Relatorio anexo 40867320133

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Observatório Imobiliário OIPSOLO/IPPUR/UFRJ

e

de

Políticas

do

Solo

Relatório Final

Equipe: Coordenação Geral: Pedro Abramo Coordenação Executiva: Andréa Pulici Pesquisadores: Vanessa Fernandes Thaís Vasconcelos Gabriel Mieskalo Tiago Borba

Sumário


I – Sondagem do mercado imobiliário

II – Metodologia de campo

III – Questionário e universo da pesquisa

IV – Tipologia sócio-espacial

V – Favelas selecionadas

VI – Trabalho de campo

VII – Relatório de campo

VIII – Graduação de violência nas favelas

IX – Dinâmica do mercado imobiliário

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I – SONDAGEM DO MERCADO IMOBILIÁRIO

Na última década, o número de assentamentos informais nas grandes cidades apresentou um crescimento significativo, mas a surpresa foi o surgimento de uma forte tendência à densificação e a verticalização sinalizando um crescimento da população pobre em assentamentos informais centrais. Podemos concluir que a dinâmica de crescimento populacional nos assentamentos informais obedece, hoje, um duplo movimento de estruturação das “cidades informais” (Abramo, 2009). De um lado, temos um processo de extensificação dos limites urbanos com o fracionamento irregular e/ou ilegal (informal) de glebas produzindo as super periferias metropolitanas. De outro, um movimento de forte densificação e verticalização dos assentamentos informais com melhores acessibilidades e centralidade. Nos dois casos o mecanismo que opera o acesso do pobre ao solo a estes assentamentos informais é o mercado imobiliário-fundiário. Dados de pesquisas recentes (Abramo, 2003, 2006,2009) revelam a existência de práticas recorrentes de transações de compravenda e locação nas áreas de assentamentos informais, apontando para uma regularidade de mercado e temos também que os produtos fundiários e imobiliários transacionados apresentam vantagens comparativas em relação ao mercado formal para os estratos de baixa renda. Essas pesquisas também revelam que o comportamento dos preços no submercado informal é muito sensível a certos atributos, próprios da informalidade urbana, e que não podem ser reproduzidos nas áreas formais das grandes cidades da AL. Acreditamos que produzir informações confiáveis, abrangentes e comparáveis a nível latino-americano sobre o mercado informal de solo é o primeiro passo para identificarmos suas regularidades e termos alguma inteligibilidade do funcionamento desse mercado. Em duas palavras, pretendemos abandonar e contestar a leitura que atribui ao mercado informal de solo um comportamento errático e incompreensível e introduzi-lo como um objeto real da teoria econômica urbana. O objetivo desta pesquisa é o de levantar informações sobre o funcionamento do mercado de solo urbano informal em alguns dos assentamentos consolidados na cidade do Rio de Janeiro que serão beneficiados com as obras do projeto Morar Carioca/Proap III e identificar as práticas e regras (instituições) informais que 3


asseguram a regularidade das transações de compra, venda e aluguel deste mercado. A metodologia para esta pesquisa foi desenvolvida em vários trabalhos anteriores (Abramo, 2002, 2006, 2008, 2009, 2011) e aplicada em estudos em 6 países da América Latina: Brasil, Argentina, México,Peru, Colômbia e Venezuela. Nesta pesquisa estaremos realizando o trabalho de campo em 2 favelas da cidade do Rio de Janeiro e que já foram objeto de estudo pelo OIPSOLO em 2003/2006. A oportunidade de refazer o trabalho de campo nestas comunidades é muito rica, pois poderemos comparar dados de crescimento (verticalização/adensamento), composição sócioespacial e mudanças ocorridas no funcionamento do mercado imobiliário nestas áreas.

A pesquisa procura: I - Identificar os determinantes da formação dos preços imobiliários em favelas (através da aplicação de questionários a compradores, vendedores e locatários de imóveis nas comunidades previamente selecionadas);

II - Descrever as articulações entre mercado imobiliário e mobilidade residencial, assim como as estratégias residenciais e os critérios de localização adotados, comparando com os dados sobre estratégias residenciais do mercado formal; e

III - Montar uma série de preços, permitindo comparar as dinâmicas imobiliárias das favelas com a do mercado formal, tendo por base os arquivos de transações, identificando similaridades e diferenças entre os dois

mercados

no

que

diz

respeito

aos

processos

de

valorização/desvalorização dos imóveis.

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II – METODOLOGIA DE CAMPO

Critérios e definições Preliminarmente é importante ter-se presente que a Metodologia definida foi aplicação de questionários abrangendo o conjunto de domicílios disponíveis para venda no momento da investigação e aqueles comprados ou alugados nos últimos doze meses em favelas selecionadas na cidade do Rio de Janeiro. A pesquisa sobre o funcionamento do mercado imobiliário informal engloba a totalidade do universo das transações imobiliárias em cada comunidade não tendo, assim, caráter amostral. A definição das comunidades investigadas obedece a um conjunto de favelas que participarão do Programa Proap III conforme projeto proposto e um grupo de favelas que realizamos pesquisas anteriormente e que por isso podem ser favelas controle do estudo com a possibilidade de uma comparação intertemporal dos valores imobiliários.

Neste sentido, foi proposto o estudo nas seguintes comunidades: Comunidade São Jose Operário Vila Joaniza Parque Royal Morro da Matriz Morro do Queto Morro do Borel Caramuru Vila Campinho

Localização Domicílios Estagio Ilha do Governador 601 Em obras Ilha do Governador 3816 Projeto Ilha do Governador 1013 Controle Lins Vasconcelos 694 Projeto Lins Vasconcelos 367 Projeto Tijuca 1232 Controle Tomás Coelho 718 Em obras Campinho 601 Controle

A localização dos proprietários ou locatários investigados ocorre desde informações obtidas nas associações de moradores e complementa-se através de contatos diretos com os próprios moradores. Em todos os casos, após o contato inicial com as associações de moradores estas indicam um guia morador da própria comunidade que se integra ao trabalho e realiza as indicações à equipe de entrevistadores dos limites da favela e propõe a melhor maneira de rastear

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completamente o território controlado pela respectiva associação, a fim de entrevistar a todos os moradores que realizam ou realizaram transações imobiliárias na forma anteriormente definida. Assim, às informações iniciais das associações somam-se as dos guias e dos moradores. Como regra geral, os percursos no interior das comunidades rodam a indicação dos setores censitários de modo q rastrear toda a favela e, a partir dos primeiros entrevistados se anda por ruas e becos entrevistando também a todos os novos proprietários e locatários. Com esse método de trabalho de campo tem-se a certeza de passar por todas as áreas das comunidades investigadas, isto é, suas ruas e becos conseguindo entrevistar praticamente a totalidade absoluta de nosso universo de pesquisa - os proprietários que estão com seus imóveis colocados à venda e proprietários e locatários instalados no domicílio no último ano. Mapa 1 – Localização das favelas estudadas

III – QUESTIONÁRIOS

Os questionários aplicados são de três (3) tipos diferentes - compra, venda e aluguel, que, no entanto tem estruturas semelhantes, sendo possível entendê-los como sendo subdivididos em cinco (5) partes:

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1. Dados sócio-demográficos do entrevistado 2. Características do imóvel 3. Funcionamento do mercado imobiliário 4. Mobilidade residencial

Esta similitude é fundamental para que se realize o cruzamento de informações entre os questionários de compra, venda e aluguel e, assim, obter nitidamente as diferenças e semelhanças entre proprietários vendedores, proprietários compradores e locatários em cada comunidade e entre as diferentes comunidades, em relação as cinco (5) partes que estruturam os questionários. Graças à manutenção da estrutura nos três tipos de questionários é que se pode avaliar as hipóteses apresentadas e construir os agrupamentos tipológicos das comunidades, assim como estabelecer com precisão a existência e as características de áreas homogêneas similares nas diferentes realidades sócio-espaciais investigadas. Na 1ª parte do questionário, referida aos dados sócio-demográficos do proprietário ou locatário, tem-se as clássicas questões quanto a estado civil, faixa etária, naturalidade, faixa de renda, renda familiar (e número de participantes na composição da renda), ocupação profissional e local de exercício e grau de instrução. Em seguida, o entrevistador com a ajuda do entrevistado, preenche uma série de questões que apresentam as características do imóvel (tipo, n.º de pavimentos, padrão construtivo, estado de conservação, n.º de cômodos, relação com o lote, topologia do terreno). Na 3ª parte, surgem as questões sobre o funcionamento do mercado imobiliário com perguntas sobre preço, critérios de escolha, procura, forma de acesso ou oferta e relação contratual. Depois, é preenchido um breve quadro com o histórico de mobilidade residencial do entrevistado e os motivos para entrar ou querer deixar a comunidade. No caso das favelas onde ocorreu o programa Favela-Bairro há indagações sobre a possível valorização do imóvel em virtude das melhorias trazidas pelo programa. A 5ª e última sessão dos questionários coloca ao entrevistado um conjunto de perguntas a respeito de suas relações de vizinhança e associativas, enfim de sua vida cotidiana, procurando levantar informações que possam apresentar indícios da existência de motivações de tipo comunitário capazes de explicar as 7


diferentes valorizações que os imóveis das comunidades adquirem autonomamente à sua localização na cidade.

V – FAVELAS SELECIONADAS

As favelas selecionadas fazem parte da lista de favelas a serem beneficiadas por obras do programa Morar Carioca/Proap III e foram escolhidas de comum acordo com a Secretaria Municipal de Habitação da cidade do Rio de Janeiro, responsável pelas obras do financiamento do BID.

Tabela 1 – Comunidades pesquisadas Comunidade São Jose Operário Vila Joaniza Parque Royal Morro da Matriz Morro do Queto Morro do Borel Caramuru Vila Campinho

Localização Domicílios Estagio Ilha do Governador 601 Em obras Ilha do Governador 3816 Projeto Ilha do Governador 1013 Controle Lins Vasconcelos 694 Projeto Lins Vasconcelos 367 Projeto Tijuca 1232 Controle Tomás Coelho 718 Em obras Campinho 601 Controle

IX – DINÂMICA DO MERCADO IMOBILIÁRIO

A Estrutura do Mercado de solo informal na cidade do Rio de Janeiro O mercado informal nos assentamentos consolidados está dividido em submercado comercial e residencial. Nosso foco nesta pesquisa foi o sub-mercado residencial nas favelas. Esse sub- mercado residencial esta dividido em dois outros submercados. O primeiro é o sub-mercado informal de comercialização onde temos os

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dados sobre a oferta imobiliária e as transações efetivamente realizadas. O segundo sub-mercado residencial nas favelas é o mercado informal de locação. Nos itens que se seguem apresentamos os dados dos dois sub-mercados residenciais informais.

4.1. Composição dos sub-mercados:

Como podemos ver no gráfico abaixo, a composição do mercado informal nas favelas pesquisadas revela que ao longo do ano de 2012 68% das transações correspondem a transações do mercado de locação informal (aluguel). No mercado de comercialização informal identificamos que 20% das transações são de aquisição e 12% correspondem a oferta de imóveis a venda.

Tabela 1 – Composição dos sub-mercados informais nas favelas da Cidade do Rio de Janeiro.

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

A predominância do mercado de locação informal nas favelas da cidade do Rio de Janeiro é um fenômeno dos últimos 10 anos e marca uma mudança estrutural desse mercado. Em pesquisas anteriores (2002,2006, 2009) que apresentamos na tabela 2 identificamos que o sub-mercado de comercialização era predominante na maioria das comunidades pesquisadas. Mas em apenas 4 anos a participação da locação informal passou de 15% em 2002 a 29,96% em 2006 (Abramo, 2007-b). Mas no

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levantamento que realizamos em 2009 vimos um crescimento exponencial da locação informal que passa a ser o sub-mercado dominante correspondendo a 60,09% das transações imobiliárias do mercado informal nas favelas (Abramo, 2010). Na pesquisa para esse trabalho o percentual segue crescendo, mas a um ritmo inferior ao verificado nos anos anteriores que realizamos pesquisa de campo. Porém o mercado de alugueis com 68% das transações imobiliárias se consolida de forma indiscutível como a principal forma de acesso mercantil nas favelas cariocas.

Tabela 2 – Composição dos sub-mercados informais nas favelas da Cidade do Rio de janeiro - 2002, 2006, 2009

Fonte dos dados: Abramo, OIPSOLO, 2002, 2006, 2009

Quando somamos a participação das transações de compra e de venda e o comparamos com o de aluguel, podemos observar a predominância do mercado de locação sobre o mercado de comercialização em todas as comunidades pesquisadas, o que reforça nossos estudos anteriores que revelavam um crescente aumento deste sub-mercado.

Tabela 3 – Composição dos sub-mercados

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Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Na pesquisa INFOSOLO (cidades brasileiras) e INFOMERCADOS (cidades latinoamericanas) em 2006 já tínhamos detectamos a importância da locação informal nos mercado de solo nos assentamentos consolidados de varias cidades conforme podemos visualizar na tabela 4 abaixo.

Tabela 4 - Distribuição por tipo de transações do mercado residencial País

aluguel

compra

venda

total

Buenos Aires- Argentina

61,93

21,66

16,42

100,00

Bogotá - Colômbia

80,24

11,65

8,11

100,00

México- DF

27,72

68,73

3,55

100,00

Lima - Peru

44,08

39,91

16,01

100,00

Caracas - Venezuela

67,61

13,60

18,79

100,00

Rio de Janeiro Brasil

29,73

16,81

54,46

100,00

Fonte: Abramo/INFOMERCADO, 2006

O forte crescimento da participação relativa do mercado informal de locação sugere uma pergunta sobre o seu caráter conjuntural ou estrutural, pois o impacto e projeções sobre esse crescimento tem efeitos muito diferentes em termos de estruturação e composição sócio-espacial da informalidade urbana, mas também em relação a formulação de políticas públicas em particular em relação a uma tendência de precarização do parque residencial desse habitat popular.

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Dois indicadores poderiam estar confirmando essa hipótese. A primeira sobre a característica dos produtos transacionados no mercado de locação. A segunda sobre as preferências locacionais da demanda. Quando identificamos as características do produto do mercado de locação informal verificamos que praticamente 70% das relações de locação correspondem a um imóvel com apenas um quarto, em sua grande maioria um único cômodo com banheiro e entrada independente, mas com dimensões muito pequenas em metros quadrados. Esse é um típico produto de um trabalhador que faz uso da sua moradia basicamente para dormir revelando sua intenção de transitoriedade. Outro indicador que podemos utilizar são os motivos de atratividade residencial. No mercado de comercialização, o fator de atratividade (preferência locacional residencial) é a proximidade de parentes e amigos. Porém, no mercado de locação o fator de atratividade mais importante é a proximidade do trabalho.

Tabela 5 – Produto locado dominante em cidades latino-americanas - 2006 País

Produto dominante

Buenos Aires - Argentina

1 quarto (89,8%)

Rio de Janeiro - Brasil

1 quarto (79,4%)

Bogotá - Colômbia

2 quartos (42,7%)

México DF

2 quartos (42,2%)

Peru

1 quarto (56,2%)

Caracas - Venezuela

1 qto (40,3%) / 2 qtos (38,4%)

fonte: Abramo/INFOMERCADO, 2006

Como podemos ver nas tabelas 6 e 7 abaixo, a rentabilidade do mercado informal de locação parece ser superior ao do mercado informal de comercialização. Esse fator, eventualmente conjuntural, pode gerar novas condições estruturais que auto-alimentam a dinâmica do mercado informal de locação. Utilizamos o indicador de rentabilidade do mercado de locação a partir da relação entre os preços dos aluguéis e os preços de comercialização, isto é o percentual do preço de comercialização que

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corresponde aos preços dos alugueis. Utilizamos os preços médios dos dois submercados informais como uma primeira aproximação para avaliar a rentabilidade do mercado de locação nas favelas. No caso do mercado imobiliário formal, os preços dos alugueis variam entre 0,5 a 1 % do valor de comercialização. Como vemos abaixo, os indicadores de rentabilidade do mercado informal superam em muito os patamares do mercado formal. Em outras palavras, os preços dos alugueis informais são muito elevados em termos relativos do mercado informal, mas, para o Rio de Janeiro, também o são em termos reais quando comparamos com os preços do mercado formal e em alguns bairros os preços dos alugueis das favelas se aproximam de forma assombrosa dos valores do mercado formal.

Tabela 6 - Indicador de rentabilidade relativa do mercado informal de locação Metrópoles latino-americanas - 2006 Cidade

Aluguel /Compra (%)

Rio de Janeiro

2,37

Buenos Aires

2,28

México DF

1,09

Caracas

0,70

Bogotá

3,20

Lima

1,51

Fonte: Abramo/INFOMERCADO, 2006

Tabela 7 - Indicador de rentabilidade relativa do mercado informal de locação Favelas pesquisadas 2012

Comunidade

rentabilidade

borel

1,56

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Matriz/Queto

1,27

Vila Campinho

1,34

Vila Joaniza

1,51

S.J.Operário

1,51

Parque Royal

1,42

Vila Caramuru

1,28 Fonte: Abramo, 2013. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Nas favelas pesquisadas para esse trabalho encontramos uma taxa de rentabilidade superior a 1% sendo a favela do Borel a que apresenta a maior rentabilidade no mercado informal de alugueis comum a taxa de 1,56%. Esses valores são altos quando comparamos com os indicadores de rentabilidade do mercado formal de locação dos bairros adjacentes. Porem a rentabilidade média dos alugueis dessas favelas pode ser classificada no grupo intermediário de rentabilidade do mercado informal de alugueis das favelas do Rio de Janeiro.

4.2. Estrutura sócio-demográfica

Nesse item vamos apresentar algumas variáveis que permitem uma primeira aproximação da estrutura sócio-demográfica da demanda e da oferta do mercado imobiliário informal nas favelas que pesquisamos.

4.2.1 composição etária e gênero

A dimensão de gênero é importante no mercado informal e podemos dizer que desconhecida até os levantamentos que realizamos. No mercado informal temos uma clara predominância das chefes de família mulheres como compradoras de imóveis nas favelas. Os resultados da pesquisa que realizamos para esse trabalho é contundente em relação a presença feminina no mercado informal imobiliário. Na tabela 8 abaixo vemos que as mulheres chefes de família representam 66,3% dos compradores,

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podendo chegar a 85,7% em comunidades como o Borel e 83% em Parque Royal. Nas tabelas 9 e 10 vemos que entre os vendedores e os locatários as mulheres também predominam, com taxas semelhantes. É curioso notar que nas favelas que tiveram investimentos do Programa Favela-Bairro o predomínio das mulheres no mercado de compra é um pouco menor, girando em torno dos 58%, mas mesmo assim elas continuam a ser maioria em relação aos compradores homens. No mercado de venda de imóveis a presença feminina é de 68%, e no mercado de aluguéis temos 63,26% dos locatários chefes de família mulheres. Quando comparamos esses dados ao levantamento que realizamos no mercado formal de comercialização imobiliário (Abramo, 2004), onde apenas 30% dos compradores são mulheres, encontramos uma diferença significativa na composição em termos de gênero entre os mercados formal e informal. Essas diferenças e sobretudo as estratégias de localização residencial das mulheres no mercado informal é evidente quando perguntamos sobre os fatores de atração que levaram as famílias a comprarem os seus imóveis em favelas. A resposta mais importante no ranking de motivos é a proximidade de familiares e de amigos e a existência de redes sociais de reciprocidade. Esses atributos do habitat da favela são muito importantes para as chefes de família mulheres e se tornam um valor residencial (externalidade) positiva nas escolhas femininas de morar em favela. Quando comparamos a composição por gênero nas favelas pesquisadas vemos a clara predominância das chefe de família mulheres no mercado informal, mas comparando a composição dos compradores, locatários e vendedores constatamos que a presença de chefes do gênero masculino entre os vendedores é inferior a de mulheres, mas superior a composição de compradores e locatários. Nesse sentido temos uma tendência de feminização crescente dos chefes de família, pois seja na condição de compradoras e seja como locatárias as mulheres são maioria e o percentual de chefes homens, ainda que em minoria é superior entre os vendedores quando comparado ao seu percentual entre compradores e locatários.

Tabela 8 – Gênero dos compradores de imóveis nas favelas – 2012

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Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Tabela 9 – Gênero dos locatários de imóveis nas favelas - 2012

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Tabela 10 – Gênero dos vendedores de imóveis nas favelas - 2012

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Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

A idade predominante dos compradores de imóveis na favela é de 21 a 40 anos. Nessa faixa etária encontramos 56% das comercializações. No caso do mercado de aluguéis os locatários são um pouco mais jovens, pois na faixa entre 21 e 30 anos concentram-se 42,8% dos moradores que entraram na favela pela via do aluguel.

Em relação ao estado civil dos compradores e dos vendedores de imóveis, notamos nas tabelas 11, 12 e 13 abaixo uma maioria absoluta de casados (45% dos entrevistados), seguidos de solteiros (22%) e amigados (15%). Estes percentuais mudam um pouco em relação aos locatários de imóveis, pois a diferença entre os casados (36%) e os solteiros (31%) diminui de forma significativa revelando um perfil de demanda diferente entre o sub-mercado de comercialização e o sub-mercado de locação.

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Tabela 11 – Estado civil dos compradores de imóveis em Favelas - 2012

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Tabela 12 – Estado civil dos locatários de imóveis em Favelas - 2012

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

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Tabela 13 – Estado civil dos vendedores de imóveis em Favelas - 2012

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

4.2.2. Renda média da demanda e da oferta: locação e comercialização

Em relação a faixa de renda dos compradores de imóveis, podemos ver na tabela abaixo que 35% tem rendimentos entre 1 a 2 salários mínimos e 29% entre 2 a 3 salários. Em outras palavras, 79,51% dos compradores do mercado informal tem até 3 salários mínimos de renda. Esses valores são um pouco menores para os vendedores de imóveis, 30% estão na faixa de 1 a 2 e 18%, no intervalo de 2 a 3, isto é 75,2% dos vendedores tem renda até 3 salários mínimos. Este dado é interessante, pois podemos notar que a diferença em termos de renda entre os que estão entrando na favela como compradores tem uma renda bastante similar aos que estão vendendo os seus imóveis na favela. Assim, os primeiros resultados sobre o impacto do mercado informal de solo na composição de renda dos moradores de favelas não revela um processo de elitização ou expulsão branca dos mais pobres. Porém quando somamos as faixas de renda até 2 SM dos compradores vemos que eles são 50%, enquanto que os vendedores são 56,9% do total de vendedores desvelando uma ligeira tendência de elitização das favelas. Esse é

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um tema importante que não vamos tratar nesse trabalho, mas que deve ser discutido a partir das informações sobre o mercado informal e da construção de indicadores que permitam uma avaliação sobre os processos de elitização e/ou empobrecimento das favelas comparando compradores (famílias que estão entrando na favela) e vendedores (famílias que estão saindo da favela).

Tabela 14 – Renda média dos compradores de imóveis

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Tabela 15 – Renda média dos vendedores de imóveis

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Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Em relação ao tempo de escolaridade, temos que os compradores apresentam níveis de escolaridade ligeiramente superior ao dos vendedores, pois a maioria dos compradores tem o primário completo e/ou o secundário incompleto, enquanto que a escolaridade dos vendedores é predominantemente de primário completo e incompleto. Levando em consideração que o nível de escolaridade é uma proxy de rendimento temos mais um indicador que aponta para um ligeiro processo de mudança na composição sócio-econômica dessas favelas. O curioso é que os locatários têm um perfil de escolaridade superior a ambos.

4.2.3. Inserção no mercado de trabalho: comercialização e locação Entre os compradores de imóveis informais, os assalariados representam 65% enquanto os autônomos correspondem apenas 35% do total. Entre os vendedores e os locatários também encontramos uma clara predominância dos assalariados ainda que com valores ligeiramente inferiores. No caso dos vendedores a participação dos assalariados é de 60% enquanto em relação aos locatários, a predominância é para os assalariados, com 61,4% contra 38,60% de autônomos.

Tabela 16 - Ocupação Profissional dos Compradores de Imóveis COMUNIDADE

Assalariado

Autônomo

total

Total

64,75

35,25

100,00

Borel

75,30

24,70

100,00

Matriz/Queto

82,40

17,60

100,00

Vila Campinho

66,67

33,33

100,00

Vila Joaniza

72,73

27,27

100,00

São José Operário

57,14

42,86

100,00

Parque Royal

85,71

14,29

100,00

Vila Caramuru

50,00

50,00

100,00

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

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Tabela 17 - Ocupação Profissional dos Compradores de Imóveis COMUNIDADE

Assalariado

Autônomo

total

Total

60,05

39,95

100,00

Borel

79,31

20,69

100,00

Matriz/Queto

60,00

40,00

100,00

Vila Campinho

67,14

32,86

100,00

Vila Joaniza

72,41

27,59

100,00

São José Operário

72,73

27,27

100,00

Parque Royal

76,00

24,00

100,00

Vila Caramuru

78,57

21,43

100,00

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Ao analisarmos o bairro do local de trabalho dos participantes do mercado informal, temos que em sua maioria eles trabalham e/ou tem o seu rendimento principal próximo ao local de moradia. Em pesquisa sobre o funcionamento do mercado imobiliário formal da cidade do Rio de Janeiro verificamos que 40% dos entrevistados tem o seu local de trabalho localizado no centro da cidade (Abramo, 2006).

5. Funcionamento do Mercado Imobiliário

Em relação ao funcionamento do mercado imobiliário propriamente dito, um primeiro dado interessante diz respeito ao financiamento da aquisição de imóveis informais nas favelas. Em relação a pesquisas anteriores notamos um crescimento do percentual de imóveis comprados com financiamento informal. Nesse caso temos que em 61,3% das transações de compra é realizada a vista, mas em 38,7% das transações encontramos um mecanismo de financiamento que em geral assume a forma de parcelamento do valor acordado entre o vendedor e comprador. Comparando estes dados com os resultados de pesquisas de anos anteriores onde apenas em 16% das compras tínhamos alguma forma de financiamento e em algumas comunidades não identificamos transações financiadas pelo vendedor, podemos dizer que há uma

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tendência de crescimento de um financiamento informal onde o vendedor se dispõe a parcelar o valor da transação. Em relação a esse fenômeno de financiamento informal podemos aventar duas hipóteses: o alto valor dos imóveis e a diminuição da capacidade de poupança das famílias. A utilização de um mecanismo de troca por bens ou permuta entre imóveis com compensações monetárias as informações dessa pesquisa e de outras que realizamos revelam que esse tipo de forma de aquisição nas favelas não tem peso relevante. O parcelamento como forma informal de financiamento não é novo, mas o seu peso no mercado informal de comercialização nas favelas sempre foi pouco relevante em nossas pesquisas anteriores predominando o pagamento à vista. No mercado informal de loteamentos irregulares e/ou clandestinos a pratica do financiamento informal com o parcelamento do valor do lote é muito usual e estabelece uma forma institucional particular do sub-mercado de loteamentos informais onde o agente loteador assume uma centralidade institucional mais importante do que no mercado informal de favelas (Abramo, 2013). A utilização do mecanismo de parcelamento na comercialização imobiliária em favelas altera a forma institucional de funcionamento desse mercado com a utilização de registro de promessas de compra e venda com pagamento em parcelas registradas seja na Associação de moradores, seja em cartórios. Quanto à origem dos recursos utilizados na compra do imóvel, predominam a venda de outro imóvel (32%), empréstimos de parentes (34%) e poupança familiar (20%). Nas favelas onde não temos violência, cresce a importância do empréstimo de parentes, revelando que aqui há um esforço familiar mobilizando a sua rede de parentesco para a aquisição do imóvel. A indenização trabalhista (incluindo Fundo de Garantia) responde por apenas 3,6% da poupança para a aquisição de uma casa nas favelas. Em relação aos estudos anteriores que realizamos na ultima década (Abramo, 2002, 2006, 2009) os resultados sobre a origem dos recursos utilizados vem nos revelando um outro fenômeno novo no mercado informal de favelas. Em 2002 a venda de imóveis como origem de recursos para a aquisição é praticamente desprezível e a utilização de recursos próprios de poupança familiar e/ou empréstimos parentais e de amigos representavam mais de 70% da origem dos recursos de aquisição imobiliária 23


nas favelas. O resultado de praticamente 1/3 dos imóveis terem a venda como origem dos recursos necessários aquisição é reveladora do amadurecimento e amplificação mercantil do mercado informal nas favelas onde a dinâmica de funcionamento do mercado secundário se alimenta de uma cadeia de transações. Essa cadeia de transações imobiliárias informais como parte integrante e estrutural do mercado informal não é nova como nos revelam os dados da forma de ocupação dos imóveis disponíveis a venda onde em sua maioria foram adquiridos por uma transação de compra. Mas o elemento novo é a utilização dos recursos da venda de um imóvel para adquirir um bem imobiliário na favela. Em outras palavras o mercado informal nas favelas está entrando em uma fase mais madura de funcionamento em termos de dinâmica auto-reprodutiva (Abramo, 2013 e Abramo e Pulici, 2013).

Tabela 18 – Recursos utilizados na compra dos imóveis 100,00 90,00 80,00 70,00 60,00 50,00 40,00 30,00 20,00 10,00 0,00

EMPRÉSTIMO DE PARENTES/AMIGOS

POUPANÇA VENDA IMÓVEL

INDENIZAÇÃO TRABALHISTA TROCA

OUTROS S/INFORM

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

No intuito de avaliarmos o caráter concorrencial e de formação dos preços no mercado informal nas favelas realizarmos a seguinte pergunta: ‘o comprador fechou o negócio pelo valor pedido’. Os resultados são reveladores, pois temos que em 85% dos casos não houve negociação de preços, chegando até quase 100% nas comunidades Vila Joaniza e Vila Campinho. Provavelmente esse resultado se deve ao fato que estas

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comunidades apresentam um grau de consolidação acentuado, com muitos serviços, e sobretudo pouca possibilidade de construção de imóveis novos para comercialização (oferta inelástica) dando maior poder de barganha aos vendedores de imóveis nestas comunidades. Em outras palavras o caráter de um mercado racionado se manifesta de forma clara no mercado imobiliário informal nas favelas (Abramo, 2013) e a eventual concorrência da oferta residencial do Programa Minha Casa, Minha Vida não parece diminuir esta característica de oferta racionada do mercado informal nas favelas.

Tabela 19 – Fechou a transação com o valor pedido?

Total Vila Caramuru Parque Royal S.J.Operário

SIM

Vila Joaniza

NÃO

Vila Campinho Matriz/Queto borel 0,00

20,00

40,00

60,00

80,00

100,00

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Do total de entrevistados, 70% dos compradores de imóveis obtiveram a informação do imóvel adquirido através de amigos/parentes, podendo este valor chegar a 82% nas comunidades do Vila Caramuru e Vila Campinho. Em nossos trabalhos anteriores encontramos dados semelhantes reafirmando o que já tínhamos caracterizado como uma forte assimetria informacional no mercado informal nas favelas (Abramo, 2013). Sobre essa característica de assimetria informacional os fatores de atratividade de proximidade, em particular as redes parentais e sociais tem um papel determinante e se auto-reforçam pela via do mercado informal. Tabela 20 – Como obteve a informação do imóvel comprado 25


90,00 80,00 70,00 60,00 50,00 40,00 30,00 20,00 10,00 0,00

AMIGOS /

PARENTES

ASSOCIAÇÃO MORADORES JORNAL CORRETOR PLACA PORTA A PORTA

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Notamos que a Associação de Moradores ainda desempenha um papel importante nestas transações, não somente servindo de local de busca de informações sobre os imóveis alugados, bem como servindo de papel mediador destas transações, como podemos ver abaixo no recibo de compra e venda de um imóvel na comunidade de Parque Royal. Figura 1- Recibo de transação na comunidade de parque Royal

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

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O caráter informacional do mercado em favelas revela que há uma mediação informacional de parentes e amigos para ter acesso a oferta imobiliária. Em termos de caracterização informacional do mercado informal vemos que há uma opacidade informacional que alimenta uma cadeia de transações imobiliárias que buscam a proximidade parental e/ou de amigos como fator de atração residencial. Essa característica do mercado informal e da mobilidade residencial em favela deve estar presente nas discussões sobre a oferta pública de moradias para os setores populares. No sentido de avaliar os critérios de racionalidade e sobretudo de consistência das decisões de aquisição de um imóvel na favela realizamos uma simulação de opção de compra de um outro imóvel com valores semelhantes ao adquirido. Nessa simulação a opção mais assinalada em praticamente todas as favelas estudadas é a “continua no imóvel adquirido” com uma porcentagem variando entre 61,50% a 95,00%. As outras opções eram a de um apartamento formal na zona central da cidade com metragem quadrada inferior ou uma casa formal em bairro periférico com área construída superior. Essas duas opções da nossa simulação objetivam traduzir os critérios tradicionais da economia urbana de um trade off entre consumo de espaço e acessibilidade (Fujita, 1989 e Glaser, 2008). Todas as opções tinham um valor similar ao preço do imóvel recém adquirido na favela. Em outras palavras, a maioria dos entrevistados prefere adquirir o mesmo imóvel na favela, do que ir para um apartamento formal. A segunda opção mais citada foi a de um “imóvel em outra comunidade, com maiores opções de lazer e serviço”. Esta opção tem porcentagens que variam entre 5,00% a 18,10% nas favelas pesquisadas.

Tabela 21 – Simulação de outra opção de compra Imovel em Casa maior em outra Continuaria Bangu/Campo comunidade, optando pelo Grande com com melhores Quitinete imovel Favelas escritura opcoes área central adquirido Total borel 6,00 18,00 9,00 67,00 100,00 Matriz/Queto 3,00 10,00 18,00 69,00 100,00 Vila Campinho 12,00 10,50 13,20 64,30 100,00 Vila Joaniza 8,00 19,00 8,60 64,40 100,00 S.J.Operario 0,00 5,00 0,00 95,00 100,00

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Parque Royal 2,00 6,00 7,00 Vila Caramuru 10,40 18,10 10,00 Total 5,91 12,37 9,40 Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

85,00 61,50 72,31

100,00 100,00 100,00

O resultado dessa simulação é revelador da atratividade do mercado informal nas favelas e coloca de forma evidente a necessidade de formular políticas de formalização do mercado informal nas favelas e refletir sobre os atuais programas de provisão de moradia para os estratos populares.

6. Uma primeira aproximação dos fatores determinantes do preço no mercado informal

Em relação a formação dos preços dos imóveis à venda, temos que a maioria das respostas foi de que o preço está baseado nos preços dos imóveis do entorno das favelas, principalmente nas comunidades Vila Caramuru (92%) e Vila Joaniza (94%), seguidas de Parque Royal, São José Operário e Matriz/Queto com cerca de 70%. Nas comunidades do Borel este valor cai para 38% e em Vila Campinho para 54%, predominando nestas comunidades a opção de que o valor do imóvel está relacionado com gastos e obras realizados. A dimensão paradoxal dessas respostas está no fato que o gradiente de preços do mercado informal não acompanha o gradiente dos preços do mercado formal revelando que a referência dos preços dos bairros formais não se constitui no elemento determinante da formação de preços do mercado informal. No sentido de refletir sobre esse paradoxo estamos convencidos que no mercado informal intervêm um conjunto de fatores específicos da territorialidade e da sociabilidade da favela que se transformam em atributos e externalidades positivas no mercado informal. Dentre esses atributos identificamos duas externalidades do mercado informal que interferem de forma positiva na formação dos preços desse mercado (Abramo, 2009). A primeira dessas externalidades positivas vamos chamar de “externalidade de liberdade urbanística e construtiva”. Essa liberdade permite uma liberdade na mudança da intensidade do uso do solo com a eventual edificação de novos andares e/ou o

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fracionamento do lote. Com isso a aquisição de um imóvel na favela se transforma em um valor a futuro, pois ele pode crescer em área construída sem as restrições das normativas urbanísticas. O vendedor sabe dessa potencialidade e a transforma em uma externalidade positiva e antecipa o eventual uso futuro aumentando o valor do solo. A segunda externalidade positiva característica do mercado informal nas favelas vamos denominar de “externalidade comunitária”. Essa externalidade é a manifestação em bens e serviços das redes de economias de reciprocidade e redes sociais de auto-ajuda coletiva que permite o acesso a bens e serviços sem um desembolso monetário. O exemplo clássico “de hoje eu tomo conta do filho da minha vizinha para que ela vá trabalhar e no fim de semana o marido dela me ajuda a levantar o muro do meu quartinho” é uma das inúmeras formas dessa relação se manifestar. De fato, essa dinâmica de reciprocidades permite o acesso a serviços de creche para a primeira pessoa e de um pedreiro para a segunda pessoa sem que nenhuma delas tenha que entrar em uma relação mercantil fazendo uso da intermediação monetária. Na dinâmica de reciprocidades o elemento que garante o dar e o receber em seguida (Dom e Contra-Dom) são as relações de confiança e de lealdade que essas duas pessoas estabelecem entre si e que garante a continuidade de uma relação contratual não-monetária (Pelligra, 2007; Bruni e Zamagni, 2004). Mas para entrar nessa verdadeira economia de reciprocidades a condição indispensável é a de morar na favela. Assim, o vendedor de um imóvel na favela sabe que ao vender o seu imóvel ele também estaria vendendo uma eventual participação em uma rede de economia de reciprocidades e neste sentido ele incorpora no preço do seu imóvel essa externalidade positiva (Abramo, 2009). Assim, o mercado informal valora certos atributos que não estão presentes no mercado formal e ao valora-los incorpora novos elementos de formação dos preços que promove diferenciações dos preços informais que não estão presentes no gradiente de preços do mercado formal. Ao serem perguntados sobre a forma de ocupação do imóvel das famílias que estão vendendo esse imóvel, a resposta mais observada foi da compra do imóvel. Desvelando que o mercado informal de comercialização não é um fenômeno recente. A exceção a essa constante foram as favelas Campinho onde 28% da forma original de 29


ocupação dos proprietários dos imóveis disponíveis a venda foi a invasão e Matriz/Queto onde a invasão corresponde a 20% do acesso original ao solo. Em São José Operário e em Vila Caramuru cerca de 5,5% de vendedores haviam comprado o lote como forma original de acesso a favela. Um resultado Interessante e contraintuitivo é o pequeno percentual da opção de herança que somente em Vila Campinho e Vila Joaniza representa cerca de 20% do acesso a favela dos vendedores de imóveis .

Tabela 22 – Forma de acesso a favela dos imóveis ofertados

COMUNIDADE

borel Matriz/Queto Vila Campinho Vila Joaniza S.J.Operario Parque Royal Vila Caramuru Total

COMPROU COMPROU HABITAÇÃO COMPROU COMPROU O LOTE PRECARIA CASA A LAJE OCUPOU HERANÇA DOAÇÃO TROCA REASSENTAMENTO Total

0,00 0,00

13,79 20,00

72,41 60,00

0,00 3,45 0,00 20,00

0,00 0,00 6,67 0,00

0,00 0,00 0,00 0,00

14,29 66,67 73,33 83,33

0,00 28,57 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

5,00 1,67

10,00 6,26

75,00 63,58

0,00 0,00

0,00 7,43

0,00 0,00

3,45 3,45 0,00 0,00

3,45 100,00 0,00 100,00

28,57 14,29 14,29 11,11 22,22 0,00 0,00 6,67 13,33 0,00 0,00 16,67

0,00 100,00 0,00 100,00 0,00 100,00 0,00 100,00

0,00 5,67

5,00 5,00 7,37 7,53

0,00 100,00 0,49 100,00

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Em relação as características da oferta de imóveis do mercado informal em algumas favelas pesquisadas. a Associação de Moradores assume um papel de mediação no mercado. A participação das Associações de moradores como intermediária das transações nas comunidades de Vila Campinho foi de 28%, Matrz/Queto de 21%, Vila Joaniza de 14% e Parque Royal 10%. Um fator interessante e que poderia explicar o papel mediador das associações é o fato destas comunidades serem as consideradas como as mais violentas desta pesquisa, necessitando de um ente que garanta a legitimidade da transação de venda em um clima de insegurança promovido pela violência. Esses resultados nos revelam que a existência de imobiliárias nestas comunidades ainda é praticamente inexistente e somente em algumas favelas (Parque Royal e Borel) temos a sua tímida presença.

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De fato e os nossos resultados são reveladores dessa realidade o funcionamento do mercado informal em favelas, todavia não está mediado por agentes mercantis profissionais como as imobiliárias, porém em alguns casos encontramos a figura do que podemos denominar de um “corretor comunitário” na favela e que coincidentemente este “corretor” informal participou durante muitos anos das associações de moradores locais (como é o caso do Sr. Carlos em Parque Royal e o Sr. Edvaldo na favela do Borel). Porem e como vimos em nossos resultados a maior parte das transações ocorrem diretamente entre as famílias vendedoras e as famílias compradoras sem a presença de um agente intermediário. Ainda em relação a oferta de imóveis, podemos ver na tabela 20 que segundo os vendedores o fator preço do imóvel/falta de recursos das famílias são os principais motivos que dificultam a concretização das vendas. Nas comunidades de Matriz/Queto e Vila Joaniza a questão da violência também aparece como um dos motivos para os imóveis não terem sido vendidos (10%). Nesse sentido, o mercado informal não se diferencia de forma significativa do comportamento do mercado formal, pois o grau de violência é um fator importante na liquidez do mercado imobiliário seja ele formal ou seja informal.

Tabela 23 - Motivos pelos quais os imóveis ainda não foram vendidos.

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

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Em relação ao gradiente preços do mercado informal nas favelas o valor médio de compra de um imóvel de 2 quartos nas favelas pesquisadas foi R$ 43.200,00. Esse preço varia bastante entre as comunidades e podemos encontrar valores desde R$ 15.580,00 (Vila Caramuru) até R$ 68.500,00 (Borel). Em relação ao preço de venda (oferta), como esperado este valor é superior ao valor médio das transações efetivamente realizadas (compra), mas ele guarda uma proporção razoável com os preços praticados revelando um comportamento racional do funcionamento da oferta imobiliaria nas favelas. Tabela 24 – Preços médios de oferta de imóvel de 2 quartos(Reais)

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ. Tabela 25 – Preços médios de comercialização de imóvel de 2 quartos (Reais)

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Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ. Convertendo os preços em salários mínimos vemos que os valores praticados no mercado informal são relativamente elevados quando comparamos o perfil de rendimento da demanda de comercialização e sobretudo da demanda de locação. Em praticamente todas as favelas o valor médio do aluguel de uma residência de 2 quartos supera o valor de um salário mínimo. Quando comparamos esses valores com os valores de locação dos bairros formais próximos das favelas pesquisadas que os preços do formal são superiores, mas a relação entre o valor médio do aluguel e o rendimento do chefe de família é muito superior na favela do que no bairro formal revelando que o preço relativo do aluguel em relação o rendimento do chefe maior na favela do que nos domicílios formais da sua proximidade. Levando em consideração as características do produto imobiliário, formalização e características da urbanização dos bairros formais em relação aos imóveis do mercado informal nas favelas poderíamos esperar uma diferença entre os preços de locação no mercado formal e informal muito superior a que encontramos na pesquisa realizada nas favelas indicadas na tabela 26 abaixo. Em relação aos atributos tradicionais que definem os preços do mercado formal, os domicílios em favelas deveriam ter um preço de locação inferior aos que encontramos na pesquisa. Essa conclusão nos leva a reafirmar a nossa hipótese da existência de externalidades positivas (liberdade construtiva e economias de reciprocidade) presentes no mercado informal das favelas que se manifestam monetariamente nos preços deste mercado

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valorizando esses imóveis em relação aos atributos tradicionais de formação de preços imobiliários.

Tabela 26 – Preços médios de comercialização imóvel de 2 quartos em Salário Mínimo

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ

Tabela 27 – Preços médios de locação imóvel de 2 quartos em Salário Mínimo

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ

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Quando cruzamos os preços de compra/venda com ocupação profissional, observamos que na média, os assalariados compram imóveis mais caros que os autônomos e em contrapartida, os vende mais baratos. Esse fato curioso pode revelar uma desarticulação intertemporal entre a mobilidade social e a mobilidade residencial de algumas famílias e o desejo de recuperar uma posição superior na escala socioterritorial da hierarquia da mobilidade residencial. Também quando tabulamos os valores transacionados dos imóveis por gênero dos compradores/vendedores, vemos que as mulheres tendem a comprar a valores mais baixos e a vender a valores mais altos. Podemos levantar a hipótese que a inserção das mulheres nas redes de solidariedade nas comunidades é mais importante o do que a verificada pelo chefes de família do sexo masculino e por esse motivo elas tendem a valorar mais os seus imóveis no mercado de oferta imobiliária na favela.

7. Preferências locacionais A literatura sobre mobilidade residencial dá uma particular importância a caracterização das preferências locacionais das famílias quando do momento da sua decisão de onde residir (acessibilidade) e as características do imóvel (grau de urbanização, metragem, qualidade da edificação, etc.). No caso do mercado informal a decisão de morar em favela é vista pelo senso comum como uma “não decisão”, isto é morar em favela seria a única e última opção dessas famílias. Ao estudar a mobilidade residencial nas favelas verificamos que em muitos casos, em particular na mobilidade residencial operada pelo mecanismo do mercado informal, as famílias tomam uma decisão de morar em favela seguindo uma lógica de otimização familiar. A tabela 21 que apresentamos anteriormente sobre a simulação de decisão de localização residencial com opções de morar em bairros formais da cidade a preços similares aos praticados no mercado informal das favelas é definitiva, pois a maioria dos entrevistados prefere a opção de morar na favela. Mas podemos levantar a hipótese que essa decisão de preferência em morar na favela seria um ato irracional destas famílias e portanto não poderia ser considerada como uma decisão familiar que maximizasse o bem-estar ou a sua satisfação familiar segundo os critérios da teoria

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econômica e da teoria convencional de políticas publicas (critério de ótimo de Pareto ou decisão eficiente de Simon). Nesse sentido vamos apresentar o ranking dos “motivos de atração” que levaram as famílias a decidirem a comprar um imóvel na favela e o ranking dos “fatores de repulsão” que levam as famílias a colocarem a venda os seus imóveis. Como vamos ver abaixo, as famílias que decidem comprar imóveis nas favelas tem uma racionalidade bem definida em relação as suas escolhas de aquisição residencial. Essa racionalidade pode ser identificada por uma estratégia de otimização do tempo e recursos familiares vinculados a proximidade de localização residencial que nos conduz a particularidade da forma de reprodução da vida urbana dos setores populares nas grandes metrópoles brasileiras e latino-americanas1.

Tabela 28 – Ranking dos motivos dos compradores

Motivos de atração – Entrada no imóvel Motivos 1 2 19,42 19,32 Proximidade parentes 17,48 5,68 Já morou na comunidade 13,59 9,09 Proximidade trabalho 13,59 6,82 Sair do Aluguel 7,77 1,14 Tamanho domicílio 6,80 1,14 Casamento 5,83 9,09 Proximidade amigos 3,88 14,77 Gosta do bairro 2,91 7,95 Facilidade transporte 1,94 5,68 Valor do domicílio 1,94 2,27 Propriedade 1,94 1,14 Tem melhor condição social 0,97 3,41 Fugir da violência 0,97 2,27 Valorização do domicílio 0,97 1,14 Acesso escola 0,00 3,41 Acesso hospital 0,00 2,27 Proximidade comercio e serviços 0,00 2,27 Programa urbanização 0,00 1,14 Redução dos gastos (taxas) 1

3 11,29 11,29 3,23 6,45 4,84 6,45 11,29 8,06 6,45 3,23 1,61 8,06 1,61 1,61 0,00 6,45 6,45 0,00 1,61

Para uma discussão sobre esse tema, ver Abramo, 2009 e Abramo, 2013.

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0,00 0,00 Programa regularização 100,00 100,00 Total Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

Tabela 29 – Ranking dos motivos dos vendedores Motivos de repulsão – Saída do imóvel Motivos 1 2 35,16 22,06 Fugir da violência 11,53 11,27 Tamanho do domicílio 11,53 9,80 Distância dos parentes 10,95 6,37 Não gosta do bairro 6,92 5,88 Voltar para a cidade de origem 4,61 9,31 Tem melhor condição social 4,03 9,31 Desvalorização do domicílio 2,88 1,96 Distância ao trabalho 2,59 7,84 Já morou na comunidade 2,02 3,43 Precariedade comércio/ serviço 1,44 3,43 Inexistência prog. urbanização 1,44 0,98 Valor do domicílio 1,44 0,00 Falta transporte 1,15 1,47 Inexistência de escola/ posto de saúde 0,86 0,98 Inexistência prog. regularização 0,58 5,39 Distância dos amigos 0,58 0,49 Casamento 0,29 0,00 Sair do aluguel 100,00 100,00 Total Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

0,00 100,00

3 10,79 2,88 13,67 12,95 5,76 7,19 15,11 2,88 5,76 5,76 2,88 2,16 0,72 2,88 2,16 6,47 0,00 0,00 100,00

Como podemos nas duas tabelas 28 e 29 sobre as preferências residenciais nas favelas, a proximidade dos parentes (19,4%) é o principal motivo de atração (atributo) valorado pelas famílias na sua decisão de aquisição de uma residencia nas favelas. Chamamos a atenção para os percentuais do segundo motivo do ranking (“já morou na comunidade”) que tem 17,4% das preferências e do motivo (“proximidade dos amigos”) com 5,8% das indicações. Esses três motivos de atração residencial perfazem um total de 42,6% das preferências famíliares e revelam de forma clara que estas famílias ao decidirem morar em favela buscam manter ou estabelecer redes de solidariedade e de confiança mútua que viabilize uma forma de reprodução da vida popular onde as reciprocidades de ajudas inter-parentais e entre amigos sejam um

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componente determinante para aumentar o seu bem-estar familiar. Aqui está a racionalidade das decisões das famílias populares em morar nas favelas e para tal pagar valores relativamente elevados para aquisição ou locação de uma casa informal é justificado pelo”ganho de proximidade” (Abramo, 2013) do fato de morar em favela . Podemos dizer que essa não seria a racionalidade instrumental normalmente utilizada nos estudos de economia urbana, mas é a racionalidade da inteligência popular nas suas estratégias de reprodução familiar nas grandes metrópoles (Abramo, 2013). Em relação aos motivos de repulsão da comunidade revelados por aqueles que desejam vender as suas casas, temos o motivo de “fugir da violência” (35,1%) como a motivação de mudança destas áreas, seguidos de tamanho do domicílio (11,5%) e distância dos parentes (11,5%). Aqui encontramos uma racionalidade mais tradicional e conforme o esperado pelo senso comum onde a externalidade negativa violência tem um peso importante nas decisões de mobilidade residencial. Porém é interessante notar que o terceiro motivo do ranking é um fator de busca de proximidade parental que reafirma o que dizemos no paragrafo anterior sobre a racionalidade popular em suas escolhas locacionais.

8. Mobilidade Residencial Os estudos sobre a mobilidade residencial utilizam frequentemente uma matriz de origem e destino para identificar os fluxos de mudança domiciliar segundo a sua localização. No caso da cidade do Rio de Janeiro construímos uma matriz de origem e destino da mobilidade residencial promovida pelo mercado formal e verificamos que mais da metade dos fluxos de origem e destino na mudança residencial se realiza intra bairro (Abramo, 2003). No estudo sobre a mobilidade residencial no mercado informal encontramos um resultado muito similar aos resultados do mercado formal. Nas favelas do Rio de janeiro que estudamos para esse trabalho 66% dos compradores de imóveis em favelas moravam na própria favela, ou seja o fluxo mais importante da mobilidade residencial do mercado informal é intra-favela. Quando identificamos na tabela 30 a localização da mudança domiciliar (origem e destino) em cada uma das favelas pesquisadas vemos que em 50% destas favelas 75% dos compradores viviam na

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própria comunidade. O resultado é definitivo: o fluxo de mobilidade residencial na comercialização informal é intra-favela, Isto é a origem dos moradores que estão comprando casa na favela é a mesma favela.

Tabela 30 – Mobilidade residencial: localização de origem dos compradores de imóveis - 2012

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

O senso comum sobre o desejo dos moradores de favelas deixarem as suas comunidades também é colocado em questão a partir dos resultados da nossa pesquisa que evidencia que a proporção daqueles que estão vendendo os seus imóveis e continuar residindo na própria comunidade é alta. Na média das comunidades pesquisadas 49% das famílias que estão vendendo as suas residências desejam permanecer na mesma favela. A segunda opção de moradia futura é uma mudança residencial para uma outra cidade que se aproxima de 20% do total das respostas. Na Comunidade de São José Operário se somarmos a opção “outra comunidade” este percentual chega ao impressionante percentual de 85%.

Tabela 31 – Mobilidade residencial: intenção de destino dos vendedores de imóveis 2012

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Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ. Também segundo os nossos dados podemos observar que as respostas por gênero para a pergunta: “para onde vai após a venda ?” revelam que as mulheres têm maior intenção de ficar na mesma favela vis-`a-vis os homens sugerindo que realmente para elas os laços comunitários e de vizinhança têm uma grande importância nas suas escolhas de localização residencial.

9. Rotatividade do estoque residencial nas favelas

Uma variável importante no estudo do mercado imobiliário é o volume das transações em relação ao numero de domicílios de cada área urbana. O indicador utilizado na literatura é o de rotatividade do estoque que indica a porcentagem de imóveis transacionados em relação ao total de domicílios existentes. A ordem de grandeza da rotatividade do estoque imobiliário é o melhor termômetro para avaliar o nível de atividade deste mercado sugerindo se ele muito ativo (aquecido) ou com poucas atividade (desaquecido) em relação a outras áreas da cidade. Nesse sentido a rotatividade do estoque é uma variável que permite a comparação do nível de atividade do mercado imobiliário em termos comparativos entre cidades e inter e bairros. O indicador de rotatividade ao estabelecer o percentual de famílias que estão deixando e entrando nos bairros também revela a velocidade das eventuais

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transformações sócio-econômicas e demográficas operadas pelo mecanismo de mercado seja pela via da comercialização, seja pela via da locação. Nesse sentido avaliar a rotatividade do estoque imobiliário nas favelas operado pelo mercado informal tem um duplo objetivo. O primeiro é o de estabelecer o nível de atividade do mercado informal. O segundo avaliar o potencialidade de mudanças possíveis no perfil social das favelas. Na tabela 32 podemos verificar que a rotatividade do estoque residencial motivada por transações de comercialização e locação em relação ao estoque residencial nas favelas pesquisadas não apresenta o mesmo valor revelando que em termos relativos a atividade do mercado informal esta mais ativa em algumas favelas do que em outras. A favela que apresenta o menor nível de atividade imobiliária em relação ao seu estoque domiciliar é Vila Joaniza com uma rotatividade de 1,7%, enquanto as favelas que apresentam a maior taxa de rotatividade são São José Operário com 5,74% e Parque Royal com uma rotatividade de 5,43%. Das favelas pesquisadas apenas Vila Joaniza tem uma rotatividade inferior a 2% e a maioria delas apresenta uma taxa superior a que calculamos para a cidade do Rio de Janeiro (3,85%) no ano de 20122 que pode ser classificado como um ano excepcional de boom do mercado imobiliário formal.

Tabela 32 –Rotatividade do estoque domiciliar –comercialização + locação - 2012 COMUNIDADE

ROTATIVIDADE

borel

3,81

matriz/queto

2,10

vila campinho

4,83

vila joaniza

1,67

s.j.operario

5,74

parque royal

5,43

2

A txa de rotatividade do mercado formal se restringe às transações de comercialização e foi calculada a partir das guias de ITBI pagas sobre o total de unidades cadastradas (fonte: Secretaria de Finanças e Fazenda do Município do Rio de Janeiro).

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vila caramuru

5,02

Fonte dos Dados: Abramo, 2012. BID/OIPSOLO/IPPUR/UFRJ.

A elevada taxa de rotatividade encontrada na maioria das favelas pesquisadas revela a importância do mercado imobiliário informal nas favelas da cidade do Rio de Janeiro e confirma a nossa hipótese que esse mercado é hoje um elemento estrutural do acesso dos setores populares a moradia. Nossas pesquisas em outras favelas revelam taxas de rotatividade superiores as que encontramos nas favelas pesquisadas para esse trabalho evidenciando que nível de atividade do mercado imobiliário informal nas favelas é comparável e em muitos casos superior ao do mercado formal. Da mesma forma que o mercado imobiliário formal o nível de atividade do mercado imobiliário informal se diferencia espacialmente indicando uma gradação da sua intensidade segundo a localização das favelas.

10. Algumas considerações finais

Os resultados que apresentamos ao longo desse relatório sobre o mercado informal e a mobilidade residencial nas favelas pesquisadas nos revelam que devemos ter dúvidas em relação a alguns mitos e o senso comum sobre as formas de acesso ao domicilio nas favelas do Rio de janeiro. O primeiro diz respeito ao mercado de comercialização e locação informal nas favelas. Os nossos resultados são contundentes em relação a sua existência e importância como forma de acesso as favelas consolidadas. O mercado informal não é um mercado ocasional de compra e venda de imóveis, ele apresenta uma regularidade de transações de comercialização e locação que o define como um verdadeiro mercado que funciona segunda regras e normas implícitas e o difere do mercado imobiliário formal. Ademais o sub-mercado informal em assentamentos consolidados tem uma estrutura de mercado caracterizada por uma relativa pulverização da oferta e da demanda ainda que a capacidade de resposta da oferta seja relativamente inelástica no mercado de comercialização. Ele também apresenta uma forte

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rotatividade do estoque e em muitas situações a taxa de rotatividade é superior ao próprio mercado formal. Em razão da redução e/ou dificuldades crescentes de processos de ocupação (invasão) de novas áreas urbanas peri-urbanas o mercado informal tende a se transformar na principal porta de entrada nos assentamentos consolidados. Em outras palavras, o mercado informal tende a ganhar importância como mecanismo de acesso às favelas e de promoção do processo de intensificação do uso do solo com as suas consequências de aumento de densidade (populacional e predial) e verticalização (Abramo, 2009). Outro mito que procuramos relativizar é o mito da residência na favela ser uma “não escolha”, “a última saída” para a moradia popular e como conseqüência uma relativa rejeição popular ao habitat da favela. Ao longo do relatório procuramos apresentar alguns dados que demonstram a preferência de muitas famílias em residir em favelas e a suas estratégias e racionalidades de escolher viver no habitat das favelas como melhor opção para a reprodução da vida popular. Essas famílias valorizam a vida nas comunidades de favela onde fatores como a proximidade de parentes e redes sociais permitem o acesso a economias de reciprocidade de dom e contra-dom que muitas vezes dá acesso gratuito a bens e serviços que, de outra forma, seriam pagos com a renda familiar. Outro fator valorado pelas famílias em suas escolhas em residir em favelas é a de desfrutar de uma “liberdade urbanística e construtiva” que permite certa plasticidade para adequar o tamanho do imóvel às mudanças na composição demográfica (estrutura familiar e parental) e/ou utilizar a casa ou o lote como uma forma de complemento do rendimento familiar participando do mercado de locação informal. Os dados sobre a mobilidade intra-favela são reveladores da preferência de muitas famílias em permanecer nas favelas. Um resultado importante e que deve ser monitorado de forma atenta diz respeito ao crescimento do mercado de locação informal nas favelas. No caso do Rio de Janeiro a participação do mercado de locação dobrou de 2002 a 2006 e em 2009 a locação se consolida como o sub-mercado mais importante em termos percentuais superando o sub-mercado de comercialização informal. Os dados encontrados na

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pesquisa de 2012 ratificam essa importância e a continuidade do seu crescimento representando mais da metade das transações do mercado informal nas favelas. A explicação do crescimento do mercado informal de locação nas favelas articula um conjunto de variáveis e certamente é um dos temas mais importantes para a agenda futura das políticas urbanas que desejam promover uma cidade mais democrática e sustentável. Do ponto de vista das informações que sistematizamos sobre o mercado informal destacamos dois elementos que poderiam compor um mosaico de argumentos que explicam o seu crescimento. O primeiro elemento é a relativa atratividade do “morar favela” para os setores populares que fizemos referencia acima, mas que paradoxalmente promovem um crescimento dos seus preços de comercialização. Nesse sentido a locação informal se transforma em uma segunda porta de entrada nas favelas. A pressão de demanda no mercado de locação resultante do aluguel se transformar na porta de entrada na favela também eleva os seus preços e assim estimula a oferta de imóveis para alugar. Mas contrariando o senso comum da teoria do ajuste do mercado até o momento o crescimento da oferta de locação informal não promoveu uma tendência de queda nos seus preços. Essa rigidez do piso dos preços de aluguel nos conduz a um segundo elemento para o seu crescimento que é a sua alta rentabilidade. Como podemos ver na tabela 7 que estima a rentabilidade da locação informal nas favelas a partir da sua relação com os valores médios de comercialização do mercado informal nas mesmas favelas as taxas são impressionante altas quando comparadas a que encontramos no mercado formal. Em todas as favelas pesquisadas a taxa de rentabilidade media é superior a 1,2% do valor de comercialização chegando a 1.56% na favela do Borel. Um bom indicador para avaliar a forte rentabilidade do mercado de locação informal nas favelas é ter como referencia a taxa de rentabilidade de 0,5% no mercado formal consensualmente avaliada como muito alta e praticamente o teto da rentabilidade da locação formal. No caso da favela do Borel essa taxa é 3 vezes superior e como podemos ver na tabela 7 a rentabilidade dos alugueis nessa favela guarda uma relação com as outras favelas que apresentam posições inferiores na hierarquia urbana da cidade do Rio de Janeiro.

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Os dados que levantamos sobre as características de habitabilidade dos imóveis no mercado de locação revelam uma precariedade habitacional e uma tendência de crescimento de moradias alugadas com baixo indicadores de habitabilidade com o predominância de imóveis de 1 cômodo sendo que o principal tipo de imóvel transacionado no sub-mercado de comercialização nas favelas é de 2 cômodos. Estamos convencidos que esse crescimento da precariedade domiciliar nas favelas deve ser objeto da preocupação do poder público e abre um debate sobre a necessidade de uma política pública de locação social. Por último esperamos que os resultados apresentados sirvam de subsidio para um debate sobre as políticas de provisão habitacional para os setores de baixa renda e que efetivamente leve em consideração que a reprodução da vida popular ao longo das últimas décadas no Brasil construiu uma cultura de produzir o habitat que se articula com as estratégias de reprodução familiar. Nesse sentido, refletir sobre uma política de provisão habitacional não deve se restringir a uma política de produção massiva de moradias, mas sobretudo pensar a moradia no marco da cultura popular urbana e das suas racionalidades e estratégias de viver, se reproduzir e se divertir.

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