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Entrevista | Sylvia Sanchez
Sylvia Sanchez trabalha entre a fotografia encenada, a performatividade para a câmera e o audiovisual. Investiga os pequenos desvios da dita normalidade que povoam o quotidiano: o disfuncional, o incontrolável, o mágico, o ilusório, o improvável, o estranho e o que eles podem carregar de poético, divertido ou trágico. Vive e trabalha em São Paulo. É também educadora, diretora de fotografia e filmmaker pela Cardamomo Filmes, da qual é sócia-fundadora. Em 2019, realizou sua primeira exposição individual com a série Crônica de Banalidades Ordinárias, no MIS-SP.
Como você começou a fotografar?
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Minha primeira relação com a fotografia foi durante o curso de Publicidade, na ECA/USP, em 1998. Foi ali que percebi na fotografia uma possibilidade de me relacionar de um modo diferente com o mundo e me conectar mais com ele. Logo em seguida, me aproximei da fotografia de espetáculos: eu sempre tive um fascínio grande pelas artes cênicas e alguns amigos acabaram enveredando por esse caminho – desse modo, as portas da fotografia de espetáculo se abriram pra mim, como forma de me aproximar dos palcos e da encenação. Passei quase 10 anos fotografando espetáculos teatrais e de dança, fazendo capas de CDs e DVDs de música e criando retratos de artistas. A partir de 2013, comecei a me aproximar também do audiovisual e do cinema. Hoje em dia, comercialmente, minha atuação é maior como videomaker e diretora de fotografia do que como fotógrafa still propriamente dita. Em 2010 comecei a dar aulas (de fotografia) na Panamericana Escola de Arte e Design. Paralelamente, fui descobrindo o universo da fotografia autoral e suas possibilidades expressivas.
Até 2015, orientar os projetos autorais de meus alunos foi suficiente para nutrir minha criatividade. Porém, num dado momento eu simplesmente não conseguia mais deixar minha própria expressão silenciada e, em 2016, comecei a me dedicar à criação de meus próprios projetos autorais. De lá pra cá, minha relação com a fotografia é cada vez mais permeada pela arte e, em sintonia com a tendência contemporânea da arte, vem incorporando outros meios, como a performance e o audiovisual.
Quais são suas referências na fotografia, no cinema e na literatura?
Na fotografia: Erwin Wurm, Erwin Olaf, Cristina de Middel, Joan Fontcuberta, Broomberg & Chanarin, coletivo Garapa, Larry Sultan, Penna Prearo, Jonathas de Andrade. No cinema: David Lynch, Wes Anderson, Pedro Almodóvar, Wong Kar-wai, Eduardo Coutinho. Na literatura: Jorge Luis Borges, Gabriel García Márquez, Julio Cortázar, José Saramago, Mia Couto, Ítalo Calvino. Outras referências fundamentais pra mim: Bill Viola, Yoko Ono, Ivan Grilo, William Forsythe, Ana Teixeira, Theo Mercier.
O que você fotografa?
Eu trabalho principalmente com fotografia construída, encenada Eventualmente me coloco no quadro, mas não classifico minha produção como auto-retrato, porque quando apareço em minhas próprias imagens, não é para falar sobre mim e sim colocando meu corpo (e sua imagem) a serviço de uma ideia. Interessam-me os pequenos desvios e as incongruências da dita “normalidade”: o incontrolável, o disfuncional, o mágico, o ilusório, o improvável, o estranho. Eu olho para o cotidiano banal, que, para mim, é onde vazam os gestos e escolhas que explicitam nossas formas de ver o mundo. Penso que olhar para o banal e buscar pelos sentidos que ele pode carregar é uma forma de posicionamento micropolítico pela libertação. Nesse sentido, em minhas obras, procuro questionar o utilitarismo e a produtividade, subvertendo um pouco os gestos e os usos dos objetos, dos espaços e do tempo.
Crônica de Banalidades Ordinárias
Como se dá o processo de criação dos seus trabalhos fotográficos?
Como o que me interessa é a construção de cenas, meus trabalhos fotográficos são todos muito planejados. Como o que me interessa é o banal, os “temas” específicos de cada projeto nascem da minha vida e de minhas observações sobre o que me circunda: o que pode abranger desde hábitos e relações familiares até a relação com a tecnologia ou com o meio ambiente (pelo viés da sustentabilidade). A partir do momento em que tenho um interesse em vista, começo a visualizar imagens, pensando que tipo de visualidade e de experiência para o expectador me interessa provocar. Começo então a rascunhar algumas ideias (ainda que eu desenhe muito mal) e já sigo para os primeiros testes fotográficos. É só a partir desses primeiros testes que começo a entender de fato o projeto – e, então, começo um movimento circular entre produzir, repensar, listar palavras e conceitos que me interessam, pesquisar referências, produzir novamente e assim por diante. Desse modo, o trabalho vai encontrando sua própria lógica num movimento casado de fazer e analisar.