Revista Prática Urbana #1 - Parte 4: Vocabulário de elementos urbanos

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VOCABULÁRIO DE ELEMEN TOS URBANOS

Luca Narracci gravando sessão de skate em 2019 - Vale do Anhangabaú pré-reforma

Este ensaio, intitulado de vocabulário de elementos urbanos, tem como propósito ressaltar através de fotografias e textos os componentes básicos que promovem os movimentos do skate na sua ocupação da cidade. Isso vale para qualquer cidade no mundo, pois a prática do skate parte das mesmas premissas básicas. Contudo, o que torna cada lugar único é a sua arquitetura, a sua infra-estrutura e a sua cultura local –fatores que proporcionam maneiras diferentes de performar o skate em cada cidade.

Para execução deste ensaio, elenquei algumas diretrizes para conseguir representar de modo simples o assunto aqui tratado. Em um primeiro momento, selecionei 6 elementos dos mais essenciais para o skate urbano, sendo eles: o chão; o banco; a escada; o corrimão; a parede ou inclinação; e o desnível. Após isso, entrando em cada elemento, retratei um mesmo ambiente em três situações diferentes: primeiro do elemento sozinho sem nenhuma interferência; em seguida o elemento sendo ocupado pelo uso que lhe foi dado; e por último, o skate reinterpretando o uso "original" do elemento.

Todas as fotos foram feitas na manhã do dia 11/11/22, no Vale do Anhangabaú, em São Paulo. Estas foram tiradas com um tripé para que o registro fosse sempre do mesmo ponto de vista, de forma a facilitar a compreensão das mudanças em cada imagem. O skatista manauara Maikon Quaresma, que atualmente reside na cidade de São Paulo, foi convidado para performar no ensaio. Acrescenta-se aqui o critério ter a mesma pessoa em todas as fotos para estabelecer unidade e continuidade ao conjunto.

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CHÃO

O primeiro elemento apresentado neste ensaio é o chão, pois acredito que esta é a base para a construção da prática urbana que entendemos como skate. Este chão duro, liso, às vezes quebrado, com todas as variações possíveis que permitam a roda de poliuretano do skate percorrer pelo espaço urbano. A superfície plana ou inclinada se dá como apoio aos outros elementos que fazem o skate acontecer.

Caminhando com o óbvio, é claro que o chão muda de país para país, de estado para estado, de cidade para cidade e de bairro para bairro. Existem muitas maneiras de se construir um piso e muitas formas de identificar os contrastes sociais e econômicos, em que há variações de qualidade de chão – lisos, quebrados, etc.

É evidente que quanto mais liso o chão, melhor a rodinha do skate vai ser rodada. Porém, essa não é a realidade da prática do skate no Brasil e, especificamente, no centro de São Paulo, onde andamos em diversos tipos de "terrenos" como: a clássica pedra portuguesa mal cuidada do centro; o asfalto mal feito e que muitas vezes até treme/formiga nossas pernas; o piso "oficial" das calçadas de São Paulo – aquele piso que tem um desenho que lembra o desenho do estado de São Paulo no mapa –; e o mais recente deles, o grande "concretão" da explanada do novo Vale do Anhangabaú, que talvez seja a maior área com piso liso e skatável na cidade inteira. A seguir poderemos ver tudo o que esse novo chão do centro de São Paulo pode proporcionar para a prática urbana: o percurso; o encontro; o pulo; o deslize; a queda; a execução; a ativação; a satisfação; e o conflito.

elemento

CHÃO

Anterior à Praça das Artes, próximo ao íngreme acesso ao Vale pela lateral da Praça Ramos de Azevedo, o trecho escolhido para a fotografia está muito perto de um par de quiosques que, na escala macro do novo projeto, não tiveram um uso definido, tornando-se obsoletos. Além disso, o piso reformado é de concreto de boa qualidade, substituindo o antigo de pedra portuguesa. Contudo, a ausência de pisos alagáveis para absorção de água, restando apenas um infinito chão liso concretado, faz do espaço um grande vazio árido e cinzento, que possui momentos de sombra apenas em suas bordas.

O chão, obviamente, é um elemento feito para pisar: deslocar; locomover-se pelo espaço. É o meio que conecta pontos de partida e de chegada em um trajeto. O chão do Vale, se propõe como uma grande esplanada para passantes cruzarem e repousarem. Ademais, seu aspecto liso e bastante horizontal, torna dele um elemento capaz de abrigar outros objetos de movimentação. Aí surge o skate, a bicicleta, o patins, etc., como objetos urbanos que podem apropriar-se do espaço público - do seu chão - para inventar novas possibilidades de uso.

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CHÃO

Na manhã em que a imagem foi feita, trabalhadores estavam desmontando a estrutura de um evento musical que ocorreu dias antes no Vale. Com isso, encontramos muitos materiais de madeira jogados pelo chão deste espaço e assim pensamos em montar alguns "obstáculos”, tendo este possível banco de madeira empilhada como um dos resultados. A ideia de criar algo para o elemento do chão, surgiu para criar novos imaginários da função deste elemento, que por muitas vezes é pensado apenas como o espaço de circular com o skate. Em outras possibilidades busco evidenciar essa potência do chão em dar impulso, mobilização que é necessária para todos os movimentos do skate.

prática

BANCO

Dando sequência ao chão, o banco, talvez um dos elementos mais ordinários dentro do nosso imaginário do espaço urbano, entra como elemento que, em uma linha de aprendizado comum do skate, é um dos primeiros obstáculos que começamos a usar. O skate salta e sobe neste obstáculo, onde ele pode apenas subir, pode deslizar com os eixos (grind) do skate, ou até mesmo deslizar com o "shape" – que no caso é a prancha (slide). Essas são as três maneiras mais tradicionais que o skate se projeta sobre o banco, sendo este de concreto, de madeira, de concreto com madeira, de madeira plástica ou o que estiver em nossa frente. Como sabemos, o banco tem uma função definida. Entretanto, este espaço dá margem para outros tipos de ocupações, principalmente em países e cidades com questões de desigualdades sociais como no Centro de São Paulo, evidenciado neste contexto atual pós-pandêmico, onde cada vez mais aumenta o número de pessoas em situação de rua. Cabe notar que os usos e as práticas no espaço público da cidade que são vistas como atividades fora das funções

previstas muitas vezes são tratadas como erro e jogadas como lógicas inversas ao funcionamento normal – tal como desvios e rupturas no sentido infeliz dos termos. O skate se coloca nesses termos de uso indesejado e as políticas públicas normalmente reforçam em suas ações um programa conservador e higienista que se ativa através da repressão. No caso do uso dos bancos dentro da prática do skate, há o sistemático controle que se apresenta na tentativa de criar novos modelos de banco para os espaços de uso coletivo, que possuem divisórias, travas e arcos metálicos que inibem até mesmo a possibilidade de uso para pessoas em situação de rua que necessitam destes lugares para abrigarem-se – uma vez que não há políticas públicas de auxílio moradia para a larga porcentagem de habitantes que estão nesta situação. Com base nestes obstáculos criados para as ocupações indesejadas da cidade, o skate evolui e cria cada vez mais novas maneiras de performar no espaço público urbano. Enquanto o chão da cidade não for inteiro de grama, o skate continuará existindo e se reinventando.

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BANCO

Foi escolhido este banco, localizado em uma parte do Vale próxima ao Viaduto do Chá e de algumas das escadarias que dão acesso a rua Líbero Badaró. Ele faz parte dos novos bancos de concreto construídos na última reforma do Vale: tem seu formato geométrico que remete as arquibancadas do antigo projeto do Vale; acabamento em concreto deixando-o bem liso; e quinas minimamente anguladas. Um dos motivos da escolha deste foi a sua altura, pois bancos baixos geralmente são mais fáceis de andar por não demandarem tanto esforço para subir - sua altura é de 0,30m.

Os bancos do Vale, em boa parte, não só foram feitos para as pessoas sentarem, mas também para contornar os canteiros de árvores no local. A parte escolhida é visivelmente mais baixa que as outras partes do banco, por isso que poucas pessoas escolhem esta para sentar. Como vemos na foto, dois homens escolheram a parte ao fundo, em que o banco tem uma altura maior e uma sombra mais definida, além de um recuo que o seu desenho promove, criando uma maior sensação de conforto. Em sua função de canteiro, é possível observar, a partir da imagem, que estes são fechados com grades metálicas ao fundo.

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BANCO

Na foto acima, o skatista executa a manobra chamada "backside tailslide". Em tradução literal, seria algo como deslizamento traseiro: ele dá um pulo; vira o corpo com um giro 900 de costas para o banco; encaixa a ponta traseira do skate; desliza até o fim da borda. Pelo motivo de ser um banco bastante usado pelos skatistas, a intensidade do uso acaba criando manchas escuras em sua quina. Isso se dá por conta da vela que passamos no banco para deslizar o skate, e são características como essa, da mancha escura na quina, que faz ser possível distinguir, até de longe, se algum skatista já passou por ali e se é um banco propício para a prática.

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ESCADA

A escada, a depender de sua altura, pode ser o ápice do skate urbano em seu distanciamento do chão. Esta, é usada de similarmente dentro da prática do skate. Ele pode, se a escada permitir fisicamente tal ação, pula-lá para descer ou pula-lá para subir.

É interessante colocar em ordem de aparição a escada após o banco. Isto se dá pois é intrigante reparar como a escada pode simultaneamente ser um elemento de passagem – conectando um lugar de um nível com um lugar com outro nível – e também pode virar um local de estar – usando o espaço do patamar do degrau para sentar e desorganizar a lógica que existe em uma escada como lugar de circulação. É em situações de desordem que o skatista entra como praticante de pulos em escadas; de forma que de repente pode aparecer alguém saltando uma escada e quase atingindo um passante no caminho. A temática das escadas dentro do universo do skate é tão importante

que até temos um "hall" das escadas clássicas de cada região/cidade. No Centro de São Paulo não é diferente, desde as mais famosas nos anos 1990, até as mais recentes construídas. Dentre elas, as pequenas escadas da praça de alimentação da estação São Bento do metrô foram palco dos primeiros pulos de skate pelo centro de São Paulo. Há também: as sequências de escadas da recente Praça Roosevelt; a nova e já muito famosa escada do Vale do Anhangabaú – que vemos ao lado; e a emblemática escadaria da Igreja da Praça da Sé – talvez o maior desafio do skatista contemporâneo da cidade de São Paulo –, onde poucos tiveram a coragem de se jogar e acertar alguma manobra e que muitos tem a certeza que nunca na vida pularão. Essas são apenas algumas importantes escadas da região que aqui está em foco, mas são exemplos de grande importância para nós, criando novas centralidades e gerando novos debates acerca deste tema.

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ESCADA

A escada na foto acima, localizada na extremidade do Vale próxima ao Viaduto Santa Efigênia, conecta o Memorial do Vale do Anhangabaú com a entrada da estação de metrô São Bento, tornando-se uma escada de acesso e circulação. Ao fundo da imagem, é possível ver uma massa arbórea que quase engana o que temos de imaginário de paisagem sobre o centro de São Paulo. Contudo, o Edifício Mirante do Vale e as pichações feitas sobre a escada, escancaram qualquer dúvida sobre o que é o centro da cidade e sua paisagem construída, de forma que esta foto mostra-se capaz de sintetizar muito bem seus conflitos e elementos urbanos.

Anteriormente, a escada até tinha corrimões metálicos para acessibilidade, mas como muitos materiais metálicos que estão nas ruas do centro, eles foram roubados. Com seus 8 degraus, a escada tem a altura de 1,50m e a largura de 2,10m, sendo estas dimensões padrões dentro das medidas comuns deste elemento. Por conta desta escada ter um ritmo de circulação muito intenso de pedestres, de skatistas manobrando-a e ser excepcionalmente exposta ao sol direto, é raro ver pessoas sentadas nos patamares de seus degraus.

uso

ESCADA

Devido a diversas circunstâncias, esta escada é muito propícia para a prática do skate: o chão é liso; tem espaço para dar impulso; tem espaço para finalizar a manobra na parte inferior. Porém, executar uma manobra neste espaço não é tão simples, pois o piso tanto em cima quanto embaixo não são exatamente planos, o que dificulta a manobra. Outro ponto é o piso tátil instalado para acessibilidade de pessoas com deficiência de visão, que provoca texturas no chão. Pequenas situações como estas podem até inviabilizar a prática do skate em alguns "picos", mas felizmente nesta escada são apenas detalhes.

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CORRIMÃO

O corrimão, quase sempre acompanhado de uma escada ou uma rampa, é um elemento essencial de acessibilidade para idosos, pessoas com deficiência física, ou para qualquer indivíduo que julgue necessário ao percorrer por estes espaços. No decorrer da revista, podemos reparar na potência do skate em vislumbrar elementos urbanos de forma diferente do habitual. No caso do corrimão isso não é diferente, pois dentro desse campo há algumas tipologias que enxergamos. Os corrimões, que descem escadas ou rampas, são geralmente feitos em barras tubulares metálicas quadradas ou redondas, mas às vezes em madeira e em alvenaria – estes um pouco mais robustos do que os esbeltos corrimões em barras.

Contudo, nem todos estão dispostos de maneira inclinada. Para nós skatistas os corrimões também são vistos em barras horizontais, como travas geralmente metálicas que dividem ambientes externos, tais como estacionamentos ou canteiros de arbustos.

Descer um corrimão de rua não é tarefa fácil, muitas vezes marcante quando um praticante executa esse movimento pela primeira vez. É um movimento que se começa a atingir quando chega-se a um nível mais avançado da prática, em que se sente confiança e coragem para lançar-se a tal ação.

Geralmente, com boas escadas, acompanham-se bons corrimões. No centro de São Paulo existem alguns exemplos de corrimões que são propícios para a prática, sendo eles: os corrimões das escadas da Praça Franklin Roosevelt; o corrimão da escada que conecta a rua Líbero Badaró com a rua Dr. Falcão Filho; e os novos espalhados pela explanada do Vale do Anhangabaú.

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CORRIMÃO

Como dito antes, o corrimão quase sempre é acompanhado de uma escada. Na imagem acima, podemos ver uma escada claramente antiga, com dois grandes lances que ligam o Vale com a rua Líbero Badaró, mas ela é pouco usada pelos passantes, deixando de ser um acesso importante ao Vale do Anhangabaú. Feita em pedra - material que não vemos com frequência atualmente - tem o total de 11 degraus, com 1,43m de altura e 3,85m de largura. Já o corrimão começa em uma altura baixa, de 0,65m e termina com uma altura relativamente alta, de 1,25m.

Este trecho de acesso, que pode já ter sido muito mais usado, foi construído há bastante tempo atrás, na época do Parque do Anhangabaú projetado por Joseph Bouvard, em 1911. Atualmente, o corrimão robusto, construído de apoio a escada, é mais usado por skatistas do que passantes que necessitam de um apoio ao se locomover na escadaria. Este espaço, inserido entre um prédio e um canteiro com uma densa vegetação, acabou se transformando em um lugar de estar; onde as pessoas em horários de almoço ou em momentos de espera, se aproveitam desta sombra construída para descansar. Criou-se um ambiente escondido da rua e do agito, promovendo um ponto de sossego em meio ao movimento incessante da cidade.

uso

CORRIMÃO

Maikon executa a manobra "backside noseslide", que traduzindo seria algo como deslizamento de nariz traseiro: ele pula com o skate girando seu corpo em 90°; encaixa a ponta da frente do skate; desliza sobre o corrimão até chegar ao chão. Como o espaço para pegar impulso é curto, esse movimento se torna um pouco menos arriscado do que descer outros corrimões, pois é executado em baixa velocidade. Mas não é por isso que se tornaria um corrimão de fácil execução para o skate. Na parte que acaba, que é um pouco antes do final da escada, o corrimão está em um nível alto, deixando a saída da manobra ser o momento mais difícil de todo o movimento.

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PAREDE

A parede não é um elemento planejado para ocupações em que o corpo se apoia, como no caso do chão, do banco, da escada e do corrimão. Ela é um elemento vertical que divide dois ambientes, cria barreiras e delimita usos. No caso do skate, muitas coisas podem ser paredes, isto é, qualquer elemento vertical pode ser ocupado pelo skate como seria em uma parede. Em resumo, a parede é como um chão vertical, no qual subimos e andamos como se estivéssemos no plano horizontal.

O nome da manobra utilizada para andar de skate na parede é "wallride" ou "wallie", traduzindo seria algo como passeio na parede. Por sua verticalidade, as manobras de skate nas paredes geralmente acontecem de forma rápida, que dependerá do seu nível de skate. Quando o skatista sobe, anda e desce da parede, chamamos de "wallride", mas quando o skatista apenas "dá uma atropelada" na parede, chamamos de "wallie".

Postes de luz, bicicletários amarelos da prefeitura, laterais de bancos, ou qualquer tipo de elemento vertical e minimamente inclinado, podem ser utilizados, na ativação do skate, como se fossem uma parede. Essa prática urbana está em constante construção: com ela é possível propor novas formas de moldar o olhar e enxergar os elementos da cidade de diferentes maneiras, de forma a possibilitar a recriação de componentes já excepcionalmente estruturados em nosso cotidiano.

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PAREDE

Localizado próximo do acesso ao Vale que se dá entre a Praça Ramos de Azevedo e o Theatro Municipal, está o poste de luz aqui escolhido. Este, como um dos principais símbolos estéticos do atual Vale, possui uma alta base trapezoidal de concreto de 2m de altura por 1m de largura e 1m de profundidade, seguido por uma haste metálica que afunila-se até seu topo, momento em que há uma dobra horizontal em que acopla-se às lâmpadas de led. Aqui, sua base foi o elemento escolhido para simbolizar a parede, como este chão vertical que nós skatistas utilizamos em manobras. O poste de luz do Vale, além de possuir uma monumentalidade física, tem também uma enormidade simbólica. Cabe notar que apenas 28 destes são capazes de iluminar os 43 mil m2 do Vale de maneira homogênea, sem deixar vestígios de sombra. Entretanto, em seu uso cotidiano à luz do dia, apenas a grande base fica exposta e promove relações com quem circula pelo espaço. O concreto torna-se amparo para sentar-se e apoiar as costas, para repousar de pé, ou até mesmo, como será explicado adiante, para executar manobras. Sua utilidade comum é destituída por outras possibilidades que a forma provoca.

uso

PAREDE

Os postes de luz do Vale são muito chamativos para nós skatistas, eles quase pedem para que andemos neles, a sua base feita em concreto com uma leve inclinação, acaba sendo muito propícia para as execução das manobras de "parede" do skate. Paredes retas e anguladas são aptas para a prática, mas as anguladas proporcionam maneiras mais fáceis de serem ocupadas, por conta da entrada do skate sobre a parede. O skatista, executa a manobra "wallie" no poste de luz, que é apenas o ato de passar (atropelar) a parede, quase como se o elemento fosse "uma pedra no caminho" em nosso caminho e não pudessemos desvia-lá.

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DESNÍVEL

Para fechar os elementos deste ensaio, trago o desnível como o último. Este, apesar de não ser construído a partir de um propósito de uso, é um encontro situado que sobra entre dois espaços com níveis de altura distintos. Esta significação integra-o na paisagem urbana e coloca-o dentro do conjunto de componentes do espaço público.

Por isso, o desnível pode ser um dos elementos mais interessantes. Seria um equívoco afirmar que a prática do skate se apropria dos espaços e simplesmente dá um novo uso ao que já foi estabelecido, mas interessa dizer que o skate cria uma possibilidade de uso dentre as várias que ainda não foram dadas previamente àquela situação. No caso então do elemento desnível, ou “gap” – palavra que se usa para nomear estes espaços –, sua ativação ocorre de maneira similar a da escada: pode-se saltar de cima para baixo e de baixo para cima.

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DESNÍVEL

O trecho do elemento desnível escolhido para a fotografia está próximo ao acesso do Vale pela Praça Ramos de Azevedo. Sua formação está justamente na conexão entre os níveis presentes na esplanada. São porções estreitas e compridas de terra gramada, com pequenas bordas de concreto que delimitam seu perímetro. Nas bordas longitudinais, o chão está mais baixo, pois obedece a cota dos edifícios vizinhos. Já o centro do Vale eleva-se por motivos de decisões projetuais que aqui não cabe desvendar. Com isso, não faria sentido o vão angulado entre as cotas ser também concretado como íngremes rampas de acesso, criando canteiros que, em teoria, não são feitos para pisar.

Como um dos poucos trechos de piso permeável, os desníveis acabam tendo a utilidade de canteiros. Em todo caso, não há barreiras físicas que impeçam o deslocamento sobre ele - diferente de todos os outros tipos de canteiros que ali são cercados. Para pedestres, a aderência da grama tira a dificuldade em atravessá-lo e, para crianças, pode tornar-se um desafio lúdico vencer seu vão e declive saltando-o. Além disso, a diferença de altura coloca-o como um obstáculo interessante a se manobrar com o skate. Estes são exemplos que indicam, também a este elemento, a sua potencialidade de modos de apropriação, uma vez que não há a imposição como regra de um uso específico.

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DESNÍVEL

Nesta imagem há um desnível relativamente baixo para os padrões do skate, pois sua altura é de aproximadamente 0,90m por 1,60m de largura. Contudo, nem sempre é a altura que diz se um desnível é difícil ou não para a prática, mas sim sua combinação entre altura e largura. Maikon pula do nível mais alto e pousa sobre a rampa apoiada na grama, passando para o chão onde finaliza o movimento. No caso, a rampa foi achada por nós jogada pelo Vale, depois instalamos-na precisamente neste desnível para a foto, criando a possibilidade de ocupação diferente dentro das comuns para um desnível. Pequenas movimentações como essa – de achar algo na rua para completar uma manobra – são típicas na cultura do skate urbano; e nada melhor do que uma rampa para vencer um desnível, não é?

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