Especial SPED - Revista EXAME - 2011

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A escrituração digital é uma ótima notícia para melhorar a produtividade das empresas e arrecadação fiscal, mas ainda há questões que precisam ser enfrentadas com coragem

Os desafios do

C

omo um superpetroleiro que se desloca e gera uma onde gigantesca nos mares que atravessa, a implantação do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), a partir de setembro de 2006, provocou um verdadeiro tsunâmi contábil e empresarial no país. Até agora, as 692 000 empresas já emissoras de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) lançaram algo como 3,4 bilhões de documentos fiscais eletrônicos. Cerca de 150 000 delas autenticam digitalmente a contabilidade por meio do SPED Contábil e transmitem pela internet os livros fiscais de ICMS e IPI pela EFD-ICMS/IPI. Isso não é nada perto do que vem aí.


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No primeiro trimestre de 2012, mais 1,5 milhão de empresas se integram ao sistema, passando a fazer a escrituração das contribuições do PIS e Cofins pelo EFD-PIS/ Cofins, e, até 2014, participarão também da EFD-ICMS/IPI. Até os mais céticos concordam: o SPED representa um grande avanço não só da gestão fiscal, mas da operação das empresas brasileiras. “Calejados em relação às leis e projetos que ‘pegam’ ou não no Brasil, ficamos observando o que iria acontecer com o SPED. O projeto não só foi implantado a todo vapor, como já ajudou a identificar milhares de empresas sonegadoras no Brasil e a fomentar arrecadações recordes nos primeiros meses de 2011, que atingiram mais de 90 bilhões de reais em impostos – um valor 21% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado”, comenta o especialista José Ronaldo da Costa. Sobre isso, o professor e consultor Roberto Dias Duarte, que mais que grande especialista é um entusiasta desse novo modelo, faz um alerta: “Além de inserir toda a cadeia produtiva no universo digital, essa tecnologia impõe boas práticas de governança aos participantes, e as empresas não podem mais utilizar velhas ferramentas em busca de novas soluções”. Ele destaca que poucos vislumbraram as profundas implicações que viriam com o novo modelo fiscal, mas quem conseguiu promoveu as mudanças necessárias com base em

“As empresas não podem mais utilizar velhas ferramentas em busca de novas soluções” Roberto Dias Nunes

Normas tributárias publicadas desde 1988 total de normas editadas

federal estadual municipal

gerais

tributárias

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Fonte: Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário

três pilares: tecnologia (sistemas integrados nas empresas e entre as empresas), conhecimento (capacitação de profissionais) e comportamento (exemplo ético e empreendedor). Ele tem toda razão. Mais que implantar um sistema digital para troca de informações contábeis entre empresas e o Fisco, é preciso estabelecer um novo paradigma na maneira de pensar e administrar, o que é válido tanto para o profissional da contabilização quanto para o empresário, certamente os dois grandes desafios do SPED.


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O novo profissional

De um lado, não basta mudar a mentalidade; é preciso redesenhar o papel do profissional do setor, o que inclui desde a sua valorização até a capacitação para assumir um papel vital. Na nova ordem, o antigo guarda-livros deixa para trás a função tradicional de tão-somente classificar e registrar movimentos contábeis e fiscais das atividades financeiras da empresa, e pelas quais nem sempre se envolveu de coração. Em contrapartida, agora ele se torna um proativo estrategista que participa das decisões, ao oferecer soluções que podem beneficiar não só os resultados, mas o próprio destino da organização. “O profissional contábil deve estar em harmonia

Tempo gasto pelas empresas para calcular e demonstrar os tributos Comparado a 183 países, o Brasil é campeão não só da América do Sul, mas mundial, com 2 600 horas/ano dedicadas à apuração das taxas e ao cumprimento das normas tributárias

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com a gestão da empresa, o que inclui conhecer o objeto social da empresa e o funcionamento dos processos para planejar e controlar de forma adequada a gestão tributária daquela atividade. Para isso, ele precisa de conhecimentos multidisciplinares para entender de forma orgânica e sistêmica todas as rotinas e informações específicas na área fiscal”, define o especialista Ladmir Carvalho. A nova legislação trouxe aumento significativo na demanda de trabalho do contador, pois arquivos que antes eram apresentados apenas no fim do ano passaram a ser entregues com maior frequência. Além disso, há uma mudança radical na estrutura tecnológica do escritório, pois o que era papel agora é digital. Para compensar, uma nova perspectiva se abre para ele: “Se considerarmos que o Brasil tem 22 milhões de empreendedores e só 6 milhões de empresas são legalmente instituídas, às quais se somam anualmente mais 1 milhão; qualquer que seja o tamanho, elas precisam de planejamento tributário, auditoria e contabilidade para sua gestão. Portanto, há uma gigantesca janela de oportunidades para os 500 000 contabilistas do país”, comenta Dias Duarte. Mas entre a oportunidade e a realidade há um grande abismo quando o tema é formação técnica: repetindo padrões anuais, só 30% dos bacharéis em ciências contábeis e 24% dos técnicos do país conseguiram ser aprovados no último exame de suficiência do sistema CFC/CRCs, realizado em março de 2011. “O fato serviu como alerta e constatou o despreparo dos profissionais para atender às exigências do mercado. A má

459 654 864 1080 2 600

Média mundial

Média América

do Sul

Fonte: World Bank (Banco Mundial), International Finance Corporation (IFC) e PwC


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qualidade da educação básica e da formação do ensino superior e a abertura indiscriminada de faculdades de ciências contábeis e cursos técnicos de contabilidade são fatores que contribuem diretamente para o mau desempenho dos inscritos”, lamenta Domingos Orestes Chiomento, presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Estado de São Paulo. “Os estudantes de graduação chegam à faculdade com baixo conhecimento de matemática e português. Em um curso de contabilidade, isso é fatal. Esse profissional tem que ler, compreender, interpretar, analisar e escrever bem. Obviamente, também precisa da habilidade com números”, avalia Roberto Dias Duarte. E o que dizer, então, da capacidade operacional para lidar com sistemas digitais complexos exigidos pelo SPED de forma eficaz e segura? Mas como atrás de grandes problemas surgem sempre imensas oportunidades, esse segmento é, com certeza, um crescente campo que se abre para quem se preparar academicamente e busca realização profissional e uma carreira promissora.

O papel do empresário

“O SPED reduz custo e agiliza o processo, antecipando inconsistências fiscais e evitando uma contingência de passivo tributário” Ladmir Carvalho

movimento já pode ser percebido pelo aumento da agilidade na fiscalização, pois as empresas estão agora mais preocupadas em melhorar o controle financeiro e dos estoques, assim como ganhar produtividade para compensar possíveis aumentos na carga tributária. Além disso, lembra Ladmir, com a integração de operações internas para atender o SPED, o empresário precisa se conscientizar de que o fato gerador da obrigação tributária inicia-se na entrada do produto em estoque, passa pela venda, pela escrituração da nota fiscal até o envio do arquivo do SPED. Trocando em miúdos, se quem der entrada nas mercadorias digitar erroneamente um dado ou cadastrar indevidamente o tipo de imposto, pode promover inconsistências nos relatórios do SPED, acarretando multas pesadas para a empresa. Ladmir revela que tem sido procurado por empresários que buscam soluções para integrar todos os segmentos de seus negócios. “É um

O SPED permite ao empresário obter substantivos ganhos de produtividade, só que acompanhados de maior controle nas obrigações fiscais. Isso exigirá dele atenção redobrada para não incorrer em erros Habilidades do que possam comprometer os resultados de sua operação. “O SPED tem como característica a redução de custo e agilidade Habilidades do processo, antecipando Relacionamento eventuais inconsistências fiscais negociação e evitando uma contingência comunicação de passivo tributário. Porém Análise essa oportunidade pode Síntese transformar-se em ameaça, Criatividade caso o contribuinte não tome Iniciativa as medidas necessárias para uso da tecnologia Assimilação de informações adequar-se ao novo processo”, Planejamento comenta o especialista Ladmir Autoaprendizado Carvalho. Para ele, esse

novo profissional área de atuação auditoria contábil

gestão fiscal, tributária e financeira

contabilidade gerencial

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Fonte: Roberto Dias Duarte adaptado de www.careers-in-accounting.com


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movimento que vem acontecendo aos poucos, desde a queda dos índices de inflação no início do Plano Real. Mas estamos sentindo essa procura com mais intensidade nos últimos anos, com a implantação do SPED e da Nota Fiscal Eletrônica”, completa. Para Roberto Dias Duarte, o maior desafio das empresas é dar um salto qualitativo na gestão e harmonizar tecnologia com visão ética e empreendedora: “É preciso deslocar o foco para as pessoas”, resume.

Excesso de normas

Há, ainda, uma questão deixada para o fim, mas nem por isso menos importante: como lidar com a verdadeira produção em massa de normas que afetam o país? Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, desde 1988, quando foi promulgada a Constituição Federal, foram editadas quase 250 000 normas tributárias, o que leva à inacreditável média de 34 por dia, duas por hora. Infelizmente, o problema não para por aí. Nestas mesmas pouco mais de duas décadas, já foram realizadas treze reformas tributárias, e criados novos impostos e taxas, como o CPMF, Cofins, Cides, CIP, CSLL, PIS Importação, Cofins Importação, ISS Importação, entre outros. Além de promover a insegurança fiscal, que torna inviável um planejamento tributário decente a médio e longo prazo e leva a riscos e custos desnecessários promovidos por erros contábeis involuntários, essa indústria insensata de normas é incompatível com as aspirações e a realidade empresarial brasileira. A situação sequer atende ao interesse das empresas fornecedoras de software de gestão. À primeira vista, elas parecem lucrar com essas trocas contínuas de parâmetros, mas, na prática, as fazem sempre correr atrás das atualizações e consequentes demandas de seus clientes.

“O SPED não só foi implantado a todo vapor, como já ajudou a identificar milhares de empresas sonegadoras” José Ronaldo da Costa

Apoio à gestão

Para contar com uma base fiscal confiável, cedo ou tarde todas as empresas terão que adotar tecnologias que integrem as operações e a função fiscal, como os sistemas ERP. Na prática, a realidade brasileira é bem diferente. Apenas 1% das empresas utiliza algum tipo de software de apoio à gestão. Por isso, o movimento irreversível do Fisco na direção da inteligência eletrônica deve ser acompanhado em paralelo pelos governos com a simplificação e democratização do sistema tributário, tornando-o mais simples, objetivo e acessível. Até porque não há alternativa. “Seria uma insanidade imaginar atualizações quase diárias em uma base instalada de 6 milhões de usuários de sistemas estabelecidos em organizações distribuídas por mais de 5 000 municípios”, conclui Roberto Dias Duarte.

As ferramentas do progresso Como as empresas, principalmente as de médio e pequeno porte, devem se ajustar ao movimento irreversível do Fisco em direção à inteligência eletrônica, com um sistema tributário de complexidade crescente e um conjunto de regras intricadas que se multiplicam a cada instante?

Cedo ou tarde será necessário adotar tecnologias de apoio administrativo, como os sistemas ERP, que podem ser apresentados em módulos e com diferentes nomes, jargões e siglas. Essencialmente permitem integrar operações, inclusive as fiscais, tanto dentro da empresa quanto destas com demais empresas, formando, assim, uma gigantesca e única cadeia produtiva. Neste cenário, não haverá mais lugar para provedores de serviços incompletos. O mercado só vai aceitar consultorias e empresas desenvolvedoras de software capazes de oferecer soluções que integrem uma contabilização atualizada e em acordo com as exigências do SPED associadas a programas que permitam exercer uma boa gestão empresarial.


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