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LUZES COLETIVAS

COLETIVO 7MULHERES APRESENTA A EXPOSIÇÃO NOITE: PAISAGENS IMAGINÁRIAS , EM CURITIBA

A DICOTOMIA ENTRE a luz e as sombras é bíblica, sociológica, filosófica, astronômica e até matemática. Na Teoria Criacionista, Deus separou as luzes e as trevas logo no primeiro dia. Para a ciência, foi uma grande luz que tornou vivo tudo aquilo que era sombra.

Aristóteles observava o céu por meio de uma caixa escura. Com ela, ele enxergava o infinito. Os registros ajudam a entender o ínfimo da existência humana no presente. Leonardo Da Vinci a percebeu como um apoio para aprimorar os desenhos. E o físico Girolamo Cardano encontrou na len - te biconvexa a solução para aumentar a nitidez dos objetos refletidos e impulsionar a fotografia como conhecemos hoje, uma comunicação que vai além dos registros de imagens.

“Nós usamos a fotografia como linguagem de arte”, declara Luciana Petrelli, que destaca a importância da fotografia e da arte como um movimento de expressão e reflexão acerca da realidade do mundo e da própria realidade. “Você pode não ter a mesma leitura, mas precisa ter alguma leitura”, evidencia a fotógrafa ao mencionar a importância da pluralidade de expressões.

A variedade é refletida, inclusive, no Coletivo 7Mulheres, grupo do qual a artista visual faz parte e que contribui para o Núcleo de Estudos em Fotografia e Arte (NEFA) de Florianópolis (SC).

Desde 2018, a fotógrafa se une à Ana Sabiá, Betinha Trevisan, Dirce Körbes, Lucila Horn, Ro Cechinel e Soninha Vill para registrarem diversos conceitos sob a ótica de cada uma delas.

Ana Sabiá explica que o grupo reforça a união de artistas mulheres. A professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) detalha os pontos fortes do coletivo: “a potência de ir além dos estereótipos físicos, etários e de gênero, afirmar nossa lucidez e sensibilidade e investigar os desafios e descobertas de se tornar aquilo que escolhemos como mulheres, latino-americanas, cidadãs e agentes de transformação de mundos”, descreve.

As participantes do conjunto têm mais de 40 anos e, mesmo com diferentes histórias, constroem juntas os trabalhos que se propõem a publicar. Essa diversidade de trajetórias justifica as técnicas usadas pelas artistas. Lucila Horn, artista e curadora, pontua que além da fotografia, algumas das integrantes do grupo usam pintura, desenho e a criação de objetos para ilustrar os temas. “Buscamos pensar que o trabalho não é a fotografia em si, mas tudo o que envolve sua apresentação”, esclarece.

Dessa forma, a fotografia faz mais do que apenas trazer luz ao olhar dessas sete mulheres. Körbes fala da importância do movimento: “o coletivo nos proporciona a possibilidade de trocar experiências e conhecimentos, de falarmos sobre nossas poéticas e de refletir sobre os nossos processos.” A artista visual completa que o Coletivo 7Mulheres é uma oportunidade para que elas interajam criativamente, apoiem-se e, principalmente, fortaleçam as atividades e os projetos próprios.

NOITES: PAISAGENS IMAGINÁRIAS

O Coletivo 7Mulheres expõe ao público a mostra Noites: Paisagens Imaginárias . Criada em 2019, a arte traz a noite como um conceito que representa mais do que apenas a escuridão.

As artistas focam temas como machismo, racismo, consumismo e devastação ambiental. A mostra, por definição, é “um chamado ao sensível em um processo de pesquisa e criação que trouxe à luz as inquietações de cada artista, sempre debatidas e fortalecidas em grupo”.

A arte-educadora Ro Cechinel sintetiza a experiência de participar da criação em grupo: “refletir sobre a noite foi como remexer em um caldeirão de sentimentos e sensações”, relata. Para ela, realidade e fantasia se mesclam em um espaço de prazer, medo, ilusão e dor.

Conceitos como vazio, abandono, conflitos de classe e o contraste com a fuga e a busca para um novo lugar e um novo caminho são citados pela fotógrafa Soninha Vill como um ambiente comum entre as obras.

“A ideia é instigar o imaginário fundindo imagens de lugares distintos ou distantes, Sul e Norte, por exemplo, transformando imagens reais em uma realidade imaginária”, conclui a artista visual Betinha Trevisan.

A Exposi O

Em 2023, após um hiato causado pela pandemia da Covid-19, Noites: Paisagens Imaginárias chega a Curitiba. Os espectadores poderão conhecê-la de 9 de março a 14 de abril de 2023 no Espaço BRDE, que fica no Palacete dos Leões.

A entrada é gratuita, mas é necessário agendar a visita online. x

A noite sob o olhar de Luciana Petrelli. Para a artista, “a noite oferece mistério”.

"A noite é silêncio” é a frase que conceitua a obra de Dirce Körbes.

“Noite como sombras que ofuscam os dias”, em obra de Soninha Vill.

Sensibilidade Visual

FOTÓGRAFA COM MAIS DE 40 ANOS DE CARREIRA REGISTRA A HISTÓRIA POR MEIO DE UM TRABALHO

ATUAL, DELICADO E CONTUNDENTE

VILMA SLOMP É uma de nossas fotógrafas de maior prestígio, reconhecida nacional e internacionalmente. Possui cinco livros publicados e dispensa apresentações. Esta coluna já estava devedora há algum tempo do registro desse excepcional trabalho, que se constitui de maneira sólida e potente.

São mais de 40 anos de história, dos registros mais líricos e poéticos aos temas mais contundentes e engajados. De soluções mais artísticas – como quando formatava as imagens de acordo com o perímetro do que estava sendo fotografado – a soluções mais próximas do fotojornalismo. Dos surpreendentes registros de culturas longínquas em oposição aos do nosso entorno social e urbano mais imediato. Sempre de maneira elegante e sensível, transita pelos diversos temas da atualidade. Para esta coluna, selecionamos ensaios de algumas das inúmeras visitas feitas por Vilma às populações indígenas e ribeirinhas do Amazonas. Deparamo-nos com imagens de rara beleza, de indígenas com seus corpos pintados de maneira geométrica, em cores chapadas e adereços têxteis. Abordagens amplamente experimentadas pela arte dita culta e erudita, sem nos darmos conta do quanto somos devedores de culturas que, até pouco tempo, foram erroneamente chamadas de primitivas. Nas imagens das populações e paisa - gens ribeirinhas, ressurge um Brasil profundo, não menos intrigante e desconhecido, quando a paisagem natural se impõe de maneira desabrida, condicionando inteiramente a vida dessas populações carentes e mal assistidas.

Organizamos este material em momento prévio às notícias da tragédia que já se abatia em território Yanomami, ocupado ilegalmente pela mineração e pelo tráfico. A expansão de um processo cruel e agudo de extermínio de nossos povos originários faz deste registro algo dramático e contundente, mais urgente do que poderíamos inicialmente supor. Boa fruição.

– Marcos Bertoldi.

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