Viagem e Turismo

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ANDALUZIA, a verdadeira alma espanhola 1 J. R. Duran testa e clica o Ritz de Madri • Delícias do País Basco • Valência, a bola da vez


Fin de Siècle De passeios clássicos a hotéis e restaurantes, um mergulho no Modernismo, o movimento que tomou conta de BARCELONA no final do século 19 e foi o grande responsável pela cidade ser o que é g

POR ADRIANA SETTI FOTOS MARCO POMÁRICO

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As colunas assimétricas do Parc Güell e, na pág. oposta, desenho de Gaudí, um dos mestres que esculpiram a Barcelona de hoje

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Cartaz do centenário do Els Quatre Gats, um dos preferidos de Picasso

Museu de Zoologia do Parc de La Ciutadella, de Domènech i Montaner

O salão da Casa Calvet, mais uma obra de Gaudí

Uma das colunas que decoram o hall do Hotel Espanya

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s catalães e sua mania de ser diferente. Para 99% da população terrestre, o Modernismo é um conceito que engloba tudo o que aconteceu entre Georges Seurat e Andy Warhol, incluindo todos os “ismos” que se possa imaginar – fauvismo, cubismo, surrealismo, Bauhaus, expressionismo abstrato, pop arte etc. Na Catalunha, porém, o Modernismo, ou melhor, o Modernisme (em catalão), é uma versão do que na França (e em boa parte do planeta) se conhece como Art Nouveau, na Itália como Stile Liberty e na Alemanha como Jugendstil, “o estilo da juventude”. Se esse movimento artístico não tivesse começado a chacoalhar a cidade por volta de 1888, com a exposição universal, Barcelona provavelmente seria apenas mais um lugar bacana à beira do Mediterrâneo. Não é exagero. Fazem parte dessa fase nada menos do que toda a obra do arquiteto Antoni Gaudí, incluindo a Sagrada Família (Carrer Mallorca, 401, 932-073-031, sagradafamilia.org; € 8), o Parc Güell (Carrer d’Olot, 932-130-488) e a Casa Milà, ou La Pedrera, (Carrer Provença, 251-265, 902-400-973, lapedreraeducacio.org; € 8), os quarteirões simétricos do bairro do Eixample e quase todos os seus edifícios, o Palau de la Música Catalana (Carrer Palau de la Música,4-6, 902-442-882, palaumusica.org; visitas guiadas: € 9) e muitos e muitos outros itens que compõem o visual colorido, vivo e impactante da cidade. Não fossem suas cerâmicas, seus ferros retorcidos, seus vitrais loucamente coloridos, seus trabalhos em marcenaria fina e, claro, suas composições improváveis de ladrilhos e azulejos, Barcelona dificilmente entraria para a lista dos lugares mais espetaculares do mundo. E se não fosse capaz de arrebatar corações, também não seria cada vez mais cosmopolita, efervescente e, conseqüente-

mente, um dos melhores lugares do globo terrestre para se divertir intensamente. Muito mais interessante do que esse papo cabeça, porém, é celebrar o Modernismo na prática. Para mergulhar no espírito da coisa, é possível dormir, acordar, passear, comer e cair na balada com ele. Cumprir o desafio de voltar no tempo por um dia, ou mais, é satisfação garantida. A maneira mais fácil de seguir este itinerário colorido é comprando o pack de la ruta del Modernismo – um kit completo com um guia detalhado de todos os lugares a visitar, um talão de descontos em entradas, um mapa, um guia de bares e restaurantes modernistas, um lápis e uma bolsa para carregar toda a parafernália (à venda no Centro del Modernismo na Plaza Catalunya, 17, subterrâneo, 902-076-621, rutadel modernisme.com; € 22). O Modernismo faz parte do cotidiano da cidade. O morador de Barcelona compra seus remedinhos em farmácias com balcões de madeira esculpidos e vitrais coloridos, toma o cafezinho da tarde em um mesmo lugar onde seus bisavós encontravam-se com os amigos e mora em edifícios que deixam os turistas alucinados. E tudo está impecavelmente preservado, como se o tempo não houvesse passado. Desde 1986, o Instituto de Paisagem Urbana e Qualidade de Vida da prefeitura de Barcelona realizou mais de 22 mil restaurações em fachadas e interiores de moradias e estabelecimentos culturais históricos, boa parte modernista, dentro da campanha Barcelona, posa’t guapa (Barcelona, fique bonita). Após todo esse empenho, hoje em dia é raro encontrar um edifício caindo aos pedaços na região central da cidade. Além do esforço da prefeitura, a iniciativa privada também entrou com força total na reVIAGEM E TURISMO

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vitalização do patrimônio artístico. É o caso dos hotéis Cram (Carrer Aribau, 54, 932-167-700, hotelcram.com; diárias de € 155 a € 255; Cc: A, M, V) e Axel (Carrer Aribau, 33, 933-239-393, axe lhotels.com; diárias de € 179 a € 226 - AT - e de € 137 a € 184; Cc: todos), o hotel gay mais famoso da Espanha. Localizados em edifícios belíssimos, ambos ocupando esquinas oitavadas, o símbolo do estilo de urbanização do bairro modernista por excelência (Eixample), eles mantiveram e melhoraram suas fachadas e transformaram seu interior em ambientes típicos de hotel-butique. Outra jóia é o Hotel Espanya (Carrer Sant Pau, 9-11, 933-181-758, hotelespanya.com; diárias de € 105 a € 135; Cc: todos), no coração da cidade, em plena Ramblas, a avenida onde tudo acontece, o principal cartão-postal da cidade. Ao contrário do que ocorre nos hotéis do Eixample, neste caso o interior continua intacto, como os arquitetos, Domènech i Montaner, o escultor Eusebi Arnau e o Ramón Casas deixaram. Gaudí é, sem dúvida, o maior símbolo desse movimento artístico. Mas Domènech i Montaner goza de tanto prestígio quanto o autor da Sagrada Família. Seu legado é impressionante. De suas pranchetas saíram os projetos do prédio do Museu de Zoologia do Parc de La Ciutadella (Avinguda Del Marqués de l’Argentera), obra revolucionária que elevou o tijolo exposto, antes considerado vulgar, à categoria de belo; o Palau de la Música Catalana (considerado por muitos o edifício mais emblemático do Modernismo); a Casa Lleó Morera, uma das estrelas do Quarteirão da Discórdia, no Passeig de Gràcia (nº 35); e o Hospital de Sant Pau (Carrer Sant Antoni Maria Claret, 167, 934-882-078, sanpau.es; € 4,20). Ao contrário de Gaudí, cuja personalidade arredia e obsessão religiosa o tornaram solitário e excêntrico, Montaner era engajado na sociedade da época. Ao mesmo tempo em que freqüentava a alta sociedade, transitava por várias outras ocupações. Era um desenhista talentoso, historiador da arquitetura que amava o trabalho de campo, trabalhava em uma editora como capista, escrevia críticas e metia-se na política. Conhecer um pouco de sua biografia faz com que suas obras pareçam ainda mais especiais. Se o leque de hotéis de época é enorme, o de 26 ESPANHA - A ESCOLHA DO LEITOR

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A impressionante riqueza de detalhes da sala de concertos do Palau de la Música Catalana


SOBRE O MODERNISMO “Colher da vida humana não espetáculos diretos e tacanhos, não expressões vernaculares banais... mas visões cintilantes, selvagens, paroxistas, alucinantes; traduzir verdades eternas em paradoxos insanos; viver para o mal e o inaudito; calcular os horrores da razão, inclinando-se à beira do abismo. (...) Tal é a fórmula dessa arte nebulosa e brilhante, caótica e radiante, prosaica e sublime, sensual e mística, refinada e bárbara, moderna e medieval (...).” Ramón Casellas, crítico de arte catalão VIAGEM E TURISMO

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As chaminés criadas por Gaudí para o terraço da Casa Milà, verdadeiras esculturas

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restaurantes é ainda maior. O mais famoso deles é o Els Quatre Gats (Carrer Montsió, 3bis, 933-024-140; Cc: todos). O catalão Pere Romeu trabalhava como garçom no cabaré Le Chat Noir, em Paris, no final do século 19. Empolgado com o ambiente da boemia francesa, decidiu transportá-lo para Barcelona. A idéia era criar algo parecido, com comida barata e música de piano. Foi em busca de sócios capitalistas e, em junho de 1897, o lugar abriu as suas portas. A decoração de outro monstro da arquitetura modernista, Puig i Cadafalch, que misturava objetos requintados com móveis toscos de tavernas, rompeu com todos os paradigmas da época. Em 1899, com 17 anos, ninguém menos que Picasso começou a freqüentá-lo e acabou fazendo ali sua primeira exposição. O desenho que ilustra a capa do menu é dele, e foi criado entre aquelas paredes, entre um copo de vinho e outro. Com o tempo, a casa passou a reunir a nata das rodinhas intelectuais, o que faz com que o lugar tenha uma aura especialíssima até os dias de hoje. O menu de almoço, a 12 euros, é a fórmula “boa e barata” para curtir o local. Outro lugar para encher a barriga de história é a Casa Calvet (Carrer Casp, 48, 934-124012; Cc: todos), cujo projeto leva a assinatura de Gaudí. O restaurante fica no edifício de mesmo nome feito sob encomenda para um empresário do ramo têxtil, cujos escritórios de contabilidade foram adaptados e converteram-se em salões. O menu gastronômico do chef Miguel Alija, com seis pratos e duas sobremesas, sai por 65 euros. E ali perto, no Bairro Gótico, o El Gran Café (Carrer Avinyó, 9, 933-187-986; Cc: todos), vizinho da escola de artes Llotja – que formou Picasso – mantém toda a pompa do final do século 19, tanto em sua fachada como em seu interior. A boemia que entorpecia os gênios modernistas entre uma obra-prima e outra está tão viva quanto as cores de seus mosaicos de azulejos. Em diversos bares da cidade, o ambiente esfumaçado, os balcões de madeira e os cartazes épicos transportam os amantes da noite a outros tempos. O bar La Confiteria (Carrer Sant

Pau, 128, 934-430-458), por exemplo, é um primor. Funcionando em uma antiga confeitaria, como no nome já diz, ele mantém o balcão esculpido, os lustres de cristais e até mesmo as vitrines onde ficavam expostos os quitutes. Em lugar de pães doces, serve cervejas, coquetéis e petiscos. A dona, Núria Casals, descobriu o local há dez anos. A antiga confeitaria estava abandonada e uma senhora de mais de 80 anos vivia dentro dela em condições desumanas, sem saber a jóia que tinha em mãos. Após um duro período de convencimento, Núria e seus sócios compraram o lugar, reformaram e abriram o bar, que vive lotado de segunda a segunda e ganhou John Malkovich como cliente fixo quando o ator esteve em cartaz em uma peça na cidade. Também no bairro do Raval fica o Almirall (Carrer Joaquín Costa, 33, 934-121-535), de 1860. No meio de uma região onde os bares se desdobram em minimalismos para ser cool como o vizinho MACBA, o Museu de Arte Contemporânea, ele é um contraste. Com a exceção do lounge instalado no fundo, o resto da arquitetura foi mantida. Sentar-se em uma de suas mesinhas próximas à janela e observar o vaivém de moderninhos é como estar em dois mundos ao mesmo tempo. Essa também é a sensação que se tem no bar Marsella (Carrer Sant Pau, 65, 934427-263), construído em 1820, onde até a especialidade da casa remete ao espírito da época: o absinto. Entre garrafas com o pó acumulado de séculos – a marca registrada do lugar – e espelhos com avisos como “proibido subir nas mesas” e “proibido cantar”, jovens estrangeiros se misturam à fauna habitué da região para evocar os fantasmas de Miró e Picasso, que, diz a lenda, freqüentavam o lugar quando aquelas garrafas ainda estavam limpinhas. Quando tudo se acaba, a esticadela clássica por ali é o London Bar (Carrer Nou de la Rambla, 34, 933-185-261, Cc: A), mais um primor de espelhos, balcão em forma de obra de arte e lustres preciosos. A quantidade de fumaça beira o intolerável, mas a boa música (ao vivo) e o caráter antropológico da sua balada valem qualquer olho vermelho. VIAGEM E TURISMO

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Alma gitana Nos últimos tempos só se tem falado da Espanha moderna. E o flamenco, as tapas, as touradas? Continuam lá, mais vivos do que nunca. A ANDALUZIA é a mais perfeita tradução de todos os (deliciosos) estereótipos espanhóis g

POR RACHEL VERANO FOTOS MARCO POMÁRICO

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Rodopios e passos firmes num autêntico show de flamenco e, na pág. oposta, toda a sedução da castanhola

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á passa das 21h30 de uma quinta-feira de inverno e um boteco numa das esquinas da Avenida Maria Auxiliadora, em Sevilha, está especialmente animado. Mulheres maquiadas e homens de coletes e calças justas trocam abraços calorosos, contam casos animados, fazem brindes sucessivos. De repente um deles olha no relógio e todos se levantam apressadamente em direção ao outro lado da rua. Menos de 15 minutos mais tarde as cortinas se abrem e aquela mesma alegria contagiante da rua se apresenta diante de dezenas de pessoas, agora vestida de babados e castanholas em punho. Estamos num autêntico tablao flamenco. Bailaoras e bailaores de passos firmes e feições duras parecem flutuar ao som choroso da guitarra, das palmas, dos gritos de olé. “Quando entro no palco eu me transformo”, diz Gloria Berenes, coordenadora do corpo de baile do El Palacio Andaluz, um dos grupos mais tradicionais da cidade. “Coloco todos os meus sentimentos para fora, é uma dança de alma.” Uma alma gitana, como diriam os espanhóis. Sevilha é o coração da Andaluzia, uma região onde a Espanha é mais densa, mais profunda, mais cigana, mesmo. E o flamenco é, talvez, a melhor tradução desse estado de espírito. Seus primeiros registros remetem ao século 18, mas sua história é bem anterior, com pitadas de influências árabes e até mesmo indianas, uma das origens mais prováveis do povo cigano, um dos primeiros habitantes da região sul da Espanha. Esqueça todos os modismos que estão voltando os holofotes para o país recentemente. Por aqui não há hotéis futuristas que mais parecem instalações de arte. Muito menos mirabolâncias arquitetônicas. Há, sim, bares de tapas lendários, uma paixão pelo mundo das touradas e um eterno culto à fiesta. Em outras palavras, tudo o que você sempre pensou sobre a Espanha. 48 ESPANHA - A ESCOLHA DO LEITOR VIAGEM E TURISMO

Sevilha tem um passado de 2 mil anos que se revela docemente no centro histórico às margens do Guadalquivir, forrado de laranjeiras. Mas seu coração bate mesmo é na imponente Giralda, o minarete da catedral. Principal cartão-postal da cidade, com mais de 900 anos de idade, ela é testemunha de um belo pedaço da história do país. No século 8, os muçulmanos partiram da África para conquistar o continente europeu. Foram detidos antes de chegar à França, mas dominaram quase toda a Península Ibérica. Durante os sete longos séculos em que estiveram no poder, ergueram grandes maravilhas – mesquitas, palácios e salas de banhos impressionantes. E deixaram um riquíssimo legado cultural que ainda se sente no ar da Andaluzia, a última região de resistência. Com a retomada do poder pelos cristãos, a antiga mesquita sevilhana cedeu espaço a uma catedral católica, mas o seu campanário escapou ileso. E é do alto de seus mais de 90 metros de altura que a Giralda reina soberana. Aos seus pés, a cidade curva-se em deliciosas vielas e becos cheios de vida e de cor. Há poucos prazeres maiores do que se juntar à movida alegre da cidade, que enche os bares, anima as esquinas e invade as ruas. Vez em quando a teia de ruelas abre-se numa deliciosa praça com mesinhas ao ar livre, sombras de árvores, barulhinho de fonte. Verdadeiros oásis. E a vida dita seu ritmo entre siestas e copos. Perder-se pela Juderia, o antigo bairro judeu, ou pelas calles do bairro de Santa Cruz, é ir fundo na alma sevilhana. E quando o coração bater mais forte aos primeiros acordes da guitarra, pronto. Você já terá se rendido aos encantos andaluzes. Uma viagem sem volta. O charme maior da Andaluzia é justamente conjugar o espírito superlativo do espanhol com o pano de fundo mouro de um passado que parece nem tão distante assim. E é nas


Suvenires de Granada, com pitadas orientais

Rua do centro de Córdoba, com a Mesquita ao fundo

Delícias da casa de chá Hamman, em Córdoba

Detalhes da arquitetura moura do Alhambra, Patrimônio Mundial

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A vida segue tranq체ila entre as ruelas e becos do centro hist처rico de Sevilha, onde os carros n찾o circulam

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A LUZ DE SEVILHA “Não há uma luz sobre Sevilha, embora sofra sol e lua; o que há sim é uma luz interna, luz que é de dentro, dela estua. “Luz das casas branco caiadas, que vem de baixo para cima, que vem de dentro para fora como a água de uma cacimba; “luz de dentes de luz, e vivos, que parecem a sede da alma, e luz que parece acender no espaço seu andar de palma; “enfim, luz de tudo o que faz seu estar na vida, vivê-la, a da clara alegria interna, de diamante extremo, de estrela.” João Cabral de Melo Neto, escritor brasileiro VIAGEM E TURISMO

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