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One Day at a Time
a quebra da família tradicional norte-americana
por VITÓRIA SILVA (@vivisgms)
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Imagine um retrato de uma típica família norte-americana. Agora substitua por uma mãe ex-militar divorciada, uma filha lésbica, um filho latino e uma avó imigrante cubana. Essa é a receita perfeita e incomum que deu origem a (nova versão da série) ONE DAY AT A TIME. Produzida pela Netflix e lançada em 2017, a produção é um reboot da sitcom de mesmo nome, originalmente lançada em 1975. Ambientada na cidade de Los Angeles, esta versão retrata o cotidiano da família cubano-americana Alvarez, formada por Penelope (Justina Machado), Elena (Isabella Gómez), Alex (Marcel Ruiz) e Lydia (Rita Moreno).
Justina interpreta uma veterana do corpo de enfermagem do exército dos Estados Unidos, com o desafio de criar seus dois filhos após se divorciar do seu marido alcoólatra. A matriarca conta com a ajuda de sua mãe Lydia, uma imigrante que deixou Cuba durante a ditadura de Fidel Castro – em um episódio histórico conhecido como Operação Pedro Pan, um êxodo em massa de mais de 14 mil cubanos menores de idade desacompanhados. A filha mais velha, Elena, é extremamente engajada em causas sociais, diferente de seu irmão, Alex, que ainda tem muito a aprender com os problemas da adolescência e passa grande parte do tempo sendo mimado por sua avó.
Outros personagens acabam integrando o ambiente familiar do apartamento dos Alvarez. Um deles é Schneider (Todd Grinnell), canadense e síndico do prédio, que acaba assumindo uma imagem paternal para Elena e Alex e é um dos maiores alívios cômicos da série. Além dele há o Dr. Leslie Berkowitz (Stephen Tobolowsky), chefe de Penelope, que assume a posição de “fiel escudeiro” de Lydia e acaba por tornar os desastres da sua vida, em especial a difícil relação com sua filha, em algo tragicômico.
Na primeira temporada, o grande enfoque é a questão LGBTQI+ por meio do arco de Elena, que se assume lésbica para a família, posteriormente precisando lidar com todo o processo de aceitação por parte de seus parentes (e dela mesma). Já na segunda temporada, assuntos como depressão, xenofobia e a relação dos imigrantes nos EUA são trabalhos na série em grande profundidade, sempre de uma forma leve e educativa.
Após ser ameaçada de cancelamento, One Day At A Time conseguiu ser renovada para uma terceira temporada, principalmente graças ao apoio dos fãs nas redes sociais. Com a sequência garantida, o novo ano levantou diversas questões pertinentes na sociedade, como, por exemplo, a ansiedade e o alcoolismo. No entanto, apesar de manter a variação entre o drama e o humor, é notável uma escassez de fôlego em relação ao desenrolar as temáticas, com algumas discussões extremamente rasas e que rodeiam o humor escrachado.
A temporada não tem uma linha cronológica bem definida, com episódios que parecem independentes uns dos outros, em que a duração do castigo do Alex e a “bouquet list” de Lydia são alguns dos pequenos detalhes que estabelecem uma conexão e conseguem nos localizar no tempo. Dessa forma, os temas abordados acabam soando avulsos e pouco desenvolvidos nos 25 minutos de cada episódio. Ainda, o peso dramático dado a cada um destes assuntos não possui um devido balanceamento, tendo questões como o alcoolismo de Schneider sofrendo com a falta de aprofundamento, enquanto simples conflitos entre irmãos são excessivamente dramatizados, beirando a exaustão.
Mesmo com decaídas na nova temporada, ainda restam elogios à One Day At A Time, principalmente no quesito atuações. A começar por Justina Machado, que merece grande destaque por ainda conseguir estabelecer a ponte perfeita entre o cômico e o dramático, sem causar um efeito brusco e “novelesco”. Mas a premiada Rita Moreno é quem consegue roubar o foco da série em todos os segundos de aparição na tela. Desde sua primeira entrada teatral em meio às cortinas, a atriz transparece naturalmente à fidelidade cubana de Lydia, especialmente no seu sotaque forte – e ainda há, é claro, as diversas entregas das melhores tiradas da série.
Entre os principais destaques da nova temporada estão também às participações especiais, que contam com duas atrizes já bem conhecidas pelo público das sitcoms: Melissa Fumero e Stephanie Beatriz, ambas da série Brooklyn Nine-Nine, além da intérprete da música-tema da série, a veterana cantora cubana Gloria Estefan. Além disso, o roteiro dá mais espaço para a terapia em grupo da qual Penelope participa, tornando este espaço um refúgio da personagem para tratar sobre seus problemas pessoais e questões familiares.
One Day At A Time se arrisca – e faz isso muito bem – ao misturar o drama com a comédia, em uma abordagem mais leve e um humor mais fraco que o de temporadas anteriores. Mas é sempre de suma relevância ressaltar a importância da sitcom, que trata de pautas extremamente pertinentes nos dias atuais, estimulando diversas reflexões ao mesmo tempo que entretém. Além disso, a produção consegue se destacar no meio da grande maioria de concorrentes, que repetem a mesma fórmula e muitas vezes não conseguem passar da supercialidade e entreguem (muito) menos do que o planejado.
Uma coisa é certa: não há como assistir One Day At A Time sem se identificar com as personagens ou com os próprios conflitos de gerações vividos entre eles. A vida dos Alvarez tem conquistado um público cada vez maior, que se sente extremamente acolhido e representado no cotidiano da família cubana. Que venha uma próxima temporada! //