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7. ENTREVISTA
ENTREVISTA
Miasmas: O que são, afinal?
A Teoria dos Miasmas foi criada por Hipócrates (460 a.C.-377 a.C.) e parte do pressuposto de que processos de adoecimento são causados pelo ar, pela água, e por outros locais insalubres. Contudo, a nomenclatura que conhecemos hoje foi estabelecida por Hahnemann, precursor da Homeopatia.
Para falar sobre isso, convidamos o terapeuta homeopata e professor de Homeopatia Milton Bezerra de Sousa, responsável pelo projeto “Homeopatia para todos” que, desde 1986, realiza atendimentos gratuitos em comunidades carentes do Distrito Federal e Goiás.
Milton Bezerra/Arquivo pessoal.
REH: Professor, em primeiro lugar, agradecemos a sua colaboração. Gostaríamos de começar pelo princípio. O que são miasmas e qual é a concepção de miasmas na Homeopatia?
Milton Bezerra: Este é um dos pontos mais polêmicos que existem na Homeopatia. Depois que o significado de miasmas foi atualizado por Samuel Hahnemann, muitos homeopatas vêm se debruçando intensamente sobre a mesma, entre os quais cito Bernardo Vijnovisky, Pafull Vijayakar, José Alberto Moreno, José Laércio do Egito, Paulo Rosembaum, Rajan Sankaram.
Também designados pelo termo “diáteses”, os miasmas são apresentados como disposições mórbidas que algumas pessoas possuem, variando de pessoa para pessoa, de acordo com terreno, predisposições e sensibilidade, entre outros. Particularmente, eu entendo o miasma como um espaço existencial com características claras e específicas, onde a criatura humana pode vir a estagiar por mais ou menos tempo, de acordo com os elementos citados anteriormente.
Para entendermos bem a ideia de miasmas, precisamos também ter em mente do que se tratam as “noxas”, influências externas ou internas às quais somos submetidos constantemente. Influências externas são tudo o que nos chega através dos sentidos, como odores, sabores, imagens, sons e texturas, positivas ou negativas, agradáveis ou desagradáveis; tudo aquilo que nos alcança é uma “noxa”. As influências internas são memórias, sonhos, imaginação, fantasias, pensamentos, sentimentos, de uma forma ou de outra, positiva ou negativamente, e tudo isto também irá nos afetar de alguma forma. Ao nos depararmos com as “noxas”, de forma natural teremos algum tipo de reação, positiva ou negativa.
Digamos que tal influência, ou noxa, nos cause algum tipo de incômodo ou desconforto. Neste exato momento a energia vital irá lançar mão de mecanismos de defesa com o objetivo de eliminar possíveis reações destas “noxa”. Entendo que existem formas de defesa variáveis, tudo com o objetivo de eliminar as toxinas inseridas em nossa constituição, advindas da ação das noxas. Cada um destes níveis de defesa é um nível miasmático em si. Por exemplo, a pessoa ouve uma afirmação qualquer, e, “de cara”, ela tem a opção de não se abalar com tal afirmação. Desta forma, tal noxa não irá provocar a presença de nenhuma toxina em sua constituição. Porém, o mais esperado é que a pessoa absorva aquela noxa e fique chateada, irritada, triste, decepcionada, etc. Imediatamente tal noxa irá promover a presença de toxinas na constituição desta pessoa. De imediato, é acionado o que chamo de “primeiro nível de defesa”, que é denominado “miasma psórico”. Neste nível miasmático, os emunctórios estão promovendo uma exoneração, como vômitos, diarreias, transpiração, lágrimas, etc. Caso estas ações consigam eliminar as toxinas por completo, o organismo como um todo volta ao seu nível de equilíbrio.
Caso a presença de toxina seja mais intensa que o nível de defesa, um segundo nível de defesa, ou miasma, é acionado, e temos então, o “miasma sicose”. Neste nível, as toxinas que estavam espalhadas de forma aleatória por toda a constituição, passam a ser reunidas em determinado local, surgindo daí as “aglomerações´”, que podem ser verrugas, miomas, pólipos, etc., ao mesmo tempo em que as exonerações que estavam sendo utilizadas são mantidas, porém em nível mais intenso, como no caso de corrimentos e corizas. Caso, com esta ação, o organismo retorne ao seu equilíbrio, tudo se resolve.
Caso o nível de toxinas seja mais forte que o sistema de defesa, um terceiro nível de defesa é acionado e, temos, então, o “miasma sifilinismo” - ou luetismo. Aqui, a Energia Vital buscará a eliminação da toxina, agora mais intensa e ameaçadora junto à constituição da pessoa, ainda que, para tanto, se faça necessária a eliminação de determinadas partes do organismo (cirroses, gastrites, úlceras, etc), e assim, sucessivamente, até alcançarmos o “miasma tuberculínico”, o “miasma cancerínico” e o “miasma aidetismo”. Estes são os miasmas mais reconhecidos e trabalhados dentro da Homeopatia, sendo que Hahnemann fez referência aos três primeiros: psora, sicose e luetismo.
Rajam Sankaram fala de dez níveis miasmáticos, que são: agudo, psora, tifóide, sicose, malárico, tineídeo, cancerinismo, tuberculinismo, leproso, sifilinismo ou luetismo. Os cinco canais responsáveis
pela eliminação das toxinas são a pele (eczemas, vesículas, pústulas, prurido, etc), aparelho respiratório (produção de muco, aumento de frequência respiratória), aparelho urinário (eliminação de maior quantidade de urina, de sais minerais, de corpos cetônicos, etc), sistema linfático (elimina grandes moléculas de circulação sanguínea), e intestino grosso (diarreia, fezes mucosas, por exemplo).
REH: O que são os chamados “miasmas de Hahnemann”?
Milton Bezerra: Hahnemann estava intrigado com o motivo de determinadas ações e intervenções que ele fazia com a Homeopatia não alcançarem sucesso, sendo que outras tantas nas mesmas condições eram plenas de resultados positivos. Após muito estudo, ele concluiu que havia algumas doenças que deixavam a constituição do paciente mais fragilizada, isso devido à presença de algumas moléstias específicas: a sarna, a gonorréia e a sífilis. Esta ideia se confunde com a teórica bacteriana, de que determinados microorganismos seriam responsáveis pelo adoecimento das pessoas. Embora Hahnemann faça referência a essas doenças, ele não as relaciona à ideia de miasmas. Ele apenas utilizou-se desta nomenclatura, principalmente pelo fato de que seus três miasmas, que são a psora, a sicose e o luetismo, tinham tais doenças presentes como pano de fundo. Assim, miasma não é o resultado da ação específica de um agente infeccioso e, sim, uma condição patológica ampla, que em si carrega vários sinais e sintomas, que por sua vez são características de muitos estados denominados “doenças” pela medicina oficial, a alopatia. A condição patológica apresentada por cada indivíduo em cada nível miasmático corresponde a doenças específicas catalogadas como tais pela alopatia.
REH: O que é a chamada Teoria Miasmática? Qual é a relação entre ela e os miasmas na Homeopatia?
Milton Bezerra: De uma forma muito simplista, podemos dizer que a Teoria Miasmática é a percepção de que microorganismos podem afetar a saúde, sendo os mesmos os responsáveis pelo adoecimento das pessoas. Como já dito em questão anterior, na Homeopatia os Miasmas (embora tenham como base determinados adoecimentos) não se prendem a estes adoecimentos, apenas ressaltam condições em que se apresentam o organismo de forma geral quando a Criatura se encontra em determinado padrão existencial, ou seja, ao entrar em desequilíbrio, a Energia Vital irá trabalhar para promover a Homeostase (equilíbrio geral) – então, reforço a ideia de que os níveis miasmáticos são simplesmente níveis de defesa – e, ao realizar tal trabalho, determinadas características (sinais e sintomas) se apresentarão (para a Alopatia, tais sinais e sintomas em si são doenças a serem eliminadas).
REH: A Teoria Miasmática foi substituída pela chamada Teoria Microbiana, no mundo científico. No que isso afeta a compreensão de miasmas na Homeopatia?
Milton Bezerra: São duas ideias que, embora se utilizem de nomenclatura igual, são completamente diferentes. Para a Ciência canônica, tudo tem que estar estruturado nos elementos de teoria, experimentação, experimentação, repetição e controle. Quando estamos lidando com os microorganismos, tal situação pode até se dar, daí todo trabalho com os microorganismos pode chegar ao nível de cientificidade. Embora se utilize do mesmo termo e tenha doenças conhecidas [sarna, sífilis e gonorreia], a Homeopatia não se prende a tais doenças. Elas são apenas referências para a divisão deste conhecimento e, consequentemente, uma melhor forma de realizar todo o trabalho a que se propõe. Então, quando falamos do nível miasmático “psora”, por exemplo, não estamos nos prendendo à “psoríase”, ou quando falamos do “luetismo” não estamos nos prendendo à “sífilis”. A medicina ocidental oficial (Alopatia), de certa forma, vem exigir da Homeopatia um grau de cientificidade, porém, por ser imponderável [energia vital], a Homeopatia não se enquadra em tal exigência. Ao menos por enquanto, a nível humano, não existe equipamento para se mensurar a energia vital. Quando alguns Homeopatas tentam dar o caráter de ciência à Homeopatia, acabam por querer fazer uso de comprovações de ações realizadas junto a adoecimentos específicos. Cabe estar sempre lembrando que a Homeopatia não cuida de doenças, cuida de doentes, e, aquilo que se apresenta como doença, em verdade, trata-se de sinais e sintomas que, por sua vez, são
indicativos de desequilíbrio que está se dando a nível interno. Os sinais e sintomas não devem ser o centro da ação do Homeopata. Então, a Teoria Microbiana somente se mistura com a Teoria dos Miasmas na Homeopatia na cabeça dos profissionais que, de alguma forma, querem explicar com leis físicas uma ação totalmente energética.
REH: De forma mais específica, quais são as diáteses homeopáticas e como elas se manifestam no organismo?
Milton Bezerra: Hahnemann nos vem falar de três miasmas. Os Homeopatas que o seguiram acrescentaram mais dois. Então a maioria dos Homeopatas atuais consideram cinco miasmas, com exceção de Rajan Sankaram, que faz referência a dez níveis miasmáticos. A Psora seria tudo o que coça, a Sicose tem relação com hipertrofia do ego, o luetismo ou sifilinismo está ligado a problemas mais graves, o tuberculinismo ao abandono e perdas afetivas e emocionais, e o cancerinismo à desorganização e desestruturação por completo. É importante destacar as maiores características dos três principais níveis miasmáticos.
Na Psora, por exemplo, há o ambiente poluído e sedentário com uma alimentação incorreta e abusos de tóxicos, como bebidas alcoólicas, café e fumo, com antecedentes de recidivas de afecções recidivantes, choques afetivos repetitivos e parasitoses intestinais, no paciente e na família, além de anamnese composta de problemas dermatológicos, asmas, colites e toda sorte de afecções crônicas. Também há a astenia física e mental, primeiro intermitente em surtos e depois generalizada, profunda e contínua. Alternâncias mórbidas e manifestações paroxísticas periódicas com exteriorização dos distúrbios são outra característica.
Há também a agravação pelo desaparecimento das eliminações cutâneas ou mucosas que, quanto mais patológicas forem mais provocam agravações internas. Também existe tendência a distúrbios de termorregulação, intolerância a calor até o extremo da friosidade, secreções e excreções com odores fétidos seja em qual lugar for, aumento de apetite de forma global ou seletiva, seja sob forma de fome absurda ou em relação a alimentos indigestos, tendência às parasitoses cutâneas ou intestinais, acometimento cutâneo importante e polimorfo, com prurido persistente e intenso, e trato intestinal atingido com frequência.
Já no caso de Sicose, há persistentes infecções, sobretudo genitais.. Pode-se acrescentar o choque, seja de um processo cirúrgico ou de um baque emocional, e os contextos do transtorno hormonal, erros higenodietéticos e de ambiente com umidade; ideias obsessivas associadas a um estado depressivo, acrescido pelo tempo úmido; agravação pela umidade; sujeição a retenções hídricas frequentemente dolorosas; e transpiração com suores gordurosos que até parecerem viscosos.
No caso do luetismo, há características ligadas a transtornos infantis diversos, incluindo vômitos e convulsões; estado mental sujeito à instabilidade tanto na excitação quanto no sentido depressivo, podendo chegar até a uma certa debilidade mental. Há também a necessidade de lavar as mãos a todo instante ou de esfregar um objeto sem razão. As patologias geralmente são ósseas e se agravam nitidamente à noite, com o organismo sofrendo influência do clima.
REH: Qual é a relação entre miasmas e doenças?
Milton Bezerra: Podemos entender que as doenças são as representações físicas da condição existencial do paciente, as doenças não são o problema em si, elas representam o problema na condição concreta. Cada nível miasmático apresenta uma série de sinais e sintomas que servem para indicar em que estado de desequilíbrio se encontra o paciente.
REH: Quais obras o senhor pode sugerir para aqueles que desejam se aprofundar no conhecimento de miasmas?
Milton Bezerra: Eu sugeriria Homeopatia Previsível (volumes I, II e III), de Prafull Vijayakar. Miasmas, segundo Kent e Egito – José Alberto Moreno. Contribuição ao estudo da teoria miasmática – José Laércio do Egito. Doenças agudas – Bernardo Vijnovisky. Miasmas, saúde e enfermidade na prática clínica homeopática – Paulo Rosembaum. Organon da arte de curar – Samuel Hahnemann.