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SUPERAÇÃO & humanidade
ainda menina, foi buscar ajuda para a minha mãe”, lembra.
DO ALTO DE SEU 1,80 metro de altura, cabelos vermelhos, muitas vezes a única mulher entre os chefes de governo e sempre esbanjando eloquência, sinceridade, humanidade, simpatia e muita sensibilidade diante das causas humanas, Ângela Maluf gosta de abraçar e sorrir. Aos 67 anos, representou a mulher cotiana no cargo mais importante do executivo, quando esteve prefeita em exercício no mês de julho.
Mas quem vê suas vitórias não tem noção dos desafios que precisou superar. A caçula de quatro mulheres conviveu com o pai alcoólatra na infância e passou por situações de violência doméstica. Ainda adolescente, veio com a mãe e as irmãs, de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, sua terra natal, a São Paulo para dar novos rumos à vida depois da separação dos pais.
Um dia, ouvindo a mãe conversando com amigas do clube Sírio-Libanês sobre um desfile de moda beneficente, se ofereceu para desfilar, “um sonho meu”. “Na semana, tive caxumba. Cobri o rosto inchado com o cabelo alisado e fui para a passarela. Foi um sucesso, uma das noites mais lindas da minha vida”, recorda-se.
Dali, vieram outros convites e não parou de desfilar por 15 anos. Trabalhou na TV Mulher, com o diretor Nilton Travesso, a apresentadora e jornalista Marília Gabriela e com estilistas Clodovil, Dener e Ney Galvão. Desfilou alta moda. Fez carreira internacional. Esteve em passarelas da Europa, Estados Unidos e Argentina. “As coisas acontecem naturalmente em minha vida, mesmo sem a gana de conquistá-las”, afirma.
Na Alemanha, vivenciou o preconceito étnico por seus traços árabes. “Eu ia às lojas e pegava as coisas com as mãos para ‘sentir os produtos’, mas lá eles não têm esse hábito. Então, sempre que eu entrava na loja, ouvia a palavra ‘Achtung’, que depois descobri que significava ‘Perigo’. Eles achavam que eu ia roubar. Foi fora do Brasil que eu aprendi a amar mais o meu país”, afirma. E lá também aprendeu a pintar sedas: “eu pintava a fauna e a flora brasileira em lenços para presentear”.
Quando voltou para o Brasil, a mãe estava com Alzheimer, “um momento muito difícil não ser mais reconhecida por ela”. Foi preciso vender o apartamento para custear o tratamento e Ângela passou vender lenços aos domingos, na feira de Embu das Artes. Uma rotina que durou cinco anos.
Através de uma amiga, soube de uma vaga para vendedora em uma joalheria. Enviou o currículo, mas quando informou sua idade, 40 anos, declinaram. Voltou para casa consciente de que precisava retomar os estudos, pois não havia concluído o ensino fundamental. Fez supletivo em Osasco, se destacou, foi até representante de classe! Amou voltar a estudar. Depois, cursou a faculdade de pedagogia. “Eu soube que, no magistério, a idade não seria empecilho, pelo contrário, contaria a meu favor e eu teria segurança se fosse aprovada em um concurso público”, conta.
Morava com a família em um residencial na Granja Viana e foi eleita diretora ambiental com a proposta de, entre outras, plantar árvores frutíferas silvestres. Conseguiu mais de 8 mil mudas com o então Secretário Estadual de Meio Ambiente, Ricardo Tripoli, e também mudas de Palmito Juçara, com o Sr. Hélio Foltolan, que tinha um berçário desta espécie, orientada pela amiga Bárbara Krotoszynski. Os moradores fizeram o plantio em mutirão e, na foto, Ângela aparece ao lado da saudosa Teresa Maia.
Começou a trabalhar como professora eventual da E.E. Ary Bouzan, no Parque São George. “Eu substituía professores quando faltavam e, como não dava para planejar aulas, ia para as classes com jornal e globo terrestre”, conta. Com os alunos, lia as notícias do mundo, localizava os países no globo, refletia sobre os acontecimentos do dia e questionava o porquê do fotógrafo ter feito a foto naquele ângulo.
Um dia, a coordenadora Ana lhe perguntou se sabia trabalhar com mosaicos para fazer nos muros que estavam pichados. “Eu disse que sabia, mas nunca havia feito. Fui a uma loja de materiais de construção, me informei sobre o que era necessário e fui, com os alunos, recolher cacos de azulejos nas caçambas de entulho”, lembra. Fizeram os mosaicos e refletiram sobre os cacos rejeitados que tiveram novo destino. Sua arte está até hoje nos muros da escola.
O trabalho foi tema de uma matéria na Revista Circuito e, dada a sua repercussão, caiu nas mãos da então presidente da Apae de Cotia, Ana Maria Bastos, que a convidou para fazer o mesmo junto aos alunos da instituição. Foi lá que se apaixonou pelo trabalho com pessoas com deficiência e se especializou na área.
Concluiu pedagogia, prestou concurso público e foi aprovada. Aos 45 anos, diante de sua experiência na APAE, foi convidada para trabalhar como professora de artes no CEIC, uma escola municipal para pessoas com deficiência. “Eu sou apaixonada pelos meus alunos até hoje”, comenta. “Eu encontro-os nas ruas, em eventos e eles me chamam pelo nome, não esquecem de mim e eu não esqueço deles”, afirma.
“A minha vida sempre foi pautada na surpresa. Muitas adversidades surgem, claro, mas eu as enfrento e supero”, finaliza Ângela, que segue lutando pelo direito das pessoas serem quem são e estarem onde quiserem.
Mônica Krausz é jornalista, escritora, assessora pós-graduada em marketing político e eleitoral.
Em 2009, foi criada a primeira a primeira Secretaria da Mulher de Cotia, a quarta no Estado de São Paulo e, diante de suas lutas pelos direitos da mulher, Ângela Maluf foi convidada a assumir a pasta. Depois, veio o convite para contribuir na saúde. Dirigiu as UBSs de Caucaia e região, além da UBS do Atalaia, e assumiu a pasta como Secretária Adjunta da Saúde. “Essa experiência foi e é grande pauta motivadora”, afirma.
Por duas vezes, concorreu a uma vaga na Câmara Municipal de Cotia. Embora tenha sido a mulher mais votada, não conseguiu ser eleita. Chegou a ocupar uma das cadeiras por um breve período de três meses como suplente. Quando ia concorrer pela terceira vez, foi convidada pelo prefeito Rogério Franco a sair candidata a vice em sua chapa. Na campanha, foi vítima de preconceito de gênero, racial e religioso, mas também superou e venceu!
Leia o bate-papo completo em revistacircuito.com/encontros-com-angela-maluf/