LIVRO - VIVER, REZAR & AMAR

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Digitação / Revisão Laura Carolina Saito Machado

Capa Fábio Ferrari

Autora Odette Antunes Peres

Editoração Anderson Dias Machado

Impressão e Acabamentos Printing Gráfica • Tietê-SP • (15) 3285-2150 contato@printingrafica.com.br


Sumário Apresentação.......................................................................................................................05 Depoimento de uma Mãe....................................................................................................07 As palavras de Justino........................................................................................................11 Oração de um estudante.....................................................................................................15 O que se faz com o amor.....................................................................................................16 As flores...............................................................................................................................16 Aniversário..........................................................................................................................16 Apelo a Jesus.......................................................................................................................17 Caneta mágica.....................................................................................................................17 Seria bom.............................................................................................................................17 Felicidades...........................................................................................................................18 O casamento........................................................................................................................18 Parabéns e felicidades........................................................................................................18 Luan.....................................................................................................................................21 Pai........................................................................................................................................23 A força das palavras............................................................................................................25 Oração das sete semanas....................................................................................................31 Um conselho........................................................................................................................35 A vida de uma sonhadora...................................................................................................37 Avaliação das vivências......................................................................................................43 Dado, o peregrino................................................................................................................45 Dado, o peregrino 2.............................................................................................................49 Saulo....................................................................................................................................51


Um bom alerta....................................................................................................................55 O flautista feliz....................................................................................................................57 Um conselho da Esther (a ervista).....................................................................................61 Duas vivências....................................................................................................................63 Camum, o cameleiro...........................................................................................................67 Don Carmelo, Josepe com as bênçãos de Domingos.......................................................... 71 Um pobre sonhador.............................................................................................................73 Carmem, uma dançarina flamenca....................................................................................79 Conversa de barbeiro..........................................................................................................85 Aceitar a vida como ela nos é dada....................................................................................87 A sogra de Laura.................................................................................................................95 Joana de Deus.....................................................................................................................99 A vida de Irma...................................................................................................................103 A infância de Ana Carolina..............................................................................................109 É dando que se recebe.......................................................................................................117 O moço loiro.......................................................................................................................121 O lanche do estudante......................................................................................................123 A vida de um jovem drogado............................................................................................125 A vivência de um fazendeiro.............................................................................................131 Primeira parte Mãe Lu.....................................................................................................135 Segunda parte Tito o professor........................................................................................143 O mercador Emuae...........................................................................................................147 Neno...................................................................................................................................155 Não blasfeme, agradeça....................................................................................................159 O aniversário de 90 anos da Dona Odette....................................................................... 161 Dr. Quinzinho ou Índio da força.......................................................................................165 A vivência de Iris ou a Mulçumana dos pés descalços.................................................... 171 A lenda da montanha........................................................................................................177 Dona Odette conta............................................................................................................181 Uma vivência de amor......................................................................................................183 Um recebimento por merecimento...................................................................................187


Apresentação Aos Leitores

Hoje comemoramos o sétimo livro da Médium Odete Antunes Peres. 1. Palavras que Ouvi – abril/2000 2. Vidas – setembro/2005 3. Vivencias – março/2008 4. Lições do Outro Lado – agosto/2009 5. A Passagem – janeiro/2011 6. Amar e Semear – novembro/2012 7. Viver, Rezar & Amar – dezembro/2018 Uma longa jornada cheia de amor e doação. Uma difícil estrada de dedicação e caridade, com versos, textos e mensagens para a todos ajudar. Uma estrada por onde cruzam muitas pessoas. Algumas simplesmente passam, outras passam e logo voltam, mas tem aqueles que permanecem e contribuem para que essa estrada seja cada vez mais iluminada. Obrigado a todos, encarnados e desencarnados por fazerem parte desse caminho e ajudar a levar essas palavras para quem precisar.

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17/02/2010

Depoimento de uma Mãe

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meu relato é para as mães compreenderem o relacionamento com os filhos. Tive quatro filhos e três filhas, morava em uma fazenda com casa grande, bem perto passava um rio com uma pequena cachoeira e seu barulho a noite era para mim uma linda música. O pasto onde as crianças brincavam era enorme. A fazenda era composta de gado. Às cinco da manhã os usineiros vinham buscar o leite. Nossa vida começava bem cedo, as crianças assim foram criadas, sempre dentro do rio nadando, correndo e depois iam para a escola, até ficarem jovens. Cada um foi para uma cidade estudar, as meninas para a capital e os meninos foram para outro país. Um seguiu medicina, outro foi ser um grande nadador, conseguiu ser campeão mundial, o mais velho comprou uma grande fazenda e se exemplou a seu pai. As meninas foram casando e acompanharam cada uma os seus maridos. O caçula escolheu a vida religiosa, também saiu do país. Meu marido não viu os filhos crescerem, foi para junto de Deus. Eu fiquei somente com meus empregados, Maria e o marido com quatro filhas que passaram a morar comigo. Uma das meninas dormia em meu quarto. Meu filho fazendeiro vinha todos os fins de semana para ajudar na direção, tínhamos outras pessoas nos ajudando, assim pudemos continuar a vida. Todas as noites eu e Angela fechávamos a casa, cada quarto que ia, as minhas lembranças se avivavam, ouvia a voz das crianças gritarem. Os meninos costumavam fechar a porta dos quartos das meninas, elas berravam, quando eu abria as portas era uma algazarra. Eu ouvia todas as noites, como se eles ali estivessem. Depois da casa fechada ia para meu quarto e ficava boa parte da noite numa grande cadeira, relembrando. A Angela, a menina que dormia comigo, dizia: – Dona Tereza a senhora não descansa, venha se deitar. Era justamente ao contrário, quando eu deitava não conseguia dormir, sentava e revivia, ninguém poderia entender Viver, Rezar & Amar

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que as minhas lembranças era o meu viver. Todos vinham na véspera do natal, era uma grande alegria. Tivemos que fazer mais quartos para acomodar todos da família, mas conforme iam chegando se acomodavam na casa velha e diziam: – Nada de dormir no galinheiro (no local dos quartos novos, antigamente era um galinheiro) queremos ficar todos juntos, chegaram a tirar duas grandes mesas da sala e lá colocaram colchões e os meninos dormiram no chão, ainda eu ouvia as risadas e as crianças que vieram eram continuação dos meus. Como toda vivência tem seu curso. As vidas foram mudando. Meus filhos, cada natal vindo menos. Neste último, só veio a minha filha mais velha que morava na Espanha e sua família com quatro lindas meninas e o meu filho que morava ao lado com sua família, não veio. Passamos bem e com alegria. Meu filho sugeriu que eu fosse com minha filha para a Espanha consultar um médico, assim ele ficaria mais tranquilo, pois por duas vezes eu tive um desmaio e até eles chegarem eu estava normal. As meninas vibraram, começaram a disputar com quem eu iria dormir, mas minha filha disse: - que eu teria um quarto sozinha. Uma olhou para a outra fazendo careta, uma falou: – Mas podemos ficar com a vovó até ela dormir. Rimos e aceitei, por não estar me sentindo muito bem. Meu filho que também mora no estrangeiro contou algumas passagens da sua vida que não foi fácil mas venceu, pensando na vida de seu pai que levantava às três horas da manhã para tirar leite, que vinham buscar às cinco. Não entendia essa maneira de viver, agora que também levanto às três horas sinto o porquê das pessoas que dependem de nós não terem horário, vendo as suas necessidades, comparo sempre ao exemplo de meu pai cumpridor de seus deveres, sigo aquilo que ele me deixou, senso de responsabilidade do ser humano. Fiquei muito feliz de ouvir um médico comparar a sua capacidade com um tirador de leite. Senti uma leve canseira e disse que ia repousar, as crianças já pegaram minha mão e levaram-me para o quarto, minha filha pediu que depois que me deitassem fossem se despedir do tio que iria para o hospital fazer o plantão da noite. Deitei-me, as meninas me cobriram. Aí ouvi um grito de uma das minhas netas quis levantar, mas o cansaço me obrigou a ficar deitada. Logo tudo ficou calmo, procurei dormir. Quando acordei já estava no hospital e uma enfermeira ao meu lado sorrindo disse: – Bom dia, está se sentindo bem? – Disse que sim, mas que não se lembrava de ter vindo para o hospital. Perguntei se meu filho ainda estava lá, sorriu e disse: – A senhora aceita um pouco de leite? Ao responder que sim trouxe uma bandeja com leite, café e bolachas que a minha empregada costumava fazer e ainda quente, como eu gostava, não comentei, tomei o leite e perguntei como vocês conseguem esse leite de primeira tirada. A senhora conhece bem a qualidade do leite. Sim. Nasci em fazenda e até hoje sempre lidei com gado, esse leite é a primeira puxada, sempre bebia desse procedimento, por isso é que conheço. Não entendendo como vocês conseguiram, esse processo é para os donos da fazenda, depois vai para o latão. Não me respondeu, como estava meio tonta, levou-me para a cama e pediu para eu dormir. E assim fiz. Acordei, não posso precisar o tempo que dormi, mas a enfermeira 8

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estava ali sorrindo, perguntando se tinha descansado. Respondi que sim, mas gostaria de ver o meu filho, expliquei que ele era médico e que talvez fosse quem me operou. Desconversou e me convidou para tomar um bom banho, depois iriamos andar um pouco. Tomei o banho e fomos para um grande pátio com bancos. Sentei-me e respirei fundo o cheiro da terra, me fazia bem. A senhora gostaria de abraçar alguém da sua família que há anos não vê? Sim, deve ser o meu filho que é padre, faz muitos anos que está estudando longe. Vi um homem se aproximando, não era possível, aquele andar, olhei novamente e disse, é o meu marido, mas ele faleceu há muitos anos, estou sonhando, ele chegou mais perto pegou minha mão, eu senti o seu contato, não pude falar. Ele me disse que há muito tempo esperava por esse momento. Você veio para mim, abracei-o e perguntei: – Como veio até o hospital? Nosso filho médico me operou você não o conhece mais, está um lindo jovem e também tem uma linda família, assim que sarar vou leva-lo para conhece-la. Agora você poderá ir comigo, ele sorriu e disse: – Vou sim, você estará sempre comigo e quando tivermos permissão vamos rever todos os nossos filhos e netos. Permissão? De quem? Sempre segurando a minha mão disse: – Tereza agora você veio para mim e nossos filhos estarão em outro plano de vida, nós não morremos, nós passamos para outro plano de vida, quando ganharmos energias iremos distribuir a quem precisar. Abracei-o e chorei muito. A enfermeira me levou de volta para cama e adormeci, não posso precisar o tempo. Agora eu sei que com a permissão dos guias poderei orientar os meus filhos e outras mães que se acham abandonadas pelos filhos. Não é assim. Temo-los por um período, depois o mundo é que se encarrega de dirigir as suas vidas. As mães são apenas os amuletos que eles usam quando querem. O amor de mãe é tão grande que comparado com o amor de Deus pela humanidade, sem análise é muito menos compreendido. Toda mãe deveria ter cem vidas para dividir, mas apenas ela tem um só coração que tudo vê, perdoa e supera. Mãe Tereza

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19/02/2010

As palavras de Justino

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s palavras que aqui deixo, sirvam de orientação para os jovens. Casei muito cedo, minha companheira era professora primária e eu trabalhava em um departamento do governo, ganhávamos pouco. Ela comprou um apartamento do governo como professora, juntávamos os salários e íamos vivendo. Depois de três anos de união tivemos uma linda filha. Minha companheira estudou muito e assim pode dar mais aulas numa faculdade e ganhava mais do que eu. No entanto prestei concurso em uma empresa multinacional e consegui entrar, com um bom salário. Resolvemos comprar uma casa mais próxima a faculdade. Com falta de professores ela teve um convite de dar mais aulas a noite, assim lecionava nos três períodos, saía muito tarde da noite e eu ia buscá-la, pois tínhamos somente um carro. Com esse nosso esforço, mais dela que meu, poderíamos realizar mais sonhos da nossa filha, mais conforto. Tínhamos uma boa casa, com um bom jardim. Minha sogra veio passar um tempo para ajudar no crescimento da nossa filha. Demos o nosso apartamento para morar, minha mãe, minha irmã, marido e um filho. Passei a pagar as despesas do apartamento para ajudar minha família. Minha mãe vinha para nossa casa todas as sextas-feiras e ia embora na segunda-feira de manhã. Eu sentia que minha companheira não gostava muito, ela dizia para mim: – Não me importo de sua mãe vir passar os fins de semana aqui, só que ela toma atitudes que não gosto, esta é minha casa e nela eu tomo o comando que quiser. Eu ouvia, mas não dava muita importância, e assim os anos foram passando. Minha sogra veio a falecer e minha mãe passou a morar em casa. Eu sentia qualquer coisa errada, mas não procurava saber o que era. Certa noite, minha filha que estudava na faculdade onde a mãe trabalhava, veio pedir para conversarmos, estranhei, mas fomos para o seu quarto, aí ela falou, meio sem jeito: Viver, Rezar & Amar

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– Papai, gostaria que o senhor pedisse a vovó, receber menos os seus parentes aqui em casa, fazem muita algazarra e está me incomodando, se continuar irei morar no alojamento da escola. Fiquei surpreso e disse: – Não estou sabendo desses encontros aqui. – Também mamãe acha que os gastos estão muito alto, ela não quis dizer nada por se tratar de sua família. – Estranho, nunca tive amizade assim com meus parentes. Não reclamei de a minha mãe vir morar conosco, por perceber que ela gostava muito da casa e do jardim, mas ignorava que ela estava tomando essas atitudes. Infelizmente, minha companheira adoeceu de repente, teve que ser hospitalizada e eu pedi afastamento provisório para ficar com ela no hospital. Foram quatro semanas de muita agonia. Assim veio a falecer. Fiquei desorientado, somente minha filha me acalmava, a presença de minha mãe passou a me incomodar. A nossa empregada veio me perguntar, quem assumiria o abastecimento das geladeiras. Como assim? A onde gastamos tanto? É que sua mãe cozinha tudo em jantares de três a quatro vezes por semana com a família e o seu cunhado e sobrinhos almoçam todos os dias e geralmente sua irmã também vem. Assim tenho que fazer almoço e janta todos os dias. Sua mãe é quem faz o cardápio, às vezes a sua esposa me dava dinheiro para comprar o que faltava. Mas agora ela não pode fazer isso. Estou até pensando em ir embora, a minha menina cresceu e a senhora não está mais aqui, o trabalho está muito para minha idade. Permaneci calado, pedi a ela para não nos deixar agora, nós precisávamos da sua ajuda. Eu ia tomar uma providência que ninguém esperava. Chamei minha filha e contei a conversa que tive com a pessoa que sempre esteve ao nosso lado nos tempos mais difíceis. Propus a minha filha, iria vender a casa onde morávamos, o apartamento da praia, porque não usávamos, compraria um apartamento pequeno perto da faculdade, mas não daria endereço a ninguém, nem para a minha mãe. Ela achou ótimo. Em uma semana já tinha vendido tudo, vendi tudo mobiliado, saímos com nossas coisas pessoais e algumas peças que nos eram muito queridas. Não avisei ninguém. Começamos a noite a colocar em caixas, tudo em muito silêncio. Comprei um pequeno apartamento com dois quartos, sala, cozinha e dependências para a nossa empregada. Minha mãe veio falar comigo, muito brava, o que eu estava fazendo, não tinha abastecido as geladeiras nem para o almoço. Respondi que nem eu e nem a minha filha comíamos em casa, a senhora tem sua casa e esta casa não mais me pertence, já vendi tudo e comprei um pequeno alojamento para minha filha. Você vai morar na praia? Não, lá também já vendi, vou viajar e ficarei na Europa por um tempo indeterminado. Como você nem me avisou, eu tenho direitos, como sou sua mãe. Não avisei, por não ser necessário, os seus convidados, a senhora suspende e passa para o seu endereço, eu nunca convidei ninguém para comer aqui, fui alertado, mas não tomei nenhuma atitude por ser a minha mãe, que estava abusando da hospitalidade, dei a senhora moradia com tudo pago, mas a partir de agora terá de pagar p seu condomínio, a sua luz, a sua água, o seu telefone e sua comida. Minha senhora, morreu de tanto trabalhar para dar conforto a nossa filha, assim tudo transformei em dinheiro para o sustento dela e o que ganhei é para o meu. Não poderei 12

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ajudar mais, mas o imóvel pertence a minha filha, enquanto a senhora viver, não vivera lá sem pagar aluguel. Ela deu um grito e disse que eu era um filho ingrato, jogando a mãe naquele lugar horrível, nem sua irmã gostava de lá, ambiente mesquinho. A senhora e minha irmã não são obrigadas a morar lá, é só me avisar, colocarei também esse imóvel a venda e vocês vão viver onde achar melhor. Minha filha chegando ouviu tudo e me disse: – O senhor não foi muito duro? – Não, sua mãe me alertou, mas não quis entender, agora um pouco tarde, faço justiça. – O senhor vai mesmo morar no estrangeiro? – Comprei um pequeno sitio onde nos fins de semana você com a nossa empregada irão descansar, é um lugar lindo, sua mãe iria adorar. Lá tudo farei para que nos lembre ela. A minha vida teria sido diferente, se eu tivesse prestado atenção no que se passava a minha volta, minha companheira não teria trabalhado tanto e teríamos um pouco mais de tempo para nós, pouco convivi com minha filha e minha companheira. Eu achava que ela implicava com a pessoa de minha mãe, quando descobri o abuso já era tarde. Prestem sempre muita atenção, como são as pessoas independentes do parentesco, isso nada tem a ver com a vivência, depende do caráter e dos pensamentos, eles envolvem muitos problemas que às vezes vem a modificar a existência. Devemos observar as pessoas para vivenciarmos melhor. Valorizei tarde demais a pessoa que viveu mais tempo comigo do que minha própria mãe, pessoa sem compreensão para avaliar o que tivemos em nossa família. Quem sabe poderei dizer quem foi a minha companheira, o quanto ela foi valiosa na minha vida. Hoje estou em outro plano, ainda não a encontrei, mas guardo sempre em meu coração o amor que vivemos, o quanto lhe sou grato por ter me ensinado a viver. Tive um nome singular, Justino.

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03/2010

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s pessoas se preocupam com as vivências passadas, coisas que não tem importância. Devem se preocupar com a vivência atual, essa, sim vale muito, tanto para o físico como para a parte espiritual. As duas caminham juntas. O que o físico faz tem tudo a ver com o espírito, analise, ontem para ter a resposta hoje. As ações são os efeitos para tudo, as vezes tem seres que recebem uma grande ajuda, talvez por merecimento.

Oração de um estudante Senhor, deste-me ao nascer uma escada para subir, mas minhas pernas frágeis não iriam conseguir, mas eu tinha duas mãos para me amparar na subida de cada degrau, para me equilibrar. Cada ano um degrau deixei para trás sempre com as duas mãos a me amparar. Passaram-se vários degraus e não senti o meu subir, quando olhei as duas mãos já não estavam a me ajudar, tive que só me equilibrar, para nova subida, deixando os degraus passar. Mas, senhor, eu sei que está a me escutar, ajuda-me na minha subida e te escutar para poder ajudar aqueles que a subida estão a iniciar. Que os teus degraus sempre estejam cobertos de compreensão e luz para a tua missão possa cumprir.

A D R I A N A

s flores que tem perfumes elicados e suaves equer tratos e carinhos nduzindo a conversar delicadamente mostrar todo o nosso carinho os mostrando quanto elas são importantes nossa existência

Seja como as flores sempre cheia de amor, carinho e paz interior. Viver, Rezar & Amar

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O que se faz com o amor Certa vez eu ouvi uma linda frase do meu avô: – O que se faz com amor se recebe em dobro. Quando comecei a ouvir suas mensagens, me senti a maior pessoa do mundo. Não conheço ninguém que tenha recebido tantas palavras com tanto amor. Aí é que eu percebi, as suas palavras me foram enviadas para serem entregues a quem de direito merecer. Eu apenas sou um pequeno instrumento onde os grandes mensageiros enviam as suas palavras para que todos possam ouvir, pois nem todos têm a capacidade desse intercâmbio com seres de outra dimensão. Pude entender que as palavras de humildade e carinho podem derramar lágrimas de amor e felicidade, como se todo trabalho reconhecido e aceito são o prêmio maior. A incompreensão das pessoas é o meio que se pode crescer, pois a compreensão entra e trabalha para que essa pessoa, ou se afaste do caminho que está tentando obstruir, ou os nossos amigos fazem ela se aproximar e ouvir palavras não de agressão, mas de amor. Esse é o caminho que os mentores tentam nos passar, mas é muito difícil entender. Quando um ser compreende esse caminho é uma gratificação grande, tanto espiritualmente como para a matéria. Qual seja a caminhada, saberão passar os obstáculos para traz sem se importar com a dureza da vida, pois ela se transformará em suaves plumas para quem tem fé.

As flores As flores são a beleza da vida, que nos traz paz e com o seu colorido alegra nossa vida. Um abraço bem grande e cheio de carinho.

Aniversário Dia de aniversário é quando recebemos as vibrações positivas. Aí devemos fazer uma reflexão do que foi feito e do que está para fazer. Assim a vivência se tornará mais fácil e dócil. Sempre que puder agradeça a Deus pela sua vivência, pois na terra é onde podemos evoluir. Dentro de todos os abraços e desejos benéficos, inclua os nossos bem cheios de amor e carinho. Um abraço. 16

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Apelo a Jesus Senhor Jesus, sei que tuas mãos são fortes e seguras, por isso nelas estou a me apoiar, para que eu possa ao meu caminho voltar.

Caneta mágica Se eu tivesse uma caneta mágica, seria fácil escrever para uma pessoa que adquiriu mais cultura. A minha caneta escreve palavras do coração. Desejo que sua estrada seja larga e clara para você despontar seu futuro.

Seria bom

Bom seria Os porquês, responder Para todos entender. Anos serão preciso, Para um pouco compreender Primeiro o sentido Temos que apurar e moldar, Depois o tato, e o olfato Para nos presenciar. Por que eu? Perguntas, O teu sentido atrapalhado, Temos que encaminhar, Para melhor nos escutar. Escrever é fácil para você Ao papel palavras, Fácil passarás Mas poucas estas a acertar.

O tempo vai te encaminhar. Que tua cabeça, nada poderia receber. Mensagens com vagar vais receber, Viver, Rezar & Amar

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Para muitos ajudar, Um irmão que precisa de orientação. Aí começa a tua missão. Dizer quem sou, não vai ajudar Para isso precisas esperar.

Felicidades Felicidades é o que se costuma desejar aos amigos. Essa palavra não anda sozinha, os seus companheiros são: o amor e a compreensão. Por isso, peço à felicidade que leve os seus amigos para morar sempre em seu coração, e assim você poderá colher também a paz, muita paz...

O casamento O casamento é uma parte da vida muito importante, onde o amor e a compreensão são coisas principais para a formação de uma família. Assim um dia quando forem escrever para seus netos, lembrem-se que a nossa vida valeu a pena, pois temos muito amor para dar.

Parabéns e felicidades Essas palavras são as tradicionais para um aniversariante. Mas, sabe hoje, eu procuro outras palavras para poder escrever. Nunca fui a faculdade para aprender escrever o que sentimos. Somente me dediquei ao fogão para fazer quitutes a fim de ver um sorriso nos lábios de quem saboreava, e isso para mim já era o suficiente. Hoje vejo que não é bem assim. Cresce-se adquiri cultura e se prepara também espiritualmente e por isso vejo com tristeza que as palavras são pequenas e sem o sentido que eu gostaria de transmitir, mas sempre temos a ajuda de alguém. Vi-me em um grande jardim florido e bem colorido. O guardião desse local aproximou-se e me disse: – Vou te auxiliar a dar um mimo a quem aniversaria. 18

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Foi ao jardim e trouxe uma linda flor vermelha de pétalas como o veludo, e me disse: – Esta flor chama-se SAÚDE. Voltou ao jardim e trouxe outra flor branca com pétalas transparentes exalando um suave perfume, e falou: – Esta flor chama-se AMOR. Tornou ao jardim e voltou com outra flor da cor do pôr do sol, como vejo daqui de casa, alaranjado com amarelo e exalando um perfume exótico como essências desconhecidas, mas muito bom de sentir, disse-me: – Esta flor chama-se FIRMEZA. Em seguida retornou ao jardim e voltou com uma espécie de pirâmide de cristal, muito linda e abrindo a ponta disse-me: – Coloque as três flores aqui dentro. A peguei, estava quente e eu lhe disse: – Que pena, este mimo é invisível aos olhos. Ele sorrindo respondeu: – Nem tudo que os olhos humanos veem, é bonito. Eu respondi-lhe: – Mas gostaria que a aniversariante pudesse ver uma coisa tão bonita. Sorrindo me disse: – Quem sabe um dia ela terá a capacidade espiritual para ver esse mimo e muito mais. Só o tempo poderá dizer. Assim entrego a você, como me entregaram e que esse presente tenha a capacidade de te dar a felicidade que eu te desejo.

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03/04/2010

Luan

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ste relato é igual a tantos que já foi escrito. Eu nasci em uma família numerosa de 18 a 20 filhos, criados dentro de muito amor e compreensão, o pai sem instrução na matéria, mas sabia transmitir aos filhos as palavras certas para a ocasião, sempre dentro de uma sabedoria que hoje não poderia ser explicado. Os filhos que iam crescendo partiram para as cidades grandes ou ainda para outros países, conforme as suas vontades. Nunca ouvi meu pai recriminar, abençoava a todos e assim essa família foi se espalhando pelo mundo. Eu também fui me aventurar, viajamos de carroça, por muito tempo percorremos cidades, lugarejos, passamos fome, frio e mesmo assim íamos para frente, procurávamos não sabíamos o que. Até chegarmos num local e ali fiquei, os outros seguiram. Procurava abrigo e encontrei um rapaz na mesma situação e juntos achamos trabalho pesado, mas como éramos jovens, enfrentamos. Para nos acomodar fomos para uma casa de família que tinha dois lugares e assim começamos a nossa jornada. Trabalhávamos de sol a sol. O patrão e sua esposa só viam em nós seres para os seus lucros financeiros. Certo dia veio a notícia que meu patrão sofreu uma queda de cavalo e estava a morte, procuravam quem podia doar sangue. Todos se negaram. Eu lembrei-me das palavras do meu pai “o que te foi dado sem nunca ter sido cobrado”. Aí resolvi ir salvar essa vida sem o conhecer. Foi passado de mim para ele o meu sangue e os médicos acharam que estava fazendo bem, por isso me pediram para voltar dentro de três dias. Voltei e dei uma nova quantia, ele já estava conversando e me ofereceu dinheiro em pagamento, respondi que o meu sangue não estava à venda, fiz pelo que meu pai tinha me ensinado, nada me devia, fiquei contente em poder ser útil, uma pessoa igual a mim. A esposa se ofendeu e proibiu a minha volta, como uma pessoa de meu nível se julgava Viver, Rezar & Amar

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igual, eu era uma criatura inferior e assim também eu seria despedido. No dia seguinte o responsável pelo nosso trabalho veio me pedir para ir à residência, pois o patrão queria falar comigo, pensei que iria me despedir. Não dei muita importância, fui. Chegando a casa o empregado me conduziu ao quarto. Fui muito bem recebido por ele, mas quando sua esposa soube, veio para me expulsar. Ele pediu que ela se retirasse, pois queria ter uma conversa em particular comigo, e só a ele e a mim dizia respeito. E assim foi. Pediu que eu lhe contasse a minha vida. Pouco eu tenho para relatar: – Venho de uma família grande, temente a Deus. Assim fui relatando passagens e ele sorria e ia dizendo: – Você sabe que eu também tive pai e mãe? Não sei dizer os seus nomes, já esqueci, mas lembro que tive muitos irmãos. Cada um que nascia tinha o seu nome escolhido por nós, dizíamos um nome de menina ou menino e se acertasse o sexo seria padrinho. As meninas, às vezes, tinham o nome escolhido por nome de flores e foi descrevendo os nomes e eu dizia que também tinha irmãos com esses nomes, por fim disse bem emocionado o último que eu dei o nome foi para um irmão, nisso o médico pediu para que eu fosse embora, o doente teria que descansar. Ele pediu por favor, volte amanhã, você me faz muito bem. A esposa não gostou, mas concordou em que eu voltasse. Voltei e assim conversamos muito e aos poucos ele foi se lembrando de sua origem, só o que não tínhamos igual era o nome, as nossas famílias eram semelhantes. Nisso ele se lembrou o nome do pai e da mãe, José e Maria, chorou muito e disse: – Somos irmãos. Eu lhe falei que me lembrava do nome do nosso irmão mais velho, chamava-se José, mas esse é o meu nome, me disse emocionado. Esse nome foi nossos pais que me deram, mas tive que trocar porque minha esposa achava um nome vulgar e assim me tornei Davi. E o seu nome? O último nome que dei a irmão foi para um homem Luan, que procurei me inspirar no luar e se fosse menina seria Soleda, me inspirei no sol, e ganhei dessa vez. Luan é meu afilhado perante Deus, mas não o conheço. Com a voz embargada disse: – Gostaria de te pedir... Ele me interrompeu e disse: – Peça o que for e já estará dado. – Amanhã trarei minha companheira e assim você nos abençoará, como manda as nossas tradições, somente o irmão mais velho ou o pai pode abençoar aquele que vai se unir para construir a sua família. Nos abraçamos e no outro dia ele me abençoou por eu ser seu irmão e por ter dado a ele uma lição de vida que ele tinha dentro de si, mas esqueceu dando somente valor ao seu agora, e não as origens dos seres que devem ser valorizados senão seremos cobrados pela própria vida. Luan

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08/2010

Pai

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ara ser pai, quando o bebê chegar, diga: – É muito bom receber você. Para ser um bom pai, voltar ao tempo de criança e brincar para mostrar a sua criatividade. Para ser um bom pai, ao chegar do trabalho participar dos deveres escolares para mostrar que você é culto. Para ser um bom pai, ao chegar a adolescência, segurar suas mãos apertadas para mostrar que você o compreende. Para ser um bom pai, quando chegar a hora de ele ser pai, o abrace e diga “estou do teu lado”, para mostrar que você foi pai, amigo, culto e forte. Diga a frase que Jesus disse: – Deixe vir a mim as criancinhas, pois elas fazem parte do céu. Adalberto

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15/08/2010

A força das palavras

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finalidade desta vivência é mostrar para que as pessoas prestem mais atenção nas palavras ditas, elas podem refletir em várias gerações, afetando tanto a parte física como a espiritual. Para desbloquear não é fácil, muita prece e fé podem ajudar, mas nem sempre com êxito pleno. As palavras ditas, tem muito poder. Quando criança sentia ser diferente dos meus irmãos, mas minha mãe dizia que eu era igual, apenas mais calado e observador. Não me lembro de ter chorado ou sentido alguma dor, me analisava, mas não tinha respostas. O tempo passou, cresci e me tornei um rapaz forte e saudável, meus pais para facilitar a vida dos filhos se mudaram para a cidade e um dos meus irmãos casou e ficou na fazenda e quando chegava os fins de semana nós nos reuníamos na fazenda e meu pai ficava às vezes para ajudar, pois dependíamos da colheita para viver. Fiz faculdade de agronomia e assim passei a morar na fazenda e também ajudar os outros fazendeiros amigos. Passei a ser conhecido e mais tarde fui convidado a dar aulas na faculdade e assim sendo, voltei a morar na cidade. Meus irmãos me cobravam um casamento, mas eu não conseguia gostar e nem amar ninguém como uma pessoa normal, eu dizia que era vazio, não tinha coração, todos riam, mas era assim que me sentia, sabia avaliar tudo sem sentir. Diziam que uma amiga de meu irmão que frequentava nossa casa me amava, passei a conversar e sair com ela para irmos à igreja, daí veio a convivência e o casamento, coisa que nunca me arrependi. Esposa dedicada. Foi mãe extremosa, mas às vezes dizia: – Você não me ama e nem aos nossos filhos, você apenas é dedicado e nos dá muito apoio. Eu ria, mas sabia que ela tinha razão. Quando meus pais faleceram todos ficaram desesperados e chorosos, menos eu, dizia a todos: Viver, Rezar & Amar

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– Vejo a morte como uma consequência da vida, tudo muito normal. Não sei se eu era feliz, isso eu não saberia dizer. Eu eduquei os meus filhos bem, três filhos e duas filhas, um se formou farmacêutico, outro quis seguir mecânica, e o outro agrônomo como eu, e as mulheres formaram-se educadoras infantis, mas casaram-se e me deram quatro netas e não exerceram suas profissões. Minha esposa veio a falecer e eu já estava aposentado e pude tratá-la com muito carinho e atenção, fiz o que pude de coração, mas não senti sua partida. Às vezes sentia uma revolta por não me compreender, meus filhos me diziam para eu consultar um psicólogo, mas receava, como outro ser igual a mim poderia me dizer o que eu sentia. Resolvi reformar o casarão, fiz dele duas residências, a menor ficou para mim, um quarto, sala, cozinha, banheiro e uma grande varanda onde passava a tarde e à noite lia ou meditava, tentando me encontrar. A residência maior ficou para uma das minhas filhas que veio morar com suas duas filhas, fazia as minhas refeições com ela e assim poderia ajudá-la a pagar os colégios e colocava muita coisa sem ela perceber, era muito orgulhosa. Assim segui o rumo da minha vida. Certo dia uma das minhas netas veio pedir se eu pagaria uma professora particular, não estava acompanhando a classe numa matéria, concordei e fiquei contente da sua atitude. A mãe era professora, mas preferiu uma estranha. Todas as tardes ela passou a estudar com essa pessoa, não coincidia os horários, assim eu não a conhecia, mas certa tarde esqueci-me de levar a minha roupa para a lavanderia e voltei a casa da minha filha, quando a porta se abriu senti uma dilatação na cabeça, como uma grande pancada, comecei a soar gotas grandes de suor, senti que ia cair como um furacão me puxando, não cai porque alguém me segurou depressa, tudo escureceu. Quando acordei estava na cama de minha filha, todos em minha volta até o meu filho farmacêutico. Quis levantar, mas não me deixaram, meu filho perguntou como eu estava me sentindo, me verifiquei e estava normal, talvez fosse o sol disse, a minha filha me perguntou se queria ir para o hospital, não respondi, já passou, sentei na cama, estava bem e me levantei. A minha neta relatou que a professora chorou muito e foi embora, minha filha acrescentou que talvez ela tenha se assustado vendo um homem cair. Não me deixaram ir para casa, meu filho levou as meninas para sua casa e ele iria dormir comigo, quis questionar, mas vendo a alegria das meninas de irem dormir com as primas, sorri e concordei. A noite veio o meu outro filho, assim nós quatro ficamos conversando, eu deitado e os filhos sentados na cama. Minha filha disse, que os três faziam parte de uma crença e que gostariam de rezar para mim, concordando, fiquei surpreso, pois nunca tinham dito nada, os três tiraram os sapatos, se deram as mãos e cada uma das pontas voltaram as mãos para minha cabeça e fizeram uma linda oração. Gostei de ouvir, meu filho mecânico falava numa voz estranha, tudo o que eu senti durante minha vida. O que passou eram consequências de uma vida passada, eu teria que lembrar para tirar esse bloqueio, porque haviam outras pessoas sofrendo pela mesma causa, por esses motivos era necessário voltar ao passado. Sabiam da minha descrença, mas tudo tem o seu tempo. Minha filha colocou numa cadeira um copo com água e me deram para beber um pouco, recolocou o copo na cadeira rezaram novamente, depois me perguntaram se tinha gostado, eu lhes respondi que sim, minha filha me tornou a falar: “tudo tem seu tempo, agora o senhor, qualquer dia vai receber a visita de um jovem de forças maiores que as nossas e terá as explicações que desejar, isso se o senhor quiser”. 26

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Na nossa crença não obrigamos a ninguém seguir ideias expostas. Perguntei se havia mais pessoas envolvidas na minha vida, gostaria de saber quem são iguais a mim, nunca chorei, nunca senti dores e como sempre disse, nunca amei ninguém, sou um homem vazio, como sua mãe falava. Se esse rapaz me esclarecesse marquem o dia que vocês acharem melhor. Todos me beijaram e o meu filho mais jovem foi embora dizendo voltar no dia seguinte. Assim foi. Fomos para a minha casa por causa das meninas que ficaram com a tia. O dia chegou, recebi o jovem que era bem mais jovem que os meus filhos, bonito e sorridente pegou minhas mãos beijou-as e me abraçou, minhas pernas bambearam, precisei que meus filhos me segurassem, me fizeram sentar. Eu disse: – Estou ficando velho bambo Todos sorriram. Entramos na sala onde minha filha tinha colocado uma toalha na mesa, uma jarra de água e uma bíblia. Fiquei olhando sem entender nada, perguntei ao jovem de nome José: – Como você é tão jovem e tem tanto conhecimento para me esclarecer o meu passado? – Sou jovem na matéria e bem velho em espírito, pois assim terei mais vigor para resgatar os erros de uma vivência pecaminosa, se fosse velho na matéria não teria forças, para se chegar até os dias de hoje, sendo os resgates sempre pesados, Deus nos dá energias para vivermos pagando tudo o que fazemos de errado, nem sempre por nossa culpa, pois não estamos preparados para uma vida de fé e amor ao próximo. Precisamos estar sempre alerta das partes negativas que às vezes estão prontas a nos destruir. Assim agradeço muito a Deus por esse meu caminho da caridade e que ele me de forças para eu seguir e levar comigo aqueles que precisar. As caminhadas são longas, mas com amor as faremos curtas, cheias de boa vontade, resgatando as estradas fáceis e cheia de erros. Como um jovem podia falar tão bonito. Tiramos os sapatos, sentamos, todos nós demos as mãos e José rezou uma oração muito bonita, só que eu comecei a ficar surdo, vi José abrir um livro, depois tudo ficou escuro, me pareceu que eu entrei em um túnel e algo me puxava, algo muito ruim. Quando eu voltei a mim o jovem estava me chamando, não pelo meu nome: “João você está com Deus”. O meu nome não era esse, chamo-me Davi. Minha filha me segurou a mão e me calando rezaram novamente, disso eu gostava. Achava que essas palavras estavam me fazendo bem, bebemos água e José me disse: – O senhor gostaria de ir a minha casa, aonde receberei vários amigos, inclusive seus filhos e todos que moram na fazenda, pois formamos uma família de Cristo. Gostaríamos de contar com o senhor nessa família, não será fácil, ela lhe trará trabalho e lhe tomará tempo, isso eu sei que hoje, o senhor tem. – A sua vida sempre foi ensinando as pessoas a verem o valor da terra e da água e isso lhe deu um bom adiantamento, como assim? – Seus livros escritos e experiências que o senhor fez, trouxe muita ajuda aos seus ensinamentos sabeis, sem perceber já percorreu um bom caminho. – Quem lhe contou tudo isso? Perguntei-lhe – Simples. Na sua vida sem afeto, houve um jovem escravo, vamos dar esse termo a pessoa que cavoucava a terra para as suas experiências que lhe deu amizade. – Sim, quando comecei a faculdade, tive um amigo que viveu muitos anos comigo, me ajudou a ser o que sou hoje, um agrônomo de nome. Quando casei e fui morar numa Viver, Rezar & Amar

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outra cidade, nunca mais soube dele. Sorrindo o jovem pegou minha mão e disse: – São duas vivências minhas que estou contigo, esta é a terceira, só que desta vez venho esclarecido para podermos continuar juntos se assim quiser. Meus filhos estavam espantados, como eu abracei o amigo da juventude e agora mais parecia um neto. Perguntaram se eu estava bem e respondi: – Daqui para frente sem temor, pois estaria sempre ao lado deles. Meu filho mais jovem levou a irmã e o meu amigo embora e o meu outro filho ficou, quis dormir comigo, gostei, assim poderia saber mais do que se passou. Engano meu, ele disse que somente rezaram muito e nada mais. Eu sabia que talvez ele não pudesse me dizer. Tomamos um chá e fomos dormir, quando acordei encontrei um bilhete na mesa escrito “venho buscar o senhor às seis horas”. Mas como? Eu dormi tanto assim? Estava pronto quando um dos meus filhos veio me buscar. Fomos pegar minha filha e nos dirigimos para a casa do rapaz, achei longe da nossa casa, mas como diz meu filho, o carro nos leva a qualquer lugar sem nos cansar. Chegamos, tinha várias pessoas na porta, uma casa bem humilde. Ele morava com a mãe. Ficamos aguardando a minha filha, esta me explicou que essas pessoas só iriam receber um passe, que isso era rápido. Resolvi ficar dentro do carro, meus filhos estavam conversando com vários casais, passei por um cochilo, quando meu filho veio me buscar, entramos numa pequena sala com algumas cadeiras e várias latas cobertas com papel que também serviam de bancos, reconheci as latas, eram da oficina do meu filho. José estava sentado numa pequena mesa rezando, levou algum tempo, levantou e veio até nós, me abraçou com muito carinho e me levou para perto da mesa, sentei em um banco, mas meu filho o trocou por uma lata, quis recusar por não querer privilégio, me advertiu por ser mais seguro, ele já estava acostumado, sorrindo tiramos os sapatos, o ambiente foi escurecido e passaram a rezar. Prestei bastante atenção, gostava das orações, ele não lia, dizia tanta coisa boa. Depois disse que seria de reflexão essa reunião, pediu para a minha filha falar, primeiro dizer o que fez de bom, depois seus projetos. Ela começou: – Dei muitas aulas as crianças que não estavam acompanhando as aulas, não era por preguiça, mas a maioria tinha falta de estrutura, algumas escreviam em cima de bancos, a casa não tinha outro lugar para fazerem as lições, outras no degrau da entrada de casa, também senti a fome e a tristeza nessas criaturas, fiz o que me foi possível, os lugares eram muito longes e por isso perdia muito tempo em me locomover. Agora vou expor o meu projeto, não sei como dizer, me faltam energias e meios financeiros, pois gostaria de alugar uma sala próxima dessas crianças e colocar carteiras onde pudessem escrever e de alguma forma fornecer um prato de alimento. Quando terminou de falar, chorava muito. Meu filho a abraçou e disse: – Confia em Deus, ele vai nos ajudar. José escrevia sem parar, resolvi pedir em voz alta um auxílio, que Jesus, que tanto amou as crianças nos ajudasse na luta que minha filha estava travando. Pediram para outra moça falar, não ouvi muito bem, mas senti um aperto dentro de mim, porque minha filha não veio pedir essa ajuda, ela sabia que eu poderia fazer isso e muito mais, sem me afetar. Não sabia que ela ia dar essas aulas, eu pagava para minha neta aulas particulares 28

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e ela se sacrificava com outras crianças, não entendia porque disso. Quando fui convidado a dizer o que tinha feito e o que queria para o amanhã, respondi que estava escrevendo outro livro sobre minha experiência e não tinha sido publicado, mas seria de utilidade para as aulas de agronomia e o amanhã iria procurar um galpão ou um terreno, mandaria construir o que mina filha precisasse para essas crianças, se não o fiz antes foi por não estar a par, todos bateram palmas. Minha filha disse que não o fez porque não pedia a quem poderia dar, que desse e o nosso amanhã devemos aceitar conforme nos é dado, e pede a Jesus retornar bênçãos a caridades feitas, elas virão como pagamento. Não podemos ver, mas com certeza podemos sentir nas nossas vivências ou os nossos descentes receberão sem saber, sorrimos e os outros falariam nas próximas reuniões. Bebemos água de um garrafão que estava na mesa, José veio me agradecer a colaboração, não respondi, me achava um ignorante perante eles. Vieram várias pessoas em direção da minha filha dizendo que, poderiam ajudá-la, uns eram professores de português, outros de matemática e outros de matérias diversas, minha filha chorava e agradecia a ajuda. No carro falei ao meu filho, me ajudar a procurar um terreno ou um galpão para a minha filha e isso correria por minha conta. Minha filha só chorava, abracei-a e fomos para casa, chegando disse: – Por que você não pede para a professora da sua filha lhe ajudar. Prontamente me respondeu: – Ela já sabe e vai me ajudar. Vi que meu filho olhou para mim de uma maneira estranha, entrei em casa ainda refletindo em tudo, gostaria de ajudar também José, pois sua casa era muito humilde e não sabia se poderia oferecer alguma coisa, iria falar com os meus filhos, assim não teria receio de ofender o rapaz. Dormi muito bem, estava tomando o meu café, quando bateram na porta. Estranhei por ser muito cedo, abri e vi uma moça, me senti mal outra vez. Mais tarde contei a José e ele me disse: ─ O senhor perdeu os sentidos porque teve contato com a presença dela. Estou contando para que o senhor possa avaliar a vida, tudo tem ligação, o passado nos traz sintomas que nós desconhecemos. Tivemos permissão desta revelação pela sua conduta de amor pela sua família. O senhor deve bastante a sua esposa que contribuiu com o amor vencendo o mal, dando muito de si por sua conduta. Está no senhor perdoar quem lhe feriu, assim passarão a viver pelo amor. ─ Se tudo depender de mim, eu já perdoei. ─ Não é tão fácil, o tempo vai se encarregar do perdão, ele está escrito na escuridão, ele terá que vir para a luz. ─ Como devo fazer? ─ Essa moça passará a vir duas vezes por semana, primeiro comigo e depois sozinha. O tempo se encarregará do resto. Concordei. No dia seguinte cedo, José esteve em minha casa, eu estava ótimo. Oramos e pedimos proteção para essa nova tarefa, mandou me sentar e chamou a moça, combinamos que começaria a vir todas as tardes, eu deixaria a porta aberta. Ficava sentado para evitar cair, ela rezava e depois ia embora. Eu sem poder ouvir uma única palavra, assim foi durante um ano. Numa dessas tardes comecei a ouvir algum som, depois passei a entender, disse Viver, Rezar & Amar

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a ela e por isso chorou muito. Fui melhorando dia após dia, ela percebendo que eu podia ouvir ajoelhou-se e pediu perdão, me disse: ─ Se o senhor me consentir serei liberta e poderei seguir o meu caminho, não está sendo fácil, mas ficarei em paz do mal que lhe causei. Respondi: ─ Eu te perdoei de coração, siga sua vida e se precisar te ajudarei. Todos os dias rezávamos juntos, um dia perguntei se gostaria de me acompanhar na procura do terreno ou galpão, me respondeu que faria com prazer e se eu comprasse um carro ela guiaria, assim seria mais rápido. Pedi ao meu filho e ele achou um pequeno carro, simples e econômico. Fomos a todos os lugares que nos indicaram, tudo se tornou simples com esse meio de transporte. Comprei um grande terreno e construí um galpão, onde minha filha, amigos e essa moça começaram a ajudar as crianças. No espaço que sobrou mandei construir uma grande sala para o centro de estudo, tudo estava caminhando conforme Jesus queria ajudar a quem precisasse. Passei para este plano, mas continuo ajudando. Nome e vivência somente serve de identificação, assim sendo fui Davi nessa encarnação e agora sou apenas Mestre das plantas.

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10/2010

Oração das sete semanas 1ª SEMANA Senhor, hoje estou com a consciência muito pesada. Senhor, eu vos peço ajuda. Ajuda para não julgar. Creio que não tenho competência. Com a vossa ajuda, vou poder dar energias e a boa palavra a quem precisar, como um pequeno resgate meu. Ajuda-me nesta caminhada para poder avaliar-me bem. Ajuda-me jesus para eu poder ser melhor.

2ª SEMANA Senhor, deste-me tanto, e não avaliei o quanto recebi nesta existência. Deste-me a água da chuva que cura todos os males físicos. Deste-me a terra que com sua energia nos dá tudo Viver, Rezar & Amar

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Quanto necessitamos e com ela podemos ainda construir nossos abrigos e melhorar, os embelezando plantando a natureza para os nossos olhos. Que teu nome seja sempre bendito.

3ª SEMANA Se vos peço Senhor, não tanto por mim, mas pelos que me são chegados, e amigos dessa vivência. pelo físico ou pela compreensão que possamos falar através da vossa grande energia e mandar para aqueles que precisam da ajuda espiritual que é muito importante nesta vida.

4ª SEMANA Senhor, se eu com a minha intolerância julgar qualquer amigo, perdoa-me e me dá a compreensão que devo primeiro me avaliar e depois ajudar aquele que julguei que eu possa dar o que me deste sem me julgar e nem me avaliar nesta minha vivência.

5ª SEMANA Senhor, saiba me esclarecer porque reclamamos tanto de tudo desta nossa vivência no julgar de tanta incompreensão que até está me fazendo mal. Faça-me um instrumento da tua vontade somente ver o que eu devo dar valor nesta vida que me deste 32

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de graça e com amor como Jesus disse.

6ª SEMANA Senhor, estou pedindo ajuda-me sei que meus erros são pesados, mas não os vejo. Somente sinto os dos outros seres que até são fáceis de resolver. Os meus não os enxergo. Ajuda-me para que eu possa sentir e ver os meus erros. Ajuda-me senhor.

7ª SEMANA Senhor, perdoa-me pelo meu egoísmo e minha falta de espiritualidade. Ajuda-me para eu crescer e poder ter forças de ajudar aqueles que precisam. Perdoa-me se puder e ajuda-me a fazer tudo dentro da tua luz. Que eu possa enxerga-la e guiar-me nesse vosso caminho. Agradeço por todos os seus valores.

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11/2010

Um conselho

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odo ser que vem para o plano físico tem um objetivo, não inclui crença ou religião. Quando o ser ainda pequeno recebe as energias do pai e da mãe. Às vezes de algum familiar que esteja ligado ao plano espiritual. Quando o ser cresce e começa a escolher as suas roupas está se desligando das energias dadas. Começa a usar as suas. Podem ser fortes ou fracas e esse ser tem a capacidade de ver coisas que outros não veem. Quando crescem tem totalmente as suas energias conforme as forças desse ser. Distancia-se de todos os familiares, vive a procura dos complementos para a sua vivência, quase sempre são criticados pelas pessoas que não o entendem, mas é assim a volta para se cumprir escolhas feitas. Nem sempre encontram o que procuram, sofrem na parte física, doenças ou até desligamento da matéria. Voltam em outras vidas para encontrar a realização da sua meta. Os familiares nem sempre fazem parte da sua vivência, apenas uma aproximação do objetivo. A vida é simples, o complicado é o entendimento. Tem seres que se afastam de todos, não que de todos ele julga, mas não é culpa dele, é a procura da volta ao corpo físico para ajustar o seu julgamento, resgatar ou ajudar a quem amou muito. Quantos seres não precisam do corpo físico, mas mesmo assim voltam por querer estar ao alcance da ajuda que sabe ser necessária. Sofrem as consequências da terra, mas preferem esse caminho. Quando não entenderem o que estão passando, analisem as suas vidas e verão que tudo tem resposta. Sejam sinceros nas suas perguntas e reflitam os seus procedimentos. Terão todas as explicações, vai parecer difícil, mas se analisarem bem fundo sentirão como é fácil viver para se cumprir o objetivo desejado. Nem sempre as suas respostas estão entre os seus familiares. Prestem atenção nos seus amigos e talvez alguns não lhe fazem bem no contato. Às vezes as pessoas que proViver, Rezar & Amar

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curamos está bem perto e não conseguimos sentir, por ser um caminho obscuro. Assim foi e sempre será. Os seres terão que aprender pela vivência. Analisem e estarão sempre bem consigo. Se eu puder dar maiores explicações, o farei. Que Deus possa iluminar todas as cabeças. Adalberto

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12/2010

A vida de uma sonhadora

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stas palavras da minha existência que sirvam de alerta para aqueles que pensam que a vida se resume em poder financeiro e em sobrenomes. Quando os serem veem ao universo são todos iguais, é o homem que faz as classes e assim estão tornando as vivências mais sofridas e as moças, principalmente avaliam muito isso para casamento, por isso dou o meu exemplo. Quando nasci minha mãe já tinha oito filhos, eu fui a última. Logo que vim ao mundo, meu pai faleceu e minha mãe para criar tantos filhos começou a fazer comidas para trabalhadores, meus irmãos ajudavam dentro do possível e eu fui criada pela minha irmã mais velha. Quando cresci, sempre fui mimada. Estudei em colégio pago, assim quando faltava um ano para me formar professora, conheci um rapaz de boa aparência que ia se formar advogado, família de nome e de um nível alto, todos os membros tinham o título de doutor. Dessa forma começou a minha ilusão. Levei-o para conhecer todos de casa. Dois irmãos tinham bar e minha mãe fazia comida para eles servirem. Mal sabiam escrever, meus irmãos e minha mãe não aprovaram o meu namoro, disseram que nunca iria dar certo, o rapaz era muito orgulhoso. Achei implicância e não dei ouvidos. Fui conhecer os pais dele em um almoço, achei muito luxuoso e não gostei, mas deduzi que ali eu poderia ser alguém. Fui influenciada pelo rapaz para fugir. Ele se justificou dizendo que a minha família não teria como ir ao nosso casamento, iriam se sentir mal perante seus amigos, analisei em minha mente e reconheci que era verdade. Poderão ir a minha formatura. Segui o meu sonho, fugi e logo dois dias após realizou-se o nosso casamento, não comparecendo ninguém, somente os padrinhos que ele escolheu. Depois passamos em uma igreja da religião dele e fomos abençoados para termos muitos filhos, eu achei graça, ele me explicou que como descendente de árabes, teria que ter muitos filhos homens, pois as mulheres não eram muito bem vistas. Estranhei, mas não dei importância. Viver, Rezar & Amar

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Estava entrando em uma família de nível alto. Fomos viajar para o interior, na casa da avó materna, gente simples que me aconselharam muito bem. Numa conversa soube que minha sogra fora pobre e depois que se casou nunca mais veio ver sua família e para eles isso era muito grave, pois concluíam que ela tinha concordado com a forma de vida do marido. Como esposa não deu os filhos desejados pela religião. Eles conheciam somente o meu marido de filho. Fui alertada para ter muitos filhos, só assim seria gente, perante eles. Não espere muito dessas pessoas, nem desse que é o seu marido. Achei conselhos de velhos. O meu marido já era advogado, ganhava bem como me dizia, trabalhava com vários primos, todos advogados. Futuramente teria o seu próprio escritório e eu seria sua secretária, viveríamos sempre juntos. Passei a morar num quarto dos fundos na casa dos meus sogros, falaram que seria melhor, eu teria mais liberdade, não era o que eu sonhava. Tínhamos uma cama e um pequenino guarda-roupa usado. Ele sempre dizia que era por pouco tempo, até realizar certos negócios. Minha família nunca me procurou. Encontrei certa manhã minha irmã mais velha e conversando, me disse: – Se você precisar, seja o que for, conte comigo. Os outros acham que você escolheu o que quis, assim tiraram-lhe da família e proibiram a mamãe de te procurar. Sorrindo muito me abraçou. E eu lhe respondi que estava muito feliz e que nenhuma mulher trabalha para comer no nível deles, não é o nosso de miséria. Logo fiquei grávida, mas para frustação deles tive uma menina. Minha sogra se apressou a dizer: – Guarde todas as roupas dessa menina para a próxima gravidez e peça a Deus que seja varão, se não sua vida não será a mesma. Não entendi, mas devido eu ter de cuidar da minha filha não dava muita importância aos acontecimentos. Quando eu ia lavar a roupa do bebê e a nossa, estavam no tanque muitas roupas que a cozinheira delicadamente me pedia para lavar, era para ajudar e que continuasse ajudando, pois seria o pagamento da nossa moradia, esqueci de dizer que o meu prato feito era colocado no meu quarto e que meu marido comia com os pais. Depois era para passar o que eu tinha lavado o dia todo. Mal tinha tempo para amamentar, quando meu marido chegava a noite eu lhe contava o acontecido, ele dizia que a mãe estava sem uma das empregadas. Comecei a cobrar do meu marido para mudarmos dali, não estava mais aguentando essa vida. Ele prometia, mas nada fazia. Fiquei grávida pela segunda vez e não passava bem, o desgaste físico era grande. Pedi a minha sogra para ir ao médico, eles tinham vários primos doutores que se fosse pedido seria atendida sem pagamento e também eu e minha filha estávamos precisando de roupas, respondeu-me que iria ver o que poderia fazer. Fui procurar minha irmã e contei a minha situação, ela disse: – Quando eu for ter meu filho, ela ficaria com a minha filha o tempo que fosse necessário. Também me levou a seu médico pagando a consulta e os remédios, recomendando mais repouso, algo impossível. Minha irmã me perguntou se podia entrar no meu quarto sem ser vista, dizendo: – Irei lavar e passar toda a roupa, assim você poderá descansar. Foi o que se passou até o fim da minha gravidez. Tive um menino que teve o nome de avô paterno, teve as bênçãos na religião deles e minha filha, minha irmã levou para batizar na nossa religião, ela e o marido foram padrinhos, ninguém me perguntou onde minha 38

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filha estava e com quem, nem o pai. Nesse tempo fui implorar que ele alugasse uma casa num bairro retirado que eu conhecia, era para poder criar as crianças com mais liberdade, só que ele não sabia ser próximo dos meus irmãos, e a minha vida ficaria melhor. Certo dia ele disse que trocaria de firma para ganhar mais, mas teria que ficar mais tempo no Rio de Janeiro do que em São Paulo, achei ótimo. Meses depois me comunicou que tinha comprado uma casinha no bairro em que eu queria, mas o preço era ele ficar mais ausente devido à distância, mas faria isso para melhorar ainda mais nossa situação. Essa casa era vizinha do meu irmão, coisa que ele nunca soube. Assim aconteceu, comecei a fazer macarrão em casa e vendia bem, para me sustentar e aos meus filhos. Os filhos foram chegando e minha família me ajudado. Meus irmãos e minha mãe estenderam as mãos. Fazia bolinhos que meu irmão vinha comprar para vender no bar. Nessa época minha mãe já estava doente e logo veio a falecer. Assim eles me ajudaram. Quando meu primeiro filho fez 10 anos passou, depois do almoço a ajudar no bar e a noite meu irmão o trazia para dormir e pela manhã ia a escola. Meu marido nunca perguntou nada, trazia suas roupas sujas para lavar e passar. Minha filha passou a trabalhar em uma firma que meus cunhados arrumaram e estudava a noite. Deus me deu muitos filhos que somente me ajudaram a passar a vida e avaliar as ilusões. Minha filha, uma noite que não teve aula e o pai estava em casa, perguntou se uma pessoa com o mesmo nome do seu avô paterno, e do seu irmão poderia ser parente, pois o dono da firma onde trabalhava se chamava assim. O pai pulou da cadeira e falou com agressividade, como era do seu costume ao se dirigir a mim e aos meus filhos, gritava e grosseiramente disse que não queria saber da família e proibia dela investigar essa origem. Ela explicou que tinha dito ao seu chefe que não poderia ser parente, pois somos muito pobres para ser dessa família, mas vou perguntar ao meu pai. Por essa atitude do pai, meus filhos passaram a investigar, e minha filha conseguiu com o rapaz que entregava documentos verificar o endereço do dono da firma, era num dos bairros mais nobres da cidade. Meu filho mais velho pediu uma calça melhor ao seu primo e com minha filha se dirigiram para esse endereço. Chegando viram um velho saindo da casa, esperaram um pouco e tocaram a campainha, pediram para falar com o proprietário, o senhor que a atendeu disse que ele tinha saído. E sua esposa não pode nos receber? Mas quem são vocês? O meu filho mostrou a carteira de identidade ao homem, este disse: – Não pode ser, nunca soube que esse senhor tivesse netos. – Só quero ver essa senhora, por favor, não vamos demorar. Imediatamente veio uma senhora que minha filha descreveu como uma pessoa má. Meu filho apenas disse: – Eu sei quem a senhora é, mãe do meu pai e que ele mora aqui. Só peço a senhora que lhe de um recado, não aparecer mais em nossa casa, não o reconhecemos mais como pai e será melhor para ele, do contrário levaremos o caso a público. E todo esse luxo a senhora perderá, somos filhos legítimos de seu filho e somos nove membros. Desfrute o que a senhora puder e o senhor seu marido acompanhado do seu filho sem caráter. Viraram as costas e ao sair perceberam que o criado a segurava para não cair. Minha filha contou ao chefe o acontecido dizendo que se ela causava consequências a firma, que sairia. Ele prontamente respondeu que se precisasse juridicamente de algo, que contasse com ele, pois ainda tínhamos irmãos menores. Passou-se um bom tempo, mas eu esperava o pior deles. Certa tarde parou um carro em frente a nossa casa, desceu um velho, entrou como Viver, Rezar & Amar

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se fosse dono da casa, nesse momento estávamos eu e três de minhas irmãs. Eu o reconheci logo. Veio falando alto e grosso, uma das meninas perguntou quem era esse velho mal-educado. Respondi: – Esse velho é o pai do seu pai, que se acha importante e deve se dar o respeito. Nisso chegou um dos meus irmãos, pediu com voz firme segurando-o pelo braço, que saísse da nossa casa, o senhor está sujando o lugar onde mora a pobreza e a dignidade. Minha irmã lhe disse: – Respeito sua velhice, volte para sua casa, não queremos nada nem do senhor e nem de ninguém que leve seu sobrenome, pois iria sujar os meus filhos. Retire-se ou chamo a polícia, o senhor invadiu um lar e isso é contra as nossas leis, sou uma cidadã brasileira e o senhor é um invasor de domicílios. O velho levantou a mão para bater em meu rosto, mas meu filho segurou e falou: – Não se atreva a usar a sua força, sou mais jovem e poderei jogá-lo na calçada. – Vim para dar algo a sua miséria, mas devido a sua falta de compostura não darei nada. – Ótimo, o senhor diga ao seu filho que também não queremos nada dele, apenas que nos ignore. Pois talvez nem reconheça mais os seus filhos, isso é muito bom. Tenho vergonha de ter o seu sobrenome e até a sua fortuna pode ser uma fraude no meu país. Ele se retirou. Eu passei mal. Minha irmã veio e elogiou a atitude dos meus filhos pedindo que trancassem a porta, dessa gente tudo se pode esperar. Passaram-se muitos anos e não tivemos mais notícias de ninguém, quase todos os meus filhos se foram, alguns casando e outros seguindo suas vidas. O meu filho mais velho assumiu o bar do meu irmão, transformando em um elegante barzinho de luxo, minhas filhas casaram-se com pessoas pobres, mas dignas. Certa tarde minhas três netas estavam brincando no meu pequeno jardim. Vi um senhor malvestido no parapeito, pensei se tratar de um andante, mas reconheci o meu esposo, o homem causador de um sonho de adolescente que esperava um príncipe, no lugar encontrou somente um sapo. Cheguei ao portão e minhas netas se abraçaram em mim, como para me proteger. Perguntei o que desejava, com a voz bem baixa, perguntou quem eram as crianças. Respondi: – São minhas netas, filhas de uma das minhas filhas que Deus me presenteou, fale o que quer aqui. Com a voz embargada, disse: – Devido ao país estar passando por momentos difíceis e o meu pai ter ligação direta com o estrangeiro, perdemos tudo, não tenho mais emprego. Moramos em uma pequena casinha na periferia e temos que sair por falta de pagamento, então vim pedir se você pode alojar os meus pais, eu tenho onde me abrigar, mas não posso leva-los, minha atual companheira não os suporta, sei que errei muito e você sempre foi uma boa pessoa. Será por pouco tempo, até achar alguém da família deles. – No momento não tenho nenhum quarto disponível, mas no fundo da casa tenho a lavanderia, poderia acomodá-los lá. Nisso veio minha filha que tinha reconhecido o pai, dizendo: – Quanto o senhor pode pagar para esses velhos ficarem aqui? Minha mãe não é empregada de ninguém, nem responsável de seus parentes. Ele pensou e disse: 40

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– Vou falar com eles. – Ótimo, esse casal terá que lavar suas roupas, esse serviço sou eu que faço, tenho três crianças e também a alimentação terão que se virar, trabalhamos para nos sustentar e ainda eu leciono. Acho bom o senhor coloca-los em um asilo. E foi por causa de sua família que minha mãe sempre pagou para morar com os filhos e os criou sozinha, por isso não quero que ninguém venha morar aqui. Veremos o quanto é esse valor, do contrário terá que bater em outra porta, esta sempre esteve fechada para o senhor. Minha filha pegou as crianças e pelo meu braço dizendo: – Vamos mãe, a justiça divina é maior do que nós podemos estar em paz. Entrei chorando com pena dos velhos. Duas de minhas filhas me abraçaram falando: – Mãe, você é a pessoa mais forte que eu conheço. Eles não vieram, não fiquei sabendo do destino deles, só sei que agradeço os filhos que Deus me deu. Hoje onde me encontro tenho paz, mas me preocupo com os sonhos dos adolescentes. Uma sonhadora

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01/12/2010

Avaliação das vivências

A

vivência espiritual é bonita e gratificante para poder sentir e julgar. Dizer palavras soltas não faz bem a ninguém, “eu quero isto ou aquilo”, é fácil sair de uma mente, mas para se adquirir coisas ou causas, primeiro tem que merecer. Somente querer não tem sentido. Se damos orientações é porque esse poder temos, nada do que fazemos fica sem sentido ou mal julgado. As ações, não julgamos nem a vida e nem as atitudes. Há seres que já pagaram todas as dívidas por vivências vividas, tiveram erros, mas hoje tem potencial adquirido com trabalho e estudo. Somente queremos ajudar os seres que ainda não possui energias suficientes para enxergar a sua vivência, às vezes por estar com energias não boas e assim sofrem coisas que não são suas. Nesse nosso trabalho somos muito bem pagos, adquirimos conhecimento e novas energias, coisa de muito valor, nem sempre o pagamento é da forma que queremos e sim o valor dado pelas nossas leis que são justas. O ser humano faz coisas sem avaliar. Os resultados, ao contrário avaliamos tudo para saber os efeitos. Não pesamos o que dizem, mas pedimos que não nos julguem sem saber explicar, não seria com simples palavras que poderíamos reduzir as energias, isso o ser deve sentir e quando falta vai avaliar o que é nosso trabalho é tão justo que às vezes sentimos que fazemos tão pouco e somos tão bem reconhecidos. As vossas crenças imensamente sentidas por nós dão oportunidades de trabalho e isso é o nosso maior pagamento, mas aqueles que não nos dão crédito, ficamos tristes porque perdem uma oportunidade de ver mais luz no seu caminhar. Procurem sempre pela luz, não pelo brilho. Assim vocês sofrerão menos, não necessariamente seguir os nossos padrões. Sigam os seus, mas cientes. Observem os seus potenciais e assim serão menos sofredores dessa bola que é o universo. Que Deus possa estar sempre com vocês. Beto Viver, Rezar & Amar

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01/2011

Dado, o peregrino

N

uma das minhas vivências fui um ser muito feliz, tive uma esposa maravilhosa e uma filha amorosa, tinha estudo profissional e era uma pessoa que não pretendia mais nada da vida. Apesar de ter um poder aquisitivo bom, minha esposa sempre fez as nossas refeições, às vezes eu a convidava para irmos comer fora e ela dizia? – Você não gosta de comer mal, assim comeremos bem em nossa casa. Sempre comíamos na pequena sala de almoço, ela dizia que assim podia atender os dois lados, a família e as empregadas sempre prontas para ajudar. A sua ordem era: – As refeições da família a mim pertence, só deixarei quando Deus me tirar as forças. Colocava sempre um prato a mais na mesa e depois de nos servimos, enchia bem o prato e dizia: – Senhor, esta refeição é para aquele que tem fome, envie a ele, assim comerá. E nós tínhamos que dizer “amém”. Vivemos muitos anos sempre felizes, minha filha cresceu foi estudar fora, assim passamos a viver de recordações, minha esposa adoeceu e muito rapidamente me deixou fisicamente. Minha filha se formou em medicina e se dedicou as pesquisas, se casou com um colega e viajavam muito. Assim me achei só me dedicando ao trabalho, mas achei que precisaria estudar e pesquisar a vida de Jesus, tudo estava me interessando, mas porque eu tinha que estudar essa vida? A vida de Jesus que já foi vivida e dedicada a tantas pessoas, sempre dizendo boas palavras, ajudando a quem precisasse em sua existência. Eu não poderia fazer muito, pelo menos seguir o que ele deixou para todos nós. Escrevi para minha filha, dizendo que no futuro iria viajar e daria notícias. Vendi tudo o que pude e muita coisa dei para as pessoas que conviveram todo esse tempo comigo. Primeiro fui para a Itália, pesquisei muito e depois fui para o Egito e de lá para Israel. Viver, Rezar & Amar

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Comprei muitas coisas conforme as minhas pesquisas. Fui para Jerusalém, uma cidade sem nenhuma estrutura, sem higiene e de muita fome, por esse motivo Jesus viveu lá. Comprei muito sabão, sacos de pano bem grandes e pequenas tesouras, remédios para tratamentos rápidos, muitos vidros de um produto para desinfetar pestes, facão e alguns cobertores. Me dirigi para a grande montanha dos sábios, muitas pessoas iam para lá e pediam ajuda e eu com os meus sacos ajudava com o que podia. Quanto mais próximo chegávamos íamos sentido o ar mais difícil, um cheiro horrível, muitas pessoas desistiam e voltavam, mas eu continuei. Iria fazer algo que nem eu sabia, queria ajudar. Pedia a Jesus que me desse forças no meu propósito. Chegamos a entrada da montanha, o mau cheiro era horrível, quase não dava para respirar. Ali encontrei um ser idoso de longos cabelos e barba com aspecto bem sujo, com uma túnica nas mesmas condições, cada pessoa dava as suas ofertas e iam embora. Quando chegou a minha vez, falei no idioma egípcio, em francês, italiano, dialetos e o velho parecia não me entender, nem as crianças que o cercavam, aí falei em hebraico, a língua que se falava em Israel na época dos meus antepassados, falei que eu ia ficar para ajudara todos. Ficaram alegres, as crianças carregaram tudo que era meu rapidamente nos pusemos a subir parando duas vezes em abrigos muito sujos, mas ali havia nascentes. As crianças tiraram as roupas e se banharam, abri um dos meus sacos e peguei um sabão e esfreguei cada criança com a água, que formou muita espuma, riram e gritaram ”o senhor também tirou a roupa, molhou-se passou sabão”, falei que para valer tinha que esfregar. Começou assim, todos tomaram um banho, não como eu queria, mas para princípio estava ótimo, cortei as unhas do senhor e das crianças com pedras grossas, eles gostaram, cortei também seus cabelos. Assim foi a minha chegada. Pelos meus cálculos, levamos dois dias para chegar aos abrigos, olhei tudo, haviam muitos abrigos, todos feitos de grandes pedras. Meu trabalho seria grande, mas estava convencido que iria conseguir. O principal era nos entender, isso já estava conseguindo, num dos abrigos de homens idosos, um deles falava francês, eu falava com ele e ele traduzia aos outros. Onde as crianças dormiam eram barracas feitas de folhas, em volta de tudo haviam muitas árvores e num dos lados se localizava um vale que fazia a separação com outra montanha e nesse vale passava um grande rio e também se enxergava uma grande cachoeira na costa da montanha. Eram pessoas boas, se tratavam com tolerância e respeito um com os outros, todos acordavam voluntariamente, distribuíam comida e assim foi nossa caminhada. Andamos muito, seria incapaz de voltar, mas os meninos riram e disseram que voltariam sem problemas. Escolhi três meninos e dois barcos para irmos em busca de ajuda para os meus propósitos, mas não tínhamos muito tempo, teríamos que voltar antes da chuva, isso os meninos sabiam. Fomos até chegarmos a um pequeno povoado, mas somente encontramos pessoas idosas. Os meninos falavam o idioma e certo senhor ensinou que no grande mercado seria mais fácil e disse também para levarmos ferramentas e isso eu já tinha pensado. Levamos dois dias inteiros para chegarmos. Era apenas uma pequena praça e lá tinha muitas casas e alguns homens, quando nos viram, correram oferecer suas mercadorias. Percebi que falavam um idioma que eu conhecia, falei que pagaria em dinheiro do país, que depois podiam comprar terras. Mas quando falei que éramos da montanha, fugiram largando tudo. Fiquei sem saber o que fazer, sentei com os meninos num canto. Ao retornarmos conversei com o mestre e contei sobre a minha deserção, não desistiria, iria até a mais próxima aldeia e contrataria alguns homens para nos ajudar no que tinha 46

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que ser feito na montanha, para amenizar o cheiro que poderia causar uma epidemia, não só nas crianças como em todos, teríamos que enterrar todos os animais mortos, como várias coisas mortas e as fezes teríamos que enterrar tudo do outro lado do rio. Fazer fossas e buracos na outra montanha para enterrar os mortos, revolver a terra dos abrigos e muitas outras coisas necessárias, como educar as crianças a ter higiene com o corpo, além do lugar onde comem e dormem. O mestre achava tudo maravilhoso, mas mexer com os mortos seria um sacrilégio, tive que apelar para a religião dos antigos faraós, que seus mortos eram colocados dentro de grandes pirâmides e ali ficavam. O cheiro poderia matar muitas pessoas, até da aldeia sentia-se o odor da montanha. Depois de muita conversa consegui o que queria. Ele se lembrou que nenhum homem subia para ajudar, veremos, se eu pagar bem eles não vão recusar. Vi muita miséria na aldeia. Eu vou pelo rio e terei de levar dois ou três meninos grandes e dois barcos, assim eles me ajudarão, talvez levaremos vários dias, não sei quantos, para achar tudo o que pretendo. Ele concordou e disse que depois falaria com os outros mestres. Partimos e quando chegamos para mim seria um grande barracão, mas estava fechado, mas os meninos sabiam onde os mestres moravam, demos a volta no barracão e bem no fundo via-se um grande abrigo de pedras, apareceram nesse momento uns mocinhos de túnicas longas. Esses sacerdotes eram de origem muito antiga, falavam vários idiomas inclusive o de Jesus, o aramaico que eu também falava, assim foi fácil nos entendermos. Prontificaram-se em tudo, levariam ferramentas e propuseram de trazer as crianças até realizarmos tudo, seria mais fácil, se queríamos fazer muitas coisas. Eles iriam para a montanha pela trilha e nós voltaríamos pelo rio e depois do transporte das crianças todos subiriam por esse caminho para destruir vários abrigos, já iriamos arrumando com as mãos oferecidas, tudo foi feito. Depois de dois anos a montanha voltou ao normal, os abrigos limpos, pessoas para educar as crianças, os mestres realizando suas missões, até o ar era mais puro. Certo dia disse para um dos mestres: – Estou feliz. Posso voltar para o meu mundo. O que me foi pedido cumpri. Ele me perguntou: – Quem foi que te pediu? – Não sei dizer com palavras, mas dentro de mim eu sabia que teria de ajudar o conhecer de Jesus, ajudar a sua montanha com as suas crianças, agora vendo tudo bem, esse perfume da água e flores, sou a pessoa mais feliz na terra. – E para onde vais agora? Terá outras montanhas? – Não. Vou estudar o que ele deixou para o mundo e os seres esqueceram-se de continuar os seus ensinamentos que é tudo muito simples e fácil. Quando conseguir traduzir em palavras, escreverei para assim ensinar como deverás amar. Sai das montanhas após dez anos, agradeci aos sacerdotes pois lá fui acolhido, pude aprender um pouco mais e hoje me foi permitido passar essa minha passagem. Aquele que ler e gostar não precisa ir as montanhas, em qualquer lugar no seu próprio convívio encontrará um lugar para ajudar aqueles que estão precisando. O perfume do ar é a vida, a água e sua pureza são a força dos braços e o conjunto é a união para fazer um ser feliz, não poderá só pensar em si, leve a boa palavra a quem não sabe entender, a chuva é de todos, mas nem todos sabem que ela tem um poder muito maior do que molhar e o sol também não só aquece, ele dá a vida, seja amanhã uma estrela e diga: eu também sou um seguidor de jesus. Viver, Rezar & Amar

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Verão como a vida terá outro valor. Seja uma flor de um lindo jardim que ele oferece ao mundo e poucos podem sentir. Do amigo Dado (do verbo doar)

Dado o peregrino quer dizer: o ser que se doou seguindo os passos de Jesus sem esperar nada a merecer. A realização de um sonho em vida.

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02/2011

Dado, o peregrino 2

T

odas as vivências são consequências da vida, mesmo que não aceitemos, são leis que regem o universo. Às vezes os viventes reclamam das mais diversas formas com o que lhe acontecem, mas são escolhas por dívidas ou ajuda pelo amor deixado. A sequência das vivências depende muito de o próprio ser se educar, do contrário os problemas serão cada vez mais doloridos, por isso sempre se analise, assim poderão reverter as dores e mesmo o peso de uma vida. Vou relatar uma das minhas vivências, verão como tudo são sequências. Quando fui analisar a vida de Jesus, como ele pode passar para o mundo suas ideias e o modo mais fácil de viver, aconteceu o seguinte: As minhas caminhadas sempre foram longas. Em uma delas, eu me encontrava no deserto do Egito, num dia quente, acima do normal e estava muito cansado, quando avistei uma árvore, coisa rara no deserto, achei ótimo e corri para ela. Lá encontrei uma senhora muito bonita, mas de certa idade. Cumprimentei-a e pedi licença em me abrigar do sol e do imenso calor. Ela sorriu e disse: – Esta sombra não me pertence, é de todos, sente aqui neste tronco e tome um gole de água que trago neste vasilhame. Tomei e por incrível a água estava bem fresca. Sentei ao seu lado e me senti sonolento, ela me disse: – Se quiser deite na relva e coloque sua cabeça no meu colo. – Mas senhora eu vou abusar da sua generosidade. Sorrindo me puxou para seu aconchego. Adormeci logo e sonhei. Estava no Egito, mas num lugar estranho para mim, era um lindo jardim, ali estava uma moça vestida como sacerdotisa, usava um cinturão dourado, nisso se aproximou um jovem e a beijou, disse em voz baixa: Viver, Rezar & Amar

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– Estou sendo vigiado pelo grande sacerdote, é melhor não nos vermos por algum tempo. Ela o abraçou e respondeu: – Mas você como faraó não tem mais poder? – Tenho, mas por você, na tua situação é muito perigoso. Quando a criança nascer eles não irão investigar, será criada por você se for menina e ao contrário eles o criarão, mas sempre poderemos identificar, porque meus descentes terão a minha marca, a estrela de Davi. Estará para sempre em seus corpos, em todas as gerações. Aí eu vi outra cena, um grande templo e essa mesma moça dando uma criança para um sacerdote dizendo: – O faraó já o abençoou, você dará o seu nome e o educará para o mundo. Acordei num sobressalto e pedi desculpas a senhora. Ela me acariciava os cabelos, eu disse: – Como é bom recordar, isso também nos instruiu, sonhei uma vivência no tempo dos faraós, isso faz muito tempo que não sei analisar, mas eu tenho na perna uma marca da estrela de Davi e tenho uma filha com a mesma marca. Não sei se há alguma relação com esse sonho. Sempre sorrindo disse: – Isso pertence a você analisar tuas vivências sem contar o tempo entre elas. Levantei e perguntei se a senhora não queria ver a marca, ela com a cabeça disse que sim. Agachei-me para levantar a calca e virei dizendo: – Olhe senhora, a marca. Ela já não estava ali, mas deixara um perfume de flores no ar, não saberia identificar a flor, mas era muito agradável e conhecido, minha esposa usava e minha filha também. Mas essa senhora não parecia com a minha esposa, ela quando passou para outra vida era bem jovem, fiquei sem saber o que pensar ou fazer. Analisei esse sonho, mas não cheguei a nenhuma conclusão lógica, mas como terminei os meus dias em um grande templo, hoje sei que o sonho foi uma volta ao passado, nada que fiz foi por acaso. Aquela senhora foi minha mãe, depois viveu como minha esposa e hoje está trabalhando com os meninos na montanha, deixando o seu perfume de flores como uma assinatura. Assim recebi um grande presente de amor, tanto de mãe com a sabedoria da sacerdotisa e depois como esposa amiga, amante e mãe exemplar dos meus filhos. Sinto-me um ser privilegiado, tirando como posso as coisas pesadas e sem valores, limpo sempre os caminhos para que o perfume permaneça no universo entre todos os seres. Dado, o peregrino

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03/2011

Saulo

E

u fui e sou um ser muito feliz, por não ter as energias do mundo físico, mas as energias do espaço e do vento. Nasci como todos, numa família de pai, mãe, uma irmã e dois irmãos. Eu fui o último filho, muito amado até os dez anos. Quando ia cursar o ginásio, pedi aos meus pais permissão para seguir música, meu pai relutou, pois naquela época um músico, não era ninguém, era julgado um vagabundo, mas mesmo assim fiquei firme no meu ideal. Fui para a cidade e comecei a minha caminhada, fiquei morando no próprio conservatório, pela manhã fazia o ginásio e a tarde a música, cursei os instrumentos: piano e todos os de corda para melhor avaliar o que mais me identificava. Quando comecei os de sopro, senti que aí estava a minha realização. Escolhi a flauta. Para mim esse instrumento fazia parte da minha vida. Quando terminei o ginásio, comecei a dar aulas de português e matemática. Assim com esse meu trabalho poderia pagar o meu curso e a noite tocava em bares e reuniões, assim tirava o meu sustento. Desliguei-me dos meus familiares, sem perceber. Ao terminar o curso de música, montei uma orquestra internacional, que acompanhavam as óperas e com isso fui o centro de muitos elogios, assim percorri vários países até me fixar na Itália. Ali faria apresentações com alguns colegas. Certa vez fomos convidados a ir para a Alemanha, depois Áustria, nesse lugar fomos em três músicos fazer uma apresentação numa casa de um coronel e ali também ficamos alojados. Fizemos muito sucesso. Tocávamos músicas e algumas de minha autoria. Assim crescemos muito nesse país. Certo dia levantei-me como costumava, às sete da manhã, era muito escuro nessa região, a claridade do dia começava às dez horas, era assim devido as montanhas. O cocheiro da casa que também se levantava essa hora, me convidou para irmos ver o dia nascer nos Viver, Rezar & Amar

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alpes, fomos andando no escuro, reparei que a grama era baixa e macia, diferente de todas que eu conhecia. Paramos no meio de uma montanha, ele me segurava o braço e disse: – Quando clarear verá o perigo em sua frente, uma grande pedra e depois uma profundidade. Conversamos bastante e me contou que era cocheiro somente quando tinha hospedes, pois morava no vale com seus pais, que tomavam conta de uma linda casa de uma família que a usava somente no inverno, e nesse ano não tinham vindo, mas depositavam os três salários: o de cuidar do jardim, cuidar dos cavalos e o de sua mãe que cuidava da casa e do fogão. Sua mãe era uma excelente cozinheira. Quando estavam disponíveis eram requisitados pela vizinhança, faziam extras, para guardar um pouco para o futuro, pretendia comprar uma casinha no vale e deixar os pais descansarem. Nisso começou a clarear, vi nos meus pés um vale profundo e no meu nível dos olhos outra montanha de lindos pinheiros, como se fosse um quadro. Nunca tinha visto nada tão bonito na minha vida, ele me disse: – Grite qualquer coisa, o vale e o vento vão lhe responder. Olhei para ele sorrindo, gritei o meu nome, esperei alguns segundos, ouvi a minha voz dizendo o meu nome em vários tons, espantado lhe perguntei: – Se eu trouxer a minha flauta e tocar, eu ouvirei a música? – Sim, faça isso. Sentirá o que Deus deu a humanidade e ninguém dá valor. No dia seguinte fui juntamente com os pais dele, preparei a minha flauta e assim que clareou toquei a minha música predileta, a minha primeira composição. Esperamos, quando os pinheiros foram movidos pelo vento ouvimos a minha música como se fosse um sopro do céu, eu e todos choramos pela emoção, olhando para a relva perguntei: – Quem plantou tudo o que estou vendo? O pai dele disse: – O maior jardineiro que não recebeu nada em troca e ainda responde a tudo, o que falam ou gritam. Ficamos muito tempo ali e me deixaram quando eu falava baixo com o vale e as montanhas, que eu nunca mais iria sair desse lugar e que tudo que eu composse iria tocar para o vale e as montanhas. Meus amigos músicos foram tocar em outras cidades, mas eu resolvi comprar a casa que os pais do meu amigo cocheiro tomavam conta, eles vieram morar comigo e me ajudar. Dava aula de música três vezes por semana, vendia as minhas composições e tinha um bom pecúlio. Vivi muitos anos, todos os dias ia ouvir os pinheiros e o vale conversar, dando-me uma vida dos sonhos, amor e muita felicidade. Certa manhã não consegui me levantar, o meu amigo não me vendo correu no meu quarto, eu lhe disse que não estava bem, talvez fosse a idade, ele não quis ouvir mais nada. Levou-me para o hospital junto com sua mãe. Os médicos disseram que precisava ficar uns dias para fazer alguns exames, pois como eu tocava instrumento de sopro, o meu pulmão estava com algum problema. Fiquei alguns dias hospitalizado, pedi que trouxessem o meu advogado, precisaria deixar os meus negócios em dia. Passei todos os meus bens para o meu amigo de tantos anos juntos com seus pais e o dinheiro quis que retirasse do banco para evitar transtornos. Dei tudo a ele, mas que sempre olhasse pela mãe e o pai que me cuidaram com tanto carinho. Nesse momento lembrei-me que também tive mãe, pai e irmãos. Estranho, nunca me lembrei deles, nem da minha irmã que sempre se dedicou por mim, qual o motivo desse 52

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esquecimento? Será que eu era desprendido do coração? Como eu amei o vale e as montanhas, pois para mim isso fazia parte do meu ser, era a minha existência as montanhas com seus pinheiros, a relva que sempre estava aparada e de um verde que jamais poderei descrever. Onde falhei? Não nasci ali, mas minha vida era nesse lugar. Quando eu tocava para o vale e depois de alguns segundos ele devolvia o meu som, era como uma grande carícia que eu recebia. Pedi apenas que se era meu fim, que me enterrassem no vale, pois ali seria o meu eterno sonho. Passei para este outro lugar não tão bonito, mas aconchegante. Olhei todo esse lugar, tinha flores coloridas e o meu vale somente o verde, eram de vários tons, procurei a minha flauta e não achei, precisaria que alguém me trouxesse, gostaria de tocar para essa nova paisagem. Vi uma senhora me olhando, fui até ela e percebi que já a conhecia, mas como poderia? A minha mãe veio até mim, um filho que teve muitos anos de esquecimento. – Não me esqueceu, foi a sua vida que assim te dirigiu. – Eu sempre soube que você não era para mim, a tua missão eu não sabia, mas foste mandado para a terra para mostrar que a terra com o vento e as árvores também sabem transmitir o amor e muita paz que o homem desconhece. Com a tua música deste ao mundo um novo som, quem ouviu ficou dentro deles, com um pouco de Deus. A minha passagem pela terra foi muito bonita e feliz, mas nos alpes me senti o maior e mais abençoado, tocava para o vale e para a montanha, depois de segundos eles em eco me devolviam o meu som na mesma tonalidade. Como eu posso agradecer tanta coisa que Deus me presenteou. Fui ingrato com a minha família, mas não fiz por mal, somente vivi para a música e a natureza. Cheguei a pensar que não tinha coração, mas se amei tudo isso, fui um ser normal. Espero um dia poder dar amor em dobro a minha mãe, por ter dado essa vida. Apenas fazemos o que temos de direito ou por merecimento. Se vocês sentirem o bem é porque já tem merecimento para isso, daqui para frente segues os vossos corações. Se eu puder seguirei as vossas caminhadas de muito amor e paz. Os seres que puderem analisar o quanto podemos ser felizes, e só depende de cada um. Que eu possa passar a minha paz para quem dela precisar. O meu nome nesse tempo foi Saulo.

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04/2011

Um bom alerta

G

ostaria que todos ao lerem, prestassem muita atenção na sua vivência, a maneira de falar e agir. Sua conduta, atinge a sua própria vida, tanto no seu futuro como no seu porvir. Quantos como eu disseram tantas palavras mal-empregadas, que romperam outras vivências tão importantes como a minha. Quantas lágrimas fiz derramar a pessoa que muito amei. Se um ser, durante um ano pudesse avaliar o som das palavras como nos afeta. Hoje vejo tantas flores coloridas de um perfume imenso, a relva tão linda, uma paz, tudo seria diferente se eu tivesse tido outra postura na vida, se tivesse observado o quanto me foi dado sem valorizar, se eu pudesse colher essas flores para amenizar o meu procedimento errado eu faria, gostaria de perfumar o caminho que estás percorrendo eu faria. Tive todas as chances e não dei valor. Ainda escuto dizer que faço falta no seu viver, de uma maneira sim, porque tive muitas glórias de sua vida. Hoje só temos isso que passou. Viver errado é fácil, difícil é reparar. Seria tão simples se não existisse o egoísmo, assim teríamos uma vivência de paz. Tive uma grande luz, eu sabia e não dei importância, sai da escuridão, não soube ver porque não tive força para sentir enquanto estive perto. Atenção, a sua maneira de viver é um alerta para a paz e a luz no coração. Estejam sempre atentos em tudo. A vida nos é dada, mas passa muito rápida, quando se tem tudo e não damos o devido valor. A luz brilha, mas quando nos é tirada, sentimos. Isso é tudo que eu pude relatar. Seja observador, onde está a sua luz, não a deixe apagar, olhe sempre para as flores e o seu perfume, isso pode ajudar.

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05/2011

O flautista feliz

À

s vezes temos chances de fazermos o que desejamos, mas não aproveitamos o tempo, assim temos que pôr mais atenção no dia a dia, nem sempre temos renovação das oportunidades e nem da que queremos. Eu fui e sou um ser privilegiado, tive uma vivência de felicidades, agora devo participar da vivência que gostaria de ajudar no parecer que tenho para dar, unir corações que viveram sempre em conflito e agressões. Essas pessoas foram umas que me deram muito amor. Meu pai que tudo o que fui, aprendi com seu carinho e amparo, até a idade de quatorze anos. Tive essa oportunidade, apesar de pouco tempo tentei aproveitar o máximo e ele aceitou, passamos a viver melhor. Que eu possa dar alguma explicação de quem foi quem nas minhas vivências, para entenderem melhor. Minha irmã passou a ser minha mãe e meu pai pela segunda vez meu pai. Minha avó muito querida, novamente minha avó materna para minha felicidade. Fui esperado com muito amor por todos, cresci assim até os cinco anos, aí começou a minha caminhada. No dia do meu aniversário, minha avó me disse: – Peça o que você quer ganhar. Pensei e pedi: – Quero uma flauta. Minha avó me explicou: – Quando sua mãe sair e encontrar, vai comprar. Mas minha mãe comprou uma flauta de brinquedo. Não gostei, mas não disse nada. Minha avó percebeu e disse: – Quando eu sair verei uma melhor. Somente respondi: – Sabe vovó o meu tempo é bem curto, por esse motivo a senhora terá de comprar logo. Viver, Rezar & Amar

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Ela sorriu e disse: – O teu tempo é curto e o meu está muito longo. Eu sorri, mas fomos cada um seguir o seu dia. Passou alguns dias e o meu pai veio em casa dizendo que teria um carro para ir à cidade, se queríamos fazer algumas compras ele ia nos levar, pois tinha que buscar uma peça para um carro, ele era mecânico de uma firma e sonhava em abrir seu próprio negócio. Minha mãe trabalhava menos, fazia compotas de doces para um empório e aos sábados fazia bolos para festas, minha avó a ajudava. Iriamos comprar vidros para os doces e mais algumas coisas que lá pareciam mais baratos, assim fomos para a cidade. Aonde vendia vidros tinha muitas coisas, até pianos, me deparei com uma flauta grande e bonita, mostrei a minha avó e ela tentou me explicar que aquele instrumento era para adultos, assim mesmo insisti. O dono veio e me disse: – Essa flauta é maior que você e pesada. Trouxe para perto de mim, senti algo como se eu estivesse ficando uma pessoa maior. Passei as mãos como se acariciasse e destravei os botões. O senhor disse: – Quem te ensinou que esses botões soltassem as teclas? Respondi que não sabia, mas que sabia tocar uma linda canção. Ele sorrindo me entregou a flauta, no princípio achei pesada, mas logo parecia um lápis, coloquei a boca e todos estavam atentos, comecei a tocar a música dos Alpes, meio inseguro, depois como se fosse normal. Toquei. Quando terminei todos estavam chorando, até meu pai que estava de volta da sua compra, tinha vindo me buscar. O dono perguntou: – Quem te ensinou essa música? Expliquei-lhe que ela era muito antiga, e o meu pai tinha uma gravação e eu me lembrei dela, não sei se o senhor quer, mas posso tocar outra, também bonita. Meu pai quis tirar a flauta e eu pedi: – Não faça isso, eu estou à espera disso faz tempo. Meu pai retirou a mão e olhou para a minha mãe que chorava muito, o dono disse: – Toque o que você quiser. Fiquei novamente em posição e toquei, senti que tocava como se fosse induzido, mas fiz com muito amor. Entreguei a flauta e minha avó disse para o senhor se podia guardar a flauta, pois viria buscar nem que tivesse que vender onde morava, mas que essa flauta seria minha, ele pediu o nosso endereço e meu nome foi dado. Íamos saindo, voltei e disse para o senhor: – O meu nome é Paulo, mas gostaria de ser Saulo, o flautista. Ele sorriu, mas anotou. Na porta da loja tinha várias pessoas que me ouviram e um senhor bem idoso passando a mão pela minha cabeça disse: – Você retornou para nos encantar. No carro meu pai propôs durante a noite trabalhar em outra oficina, assim poderíamos juntar dinheiro e compraríamos a flauta. Eu disse que poderia ajudar, tocando no jardim e mamãe e vovó vendem doces. Assim ganharíamos bem mais. Acharam uma boa ideia. Meu pai iria ver se conseguia um carro emprestado e voltaríamos para fazer uma nova proposta para o dono da loja. Certa manhã chegou o senhor da loja e mais dois senhores, pediram que chamassem minha mãe. Chamei e minha avó veio junto, entraram e o senhor da loja foi logo dizendo: 58

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– Esse é o menino que toca como um grande artista. – Se eu tivesse uma flauta, tocaria para os senhores. – Ela está no meu carro. Bati palmas de tanta alegria, foi buscar. Não ouvi a conversa, peguei a flauta e toquei com tanta saudade que me transportei para outro lugar, onde não havia ninguém, somente eu e a música. Quando acabei de tocar, minha mãe e a vovó choravam, olhando para elas disse: – Se todas as vezes que eu tocar vocês chorarem, não tocarei mais. A música nos leva para um lugar lindo e não para a tristeza. Todos bateram palmas e me abraçaram. Propuseram para que eu tocasse numa excursão de navio, junto com uma grande orquestra, mas meu pai e minha mãe tinham medo de eu não ter capacidade. Eu ri e disse: – Disso eu não tenho medo, a música faz parte de mim. Tenho medo do mar, esse eu não conheço, não sei se poderei ser seu amigo. Meus pais iriam pensar e dariam a resposta em breve. Também propuseram de comprar toda a produção dos doces, venderiam no navio. Fiquei muito feliz, falei muito e resolveram que eu iria com a vovó. Entregariam tudo nas mãos de Deus. A flauta ficou comigo para eu treinar, tocava na porta de casa e os vizinhos vinham ouvir. Isso me deixa muito feliz. Quando os senhores vieram com um contrato, no qual o meu pai tinha que depositar em juiz por eu ser menor, recebendo somente na maioridade. Corri perto do meu pai e disse: – Nesses termos me recuso a tocar. Quero o dinheiro na mão do meu pai. O meu futuro está muito longe. O que eu receber por um trabalho é meu e dou a quem quiser. Questionaram, mas fui firme nas minhas condições, ou eu não vou. Resolveram que uma pequena quantia seria depositada em meu nome, assim como exige a lei e a maior parte daria em dinheiro ao meu pai. O meu pai não queria, mas todos concordaram. Me abraçaram e fui muito elogiado. Os doces também foram comercializados e deram uma margem de lucro maior. O dinheiro que eu ganhar será para o senhor, meu pai, abrir sua oficina, com ela o senhor ganhará mais dinheiro e o meu futuro estará garantido, pois dinheiro eu penso, que nada me falta, a flauta eu já tenho, que é com ela que eu ganho. Fiz várias viagens sempre nos mesmos termos, quando completei quatorze anos fizemos uma viagem para a Suíça, como o navio pararia uns dias, pedi se poderia conhecer as montanhas e ir até os Alpes, me foi concedido. O capitão e minha avó me acompanharam. Vi tudo como se já conhecesse, foi inesquecível, essa foi a minha última viagem. Quando voltei para o navio tive uma febre muito alta, levaram-me para casa, vi o quanto meus pais progrediram, estavam muito bem instalados e se amavam. Fiquei feliz. Vi o quanto a música pode ajudar, ela traz a paz, o amor e a realização de vários sonhos, sem querer sonhar. Eu toco e digo: – Ouçam o som suave e sonhem com a paz e o amor para serem felizes como eu fui, sou e serei. Ainda toco para as pessoas que se acham tristes. Fui Saulo, Sou Paulo E serei o flautista feliz. Viver, Rezar & Amar

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06/2011

Um conselho da Esther (a ervista)

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ada ser tem para si tudo o que seu corpo precisa, as ervas que foram deixadas seriam para a cura de cada órgão, sendo, que o ser humano teria nisso a conservação sem sentir dor, mas com a tal evolução essas ervas foram desaparecendo e todos ficaram a depender da evolução. É muito triste que agora o ser humano vive a procura das ervas, que Deus os ajude achar, assim a humanidade não sofrerá muito. A mesma coisa aconteceu com o raciocínio. O ser sabia da sua crença, sabia avaliar a sua capacidade espiritual, algumas pessoas bem humildes, sem nenhum conhecimento sabiam orientar com palavras sábias ao outro ser, como viver com mais facilidade direcionando sua conduta para que a vivência fosse mais tranquila. Mesmo hoje as boas palavras são pouco usadas, o ser é muito crítico, sem orientação e sem crença alguma, cada qual procura a sua comodidade de viver melhor sem analisar o potencial espiritual para que sua vivência seja o que ele idealiza. Se não tem capacidade para análise, como esse ser pode desejar tanta coisa fútil. Pergunto-me: – Como posso analisar, se eu nem sei quem sou? Essa análise precisa somente de perseverança e também saber que acima de você tem seres de altíssimo conhecimento da humanidade, aí torna-se bem simples. Passe a observar as pessoas, excluindo o tal socialismo, as vezes pessoas simples são mais esclarecidas do que você, observe as necessidades de cada um e compare com a sua pessoa. Você terá lindas respostas para a sua vivência, algumas observações: – Você terá a resposta da sua espiritualidade, verá que tens capacidade de orientar e verá o quanto você está evoluído ou está sem saber nada, aí entra a procura de orientação com pessoas de mais espiritualidade para uma boa conversa. Existem escritas orientadoras que trazem luz e indicam o caminho certo e simples de percorrer. A maior caridade que um ser pode receber são as boas palavras. Nunca julgue Viver, Rezar & Amar

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sem pensar bem, porque às vezes a comparação atrapalha, analise o que você já fez e o que poderá fazer, aí sim diga a sua palavra, nunca se baseie em vivências, cada um tem a sua. Os caminhos são vários, mas aconselhar não é simples. Você poderá sentir quem é você e o que poderá fazer para a sua evolução espiritual, crescendo, e a sua vivência será fácil e tudo vai sendo realizado. Poderia escrever muito, mas temos que ir por etapas, você que está lendo faça esse teste e verá o quanto tem e nunca usou.

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Esther

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07/2011

Duas vivências

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ser humano vive a sua vida sem pensar nas consequências, se vai afetar outra pessoa ou não. Cada qual enxerga só o seu lado, dessa forma no resultado sempre entra a parte negativa e o sofrimento. Às vezes são grandes tanto na parte física como na parte espiritual. Aparecem doenças graves, sem cura. Nada mais é do que uma vivência tendo muitas partes negativas. Vou contar duas vivências com as mesmas pessoas. Na primeira parte foi a negativa quem venceu e na outra a positiva. Um rapaz de vinte anos e uma jovem de quinze anos se apaixonaram e marcaram o casamento, mas sem a mãe do rapaz ter conhecimento, essa senhora e sua filha viviam com o dinheiro que ele ganhava com seu trabalho, ou seja, o seu ordenado. O casal comprou os móveis, a jovem confeccionou o seu enxoval com carinho e iam morar na casa da mãe dela, todos estavam felizes e realizados. A festa combinada, os padrinhos escolhidos, o vestido da noiva já pronto e bordado por ela, enfim muita alegria a ser comemorada. Faltando uma semana para o casamento, a sogra e a sua cunhada vieram fazer uma visita. A jovem alegremente disse: – Vocês vieram ver meu quarto, ele está muito bonito, valeu o sacrifício na compra dos móveis. A sogra perguntou: – Que móveis você está falando? – A senhora não sabe que vamos casar no próximo sábado? – Não fomos informados, vou falar com o meu filho. Viraram as costas e saíram sem falar nada, nem se despediram. A jovem não entendeu, mas como estava muito feliz não deu importância. No dia seguinte o rapaz veio e disse: – Teremos que adiar nosso casamento, minha mãe me pediu, pois, minha irmã está Viver, Rezar & Amar

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grávida e meu cunhado não tem dinheiro para a maternidade. A jovem ouviu e aconselhou: – Não faremos a festa, mas não precisamos adiar a igreja, ela está marcada e já distribuímos todos os convites. Você se comprometeu em pagar tudo para sua irmã, assim o dinheiro dará, será mais fácil. Ele disse: – Você não conhece minha mãe, ela quer o meu ordenado inteiro, como fiz até hoje, eu fico com alguns trocados. Os nossos móveis paguei com o que recebo de horas extras e ela nunca soube. Terei que adiar por pelo menos um ano. A jovem entre lágrimas disse: – Agora quem vai decidir sou eu, se você adiar será a separação para sempre. Quando você sair com sua proposta, não volte nunca mais, nem tente passar pela minha rua, seguirei meu caminho e você fique com sua mãe. A mãe da jovem tentou alertar o rapaz, pois seria muito ruim desavisar todos. – Vocês vão passar por um período difícil. Mas se minha filha falou que seria para sempre, assim será, ela é de opinião, nem que com isso ela perca a própria vida, pense bem. O deixou pensando e quando voltou na sala, ela estava vazia. Essa moça sofreu muito, teve uma paralisia cerebral que durou dez anos, não falava, nem se movia. Um dos seus irmãos, o mais velho tomou para si, levou a irmã para morar com ele na Itália. Ele era maestro em uma orquestra, achava que quando a irmã ouvisse a música teria alguma reação, assim com auxílio de uma cantora falavam com ela da música, de musicais e procuravam incentivar a sua volta para o mundo. Foi um trabalho longo, até ela balbuciar a palavra música com vinte e cinco anos de idade. Com bastante exercícios ela voltou a andar, voltou a viver, mas não se lembrava do passado e irmão procurava não a recordar. Estudou canto, fazia parte da orquestra do irmão, percorreram muitos países. Ela nunca tirou a aliança do dedo, dizia que pertencia ao seu casamento com a música. Vieram dar um recital no Brasil, fizeram muito sucesso, ela no Brasil não quis participar da orquestra, dizia estar cansada, iria somente assistir o irmão e os amigos. Certa noite estavam todos juntos jantando, quando o irmão viu um senhor olhando firme para sua irmã, veio até ela e lhe perguntou: – A senhora me conhece? Ela olhou e respondeu não, é a primeira vez que venho ao Brasil, e estou adorando. Foram para o hotel, pois ela dizia não estar se sentindo bem. Tornou a ver o senhor, na lanchonete do hotel, no dia seguinte e perguntou em voz alta, se alguém a levaria para lanchar, olhou para o senhor e disse: – Eu não falo o seu idioma, mas entendo você me compreende? Ele disse que sim, mas pediu que ela olhasse a aliança que trazia no dedo, ela rindo falou: – O senhor é casado com uma pessoa e eu sou casada com a música e as nossas alianças são iguais. Ele tirou a aliança e mostrou o nome que estava gravado, Clara. – Esse era o nome da mulher que mais amei na vida, fui separado dela por egoísmo da minha mãe, assim perdi a minha vida. Ela se distraiu com um colega e seu irmão percebendo o assunto, pegou o senhor pelo braço e pediu que o acompanhasse e na rua explicou a ele todo o acontecido, o sofrimento 64

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dela, sua falta de lembrança e a troca de seu nome. O senhor chorou muito, mas seu irmão pediu que se retirasse, não poderia saber o que ainda enfrentariam. – Ela vive para a música e eu dediquei minha vida para ela e não quero voltar ao passado. O senhor não soube viver, não teve forças para o seu amor, fique com a vida que escolheu e deixe-a viver. Agora é muito tarde para voltar. Ela é outra pessoa, nem tem lembranças do que passou. Seja feliz e permita ela ser da forma dela. O que eu escrevi passou-se numa vivência, essa jovem passou para outra dimensão, estudou muito e se elevou, pediu permissão para voltar com a participação das mesmas pessoas que viveram com ela. Voltou. Só que com um conhecimento muito grande sobre a espiritualidade. Conheceu o mesmo rapaz na mesma idade, e a história foi igualmente repetida. A mãe e a irmã dependiam dele, não gostavam da namorada, marcaram o casamento na mesma condição, só que a parte espiritual dela era muito grande e a dele era tranquila, mas de resto, da mesma forma que foram, voltaram. Quando ele propôs o adiamento do casamento sentiu um alerta tanto dela como de todos da casa, ele acatou e o casamento não foi adiado. Só que o espírito da mãe sendo negativo, procurou de todas as formas a separação que devido a parte dela ser positiva nada pegou e sim ficou sobre quem desejou. Hoje todos estão nos seus devidos lugares e a jovem faz um bonito trabalho tentando mostrar a luz a quem precisa, e sem rancor, isso somente fortalece a sua força. Somente ganharemos força espiritual praticando o bem-estar, não o nosso e sim de quem precisa. Quando as pessoas deixarem o egoísmo de lado o ser humano viverá feliz. Talvez quem estiver lendo, vai identificar várias vivências iguais a essa, somente com uma diferença, que todos que partiram essa jovem no passado, esteve no presente desses seres, aqui ainda procura orientar as vivências para o bem-estar de todos. Analisem o passado dentro do que lhe é permitido, perdoa os que te ofenderam, viva o presente. Para orientar dizemos palavras boas e não ofensivas, assim sempre será elevado. Valorize o tempo e ele te dará como um grande presente, ser feliz. A primeira vivência foi dolorida, mas vivida, pela influência da parte negativa, mas pelo sofrimento ganharam uma lição de vida recebendo muito entendimento, quando passaram para outra dimensão, assim ao voltarem neste plano estavam preparados e tiveram forças para enfrentar as mesmas pessoas com as mesmas partes negativas, não foi fácil, mas com ajuda dos mentores viveram uma longa experiência de espiritualidade positiva até ajudaram pessoas que necessitavam e isso os ajudou muito. Agora trabalham ajudando aqueles que lhe prejudicaram no passado, assim as energias vão aumentando e mais poderão ajudar. Feliz aquele que pode ajudar seus inimigos os levando para a luz eterna. Pense sempre o melhor, seja para quem for o trabalho será cada vez mais livre e claro. Seja hoje pequeno para que amanhã cresça. Suas lágrimas serão balsamo no futuro ajudando aqueles que lhe prejudicaram no passado. Paulo

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08/2011

Camum, o cameleiro

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que eu vou contar é para mostrar que se dermos amor recebemos o mesmo em troca, seja na areia, seja no céu ou no vento. A pessoa que me criou foi um ser de alma nobre e eu ainda o respeito pelo que ele fez por mim, dando tudo o que uma pessoa necessita para viver, neste plano tão difícil de ser compreendido. No deserto houve uma tempestade de areia nunca vista, assim todas as caravanas que ali se encontravam foram engolidas e tudo foi destruído. Meu pai, vamos o chamar dessa maneira, foi com outras pessoas procurarem algum sobrevivente, coisa impossível, mas mesmo assim foram para o deserto, sabiam que duas caravanas tinham se dirigido para o deserto em busca de ossos de animais extintos, mas pouca coisa foi encontrada, até os camelos que resistem essas tempestades, não foram achados. Encontraram um grande saco de um material desconhecido daquele povo, foi meu pai que desenterrou, portanto a ele pertencia, levou para uma barraca e abriram encontrando muitas roupas pequenas, como se fossem de um bebê. Foram tirando as peças e quando viram que eram só roupas de um tecido que para eles não tinha valor o abandonaram, mas meu pai foi tirando até encontrar uma criança muito branca, começou a soprar sua boca fazendo esse bebê chorar, todos voltaram e juntos agradeceram a Davi por esse ser ainda ter vida. Essa criança ficou a pertencer a quem a descobriu. Deram o nome de Camum, filho do Sol e da mãe Lua, pois era muito branco, o cabelo igual ao Sol e os olhos da cor do céu. Fui amamentado com um leite, vamos dizer, líquido branco de uma planta que davam para os camelos ficarem fortes e enfrentarem o deserto. Meu pai tinha quatro camelos e eu, para cuidar na sua caravana, às vezes passava muitas luas no deserto, mas Davi nos dava forças para chegarmos a um oásis para podermos beber água, nos banhar e encher o bucho para voltar, assim era a nossa vivência. Cresci sempre agradecendo ao Sol, que me ensinaram ser o meu pai que me trouxe para o pai que me Viver, Rezar & Amar

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criou, mas a maior das maravilhas que recebi foi que meu pai o Sol nunca me queimou. Fui um ser de pele branca como a minha mãe Lua. Para eu dormir, quando o meu pai Chet me ganhou, ele me deu um camelo de pelo longo, assim eu seria protegido da areia. Quando a Lua saia no céu o meu camelo deitava dobrando as patas e Chet me colocava nas patas dobradas e ele colocava sua cabeça encima do meu corpo, assim dormia protegido pelo meu amigo e protetor. Estrela de Davi era seu nome, por ele ter entre as suas orelhas essa marca com o pelo mais escuro. Quando eu chorava, ele com seu focinho procurava me acalmar, essa infância cheia de amor do Sol, da Lua, de meu pai Chet e de Estrela de Davi foi a minha. Meu camelo me ensinou a compreende-la, a ouvir o seu chamado. Cresci um ser muito privilegiado, todos me amavam, até os camelos que não nos pertenciam. Era convidado para ir as caravanas, diziam ser protegido pelo Sol e a Lua, isso me dava mais amigos. Quando já era um rapaz, meu pai Chet me deu a sua caravana para eu dirigir. Me sai muito bem, os turistas me elogiavam, fui adquirindo fama. Um dia apareceu uma caravana pequena e me convidaram para completar com os meus camelos a viagem deles, mas fui junto, não emprestaria meus amigos para ninguém. Quando estávamos voltando, a filha do dono da caravana me fez uma proposta, dizendo “ que meus camelos eram velhos e estavam muito lentos, deveria vender e comprar novos os turistas gostavam de animais ágeis ”. Fiquei chocado, mas depois refletindo, vi que era verdade, se eu já era adulto, eles eram bem mais velhos que eu, estariam cansados, esqueci-me da parte mais valiosa, o amor que sempre me dedicaram e como eles me entendiam. Nessa noite essa moça veio dormir comigo e trouxe o dinheiro da venda dos camelos, aceitei, ficamos bebendo e de repente senti sono e fui com ela para minha barraca. Quando acordei no outro dia, o meu pai Sol já estava quente e alto. Levantei para alimentar os meus camelos e nada encontrei, todos tinham ido embora, levando os meus amigos e também o meu dinheiro. Chorei muito, pela primeira vez senti o Sol me queimar, era sinal que eu tinha cometido uma coisa errada. Pedi perdão e jurei que iria até o fim do mundo, mas encontraria os meus amigos e ficaria com eles até o momento que fossem morar no céu com o meu pai e minha mãe que olhariam por eles, seriam felizes. Recolhi o pouco que me deixaram e comecei a caminhada de volta para meu pai Chet. Seria punido com razão, aquela moça me enfeitiçou para roubar os meus animais, só que ela não sabia que eles eram meus pelo coração, não pelo trabalho, cada movimento deles eu sabia o que eles diziam, sendo assim eles voltariam para mim. Estrela de Davi era o meu amparo e líder da minha caravana. Nossas leis e nossos credos me dariam forças para recuperá-los. Meu pai Chet veio até mim para dizer que estava na hora de ele ir para casa de Davi, ficaria na grande montanha a espera dessa hora, chorei muito, não tive coragem de contar o sucedido, o deixei ir em paz. Eu fui o responsável, teria que achar os meus amigos. Davi os tinha me dado e eu responderia pelas suas vidas. Caminhei muitas luas, mas não encontrei nada, voltei para o oásis, teria que responder pelo poço de água que Davi me responsabilizou. Teria que sofrer pela minha falta. Passou uma caravana e eu perguntei se tinham visto uns camelos diferentes com pelos longos na cabeça. Um senhor da caravana disse ter visto quatro camelos, um perto do outro, como se estivessem se protegendo, mas eram muito magros e pareciam maltratados. Fiquei feliz. Perguntei onde estavam ele me explicou. Pedi ao dono da caravana se podia me ceder um animal para carregar água, eu iria até o fim do mundo. Expliquei que esses animais me pertenciam, tinham sido roubados quando eram fortes e sadios, agora 68

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doentes não tinham mais valor, mas para mim era a família que Davi me presenteou. Emprestaram-me um camelo carregador forte. Eu teria que levar muitos buchos de água para dar a eles e traze-los para perto de mim, somente Davi poderia nos separar. Assim me preparei para a grande caminhada, foram dias sentindo o Sol me castigar, a areia me cobrindo, me dando sede, mas não tomei nem um gole da água que levava para os meus amigos. Eu teria que pagar o que fiz. Quase morto de sede e cansado, avistei ao longe um monte de pelos, não podia enxergar os animais, mas isso me deu forças para continuar nessa direção, foram muitas luas, pedia a minha mãe Lua que me ajudasse nas forças para salvar meus amigos. Consegui chega perto, mas eles não ficavam de pé, olhei, eram eles, mas estavam no fim de suas vidas, dei água para eles beberem, mas quase não conseguiram engolir, lavei suas pernas cheias de feridas horríveis. Chorando pedi que tirassem minha vida, mas que eles pudessem viver. Lembrei-me do leite que meu pai dava para aumentar as forças dos camelos, onde eu poderia achar nessa imensidão de areia. Abracei chorando a cabeça de Estrela de Davi, eu sabia que ela me entendia, ela fez um grande esforço e com a boca me pegou o braço e mostrou a direção. Subi no camelo carregador e levei uma bucha vazia e disse para ela “ por favor, me espere, voltarei ”. Segui a direção, dia e noite nada encontrando, deitei na areia e chorei pelo meu fracasso, quando o Sol começou a iluminar o céu, vi que bem perto, tinha a árvore e um poço, talvez seco. Corri com o camelo que também parecia me entender pela minha aflição, raspei bem o tronco e o leite começou a aparecer, recolhi o mais que pude, fiz o camelo beber e eu também bebi, estava no fim de minhas forças. Voltamos, caminhamos noite e dia sem parar, somente alimentava o animal que fazia tudo que eu falava sem nunca demonstrar rebeldia. Chegamos, estavam quase todos mortos, abri suas bocas e derramei o leite aos poucos para não perder uma gota. Lavei as feridas e as expunha ao Sol pedindo perdão, mas que meu pai, o Sol não me tirasse o maior bem que eu possuía, que eram esses animais. Aos poucos foram se equilibrando e todos ficaram de pé, abracei-os, beijei seus focinhos fedidos, mas eu não me importava com o cheiro, para mim esse cheiro se chamava vida. Consegui leva-los para o oásis e ficamos juntos o resto da minha vida, mas todas as noites amarrava todos em minha cintura com uma corda, de medo de uma nova surpresa. Hoje em outro plano, estou com a Estrela de Davi e percorro todo o deserto para proteger os camelos dos maus-tratos dos homens, que não querem entender, que tudo que tem vida, temos o dever de cuidar e nos fazer entender com sabedoria a nossa linguagem, para que eles nos entendam na sua fala, ou seja, seus relinchos. Aprendi com eles o amor mutuo, eu por eles e eles por mim. Sou um amigo dos animais, sou branco como a Lua e o cabelo dourado como o Sol.

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24/12/2011

Don Carmelo, Josepe com as bênçãos de Domingos

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eto explica uma comunicação de um guia com um ser humano através da fala. Explicação, graças e agradecimento pela primeira vez Don Carmelo se comunicava através da fala. Folha virada não volta novamente. Hoje os mentores são nossos familiares e afins há muitas gerações. O Beto teve permissão para ficar mais algum tempo entre nós aqui na terra. História: 1° filho Josepe, 2° filho Don Carmelo e 3° filho Domenico, irmãos de laços energéticos. São nove irmãos de sangue. A mesma que era feita pelos irmãos, é tal e qual a mesa que fazemos de agradecimento no natal. A semente era utilizada para proteção das uvas (as favas cobriam as uvas). Ao retirar as favas, no momento de expor as uvas ao sol as sementes das favas eram utilizadas, tudo se comia para agradecer. O caldo era utilizado como remédio. Há muitos anos não se fazia a mesa para o agradecimento. Mesmo se alguém faltar, a mesa deverá ser feita da mesma forma. Com poucas pessoas ou não, tanto faz. É um ofertório aos antepassados. Fazer a lentilha é pedir proteção para os três irmãos. Açúcar representa o mel das abelhas que ficavam nas árvores. Uma pitada de açúcar para pedir proteção, saúde, amparo, paz, mas não para o dinheiro. Guardar em saco plástico o açúcar para dar a amigos e familiares que precisem. Pode acrescentar mais açúcar quando estiver acabando. Benção a todos, inclusive a Eva e seus familiares.

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05/02/2012

Um pobre sonhador

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s palavras ditas ou escritas são importantes, mas o que importa é que sejam entendidas. As minhas palavras são simples, mas foram vividas intensamente. Fui um ser muito pobre, tanto de espírito como financeiramente. Meu pai possuía um carro velho e com ele trabalhava como taxista. Morávamos em um bairro retirado e pobre, ele com frequência fazia corridas para os vizinhos como, por exemplo: enterros, médicos, hospitais etc., nem sempre recebia por esse trabalho. Nossa vida era muito difícil. Pela manhã comíamos dois filões de pão que dividíamos em seis pedaços, o pior para a minha fome era que para satisfaze-la teria que comer no mínimo o dobro, minha mãe dizia que gula era pecado. Quando apareciam pequenos serviços para eu fazer e ganhar algum trocado por esse trabalho, corria a padaria comprava filão e comia sozinho, mas depois me arrependia e pedia perdão a minha mãe, ela dizia para não repetir a gula, reforçava que as minhas irmãs repartiam sempre, tudo que ganhavam, eu prometia, mas não cumpria, a minha fome era maior que o meu amor fraternal. Assim vivíamos com muitos problemas, estudei apenas para aprender a ler e escrever, fui trabalhar com dez anos em uma oficina mecânica com o salário semanal de cinco mil réis (dinheiro da época) que dava a minha irmã para fazer a feira, ela comprava somente arroz, feijão e um pouco de farinha de milho, era o que comíamos. Eu prometia para mim mesmo quando crescesse iria comprar muita comida e daria a todos nós. Meu pai adoeceu e logo veio a falecer na Santa Casa onde ficou internado na ala gratuita. Nossa situação ficou ainda pior. Ficamos com o velho carro que idealizei fazer corridas para ajudar nas despesas da casa, mas como ainda não tinha idade para tirar a carteira de habilitação, só o movimentava. Na oficina melhorava cada dia, já fazia até pequenos consertos e movimentava todos os carros. Meu patrão a noite ia comigo dar voltas com o meu velho carro e assim quando tive idade tirei a minha carta. Pude trabalhar pela manhã na oficina e a tarde com o velho carro, lotação para a cidade. Viver, Rezar & Amar

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Uma das minhas irmãs se casou e minha mãe em pouco tempo veio a falecer. Ficamos bem desequilibrados, mas íamos vivendo, eu já podia colaborar mais com as despesas e como a casa onde morávamos era nossa, ajudava muito. Esqueci-me de contar a pior parte da minha vida, com dez anos de idade, devido a minha fome e a do meu vizinho, garoto da mesma idade que eu, descobrimos uma capela de um colégio de pessoas ricas, que após a missa era servido um lanche com café, sem cobrar nada. Ficamos fregueses, mas para comer tínhamos que assistir toda a missa. Os nossos chinelos eram muito velhos, e sentíamos vergonha, por isso os deixávamos em cima de um arbusto e entravamos descalços. Eu sempre via uma das alunas, bem pequena, que também entrava sem sapatos e com um livro que lia durante a missa, era muito bonita e vim logo a me apaixonar por ela, chegava até a sonhar que eu conversava com ela, riamos e passeávamos de mãos dadas. Certo domingo a pároco antes da missa veio até o banco e me perguntou se eu sabia ler, disse que sim, me entregou um bíblia e me explicou como devia ouvir a palavra que Deus nos deixou. Dizendo: ─ Você irá até o altar e lerá com voz bem firme e alta para que todos possam ouvir. Quis dizer que não podia, mas não deu tempo, o padre se dirigiu ao altar e a missa começou para minha aflição. Meu amigo disse: ─ Não posso fazer nada. Eu teria que ler e assim foi. Li no princípio meio inseguro, mas depois esqueci onde estava e li com segurança e vontade, fui elogiado pelo padre que me convocou, dizendo: ─ A partir desse dia, fará as leituras, marcarei o trecho na bíblia, é uma forma de você pagar o seu café. Pedi perdão ao padre pelo nosso ato, ele sorriu e disse: ─ Traga de sua casa um saco limpo, espere todos irem embora e poderá levar tudo o que sobrar. E eu poderia ver a minha deusa bem de perto, mas ela nunca me viu ou percebeu a minha existência de um pobre menino sonhador. Os anos passaram rápido. Esse padre me ajudou muito dando roupa e sapatos para a minha família e às vezes pedia que eu guiasse o seu carro e me dava mantimento em troca eu levava ele para casa. Certo domingo estranhei que a capela estava com a porta fechada, tínhamos que entrar pela porta lateral. Lá dentro tudo estava enfeitado com muitas flores brancas, uma passadeira da porta até o altar também branca, as meninas de uniforme branco com uma fita azul na cintura e nas mãos um lindo buque de rosas brancas, até o padre estava de branco, para onde se olhasse via branco. Ouvia-se uma música suave e as meninas estavam perfiladas aos bancos, quando a porta se abriu, lá estava a minha menina com uma senhora também de branco, foram entrando e pararam bem perto do banco onde eu estava, pude ver a beleza do seu rosto e a suavidade do seu olhar. Duas meninas que estavam no altar vieram e retiraram a fita azul da sua cintura, dobraram e entregaram a senhora e a mesma se dirigiu ao altar. A minha menina continuou parada e um senhor saiu do altar e veio até ela, beijou sua mão e a conduziu para o altar. Nesse momento a música ficou mais forte e eu compreendi que estava sendo realizado um casamento. Chorei muito, sai da igreja e fui me refugiar no fundo do jardim, não sai por quanto tempo permaneci lá, veio até mim dona Rosália, a senhora que tomava conta da cozinha, dizendo: ─ Já terminou o casamento e você não leu sua parte na missa, o que aconteceu? Eu respondi somente: ─ O meu mundo acabou. 74

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Ela sorriu e me entregou um enorme saco de alimentos para eu levar para casa. Quando dei o saco as minhas irmãs, elas me disseram: ─ Você já deve estar satisfeito, assim tudo isso é nosso. Achei graça e fui dormir com fome e cheio de tristeza. Nunca mais vi minha menina. As minhas irmãs se casaram e seguiram os seus caminhos. Fiquei só, a casa agora era enorme, comprei um sofá que coloquei na sala e ali era onde eu dormia, minhas irmãs revezavam na limpeza e lavagem das minhas roupas. Não fui mais as missas, mas ia todos domingo buscar dona Rosália (a senhora que sempre se lembrava de mim, na pior fase da minha vida quando a fome era grande) na igreja e a levava para sua casa, às vezes almoçava com ela e depois ia descansar. Eu possuía dois carros numa frota de lotação durante o dia e a noite fazia ponto em frente a uma boate, assim estava bem financeiramente. Minhas irmãs me cobravam que já tinha trinta anos de idade e não estava casado, não conseguia amar ninguém, a minha paixão foi e ainda era a minha deusa que nem seu nome sabia. Uma vizinha de minha casa ficou viúva bem jovem e com uma filhinha para criar, resolvemos viver juntos, gostava muito da menina, passei a tratar como filha. Passaram anos, não sei precisar quanto, o tempo para mim não existia, vivi e seguia a minha caminhada. Certo dia precisei guiar uma das minhas lotações, fui meio bravo, pois tinha em plano fazer outro serviço. O meu carro estava quase lotado, quando uma senhora com uma menina me parou e perguntou se podia leva-la para a cidade, respondi que era impossível, pois havia somente um lugar e ela imediatamente me respondeu que colocaria a menina em seu colo e assim foi. Quando ela entrou pude ver uma linda senhora e muito bem vestida, deixando no carro um perfume suave que eu já tinha sentido e no momento não me lembrava onde. Todos acomodados segui rumo ao Largo São Francisco, ali era o ponto final da lotação. Estávamos quietos, até que um passageiro que estava perto de mim, mandou parar, pagou e desceu, nisso outro passageiro de traz disse: ─ Posso passar para frente para que a senhora fique melhor acomodada. Disse que sim, e a menina pode sentar no banco, falando para mãe em um idioma que no momento não compreendia, mas a mãe disse bem baixo: ─ Você está aqui oficialmente, fique bem quieta até chegarmos ao ponto de descermos. A menina tornou a falar um pouco mais alto e eu percebi que o idioma era italiano, mas devido falarem rápido, deduzi a pergunta: ─ O passageiro não pediu por favor, e nem agradeceu o motorista, é assim neste país? Ouvi a mãe responder em português: ─ Não. Em todo o mundo sempre agradecemos e pedimos, por favor, talvez esse senhor que desceu estava atrasado e se esqueceu de dizer as palavras que você já aprendeu neste idioma, repete comigo, por favor, e obrigado. A menina repetiu e a mãe a beijou, dizendo: ─ Eu te disse que o meu idioma era fácil. A menina perguntou: ─ Quando chegarmos em nosso ponto de descer, posso falar com o motorista e dar o “denaro”. A mãe disse que sim, mas corrigiu, “não é denaro é dinheiro”. Ficamos quietos um tempo e a menina tornou a perguntar: ─ Porque “questo” motorista não usa quepe? Viver, Rezar & Amar

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Ela sorriu e respondeu: ─ Por que ele não é um oficial. Um senhor que estava ao lado perguntou para a menina: ─ De que parte da Itália você é? A mãe fez um gesto com a cabeça e a menina respondeu: ─ Sou de Nápoles, mas moramos em Roma pelo “lavoro” de “papa”. ─ Qual é seu nome? ─ Chamo-me Maria Imaculada, mas todos me chamam de Mariucha. O senhor também vai pedir, por favor, para o motorista parar o carro e dizer “grazie signore”? ─ Eu falarei sim, no nosso país também usamos agradecimentos, foi um esquecimento pela pressa do senhor que desceu. Aí eu pude ver e lembrar quem era a linda senhora, como não a reconheci, era a minha menina que eu tinha no coração. Um amor sem explicação estava atrás de mim e eu nem sabia o seu nome, supunha que morasse na Itália e essa criança era sua filha que estava analisando os nossos costumes. Comparei com a minha vivência e percebi que estava vivendo um sonho de menino pobre sem maneiras educadas, como havia notado nessa criança. Eu tinha que acordar, pois estava velho para sonhar. As lágrimas escorriam pelo meu rosto, me embaçava a visão e disfarcei para enxugar. O senhor pediu, por favor, para que eu parasse no próximo ponto, pagou sob o olhar da menina que ficou em pé atrás do meu banco e disse: ─ Ele pagou e agradeceu. A mãe sorrindo disse que sim. A menina pediu para a mãe se podia dar a nota que ela queria pagar. Estávamos chegando, vi o Largo São Francisco cheio de pessoas mais que o normal e disse a senhora: ─ Talvez não possa entrar no Largo, não sei o que está acontecendo. Não terminei de falar, um oficial olhou dentro do carro e segurando a minha porta pediu que parasse, fez um sinal para um policial apontando meu carro, no momento fiquei sem saber o que estava acontecendo, nisso ele me falou: ─ Tire essa placa de lotação e siga os motoqueiros bem devagar, tem muita gente, mas temos que levar a senhora até lá na frente. A menina não gostou que eu tirei a placa de lotação e disse chorosa: ─ Não quero que tire a “calza”, eu gostei muito dela, pedirei ao “papa” que compre uma para eu ir ao colégio. A mãe pediu que ela ficasse quieta, pois estava como oficial, e eu segui bem devagar até um grupo de senhores, todos bem vestidos e reconheci o governador. Um dos senhores veio até o carro e a menina o chamou de Josepe e falou em seu idioma bem rápido que não consegui entender. Abriram a porta e a senhora passou a menina que se pendurou no pescoço desse senhor, percebi que se tratava de algum oficial italiano, a menina tirou o quepe dele e colocou em sua cabeça, foi tão rápido que todos riram e ela disse: ─ Eu sou uma “oficiale”. A senhora desceu ajudada por outro jovem que a beijou e segurando a sua mão a apresentou ao governador, e se afastaram. O senhor olhou para meu carro e perguntou: ─ Porque você não é um oficial? A menina respondeu por mim, não entendi, mas quis entrar novamente no carro e perguntou se podia, o oficial a colocou no banco e ela dirigindo-se a mim falou meio 76

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atrapalhada se eu podia lhe dar a placa de “calza”, entendi, peguei do chão e dei a ela, o oficial sorrindo disse: ─ Isso pertence ao carro. E ela com carinha que ia chorar me pediu: ─ O “signore” pode me dar para eu levar para Roma e mostrar que eu andei numa “calza”? Respondi que sim, eu podia dar e fico muito feliz de saber que gostou de andar no meu carro. ─ Viu, disse para o senhor oficial levarei e contarei como é andar nesse carro “troppo buono”, “gracie signore”. A menina ficou falando com o oficial e eu a admirava como se estivesse sonhando, não podia ser real um acontecimento desse porte, mas tudo ficou calmo. Veio um guarda e me deu o recado que aguardasse nesse local, pois talvez precisassem do meu carro. Fiquei quieto, nisso o oficial chegou com a menina no colo e pediu se podia ficar no carro, pois dentro da igreja estava muito quente, prontamente abri a porta e ele colocou a menina no banco de trás. Ela ficou contente e falava muito rápido no seu idioma, o senhor falou em português “se você quer conversar, terá que falar no idioma do senhor”. Ela pediu desculpas e começou a falar meio atrapalhada, mas dava para entender. Fez várias perguntas e de repente pediu “quero fazer xixi” olhei para o oficial que imediatamente desceu do carro e se dirigiu para uma policial feminina e os dois levaram a menina para dentro do prédio da universidade e demoraram, mas quando voltaram a menina estava no colo de um jovem com uma roupa longa e preta, ela o beijava e ria. Chegando ao carro o rapaz conversou com ela e colocou o quepe do senhor Josepe dizendo: ─ Agora você está “oficiale comandante”. Fez um gesto com a mão e a menina bateu continência e ele rindo se dirigiu para igreja. Perguntei ao senhor Josepe qual o motivo de dizerem a menina “estás em oficiale”, ele respondeu: ─ É que ela é mascote da Guarda Oficial do Parlamento Italiano e possui o uniforme igual a um oficial e quando ela veste e coloca o quepe fica quieta e calada, pois foi treinada desde os três anos de idade, assim todos aproveitam isso para que ela fique quieta. O rapaz que a trouxe a pouco é seu tio e vai casar amanhã na capela da faculdade e ela entrará com o uniforme, assim ela aproveitou a desculpa do xixi para ver a capela, no que a moça que a levou desconhecesse isso a levou no prédio da universidade, a menina procurou seu tio que disse que não podia mostrar porque estava “oficiale”, assim ela concordou em voltar para o carro. O senhor Josepe entrou no carro e ficou quieto, achei muito silêncio e olhei pelo espelho, percebi que a menina estava dormindo, o senhor fez um gesto de silêncio e assim ficamos um bom tempo, até que as pessoas começaram a sair. O governador veio até o carro com a senhora e um jovem que penso ser o pai da criança e olharam para dentro do carro e viram-na dormindo no colo do senhor Josepe, mas segurando o meu cartão, fizeram um gesto como se deixassem ela dormir. A senhora se dirigiu a mim e falou bem baixo: ─ O senhor poderia leva-la para casa? Eu disse que sim, somente precisava do endereço. Josepe olhou para a senhora e disse: ─ Como faço? Estou numa cerimônia oficial. Viver, Rezar & Amar

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E a senhora rindo disse: ─ Mariucha também está, veja que dorme com o seu quepe, assim você está sem a sua função. Dirigiu-se ao seu esposo, conversaram e esse falou: ─ Josepe, vá para casa e não se preocupe. Eu estou com muitos guardas e um com certeza após a cerimônia me levará para o consulado e no fim da tarde você irá me buscar e Nino levará a senhora. Tirou um papel do bolso escreveu o endereço e me deu dizendo: ─ Você está levando a minha joia. Josepe de a esse senhor o pagãmente do seu dia e do seu almoço. Fiz um gesto que isso seria de menos, esse dia, Deus já tinha me pago, nunca mais poderia receber tanto da vida, revi o meu passado no meu presente e o resto seria saudades de um grande amor, puro sem cobranças e sem ver nada num futuro que hoje eu estava vivendo, sendo um ser tão pobre e fui considerado como uma pessoa de nível que nunca tive e nem pensava em ser. Agora neste plano tenho todas as respostas. Agradeço a todos deste plano, o que eu passei para hoje poder valorizar a fome, a miséria física e tudo o que me foi dado. Se um dia for possível a permissão, escreverei a outra parte dessa vivência. Jair

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09/05/2012

Carmem, uma dançarina flamenca

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iver, esta palavra tão pequena, significa: avaliar todos os seus procedimentos com o outro ser. Fazer de um relacionamento uma obrigação, aí começa uma avaliação de vida, ela é feita de momentos onde podemos nos entregar pelo que viemos fazer, avaliar-se é uma das prioridades do amor, da compreensão para saber o que Deus nos deu e não sabemos desfrutar. Você vai me dizer que são apenas palavras e não o motivo dessa avaliação da minha vivência. Meu pai herdou um hospital do meu avô paterno, para terminar o que meu avô começou, assim como médico deixou uma vivência para meu pai avaliar e dar sua continuidade, pois era também um médico famoso, mas na área da ortopedia, minha mãe também médica pediatra, trabalhava no mesmo hospital. Essa dupla me deu uma grande lição de vida pelo exemplo de seus trabalhos com os menos favorecidos, talvez não tivesse aprendido se eles não fossem tão estruturados. Eu cheguei nessa família para dar muita alegria e felicidade a eles, aos amigos e familiares, pois todos nós tínhamos a mesma afinidade. Fui uma criança sadia, meiga e dei a todos o meu amor. Gostava da natureza e conversava sempre com o sol, com a lua e as estrelas, adorava música, principalmente flamenca. Frequentava uma escolinha de dança, mas dançava por instinto, ninguém me ensinou. Tive essa vida até meus dez anos, quando terminei o primário. Meus pais sempre atentos me perguntaram qual a minha vontade para a continuidade dos meus estudos, eu sem pestanejar fui logo dizendo: ─ Quero ser dançarina, não balé clássico, e sim dançar flamenca. Meu pai se espantou e tentou me levar para a medicina, mas disse com segurança: ─ Vocês me deram liberdade de escolha e essa é minha vontade. Quero fazer esse curso, na Espanha, lá poderei desenvolver o que trago dentro de mim. Eles se calaram e depois de muita conversa me deram todo o apoio. Fui com minha mãe para Madri para pesquisar tanto o local para estudar, como o lugar para morar, com Viver, Rezar & Amar

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os meus dez anos, seria difícil me deixarem em um país desconhecido, nem descendência espanhola tínhamos. Minha mãe, como médica chegou em um hospital e lá nos aconselharam a ir para Barcelona, onde estavam as maiores escolas de dança. Fomos e encontramos a escola dos meus sonhos. Minha mãe teve uma boa impressão, a escola tinha internos de vários países, não tinham descriminalização religiosa e nem de cor. Visitamos os alojamentos e a vaga era com uma menina italiana, que já falava corretamente o espanhol, o que seria favorável para mim que não sabia nem me expressar em espanhol, mas entendia o italiano, pois minha babá era dessa nacionalidade e vivia com ela mais do que com meus pais, devido a profissão dos dois. A vida tinha me dado essa babá que continuaria a morar com os meus pais, pois não tinha mais ninguém da sua família. Essa foi a minha infância, agora começaria uma nova vivência sozinha, mas que tinha consciência da minha responsabilidade com a minha vida. As atividades nessa escola eram cansativas. No princípio precisei pedir algumas horas de descanso, não conseguia fazer tudo, mas o diretor, muito compreensivo me ajudou muito. Não tínhamos somente música, também aprendíamos idiomas, postura no palco e na vida social, tínhamos atividades o dia inteiro, só a noite eu podia escrever para os meus pais e conversar com a minha nova amiga Carmela, esse era o seu nome e o meu era Carmelita (até o meu nome era da língua espanhola). Nos sábados e domingos íamos para a fazenda dos pais de Carmela que me adoravam. Com o tempo me tratavam como filha, até as roupas que compravam eram duas, uma para mim e a outra para minha irmã que eu não possuía. A mãe de Carmela se chamava Dona Itália e seu marido Senhor Primo. Meus pais vieram várias vezes me visitar e ficavam hospedados na fazenda. Tornaram-se grandes amigos e isso os deixavam bem mais tranquilos, pois eu estava sempre com a atenção dessas excelentes criaturas, somente sua religião era diferente de nós, eles eram espíritas, mas isso veio me ajudar, aprendi muito, fui várias vezes nas reuniões que frequentavam até os meus pais foram num congresso espírita no Rio de Janeiro e gostaram muito. Minha mãe ficou interessada e passou a ajudar o centro, dando assistência médica aos irmãos, assim eram chamados os que frequentavam. Se precisassem de tratamento mais específico, meu pai abriu as portas do hospital para ajudar, assim essa amizade, através da música teve um som muito maior que eu poderia esperar. A cada sete anos nossa vida da uma transformação para maiores conhecimentos. A minha amiga Carmela se dedicou ao balé clássico e eu para a dança da Companhia Flamenca, cujo nome vem do pássaro flamingo e suas longas pernas, imitados pelas bailarinas durante a dança. Eu desde pequena dançava com os pés descalços, mas minha mãe me comprou umas sapatilhas, com as quais não me adaptei, sempre gostei dos meus pés sem nada, e mesmo assim, nunca me machuquei. Meu professor contava que só uma bailarina dançava assim, mas sua trajetória tinha sido interrompida por um desastre, lhe tirando a vida. Li tudo que podia sobre a vida dessa bailarina, sabia todos os seus gostos de dança. Agora somente um bailarino de nome Pablo dançava como a bailarina portenha gostava. Ele era considerado o melhor de todos os tempos, era natural de Barcelona. E viria aqui no próximo ano dar um espetáculo, depois iria para Madri e seguiria sua turnê pela Europa. Minha amiga Carmela teria que seguir sua caminhada, seu próximo destino seria Roma para dar continuidade a sua especialização e eu continuaria a minha. Com quatorze 80

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anos já dava espetáculos com a escola, sendo a primeira bailarina e em cada apresentação eu ganhava uma porcentagem, com isso estava me preparando para minha independência financeira. Nas minhas folgas continuava indo para a fazenda dos pais da Carmela, diziam que tampava a saudade da filha. Quando ia completar quinze anos, meus pais vieram para organizar uma festinha para os amigos, pedi para Carmela vir, mas também pedi que essa reunião fosse antes do meu aniversário, que por coincidência na data do meu cumpleãnos, o dançarino Pablo daria o seu espetáculo. Os pais da Carmela pediram para eu comprar os ingressos, assim iriamos todos juntos, mas o meu diretor providenciou quatro camarotes, um perto do outro para podermos opinar sobre a dança. Minha mãe queria escolher o meu vestido da festa, percorremos todas as lojas, mas nada era do meu agrado, queria um vestido como tinha na minha imaginação, de cor vermelha, com muito brilho. Minha mãe dizia que preferia cor rosa ou branco, eu ria e confirmava que os quinze anos eram meus e sendo assim tinha direito de escolha. Já estávamos cansadas de andar sem nada achar. Pedi a minha mãe para irmos a um brechó dos artistas, ela ficou brava e disse: ─ Lá só tem roupas velhas. Reforcei dizendo: ─ Quem sabe lá encontrarei o que estou idealizando. Mesmo contra sua vontade, fomos. Encontrei um vestido que estava em um cantinho dedicado a bailarina portenha de nome Clarita, era vermelho, bordado, cheio de brilho e tinha os sapatos iguais. Minha mãe não achou adequado para a minha idade, mas eu abracei o vestido como se fosse uma preciosidade, ela concordou. Experimentei, caiu como se tivesse sido costurado para mim, sem um defeito. No dia da reunião, eu estava deslumbrante, todos me elogiaram, até minha mãe gostou e me disse que parecia ter brilho em cima da minha cabeça, foi um sucesso. O meu diretor me pediu que na nossa apresentação da escola, gostaria de que eu usasse esse traje. No dia do espetáculo de Pablo usei o mesmo vestido, me esqueci de contar que a dona do brechó me presenteou com uma linda capa preta com capuz, me dizendo: ─ Quando você quiser se esconder, use-a. Estava ansiosa para ver o grande bailarino, quando anunciaram houve muitos aplausos e ele agradeceu a terra de sua infância, e mandou um beijo a todos. Começou dançando, sozinho, depois com uma moça, eu achei sem graça, sem brilho, em um rodopio ela caiu e a puxaram para dentro do palco. Pablo continuou dançando. Retirei a minha capa, todos ficaram paralisados sem entender. Corri para uma porta no fim do corredor, abri e com as castanholas na mão, dei o toque para o bailarino Pablo que estava ali dançando. Ele veio até mim, me puxando pela mão, rodopiou e me disse: ─ Quem é você? Sorrindo disse para ele em seu ouvido: ─ Sou um sonho, dance o melhor que puder, pois dançaremos o melhor espetáculo já visto. Dançamos, a plateia aplaudiu de pé, ele me olhava como se já conhecesse. Perguntou várias vezes: ─ Quem é você? Dança como nunca vi. Sorria e respondia: ─ Se gosta de sonhar, continue a dançar como em um sonho perfeito, eu sei que te darei muitas alegrias após este espetáculo. Concentre-se na música, ela te ensinará os passos. Viver, Rezar & Amar

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Quando as cortinas fecharam para o intervalo, fui até o maestro, que chorava de emoção, e ele me falou: ─ Você comanda a orquestra com a batida de suas castanholas. Ri e voltei para o palco, pedi as camareiras uma rosa vermelha sem espinhos e para o próximo número um macacão prata, todas essas trocas teria que ser em segundos, saíram correndo para arranjarem tudo. As cortinas estavam se abrindo quando me deram a rosa, começamos a dançar e Pablo me disse: ─ Sabe, esta música é difícil e nós não ensaiamos. Respondi: ─ Como não ensaiamos, se toda nossa existência fomos par na dança das rosas, música que amo, pois ponho em prova o seu amor. E com a rosa presa na boca dancei como nunca, porque ali coloquei o meu amor. Fomos aplaudidos e todos adoraram. Pablo me olhava sem entender, tirei a rosa da boca, beijei e entreguei a ele, dizendo: ─ Aqui está a prova da nossa dança. Tudo escureceu para a troca de cenário, esse seria o último número, eu corri para a troca de roupa, colocaram primeiro o macacão e depois as saias, que eu sabia que eram sete, e depois a fita que as segurariam. Os tambores começaram a rufar, estremeci, no chão estavam os sapatos que eu usaria, eu fugi dizendo: ─ Danço descalça, não quero machucar o Pablo. Tocando as castanholas rodopiei e vi que Pablo estava vestido com um colete prata igual ao meu macacão e o cenário era um céu estrelado, coisa muito bonita, também vi o meu corpo dançando, eu estava assistindo a minha dança, não conseguia entender o que estava acontecendo, senti que estava chorando. Mas quem estava dançando? Sorri para o Pablo, sempre dançando, ele me disse: ─ Esta dança não pode ser completa, não ensaiamos e são muito perigosas suas piruetas. Olhando para ele, disse: ─ Não tem forças de me erguer? ─ Claro que tenho, se estou falando é por você, sabe que há muitos anos ela não é dançada inteira. ─ Nesta noite será diferente, dance e se concentre nisso. Ele segurando a fita na minha cintura, rodopiei e cada saia ia caindo no chão, fiquei com o macacão prateado e com as luzes parecia que eu era somente uma estrela a mais no cenário. Pablo no meio do palco, colocou um joelho no chão e estendeu a mão e eu corri tocando as castanholas, subi em seu joelho e com o outro pé me equilibrava, entraram vários bailarinos e dançando gritei para Pablo me erguer: ─ Vamos e coragem. Ele como um autômato foi me erguendo o mais alto possível, joguei as castanholas e com os braços erguidos dei um impulso e ele me jogou para cima, dei duas voltas no ar e cai com as pernas abertas como uma boa dançarina, para dizer o nome da dança Noches de estrellas. Os tambores rufavam, como querendo ajudar as estrelas a cair no chão. Fiquei no chão, até o Pablo vir me erguer, me beijando as mãos. Tornou a me perguntar: ─ De onde vieste, e quem és? 82

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Apenas disse: ─ Vim das estrelas e sou somente um sonho, nada mais. A plateia aplaudia, os músicos e o maestro vieram e me disseram: ─ Tu és uma estrela. E me abraçaram chorando, nisso Pablo foi rodeado pelos artistas do show, aproveitei a sua distração e corri para a porta por onde eu tinha entrado. Fui até o camarote e todos estavam de pé, peguei minha capa, vesti e disse aos meus pais: ─ Vamos embora rápido, por favor. Minha mãe queria que eu voltasse ao palco, eu a puxei e tornei a pedir ao meu pai: ─ Vamos embora, por favor. Ele falou alguma coisa para os nossos amigos e saímos, ninguém deu importância a um vulto preto andando com pressa, o mais importante era aplaudir o espetáculo. Na rua havia uma carruagem e nela subimos e voltamos para o alojamento. Ali consegui falar e pedir ao meu pai, que assim que clareasse, gostaria de voltar para o Brasil. Como eu chorava muito meu pai me aplicou um calmante para que descansasse, deitei como estava e dormi com a roupa do teatro e sem sapatos. De manhã minha mãe me disse que eu tinha deixado a minha roupa no camarim do teatro, lhe respondi: ─ Mãe aquelas roupas não são minhas, terei que as devolver juntamente com esse macacão, não fui eu que dancei ontem, foi a grande bailarina flamenca, eu simplesmente emprestei o meu corpo. Entendeu, porque eu quis fugir? Não saberia explicar, a maravilha da espiritualidade. Nossos amigos vieram me cumprimentar e eu agradeci. Trouxeram vários jornais e num deles, Pablo dizia que se eu lesse aquele artigo, me comunicasse com ele, não iria me forçar a nada, apenas queria gravar o meu semblante. Nessa noite ele tinha encerrado a sua trajetória de dançarino, me agradecia por poder encerrar tantos anos de dança por uma noite, onde uma linda menina caída das estrelas tinha dançado com ele. Iria gravar o sonho mais lindo que um dançarino podia ter e que iria guardar para sempre as roupas, os sapatos e a flor que beijei. Ele ainda escreveu “ você me disse, sou um sonho. Jamais seria acordado desse sonho, seja você quem for, sinto que te amei um dia, e hoje te adoro e amanhã seremos um do outro”. Voltamos para o Brasil, comecei os meus estudos para medicina, quem sabe seria um dia igual ao meu pai, dando continuidade ao hospital, dando assistência a quem precisasse e continuar a amar a família que ganhei na Europa. Tive uma vivência inexplicável, cheia de amor, paz e compreensão. Assim pude sentir que fui escolhida pela grande bailarina, para dançar uma noite de sonho e alegria. Nunca mais dancei, nem por isso deixei de ser alegre e feliz, somente incorporei o nome por inteiro, por ter esse direito. Hoje, como amanhã, sou e serei sempre CARMEM.

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09/09/2012

Conversa de barbeiro

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erto barbeiro resolveu fazer uma campanha de publicidade e ofertou cortes de graça para quem entrasse em sua barbearia. Como é normal houve vários assuntos entre seus clientes durante os cortes. Um bem discutido foi a existência de Deus, sua ajuda aos menos favorecidos, aos doentes e outros que parecem que precisam de auxilio. O barbeiro com sua fé demonstrou, o quanto Deus é bom e ajuda sempre. Levou o descrente até a porta da barbearia e passava pela rua um mendigo com cabelos desalinhados e barba por fazer, o chamou e lhe ofereceu cortar seu cabelo e fazer sua barba com tudo que tivesse direito entre produtos e matérias de primeira linha. O mendigo muito arredio se negou e não quis de forma alguma ter esse tratamento. O barbeiro se dirigiu ao seu freguês e disse: ─ Assim é Deus, não adianta ele querer te ajudar se você não quiser. De a ele a chance de ser ajudado e sentirá como é grande a sua presença. Essa é uma lição que mostra que devemos orar e estarmos sempre alertas para nunca negarmos a ajuda divina tão necessária nos nossos dias.

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13/09/2012

Aceitar a vida como ela nos é dada

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asci em uma família muito pobre e bem numerosa, pai trabalhador e mãe amorosa, mas não podiam dar mais do que tinham. Vivíamos apenas com o básico. Os sapatos eram dados um por mês, para cada filho e quando chegava a hora de renovar, já não tinha sola. Eu para não passar vergonha na escola, poupava os sapatos, andava um pedaço do caminho descalço e quando chegava perto de um poço, parava, lavava os pés, os secava com um pedaço de papel e colocava os sapatos para quando chegasse a escola estivesse igual a todos, calçado. A senhora, dona do poço me observava e resolveu vir ao meu encontro, oferecendo uma toalha para secar meus pés e uma caneca de leite com um pedaço de broa de milho, ao qual aceitei agradecido e isso passou a ser habitual dos meus dias. Passaram-se os anos, eu sempre fui aplicado e com bolsa de estudos me tornei médico. Certo dia apareceu em meu consultório hospitalar uma senhora bem humilde, precisando de atendimento. Fiz os primeiros socorros, mas a olhando, me pareceu conhecida, puxei pela memória e com ajuda dos meus anjos da guarda, veio a minha mente, a senhora que me oferecia o leite e a broa na beira do poço quando criança. Apresentei-me a ela, mas sem sucesso, pois garantia que não se lembrava de nada que eu narrava. Teve o seu restabelecimento e quando foi pagar pela sua permanência no hospital, pediu que fosse parcelado, pois tinha poucas posses, mas para sua surpresa, deixei uma carta no lugar da sua conta onde dizia que o seu tratamento já estava pago com leite e broas. Essa é uma lição de agradecimento por parte de quem recebe com amor, pois tudo o que lhe foi ofertado é sempre lembrado e quem dá de coração e boa vontade, esquece seus atos, pois acha que só se fez a sua obrigação. A minha vida poderá ser um alerta a pais que queiram dar mais do que podem aos seus filhos, tornando a vida falsa e sem sentido, pois estão dando uma visão que não é a sua, prestem bem atenção no seu idealismo. Viver, Rezar & Amar

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Nasci num ambiente pobre, meu pai era jardineiro na casa de um casal sem filhos, ele era médico e ela uma sonhadora, de uma bondade sem limites. Minha mãe lavava as roupas de pessoas abastadas. Essa era a minha família. A patroa do meu pai, quando soube que minha mãe teria um filho, comprava roupas como se fosse para os seus, dessa forma, cresci vestido de rico de pais pobres. Quando fui para o grupo escolar muito bem vestido, sendo que as outras crianças iam de roupas que ganhavam e muitas sem sapatos. Fui dois dias e falei para minha mãe que lá eu não ia mais, as crianças eram sujas e mal-educadas, ela me explicou que iam assim porque eram pobres como nós, me revoltei, eu não era pobre e nunca ia ser. Eu ia crescer e ser rico como tio doutor, assim eu poderia olhar as pessoas de baixo para cima, nunca iria querer conviver com a pobreza, minha mãe tentou novamente me explicar, mas eu não ouvi. Eu estudei em colégio pago com o salário dos meus pais, não quis saber como, ia e voltava de carro com o tio doutor, nunca tive convivência com alguém que não tivesse um nível alto, também nunca disse a ninguém que o meu pai era apenas um jardineiro, do que tanto ele se orgulhava. Quando fui para a Universidade me desliguei totalmente do meu passado, apenas recebia o pagamento dos meus pais para pagar o meu alojamento de pessoas abastadas. Contava a todos que meu pai era um rico fazendeiro, que apenas me manda um miserável dinheiro e eu que me virasse. Assim eu poderia frequentar os lugares da alta sociedade sem vergonha de dizer que não poderia pagar as minhas contas, meus colegas pagavam e comentavam que meu pai era sovina. Na minha formatura, vi meus pais na entrada da igreja, mas com vergonha de alguém me ver abraçando uns caipiras, me escondi, quando a cerimônia terminou sai pela porta lateral. Foi a última vez que os vi. Na noite do baile, elegantemente vestido, a custa deles, mas mesmo assim não senti remorso, estava decidido a enriquecer, não sabia a forma como iria conseguir. Entrei no salão e analisei todas as moças e uma só me chamou atenção, cheia de joia, feia e muito deselegante, perguntei a um colega quem era aquela figura tão fora do tempo. Respondeu-me: ─ Ela é filha de um grande industrial riquíssimo, mas mesmo assim nunca vi alguém se aproximar dela em qualquer baile ou festa, não pesca ninguém. Você quer que eu lhe apresente? Pensei e resolvi enfrentar o saco de ouro, valia a pena tentar a sorte, nos aproximamos e meu colega me apresentou, o nome dela era Rosa, a flor mais linda em uma pessoa tão feia. Dancei várias vezes com ela e as outras moças me perseguiam sem entender minha atitude. Eu sim estava aplicando num investimento futuro. Quando o baile acabou eu a acompanhei até seu carro com motorista e disse se podia acompanha-la até sua casa. Ela se assustou e prontamente concordou. No carro eu disse que teria de dormir no jardim do alojamento, pois esse já estava fechado e ele seria reaberto somente às seis da manhã, portanto teria que esperar apenas duas horas e rimos. Quando chegamos ela me convidou para dormir em sua casa, ali tinha muitos quartos de hóspedes que nunca eram usados, mas eu perguntei: ─ E seus empregados, o que iriam dizer? Ela encolheu o braço e disse: ─ Eles dirão que está acontecendo algum milagre. Rimos, eu aceitei. A mansão era uma verdadeira maravilha. Entramos e uma empregada nos recebeu com todo esmero. Rosa deu ordem que fos88

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sem verificar um quarto para um amigo, assim tudo começou. Dormi muito bem. Quando acordei eram quatro horas da tarde, tomei banho e vesti o smoking sem a gravata. Rosa já estava me esperando com um senhor ao seu lado que deduzi ser seu pai, pedi desculpas por ter dormido até àquela hora, o senhor muito educado respondeu: ─ Não tem do que se desculpar, se dorme conforme o cansaço do corpo. Minha filha me disse que dançaram a noite inteira, isso foi muito bom e lhe agradeço, mas vamos almoçar, pois também estou faminto. Estou chegando de uma viagem pela Europa, depois contarei os detalhes. ─ Eu agradeço o seu convite para o almoço, mas tenho que ir ao alojamento devolver o quarto para a faculdade, que já estão chegando novos alunos para as vagas. ─ E você sabe para onde vai agora depois de formado? ─ Sim, vou para a fazenda de meus pais, pois estão viajando, acho que pela Europa, não vieram nem para a minha formatura. ─ Você irá para a fazenda, recém-formado, nada disso. Irá buscar suas coisas e se mudará para minha casa em companhia da minha filha. Amigo de minha filha também será meu amigo. Aceitei isso como uma oferta sem querer magoa-lo. Rosa abraçou o pai e disse: ─ Almoçaremos e eu irei com você buscar os seus pertences, sei que não poderei entrar, mas espero no carro. Estava saindo melhor do que eu esperava, foi tudo como ela disse. Instalei-me num quarto com mais uma sala para eu colocar os meus livros. Um pouco mais tarde fui convidado para acompanha-los a fazenda deles, ele teria que verificar umas cotações de café que já estavam atrasadas, fomos e lá permanecemos durante duas semanas. Como conhecia bem o embarque do café, pois os patrões de meu pai faziam isso também em sua fazenda, eu aproveitei a minha experiência e a usei, o pai de Rosa ficou encantado. O meu começo foi excelente, voltamos e fui para a indústria dele que aí que eu fiquei maravilhado com o modernismo e pude aplicar o que tinha aprendido na faculdade, conversei com os empregados, como já estava a par dos negócios. O diretor no meio da conversa disse ao Sr. Euzébio: ─ Eu estou precisando de auxiliar dessa categoria. E o velho me olhando de modo carinhoso perguntou: ─ Quer fazer parte dos negócios? No momento, disse que não poderia dar nenhuma resposta, não sabia se meu pai precisaria de mim nos seus negócios, depois de falar com ele eu ficaria por um período, pois pretendia assumir todos os negócios de meu pai, assim ele viajaria mais tranquilo. Nisso ele me perguntou: ─ Você é filho único? Disse que sim, ele rindo me argumentou: ─ Rosa também é única, mas não se interessa por nada nos negócios. Fale com seu pai se me empresta você por um tempo? Rimos e assim voltamos para casa e Rosa estava muito brava, pois tinha uma festa e queria a minha companhia. Como as minhas roupas eram de marca, fui me aprontar com esmero e o Sr. Euzébio me observou e comentou: ─ Você está muito elegante para sair com minha filha. Escrevi uma longa carta e pedi a um amigo que iria para Roma que me reenviasse, com endereço da faculdade, assim poderia completar a minha ideia. Tudo saiu como planejei. Viver, Rezar & Amar

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A faculdade me telefonou eu pedi a Rosa para ir comigo ver o que eles queriam. Uma carta me foi entregue supostamente dos meus pais, eu li, depois entreguei a Rosa que ficou encantada. Meus pais ficariam ainda alguns meses e ele pediam para eu ir a fazenda até eles voltarem. Mostrei ao pai de Rosa o motivo do meu retorno a minha fazenda. Aí veio a proposta que eu esperava. ─ Fique aqui e me ajude nos meus negócios até seus pais chegarem. Feliz aceitei, ia todos os dias no escritório e me instalei na sala do Sr. Euzébio. O advogado não gostou muito, eu fazia muitas perguntas a ele, e não as respondia muito bem. Descobri umas series de irregularidades de dinheiro que tive de levar ao conhecimento do Sr. Euzébio. Pedi a ele uma auditoria e muito sigilo principalmente com o diretor e o advogado, assim foi feito e constatado as irregularidades, em grau muito alto. Os dois foram chamados e tiveram de devolver o dinheiro. Houve uma grande revolta e fui até ameaçado, mas tive todo apoio do Sr. Euzébio, mesmo assim senti que faltava meus planos, iria dar a grande tacada. Falei ao Sr. Euzébio que iria alugar um quarto para não ficar ali, pois estava apaixonado por Rosa e não seria correto a minha permanência na casa. O velho aplaudiu de alegria, fazendo mil perguntas, pois eu era um bonito rapaz e rico, não precisando da sua fortuna e assim mesmo queria casar. Chamou Rosa que sabendo da notícia explodiu de alegria querendo imediatamente chamar a imprensa para divulgar, mas achei prudente não o fazer, pela grande ameaça que eu estava sendo vítima. Combinamos tudo para não fazer alarde, pois não seria um casamento formal, apenas um contrato onde o beneficiário teria a metade dos bens, eu passaria a ser responsável pelos negócios. Rose teria uma boa retirada e nós dois uma retirada condizente com os lucros e este era inteiramente ao meu critério, assim o velho poderia desfrutar na Europa com a outra família que possuía. Assim foi feito da melhor forma que eu poderia querer. Rosa logo engravidou e nesse período recebemos notícias que o Sr. Euzébio estava mal de saúde. Rosa queria ir e eu impedi devido à proximidade do nascimento do bebê. Assim que ocorreu a chegada do nosso filho, ela queria ir junto do seu pai, sugeri que levaria o menino para a minha ama, pessoa excelente que eu tinha grande consideração, tinha acompanhado toda a minha infância, ela prontamente aceitou. Entrei em contato com o tio Zezinho para saber o paradeiro de minha mãe, sabendo que estava há vários anos na chácara do doutor, telefonei e expliquei a ela o que estava se passando e a resposta veio com muita alegria da parte dela como do meu pai, que também estava trabalhando na chácara por motivo da idade avançada dos dois. Assim foi a cada dois anos, eu enviava um filho como se fosse um objeto qualquer. Foram trinta anos de lutas constantes para o meu objetivo de aumentar o patrimônio que adquiri facilmente devido a indústria, assim tudo o que eu fizesse era meu sem precisar dar satisfação a ninguém. Esse foi o motivo de tanta luta sempre com muito êxito. Viajei muito, adquirindo experiências e sempre modernizando os equipamentos. E Rosa por sua vez entregou tudo ao diretor e ao advogado que nem avisaram do declínio da indústria. Ela somente pensava em aparecer nas colunas sociais, sendo apontada como maior contribuinte para os eventos beneficentes, coisa que nem sempre as apontadas como beneficiarias recebiam, pois, esses organizadores entregavam para quem queriam. Assim seu patrimônio estava bem comprometido, ao contrário do meu. Comprei uma grande gleba de terra e ali construí a minha indústria bem moderna e apontada como a mais segura do país. Numa dessas viagens pela Espanha conheci uma moça simples, mas muito inteligente, casei-me e a trouxe para o Brasil, frequentou uma escola para aprender o nosso idioma, poderia 90

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me ajudar na indústria, pois era formada em advocacia. No princípio precisou de ajuda de outro advogado para trabalharem na parte jurídica. Os dois se tornaram muito amigos, eu não o conhecia, dificilmente tinha contato com os empregados, isso ainda eu não perdi, o afastamento de pessoas pobres. Assim vivi por vinte anos. Certo dia fui procurado pelo advogado de Rosa para me pôr a par do fechamento da sua indústria, estava com grandes dividas e já tinha perdido tanto a sua parte como a herança do pai, dessa forma só estava sobrando a fazenda que teria que ser vendida, que por abandono estava também dando prejuízo, mas eu teria de dar aprovação, por metade desse patrimônio ser meu também. Pedi uns dias de prazo para estudar, fiz uma reunião e minha esposa tomou parte e deu sua sugestão, como último bem do meu sogro eu não deveria vender e sim entrar num acordo com os devedores, eu compraria a parte de Rosa e orientaria para diminuir seus gastos, pois não possuía mais nada de sua grande fortuna deixada pelo seu pai. Seu maior interesse era aparecer em colunas de revistas como uma grande industrial e suas contribuições beneméritas para a caridade, o que a deixava muito envaidecida. Ficou muito revoltada, não acreditava no que estava acontecendo, mas não tinha outra solução. Menti que não queria ficar com a fazenda, seria vendida com prejuízo, pois ela não estava cobrindo os seus próprios gastos, também seus empregados estavam sem receber assim como a parte legal. Eu somente iria me responsabilizar por elas e se sobrasse alguma coisa era dela. Foi aí que Rosa se lembrou de que tinha três filhos e que não tinha nada para deixar a não ser a casa que deveria ter algum valor. Nessa hora de perda tudo era lembrado e me cobrou pela minha indústria, pedi aos advogados dela que examinasse todos os documentos. A minha indústria era patrimônio meu, separadamente de tudo que era dela, pois nem minha esposa era, tivemos um contrato formulado por seu pai e aceito por ela, sendo assim nem o palacete escaparia da venda. Gastou por todos esses anos sem lembrar que se tirando sem repor perderia o que se tem. Sugeri que ela se mudasse para uma casa menor, diminuiria os gastos, pois ficaria somente com a aposentadoria do seu pai e me comprometia liquidar as dívidas dos imóveis, pagas em parcelas, ela concordou. Pediu para conhecer a minha indústria, a acompanhei na visita, mas não apresentei a minha esposa, no decorrer da visita Rosa perguntou quem era um jovem que estava trabalhando, me acheguei a ele perguntando o seu nome, que disse ser Olavo, ela respondeu: ─ Que interessante esse rapaz, lembra você. Sorri e disse: ─ Já faz tanto tempo que nem sei como fui. Observei que minha esposa olhou para o rapaz, não disse nada, mas esse episódio foi comentado depois em casa e eu quis saber qual o sobrenome desse moço, ela me respondeu que não sabia, mas que conheceu a sua mãe e o seu irmão trabalhava também no departamento pessoal e o pai tinha falecido há dois anos e que moravam numa chácara e não poderia ser um dos meus filhos, ela estava a par que eu tinha três filhos e não sabia dos seus paradeiros. Fui à procura do Dr. Zezinho e não fui bem recebido, pediu que eu fosse breve, não tinha tempo disponível. Falei logo o que me levou até ele, propus ao Dr. Zezinho que eu daria a parte de Rosa e colocaria tudo em seu nome e ele faria como se fosse dela e assim essa quantia seria repartido entre os meus filhos, pois se soubessem que isso me pertencia não iriam querer receber nada. Sai mais aliviado, tinha certeza que daria certo. Três dias depois o Dr. Zezinho me ligou dizendo que poderia fazer como eu propus. Que ele Viver, Rezar & Amar

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iria vender a sua chácara e empregaria junto com o meu dinheiro a reforma da fazenda, assim daria mais autenticidade ao meu negócio, que qualquer coisa eu o procurasse no hospital. Tudo saiu como planejei. Eu comuniquei minha esposa, ela precisaria estar a par desse negócio, onde ela não seria beneficiada, e concordou. Fiquei sabendo que o rapaz que trabalhava com ela, era meu filho mais velho e o que trabalhava no departamento pessoal era o meu filho do meio. Eles estavam ajudando o mais novo que já era médico a fazer um aperfeiçoamento em ortopedia o que custava muito caro. O Dr. Zezinho também ajudava, mas dessa vez fazia com moderação, erramos uma vez e se tivermos consciência não repetiríamos o erro. Tudo ficou do meu jeito. Ofereci-me em comprar a chácara do doutor para dar a minha esposa, e isso aceito, reformei e ali passávamos os fins de semana. Rosa comprou um pequeno apartamento, assim reduziu seus gastos, mas foi esquecida como madame que mais ajudava as entidades, não saiu mais em publicidades e ficou uma senhora idosa como outra pessoa qualquer, isso a deprimiu e assim veio a falecer, deixando apenas um apartamento e algumas joias que dei ao doutor para entregar aos meus filhos. O apartamento ofereci como alojamento para os estagiários do hospital, o qual o doutor concordou e o hospital pagaria as despesas. Diria aos meus filhos que foi uma doação de um amigo seu. Fiz um exame médico e o mesmo pediu que eu precisaria me afastar dos negócios, isso me preocupou, como poderia dizer aos meus filhos para assumir tudo que já estava no nome deles. Falei com o doutor e ele me aconselhou a esperar a hora certa. Eles já sabiam quem eu era e o mais novo tinha muito argumento com os outros irmãos. Marquei uma reunião na minha indústria com a diretoria, meus advogados, meus três filhos, minha esposa de secretaria e Dr. Zezinho, dizendo a todos que seria a minha última reunião, pois todos os meus direitos passariam para os três filhos rapazes, sendo o que eles planejassem seria executado, teriam acesso livre para isso. Todos da diretoria não gostaram das minhas diretrizes, dizendo que a última palavra seria a minha por direito, mas existia ainda uma diretoria, e assim sendo essa diretoria pedia a sua demissão, sairiam da firma, não se submeteriam a vontade de três jovens inexperientes na direção de uma indústria desse porte. Resumi rapidamente: ─ Esses três jovens são os legítimos herdeiros, teriam liberdade de prosseguir ou não com tudo que lhes deixava. Responderam ressentidos: ─ Retiramo-nos sentidos depois de tantos anos de dedicação, deixamos a liberdade para eles usarem como uma rápida destruição de tudo. O Dr. Zezinho pediu a palavra e disse: ─ Querem profetizar o futuro? Dei a palavra ao meu filho mais velho Doutor Olavo Filho, disse: ─ Os nossos projetos não é visar lucros, isso para nós não interessa, daremos aos funcionários de todas as categorias os lucros igualmente divididos e agora de início construiremos um núcleo de casas para atender quem precisa, começando com as oficinas, pois esses entram muito cedo no serviço, assim estarão próximos do local de trabalho e para a direção não haverá ninguém melhor que eles para dividir os lucros. Cuidaremos dos departamentos, pois para isso requer uma divisão de direção. Não será eu e meus irmãos que irão dirigir, porque quanto maior for o lucro da indústria maior será os benefícios de todos. Pretendo também criar um ambulatório para atender todas as famílias. Se isso for 92

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ser revolucionário assumo esse nome, mas somente nessas condições é que ficaremos, do contrário sairemos imediatamente. Foram muito aplaudidos. ─ Meus jovens! Já disse e repito, tudo o que estiver em meu nome vocês assumirão, se precisarem de autorização eu darei, quem não quiser fazer parte dessa nova direção devem passar no departamento pessoal e receber tudo que for de direito. Todos da diretoria levantaram e ao sair um deles falou: ─ Isso está se passando por confiarmos em pessoas que enriquecem e não vieram de berço de ouro. Abaixei a cabeça e nada disse, eu merecia ouvir isso. O Dr. Zezinho me telefonou e disse, “assim que achasse oportuno marcaria uma reunião para o acerto com os meus filhos, mas que eu deveria ir ao hospital ver minha mãe, que seu estado era grave”. Na mesma tarde fui, consegui entrar com o Dr. Zezinho que me apresentou ao Dr. Juca, assim era chamado o meu filho caçula. Ele me acompanhou até o quarto onde estavam os seus irmãos e uma linda jovem que me foi apresentada como esposa do meu filho mais velho. Quando entrei os dois se ergueram e o mais velho disse: ─ O que o senhor veio fazer aqui? Este lugar é somente nosso, filhos do coração desta santa mulher, que deu sua vida para nos criar. O senhor nada tem aqui, já fez o bastante, queira se retirar. Meu filho caçula disse: ─ Quem somos nós para julgar os atos, se somos também pecadores? Não estamos diante de nossa mãe para dar ou negar qualquer ato. Respeito seu modo de ver, mas como médico eu te digo, esta hora não é você nem nós que pode dar o perdão, somente ela, a nossa mãe que tanto amamos. Abraçaram-se, o mais velho abaixou a cabeça pediu desculpas e saiu do quarto. Eu cheguei perto de sua cama e falei: ─ Tenho somente duas palavras para dizer, perdão mãe. Minha vida foi uma ilusão. Hoje sinto o quanto uma família pode valer se for possível, mãe, se ainda posso usar essa santa palavra me dê o seu perdão, isso para mim, hoje é mais importante que todo o ouro do mundo. Minha mãe levantou a mão e eu a peguei e beijei, aquela mão calejada pelo tempo e o trabalho. Sai dali chorando, nisso meu filho mais velho entrou no quarto fechando a porta. Meses depois fiquei pior, recorri ao meu filho Dr. Juca, precisaria da sua ajuda para que os outros dois que trabalhavam comigo assumissem a direção de tudo o que de direito já era dos três. Ele prometeu falar com os irmãos e o tio Zezinho. Foi marcada uma reunião e tudo ficou acertado como eles desejavam. Já se passou muito tempo, sei do progresso deles pela minha esposa, até ela quis uma casinha no núcleo da fábrica e também sei que esse núcleo tem o nome da minha mãe, Jardim Clara e vem só os finais de semana para a nossa chácara, ela se dá muito bem com meus filhos. Minha mãe merece essa lembrança, tudo deu certo, eu apenas não compreendi o rumo dos meus ideais. Lutei contra todos os que pertencessem a pobreza, abandonei todos que eram ligados a mim, desrespeitei mãe e pai, fiquei com amigos por dinheiro e posição social e agora meus filhos faziam dessa família pobre um pedestal onde colocaram aqueles que eu deveria amar, mas eles fazem por puro amor, estão ligados aos funcionários mais pobres e dão apoio com o que eu consegui aqui. Me pergunto, porque eu Viver, Rezar & Amar

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agi assim, se fui criado pela mesma mãe que eles tanto amam? Agora sei o porquê, nesta dimensão que estou. Posso avaliar que o egoísmo humano ultrapassa os limites do amor e nada nos favorece a não ser dor. O abandono de todos os seres que nos poderão oferecer amor e compreensão. Sei também avaliar uma vida dada pelo amor e transformar em ilusão de brilho que nada nos favorece. Hoje estou estudando os efeitos de uma vivência falsa e a outra simples, mas valiosa de amor. Espero que quem ler, não me julgue mal. Perdi uma vivência para ganhar uma experiência dolorida. Temos que aceitar a vida que nos é dada e não aquela que idealizamos pela ganancia, sem medir o sofrimento que causamos. O amor transforma a vida simples em riquezas não dada pelo homem, mas pela vida que nos foi presenteada por Deus. Os caminhos serão floridos, sem dor e com uma esperança de amigos como os meus filhos possuem. Deixo amor, paz e muitos votos de luz não de ouro, mas do sol e das estrelas. Olavo de Deus

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02/10/2012

A sogra de Laura

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ui criada por meu pai e uma irmã que sempre se dedicou a mim. Cresci num ambiente de muita cultura e sabedoria, pois meu pai era professor em uma universidade e minha tia lecionava línguas. Me formei e fui dar aulas de matemática em um colégio, onde conheci um professor, nos apaixonamos e casamos, mas como ele era filho único, me propôs irmos morar com a sua mãe, concordei, pois eu pouco ficaria em casa, lecionava em três períodos como ele, assim não teríamos problemas. Essa senhora de nome Clara não fazia jus ao seu nome, pessoa amarga e muito ciumenta de seu filho, mas não dei muita importância, achando que com o tempo tudo se encaixaria. Nas primeiras semanas que tomávamos nossas refeições em uma pensão, tudo estava bem, nos sábados e domingos, eu e meu marido fazíamos faxina na casa, tudo com muito bom humor e alegria. Resolvemos comprar um terreno e nele construímos a nossa casa, isso nos causou certa mudança em nosso padrão de vida, teríamos que vir em casa para almoçar nos demorando no máximo em uma hora, mas o que eu não esperava, dona Clara disse: ─ Ótimo, assim também descansarei, você terá que fazer o almoço, é a regra, a esposa deve alimentar sua família, eu pertenço a ela e comerei o que você cozinhar, assim viveremos com menos abraços e beijos. Meu marido nada disse, percebi que ficou meio decepcionado com essa atitude, mas resolvi enfrentar o desafio e mostrar a ela do que eu seria capaz. Chegávamos em casa em nosso carro velho, quando não enguiçava, quase as vinte e duas horas, aí eu corria para a cozinha, meu marido me ajudava limpando o feijão e o arroz, eu preparava tudo, comíamos e deixando a mesa posta para o café, arrumava as roupas sujas, para levar para a lavanderia, assim íamos deitar mais ou menos duas horas da madrugada, cansada que às vezes não conseguia conciliar o sono e o meu marido também. Foram dois anos inteiros, eu estava exausta, mas nada dizia, ela sempre reclamando, ora da solidão, ora da falta de Viver, Rezar & Amar

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sair de casa, dizendo que vivia num convento, meu marido respondia: ─ Não temos tempo nem de corrigir as provas dos alunos e a senhora fala em passear. Se colaborasse conosco, talvez pudéssemos sair dessa rotina, pois a louça do seu café a senhora não põe na pia, isso eu tenho que fazer na hora do almoço, enquanto Laura frita os bifes e tempera salada, pois cada um de nós temos apenas dois braços, mas em breve almoçaremos no colégio, temos uma proposta disso. Assim a senhora ficará só, o tempo será somente seu. Ela começou a chorar, dizendo que nós queríamos fazer dela uma empregada, assim preferia ir morar num asilo, essa era a consideração que ele estava lhe dando, depois de cria-lo sozinha. Coloquei a comida para ela e saímos comer, falei ao meu marido que não estava em condições de dar aula, iria para a casa do meu pai, passar a tarde, assim poderia me acalmar. Ele concordou e viria me buscar a noite. Contei tudo ao meu pai e a minha tia, eles ficaram horrorizados, aí eu disse uma coisa muito pesada: ─ Seria capaz de matar essa mulher egoísta e má, eu a detesto, está me afastando do meu marido, pois não temos tempo para nós. Meu pai sorriu e disse: ─ Você seria capaz disso, minha filha? ─ Seria, pois eu a detesto tanto que estou com medo de mim. ─ Ótimos, eu tenho um remédio para resolver esse seu problema, mas teremos que ter muito cuidado para que ninguém perceba, vamos envenenar essa bruxa. Todas as noites, quando ela for dormir, você fará um chá bem quente e lhe dará um comprimido desses, quando acabar venha buscar mais, eu tenho isso para fazer experiências na faculdade, mas tenha muito cuidado, trate-a muito bem, quando for ao mercado convide-a para lhe acompanhar, de algumas voltas com ela pelo jardim aos sábados, assim todos verão que você a trata bem e não dará chance de julgar o que estamos fazendo, faço isso por te amar muito. Aqui você sempre teve muito conforto, mas vamos resolver, tenho fé disso. Pedi ao meu marido esperar um pouco, preparei um bom lanche na casa do meu pai e levei para dona Clara, que estava nos esperando, pedindo desculpas do que tinha dito, não respondi, dizendo que minha tia mandou lanche, mas meu marido contou a verdade, reforçando que ela não merecia, pois estávamos nessa luta e ela fazia parte e poderia colaborar. Depois desse dia passei a dar todas as noites a tal da pílula, sem remorso e por sua vez ela passou a me tratar melhor, lavava a louça do café, cozinhava o feijão antes de chegarmos, fazia o arroz e eu terminava. Quando ia ao mercado passei a convida-la, e ela sugeriu para não comprar tanta carne e mais legumes, disse que isso requeria mais tempo para lava-las, coisa que eu não tinha, mas se propôs a fazer o trabalho, se eu quisesse, concordei e a noite quando chegávamos sempre tinha uma torta ou bolinhos de batata que comíamos com apetite, eu a elogiava por tanta comida gostosa. Um dia sugeri que ela fizesse um jantar, gostaria de convidar meu pai e minha tia para saborear a comida feita por ela, ficou sem jeito, mas percebi que se sentiu feliz. Ela mesma marcou a data e fez as compras de mercado e preparou um jantar que meu marido nunca soube que ela sabia cozinha. Meu pai trouxe flores, dizendo que quem trata sua filha com tanto carinho merecia não flores, mas um grande prêmio. Ela ficou muito emocionada. Quando eles iam embora fui com meu pai até a garagem e disse: ─ Pai, como passo parar de dar o veneno a ela, até a chamo de mãe, a minha não conheci, mas minha sogra a tenho mais que mãe, me dedico a ela de corpo e alma. Tem 96

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algum jeito, eu não posso perder a mãe que sempre quis. ─ Fique tranquila minha filha, apenas dei um calmante para ela ficar mais relaxada, somente fez dormir melhor, pus a minha experiência de vida no cotidiano de vocês. Fico feliz por ter dado certo. Trate-a como ela merece, para você ser feliz com o seu marido. E ela nada mais queria uma filha que não teve. Assim são as vivências: De mais amor a quem precisa, para receber uma vida melhor. Laura

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07/10/2012

Joana de Deus

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que vou escrever não parece real, mas foi uma linda passagem de minha vida. Tive dois filhos, Jonas e José, Jonas com cinco anos, já rezava orações lindas, sem ninguém ensinar. Quando íamos ao templo, ele falava em voz alta trechos do evangelho sem nunca ter ouvido, perguntávamos: ─ Quem o ensinou? Respondia: ─ Eu sei, ninguém me ensinou. Quando fez sete anos o colocamos no grupo escolar e sempre recomendava que respeitasse a professora, ela representava a cultura que ele iria aprender, que nem eu e o seu pai tínhamos. Num determinado dia, recebi um bilhete da professora que desejava falar comigo, fiquei apreensiva, mas tinha certeza que não seria nada grave, meu filho era calmo e obediente, mas mesmo assim fui a escola. O diretor me recebeu e me acompanhou até a sala de aula. A porta estava aberta e ouvimos a professora dizer aos alunos: ─ Não sei aonde falhei, dou aulas há muitos anos e nunca me considerei uma pessoa que não soubesse transmitir aos alunos as palavras certas do ensino. E abaixando a cabeça, pude perceber que estava chorando. Nisso meu filho levantou a mão e pediu licença para falar. A professora levantou a cabeça e disse: ─ Venha até aqui e fale. Todos ficaram em silencio, ele veio e de costas para a porta começou: ─ Senhora, não se sinta culpada dos meninos não terem boas notas na caderneta, a senhora sempre nos ensinou com clareza, se não aprenderam a falta é deles, a senhora não observou que durante quase todo o tempo que temos para aprender, alguns meninos ficam alheios somente atentos na destruição das carteiras. Examine, a senhora, elas estão danificadas, até pedaços de madeiras eles arrancam, ficam rindo e gozando de quem quer Viver, Rezar & Amar

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aprender, a violência é grande. A senhora me perguntou certo dia, porque eu não participava das brincadeiras, não por me achar melhor que eles, mas minha mãe todos os dias me recomenda, “respeite a professora”, assim eu a obedeço. Essas criaturas de Deus são tão violentas que se agridem no recreio, dão socos e ponta pés chegando a rasgar as blusas dos uniformes, também rasgam os livros que nos são dados pela senhora. Não brinco com eles por não ter essa educação de violência, em casa procuro ajudar o meu pai na coleta de madeira para minha mãe fazer nosso pão, dessa forma meu pai diz, que minha ajuda aumenta a lenha para o inverno. Como posso participar dessas agressões? A senhora que substitui aqui nossas famílias, devemos respeitar e obedecer. Se a senhora ler o versículo de Paulo que diz o que Jesus disse ao pai, “senhor onde eu falhei que não consegui que o homem respeitasse o seu semelhante, somente ensinei amor, paz e compressão, se errei, meu pai dá-me o castigo, por a humanidade se agredir desrespeitando o ser humano”. Agora pergunto, se Jesus não conseguiu ensinar o amor, coisa tão fácil, como a senhora se culpa desses seres não entenderem os números e palavras que tão bem nos transmitem. Sei que quando sair daqui irão me agredir, eu não me importo, somente peço a essas pessoas que não rasguem os meus livros, pois esses não me pertencem, podem me machucar que não vou revidar, não fui criado para agredir ninguém, mas também não posso deixar a senhora se culpar por uma causa que não é sua. Dizem que sou diferente, talvez sim, como digo, a minha mãe que eu adoro e respeito, a minha estada aqui é pequena. Vim para observar e ajudar, e não para fazer uma pessoa como a senhora chorar, se preciso for, irei falar com o diretor, peço em nome de Jesus, não chore por uma causa sem solução. A professora agradeceu a Jonas enquanto entravamos na classe, ele levou um susto e veio a mim me beijar, ainda chorando disse: ─ Não é somente a humanidade que ferem as pessoas boas, também as crianças como eu. Eu o abracei e choramos juntos. O diretor falou com a professora, que ela não precisava falar nada, pois um menino nos ensinou amar as coisas e também respeito, não sé pelas carteiras que foram danificadas, também pelas paredes dos banheiros e as pessoas idosas que aqui trabalham para tudo estar limpo. Esse menino nos deu uma boa lição. Sai do colégio, orgulhosa de ser mãe de um ser tão iluminado. Uma tarde, meu marido me chamou e disse: ─ O nosso filho está fazendo muita força, ele é ainda muito pequeno para carregar toras de madeiras tão grandes, quando eu vou recolher o que ele ajuntou, eu não consigo colocar na carriola de tão grossas, mas ele não apresenta cansaço algum. Chamamos Jonas e ele sorrindo nos contou: ─ Não sou eu que carrego essa lenha, são os meus amigos de força que vem sempre me ajudar, assim temos boas lenhas para o inverno e não os gravetos que consigo carregar. Perguntei curiosa para saber quem eram esses amigos de força. Jonas com naturalidade respondeu: ─ São aqueles que agrediram a escola e dessa forma eles dizem que se tornaram meus amigos e usam a força deles para uma causa útil. Quando a mamãe faz o pão e eu peço um pedaço bem grande é para levar para eles e digo, foi com suas forças que esse pão foi cozido, fofo e gostoso é preciso uma boa lenha para o aquecimento do forno, por tudo isso vocês merecem saborear o resultado. Toda vez que assava o pão mandavam um bom pedaço para os amigos da força. Esse meu filho com dez anos foi para a cama dormir pedindo a benção e disse: 100

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─ Esta noite vocês estarão comigo no meu coração. Assim adormeceu para ir ao paraíso junto de Jesus. Parece uma lenda, mas foi uma linda vivência, de um filho que Jesus me emprestou por um pequeno período, mas mesmo assim, agradeço essa dádiva que recebemos em nosso lar. Uma mãe vaidosa. Joana de Deus

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15/10/2012

A vida de Irma

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finalidade desta é para mostrar que muitas doenças do ser humano não pertencem ao corpo e muitas vezes até é desconhecida do homem. Fui uma criança normal, estudei e me formei, mas fazendo um concurso como tantas outras jovens fui designada a lecionar em uma escola longe da minha cidade natal, resolvi enfrentar o meu caminho, quem sabe, breve voltaria com uma transferência e retomaria a minha vida de todos os dias. Minha mãe não gostou, mas se conformou, ainda tinha duas filhas para formar. Meu pai falecido há muitos anos atrás, era dever dela nos educar da forma que fez, não era uma mãe carinhosa, e sim rígida nas mínimas coisas, eu sentia falta da atenção dela, tudo muito formal e educadamente. Ela era professora de uma universidade muito antiga e suas atitudes sempre foram assim e aplicou em suas filhas o mesmo modo do ensino universitário. Agora eu iria enfrentar uma nova etapa, sozinha em uma cidade desconhecida. Fui recebida com muita alegria pelas outras professoras, que logo me indicaram os alojamentos para ficar, assim foi bem mais fácil do que eu esperava. Minhas colegas de quarto também eram muito atenciosas. Dei aulas durante três ou quatro semanas e me convidaram para fazer um curso de inglês a noite, achei ótimo, gostaria de aprender mais, seria útil para o meu futuro. Fui com mais colegas na faculdade da cidade, onde seria dado o curso, com um professor de línguas, jovem de timbre de voz excelente. Quando saímos do curso ele veio nos perguntar se tínhamos entendido a aula, pois esse curso já estava adiantado e ele em outro horário, poderia nos pôr em dia com a matéria. Gostamos do oferecimento, mas não poderia ser na faculdade e sim em sua casa, não muito longe dali nos daria uma aula por semana até ficarmos em dia com a matéria. Ficou combinado e fomos a sua casa, ele morava com sua mãe e uma irmã da minha idade. Gostei muito da família, no término da aula sua mãe nos serviu um lanche saboroso, tudo muito simples, mas com tanta delicadeza, coisa que eu não estava habituada, minha mãe jamais faria um lanche assim. Viver, Rezar & Amar

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Eu me afeiçoei com Ía, esse era o apelido de sua irmã. Ela também ficou muito minha amiga, assim me convidava para passar os sábados e domingos com ela, dormia em seu quarto, mas como eu levantava mais cedo, ia para a cozinha, conversar com a sua mãe. Era uma nova vida para mim. Depois do almoço íamos passear no bosque, perto de sua casa, levávamos bolo, suco, tudo preparado por sua mãe com tanto carinho, que um dia falei para a dona Inês: ─ Como a senhora pode ter tanto amor para dar aos seus filhos e ainda a uma visita que interrompe seus afazeres. Ela riu e respondeu: ─ Amor, trazemos dentro de nós, é tão fácil dar. Eu gosto muito de você como de minha filha, não faço nada forçado, tudo é natural, por isso a sua presença durante a semana me faz falta, você gostaria de vir morar aqui, dormiria com Ía, não temos muito conforto, mas eu ficaria muito feliz. Chorando eu respondi: ─ Como eu posso recusar um oferecimento com tanto amor, isso para mim é uma vida no paraíso, desconheço esse amor de mãe, por isso eu seria uma louca se não aceitasse. Tem só um problema, não posso pagar mais do que pago no alojamento, e terei as refeições para pagar, como a senhora sabe um professor não ganha muito bem, mas dividirei o dinheiro e ainda tenho as aulas de seu filho, se a senhora aceitar virei correndo. Ela riu e disse: ─ Nada quero a não ser que venha. A refeição fará aqui em casa, não comemos muitas variedades, mas onde come três come quatro. Chorei muito, abracei a alma de amor, ela me transmitia tudo o que um ser pode ter na vida. Ía as vezes vinha dormir na minha cama e dizia: ─ Não conte para minha mãe, mas tenho medo da noite. Ri e prometi nada contar. Uma manhã de sábado, dormi mais do que costumava dormir, dona Inês veio nos acordar e viu sua filha em minha cama, dormindo. Ía preocupada falou: ─ Eu durmo em sua cama, porque gosto dela como se fosse minha irmã. Sua mãe sorrindo disse: ─ Já sabia, pois desde que sua irmã mora aqui, você deixou de dormir no quarto de seu irmão. Nos abraçamos e rimos muito. Na mesa do café, o irmão falou: ─ Graças a você durmo mais à vontade na minha cama, esse trambolho tomava toda a cama e eu dormia na madeira. Foi muito gratificante esse dia, eu pude sentir como era essa família que eu estava fazendo parte. Certo dia, que fomos ao bosque Ivo foi conosco, Ía saiu para conversar com as amigas e eu fiquei conversando com ele, coisa meio rara, ele lecionava dia e noite para dar a mãe e a irmã um pouco de conforto. Esse dia ele tirou para descansar. Falei da minha família, bem diferente da dele, minhas irmãs nunca dormiram em minha cama e minha mãe nunca tinha me dado um beijo, como sua mãe nos dá, nunca minha mãe entrou no meu quarto para dar boa noite, como dona Inês faz todas as noites. Passei a adorar os domingos em que Ivo passava conosco no bosque. Ali ele me explicava passagens de vidas de seres que muito nos ensinaram com seus exemplos de condutas, coisa que nunca tinha ouvido, gostei muito, perguntava o que eu não entendia e tinha as respostas bem explicadas. Deu-me livros para eu ler, assim no próximo domingo comen104

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tava a leitura que não tinha compreendido. Em casa, uma noite, perguntei a dona Inês: ─ Vocês são crentes no espiritismo? ─ Sim, todos da minha família somos espiritas, Ivo é um grande doutrinador, mas como não tem tempo, eu faço o que posso para ele não sofrer. Teria que frequentar mais o centro, assim sua vida seria menos difícil. Não compreendi, mas me calei dizendo: ─ Eu tenho medo de ir numa seção. ─ Se você quiser ir comigo, verá que nada tem demais, apenas muita reza e palavras, que quando saímos de lá, só levamos uma grande tranquilidade no coração. Você não deve ter medo, pois nada se vê, somente aprendemos a viver como somos feitos de matéria e espírito ou corpo e alma como os católicos dizem. Jesus é um grande espírito, e está sempre pronto para nos amparar neste vale da vida, cheio de impurezas. Conversamos bastante até a chegada do Ivo, dona Inês disse que ele teria mais cultura para uma conversa, ela não lia muito, mas ele lia bastante e era um estudioso do espiritismo, onde aprendeu a falar nas seções, sabia explicar e responder perguntas. Ele sorriu e disse: ─ Faço isso todos os domingos e breve levarei você para conhecer uma pessoa de minha confiança, para lhe explanar sobre o assunto e aí entenderá porque nossa família é do amor como você diz. Fomos tomar nosso leite e cada um foi para o seu repouso, como dona Inês sempre dizia “um repouso tranquilo para amanhecer com o nosso maior astro, o Sol”. Eu gostava desse boa noite, era gratificante. Numa tarde de folga, pedi a dona Inês se poderia sair com Ía. Sorrindo, disse: ─ Vão passear, mas não gastem muito em coisas supérfluas. Fomos para a cidade e passei em várias lojas, até que encontrei o que eu queria, comprei um vestido para dona Inês de cor bem clara, eu queria vê-la dessa forma, comprei outro para Ía, bem moderno e branco, e uma camiseta para Ivo, pois ele só usava terno, camisa social com gravata. Depois comprei uma torta de palmito, que um dia dei para dona Inês, e ela adorou. Ía me pediu um sorvete, mas para eu não contar nada em casa, prometi. Comprei o tal sorvete, que ela queria tomar sozinha, não me daria nem uma pazinha. Fomos até a praça e lá se deliciou com o tal sorvetão, mas o que eu não esperava é que ela se lambuzou de uma forma que não teríamos como voltar andando, até os sapatos tinha chocolate. Mandei que ficasse ali, e fui ao colégio pedir a Ivo se poderia nos levar para casa, ele pediu licença na diretoria e fomos ao encontro de Ía, falando: ─ Vamos levar o nosso bebezão tomar banho. Subimos no carro, mas ao invés de irmos para casa, ele se dirigiu sentido contrário, perguntei onde estava indo, ele de uma forma zombeteira disse: ─ Espere o tempo, ele vai te responder. Parou em uma esquina e falou: ─ Já volto. ─ Onde vai? — Perguntou Ía. — E ele disse: ─ Você não pode falar nada, pois não passa de um sorvetão de chocolate. E foi correndo para outra rua. Quando voltou trazia pacotes que colocou no porta malas, cantarolando, como se estivesse muito feliz, assim fomos para casa. ─ Primeiro o nosso bebezão vai tomar banho e você e a mamãe vão para a cozinha, quem põe a mesa do jantar hoje, sou eu. — Disse Ivo. Viver, Rezar & Amar

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Olhei para dona Inês e vi lágrimas em seus olhos, somente disse: ─ Ótimo, meu filho, já devia ter posto essa mesa para a sua família. Me pegou pelo braço e me levou para o meu quarto, pedindo para eu colocar um vestido branco, obedeci e dei a ela o vestido que tinha comprado, dizendo que se não gostasse poderia trocar, pois comprei do meu gosto, levei para Ía o dela e a camiseta do Ivo, depois eu daria, pois estávamos proibidas de ir à sala. Ajudei Ía a se arrumar, gritava de alegria ao se vestir, dizendo: ─ Minhas amigas vão me invejar. Nisso bateram na porta do quarto, eu abri e fiquei parada, Ivo estava muito elegante, num terno azul marinho, parecia outra pessoa, fiquei parada e Ía perguntou: ─ Vamos a alguma festa? Ivo respondeu: ─ Será a maior festa nessa casa. Me ofereceu o seu braço e me levou para a sala de jantar. A mesa estava lindamente posta com uma toalha de renda branca, no centro com um vaso de flores e pratos coloridos. Ía falou: ─ Que legal tudo isso é para o seu casamento? Ivo sorriu e falando onde deveríamos sentar, dando uma taça de vinho a cada um de nós, pediu licença a sua mãe e para sua irmã, que pouco conhece da vida, mas falando: ─ Tenho o prazer de pedir sua mão para mim e toda a minha família que está aqui, para casarmos perante os homens e todos da nossa crença. Se esse pedido for aceito, pedirei aos grandes mentores que nos abençoe. Eu chorava e dona Inês também, eu disse: ─ Não esperava isso. ─ Pare de chorar e diga. Quer casar comigo? — Perguntou Ivo. Fiz somente o sim com a cabeça, ele saiu do seu lugar e veio me abraçar, me levando até dona Inês e disse: ─ Mãe, agora sim, ela será sua nova filha. Abraçamo-nos e choramos de alegria. A torta que eu comprei, estava quente, ele trouxe e comemos com muita alegria, trouxe também um bolo grande, e Ía disse: ─ A metade é só minha. Rimos, e Ivo explicou: ─ Vamos comer só um pedaço cada um, o restante levaremos para o centro, onde todos devem comer um pedacinho, esse é o nosso costume. Ele colocou o bolo na caixa, depois de comermos e fomos a pé até a casa do senhor que as vezes vinha tomar café. Fomos recebidos com palmas e nos serviram o bolo com água, gostei e pensei que seria servida bebida alcoólica, mas foi me explicado que essa água era benta, assim seria maior felicidade dos noivos e que na próxima seção estávamos convidados para a benção do casamento. E assim foi. Não, como uma noiva de igreja, mas fui de branco, com uma flor nos cabelos, rezaram muito, a sala estava repleta, todos de branco, o senhor veio até mim e disse: ─ Eu, em nome de Jesus te abençoo. Tirou a flor do meu cabelo e deu a Ivo, que levou a mesa pronunciando uma linda oração, falando de amor, compreensão e fidelidade a mim, e respeito a sua família. Colocou a aliança no meu dedo e dona Inês me deu a que eu colocaria no dedo dele. Assim com essa cerimônia, achei que estava mais casada do que na minha religião, mas ele disse, 106

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que eu iria para a casa da minha mãe e no sábado casaríamos no civil e no religioso, na sua crença na impediria tudo era válido em nome de Deus. E assim foi o meu casamento, duplamente casados. Quando voltamos para casa, o meu quarto passou a ser onde ele dormia, foi reformado e se transformou num lindo quarto, todos os livros e a escrivaninha, foram parar no quartinho dos fundos, onde ele passava a noite corrigindo os trabalhos e as aulas dadas, eu não colaborava, pois eram cursos em espanhol, inglês, francês e português, assim não poderia ajuda-lo, mas com muita paciência ele dava conta. Depois de duas semanas de casada me senti muito cansada e fui me deitar sem esperar Ivo chegar. Quando ele chegou por volta da meia-noite dona Inês estava o esperando e contou que não gostou da minha cara, eu estava esquisita, não disse nem boa noite, fui para o quarto. Ivo correu para o quarto e lá chegando, gritou pela mãe, pois me contou depois que eu suava muito e estava branca, parecendo desfalecida, tentaram me acordar, mas não respondia. Dona Inês entrou e disse: ─ Vamos rezar, não é nada bom. Nisso Ía entrou e perguntou: ─ O que Irma tem? Correu e me abraçou, me chamando, falando que ela precisava de mim, Ivo tentou segura-la, mas dona Inês pediu para deixar, que ela poderia fazer o que não conseguimos. Perceberam que eu estava voltando, pois gemia muito, isso demorou um bom tempo. Quando acordei, percebi que eu gritava tanto, Ivo e sua mãe, me seguravam, eu falava que queria as minhas roupas. Ivo devagar ia conversando e eu ia me acalmando e abrindo os olhos, falei que não queria dormir nunca mais, pois um homem queria me levar. Todos rezavam, como era muito tarde, esperaram amanhecer para ir em busca de ajuda. Fomos até a casa do senhor da seção, mas dizia a dona Inês que me molhasse os olhos para eles não fecharem, para eu não dormir. Quando o senhor veio falar comigo e me perguntou o que eu vi, contei que um moço veio até a minha cama, arrancou as minhas roupas e foi me levando para um matagal, falando que eu pertencia a ele e que nunca mais voltaria para aquela casa. Ele fez uma prece e disse agora esse homem não está aqui, mas pode voltar. Rezem bastante, e a noite vão a seção com ela. Assim foi, mas me senti muito mal, desmaiei duas vezes. Ivo me levou para a Santa Casa e fiquei internada, mas resistia para dormir, foram vários dias desse pesadelo, até que um médico me consultou e disse que eu estava com a doença do pânico do sono. Ivo avisou minha mãe e essa veio imediatamente com meu tio, seu irmão. Eu já não reconhecia as pessoas, somente queria que me molhasse o rosto para não dormir e chorava sem parar. A noite meu tio pediu para o Ivo, se poderia ir em casa com minha mãe, enquanto dona Inês ficasse comigo no hospital. Foram e meu tio contou ao Ivo que eles eram espíritas, e Irma não tinha doença nenhuma, teremos que tirá-la do hospital, do contrário perderemos a batalha. Ivo disse ser também espírita e que iria conversar com os médicos, dizendo que a minha mãe, iria removê-la, para a cidade dela, que teria mais recursos e assim foi. Fui levada para casa. Meu tio e todos da família rezaram muito, pois eu precisaria dormir dois ou três dias e me alimentar por sonda, tudo foi feito com orientação médica. Recuperei-me devagar dos tratamentos da matéria e do espírito. Tive conhecimento de que a entidade que me perturbava já estava recolhida em colônia de luz, em tratamento e aos poucos iria se iluminando e saindo da escuridão. Ficamos tranquilos e voltamos a nossa vida normal. Viver, Rezar & Amar

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Agradeço a deus a família que me permitiu nascer e a linda família que ele me presenteou para conviver. Meu nome tanto na minha vida terrena como aqui é Irma.

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03/01/2013

A infância de Ana Carolina

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iquei muito feliz e disse que pediria ao Jorge apanhar rosas e compraria uma cesta de vime e iria vender onde as moças elegantes ficariam, assim venderia tudo, todos concordaram, mas Jorge disse que não poderia fazer isso, pois as rosas não eram dele e a senhora sua patroa poderia manda-lo embora. Falei: ─ Me leve até essa senhora que eu falarei com ela. Nesses dias houve uma reunião na ACD para os detalhes da festa onde se conseguiria o dinheiro para podermos comprar o que essa instituição necessitasse. Os médicos e todos os profissionais que lidavam conosco eram voluntários, mas o sustento da associação tinha um gasto alto e o presidente e seus amigos não aguentavam sozinhos. Nessa reunião eu fui eleita a garota ACD, falava muito bem e tinha o rosto adequado para as fotos de propaganda. Todos os dias vinham jornalistas para fotos e entrevistas, até os meus quadros foram fotografados e eu me prontifiquei se fossem todos vendidos, pintaria outros, era só o tio me comprar as telas. Era uma alegria, esqueci-me de contar que dei a caminhonete o nome de geringonça, mas todos os dias conversava com ela e dizia que aquelas rodas nos deram muita ajuda, o que aliviou o Jô e a mama. Conseguiram um lindo vestido branco com rendas e bordados e nos meus pés colocaram um lindo par de sapatos também brancos, para eu aparecer em público. Foi nessa euforia que nos avisaram que uma grande personalidade, acompanhada de sua esposa, confirmou sua presença na festa. Para nós seria ótimo. As minhas professoras estavam me ensinando como teria que falar com as pessoas, pois ficariam pouco tempo, tinham os seus minutos contados, teria que falar pouco. Mama, quando disse de todos os preparativos ficou muito séria, me disse que talvez ela não pudesse estar comigo nessa festa. Fiquei chorosa, pois tudo que eu fazia era contando com ela, Jô, a minha irmã e a Zefa, mas como me sentia com muita responsabilidade, fiquei quieta, não poderia entrar na água para não me dar as dores e participar no dia da festa. Mama me levou e voltou com Jô. Viver, Rezar & Amar

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Eu escutei quando Jô disse a mama, que a dias no casarão ouve-se barulho de muitas pessoas e eles estão de volta, se prepare. Eu mesmo sem entender, disse: ─ Se essa gente se meter com mama, eu e a minha irmã Maria Alice, vamos enfrentar, se quiserem a cadeira que pegamos nós a entregamos. Mama rindo respondeu: ─ Eu sei que vocês me amam e isso me dá forças para enfrentar tudo. Eu a abracei e continuou dizendo: ─ Eu sem vocês morro, vocês são minha vida. Os preparativos foram intensos até que chegou o dia, seria no período da manhã e nos avisaram que o doutor ficaria somente meia hora. Mama me vestiu, mas não foi, fui com Maria Alice e Jô, me deram três rosas amarelas para entregar a esposa do doutor, quando ouvia falar dessa senhora sentia um aperto no coração, já não gostava dela em pensamento. Eu quis que Maria Alice ficasse perto de mim ou onde eu a visse. Tudo preparado, as crianças ficaram em fila no portão até a entrada, onde eu a receberia, os jornalistas orientaram como eu tinha que ficar para que essa senhora pudesse me beijar e sair na foto, pois eles fazem a foto para a senhora aparecer, não eu, isso tudo está me cansando, não gosto dessa confusão, ela é de doer. Como não entendia nada, perguntei se ela estava trazendo um bicho, e responderam que ela era a própria fera, me beijaram e riram. Um deles me disse: ─ Tomara que você nunca precise enfrenta-la. Rimos, nisso todos estavam batendo palmas e eu também bati, sem saber o porquê. Vi uma senhora se dirigir a mim, com um grande chapéu e agachando disse para um fotógrafo: ─ Seja rápido, eu detesto essas cenas. Encostou o rosto e aí pude ver seus olhos e fiquei calada, com muito medo chamando minha irmã para me socorrer, que veio e segurou a minha mão, dizendo tudo está bem eu estou aqui. A senhora talvez nem tenha te visto, pois ergueu o rosto e falaram várias coisas, que eu não entendi, para mim ela falava outra língua. Houve mais palmas e surgiu um senhor muito elegante que se aproximou e pegou na minha mão, e carinhosamente perguntou como eu estava, olhei para ele, pois somente a mama falava assim comigo. Respondi e nisso ele olhou para as minhas mãos e comparou as minhas mãos com as de sua mãe, as beijou e perguntou meu nome, lhe disse ser Carol. Ele me falou, deve ser Carolina, eu com a cabeça confirmei, perguntou a minha idade, eu disse, e ele contou que tinha uma filha com esse nome, aí me lembrei de que tinha que falar rápido, tudo o que tinha decorado, mas tinha esquecido, peguei as mãos dele e disse quase chorando: ─ Treinei para falar com o senhor, mas esqueci tudo com medo dos olhos da senhora, o senhor não vai ficar zangado? Vou falar com as minhas palavras: compre alguns dos meus quadros, isso vai nos ajudar a comprar os nossos remédios e também o meu tio Jorge a trocar a minha cadeira, acho que falei tudo, mas também gostaria de o senhor dar as flores para a senhora, pois não quero nunca mais ver essa senhora. Ele se ajoelhou e pegando as minhas mãos, disse: ─ Não precisa falar mais, com o que te ensinaram você falou tudo o que precisava. Gostaria de conhecer sua mãe. ─ Ela não pode vir, somente a Alice e o Jô vieram comigo. O senhor tem tempo para conhecer minha família? 110

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─ E o seu pai, não pode vir? ─ Meu pai, eu não conheci. Ele trata das crianças que precisam dele, é um homem de grande bondade. E a minha mama, quando ela vier posso pedir para ela explicar o que o senhor não entendeu. Para mim é simples, eu tenho a mama que amo e dou a minha vida por ela, mas tenho outra mama que quando ela voltar, vou chama-la de mama mais. ─ Quer dizer que sua mama não é sua mãe? ─ É mais ou menos isso. Mas minha irmã Alice, essa que está atrás do senhor é mesmo minha irmã. Ele se virou e ficou parado sem dizer nada, depois abraçando Alice disse: ─ Não pode ser o que estou vendo. Passou mal. O doutor Jorge veio em auxilio, ao se levantar lhe perguntou se ele também se emocionou com a Carol, ela é o nosso símbolo, sua cara, um ser que larga uma criança como essa, não sei o sobrenome, mas gostaria de adota-la, ninguém conhece esse canalha. ─ Me perdoa, sei que tem os seus minutos contados e agradecemos a sua permanência aqui. Ele me pegou outra vez as mãos e disse: ─ Meu anjo se algum dia você puder me perdoar, isso me fará muito feliz. Perguntou ao doutor Jorge se ele tinha um consultório onde pudesse examinar a Carol. ─ Claro que tenho, mas sua comitiva já estão lhe esperando. Respondeu que não tinha comitiva e ninguém merecia mais atenção que essas duas criaturas de Deus, perguntou: ─ Posso pegar você no colo? ─ Eu sou pesada, mama não aguenta mais me levantar, mas se o senhor não me derrubar, seguro firme no seu pescoço, não pode amassar o vestido, ele não é meu. ─ Você tem outra roupa por baixo do vestido? ─ Tenho. Chamei Alice e pedi que tirasse o lindo vestido para o senhor me carregar. Estranhei que Alice estava chorando e o senhor também. Ela me tirou o vestido e eu disse: ─ Agora sou somente Carol. Levantei os braços e ele me carregou, sempre chorando, nisso a senhora entrou falando num tom agressivo: ─ O que você está fazendo, temos minutos para a outra palestra. Ele sempre me segurando, com a voz firme disse: ─ Anule tudo o que você marcou, não tenho mais tempo para você. De agora em diante, somente o doutor existirá para um dever sagrado de pai e de ser humano. Me levando para o consultório, as lágrimas caiam em cima de mim e eu com uma mão enxuguei e disse: ─ Se o senhor não parar de chorar eu também choro. ─ Não quero ver choro em seu rosto, sempre quero ver um lindo sorriso. Me colocou na cama e foi lavar o rosto, voltando em um minuto. Alice também chorando me disse: ─ Agora estamos em paz, vou dizer para o Jô ir buscar mama, ela precisa estar aqui. ─ Vai, eu te espero aqui, mas diga para ela vir logo, para conhecer esse doutor. Escutei ele dizer “vai e traga essa santa mama, para que eu possa pedir perdão, se isso é possível”. Segurando Alice perguntou: ─ Você me reconheceu? Viver, Rezar & Amar

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Ela o abraçou e disse que sim. Eu falei: ─ Vai com a charanga e diga para ela não parar em lugar nenhum, depois eu dou um grande beijo nela. Ele não entendeu, mas não deu muita importância, tirou os meus sapatos e foi falando “se está sentindo alguma dor me fala”, eu não vou te machucar. Fiz com a cabeça que sim e o doutor Jorge informou que eu tinha dores após os exercícios na água, concordei com a cabeça. Enquanto ele estava me examinando, a senhora abriu a porta e entrou gritando com o doutor. Ele a olhou e disse em tom firme: ─ Cale-se e saia. Ela o olhou e apontando para mim disse: ─ Você está desperdiçando a sua vida por essa coisa, o seu nome tem mais valor que todas as crianças aleijadas. Eu levantei e gritei: ─ Quero a minha mama. Nisso a mama entrou e pegou-me no colo, falou num tom que eu nunca tinha ouvido: ─ No meu anjo ninguém toca e nem grita, ponha-se daqui para fora sua inútil, vá exibir sua roupa no seu mundo, porque o meu e o do meu anjo ninguém vai magoar. Me abraçando, me beijava dizendo não chore, estou aqui, vamos para casa. O médico segurando o braço da mama pediu: ─ Eu quero examinar esse seu anjo, acho que ainda tenho tempo de fazer esse anjo andar e vir nos dar muitos abraços. Ajoelhou e pegando na barra do vestido de mama tornou a falar: ─ Permita beijar a barra do seu vestido, pois não sou digno de beijar suas mãos, que acaricia esses anjos e se um dia puder, olhe para mim sem ódio, e o senhor doutor Jorge que me falou que gostaria de esmurrar a cara do pai desse anjo, estou pronto a receber sem me queixar, mas tenho algumas palavras em minha defesa. Passei esses anos todos estudando e pesquisando, esqueci-me do mundo que nos cerca para aprender exatamente do que minha filha hoje precisa, estou aqui, ela me aceitou sem saber quem era, permita que a trate para que tenha forças nas pernas, nem que seja a última coisa que faço como médico. Alice me abraçou e disse: ─ Pai, faça tudo que puder para a nossa pequena andar, será nossa maior alegria. Mama estendeu a mão e ele a beijou. A senhora que tudo observava disse: ─ Acabou com essa palhaçada, vamos que o dever nos chama. Ele a olhando, respondeu: ─ Você falou uma verdade, acabou a palhaçada. Abriu a porta e olhando para a moça que o aguardava, pediu que cancelasse todos os compromissos, menos a reunião com os médicos que tratam dos deficientes. ─ Para esses estarei disponível dependendo do meu tempo, pois estarei ocupado por muitos meses com os anjos que Deus me deu. A senhora estava sem o chapéu e olhando para ela, eu abraçava mama com medo daqueles olhos. Meu pai me olhando me disse: ─ Sabe Carol, eu nunca tinha olhado para esses olhos e nariz, tem toda razão por estar apavorada, eles são de assombrar qualquer pessoa, eles fazem parte do seu passado. 112

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Alice minha irmã, me disse: ─ Nossa vida vai mudar, isso eu tenho certeza, nosso pai é um homem justo e sábio e a bruxa de olho roxo não vai ficar perto de nós, garanto para você. Mama veio até nós e disse: ─ Vamos para casa, todos estamos cansados. Chegou um homem que não conhecia e comunicou a Marta, que o doutor pediu para acomodar todos no carro dele e mais tarde ele iria se encontrar com vocês, e a mama disse ao Jô para levar a cadeira na geringonça. Eu não gostei do que ouvi e pedi a mama que voltássemos para nossa casa, da mesma forma que viemos. Nisso veio o doutor e falou com todo carinho possível: ─ Você faria para mim um grande favor em aceitar a minha oferta de ir na minha charanga, não tão alegre como a sua, mas ela também sentirá prazer de carregar umas lindas meninas, ela só carrega tristezas e nunca viu um sorriso assim, vamos alegrar esse veículo tão solitário. Sorri e concordei, mas que a minha cadeira fosse junto com Jô, tudo combinado e me puseram numa grande almofada macia, fiquei olhando, tudo era muito luxuoso, nunca tinha sentado em um lugar tão confortável e perfumado, entrou mama e Alice e na frente foi o doutor com um homem de chapéu, olhando para esse chapéu pedi ao meu pai se ele poderia tirar o chapéu, pois me dava medo, meu pai autorizou que o senhor guiasse sem o chapéu e fomos em frente. Gostei de ver o cabelo do senhor, bem tratado e de cor negra, agradeci a sua atitude. Alice me disse como se faz quando a pessoa é gentil, ri e comecei a cantar a música de agradecimento que no final diz “Jesus veio te recompensar por esse ato, por sua alegria e a paz te envolva e te fortaleça para sempre”. Ele me agradeceu e falou: ─ Já fui bem pago pelas tuas palavras. Pedi colo para mama e adormeci, sei que o meu pai queria parar o carro e me carregar, mas mama disse que isso ela fazia com muito amor e carinho, chegamos, e o chofer me carregou e perguntou onde deveria me levar, mama indicou a minha casa, lá ela terá que acordar, porque por hoje já teve muitas novidades e isso não é muito saudável. Meu pai concordou dizendo: ─ Devagar arrumarei as coisas desajustadas. Quando acordei já era muito tarde, chamei pela mama, queria água, ela me acariciando perguntou se eu tomava um pouco de leite, concordei e Zefa trouxe a minha caneca, bebi, mama me arrumou dizendo: ─ Vamos dormir, hoje foi um dia muito pesado, assim amanhã resolveremos o que ficou pendente. Não dei muita importância, vi que Alice estava dormindo em sua cama, então estava tudo bem, e o resto eu iria saber amanhã. Quando despertei senti que já era tarde, chamei por mama que sorrindo perguntou se tinha dormido bem e me levou para o banho, dizendo que tínhamos de ir para a escola e saber o que o doutor estava organizando para o seu dia, nisso o meu pai entrou falando: ─ Bom dia, meu anjo. ─ Bom dia, papai. Ele correu e me abraçou falando: ─ Esse é o maior presente que você poderia me dar, me dando esse título. Puxei as cobertas e pedi desculpas, pois estava cheirando xixi, sorrindo disse: ─ Esse perfume não é vendido em lugar nenhum, para mim ele é agradável, mas logo Viver, Rezar & Amar

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você não vai fazer mais isso, terá o controle de si, eu te garanto, confie em mim. Respondi que sim. Ele me carregando para o meu banheiro, era diferente dos demais, a banheira era baixa, para que as minhas pernas não ficassem penduradas, ele ficou de joelhos e conversando, me esfregando, levantava os meus pés e pernas pedindo para eu falar se doía ou não. Na água sempre doía. Me entregou para mama me enxugar, pedindo para tomar café comigo, lhe respondi que não tomava café, apenas um copo de suco e um pedaço de bolo. E fomos correndo para a escola, para eu não chegar atrasada. Sorri e perguntei para mama: ─ Por que a Alice não veio me dar bom dia? Meu pai me respondeu: ─ Hoje ela tem uma prova e eu a levei ao colégio pela primeira vez, e agora vou levar você também, terá um dia bem cheio. Fomos no carro dele, mas João, esse era o nome do chofer que estava sem o chapéu me dando bom dia, me informou que a minha cadeira já estava na escola, hoje eu usaria a minha cadeira nova e a velha eu daria a um coleguinha que precisasse, assim é a vida, passamos o que nos serviu por tanto tempo e agora iria alegrar outro ser, não disse nada, mas já estava com saudades da minha cadeira velha. Chegando a ACD, meu pai falou que teria um dia normal, porque ele e mama iriam organizar o que foi desfeito há tempos atrás, a noite buscaria eu e Alice para jantarmos em família. Gostei como me falou, como se eu fosse adulta, não entendi muito bem, mas gravei que ele viria me buscar junto com a Alice. ─ E mama? Não iria conosco? ─ Exatamente, sua mama estará ocupada o dia inteiro, amanhã iremos conhecer o mar, onde poderá ver o quanto Deus é poderoso, o mar só vai onde ele determinou, não pode passar do seu limite, lá eu explico tudo. Você comentou que não conhece o mar, eu terei o prazer em te apresentar essa grandeza que foi dada ao homem, e esse tenta se apossar sem resultado, o que é de Deus ninguém toma. Vai meu anjo, tenha um bom dia. Montaram a minha cadeira nova e esperei a minha ajudante me levar. Olhei para os dois e mandei um beijo para cada um, estava com vontade de chorar, mas os meus amiguinhos vieram e assim me distrai e passei um dia muito bom. O que vou relatar me foi contado pela mama e papai, muito tempo depois. Mama e papai foram em um departamento jurídico, onde já estavam a minha mãe e o tal financista. Ela ao ver o meu pai levantou e disse: ─ Querido você está atrasado, onde esteve? Meu pai sem responder foi se dirigindo aos senhores que estavam na porta e os levaram para um escritório, e lá o meu pai pediu a mama os documentos do bando e os entregou a um senhor, dizendo: ─ Que estas provas sejam suficientes e o jardineiro já está aqui, se corresponderam muito tempo por uma máquina de escrever. Chamou a minha mãe e o tal financista, e pediu que eles respondessem apenas as perguntas, e as explicações teriam o direito de fazerem com seus advogados e o juiz. Os dois se olharam, iam dizer alguma coisa, mas um dos senhores, mostrando o extrato do banco, perguntou: ─ Esse foi o pagamento efetuado pelo senhor? Ele respondeu que sim. ─ A senhora tinha conhecimento disso? Ela ficou calada, mas confirmou com a cabeça. Depois, mostrando uma conta de farmácia, perguntou: 114

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─ O senhor confirma que uma menina menor levou essa conta para o senhor saldar e o senhor se negou? Ele se mexeu na cadeira dizendo que sim, mas que o fazia a mando da senhora, essa em defesa própria informou que não tinha obrigação de sustentar ninguém. Depois de todas essas provas, minha mãe perdeu tudo, carros, imóveis, joias e toda a publicidade que ela mais adorava. Meu pai se separou judicialmente, mas deu um pequeno apartamento para ela morar e uma pensão para o seu sustento. Quanto ao financista, ficou a critério da justiça. Meu pai recebeu três sítios de bom nível comercial, várias casas alugadas de alto padrão. Deu a mama um sítio, para Jô uma linda chácara de nome Dama das Rosas e para Zefa uma casa alugada dando a ela um rendimento bom pela farmácia que tantos anos ajudou a pagar. Ele ajudou muito a ACD, mas não quis morar no casarão, preferiu morar conosco, ficou no quarto na Alice, assim poderia ouvir quando eu chorasse e ajudava mama a me fazer adormecer e Alice foi para o quarto de Zefa, e ela com o Jô passaram a dormir no casarão. Tudo ficou maravilhoso para mim, aprendi a amar meu pai e sentir o quanto ele nos amava. Fiz muitos tratamentos com ele na clínica que era de sua propriedade, mas estava longe de ser igual as clínicas que ele possuía na Europa. Sendo assim resolveu me levar para a Suíça, ficamos três longos meses, lá não é permitido acompanhante para os doentes, e eu queria mama, mas ela ficou com Alice. E o meu pai, mesmo sendo o meu médico, ficava comigo e me fazia companhia. Meu tratamento foi dolorido, usava vários aparelhos presos nas pernas por muitos dias, sem poder me mexer, mas meu pai estava ali para me amparar e me ajudar nas dores. Um lindo dia de sol ele me disse: ─ Hoje será o dia mais feliz da minha vida, você será examinada por um dos maiores especialistas e iremos para o nosso país. Vieram alguns moços e me carregaram para ser examinada, me puseram de pé e meu pai traduzia o que eles falavam, para eu dar um passo à frente e para traz, erguer a perna uma diferente da outra, colocaram uma espécie de metal em baixo dos meus pés e meu pai disse que teria que usar isso por algum tempo, que poderíamos voltar para casa. Eu teria uma vida normal, de tempos em tempos eu teria que voltar para ele observar o meu progresso. Fiquei muito emocionada e quase não podia andar, ele me explicou que com o tempo iria me habituando e andaria normalmente, mas que provisório usaria uma cadeira muito leve, que eu sozinha poderia dirigir, sem ajuda. Fiz tudo como ele me ensinava e fui me habituando aos novos movimentos para viver como qualquer ser. Ia e vinha no quarto e meu pai ria de ver esses movimentos. Dizia: ─ Quando a mama ver não vai acreditar. ─ Mesmo assim eu quero seu colo, isso me faz muita falta. Ele me pegou no colo e respondeu: ─ Será que os meus braços poderão te dar o mesmo que recebe daqueles que deram tanto? Eu o abracei e disse: ─ Eu também te amo, mas a minha mama é a minha existência, você entende? Ele emocionado respondeu que sim. Para me distrair perguntou se eu queria conhecer os Alpes, respondi que sim, pois tinha lido e visto fotos maravilhosas da natureza, mas isso quando eu voltasse e com a Alice, a mama, Zefa e o Jô, somente para passear, sozinha não conseguiria enxergar as Viver, Rezar & Amar

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belezas do lugar, e você nos dará explicações sobre tudo, sentiremos alegria em família, ele concordou, pediu para a camareira arrumar as nossas malas, voltaríamos nesse dia para o nosso país. Eu sentia as minhas pernas como uma coisa que não me pertencia e era isso que me impedia de andar. Ele me explicou que as minhas pernas estavam dormindo, agora elas acordaram, você terá de conversar com elas e exigir que elas passem a trabalhar, concordei e voltamos para o Brasil, todos estavam no aeroporto nos esperando, uma alegria só. Nessa noite dormi no colo de mama, beijando suas mãos e dizendo muitas vezes, como uma pessoa tão pequena tem tanto amor, como eu tenho por você. Consegui conversar com as minhas novas pernas, e o quanto eu crescia as minhas pernas também, tinha que voltar a Suíça para acertos. Certa vez fomos todos, meu pai alugou uma bela casa bem próxima dos Alpes, foi um sonho esse dia. Eu andava com auxílio de alguém, dentro de casa eu me equilibrava sozinha, as vezes eu tinha medo de ficar em pé, eu me negava a andar, meu pai com muito jeito conseguia, porque mama ainda me carregava no colo com todo o peso das pernas de aço, como eu as chamava. Alice se formou em financista para ajudar a família, montou um bom escritório e administrava tudo o que pertencia ao meu pai e a nós. Casou-se com um médico que também trabalhava na ACD e eu fazia de tudo nesse hospital, era babá, nadava para auxiliar quem precisasse. Quando fiz vinte anos fui orientadora dos deficientes, mas essa minha passagem pela terra estava chegando ao fim, deixei esse lado, mas trabalho onde estou dando forças nas pernas das crianças ou adultos que precisam dessa ajuda. O meu caminho é ajudar sem chorar, não chorar por dó ou piedade, vale apenas lágrimas derramadas por boas emoções e alguém que as enxugue com amor. Ajude dentro das tuas forças, se sentira grande e útil junto a Jesus, que ele possa abençoar as criaturas que se esquecem de si para amar ao seu irmão, sem olhar cor, raça ou posição social. Assim melhoraremos a humanidade. Carol ou Ana Carolina

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05/01/2013

É dando que se recebe

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ui criado em um ambiente pobre, mas tínhamos conforto. Minha mãe fazia para noite uma sopa que meu pai gostava, ele elogiava dizendo que parecia uma sopa feita para um rei, o que minha mãe gostava de ouvir, mas fazia para sobrar e após o jantar, chamava os seus três filhos e mandava levar o que sobrou a um casebre onde viviam quatro meninos em pobreza total, ficavam contentes com a nossa chegada, diziam: ─ Chegou a nossa sopa maravilhosa. E abençoavam a nossa família, as vezes no meio do caminho encontrávamos um senhor, que sorria para nós e dizia: ─ Diga a sua mãe que nunca faltará provisão no seu lar. Tinha uma barba comprida e branca. Quando contávamos a nossa mãe, essa dizia brincando ser o papai Noel. Assim foi a minha infância, gostava de levar as coisas que aliviavam a miséria de alguém. Cresci e tive muita sorte, trabalhei bastante até conseguir ter uma pequena indústria, casei com uma pessoa de mesmas ideias, íamos a noite levar lanches numa rua perto de nossa casa, para as pessoas necessitadas. Com o tempo essas pessoas foram aumentando, ficou impossível continuar essa distribuição, minha esposa resolveu fazer uma sopa, ficaria mais em conta, pois os vizinhos se propuseram a ajudar e aí começou um caminho meio difícil, cada dia aumentava mais os pobres e as filas começavam muito cedo, a polícia nos avisou que os moradores reclamavam dessas pessoas que faziam arruaças, assim ficou proibido a nossa distribuição. Do lado da minha indústria eu tinha um grande terreno onde pretendia ampliar o refeitório para o meu pessoal, sugeri avisar alguns pobres que fossem nesse terreno, que era particular. Abriria os portões, eles entrariam sem fazer alarde e depois limpariam o local, dessa forma começariam a trabalhar para pagar sua comida, sem amolar ninguém, assim foi por alguns anos. Minha esposa não podia mais Viver, Rezar & Amar

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ajudar, pois tínhamos três filhos que lhes tomavam o seu tempo. Os meus funcionários e alguns familiares começaram a nos ajudar. Começou uma nova etapa, não fazíamos mais sopa, o que sobrava das refeições eram distribuídas e eles ajudavam na cozinha e na limpeza. Certo dia fui ver como estava essa distribuição, e vi um senhor de longas barbas que me pareceu conhecido, não me lembrava de onde, ele veio até mim e disse: ─ Preciso falar contigo, mas em particular. Respondi que me acompanhasse ao meu escritório, balançou a cabeça negativamente e preferiu ir onde os funcionários tomavam café, fomos juntos, reparei que estava malvestido, mas seus cabelos e barba eram bem tratados, nos sentamos e ele falou: ─ Não me pergunte nada, só escute e espero que me atenda para o seu bem. Sei que vai para a fazenda amanhã com uma grande quantidade de dinheiro, para o pagamento das pessoas que lá trabalham, coisa que já está atrasado faz três meses e eles ainda estão trabalhando por ter muita consideração consigo e sua esposa. O seu administrador e o secretário já providenciaram a mala para o senhor levar o dinheiro. O senhor tem outra mala igual a essa? Respondi que sim, pois tínhamos muitas dessas malas para transportar documentos. Estava abismado, ninguém sabia do que ele estava me falando, essa remessa de dinheiro só três pessoas estavam envolvidas, mas como ele pediu, nada falei. Continuou a dizer: ─ Mande amanhã esse dinheiro pelo seu filho e alguém de sua confiança, mas não essas pessoas que mencionei, vamos até o seu escritório e faremos outra mala, com tijolos e papéis, avise a polícia para ficar na bifurcação das estradas, quando começa a estrada que leva para a fazenda, o senhor deve parar o carro ali e entrar nessa estrada e se esconder com os agentes policiais e esperar, mas vão bem armados, esses três são pessoas perigosas. O carro deles estaria bem mais adiante esperando pelo acontecimento. Tenha fé, que nada vai acontecer se seguir o que lhe expliquei. Fiquei calado, somente perguntei: ─ O senhor me conhece? Ele riu e respondeu: ─ Há muitos anos pela sua fé e vivência de amor ao próximo sem se quer saber quem são. Aí está o pagamento das caridades feitas com amor. Prometa que vai seguir à risca tudo que lhe pedi. Prometi que iria imediatamente providenciar tudo para sair conforme ele me explicou, mas essas três pessoas de minha inteira confiança, como estão agindo, deixando de pagar os funcionários da fazenda que trabalham com tanto amor. Fizemos tudo sem complicações, logo cedo os meus secretários estavam me esperando. Perguntei se o carro tinha sido revisado, eles me responderam que tudo estava bem, que faria uma viagem maravilhosa, somente me perguntaram se alguém sabia o que eu estava levando. Respondi que nem a minha esposa sabia. Todos sabiam que eu estava levando roupas para serem distribuídas entre os operários, conforme tinha pedido um dos meus filhos. Sentei no carro e eles porque eu iria guiando, informei que o meu chofer no dia de ontem passou mal e eu iria muito bem, pois conhecia a estrada como a palma da minha mão. Um deles se ofereceu para me acompanhar, agradeci ligando o carro e sai, estava com medo, mas fiz tudo como combinado, parei no local, entrei no mato e logo o delegado e o gerente do banco chegaram com três agentes da polícia armados, ficamos escondidos por 118

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quase uma hora. Quando um carro parou ao lado do meu, desceram e conversando entre si perguntavam onde eu estaria, mas isso não tem importância, vamos acha-lo e fazer o serviço, o outro questionava porque haveria morte, o primeiro disse que tinha ocorrido um erro de cálculo, e não podia deixar a pista. Pegaram uma chave e abriram o porta-malas, nisso os agentes foram mais perto e perguntaram porque eles estavam mexendo naquele carro, responderam rapidamente que o chefe deles tinha telefonado pedindo ajuda, pois o chefe foi buscar o mecânico e eles tinham que levar o que estava no porta-malas. Os agentes com as armas em punho se apresentaram como agentes da polícia e mandaram eles encostarem no carro, avisando que passariam fogo se resistirem. Nisso apareci e os reconheci como pessoas de minha inteira confiança até aquela data, responderam para os agentes: ─ Viu como é verdade. O delegado e o gerente do banco apareceram e eles ficaram sem ação, mas cumprimentaram e perguntaram se o carro deles também deu problema. Abri o porta-malas e disse: ─ Era esta mala que vocês queriam, podem levar, ela é toda de vocês. Aí estão papéis velhos e tijolos que tenho que dar aos meus amigos de tantos anos e digo mais, amigos que não veem lucro ou dinheiro em troca de uma amizade sincera, guardei no fundo do coração essa lealdade. Os papéis se espalharam e coloquei os tijolos embaixo da árvore e olhando para a mata, vi o velho com uma túnica cor de mel e um cinto de corda mais escuro, com sua barba branca bem tratada. Agradeci mentalmente tanta proteção que tinha recebido, e ouvi como se alguém estivesse falando “é dando que se recebe”, assim foi que Jesus determinou em suas parábolas. Quando passei para este novo plano tentei encontrar esse amigo, mas até agora não tive essa oportunidade, mas espero encontrá-lo e dizer: ─ Quando recebemos graças sem esperar, devemos agradecer. De um amigo da caridade. Leonardo ou Leo

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07/01/2013

O moço loiro

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ui professor de uma faculdade, no início do ano tive em minha sala de aula um jovem como aluno, que me chamou atenção. Loiro e de longos cabelos, rapaz muito bonito, de personalidade marcante, se impunha nas discussões e debates, sempre defendendo à sua maneira de pensar e fazendo pose para exibir seus cabelos, que tanto tinha orgulho. Passou o tempo e ele ficou muito doente, seu tratamento levou seus lindos cabelos loiros. Um dia enquanto corrigia provas, ele adentrou em minha sala, só o reconheci por uma mecha de cabelos loiros que lhe restava em sua cabeça, até a sua voz estava baixa e sem emoção, seu corpo curvado, por um peso invisível. Fiquei sem ação pelo seu estado físico e emocional, ver como tinha se transformado o moço dos cabelos loiros. Pedi que ele retornasse as aulas, nem que fosse só para um depoimento, concordou e marcamos para o dia seguinte. Ao começar a prece todos os meus alunos ficaram me fitando com um olhar de espanto, eu mais espantado ainda. Procurava me concentrar e falar no carinho que todos mandavam a ele e a nossa compreensão pelo seu estado. Ao termino da prece todos afirmaram que ele recebeu os votos enviados, o espanto geral foi porque no lugar dos meus ralos cabelos, todos viram os lindos cabelos loiros do amigo. Soube aí o porque ele não tinha vindo, ele tinha nos deixado, passando para outro plano, mas recebeu nossa homenagem. Não adianta sermos vaidosos, nada é para sempre. O melhor é que temos dentro de nós, em nossos corações. Pensem nisso. Fato contado por Beto

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09/01/2013

O lanche do estudante

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m jovem pobre para estudar e trabalhar, tinha que caminhar por muitas horas para dar conta das duas jornadas. Para isso não tinha tempo de descansar e comer. Durante o seu percurso, que fazia a pé da sua casa, o trabalho e a escola, parava em um poço perto de uma laranjeira, para se refrescar e seguir o seu caminho, isso fez por muito tempo. A dona do sítio que presenciava essa atitude cotidiana do rapaz, começou a fazer um lanche e um copo de leite, deixando na borda do poço para o rapaz se alimentar além da laranja e a própria água. No início o rapaz estranhou, mas acabou aceitando, pois, sua fome era grande, com o tempo ele já esperava sua alimentação e sempre agradecia a bondade da senhora. Os anos se passaram, tanto para o rapaz que se formou em medicina e passou a trabalhar no hospital da cidade, como para a senhora do sítio que com a idade chegando, veio as doenças e não possuía finanças para se tratar. Um dia seus males foram mais graves e vizinhos a levaram para o hospital. Lá foi recebida pelo jovem doutor com carinho e atenção, tratada com tudo que precisava para sua recuperação. Ao término de seu tratamento, a senhora foi perguntar como faria para pagar tudo que tinha sido gasto com ela. Foi nessa hora que teve ainda mais emoção pela resposta do doutor. ─ A senhora não tem que pagar nada, pois já pagou há tempos atrás com alimentos que muito me ajudaram para ser o que sou hoje. A senhora agradecida disse: ─ Tudo que eu fiz foi de coração e nunca esperei pagamento, se precisar farei de novo. Essa é uma lição onde aprendemos fazer o bem sem olhar a quem, nem esperar pagamento pelas nossas caridades e nem propaganda de nossas ajudas. Fato contado por Beto Viver, Rezar & Amar

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11/01/2013

A vida de um jovem drogado

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cho que desde que nasci sou uma pessoa revoltada. Tudo na vida para mim estava ruim. Os pais, como todo mundo adora, eu os detestava, não sei avaliar esse meu sentimento. Fui para a escola como todas as crianças, aprendi a ler e escrever muito mal, mas para mim estava bom, não precisava frequentar mais. Fui expulso por faltas, meus pais ficaram muito sentidos, mas nada me atingia, sabia que era algo, mas não sabia o que. Vadiava o dia inteiro, via os meninos irem para a cidade de bicicleta e eu não tinha, eu não pedi, exigi de meus pais uma, eles se entreolharam e disseram: ─ Nós trabalhamos o dia todo e não temos mais horas para trabalhar e lhe dar uma bicicleta. Mas pedirei ao porteiro da fábrica onde meu amigo engraxa os maquinários, que se ele quisesse faria o turno da noite, assim ele descansa e eu ganho um pouco de dinheiro para comprar a bicicleta. Uns dias depois vi na porta de casa uma bicicleta, perguntei de quem era aquela porcaria. Minha mãe me repreendeu e disse: ─ Isso é o que seu pai pode lhe dar, se não gostar vai trabalhar e compre uma melhor. Não gostei, mas peguei e sai com aquela coisa, meus amigos me disseram: ─ Essa bicicleta vale apenas um cigarro. Fomos todos para a cidade, lá me fizeram fumar um cigarro, me senti muito mal, me levaram para um buraco e me deixaram lá até eu melhorar, isso já era noite. Desde esse dia eu não voltei mais para casa, andei de um lado para o outro, dormia na porta da igreja. Assim começou a perdição de uma vida, provei todas as drogas, roubei para comprá-las, fui várias vezes mandado para o abrigo de menores, lá tínhamos mais drogas que nas ruas, fazíamos dívidas que com certeza nunca poderemos pagar, mas íamos para as ruas entregar as drogas em lugar determinado e isso ajudava abaixar as nossas dívidas. Nesse local aprendi mais vadiagem, como roubo em lojas, furtos em pessoas nas Viver, Rezar & Amar

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ruas. Voltávamos para o abrigo, mas podíamos entrar e sair à vontade desde que ajudássemos os que tomavam conta e déssemos o lucro esperado, do contrário apanhávamos e éramos suspensos das saídas. Resolvi fugir desse lugar, já era maior de idade, mas não tinha documentos, isso dificultava as minhas caminhadas. Tendo na minha roupa a identificação do abrigo, fui levado para tratamento em hospitais várias vezes, mas ficava cada vez pior, não sabia quem eu era, nem de onde vinha. As lembranças iam se apagando totalmente da minha cabeça. Para mim a cabeça crescia, tinha impressão que ela era enorme, até a minha fala ficou prejudicada, repetia sempre só o final que ouvia. Foi assim a minha vida de drogado e infeliz. Numa dessas minhas fugas vi um trem parado, subi e sentei num banco. O trem percorreu um bom pedaço do trilho, quando um homem veio até mim e disse: ─ Chegamos ao final da linha, aqui é o Poço Fundo, cidade que nada tem, mas se quiser ficar, pode dormir, mas amanhã bem cedo vem a máquina buscar esse vagão e poderá leva-lo de volta, pois aqui é o fim de muitos como você, que vem e não voltam. Foi embora e eu fiquei sem responder nada. Fiquei pensando e nada fez sentido para mim, no que eu ouvi. Adormeci e quando acordei, vi um rapaz me olhando e perguntou qual era o meu nome, fiquei lhe fitando e me perguntando, qual era o meu nome? Não lembrava e encolhi os ombros em resposta, e o rapaz disse: ─ Até seu nome não se lembra. Levantou e saiu. Voltou com uma caneca de café, me entregou dizendo: ─ Beba tudo isso, lhe fará bem. Bebi e respondi: ─ Que café ótimo. O rapaz me agradando pediu que eu deitasse e procurasse dormir, ficaria me vigiando e amanhã seria um novo dia. Quando acordei o vagão estava se mexendo, olhei e não vi o rapaz, nisso a porta se abriu e ele entrou trazendo uma caneca de café quente e com um lanche. Comi e bebi tudo. ─ Daqui algumas horas desceremos e vou te levar para a tua cura, se assim for permitido por Deus. ─ Ouvir Deus? Não quero voltar aonde me aplicam agulhas, ficarei aqui, ninguém me bate ou me machuca. ─ Nesse lugar que vou te levar, você encontrará somente a paz. O teu resgate já terminou, está na hora de começar a viver, encontrar o teu passado e presente, sua mãe precisa de você. ─ Mãe Linda. ─ Isso mesmo, esse nome é de sua mãe, gostei de ouvir, mãe é sempre um começo, o meio e o futuro. Rindo pediu para eu descer e caminhar, dizendo que eu conseguiria. Fiquei de pé e dei alguns passos, pegou no meu braço e falou: ─ Vamos para o teu futuro. Chegamos a um lugar muito bonito, cheio de árvores e grama, fiquei parado e olhando tudo, o rapaz me observando disse: ─ Pode me chamar de Neno e o seu, você se lembrou? Pensei e disse: ─ Acho que é, Domar. 126

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─ Muito bem, gostei. Vamos devagar e logo você vai se lembrar de tudo. Vimos um rio de água calma e transparente, quis entrar, mas Neno me disse: ─ Vamos um pouco mais a frente. Andamos e logo vi uma cachoeira, volumosa e muito bonita. Disse que podia entrar, me dando o que parecia uma pedra para esfregar na cabeça, falando que ia me fazer bem, entrei e fiz o que ele mandou, quando sai não vi meu amigo, fiquei preocupado, mas deitei na relva e adormeci. Talvez por isso não tenha visto quando ele chegou me trazendo calças, uma camisa, uma caneca de café e um sanduíche de carne, tudo muito gostoso. ─ Te trouxe essas roupas, pois as suas tinham símbolo do hospital e poderiam te levar de volta. Voltamos a andar e Neno disse: ─ Vamos mais rápido, vai chover. Não vi sinal de chuva como ele falou, mas obedeci. Entramos em um caminho cheio de árvores e num canto vi uma casinha bem velha, e foi para lá que seguimos. A porta estava aberta e dentro só havia um grande papel no chão. ─ Pode descansar aí, vai se sentir bem. Não tenha medo do escuro e nem da chuva, eu estarei por perto. Deitei-me e foi como se eu estivesse numa cama bem macia, dormi e quando acordei o dia estava alto, mas o meu amigo não estava ali, não me preocupei, sabia que logo voltaria. Assim foi e dessa vez trouxe frutas e me disse: ─ Fale o nome de cada uma delas. Comi a primeira e não conseguia lembrar o nome, Neno ajudou dizendo que eu comia quando criança e gostava. Fiquei pensando e disse banana, fiquei feliz por me lembrar. Depois comi outra, disse manga. Neno disse: ─ Muito bem, o que te lembra essa fruta? Fiquei a pensar e respondi: ─ O meu sustento por muito tempo, quando deixei a casa dos meus pais. Também lembrei do nome Ana, quem é Ana? ─ Agora vamos, sua mãe precisa de você. Não entendi, mas o segui. Olhava tudo e me parecia familiar o local, andamos bastante e entramos numa espécie de vila, tinha algumas casas iguais, todas muito malcuidadas. Neno parou e disse: ─ Você terá de ir sozinho enfrentar a tua deficiência e se curar conforme a tua energia. Ia gritar, mas ele simplesmente sumiu. Fiquei só, chorei muito, mas comecei a olhar as portas e senti que a segunda me puxava, abri a porta e vi uma mesa e uma cama, entrei e ouvi uma voz dizer: ─ Você voltou meu filho, venha aqui, estou na cama. Fui até o outro cômodo e vi uma senhora deitada, muito magra. Ela estendia os braços e eu me curvando a abracei, não tinha lembranças dessa senhora, mas como ela me chamou de filho fiquei quieto. Ela me pediu para ajudá-la a se sentar, abracei-a e a pus sentada, me perguntou entre soluços e choro: ─ Porque você tardou tanto, seu pai já não está mais aqui, foi morar com Deus. Não sabia o que falar, mas disse: ─ Estive muito doente e não lembrava o caminho de casa, agora um amigo me trouxe. ─ Diga para o seu amigo entrar, pois se ele trouxe você para mim o terei como filho. ─ Ele me deixou e foi embora, quem sabe voltará para me ver, ele sabe que eu o amo. Viver, Rezar & Amar

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Falei chorando, já sentia sua falta, engoli e respirei fundo. Ela me pediu se eu poderia leva-la ao banheiro, respondi que sim. Mas como ia leva-la se não sabia onde era esse banheiro, abracei-a e peguei no colo, parecia um bebê de tão leve. Somente disse para me indicar a direção. Apontou para o quintal e me dirigi para lá, eu ia indo até que vi uma portinha com uma bacia e a pus no chão. Sorrindo, disse: ─ Pode me deixar sozinha, fique aí fora e eu o chamarei. Esperei e ela me chamou: ─ Lindomar me leve de volta para o quarto. Tornei a pega-la no colo e ia levando para o quarto, mas disse: ─ A senhora não quer se sentar um pouco lá fora comigo? ─ Claro que sim. Mesmo com ela no colo, peguei uma cadeira e carreguei as duas. Ela rindo e eu também, nunca tinha feito nada igual. Coloquei-a na cadeira e eu me sentei no degrau, falando que estava feliz por ela me fazer sentir útil, faz muitos anos que eu não me sinto assim. ─ O seu jardim está muito sujo, se a senhora quiser eu vou buscar uma vassoura e varrer. ─ Pode ir, eu não me mexerei. Depois de algum tempo, vi uma senhora gorda entrando e perguntando: ─ Dona Linda como a senhora veio até aqui? Demorei-me um pouco, quis ouvir a conversa. A senhora então disse: ─ Trouxe a sua janta, assim ficarei até a noite. Nisso ela me viu e gritou: ─ Você voltou, nossa senhora ouviu nossas preces, você está um belo rapaz. Eu a olhava sem saber o que falar, mas calculei que seria uma vizinha que cuidava da minha mãe. Enquanto a senhora olhava minha mãe, tirei tudo da casa, respinguei água no chão e depois varri, deixei tudo bem limpo. Pensei em quem tinha me ensinado isso, foi Ana, mas quem é Ana? Não quis pensar mais, procurei roupas limpas e troquei a cama de minha mãe, carreguei-a no colo e a coloquei em sua cama, quando perceberam o que eu tinha feito, ficaram felizes. Pedi novamente a senhora que olhasse a minha mãe, que iria no rio tomar um banho. Levei a pedra que tinha ganhado e ao entrar na água vi meu amigo nas margens do rio. Ia sair, mas ele fez sinal para continuar com o meu banho, e disse: ─ Vista as roupas de seu pai, vão lhe servir. Voltei para casa feliz, minha cabeça estava mais leve. A senhora já tinha esquentado a sopa e tomamos juntos. Ela foi embora, pois seu marido estava só e agora ela ia tranquila, por eu estar com minha mãe. ─ Amanhã trarei o café e o pão. Lavei a louça e vi que minha mãe estava dormindo, assim fui arrumar o meu quarto, levei a cama que estava na sala, abri o armário e ali estavam os meus cadernos e os meus brinquedos que já não lembrava mais, abracei tudo e chorei muito, nisso me lembrei que Ana foi uma companheira que tive e ela teve Linda, a nossa filha, iria a sua busca. Mas antes queria falar com Neno, estava me lembrando de muitos detalhes esquecidos. Dormi como há muitos anos não fazia, quando acordei ouvi um barulho na cozinha, levantei correndo e vi a senhora já com o fogão aceso e o café coado, pedi desculpas e perguntei sobre minha mãe, ela ainda estava dormindo. Ela me informou que o padre possuía uma cadeira de rodas que servia para minha mãe, era só ir buscar. Enquanto a senhora dá banho em minha mãe, irei buscar essa cadeira que nos ajudará. Encontrei Neno, fiquei 128

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feliz e disse que iria até a igreja buscar uma cadeira para minha mãe, ele sorriu e falou: ─ Lá terá novas revelações, preste atenção. O teu caminho daqui para a frente está reto, não entre em atalhos. Viva a vida como se ela e todos ao seu redor tivessem um tempo certo, pois é assim, todos têm seu tempo, nem um minuto a mais. A alegria está dentro de você, abrace o quanto puder essa sua vida, quando alguma dúvida te abater, pense em Jesus e ele te indicará o caminho. Vá meu amigo Domar, você me fez muito bem, que Deus te proteja. Fui para a igreja, o meu amigo já estava na porta com a cadeira, dizendo que o padre tinha lhe pedido para entregar. Sai feliz, olhei para trás e não vi mais o meu amigo Neno, não estranhei e segui meu caminho. Quando uma menina chorando veio ao meu encontro, pedindo ajuda para sua mãe que não estava passando bem, perguntei onde morava e ela me indicou o fundo da igreja. Larguei a cadeira e entrei por um corredor e no seu fim vi um quarto, entrei e uma moça chorando me perguntou se eu era o padre, lhe respondi que não, mas posso ajudar. ─ O que está sentindo? ─ Não estou bem, mas estou melhorando. A minha filha se assustou. Ao me virar e a moça me ver melhor gritou: ─ Domar, você voltou. Abraçando me disse: ─ Quanto eu rezei por esse momento, tenho medo de morrer e deixar a nossa filha. Abracei-a, mas não estava me lembrando de nada. Pensei no meu amigo Neno e pedi amparo. Ela chamou a menina Linda, venha abraçar seu pai, peguei-a no colo e a beijei, ali estava a outra linda, disse quase chorando: ─ Como Jesus me recompensou pelos sofrimentos que tive. Devagar contarei a você o que se passou. Perguntei se ela poderia andar, ela rindo falou: ─ Estou bem demais, caminharei o tempo que for preciso. Não te abandonarei mais. ─ Tenho que levar uma cadeira para minha mãe, você e Linda querem vir comigo? Pelo caminho contarei algumas coisas do que passei em todos esses anos. Assim foi. Ana de pronto chamou minha mãe de mãe e minha filha a chamou de vovó. Ana me olhando disse: ─ Eu quero que ela seja a minha mãe também. Rimos e aí começou a minha nova etapa de vida feliz. No começo do mês, minha mãe me entregou um cartão e falou: ─ Agora tenho uma família que irá buscar o que seu pai nos deixou, recebo da indústria uma pensão e uma cesta de alimentos, é só apresentar esse cartão. Quando ia saindo, minha filha disse: ─ Lembre-se de mim, papai. Estranhei essas palavras, mas quando vi o dinheiro em minhas mãos, sai e ao invés de ir pelo caminho de casa, fui para a cidade e nisso em meus ouvidos soou “lembre-se de mim, papai”, parei e pensei o que está fazendo? Indo novamente para a outra estrada que não é mais a sua, volte e pense em Linda, compre doces para essa criança que te espera e peça perdão por você ser vacilante. Quando entrei em casa, as três estavam rezando e Linda disse me abraçando: ─ Você voltou. Abracei-a e depois beijei a minha mãe e a minha esposa dizendo: Viver, Rezar & Amar

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─ O som da voz de minha filha foi mais alto que as drogas. Agora sei que ela não mais me chama, pois tenho um anjo que me fala mais alto para eu não errar o meu caminho. Hoje quando vocês lerem estas palavras, estejam certos que sou um grande auxiliar para aqueles que perdem o rumo de seus lares, tenham sempre na cabeça pequena os pensamentos em Jesus, que tanto me ajudou para que essas palavras pudessem ser lidas e espalhadas pelo vento. De um amigo que está sempre pronto para um auxílio. Lindomar ou apenas Domar

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20/01/2013

A vivência de um fazendeiro

H

erdei uma fazenda do meu avô, sempre trabalhando muito e com ajuda dos amigos, fiz uma propriedade produtiva de café e feijão. Tínhamos também, vacas leiteiras que nos fornecia o leite para o nosso uso. Pais de dois filhos, como bom fazendeiro gostaria de ter oito, mas minha esposa no segundo parto, quase a perdi, assim ficamos com o que Deus nos tinha dado. Sinto-me premiado por isso. Meus filhos, quando chegou a idade, foram para a cidade estudar, mas não estávamos tranquilos. Eles eram acostumados em fazenda, lugar de sossego e liberdade na natureza. Resolvi ir para a cidade também, a fazenda ficaria em boas mãos do meu administrador. Comprei um casarão com uma grande área verde, assim não me sentiria fora do meu ambiente, todos gostaram. Trouxemos alguns empregados para nos ajudar. Nossa vida estava equilibrada, mas eu não tinha uma ocupação. Falando com alguns novos amigos soube de um senhor que queria vender uma fábrica de fios de algodão, isso me interessou, pois, o produto bruto eu tinha na fazenda. Conversei muito com o dono, comecei a frequentar a fábrica, aprender a mexer nos maquinários, aprendi rápido e comprei a indústria. O dono continuou a conviver comigo. Tudo começou com a proteção de Deus, em dois anos dobrei a produção e a cada ano ia aumentando, tanto o prédio como os operários. O meu filho mais velho se formou em direito e começou a trabalhar no escritório, o outro se formou em contabilidade, também ficou com a parte administrativa. Construí um galpão onde funcionaria a cozinha e na outra parte o refeitório, acho que assim os funcionários ficariam mais confortáveis. Não precisavam comer lanches ou ir para suas casas almoçar. Essa refeição seria gratuita e o que sobrasse seria levado para a igreja, onde o padre cuidava de várias crianças pobres. As frutas que vinham da fazenda eu também dividia entre os funcionários e as crianças. Viver, Rezar & Amar

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Me tornei muito querido por todos e respeitado pelos meus atos. Os meus filhos se casaram e me deram netos, o mais velho me deu duas lindas meninas que conheci quando nasceram. A minha nora era pessoa da sociedade e não gostava da nossa vivência simples. O mais novo se casou com uma funcionária da fábrica e tinha muito carinho por nós, nos chamava de pai e mãe e nos deram dois meninos, que foram criados pela avó, por motivos de os dois trabalharem. Cresceram adorando a avó e sempre que íamos para a fazenda eles amavam. A nossa vida na cidade estava caminhando bem, então resolvi voltar para a fazenda e deixar a direção da fábrica para os meus filhos, e os funcionários competentes que já eram mais que amigos, viria de vez em quando visita-los. Assim fiz. Meus netos choraram muito, mas para consolo de nós, nas férias ficaram conosco. Mas como tudo tem um porém, tivemos uma grande chuva por vários dias e quase perdemos tudo, a lavoura ficou muito danificada e o sustento da fazenda passou a ser somente do leite e queijo. Voltamos ao princípio, não desanimei, todos trabalhavam com vontade e amizade. Passaram-se dois anos que eu não me afastei da fazenda e não sabia como estava indo a fábrica. Quando tudo voltou ao normal resolvi ir ver como ia a indústria, recebi a visita inesperada do gerente do banco, me pedindo para verificar o andamento das finanças da fábrica e também a nova direção, coisa que ele como meu amigo não concordava. Não compreendi essa situação, pois não tinha conhecimento da mudança, eu ainda era o presidente e meus filhos estavam como gerentes, cada um tomando conta de um setor. O gerente do banco explicou que o meu filho mais velho assinava os documentos como também a parte financeira, no lugar de um presidente, e o outro filho era apenas um funcionário. Despediu quase todos os funcionários antigos, reformou o prédio, colocou seguranças em guarita nos portões da entrada. A comida só era grátis para os executivos, os operários não recebem nem café. ─ Por que o meu filho menor não veio me contar? ─ Essa mesma pergunta eu fiz a ele, que me deu a seguinte resposta: nunca iria acusar meu irmão. O meu pai saberá quando vier, não por mim, nem pelos meus filhos, que agora somos somente operários de uma fábrica que ele dirige e se diz dono. Pedi licença, fui até o meu quarto pegar algumas roupas e disse: ─ Meu amigo, vamos juntos para uma nova luta, aqui foi contra a natureza, mas lá terei que enfrentar uma batalha pesada, vou machucar muitas pessoas que daria tudo para não o fazer. Na viagem ele me foi pondo a par da grande mudança, seu filho mais velho foi comprando várias propriedades e pondo no nome dele e deixando a conta bancária da fábrica no vermelho, foi aí que resolvi te contar pessoalmente. Assim fiquei sabendo das muitas coisas erradas que meu filho fez, mas ainda tinha remédio. Hospedei-me numa pensão longe da fábrica, vesti a pior calça, um par de sapatos velhos que trouxera e sai para investigar. Não dava crédito dos absurdos que ouvira. Enquanto isso o meu amigo gerente, já tinha tomado várias providencias, uma delas bloqueou todos os bens e todo acesso a qualquer banco no Brasil e exterior, pois ele possuía uma mansão de luxo em Miami, financiada via Brasil, quem a tivesse usando teria que desocupar, essa propriedade seria do banco internacional e muitas outras providencias foram tomadas, para me apoiar. Seria esse caminho a tomar para não fechar a indústria e muitos operários ficarem sem emprego. Teríamos que fazer um acordo e trabalhar muito para não vir a falência, nem queria pensar nisso. Tantos anos de trabalho e ser tudo destruído 132

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por um filho, eu não ensinei isso, somos pessoas simples e trabalhadoras, temente a Deus. Fiquei ao redor da fábrica e constatei como era o dia dos operários. Num dia desses o guarda que ficava na guarita me disse: ─ Eu ainda não empregado, meu pai contava a maravilha que era trabalhar aqui, até a comida que sobrava os operários podiam levar para casa para ser a janta, e ainda era mandado para a igreja, para as crianças pobres. Hoje eles não podem encostar ao portão, pois esse é acionado um botão, causando um choque. Fomos nos encontrar no refeitório, eram muitas pessoas do alto escalão, para disfarçar os cozinheiros e os garçons nos ajudaram, mas meu filho menor e meus netos estavam atentos. Esperamos um pouco, o filho mais velho não tinha o habito de ser pontual, mas seu carro chegou e ele todo almofadinha abraçado a sua secretária, atualmente viviam juntos. Não resisti ficar escondido e me coloquei em sua frente, ele assustado perguntou: ─ O que você está fazendo aqui? Dois gorilas vestidos de preto e com um cassetete nas mãos avançaram em minha direção, somente ouvi um grito e a palavra “Já” e os dois vultos deram um golpe certeiro nos joelhos e o outro na cara, os cassetetes voaram e os gorilas caíram no chão como folha seca, todos bateram palmas e meu filho encostou-se a parede e não disse nada, estava apavorado. Então eu disse: ─ Respondendo à pergunta que me fez. Estou aqui para ver a minha fábrica e meus bens, coisa que ainda tenho direito, estão aqui também representantes do governo, policiais, juristas e banqueiros, está satisfeito? Agora quem pergunta sou eu, quem você pensa que se tornou? Nisso os dois gorilas já estavam de pé e perguntaram: ─ Quer que eliminemos esse velho? Meus netos se adiantaram e falaram: ─ Se não bastou esses golpes, daremos um fora da lei que assumiremos nosso ato, só para defender nosso avô e todo o seu patrimônio, esse novo golpe é mortal, não de nenhum passo senão o aplicaremos. Acabamos com pessoas como vocês, que são apenas corpo, do contrário de nós que temos força nos braços e na mente. Ficaram parados em posição de ataque. Eu fui até meus netos e os abracei chorando, falei: ─ Não façam nada, esses animais cumprem ordens de um cérebro doentio, tenho pena do que está reservado para o seu futuro. Abraçaram-me e disseram: ─ Vô, não precisa falar mais nada, deixe para as pessoas competentes agirem pela justiça. Meu filho parecia um monte de bílis pela sua cor. ─ Pode chamar seu advogado que você irá precisar. — Disse com voz embargada. A porta se abriu e minha esposa entrou e me abraçou dizendo: ─ Estou aqui, para enfrentar esse caminho turbulento que você vai passar. ─ Como você veio? Eu queria te poupar. ─ Eu já sabia, não te contei porque você tinha a terra para defender, que era mais importante que essa sujeira de dinheiro e poder. Estou velha, mas não inútil que não possa enfrentar, vamos juntos e todos esses amigos, começar do zero, temos um aliado muito importante que é Jesus e Maria, que me ajudaram a esconder de você isso. Esteja certo, quando essa criatura enxergar o que fez, estaremos aqui de braços abertos para recebê-lo Viver, Rezar & Amar

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e dizer “mais um filho que volta para casa, seja bem-vindo”. Essa luta durou longos anos. Ele mandou demolir o meu casarão para levantar uma mansão com escadaria de mármore, o lindo jardim da minha esposa virou caminhos de pedra. Tivemos que vender tudo. As casas do estrangeiro, o governo nos indenizou como compra ilegal, por ser verba tirada da indústria, assim como tudo que ele comprou. A esposa e filhas tiveram que ser deportadas, com isso houve a separação do casal, fiquei sabendo que as duas meninas não eram dele e a união foi somente pela posição social conveniente. Os carros estrangeiros não quitados foram devolvidos. Não sei explicar a vivência do meu filho, somente na morte da minha esposa ele veio, mas não se aproximou de mim. Passado algum tempo, fiquei morando definitivamente na fazenda e meu filho mais novo e netos ficaram com a indústria refeita sem luxo, somente pedi que tirassem as grades e continuassem com a alimentação dos operários e os órfãos do padre, eu ficaria tranquilo. Tudo voltou ao normal, simples, mas com a garantia de um emprego cheio de amizades e amor pelo trabalho justo. Passaram anos, não soube mais do meu filho. Depois soube pelo meu neto, que meu filho menos ajudava o irmão, comprou uma casa pequena em um bairro não de luxo, e ele tinha começado uma fábrica da mesma da nossa. Até nos sábados e domingos ia a fábrica do irmão lhe ajudar com as escritas, do nosso modo. Para a minha surpresa, num fim de semana ele veio até a fazenda com uma moça bem simples, a princípio pensei se tratar de uma funcionária, mas me chamando de pai, disse: ─ Pai, vim pedir perdão. E que você e a mamãe lá do céu abençoe minha esposa, pois estamos esperando um filho e para mim é muito importante a sua benção. Abracei a moça e falei: ─ Mais uma filha que vem até mim. Ela emocionada pediu se podia me chamar de pai, pois o seu ela não conhecera. ─ Fui criada em um orfanato do padre que tanto o senhor ajudou, fui muitas vezes buscar o nosso alimento, tenho pelo senhor e suas ações, muito respeito. Agora o chamar de pai é um prêmio que recebo de Jesus. Abracei-a e choramos juntos. ─ Filhos, eu apenas posso dar a vocês o que Jesus me deu, amor. Minha casa será sempre o teu abrigo, nele vocês sentirão o calor do verdadeiro amor. Apesar dos dissabores, minha vida foi sempre dentro do amor. Nunca diga não poderei fazer, pois sempre terá uma saída nos atropelos da vida. As lições que nos são dadas servem para nos engrandecer na vivência e nos dar forças para perdoar aqueles que entram em caminhos que não queremos. Jesus nos deixou rastros para segui-lo e deixou a sua sabedoria que nos faz feliz a aquele que sabe compreender e perdoar. De um fazendeiro sem instrução material, mas que poderá lhes ensinar a amar e olhar as falhas com justiça e amor. Justus

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05/02/2013

Primeira parte Mãe Lu

O

que vou descrever vai parecer uma coisa impossível, mas aconteceu comigo, somente o que me lembro da minha existência. Estava andando por uma estrada margeando um rio, ouvi risadas e falatórios, me aproximei e vi vários meninos, pareciam mais velhos do que eu, estavam se banhando, chegando mais perto um deles disse: ─ Olá garoto, venha se banhar antes que escureça. Tirei as roupas e me aproximei do rio, uma menina perguntou meu nome, respondi que não sabia, achava que não tinha nome. Ela saiu do rio e chagando próximo de mim perguntou: ─ Quem é sua mãe? Respondi que também não sabia. Todos saíram do rio e segurando minha mão, a menina disse: ─ Não tenha medo, não vamos te entregar aos soldados se eles aparecerem, eu te escondo. Sorri e disse: ─ Não sei quem sou, não tenho ninguém. Todos se olharam e a menina falou: ─ O seu nome será Tito, você fará parte da nossa turma. Todos bateram palmas e ela me informou: ─ Meu nome é Lu, vamos que te dou um banho. Ela fez isso e me vestiu, passou a mão pelos meus cabelos e exclamou: ─ Vejam que cor linda de cabelo. Todos olharam e falaram: ─ Você é muito bonito para ser um menino de rua, tente se lembrar de onde veio. Olhando para a menina, disse quase chorando: Viver, Rezar & Amar

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─ Não sei de onde vim, somente falo a língua de vocês. Lu me pegando no colo pediu que não me amolassem. ─ Você está com fome? Respondi que também não sabia. Fomos andando todos muito molhados e comecei a sentir frio e disse isso pra Lu, ela me apertou contra seu corpo e falou: ─ Vamos arranjar um pedaço de pão e vou te aquecer. Cada um saiu correndo e ela foi para uma escadaria comigo, dizendo: ─ A nossa vida não é fácil, mas vamos ver o que esses palermas vão trazer. Voltaram uns com jornal, outros com papelão e o último com um saco de papel, Lu pegou o saco e me vestiu, era pequeno, mas deixou assim mesmo, enrolando com jornal onde faltava papel, disse: ─ Hoje ele dormirá no primeiro degrau de cima para baixo, não quero ouvir reclamação, ele é o menor da turma. Agora vão arrumar algo para ele comer. Eu só ouvia e já estava aquecendo. Saíram correndo e eu fiquei com a Lu. Ela me apontou um homem no jardim e me alertou: ─ Quando você ver um deles se esconda em qualquer lugar, senão ele te leva para o abrigo, lá todos são maus, somente sabem bater com um cassetete. Nem sempre estaremos juntos, o nosso destino entregamos a Deus, se você sentir medo olhe para o céu e peça ajuda, somente ele nos ampara, o céu talvez te atenda mais rápido por seus olhos serem da cor dele. Um menino veio correndo e me deu um pedaço de pão, mas eu estava embrulhado, não podia pegar. Lu riu e falou: ─ Como quer que ele pegue se não está com os braços soltos. Lu me ajudou, mas estava muito duro e não pude morder, Lu argumentou: ─ Quem sabe se os outros terão mais sorte. Encostei a cabeça no seu colo e adormeci, quando acordei estava deitado encima de umas pernas e todos estavam encostados uns nas costas dos outros, fiquei quieto e tornei a adormecer. Quando despertei novamente já era dia, todos estavam de pé e me tiraram dos jornais e do papelão, fomos andando. Lu sempre segurando minha mão, explicando que nem sempre tínhamos algo para comer. ─ Pode ser que você consiga por ser pequeno, qual a sua idade? Encolhi os ombros como resposta, um dos meninos maiores opinou: ─ Ele aparenta cinco anos de idade. Todos concordaram. Estávamos perto de uns latões e Lu comunicou: ─ Não vamos dar comida estragada ao Tito, depois ele pode ficar doente. Mas mesmo assim levantaram as tampas e tiraram várias bolas de papel, cada um foi desembrulhando e dizendo: ─ Isso não serve para ele. ─ Vocês podem esperar aqui, que eu já volto. Largando a mão da Lu corri para uma porta, entrei era outra porta, entrei e dei de cara com uma cozinha, um grande fogão com lenha acesa e um senhor veio me encontrar, perguntou: ─ O que você quer? Olhando para ele, pedi comida. Ele tornou a perguntar pela minha mãe, lhe respondi 136

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que não tinha, somente uns meninos que me ajudaram. Ele sorriu e disse: ─ Eles te mandaram porque você é o menor? ─ Não, eu que fugi da mão da Lu, eles estão procurando comida, desde ontem não comemos nada. Não tanto por mim, mas eles estão preocupados em me alimentar, não acho justo, sei falar e andar, assim que vi a porta entrei. Fiz alguma coisa errada? ─ Não, você nada fez de errado. Os adultos é que erram. Vem, te darei uma caneca de leite quente e pão. ─ Posso levar até meus amigos? Devolverei a caneca. Deu-me uma grande caneca com café e um pacote com pães. Mandou que eu dividisse com os meninos. Quando os meus amigos me viram, correram para me ajudar, lhes disse: ─ Consegui isso com aquele senhor. Todos comeram e beberam. Lu me disse que sabia onde eu tinha vindo, do céu. Quando fui devolver a caneca, o senhor falou: ─ Volte sempre que tiver fome, eu posso te dar algo. Agradeci e fui para a rua. Andamos e chegamos a um grande prédio e Lu me explicou: ─ Isso é uma igreja, onde mora Jesus. Entramos e sentamos num banco e todos ficaram quietos, veio um velho de vestido longo e acariciou os meus cabelos, perguntou se eu era novo na turma. Respondi que sim. Lu disse: ─ Senhor, não tem alguma roupa para ele? Está muito frio e o agasalhamos com jornais. Ele me pegando pela mão, falou: ─ Vamos ver o que te serve. Lu foi junto. Fomos para um cômodo e lá ele tirou muitas roupas, mas todas muito grande para mim, somente achou um pé de chinelos e sorrindo brincou que aquele menino tinha somente um pé, eu peguei e calcei, serviu. Lu disse: ─ Você tem dois pés, mas mesmo assim fique com ele. Esse senhor disse para a Lu que voltasse mais tarde. E me perguntou: ─ Qual é o seu nome? Lu disse que o meu nome era Tito. ─ Vamos ver como posso te ajudar. Batendo na minha cabeça, perguntou para Lu: ─ Vocês roubaram esse menino? ─ Não senhor, ele apareceu e eu dei um banho, mas não o machuquei. Ele tremeu a noite toda de frio. ─ Ele não parece ser um menino maltratado, cuidado com ele, poderá trazer complicações. Vão e volte, verei o que posso fazer. Saímos e Lu disse: ─ Não voltaremos, pois ele nos entregará para o abrigo. Perguntei: ─ Lu, como você sabe disso? ─ Pelo jeito dele falar, você pode voltar, mas eu não. Prefiro o frio que sentimos na rua. A noite um dos meninos foi até a igreja e viu vários homens, percebeu que estavam esperando alguém e o padre falava: ─ Eles virão, o menino está com frio e deve ser filho de pessoas de posses. O menino saiu depressa e nos encontrando falou: ─ Temos que fugir, Lu tinha razão. Os caras estão nos esperando, vão investigar Viver, Rezar & Amar

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todos os lugares. O menino mais velho mandou: ─ Vamos para o nosso esconderijo, lá ninguém nos achará. Corremos muito, eu de cavalinho nas costas desse menino de nome Jô. Eles me carregaram e eu pude ir olhando a paisagem, árvores de frutas bem carregadas, prontas para serem colhidas. Certo momento eles pararam e disseram: ─ É aqui. Me colocaram no chão, afastaram alguns galhos e surgiu uma cabana bem baixa, entramos e aí falaram: ─ E agora, o que vamos comer? ─ Comeremos frutas, elas nos farão bem. — Respondi. ─ Onde vamos arranjar frutas? ─ Ali mesmo, bem na estrada. Peguei a mão de um dos meninos e o levei até as árvores. Eles falaram ao mesmo tempo, que nunca viram frutos nessas árvores. Colheram e comemos, eram mangas bem doces, só que eu me lambuzei todo, todos riram. Apanharam mais e levaram para a cabana, assim teríamos alimento para mais tarde. Limparam o chão e saímos até o rio para nos lavar, vi folhas grandes e perguntei: ─ Por que não colhem essas folhas para forrar o chão? Elas nos darão calor para dormir melhor. Eles se olharam e começaram a cortar as folhas, levaram bastante e forraram todo o chão, depois se sentaram e constataram que elas eram quentes e queriam saber como eu sabia disso. Eu não sabia explicar, apenas tinha gostado delas, grandes e fortes. Como eu era o menor, fiquei no meio de dois, caso tivesse medo eles perceberiam, dormimos em paz. Quando acordei, eles me fizeram sinal para ficar quieto, pois tinham ouvido barulho de pessoas. Alguém falou do lado de fora: ─ Aqui não tem ninguém, não tem vestígio de pés. Sabemos de uma coisa, o padre sonhou com esse tal menino. Vamos embora que temos mais o que fazer. Olhem, ninguém colheu mangas, se esses meninos estivessem passado aqui, não sobraria nenhuma fruta no pé. Foram embora, mas ficamos quietos por mais algum tempo, com medo deles estarem parados na árvore. Saiu um menino andando com cuidado, voltou e nos informou que o carro já tinha deixado a estrada. Ficamos muito tempo nessa cabana, eu sentia saudades da Lu, onde ela estaria? Mas como eles diziam “hoje estamos juntos, amanhã não sabemos nosso destino”. Perguntei ao menino maior: ─ Quando vocês forem embora, me deixariam sozinhos? ─ Onde formos, você irá. Somos todos irmãos de coração. Fiquei mais tranquilo. Certo dia resolveram andar novamente e fomos para a estrada. Nos dirigimos para outra cidade, assim evitaríamos o padre. A outra cidade era grande e bem movimentada, ficamos numa praça onde tinha muitas crianças brincando e quando elas foram embora, deixaram sacos de bolachas, saquinhos de pães e até bananas, tudo foi dividido. Nisso chegou uma moça chorando e eu me aproximei, peguei a mão dela e ela me olhando, disse: ─ Que menino bonito! ─ Posso lhe ajudar? ─ O meu filho está em estado grave no hospital onde sou enfermeira, não posso fazer 138

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nada, somente Deus pode olhar por ele. Olhei em volta e não vi os meus amigos, já estava ficando aflito e a moça logo me acalmou dizendo que não me deixaria sozinho. Ela me perguntou: ─ E a sua mãe? ─ Não tenho, nem sei que eu sou. Me chamam de Tito. Ela sorriu e carinhosamente falou: ─ Me chamo Luiza, mas todos me chamam de Lu. Rindo lhe disse: ─ Também tive uma amiga chamada Lu. Foi muito boa para mim, só que sumiu, como meus amigos sumiram agora. Eu tenho medo da solidão. Pegando-me no colo, Lu me levou na direção do hospital, falando que ia me deixar com o senhor Antônio, pois tinha que voltar a trabalhar, mas assim que saísse me levaria com ela. Fiquei no jardim conversando com o senhor Antônio, ele me deu um lanche e depois me perguntou se não tinha outra roupa para trocar, respondi que não. Ele convidou-me para acompanha-lo para ver se conseguiria alguma roupa limpa para mim, um bom banho e quando a dona Lu chegasse eu estaria novinho. Entramos em uma casa e o senhor Antônio chamou pelo pastor, apareceu uma moça, conversaram e nos levou para um quarto, mas estava com medo e perguntei: ─ Vocês vão me entregar para o padre? Eles se olharam e o pastor falou: ─ Eu sou um pastor de Deus, pode ficar sossegado. Aqui você estará seguro. Entrei, mas estava com vontade de chorar agarrado a mão do senhor Antônio, ele me ergueu e me consolando disse: ─ Você só sai daqui com a dona Lu. Arranjaram muitas roupas e também um bonito chinelo. Nos fundos do hospital o senhor Antônio me deu um banho e lavou os meus cabelos, falando que achava que eles estavam sujos, mas não, eles eram daquela cor. Me vestiu e eu lhe disse: ─ Estou bem quentinho. Ele me deu um beijo e fomos até a cozinha, esquentou leite e me deu para tomar, explicando que logo trariam sua comida e ele dividiria comigo. E assim foi, comi e depois me deitei no chão e ele me falou: ─ Não deite no chão, ele é frio. ─ Era assim que dormíamos. Ele me levou numa cama e me cobriu com carinho dizendo: ─ Agora durma, quando a Lu chegar ela vai levar você para a casa dela. Durma tranquilo, eu não sairei do seu lado. Não sei se ele saiu, mas quando acordei eu estava em outra cama e ao meu lado estava dona Lu. Essa etapa da minha vida foi tranquila, íamos todos os domingos visitar Paulo, passei a ama-lo como a um irmão, lhe fiz uma promessa, quando crescer serei médico e tratarei todas as crianças que tiverem doenças nos ossos, ele sorria e dizia: ─ Cuidado, eu cobrarei essa promessa, não por mim, mas pelas criaturas que tiverem esse mal, só no colo que não tenho dor. Lu passou a ser minha mãe legalmente, assim passei a me chamar Tito Borges. Passei a frequentar a escola do pastor que também era professor. Quando acabei o ginásio passei a lecionar o primário e com o que ganhava ajudava minha mãe Lu e o resto me sustentava, a faculdade era do governo, mas ganhei bolsa por notas altas que obtinha, nossa vida era Viver, Rezar & Amar

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normal, vivíamos com dificuldades, mas éramos felizes. Certo dia, mãe Lu me disse: ─ Tito, acho que terei que decidir algo muito difícil. Fiquei ouvindo. Ela soube que em certo país tinham descoberto um novo tratamento para o Paulo e ele seria levado para lá com tudo pago e se quisesse ela poderia trabalhar no mesmo hospital, mas eu como ficaria os meus estudos, não permitiam mudanças. Ri e falei: ─ Você esqueceu que já sou um homem e que já recebi muito de você, saberei me cuidar e irei quando puder vê-los e matar a saudade que já estou sentindo. Não pense duas vezes, vá que eu estarei bem. Passarei a morar no alojamento que pagarei pouco e assim poderei te ajudar. Ficou tudo resolvido, tinha também o meu tio, irmão da Lu que não morava perto, mas poderia contar com ele, pois gostava muito de mim. Nos primeiros meses, até tudo se equilibrar não foi fácil, mas depois passamos ao normal, tinha uma conta no banco onde depositava o mais que podia para a Lu. Passou-se dois anos quando o banco avisou que o dinheiro não tinha sido retirado como de costume, achei estranho. Fui até a chácara do meu tio e ele também não tinha notícias, como naquela época as notícias eram difíceis de mandar, esperei o próximo mês e o dinheiro foi devolvido. Escrevi para o hospital pedindo notícias, essa carta também foi devolvida por não encontrar o remetente. Fiquei aflito e resolvi ir para os Estados Unidos e procurar por eles. Se houvesse um desencontro o meu tio escreveria. Tranquei os meus estudos e viajei com o pouco dinheiro que tinha e com o pouco de inglês que sabia. Encontrei uma universidade que me aceitou e dei continuidade aos meus estudos e morando em alojamento, o que me pareceu ótimo. Fiz um curso de inglês com bolsa e minhas notas sempre foram ótimas, na faculdade de medicina a chance de pedir transferência do que já tinha estudado no Brasil foi aceita, assim pude fazer física nuclear e no seu termino pude ingressar na NASA. Somente não contava que o meu tempo era tomado pelos meus estudos e não conseguia horas para procurar a minha mãe Lu. Conheci uma estudante na faculdade que me ajudava a procurar, prontificou-se de ir ao consulado e me daria notícias, mas não tivemos, apenas a sua entrada com um doente, nada mais. Meu ingresso na NASA foi elogiado e com isso fiquei confinado nos seus laboratórios, mas antes quis casar com a estudante Suzi, que nos conhecemos na faculdade e ficamos apaixonados. Casado com uma americana poderia sair mais vezes do meu confinamento, mas me apaixonei pelas experiências e por mim não sairia de lá, mas Suzi solicitou a minha saída. Quando sai parecia um robô, não conseguia olhar para o sol e nem respirar normalmente, sentia que era outro ser fora daquele ambiente, não conseguia nem andar direito. Viram o meu estado e fui internado em um hospital da NASA para me ambientar com o oxigênio. Suzi tinha direito de me visitar uma vez por semana. Uma noite no meu quarto do hospital, vi o meu irmão Paulo entrar e me mostrar um papel com números gráficos, levantei e perguntei como ele tinha entrado ali e que papel era aquele, ele sorrindo sumiu, mas eu tinha falado alto e em português, logo veio um médico e me vendo de pé me deitou e veio outro médico me examinar. Tive que voltar para a NASA, para me examinarem nos laboratórios, estavam com medo de um desequilíbrio mental, mas não disse o que vi, somente ouviram o que falei. Voltei para o confinamento, nisso deu uma diferença nas estatísticas do laboratório e ninguém achava a solução, resolveram conversar comigo, me prontifiquei em analisar os dados. Seria impossível descrever os detalhes dessa pesquisa, mas de repente vi Paulo en140

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trar e colocar o dedo no número, ele se iluminava. Deduzi que ele estava errado, chamei o professor e disse o que achava errado, todos correram para junto de mim e de fato ali estava o erro de tantos meses de estudo, ficamos felizes e nos abraçamos. Trabalhei mais alguns meses e depois fui liberado. Tirei a minha vestimenta especial e vi novamente Paulo sorrindo, mas não um menino e sim um belo rapaz, com uma roupa diferente do normal. Estendi os braços e ele sorrindo desapareceu. Suzi me esperava com muitas pessoas, todas desconhecidas para mim, correram e todas queriam falar ao mesmo tempo, não estava entendendo, vários homens da segurança da NASA ficaram na minha frente, só a Suzi podia se aproximar, ela me abraçou dizendo: ─ Hoje você é o maior cientista do país, parabéns. ─ O que esse povo quer de mim? ─ Falar com você, são jornalistas do mundo todo. Pedi a um segurança que lhes informasse que falaria com eles outro dia, mas não hoje, eu estava muito cansado. Desviaram a nossa saída e tudo deu certo. Fomos para casa e demorei muito para me equilibrar, contei tudo para Suzi que me ajudou dizendo que achava que meu irmão não estava mais entre nós, mas ele ajudaria e veio me proteger e está comigo. Veio em minha mente para irmos novamente ao consulado brasileiro, falarei com o encarregado da migração. Vesti-me com roupas disfarçadas, um boné para cobrir os meus cabelos e um óculos escuro, fomos sem problemas. Ao chegarmos a fila para ser atendido era imensa, Suzi ficou desanimada, fui andando ao lado da fila de pessoa em pessoa, as olhando como se procurasse alguém, todos me olhavam admirados, mas sem entender nada. Prossegui, quando cheguei a metade da fila vi uma senhora de cabeça baixa, não dando a mínima para mim, encostei a minha mão em suas costas e ela levantou o rosto e deu um grito, desmaiando em meus braços. A carreguei e a coloquei num banco, os guardas quiseram impedir, mas Suzi disse: ─ Sabem quem é esse homem? É o professor Tito da NASA, está assim vestido para poder chegar aqui. O auxiliar do cônsul correu e foi chamar o cônsul que veio imediatamente e Tito não dando muita importância a ele, socorreu a senhora e pediu um copo de água e ela foi voltando a si e o abraçou chorando muito. Ninguém interrompeu, só o cônsul pediu que a levasse para o seu gabinete e fomos juntos. Tito tirou o boné, os óculos e falou: ─ Esta senhora é minha mãe. Suzi a abraçou e lhe disse em português: ─ Não tenha medo, já vamos para casa. Agradeceram todo auxilio e saíram, mas na porta já havia alguns jornalistas que perguntavam quem era esse homem, os guardas respondiam que era o filho e a filha de uma senhora que passou mal. Tito batendo no ombro do guarda falou baixinho: ─ Voltarei para lhes agradecer. Fomos para o carro, nisso Suzi perguntou da mala de dona Lu, esta respondeu: ─ Aqui como enfermeira nada tenho a não ser o meu coração. Rimos e seguimos para a nossa casa. A alegria era tanta que eu sentia meu coração bater na boca. Suzi não sabia falar muito bem o português, mas a entendia, assim podia falar com minha mãe e esta sorrindo dizia: ─ Fale em inglês, o tempo que estou aqui aprendi a falar bem inglês. Tudo foi se normalizando. Suzi pediu se podia chama-la de mãe, pois não conheceu a Viver, Rezar & Amar

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sua, foi criada por uma tia. Assim minha mãe ganhou mais uma filha. Como cientista americano fui muito bem pago, pude ter o luxo de ficar sem trabalhar por algum tempo. Compramos uma chácara para não me envolver nos noticiários e vivemos lá como se fosse um sonho. Quis saber do meu irmão, contou-me que teve todo atendimento, foi muito bem tratado, mas não resistiu e nos deixou. Eu a abracei e contei que Paulo não nos deixou, ele foi o maior cientista dos Estados Unidos e não eu, esse título é dele e toda a minha fortuna também, minha mãe me olhava sem entender. Contei como eu o vejo, não como um menino magro e doente, e sim como um belo rapaz que me protegeu e me deu esse título. Ela chorando disse: ─ Quando você o ver, diga a ele que eu o amei e amo como a vocês dois. A maior riqueza está aqui no nosso coração e no nosso viver, seja no Brasil ou na América. Nunca deixe uma criança chorar de dor ou fome, é a maior benção de uma mãe feliz. Mãe Lu

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07/02/2013

Segunda parte Tito o professor

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erta tarde estávamos sentados na varanda de casa e eu pensando na trajetória da minha vida, Suzi lendo e minha mãe cochilando, vi Paulo sentado nos pés de minha mãe, ele usava uma túnica azul claro, sorrindo encostou a cabeça no seu colo, e ela sem perceber colocou as mãos na cabeça dele, sorri com essa cena. Minha mãe me olhou sorrindo também. Aproveitei para lhe perguntar se desejava fazer alguma coisa, e ela me disse: ─ Minha vontade é de quando receber a aposentadoria, queria exumar o corpo do Paulo e transferir para o cemitério que fica aqui perto, assim poderei ir sozinha enfeitar e conversar com ele em sua campa. Sorri e respondi: ─ Isso posso fazer quando a senhora quiser, mas para falar com ele não precisa ir ao cemitério, ele está com a cabeça no seu colo, ele vai lhe ouvir. Ela ficou espantada e falou: ─ Que Deus te abençoe meu filho por ver, eu gostaria também. ─ Mãe, não sei como funciona, somente sei quando ele me aparece com a túnica de uma cor, vai suceder alguma coisa. Gostaria de saber o que isso significa. Nisso Paulo sumiu. Minha mãe disse: ─ Acho que vou escrever para o seu tio, há muito tempo não tenho notícias dele. ─ Faça isso e o convide para vir morar conosco, a casa é grande, mas se ele quiser posso construir uma só para ele, que traga o filho. Assim foi, depois de um mês recebemos a sua resposta, na qual dizia que seu filho estava internado há mais de um ano em um hospital, que já não tinha mais nada para vender e aliviar as dores do filho, pois a cura os médicos nada mais poderiam fazer. Se eu conseguisse a ida do filho já o faria feliz. ─ Quem sabe aqui ele terá melhoras? — Disse minha mãe. Viver, Rezar & Amar

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Fiquei parado e disse: ─ Aí está o aparecimento do Paulo, ele quer que eu cumpra o que lhe prometi. Descobrir a cura dessa doença que os dois tiveram. Minha mãe questionou: ─ Você já fez tantas curas com suas experiências, vai começar tudo de novo? ─ Se isso eu puder descobrir, farei. Irei imediatamente pedir ajuda, não sei a quem, mas Paulo vai me ajudar. Pedi a Suzi para ir comigo até o departamento de imigração e perguntar o que era preciso fazer. Primeiramente teríamos que pedir permissão ao Brasil a vinda desse doente e o porquê. Eu com a minha influência pediria também a vinda do médico brasileiro para acompanhar o caso. Eles ficariam sob a minha responsabilidade e custas. A viagem seria paga por aqui e de acordo com a doença seria requisitado um avião hospital, não saberiam calcular o valor dos gastos, agradeci e saímos. Dirigi-me ao hospital da NASA e fui falar com o diretor sobre o que eu precisava e quanto custaria, ele sorrindo disse: ─ O senhor pegue o que precisar e mais, essa criatura terá toda a assistência que precisar, juntamente com os médicos. Sentirmo-nos gratos em poder lhe ajudar depois do tanto que o senhor nos deu. O senhor terá todo o nosso apoio, assim como do governo americano. Fiz a parte do Brasil que foi muito mais difícil, mas consegui a permanência dos meus tios também. Na data marcada fui para o Brasil, só não pude descer do avião, por motivos de contaminação. Meus tios foram postos em um compartimento e os médicos vieram onde eu e o doente viajaríamos. Assim que José foi colocado na maca do avião, vi Paulo e mais duas pessoas ao seu lado, uma delas era negra e muito forte, de uma energia que eu podia sentir. Paulo estava com um cordão azul e os outros estavam com um cordão verde, gostaria de saber o significado dessas cores. Iniciamos a volta com a recomendação do piloto, que iriamos fazer duas escalas, mas seria avisado com antecedência para cuidarmos do doente. Ao levantarmos voo, as entidades, uma segurava a mão do José e o negro a sua cabeça, ele dormia calmo sem precisar tomar tranquilizante. Quando chegamos tudo correu bem, só tomei uma injeção para dor por precaução. Meus tios não tiveram contato com ele, fomos direto para o hospital da NASA e lá pela janela vi Suzi e minha mãe, pois a porta do avião foi introduzida no corredor direto para o quarto onde José ficaria, em uma bolha sem nenhum contato físico, tudo administrado por aparelhos. Não vou descrever o tratamento, mas as minhas pesquisas iam sendo aplicadas e os dois médicos brasileiros abismados com o que viam, nunca pensaram que existia tanta tecnologia, conversávamos muito e procurava dar todas as explicações cabíveis. Estavam felizes e realizados, que chegaram a me pedir se era possível eles permanecerem após a cura do José. ─ Vou dar uma resposta antecipada, vocês serão bem-vindos, mas quem entra aqui dificilmente sai, ficarão confiscados e o trabalho é incessante. Eles riram e falaram que não tinham nada no Brasil que os prendia, e trabalhar para mim seria um prêmio. José foi melhorando, sempre com a presença de Paulo e seus amigos dando apoio e energia, mas também medicamentos que não davam para identificar, apenas suas vestes mudavam de cor, tinha dias que eram verdes, laranja, lilás ou também marrom com o cordão sempre branco. Perguntava para o Paulo o significado e ele sempre levantava a mão e nada falava, como sempre sorria. Quando se vestia de branco o seu rosto ficava mais sério, mas estavam dia e noite atentos, isso por três meses. Numa manhã não estavam em seus postos, fiquei alarmado, verifiquei os dados do doente e estavam normais, chamei os médicos 144

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brasileiros e os informei que estávamos na etapa final, eles se olharam e disseram: ─ Que maravilha, vencemos o nosso inimigo. ─ Exatamente, vamos tirar o José da bolha, faze-lo andar e respirar o nosso ar, devagar e com cautela. Nisso José levantou, andou e disse: ─ Posso andar! Nisso vi Paulo de túnica verde e levantando a mão como se me dava adeus. Ajoelhei-me e chorei de emoção, os médicos me abraçaram, nada entendo, mas me disseram: ─ O senhor venceu novamente para o bem da humanidade. Eu sorri e respondi: ─ Somente paguei uma promessa que tinha feito há anos atrás ao meu irmão, aí está o resultado da promessa. Paulo fez que sim com a cabeça. Eu em voz alta falei: ─ Paulo, tudo o que eu fiz foi pouco, mas um dia terei as respostas das perguntas sobre todas as cores que eu vi, sejam benditas todas as pessoas que te seguem. Me benzi e os médicos me imitaram. José do nada me falou: ─ O branco é o início duvidoso, o azul é o início de uma batalha, o verde é a esperança da cura, o laranja é o deitar do sol que nos dá a força do amanhã e o marrom é a terra que pisamos com tudo e o que um ser precisa para vencer o ar, e o cordão branco é a força que recebemos. Estava ainda ajoelhado e aí fiquei sem saber o que falar, abracei José e disse: ─ Você foi abençoado, mas eu fui muito mais em ouvir o que você disse. Os dois médicos choravam sem imaginar o que estava acontecendo, nada disse, abracei a todos e fui chamar o diretor para anunciar que iriamos para casa, mais uma luta estava ganha, a dor estava vencida pela ciência e pelos fios de energia que tínhamos, mas não sabíamos que fossem tantos. Pedi que os médicos ficassem mais algum tempo em companhia do paciente em minha casa e depois eu os devolveria para mais pesquisas, eles seriam a minha continuidade de trabalho na NASA. Fomos para casa, a felicidade que senti não sei descrever, são apenas sentimentos de seres que possuem coração. Certa noite todos da família reunidos, José me perguntou: ─ Tio, posso contar o que vi no hospital? Minha mãe disse: ─ Quero saber, me conte. Ele me olhando, apenas esperando o meu consentimento, falei: ─ Todos nós queremos conhecer e com detalhes, sei que você sentiu, viu e ouviu coisas lindas. Eu digo que nada fiz, apenas segui o caminho indicado por luzes e cores, recebi muita energia para o meu trabalho. Ele relatou muito mais do que vi, disse coisas sábias, isso eu não posso contar, pois não me pertence, mas José foi um enviado maior para essa descoberta da cura dos ossos, do que os remédios que serão dados ao mundo, mas aquele que tomar com fé será curado com certeza. Agradeço ao Paulo e a todas as entidades que ficaram comigo e todas as honras que recebo sempre me dirijo a eles e os agradeço, pois nada sou sem a ajuda deles. Que todas as curas sejam abençoadas. Tito – o tio, o professor, o cientista e o filho Viver, Rezar & Amar

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05/07/2013

O mercador Emuae

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asci um menino, do amor entre uma sacerdotisa e de um grande sacerdote. Sendo menino ficaria com os sacerdotes, para no futuro ser também um religioso, mas se fosse menina ficaria com a mãe, para no futuro servir no palácio ou ser uma sacerdotisa. A rainha Clara, esposa do Faraó gostou de mim e ainda mais por eu ter nascido com a marca de David, ou seja, uma estrela de três pontas. Isso era muito raro, assim fui morar no palácio com a mãe de leite que eu chamava de Lu. Cresci com todo carinho que uma criança poderia querer, o Faraó veio me conhecer quando já era crescido e se afeiçoou muito a mim. Certo dia fui chamado junto com o grande sacerdote e minha mãe Clara na sala do Faraó, conversamos e tivemos a grata satisfação de saber que fui legalmente chamado de filho do Faraó e que teria o direito de ser no futuro “O Faraó do Egito”, assim sendo recebi o anel oficial que ficaria no poder da rainha Clara, minha mãe. Tive daí para a frente os meus cabelos cortados como o do Faraó, mas minha mãe procurava sempre esconder com um gorro, para ser uma criança normal sem ser perseguida. Gostava de ir ao grande mercado e ver as trocas de mercadorias, no princípio ia com minha mãe Lu, depois pedi permissão para a rainha Clara para eu ir como uma criança normal. Ela riu muito e disse: ─ Pedido concedido, mas quando voltar tire o gorro, assim te deixarão entrar. ─ Não se preocupe, como mercador mirim vão me reconhecer, sou amigo de toda a tropa do meu pai Faraó. Todos os dias minha mãe Clara me dava algo para eu poder fazer as trocas. Eu ia para o mercado e às vezes trazia coisas incríveis, minha mãe me ensinava “Deves sempre trocar o seu melhor, mas nunca seja trapaceiro”. Ela sempre me dava as toalhinhas que ela bordava, assim eu teria que valorizar o seu trabalho. Fazia isso todos os dias com muita Viver, Rezar & Amar

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alegria, estava tão queimado pelo sol que todos me apelidaram de mercador Emuae, este era o nome que me foi dado pela mãe Clara, era o nome do meu avô por parte do Faraó, mas eu não sabia disso, fui ter conhecimento quando adulto. Quando tinha dez anos ganhei um irmão, que depois de muitos anos a rainha Clara deu ao Faraó, fiquei muito feliz e passava os dias no seu quarto com a mãe Lu, minha vida teve outro sentido, quase não ia ao mercado. Quando Luadi cresceu um eunuco de minha mãe me deu um conselho, como futuro Faraó do Egito eu teria que voltar ao mercado para conhecer o povo. Quando meu irmão completou cinco anos, minha mãe me pediu que eu voltasse a minha vida normal, deveria ir ao mercado e voltar a aprender o que o povo dizia e como viviam, assim aprenderia para a minha vida futura. Voltei para o mercado e para todos eu era filho de um grande mercador. Trazia sempre boas trocas, fui adquirindo fama, mas num dia desses não fiz bons negócios, tinha trocado um objeto caro por um grande peixe, caminhava sem ânimo, foi quando vi uma criança com uma flor diferente nas mãos, sem oferta para ela me aproximei e perguntei: ─ Quer trocar essa flor por esse peixe? ─ Com você eu trocaria, mesmo sendo para mim. É mais fácil carregar a flor do que esse grande peixe, mas será uma boa refeição. Assim fizemos a troca, ao me entregar a flor vi que ela mudou de cor, ele riu e disse: ─ Entregue essa flor para sua mãe e lhe explique que não precisa colocar na água, ela viverá até ser usada, essa flor é da areia do deserto e tem um poder mágico, se alguém da sua família precisar em alguma doença, coloque a flor em um jarro com água e esse líquido deverá ser tomado por quem estiver precisando. Se o pedido for aceito a flor mudará de cor e vai secando, a pessoa vai melhorando, quando secar bem a cura será total. Ela não é bruxaria, ela traz o poder do deserto, só nasce de sete em sete anos. Não esqueça o que te contei, sua mãe vai acreditar e usará num dia de muita aflição. Saiu correndo, foi quando percebi que ela também usava um gorro nos cabelos e estava descalça, estranhei, mas fui para casa. Contei para a minha mãe tudo que ouvira e tinha visto, ela muito séria pegou a flor e disse: ─ Que cor linda, uma rosa cor do pôr do sol. Olhei, mas vi lilás. E mãe Lu disse: ─ Senhora eu estou vendo a flor vermelha. Rimos, mas minha mãe explicou: ─ Essa flor tem a magia do deserto, guardarei com muito cuidado nos meus aposentos. Passaram os anos onde tive que fazer muitas coisas, como cavalgar, ir para o deserto com as tropas do meu pai, dormir nas matas, passar fome ou comer frutos que encontrassem. Isso foi o meu aprendizado para poder ser um xeique, como meu pai dizia “Você aprenderá o resto sofrendo na vida, para poder analisar as pessoas que vão depender da tua sabedoria. Não julgue sem antes refletir, sem ver e ouvir, use sempre o seu coração e este nunca vai nos enganar”. Assim foi meu aprendizado. A comunidade que viria a me pertencer já estava sendo formada, os aldeões poderiam adquirir as terras e ficariam sem pagar tributos, teriam algumas vantagens e o castelo já estava pronto. Eu não me conformava de deixar a minha mãe e o meu irmão, não conseguia me imaginar em um lugar desconhecido tendo que dirigir causas e coisas sem ter noção. Chorava no colo da minha mãe e pedia: ─ Mãe, fale para o Faraó que coloque outra pessoa no meu lugar, eu nunca poderei 148

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julgar nada e nem ninguém. Ela me abraçava e dizia: ─ David vai te iluminar, assim tudo se tornará fácil. Certo dia, chegando de uma longa cavalgada, vi uma correria no palácio, corri perguntando e alguém me informou que meu irmão tinha sido mordido por um bicho, não sabem qual, ele estava desmaiado e os sacerdotes estavam tratando, mas a sua perna estava totalmente preta. O Faraó também estava com as portas fechadas para o atendimento ao povo, isso me assustou, ele nunca iria ter essa atitude se não fosse grave o que estava passando. Fui até o quarto do meu irmão e encontrei minha mãe muito aflita dizendo: ─ O caso é muito grave, ele está desacordado, não sei a quem pedir pela vida do meu filho. Me abraçou chorando, eu a afastei e lhe lembrei: ─ Mãe, nós temos a flor. Vamos usar, a menina disse que ela tem muito poder para a cura. A mãe Lu correu e trouxe um grande jarro de água, minha mãe trouxe a flor que para mim estava roxa, foi mergulhando a flor na água e imediatamente ficou da cor de terra, minha mãe correu para o meu irmão, com as críticas dos sacerdotes dizendo: ─ Nem a pedra azul terá mais poder que essa flor. Minha mãe respondeu: ─ Farei de tudo para salvar a vida do meu filho e tenho fé que as areias do deserto farão esse milagre, pois ela dará a sua força para ele e eu prometo que conservarei a flor seca nos meus domínios, sempre agradecendo por esse poder que ela tem. Se um dia encontrar quem me deu, serei eternamente grata. Mãe Lu ia derramando a água na boca e na perna, nisso olhei para o jarro e este estava bem escuro, não podíamos ver a flor, meu irmão abriu os olhos e chamou: ─ Mamãe estou com sede. Ela o deu mais água e chorando disse: ─ Flor do deserto, que David te cubra de poderes, está dando a tua força para meu filho. A perna dele estava clareando e uma cor rosa estava no seu rosto. O Faraó disse: ─ Que flor é essa que tanto poder tem? Cheguei perto do meu pai e contei como essa flor veio até nós. ─ Precisamos encontrar essa criança. ─ Já faz muitos anos, não sei se a encontraremos. Nisso um dos sacerdotes disse: ─ Essa criatura deve ser a guarda dessa flor, ninguém pode tirar do deserto, ela pertence as areias, se foi dado a rainha é porque foi permitido. Meu irmão sarou e minha mãe colocou o galho seco no altar em seu dormitório, uma coisa que para se olhar não era agradável, mas minha mãe todas as noites lhe agradecia o milagre das areias. Vários anos passaram, eu sempre indo ao mercado e tinha me esquecido que estava chegando aos meus dezessete anos e teria que assumir o que meu pai tinha me avisado, que era partir para a minha nova vida. Os aldeões já estavam na minha aldeia, o castelo já estava pronto a espera do meu posto, as pessoas no castelo também, até os sacerdotes e o vizir estavam em seus postos, faltava somente eu e minha função como xeique. Logo chegou o aviso “seguir viagem”, chorei muito ao deixar tudo o que mais amava, até os meus amigos do mercado. Tinha que assumir. Eu e os quatro que iriam comigo partimos, sem eu ter coragem de olhar para Viver, Rezar & Amar

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traz. Cavalgamos o dia inteiro, parávamos somente quando percebíamos que os cavalos estavam exaustos, dormíamos onde podíamos, assim foi durante um mês e alguns dias, até chegarmos numa floresta bem arborizada, fiquei deslumbrado, nunca tinha visto um lugar tão lindo. Desci do cavalo e corri para desfrutar do frescor do lugar, parecia que eu estava em um paraíso, gritei e me joguei no chão, agradeci de tanta felicidade. Mandei os meus amigos virem participar, eles também riam e gritavam tirando o uniforme, andamos e logo ouvimos que tinha água correndo, vimos uma pequena queda de água que para mim era imensa, em tamanho e em volume, ficamos sem roupas e os cavalos também se deliciaram, rimos por muito tempo até sentirmos fome, olhamos para as árvores e vimos frutos, pegamos e comemos sem pensar se era perigoso, nada poderia nos impedir da nossa alegria. Fiquei deitado no chão e ele foram andar para ver como poderíamos passar a noite, acabei dormindo. Quando acordei eles estavam me esperando e me deram boa notícia, as pessoas que passaram por ali tinham deixado duas cabanas, onde poderíamos passar a noite. Não estava muito confortável, mas no dia seguinte iriamos melhorar. Assim foi cada dia que passava, íamos melhorando as acomodações. Passamos mais de um mês nesse paraíso, certo dia eu estava meditando e um dos guardas veio até mim pedindo desculpas, mas me alertando que teríamos que prosseguir a viagem. Agradeci, mas não iria embora daquele lugar se fosse possível. Prometi aos deuses que voltaria ali para construir o meu refúgio, esse seria o nome da cabana e construiria um grande mercado. Na madrugada fomos para a estrada e para chegar o mais breve possível, foram longos dias e noites. Chegamos, fomos bem recebidos, mas os sacerdotes nos cobraram pela demora, explicamos que as paradas foram por causa dos cavalos e da alimentação que foi difícil encontrar. Assim foi o meu início no castelo, ele tinha sido construído com bastante conforto, mas eu não me sentia bem, pensava somente no meu refúgio, logo que pudesse começaria a construir a minha cidade dos sonhos. Passou muito tempo, talvez anos. Numa das minhas cavalgadas com a guarda em um dia muito quente, resolvemos procurar abrigo para descansar os cavalos. Um guarda me aconselhou que ali próximo morava seu pai com sua irmã e teríamos água a vontade, e para lá fomos. Quando avistei a casa fiquei deslumbrado, toda feita de pedras brancas e em volta muitas árvores, dava uma visão do meu sonho no deserto. Apeamos e corremos para o poço de água farta e fresca, as árvores nos beneficiaram com suas sombras e nos alimentou com seus frutos. Todos diziam que nunca tinham comido nada igual, doce e fresco. Enquanto todos descansavam me dirigi para a varanda da casa e vi uma menina de gorro, a reconheci e disse: ─ A menina da flor! Ela me respondeu: ─ Você, te esperava há muito tempo, temos assuntos a serem resolvidos com urgência. Sorri em ouvir essas palavras, sem a devida cerimônia que estava habituado. Respondi: ─ Estou aqui e te ouvirei com prazer. Qual é o seu nome e quanto anos você tem? ─ O meu nome é Lilás e tenho doze anos. Você não está lembrando de mim, Mercador Emuae? Olhei em volta, mas não havia ninguém, fiz sinal para que não me chamasse de mercador, isso era segredo do passado. Ela fez sinal de sim com a cabeça e me lembrou da flor e da nossa troca. Eu lhe contei que minha mãe queria agradecer pela vida do meu irmão e quando pudesse a levaria até ela, ficaria muito feliz. Lilás me falou que precisávamos vencer o inimigo com sabedoria e estratégia, lhe 150

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perguntei: ─ Que inimigo é esse? ─ É seu inimigo há muito tempo, venho trabalhando, só que agora não temos mais tempo a perder. Eu tenho dormido nos seus aposentos todas as noites. ─ Como não a vejo? ─ Uso uma capa da sua mãe, ao me cobrir com ela fico fora das vistas das pessoas, só a mãe Lu sabe. A primeira mulher do vizir lhe leva todas as noites uma jarra de água e coloca nela um pó para que adormeça profundamente. Ela e o vizir tiram do seu pescoço as chaves da sua caixa de tesouros e cada um leva uma joia para seus aposentos, mas agora querem mais que joias, eles estão tramando te eliminar para serem donos de tudo, com o seu anel oficial igual do Faraó, eles comandarão tudo. Eu e meu irmão já achamos um cadáver da sua altura e tamanho, vestiremos com as suas roupas e forjaremos que o xeique sofreu um acidente com o cavalo e o resto as areias do deserto resolvem. Se você confiar em mim e nas pessoas que estão me ajudando é claro. ─ Claro que eu confio, acredito em você, mas o que eles lucrarão com a minha morte? ─ A ambição é grande dentro deles, para analisar a verdade vamos deixar que eles se eliminem, sem você ser ferido. Agora terá que me dar o anel do seu pai e no lugar coloque esse, é falso e a marca é diferente, aí está o nosso trunfo. ─ Não estou entendendo. ─ É fácil, eles terão que levar o corpo para seu pai, que terá que levar para as catacumbas e entregar o anel que está no dedo do cadáver. Seu pai com toda sabedoria perceberá que o anel é falso, mataremos a cobra no seu ninho. ─ E onde eu fico? ─ Todos iremos como mercadores, assistiremos tudo e o resto confiemos no poder da areia. Aceita fazer tudo como expliquei? Você será mais feliz sem inimigos e eu e a mãe Lu também. Terá que ser hoje, senão não teremos mais tempo. ─ Confio em você e nos meus amigos guardas, que David nos aguarde. Concordei com tudo e fomos para o castelo, deixei que todos me vissem, depois sai com minhas roupas trocadas e com a chave da caixa de tesouro no meu pescoço, falei para o vizir que iria ver as ovelhas e voltaria logo. Fui ao local combinado e tirei minhas roupas, os irmãos de Lilás levaram juntamente com a corrente, as chaves e o anel falso. Entrei com Lilás num subterrâneo e andamos bastante até chegarmos a uma porta, Lilás me fez um sinal para ficar quieto e apenas escutar, ouvi vozes dizendo: ─ Ele saiu novamente, mas esta noite não pode falhar. Outra voz disse: ─ Já preparei a dose mais forte, assim ficará mais fácil para você o eliminar. ─ Como faremos com as joias? ─ Deixa onde você escondeu, depois de levarmos as falsas para o Faraó voltaremos para buscar, tudo dentro da lei. Tudo vai nos pertencer. Ouvimos gritos e uma correria, Lilás me apertou a mão e disse: ─ Tudo pronto. Ficamos bem quietos até as vozes voltarem e comentarem: ─ Por essa não esperávamos, tudo foi mais fácil. Agora é somente deixar passar as horas, levaremos o cadáver para o Faraó com toda a cerimônia de praxe. A outra voz disse: ─ Como ele foi ficar com o pé preso no estribo? Bem, isso não nos diz respeito, vai ver Viver, Rezar & Amar

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ele bebeu a água que deixei no seu quarto. Se vista de luto, amanhã bem cedo seguiremos com o cortejo rumo a nossa libertação. Lilás me pegou na mão e me puxou para voltarmos para fora. Ao sair os irmãos dela disseram: ─ Vamos para o refúgio, de lá iremos para o palácio do Faraó. Perguntei: ─ Como vamos nos apresentar se estamos vestidos de mercadores? ─ Vamos nos apresentar com seu nome Emuae e com essa identificação agiremos. Vamos que temos que cavalgar por muito tempo, os cavalos estão longe, não podemos falhar em nada. Cavalgamos a noite toda e quando amanheceu estávamos no meu refúgio e mãe Lu estava com uma mesa de café da manhã para nos dar boas-vindas. Fiquei surpreso e perguntei: ─ A senhora faz parte disso tudo? Ela sorriu e respondeu: ─ Tudo que envolve meus filhos sim. Vão descansar, eu e os guardas vigiaremos. ─ Guardas? Como assim? ─ Esses guardas são fieis a você e ao seu pai, quase a guarda toda não recebe o salário que seu pai envia, pois, o vizir fica com o dinheiro, mas o que estão acompanhando o cortejo fúnebre sabem da farsa e querem ver o final. Tudo correu conforme o previsto. Quando o cortejo passou nos misturamos com o povo e ao chegarmos ao palácio entramos por outra porta que conhecia muito bem. De lá nos dirigimos para o grande salão, não entramos, ficamos escondidos atrás do trono do Faraó, onde às vezes me escondia para ouvir as decisões tomadas por meu pai e eu vibrava com suas respostas, onde ele ia buscar tanta sabedoria para fazer justiça. Ficamos bastante tempo até ouvirmos a voz do meu pai, dando ordens para que o caixão fosse retirado e levado para as catacumbas. Nisso o vizir pegou a caixa de tesouro que me pertenceu, abriu e pegou o anel entregando para o Faraó, este ao pegar perguntou: ─ Da onde você tirou o anel? ─ Ele estava junto com a chave na corrente em seu pescoço. Lilás me apertou a mão e disse: ─ O Faraó recebeu o nosso recado. Não entendi, mas fiquei quieto. Ouvimos o vizir dizer: ─ Tudo que pertencia ao seu filho está aí nessa caixa. O Faraó pediu o anel novamente e o examinou, chamou um sacerdote que fez a mesma coisa e falou em voz alta e firme: ─ Vamos dar algum tempo antes de julgarmos o que está se passando aqui. Retirando-se do salão ouvimos o que disse ao sacerdote: ─ O senhor viu a marca do anel? ─ Sim majestade, nada tem do senhor ou do vosso filho. ─ Exato. Vamos dar ordem para que sejam retirados os panos de luto, meu filho deve estar em algum lugar. Que David oriente para acha-lo e que nada de mal tenha acontecido. Ouvimos o barulho da retirada dos panos e a claridade entrou e todas as portas foram abertas. O vizir não estava entendendo, alguns guardas foram ficar de sentinela ao lado dele e de sua esposa, eles resmungaram, mas não dava para ouvir. O Faraó voltou em seu trono e a rainha também, pedindo para entrar o mercador Emuae, o vizir perguntou 152

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se não iam encerrar com o funeral, o Faraó respondeu: ─ Estou seguindo com a cerimônia conforme nossa tradição. Fui puxado para a grande porta e ali me vi frente à minha mãe e meu pai, tive vontade de correr e abraça-los, mas esperei a ordem do guarda que me disse: ─ Tire o gorro. Não tem chinelo para seus pés? Eu respondi: ─ Para falar com o Faraó e me curvar perante a rainha farei isso com todo respeito, mas tirar o gorro somente a rainha é que pode fazê-lo se assim desejar. Eles fizeram um sinal e eu entrei até seus pés, minha mãe e meu pai ficaram de pé e segurando as minhas mãos disseram: ─ Tenha calma. Com a outra mão tiraram o meu gorro e no avesso tinha um fio segurando o meu verdadeiro anel, cujo símbolo era apenas um risco que quer dizer justiça, o que mais se venera em uma amizade é compreensão e justiça. Deu-me a ordem de levantar e eu os abracei chorando e com muita alegria, sem cerimônia diziam: ─ Você está vivo. O meu irmão correu e nos abraçamos. O Faraó perguntou se teria mais alguém que queria vir nos abraçar, eu me virei e pedi permissão para buscar Lilás e seus dois irmãos, ficaram de joelhos perante o trono, o Faraó disse: ─ Levantem e venham até mim, pois amigos do meu filho sempre serão meus amigos e de minha família. Contei rapidamente o sucedido e o que Lilás fez com seus irmãos e os outros que nos ajudaram. ─ Se errei, me castigue meu pai. O Faraó levantando abraçou a todos e disse a Lilás que poderia tirar o seu gorro, Lilás disse: ─ Posso, mas corro o risco de ser queimada em praça pública. ─ Não se eu estiver aqui. — Respondeu Faraó. Ela retirou o gorro e deixou aparecer um lindo cabelo lilás com dourado. Todos se ajoelharam gritando que ela era a fada das areias do deserto, que David seja louvado. Ela tinha nas mãos a flor do deserto, indo até minha mãe disse: ─ Mandei te entregar a primeira e agora te dou essa com alegria, pois estás com tua família sem perigo. O Faraó falou: ─ És a fada do deserto? ─ Não, a minha mãe foi e será sempre a guardiã da flor do deserto, que nasce de sete em sete anos, surge uma para ser dada a quem tem fé em David. Levantando a manga da blusa mostrou uma linda estrela de David com quatro pontas brilhantes. O Faraó se levantou e abraçando-a explicou que ela era uma divindade que ali estava. Eu disse: ─ Me deixe passar as mãos em seus cabelos e te dizer que tens mais poder que eu, somente tenho a estrela com quatro pontas, mas nunca vi o brilho que tem na sua. Obrigada por estar junto de nós e agora vou pedir a sentença de justiça para esses infelizes. Ela respondeu: ─ Se eles querem tudo para si, porque não os deixa viver no deserto? Eles gritaram e reclamaram, mas assim foi feito. Viverão com as areias. O pastor de ovelhas que muitas vezes ajudou o mercador mirim a negociar ou transitar da rua para o Viver, Rezar & Amar

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palácio chegou até o Faraó e pediu permissão para retirar a sua filha e os seus dois filhos. Respondi em forma de pergunta: ─ Irmão posso pedir que me deixe Lilás para minha mãe e o senhor como nosso vigia? O pastor abaixando a cabeça em sinal de respeito disse: ─ Se isso for da vontade do Faraó, serei sempre o pastor de ovelhas, somente darei a ovelha preta para o casal ter muita sorte. Assim foi, Emuae reinou com muita justiça junto de Lilás. O mercador Emuae

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10/08/2013

Neno

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ui um privilegiado neste plano, desde criança tinha intuição de ajudar as pessoas. Minha mãe dizia que eu era muito pequeno para auxiliar quem precisasse. Aos dez anos ia uma vez por semana na floresta que não era tão perto da minha casa caminhando e lá seguia trilhas a procura de folhas e plantas, mas não sabia para o que e nem o que fazer com elas, mas continuava procurando espécies diferentes. Um dia encontrei um jovem que procurava o mesmo que eu, perguntei para que ele escolhia as folhas. E ele começou a me explicar o valor de cada planta, os vincos das folhas que às vezes são profundos, outros menos e ainda outras folhas lisas, as mais verdes ou ainda mais amarronzadas, mostrando um de cada vez e me propôs ensinar os seus valores e sua serventia para a cura do ser humano. Fiquei emocionado e perguntei como iria gravar tudo aquilo. Respondeu que todas as segundas iria me ensinar o que sabia, assim eu faria vários remédios para aliviar as dores do humano. ─ É isso que você procura na mata, ervas medicinais. Respondi: ─ Isso eu não sei, mas sinto que poderia ajudar os que sofrem. Minha mãe diz que na hora certa farei o que Jesus me pede, não preciso ter pressa. Você me ensinando vou aprender e poderei ajudar mais rápido. ─ Te ensinarei com muito gosto. Quando cheguei em casa e contei o sucedido, minha mãe perguntou: ─ Quem é esse moço? ─ Não sei, ele é muito bonito e fala com muita doçura na voz, levou muitas folhas prometendo me ensinar. Ao me deitar vi o rapaz na porta do meu quarto, acenando e me falou em pensamento: ─ Tudo acontece na hora certa e sumiu. Viver, Rezar & Amar

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Não contei para minha família por medo de pensarem que eu estivesse mentindo ou inventando. Passaram muitos anos, aprendi a diferenciar as espessuras das folhas, seus nervos e cores, saber cada um dos seus valores, aprendi a lavar e secar com o vento e o sol, espremer para conseguir o seu suco e conhecer as rasteiras e suas raízes. Muitas pessoas do povoado vinham pedir remédios e eu dava com muito amor, somente os lembrava: ─ Esses são apenas para passar no local, não podem beber, chegará o dia que poderei fazer a cura pela bebida. Aos quinze anos meu amigo Saul, esse era seu nome, me disse: ─ Hoje a tua vida mudará como o vento, eu sempre te ajudarei, os dias que virão serão para a melhoria do teu povo. Chorei muito, com medo do futuro e da saudade de um amigo que aprendi muito com ele, a aliviar o sofrimento dos amigos que me procuravam. ─ Como poderei viver sem você e sua ajuda? Não tinha certeza do que sabia, tinha dúvidas, mas quando me deu um abraço me disse: ─ Cumpra com o que te foi dado, não tenha medo, a tua sabedoria é muito grande, assim como a tua luz. Seguirá a tua trilha cumprindo o que te foi pedido. Fui para casa sem ânimo, contei para minha mãe e ela me respondeu: ─ Se esse anjo falou isso, procure ser o que até hoje você foi, sabes o que vem de Deus é abençoado. Continuei com a minha caça as folhas e com as poções fazia os curativos. As pessoas beneficiadas sempre diziam: ─ Suas mãos são abençoadas. Me davam muitos presentes, como ovos, pedaços de carne de porco, frutas e às vezes pão de polenta ou ainda roupas usadas que iam buscar na igreja. Eu ficava com o que usava e o restante dava para a aldeia distribuir aos necessitados. Meu pai passou para outra dimensão, me abençoando e falando: ─ Obrigada por ser meu filho e ter as mãos cheias de cura, cumpra sempre com a missão que Deus te deu. Nas noites de insônia lembrava dessa frase e isso me dava energia para um novo dia, num dia desses o farmacêutico mandou me chamar e me propôs que fosse ajuda-lo em sua farmácia, pois quase não havia mais remédios e como eu sabia fazer trocaríamos, eu ajudava e ele me pagaria por isso. Minha mãe ficou contente e disse: ─ Aí está a tua nova estrada. Fui para essa caminhada, os que me conheciam vieram e mais outras pessoas, com isso o meu trabalho triplicou. Aos domingos passava o dia todo catando folhas para levar ao laboratório do Sr. Mingo, lá havia mais higiene e instrumentos para manipular as ervas e muitas garrafas, todas esterilizadas para armazenar. Tive que passar a dormir na farmácia, pois atendia até altas horas da noite e ficava difícil ir para casa. Minha mãe passou a morar com uma irmã, assim eu ficaria mais tranquilo, isso até sua passagem para o outro plano que também foi com muita benção para mim, dizendo: ─ Não reclame das tuas aflições, aqueles que te procuram tem mais necessidade do que você. Seja sempre você, isso te ajudará. Às vezes pensava nas palavras que me foram ditas de pessoas que nem ler ou escrever sabiam, sentia que essas palavras teriam sido enviadas e me davam mais forças para prosseguir. Um médico enviado pelo prefeito me fez uma proposta de eu cursar uma escola de 156

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farmácia na capital e obter maiores conhecimentos, para melhor trabalhar com as minhas ervas e ele também poderia nos ajudar com mais segurança. A faculdade e o meu alojamento foram arranjados pelo Dr. Luiz, deixei a comunidade muito apreensivo, não sabia o que iria enfrentar. Fui acolhido muito bem, os estudantes me procuravam para diversas perguntas e por incrível que possa parecer, eu sabia as respostas. Quando os mestres se reuniam eu era chamado e pediam que desse a minha opinião, eu sabia que aquelas palavras não eram minhas, mas sentia segurança em expressa-las, porque eram verdade. Assim eles me apoiavam e com seis meses de curso fui diplomado farmacêutico com louvor. Ganhei um pequeno laboratório da faculdade na minha formatura, no meu agradecimento falei aos meus colegas e mestres: ─ Meus amigos, Deus existe dentro de cada um de nós, assim temos que abaixar a cabeça e seguir a estrada que ele nos indicar. Voltei e com alguns recursos do povo, prefeito, eu e o Dr. Luiz, ampliamos a farmácia e lá o Dr. Luiz atendia os necessitados e eu fazia as receitas, curávamos aqueles que Deus permitia. Quando perdíamos um paciente, dizíamos: ─ Senhor a tua vontade está acima de nós. Vivi, vamos dizer que foi uma eternidade neste plano, mas como nada termina continuo na ativa ajudando aqueles que me podem ouvir e entender, às vezes devem ter mais fé e confiança na parte divina, acreditar no milagre da água como Cristo curava, para que a humanidade sofra menos entenda que todos os caminhos são dados para caminhar com humildade e amor. Junte as mãos e sintam quanta energia podemos passar para os que não acreditam, olhem mais para o ser que te estende as mãos do que aqueles que te oferecem uma bolsa de dinheiro. O amor une os seres, a ambição destrói e a humildade ilumina os caminhos. Estou sempre nas plantas, nas flores e na mata para que vocês possam obter mais energias. Que Deus esteja em seus corações. Do amigo Neno

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27/08/2013

Não blasfeme, agradeça

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ois bons amigos resolveram cada um em seu espaço de terra, numa mesma data, formar um pomar, começando pelas sementes das frutas. Compraram todo o necessário e cada um seguiu para o seu terreno, fizeram os caminhos, os vincos para deitarem as sementes, regaram, adubaram e ao término do serviço se encaminharam para suas casas, cansados pelo trabalho feito. Ao deixarem o terreno ouviram barulho de pássaros, o primeiro amigo ao se virar viu os corvos abrindo os vincos recém feitos, e começarem a comer suas sementes. Elevou seus olhos para o céu e pediu com fé para que Deus ajudasse aquelas aves, que lhes dessem comida para seu crescimento e que permitissem que seus frutos nascessem para alimentar os seus filhos e o restante comercializa-los para ganhar o dinheiro que daria o teto do seu lar. Orava com devoção e o seu pedido foi ouvido, suas plantas cresceram e deram frutos doces e os corvos seguiram os seus caminhos, como qualquer ave. O segundo amigo ao ver a mesma cena se desesperou e o que mais fez foi perguntar o porquê daquela desgraça, o porque ele que tanto trabalhou, porque Deus permitia aquilo, porque aqueles pássaros não iam para o inferno em vez de acabarem com tudo que era dele. Enfim blasfemou tudo o que podia sem descanso. Olhando para o terreno do primeiro amigo e vendo o oposto do seu, se intrigou e foi perguntar o que ele tinha feito para não ser atacado pelas aves. Esse seu amigo disse apenas que pediu aos céus ajuda e amparo para as aves que também tem direito de comer para viver e que seu trabalho fosse abençoado. E você o que foi que fez? ─ Amigo, eu não enxerguei como você, me desesperei e os amaldiçoei desejando tudo de ruim e revoltado com tudo que estava me acontecendo. Aprende-se uma lição com esse exemplo, que devemos sempre agradecer nossos acontecimentos, pois são para cada um de nós um aprendizado nesta nossa vivência. Ao pronunciarmos más palavras, elas voltam e dificultam o nosso viver, pois são energias Viver, Rezar & Amar

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boas ou ruins. Não é que o segundo amigo ficou sem as frutas, mas foi difícil refazer tudo e elas não foram tão produtivas como as do primeiro amigo. Fato contado por Beto

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11/09/2013

O aniversário de 90 anos da Dona Odette

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que eu vou relatar não chega nem perto do tamanho da emoção e alegria que senti. Recebi um presente que não se compra, pois não tem dinheiro que possa pagá-lo. Acredito que poucas pessoas na terra tenham ganhado um presente igual. Sem saber a minha família me levou para um retorno da minha existência, lá pude sentir que o mundo não muda e sim as pessoas. Encontrei as mesmas árvores, até mais imponentes, as mesmas águas, sempre correndo com a mesma velocidade, somente as alamedas estavam mais bem cuidadas, algumas melhorias e mais limpas, mas tudo estava no mesmo lugar. Somente não encontrei o coração gravado em um tronco. Vou contar como tudo aconteceu, quando namorava o meu marido em um domingo fomos até a cidade de Piracicaba de trem com minha mãe e minha irmã, chegando a estação pegamos uma charrete para irmos até o rio, nesse local tinha caminhos de terra para passearmos a beira do rio, todo percurso arborizado e com cercas de madeira. O meu namorado pegou o seu canivete e escreveu no tronco de uma árvore bem frondosa os nossos nomes dentro de um grande coração e me falou a seguinte frase: ─ Aqui ficará gravado o teu nome junto do meu, para um amor eterno. Minha mãe que estava um pouco distante não gostou e fez uma cara fechada, meu namorado sorrindo lhe abraçou e disse: ─ Está com ciúmes da sua filha? A vida é assim mesmo. Depois fomos almoçar, hoje em dia é um prédio moderno, naquela época era um barViver, Rezar & Amar

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racão, mas continua com o mesmo tempero, o mesmo espeto de peixe e lá senti que voltei no tempo, as coisas que estavam ali me fizeram que sentisse que setenta anos não foram suficientes para se esquecer um grande amor. Nessa hora começou uma grande emoção no meu peito em forma de aperto e vontade de chorar. Continuamos a viagem e chegamos ao hotel, bonito e acolhedor, ali estava a minha família me homenageando, todos preocupados com o meu silêncio e meu olhar triste, não era tristeza e sim saudades de uma linda existência que tive desde pequena, primeiro com o meu avô maravilhoso me ensinando a olhar para o mundo e vê-lo bonito e vivermos com muito amor e compreensão, depois cresci e encontrei um jovem que me deu muito amor. Às vezes tínhamos dificuldades e me dizia: ─ Amanhã será um novo dia para podermos resolver esse problema. Quando Deus nos deu o maior presente que um ser pode de receber um filho, chegou a nossa filha, fiquei contente, mas triste por meu avô não estar mais entre nós. O amor dobrou na nossa família, essa criança que somente nos deu alegrias, casou com um moço que não me considerava sogra e sim uma amiga, pois sempre que podia me entregava seus quatro filhos, que são a maior benção que se pode ter. A minha filha e ao meu genro desejo que Deus de a vocês a alegria de serem avós. Anoiteceu e fomos para o jantar, pensei que iriamos comemorar meu aniversário no domingo, mas não estava me sentindo muito bem, a minha amiga que dormiu comigo perguntou várias vezes: ─ A senhora não está bem? Respondi que estava um pouco emocionada com o tanto que estão fazendo por mim. O jantar correu normalmente, ouvi alguém dizes que estava na hora do bolo, minha neta saiu da mesa e voltou com uma garçonete trazendo um bolo. Vi uma pessoa de terno azul marinho, muito bem vestido e com uma das mãos no ombro da minha neta, olhei firmemente e quase perdi os sentidos, ele me olhando sorria, vinham chegando e era o meu amor eterno sorrindo para mim. Não conseguia ficar quieta, tive ímpetos de correr e ir ao seu encontro para abraça-lo, gritar seu nome, mas uma força maior me segurou e da minha boca não saiu nenhum som, quando chegou bem perto ele sumiu. Não tinha visto a vela em forma de flor, somente percebi a minha bisneta tentando pegar e dizendo que era dela, tentava apagar as pétalas que se acendiam quando essas se abriam, fiquei com medo dela se queimar e com isso perdi a linda visão. Vocês poderão dizer que foi minha emoção do dia, foi perfeito. Ao cortar o bolo senti o perfume do meu marido, não era ilusão, eu estava lúcida e com todos os meus sentidos abertos. O meu genro perguntou se eu queria mais um pedaço de bolo, estava ouvindo bem claro, não podia ser alucinação. Bibi sentou no colo da Andrea para brincar com o seu celular e vi ela olhando para o lado e ali estava ele, sorrindo com uma mão na cabeça da Bibi e a outra dando um pedaço de doce, ela olhou bem para mim e depois para ele abrindo a boca e comeu (favos de mel). Alguém falou para não dar mais bolo para Bibi, aí consegui dizer que Andrea não estava dando mais bolo, mas eu queria dizer que o bisavô é que tinha dado, mas não saiu nada e ele foi embora, não consegui falar mais nada. Chorei muito, não por medo, mas por pura emoção. Ninguém que eu conheço recebeu um presente tão valioso. Só hoje dia 11/09/2013 consegui escrever essa maravilha. Estejam certos que esse presente está dentro de uma linda caixa, amarrada com uma fita larga no meu coração. Gostaria de agradecer a todos, mas as palavras para mim estão sem sentido. Um dia 162

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vocês escreverão as palavras que hoje eu não consigo expressar. A você Neise, minha filha, do fundo do meu coração te agradeço. Ao Carlos o mesmo, aos meus netos a minha eterna benção e a minha pequena flor minha bisneta um beijo grande, pois a benção você já recebeu do alto. Da mãe, da sogra, da avó e da bisavó um beijo grande. Odette

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25/06/2014

Dr. Quinzinho ou Índio da força

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relato dessa vivência é maravilhoso, onde podemos definir a força da mente de pessoas não cultas pela humanidade, mas pelo amor dos seres. Minha mãe era filha de uma pessoa muito boa do coração, meu avô Quinzinho foi quem criou eu e meu irmão mais velho. Minha mãe foi estudar na cidade grande para mais tarde administrar a fazenda que hoje era administrada pelo meu tio Totó. Ela se apaixonou por uma pessoa que se dizia ser médico conceituado na sociedade, tendo a pretensão de possuir um hospital para melhor atender as pessoas com necessidades financeiras. Minha mãe morava em um pequeno apartamento que comprou com seu esforço, trabalhava de dia e estudava a noite. Essa pessoa que se dizia médico veio morar com ela e assim veio a nascer o meu irmão, no princípio foi difícil para ela, mas depois arranjou uma boa criatura que a ajudou muito com o bebê. Quando minha mãe se formou teve uma melhora financeira no trabalho, levou mãe Maria para a fazenda, lá poderia criar melhor o meu irmão Paulo, junto com o meu tio Totó e o meu avô que ficaram muito felizes com a sua chegada. Queriam que passassem a morar com eles, ela iria cuidar melhor das finanças da fazenda, minha mãe deu a desculpa que seu marido era uma pessoa muito ocupada no hospital, mas com o tempo viria morar na fazenda. Minha tia ficou muito feliz, pois não podia ter filhos, disse para minha mãe Clara que seria a mãe Lu, ele teria três mães. Tudo correu como Clara idealizou, conhecia bem a família que possuía, mas o seu marido sumiu por muito tempo e a vida continuou. Certa noite ele apareceu dando uma desculpa que já estava cuidando do seu hospital com muita dificuldade financeira. Permaneceu com minha mãe por um tempo, mas tirando as economias que ela possuía e sumiu sem dar satisfação. Minha mãe tornou a engravidar e resolveu procurar ele no hospital que dizia trabalhar. Chegando a recepção deu o nome do seu companheiro, pedindo para ser anunciada. A enfermeira ficou calada e depois falou: ─ O doutor não costuma atender sem hora marcada. Viver, Rezar & Amar

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─ Diga que é Clara, aquela que ele tirou todo o dinheiro do banco sem avisar e estou em uma situação difícil. A enfermeira foi para dentro e voltou acompanhada de um senhor idoso de olhar bondoso, se dirigiu a minha mãe dizendo: ─ Deve haver algum mal-entendido, eu não a conheço e nem poderia ter tirado as suas economias. Pegou-a pelo braço pedindo que o acompanhasse. No seu consultório fez minha mãe se sentar, lhe deu um copo de água, ela ficou sem falar por um tempo e depois perguntou se ele era o Dr. Otávio e ele lhe respondeu que era, desde que tinha se formado. Sem jeito contou sua vida de dez anos junto de um Dr. Otávio e tudo que lhe aconteceu. Contou também que a sua família morava em uma fazenda, logo o Dr. Otávio perguntou se ele, seu companheiro sabia onde era a fazenda, ela respondeu que não e que ele nunca tinha demonstrado interesse pelo campo. Ele sabia apenas o endereço do seu trabalho. Minha mãe estava apavorada e o doutor mais ainda, tentava acalma-la pedindo para ela esperar, saiu e voltou com outro senhor, perguntou para minha mãe: ─ Seu filho foi registrado com o mesmo sobrenome do seu companheiro? ─ Não sei responder, ele disse que tinha registrado no cartório de um conhecido seu. O outro senhor se apresentando como advogado fez várias perguntas e uma delas foi: ─ Você nunca viu algum documento do seu companheiro? Ela ficou pensando e se lembrou que ele tinha pedido para passar o apartamento para o nome dele, que depois do hospital ficar pronto ele compraria outro maior e colocaria no nome do filho. ─ Fui ao banco e fiz o encaminhamento, não sei como está, ele precisava levar alguns documentos e me chamariam quando tudo estivesse pronto para assinar. O doutor disse: ─ Vamos imediatamente ao banco e verificar como tudo isso ficou. Foram os três, quando chegaram o doutor se dirigiu ao gerente e contou o sucedido, o gerente providenciou toda a documentação com a sua secretária, constataram que continuava em andamento por falta de papéis e que a assinatura estava muito clara, ele tinha que assinar de novo. O advogado leu tudo e pediu suspensão de toda a papelada até ser provado a duplicidade dos nomes dele com o doutor. O companheiro da minha mãe assinava da mesma forma que o doutor, o gerente ficou abismado e avisaria o banco central do sucedido e caso ele aparecesse iria se comunicar com o banco e a polícia. Do banco foram direto ao cartório ver o registro do meu irmão e lá nada constou, meu irmão não tinha sido registrado, para alívio de todos, pois poderia causar um grande transtorno para nossa família. Antes de irem cada um para sua casa, o doutor levou minha mãe para sua casa conhecer sua esposa e relatou sua trajetória, ela não tendo nada a esconder aceitou. Elas ficaram muito amigas, começou a frequentar a nossa fazenda, mas sem contar nada para o meu tio e meu avô. Seus filhos passavam dias com o meu irmão e isso fez bem a todos. Minha mãe passou a ser atendida pelo doutor, ela teve uma gestação sofrida e quando nasci ficamos na casa dele, mas minha mãe piorou e precisou ser internada. O doutor chamou toda a minha família, pois o caso dela era bem grave, ela partiu pedindo a essa amiga que ajudasse a me criar e contou toda a verdade para o meu tio e tia. Meu tio prometeu registrar os dois sobrinhos como filhos e que essa história ficaria somente entre eles, que meu avô nunca saberia que ela tinha sido enganada por um vadio, mas se um 166

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dia ele cruzasse o nosso caminho, seria um homem morto. Assim fomos criados pelos meus tios, que para nós era nossos pais. Crescemos muito felizes. Quando o meu irmão precisou ir para a cidade estudar, o nosso tio doutor e sua esposa Linda foram nossos melhores amigos. Já descrevi a passagem dos meus familiares, agora é a minha vez. Fui um ser desde criança feliz, alegre e comunicativo, fui criado pela mãe Maria, que era índia de coração grande e branca como a lua protetora. Na fazenda meu avô contratou vários índios, por eles estarem passando dificuldades e vir viver bem perto dos brancos, dessa forma se ambientaram e nos adoravam. Junto desse povo aprendi a ter força mental, com eles fazia experiências e davam certo, nunca duvidei dessa força. O grande índio dizia: ─ Nós sempre vencemos, porque sabemos usar o que temos de maior, a força mental e a lua que nos ilumina para o nosso crescimento. Fui estudar na cidade grande e prometi aos meus irmãos de força que voltaria vencedor, com a sabedoria dos brancos para vencer a dor e os grandes males físicos, porque da alma eles já sabiam curar. Fiquei no quarto junto do meu irmão que estava se preparando para viajar para Alemanha, como médico ia se preparar para ser cientista, junto foram os filhos do meu padrinho e amigo, o doutor. Antes de embarcar fez uma reunião comigo, para me prevenir que na faculdade tinha sido perseguido por vários alunos e um chegou a agressão. Esse jovem foi expulso, ele dizia que nós éramos filhos de um assassino e ladrão, que o pai dele tinha dado um tiro na cabeça por perder tudo o que possuía de bens matérias por causa dele e perdido até seu nome, mas ele e seus colegas iriam se vingar, por tudo que sua família e ele estavam passando. Tinham posto até fogo no carro do meu irmão que deixaria para eu usar como condução. Deixaram um aviso que tudo o que fosse comprado seria destruído. Respondi para o meu irmão: ─ Esqueceu que sou um índio com forças ocultas, nada me assusta, vá tranquilo, esses jovens no futuro serão meus amigos, quem sabe isso será na sua frente para você não duvidar que temos um cacique que comanda além daqui, com uma força ainda maior. Foram viajar mais tranquilos, mas antes foram pedir aos diretores para olhar pela minha pessoa, esses senhores tinham passado várias férias na fazenda e me conheciam bem. O tempo passou, meu irmão e meus amigos já estavam para voltar, com muita glória que obtiveram como brasileiros e como estudantes de medicina dessa faculdade, com isso todos se uniram para homenageá-los e convidaram várias autoridades, jornalistas e pessoas ligadas a ciência. Eu resolvi fazer uma surpresa para eles, fui falar com o meu padrinho o que eu pretendia fazer, ele me apoiou plenamente. Fomos falar com a direção da faculdade e todos me ajudariam e ficaram encantados com o discurso que colocaria fim nessa perseguição dos jovens que poderiam até já estar com o diploma em mãos, era ignorância essa agressão gratuita, nem sabíamos a razão. Começaria daí a minha proposta, até leva-los para o nosso pronto socorro, onde seriam úteis, pois eram jovens e fortes. Passaram vários meses e tudo estava preparado, trabalhei muito, tinha que ter cuidado e esconder de todos, queria que fosse uma surpresa total. Chegou o dia da chegada deles, dos mais jovens cientistas brasileiros. No aeroporto já começaram as homenagens pelo corpo diplomata e autoridades, tudo muito bonito e repleto de emoções. Eles estavam muito cansados, mas não dei importância. O que tinha feito iria valer muito para o nosso futuro, tinha descoberto que o grupo estava se preparando Viver, Rezar & Amar

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para desmascara-los em público. Isso seria melhor do que estava esperando, fiz minhas mentalizações e pedi ao grande cacique que me desse a força dele e de toda a sua tribo para o que eu ia falar. Desfilaram em carros de bombeiros e pararam na faculdade para receber as outras homenagens no salão nobre, lotado de autoridades, alunos, professores e policiais de prontidão. Todos se acomodaram e o meu irmão com os meus amigos estavam compondo a mesa no palco com a diretoria. O cabeça do grupo dos jovens arruaceiros começou a assoviar e a vaiar os cientistas, dizendo que o povo tinha que saber quem eles eram, o principal era filho de um assassino, ladrão e destruidor de famílias direitas e honestas. O diretor fez menção de mandar os guardas expulsá-los, mas eu em bom tom pedi que deixassem ele prosseguir e assim foi feito, falou e tudo o que ele mandava os companheiros faziam, apoiando com gritos. Quando achei que eles tinham terminado subi no palco e bati palmas, para eles que estavam cercados de policias, primeiramente me dirigi as autoridades da faculdade, olhei para o meu irmão que estava rindo e chorando, confiante em mim. Pedi por pensamento ajuda aos jovens índios, visualizei junto aos agressores índios com seus cocares de guerra, isso me acalmou e comecei o meu discurso, não vou redigi-lo, mas tenho que escrever alguma coisa para dar sentido ao que descrevo. Dizendo aos jovens cientistas que eu os admirava pelo esforço de vários anos em cima dos papéis e tubos de ensaio para nos oferecer uma vida longa, melhor e com saúde. ─ Como esse jovem disse que o cientista Paulo é filho de um assassino, ladrão e várias palavras que peço a Deus para o vento levar. O nosso pai, pois eu sou irmão do cientista, não quis assistir a esta homenagem, pois esse pai que tenho muito orgulho de ser filho nunca colocou um sapato nos pés, somente anda com suas botas cheias de terra, de onde planta café que todos nós saboreamos e mandamos para o mundo. Foi somente a igreja como ele mesmo disse: “na casa de Deus não vão olhar para um caboclo de botinas, eu posso assistir meu filho ser doutor e agradecer”. Assim senhoras e senhores quero que entre o meu pai Quinzinho e minha mãe índia que me criou, juntamente com todos os nossos papéis de nascimento que comprovam que somos filhos legítimos de uma família brasileira, mas caboclos do sertão. Todos entraram e o jovem quis gritar que era uma palhaçada, mas os guardas o impediram e disseram: ─ Se não se comportar será retirado e levado para a delegacia. Meu pai com suas botas e todos da fazenda, mais os índios trabalhadores vestidos a caráter nos abraçamos e choramos de alegria e emoção. O povo de pé aplaudia assim como todos os componentes da mesa. O diretor pediu licença e disse que ia fazer um discurso solene dentro das normas da sociedade, mas depois das minhas palavras e das pessoas que faziam parte do verdadeiro povo brasileiro, nada tinha que acrescentar, somente disse: ─ Sou patriota e todos nós somos, mas essa família nos mostrou ao vivo. Nesse momento os jovens começaram a sair e sai também, mentalizando que me dessem forças para qualquer problema que surgisse. Os índios da minha fazenda estavam no jardim, o jovem agressor veio me ameaçar, colocando o dedo no meu nariz dizia que eu não sabia com quem estava lidando, sem responder pedia forças aos meus amigos índios e sentia que tinha segurança, agarrei-o pelo braço e o joguei na grama, se levantou rápido e falava alto: ─ Vejam como ele me atacou. Ninguém deu importância e agradeci a ajuda dos índios e voltei ao salão. Terminada 168

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a cerimônia todos voltariam para a fazenda para um justo descanso. Só eu fiquei por ter provas finais, mas em breve iria ao encontro deles, para conversarmos e matar a saudade. Me formei nesse ano e não quis participar das festividades de encerramento, estava muito cansado e fui para a fazenda aproveitar a companhia dos meus familiares, foram dias maravilhosos. Tive que retornar, pois ainda tinha dois anos de residência, já tinha optado pelo pronto socorro de um hospital público, me avisaram que seria pesado e mesmo assim me tornei o doutor mais procurado pelas pessoas que passavam a noite inteira na fila para ser atendido. Fazia tudo com muito amor e com muito bom humor. Certo dia vi o jovem agressor entrando, os enfermeiros que já o conheciam quiseram impedir a sua entrada, fui até ele e perguntei o que ele queria. Com muita humildade me pediu se eu poderia atender sua mãe, que estava mal e não tinha condição de chegar ao hospital, respondi para que esperar que veria o que era possível fazer. Providenciei uma ambulância e tudo o que eu precisasse para emergência e juntos fomos busca-la. Dirigimo-nos para a periferia por indicação do jovem, paramos na frente de uma casa bem pobre e fui levado para os fundos onde estava a senhora deitada em um colchão imundo no chão. Ao me ver falou um obrigado de coração e desabafou toda a magoa que sentia. ─ Estou assim porque tenho um filho que não vale o ar que Deus deu para respirar. Me agachei e a examinando verifiquei que o caso era grave, pedi ajuda ao enfermeiro e na ambulância com sirenes ligadas fui pedindo o que precisava para acelerar o seu atendimento até a nossa chegada ao hospital. Essa senhora foi atendida por um especialista a meu pedido e tratada em quarto particular, como se fosse da minha família, assim seu filho poderia acompanha-la. Todas as despesas correriam por minha conta. Alguns dias depois começou a melhorar, numa manhã ao visita-la pegando em minhas mãos disse: ─ Como posso agradecer tanta atenção? Uma pessoa que meu filho perseguiu e a toda sua família sem motivo. O jovem de cabeça baixa ouvia sem falar nada. Sorrindo, respondi: ─ A senhora poderá me pagar ficando boa e assim poderei leva-la para a minha fazenda para se restabelecer, ficarei muito feliz. Será que pode colaborar comigo? Chorando muito perguntou: ─ Como pode você perdoar o que esse agressor fez, dizendo estar defendendo o pai, o que não é verdade. Ele sabe da verdade, o pai destruiu a família por ser um viciado nos jogos e casinos, gostava de aparentar riqueza e tudo que tínhamos era meu por herança de pai, que lutou muito para me deixar uma loja onde trabalhei para comprar uma casa e sustentar esse homem por anos, e esse filho que somente soube me trazer desgosto e miséria. E hoje eu recebo da pessoa que ele mais agrediu, carinho e amor. Deus, somente ele poderia dar esse dom a você. Respondi: ─ Não guardo nenhuma magoa, talvez ele pudesse até ajudar no pronto socorro, pois preciso de um ajudante, a miséria é grande e o que eu recebo é pouco, mas mesmo assim dá para comprar leite e um pãozinho para matar a fome. Se ele quiser me ajudar terá cama e comida do hospital, por enquanto, depois que meu hospital ficar pronto todos vamos trabalhar juntos, pois as horas serão todas ocupadas para atender tantos necessitados. Assim foi, anos de trabalho, uma grandeza de amor dessa senhora que aprendeu a ser enfermeira e me deu muita força. A vida dá amor e quem retribui, recebe em dobro, se damos um sorriso recebemos um abraço, como sempre dei o que eu tinha recebi muita Viver, Rezar & Amar

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força e alegria. Hoje tenho tudo para oferecer aos irmãos que aqui chegam, não importa quem eles sejam, recebo como salario luz, força, uma alegria imensa e todas essas palavras que estou deixando para vocês analisarem. Dr. Quinzinho ou Índio da força

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28/06/2014

A vivência de Iris ou a Mulçumana dos pés descalços

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ais de uma vez estou sendo privilegiada por poder escrever uma vivência, fui sempre uma pessoa de muita intuição, assim sendo pude observar as pessoas e auxiliar da minha forma, não sabendo se era certo ou errado, mas fazia com a melhor das intenções. Nasci da união de um grande amor, um amor considerado eterno, os meus pais. Aqui deixo a minha vivência. Minha mãe, filha única de um grande fazendeiro, que naquela época criava e vendia cavalos da raça árabe, o que lhe ajudou a aumentar sua fortuna. De tempos em tempos ele fazia uma grande festa e nessa ocasião comercializava os cavalos. Numa das festas veio um moço de Jerusalém trazendo cavalos belgas, com a pretensão de fazer negócios. Esse rapaz era também um pintor famoso, que faria duas exposições no Brasil. Esse é o começo da minha vida. Quando esse pintor viu minha mãe, seu lado artístico falou mais alto e se propôs a pintar em um quadro de corpo inteiro dela, procurou um local bonito na fazenda e começou sua obra, tudo com a permissão do seu pai, isso levou vários meses. Perto do local escolhido havia uma cabana onde os cavaleiros descansavam de suas caçadas, ao redor dessa cabana havia muitos canteiros de flores que Lu plantava quando fazia suas caminhadas. Ficou marcada essa cabana por vários motivos. Ali, minha mãe se apaixonou, coisa que seu pai não entendeu por ser um amor impossível, pois ela sabia que já estava comprometida com o filho do melhor amigo da sua família e vizinho da fazenda. Antigamente os pais usavam Viver, Rezar & Amar

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a vida dos filhos como se fossem negócios, mas nossas vidas são conduzidas por uma força maior e a minha também foi. A minha infância foi uma parte boa da minha vida, tive amor, compreensão do vovô Quinzinho e mama Lu, me deram tudo o que um ser pode receber. No casarão nunca desconfiaram que eu fosse a única herdeira da fazenda de cavalos árabes e que ali existia uma imensa fortuna. Com a morte do meu avô e depois da minha avó, minha mãe me ensinara a chama-la de madrinha, assim foi fácil contornar o meu nascimento e me registraram como filha legitima dela com o meu pai e esse segredo ficou entre duas criaturas que me criaram. Desde muito pequena eu sempre usei uma toca para esconder os meus cabelos que eram negros e conforme mexia a cabeça ele mudava de cor, parecia azulado de tão preto, meus olhos eram verdes, diferente da minha madrinha que eram azuis bem claros. Vovô Quinzinho e mama Lu tinham os cabelos escuros e encaracolados como os outros trabalhadores. Minha madrinha passava todos os dias comigo na casa de mama Lu e vovô Quinzinho, mas como tudo muda de repente ela não podia mais se dirigir a casa dos empregados. Mandava tudo o que eu necessitasse, desde as minhas roupas que eram cuidadosamente compradas por ela, até a minha saúde era vigiada de perto para nada me acontecer, para todos ela era a minha madrinha e essas atitudes eram normais para uma madrinha carinhosa. Seu marido passou a proibir essas suas atenções comigo, mesmo o casamento deles sendo arranjado pelos pais, viviam cada qual a sua vida, só socialmente é que ficavam juntos. Minha madrinha morava numa fazenda e seu marido em outra, dificilmente se encontravam. Ela se comportava como uma dama casada, mas seu marido tinha outra pessoa que vivia fora da fazenda, isso todos sabiam, mas para a sociedade ele era um grande e respeitado administrador. As duas fazendas prosperavam e a vida continuava. Quando completei oito anos, minha madrinha e mama Lu me levaram para um colégio, chorei muito, mas a minha companheira de quarto me consolava e aos poucos fui me habituando. Estudei muito, eu gostava de música, a qual me dediquei com muito amor. Duas vezes por ano vovô Quinzinho e mama Lu vinham me ver e trazer notícias de todos, principalmente do meu cavalo Dourado, que eu adorava tanto e ele a mim, vovô me contava que ninguém podia cavalgar nele, pois ele não obedecia. O fazendeiro tentou vendê-lo, mas não conseguiu comprador. Era um cavalo muito caro e rebelde, ele também descobriu que não poderia vendê-lo porque pertencia a mim, que com certeza não autorizaria o negócio. Com essas notícias fiquei mais tranquila, quando voltasse para a fazenda falaria com a minha madrinha e iria implorar que Dourado nunca fosse vendido, pois fazia parte da minha vida, eu sabia que ela iria me atender e quando tivesse dinheiro a primeira coisa que faria seria compra-lo. Passei o maior tempo da minha vida estudando, o que mais gostava eram os idiomas francês e árabe, os quais passei a dar aulas particulares no próprio colégio e recebia por elas, guardava tudo o que conseguia, pensando em comprar Dourado. Terminei o meu primeiro curso de psicologia e tive que mudar para um alojamento, prestei exames para a faculdade, passei com louvor e ganhei bolsa para seguir com o doutorado, daria uma folga financeira para a madrinha, que tinha custeado tudo o que eu gastava. Passaram doze anos, resolvi visitar a fazenda e rever o meu passado, coisa que nunca me preocupou. O meu colega Sergio ia viajar para o mesmo local que eu tinha que ir, conversei e fizemos a viagem juntos. Nos encontramos na hora marcada na estação de trem e esse meu amigo Sergio estava com um colega que faria a mesma viagem que nós. O 172

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percurso seria de uma noite inteira, como o trem estava com poucos passageiros, sentamos à vontade para melhor conversarmos. Na madrugada o meu colega adormeceu e eu com seu amigo fomos nos conhecendo, seu nome era Raul, iria a serviço em uma fazenda para substituir seu pai advogado que tinha falecido, e meu amigo iria como representante de um banco para a mesma negociação. Rimos da vida, que sem nos conhecermos estávamos reunidos no mesmo caminho. Desde pequena eu usava sempre algo na cabeça por causa dos meus cabelos, hoje adulta esse uso era parte de mim, durante o dia usava um turbante e no frio um gorro, mas para o meu conforto tirei o turbante, ficando com os meus cabelos soltos, tirei os sapatos, coisa que sempre me incomodava e sem perceber adormeci. Acordei com o guarda anunciando a próxima parada, que era a cidade que iriamos descer, ri e me arrumando vi que o Raul não tinha nem cochilado, me ofereceu um café, que aceitei e olhamos para o Sergio, meu colega que ressonava. Voltamos a conversar sobre os meus estudos e logo amanheceu. Ficamos preparados, a próxima estação era onde devíamos descer, eles não conheciam nada e eu fazia tantos anos, mas era eu que mais conhecia o lugar. Para a minha surpresa vovô Quinzinho estava na estação, sem saber da minha chegada, tinha vindo buscar uma visitante. Nos abraçamos e choramos de alegria, apresentei os dois amigos e nos dirigimos para a carruagem. Vovô me perguntou porque não avisei a chegada, lhe respondi que tinha uma semana de folga e quis aproveitar. Quando chegamos a fazenda o dia já estava claro e estranhei o silêncio, não tinha barulho das atividades normais que conhecia, mas não disse nada. (Estavam falidos). O dono da fazenda veio até nós, os rapazes se apresentaram, mas nada foi dito na minha frente, foi aí que vovô disse: ─ Senhor, esta é minha filha que veio sem nos avisar. Ele respondeu: ─ Não sabia que tinha uma filha já moça. Me olhou firme e falou: ─ Eu já a vi em algum lugar, não sei dizer onde, esses seus cabelos não são comuns e por sinal são lindos, você está de parabéns Quinzinho, sua filha é linda, apesar de seu desalinho e seus pés descalços. Olhei para baixo e ri, tinha esquecido os sapatos no trem. O senhor disse para o meu avô: ─ A tarde vá até a estação e verifique se os sapatos estão lá. Assim nos despedimos. Vovô pediu se poderia me levar para casa no coche, retruquei: ─ Você sabe que gosto de andar e antes terei de dar um abraço no meu melhor amigo, o Dourado. O senhor já tinha dado alguns passou, voltou dizendo: ─ Aquele cavalo maldito é seu amigo? Pois fique sabendo que logo o matarei. Eu sem ter o que falar, disse: ─ Espere mais um pouquinho, estou guardando dinheiro e logo poderei compra-lo e levar comigo. ─ Pode levar sem pagar, ele é um inferno. Virou as costas levando os meus amigos. Fiquei um pouco parada e depois me dirigi para as cavalariças sem saber onde o Dourado estava. Nisso vi mama Lu correndo ao meu encontro, nos abraçamos e chorei de verdade de saudades, de alegria e de toda angustia que sentia. Minha madrinha também estava nos vendo da janela, fez um sinal e veio ao Viver, Rezar & Amar

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nosso encontro amparada por uma jovem, se jogou em meus braços dizendo coisas boas para nos acalmar, pedindo para nós e o vovô irem ao seu escritório as nove horas sem atraso. Minha madrinha mandou mama Lu levar a minha mala para o seu quarto e disse: ─ Tome um banho e se recomponha, sem os seus sapatos, isso é muito importante. Vovô Quinzinho e Lu, tragam todos os documentos. Vovô respondeu: ─ Estão aqui comigo e estaremos lá em meia hora. Eu perguntei: ─ Por que eu terei que enfrentar aquele senhor? Ele não me agrada e vi perfeitamente que não sou bem-vinda. Minha madrinha respondeu: ─ Terá que ser assim, fiz tudo o que eu pude, mas chegou o momento de conhecer o teu passado e nos julgar, assim como esse senhor. Ela foi saindo em direção ao casarão, falei brava: ─ Não vou para o casarão, irei para qualquer outro lugar. Eles me olharam assustados, pensei um pouco e disse: ─ Vamos todos para a cabana, tomarei um banho no rio e trocarei de roupas. Não garanto que no próximo encontro com esse senhor eu diga palavras que ele vai gostar de ouvir. Nada disseram e nos dirigimos para a cabana, quando chegamos vi que estava cuidada e enfeitada com muitas flores. Vovô se afastou para eu me despir e tomei meu banho de rio com direito a cachoeira, mama Lu me fez sinal para sair e assim voltei a realidade. Me vesti, mama Lu prendeu os meus cabelos em uma trança para não ficar em desalinho e voltamos para o casarão, onde todos nos esperavam no escritório da madrinha. Chegando ao topo da escadaria dei com o quadro da madrinha com o corpo inteiro segurando algumas flores coloridas, usava um vestido rosa lindíssimo e os seus cabelos pareciam que o sol estava neles, precisou mama Lu me puxar, para ela não tinha nada de mais, tinha passado toda sua vida trabalhando ali. Era a primeira vez que me lembrava de entrar no casarão, não me sentia bem, mas entrei. Todos estavam acomodados. O senhor se dirigiu para a escrivaninha e a minha madrinha disse: ─ Pode se acomodar em outro lugar, esse tem dono, logo você ficará sabendo. Ficou nervoso, mas não disse nada. A madrinha falou ao Raul que começasse a leitura. Eu estava sentada em um almofadão aos pés da madrinha e ela alisava os meus cabelos me passando muito amor. Raul leu os contratos do meu avô com o seu amigo vizinho, que uniram os filhos em casamento para unir as duas fazendas, mas com a separação dos valores de cada propriedade e cada um seria dono das suas terras, sem poder vender, somente administrar os bens e os lucros divididos em partes iguais. O matrimonio seria apenas nos contratos, sem vida conjugal, leu ainda vários termos até chegar a situação atual. A fazenda do senhor estava penhorada pelo banco e a da madrinha livre de qualquer questão financeira. O senhor fez um pedido de empréstimo no valor atual da fazenda da madrinha e o banco não obteve confirmação dessa transação, veio o Sergio fazer a verificação de propriedade. A fazenda já não pertencia a madrinha e sim a sua filha legitima, conforme a documentação anexada. O senhor deu um pulo da cadeira dando um soco na mesinha, falando: ─ Tudo não passava de uma farsa da esposa, pois eles não tinham filhos, sendo assim ele era o único herdeiro das terras. 174

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Todos permaneceram calados, Sergio disse ao senhor: ─ Como funcionário do banco, posso dizer que todos os documentos estão atualizados pela proprietária e que sua filha legitima, aquela que o pai deposita quantia elevada todo mês para seus estudos é a herdeira e possui dinheiro no valor dessa fazenda e tudo que nela existir, por esse motivo posso lhe afirmar que será inútil pedir revisão dos contratos antigos. O senhor Quinzinho tem toda a documentação da legitimação da filha da senhora com o senhor Sambul, que tem moradia em Jerusalém, está vivo e pronto para qualquer verificação. O senhor se calou, mas com olhar que parecia agredir a madrinha, Sergio o segurou pelo braço dizendo: ─ Tenho a autorização de lhe pedir postura, do contrário sua situação ficará bem pior. Ele se revoltou contra mama Lu e o vovô, os insultando. Aí eu me levantei e fiquei na sua frente dizendo: ─ O senhor se acha com direitos, não use as mãos, use os direitos como a madrinha está usando, seja pelo menos digno de ser chamado de homem, do contrário peço que se retire do local. Ele riu e me disse: ─ Uma jovem que não tem a dignidade de pôr sapatos nos pés, vem me enfrentar. A madrinha se pôs de pé e gritou: ─ Esta jovem tem todo direito de pedir que se retire, ela é a legítima dona de tudo. Ela pode andar sem sapatos, pois não os suporta, tem na sua origem um pai muçulmano, como todos em sua terra andam como Jesus andava, com os pés descalços. Uma legítima mulçumana, essa é sua verdadeira origem, mostre ao mundo que você nunca desmereceu o teu nascimento, não pude casar com o seu pai por ter esse contrato feito pelo meu pai, mas o senhor não soube fazer, pois tem outra família que lhe destruiu toda a sua fortuna, mas a minha o senhor não pode mexer. Eu tive orientação do homem que amei e amo com todo o meu respeito e assim a minha filha posso dizer que lhe entrego essas terras que tanto amo, o seu cavalo que nunca deixei toca-lo e tudo o que for seu, e se um dia puder entender o que é um amor verdadeiro, saiba que ele vive dentro de mim. Você é igual ao seu pai, ama tudo o que Deus deu ao homem, dignidade e respeito ao próximo. Os seus cabelos que aprendeu a esconder dos olhos alheios para não ser identificada, mas os seus olhos terão que falar ao mundo “estou aqui, mostrando a minha severidade, estudei em troca de sacrifícios, cresci com o meu esforço e mostrando que os meus pés e cabelo são dignos da minha raça”. E eu fui fraca por não enfrentar o mundo hipócrita, como o senhor que aparenta um ser digno em atitudes e no fim é um fracassado por uma família destruída pelo poder e dinheiro. Agora colha tudo o que construiu e leve os seus filhos criados na falsidade e no egoísmo. Abracei aqueles que mais tinha amado na minha vida, vovô Quinzinho, mama Lu e minha verdadeira mãe, mãe de coração e minha madrinha no exemplo de Deus na sua honestidade. Agora deixo a vocês o julgamento “fui ou não uma criatura privilegiada pelo meu Deus mulçumano ou pelo Deus brasileiro” Até hoje me acho privilegiada por ter tido a permissão de escrever essa minha passagem. Iris a mulçumana dos pés descalços

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27/07/2014

A lenda da montanha

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uando conhecemos uma lenda contada por alguém idoso falamos que é crendice, mas o que vou narrar aconteceu de verdade e devemos respeitar essa história. Nasci em uma montanha onde as famílias viviam do comércio de grandes pedras recolhidas por eles e vendidas para o povo da cidade, mas existia uma grande ave que roubava crianças com seus pés que mais pareciam garras em voos rasantes, somente meninas até a idade de cinco anos. Conta os antigos que certa vez uma ave dessas roubou uma menina que brincava perto de sua mãe, quando a ave voou para um abismo soltando gritos horríveis a mãe em desespero se jogou no abismo tentando agarrar a sua filha e assim sumiram as duas, tentaram descer, mas não conseguiram achar o fundo do grande buraco. Foi o início da lenda. Todos os anos na data dessa tragédia, essa ave voltava para pegar mais meninas, os moradores viviam em constante sobressalto. Construíram um salão sem janelas ou qualquer abertura e no dia certo as meninas dessa idade e suas mães ficavam nesse local, protegidas por homens armados do lado de fora. Diz a lenda que somente um membro de uma família atingida poderia matar essas aves. Com o passar dos anos as aves nunca mais apareceram, os mais jovens não acreditavam nessa história, mas na data marcada faziam o mesmo ritual com as meninas por precaução. Quando tinha a idade de estudar, sai da montanha. Fui para a casa de uma tia e ali fui criado, estudei e me formei, ouvindo sempre a mesma lenda, coisa que nunca acreditei. Visitei várias vezes os meus pais. Casei e tivemos uma linda menina de nome Luz, pedi a minha esposa que gostaria de levar a nossa filha para conhecerem, pois ainda moravam na montanha e aproveitava para trazê-los morar conosco. Minha esposa vibrou com a ideia, pois ela não tinha mãe e assim a minha ajudaria a criar a Luz. Marcamos de viajar num feriado prolongado, teríamos tempo de arrumarmos tudo. Em nossa casa na cidade tínhamos acomodações suficientes para todos e ficaríamos juntos, Viver, Rezar & Amar

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o que seria muito bom. Tudo resolvido, fomos para a montanha, mas o nosso carro não poderia subir, só cavalos é que passavam pelo caminho da subida, teríamos que alugar um coche, tudo foi calculado. Quando contratei o coche, o cocheiro me disse: ─ Vocês conhecem a lenda do grande pássaro? Respondi: ─ Nasci lá, conheço bem essa história e não acredito. Por que o senhor está me fazendo essa pergunta? ─ Porque hoje é a data daquela tragédia. Ri e falei: ─ A lenda não existe, ninguém viu a ave, somente ouviram seus gritos que dizem ser horrível. Contei-lhe que estávamos levando nossa filha para os avós conhecerem, assim subimos bem devagar, minha esposa e Luz estavam sentadas na parte fechada do coche e eu fui obrigado a ir na boleia com o cocheiro segurando uma carabina engatilhada, ri e disse: ─ Se for preciso usar, não sei manusear. Ele parou os cavalos e me explicou bem detalhadamente como atirar, ainda disse que aquela arma não falhava, se fosse preciso era para atirar sem medo. Subimos a montanha sem nada ouvir, quando estávamos na planície ouvimos um bater de asas e o cocheiro assustado disse: ─ Jesus nos ajude! Nisso ouvimos um grito horrível e uma sombra nos cobriu, senti uma coisa pesada posar na capota bem na direção da minha cabeça, o cocheiro gritou: ─ Atire! Ela está bem ao seu alcance. Eu senti que não conseguiria atirar, os homens que estavam próximos a nós gritavam: ─ Atire homem de Deus, o bicho está arrancando o teto do coche. Mirei a espingarda para cima e puxei o gatilho, ouvi um grito pior que o primeiro e um bater de asas que se dirigia para o penhasco. Não me mexia, estava sem forças, percebi que o coche foi aberto e minha filha foi levada para dentro de uma casa, desmaiei e nada mais saberia descrever, o que conto é o que me contaram anos depois. Minha esposa morreu de um colapso pelo susto do ataque da ave que chegou a erguer o teto, mas o tiro que dei foi certeiro, minhas roupas ficaram sujas de seu sangue, a ave se precipitou para o abismo e eu fui levado inconsciente para um hospital na cidade e permaneci assim por vinte anos. Meus pais se mudaram para minha casa e criaram minha filha. Luz cresceu e estudou, se formou em jornalismo, queria pesquisar e saber ao certo o que aconteceu com a ave que matei. Fizeram os tratamentos mais modernos comigo, com o passar dos anos os estudos na medicina progrediram, certo dia fizeram uma experiência comigo em um aparelho e voltei a vida, mandaram chamar a minha família e quando vi uma moça na minha frente, pensei ser a minha esposa e uma senhora idosa que chorava muito, me chamou de filho, dizendo que aquela era Luz, a luz que eu tinha lhe dado pequenina e que agora me pedia para eu reagir para me levar para casa, sorri e chorava. Todos falavam e eu não compreendia, mas fiz sinal que estava voltando para a vida, mas quando me separaram do aparelho, aconteceu ao contrário, eu parei de vez. Adormeci com uma paz interior. A minha passagem foi muito rápida e por algum motivo fiquei preso por muito tempo neste planeta e com isso sofri muito. Quando tive o reconhecimento da vivência é que pude avaliar toda a orientação recebida. Tive muita ajuda de todos para estar escrevendo 178

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essa mensagem não muito bonita, gosto de pássaros, flores e tudo que embeleza o vosso mundo. Deus proteja a todos. Hoje tive a permissão de escrever esta lenda. A pessoa que escreveu me viu várias vezes na montanha, eu estou nessa montanha para ajudar a rever um mundo que duvidei e pude afastar a maldição das crianças. Jesus está comigo para eu avaliar que tudo o que falam aconteceu num passado longínquo e no presente que ainda duvidamos, mas se existe hoje foi apenas uma lenda no passado. Que Jesus possa guardar bem todas as crianças de todos os perigos. Assim, cumpri hoje essa missão com a ajuda de todos. Eu os abençoo. Justino ou Jucelino

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31/08/2016

Dona Odette conta

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stava na minha cama meio dormindo, pois era cedo demais para levantar. Vi um enorme portão branco e junto a ele um senhor, vestindo uma túnica marrom claro com um cordão marrom escuro na cintura e os seus pés estavam descalços. Sorrindo para mim, disse: ─ Você veio, seja bem-vinda. Pegou em minha mão e caminhamos por uma alameda com muitos bancos brancos, algumas pessoas nos olhavam e foi quando me deparei com uma árvore cheia de flores iguais o meu “olho de boneca”, perguntei: ─ Como pode ter um arbusto igual ao da minha casa, carregada de flores? Ele sorriu e disse: ─ Essa árvore é a sua, cada flor veio com você. Se lembra do que disse a sua neta? “Parece que quanto mais você tira mais aparece as flores”, sua neta concordou e confirmou que não estava aparecendo o quanto já tinha cortado e ela sorrindo continuou a colher. ─ Nunca tivemos tantas flores, esse ano foi e está sendo uma florada muito bonita. ─ São as flores que você recebeu na sua caminhada. Nisso eu vi um moço sentado em um dos bancos, se apoiando com os cotovelos no joelho e cobrindo o rosto com as duas mãos, soltei do braço do senhor e pedi se podia falar com aquele moço. Sempre sorrindo me falou: ─ Se você o conhece... Fui e falei: ─ Bom dia, senhor! O dia está muito bonito hoje, não quer vir caminhar conosco? Ele sem tirar as mãos do rosto, perguntou: ─ Caminhar para ir aonde? ─ Olhar as flores, o campo. Nisso ele tirou as mãos do rosto e pude ver seu rosto muito triste, perguntei: Viver, Rezar & Amar

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─ Oswaldo é você? Não se lembra mais de mim? Sou a Odette, fui sua esposa. Você me deu tantas flores e hoje vejo essas lindas e tão coloridas. Ele fez um gesto como se não estivesse entendendo, tornei a falar: ─ Venha caminhar e ver as flores que você gostava, olhe tanta beleza. O senhor me pegou pela mão e disse: ─ Venha, cada pessoa recebe a sua parte. As tuas flores você ainda conserva, quantas levarem, quantas nasceram. Aquelas que levarem, levam um pouco da tua força. Na tua casa nunca faltará um galho florido, aquelas que vem sem vida florescem mais fortes. As flores que hoje florescem são forças para você doar, pelo poder das energias que elas possuem, muitas delas têm várias cores em uma só pétala, isso é o poder que Deus deu as plantas e vocês nunca prestam atenção nisso. Estas palavras são apenas para confirmar que hoje elas florescem para a necessidade de cada ser. Façam os seus pedidos a flor que achar mais bonita. Raphael

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10/10/2016

Uma vivência de amor

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minha vivência foi muito bonita. Quando completei quatorze anos, meus pais tiveram que se mudar para o Brasil, meu pai trabalhava no consulado italiano. E era assim, uma temporada no Brasil e depois voltava para a Itália, dessa vez viemos todos, minha mãe, meu pai, eu e minhas duas irmãs. Já estavam todos nos esperando com uma linda casa, carro com motorista que falava o nosso dialeto, o napolitano. Eu fiquei encantada com o país e as pessoas, só nos atrapalhava era o idioma português. Depois de meses fomos para uma escola italiana, nos ajudou em nossa comunicação. Fiz logo amizades e o resto corria normalmente, minhas irmãs estavam detestando, tudo era difícil. Nosso professor de português tinha mais ou menos trinta e cinco anos, olhos verdes, cabelo avermelhado, alto e elegante, era adorado por todas as alunas, mas muito consciente do seu lugar. Certo dia na hora do almoço, ele veio sentar em minha mesa e me questionou por eu não comer arroz com feijão, respondi: ─ Não estou acostumada, gosto de verduras e carne. O senhor acha que isso é uma indelicadeza da minha parte? ─ Não, de forma nenhuma. Apenas que a maioria dos estrangeiros gostam desse prato e você ainda é muito nova, deveria comer para crescer forte como uma mamãe. ─ A minha é forte e muito elegante. ─ Desculpe a minha intromissão, tudo isso foi para eu ter um diálogo com você. Esse seria o início do meu grande amor. Quando terminou as aulas, o professor Enzo veio nos convidar, eu e minhas irmãs para uma carona em seu carro. Minhas irmãs adoraram, eu fui para não ser mais grosseira. Quando encontramos nosso pai, este perguntou: ─ Como chegaram rápido? Minhas irmãs contaram empolgadas, eu não disse nada, passado algum tempo meu Viver, Rezar & Amar

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pai me indagou: ─ Você não gostou de vir com o professor? ─ Ele só nos trouxe para se desculpar da forma que me tratou na hora do almoço. Contei em detalhes para o meu pai, ele me explicou: ─ Estamos em outro país e os costumes são diferentes. Se ele convidar vocês de novo, tem minha permissão de convida-lo para jantar aqui em casa. Olhei para o meu pai e disse: ─ Eu não sou mais criança, essa atitude não fica bem para mim. ─ Concordo, mas é uma gentileza pagando com outra gentileza, para isso deixa o resto comigo. No dia seguinte sai atrasada da aula e minhas irmãs já estavam no portão me esperando conversando com o professor Enzo, cheguei perto e uma de minhas irmãs disse: ─ Como saiu tarde. Respondi: ─ Não podia ser de outro jeito. O professor sorrindo falou: ─ Não tem importância, eu recupero na estrada. Entramos no carro e partimos. Ao chegar em casa fiz como meu pai tinha pedido, minhas irmãs me olharam sérias, mas enfatizei que esse convite era por parte do meu pai. Ele me respondeu: ─ Se esse convite veio do seu pai, eu aceito, pois você é muito jovem para fazer um convite desse. Fiquei séria e entramos. Papai estava nos esperando e foram feitas as apresentações. Pedi licença e sai, minhas irmãs estavam me esperando para reclamar, mas antes disso entrei no banheiro. Procurei me arrumar melhor e iria mostrar para ele quem era jovem demais. Jantamos, percebi que ele não fazia cerimônia, comeu de tudo e conversou muito com meus pais e depois foram para a varanda tomar café. Na hora da despedida pedi licença e o levei até o carro, onde segurando minha mão a beijou, falando: ─ Tenha lindos sonhos, até amanhã mocinha. Ao entrar, meu pai deu um sorrisinho e me comunicou que o professor Enzo viria todas as tardes reforçar o nosso português. Uma das minhas irmãs falou: ─ Ele está interessado em alguém. Olhei para ela e entrei no meu quarto. Sozinha fiquei me perguntando “ele está interessado na mais velha, pois só faltou me chamar de criança”. Todos os dias dava aula, depois jantava e tomava um vinho com o meu pai. Quando estava chegando as férias ouvi meu pai convida-lo para um novo emprego, iria trabalhar em um banco italiano no departamento de finanças, teria direito a uma casa para morar com a família. Senti um aperto no coração, mas nada comentei. Nas aulas que ele dava, corrigia mais a mim que minhas irmãs, um dia perguntei o motivo dessa atitude, me explicou que era simples, eu era a mais velha e tinha um futuro pela frente. Na última aula antes das férias, o professor Enzo se despediu dizendo que ia deixar de dar aulas para ser um bancário. Ficamos caladas, mas eu pensei “será que a esposa dele não gosta que ele jante todos os dias aqui em casa?”. Mamãe na hora do jantar o convidou para almoçar no sábado junto com a sua família para nos despedirmos. Fiquei triste, mas não sabia o motivo. Passei a noite sem dormir pensando no porquê dessa tristeza. No sábado me arrumei com capricho, minhas irmãs me amolavam dizendo que ele era pai de três filhos. Sentei na varanda para es184

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perar pela família e para minha surpresa desceu do carro um jovem parecido com Enzo, somente os seus cabelos eram pretos e uma senhora simples segurando sua mão, para mim correspondia ser sua mãe e não esposa, chamei a todos e fomos receber a família. A senhora falava bem o italiano e o nosso dialeto, nos entendíamos muito bem. No final do jantar, papai convidou a família para passar uns dias em nosso sítio, fiquei feliz. A senhora concordou em passar o fim de semana, pois durante a semana seria impossível. ─ Podemos jogar basquete, pois sei que você está sendo muito elogiada pelo seu desempenho nesse esporte e meu irmão joga muito bem. Fica acertado Ana Carolina. — Falou o professor. Pela primeira vez ele me chamou pelo meu nome, sorri e assim foi. O ano inteiro foi rotina. Após o Natal Enzo recebeu um comunicado do banco para uma viagem a trabalho, isso mudou a minha vida, meus fins de semana eram longos, percebi o quanto ele me fazia falta. Quando completei dezesseis anos ele pediu se poderia falar com meu pai sobre nós. Em minha festa de aniversário foi anunciado o nosso compromisso, fiquei muito feliz, em poucos meses ficou resolvido o nosso casamento, seria em Roma e após quatro meses fiquei grávida e com muita alegria começou os preparativos. Minha sogra veio para ajudar, ela foi mais mãe que a minha, que só tinha tempo para os seus compromissos. A minha sogra era a mãe que eu precisava. Quando nasceu o bebê ela escolheu o nome, a nossa menina se chamaria Emanuela, tudo corria normalmente, até o meu marido ser novamente transferido para o Brasil. Fiquei contente, assim D. Maria ficaria perto do seu outro filho. Fomos nos informar sobre a viagem, o navio não tinha condições para um bebê de seis meses. Chorei muito, fomos falar com o meu pai se ele conseguia algo mais, ficou estabelecido que meu marido e sua mãe embarcariam para o Brasil e quando o bebê estivesse com um ano iriamos, seis meses passariam depressa e eu com Emanuela iriamos encontra-los. Fomos todos ao porto para darmos um até breve, os dias passariam rápido e logo todos estaríamos juntos. A babá e uma das minhas irmãs que estavam comigo faziam planos para quando chegassem no Brasil, mas a nossa caminhada mudou. Recebi um comunicado do porto que o navio que viajava o meu marido estava sem dar notícias, poderiam estar em algum porto parado por motivos de temporais, isso era normal. Meu pai já estava se comunicando com vários portos, cada um falava de um jeito, mas ninguém tinha visto o navio. Fiquei em pânico, meu cunhado Lívio veio do Brasil e juntos fomos para Nápoles onde estava a minha família e juntos resolveríamos melhor. Foi quando recebi uma carta com uma faixa preta, confirmando o acidente com o navio e a morte de todos, tripulação e passageiros. Fiquei doente e Lívio era quem me dava forças, dizendo: ─ Você tem uma filha. E eu respondia que não tinha mais ninguém. Assim comecei a perceber o meu egoísmo, mas vivemos por quatro longos anos dessa forma. Estava sentada no jardim e veio Lívio dizendo que não trazia boas notícias, teria que voltar para o Brasil por motivos de trabalho, na próxima semana teria que estar no banco. Perguntei já chorando: ─ Como eu fico aqui sozinha? Você é o meu tudo, me agarrei em você como uma tábua de salvação. Ele me acalmou e me deu uma solução: ─ Vamos nos casar, pois eu aprendi a te amar e minha sobrinha me chama de pai e não de tio. Viver, Rezar & Amar

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Fiquei calada e senti que era a única saída. Senti que eu o amava mais que um amigo ou cunhado, abracei-o e respondi: ─ Se você me ama eu te seguirei, mas com uma condição de você não ficar magoado de eu amar o Enzo e sua mãe. Ele me abraçou e choramos juntos. Casamos no Brasil, na presença dos meus pais e minhas irmãs, formamos uma nova família. Minha filha pediu uma festinha de aniversário, assim aproveitamos para anunciar aos amigos que íamos ter mais um filho. Escrevi aos meus pais contando a novidade e ele ao vir para seu trabalho conheceria o neto, tivemos um menino, parecido com a irmã, mas os seus cabelos eram pretos como o do pai. Os meses, os anos foram passando com muita saudade dos que partiram e que eu tanto amei. Minha filha ficou noiva de um colega da faculdade e marcaram que no dia da formatura se casariam. Iriam morar na Itália em Roma, como médicos cientistas em pesquisas para os dois países. No dia da formatura/casamento, todos de beca preta fizeram uma linda homenagem ao casal, os membros da mesa mais os convidados e todos os professores ficaram de pé para que entrasse o noivo e ficasse na frente da mesa ladeado de professores que seriam seus padrinhos, aí entrou minha filha Emanuela de braço com seu irmão futuro cientista, todos de pé ouvindo ao fundo uma música religiosa deu entrada ao religioso para fazer o seu casamento. A escrita não traduz a cena, foi muito bonito e emocionante. No término da cerimônia minha filha entregou o seu buquê ao pai e disse: ─ Somente você sabe a quem levar o símbolo do meu casamento. Foi oferecida uma festa após a cerimônia no próprio salão. Eles embarcaram no dia seguinte em um navio italiano. Meu filho explicou ao comandante do navio e nos proporcionou uma surpresa, veio até mim e dando o buquê em minhas mãos falou: ─ Vamos juntos terminar a sua missão. O capitão nos explicou que navegaríamos até em alto mar e de lá voltaríamos em outro barco. Subimos a bordo e todos estavam curiosos, quando chegamos em mar aberto o capitão deu uma ordem e uma prancha apareceu, aí foi colocado a caixa com o buquê e nesse momento o navio balançou fortemente e deu um arranque para parar e a caixa caiu no mar, abrindo a tampa e o buquê afundou, nisso o navio parou totalmente e todos bateram palmas, e ao fundo se ouvia uma música suave. Ficamos emocionados olhando para o mar, quando o buquê apareceu e ficou na posição de pé, depois inclinou e boiou por muito tempo. Choramos muito, mas para mim foi o pai e a avó que vieram buscar o símbolo do amor e para nós foi muito emocionante, por isso me considero um ser muito amado na infância, adolescência, amada pela sogra, cunhado e pelos filhos. E para você que está lendo, muito amor. Ana Carolina

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20/10/2016

Um recebimento por merecimento

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minha passagem foi comum, como uma garota normal. Estudei sem sacrifício, fui para a faculdade e cursei química, engenharia mecânica e letras. Trabalhava numa indústria que pagava por dia, limpava as máquinas num período, estudava no outro e escrevia capas de cadernos a noite, assim ganhava para o meu sustento, repartia o quarto com uma colega para gastar menos. Um dia fui informada que um banco precisava de um mecânico para uma impressora. Na manhã seguinte às 8 horas já estava na porta e fui informada que só abririam às 9 horas, disse na portaria que era a mecânica de máquinas que tinha vindo para ver uma impressora, me arrumaram um cartão e entrei antes da hora, fui muito bem recebida. O gerente da sessão disse que precisava de um moço, sorri e respondi que estava no último ano e entendia do problema. Levantou-se e pediu que o acompanhasse, entramos numa sala e me assustei, pois tinha dois moços em volta de um caixote com muitos papéis. Aqui está o problema, a máquina borrou todos esses documentos e os rapazes estão tentando limpar o excesso da tinta para identificação, mas nada conseguiram. Olhei tudo e falei: ─ Primeiro não devem limpar a tinta, porque se a máquina gravou o nome e vocês limparem, a tinta fica branca. Deve-se ler a gravação primeiro. ─ Fizemos de tudo e nada conseguimos. Mostre-nos a sua técnica. ─ Preciso de um macacão para vestir, panos, álcool e verificar se as letras foram danificadas, depois limpar as teclas e aí darei uma resposta ao senhor Dr. Ele sorriu, estava duvidando, mas foi pedir ao faxineiro o macacão, pano e álcool que prontamente trouxeram um de número bem grande, tive que dobrar pernas e mangas para eu poder me mexer, mas não me importei com aparência. Abri uma parte da máquina e retirei a tampa, fui limpando com o pano com álcool e verifiquei que ela não estava danificada. A sala estava cheia de gente aguardando a minha resposta, falei com o gerente da sessão: Viver, Rezar & Amar

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─ Dr., a máquina não está quebrada, o uso dela que foi errado. Todos permaneceram calados, o gerente respondeu: ─ Veja um caixote de erros é o que temos. Percebi ironia na sua fala, respondi: ─ Essa máquina é sensível, deve ser usada com as pontas dos dedos, se usar a força ela grava e solta uma grande quantidade de tinta. ─ Você pode conserta-la, por favor. ─ Não, pois ela não está quebrada, se o senhor me der um papel eu posso mostrar. Trouxeram uma pilha de folhetos, peguei dois e coloquei com suavidade, a máquina me obedeceu. A escrita saiu limpa e bem legível, mostrei e falei: ─ Os outros papéis que vocês limparam nada posso fazer, mas o que a máquina gravou eu posso salvar com cuidado. Mostrei e sorri. Perguntei se queriam mais alguma coisa, o gerente se manifestou dizendo: ─ Você sabe mais do que eu esperava. Um rapaz vai te acompanhar ao departamento pessoal, leve este papel e assim fica tudo certo. Fomos e lá também fui muito bem atendida e informada do ordenado que seria quatro vezes o que eu recebia na fábrica e minha experiência seria de três meses. Me perguntaram quando podia começar e eu respondi: ─ Amanhã, pois sou contratada por dia. ─ O seu horário será das 9 horas até 12 horas, com 1 hora de almoço e saída às 17 horas. Sorri para não pular de alegria. Trabalhava seis dias por semana e nas madrugadas escrevia as capas de caderno. No dia seguinte quando os funcionários chegaram se admiraram de me ver trabalhando, como eu tinha o cartão de mecânico do dia anterior eu pude entrar mais cedo e adiantar o serviço para eles. Chegou o gerente e perguntou: ─ Por que chegou mais cedo? Expliquei a história do cartão e ele sorrindo disse: ─ Esse serviço nunca acaba, só muda de lugar. O meu nome é Silvio Lopes, mas todos me chamam de Lopes, não use o doutor, pois aqui somos todos funcionários. Tenha um bom dia. Continuei o meu trabalho que estava adorando. Certo dia senti que meus pés não me obedeciam, estavam devagar para eu poder andar e o Sr. Lopes perguntou o motivo de eu estar assim, respondi: ─ Não sei, parece que meus joelhos estão presos. ─ Vá até o médico, temos convênio para isso. Fui com um dos meus companheiros por não conseguir andar. O médico me atendeu prontamente, tirou uma chapa, mas nada foi constatado e eu me sentia cada vez pior. Fui para casa e piorava cada dia que passava. Meus amigos do trabalho vinham todas as tardes, mas meus joelhos estavam mais tortos e eu com medo de perder o emprego, eles me acalmavam dizendo que o meu serviço estava à minha espera. Meu amigo Tadeu veio uma tarde e eu estava chorando, ele me contou que existia um senhor chamado Pedro que benzia e se eu queria que ele me levasse, já que os médicos nada estavam achando. Respondi aflita: ─ Vou a qualquer lugar. ─ Só que é em Recife. 188

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─ Não tem importância, irei. Meus pais moram lá. Nisso bateram na porta e era o Sr. Lopes, entrou e disse: ─ Soube que você não estava bem. Meu amigo contou aonde queria me levar e ele muito sereno disse: ─ Irei com vocês, vou inventar um serviço em Recife e iremos todos. Embarcamos a noite, eu fui numa cadeira de rodas, já não sentia minhas pernas e tinha muita dor. Chegamos ao amanhecer, meu pai estava nos esperando com uma charrete, tiveram que me carregar no colo, minhas pernas não me obedeciam mais, disse ao meu pai: ─ O senhor vai junto conosco. Ele prontamente respondeu: ─ Sim, eu acredito nos ensinamentos, mais que a maioria das pessoas. Acomodamo-nos na charrete e fomos direto, meu pai conhecia o senhor e as minhas dores eram horríveis, mas fui quieta. Quando chegamos tinha muitas pessoas, mas meu pai disse para esperar que ele ia falar com o senhor, ele e o senhor vieram até a charrete me ajudar a sentar na cadeira de rodas, eu não consegui, pois, a dor era grande, me levaram no colo e lá dentro me fizeram olhar para um quadro de Jesus, fiquei olhando e me senti melhor. Ele pegou um barbante e pediu que quem pudesse ficar de joelhos e rezar, pois, ele iria precisar de muita ajuda, pediu para o meu pai ficar do lado direito, Lopes e meu amigo nas costas, mas que me segurassem com força, pois o trabalho era pesado. Ergui minha saia até os joelhos e mostrando o barbante para o quadro fez uma linda oração, foi enrolando nos meus pés e no fim do barbante fez um laço bem apertado, mesmo que fosse para me machucar. Nisso eu vi no quadro de Jesus um rosto de uma moça loira com grandes dentes e nos olhos ódio. Falei para o senhor e ele respondeu: ─ Não tenha medo, Jesus está com você. Senti tanta dor que gritei. Ele gritou mais alto: ─ Rezem por favor, bem alto. Eu queria fugir, fazia muita força com os braços, mas eles estavam presos e meus ombros também, meu pai me chamava, mas eu não ouvia, só sentia uma grande força e vontade de gritar. Me contaram depois que parei e fiquei quieta, mas desacordada e a moça loira foi se desenrolando e se desenrolando e caiu no chão, começou a se arrastar para a porta e todos se afastaram, ela foi para a parte de fora e o senhor pedia para rezarem com força para Jesus, estavam conseguindo. Voltei do desmaio e pedi que me soltassem e o senhor pegou um copo de água e molhou os dedos passando na minha cabeça, depois jogou nos meus joelhos dizendo: ─ Em nome de Jesus eu te solto. Pediu que todos me largassem, mas meu pai ficou segurando a minha cabeça, me senti sem dor. Meu pai perguntou: ─ Quem será que fez essa maldade? O senhor respondeu: ─ Foi Jesus que curou a sua filha, ela merecia. A quem fez isso a justiça divina que julga e condena, mas nós somente temos que agradecer os merecimentos. Façam alguma caridade e ofereçam a quem quiserem agradar e agradeçam a Jesus o que receberam. Todos prontos para me segurar, mas senti que ficaria de pé, chorei muito, não de dor, mas de comoção. Jesus estava comigo, senti que estava curada, abracei o senhor e disse: ─ Só Jesus pode lhe pagar. Viver, Rezar & Amar

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O senhor fez outra oração de agradecimento e fiquei quieta, pegou em minhas mãos que estavam dormentes e disse: ─ Fique de pé, procure mentalmente também pedir ajuda de Jesus. Devagar e com medo fiquei de pé, todos bateram palmas. Teria muito que contar, mas também a agradecer. Lopes comprou cadeiras e bancos para o senhor e quando temos folga vamos até lá para dar um abraço nele e Lopes sempre diz que queria conhecer essa tal, mas isso ficou no nosso passado. Esta mensagem serve para quem ler e saber perdoar para um dia receber.

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