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Alessandra Cotting Baracho

Alessandra Cotting Baracho Maceió/AL

O começo e o fim

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Ela imaginava como seria aquele momento, se reconheceria os sinais. Ironicamente, não houve um rito de passagem, um clic ou nada do tipo, apesar de conviver com a imagem recorrente de um lindo sonho terminando, como acontece nos sonhos que sabemos que é sonho e que vai acabar a qualquer momento. O medo prematuro de uma separação sempre à espreita. Quando se conheceram, foi uma paixão instantânea e como acontece nos filmes clichês que ela tanto amava, o sentimento fugaz se metamorfoseou, o ideal dos amantes, o amo, eterno amor. Tudo correu bem. O casamento aconchegante, a lua de mel no bangalô. Sonhos realizados. Dois filhos vieram, menino, menina. Andaram e falaram mamãe, mesmo ele insistindo que o som se parecia muito mais com um papap... Tudo estava bem e o amor sempre ali, forte. Vieram os primeiros fios brancos. Normal. A maturidade traz coisas boas. A filha fez quinze e quis um piercing, conflito rapidamente resolvido. O filho mais velho casou e a “garota rebelde” foi estudar medicina na capital. Vida realizada. Agora eram só eles, enfim, apenas. Vinte anos se passaram desde o primeiro beijo e o fantasma da separação voltou. Sabia que iria perdê-lo. Seria a secretária de cabelo platinado ou a moça da recepção que ostentava, provocante, dezenas de sardinhas minúsculas. Pensou em lutar, comprar um óleo aromático ou um body rosê. Inútil. Era o destino deles, soube desde os primeiros tempos. O dia amanheceu. Estava mais gorda, mais velha, mais chata. As certezas pesando sobre ela. Conformidade e conformação. Sentou na varanda, era dada a essas coisas agora, leu as últimas páginas do livro preferido, já descorado e, enquanto o fechava melancólica, lembrou dos seus próprios motivos, reais, válidos em tudo. O marido ainda dormia, era domingo. Foi até o quarto tentando não fazer barulho, não queria atrapalhar o sono dele. Olhou-o com amor. Não se permitiu pensar em mais nada, se entregou àquele momento bucólico. Como era belo, ainda. Caminhou até a gaveta da penteadeira e agarrou o objeto. Foi rápida e ágil, sem nenhum titubeio. Três minutos depois tudo estava terminado.

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