtores de arroz do SudesteAsiático.6 Com início há duas décadas, a cultura dupla de trigo e milho de Inverno na Planície do Norte da China fez disparar a produção chinesa de cereais até ao nível dos Estados Unidos. O trigo de Inverno lá cultivado produz perto de 4 toneladas por hectare. O milho, cerca de 5 toneladas. Em conjunto, estas duas culturas, feitas em alternância, podem produzir anualmente 9 toneladas de grão por hectare.7 Há 40 anos, o norte da Índia apenas produzia trigo, mas com o advento dos trigos e arrozes de maturação rápida e alta produtividade, o trigo passou a poder ser colhido antes do arroz ser plantado. Esta combinação de trigo/arroz é agora usada correntemente no Punjab, Haryana e partes do Uttar Pradesh. A produção de 3 toneladas de trigo e de 2 toneladas de arroz combinam-se numa produção por hectare de 5 toneladas, ajudando a alimentar os 1,1 mil milhões de pessoas da Índia.8 A área que pode ser usada em multiculturas é limitada pelo abastecimento de água para rega, em algumas áreas, e pela falta de mãode-obra suficiente que permita colher rapidamente uma cultura e plantar a outra. A perda de mão-de-obra rural de baixo custo a favor da industrialização pode vir a reduzir drasticamente as multiculturas e, portanto, a área cultivada. No Japão, por exemplo, a área cultivada de cereais atingiu o seu máximo nos 5 milhões de hectares em 1960, quando os seus laboriosos agricultores faziam duas colheitas por ano. A partir de 2005, a área cultivada no Japão tinha caído para 2 milhões de hectares, em parte devido à conversão de terrenos para fins não agrícolas, mas principalmente devido ao declínio constante das culturas duplas ao longo de décadas, à medida que o aumento dos salários na indústria retirava os trabalhadores da agricultura.Amão-


Plano B 2.0 234 de-obra barata necessária para cultivar intensivamente pequenos lotes desapareceu. Mesmo com um preço de suporte do arroz quatro vezes superior ao nível do mercado mundial, não foi possível reter o número suficiente de trabalhadores na agricultura para manter a multicultura generalizada.9 Igualmente, a área de cereais cultivada pela Coreia do Sul diminuiu para metade, desde o seu pico em 1965, devido principalmente ao declínio das culturas múltiplas. Na Tailândia a área diminuiu quase dois terços desde 1975. À medida que a industrialização cresce na China e na Índia, as suas regiões mais prósperas podem vir a ter idênticas reduções nas culturas múltiplas. Na China, onde o rendimento per capita quadruplicou desde 1980, este processo parece já estar a reduzir a produção.10 Nos Estados Unidos, com o levantamento das restrições à área de plantação, em 1996, abriram-se novas oportunidades para as culturas múltiplas.Acombinação de cultura dupla mais comum nos Estados Unidos é de trigo de Inverno com soja, enquanto cultura de Verão. Seis por cento da colheita de soja provém de terra que também produz trigo de Inverno. Uma vez que a soja fixa o nitrogénio, esta rotação reduz a necessidade dos agricultores aplicarem fertilizante no trigo.11 Um esforço concentrado dos Estados Unidos tanto para criar variedades de maturação rápida como para desenvolver práticas que facilitem as culturas múltiplas pode fazer aumentar muito a produção. Se os agricultores chineses conseguem usar de forma generalizada as culturas duplas de trigo e milho, então os agricultores americanos, a uma latitude semelhante e com padrões de clima similares, também o podem conseguir, se a investigação agrícola e as políticas de agricultura forem reorientadas para esse fim. A Europa ocidental, com os seus Invernos pouco rigorosos e o trigo de Inverno de alta produção, pode também conseguir fazer mais culturas duplas com um cereal de verão, como o milho, ou com uma cultura de semente para óleo. O Brasil e aArgentina têm uma estação de crescimento longa, com ausência de geada, que suporta uma multicultura generalizada, frequentemente de trigo ou milho com soja. A disponibilidade de fertilizantes químicos também facilita as culturas múltiplas.12


235 Alimentar Bem Sete Mil Milhões Em muitos países, incluindo os Estados Unidos, a maioria dos países da Europa ocidental e o Japão, a utilização de fertilizantes atingiu um nível em que a utilização de mais adubos já não tem efeito visível no aumento da produção. Há ainda, no entanto, alguns locais, como a maior parte da África, onde o uso adicional de fertilizantes ajudaria a aumentar as produções. Infelizmente, a África subsariana não tem a infra-estrutura necessária para assegurar um transporte económico dos fertilizantes até às aldeias onde são necessários. Como resultado da degradação em nutrientes, as produções de cereais na África subsariana estão a diminuir.13 Uma resposta encorajadora a esta situação em África é a plantação simultânea de cereais e árvores leguminosas.As árvores começam por crescer lentamente, permitindo à cultura de cereais que amadureça e seja colhida. Depois as árvores crescem mais rapidamente até atingirem uma altura de vários pés, deixando cair folhas que fornecem nitrogénio e matéria orgânica – ambas muito necessárias aos solos africanos.Amadeira é então cortada e usada para combustível. Esta simples tecnologia, adaptada localmente e desenvolvida por cientistas no Centro Internacional de Investigação da Agrofloresta em Nairobi, permitiu aos agricultores duplicarem a produção de cereais em poucos anos ao mesmo tempo que aumenta a fertilidade do solo.14 Apesar de alguns avanços a nível local, a perda de impulso, a nível geral, na expansão da produção de alimentos é inegável. Ela obriga-nos a pensar em como limitar a procura e usar de forma mais produtiva as culturas existentes. Do lado da procura, chegar a um equilíbrio mundial aceitável entre os alimentos e as pessoas pode depender agora da rápida estabilização da população, da redução do pouco saudável e exagerado consumo de produtos de origem animal nos países industrializados e da restrição da conversão de culturas de produtos alimentares em cultivos destinados à produção de combustíveis para automóveis. Mas temos também que pensar de forma mais abrangente sobre a produtividade da terra, equacionando não só cada cultura em particular mas a forma de aumentar a multicultura e de produzir mais a partir das culturas existentes.


236 Aumentando a Produtividade da Água

Plano B 2.0

Uma vez que são necessárias 1.000 toneladas de água para produzir 1 tonelada de cereais, não surpreende que 70 por cento da utilização mundial da água se destine à rega. Assim, aumentar a eficiência da água de rega é fulcral para aumentar a produtividade da água em geral. Usar tecnologias de irrigação mais eficientes e mudar para culturas que usem menos água pode ajudar a aumentar a área irrigada, mesmo com um fornecimento de água limitado. Eliminar os subsídios à água e à energia, que encorajam o uso desregrado da água, leva a que os preços desta subam até aos níveis do mercado. O aumento dos preços incentiva todos os utilizadores a usarem a água de forma mais eficiente. Em termos de organização, as associações locais de utilizadores da água, que envolvem directamente os utilizadores na gestão, teve como consequência o aumento da produtividade da água em muitos países.15 O mundo precisa de desenvolver agora um esforço para aumentar a produtividade da água semelhante ao que conduziu ao aumento para o triplo da produtividade das terras de cultivo durante a última metade do século vinte. A produtividade é, em geral, medida em toneladas de grão por hectare ou em bushels por acre. Um indicador comparável para a água de rega é o de quilos de grão produzidos por tonelada de água.Anível mundial, essa média é actualmente de cerca de 1 quilo de grão por tonelada de água usada.16 Alguns dados têm sido recolhidos sobre a eficiência da água para rega a nível internacional no que respeita a projectos de água de superfície – quer dizer, barragens que fornecem água a agricultores através de uma rede de canais de rega. A utilização de água de rega nas culturas nunca atinge os 100 por cento simplesmente porque alguma desta água se evapora à superfície, alguma infiltra-se para a profundidade do solo e alguma escoa-se.17 As analistas de política da água, Sandra Postel e Amy Vickers descobriram que “a eficiência da água de superfície para irrigação varia entre 25 e 40 por cento na Índia, México, Paquistão, Filipinas e


237 Alimentar Bem Sete Mil Milhões Tailândia; entre 40 e 45 por cento na Malásia e Marrocos; e entre 50 e 60 por cento em Israel, Japão e Taiwan”. A eficiência da água de rega é afectada não só pelo tipo e condição dos sistemas de irrigação mas também pelo tipo de solo, temperatura e humidade. Em regiões áridas com temperaturas altas, a evaporação da água de rega é muito maior que nas regiões húmidas com temperaturas mais baixas.18 Numa reunião em Maio de 2004, o Ministro dos Recursos de Água da China, Wang Shucheng descreveu-me com algum detalhe os planos para aumentar a eficiência de rega na China de 43 por cento em 2000 para 51 por cento em 2010 e, depois, para 55 por cento em 2030. Os passos descritos por ele incluíam o aumento do preço da água, incentivos para a adopção de tecnologias de rega mais eficientes e o desenvolvimento de organizações locais para gerir este processo. Ele sentia que se estas metas fossem atingidas, a segurança alimentar da China seria assegurada.19 Aumentar a eficiência da água de rega significa, em geral, mudar do sistema menos eficiente de inundação ou de regos para dispersores de água ou para a rega gota-a-gota, o mais eficiente sistema de rega. Mudar do sistema de inundação ou de regos para sistemas de dispersores de baixa pressão reduz o uso de água em cerca de 30 por cento, enquanto o sistema gota-a-gota reduz, em geral, o consumo a metade.20 Como alternativa à irrigação através de regos, o sistema gota-agota também aumenta as produções porque fornece uma quantidade de água regular com perdas mínimas por evaporação. Uma vez que os sistemas de gota a gota são de mão-de-obra intensiva e eficientes na utilização da água, eles adequam-se bem a países com desemprego e com falta de água, permitindo que os agricultores aumentem a produtividade da sua água utilizando a mão-de-obra que existe muitas vezes em excesso nas comunidades rurais.21 Alguns países pequenos – Chipre, Israel e Jordânia – dependem fortemente da rega gota-a-gota. Entre os três grandes produtores agrícolas, esta tecnologia mais eficiente é usada em menos de 1 por


Plano B 2.0 238 cento da terra irrigada, no caso da Índia e China, e em cerca de 4 por cento, no caso dos Estados Unidos.22 Em anos recentes, foram desenvolvidos sistemas de rega gota a gota de escala muito reduzida – em essência, um balde com tubos de plástico flexível para distribuir a água – que regam uma horta pequena, com cerca de 100 plantas (cobrindo 25 metros quadrados). Outros sistemas com um contentor um pouco maior irrigam 125 metros quadrados. Em ambos os casos, os contentores estão ligeiramente elevados para que a água se distribua por gravidade. Sistemas de gota-a-gota um pouco maiores, que usam emissores de plástico que podem ser movidos facilmente, estão também a tornar-se populares. Estes sistemas simples podem pagar-se a si mesmos num ano. Ao reduzirem os custos com a água e, simultaneamente, aumentarem as produções, eles podem aumentar muito as receitas dos pequenos agricultores.23 Sandra Postel acredita que a combinação destas tecnologias de gota-a-gota em várias escalas tem o potencial para irrigar lucrativamente 10 milhões de hectares das terras de cultivo da Índia, quase um décimo do total. Ela vê um potencial idêntico na China, que está também a expandir agora a sua área irrigada gota-a-gota para poupar a água que escasseia.24 Mudanças de organização – especificamente, transferir a responsabilidade da gestão dos sistemas de rega dos organismos governamentais para as associações locais de utilizadores – podem facilitar um uso mais eficiente da água. Os agricultores de muitos países estão a organizar-se a nível local para poderem assumir esta responsabilidade. Uma vez que a população local tem vantagens económicas directas na boa gestão da água, estas associações tendem a fazer um melhor trabalho do que um organismo governamental distante.25 O México é líder neste movimento. Apartir de 2002, as associações de agricultores passaram a gerir mais de 80 por cento da terra anteriormente irrigada pelo estado. Para o governo, uma das vantagens desta mudança é que o custo de manutenção do sistema de rega


239 Alimentar Bem Sete Mil Milhões é assumido localmente, reduzindo os gastos públicos. Isto também implica que as associações têm necessidade de cobrar mais caro pela água. Mesmo assim, para os agricultores, os ganhos de produção com a gestão própria do fornecimento cobrem facilmente essa despesa adicional.26 Na Tunísia, onde as associações de utilizadores de água gerem tanto a água para rega como a água de consumo doméstico, o número de associações aumentou de 340, em 1987, para 2.575, em 1999. Muitos outros países têm agora este tipo de associações a gerirem os seus recursos de água. Embora os primeiros grupos tenham sido organizados para lidarem com grandes sistemas de irrigação desenvolvidos pelo Estado, alguns dos mais recentes foram formados para gerir também as águas locais subterrâneas para rega. Eles assumem a responsabilidade de estabilizar o nível freático com o objectivo de evitar a degradação do aquífero e a perturbação económica que ela acarreta para a comunidade.27 A produtividade baixa da água é muitas vezes o resultado de preços baixos. Na maior parte dos países, os preços são irracionalmente baixos, próprios de uma era em que a água era um recurso abundante. À medida que a água se torna escassa, tem que passar a ter um preço que reflicta essa realidade. Os governos provinciais do norte da China estão a aumentar os preços da água em pequenos incrementos com o objectivo de desencorajar o desperdício. Um preço mais elevado afecta todos os utilizadores, encorajando o investimento em tecnologias de rega, processos industriais e electrodomésticos mais eficientes.28 O que é necessário agora é uma atitude mental diferente, uma nova maneira de pensar no uso da água. Por exemplo, mudar para culturas mais eficientes no consumo de água onde seja possível também aumentar a sua produtividade. A produção de arroz está a ser excluída da área à volta de Pequim porque o arroz é muito sedento de água. Da mesma forma, o Egipto restringe a sua produção de arroz em favor do trigo.29


Plano B 2.0 240 Quaisquer medidas que aumentem as produções das culturas em terras irrigadas também aumentam a produtividade da água de rega. Do mesmo modo, qualquer coisa que aumente a eficiência com que os cereais são convertidos em proteína animal aumenta, de facto, a produtividade da água. Para as pessoas que consomem quantidades pouco saudáveis de produtos de origem animal, descer na cadeia alimentar significa não só uma dieta mais saudável e menores custos de saúde mas também um menor uso de água. Nos Estados Unidos, onde o consumo anual de cereais para a alimentação humana e animal é cerca de 800 quilos por pessoa, uma redução modesta no consumo de carne, leite e ovos poderia facilmente fazer descer o uso dos cereais por pessoa em cerca de 100 quilos. Uma vez que há agora quase 300 milhões de americanos, uma tal redução faria diminuir o consumo de cereais em 30 milhões de toneladas e da água para rega em 30 mil milhões de toneladas.30 Reduzir o consumo de água para um nível que possa ser sustentado pelos aquíferos e rios de todo o mundo envolve uma ampla gama de medidas não só a nível da agricultura mas também de toda a economia. Os passos mais óbvios, para além das práticas mais eficientes de irrigação e das culturas mais eficientes em consumo de água, incluem a adopção de processos industriais mais eficientes em água e o uso de electrodomésticos mais eficientes no consumo de água. Um dos passos menos convencionais é mudar das velhas centrais eléctricas a carvão, que necessitam de grandes quantidades de água para o sistema de arrefecimento, para a energia eólica – algo que, de qualquer forma, é necessário há muito tempo devido às perturbações do clima. Reciclar a água urbana é outro passo óbvio a ser considerado nos países confrontados com a falta de água.

Produzindo Proteínas de Forma Mais Eficiente A segunda forma de aumentar a produtividade tanto da terra como da água é produzir proteína animal de forma mais eficiente. Com cerca de 38 por cento (aproximadamente 730 milhões de toneladas) da colheita mundial de cereais usada para produzir proteína animal, o potencial para um uso mais eficiente dos cereais é grande.31


241 Alimentar Bem Sete Mil Milhões O consumo mundial de carne aumentou de 47 milhões de toneladas em 1950 para 260 milhões de toneladas em 2005, tendo subido para mais do dobro o consumo per capita, de 17 quilos para 40 quilos. O consumo de leite e ovos também aumentou. Em todas as sociedades onde o nível de vida aumentou, o consumo de carne também aumentou, reflectindo talvez um gosto que evoluiu ao longo de 4 milhões de anos de caça e criação animal.32 À medida que tanto a captura de peixe oceânico como a produção de carne em pastagens atingiram um nível idêntico, o mundo virou-se para a produção de proteína animal baseada em cereais a fim de aumentar a produção. E à medida que a procura de proteína animal aumenta, o consumo do conjunto de produtos à base de proteínas está a mudar para aqueles que convertem cereais em proteínas de forma mais eficiente, e que são mais baratos. As preocupações com a saúde também provocaram uma viragem da carne de vaca e de porco para as aves e o peixe. A eficiência com que vários animais convertem os cereais em proteínas varia muito. No caso do gado em currais de alimentação, são necessários cerca de 7 quilos de grão para produzir um ganho de 1 quilo em peso vivo. No caso do porco, o número é perto de 4 quilos de grão por quilo de peso ganho. No caso das aves, é um pouco mais de 2. E no caso das culturas de espécies herbívoras de peixe (tais como a carpa, a tilápia e o peixe gato), é menos de 2. A mudança do mercado para produtos mais eficientes no consumo de cereais aumenta a produtividade tanto da terra como da água.33 A produção global de carne de vaca, a maior parte da qual vem de terras de pastagem, cresceu menos de 1 por cento ao ano de 1990 a 2005. O aumento de currais de alimentação de gado é mínimo. A produção de carne de porco cresceu cerca de 2,5 por cento ao ano, e a de aves, cerca de 5 por cento. O rápido crescimento na produção avícola, de 41 milhões de toneladas em 1990 para 80 milhões de toneladas em 2005, fez com que a carne de aves eclipsasse a carne de vaca em 1995, colocando-a em segundo lugar, atrás da carne de porco. (Ver Figura 9-1) A produção mundial de carne de


Plano B 2.0 242 porco, metade da qual na China, ultrapassou a produção de carne de vaca em 1979 e tem consolidado a sua liderança desde então. A produção mundial de carne de vaca, restringida tanto pelos limites ao pasto como pela conversão ineficiente do gado para cercas de alimentação, continua a crescer, mas lentamente. De facto, dentro de aproximadamente uma década, a produção das aquaculturas em rápido crescimento e altamente eficientes no consumo de cereais, poderá ultrapassar a produção de carne de vaca.34 O grande vencedor na produção de proteína animal foi a aquacultura, devido principalmente ao facto de os peixes herbívoros converterem tão eficazmente a ração em proteína. A produção de aquacultura cresceu de 13 milhões de toneladas em 1990 para 42 milhões de toneladas em 2003, ou seja, mais de 10 por cento ao ano. AChina, o maior produtor, representa uns espantosos dois terços da produção mundial.Aprodução de aquacultura na China é dominada pelo peixe (principalmente carpas) que é produzido em pequenos e grandes lagos de água doce, reservatórios e zonas inundadas de cultivo do arroz, e pelos bivalves (em especial, ostras, amêijoas e mexilhões) que são produzidos, na sua maioria, em regiões costeiras.35

Figura 9-1. Produção Mundial de Carne por Tipo, 1961-2005


243 Alimentar Bem Sete Mil Milhões A aquacultura da China está muitas vezes integrada com a agricultura, o que permite aos agricultores usarem os desperdícios agrícolas, tal como os dejectos de porco ou pato, para fertilização dos lagos, estimulando assim a criação de plâncton do qual os peixes se alimentam.Apolicultura piscícola, que normalmente gera um aumento da produtividade dos lagos e tanques de pelo menos metade em relação às monoculturas, é muito praticada tanto na China como na Índia.36 Com a terra e a água para os lagos e tanques de peixes a tornarem-se cada vez mais escassas, os pscicultores da China estão a alimentar mais os peixes com elementos mais concentrados, tal como a soja, para aumentar a produtividade das explorações. Utilizando esta técnica, os produtores chineses aumentaram a produção anual por hectare de 2,4 toneladas de peixe em 1990 para 4,1 toneladas em 1996.37 Nos Estados Unidos, o peixe-gato, que requer menos de 2 quilos de ração por quilo de peso vivo, é o líder da produção em aquacultura. A produção anual de peixe-gato dos Estados Unidos, de 272 mil toneladas (cerca de 900 gramas por pessoa) está concentrada em quatro estados: Mississipi, Louisiana,Alabama eArkansas. O Mississipi, com 60 por cento da produção dos Estados Unidos, é a capital mundial do peixe-gato.38 A atenção do público concentrou-se nas explorações de aquacultura que são ambientalmente ineficientes ou agressivas, tais como a cultura do salmão, uma espécie carnívora, e o camarão. Estas explorações representam 3,6 milhões de toneladas de produção, menos de 9 por cento do total da produção global em aquacultura, mas estão em crescimento rápido. O salmão é ineficiente na medida em que se alimenta de outros peixes, normalmente uma ração de peixe composta por desperdícios de fábricas de peixe ou por peixe de baixo valor capturado especificamente para este efeito. A produção de camarões envolve muitas vezes a destruição das florestas costeiras de mangue para estabelecer áreas de cultivo.39


Plano B 2.0 244 A aquacultura mundial é dominada pelas espécies herbívoras – principalmente a carpa, na China e Índia, mas também o peixe-gato, nos Estados Unidos, e a tilápia em vários países – e pelos bivalves. É aqui que está o grande potencial de crescimento na produção eficiente de proteína animal.40 Quando pensamos na soja, na nossa dieta diária, pensamos normalmente no tofu, nos hambúrgueres vegetais, ou outros substitutos da carne. Mas a maior parte da colheita mundial de soja, em rápido crescimento, é consumida indirectamente na carne de vaca, de porco e de aves, no leite, nos ovos e nos peixes de aquacultura. Embora não seja uma parte visível das nossas dietas, a incorporação do farelo de soja nas rações animais revolucionou a indústria mundial de rações, aumentando muito a eficiência com que as sementes são convertidas em proteína animal.41 Em 2005, os agricultores produziram em todo o mundo 220 milhões de toneladas de soja – 1 tonelada por cada 9 toneladas de cereais e leguminosas. Destas, cerca de 15 milhões de toneladas foram consumidas directamente como tofu ou substitutos da carne. A maior parte dos restantes 205 milhões de toneladas, tirando alguma que foi guardada para semear, foi esmagada para a extracção de 33 milhões de toneladas de óleo de soja, separando-o do farelo de alto valor proteico. Em 2006, talvez 2 milhões de toneladas (7 por cento) destes 33 milhões estejam a ser encaminhados para as estações de serviço, como biodiesel.42 Os 144 milhões de toneladas de farelo de soja que restam depois do óleo ter sido extraído, vão para a alimentação do gado bovino, porcos, galinhas e peixes, enriquecendo as suas dietas com proteína de grande qualidade.Acombinação do farelo de soja com grãos de cereais e leguminosas, na proporção de cerca de uma parte de farelo para quatro partes de grão, aumenta drasticamente a eficiência com que os grãos são convertidos em proteína animal, por vezes, quase duplicando-a.43 Os três maiores produtores mundiais de carne – China, Estados Unidos e Brasil – dependem todos agora fortemente do farelo de soja, como suplemento proteico das rações animais. Nos Estados Unidos, que há muito usam o farelo de soja para melhorar as rações do gado e das aves, a percentagem de farelo de soja nas rações


245 Alimentar Bem Sete Mil Milhões animais subiu de 8 por cento em 1964 para cerca de 18 por cento nos últimos anos.44 No caso do Brasil, onde a mudança começou no final da década de 1980, o farelo de soja representa agora cerca de 21 por cento da mistura da ração. Na China, só vários anos mais tarde se aperceberam de que a eficiência das rações podia ser significativamente aumentada com a adição de farelo de soja. Entre 1991 e 2002, a componente de farelo de soja saltou de 2 por cento para 20 por cento. No que respeita aos peixes, cuja necessidade de proteína é particularmente elevada, a China incorporou cerca de 5 milhões de toneladas de farelo de soja nos 16 milhões de toneladas de ração à base de cereais e leguminosas utilizados em 2003.45 Com este crescimento fenomenal, o farelo de soja não só substituiu parte dos cereais e leguminosas incluídos nas rações como aumentou a eficiência com que o restante grão é convertido em produto animal. Isto também ajuda a explicar porque é que a percentagem da colheita mundial dos cereais e leguminosas usados em rações não aumentou nos últimos 20 anos, apesar da produção de carne, leite, ovos e peixes de cultura ter subido muito. E explica porque é que a produção mundial de soja saltou de 16 milhões de toneladas em 1950 para 220 milhões de toneladas em 2005, 13 vezes mais. Se bem que o potencial de aumento da eficiência das rações com o farelo de soja seja actualmente bem conhecido nos países mais importantes na produção alimentar, há ainda muitos países em vias de desenvolvimento que não exploraram plenamente o seu potencial.46

Novos Sistemas de Produção de Proteínas As pressões crescentes sobre os recursos de terra e de água para a produção de gado, aves e peixe conduziram à evolução de alguns novos modelos promissores de produção de proteína animal; um deles é o do leite, na Índia. Desde 1970, a produção de leite na Índia foi multiplicada por quatro, passando de 21 milhões para 95 milhões de toneladas. Em 1998, a Índia ultrapassou os Estados Unidos para se tornar no maior produtor mundial de leite e outros lacticínios. (Ver Figura 9-2)47


Plano B 2.0 246 Afaísca para este crescimento explosivo surgiu em 1965 quando um jovem empreendedor indiano, o Dr. Verghese Kurien, organizou o National Dairy Development Board, uma organização que reúne as cooperativas de lacticínios. O principal objectivo das cooperativas era comercializar o leite das pequenas explorações, com uma média de duas ou três vacas cada, estabelecendo a ligação entre o apetite crescente de produtos lácteos e os milhões de famílias das aldeias que apenas tinham pequenos excedentes comercializáveis.48

Figura 9-2. Produção leiteira na Índia e Estados Unidos, 19612005 A criação de um mercado para o leite multiplicou a produção por quatro. Num país onde a escassez de proteínas impede o desenvolvimento de tantas crianças, expandir o fornecimento de leite de menos de meia caneca diária por pessoa, há 30 anos, para mais de uma caneca representa um grande avanço.49 O que é tão assinalável é que a Índia construiu a maior indústria mundial de lacticínios quase só à base de fibras – palha de trigo e de arroz, talos de espigas de milho e erva cortada na berma das estradas. Apesar disso, o valor do leite produzido anualmente excede já o da colheita de arroz.50


247 Alimentar Bem Sete Mil Milhões Um segundo novo modelo de produção de proteína, que também assenta nos ruminantes, evoluiu em quatro províncias da parte central do leste da China – Hebei, Shangdong, Henan eAnhui – onde as culturas duplas de trigo de Inverno e milho são comuns. Logo que o trigo de Inverno fica maduro, no início do Verão, é colhido rapidamente para que a cama das sementes possa ser rapidamente preparada para o milho. Da mesma forma, logo que o milho é colhido no Outono, a cama das sementes é rapidamente preparada para semear o trigo. Embora a palha do trigo e os talos da espiga do milho sejam muitas vezes usados como combustível para a cozinha, os habitantes das aldeias estão a recorrer a outras fontes de energia para esse efeito, o que lhes permite dar a palha e os talos ao gado. Acrescentar a esta fibra pequenas quantidades de nitrogénio na forma de ureia permite que a microflora converta eficazmente a fibra em proteína animal no complexo sistema digestivo de quatro estômagos do gado.51 Estas quatro províncias chinesas produtoras de cereais, designadas pelos responsáveis oficiais por Cintura da Carne de Bovino, produzem muito mais carne de vaca usando resíduos das colheitas – palha de trigo e arroz e talos de milho – do que as pastagens das grandes províncias do norte. A utilização de resíduos das colheitas para produzir leite na Índia e carne de vaca na China oferece aos agricultores uma segunda colheita a partir da colheita de cereais original, aumentando a produtividade da terra e da mão-de-obra.52 Com o passar do tempo, a China também desenvolveu uma policultura de peixe particularmente eficiente usando quatro tipos de carpa que se alimentam de níveis diferentes da cadeia alimentar, reproduzindo na prática os ecossistemas aquáticos naturais. A carpa herbívora e a carpa de cabeça grande são filtros alimentares que ingerem o fitoplâncton e o zooplâncton respectivamente. A carpa de erva, como o seu nome indica, alimenta-se em grande parte de vegetação, enquanto a carpa comum se alimenta nos fundos, vivendo de detritos. Estas quatro espécies formam assim um ecossistema, ocupando um nicho específico cada uma. Este sistema de múltiplas espécies, que converte ração em proteína de alta qualidade com uma eficiência assinalável, produziu cerca de 13 milhões de toneladas de carpas em 2002.53


Plano B 2.0 248 Apesar da produção de aves ter crescido rapidamente na China, como noutros países em desenvolvimento, esse crescimento é muito pequeno comparado com o fenomenal crescimento da aquacultura. Hoje, a produção da aquacultura na China – cerca de 29 milhões de toneladas – é o dobro da das aves, o que faz da China o primeiro grande país onde a aquacultura eclipsou a criação de aves. O grande atractivo económico e ambiental deste sistema é a eficiência com que produz proteína animal.54 Embora estes três modelos de proteínas tenham evoluído na Índia e na China (ambas densamente povoadas), sistemas similares podem ser adoptados noutros países à medida que as pressões populacionais se intensificam, que as procuras de carne e leite aumentam, e que os agricultores procuram novas formas de converter produtos vegetais em proteína animal. O mundo precisa desesperadamente de mais técnicas de produção de proteína como estas. Há meio século atrás, quando havia apenas 2,5 mil milhões de pessoas no mundo, quase toda a gente queria subir na cadeia alimentar. Agora que o número terá passado para o dobro, o consumo de carne está a crescer duas vezes mais depressa que a população, o consumo de ovos cresce quase três vezes mais depressa e o crescimento da procura de peixe – tanto do oceano como das culturas – está a ultrapassar o da população. Face a este atraso em relação à procura, a capacidade humana para engendrar formas de produzir proteína animal em cada vez maiores quantidades e de forma mais eficiente será posta à prova.55 Embora o mundo tenha tido muitos anos de experiência na alimentação adicional de 70 milhões ou mais de pessoas por ano, não tem experiência no facto de 5 mil milhões de pessoas quererem subir na cadeia alimentar ao mesmo tempo. Para se ter uma ideia em que é que isto se traduz, basta ver o que aconteceu na China desde as reformas económicas em 1978. Sendo a economia em mais rápido crescimento a nível mundial desde então, a China, da facto, permite que se observe a história por um telescópio, mostrando como as dietas mudam quando os rendimentos sobem rapidamente.56


249 Alimentar Bem Sete Mil Milhões Ainda há muito pouco tempo, em 1978, o consumo de carne era baixo na China, consistindo principalmente em quantidades modestas de carne de porco. Desde então, o consumo de carne de porco, vaca, aves e carneiro multiplicou-se, levando a que o consumo total de carne na China ultrapassasse em muito o dos Estados Unidos. À medida que o rendimento aumenta noutros países, os seus consumidores também querem mais proteína animal. Ter em consideração o efeito desta expansão da procura nos recursos globais de terra e de água, juntamente com a procura mais tradicional gerada com o crescimento populacional, dá uma melhor medida das pressões futuras na Terra. Se as ofertas mundiais de cereais escassearem nos anos vindouros, a competição pelos cereais entre pessoas que querem mais biocombustíveis - aquelas que vivem no nível superior da cadeia alimentar - e os que estão nos degraus mais baixos da escada económica não só se tornará mais visível como se poderá transformar numa fonte possível de tensão no interior das sociedades e entre sociedades.57

Descer na Cadeia Alimentar Uma das questões que mais me colocam nos meus ciclos de palestras é, “Quantas pessoas consegue a Terra suportar?” Eu respondo com outra questão: “a que nível de consumo alimentar?”Ao nível dos Estados Unidos, de 800 quilos por pessoa em alimentação humana e rações, a colheita anual de 2 mil milhões de toneladas de cereais suportaria 2,5 mil milhões de pessoas. Ao nível italiano de consumo anual de cerca de 400 quilos, a colheita actual suportaria 5 mil milhões de pessoas. Ao nível de cerca de 200 quilos de cereais consumidos por ano em média na Índia, suportaria uma população de 10 mil milhões.58 Em todas as sociedades onde os rendimentos sobem, as pessoas sobem na cadeia alimentar, comendo mais proteína animal como carne de vaca, de porco e de aves, leite, ovos e produtos do mar. A combinação dos vários produtos de proteína animal varia com a geografia e a cultura, mas a mudança para mais proteínas animais à medida que o poder de compra aumenta parece ser universal.


Plano B 2.0 250 Com o aumento do consumo de produtos de origem animal, nomeadamente, gado, aves e peixes de aquacultura, sobe também o consumo de cereais e leguminosas por pessoa. Dos cerca de 800 quilos de cereais e leguminosas consumidos anualmente por pessoa nos Estados Unidos, cerca de 100 quilos são comidos directamente como pão, massa e cereais de pequeno-almoço. Mas a maior parte é consumida indirectamente na forma de carne de gado, de aves e de peixes de aquacultura. Em contraste, na Índia, onde as pessoas consomem cerca de 200 quilos de cereais e leguminosas por ano, ou cerca de 450 gramas por dia, quase todos os cereais e leguminosas são consumidos directamente na satisfação das necessidades energéticas básicas por via da alimentação. Pouco fica disponível para a conversão em produtos de origem animal.59 Dos três países acabados de citar, a esperança de vida mais elevada situa-se na Itália, apesar de os gastos por pessoa em cuidados de saúde serem nos Estados Unidos muito superiores. Aqueles que vivem num nível muito baixo da cadeia alimentar não vivem tanto como os que estão numa posição intermédia. A dieta mediterrânea inclui carnes, queijos e produtos do mar, mas com moderação. Do ponto de vista nutricional, esta é a forma mais saudável de comer.60 O que isto quer dizer é que as pessoas que vivem no nível alto da cadeia alimentar, como o americano e o canadiano médio, podem consumir menos cereais e leguminosas, e melhorar a saúde ao mesmo tempo. Para aqueles que vivem em países de baixos rendimentos, como a Índia, onde as dietas são dominadas por um produto alimentar básico rico em amido, o arroz, que fornece por vezes 60 por cento ou mais da ingestão total de calorias, comer mais produtos animais pode melhorar a saúde e aumentar a esperança de vida.61 Para além de levar o sector afluente a mover-se para baixo na cadeia alimentar, consumindo menos produtos com origem na pecuária, o mundo está a virar-se para as formas de proteína animal mais eficientes em cereais e leguminosas. Em conjunto, estes dois passos ajudaram a manter constante nas duas últimas décadas a percentagem da colheita mundial de cereais e leguminosas destinada à produção de rações: cerca de 38 por cento .62


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É geralmente assumido que mudar da proteína animal para as proteínas de alta qualidade de origem vegetal, tais como a soja ou o tofu — feito do feijão de soja —, conduz a uma utilização mais eficiente da terra. Mas isto não é sempre verdade. Por exemplo, e já o dissemos, com as aves, só são necessários pouco mais de 2 quilos de cereais e leguminosas para produzir 1 quilo de peso adicional vivo. No caso do peixe-gato, é menos de 2 quilos de cereais e leguminosas por quilo de peso ganho. Um acre (0,4 hectares) de terreno no Iowa pode assim produzir 3 556 quilos de milho ou 952,5 quilos da muito menos produtiva soja.Alimentar as galinha e o peixe-gato com milho pode garantir uma proteína de mais elevada qualidade do que cultivar soja e consumi-la directamente, por exemplo, como tofu.63 É necessário uma grande quantidade de terra para produzir proteína de soja, em grande parte porque as plantas requerem mais energia metabólica para produzir proteína vegetal de alta qualidade do que para produzir amido. Mas porque as aves e o peixe-gato são tão eficientes a converter os cereais e as leguminosas, comer esses produtos é mais eficiente em termos do uso da terra e da água do que comer soja.64 Alguns países estão a mover-se para baixo na cadeia alimentar voltando-se para as fontes de proteína mais eficientes em termos de grão, como a aquacultura. A China, com a sua enorme produção de aquacultura, pode ser o primeiro país onde a produção de peixe de cultura excede a captura de peixe selvagem.65 Com os rendimentos a subir na densamente povoada Ásia, outros países estão a seguir o exemplo da China. Entre eles, destacamse a Índia, a Tailândia e o Viet Nam. O Viet Nam, por exemplo, fez um plano em 2001 para desenvolver a aquacultura em 700.000 hectares de terra no Delta do Mekong, com o objectivo de produzir 1,7 milhões de toneladas de peixe e camarão até 2005. Parece que irá mesmo exceder esse objectivo.66


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Acção em Muitas Frentes Historicamente, a responsabilidade pela segurança alimentar estava, em grande parte, dependente do ministério da agricultura. Na última metade do século passado, garantir fornecimentos adequados de cereais no mercado mundial era uma tarefa relativamente simples. Quando a colheita mundial era insuficiente e os preços começavam a subir, o Departamento da Agricultura dos Estados Unidos repunha em produção a parte da terra que não tinha sido usada ao abrigo dos programas de controlo da oferta, aumentando assim a produção e estabilizando os preços. Este tempo terminou em 1996 quando os Estados Unidos desmantelaram o seu programa anual de pousio.67 Os ministérios da agricultura têm a principal responsabilidade na expansão da produção alimentar de modo a satisfazer o que parece ser o apetite insaciável do mundo. O rápido crescimento da procura por parte do acréscimo anual de 70 milhões de bocas para alimentar e dos 5 mil milhões de pessoas que se querem mover para cima na cadeia alimentar e, agora, pela primeira vez, da procura imparável de produtos agrícolas básicos para produzir combustível para automóveis, colocará um desafio sem precedentes aos ministros da agricultura.Ao mesmo tempo, estão confrontados com a diminuição das expectativas em tecnologia agrícola não utilizada, com a diminuição do fornecimento de água para rega e com a perspectiva de ondas de calor capazes de danificar gravemente as culturas. O crescimento da procura e as restrições na oferta juntos colocam um desafio sem precedentes aos responsáveis pela agricultura. Neste capítulo, analisámos algumas das medidas mais recentes que podem ser usadas para aumentar a produtividade da terra e da água. A adopção destas e outras acções é obviamente importante, mas no mundo novo em que entrámos, as políticas dos outros ministérios pesam também fortemente na definição dos objectivos da segurança alimentar.


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Agora, com o nosso planeta a ser levado até aos seus limites, e mesmo para além deles, a capacidade dos ministérios da saúde e do planeamento familiar para educar o público sobre as consequências do crescimento populacional e para conseguir atingir as necessidades de planeamento familiar tornou-se num assunto de segurança. O facto dos casais terem um, dois ou três filhos afecta directamente a segurança alimentar mundial. No mundo de hoje, as decisões tomadas nos ministérios da energia sobre permanecer com os combustíveis fósseis e continuar a aumentar a temperatura da Terra ou mudar para as fontes renováveis de energia e estabilizar a temperatura do planeta podem ter um efeito maior na segurança alimentar a longo prazo do que quaisquer acções tomadas pelos ministérios da agricultura. E na maior parte do mundo, no que respeita à produção de alimentos, a água é um problema mais sério que a terra. O sucesso, ou falta dele, por parte dos ministérios, em aumentar a produtividade da água afectará directamente a futura segurança alimentar e os preços da alimentação. Igualmente, num mundo onde as terras de cultivo são escassas e se tornam cada vez mais escassas, as decisões tomadas nos ministérios dos transportes sobre o desenvolvimento de sistemas centrados no automóvel ou de sistemas de transporte mais diversificados que se baseiem fundamentalmente em formas de transporte menos intensivas em terra, nomeadamente os carris ligeiros, os autocarros e as bicicletas, também afectarão a segurança alimentar mundial. Em termos mais gerais, até onde os governos forem no encorajamento do uso dos recursos agrícolas escassos para produzir bens básicos que sejam convertidos em combustível automóvel, isso afectará directamente os esforços para erradicar a fome. Aquestão é saber quão eficazes os governos serão na gestão desta competição emergente entre carros e pessoas pelos bens alimentares.


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No nosso mundo cada vez mais cheio de pessoas, a responsabilidade pela segurança alimentar vai muito para além do ministério da agricultura, envolvendo todos os ministérios no esforço para atingir plenamente o potencial sustentável da produção alimentar.Ao mesmo tempo, há muitos sucessos agrícolas que podem ser importados pelos países que se debatem para melhorar a sua segurança alimentar. É encorajador ver que os dois grandes êxitos na expansão dos abastecimentos de proteína animal – os ganhos dramáticos na produção de leite na Índia e a produção pscícola na China – podem ser replicados em muitos outros países em vias de desenvolvimento.


10 Estabilizando o Clima

Há algum tempo, recebi uma chamada do meu filho Brian, que tinha encontrado um novo parque eólico enorme quando conduzia numa das auto-estradas interestaduais no oeste do Texas. Disse-me que as hélices das torres aerogeradoras se perdiam no horizonte. Alternando com elas, havia poços de petróleo. As hélices rodavam com o vento e as bombas dos poços repetiam os seus movimentos de extracção do petróleo. Ele estava fascinado com esta justaposição do velho com o novo, o passado e o futuro. E disse-lhe, “se voltares daqui a 30 anos, as hélices das torres ainda estarão a girar, mas não é provável que ainda haja petróleo a ser extraído.” Aquilo a que o meu filho estava a assistir naquela paisagem era à transição energética, a mudança da era dos combustíveis fósseis para a das energias renováveis. A transição energética está a ganhar impulso. Quando o Protocolo de Quioto foi negociado, em 1997, a proposta de redução até 2012 de 5 por cento das emissões de carbono face aos níveis dos países industrializados em 1990, parecia um projecto ambicioso.Actualmente é vista, em grande medida, como uma meta desactualizada


Plano B 2.0 256 e claramente inadequada. Os governos nacionais, os governos locais, as grandes empresas e os grupos ambientalistas estão a surgir com planos para cortar nas emissões de carbono muito mais do que foi acordado em Quioto, voltando-se para as energias renováveis e aumentando a eficiência energética.Alguns indivíduos e grupos começam mesmo a pensar em como reduzir as emissões de carbono em 70 por cento, o número que os cientistas dizem ser necessário para estabilizar o clima.1 Em Julho de 2005, a Comissão Europeia propôs um novo plano para reduzir o consumo de energia em 20 por cento até 2020 e para aumentar em 12 por cento até 2010 a percentagem das energias renováveis na produção europeia de energia. Juntas, estas duas iniciativas reduzirão as emissões de carbono na Europa em cerca de um terço. Entre a longa lista de medidas para aumentar a eficiência energética nestes países, estão a substituição de frigoríficos velhos e ineficientes, a mudança para lâmpadas de alta eficiência e o isolamento dos telhados. Para alcançar os objectivos estabelecidos para as energias renováveis é necessário acrescentar um valor de produção, bastante conservador, de 15.000 megawatts de potência em energia eólica, multiplicar por cinco a produção de etanol, e por três a produção de biodiesel. O corte de 20 por cento proposto pelos europeus no consumo de energia até 2020 contrasta claramente com o crescimento projectado de 10 por cento num cenário económico convencional.2 O plano proposto, que se prevê para aprovação final em 2006, está concebido para a poupança de 60 mil milhões de euros até 2020. Está também desenhado para estimular o crescimento económico, criar novos empregos e, ao reduzir os consumos de energia, melhorar a competitividade europeia nos mercados mundiais.AUnião Europeia, com 25 membros, é o segundo maior consumidor de energia a seguir aos Estados Unidos.3 Em 2005 o governo japonês anunciou também uma campanha para aumentar significativamente a eficiência energética na sua economia, que é já uma das mais eficientes do mundo.Apelou à popula-


257 Estabilizando o Clima ção para substituir electrodomésticos antigos e ineficientes e para comprar carros híbridos. O New York Times descreveu isto como “uma parte do esforço patriótico para poupar energia e combater o aquecimento global”. Salientou que as grandes empresas de manufactura estavam a apanhar o combóio da eficiência energética como forma de aumentarem as vendas dos seus modelos de alta eficiência mais recentes.4 Para além deste esforço inicial, o Japão estabeleceu metas para aumentar ainda mais a eficiência dos electrodomésticos, diminuindo o consumo de energia em aparelhos de televisão em cerca de 17 por cento, em computadores pessoais em 30 por cento, em aparelhos de ar condicionado em 36 por cento, e em frigoríficos nuns impressionantes 72 por cento. Os cientistas estão a desenvolver um frigorífico isolado a vácuo que apenas gastará um oitavo da energia dos que eram comercializados há uma década.5 Ao nível não-governamental, um plano desenvolvido para o Canadá pela Fundação David Suzuki e a Climate Action Network reduziria para metade as emissões de carbono até 2030, apenas com investimentos em eficiência energética que fossem rentáveis. E no início de Abril de 2003, o World Wildlife Fund divulgou um estudo revisto por pares feito por uma equipa de cientistas que propunha reduzir em 60 por cento, até 2020, as emissões de carbono geradas nos Estados Unidos na produção de electricidade. Esta proposta baseia-se numa mudança para geradores de energia eléctrica mais eficientes, no uso de electrodomésticos, motores industriais e outros equipamentos mais eficientes e, nalguns casos, numa mudança do carvão para o gás natural, como fonte de energia. Se for implementada, resultará numa poupança média nacional de 20 mil milhões de dólares por ano, daqui até 2020.6 No Ontário, a província mais populosa do Canadá, o ministério da energia planeia encerrar as cinco grandes centrais a carvão até 2009. A primeira, a central de Lakeview, foi fechada em Abril de 2005; mais três fecharão até ao final de 2007, e a última encerra no início de 2009. Os três principais partidos políticos apoiam o plano para substituir o carvão pelo vento, pelo gás natural, e por ganhos de eficiência. Jack Gibbons, director da Clean Air Alliance do Ontário,


Plano B 2.0 258 que subscreve o plano do ministério, refere sobre a queima de carvão, “É um combustível do século dezanove que não tem lugar no Ontário do século vinte e um”.7 As grandes empresas estão também envolver-se. A Interface, o maior fabricante de carpetes industriais, com sede nos Estados Unidos, cortou as emissões de carbono em dois terços na sua filial do Canadá na década de 1990. Agiu desta forma ao examinar todas as facetas do seu negócio – do consumo de electricidade até aos procedimentos do transporte rodoviário. O Fundador e Presidente Ray Anderson afirma, “A Interface Canadá reduziu as emissões de gases de estufa em 64% do respectivo pico ganhando dinheiro neste processo, e não foi pouco, já que os nossos clientes apoiaram esta atitude de responsabilidade ambiental”. O plano Suzuki para reduzir à metade as emissões de carbono até 2030 foi inspirado pela rentabilidade económica da iniciativa da Interface.8 Embora seja um grande desafio estabilizar os níveis de dióxido de carbono na atmosfera, é perfeitamente possível fazê-lo. Com os avanços na concepção de torres aerogeradoras, com a evolução dos carros híbridos a gasolina e electricidade, os avanços na produção de células solares, e os ganhos na eficiência dos electrodomésticos, temos já as tecnologias essenciais para mudar rapidamente de uma economia baseada em combustíveis fósseis para uma economia assente em energias renováveis. Reduzir a metade as emissões de carbono do mundo até 2015 está totalmente ao nosso alcance. Por muito ambicioso que este objectivo possa parecer, ele é apenas o necessário para responder à ameaça colocada pela alteração climática.

Aumentando a Produtividade Energética O enorme potencial de aumento da produtividade energética tornase claro quando comparamos consumos energéticos em países diferentes.Algumas nações na Europa têm essencialmente o mesmo nível de vida que os Estados Unidos e, no entanto, consomem menos de metade da energia por pessoa. Mas nem os países que têm um consumo mais eficiente da energia estão perto de perceber qual o pleno potencial desse facto.9


259 Estabilizando o Clima Quando em Abril de 2001 a administração Bush anunciou um novo plano energético que previa a construção de 1300 novas centrais eléctricas até 2020, Bill Prindle, da Alliance to Save Energy de Washington, respondeu mostrando como o país podia eliminar a necessidade dessas centrais e ganhar dinheiro no processo. Ele conferiu vários passos que reduziriam a procura de electricidade: melhorar os padrões de eficiência para os electrodomésticos eliminaria a necessidade de 127 centrais; padrões de eficiência mais apertados em aparelhos domésticos de ar condicionado eliminariam 43 centrais; melhorar os padrões dos sistemas comerciais de ar condicionado acabaria com a necessidade de 50 centrais; usar isenções fiscais e códigos de energia para melhorar a eficiência dos novos edifícios pouparia mais 170 centrais; passos idênticos para melhorar a eficiência energética dos edifícios existentes poupavam 210 centrais. Estas cinco medidas da longa lista sugerida por Prindle não só eliminariam a necessidade de 600 centrais como poupariam dinheiro. Embora estes cálculos tenham sido elaborados em 2001, eles são ainda válidos simplesmente porque, nos Estados Unidos, o progresso no aumento da eficiência energética foi muito pequeno desde então.10 É claro que cada país terá que conceber o seu próprio plano para aumentar a produtividade energética. No entanto, há uma série de componentes comuns.Alguns são muito simples mas muito eficazes, tais como usar electrodomésticos com mais eficiência energética, eliminar o uso de lâmpadas incandescentes, mudar para carros híbridos a gasolina e electricidade e redesenhar o sistema de transportes públicos urbanos de modo a aumentar a eficiência e melhorar a mobilidade. Embora tenha havido uma impressionante vaga de ganhos de eficiência em electrodomésticos após as subidas do petróleo durante a década de 1970, o mundo perdeu em geral o interesse à medida que os preços do petróleo desceram depois de 1980. A subida dos preços do petróleo e do gás está a reacender o interesse por este assunto. Em coincidência, avanços de engenharia desde então trouxeram outra onda de ganhos de eficiência, tais como os já mencionados no caso do Japão, que prometem reduzir substancialmente o consumo


Plano B 2.0 260 de electricidade. Se os governos nacionais elevarem os padrões de eficiência dos electrodomésticos, explorando totalmente as últimas tecnologias, isso reduzirá drasticamente as emissões de carbono em todo o mundo. Um passo simples para poupar energia é substituir todas as lâmpadas incandescentes ainda em uso por lâmpadas fluorescentes compactas (CFLs), que usam apenas um terço da electricidade e duram 10 vezes mais. Nos Estados Unidos, onde 20 por cento de toda a electricidade é usada para iluminação, se em cada casa se substituísse as ainda muito usadas lâmpadas incandescentes por fluorescentes compactas, a electricidade para iluminação seria facilmente reduzida a metade. Acombinação entre maior longevidade e menor consumo de electricidade ultrapassa em muito o custo mais elevado das CLFs, produzindo um retorno do investimento sem risco de cerca de 25 a 40 por cento ao ano. Substituir em todo o mundo lâmpadas incandescentes por CFLs, digamos, nos próximos três anos, permitiria fechar centenas de centrais eléctricas a carvão danificadoras do ambiente.11 Uma outra área óbvia para aumentar a eficiência energética é o sector automóvel. Se na próxima década os Estados Unidos, por exemplo, se virassem da actual frota de carros com motor a gasolina para híbridos a gasolina e electricidade com a eficiência de combustível do Toyota Prius, a gasolina podia ser facilmente cortada a metade.As vendas de carros híbridos, introduzidos no mercado dos Estados Unidos em 1999, atingiram um número estimado de 88.000 em 2004. Preços mais elevados da gasolina e preocupações maiores com as alterações climáticas estão a fazer subir as vendas. Com os construtores americanos a trazerem para o mercado vários modelos novos, prevê-se que as vendas de veículos híbridos venham a exceder 1 milhão em 2008.12 Outra forma atractiva de aumentar a eficiência energética é redesenhar os sistemas de transportes urbanos, mudando do sistema existente, baseado em ocupantes únicos de um automóvel, para um sistema mais diversificado e amigável das bicicletas e da locomoção pedestre, que incluiria também sistemas bem desenvolvidos de metro


261 Estabilizando o Clima ligeiro sobre carris complementados por autocarros. Um tal sistema aumentaria a mobilidade, reduziria o consumo de energia e a poluição do ar e ofereceria mais oportunidades de exercício físico, uma solução triplamente ganhadora (win-win-win situation). Tirar os automóveis das ruas facilitaria a conversão dos parques de estacionamento em espaços verdes, criando cidades mais agradáveis.

Dominando o Vento A capacidade mundial de produção eléctrica usando o vento, que cresce 29 por cento ao ano, saltou de menos de 5.000 megawatts em 1995 para mais de 47.000 megawatts em 2004, um aumento de nove vezes. (Ver figura 10-1). O crescimento anual da energia eólica de 29 por cento pode comparar-se aos 1,7 por cento do petróleo, 2,5 por cento do gás natural, 2,3 por cento do carvão e 1,9 por cento da energia nuclear. Há seis razões para este grande crescimento da energia eólica. É abundante, barata, inesgotável, encontra-se por toda a parte, é limpa e é benigna do ponto de vista climático. Nenhuma outra energia tem todos estes atributos.13 AEuropa está a conduzir o mundo para a era da energia eólica.A Alemanha, que ultrapassou os Estados Unidos em 1997, é o líder mundial com 16.600 megawatts de capacidade geradora.AEspanha, uma potência em ascensão na energia eólica no sul da Europa, ultrapassou os Estados Unidos em 2004. A Dinamarca, que obtém actualmente uns impressivos 20 por cento da sua electricidade a partir do vento, é também líder mundial no fabrico e exportação de torres aerogeradoras.14 Nas suas projecções de 2005, o Global Wind Energy Council mostra a capacidade da Europa para gerar energia eléctrica a partir do vento a expandir-se de 34.500 megawatts em 2004 para 75.000 megawatts em 2010 e 230.000 megawatts em 2020. Prevê-se que em 2020, daqui a apenas 15 anos, a electricidade gerada a partir do vento venha a satisfazer as necessidades domésticas de 195 milhões de consumidores, metade da população da Europa.15


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Figura 10-1. Capacidade de Produção de Energia Eólica, 1980-2004 Depois de ter desenvolvido a sua actual capacidade de 34.500 megawatts em terra, a Europa está agora a voltar-se também para o vento no mar. Uma avaliação do potencial no mar da região feita em 2004 pelo grupo de consultadoria de energia do vento Garrad Hassan, concluiu que se os governos se voltarem para o desenvolvimento agressivo das suas vastas áreas marítimas, o vento poderá estar a fornecer toda a energia doméstica da Europa até 2020.16 O Reino Unido, que está a voltar-se rapidamente para o desenvolvimento do seu potencial eólico no mar, aceitou ofertas em Abril de 2001 para parques concebidos para produzir 1.500 megawatts de capacidade gerada pelo vento. Em Dezembro de 2003, o governo aceitou ofertas para 15 parques adicionais no mar com uma capacidade geradora que podia exceder 7.000 megawatts. Requerendo um investimento de mais de 12 mil milhões de dólares, estes parques eólicos no mar poderiam satisfazer as necessidades domésticas de 10 milhões dos seus 60 milhões de pessoas. No final de 2004, O Reino Unido tinha uma capacidade geradora no mar de 124 megawatts, com um adicional de 180 megawatts em construção.17


263 Estabilizando o Clima O impulso para desenvolver a energia eólica na Europa é encorajado pelas preocupações com as alterações climáticas. Amaior onda de calor na Europa, em Agosto de 2003, que queimou colheitas e reclamou 49.000 vidas, acelerou a substituição do carvão danificador do ambiente por fontes limpas de energia. Entre outros países que se estão a voltar para o vento de forma muito significativa encontram-se o Canadá, o Brasil, a Argentina, a Austrália, a Índia e a China.18 Um dos grandes atractivos do vento é a sua abundância. Quando o Departamento de Energia dos Estados Unidos apresentou o seu primeiro inventário de recursos eólicos em 1991, salientou que apenas os três estados ricos em vento – Dakota do Norte, Kansas e Texas – tinham energia eólica útil suficiente para satisfazer as necessidades eléctricas nacionais.Aqueles que tinham pensado no vento como uma fonte marginal de energia ficaram obviamente surpreendidos por esta descoberta.19 Em retrospectiva, sabemos agora que esta previsão subestimava grosseiramente o potencial eólico, já que se baseava nas tecnologias de 1991. Os avanços feitos desde então na concepção de torres aerogeradoras permitem que as turbinas operem a velocidades de vento mais baixas, convertam vento em electricidade mais eficientemente e aproveitem uma muito maior gama de intensidades do vento. Em 1991, as torres aerogeradoras teriam uma média de alturas próxima dos 40 metros. Hoje, as novas torres têm 100 metros, aproveitando talvez o triplo do vento. Sabemos agora que os Estados Unidos têm energia eólica utilizável suficiente para satisfazer não só as necessidades nacionais de electricidade nacionais mas também as necessidades de energia nacionais.20 Quando a indústria eólica começou na Califórnia no início da década de 1980, a electricidade gerada pelo vento custava 38 centavos de dólar por kilowatt-hora. Desde essa altura o custo baixou para 4 centavos de dólar ou menos nos principais parques eólicos. E foram assinados alguns contratos de longo termo nos Estados Unidos a 3 centavos de dólar por kilowatt-hora. Os principais parques eólicos poderão vir a produzir electricidade a 2 centavos de dólar por kilowatthora em 2010, transformando-se numa das mais baratas fontes de electricidade.21


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A electricidade de baixo custo produzida a partir do vento pode ser usada para fazer a electrólise da água e produzir hidrogénio, que constitui uma forma de armazenar e transportar a energia eólica. À noite, quando a procura de electricidade baixa, podem ligar-se os geradores de hidrogénio para acumular reservas. Uma vez armazenado, o hidrogénio pode ser usado como combustível para centrais eléctricas. O hidrogénio gerado a partir do vento pode assim tornarse numa reserva para a electricidade gerada a partir do vento, com a produção de electricidade gerada por hidrogénio a ser usada quando o poder do vento enfraquece. O hidrogénio gerado a partir do vento pode também ser usado como alternativa ao gás natural, especialmente se a subida dos preços tornar o gás para a geração de electricidade proibitivamente caro. O custo principal da electricidade gerada pelo vento é o do capital inicial para a construção das torres. Uma vez que o vento é um combustível gratuito, o único custo da operação é o da manutenção das turbinas. Dada a recente volatilidade dos preços do gás natural, a estabilidade dos preços da energia do vento é particularmente apelativa. Com a certeza de em breve os custos do gás natural serem ainda mais elevados, as centrais a gás natural poderão vir a ser apenas usadas como reserva para a electricidade gerada pelo vento.

Os Estados Unidos estão a atrasar-se no desenvolvimento da energia eólica simplesmente porque o subsídio fiscal (PTC) para a produção de energia eólica, de 1,5 centavos de dólar por kilowatthora, o qual foi adoptado em 1992 para estabelecer a paridade com os subsídios aos combustíveis fósseis, caducou três vezes em cinco anos.Aincerteza sobre o subsídio fiscal perturbou o planeamento em toda a indústria de energia eólica. No entanto, com a extensão do PTC por dois anos em meados de 2005, até ao fim de 2007, o crescimento nos investimentos nas eólicas está a subir rapidamente.22


265 Estabilizando o Clima Atendendo ao seu enorme potencial e aos benefícios associados à estabilização do clima, é tempo de equacionar um grande esforço para desenvolver os recursos do vento. Em vez de duplicar em cada 30 meses aproximadamente, talvez devêssemos duplicar em cada ano que passa a geração eléctrica através do vento ao longo dos próximos anos, tal como as ligações de computadores à Internet duplicaram todos os anos desde 1985 até 1995. Os custos desceriam então rapidamente, dando ainda à electricidade gerada do vento uma maior vantagem sobre os combustíveis fósseis.23 O consultor de energia Harry Braun salienta que, uma vez que as torres aerogeradoras são similares aos automóveis, no sentido em que cada uma tem um gerador eléctrico, uma caixa de velocidades, um sistema de controlo electrónico e um travão, elas podem ser produzidas em série em linhas de montagem. Na verdade, as linhas inactivas da indústria automóvel dos Estados Unidos são suficientes para produzir um milhão de torres aerogeradoras por ano. O custo inferior associado à produção em massa poderia fazer descer o custo da electricidade gerada pelo vento abaixo dos 2 centavos de dólar por kilowatt-hora. A produção das torres nas linhas de montagem em velocidade de uma “economia de guerra” diminuiria rapidamente a poluição do ar nos centros urbanos, as emissões de carbono e a perspectiva das guerras do petróleo.24 Os incentivos económicos para fazer disparar um tal crescimento poderiam vir em parte de uma simples reestruturação dos subsídios globais à energia – aplicando os subsídios para os combustíveis fósseis, de 210 mil milhões de dólares, ao desenvolvimento da energia eólica e de outras fontes de energia renovável.25 Estes objectivos podem parecer muito ambiciosos, mas esforços ambiciosos começam a tomar forma em todo o mundo. Nos Estados Unidos, um parque eólico de 3.000 megawatts está na fase inicial de planeamento. Localizado no Dakota do Sul, perto da fronteira do Iowa, este parque está a ser lançado pela Clipper Wind, dirigida por James Dehlsen, um pioneiro da energia do vento na Califórnia. Concebido para fornecer energia ao Midwest industrial à volta de Chicago, este projecto não só é muito grande em termos de energia eólica


Plano B 2.0 266 propriamente dita, como é actualmente um dos maiores projectos de energia de qualquer tipo em todo o mundo. No leste dos Estados Unidos, a Cape Wind planeia um parque eólico de 420 megawatts para a costa do Cape Cod, Massachusetts.26 Cerca de 24 estados têm agora parques eólicos de escala comercial a fornecer electricidade para a rede eléctrica dos Estados Unidos. Embora haja ocasionalmente um problema NNMQ (“não no meu quintal”), a resposta PNMQ (“ponha no meu quintal”) é muito mais abundante. Isto não surpreende, uma vez que uma única torre grande pode facilmente gerar uma receita de 100.000 dólares em electricidade por ano.27 A competição por parques eólicos entre agricultores, em lugares como o Iowa, ou entre rancheiros, no Colorado, é intensa. Os agricultores, sem investimento próprio, recebem da instituição local cerca de 3 a 5 mil dólares por ano em royalties para colocarem uma única, grande, torre aerogeradora de última geração, que ocupa pouco mais de 1.000 metros quadrados de terreno. Este terreno produziria 100 alqueires de milho no valor de 120 dólares ou, na terra dos ranchos, carne de vaca no valor de 15 dólares.28 A acrescentar à receita adicional, à receita de impostos e aos postos de trabalho que os parques eólicos trazem, o dinheiro gasto em electricidade gerada pelo vento permanece na comunidade, criando um efeito de alastramento através de toda a comunidade local. Em alguns anos apenas, milhares de rancheiros poderiam estar a ganhar muito mais com vendas de electricidade do que com vendas de gado. A questão não é só saber se o vento é ou não uma vasta fonte potencial de energia benigna do ponto de vista climático, e que pode ser usada para estabilizar o clima. É. Mas será que a vamos desenvolver de forma tão rápida que possa atender a tempo à alteração climática perturbadora da economia?


Estabilizando o Clima

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Carros Híbridos e Energia Eólica Com o preço do petróleo a ultrapassar os 60 dólares por barril quando escrevo, Setembro de 2005, com a instabilidade no Médio Oriente no horizonte, com pouca margem de manobra na economia mundial do petróleo, e com as temperaturas a subir, o mundo precisa de uma nova economia da energia. Felizmente, as bases para uma nova economia da energia dos transportes foram lançadas com duas novas tecnologias – os motores híbridos a gasolina e electricidade de que a Toyota é pioneira, e as torres aerogeradoras de última geração.29 Estas tecnologias instaladas em conjunto podem reduzir drasticamente o consumo mundial de petróleo. Como referido anteriormente, os Estados Unidos podem facilmente reduzir o consumo de gasolina para metade convertendo a sua frota de automóveis para carros híbridos que sejam tão eficazes como o Toyota Prius. Não é necessário diminuir o número de veículos nem o número de quilómetros percorrido – basta usar a tecnologia de propulsão mais eficiente do mercado.30 De facto, para além do Prius, há já no mercado vários modelos de carros híbridos a gasolina e electricidade, como o Honda Insight e uma versão híbrida do Honda Civic. De acordo com a Environmental Protection Agency, o Prius – um carro de dimensões médias, na vanguarda da tecnologia automóvel - gasta uns incríveis 4,3 litros de gasolina aos 100 Km numa condução combinada entre cidade e autoestrada, em comparação com os 10,6 litros aos 100 Km gastos pelos novos veículos ligeiros de passageiros. Não é de admirar que haja filas de compradores ávidos que não se importam de esperar vários meses pela sua entrega.31 Recentemente, a Ford colocou no mercado um modelo híbrido do seu Escape SUV, e a Honda apresentou uma versão híbrida do popular Accord sedan.AGeneral Motors vai oferecer versões híbridas de vários dos seus carros, começando pelo Saturn VUE em 2006 e seguindo-se o Chevy Tahoe e o Chevy Malibu.32


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Plano B 2.0

Salientámos já neste capítulo a forma de reduzir pela metade o consumo de gasolina nos Estados Unidos durante a próxima década, mudando para veículos híbridos a gasolina e electricidade. Com a mudança para este tipo de carros, ficam criadas as condições para um segundo passo na redução do consumo de gasolina, que poderá ser o uso de electricidade gerada pelo vento para alimentar os automóveis. Se adicionarmos aos carros híbridos uma segunda bateria para aumentar a sua capacidade de armazenar electricidade e um dispositivo de ligação que permita também o carregamento a partir da rede eléctrica, os automobilistas poderão então fazer as suas deslocações, compras e outros percursos de curta distância usando principalmente electricidade, guardando a gasolina para viagens mais longas.Ainda mais excitante, recarregar as baterias com electricidade gerada pelo vento em horas de baixo consumo teria um custo equivalente à gasolina a 13,2 centavos de dólar por litro. Esta modificação nos híbridos reduziria o consumo da gasolina ainda usada em mais 40 por cento (ou 20 por cento do nível de consumo original), ou seja, uma redução total do consumo de gasolina de 70 por cento.33 Estas não são as únicas tecnologias que podem cortar drasticamente o consumo de gasolina.Amory Lovins, um muito considerado pioneiro na concepção de formas de reduzir o consumo de energia, observa que a maior parte dos esforços para aumentar a eficiência combustível dos automóveis se centra na concepção de motores mais eficientes, desprezando em grande medida o potencial de poupança através da redução do peso do veículo. Ele afirma que se substituir o aço por avançados compostos polímeros na construção do corpo dos automóveis pode-se “duplicar, aproximadamente, a eficiência de um híbrido com um peso normal sem se aumentar na prática o seu custo total de fabrico”. Se construirmos híbridos a gasolina e electricidade usando os mais avançados polímeros, então podemos reduzir os restantes 30 por cento de consumo de combustível à metade, numa redução total de 85 por cento.34 Ao contrário do muito discutido modelo de transporte a pilhas de células de hidrogénio, o modelo híbrido a gasolina e electricidade


269 Estabilizando o Clima produzida a partir do vento não requer uma nova infra-estrutura de alto custo, uma vez que a rede de estações de serviço de gasolina e a rede de electricidade já existem. Para explorar totalmente esta tecnologia, os Estados Unidos teriam necessidade de integrar as suas fracas redes regionais numa rede nacional mais forte, coisa que de qualquer forma precisam de fazer para reduzir o risco de blackouts. Isto, conjugado com a construção de milhares de parques eólicos em todo o país, permitiria que a frota nacional de automóveis se movesse, em grande parte, a energia eólica.35 Um dos poucos pontos fracos da energia produzida a partir do vento – a sua irregularidade – é em grande medida ultrapassada com o uso de veículos híbridos a gasolina e electricidade com capacidade de ligação à rede eléctrica, uma vez que as respectivas baterias constituem um sistema de armazenamento para este tipo de energia. Para além disso, há sempre o depósito de gasolina como reserva. A combinação dos híbridos a gasolina e electricidade, equipados com uma segunda bateria de armazenamento e capacidade de ligação à rede eléctrica, com o desenvolvimento dos recursos do vento e o uso de avançados compostos polímeros para reduzir o peso dos veículos, tem sido discutida no âmbito dos Estados Unidos, mas trata-se de um modelo que pode ser adoptado em todo o mundo. É particularmente apropriado para países dotados com abundante energia eólica, tais como a China, a Rússia, a Austrália, a Argentina e muitos países da Europa.36

Mudar para estes híbridos altamente eficientes, em combinação com a construção de milhares de parques eólicos em todo o país para fornecer electricidade a uma forte e integrada rede eléctrica nacional, pode baixar o consumo de gasolina em 85 por cento. Rejuvenescerá também as comunidades de quintas e ranchos e diminuirá o deficit da balança comercial dos Estados Unidos. Mais importante ainda, pode reduzir as emissões de carbono dos automóveis em 85 por cento, transformando os Estados Unidos num modelo para os outros países.


270 Convertendo a Luz do Sol em Electricidade

Plano B 2.0

O vento não é a única vasta fonte de energia por descobrir. Quando uma equipa de três cientistas em Bell Labs, Princeton, New Jersey, descobriu em 1952 que a luz do sol ao bater numa superfície de silicone podia gerar electricidade, abriu a porta a outra fonte inesgotável de energia – as células fotovoltaicas (ou solares). “ Nenhum país utiliza toda a energia que está contida na luz solar que bate todos os dias nos seus edifícios”, escreve Denis Hayes, antigo Director do Instituto governamental de Investigação da Energia Solar dos Estados Unidos.37 As vendas de células solares em todo o mundo aumentaram uns fenomenais 57 por cento em 2004, elevando a capacidade geradora instalada nesse ano em 1.200 megawatts. Com este aumento, a capacidade geradora de energia solar, que duplicou nos últimos dois anos, excede agora os 4.300 megawatts, o equivalente aproximado a 13 centrais eléctricas a carvão. (Ver Figura 10-2). Há uma década, os Estados Unidos tinham cerca de metade do mercado mundial, mas passaram agora para 12 por cento, com o Japão e aAlemanha a surgirem à frente com ambiciosos programas solares.38 As células solares são usadas tanto em sistemas isolados como em sistemas que podem alimentar a rede eléctrica. Nos seus primeiros anos, a indústria de células solares era dominada por utilizações não ligadas à rede para fornecer electricidade a satélites de comunicação e em locais remotos tais como florestas ou parques nacionais, a faróis no mar, a casas de verão em regiões montanhosas isoladas, ou ilhas. Na última década, as instalações de células solares que fornecem para a rede eléctrica cresceram rapidamente em resposta aos incentivos oferecidos pelos governos, e são agora mais de três quartos do total das novas instalações. Contadores bidireccionais que permitem aos consumidores domésticos fornecer excedentes de electricidade à rede a um preço fixo fizeram disparar o crescimento na utilização das células solares. O Energy Policy Act dos Estados Unidos de 2005 estipulou os contadores bidireccionais para todas as pessoas que os requeiram.Alguns países determinaram um preço fixo a ser pago pela


271 Estabilizando o Clima companhia eléctrica pela electricidade fornecida para a rede. NaAlemanha, este preço foi fixado bastante acima do preço de mercado para reflectir o valor da electricidade limpa e para provocar o arranque da nova indústria de energia solar.39

Figura 10-2. Capacidade Mundial de Geração Fotovoltaica, 1971-2004 O uso doméstico das células solares está a expandir-se a um ritmo alucinante em alguns países. No Japão, onde as empresas comercializaram um material para telhados solares, a ideia de tornar o telhado na central eléctrica da casa é cada vez mais popular. Isto, combinado com o Programa de 70.000 Telhados lançado em 1994 para subsidiar instalações, colocou o país numa plataforma de lançamento rápido, tornando-o no líder mundial em electricidade gerada por energia solar.40 Em 1998, a Alemanha iniciou um Programa de 100.000 Telhados fazendo empréstimos de 10 anos com juros reduzidos aos consumidores para adquirirem sistemas fotovoltaicos. Este programa terminou em 2003 quando a meta de 100.000 telhados solares foi atingida. Com este mercado de crescimento rápido, os custos das células solares desceram agora a um ponto em que os fabricantes alemães se sentem bastante competitivos internacionalmente.41


Plano B 2.0 272 Dentro dos Estados Unidos, a Califórnia está também a oferecer atraentes incentivos para a instalação doméstica de células solares. Num clima onde a capacidade máxima em dias quentes de verão chega a pôr pressão na capacidade de recepção da rede eléctrica, as células solares são usadas como uma alternativa às centrais de combustível fóssil, na sua maioria a gasolina, que operam apenas no pico da procura durante o dia. Felizmente, as células solares geram a maior quantidade de electricidade durante as horas mais quentes do dia, tornando-as ideais para satisfazer os picos da procura.42 As instalações de células solares podem ser ainda mais económicas em grandes edifícios. Em Manchester, Inglaterra, um edifício de 40 andares que precisa de ser renovado será coberto com material fotovoltaico. Com três lados cobertos com este material, este edifício de 122 metros, tem uma enorme superfície de geração. Um representante do proprietário e ocupante do edifício, Co-operative Insurance Society, referiu, sorridente, que produzirá em cada ano electricidade suficiente para fazer 9 milhões de chávenas de chá.43 Em anos recentes, um novo e vasto mercado de células solares sem ligação à rede abriu-se nas aldeias dos países em vias de desenvolvimento, onde o custo de construir uma central eléctrica centralizada e uma rede eléctrica para distribuir relativamente pequenas quantidades de electricidade a consumidores individuais é proibitivo. Com os custos das células solares a cair, no entanto, é agora, com frequência, mais barato fornecer electricidade através da instalação de células solares do que a partir de uma fonte centralizada. Nas aldeias dos Andes, instalações solares estão a substituir os candeeiros como forma de iluminação. Para os habitantes que estão a pagar a instalação há 30 meses, o pagamento mensal é mais ou menos igual ao custo de um mês da luz dos candeeiros. Logo que as células solares estejam pagas, então eles terão uma fonte de energia praticamente gratuita – que poderá fornecer electricidade por décadas. Também nas aldeias da Índia, onde a luz é fornecida por candeeiros de querosene, os altos preços do petróleo querem dizer que o querosene feito a partir de petróleo importado pode custar agora muito mais do que as células solares.44


273 Estabilizando o Clima Hoje mais de um milhão de casas em aldeias do mundo em vias de desenvolvimento estão a obter a sua electricidade a partir de células solares, mas isto representa menos de 1 por cento de 1.7 mil milhões de pessoas que ainda não têm electricidade. O principal obstáculo à disseminação de instalações de células solares em aldeias não é o custo em si, mas a falta de programas de crédito baixo para os financiar. Se esta falta de crédito for ultrapassada rapidamente, as compras de células solares em aldeias irá disparar.45 O futuro das células solares é promissor. O Japão, por exemplo, onde as instalações em residências excederam 1.000 megawatts de capacidade instalada no final de 2004, planeia ter 10 por cento da sua electricidade a partir de células solares até 2030. AAlemanha tem actualmente 700 megawatts de capacidade instalada, e está a crescer rapidamente. Os Estados Unidos, terceiro a grande distância, introduziram um subsídio fiscal solar no Energy Policy Act de 2005. Primeiro crédito deste tipo em 20 anos, este subsídio promete rejuvenescer a indústria solar americana.46 O custo das células solares tem vindo a descer há várias décadas e espera-se que continue a cair no futuro. De cada vez que a produção acumulada duplica, as economias de escala da produção fazem baixar o preço em mais 20 por cento. Além disso, em inúmeros centros de investigação de vários países, estão a ser desenvolvidas tecnologias de produção de células solares que convertem uma maior quantidade de luz solar em electricidade a um custo inferior.47 Para além da produção directa de electricidade a partir de células solares, a energia solar pode também ser concentrada para ferver água e produzir vapor, accionando uma turbina para gerar electricidade. Há vários modelos usados em centrais de energia solar, entre os quais torres de energia que consistem num dispositivo elevado contendo água aquecida por um sistema de espelhos, e contentores solares. Geralmente controlados por computador, os espelhos mudam de posição com o movimento do sol para maximizar a luz focada na caldeira. Cerca de 350 megawatts de capacidade gerada têm estado a operar na Califórnia com muito sucesso, desde que foram


Plano B 2.0 274 construídas nove centrais deste tipo, entre meados dos anos 1980 e o início da década de 1990. Novas iniciativas para desenvolver centrais de energia solar térmica estão actualmente na forja em Espanha.48 Uma das formas mais populares de dominar a energia solar é o uso de colectores solares térmicos de telhado tanto para águas quentes como para aquecimento do ambiente. Janet Sawing do Worldwatch Institute refere que há 150 milhões de metros quadrados de instalações a nível global. Excluindo um quarto desta quantidade, usado em piscinas, o resto fornece água ou ambiente aquecido a 32 milhões de famílias.49 Há anos que tanto Israel como o Chipre, países ricos em sol, encorajam o uso de aquecedores de água solares como forma de reduzir a necessidade de importar combustíveis fósseis.AAlemanha, que tem 5.4 milhões de metros quadrados de painéis de aquecimento solar de água, está em segundo lugar no ranking da capacidade instalada. A sua área de painéis totaliza 540 hectares.50 A China, muito atrás do líder mundial nesta tecnologia, planeia quadruplicar os seus 52 milhões de metros quadrados de colectores até 2015, informa Sawin. A Espanha, líder na produção de painéis solares térmicos, aposta em liderar a indústria exigindo a inclusão de aquecedores solares de água de telhado em todos os novos edifícios, tanto residenciais como comerciais, a partir de 2005. Um painel de dois metros numa casa unifamiliar pode reduzir as contas anuais de aquecimento de água em cerca de 70 por cento. Com efeito, a Espanha está a substituir a importação de petróleo pelo seu abundante sol.51 As tecnologias para converter luz solar em electricidade ou usála para o aquecimento de águas ou ambiente em edifícios estão já bastante desenvolvidas. E os aspectos económicos estão a ajustar-se a esta realidade. O que é necessário para acelerar isto é uma série de incentivos em todos os países que reflictam o valor que tem para a sociedade a redução da dependência do petróleo e a redução das emissões de carbono.


Estabilizando o Clima Energia da Terra

275

Quando pensamos em energia renovável, geralmente pensamos naquelas fontes que são oriundas directa ou indirectamente do sol. Mas a Terra é, ela própria, uma fonte de energia de calor (vinda principalmente da radioactividade nas suas profundezas), que se escapa gradualmente quer por condutividade ou através de fontes de água quente e geysers que trazem o calor das entranhas da Terra para a superfície.Aenergia geotérmica é inesgotável e durará tanto como a própria Terra. Para além de ser uma fonte ideal de energia contínua, a energia geotérmica é ambientalmente atractiva por várias razões. As suas emissões de dióxido de carbono, dióxido sulfuroso e óxido de nitrogénio são negligenciáveis ou não existentes.Aágua usada para a geração eléctrica geotérmica é 1 por cento da usada nas centrais eléctricas a gás natural.52 O potencial da energia geotérmica é extraordinário. Só o Japão tem uma capacidade estimada de geração de electricidade geotérmica de 69.000 megawatts, o suficiente para satisfazer um terço das suas necessidades de electricidade. Entre os países ricos em energia geotérmica estão os situados na orla do Pacífico, no chamado Círculo de Fogo. Entre esses estão, na costa, o Chile, o Peru, o Equador, a Colômbia, todos os países da América Central, o México, o oeste dos Estados Unidos e o Canadá, e a oeste, a Rússia, a China, a Coreia do Sul, o Japão, as Filipinas, a Indonésia, aAustrália e a Nova Zelândia. Outros países ricos do ponto de vista geotérmico são os que se situam ao longo da Grande Falha de África e Mediterrâneo Leste. Felizmente, muitos países têm já experiência suficiente e capacidade de engenharia para dominar este vasto recurso.53 Tal como a energia solar, a energia geotérmica é usada tanto para gerar electricidade como para aquecer directamente edifícios, estufas e lagos de aquacultura. É também utilizada como fonte de calor para processos industriais. Depois da Itália ter sido pioneira no uso da energia geotérmica para produzir electricidade em 1904, a prática


Plano B 2.0 276 generalizou-se a cerca de 25 países. Globalmente, a capacidade de 8.400 megawatts em 2003 representa um crescimento de 44 por cento sobre os 5.800 megawatts disponíveis em 1990.54 Dois países – os Estados Unidos, com 2.000 megawatts, e as Filipinas, com 1.900 megawatts – são responsáveis por cerca de metade da capacidade mundial de produção. As Filipinas, onde o geotérmico fornece 27 por cento da electricidade do país, são o líder mundial. A Califórnia, o estado mais populoso dos Estados Unidos, obtém 5 por cento da sua electricidade a partir de centrais geotérmicas. A maior parte da restante capacidade de produção de energia geotérmica está concentrada em cinco países: Itália, México, Indonésia, Japão e Nova Zelândia.55 O uso directo do calor geotérmico para vários fins de aquecimento é ainda o maior em todo o mundo, equivalendo a 12.000 megawatts de produção de electricidade. O seu uso nas bombas de calor geotérmicas, que extraem e concentram calor de águas quentes para vários fins, domina este tipo de aplicação. Mais de 30 países recorrem à energia geotérmica para aquecimento.56 A Islândia e a França são os líderes. Na Islândia, 90 por cento das casas são aquecidas com energia geotérmica, economizando mais de 100 milhões de dólares por ano em importações de petróleo. A energia geotérmica representa mais de um terço do consumo energético da Islândia. Após os dois picos do preço do petróleo na década de 1970, foram construídas cerca de 70 instalações de aquecimento geotérmico na França, fornecendo calor e água quente para cerca de 200.000 residências. Nos Estados Unidos, as casas particulares são fornecidas directamente com calor geotérmico em Reno, Nevada e em Klamath Falls, Oregon. A China, o Japão e a Turquia são outros países que têm bastantes sistemas distritais de aquecimento geotérmico.57 A energia geotérmica é uma fonte ideal de calor para estufas, particularmente em climas do norte.ARússia, a Hungria, a Islândia e os Estados Unidos, todos usam estufas aquecidas com energia


277 Estabilizando o Clima geotérmica para produzir legumes frescos no Inverno. Com os preços galopantes do petróleo a fazer disparar os custos de transporte dos produtos frescos, esta opção acabará, provavelmente, por se tornar mais popular nos anos que aí vêm.58 Cerca de 16 países usam a energia geotérmica em aquacultura. Entre eles, China, Israel e Estados Unidos. Na Califórnia, por exemplo, 15 explorações produzem tilápia, robalo-muge e peixe-gato com águas mornas do subsolo. Esta água mais quente permite aos peixes crescerem sem interrupção durante o Inverno e ficarem prontos para consumo mais rapidamente. Em conjunto, estas explorações da Califórnia produzem 4,5 milhões de quilos de peixe por ano.59 O número de países que se está a voltar para a energia geotérmica, tanto para produção de electricidade como para uso directo, está a crescer rapidamente. E cresce também a gama de utilizações.Apartir do momento em que o valor da energia geotérmica é descoberto, a sua utilização é muitas vezes diversificada.ARoménia, por exemplo, usa a energia geotérmica para aquecimento a nível distrital, para estufas, e para fornecer água quente a casas e fábricas. Com bombas de calor geotérmicas, a Terra pode servir tanto de fonte de calor como de reservatório para fornecer aquecimento no Inverno e arrefecimento no verão.60 A energia geotérmica tem um uso generalizado para banhos e natação. O Japão, por exemplo, tem 2.800 termas, 5.500 banhos públicos e 15.600 hotéis e estalagens que usam água quente geotérmica.AIslândia utiliza a energia geotérmica para aquecer cerca de 100 piscinas públicas, a maioria delas ao ar livre e funcionando todo o ano. A Hungria aquece 1.200 piscinas com esta energia.61 A Indonésia, com uma população de mais de 222 milhões de pessoas, poderia obter facilmente toda a electricidade a partir da energia geotérmica. Situada no limite oeste do Pacífico, com 500 vulcões, 128 dos quais activos, a Indonésia tem um plano geral para 11 centrais de energia geotérmica com uma capacidade de um pouco mais que 300 megawatts cada – o que totaliza 3.400 megawatts. Este


Plano B 2.0 278 plano foi perturbado pela crise financeira asiática de 1997, mas os seus apoiantes estão agora a tentar reanimá-lo. Com a produção de petróleo a cair, a Indonésia precisa de desenvolver rapidamente fontes alternativas de energia.Ao contrário dos investimentos no petróleo, a energia geotérmica aproveita uma fonte que pode durar para sempre.62

Reduzir Rapidamente as Emissões de Carbono De longe, a forma mais barata e rápida de reduzir as emissões de carbono é aumentar a eficiência no consumo da energia. Não só é barato, mas também, muitas vezes, rentável economicamente.Aoutra opção é desenvolver fontes renováveis de energia. Neste quadro, talvez a questão mais complexa seja a de saber qual dos combustíveis alternativos para automóveis deve ser desenvolvido.Até há pouco, a única alternativa considerada de modo generalizado era, desde os picos iniciais do preço do petróleo, na década de 1970, o biocombustível.Agora, com o advento dos híbridos a gasolina e electricidade com ligação à rede eléctrica, a electricidade gerada pelo vento torna-se uma opção apelativa devido à sua abundância e baixo custo. O uso limitado de terrenos pelas eólicas é impressionante. No interior dos Estados Unidos, mil metros quadrados de terreno na cintura do milho pode ser usado para albergar uma torre aerogeradora de concepção avançada que produzirá electricidade no valor de 100.000 dólares por ano, ou pode ser usado para produzir 1 300 litros de milho que gerarão 379 litros de etanol valendo, talvez, 200 dólares. Se o objectivo é minimizar a competição da economia dos combustíveis de automóvel pelos recursos alimentares, a electricidade gerada pelo vento é a escolha óbvia.63 Entre as várias fontes de etanol, a cana-de-açúcar é de longe a mais eficiente tanto a nível do uso da terra como da energia.Aprodução de etanol por acre (0,4 hectares) a partir da cana-de-açúcar é aproximadamente de 2.460 litros, enquanto que a partir do milho, nos Estados Unidos, é de 1.324 litros, cerca de metade. Comparan-


279 Estabilizando o Clima do a energia líquida produzida pela cana-de-açúcar e pelo milho regista-se uma enorme vantagem da primeira sobre o segundo, de 8 para 1,5.64 A produção a partir do óleo de palma de mais de 4.700 litros de biodiesel por acre compara muito favoravelmente com 530 litros por hectare no caso da soja. O aspecto negativo tanto da cana-de-açúcar como do óleo de palma, enquanto matérias-primas, é que ambos crescem em regiões tropicais e subtropicais, o que quer dizer que a sua produção será provavelmente expandida arrasando as florestas tropicais.65 A mais eficiente opção de combustível para automóveis parece ser o híbrido a gasolina e electricidade com capacidade de ligação a uma rede principalmente alimentada com energia eólica. Uma vez que quase todos os alimentos básicos podem ser convertidos em combustível automóvel, etanol ou bio diesel, há um risco de que a subida dos preços do petróleo estimule investimentos maciços na produção de biocombustíveis, utilizando alimentos básicos como matéria-prima. Isto poderia iniciar uma competição directa entre automobilistas afluentes e consumidores de alimentos com baixo poder de compra pelos mesmos itens alimentares, incluindo o trigo, o arroz, o milho, a soja e a cana-de-açúcar. Evitar esta competição potencial entre supermercados e estações de serviço pelos mesmos alimentos depende da capacidade dos governos estabelecerem políticas para proteger os consumidores de alimentos. Num mundo que faz face à perniciosa alteração climática, cada país terá que encontrar a sua própria estratégia de redução do carbono à luz das suas fontes renováveis de energia complementares e dos seus muito promissores potenciais de aumento da eficiência energética. No entanto, muitas tecnologias para cortar as emissões de carbono, tais como electrodomésticos eficientes energeticamente e veículos híbridos a gasolina e electricidade, são comuns em todas as sociedades. AIslândia é provavelmente o único país que tem uma estratégia actual para erradicar o consumo de combustíveis fósseis, incluindo o petróleo, completamente. Nesta altura já aquece 85 por cento de todos os edifícios, residências particulares e comerciais, com energia


Plano B 2.0 280 geotérmica. Além disso, 82 por cento da sua electricidade vem da energia hídrica, sendo geotérmica a maior parte da restante energia eléctrica. Está agora a utilizar a sua electricidade hídrica barata para electrolisar água e produzir hidrogénio. Com a primeira estação de hidrogénio em operação em Reykjavik, o país está a voltar-se para autocarros a pilhas de células de hidrogénio.Aseguir planeia converter também os automóveis e depois fazer o mesmo com a frota de pesca, a qual está no centro da sua economia.66 O maior ganho em redução de emissões de carbono pode surgir no sector automóvel dos Estados Unidos onde, se disse, existe o potencial de redução do consumo de gasolina de uns extraordinários 85 por cento. Este modelo aplicado no mundo inteiro poderia ajudar o planeta a ajustar-se ao próximo declínio da produção petrolífera.67 Nos Estados Unidos, a grande aposta económica na energia eólica de baixo custo sugere que o vento irá provavelmente emergir como a peça central da nova economia energética. Pode fornecer electricidade para aquecimento, para arrefecimento, para cozinhar, para combustível de automóveis, e até para produzir aço, usando a energia eléctrica eficiente das fornalhas de arco voltaico para o fundir. Os Estados Unidos, que obtêm 7 por cento da electricidade a partir das instalações hidroeléctricas que possuem, têm também um potencial geotérmico considerável nos estados do oeste e um enorme potencial de uso de células solares em todo o país.68 AAlemanha planeia cortar drasticamente as suas emissões de carbono, aumentando continuamente a eficiência energética e recorrendo a fontes renováveis de energia, com ênfase para o vento. Planeia ter em 2050 uma redução da energia global de cerca de 37 por cento, usando para tal as últimas tecnologias no aumento da eficiência energética. Dos restantes 63 por cento, 45 por cento serão energias renováveis. Isto significa um corte de 65 por cento das suas emissões de carbono totais. AAlemanha apostará fortemente no vento e nas células solares para produzir electricidade e nos painéis solares térmicos para aquecimento de águas e do ambiente.69


281 Estabilizando o Clima O futuro energético da Indonésia está nas suas vastas fontes de energia geotérmica. Com mais do que suficiente capacidade para satisfazer todas as suas necessidades de electricidade, a Indonésia pode também desenvolver os seus abundantes recursos solares e eólicos e usar electricidade para alimentar veículos híbridos. Com 11 por cento da electricidade de origem hídrica, a Indonésia tem disponível uma grande gama de recursos renováveis de energia.70 Para a Espanha, banhada em sol o ano inteiro, serão as células solares e painéis solares a aparecer com proeminência no fornecimento de electricidade, para aquecimento e arrefecimento.AEspanha está também a mover-se rapidamente no desenvolvimento das suas ricas capacidades de energia eólica.71 O Brasil é único na possibilidade de atingir dentro de poucos anos a auto-suficiência em combustível para automóveis sob a forma de etanol produzido da cana-de-açúcar. Em conjunto com um significativo fornecimento de energia hídrica, o vento e as células solares também fornecerão electricidade. Painéis solares farão o aquecimento de águas. O Brasil poderá ser um dos primeiros grandes países a colocar fora de uso de forma significativa os combustíveis fósseis.72 No caso da China, a energia hídrica já fornece 15 por cento da electricidade, mas o grande potencial está no vento. A China pode facilmente duplicar a sua produção actual de electricidade usando apenas o vento. Como os Estados Unidos, a combinação de veículos híbridos a electricidade e gasolina com uma segunda bateria de armazenamento e capacidade de ligação à rede eléctrica e com um grande investimento na utilização das suas abundantes fontes de vento pode minimizar o uso da gasolina e reduzir a dependência do carvão.73 No Reino Unido, a electricidade gerada pelo vento, principalmente em parques eólicos no mar, tem um enorme potencial. Isto, combinado com a energia das ondas (que tem em grande abundância) e os painéis solares para aquecimento de água, pode satisfazer uma grande parte das necessidades de energia do país.74


Plano B 2.0 282 Na Argentina, onde a energia hídrica já fornece 42 por cento da electricidade, o vento pode fornecer facilmente o restante.Asua vasta região da Patagónia possui uma das mais ricas fontes eólicas do mundo.AArgentina tem também potencial para electricidade solar e painéis solares.75 Ao longo do século passado, o mundo tornou-se cada vez mais dependente de uma pequena mão cheia de países no Médio Oriente para obter energia. Neste século, está a voltar-se para as fontes de energia locais. O século passado assistiu à globalização da economia da energia, enquanto que hoje assistimos à sua localização. Onde havia, no século passado, uma situação em que “uma medida serve para todos”, no século vinte e um, cada país irá escolher uma estratégia energética que se ajuste às suas próprias fontes de energia renovável e ao seu potencial para gerar eficiência energética. Para todos os países, em especial os países em vias de desenvolvimento, a boa notícia económica relativa à transição energética é que esta recorre mais ao trabalho intensivo do que ao uso dos combustíveis fósseis.Apesar daAlemanha ainda estar numa fase inicial da transição energética, as suas indústrias de energia renovável já empregam mais trabalhadores do que as velhas indústrias de combustíveis fósseis e nuclear. Num mundo em que o desemprego se generaliza, estas são certamente notícias bem-vindas.76 Além do mais, ao contrário dos investimentos em campos de petróleo e gás e em minas de carvão, onde a delapidação e o abandono eram inevitáveis, as novas fontes de energia são inesgotáveis. Apesar de todas as torres aerogeradoras de energia eólica, células solares e painéis solares térmicos poderem vir a precisar de reparações e substituições ocasionais, o investimento inicial pode manter-se indefinidamente. Este poço não irá secar.


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Concebendo Cidades Sustentáveis

Há alguns anos, enquanto me levavam do meu hotel para um centro de conferências em Telavive, não pude deixar de reparar na presença esmagadora dos carros e parques de estacionamento. Telavive crescera durante a era automóvel de um pequeno conjunto habitacional, há meio século, para a actual cidade de 3 milhões de habitantes. Ocorreu-me então que o ratio entre espaços verdes e parques de estacionamento poderia ser o melhor indicador de habitabilidade de uma cidade – uma indicação sobre se a cidade foi concebida para as pessoas ou para os carros.1 As cidades deste nosso mundo estão em apuros. Na cidade do México, em Teerão, Banguecoque, Xangai e centenas de outras cidades, a qualidade de vida diária está a deteriorar-se. Respirar o ar em algumas urbes é equivalente a fumar dois maços de cigarros por dia. Nos Estados Unidos, o número de horas que as pessoas demoram para ir a lado nenhum, paradas nos seus carros em ruas e autoestradas com tráfico congestionado, aumenta todos os anos, elevando os níveis de frustração.2


Plano B 2.0 284 Em resposta a isto, assistimos à emergência de um novo urbanismo. Uma das transformações urbanas modernas mais notáveis aconteceu em Bogotá, Colômbia, onde, a partir de 1998, Enrique Peñalosa foi por três anos Presidente da Câmara. Quando iniciou funções, a sua preocupação não foi a de saber como melhorar a vida dos 30 por cento de pessoas que tinham carro; queria, sim, saber o que podia ser feito pelos 70 por cento – a maioria – das que não tinham automóvel. 3 Peñalosa percebeu que uma cidade que tenha um ambiente agradável para crianças e idosos é boa para toda a gente. Em apenas alguns anos, ele transformou a qualidade da vida urbana com base na sua visão da cidade concebida para as pessoas. Sob a sua liderança, a cidade proibiu o parqueamento de automóveis nos passeios, criou ou renovou 1.200 espaços verdes, introduziu com sucesso um sistema de trânsito rápido baseado em autocarros, construiu centenas de quilómetros de trilhos de bicicletas e vias pedonais, reduziu o trânsito na hora de ponta em 40 por cento, plantou 100.000 árvores, e envolveu os cidadãos locais directamente na melhoria das suas zonas habitacionais.Ao fazer isto, ele gerou um sentimento de orgulho cívico entre os 8 milhões de residentes da cidade, tornando as estradas de Bogotá, neste país agitado, mais seguras que as de Washigton, D.C.4 Enrique Peñalosa observa que “os espaços pedestres públicos de alta qualidade, em geral, e os espaços verdes, em particular, são o espelho de uma verdadeira democracia em funcionamento”. Refere ainda que “Os espaços verdes e o espaço público são também importantes para uma sociedade democrática por serem os únicos sítios onde as pessoas se encontram em plano de igualdade… Numa cidade, os espaços verdes são tão essenciais para se manter a saúde física e emocional como o abastecimento de água”. Ele salienta que isto não parece assim tão óbvio nos orçamentos da maior parte das cidades, onde os parques são considerados um luxo. Em contraste, “as estradas, o espaço público para carros, recebem infinitamente mais recursos e menos cortes orçamentais do que os parques e o espaço público para as crianças. “Porquê”, pergunta, “são os espaços públicos para carros considerados mais importantes do que os espaços para crianças?”5


Concebendo Cidades Sustentáveis 285 Ao abraçar esta nova filosofia urbana, Peñalosa não está sozinho. Areforma que iniciou em Bogotá está a ser continuada pelo seu sucessor, Antanas Mockus. Agora, projectistas governamentais em toda a parte experimentam e procuram formas de projectar cidades para pessoas e não para os carros. Os carros prometem mobilidade, e oferecem-na em meios rurais afastados entre si. Mas num mundo em urbanização há um conflito intrínseco entre o automóvel e a cidade. A partir de certa altura, quando o seu número aumenta, os automóveis já não oferecem mobilidade, antes imobilidade.6 Algumas cidades, tanto em países industrializados como em vias de desenvolvimento, estão a aumentar significativamente a mobilidade urbana afastando-se do automóvel. Jaime Lerner, o anterior Presidente da Câmara de Curitiba, Brasil, foi um dos primeiros a projectar e adoptar um sistema alternativo de transportes que, não imitando os do ocidente, é pouco caro e é amigo das pessoas que se deslocam. A partir de 1974 o sistema de transportes de Curitiba foi totalmente reestruturado. Embora um terço das pessoas tenham automóvel, este desempenha um papel menor no transporte urbano. Andar de autocarro, de bicicleta e a pé são os meios dominantes, sendo dois terços das viagens totais na cidade feitos em autocarro. De 1974 para cá, a população duplicou, mas o tráfego de carros diminuiu uns significativos 30 por cento.7 Para além do próprio crescimento da população, o processo de urbanização é a tendência demográfica dominante do nosso tempo. Em 1900, viviam em cidades 150 milhões de pessoas. Em 2000, eram 2,9 mil milhões de pessoas, um aumento de dezanove vezes. Por volta de 2007, mais de metade de nós viveremos em cidades – o que nos transformará pela primeira vez numa espécie urbana.8 Em 1900 apenas havia uma mão cheia de cidades com um milhão de pessoas. Hoje há 408 cidades com, pelo menos, esse número de habitantes. E há 20 megacidades com 10 milhões ou mais de residentes. A área urbana de Tóquio, com 35 milhões de habitantes, excede a população do Canadá. A população da área urbana da cidade do México, de 19 milhões, é quase igual à da Austrália. Os aglomerados urbanos de Nova Iorque, São Paulo, Mumbai (antiga Bombaim), Nova Deli, Calcutá, Buenos Aires e Xangai, seguem-se com um número próximo de habitantes.9


286 A Ecologia das Cidades

Plano B 2.0

As cidades requerem uma concentração de comida, água, energia e materiais que a natureza não pode fornecer. A concentração destas grandes quantidades de materiais e a sua posterior dispersão sob a forma de lixo, esgotos e poluentes do ar e da água está a inquietar os gestores das cidades em toda a parte. A maior parte das cidades de hoje não são locais saudáveis para se viver. O ar urbano está poluído em todo o lado. Caracteristicamente centradas no automóvel e já não amigáveis para as bicicletas e peões, as cidades privam a sua população do necessário exercício, criando um desequilíbrio entre a absorção de calorias e o consumo calórico. Como resultado, a obesidade atinge proporções epidémicas nas cidades quer dos países em desenvolvimento quer dos países industrializados. Com mais de mil milhões de pessoas com excesso de peso em todo o mundo, os epidemiologistas vêm agora isto como uma ameaça à saúde pública de proporções históricas – uma fonte crescente de doenças cardíacas, tensão arterial alta, diabetes e duma alta incidência de várias formas de cancro.10 A evolução das cidades modernas está ligada aos avanços dos transportes, feitos inicialmente por barcos e comboios. Mas foi o motor de combustão interna, combinado com o petróleo barato que garantiu a mobilidade às pessoas e mercadorias, que impulsionou o fenomenal crescimento urbano do século vinte. À medida que o mundo se urbanizava, o consumo de energia aumentava. Inicialmente, as cidades dependiam da comida e da água que vinham do campo, nos arredores, mas hoje, as cidades dependem muitas vezes de fontes distantes mesmo em relação a fornecimentos básicos. Los Angeles, por exemplo, obtém a maior parte do seu fornecimento de água a partir do rio Colorado, a uns 970 quilómetros.A população em rápido crescimento da cidade do México, vivendo a 3.000 metros de altitude, depende agora do dispendioso bombeamento de água feito a 150 quilómetros de distância, e tem de o elevar um quilómetro ou mais para evitar as fontes de água imprópria. Pequim planeia ir buscar água à bacia do rio Yangtze, a cerca de 1.500 quilómetros.11


Concebendo Cidades Sustentáveis 287 A comida vem ainda de mais longe, como no caso de Tóquio. Embora esta cidade dependa ainda do arroz dos produtivos agricultores japoneses, com as suas terras cuidadosamente protegidas por políticas governamentais, o trigo que consome vem em grande parte das Grandes Planícies da América do Norte ou da Austrália. Uma grande porção do milho vem do Midwest dos Estados Unidos. A soja vem do Midwest americano e do cerrado brasileiro.12 O próprio petróleo que fornece a maior parte da energia necessária à movimentação de recursos para dentro e fora das cidades vem frequentemente de campos de petróleo distantes. O preço crescente deste afectará as cidades, e mais ainda os subúrbios que muitas cidades geraram. Todos parecem assumir que o processo de urbanização irá continuar. Mas isso não é certo. A escassez crescente da água e o alto custo da energia investida no seu transporte ao longo de grandes distâncias pode, por si só, começar a restringir o crescimento urbano. Por exemplo, cerca de 400 cidades da China estão já a ter que lidar com a falta crónica de água.13 Face a este cenário, Richard Register, autor de Ecocities: Building Cities in Balance with Nature, diz que é tempo de repensar a essência do projecto das cidades. Ele concorda com Peñalosa quando acha que as cidades devem ser projectadas para as pessoas, não para os carros. Vai mesmo mais além ao falar de cidades pedonais – comunidades projectadas de tal modo que as pessoas não precisem de carros porque podem fazer a pé o percurso até à maior parte dos sítios onde precisam de ir, ou tomar um transporte público.14 Register diz também que uma cidade deve ser vista como um sistema funcional, não em termos das suas partes, mas como um todo. É bastante convincente quando afirma que as cidades deveriam ser integradas nos ecossistemas locais em vez de se imporem a eles.15 Ele descreve com orgulho a situação criada com a integração no ecossistema local de San Luís Obispo, uma cidade da Califórnia com


Plano B 2.0 288 50.000 habitantes, a norte de Los Angeles: “Tem um belo projecto de recuperação de uma ribeira, com várias ruas e passagens através de edifícios, alinhadas com lojas que se ligam à rua de comércio principal da cidade, e as pessoas adoram-na. Antes de fechar uma rua, transformar um pequeno parque de estacionamento em espaço verde, recuperar a ribeira e tornar a rua principal facilmente acessível ao corredor de ‘natureza’, ou seja, a ribeira, a baixa da cidade tinha cerca de 40 por cento de montras de lojas vazias; agora a percentagem é zero. É claro que é popular. Sentamo-nos num restaurante face à ribeira… onde uma brisa fresca provoca o marulhar das árvores num mundo não afectado pelo barulho dos carros ou pelo fumo dos escapes.” San Luis Obispo está rodeado por paisagens naturais e agrícolas.16 Para Register, a imagem da cidade e dos seus edifícios tornase uma parte da paisagem local, beneficiando da ecologia local. Por exemplo, os edifícios são concebidos para serem aquecidos e arrefecidos pela natureza tanto quanto possível. Mais à frente, neste capítulo, falamos sobre como as cidades podem viver, em grande medida, com água que é permanentemente reutilizada depois de limpa. O sistema de “descarrega e esquece” tornar-se-á muito caro para muitas cidades com escassez de água num mundo pós petróleo.Aprodução urbana de comida, em especial de frutos e legumes frescos, expandir-se-á em lotes de terreno vazios e em terraços de edifícios à medida que os preços do petróleo subam.17 Nos próximos anos, a urbanização poderá abrandar ou mesmo regredir. Num mundo onde a terra, a água e a energia são escassos, o valor de cada recurso deverá aumentar substancialmente, alterando os termos da troca entre o campo e a cidade. Desde o início da Revolução Industrial, as relações comerciais favoreceram as cidades porque elas controlam o capital e a tecnologia, os recursos mais escassos. Mas se a terra e a água se transformarem em recursos ainda mais escassos, então aqueles que estiverem nas áreas rurais que os controlam poderão por vezes beneficiar dessa nova vantagem. Com uma nova economia baseada nas energias renováveis, uma parte muito significativa dessas energias, em particular a energia do vento e as bioenergias, virá das áreas rurais vizinhas.18


Concebendo Cidades Sustentáveis 289 Para além da escassez dos recursos, a evolução da Internet, que está a mudar o nosso modo de pensar sobre a distância e a mobilidade, pode também afectar a urbanização. Entre outras coisas, o seu potencial de comunicação à distância pode reduzir as vantagens de viver numa cidade. O comércio na Internet, oferecendo mais opções do que qualquer centro comercial, pode também diminuir o papel dos centros comerciais urbanos como fontes duma grande variedade de bens e serviços.

Redesenhando o Transporte Urbano Os sistemas de transporte urbanos baseados numa combinação de transportes sobre carris, autocarros, trilhos de bicicletas e caminhos pedonais são os que oferecem a melhor opção em termos de mobilidade, baixo custo de transporte e ambiente urbano saudável.As grandes cidades voltam-se, em geral, para sistemas de metro subterrâneo para assegurarem a mobilidade. Se é este sistema sobre carris, ou o sistema de carris ligeiros de superfície, ou ambos, que dominam, isso depende, em parte, do tamanho da cidade e da geografia. Em cidades de tamanho intermédio, os carris ligeiros são muitas vezes uma opção atractiva. Um sistema de carris oferece uma base essencial para o sistema de transportes de uma cidade. Os carris estão fixos no chão, oferecendo um meio permanente de transporte em que as pessoas podem confiar. Uma vez colocados, os nódulos deste sistema tornam-se nos locais óbvios para concentrar edifícios de escritórios, altos edifícios de apartamentos, e lojas. Como salientado anteriormente, alguns dos mais inovadores sistemas de transportes públicos, que fazem enormes quantidades de pessoas deixar os automóveis para passar a usar autocarros, foram desenvolvidos em Curitiba e Bogotá. O sucesso do sistema de bus rapid transit (BRT), TransMilenio, que assenta em faixas rápidas especiais para movimentar expeditamente as pessoas através da ci-


Plano B 2.0 290 dade, está a ser replicado não só em mais seis cidades da Colômbia, mas também em cidades um pouco por toda a parte: Pequim, cidade do México, São Paulo, Seoul, Taipé e Quioto. Muitas mais cidades em África e na China estão também a planear sistemas BRT. Mesmo cidades de países industrializados, como Otava e – para grande satisfação de todos – Los Angeles, estão agora a equacionar a introdução de sistemas BRT.19 Muitas cidades estão a reduzir a congestão do tráfego e a poluição através de portagens de entrada. Singapura, há muito líder na inovação em transportes, impôs uma taxa em todas as estradas que conduzem ao centro da cidade. Sensores electrónicos identificam os carros e debitam os cartões de crédito dos utilizadores. Este sistema reduziu o número de automóveis em Singapura, dando aos residentes uma maior mobilidade e um ar mais puro do que em muitas outras cidades.20 A Singapura juntaram-se Londres e várias outras cidades da Noruega, como Oslo, Bergen e Trondheim. Em Londres – onde a velocidade média de um carro era há alguns anos mais ou menos a mesma que uma carroça puxada a cavalos há um século atrás – foi adoptada uma taxa de congestão no início de 2003. A cobrança de 5 libras a todos os automobilistas que circulem no centro da cidade entre as 7 da manhã e as 6:30 da tarde reduziu imediatamente o número de veículos, fazendo com que o tráfego circule com mais facilidade e reduzindo a poluição e barulho.21 Durante o primeiro ano após a introdução da nova taxa, o número de pessoas que usam autocarros para se dirigirem ao centro da cidade subiu 38 por cento. Desde a entrada em vigor desta taxa, o fluxo diário de carros para o centro de Londres foi reduzido para 65.000 a 70.000, um decréscimo de 18 por cento, ao mesmo tempo que os atrasos diminuíram 30 por cento. O número de bicicletas e motorizadas aumentou 17 por cento, e a velocidade dos veículos nas principais avenidas aumentou 21 por cento, de 12,2 para 14,8 km por hora.22


Concebendo Cidades Sustentáveis 291 Contrariando o receio que houvesse uma perda de lucros, 65 por cento dos negócios no centro de Londres não referiram qualquer efeito a este nível. Uma maioria significativa de proprietários de negócios acha que a redução do fluxo de veículos teve um efeito positivo na imagem da cidade. Em Cardiff está agora a ser equacionada para breve uma taxa idêntica a esta. Estocolmo, São Paulo, São Francisco, Milão e Barcelona equacionam tomar a mesma medida.As autoridades francesas estão a pensar adoptar uma taxa de congestão para resolver o problema do sufocante ar poluído de Paris. Esta utilização bem sucedida de taxas para reestruturar os sistemas de transporte urbano é apreciada, em termos da reestruturação global da economia, no capítulo 12.23 A bicicleta, uma forma de transporte pessoal, tem muitos atractivos. Alivia a congestão do trânsito, diminui a poluição do ar, reduz a obesidade, aumenta o bem-estar físico, não emite dióxido de carbono perturbador do clima, e tem um preço ao alcance dos milhões de pessoas que não têm dinheiro para comprar um automóvel. As bicicletas aumentam a mobilidade ao mesmo tempo que reduzem a congestão e a área de terra alcatroada. Seis bicicletas ocupam o mesmo espaço de estrada usado por um carro. No parqueamento, a vantagem é ainda maior, uma vez que 20 bicicletas ocupam o espaço requerido para estacionar um carro.24 A bicicleta não é só um meio de transporte flexível, é uma forma ideal de restaurar o equilíbrio entre a absorção e o consumo de calorias. A oportunidade de fazer exercício físico é, em si mesma, uma mais valia. O exercício regular que o uso da bicicleta, como transporte para o trabalho, proporciona reduz a doença cardiovascular, a osteoporose e a artrite, e fortalece o sistema imunitário. Milhões de pessoas pagam mensalmente para frequentar ginásios, para onde se deslocam com frequência de carro, e onde pedalam em bicicletas fixas, tentando obter o mesmo benefício. Poucos métodos para reduzir as emissões de carbono são tão eficazes como substituir o automóvel pela bicicleta em viagens de curta distância.Abicicleta é uma maravilha em eficiência de engenharia, em que um investimento em 13 quilos de metal e borracha aumenta três vezes a eficiência da mobilidade individual. Na minha bicicleta eu calculo que faço facilmente11 km por cada batata que como.


Plano B 2.0 292 Um automóvel, que requer 1 a 2 toneladas de material para transportar quase sempre só uma pessoa, é, em comparação, extraordinariamente ineficiente. A capacidade da bicicleta de fornecer mobilidade a populações de baixos rendimentos foi demonstrada de forma dramática na China. Em 1976, a China produziu 6 milhões de bicicletas. Depois das reformas de 1978 que conduziram a um crescimento económico rápido, o aumento dos rendimentos e uma economia de mercado em que as pessoas podiam optar pelos seus gostos preferidos, a produção anual de bicicletas começou a subir, chegando a atingir mais de 40 milhões em 1988. Quando o mercado ficou em grande medida saturado, a produção caiu um pouco e permaneceu entre os 30 e os 40 milhões por ano até aos anos 1990. Desde 1999, a produção disparou de novo, atingindo 79 milhões de bicicletas em 2004. O enorme surto de 545 milhões de donos de bicicletas surgidos na China desde 1978 provocou o maior aumento de mobilidade humana da história. As bicicletas invadiram as ruas das cidades e as estradas rurais. Embora se fale muito dos 7 milhões de passageiros de automóveis da China, especialmente nas grandes cidades, é a bicicleta que garante a mobilidade pessoal.25 Muitas cidades estão a voltar-se para as bicicletas por várias razões. Nos Estados Unidos, mais de 80 por cento das polícias em aglomerados entre 50 000 e 249 999 pessoas e 96 por cento em aglomerados com mais de 250 000 residentes têm agora patrulhas de rotina em bicicleta. Nas cidades, os polícias em bicicleta são mais produtivos porque têm mais mobilidade e conseguem chegar ao local de um acidente ou crime mais rapidamente do que os polícias que se deslocam em carros. Eles fazem mais 50 por cento de prisões por dia do que os polícias em carros de patrulha. Para os responsáveis mais sensíveis aos aspectos fiscais, o custo de utilizar uma bicicleta é menosprezável comparado com o de um carro de polícia.26 Os serviços urbanos de mensagem por bicicleta são comuns nas maiores cidades do mundo.As bicicletas conseguem entregar pequenos volumes mais depressa do que os veículos motorizados e fazemno a um custo muito mais baixo. À medida que a economia da infor-


Concebendo Cidades Sustentáveis 293 mação se desenvolve e o comércio electrónico se expande, a necessidade de serviços urbanos de entrega rápida e segura está a aumentar bastante. Para muitas das empresas competitivas da Internet, a entrega rápida é uma forma de conquistar clientes. Numa cidade como Nova Iorque, isto quer dizer usar bicicletas na entrega. Cerca de 300 empresas de mensageiros em bicicletas operam na cidade de Nova Iorque, concorrendo num negócio avaliado em 700 milhões de dólares por ano. Nas grandes cidades, a bicicleta está a tornar-se parte integrante do sistema de suporte ao comércio electrónico.27 A chave para perceber o potencial da bicicleta está em criar um sistema de transporte amigo da bicicleta. Isto significa tanto criar trilhos de bicicletas como faixas nas ruas, especiais para bicicletas. Estas soluções deverão ser criadas para servir tanto pessoas em deslocação como pessoas em recreio. Além disso, o uso de bicicletas será alargado com a oferta de parques para estacionamento e de chuveiros nos locais de trabalho. Entre os líderes dos países industrializados na criação de sistemas de transporte amigos da bicicleta estão os Holandeses, os Dinamarqueses e os Alemães.28 A Holanda, líder inquestionável, entre os países industrializados, na recomendação do uso de bicicletas, incorporou a visão do papel das bicicletas num Plano Geral da Bicicleta. Para além de criar faixas e trilhos de bicicletas em todas as cidades, o sistema dá também muitas vezes a vantagem aos ciclistas face aos motoristas na prioridade e nos sinais de tráfico.Alguns sinais de tráfico permitem que os ciclistas avancem antes dos carros. Cerca de 30 por cento das viagens urbanas na Holanda são feitas em bicicleta. Em comparação, nos Estados Unidos, apenas 1 por cento.29 A Espanha, um dos mais recentes países a subir para a carruagem das bicicletas, começou a converter linhas de comboio abandonadas para trilhos recreativos em 1993. Os 52 novos “trilhos verdes” contam com 1.300 quilómetros de trilhos de bicicletas em todo o país.30 Na Holanda, um grupo não-governamental chamado Interface for Cycling Expertise (I-ce) foi formado para partilhar a experiência


Plano B 2.0 294 holandesa na criação de um sistema moderno de transporte que privilegie a utilização das bicicletas. Está a trabalhar com outros grupos no Brasil, Colômbia, Gana, Índia, Quénia, África do Sul, Shri Lanka, Tanzânia e Uganda para incrementar o uso da bicicleta. Roelof Wittink, director do I-ce, observa, “se planearmos apenas para os carros, então os automobilistas sentir-se-ão como os Reis da Estrada. O que reforça a atitude que considera a bicicleta uma coisa do passado e usada apenas pelos pobres. Mas se planearmos para as bicicletas, isso muda a atitude do público”.31 Tanto a Holanda como o Japão fizeram um esforço concertado para integrar as bicicletas com o serviço de comboios de acesso aos empregos, ao disponibilizar estacionamento para bicicletas junto às estações de comboio, tornando assim mais fácil o uso dos comboios pelos ciclistas. No Japão, o uso de bicicletas para ligação ao transporte ferroviário atingiu um ponto em que algumas estações investiram em parques de estacionamento verticais para bicicletas, com vários níveis, tal como acontece com frequência com os automóveis.32 A combinação do transporte ferroviário com a bicicleta, e especialmente a sua integração num único sistema global de transporte, torna uma cidade muito mais habitável do que a aposta quase exclusiva em automóveis privados. O barulho, a poluição, a congestão de tráfego e a frustração, diminuem. ATerra e todos nós teremos mais saúde.

Agricultura na Cidade Quando participava numa conferência nos arredores de Estocolmo, no Outono de 1974, passei por um jardim comunitário perto de um prédio alto de apartamentos. Era uma idílica tarde de Verão indiano, com muitas pessoas a cuidar dos jardins perto das suas casas. Mais de 30 anos depois consigo ainda lembrar aquele quadro devido à aura de contentamento que envolvia os que trabalhavam nos seus jardins. Quase todos eram idosos; estavam absorvidos a produzir não só legumes mas também flores. Lembro-me de pensar, “Esta é a marca de uma sociedade civilizada”.


Concebendo Cidades Sustentáveis

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Em Junho de 2005, a Food and Agriculture Organization (FAO), da ONU, relatou que as quintas urbanas e peri-urbanas – as que se situam na vizinhança imediata duma cidade – fornecem alimentos a cerca de 700 milhões de residências urbanas em todo o mundo. Trata-se principalmente de pequenos lotes de terra – lotes desocupados, pátios, e mesmo terraços.33 No interior e perto da cidade de Dar es Salaam, capital da Tanzânia, há cerca de 650 hectares de terra a produzir legumes. Esta terra não só fornece os produtos frescos à cidade como é o sustento para 4.000 agricultores que cultivam intensamente os seus pequenos lotes ao longo do ano inteiro. No extremo do continente, um projecto da FAO inclui residentes urbanos de Dakar, no Senegal, que produzem até 30 quilos de tomate por metro quadrado ao ano, com colheitas contínuas em jardins nos terraços das casas.34 Em Hanoi, 80 por cento dos legumes frescos vêm de quintas no interior e na vizinhança imediata da cidade. Estas quintas urbanas produzem também 50 por cento da carne de porco e de aves consumida na cidade. Metade dos peixes de água doce é produzida por aquacultores urbanos empreendedores. Cerca de 40 por cento do fornecimento de ovos vem do interior da cidade ou dos arredores. Os agricultores urbanos reciclam engenhosamente os desperdícios humanos e do gado para adubar plantas e fertilizar as culturas de peixe.35 As pessoas que vivem nas terras húmidas a leste de Calcutá, na Índia, gerem culturas de peixe em lagos com água reciclada que cobrem perto de 3.500 hectares.Aágua dos esgotos da cidade é mantida em lagos e conduzida através de vários estágios para que as bactérias façam a decomposição do desperdício orgânico. Isto, por sua vez, suporta o rápido crescimento de algas que servem de comida para as várias espécies de peixes herbívoros. Este sistema garante um fornecimento regular de peixe à cidade, que é de bastante melhor qualidade do que qualquer outro que chega ao mercado da cidade de Calcutá.36


Plano B 2.0 296 A revista Urban Agriculture descreve como Xangai criou de facto uma zona de reciclagem de nutrientes à volta da cidade. A fim de ter terreno suficiente para reciclar os dejectos humanos da cidade, os limites da cidade foram alargados a cerca de mais 300.000 hectares de terrenos agrícolas à sua volta. Esta terra fornece 60 por cento dos legumes desta megacidade. Metade da carne de porco e de aves de Xangai e 90 por cento do leite e ovos vêm desta extensão da cidade e da região limítrofe envolvente.37 Em Caracas, Venezuela, um projecto subsidiado pelo governo e apoiado pela FAO criou 4.000 micro-hortas de um metro quadrado cada nos bairros pobres da cidade, muitas delas situados a alguns passos das cozinhas familiares. Logo que uma cultura amadurece, é colhida e imediatamente substituída por novos rebentos. Cada metro quadrado, continuamente cultivado, pode produzir 330 alfaces, 18 quilos de tomates ou 16 quilos de couves por ano.38 O objectivo da Venezuela é ter 100.000 micro-hortas nas áreas urbanas das cidades e 1.000 hectares de hortas urbanas adubadas com composto orgânico vegetal em todo o país. Leonardo Gil Mora, vice-ministro do desenvolvimento rural integrado, salienta que “nos bairros pobres, como na Venezuela em geral, as pessoas são a coisa mais importante que temos. Através da agricultura urbana, esperamos aumentar a autoconfiança dos pobres, e assim aumentar a sua participação na sociedade”.39 Há uma longa tradição de hortas comunitárias nas cidades europeias. Quando chegamos a Paris de avião, podem ver-se inúmeras hortas comunitárias nos arredores da cidade. Estes lotes pequenos produzem não só alimentos de grande qualidade mas também um sentimento de bem-estar e de comunidade. Como resultado de uma campanha nacional em Cuba para desenvolver a agricultura urbana depois do fim do apoio soviético, há mais de uma década, Havana produz agora metade dos legumes que são consumidos pelos seus residentes.Acidade-estado de Singapura tem 10.000 agricultores urbanos que produzem quatro quintos da


Concebendo Cidades Sustentáveis 297 carne de aves e um quarto dos legumes que ali se consomem. Um estudo de 2003 da Urban Agriculture relata que 14 por cento dos 7,6 milhões de residentes de Londres produzem uma parte da sua própria comida. No caso de Vancouver, a maior cidade da costa oeste do Canadá, o número equivalente é de impressivos 44 por cento.40 Na cidade de Filadélfia, Estados Unidos, perguntaram aos agricultores comunitários porque é que eles faziam aquela agricultura. Cerca de 20 por cento faziam-no para se distraírem, 19 por cento disseram que lhes melhorava a saúde mental, e 17 por cento a saúde física. Outros 14 por cento faziam-no porque queriam ter os produtos frescos de maior qualidade que uma horta própria pode oferecer, 10 por cento faziam-no por razões espirituais e 7 por cento aduziram principalmente razões económicas – custo e conveniência.As hortas urbanas são locais de convívio social que geram um sentido de comunidade. Além disso, as pessoas que trabalham nas hortas três a quatro vezes por semana obtêm o mesmo benefício físico das pessoas que fazem caminhadas moderadas a pé ou andam de bicicleta.41 Em alguns países, como os Estados Unidos, há um enorme potencial não explorado de agricultura urbana. Um levantamento indicava que Chicago tem 70.000 lotes vagos, e Filadélfia, 31.000. A nível nacional, os lotes vagos nas cidades devem totalizar centenas de milhar. O relatório da Urban Agriculture resume as razões pelas quais a agricultura urbana é tão apetecível. Tem “um efeito regenerador… quando os lotes vagos a transformar são áreas degradadas – desinteressantes, cheias de lixo, locais de encontro perigosos – e passam a aprazíveis, bonitas e seguras hortas que alimentam o corpo e a alma das pessoas.”42 Dado o quase inevitável aumento futuro dos preços do petróleo, os benefícios económicos do desenvolvimento da agricultura urbana, mesmo em sociedades afluentes, irão tornar-se muito mais óbvios. Para além de fornecer mais produtos frescos, ela ajudará milhões de pessoas a descobrir os benefícios sociais e o bem-estar psicológico que a agricultura urbana traz.


298 Reduzindo o Consumo da Água Urbana

Plano B 2.0

A utilização da água, uma única vez, para dispersar desperdícios humanos e industriais é uma prática fora de moda, tornada obsoleta pelas novas tecnologias e pelas faltas de água. A água entra na cidade, é contaminada pelos desperdícios humanos e industriais, e deixa a cidade perigosamente poluída. Os desperdícios industriais tóxicos descarregados em rios e lagos ou poços também se infiltram nos aquíferos, tornando a água – tanto à superfície como em profundidade – sem qualidade para consumo. E os seus desperdícios tóxicos estão a destruir os ecossistemas marítimos, incluindo as reservas de peixe locais. Chegou a altura de gerir os desperdícios sem os descarregar no meio ambiente local, e permitir que a água seja reciclada indefinidamente e reduzir drasticamente a sua procura tanto urbana como industrial. O conceito de engenharia actualmente utilizado para lidar com o desperdício humano é usar grandes quantidades de água para o remover, de preferência para um sistema de esgotos onde será tratado antes de ser descarregado para o rio local. O sistema de “descarrega e esquece” é um sistema de água intensivo, perturba o ciclo dos nutrientes, a maior parte da humanidade não o consegue pagar e é uma grande fonte de doença nos países em vias de desenvolvimento. Com a generalização da falta de água, a viabilidade dos sistemas de esgotos baseados em água diminuirá. Os sistemas de esgotos baseados em água retiram os nutrientes originados no solo e deitamnos, em geral, nos rios, em lagos ou no mar. Não só se perdem os nutrientes da agricultura, como o acréscimo exagerado de nutrientes levou à morte de muitos rios e à formação de cerca de 146 zonas mortas em áreas oceânicas junto à costa. Os sistemas que deitam os esgotos não tratados em rios e ribeiras são uma grande fonte de doença e morte.43 Sunita Narain, do Centro para a Ciência e Ambiente, na Índia, defende de forma convincente que um sistema de escoamento baseado em água com instalações de tratamento de esgotos não é


Concebendo Cidades Sustentáveis 299 ambientalmente nem economicamente viável para a Índia. Ela observa que uma família indiana de cinco pessoas, produzindo 250 litros de excremento num ano e usando uma casa de banho com autoclismo, requer 150.000 litros de água para escoar os seus desperdícios.44 Na sua formulação actual, o sistema indiano de esgotos é antes um sistema de dispersão patogénica. Recebe uma pequena quantidade de material contaminado e usa-a para gerar grandes quantidades de água imprópria para o consumo humano, muitas vezes descarregando-a em rios ou ribeiras da proximidade. Narain diz que tanto “os rios como as nossas crianças estão a morrer”. O governo indiano, como o de muitos países em desenvolvimento, tenta resolver o problema, sem sucesso, usando o sistema universal de esgotos baseado em água e estações de tratamento – sem conseguir tapar o fosso entre serviços necessários e serviços prestados, mas não querendo ao mesmo tempo admitir que é uma opção economicamente inviável. Narain conclui que a abordagem “descarrega e esquece” não está a funcionar.45 Este dispersar de elementos patogénicos constitui uma enorme ameaça à saúde pública. Em todo o mundo, a falta de saneamento básico e os baixos índices de higiene pessoal são responsáveis por 2,7 milhões de mortes por ano, logo atrás dos 5,9 milhões causados pela fome e a má nutrição.46 Felizmente, há uma alternativa de baixo custo: o WC ecológico. Trata-se de uma sanita simples, sem água, sem cheiro, ligada a um pequeno dispositivo de compostagem. Os restos da mesa e da cozinha podem também ser incorporados nas câmaras de compostagem. A compostagem seca converte o material fecal humano num húmus do mesmo tipo do solo, que é essencialmente inodoro e representa apenas 10% do volume original. Estas instalações sanitárias de compostagem têm que ser esvaziadas mais ou menos uma vez por ano, conforme o seu desenho e tamanho. Os vendedores recolhem periodicamente o húmus e podem vendê-lo no mercado como suplemento de solo, assegurando assim que os nutrientes e a matéria orgânica voltam ao solo, reduzindo a necessidade de fertilizantes.47


Plano B 2.0 300 Esta tecnologia reduz o uso residencial da água, cortando assim as contas e diminuindo a energia necessária para bombear e purificar a água. Como bónus, também reduz o fluxo de lixo se incorporar os restos da mesa e da cozinha, elimina o problema do escoamento das águas de esgoto, e restaura o ciclo dos nutrientes. AAgência de Protecção do Ambiente dos Estados Unidos tem agora uma lista de várias marcas de sanitas secas aprovadas para uso. Tendo surgido inicialmente na Suécia, estas sanitas funcionam bem nas mais variadas condições em que são actualmente usadas, nomeadamente, nos edifícios de apartamentos suecos, nas vivendas dos Estados Unidos e nas aldeias chinesas.48 Nas casas privadas, a água pode ser economizada usando dispositivos e equipamentos mais eficientes no consumo da água, como sejam as cabeças de chuveiro, autoclismos e máquinas de lavar pratos e roupa. Alguns países estão a adoptar padrões de eficiência no uso da água e rotulagem para equipamentos, muito na linha do que foi feito para a eficiência energética. Quando os custos da água subirem, como irão subir inevitavelmente, os investimentos em WCs ecológicos e em equipamentos domésticos eficientes no consumo de água tornar-se-ão mais atractivos para os proprietários de casa própria. No caso das cidades, o passo mais eficaz para aumentar a produtividade da água é adoptar um sistema generalizado de tratamento e reciclagem de água, reutilizando a mesma água continuamente. Com este sistema, só uma pequena percentagem de água se perde por evaporação de cada vez que acontece um novo ciclo. Atendendo às tecnologias disponíveis actualmente, é perfeitamente possível reciclar os fornecimentos urbanos de água de forma generalizada e fazer com que em larga medida as cidades deixem de ser um sorvedouro dos escassos recursos de água. Algumas cidades, confrontadas com a diminuição do fornecimento e o aumento dos custos da água estão a começar a reciclar os seus fornecimentos de água. Singapura, por exemplo, que compra a sua água à Malásia a um preço que cresce constantemente, está a começar a reciclar a água, reduzindo as quantidades importadas. Para certas cidades, a reciclagem constante da água pode tornar-se numa condição de sobrevivência.49


Concebendo Cidades Sustentáveis 301 As indústrias individuais, que estão confrontadas com as mesmas questões relacionadas com a água que as cidades, estão a começar a abandonar a utilização da água para escoar o desperdício industrial. Algumas empresas separam os efluentes, tratando individualmente cada um deles com químicos apropriados e filtragem de membrana, preparando a água para ser reutilizada. Peter Gleick, autor e editor principal do relatório bianual The World’s Water, escreve: “De facto, algumas indústrias, tais como a do papel e polpa, as lavandarias industriais, e os acabamentos em metal, estão a começar a desenvolver sistemas “à lupa” em que toda a água de desperdício é reutilizada internamente, e em que apenas poucas quantidades de água nova são necessárias para compensar a água incorporada no produto ou a perdida por evaporação”. As indústrias estão a movimentar-se mais rapidamente do que as cidades, mas as tecnologias que estão a desenvolver podem também ser usadas na reciclagem da água urbana.50 Poupar água nas cidades depende, em primeira linha, de dois equipamentos caseiros: sanitas/autoclismos e chuveiros – que em conjunto representam mais de metade da utilização doméstica. Enquanto os tradicionais autoclismos usavam 22,7 litros por cada descarga, o máximo legal actual dos autoclismos dos Estados Unidos é de 6 litros. Um sistema australiano de sanita/autoclismo com uma tecnologia de dois botões para dois volumes de descarga diferente descarrega apenas 3,8 litros para desperdícios líquidos e 6 litros para desperdícios sólidos. Mudar de cabeças de chuveiro com um fluxo de água de 19 litros para um modelo de 9,5 litros por minuto corta a utilização de água quase para metade. Quanto às máquinas de lavar, o modelo de um eixo horizontal concebido na Europa gasta menos 40 por cento do que os modelos tradicionais americanos, de carregar por cima. Além disso, este modelo europeu, que é agora vendido a nível mundial, também gasta menos energia.51 A actual economia de remoção de resíduos com uso de água não é viável. Há demasiadas casas privadas, fábricas e explorações de gado para se continuar a tentar remover com água os desperdícios no nosso superlotado planeta. Fazê-lo não faz sentido, do ponto de vista ecológico, e está ultrapassado – é uma abordagem que pertence ao tempo em que havia muito menos pessoas e muito menos actividade económica.


302 O Desafio dos Guetos Urbanos

Plano B 2.0

Entre 2000 e 2050, é pequena a projecção de crescimento da população nos países industrializados ou no mundo rural em desenvolvimento.Assim, quase todo o crescimento populacional projectado no mundo, cerca de 3 mil milhões de pessoas até 2050, acontecerá nas cidades dos países em vias de desenvolvimento, a maior parte em bairros de lata.52 Bairros de lata – quer sejam favelas no Brasil, barriadas no Peru, ou gecekondu na Turquia – consistem em geral numa área residencial urbana habitada por pessoas muito pobres que não possuem nenhuma porção de terra. Elas simplesmente “ocupam” um terreno vazio, quer seja privado ou público.53 A vida nestes agregados é caracterizada por uma habitação totalmente inadequada e por uma falta de acesso aos serviços urbanos. Como Hari Srinivas, coordenador do Centro de Investigação do Desenvolvimento Global, escreve, estes migrantes rural-urbanos tomam a “opção drástica de ocupar ilegalmente uma porção de terra vaga para construírem um abrigo rudimentar” simplesmente porque é a única opção que lhes resta. São frequentemente tratados pelos organismos governamentais, senão com antipatia, pelo menos com apatia, sendo por eles vistos como invasores e como uma fonte de problemas.Alguns vêem os bairros da lata como um “demónio” social, algo que tem que ser erradicado.54 Os guetos urbanos incluem não só os bairros da lata mas também partes velhas das cidades muito deterioradas, que estão também sobrelotadas e onde faltam muitas vezes os serviços urbanos mais rudimentares, como esgotos. Uma das melhores formas de tornar a migração rural-urbana possível de gerir é melhorar as condições de vida no campo. Isto quer dizer, não só prestar serviços sociais básicos, tais como serviços de saúde básicos e educação para as crianças, como salientado no Capítulo 7, mas também encorajar o investimento industrial nas pequenas cidades do país e não apenas nas grandes cidades, como a cidade do México e Bangkok. Estas políticas abrandam o fluxo para as cidades e dão-lhe maior ordem.


Concebendo Cidades Sustentáveis 303 A evolução das cidades nos países em vias de desenvolvimento é muitas vezes moldada pela natureza não planeada dos bairros da lata. Deixar os seus habitantes instalar-se onde quer que consigam – em declives, em leitos de cheia ou em outras áreas de alto risco – torna difícil prestar serviços básicos como transportes, água e esgotos. Curitiba, na vanguarda do novo urbanismo, projectou parcelas de terreno destinadas a bairros da lata. Ao considerar à parte estas parcelas de terreno, o processo pode, pelo menos, ser estruturado duma forma que seja consistente com o plano oficial de desenvolvimento da cidade.55 Entre os serviços mais simples que podem ser prestados num bairro da lata estão os sanitários de compostagem. Além disso, torneiras que forneçam água corrente potável distribuídas pelo bairro podem dar um grande contributo no controlo da disseminação de doenças nestes bairros sobrelotados. Regulando o serviço de autocarros pode permitir-se a deslocação dos habitantes do bairro para o seu local de trabalho. Se a abordagem de Curitiba for seguida em toda a parte, espaços verdes e outras áreas comuns podem ser incorporados na comunidade desde o início. Algumas elites políticas acham que o que deve ser feito é simplesmente arrasar os bairros da lata, mas isto trata os sintomas da pobreza urbana, não a causa. As pessoas que perdem o pouco que conseguiram investir na sua habitação não ficam mais ricas em consequência da demolição, antes mais pobres, tal como a cidade, ela própria. A melhor opção é, de longe, melhorar as casas mantendo-as no local. A chave para isto é dar segurança de propriedade e pequenos empréstimos aos habitantes desses bairros, que lhes permitam ir fazendo melhorias ao longo do tempo.56 Requalificar os guetos depende da capacidade dos governos locais para oferecer uma resposta em vez de os ignorar. O progresso na erradicação da pobreza e na criação de comunidades progressivas e estáveis depende do estabelecimento de ligações construtivas aos governos. Em alguns casos, serviços de micro-crédito apoiados pelo estado podem não só ajudar a estabelecer uma ligação entre o governo da cidade e as comunidades de bairros da lata mas também oferecer esperança aos residentes.57


Plano B 2.0 304 Embora os líderes políticos possam desejar que estes bairros sejam deslocados ou demolidos, a realidade é que eles tenderão a expandir-se ao longo das próximas décadas. O desafio é integrá-los na vida urbana de uma forma humana que dê esperança através da possibilidade da sua requalificação. Ou então, inevitavelmente, o aumento do ressentimento, da fricção social e da violência.

Cidades de Pessoas Com o início do novo século, torna-se evidente para as pessoas que lidam com o urbanismo, tanto em países industrializados como em vias de desenvolvimento, que há um conflito latente entre o automóvel e a cidade. A poluição do ar urbano, em grande parte dos automóveis, é responsável por milhões de mortes.Acongestão do tráfego é também economicamente responsável pelo aumento dos custos em tempo e gasolina. Outro custo para as cidades atribuível aos carros é um custo psicológico, associado à privação do contacto com o mundo natural – um “complexo do asfalto”. Há um crescente conjunto de evidências que apontam para a existência duma necessidade humana inata de contacto com a natureza. Tanto ecologistas como psicólogos estão conscientes disto há algum tempo. Ecologistas, liderados pelo biólogo da Universidade de Harvard E.O. Wilson, formularam a “hipótese da biofilia”, que defende que as pessoas que estão privadas do contacto com a natureza sofrem psicologicamente e que esta privação leva a um decréscimo mensurável do bem-estar.58 Entretanto os psicólogos já criaram o seu próprio termo – ecopsicologia – acerca do qual usam a mesma argumentação. Theodore Roszak, um especialista neste campo, cita um estudo que documenta a dependência humana em relação à natureza ao observar a taxa de recuperação de doentes num hospital da Pensilvânia. Aqueles que estavam em quartos com vista para jardins com relva, árvores, flores e pássaros recuperavam das suas doenças mais rapidamente do que os que estavam em quartos com vista para o parque de estacionamento.59


Concebendo Cidades Sustentáveis 305 Um dos argumentos a favor das hortas comunitárias é que, para além de fornecerem comida, também oferecem um espaço verde e uma sensação de comunidade. Trabalhar com a terra e ver as coisas a crescer tem um efeito terapêutico. Ao longo da era moderna, os orçamentos para transportes na maior parte dos países – e nos Estados Unidos em particular – têm sido desviados para a construção e manutenção de auto-estradas e ruas. Criar cidades mais habitáveis e a mobilidade que as pessoas desejam, depende duma realocação orçamental no sentido de favorecer o desenvolvimento de serviços de suporte ao transporte público por carris ou autocarros e bicicletas. O mais interessante é que já há sinais de mudança, indicadores diários de um maior interesse no redesenhar de cidades para as pessoas, não para os carros. Uma tendência encorajadora vem dos Estados Unidos. O aumento de 2,1 por cento ao ano do número de passageiros de transportes públicos desde 1996 indica que as pessoas estão a abandonar gradualmente os seus carros em troca dos autocarros, metros e veículos de carris ligeiros. Os aumentos rápidos dos preços da gasolina em 2005 encorajam ainda mais pessoas a abandonar os carros e tomar autocarros ou o metro, ou irem de bicicleta para o emprego.60 Os Presidentes de Câmara e planeadores de cidades em todo o mundo estão a começar a repensar o papel do carro nos sistemas de transporte urbano. Um grupo de eminentes cientistas na China pôs em causa a decisão de Pequim de promover um sistema de transportes baseado no automóvel. Eles chamaram à atenção para o seguinte facto: a China não tem terreno suficiente para acomodar o automóvel e alimentar as suas pessoas. O que é verdadeiro para a China é também verdadeiro para a Índia e para dezenas de outros países em vias de desenvolvimento e densamente povoados. 61 Algumas cidades estão em muito melhor situação do que outras no que respeita ao planeamento do seu crescimento. Elas planeiam sistemas de transportes que oferecem mobilidade, ar puro e exercício – um contraste muito grande com cidades que oferecem congestão de tráfego, ar pouco saudável e poucas hipóteses de fazer exercício. Quando 95 por cento dos trabalhadores de uma cidade dependem


Plano B 2.0 306 do automóvel para se deslocarem para o trabalho, como em Atlanta, Geórgia, a cidade está em apuros. Ao contrário, em Amesterdão só 40 por cento dos trabalhadores se fazem transportar de carro; 35 por cento fazem-no de bicicleta ou a pé, enquanto que 25 por cento usa transportes públicos. Os padrões de deslocação para o trabalho em Copenhaga são praticamente idênticos aos de Amesterdão. Em Paris, pouco menos de metade dos trabalhadores dependem dos carros para se dirigirem aos empregos. Mesmo sendo estas cidades europeias mais antigas, muitas vezes com ruas estreitas, o facto é que têm muito menos congestão de tráfego queAtlanta.62 Não é surpreendente que as cidades dependentes dos carros sejam mais congestionadas e tenham menor mobilidade do que aquelas que oferecem uma maior variedade de opções de deslocação para o trabalho. O mesmo veículo cuja grande promessa era a mobilidade pessoal está, de facto, a imobilizar populações urbanas inteiras, tornando difícil a deslocação tanto para ricos como para pobres. As estratégias de transporte a longo prazo em muitos países em desenvolvimento assumem que toda a gente, um dia, poderá ter um carro. Infelizmente, dadas as restrições de disponibilidade de terreno para os carros, sem falar das impostas pelas reservas de petróleo, isto simplesmente não é realista. Estes países conseguirão garantir mais mobilidade se apoiarem o transporte público e a bicicleta. Se os governos dos países em desenvolvimento continuarem a investir a maior parte dos recursos públicos disponíveis destinados ao transporte para apoiar o automóvel, acabarão com um sistema construído para a pequena parte da população que tem carros. O reconhecimento actual que a maior parte das pessoas nunca irá ter um automóvel pode levar a uma reorientação fundamental no planeamento e investimento nos transportes. Há muitas formas de reestruturar o sistema de transportes de modo a satisfazer as necessidades das pessoas - não só as afluentes -, promover a mobilidade - não a imobilidade - e melhorar a saúde, em vez de a estragar. Há que eliminar os subsídios, muitas vezes indirectos, que muitos empregadores dão para o parqueamento. Por exemplo, os subsídios para parqueamento nos Estados Unidos, no valor de cerca de 85 mil milhões de dólares por ano, incentivam as pessoas a ir de carro para o trabalho.63


Concebendo Cidades Sustentáveis 307 Em 1992, a Califórnia determinou que os empregadores dessem aos empregados o valor em dinheiro correspondente aos subsídios de parqueamento, de modo a que estes pudessem usar esse dinheiro no pagamento de transportes públicos ou na compra duma bicicleta. Em empresas onde se recolheu informação, esta mudança de política reduziu o uso do automóvel em cerca de 17 por cento.Anível nacional, nos Estados Unidos, em 1998, foi incorporada uma provisão no Transport Equity Act of the 21st Century para mudar o código do imposto de modo a que aqueles que usassem o transporte público ou participassem em pools de carrinhas tivessem as mesmas isenções de imposto de que desfrutavam os que tinham direito a parqueamento gratuito. O que as sociedades deviam tentar conseguir não são subsídios de parqueamento, antes taxas sobre o parqueamento – taxas que comecem a reflectir o custo para a comunidade que tem a congestão de tráfego e a deterioração da qualidade de vida que se verifica quando as cidades são conquistadas pelos carros e parques de estacionamento.64 Muitas cidades estão a criar zonas sem carros, nomeadamente, Estocolmo, Viena, Praga e Roma. Paris desfruta de uma proibição total de carros nas margens do rio Sena aos domingos e feriados e está a tentar tornar a maior parte do centro da cidade livre de carros a partir de 2012.65 Ainda, para garantir que os metros são funcionais e a preços acessíveis, a ideia de os tornar atractivos, transformando-os mesmo em centros culturais, está a ganhar terreno. Em Moscovo, com obras de arte nas estações, o sistema de metro é justificadamente referido como a jóia da coroa da Rússia. Em Washington, D.C., a Union Station, que liga o sistema de metro da cidade com as linhas de comboio intercidades, é uma delícia arquitectónica. Desde que a sua restauração ficou pronta em 1988, tornou-se num local social de encontro, com lojas, salas de conferências e um conjunto significativo de restaurantes. Um dos passos mais inovadores para incentivar o uso do transporte público vem de State College, uma pequena cidade no centro da Pensilvânia onde fica a Universidade Estatal da Pensilvânia. Para


Plano B 2.0 308 reduzir a congestão de tráfego no campus e para resolver o problema da falta de estacionamento, Penn State decidiu em 1999 que iria atribuir 1 milhão de dólares ao sistema local de trânsito, baseado em autocarros, para pagar um número ilimitado de trajectos a estudantes, professores e colaboradores. Como resultado, as viagens de autocarro em State Colege aumentaram 240 por cento num ano, obrigando a que a empresa de transporte fizesse um grande investimento em novos autocarros para dar resposta ao aumento da procura. Esta iniciativa da universidade deu origem a um campus muito mais agradável e atractivo – motivo de atracção para novos estudantes e professores.66 Com o início do novo século, o mundo reequaciona o papel dos automóveis, naquilo que é uma das viragens mais importantes no pensamento sobre transportes no período dum século. O desafio é redesenhar as comunidades, tornando o transporte público na peça central do transporte urbano e complementando-o com passeios, passadeiras de jogging e trilhos de bicicletas. Isso também significa substituir os parques de estacionamento por áreas verdes, parques infantis e campos de jogos. Podemos projectar um estilo de vida urbano que repare de forma sistemática a saúde, incorporando o exercício físico nas rotinas diárias, e reduza ao mesmo tempo a poluição do ar e a obesidade.


III UMA NOVA E EXCITANTE OPÇÃO



12 Construindo uma Nova Economia

No Capítulo 1 concluímos que o modelo económico ocidental – a economia baseada nos combustíveis fósseis, centrada no automóvel e de desperdício – não era viável para o mundo. Ao contrário, a nova economia será accionada pelas fontes renováveis de energia, terá um sistema de transporte mais diversificado – assentando mais no caminho de ferro, em autocarros e em bicicletas, e menos nos carros – e reciclará os materiais de forma generalizada. Podemos descrever esta nova economia com algum detalhe. A questão é saber como ir do ponto em que nos encontramos até onde queremos chegar de forma suficientemente rápida para evitar o declínio económico e o colapso. A nosso favor, temos alguns bens que as civilizações anteriores não tiveram, incluindo registos arqueológicos, um conhecimento científico mais avançado e, muito importante, o conhecimento de como utilizar a política económica para atingir metas sociais. A chave para construir uma economia global que sustente o progresso económico está na criação dum mercado honesto, que diga a


Plano B 2.0 312 verdade ecológica. O mercado é uma instituição incrível, que disponibiliza recursos com uma eficácia que nenhum corpo de planeamento central consegue igualar. Equilibra facilmente a procura e a oferta, e estabelece preços que prontamente reflectem tanto a escassez como a abundância. O mercado, no entanto, tem alguns pontos fracos fundamentais. Não incorpora nos preços os custos indirectos do fornecimento de bens ou serviços, não valoriza devidamente os serviços prestados pela natureza e não respeita os limites da produção sustentável dos sistemas naturais. Também favorece o curto prazo em detrimento do longo prazo, mostrando pouca preocupação com as gerações futuras. Ao longo de grande parte da história registada, os custos indirectos da actividade económica eram tão pequenos que raramente eram considerados importantes e, mesmo que o fossem, eram-no apenas ao nível local. Mas, com a expansão da economia global, que se multiplicou por sete desde 1950, a incapacidade de dar respostas a estes inconvenientes do mercado e as distorções económicas irracionais que eles geraram podem vir a ser fatais.1 Como referido no Capítulo 1, os sistemas contabilísticos que não contam a verdade podem custar caro. Sistemas deficientes de contabilidade nas empresas, que deixam os custos fora dos balanços, conduziram algumas das maiores companhias do mundo à bancarrota. Infelizmente, o nosso deficiente sistema de contabilidade económica global pode ter potencialmente consequências muito mais sérias. A prosperidade económica que se vive hoje é conseguida, em parte, pela acumulação de deficits ecológicos, custos que não aparecem nos livros, mas que alguém acabará por pagar. Uma vez que calculemos os custos indirectos de um produto ou serviço, podemos incorporá-los nos preços de mercado sob a forma de um imposto, contrabalançando-os com reduções nos impostos sobre os rendimentos. Se queremos que o mercado diga a verdade, então devemos evitar ser surpreendidos negativamente por sistemas


Construindo Uma Nova Economia 313 contabilísticos deficientes que levam à bancarrota. Como Øystein Dahle, o antigo vice-presidente da Exxon para a Noruega e Mar do Norte, salientou: “O socialismo falhou porque não permitiu que o mercado reflectisse a verdade económica. O capitalismo pode falhar por não permitir que o mercado reflicta a verdade ecológica”.2

Mudando os Impostos A necessidade de mudar a política de impostos – baixando os impostos sobre os rendimentos e, ao mesmo tempo, levantando barreiras às actividades ambientalmente destrutivas – para pôr o mercado a contar a verdade tem sido muito apoiada pelos economistas. Por exemplo, um imposto sobre o carvão que incorporasse o aumento dos custos dos cuidados de saúde associados à respiração do ar poluído, os custos dos danos devidos às chuvas ácidas e os custos da alteração climática, teria o efeito de incentivar o investimento em fontes renováveis de energia, como o vento ou a energia geotérmica. Com este conceito na mão, é um passo até ao deslocamento da carga fiscal. Alguns países da Europa ocidental estão já a mudar a sua política de impostos, num processo que designam por reforma ambiental dos impostos, com vista à prossecução dos objectivos ambientais sublinhados em capítulos anteriores.3 Entre as várias actividades prejudiciais ao ambiente taxadas na Europa estão as emissões de carbono, a produção de lixo (taxas de aterro), e o número excessivo de carros nas cidades. Um plano de quatro anos adoptado na Alemanha em 1999 transfere, de forma sistemática, os impostos do trabalho para a energia. Em 2001, este plano tinha baixado o consumo de combustível em 5 por cento. Tinha também acelerado o crescimento no sector das energias renováveis, criando cerca de 45.400 postos de trabalho em 2003 só na indústria do vento, um número que se prevê aumentar para 103.000 até 2010.4 Em 2001, a Suécia lançou uma viragem ambiental total nos seus impostos que, em 10 anos, pretende converter 30 mil milhões de Coroas suecas (3,9 mil milhões de dólares) de impostos sobre os


Plano B 2.0 314 rendimentos em impostos sobre actividades ambientalmente destrutivas.Amaior parte desta viragem de 1.100 dólares por família recai sobre os transportes rodoviários, com aumentos substanciais nos impostos sobre veículos e combustíveis. Parte da viragem está também a abranger a electricidade. Desde 2005, a Suécia está a cumprir com algum avanço o seu plano de 10 anos de viragem nos impostos, tornando-se líder mundial na reforma ambiental dos impostos.5 Entre os outros países europeus com fortes esforços de reforma fiscal estão a Espanha, a Itália, a Noruega, o Reino Unido e a França. Há casos isolados noutros lugares.Alguns países, incluindo a Malásia, a Tailândia e a Turquia usaram um imposto sobre as emissões de chumbo como forma de acabar com o seu uso como aditivo na gasolina. Os Estados Unidos impuseram uma taxa pesada sobre os clorofluorcarbonos com o objectivo de se verem livres deles de acordo com o Protocolo de Montreal de 1987 e legislação subsequente. A nível municipal, quando Vitória, a capital da Columbia Britânica, adoptou um imposto sobre o lixo de 1,20 dólares por saco de lixo, em 1992, reduziu o fluxo de lixo diário em 18 por cento num ano.6 As cidades que vivem sufocadas pelos carros estão a usar fortes taxas de entrada para reduzirem a congestão de tráfego. Adoptada pela primeira vez em Singapura há cerca de duas décadas, esta taxa foi posteriormente introduzida em Oslo, Melbourne e, mais recentemente, Londres.Ataxa londrina de 5 libras, ou quase 9 dólares, posta em prática em Fevereiro de 2002 pelo Presidente da Câmara Ken Livingstone, foi aumentada para 8 libras, mais de 14 dólares, em Julho de 2005. A receita resultante será investida na melhoria da rede de autocarros, que transporta 2 milhões de passageiros por dia. O objectivo desta taxa de congestão é a reestruturação total do sistema de transportes de Londres de modo a reduzir a congestão de tráfego, a poluição do ar e as emissões de carbono, e aumentar a mobilidade.7 Enquanto Londres e outras cidades estão a cobrar taxas aos carros que entram no centro da cidade, outras impõem simplesmente um imposto sobre a propriedade dos automóveis. Na Dinamarca, o imposto sobre a compra de um carro novo é superior ao preço do


Construindo Uma Nova Economia 315 carro propriamente dito. Um carro novo de 25 mil dólares custa ao comprador mais de 50 mil dólares! Em 2000, foram introduzidos descontos para veículos eficientes em energia. Outros governos estão a caminhar nesta direcção. O repórter do New York Times, Howard French escreve que Xangai, que sufoca com os automóveis, “aumentou todos os anos, desde 2000, o valor para o registo de carros, duplicando-o ao longo deste período para cerca de 4.600 dólares por veículo – mais do dobro do rendimento per capita da população urbana da cidade”.8 No caso de alguns produtos cujos custos para a sociedade são grandes e óbvios, há pressões crescentes para lhes impor taxas. De longe, o exemplo mais dramático disto foi o acordo negociado entre a indústria do tabaco e todos os governos estaduais nos Estados Unidos. Depois de inúmeros destes governos terem iniciado um processo litigioso para forçar as empresas de tabaco a reembolsá-los pelos custos médicos de tratar doenças relacionadas com o fumo do tabaco, a indústria decidiu negociar um pacote de reembolso, acordando, em Novembro de 1998, em pagar aos cinquenta governos estaduais cerca de 251 mil milhões de dólares – perto de mil dólares por cada pessoa dos Estados Unidos. Este acordo de referência foi, de facto, um imposto retroactivo sobre os cigarros fumados no passado, destinado a cobrir custos indirectos. Para pagar esta enorme conta, as empresas aumentaram muito o preço do tabaco, o que desencorajou ainda mais o consumo.9 Um estudo elaborado pelos Centros de Controlo da Doença e Prevenção (CCD) dos Estados Unidos, calculou os custos sociais do fumo de cigarros em 7,18 dólares por cada maço. Isto não só justifica o aumento dos impostos sobre o tabaco, que é responsável por 4.9 milhões de mortes por ano em todo o mundo, mas também fornece linhas de orientação para determinar qual o valor desse aumento. Em 2002, um ano em que os governos dos estados se depararam com deficits fiscais, 21 estados dos Estados Unidos aumentaram o imposto sobre o tabaco. Talvez o maior aumento tenha sido o da cidade de Nova Iorque, onde os fumadores pagaram um adicional de 39 centavos de dólar de imposto estadual e 1,42 dólares de imposto municipal – um aumento total de 1,81 dólares por maço de tabaco. Uma vez que, em média, um aumento de preço de 10 por cento


Plano B 2.0 316 reduz o consumo em cerca de 4 por cento, os benefícios para a saúde deste aumento de imposto deverão ser substanciais.10 Se o custo para a sociedade de fumar um maço de cigarros é de 7,18 dólares, quanto será o custo para a sociedade de queimar um galão (3,785 litros) de gasolina? Felizmente, como salientado no Capítulo 1, o International Center for Technology Assessment fez uma análise detalhada, a que deu o título de “O Verdadeiro Preço da Gasolina”. O grupo calcula vários custos indirectos, incluindo isenções de imposto sobre o petróleo, preços de fornecimento de petróleo protegidos, subsídios à indústria do petróleo e custos dos cuidados de saúde referentes ao tratamento de doenças respiratórias relacionadas com a exaustão dos automóveis. O total destes custos indirectos anda à volta de 9 dólares por galão (2,38 dólares por litro), algo mais elevado que o custo social de fumar um maço de tabaco. Se adicionarmos este custo externo ou social aos cerca de 2 dólares por galão (0,53 dólares por litro) de preço médio da gasolina nos Estados Unidos no início de 2005, a gasolina deveria custar 11 dólares por galão (2,91 dólares por litro). Os custos são reais. Alguém tem que os pagar. Uma vez calculados, estes custos podem ser usados para estabelecer os valores dos impostos sobre a gasolina, tal como a análise dos CCD está a ser usada para aumentar os impostos sobre o tabaco.11 As duas principais economias da Ásia – Japão e China – estão agora a equacionar a possibilidade de cobrar taxas de carbono. Nos últimos anos, muitos membros da Dieta Japonesa têm tentado operar uma viragem ambiental nos impostos, mas a indústria opôs-se a um imposto sobre o carbono. A China, que está à beira de bater todos os recordes com o seu crescimento explosivo no uso da energia e nas emissões de carbono, está a trabalhar na reestruturação do imposto ambiental que irá desencorajar a utilização do combustível fóssil.Wang Fengchum, um responsável do Congresso Nacional do Povo, diz, “Os impostos são a ferramenta mais poderosa numa economia de mercado para direccionar os hábitos de consumo da população. É superior às regulamentações do governo”. Se os responsáveis das políticas chinesas conseguirem fazer uma reforma ambiental dos impostos, isso será um desenvolvimento de referência não só para a China mas para todo o mundo.12


Construindo Uma Nova Economia 317 A viragem dos impostos na direcção ambiental traz normalmente um duplo dividendo.Ao reduzir os impostos sobre os rendimentos – de facto, impostos sobre a mão-de-obra – a mão-de-obra torna-se mais barata e são criados mais postos de trabalho enquanto se protege o ambiente. Esta foi a motivação principal na viragem feita pela Alemanha em 4 anos, redireccionando a incidência dos impostos sobre os rendimentos para a energia. Ao reduzir a poluição do ar proveniente de chaminés e escapes, a incidência das doenças respiratórias, tais como a asma e o efisema pulmonar, diminui – o mesmo acontecendo com os custos gerais dos cuidados de saúde.13 Com as florestas, os ecologistas podem calcular os valores dos serviços que são prestados pelas árvores. Uma vez determinados, podem ser incorporados no preço das árvores como um imposto de abate idêntico ao que a Bulgária e a Lituânia adoptaram. Quem quiser cortar uma árvore terá que pagar uma taxa igual ao valor dos serviços fornecidos por essa árvore, por exemplo, o controlo de cheias. O mercado da madeira estará assim a contar a verdade ecológica. O efeito disto é reduzir o abate de árvores e encorajar a reutilização e a reciclagem do papel.14 A mudança nos impostos ajuda também os países a tomarem a dianteira na produção de novo equipamento, tal como novas tecnologias de energia ou de controlo da poluição. Por exemplo, os incentivos fiscais à energia gerada pelo vento fizeram com que a Dinamarca, um país com apenas cinco milhões de pessoas, se tornasse o maior fabricante mundial de turbinas de vento.15 Cerca de 2.500 economistas, incluindo oito Prémios Nobel de economia, recomendam o deslocamento da carga fiscal. O professor de economia de Harvard, N. Gregory Mankiw escreveu na revista Fortune: “Cortar nos impostos sobre o rendimento e, ao mesmo tempo, aumentar os impostos sobre a gasolina, conduziria a um crescimento económico mais rápido, a menos congestão do tráfego, a melhores estradas e a um risco mais reduzido de aquecimento global – tudo sem pôr em causa a sustentabilidade fiscal a longo prazo. Isto pode ser a coisa mais próxima de um almoço grátis que a economia tem para oferecer”.16


Plano B 2.0 318 O The Economist recomenda fortemente a viragem ambiental nos impostos: “Em termos ambientais, para não falar da segurança energética, a América taxa a gasolina de forma muito leve. Mais do que um aumento simples, uma ideia politicamente mais fácil de implementar, e desejável nos seus próprios termos, seria um plano de longo prazo para fazer a viragem dos impostos dos rendimentos para as emissões de carbono”. Na Europa e Estados Unidos, as sondagens indicam que pelo menos 70 por cento dos votantes apoiam a reforma ambiental dos impostos desde que ela lhes seja explicada.17 Licenças transaccionáveis são, por vezes, uma alternativa interessante aos impostos ambientais.Ambos são instrumentos económicos que podem ser usados para atingir objectivos ambientais.Aprincipal diferença entre eles é que com as licenças, os governos estabelecem o montante permitido de uma determinada actividade, como a captura num banco de peixe, e deixa o mercado estabelecer o preço das licenças submetendo-as a leilão. Com os impostos ambientais, em contraste, o preço da actividade ambientalmente destrutiva é estabelecido pelo governo no valor do imposto, e o mercado determina a quantidade de actividade que ocorrerá a esse preço. Qualquer destes instrumentos económicos pode ser usado para desencorajar o comportamento ambiental irresponsável.18 A decisão sobre quando usar cada um destes instrumentos não é sempre fácil. Os governos têm muito mais experiência com os impostos ambientais do que com as licenças transaccionáveis. Também é claro que estas estão sujeitas a muitas condições. No entanto, as licenças foram utilizadas com sucesso em muitas situações diferentes, desde a restrição das capturas num banco de peixe australiano até à redução das emissões de enxofre nos Estados Unidos. Preocupado com a pesca excessiva no seu banco de lagosta, o governo daAustrália calculou qual a produção sustentável de lagostas e depois emitiu licenças que totalizavam esse valor. Os pescadores podiam então fazer lances para estas licenças. De facto, o governo decidiu quantas lagostas podiam ser apanhadas em cada ano e deixou o mercado decidir quanto valiam as licenças. Desde que o


Construindo Uma Nova Economia 319 sistema de transacção de licenças foi adoptado, em 1986, o banco de lagosta estabilizou e parece estar a funcionar de modo sustentável.19 Talvez o esforço mais ambicioso até à data para usar licenças transaccionáveis seja o esforço dos Estados Unidos para reduzir as emissões de enxofre das centrais eléctricas a metade, de 1990 a 2000. O objectivo foi atingido em 1995, muito antes da data prevista e com um custo mínimo. Um dos pontos fracos das licenças transaccionáveis é o de, nalgumas comunidades, as emissões poderem simplesmente não ser reduzidas.20 Embora as licenças transaccionáveis sejam populares na comunidade de negócios, elas são mais complicadas do ponto de vista administrativo e não são tão bem entendidas como os impostos. Edwin Clark, antigo economista sénior do White House Council on Environmental Quality, observa que as licenças transaccionáveis “requerem o estabelecimento de quadros regulatórios, definindo as licenças, definindo as regras das transacções e impedindo as pessoas de agirem sem licenças”. Em contraste com a reestruturação dos impostos, com os quais há uma grande familiaridade, as licenças transaccionáveis não são um conceito fácil de entender de forma generalizada, tornando mais difícil conseguir um apoio público alargado.21

Mudando os Subsídios Todos os anos os contribuintes mundiais dão cerca de 700 mil milhões de dólares em subsídios a actividades ambientalmente destrutivas, tais com a queima de combustíveis fósseis, a extracção excessiva de água dos aquíferos, o abate de florestas e a pesca excessiva. Um estudo do Conselho da Terra, Subsidiando o Desenvolvimento Insustentável, observa que “há algo inacreditável no facto do mundo gastar anualmente centenas de milhares de milhões de dólares para subsidiar a sua própria destruição”.22


Plano B 2.0 320 O Irão fornece um exemplo clássico de subsídios extremos quando estabelece os preços do petróleo para uso interno a um décimo do preço mundial, encorajando assim fortemente a propriedade de carros e o consumo de gasolina. O Banco Mundial relata que se este subsídio anual de 3,6 mil milhões de dólares fosse eliminado, as emissões de carbono do Irão seriam reduzidas nuns surpreendentes 49 por cento. E também fortaleceria a economia ao libertar receitas públicas para investimento no desenvolvimento económico do país. O Irão não está sozinho. O Banco refere que retirar os subsídios à energia reduziria as emissões de carbono na Venezuela em cerca de 26 por cento, na Rússia em 17 por cento, na Índia em 14 por cento e na Indonésia em 11 por cento.23 Alguns países estão a eliminar ou reduzir estes subsídios danosos para o clima. A Bélgica, a França e o Japão eliminaram todos os subsídios ao carvão.AAlemanha reduziu o seu subsídio ao carvão de 5,4 mil milhões de dólares em 1989 para 2,8 mil milhões de dólares em 2002, tendo entretanto baixado o uso do carvão em cerca de 46 por cento. Planeia eliminar este suporte completamente em 2010. A China cortou o subsídio ao carvão de 750 milhões de dólares em 1993 para 240 milhões de dólares em 1995. Mais recentemente, impôs uma taxa sobre os carvões com alto teor de enxofre.24 Um estudo da Green Party, do Reino Unido, “Aviation’s Economic Downside”, descreve a extensão dos subsídios dados actualmente à indústria britânica de transporte aéreo.As dádivas começam com 17 mil milhões de dólares em isenção de impostos, incluindo uma isenção total do imposto federal. Os custos externos ou indirectos que não são pagos, como o tratamento das doenças causadas pela respiração do ar poluído pelos aviões, os custos da alteração climática, etc., somam quase 7 mil milhões de dólares. O subsídio no Reino Unido totaliza 391 dólares por residente. Isto é também inerentemente uma política de impostos regressiva já que uma parte substancial da população da Grã-Bretanha não tem posses para viajar de avião com frequência, e no entanto ajuda a subsidiar o uso deste caro meio de transporte por parte dos seus compatriotas com maior poder de compra.25


Construindo Uma Nova Economia 321 Enquanto alguns dos principais países industrializados têm vindo a reduzir os subsídios aos combustíveis fósseis – especialmente o carvão, de todos, o combustível mais prejudicial para o clima – os Estados Unidos têm aumentado o apoio ao combustível fóssil e às indústrias nucleares. Um relatório da Green Scissors de 2002, um estudo apoiado por uma coligação de grupos ambientalistas, calculou que, ao longo dos últimos 10 anos, os subsídios à indústria de energia ascenderam a 33 mil milhões de dólares. Deste valor, a indústria do petróleo e da gasolina obteve 26 mil milhões de dólares, a do carvão, 3 mil milhões de dólares e a nuclear, 4 mil milhões de dólares. Numa altura em que há necessidade de conservar os recursos de petróleo, os contribuintes dos Estados Unidos estão a subsidiar a sua delapidação.26 A viragem ambiental dos impostos que se acaba de descrever reduz os impostos sobre os salários e encoraja o investimento em actividades como a energia eólica e a reciclagem, aumentando assim o emprego e diminuindo a destruição ambiental. Eliminar os subsídios destrutivos do ponto de vista ambiental reduz tanto a carga sobre os contribuintes como as próprias actividades destrutivas. Os subsídios não são maus por natureza. Muitas tecnologias e indústrias nasceram de subsídios governamentais. Os aviões a jacto desenvolvidos com despesas de investigação e desenvolvimento deram origem aos aviões comerciais modernos.AInternet foi o resultado de ligações entre computadores subsidiadas pelo estado, em laboratórios governamentais e institutos de investigação. E a combinação entre a dedução do imposto federal e uma forte dedução de impostos na Califórnia fez nascer a moderna indústria de energia eólica.27 Mas tal como há uma necessidade de deslocamento da carga fiscal, há também uma necessidade de viragem nos subsídios. Um mundo confrontado com a perspectiva da alteração climática com efeitos nefastos na economia, por exemplo, já não pode justificar subsídios para aumentar a queima de carvão e petróleo. Fazer a viragem destes subsídios para o desenvolvimento de fontes energéticas benig-


Plano B 2.0 322 nas para o clima, como a energia eólica, solar, da biomassa e geotérmica, é a chave para estabilizar o clima da Terra. Virar os subsídios da construção de estradas para a construção de caminhos de ferro pode aumentar a mobilidade em muitas situações ao mesmo tempo que reduz as emissões de carbono. Numa economia mundial em apuros, que enfrenta deficits fiscais a todos os níveis do governo, explorar estas viragens de impostos e subsídios, com os dividendos duplos e triplos que acarretam, pode ajudar a equilibrar os livros e a salvar os sistemas ambientais de suporte da economia.Aviragem de impostos e subsídios promete ganhos tanto em eficiência económica como na redução da destruição ambiental, uma situação duplamente ganhadora.

Eco-rotulagem: Votando com as Nossas Carteiras Ainda um outro instrumento para a reestruturação ambiental da economia é a eco-rotulagem.Arotulagem de produtos criados com práticas ambientais evidentes permite que os consumidores votem com as suas carteiras. A eco-rotulagem é agora usada para permitir aos consumidores a identificação de electrodomésticos eficientes em energia, produtos da floresta oriundos de florestas geridas de forma sustentável, produtos da pesca de bancos de peixe com uma gestão sustentável e electricidade “verde”, de fontes sustentáveis. Entre estes eco-rótulos estão os que são atribuídos pelo Marine Stewardship Council (MSC) para os produtos do mar. Em Março de 2000, o MSC lançou um programa de certificação das pescas quando aprovou o Banco de Lagosta da Rocha da Austrália Ocidental. Tendo obtido também aprovação nesse dia o banco de Arenque do Tamisa Ocidental. Em Setembro de 2000, o banco de salmão do Alasca tornou-se o primeiro banco de pesca americano a ser certificado. Entre os actores principais na indústria de produtos do mar e sectores de retalho que apoiam a iniciativa do MSC estão a Unilever europeia, a Youngs-Bluecrest e a Sainsbury’s.28 Para ser certificado, um banco de peixe tem que demonstrar que é gerido de forma sustentável. Especificamente, de acordo com o MSC: “Em primeiro lugar, o banco de peixe tem que ser conduzido


Construindo Uma Nova Economia 323 de modo a não retirar peixe para além do que pode ser reposto naturalmente ou matar outras espécies através de práticas de pesca nocivas. Em segundo lugar, o banco de peixe tem que funcionar de modo a assegurar a saúde e diversidade do ecossistema marinho de que depende. Finalmente, o banco tem que respeitar as leis e regulamentos locais, nacionais e internacionais relacionadas com a pesca responsável e sustentável”. Em meados de 2005 havia mais de 46 bancos de peixe certificados em todo o mundo, fornecendo cerca de 2 milhões de toneladas de produtos do mar.29 O equivalente do MSC para os produtos da floresta é o Forest Stewardship Council (FSC), que foi fundado em 1993 pelo World Wide Fund for Nature (WWF) e outros grupos. Fornece informação sobre as práticas de gestão na indústria de produtos florestais. Algumas das florestas existentes no mundo são geridas de forma a manter uma produção permanente e estável; outras são cortadas totalmente, dizimadas de um dia para o outro na busca de lucros rápidos. O FSC emite rótulos apenas para os produtos das primeiras, quer seja madeira vendida numa loja de bricolage, mobília numa loja de móveis ou papel numa papelaria.30 Com sede em Oaxaca, México, o FSC acredita organizações nacionais que garantam que as florestas são geridas de forma sustentável. Para além desta monitorização no terreno, as organizações acreditadas têm também que ser capazes de identificar o caminho dos produtos através dos vários estágios de processamento, até ao consumidor. O FSC estabelece os padrões e fornece o rótulo do FSC, o selo de aprovação, mas o verdadeiro trabalho é feito pelas organizações nacionais.31 O FSC estabeleceu nove princípios a serem satisfeitos para as florestas se qualificarem à obtenção do seu rótulo. O requerimento principal é que a floresta seja gerida de maneira a garantir que a sua produção pode ser mantida indefinidamente. Isto significa cortes de árvores cuidadosos e selectivos, de facto, copiando a gestão que a natureza faz da floresta, removendo sempre as árvores mais maturas, mais velhas.32


Plano B 2.0 324 O rótulo do FSC oferece aos consumidores a informação de que necessitam para apoiar a gestão responsável da floresta através das suas compras de produtos da floresta. Ao identificar as empresas e retalhistas de madeira para construção que participam no programa de certificação, os investidores com preocupações sociais têm também a informação de que necessitam para investirem de forma responsável. Em Março de 1996, os primeiros produtos de madeira certificados foram introduzidos no Reino Unido. Desde então, o processo de certificação cresceu em todo o mundo. Em Agosto de 2005, cerca de 57 milhões de hectares de floresta em 65 países tinham sido certificados sob os auspícios do FSC.33 Para apoiar este programa de certificação, foram constituídas redes de floresta e mercado em cerca de 35 países, incluindo a Áustria, o Brasil, Canadá, França,Alemanha, países nórdicos, Rússia, Espanha, Suiça, Reino Unido e Estados Unidos. Estas redes fazem parte do vasto grupo de suporte de empresas que, no seu marketing, aderem aos standards do FSC. Os três maiores compradores mundiais – Home Depot, Lowe’s e Ikea – todos compram preferencialmente madeira com a certificação do FSC.34 Em Junho de 2001, o Ministro dos Recursos Naturais, em Moscovo, anunciou a introdução da certificação obrigatória da madeira. Embora uma pequena porção do corte de madeira para construção já fosse certificada, a discriminação dos compradores contra o resto dos cortes custava à Rússia mil milhões de dólares em receitas de exportações. O ministério calcula que a madeira não certificada vende-se por menos 20 a 30 por cento que a madeira certificada proveniente de países concorrentes.35 Outro bem que começa a ter um rótulo ambiental é a electricidade. Nos Estados Unidos, muitas comissões estaduais de serviços públicos estão a exigir que estes serviços ofereçam aos consumidores uma opção de energia verde. Esta é definida como a energia de fontes renováveis com excepção da hidroeléctrica, e abrange a ener-


Construindo Uma Nova Economia 325 gia eólica, as células solares, a energia solar térmica, a energia geotérmica e a biomassa. Os serviços públicos enviam simplesmente um cartão a ser devolvido por correio juntamente com a conta de electricidade, onde os consumidores podem assinalar se pretendem energia verde.Aoferta especifica o custo adicional desta energia, que em geral é de 3 a 15 por cento.36 Os responsáveis dos serviços públicos ficam muitas vezes surpreendidos com o número de consumidores que optam pela energia verde. Muitos estão aparentemente dispostos a pagar mais para ajudarem a estabilizar o clima para as gerações futuras. Os governos locais, como por exemplo, os de Santa Mónica, Oakland e Santa Barbara, na Califórnia, optaram por usar exclusivamente energia verde. Isto inclui a energia usada nos edifícios municipais, assim como nos vários serviços municipais, como a iluminação pública e a sinalização de tráfego. Outros governos de cidades e estados comprometeram-se a comprar parte da sua electricidade com origem em fontes verdes, como é o caso de Chicago, Portland, Nova Jersey e Nova Iorque.37 Muitas empresas estão também a aderir. Johnson & Johnson, Whole Foods Marquet e Staples, encontram-se todas entre os 25 maiores compradores de energia verde, de acordo com o Environmental Protection Agency’s Green Power Partnership. Dezenas de empresas na Califórnia e no Texas estão a aderir.38 O efeito prático deste número crescente de apoiantes da energia verde é uma vaga de procura que está a forçar muitos serviços públicos a apressarem-se para conseguir oferecer um fornecimento adequado de electricidade verde. Uma das razões porque os parques eólicos se estão a multiplicar em tantos estados é porque esta é uma das formas mais rápidas de fazer chegar nova energia verde à a rede eléctrica. Do mesmo modo que a comercialização da energia verde já está bastante avançada nos Estados Unidos, no Japão está agora também bem estabelecida, tendo o rápido crescimento das compras de energia verde ameaçado ultrapassar a oferta em 2004, o que forçou as empresas de serviços públicos a investirem rapidamente em mais turbinas eólicas.39


Plano B 2.0 326 Outro tipo de eco-rotulagem são os rótulos de eficiência colocados nos electrodomésticos caseiros que atingem certos padrões de eficiência. Estes estão em vigor em muitos países desde a crise energética do final da década de 1970. Há também rótulos verdes implementados por grupos ambientalistas ou governamentais a nível nacional. Entre os selos ambientais mais conhecidos estão o Blue Angel da Alemanha, o Environmental Choice do Canadá, e o Environmental Protection Agency’s Energy Star dos Estados Unidos.40 Uma Economia de Novos Materiais Na natureza, os fluxos lineares numa só direcção não sobrevivem durante muito tempo. Também não podem também sobreviver muito tempo na economia em expansão que é parte do ecossistema da Terra. O desafio é pois redesenhar a economia dos materiais de modo a que esteja conforme com a natureza.Aeconomia de desperdício que se desenvolveu ao longo do último meio século é uma aberração, destinada agora ao monte de lixo da história. O potencial de redução do uso dos materiais foi examinado durante a última década em três estudos específicos. O primeiro – Factor Four, feito por Ernst von Weizäcker, um ambientalista e dirigente do Bundestag alemão – defende que as economias industrializadas modernas poderiam funcionar de forma bastante eficaz com apenas um quarto do nível actual de utilização de matérias-primas virgens. Esta ideia foi seguida uns anos mais tarde pelo Factor Ten Institute organizado em França sob a direcção de Friedrich Schmidt-Bleek.A sua investigação conclui que a produtividade dos recursos pode ser aumentada 10 vezes, e isso está perfeitamente ao alcance da tecnologia e gestão existentes desde que haja uma política de incentivos adequada.41 Em 2002, arquitecto americano William McDonough e o químico alemão Michael Braungart elaboraram em equipa o livro intitulado Cradle to Cradle: Remaking the Way We Make Things. O desperdício e a poluição devem ser evitados a qualquer custo. “A Poluição”, diz McDonough, “é um símbolo do fracasso dum projecto”.42


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Uma das chaves para reduzir a utilização dos materiais é a reciclagem do aço, cujo uso ultrapassa o de todos os outros metais juntos.Autilização do aço é dominada pelas indústrias do automóvel, dos electrodomésticos e da construção. Entre os produtos à base de aço, nos Estados Unidos, os automóveis são os mais reciclados. São na realidade demasiado valiosos para serem abandonados a ganhar ferrugem em ferros-velhos fora do nosso alcance.43 A taxa de reciclagem dos electrodomésticos é cerca de 90 por cento. A taxa de 60 por cento de recuperação das embalagens de lata dos Estados Unidos em 2003 pode ser justificada em parte pelas campanhas municipais de reciclagem lançadas no final da década de 1980.44 Nos Estados Unidos, cerca de 71 por cento do aço produzido em 2003 proveio de sucata, sendo só 29 por cento proveniente do minério puro de ferro. A reciclagem do aço começou a aumentar há mais de uma geração com o advento do forno de arco eléctrico, um método de produzir aço a partir da sucata, com apenas um terço da energia usada na produção a partir do minério puro de ferro. E como não requer nenhuma mineração, elimina completamente uma fonte de dano ambiental. Nos Estados Unidos, Itália e Espanha, os fornos de arco eléctrico usadas na reciclagem são responsáveis por metade ou mais da produção de aço.45 Para as economias industrializadas maduras com populações estáveis é mais fácil obter a maior parte do aço a partir de ferro-velho reciclado, simplesmente porque a quantidade de aço integrada na economia é, basicamente, fixa. O número de electrodomésticos, a frota de automóveis e o stock de edifícios está a aumentar pouco ou mesmo nada. No caso dos países que se encontram nos estágios iniciais da industrialização, no entanto, a criação de infra-estrutura – quer sejam fábricas, pontes, edifícios de grande porte, ou o transporte, como automóveis, autocarros e carruagens de caminho de ferro – não deixa muito aço para ser reciclado.


Plano B 2.0 328 Na nova economia, as pequenas fábricas de aço de arco eléctrico que convertem eficazmente aço do ferro-velho em aço acabado irão substituir, em grande parte, as minas de ferro. As economias industrializadas avançadas acabarão por se basear principalmente no stock de materiais já existente na economia em alternativa às matérias-primas puras. Nos metais como o aço e o alumínio, as perdas com o uso são mínimas. Com políticas apropriadas, o metal pode ser usado e reutilizado indefinidamente. Em anos recentes, a indústria de construção começou a desmontar velhos edifícios, decompondo-os nas suas partes, de forma a poderem ser recicladas e reutilizadas. Por exemplo, quando o PNC Financial Services em Pittsburgh desmontou um edifício de sete andares, os produtos principais resultantes foram 2.500 toneladas de cimento, 350 toneladas de aço, 9 toneladas de alumínio e segmentos de revestimento de tecto em espuma. O cimento foi pulverizado e usado para fazer um parque no local. O aço e o alumínio foram reciclados. E os segmentos de revestimento do tecto foram devolvidos ao fabricante também para reciclagem. Esta reciclagem economizou cerca de 200.000 dólares em taxas de descarga de lixo de obras. Quando se desconstrói um edifício, em vez de o demolir pura e simplesmente, a maior parte dos seus materiais podem ser reciclados.46 A Alemanha e, mais recentemente, o Japão requerem que os produtos como automóveis, electrodomésticos e equipamento de escritório sejam projectados de modo a poderem ser facilmente desmontados e os seus componentes reciclados. Em Maio de 2001, a Dieta Japonesa criou uma dura lei de reciclagem, que proíbe que os electrodomésticos, como máquinas de lavar, televisões e aparelhos de ar condicionado, sejam deitados fora. Com os consumidores a suportar os custos da desmontagem dos aparelhos domésticos através de uma taxa de remoção para as firmas de reciclagem, que pode ir até 60 dólares por um frigorífico e 35 dólares por uma máquina de lavar, a pressão para se projectar electrodomésticos de modo a poderem ser desmontados mais facilmente e de forma mais barata é forte.47


Construindo Uma Nova Economia 329 Com os computadores a ficarem obsoletos ao fim de alguns anos à medida que a tecnologia avança, a necessidade de os poder desmontar e reciclar rapidamente é um desafio de monta na construção da eco-economia. Para além das medidas que encorajam a reciclagem de materiais estão as que encorajam a reutilização de produtos como as embalagens de bebidas.AFinlândia, por exemplo, proibiu o uso de embalagens não reutilizáveis de bebidas.Ailha canadiana de Prince Edward adoptou uma proibição semelhante de todas as embalagens de bebidas não reutilizáveis. O resultado em ambos os casos é uma redução drástica do fluxo de lixo nos aterros.48 Uma garrafa de vidro reutilizável usada várias vezes pode requerer, em cada utilização, cerca de 10 por cento da energia usada na reciclagem de uma lata de alumínio. Fazer a limpeza, a esterilização e a rotulagem de uma garrafa usada requer pouca energia, mas reciclar latas de alumínio, que têm um ponto de fusão a 660 graus Celsius, é um processo intensivo em energia. Banir as embalagens não reutilizáveis é uma opção triplamente ganhadora – corta no uso de energia e material, no fluxo de lixo e na poluição do ar e da água.49 Há também economias de combustível no transporte, uma vez que as embalagens se limitam a ser devolvidas às fábricas originais de engarrafamento ou às cervejeiras. Se forem usadas embalagens não reutilizáveis, quer de vidro quer de alumínio, e elas forem recicladas, então têm que ser transportadas para uma fábrica onde possam ser fundidas para voltar a fazer novas embalagens que serão novamente transportadas para a fábrica de engarrafamento ou cervejeira. Mais importante ainda que projectar os produtos é a reorganização dos processos de fabrico de modo a eliminar completamente a descarga de poluentes. Muitos processos de fabrico actuais evoluíram numa altura em que a economia era muito mais pequena e em que o volume de poluentes não danificava o ecossistema como hoje. Cada vez mais empresas se vão apercebendo de que a situação não pode continuar e algumas, como a Dupont, adoptaram como meta o nível zero de emissões.50


Plano B 2.0 330 Outra forma de reduzir desperdícios é concentrar de forma sistemática as unidades fabris, de modo a que os desperdícios de um processo possam ser usados como matéria-prima de outro. A NEC, a grande empresa japonesa de electrónica, é uma das primeiras multinacionais a adoptar esta abordagem em várias das suas instalações de produção. De facto, parques industriais estão a ser projectados por grandes empresas e governos, com o objectivo específico de combinar fábricas que tenham desperdícios utilizáveis. Agora, na indústria como na natureza, o desperdício de uma empresa transforma-se em alimento para outra.51 A política de compras dos governos pode ser usada para fazer aumentar a reciclagem. Por exemplo, quando a administração Clinton emitiu uma Ordem Executiva em 1993 obrigando a que, até 1995, todo o papel comprado pelo governo contivesse 20 por cento ou mais de desperdício de papel (aumentando para 25 por cento até 2000), isso criou um forte incentivo a que os fabricantes de papel incorporassem desperdício de papel no seu processo de fabrico. Uma vez que o governo dos Estados Unidos é o maior comprador mundial de papel, este facto criou um mercado em rápido desenvolvimento para o papel reciclado.52 As novas tecnologias que são menos dependentes de materiais também reduzem a sua utilização. Os telemóveis que dependem de torres dispersas um pouco por toda a parte ou de satélites para transmissão de sinal, dominam agora totalmente o uso dos telefones nos países em vias de desenvolvimento, o que evita o investimento em milhões de quilómetros de fio de cobre fabricado nos países industrializados.53 Uma indústria cujo valor para a sociedade está a ser questionada pela comunidade ambientalista é a indústria de água engarrafada. O World Wide Fund for Nature, uma organização com 5,2 milhões de membros, publicou um estudo em 2001, apelando aos consumidores dos países industrializados para que se abstivessem de consumir água engarrafada, observando que não era nem mais segura nem de melhor qualidade para a saúde do que a água da torneira, apesar de poder custar 1.000 vezes mais.54 O WWF nota que, nos Estados Unidos e na Europa, há padrões mais exigentes para regular a água canalizada do que para a água


Construindo Uma Nova Economia 331 engarrafada. Embora um marketing inteligente feito nos países industrializados tenha convencido muitos consumidores de que a água engarrafada é mais saudável, o estudo do WWF não conseguiu comprovar esta suposta verdade. Para aqueles que vivem onde a água não é segura, como em algumas cidades do Terceiro Mundo, é muito mais barato ferver ou filtrar a água do que comprá-la em garrafas.55 Acabar com o uso de água engarrafada eliminaria a necessidade de milhares de milhões de garrafas de plástico e da frota de camiões que se arrastam na distribuição da água. Isto, por sua vez, eliminaria a congestão de tráfego, a poluição do ar e o aumento dos níveis de dióxido de carbono que resulta da circulação dos camiões.56 Um pequeno resumo dos efeitos ambientais da mineração do ouro levanta dúvidas se esta indústria constitui um benefício líquido para a sociedade. Para além da grande libertação de mercúrio e cianeto para o ambiente, a produção anual de 2.500 toneladas de ouro requer o processamento de 750 milhões de toneladas de minério – o que está logo abaixo dos 2,5 mil milhões de toneladas de minério processados para produzir mil milhões de toneladas de aço bruto.57 Mais de 80 por cento do ouro extraído em cada ano é usado para produzir jóias que são muitas vezes usadas como símbolo estatutário, uma forma de exibir riqueza por parte de uma pequena minoria da população mundial. Birsel Lemke, uma ambientalista turca muito respeitada, questiona o futuro da exploração mineira do ouro, perguntando se valerá a pena transformar grandes áreas no que designa por “paisagem lunar”. Ela não está contra o ouro em si, mas contra os químicos mortais – cianeto e mercúrio – que são libertados no processamento do minério de ouro.58 Obter um preço justo de mercado para o ouro significa impor um imposto sobre ele que cubra o custo de limpar a poluição de mercúrio e cianeto das explorações mais os custos de restaurar a paisagem das regiões ocupadas pelas minas. Esse imposto, levando a que o preço deste metal precioso reflectisse o seu custo total para a sociedade, faria provavelmente aumentar o preço do ouro para valores várias vezes superiores ao actual. Outra opção para reduzir a utilização de matérias-primas seria eliminar subsídios que encorajam o seu uso.Aindústria de alumínio é onde eles são mais elevados. Por exemplo, um estudo do Australia


Plano B 2.0 332 Institute refere que as fundições naAustrália compram electricidade a um baixíssimo preço subsidiado de 0,7 a 1,4 centavos de dólar por kilowatt-hora, enquanto outras indústrias pagam 2,6 a 3,1 centavos. Sem este enorme subsídio, deixariamos provavelmente de ter bebidas em latas de alumínio descartáveis. Este subsídio ao alumínio subsidia indirectamente tanto as companhias aéreas como os automóveis, encorajando assim as viagens, uma actividade de energia intensiva.59 A mais abrangente iniciativa de política para desmaterializar a economia é o imposto proposto sobre os combustíveis fósseis, um imposto que reflectiria o custo total para a sociedade da extracção de carvão e petróleo, da poluição do ar associada ao seu consumo e dos danos para o clima. Um imposto de carbono levará a um preço da energia mais realista, que integre a economia dos materiais de energia intensiva e conduza à redução do uso de materiais. O desafio de construir um sector da eco-economia dos materiais é o de assegurar que o mercado envia sinais verdadeiros. Nas palavras de Ernst Weizäcker, “O desafio é fazer com que o mercado conte a verdade ecológica”. Para ajudar o mercado a contar a verdade, precisamos não só dum imposto do carbono, mas também duma taxa de aterro que obrigue os produtores de lixo a pagar o custo total da sua eliminação.60 Novas Indústrias, Novos Postos de Trabalho Descrever a eco-economia é, obviamente, especulativo, mas menos do que parece, já que as grandes linhas da descrição são definidas pelos princípios da ecologia.As tendências e viragens específicas aqui descritas não são projecções do que acontecerá, embora o termo “acontecerá” seja usado por uma questão de eficácia. Ninguém sabe se estas viragens “acontecerão” de facto, mas será necessário algo parecido com isto se quisermos construir uma eco-economia. Construir uma nova economia envolve acabar com indústrias antigas, reestruturar indústrias existentes, e criar indústrias novas. Por exemplo, o uso do carvão está a ser posto de lado, substituído por ganhos de eficiência em muitos países, mas também pelo gás natural, como no Reino Unido, e pela energia eólica, como na Dinamarca e Alemanha.61


Construindo Uma Nova Economia 333 A indústria automóvel mundial enfrenta alguma reestruturação em função da viragem dos motores de combustão interna a gasolina para o híbrido a gás e electricidade, o híbrido a gasóleo e electricidade ou o veículo a gasóleo de alto rendimento que é tão popular na Europa. Esta viragem irá requerer tanto um re-equipamento das fábricas de motores como uma formação adicional dos operários e mecânicos automóveis.Anova economia trará também novas grandes indústrias, que ainda não existem ou estão apenas a começar. A geração de electricidade a partir do vento é uma dessas indústrias, que incorpora três indústrias subsidiárias: fabrico de turbinas, instalação e manutenção.Ainda no seu estado embrionário, esta indústria promete tornarse na base da economia da nova energia. Milhões de turbinas estarão em breve a converter o vento em electricidade barata, tornando-se parte da paisagem, gerando receitas e postos de trabalho nas comunidades rurais de todo o mundo. À medida que a energia eólica emerge como uma fonte principal de electricidade de baixo custo, irá dar origem a outra indústria – a produção de hidrogénio. Quando as turbinas de vento tiverem uma utilização generalizada, haverá uma grande capacidade não utilizada durante a noite, quando o consumo desce. Com esta electricidade essencialmente grátis, os proprietários das turbinas podem ligar os geradores de hidrogénio, convertendo a energia do vento em hidrogénio. Isto poderá então ser usado para alimentar centrais de energia que agora são alimentadas a gás natural, à medida que o gás for encarecendo ou deixar de estar disponível.Aturbina de vento substituirá a mina de carvão, o poço de petróleo e as reservas de gás. Entre as muitas mudanças na economia alimentar mundial estará a continuação da viragem para a piscicultura. A aquacultura, o subsector em maior crescimento da economia alimentar mundial, expandiu-se a 9 por cento ao ano desde 1990. A criação de peixe, em especial de espécies omnívoras como a carpa, o peixe-gato e a tilápia, deverá continuar a expandir-se rapidamente simplesmente porque estes peixes convertem grão em proteína animal de forma muito eficiente. Com o crescimento da aquacultura surge a necessidade de uma indústria alimentar de crescimento rápido para estas culturas, onde as rações sejam criadas por nutricionistas de pescado, à semelhança do que acontece na avicultura, hoje em dia.62


Plano B 2.0 334 O fabrico e reparação de bicicletas é uma indústria em expansão. Ainda há pouco tempo, em 1965, a produção mundial de carros e bicicletas era mais ou menos a mesma, cerca de 20 milhões de unidades por ano; mas desde 2003, a produção de bicicletas subiu para mais de 100 milhões por ano, em comparação com 42 milhões de carros. Este crescimento da venda de bicicletas reflecte o crescimento do número de pessoas que atingiu o nível de riqueza que lhes permite adquirir uma bicicleta, principalmente na Ásia. Nos países industrializados, a Holanda e a Dinamarca são pioneiras num modelo de transporte urbano em que as bicicletas têm um papel determinante, o que faz prever o futuro papel das bicicletas no mundo.63 Com a expansão da utilização das bicicletas, o interesse nas bicicletas com bateria de apoio está também a crescer. Idênticas às bicicletas existentes, com excepção de um pequeno motor eléctrico alimentado por uma bateria que pode fornecer a totalidade da energia necessária à deslocação da bicicleta ou servir de apoio a ciclistas mais idosos ou que vivam em terrenos montanhosos, prevê-se que as suas vendas continuem a subir.64 Ainda outra indústria em crescimento é a ligada ao aumento da produtividade da água. Tal como o último meio século foi dedicado ao aumento da produtividade da terra, este meio século estará centrado no aumento da produtividade da água. Tecnologias de irrigação tornar-se-ão mais eficientes.Areciclagem continuada dos abastecimentos de água urbana, já iniciada nalgumas cidades, tornar-se-á uma coisa vulgar, substituindo o sistema de “puxar o autoclismo e esquecer”. Com o aumento dos preços do petróleo, a teleconferência tornase mais apelativa. Para poupar combustível e tempo, os indivíduos “participarão” em conferências electrónicas, com ligações de som e de imagem. Em breve haverá, provavelmente, milhares de empresas a organizar conferências electrónicas. Outras promissoras indústrias em crescimento são o fabrico de células solares, o transporte ferroviário ligeiro e a plantação de árvores. Para os 1,7 mil milhões de pessoas dos países e aldeias em desenvolvimento sem electricidade, a produção em massa de células solares é a melhor aposta para a electrificação. À medida que as pessoas se vão cansando da congestão do tráfego e da poluição, as


Construindo Uma Nova Economia 335 cidades de todo o mundo começarão a restringir a utilização dos carros e a virar-se para o caminho-de-ferro ligeiro para garantir a mobilidade. À medida que os esforços para reflorestar a Terra ganham impulso e a plantação de árvores se expande, esta actividade emergirá como uma actividade económica de primeira linha.65 A reestruturação da economia global criará não só novas indústrias, mas também novos postos de trabalho – de facto, profissões e especialidades dentro das profissões completamente novas. Fazer uma viragem em força para as eólicas irá requerer milhares de meteorologistas do vento para analisar o potencial dos locais com vento, identificando os melhores sítios para a instalação de parques eólicos. O papel dos meteorologistas do vento na nova economia será comparável ao dos geólogos do petróleo na velha economia. Há uma procura crescente de arquitectos amigos do ambiente que desenhem edifícios eficientes em energia e materiais e que maximizem o aquecimento, o arrefecimento e a iluminação naturais. Num futuro com menos água, os hidrólogos das bacias hidrográficas serão chamados a estudar o ciclo hidrográfico local, incluindo o movimento das águas subterrâneas, determinando qual a produção sustentável dos aquíferos. Eles estarão no centro dos sistemas de gestão das bacias hidrográficas. À medida que o mundo abandone a economia do desperdício, serão necessários engenheiros para desenhar produtos que possam ser produtos reciclados – dos carros aos computadores. Uma vez que os produtos sejam desenhados para ser desmontados rápida e facilmente nas suas partes e materiais componentes, a reciclagem generalizada será relativamente fácil. Estes engenheiros serão responsáveis pelo encerrar do ciclo dos materiais, convertendo a economia do deixa andar numa economia de reciclagem. Nos países ricos em energia geotérmica, será dos geólogos da energia geotérmica a responsabilidade da localização dos melhores locais quer para centrais energéticas quer para aproveitar esta energia subterrânea directamente para o aquecimento de edifícios. Dar nova formação aos geólogos do petróleo para que dominem as tecnologias da energia geotérmica é uma forma de dar satisfação ao provável aumento da procura de geólogos da energia geotérmica. Outra necessidade premente, particularmente nos países em de-


Plano B 2.0 336 senvolvimento, são os engenheiros sanitários que possam desenhar sistemas de esgotos que usem casas de banho com sanitários de compostagem, com menos água e menos cheiro, uma tendência já em marcha nalgumas comunidades com falta de água. Outra procura crescente será a de agrónomos especializados em cultivos múltiplos e cruzados. Isto requer uma especialidade tanto no desenvolvimento e selecção de culturas que se ajustem umas às outras numa rotação contínua, em vários locais, como em práticas agrícolas que facilitem as culturas múltiplas. As grandes empresas serão obviamente desafiadas a fazerem uma reestruturação económica, mas as universidades também. Reestruturar economicamente implica uma procura de novas profissões, tais como meteorologistas do vento, arquitectos de energia, engenheiros de reciclagem e, portanto, a necessidade de criar cursos para formar estes profissionais do futuro. A Revolução Ambiental Reestruturar a economia global de acordo com os princípios da ecologia representa a maior oportunidade de investimento da história. Em termos comparativos, a Revolução Ambiental é equivalente às RevoluçõesAgrícola e Industrial que a precederam. A Revolução Agrícola envolveu a reestruturação da economia alimentar, mudando o estilo de vida nómada, baseado na caça e na colecção, para um estilo de vida estável baseado no amanho dos solos. Embora a agricultura tenha começado como um complemento à caça e à colecção, ela acabou por as substituir quase por completo. ARevoluçãoAgrícola acabou por limpar um décimo da superfície da Terra coberta de erva ou de árvores a fim de ser arada e cultivada. Ao contrário da cultura de caça e colecção que tinha muito pouco efeito na Terra, esta nova cultura agrícola transformou literalmente a superfície da Terra.66 A Revolução Agrícola envolveu a reestruturação da economia alimentar, mudando o estilo de vida nómada, baseado na caça e na recolecção, para um estilo da vida estável baseado no amanho dos solos. Embora a agricultura tenha começado como um complemento da caça e da recolecção, acabou por as substituir quase por comple-


Construindo Uma Nova Economia 337 to.ARevoluçãoAgrícola acabaria por limpar um décimo da superfície da Terra coberta de erva ou de árvores a fim de ser arada e cultivada. Ao contrário da cultura de caça e recolecção que tinha muito pouco efeito na Terra, esta nova cultura agrícola transformou literalmente a superfície da Terra. A Revolução Industrial está em marcha há dois séculos, embora em alguns países esteja ainda no seu início. Na sua base esteve uma viragem dos combustíveis à base de madeira para os combustíveis fósseis, uma mudança que criou as condições para uma expansão maciça da actividade económica. De facto, a sua característica distintiva é o domínio das vastas quantidades de energia solar armazenadas debaixo da superfície terrestre como combustíveis fósseis. Enquanto que a RevoluçãoAgrícola transformou a superfície da Terra, a Revolução Industrial está a transformar a atmosfera terrestre. A produtividade adicional que a Revolução Industrial tornou possível libertou enormes energias criativas. Também deu origem a novos estilos de vida e à era da história humana mais destrutiva do ponto de vista ambiental, colocando o mundo numa rota firme em direcção ao declínio económico. A Revolução Ambiental parece-se com a Revolução Industrial, na medida em que são ambas dependentes da viragem para uma fonte nova de energia. E como as primeiras duas revoluções, a RevoluçãoAmbiental afectará o mundo inteiro. Há diferenças de escala, tempo e origem entre as três revoluções. Ao contrário das primeiras duas, a Revolução Ambiental tem que ser comprimida em algumas décadas. As outras revoluções foram conduzidas pelas novas descobertas, pelos avanços na tecnologia, enquanto que esta revolução, embora seja facilitada pelas novas tecnologias, é conduzida pela nossa necessidade de conseguir estabelecer a paz com a natureza. Como referido atrás, nunca antes houve uma situação de investimento como a presente. Os 1,7 mil milhões de dólares que o mundo gasta actualmente por ano com o petróleo, a principal fonte de energia, dá uma ideia sobre o que se poderia gastar em energia na ecoeconomia. Adiferença entre os investimentos em combustíveis fósseis e os investimentos na energia eólica, de células solares e geotérmica, é que os últimos não se esgotam.67


Plano B 2.0 338 Para os países em desenvolvimento dependentes da importação de petróleo, as novas fontes de energia prometem libertar capital para investir em fontes domésticas de energia. Não há muitos países que tenham os seus próprios campos de petróleo, mas todos têm energia do vento e solar à espera de ser aproveitada. Em termos de expansão económica e da criação de emprego, estas novas tecnologias de energia são enviadas por Deus. Os investimentos na eficiência energética crescerão rapidamente pela simples razão de que são rentáveis. Praticamente em todos os países, a energia guardada é a fonte mais barata de nova energia. Há também grandes oportunidades de investimento na economia alimentar. É provável que o aumento da procura de pescado, por exemplo, suba pelo menos 50 por cento nos próximos 50 anos, e talvez até muito mais. Se isso acontecer, a produção proveniente da piscicultura – agora de 42 milhões de toneladas/ano – terá que praticamente duplicar, tal como os investimentos nesta indústria. Embora o crescimento da aquacultura deva abrandar relativamente aos 9 por cento anuais da última década, não deixa de constituir uma oportunidade de investimento muito promissora.68 Uma situação similar existe na plantação de árvores. As plantações de árvores desde 2000 cobrem cerca de 187 milhões de hectares. Um crescimento de cerca de metade deste número será necessário tanto para satisfazer a procura futura como para reduzir a pressão sobre as florestas naturais.69 Nenhum sector da economia global ficará imune à Revolução Ambiental. Nesta nova economia, algumas empresas serão vencedoras e algumas perdedoras. Aquelas que participarem na sua construção serão as vencedoras. Aquelas que se agarrarem ao passado arriscam-se a passar a fazer parte dele.


13 Plano B: Construindo um Futuro Novo Ao olharmos para o futuro, duas preocupações surgem. Será que o declínio civilizacional já está em marcha? E, como é que isso se pode ver? Entre os sinais sociais precoces de um possível declínio estão a queda generalizada da esperança de vida, o aumento do número de pessoas com fome e o crescimento da lista de estados falhados ou em falência. Pela primeira vez na era moderna, a esperança de vida para uma grande parte da humanidade – os 750 milhões de pessoas que vivem na África subsariana – caiu drasticamente dos 61 para os 48 anos, como resultado da epidemia do HIV/SIDA.1 No último meio século, a quantidade de pessoas com fome estava a diminuir mas, recentemente, este processo inverteu-se, com o número a subir de 826 milhões em 1998 para 852 milhões em 2002. Com a inércia económica actual (business as usual), o número de pessoas com fome irá provavelmente aumentar, reforçando as preocupações com a segurança alimentar. Por outro lado, temos agora uma nova carta no baralho da segurança alimentar, que é a conversão, em rápido crescimento, de produtos alimentares como o trigo, milho, soja e cana-de-açúcar em combustível para carros. Com a


Plano B 2.0 340 multiplicação das destilarias de biodiesel, esta ameaça aumentará. Poderá o fornecimento alimentar ser o elo mais fraco da nossa civilização, tal como foi para os sumérios, os maias e os habitantes da Ilha de Páscoa?2 Talvez o desenvolvimento recente mais perturbador seja a lista crescente de estados falhados. O artigo do Foreing Policy referido no Capítulo 6 enumera cerca de 60 países que falharam, estão em falência ou correm o risco de falhar. Os governos estão a ser avassalados pelas forças demográficas e ambientais. Depois de décadas de rápido crescimento populacional, muitos governos estão a sofrer de fadiga demográfica. Com os governantes sem conseguirem lidar com o crescimento permanente das populações, os sistemas de suporte ambiental estão a desintegrar-se e os serviços sociais a entrar em ruptura.3 Quantos estados terão que falhar antes que a nossa civilização global falhe? Cada novo estado falhado contribui para o enfraquecimento da capacidade da comunidade internacional para manter a estabilidade no sistema monetário, para controlar a disseminação de doenças infecciosas e para lidar com as ameaças locais da fome. A certa altura, à medida que o número de estados falhados se multiplica, os sistemas globais começam a falhar. Sabemos que a manutenção do progresso depende da reestruturação da economia global; há que mudar de uma economia baseada nos combustíveis fósseis, centrada no automóvel, e de desperdício, para uma economia baseada em fontes renováveis de energia, num sistema diversificado de transportes e num sistema generalizado de reutilização/reciclagem de materiais. Isto pode ser feito, em grande medida, reestruturando os impostos e os subsídios. Manter o progresso significa também erradicar a pobreza, estabilizar a população e restaurar os sistemas naturais da Terra. Assegurar os investimentos públicos adicionais necessários para atingir estes objectivos depende da reordenação das prioridades fiscais de forma a poder dar resposta às novas ameaças à nossa segurança. Nesta mobilização, o recurso mais escasso é o tempo. A tentação é atrasar o relógio, mas isso não é possível.Anatureza é o guardião do tempo.


Plano B: Construindo um Futuro Novo Ouvindo os Sinais de Despertar

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Estamos a entrar num mundo novo. Sobre isso não há muitas dúvidas. O que não sabemos é se será um mundo de declínio e colapso ou um mundo de recuperação ambiental e de progresso económico. Será que o mundo se pode mobilizar com a rapidez necessária? Donde surgirão os sinais de despertar? Que forma terão esses sinais? Seremos capazes de os ouvir? Aos olhos de muitos, o furacão Katrina foi um desses sinais de despertar. Até há pouco tempo, os eventos atmosféricos registados com maiores custos eram o furacão Andrew, que se abateu sobre a Florida em 1992 e as cheias na bacia do rio Yangtze, na China, em 1998, que causaram cerca de 30 mil milhões de dólares de prejuízos cada. Quando o furacão Katrina atingiu a Costa do Golfo nos Estados Unidos, no fim do Verão de 2005, devastando Nova Orleães, o seu custo aproximado foi de 200 mil milhões de dólares – quase sete vezes mais que o último máximo. As temperaturas mais elevadas da água à superfície ajudaram a fazer do Katrina uma das mais poderosas tempestades alguma vez vistas nos Estados Unidos.4 Em 1995, uma intensa onda de calor em Chicago foi responsável por mais de 700 mortes, concentrando a atenção dos Estados Unidos na alteração climática, mas esse foi um acontecimento menor comparado com a pior onda de calor na Europa, em 2003, que causou 49.000 mortes. A França anunciou 14.800 mortes; a Itália, mais de 18.000. Infelizmente, esta trágica perda de vidas nunca foi devidamente registada uma vez que o número de mortes se estendeu por vários meses, em alturas diferentes nos vários países. Tal como a destruição causada pelo furacão Katrina foi várias vezes superior aos máximos anteriores, também as mortes causadas por esta onda de calor ultrapassou várias vezes todos os recordes anteriores.5 Poderá um sinal de despertar assumir a forma de um mar de refugiados ambientais? Como referido antes, os líderes políticos da África subsariana estão a discutir a possibilidade de plantar uma cintura de árvores, com 5 quilómetros de largura e 7.000 quilómetros de


Plano B 2.0 342 comprimento, que atravesse o continente, frente ao deserto, num esforço para parar o seu avanço. Se os países africanos vão conseguir criar uma Grande Muralha Verde, e fazê-lo a tempo de parar o avanço do deserto, é algo que se verá no futuro. Se não o conseguirem, estaremos confrontados com milhões de refugiados, à medida que a terra produtiva se transforma em deserto.6 Em Setembro de 2005, os cientistas informaram que a fusão do gelo no Árctico pode ter alcançado o ponto de não-retorno. Podemos ter já ultrapassado sem saber um dos limites da natureza. De acordo com um artigo, a equipa de cientistas “acredita que o aquecimento global está a derreter o gelo do Árctico de forma tão rápida que a região começa a absorver ainda mais o calor do sol, levando a que o gelo se derreta mais e reforçando assim este círculo vicioso da fusão do gelo e do aquecimento”. Se o gelo do mar Árctico se derreter e o clima da região continuar a aquecer, a cobertura de gelo da Gronelândia, que em algumas partes tem uma profundidade de uma milha e meia, acabará por desaparecer. Isso causaria uma subida do nível do mar de cerca de 7 metros, com a inundação de muitas das cidades costeiras e das planícies aluviais onde cresce o arroz em todo o mundo.7 Se se tornar claro que já pusemos em movimento um processo de subida do nível do mar que não conseguimos fazer parar ou inverter, de que maneira é que isto afectará a forma de nos pensarmos a nós próprios como indivíduos e como sociedade? Será que vamos deparar-nos com uma fractura social entre gerações, entre os que causaram a subida do nível do mar e os que têm que lidar com as suas consequências? A alteração climática, quer seja natural ou causada pelo homem, é uma fonte de tensão social. Jared Diamond refere que a seca foi uma das causas principais do colapso e desaparecimento, pouco depois do ano de 1150, da civilização Anasazi, com 600 anos de existência, no sudoeste dos Estados Unidos. A diminuição do abastecimento alimentar conduziu ao conflito e ao canibalismo nesta antiga


Plano B: Construindo um Futuro Novo 343 civilização do Novo Mundo. Três séculos mais tarde, a população Norse, na Gronelândia, entrou em colapso e desapareceu durante um período de frio extremo. No caso da civilização moderna, é a subida da temperatura, sob a forma de ondas de calor que dizimam as colheitas, da fusão do gelo, da subida dos mares e de tempestades mais destrutivas, que está a gerar tensão social.8 É o preço recorde do petróleo no final de 2005 uma aberração ou será que ele reflecte algo mais essencial – uma falha no planeamento da delapidação das reservas mundiais de petróleo? Será o resultado de uma falha do sistema? Se é, pode a comunidade internacional organizar-se para estabilizar os preços do petróleo e evitar tanto uma possível depressão global devida ao petróleo como a generalização dos conflitos pelo acesso às reservas ainda existentes?9 Serão estes, sinais de despertar? Se são, ainda não nos acordaram. Será que carregámos no botão de repetição do toque para dormirmos um pouco mais? Ou será que estes assuntos são demasiado complicados para serem compreendidos? Estaremos a ser vencidos pela complexidade, como afirma Joseph Tainter no seu livro, The Collapse of Complex Societies, a propósito de algumas civilizações antigas?10 É frustrante e difícil escrever este capítulo porque não trata do que precisamos fazer ou de como o fazer, mas sim de como mobilizar apoio para o fazer. Como é que nos podemos convencer a nós próprios da gravidade e urgência da situação que se nos depara? Em parte, é uma questão de ultrapassar os interesses de vária ordem e a inércia social, por outro lado, é uma questão de aumentar a compreensão pública das ameaças à civilização. Enfrentar muitas ameaças ao mesmo tempo implica estabelecer prioridades. O terrorismo é uma dessas ameaças. Sem dúvida. Mas não é nem de perto a maior ameaça com que a nossa civilização do início do século vinte e um se depara. O crescimento da população, a alteração climática, a pobreza, a generalização da falta de água, o aumento dos preços do petróleo e o potencial aumento dos preços da alimentação que podem levar a uma instabilidade política sem precedentes são as principais ameaças.


Plano B 2.0 344 Novas ameaças requerem novas prioridades e novas respostas. As velhas prioridades estão irremediavelmente fora de moda. Grandes investimentos em poder militar e sistemas sofisticados de armas, por exemplo, são de pouca utilidade, até para lidarem com o terrorismo, quanto mais para lidar com a alteração climática ou a degradação dos aquíferos. Historicamente, foram as nações agressoras, que aumentaram e concentraram o seu poder militar, que ameaçaram o resto do mundo. Em contraste, hoje são os estados em falência, os que se estão a desagregar internamente, que ameaçam o progresso futuro e a estabilidade. No nosso mundo novo, precisamos de líderes políticos que consigam ver o quadro geral, que entendam a relação entre a economia e os seus sistemas ambientais de suporte. E uma vez que os principais conselheiros dos governos são economistas, precisamos de economistas que consigam pensar como ecologistas. Infelizmente eles são raros. RayAnderson, fundador e presidente da Interface emAtlanta, um dos maiores fabricantes mundiais de alcatifas industriais, é especialmente crítico em relação à economia que é ensinada em muitas universidades, referindo que “continuamos a ensinar aos estudantes de economia que se deve confiar na ‘mão invisível’ do mercado, quando a mão invisível é totalmente cega aos aspectos exteriores, e trata os subsídios maciços, tal como uma guerra para proteger o óleo das companhias petrolíferas, como se tais subsídios fossem merecidos. Será que realmente podemos confiar numa mão invisível ‘cega’ para distribuir recursos de forma racional?”.11 Alguns observam que a economia neoclássica reconhece os custos externos como coisa a evitar. É verdade. Mas será que os professores de economia registam esses custos e analisam os seus efeitos no ecossistema da Terra e na sua capacidade para sustentar a economia? Por exemplo, quantos cursos de economia ensinam que a nossa economia baseada nos combustíveis fósseis, centrada no automóvel, e de desperdício, pura e simplesmente não é um modelo viável de economia para o mundo? E que o maior desafio que o mundo enfrenta é o de construir uma nova economia que sustente o progresso económico?


Plano B: Construindo um Futuro Novo 345 Uma Mobilização como em Tempo de Guerra Ao contemplarmos a necessidade de nos mobilizarmos para salvar um planeta sob stress e uma civilização em apuros, tanto vemos semelhanças como contrastes em relação à mobilização operada na Segunda Guerra Mundial. Nesta primeira mobilização, havia uma reestruturação económica, mas era temporária. A Mobilização para salvar a civilização, ao contrário, requer uma reestruturação económica permanente. A entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial é um fascinante caso de estudo sobre a capacidade de mobilização rápida. Inicialmente, os Estados Unidos resistiram ao envolvimento na guerra e responderam apenas depois de terem sido directamente atacados em Pearl Harbour, em 7 de Dezembro de 1941. Mas realmente responderam. Depois de um envolvimento total, a participação dos Estados Unidos ajudou a mudar a maré da guerra, conduzindo as forças aliadas à vitória em três anos e meio.12 No seu discurso do Estado da Nação em 6 de Janeiro de 1942, um mês depois do bombardeamento de Pearl Harbour, o Presidente Roosevelt anunciou as metas de produção de armas do país. Os Estados Unidos, disse ele, planeava produzir 45.000 tanques, 60.000 aviões, 20.000 armas antiaéreas e 6 milhões de toneladas de navios mercantes. E acrescentou: “que ninguém se atreva a dizer que isto não pode ser feito”.13 Nunca ninguém vira números tão grandes de produção de armamento. Mas Roosevelt e os seus colegas perceberam que a maior concentração de poder industrial do mundo nessa altura estava na indústria americana de automóveis. Até durante a Depressão, os Estados Unidos produziam 3 milhões ou mais de carros por ano. Depois do seu discurso do Estado da Nação, Roosevelt encontrou-se com os dirigentes da indústria automóvel e disse-lhes que o país ia depender muito deles para atingir aquelas metas de produção de armas. De início, eles queriam continuar a fazer carros, acrescentando apenas a produção de armamento. O que eles ainda não sabiam era que a venda de automóveis privados seria em breve proibida. Desde Abril de 1942 até ao fim de 1944, quase três anos, praticamente não se produziram carros nos Estados Unidos.14


Plano B 2.0 346 Para além da proibição da produção e venda de carros para uso privado, a construção de casas e de auto-estradas foi parada, e a condução de automóveis por lazer foi proibida. Foi também introduzido um programa de racionamento. Bens estratégicos – como pneus, gasolina, gasóleo e açúcar – foram racionados a partir de 1942. O corte no consumo destes bens libertou recursos de materiais para apoiar o esforço de guerra.15 O ano de 1942 testemunhou a maior expansão da produção industrial da história da nação – toda para uso militar.As necessidades de aviões durante a guerra eram enormes. Incluíam não só caças, bombardeiros e aviões de reconhecimento, mas também os transportes de tropas e carga necessários para levar a cabo uma guerra em frentes muito distantes. Desde o início de 1942 até 1944, os Estados Unidos excederam em muito a meta inicial de 60.000 aviões, produzindo 229.600 aviões, uma frota tão grande que, mesmo hoje, é difícil imaginar. Igualmente impressionante, foi que, no fim da guerra, tinham sido acrescentados 5.000 navios aos cerca de 1.000 que constituíam a Frota Americana de Navios Mercantes em 1939.16 No seu livro No Ordinary Time, Doris Kearns Goodwin descreve como muitas firmas foram convertidas. Uma fábrica de velas de automóvel foi uma das primeiras a começar a produzir metralhadoras. Em breve um fabricante de fornos estava a produzir barcos salva-vidas. Uma fábrica de carrosséis começou a fazer suportes de armas; uma empresa de brinquedos fazia bússolas; um fabricante de cintas de mulher produzia cintos para granadas; e uma fábrica de máquinas de flippers começou a fazer granadas perfurantes.17 Em retrospectiva, a velocidade desta conversão de um tempo de paz numa economia de guerra é espantosa. O domínio do poder industrial dos Estados Unidos fez pender a balança de forma decisiva para as Forças Aliadas, invertendo a tendência da guerra. AAlemanha e o Japão, já no máximo da sua produção, não podiam opor-se a este esforço. Winston Churchill citou muitas vezes o seu ministro dos negócios estrangeiros, Sir Edward Grey: “Os Estados Unidos são como uma grande caldeira. Uma vez que o fogo seja aceso debaixo dela, não há limites para o poder que conseguem gerar”.18


Plano B: Construindo um Futuro Novo 347 Esta mobilização de recursos numa questão de meses demonstra que um país e, na realidade, o mundo consegue reestruturar a economia rapidamente se estiver convencido da necessidade de o fazer. Muitas pessoas – embora ainda não a maioria – já estão convencidas da necessidade duma completa reestruturação económica. O objectivo deste livro é convencer mais pessoas, ajudando a fazer pender a balança para o lado das forças da mudança e da esperança.

Mobilizar para Salvar a Civilização Mobilizar para salvar a civilização quer dizer reestruturar a economia, restaurar os sistemas naturais de suporte da economia, erradicar a pobreza e estabilizar a população. Temos as tecnologias, os instrumentos económicos e os recursos financeiros para fazer isto. Os Estados Unidos, a sociedade mais rica que alguma vez existiu, têm os recursos para dirigir este esforço. Jeffrey Sachs, do Columbia University’s Earth Institute resume a questão da seguinte forma: “A ironia trágica deste momento é que os países ricos são tão ricos e os países pobres tão pobres que apenas com alguns décimos da percentagem do PNB dos ricos aplicados ao longo das próximas décadas se poderia fazer o que não foi nunca possível na história humana: garantir que as necessidades básicas de saúde e educação de todas as crianças pobres deste mundo são satisfeitas. Quantas mais tragédias teremos que sofrer neste país até acordarmos para a nossa capacidade de ajudar a transformar o mundo num local mais seguro e próspero, que não seja só através do poder militar, e também da perda de vidas?”.19 Não é possível colocar uma etiqueta com o preço preciso nas mudanças necessárias para levar a nossa civilização do século vinte e um a abandonar o caminho de sobre-exploração-e-colapso e seguir uma via que suporte o progresso económico. O que podemos fazer, no entanto, é fornecer algumas estimativas sobre a medida do esforço requerido. Tal como vimos no Capítulo 7, o adicional de financiamento externo necessário para se conseguir uma educação primária generalizada nos mais de 80 países em desenvolvimento que necessitam de


Plano B 2.0 348 ajuda, por exemplo, é calculado de forma conservadora pelo Banco Mundial em 12 mil milhões de dólares por ano. O financiamento para um programa de alfabetização de adultos baseado principalmente em voluntários terá um custo adicional de cerca de 4 mil milhões de dólares por ano. Assegurar serviços básicos de cuidados médicos nos países em desenvolvimento terá um custo estimado de 33 mil milhões de dólares, de acordo com a Organização Mundial de Saúde. O financiamento adicional para o fornecimento de serviços de saúde reprodutiva e planeamento familiar é inferior a 7 mil milhões de dólares por ano.20 Atingir a meta de distribuição profiláctica de preservativos, fornecendo o adicional de 9,5 mil milhões de preservativos necessários para controlar a disseminação do HIV no mundo em vias de desenvolvimento e na Europa de Leste requer 2 mil milhões de dólares — 285 milhões para preservativos e 1,7 mil milhões para a educação de prevenção contra a SIDA e para a distribuição dos preservativos. O custo da generalização dos programas de almoço escolar aos 44 países mais pobres é de 6 mil milhões de dólares. Cerca de 4 mil milhões de dólares por ano cobririam o custo da assistência às crianças no pré-escolar e às mulheres grávidas destes países. Ao todo, o custo de assegurar o cumprimento das metas sociais básicas é de 68 mil milhões de dólares por ano.2 1 Como referido no Capítulo 8, um esforço para erradicar a fome que não seja acompanhado por um esforço para restaurar a Terra está condenado ao fracasso. Proteger o solo de superfície, reflorestar a Terra, restaurar os bancos oceânicos de peixe, e outras medidas necessárias, custará cerca de 93 mil milhões de dólares de despesas adicionais por ano.As actividades de maior custo, proteger a diversidade biológica, 31 mil milhões de dólares, e conservar o solo nas terras de cultura, 24 mil milhões de dólares, representam mais de metade do gasto anual para restaurar a Terra. Combinando os objectivos sociais e os componentes de restauração da Terra num orçamento para um Plano B, obtemos uma despesa anual adicional de 161 mil milhões de dólares, cerca de um terço do orçamento militar actual doa Estados Unidos, ou um sexto do orçamento militar global. (Ver Quadro 13-1).22


Plano B: Construindo um Futuro Novo 349 Quadro 13-1. Plano B: Despesas Adicionais Necessárias para Atingir os Objectivos Sociais e Restaurar a Terra Objectivos

Financiamento (mil milhões de dólares)

Objectivos Sociais Básicos Educação primária generalizad

12

Alfabetização de adultos

4

Programas de almoços nas escolas para os 44 países mais pobres

6

Assistência a crianças do pré-escolar e mulheres grávidas nos 44 países mais pobres

4

Saúde reprodutiva e planeamento familiar

7

Cuidados de Saúde generalizados

33

Fechar o fosso do preservativo

2

Total

68

Objectivos de Restauração da Terra Reflorestação da Terra

6

Proteger a superfície das terras de cultura

24

Restaurar as terras de pastagem

9

Estabilizar os níveis freáticos

10

Restaurar os bancos de peixe

13

Proteger a diversidade biológica

31

Total

93

Total Geral

161


350

Plano B 2.0

Infelizmente, os Estados Unidos continuam a concentrar-se na construção duma força militar cada vez maior, ignorando, em grande medida, as ameaças da degradação ambiental contínua, da pobreza e do crescimento populacional. A sua proposta de orçamento de defesa para 2006, que inclui 50 mil milhões de dólares para operações militares no Iraque eAfeganistão, traduz-se numa despesa militar prevista de 492 mil milhões de dólares (Ver Quadro 13-2). Outros membros da NATO gastam 209 mil milhões de dólares por ano na defesa.ARússia gasta cerca de 65 mil milhões de dólares, e a China, 56 mil milhões de dólares. A despesa militar dos Estados Unidos é agora aproximadamente igual ao total combinado de todos os outros países. Como Eugene Carroll, Jr., um almirante retirado, observou, “Durante os quarenta e cinco anos da Guerra Fria tivemos numa corrida aos armamentos com a União Soviética. Agora parece que temos uma corrida às armas contra nós próprios”.23 Chegou a hora da decisão. Tal como as civilizações antigas que entraram em apuros ambientais, podemos decidir deixar as coisas seguirem as sua inércia e ficar a assistir ao declínio da nossa economia moderna e ao seu colapso final, ou podemos mudar de forma consciente para um novo caminho, que sustente o progresso económico. Nesta situação, não agir significa decidir permanecer no caminho do declínio-e-coplaso.


Plano B: Construindo um Futuro Novo 351 Quadro 13-2. Comparação dos Orçamentos Militares, por País e para o Mundo, com o Orçamento do Plano B País

Orçamento (em milhares de milhões de dólares)

Estados Unidos Rússia China Reino Unido Japão França Alemanha Arábia Saudita Índia Itália Todos os restantes

492 65 56 49 45 40 30 19 19 18 142

Despesa Militar Mundial

975

Orçamento do Plano B

161

Nota: O número dos Estados Unidos é o orçamento previsto para o Ano Fiscal de 2006 (que inclui os 50 mil milhões de dólares para operações militares no Iraque e Afeganistão); os dados da Rússia e China referem-se a 2003. Fonte: Ver nota final 23.

É difícil encontrar as palavras que exprimam a gravidade da situação em que nos encontramos e a importância da decisão que temos de tomar. Como poderemos transmitir a urgência deste momento à História? Será que amanhã já é demasiado tarde? Haverá um número suficiente de pessoas como nós que se preocupam o suficiente para mudar a situação agora? Será que um dia alguém irá erguer uma pedra tumular sobre a nossa civilização? E que epitáfio lá ficará gravado? Não poderá dizer que não compreendemos a situação. Nós compreendemos. Não poderá dizer que não tínhamos os recursos. Nós temos os recursos. Só poderá dizer que fomos demasiado lentos a responder às forças que punham em risco a nossa civilização. O tempo esgotou-se.


Plano B 2.0 352 Ninguém pode dizer que não temos os recursos para erradicar a pobreza, estabilizar a população e proteger a base de recursos naturais da Terra. Podemos eliminar a fome, o analfabetismo, a doença e a pobreza, e podemos restaurar os solos, as florestas e os bancos de peixe do planeta. Reorientar um sexto do orçamento militar mundial para o orçamento do Plano B seria mais que o necessário para mudar o mundo para um caminho que sustentaria o progresso. Podemos construir uma comunidade global em que as necessidades básicas de todas as pessoas da Terra sejam satisfeitas – um mundo que nos permita pensar em nós próprios como pessoas civilizadas. Esta reestruturação económica depende da reestruturação fiscal, de fazer com que o mercado seja honesto do ponto de vista ecológico. O critério de avaliação da liderança política em todos os países consistirá em os líderes terem ou não sucesso na reestruturação do sistema fiscal, tal como aconteceu, por exemplo, na Alemanha e na Suécia. Esta será a chave para reestruturar a economia da energia – tanto para estabilizar o clima como para fazer a transição para o mundo pós-petrolífero.24 É fácil gastar centenas de milhares de milhões para responder às ameaças terroristas, mas a verdade é que os recursos necessários para perturbar uma economia moderna são pequenos, e um Department of Homeland Security dos Estados Unidos, embora fortemente financiado, apenas assegura uma protecção mínima face aos terroristas suicidas. O desafio não é fornecer uma resposta militar de alta tecnologia ao terrorismo, mas construir uma sociedade global que seja ambientalmente sustentável e equitativa – que restaure a esperança para todos. Esse esforço teria mais efeito em diminuir o apoio ao terrorismo do que qualquer aumento de despesas militares, do que qualquer sistema de armas, por muito avançado que seja. Ao olharmos para as tendências ambientais destrutivas que estão a pôr em causa o nosso futuro, vemos que o mundo precisa urgentemente de sinais visíveis de que podemos realmente alterar o curso das coisas a nível global. Felizmente, os passos para inverter as tendências destrutivas ou para dar início a novas tendências construtivas reforçam-se uns aos outros, muitas vezes, constituindo soluções du-


Plano B: Construindo um Futuro Novo 353 plamente ganhadoras. Por exemplo, ganhos de eficiência que reduzam o uso do petróleo também reduzem as emissões de carbono e a poluição do ar. Passos para erradicar a pobreza ajudam simultaneamente a erradicar a fome e a estabilizar a população. Areflorestação fixa o carbono, aumenta a recarga dos aquíferos e reduz a erosão do solo. Logo que tenhamos suficientes tendências na direcção certa, elas reforçar-se-ão mutuamente. O que o mundo precisa agora, para reforçar a esperança no futuro, é de uma grande história de sucesso na redução das emissões de carbono e da dependência do petróleo. Se os Estados Unidos, por exemplo, decidissem substituir a frota existente de veículos ineficientes de combustão a gasolina, nos próximos 10 anos, por híbridos a gasolina e electricidade altamente eficientes, o consumo de gasolina poderia ser facilmente reduzido a metade. Para além disto, um híbrido a gasolina e electricidade, com uma bateria adicional de armazenamento com capacidade de ligação à rede eléctrica, cria as condições para usar electricidade na deslocação em distâncias curtas, como as que se fazem entre os subúrbios e as cidades ou para compras nos hipermercados. Depois, como sugerido no Capítulo 10, se investirem em milhares de parques eólicos, os americanos poderão fazer a maior parte das suas deslocações de curta distância conduzindo essencialmente com energia eólica, reduzindo drasticamente as pressões sobre os fornecimentos mundiais de petróleo.25 Com muitas linhas de montagem de automóveis inactivas nos Estados Unidos, seria uma questão relativamente simples reequipar algumas delas para produzir turbinas de vento, permitindo ao país dominar rapidamente o seu enorme potencial em energia eólica. Esta seria uma iniciativa muito modesta se comparada com a reestruturação operada na Segunda Guerra Mundial, mas ajudaria o mundo a ver que reestruturar uma economia é algo totalmente possível e pode fazer-se rapidamente, de forma lucrativa, e de tal forma que melhore a segurança nacional, ao reduzir a dependência de fornecimentos vulneráveis de petróleo. Globalmente, ajudaria a abrandar a subida potencialmente perturbadora dos preços do petróleo. Para além disto, reduziria as emissões de carbono, ajudando a estabilizar o clima. E, mais importante, restauraria a confiança pública no governo.


354 Um Apelo à Grandeza de Espírito

Plano B 2.0

A história julga os líderes políticos pela forma como respondem às grandes questões do seu tempo. Para os líderes de hoje, a grande questão é como virar a economia global para uma via ambiental consistente. Precisamos que um líder político nacional dê um passo em frente, um Churchill ambiental, para mobilizar o mundo. Na sequência dos ataques terroristas ao World Trade Center e ao Pentágono, em 11 de Setembro de 2001, vários líderes mundiais sugeriram uma variante do Plano Marshall no século vinte e um para lidar com a pobreza e os seus sintomas, argumentando que, num mundo cada vez mais integrado, a pobreza abjecta e a grande riqueza não conseguem coexistir. Gordon Brown, Ministro das Finanças do Reino Unido, nota que, “Como a paz, a prosperidade é indivisível e, para ser mantida, tem que ser partilhada”. Brown vê a iniciativa de um novo Plano Marshall não como uma ajuda no sentido tradicional do termo, mas como um investimento no futuro.26 O Presidente francês, Jacques Chirac, um político conservador, afirmou na Cimeira da Terra de Joanesburgo, em Setembro de 2002, que “o mundo precisava de um imposto internacional para lutar contra a pobreza no mundo”. Ele sugeriu uma taxa sobre os bilhetes de avião, as emissões de carbono ou o comércio internacional de moeda. Para ilustrar o seu empenhamento, Chirac anunciou que, nos cinco anos seguintes, a França iria duplicar a sua ajuda ao desenvolvimento, atingindo o acordado objectivo mundial de gastar 0,7 por cento do produto nacional bruto em ajuda. Indo para além dos assuntos económicos, ele sugeriu também a criação de uma organização mundial de ambiente para coordenar esforços na construção duma economia ambientalmente sustentável.27 A urgência da situação em que nos encontramos significa que os países a nível individual terão que tomar iniciativas em questões como a redução das emissões de carbono sem esperar pela negociação dum novo acordo internacional. Levou quase uma década para negociar o Protocolo de Quioto, que em grande medida é inadequado. Já não há mais tempo para negociações prolongadas.28


Plano B: Construindo um Futuro Novo 355 Em 1999, quando o governo alemão decidiu iniciar uma reestruturação fiscal que aumentava os impostos sobre o consumo de energia e reduzia os impostos sobre os rendimentos, um passo pensado não só para reduzir as emissões de carbono como para aumentar os níveis de emprego, os seus dirigentes não insistiram que o resto do mundo, ou mesmo outros países da Europa, concordassem em fazer o mesmo. Eles fizeram-no porque pensaram ser a coisa certa a fazer pela Alemanha. Se os países derem passos decididos para inverter as tendências que põem em causa o nosso futuro, outros países segui-los-ão. Neste ponto da história, a melhor forma de liderar é fazer.29 Igualmente, quando a Suécia decidiu fazer uma reforma fiscal ainda mais orientada para as questões ambientais, não insistiu com outros para que fizessem o mesmo. Agiu por si só e de modo decisivo, dando um exemplo aos outros países.30 Nos Estados Unidos, a frustração com a decisão de Washington de ignorar o Protocolo de Quioto levou os Presidentes das Câmaras de mais de 180 cidades a juntarem-se para honrar os objectivos do Protocolo de reduzir 7 por cento das emissões de carbono em relação aos valores de 1990, ao longo da década seguinte. No início de Junho de 2005, Fred Pearce escreveu no New Scientist, “O mês passado, na maior acção de repúdio face a um governo nacional, um grupo de Presidentes de Câmara americanos contestou a recusa da administração Bush de reduzir as emissões de carbono”. Entre as cidades, estão algumas das maiores do país: Los Angeles, Denver e Nova Iorque. As iniciativas para atingir os objectivos de redução do carbono são inúmeras e variam muito nas várias cidades. Em Salt Lake City, as autoridades da cidade estão a comprar electricidade gerada pelo vento. A cidade de Nova Iorque está a converter a sua frota municipal de automóveis em veículos híbridos a gasolina e electricidade.31 Uma revolta está também a surgir a nível dos estados. Nove estados no nordeste dos Estados Unidos estão a negociar um pacto para reduzir as emissões de carbono das centrais eléctricas. As


Plano B 2.0 356 legislaturas estaduais, um pouco por toda a parte no país, estão a adoptar procedimentos padrão em relação ao renovável, que estabelecem que um mínimo da electricidade futura provenha obrigatoriamente de fontes renováveis de energia. Entre elas estão a Califórnia, Colorado, Iowa, Minnesota, Nova Iorque, Pennsylvania, Texas e Wisconsin.32 Em paralelo com a necessidade de liderança política está a necessidade de liderança nos média. Dada a urgência de agir, e de mobilizar o apoio a estas acções, o mundo enfrenta um desafio sem precedentes no que respeita à educação pública. Virar a maré depende da capacidade dos meios de comunicação estarem à altura de informar o público sobre a gravidade da nossa situação e a urgência de lhe dar uma resposta. Só os meios de comunicação podem disseminar a informação na escala necessária e no tempo disponível. Nenhuma outra instituição tem esta capacidade. Esta posição da indústria da comunicação social é muito semelhante à da indústria automóvel dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. Como aconteceu com a indústria automóvel há cerca de 60 anos, isto não é uma responsabilidade que tenha sido reclamada pelos jornalistas e editores ou, na realidade, que eles queiram necessariamente assumir. Mas não há alternativa. Se os meios de comunicação de todo o mundo não assumirem a liderança no objectivo de aumentar o conhecimento público sobre as questões ambientais, a mobilização poderá acabar por falhar. Estamos perante uma situação completamente diferente de qualquer outra anterior, que requer uma resposta totalmente nova. Em 1 de Janeiro de 2005, o New York Times deu um passo em frente nesta direcção quando dedicou quatro quintos da sua página de opinião a uma peça de Jared Diamond, baseada no seu livro Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed. Diamond reflectiu sobre as lições que poderíamos tirar das civilizações antigas que, como a nossa, caminharam numa direcção económica que era ambientalmente insustentável.33


Plano B: Construindo um Futuro Novo 357 O que Diamond aprendeu ao investigar para escrever este livro foi que sair do caminho do declínio-e-colapso e voltar a um caminho económico que seja ambientalmente sustentável não é sempre uma coisa fácil.Algumas civilizações são capazes de ler os sinais de aviso e mudam rapidamente de curso. Outras não o conseguem fazer e entram em colapso.34 Esta investigação torna claro que a má gestão ambiental, caso se mantenha durante muito tempo, conduz a um colapso ambiental. O artigo de Diamond ajudou a lançar a discussão pública sobre os paralelismos entre a civilização global contemporânea e as civilizações antigas analisadas no livro. Os grupos ambientalistas não-governamentais estão também a responder à chamada.Ao seleccionar Wangari Maathai para o Prémio da Paz de 2004, o comité do Prémio Nobel da Paz estava a prestar o devido reconhecimento às raízes da melhor liderança ambiental. Quase há 30 anos atrás, Maathai fundou o Green Belt Movement, uma organização que mobilizou as pessoas a nível local para plantar 30 milhões de árvores no Quénia. Como Geoffrey Dabelko escreveu em Grist, o movimento mobilizou milhares de mulheres, oferecendolhes capacidade de decisão, educação e até planeamento familiar. Em 2002, Maathai foi eleita para o Parlamento e passado pouco tempo foi nomeada Ministra-Adjunta doAmbiente pelo novo governo.35 Os dirigentes empresariais estão também a envolver-se. Ted Turner, o fundador da CNN, abriu novos caminhos para a filantropia individual quando anunciou em 1997 uma oferta de mil milhões de dólares às Nações Unidas para apoiar a estabilização da população, a protecção ambiental e o fornecimento de serviços de saúde. Ele criou a Fundação da ONU como veículo através do qual os recursos pudessem ser transferidos. Turner poderia ter esperado pela sua morte para deixar um testamento à Terra, mas dada a urgência da situação com que o mundo se defronta, ele argumentou que os multimilionários têm que responder agora, antes que os problemas se tornem insolúveis.36


Plano B 2.0 358 Turner sem dúvida que influenciou Bill Gates, o fundador da Microsoft, assim como outros novos multimilionários. Canalizando a sua fortuna de indivíduo mais rico do mundo para uma fundação e destinando-a à melhoria das condições de saúde nos países em desenvolvimento, nomeadamente em iniciativas que vão desde vacinações maciças de crianças até à luta para debelar a epidemia do HIV, Gates está a salvar milhões de vidas.37 Entre os líderes políticos mais atentos, cresce a percepção de que a inércia dos negócios (business as usual) já não é uma opção viável, de que, se não respondermos às ameaças ambientais à civilização do século vinte e um, estaremos em apuros.Aperspectiva dos estados em falência cresce à medida que ameaças gigantes como a epidemia do HIV, a pobreza hidrológica e a fome de terra se aprestam para avassalar os países que ocupam os degraus mais baixos da escada da economia global.

Você e Eu Uma das perguntas que me fazem frequentemente quando falo em vários países é: dados os problemas ambientais com que o mundo se defronta, será que vamos conseguir? Isto é, poderemos evitar o declínio económico e o colapso civilizacional? A minha resposta é sempre a mesma: depende de si e de mim, do que você e eu fizermos para inverter estas tendências. Isso quer dizer, tornar-se activo politicamente. Salvar a nossa civilização não é um desporto de espectadores. Chegámos a este novo mundo de forma tão rápida que ainda não percebemos totalmente o que está a acontecer. Tradicionalmente, a preocupação com os nossos filhos tem-se traduzido em assegurar cuidados de saúde e conseguir para eles a melhor educação possível. Mas se não agirmos depressa no sentido de inverter a deterioração dos sistemas ambientais da Terra, erradicar a pobreza e estabilizar a população, o seu mundo entrará em declínio económico e desintegrar-se-á politicamente. Hoje, assegurar o futuro dos nossos filhos significa não só investir na sua educação e saúde, mas também investir num programa para inverter as tendências que estão a pôr em risco o seu futuro.


Plano B: Construindo um Futuro Novo 359 Como indivíduos, devemos continuar a participar em organizações dedicadas ao ambiente e ao problema demográfico. Devemos melhorar os programas locais de reciclagem. Devemos votar com a carteira. Por exemplo, comprar certificados de Energia Verde ajuda a orientar o investimento para a energia renovável. Precisamos de fazer todas as coisas que já estamos a fazer para proteger o ambiente. Mas isso não é suficiente. Temos vindo a fazer isso há trinta e cinco anos. Ganhámos muitas batalhas locais, mas estamos a perder a guerra. Os dois desafios mais importantes são a reestruturação dos impostos e a reordenação das prioridades fiscais. Salvar a civilização significa reestruturar a economia – e a uma velocidade de tempo de guerra. Quer dizer, reestruturar os impostos de modo a pôr o mercado a contar a verdade ecológica. E significa reordenar as prioridades fiscais de modo a obter os recursos necessários para recuperar a Terra, erradicar a pobreza e estabilizar a população. Escreva ou envie um e-mail ao seu representante eleito sobre a necessidade de reestruturar os impostos para criar um mercado honesto. Lembre-lhe que as empresas que deixaram custos fora dos livros parecem prosperar a curto prazo, mas apenas para entrarem em colapso no longo prazo. Ou ainda melhor, encontre-se com os seus representantes eleitos para analisar a razão pela qual temos que aumentar os impostos ambientais e reduzir os impostos sobre os rendimentos. Trabalhe com os seus amigos e associados que tenham as mesmas ideias, com este objectivo. Crie uma delegação para se encontrar com o seu representante eleito. Descarregue gratuitamente, na nossa página da Web, a informação sobre reestruturação de impostos contida no capítulo anterior e use-a nestas iniciativas. Se não conseguirmos reestruturar o sistema de impostos de modo a fazer com que o mercado conte a verdade, quase de certeza que não chegaremos lá. Diga aos seus representantes políticos que um mundo que tem quase 1 bilião de dólares por ano de gastos militares está simplesmente fora de sintonia com a realidade, numa situação em que o futuro da civilização está em causa. Perguntem-lhes se 161 mil milhões


Plano B 2.0 360 de dólares por ano não são uma despesa aceitável para salvar a civilização. Perguntem-lhes se reorientar o equivalente a um sexto do orçamento militar global para salvar a civilização é muito caro. Se gosta de escrever, experimente elaborar um artigo de opinião para o seu jornal local sobre a necessidade de aumentar os impostos sobre as actividades ambientalmente destrutivas e contrabalançar isto com uma baixa dos impostos sobre os rendimentos. Tente uma carta ao editor. Organize uma campanha de cartas, incitando as pessoas a contactarem os seus representantes eleitos e a imprensa local sobre este assunto. Apoie a inclusão da erradicação da pobreza, do planeamento familiar e da reflorestação nos programas de assistência internacional. Faça campanha a favor da inclusão destes programas e de um corte nas despesas militares, alertando para o facto de os sistemas avançados de armas serem inúteis para lidar com as novas ameaças à nossa civilização. É preciso que alguém fale em nome dos nossos filhos e netos porque é o seu mundo e o seu futuro que está em causa. Obtenha mais formação sobre assuntos ambientais e sobre o que aconteceu às civilizações antigas que também se depararam com uma situação de apuro – e ajude os seus amigos a informarem-se melhor. Sobre este assunto, recomendo o Collapse de Jared Diamond e A Short History of Progress, de Ronald Wright. Para compreender a questão da erradicação da pobreza, leia “Can Extreme Poverty Be Eliminated?” de Jeffrey Sachs no número de Setembro da revista Scientific American. Para ter uma ideia do enorme potencial de aumento da eficiência energética, leia “More Profit with Less Carbon” deAmory Lovins, no mesmo número.38 Lembre-se, por maior que seja o desafio que nos é colocado, há sinais da nova economia a emergir em todo o mundo. Vemo-los nos parques eólicos da Europa, na frota em rápido crescimento de carros híbridos a gasolina e electricidade nos Estados Unidos, nas montanhas reflorestadas da Coreia do Sul, no programa de planeamento familiar do Irão, na erradicação maciça da pobreza na China, e nos painéis solares nos telhados do Japão.


Plano B: Construindo um Futuro Novo 361 O que temos que fazer pode ser feito. Sente-se e organize o seu próprio plano pessoal e calendarize o que pretende fazer para mudar o mundo de um caminho que se dirige ao declínio económico para um caminho de progresso económico sustentável. Faça um plano para o próximo ano das coisas que pretende fazer, como é que as quer fazer e com quem pode trabalhar para atingir o único objectivo que realmente importa – a preservação da civilização. Que outra coisa poderia ser mais compensadora? A escolha é nossa – sua e minha. Podemos ficar na rotina de sempre (business as usual) e assistir a uma economia que continua a destruir os seus sistemas naturais de suporte até se autodestruir, ou podemos adoptar o Plano B e ser a geração que muda de direcção, levando o mundo para um caminho de progresso sustentado.Aescolha será feita pela nossa geração, mas afectará a vida na Terra para todas as gerações vindouras.



Recursos Adicionais Nas referências abaixo pode ser encontrada mais informação sobre os tópicos cobertos no Plano B 2.0. Dados adicionais e uma lista maior de recursos estão disponíveis na seguinte página Web do Earth Policy Institute: www.earthpolicy.org/books/PB2/resources.htm. Capítulo 1 Diamond, Jared, Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed (Nova Iorque: Penguin Group, 2005). Tainter, Joseph, The Collapse of Complex Societies (Cambridge, Rino Unido:Cambridge University Press, 1988). United Nations Environment Programme (UNEP), www.unep.org. United Nations Statistics Division, unstats.un.org/unsd. Capítulo 2 Association for the Study of Peak Oil and Gas, www.peakoil.net. BP, Putting Energy in the Spotlight: BP Statistical Review of World Energy 2005 (Londres: Junho 2005), www.bp.com/ genericsection.do?categoryId=92&contentId=7005893. Deffeyes, Kenneth S., Beyond Oil: The View from Hubbert’s Peak (Nova Iorque: Hill and Wang, 2005). Ethanol Marketplace, www.ethanolmarketplace.com. Heinberg, Richard, Power Down: Options and Actions for a Post-Carbon World (Gabriola Island, BC, Canadá: New Society Publishers, 2004). Renewable Fuels Association, Homegrown for the Homeland: Ethanol Industry Outlook 2005 (Washington, DC: 2005). Capítulo 3 Gleick, Peter H., The World’s Water: The Biennial Report on Freshwater Resources (Washington, DC: Island Press, vários anos), www.worldwater.org. International Water Management Institute, www.iwmi.cgiar.org. LakeNet: World Lakes Network, www.worldlakes.org.


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Notas Capítulo1. Entrando num Mundo Novo 1. Jared Diamond, Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed (Nova Iorque: Penguin Group, 2005). 2. Mathis Wackernagel et al., “Tracking the Ecological Overshoot of the Human Economy,” Proceedings of the National Academy of Sciences, vol. 99, no. 14 (9 Julho 2002), pp. 9,266–71. 3. Paul B. MacCready, AeroVironment Inc., carta ao autor, 19 Abril 2005. 4. Ned Rozell and Dan Chay, “St. Matthew Island: Overshoot & Collapse,” Energy Bulletin, 23 Novembro 2003. 5. Diamond, op. cit. nota 1, pp. 90, 248–76; “Población Total, Por Sexo E Indice de Masculinidad, Según División PolíticoAdministrativa y Area Urbana-Rural,” quadro no Instituto Nacional de Estadísticas do Chile, Resultados Generales Censo 2002 (Santiago, Chile: 2003). 6. Nações Unidas, World Population Prospects: The 2004 Revision (Nova Iorque: 2005); Population Reference Bureau, 2005 World Population Data Sheet, Quadro de Parede (Washington, DC: Agosto 2005); Population Reference Bureau, 2004 World Population Data Sheet, Quadro de Parede (Washington, DC: Agosto 2004). 7. Nações Unidas, op. cit. nota 6. 8. Ver Capítulo 2 para análise mais detalhada do pico do petróleo. 9. Afrota de carros inclui automóveis particulares e veículos comerciais, muitos dos quais são veículos ligeiros de transportes e veículos particulares de desporto, de Ward’s Communications, Ward’s World Motor Vehicle Data 2004 (Southfield, MI: 2004), p. 238; população que vive com menos de $1 por dia, em Banco Mundial, World Development Report 2005 (Nova Iorque: Oxford


University Press, 2004). 10. Diamond, op. cit. nota 1, pp. 90, 248–76. 11. The New Road Map Foundation, “All-Consuming Passion: Waking up from theAmerican Dream,” factsheet, EcoFuture, actualizado 17 Janeiro 2002. 12. U.S. Department of Agriculture (USDA), Production, Supply, & Distribution, base de dados electrónica, em www.fas.usda.gov/ psd, actualizado 13 Setembro 2005. 13. U.N. Food and Agriculture Organization (FAO), FAOSTAT Statistics Database, em apps.fao.org, actualizado 14 Julho 2005. 14. U.S. Department of Energy (DOE), Energy InformationAdministration (EIA), “World Oil Demand,” International Petroleum Monthly, Dezembro 2004. 15. British Petroleum (BP), Statistical Review of World Energy 2005 (Londres: Group Media & Publishing, 2005). 16. International Iron and Steel Institute, Steel Statistical Yearbook 2004 (Bruxelas, 2004); dados de 1990–93 de Phil Hunt, Iron and Steel Statistics Bureau, e-mail a Viviana Jiménez, Earth Policy Institute, 24 Janeiro 2005. 17. UNStats Statistics Database, em unstats.un.org/unsd, visto 14 Fevereiro 2005; International Telecommunication Union (ITU), Telecommunication Statistics em www.itu.int/ITU-D/ict/statistics/ at_glance/cellular03.pdf, 15 Março 2005; ITU, Telecommunication Statistics em www.itu.int/ITU-D/ict/statistics/at_glance/ internet03.pdf, 15 Março 2005; Ward’s Communications, op. cit. nota 9. 18. Crescimento económico chinês, Fundo Monetário Internacional (FMI), World Economic Outlook Database, em www.imf.org/ external/ pubs/ft/weo, actualizado Abril 2005; população em Nações Unidas, op. cit. nota 6. 19. Grain from USDA, op. cit. nota 12; papel inclui papeis com revestimento, papel de uso doméstico e sanitário, papel de impren-


sa, outros papeis, embalagens, papel para impressão e escrita, e papeis de embrulho, baseado em dados da FAO, op. cit. nota 13; petróleo em BP, op. cit. nota 15; todos os cálculos per capita baseados em população em Nações Unidas, op. cit. nota 6. 20. Ward’s Communications, op. cit. nota 9. 21. Nações Unidas, op. cit. nota 6. 22. Diamond, op. cit. nota 1; Garrett Hardin, “The Tragedy of the Commons,” Science, vol. 162 (13 Dezembro 1968). 23. Sandra Postel, Pillar of Sand (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 1999), pp. 13–21. 24. Ibid. 25. Ibid. 26. Robert McC. Adams citado em Joseph Tainter, The Collapse of Complex Societies (Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press, 1988), p. 1. 27. “Maya,” Encyclopaedia Britannica, enciclopédia online, visto em 7 Agosto 2000. 28. Ibid. 29. Jared Diamond, “Easter’s End,” Discover, Agosto 1995, pp. 63–69. 30. Ibid. 31. Nações Unidas, op. cit. nota 6. 32. USDA, op. cit. nota 12. 33. Nações Unidas, op. cit. nota 6; U.S. Census Bureau, Foreign Trade Statistics, “Trade: Imports, Exports and Trade Balance with China,” em www.census.gov/foreign-trade/balance/c5700.html, actualizado Junho 2005; Peter Goodman, “China Tells Congress to Back Off Business,” Washington Post, 5 Julho 2005. 34. Munich Re, Topics Annual Review: Natural Catastrophes


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3. DOE, EIA, “Table 11.5 World Crude Oil Production, 1960– 2004,” International Energy Outlook 2004 (Washington, DC: 2004), em www.eia.doe.gov/emeu/aer/txt/ptb1105.html; Vidal, op. cit. nota 1; International EnergyAgency (IEA), IEA Data Services, em data.iea.org, actualizado Agosto 2004. 4. Neil Chatterjee, “‘Peak Oil’ Gathering Sees $100 Crude This Decade,” Reuters, 26 Abril 2005; Javier Blas e Isabel Gorst, “Oil Production in Russia Stagnates,” Financial Times, 2 Junho 2005; Justin Blum, “Alaska Oil Field’s Falling Production Reflects U.S. Trend,” Washington Post, 7 Junho 2005; DOE, EIA, “Table 2.2 World Crude Oil Production, 1980–2003,” International Energy Annual 2003 (Washington, DC: 2005); Heather Timmons, “Shell Makes Another Cut in Reserves; Profit Jumps,” New York Times, 4 Fevereiro 2005; DOE, EIA, “Kazakhstan,” EIA Country Analysis Briefs, (Washington, DC: actualizado Julho 2005); IEA, op. cit. nota 3. 5. DOE, EIA, “Saudi Arabia,” EIA Country Analysis Briefs (Washington, DC: actualizado Janeiro 2005); Chatterjee, op. cit. nota 4; Adam Porter, “Expert Says Saudi Oil May Have Peaked,” Al Jazeera, 20 Fevereiro 2005. 6. DOE, EIA, op. cit. nota 3; IEA, op. cit. nota 3. 7. Michael T. Klare, “The Energy Crunch to Come,” TomDispatch, 22 Março 2005; Jad Mouawad, “Big Oil’s Burden of Too Much Cash,” New York Times, 12 Fevereiro 2005; Timmons, op. cit. nota 4. 8. Mouawad, op. cit. nota 7; Mark Williams, “The End of Oil?” Technology Review, Fevereiro 2005; Vidal, op. cit. nota 1. 9. Klare, op. cit. nota 7; Timmons, op. cit. nota 4; Walter Youngquist, carta ao autor, 29 Abril 2005. 10. James Picerno, “If We Really Have the Oil,” Bloomberg


Wealth Manager, Setembro 2002, p. 45; Klare, op. cit. nota 7; Kenneth S. Deffeyes, Beyond Oil: The View from Hubbert’s Peak (Nova Iorque: Hill and Wang, 2005); Richard C. Duncan and Walter Youngquist, “Encircling the Peak of World Oil Production,” Natural ResourcesResearch, vol. 12, no. 4 (Dezembro 2003), p. 222; A. M. Samsan Bakhtiari, “World Oil Production Capacity Model Suggests Output Peak by 2006–07,” Oil & Gas Journal, 26 Abril 2004, pp. 18–20. 11. Peter Maass, “The Breaking Point,” New York Times Magazine, 21 Agosto 2005. 12. Robert Collier, “Canadian Oil Sands: Vast Reserves Second to Saudi Arabia Will Keep America Moving, But at a Steep Environmental Cost,” San Francisco Chronicle, 22 Maio 2005; Vidal, op. cit. nota 1; Walter Youngquist, “Survey of Energy Resources: Oil Shale,” Energy Bulletin, 24 Abril 2005; William Brown, DOE, EIA, discussão com o autor, 9 Agosto 2005. 13. “US: Caution Warranted on Oil Shale” (editorial), Denver Post, 18 Abril 2005; Gargi Chakrabarty, “Shale’s New Hope,” Rocky Mountain News, 18 Outubro 2004; Walter Youngquist, “Alternative Energy Sources,” in Lee C. Gerhard, Patrick Leahy, e Victor Yannacone, eds., Sustainability of Energy and Water through the 21st Century, Proceedings of the Arbor Day Farm Conference, 8– 11 Outubro 2000 (Lawrence, KS: Kansas Geological Survey, 2002), p. 65; Cavallo, op. cit. nota 1. 14. DOE, EIA, “United States,” EIA Country Analysis Briefs (Washington, DC: actualizado Janeiro 2005); Collier, op. cit. nota 12; Thomas J. Quinn, “Turning Tar Sands into Oil,” Cleveland Plain Dealer, 17 Julho 2005; “Exxon Says N. America Gas Production Has Peaked,” Reuters, 21 Junho 2005. 15. Judith Crosson, “Oil Prices Prompt Another Look At Shale,” MSNBC, 23 Novembro 2004; Youngquist, op. cit. nota 12;


Youngquist, op. cit. nota 13, p. 64; Vidal, op. cit. nota 1. 16. Danielle Murray, “Oil and Food:ARising Security Challenge,” Eco-Economy Update (Washington, DC: Earth Policy Institute, 9 Maio 2005), p. 2 e quadros informativos; os dados sobre irrigação incluem U.S. Department ofAgriculture (USDA), “Chapter 5: Energy Use in Agriculture,” U.S. Agriculture and Forestry Greenhouse Gas Inventory: 1990–2001, Technical Bulletin No. 1907 (Washington, DC: Global Change Program Office, Office of the Chief Economist, 2004), p. 94. 17. James Duffield, USDA, e-mail a Danielle Murray, Earth Policy Institute, 31 Março 2005; USDA, Production, Supply & Distribution, base de dados electrónica, em www.fas.usda.gov/psd, actualizado 13 Setembro 2005. 18. Conservation Technology Information Center (CTIC), “Conservation Tillage and Other Tillage Types in the United States— 1990–2004,” 2004 National Crop Residue Management Survey (West Lafayette, IN: Purdue University, 2004); CTIC, “Top Ten Benefits of Conservation Tillage,” em www.ctic.purdue.edu/Core4/ CT/CTSurvey/10Benefits.html, visto em 27 Julho 2005; Rolf Derpsch, “Extent of No-TillageAdoption Worldwide,” a ser apresentado no III World Congress on Conservation Agriculture, Nairobi, Kenya, 3–7 Outubro 2005, e-mail a Danielle Murray, Earth Policy Institute, 9 Agosto 2005. 19. Duffield, op. cit. nota 17; uso de tractores e stock de cavalos em U.N. Food and Agriculture Organization (FAO), FAOSTAT Statistics Database, em apps.fao.org, actualizado 4 Abril 2005. 20. Fertilizer energy use data from Duffield, op. cit. nota 17; DOE, EIA, Annual Energy Outlook 2003 (Washington, DC: 2004); John Miranowski, “Energy Demand and Capacity toAdjust in U.S. Agricultural Production,” apresentação noAgricultural Outlook Forum 2005,Arlington, VA, 24 Fevereiro 2005; ratios de fertilizantespor-grãos em USDA, op. cit. nota 17; Patrick Heffer, Short Term


Prospects for World Agriculture and Fertilizer Demand 2003/ 04–2004/05 (Paris: International Fertilizer IndustryAssociation (IFA), 2005); IFA Secretariat and IFA Fertilizer Demand Working Group, Fertilizer Consumption Report (Bruxelas: 2001). 21. U.S. grain production data from USDA, op. cit. nota 17. 22. Brian Halweil, Eat Here (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 2004), p. 29; USDA, op. cit. nota 17. 23. Compiled by Earth Policy Institute from Duffield, op. cit. nota 17; DOE, EIA, op. cit. nota 20; USDA, National Agricultural Statistics Service, “Table 20: Energy Expenses for On-Farm Pumping of Irrigation Water by Water Source and Type of Energy: 2003 and 1998,” 2003 Farm & Ranch Irrigation Survey, Census of Agriculture (Washington, DC: 2004); dados sobre irrigação e uso da terra da FAO, op. cit. nota 19. 24. Dados referentes a 1950 de Sandra Postel, “Water for Food Production: Will There Be Enough in 2025?” BioScience,Agosto 1998; dados sobre irrigação e uso da terra em FAO, op. cit. nota 19; Mark Rosengrant, Ximing Cai e Sarah Cline, World Water and Food to 2025: Dealing with Scarcity (Washington, DC, and Battaramulla, Sri Lanka: International Food Policy Research Institute and International Water Management Institute, 2002), p. 155. 25. Murray, op. cit. nota 16. 26. Ibid., p. 3; M. Heller and G. Keoleian, Life-Cycle Based Sustainability Indicators for Assessment of the U.S. Food System (AnnArbor, MI: Center for Sustainable Systems, University of Michigan, 2000), p. 42. 27. Halweil, op. cit. nota 22, p. 37; Stacy Davis and Susan Diegel, “Chapter 2: Energy,” Transportation Energy Data Book: 24th Edition (Washington, DC: DOE, Energy Efficiency and Renewable


Energy, 2004), pp. 2–17; DOE, EIA, “Chapter 5: Transportation Sector,” Measuring Energy Efficiency in the United States Economy: A Beginning (Washington, DC: 1995), p. 31; U.S. Department of Transportation, Bureau of Transportation Statistics (BTS), Freight Shipments in America (Washington, DC: 2004), pp. 9–10; Andy Jones, Eating Oil— Food in a Changing Climate (Londres: Sustain and Elm Farm Research Centre, 2001), p. 2 do sumário. 28. Jones, op. cit. nota 27, pp. 1–2 do sumário; Charlie Pye-Smith, “The Long Haul,” Web site Race to the Top, www.racetothetop.org/ case/case4.htm (Londres: International Institute for Environment and Development, 25 Julho 2002). 29. BTS and U.S. Census Bureau, “Table 14. Shipment Characteristics by Three-Digit Commodity and Mode of Transportation: 2002,” 2002 Commodity Flow Survey (Washington, DC: Dezembro 2004); Jones, op. cit. nota 27; James Howard Kunstler, autor de Geography of Nowhere, em The End of Suburbia: Oil Depletion and the Collapse of The American Dream, documentário filmado (Toronto, ON: The Electric Wallpaper Co., 2004). 30. Heller and Keoleian, op. cit. nota 26, p. 42; conteúdo de energia dos alimentos e componente de embalagem calculados por Danielle Murray, Earth Policy Institute, usando a informação nutricional e de custos de energia de embalagem da USDA a partir de David Pimentel e Marcia Pimentel, Food, Energy and Society (Boulder, CO: University Press of Colorado, 1996), citado em Manuel Fuentes, “Alternative Energy Report,” Oxford Brookes University and the Millennium Debate, 1997; Leo Horrigan, Robert S. Lawrence, and Polly Walker, “How SustainableAgriculture Can Address the Environmental and Human Health Harms of Industrial Agriculture,” Environmental Health Perspectives, vol. 110, no. 5 (Maio 2002), p. 448. 31. Murray, op. cit. nota 16, pp. 1, 3; Duffield, op. cit. nota 17;


DOE, EIA, op. cit. nota 20; USDA, op. cit. nota 23; Miranowski, op. cit. nota 20, p. 11. 32. Dados para o quadro 2–1 compilados pelo Earth Policy Institute do Fundo Monetário Internacional (FMI), International Financial Statistics, base de dados online, ifs.apdi.net, actualizada Setembro 2005; FMI, International Financial Statistics (Washington, DC: 2005). 33. FMI, base de dados online, op. cit. nota 32; FMI, International Financial Statistics, op. cit. nota 32. 34. U.S. Census Bureau, “U.S. Trade in Goods and Services,” em www.census.gov/foreign-trade/statistics/historical/gands.pdf, actualizado 10 Junho 2005; FMI, base de dados online, op. cit. nota 32. 35. Valor das exportações de grãos e importações de petróleo em U.S. Census Bureau, Foreign Trade Statistics, “US Imports of Crude Oil,” em www.census.gov/foreign-trade/statistics/historical/petr.pdf, visto em 29 Julho 2005; USDA, Foreign Agricultural Service (FAS), U.S. Trade Internet System, base de dados online, em www.fas.usda.gov/ustrade, actualizado Julho 2005; produção e consumo de petróleo dos EUA em BP, Statistical Review of World Energy 2005 (Londres: 2005). 36. Valor das exportações de grãos e importações de petróleo em U.S. Census Bureau, op. cit. nota 35; USDA, op. cit. nota 35; produção e consumo de petróleo dos EUA em BP, op. cit. nota 35. 37. Figura 2–1 dados compilados por Earth Policy Institute em F.O. Licht, “Too Much Too Soon?—World Ethanol Production to Break Another Record in 2005,” World Ethanol and Biofuels Report, vol. 3, no. 20 (21 Junho 2005), pp. 429–35, e em série histórica em MollyAeck, “Biofuel Use Growing Rapidly,” em Worldwatch Institute, Vital Signs 2005 (Nova Iorque: W.W.


Norton & Company, 2005), pp. 38–39; As previsões da produção de biodiesel para 2004–05 baseiam-se em dados preliminares de F.O. Licht, op. cit. esta nota, assumindo um crescimento anual contínuo de 30 por cento; USDA, FAS, Production Estimates and Crop Assessment Division, EU: Biodiesel Industry Expanding Use of Oilseeds (Washington, DC: 2003). 38. F.O. Licht, op. cit. nota 37; Aeck, op. cit. nota 37; As previsões da produção de biodiesel para 2004–05 baseiam-se em dados preliminares de F.O. Licht, op. cit. nota 37, assumindo um crescimento anual contínuo de 30 por cento. 39. Marla Dickerson, “Homegrown Fuel Supply Helps Brazil Breathe Easy,” Los Angeles Times, 15 Junho 2005; Renewable Fuels Association, Homegrown Homeland for the Ethanol Industry Outlook 2005 (Washington, DC: 2005), pp. 2, 14–15; consumo de gasolina de BP, op. cit. nota 35, p. 12; F.O. Licht, op. cit. nota 37; Karin Bendz, EU-25—Oilseeds and Products— Biofuels Situation in the European Union—2005 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), p. 6. 40. DOE, EIA, op. cit. nota 1; Jim Landers, “Ethanol’s Sweet Allure,” Dallas Morning News, 10 Junho 2005; Sergio Barros, Brazil—Sugar—Annual Report—2005, GAIN Report BR5008 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), p. 6; USDA, Brazilian Sugar (Washington, DC: Outubro 2003), p.1; Todd Benson, “In Brazil, Sugar Cane Growers Become Fuel Farmers,” New York Times, 24 Maio 2005; produção de cana-de-açúcar e necessidades de terra do Brasil calculados pelo Earth Policy Institute a partir da União da Agroindústria da Cana-de-Açúcar de São Paulo, apresentação “Brasil como Fornecedor Estratégico de Combustível de Etanol”, São Paulo, Brasil, Janeiro 2005. 41. USDA, Brazilian Sugar, op. cit. nota 40, p. 4; Benson, op. cit. nota 40; Emma Ross-Thomas, “Brazil Ethanol Industry Sees Japan Move in 2 Years,” Reuters, 19 Maio 2005; Steve Thompson, “Great Expectations: Ethanol Is Hot, But What Is The Long-Term


Outlook For Biofuel?” Rural Cooperatives (USDA), vol. 71, no. 3 (Julho–Agosto 2004). 42. Dan Morgan, “Brazil’s Biofuel Strategy Pays Off as Gas Prices Soar,” Washington Post, 18 Junho 2005; Otto Doering, “U.S. Ethanol Policy: Is It the Best EnergyAlternative?” Current Agriculture, Food and Resource Issues, no. 5, 2004, pp. 204–05; Steve Raabe, “Drivers’ Increasing Demand for Lower-cost Ethanol is Behind Plans for Three Plants on the Eastern Plains—Fill ‘er Up on Corn,” Denver Post, 19 Julho 2005; Suzy Fraser Dominy, “The Onward March of Ethanol,” World Grain, 1 Junho 2005; Renewable Fuels Association, op. cit. nota 39, pp. 8–9. 43. Christoph Berg, World Fuel Ethanol Analysis and Outlook (Ratzeburg, Alemanha: F.O. Licht, Abril 2004); F.O. Licht, op. cit. nota 37. 44. F.O. Licht, op. cit. nota 37. 45. Bendz, op. cit. nota 39, p. 6; Sabine Lieberz, Germany—Oilseeds and Products—Biofuels in Germany—2004, GAIN Report GM4048 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), pp. 4, 9. 46. “France Opens Second Phase of Biofuel Plan,” Reuters, 20 Maio 2005; Bendz, op. cit. nota 39, pp. 1, 6; Marie-Cécile Hénard, France— Oilseeds and Products—Biodiesel Demand Boosts Rapeseed Production—2005, GAIN Report FR5018 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), p. 3; Berg, op. cit. nota 43. 47. Matthew Wilde, “Soybean Farmers Could Reap Benefits from Biodiesel Industry’s Rapid Growth,” Knight Ridder, 18 Julho 2005; American SoybeanAssociation, “Soybeans ...The Miracle Crop,” “U.S. Soybean Meal Production 1979-2004,” and “U.S. Soybean Oil Production 1979-2004,” Soy Stats Online 2005 edition, em www.soystats.com/2005. 48. “Brazil’s Fledgling Biodiesel Industry Takes Off,” Environment


News Service, 29 Abril 2005; Raymond Hoh, “Malaysia—Oilseeds and Products—actualização de Junho—2005,” GAIN Report MY5027 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), p. 3; Chris Rittgers and Niniek S.Alam, “Indonesia—Oilseeds and Products— Annual—2005,” GAIN Report ID5002 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), p. 4; Elizabeth Mello, “Brazil— Oilseeds and Products—Annual—2005,” GAIN Report BR5613 (Washington, DC: USDA, FAS, 2005), p. 33; “Biofuels Take Off in Some Countries,” Reuters, 9 Junho 2005; Dickerson, op. cit. nota 39. 49. Quadro 2–2 compilado por Earth Policy Institute da FAO, op. cit. nota 19, actualizado 14 Julho 2005; Manitoba Department of Energy, Science, and Technology, “Ethanol FAQ,” Web site Energy Development Initiative, www.gov.mb.ca/est/energy/ethanol/ ethanolfaq.html, visto 5Agosto 2005; Renewable FuelsAssociation, op. cit. nota 39; Nandini Nimbkar andAnil Rajvanshi, “Sweet Sorghum Ideal for Biofuel,” Seed World, vol. 14, no. 8 (Novembro 2003); Boma S.Anga, “Investment Opportunities in the Up & Down Stream Sectors of the Nigerian Cassava Industry,” Cassava Agro Industries Services, www.cbc globelink.org; Ellen I. Burnes et al., Ethanol in California: A Feasibility Framework (Modesto, CA: Great Valley Center, 2004), p. 18; Berg, op. cit. nota 43; DOE, Biofuels from Switchgrass: Greener Energy Pastures (Oak Ridge, TN: Oak Ridge National Laboratory, 1998); “Oil Yields and Characteristics,” Web site Journey to Forever, www.journeytoforever.org/biodiesel_yield.html, visto 15 Julho 2005; a produção de soja é estimada pelo autor. 50. “Oil Yields and Characteristics,” op. cit. nota 49; a produção de soja é estimada pelo autor. 51. Berg, op. cit. nota 43; Morgan, op. cit. nota 42; Benson, op. cit. nota 40; Thompson, op. cit. nota 41; F.O. Licht, citado em apresentação de Alfred Szwarc, “Use of Bio-Fuels in Brazil,” na InSession Workshop on Mitigation, SBSTA 21 / COP 10, Buenos Aires: Ministry of Science and Technology, 9 Dezembro 2004;


Hosein Shapouri, James A. Duffield, e Michael Wang, The Energy Balance of Corn Ethanol: An Update, Agricultural Economic Report No. 814 (Washington, DC: USDA, 2002), pp. 9, 11. 52. Berg, op. cit. nota 43; o saldo de energia do etanol obtido do milho é uma estimativa do autor, baseado em várias fontes, nomeadamente, F.O. Licht, citado em Szwarc, op. cit. nota 51, and Shapouri, Duffield, e Wang, op. cit. nota 51. 53. Aeck, op. cit. nota 37, p. 38; DOE, op. cit. nota 49, p. 3; David Bransby, “Switchgrass Profile,” DOE Feedstock Development Program, Web site do Oak Ridge National Laboratory, em bioenergy.ornl.gov/papers/misc/switchgrass-profile.html, visto 21 Junho 2005. 54. DOE, op. cit. nota 49, p. 2; Berg, op. cit. nota 43; R. Samson et al., The Use Of Switchgrass Biofuel Pellets as a Greenhouse Gas Offset Strategy (Sainte Anne de Bellevue, PQ, Canada: Resource EfficientAgricultural Production-Canada (REAP), 2000). 55. Renewable Fuels Association, op. cit. nota 39, pp. 2, 10; FAO e U.S. Bureau of the Census, citado em Brian Halweil, “Grain Harvest and Hunger Both Grow,” em Worldwatch Institute, op. cit. nota 37, p. 23; USDA, FAS, Grain: World Markets and Trade (Washington, DC: Julho 2005), pp. 8, 13. 56. População em Nações Unidas, World Population Prospects: The 2004 Revision (Nova Iorque: 2005). 57. Population Reference Bureau, “Largest UrbanAgglomerations, 1950, 2000, 2015,” Human Population: Fundamentals of Growth—Patterns of World Urbanization (Washington, DC: 2005); U.N. Human Settlements Programme (UN-HABITAT), The State of the World’s Cities 2004/2005: Globalization and Urban Culture (Londres: 2004), pp. 24–25; Nações Unidas, World Urbanization Prospects, The 2003 Revision: Data Tables and


Highlights (Nova Iorque: 2004), p. 7; U.N. Department of Economic and SocialAffairs, Population Division, Urban Agglomerations 2003, Quadro de Parede (Nova Iorque: Março 2004). 58. Thomas Wheeler, “It’s the End of the World as We Know It: A Review of The End of Suburbia—Oil Depletion and the Collapse of the American Dream,” Alternative Press Review, 28 Julho 2004. 59. Jad Mouawad, “Production Trends Point to Reliance on Imported Oil,” New York Times, 3 Janeiro 2005; Ball, op. cit. nota 2; Vidal, op. cit. nota 1; Klare, op. cit. nota 7. 60. BTS, “Quadro 1–12: U.S. Sales or Deliveries of New Aircraft, Vehicles, Vessels, and Other Conveyances,” National Transportation Statistics 2005 (Washington, DC: 2005). 61. Oliver Prichard, “SUV Drivers Reconsider,” Philadelphia Inquirer, 1 Junho 2005; Danny Hakim and Jonathan Fuerbringer, “Fitch Cuts G.M. to Junk, Citing Poor S.U.V. Sales,” New York Times, 24 Maio 2005; Danny Hakim, “G.M. Will Reduce Hourly Workers In U.S. By 25,000,” New York Times, 8 Junho 2005. 62. Micheline Maynard, “Surging Fuel Prices Catch MostAirlines Unprepared, Adding to the Industry’s Gloom,” New York Times, 26 Abril 2005; “Revealed: The Real Cost of Air Travel,” The Independent (Londres), 29 Maio 2005; Federal AviationAdministration (FAA), “Commercial Forecast Reports Eighth Consecutive Year of Aviation Growth—‘Aviation Enjoyed One of its Best, If Not the Best, Decade Ever,’” comunicado de imprensa (Washington, DC: 7 Março 2000); FAA, “FAA Forecasts Passenger Levels to Top One Billion in the Next Decade,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 17 Março 2005); U.S. Department of Transportation and FAA, FAA Aerospace Forecasts—Fiscal Years 2005–2016 (Washington, DC: 2005), p. I-25. 63. BTS, “Quadro 1–4: Public Road and Street Mileage in the United States by Type of Surface,” National Transportation Sta-


tistics 2005 (Washington, DC: 2005); U.S. Department of Transportation, Federal HighwayAdministration, Highway Statistics (Washington, DC:Annual Issues). 64. Nicholas Lenssen, “Nuclear Power Inches Up,” in Worldwatch Institute, Vital Signs 2001 (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 2001), pp. 42–43.

Capítulo 3. Emergência das Faltas de Água 1. M.T. Coe e J.A. Foley, “Human and Natural Impacts on the Water Resources of the Lake Chad Basin,” Journal of Geophysical Research (Atmospheres), vol. 106, no. D4 (2001), pp. 3349– 56; Lynn Chandler, “Africa’s Lake Chad Shrinks by 20 Times Due to Irrigation Demands, Climate Change,” comunicado de imprensa (Greenbelt, MD: NASA, Goddard Space Flight Center, 27 Fevereiro 2001); informação sobre população em Nações Unidas, World Population Prospects: The 2004 Revision (Nova Iorque: Fevereiro 2005). 2. Banco Mundial, China: Agenda for Water Sector Strategy for North China (Washington, DC: Abril 2001); Christopher Ward, The Political Economy of Irrigation Water Pricing in Yemen (Sana’a, Yemen: Banco Mundial, Novembro 1998); U.S. Department of Agriculture (USDA), Agricultural Resources and Environmental Indicators 2000 (Washington, DC: Fevereiro 2000). 3. Consumo do triplo da água em I.A. Shiklomanov, “Assessment of Water Resources and Water Availability in the World,” Report for the Comprehensive Assessment of the Freshwater Resources of the World (S. Petersburgo, Rússia: State Hydrological Institute, 1998), citado em Peter H. Gleick, The World’s Water 2000–2001 (Washington, DC: Island Press, 2000), p. 52.


4. Jacob W. Kijne, Unlocking the Water Potential of Agriculture (Roma: FAO, 2003), p. 26; uso da água em Shiklomanov, op. cit. nota 3, p. 53. 5. Produção de grãos em USDA, Production, Supply, & Distribution, base de dados electrónica, www.fas.usda.gov/psd/ psdselection.asp, actualizada 13 Setembro 2005; Quadro 3–1 compilado por Earth Policy Institute a partir das Nações Unidas , op. cit. nota 1. 6. Michael Ma, “Northern Cities Sinking as Water Table Falls,” South China Morning Post, 11 Agosto 2001; percentagem da colheita de grãos da Planície do Norte da China baseado em Hong Yang eAlexander Zehnder, “China’s Regional Water Scarcity and Implications for Grain Supply and Trade,” Environment and Planning A, vol. 33 (2001), e em USDA, op. cit. nota 5. 7. Ma, op. cit. nota 6. 8. Banco Mundial, op. cit. nota 2, pp. vii, xi. 9. John Wade, Adam Branson, e Xiang Qing, China Grain and Feed Annual Report 2002 (Beijing: USDA, 21 Fevereiro 2002). 10. Produção de grãos em USDA, op. cit. nota 5. 11. Wade, Branson, e Xiang, op. cit. nota 9; produção de grãos em USDA, op. cit. nota 5. 12. Produção de grãos em USDA, op. cit. nota 5. 13. Banco Mundial, op. cit. nota 2, p. viii; cálculos por Earth Policy Institute baseados em 1,000 toneladas de água para produzir 1 tonelada de grão em U.N. Food and Agriculture Organization (FAO), Yield Response to Water (Roma: 1979). 14. Área irrigada em FAO, FAOSTAT Statistics Database, em


apps.fao.org, actualizada 4 Abril 2005; colheita de grão em USDA, op. cit. nota 5. 15. Fred Pearce, “Asian Farmers Sucking the Continent Dry,” New Scientist, 25 Agosto 2004. 16. Ibid.; Tamil Nadu população no censo de 2001, “Tamil Nadu at a Glance:Area and Population” em www.tn.gov.in. 17. Pearce, op. cit. nota 15. 18. Tushaar Shah et al., The Global Groundwater Situation: Overview of Opportunities and Challenges (Colombo, Sri Lanka: International Water Management Institute, 2000). 19. USDA, op. cit. nota 2, Chapter 2.1, p. 6; parte irrigada calculada a partir de FAO, op. cit. nota 14; colheita em USDA, op. cit. nota 5. 20. População em Nações Unidas, op. cit. nota 1; abaixamento do nível freático em “Pakistan: Focus on Water Crisis,” U.N. Integrated Regional Information Networks, 17 Maio 2002. 21. “Pakistan: Focus on Water Crisis,” op. cit. nota 20; Garstang citado em “Water Crisis Threatens Pakistan: Experts,” Agence France-Presse, 26 Janeiro 2001. 22. Sardar Riaz A. Khan, “Declining Land Resource Base,” Dawn (Pakistan), 27 Setembro 2004. 23. USDA, op. cit. nota 5. 24. População em Nações Unidas, op. cit. nota 1; excesso de bombeamento em ChenaranAgricultural Center, Ministry of Agriculture, de acordo com e-mail ao autor deHamid Taravati, editor, Irão, 25 Junho 2002.


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grãos em USDA, op. cit. nota 5. 70. População em Nações Unidas, op. cit. nota 1; produção de grãos em USDA, op. cit. nota 5. 71. Curso do rio Nilo em Postel, op. cit. nota 33, p. 77; importação de grãos em USDA, op. cit. nota 5; cálculo baseado em 1,000 toneladas de água para 1 tonelada de grãos em FAO, op. cit. nota 13. 72. População em Nações Unidas, op. cit. nota 1; produção de grãos em USDA, op. cit. nota 5. 73. Andrew Keller, R. Sakthivadivel e David Seckler, Water Scarcity and the Role of Storage in Development, Research Report 39 (Colombo, Sri Lanka: International Water Management Institute, 2000), p. 5. 74. USDA, op. cit. nota 2, p. 7; USDA, National Agricultural Statistics Service, Agricultural Statistics 2003 (Washington, DC: U.S. Government Printing Office, 2003), pp. I-6 – I-42. 75. David Seckler, David Molden, e Randolph Barker, “Water Scarcity in the Twenty-First Century,” Water Brief 1 (Colombo, Sri Lanka: International Water Management Institute, 1999), p. 2; Nações Unidas, op. cit. nota 1. 76. USDA, op. cit. nota 5; FAO, op. cit. nota 13.

Capítulo 4. Temperaturas Mais Altas e Subida do Nível do Mar 1. Sir David King, “Global Warming: The Science of Climate Change— the Imperatives for Action,” apresentado como 3ª Greenpeace Business Lecture (Londres: 12 Outubro 2004); Paul Brown, “Melting Ice: The Threat to London’s Future,” The Guard-


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Survival Commission, op. cit. nota 5, p. 28.

Capítulo 6. Sinais Precoces do Declínio 1. Nações Unidas, World Population Prospects: The 2004 Revision (Nova Iorque: 2005); Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS), 2004 Report on the Global AIDS Epidemic (Genebra: 2004), p. 191. 2. Nações Unidas, op. cit. nota 1; UNAIDS, op. cit. nota 1. 3. Nações Unidas, op. cit. nota 1; seguro de saúde em U.S. Census Bureau News, “Income Stable, Poverty Up, Numbers of Americans With and Without Health Insurance Rise, Census Bureau Reports,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 26Agosto 2004). 4. Organização Mundial de Saúde (OMS) citada em Gary Gardner e Brian Halweil, Underfed and Overfed: The Global Epidemic of Malnutrition, Worldwatch Paper 150 (Washington, DC: Worldwatch Institute, 2000), p. 7. 5. OMS and UNICEF, Global Water Supply and Sanitation Assessment 2000 Report (Nova Iorque: 2000), pp. v, 2; Gardner e Halweil, op. cit. nota 4, p. 7. 6. “Trends in Educational Attainment of the 25- to 34-Year-Old Population (1991–2002),” em Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Education at a Glance 2004 (Paris: 2004); UNICEF, Progress for Children: A Report Card on Gender Parity and Primary Education (Nova Iorque: 2005), p. 3; The Education for All (EFA) Global Monitoring Report Team, EFA Global Monitoring Report 2005: The Quality Imperative (Paris: UNESCO, 2004). 7. Taxas de crescimento populacional em Population Reference


Bureau (PRB), 2005 World Population Data Sheet, Quadro de Parede (Washington, DC: Agosto 2005); Hilaire A. Mputu, Literacy and Non-Formal Education in the E-9 Countries (Paris: UNESCO, 2001), pp. 5–13; UNESCO Institute for Statistics, “Youth (15–24) and Adult (15+) Literacy Rates by Country and by Gender for 2000–2004,” em www.uis.unesco.org, Maio 2005. 8. Gene B. Sperling, “Toward Universal Education,” Foreign Affairs, Setembro/Outubro 2001, pp. 7–13. 9. OMS e UNICEF, op. cit. nota 5; Peter H. Gleick, Dirty Water: Estimated Deaths from Water-Related Disease 2000–2020 (Oakland, CA: Pacific Institute, 2002); Nações Unidas, op. cit. nota 1. 10. A fome como factor de risco de doença em OMS, World Health Report 2002 (Genebra: 2002), e em Majid Ezzati et al., “Selected Major Risk Factors and Global and Regional Burden of Disease,” The Lancet¸ 30 Outubro 2002, pp. 1–14. 11. U.N. Food and Agriculture Organization (FAO), The State of Food Insecurity in the World 2004 (Roma: 2004). 12. FAO, The State of Food Insecurity in the World 2002 (Roma: 2002); população em Nações Unidas, op. cit. nota 1. 13. FAO, op. cit. nota 11. 14. Ibid. 15. Gary Gardner e Brian Halweil, “Nourishing the Underfed and Overfed,” em Lester R. Brown et al., State of the World 2000 (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 2000), pp. 70–73. 16. OMS/UNICEF, World Malaria Report 2005 (Genebra: 2005);Anne Platt McGinn, “Malaria’s Lethal Grip Tightens,” em Worldwatch Institute, Vital Signs 2001 (Nova Iorque: W.W.


Norton & Company, 2001), pp. 134–35; Sachs em Center for International Development, Harvard University e London School of Hygiene and Tropical Medicine, “Executive Summary for Economics of Malaria,” www.rbm.who.int/docs/abuja_sachs2.htm, visto 3Agosto 2005; mortes por malária calculadas com base em dados das Nações Unidas, op. cit. nota 1, e OMS/UNICEF, op. cit. esta nota. 17. Mais mortes devido à SIDA do que às guerras, de Lawrence K. Altman, “U.N. Forecasts Big Increase in AIDS Death Toll,” New York Times, 3 Julho 2002. 18. UNAIDS, AIDS Epidemic Update (Genebra: Dezembro 2004), p. 1; UNAIDS, op. cit. nota 1, pp. 189–207; total de mortes e estimativas históricas calculadas usando as estatísticas da UNAIDS em Worldwatch Institute, Signposts 2004, CD-Rom (Washington, DC: 2004); tratamento anti-retroviral na África Subsariana em OMS, “Access to HIV Treatment Continues to Accelerate in Developing Countries, but Bottlenecks Persist, Says OMS/UNAIDS Report,” comunicado de imprensa (Genebra: 29 Junho 2005). 19. UNAIDS, op. cit. nota 1, pp. 39–66, 191. 20. SIDA e segurança alimentar em UNAIDS, op. cit. nota 1, pp. 39–66; FAO, The Impact of HIV/AIDS on Food Security, 27ª Sessão do Committee on World Food Security, Roma, 28 Maio–1 Junho 2001. 21. “Strategic Caring: Firms Strategize About AIDS,” The Economist, 5 Outubro 2002; UNAIDS, op. cit. nota 1, pp. 39–66. 22. EFA Global Monitoring Report Team, op. cit. nota 6; UNAIDS, op. cit. nota 1, pp. 39–66; Prega Govender, “Shock AIDS Test Result at Varsity,” Sunday Times (Joanesburgo), 25 Abril 1999; “SouthAfrica: University Finds 25 Percent of Students Infected,” Kaiser Daily HIV/AIDS Report, 27 Abril 1999.


23. UNAIDS, op. cit. nota 1, pp. 39–66. 24. UNAIDS, UNICEF, e U.S. Agency for International Development (USAID), Children on the Brink 2004: A Joint Report on New Orphan Estimates and a Framework for Action (Washington, DC: Julho 2004), p. 29; Michael Grunwald, “Sowing Harvests of Hunger in Africa,” Washington Post, 17 Novembro 2002. 25. Stephen Lewis, conferência de imprensa (Nova Iorque: 8 Janeiro 2003); Edith M. Lederer, “Lack of Funding for HIV/AIDS is Mass Murder by Complacency, Says U.N. Envoy,” Associated Press, 9 Janeiro 2003. 26. Alex de Waal, “What AIDS Means in a Famine,” New York Times, 19 Novembro 2002. 27. Sarah Janssen, Gina Solomon, e Ted Schettler, Chemical Contaminants and Human Disease: A Summary of Evidence (Boston:Alliance for a Healthy Tomorrow, 2004); Geoffrey Lean, “US Study Links More than 200 Diseases to Pollution,” Independent News (Londres), 14 Novembro 2004. 28. Jane Houlihan et al., Body Burden: The Pollution in Newborns (Washington, DC: Environmental Working Group, 2005). 29. Bernie Fischlowitz-Roberts, “Air Pollution Fatalities Now Exceed Traffic Fatalities by 3 to 1,” Eco-Economy Update (Washington, DC: Earth Policy Institute, Setembro 2002), citando OMS, “Air Pollution,” Fact Sheet 187 (Genebra: revisto Setembro 2000); N. Künzli et al., “Public-Health Impact of Outdoor and Traffic-related Air Pollution: A European Assessment,” Lancet, 2 Setembro 2000, p. 795; mortes em acidentes de trânsito em British Red Cross, “May 8 Spotlight on the Millions Injured and Disabled by RoadAccidents,” comunicado de imprensa (Londres: 9 Maio 2001); 70,000 mortes de americanos em Joel Schwartz, citado em Harvard School of Public Health, “Air Pollution Deadlier Than Pre-


viously Thought,” comunicado de imprensa (Cambridge, MA: 2 Março 2000). 30. C. Pritchard, D. Baldwin e A. Mayers, “Changing Patterns of Adult (45–74 years) Neurological Deaths in the Major Western World Countries 1979–1987,” Public Health, vol. 118, nº 4 (Junho 2004), pp. 268–83; Juliette Jowit, “Pollutants Cause Huge Rise in Brain Diseases: ScientistsAlarmed as Number of Cases Triples in 20 Years,” The Observer (Londres), 15 Agosto 2004. 31. Sharon LaFraniere, “Mother Russia’s Poisoned Land,” Washington Post, 22 Junho 1999. 32. “Mercury Poisoning Disease HitsAmazon Villages,” Reuters, 4 Fevereiro 1999; emissões de mercúrio nas minas de carvão dos EUAem U.S. Environmental ProtectionAgency (EPA), Office of Air Quality Planning and Standards and Office of Research and Development, Mercury Study Report to Congress Volume II (Washington, DC:Dezembro 1997), p. ES-4; Patricia Glick, The Toll from Coal (Washington, DC: National Wildlife Federation, 2000), p. 9; EPA, “EPA Decides Mercury Emissions from Power Plants Must Be Reduced,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 15 Dezembro 2000); Ilan Levin e Eric Schaeffer, Dirty Kilowatts: America’s Most Polluting Power Plants (Washington, DC: Environmental Integrity Project, 2005). 33. EPA, Office of Water, “2004 National Listing of Fish Advisories,” EPA Fact Sheet (Washington, DC: Setembro 2005); Kathryn Mahaffey, EPA, Methylmercury: Epidemiology Update, apresentação no The National Forum on Contaminants in Fish, San Diego: Janeiro 2004, em www.epa.gov/waterscience/fish/forum/ 2004/presentations/monday/mahaffey.pdf; Leonardo Trasande, Philip J. Landrigan e Clyde Schechter, “Public Health and Economic Consequences of Methyl Mercury Toxicity to the Developing Brain,” Environmental Health Perspectives, vol. 13, no. 5 (Maio 2005).


34. Anne Platt McGinn, Why Poison Ourselves? A Precautionary Approach to Synthetic Chemicals, Worldwatch Paper 153 (Washington, DC: Worldwatch Institute, Novembro 2000), p. 7; 200 químicos no corpo em Pete Myers, discussão plenária sobre AssuntosAmbientais Emergentes, no USAID Environmental Officers Training Workshop, “Meeting the Environmental Challenges of the 21st Century,” Airlie Center, Warrenton, VA, 26 Julho 1999. 35. EPA, “Toxics Release Inventory (TRI) Program,” fact sheet, em www.epa.gov/tri, actualizado 17 Maio 2005; EPA, “EPA Issues New Toxics Report, Improves Means of Reporting,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 11Abril 2001). 36. Rachel Carson, Silent Spring (Boston: Houghton Mifflin Company, 2002); Theo Colborn, Dianne Dumanoski e John Peterson Myers, Our Stolen Future (Nova Iorque: Dutton Publishing, 1996). 37. Helen Spiegelman e Bill Sheehan, “Products, Waste, and the End of the Throwaway Society,” em Carolyn Raffensperger e Nancy Myers, eds., The Networker: The Newsletter of the Science and Environmental Health Network, newsletter electrónica, vol. 10, no. 2 (Maio 2005). 38. Calculado por Earth Policy Institute a partir de United States Geological Survey, Mineral Commodity Summaries 2005 (Washington, DC: U.S. Government Printing Office, 2005). 39. Eric Lipton, “The Long and Winding Road Now Followed by New York City’s Trash,” New York Times, 24 Março 2001. 40. Lester R. Brown, “New York: Garbage Capital of the World,” Eco-Economy Update (Washington, DC: Earth Policy Institute, Abril 2002); cálculos pelo autor, actualizado no The City of New York Department of Sanitation, “DSNY–Fact Sheet,” em www.nyc.gov/html/dos/ html/dosfact.html, actualizado 27 Outubro 2003; Kirk Johnson, “To City’s Burden, Add 11,000 Tons of Daily


Trash,” New York Times, 24 Março 2001; Lhota citado em Eric Lipton, “The Long and Winding Road Now Followed by New York City’s Trash,” New York Times, 24 Março 2001. 41. Gilmore citado em Lipton, op. cit. nota 40. 42. Joel Kurth, “N.J. Piles Demolition Trash on Michigan,” Detroit News, 28 Dezembro 2004; Lipton, op. cit. nota 40. 43. Günther Baechler, “Why Environmental Transformation Causes Violence: A Synthesis,” Environmental Change and Security Project Report, nº 4 (primavera 1998), pp. 24–44. 44. Área semeada em 1950 em U.S. Department of Agriculture (USDA), Production, Supply, and Distribution Country Reports, Outubro 1990; área semeada em 2004 em USDA, Production, Supply, & Distribution, base de dados electrónica, em www.fas.usda.gov/psd, actualizado 13 Setembro 2005; população em Nações Unidas, op. cit. nota 1. 45. Editorial Desk, “Time for Action on Sudan,” New York Times, 18 Junho 2004.

46. Ponto da situação no Sudão em Coalition for International Justice (CIJ), “New Analysis Claims Darfur Deaths Near 400,000: Experts Estimate 500 People a Day Are Dying,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 21 Abril 2005); CIJ, Quadro: “Estimates from Retrospective Mortality Surveys in Darfur and Chad Displacement Camps, Circa Fevereiro 2003—April 2005,” em www.cij.org,Abril 2005; “Sudan,” em U.S. Central Intelligence Agency, World Fact Book, em www.cia.gov/cia/publications/ factbook, actualizado 30 Agosto 2005. 47. Somini Sengupta, “Where the Land is a Tinderbox, the Killing Is a Frenzy,” New York Times, 16 Junho 2004; dados de população da Nigéria em Nações Unidas, op. cit. nota 1; Governo


da Nigéria, Combating Desertification and Mitigating the Effects of Drought in Nigeria, National Report on the Implementation of the United Nations Convention to Combat Desertification (Nigéria: Novembro 1999).

48. Sengupta, op. cit. nota 47. 49. Ibid. 50. James Gasana, “Remember Rwanda?” World Watch, Setembro/Outubro 2002, pp. 24–32. 51. Ibid. 52. População em United States Census Bureau, Population Division, International Programs Center, International Database, em www.census.gov/ipc/www/idbacc.html, actualizado 26Abril 2005; procura de madeira para lenha em Gasana, op. cit. nota 50. 53. Gasana, op. cit. nota 50; Emily Wax, “At the Heart of Rwanda’s Horror: General’s History Offers Clues to the Roots of Genocide,” Washington Post, 21 Setembro 2002. 54. Nações Unidas, op. cit. nota 1. 55. Ibid.; Gasana, op. cit. nota 50. 56. Nações Unidas, op. cit. nota 1; Nile River discussed in Sandra Postel, Pillar of Sand (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 1999), pp. 141–49. 57. População em Nações Unidas, op. cit. nota 1; rendimento por pessoa calculado a partir do produto interno bruto baseado na paridade do poder de compra em Fundo Monetário Internacional, World Economic Outlook Database, Washington, DC, actualizado Abril 2005; Postel, op.cit. nota 56.


58. Postel, op. cit. nota 56; Nações Unidas, op. cit. nota 1. 59. O’Hara citado em Michael Wines, “Grand Soviet Scheme for Sharing Water in Central Asia is Foundering,” New York Times, 9 Dezembro 2002. 60.Alan Cowell, “Migrants Found off Italy Boat Piled With Dead,” International Herald Tribune, 21 Outubro 2003, citado em Lester R. Brown, “Troubling New Flows of Environmental Refugees,” Eco-Economy Update (Washington, DC: Earth Policy Institute, Janeiro 2004). 61. Ibid. 62. “Mexico’s Immigration Problem: The Kamikazes of Poverty,” The Economist, 31 Janeiro 2004; cálculo pelo autor. 63. “Mexico’s Immigration Problem,” op. cit. nota 62. 64. Norman Myers, “Environmental Refugees:AGrowing Phenomenon of the 21st Century,” Philosophical Transactions: Biological Sciences, 29 Abril 2002, pp. 609–13, citado em Brown, op. cit. nota 60. 65. Frank Bruni, “Off Sicily, Tide of Bodies Roils Immigrant Debate,” New York Times, 23 Setembro 2002; “Boat Sinks Off Coast of Turkey: One Survivor and 7 Bodies Found,” Agence France-Presse, 22 Dezembro 2003; Flora Botsford, “Spain Recovers Drowned Migrants,” BBC News, 25 Abril 2002; Mary Jordan and Kevin Sullivan, “Trade Brings Riches, But Not to Mexico’s Poor,” Washington Post, 22 Março 2003; Robert McLeman e Barry Smit, “Climate Change, Migration and Security,” Commentary No. 86 (Ottawa: Canadian Security Intelligence Service, 2 Março 2004); mortes no Deserto do Arizona em “Humane Approach to Border,” Denver Post, 24 Abril 2003; Ralph Blumenthal, “Citing Violence, 2 Border States Declare a Crisis,”


New York Times, 17 Agosto 2005. 66. Bolsa de Poeira dos E.U.A. em Yang Youlin, Victor Squires e Lu Qi, eds., Global Alarm: Dust and Sandstorms from the World’s Drylands (Bangkok: Secretariado da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação, 2002), pp. 109–22. 67. Jonathan Shaw, “The Great Global Experiment,” Harvard Magazine, Novembro–Dezembro 2002, p. 35; Tomas Alex Tizon, “Can One Man Turn the Tide? As Erosion Eats Away at Tiny Newtok,Alaska, the Relocation of Its Yupik Eskimo Villagers and Their Homes Has Fallen to the Local Grocer,” New York Times, 28 Outubro 2004. 68. Aldeias abandonadas na Índia em Tushaar Shah et al., The Global Groundwater Situation: Overview of Opportunities and Challenges (Colombo, Sri Lanka: International Water Management Institute, 2000); população em Nações Unidas, op. cit. nota 1.


Notas: chapter 6

69. Wang Tao, Cold and Arid Regions Environmental and Engineering Research Institute (CAREERI),Academia Chinesa das Ciências, e-mail ao author, 4 Abril 2004; Wang Tao, “The Process and Its Control of Sandy Desertification in Northern China,” CAREERI, Academia Chinesa das Ciências, seminário sobre desertificação, realizado em Lanzhou, China, Maio 2002. 70.Agência de Notícias Iraniana, “Official Warns of Impending Desertification Catastrophe in Southeast Iran,” BBC International Reports, 29 Setembro 2002; Governo da Nigéria, op. cit. nota 47, p. 6. 71. Painel Intergovernamental sobreAlteração Climática (IPCC), Climate Change 2001: The Scientific Basis. Contributions of Working Group I to the Third Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change (Nova Iorque: Cambridge University Press, 2001); Banco Mundial, World Development Report 1999/2000 (Nova Iorque: Oxford University Press, 2000), p. 100; população em Nações Unidas, op. cit. nota 1. 72. Fund for Peace and the Carnegie Endowment for International Peace, “The Failed States Index,” Foreign Policy, Julho/Agosto 2005, p. 56–65. 73. Ibid. 74. Ibid. 75. Ibid. 76. Ibid. 77. Ibid.


78. Ibid. 79. Richard Cincotta, Robert Engelman e Daniele Anastasion, The Security Demographic: Population and Civil Conflict After the Cold War (Washington, DC: PopulationAction International, 2003). 80. Ed Stoddard, “Environment Looms as Major Security Threat,” Reuters, 1 Março 2004. 81. Ginger Thompson, “ANew ScourgeAfflicts Haiti: Kidnappings,” New York Times, 6 Julho 2005; Madeleine K. Albright e Robin Cook, “The World Needs to Step It Up in Afghanistan,” International Herald Tribune, 5 Outubro 2004; Desmond Butler, “5-Year Hunt Fails to Net Qaeda Suspect in Africa,” New York Times, 14 Junho 2003. 82.Abraham McLaughlin, “CanAfrica SolveAfrican Problems?” Christian Science Monitor, 4 Janeiro 2005; Marc Lacey, “Beyond the Bullets and Blades,” New York Times, 20 Março 2005. 83. UNAIDS, op. cit. nota 1, p. 191; AIDS orphans from Children on the Brink 2004: A Joint Report on New Orphan Estimates and a Framework for Action (Washington, DC: UNAIDS, UNICEF, e USAID, 2004), p. 29. 84. “Afghanistan: The Ignored War,” em Christy Harvey, Judd Legum e Jonathan Baskin, The Progress Report (Washington, DC: American ProgressAction Fund, 2005); McLaughlin, op. cit. nota 82; “A Failing State: The Himalayan Kingdom Is a Gathering Menace,” The Economist, 4 Dezembro 2004. 85. Nações Unidas, “United Nations Peacekeeping Operations,” nota, em www.un.org/Depts/dpko/dpko/bnote.htm, 30 Junho 2005; Marc Lacey, “Congo Tribal Killings Create a New Wave of Refugees,” New York Times, 6 Março 2005.


86. Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (PAM), “New Operation Provides WFP Food Aid to 550,000 Haitians,” comunicado de imprensa (Roma: 5 Maio 2005); PAM, “India Helps WFP FeedAfghan Schoolchildren,” comunicado de imprensa (Roma: 17 Maio 2005).

Capítulo 7. Erradicando a Pobreza, Estabilizando a População 1. Assembleia Geral das Nações Unidas, “United Nations Millennium Declaration,” resolução adoptada pelaAssembleia Geral, 8 Setembro 2000; Nações Unidas, The Millennium Development Goals Report 2005 (Nova Iorque: 2005); “More or Less Equal? Is Economic InequalityAround the World Getting Better or Worse?” The Economist, 13 Março 2004; Fundo Monetário Internacional, World Economic Outlook, base de dados electrónica, www.imf.org, actualizado Setembro 2005. 2. Banco Mundial, World Development Report 2005 (Nova Iorque: Oxford University Press, 2004); Jeffrey D. Sachs, “India Takes the Lead,” Korea Herald, 4 Agosto 2004. 3. Nações Unidas, “Poverty, Percentage of Population Below $1 (1993 PPP) Per Day Consumption (Worl Bank),” Millennium Development Goals Indicators Database, actualizado 26 Agosto 2005. 4. Nações Unidas, World Population Prospects: The 2004 Revision (Nova Iorque: 2005); líderes do G8, “Gleneagles Communiqué onAfrica, Climate Change, Energy and Sustainable Development,” documento da Cimeira do G8, Gleneagles, Escócia, Julho 2005. 5. Assembleia Gerald as Nações unidas, op. cit. nota 1. 6. Nações Unidas, op. cit. nota 1; UNICEF, Children Under


Threat: The State of the World’s Children 2005 (Nova Iorque: 2004). 7. UNICEF, Progress for Children: A Report Card on Gender Parity and Primary Education (Nova Iorque: 2005), p. 3; Hilaire A. Mputu, Literacy and Non-Formal Education in the E-9 Countries (Paris: UNESCO, 2001), p. 5; Paul Blustein, “Global Education Plan Gains Backing,” Washington Post, 22 Abril 2002; Gene Sperling, “Educate Them All,” Washington Post, 20 Abril 2002; Polly Curtis, “Lack of Education ‘a Greater Threat than Terrorism’: Sen,” The Guardian (Londres), 28 Outubro 2003. 8. Assembleia Gerald as Nações Unidas, op. cit. nota 1; Blustein, op. cit. nota 7; Sperling, op. cit. nota 7; Banco Mundial, “World BankAnnounces First Group of Countries for ‘Education ForAll’ Fast Track,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 12 Junho 2002); Banco Mundial, “Education forAll the World’s Children: Donors Have Agreed to Help First Group of Countries on Education Fast-Track,” comunicado de imprensa (Washington, DC: 27 Novembro 2002); Gene Sperling, “The G-8—Send 104 Million Friends to School,” Bloomberg News, 20 Junho 2005. Para mais informação sobre os Millennium Development Goals, ver www.un.org/millenniumgoals; para mais informação sobre o envolvimento do Banco Mundial e da comunidade internacional no programa Education ForAll, ver www1.worldbank.org/education/ efa.asp. 9. Ver capítulo sobre educação em Banco Mundial, Poverty Reduction Strategy Paper Sourcebook (Washington, DC: 2001), pp. 2–4. 10. Gene B. Sperling, “Toward Universal Education,” Foreign Affairs, Setembro/Outubro 2001, pp. 7–13. 11. Sperling, op. cit. nota 7.


12. The Education forAll (EFA) Global Monitoring Report Team, EFA Global Monitoring Report 2005: The Quality Imperative (Paris: UNESCO, 2004), p. 21; ONU, Comissão sobre População e Desenvolvimento, Trigésima sexta Sessão, Population, Education, and Development, Comunicados de imprensa, 31 Março–4 Abril 2003; UNESCO, “Winners of UNESCO Literacy Prizes 2003,” comunicado de imprensa, 27 Maio 2003. 13. Blustein, op. cit. nota 7; Nações Unidas, “Progress Towards the Millennium Development Goals, 1990–2005,” Nova Iorque, 13 Junho 2005. 14. George McGovern, “Yes We CAN Feed the World’s Hungry,” Parade, 16 Dezembro 2001; George McGovern, The Third Freedom: Ending Hunger in Our Time (Nova Iorque: Simon & Schuster: 2001), capítulo 1. 15. Jeffrey Sachs, “A New Map of the World,” The Economist, 22 Junho 2000; McGovern, “Yes We CAN Feed the World’s Hungry,” op. cit. nota 14. 16. McGovern, “Yes We CAN Feed the World’s Hungry,” op. cit. nota 14. 17. Ibid. 18. Ibid. 19. População em Nações Unidas, op. cit. nota 4; Population Reference Bureau (PRB), 2004 World Population Data Sheet, Quadro de Parede (Washington, DC: Agosto 2004). 20. Nações Unidas, op. cit. nota 4; PRB, 2005 World Population Data Sheet, Quadro de Parede (Washington, DC: Agosto 2005). 21. Nações Unidas, op. cit. nota 4.


22. U.N. Population Fund (UNFPA), The State of World Population 2004 (Nova Iorque: 2004), p. 39; os 201 milhões de mulheres que querem limitar o tamanho da sua família mas não têm acesso a uma opção de contracepção eficaz incluem 137 milhões de mulheres com neecessidades não atendidas de contracepção e mais 64 milhões que usam métodos familiares tradicionais de contracepção menos fiáveis. 23. Janet Larsen, “Iran’s Birth Rate Plummeting at Record Pace,” em Lester R. Brown, Janet Larsen, e Bernie Fischlowitz-Roberts, The Earth Policy Reader (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 2002), pp. 190–94; ver também Homa Hoodfar e Samad Assadpour, “The Politics of Population Policy in the Islamic Republic of Iran,” Studies in Family Planning, Março 2000, pp. 19–34, e Farzaneh Roudi, “Iran’s Family Planning Program: Responding to a Nation’s Needs,” MENA Policy Brief, Junho 2002; taxa de crescimento da população do Irão em Nações Unidas, op. cit. nota 4. 24. Larsen, op. cit. nota 23. 25. Ibid. 26. Ibid.; taxas de crescimento da população em PRB, op. cit. nota 20; Nações Unidas, op. cit. nota 4. 27. Janet Larsen, “World Population Grew by 76 Million People in 2004— 3 MillionAdded in the Industrial World and 73 Million in the Developing World,” Eco-Economy Indicator (Washington, DC: Earth Policy Institute, 21 Dezembro 2004); UNFPA, “Meeting the Goals of the ICPD: Consequences of Resource Shortfalls up to the Year 2000,” papel apresentado à Comissão Executiva do U.N. Development Programme and the UNFPA, Nova Iorque, 12–23 Maio 1997; UNFPA, Population Issues Briefing Kit (Nova Iorque: Prographics, Inc., 2001), p. 23; UNFPA, op. cit. nota 22, pp. 89–90.


28. UNFPA, op. cit. nota 22, p. 39. 29. Ministério da Saúde das Honduras, Encuesta Nacional de Epidemiología y Salud Familiar (Inquérito Nacional de Epidemiologia e Saúde Familiar) (Tegucigalpa: 1996), citado em George Martine e Jose Miguel Guzman, “Population, Poverty, and Vulnerability: Mitigating the Effects of Natural Disasters,” em Environmental Change and Security Project Report (Washington, DC: Woodrow Wilson International Center for Scholars, 2002), pp. 45–68. 30. “Bangladesh: National Family Planning Program,” Family Planning Programs: Diverse Solutions for a Global Challenge (Washington, DC: PRB, 1994). 31. John Donnelly, “U.S. Seeks Cuts in Health Programs Abroad,” Boston Globe, 5 Fevereiro 2003. 32. Jeffrey D. Sachs e a Commission on Macroeconomics and Health, Macroeconomics and Health: Investing in Health for Economic Development (Genebra: Organização Mundial de Saúde(OMS), 2001); Ruth Levine e o What Works Working Group, Millions Saved: Proven Successes in Global Health (Washington, DC: Center for Global Development, 2004). 33. OMS, World Health Report 2002 (Genebra: 2002), p. 10; “The Tobacco Epidemic:ACrisis of Startling Dimensions,” em Message From the Director-General of the World Health Organization for World No-Tobacco Day 1998, em www.who.int/archives/ntday/ ntday98/ad98e_1.htm; poluição do ar em OMS, “Air Pollution,” fact sheet 187 (Genebra: revisto Setembro 2000). 34. Alison Langley, “Anti-Smoking Treaty Is Adopted by 192 Nations,” New York Times, 22 Maio 2003; informação sobre a Tobacco Free Initiative da OMS em www5.who.int/tobacco/ index.cfm.


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15. FAO, op. cit. nota 8, p. 161; FAO, op. cit. nota 3, actualizado 10 Abril 2001; Ashley T. Mattoon, “Paper Forests,” World Watch, Março/Abril 1998, p. 20. 16. Mattoon, op. cit. nota 15; corn yields from USDA, op. cit. nota 13. 17. FAO, op. cit. nota 8, p. 185; Brown and Mead, op. cit. nota 14. 18. M. Davis et al., “New England-Acadian Forests,” em Taylor H. Ricketts et al., eds., Terrestrial Ecoregions of North American: A Conservation Assessment (Washington, DC: Island Press, 1999); David R. Foster, “Harvard Forest: Addressing Major Issues in Policy Debates and in the Understanding of Ecosystem Process and Pattern,” LTER Network News: The Newsletter of the Longterm Ecological Network, primavera/verão 1996. 19. C. Csaki, “Agricultural Reforms in Central and Eastern Europe and the Former Soviet Union: Status and Perspectives,” Agricultural Economics, vol. 22 (2000), pp. 37–54; Igor Shvytov, Agriculturally Induced Environmental Problems in Russia, Discussion Paper No. 17 (Halle,Alemanha: Institute ofAgricultural Development in Central and Eastern Europe, 1998), p. 13. 20. Se-Kyung Chong, “Anmyeon-do Recreation Forest:AMillennium of Management,” em Patrick B. Durst et al., In Search of Excellence: Exemplary Forest Management in Asia and the Pacific, Asia-Pacific Forestry Commission (Bangkok: FAO Regional Office for Asia and the Pacific, 2005), pp. 251–59. 21. Ibid. 22. The Turkish Foundation for Combating Soil Erosion (TEMA), em english.tema.org.tr, visto 10 Agosto 2005.


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p. 85. 39. Megan Dyson, Ger Bergkamp e John Scanlon, eds., Flow: The Essentials of Environmental Flows (Gland, Suiça, e Cambridge, Reino Unido.: World Conservation Union–IUCN, 2003), p. 2. 40. Sandra Postel, Pillar of Sand (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 1999), pp. 121–22. 41. Ibid. 42. John Tibbetts, “MakingAmends: Ecological Restoration in the United States,” Environmental Health Perspectives, vol. 108, no. 8 (Agosto 2000), pp. A357–A361. 43. Definição de rede de reservas marinhas em “Scientific Consensus Statement on Marine Reserves and Marine Protected Areas,” apresentado no meeting anual da AAAS, 15-20 Fevereiro 2001, entre os signatários iniciais estão Steven Gaines, Jane Lubchenco, Stephen Palumbi e Megan Detheir, p. 2. 44. Andrew Balmford et al., “The Worldwide Costs of Marine Protected Areas,” Proceedings of the National Academy of Sciences, vol. 101, no. 26 (29 Junho 2004), pp. 9,694–97; “Costs of a Worldwide System of Marine Parks,” comunicado de imprensa (York: The University of York, 12 Julho 2004). 45. Balmford et al., op. cit. nota 44; Tim Radford, “Marine Parks Can Solve Global Fish Crisis, Experts Say,” Guardian (Londres), 15 Junho 2004. 46. Balmford op. cit. nota 44; Radford, op. cit. nota 45. 47. Radford, op. cit. nota 45; Richard Black, “Protection Needed for ‘Marine Serengetis,’” BBC News, 6 Agosto 2003; Balmford et al., op. cit. nota 44.


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62. Ibid., pp. 173–74. 63. Ibid., p. 174. 64. Ibid. 65. Ibid. 66. UNEP, op. cit. nota 57, com números em dólares convertidos de 1990 para dólares de 2004 usando deflactores de preços implícitos do U.S. Department of Commerce, Bureau of EconomicAnalysis, “Table C.1. GDP and Other Major NIPA Aggregates,” em Survey of Current Business, Setembro 2005, p. D-48. 67. H. E. Dregne e Nan-Ting Chou, “Global Desertification Dimensions and Costs,” em Degradation and Restoration of Arid Lands (Lubbock, TX: Texas Tech. University, 1992); UNEP, op. cit. nota 57. 68. Balmford et al., op. cit. nota 44. 69. World Parks Congress, “Financial Security for Protected Areas” e “The Durban Accord,” op. cit. nota 57. 70. Terras de cultura irrigadas em FAO, op. cit. nota 6, dados relativos a terra actualizados 4 Abril 2005. 71. Jordânia de Tom Gardner-Outlaw e Robert Engelman, Sustaining Water, Easing Scarcity: A Second Update (Washington, DC: PopulationAction International, 1997); México de Sandra Postel, Last Oasis (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 1997), pp.150–51. 72. Postel, op. cit. nota 40, pp. 230–35; Postel, op. cit. nota 71, pp. 167–68.


Capítulo 9. Alimentar Bem Sete Mil Milhões 1. “Last Food Shipment Signals End of 25-Year WFPAid to China,” Asian Economic News, 8 Abril 2005; U.S. Department of Agriculture (USDA), Production, Supply, & Distribution, base de dados electrónica, em www.fas.usda.gov/psd, actualizado 13 Julho 2005. 2. U.N. Food and Agriculture Organization (FAO), The State of Food Insecurity in the World 2004 (Roma: 2004), p. 6. 3. Thomas R. Sinclair, “Limits to Crop Yield,” papel apresentado no 1999 National Academy Colloquium, Plants and Populations: Is There Time? Irvine, CA, 5–6 Dezembro 1998; FAO, FAOSTAT Statistics Database, em apps.fao.org, com dados referentes a utilização de fertilizantes actualizados 4Abril 2005. 4. Nações Unidas, World Population Prospects: The 2004 Revision (Nova Iorque: 2005). 5. USDA, op. cit. nota 1. 6. Ibid. 7. John Wade, Adam Branson e Xiang Qing, China Grain and Feed Annual Report 2002 (Pequim: USDA, 2002); USDA, op. cit. nota 1. 8. Produções com duas colheitas em USDA, India Grain and Feed Annual Report 2003 (Nova Deli: 2003); população em Nações Unidas, op. cit. nota 4; USDA, op. cit. nota 1. 9. Área cultivada de grãos em USDA, op. cit. nota 1; USDA, Japan Grain and Feed Annual Report 2003 (Tóquio: 2003).


10. USDA, op. cit. nota 1. 11. Richard Magleby, “Soil Management and Conservation,” em USDA, Agricultural Resources and Environmental Indicators 2003 (Washington, DC: Fevereiro 2003),Capítulo 4.2, p. 14. 12. USDA, op. cit. nota 1; Randall D. Schnepf et al., Agriculture in Brazil and Argentina (Washington, DC: USDA Economic Research Service (ERS), 2001), pp. 8–10. 13. FAO, op. cit. nota 3; USDA, op. cit. nota 1. 14. Pedro Sanchez, “The Climate Change–Soil Fertility–Food Security Nexus,” nota de resumo (Bona: International Food Policy Research Institute, 4 Setembro 2001). 15. Necessidades de água para a produção de grãos em FAO, Yield Response to Water (Roma: 1979); uso da água em I.A. Shiklomanov, “Assessment of Water Resources and Water Availability in the World,” Report for the ComprehensiveAssessment of the Freshwater Resources of the World (S. Petersburgo, Rússia: Instituto Hidrológico Estatal, 1998), citado em Peter H. Gleick, The World’s Water 2000–2001 (Washington, DC: Island Press, 2000), p. 53. 16. Uso de água para a produção de grãos em FAO, op. cit. nota 15. 17. Sandra Postel e Amy Vickers, “Boosting Water Productivity,” em Worldwatch Institute, State of the World 2004 (Nova Iorque: W.W. Norton & Company, 2004), pp. 51–52. 18. Ibid. 19. Wang Shucheng, reunião privada com o autor, Pequim, Maio 2004.


20. FAO, Crops and Drops (Roma: 2002), p. 17; Alain Vidal, Aline Comeau e Hervé Plusquellec, Case Studies on Water Conservation in the Mediterranean Region (Roma: FAO, 2001), p. vii. 21. FAO, op. cit. nota 20; Vidal, Comeau, and Plusquellec, op. cit. nota 20. 22. Postel e Vickers, op. cit. nota 17, p. 53. 23. Sandra Postel et al., “Drip Irrigation for Small Farmers: ANew Initiative to Alleviate Hunger and Poverty,” Water International, Março 2001, pp. 3–13. 24. Ibid. 25. Para mais informação sobre associações de ulilizadores de água, ver R. Maria Saleth e Arial Dinar, Water Challenge and Institutional Response: A CrossCountry Perspective (Washington, DC: Banco Mundial, 1999), p. 26. 26. Saleth and Dinar, op. cit. nota 25, p. 6. 27. Banco Mundial eAgência Suiça para o Desenvolvimento e Cooperação, Summary Report, Middle East and North Africa Regional Water Initiative Workshop on Sustainable Groundwater Management, Sana’a, Yemen, 25–28 Junho 2000, p. 19. 28. Peter Wonacott, “To Save Water, China Lifts Price,” Wall Street Journal, 14 Junho 2004.


29. USDA, op. cit. nota 1. 30. População em Nações Unidas, op. cit. nota 4; consumo de grãos em USDA, op. cit. nota 1; cálculo de água baseado em 1,000 toneladas de água para 1 tonelada de grão em FAO, op. cit. nota 15. 31. USDA, op. cit. nota 1. 32. FAO, op. cit. nota 3, com dados da produção animal actualizados 14 Julho 2005; estimativas de produção de 2005 em FAO, Global Information and Early Warning System on Food and Agriculture (GIEWS), Food Outlook, No. 1 (Roma: Abril 2005). 33. Ratio de conversão de ração em ave derivado a partir de dados em Robert V. Bishop et al., The World Poultry Market— Government Intervention and Multilateral Policy Reform (Washington, DC: USDA, 1990); Ratio de conversão de grão em carne de vaca baseado em Allen Baker, Feed Situation and Outlook staff, ERS, USDA, discussão com autor, 27 Abril 1992; dados relativos à carne de porco em Leland Southard, Livestock and Poultry Situation and Outlook staff, ERS, USDA, discussão com o autor, 27 Abril 1992; peixe em Rosamond L. Naylor et al., “Effect of Aquaculture on World Fish Supplies,” Nature, vol. 405 (29 Junho 2000), pp. 1,017–24. 34. Figura 9–1 em FAO, op. cit. nota 3, com dados da produção animal actualizados 14 Julho 2005; FAO, GIEWS, op. cit. nota 32; dados relativos ao peixe em FAO, FISHSTAT Plus, base de dados electrónica, em www.fao.org/fi/statist/FISOFT/ FISHPLUS.asp, actualizado Março 2005. 35. FAO, op. cit. nota 34.


36. Naylor et al., op. cit. nota 33; policultura na Índia em W. C. Nandeesha et al., “Breeding of Carp with Oviprim,” em Indian Branch,Asian Fisheries Society, India, Special Publication No. 4 (Mangalore, Índia: 1990), p. 1. 37. Krishen Rana, “Changing Scenarios inAquaculture Development in China,” FAO Aquaculture Newsletter, Agosto 1999, p. 18. 38. Necessidades do peixe-gato em Naylor et al., op. cit. nota 33;.dados relativos à produção de peixe-gato nos EUA em USDA, National Agricultural Statistics Service, Catfish Production (Washington, DC: Fevereiro 2003), p. 5. 39. FAO, op. cit. nota 34; Naylor et al., op. cit. nota 33; TaijaRiitta Tuominen e Maren Esmark, Food For Thought: The Use of Marine Resources in Fish Feed (Oslo: WWF-Noruega, 2003); Rebecca Goldburg e Rosamond Naylor, “Future Seascapes, Fishing, and Fish Farming,” Frontiers in Ecology and the Environment, vol. 3, no. 1 (Fevereiro 2005), pp. 21–28. 40. FAO, op. cit. nota 34; FAO, The State of World Fisheries and Aquaculture 2004 (Roma: 2004). 41. USDA, op. cit. nota 1; Suzi Fraser Dominy, “Soy’s Growing Importance,” World Grain, 13 Abril 2004. 42. Uso de soja a partir de cálculos do autor baseados em USDA, op. cit. nota 1, e em USDA, Foreign Agricultural Service (FAS), vários relatórios de agricultura (Washington, DC: vários anos); crescimento do biodiesel analizado com mais detalhe no Capítulo 2. 43. USDA, op. cit. nota 1. 44. Ibid.


45. Ibid.; David McKee, “Crushing Competition,” World Grain, 13 Abril 2004; USDA, FAS, China Oilseeds and Products Annual Report 2004 (Pequim: Março 2004); Dominy, op. cit. nota 41. 46. Historical statistics in Worldwatch Institute, Signposts 2002, CD-Rom (Washington, DC: 2002); USDA, op. cit. nota 1. 47. Figura 9–2 em FAO, op. cit. nota 3, actualizado 14 Julho 2005; estimativas preliminares para a produção de 2005 em FAO, GIEWS, Food Outlook, No. 2 (Roma: Junho 2005). 48. S. C. Dhall and Meena Dhall, “Dairy Industry—India’s Strength in Its Livestock,” Business Line, Edição da Internet de Financial Daily do grupo editorial The Hindu, 7 Novembro 1997; ver também Surinder Sud, “India Is Now World’s Largest Milk Producer,” India Perspectives, Maio 1999, pp. 25–26; A. Banerjee, “Dairying Systems in India,” World Animal Review, vol. 79, no. 2 (1994). 49. Fornecimento de leite por pessoa em FAO, op. cit. nota 3, actualizado 27 Agosto 2004; Nações Unidas, op. cit. nota 4. 50. Banerjee, op. cit. nota 48; Dhall and Dhall, op. cit. nota 48. 51. Wade, Branson e Xiang, op. cit. nota 7; Produção e uso de resíduos de colheita na China em Gao Tengyun, “Treatment and Utilization of Crop Straw and Stover in China,” Livestock Research for Rural Development, Fevereiro 2000. 52. USDA, ERS, “China’s Beef Economy: Production, Marketing, Consumption, and Foreign Trade,” International Agriculture and Trade Reports: China (Washington, DC: Julho 1998), p. 28. 53. S. F. Li, “Aquaculture Research and Its Relation to Development in China,” em World Fish Center, Agricultural Development and the Opportunities for Aquatic Resources Research in China


(Penang, Malásia: 2001), p. 26; FAO, op. cit. nota 34. 54. FAO, op. cit. nota 34; FAO, op. cit. nota 3, actualizado 14 Julho 2005. 55. Nações Unidas, op. cit. nota 4; FAO, op. cit. nota 3, actualizado 14 Julho 2005. 56. Crescimento económico chinês em Fundo Monetário Internacional, World Economic Outlook Database, em www.imf.org/ external/pubs/ft/weo, actualizado 13Abril 2005. 57. Consumo de carne em FAO, op. cit. nota 3, actualizado 14 Julho 2005. 58. Cálculos do autor a partir de USDA, op. cit. nota 1; Nações Unidas, op. cit. nota 4. 59. USDA, op. cit. nota 1; Nações Unidas, op. cit. nota 4. 60. USDA, op. cit. nota 1; Nações Unidas, op. cit. nota 4; Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, “Total Health Expenditure Per Capita, US$ PPP,” quadro, OECD Health Data, www.oecd.org, Junho 2005. 61. FAO, op. cit. nota 3, actualizado 14 Julho 2005. 62. USDA, op. cit. nota 1. 63. Aves baseado em dados em Bishop et al., op. cit. nota 33; peixe-gato e carpa em Naylor et al., op. cit. nota 33. 64. Naylor et al., op. cit. nota 33; ratio de conversão de ração em ave baseado em dados em Bishop et al., op. cit. nota 33. 65. Aquaculture output from FAO, op. cit. nota 34.


66. Ibid.; “Mekong Delta to Become Biggest Aquatic Producer in Vietnam,” Vietnam News Agency, 3 Agosto 2004. 67. USDA, ERS, Natural Resources and Environment Division, Agricultural Resources and Environmental Indicators, 1996– 1997, Agricultural Handbook No. 712 (Washington, DC: 1997).

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Iorque: W.W. Norton & Company, 2003), pp. 60–61. 24. Harry Braun, The Phoenix Project: Shifting From Oil to Hydrogen with Wartime Speed, preparado para a Renewable Hydrogen Roundtable, World Resources Institute, Washington, DC, 10–11 Abril 2003, pp. 3–4; capacidade da indústria automóvel americana para produzir um milhão de turbinas de vento por ano é estimativa do autor. 25. Subsídios aos combustíveis fósseis em Bjorn Larsen, World Fossil Fuel Subsidies and Global Carbon Emissions in a Model with Interfuel Substitution, Policy Research Working Paper 1256 (Washington, DC: Banco Mundial, 1994), p. 7; empresas envolvidas no vento em Birgitte Dyrekilde, “Big Players to Spark Wind Power Consolidation,” Reuters, 18 Março 2002. 26. Jim Dehlsen, Clipper Wind, discussão com autor, 30 Maio 2001; Massachusetts Institute of Technology, “MIT Hosts Hearing On Cape Wind Farm,” comunicado de imprensa (Cambridge, MA: 14 Dezembro 2004). 27. AWEA, “Wind Energy Projects,” fact sheet (Washington, DC: 24 Abril 2005); cálculo da produção de electricidade em Tom Gray, AWEA, e-mail ao autor, 12 Junho 2002. 28. Royalties do Vento em Union of Concerned Scientists, “Farming the Wind: Wind Power andAgriculture,”www.ucsusa.org/ clean_energy/renewable_energy/page.cfm?pageID=128; para o milho, cálculos do autor usando dados em John Dittrich,American Corn Growers Association, “Major Crops: A 27-Year History with Inflation Adjustments,” Key Indicators of the U.S. Farm Sector (Washington, DC: Janeiro 2002); carne de vaca é estimativa do autor. 29. “Benchmark Oil Price Hits Dollars 66.50 A Barrel,” Financial Times, 29 Setembro 2005.


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30. Spanish Railway Foundation, “Spanish Greenways Programme,” Web site Vias Verdes, em www.ffe.es/viasverdes/ programme.htm, visto 10 Agosto 2005. 31. Walljasper, op. cit. nota 19. 32. O’Meara, op. cit. nota 6, pp. 47–48; Japão a partir da observação pessoal do autor. 33. “Farming in Urban Areas Can Boost Food Security,” FAO Newsroom, 3 Junho 2005. 34. Ibid. 35. Jac Smit, “UrbanAgriculture’s Contribution to Sustainable Urbanisation,” Urban Agriculture, Agosto 2002, p. 13. 36. Ibid. 37. Ibid., p. 12. 38. “Gardening for the Poor,” FAO Newsroom, 2004, em www.fao.org/ newsroom/en/field/2004/37627/ article_37647en.html, visto 27 Junho 2005. 39. Ibid. 40. “Cuba: Ciudad de la Habana,” Urban Agriculture, Agosto 2002, p. 22; Lawrence Solomon, “Sowing the Skyline,” National Post (Urban Renaissance Institute), 13 Novembro 2004; Katherine H. Brown e Anne Carter, Urban Agriculture and Community Food Security in the United States: Farming from the City Center to the Urban Fringe (Venice, CA: Community Food Security Coalition, Outubro 2003), p. 10; Nações Unidas, op. cit. nota 1, p. 260.


41. Brown e Carter, op. cit. nota 40, p. 7. 42. Ibid. 43. Sunita Narain, “The Flush Toilet is Ecologically Mindless,” Down to Earth, 28 Fevereiro 2002, pp. 28–32; zonas mortas em R. J. Diaz, J. Nestlerode, e M. L. Diaz, “A Global Perspective on the Effects of Eutrophication and Hypoxia onAquatic Biota,” em G. L. Rupp and M. D. White (eds.), Proceedings of the 7th Annual Symposium on Fish Physiology, Toxicology and Water Quality, Estónia, 12–15 Maio 2003 (Atenas, GA: U.S. Environmental ProtectionAgency (EPA), Ecosystems Research Division: 2003). 44. Narain, op. cit. nota 43. 45. Ibid. 46. Ibid. 47. EPA, “Water Efficiency Technology Factsheet—Composting Toilets,” folheto informativo (Washington, DC: Setembro 1999); Jack Kieffer,Appalachia—Science in the Public Interest, Humanure: Preparation of Compost from the Toilet for Use in the Garden, ASPI Technical Series TP 41 (Mount Vernon, KY: ASPI Publications, 1998). 48. EPA, op. cit. nota 47. 49. Tony Sitathan, “Bridge Over Troubled Waters,” Asia Times, 23 Agosto 2002; “Singapore Opens Fourth Recycling Plant to Turn Sewage into Water,” Associated Press, 12 Julho 2005. 50. Peter H. Gleick, The World’s Water 2004-2005: The Biennial Report on Freshwater Resources (Washington, DC: Island Press, 2004), p. 149.


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