Revista Fraude #2

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AFraude recompensa. E ao contrário do que se pensa, dá trabalho pra fazer. Tornar viável uma revista que fala sobre cultura e comunicação já é algo bem complicado. Principalmente quando ela é universitária e com tiragem modesta. Pior ainda quando é em preto-e-branco e com sérias restrições orçamentárias! Mas a nossa equipe não se abate com isso - pelo contrário: a gente aceita a Fraude como ela é. E olha que ela é bem bonitinha, modéstia à parte.

O problema é que o mercado não faz o mesmo. É cada vez mais complicado convencer o empresariado da cidade a apoiar uma produção independente e que chega apenas ao seu segundo número. O que por aí se chama de

“lógica de mercado” é, no fim das contas, uma mentalidade tacanha e sem qualquer ponta de nobreza. Acreditar num produto novo, que movimenta o mercado editorial local e incrementa a vida universitária da cidade parece um grande pecado. E tem quem “acredite”, mas com a condição de barganhar, barganhar e barganhar! No final não sobra nada. Felizmente, a Fraude é uma saída. Infelizmente, é uma ilha em meio à carência de revistas independentes feitas aqui mesmo na cidade, sem qualquer espécie de “rabo preso editorial”.

A propósito, nesta edição a revista está mais local. Saímos um pouco do

Índice

cosmopolitismo exagerado e exploramos um pouco mais os temas que a cidade oferece. Com destaque para o Museu do Objeto imaginário (seja lá o que for isso...), o Rio Vermelho e suas enchentes e vazantes, além dos nossos apresentadores-porretões da TV.

Destaque ainda para as rádios evangélico-comunitárias, o que tem no humor de Hermes e Renato e os olhos vigilantes do MediaWatch. Por fim, um artigo sobre as táticas do amor escrito pelo professor Juremir Machado, autor do romance recém-lançado “Getúlio” (um privilégio desses só a Fraude mesmo!).

Então, boa leitura. E obrigado aos que apóiam a Fraude. Não é nada comprometedor...

A luta pelaSobrevivência Entrevista: Yakoff Sarkovas Carnaval do meio-dia Renato: Caótico o rio deságua no mar Crl+AltRock com batuque vigia os vigilantes Jesus quer dinheiro? mim de tudo amor sobriedade dos 30 escuro dos cinemas Ideal Fast-Food de Filosofia

Repórteres e Colaboradores: Beth Ponte, Camilla Costa, Camilo Aggio, Danilo Fraga, Jeder Janotti Jr., Júremir Machado, Lívia Nery, Lucas Cunha, Pedro Fernandes, Ricardo Sangiovanni, Tiago Félix e Vivian Barbosa.

Imagens e Diagramação: Camilla Costa, Danilo Fraga, Lucas Cunha e Ricardo Sangiovanni.

Revisão: Beth Ponte, Camilla Costa, Danilo Fraga, Lucas Cunha, Ricardo Sangiovanni e Vivian Barbosa.

Produção Executiva: Beth Ponte e Vivian Barbosa

Agradecimentos: Juremir Machado, Tio Dú da Graúna, Sala de Arte, LabMedia, LabVídeo.

FACOM/UFBA - Salvador - BA - Brasil

Ano 1, número 2 - Dezembro de 2004

Expediente 04. 16. 28. 06. 18. 31. 12. 22. 34. 09. 19. 32. 14. 24. 36. 38. Pop Up Entrevista: O Carnaval Hermes e Quando o Crl+AltRock Roque com Quem vigia 26. I AM Jesus Quem quer Vote ni mim Museu de A arte do A triste sobriedade O mais escuro Azougue Fast-Food

quaseumanoagora...

Fraude -Você morou em várias cidades brasileiras por causa do trabalho de seu pai, morando por algum tempo em Salvador, o que inclusive gerou a letra de Antes Que Seja Tarde. Qual sua relação comSalvador?

Fernanda - Passei parte da infância em Salvador, comecei a ir

Pop-Up

à escolinha aí, aprendi a nadar em Ondina, soltar pipa no Farol, gostar de acarajé. É uma terra muito boa, temos amigos de muitos anos na cidade. Depois com a banda, foi uma das capitais que melhor nos acolheu desde o comecinho. Fazemos questão de incluí-la como prioridade nasturnês. Parte

o primeiro museu brasileiro exclusivamente virtual, o Museu VirtualdeArteBrasileira.

Como Internet quer dizer interatividade, o passo seguinte é dado pelo Museu de Arte Contemporânea de Chicago. Além de mostrar parte do acervo permanente e trazer a programação do museu, o ponto alto é a visita virtual "Transmute" (ela está meio escondida, em Past Exhibitions/Transmute). Nela, o visitante pode montarsuaprópriaexposição. Com a Internet mais veloz, a tendência é que esses ambientes se tornem mais realistas e que permitam interação: já não será mais apenas fazer a curadoria de uma exposição, mas montá-la em grupo, discutindo o assunto com outros visitantes e modelando o espaço virtual. Isso, tecnicamente, já pode ser feito, pois existem boasexperiênciasdesalasdechatem3D,comoapágina-demodo navegador pelo VRML Blaxxun. É só questão de tempo (e de dinheiro,comosempre)parajuntartudoemalgoquefaçasentido.

Escritores escrotos...

...E sua literatura de esgoto

Assim como ratos se proliferam no esgoto, novos escritores aparecem para colocarem seus escritos nasruas.Umadasúltimascriasdestanovageraçãoé a Edições K, que entra no mercado editoral com quatro livros, três de contos de autores já famosos em e-zines como Marcelo Benvenutti ( O Ovo Escocês), Delfin ( Kreuzweltratsel ) e Patrick Brock ( Velhas Fezes), além do cordel “A filha do imperador que foi morta em Petrolina”, do baiano Wladimir Cazé, exmembro do PetCom em meados dos anos 90. Compostos basicamente de textos publicados na Internet - inéditos no formato livro - Benvenutti, Delfin e Brock trazem nos seus contos temas urbanos como sexo, drogas e música pop, colocados da forma mais caótica possível e sobra até espaço para aventuras cyberpunks. Os livros das Edições K podem ser adquiridos no Sebo Berinjela (Travessa da Ajuda, Centro) ou com Patrick Brock pelo tel: (71) 358-1442 oue-mail:textorama@ig.com.br

O mapa das canções perdidas

SITES: http://www.walkerart.or g/resources/res_msg_v rmlframe.html www.mcachicago.org www.blaxxun.com www.museuvirtual.com. br

Guia do hardware

pelo programador Carlos Morimoto, criador do LinuxKurumim(quejáestánaversão4),oguia do hardware traz dicas e excelentes tutoriais (escritos por ele mesmo) contendo noções de hardware, software, programação e redes, em linguagem acessível até para quem nunca ouviufalardessascoisas.

O site conta também com informações atualizadas diariamente sobre o mundo da informática, software livre, cursos na área e games, além de trazer notícias do Kurumin e outras versões do sistema operacional Linux. Outroatrativosãoosfórunsdediscussãoentre usuários, que tiram dúvidas, comentam, sugeremeproduzemsoluçõeseminformática.

ParaaquelesqueachamqueorocknoBrasildosanos 60 se resume à Jovem Guarda, está disponível na Internet uma compilação de bandas de rock brasileiro do período.A coletânea virtual é conhecida como Brazilian Nuggetsuma referência à famosa coletânea de “garage bands” norte-americanasdosanos60.

A compilação conta com uma grande variedade de bandas desconhecidas, como Os Brasas, Sueli & os Kanticus, Os Jovens, Bango, Os Minos (do guitarrista PepeuGomes), Megatons e Beat Boys.Váriasgravações chamam a atenção pela ousadia, como “Lindo Sonho Delirante”, do soulman apocalíptico pré-Raul Seixas, Fábio. A música, gravada com acompanhamento dos Fevers,homenageavaingenuamenteoLSD,noestiloLucy in the Sky with Diamonds de ser. Outra surpresa é a balada “Sílvia 20 horas Domingo” de Ronnie Von, que lembra um poucoosomdoquartetobarbudoLosHermanos.

Para ter acesso ao Brazilian Nuggets é necessário baixar o programa Soulseek - disponível na seção de Downloads do site www.slsknet.org. Depois, é só digitar "brazilian nuggets" no buscador e todo um mundo de obscuridadesdorocknacionalestaráàsuadisposição.

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Fraude Fr aude 5

ébomnegócio?

Fundador e presidente da

Articultura, primeira agência de planejamentoegestãodepatrocíniosdo país,YacoffSarkovaséreconhecido como um dos maiores críticos às LeisdeIncentivoàCultura.Concebeu e gerenciou quase uma centena de projetos nas áreas cultural, ambiental, esportiva e social para instituições no Brasil e noexterior.Foitambémresponsável,entre1999 e2002,pelareformulaçãodapolíticadepatrocínios da Petrobras, a maior patrocinadora brasileira.

Sarkovas foi convidado, no início da gestão do PT, para colaborar com a reformulação da aplicação das Leis de Incentivo em empresas estatais e entrou na mira de produtores e diretores de cinema como Cacá Diegues e Luiz Carlos Barreto, o Barretão, que em junho deste ano se referiu a Yacoff como um “gigolô da cultura”. Polêmico e incisivo, ele fala das deturpações das Leis Rouanet e do Audiovisual, da realidade do Marketing Cultural e dos rumos daculturanoBrasil.Ementrevista exclusiva à revista Fraude, Yacoff vem contestar a máxima de que “a cultura é um bom negócio” (o slogan defendido por Wefort, no Ministério da Cultura do governo FHC) com o questionamento: bom negócioparaquem?

Fraude - Em debate com o Ministro da Cultura Interino, Juca Ferreira, você causou polêmica ao se referir às Leis de Inventivo Fiscal (Rouanet e do Audiovisual) como um câncer que contamina toda relação entre as empresas e os cidadãos com a cultura. Por que criticar o que muitos consideram o maior avanço na história nacionaldefinanciamentoàcultura?

Sarkovas - As leis de incentivo tornaramse uma forma insensata de financiamento do Estado. Incentivo fiscal é uma estratégia de aplicar o dinheiro público para estimular investimento privado, em que o governo deixa de recolher parte dos impostos das empresas para que este seja investido em áreas culturais. Mas no Brasil, as leis de incentivo à cultura passaram a transferir recursos públicos sem nenhuma contrapartida privada. Foram deturpadas desde que passaram a permitir, ainda no governo FHC, a deduçãointegral,tornandoaempresa,um mero repassador dos recursos do Estado, despendidossematenderobjetivos Fraude

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Beth Ponte
Entrevista: Yacoff Sarkovas
BETHPONTE@YAHOO.COM.BR

coletivos. Ao se transferir para as empresas recursos e responsabilidades do Estado foram cometidos múltiplos equívocos: investe-se dinheiro público sem a efetiva garantia de atender o interesse público; não se formam reais investidores privados, pois ninguém aprende nada gastando dinheiro alheio; deforma-se o mercado de patrocínio, incutindo na cultura empresarial um benefício a custo zero. Não há nada de erradoemempresasprivadasfinanciarem a cultura, quando o dinheiro é, de fato, privado. As leis de incentivo fiscal são importantes para a cultura porque transferem cerca de R$ 500 milhões anuais para a área, mas o Ministério da Cultura tornou-se, na verdade, o "MinistériodasLeisdeIncentivo".Porquesomente no Brasil a dedução fiscal é o principal mecanismo de financiamento público à cultura. É impossível atender à diversidade e à extensão das demandas culturais da sociedade com um sistema baseado em incentivo fiscal. Enquanto este paradigma não for quebrado, tudo continuarácomoestá.

Fraude - Você prega a abolição gradual dos mecanismos de incentivo fiscal empregados hoje em dia. Para tanto, defende a idéia de formas de investimento público, como os Fundos de Investimento à Cultura. Mas as empresas não são também importantes patrocinadoras? Podemos contar somente com a consciência de seus empresáriosparaqueelasinvistamem cultura?

Sarkovas - Se a empresa não vê sentido em patrocinar cultura, faz menos sentido ainda colocar em suas mãos dinheiro público para que ela decida a quem deve beneficiar. O fim do anabolizante fiscal revelaria a verdadeira dimensão econômica do patrocínio empresarial. Ele cresceria estimulado pela necessidade de gerar resultado, irrigando a cultura com recursos privados reais, como ocorre nas áreas ambiental, social e esportiva, que não sucumbiram, ainda, ao perverso encanto das leis de incentivo e desenvolveram formas concretas de sustentabilidade. Nos EUA, os institutos e fundações empresariais estendem suas atividades ao campo cultural, dispondo fundos para os mais variados projetos e segmentos artísticos. É o que chamamos de investimento social privado e que tem que trabalhar em conjunto com o financiamento público. Porém, no Brasil, um dramático quadro de desigualdade induz a maioria

do investimento privado para ações relacionadas à pobreza e à exclusão socialenãoaindaparaacultura.

Fraude - Atualmente, suas perspectivasquantoàsaçõesdoMinCduranteo governo Lula são muito céticas sobre mudançasnofinanciamentodacultura. Como se deu sua participação na reformulação do sistema no início da gestãodoPT?

Sarkovas -NoiníciodoGovernoLula,não eu, mas a Articultura foi chamada pela SECOM (Secretaria de Comunicação do Governo Federal) para fazer um trabalho muito pontual de assessorá-la numa normatização dos patrocínios das estatais, buscando estabelecer alguns princípios que pudessem servir como norteadores de todos os patrocínios. O que não significaria dizer o quê a Caixa, a Petrobrás ou o Banco do Brasil deveriam fazer, mas estabelecer alguns preceitos. Por exemplo, os patrocínios deviam ser organizados em programas, os programas deveriam ter cunho técnico, o acesso deveriasertransparente,democrático... Isso aconteceu porque em 1999, ainda no governo FHC, a Articultura foi chamada pela Petrobrás, na época em que o monopólio do petróleo tinha sido quebrado e a empresa tinha que passar por um forte processo de modernização, inclusive naáreadepatrocínios,parapoder

enfrentar um mercado em que ela não seria mais a única empresa de petróleo no país. A Petrobrás então não tinha nenhuma percepção pública dos seus patrocínios, investia R$100 mi por ano em projetos e as pesquisas demonstravam que ninguém sabia que a Petrobrás era patrocinadora. Nosso trabalho mudou completamente a área de patrocínio da Petrobrás, a percepção pública dos patrocínios da empresa cresceu enormemente. Hoje as pesquisasmostramqueopatrocínionos programas cultural, ambiental e esportivo é um dos maiores fatores de construçãodamarcaPetrobrás.

Fraude - Por causa desse convite, muita gente confundiu sua participação com uma forma de dirigismo da SECOM, como se ela quisesse dessa forma delimitar o patrocínio dessas empresas..

Sarkovas - O fato de a SECOM ter nos chamado assustou, e muito, as áreas que tentam a todo custo manter a Lei do Audiovisual no Brasil, porque acharam que o fato daArticultura ter se aproximadodogovernopoderiaporemriscoessa Lei que sabidamente é combatida por mim e pela empresa. Então criaram, fizeram um trabalho de “queimação midiática”, um golpe aplicado pelo lobby do Audiovisual em maio de 2003 tentando neutralizar a possibilidade da Articultura ser ouvida em outras questões além daquilo em que ela vinha sendoouvida.

Fraude - Nessa época você utilizou em entrevista ao jornal O Globo o conceito “Grito dos Incluídos”, para falar desse apego à Lei do Audiovisual pelos que são favorecidos por ela, numa época em que ser incluído no país do assistencialismo era quase um pecado. E hoje, os incluídoscontinuamosmesmos?

Sarkovas - Eu jamais “fulanizo” essas discussões por que é exatamente o jogo que algumas dessas pessoas pretendem: transformar isso numa discussão de pessoas, de nomes, e eu não tenho nenhum interesse de fundo pessoal ou profissional nesta discussão. Eu tenho pensado muito no que faz com que pessoas eventualmente se mobilizem pela manutenção de um sistema de financiamento que é evidentemente perdulário, dissociado do interesse público. Aí você encontra um grupo de produtores, particularmente na área de

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cinema, que foram responsáveis pela própria promulgação da Lei do Audiovisual e que tem interesse na manutenção deste mecanismo porque eles têm um domínio direto dos canais de acesso a esses recursos e temem um sistema que seja distinto desse. Mas não é só isso que mantém essas leis em vigor. O que de fato acaba fazendo diferença é que boa parte dos profissionais da área de cultura desconhece qualquer outro mecanismo de financiamento público e acha que se acabar o incentivofiscalnão há outra forma de distribuir o dinheiro público. Nesse estado de ignorância eles são facilmente atemorizados por estes espantalhos de dirigismo, mas, na verdade, não há como você desenvolver uma política pública sem estabelecer diretrizes. Isso está longe de ser dirigismo, uma política cultural é uma estratégia cultural pública. É a mesma coisa de você chamar a política pública de transportes ou de segurança pública do país de dirigismo. Isso é contar com a ignorância alheia para gerar uma paralisação e impossibilidade de transformação nos mecanismos queestãoemvigor.

Fraude - A Articultura é uma agência que se tornou referência no patrocínio empresarial brasileiro, uma das primeiras a lidar com o conceito de marketing cultural quando este ainda não era uma realidade no Brasil, em meados dos anos 80. Como você vê o Marketing Cultural hojeemdianopaís?

Sarkovas - O marketing cultural se desenvolveu enormementenestesúltimos 20anos,nãosóoMarketing Cultural, mas todas as formas de comunicação empresarial que são feitas por de”, que é

meio de ações de interesse público. O desenvolvimento do Marketing Cultural não difere do desenvolvimento que ocorreu no que nós, na Articultura, chamamos de “comunicação por atitude”, que é essa estratégia de uma marca se associar a uma ação que expresse os atributos que ela possui ou deseja ter. Por que a publicidade é a marca falando de si mesma. O patrocínio,emresumo,éaformadeumamarca agir de acordo com o que ela, por meio da publicidade, diz ser. Hoje, todas as formas de comunicação por atitude, que se encontram no campo social, esportivo, cultural e ambiental movimentam em torno de US$ 27 bi no mundo. Isso não é só o investimento no Marketing Cultural, mas em todas as quatro áreas. Eu estimoqueoinvestimentoaquinoBrasil, estritamente no campo cultural, deva estar beirando cerca de R$Um bi por ano.

Fraude - Sua empresa nasceu, coincidentemente,nomesmoanoem que a Lei Sarney, o marco inicial no que diz respeito ao financiamento cultural brasileiro, hoje em dia criticado por você. A Articultura nunca trabalhou com Leis de Incentivo no planejamento estratégico do patrocínio das diversas empresasaqueprestaserviço?

Sarkovas - AArticultura foi responsável pelos primeiros manuais sobre Leis de IncentivonoBrasileaArticulturasempre na medida da necessidade dos projetos seus, ou de seus clientes, usou e usa normalmente Leis de Incentivo. O que a Articultura nunca fez foi colocar Leis de Incentivo como motivação para o patrocínio empresarial. A Articultura sempre colocou a Lei de Incentivo Fiscal como um fator agregado a uma motivação de patrocínio empresarial, um dispositivo que, eventualmente, pode ser usado (mas que várias vezes não precisa ser usado) para baratear uma ação de patrocínio. Não para justificar uma ação de patrocínio. E mesmo assim, esse uso da Lei de Incentivo, quando se deu pela Articultura foi sempre pela modalidade da redução parcial, o que de fato torna uma Lei de Incentivo uma Lei de Incentivo. Agora, na prática, se você for analisar o currículo de mais de cento e poucos projetosqueaArticulturajádesenvolveu ao longo da sua história, você vai contar nos dedos os que efetivamente envolvem incentivo fiscal, não passam

decinco,dez.

Fraude - Você acredita na validade de eventos como Fórum Cultural Mundial, em São Paulo, ou as discussões recentes sobre as modificações nas Leis de Incentivo como meios de mudar a forma como é encarada a cultura no Brasil, pelas autoridades e cidadãos?

Sarkovas - Essa movimentação em torno da questão cultural tem que ser vista com muito otimismo, como um sinal bastante positivo, senão na agenda da sociedade ou na agenda da política, pelo menos na agenda da mídia. Infelizmente, a cultura ainda não faz parte da agenda política do país da mesma forma que outros assuntos de interesse público, e neste caso nós temosquedestacarmuitoaeducação,já fazem. Na verdade a grande beneficiada do desenvolvimento cultural, que é a sociedade em geral, tem um grau de envolvimento e participação ainda muito reduzido. Nós tivemos este ano muitos episódios que levaram a colocar a cultura no centro de alguma discussão ou reflexão. Não só os eventos que você citou. Tivemos também a discussão organizada pelo ministério para debater a Lei Rouanet, a revelação do relatório de desenvolvimento humano mundial da ONU, que deu uma ênfase extrema à questão do desenvolvimento cultural. Não é exatamente uma real democratização do debate em torno da cultura, mas uma etapa inicial para o que um dia poderáserumenvolvimentoepreocupação verdadeiros de todos, dos cidadãos epolíticos,nãoapenasdamídia.

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Todo dia meio-dia. Basta ligar a TV paratomaradosediáriaderealidade.

Tem espaço para a água que tá faltando, para a cobrança indevida, a mãe que perdeu o filho, o idoso que precisa de remédio. Todo o mundo. E agora em vários canais:Varela,Kertèsz,Gerdan...Resolvem os problemas do povo? Que bom. Mas até quepontoojornalismonaTVdeveassumira função de reclamadoria pública em forma de tribuna popular? Como isto é feito hoje, na Bahia?

Considerando algumas nuances um é maismoderadoaqui,ooutromaisbravateiro ali - dá pra juntar os três no mesmo bolo. No mesmosambadocrioulodoido.Eporfalar

Programas de TV misturam jornalismo, denuncismo e assistencialismo. E acabam misturando tudo na cabeça do telespectador...

emsamba... É sempre o mesmo. As pessoas têm problemas das mais diversas origens e naturezas, mas passam muito longe das soluções. Aliado à falta de informação da população, o excesso de providências que se tem que tomar para resolver problemas simples acaba transformando qualquer unha encravada num pandemônio. Ora, nada melhor do que meter a boca no trombone. Melhor: no microfone. Centralizar as reclamações do cidadão

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Televisão

comum e torná-las fato público é, sem dúvida,umasaídaeficaz éuminstrumento queocidadãocomumtemparafazerfrente ao Estado ou às grandes empresas. Além do mais, se por um lado para uma empresa ou órgão público pouco representa uma queixa individual, por outro não é nada cômodoterseunomenabocadoVareladia apósdianaTV...

Tudo isto seria muito bom - se fosse só isso. No entanto, o que cresce por trás da atitude de aparente caridade é sempre a figura do apresentador. Uma espécie de padrinho que aparece, no fim das contas, como a melhor via de reclamação afinal, entreprocuraropoderpúblico(eestacionar nas suas congestionadas vias legais) e procurar um microfone que espalhe sua queixa por todo o estado, a segunda opção acabasendoaprediletadograndepúblico.

Pode-sejustificarestaescolhacomum motivo simples: quem fala quer ser ouvido. E, às vezes, ser ouvido (ou pelo menos parecer ser ouvido), ainda que por alguém que tenha pouco poder para solucionar o problema,valemaisdoquegritarnoouvido de quem manda de verdade e nunca ouve nada.Amaior parte dos problemas levados ao ar por estes programas não são da alçada da imprensa: quem não tem água deveria mandar reclamação para a Embasa. Quem teve o pneu furado no buracodarua,oufoiassaltado,oucomprou

um computador e não recebeu não deveria procurar a TV como última e salvadora instância para seus problemas. No entanto, o enorme vão comunicacional que existe entre o poder público e o cidadão precisa ser ocupado se o Estado élento,emuitasvezespoucoseincomoda com os impasses pontuais do inconveniente Zé-povinho, este por sua vez tem cada vez mais motivos para reclamar. Simular tribunas públicas é um excelente artifício que a TV usa pra ocupar este espaço. A falta de comunicação entre governantes e governados inviabiliza a execução da democracia de fato: o que ocupa este posto é uma espécie de “mediocracia”, a democracia mediada (se é que isto é possível), em que o mediador tem mais importância do que as partes envolvidas. A TV no caso, seus personagens se alimenta dos farrapos das partes envolvidas.Eacabasaindoporcima.

Não que se esteja buscando colocar a TV na posição de bode expiatório. Muito pelo contrário: no caso dos programas estilo tribuna popular, trata-se de um uso do meio de comunicação para preencher uma carência social. Que não se estabeleça o velho maniqueísmo e todo mundo passe a odiar o Varela do dia para a noite qualquer comportamento vem de um movimento gradual da história, e só acontece embasado por uma prática, algo

que se estabelece como um modode-fazer coletivo através do tempo. Portanto, se há culpa, ela não é só daTV. ATV é oportunista, sim. Mas o governo é negligente, inacessível. Ingovernável. E a população é, infelizmente, ignorante e nãoburra.Eisasantíssimatrindade. Oquesepodecriticar,enfim,éolado absurdo da coisa: ora, como pode aTV, e toda a mídia de massa em muitos casos, assumir uma função que exige enorme responsabilidade social (uns diriam abnegação), e estar ao mesmo tempo atrelada à lógica da audiência e do mercado? Qual o critério de relevância? Solucionar todos os problemas ou botar no ar os que dão imagens mais escabrosas? Ajudar as pessoas ou fazer o maior número delas se comover na frente da TV?TalvezvalhaapenaolharanossaTV de meio-dia com olhos menos cristãos...

Para a turma um pouco mais comedida - e com sérias restriçõesdememória-,MárioKertèsz faz bem o tipo gentleman. Nada de gente mal-vestida chorando migalhas na telinha. No Jogo Aberto a coisa é mais clean. Mário, como é carinhosamente tratado por seu público e equipe de estúdio, bem que poderia ser chamado de “Grande Oráculo da Democracia” - afinal, tem sempre na ponta da língua um bom conselho para o telespectador desamparado. Em meio a piadinhas (um tanto quanto passadas) ele sabe sempre a quem recorrer nos momentos difíceis e volta-e-meia explica como funciona o poder público, com ares de quem conhece bem a cozinha. O programa segue à risca a máxima do “aqui tem nível”, pra ninguém entalar com o almoçonaboca...EoMáriose

transforma, sem que se perceba, em Super Mário. Sem cogumelonemnada.

uma.Asolução: mete tudo no ar pra vernoqueéquedá.

Na trilha do Varelão aparece o novato (e no mínimo estranho) Gerdan. Este não está nem aí pra almoço coisa nenhuma. SeuAquiAgora é, de longe, o mais trash de todos. A começar pelo martelo de madeira com que o apresentador golpeia, impiedosamente, a sua mesa. Nada mais sugestivo do que o tradicional símbolo da justiça. É com ele que Gerdan intim(id)a políticos, donos de empresas e demais poderosos, seguindo um estilo muito semelhante ao de Varela. Com uma diferença: além de bater na mesa e soltar os cachorros pra cima dos poderosos, o apresentador arranja benefícios para personagens necessitados, como tratamento e remédio pra as pessoas através de empresários de 'bom coração'... E ainda faz anúncio ao vivo (de produtos como o anti-frieiras e micoses Micosina! Não tem hora melhor...). Fraude

Mas quem não gosta de muita frescura pára mesmo é no Varela. O grandalhão mete a mão na mesa, chama todo mundo de maluco e resolve tudo em dois tempos. Será que resolve mesmo? Pelo sim ou pelo não, todo dia tem gente na tela pra fazer denúncia. Por e-mail ou fax vale também: nada mais unilateral e anti-jornalístico: bastou falar mal do patrão que vai pro ar. O cidadão tem o direito de reclamar? Tem sim. E o jornalismo tem, por sua vez, o dever deprocurarinformações,ouvirquem está envolvido no caso, mesmo que esteja errado, antes de sair por aí mandando bravatas em suma, apurar. Mas isto muitas vezes é detalhe na conta do Varela. Afinal, o volume de reclamações, denúncias e problemas é muito maior do que o tempoquesetemparaapurarumaa

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Mário, o clean - O Jogo Aberto, dentre os programas estilo tribuna popular, é o que tem o aspecto mais profissional: é o mais “quase-global” entre os três. A começar pela apresentadora que fica elegantemente sentada, lendo os e-mails e, às vezes, contracenando com Kertèsz. Este, também sempre elegante, apresenta o programa bem descontraído, andando pelo estúdio. A decoração predominantemente branca e azul retratapontosturísticosdacidade:farolepraiasprincipalmente. Tudo muito limpo, muito claro. Uma pretensa aproximação com o padrão Globo de qualidade é visível - porém sem a mesmaneurosedosapóstolosdeRobertoMarinho.Masficao distanciamento: a construção do programa evidencia a preocupação em atingir um público mais elitizado, que não curtepancadasnamesa...Loboempeledecordeiro,oucoisa dotipo.

Varela,omandão- OBalançoGeraléumtantoquanto

estático. Não tem esta história de caminhar pelo estúdio. É uma câmera no Varela, outra no entrevistado. O cenário, cheio de figuras de pessoas carentes, sob um efeito daqueles de Adobe Photoshop, se encarrega de avisar que ali não é lugar para frescura. É preto no branco ou melhor: cinza no marrom (que beleza de combinação!). E pronto.Afinal, Varela tem mais o que fazer: não bastando apresentar o show e bater com a mão na mesa, o apresentador ainda se mete a dirigir o programa! Isso mesmo: não raro é possível pegar Varela dando umas boas broncas nos câmeras e equipe de produção, seja por um enquadramento mal feito, ou por uma imagem que ele pediu pra ficarnoarealgum“engraçadinho”tirou.Vaientender... Gerdan,o...- OnegóciodoGerdanémeteromartelonamesae ficar soltando uns proverbiozinhos de autoria desconhecida. De resto,nãotemmuitomistérionão.Éovelho“eu-saio-andando-eo-câmera-que-se-vire-pra-me-acompanhar, típico da escola capitaneadapeloRatinho.

De modo nem sempre muito sutil, nossos apresentadores-porretões desacreditam cada vez mais o poder público, e, por tabela, as instituições da nossa combalida democracia. Talvez não sem razão, mas certamente de maneiraarroganteeirresponsável.

A razão: não raro a indignação nos toma conta e o país parece condenado a um eterno caos. Nada funciona como deveria - nem saúde, nem educação, nem habitação, nem nada.

Aarrogância: também não raro, o time dos porretões passa por cima dos representantes públicos e verdadeiros encarregados pelas soluções dos problemas do grande público. Quase todo dia ouve-se o bordão: “Para quê procurar o poder público, se a gente sabe que ele não faz nada? A gente resolve é aqui mesmo”. Não bastando isto, distribuem intimações: “Mostra o microfone para ele... Vai terqueseexplicar!”.Demagogiapura:ouvocê

já viu algum desses apresentadores atacarem os políticos durante as entrevistas do mesmo modo que brigam quando elesnãoestãolá?

A irresponsabilidade: esvaziar o poder público. Afinal, discutir, argumentar e cobrar soluções é um direito. Não é direito, entretanto, esvaziar a importância do Estado.Amáxima do “a gente resolve aqui mesmo” é uma propaganda enganosa e extremamente perigosa para a democracia. É o temido espírito da “igualdade extrema”, diria o Barão de Montesquieu, em que o sujeito não se considera igual ao outro somente como cidadão, “mas tambémcomojuiz,comopai,comomarido, como senhor”. Ou seja: se alguém pode mandar, eu também posso. E se ninguém resolve, eu vou lá e dou o meu jeito. Agora imagina se todo mundo resolve sair por aí mandando a mão na mesa e arrotando valentia?

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Televisão

Nos ares da MTV desde 2000, inicialmente perambulando entre a programação na forma de

vinhetas que narravam as aventuras de dois malandros típicos das chanchadas brasileiras, o programasemanalHermeseRenatovemseconsolidandocomo agrandenovidadenogênerohumorísticotelevisivo.

Amados e odiados na mesma intensidade, H e R divide opiniões entre os admiradores do humor televisivo: para alguns não passa de mera banalidade feita por um bandosemcriatividadenemqualquertalentoparaacoisa; para outros são fantásticos inovadores do gênero humorístico televisivo. Inovadores sim! Mas seria um equívoco afirmar que são fundadores de um formato de humor na Tv. No ar entre 88 e 90 na Tv Globo, voltando rapidamente, em 92, a Tv Pirata, programa humorístico dirigido por Guel Arraes, foi fundador de um formato humorístico que satirizava a própria Tv, com quadros que parodiavam desde novelas até telejornais, passando pelo cinema e pela cena musical. Beirando o non-sense em certa medida, a Tv Pirata contava com a participação de grandes atores como Diogo Vilela, Marisa Orth e Marco Nanini, além de ótimos redatores do gênero, como Fernando Veríssimo. Também na década de 90 surge o programa Casseta & Planeta Urgente que definiu um formato, a princípio, com influências da Tv Pirata (já que quase todos integrantes do Casseta foram redatores da TvPirata),masseconsolidoumesmocomumavariedade dequadrosdeentrevistasaleatóriasemlocaispúblicosou dentro dos estúdios da Tv Globo (sempre com um clima de “pegadinhas”), personagens próprios, críticas políticas com pitadas de humor, intercalando com paródias a novelas, telejornais e outros programas da Tv Globo. O Casseta & Planeta se diferencia da Tv Pirata principalmente por não ter a mesma pretensão cênica nas representações e cenários. Fazendo uma comparação de formatos, Hermes e Renato, sem sombra de dúvida, se vale dessas estruturas paracomporoseuprograma.

EqualaNovidade?

Adiferença é a abordagem. Nunca na Tv brasileira tantos temas trash´s com abordagens tão cruas foram levados ao ar. Antes da MTV, nenhuma emissora brasileira deixou de lado tabus e moralismos, abrindo espaço para um grupo tratar satírica e explicitamente de situações constrangedoras muito comuns, como em “Merda Acontece”. Neste quadro o próprio vilão, o Cocô, apresenta um programa em que personagens narram seriamente (como em programas de entrevista que pretendemsersérios,mastratamdetemastãobanaisquanto) os momentos de um dia em que aquela indisposição intestinal ocorre no meio da rua ou em plena mesa de jantar da casa do chefe.Ouaindadeumsujeitoque,sememprego,arranjouum bico para se vestir de coelho e vender ovos de páscoa, mas como a fome acaba apertando e sua marmita ficou esquecida emcasa,aúnicasaídaédevorartodososchocolates,debaixo de um forte sol. Não podia deixar de ser, como o próprio apresentador, o Cocô “em pessoa”, narra: “O cara comeu tanto chocolate na páscoa... que o caldinho desceu... ah desceu...”.

O figurino usado, a locação, os cenários, os diálogos, os enquadramentos, os movimentos de câmera e a luz remetem a uma produção de vídeo amador dos mais toscos, mas classificá-los como amadores e atribuir essas aparentes deficiências a uma incapacidade do grupo é um equívoco. Com um olhar mais preciso e menos preconceituoso é possível enxergar que este sempre foi o efeito pretendido, é a aposta do programa. O amadorismo é estrategicamente simulado e existe uma preocupação estética, talvez até minuciosa, nos detalhes da composição de uma cena ou sequência. Isso é notável mesmo quando o grupo era independente e produzia pequenos episódios parodiando personagens da pornô chanchada. A prova desta preocupa-

Camilo O. Aggio camiloaggio@hotmail.com
Televisão Fraude 12
Explicitamente escrachado, escatológico e amador,o humor de Hermes e Renato pode oferecer algo mais - e até exigir um certo conhecimento para sua apreciação.

disponibilizam vídeos para downloads na internet usando o nome Hermes e Renato.Adiferença é nítida, os episódios destes grupos possuem uma desarmonia completa, com enquadramentos mal feitos, edições sofríveis, textos e atuações mal encaixadas, figurinos e cenários em um conflito insuportável. Uma completa desarmonia: doloroso compreender, difícil fazerrir.

Hermes e Renato incorpora na sua estética um conjunto de influências da Cultura Pop que vão desde Zé do Caixão, filmes B da década de 80 como O Massacre daSerraElétrica, a estética da chanchada brasileira até programas televisivos como O Homem do Sapato Branco e Aqui eAgora. Aparentementenãoháqualquer restrição por parte da emissora, que permite que programas das concorrentes sejam parodiados. Alista é extensa e vai desde paródias ao programa do Padre Quevedo, onde um sujeito semi-analfabeto com jargões na ponta da língua tenta provar ao padre que é filho do capeta:“Eusoisofilhodocapeta,seupadre”,“Euvimdas mais profundeza do inferno, de onde você nem imagina que eu tenha vindo” ou “Eu vim botá o filho dos ôtro na maconha, cheirar maconha, fumar cocaína, essas coisa caótica”, instaurando no programa um combate de ofensas hilário entre o padre e o “suposto filho do capeta “, cada um com suas convicções. Para quem não acompanhou o quadro original do Padre Quevedo e alguns episódios específicos, dificilmente encontrará algo cômico. De forma muito semelhante pode-se observar quadros como o Programa Cláudio Ricardo, que parodia programas de auditório em geral, mais

na Redetv. Neste ponto é interessante observar que Hermes e Renato, em determinadosquadros,deixadeserparódiae passa a reproduzir os absurdos de determinados programas da Tv brasileira, evidenciando certos níveis de conteúdo das nossas mídias.

Retornando a paródia, seria um pecado deixar de citar a banda Massacration, que tomou vida fora do programa, atualmente fazendo shows e dando entrevistas, mas que se originou de uma brincadeira com o clichês musicais e videoclípticos do mundo metaleiro. Conceitualmente falando, a paródia pressupõe o conhecimento do que está sendo parodiado, mas Hermes e Renato leva esta relação àsúltimasconseqüências.Detalhesmínimosdecomportamentos, situações, músicas, roupas, cenários, diálogos de um filme, um programa, um comercial, são inseridos muito discretamente nos quadros, exigindo do telespectador um conhecimento maior das referências que ali estão sendo feitas.

HermeseRenatoéumtipodehumorquenecessitado conhecimento das referências para ser fruído ou mesmo criticado. Pode parecer exagero à primeira vista, mas é fundamental apreciar este programa com um olhar mais apurado e analítico, mesmo que despretensiosamente. Longavidaa'caoticidade'deHermeseRenato.

Exatamente. Caótico por excelência. Talvez essa seja a melhor forma de se definir o trabalho dos cinco cariocas dePetrópolisqueintegramogrupo.Abrindoumparêntese: caótico, não no sentido literal de grande desordem, inteligibilidade, confusão que pode resultar em um não entendimento, uma impossibilidade interpretativa. Mas sim,caóticocomosugeridopeloscriadoresdoHeR,como um feito demasiadamente amador, “amadoresco”, tosco, ou mesmo como uma catacrese salvadora usada por seus personagens em determinadas situações de falta argumentativa.

Fraude 13 Televisão

livianery@terra.com.br

Assim como as águas barrentas e vermelhas que enchiam o Rio Camarujipe são hoje um esgoto a céu

aberto,oRioVermelhoestáseesgotando.Amudançaé visível para qualquer um que passar pelo trecho dos bares em busca de uma boa noite de diversão: das inúmeras casas de show de algum tempo atrás, apenas uma ainda funciona. Mal das pernas, o bairro que nunca dormia vai pra cama às duas e quemsearriscaapermaneceraté as quatro fica a ver navios - ou barquinhospescando.

Carregando a fama de “bairro boêmio”, em algum momento da história o Rio Vermelho começou a ter sua imagem atrelada à do rock baiano. Acompanhando a nascente cena roqueira, durante as décadas de 80 e 90 muitas casas passaram a oferecer shows ao vivo. Neste períododezenasdebaresabrirame fecharam as portas, como o Saint Louis, Chico Louco, Anexo, Café & Cultura, Idearium, Santana/Havana hoje todos finados. Cristiano Macchi, músico que há oito anos freqüenta e toca no Rio Vermelho resume a situação:

“De oito a sete anos atrás foi o auge desses lugares, que estavam sempre lotados e sempre com bandas tocando. Hoje as casas de show estão fechando, tem reduzido também o númerodaspessoasquefreqüentam”. Se levarmos em conta que as bandas de rock da Bahia não vivem um momento de baixa significativa, não podemos tomar isso como a causa da decadência. Então, o que terá acontecido?

Problemas

Em busca da resposta para esse enigma, entrevistamos diversos frequentadores, músicos e donos de bar. Depois de um trabalho árduo de levantamento e cruzamento de dados, chegamos a algumas conclusões. Um dos problemas mais levantados é opreçodacervejaedoacarajé.ParaKahyruPontel,músicoe frequentador (será que existe alguém que frequenta os bares do Rio Vermelho que não toque?) “os bares só vendem cerveja long neck e por um preço abusivo”. Reclamação válida. Imaginemos um camarada que não sofra de distúrbios alcoólicos e queváassistirumshownoRioVermelho.Seessenosso

Danilo Fraga e Lívia Nery sugarpie@terra.com.br
Fraude 14
Música

personagem fictício consumir durante uma noite 5 garrafas de cerveja (long neck) e 2 acarajés, sua conta não saí por menos de 20 reais, isso sem contar couvert e outras despesas. Jean-Claude Wolpert, que administrou o Café Calypsopormaisdeseteanos,defendeopreçocobradopela cerveja em seu bar R$ 2,70 cada long neck. Segundo ele, seus custos são mais altos que outros bares. “Num bar equivalente em São Paulo, a cerveja custa no mínimo cinco reais”. Um outro comerciante, mais satisfeito, mais sincero e mais tímido (não quis se identificar), discorda: “lá onde eu moro eu compro uma cerveja por R$ 1,80, aqui ela vale R$ 3,00.Comoéquenãolucra?”

Jean-Claude vai além, dizendo que em Salvador, apesardosmaisde2milhõesdehabitantes,poucaspessoas saem à noite principalmente durante a semana o que torna difícil oferecer música ao vivo sempre e cobrar menos pela cerveja. “Talvez existam bares demais para pouca gente, especialmente no Rio Vermelho”, completa. O pouco poder aquisitivo do público é uma causa para o esvaziamento do local, mas outros fatores são destacados. Freqüentadores confessam cansar de encontrar sempre as mesmas pessoas e assistir às mesmas bandas, muitas delas tocando covers, apenas.ParaKhayru,quejátocoumuitonolugar,tempúblico sim, principalmente em se tratando de rock. “O que falta pra gente voltar aquelas épocas que já foram legais é fazer uma articulação maior, entre donos de bar, o comércio, bandas, todos os participantes”.Afalta de inovação e criatividade por parte das casas de show foi bastante apontada como uma deficiência deste setor que implica na falta de público. Há anos,porém,temsidoassim.

As casas de show sempre se organizaram da seguinte forma: recebem a banda no seu espaço e repassam a ela uma parte do couvert. A banda arca com despesas como divulgaçãoepartedaaparelhagem.“Agentetemquearriscar se as pessoas vêm ou não”, desabafa Macchi. Durante muito tempo os bares vêm ficando marcados por bandas e público fixos, ou seja, músicos que tocam na quinta servem como público para as bandas de sábado, e vice versa. Mas, nos últimos anos parece ter havido uma mudança no perfil das bandas e de rock em salvador. Segundo o professor Jeder Jannoti - que está lançando o livro Heavy Metal com Dendê, sobre a cena metálica de Salvador “o rock que era tocado nos bares do Rio Vermelho está em baixa. O público está mais jovem e a forma de consumo mudou, isso acontece de temposemtempos".

O ciclo das cheias do rio

Isso pode indicar, enfim, que esta é a dinâmica do Rio vermelho.Assimcomomuitosrios,oRioVermelhodeveestar passando por um período de esvaziamento, parte de seu ciclo natural que em breve resultará numa nova cheia. Para o Jannoti “essa ciclicidade é comum na maioria dos bairros boêmios. O próprio Rio Vermelho já havia passado por uma situação parecida no final dos anos 80”. Essa posição é partilhada também pelo freqüentador Solovera: “a vida musical no bairro não dura muito, apenas três, quatro anos, no máximo.” Segundo ele, isso que está acontecendo agora tambémjáfoivistoantes.“Oriovermelhovai,cresce,temum movimento da porra e aí pluft, todo mundo some.Daqui a pouco volta a encher novamente”. Durante o intervalo, novas bandasqueantesseescondiamemsuasgaragensvão

mostrando as caras, para em seguida voltar a tocar nos bares com seus novos proprietários e reanimar a vida culturaldobairro.

Um exemplo de novo fôlego no ramo de casas de show é o Nhô Caldos. Primeiramente uma mera casa que vendia cerveja e petiscos (o caldo nunca foi seu ponto forte), há três meses, o Nhô Caldos resolveu colocar música ao vivo, tocada por bandas de rock, sem cobrar couvert ou entrada. “Por as bandas não acharem espaços para tocar, terminam querendo se apresentar de qualquer forma, e com isso não se importam em tocar por um valor baixo. Dá condição para o dono de bar oferecer o espaço a eles e não cobrar couvert.”, conta Rodrigo, proprietário do Nhô Caldos. Ele diz destinar 10% da vendagem para as bandas, o que por sua vez não confere com os músicos. Eles afirmam não receber a gratificação e tocam de graça.

Para Rodrigo, ocorre um pouco de falta de criativi dade por parte dos proprietários de bares. Segundo ele, “quando abrirem de fato um bar, os donos devem dar mais liberdade às pessoasque freqüentam e mudar quando não estiver dando certo”. Defensor da não-cobrança de couvert, ele garante que com a vendagem de cerveja e refrigerante já dá pra sair ganhando. Da mesma forma, outros espaçosparashowsapareceram,comoéo caso da loja de CDs São Rock e do Teatro do Sesi, que de tempos em tempos é palco de shows de rock. Talvez com a implantaçãodoBahiaAzul,oRioVermelho volteaprosperar.Assimesperamos.

Fraude 15 Música

Nos últimos anos, têm surgido em Salvador algumas bandas que, influenciadas pelo manguebeat, têm

como característica principal a mistura da música pop com elementos, digamos assim, “de raiz”. Esse tipo de rock com batuque, que vamos chamar aquiAfro-Rock, ocupa cadavezmaisosespaçosculturaisdeSalvador.Fazemparte desse balaio bandas como Navio Negreiro, a extinta O Cumbuca, Nêgo Veio (ex-Ataraxia e ex-Mano Veio), Lampirônicos, Zambotronic, entre outras. Todas elas misturam o rock com alguma outra coisa, seja essa “coisa” afoxés, samba, reggae, baião ou maracatu. Essa preocupação,quedatadotropicalismo,permeiatodaahistóriadorock nacional e reaparece de tempos em tempos. Não sei se por sorteouporazar,elaresolveureaparecerporagoranaBahia.

Um aspecto interessante na construção de identidade feita por essas bandas seria o resgate das raízes negras do povo baiano esquecidas em favor de uma falsa baianidade vendida pela axé-music. Como se pode ler no release da banda Navio Negreiro, "De volta à Bahia, reencontraram antigos parceiros e fundaram não apenas uma banda, mas uma comunidade de músicos, um neoquilombo musical, raiz sólida da cultura negra brasileira, concebida para atuar independente das limitações e restrições impostas pelo mercado cultural oficial". Frases parecidas podem ser encontradas no release das bandas Nêgo Véio e Lampirônicos, além de entrevistas e matérias sobre outras bandas.

De fato, na música popular, é comum que o discurso de autenticidade de uma forma musical se dê a partir da desvalorizaçãodeumaoutra-aaxé-musicévilãem9,8entre 10 grupos de “roqueiros” de Salvador. Porém, me espanta a ferocidade com que essas bandas se dirigem ao ritmo das morenas (e loirinhas) rebolantes.Ao contrário de outros subgênerosdorock,aidentidadedoafro-rockéconstruídasob

os mesmos signos de baianidade da axé-music - temas como negritude e sensualidade tem papel de destaque em ambos.

Porém,naconstruçãoda“baianidadenagô”-pratomaro termo emprestado do axé - feita por essas bandas, alguns pontos podem ser questionados. O tema do resgate da cultura negra é complicado. A África é um continente gigantesco, com diversas etnias, culturas e, como não poderiadeixardeserdiferente,comdiversostiposdemúsica. Resumirtodamúsicaafricanaàpresençadeumapercussão, oualgunsdreadlocks,nabandaé,nomínimo,empobrecedora. Na verdade, parece que o termo afro entra aí como um slogan, uma garantia de autenticidade.Ao mesmo tempo em que essas bandas anunciam o resgate da cultura negra, repetem sem saber séculos de cultura musical européia o que é expresso na utilização do sistema tonal europeu, do formatocançãoedeperformancestipicamente“brancas”(ao contrário da maior parte da música africana que tem na improvisaçãoseuprincipalelemento).

Talvez eu esteja colocando problemas em coisas relativamente simples. Mas, a simples possibilidade de alguém achar que está resgatando alguma raiz cultural em sábados regados a cervejas e maconha me assusta. Onde quer que esteja nossa raiz, não me parece tão simples, ou mesmo possível e desejável, encontrá-la. O que existe na verdade é um misto de frankfurtianismo inconsciente e mito do bom selvagem, onde o índio e principalmente o negro (mesmo os mulçumanos malês que não batucavam e nem dançavam)figuramcomonossaverdadeiraraizcultural.

Fraude 18
Música
Danilo Fraga sugarpie@terra.com.br

Era uma vez a mídia. Ela foi criada para ser um fórum público de discussão,

para manter as pessoas informadas sobre o mundo ao seu redor e para vigiar o poder. Durante muito tempo ela teve uma existência tranqüila, entre boas ações e atos irresponsáveis que lhe concederam grande poder dentro da sociedade. Tempos atrás, alguns já haviam percebido que a mídia não era tão confiável assim. Mas um belo dia perceberam que poderiam se organizar para monitorá-la. Foi assim que surgiram os vigilantes da mídia, os observatórios de imprensa.

Na verdade, a idéia de criticar o modo como se seleciona e veicula notícias pelos meios de comunicação no mundo nasceu de uma discussão mais ampla sobre os ideais democráticos das sociedades ocidentais. A criaçãodocargode“ombudsman”para

Monitorar

Fraude 19
a mídia agora virou moda no brasil. Ainda bem.
Mídia
Camilla Costa camillacosta@gmail.com

empresas

jornalísticas nos Estados Unidos,nos anos 60, foi um dos primeiros reflexos desta discussão. Ombudsman é um termo sueco que, em português,ganhouatraduçãode“ouvidor”.Concebido comoumcargodegoverno,oouvidoremlinhasgerais deverepresentarocidadão,receberasreclamações,críticase sugestões do público e encaminhá-las à instituição que representa. Nos jornais, o ombudsman deve ainda redigir uma crítica de circulação interna e outra a ser publicada no jornal, baseada em suas observações sobre a cobertura do veículo e nacomparaçãodelecomosprincipaisconcorrentes.

deve exercer o controle sobre os meios de comunicação.Seráentãoqueopúblicobrasileiromudou?

O Brasil teve momentos específicos de contestação da grande mídia, geralmente ligados a eventos políticos maiores. Afinal, mídia e poder estão sempre conectados. Nos Estados Unidos e Europa, momentos como estesacabaramgerandoorganizaçõescomoaMediaWatch, criada em 1984 com o objetivo de monitorar o uso de estereótipos e imagens preconceituosas na mídia. O projeto é um dos primeiros e mais antigos a se beneficiar com a popularização da internet. Do lado de cá, as primeiras iniciativas de crítica da mídia após a abertura política nos anos 80, vieram da Igreja Católica que criou o projeto Leitura CríticadaComunicação.

Em 1996, o jornalista Alberto Dines funda o Observatório da Imprensa, na UNICAMP. Dines já havia sido responsável pela primeira coluna de análise da mídia no país - o Jornal dos Jornais - na Folha de São

No Brasil, o primeiro e durante muitos anos único cargo de ombudsman emempresajornalísticafoiodojornalFolhade São Paulo, criado em 1989. Desde então, outros jornais têm incluído tais profissionais em sua folha de pagamento. Recentemente, o Brasil ganhou o seu primeiro ombudsman televisivo, o jornalista Osvaldo Martins, que ocupará o cargo na TV Cultura. Para Martins, “o ombudsman não é um crítico de TV, mas alguém que deve vê-la comolhosdetelespectadorcomum”.

VigiarePunir

O “telespectador comum” brasileiro ou público de meios de comunicação em geral, é freqüentemente descrito como passivo e de postura pouco crítica em relação a estes meios. No entanto, o país assiste hoje a um movimento crescente de “vigilância e democratização da imprensa”, que começa com a proliferação de websites sobre o tema e culmina com amaisrecentetentativadogovernofederal de criar o Conselho Federal de Jornalismo, que reacendeu o debate sobre até onde se

Paulo, na década de 70. Nos últimos anos, o número de projetos como este e o alcance dos mesmos aumentou consideravelmente. Como exemplo, podemos citar a revista Imprensa, uma das primeiras publicações de crítica à mídia (não filiadas diretamente a facções políticas) do Brasil. Criada há cerca de17anosepublicadaatéhoje,arevistanuncatevegrande projeção. Hoje, além da circulação impressa, há uma edição eletrônica-oPortalImprensaqueestáoficialmentenarotados internautasinteressadosnoassunto.

Panopticon

A trajetória do Observatório da Imprensa merece

Enquanto os alguns críticos procuram tratar a mídia de maneira mais técnica e apartidária, como é o caso do Observatório da Imprensa, outros assumem uma postura política mais clara. Na Internet, são numerosos os sites que se propõem a denunciar o complô da mídia em favor de um ou outro grupo politico. No Brasil, os dois principais exemplos desse tipo de mídia engajada são os sites Midia Sem Máscara (www.midiasemmascara.com.br) e o Centro de Mídia Independente (www.midiaindependente.org ). O site Mídia sem Máscara, que completou três anos de existência neste ano, é capitaneado pelo polêmico filósofo anticomunista Olavo de Carvalho e reúne textos quetratamdetemasquevãodesdeadefesa

do liberalismo econômico até o suposto “controleesquerdista”damídianacional.

Defensordoideárioliberalecristão,Olavode Carvalhoescrevepérolascomo:“Nagrandemídia brasileira não existe jornalismo nenhum. Existe apenasmanipulaçãoaserviçodaesquerda”.

Já o Centro de Mídia Independente faz parte de uma rede internacional que armazena e difunde notícias publicadas por produtores independentes aIndymedia,criadaem1999para divulgar os protestos anti-globalização durante o encontro da Organização Mundial do Comércio (OMC), na cidade americana de Seattle. No Brasil, o site é resultado de uma rede que congregacoletivosdevoluntáriosjáestabelecidos em10cidades.

Assemelhançasentreosdoissitessão

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Mídia
Danilo Fraga sugarpie@terra.com.br

atenção especial. O site, desenvolvido a partir do LABJOR (Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo) na UNICAMP, tornou-se rapidamente a principal referência em crítica da cultura midiáticanopaísefoitransformadoatéemprogramanaTV Cultura. Criado para ser um fórum de discussão para a sociedade sobre o comportamento da mídia, o Observatóriodeuvisibilidadeaoutrostantossites do gênero, como o Canal da Imprensa, o Mídia Sem Máscara e o Centro de Mídia Independente (veja Box),alémdoportalComunique-se,quetêmosmesmos objetivos. Segundo Alberto Dines, editor-chefe do Observatório da Imprensa, “estamos aprendendo a observaraimprensa,eistocolocaoBrasilnavanguardada democratizaçãodamídia”.

Talvez pela aura de independência e imparcialidade que ostenta, o Observatório tenha alcançado tanto prestígio junto aos leitores. A organização dos assuntos favorece esta impressão: desde assuntos polêmicos em geral, passando por críticas às coberturas sensacionalistas, comentários sobre o conteúdo das faculdades de jornalismo,críticadeTV,publicaçãodascríticasdos

principais ombudsmen, brasileiros e estrangeiros. Desde textos de estudantes até contribuições de profissionaisrenomados.NoObservatóriodaImprensa, feito no molde dos observatórios europeus e americanos, parece existir espaço para todas as discussões e todososinterlocutores.

É interessante notar, no entanto, o aspecto que diferenciaacríticadamídiafeitanoBrasileafeita no exterior. Em outros países, muitas das organizações de monitoramento da mídia surgem e se fortalecem na sociedade civil organizada, na esteira de movimentos sociais que envolvam protestos e debates públicos. Por aqui isso não acontece. Por incrível que pareça, no Brasil os novos algozesdamídiasãoosseusprópriosprofissionais. Os principais websites nacionais surgiram dentro das faculdades de comunicação, onde há um interesse bastante específico em discutir a mídia. A maioria destas iniciativas, ainda que de rápido crescimento, como o Observatório da Imprensa, são pouco de jornalismo e

populares e o próprio fato de este crescimento ter acontecido através da internet, ferramenta ainda pouco acessível para a maioria da população, é sintomático. No mesmo Observatório, a maioria dos artigos é escrita por estudantes de jornalismo e profissionais da área. Para Elias Machado, professor e coordenador do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Online da Universidade Federal da Bahia,“deveríamosestarpreocupadosemgarantira incorporação da crítica dos meios como um componente essencial à formação cultural de todo o cidadão”.

Sem dúvida, democratizar a mídia passa por democratizar a discussão sobre ela.Talvez ainda seja muito cedo para nos colocarmos na vanguarda do processo.Aindahámuitoparavigiar.

muitas, a começar pela forma como eles se descrevem. Se de um lado o Mídia sem Máscara é “destinado a publicar as idéias e notícias que são sistematicamente escondidas, desprezadas ou distorcidasemvirtudedoviésesquerdistadagrande mídia brasileira”, de outro, o “CMI Brasil quer dar voz aos que não têm voz constituindo uma alternativa consistente à mídia empresarial que frequentemente distorce fatos e apresenta interpretações de acordo com os interesses dos ricos e dos poderosos”. Como dois times de futebol, os partidários de cada lado têm uma relação de ódio recíproco. Para Olavo de Carvalho, “O CMI é uma ONG milionária, com escritórios em mais de uma centena de países, empenhada em fazer propaganda contra os EUA e Israel, exatamente na linha de milhares de sites nazistas e comunistas, e que ainda tem o desplante

de chamar de 'fascista' quem tome posição contrária à sua”. Na verdade, “fascista” é o adjetivo mais generoso utilizado para falar de OlavodeCarvalhoemambientesmaisàesquera. Para Roberto Venturini, colaborador assíduo do CMI, “Olavo Carvalho é o pastor dos reacionários deplantão,osquaissãodesprovidosdeinteligência e a favor de medidas totalitarias e fascistas. Aliás, Olavo é um típico racista neo-liberal e pseudo-intelectual”.

Nesses tempos em que a crítica ideológica dos meios de comunicação está tão em voga, gostaria de explicar meu título. Ele foi escolhido apenas por um trocadilho barato, não tem nenhumacargaideológica.

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Chiado, barulho, sintonia ruim... Paciência para achar uma freqüência que dê para escutar. Estudiosos do

rádio dizem que as emissoras AM valem mais pelo que já representaram e não por sua atual resistência perante as rádios FM. Mas afinal, o que se tem para ouvir no mundo das ondas de Amplitude Média? Nos últimos anos, ouvir rádio, até mesmo as FM's tem sido um costume cada vez mais raro nas grandes cidades: CD's, MP3 e rádios on-line, pouco a pouco vão conquistando seu público. Então, o que dizerdaAM?

Uma polêmica envolve o surgimento do rádio no Brasil. Oficialmente, é considerada a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro a primeira do país, em 1923, mas existem provas de que a Rádio Clube de Pernambuco já fazia transmissões quatro anos antes. De lá para cá, o meio radiofônico cresceu, ganhou e perdeu importância entreas mídias, acompanhou, não homogeneamente,osavançostecnológicosepassou a fazer parte da rotina de muitos. Enquanto as emissoras de car[ater mais comercial (FM), ganharam audiência e conquistaram a massa, as rádiosAM passaram por um processo de desvalorização que acarretou em desemprego de funcionários, falta de interesse de anunciantes e conseqüente venda paragruposreligiosos.

Na Bahia, presenciamos o fenômeno da “evangelização” darádioAM. Rádio Novo Tempo, Rádio Cruzeiro da Rádio IgrejaReligião deDeus...essassãoalgumasdasque ocuparam o espaço, por exemplo, das extintas Rádio Comercial e Rádio Clube. A programação consiste basicamente na “pregação da palavra” e inclui blocos “jornalísticos” (em uma das rádios, podemos ouvir a leitura das manchetes dos principais jornais do dia com a músicatema do filme Missão Impossível ao fundo) e até rádio novela. Os ouvintes participam avidamente escolhendo músicas e participando de enquetes, como as comandadas pelo locutor do programa TicTac Musical Gabriel Oliveira. Entre os vários assuntos debatidos, é possível opinar em temas como “Um jovem consegue conhecer 100% seu parceiro já no namoro?” ou “A pena de morteajudariaadiminuiraviolêncianopaís?”

Um estudo realizado pelas pesquisadoras Lucina Miranda Costa, Fabiana Gomes de Souza e Cristiana Karine Cardoso, da Universidade Federal do Pará, entitulado “Em nome de Deus: as ondas radiofônicas louvam cada vez mais ao Senhor”, revela que o rádio, tendo um grande poder de penetração e com um custo mais acessível, se comparado à TV,éoprincipalveículoutilizadoparadivulgaroevangelho.O grande número de emissoras religiosas só comprova o próprio crescimento das igrejas, seja na ampliação do número de templos, seja na criação de novas denominações religiosas.

Jonicael Cedraz, Professor de Radiojornalismo da Universidade Federal da Bahia, afirma que o rádio AM se transformou em um espaço de disputa entre grupos religiosos. “O fenômeno religioso tomou conta das rádios AM em Salvador, desde os anos 90, transformando essa mídia também em um espaço para políticos cativarem votos”, diz o professor.Ojornalismopraticadoporessasrádios,deacordo comCedraz,temseuconteúdomodeladoapartirdas

Fraude 22 Rádio

esportivas. “Ouço a rádioAM porque a programação dela se destina a uma faixa de público diferente e é mais direcionada para a área esportiva, relegada na maioria das rádios FM”, concluiAgnelo.

Programas como o Balanço Geral (da Rádio Sociedade da Bahia, apresentado por Raimundo Varela e Armando Mariane), que se colocam como alternativas para solucionar os problemas da população carente da cidade, também atraem muitos ouvintes. É a D. Gildete, moradora do Alto do Coqueirinho, que precisa de uma cadeira de rodas e liga para a rádio pedindo ajuda ou Seu Antônio, de Dias D´Ávila, solicitando que 'orelhões' sejam instalados na rua em que ele mora. “Esse tipo de programa se aproveita do fato da populaçãocarentetersidoeducadaparabuscaramparonopolíticoe na religião. Mas isso não é fazer uma rádio popular, mas popularesca, que trabalha no demagógico”, critica o professor

para se aproximarem do ouvinte e daí garantir sua fidelidade. Não é raro um locutor passar até mais de cinco minutos apenas distribuindo beijos e abraços para os “cumpadis”eas“cumadis”,semesquecerdemandar“aquelealô”para o seu Zé da barbearia e à dona Rita do açougue. Tudo isso proporciona uma sensação de comunidade, diminuindo a distância entre quem fala e quem ouve, atraindo um público que encontra nessas rádios uma chance de falar de seus problemas, pedir ajuda e conselhos. Tudo isso colabora para que a rádio AM deixe de ser vista apenas como um tipo de mídia 'quase extinta'. Excluída, sim, das grandes mídias, mas com visibilidade e importância garantida em determinados grupos sociais, principalmente os de baixa renda. Daí ser necessário acompanhar o desenvolvimento dessas rádios e discutirseupapelnasociedade.

Rádio 23 Fraude
Barbosa vivian.barbosa@gmail.com

No mês de dezembro, reportagens especiaisevinhetasdevemcomeçar

a circular na TV Globo anunciando as comemorações pelo 100º aniversário de nascimentodeRobertoMarinho.Ocriadorda Rede Globo de Televisão, que morreu há pouco mais de um ano, foi um dos grandes empreendedores do ramo da comunicação em todo o mundo. "Dr. Roberto", como costumava ser tratado, misturou imprensa e política com interesses pessoais e hoje é lembrado entre o ódio e a admiração dos brasileiros.

Nesse universo dos "grandes comunicadores", já tivemos muitos ícones na história do Brasil. Para que Roberto Marinho se tornasse o todo-poderoso, ele precisou passar por cima de outro magnata, dono do maior conglomerado de empresas jornalísticas de até então, com 36 jornais, 34 estações de rádios, 19 tevês, 18 revistas e duas agências de notícias: Assis Chateaubriand. Por sua vez, para alcançar prestígio, "Chatô" usou de suas principais armas - a pena e a tinta - para desmoralizar seuopositoreconcorrenteSamuelWainer.O próprio Roberto Marinho não escapou de ter problemas em seu império quando Senor Abravanel (leia-se Sílvio Santos) ganhou popularidade e conquistou, pouco a pouco, emissorasdeTVecredibilidade.

Intrigas, batalhas declaradas, acordos ilegais... tudo isso com uma pitada de senso de humor e a tranqüilidade de quem nunca enfrentará problemas porque "tem o poder nas mãos". Assim viveram esses homens que se cobriam com a fachada do "amor pela comunicação".Masnãoseriasededepoder? Ou amor ao dinheiro? Os livros, filmes, vídeos documentários e sites que contam a vidadecadaumdessespersonagenstentam resolver essa questão, mas costumam dar mais ênfase sempre a um lado, pintando-os oracomoheróis,oracomobandidos.

AprincipalbiografiadeChateaubriandfoi publicada em 1994 e escrita pelo jornalista

Fernando Morais. Uma das raras exceções, Chatô: o rei do Brasil, a vida de Assis Chateaubriand (Companhia das letras. 732 págs), consegue fugir do maniqueísmo ao mostrar um Chatô polêmico, entusiasta e capaz de cometer crimes para garantir sua influência, mas envolvido com tudo que se passava em suas empresas, sempre escrevendo em seus jornais e buscando trazer inovações técnicas para o país. Nem as excentricidades de um apaixonado por mulheres e pela arte escaparam de ser detalhadas no livro. A criação da primeira emissora de TV daAmérica do Sul, em 1950, aTVTupi, foi o maior feito de Chateaubriand, quemorreudezoitoanosdepois,mergulhado

em dívidas que começavam a destruir seu patrimônio e cresciam ao mesmo passo que a TVGlobo.

Os direitos autorais do livro de Morais foram comprados pelo ator e "cineasta" Guilherme Fontes, que desde 1998 está dirigindo o filme Chatô, em meio à tramitação de processos judiciais e acusações sobre mau uso de verbas. Apenas em abril deste ano, as filmagens, suspensas desde 1999, foram retomadas e as últimas cenas do filme começaram a ser rodadas, mas ainda sem prazo para estréia. Fontes idealizou um ambiciosoprojetoqueconseguiucaptarR$8,5 milhões através de leis de incentivo à cultura, mas foi só com a ajuda da BR Distribuidora e da Riofilme que o filme pôde voltar a ser rodado.OorçamentototaldeChatôserádeR$ 12 milhões, tornando-se o mais caro longametragemdahistóriadocinemabrasileiro. Se nomes de tanta importância atraem o público quando falamos bem, imagina quando revelamos seus podres? Seguindo essa lógica, o que não falta no mercado são publicações que "desmascaram", por exemplo, Roberto Marinho. Romero da Costa Machado, trabalhou 10 anos nas Organizações Globo e publicou dois livros:Afundação Roberto Marinho (Ed. Tchê!, 266 págs) e Afundação Roberto Marinho 2 - uma biografia de corrupção (Ed. Meus Caros Amigos, 164 págs). Ligações da Globo com o jogo do bicho, a fraude do PapaTudo, transações em dólares ilegais, entre outras acusações de irregularidades são reveladas, servindo como combustível para sites especializados em pregar o ódio à Rede Globo. Muitos deles chegaram a festejar a morte de Roberto Marinho, que na realidade, já tinha morrido váriasvezesantesemboatosdivulgadosviaemail.

Ainda mais polêmico e até hoje um verdadeiro mistério, é o documentário Beyond Citizen Kane (Além do Cidadão Kane), dirigido por Simon Hartog e realizado pela produtora independente Large Door Ltda, em 1992. O vídeo foi exibido pelo Channel 4, de Londres, no dia 10 de maio de 1993 e contava a história da televisão no Brasil, focando a vida do empresário Roberto Marinho e a TV Globo.As fitas chegaram ao país e viraram uma atração clandestina, apresentando temas que iam desde o acordo ilegal da Globo com a TimeLife até a intervenção nas eleições de 1989, disputadas entre Collor e Lula, incluindo o escândalo da edição do debate entre os candidatos, que teria ocorrido por ordens do presidente da emissora. Depoimentos de Chico Buarque, Leonel Brizola, entre outros, dão um tom irônico ao documentário. As fitas foram s pelo

dono do SBT

Fraude 24
Televisão
Sílvio Santos Assis Chateaubriand Fundador da TV Tupi

confiscadas pelo então governador de São Paulo, Luiz Antônio Fleury Filho e um livro que transcreve o vídeo foi lançado mais tarde por Geraldo deAnhaia Mello. No entanto, a cópia do DVD "Além do Cidadão Kane" podia ser comprada pela bagatela de R$ 5,00 em uma manifestação organizada pelo Centro de Mídia Independente,queocorreunodia18deoutubro, na Av. Jornalista Roberto Marinho, zona sul de São Paulo. O movimento teve como lema a luta pela democratização da mídia, ideal julgado pelos manifestantes como comprometido pela

A grande expectativa, porém, está voltada para a publicação da biografia oficial de Roberto Marinho. Quando você estiver lendo esta matéria, o livro lançado para as comemorações docentenáriodenascimentodopatriarcaglobal, já estará nas livrarias de todo país. O escolhido pelaprópriafamíliaMarinhoparaescrevê-lafoio jornalista Pedro Bial, que em entrevista ao "Programa do Jô", no mês de novembro, contou detalhes do processo de criação da obra, inclusive sobre os documentos a que teve acessosobreavidaparticulardoempresário.

Até a senhora Lily Marinho, última das três esposas, ingressou no fantástico mundo Roberto e Lily, lançado recentemente, revela seu relacionamento amoroso com o imortal jornalista (que foi membro da Academia Brasileira de Letras com um único libro publicado).Toda a renda obtida com a venda deste livro será destinada à

dominicaismarcaramahistóriacomooQual é a música?, Topa tudo por dinheiro e o Show de Calouros.

Com um jeito bem irreverente, Sílvio Santos briga pela audiência: "É um filme muito bom, um filmeaqueeujáassistiváriasvezes.Maspodem ver a novela. Esse filme só vai começar depois que a novela acabar", falava no ar, durante seus programas. Atualmente, os maiores investimentos têm sido feitos na compra de direitos pela exibição de filmes e seriados. Contratos milionários com a Warner Bros. garantiram, por exemplo, a trilogia "O Senhor dos Anéis" e o seriado "Friends", além de picos no primeiro lugar na audiência, abalando, mesmo que "de leve", a estrutura imperial dos Marinho.

No livro A Fantástica História de Silvio Santos (Editora do Brasil, 278 págs), escrito pelo amigo e ex-assessorArlindo Silva, Sílvio Santos concedealgunsdepoimentoserevelaasintrigas com Roberto Marinho, como a vez em que o dono das Organizações Globo, rompeu a amizade com o então Presidente da República, José Sarney, por acreditar que ele teria lançado Silvio Santos como candidato à presidência pelo PMDB. Na guerra para ser o número um no IBOPE, Sílvio Santos não parece se preocupar em ser original ou colocar no ar programas "políticamente corretos". A Casa dos Artistas, cópia mal-feita do sucesso global Big Brother BrasileoprogramadoRatinhosãoprovadaluta, independente de com quais armas, para atrair o grandepúblico.

Sem Assis Chateaubriand ou Roberto Marinho, Sílvio Santos - que ficou em terceiro lugar em uma pesquisa feita pela Revista Istoé, queperguntouquemfoiomaiorcomunicadordo século XX - parece agora ter a coroa do Brasil.A sua história já é muito conhecida: um camelô que começou a fazer fortuna vendendo portatítulos nas ruas do Centro do Rio de Janeiro e que transformava amigos em sócios, investindo em negócios praticamente falidos (como o Baú da Felicidade) e correndo o país atrás de clientes. Em 1966, já comandava os domingos na Rede Globo (!). Dez anos se passaram para que o "Peru que Fala" , como era conhecido, tivesse a concessão da TVS e saísse daTV Globo para conquistar sua fatia do mercado. Diferente de outros grandes comunicadores, que não gostavam de aparecer, ele é figura permanentenatelinha.Seusprogramas

O que não se pode negar, em 'Chatô', 'Dr. Roberto' ou 'Seu Sílvio' é que, seja em nome do desenvolvimento do país, seja atrás de poder e prestígio(edinheirotambém,porquenão?),eles trouxeram inovações no suporte e no conteúdo da TV. Influenciaram mídias como a radiofônica, a impressa e, recentemente, a Internet. A Globo.com e a TV Globo Internacional proporcionaram maior visibilidade no exterior à programação nacional. Exportamos novelas para diversos países, os programas jornalísticos ganharam investimentos e estão entre os melhoresdomundoemqualidade.

Mas no final, como brasileiro tem memória curta, servir de nomes para cidades, ruas e museus será o destino e a forma de lembrar de cada uma dessas figuras. E, é claro, através das dezenas de livros, documentários, filmes e reportagens que sempre serão produzidos por alguém que queira imortalizá-los ou apenas abocanhar seu pedaço em um mercado que movimentatantodinheiro.Umaperguntaque,no entanto, não quer calar é se teríamos hoje no país alguma "(jovem) promessa" de sucessor de Sílvio Santos, herdando sua coroa. Gugu Liberato? Luciano Huck? Celso Portioli? Façam suasapostas...

Fraude 25 Televisão

seja. O convencimento, a adesão e a conseqüente conquista do voto não se justificam estritamente no corpo de propostas ou do viés político do candidato - não é estritamente racional, embora a discussão política sempre caminhe pra esse lado. Justificar uma opção eleitoral levando em conta identificação imagética com o candidato é visto quase sempre como alienação política, comportamento demassaoudesvario.Respeita-sepouco esta indicação tão clara. Procura-se sempre argumentos racionais para atitudes que tem grande parcela de passionalidade.

Ainda que pareça anti-político, a

somente levando em conta bons conjuntos de idéias, e tantos outros de como as paixões contribuíram de maneira decisiva para o sucesso ou fracasso de muitas delas. Deve haver alguma receita de moderação, um equilíbrio entre a razão e as paixõesmas ainda está bem escondida na bibliotecadeBabel.

Oqueistotemavercomoshortinho da Milena? Ora, candidato a vereador também é candidato. Só não tem dinheiro nem tempo pra fazer uma mega-campanha. Por isto eles fazem assim, meio a facão, meio de qualquer cupação educativa. Descre

Campanhas feitas a Facão: A imagem dos candidatos a vereador compõe um bom retrato do modo como nosso povo encara a política.

em relação à mídia, o modo como aparecem, o que tentam passar e de que modo o fazem. O mesmo se aplica ao comportamento do eleitor: que tipo de aparência lhe agrada e os porquês desta satisfação, se há um equilíbrio entre ideologia, proposta e imagem do candidatoescolhido.

O desafio das nossas rodas de bar é ir um pouco além da aparência de “moralmente correto ou não”, do “lógico ou não”, do “verdadeiro ou não” afinal, da verdade também faz parte uma

Além de observar a atitude dos políticos, cabe também problematizar a própria atitude, de eleitor, de público: “por que isto ou aquilo nos agrada? O que determinadas estratégias e truques na construção de uma imagem visam despertar em nós? Qual o peso da imagem na difusão da intenção e da idéia?”. Talvez seja uma ferramenta indispensável para compreender porque a política é como é. A história traz incontáveis exemplos de tentativas frustradas de transformar o mundo

Política

jeito. Põem em prática aquela idéia mirabolante, da própria cabeça, ou que foi sugestão da mulher ou do amigo. Compoucapreocupaçãotécnicaoucom a construção de uma imagem que vá além do “Vote em mim”. E acabam denunciando, do modo mais cômico possível, nosso senso comum. Resultado de uma história de sucessivo esvaziamento das plataformas políticas, refém de imagens construídas de modo leviano, com pouquíssima ou nenhuma preocupação educativa. Descrente das idéias, desesperado para se destacar da multidão.Dequalquerjeito.

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A lista telefônica está para o telefone como o Google para o computador. Mesmo antes de ouvirmos falar em internetjápossuíamosumanoçãodoqueviriaaserum Alistatelefônicapodeservistahojeemdiacomoumimenso buscador, com links para tudo que interessa na cidade. Até mesmo para o que não existe, se não com o auxílio da imaginação.

Foi assim meu primeiro contato com o Museu do Objeto Imaginário. Primeiro contato que, até pouco tempo, eu acreditei também ser o último. Como um indicativo dado pelo próprio nome, o Museu do Objeto Imaginário não foi fácildeserencontrado.

Um nome e um telefone na lista telefônica. Ao lado de tantosmuseuscomunsnãohaviacomonãoprestaratenção a este de nome intrigante. Contudo, o Museu do Objeto Imaginárioeraummistério.Onúmeroindicadonalistahavia mudado. Não havia registros no Dimus (Diretoria de Museus),IPAC(InstitutodoPatrimônioArtísticoeCulturalda Bahia), na Fundação Cultural do Estado ou mesmo na memória de qualquer morador da suposta vizinhança. Nem sequerhaviaumlinknoGoogle,ograndeoráculomoderno. Enquanto procurava por aquele que parecia não existir e vendo confirmada cada vez mais minha ausência total de tino jornalístico, me questionava: o que haveria em um museu com este nome? Afinal, o que seria um objeto imaginário?

A Imaginação do objeto

Imaginar, porém, é antes de mais nada brincar com as possibilidades.Epensandodestamaneira,dei-meporconta que o Museu do Objeto Imaginário poderia ser uma infinidade de coisas. Ou mesmo nenhuma. E tudo indicava estaalternativa.

ASecretaria de Cultura do Estado indicou-me o contato da Diretoria de Museus (DIMUS) e lá conversei comAntônia Pinheiro, responsável pelo Setor de Documentação e Pesquisa. Como já não bastasse nenhuma informação sobre os número e o endereço que constavam na lista, tambémlánãoencontreiindícioalgumdotalmuseu.“Atéde

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aberturaoufuncionamento”explicouAntônia.

“Você já procurou a Bahiatursa? Se ela não souber ninguém sabe....”.Era a resposta quase unânime dos moradores e comerciantes do Centro Histórico. As informações que lá encontrei foram as mesmas localizadas na Lista, com exceção de um e-mail, que para nenhuma surpresaminha,estavadesativado.

Se o Museu do Objeto Imaginário insistia em não se revelar, outros Museus do Objeto são hoje em dia bem conhecidos. A grande maioria cuida da preservação de objetos de valor enquanto parte da História de uma sociedade, como o que acontece com objetos e utensílios muito antigos ou pertencentes a personagens ilustres. Um exemplo de museu com essa proposta é o belíssimo Museu da Casa Brasileira, localizado em São Paulo. Uma outra forma, ainda bastante recente, é em muito associada ao design e tem na InstituiçãoACASA- Casa Museu do Objeto Brasileiroumdosprincipaisrepresentantes.Masmeuobjeto procuradocontinuavaapenasnaimaginação.

mostrasindividuais,coletivasesalõesdearte,noBrasil, na Europa e nos Estados Unidos, onde viveu por alguns anos. João retornou ao Brasil em novembro de 1996 para expor uma de suas obras a convite de uma exposição no Pelourinho e desde então se estabeleceu aqui em Salvador, jácomodesejodecriaroMOI.

Foi ainda na Europa que João Augusto começou a desenvolver e produzir obras dentro deste movimento chamado por ele de Objetivismo Imaginário, que consiste basicamente na utilização dos mais variados objetos na composição de obras de arte, de quadros a instalações inteiras. Não se pode dizer que o uso de objetos em obras seja algo novo, afinal podemos lembrar que no final do século XIX e início do XX, artistas como Matisse, Picasso e Braque chocavam a comunidade artística e a e sociedade parisiense inserindo papelões, tesouras e outros objetos em seusquadros. Etambémnãoseriaessaaprimeiravezemqueoobjeto do museu, para além da arte ou da história, seriam objetos comuns, a princípio sem nenhuma pretensão ao status de arte (sem contar, obviamente, com exceções como as da famíla Stolarczyk, de Yorkshire, Inglaterra, famosa por seus museus excêntricos, como da cenoura ou das torradeiras ) E não se pode dizer que foi tudo responsabilidade de Duchamp e seu mictório. Mas a proposta do Objetivismo Imaginário de JoãoAugusto tem seus próprios contornos e particularidades, nascendo da recuperação e aproveitamento de objetos rejeitados, abandonados e condenados ao desaparecimento. “Tornei-me um 'objetista', que trabalha com objetos industrializados e outros confeccionados por mim” escreve João em carta a Solange noanode1995.“Cadatrabalhopareceodecórdeumapeça de teatro, de uma ópera, onde tudo se harmoniza por mais paradoxal que olhos imaturos e insensíveis possam enxergar.”

Quando a proposta é utilizar-se dos objetos do dia-a-dia para a confecção de obras, o que temos são possibilidades infinitas, num jogo de análise combinatória cujo único fim é a criação de novos olhares e o despertar da imaginação. Olhe a seu redor. Quantos objetos você consegue visualizar?

Canetas, lápis, cadeiras, cds, brinquedos... Nada escapava

O Objeto do Museu

Aresposta à minha pergunta começou a se delinear em um bricabrac no final da Rua das Laranjeiras, no Centro Histórico. Com a ajuda do dono, Pedro Ivo e do Sr. Jorge Bandeira, do DIMUS, pude localizar dona Solange Cintra e Maria, sua filha, que me contaram a respeito o Museu do ObjetoImaginárioeprincipalmentesobreseufundador,João AugustodeMoraes.

O artista plástico João Augusto nasceu em Salvador no ano de 1933. Nos anos 50, ainda jovem, partiu para a Europa, onde viveu por mais de 40 anos em diversos países. (Na Itália, onde viveu em Roma, foi colega de Fellini e aparece em um trecho de “Dolce Vita” vendendo suas obras a Marcelo Mastroinani.) Lá conseguiu o que muitos poucos conquistam aqui no Brasil: a possibilidade de viver de sua arte. Seu currículo é bastante vasto, com cerca de 50 Fraude

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Artes

Artes

às criações de João Augusto que, no ano de 1994 escreve:“Diminuiracegueiradegrandepartedosindivíduos, é também a tarefa do artista.” Era justamente isso que João pretendiaealcançavacomsuasobras,criandosobreoquejá fora criado, fazendo nosso olhar e nossa imaginação perderem-se nos detalhes e belezas dos objetos comuns, os quaisusamosejogamosforaquasetodososdias.

Muito do Objetivismo Imaginário pode ser encontrado na exposição “Les temples de la terre vagues” (Templos de terras vagas), uma co-produção do Museu do Montparnasse e que foi um dos destaques do 8º Festival de l'Imaginaire em Paris, que aconteceu entre março e abril de 2004. O crítico Gilbert Lascault, na apresentação da exposição, explica que “todo trabalho é um santuário que venera fragmentos do corposocial.”Estesfragmentossãoosobjetos,colecionados do lixo, de sobras, de partes perdidas e freqüentemente separadas do que já foi útil um dia, de destroços. “A exposição dá uma segunda sorte a lixos. Os salva”, diz Lascault, ou nas palavras do Objetivismo de João Augusto “dá uma nova vida ao objeto rejeitado e condenado ao desaparecimento”.

Ao ser questionada sobre a maior dificuldade que enfrentam atualmente para por o Museu em funcionamento, Solange e Maria são categóricas : dinheiro. 'Esperamos contar com o apoio dos órgãos responsáveis pelo Patrimônio Cultural do Estado para que a Fundação possa de fato funcionar.' Diz Maria. 'E para isso é preciso poder dar a manutenção necessária, pois você vê que aqui é um lugar (um prédio no Centro Histórico cedido em 1997 pelo IPAC) inadequado, um prédio antigo com umidade, cupins e de difícil acesso.' A Fundação João Augusto de Moraes, da qual o MOI faz parte, tem como proposta perpetuar o objetivismo imaginário através das exposições no Museu e deoficinascomcrianças,ensinando-as,comaimaginação,a criarseusprópriosobjetos.

JoãoAugusto faleceu dia 28 de junho deste ano, aos 70 anos, sem poder ver o Museu do objeto Imaginário e a Fundação que ganhou seu nome abertos. Infelizmente nossos dias comprovam que a arte a imaginação, com sua força e poder, superam muitas coisas, mas não ainda a falta derecursosedereconhecimentoporpartedasociedade.

depoentes, além de poder também enviar sua história. Como toda curadoria de museu, a organização do Instituto selecionaoquedeveounãofazerpartedoacervo.Mas,normalmente, apenas não são publicadas aquelas que trazem qualquer tipo de difamação a outras pessoas ou que contenham relatosquepreguemvalorescontráriosàideologiadoMuseu. Outra restrição diz respeito à idade. Pessoas com menos de 12anosnãopodemterseusdepoimentospublicados.

Hoje em dia, o Portal conta com 25 sites ligados ao acervo do Museu da Pessoa. Net, alguns de iniciativa de empresas privadas. Algumas empresas têm também percebido que a memória é essencial para garantir a identidade de uma instituição além de valorizar seus trabalhadores.

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Esteéumtemaparaleitoresdemaisde40anosem pânico diante da passagem do tempo e das

dificuldades para encontrar um novo e sólido amor, mas serve também aos jovens precoces. Para fornecer-lhes armar úteis nessa dura luta, verdadeira guerra sem quartel, retomo “AArte de amar”, de Ovídio, clássico latino que, como se sabe, foi um dos primeiros best-sellers da auto- ajuda e do consultório sentimental. Se alguém pensa que inventamos os nossos clichês amorosos e sobre as mulheres, sempre tão em voga, melhor tirar o cavalinho da chuva: Ovídio já os recolhera ou concebera no começo do período romano conhecido comoImpério.

Pragmático, dá lições simples e diretas. No primeiro contato com uma mulher desejada é melhor que “as primeiras palavras não passem de lugarescomuns”. Nada de ficar bolando abordagens originais, poisoquefuncionamesmocomelaséotradicional“eu não te conheço de algum lugar?”. Não tem nada disso de não poder convidá-las de cara para conhecer a sua coleção de havaianas. “Se a poeira atingir o colo da jovem, trata logo de tirá-la, e se não cair poeira, tira-a também”. Em resumo, passa a mão. Ovídio é préassédio sexual. A sua alta filosofia está nesta máxima de sabedoria milenar, “todas as mulheres podem ser apanhadas”, dependendo “da maneira de colocar as armadilhas”

Vê-se que Ovídio foi claramente um espírito à frente do seu tempo. Num rasgo de psicologia, alerta: “Aquilomesmoquepodesacreditarqueelanãoqueira, ela quer”. Percebe-se que antecipou toda a moderna psicologia e pôs numa frase metade da obra de Balzac etodaadeNelsonRodrigues.Oseruditosdizemqueo poeta fez isso por cinismo, decadentismo, ironia ou gênero. Pode ser. O vulgo tomará isso como reles manual de instruções. A sofisticação de Ovídio pode chegar ao extremo e excitar o olhar dos nossos quarentões entediados: “As searas são mais ricas nos campos dos outros e as vacas do vizinho têm sempre os ubres maiores.” Difícil conceber uma imagem mais adequadaebela

Alguns conselhos do autor aos que desejam não passarmaisosdomingossozinhos.Aoiràcaça,ébom

Juremir Machado*

juremir@pucrs.br

que as “unhas estejam curtas e nenhum pêlo saia paraforadasnarinas”.Tambéméimportantenãoexalar um hálito de bode no rosto da presa. Se ela for casada, algo bastante comum nos tempos que correm, é bastante razoável ficar amigo do sócio. Na hora da conquista, a melhor estratégia é não poupar elogios às formas malhadas da escolhida. O negócio, é ser mais generoso na cantada do que os políticos: “As promessas é que prendem as mulheres”. Em outras palavras, mintaparaelas.E“enganaasqueenganam”.Todas. Deve-se variar o método de ataque conforme a idade. Alento para os feios: “Ulisses não era belo, mas era eloqüente e com isso conquistou o amor de duas deusas do mar.” Ronaldo, o fenômeno, está aí para provar que Ovídio tem razão: com eloqüência e alguns milhões de dólares não tem Cicarelli que resista. É lindo o amor! Eis o principal: “O amor é uma espécie de serviço militar”. Sabemos que, nos países avançados, deixou de ser obrigatório. A poesia é legal desde que não seja recitada na hora de mostrar armas. Outra coisa:convenceramulherapediraquiloquesequerdar aela.Chama-seaissodeestaremsintonia.

* é professor de Comunicação da PUC/RS e lançou recentemente o romance “Getúlio” pela editora Record

Toda a sabedoria já está em Ovídio: se ela estiver furiosa, sela-se a paz na cama. Mesmo tendo de ingerir uma artilharia de Viagra. O bom é demorar para acabar, massenãoforpossível,omelhoréadotarométodo contrário e “calcar as esporas no cavalo em disparada”. As mulheres gostam de atitude. De manhã, é conveniente ficar de boca fechada ou escovar os dentes antes de mais nada. Para as mulheres: evitar os homens obcecados pela própria beleza (metrossexuais incluídos) e que já tenham tido muitas relações com outroshomens.Sábioconselho.

Na cama, a mulher bonita e em boa forma deve espichar-se para ser vista. As outras devem esconder alguma coisa ou dobrar os joelhos para só mostrar o flanco.Ohomem sódeve arrotarnobanheiro. Porfavor, não me acusem de machismo nem de misogonia. Apenas recuperei os ensinamentos de um clássico. Quem não se interessar por alta cultura, pode fazer o contráriodoensinado(ousatirizado)peloinvulgarpoeta latino. Se Ovídio pode, por que Paulo Coelho e Dráuzio Varela não poderiam? É só uma questão de séculos. E deestilo.Oimportanteéserútil.

Fraude 31
Artigo

estou usando essa palavra sem suspeição. Amadurecer significa estar no ponto, mas ao contrário das frutas verdes, também significa estar mais próximo do apodrecimento. Não quero usar essa palavra. Mas não há volta. O texto do outrora bom e velho Charles Bukowski apodreceu. Não sinto arrebatamento e, sim, estranhamento. O que será que me atraía, só suas inúmeras bebedeiras narradas de maneira coloquial? Muito pouco! Difícil descobrir. Talvez a representação narrativa de uma festa permanente, obliterando um fato crucial: quanto maior a bebedeira,maioraressaca.

Sinto-me esgotado. Vejo o quanto meus valores se modificaram e se estabilizaram. Será que sou apenas mais um conservador à procura de estabilidade? Ou apenas uma junção desses diversos eus, sendo que um deles amou, sofreu e esqueceu os escritos de Bukowski. Mas desvelominhafalta.Oproblemanãosãomeusvaloresouo escritor norte-americano. É mais amplo o que sinto: é apego. Os livros, os discos, as mídias foram feitos para circular. Um texto sem leitor é uma impossibilidade. Bukowski escreveu para jovens ávidos por álcool. Por que diabos guardei esse livro em minha prateleira durante 17

anos ? Livros devem circular, a cultura nômade das mídias não se inscreveu totalmente em nossas prateleiras, nos apegamos aos livros como se fossem obras expostas em um museu. Algum dia eu devo reler Bukowski? Definitivamente Não. Vou doá-los, que os livros voltem ao seu lugar de destino: os leitores. Essas idéias me remetem a um trecho de um dos livros de Bukowski. Uma cena em que perambulando pelas ruas de Los Angeles, ele passa emfrenteaoantigoendereçodoescritorJohnFante,umde seus preferidos. Por alguns segundos, ele fica parado olhando, dilacerado entre o ato de tocar a campainha e o medo perder a oportunidade de encontrar Fante. Por fim, Bukowski decide ir embora, concluindo que os deuses não devem ser incomodados. Como não se trata, pelo menos para mim, de deuses e de incomodo, reconfiguro a cena: Bukowski não deve ser incomodado. Hoje, preciso de mais espaço. Já não me sinto tão mal. É uma tarde sombria de domingo, mas nada que um bom romance não possa aliviar. Na verdade, os livros e autores devem ser descartados,paraquesóentão,possamserreciclados,reavaliados e,talvez,esquecidos.

Fraude 33 Literatura

A cultura pornográfica tem quatro grandes divisões: hetero, gay, lésbico e bissexual. Existem outras subdivisões que incluem categorias étnicas, profissionais e grupais. E outras categorias menos convencionais como zoofiliaeincesto.

Os produtos com conteúdo erótico são variados: poesias, contos, revistas, livros e sites. Além, é claro, de acessórios bastante específicos encontrados em lojas especializadas. Mas o gênero que melhor representa a culturaeróticaé,semdúvida,ocinema.

O cinema pornô já produziu seus clássicos, a exemplo do famigerado Garganta Profunda, mas também se nutre na cultura popular com releituras de personagens da Literatura como Tarzan e Lolita. Além disso ele apresenta suas versões para filmes de sucesso como Titanic e Gladiador, e se deixa influenciar pelo mainstream mesclandoelementosdefilmesdeação,entreoutrosgêneros.

Salvadorpossuidoiscinemaseróticos:oCineAstoreo Cine Tupy, que funcionam de forma bastante diferente dos cinemas convencionais, exibindo dois filmes que se alternam das dez da manhã até as oito da noite (quando normalmente fecham). Com um ingresso o espectador permanecequantotempodesejar.

Os filmes são produções estrangeiras de conteúdo heterossexual de forte apelo, com recorrentes closes e palavrões. A maioria dos títulos está disponível nas locadoras, o que levanta a possibilidade de os espectadores usarem o cinema como ponto de encontro ou por falta depoderaquisitivo.

Outro aspecto que diferencia o cinema pornográfico dos outros é a ausência de esquemas de circulação prédeterminados. Nos dois cinemas existem duas passagens após um saguão principal, por onde se pode entrar ou sair. As luzes ficam todo o tempo apagadas, o que dificulta a locomoção e a escolha de um lugar para sentar, mas ao mesmo tempo preserva o anonimato de seus freqüentadores.

Não existe perfil pré-definido do freqüentador, mas algumascaracterísticaspodemserobservadas.Amaioriaé masculina, vai desacompanhada, prefere manter a discriçãoetrabalhaemregiõespróximasaocinema.Idade, orientaçãosexualeestadocivilvariambastante.

Oscinemastêmseuspicosdefreqüênciaentresextae segunda-feiraenãohálanterninhasoufiscais.Osespectadores têm toda a liberdade de se comportar como quiserem, a não ser que haja reclamações (o que é muito raro). Nos corredores e saguões dos cinemas há casais homossexuais, pessoas caminhando, conversando e uns poucos funcionários, todos convivendo sem problemas. Algumas vezes há travestis, mulheres e homens que percorrem o cinemaoferecendoseusserviços.

Oambientecriaumaatmosferaqueparecepropíciaao assédio, no entanto há uma espécie de pacto tácito de as pessoas não se tocarem, nem sentarem ao lado umas das outras. O que não as impede de estabelecer relações caso estejamdeacordo,nestecasoelassedirigemaobanheiro

ouaofundodasaladeexibição.Masamaioriapermanecesozinhaassistindoaosfilmes.

A atmosfera marginal e decadente esconde as relações deste cinema com os outros. O Cine Astor pertence à Art Filmes e o CineTupy à Orient Filmes, empresas que mantêm os dois maiores cinemas soteropolitanos. Isso nos leva a presumir que tanto o Astor quanto o Tupy sejam rentáveis o bastante para continuar funcionando e fazer empresas deste portetrabalharemcomumnichotãorejeitadodacultura.

O que se constata é que em meio a uma vasta produção daculturapornográficaeentreváriosmeiosdedivulgaçãoos cinemas pornográficos permanecem escondidos, apesar de bastante freqüentados, sobrevivendo sem muitas formas de divulgação, funcionando como ponto de encontro para homossexuais, local de trabalho de prostitutas e travestis, ambiente ideal para os mais fetichistas e alternativa de entretenimentoparaostrabalhadoresdaregião.

O cinema pornô pode não ser arte, mas já mostrou que merece ser visto a partir de conceitos menos preconceituosos e simplificadores que os utilizados até agora para analisá-lo.

Fraude 35 Cinema

desmedida, um gozo que não lhe parecia natural, como que imbuído de alguma perversidade que lhes fornecia a energia vital. Tinham pressa em preencher os papéis e efetuar o pagamento. Dizia-se que realizavam grandes cerimônias para a degustação e preparavam o próprio corpo antes de ingerir as carnes especiais, temperando os músculos e o paladar com óleos e ervas específicas para cadacorte.

Chegou ao azougue a tempo de ainda acompanhar o descarregamento do lote de que fora informado. Poucos homensrealizavamotrabalhonaqueledia,oqueoincentivou a auxiliar no transporte da carga. Observara muitas vezes aquelerolardecorposparaascarretas,masjamaisdedentro do caminhão, em meio às carcaças que iam desabando do topo da pilha umas por cima das outras, até sofrerem forte impacto no contato com o piso ensangüentado e serem brutalmente empurradas para o descanso final naquelas covasdeaçosobretrilhos.Chacoalhavaasmãosaoredorda cabeça e do peito para afastar o mosqueiro atraído pelo grude sangrento da pele, ao tempo que repuxava os membros que se entrelaçavam no monte de corpos para que sedesvencilhassemunsdosoutros,facilitandootranslado.A pelagem dos bichos adquirira uma aparência plastificada e uma dureza que o impressionou no primeiro contato, haveria deserculpadasangrariaqueasbesuntavaedaquentura,tal qual a de um forno, da carroceria chapeada de aço. Um dos cadáveres, de corpanzil acima da média, obstruía os demais por causa de suas dimensões incomuns, o que o obrigou a forçar sua precipitação agarrando-se às pelancas do pescoço e da papada, forçando a carga a se deslocar. Um urro gutural ecoou, cessando apenas quando involuntariamente largou a massa molenga que tinha nas mãos. O movimento desequilibrou-o, fazendoo despencar do topo da pirâmide de carne, pele e osso. Depois de ter escorrido o rosto, as mãos, o tronco todo, até mesmo os lábios na couraça enrijecida pelo grude de sangue e vômito seco, mirou o topo da pilha de corpos e pôde ver o par de pupilas dilatadas responsabilizando-o pela dor. Estava viva, a besta. Cobrava providênciasparaoseuestado.

Quatro homens foram necessários para pô-la numa carreta onde o corpo fora mal acomodado, enquanto o chefe fazia ligações para o fornecedor, o transportador, o corretor, o advogado e o proprietário. Não queria, sob qualquer condição, ter de se responsabilizar pelo erro alheio. Não iria, da mesma forma, abater o bicho e conduzi-lo ao beneficiamento: seria,nãorestadúvida,acusadodemaustratos,de

hedionda - de assassinato. A responsabilidade era de quem havia encontrado o corpo ainda sensível ao toque, aos estímulos e percepções, incapacitado de ser submetido ao consumo. E não havia coincidência nenhuma em ser um trabalhador fora de suas funções profissionais e, portanto, inepto para aquele tipo de serviço. Com a condição de prover uma destinação ao corpo, ele não seria responsabilizado administrativamente e receberia todos os seus direitos legais pelaquebradovínculocomaempresa.

Expiado menos pela culpa que pelo esforço de transportar o peso da carga viva até a cama, providenciou antibióticos, antiinflamatórios, analgésicos, antitérmicos, fitoterápicos,coagulantes,antitetânicoseumvariadoarsenal de suplementos vitamínicos. Tratou da ulceração no crânio e das lesões menores pelo corpo, removendo pruridos e infecções, até restabelecer a condição saudável naquele corpoagonizante,comadedicaçãoeoesmeroadquiridonos anos de manipulação de carnes e tecidos. Em uma manhã, desperto de um sono pesado que lhe atingira os sentidos, só aos poucos recobrados, não achou a besta sobre o leito. Foi encontrá-ladepé,nacozinha,comtodasaspartesdocorpoà mostra, preparando o café com os seios lácteos que entornaramsuaimaginação.

Fraude 37 Conto
É aluno de graduação em Jornalismo da Facom/ufba

Arede de fast-food de Filosofia surgiu no começo do século XX, nos EUA. Contrários ao modelo europeu de ensino, muito antiquado e preso à tradição, nós

desenvolvemos uma forma de trazer filosofia de qualidade para todos que possam pagar por ela. Em nossas lojas, vendemos filósofos para todos os gostos: Descartes para os clientes mais conservadores, Maffesoli para os ciber-modernosos e Derrida para aqueles com problemas de adaptação social. Além disso, temos outros produtos como barbas postiças e óculos de aro grosso, para tornar a imersão do cliente no mundo da filosofia ainda mais completa. Atualmente, nosso campeão de vendas é o Mc Niilismo Infeliz uma caixinha lúgubre que contém as últimas obras de Nietzsche e uma cartela de Prozac como brinde.

Muitos nos acusam de diluição e propagação de pensamentos de qualidade duvidosa. Alguns chegam mesmo a insistir que o “Mc” de nosso nome vem de Marilena Chauí. Porém, isso tudo não passa de conjecturas infundadas. Na verdade, nós só trazemos benefícios à sociedade. Hoje em dia, qualquer um pode ser um bom escritor. Basta vir aqui para uma simples refeição e sair com uma tese de doutoramento completa. Além disso, tem também

Humor
o fato de sermos uma empresa com responsabilidade social. Distribuímos bolsas para Danilo Fraga sugarpie@terra.com.br

o fato de sermos uma empresa com responsabilidade social. Distribuímos bolsas para jovens clientes com talento para a reflexão ou para a escravidão. Eu, hoje apenas um desses bolsistas, com muito esforço e trabalho posso, quem sabe, um dia ser chefe de setor e coordenar meu próprio grupo.

Nosso cardápio conta com muitas novidades. A linha old fashioned burgers, que vem com o melhor da filosofia antiga, de Platão a Aristóteles, tudo regado ao delicioso molho de cicuta. O McHóstia com as obras dos santos filósofos e um churrasquinho à moda da Inquisição. E, para acompanhar tudo isso, um Schopenhauer bem gelado. Neste mês, temos a promoção ABC dos Filósofos: o cliente que conseguir soletrar os nomes de Heidegger, Husserl, Nietzsche e Kierkegaard ganha um mini-filósofo que recita os diálogos de Platão em grego arcaico. Não perca tempo, peça pelo número. Kant 1, 2 ou 3?

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Fraude

scgo s,piquiatras,psianalistaseoutrosmédicosdedoidos apóiamaexistênciadaredede “ Fast -Food de Filosofia. Não hdqeu,ote n o o uem q eixar estu dicom agen a chea até dezembro do ano que vem. oo Sabecm é:eleslêemSartre jde depois precisam de au a ”c e médica onf ssa um psicana-lista sorridente. Já a associa da çãodeacaem isdeginástica iafrma que grande parte dos males provocados pela o i rsingestã odefil sofabaata ão apotencializado s pel falta de euxercício. Em sa defesa, a rededeFast-FooddeFilosofia

mento normal da doenç, seguidapelototaldesinteresse pela vida mundana e pelo suicídio. Não há porque se preocupar. Paraele, “acade mia,sóseforadePlatão”.

alega não ser necessária qualquermedidapreventivaou a acompanhmentomédicopaa r eopda ntism mórbido. Para o Olavo de Carvalho, diretor de marketing da empresa, essa é sóuma fase do desenvolvia

(ml
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