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O que se vê pela janela? | Rogério de Souza

O que se vê pela janela?

Rogério de Souza

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Agora, por tempo indeterminado, não há mais “olho no olho”. A ordem da vez: ficar em casa, trabalhar online, conversar por vídeo e talvez resgatar uma antiga invenção que transmite voz e que quase ninguém lembrava o nome.

Além disso, é tempo de reinventar os usos de nosso conhecido aparelho de produzir significados em forma de imagem: nossa velha câmera fotográfica, fotografando o que se vê e o que se sente. Para muitos, abrir as janelas serviu de pretexto para se atentar ao mundo exterior e aos eventos cotidianos. Tudo que sempre esteve lá, mas que agora ganhou ares de novidade. Nunca havia me atentado a isso! Pensariam alguns. Para outros, as janelas se abriram para o interior. Olhar para o local de habitação em que passariam a maior parte do tempo levou ao aguçar dos sentidos, transformando angústia em informação visual. Se dermos um passo adiante nessa caminhada, o abrir das janelas levou ao acesso restrito da percepção subjetiva. Afinal, todas as coisas que formam essa teia visual, foram postos ali por nós. Se aciono a sintonia fina ao perceber os objetos à volta, vejo a mim mesmo representado neles. Mais do que isso, agora percebo o tempo. Quase posso tocá-lo, ora passando devagar, ora acelerado, dia após dia. Perceber o tempo passando é perceber a existência de tudo e de todos. Quanto tempo ainda tenho? Pergunta que se tornou comum, numa realidade incerta. Todos os dias, os números gritam para que nunca nos esqueçamos.

Memórias do que fomos há bem pouco, convivem com lembranças de outros tempos. Penso que a fotografia tenha voltado a ter aquela importância primária que assombrou nossos antepassados: aprisiona o tempo em um retângulo digital ou analógico, em mínimos detalhes tal como aconteceu um dia. Todas as coisas que fotografamos hoje, o que se passa pela janela ou o que se vê pela janela interior será, em segundos, parte de um estranho passado. Quando novamente sairmos às ruas sem restrições, algo terá mudado. Nossa jornada de heróis chegará ao fim e seremos forçosamente chamados a iniciar a próxima. No entanto, olharemos para fotos que fizemos das coisas, lugares e pessoas com um certo saudosismo, na certeza de que um dia “isso foi”. Nos vemos em breve?

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Esta publicação foi composta com a família tipográfica Helvetica. NUDEF – Núcleo de Design e Fotografia da Escola de Design/UEMG. 2020.

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