Revista Estilo 32

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Ano 7 N0 32 R$3,50

Itรกlia BELA, ALEGRE, DELICIOSA, DERRAMADA...

ZECA CAMARGO: VIAJANTE GLOBAL NEVE QUENTE: VALLE NEVADO


Milene Leal milene@contextomkt.com.br

EDITORA E DIRETORA DE REDAÇÃO REDAÇÃO Beatriz Guimarães, Cris Berger, Gustavo Mini Bittencourt, Irene Marcondes, Paula Taitelbaum

REVISÃO Flávio Dotti Cesa PROJETO GRÁFICO Odyr Bernardi DIREÇÃO E EDIÇÃO DE ARTE Luciane Trindade luciane@contextomkt.com.br ILUSTRAÇÕES Nik FOTOGRAFIA Angela Farias, Cris Berger, Cristiano Sant’Anna, Daniel Martins, Eduardo Iglesias, Letícia Remião

PRODUÇÃO DE ALIMENTOS Jorge Nascimento COLUNISTAS Fernando Lokschin, Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros, Malu Coelho, Ruza Amon, Tetê Pacheco

EDITORA RESPONSÁVEL Milene Leal (7036/30/42 RS) COLABORADORES Cook Store, Livraria Cultura, Mariangela Badalotti

Izabella Boaz izabella@contextomkt.com.br

DIRETORA DE ATENDIMENTO DEPTO. DE ATENÇÃO AO LEITOR Renata Xavier Soares renata@contextomkt.com.br A revista Estilo Zaffari é uma publicação bimestral da Contexto Marketing Editorial Ltda., sob licença da Companhia Zaffari Comércio e Indústria. Distribuição exclusiva nas lojas da rede Zaffari e Bourbon. Estilo Zaffari não publica matéria editorial paga e não é responsável por opiniões ou conceitos emitidos em entrevistas, artigos e colunas assinadas. É vedada a reprodução total ou parcial do conteúdo desta revista sem prévia autorização e sem citação da fonte.

TIRAGEM 25.000 exemplares PRÉ-IMPRESSÃO Maredi IMPRESSÃO Pallotti

ENDEREÇO DA REDAÇÃO Rua Padre Chagas, 185/801– Porto Alegre/RS – Brasil – 90570-080 (51) 3395.2515 (51) 3395.2404 (51) 3395.1781 estilozaffari@contextomkt.com.br

CAPA: POLENTA COM GORGONZOLA FOTOGRAFADA POR LETÍCIA REMIÃO


NOTA

DO

EDITOR

Bela e deliciosa

Itália Que delícia fazer esta edição da Estilo Zaffari! Quando resolvemos prestar uma homenagem aos 130 anos da imigração italiana no Rio Grande do Sul, não imaginávamos que trabalho maravilhoso teríamos pela frente. Começamos por aquilo que é indiscutivelmente uma delícia: a culinária italiana. Escolher quais receitas iríamos publicar e quais pratos seriam fotografados foi uma tarefa dificílima. Todo mundo tem um prato predileto na gastronomia italiana. Ou vários... Não foi à toa que sofremos para fazer essa escolha. Quando a gente começa a pensar (e salivar...), parece que tudo que os italianos fazem é absolutamente saboroso e irresistível. Mas, enfim, chegamos a um consenso, procurando levar até nossos leitores um mix de receitas que resume o talento culinário da colônia italiana. Depois disso, a fotógrafa Letícia Remião fez jus ao seu sobrenome toscano e produziu imagens lindíssimas. Não deixe de conferir as fotos, as receitas e, é claro, experimente esses sabores. Se você é ou não descendente de italianos não importa: qualquer um se emociona com a matéria de Paula Taitelbaum sobre as Mammas. Paula literalmente se meteu no dia-a-dia de três famílias, com o objetivo de delinear o perfil dessas matriarcas italianas. Resultado: ela descobriu e publica aqui na Estilo Zaffari a “Receita de Mamma”. Não perca. Emoção também tem de sobra na reportagem de Irene Marcondes sobre as relíquias do passado colonial italiano. Visitando três antiquários, Irene garimpou objetos e móveis que contam lindas histórias. As antigüidades italianas – móveis simples e rústicos que hoje são usados como peças de decoração altamente valorizadas – expõem um modo de vida e uma cultura que tiveram um papel importantíssimo na construção da identidade do nosso Estado. Já que o tema é Itália, os colunistas da Estilo Zaffari aderiram, entusiasmados. Martha Medeiros confessou que ama a Itália, a qualquer hora, em qualquer lugar. Fernando Lokschin dissecou as origens etimológicas e históricas da “pasta”. Luís Augusto Fischer diz por que a saga dos nossos “gringos” é um verdadeiro romance. E Malu Coelho conta como surgiu o mito do nhoque da sorte. Afora as saborosas italianices, esta edição da sua revista tem outras matérias supergostosas. Tem um perfil do viajante, contador de histórias e global Zeca Camargo; tem uma reportagem sobre o templo budista de Três Coroas, escrita por um publicitário que é também praticante dos ensinamentos de Buda; e tem a já tradicional viagem da incansável Cris Berger: desta vez ela foi ao Valle Nevado e fez imagens lindíssimas do lugar. Olhando essas fotos, você vai se encher de vontade de planejar férias aqui pelas montanhas da América Latina. É um programa e tanto! A Estilo Zaffari recomenda!


Correio CRIANÇAS NA COZINHA

ESTILO COM ESTILO Acredito com certeza que toda a equipe dessa importante publicação tenha estilo apurado. Acompanho a revista ao longo do tempo e observei, ao ler o exemplar de nº 31, que os “estilos” se fundiram em um belo presente aos leitores apreciadores de textos, fotos, com excelente resultado final. É uma edição saborosa, light, perfumada: a caminhada por Paris, os aromas dos temperos, as cores, bom gosto das casas, as delícias de Punta, vida mais saudável, organicamente falando. Enfim, gostaria de fazer um pedido: não permitam que nada possa alterar o ESTILO desse grupo ao produzir uma edição maravilhosa, nos apresentando tudo com exclusividade aqui no eixo meridional deste nosso paralelo 30. Sigam com estilo. Abraços a toda a equipe editorial.

Lendo a revista Estilo Zaffari nº 28 depareime com a excelente reportagem de Tetê Pacheco, “Os Novos Gourmets”, que relata as curiosas incursões de crianças na cozinha. Tomei também conhecimento da existência do Clubinho do Esquilo, que leva a garotada às oficinas gastronômicas como uma formação ao mesmo tempo séria e lúdica. Sou cliente do Zaffari há muitos anos (desde a inauguração do Ipirangão) e assídua leitora e colecionadora dessa grande revista, bem ao gosto gaúcho. Como professora aprecio a boa leitura, e como consumidora opto sempre pela qualidade e variedade existentes no Zaffari. LISETE JOHNSON – PORTO ALEGRE

Que legal, Lisete. Este projeto do Clubinho do Esquilo é realmente muito interessante, uma iniciativa maravilhosa que contribui de forma diferente para a formação da criançada. Continue nos prestigiando, tanto na revista como em nossas lojas, ok?

ARQUITETO WILLIAM PUPE

Diante dessas palavras, a equipe só pode agradecer efusivamente a tantos elogios e prometer que nunca abandonaremos nosso ESTILO! Um grande abraço!

VONTADE DE MORDER! AINDA OS AZEITES Adoro a revista Estilo Zaffari e compro sempre que vou ao Bourbon. Porém, como moro no interior (Lajeado), não consigo adquirir todas as edições. Lendo a nº 30, nas cartas, observei que uma leitora referia-se a uma edição anterior onde havia uma reportagem sobre azeites. O assunto me interessa muito, especialmente a questão da degustação. Procuro experimentar azeites de diferentes tipos, porém, sem método. Gostaria de conhecer o conteúdo dessa reportagem ou, melhor, toda a revista onde consta tal matéria. Como devo proceder para consegui-la? Aguardo retorno. Abraço. RICARDO ANTONIAZZI

Olá! De fato, publicamos na edição 29 uma linda matéria sobre degustação de azeites. A redatora Rejane Wilke conta nesse texto uma experiência de degustação que realizou em Lisboa. Se a edição ainda estiver disponível em estoque, providenciaremos o envio para seu endereço, ok? E boa leitura!

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Estilo Zaffari

Oi, Milene. Mais uma vez fico muito feliz em participar da Estilo Zaffari. Os textos da Irene estão ótimos, e as fotos do Cláudio também. Participar ao lado da Susi e da Anne contribuiu ainda mais para a qualidade da matéria. Acho a revista sensacional e fico na expectativa para ver os artigos todo mês quando minha mulher chega com ela em mãos. As receitas da edição nº 31 estão imbatíveis. A matéria de Punta nem se fala, dá vontade de comer as páginas! Florianópolis! Paris! A minha paixão. A cidade ideal para se viver! Obrigado mais uma vez a ti e a toda tua equipe. ZECA AMARAL – ARQUITETO

Zeca, pra nós também é sempre um prazer ter o teu trabalho nas páginas da revista. Ficamos felizes que tenhas gostado da matéria, pois também achamos o resultado ótimo. Concordamos contigo sobre as fotos de Punta: dá vontade de morder a revista! Um grande abraço e obrigada pelo carinho. Esperamos contar sempre contigo como leitor, além de te ter como uma das nossas fontes preferidas para as matérias de decoração.



Í N D I C E 6

Cartas

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Coluna: Cotidiano

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Cesta Básica

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O Sabor e o Saber

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Viagem: Valle Nevado

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Lugar: Templo Budista

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Perfil: Zeca Camargo

Relíquias

italianas 38

Irene Marcondes visitou três antiquários e descobriu verdadeiros tesouros em mobiliário e objetos coloniais italianos


PAULA TAITELBAUM APRESENTA TRÊS

Italianos no

MAMMAS ITALIANAS E SEUS SEGREDOS PARA

RS

MANTER A FAMÍLIA SEMPRE UNIDA

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A saga dos imigrantes italianos no Rio Grande do Sul, sua história e sua herança cultural

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Cotidiano MARTHA MEDEIR OS

ITALIANADAS Pra mim, a bota sempre está na moda Quando a Milene, diretora de redação aqui da revista, me disse que esta edição traria um sapore di Italia, fiquei com água na boca, e não apenas pela mentalização que fiz de macarronadas bem calóricas, pizzas com queijo escorrendo pelas bordas e vinhos de embriagar a alma. Salivei, na verdade, por tudo. A Itália é tudo. Tem tanto lugar no mundo que não conheço – nada do Oriente, pra começar – e, no entanto, quando pinta grana e tempo para uma viagem, me vejo rondando a Itália ou definitivamente enfiada nela. A moda agora não é bota? Para mim, sempre foi. Por dentro das calças, por baixo das saias, dentro da mala e carimbando o passaporte. Bota, sempre. Moda, então. Poderíamos falar de Dolce e Gabbana, Versace, Valentino, mas dispenso esta turma toda e fico só com o que interessa: Giorgio Armani. Claro que estou falando metaforicamente, porque de grifes internacionais meu armário não tem visto nem a cor – tudo o que tive do Armani até hoje foi um perfume, mas tudo bem, ele me inspira a ponto de eu me “armanizar” com grifes nativas mesmo, fazer o quê. Armani tem o dom de unir o chique ao simples, e ele próprio é o melhor retrato disso: cabelo grisalho, olhos azuis, camiseta branca (ou preta) e jeans. Nada pode ser mais digno. E atual. Atual hoje e daqui a 200 anos. Um homem pronto tanto para a balada quanto para o dolce far niente. Acessório? Relógio de pulso e pele bronzeada os 12 meses do ano. Avanti. Conheci a Itália pelas mãos de Visconti, Marco Ferreri, Bertolucci, Fellini, Ettore Scola. Eu matava aula na faculdade para assistir a Esposamante, A Comilança, Sacco e Vanzzetti,

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Estilo Zaffari

Feios, Sujos e Malvados. Ainda hoje gosto de filmes italianos, e também de filmecos americanos que me remetem à Itália, como aquele com Robert Downey Jr. e Marisa Tomei que se passa em boa parte do tempo em Positano!!! E quando vi Sob o Sol da Toscana, desejei acordar no dia seguinte sendo o personagem de Diane Lane: uma escritora que compra e reforma uma vila italiana no meio do nada mas cercada de afeto, de cenários bucólicos, de vinhedos e de homens lindos. Eu falei homens lindos? Vou ter que pular esta parte, pois tenho que concluir a crônica nesta única página – se entrar no assunto “homens lindos”, precisarei de no mínimo umas 12. A Itália nos deu Veneza, a cidade mais inusitada e espetacular do mundo. Marcello Mastroianni e Sophia Loren. O pôr-dosol em Florença. A falta de pontaria do Roberto Baggio. A cor do mar em Capri. A lambreta. A Ferrari. A via Condotti. A Sicilia. Michelangelo. Leonardo da Vinci. Dino Buzzati. Italo Calvino. Roberto Begnini. Pavarotti. Eros Ramazzoti. Escuse, acho que estou começando a apelar. Itália e seu trânsito esquizofrênico, sua gente franca e gritona, suas ruas estreitas e igrejas enormes, e pessoas que se chamam Paola, Francesco, Giuseppe, Itália – sim, no livro Não se Mexa, de Margarete Mazzantini (que já virou filme), há uma personagem caótica chamada... Itália. A Itália dos papas e da nossa gente aqui da serra. Que grande país. Que alegria que provoca. Um lugar que, mesmo longe, a gente sente muito perto, tão perto que... Dá licença, vou dar um pulinho em Milão e já volto. MARTHA MEDEIROS É ESCRITORA


Cesta básica FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA

NESTA SEÇÃO VOCÊ ENCONTRA DICAS E SUGESTÕES PARA CURTIR O DIA-A-DIA E SE DIVERTIR DE VERDADE: MÚSICA, CINEMA, LUGARES, OBJETOS ESPECIAIS, COMIDINHAS,

Sakura Kaiten Os pratos vão passando diante dos seus olhos e tudo o que você precisa fazer é esticar o braço para o seu sushi preferido. O Kaiten, como é chamada essa esteira giratória no Japão, surgiu muito mais por necessidade do que por maneirismo. Os japoneses tinham pouco tempo para suas refeições, mas não queriam abrir mão de comer bem. Aqui em Porto Alegre, a novidade chegou através do Sakura, que em janeiro inaugurou seu segundo restaurante na capital, no Bourbon Shopping Country. Os pratos têm bordas de diferentes cores para sinalizar o preço do que você escolhe. Niguiris, makis e outras maravilhas da culinária japonesa no melhor estilo self service. Muita gente anda fazendo uma boquinha antes do cinema e voltando depois do filme para comer mais.

DANIEL MARTINS, PUBLICITÁRIO

PASSEIOS, COMPRAS. BOM PROVEITO!

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Cesta básica FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA

VILLA RÚSTICA A pizza é deliciosa, o ambiente aconchegante, de bom gosto, e o atendimento é atencioso, supercorreto. Precisa de mais alguma coisa? A Villa Rústica inaugurou em janeiro e já conquistou clientela assídua em Porto Alegre. Não é pra menos. Raros são os restaurantes que conseguem se sair tão bem neste “tripé”. Feita artesanalmente e assada em forno a lenha, a pizza da Villa Rústica pode vir com sabores diferentes e criativos, além dos tradicionais já consagrados. A variedade é imensa, você se diverte pedindo uma novidade cada vez que vai lá. A massa é fina e crocante, como convém. E pode ter bordas recheadas, coisa que os puristas odeiam e os junkie-food lovers, como eu, não conseguem dispensar... Experimente: Fabrício Pillar, 27 – Moinhos de Vento.

LANÇAMENTO TRIPLO A ESTILO ZAFFARI 32 ESTÁ APRESENTANDO O VALLE NEVADO, COM FOTOS E REPORTAGEM DE CRIS BERGER. A REVISTA E A TEMPORADA DE ESQUI 2005 DA OPERADORA POINT DA NEVE/S7 VIAGENS TERÃO LANÇAMENTO ESPECIAL NO DIA 12 DE MAIO, ÀS 20H30MIN, NA DADO BIER, QUANDO TAM-

MILENE LEAL, JORNALISTA

BÉM INAUGURA A EXPOSIÇÃO COM OS MELHORES CLIQUES DA MATÉRIA. DEPOIS, AS IMAGENS PODERÃO SER VISTAS NA MOSTRA FOTOGRÁFICA “UM VALLE NEVADO”, QUE PERMANECE DE 13 A 23 DE MAIO NO SEGUNDO ANDAR DO BOURBON COUNTRY, EM FRENTE À LIVRARIA CULTURA.


Livros italianos

Já que místico é o que está além do real – envolto em mistério e espiritualidade –, eu ousaria dizer que a trilha do balé O Grande Circo Místico é para você escutar não apenas com o ouvido, mas também com a alma. As músicas são uma parceria de Chico Buarque e Edu Lobo e foram criadas no início dos anos 80 para o Ballet Guaíra, a partir do poema homônimo de Jorge de Lima. A trilha completa foi editada na época, mas o disco não chegou a ser lançado comercialmente. Talvez por isso, o CD O Grande Circo Místico, relançado pela Dubas, tenha chegado como um coelho tirado da cartola: feito surpresa. Em versão completa, traz clássicos como “Beatriz”, na voz de Milton Nascimento, “Sobre Todas as Coisas”, por Gilberto Gil, e “A Bela e a Fera”, com Tim Maia, além da versão original de “Ciranda da Bailarina”, com um coro que inclui todas as filhas do Chico quando elas ainda eram crianças. Ao escutar, você vai descobrir que circo é mais do que alegria. É pura alegoria.

É fácil se apaixonar pela Itália. Um país verdadeiramente fascinante. Berço da civilização, conhecida por sua história e cultura milenares, a Itália até hoje guarda a maior coleção de arte do mundo, e 60% do patrimônio cultural da humanidade está lá. Para os italianos, a paixão está em todo lugar, principalmente quando o assunto é gastronomia. A diversidade, qualidade e a consciência da tradição italiana nos trazem à mesa iguarias que aguçam todos os sentidos. Mas tudo isso só tem valor quando reconhecemos a atitude típica dos italianos perante a comida e a bebida. O livro “Culinária Itália”, com suas imponentes 496 páginas e mais de 1.200 fotografias, apresenta não somente receitas e vinhos, mas também a paisagem e a história deste povo que nos é tão familiar. Saiba no livro como aparecem os bolores azuis do queijo gorgonzola. Por que o Prosecco é tão apreciado, quais pratos eram servidos na Roma antiga. Do café aos queijos, das ervas aromáticas ao tradicional panettone, do carnaval veneziano à hospitalidade na Toscana. Está tudo ali. O maior e mais completo registro da arte da cozinha e da arte de viver bem. Buon appetito! (Culinária Itália, 496 páginas, Editora Konemann). Mais literatura sobre o tema: La Cucina, 598 páginas, Editora Cia. das Letras; Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, 698 páginas, Editora Martins Fontes.

PAULA TAITELBAUM, ESCRITORA

EDUARDO BORGES, ESPECIALISTA EM GASTRONOMIA

Hoje tem Circo Místico? Tem, sim, senhor!


Cesta básica

Gel New Wave no cabelo e muita purpurina. Carteira emborrachada com velcro. Os Goonies na Sessão da Tarde. MacGyver consertando um radiador com clara de ovo. Lembrar de tudo isso dá uma vontade danada de voltar no tempo e àquela época gostosa em que éramos realmente felizes e não nos dávamos conta. Esse tipo de nostalgia é o que deve ter servido de estímulo aos jornalistas Mariana Claudino e Luiz André Alzer. Eles criaram o “Almanaque dos Anos 80”, um livro dividido em oito capítulos, sobre temas como televisão, música, cinema e os modismos que transformaram a década em um clássico. O almanaque demonstra a profundidade de seu mergulho no tempo ao revelar detalhes até então considerados verdadeiros tabus, como a quantidade exata de chicletinhos que vinha naquele saquinho rosa e vermelho dos Minichicletes Adams. É uma viagem no tempo capaz de sensibilizar toda uma geração! Os mais novos, que infelizmente não viveram os anos 80, podem matar sua curiosidade sobre a década que hoje é cultuada com louvor. Também merece destaque o trabalho do designer gráfico Marcelo Martinez, responsável por dar ao almanaque um visual que remete à estética dos anos 80. Pode ser que eu nunca mais volte a ser criança. Mas com o Almanaque dos Anos 80 dá pra matar a saudade.

RAFAEL TRINDADE, JORNALISTA

FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA

PRA VIAJAR NO TEMPO É PRECISO UM ALMANAQUE

CÍRCULO DE BABETE Se você, assim como eu, é uma daquelas pessoas que têm medo de cozinha, prepare-se para perder completamente a fobia. Carla Civile, idealizadora do Círculo de Babete, é apaixonada por culinária. Desde criança, rodeada de panelas, ela ajudava suas nonas na preparação das pastas e dos doces típicos italianos. Aprimorou seu prazer pela gastronomia quando morou na França. Um dos objetivos de Carla é justamente tirar da cabeça das pessoas a idéia do “eu não sei cozinhar” e, mais ainda, divulgar sabores e paladares de diferentes partes do mundo para o maior número de “simpatizantes”. O Círculo promove cursos mensais que são uma verdadeira Festa de Babete. Os participantes aprendem com Carla a preparar um menu completo e, depois de tudo pronto, sentam juntos para saborear os pratos. Então, prepare seu avental e reserve um espaço pra você no próximo evento. Vai ser uma grande diversão! Os cursos acontecem na Confraria Blue Ville, Av. Cristóvão Colombo, 3309. Fone: 3326-7000.

LUCIANE TRINDADE, DESIGNER GRÁFICA 14

Estilo Zaffari



Consumo T E T Ê

PAC H E C O

SOBRE HOMENS E SACOLAS A existência masculina parece estar condenada à performance Tenho amigas que até hoje acreditam que os maridos ou os namorados não são tão legais quanto deveriam porque não saem com elas pra fazer compras. Confesso que eu mesma, embora prefira um milhão de vezes a companhia feminina para esses fins, já me peguei chateada com a falta de paciência e vontade masculina para o maravilhoso mundo das sacolas. Outro dia vi um documentário da BBC onde um homem era colocado na seguinte situação: numa rua lotadíssima, com um medidor de batimentos cardíacos colado ao corpo e carregando um carrinho de bebê, o cara recebia a tarefa de, em alguns minutos, comprar um caminhãozinho de brinquedo para a criança e uma camiseta branca para ele. A tarefa que qualquer uma de nós executaria rindo quase infartou o pobre coitado. Foi impressionante acompanhar o nervosismo dele diante do que costumamos fazer para dar uma relaxadinha. O que nos coloca em mundos tão opostos é a velha questão da performance. Segundo esse documentário, os nossos queridos

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do sexo oposto vivem num desafio interno permanente. A simples idéia de “ter” que ir às compras libera neles uma adrenalina semelhante à de uma caçada, de uma perseguição. Imagine-se no meio de uma selva sabendo que a qualquer momento vai pintar um tigre de 300 quilos para você matar antes que ele mate você. É o que eles sentem ao sair pra comprar a tal camiseta branca sob encomenda. Não conseguir “executar a tarefa” os transforma em derrotados, e para os derrotados não há perdão, ou qualquer outra conclusão dramática assim. A existência masculina parece estar mesmo condenada à performance. Mas veja pelo lado bom: não é que ele não te ama porque prefere qualquer outra coisa a sair com você para ir ao shopping. Lembre-se disso antes de pedir que ele vá ao súper com aquela listinha.

TETÊ PACHECO É PUBLICITÁRIA



Sabor


Italianos no

RS AO COMEMORAR OS 130 ANOS DE IMIGRAÇÃO ITALIANA NO RS, PERCEBEMOS QUE AQUELA GENTE SIMPLES QUE VEIO DE TÃO LONGE PRODUZIU UMA GRANDE REVOLUÇÃO POR AQUI. JUNTO COM SUA VONTADE DE TRABALHAR E DE VENCER, OS IMIGRANTES ITALIANOS ACABARAM INTRODUZINDO UM MODELO DE DESENVOLVIMENTO CENTRADO NA FAMÍLIA E NA PEQUENA PROPRIEDADE. ELES INSTALARAM EM TERRAS GAÚCHAS, COM GRANDE SUCESSO, UMA SOCIEDADE DE HOMENS LIVRES, PRODUZINDO MUITAS RIQUEZAS, ORGANIZANDO AS COMUNIDADES EM TERMOS IGUALITÁRIOS, COM BASE NO TRABALHO COOPERATIVO. UM EXEMPLO PARA TODO O PAÍS.

P O R B E AT R I Z G U I M A R Ã E S F OTO S L E T Í C I A R E M I Ã O I LU S T R A Ç Õ E S N I K

Estilo Zaffari

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Sabor TRABALHO, RELIGIÃO, FAMÍLIA E ALEGRIA DE VIVER: OS ÍCONES DA COLÔNIA ITALIANA

Quando os colonos chegaram ao Brasil, encontraram um país de escravos, com a economia baseada na monocultura – o café no Sudeste e as charqueadas e a pecuária no Sul –, um modelo perverso e ineficiente. Os imigrantes mostraram, então, que era possível plantar, colher, gerar riquezas, promover a educação e ter uma vida digna. Hoje, 130 anos depois da chegada dos primeiros colonos ao Estado, fica evidente o acerto desse modelo. Nenhuma região do Estado tem se desenvolvido tão plenamente quanto esta. Atualmente, a zona italiana da Serra gaúcha envolve mais de 50 municípios e possui, ao todo, mais de 1 milhão de habitantes, tornando-se o pólo econômico, cultural e turístico de maior expressão no sul do Brasil. Além das vinícolas de qualidade, também há a produção de móveis – e uma das maiores fábricas de equipamentos de cozinha do país –, calçados, vestuário, fábricas de tratores e equipamentos agrícolas, carrocerias de ônibus, caminhões, cutelaria, além da tradicional indústria alimentícia.

O Vale do Rio das Antas Foi ao longo do Rio das Antas que surgiram as primeiras comunidades de colonos italianos. O rio, que chega a percorrer quase 400 km com este nome, e que forma um dos mais belos vales do Rio Grande do Sul, foi o berço de uma comunidade nova e empreendedora. Vindos de uma Itália dilacerada pela miséria causada pela modernização capitalista que atingiu diretamente a estrutura agrária tradicional, os imigrantes tinham muito pouco a perder. A grande maioria dos italianos que vieram para o RS – quase 90 % – eram originários do Vêneto e da Lombardia, daí a presença de uma certa unidade cultural e religiosa, tão importantes para a formação de uma comunidade sólida como esta. Há inúmeros relatos sobre as dificuldades que os imigrantes tiveram ao sair do seu país. Geralmente eram casais jovens que deixavam os pais, a família, enfrentavam uma longa viagem, durante meses, passando por privações, doenças, mortes de parentes, rumo a uma terra estranha e, no seu imaginário, cheia de mistérios. Talvez até selvagem. Muitos deles, quando chegaram aqui, querendo ir logo para os seus lotes, acomodavam-se embaixo de árvores, ou de alguma gruta, até que pudessem derrubar a mata e construir suas casas. Ficavam ali isolados, com medo do ataque de animais, dos índios, dos bichos peçonhentos e das doenças.


Para quem se interessar, há o romance Nanetto Pipetta, de Aquiles Bernardi, que relata as aventuras e desventuras de um colono no RS, narradas com muita imaginação e humor, para o divertimento da comunidade italiana. Vinho, elixir da alegria As primeiras culturas foram as de milho e abóbora, para garantir o alimento das famílias e da criação, além da uva, para assegurar o elixir da vida e da alegria que é o vinho. Mas até que pudessem fazer a colheita, os pinhões serviram de base para a alimentação de muitos. Como a polenta é um prato típico da região do norte da Itália, os colonos mantiveram essa tradição. Sempre presente, ela era servida de muitas maneiras: grelhada com salame, com queijo, com radici e toucinho, com molho de galinha. Consumida até no café da manhã, era feita em grande quantidade nos caldeirões de ferro, onde se devia mexer até borbulhar, para atingir uma consistência bem firme. Apreciadores da caça, os colonos costumavam capturar passarinhos e aves como pombos, sabiás, tico-tico e, dizem, até papagaios. A passarinhada e as aves eram preparadas geralmente com toucinho e sálvia e acompanhadas de polenta. O risoto também era muito comum nas refeições e era feito quase sempre com os miúdos da galinha, e servido como acompanhamento para outros pratos. A religiosidade e as festas Diferentemente dos alemães, que construíram seus núcleos a partir da escola, os italianos buscaram a unidade pela religião, e é a partir das capelinhas que muitas comunidades surgiram e iniciaram o seu convívio social. Segundo Rovílio Costa e De Boni*, em algumas construções, para umedecer o barro ao erguer capelas e igrejas, foi usado o vinho, em vez de água. Este foi o caso da capela Nossa Senhora das Dores, no interior de Bento Gonçalves, e de muitas outras construções. Portanto, as festas estavam muito ligadas à Igreja, com festejos dos santos padroeiros, chamadas de “sagras”, além dos casamentos, batizados, festas da vindima, etc. Geralmente, depois da missa, os almoços eram preparados e compartilhados por todos, com muita fartura, com sopa de capeletti, galeto, polenta, massas e muito vinho e canções, ao som das sanfonas, para alegrar a vida dessa gente que trabalhava duro desde cedo. Enquanto as mulheres bordavam e conversavam, os homens jogavam bocha, ou a mora, que consistia em fazer

um cálculo rápido da soma dos dedos dos participantes colocados sobre a mesa, além dos jogos de cartas, como o quatrilho, a escova, bisca – e tantas outras brincadeiras. O basalto e a poesia das pedras Os colonos usaram o basalto para construir a base de suas casas, mas a parte de cima era quase sempre de madeira. Era ali, no porão de pedra, e ainda hoje é assim, que abrigavam os queijos, os vinhos, os salames, as copas e, quase sempre, a marcenaria. Essa combinação de pedra e madeira trouxe graça e beleza, além de utilidade e conforto num clima tão frio. Ao longo da Serra se vêem os muros feitos de pedras de basalto serpenteando os morros e dividindo as propriedades entre parreiras e pinheiros. O escultor João Bez Batti recolhe o basalto que encontra na beira do rio, e continua o trabalho das águas esculpindo e arredondando, completando a forma que a própria natureza deu. O escultor e poeta nos leva de volta pelos Caminhos das Pedras, onde ele vive e trabalha. O colono, assim como o escultor, molda a terra, trata e cuida, e, complementando o trabalho da natureza, colhe seus frutos e celebra a vida. Como deve ser. *Os Italianos do Rio Grande do Sul – Costa, Rovílio e De Boni, L., 1979, Vozes


Sabor


Polenta com Gorgonzola

Coelho ao Vinho Tinto

A POLENTA TORNOU-SE UM DOS ALIMENTOS BÁSICOS DAS POPULAÇÕES RURAIS DO NORTE DA ITÁLIA, QUE TROUXERAM PARA O RIO GRANDE DO SUL A TRADIÇÃO DESTE PRATO. ERA MUITO COMUM PREPARAR A POLENTA COMO ACOMPANHAMENTO PARA AVES, ESPECIALMENTE PASSARINHOS, MAS AQUI SUGERIMOS UMA RECEITA COM O FAMOSO QUEIJO ITALIANO.

A CARNE DE COELHO É MUITO APRECIADA POR TODA A ITÁLIA. AQUI SUGERIMOS UMA RECEITA TRADICIONAL COM VINHO TINTO, ERVAS E UM TOQUE DE CANELA.

250 G DE POLENTA PRÉ-COZIDA

1 PEDAÇO PEQUENO DE SALSÃO PICADO

(OU FUBÁ DE MILHO)

2 COLHERES DE AZEITE

ÁGUA / SAL

1 COELHO EM PEDAÇOS

1 PITADA DE NOZ-MOSCADA

1 TOMATE SEM PELE E SEM SEMENTES PICADO

25 G DE MANTEIGA

½ GARRAFA DE VINHO TINTO SECO

300 G DE QUEIJO GORGONZOLA EM PEDAÇOS

1 PITADA DE CANELA

Modo de fazer: Siga as instruções para cozimento da polenta, acrescente os temperos, e a manteiga no final. Quando estiver pronta, despeje parte da polenta numa fôrma refratária e cubra com gorgonzola. Repita a operação para formar camadas. Leve ao forno até dourar. Sirva em seguida. Serve como entrada ou como acompanhamento para carnes. Caso você queira usar o fubá de milho, a polenta deverá ser cozida durante 45 minutos, mexendo sempre, como nas receitas tradicionais.

1 CEBOLA PICADA / 1 CENOURA PICADA

SAL / 3 COLHERES DE MARSALA (OPCIONAL) Modo de fazer: Faça um refogado com a cebola, cenoura e salsão. Junte o coelho e deixe pegar cor nos dois lados, e então acrescente o vinho, a canela e o sal. Abaixe o fogo, tampe e cozinhe lentamente até ficar macio. Antes de desligar, adicione o Marsala.

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Sabor

Ragu, ou Molho à Bolonhesa

Spaghetti com Mexilhões

O RAGU, OU MOLHO À BOLONHESA, É ENCONTRADO EM DIVERSAS REGIÕES DA ITÁLIA, APRESENTANDO VARIAÇÕES. O SEGREDO É COZINHAR POR LONGO TEMPO EM FOGO BAIXO. SERVE PARA LASANHAS, SPAGHETTI E VÁRIOS TIPOS DE PASTA. FAÇA COM ANTECEDÊNCIA E GUARDE NA GELADEIRA.

É UM PRATO TÍPICO DAS REGIÕES COSTEIRAS, PRINCIPALMENTE DE NÁPOLES, ONDE O VONGOLE É MAIS POPULAR. MAS CASO VOCÊ NÃO ENCONTRE O VONGOLE, PODE SUBSTITUIR POR MEXILHÕES.

2 KG DE MEXILHÕES LIMPOS 400 G DE CARNE MOÍDA (PODE SER DE BOI,

2 COLHERES DE AZEITE

VITELA, PORCO, OU TUDO MISTURADO)

4 DENTES DE ALHO PICADOS

1 CEBOLA PICADA / 1 CENOURA PICADA

½ COPO DE VINHO BRANCO SECO

50 G DE BACON PICADO

3 TOMATES SEM PELE E SEM SEMENTES

½ GARRAFA DE VINHO TINTO SECO

SAL / SALSINHA PICADA

1 LATA DE TOMATE PELADO

1 PIMENTA VERMELHA PICADA SEM SEMENTES

1 COPO DE ÁGUA QUENTE OU CALDO DE CARNE

400 G DE SPAGHETTI / 2,5 A 3 LITROS DE ÁGUA

SAL / 1 PITADA DE NOZ-MOSCADA

Modo de fazer: Numa panela, aqueça o azeite, acrescente o alho e deixe pegar uma cor. Ponha os mexilhões e a pimenta, tampe e cozinhe em fogo alto por uns 2 minutos. Retire os mexilhões e descarte aqueles que estiverem fechados. Retire o recheio da metade dos mexilhões, e mantenha a outra metade nas conchas. Reserve-o. Aqueça a panela em que foram cozidos os mexilhões e acrescente o vinho, reduzindoo por uns 3 minutos. Ponha um pouco de sal, a salsinha, os tomates e os mexilhões. Enquanto isso, ponha água numa panela e depois que ferver junte o sal e a pasta. Deixe cozinhar conforme as instruções, e um pouco antes de ficar pronta escorra a pasta e leve-a à panela com os mexilhões. Finalize o cozimento da pasta no próprio molho. Sirva em seguida. Não se esqueça de que na cozinha italiana não se deve usar queijo nos pratos de frutos do mar e de peixes.

1 PITADA DE CANELA / 2 COLHERES DE AZEITE Modo de fazer: Numa panela bem grande, ponha o azeite, a cebola e o bacon. Deixe pegar uma cor, acrescente a cenoura e a carne. Mexa bem até a carne ficar marrom, junte então o vinho, e deixe reduzir. Acrescente o tomate, a água quente e deixe cozinhar em fogo baixo por bastante tempo. Ponha a canela e a noz-moscada. Continue mexendo de vez em quando, e mais para o fim adicione o sal. Este cozimento pode levar em torno de 1 a 2 horas.

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Sabor


Risoto Milanês O RISOTO É UM PRATO MUITO POPULAR NO NORTE DA ITÁLIA, ESPECIALMENTE NA LOMBARDIA E NO VÊNETO. É FEITO COM UM ARROZ ESPECIAL, ARREDONDADO, E OS TIPOS MAIS CONHECIDOS SÃO O CARNAROLI, O VIALONE E O ARBÓRIO. SEU PREPARO EXIGE ATENÇÃO, POIS O MAIS IMPORTANTE, ALÉM DO SABOR, É MANTER A CONSISTÊNCIA CREMOSA E OS GRÃOS FIRMES.

Pepperonata Alla Treviso EMBORA A PEPPERONATA SEJA UM PRATO MUITO POPULAR EM NÁPOLES, E NO SUL DA ITÁLIA, TAMBÉM HÁ UMA VERSÃO VINDA DA CIDADE DE TREVISO, AO NORTE. LOCALIZADA NA REGIÃO DO VÊNETO E CERCADA POR BELOS CANAIS, TREVISO É A CIDADE DE ORIGEM DE MUITOS DOS NOSSOS IMIGRANTES.

300 G DE ARROZ ARBÓRIO, OU OUTRO PRÓPRIO PARA “RISOTTO”

2 BERINJELAS CORTADAS EM CUBINHOS

1 CEBOLA PICADA / 1 COLHER DE AZEITE

2 COLHERES DE AZEITE

1 LITRO DE CALDO DE GALINHA OU ÁGUA

3 CEBOLAS

MINERAL QUENTE

2 DENTES DE ALHO MACHUCADOS

½ COPO DE VINHO TINTO OU BRANCO

2 PIMENTÕES VERMELHOS PICADOS

2 A 3 COLHERES (SOPA) DE MANTEIGA

EM QUADRADINHOS

1 ENVELOPE DE AÇAFRÃO / SAL

150 ML DE VINHO BRANCO

QUEIJO PARMESÃO RALADO NA HORA

50 G DE AZEITONAS PRETAS PICADAS

TUTANO DE BOI (OPCIONAL)

5 TOMATES SEM PELE E SEM SEMENTES

Modo de fazer: Numa panela, aqueça o caldo de galinha, ou a água, mantendo-a em fogo baixo. Em outra panela, ponha o azeite, a cebola e o tutano, caso for usá-lo. Coloque o vinho e deixe reduzir bem. Ponha o arroz e misture bem na panela. Acrescente o caldo ou a água quente sobre o arroz, aos poucos. Adicione sal e mexa delicadamente com um garfo. Vá acrescentando mais líquido conforme o arroz vai sendo cozido, sem deixar secar. O risotto deve ser sempre bem molhado. Mexa de vez em quando, mas sempre atento ao cozimento. Quando estiver quase pronto, adicione a manteiga e o açafrão, que deve ser desmanchado com um pouco de água. Mexa mais uma vez e sirva com parmesão e um fio de azeite por cima. A consistência deve ser sempre cremosa. Pode ser servido como entrada ou como acompanhamento.

TOMILHO FRESCO / SAL Modo de fazer: Salgue a berinjela e reserve por 1 hora ao menos. Depois lave bem os cubinhos de berinjela e seque tudo com papel-toalha. Enquanto isso, aqueça o azeite numa panela, ponha o alho, deixe tostar e então retire-o da panela. Acrescente a cebola picada, deixando ficar dourada, adicione a berinjela até secar bem e junte os pimentões e o tomilho. Ponha o vinho, tampe a panela e deixe cozinhar por uns 15 a 20 minutos, cuidando para não queimar. Junte os tomates e finalize o cozimento por uns 5 a 10 minutos mais. Ao final, ponha as azeitonas. Serve-se frio ou quente.

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Sabor

Galeto com Ervas TALVEZ O MAIS TÍPICO DOS PRATOS ITALIANOS DO RIO GRANDE DO SUL, O GALETO, NA VERDADE, TEM ORIGENS NA ITÁLIA. O GALETO TEMPERADO COM ERVAS DO CANTEIRO E ASSADO NAS BRASAS É IMBATÍVEL.

Ossobuco Alla Milanesa

2 GALETOS CORTADOS AO MEIO (VERTICAL)

O OSSOBUCO, EM ESPECIAL O DE VITELA, É MUITO APRECIADO EM TODA A ITÁLIA. É A COMBINAÇÃO DE UM PRATO SUBSTANCIOSO, DE COZIMENTO LENTO, E SABOROSÍSSIMO. AQUI, UMA RECEITA TRADICIONAL DE MILÃO.

4 DENTES DE ALHO AMASSADOS

4 FATIAS DE OSSOBUCO

SÁLVIA FRESCA PICADA

FARINHA DE TRIGO / AZEITE / SAL

TOMILHO FRESCO PICADO

½ XÍCARA DE VINHO BRANCO SECO

ALECRIM FRESCO PICADO

3 TOMATES SEM PELE E SEM SEMENTES

1 COPO DE VINHO BRANCO SECO

1 XÍCARA DE CALDO DE CARNE OU ÁGUA QUENTE

SAL GROSSO

GREMOLATA

1 COLHER DE AZEITE

1 DENTE DE ALHO BEM PICADO

RASPA DE 1 LIMÃO

SALSINHA PICADA / RASPA DE 1 LIMÃO Modo de fazer Gremolata: Misture os ingredientes da gremolata e coloque sobre o osso buco antes de desligar o fogo.

Modo de fazer: Deixe os galetos marinando de véspera com todos os ingredientes, menos o limão. Vire às vezes para temperar bem a carne. Aqueça a churrasqueira, raspe o limão sobre o galeto e esprema o sumo também. Ponha o galeto para assar em grelha própria ou em espetos. Deixe dourar. Sirva em seguida com salada de radite.

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Modo de fazer o Ossobuco: Passe o ossobuco na farinha e frite-o dos dois lados. Acrescente o vinho e deixe cozinhar por uns 10 minutos. Junte então os tomates, o caldo até cobrir, e o sal. Abaixe o fogo, tampe e cozinhe por cerca de 2 horas, mexendo às vezes para não pegar. A carne deve ficar bem macia e o molho, espesso. Acrescente a gremolata, deixe cozinhar mais um pouco e sirva em seguida.



Sabor


Tiramisu EMBORA TENHA SE TORNADO MUITO POPULAR A PARTIR DOS ANOS 90, O TIRAMISU TEM DIVERSAS VERSÕES E É BASTANTE TRADICIONAL DENTRE OS DOCES ITALIANOS. O MASCARPONE É UM QUEIJO CREMOSO ITALIANO MUITO LEVE, FEITO COM ÁCIDOS CÍTRICOS DA REGIÃO DE LODI. É QUASE UMA NATA BATIDA, E PODE MUITO BEM SER SUBSTITUÍDO POR ELA.

Torta de Amêndoas Lombardia

½ XÍCARA DE CAFÉ FORTE

AQUI SUGERIMOS UMA RECEITA ANTIGA, MUITO SIMPLES MAS DELICIOSA, VINDA DA LOMBARDIA. A AMÊNDOA É MUITO UTILIZADA NA CULINÁRIA ITALIANA, ESPECIALMENTE NOS DOCES E BISCOITOS.

¼ DE XÍCARA DE CONHAQUE, OU WHISKY

100 G DE AMÊNDOAS DESCASCADAS

2 OU 3 COLHERES DE VINHO BRANCO

E TRITURADAS

OU ESPUMANTE

3 OVOS SEPARADOS / 180 G DE AÇÚCAR

20 BISCOITOS TIPO CHAMPANHE

120 G DE MANTEIGA

400 G DE NATA FRESCA (OU MASCARPONE)

100 G DE FARINHA DE SEMOLINA

2 OVOS SEPARADOS

RASPA DE UM LIMÃO / 1 PITADA DE CANELA

5 COLHERES DE AÇÚCAR CONFEITEIRO

PEDACINHOS DE LARANJA GLACEADA OU

100 G DE CHOCOLATE MEIO-AMARGO PICADO

CRISTALIZADA (OPCIONAL)

Modo de fazer: Misture o café, o conhaque e o vinho. Arranje os biscoitos numa travessa de vidro ou louça retangular e umedeça-os com o café. Bata as claras em neve e reserve. Bata as gemas com o açúcar, acrescente a nata e misture tudo com as claras em neve. Caso tenha sobrado um pouco do café com conhaque, adicione à mistura. Espalhe sobre os biscoitos cobrindo bem, ponha o chocolate picado por cima, cubra com filme e leve para a geladeira. Sirva depois de algumas horas ou no dia seguinte.

Modo de fazer: Para pelar as amêndoas, afervente-as em um pouco de água, em seguida tire as cascas e seque bem as amêndoas. Passe no processador e reserve as amêndoas. Bata as gemas e o açúcar muito bem até ficar com uma cor pálida. Acrescente a farinha, a manteiga, a amêndoa, a raspa de limão, a canela e os pedaços de laranja. Bata as claras em neve e misture tudo delicadamente. Unte uma fôrma com manteiga e farinha, leve ao forno moderado por uns 30 minutos. Pode ser servida com nata fresca ou creme de baunilha.

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O sabor e o saber F E R NA N D O

LO K S C H I N

MASSA, A VOLÚPIA Um paraíso a contrastar com a Peste que assolava a Itália, Bocage imaginou a ‘doce terra’ de Bengodi. Lá crescia uma montanha de queijo gratinado: bastava deixar o macarrão rolar encosta abaixo para se gozar a mais deliciosa das refeições. Ícones italianos, Frederico Felini definia o mundo como a mistura da massa com magia e Sofia Loren se considerava mero subproduto do espaguete. A massa é a metáfora pela qual a Itália expressa o universo; se a comida é uma linguagem, a massa é seu vocabulário íntimo, seu poema. Não há caso igual de identificação entre alimento e povo. Para Garibaldi, “o herói de dois mundos”, seu aliado mais poderoso, o verdadeiro unificador da Itália foi o macarrão. Nascidos e criados na massa, os italianos passaram séculos engolindo a lenda de que seu prato nacional era

uma invenção chinesa importada por Marco Polo (séc. XIII). Na verdade, o que contou o viajante é que na China também descobrira a massa; numa cultura diferente esta semelhança, embora feita de um “trigo que crescia em árvores” (a fruta pão). A história da massa é tão enovelada como um prato de espaguete. Ela se confunde com a dos cereais, historicamente comidos ou cozidos como pirão num caldo (o puls latino, a polenta) ou assados em pão. Mistura simples de farinha e água, a massa descende destes dois alimentos básicos: pão e polenta. Tanto o It. pasta como o P. massa nasceram no grego: paste e maza, sinônimos que descrevem uma mistura uniforme e maleável. É possível que o cozinhar em vez de assar a massa de pão, mescla do preparo do pão e polenta, tenha surgido ao leste de Roma. A literatura persa fala de um ali-

“LA PASTA DI PIETRO MASSA” FERVER ÁGUA MINERAL COM UM POUCO DE ÓLEO DE OLIVA. COZINHAR AL DENTE A MASSA CARACOL (“CONCHIGLIONI”). RETIRAR. REFOGAR CEBOLA, ALHO, TOMATES PELADOS E CAMARÕES. RETIRAR. MISTURAR QUEIJO COTTAGE E TEMPERO VERDE. ENGROSSAR COM FARINHA DOURADA OU MAISENA. RECHEAR O INTERIOR DOS CARACÓIS COM O REFOGADO. COLOCAR UM A UM OS CARACÓIS NA TRAVESSA UNTADA. DESPEJAR O RESTO DO MOLHO COADO E LEVAR AO FORNO. SERVIR JUNTO A ERVILHAS TORTAS E ASPARGOS NA MANTEIGA.

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HONESTA

O mundo é a mistura da massa com a magia

mento, o lakshah (‘escorregadio’), termo que passou a diversos idiomas com o sentido de ‘massa’: Rus. laksha, Ucr. lokschina, Iídiche, lokschin. Antes sempre fresca, a massa passou a ser seca ao sol, a pastaciutta (‘pasta enxuta’) do sul da Itália, na época colônia moura (sécs. IX a XI). Tanto as caravanas árabes como os navegadores italianos precisavam de um alimento assim: versátil, nutritivo, leve de transportar, simples de preparar e que se conserva por mais de ano, quando, na tradição napolitana, preparado na lua cheia... A palavra árabe para ‘massa’, ainda presente nos dialetos do sul da Itália, itriyya passou ao português e espanhol: aletria. Uma das massas pioneiras foi a que os gregos chamavam de laganon, uma lâmina de massa, a lasanha; prato predileto de Cícero, era definida por Horacio como a

comida simples e saudável do homem simples e saudável. É bem possível que laganon derive de lazanon, o pote em que os gregos urinavam: assar lasanha seria uma nova utilidade dos urinóis... Roma só dizia dois nomes para massa, laganun e tracta, todos os outros trezentos surgiram no italiano medieval. O mais antigo é vermicelli (vermezinho), e o mais popular é espaguete (cordãozinho), mas a lista é curiosa: linguini (lingüinha), orechietti (orelhinha), capeletti (chapeuzinho), agnolli (ovelhinha). Os diminutivos falam do carinho, e o leque de nomes se estende desde a Ave Maria, que imita contas de rosário, até o penne, na forma do próprio. Convivendo com o epicentro do catolicismo, a massa recebeu o condimento da religião: ravioli e torlelli, antes recheados com as sobras da véspera, receberam abóbora,


O sabor e o saber F E R N A N D O

LO K S C H I N

nozes e creme para os dias de abstinência à carne, eram la pasta di quaresma. A estada do papado em Avignon deixou como legados gastronômicos o divino tinto Chateauneuf du pape (‘castelo novo do Papa’) e a escatológica lasanha crouzet, que, recheada de queijo, nozes e amêndoas, é um prato natalino a imitar as fraldas do menino Jesus. No livro de culinária com o mais saboroso dos títulos, ‘A Volúpia Honesta’, Bartolomeu de Platina (1475) dava receitas de massa e o tempo de cozinhá-las, a reza de ‘tres pai-nossos’ – é antigo o gosto pela pasta al dente... A origem da palavra macarrão é uma verdadeira salada, há até quem identifique um comentário ao provar o prato: bon, ma caroni (‘bom, mas caro’) – não é à toa que a expressão si no è vero è bene trovato é italiana. Macarrônico descrevia os poemas cômicos do séc. XVI, onde o latim parodia os dialetos populares. Pilhéria da Itália do norte em relação ao sul é que, ao fazer macarrão, o furo do meio é o último e mais difícil passo. Spaghetti Western foi o estilo criado pelos filmes de faroeste italianos dos anos 70 que revitalizou o cinema e que se traduz na luz do Mediterrâneo, câmara de Sergio Leone e ação de Clint Eastwood embalados pela música de Enio Morricone. O queijo da região de Parma tem sido o fiel escudeiro da massa por 800 anos. Vizinhos de nascimento, pasta e parmezzano compõem uma dupla de amigos que se enchem de alegria toda vez que se encontram. Tempos sem molho, o queijo era misturado a pimenta, canela, ervas e até açúcar. No olhar poético de Goethe, o queijo ralado “espraia-se sobre o espaguete como o orvalho na relva”; ao visitar a Itália em 1787, o gênio alemão conheceu a massa e esqueceu o chucrute. Já o tomate se uniu com a massa e o queijo no triângulo do macarrão. Trazido da América do Sul, o tomate chegou primeiro na Sicília e Nápoles, então colônias es-

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panholas: o pommarolla era antes o pomodoro alla spagnuola. O sabor e cor do tomate deram o contraste para a neutralidade da massa. Nascidos em mundos à parte, tomate e massa formaram o par perfeito, desde sempre predestinados um para o outro. Após o tomate, nem a massa nem a mesa seriam as mesmas. A massa era comida pura e com as mãos, o molho de tomate motivou o uso do garfo, costume que da Itália migrou à França e daí se alastrou. A globalização da massa, favorecida pela emigração italiana e consolidada no pós-guerra, deu-se pelo Espaguete com Molho de Tomate (enlatado!), ainda hoje o prato de massa mais consumido. O gosto romano por aves, principalmente passarinhos, ganhou expressão na galinha recoberta com massa, um dos pratos mais tradicionais na Itália do séc. XIX. Hoje a galinha com massa rivaliza com o feijão com arroz como o prato do domingo brasileiro, e no galeto al primo canto do imigrante estão presentes a massa, a pequena ave e a polenta, os três principais pratos do país de origem. Este texto, indigesta maçaroca macarrônica, á assinado por um nome materno italiano – Massa – e um paterno iídiche – Lokschin, um ‘Massa Massa’, a invocar dose dupla de euforia na mesa e de agonia na balança. Qualquer que seja o nome, somos subprodutos da massa e, Volúpia Honesta, junto à mesa a presença emanante de Sofia Loren, afinal o mundo não é a mistura da massa com magia? Mangia que te fa biene. E a massa é até mesmo o segredo energético de Arnold Schwarzenegger, Mr. Músculo eleito Governador que se despediu do Exterminador do Futuro com a famosa frase: “Pasta la vista, baby!”.

FERNANDO MASSA LOKSCHIN É MÉDICO E GOURMET fernando@vanet.com.br


Bom conselho P O R

M A LU

C O E L H O

NHOQUES DA SORTE A origem do costume é explicada com a lenda de um frade andarilho que chegou a uma pequena localidade italiana e bateu à porta de um casal de velhinhos, num dia 29. Pediu um prato de comida e recebeu o único alimento que havia: nhoque. Tempos depois, voltou ao local e contou aos velhinhos que, após comer aquele prato, sua vida mudara para melhor. NOS PERGUNTAMOS: MAGIA OU SUPERSTIÇÃO? Magia ou superstição, a lenda virou costume entre os italianos e se espalhou pelo mundo. No Brasil, ganhou a simpatia das pessoas, que procuram o nhoque nos restaurantes sempre no dia 29 do mês ou o preparam em casa, cultivando o ritual. Alguns comem apenas sete nhoques, mastigando sete vezes cada um. Outros comem tudo, pois consideram importante não haver sobras. Outros ainda colocam dinheiro embaixo do prato, almejando alcançar a fortuna. VARIEDADES Diferenciando-se conforme o ingrediente da massa e do molho, o nhoque começou a ser elaborado com várias farinhas: trigo, arroz, miolo de pão e até de milho. Mas foi a chegada da batata que mudou a história do prato. Tornou-se seu ingrediente supremo. O modo de cozimento varia conforme o país – uns cozinham na água, outros no leite, colocam recheios de queijo, uva passa, temperam das mais variadas formas, com manjericão fresco, castanhas e frutos secos. RAZÃO DO SUCESSO O que explica o sucesso do prato de todos os dias 29, além da relação mística com este alimento, são suas variadas elaborações e o seu delicioso sabor, que independe de magia ou superstição.

O NHONQUE É SEMPRE UMA DELÍCIA! ESTA É A VERDADEIRA FORTUNA!

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Casa

RelĂ­quias


italianas POR I R E N E M A R C O N D E S FOTOS L E T Í C I A R E M I Ã O Estilo Zaffari

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Casa


CORES VIBRANTES DESTACAM A CULTURA ITALIANA Restaurar um móvel colonial antigo garimpado no interior

ladas nas peças: azul anil, vermelho, verde-claro e azul

do Rio Grande do Sul e depois devolvê-lo em plena for-

celeste. Especialistas revelam que ao longo de quase um

ma à sociedade é certamente uma das maneiras mais

século existiu uma seqüência igual no uso dessas cores

nobres de se preservar e honrar a cultura dos imigran-

mesmo entre as colônias distantes. Mais do que imprimir

tes italianos. Produzidos em madeira maciça, como ce-

uma nova roupagem, essas pinceladas de tinta a óleo

dro, araucária e louro, os móveis concebidos por esses

tinham como objetivo estabelecer um código social, um

aprendizes de marceneiro priorizavam os aspectos fun-

elo entre as famílias estrangeiras que se adaptavam ao

cionais. A agradável surpresa é que essas formas, mui-

novo país. Hoje, a decoração contemporânea reserva

tas vezes sem proporção e com acabamentos rústicos,

um espaço privilegiado para essas peças. No entanto,

conferem uma identidade única ao mobiliário colonial.

não se trata de mero modismo. Trata-se de humanizar a

A personalidade marcante e alegre desses imigrantes

decoração, de resgatar a história de uma cultura e de

italianos se reflete nas cores vibrantes que eram pince-

trazê-la para a intimidade de nossas casas. Estilo Zaffari

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Casa


MÓVEIS DE MADEIRA NOBRE CONTAM HISTÓRIAS DA COLÔNIA

Via Appia: resgate de raridades A cultura dos imigrantes italianos e alemães sempre despertou um interesse especial no advogado gaúcho Paulo Roberto Maia. Nas temporadas que passava em sua casa na Praia do Rosa, Santa Catarina, ele levava consigo antigos móveis coloniais para serem restaurados cuidadosamente. Como nunca tinha coragem de desfazer-se deles, a residência litorânea foi ficando intransitável. Paulo começou a vender alguns exemplares para os amigos, até que, em 1990, abriu a loja Via Appia, em Porto Alegre. “Cheguei a dormir no carro quando viajava pelo interior do Estado à procura de raridades que conservam a história destes imigrantes”, revela Maia. Um de seus achados prediletos é o roupeiro de cedro verde-azulado, do começo do século XX, a síntese mais fiel do legítimo móvel italiano. “Esta peça não foi produzida numa marcenaria, mas sim no quintal de uma casa, com poucas ferramentas. As dobradiças aparentes e a tramela no lugar da fechadura expõem a simplicidade e a robustez da peça.” O curioso é que ao contrário dos móveis, que não recebiam muitos acabamentos, os brin-

quedos mostravam-se ricos em entalhes e encaixes. “Os avós faziam carrinhos e cavalinhos de madeira para seus netos, e a dedicação a estes projetos era grande”, conta. Exibindo um pouco mais de elaboração, a cadeira de cedro pincelada de azul ainda não passou por restauros. Veio junto com mais cinco exemplares de um conjunto de doze cadeiras. “As demais foram terminando com o tempo e podem até ter virado lenha. Isto era muito comum”, conta Maia. Ele ressalta que esse modelo tipicamente italiano de cadeira é um dos mais copiados até hoje. “Uma peça rara.” Já a imaculada mesa de louro nunca recebeu uma demão de tinta e foi encontrada em ótimo estado de conservação. “Certamente a família era mais abastada e tinha consciência de que se tratava de uma madeira nobre”, explica. Detalhes como esse reforçam a teoria de Maia: cada peça tem uma boa história para contar, sobre tempos em que as famílias se reuniam em torno do fogão a lenha e as crianças se distraíam com os brinquedos, que eram, na verdade, pequeninas obras de arte.

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Casa

ANTIGOS UTILITÁRIOS VIRAM CHARMOSAS PEÇAS DECORATIVAS

Naftalina: reinventando a História Você pode se perguntar o que este paulista e descendente de ucraniano tem a ver com os móveis coloniais italianos. A resposta é simples: paixão. Quando Carlos Sautchuck veio morar em Porto Alegre, no início dos anos 80, passou a dedicar-se a um hobby bem peculiar nos finais de semana. Viajava pelo interior do Estado em busca de móveis antigos para depois restaurá-los e colocá-los em uso na sua residência. Aos poucos, os amigos começaram a encomendar essas peças antigas e a brincadeira acabou virando um negócio. Em 1991 Sautchuck abriu as portas da loja Naftalina e hoje dedica uma área de 400 metros quadrados exclusivamente para os modelos coloniais, exibindo um acervo invejável de centenas de móveis e objetos. Da cidade de Bento Gonçalves vieram, por exemplo, os tamancos de madeira e de couro, da década de 40, que eram utilizados pelos italianos no parreiral. Outro design curioso é o do baú de araucária, que hoje apresenta um desgaste natural da pintura avermelhada. Repare que a robusta caixa de madeira fica suspensa por quatro delica-

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dos pés. “O italiano fazia o móvel de acordo com a sua vontade, sem se preocupar com tendências, estilos e estética”, conta o especialista. Segundo ele, muitas vezes a fronteira que separa a cultura italiana da cultura alemã se confunde. “O bule de ferro esmaltado é a prova disso. Apesar de ser produzido pelos alemães, foi amplamente utilizado nas residências italianas”, comenta. Cidades coloniais como Brochier, Maratá, Serafina Corrêa e Carlos Barbosa são minas de ouro para garimpeiros de peças antigas como ele. As garrafas de vidro, que antes conservavam vinho e graspa, vieram de Carlos Barbosa e hoje assumem um papel decorativo na casa de seus clientes. “Essa mudança de status é fascinante. Transformar algo que foi meramente utilitário em uma peça a ser admirada é como reinventar a História”, diz. O mesmo acontece com as gamelas “de orelhas”, utilizadas para salgar a carne. Hoje, as peças de madeira maciça ainda estão em perfeito estado e poderiam ser usadas, mas as pessoas preferem empregá-las na decoração, como se fossem objetos valiosos demais para voltarem para a cozinha.



Casa


ARTESÃO REVELA SUA COLEÇÃO DE OBJETOS RAROS

Normélio: garimpo de relíquias Na casa deste artesão, em São Sebastião do Caí, que também abriga o ateliê de restauro de móveis, todos os cantos remetem à cultura colonial. A começar pela própria estrutura da moradia: janelas e portas trazidas de antigas residências do interior e paredes erguidas com madeiras de costaneira e tijolos de demolição. Na cozinha, destacam-se o robusto armário colonial azul, que abriga as louças e as schmier, e um porta-utensílio por onde desfilam as colheres de pau usadas nas colônias. Normélio Brill, filho de um carpinteiro alemão, herdou não só o talento do pai como também boas lições de marcenaria. “Ele me ensinou a fazer encaixes, a conhecer a madeira e a afiar as ferramentas. Uma arte que é fundamental neste ofício”, conta. A paixão pelo garimpo e restauro de móveis coloniais começou na década de 80. “Certo dia eu entrei numa tenda de móveis antigos na beira de uma estrada e vi uma cadeira de balanço bastante danificada. Foi paixão à primeira vista. Restaurei e vendi para um amigo. A peça continua

perfeita e em uso quase 25 anos após o conserto”, comenta. A possibilidade de dar nova vida ao móvel é que fascina este artista. “Só de olhar para uma peça eu consigo identificar a espécie de madeira empregada. Sou movido por um forte sentimento de que não se pode deixar uma boa madeira sem restauro”, afirma Brill. Ele não mede esforços e viaja para cidades no interior em busca dessas relíquias, muitas vezes esquecidas em porões. Segundo Brill, o mérito da resistência deste mobiliário deve ser atribuído aos colonos, que respeitavam a época certa do corte das árvores. “Os meses que não tinham a letra ‘r’ eram os liberados ao corte. Desse modo, a seiva estava baixa e a madeira ficava mais durável e resistente ao ataque de cupins”, explica. A longevidade dessas madeiras é comprovada no armário italiano transformado em cristaleira e escolhido para acomodar a coleção de imagens sacras, figuras de ex-votos e de cerâmicas holandesas. “É um bom exemplo de como uma peça centenária pode integrar a decoração atual”, diz.

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Tradição

Receita de POR

P AU L A

TA I T E L B AU M

FOTOS

E D UA R D O

I G L E S I A S

Eu, que nunca fui de preparar receitas italianas,

pre em ritmo de tarantela. E isso, eu juro, não é fol-

aprendi. É assim: junte força de vontade com alegria

clore. Leia esta matéria e você terá certeza do que

de viver, acrescente carinho e superproteção, mis-

eu estou dizendo. Porque ao conhecer de perto as

ture com o amor pela cozinha, coloque no meio de

matriarcas italianas, a gente percebe que elas car-

uma grande família e pronto. Você terá aí uma legíti-

regam muito mais do que sobrenomes vindos da

ma mamma. Independentemente da época em que

Itália. Carregam, todas, muita energia e a certeza

nasceram e dos gostos pessoais que possuem, a

de que nada é mais importante do que ter a família

impressão é a de que a vida dessas mulheres é sem-

unida. De preferência, é claro, em volta da mesa.

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Mangia che te fa bene! Antigamente, na colônia italiana, era comum que os noivos recém-casados fossem morar com os pais do rapaz. Quer saber o que a sogra fazia quando a nora chegava? Mandava a jovem desposada ir fazer a polenta. Só pra ver se a moça era forte o bastante pra ficar mexendo mais de uma hora o fubá fervilhante no caldeirão enorme. Mamma mia! Não quero nem pensar o que acontecia se a sogra encontrasse uma bolinha de farinha perdida lá no meio. Felizmente, isso já era. Hoje, as mammas italianas, pelo menos as que moram em Porto Alegre, são modernas, flexíveis e... lights. Se bem que light é uma palavra que definitivamente não combina com elas. Ao menos não no que se refere a comida. Onde tem mamma tem que ter muita massa. Quando eu sentei pra conversar com Dona Inês Franciosi La Porta, uma doce mamma de quase 86 anos, a primeira coisa que ela fez foi me mostrar um cartão


onde estava escrito de próprio punho que, nesses anos da sua vida, ela teve a oportunidade de saborear massas feitas por cinco gerações da família, da sua avó até sua neta. Ou seja, a massa é uma coisa que passa de mamma para filha. Não é à toa que Paula, uma das netas de Dona Inês, é sócia do Puppi Baggio, um restaurante italiano com clima de casa da nona. Paula e as irmãs lembram que passaram muitos finais de semana esticando massa de lasanha na casa da avó. O que era uma festa. “É massa dia e noite”, diz toda faceira Jandira Broilo, uma moderna mamma que se veste com camisa Forum e calça capri pra cozinhar. Janda, como é chamada pelos amigos, me diz que o supermercado é o seu shopping, tamanho é o seu prazer em escolher ingredientes. Para ela, a mamma é aquela que preserva o culto pela comida. “Pra gente, comer não é só se nutrir, tem todo um ritual, ficar junto na mesa, decidir as coisas...” Janda morou onze anos na Itália com

o marido e os dois filhos. De volta ao Brasil, trouxe maravilhosas receitas da cozinha toscana que hoje prepara para a família diariamente. Observo ela cozinhando e, ao mandar o marido sair de perto, descubro outro segredo de mamma: homens não devem se meter (a não ser para provar). Janda é outra que herdou da mãe o amor pelas receitas. Já Dona Ignez Varnier Spolidoro, quando casou, aos 17 anos, nunca tinha cozinhado nada na vida. Como há 63 anos não existia comida congelada, muito menos telepizza, ela nem pestanejou. Antes das bodas, encheu um caderno inteiro com receitas da mãe. Pra você ver como toda mamma é um poço de decisão (mesmo quando nem é mamma ainda). Eu conheci o caderno, que hoje é uma relíquia com direito a manchas de molho e tudo. E Dona Ignez, aos 80 anos, continua cozinhando pra família. Entre suas especialidades, também está a organização de festas, assistência social, ar-

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recadação de fundos, bordado e costura, jogo de cartas e por aí vai. É... mammas italianas parecem estar sempre ligadas na tomada. Boas conselheiras Uma pesquisa realizada na Itália mostrou que sete, em cada dez homens entrevistados, pedem a opinião de suas mães para tomar as decisões corretas em sua vida profissional e pessoal. A razão para esse hábito é o fato de considerarem a mãe a pessoa mais próxima, que melhor os entende e que, em muitos casos, é a “musa” de seu sucesso. Para 31% dos entrevistados, a mãe transmite segurança, para 26%, tranqüiliza na hora de tomar decisões difíceis e para o restante é aquela que dá força para que sigam em frente. Ou seja, mamma nunca deixa a peteca das suas crias cair. Elas são orgulhosas, elas são protetoras, elas são as primeiras a tentar encontrar uma boa saída.

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Questionando os filhos e netos das mammas sobre isso, ouvi coisas como “ela sempre quer saber com quem eu saio, o sobrenome” ou “quando tenho um problema, não recorro às amigas, mas sim a ela”. Talvez seja por isso que casa de mamma nunca fica vazia. “Eu moro sozinha, mas nunca estou sozinha”, diz, feliz, Dona Ignez. “Meu filho vem três vezes por dia me ver”, conta Dona Inês La Porta. “Qui no beve in compania é un ladro o un spia”, fala Dona Jandira, citando um provérbio italiano que diz que quem não bebe vinho acompanhado é um ladrão ou um espião. Ou seja, toda mamma quer bastante gente pra dividir a bebida, a comida e tudo o que ela tem a oferecer. Todas vinhos da mesma pipa Mammas, como boas italianas que são, adoram vinho. Tomam diariamente, sempre pouquinho. O que talvez seja o segredo da longevidade. Peço para Dona


Ignez contar uma história de quando era criança, e ela acessa os arquivos. Lembra de quando tinha seis anos e conta que o pai ia encontrar os amigos depois do trabalho na bodega perto de casa. Depois de jantar, a menina Ignez ia então buscá-lo. Chegando lá, ganhava um pouquinho de vinho. “Não sou viciada! Vicia quem quer”, ela me diz com toda sua sapiência de mamma. No almoço dominical na casa de Dona Janda também é assim. “Deus me livre colocar Coca-Cola na mesa”, diz ela, enquanto serve um bom vinho para todos. Seus netos de olhinhos puxados (o genro é de descendência oriental) estão na mesa, e o menor, de seis anos, molha o dedinho na taça do pai para depois provar. Ele faz uma careta e todos riem. E na mesa de Dona Inês também não faltam vinho e muita alegria. Risada, aliás, é outra característica da mesa de mamma. Todo mundo alegre, rindo e falando alto e ao mesmo tempo.


Elas aquecem os pés e a alma No almoço que reuniu a família de Dona Inês para a matéria, suas netas se empolgam e começam a contar outras histórias da mamma e avó. De repente, uma delas diz “tem o sapatinho de lã”. Sapatinho de lã?, Pergunto eu. E fico sabendo que Dona Inês adora presentear as pessoas com o tal mimo. “A gente mal apresenta um namorado e ela já vem com um sapatinho de lã para ele”, diz uma delas. No final da entrevista, Dona Inês pede meu endereço, diz que vai mandar um presente. Tomara que seja um sapatinho de lã, penso eu. Com essa do sapatinho, não consigo deixar de pensar que mammas são uma fonte inesgotável de calor humano. Sempre com um sorriso enorme e o braços abertos, não apenas para a família, mas também para os amigos. “Quando a gente morava na Itália, tinha sempre um monte de gente em casa, Sócrates e Zico viviam por lá.” Sim, caro leitor, Sócrates e Zico, os jogadores,

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que como todos que vivem longe de casa também precisavam de um colinho de mãe de vez em quando. Ou de mamma, pra ser mais exata. E já que o assunto é futebol, vale dizer que em casa de mamma até jogo na televisão é motivo pra reunir a família e começar a gritaria. Na casa de Dona Ignez Varnier Spolidoro é assim. Só que o engraçado é que entre os Spolidoro só tem colorado, enquanto os Varnier são todos gremistas. Dá pra imaginar a confusão quando se reúnem, não? Os dez mandamentos da boa mamma Depois desta matéria, conhecendo as mammas de perto, poderia dizer que essas matriarcas de descendência italiana têm mais do que receitas: têm seus próprios mandamentos. Que nem sempre são seguidos à risca, mas que existem para caracterizá-las. Vou me atrever a listá-los.


DEZ MANDAMENTOS DA BOA MAMMA OFERECERÁS SEMPRE BOA COMIDA E BEBIDA À FAMÍLIA E AOS AMIGOS. TERÁS O COLO MAIS MACIO E OS BRAÇOS MAIS ACOLHEDORES QUE PODEM EXISTIR. COMEÇARÁS A PREPARAR O ENXOVAL DAS FILHAS ASSIM QUE ELAS NASCEREM. SABERÁS SEMPRE COM QUEM ANDAM FILHOS E NETOS. CULTIVARÁS O GOSTO PELO JOGUINHO DE CARTA, PRINCIPALMENTE OS DE ORIGEM ITALIANA. ESQUENTARÁS A CABEÇA QUANDO NECESSÁRIO, MAS OS IMPROPÉRIOS SERÃO SEMPRE EM ITALIANO. TERÁS UM ORGULHO ENORME DE TODOS OS TEUS DESCENDENTES. TERÁS FIBRA E FORÇA PARA ENFRENTAR QUALQUER PROBLEMA. FREQÜENTARÁS A IGREJA – A NÃO SER QUE SEJAS UMA ANARQUISTA. FARÁS DAS FILHAS MULHERES AS MAMMAS DA NOVA GERAÇÃO.


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Um vale


nevado T E X TO S

E

F OTO S

C R I S

B E R G E R


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O VISUAL É DESLUMBRANTE. MESMO QUE VOCÊ NÃO ESQUIE, VAI AMAR ESTE LUGAR

Antes de começar a escrever esta matéria vou lhes confidenciar um antigo e superado preconceito. Para isto, preciso voltar no tempo uns cinco anos, quando eu tinha a convicção de que férias deveriam ser aproveitadas sob um sol de quarenta graus em alguma ilha paradisíaca do Caribe. Eu detestava inverno. Mas um dia, por ironia do destino, acabei aterrissando em uma estação de esqui da América do Norte. Resultado? Passei a amar a neve, o frio e todas aquelas coisas maravilhosas que acompanham as baixas temperaturas: vinho tinto, fondue, roupas elegantes e ambientes acolhedores. Assim, ao ser convidada a escrever sobre Valle Nevado eu estava predestinada a adorar a viagem. E adorei! Não há como discordar que o principal motivo que leva as pessoas ao Valle Nevado seja a prática do esqui, mas ouso afirmar que há muito mais do que neve por lá. No decorrer das linhas que se formam vou lhes mostrar as delícias que este Valle chileno reserva para todos que o visitam. Acima das nuvens sempre raia o sol Me despedi de Santiago do Chile rumo às montanhas de Valle Nevado com o céu nublado, em uma manhã mais fria do que o habitual. Estava ansiosa para subir a 3.025 m de altura. Deixar para trás a agitação urbana. Uma verdadeira sucessão de “esses” se revelou pelos 42 quilômetros de estrada asfaltada. À medida que eu ganhava altura, o azul substituía o branco do céu.


“Bom sinal”, pensei. Sempre é melhor chegar em um lugar novo com o colorido do sol. Ao olhar para baixo pude ver um grande cobertor de nuvens me separando da elétrica capital chilena. A natureza mostrava sua força, e meus olhos foram contemplados com a imagem de montanhas salpicadas de neve e cercadas de brumas. De repente, avisto o hotel; mais uma curva e ele foge dos meus olhos; volta a aparecer e não me restam dúvidas: eu estava chegando à estação de esqui de Valle Nevado. Antes de prosseguir quero deixar uma dica útil para quem enjoa facilmente: tome um remedinho dez minutos antes de entrar na van e evite ficar sentado de costas. Caso contrário, você provavelmente não terá as melhores recordações do trajeto até a estação... Mapa do Valle Valle Nevado é a maior estação de esqui da América do Sul, tem 37 quilômetros de pistas e 9 mil hectares. São 34 pistas que se dividem conforme o grau de dificuldade que impõem aos esportistas, com opções para principiantes, intermediários e profissionais. Para quem está começando, aulas de esqui ou snowboard são fundamentais. Fatalmente os primeiros dias serão de quedas, mas com um pouco de determinação a brincadeira começa a valer a pena. Faz toda diferença ter aulas. Elas não são baratas, mas se tornam absolutamente necessárias. Lembre-se: um bom professor fará você amar o esporte de neve. Garanto

que depois desta temporada esquiar estará sempre dentro de seus planos. Valle oferece uma equipe de 70 instrutores bilíngües de diversas nacionalidades. Nós, brasileiros, somos grandes freqüentadores da estação, o que torna garantidas as aulas em português. Como sua concentração deverá estar totalmente direcionada para aprender a se equilibrar na neve, a aula de esqui não será o melhor momento para aprimorar o espanhol. Portunhol não vale. Opte por aulas no nosso idioma. A equipe de instrutores de esqui conta com o talento de Isabel Clark. Ela foi classificada para os Jogos Olímpicos de 2006 em Torino, na Itália. Ostenta com orgulho o título de ser a primeira sul-americana classificada para as Olimpíadas. A 3.670 metros de altura está o cerro Três Puntas, onde se encontra o desnível mais alto da estação, com 810 metros. Para subir as montanhas, o Valle oferece 11 meios de elevação. O Andes Express leva 5 minutos e quarenta segundos para percorrer 1.700 m. Caso a neve não seja generosa com os esportistas, o Valle tem 19 canhões que a fabricam e garantem a diversão de quem não pode ficar sem descer uma montanha. Para quem pratica snowboard, as pistas Half Pipe e Border Cross são um verdadeiro deleite. A Half Pipe tem o formato de meia-lua e é perfeita para manobras radicais. É em Valle Nevado que acontecem, desde 2001, os campeonatos mundiais de snowboard. Detalhe importante: Valle é a única estação latino-americana a


sediar o Mundial. Cinco curvas, seis saltos e uma “triple ola” compõem a pista de Boarder Cross. E para a temporada de 2005 Valle Nevado promete um novo snowpark, mesclando a modalidade de half pipe, saltos e obstáculos. Para os mais experientes, a estação oferece o heliskiing, e um helicóptero leva os esquiadores para os topos mais altos e exclusivos da montanha, onde a neve é virgem e de excelente qualidade.

O ESQUI É SENSACIONAL. MAS VALLE NEVADO TEM MUITAS OUTRAS DELÍCIAS 62

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Um momento só seu Muitas pessoas acham que uma estação de esqui é um local perfeito apenas para quem pratica esportes de neve. Eu ouso discordar. Uma estação é um lugar ideal para um momento só seu. Coloque sua leitura em dia, deixe as horas correrem soltas enquanto você relaxa ao sol ouvindo seu CD preferido. Reorganize seus pensamentos, estipule novas metas de vida, olhe para dentro, se conheça. É exatamente a idéia de não fazer nada que provoca um momento de introspecção maravilhoso. Como inspiração, você tem os Andes. Gosto de pensar que uma estação de esqui é como uma praia. No lugar da areia, a neve. As cadeiras de praia


são trocadas pelas diversas mesinhas espalhadas pelo deck. Foi assim, sentada em uma delas, que as horas da minha primeira tarde no Valle passaram. O sol deixava a temperatura deliciosamente agradável. O colorido das roupas dos esquiadores emprestava ao ambiente um clima ainda mais alegre. No alto das montanhas, manobras arrojadas. No pé dela, os iniciantes buscavam o equilíbrio para provar a sensação de liberdade que só entende quem esquia. Inspiração das montanhas Se nas pistas a grande atração são os esquiadores e snowboarders, fora delas a gastronomia ganha brilho especial. No Valle há cinco opções para agradar a seu paladar. Você pode escolher entre as cozinhas francesa, mediterrânea, italiana, americana, chilena e suíça. Todas elas sob o olhar atento do chef chileno Axel Manrriquez, que ostenta no seu currículo quatro temporadas na semana gastronômica de Milão e Roma. Axel gosta de levar para dentro de sua cozinha sabores naturais com influência latino-americana. Ele cria os pratos sem repetir ingredientes. Admira a textura dos alimentos, aposta na alquimia dos sabores e cozinha como se todos os

dias fossem domingos. Para o cardápio da temporada de esqui de 2005, que se inicia em junho e estende-se até o fim de setembro, Axel garante que todos os pratos já estão elaborados na cabeça. Quando conversamos ele estava prestes a colocar suas criações em prática. Desconfio que haja um ingrediente especial que faz os pratos alcançarem tanto sabor e sofisticação. Arrisco dizer que é o ar montanhês. Uma nova geração de chefs de primeira classe toma conta da gastronomia do Valle. O Fourchete D’or é comandado pelo talentoso Damian Sanches, da região de Chillán. Com apenas 22 anos, Damian já passou pela cozinha do Hotel Ritz Carlton. Formado pelo Instituto de Gastronomia de Santiago, ele me contou o segredo para deixar os pratos saborosos: prepará-los com amor e carinho. Há que se levar em conta que a rotina do jovem chef se dá entre comandar a cozinha e descer as montanhas esquiando. O máximo de trânsito que ele pega é no ski lift (meios de acesso ao alto da montanha). No clima do Valle Viajei ao Valle sozinha e descobri que, como eu,

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FORA DAS PISTAS, A GASTRON0MIA É A GRANDE ATRAÇÃO 64

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muitas pessoas chegam à estação desacompanhadas. Tudo bem que eu estava ali a trabalho e o restante do pessoal de férias. Mesmo assim me dei conta de que se “enturmar” por lá não leva mais do que meio turno. Portanto, se você não tem companhia para fazer esta viagem ou quer mesmo viajar sozinho para ter a oportunidade de conhecer novos amigos, vá sem medo de ser feliz. No final do primeiro dia eu já tinha feito minha turma. Não apenas como repórter, mas também na posição de quem gosta de aproveitar as coisas boas da vida, vou logo dando uma dica: é obrigatório acabar o dia mergulhado na piscina climatizada, ao ar livre. Você só precisa de um pouquinho de coragem para vencer o frio, tirar a roupa e pular na piscina. Uma vez dentro dela, é observar o sol deixando o horizonte avermelhado e curtir a incrível sensação que a água quente provoca em contraste com a baixa temporada do ar. Fim do dia. Boas lembranças das manobras na montanha. Hora de relaxar e pedir um pisco sauer, bebida típica chilena. A 3 mil metros de altura, uma única dose é suficiente para deixar as pernas bambas, por isso, vá com calma. Aviso às mulheres: a predominância do sexo mas-


culino em Valle Nevado é e-vi-den-te. Se você chegar na piscina e perceber que é a única mulher presente, deixe de besteira e siga em frente. Posso afirmar que o clima descontraído da estação é um ótimo ambiente para conhecer pessoas diferentes. Afinal, não há pressa para nada. A vida passa tranqüila em meio à Cordilheira. E o romance está no ar. Montanha acima Há horas eu estou tentando disfarçar, mas terei que contar. Eu não esquiei. Quero dizer, não foi desta vez. Prometi às montanhas que na próxima passagem pelo Valle Nevado eu não direi adeus sem antes deslizar em seus cerros. Porém não foi só da base da montanha que as observei. Por dois caminhos bem distintos fui até o topo. A história é a seguinte: todos os dias, à noite, uma espécie de caminhão alisa a neve da pista para o dia seguinte. Fui de carona com um deles. Rádio ligado, farol acesso, eu e o motorista montanha acima. Um trabalho solitário que é feito durante a madrugada. Na descida paramos para uma fotografia. Um daqueles momentos mágicos. Montei meu tripé e arrumei minha câmera.

Lá embaixo o hotel iluminado. O silêncio era quebrado apenas pelas vozes suaves do vento. Me senti feliz. Fui abraçada pelas montanhas. Guardei este momento para sempre dentro do meu coração. No dia seguinte, empolgada com a experiência da noite anterior, fui levada de snowmobile (moto da neve) até o restaurante Bajo Zero, que fica estrategicamente bem localizado no meio das montanhas. Que sensação deliciosa estar imersa como em um mergulho entre aquelas montanhas branquinhas. Fiz umas fotos aqui, outras ali e resolvi me dar de presente algumas horas de relaxamento. Folga para minha câmera fotográfica, hora de rabiscar idéias. Fiquei saboreando a vida entre um gole e outro da cerveja Austral, produzida na Patagônia. Sempre é bom termos um motivo para voltar. Eu já tenho um, na verdade, dois: descer esquiando as montanhas de Valle Nevado e provar as invenções do novo chef da estação, Axel Marrintez. Mas volto a repetir: mesmo que você não seja um esportista nato, saiba que no meio dos Andes muitas emoções e sabores incríveis esperam por você.

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QUEM ESQUIA UMA VEZ FICA VICIADO, QUER VOLTAR TODOS OS ANOS

Dicas de esqui do Tuca Gianotti SE VOCÊ VAI ESQUIAR NO VALE PRECISA TER EM MENTE ALGUMAS DICAS QUE PODEM CONTRIBUIR PARA QUE SUA TEMPORADA SEJA AINDA MELHOR. AS DICAS A SEGUIR FORAM DADAS POR CARLOS GIANOTTI NETO, O TUCA, EX-SURFISTA PROFISSIONAL E ATUAL AMANTE DA NEVE. O TUCA JÁ COMPLETOU SEIS TEMPORADAS DE SNOW, SENDO DUAS DELAS EM VALLE NEVADO. HOJE ELE É PROFESSOR E TÉCNICO DE SURF, CINEGRAFISTA E EDITOR DA PRODUTORA STORM. AO SUBIR A MONTANHA, VISTA-SE CONFORTAVELMENTE E EM CAMADAS. SENTIR FRIO NÃO É NADA AGRADÁVEL, POR ISSO, ESCOLHA AS ROUPAS CERTAS QUE PROTEJAM DO VENTO. NÃO ESQUEÇA QUE NO TOPO DA MONTANHA A TEMPERATURA CAI ALGUNS GRAUS EM RELAÇÃO À SUA BASE E QUE NA SUBIDA DE “SKI LIFT” O VENTO PODE SER CRUEL. MAS DEPOIS QUE VOCÊ ESTIVER EM MOVIMENTO, SEU CORPO VAI AQUECER. TENHA CERTEZA DE QUE A BOTA DE ESQUI OU “SNOW” NÃO ESTÁ MUITO APERTADA, E EXPERIMENTE QUANTAS FOREM NECESSÁRIAS. SE VOCÊ NÃO POSSUI ÓCULOS PARA ESQUIAR E VAI OPTAR POR USAR ÓCULOS DE SOL, NÃO ESQUEÇA DE PRENDÊ-LOS COM UMA “SICUREZA”, MAIS CONHECIDA COMO “CORDINHA”, PARA GARANTIR QUE VOCÊ NÃO OS PERCA. ESQUIE SEMPRE NA COMPANHIA DE AMIGOS. ALÉM DE SER MAIS DIVERTIDO, É MAIS SEGURO. MESMO QUE VOCÊ TENHA EXPERIÊNCIA NO SURF OU NO SKATE, SAIBA QUE NO SNOW A BRINCADEIRA É UM POUCO

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DIFERENTE. ENTÃO VÁ COM CALMA E SEM VÍCIOS. O TRUQUE DO SNOW ESTÁ EM SABER GIRAR O QUADRIL. HUMILDADE É FUNDAMENTAL NA EVOLUÇÃO DO ESPORTE. UMA HORA DE AULA É ACONSELHÁVEL PARA ADQUIRIR TÉCNICA. ALONGAMENTO NÃO É FRESCURA. FAÇA COM CALMA, NUM LUGAR EM QUE VOCÊ SE SINTA À VONTADE. UMA BOA OPÇÃO É NA SUA PRÓPRIA HABITAÇÃO, OUVINDO MÚSICA E CURTINDO A PAISAGEM. OS ESQUIADORES DEVEM CAPRICHAR NO ALONGAMENTO DAS PERNAS E DA VIRILHA, E OS “SNOWBOARDERS”, DO TORNOZELO. CASO CONTRÁRIO, NO TERCEIRO DIA DE ESPORTE VOCÊ CORRERÁ O RISCO DE ESTAR COM AS ARTICULAÇÕES DOLORIDAS. ISSO SEM FALAR NO QUANTO OS ALONGAMENTOS PREVINEM POSSÍVEIS LESÕES. PARA OS INICIANTES: CAIR FAZ PARTE DO JOGO, TENHA PERSISTÊNCIA E VÁ ADIANTE. OBRIGATÓRIO: PROTETOR LABIAL E SOLAR, CACHECOL OU PROTETOR DE PESCOÇO, TOUCA DE LÃ COMPRIDA QUE TAPE AS ORELHAS E LUVAS IMPERMEÁVEIS. PARA OS ESQUIADORES MAIS EXPERIENTES, VALLE NEVADO OFERECE UMA ATRAÇÃO ESPECIAL: OS “FORA DE PISTA”. A VANTAGEM É QUE NELES A NEVE É VIRGEM E FOFA. ALGUNS CUIDADOS SÃO EXTREMAMENTE IMPORTANTES: NUNCA VÁ SOZINHO E NÃO ULTRAPASSE OS LIMITES PERMITIDOS PELA ESTAÇÃO. RESPEITE A MONTANHA. PISCO SAUER E ESQUI NÃO COMBINAM. PISCO SAUER E PISCINA AO AR LIVRE, SIM.



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VALLE NEVADO TAMBÉM É UM LUGAR PERFEITO PARA RELAXAR

Dicas da Cris Berger O CENTRO DE ESQUI DE VALLE NEVADO OFERECE MEIA PENSÃO (CAFÉ E JANTAR) E PENSÃO COMPLETA (CAFÉ, ALMOÇO, CHÁ DA TARDE E JANTAR) PARA SEUS HÓSPEDES. MINHA DICA É: OPTE POR PENSÃO COMPLETA. A DIFERENÇA DE VALORES NÃO É GRANDE E NINGUÉM CONSEGUE FICAR O DIA INTEIRO ESQUIANDO. UMA PARADA NO MEIO DO DIA PARA RECARREGAR AS BATERIAS É ESSENCIAL. SEUS PÉS VÃO AGRADECER. DEPOIS SUBA A MONTANHA COM ENERGIA TOTAL. NO FINAL DA TARDE, O CHÁ É SEMPRE BEM-VINDO. VALLE OFERECE QUATRO COZINHAS DIFERENTES. FORA ISSO NÃO HÁ OUTRAS OPÇÕES POR PERTO. VOCÊ ESTARÁ NO MEIO DOS ANDES E TERÁ AO SEU DISPOR APENAS A ESTRUTURA DO HOTEL, QUE, DIGA-SE DE PASSAGEM, É ÓTIMA. PORTANTO, NADA COM QUE SE PREOCUPAR. PARA QUEM NÃO VAI ESQUIAR, HÁ ALGUMAS COISINHAS QUE NÃO PODEM FALTAR NA BAGAGEM. LEVE UM BOM LIVRO, SE POSSÍVEL DOIS. COLOQUE SUA LEITURA EM DIA. VALLE É MAIS DO QUE PROPÍCIO PARA LER. UMA BOA SELEÇÃO DE CDS TAMBÉM É IMPRESCINDÍVEL. LEMBRA QUE EU CONTEI QUE OUVIR MÚSICA NO DEQUE DA ESTAÇÃO TOMANDO UM SOLZINHO É UM PROGRAMA BÁRBARO? LEVE UM LAPTOP, BLOCO OU CADERNO E RABISQUE IDÉIAS, PROJETOS, PLANOS E METAS. GARANTO QUE OS ANDES TRAZEM INSPIRAÇÃO.

FIM DE TARDE É NA PISCINA, PORTANTO, ROUPA DE BANHO NA MALA. ÓCULOS DE SOL PARA CONSEGUIR MANTER OS OLHOS ABERTOS, POIS O REFLEXO DA NEVE É MUITO FORTE. DEPOIS É SÓ BEBER MUITO VINHO CHILENO, SABOREAR A GASTRONOMIA DO VALLE, ASSISTIR AO COLORIDO PÔR-DO-SOL, CONHECER NOVOS AMIGOS E, QUEM SABE, SE APAIXONAR. NÃO ESQUEÇA: TUDO NA VIDA É UMA QUESTÃO DE ESTADO DE ESPÍRITO, PREPARE O SEU E BOA VIAGEM!

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(con)vivências R U Z A

A M O N

A BOLSA DE DOIS GUMES Cuidado! Tudo que é romântico pode ser usado contra você Eu já tinha decidido que não escreveria sobre homens que carregam a bolsa de suas esposas ou namoradas porque eu achei que vocês não iriam compreender meu sentimento. Mas hoje, hoje mesmo, há algumas poucas horas, eu estava saindo do shopping e justamente vi um casal caminhando abraçado, a mulher de mãos vazias e o homem carregando a bolsa dela. Recebi como um sinal para escrever a respeito. É sempre assim: um homem com cara de apaixonado e com o braço sobre os ombros da mulher, por nenhuma razão aparente carrega a bolsa de sua amada. Acho particularmente linda a cena porque ali está um ato de desprendimento masculino. É visível que ele não se importa com o que as pessoas possam estar pensando. Tampouco está preocupado se o modelo tem a ver com o estilo dele, ou se a bolsa combina com seu cinto e seus sapatos. Aquela é uma bolsa sagrada. É a bolsa da mulher que ele ama. Já vi homens altos com baguetes ínfimas em couro de cobra; homens atarracados com amplas tiracolos em camurça escovada; rapazes malhados com mochilas em forma de panda... todos seguros de si, levando o acessório com desenvoltura, como se fizesse parte do seu próprio guarda-roupa. E vendo sempre suas mulheres de mãos vazias, sem nenhum impedimento para que carreguem seus pertences, me botei a pensar sobre o motivo daquele ato recorrente. Vocês já adivinharam? É isso! Eles vão abraçá-las para que caminhem juntinhos e chegam pelo lado em que está a bolsa. Sentem o volume do objeto que os impede de estar próximos como gostariam, e simplesmente o retiram. Por distração, por cavalheirismo ou para mostrar que amam tudo

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nela – e tudo que é dela – não o devolvem como seria o óbvio. Eu acho bem romântico. Vocês não acham? Romântico e conveniente, pois traz suporte lógico para uma das mais clássicas práticas femininas, que é de chamar o marido, enquanto está se arrumando, para perguntar: – Meu bem, qual das bolsas tu preferes, a branca ou a verde? (Ele não estará em condições de dizer o frustrante “tanto faz”.) Mas tem o outro lado, para azar dos homens que gostam de carregar bolsas. Como tudo que eles fazem – e principalmente o que eles deixam de fazer –, este ato romântico pode se transformar em medidor de temperatura do relacionamento, visto que as mulheres são craques em arrolar todo e qualquer detalhe como massa de manobra. Ela bem que pode argumentar: – Faz muito tempo que tu não carregas a minha bolsa. Tenho notado isso... Nem me lembro quando foi a última vez. Acho que precisamos discutir a relação... – e lá vai uma “DR”, na cabeça! Mas o desfecho dramático seria se eles tomassem gosto em andar com as bolsas porém sem as donas! – Acostumei. E daí? Vai emprestar ou não vai? Já pensou? Não bastassem as filhas adolescentes batendo no closet da gente, ter mais um sócio nos acessórios? Uma tragédia! Pensando melhor, essa história de homens carregando bolsas por aí nem é uma idéia tão boa assim. RUZA AMON É JORNALISTA



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Cotidiano

sagrado POR GUSTAVO MINI BITTENCOURT FOTOS DANIEL MARTINS

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KHADRO LING, EM TRÊS COROAS: UM LOCAL PARA APRENDER QUE TODO LUGAR É SAGRADO No século VI a.C., o príncipe indiano Sidarta Gautama olhou ao seu redor, percebeu o quão limitada era a imensa riqueza da sua família para lhe proporcionar satisfação duradoura, viu que todos os outros seres do universo estavam imersos em ilusões e deixou tudo para trás, embrenhando-se em uma jornada espiritual por seis anos. Durante esse tempo, o ex-membro do clã dos Shakyas experimentou o outro extremo, levando uma vida absolutamente austera até notar que a simples renúncia ao mundo material também não proporcionava contentamento permanente, justamente por depender da renúncia. Então, abandonando os extremos e buscando o caminho do meio, o rapaz sentou-se sob uma figueira e meditou por 49 dias, até encontrar respostas definitivas para suas dúvidas, as dúvidas de qualquer ser humano: como alcançar uma felicidade estável e eliminar para sempre o sofrimento? Hoje, 2.600 anos depois, uma comunidade incrustada no topo de uma montanha que contempla a cidade gaúcha de Três Coroas vive inspirada nas descobertas mais

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profundas do ex-príncipe, depois chamado de Buda, ou “o desperto”. O grupo teve início em 1994, quando o mestre budista tibetano S. Ema. Chagdud Tulku Rinpoche (19302002) trocou os Estados Unidos, onde vivia desde os anos 70, pela serra gaúcha, devido ao forte comprometimento de alunos brasileiros com a prática e a disseminação dos ensinamentos do Buda no país. Parte das terras foi doada, outro tanto foi comprado e logo Rinpoche manifestou o desejo de construir um tradicional templo tibetano para abrigar as práticas, os ensinamentos e as cerimônias. Construção coletiva Em cerca de dois anos o Lha Kang foi erguido, com a incansável determinação de Rinpoche e a ajuda espontânea de muitos voluntários. Alunos do mestre vieram de diversas partes do mundo para contribuir, fosse com idéias, com dinheiro ou com os próprios braços. Artistas nepaleses, butaneses e tibetanos foram “importados” para executar as minuciosas pinturas que recobrem o templo contan-



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MAIS IMPORTANTE DO QUE VIVER NO TEMPLO É VIVER O BUDA A CADA MOMENTO do histórias e espalhando sabedoria de forma colorida e instigante. Muitos dos adereços foram confeccionados por Lamas habilidosos e imunes à fadiga do trabalho duro no canteiro de obras ou na marcenaria. Foi uma época mágica, quando tarefas geralmente tomadas por comuns fizeram brotar um lugar sagrado pela mente compassiva de seres humanos decididos a produzir benefícios incomensuráveis e atemporais. Esse, aliás, é o ponto principal da vida na comunidade do Khadro Ling. Toda e qualquer tarefa serve como suporte para a prática espiritual e tem como objetivo trazer benefícios para todos os seres. Na parede em frente à pia onde se lavam os pratos, vê-se um cartazete sugerindo que o ato de limpar a louça seja utilizado para treinar a mente, direcionando-a para um tipo de compaixão infinitamente expansiva. O texto diz ao lavador para imaginar o prato como o universo inteiro e os restos de comida como os obscurecimentos mentais dos seres. Visualizações como essa parecem corriqueiras mas são extremamente poderosas e purificadoras do egoísmo, o principal obstáculo ao crescimento espiritual. Rotina de dedicação Depois da morte do generoso e diligente professor, a direção espiritual e administrativa do centro ficou a cargo da Lama americana Chagdud Khadro. Esposa de Rinpoche desde meados dos anos 70, ela mantém as atividades do Khadro Ling com a ajuda de praticantes e Lamas residentes previamente treinados pelo mestre tibetano. Apesar de a principal atribuição dos Lamas estar na orientação espiritual, todos também têm algum grau de envolvimento nos afazeres diários, seja cuidando de assuntos administrativos, seja colocando a mão na massa na hora de construir um novo monumento. No Khadro Ling, o dia começa cedo. Muito antes do sol nascer, já há alunos acordados fazendo suas práticas individuais nos quartos ou residências desde as 4h30. Às 6h todos se encontram no templo para a primeira prática coletiva do dia, que envolve meditação por meio de visualizações, gestos e mantras. A partir daí, a maior parte das pessoas, incluindo Lamas, toma conta de funções gerais, cuidando da loja, das traduções e publicações de


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TODA TAREFA PODE SER USADA COMO PRÁTICA ESPIRITUAL. BASTA A MOTIVAÇÃO CORRETA texto, manutenção física das instalações, entre todas as necessidades que uma comunidade do tamanho do Khadro Ling apresenta. Às 19h, novamente os moradores se reúnem no templo para a prática do final de tarde. Os engajados em outras práticas específicas continuam noite adentro refinando sua mente por meio dos sofisticados métodos do budismo tibetano vajraiana da linhagem nyingma. São observados atentamente por lamparinas, pinturas, textos sagrados e centenas de estátuas das diversas emanações do Buda. Moradores e visitantes Quem quer morar no Khadro Ling deve antes conversar com um dos Lamas residentes. Se o professor achar benéfico para a pessoa, vai autorizar sua mudança. Em alguns casos, os Lamas convidam praticantes para residir lá, caso isso venha a contribuir para a prática do futuro morador. A partir daí, de acordo com as possibilidades e condições, o praticante vai construir sua casa num pedaço de

terra cedido por comodato ou instalar-se em um quarto alugado. Há moradores que sobrevivem de suas aposentadorias, poupanças, aluguéis de imóveis em outras cidades e há os que pagam suas despesas no Khadro Ling com trabalho. Ainda há uma curiosa situação para os ocidentais: benfeitores que patrocinam os retiros de praticantes mais dedicados, pagando todas as suas despesas para que eles possam praticar formalmente em tempo integral. Além do grupo de residentes, há uma imensa população flutuante que vem buscar ensinamentos com o intuito de levá-los para seu dia-a-dia. Ao longo do ano, diversos eventos são realizados, muitos dos quais com a presença de grandes Lamas que vêm de longe para ensinar. O Khadro Ling, então, ganha outros ares, com uma movimentação constante e uma mistura de línguas. O inglês é quase o idioma oficial para a comunicação entre os alunos que trocam sua rotina comum por alguns dias ou semanas de treinamento da mente dentro de um contexto mais litúrgico. Essa é uma atitude muito estimulada pelos Lamas:

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TODA TAREFA PODE SER USADA COMO PRÁTICA ESPIRITUAL. BASTA A MOTIVAÇÃO CORRETA texto, manutenção física das instalações, entre todas as necessidades que uma comunidade do tamanho do Khadro Ling apresenta. Às 19h, novamente os moradores se reúnem no templo para a prática do final de tarde. Os engajados em outras práticas específicas continuam noite adentro refinando sua mente por meio dos sofisticados métodos do budismo tibetano vajraiana da linhagem nyingma. São observados atentamente por lamparinas, pinturas, textos sagrados e centenas de estátuas das diversas emanações do Buda. Moradores e visitantes Quem quer morar no Khadro Ling deve antes conversar com um dos Lamas residentes. Se o professor achar benéfico para a pessoa, vai autorizar sua mudança. Em alguns casos, os Lamas convidam praticantes para residir lá, caso isso venha a contribuir para a prática do futuro morador. A partir daí, de acordo com as possibilidades e condições, o praticante vai construir sua casa num pedaço de

terra cedido por comodato ou instalar-se em um quarto alugado. Há moradores que sobrevivem de suas aposentadorias, poupanças, aluguéis de imóveis em outras cidades e há os que pagam suas despesas no Khadro Ling com trabalho. Ainda há uma curiosa situação para os ocidentais: benfeitores que patrocinam os retiros de praticantes mais dedicados, pagando todas as suas despesas para que eles possam praticar formalmente em tempo integral. Além do grupo de residentes, há uma imensa população flutuante que vem buscar ensinamentos com o intuito de levá-los para seu dia-a-dia. Ao longo do ano, diversos eventos são realizados, muitos dos quais com a presença de grandes Lamas que vêm de longe para ensinar. O Khadro Ling, então, ganha outros ares, com uma movimentação constante e uma mistura de línguas. O inglês é quase o idioma oficial para a comunicação entre os alunos que trocam sua rotina comum por alguns dias ou semanas de treinamento da mente dentro de um contexto mais litúrgico. Essa é uma atitude muito estimulada pelos Lamas:

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MUITOS VÃO EMBORA LEVANDO UM POUCO DO TEMPLO NO CORAÇÃO. E VEM BUSCAR MAIS 80

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em vez de a pessoa abandonar sua vida cotidiana, renunciando aos bens materiais por motivos supostamente mais elevados, como reza o clichê, retirar-se durante um tempo e depois voltar para casa utilizando fatos mundanos como combustível para a reflexão e a prática espiritual. Isso porque o simples impulso de largar tudo e ir em busca de um suposto paraíso místico pode ser, na verdade, uma fuga e terminar como mais uma fonte de frustração. Não são poucos os que chegam ao centro budista cheios de delírios de bem-aventurança. Esses, ao se depararem com a disciplina que uma prática espiritual genuína exige, em pouco tempo mostram que tudo o que queriam era tirar umas férias diferentes. Quando a decepção é maior que a ligação espiritual, eles vão embora e nunca mais retornam. Quando a motivação autocentrada é percebida e abandonada, eles se conectam à essência dos ensinamentos, que é praticar para trazer a iluminação para todos os seres e não apenas para conquistar algum tipo de paz e conforto.


A verdade é que não há uma regra. Nem todos devem ir morar no templo e nem todos devem continuar a focar-se na carreira profissional e nas relações familiares. Cada caso é um caso e tem seu remédio específico. A prática espiritual autêntica está em confrontar as próprias carências e inseguranças em vez de projetá-las nos outros, o que pode ser feito em qualquer situação e em qualquer lugar. Ao transferir-se para uma comunidade espiritual, não é raro a pessoa começar a ver seus antigos obstáculos se manifestando no convívio diário do centro. Isso não é uma dificuldade em si, desde que se tenha a maturidade de enxergar os empecilhos como parte do processo de crescimento e não como uma barreira. Se você quer só fugir dos seus problemas, um centro budista não é o lugar mais recomendado. Agora, se você quer observá-los com profundidade e aprender com eles a libertar outros seres das mesmas armadilhas, apareça no Khadro Ling.

VISITAÇÃO & HOSPEDAGEM O KHADRO LING ESTÁ ABERTO AO PÚBLICO DIARIAMENTE DAS 9H ÀS 12H E DAS 13H ÀS 17H. NO ENTANTO, LIGUE SEMPRE ANTES DE IR, POIS DURANTE QUALQUER EVENTO OS HORÁRIOS SÃO ALTERADOS E HÁ MOMENTOS EM QUE VOCÊ NÃO PODERÁ CONHECER O INTERIOR DO TEMPLO. NENHUMA TAXA É COBRADA PARA A VISITA. O TEMPLO SOBREVIVE DE DOAÇÕES. CONTRIBUIÇÕES ESPONTÂNEAS SÃO BEM-VINDAS. PEÇA INFORMAÇÕES ATRAVÉS DO E-MAIL INFO@CHAGDUD.ORG OU PELOS TELEFONES (51) 546.8200 E (51) 546.8261 A HOSPEDAGEM É RESTRITA A PARTICIPANTES DE RETIROS E EVENTOS. NO MOMENTO, O KHADRO LING NÃO ESTÁ ACEITANDO NOVOS MORADORES FIXOS. SE VOCÊ DESEJA CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE AS PRÁTICAS ANTES DE IR A TRÊS COROAS, VISITE UM DOS CENTROS DO CHAGDUD GONPA. HÁ SEDES OU GRUPOS DE PRÁTICA EM VÁRIAS CIDADES DO ESTADO. VEJA OS ENDEREÇOS E TELEFONES EM WWW.CHAGDUD.ORG/ PT/CENTROS/BRASIL/SUL.HTM

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Bem Viver M A R I A N G E L A

B A DA LOT T I

PRESERVANDO A FERTILIDADE O congelamento de óvulos já é viável Algumas situações da vida moderna podem fazer com que a mulher se depare com a infertilidade por perda de função dos ovários (órgãos que produzem os óvulos). Uma dessas situações é a mudança do papel social e profissional da mulher, que nos últimos tempos tem levado ao adiamento da gravidez. O incremento de atividades laborais pode retardar o casamento ou levar à demora em encontrar o parceiro ideal. Também não é incomum os casais esperarem mais tempo para ter filhos, até que as condições financeiras e psicológicas o permitam. Entretanto, sabe-se que quanto mais tarde, mais difícil pode ser engravidar. A biologia dos óvulos femininos permanece inalterada, não acompanhando o desejo de iniciar a constituição da família tardiamente. A fertilidade das mulheres, que nascem já com um número estabelecido de óvulos, começa a diminuir aos 35 anos, sendo esta queda mais marcante a partir dos 40 anos. Até recentemente não era possível armazenar óvulos como os homens fazem com os espermatozóides há várias décadas. O congelamento esbarrava em dificuldades técnicas, decorrentes das características celulares dos óvulos: por serem células grandes e complexas, acabavam sendo danificados durante o processo. Com algumas modificações técnicas introduzidas nos últimos cinco anos, este procedimento tornou-se viável. O congelamento de óvulos pode deter o “relógio biológico” e possibilitar filhos nas situações em que há necessidade de postergar a gravidez. Esta técnica também representa uma esperança para aquelas mulheres que necessitam combater doenças malignas com a quimioterapia, que pode levar à destruição dos óvulos. Visto que atualmente a maioria das

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neoplasias já tem cura, preservar a fertilidade dessas pacientes significa diminuir ainda mais as seqüelas e proporcionar restabelecimento físico, mental e social. Congelamento de fragmentos de ovário também pode ser utilizado nessas situações. Outra utilidade do congelamento de óvulos é ser uma alternativa para os casais que se submetem à fertilização in vitro e não se sentem confortáveis com o congelamento de embriões por razões éticas, morais e religiosas. A coleta dos óvulos é feita da mesma forma que para a fertilização in vitro: a mulher recebe hormônios para produzir vários óvulos naquele ciclo, durante um período de 10 a 20 dias; os óvulos são aspirados através do ultra-som e são analisados no laboratório. Os que forem considerados adequados são congelados. Quando a mulher ou o casal decidirem que chegou a hora dos filhos, os óvulos são descongelados e inseminados com os espermatozóides do futuro pai. Este avanço da ciência é um procedimento novo, mesmo na área da reprodução assistida. Estima-se que existam pouco mais de 100 crianças nascidas em todo o mundo a partir de óvulos congelados. No Brasil, a técnica foi introduzida pioneiramente pelo Rio Grande do Sul, e a primeira criança nasceu em 2002. Antes de optarem pelo congelamento de óvulos, as mulheres ou casais devem ser amplamente esclarecidos sobre esta nova tecnologia. MARIANGELA BADALOTTI É CHEFE DO SERVIÇO DE GINECOLOGIA DO HSL/PUCRS, DIRETORA DO FERTILITAT – CENTRO DE MEDICINA REPRODUTIVA E COORDENADORA DO DEPARTAMENTO DE GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA DA FAMED/PUCRS



Perfil

O mundo de

Zeca O mundo dá muitas voltas. Numa dessas, Zeca Camargo trocou a MTV pela Globo e virou um dos âncoras do Fantástico. E foi no programa de maior audiência da TV brasileira que ele e um cinegrafista percorreram 103.792 quilômetros em diferentes continentes. Uma distância que corresponde a duas voltas em torno da Terra. Com a participação do público, que escolhia entre dois roteiros, e sob o olhar atento de milhões de brasileiros, eles andaram por 17 países em quatro meses. México, Havaí, Nova Zelândia, Tasmânia, Cingapura, Camboja, Filipinas, Rajastão, Sri Lanka, Uzbequistão, Romênia, Turquia, Grécia, Quênia, País P O R

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PA U L A

TA I T E L B A U M

Basco, Escócia e Ilha da Madeira foram os destinos. Pra ser honesta, não acompanhei essas viagens fantásticas do Zeca. Pouco ligo a televisão no domingo. Foi por isso que só tomei conhecimento da coisa toda quando li A Fantástica Volta ao Mundo, onde o jornalista mostra os bastidores de sua aventura. É nesse livro que ele conta, por exemplo, que as piores experiências gastronômicas foram – prepare-se para dizer “blergs” – estômago de boi, no México, ovo de pato fecundado, nas Filipinas, folha enrolada com especiarias, na Índia, e jantar de congelados, em Honolulu. Pra compensar, ele cita os melhores manjares, que incluem delícias indianas, e também enuF O T O S

A N G E L A

FA R I A S



O ASSÉDIO É MAIS BRANDO. SOU UM JORNALISTA, É mera as paisagens mais exuberantes da viagem – agora é a vez de dizer “uau” –, que foram o Vulcão Diamond Head, em Honolulu, o Pico do Areeiro, na Ilha da Madeira, em Portugal, as Rochas de Meteora, na Grécia, o Lago Wakatipu, em Queenstown, na Nova Zelândia, e a Península da Tasmânia, na Austrália. Só que essas não são as únicas listas que você vai encontrar no livro. Amante confesso de listagem do tipo “dez mais”, Zeca espalhou pelas suas mais de 400 páginas coisas como os cinco lugares mais estranhos de que aprendeu a gostar, as cinco melhores primeiras impressões, os três lugares mais assustadores, as quatro piores “roubadas” em hotéis, os cinco meios de transporte mais bizarros, os quatro lugares mais perfumados, as cinco línguas mais curiosas e os quatro encontros memoráveis com animais. Pra descobrir o que há nessas listas, você terá que ler A Fantástica Volta ao Mundo. Mas se o que você quer é só descobrir um pouquinho mais sobre o Zeca Camargo, então ler esta entrevista já basta. Pra começar, vale dizer

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o óbvio: Zeca é inteligente e bem informado e, além da MTV e da Globo, seu currículo traz passagem pela TV Cultura, Folha de S.Paulo e revista Capricho. Quer saber mais? Ele nasceu em 1963 em Uberaba, Minas Gerais. É do signo de Áries, já foi mochileiro, aos 17 anos, adora a Índia e quer ir para a China, gosta de cozinhar e é do tipo que não viaja sem sair do lugar. Ah, e é ultraexigente consigo mesmo, fica brabo se alguma coisa não sai exatamente como ele imaginava (essa conclusão foi minha). Conversei com Zeca em março, quando ele esteve em Porto Alegre para lançar e autografar o livro. Entre outras coisas, ele falou que não se considera uma celebridade. Acho que ele deve ter esquecido que, no Brasil, só quem vive longe da civilização e da luz elétrica não o conhece. Além do mais, pesquisando na Internet, descobri que existe o Fã-Clube Oficial do Zeca Camargo, com direito às últimas notícias e fotos. Depois ele vem dizer que não é uma cele bridade... Então tá...


DIFERENTE DE SER ATOR, QUE TEM UMA TIETAGEM DOIS TRECHOS DE “A FANTÁSTICA VOLTA AO MUNDO” “A COMEÇAR PELO CAFÉ DA MANHÃ DE BEIRA DE ESTRADA (MAIS PRECISAMENTE, DE BEIRA DE ESTRADA NO UZBEQUISTÃO), QUE INCLUÍA CHÁ, PÃO E KEBAB! KEBAB? KEBAB! ESPETINHO – ÀS 8H30 DA MANHÃ! NADA COMO UM BOLINHO DE CARNE MOÍDA AMASSADA E ENFIADA NO ESPETO QUE VAI DIRETO PRA UMA CHURRASQUEIRA – AQUI, GERALMENTE IMPROVISADA COM TIJOLOS – PARA ABRIR SEU DIA. O FAVORITO DOS UZBEQUES (E QUE NÓS, DEDICADOS TURISTAS, NÃO RECUSAMOS) É O DE CARNE DE CARNEIRO. ESPECIALMENTE RECOMENDADO PARA AS 8H30 DA MANHÃ! A SORTE É QUE, MAIS ADIANTE, DEZENAS DE MULHERES VENDIAM LINDOS BALDES REPLETOS DE MAÇÃS – BEM PEQUENAS, QUASE DO TAMANHO DE UMA AMEIXINHA, MAS EXTREMAMENTE DOCES –, E ISSO DEU UMA BALANCEADA NA NOSSA DIETA.”

“FOI NESSE DIA QUE COMI A COISA MAIS ESTRANHA DE TODA A VIAGEM. AGORA JÁ POSSO FALAR: NADA SUPEROU O BALOT! PARA OS NÃO INICIADOS (MEU CASO), A IGUARIA ME FOI APRESENTADA DA MANEIRA MAIS CRUA: OVO DE PATO FECUNDADO. NÃO SEI BEM COMO CHAMAR ISSO. A PRONÚNCIA É ALGO COMO “BALÚTH”. TENTANDO DESCREVER: É UM OVO COZIDO, DE PATO; SÓ QUE A GEMA, BEM, NÃO É MAIS GEMA, É UM EMBRIÃO; ENTENDO POUQUÍSSIMO DO DESENVOLVIMENTO DOS BICHOS ANTES DE ELES NASCEREM (ALIÁS, ENTENDO POUCO TAMBÉM DO DESENVOLVIMENTO DEPOIS DE ELES NASCEREM...), MAS ACHO QUE O QUE É COZIDO ALI NO BALOT JÁ É UM FETO. QUER CONFERIR? PENAS? TEM. OSSINHOS? TEM. BICO? TEM. PESCOÇO? TEM. TEM TUDO! E FICA LÁ, ENROLADINHO. E NÃO SERIA EXAGERO CONTAR QUE A SENSAÇÃO É DE QUE O BICHO ESTÁ TE OLHANDO...”

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Perfil NUNCA FUI PRECONCEITUOSO. AGORA EU POSSO ESCREVER PORQUE SENTI: TODO MUNDO É IGUAL

O QUE MUDA DEPOIS DE UMA VOLTA AO MUNDO? Essas diferenças que eu considero ultra-superficiais, como de cultura, se você vencê-las, vai encontrar pessoas muito interessantes que poderiam ser seus amigos, seus namorados, qualquer coisa assim, entende? Mas você precisa vencer um preconceito.

OU SEJA: VOCÊ VOLTOU DA VIAGEM COM MENOS PRECONCEITO. Eu consolidei isso, nunca fui preconceituoso. Só que agora eu posso escrever porque senti: todo mundo é igual. Eu tenho a prova empírica do que eu já achava intuitivamente. Isso vale pra mim.

QUAL O SOUVENIR ESPECIAL QUE VEIO NA SUA BAGAGEM? A coisa mais linda que eu trouxe foi da Índia, é um teatrinho, uma pecinha de madeira. Tem de vários tamanhos, mas eu trouxe uma bem pequenininha. É um brinquedo de criança, como um altarzinho, e conta a passagem de uma lenda hindu. E é tão bonitinho... Eu já gosto de coisa indiana, sempre gostei.

VOCÊ ACREDITA QUE TEM ALGUMA LIGAÇÃO ESPIRITUAL COM O ORIENTE? Eu não sou espiritualizado, porém eu tive momentos muito reveladores na viagem, um deles foi no Sri Lanka, saindo de um templo na montanha. Lá tem um santuário onde fica uma suposta relíquia, que é um dente de Buda, mas você nem vê, porque só o imperador tem direito de ver aquilo. Saindo desse templo, tem uma árvore que nasceu de um ramo da árvore original onde Buda sentou e chegou ao Nirvana, e aí posso acreditar nessa história ou não, mas era uma árvore tão bonita, larga, cheia de bandeirinhas coloridas, e no pé dela centenas de Budas de todos os tipos. Um lugar muito sereno, mesmo com um monte de gente em volta eu resolvi ficar sentado ali olhando. Foi um momento muito especial da viagem.

QUAIS FORAM AS MELHORES EXPERIÊNCIAS GASTRONÔMICAS? Na Índia... cada banquete maravilhoso. Eu tive a sor-

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te de ficar na casa de um amigo meu, e a mãe dele cozinhava pra gente. No primeiro dia, tinha um café da manhã maravilhoso, muito estranho na verdade, um macarrãozinho que parecia um arroz doce, uma sopa de tomate, aquele pão frito que é uma delícia. Em Odaipura, no final da viagem, nós fizemos uma extravagância, ficamos em um palácio e pedimos uma dieta digna de um marajá, era um prato enorme com uns doze pratinhos em volta, cada um deles com uma coisinha ultradeliciosa.

VOCÊS COMIAM MUITO? Muito, sim, muito. Como a rotina era muito maluca, a gente comia a toda hora. Churrasquinho de carneiro com pão na beira de estrada como café da manhã, por exemplo...

VOCÊ COZINHA, É UM GOURMET? Cozinho, cozinho bastante.

TROUXE RECEITAS? Trouxe, mas é difícil conseguir todos os ingredientes.

QUAL A SUA ESPECIALIDADE? O cuscuz que eu faço, muito bom! Com camarão e rúcula, fica muito gostoso. Mas cuscuz é fácil, né?

DEPENDE... É, tem que ter um toque pessoal.

VOCÊ É PERFECCIONISTA? Um pouco... Na verdade eu sou CDF, se eu me propus a fazer alguma coisa, tem que sair direitinho. E tem uma coisa de desafio. Eu sou meu chefe, eu não gosto de ser cobrado. Se alguém me pede pra fazer alguma coisa, eu quero entregar do jeito que me pediram pra fazer, essa é minha meta. Caso eu não consiga, fico bravo comigo mesmo.

PUXA, QUAL O TEU SIGNO? Sou ariano.



SER BRASILEIRO TE OBRIGA A SER CURIOSO, ÁVIDO DE TODOS OS LUGARES EM QUE VOCÊ ESTEVE, QUAL VOCÊ DIRIA QUE AS PESSOAS NÃO PODERIAM DEIXAR DE CONHECER? A Índia, eu sou doido pela Índia, já fui quatro vezes e não conheço tudo.

POR QUE A ÍNDIA? Porque é muito diferente do nosso referencial. Você ali é forçado a pensar em outros referenciais. E não é só pelo esoterismo. A Índia tem uma cultura pop violenta, uma indústria cinematográfica maior do que Hollywood, a música é louca, tem todos os gêneros, tudo misturado e intenso, muito intenso. Não gostaria de morar lá, pra trabalhar é muito difícil. Um dia eu fui tentar trocar dinheiro num banco da Índia, e uma operação que leva minutos em qualquer lugar do mundo lá levou duas horas e quarenta. É infernal.

SE PUDESSE ESCOLHER, ONDE VOCÊ QUERIA TER NASCIDO? Ah, com certeza no Brasil. Não é nem ufanismo, mas é que ser brasileiro te obriga a ser curioso, ávido de informação, te obriga a ter uma personalidade muito forte. E quando você viaja

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descobre que é brasileiro pelas negativas. Tipo: olha, eu não sou esse cara, eu não sou turco, eu não sou grego, eu não sou cambojano, e aí você vai se reafirmando mais ainda. Essa nãoidentidade, que acaba sendo a própria identidade, é a coisa mais positiva. Eu não queria ter nascido em outro lugar do mundo e hoje em dia não queria morar em nenhum outro lugar do mundo. Eu quero viajar pra tudo quanto é lugar, mas eu quero morar no Brasil.

ALGUM PROJETO A CURTO PRAZO? Tenho um projeto pessoal: eu queria ir pro Butão e pra China.

E ALGUMA COISA QUE VOCÊ QUERIA FAZER MAS NÃO TEM TEMPO? Escrever meu segundo livro, de entrevista sobre música. Por enquanto, só escrevi o título... “De A-ha a U2”...

VOCÊ ASSISTE A MUITA TV? Assisto a bastante TV, sim, mas sempre menos do que


DE INFORMAÇÃO, A TER PERSONALIDADE FORTE eu gostaria... é tanta coisa pra ver... contando os programas a cabo, então...

QUAL O SEU PROGRAMA FAVORITO? Adoro comédias, e a minha favorita é uma que se chama “Curb Your Enthusiasm”, criada e protagonizada por um dos criadores de “Seinfield”, Larry David – e é sensacional!

VOCÊ ESTRANHA CHEGAR EM OUTRO PAÍS E NÃO SER RECONHECIDO NA RUA? Não tem o menor problema, porque eu não fui pra televisão procurando assédio. Fora do Brasil, pra trabalhar, é muito mais fácil. Porque o assédio atrapalha o trabalho, você tá se deslocando pra outro lugar, você precisa chegar, e demora porque pára pra falar com as pessoas. Mas, no meu caso, o assédio é muito mais brando. Eu sou um jornalista, é diferente de ser um ator, que tem uma tietagem. Tem sempre uma reverência, só que a pessoa não chega a falar “ai, você é lindo”, ela diz “gosto do seu trabalho”, e isso é bacana. Pra falar a verdade, no meu dia-a-dia, isso

não atrapalha nem um pouco.

QUEM GOSTARIA DE CONVIDAR PRA DAR A VOLTA AO MUNDO COM VOCÊ? Quando saio de férias, gosto de ir sozinho... é sério! Ninguém acredita muito nisso, mas eu prefiro viajar só porque é a melhor maneira de conhecer pessoas, absorver os lugares por onde eu passo e refletir sobre as coisas. Sem contar que é inspirador: foi durante férias no Vietnã que eu tive a idéia da Fantástica Volta ao Mundo. Mas se você me forçar a ter uma companhia... Ernest Schkleton, o grande aventureiro que tentou, em várias expedições, chegar ao Pólo Sul (sem sucesso, mas cheio de obstinação!!).

O QUE NUNCA FALTA NA SUA MALA, INDEPENDENTEMENTE DO SEU DESTINO? Meu iPod.

VOCÊ ACREDITA EM DESTINO? Não, acredito em acaso!

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Assim, ó... L U Í S

A U G U S TO

F I S C H E R

MIGRAÇÃO DE PALAVRAS E GENTES A saga dos nossos “gringos” rende muito romance Palavras migram, ao longo do tempo. E não apenas viajam na geografia, acompanhando os deslocamentos humanos; elas passam de um significado a outro. Dessas viagens resulta a língua nossa de cada dia, essa espécie de coleção de sabedorias e espantos, que se revela quando observada de perto. Tome lá o prezado leitor a palavra romance. Bem no começo de sua vida ela foi uma forma da então nascente língua francesa, que veio principalmente do latim, como o espanhol, o português e o italiano. Grafava-se romanz e guardava em sua forma algo de romano, quer dizer, de coisa relativa a Roma, a sede do império que viveu em latim por séculos. Nos anos 1100 e 1200, começou-se a observar que em certos lugares do Império Romano não se falava latim, propriamente, mas uma língua diferente, apenas aparentada, uma língua romance, parecida com a língua de Roma mas já distinta. Em seguida, passou-se a dizer que as histórias relatadas nessa nova língua eram histórias romances. Que peripécias se contavam então? Histórias de valentia e de amor. Nasceram os romances de cavalaria, que juntavam guerra e sentimento, naqueles extraordinários feitos dos cavaleiros de Carlos Magno e do rei Arthur. Mais adiante, a palavra romance concentrou-se na significação genérica de relato da história de uma vida, em geral marcada por grandes e intensos lances de amor e desamor. Daí que hoje em dia, na linguagem geral, a mesma palavra romance signifique, essencialmente, um envolvimento amoroso, uma paixão, um amor. Toda aquela história multicentenária veio parar nesse inesperado lugar. Outras voltas semânticas aconteceram com a palavra gringo. Há hipóteses fantasiosas variadas para sua origem, como aquela que afirma ter a palavra nascido da contração de Green, go!, do inglês (Verdes, vão embora!), palavras que teriam sido usadas por mexicanos contra o exército norte-americano, em certa época. Em todo caso, parece mesmo que a origem vem de uma deformação de griego, isto é, grego, em espanhol: conta-se que alguns conterrâneos de Cervantes chamavam de grigo ou de gringo tudo o que não entendiam, tudo o que

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parecia grego, língua remota e ininteligível para eles. No Brasil, a palavra designa os estrangeiros, quaisquer que sejam; mas aqui no Rio Grande do Sul, gringo ficou como nomeação exclusiva para os descendentes dos italianos. Por quê? Difícil encontrar resposta direta e definitiva para a questão. Como explicar que, na linguagem cotidiana gaúcha, a gente denomine de alemães os descendentes de imigrantes alemães e chame de gringos os ítalo-descendentes, sem jamais misturar as duas etnias de origem européia sob a mesma palavra? O certo é que os gringos gaúchos começaram a chegar aqui nos anos 1870 e foram designados para ocupar terras ruins de trabalho – terras nas encostas, terras pedregulhentas, terras que não se entregaram facilmente. Tanto fizeram, que prosperaram e conseguiram criar até um pólo metalmecânico fortíssimo, que exporta caminhões e ônibus para meio mundo, sem que haja uma mina de ferro num raio de centenas de quilômetros, e isso tudo num lugar que não fica em beira de mar ou rio, de tal forma que pudessem embarcar seu produto facilmente. Parece que as adversidades mais aguçaram o senso de trabalho e dedicação dos colonos, seus filhos e netos. A mesma natureza que dificultou sua vida no começo foi em parte responsável pela manutenção das pequenas propriedades, com agricultura familiar e cooperativas de produção – bem diferente de regiões em que a antiga vida comunitária foi desalojada para dar lugar à monocultura da soja. Mantido o núcleo familiar de trabalho, preservou-se também muito do estilo de vida austero, a ética do trabalho duro que recompensa, até mesmo a língua dos pioneiros. Língua familiar e dialetal, forma popular do italiano culto (onde por sinal não há a palavra gringo), este por sua vez uma língua derivada do mesmo latim que viu nascer o romance e que viu aparecer a esquisita palavra gringo. E quanto romance vai ainda ser escrito para contar a saga dos nossos gringos... LUÍS AUGUSTO FISCHER É PROFESSOR DE LITERATURA E ESCRITOR




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