artigo sobre mobilidade

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TEMA O espaço urbano e os seus utilizadores - consciencialização da existência de barreiras físicas na mobilidade urbana.

Isaías António Costa Carvalho Faculdade de Arquitectura e Artes - Universidade Lusíada Vila Nova de Famalicão 1


ÍNDICE:

Resumo Abstract Palavras-chave Introdução I – O peão e as barreiras fisicas – Onde existem e Porquê II – Ferramentas para melhor resolver III – Proposta de expansão em Vila Nova de Famalicão Conclusões Agradecimentos Referências Bibliográficas

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Resumo do Artigo:

No decorrer da unidade curricular Projecto 2, do 4º ano de arquitectura, da Faculdade de Arquitectura e Artes da Universidade Lusíada de Vila Nova de Famalicão, foi proposto o exercício de desenho de composição urbana para a Zona Nordeste da mesma cidade. Após uma análise abrangente ao nível da história, do enquadramento social, económico e populacional foi elaborado um diagnóstico donde são levantadas questões ao nível das barreiras físicas que estrangulam o crescimento da cidade, e a sua repercussão ao nível da mobilidade dos seus utilizadores. A proposta apresentada passa pela utilização de soluções ao nível do controlo e dimensionamento do espaço do peão e pela articulação entre a estrutura viária e a pedonal para que a interligação seja o menos brusca possível, com corredores verdes e quarteirões contínuos associados a locais de lazer e mobilidade não condicionada.

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Introdução: Este artigo visa apresentar uma refleção sobre a cidade ao nível do peão, os modos e formas de a desenhar, de pensar o espaço urbano dando real valor à existencia de barreiras fisicas e visuais na mobilidade urbana. Existe a necessidade de compreender a cidade como um todo, um organismo vivo, de forma a perceber as suas acções, transformações, evoluções, no contexto de espaço e tempo, deve também ter-se em consideração o seu passado histórico, as raízes culturais, hábitos e tradições de uma memória colectiva que caracteriza o local e o condiciona, com vista a um crescimento coerente. Mas para que esse crescimento seja sustentável é obrigatória uma tomada de consciencia das necessidade do mundo actual, dos valores e realidades que moldam o quotidiano dos diferentes tipos de utilizadores do espaço urbano. Desta forma a proposta passa então pela integração de transportes públicos adequados, associados a um conjunto de infra-estruturas de circulação pedonal (ruas, equipamentos, passeios, serviços e transportes públicos) dimensionadas e adaptadas para uma utilização facilitada e acessível a todos, demarcando pontos referenciais na cidade para uma matriz de estruturação urbana. Em conjunto com esta primeira fase, a solução procura encontrar um desenho e planeamento de território capaz de funcionar associado as características do terreno (inclinação, manchas arbóreas, drenagem dos solos, relações visuais, etc) , assim como relações com a estrutura viária existente.

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I - O peão e as barreiras fisicas – Onde existem e Porquê Para quem habita o espaço urbano é normal depararmo-nos com uma rua difícil de atravessar, um passeio estreito, um degrau, mobiliário urbano, obras, vegetação, veículos motorizados e não motorizados, semáforos, sinais informativos, comércio, entre muitos outros. São imensas as barreiras que compõem o espaço que é de todos. À partida, algumas destas situações não representam barreira visual ou qualquer tipo de entrave à mobilidade, todavia, nem sempre é assim, ou melhor ainda quase sempre não é assim. O que nos leva a pensar: O que poderá estar mal? De que forma podemos combater este problema? A cidade é um lugar de proximidades, de relações, de comunicação, que tem como um dos pilares a união de uma comunidade para o crescimento generalizado, mas esta proximidade é muitas vezes quebrada pelo não comprimento de leis , desde questões de mobilidades (construção em discordância com o regulamentado) passando por questões financeiras (lucro versus qualidade) , ambientais e sociais. “ A nossa cidade só fará sentido quando Todos a percorrermos livremente, cada um com as suas diferenças de capacidade de mobilidade. Mais do que condição Urbana é a Condição Humana que nos tem de mover na construção de um desenho de cidade mais compatível com os novos paradigmas das cidades democráticas.” ( Paula Teles,2006: 121)

Assim a cidade cresce e as suas estruturas, como ruas e passeios, mantêm as dimensões que aquando da sua realização visavam responder a um valor muito inferior de utilizadores. Desta forma estas mesmas estruturas tentam suportar as novas realidades urbanas, desde a disposição de equipamentos informativos,iluminação, estacionamentos, semaforos, sinaletica de transito, até a vegetação, o que tem vindo a provocar uma diminuição do espaço destinado à circulação pedonal e congestionamento de trafego automovel, ao ponto de nao serem respeitadas as medidas minimas exigidas. “ Uma primeira abordagem a esta temática permite constatar que as impossibilidades de percorrer livremente os espaços publicos,os edificios e os transportes, devem-se à conjugação de diversos factores, dos quais se destacam: o ambito restrito da legislação; o imcomprimento pontual da legislação em vigor; a morosidade na realização de intervenções para as questões de acessibilidade; a reduzida formação de tecnicos e profissionais; e, por ultimo, a reduzida sensibilizaçãodos politicos e da população em geral.” ( Paula Teles,2006: 24)

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II - Ferramentas para melhor resolver

A utilização do automóvel é, como sabemos, algo a que estamos acomodados, de tal forma que se torna por vezes absurdo o uso despropositado que lhe é dado, é no entanto um problema que poderá ser atenuado com a aplicação de alternativas viáveis ao quotidiano da actualidade. Passa então pela interligação de vários sectores administrativos das autarquias a possibilidade de desenvolver em conjunto acções onde problemas relacionados com planeamento urbanos, mobilidade, acção social, serviços públicos, acessibilidades, obras públicas, e muitos outros departamentos da cidade possam funcionar em conjunto e devidamente apoiados na informação que todos desenvolvem com um objectivo comum. “Cabe às autoridades promover a co-modalidade e redistribuir o espaço libertado pelas medidas de redução do congestionamento...“ “...Para promover a atractividade e segurança das deslocações a pé e de bicicleta, as autoridades locais e regionais devem fazer com que estes meios sejam totalmente integrados no desenvolvimento e acompanhamento das políticas de mobilidade urbana. O desenvolvimento de infraestruturas adequadas deve merecer mais atenção.”( Comissão das Comunidades Europieas, 2007: 6)

Nós, arquitectos, urbanistas, planeadores, pensadores de cidade e de tudo o que tem forma, somos a ferramenta que deve apresentar soluções para os problemas que o crescimento urbano apresenta, actualizando-o para as necessidades dos utilizadores da cidade contemporânea. “ARTIGO XIII. DIREITO AO TRANSPORTE PÚBLICO E MOBILIDADE URBANA 1 .As cidades garantem o direito a mobilidade e circulação na cidade através um sistema e transporte públicos acessíveis a todas as pessoas segundo um plano de deslocamento urbano e interurbano, e com base nos meios de transportes adequados as diferentes necessidades sociais ( de gênero, idade, incapacidade ) e ambientais, com preços adequados a renda dos cidadãos(ãs). Será estimulado o uso de veículos não contaminantes e reservando áreas aos pedestres de maneira permanente a certos momentos do dia. 2. As cidades promoverão a remoção de barreiras arquitetônicas para a implantação dos equipamentos necessários ao sistema de mobilidade e circulação e a adaptação de todas as edificações públicas ou de uso público, dos locais de trabalho, para garantir a acessibilidade das pessoas portadoras de necessidades especiais.” (Carta Mundial do Direito à Cidade)

Nós como utilizadores do espaço urbano somos parte dele, e como tal devemos ser considerados no planeamento, no desenho e no projecto como elemento fulcral em todo o processo, com todas a as nossas limitações e capacidades. “Os elementos móveis de uma cidade, especialmente as pessoas e as suas actividades, são tão importantes como as suas partes físicas e imóveis.” (Kevin Lynch, 2008: 9)

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III – Proposta de expansão em Vila Nova de Famalicão

Procuramos então encontrar soluções para um aumento de qualidade de vida, para que a cidade seja um espaço de mobilidade, de fluidez, proporcionado espaços dignos a quem se destinam, desde crianças a idosos, desportistas, trabalhadores, intelectuais, com maior ou menor capacidade física, com ou sem deficiência. A análise elaborada sobre a área de intervenção e a cidade de Vila Nova de Famalicão mostrou, entre outros, problemas ao nível do crescimento. Tanto por razões de planeamento, quer por barreiras físicas de grande envergadura, tais como a linha de caminhos-de-ferro e a nova Variante que contorna a cidade. O centro da cidade, característico de cidade típica que cresce agregado a uma estrada nacional (N14 – ligação Porto/Braga) devido ao comércio (feiras, trocas) ramificou-se nas laterais e mostra sinais de sobrecarga.

01- Evolução da cidade de Vila Nova de Famalicão

As ruas, nomeadamente a antiga N14, que rasga toda a cidade, já não consegue dar resposta às novas realidades (aumento parque automóvel, número de peões), deste modo o espaço público começa a ser pequeno e atrofiado.

03- Rua Adriano Pinto Basto, inicio sec. XX

02- Rua Adriano Pinto Basto, actualidade

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Constatamos também a existência de planos de crescimento, como é exemplo a proposta para o “Parque da Devesa”, que pretende unir a zona sul da cidade e a zona este do terreno proposto. Com a existencia de planos para contornar e quebrar as barreiras existentes, de forma a unir a cidade “antiga” e as zonas de expansão (terreno proposto) é vital ter em atenção os elementos caracterizadores desta zona da cidade.

04- Vista Aérea Zona de intervenção

05- Plano para o “Parque das Devesas”

O terreno fortemente caracterizado pelo seu aspecto híbrido é também “balizado” pela variante e pelas estradas nacionias N14 e N206 (Figura 04) permanecendo como uma ilha. Desta forma, é nossa intenção unificar as diferentes centralidades existentes. Propomos então ligar pontos importantes da cidade, tanto do centro como os existentes no terreno, exemplo disso é o tribunal, a biblioteca, o hospital, etc., através de uma estrutura de transportes públicos, como o metro de superfície ou eléctrico, associado a zonas de circulação pedonal, ciclovias e espaços verdes. Como referido anteriormente a antiga N14 rasga toda a cidade e está associada a muitos equipamentos (escolas, hospital, câmara, feira) é então aqui que recai a escolha para a linha do eléctrico, eliminando o acesso automóvel, privilegiando a circulação pedonal.

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Esta estrutura organiza-se por pontos-chave (paragens) e formam 3 linhas, uma no centro da cidade (N14), outra de ligação entre as duas zonas (passagem pedonal e do electrico sobre a Avenida) e uma terceira de distribuição no terreno da proposta.

N 06- Perspectiva Aérea de Famalicão – Destaque da zona de intervenção e principais vias

07- Esquema da Proposta – Pontos Referencia e Linhas do Electrico (3)

de

Com a matriz de estruturação do desenho urbano definida, a atenção volta-se para a 2ª fase, esquema de infra-estruturas viárias. A intervenção propõe uma cidade para o peão, em que o espaço do automóvel e o espaço de circulação pedonal não chocam de forma brusca, onde um não invada o que é do outro. Para tal o desenho do alçado da rua e a forma dos quarteirões é fundamental. Procuramos assim encontrar solução para um dos problemas da actualidade, o atrofiar dos espaços públicos. Este é um problema em crescimento de tal forma que os passeios são cada vez menores, e o limite entre o espaço público (rua, passeio) e o espaço privado (habitação) é por vezes a apenas uma porta. Deste modo é proposto que os acessos aos edifícios se efectue sempre pelo interior dos quarteirões e não pelo lado voltado para a rua, criando “ruas pedonais” no interior, locais de lazer, convívio ou mera circulação. ( ver imagem TALLL)

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A

B

08- Quarteirões tipo- Zona Central da proposta

09- Proposta Final

Os quarteirões organizam-se de forma rectangular totalmente permeável em que o seu interior é o espaço onde o peão é privilegiado. Como podemos constatar na imagem 08 quando pretendemos deslocar-nos de um ponto “A” a um ponto “B”, existe uma diversidade de percursos que podemos seguir, desde caminhar junto à rua, pelo perimetro exterior dos quarteirões ou então, deambulamos pelo seu interior, atrevessando quarteirões e vias secundarias (de sentido unico, e por consequencia mais calmas) atraves de rampas, escadas, jardins, e patios. Para que tal aconteça, para que seja possivel ter percepção do que existe para lá da primeira linha de edificios, eles afastam-se num jogo de cheios e vazios proporcionado relações visuais entre os diversos pontos da cidade.

10- Perspectiva interior

11- Relações visuais entre os edifícios e quarteirões

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Toda a malha da cidade segue a mesma ideia base, isto é, os quarteirões sao totalmente permeaveis, mantendo no seu interior o espaço destinado ao peão, e de forma a permitir o acesso automóvel aos edifícios existem ruas que dividem os quarteirões, ruas estas geralmente de sentido único. Existe então uma infra-estrutura de circulação pedonal e outra de circulação motorizada, interligadas mas completamente distintas, em que cada uma responde as necessidades que apresenta, pois da mesma forma que os carros nao andam nas linhas dos comboios tambem ao peão deve ser possibilitada a circulação no espaço para ele desenhado, pois desde os anos noventa que na Europa ficou decidido que “andar a pé” é considerado um meio de transporte. “…na última década, o modo de andar a pé, apresenta-se como o segundo maior modo de transporte nalgumas cidades e metrópoles europeias. Portugal não foge à regra. Mas, paradoxalmente, não temos dado a devida importância ao veículo que transporta este modo de deslocação, que é efectivamente, o espaço público e o seu desenho.” (Paula Teles, 2006: 7)

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Conclusões:

Pretende-se

com

este

artigo

levantar

algumas

questões

ao

nivel

da

consciencialização dos intervenientes no desenho de cidade pois vivemos a cidade ao nível dos nossos olhos e devemos pensa-la como tal. O planeamento e desenho urbano deve englobar a perspectiva do observador, pela forma como se circula, como somos manipulados pelas barreiras físicas encontramos e como as suas imposições e convites interferem na percepção do espaço que nos rodeia. É necessário compreender a cidade como um organismo vivo e complexo, em constante mudança e espelho da sociedade que a habita. Os utilizadores do espaço urbano estão em muitos casos estilizados, isto é, existe uma imagem pré-definida do cidadão tipo, mas a realidade mostra que os seus utilizadores variam em tipos, idades, e limitações sendo cada vez mais importante a consciencialização de que a cidade é para todos. Deste modo concideramos que existem ferramentas para que seja realizado um melhor planeamento, e condições para que este assunto seja muito aprofundado de forma a levar estas questões a todos os seusintervenientes.

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Referências Bibliográficas:

Comissão das Comunidades Europeias, Por uma nova cultura de mobilidade urbana – Livro Verde, Bruxelas, 25.9.2007 Carta Mundial do Direito à Cidade, Maio 2005

Paula Teles, Revista Planeamento 3- Mobilidade, APPLA, 2006

Paula Teles, Desenho Urbano e Mobilidade para Todos, APPLA, 2006

Lynch, Kevin; Arquitectura e Urbanismo - A imagem da cidade; Edições 70, 1ª edição; Lisboa, Portugal; Janeiro 2008

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