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Jeong Hana
Jeong Hana Manaus/AM
Não entendo, mas sinto
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Queria eu ensinar, e ensinei. O que deu, o que pude, o que o tempo permitiu.
Ela sente, sofre, balbucia, mas não fala. Observa, sonha, planeja e escreve. Sempre foi assim.
Mãe!
Eu procurava a chave do portão de casa quando chegamos. Percebi, ao meu lado, que o bracinho abriu a mochila jeans com detalhes cor-de-rosa e retirou um caderno com capa dura amarela. Abriu na página marcada e o levantou até onde eu avistaria. Espiei e vi olhinhos ansiosos em busca de um gesto de aprovação.
Entra minha filha, lá dentro mamãe vê tudinho.
Li então os quatro versos de amor relativos ao dia das mães que se aproximava. Seus lábios ficaram com inveja dos meus e sorriu disfarçadamente, baixando a cabeça envergonhada.
A mandei pro banho. Peguei o caderno da escola. Segredo absoluto. Era como ler a mente de alguém sem permissão. As páginas eram usadas como rascunhos de poesias que retratavam tanta emoção que ninguém imaginaria pela feição quieta e tímida. As palavras delicadas pulsavam e riam. Exalavam o café da manhã em família e o gosto de amor açucarado.
As últimas laudas eram tão utilizadas quanto os conteúdos ministrados em sala de aula, e assim tomava conta de metade da brochura. Então comprei um presente: um caderno só pra sua arte. Logo ele virou “Versos e Poesias da Paulinha”.
Tentei reiteradamente fazer com que ela verbalizasse seus medos e desejos.
Quero ser sua amiga, pode falar comigo sobre o que precisar. Quando tiver um namoradinho, eu não falo pro seu pai.
Não adiantou.
Logo aquele caderno se transformou em diário, que foi mais utilizado que os livros didáticos. Tentei, mas não consegui ler. Apresentava uma fechadura fraca, inútil, mas que se eu abrisse a quebraria e meu delito estaria à mostra. O que se sucede naquele pequeno universo?
Na escola descobri que gostava de conversar com a melhor amiga. Sempre pedia pra ir pra casa dela. Porque falava com a amiga e não
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comigo? De resto, boa aluna, quieta, comportada, nenhum incidente.
Descobria um pouco sobre minha primogênita em cada data comemorativa. Cartões, cartas, mini livros artesanais, obras infantis que revelavam sentimentos, exprimiam desejos, elaboravam felicitações. Sempre desenhava nós duas ou a família inteira.
E as cartinhas da noite? Sempre entravam por baixo da porta do meu quarto. Insatisfações disfarçadas e pedidos de desculpas que finalizavam sempre com o “eu te amo” e corações. Desculpa por ter demorado pra calçar o sapato. Desculpa por não estar na porta da escola quando a senhora chegou. Desculpa por demorar tanto pra almoçar. Um eterno desculpar. Gerava isso? Pressionava? Comecei a refletir.
Carinho, atenção, cuidado e um pouco de limite. Conversa também, ou pelo menos sempre tentei. Eu odiava os monólogos e como eu não podia falar nada na minha infância. Queria que com meus filhos fosse diferente, e assim fiz, mas com não deu muito certo. Porque é tão tímida?
Eu perguntava e a resposta sempre era: - Aham, sim, tá, é, hum, an? Muitas vezes nem isso, só acenava com a cabeça. Eu falava e ela me fitava. Eu chorava, ela chorava junto. Me fazia cafuné da mesma forma como eu a afagava.
Seus olhos sempre pareciam percorrer minha alma em busca de uma mentira ou um segredo, era o que eu achava. Comumente desse jeito: olhava, olhava e olhava. Eu tinha que brigar pra parar de ficar encarando as pessoas na rua porque muitas se sentiam incomodadas. Em casa não era diferente.
Será que já pressentia e queria decorar cada gesto, cada trejeito, ou cada sinal que havia no meu corpo? Tive que ir, fui chamada a contragosto. Agora vejo que me observou mais do que deveria. Lembra e relembra cada memória antiga e sofre.
Nesse instante ela escreve não só pra extravasar, mas pra tentar entender o ser humano, superar os traumas e amenizar a dor. Suas cartinhas atualmente tem cheiro de lágrimas e sabor de saudade. E disso eu entendo.