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Taís Curi
Taís Curi Santos/SP
Narcisismo auricular
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Todas as vezes que fico diante de um ‘interlocutor’ que se extasia com a própria voz, ignorando completamente todas as outras que o cercam, lembro-me de um grande amigo. Ele possui um diagnóstico perfeito para esse tipo de ‘anomalia’: narcisismo auricular. Brincadeira à parte, o fato é que não raras vezes tenho encontrado pessoas que preferem mesmo ouvir e se deleitar somente com o que dizem, sem dar qualquer chance para um comentário complementar e, muito menos, que ofereça oposição ao que expressam. Dia desses pude constatar - mais uma vez - o quanto meu amigo foi assertivo na classificação. Entrei ansiosa em uma live, na qual seria tratado um assunto que me interessava muito. Outros participantes foram ingressando rapidamente e, em pouco tempo, já formávamos um grande grupo. O coordenador então se apresentou e a sala foi aberta. Passados os primeiros quinze minutos, só ele falava, não dando a menor bola para os sinais de mãozinha levantada, que apareciam na tela para indicar que mais pessoas desejavam participar da conversa. Eu fiz três tentativas, pelo menos, e não obtive sucesso em nenhuma delas. E a criatura, prosseguia... Próximo dos quarenta minutos e sem que houvesse qualquer concessão por parte do ‘Narciso’, a sala já estava praticamente vazia, restando somente eu e mais dois inscritos. De minha parte, já havia perdido o interesse pelo tema tratado, mas queria ver até onde aquela situação iria. Penso que o mesmo deveria estar ocorrendo com os outros que ficaram. E não é que aos 60 minutos – cravados –, a live é encerrada, com o seguinte comentário: “Foi muito importante a participação de todos vocês para jogar luz
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em um assunto tão relevante”. Gente ... fui acometida de um acesso de riso – e de raiva -, que deve ter durado uns dez minutos. Recuperada, pus-me a pensar sobre esse tipo de comportamento, que venho observando entre pessoas próximas e também entre as que os meios de comunicação projetam. É o entrevistador que leva vários minutos querendo demonstrar conhecimento, antes de fazer uma pergunta, e depois dá míseros segundos para a resposta do entrevistado. É o ‘engraçado’ das reuniões de amigos ou até de trabalho, que não deixa ninguém falar enquanto não contar as últimas piadas que ouviu. É o político que faz discurso a qualquer tempo e lugar, relacionando projetos que sequer saíram do papel, sem admitir qualquer interrupção. Enfim, a interlocução – verdadeira – parece estar com os dias contados. E sendo assim, creio que chegará o momento em que precisaremos escolher entre a convivência com o ‘narcisismo auricular’ ou com um outro concorrente seu: o ‘monólogo coletivo’. Neste – bastante comum também –, cada participante do grupo fala o que lhe interessa, pouco se importando com o que dizem os demais.