ENEM
Como será o futuro? A prova do Enem está movimentando as aulas de um colégio estadual do oeste do Paraná
DO GIZ À TECNOLOGIA DIRETORIA
Identidade, gênero e cidadania O papel da escola é formar cidadãos críticos e romper com a intolerância e o prconceito
Aulas mais interativas com a utilização da tecnologia.
EDITORIAL
I N F O R M A T I V I D A D E 1
a todos os educadores
EXPEDIENTE:
Pensando na importância da construção de um jornalismo mais humano e desenvolvedor social, para a escolha da temática, consideram-se as principais lacunas advindas da modernidade, bem como nossas possibilidades, competências e afinidades, priorizando sempre a utilidade pública e a possível relevância dos conteúdos a serem abordados. Dentre as lacunas sociais advindas da modernidade, destacam-se as discrepâncias sociais, culturais e econômicas. O pequeno progresso da sociedade (considerando elevação moral, filosófica, cultural, crítica e democrática) torna-se irrelevante perante à ampla ascensão tecnológica. Esse desequilíbrio resulta em uma população de maioria acrítica e alienada à deriva de uma minoria crítica incumbida da evolução social (por meio da luta por direitos e a melhoria da educação pública) e outra exploratória. Considerando as instituições escolares como principais mediadoras de conhecimento à sociedade, e, paralelo a este paradigma, a eficácia da evolução das tecnologias de informação e da mídia de maneira geral, infere-se que o processo de advento dos assujeitados a sujeitos críticos tomará maiores proporções caso mídia e educação (apesar da distância entre os discursos) aliem-se. Pressupondo que na aliança mídia-educação cabe aos educadores o papel de letramento midiático (formação de leitores críticos de todos os processos de significação e de conteúdos explícitos e implícitos, sendo conhecedores das intencionalidades subjetivas e/ou ideológicas), aos profissionais da área de comunicação social, cabe a tarefa de possibilitar aos educadores, conteúdos com o intuito não somente informativo, mas também que possibilite a constante formação continuada desses profissionais. Assim, a Revista Eduque parte do princípio de que somente a educação e apenas a partir dela é que a sociedade pode evoluir. A partir disso, desponta-se como ferramenta de apoio, mediação e incentivo a esse desenvolvimento, tornando-se um meio de informatividade e incentivo à formação continuada. A equipe define-se como amiga da educação e tolerante às mais diversas formas de manifestações ideológicas, respeitando e defendendo a diversidade, não sendo desdobramento de nenhum partido político ou ideologia religiosa. Boa Leitura
JORNALISTAS RESPONSÁVEIS Kássia Beltrame Renan Bini
TEXTOS Flávia Duarte Jhonathan Dwitt Kássia Beltrame Renan Bini
FOTOS Divulgação
DIAGRAMAÇÃO Kassia Beltrame
IMPRESSÃO Gráfica Tuicial
ILLUSTRAÇÃO CAPA Freepeack Kassia Beltrame
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SUMÁRIO
OPINIÃO
Carta de opinião feita pelo professor Ms. Cézar Versa
BIO/EDUCAÇÃO Drogas: esse assunto deve ser debatido na sala de aula? E quando o assunto sexualidadade chega na sala de aula?
HOMOALTERIDADE Ébano e Marfim: desigualdades raciais
PONTO FINAL Como torná-la mais interessante: leitura Crônica: português e a matemática
ENEM Como será o futuro: prova do Enem 3
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CULTURA EDUQUE Meteram poesia na bagunça do dia a dia. Asaltaram a gramática Religião ou não? Eis a questão
PERFIS A escolha de poucos Uma mulher comum
PONTO, VÍRGULA E EXCLAMAÇÃO Por que eles vão mal na redação?
DIRETORIA Identidade, gênero e cidadania
DO GIZ À TECNOLOGIA Aulas mais interativas com a utilização da tecnologia A modalização como instrumento de democrá zação do ensino
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Carta do Professor
Cezar Roberto Versa
A
constituição de seres humanos capazes se perfaz via uma educação de qualidade e de perfil holístico. Para tanto, vários são os desafios apresentados nessa empreitada nada simplória e de complexidade única. Novos saberes surgem, numa realidade cibernética, de simulacros sociais cada vez mais reforçados. Cabe ao educador conhecer as realidades e conduzir seus alunos nesse labirinto imerso na pós-modernidade. Trabalhar com a formação humanística é imprescindível, contudo não se pode deixar à margem os conhecimentos formais, os quais sofrem críticas duras demais nessa nova era. Aprender exige responsabilidade, ensinar exige compromisso e compreender essa ambiência é mister para aclaramento de problemáticas de práticas didáticas contemporâneas.
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Opinião
O que é ética? Renan Bini De acordo com o livro “O que é ética?”, do pesquisador Álvaro Valls, publicado em 1994, pela editora Brasiliense, popularmente, a ética é entendida como um estudo ou uma reflexão, científica ou filosófica, e eventualmente até teológica, sobre os costumes ou sobre as ações humanas. Mas também consideramos conceitos da ética, nossa própria reflexão sobre a vida, quando conforme a partir de nossos costumes e do que nos foi ensinado, consideramos algo correto ou errado. Se você achar que, por se tratar de um livro que foi publicado em 1994, ele está desatualizado, seu conceito sobre o que é ética provavelmente está errado. O que mudam, são as leis, a moral e os paradigmas sociais; e não a ética. Sendo esta a área de pesquisa e reflexão sobre os conceitos anteriores. Valls separa os problemas teóricos da ética em dois campos: no primeiro, os problemas gerais e fundamentais (como a liberdade, a consciência, o bem, o valor, a lei e outros); e no segundo, os problemas específicos e de aplicação concreta, como os problemas da ética profissional, da ética política, de ética sexual, de ética matrimonial, de bioética, etc. E é a partir da volatilidade e da discrepância social e cultural em relação ao primeiro campo, analisado pelo viés do segundo campo que surge o nosso debate: considerando a profissão de professor como formadora de opiniões e de mediadora e influenciadora no processo de formação subjetiva, será que os docentes conseguem separar suas opiniões pessoais do conhecimento científico
e serem éticos e objetivos na transmissão de seus conhecimentos? Questões que envolvem a ética está no nosso dia a dia. Em épocas mais difíceis, como por exemplo, durante a Ditadura Civil Militar no Brasil, muitas pessoas podem ter se perguntado se uma lei injusta do Estado autoritário precisava ou não ser obedecida. E quando temos “problemas de consciência”, como o próprio livro exemplifica, quando sentimos “culpa”, coisa que ocorre a todos, não se torna importante saber se este sentimento corresponde de fato a uma culpa real? Cabe à ética questionar se nós somos realmente culpados, ou se o que existe é apenas um sentimento de um mal-estar sem fundamento. Porém, essa fórmula parece se tornar mais difícil quando se trata de ocupar um papel social de maior hierarquia em relação a um ambiente heterogêneo e possivelmente híbrido em relação a costumes e a determinados paradigmas. Então, o que seria um comportamento correto, em ética? Para Valls, não seria nada mais do que um comportamento adequado aos costumes vigentes, e enquanto vigentes, tivessem força para coagir moralmente. Apesar desse aspecto, não são apenas os costumes que variam, mas também os valores que os acompanham, as normas, os ideais e a sabedoria, de um povo a outro. E os grandes pensadores éticos, como Sócrates, Kant e Nietzsche, sempre buscaram formulações que explicassem, a partir de alguns princípios mais universais, tanto a igualdade entre os homens, quanto as naturais variações.
Assim, uma boa teoria ética deveria atender a pretensão de universalidade, e, simultaneamente, ser capaz de explicar as variações de comportamento das diferentes formações culturais e históricas. Considerando a responsabilidade ética do professor no papel social em que ocupa, o pesquisador e linguista Carlos Bagno, no livro “Pesquisa na Escola”, ao abordar a questão da ética em sala de aula, aponta que muitos educadores assemelham-se a “procustos modernos”. Na mitologia grega, procusto era um malfeitor que morava numa floresta e que possuía uma cama que tinha exatamente as medidas do seu próprio corpo, nem um milímetro a mais, nem um milímetro a menos. Quando capturava uma pessoa na estrada, procusto amarrava-a naquela cama. Se a pessoa fosse maior do que a cama, ele simplesmente cortava fora o que sobrava. Se fosse menor, ele a espichava e esticava até ela caber naquela medida. De acordo com Bagno, é fácil decifrar a simbologia desse mito. Procusto representa a intolerância diante do outro. Representa a visão de mundo totalitária das pessoas que querem moldar todos os demais seres humanos a sua própria imagem e semelhança, o que, segundo o pesquisador, ocorre com frequência em ambiente escolar. É a recusa da multiplicidade, da diversidade, da criatividade, da originalidade: “Quem não se conforma ao meu tamanho não pode andar solto por aí, a menos que vá jogando fora todo o que eu não tenho até caber na minha medida, ou a menos que se espiche e se estique até ter o mesmo que eu e ser igual a mim”.
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Bio/Educação FOTO: DIVULGAÇÃO
DROGAS: ESSE ASSUNTO DEVE SER DEBATIDO NAS ESCOLAS? A escola é um dos espaços propicios para a realização de atividades de prevenção do uso de drogas
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Kássia Beltrame
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A Organização Mundial de Saúde (OMS) define droga como qualquer substância que, se ingerida, provoca alteração no funcionamento do organismo. Sendo assim, as drogas vão desde medicamentos como a aspirina até o crack, cocaína e outros. As drogas lícitas, como o álcool e o tabaco, se destacam no consumo entre os adolescentes. O consumo entre a faixa etária de 14 a 17 anos é de 44,3%, de acordo com o Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas –(Cebrid). Os inalantes são utilizados por aproximadamente 15% da população adolescente. A partir desses dados, não se tem mais dúvidas de que, o uso de drogas por estudantes é um assunto que necessita da atenção dos municípios, em especial da secretaria de saúde pública, dos pais e da educação escolar. No entanto, quando o tocante é a educação não se pode descartar o fato de que falar sobre drogas é algo delicado. Por vezes, as discussões em relação a isso são carregadas de juízos de valor e de julgamentos preconceituosos por parte dos educadores e dos próprios alunos. É necessário relembrar que não se pode punir preconceituosamente os usuários de drogas. Fernando Hallberg, presidente do Conselho Municipal Antidrogas (Comad) relata que, “a melhor maneira para conversar com um adolescente é utilizando a linguagem dele, é se aproximar do mesmo, conversar abertamente, sem banalizar uma atitude que talvez o aluno esteja cometendo. É necessário explicar de maneira objetiva, mostrar os efeitos que ao utilizar determinada droga pode ocasionar”, afirma.
O uso de drogas algo da sociedade moderna?
plina, estejam preparados para abordar o assunto com seus alunos”.
Dal Bosco complementa, “é preciso pensar em ações de caráter preventivo universal, mas também não podemos esquecer de falar daquelas escolas reais que, muitas vezes, já enfrentam problemas muito concretos de consumo ou tráfico nas suas imediações ou, até mesmo, dentro da própria escola, e trabalham com adolescentes que já se encontram em situação de risco e vulnerabilidade social. Transitar entre esses diferentes olhares tem como objetivo fomentar um espaço para reflexão e revisão de seis práticas, para que os educadores sintam-se fortalecidos para enfrentar este assunto que, muitas vezes, é gerador de medos, preconceitos e dificuldades para abordar o tema junto aos jovens, nosso principal público-alvo”, afirma.
É necessário relembrar que diversos estudos relatam que a utilização dessas substâncias são encontradas em diferentes civilizações antigas e principalmente em muitos contextos religiosos antigos, que utilizavam essas substâncias em rituais e também como forma de medicamentos. A doutora em Psicologia Clínica e Cultura, Carla Dal Bosco relata: “O que muda, ao longo dos diversos momentos históricos, são as questões conceituais entre, por exemplo, o que é lícito e o que é ilícito, quais drogas serão toleráveis socialmente e quais não. Nas últimas décadas, a preocupação com o consumo dessas substâncias vem aumentando, principalmente quando se pensa em crianças e adolescentes, e a discussão sobre estratégias possíveis para o enfrentamento dos problemas decorrentes deste uso, aliadas a ações preventivas, têm sido fomentada no âmbito do governo e da sociedade. Mas este não é um debate simples”, afirma ela. Renato Cândido professor do EJA em Toledo – Pr, relata que muitos de seus alunos são usuários de drogas “ dou aula à noite e muitos dos meus alunos são usuários de drogas. No meu caso é bem complicado pois estou dando aula para pessoas maiores, mas acredito que se a escola tivesse trabalhado os conceitos sobreas drogas talvez muitos desses meus alunos não seriam usuários”, afirma De acordo com o presidente do Conselho Municipal de Políticas Públicas sobre Drogas (Comad), Fernando Hallberg “é necessário que os professores, independente da disci-
Eduardo Pinheiro é professor de artes na rede pública de ensino e em uma de suas aulas teve que abordar a temática, pois sabia que um de seus alunos estava envolvido com álcool e cigarro: “Eu sabia o que estava ocorrendo com aquele meu aluno, no entanto, não sabia se tinha algo além do álcool e cigarro mas tive que abordar o assunto. É claro que não sou especialista nem nada, no entanto, sei que o uso sem consequências de determinadas substâncias não fazem bem”, afirma Eduardo. Ele ainda complementa: “Não me considero muito habilitado para trabalhar esse assunto em sala de aula, mas que se um aluno me perguntar irei alertá-lo dos danos e se eu souber de algo irei abordar novamente em sala. Seria interessante os municípios nos treinarem ou enviarem pessoas da área da da saúde para realizar palestras,
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De acordo com o Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópica (Cebrid), há mais de 20 anos as iniciativas escolares de prevenção não têm mais alcançado os resultados desejados e isso se reflete nas escolas, quando os professores se recusam abordar o assunto por falta de conhecimento e também pelo fato de não terem auxílio de formação continuada sobre o tema. Mesmo tendo o conhecimento de que a temática é importante e que deve sim ser discutida em sala
de aula, muitos professores se veem incapacitados de abordar o tema, sendo assim, ainda falta incentivo aos docentes, para que eles possam repassar o conhecimento de maneira plena aos alunos, sem que haja alterações e preconceitos, que podem acabar tendo resultados negativos ao invés de positivos. É necessário que quando colocado em pauta, assuntos que por muitos são considerados tabus haja consciência de que a sociedade se remodela a cada instante e que conceitos pré–determinados não são bem vindos em grande parte das vezes.
"Eu sabia o que estava ocorrendo com aquele meu aluno, no entanto, não sabia se tinha algo além do álcool e cigarro mas tive que abordar o assunto. É claro que não sou especialista nem nada, no entanto, sei que o uso sem consequências de determinadas substâncias não fazem bem”, diz Eduardo Pinheiro
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ANUNCIO
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E quando o assunto na sala de aula? A sexualidade é uma construção biológica, histórica e cultural, sendo assim, ela é muito mais complexa do que o simples fato da reprodução humana e relacionamentos entre os indivíduos
Kassia Beltrame
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o é sexualidade
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“É preciso que a sexualidade seja vista como algo positivo, bonito e não como algo feio, sujo, vulgar. Precisamos urgentemente modificar este pensamento repressor”, Ricardo Desidério
Mesmo que todos nós saibamos que a sexualidade faz parte da vida humana desde o nascimento do ser humano até a sua morte, falar sobre ela ainda é considerado um tabu. Apesar da evolução em vários aspectos que envolvem a sociedade, a abordagem do assunto em sala de aula é ainda considerada por algumas pessoas como desnecessária. Um dos argumentos dos mais conservadores está relacionado com o excesso de conteúdo que a escola tem que ensinar a seus alunos e que por vezes, não dá conta. Além disso, há também o medo dos professores em relação aos pais das crianças, uma vez que estes também possuem conceitos já formulados e não querem que seus filhos aprendam sobre sexualidade na escola e sim apenas em casa. Para o professor de biologia e doutor em Sexualidade, Cultura e Educação Ricardo Desidério, as escolas não devem se omitir ao assunto. Para ele, “falar de sexualidade em sala de aula nada é mais do que um direito de toda criança e adolescente”. Ricardo diz que o tema em sala de aula é uma forma de proporcionar ao aluno o autoconhecimento. “Não falamos sobre sexualidade porque os pais não abordam a temática, mas sim, porque é fundamental que a criança e o adolescente entendam o próprio corpo, sobre o corpo do outro, sobre o respeito e sobre a afetividade”.
A problemática de não conhecer sobre sexualidade O assédio sexual em crianças, adolescentes e mulheres é um dos grandes problemas sociais que
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o país está enfrentando atualmente. Luci Pfeiffer, médica especialista em crianças e adolescentes, destaca que “os fatores como a desigualdade, a falta de criticidade da criança, o individualismo, o tradicionalismo e a falta de apoio materno, são os grandes precursores desses atos”, explica. Doenças sexualmente transmissíveis, gravidez indesejada e abuso sexual intrafamiliar são apenas algumas das consequências que a falta de conhecimento em relação ao corpo ocasionam diversos resultados. No levantamento feito pelo Data Popular, a pedido do Instituto Patrícia Galvão, a cada quatro minutos uma mulher é vítima de agressão em casa. Em regiões do país como em Vitória, no Espírito Santo, o abuso sexual em menores de idade é o segundo crime mais frequente, perdendo apenas para o abandono de crianças. Dentre os casos divulgado pela Secretária Municipal de Saúde (Samus), 89% das ocorrências são com as crianças do sexo feminino e no âmbito familiar.
O professor e vereador Paulo Porto Paulo Porto complementa: “Um dos problemas de não se discutir sexualidade na adolescência ou na infância, se relaciona com a questão do abuso sexual que, na maioria das vezes ocorre na família. Hoje, as pessoas são abusadas sexualmente, na família, pelo pai, pelo padrasto pelos mais próximos. Então, uma maneira de combater o abuso sexual nas crianças é discutir sexualidade. Eu acho que não pode ficar apenas ao cargo das famílias, o Estado tem o dever de debater isso”, explica.
Sendo assim, pressupõe-se
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que só será possível reverter esses casos de abuso e desigualdade quando a criança, o jovem e a mulher tiverem conhecimento sobre o seu corpo, sobre os conceitos relacionados à sexualidade. É fato que em pleno século XXI, o papel de quem tem que falar sobre sexualidade ainda é divergente. No entanto, é necessário pensar em conjunto, ou seja, famílias e estado. Deixar esse assunto apenas para as famílias não é o ideal, pois muitas não têm aparatos críticos suficientes para explicar a seus filhos sobre a temática. As escolas sozinhas também não conseguem abordar tudo o que envolve a sexualidade. Além disso, é de extrema dificuldade para os professores abordar um tema tão complexo sem que as crianças e adolescentes tenham ao menos uma base sobre o assunto. Por outro lado, a base de conhecimento vinda da família não deve estar instaurada dentro do preconceito, pois se estiver, será de extrema dificuldade aos professores quebrarem esses paradigmas. A professora de português e também advogada, Benilde Depubel fala a respeito da diversidade que deve ser abordada quando o assunto é sexualidade:“Toda essa realidade, toda essa diversidade faz parte do nosso dia a dia”. Assim como Ricardo, ela abordou a importância dos professores na formação do individuo. “É preciso que os educadores deixem
de lado o preconceito e trabalhem de maneira igual em sala de aula. Se a pessoa tem preconceito lá na casa dela esse preconceito ela não pode trazer para o trabalho. Se ela tem determinada religião que segue, ela não pode fazer o proselitismo aqui na escola da igreja dela”, afirma a docente. Benilde destaca um caso em que o pai de um aluno foi até a escola para saber o motivo de estarem falando sobre sexualidade em sala: “A maneira como ele falava era totalmente religiosa e preconceituosa. Teve um momento da conversa em que ele falou assim ‘eu sou teólogo e se Deus quisesse a homossexualidade ele teria criado o Adão e o Ivo”. Nesse momento a minha vontade era falar todo o meu conhecimento a respeito do assunto e mandá-lo embora da escola. No entanto, precisei respirar fundo e respondê-lo com calma”. É necessário destacar que ensinar sobre sexualidade dentro de uma sala de aula vai muito além do aprender sobre o corpo feminino e masculino. Ricardo explica que é necessário, também, abordar sobre as diferenças afetivas das pessoas e que isso é o que causa maior preconceito em relação à temática. “É importante, ainda, que as crianças saibam respeitar as diferenças que estão a sua volta, sem discriminação ou quaisquer tipos de violência”, relata. O educador destaca também que é necessário modificar o pensamento atrasado
a respeito do tema e da importância do autoconhecimento: “Quando falamos sobre a temática em sala de aula, não estamos incentivando a prática sexual, mas estamos preparando-os para a vida, de forma que os mesmos não tenham vergonha de falar sobre o assunto, que a sexualidade seja vista como algo positivo, bonito e não como algo feio, sujo, vulgar. Precisamos urgentemente modificar este pensamento repressor”, afirma Ricardo.
O papel da psicologia e do estado quando o assunto é sexualidade
Para auxiliar os professores a psicologia está cada vez mais presente na educação. Os psicólogos são peças chave para auxiliar os professores e os pais a falar sobre sexualidade com alunos e filhos. A psicóloga e doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano, Ana Benevides, explica a necessidade de realizar primeiramente um trabalho junto com o corpo docente e depois com os alunos. “De modo geral, deve-se observar e refletir junto ao corpo docente, a concepção que estes têm sobre sexualidade, bem como, dificuldades e preconceitos que apresentem em abordar o tema. Seguramente estes vão lidar com maior ou menor desenvoltura nos contatos com os alunos, de acordo com sua forma de pensar. Assim sendo, o ideal é primeiramente
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realizar um trabalho junto aos professores, para depois abarcar os pais e alunos”. Paulo Porto defende que os professores precisam tratar do assunto em sala e também destaca que para o docente não é algo fácil. “O professor faz parte desse mundo. Ele é um ser histórico e por isso carrega os mesmo preconceitos. Então, é necessário primeiro formar o professor, pois a maioria deles não consegue lidar de maneira mais emancipada, mais humanizada. Muitos têm resistência. Sendo assim, o primeiro passo é a formação dos professores, para que eles possam ter condições de trabalhar esse debate sem a utilização de senso comum. O estado tem papel fundamental nessa formação
e deve participar ativamente, dando aparatos aos professores. No entanto, um discurso que há tempos tínhamos conseguido está vindo por terra devido a uma bancada extremamente conservadora”. Ana Benevides destaca que a dificuldade de deixar de lado o senso comum está pautada em diversos fatores: “Penso que a dificuldade envolve vários aspectos, por vezes bastante complexos. No tocante à religião, para alguns pode vir a colocar em xeque concepções fortemente arraigadas, o que causa muito sofrimento, levando muitos a nem sequer se permitirem abordar o assunto. Fatores socioculturais, apesar de importantes, geralmente são menos determinantes do que os familiares”, declara Ana.
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E quando a sexualidade chega às diferenças afetivas?
O professor Ricardo complementa que “quando o assunto sai da temática homem e mulher, os problemas se intensificam ainda mais. Muitos professores se recusam a falar sobre homossexualidade ou transsexualidade em sala. Alguns por não saberem, outros por preconceitos ou até mesmo por medo dos pais conservadores”. Ele complementa que “o professor pode até não aceitar, não gostar de ver dois homens ou duas mulheres juntas, mas ele precisa respeitar. Precisa ensinar
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que acima de tudo precisamos respeitar a orientação sexual de cada um. Um professor que compartilha de suas crenças e tabus só está fazendo um desserviço à educação”, explica Ricardo.
Sexualidade: além da disciplina de biologia Quem disse que apenas os professores de ciências e biologia devem falar desse assunto? A sexualidade vai além do simples conhecer biológico, atuando em áreas da esfera social e cultural. “Não acredito que
abordar esse tema apenas pelo professor de biologia, por exemplo, seja o início de uma discussão sobre o assunto. Na verdade, precisamos ir além do biológico. Sabemos que nascemos machos e fêmeas (biológico) para nos tornarmos homens e mulheres (social, cultural). Não podemos apenas nos limitar as dimensões biológicas, uma vez que hoje, por exemplo, temos os transexuais que nascem com um corpo biológico, mas não se sentem pertencentes a ele, passando por procedimentos cirúrgicos. É preciso ir além da biologia. Os professores ainda precisam de muita formação à
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respeito do assunto. Sem conhecimento, o senso comum ainda será dominante”, alerta Ricardo. O professor e vereador Paulo Porto destaca a importância de todos os professores abordarem o assunto sexualidade em sala de aula: “Em primeiro lugar é necessário que os professores saibam lidar com as suas próprias opiniões. É importante que todos abordem isso e não apenas em uma matéria ou outra”, afirma Paulo.
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aNUNC
QUINZE
CIO
DEZESSEIS
Homo Alteridade
Ébano e Marfim Reconhecer as desigualdades raciais e combatê-las para lutar contra o racismo
Renan Bini
Ébano e Marfim vivem juntos em perfeita harmonia, lado a lado no teclado do meu piano. Oh Senhor, por que nós não vivemos? Nós todos sabemos que as pessoas são iguais onde quer que seja e que há bondade e maldade em todos! Nós aprendemos a viver, aprendemos a dar um ao outro o que precisamos para sobrevivermos, juntos, vivos... A música de Paul McCartney, originalmente intitulada Ebony and ivory, em inglês, traduz a questão da discussão racial. Por que ainda discutimos a questão racial no Brasil? Por que
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ainda há divergências tão evidentes referente à qualidade de vida de negros e brancos? 127 anos depois de a Lei Áurea ser sancionada, a população negra brasileira enfrenta um abismo de desigualdades. De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a população negra é a mais vulnerável à pobreza: sete em cada dez residências que recebem Bolsa Família são chefiadas por negros, além disso, a taxa de analfabetismo é duas vezes maior entre os negros e, em média, possuem rendimento salarial 40% menor do que dos brancos. Segundo a doutora em Psicologia e professora universitária, Ana
Luiza Julio, “sem sombra de dúvidas há racismo no Brasil e ele é do pior tipo, ainda que não haja o melhor tipo, mas digo pior tipo, porque ele é, em geral, dissimulado, dificultando desta forma, que se possa reagir com maior vigor, para combatê-lo. Dissimulado, ele nos quer faz crer que não existe. Supõe que o(a) negro(a) seja paranóide, que tem complexo de perseguição. Dissimulado, ele inverte o sentido e faz com que os(as) negros(as) sejam os responsáveis pelo racismo”, afirma. Nesse sentido, considerando que os preconceitos são culturais e que a escola é um importante instrumento de formação crítica e de desconstrução de preconceitos por
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sabem que o Brasil é um dos países mais racistas apesar de sua variedade de tons de pele. Em prosa, meu tom de pele é brasileiro, não tenho uma cor, tenho uma cultura, creio que seja bom ressaltar essa parte”, afirma. Sobre a formação de professores e a preparação em relação à temática, a doutora Ana Luiza analisa: “A formação é nula, ou quase nula. Dever-se-ia estudar, promover palestras, discussões. Esta é uma temática muito importante, que os professores fazem vistas grossas, e fingem não haver a demanda. Fingem ter coisas mais importantes a serem conhecidas e trabalhadas. É um equívoco. A nação brasileira é diversa e precisa encarar isto de frente. Precisa aprender a conhecer e lidar melhor com o outro”, comenta. De acordo com ela, as universidades precisam entender a importância do combate ao racismo e se comprometerem com esta política, que implica na inclusão social dos(as) negros(as), na valorização da identidade negra e de que, sobretudo universidade vem de universal: “como é possível um grupo se sobrepor sobre outro e considerar-se hegemônico? E qual é o lugar do universal? Quem define o que é mais importante?”, indaga. que os alunos conheçam os aspectos socioculturais e históricos das origens da miscigenação brasileira, entre elas, as afro-brasileiras, como também, que compreendam a importância do desenvolvimento igualitário, entre as raças. A Lei 10.639 regulamenta o ensino e o debate da história e da cultura afro-brasileira e africana nas escolas, no entanto, a maioria dos cursos de licenciatura não preparam suficientemente os professores para lidar com a questão. A professora de matemática Andressa de Lima relata que nunca houve nenhuma discussão relacionada ao assunto durante a graduação: “Se tivermos que lidar com isto na escola, nós mesmos te-
remos que ir em busca de alternativas para lidar com o racismo. A cultura afro-brasileira é importante porque faz parte das nossas origens. Acredito que deveriam haver palestras e cursos com reflexões e orientações a respeito”, relata. Infelizmente, a ausência do debate em cursos de nível superior não ocorre apenas na área de Exatas. O professor Johnatan Silva, formado em Artes e Música também lamenta a falta da discussão em sua área de conhecimento. “Não devemos julgar os negros por serem negros e muito menos laurear o branco pelo mesmo motivo, porém, todos
Escravidão
O Brasil, enquanto nação, está intrinsecamente ligado ao continente africano pela história e pela cultura. Há 200 milhões de anos, o litoral brasileiro e a costa oeste africana estavam ligados em um só continente. Há cinco séculos, com os territórios já nas posições atuais, milhares de negros atravessaram o oceano que os separa e assumiram obrigatoriamente a função de construir o país. Do século XVI ao século XIX, o tráfico negreiro e a escravidão foram responsáveis pela economia brasileira, definindo o presente do país.
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Homo Alteridade
Questionada sobre o histórico brasileiro a respeito da exploração dos negros por meio da escravidão e, o porquê de ainda haver entre os brasileiros uma cultura de desvalorização dos negros, a doutora Ana Luiza explica que há um mecanismo psicológico que tende a ser bastante utilizado pelos que sofrem e precisam conviver com seus agressores, chamado “identificação com o agressor: Nele, o agredido tende a identificar-se com aquele que lhe agride. E isto acontece quando a pessoa não suporta mais viver junto aos que lhe oprimem. Identifica, não por covardia, mas por falta de esperança de que a igualdade um dia voltará a ter valor humano. Ao identificar-se, o preconceito de cor e o racismo ficam esvaziados, quase nulos. Isto faz com que, pelo menos aparentemente, superficialmente, o negro deixe de sentir os malefícios que vivenciam na própria pele. Desvalorizar uma pessoa apenas pelo seu pertencimento racial é uma manifestação da pequenez humana, afirma.
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Se tivermos que lidar com isto na escola, nós mesmos teremos que ir em busca de alternativas para lidar com o racismo, Andressa de Lima.
Sala de aula
Reconhecer as desigualdades raciais e combatê-las, seja ideologicamente por meio de reflexões em sala de aula, seja por meio de programas de inclusão, é lutar contra o racismo. Apesar de a lei 10.639 valer
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Homo Alteridade
a mais de dez anos, ainda são poucas as escolas em que o ensino da cultura afro-brasileira é incorporado no cotidiano escolar. O professor Johnatan Silva acredita que, por se tratar de crianças, não é possível evitar que o racismo se manifeste, porém, é possível, a partir da interação, amenizar o preconceito, ou até mesmo desconstruí-lo: “Em sala de aula nós costumamos interagir socialmente com todos para que não haja superioridade em classe. Sobre isso, acho importante ressaltar que eu trato a beleza negra, branca e aborígene como iguais. Tenho alunos de todas as cores e não deixo isso afetar a convivência entre eles”. O professor declara ainda, considerar de extrema importância abordar a história e a cultura africana em suas aulas. “Temos negros que não sabem a origem do Brasil, que não conhecem a história da escravidão e como foi abolida”, afirma. De acordo com a doutora Ana Luiza, que trabalha com nível superior e, atualmente com formação de professores, em seu campo é muito tranquilo. “A maior parte dos adultos que buscam esta profissão está aberta para lidar com a realidade circundante e reconhece a diversidade humana. Aqueles que não conhecem, mas querem ser professores, estão querendo conhecer, querendo se preparar. Esse povo das licenciaturas é diferente. É gente que gosta de gente”, declara. Sobre o cotidiano escolar das séries iniciais ao ensino médio, ela relata: “A sala de aula de ensino básico e médio, não conheço em suas peculiaridades, por que nunca trabalhei com estes níveis de ensino, mas sei que as crianças e os jovens são o reflexo da sociedade em que vivem; e das famílias. Então se suas famílias são racistas, as crianças serão também e vão apontar isto na sala de aula quando tiverem que conviver com as diferenças raciais. Mas também há muitos professores racistas e a manifestação disto é o resultado que se vê em sala, quando coincide que os negros tenham sempre piores
resultados que os outros alunos não negros”, ressalta. Considerando a importância do desenvolvimento de um currículo escolar de base “afrocentrado”, como define o professor doutor em Filosofia pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Renato Nogueira dos Santos Júnior, uma forma de incluir discussões filosófico-culturais em relação à cultura africana em sala de aula, é abordando a noção de tempo. De acordo com a pesquisa publicada na revista África e Africanidades pelo professor, enquanto as sociedades ocidentais modernas valorizam o tempo a partir do futuro, procurando o progresso e a construção de um futuro sempre melhor do que o presente e percebem o passado como um lugar menos avançado, para a visão africana, o passado, por meio da ancestralidade, oferece as respostas para o presente. Assim, a dica é que a partir de conceitos da filosofia africana, ao abordar a história afro-brasileira, os alunos passem não a devotar um passado idealizado, muito menos uma África mítica, mas sim, que compreendam a importância de aprender com as gerações mais antigas que o presente só é possível pelo passado que o antecede.
Cotas
Para a doutora Ana Luiza, as cotas são importantes e necessárias. Elas tiram os negros de um lugar de pouca expectativa de vida e os lança na Universidade para lhes fazer crescer cultural e economicamente. Tira-os da marginalidade e lhes propõe crescimento, por meio da graduação e da experiência nos bancos universitários: “É um movimento contrário ao da sociedade excludente. Nas cotas, discrimina-se positivamente justamente aquele grupo que esteve socialmente discriminado. É uma alavanca, talvez a principal. É uma alavanca necessária e, a partir dela, muitos negros(as) transformam sua condição de periférico, para um sujeito com lugar social”, afirma.
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VINTE E UM
VINTE E DOIS
Ponto Final
Como torná-la mais interessante? Motivo de “trauma” para muitos, se desenvolvida de forma a associar os conhecimentos teóricos ao cotidiano, a matemática poderá se tornar a melhor amiga dos alunos! Renan Bini
Ensinar matemática não é tarefa fácil. E fazer com que os alunos se apaixonem pelos números pode ser ainda mais difícil. Pesadelo para muitos que concluem os ensinos fundamental e médio, a simples ausência da disciplina no currículo de alguns cursos do ensino superior pode se tornar o motivo de escolha da profissão.
Outro fator importante em indivíduos que, apesar de terem o tipo de inteligência que o associa a uma determinada área, optarem por outras áreas é que ainda não foram
suficientemente motivados no desenvolvimento de suas próprias habilidades”, afirma. Já para a doutora em Educação, bacharel em Matemática e professora da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Ana Maria Petraitis Liblik, o motivo do problema é outro: “Maus professores, pois o curso que os formou não foi capaz de fazer bem e melhor”, declara. Pensando nesse aspecto e, considerando ambas as possibilidades de porque tantos olhares antipáticos à disciplina, resolvemos procurar quem é fera na área para ver o que eles acham.
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Mas, se o problema fosse com a nossa amiga matemática, ninguém se interessaria pela área de exatas, certo? De acordo com o professor doutor em Matemática Aplicada pela USP (Universidade de São Paulo), Juan Carlos Zavaleta Aguilar,
o problema do “trauma” de uma determinada área, não necessariamente a matemática, pode ser explicado por diferentes fatores, entre eles: “o tipo de inteligência que o indivíduo possui, por exemplo, os que têm inteligência lógica e espacial, terão mais afinidade com as áreas de exatas. Já os indivíduos que possuem inteligência linguística, interpessoal, etc., terão mais afinidade com áreas de letras e comunicação.
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matemática vai ser eternizada como a pior das matérias”, declara. A visão da medalhista tem tudo a ver com o que explica a professora Liblik.
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Segundo ela, ser criativo é ser capaz de ver, olhar por um outro viés o objeto a ser estudado: “Se a Matemática pode ser considerada como uma ciência de padrões, encontrar padrões nos objetos é, com certeza, tornar-se criativo”, afirma. Para o professor Aguilar, o papel do professor de matemática é ensinar a disciplina de forma que motive o estudo: “Por “É muito mais fácil aprender algo exemplo, o A me- fazendo você mesmo sem usar o p r o f e s s o r dalhista Milena tem que ter acredita que a velho ‘ctrl+c ctrl+v’. Caso contrário, uma sólida solução para a matemática vai ser eternizada f o r m a ç ã o tornar as aulas transmicomo a pior das matérias”, Milena para de matemática tir a natureza mais agradáveis Cardoso, 14 anos, medalhista da abstrata dos está na criatemas, bem OBMEP. tividade: “Os como a improfessores se portância concentram tanto em repassar seus desses conhecimentos na ciência conhecimentos para os alunos, que e na tecnologia. O aluno deve ter deixam a criatividade totalmente de consciência da importância da malado, tornando tudo odioso, chato e, temática, sem que isso implique neaparentemente difícil de aprender. cessariamente a escolha pelo aproPor isso, acho que as aulas deveriam fundamento de conhecimentos nessa ser mais criativas. Os alunos deve- área ou áreas afins. Isso, mostrando a riam poder usar mais a imaginação. importância da mesma em quase toAs aulas práticas, com experimentos das as áreas do conhecimento, desde para demonstrar as regras de cada celulares, computadores, previsões assunto deveriam ser muito mais fre- do tempo, bolsa de valores, até comquentes. É muito mais fácil aprender portamento social, psicologia experialgo fazendo você mesmo sem usar o mental, etc”, resume. velho ‘ctrl+c/ctrl+v’. Caso contrário, a
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A aluna do 9º ano do ensino fundamental, também em escola pública e medalhista da OBMEP, Milena Cardoso, 14 anos, relata sua experiência: “Eu, particularmente, odiava a matéria desde as séries iniciais. Apenas no sétimo ano, quando comecei a estudar com quem é meu professor até hoje, que passei a gostar de matemática. Acho que o porquê de muitas pessoas irem mal até chegar ao ponto de odiar a matéria, é o fato de que, desde o início da vida, cria-se o mito de que a matemática é horrível e um ‘bicho de sete cabeças’. Além disso, alguns professores dão aula de forma extremamente apática. Alguns profissionais apenas passam a matéria cheia de regras e nada de divertido. Muitos alunos se sentem aprisionados àquilo como se fossem obrigados a aprender algo que odeiam”, afirma. Viu só? Se até quem é fera nos números às vezes se assusta, imagine
como é para aqueles que, como disse o professor Aguilar, possuem outros tipos de inteligência e afinidades? De acordo com a professora Liblik, o papel dos professores de matemática é fazer com que seus alunos entendam que, o que aprendem na escola serve para a vida: “Se a função da escola é apresentar e socializar o saber construído pela humanidade durante a história, o professor deve explicar isto utilizando a própria história da comunidade onde vive/trabalha. Os cursos de licenciatura em Matemática (e na maioria das licenciaturas) não preparam os futuros professores adequadamente. É um círculo vicioso, mal preparados, maus professores, infelizmente”, afirma.
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Aluno do 1º ano do ensino médio em escola pública, Pedro Emerick, 15 anos, foi ouro na OBMEP 2014 (Olimpíada Brasileira de Matemática das escolas públicas) e nos conta um pouco do que acha de suas aulas de matemática: “Minhas aulas de matemática são baseadas em repetição de exercícios de aplicar fórmulas, sem uso nenhum de criatividade. Acho que o motivo das pessoas detestarem matemática está principalmente na maneira como ela é ensinada. Te dão fórmulas para decorar sem dizer porque elas são válidas. Desde pequenos também aprendemos que matemática é difícil, assim os alunos têm mais medo do que de fato dificuldade”, afirma.
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Ponto Final/Crônica
Elas se amam!! Kássia Beltrame
Sabe, às vezes me sinto desprezada por alguns colegas meus, principalmente aquela que diz ser a exata em tudo , pra ela ou é 8 ou é 80. Chego a chorar por dentro quando ela faz isso comigo, chego a achar que nunca daremos certo e isso me deixa entristecida, pois amo-a, há anos. Sei de toda a sua história, ela nasceu antes de Cristo, por volta de 2400 a.C. Ela ajudou a muitos, principalmente em a resolver os problemas de contagem. Depois do seu surgimento, quem a dominava não era mais passado para trás. Sei também que os “Elementos” do grego Euclides (séc IV a.C) foram um dos primeiros que me apresentaram a ela, e isso, de forma sistêmica. Eu sempre a ajudo, sempre estou perto dela complementando-a, mas ela não me vê, não está nem aí pra mim. Mas existem culpados para isso, você sabia? E esse culpado é você. Sim, você. Aposto que gosta mais de mim do que dela. Estou certa? E aposto que quem virou essa página sem me ver, gosta mais dela do que de mim. Como estou presente em tudo, independente do local, aqui no Brasil eu sempre escuto dizerem nos bancos acadêmicos “já fiz direito para não precisar ver contas e tenho que aprender isso”. Cada vez que me
falam isso, mais longe estarei do meu amor. Às vezes acontece o contrário também, e eu sei, pois estou em todos os lugares, até mesmo em sonhos eu apareço e eu sei que os apaixonados pela Exata, me odeiam, odeiam minhas regras gramaticais, meus gêneros literários, meus desdobramentos, os verbos que me compõem e a subjetividade que me constitui. Mesmo assim, mesmo a todo tempo ocorrendo esse desprezo por partes dos meus fãs e dos dela eu não irei desistir do meu amor. Eu irei provar um dia que ela sem mim não é nada e eu sem ela não sou nada, afinal ela me usa e abusa na sua álgebra. Vou mostrar a vocês a maneira que ela me usa - Ya ) 6= a (a) a. A e isso me deixa tão feliz, mas sei que os adeptos dela me odeiam, e falam “pra que essas letras aí?” “essas letras só servem para confundir”. Alguns me defendem, os professores, por isso digo, os professores são uns amores. Mas mesmo assim, eu, Língua Portuguesa, resultado da transformação do latim vulgar e do galego, vinda do outro lado do atlântico até as terras brasileiras. Aqui, sofri diversas transformações, perdi o sotaque de Portugal devido às várias influências, como as dos indígenas e dos africanos. Eu não irei desistir do meu amor, da minha amada matemática, aquela por qual me apaixonei desde a primeira vez que estive junto a um rascunho de papel. Amo-te
Ass: Língua Portuguesa.
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VINTE E SEIS
Enem
Jhonathan D’witt
Como será o futuro? A prova do Enem está movimentando as aulas de um colégio estadual do oeste do Paraná
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“Muita coisa a gente não lembrava e a prova serviu para mostrar o que vai cair. Nós vamos ter vantagens sobre os outros candidatos que não tem esse tipo de preparação, porque já sabemos mais ou menos o que vai cair”, Luíz Henrique.
Ano após ano ele chega e junto com ele esperanças de um futuro para milhões de jovens em todo o Brasil, pois abre as portas das universidades para esses estudantes e permite que façam o curso que sempre sonharam. No entanto diversos alunos e professores concordam que esse ano a prova foi muito caprichada. “O Enem de 2015 foi o mais difícil de todos os anos”, diz a professora Marcia Nunes. Para tamanho desafio os professores do Colégio Estadual Duque de Caxias incluem em suas avaliações questões de vestibulares públicos e do Enem em todos os anos do ensino médio e um simulado específico sobre a prova ao terceiro ano. “Geralmente nós professores nos organizamos para aplicar essas provas com o apoio da direção e da equipe pedagógica,” completa Whesley Fagliari que é professor de filosofia e sociologia do colégio. O estudante Luiz Henrique Pinto fez a prova preparatória no colégio e acredita que foi fundamental para esclarecer as dúvidas dos alunos. “Muita coisa a gente não lembrava e a prova serviu para mostrar o que vai cair. Nós vamos ter vantagens sobre os outros candidatos que não tem esse tipo de preparação, porque já sabemos mais ou menos o que vai cair”, explica.
Ano após ano ele chega e junto com ele esperanças de um futuro para milhões de jovens em todo o Brasil, pois abre as portas das universidades para esses estudantes e permite que façam o curso que sempre sonharam. No entanto diversos alunos e professores concordam que esse ano a prova foi muito caprichada. “O Enem de 2015 foi o mais difícil de todos os anos”, diz a professora Marcia Nunes. Para tamanho desafio os professores do Colégio Estadual Duque de Caxias incluem em suas avaliações questões de vestibulares públicos e do Enem em todos os anos do ensino médio e um simulado específico sobre a prova ao terceiro ano. “Geralmente nós professores nos organizamos para aplicar essas provas com o apoio da direção e da equipe pedagógica.” Completa Whesley Fagliari que é professor de filosofia e sociologia do colégio. O estudante Luiz Henrique Pinto fez a prova preparatória no colégio e acredita que foi fundamental para esclarecer as dúvidas dos alunos. “Muita coisa a gente não lembrava e a prova serviu para mostrar o que vai cair. Nós vamos ter vantagens sobre os outros candidatos que não tem esse tipo de preparação, porque já sabemos mais ou menos o que vai cair”, explica. Layne Dupont que também é aluna do colégio buscou também outra forma de preparação. “Eu fiz os simulados no colégio, mas procurei ver as provas do Enem que foram aplicadas nos anos anteriores, porque nas aulas de matemática, português e filosofia temos ajuda, mas precisamos saber mais para chegar na hora e ter uma base do que aprendemos”, acrescenta. Faz mais de 5 anos que juntamente com a direção o colégio aplica esses simulados preparatórios para os alunos. A idéia é que os alunos tenham referenciais para pautar suas escolhas de forma mais condizente com a sua realidade. “Temos muito ainda a conquistar como escola pública, em termos gerais, mas estou confiante”, diz o professor de filosofia.
E DEPOIS DA PROVA?
Depois de dois dias cansativos que testaram a capacidade dos alunos por todo o país a prova do Enem ainda é assunto. Na mídia as principais notícias foram os atrasos dos alunos que não conseguiram entrar depois de os portões fechados, 743 alunos eliminados do Enem por cometer irregularidades, como por exemplo, divulgar a prova nas redes sociais, 529 mil alunos ficaram com nota zero na redação e também a surpresa do tema escolhido para essa redação. Aqui na região a opinião dos professores e alunos é bem singular e não muito diferente dos anos anteriores. Vejam:“Eu escolhi responder as questões de inglês no Enem e quando estava lá li as de espanhol e vi que estava muito mais fácil. Que arrependimento...”, diz Diego Cella. “Nós professores buscamos preparar os alunos para enfrentar o desafio da prova do Enem, cabe a ele se interessar e se esforçar para ir bem na prova”, Marcia Nunes. “Estou ansiosa para ver o meu resultado da prova. Prestei vestibular para o curso de agronomia e dependo da nota para conseguir uma bolsa ou um financiamento”, Layne Dupont. “Estamos pensando em ações para o próximo ano letivo. Fazer aulas sobre o Sisu, Enem, Prouni e Fies, para que os alunos compreendam as diferenças”, Whesley Fagliari.
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Cultura Cultura EDUQUE EDUQUE
Meteram poesia na bagunça do dia a dia Assaltaram a Gramática. Flavia Duarte
“A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte...”. Nisso os Titãs estavam certos. A sociedade quer além do básico para viver e é com este pensamento que se deve ressaltar a importância da música como disciplina curricular. “A arte dos sons instiga áreas do cérebro e desenvolve habilidades como a concentração, coordenação motora e socialização”, relata o professor de ensino médio e músico Raimundo Soares. Esta junção de melodia, harmonia e ritmo, conhecida na antiguidade por arte das musas é obrigatória no âmbito acadêmico com o objetivo
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de servir como um instrumento didático que além de expressar e trazer uma aula totalmente diferente das convencionais disciplinas, estimula a criatividade e promove paz de espírito. “É uma válvula de escape, pois proporciona liberdade, além de disciplina, paciência e sensibilidade”, defende a psicóloga Joice.
isso na rotina dos acadêmicos contribui para o aprendizado, porém há aqueles que acreditam que deveria ser ensinado um pouco além do básico. “Seria melhor e mais eficiente se o professor ensinasse também a tocar instrumentos, pois seria um diferencial”, relata o estudante de Direito, Marcos Rodrigues.
A música é uma linguagem e um deleite que entorpece a alma, agrada os ouvidos e contribui para o desenvolvimento do ser humano como indivíduo e também como sociedade. É exatamente esta poesia que ajuda a resolver ou acalmar todas as bagunças do dia a dia. Inserir
A ideia tem o lado bom, o outro é o fato de que por mais que seja obrigatório desde 2011, o sistema é falho e não acontece em todas as instituições como deveria, afinal, por mais que tenha metido poesia onde devia, ainda há bagunça no dia a dia. Schwab.
Cultura EDUQUE
COMO SURGIU? A música surgiu quando o homem começou a bater um objeto no outro produzindo som. Suas funções foram muitas como por exemplo louvar os deuses, lutar, conquistar etc. foi na Grécia que se tornou o que conhecemos hoje, mas foi o italiano Guido D’Arezzo quem colocou os nomes das notas musicais.
A LEI O art. 26 da Lei de Diretrizes e Bases na Educação Nacional nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescido do seguinte § 6o A música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular de que trata o § 2º deste artigo.”
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VINTE E NOVE
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Religião ou não? Eis a questão Abordar o ensino religioso nas escolas públicas ainda é uma incógnita Flávia Duarte
FOTO: DIVULGAÇÃO
Cultura EDUQUE
“Imagine, junto com John Lennon, um mundo sem religião. Imagine o mundo sem ataques suicidas, sem o 11/9, sem o 7/7 londrino, sem as Cruzadas, sem caça às bruxas, sem a Conspiração da Pólvora, sem a partição da Índia, sem as guerras entre israelenses e palestinos, sem massacres sérvios/croatas/muçulmanos, sem a perseguição de judeus como “assassinos de Cristo”, sem os “problemas” da Irlanda do Norte, sem “assassinatos em nome da honra”, sem evangélicos televisivos de terno brilhante e cabelo bufante tirando dinheiro dos ingênuos (“Deus quer que você doe até doer”). Imagine o mundo sem o Talibã para explodir estátuas antigas, sem decapitações públicas de blasfemos, sem o açoite da pele feminina pelo crime de ter se mostrado em um centímetro.” Deus, um delírio de Richard Dawkins. Mas só imagine mesmo, porque por mais que o Estado se diga na
teoria laico, não é o que acontece na prática. Um exemplo é a instituição do ensino religioso nas escolas públicas. Ainda que seja facultativo, não é democrático. “Dizem que é optativo, mas está incluso nos horários das aulas, como qualquer outra disciplina, o que acaba por tornar ‘obrigatório’, pois os alunos também pensam na questão de aceitação social e não querem ser diferentes”, alega o estudante de Psicologia, Yhago Muniz. Há ênfase na religião católica. “Há o monopólio de uma religião, que impõe seus ‘ensinamentos’ aos alunos, como se fosse um culto dentro da escola, que não é um local para isso”, alega o estudante de Jornalismo, Leonardo Farias. E vai de encontro ao artigo 19 da Constituição, que estabelece o seguinte: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios: estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embarcar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou com seus representantes
relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”. A sala de aula não é espaço para catecismos, mas é possível permitir aos alunos tomar conhecimento de que existem muitas religiões distintas. “O ensino religioso deve ser abordado e desenvolvido de uma forma bem imparcial, visando seu desenvolvimento em sala uma visão voltada a antropologia, histórica, sociológica e filosófica, levando assim o aluno a ter conhecimento do assunto em questão com um olhar crítico e inovador, não apresentando defeitos e ou qualidades de religiões em si, mas levando o aluno a um ponto de vista histórico e imparcial da função e desenvolvimento ao longo dos tempos da religião na história da sociedade e do homem, que o foco do ensino seja revelação e aprendizado e não conversão,” Defende o historiador Alexandre Couto.
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TRINTA E TRÊS
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A escolha de poucos
Ser profissional da área da educação não é um atrativo para muitos, mas há aqueles se orgulham da profissão Flávia Duarte
Pelas pacatas ruas de Cascavel, há muitas histórias, esta em questão é de uma profissional da área de educação que leciona há 38 anos. A professora e catequista de Cascavel, Judith Francisca dos Santos Rodrigues, conta um pouco de sua trajetória e conquistas. “Comecei na área da educação aos 17 anos, em escola rural com sala multisseriada, na qual alunos de idades e níveis educacionais diferentes são instruídos por um professor”. Como não tinha faculdade em São Miguel do Iguaçu ela resolveu ir para um convento no Rio de Janeiro, a fim de cursar Letras, “Porém, atuei na educação infantil, pois o carisma da congregação era a educação de crianças e jovens da classe média a alta.” Depois de oito anos a professora retornou à sua cidade, mas havia um problema: “Não pude atuar em sala de aula, pois os tempos mudaram e era necessário ter magistério. Então continuei na área como secretária e outras funções”, Alguns anos mais tarde, Judith cursou Pedagogia podendo assim, retornar à verdadeira vocação.
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Quais foram suas conquistas? Diria que a minha maior conquista foi o momento da minha colação de grau. Senti-me autorizada a continuar compartilhando o conhecimento de maneira formal e autêntica.
Que momentos de sua vida como educadora destacaria? O momento da minha colação de grau. Foi um marco que dividiu minha trajetória como educadora, embora me sinta uma professora nata.
Os alunos estão menos comprometidos? Talvez não seja esta palavra, hoje estão imbuídos num mundo totalmente cibernético e o sistema educacional não acompanhou esta evolução.
A figura do professor perdeu reconhecimento e respeito por parte dos alunos nesses últimos anos?
O professor era mais valori zado antigamente?
Monetariamente, o professor sempre foi desvalorizado neste país, mas moralmente, quando iniciei nos anos 70, éramos tratados como autoridade, diferente de todo o desrespeito vistoatualmente, talvez não pelos contratantes, mas pela comunidade em geral. Penso que ainda hoje temos ótimos professores, porém é outra realidade.
Houve mudança na cultura das famílias e portanto da sociedade brasileira em geral, não diria que perderam o respeito, existem casos esporádicos, penso eu.
Muitas escolas tem a preocupação de preparar seus alunos apenas para passar no Enem ou no vestibular. Qual sua opinião sobre isso?
Infelizmente, a escola ainda é muita classificatória, e isto retrata a realidade da sociedade nos dias atuais. Órgãos competentes constroem mecanismos de inclusão social, tais como as “cotas”, mas mesmo assim, a competição existe e é excludente.
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Quais devem ser as prioridades na Educação? Investimento,adequação, inovação, formação continuada dos professores e profissionais da educação e valorização salarial dessa classe trabalhadora que tanto contribui para o progresso da nação brasileira. Pois o professor é a base de todas as outras profissões.
E pela escola, o que deve ser priorizado? Bem, se for em relação ao espaço físico da escola, diria que este país está penalizando não só os alunos mas todo o povo. As estruturas, na maioria, são péssimas.
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UMA MULHER COMUM Professora da rede pública de ensino se torna campeã na quadra e na vida Jhonathan Dwitt
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um investimento de base e infelizmente as nossas políticas públicas não dão subsídio. É muito cansativo lutar para manter os atletas no treino e ainda mais hoje com a tecnologia. Hoje temos incentivo como a bolsa atleta para buscar algum resultado, pois o treinador como o atleta sem resultado é frustrado. Hoje não penso em ser treinadora. Já recebi um convite de uma equipe de para-atletas, mas não sei se é o momento certo.
O meu nome é Cristiane Küger, tenho 36 anos, sou mãe de duas filhas, tenho 14 anos de professora de educação física formada nessa área sou deficiente física e sou uma pessoa normal como qualquer outra.
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Eu sempre fui jogadora de voleibol. Era a minha segunda casa. Minha mãe dizia que ia colocar uma cama no ginásio pra mim. Mesmo depois de ter perdido a perna sempre gostei de jogar e ensinar a jogar. A minha vontade era ser treinadora. Nunca imaginei que eu iria dar aulas dentro de uma sala de aula, dentro de uma quadra de colégio, porque eu não me achava capacitada. Para mim o professor é aquele que ensina a todos os demais profissionais desde a conviver em sociedade até a desempenhar as funções no meio em que atuam profissionalmente. O fato de eu entrar na sala de aula se deu depois do câncer como uma segunda opção, pois trabalhar como treinadora ou em academias seria muito complicado. Já pensei em desistir, pois para ser treinadora hoje em dia precisa ter
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Me apaixonei por dar aulas. A minha primeira aula foi para uma turma de terceiro ano do ensino médio e eu estava apavorada, porque eles eram muito grandes e pensei sozinha: - O que eu estou fazendo aqui? Mas depois me acostumei. Hoje não estou mais em sala, sou readaptada. As maiores dores foram ter perdido a perna, o falecimento do meu esposo e ter que parar de dar aulas por falta de condições. A rotina era muito desgastante. Eu com uma perna apenas, ter que subir e descer escadas para pegar material, buscar os alunos, da quadra pra sala, da sala pra quadra e estava sofrendo muito com o meu joelho, a coluna e sobrecarregada. Atuo na educação, na área de readaptação, mas não na área que eu tenho paixão que é educação física. Deus me fez pra isso, pra atuar na educação física, mas infelizmente eu não posso.
Eu tive câncer que foi causado por uma distensão muscular jogando vôlei e dessa distensão gerou o câncer com 14 anos. Eu fiz oito cirurgias e por último a amputação. Chegou num ponto que a quantia de músculos retirados e a situação da minha perna não permitiam que eu tivesse uma vida saudável, então fiz a amputação para ter mais qualidade de vida.
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Eu fiz o concurso público e passei. O papel do professor é de muita responsabilidade, porque você não ensina só com sua fala, mas também com o que você é. E se você for uma pessoa com valores invertidos, vai passar isso para os seus alunos também.
Os alunos não têm muito preconceito, eles têm mais curiosidade. Elesquerem tocar a prótese para ver como é feita. Eles perguntam: - A sua perna é de robô ou de pau? e eu sempre digo: - Não, Não, é de ferro mesmo! Eles sempre me respeitaram demais e eu nunca tive problemas com os meus alunos. Nunca tive sequer uma manifestação de preconceito por parte deles. Os adultos sim são preconceituosos. Às vezes as pessoas pensam que a gente age e reage da mesma maneira que uma pessoa que não tem uma limitação física. Já tive cobranças de colegas professores, de eu ter que ir buscar os alunos em sala, quando
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na verdade os alunos deveriam ser encaminhados até a quadra para que eu não precisasse ficar subindo as escadas o tempo todo. Eu carrego uma prótese de mais de 5 quilos. É a questão da inclusão. Quando parei de dar aulas nessa escola é que foram feitas as rampas de acesso. Até então eram escadarias. Falava-se muito em inclusão até que um dia em uma reunião pedagógica eu questionei: - Está realmente havendo inclusão? Por que não é o que eu estou vendo. Ou estamos fazendo de conta que existe inclusão para os deficientes?. Depois disso colocaram barras nas escadas, feitas as rampas, adaptação nos banheiros. Mas até quando precisará começar uma briga para garantir que todos os seres humanos com limitações ou não, possam usufruir dos seus direitos?
De modo geral, depois que as pessoas os conhecem vai julgar que o deficiente usa a deficiência como muleta para sobreviver. Mas eu visto a camisa. Sou deficiente física e não sou coitadinha. Eu não gosto que pensem que sou coitadinha, que tenham peninha de mim. Não sou digna de pena, pelo contrário. Esse rótulo não tenho, por que nunca permiti que me colocassem, mas infelizmente um grande número de deficientes, por estarem com a estima completamente abalada e desestruturada, permitem que sejam dignos de pena e que as pessoas acreditem que não possam fazer nada sozinhos, por isso que na sociedade ainda existe tanta discriminação.
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Como eu moro em uma cidade pequena, Corbélia, tive que treinar muito em Cascavel que é a equipe que eu jogo e me adaptar ao esporte também. Sempre fui jogadora ‘normal’ e de repente me apresentam um esporte adaptado que eu teria que jogar sentada numa cadeira de rodas. Eu nunca havia jogado assim. Não sabia
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nem o que era sentar numa cadeira de rodas. A gente não tem noção de como funciona, até viver o momento. Foi difícil aprender a andar sobre as rodas, aprender a cair, por que durante o jogo cai muito, aprender a lidar com as colegas de equipe que também são deficientes, pois muitas já são bem fragilizadas, e aprender a respeitá-las como atletas e como pessoas também. Foi um processo difícil aprender e ainda é, já que a gente começa a tentar superar os limites do próprio corpo também. Quando se é atleta todo mundo tem um objetivo igual que é a vitória. Não se pode simplesmente passar por cima dos outros, é preciso respeitar as diferenças e as semelhanças.
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A gente se chama de aleijada, por que é o que nós somos. Eu não tenho uma perna, outras não têm movimento das pernas. Apesar de parecer pejorativo, nós encaramos e aceitamos o que nós somos e esse clima de brincadeira é importante dentro de uma equipe. A gente se trata com igualdade e se respeita muito. Algo que eu tenho visto dentro do paradesporto hoje é o respeito aos limites do ser humano. Vejo pessoas com muita vontade de vencer e superar os limites impostos pelo dia a dia e pelos próprios limites. Ser um para-atleta é muito complicado. Eu ainda consigo caminhar, mas tenho colegas que são ca-
deirantes e tem que pegar lotação para ir treinar, andar em calçadas sem condições. Eles enfrentam barreiras muito maiores do que eu e são pessoas que tem muito a ensinar. Penso que todo mundo deveria ficar um dia com um cadeirante para saber quais as dificuldades dele e aprender a dar valor ao que tem.
sentirem-se mal com o olhar das pessoas ‘normais’.
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Eu fui viajar com dois colegas que são cadeirantes onde tínhamos que levar as duas cadeiras deles, mais duas cadeiras adaptadas para o jogo e mais as malas. Além de tudo isso, éramos só nós três em um ônibus. Ver a dificuldade e a humilhação de ter que se arrastar para entrar no ônibus porque a empresa não dá condição. Já imaginou você entrar num ônibus se arrastando? Se fosse eu na situação deles eu não faria. Eu ficaria em casa mesmo. Eu sei o preço que eu pago todos os dias. As pessoas perguntam: Cris, você se orgulha de quem você é? Eu respondo que eu me alegro com quem eu sou. E tem diferença. Orgulho não é bom se você não leva em conta as pessoas a sua volta. É difícil carregar uma prótese de cinco quilos. É difícil você andar na rua e a pessoa te julgar com um olhar. Hoje eu encaro isso normalmente sem brigar, mas muitas pessoas não saem na rua por
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Eu tenho duas filhas lindas. A primeira tem 14 anos, na época que eu tive a perna amputada ela tinha seis meses e ela foi de uma importância muito grande. Deus usou muito ela para me levantar, porque eu estava entrando em depressão. Não é fácil você perder uma coisa que você se acostumou a vida toda a ter. Eu me deparei com um momento em que eu era professora de educação física, formada e sem uma das pernas, tinha recém casado, com uma filha de seis meses. Depois que o meu marido faleceu, minhas duas filhas tornaram-se ainda mais as minhas fortalezas. Eu olho para elas e penso: ‘Vale a pena levantar, por elas vale a pena levantar’. Existem presentes que ganhamos e não gostamos e que com um olhar entregamos que não nos agradou, mas elas são daqueles presentes que ao receber enchemos os olhos de alegria.
A Professora Cristiane Küger foi campeã de handebol em cadeira de rodas pela equipe Apac Cascavel. O campeonato foi realizado em Céu Azul no dia 29 de agosto e contou com 20 equipes das cidades de Cascavel, Toledo, São Miguel do Iguaçu, Maringá e Cianorte.
Não gostaria de voltar atrás no momento em que eu tinha a minha perna. O melhor momento da minha vida que eu estou vivendo, é hoje. Não posso voltar atrás, mas eu posso fazer de hoje um bom dia para viver.
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Ponto,vírgula e exclamação
Por que eles vão mal na redação? Em entrevista pingue-pongue, a professora e doutora em Letras e Linguística, Alcione Tereza Corbari, fala sobre o porquê de tantos alunos terem dificuldades no desenvolvimento de uma das partes mais importantes nos processos seletivos para o ensino superior Renan Bini
De acordo com dados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2014, dentre as quase seis milhões de dissertações sobre publicidade infantil, temática da edição 2014, apenas 250 receberam 1000, a nota máxima da prova. Considerando o outro extremo, mais de 529 mil alunos tiraram nota zero e outros 654.971 ficaram abaixo dos 300 pontos. Considerando a importância da criticidade e da expressão por meio das palavras tanto na garantia do ingresso para o ensino superior quanto na postulação de melhores postos de trabalho, a equipe Eduque entrevistou a professora da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), Alcione Tereza Corbari. Ela defendeu sua tese de doutorado em 2013 na UFBA (Universidade Federal da Bahia), analisando os “elementos modalizadores como estratégia de negociação em textos opinativos produzidos por alunos do ensino médio”.
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Eduque: Por que os alunos, de uma forma geral, apresentam dificuldades para desenvolver a redação em vestibulares?
frágeis ou estereotipados, que são mal estruturados, confusos e incoerentes (tanto em relação à comanda quanto internamente ou em relação aos conhecimentos socialmente partilhados).
Alcione: De forma geral, nosso siste- Eduque: O mesmo grau de dima de ensino não consegue dar con-
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ta de preparar uma grande parte de nossos alunos para, após 11 (agora 12) anos de educação básica obrigatória, conseguir escrever um texto respondendo adequadamente à comanda e à situação de interação aí simulada. Os textos expressam várias dificuldades, que vão desde a falta de domínio de questões ortográficas e gramaticais (como concordância, regência e pontuação, por exemplo) até a dificuldade de o produtor se colocar como um sujeito que tem algo a comunicar a alguém, o que passa por questões como o domínio da temática abordada e a forma de organizar textualmente a interação naquela situação proposta. Os textos produzidos no vestibular têm apontado que, além das dificuldades relativas ao domínio da língua em sua modalidade escrita, são recorrentes as dificuldades de fazer inferências, decidir adequadamente sobre os conteúdos que precisam ser explicitados ou que devem ficar subentendidos, relacionar as diversas partes do texto de maneira coesa e coerente, usar estratégias argumentativas adequadas, calcular os conhecimentos compartilhados com os potenciais leitores (ainda que virtuais), enfim, de compreender as características linguísticas e pragmáticas do gênero requerido. No que tange à temática, têm mostrado pouco conhecimento (ou mesmo desconhecimento, em alguns casos) de temas socialmente relevantes e dificuldade em apresentar uma posição em relação a eles. Infelizmente, o que se vê de forma bastante recorrente são textos que apresentam, em menor ou maior grau, argumentos
ficuldade é percebido em relação à interpretação de questões mais complexas (questões do ENEM, por exemplo). Em sua opinião, quais são as possíveis causas da dificuldade? Alcione: A escrita é uma atividade complexa que envolve aspectos linguísticos, cognitivos e sociais. Entendo que esses testes requerem não apenas concentração, mas também conhecimentos de ordem linguística, social e interacional mais elaborados do que exigira uma interação oral ou, por exemplo, a escrita de um bilhete. São conhecimentos que se consolidam com a prática constante de leitura, escrita e reescrita. E são justamente esses conhecimentos (claro, somados a outros fatores), mais do que a concentração, que permitem que o candidato, primeiro, entenda a comanda e, depois, responda a ela adequadamente. Na escola pública (que é a enseada que eu conheço, quer como aluna, quer como docente), as causas desse problema estão diretamente ligadas a um fator que perpassa todas as disciplinas, e não atinge apenas a Língua Portuguesa: a qualidade da educação. Esta, por sua vez, depende de muitos fatores, que passam, claro, pela formação adequada do professor, pelo interesse e compromisso dos alunos e suas famílias, mas que estão muito imbricadas com as políticas de governo, que, infelizmente, não têm apresentado saldo positivo na área da educação,
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tanto no que tange aos investimentos em estrutura física e de recursos humanos quanto à valorização do profissional (29 de abril e seus desdobramentos estão aí para exemplificar). Ademais, há aspectos que fogem do domínio da escola, como a indisciplina, a falta de perspectivas do aluno, a falta de prática de leitura e escrita, entre outros, que são problemas estruturais que vão muito além dos limites do colégio.
Eduque: Você acredita que os alunos que concluem o ensino médio público possuem conhecimentos suficientes em língua portuguesa para inserirem-se no mercado de trabalho e/ou no ensino superior? Alcione: Não é raro ouvirmos de
professores universitários, de diferentes cursos/áreas, a reclamação de que os acadêmicos não têm as habilidades, no que tange à leitura e à escrita, esperadas de alunos de graduação, e que carregam dificuldades que deveriam ter sido superadas na escola básica. Em 2012, o Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF) concluiu que 38% dos universitários não dominavam habilidades básicas de leitura e escrita, sendo caracterizados como analfabetos funcionais. Esse quadro sugere que aqueles que não tiveram acesso ao ensino superior formariam um grupo em situação ainda mais delicada, se partirmos do pressuposto de que entram na universidade os egressos do ensino médio que estão mais bem preparados em termos de habilidades e conhecimentos trabalhados na escola básica. Os relatos de professores de ensino médio e pesquisas diversas endossam essa análise, os quais apontam que há um grande contingente de alunos que chega ao final do ensino
básico sem uma formação adequada que lhe permita transitar por diferentes situações de interação de forma confortável. Nesse sentido, pode-se dizer que muitos alunos terminam esse nível de ensino sem ter adquirido conhecimentos e habilidades suficientes para ingressar na universidade ou, tendo ingressado, para acompanhar de forma satisfatória os estudos da graduação. Essa mesma análise vale para a inserção no mercado de trabalho, especialmente em áreas que exigem leitores competentes e produtores de textos, escritos e orais, mais elaborados do que aqueles pertencentes aos gêneros primários.
Eduque: Como você avalia o nível de criticidade dos vestibulandos? Alcione: Não posso falar do ves-
tibulando de forma específica, pois não atuo em banca de correção de redações, nem tenho dados relativos ao desempenho médio dos vestibulandos em questões que requerem uma leitura crítica. Mas, de forma geral, as
dificuldades relacionadas por professores, quer do ensino básico, quer do ensino fundamental, apontam para problemas básicos de interpretação e para um baixo nível de criticidade, sendo recorrente a apresentação de argumentos frágeis ou estereotipados, bem como a dificuldade de fazer inferências e de relacionar fatos. Não podemos dizer que a leitura crítica depende única e exclusivamente de conhecimentos e habilidades ligados à modalidade escrita. Leitores plenos (conforme definição do INAF) podem não alcançar um nível elevado de leitura crítica, e leitores com baixo grau de letramento podem ser leitores críticos, como bem exemplifica Patativa do Assaré (ainda que o objeto de leitura não seja um texto verbal). Mas, num sentido mais estrito, o leitor crítico é aquele que tem condições de interagir com o texto, o que depende de uma adequada interpretação, de inferências e de conhecimentos que vão além do âmbito linguístico. Nesse sentido, considerando o quadro já descrito acima, entendo que, de uma forma geral, não conseguimos lograr êxito quanto ao objetivo de formar leitores críticos na escola básica,
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Ponto,vírgula e exclamação
pelo menos não no nível desejadoleitura não seja um texto verbal). Mas, num sentido mais estrito, o leitor crítico é aquele que tem condições de interagir com o texto, o que depende de uma adequada interpretação, de inferências e de conhecimentos que vão além do âmbito linguístico. Nesse sentido, considerando o quadro já descrito acima, entendo que, de uma forma geral, não conseguimos lograr êxito quanto ao objetivo de formar leitores críticos na escola básica, pelo menos não no nível desejado.
Eduque: Qual é a importância da formação de leitores críticos e quais os desafios aos professores para o desenvolvimento de cidadãos críticos? Alcione: A leitura crítica é imprescindível à formação do cidadão, pois a cida-
dania tem relação com a forma como o indivíduo se insere no mundo e se relaciona com as diferentes esferas da sociedade. A leitura crítica é imprescindível à consciência desse indivíduo em relação a si mesmo, ao outro e ao conjunto de que participa e para seu fortalecimento em espaços de participação social e política. Nosso desafio está em conseguir superar os índices de analfabetismo funcional e avançar no sentido da formação leitores competentes que consigam, mais do que decodificar um texto, interagir com ele, respondê-lo ativamente, que consigam perceber muito além da realidade editada pela mídia, por exemplo, que consigam superar discursos naturalizados; enfim, que consigam perceber o mundo ao seu redor e posicionar-se criticamente em relação a ele.
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QUARENTA E OITO
QUARENTA E NOVE
Diretoria
Identidade, gênero e cidadania O papel da escola é formar cidadãos críticos e romper com a intolerância e o preconceito
Renan Bini
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Diretoria
Entendendo a sala de aula cultural Pós-Moderno e pelo niilis- Considerando a questão de como um ambiente, fruto das mais di- mo, Torezan argumenta sobre os no- gênero, por exemplo, de acordo com versas discrepâncias sociais e cultu- vos parâmetros que regulamentam o historiador, doutor em educação e rais, e considerando a importância do a organização familiar e como eles professor da Unioeste (Universidade bom desenvolvimento subjetivo dos influenciam a formação identitária Estadual do Oeste do Paraná) e vealunos para o futuro, compreender dos adolescentes: “Cada vez mais reador da cidade de Cascavel, Paulo a fase de Humberto Porto transição Borges, a sociedada Pós-Mo- "A tolerância parece ser uma coisa muito legal, mas não é. Eu de está pautada em dernidade em tolero você. Então eu tolero homossexual, eu tolero a sua reli- expectativas e o porquê relação ao papel gião. Isso está significando de muitos social que cada inconflitos divíduo irá cumprir que eu não aceito e nem sociais mona sociedade a parrespeito. Nós estamos em um estágio tão dernos, a tir partir do do sexo biológico. rudimentar, que estamos ainda tentando chegar viés da psiAssim, debater a teà tolerância canálise, mática em sala de t o r n a - s e , Benilde Teresinha Depubel, professora do Colégio Presidente aula é uma forma fundameninclusive de garanCosta e Silva. tal aos protir os Direitos Huf i ss i o n a i s manos: “O papel da da educação. Abordando a temáti- autônoma em relação ao laço social, escola é romper toda intolerância e ca, o livro Sublimação, ato criativo e e atravessada pelo lema dos direitos preconceito. sujeito da psicanálise, desponta-se iguais, a família sofre uma espécie de como uma ótima opção para conhe- achatamento em suas relações e de Eu costumo falar que a escocer mais sobre o assunto. dissipação da autoridade parental. la é o local que o senso comum não Masculino e feminino já pode entrar. Tem que se debater as A partir das reflexões apre- não guardam as diferenças de ou- coisas de uma maneira mais cientísentadas na obra disponível na livra- trora, vivemos sob o imperativo de fica e mais humanizada. Eu entendo ria da UEL (Universidade Estadual de uma particular ética contemporânea que a raça humana tem diversas forLondrina), da doutora em psicologia e caracterizada por uma apologia do mas de manifestar sua sexualidade, e professora do curso de Psicologia do consumo em conjunto com efeitos a escola tem que deixar isso claro, de Instituto Filadélfia de Londrina, Zeila nefastos do enfraquecimento da lei forma a garantir que cada ser humaFacci Torezan, é possível refletir acer- na cultura, da suposta superação hu- no, cada integrante da raça humana ca dos índices de violência (simbóli- mana de todo e qualquer limite e da se exercite em sua sexualidade seja ca ou não), distribuídos por todas as anulação das diferenças”. ela qual for, e a escola não pode reclasses, frutos do isolamento social, plicar teorias machistas, homofóbida virtualidade das relações huma- A partir da reflexão proposta cas, sexistas, que tolham essa divernas advindas da modernização e das por Torezan, e considerando como sidade, essa pluralidade humana”, novas formas de adoecimento, como objeto de reflexão e análise, o proces- afirma. a depressão, principalmente entre so de formação subjetiva em sala de crianças em idade escolar. aula, visando à formação de cidadãos A temática ficou em evidêncríticos e livres de forma igualitária, cia, recentemente, devido à discus De acordo com a autora, não entende-se que a desconstrução dos são dos Planos Nacionais, Estaduais é possível considerar a subjetividade mais diversos preconceitos por meio e Municipais de Ensino. Em nível nacomo desgarrada ou independente da orientação dos professores é ex- cional, por exemplo, o projeto que foi de um contexto sócio-histórico. Sen- tremamente necessária e aceita pela desenvolvido e discutido por equido assim, entende-se que a formação maior parte da sociedade. Porém, pes de especialistas nas mais diversubjetiva está intrinsecamente liga- quando o preconceito a ser comba- sas áreas do conhecimento com o inda aos paradigmas sociais vigentes tido é especificado, muitas pessoas tuito de promover a igualdade entre e, considerando a atual fase de tran- mudam de posicionamento. os gêneros, foi apelidado como “idesição influenciada pelo hibridismo ologia de gênero” e barrado com o ar-
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que os professores não devem discutir gênero em sala de aula? A advogada Clara Becker, que é cristã assídua e representa boa parte da opinião pública, acredita que todos os seres humanos devem respeitar seu sexo de origem, pois aqueles que não o fazem, desrespeitam os desígnios de Deus: “Você já nasce, não tem como querer escolher se vai ser menino ou menina. De jeito nenhum! Minha opinião é não. Desde que o mundo é mundo, pai, mãe e filhos: Isso é uma família. Esse tipo de educação vem de casa, já nas escolas, tem muito o que ensinar, não tem o porquê ficar explicando esse tipo de ideologia de gênero!”, afirma. Porém, a discussão de gênero vai muito além da questão dos transgêneros (condição onde a expressão de gênero e/ou identidade de gênero de uma pessoa é diferente daquelas atribuídas ao gênero designado no nascimento). De acordo com o doutor em Letras pela UFF (Universidade Federal Fluminense), pós-doutor pela Universidade de Coimbra, Portugal, e professor da Unioeste, Alexandre Sebastião Ferrari Soares, ainda há uma disparidade muito grande entre homens e mulheres: “As mulheres conquistaram muitas coisas a partir do movimento feminista, mas ainda há muitas coisas a serem conquistadas e a briga será diária. As mulheres ainda ganharem menos do que os homens desempenhando a mesma função, é uma questão discriminatória. E como é que a gente muda isso na prática? Discutindo, denunciando, apontando, colocando o dedo na ferida em relação a essas questões. Nosso papel é fazer com que a mulher compreenda que tem tanto valor quanto o homem na sociedade”, declara. Quem concorda que a discussão de gênero deve ocorrer em sala de aula, é a professora de artes Telma Serafini Boschirolli: “A escola é o local em que o nosso estudante vem para ter o conhecimento científico e uma visão de mundo mais ampliada o possível. Então, esse é o local privilegiado para que ele tire dúvidas, para que aprenda, para que desconstrua
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Gênero e sexo
Apesar de uma parcela significativa da população defender o contrário, a ciência confirma que o gênero nem sempre será atribuído a partir do sexo designado no nascimento.
Preconceitos. O conhecimento nos ajuda a desconstruir aquela coisa do senso comum e a compreender melhor o outro. Então, discutindo gênero e sexualidade com os alunos, você abrirá para eles visões de mundo diferentes. Você possibilita contato com esse mundo real em que ele está inserido, e se você traz essas discussões e as faz de forma democrática, ele vai desconstruir preconceitos e se tornar um cidadão que vai ver o mundo de uma forma melhor”, afirma.
Segundo a doutora em genética pela USP (Universidade de São Paulo), Luciana Paula Grégio D’Arce Rodrigues, “o sexo biológico começa no momento da fecundação com a determinação da fecundação de um óvulo com o espermatozoide, quando o espermatozoide pode ser y ou x, e se um espermatozoide x fecundar um óvulo, se formaria um embrião do sexo feminino, e caso um espermatozoide y fecundasse, nasceria um indivíduo do sexo masculino. Entretanto, essa é a primeira instância da determinação do sexo biológico. Depois que se define cromossomicamente, o segundo passo é um gene que está principalmente no cromossomo y que iria engatilhar a via masculina que é chamado de gene do fator determinante testicular. Neste caso, quando o gene está presente, se desenvolve o sexo masculino, e se o gene estiver ausente, o sexo feminino. Se o gene está presente, primeiro ocorre o desenvolvimento das gônadas internas e, posteriormente, das genitálias externas. Porém, dentro da biologia, nós sabemos agora, com o avanço da genética, que o comportamento também influencia a questão de gênero e da sexualidade. Então, a gente ainda considera, dentro da genética, a escolha do indivíduo quanto à sua sexualidade no futuro, que teria influências genéticas e comportamentais”, afirma.
De acordo com a psicanalista Rita Kassab, a transexualidade é uma questão séria: “Além do indivíduo não manter desejos sexuais pelo sexo oposto, tem a dificuldade da aceitação do próprio corpo. Além do conflito e da pressão social, de você ser excluído da sociedade, de uma certa maneira, há também uma questão muito pessoal no sentido da não aceitação do próprio corpo e isso gera um conflito imenso, um transtorno muito grande, uma infinidade de angústias, a falta de aceitação e transtornos psicológicos e emocionais severos”. Segundo Rodrigues, considerando a perspectiva genética, o desejo sexual e a construção da identidade de gênero dependerá da constituição genética e de fatores ambientais. “Geneticamente falando, existem algumas evidências de um gene do cromossomo x, e um outro gene do cromossomo 8, que foi feito num estudo entre 400 homossexuais. Em cerca de 330, havia esse alelo em comum em indivíduos homossexuais, alelo esse que estaria ausente em indivíduos heterossexuais. Se está realmente no cromossomo x ou no cromossomo 8, ainda não se tem certeza, mas existe uma evidência genética, inclusive comparando dados de núcleos hipotalâmicos que são diferentes entre homossexuais e heterossexuais; existe a questão de que os homossexuais sentem um cheiro diferente para o homem em resposta aos ferormônios masculinos. Então, se não fosse geneticamente determinado, por que o comportamento definiria que ele sente um cheiro de um homem, se ele se atrai mais por um homem do que por uma mulher?”, questiona.
Sala de aula A professora transexual Jaqueline Denardin acredita que todos nascem com o sexo definido. Porém, defende que a escolha do gênero deve ser permitida caso o indivíduo não se identifique com o sexo de origem:
“Tem a ver com o como eu quero ser vista, como eu quero ser tratada e quais os valores que eu quero assumir. É importante ter o conhecimento sobre esse assunto, sobre a transexualidade, homossexualidade, bissexualidade, porque hoje nós temos um número considerável de alunos que estão nessas condições, que são homossexuais e se assumem, que são transexuais e se assumem... Nós estamos inseridos em um contexto diferente e nós precisamos ter o conhecimento de como trabalhar com os alunos, de como inserir esses conteúdos enquanto currículo, porque, nós vamos voltar a excluir essas pessoas?”, questiona. De acordo com o professor Alexandre Sebastião Ferrari Soares, o papel da escola, quando ela traz a discussão de gênero em sala de aula, é fazer com que as pessoas pensem a respeito. “O que a gente não pode querer é que essas discussões não passem pela questão do ensino, porque são fundamentais. O preconceito a gente já aprende na família. A gente sabe respeitar o que é igual. No entanto, na escola, nesse ambiente mais democrático, a gente vai encontrar aquelas pessoas que não são iguais a nós, e é exatamente nesse ambiente heterogêneo que você estará exposto a essas situações de diferença. Então, a escola, quando traz essa discussão à sala de aula, faz com que, ao menos, os alunos possam pensar de forma diferente daquela com que ele era acostumado ou que ele percebia”, afirma. Segundo a professora do Colégio Estadual Presidente Costa e Silva, Benilde Teresinha Depubel, a orientação a respeito de como abordar a temática em sala de aula, é a de que se o professor ou professora tiver o preconceito na casa dela, esse preconceito não pode ser trazido ao trabalho. “Se a pessoa possui determinada religião na casa dela, ela não pode fazer o proselitismo aqui da igreja dela. Ela não pode falar ‘reze para Deus lhe tirar essa vontade de ser homossexual’ porque na igreja dela consideram isso correto. A tolerância parece ser uma coisa muito legal, mas não é. Eu tolero você. Então eu tolero homossexual, eu tolero
a sua religião. Isso está significando que eu não aceito e nem respeito. Nós estamos em um estágio tão rudimentar, que estamos ainda tentando chegar à tolerância, que não é uma coisa legal, mas nem até ela a gente chegou, porque tem gente que não tolera. A gente gostaria de chegar à solidariedade, mas para chegarmos à solidariedade, é necessário chegarmos primeiro à aceitação. Antes da aceitação vem a tolerância, e nem lá a gente chegou ainda”, afirma. De acordo com o professor de geografia, Nelson Douhi, o aluno já chega com uma carga preconceituosa da família, então, “a função da escola, a função do professor, é fazer com que as pessoas sejam respeitadas de acordo com aquilo que elas consideram o correto para elas. Algumas questões, dentro da concepção de convivência de cada um, podem até ser consideradas incorretas, mas, se legalmente é permitido, as pessoas têm que aceitar. É algo que o professor tem que trabalhar dentro da sala de aula, que o respeito deve existir independente do seu gosto ou do que você acha que é certo ou não é, e sim do que é legal”, declara. Douhi afirma ainda que a interação é necessária para o desenvolvimento pleno do indivíduo, e “a partir do momento em que o aluno sofre preconceitos devido à orientação sexual, ao gênero, ou à outra característica, prejudica-se o seu desenvolvimento pleno, que ocorre por meio da interação social, a participação em grupos para o desenvolvimento de atividades. Então, quando o aluno é excluído por causa disso, ele passa a ser prejudicado. Nós não temos casos extremos aqui no colégio, tivemos algumas situações leves de preconceito que conseguimos contornar bem, trabalhar bem, mas nós temos inúmeros casos de outras realidades que a gente sabe até de suicídio de alunos que passaram por discriminação”,
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CINQUENTA E QUATRO
Do giz à tecnologia
Aulas mais interativas com a utilização da tecnologia. A tecnologia está assumindo cada vez mais uma função importante no modelo de ensino, funcionando como apoio pedagógico. Kassia Beltrame
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Do giz à tecnologia Estamos inseridos em um novo cenário, onde a tecnologia está sendo cada vez mais aprimorada. Ela tem papel importante na comunicação dos indivíduos e isso ocorre desde o surgimento da prensa de Gutemberg. Quando o assunto é a sala de aula, já não se pode mais deixar de considerar que o uso da tecnologia auxilia na explicação do professor, ou seja, pode servir como um ponto de apoio e interatividade, assim como, uma revista, um documentário televisivo entre outros, desde que bem utilizado. Para o professor de Tads (Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas) e mestre, Anselmo Battisti, o uso da tecnologia começa bem antes da internet: “O livro impresso é uma tecnologia. Estamos em um momento onde se valoriza mais o tecnológico do que o social”, além disso, ele destaca que o ensino tradicional não deve em hipótese alguma ser desprezado. “A tecnologia da informação não necessariamente tem que ser usada em sala de aula, ela PODE ser utilizada. É uma utopia esperar que um professor que ensina álgebra há 20 anos vá mudar seus métodos, que por sinal funcionam, devido ao advento de uma tela brilhante de celular” afirma. O professor de artes Vilson Ismério é um educador que utiliza em suas aulas diversas ferramentas relacionadas à tecnologia. Ele destaca a melhoria de aprendizagem dos jovens, quando utiliza a tecnologia como apoio as suas aulas. Para ele, “não basta apenas livros e explicações verbais, devemos fazer com que o aluno tenha mais interesse e isso só conseguimos mostrando diversas formas de aprendizado por meio das tecnologias, onde acabamos desenvolvendo a curiosidade de muitos em pesquisa. Posso dizer que é um ou outro que se dispersa, mas isso acontece com maior frequência em aulas monótonas, por isso o uso das tecnologias tem um bom resultado”, afirma.
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Professores e alunos estão preparados para as novas tecnologias? Nas escolas públicas uma das maiores preocupações dos professores é em relação à atenção do aluno nas aulas, principalmente com tantos fatores externos e tecnológicos, os quais contribuem para tal desatenção. O método tradicional de dar aula já não é mais tão eficaz quanto há 10 anos. A utilização de dispositivos móveis conectados a internet são utilizados por grande parte dos alunos. Esse uso ocorre até mesmo dentro da sala de aula. Devido a esses avanços da tecnologia e mudanças no comportamento do aluno, torna-se necessário uma alteração no modo de dar aula nos dias de hoje. É fato que, já não basta mais apenas a teoria e explicações dos livros, agora é necessário usar a tecnologia a favor do professor e de suas aulas. Para alguns educadores o processo de adaptação, tanto do professor, quanto do aluno se dará pelo tempo, “Os professores serão preparados naturalmente. Isso ocorrerá quando a nova geração de professores assumir o papel dos antigos”, afirma Battisti. Já para a pedagoga Jaqueline Silva, “só não estão preparados aqueles que se apropriam do comodismo, pois as próprias editoras que regem o sistema de ensino das escolas oferecem meios para o avanço da utilização dos meio tecnológicos”, declara. Ela aponta, ainda, que muitos professores apresentam a desculpa de ser um professor mais antigo ou ter acabado de entrar na docência. Em 2008 o ministério da educação chamou professores para elaborar um guia com o objetivo de orientar gestores na hora de escolher tecnologias capazes de melhorar a qualidade do ensino e do aprendizado. O guia ficou pronto em 2009 e encontra-se disponível no site do Ministério da Educação (MEC). No ano de 2012, o Ministério da Educação repassou R$ 180 milhões aos estados para a compra de tablets para os professores.
Jaqueline destaca que os
alunos estão preparados para terem como ponto de apoio as tecnologias em sala de aula e isso só ocorre pelo fato da geração já nascer inserida no meio tecnológico. “Os alunos de hoje, já nasceram dentro de um sistema que para tudo utiliza a informatização. A tecnologia está diretamente ligada a isso”. O estudante do terceiro ano do ensino médio, Mário Vinicius Neckel declara que aprende muito mais com aulas mais interativas: “Eu não sou muito de estudar, mas quando o professor traz um vídeo, traz alguma atividade que envolva internet ou algum dispositivo eu percebo que presto bem mais atenção. As novidades são interessantes, às vezes, só falar e falar não adianta e não se aprende nada, eu pelo menos, não aprendo”, afirma ele. A aluna recém-formada no ensino médio Hellen Cristina destaca a diferença de aprendizado no ensino médio público, onde os professores raramente usavam a tecnologia para explicar determinados assuntos em relação a faculdade, local em que a maioria dos professores usam como suporte as tecnologias, segundo ela. “No colégio, raramente os professores usavam alguma tecnologia como som ou televisão. Geralmente as aulas eram escritas e com o mínimo de comunicação possível, sem muito diálogo entre as explicações. Os professoras escreviam e pronto. É muito complicado aprender com essa forma maçante de ensino. A aula não consegue ser fixada de maneira proveitosa. Percebo que quanto mais o professor insere músicas, vídeos, filmes, o meu aprendizado aumenta muito. Hoje, eu não tenho nenhuma nota baixa e eu estudo muito com o auxílio da tecnologia”, expõe ela. No ensino público atual, algumas ferramentas tecnológicas já são disponibilizadas para os professores utilizarem em sala. No entanto, ainda não é o suficiente para que haja
uma educação embasada na utilização de ferramentas eletrônicas, com o objetivo de auxiliar os professores. Em 2013 o Comitê Gestor de Internet no Brasil divulgou que apena 2% dos professores brasileiros utilizam a tecnologia como suporte em sala de aula.
Do giz à tecnologia
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A TV Pendrive, computadores e tablets são alguns dos aparelhos disponíveis no ensino público, no entanto, a quantidade desses aparelhos não é suficiente para suprir a demanda necessária, além disso, a manutenção desses das maquinas, não são realizadas periodicamente, perdendo assim a máxima eficácia. Quando o assunto envolve colégios particulares e faculdades, a realidade em relação à tecnologia é um pouco diferente, só que, ainda os recursos são pouco explorados pelos educadores: “Eles usam bastante multimídia na faculdade, bastante slides, às vezes passam filmes do respectivo assunto e músicas, mas ainda acho que poderia ser melhorada essa dinâmica, trazer mais novidades.”, afirma a aluna Hellen Cristina. No curso de Jornalismo, uma das disciplinas da grade chama-se Novas Tecnologias. A matéria tem como objetivo ensinar os alunos a utilizarem a tecnologia a favor do seu trabalho diário, no entanto, de acordo com a aluna do terceiro ano do curso, Alice Oliveira, a maneira que a aula é ministrada ainda é tradicional. “Atualmente muitos professores não estão preparados para ensinar por meio da internet. Ainda é perceptível a dificuldade de relacionar o ensino convencional com a nova tecnologia. Assim como tive a experiência no colégio, vejo que muitos professores não estão preparados para ensinar por meio deste meio, assim como na faculdade”, diz ela. Alice nota uma disparidade no ensino e na forma de avaliação: “Passamos o bimestre todo mexendo no computador e aprendendo a usar algumas ferramentas, depois, a prova é imprensa, manuscrita”, relata a aluna. O que fica claro é, portanto, que a utilização da tecnologia não pressupõe a interatividade.
“Os alunos de hoje, já nasceram dentro de um sistema que para tudo utiliza a informatização. A tecnologia está diretamente ligada a isso”, Jaqueline
“Os professores serão preparados naturalmente. Isso ocorrerá quando a nova geração de professores assumir o papel dos antigos”, afirma Batisti
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CINQUENTA E NOVE
SESSENTA
Do giz à tecnologia A opção de estudar em casa atrai cada vez mais brasileiros. Considerando suas potencialidades, a modalidade EAD (Ensino à Distância), possibilita o vencimento de barreiras como o tempo e o espaço, e, consequentemente, desponta-se como instrumento de democratização do ensino e de amenização das discrepâncias sociais. Apesar dos diversos benefícios, muitos dos que escolhem o sistema tradicional de ensino, possui um pouco de resistência ou é desinformada em relação à modalidade EAD. A acadêmica do segundo ano do curso de Comunicação Social, Laura Siqueira, apesar de morar no município de Realeza, a 108 km de Cascavel, optou pelo ensino presencial, percorrendo a distância todos os dias: “Eu acho que não é a mesma coisa que estar em sala de aula, onde você está olhando para o professor e para o quadro”, afirma. Ao contrário do que ocorria em um passado recente, em cursos por correspondência ou, posteriormente, por as gravações audiovisuais, a educação à distância, no Brasil, não pode mais ser considerada de baixa qualidade. A interatividade trazida pela internet possibilita que as dú-
vidas em relação ao conteúdo sejam esclarecidas instantaneamente, seja por meio de fóruns, ou por uma equipe de tutores. De acordo com o professor e diretor da Unicesumar Cascavel, Wanderley Kendrick, a modalidade EAD, em sua instituição, “é uma metodologia que se caracteriza pela aula que é transmitida a partir de um estúdio, onde o professor desenvolve o conteúdo sem se preocupar com disciplina, sem se preocupar em fazer chamada, e sem se preocupar inclusive em responder ao aluno. Mesmo sendo aula ao vivo, online, via internet, o aluno faz as perguntas, e quantas desejar. Não é o professor orador que vai responder o aluno, pois há uma equipe de mediadores que emitem a resposta aos alunos via e-mail”, relata. Segundo o professor e responsável pela modalidade na Univel, Cezar Versa, a perspectiva hoje de se usar a tecnologia para que o conhecimento seja transmitido de forma mais eficaz, ou seja, proporcionar que as pessoas possam ter acesso a esse conhecimento rapidamente, centraliza, praticamente, a grande importância do ensino à distância para a forma-
ção continuada: “Imagine você, que um professor pode gravar um vídeo, e mais de mil pessoas podem assistir esse vídeo, porque ele está disponibilizado na internet, então eu posso chegar a grupos que precisam de formação continuada de um modo muito mais eficaz”, afirma. Apesar do preconceito, de acordo com dados do Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes), em alguns cursos de nível superior, os acadêmicos da modalidade EAD obtiveram até 6,7 pontos a mais do que os matriculados no ensino tradicional. A professora da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), pós-doutora em Engenharia e Gestão do Conhecimento, e coordenadora do programa EAD Unioeste, Beatriz Helena Dal Molin, afirma que o preconceito em relação à modalidade deriva-se em seu recente desenvolvimento: “Eu acho que até de certa forma, algumas pessoas podem até acreditar que falta um pouco de qualidade na EAD, mas deixe a gente fazer 500 anos da modalidade EAD, como a gente fez de ensino presencial, para vocês verem uma coisa! Eu acho que tudo o que está no começo tem o seu tempo de experimentação, tem o seu tempo de ajustes. Não acho
A modalidade EAD como instrumento de democratização do ensino Considerando a formação continuada, por exemplo, a modalidade possibilita que profissionais continuem se aperfeiçoando sem precisar sair de casa Renan Bini
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que devemos dizer que esta seja melhor que aquela e que a educação à distância tenha a menor qualidade... Existem cursos presenciais que também são de péssima qualidade!”, afirma. Para o professor Wanderley, quem não conhece o ensino à distância é normal ter um preconceito: “tem muita gente que tem ainda.Eu encontro professores catedráticos que temesse preconceito, que eu não tive absolutamente em momento algum. Quando eu soube que estávamos implantando educação à distância no país, eu acreditei na ideia e tenho comprovado que, quanto à qualidade, se não é superior, não deixa nada a desejar comparando O advento da internet criou um cenário totalmente novo para a educação à distância. Hoje, as possibilidades são mais amplas e pode-se fazer um curso à distância praticamente nos mesmos moldes dos presenciais: com os estudantes assistindo as aulas pela internet, exibição dos conteúdos em tempo real e avaliações feitas pela rede ou em um pólo presencial. Para o acadêmico na modalidade EAD, Endrey Theodoro, “a faculdade presencial exige o empenho de você ter de se deslocar do seu trabalho todos os dias, para daí você ir à faculdade, estudar e depois ter de retornar para a sua residência, meia noite, ou às vezes, até depois, dependendo da pessoa. Isso acaba gerando
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um cansaço”, relata. A professora do curso de Jornalismo da Univel, Letícia Garcia, concorda com os benefícios e viu na modalidade EAD a possibilidade de investir em sua formação e ampliar seu campo de conhecimento: “A logística de estar preso em sala de aula por quatro horas dificultava a minha vida. Eu já havia começado Letras na Unioeste, lá o curso é de manhã e eu não tinha com quem deixar o meu filho. Tranquei o curso quando ele nasceu e depois de um tempo vi na EAD a única possibilidade de eu voltar a fazer o curso. A flexibilidade de horário é a grande vantagem da EAD”, opina. Não se constrói uma educação desenvolvida sem ensino de qualidade. Em países continentais como o Brasil, a educação à distância é uma possibilidade interessante para ampliar o potencial de acesso dos brasileiros às universidades, especialmente em estados e municípios com maior dificuldade de mobilidade para estudantes. É o que afirma a professora Beatriz: “O ensino à distância é uma modalidade que, além de ser condizente com o espírito do século XXI, que é um espírito onde a tecnologia tem que estar mais presente para somar e agregar valores ao conhecimento. Ela permite que pessoas que não tem acesso ao ensino superior regular presente em suas cidades possam ter conhecimento e serem pessoas que depois irão postular melhores posições na sociedade e melhores empregos”, afirma.
Investimento De acordo com o professor Wanderley, considerando instituições pri- vadas de ensino, o custo de um curso de educação à distância, em relação ao curso presencial, chega a ser até um terço: “É um custo que permite que cada brasilei- ro, mesmo em períodos de crise, como o que estamos vivendo, possa realizar um curso de nível superior. Vai mudar a cara da educação desse país em poucos anos em função disso”, relata.
Haverá uma substituição? Para o professor Cezar não. “Possivelmente não uma substituição- completa. O que haverá é uma mudança de panorama. Não falamos em uma substituição, mas em uma tendência de que o ensino à distância cresça e se torne uma referência para o próprio ensino presencial”, comenta. Quem concorda com a opinião é a professora Letícia: “Eu acho que subs- tituir não. Pode ser que ela ganhe mais espaço nos próximos anos, mas eu não acredito que uma modalidade substitua a outra, porque cada pessoa tem uma condição, cada pessoa tem uma necessi- dade, uma perspectiva, uma projeção em relação à educação”, afirma. Já a professora Beatriz acredi- ta que a substituição possa acontecer, porém, não agora: “Acho que vai levar muitos anos para que exista só a modali- dade à distância. Eu acredito que vai haver, por conta da presença mais massiva da educação à distância, aulas bem diferenciadas, não aulas nos moldes do século XX, mas acredito que os dois podem conviver e existir”, relata
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