Revista tec ed22

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Dados Editoriais Ano IX - Número 22 - 1.º Semestre de 2012

Projeto Gráfico

ISSN - 1678-3824

Coordenação

Publicação Semestral da Fucapi - Fundação Centro

Nancy Claudiano Cavalcante

de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica Designers

Conselho Editorial

Anna Carolina Azulay Refkalefsky

Dimas José Lasmar

Emmanuelle Bezerra Cordeiro

Guajarino de Araújo Filho

Osvaldo Relder Araújo da Silva

Isa Assef dos Santos Carlos Maurício Seródio Figueiredo

Capa

Narle Silva Teixeira

Alderlane Aquino - Núcleo de Design - NUDE/FUCAPI

Niomar Lins Pimenta

Revisão Coordenador de Comunicação

João Batista Gomes

Renato Moraes

Edson Augusto Brazão

Mtb 1.132 DRT/RN

Estagiário de Jornalismo Jornalista Responsável

Marcos Caminha

Lucy Rodriges

As opiniões emitidas nos artigos publicados nesta

Mtb 214 DRT/AM

revista são de inteira responsabilidade dos autores.

E D I T O R I A L O aumento da frequência de eventos climáticos extremos em vários lugares do planeta reforça as discussões em torno das mudanças climáticas globais. O tema extrapola os muros da ciência e os interesses de grupos, produzindo alterações na política, na economia e no cotidiano das pessoas. Diante disso, a necessidade de produção de conhecimento e disseminação de informação contextualizada sobre o assunto é requisito inadiável. A ciência tem feito a sua parte. Pesquisadores do mundo inteiro, há décadas, analisam as alterações climáticas, comparam dados, criam sistemas de monitoramento, preveem cenários, reforçam e derrubam teorias. Uma das teses mais difundidas - e também controversa – é a de que a interferência humana na natureza impacta no clima global. Além de acalorar a discussão, trazendo diferentes pontos de vista sobre o tema, esta edição da T&C destaca ainda as principais pesquisas que buscam entender melhor o papel do bioma Amazônia no cenário de mudanças climáticas globais. O programa Grande Escala da Biosfera Atmosfera na

Amazônia (conhecido pela sigla inglesa LBA) é uma das principais pesquisas nesse sentido, coordenado nacionalmente pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Outra pesquisa pioneira, fruto do LBA e ainda em fase inicial, é o Observatório Amazônico com Torre Alta (Atto), que busca ampliar a cobertura de monitoramento climático por meio da construção da maior torre científica de observação em uma área de floresta tropical natural. O projeto tem como realizadores o Inpa, a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e o instituto MaxPlanc, da Alemanha. O trabalho da Sub-rede Biodiversidade, ligada à Rede Clima e sob coordenação do Museu Paraense Emílio Goeldi, também é destaque na reportagem de capa desta edição. Todas essas iniciativas reforçam a necessidade de ampliar cada vez mais o número de pesquisas que busquem entender o funcionamento dos ecossistemas amazônicos, assim como as causas e os efeitos das mudanças em curso na Região. Ao difundi-las, esperamos contribuir para elevar a qualidade das discussões acerca do assunto. Boa leitura!


S U M Á R I O

Seções

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Editorial Artigo

Ordenamento pesqueiro por meio da criação do CIPAR Parintins Jean Reis de Almeida e William de Souza Barreto

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Reportagem Amazônia, protagonista ou coadjuvante das mudanças climáticas globais? Lucy Rodrigues

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Artigos

Mitigação de vazamentos em projetos REDD+ com base em ações programadas para a região do rio Madeira/AM Renan Albuquerque Rodrigues, Antônio José do Nascimento Fernandes, Ramón Troitiño Cachafeiro e Rodrigo da Costa Lima

Mobilidade urbana na Amazônia e emissão de CO2 para a atmosfera Geraldo Alves de Souza

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A mudança da matriz energética e o potencial impacto dos NOx na atmosfera urbana da cidade de Manaus Ilsa Valois, Elizabeth Cartaxo e Jamal Chaar

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Métodos de avaliação: instrumentos para políticas em CT&I Renilson Rodrigues da Silva

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Ganhos ambientais decorrentes da mudança de fonte energética dos fornos utilizados nos polos cerâmicos de Iranduba-Manacapuru/AM a lenha para gás natural Antonio Cleiton Lopes da Silva e Elizabeth Ferreira Cartaxo

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Avaliação Ambiental do Ciclo de Vida da Célula a Combustível de Membrana Trocadora de Prótons – PEMFC. Dênis de Freitas Castro, Luciana de Souza Freire, Raimundo Ribeiro Passos e Elizabeth Ferreira Cartaxo

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AO S L E I T O R E S T&C Amazônia é uma publicação semestral criada com o intuito de discutir temas relevantes de interesse do País e, em especial, da Região Amazônica. Desde a 20.ª edição, T&C abriu espaço para contribuições relacionadas ao desenvolvimento regional em seus diferentes aspectos, desde que aderentes ao perfil da revista. Portanto serão bem-vindos estudos que contemplem ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação. O teor dos textos é de inteira responsabilidade dos autores. Os interessados em publicar seus trabalhos devem encaminhá-los para o e-mail tec_amazonia@fucapi.br, para que sejam submetidos à análise do Conselho Editorial. O envio de

um artigo não garante a sua publicação. Os artigos publicados não concedem direito de remuneração ao autor. O artigo deverá ser enviado exclusivamente por meio eletrônico, em arquivo texto, digitado em editor de texto Microsoft Word, formatado em papel Carta, com margens laterais de 3,0 cm, superior de 3,5 cm, inferior de 2,5 cm, fonte Arial tamanho 12 e espaçamento simples. Os textos devem ser inéditos. O artigo deve conter um resumo, breve currículo do autor e pode apresentar gráficos e figuras, desde que o tamanho do artigo permaneça entre 8 e 12 páginas. A publicação também deverá ser autorizada pelo(s) coautor(es) e encaminhada anexa ao artigo submetido a aprovação.


Artigo

Ordenamento pesqueiro por meio da criação do CIPAR¹ Parintins Jean Reis de Almeida e William de Souza Barreto

Resumo Este artigo tem como objetivo diagnosticar a contribuição e o papel da criação do CIPAR no município de Parintins e a implantação de um modelo de ordenamento pesqueiro para essa região. A primeira dificuldade encontrada no planejamento participativo para a criação do CIPAR foram os inúmeros conflitos relacionados ao mundo da pesca. Os conflitos identificados extrapolam o simples caráter extrativista e individualista dos pescadores ribeirinhos. Ao ingressar no mundo do trabalho dos pescadores, podemos observar uma rede complexa de conflitos entre as entidades que representam os pescadores,

¹ Centro Integrado de Pesca Artesanal

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entre os órgãos federais, estaduais e municipais, e o principal conflito deletério encontrado é a disputa voraz pelos votos dos pescadores. Com a criação do CIPAR e a implantação do ordenamento pesqueiro estruturado nas diretrizes da Economia Solidária, cogitamos a redução de tais conflitos. Introdução A pesca configura-se numa das atividades econômicas mais importantes da Amazônia. É a base alimentar para a maioria da sua população, gerando ao mesmo tempo renda, especialmente para os caboclos ribeirinhos.


Ordenamento pesqueiro por meio da criação do CIPAR¹ Parintins

Para Barthem (1997 apud SANTOS et alli, 2005) a pesca é uma atividade destinada basicamente à alimentação e ao comércio. O município de Parintins está localizado à margem direita do rio Amazonas, a 369 km em linha reta da capital amazonense, e é município polo da mesorregião denominada de Baixo Amazonas, que abrange os municípios de Barreirinha, Nhamundá, Maués, Boa Vista do Ramos, Urucará e São Sebastião do Uatumã. O município de Parintins conta com duas regiões com potencial para a pesca artesanal: a primeira é a região do Remanso, caracterizada pela pesca de peixes migratórios (grandes bagres) realizada no rio Amazonas; já a segunda é o Complexo Macuricanã, local de estudo deste artigo. É uma área de várzea em que na época da seca da Amazônia são formados inúmeros lagos, onde são capturados os peixes de escamas. O Complexo Macuricanã O Complexo Macuricanã localiza-se na área de proteção ambiental, estendendo-se numa superfície de 195.900 ha de ambiente de várzea, onde, apesar de denominada APA²-Nhamundá, 70% da sua área estão localizados no município de Parintins, e o restante pertence ao município de Nhamundá, no Estado do Amazonas. Além de comunidades circunvizinhas ao complexo, os municípios de Faro e Terra Santa, sediadas no Estado do Pará, com 33 comunidades, pertencem ao Complexo, envolvendo cerca de 1370 famílias, num total de 5.662 habitantes. A Área de Proteção Ambiental Nhamundá (APA Nhamundá) é uma unidade de conservação estadual criada pelo Decreto nº 12.836, de 09 de março de 1990 e, primeiramente, gerenciada pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas – IPAAM. Hoje em dia a responsabilidade pelo seu gerenciamento é da CEUC³. O Complexo Macuricanã tem um enorme potencial pesqueiro e turístico, porém vem sofrendo degradação de seus recursos por possuir um

plano de desenvolvimento que vigora em apenas sete comunidades próximas ao município de Parintins, pois não há acordos de pesca envolvendo todas essas comunidades, permitindo que as espécies sejam capturadas em quantidades desenfreadas. Outro aspecto relevante a ser considerado é que, por ser aquela área uma APA, mais cedo ou mais tarde os pecuaristas da região terão que optar por desocupá-la ou inserir-se em um projeto de manejo sustentável que, de acordo com alguns estudos preliminares, geraria uma provável alternativa de renda com menos impacto ao ambiente que suas atividades econômicas atuais. Em 2009 o Ministério da Pesca e Aquicultura lançou o edital para o projeto Desenvolvimento local por meio da incubação do CIPAR associada ao turismo de base comunitária relacionada à pesca artesanal, na mesorregião de Parintins. O projeto prevê a construção de 68 unidades em todo o Brasil, sendo duas no Estado do Amazonas: uma em Barcelos; e outra em Parintins. Os CIPARs visam à “Implantação de uma rede estratégica e regionalizada de infraestrutura de pequeno e médio porte para o desenvolvimento e o bom funcionamento das cadeias produtivas aquícola e pesqueira”. (MINISTÉRIO DA PESCA E AQUICULTURA, 2011). Para Parintins estão previstos investimentos de até cinco milhões de reais. A liberação depende da viabilidade e do tamanho do empreendimento. As fases do projeto se darão em três momentos. Primeiramente será feito o diagnóstico da pesca para conhecer a época de maior produção, entressafra, aspectos de comercialização, questões logísticas, mapeamento dos lagos, período de defeso, mobilização dos pescadores, com aulas de capacitação sobre cooperativismo, marketing, custos e gestão de empreendimentos econômicos solidários; em seguida, estudos de viabilidade econômica com levantamento de custos, questões relativas a preços, decisão de investimentos, escolha do local da infraestrutura, tamanho das

² Área de Proteção Ambiental ³ Centro Estadual de Unidade de Conservação

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Ordenamento pesqueiro por meio da criação do CIPAR¹ Parintins

instalações; finalmente, com a implementação por meio do Ministério da Pesca, o CIPAR entra em operação, com suporte da ITESES4, prestando serviços de acompanhamento e assessoria, de onde começa o processo de desincubação e, a partir desse momento, os próprios pescadores vão assumir o processo de gestão do CIPAR. Assim, o objetivo deste artigo é avaliar a contribuição e o papel que o CIPAR pode desempenhar na conjugação de esforços comuns e na mediação de conflitos, fortalecendo as famílias que vivem no complexo Macuricanã. Considerando o grande volume de investimento financeiro, a abrangência e o impacto que pode ocorrer na vida dos pescadores, aliados ao potencial desenvolvimento econômico, sustentabilidade ambiental, social e cultural, desencadeia-se uma nova configuração na forma de gestão dos recursos pesqueiros por meio da organização e na conscientização dos pescadores e comunitários. Pescador Artesanal Segundo a Instrução Normativa nº 6, de 16 de abril de 2010, do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), a definição de pescador artesanal é aquele que exerce a atividade de pesca profissional de forma autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria, podendo atuar de forma desembarcada ou utilizar embarcação de pesca com Arqueação Bruta5, (AB) igual ou menor que 20 (vinte). O glossário da Food and Agriculture Organization (FAO) define pescarias artesanais como aquelas pescarias tradicionais que envolvem trabalho familiar, como forma de subsistência ou comercialmente orientadas, utilizando relativamente pouco capital e energia, e que empregam, ou não, embarcações pequenas para viagens curtas e próximas à costa (SILVA, 2008, p. 22).

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Segundo Cardoso (2002), os pescadores artesanais, desprotegidos de políticas públicas, presenciaram suas áreas de pesca servindo de objeto para o avanço da frota pesqueira industrial que realiza atividades próximas à costa, intensificando a competição desigual pelo pescador artesanal. Como consequência, os pescadores de pequena escala submetem-se a um mercado dominado por atravessadores, o que resulta na queda de seus rendimentos. Conforme Maruyama (2007), a pesca artesanal continental é praticada basicamente em áreas represadas, em lagos e em trechos livres de grandes rios e pode ser classificada basicamente nesta modalidade a seguir: • A pesca Artesanal Profissional é aquela praticada por formações socioeconômicas de pequena escala ou como pequena produção mercantil, em que a pesca é a principal atividade exercida pelo pescador, entendida como uma profissão e cuja principal motivação é a comercialização, sendo uma parte usada também para seu próprio consumo alimentar. O excedente da produção também pode ser convertido na incrementação dos instrumentos de pesca. O pescador artesanal na Amazônia A pesca artesanal na Amazônia é uma das atividades mais antigas do Brasil, por a Região Amazônica possuir a maior bacia hidrográfica do País. Essa atividade fixa o ribeirinho numa constante dependência desse recurso, tornando-o um importante contribuinte na produção local, haja vista que a pesca artesanal é inicialmente de subsistência, mas, por fatores logísticos (armazenagem), o pescador passa a comercializar para que não se estraguem os peixes capturados. Vale ressaltar que tal atividade é praticada por várias famílias ribeirinhas, porém a pesca artesanal não é o único “produto” que elas comercializam. O conceito de vender o excedente

Incubadora de Tecnologias para Empreendimentos Sociais de Economia Solidária, responsável pelo diagnóstico da pesca e estudos de viabilidade para implantação do CIPAR. 5 Valor que expressa o tamanho total de uma embarcação, sendo função do volume de todos os espaços fechados; é um parâmetro adimensional e é utilizada desde o cálculo de taxa portuária até o parâmetro para classificação.

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aplica-se também à atividade agrícola familiar e às atividades extrativistas. O pescador artesanal é aquele que, para sua sobrevivência, pesca utilizando métodos tradicionais como espinhel, tarrafa, redes, caniços artesanais, entre outros, obtendo apenas o suficiente para o seu consumo, mas, em períodos em que a pesca supera a quantidade necessária, o pescador artesanal vê-se então com a oportunidade de obter renda extra, pois não dispõe de estrutura básica para armazenamento do excedente. Ordenamento Pesqueiro O Ministério da Pesca define o ordenamento pesqueiro como um conjunto de normas e ações que permitem administrar a atividade pesqueira, com base no conhecimento atualizado dos seus componentes biológico-pesqueiros, ecossistêmico, econômicos e sociais. Amparado de acordo com a Lei 11.959 do Código de Pesca, na pesca industrial, o ordenamento pesqueiro é definido como um conjunto de normas e ações que permitem administrar essa atividade. Tais medidas foram estabelecidas para que o consumo dos recursos pesqueiros seja sustentável, considerando as qualidades de peixes ameaçadas e que devem ser preservadas, de forma que a pesca não prejudique a reprodução dos peixes; o tamanho destes; a sua quantidade, havendo, assim, um equilíbrio entre os resultados econômicos e sociais e o consumo. Conflito da Pesca utilizando a matriz da SWOT a) Diagnóstico participativo Por meio da pesquisa de campo com a participação dos autores, realizada na região do Complexo Macuricanã, apontam-se vários tipos de conflitos envolvendo a prática pesqueira na localidade. Dentro desse diagnóstico, percebemos: • Transporte Fluvial: Na época de cheia, o Complexo Macuricanã serve de via de transporte mais rápido para se chegar às

regiões circunvizinhas entre os estados do Amazonas e Pará. Com o aumento de fluxo de embarcações, há uma agressão ao meio ambiente da região ocasionada pela poluição sonora, por meio dos barulhos dos motores, óleo diesel despejados pelas embarcações e consequentemente os lixos jogados no lago. • Pecuária: Criações de bovinos e bubalinos encontrados nas áreas do Complexo Macuricanã, que provocam destruições dos pastos das cabeceiras dos lagos onde os peixes e os camarões depositam seus ovos. • Queimadas: A utilização empírica na “preparação do solo” feita pelos comunitários para a formação de pastagens, criações de bovinos e bubalinos, sem dúvida, causa sérios danos à fauna e à flora locais. • Pesca Predatória: Localizado na região do Baixo Amazonas, o local do Complexo Macuricanã é considerado como um berçário de peixes e quelônios, então a demanda de pesca é bem intensa, pois se localiza estrategicamente entre dois estados, Amazonas e Pará. • Conflito entre as Comunidades: Há a disputa de uso dos recursos entre indivíduos de uma determinada comunidade por existir o individualismo das comunidades da localidade, visto que em algumas o sentimento de propriedade privada em relação aos lagos e à região prevalece em detrimento dos interesses coletivos. • Conflito entre os Pescadores, Agricultores e Pecuaristas: O Complexo é considerado uma área de várzea, e a desavença que dura há anos, até antes da criação da APA Nhamundá, na qual os moradores das comunidades que vivenciam da pesca e agricultura acusam os pecuaristas de alocarem grande quantidade de gado, que

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consequentemente destrói as plantações e as belezas naturais da região. • IBAMA6 e os Agentes Ambientais Voluntários: Depois de criado o Acordo de pesca do Complexo Macuricanã, o IBAMA capacitou os comunitários locais para serem Agentes Ambientais Voluntários, que ajudariam o IBAMA no policiamento de monitoramento e na apreensão de materiais oriundos das atividades ilegais. Com o passar do tempo houve vários conflitos sérios, e a justiça brasileira decretou que os Agentes Voluntários Ambientais somente poderiam atuar como Agentes Educadores, conscientizadores e comunicadores de acordos para outros comunitários que continuassem a infligir as leis. Mas, como a fiscalização do IBAMA não é frequente na região, facilita aos pescadores de outros locais capturarem no lago, já que os comunitários perderam o poder de policiamento. • Acordo de Pesca do Complexo Macuricanã: Projetos realizados na região não atingiram o objetivo de preservação por meio do acordo de pesca pelo olhar único da preservação ambientalista passando até de forma autoritária pela cultura dos atores locais. Um dos problemas foi a não complementação do projeto em todo o Complexo, por não ter alcançado a sustentabilidade da pesca, nos aspectos econômicos, sociais e culturais da localidade. • Direito de Propriedade: Os comunitários não possuem títulos de terra. Por ser área de várzea, respaldada pela Constituição Federal, é terra da União e o Rio Amazonas, por passar também em outros países, é considerado como águas internacionais, prejudicando os comunitários na obtenção de algum tipo de financiamento nas agências de fomento.

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• Infraestrutura: As comunidades do Complexo Macuricanã não possuem a infraestrutura adequada para a permanência dos ribeirinhos na própria comunidade, tais como falta de comunicação relacionada a telecomunicações, falta de existência de água potável e luz elétrica, a não adaptação das escolas no regime Amazônico para o período das cheias; e, quando está em período da seca, as comunidades praticamente ficam isoladas. b) Matriz SWOT Por meio da pesquisa, buscou-se identificar também alternativas de geração de renda sustentáveis não só relacionadas à pesca na região, utilizando os pressupostos do modelo SWOT em que se identificam as forças (strengths), fraquezas (weaknesses), oportunidades (opportunities) e ameaças (threats). Pontos Fortes e Oportunidades para a Região: A localização da comunidade com suas diversidades naturais; na fauna se tem gavião real, jacarés, patos selvagens, marrecas, ninhais de garças, e uma infinidade de lagos impregnados de camarões e de peixes na piracema, além de vários locais propícios à exploração turismo. Pontos Fracos e as Ameaças para a Região: Fica evidente a falta de infraestrutura das comunidades da região, o descumprimento do Acordo de Pesca, a degradação ambiental, a depredação dos berçários, a pesca predatória, a falta de acesso ao gelo e a falta de capacitações técnicas, a inexistência de organização para o trabalho coletivo, o acentuado egoísmo individual e a falta de consciência da população. Análise de dados Apesar de fazerem parte de uma mesma região, e de terem muitas características em comum, as necessidades, os desafios, as oportunidades, as condições de educação e a infraestrutura

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis


Ordenamento pesqueiro por meio da criação do CIPAR¹ Parintins

são distintos nos setores da APA-Nhamundá e Remanso. No mesmo local existem muitos conflitos de interesse oriundos de visão política, religiosa, ideológica e o papel exercido no grupo social. Entre os pescadores alguns são alinhados com a colônia de Pescadores Z-17, de Parintins; outros são filiados ao SINDPESCA7. Apesar de ser legal, essa questão enfraquece a categoria politicamente, ressaltando que o governo federal reconheceu a colônia como representante legítima dos pescadores artesanais, e todas as políticas públicas serão feitas por meio dela. O nível de conscientização ambiental e o reconhecimento da necessidade de preservação ambiental, o uso racional dos recursos pesqueiros já se fazem presentes no pensamento e na ação de muitas pessoas. Elas mesmas se deram conta das mudanças ocorridas no ambiente local, com a redução do pescado, dificuldade de captura, destruição da vegetação nativa dos lagos por bovinos e bubalinos, seca de lagos que antes permaneciam cheios o ano todo, destruição de berçários, redução significativa da vegetação típica. Existe muita rivalidade entre os comunitários de uma mesma comunidade; estendendo-se entre as próprias comunidades, em lagos de domínio de uma comunidade; pescadores de outras comunidades próximas são proibidos de pescar, mesmo que para a própria subsistência. Esses conflitos prejudicam a coletividade. O IBAMA não consegue fiscalizar com eficiência toda a extensão do complexo Macuricanã; as abordagens se intensificam no período do defeso e na época de desova de quelônios, especialmente para a espécie de tracajá. Assim o IBAMA capacitou moradores das comunidades para serem Agentes Ambientais Voluntários para atuar como agentes educadores, conscientizadores e comunicadores aos órgãos competentes sobre pessoas que infringem a lei.

As comunidades do Complexo Macuricanã possuem infraestrutura precária em comunicação, educação, com escolas inadequadas para o regime de subida e descida das águas, ficando mais complicada para as comunidades mais longínquas das cidades de Parintins e Nhamundá. Considerações finais A implantação do CIPAR vai: a) promover melhorias nos canais de comercialização do pescado, permitindo que os próprios pescadores controlem os elos da cadeia produtiva; b) promover o desenvolvimento econômico e o compromisso com o meio ambiente e com as gerações futuras, baseados em laços solidários de cooperativismo. A capacidade de resolução de conflitos e a superação das contradições entre grupos e comunidades serão fundamentais para o sucesso do empreendimento, baseado em princípios da economia solidária, conscientização sobre a necessidade de eliminar a pesca predatória e a vontade de aprender técnicas de gestão do empreendimento. Além do compromisso de zelar e de cuidar do patrimônio, será fundamental para o Ministério da Pesca decidir investir no CIPAR. A organização e o respeito aos acordos de pesca estabelecidos na região proporcionarão controle sobre pescadores invasores e que não respeitam as leis sobre pesca. O aproveitamento do pescado será feito de forma integral, não somente a venda in natura, mas também a comercialização com valor agregado, não desperdiçando nada do peixe, aproveitando-se os produtos e subprodutos. O modelo de desenvolvimento econômico proposto para a região pressupõe aliar sustentabilidade ambiental – conservação dos recursos pesqueiros; sustentabilidade cultural – valorização da cultura ribeirinha; sustentabilidade econômica – melhoria do nível de renda das pessoas.

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Sindicato dos Pescadores; sua criação foi motivada por disputa política ocorrida na colônia de pescadores Z-17, de Parintins.

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Ordenamento pesqueiro por meio da criação do CIPAR¹ Parintins

Figura 01 – Localização da área de estudo Fonte: CEUC, 2011.

Bibliografia CARDOSO, T. A. Estudos etnoecológicos em comunidades de pescadores de manjuba no Parque Estadual da Ilha do Cardoso, SP. 2002. 47f. Monografia (Graduação em Ecologia e Recursos Naturais) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos – SP.

SANTOS, G. M; SANTOS, A. C. M. Sustentabilidade da Pesca na Amazônia. Brasília, 2005. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ea/v19n54/09. pdf. Acesso em: 05 set. 2011, 15:46:12.

JÚNIOR, Miguel Petrere. et al. Amazônia: Ambientes, Recursos e Pesca. In: Júnior, Miguel Petrereetal (org.). O Setor Pesqueiro na Amazônia: Situação Atual e Tendências. Manaus: IBAMA/ ProVárzea,2007.

Jean Reis de Almeida Graduando em Administração no Instituto de Ciências Socais, Educação e Zootecnia (ICSEZ) da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), bolsista do Ministério da Pesca e membro da Incubadora de Tecnologias para Empreendimento Sociais de Economia Solidária (ITESES Campus Parintins). (jan_reis18@hotmail.com)

MINISTÉRIO DA PESCA E AQUICULTURA. CIPARs – Centros Integrados da Pesca Artesanal. Disponível em: http://www. T&C Amazônia Ano IX, Número 22, I Semestre de 2012

SILVA, M. E. P. A. Pescaria de pequena escala no reservatório Billings (Alto Tietê, SP) nos anos de 2005 a 2007. 2008. 114f. Dissertação (Mestrado em Aquicultura) – Instituto de Pesca, Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios, São Paulo.

CÓDIGO DE PESCA. Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/ legislacao/817808/codigo-de-pesca-lei-11959-09 . Acesso em: 12 abr. 2012, 13:02:38.

MARUYAMA, L. S. A pesca artesanal do Médio e Baixo Tietê (São Paulo, Brasil): aspecto estruturais, socioeconômicos e de produção pesqueira. 2007. 109f. Dissertação (Mestrado em Aquicultura) – Instituto de Pesca, Agência Paulista de tecnologia dos agronegócios, São Paulo.

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mpa.gov.br/#infra-fomento/CIPARs. Acesso em: 05 set. 2011, 15:06:10.

William de Souza Barreto é orientador de Jean Reis de Almeida, possui graduação em Ciências Econômicas e Mestrado em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Atualmente é Professor Assistente do Colegiado de Administração e Zootecnia da UFAM Campus Parintins e Coordenador da Incubadora de Tecnologias para Empreendimentos Sociais de Economia Solidária. (barreto@ufam.edu.br)


Reportagem

Amazônia, protagonista

ou coadjuvante das mudanças climáticas globais? Lucy Rodrigues

Invernos cada vez mais rigorosos. Verões ainda

científica. Exemplo disso, uma carta assinada por

mais intensos. Cheias e estiagens batendo recor-

um grupo de 18 pesquisadores brasileiros, entre

des. O que está acontecendo com o planeta? Para

os quais estão físicos, geólogos e climatologis-

muitos, a intensificação desses eventos é influên-

tas, dirigida à presidente Dilma Rousseff, pouco

cia das mudanças climáticas globais. O fenômeno

antes da Conferência das Nações Unidas sobre o

é atribuído a alterações na composição atmosfé-

Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, ocorrida

rica, diretamente associadas às atividades huma-

em junho de 2012, no Rio de Janeiro. No texto,

nas, como o uso de combustíveis fósseis e o des-

eles afirmam, entre outras coisas, que “não há

matamento de florestas, que contribuem para a

evidências físicas da influência humana no clima

emissão de gases que intensificam o efeito estufa

global” e que a “descarbonização da economia é

natural da Terra e causam o aquecimento global.

contraproducente”.

Mas a teoria não é unanimidade na comunidade

T&C Amazônia Ano IX, Número 22, I Semestre de 2012

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Amazônia, protagonista ou coadjuvante das mudanças climáticas globais?

Como tudo começou? Foi a partir da década de 1980 que evidências científicas sobre a possibilidade de mudança de clima em nível mundial começaram a despertar maior interesse no público e na comunidade científica. Em 1988, A Organização Meteorológica Mundial (OMM ) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) estabeleceram o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). A ele coube apoiar, por meio de trabalhos científicos, as avaliações do clima e os cenários de mudanças climáticas para o futuro. O quarto e último relatório do IPCC, publicado em 2007, apontou, entre outros dados, um aumento de 0,74º C na temperatura global e de dois centímetros nos níveis dos mares em associação ao crescimento das atividades industriais humanas nos últimos séculos. A partir da maior divulgação desses dados, uma mudança de postura passou a ser cobrada de maneira mais incisiva dos governos para a adoção de políticas de redução das emissões de carbono. E o que são realmente mudanças climáticas globais? O clima do planeta é dinâmico e sofre influência de alterações naturais na incidência da radiação solar, variações na órbita terrestre e erupções vulcânicas que causam variabilidades naturais em escalas de tempo diversas. Entretanto as pesquisas apontadas pelo IPCC indicam que as alterações na composição da atmosfera resultantes das atividades humanas ocorrem em um curtíssimo espaço de tempo (entre 100 e 200 anos), em comparação com as escalas temporais geológicas (milhares ou milhões de anos). Para o coordenador de pesquisas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), o físico mestre em Meteorologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e doutor em Física da Atmosfera pela Universidade Paul Sabatier (França), Antonio Ocimar Manzi, não é porque no passado, inclusive recente, houve variações naturais importantes de temperatura e dos níveis dos oceanos que as atividades humanas não estão afetando o clima do planeta.

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“Eu concordo que há muita gente, que no afã de aparecer ou de ganhar poder ou de tentar fortalecer argumentos, como por exemplo para preservar nossas florestas, ou ainda por ignorância, exagera, profetiza grandes catástrofes ou até mesmo o ‘fim do mundo’, como o próprio criador do conceito de Gaia fez e que recentemente pediu para esquecerem o livro que escreveu aleardeando que o aquecimento global levaria bilhões de pessoas à morte. Mesmo quem usou bastante os cenários catastróficos produzidos pelo modelo climático HadCM3 do Hadley Center, nos últimos 12 anos, para alertar as autoridades sobre o iminente colapso da Amazônia, se vê agora desconfortável com o fato de o novo modelo climático do Hadley Center não mais projetar o tal colapso. Mas é fato que a concentração de gases de efeito estufa da atmosfera está aumentando, e a gente sabe bem de onde eles estão vindo”, defende. Saiba mais: O modelo climático HadCM3 é um modelo numérico acoplado da circulação global da atmosfera-oceano desenvolvido no Hadley Centre (Reino Unido). Foi um dos maiores modelos utilizados na avaliação do terceiro relatório do IPCC, publicado em 2001. São quatro os principais relatórios do IPCC. O primeiro saiu em 1990; o segundo em 1995; o terceiro, em 2001; e o último, em 2007 – que rendeu à instituição, naquele ano, um Nobel da Paz. O quinto relatório já está no forno, previsto para 2014. Na opinião do pesquisador, as mudanças climáticas globais têm relação com mudanças na composição da atmosfera, como consequência, principalmente, do uso de combustíveis fósseis pelo homem. “O aumento da concentração de CO2 na atmosfera é em torno de 50% das emissões anuais pelas atividades humanas; e, além das emissões pela queima de combustíveis fósseis contabilizam-se aproximadamente mais 10% de emissões geradas pelos desflorestamentos em regiões tropicais. O aumento da concentração de gases de efeito estufa tem a capacidade de intensificar o efeito estufa da nossa atmosfera. Esse efeito estufa ‘natural’ acontece devido principalmente ao vapor de água e ao gás carbônico e provoca um aumento


Amazônia, protagonista ou coadjuvante das mudanças climáticas globais?

Figura 01 - O coordenador de pesquisas do Inpa, Antonio Manzi Fonte: Tabajara Moreno/Ascom Inpa.

da temperatura nos primeiros quilômetros da atmosfera de aproximadamente 30 graus Celsius. Essa intensificação produz o que se chama de aquecimento global”. Manzi explica que esse aquecimento não acontece de maneira uniforme no planeta: regiões de altas latitudes - polos - aquecem mais rapidamente que os continentes, e estes, por sua vez, também aquecem com maior intensidade que as áreas oceânicas, e isso gera mudanças na circulação geral da atmosfera e dos oceanos e leva ao que se chama de mudanças climáticas globais. “Sendo assim, há regiões em que podem aumentar as chuvas e em outras diminuir; e, globalmente, espera-se e vem se constatando uma intensificação da variabilidade natural do clima: tempestades mais severas, anos mais frios, anos mais quentes, com muita chuva, muito mais secos, e assim por diante”.

Além de eventos extremos, como secas, enchentes, ondas de calor e de frio, furações e tempestades, alterações na biodiversidade, aumento no nível do mar e impactos na saúde, na agricultura e na geração de energia hidrelétrica também estariam relacionados ao problema. Contraponto Na contramão desse pensamento, estão os chamados de “céticos do clima”, como o climatologista Ricardo Augusto Felício, professor do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP). Em carta aberta à comunidade universitária, depois em um programa de televisão em rede nacional, e ainda na carta endereçada à presidente Dilma, assinada junto com outros 17 cientistas, ele coloca que “conferir ao dióxido de carbono (CO2) e outros gases produzidos pelas atividades humanas o papel de principais protagonistas da dinâmica climática, a hipótese

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do Aquecimento Global Antropogênico (AGA), simplifica e distorce um processo extremamente complexo, no qual interagem fatores astrofísicos, atmosféricos, oceânicos, geológicos, geomorfológicos e biológicos, que a ciência apenas começa a entender em sua abrangência”. Para esse grupo, não há evidências físicas da influência humana no clima global. “A despeito de todo o sensacionalismo a respeito, não existe qualquer evidência física observada no mundo real que permita demonstrar que as mudanças climáticas globais, ocorridas desde a Revolução Industrial do século XVIII, sejam anômalas em relação às ocorridas anteriormente, no passado histórico e geológico – anomalias que, se ocorressem, caracterizariam a influência humana”. O texto completo da carta pode ser obtido no endereço: http://www.abequa.org.br/inc/carta_dilma.pdf. Em meio às discussões controversas sobre o tema, a Amazônia, como detentora da maior floresta tropical do mundo, já foi apontada como a grande vilã, devido às emissões de carbono por conta dos desmatamentos; e como “pulmão do mundo” pela alta capacidade de fotossíntese das árvores – depois se comprovou que as plantas dos oceanos são bem mais eficientes - e ainda alvo de muitas previsões catastróficas, por meio de cenários assustadores como a savanização e a desertificação. Hoje, a Região vigora como campo para inúmeras pesquisas científicas relacionadas ao tema, que aos poucos vão ajudando a diminuir incertezas, a confirmar ou a descartar hipóteses. Pesquisas na Amazônia Programa LBA estuda interações entre clima e ecossistemas amazônicos Para entender o funcionamento dos ecossistemas amazônicos, assim como as causas e efeitos das mudanças em curso na Região, foi criado, em 1993, dentro do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia, conhecido pela sigla inglesa LBA. Em 2003 o LBA passou

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para a coordenação do Inpa e, em setembro de 2007, de experimento que era, tornou-se um Programa do governo federal. Hoje é considerado uma das maiores experiências científicas do mundo na área ambiental. “O LBA é o maior projeto de pesquisas ambientais em regiões tropicais já realizados no mundo. Nossas pesquisas não são exclusivamente sobre mudanças climáticas, mas sobre essa interação biosfera-atmosfera. Há uma série de pesquisas em pelo menos sete grandes áreas, como por exemplo meteorologia e climatologia, que a gente chama de física da atmosfera, química da atmosfera, hidrologia, recenseamento remoto, mudanças de uso da terra e seus impactos... Na parte de ciclos biogeoquímicos, a gente dá um destaque especial para a questão do carbono, estoque do carbono e ciclos do carbono na Amazônia, que tem mais a ver com esse tema das mudanças climáticas globais”, destaca o coordenador de pesquisas do Inpa, Antonio Manzi, que durante mais de oito anos foi coordenador executivo do Programa. Conforme dados do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o LBA soma mais de 100 projetos de pesquisa desenvolvidos por mais de 200 instituições nacionais e estrangeiras. O programa teve ampla contribuição para a formação de pesquisadores, sendo mais de 500 mestres e doutores brasileiros. Em relação à publicação dos resultados de pesquisas, soma mais de 1000 artigos em periódicos especializados, além de um grande número de livros e capítulos de livros. Os resultados integrados, obtidos pelas diferentes equipes de cientistas, têm permitido entender alguns mecanismos que governam as interações da floresta com a atmosfera, tanto em condições naturais (da floresta intacta) quanto alteradas, de maneira a favorecer um processo de desenvolvimento sustentável na Amazônia. Um dos projetos de destaque do LBA na Amazônia e no mundo é o da rede de monitoramento ambiental e de gases de efeito estufa, composta de 12 torres – a maior dela com 65 metros de altura – instaladas pelo programa em


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diferentes pontos da Amazônia. Essas estruturas abrigam sensores para medir as trocas de água, calor e gás carbônico entre a biosfera e a atmosfera, que permitiram elucidar várias questões em relação ao balanço global de carbono na floresta. Os desmatamentos na Amazônia e as Mudanças Climáticas Em quase duas décadas de estudos, Manzi afirma que foi possível diminuir muitas incertezas e, principalmente, ter informações confiáveis a respeito de quanto os desmatamentos da Amazônia têm contribuído para as emissões globais de gás carbônico e outros gases do efeito estufa como metano, ozônio, óxido nitroso. “A Amazônia, por conta dos desflorestamentos, contribui para o aumento da concentração de gases do efeito estufa na atmosfera e o aquecimento global; agora essa contribuição hoje deve ser inferior a 2%, mas, historicamente, nas últimas três décadas, foi bem maior que isso. Podemos afirmar seguramente que a contribuição da Amazônia não é determinante na questão das mudanças climáticas globais; o que

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é determinante é a utilização dos combustíveis fósseis”, avalia. Hoje, países emergentes já têm um peso cada vez maior nesse ranking das emissões de CO2. A China é a maior emissora. Junto com os EUA, os dois países emitem em torno de 45% de todos os gases do efeito estufa lançados na atmosfera. Nessa perspectiva, a Amazônia contribui com as emissões, mas não é a grande vilã. “As pesquisas do programa LBA ainda apontam que, de uma maneira geral, as florestas naturais estão sendo mais eficientes em fazer a fotossíntese, retirando uma parte desse excesso de gás carbônico da atmosfera e estocando na sua biomassa, que vem aumentando nas últimas três décadas”, frisou. Pelos cálculos do Programa, o estoque de carbono nas florestas da Amazônia como um todo está aumentando entre ½ e uma tonelada de carbono por hectare ao ano. “O que vem sendo observado nas últimas décadas é que o sequestro de carbono da atmosfera adicionado às nossas florestas é maior que as emissões brasileiras por deflorestamento na Amazônia. Mas isso não


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significa que a gente deva continuar desmatando. Se não houvesse o desmatamento, esse valor de sequestro seria maior”, defende Manzi. Outro dado interessante revelado nas pesquisas é a quantidade de carbono estocada nas florestas naturais da Amazônia. Calcula-se que haja 100 bilhões de toneladas nas árvores e outros 100 bilhões no solo, um argumento a mais, segundo o pesquisador, para que as florestas sejam preservadas. “Se houver uma mudança climática, por exemplo, com grande redução de chuva na Amazônia, que venha a matar essas florestas todas ou pelo menos grande parte delas, há um potencial muito grande que boa parte desse estoque de carbono presente na biomassa vá parar na atmosfera, intensificando ainda mais o efeito estufa e mudanças climáticas globais”. Relação de simbiose entre a floresta e as chuvas Hoje, sabe-se que a principal fonte de umidade que entra no Brasil pela Amazônia vem do oceano Atlântico. A umidade do oceano é duas a três vezes maior da que evapora na superfície das florestas naturais. Entretanto, segundo as pesquisas desenvolvidas pelo LBA, a floresta tem um papel muito importante de reciclar essa água e de contribuir para a quantidade de vapor que vai para a atmosfera, especialmente no período mais seco. “Mesmo nesse momento, quando diminui a entrada de umidade do oceano, as árvores, por terem raízes bem profundas, continuam evaporando bastante”, explica Manzi. Mas, além disso, as pesquisas do LBA descobriram também que a floresta ajuda diretamente no processo de formação das chuvas na Região Amazônica. De acordo com os estudos, no período mais chuvoso, a atmosfera da Região Amazônica é muito limpa. E, para que a gota de chuva se forme, não basta apenas o vapor d’ água e condições de temperatura adequadas; é necessária também a presença de algumas partículas na atmosfera, onde esse vapor d’ água possa aderir e condensar-se. Essas partículas são chamadas de núcleos de condensação de nuvens. Porém há poucos desses núcleos na atmosfera da Região. A descoberta do LBA é que a maioria dessas partículas é gerada pela própria floresta.

Os estudos sobre a interação atmosferabiosfera amazônica mostram que as emissões das florestas não são determinantes para as mudanças climáticas globais. Pelo contrário, os ecossistemas naturais ainda contribuem para retirar parte do excesso de CO2 da atmosfera Antonio Manzi coordenador de pesquisas do Inpa

“Uma pequena quantidade desses núcleos é formada por micro-organismos como fungos, bactérias, vírus. Outras na forma de pólen e esporos, mas a maioria vem de cristais, que são formados a partir da oxidação de gases emitidos pelas florestas. Então é um processo simbiótico. A floresta precisa das chuvas para sobreviver, e a chuva precisa desses núcleos de condensação. que acabam sendo fornecidos pela própria floresta”, resume o pesquisador. As grandes variações no clima da Amazônia e a relação com as mudanças climáticas Em um intervalo de menos de três anos, duas cheias recordes em relação aos registros históricos existentes foram presenciadas na bacia amazônica. Mas será que essas variações seriam consequências das mudanças climáticas globais? Na opinião do meteorologista e doutor em clima e ambiente pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e pelo Inpa, Júlio Tóta, é preciso tratar muito cautelosamente a questão. Ele explica a diferença e a relação entre a variabilidade local do clima e as mudanças climáticas globais. “Há fatores regionais que modulam o clima da Região e fatores climáticos planetários que

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interferem no clima regional. Quando se fala de mudanças climáticas, é preciso discernir esses dois lados. Você está falando de mudanças climáticas globais - aumento de temperatura do planeta- ou de mudanças climáticas regionais -como sugerem algumas pesquisas segundo as quais parte de floresta está virando savana, parte de cerrado virando outro bioma; e isso tudo está acontecendo ao mesmo tempo? Então, talvez o Saara, que tem um clima bem estabelecido (seco, quente e frio durante os períodos noturnos), possa ter variabilidade, mas mudança daquilo ali não vai acontecer de hoje para amanhã. É necessário muito longo prazo para haver uma mudança”, exemplifica. Segundo o pesquisador, quando um bioma está estabelecido com o seu regime de clima, ou seja, equilibrado, ele tem flutuações ou variações de maneira a manter esse equilíbrio. “No momento em que essas variações começam a ter amplitude muito grande, o ecossistema não consegue manter esse equilíbrio, então isso pode ser resultado de variações climáticas extremas em função de mudanças climáticas globais”. Devido à falta de registros de clima de longo prazo da região, o pesquisador afirma que é muito incerto ter uma posição em relação ao quanto as mudanças climáticas globais estão afetando a variabilidade climática da Região Amazônica. “Hoje a gente está tendo algumas perturbações que estão nos fazendo ver que esse ciclo não é uniforme. A gente viu que grande cheia aconteceu em 2009; e está acontecendo menos de três anos depois um novo recorde. A pergunta é: nós temos registro de clima para caracterizar estatisticamente todo o histórico de clima da Região Amazônica? Não. O único órgão no Brasil que faz esse monitoramento constante do clima na Amazônia é o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Ele tem cerca de 4 mil estações no Brasil inteiro, mas, se você olhar para a Amazônia, há pouco mais de 50 em uma Região que representa cerca de 60 porcento do País. É pouco; e nos faz pensar que é muito incerto ter uma posição quanto às mudanças de clima aqui na Região”, pondera.

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O meteorologista afirma que é necessário ter várias medidas climatológicas de longo prazo que deem uma confiança estatística para avaliar mudanças no clima de uma região. “O que a gente pode falar é que existe uma variabilidade inerente, natural do clima da Região, e oscilações não uniformes e extremas, mas ainda assim pode ser que seja natural e que a gente não tenha o registro desse fenômeno ocorrendo há muito tempo”. Para o pesquisador, a preocupação em relação ao assunto, principalmente na Amazônia, trouxe avanços significativos para ampliar as pesquisas. “Essa questão das mudanças climáticas globais despertou muita atenção e trouxe incentivos, pelo menos na área de meteorologia e climatologia. É um avanço muito grande que tivemos. Tanto em nível nacional quanto estadual. O Estado tem aumentado bastante sua atenção, fomentando uma enorme quantidade de projetos científicos. A UEA, por exemplo, é uma instituição muito jovem, que tem cerca de dez anos, mas já apresenta um grupo de doutores na área de meteorologia extremamente importante no País; eu diria que é uma das únicas instituições com mais de dez doutores nessa área. Então esse é um passo enorme que o Norte está dando para que tenhamos ainda mais estudos e pesquisas nessa área”. Projeto pioneiro vai ampliar número de torres de monitoramento do clima na Região Ampliar a cobertura de observação já existente na Amazônia e entender melhor o papel desse bioma no cenário de mudanças climáticas globais. Essa é a proposta do projeto Atto, sigla inglesa para Observatório Amazônico com Torre Alta. Fruto de uma parceria entre o Brasil e a Alemanha, a iniciativa prevê a construção da maior torre científica de observação em uma área de floresta tropical natural, com 320 metros – um pouco maior que a torre Eiffel, em Paris (França). A gigante será erguida na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã, no município de São Sebastião do Uatumã (a 246 quilômetros de distância de Manaus).


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“O Atto é associado ao programa LBA e tem esse mesmo caráter de cooperação multinacional, entre instituto Max Planck, da Alemanha, a UEA e o Inpa, que coordena nacionalmente o projeto, na pessoa do Dr. Manzi. A UEA foi convidada como parceira para apoiar na condução científica do projeto. Ele foi submetido ao governo federal via Finep e teve os recursos aprovados, da ordem de 8,3 milhões de euros (25 milhões de reais), de forma que 50% do suporte financeiro vêm da Alemanha; e a outra metade, por parte do Brasil”, explicou o coordenador científico do projeto pela UEA, Júlio Tóta.

torres juntas servirão para monitorar a relação da vegetação com a atmosfera, ajudando a entender o comportamento da floresta diante de possíveis mudanças climáticas globais e possibilitando um entendimento mais aprofundado e preciso do regime de chuvas e dos ciclos biogeoquímicos, como os ciclos do carbono e da água.

Além da torre principal, o projeto contará com outras quatro torres de 80 metros de altura ao seu redor. Dessas, duas já estão instaladas e permitiram o início das medidas meteorológicas em janeiro deste ano. O projeto prevê ainda uma infraestrutura de alojamentos para os pesquisadores. Quando todas as torres estiverem prontas, será possível monitorar em torno de 1,8 milhão de quilômetros quadrados, a maior área de floresta tropical de terra firme do planeta. Todas as

“Esses recursos vão possibilitar manter essa estrutura inicialmente por cinco anos, mas a gente tem muita esperança de que esse projeto continue por pelo menos 30 anos. Aí sim a gente vai ter um sítio experimental de monitoramento climático sobre uma área preservada de floresta tropical de terra firme, que vai servir de referência e ajudar a diminuir muitas incertezas nas estimativas do papel das florestas no balanço de carbono global”, afirma Tóta.

As informações originadas do Atto serão obtidas com novas tecnologias e metodologias de pesquisa, o que vai melhorar as estimativas anteriores, frutos de quase 12 anos de pesquisas do projeto LBA.

Figura 02 - Idealização das torres do projeto Atto em fotografia aérea real da área Fonte: Júlio Tóta.

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Figura 03 - O meteorologista Júlio Tóta (à dir.) com alunos da UEA Fonte: Agência Fapeam.

No Amazonas, o projeto Atto foi implantado na RDS do Uatumã, e a representatividade das medidas cobrirá grande área a nordeste de Manaus, com um alcance inicial de monitoramento da torre maior (320 metros) de 300 quilômetros de raio. A previsão para o início das atividades é o fim de 2013, quando a construção das torres deverá ser concluída. O Pesquisador Júlio Tóta é meteorologista e doutor em clima e ambiente e integra a equipe de pesquisadores do Centro de Estudos do Trópico Úmido (Cestu), da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), onde é professor. Ele coordena, como representante da UEA, o projeto Atto juntamente com pesquisadores de outros dois centros de pesquisa: Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e o germano Instituto Max Planck de Química (MPIC, na sigla em alemão). Pesquisas ajudam a reduzir efeitos das mudanças do clima na biodiversidade Há milhares de anos as espécies convivem com as alterações climáticas do planeta, mas, de acordo com os cientistas, agora essas transformações acontecem em um intervalo de tempo menor. Para entender e gerar o maior número de dados

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acadêmicos e científicos a respeito dos efeitos das mudanças climáticas sobre a biodiversidade brasileira, foi criado, em 2007, dentro da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (conhecida como Rede-Clima), a sub-rede biodiversidade. Ela reúne pesquisadores de várias instituições brasileiras. “A biota vem convivendo com as mudanças climáticas há muito tempo; isso não é novidade. O que acontece agora é que em uma escala de tempo muito pequena estamos observando isso. Nosso objetivo básico é entender o que vai acontecer com as espécies olhando para o passado. Há 18 mil anos, como era a superfície da Amazônia? Quais as plantas? Todas essas mudanças foram em decorrência das mudanças climáticas? Entender quais as variáveis e como a Amazônia respondeu a elas pode dar uma ideia de futuro. Isso tudo é feito com várias técnicas de pesquisa”, explica o coordenador de Zoologia do Museu Paraense Emílio Goeldi e coordenador da sub-rede biodiversidade da Rede-Clima, Alexandre Aleixo. Graduado em Ciências Biológicas e mestre em Ecologia pela Universidade Estadual de Campinas (1995/1997); e doutor em Zoologia


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pela Louisiana State University - EUA (2002), o pesquisador acredita que a reconstrução do grau de suscetibilidade e de resposta das espécies dos diferentes biomas às alterações climáticas intensas de passado recente, como aquelas ocorridas ao longo dos últimos dois milhões de anos, é um conhecimento essencial para o desenvolvimento de políticas de minimização dos efeitos das mudanças climáticas sobre a biodiversidade brasileira. Conhecer cada vez mais as espécies do bioma constitui um dos maiores desafios para os pesquisadores da sub-rede biodiversidade. “Nosso maior problema em trabalhar as mudanças climáticas no passado e futuro é saber quais as espécies da Amazônia e como estão distribuídas. Temos inventários de vários séculos

da Amazônia, mas somente agora a gente tem ferramentas disponíveis para fazer essa cobertura”, afirma. Entre as ferramentas apontadas por Aleixo, estão a maior quantidade de doutores na região, a melhoria de aspectos logísticos para ter acesso aos locais de pesquisa e também o auxílio das novas tecnologias. “No meu caso, por exemplo, que trabalho com inventário de aves, a gente sabe que a maneira mais rápida de catalogá-las é por meio do canto, que é a carteira de identidade dos pássaros. Antigamente, por exemplo, os gravadores eram enormes e demandavam rolos de fitas e pilhas grandes. Hoje, com o advento da mídia digital, que é uma tecnologia relativamente barata, é possível gravar esses sons e cruzar com um banco de dados disponível

Figura 04 - O coordenador de Zoologia do Museu Emílio Goeldi, Dr. Alexandre Aleixo Fonte: Arquivo pessoal

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na Internet e assim comparar com gravações do mundo inteiro. Da mesma maneira, existem outros equipamentos como torres, navegadores GPS, que hoje facilitaram mais a vida dos pesquisadores de outras áreas”. Censo da Biodiversidade Na busca de agregar informações e de disponibilizar publicamente números confiáveis e atualizados com frequência regular sobre a riqueza da biodiversidade amazônica, o Museu Goeldi iniciou este ano o Censo da Biodiversidade. A iniciativa vai ajudar no monitoramento e na identificação de novas espécies em nível local, regional e nacional. “A ideia é empregar de modo intenso todas essas tecnologias em áreas-chave, pouco mostradas, e um esforço maior em áreas que têm uma fauna razoavelmente concluída e assim criar um catálogo de estudos. Para isso serão usadas ferramentas como a mídia digital, o banco de dados e o auxílio da biologia molecular. No caso das aves, por exemplo, a biologia molecular está mostrando que animais antes considerados de uma única espécie são de espécies diferentes, ou seja, o número é subestimado. Então o censo vem com a proposta de integrar ferramentas e instituições em função da detecção de novas espécies”, explica. A pesquisa já conta com 3.813 espécies de 12 grupos da fauna, disponibilizadas pelo Museu nas Listas de Espécies do Estado do Pará. Os interessados podem conferir o nome científico, a família em que a espécie está inserida e, quando for o caso, a categoria de ameaça de extinção.

As espécies da flora serão disponibilizadas num segundo momento e deverão abranger duas bases de dados, uma de inventários florísticos e outra de coleções. As listas, assim como o censo local, serão atualizadas a cada nova espécie registrada e, ao fim de cada ano, os números consolidados do período serão disponibilizados, informando ainda a origem das mudanças, como novas regiões inventariadas, novas revisões taxonômicas etc. Novos grupos biológicos serão incluídos em consonância com a contribuição de especialistas e a consolidação de grupos de pesquisa atuantes em grupos biológicos. “A expectativa é incluir levantamentos de outras instituições que pesquisam a biodiversidade amazônica. Estamos conversando com outros grupos, como universidades e institutos de pesquisa, que atuam na região da Amazônia, para que também forneçam dados oficiais que serão atualizados constantemente”, explica. Ele destaca a importância das pesquisas que buscam conhecer cada vez mais a Região. “O Brasil é um país rico em biodiversidade; e constantemente se atribui à biodiversidade papel potencial farmacológico, cosmético, mas o mais importante e o maior valor dessa biodiversidade é como provedora de serviços ambientais. Principalmente quando se fala em mudanças climáticas, pois a floresta faz parte da biodiversidade, e são as plantas que ajudam na fixação e na retirada do excesso de carbono da atmosfera. Então conhecer mais essa riqueza é estratégico”, conclui Aleixo.

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Artigo

Mitigação de vazamentos em projetos REDD+ com base em ações programadas para a região do rio Madeira/AM Renan Albuquerque Rodrigues, Antônio José do Nascimento Fernandes, Ramón Troitiño Cachafeiro e Rodrigo da Costa Lima

Resumo O estudo teve por objetivo descrever quais mecanismos podem amenizar o problema do aumento das emissões de gases de efeito estufa por vazamentos em regiões de floresta tropical onde é proposta a execução de projetos REDD+. O levantamento foi orientado a partir da análise de um programa piloto denominado Projeto Trocano Araretama, proposta para ser efetivada em 2013 no sudeste do Estado do Amazonas. Palavras-chave: Vazamentos. Projetos REDD+. Amazonas. Introdução Mesmo com sua alta integridade ambiental, a Amazônia segue ameaçada pelo avanço do desmatamento para pecuária, agricultura mecanizada, iminentes explorações madeireira e mineral e ainda para o licenciamento de grandes obras de aproveitamento do potencial energético de rios (MARENGO et al, 2008). Tais ações concorrem para pressionar a densidade faunística e florística, afetando populações de rurais, ribeirinhos, caboclos, quilombolas e indígenas, as quais tradicionalmente formaram seus hábitos e seus costumes a partir da natureza que os envolve (TAJFEL, 1982; ALBUQUERQUE, 2002). O desflorestamento — seja operado por corte raso, queimada, seja por alagação por enchimento de reservatório de hidrelétricas — é um dos principais riscos à biodiversidade. Ele diminui habitats e fortalece a eliminação de espécies de animais e plantas, alguns ainda nem descobertos

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pela ciência. O desflorestamento também fomenta atividades de biopirataria e, consorciado à ocupação humana indevida, aumenta os riscos de contaminação da água e a degradação do solo. A biodiversidade amazônica também está ameaçada atualmente pela não utilização de tratamento de esgoto por parte de populações que vivem e trabalham no bioma. Trata-se de um problema estrutural; nesse caso, em que a falta de governança e a inexistência de políticas públicas consistentes acarretam a repetição desse cenário em diversos ambientes do Norte brasileiro (ARAGONÉS e AMÉRIGO, 1991; BOURDIEU e CHAMPAGNE, 2001). Somando-se à falta de esgotamento, está o problema do descarte de resíduos orgânicos e inorgânicos, que são dispostos de maneira totalmente inadequada no meio ambiente. Em meio às diferentes ações, governamentais ou não, que podem ser executadas para mitigar os efeitos da fadiga à biodiversidade, está o mecanismo REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal, incluindo a garantia de melhores práticas sociais de conservação). O REDD+ foi criado em 2007 a partir de discussões globais em encontros da ONU (Organizações das Nações Unidas). Ele delimita valor econômico para a proteção de florestas e da biodiversidade, gerando receitas que financiem a transição para uma economia sustentável, com oportunidades de geração de renda à população.


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O REDD+, por seu modelo de execução, tem como meta a proteção ou o aumento da biomassa, independentemente da diversidade biológica registrada nas áreas onde o mecanismo é aplicado. Trata-se de uma sistemática de ação essencialmente direcionada à conservação da biodiversidade, mas sem excluir o apoio socioeconômico a populações. Nesse sentido, o REDD+ se caracteriza tanto pela preservação da fauna e flora quanto pelo auxílio à ocupação humana ordenada para o uso de recursos naturais. Projetos de conservação da biodiversidade que se utilizam de ações operadas via mecanismo REDD+ podem apresentar declínio ou elevação em suas atividades por conta de um efeito conhecido como vazamento. Este é definido como o aumento ou a diminuição das emissões de carbono fora dos limites de um projeto REDD+, que são direta ou indiretamente provocadas por esses projetos (FEARNSIDE, 2008; 2009). Em geral, pode-se entender que ocorre declínio das atividades de conservação da biodiversidade a partir do aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEEs), o que significa um problema para projetos REDD+ (YANAI, FEARNSIDE e GRAÇA, 2011). Partindo das premissas elaboradas, o artigo tem por objetivo descrever mecanismos que podem amenizar o problema mais comum em projetos REDD+: o do aumento das emissões a partir de vazamentos. O estudo foi orientado mediante análise de um programa piloto, denominado Projeto Trocano Araretama. Sobre o Projeto Trocano Araretama O Projeto Trocano Araretama (TA) é uma iniciativa que tem como meta modificar a vida dos rurais e ribeirinhos que moram em Borba (a 150 km de Manaus), município a sudeste do Estado do Amazonas, na região do rio Madeira, por meio da implementação do mecanismo REDD+, que possibilita arrecadação financeira à população local em favor de suas práticas tradicionais de uso da terra. O TA está em fase de validação e poderá ser implantado em Borba a partir do início do ano de 2013.

A partir do REDD+, o Trocano Araretama tem como proposta comercializar créditos de carbono oriundos do desmatamento não efetivado pelas populações do município. A sistematização da venda de emissões evitadas depende da valorização financeira por mecanismos de mercados, como ocorre em sistemas de bolsa de valores. A atividade está contemplada dentro do plano estadual de ações relacionadas a Serviços Ambientais no Estado do Amazonas. O plano tem sido discutido desde 2008, após o governo estadual instituir a Lei de Mudanças Climáticas, em 2007. As ações do projeto estão associadas a serviços ambientais, produção primária, saúde e infraestrutura. As atividades, segundo o plano de execução do Trocano Araretama, terão anuência dos moradores das comunidades de Borba por meio de representação de suas lideranças. De acordo com estimativa do TA, haverá ações de: a) treinamento para inventário florestal, florístico e faunístico, b) implantação de serviços para aproveitar o potencial turístico do município, c) educação ambiental, d) redução de entraves ligados a transporte e armazenamento da produção primária, e) fomento a tecnologias sociais de assistência comunitária e f) incentivo a atividades ligadas ao extrativismo, com o objetivo de garantir trabalho e renda com sustentabilidade para as comunidades por meio do uso racional de produtos da floresta. Metodologia Universo da pesquisa A zona estudada está inserida no município de Borba, Amazonas, Brasil (Figura 1). Na divisão geográfica atual, o município faz parte da 5ª sub-região do rio Madeira, que também é formada pelos municípios de Apuí, Humaitá, Manicoré e Novo Aripuanã. Distante 150 km de Manaus em linha reta e por via fluvial a 215 km, o lugar possui uma área territorial de 44.367,7 km². Além da sede do município, há cerca de 260 comunidades que formam Borba, contando-se a sede e os setores

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distritais do município, onde vivem aproximadamente 34,5 mil pessoas; dessas comunidades, 107 fazem parte da área investigada. Para o estudo, foram excluídas Terras Indígenas (TIs) contidas dentro do município de Borba. Três zonas, com uma extensão total de 1.346.541,26 ha, foram analisadas.

classificação e o posterior mapeamento a partir da imagem do Landsat TM5 serão realizados a partir da escolha das melhores bandas para as áreas em estudo. Para cada classificação supervisionada, sugere-se a apresentação de respostas significativas quanto à realidade do município. Os Softwares QuantumGIS e ARCGIS deverão ser utilizados para fazer os mapas do uso do solo e analisar as imagens e Shapes.

Figura 01 - Mapa da área do projeto e seus entornos. Fonte: IAL, 2011.

Procedimentos de coleta, verificações de monitoramento e análise Para descrever quais mecanismos podem amenizar o problema do aumento das emissões via vazamentos, deve-se realizar o monitoramento de biomassa mediante três metodologias. a) Um dos métodos é a análise de imagens dos satélites LANDSAT-5, sensor TM composição 5R, 4G, 3B, com 30 metros de resolução espacial, de modo que devem ser verificadas mudanças no uso do solo dessas áreas com imagens disponibilizadas pelo Instituo Nacional de Pesquisas Espaciais. É necessária a coleta de bandas do LAND SAT a partir da validação de um projeto tipo REDD+. A classificação da imagem deverá ser feita por meio do Maxver (Método da Máxima Verossimilhança). A definição das classes para a

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b) Outro procedimento a ser realizado deve levar em consideração o inventário de biomassa na área do projeto. Considera-se toda a biomassa (tronco, ramos e folhas) das árvores com diâmetros maiores de 1,0 cm. Uma distribuição de amostras deve ser realizada para cada tipo de vegetação e de ocupação (roçados, florestas secundárias e primárias). Toda a biomassa sobre o solo deve ser considerada e, no caso do subsolo, análises qualitativas serão efetivadas. A parte arbustiva e herbácea será representada pela biomassa sobre o solo, originária de arbustos com menos de 2,5 cm de diâmetro, de gramíneas e outras ervas. Para estimar a biomassa, sugere-se a marcação ao acaso de dois quadrantes de 1x1m dentro das parcelas de 4x25m ou de 5x100m. Necessita-se do corte de toda a biomassa ao nível do solo.


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c) O último procedimento a ser descrito no monitoramento de estoque se refere ao resultado de treinamento de comunitários e sábios (populações tradicionais) locais, que ocorre após a validação do REDD+. A partir dessa formação, sugerem-se contagens e coletas de amostras de flores, sementes, galhos e raízes de espécies, além de medidas de tamanho e DAP (diâmetro altura do peito) para caracterização da estruturação ecológica florística em função da mudança dos estoques de biomassa. Discussão A partir da identificação de agentes do desflorestamento, cada projeto REDD+ deverá propor atividades sociais que estimulem a economia comunitária no intuito de amenizar o aumento das emissões via vazamentos, como foi estudado por meio do projeto piloto Trocano Araretama. É importante enfatizar que as atividades sociais tendem a ser efetivadas em áreas de projetos REDD+ na medida em que o percurso metodológico para o monitoramento de estoques de GEEs descrito neste estudo seja cumprido. Mediante o case avaliado, do projeto TA, as propostas descritas são: 1. Fortalecimento da agricultura familiar, mediante implementação de ecotecnologias ou tecnologias sociais que facilitem o labor diário e aumentem a produtividade, diminuindo a dependência de abertura de novas áreas, como descrito em tópicos anteriores deste projeto. 2. Incentivo à pesca artesanal, criando ecorregiões que funcionem como áreas próprias para a reprodução de espécies e para a extensão do seguro defeso por mais períodos do ano, viabilizando uma menor dependência das comunidades ao pescado, até que os estoques críticos sejam repostos. 3. Treinamento em sistema de cooperativismo. 4. Implantação do processo de incubação de empresa para produtos sustentáveis da região da área do projeto.

5. Realização, por meio dos recursos oriundos da comercialização do carbono não emitido, de cursos de formação profissionalizante de pessoas para atuarem nessas comunidades, contribuindo para a diversificação das atividades econômicas. 6. Implantação de serviços de guardas florestais, com treinamento especializado de profissionais prioritariamente das comunidades das regiões do projeto TA, que atuarão em conjunto com os serviços de segurança da localidade, com as autorizações para esse serviço e em contato com as outras esferas de segurança pública. É importante ressaltar que a efetivação das atividades será em módulo consorciado, tendo em vista serem exercícios de incremento à economia e à sociedade. Há a possibilidade real de se amenizar o problema do aumento das emissões, entretanto os próprios agentes promotores desses vazamentos devem ser contemplados nos projetos REDD+ e incluídos socialmente. Considerações Diferentemente de outras propostas de mitigação, como as compensações diretas por bolsa com pagamento mensal ou anual e outras formas de pagamento, as mitigações propostas por essas ações vêm mostrando vantagens em relação ao consentimento e aos entendimentos das populações locais. Além disso, elas possibilitam a participação das comunidades envolvidas, favorecendo a interação de conhecimentos tradicionais e novas práticas de produção sustentáveis. Apesar desse horizonte positivo no que se refere à integração entre conhecimentos tradicionais e científicos, os mecanismos de redução de vazamentos descritos no estudo são de difícil comparação com as demais ações REDD+ na Amazônia. Isso ocorre porque o mercado de créditos de carbono é inexistente na Região, exceto pelas iniciativas voluntárias de Estado, como ocorre no Estado do Amazonas (Bolsa Floresta).

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A dificuldade de correlacionar ou de associar as análises relativas ao TA a outros projetos faz que parâmetros não sejam possíveis de disposição. Assim, por necessidade, estudos associativos ou correlacionais diferenciados são urgentes de serem praticados para além do que se objetivou executar neste estudo. Bibliografia ALBUQUERQUE, Francisco José Batista de. Psicologia social e formas de vida rural no Brasil. Psic.: Teor. e Pesq., jan./abr., vol.18, nº.1, p.37-42. 2002. ISSN 0102-3772. ARAGONÉS, Juan Ignácio & AMÉRIGO, Maria. Un estúdio empírico sobre las actitudes ambientales. Revista de Psicologia Social, 6, 223-240, 1991. BOURDIEU, Pierre. & CHAMPAGNE, Patrick. Os excluídos do interior. In: Bourdieu, P. (org.) A miséria do mundo. 4ª ed. Petrópolis: Vozes. 2001. YANAI, Aurora, FEARNSIDE, Philip. e GRAÇA, L. Desmatamento no sul do Amazonas: Simulação do efeito da criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Juma. PP. 6193-6200 In: J.C.N. Epiphanio & L.S. Galvão (eds.) Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Curitiba, Brasil, 2011. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), São José dos Campos, São Paulo, Brazil, 9268 pp. CD-ROM [http:// www.dsr.inpe.br/sbsr2011]. FEARNSIDE, Philip. O valor de áreas protegidas em evitar mudança climática na Amazônia. In: R. Wiegland, Jr. & A.L. Albernaz (Eds.) Atualização das Áreas Prioritárias para a Conservação, Uso Sustentável e Repartição dos Benefícios da Biodiversidade – Bioma Amazônia, Ministério do Meio Ambiente, Brasília, DF. pp. 8-11, 2008.

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FEARNSIDE, Philip. Estoques e fluxos de carbono na Amazônia como recursos naturais para geração de serviços ambientais. In: Buenafuente, S.M.F. (Eds.) Amazônia: Dinâmica do carbono e impactos socieconômicos e ambientais. Universidade Federal de Roraima, Boa Vista, Roraima, 2009. (http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/ Preprints/2009/ Fearnside-Estoques%20 e%20 fluxos%20de%20C-preprint.pdf). Acesso em 15/05/10 MARENGO, Antonio., NOBRE, Afonso., NOBRE, Carlos., TOMASELLA, Javier.; CARDOSO, M,. OYAMA, M. 2008. Hydro-climatic and ecological behaviour of the drought of Amazonia in 2005. Philosophical Transactions of the Royal Society of London. Biological Sciences 21: 1-6. TAJFEL, Henri. Grupos humanos e categorias sociais. Lisboa: Livros Horizonte, 1982. Renan Albuquerque Rodrigues é graduado em Jornalismo (UniNiltonLins), mestre em Psicologia (UFPB) e doutorando em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam). Atualmente é professor assistente da Ufam/Brasil. Antônio José do Nascimento Fernandes é graduado em Química (Ufam), mestre em Química de Produtos Naturais (Ufam) e doutorando em Físico-química (Ufam). Atualmente é coordenador de projetos socioambientais no Instituto Amazônia Livre/Brasil. Ramón Troitiño Cachafeiro é arquiteto e trabalha na empresa CGV/Palma de Mallorca/ Espanha. Rodrigo da Costa Lima é graduando em Gestão Ambiental (Ciesa). Trabalha como técnico de suporte no Instituto Amazônia Livre.


Artigo

Mobilidade urbana na Amazônia e emissão de CO2 para a atmosfera Geraldo Alves de Souza

Resumo No presente artigo, discute-se a relação existente entre mobilidade urbana e emissões de gás carbônico (CO2) para a atmosfera, tendo o Brasil como um todo e a Amazônia em particular como realidades da análise. Destaca-se o fato de que, a partir do desenvolvimento da indústria automobilística, iniciou-se um processo de dispersão da população urbana, reduzindo o número de habitantes por unidade de área (densidade demográfica). O aumento da extensão das viagens urbanas é apresentado como um dos principais aspectos que têm forçado o uso de modos motorizados de transporte da população urbana, com consequente aumento na emissão de Gases do Efeito Estufa – GEE para a atmosfera.

Introdução Aglomerar a população em espaços reduzidos é o modo mais eficiente para o atendimento das demandas das pessoas. Assim, as cidades devem ser, por excelência, sinônimo de densidade demográfica e eficiência no uso dos recursos. Nesse sentido, e ao contrario do que às vezes se pensa, a verticalização não é problema para as cidades; ela potencializa melhor o uso dos recursos no atendimento das demandas humanas. Em pouco mais de meio século, o Brasil passou de um país agrário, exportador de produtos agrícolas, para mais de oitenta por cento de sua população vivendo em áreas urbanas e com o setor industrial participando significativamente

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da pauta das exportações brasileiras. Essas transformações foram apoiadas na indústria automobilística, tanto para o transporte de cargas e passageiros em escala nacional, estadual e entre municípios, quanto na escala intraurbana. Outros modais, como o ferroviário, tiveram a sua participação reduzida à medida que a indústria automobilística se desenvolvia. Ao mesmo tempo que populações eram expulsas do campo pela mecanização da agricultura, as cidades (destino desses migrantes) passaram a registrar elevados índices de crescimento urbano. A pouca atenção do estado à expansão urbana, aliada à má distribuição de renda, fez que muito do espaço urbano produzido nesse período tivesse carecido de planejamento. A dispersão da população por uma periferia cada vez mais distante tornou a população dependente de modos rodoviários de transporte. Entende-se por efeito estufa a retenção de parte da energia solar que chega à superfície da Terra. Gases (dos quais o CO2 é um dos principais) presentes na atmosfera impedem que essa energia se perca no espaço sideral. Esse fator é de vital importância para a vida na Terra. Sem ele a temperatura média seria negativa, o que inviabilizaria a vida no planeta. Chama-se aquecimento global o fato de que, segundo estudos, a temperatura média do planeta Terra está aumentando por causa do aumento da concentração dos GEE na atmosfera. Como muitas ações humanas estão contribuindo para elevar essa concentração, decorre daí o esforço para contê-la. No presente trabalho, discute-se como o modelo de cidade que estamos construindo (e, em decorrência disso, a mobilidade urbana) contribui com os aumentos da concentração desses gases na atmosfera. Espraiamento das cidades A partir do desenvolvimento industrial brasileiro, principalmente a partir da década de 1960, o processo de expansão urbana tendeu para acompanhar o modelo norte-americano, com boa

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parte das viagens urbanas sendo realizadas em modais motorizados de transporte sobre pneus, notadamente ônibus e veículos particulares (automóveis e motocicletas). O transporte coletivo sobre trilhos, que marcou o início do transporte urbano em algumas cidades brasileiras, foi fortemente alterado com a chegada dos automóveis e dos ônibus. Ao contrário do antigo sistema, cujo processo de expansão era lento e pouco flexível, a facilidade na implantação de novas linhas de ônibus do transporte coletivo e certa facilidade de aquisição de veículos particulares encorajaram a população a se dispersar sobre manchas urbanas cada vez mais extensas. Se antes a expansão das cidades era contida pela capacidade das pessoas de vencer as distâncias a pé ou acompanhava as frentes de penetração dos trilhos, a nova realidade deixa para traz tudo isto, para avançar sobre o território indiscriminadamente. Os novos limites dos sítios urbanos passaram a ser estabelecidos em função dos interesses dos incorporadores imobiliários e do poder aquisitivo da população; não mais pelas dificuldades de deslocamentos das pessoas. Com as facilidades dos novos modos de transportes, as cidades passaram a expandir a mancha urbana em velocidade nunca antes registrada. Uma das consequências desse modelo de urbanização é o aumento das distâncias a serem percorridas, e consequentemente, o consumo de energia com transportes. Segundo Glaeser (2011), “o carro e o caminhão permitiram que pessoas e empresas, sedentas por espaço, abandonassem as densas áreas urbanas” em direção à periferia. Apesar de a expansão da mancha urbana provocar o aumento das distâncias e dos custos das viagens, as cidades não dão sinal de reconhecimento dessa relação e continuam a se expandirem ainda nos dias de hoje. Com a mobilidade de boa parte da população assentada em modos rodoviários motorizados de transportes, é inegável a contribuição das cidades na emissão de GEE, principalmente o CO2 resultante


Mobilidade urbana na Amazônia e emissão de CO2 para a atmosfera

da queima de combustíveis fósseis, tais como gasolina e diesel. O consumo de energia com a mobilidade urbana Dois conceitos importantes sobre questões urbanas são acessibilidade e mobilidade urbana. O primeiro refere-se à facilidade (ou não) de as pessoas terem acesso a pontos e/ou edificações do/no espaço urbano. Pode-se, nesse caso, referir-se a macro e microacessibilidade, sendo a primeira referente ao acesso a pontos do espaço urbano, e a segunda ao acesso às edificações. Já a mobilidade refere-se à facilidade (ou não) de as pessoas se movimentarem sobre o espaço urbano. A acessibilidade e a mobilidade são influenciadas por vários fatores, tais como o poder aquisitivo e as condições físicas das pessoas, a extensão das viagens, os modos disponíveis de transporte, as condições do sistema viário, os custos etc. Se se encontram em condições de escolher, as pessoas optam por um ou outro modo de transporte em função do conforto, dos custos, do tempo de duração das viagens etc. Com forte impacto sobre a mobilidade e a acessibilidade urbana, as calçadas têm sido negligenciadas pelos governos ao longo das últimas décadas no Brasil. Pouco tem sido feito para torná-las espaços adequados às caminhadas. Basta dizer que o principal imposto que o município cobra dos proprietários dos imóveis (Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU) é utilizado para a construção e a manutenção do sistema viário destinado à circulação dos automóveis. Já as calçadas são de responsabilidade dos proprietários dos imóveis. Acrescente-se o fato de que poucos são os municípios que disciplinam (do ponto de vista legal e da efetiva fiscalização) a construção e a manutenção das calçadas. À vontade, cada proprietário dá ao espaço à frente de seu imóvel o tratamento que lhe interessa. Com isso, a descontinuidade e a falta de padrão tornam esses espaços intrafegáveis. Boa parcela da população urbana (a de menor poder aquisitivo) não se encontra em condições de escolher o modo de transporte a ser utili-

zado. Isso ocorre por dois motivos principais: a) Inviabilidade das viagens a pé – quando as distâncias são consideravelmente longas, as viagens a pé tornam-se inviáveis em função do tempo necessário para vencê-las, pelo esforço a ser desprendido, pelas condições das calçadas, da segurança pública etc; e b) Poder aquisitivo – quando os custos de aquisição e de manutenção inviabilizam o uso de veículos particulares. Nesses casos as pessoas tornam-se cativas do transporte público urbano. Deseja-se, aqui, chamar a atenção para o fato de que o transporte público no Brasil não tem sido priorizado. “Os discursos oficiais jamais negam o apoio ao transporte público, mas são essencialmente retóricos: na prática, o que ocorre são políticas aplicadas há décadas, acompanhadas da celebração do fato de que uma crescente parcela da população agora tem acesso ao automóvel e à motocicleta” (VASCONCELLOS, 2012). Faz-se um investimento aqui, troca-se a frota de veículos ali, e a realidade continua a mesma. Poucos são os projetos implantados de modo definitivo. Uma cidade ou outra têm projeto baseado em ônibus com potencial para atender à demanda da população com perspectiva de duração de uma década ou duas. Mas na maioria delas são sistemas precários, impondo sobre seus usuários longas horas de penúria em seus deslocamentos diários. Esse descaso do poder público para com o transporte coletivo decorre do fato de que os usuários desse serviço são pessoas das classes mais pobres da sociedade. Com outras preocupações prioritárias, faltou-lhes poder de pressão para conquistar melhorias na prestação desse serviço. A atenção dos governos tem sido voltada para as demandas da classe média, principal esfera de sustentação política dos governos que se sucederam ao longo das últimas décadas. (Vasconcellos, 1998). Assim, ao estruturar e ao manter minimamente um sistema viário, o poder público tem atendido às necessidades dos proprietários de veículos particulares, ao mesmo tempo que permite o estabelecimento das linhas de ônibus. Apesar de muitas vezes precárias, é

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suficiente para atender à demanda dos usuários desse sistema de transporte. Como tem faltado atenção e consequentemente investimentos, o transporte coletivo no Brasil é sinônimo de desconforto, atraso, superlotação etc. O poder público municipal (responsável pela concessão, planejamento e fiscalização do serviço) continua extraindo receita do sistema, onerando, em última análise, a tarifa, o que recai sobre a população mais pobre de nossa sociedade – usuária cativa desse serviço. E, apesar dos avanços em tecnologias embarcadas, o transporte continua sendo prestado do modo tradicional. Em função disso, quando o poder econômico permite, as pessoas procuram evitá-lo, utilizando veículos particulares. Segundo Vasconcellos et al (2011), a distribuição modal das viagens urbanas em municípios brasileiros com mais de 60 mil habitantes é a seguinte: trilhos 3%; motos 3%; bicicletas 3%; ônibus 26%; automóveis 27% e viagens a pé 38%. Ainda segundo esses autores, no Brasil o ônibus responde por cerca de 90% das viagens urbanas realizadas por transporte coletivo. Os sistemas de transporte sobre trilhos (trem, Veículos Leves sobre Trilhos – VLT e Metrô) são mais eficientes que o transporte por ônibus e veículos particulares. No entanto, como visto, menos utilizados. Apesar do melhor desempenho dos sistemas sobre trilhos, justifica-se a tímida participação desses modais no transporte público urbano no Brasil em função dos prazos e dos custos de implantação, bem superiores aos de um sistema baseado em ônibus. Acrescente-se a essas desvantagens o fato de que a viabilidade econômica desses sistemas somente é atingida em trechos com alta demanda de passageiros. Como as cidades cresceram de modo muito horizontal, a demanda encontra-se dispersa em largas manchas urbanas, quase inviabilizando a implan-

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tação de sistemas mais eficientes. Para atender à demanda dispersa, os veículos particulares e o transporte público por ônibus acabam por ser os mais viáveis, apesar de menos eficientes. Esse uso, por sua vez, continua encorajando a expansão horizontal das cidades e, desse modo, dificultando a implantação de modos de maior capacidade. Tem-se, por conta disso, um círculo vicioso negativo em que a dispersão causada pelos modos rodoviários inviabiliza modos mais eficientes. Essa espiral negativa somente pode ser rompida com a decisão de governos municipais, estaduais e o federal de destinar recursos para a implantação de sistemas mais eficientes. O consumo de energia e consequentemente a emissão de CO2 com transportes urbanos estão diretamente relacionados com o adensamento da população. Segundo Carvalho (2011), ao se deslocar sobre o espaço urbano, o passageiro é responsável por emissões de CO2 para a atmosfera, cuja quantidade varia em função do modo de transporte utilizado. Se a viagem é realizada por metrô, a emissão é de cerca de 3,5 gramas de CO2 por quilômetro percorrido por pessoa, ou 16,0; 71,1 ou 126,8 se a viagem é realizada por ônibus, motocicleta ou automóvel, respectivamente. Cidades espraiadas tornam as viagens mais longas e aumentam a participação dos ônibus e dos veículos particulares na realização das viagens. No outro extremo, quando se tem altos índices de densidade demográfica, as viagens se tornam relativamente mais curtas. Como visto acima, a alta densidade favorece também a implantação de modos de transporte baseados em trilhos, bem mais eficientes que os modos rodoviários sobre pneus. Se o sistema viário é adequado, um percentual maior das viagens é realizado a pé ou por bicicletas, reduzindo as emissões. O Gráfico da Figura 01 mostra a relação direta que existe entre densidade demográfica urbana e o consumo de energia per capita com transportes.


Mobilidade urbana na Amazônia e emissão de CO2 para a atmosfera

Figura 01 – Relação entre a densidade demográfica e o consumo de energia para o transporte Fonte: BAKER e STEEMERS, apud STEEMERES, 2003.

Como dito anteriormente, a ausência de intervenção dos governos municipais (a quem compete estabelecer padrões e procedimentos para a expansão urbana, para o trânsito e o transporte urbanos) tem permitido um crescimento urbano sem planejamento em boa parte das cidades brasileiras. E, mesmo para aqueles casos em que a expansão obedeceu a critérios previamente estabelecidos (planejamento urbano), não tem sido priorizado o adensamento, resultando em bairros com baixa densidade demográfica. Esse modelo de cidade é sinônimo de ineficiência energética e contribui sobremaneira para os efeitos do aquecimento global. Como é possível observar, o consumo de energia per capita com transporte urbano cai sensivelmente com o aumento da densidade demográfica. Assim como em muitas cidades brasileiras, Manaus possui densidade demográfica abaixo de cinquenta habitantes por hectare, aproximando-se do padrão de urbanização norte-americana e bem abaixo do padrão europeu.

O uso do automóvel em viagens urbanas tem duas consequências sobre a qualidade de vida e sobre o ambiente urbano: a) Intenso uso do sistema viário para um baixo índice de ocupação dos veículos – essa ineficiência, além de comprometer o desempenho do transporte público por ônibus, gera congestionamentos de trânsito, imobiliza parte da população, que passa a ter dificuldade de atravessar as vias, e causa muitos acidentes, principalmente sobre os pedestres (atropelamentos); b) Consumo de energia e emissão de poluentes atmosféricos – maior consumo de combustíveis e maior quantidade de gases emitidos para a atmosfera. É preciso construir para cima para diminuir a contribuição das cidades para o efeito estufa. Mas o adensamento exige sistemas de transportes mais eficientes que os veículos particulares para as viagens urbanas. Um sistema de transporte público eficiente deve ser implantado antes (ou simultaneamente) à verticalização.

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Mobilidade urbana na Amazônia e emissão de CO2 para a atmosfera

Se a densidade demográfica de Manaus fosse atualmente da ordem de 200 hab/ha, a mancha urbana seria de um quarto do tamanho atual. Mais urbanizada e com a extensão das viagens bem mais curta que a média atual, as caminhadas passariam a ser mais seguras e confiáveis. A dependência dos modos rodoviários motorizados de transportes seria menor. Um sistema viário que encoraje o uso de bicicletas e caminhadas a pé reduz a dependência dos modos rodoviários motorizados de transportes e torna a cidade mais saudável e com menor índice de emissão de CO2 por passageiros por quilometro percorrido. Amazônia - Urbanização, Mobilidades e Emissões de CO2 No Brasil, segundo Carvalho (2011), as queimadas e o desmatamento são responsáveis por 76% das emissões de CO2, enquanto o setor de transporte corresponde a 9% dessas emissões. Do total do setor de transportes, 44% são emissões por caminhões, e 49% por veículos leves a gasolina, álcool e diesel. Os ônibus, que realizam 90% das viagens do transporte coletivo, emitem apenas 7% do total do setor. Nota-se, portanto, o elevado peso dos automóveis nas emissões de CO2, contrastando com a baixa participação desses veículos na realização das viagens urbanas. Apesar das diferenças existentes entre a economia das cinco regiões brasileiras, todas apresentam um elevado grau de urbanização.

Segundo os dados do censo demográfico do Instituto de Geografia e Estatística – IBGE (2010), o percentual de habitantes vivendo em áreas urbanas é: Nordeste 73,1%; Norte 73,5%; Sul 84,9%; Centro-oeste 88,8% e Sudeste 92,9%. A média nacional é de 84,4%. Internamente, a diferença na taxa de urbanização da Região Norte é semelhante ao que se verifica entre as regiões brasileiras, conforme pode ser observado na tabela 01. Na Amazônia, de cada quatro habitantes, três vivem em áreas urbanas. Como visto anteriormente, a urbanização é positiva para efeito de eficiência no uso dos recursos. Contudo, como no restante do País, também na Amazônia predomina a dispersão da população sobre o espaço urbano. Em Manaus, por exemplo, o número de habitantes por hectare caiu consideravelmente desde o início da implantação do projeto Zona Franca, passando de 112 para menos de 40 nos dias atuais. Nas grandes cidades da Região, a taxa de motorização acompanha a média nacional, assim como a taxa de ocupação dos veículos, que fica abaixo de 1,5 usuário por veículo em circulação. Em Manaus, há pontos da cidade em que, em horário de pico, mais de 90% do espaço viário são ocupados por veículos particulares. Tem-se, por conta disso, uma elevação na taxa de emissão de CO2 por pass/km.

ESTADO

URBANA

RURAL

TOTAL

PERCENTUAL DE URBANIZAÇÃO

ACRE

532.279

201.280

733.559

72,6

AMAZONAS

2.755.490

728.491

3.483.981

79,1

AMAPÁ

601.036

68.490

669.526

89,8

PARÁ

5.191.559

2.389.492

7.581.051

68,5

RONDÔNIA

1.149.180

413.229

1.562.409

73,6

RORAIMA

344.859

105.620

450.479

76,6

TOCANTINS

1.090.106

293.339

1.383.445

78,8

TOTAL

11.664.590

4.199.941

15.864.450

73,5

Tabela 01 – Região Norte: população urbana e rural e percentual de urbanização, 2010. Fonte: IBGE, Censo demográfico.

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Mobilidade urbana na Amazônia e emissão de CO2 para a atmosfera

A mobilidade urbana das cidades de pequeno porte do interior da Amazônia é menos dependente de automóveis e ônibus. Apesar disso, o modelo de produção do espaço urbano não difere do restante do País, ou seja, a mancha urbana destas cidades também apresenta dispersão. Nesses casos, impulsionadas pelo transporte sobre duas rodas – motocicletas e bicicletas. E, como visto anteriormente, a motocicleta é o segundo tipo de veículo que mais polui, perdendo apenas para o automóvel particular.

para as emissões de GEE. Debater esses assuntos pode colocar em pauta a necessidade de revisão da produção de cidades e, por consequência, da mobilidade urbana.

Considerações Finais No presente trabalho, buscou-se analisar alguns aspectos sobre o modelo de produção do espaço urbano no Brasil, a partir desenvolvimento da industrial automobilística, e suas consequências sobre a mobilidade e sobre as emissões de CO2 com transporte urbano. Como visto, desde o início da implantação da indústria automobilística, a matriz de transporte como um todo e em especial a de passageiros urbanos foram profundamente alteradas, reduzindo-se a participação dos sistemas de transporte urbano sobre trilhos.

CARVALHO, Carlos H. R. Emissões relativas de poluentes do transporte motorizado de passageiros nos grandes centros urbanos. Brasília: IPEA, 2011. (Texto para discussão 1606)

A dispersão da população foi motivada pelo uso de transportes rodoviários motorizados, alargando a mancha urbana das cidades. Esse modelo tornou a população dependente desses sistemas de transporte para a realização das viagens urbanas. Viu-se também que, apesar de realizarem menos de um terço das viagens urbanas, os veículos particulares são responsáveis pela metade das emissões de CO2 do setor de transportes. Apesar das singularidades regionais, o modelo de urbanização da Amazônia segue o do restante do País, com o transporte sobre duas rodas predominando em cidades de pequeno porte. Apesar de as questões ambientais ocuparem boa parte da pauta dos debates atuais, parece não haver clara compreensão da população sobre os aspectos negativos desse modelo de urbanização

Bibliografia BAKER, N e STEEMERS, K. Energy and environment in architecture: a technical design guide. Apud STEEMERS, K. Energy and the city: density, buildings and transport. Energy and buildings 35 (2003) 3-14

GLAESER, E. L. Os centros urbanos: a maior invenção da humanidade – como as cidades nos tornam mais ricos, inteligentes, saudáveis e felizes. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. VASCONCELLOS, E. A. Transporte, espaço e equidade – análises das políticas públicas. São Paulo: NetPress, 1998. ______. O transporte urbano no Brasil. Le monde diplimatique. Ano 5 / Número 59. 2012. ______; CARVALHO, C. H. R e PEREIRA, R. H. M. Transporte e mobilidade urbana. Brasília, IPEA, 2011. Geraldo Alves de Souza Doutor em Planejamento de Transporte – COPPE/UFRJ, Professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Amazonas, Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Geografia – Mestrado em Geografia. (geraldoalvesmanaus@gmail.com)

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Artigo

A mudança da matriz energética e o potencial impacto dos NOx na atmosfera urbana da cidade de Manaus Ilsa Valois, Elizabeth Cartaxo e Jamal Chaar Resumo Ao contrário de outras regiões do Brasil, a energia produzida no Estado do Amazonas é principalmente de geração térmica. Isso transforma o Estado no maior sistema isolado de energia do País, crescendo em todo o seu território o número de usinas, especialmente na capital, Manaus. Consequentemente, a cidade convive com o uso crescente de combustível e de energia. A questão que aqui se discute é a mudança da matriz energética com o uso do gás natural proveniente de Urucu para substituir os combustíveis líquidos derivados do petróleo, que ainda são utilizados hoje. Com a mudança, haverá menor consumo de óleo combustível e uma consequente redução na emissão de monóxido de carbono para a atmosfera. Esse fato não exclui a preocupação com a qualidade do ar na cidade, pois o gás natural, como qualquer outra fonte de energia, gera impactos ambientais os quais precisam de controle e de monitoração. Os Óxidos de Nitrogênio (NOx) que resultam das elevadas temperaturas da combustão são graves poluentes atmosféricos, e a falta de uma política de controle de emissões conduz à ignorância dos impactos que o desenvolvimento tem sobre o ambiente e a população.

O gás natural, como qualquer outra fonte energética, gera impactos ambientais em razão das altas temperaturas desenvolvidas na combustão. Esta nem sempre ocorre com oxigênio puro, e sim com o ar, que contém 78% de nitrogênio; e, nessas condições, os gases nitrogênio e oxigênio reagem formando óxidos de nitrogênio, independentemente do tipo de combustível utilizado ou da sua composição.

Palavras-chave: Energia. Poluição do ar. Aquecimento global. Medições atmosféricas.

Reações fotoquímicas Moléculas com dipolos eletromagnéticos oscilam e vibram naturalmente em torno das suas ligações. Se a frequência vibracional da molécula coincidir com a frequência da radiação IR incidente, poderá ocorrer ressonância entre a ligação e a absorção da radiação, transferindo a energia da radiação para a molécula. A vibração natural da molécula sofre, com isso, uma variação na sua amplitude, sem, contudo, alterar a frequência da vibração molecular. [2,3]

Introdução Devido ao isolamento da Região Amazônica, 80% da energia consumida em Manaus têm origem da queima de combustíveis fósseis. Em consequência, a concentração da população na capital intensifica a emissão dos poluentes.

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Talvez os fenômenos mais importantes que ocorram na atmosfera sejam as reações fotoquímicas, abordadas no item 2 deste trabalho, pois alguns gases possuem moléculas capazes de interagir com a radiação IR (infra-red) levando a um aumento da temperatura no sistema TerraAtmosfera. A mudança da matriz energética é uma outra questão, discutida no item 3, destacando-se a preocupação com a poluição, que parece diluir-se no conceito popular e político da sociedade. Sem controle e sem monitoramento, desprezam-se as verdadeiras causas da poluição, que, segundo o pensamento ambientalista, “é uma questão de baixa eficiência no aproveitamento das matérias-primas dos processos produtivos” [1].


A mudança da matriz energética e o potencial impacto dos NOx na atmosfera urbana da cidade de Manaus

Ao absorver energia de frequência característica, a molécula é eletronicamente ativada, voltando, eventualmente, ao estado fundamental por meio da relaxação e da redistribuição da energia absorvida, ou da sua conversão em calor. No estado excitado as moléculas podem participar de reações químicas resultando em novas espécies. Dessa forma, são produzidos, na atmosfera, alguns poluentes secundários. [4, 5] É o caso, por exemplo, das reações entre os óxidos de nitrogênio (NOx) e os hidrocarbonetos, que levam à produção do ozônio, aldeídos, nitratos, ácido nítrico (responsável pela chuva ácida), além de outros oxidantes fotoquímicos. Na atmosfera, os NOx se formam naturalmente por descargas elétricas ou são provenientes do solo, devido às transformações microbianas. A contribuição antropogênica dos NOx é devida, principalmente, aos processos de combustão tanto nas descargas dos veículos quanto nas chaminés das usinas. O óxido nítrico formado (NO) é rapidamente oxidado a dióxido de nitrogênio (NO2) o qual sofre fotólise (dissociação da molécula pela absorção de um fóton) produzindo oxigênio atômico muito reativo (equações 1,2 e 3). [4, 5] Além de ser o principal participante do processo de formação do smog, o NO2 na atmosfera poluN2 + O2 → 2 NO (1) 2NO2 + hv →NO2* (2) (3) 2NO2*→ NO + O O2 + O + M → O3 + M* (4) NO + O3 → NO2 + O2 (5) ída é uma das espécies fotoquimicamente mais ativas, sendo um dos responsáveis pelo aumento das concentrações do ozônio troposférico. Numa atmosfera pura, tem-se um estado fotoequilibrado, isto é, as concentrações de O3 no ar alcançam um estado estável sendo mantidas e controladas pela velocidade das reações fotoquímicas (equações 4 e 5). Esse estado de equilíbrio, porém, pode ser rompido devido às reações do NO com os hidrocarbonetos provenientes da evaporação dos combustíveis fósseis, principalmente os

hidrocarbonetos com dupla ligação, que podem adicionar-se aos radicais livres formados, capazes de oxidar o NO sem consumir o O3, portanto antes do NO2 ser regenerado. [6, 7] Quando, na atmosfera, estão presentes os compostos orgânicos voláteis (COVs), o NO reage preferencialmente com eles, e não com o ozônio. Além de o ozônio não ser consumido, formam-se, adicionalmente, compostos muito reativos, conhecidos como peroxiacetil nitratos (PAN), (CH3 –(CO)–O–O–NO2). [6, 7]

COVs + NO + hv → HNO3 + PAN A realidade local O aumento no consumo de combustíveis fósseis torna a presença de hidrocarbonetos e outros compostos orgânicos voláteis na troposfera cada vez mais comum. Por esse motivo, na baixa atmosfera de algumas cidades brasileiras, a concentração de ozônio tem alcançado níveis elevados, geralmente excedendo as concentrações permitidas em áreas urbanas. Manaus ajusta-se às condições que favorecem a formação do smog fotoquímico (tráfego intenso de veículos; temperaturas e luminosidade elevadas e pouco movimento das massas de ar), principalmente nos meses mais quentes de agosto e setembro. Com uma área de 11.401 km2, uma população de 1.802.525 habitantes e com o interior do Estado extremamente rarefeito, a capital revela uma enorme concentração populacional e um fluxo de veículos intenso em todas as épocas do ano, o que deve favorecer a evaporação. Além dessas características, Manaus apresenta temperaturas que chegam a atingir mais de 40o C nos meses mais secos, e a forte incidência dos raios solares fornece a energia necessária às reações. Por fim, a pequena movimentação relativa das massas de ar dificulta a dispersão dos poluentes. [8, 9] A nova Matriz Energética As usinas termelétricas, baseadas na queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás), no

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mundo inteiro, têm sido grandes responsáveis, embora não sejam as únicas, pelo aumento antrópico da concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera. Por outro lado, a lógica produtivista determinada por fatores econômicos desestimula a disseminação das fontes de energia “ambientalmente corretas” de forma a impulsionar a chamada “economia dos combustíveis fósseis”. [10] No Amazonas, apesar da rica biodiversidade, essa é uma realidade agravante, pois, considerando o isolamento geográfico, a expansão do setor significa maior consumo daqueles combustíveis e maior produção de gases poluentes. Uma alternativa que permita desenvolver o interior do Estado, descentralizando as atividades econômicas no município de Manaus, é o aproveitamento do gás natural proveniente de Urucu (AM) para a produção de energia em larga escala. A redução dos custos de produção, a combustão mais limpa, considerando a emissão do principal gás do efeito estufa, e a densidade menor que a do ar são importantes vantagens do uso do gás natural. Essas vantagens, no entanto, não devem descartar a preocupação com o problema da poluição atmosférica, permitindo que as usinas termelétricas movidas a gás natural sejam vistas como solução para um desenvolvimento limpo e sustentável e desestimulando investimentos em novas tecnologias e no aperfeiçoamento de tecnologias mais limpas. Embora se considere que os níveis de emissão podem ser inferiores aos emitidos pela queima do óleo combustível, o aumento da intensidade energética há de potencializar os impactos ao ambiente, além de intensificar a participação das emissões fugitivas de metano, que é um gás com potencial de aquecimento muito maior do que o CO2. [11] Parte experimental O projeto ENERAR (Monitoramento da Qualidade Ambiental do Ar no Entorno das Usinas

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Termelétricas do Amazonas), aprovado pelo Edital CT-AMAZÔNIA/MCT/CNPq nº 27/2005 e executado pela Universidade Federal do Amazonas, deu o primeiro passo para a análise da qualidade do ar na cidade de Manaus. Para medir as emissões dispersas na atmosfera, dentro da área de interferência do maior complexo termelétrico do País, a UTE-Mauá, foi instalada uma EMQA (Estação de Monitoramento da Qualidade do Ar), distante, precisamente, 1.715,37 m da usina. O clima da cidade, de dezembro a junho, é favorável à dispersão dos poluentes, pois a umidade do ar e a ocorrência de chuvas frequentes, nesse período, interferem no tempo de residência dos gases na atmosfera. São altos os valores de energia que incidem sobre a superfície, razão pela qual a temperatura do ar não sofre grandes variações ao longo do ano, consequentemente interferindo nos fenômenos atmosféricos de maneira constante. As medições foram iniciadas em fevereiro de 2011, e os primeiros resultados obtidos para o NO2, apesar das condições climáticas favoráveis à dispersão, demonstraram alguns episódios de ultrapassagem dos padrões estabelecidos pela Resolução CONAMA 03/90, de 320 μg/m3 ou 170,08 ppb. (Figura 01) Nos dois dias em que houve ultrapassagem dos padrões de emissão de NO2, o nível de

Figura 1: Emissões de NO2 no mês de fevereiro/2011

precipitação foi zero. Esse fato reforça a tese de que as frequentes chuvas que ocorrem na Região favorecem a purificação da atmosfera. Ao mesmo tempo deixam um alerta para os dias


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secos que ocorrem geralmente a partir de julho e se prolongam pelo “farto verão” amazônico até novembro. Em março, com medições apenas nos dez primeiros dias, verificou-se que as ultrapassagens se repetiram nos dias 1,2 e 10 como demonstra o Figura 02. No mês de abril a estação não registrou nenhum

Figura 03: Emissões de NO2 e nível de precipitação no mês de maio

Se compararmos as duas curvas do gráfico (poluente medido e precipitação), veremos que existe uma correlação entre os dias chuvosos e a menor presença do poluente na atmosfera.

Figura 02: Emissões de NO2 no mês de março

episódio de ultrapassagem, mas, no dia 19, a concentração de NO2 medida chegou a 169,88 ppb, bem próxima ao padrão legal. Um maior volume de chuvas deve ter contribuído para que não ocorressem anormalidades nesse mês, que, tradicionalmente, é um dos meses mais chuvosos na cidade de Manaus. Finalmente, em maio, como demonstrado na Figura 03, as emissões nos dias primeiro e 26 novamente superaram os 170 μg/m3.

Conclusão No Brasil de dimensões continentais, a disponibilidade dos combustíveis fósseis tem sido fundamental para o desenvolvimento das pequenas localidades isoladas cuja realidade difere dos grandes centros, no clima, na geografia, na cultura, nos costumes e até na forma de adaptação e de interação com a natureza. No caso específico do Amazonas o problema não se encerra com a mudança da matriz energética. O gás natural é menos poluente que o petróleo e o carvão, mas não existirá saída energética para um mundo mais sustentável se a humanidade continuar delapidando as reservas e provocando danos ambientais irreversíveis, sem buscar alternativas.

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Os dados apresentados pelo projeto ENERAR chamam atenção para a urgência de políticas ambientais voltadas para o monitoramento e o controle das emissões, pois mesmo os padrões mais tolerantes da legislação brasileira foram excedidos em alguns dias. Esta pesquisa significou um passo importante na política de gestão ambiental do ar atmosférico devendo complementar futuros estudos sobre a poluição do ar na capital amazônica. Bibliografia [1] D. O. Martins. “Estudo do controle de emissões de compostos orgânicos voláteis em tanques de armazenamento de produtos químicos”. Universidade Federal da Bahia. Escola Politécnica. Dpto. de Engenharia Ambiental, Salvador, 2004. Dissertação de Mestrado. [2] J. C. Rocha, A. H. Rosa e A. A. Cardoso. “Introdução à Química Ambiental”, Porto Alegre: Bookman, 2004. [3] Séamus Higson. “Química Analítica”. São Paulo: McGraw-Hill, 2009. 454p. [4] C. Baird. “Química Ambiental”, 2ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2002. [5] R. Garcia. “Combustível e combustão industrial”. Rio de Janeiro: Interciência, 2002. [6] S. Manahan. “Environmental Chemistry”. United States of America: CRC Press, 2005. [7] T. Spiro; W. Stigliani. “Química Ambiental”. São Paulo: Pearson, 2009. [8] IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: http://www. ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/ estimativa2009/estimativa.shtm. Acesso em 20.09.2010. [9] INMET, Instituto Nacional de Meteorologia. Ministério de Agricultura, Pecuária e

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Abastecimento. Disponível em: http:// www.inmet.gov.br/html/observacoes.php. Acesso em: 13.06.2011. [10] SIMIONI, Carlos Alberto. “O uso da energia renovável sustentável na matriz energética brasileira: obstáculos para o planejamento e ampliação de políticas sustentáveis”. Programa de Doutorado em Meio Ambiente. Universidade Federal do Paraná. [11] L. S. Ribeiro, “O impacto do gás natural nas emissões de gases de efeito estufa: o caso do município do Rio de Janeiro”. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ, Programa de Pós-Graduação de Engenharia. Rio de Janeiro, março, 2003. Ilsa Valois: graduada em Licenciatura Química; Mestra em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade da Amazônia; Doutoranda em Química Analítica pela UFAM; Pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de Energia, Meio Ambiente e Água (NIEMA). Áreas de atuação: eficiência e conservação de energia, educação ambiental e química da atmosfera. (ivalois@ufam.edu.br) Elizabeth Cartaxo: graduada e mestra em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal de Campina Grande/PB; Doutora em Planejamento Energético pela Universidade Estadual de Campinas; Professora de Engenharia Elétrica da graduação em Engenharia Elétrica e do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Recursos Naturais da UFAM; Coordenadora do NIEMA. (ecartaxo@ufam.edu.br) Jamal Chaar: graduado em Bacharelado em Química pela UFAM; Mestre e Doutor em Ciências (Química-Química Analítica) pela Universidade de São Paulo. Professor Associado da UFAM. Áreas de Atuação: óleos vegetais, óleos essenciais e fixos, combustíveis renováveis e combustíveis derivados do petróleo e química ambiental. (jchaar@ufam.edu.br)


Artigo

Métodos de avaliação: instrumentos

para políticas em CT&I

Renilson Rodrigues da Silva

Resumo Este artigo tem como objetivo apresentar e discutir os principais métodos de avaliação de políticas de Ciência Tecnologia e Inovação (CT&I).A avaliação permite determinar se a política atingiu seu público-alvo, se teve o efeito almejado, qual seu retorno econômico e se os recursos foram gastos do modo eficiente. Na tentativa de produzir resultados que convirjam, cada vez mais, para a eficiência alocativa dos recursos e para a eficácia das políticas, os métodos de avaliação têm sido aprimorados e aplicados continuamente. Desse modo, são destacados neste trabalho os métodos mais amplamente utilizados como estudo de caso, estatístico-econométrico, benefício-custo e as possíveis aplicações às políticas de CT&I no Estado do Amazonas.

Introdução A abertura comercial brasileira, ocorrida no início dos anos 90, exigiu uma ampla modernização do parque tecnológico das indústrias nacionais. No intuito de torná-las mais competitivas e adequar a economia brasileira ao contexto mundial, o governo federal intensificou as políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). Assim, foi promulgada a Lei n.º 8.248, de 1991, a conhecida Lei de Informática, seguida de outras leis e de vários programas de apoio à inovação. Desde então as políticas de CT&I vêm se fortalecendo e se consolidando como um vigoroso instrumento de promoção da competitividade das empresas, geração de empregos, qualificação da mão de obra, entre outros.As políticas abrangem, basicamente, incentivos fiscais, linhas de crédito e subvenções econômicas.

Palavras-chave: Métodos de avaliação. CT&I. Políticas em CT&I.

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No Brasil, os principais agentes de apoio às políticas de CT&I são o CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), a FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos) e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). No entanto praticamente todos os estados brasileiros têm suas próprias agências, como é o caso da FAPEAM (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas), no Estado do Amazonas. Os programas dessas instituições são essenciais para o desenvolvimento socioeconômico do País. Em função da importância que lhes é atribuída, torna-se fundamental saber se essas políticas de CT&I realmente alcançam os resultados esperados. Ou seja, elas precisam ser avaliadas, mas para isso é precisa a aplicação de rigorosos métodos de avaliação, discutidos neste artigo. As políticas de CT&I requerem vultosas aplicações dos recursos públicos, que por sua vez são escassos. Consequentemente, é essencial conhecer seus impactos sobre os beneficiários, isto é, sua eficiência e sua eficácia, tanto para a sociedade comum quanto para os tomadores de decisão. Faz-se necessário contar com a evidência sobre aquilo que funciona, de modo a eliminar as políticas de má qualidade. A melhoria implica desenhar um programa que atenda às condições de elegibilidade, aos benefícios e que seja operado com eficiência e com focalização. Assim, com intuito de apresentar alguns métodos para avaliar políticas de CT&I, este artigo apresenta uma contextualização desses métodos na próxima seção. Na seção 3 é feita uma abordagem sobre as formas e os métodos de avaliação mais utilizados; em seguida, na seção 4, comenta-se sobre a importância da avaliação para o Amazonas; e, na última seção, as considerações finais do trabalho. Os métodos de avaliação em contexto Muitos dos métodos aqui abordados derivam daqueles empregados na avaliação de programas sociais, como Bolsa Floresta, Bolsa Família, Ronda no Bairro etc. Entretanto, diferentemente dos programas sociais, que têm um foco específico, as políticas de CT&I surtem efeitos variados e requerem avaliações, por exemplo, do impacto

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sobre as práticas de negócios, produtividade, entre outros. Adicionalmente, as políticas CT&I têm fortes componentes de incerteza que precisam ser considerados. De acordo com Perrin (2002), os casos de sucesso em políticas de CT&I são as exceções, e não a regra. A maior parte das atividades inovadoras fracassa por definição. Se o fracasso não acontece, significa que essas atividades não exploraram o desconhecido, logo não inovaram. O sucesso, contudo, vem do processo de aprendizado com os erros. Por essas razões, a avaliação de CT&I requer cuidados extras quanto ao método a ser utilizado. Os métodos quantitativos, por exemplo, dependendo do caso, não podem ser aplicados isoladamente. É precisa uma combinação de métodos qualitativos e quantitativos. Conforme esse autor, em CT&I, aplica-se o conhecido princípio de Pareto, em que 80% dos benefícios de uma política de CT&I provêm de 20% dos projetos inovadores, e 20% dos projetos de inovação são responsáveis por 80% dos problemas. Em outras palavras, 20% das atividades inovadoras funcionarão de acordo com o esperado, enquanto os 80% restante fracassarão. Todavia o princípio de Pareto pode não ser aplicável a todos os casos. A verificação ocorrerá por meio da avaliação. Nos estudos de avaliação em CT&I, não há uma metodologia única. O processo em si tem múltiplas dimensões, e por isso não há um método que possa ser definido como melhor que os outros. Alguns dos impactos podem ser captados a partir das estatísticas dos órgãos competentes, de relatórios das empresas. Outros, no entanto, podem requerer uma pesquisa de campo. Alguns podem representar o caso de um fenômeno observável; outros podem ser uma questão de julgamento subjetivo. Há situações em que são tratadas experiências individuais; em outras, organizacionais, e assim por diante. Essa diversidade de casos conduz a uma ampla gama de métodos disponíveis. Um método de avaliação envolve um conjunto de técnicas quevão da coleta dos dados à análise final dos resultados. Uma avaliação, conforme discutido adiante, pode ser feita a


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priori, durante a execução da política, ou a posteriori. Seja qual for a temporalidade, haverá aspectos multidimensionais nesse processo. Um método pode ser aplicado a priori e a posteriori, da mesma forma que pode requer dados que foram coletados via outro método. O survey, por exemplo, é um método que, além de permitir a geração de dados, pode ser usado no método de benchmarking. Este, por sua vez, pode fazer parte de um grupo de controle em que serão aplicadas técnicas econométricas para determinar o efeito de uma determinada política de CT&I. Ou seja, não há um passo a passo em relação à aplicação dos métodos, mas sim grande flexibilidade de manipulação deles, que variará de acordo com os objetivos previamente definidos. Como outro exemplo da multidimensionalidade dos métodos, pode-se citar o caso dos programas de bolsas de mestrado e doutorado. Para avaliar seus efeitos, podem ser aplicados vários métodos. Primeiramente, pode-se aplicar um survey para identificar o nível de renda de quem se beneficiou, qual a atividade econômica dos beneficiados, entre outras questões. A partir do survey, podem-se aplicar métodos econométricos para comparar os efeitos sobre quem se beneficiou e quem não se beneficiou do programa. Ainda, podem-se simular as condições socioeconômicas do Estado do Amazonas caso o programa não tivesse sido implantando e, a partir disso, dimensionar sua importância para o desenvolvimento da Região. Enfim, há vários aspectos de uma única política que podem ser avaliados com aplicações de diferentes métodos. A avaliação pode ser quantitativa ou qualitativa. A análise quantitativa envolve os métodos estatísticos para organização e visualização dos dados. A análise qualitativa, por outro lado, transforma as pesquisas de campos, sobretudo as entrevistas, em ricos instrumentos de avaliação. A análise quantitativa é um meio robusto de expressar os impactos de uma política de CT&I. Tem a grande vantagem de ser expressa em valores, os quais podem ser monetários, conforme requer a análise de custo-benefício, por exemplo. Já os dados qualitativos podem oferecer um panorama das experiências alcançadas nos programas.

Frechtling e Laure (1997) argumentam que a análise puramente quantitativa pode não ser apropriada para algumas políticas de CT&I. Um programa de incentivos para a formação de um arranjo produtivo local (APL) é um exemplo. Qualquer mudança no volume e na qualidade das ligações entre os agentes do APL pode requerer a análise dessa interação com uma abordagem mista, a qual inclui pesquisa de campo, entrevistas e mapeamento da rede. Temporalidade dos métodos de avaliação de políticas em CT&I A avaliação de políticas de CT&I pode ser feita antes de ele ser implantado (ex ante), pode ser em tempo real - portanto de monitoramento do programa -, como pode ser posterior à implantação do programa (ex post). As circunstâncias em cada um desses momentos diferem bastante. Em razão disso, os dados podem requerer métodos diferenciados para avaliação. Na avaliação ex ante, pode ser que não haja dados disponíveis para análise, a menos que eles tenham sido construídos ou projetados em uma etapa anterior à construção da política. A avaliação em tempo real pode usar os dados que são disponibilizados durante a execução do programa, mas há uma defasagem no tempo, a qual dificultaria a análise. Na avaliação ex post, por sua vez, usam-se os dados passados para dimensionar o impacto do programa. Essa é a forma mais comum de avaliação. Métodos de avaliação a priori (ex ante) A avaliação ex ante é aplicada quando se pretende conhecer os riscos da implantação de uma política, os impactos socioeconômicos e ambientais que esta irá gerar, o volume de investimentos necessário, o alvo da política de intervenção, entre outros aspectos. Como não há disponibilidades de dados para avaliação de impacto, em geral, aplicam-se os métodos de modelagem e de simulação e o método de custo-benefício. Modelagem e simulação Trata-se de métodos quantitativos para a estimação dos prováveis impactos em termos de benefícios econômicos. Com a modelagem e a si-

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mulação, constroem-se cenários baseados em variáveis existentes. Simula-se a mudança de uma ou mais variáveis-chave, como o crescimento do PIB, por exemplo, e verifica-se qual a resposta da política de CT&I a essa mudança. Os modelos podem ser utilizados para estimar o número de empresas que pode ser alcançado por uma política de CT&I e a quantidade ou o tipo de mudança que se espera no seu comportamento, por exemplo. Em agências como as FAP’s (Fundações de Amparo a Pesquisas),em que se usam vários programas de apoio à inovação, podem-se criar modelos baseados na análise custo-benefício ou com abordagem econométrica. A análise custo-benefício(C-B) Essa metodologia é fundamentada no princípio de que uma política pode ser avaliada em termos de classes de benefícios e custos a ela associados. Os custos e os benefícios são apurados em valores monetários. A partir desses valores, avaliam-se, aritmeticamente, os méritos relativos de diferentes políticas de CT&I, bem como sua eficiência global. O método pode ser aplicado tanto em análise ex ante quanto em ex post. Porém, para EuropeanComission (2002), esse método tem mais aplicabilidade na avaliação ex ante. A análise C-B é uma ferramenta útil para o desenvolvimento de políticas de sucesso, sendo mais importante que a exatidão com que se apuram os custos e os benefícios a posteriori. Em contrapartida, a posteriori, a análise de custo-benefício não é o melhor método para se avaliar a exatidão das estimativas ex ante, mas sim uma fonte de conhecimento para políticas futuras. A European Comission (2002) afirma ainda que a análise de custo-benefício não se restringe apenas à construção de planilhas com resultados finais. Ela pode ser muito útil na compreensão das principais fontes de incertezas. Métodos de avaliação a posteriori (ex post) Os métodos utilizados na avaliação de tempo real e ex post são basicamente os mesmos, pois ambos oferecem a possibilidade de se avaliarem os impactos da política. Os métodos podem ser quantitativos ou qualitativos. Os quantitativos incluem análise estatística, econométrica, modelagem macro e microeconômica, análise

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da produtividade e de grupos de controle. Os qualitativos ou semiquantitativos podem ser entrevistas e estudos de casos, análise de custo-benefício e análise de rede.

Survey de inovação e benchmarking Este método oferece dados básicos para descrever o processo de inovação. Trata-se de uma pesquisa que pode ser feita por entrevistas ou questionários que contenham perguntas sobre a atividade, planos, relacionamentos, realizações, valores etc. Os dados obtidos podem ser resumidos com o uso da estatística descritiva. O benchmarking, por outro lado, permite a comparação entre conjuntos de entidades, baseados em conjunto de indicadores e acompanhados de uma explicação fundamentada dos valores obtidos. É um método que pode ser muito útil quando aplicado a uma política de CT&I em diferentes áreas geográficas, por exemplo. Análise econométrica Econometria é um segmento da economia em que se estimam, empiricamente, relações econômicas usando modelos matemáticos para estruturar essas relações. Aplicam-se métodos estatísticos para analisar os dados, estimar parâmetros e interpretar as forças da evidência de uma hipótese examinada com base em uma teoria econômica. Dessa forma, a econometria inclui a construção de modelos, estimação, teste de hipótese e análise extensiva dos dados à luz da teoria. Os métodos empregam muitas técnicas, que podem variar de acordo com o conjunto de dados disponíveis. Um exemplo de uma possível relação que pode ser testada é um aumento do número de patentes pelas firmas em uma dada indústria e o valor dos recursos do governo federal destinados aos programas de P&D. Uma equação de regressão poderia ser usada para prever, por exemplo, a mudança no número de patentes para cada real a mais ou a menos investido em pesquisa. É importante notar que a regressão não representa a prova final da relação causa e efeito. A análise é apenas uma indicação de como ou em que medida as variáveis estão associadas umas às outras.


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Os avaliadores podem, também, utilizar análise econométrica para estimar uma função de produção, isto é, a relação matemática entre insumos e produtos. Por meio de uma função de produção, pode-se determinar o quanto a produção está aumentando ou diminuindo como resultado de alguma inovação feita na linha de montagem ou de um treinamento oferecido aos funcionários. Ou seja, é possível medir o aumento/diminuição na produtividade da empresa dada uma mudança nos fatores de produção que podem, ou não, ser resultados de um processo inovador.A grande vantagem dos métodos econométricos é que estes contribuem para um entendimento das relações entre causa e efeito em face da complexidade e das imperfeições dos dados. A desvantagem é que eles não são de fáceis aplicações, requerendo profissionais especializados. Estudo de caso Visto que o processo de inovação tem componentes de fracasso e sucesso, o método de estudo de caso torna-se bastante apropriado para avaliá-lo. Esse método permite explorar e identificar as causas dos êxitos ou fracassos aparentes da inovação e o que pode ser aprendido de cada um deles. Trata-se de um exame detalhado de um fenômeno que se está observando. Ou seja, é a análise de como uma política de CT&I está afetando uma empresa ou uma organização. Notadamente, os estudos de casos vão além de uma simples coleta de informações. É necessária a alocação adequada de recursos de modo que permita a análise dos dados e a consolidação dos resultados para facilitar a tomada de decisão. Os resultados precisam ser explorados para que se compreendam as causas e os efeitos da política e sejam amplamente divulgados para todos os agentes (RUEGG, 2003). Há diversos tipos de estudos de caso, os quais exploram diferentes aspectos de uma política. Em geral, podem ser descritivos ou de estimação econômica. Os estudos de casos descritivos procuram examinar uma política de CT&I de forma mais aprofundada. Descrevem o contexto de como e por qual motivo tudo aconteceu no projeto e identificam as relações-chave entre as

variáveis envolvidas em cada fase do programa. Os estudos de casos de estimação econômica, por outro lado, combinam o caso descritivo com a quantificação dos benefícios e dos custos da política de CT&I. A etapa descritiva é de fundamental importância na análise econômica, pois permite ao avaliador desenhar o modelo econômico adequado. A avaliação econômica pode ser retrospectiva, a qual se atém aos efeitos passados do programa, ou prospectiva, com a projeção dos efeitos futuros. Frequentemente, os estudos de caso de estimação econômica combinam elementos de dados existentes com as previsões, a fim de conduzir a análise para o estágio de avaliação de impacto de um projeto. Análise de rede Segundo a European Comission (2002), nas pesquisas de políticas em CT&I, tem-se discutido, amplamente, a promoção das redes de inovação, centros de excelência, redes de excelência etc. Esse tipo de pesquisa, além oferecer um foco de uma meta em tecnologia, conduz a uma mudança estrutural e comportamental nas instituições participantes. Essa importância cresce, de acordo com os sociólogos, pelo fato de o comportamento econômico estar incorporado nas redes de laços sociais, e isso tem um profundo impacto nos resultados econômicos. Ruegg (2003) ressalta que há interesse crescente em entender como as redes sociais surgem, evoluem e como elas afetam o comportamento econômico. Complementarmente, há grande interesse na aplicação de métodos de sociometria e de análise de redes sociais. O objetivo é obter mais informações acerca das esferas de influência de cientistas, tecnólogos e inovadores. Os trabalhos desses atores são essenciais na identificação das vias de evolução do transbordamento do conhecimento. Esse mecanismo expande o sucesso das relações de colaboração e do mapeamento do desenvolvimento com a difusão do capital humano dos projetos de inovação. O método de análise de rede permite avaliar a estrutura das relações de cooperação e as consequências das decisões dos participantes nas ações. Oferece explicações para o comportamento observado dos participantes mediante

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a análise de suas conexões sociais nas redes. A análise requer dados detalhados sobre os atores pertencentes à rede (instituições de apoio, os recursos) e o tipo de relação entre esses atores. Usualmente, a mensuração da rede ocorre uma única vez, mas é possível repetir a pesquisa para verificar mudanças na sua estrutura interna. A análise de rede é uma abordagem quantitativa usando questões altamente formalizadas. Os

dados obtidos, entretanto, devem ser complementados com dados qualitativos, por exemplo, entrevistas. A tabela a seguir apresenta a síntese dos métodos apresentados, bem como as principais vantagens e desvantagens na aplicação de cada um deles.

Tabela 1: As vantagens e as desvantagens do métodos de avaliação ex ante e ex post

Temporalidade

Método

Vantagens

Modelagem e simulação

Captura a difusão de conhecimento; estima impacto de política a longo prazo; simulação de cenários para apoio a políticas em áreas específicas; resultados baseados em teoria.

Qualidade dos dados; requer profissionais especializados.

Custo-Benefício

Oferece estimativa socioeconômica dos efeitos da política; informa em quanto os benefícios de uma política excedem seus custos

Requer elevada capacidade técnica e algum grau de julgamento e subjetividade; não permite fácil comparabilidade com outros casos; resultados não podem ser generalizados

Survey

Capta informações que permitem analisar ampla gama de questões; podem-se obter grandes quantidades de dados.

Pode apresentar viés nas respostas; pode precisar de amostra; consome muito tempo.

Benchmarking

Permite comparar as boas práticas de um grupo que se beneficiou de uma política de CT&I e criar indicadores de referência para novos programas.

Requer nível maior de detalhamento dos dados; não transferível.

Econometria

Resultado final simplificado; os métodos se adaptam aos dados; analisa a relação efeito-causa; aplicável a grande número de questões.

Difícil de operar; requer profissional especializado; nem todos os efeitos de uma política podem ser captados.

Estudo de caso

Rápida implementação; riqueza nas informações; revela questões inerentes à política que não foram pensadas previamente.

Difícil codificar e analisar as respostas das perguntas abertas e fechadas; difícil comparar políticas cruzadas; alto grau de dependência da habilidade e da experiência do avaliador.

Análise de rede

Material empírico de fácil compreensão; mostra os links de cooperação.

Exige muito tempo na coleta de dados e certo poder de persuasão na coleta.

Análise ex ante

Análise ex post

Fonte: elaboração do autor com base na pesquisa

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Desvantagens


Métodos de avaliação: instrumentos para políticas em CT&I

Aplicações às políticas de CT&I no Amazonas No Estado do Amazonas, as políticas de CT&I podem desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento do Estado. No entanto, pouco se conhece sobre os efeitos que os programas de apoio à CT&I, oriundos dessas políticas, têm produzido. Seria necessária, portanto, uma avaliação e assim dotaria o Estado de instrumentos facilitadores para alocação eficiente dos recursos. Essa proposta vai ao encontro de uma das recomendações centrais contidas no Relatório sobre os determinantes do sistema local de Inovação de Manaus (KERGEL et al, 2010), que é a de avaliar todas as políticas de CT&I existentes no Amazonas. No Estado de Santa Catarina, por exemplo, Gallon et al (2010) avaliaram o impacto da inovação resultante de uma política de crédito para micro e pequenas empresas. Aplicando o método de estudo de caso, os autores evidenciaram resultados bastante satisfatórios, concluindo que a política de CT&I está cumprindo seu papel. Em contraste, Gussi e Silva (2011) avaliaram um programa de microcrédito em Fortaleza, não obtendo respostas conclusivas sobre a eficácia do programa. Com efeito, Moraes (2008) ressalta que, dada a relevância dessas políticas, a avaliação é cada vez mais imperativa, inclusive na forma de seleção dos projetos beneficiados, a qual pode ser uma possível razão de fracasso de algumas políticas de CT&I. As políticas de CT&I existentes no Amazonas atingem grande número de agentes econômicos haja vista a amplitude de seus objetivos, que vão do microcrédito a bolsas de mestrado e doutorado. Não obstante a relevância das políticas de CT&I, quantas já tiveram êxito? Quais das atividades prioritárias mostraram-se mais propensas ao sucesso? Quais as mais fragilizadas? Quais as maiores dificuldades enfrentadas pelas empresas, tanto de sucesso quanto de fracasso? Surgiram novas tecnologias e processos a partir desse apoio? Qual a contribuição social e econômica desses projetos, ou seja, qual o retorno? Cabe questionar, também, se as empresas que se beneficiam dessas políticas têm conseguido promover mudanças na produção aumentando a

intensidade tecnológica. Se isso está ocorrendo, quais são essas empresas? Houve aumento de produtividade resultante de inovações? Qual o papel que as incubadoras têm desempenhado? De que forma os programas de bolsa de mestrado e doutorado têm contribuído para o desenvolvimento do Estado do Amazonas e como o governo tem se beneficiado do conhecimento gerado pelos pesquisadores? Enfim, há muitas questões que precisam ser respondidas, mas essas respostas só podem ser obtidas por meio de uma rigorosa avaliação. Para tanto, conforme discutido, há uma variedade de métodos de avaliação que podem ser aplicados às mais diferentes políticas de CT&I. Cabe, portanto, a iniciativa. Considerações finais Neste artigo fez-se um exercício de apresentar, de forma simplificada, as metodologias de avaliação de políticas em CT&I mais comumente empregadas, bem como a importância que a avaliação representa para a sociedade como um todo. Há muitos métodos de avaliação disponíveis na literatura, e cada método tem sua vantagem e/ou desvantagem. Neste trabalho, foram apresentados aqueles de maior relevância, sem a pretensão de apontar qual o mais adequado e sem abordá-los em profundidade. Mostrou-se que a avaliação pode ser feita antes de o programa ser implantado (ex ante), durante, e depois de implantando (ex post). Há métodos apropriados para cada temporalidade. Porém, antes da avaliação final do programa, seja a priori, seja a posteriori, existem métodos específicos para a geração, o controle e a análise de dados, os quais podem ser qualitativos e quantitativos, ou ambos. O uso de um ou outro método irá depender da necessidade de cada organização, pois cada um produz resultados de acordo com os critérios previamente estabelecidos e das questões a que se pretende responder após a avaliação. Políticas de CT&I têm o importante papel de contribuir, entre outros aspectos, para o aumento da competitividade de uma região e

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Métodos de avaliação: instrumentos para políticas em CT&I

para melhorar suas condições socioeconômicas. A exemplo de outros estados brasileiros que têm feito avaliações de suas políticas de CT&I, no Amazonas, a presença dessas políticas merece ser avaliada, tanto pela necessidade de se identificarem as descobertas inovadoras, quanto de compreender os efeitos das políticas já implantadas. Além disso, a avaliação pode indicar os rumos das políticas bem como a necessidade de reformulação ou a criação de novas. Bibliografia European, Comission. “RTD Evaluation Toolbox - Assessing the socio-economic impact of RTD-Policies.” European Comission research and innovation. 2002. http:// ec.europa.eu/research/evaluations/ index_en.cfm. FRECHTLING, J., and S. LAURE. “User-friendly handbook for mixed method evaluations.” National Science Foundation. 1997. http:// www.ehr.nsf.gov/EHR/REC/pubs/NSF97153/start.htm. GALLON, A.V, D.R.M. REINA, and S.R. ENSSLIN. “O impacto da inovação no desempenho econômico-financeiro das MPEIS catarinenses beneficiadas pelo Programa Juro Zero.” Revista de contabilidade e organizações, 2010: 112-138.

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GUSSI, A.F, and R.J.F. SILVA. “Microcrédito e desenvolvimento: avaliação dos impactos do Programa Crediamigo em População de Baixa Renda em Fortaleza.” Revista eletrônica em ciências sociais. marc 2011. KERGEL, H., L. MULLER, M. NERGER, G.A. FILHO, D.J. LASMAR, and E.G.M. SOUZA. Relatório sobre os determinantes do sistema local de inovação de Manaus. Institute for Innovation and Technology, 2010. MORAES, J.M. “Uma avaliação de programas de apoio financeiro à inovação tecnológica com base nos fundos setoriais e na Lei de Inovação.” In Políticas de incentivos à inovação tecnológica. IPEA, 2008. PERRIN, B. “How to and How Not to evaluate innovation.” Evaluation, 2002: 13-28.

C

M

RUEGG, R. A toolkit for evaluating public R&D investment: models, methods, and findings from ATP’s first decade.Economic Assessment Office, 2003.

Y

CM

MY

CY

Renilson Rodrigues da Silva é Pesquisador do Nepi da Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação tecnológica (FUCAPI) e Prof. UFAM. E-mail: renilson.silva@fucapi.br.

CMY

K



Artigo

Ganhos ambientais decorrentes da mudança de fonte energética dos fornos utilizados nos polos cerâmicos de IrandubaManacapuru/AM a lenha para gás natural Antonio Cleiton Lopes da Silva e Elizabeth Ferreira Cartaxo Resumo A indústria cerâmica é fundamental no desenvolvimento da sociedade amazonense, produzindo materiais importantes para a construção civil, notadamente tijolos e telhas. Apesar dessa importância, os processos produtivos ainda são arcaicos, baseados em métodos artesanais primários, sem grande controle de produção e energeticamente muito ineficientes. São assentados especialmente no uso da biomassa proveniente de resíduos resultantes de outros processos industriais, mas sem diminuir a pressão por madeira de origem não sustentável, o que implica impactos ambientais decorrentes tanto do desmatamento descontrolado de áreas, quanto de emissões de Gases de Efeito Estufa – GEE, gases poluentes e materiais particulados, originados e lançados na atmosfera quando do processo de queima. O presente trabalho realiza um levantamento da atual fonte energética, basicamente biomassa, utilizada pelos fornos do setor cerâmico dos municípios de Iranduba/AM e Manacapuru/AM, que são os principais fornecedores de materiais cerâmicos para a cidade de Manaus/AM. Também mostra a ineficiência das ações tomadas para mitigar os impactos e a viabilidade técnica do uso do gás natural, assim como os ganhos ambientais decorrentes de uma possível troca da matriz energética: maior controle, com redução da emissão de Gases de Efeito Estufa - GEE, de gases poluentes, como o monóxido de carbono, e de material particulado, além da redução da pressão por desmatamentos ilegais de florestas nativas, podendo evitar a devastação anual de até 3.750ha de floresta.

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Introdução Cerâmica vermelha é aquela caracterizada pela tonalidade vermelha de seus produtos, incluindo tubos e agregados de argila, entre outros, dentre os quais grande parte serve de insumos para a construção civil, sobretudo telhas, blocos e tijolos. Dentro da cadeia produtiva, há duas etapas bem distintas: uma que envolve a exploração da matéria-prima, basicamente argila, e outra concernente à transformação, em que ocorre o processo de calcinação da massa a temperaturas que variam de 900ºC a 1.100ºC. Dessa forma, a energia necessária a esse aquecimento representa um importante insumo dentro da cadeia produtiva. Estima-se (SEBRAE, 2008) que em 2006 foram consumidas pelo setor cerâmico, para uso industrial, 3,5 milhões de Toneladas Equivalentes de Petróleo (TEP), que perfazem 11,6MWh, dos quais a lenha representou quase 50% de todo o consumo, seguida pelo gás natural, com 26%, e pelo óleo combustível, 8%. No Amazonas, em 2007, a produção anual de produtos cerâmicos no polo de Iranduba e Manacapuru foi de cerca de 128 milhões de peças, das quais 112 milhões foram de blocos cerâmicos, utilizando-se como principal insumo energético a lenha e seus derivados, que representaram cerca de 60% do custo de produção, equivalente a quase 270.000m³ de madeira (CPRM, 2007).


Ganhos ambientais decorrentes da mudança de fonte energética dos fornos utilizados nos polos cerâmicos de Iranduba-Manacapuru/AM a lenha para gás natural

A lenha é um dos combustíveis mais antigos e ainda perdura como importante fonte energética de diversos países, inclusive do Brasil. Do seu uso decorre uma polêmica: para alguns, esse é um combustível atrasado, com grande potencial poluente, mas para outros é uma fonte de energia renovável e limpa. Isso tudo depende de sua origem, pois, se é proveniente de florestas nativas, é fruto de desmatamentos, muitas vezes ilegais, trazendo consigo todos os problemas daí decorrentes. Porém, se a lenha é proveniente de florestas plantadas, também chamadas de florestas energéticas, de fato se constitui em uma fonte limpa sob o ponto de vista de emissões de Gases de Efeito Estufa - GEE, pois o carbono liberado, quando da queima, é sequestrado na fase produtiva e, além disso, apresenta a grande vantagem de ser renovável. Nesse caso, apesar do balanço zero de carbono, a queima da lenha produz gases tóxicos, como o monóxido de carbono (CO) e material particulado, em quantidades que variam de acordo coma qualidade da queima. O gás natural é de forma generalizada considerado um combustível limpo por apresentar reduzidas emissões de poluentes, quando comparado com outros combustíveis fósseis. Possui densidade menor que a do ar atmosférico e por isso se dispersa rapidamente em caso de vazamento, tornando seu uso mais seguro. Quando queimado, libera para a atmosfera basicamente gás carbônico, óxidos de nitrogênio (Valois, Cartaxo &Chaar, 2011) e água e não permite a formação de monóxido de carbono (CO), por apresentar combustão completa (Lourenço, 2003). Diante desse panorama de consumo energético, no qual a lenha, sobretudo no Amazonas, representa mais da metade do custo produtivo, verifica-se que essa atividade pode oferecer forte pressão por desmatamentos, principalmente diante da falta de estrutura do setor, que conta com muitos produtores de pequeno porte, em atividade informal, e estrutura ultrapassada e ineficiente. Dessa forma, o presente estudo tem o objetivo de discutir os impactos ambientais provocados

pelo setor e a efetividade das ações mitigadoras tomadas, avaliando-se os ganhos ambientais do uso alternativo do gás natural como fonte energética. Materiais e métodos Para instrumentalizar o trabalho, realizou-se estudo em uma empresa representativa do setor, abordando uma série de temas que, inclusive, extrapolaram o foco deste estudo na tentativa de se obterem resultados mais realísticos, uma vez que as respostas podem não ser espontâneas a itens considerados sensíveis pelos empresários, como a questão da origem da lenha utilizada. Ressalta-se que há dificuldade na obtenção de dados precisos diante da grande informalidade dessas indústrias, bem como da falta de controle interno de cada empresa. Os controles em geral são empíricos, baseados na experiência dos trabalhadores. Além disso, há uma grande competitividade, e nem mesmo a Associação de Ceramistas do Estado do Amazonas – ACERAM – possui informações consolidadas. A análise abrangeu o volume de produção, quantidade e qualificação da mão de obra, origem e distância de transporte da matéria-prima, tipo de forno utilizado e combustível consumido na queima, incluindo sua procedência. Além disso, foi avaliado o ciclo de queima de tijolos, oportunidade em que pôde ser levantada a quantidade de combustível necessária para esse processo (calcinação ou sinterização). A partir daí foi possível, com base nos números de produção, estimar a quantidade de lenha consumida pelo setor. Sob outro aspecto, levantou-se a disponibilidade de fontes energéticas alternativas, bem como a viabilidade de sua utilização, indicando seus pontos positivos e negativos. Além da lenha, avaliaram-se os resíduos de madeira como pó de serragem e de outros processos industriais. Dentre os combustíveis, há especial interesse na biomassa lenhosa, por ser uma fonte energética tradicional no setor, chegando a 90% do total de

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combustíveis utilizados, com 50% de lenha nativa e 40% de resíduos de madeira (cavaco, serragem, briquetes e outros resíduos) (MME, 2010). Estudos também apontam que pode ser utilizado na calcinação da argila, como alternativa à biomassa, o óleo BPF e o gás natural (Dadam, 2006). Além disso, o gás natural encontra-se em fase de expansão no Amazonas. Por fim, realizou-se pesquisa bibliográfica a fim de serem levantadas ações empreendidas no sentido de se minimizarem os problemas enfrentados pelo setor, bem como se realizou análise dos dados de desmatamento divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que apresenta resultados do monitoramento de desmatamento desde 1988, contendo dados específicos por município desde o ano 2000. Perfil do setor Os dados levantados apontam que atualmente há cerca de 30 indústrias, com pequenas variações anuais nesse número. Segundo o Núcleo Estadual de Arranjos Produtivos Locais – NEAPL/AM (2010), são 32 cerâmicas em atuação. Quanto ao volume de produção, também não há dados oficiais, e sequer a ACERAM, associação das empresas do setor, possui tais informações. As dificuldades resultam da informalidade do setor, como já mencionado.

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A fim de se estimar a produção, foi acompanhada a cadeia produtiva de uma dessas indústrias, que, segundo informações de empresários experientes do setor, tem um porte médio em relação às demais empresas e pode representar bem o conjunto. Feito isso, constatou-se que essa indústria produz semanalmente 182 milheiros de tijolos de oito furos. Projetando-se esse valor para as 32 indústrias, totaliza-se a produção anual de aproximadamente 300.000 milheiros de tijolos. No tocante aos combustíveis para queima, constatou-se que se usa apenas biomassa, sobretudo lenha, cavaco e pó de serra. No entanto a maior parte do combustível é lenha nativa, havendo também grande dificuldade para obtenção de dados precisos, pois as informações repassadas não são confiáveis, e não existem dados oficiais referentes à sua origem. Isso acontece porque a maior parte da lenha utilizada no processo tem procedência clandestina, fato que ficou evidenciado quando de entrevistas com funcionários. Por fim, levantou-se que um metro cúbico estéril de lenha com declaração de origem custa em torno R$ 80,00 (oitenta reais), ao passo que, pelo mesmo volume de lenha sem origem declarada, pagam-se R$ 30,00 (trinta reais), o que estimula o seu uso. A questão da clandestinidade da lenha traz consigo, de um lado, todos os problemas ambientais


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e, de outro, ocasiona grande instabilidade às indústrias. As que tentam se enquadrar em todos os requisitos legais, como a questão da procedência da lenha, sofrem pela concorrência desleal das empresas que se preocupam apenas em reduzir seus custos diretos e aumentar os lucros, mesmo que de forma ilícita e ainda que estejam invariavelmente preocupadas com a possibilidade de recebimento de multas ou até de sofrerem interdição. Observou-se, por exemplo, que a falta de lenha no pátio da indústria não significa que ela não é consumida, pois uma das manobras empregadas para uso da lenha clandestina de forma a driblar as fiscalizações é o abastecimento noturno apenas com a quantidade necessária ao uso no dia seguinte, evitando-se seu depósito no local de consumo. Estimativa de consumo de lenha e desmatamento O acompanhamento do processo de calcinação mostrou que, para um típico forno utilizado no setor com capacidade plena de 26.000 peças, são necessários 65m³ de lenha. Daí, verifica-se que, em média, são consumidos 2,5m³ de lenha por mil peças. Ampliando esses cálculos para a produção anual média, estima-se que são necessários 750.000m³ de lenha por ano. Diante da informalidade do setor ceramista e da origem nativa da maior parte da lenha consumida, verifica-se que esta provém de desmatamentos de áreas sem nenhum critério sustentável definido, o que, aliado à falta de aplicação de uma política de plantação de florestas energéticas, carrega consigo toda a problemática do desmatamento. Se considerarmos que metade da biomassa consumida provém de resíduos industriais ou de outras fontes alternativas e que 50% são de lenha proveniente de florestas nativas (estimativa bastante conservadora), considerando-se que a floresta forneça 100m³/ ha (Schwob, 2007), estima-se que a atividade do polo ceramista Iranduba-Manacapuru/AM promova o desmatamento anual de 3.750ha.

Em busca de alternativas sustentáveis, o NEAPL/AM (2009) desenvolveu um Plano de Desenvolvimento para o setor cerâmico oleiro de Iranduba/AM. Entre outras análises, constatou que há problemas relacionados à indisponibilidade de produção regular adequada de lenha e derivados para queima, bem como ausência de reflorestamento particular ou público para suprir demanda por esse combustível, ocasião em que apresentou projeto para melhor aproveitar resíduos provenientes do Polo Industrial de Manaus, como embalagens descartadas. Apresentou resultado de estudos desenvolvidos com o intuito de se minimizarem impactos ambientais, a exemplo da pesquisa realizada pela Embrapa para obtenção de lenha sustentável, com “objetivo de selecionar espécies florestais adequadas para plantios racionais na região de Iranduba e Manacapuru (AM)” (NEAPL/AM, 2009). Tais medidas, porém, são incipientes e inócuas, coforme será demonstrado neste trabalho. Ainda no tocante à questão da lenha, segundo dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o município de Iranduba/AM, no ano de 2000, apresentava 15,27% de seu território desmatado, percentual que alcançou 21,44% em 2010. De forma semelhante, Manacapuru/AM saltou de uma taxa de desmatamento de 8,58% para 10,60%. Esses números são bem superiores aos do Estado do Amazonas, cuja área desmatada total saltou, no mesmo período, de 1,63% para 2,19%, o que indica correlação da atividade ceramista com o problema do desmatamento. A demanda por lenha também induz a uma pressão sobre as florestas nativas de municípios vizinhos e, da mesma, forma observam-se desmatamentos similares no município do Careiro da Várzea/AM. Os dados encontram-se compilados na Tabela 01. Analisando-se os dados anuais de desmatamento para os municípios de Iranduba e Manacapuru, também compilados a partir de valores divulgados pelo INPE, verifica-se que, após um grande decréscimo no incremento anual de áreas desmatadas do ano de 2001 para 2002, seguido de

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Tabela 1. Área desmatada nos anos de 2000 e 2010

Território Total (Km²)

LOCAL

Área desmatada até 2000

Área desmatada até 2010

Incremento no período

(Km²)

(%)

(Km²)

(%)

(Km²)

(%)

Iranduba

2.228

340,3

15,27

477,6

21,44

137,3

6,17

Manacapuru

7.381

633,2

8,58

782,7

10,72

149,5

2,14

Careiro da Várzea

2.641

369,0

13,97

515,0

19,50

146

5,53

Manaus

11.474

1.094,1

9,54

1242,8

10,83

148,7

1,29

1.601.920

26.120

1,63

35.058

2,19

8.938

0,56

Amazonas Fonte: INPE, 2012

de produção sustentável de lenha (Souza e Lima, 2005), o fato é que o desmatamento das regiões do entorno dessas indústrias é bem maior que a média do Estado, e não houve diminuição de seu incremento anual,demonstrando correlação da atividade ceramista com o desmatamento, bem como persistência de pressão sob as florestas nativas.

outro pico de 2003 para 2004, os incrementos de desmatamento permaneceram com índices bem menores a partir daí, contando, entretanto, com aumento entre 2008 e 2010. Em síntese, verifica-se que nos últimos anos não houve redução do ritmo de desmatamento, havendo inclusive sensível aumento a partir de 2008 (Tabela 02 e Figura 01).

Tabela 2. Incrementos anuais de áreas desmatadas, em Km²

Ano

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Iranduba

82,4

7

16,5

5,8

1

3,7

3,9

1,9

6,8

6,1

Manacapuru

60,5

8,9

35,3

7,7

2,9

3,9

2

2,2

12

10,9

Fonte: INPE, 2012

Figura 01. Incrementos de área desmatada, em Km², de 2001 a 2010. Fonte: INPE, 2012

Em que pese ao potencial de energia renovável da biomassa e a diversos esforços despendidos nos últimos anos na tentativa de melhorar a estrutura do setor, inclusive no que tange à busca

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Além disso, mesmo que se consiga implantar, de fato, programas de lenha sustentável, nos termos dos projetos já existentes, isso não impede o uso de lenha de floresta nativa, diante da dificuldade


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de fiscalização do setor madeireiro e da falta de maturidade da consciência ambiental do empresariado em geral. Muitas vezes ele prioriza apenas pagar o mínimo possível pelos insumos sem se preocupar com a sustentabilidade, que é geralmente postergada em nome da economia. A inserção do gás natural Como alternativa à biomassa, sobretudo da lenha nativa, surgiu como promissora a oferta de gás natural, que, embora não seja uma fonte renovável, apresenta grandes reservas e não traz consigo o problema do desmatamento, além de ser menos poluente que os demais combustíveis fósseis tradicionais. Possui combustão mais limpa e densidade menor que a do ar, sendo uma das principais vantagens do uso do gás natural (Valois, Cartaxo &Chaar, 2011), o que implica a melhoria da qualidade dos produtos finais, além da possibilidade de redução de custos, se comparados com lenha com declaração da origem florestal. Ou seja, comparando-se com lenha obtida de florestas nativas, o gás natural emite menor quantidade de gases de efeito estufa (GEE) e não emite materiais particulados tipicamente resultantes da queima incompleta da biomassa. Quanto à viabilidade técnica do uso do gás natural em substituição à lenha, teoricamente não há diferença entre queimar um combustível ou outro, sob a ótica das trocas radiativas. A diferença está no poder calorífico, no volume de ar necessário à queima e em sua qualidade (Dadam, 2006). Esse autor mostrou que a umidade existente na biomassa utilizada como fonte energética aumenta bastante o consumo. Por exemplo, umidade de 50% implica aumento de 18% do consumo energético para o caso analisado.

Uma das dificuldades do uso do gás natural reside na precariedade das instalações do setor, sobretudo no que se refere aos fornos primitivos e de baixo rendimento utilizados pela maioria das indústrias do polo cerâmico de IrandubaManacapuru/AM. O ideal seria a modernização desses fornos, com melhores rendimentos e que permitam monitoramento e controle, tanto do processo de calcinação, quanto do acompanhamento da temperatura e das emissões atmosféricas. Apesar do problema dos fornos primitivos, em uma análise comparativa prática realizada por Neri (2000),conseguiu-se com sucesso ajustar um forno padrão com abóbada para queimar gás, obtendo-se inclusive grande melhoria do rendimento por meio de pequenos ajustes técnicos, escolha dos queimadores mais adequados e treinamento dos operadores. Como resultado final, o trabalho constata que,além de possível, a conversão de fornos a lenha para gás natural, em decorrência das características deste último combustível, promove melhoria na qualidade do produto final. Considerações A biomassa, quando proveniente de fonte sustentável, como florestas energéticas, é uma boa fonte de energia. Ocorre que, embora as indústrias do polo cerâmico de IrandubaManacapuru/AM utilizem resíduos de biomassa em geral como fonte de calor para calcinação de seus produtos finais, a maior parte desse insumo resulta de lenha proveniente de florestas nativas, de origem clandestina, exercendo grande pressão por desmatamentos ilegais e sem nenhum critério.

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Dessa forma, o mais racional é que os esforços, tanto dos empresários do setor quanto dos órgãos públicos, que detêm poder de fomento e coerção, devem ser concentrados no sentido de se alterar a atual fonte energética dos fornos do polo cerâmico de Iranduba-Manacapuru/AM a lenha para gás natural, por este estar disponível na Região. Embora seja um combustível fóssil, permite maior controle gerencial, apresentando menor emissão comparativa de Gases de Efeito Estufa - GEE, de gases poluentes, como o monóxido de carbono, e de material particulado, além de reduzir a pressão por desmatamentos ilegais de vegetações nativas, podendo evitar a devastação anual em até 3.750ha de floresta. Bibliografia CPRM. Projeto Materiais de Construção na Área Manacapuru e Iranduba – Manaus – Careiro: domínio Baixo Solimões, 2007. Dadam, A. P. et al. Análise Numérica Comparativa de Combustíveis Utilizados em Fornos Túneis. Cerâmica Industrial, 11 (4) Julho/ Agosto, 2006. Lourenço, S. R. Gás Natural: Perspectivas e Utilização. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, 2003. MME - Ministério de Minas e Energia. Anuário Estatístico 2010, Setor de Transformação de Não Metálicos. Brasília: SGM, 2010. Neri, J. T. T. F. et al. Conversão de Fornos Cerâmicos para Gás Natural – A Experiência do CT-Gás no Rio Grande do Norte. Rio Oil&GasConferenceHeld in Rio de Janeiro, Brasil, 16-19 outubro, 2000. NEAPL/AM.Plano de Desenvolvimento Preliminar –APL de Base Mineral Cerâmico - Oleiro. Manaus, 2009. NEAPL/AM. Plano de Desenvolvimento Preliminar –APL de Base Mineral Cerâmico - Oleiro. Manaus, 2010.

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Artigo

Avaliação Ambiental do Ciclo de Vida da Célula a Combustível de Membrana Trocadora de Prótons – PEMFC Dênis de Freitas Castro, Luciana de Souza Freire, Raimundo Ribeiro Passos e Elizabeth Ferreira Cartaxo Resumo Com a crescente preocupação sobre o esgotamento de fontes de energia baseadas no petróleo e as mudanças climáticas, as células a combustível, dispositivos que convertem a energia química diretamente em energia elétrica por meio de uma reação eletroquímica, têm recebido muita atenção nos últimos anos, sendo associadas com sua elevada eficiência e baixas emissões. Sua eficiência pode chegar a 60% em conversão de energia elétrica e 80% no total de cogeração de energia elétrica e térmica, com 90% de redução na concentração dos principais poluentes. A maioria dos problemas que surgem a partir do acelerado crescimento global do número de veículos, incluindo a poluição atmosférica e alterações climáticas, está associada aos motores de combustão interna, que basicamente dependem de combustíveis hidrocarbonetos. A célula a combustível do tipo PEMFC tem o potencial de substituir esses motores por apresentarem maior eficiência e pouca emissão dos gases do efeito estufa. No entanto existem algumas barreiras a serem superadas como o alto custo dos materiais da membrana e dos catalisadores do grupo de metais da platina, para que essa tecnologia se torne acessível para efeito de consumo regular. Ainda que no momento a PEMFC esteja no liminar do estágio comercial, o desempenho ambiental ao longo do ciclo de vida das células a combustível deverá passar por uma inevitável avaliação a fim de contribuir com o planejamento estratégico e com o uso racional de investimentos da PEMFC.

Levando em consideração a escassez de literatura nesse campo, o presente trabalho tem como objetivo enfocar analiticamente a importância da avaliação do ciclo de vida da PEMFC, como uma significativa ferramenta para compreender o peso das questões ambientais envolvendo não somente a utilização da PEMFC, mas também os estágios relacionados à produção do sistema, já que estes também apresentam impactos. Palavras chave: PEMFC. Células a Combustível. Análise do Ciclo de Vida. Introdução No decorrer do tempo, a produção de energia elétrica constituiu-se como um fator ativo no desenvolvimento das sociedades. Para se obterem melhorias no padrão de qualidade de vida da sociedade, é preciso realizar o aperfeiçoamento da qualidade de energia distribuída e dos serviços inerentes, dentro de um processo de sustentabilidade [1]. Entretanto o modelo atual, que depende ainda de combustíveis fósseis, não atende à necessidade de preservação e de conservação de recursos naturais, tendo em vista que esses combustíveis não são renováveis, e o seu beneficiamento e uso promovem diversos impactos ambientais, dentre eles a emissão de poluentes atmosféricos, tais como o dióxido de carbono, principal responsável pela ocorrência do efeito estufa e consequentemente pelo aquecimento global [2,3]. Não obstante existem fatores estratégicos e econômicos relevantes associados a concentrações de suas jazidas em poucas regiões do mundo e à instabilidade de seus preços [1,4].

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Diante desse cenário, a busca por novas tecnologias para a obtenção de eletricidade que faça uso mais eficiente dos recursos naturais, utilizando fontes renováveis, torna-se urgente. Dentre as diferentes rotas inovadoras para a geração de energia mais sustentável, está, atualmente, o hidrogênio, cuja viabilidade energética encontra-se na tecnologia de células a combustível - CaC. Estas são dispositivos eletroquímicos que podem converter continuamente a energia química de certas fontes -renováveis ou não – em eletricidade, sem a necessidade de combustão a quente e com um rendimento global superior aos equipamentos de transformação convencionais. Em adição à natureza eletroquímica da reação produzindo água, a alta eficiência pode propiciar uma significativa redução do uso de combustíveis fósseis e da liberação de gases do efeito estufa, resultando em emissões locais extremamente baixas durante o uso, fator especialmente importante em áreas densamente povoadas [5]. Desse modo, os diferentes tipos de tecnologia CaC configuram-se como candidatas ideais para uso em aplicações móveis e estacionárias, incluindo pequenas residências, plantas de energia e calor de média e larga escala,respectivamente. No setor móvel, as CaC, particularmente as de baixa temperatura de operação (80 a 90 °C), como a Célula a Combustível de Membrana Trocadora de Prótons - PEMFC, podem ser usadas em veículos particulares e coletivos, trens, aviões, barcos, além de sistemas portáteis de diversos usos [6]. Perante essas particularidades, os distintos setores da sociedade têm direcionado uma maior atenção para as CaC, principalmente em relação à PEMFC, dada a crescente demanda por energia e a preocupação em relação à qualidade urbana do ar, acidificação regional e mudanças climáticas. Entretanto essas características vinculadas à utilização da tecnologia refletem apenas parte desse quadro, pois recursos são consumidos, e emissões são geradas em outras etapas do contexto global do ciclo de vida desse produto, incluindo a manufatura e a disposição final. O estágio em uso é tipicamente dominante na avaliação de todo o ciclo de vida dos sistemas convencionais de geração de energia e de engenharia de transporte [7].

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Contudo os sistemas de CaC comprometem uma escala relativamente exótica de materiais e requerem processos de manufatura que ainda estão em desenvolvimento. Consequentemente a análise dos seus outros estágios do ciclo de vida são de suma importância, por apresentarem vantagens ambientais durante sua utilização. No caso da PEMFC, mesmo encontrando-se no limiar do estágio comercial, o fator determinante para a sua ampla inserção no mercado envolve, além de questões econômicas relacionadas ao alto custo dos materiais da membrana e dos catalisadores de platina, os aspectos ambientais relacionados a esse metal durante a fase de produção e pós-consumo do módulo da PEMFC [8,9]. Nesse sentido, a Avaliação do Ciclo de Vida –ACV tem se consolidado como uma ferramenta líder, tanto no mundo empresarial quanto no governamental, para entender e questionar os riscos e as oportunidades que acompanham os produtos ao longo de sua vida, desde a fase de extração de recursos para a manufatura até o seu destino final, pós-consumidor. Por conseguinte os processos de decisão baseados em uma ACV conduzem a ações mais efetivas e à maior sustentação a longo prazo com relação à redução dos custos econômicos e ambientais das companhias e para o País [10]. Portanto, para o desenvolvimento e promoção de novos modelos energéticos, torna-se imperativa a adoção desse instrumento. Face a essas considerações, a preocupação primordial deste estudo está em convergência com o momento atual, isto é, com a necessidade de aprofundar o conhecimento relacionado ao peso das questões ambientais no desenvolvimento, na consolidação e na inovação da Célula a Combustível de Membrana Polimérica Trocadora de Prótons - PEMFC, devido, no âmbito do desenvolvimento sustentável, à premência pelo fornecimento de energia limpa e segura ao meio ambiente. Tendo em vista a escassez de trabalhos e pesquisas sobre essa temática, bem como a importância dos catalisadores de platina no âmbito econômico e ambiental de desenvolvimento da Célula a Combustível de Membrana Trocadora de Prótons - PEMFC, o presente trabalho tem por


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objetivo enfocar analiticamente a importância da avaliação do ciclo de vida da PEMFC, como uma significativa ferramenta para compreender o peso das questões ambientais envolvendo não somente a utilização da PEMFC, mas também os estágios relacionados à produção do sistema, já que estes também apresentam impactos. Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) A Avaliação do Ciclo de Vida - ACV é uma abordagem metodológica para estimar e avaliar os impactos atribuídos à cadeia do produto, tais como as mudanças climáticas, a depleção do ozônio estratosférico, a criação do ozônio tropoesférico (smog), eutrofização, acidificação, efeitos toxicológicos na saúde humana e ecossistemas, depleção dos recursos, entre outros. Quando conduzimos a ACV, a fase do projeto do produto é usualmente excluída, pois, frequentemente, admite-se que essa etapa não contribui significativamente para análise. Contudo é importante notar que as decisões tomadas durante o projeto influenciam significativamente os aspectos ambientais de outros estágios do ciclo de vida [11]. O objetivo da ACV é aperfeiçoar os bens e serviços. Isso se aplica analogamente à melhoria do processo do ciclo de vida do produto, principalmente se existir probabilidade de ocorrerem interações com outros estágios do seu ciclo de vida [9,11]. Embora a implementação de tecnologias limpas possa mitigar a poluição no meio ambiente, em contrapartida propicia um aumento no custo de produção, pelo menos em um curto tempo. Nesse caso, na ACV, todas as decisões relacionadas às consequências do ciclo de vida total (do berço ao túmulo) podem ser baseadas na análise, incluindo também as questões de âmbito social e econômico. Essa prática tem resultado em um balanço razoável entre os efeitos positivos e negativos, no seu sentido mais amplo, de um determinado produto. Nesse panorama, a atenção dada à ACV tem sido crescente nestes últimos dez anos e, ainda que esse aumento no interesse não seja surpreendente, a vantagem dessa abordagem metodológica em fornecer uma visão como um todo de um único processo (como a produção ou consumo de um produto) tem induzido governos e organizações privadas a adotá-la [12].

Diante de um mercado cada vez mais globalizado e ambientalmente regulado, a Avaliação do Ciclo de Vida vem sendo amplamente utilizada, entre os países desenvolvidos, como ferramenta para orientar políticas de regulamentação, de responsabilidades das empresas, de organizações públicas e para o financiamento de pesquisas e de desenvolvimento, por fornecer dados de extração de recursos naturais, pelo uso de energia e pela produção de emissões. Desse modo, a importância da ACV vem se consolidando à medida que a variável ambiental direciona as decisões de comando e controle do governo, do consumo da sociedade e de sustentabilidade das empresas. Mesmo no Brasil, em que essa ferramenta não se encontra tão difundida quanto nos diversos países da União Europeia e da Ásia, já se observa uma preocupação dos representantes de indústrias, comércios e outras atividades [13, 14]. Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) da PEMFC Uma análise da literatura especializada faz crer que os impactos ambientais associados à aplicação da tecnologia de CaC são conhecidos e bem documentados. Muitos trabalhos foram produzidos com relação a sua eficiência energética [15, 16]. Por outro lado, o mesmo não ocorre com para a produção e o destino final dessa fonte de energia. Alguns trabalhos e pesquisas tendo em vista a demanda crescente do mercado de energia, bem como o desenvolvimento de politicas regulatórias cada vez mais rígidas, dedicaram-se a avaliar os impactos associados a outras fases do ciclo de vida desse sistema [17, 18]. No Brasil ainda são poucos os trabalhos relacionados a essa temática, apresentando ainda resultado pouco concreto nessa linha de pesquisa. Dentre as pesquisas sobre a avaliação do ciclo de vida da PEMFC nas etapas de manufatura e disposição final, destacam‐se aquelas que se propuseram a examinar mais a fundo as propostas formuladas para o principal componente do módulo de célula PEMFC – o conjunto eletrodo membrana (MEA) – em particular sob a ótica dos eletrocatalisadores de platina [10, 11]. Os impactos ambientais significativos estão associados à extração mineral e ao refinamento da platina. Os efeitos nocivos ao meio ambiente

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ocorrem principalmente pelo uso e pela degradação do solo e pela poluição do ar, por emissões não controladas de dióxido de enxofre (SO2), amônia, cloro e, entre outros, ácido clorídrico. As emissões de SO2 e NH4 são responsáveis por precipitações ácidas, cujo efeito pode atingir a escala regional [8, 9, 10]. Sistema PEMFC Célula a combustível é um dispositivo eletroquímico que consiste, essencialmente, em dois eletrodos: o ânodo – “eletrodo combustível” – e, o cátodo – “eletrodo oxidante”, separados por um eletrólito. Na PEMFC, um combustível, tal como hidrogênio, gás natural (GN), etanol ou outros hidrocarbonetos, e um agente oxidante, ar ou gás oxigênio, reagem com auxílio da membrana condutora de prótons. Na reação anódica são liberados elétrons; estes passam por um circuito externo, constituindo um fluxo de corrente elétrica. Os prótons formados no ânodo são conduzidos pela membrana para o cátodo, onde ocorre a reação de redução e a formação de água quando em contato com o comburente (Figura 01). Esse processo, além de produzir corrente elétrica, também gera calor aproveitáveis. O coração de uma célula de combustível é constituído por um “conjunto membrana eletro-

do” – CME. Esse conjunto é composto por uma membrana polimérica faceada por dois eletrodos de difusão gasosa (cátodo e ânodo), os quais são compostos por uma camada catalisadora e por uma camada difusora de gases. As propriedades catalisadoras desse conjunto que produzem a divisão da molécula de hidrogênio e oxigênio se baseiam nas propriedades dos metais preciosos, como a platina depositadas para gerar quantidades utilizáveis de corrente se colocam sucessivos CME, formando o denominado “stack”. Mediante essa configuração, alcança-se a potência (tensão e corrente elétricas) requerida [16, 17]. Processo de produção do MEA A fabricação do MEA é determinante na tecnologia das PEMFC, pois é de onde se estabelece a interface trifásica gás-eletrodo-eletrólito. O preparo do conjunto de MEAs por diversas técnicas vem sendo objetos de estudos; vários processos de aplicação vêm sendo pes­quisados. O processo de produção do conjunto eletrodo membrana desenvolvido no LAPEC-UFAM, sucintamente, consiste em cinco etapas distintas: a) preparação da camada difusora, b) preparação da tinta catalítica, c) preparação do eletrodo de difusão de gás e d) tratamento da membrana polimérica e e) e prensagem a quente. Os empacotamentos membrana-eletrodos são preparados por

Figura 01 - Esquema de uma célula a combustível hidrogênio/oxigênio. Fonte: IPEN

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ultrassônico. O solvente deve ser eliminado, e o aglomerado é disperso em isopropanol, no qual é depositado quantitativamente (pintura) sobre uma das faces da camada difusora para a formação do ânodo e do cátodo. A camada catalisadora é, então, curada a 80oC por 2 horas para fixação do Náfion® .

prensagem (5 a quente (5 tonelada a 125 oC) de um par de eletrodos em ambos os lados de uma membrana Náfion® [16]. Para ACV deste estudo, os dados necessários concentram-se na fase de preparação da tinta e da camada catalítica, cujas informações sobre a composição química, a carga e a massa de catalisador de cada eletrodo são apresentados nas tabelas 01 e 02, respectivamente.

Emissões Ambientais da PEMFC: Sistema de Produção e Disposição Final A quantidade dos principais materiais do MEA e os requerimentos de energia elétrica para a manufatura de cada um destes são apresentados na tabela 03, na qual é possível identificar que a platina apresenta o valor mais significativo de requisição de energia para a produção em função

Apresenta-se a seguir um resumo do processo produtivo: Para preparação da camada catalisadora, uma dispersão homogênea contendo Pt e Náfion em isopropanol deve ser dispersa em banho

da quantidade.

Tabela 01- Composição da tinta catalítica*

Elemento

Quantidade

Unidade

Dispersão de Náfion

0,12

mL

Platina Comercial*

0,01

g

*platina ancorada em carbono (20% em massa de metal) Fonte: Baldo (2003) Tabela 02- Carga catalítica e massa estimada por eletrodo (com área ativa da célula de 25 cm²)

Eletrodo Ânodo

Carga 0,0004

Unidade g cm-2

Massa estimada 0,0100

Unidade g

Cátodo

0,0006

g cm-2

0,0150

g

Fonte: Frey &Linardi (2004)

Tabela 03- Quantidade dos principais materiais e os requerimentos em termos de energia

Materiais

Pt

Ru

Carbono

CarbonPaper

Quantidade Requerida (kg/kW)

0,83

0,21

1,25

62,36

Energia produção (MJ/kW)

164.268,35

41.348,37

501,71

87.310,00

Nafion Dispersão

Isopropanol

Água deionizada

Quantidade Requerida (kg/kW)

0,65

9,52

6,14

Energia produção (MJ/kW)

9,16

497, 84

0,12

Materiais

Fonte: KARAKOUSSIS et al (2000), modificado por FUKUROZAKI (2006)

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Os efeitos resultantes no meio ambiente e no desenvolvimento da PEMFC, relativos ao consumo de energia na produção dos materiais e na fabricação do MEA, estão diretamente relacionados à matriz energética de cada país [18]. As saídas dos processos do sistema produtivo do MEA constituem, além do próprio produto, perdas dos materiais usados na fabricação (tabela 04), bem como nas emissões ambientais (resíduos, efluentes e emissões atmosféricas) procedentes de cada fase de produção. As perdas

durante o processo podem ser consideradas por dois parâmetros: desperdícios de materiais e rejeitos oriundos de produtos defeituosos. No que diz respeito às emissões para o meio ambiente, estas foram divididas em duas categorias: ar, água. Dada a relativa importância da platina no consumo de energia para a produção do MEA e principalmente para a tecnologia PEMFC, optou-se por apresentar aqui, de forma detalhada, somente as saídas relacionadas às emissões para o meio ambiente desse catalisador (tabela 05).

Tabela 04 – Perdas de Materiais no processo de produção do MEA

Materiais utilizados nos processos

Uso (%)

Perdas (%)

Platina

98,0

1-2

Rutênio

98,0

1-2

Água deionizada1

93,7

16,3

Náfion Dispersão

93,7

16,3

Carbono

98,0

2

Tinta catalítica

90,0

10

CarbonPaper

92,5

7,5

Membrana Náfion

95,0

5

Água deionizada2

99,9

0,01

¹ Água utilizada para produzir a tinta catalítica ² Água utilizada na eliminação dos solventes orgânicos *Perdas relacionadas ao desperdício e a erros no corte FONTE: KARAKOUSSIS et.al. (2000), modificado por FUKUROZAKI (2006) Tabela 05 - Emissões para o meio Ambiente da produção de platina

Emissões para o ar

mg/kW de Platina

Emissões para a água

mg/kW de Platina

Partículas CO CO2

11272034,29 6822788,57 10775801143

DQO DBO ÁCIDO (H+)

64932,46 20022,02 665,76

SOX

3185069257,1

Sólidos dissolvidos

-

NOX

17716524,34

Hidrocarbonetos

4779,87

Hidrocarbonetos H2S HCl HF Metais

37194134,10 22025,14 2182649,94 307250,74 2850772,43

NH4 Sólidos em suspensão Metais NO3Formas de nitrogênio

23677,03 1520068,57 43142607,57 150441,99 16,49

Aromáticos- HC

76504,00

ClO3-

-

CFC/HCFC

-

Fosfato as P O

526461,82

VOC -

35608,65

Detergente/ Óleo SO4Cl-, F-

245313,37 58212200,28

Fonte: KARAKOUSSIS et.al. (2000). modificado por FUKUROZAKI (2006)

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A recuperação da platina desperdiçada durante o processo e a reciclagem do catalisador de células desativadas é uma das principais questões com as quais os produtores de CaC e empresas recicladoras de metais preciosos têm se preocupado e visualizado como uma oportunidade de negócio no setor, pois a tendência de uso da ACV para a rotulagem de produtos e a internalização das externalidades ambientais (por exemplo, taxas de carbono) poderá elevar o custo desse material no futuro.Não obstante, em muitos casos, também a ineficiência do processo pode produzir emissões adicionais, e até no caso de essas emissões não representarem um peso para as questões ambientais, o custo das crescentes perdas pode representar uma barreira para a inserção da PEMFC no mercado [18]. Assim, torna-se evidente e clara a importância da recuperação e da reciclagem de platina, pois esses procedimentos podem proporcionar uma diminuição dos requerimentos de material e reduzir significativamente o custo da produção.

Considerações Finais sobre os Estudos de ACV da PEMFC Atuante e configurando-se como uma candidata ideal para o futuro do sistema energético, a tecnologia PEMFC apresenta diversas vantagens. Contudo as informações sobre a platina evidenciam a indissociabilidade das questões ambientais em relação às econômicas, uma vez que a disposição do recurso na natureza é limitada, sua exploração envolve impactos de grande escala, e a demanda por essa matéria-prima é ampla [17]. Somado‐se requisitos de ordem ambiental, como os significativos efeitos deteriorantes da platina sobre o meio ambiente, àqueles de caráter econômico – o elevado custo desse metal, nobre por natureza –, aos técnicos, como o fato de a platina constituir‐se, atualmente, no catalisador mais viável para o sistema de energia PEMFC, a reciclagem surge como uma alternativa bastante efetiva – muito embora ainda mitigatória – para que os processos de produção de PEMFC sejam de fato sustentáveis.

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Dentre os principais resultados obtidos na avaliação do ciclo de vida, pode-se ressaltar que a célula a combustível PEMFC apresenta, durante o uso, vantagens ecológicas em função dos baixos índices de emissão de gases do efeito estufa, o que é especialmente importante para áreas urbanas com condições ambientais severas [16, 19, 20]. Contudo a produção do módulo apresenta impactos, principalmente relacionados aos metais do grupo de platina, que não podem ser negligenciados quando comparados à utilização de motores de veículos comuns. Não obstante é sempre importante ter em mente que as barreiras ambientais e econômicas à produção de qualquer produto – e o caso da PEMFC não é diferente – caminham juntas. Nesse sentido, o uso de técnicas de caráter sistêmico, tais como a ACV, ou variações, como a análise de sustentabilidade para a avaliação do desempenho ambiental dessa tecnologia, sobretudo durante a fase de manufatura, constituem ganhos significativos para a manutenção da condição de alternativa sustentável à matriz energética mundial [19]. A crescente preocupação com os impactos ambientais gerados pela provisão de bens e serviços à sociedade tem sido indutora do desen-

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volvimento de novas ferramentas e de métodos que visam a auxiliar na compreensão, no controle e/ou na redução desses impactos. A ACV vem se mostrando como uma importantíssima ferramenta para auxiliar em estudos dessa natureza, por considerar o impacto ambiental ao longo de todo o ciclo de vida do produto: da extração das matérias-primas utilizadas à produção, ao uso e à disposição final [9, 13]. Dentro desse contexto, a ACV também se mostra muito eficiente na análise e na redução de custos industriais, evidenciando benefícios econômicos e estratégicos perante uma adequada política ambiental, que afeta diretamente o comportamento da organização em relação às legislações ambientais vigentes. Nesse panorama, pode-se concluir que os objetivos estabelecidos nesta pesquisa foram atendidos, inclusive no que se refere às exigências do estudo da ACV. Portanto o desenvolvimento do processo de recuperação e o posterior método de reciclagem da platina da PEMFC devem ocorrer concomitantemente à Avaliação do Ciclo de Vida, uma vez que tal instrumento fornece a visão necessária para subsidiar as estratégias de desenvolvimento e de inovação da tecnologia.


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T&C Amazônia Ano IX, Número 22, I Semestre de 2012

(UFAM), e membro do grupo LAPEC- Laboratório de Pesquisa e Ensaios de Combustíveis da UFAM. (denisodocort@yahooo.com.br) Luciana de Souza Freire é Química, atualmente cursando mestrado no Programa de Pós-Graduação em Química (PPGQ), na linha de pesquisa Físico-química, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), e membro do grupo LAPEC - Laboratório de Pesquisa e Ensaios de Combustíveis da UFAM. (luciana-freire@uol.com.br) Raimundo Ribeiro Passos possui graduação em Licenciatura Plena pela Universidade Federal do Piauí (1997), mestrado em Físico-química pela Universidade de São Paulo (2001) e doutorado em Físico-química pela Universidade de São Paulo (2005). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do Amazonas. (rdopassos@gmail.com) Elizabeth Ferreira Cartaxo é graduada e mestre em Engenharia Elétrica pela UFCG/PB. Doutora em Planejamento Energético pela UNICAMP/SP. Professora Associada II do Curso de Graduação em Engenharia Elétrica e do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Recursos da Amazônia (PPG-ENGRAM) da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Coordenadora do Núcleo de Energia, Meio Ambiente e Água (NIEMA) da Faculdade de Tecnologia da UFAM. (ecartaxo@ufam.edu.br)




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