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FINTECHS

TEXTO E REVISÃO: DAVI DA COSTA OLIVEIRA DIAGRAMAÇÃO E INFOGRAFIA: ISIS CANONICI BARRADA REVISÃO E PRODUÇÃO: HENRIQUE CUNHA BUENO FOTOS E ILUSTRAÇÕES: RAFAEL CALDEIRA DE ALMEIDA PRADO

FINTECHS QUEBRAM PARADIGMAS

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STARTUPS FINANCEIRAS ATENDEM UM PÚBLICO SELETO E POSSIBILITAM NEGÓCIOS DE IMPACTO SOCIAL

Nas décadas de 70 e 80, os filmes futuristas apresentavam as possíveis soluções tecnológicas. Em comum, os gadgets eram instantâneos, ou seja, você apertava um botão e em poucos segundos estaria na cidade — ou galáxia — que desejava ou teria a comida pronta em mãos. No mesmo período, o

Brasil via as agências bancárias se espalharem em cada esquina e esse fenômeno acabou por concentrar a renda brasileira em cinco “bancões”: Itaú,

Banco do Brasil, Bradesco, Caixa e Santander.

Ao contrário dos filmes, os bancos não tinham respostas rápidas naquela época. Para pagar uma

Wesley Queiroz leva uma vida agitada e não vai ao banco pagar contas ou utilizar serviços

conta, fazer transferência e até sacar dinheiro, era necessário enfrentar uma fila, antes de poder resolver com um bancário, engravatado. Mesmo após algumas décadas e com a democratização do acesso à internet, boa parte dos serviços, ainda precisam ser feitos em agência bancária, como é o caso de solicitação de financiamento ou o aumento da linha de crédito.

No entanto, desafiando esse método burocrático, com o auxílio da tecnologia, as fintechs apresentam soluções financeiras digitais, mais práticas e com custo baixo ou isento. Um exemplo, é a startup brasileira Nubank, que começou oferecendo um cartão de crédito sem anuidade e agora já permite aos clientes terem uma conta digital gratuita e contratar empréstimos, usando apenas o aplicativo no smartphone.

Aproveitando da praticidade dos serviços que as fintechs oferecem, o jornalista Wesley Pacini, 23, decidiu abrir uma conta no Nubank, que em menos de 7 anos tem se popularizado entre os jovens.

“Nunca tive uma boa experiência nas agências bancárias e quando descobri o Nubank, adorei a proposta”, explica. O objetivo do banco é bem simples: centralizar todos os serviços bancários em um único aplicativo.

“No Nubank, posso fazer transferências, solicitar mais crédito, pagar contas ou pegar um empréstimo, entre outras coisas. É tudo muito fácil e intuitivo, então, nem preciso ir até uma agência”.

POTENCIAL

Nascidas no mundo digital, as primeiras fintechs surgiram no Brasil, por volta de 2010. Elas não contam com grandes estruturas físicas, como agências bancárias, o que diminui os custos, podendo oferecer serviços mais baratos ou gratuitos. Apesar disso, as fintechs geralmente não apresentam lucro de início, mas possuem grande potencial de crescimento.

Para ganhar dinheiro, as startups também podem contar com investidores. No caso do Nubank, ele recebe do estabelecimento um percentual do valor de cada compra realizada através da bandeira do cartão. Os bancos digitais também ganham com juros de financiamento, quando um cliente decide financiar parte ou o total do valor da fatura.

O especialista em mercado digital Luciano Si-

mões acredita que os bancos digitais têm desempenhado um importante papel para forçar uma evolução no atendimento.

“O sucesso das fintechs mostra que a digitalização de serviços pode tornar uma agência bancária disfuncional. Um dia não veremos mais tantos postos de atendimento”, esclarece Simões.

Ele explica que o surgimento do Nubank chega em ótimo momento por conta de uma forte demanda das novas gerações, que buscam tarifas menores, comodidade, funcionalidade, rapidez. Bancos e contas digitais costumam trabalhar com tarifas zero e transferências gratuitas e ilimitadas. Contudo, ele ainda ressalta que os bancos tradicionais não devem sentir impactos significativos por hora.

“As fintechs não têm o porte desses bancos. Os “bancões” são muito grandes e podem se adaptar, fazendo frente a essa concorrência digital, tanto que devagarzinho alguns começaram a oferecer propostas de contas digitais, para fazer concorrência a essa situação”, complementa.

DESBANCARIZAÇÃO

Do mesmo modo que os bancos tradicionais estão se reinventando para fazer frente às startups financeiras, outras ideias surgem com a finalidade de atender outros públicos. Uma é a Conta Black, que se propõe a resolver o desafio da desbancarização e, consequentemente, a exclusão financeira.

Encabeçada pelo empreendedor Sergio All, 46, a Conta Black é uma conta digital voltada para o público distante do sistema bancário. Segundo dados do executivo, o número de pessoas sem acesso ao sistema bancário chega a 45 milhões de pessoas, das quais 69% são negras. Isso significa que, a cada três brasileiros, um não possui conta bancária.

Detalhe: mesmo à margem do sistema financeiro, esse grupo movimenta anualmente no país mais de R$ 800 bilhões, sendo mais da metade em espécie.

O surgimento da ideia da fintech está ligada à

“O sucesso da Nubank e outros bancos digitais mostra que a digitalização de serviços pode tornar uma agência bancária disfuncional

Luciano Simões, Economista especialista em mercado digital

vivência de Sergio enquanto homem negro. “Eu precisava trocar 50% das máquinas da minha agência de produção de sites, e precisava de recursos. Na hora de pedir o empréstimo, o gerente me respondeu com um sonoro ‘não’, relembra All, com os cotovelos apoiados sobre a mesa e uma expressão de incredulidade.

Ele explica que a resposta não fez nenhum sentido à época, já que mantinha um bom relaciona-

COBRANÇA DE TARIFAS

Um dos principais motivos apontados pelos clientes para abrirem uma conta nos bancos digitais é a diferença na cobrança de tarifas para serviços corriqueiros.

A maior parte dos bancos tradicionais cobra taxa de anuidade de cartão de crédito, além de valores para transferência para outros bancos, via DOC ou TED, por exemplo, enquanto que as fi ntechs cobram apenas tarifas para saque.

ATENDIMENTO ONLINE

Outra diferença entre bancos digitais e bancos tradicionais é a praticidade. Todo mundo já sofreu na espera de fi las de bancos ou do atendimento telefônico para resolver problemas simples. Já as Fintechs oferecem a possibilidade de resolver praticamente todas as questões por meio do próprio aplicativo.

EDUCAÇÃO FINANCEIRA

Os bancos digitais, como Nubank, Next e Conta Black, investiram para que seus aplicativos fossem intuitivos o sufi ciente para facilitar a navegação e a operação de seus clientes. Algumas ferramentas também ajudam o usuário a controlar melhor suas fi nanças. Em bancos tradicionais, a linguagem é mais formal e difi culta o entendimento das novas gerações.

AGÊNCIA FÍSICA

Dentre as pessoas que não conhecem muito bem as fi ntechs, 50% se sentem inseguras pelo fato de não haver agências físicas. Esse é um ponto positivo dos bancos tradicionais. Dentre os que conhecem, esse receio cai para 22%.

Esse é um serviço considerado essencial, como um ponto de segurança, caso alguma coisa dê errado. De certa forma, para muita gente é preciso ter algum lugar onde você vá pessoalmente resolver algum problema ou mesmo realizar um saque ou depósito, por exemplo.

Sergio All empreende desde cedo e hoje tem o sonho de criar um banco gerenciado por pessoas pretas, algo até então inédito no País. Entre as quase mil startups no Brasil, apenas All é um gestor preto.

mento de anos e contava com uma boa pontuação. “A resposta foi muito fria por parte do gerente. No dia, ele disse que não conseguia liberar, mas hoje vejo que não queria", detalha agora frente a um banco digital com expectativa de atender mais de 20 mil clientes neste ano. "Dados de mercado mostram que o negro tem crédito negado até três vezes ou mais em comparação ao branco. O gerente costuma ver o empreendedor negro com desconfiança e os próprios algoritmos dificultam o acesso a crédito, levando em consideração a cor e o CEP, que pesam muito”, esclarece All.

Com isso em mente, All decidiu criar um banco ainda em 1999. Porém, a tecnologia ainda não permitia pôr a ideia em prática e por isso o projeto da Conta Black seguiu engavetado até 2017.

Para Sergio All, único gestor negro de uma fintech brasileira em um universo que se aproxima do seu primeiro milhar, o processo de disrupção é apenas o começo. "Hoje, nos vemos desafiados. Queremos redesenhar esse novo modelo de impacto social e mostrar aos nossos clientes que eles estão envolvidos em ações positivas, como a doação de uma bolsa de estudo e um cashback - programa de reembolso, em que uma porcentagem do valor gasto é devolvida ao titular do cartão de crédito - por confiar em nossos serviços”.

Sobre como fazer isso, o empreendedor explica que a meta da Conta Black é ter 20 milhões de contas digitais para ser convidada pelo Banco Central a se tornar um banco, alocando recursos onde quiser e permitindo que mais empreendedores marginalizados ingressem no sistema bancário. 15

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