3 minute read
EDUCAÇÃO
E D U C A Ç Ã O EDUCAÇÃO PARA COMPREENDER A ABOLIÇÃO (INCOMPLETA) DA ESCRAVATURA
Moacir Castro (11) 9.7544- 1682 moasilcas@gmail.com
Advertisement
Os negros escravizados (ainda que vários currículos escolares desprezem esse dado) tiveram um papel fundamental no processo que culminaria com a assinatura da Lei Áurea. Porém, é preciso enfatizar o esforço para esquecer um passado incômodo da escravidão no Brasil, que foi acompanhado pela construção de uma memória seletiva do processo de emancipação, que apresentava a Lei Áurea como uma dádiva concedida pela figura da princesa Isabel, amparada pela ação apenas dos abolicionistas brancos e dos parlamentares da época. Essa imagem idealizada do 13 de maio de 1888 produziu uma série de silêncios sobre as batalhas pela Abolição, marcada pela edição de jornais que reivindicavam o fim da escravidão, fugas coletivas, participação da classe trabalhadora organizada em associações, meetings abolicionistas, refregas nas ruas etc. Tentava-se, assim, desmobilizar os cenários, desqualificar os personagens, enfraquecer a força política e os desdobramentos da Abolição, remetendo a escravidão e os ex-escravos para um passado distante. Foi dessa forma que o 13 de maio entrou para o nosso calendário cívico. Em 1898, a comemoração dos primeiros dez anos da Abolição já tinha o caráter de feriado nacional, com atos cívicos e religiosos e com repartições públicas sem expediente. Em 1908, a data seria comemorada com salvas de tiros de navios de guerra e fortalezas militares foram especialmente embandeiradas. Aconteceu até um quase carnaval no Rio de Janeiro, organizado pelo Clube dos Fenianos. Em 1938, quando foram comemorados os 50 anos da Abolição, o presidente Getúlio Vargas, em pleno Estado Novo, oficializou os festejos em todo o território nacional. A comemoração da assinatura da Lei Áurea, porém, não ficou restrita às missas, manifestações públicas, marchas escolares, execução de hinos, bandas musicais e paradas militares. Os jornais do final do século XIX mostram que, após os primeiros aniversários, as celebrações oficiais passaram a ser acompanhadas por protestos populares, homenagens póstumas a abolicionistas, críticas às diretrizes republicanas e reivindicações da população negra. O final do século XIX e o início do XX foram marcados por uma batalha (protagonizada sobretudo pelo Movimento Negro) pela memória das lutas populares abolicionistas e pelas demandas de integração e cidadania. Em várias regiões do país surgiram associações, entidades e clubes formados por libertos e pela população negra em geral, pertencentes tanto aos setores literários quanto aos meios operários ou recreativos. O principal apelo organizativo era reunirse para tratar de assuntos do interesse dos “homens de cor” ou das “classes de cor” . Nessa época, surgiu um vocabulário político próprio dos negros, por meio do qual avaliavam sua inserção na sociedade, suas demandas, seus comportamentos, suas estratégias, suas formas de atuação e suas denúncias e protestos contra a ordem social vigente.
Os ex-escravos e libertos reagiam, assim, à inexistência de políticas públicas no pós-1888 para incorporar milhares de pessoas a uma sociedade até então de cidadania restrita por meio do acesso à terra, ao trabalho e à educação. Pelo contrário: o silêncio sobre a integração dos ex-escravos e os limites da sua cidadania, misturado à truculência contra a população pobre urbana, sugere mesmo a institucionalização de um modelo – nem sempre explícito legalmente, mas vigente em práticas e políticas públicas adotadas – de intolerância racial que seria adotado no século XX pelas elites e pelo poder público do país “civilizado” .
Abraços e cuidem-se! Fonte: www.geledes.org.br
Moacir Castro Professor e Pesquisador