TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
TGI 2 A Produção do Espaço Urbano na Nova Cidade Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
FAUUSP.1996 Roberto Carlos Rocco de Campos-Pereira Orientação: Dra. Vera Maria Pallamin
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Banca do TGI Profa. Dra. Vera Maria Pallamin orientadora do TGI Profa. Dra. Raquel Rolnik Prof. Dr. Cândido Malta Campos Filho
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3
Resumo
T
rata-se de monografia desenvolvida sobre o tema da produção do espaço urbano na zona sudoeste da cidade de São Paulo, com ênfase nos aspectos da associação do Estado e do Capital para a instalação da Nova Cidade Mundial. O texto procura situar o bairro do BaixoPinheiros neste contexto. A produção do espaço é tratada sob a ótica de seu desenrolar histórico, sua crítica e da documentação de algumas ações concretas nesta década.
A Produção do Espaço Urbano na Nova Cidade
Abstract
A
monograph focusing on the production of urban space in the South West area of the city of São Paulo, and particularly in the association of the State and Capital for the installation of the New Global City. The text seeks to place the District of Pinheiros in this context. The production of space is studied in historically and critically. Concrete actions taken by the public sector, the private initiative, as well as the civil society are explained.
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Agradecimentos
A
gradeço às seguintes pessoas, cuja compreensão e trabalho tornaram possível este TGI: Minha orientadora, Dr a Vera Maria Pallamin, cujo rigor e coerência entre idéias e ações alargaram meus horizontes e me inspiraram. À família Barata (e Patrícia), pelo apoio de todas as horas. Bia Kara José, Alexandre Hodapp, Valéria Contessa, Ana Paula Hirata, Daniela Sandler, Antônio Augusto, Alessandro Sbampato e pela paciência e amizade neste ano de trabalho e nos que virão. Clayton de Paula, pela ajuda na organização da apresentação. Rogério Akamine, pela atenção em ler o texto completo e comentá-lo. Mariana Fix, Carol Lefèvre e Pedro Arantes pelo ‘seminário’ pré-apresentação. Agradeço especialmente a Mariana Fix, cujo TGI ajudou-me a definir os rumos deste trabalho, fornecendo-me conceitos importantes para a compreensão da metrópole. Aos funcionários da Biblioteca e do CESAD, da FAUUSP, pela valiosíssima ajuda na pesquisa. Faço um apelo para que todo o apoio seja dado pela instituição no sentido de que estas pessoas possam continuar desenvolvendo e aperfeiçoando um trabalho que é essencial. Ana, do Parque Gráfico da FAUUSP, cuja paciência em fotocopiar as incontáveis notícias de jornal facilitaram a minha pesquisa.
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À Daniela Büchler e ao Iracelyr Rocha Júnior pela amizade e pela força com o scanner! Ao Messias, da sala Pró-Aluno, também pela força com o scanner! Prof. Dr. Cândido Malta Campos Filho, por facilitar o acesso a um importante acervo de informações e por suas opiniões e comentários. Prof. Fábio Mariz Gonçalves, pelo interesse em ler o trabalho e pelas proveitosas discussões. Prof a Dr a Maria Cecília França Lourenço, por inaugurar para mim leituras importantíssimas e o gosto pela pesquisa. Aos participantes da matéria ‘A forma em construção’ e sua viva discussão dos problemas urbanos. Ao Mauriz Alexandre, ao Diogo Zeni, à Shima Iwamizu, à Flávia Pagotti e à Tânia, por terem me ajudado com PEF! A todos os amigos que me acompanham.
Roberto Rocco
5
D
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
edico este TGI a minha mãe, Irotilde Gonçalves Pereira, que com seu trabalho vem contribuindo para melhorar as vidas de inúmeras mulheres e que sempre lutou incansavelmente pela minha formação como urbanista.
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Uma palavra sobre o TGI: Teoria ou Prática ?
Ao
decidir-me por preparar um texto para o TGI, ao invés de um projeto de edificação, um projeto gráfico ou uma peça de desenho industrial, deparei-me com olhares entre compassivos e assustados: ‘E n t ã o v o c ê v a i f a z e r u m T G I t e ó r i c o ?!’ Gostaria de acrescentar alguns elementos ao debate que hoje poderíamos levar adiante na FAUUSP: qual a função da Universidade na preparação do arquiteto para o exercício de sua profissão? O que, afinal, habilita alguém para a arquitetura? Partamos do particular para o geral. O quê é um TGI ‘teórico’? 1 Supostamente aquele trabalho de elaboração do pensamento através do estudo e da pesquisa caracterizará um Trabalho de Graduação como ‘teórico’, em oposição a um Projeto de Edifício, onde o aluno supostamente se enfrentará com problemas ‘reais’ de estabelecimento de programas, arranjo 1Para
conduzir a discussão num nível mais aprofundado, poderíamos começar pela
definição de ‘teoria’ e ‘prática’. Saltemos esta etapa importante e passemos à discussão, considerando, para efeitos da argumentação, “teórico” como algo que não tem conseqüência prática alguma, acompanhando a acepção consagrada pelos alunos da FAUUSP ao se referirem ao TGI. Esta acepção, errônea, não esconde a contradição de raíz, isto é, que a grande maioria dos TGIs ditos práticos tampouco tem qualquer efeito no mundo material, para não falar no mundo das idéias.
6
espacial, processos construtivos, etc, tudo aquilo que um arquiteto faz ‘na vida real’. Ascendamos um degrau na discussão. Quem é o arquiteto na Sociedade de hoje? Ora, há inúmeros ‘tipos’ de arquitetos, ou seja, a formação arquitetônica permite a atuação em inúmeras áreas, do projeto ao planejamento, da programação visual ao estudo dos fenômenos urbanos. Há arquitetos que trabalham em escalas pequenas, outros que trabalham as grandes escalas. Há aqueles que trazem para a arquitetura a luta efetiva contra a injustiça e a desigualdade social, caso daqueles que trabalham em mutirões, em escritórios de apoio técnico, em pequenas prefeituras. A estes, nossa admiração e respeito especiais. Também há os que estudam, tentam compreender os processos que conformam as cidades, a sociedade e a própria arquitetura. Finalmente, não creio que ninguém seja só uma coisa ou outra, apesar das especializações do mundo contemporâneo. Todos estes profissionais trabalham dentro e para a sociedade, cumprem uma função social específica, contribuem para o mundo de alguma maneira. O que faz, afinal, com que os narizes se torçam ante um TGI ‘teórico’? Temo que a crença de que o dever da Universidade é preparar o arquiteto para o ‘mercado’ está na raíz do problema. Esta noção é totalmente equivocada na sua acepção de quem é o arquiteto e do que é o mercado. Seu resultado é a busca desesperada pela habilitação técnica e, em última análise, a
7 proeminência da técnica sobre a reflexão. Milton Santos coloca assim o problema: “A profissionalização também tem efeitos perversos a longo e mediano prazos. A lista de que-fazeres autorizados para cada atividade regulamentada passou a dominar a preparação escolar dos candidatos a esta ou aquela profissão, limitando, assim, o escopo dos programas escolares e as ambições dos alunos. Isso conduz a uma formação monovalente com lamentáveis conseqüências na criação de intelectuais distorcidos, preocupados muito mais com os aspectos instrumentais que propriamente com o papel social a desempenhar.”(O Espaço do Cidadão, 1993, p.26) Parece-me que a verdadeira função da Universidade seja preparar o arquiteto para a ‘sociedade’ (entendida não como coisa ‘una’, mas como campo possível de uma ação de sentido social específico), jamais para o ‘mercado’ (entendido aqui como um campo que tem uma lógica própria, que não contempla, no atual estado de coisas, o sentido social das ações individuais). Talvez mais do que isso, seja sua função preparar os espíritos, formar mentalidades, engendrar uma atitude crítica para a inserção e atuação de um ser humano por inteiro na sociedade, atuante, questionador, crítico, um ser pensante. Parece-me, infelizmente, que os rumos hoje são outros. O afã de se inserir no mercado apaga a crítica, embota o questionamento, coloca em cheque a atuação. Afinal, para quê se atua, se não se faz a crítica, se não se questiona sobre os rumos, se não se pergunta sobre a
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e validade mesma da ‘inserção’ no mercado? Satisfação profissional parece mesclar-se à acumulação material. Quanto mais sucesso material se tem, mais se é bem sucedido e, conseqüentemente, ‘feliz’. Um TGI ‘teórico’ não é em realidade mais ou menos teórico do que o projeto de uma edificação (por mais que esta tenha preocupações sociais) ou o projeto de uma página de revista. Um TGI é mais ou menos ‘teórico’ dependendo do que se faz dele2. Na acepção correta do termo, os dois são teóricos, pois constituem exercícios de reflexão que, se bem conduzidos, têm o mesmo estatuto na Universidade e contribuirão, antes de tudo, 2É
teórico o TGI que estuda as relações entre a auto-construção e formação de mão de obra no bairro do Pari, ou o projeto arquitetônico de um centro comunitário para o mesmo bairro, que inclua creche, espaço para reunião dos moradores, praça cívica, etc? Será mais ‘teórico’, na acepção de teórico que aqui se convencionou adotar, o que encontrar primeiro o caminho da gaveta. O primeiro poderá tornar-se incrivelmente ‘prático’ ao ser utilizado por uma agência não governamental para um projeto de formação de mão de obra na periferia. Poderá ser publicado e lido por muitas pessoas, que se interessarão por sua reflexão e refletirão por sua vez, trazendo o resultado de seu pensamento para a ação cotidiana. O segundo será ‘teórico’ se for engavetado ou se implicar em pouca pesquisa, nenhuma conversa com os moradores, desconsideração da história do bairro, resultando talvez num projeto paternalista, ideológico e pouco afeito à realidade do Pari. O contrário também é verdadeiro. O Projeto de Centro Comunitário pode ser um ponto de partida para a reflexão para as relações sociais naquela área, as relações políticas, os desejos dos moradores e suas necessidades e poderá enfim ser usado por aquela mesma ONG para a consecução de seus objetivos, resultando em benefícios reais para a sociedade. O estudo sobre auto construção poderá se constituir em mero exercício retórico e de academicismo infértil se se restringir ao pequeno círculo dos que o lerão para o julgamento do TGI.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana para a formação do sujeito, formação que se refletirá na sua atuação em sociedade. O TGI se constitui, antes de tudo, num esforço de aprendizado , e como tal foi encarado por mim na elaboração deste texto. Neste sentido, tanto os TGIs ‘teóricos’ como os ‘práticos’ só podem ter conseqüência ao proporem-se à crítica radical dos processos, fenômenos, espaços a que se referem e nos quais se inserem 3. Creio que as limitações que nos impõe a FAUUSP e nossa própria atitude diante do mundo deixa-nos às vezes aparentemente sem escolha. O TGI pode ser uma mera ‘formalidade’ antes do diploma, uma formalidade incômoda e que desejamos ver finda o mais rápido possível. Por fim, pode ser também o primeiro passo e direção a uma reflexão, um trabalho e uma participação relevante no mundo.
mM
3Devo
estas considerações a Pedro Fiori Arantes.
8
9
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Índice
Capítulo 2: Forma Urbana, História e Ideologia.___ 27
1.2.1. Sobre a Ideologia.___________________________28 1.2.2. Ideologia e Ciência._________________________ 30 1.2.3. Ideologia e Mentalidades._____________________31 1.2.4. Urbanismo e Ideologia.______________________ 34
Banca do TGI_________________________________2
Resumo/ Abstract_____________________________3
Capítulo 3: A Produção do Espaço Urbano._______ 35
Agradecimentos.________________________________4 Uma
palavra
sobre
o
TGI:
Teoria
Prática?.________6 Índice._______________________________________9 Abreviaturas utilizadas para referência bibliográfica.13
ou
1.3.1. Cidade e Urbanismo.________________________ 36 1.3.2. Algumas considerações sobre o pensamento urbanístico contemporâneo.__________________________36 1.3.3. O Urbano: do Espaço Geométrico ao Espaço Histórico e Social.__________________________________ 41
Introdução.____________________________16
1.3.4. A Permanência das Formas Urbanas.___________ 42 1.3.5. Pensamento Urbanístico Pós-Moderno.__________43
PARTE 1: Os Conceitos._______________________18
1.3.6. A Crítica: do Moderno ao Pós-Moderno.________ 46
Capítulo 1: A Vida na Cidade: Participação e
PARTE 2: A Metrópole_______________________ 52
Cidadania._____________________________________19 Capítulo 1: Estado, Capital e a Construção da Metrópole 1.1.1.A Cidadania e a Cidade._________________20
Industrial.____________________________53
1.1.2. Cidadão ou Morador?._______________________24 1.1.3. Carência e Participação.______________________25
2.1.1. Introdução_________________________________54
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana 2.1.2. São Paulo Metrópole: o Plano de Avenidas de Prestes
10
Capítulo 4:Os Planos Diretores de 71 e 90_________87
Maia_____________________________________________54 2.1.3. Um novo paradigma para São Paulo: Robert Moses e as Vias Expressas.___________________________________ 61
2.4.1. O PDDI-SP, 1971____________________________88 2.4.2. O Plano de 90: Introdução____________________92
2.1.4. Anos 50: uma nova fase na industrialização brasileira.
2.4.3. O Caráter do Plano Diretor de 1990____________92
__________________________________________________70
2.4.4. ‘Os Objetivos do Plano Diretor’_______________94 2.4.5. Instrumentos de Política Urbana_______________96
Capítulo 2: O Lugar da Metrópole Sul-Americana: Anhaia Mello X Prestes Maia. _____________________72
2.4.6. Os Níveis de Gestão_________________________97 2.4.7. As Críticas ao Plano_________________________97 2.4.8. Considerações Finais________________________100
2.2.1. Uma utopia fora de lugar: Anhaia Mello e o Plano Regional.__________________________________________73
PARTE 3: Ideologia, Política e Cidade___________102
2.2.2. Prestes Maia: Crescimento e Progresso da Metrópole. __________________________________________________74 2.2.3. Urbanismo e Transporte de Massa: Prestes Maia e o Sistema Rápido
Capítulo 1: IPTU: A Ideologia em Ação: O IPTU e a construção ideológica___________________________103
de Transporte Metropolitano.___________76 3.1.1. Introdução________________________________104 Capítulo 3: A Metrópole Industrial.______________78
3.1.2. A ‘Batalha’ do IPTU: a Ideologia em Ação______105 3.1.3. A (In)Constitucionalidade do IPTU____________107
2.3.1. Cidade Clandestina: Cidade Esquecida.__________79
3.1.4. “Nós quem, cara pálidas?”____________________111
2.3.2. A Anistia aos Terrenos e Construções Irregulares. 80
3.1.5. “O IPTU e os ricos”_________________________113
2.3.3. O ‘Milagre’.________________________________82
3.1.6. Inflação e Recessão: instrumentos de chantagem__114
2.3.4. A Construção Civil como geradora de riqueza____83
3.1.7. Na ‘Contramão’ das Opiniões________________115
2.3.5. A Revolução do Automóvel___________________86
3.1.8. Em defesa do IPTU_________________________116 3.1.9. Os Resultados de uma Estratégia______________118
11 3.1.10. Uma Reviravolta nos Discursos______________120
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e 4.2.7. O Birmann 21_____________________________148
3.1.11. O ‘Desenlace’_____________________________121 3.1.12. O IPTU de 1997___________________________124
Capítulo 3: Vila Olímpia e Morumbi: espaços de privilégio na Nova Cidade_______________________150
PARTE 4: A Nova Cidade_____________________125 4.3.1. “A Vila Olímpia é fantástica”_________________151 Capítulo 1: A Nova Cidade____________________126
4.3.2. “Um novo ‘boom’ no Morumbi”_______________152
4.1.1. Introdução________________________________127
Capítulo 4: Aspectos da Nova Cidade____________155
4.1.2. A Aceleração do Mundo Contemporâneo_______128 4.1.3. Mudanças nos Meios de Reprodução do Capital__129
4.4.1. A Nova Cidade Terciária: Trabalho e Exclusão__156
4.1.4. O Lugar de São Paulo na ‘Globalização’_________134
4.4.2. A Nova Realidade Demográfica_______________159
4.1.5. A Globalização e a Metrópole ________________136
4.4.3. Do modelo Periférico ao Metropolitano_________161
4.1.6. A Globalização e os rumos das políticas municipais.
4.4.4. Metropolização X Periferização_______________163
_________________________________________________139
4.4.5. A Não-Cidade da Violência___________________166 4.4.6. As Torres e Muros da Separação_______________169
Capítulo 2: Uma nova ‘centralidade’ para São Paulo. _____________________________________________142
4.2.1. Introdução________________________________143 4.2.2. Uma definição para ‘Centro’_________________143
PARTE 5: O ‘Viarismo’_______________________172
Capítulo 1: O ‘Viarismo’: Um caso de associação entre Estado e Capital na Produção do Espaço Urbano_____173
4.2.3. O ‘Centro’ se desloca_______________________144 4.2.4. A Poli-Centralidade________________________145
5.1.1. Introdução________________________________174
4.2.5. Investimento e Nova Centralidade____________146
5.1.2. Viarismo e Valorização Imobiliária____________175
4.2.6. Marginal Pinheiros: a Super Avenida__________147
5.1.3. A proeminência do automóvel________________182
12
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana 5.1.4. A ‘Ideologia’ das Obras______________________186
Capítulo 1: O ‘Baixo Pinheiros’ e a Metrópole____226
5.1.5. Antes e depois de 1988: novos poderes para os municípios_______________________________________191 5.1.6. Construção Civil e Estratégia Política: uma base para o Viarismo_______________________________________195 5.1.7. Os Fundos de Pensão_______________________198
6.1.1. A Configuração Primitiva de Pinheiros________227 6.1.2. Pinheiros se consolida e se desenvolve_________229 6.1.3. Um novo padrão de urbanização: a Cia. City e as elites no Oeste____________________________________232 6.1.4. Pinheiros na Cidade Industrial________________233
Capítulo 2: Viarismo, Especulação e a Nova Faria Lima_________________________________________200
6.1.5. O Resultado de Escolhas Específicas___________234 6.1.6. A Área em Estudo__________________________235 6.1.7.
5.2.1. Introdução________________________________201 5.2.2. O Caso Faria Lima_________________________202 5.2.3. A Operação Urbana_________________________204 5.2.4. Os Cepacs_________________________________206
O
Lugar
do
‘Baixo-Pinheiros’
na
Nova
Cidade:
Pólo
e
Encruzilhada____________________________________235 6.1.8.
‘Uma
ilha
popular
cercada
de
riqueza
por
todos
os
lados’____________________________________________237 6.1.9. Considerações sobre o ‘Baixo-Pinheiros’________240
5.2.5. Um Compromisso Possível ?___________________208 5.2.6. Técnica e Política: uma Construção Ideológica___209
PARTE 7: Considerações Finais________________245
5.2.7. As Desapropriações_________________________214 5.2.8. A Avenida passo a passo_____________________215
7.1.Um Tipo de Inserção no Mundo do Capital______246
5.2.9. Estado e Capital: Parceria ou Apropriação ?_____218 5.2.10. Considerações sobre a nova Faria Lima________220
Bibliografia_________________________________253
5.2.11. Considerações sobre a atuação dos Movimentos de Bairro____________________________________________222
Índice
das
notícias
utilizadas
na
elaboração
trabalho______________________________________262 PARTE 6: O ‘Baixo-Pinheiros’_________________225 Índice das notícias sobre a avenida Faria Lima_____280
do
13
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Abreviaturas utilizadas para referência bibliográfica4: (A
Aceleração
Contemporânea): SANTOS, Milton, “A aceleração contemporânea: tempo mundo e espaço mundo”, São Paulo:Hucitec/ANPUR, 1993. p.p.15-22. (A Ideologia Alemã): MARX, Karl; ENGELS, Friedrich, A Ideologia Alemã.São Paulo: HUCITEC, 1984. (AGBP):PETRONE, Pasquale (relator). Aspectos Geográficos de um Bairro Paulistano. São Paulo: EDUSP, 1963. (Arantes, A cidade como não-lugar): ARANTES, Otília. “A Cidade como Não-Lugar”, AU, n° 58, fevereiro/março de 1995, p.p.83-85. (Arantes, A Ideologia): ARANTES, Otília. “A Ideologia do ‘Lugar Público’ na Arquitetura Contemporânea (Um Roteiro)” in O lugar da arquitetura depois dos modernos.São Paulo: EDUSP, 1995.
4Dados bibliográficos básicos. Para a bibliografia completa, ver seção pertinente. As demais citações incluem o último sobrenome do autor, mais a página da obra referida, facilmente identificada na bibliografia.
(AUGÉ): AUGÉ, Marc. Não-lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade. Campinas: Papirus, 1994. (Aurélio): Dicionário da Língua Portuguesa, Aurélio Buarque de Hollanda. (BLOCH): BLOCH, Marc., Introdução à História, Lisboa: EuropaAmérica, s.d. (C-P, Casas de Cultura): CAMPOS-PEREIRA, Roberto.C.R., Casas de Cultura: Cultura e Cidadania na Cidade de São Paulo. São Paulo: FAUUSP:1993. (CARDOSO, Introdução à História) CARDOSO, Ciro Flamarion S., Uma introdução à História , São Paulo, Brasiliense, 1984. (CARO): CARO, Robert A., The Power Broker: Robert Moses and the Fall of New York, New York: Vintage Books1975. (Cidades Brasileiras): CAMPOS Filho., Cândido Malta., Cidades Brasileiras: Seu Controle ou o Caos. O que os cidadãos devem fazer para a humanização das cidades no Brasil.São Paulo: Nobel: 1992 (Cordeiro): CORDEIRO, Helena Kohn, “A ‘cidade mundial’ de São Paulo e o complexo corporativo do seu centro metropolitano”, in Fim de Século e Globalização (org. Milton Santos), São Paulo: Hucitec-Anpur, 1993. Pp.318-331. (CULTURA):CARDOSO, Fernando Henrique, et al., Cultura e Participação na Cidade de São Paulo, 1975. (CUNHA) CUNHA, Antônio Geraldo da.(org.), Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
14
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (GROSTEIN): GROSTEIN, Marta Dora. A Cidade Clandestina: Os ritos e os mitos. São Paulo: FAUUSP:1987. (Justiça Social): HARVEY, David., A Justiça Social e a Cidade, São Paulo: HUCITEC, 1980. (La Production de l’Espace): LEFÈBVRE, Henri., La Production de L’Espace, Paris: Anthropos, 1974. (LEME) LEME, Maria Cristina da Silva, Revisão do Plano de Avenidas: Um Estudo sobre o Planejamento Urbano em São Paulo, 1930. São Paulo: FAUUSP, 1990. (MC, C100). Marilena Chauí, Seminário: Os Cem Anos da Ideologia Alemã. FFLCH, USP, 1996. (MC, Cultura e Democracia): CHAUÍ, Marilena de S., Cultura e Democracia., 1989. (MC, Ética): CHAUÍ, Marilena de S. , “Público, Privado, Despotismo” in Ética, 1992. (MELHORAMENTOS): MAIA, Francisco Prestes, “Os Melhoramentos de São Paulo: Palestra pelo Engenheiro Francisco Prestes Maia, Prefeito Municipal, por ocasião da ‘Semana do Engenheiro’”, São Paulo: PMSP, 1942. (MEYER, Metrópole): MEYER, Regina Maria Prosperi., Metrópole e Urbanismo: São Paulo Anos 50. São Paulo: FAUUSP, 1991. (MEYER, SBM) Regina Maria Prosperi Meyer. Workshop/Seminário BrásMitte. Projeto ArteCidade, São Paulo, Instituto Goethe, 1996. (NOTAS): MAIA, Francisco Prestes et alli, Notas sobre o ‘Esquema Anhaia Mello’, Cogep - Dossiê 001/81, São Paulo.
(OC4): KRUCHIN, Samuel. “Prestes Maia: O Sentido do Urbano”, Óculum, n° 4, São Paulo: FAUMACK, novembro de 1993. (PLANO): Maia, Francisco Prestes. Plano de Avenidas para a Cidade de São Paulo (PROGRAMA de Melhoramentos): MOSES, Robert., Programa de Melhoramentos Públicos para a Cidade de São Paulo. New York: International Basic Economy Corporation, 1950. (REALE): REALE, Ebe. Brás, Pinheiros, Jardins: Três Bairros, Três Mundos. São Paulo: Pioneira/EDUSP, 1982. (RMARTINS). MARTINS, Maria Lúcia Refinetti, Qual Modernidade, Qual Utopia? São Paulo dos últimos 10 anos. São Paulo: FAUUSP, 1993. Doutorado. (ROSSI): ROSSI, Aldo, A Arquitetura da Cidade, (SANTOS): SANTOS, Milton., Por uma Geografia Nova (São Paulo e seu Futuro): FERRAZ, J. C. de Figueiredo, São Paulo e seu futuro, antes que seja tarde demais., Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Administração Municipal, 1976. (São Paulo e seu Futuro): FERRAZ, J. C. De Figueiredo, São Paulo e seu futuro, antes que seja tarde demais., Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Administração Municipal, 1976. (SCHIFFER): SCHIFFER, Sueli T. Ramos., Políticas Nacionais e a Transformação do Espaço Paulista: 1955-1980, São Paulo : FAUUSP., 1989. (SÓCRATES):
SÓCRATES,
Jodete
Rios,
PDDI-SP,
1971:
Uma
oportunidade perdida. São Paulo: FAUUSP, 1993. Tese de
15
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e Doutoramento apresentada à FAUUSP. Orientação: Prof. Dr. Lauro Bastos Birkholz.
(Somekh): SOMEKH, Nádia, “Globalização e forma urbana: a intervenção urbanística na cidade de São Paulo”, in in Fim de Século e Globalização (org. Milton Santos), São Paulo: Hucitec-Anpur, 1993. pp.332-340. (SQVP): Seminário Pinheiros e a Qualidade de Vida, São Paulo: Auditório da Rede A de Jornais de Bairro, 1996. (VOVELLE): VOVELLE, Michel, Ideologias e Mentalidades, São Paulo: Brasiliense, 1991. (ZANETTI): ZANETTI, Valdir Zonta. A Produção da Forma Urbana: Pinheiros. São Paulo: FAUUSP, 1988. Mestrado
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Introdução
O
16
•Na segunda parte, trataremos do desenvolvimento do pensamento urbanístico em São Paulo a partir da década de 30, relacionando algumas das ações empreendidas na configuração da metrópole industrial, visando adequá-la aos modos de produção em ascenção. Apresentaremos aqui uma breve análise do Plano Diretor de 1971 e da proposta de um novo Plano, em 1990.
presente trabalho propõe-se a uma reflexão
•Na terceira parte, faremos uma descrição do litígio envolvendo a
sobre algumas hipóteses de análise da
implantação do IPTU progressivo na Capital, dentro do âmbito das
associação entre Estado e Capital na
propostas do Plano Diretor de 1990. Tal descrição servirá à análise de
produção do espaço urbano visando à
alguns modos de operação do discurso ideológico e da ação política a
reprodução deste mesmo Capital numa
nível municipal.
Propõe-se,
•Na quarta parte, retomaremos a análise desenvolvida na segunda
num segundo momento, a buscar alguns
parte do trabalho e estudaremos alguns aspectos da produção do
exemplos de como esta associação torna-se possível através do
espaço urbano nos dias que correm, agora visando adequar a cidade à
convencimento e da alienação produzidos pelo discurso ideológico. São
função de Cidade Mundial, articuladora do Capital Global numa macro
feitas algumas considerações sobre a configuração da chamada Nova
região econômica específica.
economia
dita
‘Globalizada’.
Cidade - a cidade que se adapta aos modos de produção do capitalismo
•Na
quinta
parte,
estudaremos
um
fenômeno
particular,
o
tardio - e sobre como o bairro do Baixo Pinheiros se insere neste
‘Viarismo’, o privilégio à obras viárias, e suas implicações políticas,
contexto.
econômicas e sociais. Aqui, estudaremos como a nova Avenida Faria
O texto se estrutura em 7 partes, dividas em um número variável de capítulos. •Na primeira parte procederemos a uma breve exposição e comentário de alguns conceitos adotados para a elaboração do texto.
Lima se inserirá num quadro político/administrativo que privilegia as obras viárias, com propósitos que vão além das adequações estruturais. Procederemos à apresentação de algumas hipóteses de análise crítica dos mecanismos da Operação Urbana e do Cepac, utilizados para o prolongamento da Avenida. Faremos também algumas considerações
17 sobre a atuação dos Movimentos Comunitários contrários a este prolongamento. •Na sexta parte, tentaremos situar a região do Baixo Pinheiros no quadro estudado, dando especial atenção à Marginal Pinheiros, um dos eixos constituintes da chamada Nova Cidade. •A sétima parte constitui-se de algumas considerações finais sobre os processos estudados. Na condução do TGI, buscou-se evitar compreender os fenômenos urbanos em estudo de modo a coincidí-los com uma possível metaestrutura ideal, dada a priori. Buscou-se abordar o problema da produção do espaço urbano de distintos pontos de vista. Foram considerados testemunhos tomados in loco, depoimentos orais ou escritos, consultas a urbanistas, notícias de jornal, anúncios comerciais, etc. Visou-se a trabalhar o contraste das ‘falas oficiais’ com as ações empreendidas na metrópole pelos agentes urbanos, buscando o sentido de fundo destas falas e a ‘desmistificação’ de seus conteúdos ideológicos, de modo a montar um quadro representativo para a análise. As hipóteses e considerações baseiam-se na leitura de bibliografia pertinente aos temas estudados, bem como em entrevistas, assistência a palestras e na leitura de artigos publicados na imprensa paulistana entre 1990 e início de 1997.
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TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Sobre o percurso metodológico
N
18
com um espaço onde os próprios habitantes não tem uma atitude crítica mais abrangente?
tínhamos
a
Em suma, quem somos, como arquitetos, para, num TGI, impor o
projeto
de
nosso desejo sobre uma área qualquer da cidade, tendo em vista nossa
intervenção no Bairro do baixo Pinheiros,
própria falta de fundamentação crítica e política sobre os problemas
levando em consideração as condicionantes
locais e gerais da metrópole?
um
primeiro
intenção
de
momento, elaborar
um
históricas e sociais da região. Este projeto
A partir daí precisávamos buscar um conceito, ou conceitos,
foi abandonado à medida em que se
norteadores de uma crítica radical dos processos de produção do
aprofundava a análise sobre os diferentes
espaço urbano.
fenômenos, mecanismos e processos que conformaram e conformam
O conceito balizador de toda a nossa crítica é o conceito de
a metrópole. O que nos levou de uma intervenção no bairro de
Cidadania, ou seja, uma “real participação na construção de um
Pinheiros para uma reflexão sobre a produção do espaço na
estilo de vida e na condução dos destinos da cidade” (Cultura e
metrópole?
Participação na Cidade de São Paulo).
O desencadeamento do processo se deu quando, durante o
A constatação de que o ideal da participação não se verifica na
trabalho de campo verificamos que a ação dos grupos comunitários
prática levou-nos a perguntar porquê não se constata. Fomos buscar
buscava o atendimento a necessidades muito imediatas, numa ação
as respostas em Marilena Chauí, com sua definição da carência como
política de curto fôlego e fundamentalmente acrítica e pragmática. As
inibidora da participação e da própria cidadania. Além disso,
associações de bairro e outros agentes políticos do bairro lutavam
constatamos na realidade aquilo que a crítica marxista sempre
fundamentalmente pela manutenção de seus próprios interesses. Esta
apontou: o sistema capitalista cria uma dinâmica que não permite o
constatação, junto com a constatação de que não conseguíamos
consenso nem os compromissos e concessões. Cada grupo luta para
escapar das concepções positivistas e de uma análise formalista do
preservar seus interesses e ampliar seus ganhos. A idéia de uma
bairro (a coisa que mais nos preocupava era a estrutura viária, pois o
‘Sociedade’ unida contra os interesses predatórios das classes
sentido geral da maioria das análises era essa), nos deixaram num
dominantes, ou coesa em torno de um projeto social qualquer,
primeiro momento sem chão para prosseguir a reflexão: como lidar
aparece como totalmente fora de lugar.
19 Entretanto, nossa dúvida ainda não estava respondida. O que torna a dominação e a hegemonia possíveis? Fomos buscar também em Marilena Chauí um conceito específico de Ideologia como coisa oposta ao saber, não como mero discurso que mascara a realidade, mas como discurso necessário para a representação desta realidade para o sujeito social, por vezes tomando o lugar desta realidade, substituindo o aparecer social pelo ser social. Entendeu-se que a ideologia poderia servir às estratégias de convencimento, dominação e finalmente a hegemonia das classes dominantes, tornando possíveis várias operações que beneficiam grupos específicos e perpetuam aquela mesma dominação. A ideologia nega a reflexão sobre a realidade, pois a apresenta como coisa pronta e acabada. Então, a cidadania é também o trabalho do saber, esta ação reflexionante que recusa o não saber e busca preencher as lacunas que tornam possível a construção ideológica, visando desmontá-la, permitindo uma ação concreta no mundo, a possibilidade de uma participação real, ou ao menos uma base para a luta. Estes conceitos constituem-se na espinha dorsal do pensamento desenvolvido neste texto, das análises e das críticas engendradas. Pode-se dizer que, se há um ‘objetivo’ no trabalho, é justamente o de desmonte das construções ideológicas e a crítica à participação do sujeito numa sociedade que se pretende democrática. Nossa posição é a de que somente a crítica profunda pode indicar caminhos para a atuação relevante no mundo.
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TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Parte 1: Os Conceitos
20
21
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A Vida na Cidade: Participação e
Cidadania
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Cidade e Cidadania
A
22
disciplinando as relações dos homens em sociedade. A idéia de cidade na antigüidade, como nos indica Marilena Chauí, “exprimiria a ordem natural e cósmica, onde se manifestaria o ideal da perfeita integração
civitas ou urbs dos romanos, origem das
entre homens e cosmos e entre indivíduo e comunidade política”.(MC,
palavras cidade e urbano, mas também de
Ética, p.348) A cidade não é meramente suas casas, pontes e avenidas,
cidadania e urbanidade, indicam-nos caminhos
mas o corpo social que a constitui.
na análise da produção urbana na cidade de São Paulo.
‘sociabilidade’, ‘cortesia’ e ‘bondade’, qualidades que definiriam o
A palavra cidade, do latim civitas, define, no português
No entanto, civilitas (origem de civilidade) também expressa
moderno,
“um
cidadão. Também urbanitatis expressa o estar na cidade, mas também a
complexo
própria vida de Roma. Por extensão, é a qualidade daquilo que é da
demográfico formado, social e economicamente, por uma concentração
cidade, mas significa além disso , em muitos autores latinos 5, um
populacional não agrícola” (Aurélio). Na origem, civitas significava o
conjunto de regras de comportamento associadas à educação, à boa
conjunto dos cidadãos que constituem uma cidade ou um Estado,
conduta, ao ‘bon ton’ (a urbanidade do português moderno). Em suma,
indicando não apenas o espaço construído, mas o sistema de relações
viver na cidade significava estabelecer como padrão de conduta a
que constituem verdadeiramente a cidade (CUNHA) .
‘sociabilidade’ e a ‘bondade’, que não devem ser confundidas com a
A acepção comumente aceita na linguagem corrente define a cidade
piedade cristã, pois têm um sentido eminentemente social, ligado à
em sua materialidade, enquanto que a civitas romana ou a pólis grega
noção de cooperação e de contrato, necessária para a vida em
eram conceitos que qualificavam também o sujeito. De fato, a noção de
comunidade.
liberdade confundia-se com a cidadania: “Para os antigos, a liberdade
“Cada homem, no lugar que lhe era próprio, poderia, sob a conduta
era um conceito essencialmente político, pois só na polis alguém
da razão, realizar a boa finalidade ética determinada pelo seu lugar na
poderia
ordem do mundo, na ordem social e política e na ordem familiar.”
ser
livre
e
a
liberdade
era
a
definição
mesma
da
cidadania.”(MC, Ética, p.349). Civitas é também o direito da cidade e do cidadão, isto é, aquilo que é ‘justo, reto e conforme a lei’ (Aurélio),
5GAFFIOT, Félix., Dictionnaire Illustré Latin-Français, 1934. Para este capítulo, trabalhou-se também com o Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, 1982.
23 (MC, Ética, p.348). A cidade é o locus da realização desta finalidade ética, o lugar onde se realiza a cidadania.
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e Santos recorda-nos que o simples nascer investe o indivíduo de uma soma inalienável de direitos, “viver, tornar-se um ser no mundo” seria
Para Milton Santos, “O modelo cívico forma-se, entre outros, de
assumir em coletividade uma herança moral que faz de cada indivíduo
dois componentes essenciais: a cultura e o território” (Santos, p.5) Para
o portador de prerrogativas sociais. A cidadania seria a garantia destas
Santos, este ‘componente cívico’ suporia a existência de uma visão
prerrogativas, uma ‘lei’ da sociedade que investe o indivíduo com a
comum do mundo e da sociedade, “do indivíduo enquanto ser social e
“força de se ver respeitado contra a força, em qualquer circunstância”.
das suas regras de convivência. O componente territorial suporia, de
(Santos, p.7)
um lado, a instrumentalização do território capaz de atribuir a todos os
Por outro lado, a cidadania seria ‘objeto de aprendizado’, tornando-
habitantes os bens e serviços indispensáveis à sua existência, não
se um ‘estado de espírito’, enraizado na cultura. “Ameaçada por um
importando sua localização neste território. Por outro lado, seria
cotidiano implacável, não basta à cidadania ser um estado de espírito
necessária a adequada gestão deste território, através do que esta
ou uma declaração de intenções. Ela tem o seu corpo e os seus limites
distribuição geral dos bens e serviços estaria assegurada.(p.5)
como uma situação social, jurídica e política. (...) ela deve se inscrever
Deste modo, Santos propõe um modelo cívico-territorial, onde a
na própria letra das leis.” (Santos, p.8) Entretanto, a cidadania não se
organização e a gestão do espaço seriam os instrumentos para uma
esgota com o voto, como muitos são levados a crer. Para Santos, o
política redistributiva, isto é, “tendente à atribuição de justiça social
eleitor pode existir sem que o indivíduo realize inteiramente suas
para a totalidade da população, não importa onde esteja cada
potencialidades
indivíduo.” (Santos, p.6)
comunidade 6.” (Santos, p.41) Em Santos, para ser efetiva a cidadania
como
participante
ativo
e
dinâmico
de
uma
“A plena realização do homem, material e imaterial, (...)deve
deve também poder ser reclamada, e sua consecução também depende
resultar de um quadro de vida, material e imaterial, que inclua a
do caráter do Estado, que nem sempre coincide com os anseios dos
economia e a cultura. Ambos têm que ver com o território e este não
vários atores da chamada sociedade civil, criando-se um conflito entre
tem apenas um papel passivo, mas constitui um dado ativo, devendo
eles. (Santos, p.8)
ser considerado como um fator, e não apenas reflexo da sociedade. É no território tal como ele atualmente é, que a cidadania se dá tal como ela é hoje, isto é, incompleta.” (Santos, p.6)
6Neste
sentido, Milton Santos alerta também para o engano de se tomar o cidadão exclusivamente como aquele que tem acesso aos bens materiais produzidos por determinada sociedade. Ao contrário, alerta Santos, o consumo excessivo, o chamado consumismo, pode levar à alienação. “O consumidor (...) alimenta-se de parcialidades, contenta-se com respostas setoriais, alcança satisfações limitadas, não tem direito ao debate sobre os objetivos de suas ações, públicas ou privadas”. (Santos, p.42)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
24
De fato, se a cidade é o locus da realização da cidadania, o lugar
Segundo Milton Santos, Marx saudará a chegada do capitalismo na
onde esta será reclamada com mais força, Marx nos dará o caminho
Europa Medieval como a abolição dos vínculos de servidão entre o
interpretativo para aqueles conflitos entre Poder Constituído e Sociedade
dono da terra e o trabalhador que antes lhe ‘pertencia’ (ou que
Civil.
pertencia à terra), surgindo daí o trabalhador livre, dono de seus meios
Marx analisa o surgimento do conceito moderno de cidadania a
de produção. A aglomerações urbanas, os burgos, teriam sido os
partir do ressurgimento da cidade como locus das relações econômicas,
espaços onde estas enormes conquistas teriam surgido primeiro e com
na Baixa Idade Média. Na raíz do surgimento da cidade , Marx vê a
mais força. “Com o homem do burgo, o burguês, nascia o cidadão, o
superação da “produção separada” para a subsistência, e da família
homem do trabalho livre, vivendo num lugar livre, a cidade.” (Santos,
como primeira relação social. Isto é, a cidade é o lugar onde as células
p.9) 8. As conquistas cidadãs teriam evoluído até que se chegasse às
se dividirão para criar o novo corpo social. É o lugar por excelência da
idéias modernas de sociedade civil, segundo Santos “um corpo social
produção e da reprodução do mundo material. Esta superação da
que só existe porque há homens ciosos dos seus direitos; e existe a
economia separada e da família traz no seu bojo o estabelecimento
despeito do estado.” (Santos, p.10) 9.
consciente da relação social.
Porém, ao expandirem-se os princípios do capitalismo, com a
Se o primeiro ato histórico é, como nos dizem Marx e Engels na sua
divisão do trabalho e a divisão da sociedade em novas classes, este
A Ideologia Alemã, “a produção dos meios que permitam a satisfação
acordo social, a visão de mundo unitária, em busca da consecução de
destas necessidades [comer, beber, vestir e “algumas coisas mais”] (A
todas as possibilidades do indivíduo que inspiraram os primeiros
Ideologia Alemã, p.39), a partir deste ato os caminhos se partirão e a
pensadores Iluministas, dá lugar na prática a novos fenômenos
satisfação das necessidades elementares criará automaticamente novas
complexos de dominação, seja pela força, seja pelo convencimento,
necessidades, engendrando novos movimentos para sua satisfação. 7
ainda que o ideário burguês de liberdade permaneça de certa forma intocado. Santos alerta para a necessidade da atualização do instituto da cidadania, diante do fato de que não se poderia confundir o
7Vimos
como Michel Vovelle nos adverte sobre o perigo de tomar a filosofia marxista como mera e absolutamente econômica. Ao investigar as ‘razões’ que constróem o espaço urbano, deveremos cuidar para não nos apegar em demasia a esquemas positivistas de análise, que vêem em tudo causa e conseqüência direta, nem tampouco apoiarmo-nos num pequeno marxismo que reduz o significado dos fenômenos da vida a embates econômicos. Neste quadro, o sentido da produção do espaço urbano deverá ser analisado na sua inteira complexidade.
8De fato, Leo Hubermann registra um velho provérbio alemão, aplicável segundo o autor, a toda a Europa Ocidental na época da constituição das cidades: Stadtluft macht frei, “O ar da cidade torna livre” (História da Riqueza do Homem, p.37) 9Claro está que este modelo não se aplica ao Brasil, mas refere-se ao desenvolvimento do conceito de cidadania na Europa Ocidental.
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A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
liberalismo dos Iluministas com o cidadão da era do capitalismo
nas leis e nos discursos oficiais e a realidade de milhões de indivíduos
concorrencial e menos ainda com o cidadão da era da informática.
sem
direitos
de
fato. Para
superar
esta
fratura, utilizar-se-ão
Nos dias que correm, as idéias neo-liberais, ao mesmo tempo que
principalmente duas armas importantes (quando não a violência pura).
pregam a “abstenção estatal na área produtiva, atribuem ao Estado
A primeira é a sujeição das massas através da privação e da ignorância,
capitalista uma grande cópia de poder sobre os indivíduos a título de
diminuindo suas reivindicações de cidadania através de mecanismos
restaurar a saúde econômica e , assim, preservar o futuro.” (Santos,
que descreveremos a seguir. A segunda é o convencimento e a coação
p.11) Esta nova atitude reduziu significativamente a capacidade de
através das construções ideológicas e da propaganda, que servem para
reivindicação da cidadania por parte das populações, agora às voltas
justificar as ações do poder em nome do ‘progresso’, da ‘estabilidade’
com os problemas mais prementes do desemprego e da diminuição dos
ou mesmo da alienação decorrente do consumismo excessivo.
benefícios e seguridades sociais, especialmente nos países onde as conquistas sociais ainda não são muito abrangentes. No Brasil, o processo de conquista da cidadania se dá de forma fragmentada e violenta, a ponto de perguntamos se existem ‘cidadãos’
Talvez a cidadania seja mais que a efetiva proteção contra as arbitrariedades do poder ou o acesso aos bens e serviços igualmente distribuídos pelo território, mas a consciência individual e coletiva de seu lugar no mundo e, como conseqüência deste saber, a libertação.
no país, ou se é possível que existam ao lado de tantos não-cidadãos. Os sucessivos regimes de força de que o país foi vítima utilizaram várias estratégias para coibir a organização e a luta por direitos sociais mínimos, especialmente aquele surgido com o Golpe Militar de 1964. “Trata-se, também, de um modelo político e social, tanto responsável pela eliminação do embrião da cidadania que então se desenvolvia, como pela opção de alargamento de uma nova classe média em detrimento da massa de pobres que o ‘milagre’ não apenas deixou de suprimir, como também aumentou.” (Santos p.14) Hoje, no contexto de uma República legalmente constituída, fundada nos Estado de Direito e nos moldes Iluministas do grande bastião liberal do planeta, os Estados Unidos, há uma fratura entre o ideal republicano vigente
Cidadão ou Morador?
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Os
26
autores do livro ‘Cultura e Participação 10‘,
aquele que luta para ver atendidas suas necessidades mais básicas, teria
fazem uma importante distinção entre os
sido incapaz de participar politicamente da vida da cidade, mantendo o
termos morador e cidadão. Propõem uma
nível da demanda pela produção de um espaço urbano de qualidade em
diferenciação
entre
patamares
metrópole,
vistos
os
habitantes como
da
bastante
baixos.
Vimos
como
esta
formulação
é
sujeitos
especialmente válida para as zonas periféricas da metrópole e encerra
competentes e incompetentes na produção e na fruição do espaço
um quadro social que vai muito além das vicissitudes do padrão de
urbano. ‘Sujeito incompetente’ não significa um sujeito que é sempre
urbanização da cidade. Este só refletiria o baixo nível de conquistas no
paciente das ações da ‘competência’. Neste caso, identifica-se com a
campo da cidadania conseguida por uma parcela enorme da população
figura do ‘morador’, sendo peça essencial na produção dinâmica do
paulistana, que por isso mesmo não conseguiu ir além das demandas
espaço. O morador é aquele que busca em São Paulo a oportunidade de
sociais básicas, contentando-se com a produção urbana sem ‘cidade’
ascensão social (ou a própria manutenção da vida), fugindo de
(como define a urbanista Regina Meyer a situação de grandes partes da
realidades rurais onde aquelas oportunidades de ascensão (ou mesmo a
periferia paulistana).
estrutura mínima necessária à sua subsistência.) são precárias ou até mesmo cessaram de existir.
A filósofa Marilena Chauí faz uma importante distinção, que nos ajudará a compreender melhor estes processos.
O ‘morador’ tem um nível de expectativa muito baixo quanto à qualidade de vida, o que nos dá indícios sobre como podem haver coexistido por tanto tempo o estilo de expansão urbana e os baixos níveis de exigência frente ao poder público verificados nas últimas décadas. Sob a ótica de análise dos autores de Cultura e Participação na Cidade de São Paulo, este padrão de urbanização estaria ligado a uma estrutura social específica resultante das grandes desigualdades econômicas e sociais presentes na sociedade brasileira. O morador, identificado como 10CARDOSO,
Fernando, CAMARGO, Cândido, KOWARICK, Lúcio, SINGER,Paul, Cultura e Participação na Cidade de São Paulo. 1975
Carência e Participação
27
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
“A ação dos órgãos públicos nos países subdesenvolvidos se define
usualmente
pelas
pressões
da
realidade
imediata:
atividade política, que constrói a mudança a partir de seu interior. Esta
a
atitude reforça o clientelismo, o favor, a tutela do Estado, a não-
necessidade de atender a demandas inadiáveis, dar solução ao
representação e a não-participação. A Democracia só começa,
enorme déficit social, atender a pressões de toda ordem. Desta
portanto, depois de atendidas as carências.
forma, com freqüência, ações imediatistas se perpetuam à guisa de
Já o direito insere-se num campo mais universal, onde já se
políticas. Pressões localizadas arvoram-se em metas globalizantes.
ultrapassou o nível de demanda pela satisfação da carência. Aqui o
As possibilidades de reflexão dentro da estrutura estatal são
sujeito, através da luta ou do trabalho, estabelece regras que passarão a
reduzidas. As condições objetivas de atuação são dirigidas para o
valer para todos os sujeitos. O direito implica um indivíduo consciente
‘fazer’. A postura do planejador exige, por vezes, que se pense este
e a sua participação nas decisões e escolhas. É esta ‘participação efetiva
‘fazer’. Surge daí a análise, a crítica, a possibilidade de propor os
num estilo de vida’ que define a atividade política e a cidadania, como
caminhos para a mudança.”
vimos no capítulo ‘Separação ou Civitas’. Assim, a construção de um espaço urbano de qualidade passaria por
Apresentação do boletim “Recursos Hídricos: histórico, gestão e
uma participação verdadeiramente política dos habitantes da cidade, o
planejamento.”, Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo,
que, sabemos, esteve e está longe de ocorrer para grandes camadas da
1995. p.5.
população que vive hoje na cidade de São Paulo e que reivindica ainda
C
seus direitos básicos de moradia, trabalho, saúde, educação e hauí faz a distinção entre os termos ‘direito’ e ‘carência’,
das
Resta identificar o sentido das ações do poder público. Ao afirmar o
necessidades essenciais, ou seja, “aquilo sem o que não
clientelismo e a tutela, nega a ação política e a própria noção de
se
cidadania. Ao criar um campo de real participação, integra o sujeito na
pode
colocando existir.”
esta
(MC,
última C100).
no A
rol
transporte.
carência
é
singularizada e específica e não consegue realizar-se no
campo do político, nem universalizar-se no campo do direito, pois engendra uma atividade reivindicatória que visa a ter seus objetivos atendidos imediatamente. Esta é a atividade peculiar do ativismo passivo, pois espera que uma resposta venha de fora, distinguindo-a da
vida da cidade e cria um campo propício para a cidadania.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Forma Urbana, História e Ideologia
28
29
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Sobre a Ideologia “Até o presente os homens sempre fizeram falsas representações sobre si mesmos, sobre o que são ou deveriam ser. Organizaram suas relações em função de representações que faziam de Deus, do homem normal, etc. Os produtos de sua cabeça acabaram por se impor à sua própria cabeça. Eles, os criadores, renderam-se às suas próprias criações. Libertemo-los, pois, das quimeras, das idéias, dos dogmas, dos seres imaginários, sob o jugo dos quais definham. Revoltemo-nos contra este predomínio dos pensamentos. Ensinemos os
homens
correspondam
a
substituir à
essência
estas do
fantasias homem,
diz
por um,
pensamentos a
que
comportar-se
criticamente para com elas, diz um outro; a expurgá-las do cérebro, diz um terceiro - e a realidade existente cairá por terra.” Karl Marx in A I d e o l o g i a A l e m ã , 1846, p.17
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
M
30
arilena Chauí define a ideologia como sendo não
obtida malgrado as lacunas, mas, pelo contrário, g r a ç a s a elas. (Cultura
apenas a ‘representação imaginária do real para
e Democracia, p.p. 3 e 21). Afinal, como nos lembra Otília Arantes,
servir
uma
citando Adorno, “A ideologia é mentirosa não pelo que ela promete,
sociedade fundada na luta de classes’, nem
mas quando se considera realizada”. (Arantes, Ciclo de Palestras,
tampouco a ‘inversão imaginária do processo
FAUUSP)
ao
exercício
da
dominação
em
histórico na qual as idéias ocupariam o lugar dos agentes históricos
Assim ao ocultar e manter indeterminados aspectos essenciais, a
reais’. A ideologia, definida pela autora como ‘forma específica do
ideologia busca dar a si mesma uma coerência que não conseguiria se
imaginário social moderno’, seria a maneira necessária pela qual os
todas as lacunas fossem preenchidas. Coloca-se como destacada do
agentes sociais representam para si mesmos o aparecer social, econômico
tempo, normativa e transcendente, ‘sensata’ (ainda que ‘apaixonante’
e político. Esta aparência não deve ser confundida com ilusão ou
para alguns) para além dos paradoxos e contradições que mascara.
falsidade. É antes o modo pelo qual sistematizamos as representações e
“A operação ideológica fundamental consiste em provocar uma
normas sociais que nos ‘ensinam’ a agir, “(...)o conjunto coerente e
inversão entre o ‘de direito’ e o ‘de fato’. Isto é, (...) de direito e de
sistemático de imagens ou representações tidas como capazes de
fato, a sociedade está internamente dividida e o próprio Estado é uma
explicar e justificar a realidade concreta. Em suma: o aparecer social é
das expressões desta divisão. (...) A operação ideológica consiste em
tomado como o ser do social.” (Cultura e Democracia, p 19)
afirmar que ‘de direito’ a sociedade é indivisa(...), por outro lado a
Esta construção coerente e lógica nasce de uma determinação
ideologia afirma que ‘de fato’ ( e infelizmente ) há divisões e conflitos
‘muito precisa’: a pretensa coincidência com as coisas que o discurso
sociais, mas a causa deste fato injusto deve ser encontrada em homens
ideológico busca, anulando as diferenças entre pensar, o dizer e o ser,
injustos (...). Assim, a divisão constitutiva da sociedade de classes reduz-
engendrando assim uma lógica que unifica o pensamento, linguagem e
se a um dado empírico e moral.”(Cultura e Democracia, p.20).
realidade para, “através desta lógica, obter a identificação de todos os
A ideologia “oferece à sociedade fundada na divisão e na
sujeitos sociais com uma imagem universalizada, isto é, a imagem da
contradição interna uma imagem capaz de anular a existência efetiva da
classe dominante 11. Em outras palavras ,a coerência ideológica não é
luta, da divisão e da contradição: constrói uma imagem da sociedade
11Ainda
que se fale em classe dominante, no singular, Francisco de Oliveira aponta que os grupos dominantes hoje no Brasil representam um conjunto diversificado, que precisa ser articulado: burguesia industrial, burguesia financeira, setores da classe média, empresas multinacionais, ambiente internacional, etc. (FSP:10.02.97, p.1-4).
como idêntica, homogênea e harmoniosa. Fornece aos sujeitos uma resposta ao desejo metafísico de identidade e ao temor metafísico da desagregação.” (Cultura e Democracia, p.27).
31
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
À ideologia opõe-se o saber, que Marilena Chauí define como um trabalho, uma negação reflexionante, isto é, “uma negação que por sua
No saber, as idéias são produto de um trabalho. (Cultura e Democracia, p.4).
própria força interna transforma algo que lhe é externo, resistente e
Buscando livrar-nos dos ‘moldes’ ideológicos, que conformam o
opaco” (Cultura e Democracia, p.4). Este ‘algo’ seria o ‘não-saber’, uma
pensamento, tornando-o unidirecional e ‘sensato’, mas buscando na
experiência imediata cuja obscuridade pede o trabalho da clarificação.
própria ideologia elementos para entender o nosso tempo e seus
A obscuridade de uma experiência nada mais é senão seu caráter
conflitos sociais e políticos específicos, caminharemos por um campo
necessariamente indeterminado e o saber nada mais é senão o trabalho
eminentemente político, isto é, um campo que está fora da ação
para determinar essa indeterminação. Só há saber quando a reflexão
neutralizadora da ciência como saber instituído.
aceita o risco da indeterminação que a faz nascer. Segundo Chauí, para ser eficaz, é preciso que a ideologia realize um movimento que lhe é peculiar: RECUSAR O NÃO-SABER que habita a experiência, ter a habilidade para assegurar uma posição graças à qual possa
neutralizar
a
história,
abolir
as
diferenças,
ocultar
as
contradições e desarmar toda a tentativa de interrogação. A ideologia eleva todas as esferas da vida social e política à condição de “essências”. Torna-se dominante, conjura o perigo da indeterminação
Ideologia e Ciência
V
ejamos como Flammarion Cardoso vê a produção do conhecimento científico: “(...) Longe de ser visto como um a atividade individual (de sujeitos individuais), o conhecimento
científico é encarado como uma das formas sócio-históricamente
social e política que faz a interrogação sobre o presente (O que pensar?
determinadas da atividade humana. O homem pensa e conhece em
O que fazer?) seja inutilizada graças a representações e normas prévias
unidade com a sociedade históricamente determinada que produz a sua
que fixem definitivamente a ordem instituída.
vida material e espiritual, e que realiza o contato humano com a
“Na ideologia as idéias estão fora do tempo, embora a serviço da dominação presente”. (Cultura e Democracia, p.5)
natureza: o conhecimento é gerado como forma e produto da transformação da natureza e do próprio homem pelo trabalho. Se a
A ideologia teme tudo o que é instituinte ou fundador. Só pode
ciência é sócio-economicamente determinada, isto significa entre
incorporá-lo quando perdeu a força inaugural e tornou-se algo já
outras coisas que não é possível considerá-la sem levar em conta os
instituído. As idéias aqui são ‘conhecimento’, isto é, idéias instituídas.
laços orgânicos que a ligam com todo o conjunto da cultura material e espiritual de uma dada época.” (Cardoso, p.23)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Colocando a Ciência como ‘sócio-economicamente determinada’, Cardoso tira-lhe a sacralidade do infalível e universal, introduz o
32
Ideologia e Mentalidades
conhecimento e a produção de conhecimento no tempo. Mostra-nos a História não como registro dos fatos notáveis, mas também como processo de construção, não menos sujeita às mentalidades que outros campos do fazer humano. Coloca assim o historiador e o estudioso da história como agentes que produzem história à medida em que a registram e estudam.
A
reflexão
desenvolvida
neste
trabalho
aproxima-se
das
proposições de Marc Bloch: “A história é um esforço para melhor conhecer: está portanto sempre em movimento.”
(Introdução à História), porém inseridas dentro de um contexto de análise marxista. É parte deste estudo o trato com depoimentos, enquanto recurso metodológico. A palavra, tanto a escrita quanto a denunciadora palavra falada, se constituirão em uma base para a análise do pensamento, porém atentando-se mais ao que dão a entender, sem ter tido a intenção de dizê-lo, que à superfície do seu significado, isto é, a carga ideológica que carregam. Os críticos marxistas da História das Mentalidades surpreendem-se como os historiadores desta corrente contentam-se, segundo aqueles, em descrever os ‘comos’, sem se preocupar com os ‘porquês’ dos fenômenos históricos. Esta idéia, segundo Michel Vovelle, “parece investir o historiador marxista da perigosa responsabilidade de dizer o porquê...” (Vovelle, p.10). Vovelle considera que a historiografia marxista e a história das mentalidades refletem um mal entendido: ambas necessitariam precisar os seus próprios conceitos, à luz do refinamento de suas problemáticas próprias. “Para isso”, prossegue Vovelle, “é necessário tomar claramente consciência da coexistência,
33
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
dentro de um mesmo campo, de dois conceitos que, além de rivais, são
palavra acabam por confundir ainda mais o estudioso com uma
herdeiros de duas correntes diferentes e, por isso mesmo, difíceis de se
expressão que remete à representação que se faz no senso comum da
ajustarem, embora apresentem, incontestavelmente, uma área real de
ideologia como uma configuração organizada e polarizada, em contraste
superposição.”(Vovelle, p.11). Para o autor, é evidente que ideologia e
com um certo ‘bom-senso, onde se refletiria a atmosfera da época: a
mentalidade não são uma única e mesma coisa.
mentalidade. (Vovelle, p.14).
Entretanto, o autor cita Engels visando a provar que, na origem, o
Buscando uma definição para mentalidades, o autor cita Robert
Marxismo não vê na organização dos modos de produção e reprodução
Mandrou, segundo quem a história das mentalidades não é nada mais
da vida o único fator determinante, concepção que teria engendrado o
que a ‘história das visões do mundo’, definição ao mesmo tempo ‘bela
‘marxismo vulgar’, explicação mecânica através do econômico, “em um
e satisfatória’, na opinião de Vovelle, mas incontestavelmente vaga e
universo onde as superestruturas ideológicas responderiam, como em
até caricatural, pois na história das mentalidades encerram-se a história
um passe de mágica, às solicitações da infra-estrutura.” Este conceito
das atitudes, dos comportamentos e das representações coletivas
teria condenado os historiadores marxistas ao confinamento da análise
inconscientes, buscando sair dos esquemas de uma história que
puramente econômica e social, mas sob ‘liberdade vigiada’, deixando
permanecia restrita ao nível das elites.
aos historiadores das mentalidades a tarefa de penetrar nos territórios
Ideologia e Mentalidade engendram dois modos distintos de análise
mais complexos da história religiosa, das mentalidades e das
histórica: um mais sistemático e o outro voluntariamente empírico.
sensibilidades. (Vovelle, p.12.)
Todavia, existe entre os dois termos, como já se disse, uma indiscutível
Para o historiador estas seriam as formas ‘nobres’ de expressão
e ampla área de superposição. Para o autor, há um mal-entendido
ideológica, numa história que estaria ampliando cada vez mais o campo
fundamental
em
considerar
que
as
mentalidades
se
inserem
de sua curiosidade, englobando comportamentos mediante os quais o
naturalmente no campo do ideológico, ou que a ideologia, no sentido
homem se definiria em sua plenitude - a família, os costumes , os
estrito do termo, não poderia ser senão um aspecto ou um nível no
sonhos, a linguagem, a moda - confrontando-se, nestes domínios, com
campo das mentalidades (Vovelle, p.17). “No investimento coletivo na
o aparentemente gratuito, mas nem por isso menos significativo.
historiografia dos países liberais, e particularmente na França, parece
O autor se indaga sobre a possibilidade da existência, nos
nitidamente ser a noção de mentalidade - mais flexível, desembaraçada
comportamentos humanos, de uma parte que escape à ideologia, que
de toda conotação ‘ideológica’ - a parte premiada, a mais operatória, a
esteja abaixo ou de lado, concluindo que as utilizações vulgares da
melhor habilitada, graças à própria sutileza de que se reveste, a
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
34
responder às necessidades de uma pesquisa sem pressupostos.”
se demais do comodismo da fórmula marxista “luz particular” ou
(Vovelle, p.18.)
“éter” de um dado momento: essas referências autorizariam uma leitura
Entretanto, seria a História das Mentalidades antimarxista?
laxista, se justamente a utilização do modo de produção como todo
Num primeiro nível, segundo Vovelle, o conceito de mentalidade se
englobante - o sobredeterminante - não levasse à unidade do campo
constitui, como observamos, mais amplo que o a ideologia. “Ele
histórico.” ( Vovelle, p.24).
integra o que não está formulado, o que permanece aparentemente
História das mentalidades seria então o estudo das mediações e da
como ‘não significante’, o que se conserva muito encoberto ao nível
relação dialética entre as condições objetivas da vida dos homens e a
das motivações inconscientes. Daí a vantagem , talvez, dessa referência
maneira como eles a narram e mesmo a vivem. A esse nível, as
mais maleável para uma História total.”(Vovelle, p.19).
contradições se diluiriam entre dois esquemas conceituais, cujos
O lugar onde se fixaria a incompatibilidade mais flagrante entre os
aspectos são contrastados por Vovelle. Segundo este, o estudo das
conceitos de ideologia e de mentalidade é a afirmação da autonomia do
mentalidades, longe de ser um empreendimento mistificador, tornar-se-
mental e de sua irredutibilidade ao econômico e ao social. Segundo o
ia, no limite, um alargamento essencial do campo de pesquisa, não
autor, esta irredutibilidade é uma noção antiga, que compreende
como território estrangeiro exótico, mas como o prolongamento
também noções novas, tais como as de ‘inconsciente coletivo’ ou
natural e a ponta fina de toda história social, ensinando-nos a encarar
‘imaginário coletivo’, este último menos suscetível a “extrapolações
mais diretamente o real, em toda a sua complexidade e em sua
temerária do domínio da psicanálise.” (p.21). Entretanto, uma parte da
totalidade.
historiografia francesa vem buscando “manter o controle das duas pontas da cadeia”: a história das estruturas e a história das atitudes mais elaboradas, mostrando o caráter não contingente desta abordagem histórica ‘no terceiro nível’, isto é, de uma terceira via historiográfica onde
a
análise
marxista
e
a
história
das
mentalidades
se
complementam. “De fato, o historiador não deixou, aparentemente, a ideologia senão para reencontrá-la, mais amplamente informada, dentro de uma leitura precisa e refinada. Provavelmente, ele deveria evitar aproveitar-
35
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Urbanismo e Ideologia
Ao
competência na cidade, baseando-se nas noções de infalibilidade da técnica e da ciência, montando, como vimos, um discurso lacunar onde as ações do sujeito competente são salvaguardadas da dúvida e do
tratarmos da Produção do Espaço Urbano, convém
ataque, apresentando as ações do poder competente na cidade como
delimitar o campo da discussão. É necessário aqui
necessários. Para Demetri Porphyrios, a Ideologia Arquitetônica é “um
fazer a distinção entre Urbanismo entendido como
processo de estruturação mítica que visa à reprodução das relações de
‘instituição’, ou seja, um sistema de normas e regras que versam e
poder.” (Critical History, p.19). Assim, a ideologia arquitetônica
regulam um campo do conhecimento e da atuação humanas e que é
mascararia “não porque está em erro, mas porque seu papel é justificar
socialmente sancionado (O Discurso Competente), e o Urbanismo
a própria realidade social da qual é o cimento e a nutrição”.(idem, p.19).
entendido como estudo crítico da Produção do Espaço Urbano.
O Urbanismo como instituição produz sua contraface, a crítica
Ao encararmos o urbanismo somente como ‘matéria’ ou
formalista, que desdenha o papel dos fenômenos sócio-econômicos
‘disciplina’, um conjunto de regras estabelecidas idealmente para a
como conformadores da forma construída. Esta teria um estatuto
construção do espaço físico da cidade, estaremos separando mais uma
‘isento’ na arena social.
vez aquilo que o discurso competente apresenta como resultado desejável
Por outro lado, parece-nos que a crítica urbanística deve tentar se
e possível das ações da sociedade sobre a cidade, das ações mesmas e de
aproximar dos fenômenos que estuda tomando-os como um processo
seu significado real, reduzindo o urbanismo a um discurso permeável à
de estruturação entre a metrópole, sua cultura e os modos de
ideologia,
produção, entendendo-o como um processo de reprodução das
aqui tomada como inevitavelmente ligada às relações
produtivas. Neste caso, o Urbanismo torna-se um discurso de reforço da fala competente e das construções ideológicas que a mantém. O Urbanismo como Ideologia visa, em última análise (e aqui
relações de poder na cidade. Talvez fosse desejável que, em lugar de apresenta-se como instrumento isento, o discurso urbanístico assumisse um
seguimos de perto o pensamento de Demetri Porphyrios), inserir e
posicionamento político claro e inequívoco, inerente às ações de
justificar os agentes produtores do espaço urbano em atividades
Produção do espaço Urbano na Metrópole. Este será o ponto de vista
práticas ou estéticas que reforçam este poder estabelecido sobre o
adotado na elaboração deste TGI.
fazer a cidade. Busca um consentimento geral para as ações da
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Produção do Espaço Urbano
36
37
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Cidade X Urbanismo
A
resultando em práticas não raro distintas do discurso (e da própria regulamentação engendrada por ele).
cidade é arredia às normas e teorias que se desenvolvem sobre ela. Tomar o urbanismo como ‘coisa em si mesma’, como nos indicará David Harvey, pode levar-nos a uma leitura unidisciplinar e empobrecedora da realidade urbana. Harvey
Algumas considerações sobre o pensamento urbanístico contemporâneo
da sociedade se refletem.”. Porém, o urbanismo como ‘coisa em si
S
mesma’ desapareceria “na consideração de todas as facetas do homem,
reformuladora das instituições sociais.”(Cidades Brasileiras, p.11)
considera
o
urbanismo
como
“ângulo
favorável para desvendar alguns aspectos
relevantes dos processos sociais, que operam na sociedade como um todo; ele se torna, por assim dizer, um espelho no qual outros aspectos
da sociedade, da natureza, do pensamento, da ideologia, da produção
egundo o urbanista Cândido Malta Campos Filho, “O moderno planejamento das cidades inicia-se “(...) com (...) duas visões do urbano, desenvolvidas no início da Revolução Industrial: a técnico-setorial, fruto de uma ação prática
governamental sobre as cidades, e a globalizante, política, teorizadora e Segundo o urbanista, a crença de que os problemas da cidade são o resultado da falta de racionalidade e honestidade do governo e dos
etc.” (Justiça Social, p.7). De fato, ao discursar s o b r e a cidade, o discurso urbanístico adquire às
cidadãos,
leva-nos
a
confiar
na
técnica,
ancorada
em
estudos
vezes uma autonomia ideal, tornando-o disciplina e norma. A confusão
sistemáticos, sérios e “tão científicos quanto possível” como solução
entre ‘disciplina’ (teoria) e a práxis do fazer a cidade engendra uma
possível e desejável para todos estes problemas. “Desse modo”,
separação da realidade. As teorias urbanísticas estão particularmente
prossegue Malta, “a mera ignorância da realidade dos fatos a ser
sujeitas
superada através da análise sistemática seria a causa básica do estado
às
indeterminações próprias
das
operações
ideológicas 12,
caótico das cidades. Para os que encaram a questão urbana desse modo, a abordagem técnico-científica representa uma solução; para tanto, é 12Isto se verificará claramente no caso paulistano, onde discursos ‘importados’ serão ‘transplantados’ para a realidade local, sem que se tenha feito sua crítica ou adaptação.
preciso reforçar, de um lado, os centros de pesquisa e, de outro, os
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
38
órgãos técnicos governamentais de decisão e implementação das
industrialização no bojo do [próprio] capitalismo”.(Cidades Brasileiras,
políticas orientadoras de solução dos problemas das cidades, e excluir os
p.10).
desonestos do processo decisório.”(Cidades Brasileiras, p.5)
Ligadas a estas linhas críticas surgidas nas sociedades de vanguarda da
A abordagem ‘Técnico-Setorial’ tem caráter eminentemente positivo e
transformação do capitalismo, aparecem várias correntes urbanísticas.
é oriunda desta corrente de pensamento, que vê na técnica e no
De um lado, um pensamento ‘Utópico’ ou ‘Abstrato’ que preconizava
progresso a solução de todos os males: “(...)um instrumento técnico de
inicialmente uma marcha-a-ré na história, voltando-se para uma
melhoria da racionalidade da organização do espaço urbano e também
organização comunitária, próxima à natureza, como aquelas dos
das qualidades estéticas desse espaço, considerando essas qualidades
primórdios do processo civilizatório, a dos culturalistas .”Mais tarde,
visuais como desvinculadas de qualquer determinação mais profunda da
ainda segundo Malta, a impossibilidade daquelas utopias, face à
organização social prevalecente.” (Cidades Brasileiras, p.6)
crescente urbanização e industrialização, propôs-se ‘adaptações’, entre as
Na abordagem ‘Globalizante’, buscou-se colocar o homem como ser
quais a do inglês Ebenezer Howard que, na virada do século, publica
eminentemente social, estando a organização do espaço inserida dentro
Garden-cities for tomorrow (“Cidades-Jardim para o amanhã”.). Aqui se
de um questionamento mais amplo. Entretanto, algumas vezes advogou-
combinaria a propriedade coletiva da terra com uma organização
se esta nova organização do espaço quase como solução para os
produtiva agrícola e industrial de pequena escala, numa aglomeração
conflitos sociais. “Este urbanismo foi desenvolvido por pensadores que,
urbana de número ideal de habitantes e onde o verde convivesse
procurando analisar a sociedade como um todo, o faziam de forma
perfeitamente com o urbano. Suas idéias, muito modificadas, dariam
simplificada, desembocando em propostas de alteração radical da
origem ao moderno conceito de ‘Cidade Jardim’, que, como veremos,
estrutura social e política, e ainda na organização do espaço geográfico.
será muito importante como modelo para vários bairros paulistanos
(...)”(Cidades Brasileiras, p.8). Na França, Alemanha e Inglaterra, países
desenhados para as classes altas ainda na primeira metade do século..
centrais do capitalismo industrial nascente, veremos o nascimento e a
“Ainda dentro de um caráter predominantemente utópico, mas já
proliferação das correntes utópicas, mas também do socialismo-marxista.
buscando adequar-se à sociedade industrial emergente, desenvolveu-se
Malta condensa esta contribuição: “[O socialismo-marxista] postula
também na Europa no início deste século uma outra linha de urbanistas,
uma transformação radical da sociedade a partir da lógica de sua
que procurava conciliar o conceito de cidade pequena, entremeada de
transformação,
muita área verde e lagos, com o conceito de grandes cidades industriais e
gerada
pelo
próprio
processo
de
urbanização
e
de serviços, como foi o caso de Tony Garnier(† 1948), Walter Gropius,
39
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
na sua Bauhaus na Alemanha (†1969) e Le Corbusier (†1969), na Suíça e
abordagem marcada pela idéia de “estética urbana”, que encontrou sua
França. Podem ser considerados urbanistas globalizantes utópicos pró-
maior expressão com o resgate das idéias de Camillo Sitte e a valorização
industrialistas e pró-urbanos.”(Cidades Brasileiras, p.11).
da composição plástica, para uma concepção histórica e social do espaço
Garnier, Gropius e Le Corbusier devem ser, naturalmente, entendidos
urbano.
dentro de seus contextos específicos. Entretanto, podemos encontrar
Num momento posterior, teremos os urbanistas anglo-saxões
um traço comum a todos, isto é, o fato de pretenderem ignorar os
preocupados em captar no espaço a dinâmica dos usos, no que
conflitos sociais, planejando e projetando para um homem ‘ideal’,
poderíamos qualificar de “Cena Urbana”. Mais recentemente, a idéia de
apaziguado, dócil, transparente e internacional. Aqui as especificidades
“Ambiente Urbano”, calcada nas idéias de antropólogos e psicólogos da
culturais e do sítio são apagadas em benefício de uma cidade ‘ótima’,
Europa e América do Norte, procura ver o espaço urbano como um
higiênica e perfeitamente funcional. Mais do que nunca, propõe-se a
campo
solução dos conflitos sociais através da ordenação física do espaço.
formativos: os habitantes, o sítio, o ambiente construído, etc. O enfoque
de
interações
dinâmicas
entre
seus
diversos
elementos
Sabemos como estas idéias serão ‘apropriadas’ pelo capitalismo
‘Ambientalista’ centra sua abordagem na análise da interação homem/
industrial, que buscará ocultar sob o manto humanista do modernismo,
ambiente. A educação, a evolução cultural e intelectual do homem se
um projeto de cidade (e de cidadão) conformado à lógica da produção
daria através de relações espaciais, onde
em
as
estruturado do qual ele participaria com outros e que mais nenhuma
da
outra coisa lhe daria sentido de identidade, sentido de pertencimento, a
massa
e
especificidades
do e
acúmulo os
de
conflitos
capitais, do
pretendendo
meio
urbano
anular através
homogeneização das aspirações e de uma contínua operação ideológica
desenvolveria um conjunto
partir do qual se relaciona com outros lugares durante sua existência 13.
que identifica, naqueles conflitos, ‘crises’ (portanto mais ou menos
Kevin Lynch, no seu livro A imagem da cidade, de 1966, traduz a
passageiras), e não como parte da dinâmica propiciada pelo próprio
qualidade ambiental das cidades contemporâneas na preocupação com a
modelo econômico e social. Em suma, a idéia de um espaço neutro e
qualidade da imagem mental que os indivíduos possuem da sua
geométrico tem implicações políticas profundas.
paisagem. Zonta Zanetti resume assim tal teoria: “Para que haja um
Mais tarde, o conceito de espaço urbano transformou-se de uma
equilíbrio entre o meio ambiente e o cidadão, é necessário que este meio
concepção estática e geométrica para uma concepção dinâmica e
“não só esteja bem organizado, senão que seja também poético e
quadridimensional, com a inclusão da dimensão temporal. Esta evolução do conceito de espaço no campo da análise urbana, passou de uma
13Cidade
Brasileiras. Ver também NORBERG-SHULZ, Christian: Existencia, espacio y arquitectura. Apud Valdir Zonta Zanetti.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
40
simbólico. O meio deve falar dos indivíduos e da sua sociedade
revelou-se, com o passar do tempo, insatisfatório. Isto levou à
complexa, de suas aspirações e tradições, do marco natural e das funções
demolição de muitos conjuntos. Nas periferias das grandes cidades
e dos movimentos complexos do mundo urbano. Portanto, a intervenção
européias, mais especialmente Paris, o conflito social urbano tomou
do arquiteto (não só do arquiteto, mas também de outros profissionais)
dimensões inesperadas e, dentro da linha ambientalista, cogitou-se que
nas estruturas ambientais produzidas concretamente, através do trabalho
uma das causas da pouca integração social de seus habitantes seria o
social, deveria procurar oferecer estímulos à participação e à interação
próprio ambiente construído, segregador por natureza 14.
entre os cidadãos.” (ZANETTI)
A atribuição exclusiva das mazelas sociais de uma sociedade ao
Esta abordagem da forma urbana enquanto ambiente vem se
espaço construído insere-se no campo do espaço urbano entendido
desenvolvendo desde o início dos anos 60, especialmente por dois
como coisa separada da realidade social. Parece-nos antes que, se o
motivos: “- a crescente degradação ambiental das grandes cidades
espaço pode ‘favorecer’ certas situações sociais já existentes, jamais
contemporâneas.- a insatisfação manifestada pela população que foi
poderíamos dizer que o projeto arquitetônico é, como acreditavam os
habitar os espaços produzidos para a sociedade de massas, baseados em
modernos, determinante dos processos sociais.
modelos
urbanos
idealizados
ou
esquematizados
a
partir
das
A ‘reação’ ao pensamento urbanístico modernista, em grande parte
possibilidades tecnológicas da era industrial e das formulações teóricas
ligada às “tentativas de reposição contextualista das perdas e danos
desenvolvidas pelo urbanismo desde o final do século passado, sem levar
causadas pelo Movimento Moderno” (Arantes, A Cidade como Não-Lugar,
em conta a participação dos próprios habitantes.” (ZANETTI)
p.83) tratará da separação entre o homem e o lugar urbano, sem contudo
No campo internacional, o alemão Alexander Mitscherlich, em seu
avançar significativamente na crítica ao urbanismo como ‘coisa em si’.
livro “O Fetiche Urbano” de 1965, procurou analisar as causas da
Otília Arantes (O Lugar da Arquitetura Depois dos Modernos) comentará
insatisfação com os ambientes então constituídos, em especial os
a utilização, pelo arquiteto Aldo Rossi, de um termo que “a literatura
grandes conjuntos habitacionais, projetados e executados no pós-guerra
especializada acabara esquecendo”, ou seja, o lugar, resultante, segundo
europeu. “Segundo o autor, são espaços projetados sem a mínima interferência dos seus habitantes e sem se ter o conhecimento das aspirações e dos desejos daqueles que para lá se dirigiam.” (ZANETTI) Como sabemos, ainda que tais conjuntos tivessem obedecido a uma utopia clara e, em última análise, humanista, o ambiente construído
14Em
1995 tomou-se a decisão, na França, de estabelecer em muitas destas áreas, as ‘zonas de desenvolvimento especiais’, onde o Estado, através de incentivos fiscais ao comércio e pequena indústria, tentaria reverter a degradação da estrutura social. Visaria a uma contenção dos altos índices de criminalidade entre jovens imigrantes desempregados, que acaba por inibir as atividades do comércio e da pequena indústria e resulta numa desvalorização imobiliária, prejudicial especialmente para os proprietários de imóveis.
41 Rossi, de uma “relação singular e sem embargo universal entre certa situação local e as construções aí sediadas.” (Arantes, p.123). O arquiteto identificará aí o oposto do espaço positivo geométrico, isto é, um lugar carregado de significações, onde a obra arquitetônica encontraria as relações que a animariam e lhe dariam significado, um vínculo local que
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O Urbano: do espaço geométrico ao espaço histórico e social
determinaria a individualidade da obra. “Fato singular determinado pelo espaço e pelo tempo, por sua dimensão topográfica e por sua forma, por
“A
‘substância’
deste
cosmos
(ou
deste
‘mundo’),
ao
qual
ser sede de vicissitudes antigas e modernas, por sua memória.”(Rossi,
pertencem a terra e a espécie humana, com sua consciência, esta
apud Arantes). É em nome desta individualidade, segundo Arantes, que
‘substância’, para utilizar o velho vocabulário da filosofia, tem
Rossi encara toda a atividade projetual arquitetônica.
propriedades que se resumem nestes três termos. Se alguém diz
Arantes faz notar que a passagem do campo abstrato para o concreto,
‘ energia’, d e v e l o g o a g r e g a r q u e e l a s e d e s e n v o l v e n u m e s p a ç o . S e
para o arquiteto, está ligada à noção de que o espaço dito abstrato seria
a l g u é m d i z ‘ espaço’ , d e v e l o g o d i z e r o q u e e l e o c u p a e c o m o : o
próprio da intervenção modernista, ao passo que o concreto, “expressão
desenvolvimento da energia em torno dos ‘pontos’ e num tempo
da unidade das significações insubstituíveis”, resumiria a mudança de
d e t e r m i n a d o . S e a l g u é m d i z ‘ tempo’ , d e v e l o g o d i z e r a q u i l o q u e s e
rumo proposta pela nova arquitetura da cidade.
move
ou
muda.
O
espaço
tomado
separadamente
torna-se
uma
abstração vazia, o mesmo ocorrendo com a energia e o tempo.” Henri Lefèbvre in La Production de l’Espace, 1974, p.20 15
15As
traduções para este texto são de minha autoria.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
H
42
“Não é nem absoluto, relativo ou relacional em si mesmo, mas pode enri Lefèbvre chama-nos a atenção para a conotação
transformar-se em um ou em outro, dependendo das circunstâncias”
‘geométrica’, afeita ao campo da matemática, que a
(p.5) A pergunta fundamental então não é mais ‘o que é espaço?’, mas ‘o
noção de espaço engendra. “Com a razão cartesiana,
que é isso que as diferentes práticas humanas criam, fazendo uso de
o espaço entra no absoluto. Objeto diante do Sujeito,
distintas conceituações de espaço?’ (p.5).
‘res extensa’ diante da ‘res cogitans’ (Production de
l’Espace, p.7)”.
De fato, o autor indicará uma separação que manterá à distância, uns
fora dos outros, os ‘diversos espaços’: físico, mental, social; distância que separa o espaço ‘ideal’, campo das categorias mentais (lógicomatemáticas), do espaço ‘real’, aquele da prática social, “já que cada um implica, põe e supõe o outro.”(p.21). David Harvey (A Justiça Social e a Cidade, 1973), identifica a corriqueira separação entre os processos sociais e as formas espaciais, examinando-a criticamente. “As formas espaciais são vistas não mais como objetos inanimados dentro dos quais o processo social se desenvolve, mas como coisas que contêm os processos sociais, do mesmo modo que os processos sociais são espaciais.”(Justiça Social, p.p.23). Harvey afirma que é a partir de uma correta concepção do espaço que se deve buscar compreender o fenômeno urbano e a sociedade em geral. O autor indica que, ao tomarmos o espaço como absoluto, ele se torna ‘coisa em si mesma’. Ao contrário, a caracterização de um espaço relativo “propõe que ele deve ser entendido como uma relação entre objetos, a qual existe somente porque os objetos existem e se relacionam.” (Justiça Social ,p.5), para mais adiante afirmar que o espaço
43
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
A Permanência das Formas Urbanas
A
cidade produzida historicamente, como é o caso da São Paulo, ao contrário da cidade projetada e construída de uma só vez, é formada pela somatória de elementos espaciais, caminhos, usos e funções, procedimentos e saberes que, num processo dinâmico, permanecem ou
são modificados ao longo do tempo. Poderíamos acrescentar a esta definição todos os modos e maneiras
pelos quais o sujeito habita o espaço, determinando-o e ao mesmo tempo sendo determinado por ele, conformando-o e buscando nele as referências para o seu fazer. Não apenas as táticas urbanas 16 de Michel de
Certeau, mas também os pequenos procedimentos cotidianos, os conflitos e acordos que animam o conceito de cidade com uma dimensão não quantificável, mas absoluta, que contém dentro de si todas as outras dimensões (histórica, social, econômica, etc.), que são ao mesmo tempo constituídas e constituidoras desta dimensão, a Cultura Urbana. Na concepção funcionalista da forma urbana, os conflitos aparecem amenizados. Entretanto, serão os próprios conflitos, entendidos como 16Michel
de Certeau define as táticas urbanas como o conjunto dos pequenos fazeres cotidianos que permitem ao sujeito habitar no mundo das estratégias oficiais, negando-as e reafirmando-as, tirando partido destas regras e subvertendo-as. CERTEAU, Michel. “Practices of Space”, 1985.
ações dinâmicas de apropriação e desapropriação (ou seja, as relações de poder e sujeição e suas táticas), os principais constituidores da forma urbana, que não é mais que o produto e o campo destes conflitos e interações. Diante de uma economia ferozmente consumidora, o espaço urbano torna-se, além da base para a transações comerciais, o objeto e veículo de produção e consumo, um objeto mercantil como outro. Porém, para além da dimensão comercial do espaço, está a rede de significados que o constituem como campo para a vida. Talvez seja esta rede de significados e seu suporte, o ambiente construído, a razão da valorização por Aldo Rossi (em A Arquitetura da Cidade) e Milton Santos (em Por uma Geografia Nova), do conceito de ‘permanência das formas urbanas’. Segundo Santos, “o espaço é uma forma, uma forma durável, que não se desfaz paralelamente à mudança de processos; ao contrário, alguns processos se adaptam às formas preexistentes enquanto outros criam novas formas para se inserir dentro delas.” (Por uma Geografia Nova) Rossi, por sua vez, destaca a importância que os geógrafos franceses, como Marcel Poète, davam ao conhecimento sobre o passado da forma da cidade, em particular àqueles elementos que permanecem no tempo e acabam condicionando as novas implantações urbanas, como, por exemplo, os traçados viários iniciais, os caminhos que interligam a cidade ao território e a estrutura da propriedade fundiária. Poderíamos acrescentar a esta lista os monumentos, templos e grandes instalações públicas, como mercados, arenas, edifícios administrativos, etc., além de
44
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana todos os edifícios e espaços que contribuem para formar a rede de significados nos quais a cidade se reconhece e se auto-representa. Numa sociedade mais e mais espetacularizada, onde o fetiche da mercadoria e do mercado acaba por substituir outros valores na produção do espaço urbano e é a base para construções ideológicas que tentam ocultar a violência dos conflitos gerados no processo, a permanência das formas urbanas contribuiria certamente para a construção da cultura e da cidadania na cidade. Entretanto, como contrapor à ideologia do eternamente novo e moderno, do progresso e da Globalização, o discurso da permanência das formas 17?
Pensamento Urbanístico PósModerno
P
ara Mary McLeod, nos seus primórdios o pós-modernismo não era visto pelos arquitetos como uma categoria histórica ou mesmo
crítica
propriamente
dita,
mas
antes
como
um
‘movimento polêmico’ com implicações sociais e estilísticas. Este movimento incluiria aquelas correntes que endossavam o uso de estilos históricos e de imagens que enfatizariam as propriedades cenográficas e decorativas (em oposição à composição) da arquitetura e que rejeitavam os objetivos sociais do movimento moderno (Architecture, Criticism, Ideology, 1985, p.7). McLeod indica que muitos arquitetos, embora fossem altamente críticos de aspectos da arquitetura moderna, especialmente seus
conceitos
urbanísticos
e
sua
utopia
“naïve”,
sentiam-se
‘desconfortáveis’ com as soluções receitadas pelos pós-modernos. “Não só muitos pós-modernos parecem formalmente regressivos - nostálgicos de um passado perdido - mas nos Estados Unidos também pareciam estar de alguma maneira ligados à guinada conservadora da política americana
contemporânea”
(idem,
p.7).
McLeod
via
então
uma
identificação estilística com “ gestos ‘flamboyants’ em direção a um 17Há,
para além destas considerações, a questão da reqüalificação de áreas onde a pobreza e a falta de investimento resultaram na ‘Não-Cidade’. Nestes casos, como se poderá falar em ‘permanência das formas urbanas’? Talvez se devesse buscar criar uma nova competência a partir dos saberes existentes, tentando requalificar a cidade a partir do resgate destes saberes e da valorização do homem, e jamais o contrário.
novo-richismo arrivista, a imagem imperialista das estruturas públicas, a retórica populista que soava mais paternalista que democrática e, finalmente, o apelo cada vez mais forte de programas como clubes
45
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
masculinos, hotéis de luxo e casas de banho privadas que sugeriam que esta ‘vanguarda’ teria pouco interesse em desafiar as estruturas de poder
Para Canevacci, a “praça está morta”, isto é, o Lugar (e por extensão o Lugar público) já não é mais o palco da cultura.
existentes.” (idem, p.7). A rejeição dos arquitetos ditos pós-modernos à
Tais diferenças entre Cidade Moderna e Metrópole Pós-Moderna
‘caixa de fósforos corporativa’ não era, segundo a autora, uma reação
exigiriam uma mudança de paradigmas de interpretação e a procura de
anti-capitalista, mas formal e ‘vagamente humanitária’. “A caixa em si,
uma nova metodologia de estudo. Segundo Canevacci, a forma da
como o edifício AT&T, de Philip Johnson [em Nova York] testemunha
metrópole “substituiria a própria forma da sociedade” nesta nova
tão bem, estava destinada a reaparecer em roupagens mais ‘reais’,
metodologia.
incluindo a coroa 18.” (Architecture, Criticism, Ideology, 1985, p.7).
A imaterialidade é palavra de ordem e definidora das mudanças que a
No caso paulistano, teremos um caso exemplar de análise pós-
metrópole assume. A chamada ‘Dimensão Imaterial da Metrópole’ se
moderna do espaço urbano no trabalho desenvolvido a partir de 1986
referiria à passagem da produção material à cultura imaterial, propiciada
pelo antropólogo italiano Massimo Canevacci. A publicação de seu livro
pelas novas tecnologias de comunicação, desaguando em novas
A Cidade Polifônica, em 1993, aproxima a análise pós-moderna dos
possibilidades de produção, difusão e transferência de bens
fenômenos paulistanos.
materiais e serviços.
não
Canevacci 19 propõe uma diferenciação entre os conceitos de Cidade e
Também os conceitos de Indústria e Sociedade seriam ‘arqueológicos’,
Metrópole, apontando para uma profunda modificação desta última em
pois implicariam num processo de valorização econômica e cultural já
relação às formas urbanas até aqui estudadas.
ultrapassado
no
atual
estágio
da
Globalização.
A
Comunicação
A Cidade, para Canevacci, teria uma dimensão espacial intrínseca, que
representaria em si mesma uma nova possibilidade de valorização e de
teria sido substituída na Metrópole por uma dimensão comunicativa que
produção de valor. Este seria o centro fundamental da nova forma de
não conhece limites. Assim , a noção de Espaço já não mais serviria para
valorização e, portanto, o novo centro dos conflitos. Enquanto a
entender a Metrópole.
dimensão material engendraria um pensamento dicotômico, a produção imaterial daria lugar à quebra das categorias binárias tradicionais. Uma
18Referência
à parte superior do edifício, que tem formas trabalhadas ‘como uma coroa’. 19 Antropólogo e especialista em questões relativas à comunicação Aqui serão tratados os textos “A Cidade Polifônica” e, especialmente, a palestra ministrada no Seminário “A Cultura das Metrópoles” (22 a 25 de outubro de 1996,SESC. Serviço Social do Comércio. Palestra de Massimo Canevacci, 25 de outubro: “Cultura, Comunicação e Consumo”).
das categorias desativadas seria a do próprio conceito de classe social, que daria lugar ao conceito mais soft da individualidade do múltiplo 20. O conceito Este seria um conceito calcado na Antropologia Nova. No conceito de identidade múltipla, o eu pode modificar-se, o plural de eu pode ser, além de nós, “eus”. O sujeito 20
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
46
de classe social seria assim mais um conceito dicotômico oitocentista
Segundo o conceito de dialógica, haveria dois atores principais na
relegado a uma classificação arqueológica pelo pensamento pós-
relação metropolitana, o sujeito e o objeto construído. Olha-se e é-se
moderno. De todo modo, a classe operária estaria acabando, como a
olhado pelo edifício, no que Canevacci chamará de neo-animismo da
classe agrícola, que já teria praticamente desaparecido (citando como
metrópole. Isto permitiria a modificação da forma da metrópole e a
exemplo o caso italiano, onde 1,5% da população, somente, trabalha no
criação de uma metodologia múltipla de interpretação experimental.
campo).
Segundo Canevacci, seria preciso aceitar a modificação da metrópole,
O sentido da metrópole contemporânea residiria em três conceitos básicos: o sincretismo, a polifonia e a dialógica.
que se realiza de certa forma contra a forma da sociedade. A “dicotomia oitocentista” Sociedade Civil x Estado estaria perdendo sentido. Para o
Hoje ocorreria uma enorme produção de elementos culturais
sociólogo, o conceito de Sociedade Civil não pode mais dar conta das
conflitivos: a dialética sincrética substitui a dialética sintética de Marx.
mudanças pelas quais estaríamos passando. Hoje haveria um conflito
Os
hegemonia,
entre as metrópoles, uma competição pela valorização de suas
sincreticamente. Já a forma de apresentação daqueles elementos seria
respectivas culturas e pelo financiamento para a ‘Forma’ da metrópole,
polifônica, buscando uma infinidade de mídia para realizar-se. Só a voz ou
que produz valor, mas não identidade. Não existiria uma metrópole sem
só a literatura não bastariam. Seriam necessários a música, a publicidade,
elementos dissonantes. ‘Civilização’ não é mais um conceito ligado à
os outdoors, a televisão: o que Canevacci chama de visual scape
técnica e à ciência, mas à produção de cultura, colocando índios e
(panorama visual). O sociólogo reserva para a publicidade um papel
ocidentais num mesmo patamar.
elementos
conflitantes
podem
coexistir
sem
importante, pois ela teria a capacidade de antecipar os novos códigos
O conceito de Identidade ( um conceito do moderno ) seria um dos
que continuamente aparecem na metrópole. Esta multiplicidade de
mais repressivos criados pelo pensamento ocidental. A identidade é
apresentações impele a modificação da apresentação da forma racional.
sempre igual a si mesma: tem-se de permanecer o mesmo em circunstâncias diferentes, o que significaria permanecer idêntico frente a uma mudança empírica, o que representaria uma amarra limitadora para
não é mais constrangido a ter coerência com seu eu, criando uma identidade móvel no tempo e no espaço. Isso só poderia se construir na metrópole, onde reinaria uma espécie de psiconomadismo. Desnecessário notar as implicações de tal teoria, onde o sujeito social, agora móvel, perde a mira de suas reivindicações sociais que, através da ação política, se universalizariam no direito. Agora sua ação reduz-se ao atendimento de carências momentâneas e cambiáveis.
o sujeito. Esta amarra já não poderia existir na Metrópole Pós-Moderna, onde o espaço identitário deixa de existir em benefício de um lugar virtual por onde trafegam as informações e os bens imateriais. O espaço do exterior é um espaço onde o corpo está diluído. Hoje haveria uma
47 desterritorialização da metrópole. Para Canevacci tudo o que é território fechado, com raízes tem um sentido negativo e não é favorável ao trânsito. O trânsito é absolutamente necessário às novas tecnologias. No Moderno o Espaço é identitário. Para Lévi-Strauss, segundo Canevacci, São Paulo era uma cidade de ‘espaços’ muito distintos, de espaços
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
A Crítica: do Moderno ao Pós-Moderno
privado. Esta noção seria substituída pela de lugar performativo, um
C
lugar próprio da metrópole, cujo conceito está relacionado com o
Nouvelle Architecture: “Arquitetura ou revolução: A revolução pode ser
conceito de identidade (Na metrópole, pode-se escolher a identidade à
evitada”. Segundo a autora, aquele seria um período de ‘crença ingênua’
vontade, escapando-se às suas limitações.).
e otimismo, mas não de crítica. “Enquanto ambos os praticantes e os
múltiplos e conceituais, ao contrário de Paris, por exemplo, onde o espaço é fundador da cidade. O Shopping Center, para Canevacci, é a unificação de espaços e tempos do mundo, introduzindo o conceito do Cronotopos. No espaço cronotópico haveria uma justaposição de espaços e tempos diferentes, exigindo uma sensibilidade panorâmica. A dimensão cronotópica encerra um embate maior, o embate entre público e privado. No caso do Shopping Center não haveria público nem
omo sabemos, uma das mais importantes premissas do Movimento Moderno era a crença de que a arquitetura
tinha
um
papel
na
formação
das
condições sociais 21. Acreditava-se que a arquitetura poderia ser produzida a baixos custos, tornado-se disponível
para
todos,
promovendo
assim
a
melhoria das condições sociais. O próprio Le Corbusier, como nos lembra McLeod, declarou em suas famosas frases finais de Vers une
primeiros historiadores do Movimento Moderno estavam ansiosos para ligar forma e sociedade, nenhum deles tentou penetrar os mitos nos quais sua fé messiânica estava baseada, ou analisar sistematicamente as conecções entre desenho e processos materiais.” (idem, p.8). Uma das primeiras críticas de peso aos princípios modernistas a aparecer no cenário americano foi o texto de Jane Jacob “A Morte e a 21Mary
MacLeod cita os críticos ingleses do séc. XIX, como Augustus Welby Pugin, John Ruskin e William Morris, além dos ‘polemistas modernos’, como Le Corbusier, Walter Gropius, Bruno Taut e Ernst May.
48
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Vida das grandes Cidades Americanas”(1961). Dez anos mais tarde o
também tratavam a arquitetura primariamente como um artefato
pensamento modernista seria sacudido pelo inédito clamor popular
estático, a despeito de seu interesse professo na história e na
contra o Conjunto Habitacional de Pruitt-Igoe, finalmente dinamitado
transformação política.” (McLeod, p.9) Arquitetos como Aldo Rossi,
em 1972.
Vitorio Gregotti e Rob Krier teriam assim envisionado o ‘tipo’ como
Entretanto, segundo McLeod, a crítica ao movimento moderno tendia
uma ‘constante’ num contexto de relações produtivas cambiantes.
a ser bastante orientada a questões específicas, concentrando-se em
Nos anos 80, a crítica arquitetônica pós-moderna já se define
preocupações como “a morte da rua, a anonimidade dos longos
claramente. 22 Ela poderia ser caracterizada como pluralista e eclética,
corredores, os perigos criminosos dos elevadores, a falta de espaço semi-
“uma reação contra o determinismo moral do funcionalismo e a
público controlado” (p.8), deficiências que eram geralmente atribuídas à
codificação redutiva das análises estruturais e semióticas” (McLeod, p.9).
insensibilidade pessoal dos arquitetos. “Poucos tentaram entender a
Aqui, segundo a autora, qualquer tentativa de entender a história como
arquitetura como um sistema de crenças e processos naturais mais
um processo dialético ligado às estruturas de classe, além do papel da
amplo, que existe em relação com as estruturas econômicas e sociais
ideologia em manter relações de poder, seria inteiramente rejeitado. “A
[mais complexas]. “ (McLeod, p.8).
teoria genuína, o ‘conhecimento científico’- sempre uma construção
De acordo com McLeod, a partir do começo dos anos 70, a crítica
difícil em relação à ideologia - é impossível mesmo como realização
arquitetônica se concentrou mais e mais nas questões formais e na
relativa, face a preocupações tão divergentes e altamente individuais ( e a
questão do significado. Acompanhando a nova crítica literária, dissecou-
desatenção à vida social).” (McLeod, p.9). McLeod destaca que, em
se as estruturas formais do desenho arquitetônico. Charles Jencks, Georg
meados de 80, uma crítica materialista-histórica começava a se
Baird, Françoise Choay e Mario Gandelsonas teriam adaptado conceitos
desenvolver
da semiótica e do estruturalismo à análise arquitetônica. Christian
influenciadas pela teoria Marxista. A primeira, baseada nas teorias de
Norberg-Schulz teria introduzido uma perspectiva fenomenológica ao
Galvano
desenho e à crítica, reforçada pela recepção popular dada à obra de
epistemológico igual, ‘mas não idêntico’, àquele da ciência e da história.
Gaston Bachelard A Poética do Espaço. A autora identifica nestas
A arquitetura conteria um conhecimento coerente e racional, possuindo,
aproximações amplamente divergentes um ponto comum: o ponto de
como outras artes, um alto grau de autonomia, com um código próprio.
na
Della
Itália, Volpe,
gerando clamava
duas para
aproximações a
arquitetura
fortemente um
estatuto
vista sincrônico, que não contemplaria mudanças na natureza da ideologia em si. “Os estudos tipológicos contemporâneos europeus
22McLeod
Wolfe.
cita os textos de Charles Jencks, Paul Goldberger, Suzanne Stephans e Tom
49
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Os vínculos históricos e sociais não condicionariam a arquitetura
Arantes indaga se, ao se pretender expurgar a cidade moderna,
mecânica e externamente, mas conservariam-se como parte de qualquer
eliminando tudo o que ela encerra de impessoal e insignificante,
substância intelectual e estrutural do desenho arquitetônico. A geração
cancelando os interesses materiais e seus conflitos urbanos inerentes,
de novos conteúdos aí embutida demandaria ‘formas novas e originais’.
não estaria-se criando uma identidade postiça.
“Dentro do limite em que a arquitetura pode gerar tais formas, ela tem
Segundo Arantes, cada vez mais teóricos, arquitetos e gestores
um papel positivo, ainda que limitado, na criação de novas relações
urbanos estariam abrindo mão não só de “qualquer planificação global
materiais.”(McLeod, p.10).
da cidade, mas de todo tipo de organização, mesmo parcial”, que a
A segunda posição seria mais claramente expressa nos textos de
tornasse um conjunto de espaços ‘minimamente’ ordenados, que
Manfredo Tafuri, Massimo Cacciari e Francesco Dal Co. Estes autores
pudessem
ter
algum
tipo
de
‘pregnância
visual
ou
semântica’,
estabelecem um vínculo mais direto entre arquitetura e relações
configurando para seus habitantes um lugar. “O novo jargão se compõe
materiais. Vê-se a arquitetura como ‘pura ideologia’, emprestando-lhe
de termos que, ao contrário, procuram designar a não urbanidade da
um papel social negativo: ela se tornaria instrumento da estrutura de
cidade, sua atopia 23- a cidade como não território, lugar virtual, não-lugar,
poder existente. Isto se aplicaria mesmo à arquitetura que Tafuri chama
etc.” (Arantes, A Cidade como Não-Lugar, p.83). As cidades extravasariam
de ‘crítica’, incluiria todos os impulsos utopistas da arquitetura desde o
seus limites, transformando-se numa grande rede intercomunicável e,
Iluminismo. Esta contribuiria na sua inutilidade, e mais seriamente na
aparentemente, intercambiável. A autora cita Paul Virilio, para quem
sua decepção, à perpetuação do capitalismo burguês. Para Tafuri a
haveria uma des-urbanização pós-industrial, ou concentrações pós-
arquitetura revolucionária é impossível. A única opção do arquiteto seria
urbanas, onde a cidade desapareceria na “heterogeneidade do regime de
encontrar um caminho para a práxis revolucionária fora das fronteiras de
temporalidade das tecnologias avançadas” 24. Para Arantes, esta nova
seu campo.
retórica não deixaria de ter um fundo de verdade. A forma como
Nos anos 90, Otília Arantes verá os primeiros indícios do ‘novo
mercadoria, enfim universalizada, teria redundado na redução da
sentimento’ urbano reinante nos dias de hoje na “intervenção ocorrida
arquitetura da cidade a uma simulação imagética, composta de signos
com a tentativa de reposição contextualista das perdas e danos causados
polivalentes que conteriam em si mesmos informações contraditórias,
pelo M.M. [Movimento Moderno]”. (Arantes, A Cidade como Não-Lugar,
superposições, contaminações, etc., “destinadas a um mercado que se
p.83), os Contextualismos e os Regionalismos (aqui representados pelo pensamento de Aldo Rossi).
23Atópico: 24Paul
fora do lugar; deslocado.(Aurélio). Virilio, apud Otília Arantes in A cidade como Não-Lugar.p.83.
50
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana alimenta cada vez mais da diferença e da obsolescência.”. Estes
seriam escamoteados por uma ‘espécie de estetização do heterogêneo’,
fenômenos resultariam de uma administração soft da cultura, que não
geralmente em nome das chamadas identidades locais. Este abandono de
visaria
sua
qualquer pretensão às unificações e reuniões, à procura de soluções
inconciabilidade”.(Arantes, A Cidade como Não-Lugar, p.84). Haveria um
globais para uma cidade de fato cada vez mais fragmentada e caótica,
reforço dos contrastes e dos conflitos, não visando à sua solução, mas
esta apologia da disjunção e do caos, de resto totalmente coerente com o
seu próprio consumo como mercadoria. (Arantes, Ciclo de Palestras,
discurso pós-moderno e perfeitamente útil às novas formas de produção
FAUUSP).
capitalista, teria levado ao seu próprio contrário ‘na medida mesma de
mais
a
domesticar
as
diferenças,
mas
“reproduzir
Arantes vê no discurso que pretendia a regeneração do tecido urbano,
sua implantação’, segundo Arantes. Para a autora, “a lógica que aí se
o resgate do espaço público e “quem sabe até de uma vida pública
esconde não é outra senão a da racionalidade perversa do mundo da
perdida’(Arantes, A Cidade como Não-Lugar, p.84) a origem deste estado
reprodução
de coisas. Segundo Arantes, este discurso teria pouco a pouco se
particularidades é a contrapartida da globalização.” (idem, p.85).
transformado em seu contrário. “O ideário da modéstia anti-globalizante
material
da
sociedade,
para
a
qual
o
reforço
das
De fato, o discurso pós-moderno remete-nos a uma apologia da
[que a autora considera na verdade muito pouco modesto], quanto mais
fragmentação
cumpria o prometido, menos dores de cabeça dava ao establishment - a
planejamento global ou de sentido identitário unívoco para a metrópole.
rigor, tornava-se uma forma de administrar contradições, escamotear
Entretanto, ao deslocar os conflitos sociais para o campo da produção
conflitos e esconder a miséria. No mais das vezes tais iniciativas se
imaterial e dos conflitos comunicativos, e muitos teóricos pós-modernos
resumiam a cenários destinados literalmente a fascinar, verdadeiras
levam de roldão qualquer sentido que o espaço público ainda
imagens
nenhuma
conservasse na metrópole, confundindo o espaço social, de que nos fala
continuidade com práticas sociais que lhes dessem conteúdo. Passo
Henri Lefèbvre, com o espaço performativo, cujo paradigma seria o
seguinte: recorrendo às mais avançadas técnicas de comunicação de
Shopping Center 25, um espaço eminentemente privado e de estreito
massa forjaram-se identidades para todos os gostos - proliferação de
controle comportamental 26.
publicitárias
das
administrações
locais,
sem
e
da
disjunção
que
mina
qualquer
tentativa
de
imagens que por isso mesmo não informavam mais nada. A ideologia passava dos discursos às coisas, bastava aceitá-las tais quais.”(Arantes, A Cidade como Não-Lugar, p.84). A ideologia modernista do Plano teria sido substituída por uma ‘ideologia da diversidade’, em que os conflitos
25Como
em Massimo Canevacci. muitas razões para desconsiderar o espaço do Shopping Center como lugar de exercício da vida do homem urbano, lembremo-nos que o ingresso ao Shopping pode ser restrito: regras comportamentais e de traje eliminariam boa parte da população paulistana dos dias de hoje. 26Entre
51
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Qual o sentido da análise pós-moderna? Parece-nos que a apologia da
verdadeiramente atraente para outras, mas que é de qualquer maneira
fragmentação e da descontinuidade, a busca de prazer nas sensações que
dada como verdadeira e inescapável, neutralizando a crítica e as ações
a metrópole conflituosa proporciona, esconde, como observa Otília
que visam à mudança, servindo assim à montagem das ideologias das
Arantes, um discurso fortemente ideologizado que procura escamotear
classes dominantes 28.
os reais conflitos da metrópole. Ainda que a derrocada do espaço
As construções ideológicas têm papel central nas estratégias e
público como espaço de representação e de vida seja inegável na cidade
discursos
globalizada, dentro da lógica das novas formas de produção capitalista, é
contemporânea. Entretanto, estas construções e estratégias podem ser
necessário distinguir o espaço privado e protegido onde as classes
percebidas em várias etapas do desenvolvimento da metrópole neste
favorecidas circulam, do espaço aparentemente esquecido da cidade
século, conservando o mesmo sentido geral, qual seja, o da utilização
clandestina e do espaço ‘conquistado’ ao sujeito competente, onde o
do espaço urbano como base para os projetos de dominação e a
‘sujeito incompetente’ 27, na terminologia adotada por Marilena Chauí,
qualificação da metrópole para a produção capitalista, conservando
circula mais ou menos livremente.
grande parte das populações nos limites da cidadania e da participação
É admirável a coincidência entre as teses pós-modernas e os espaços
dos
agentes
competentes
na
produção
da
cidade
política efetiva.
efetivamente criados pelo fenômeno da Globalização. De fato, as teorias
Z
pós-modernas tecidas sobre o urbano e as falas da Globalização apóiamse na produção imaterial, na circulação ilimitada desta produção, na fragmentação, na aceleração e na intensificação dos conflitos para ‘explicar’ o real, fazendo-o coincidir com uma representação aceitável para o sujeito dominado. ‘Explicar’ o real, neste caso, equivale a apresentar uma versão do real apenas palatável para algumas camadas, 27CHAUÍ, Marilena, O discurso competente e outras falas, São Paulo, Moderna, 1981. (...) "O discurso competente - a ciência como saber separado e coisa privada, como instrumento de dominação no mundo contemporâneo - pede outras falas se quisermos contestá-lo. A contestação, porém não pode realizar-se de fora, opondo à competência estabelecida uma outra, supostamente 'mais competente'. O discurso competente se instala e se conserva graças a uma regra que poderia ser assim resumida: não é qualquer um que pode dizer qualquer coisa a qualquer outro em qualquer ocasião e em qualquer lugar. Com esta regra, ele produz sua contraface: os incompetentes sociais (...).
28Seguiremos
neste trabalho a definição encontrada, por exemplo, em Marilena Chauí para a ideologia. Ver capítulo pertinente.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Parte 2: A Metrópole
52
53
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O Estado, o Capital e a Construção da Metrópole Industrial
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Introdução
N
54
primeiras leis de zoneamento européias. A preocupação com as áreas verdes e os parques, a definição das alturas das edificações em relação à largura das ruas, sem a definição de zonas de uso propriamente
este capítulo tentaremos descrever algumas das
[ditas](...). As áreas industriais a Leste não representavam incômodo
ações urbanísticas empreendidas na cidade de São
para a classe dominante, que se dirigia tendencialmente para o setor
Paulo a partir do Plano de Avenidas de Prestes Maia.
sudoeste da cidade.” (Somekh, p.333). Cabe ressaltar que a legislação
A escolha de tal marco justifica-se pela importância
estético-sanitarista trazia embutidos mecanismos de controle social e
do
pensamento
de separação de classes antes desconhecidos. “Na medida em que a
urbanístico moderno para a metrópole e um paradigma de ação pública
cidade perdia a facies colonial, a população pobre era impelida para
para as intervenções que visariam criar aqui as condições necessárias
distâncias cada vez maiores do núcleo central.” (Davidovich, p.313)
Plano
na
elaboração
de
um
para a produção, circulação e reprodução do capital industrial. Se tais
Na década de 30, período de grande prosperidade e de grande
ações já podiam ser identificadas num período anterior, é com Prestes
agitação política, a cidade se modifica profundamente. Após a
Maia que ganharão um caráter mais abrangente e se intensificarão.
Revolução Constitucionalista, São Paulo passará por um período de
São Paulo Metrópole: O Plano de Avenidas de Prestes Maia
O
administração pública conturbada. Fábio Prado foi o primeiro a ficar um período mais longo no poder após a revolução, governando de 34 a 38. (Entre 30 e 34 a cidade teve 11 Prefeitos indicados pelo poder interventor getulista). Na gestão Fábio Prado à frente da Prefeitura da cidade (1934-38), o recolhimento do imposto predial passa para a administração municipal, cujo orçamento apresenta então um superávit, o primeiro desde 1930 29.
período anterior à proposta do Plano de Avenidas de
A cidade experimenta uma mudança na sua base produtiva deste a
Prestes Maia pode ser definido, quanto ao pensamento
década passada, a industrialização dá seus primeiros passos e o ímpeto
urbanístico, como um período de preocupações de caráter
‘estético-sanitarista’ e pontual. “A legislação urbanística pontual, como as intervenções públicas, reproduz o padrão estético-sanitarista das
29Cabe
notar que este fenômeno, aumento repentino de arrecadação seguido de uma febre de obras, se repetirá na história da cidade. Referimo-nos especialmente à adm. Paulo Maluf (1993-96) que, beneficiando-se do aumento da arrecadação propiciado pela nova constituição de 1988,encherá a cidade de obras.
55
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
dos imigrantes enche a cidade de novas aspirações e projetos. A alta-
Samuel Kruchin 30, ao comentar o título do plano de Prestes Maia,
burguesia cafeeira demanda um novo padrão de urbanização, buscando
“Estudo para um Plano de Avenidas para a Cidade de São Paulo”,
livrar a cidade de seus ares provincianos e coloniais. O engenheiro e
afirma que, longe de significar uma intencionalidade urbanística
urbanista
estreita, limitada a resolver questões de circulação, esconde uma grande
Francisco
importantes
na
área
Prestes central
Maia,
proporá
paulistana,
então
inspirado
modificações no
modelo
haussmanniano, complementado por outras experiências européias.
amplitude nas preocupações de Maia em relação à cidade: “(...) qualquer projeto de rua envolve, implícita ou explicitamente, uma
O pensamento urbanístico é francês, coincidindo com o prestígio da
concepção sobre a cidade, sua estrutura, seu desenvolvimento.” 31
capital francesa e de sua cultura, como provam os desenhos elaborados
Segundo Kruchin, o termo “avenida” teria uma carga simbólica que lhe
para o Plano e que mostram pontes, avenidas e blocos de edifícios que
emprestaria dimensões para além do sentido comum de artéria viária
em tudo lembram as configurações de Paris. (MELHORAMENTOS,
larga e veloz. “Era o signo de uma modernidade emergente a
OC4, etc.). Houve, entretanto, alguma associação deste padrão estético
multiplicar-se por todos os espaços.” (OC4, p. 77)
europeu a conhecimentos e propostas funcionais de reformulação
A idéia do controle do processo de expansão racional do espaço
urbanística que demonstram, segundo a urbanista Regina Meyer, um
urbano, fundamentado por formulações conceituais, seria, senão nova,
‘certo comprometimento com premissas modernistas’.(MEYER, SBM).
ao menos oposta ao empirismo e ao espontaneísmo que dirigiria a
O Plano de Avenidas proposto por Maia orientará a atuação de dois
produção do espaço urbano até então: “A cidade passava a ser idéia,
Prefeitos da cidade de São Paulo, Fábio Prado e ele próprio, no
intenção, objetivo.” (OC4, p.77), Este controle sistematizado teria sido
período entre 1934 e 1945, transformando a estrutura viária de São
defendido por Maia, em companhia de Ulhôa-Cintra, desde pelo menos
Paulo e preparando a cidade para o grande desenvolvimento do pós-
1925 32. (Leme, p.17).
guerra. (Leme, p.7). Segundo Nadia Somekh, o Plano, que teria consolidado o setor sudoeste da cidade, remodelando-a para o automóvel, teria sua implantação continuada até a última gestão de Prestes Maia (1961-1965). (Somekh, p.334).
30Professor
do Departamento de Projeto da FAU/PUCCAMP. MAIA, Francisco. “Plano de Avenidas para a Cidade de São Paulo”, p. 4. Apud. KRUCHIN, Samuel. v.b. 32O arquiteto e historiador Benedito Lima de Toledo, autor do livro Prestes Maia e as Origens do Urbanismo Moderno em São Paulo, considera Maia o introdutor da própria idéia de urbanismo na cidade. (VEJA SP, 28.02.96, p.14). Claro está que aqui Urbanismo é entendido na sua acepção clássica, isto é “o estudo sistematizado e interdisciplinar da cidade e da questão urbana, e que inclui o conjunto de medidas técnicas, administrativas, econômicas e sociais necessárias ao desenvolvimento racional e humano delas.” (Aurélio) 31PRESTES
56
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Em linhas gerais, o Plano buscaria partir de uma crítica à
sistema
de
transportes
e
aos
setores
residenciais
operários,
centralidade absoluta e à convergência de um espaço único, já saturado,
devidamente separados por espaços ajardinados e play-grounds.(OC4,
para buscar uma unidade espacial nos termos de um projeto que desse
p.77). A avenida tem também para Prestes Maia um papel ‘indutor’ de
à multiplicidade desejada por Maia uma nova integração. Definiu-se um
urbanização, indicando as direções e formas de ocupação dos vazios
modelo composto por um sistema de vias perimetrais concêntricas (um
urbanos (MEYER, SBM), como mostrariam algumas fotografias da
perímetro de irradiação e dois outros circuitos) associadas a um
época, onde se vêem grandes avenidas abertas em áreas ainda não
conjunto de artérias radiais que atuariam como estruturadoras de todo
urbanizadas.
o espaço urbano, integrando assim os diversos setores que deveriam compor a nova cidade. (OC4, p.77) 33. Segundo Kruchin, o Plano de Avenidas procuraria conectar áreas até
Maia consideraria o Centro como o maior ‘problema’ urbanístico da cidade quando da elaboração do Plano, (MELHORAMENTOS, p.8), indicando
como
causa
o
congestionamento
das
atividades
no
então fragmentadas “Esse conjunto de vias articula e organiza um
‘Triângulo tradicional’, para onde a topografia faria convergir todo o
sistema de transportes e de terminais unificados que libera áreas
tráfego diametral, agravando ainda mais o problema, justificando o
centrais da segmentação provocada pelas linhas férreas, incorporando
caráter ‘descentralizador’ do plano.
novos segmentos até então desconectados do conjunto e articulando,
A urbanista Maria Cristina Leme considera ‘falsa’ a descentralização
também, uma sucessão de espaços abertos, uma rede de parques e
proposta por Maia, pois em sua análise do Plano de Avenidas, constata
parkways 34 distribuídas por toda a cidade. Define as áreas residenciais a
que o perímetro de irradiação tem por objetivo ‘isolar’ o centro,
partir de uma lógica de aeração do espaço e posiciona, ao longo do
retirando-lhe o tráfego de passagem, buscando expandir o centro de
perímetro exterior, as áreas industriais conectadas diretamente ao
serviços para além do vale do Anhangabaú, no bairro de Santa Ifigênia. Este arranjo não tiraria, entretanto, o caráter mononuclear da cidade,
33“A
concepção é simples: envolvimento da área congestionada por um anel, de modo a provocar ao mesmo tempo sua expansão superficial, o desvio das correntes diametrais e uma fácil distribuição perimetral do tráfego. Tem a vantagem de fugir às áreas muito valorizadas que no centro bancário sobem a mais de 10 contos por metro quadrado.” (MELHORAMENTOS, p.9). 34Grandes vias longitudinais plantadas, quase como parques lineares com uma via de circulação central. O tradutor do “Programa de Melhoramentos Públicos para a Cidade de São Paulo” (1950), Ernesto da Cal, explica: As “estradas parques” seriam “estradas com duas mãos, arborizadas dos lados e no centro, nas quais o tráfego comercial é proibido.”,(p.27).
mas o reforçaria. Prestes Maia teria rejeitado o afastamento de atividades para a periferia e a criação de centros secundários, conforme sugeridas pelo urbanista americano Harland Bartholomew, por considerar estas alternativas prematuras para São Paulo. Será radicalmente contrário à alternativa de organização do tipo metropolitano, de desenvolvimento
57
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
de pequenas comunidades, à maneira londrina, uma das possibilidades
tipologia pré-fixada pelo código de obras. Há uma hierarquia de
sugeridas pelo urbanista.
gabaritos entre as diferentes avenidas, que se distinguem entre centrais
A cidade, nesta época, limita-se ao inter-rios, isto é, o espaço entre
e radiais. 35 Já nesta época pode-se observar um tratamento urbanístico
os rios Tietê e Pinheiros. O bairro de Pinheiros é então o que se
diferenciado dado às avenidas do Oeste da cidade, que vão buscar os
convencionou chamar de “primeira periferia” paulistana, ainda que
“novos e aristocráticos bairros do Pinheiros” (MELHORAMENTOS,
periferia distante. Lembremo-nos de que o bairro já se desenvolvia
p.16.).
como núcleo independente desde o século XV e que sua localização
possibilidade de estruturação do espaço urbano, com um sistema de
estratégica favorecia seu papel de “intermediário” entre o núcleo
parques colocados na parte mais externa das perimetrais.
O
sistema
de
espaços
públicos
se
coloca
como
uma
principal, São Paulo, e as zonas produtoras de gêneros alimentícios a
O surgimento de uma nova classe média formada por pequenos
Oeste, além de sua importância como “porta de entrada e saída” para o
comerciantes e funcionários públicos, que se consolida desde finais do
Sul do país. A ligação do Largo de Pinheiros com o centro da cidade
século
através do bonde mostra sua crescente importância dentro do esquema
habitacionais. A
territorial urbano, o que justificaria um investimento tão significativo.
essencialmente na iniciativa privada, e é destinada ao aluguel.
XIX,
abre
o
mercado
produção
para
alguns
empreendimentos
habitacional dos anos 30 origina-se
Prestes Maia propôs intervenções em áreas importantes como o
Empreendimentos imobiliários de pequeno porte são financiados pelas
Parque Dom Pedro e o Parque do Anhangabaú, que já nesta altura
economias de pequenos comerciantes e colocadas no mercado. No caso
passava pelo seu segundo projeto. Buscava-se dar uma fisionomia clara
das
à área central da cidade, que refletisse as realizações econômicas e
conjugados. Estas vilas eram financiadas pelos empregadores e
culturais de seus habitantes, ao mesmo tempo em que se propunha a
geralmente destinadas ao aluguel por seus empregados. 36
vilas
operárias,
indústria
e
habitação
eram
praticamente
conexão entre esta área central e o espaço que naquele momento era
Uma lei regulamentando as relações de inquilinato introduzida no
considerado periférico. Tentava-se, através da monumentalidade,
começo dos anos 40 praticamente afastou estes agentes do mercado,
adequar a cidade provinciana à nova imagem que as elites tinham de si mesmas. Ao buscar estabelecer novos padrões estéticos para a cidade, confiava-se que a legislação poderia induzir certas configurações. Os edifícios que comporiam as avenidas teriam então quase que uma
35É
interessante, neste ponto, remeter-se às teorias do urbanista Cândido Malta Campos Filho, sobre as diferenciações entre Avenidas “Perpendiculares” e “Radiais”. 36Segundo Maria Cristina Leme, Prestes Maia em suas propostas para a cidade, diferenciaria a localização das moradias segundo critérios de ocupação e classe social. “As habitações coletivas recomenda ao longo das vias radiais e perimetrais e as individuais nos vãos dos setores. As habitações operárias, que classifica como de segunda classe, recomenda localizá-las junto às indústrias.“ (Leme, p.126).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
58
fazendo com que a produção de habitação para baixa e média renda se
Tiradentes. As hastes do Y seriam a Avenida Nove de Julho e a
vinculasse cada vez mais à oferta governamental. Um grande déficit
Avenida Itororó (23 de Maio).(MELHORAMENTOS, p.11).
habitacional na cidade seria detectado já em meados dos anos quarenta.
Neste momento, os textos de Le Corbusier que advogavam a
As ações e projetos de Prestes Maia partiam da premissa de que a
penetração do centro por grandes avenidas, abandonando a idéia de
cidade cresceria e que este crescimento era desejável. De fato, esta é o
que este deveria ser preservado do trânsito, têm uma grande
começo da disputa que ocupará os urbanistas paulistanos durante mais
importância enquanto alternativa para situações perimetrais. Esta é a
de 20 anos: o crescimento da cidade seria realmente desejável ou
grande ênfase dada na elaboração do Projeto da Segunda Perimetral,
deveria-se inibí-lo? De um lado, teríamos urbanistas extremamente
que também conta com a linha férrea como um importante fator de
‘conservadores’, como Anhaia Mello, que proporia na legislação um
estruturação. Ainda por ocasião da apresentação do Projeto da Segunda
gabarito único e extremamente baixo para toda a cidade. Por outro,
Perimetral, instituiu-se uma nova concepção em relação ao transporte
Prestes Maia aposta num crescimento vertiginoso e na liberação quase
público paulistano, que seria a ligação das Perimetrais com o
total dos gabaritos nas áreas centrais.
Metropolitano e o Trem, ou seja, a integração dos meios de transporte
No segundo ‘Perímetro de Irradiação’, Prestes Maia proporá uma
público. Esta política de integração dos meios de transporte atingiria
conecção entre a área central e os bairros periféricos, desviando o
seu auge na década de 70, com resultados muito aquém daqueles que se
grande trânsito do centro através de um sistema de trânsito
poderia prever pelo tom do discurso político de então.
inteiramente perimetral. A possibilidade de penetração seria o sistema
Em termos concretos, o Plano de Avenidas significou a opção pelo
‘Y’, o conjunto de três grandes avenidas que atravessariam toda a
transporte de superfície, em detrimento de um sistema de metrô e
cidade, desde o Tietê até o vale do Pinheiros, percorrendo os
‘bondes subterrâneos’, proposto pela Light e rejeitado com bases
chamados ‘thalwegs 37‘ com um mínimo de cruzamentos, favorecendo
frágeis de argumentação por Maia.
assim o tráfego de automóveis. Uma destas avenidas seria a 9 de Julho,
Além de uma visão do crescimento da cidade de forma espraiada e
projetada para ligar o então parque do Anhangabaú à Ponte Grande
contínua. São Paulo deveria crescer e era desejável que assim fosse.
(Ponte
Porém, ao crescimento econômico, se confunde, no Plano de Avenidas,
das
Bandeiras),
incorporando
grande
parte
da
Avenida
o crescimento físico para as periferias. “A estrutura urbana destas propostas é mononuclear, de baixa densidade, de ocupação extensiva 37’Linha’
imaginária juntando os pontos mais baixos do fundo de um vale. (Aurélio).
do solo e sem limites para o seu crescimento. Esta concepção em que o
59
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
sistema viário radial é um dos elementos fundamentais, não nasceu da
o que tornaria impraticável desapropriações para a realização de obras
utopia idealizada de um urbanista, engenheiro da Prefeitura, mas
viárias [ do Plano de Avenidas ].”(Leme, p.64). Já nesta época, a
apenas confirmava as tendências principais observadas de crescimento
questão das desapropriações se colocava como de capital importância,
da cidade na direção centro-periferia.” (Leme, p.10).
especialmente no que tangia o nível de investimentos necessários e às
A opção pelo transporte de superfície se baseava, entre outras
demoras provocadas pelos processos jurídicos. Porém, é lícito imaginar
coisas, na expectativa de um grande aumento no número de
que
uma
valorização
da
Santa
Ifigênia
automóveis na cidade, baseando-se na realidade americana. Prestes
empreendedores e proprietários de terrenos.
fosse
desejada
por
Maia chega mesmo a citar o número de automóveis em circulação nos
Qual o significado da extensa lista de obras executadas entre 1934 e
Estados Unidos para defender sua opção (Leme, p.31). Maia crê que
1945? Maria Cristina Leme demonstra que houve uma grande
São Paulo ainda não estaria preparada para o metrô, pois sendo uma
transformação nas comunicações intra-bairros e destes com o centro.
cidade de crescimento circular e rápido, ofereceria ‘perspectivas pouco
São Paulo teria deixado uma configuração compartimentada em
favoráveis’ ao estabelecimento prematuro de linhas rápidas, ainda que
benefício da integração proporcionada pela largas, para a época,
observasse as grandes vantagens para o sistema, principalmente no
avenidas radiais e perimetrais. “A capacidade e a rapidez de
transporte das massas para a periferia.(PLANO, p.268).
comunicação que se estabelecem entre os diferentes bairros e o centro
O Plano da Light seria conflituoso com a visão do urbanista da nova
da cidade é condição necessária ao desenvolvimento da indústria e do
organização urbanística da cidade. Enquanto Maia, com seu Plano de
comércio, propiciando o salto de desenvolvimento econômico que se
Avenidas, visava a envolver o centro sem penetrar no triângulo central,
dará na década seguinte.” (Leme, p.162.). Estas novas ligações
levando comércio e serviços para além Anhangabaú, a Light propunha
favoreceram
uma rede de metrô e bondes subterrâneos servindo justamente este
imobiliários, como a Cia. City, que criavam em direção à Zona Oeste
centro, o que reforçaria sua exclusividade comercial e de serviços,
de São Paulo novas zonas residenciais, prontas para abrigar as classes
dificultando sua expansão para Santa Ifigênia. O problema básico para
altas que se beneficiariam com o salto industrial do pós-guerra.
principalmente,
como
vimos,
os
empreendedores
Prestes Maia seria, assim, de ordem logística: se aprovado o plano de
O Plano representou também uma mudança na percepção por parte
bondes subterrâneos na área central, estaria comprometida a execução
dos urbanistas paulistanos em relação ao papel do Estado nas
do Plano de Avenidas. “A construção do projeto da companhia
mudanças urbanísticas. Maia mostra-se favorável ao aumento da
canadense incentivaria a construção de edificações, valorizando a área,
intervenção direta do Estado, na forma de obras viárias, e indireta,
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana através da gestão de serviços urbanos e o arbítrio entre interesse público e privado. O Plano também defende um campo de trabalho profissional emergente: a engenharia profissional (Leme, p.10).
60
Um novo paradigma para São Paulo: Robert Moses e as vias expressas. “O urbanismo paulista atravessa um período notável. Iniciadas as primeiras obras na administração Fábio Prado, coordenadas e incrementadas sob o governo passado, atingem presentemente, na Interventoria Fernando Costa, uma atividade inusitada. (...) Este acervo de concretas realizações comprova dum modo insofismável e brilhante, no campo do municipalismo, a excelência do regime e das diretrizes implantadas pelo Presidente Getúlio Vargas, pois não se conceberia no regime das disputas demagógicas, dos embaraços formalísticos e da confusão administrativa e financeira”. Francisco Prestes Maia in Os Melhoramentos de São Paulo, 1942. Introdução.
61
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
“(...) Robert Moses was unquestionably America’s most prolific physical creator. He was America’s greatest builder. More significant than what Robert Moses built is when he built it. That was how he put his mark on all the cities of America. (...) The greatest secret was how to remove people from expressways’ paths, and Robert Moses taught them his method of dealing with people. This method became one of the trademarks of the building
A
década de 50 trouxe uma importante mudança geral de paradigmas. Seguindo-se à vitória Aliada na 2ª Guerra Mundial e um extraordinário aumento do prestígio e da influência norte-americanas em todo o mundo, o pensamento urbanístico brasileiro abandona
os modelos europeus em benefício dos norte-americanos. O modelo de desenvolvimento
norte-americano
suplanta
assim
este
último,
of America’s urban highways, a Moses trademark impressed on all
acompanhando a subida daquele país ao papel hegemônico de condutor
urban America.(...) He was America’s greatest road builder, the
do capitalismo no mundo ocidental, do qual o Brasil constituía e
most influential single architect of the system over wich rolled the
constitui uma das periferias.
wheels of America’s cars. And there was, in this fact, an irony.
São Paulo, a partir da 2ª Guerra Mundial, passará por grandes
For, except for a few driving lessons he took in 1926, Robert
mudanças. Estas são geradas, entre outras coisas, pelas pressões
M o s e s n e v e r d r o v e a c a r i n h i s l i f e . ” 38
demográficas produzidas pelos grandes contingentes que se transferem do campo para a cidade, para mais tarde constituir a massa de
Robert Caro in The Power Broker, 1974,. p.p. 11-12.
trabalhadores que, entre outros fatores, propiciará o salto industrial de meados dos anos 50. Segundo Celso Furtado, a urbanização neste período resultou sobretudo do forte crescimento demográfico, da grande concentração na distribuição da renda, de uma forte presença do Estado no cotidiano, das mudanças tecnológicas introduzidas na agricultura, reduzindo a demanda por mão de obra e sobretudo do
38Trad.
Própria: Robert Moses foi inquestionavelmente o mais profícuo criador físico da América. Ele foi o maior construtor da América. Mais significativo que aquilo que Robert Moses construiu foi quando ele o construiu. Foi assim que ele pôs sua marca em todas as cidades da América (...) O grande segredo era como remover as pessoas do caminho das vias expressas, e Robert Moses ensinou seu método de lidar com as pessoas. Este método tornou-se uma das marcas registradas da construção das auto-pistas urbanas da América, uma marca registrada de Moses impressa em toda a América urbana. (...) Ele foi o maior construtor de estradas da América, o arquiteto individualmente mais influente do sistema sobre o qual rodavam os carros da América. E havia, neste fato, uma ironia. Pois, exceto por algumas lições de direção que tomou em 1926, Robert Moses jamais dirigiu um carro em sua vida”.
abismo entre os níveis de desenvolvimento e conforto entre campo e cidade no Brasil, o que tornava a vida na cidade extremamente desejável. Meyer aponta que neste período, na análise de Furtado, não havia “uma correlação clara entre urbanização e industrialização.”. A presença
desta
‘massa
urbana’
teria
sido
também
decisiva
na
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana organização
físico-espacial-funcional
da
metrópole,
o
que
62
teria
prestígio e poder, vem a São Paulo como consultor da International
exercido um importante papel na vida política do país. (MEYER,
Basic Economy Corporation, entidade privada sediada em Nova York e
Metrópole, p.18.). Ainda que os níveis de carência tenham, até o
presidida por Nelson Rockefeller. Era prefeito Linneu Prestes,
presente, impedido a atuação política real em uma extensa camada da
indicado pelo interventor Adhemar de Barros 40.
população brasileira, é inegável que a vida na cidade representou uma
Moses vem a São Paulo e aqui fica durante o mês de agosto de 1949,
mudança qualitativa importante nos níveis de politização e de pressão
volta para Nova York e em 1950 apresenta um plano que terminou por
social sobre os poderes públicos. A intensa urbanização do pós-guerra
ser realizado em suas formas gerais. Entre seus assistentes, contava
engendrou mudanças essenciais nos estilos de vida e nas mentalidades
com um grupo de quatro engenheiros brasileiros indicados pela
brasileiras, resultando em novas demandas e modos de apropriação do
municipalidade paulistana, entre eles o Engenheiro Luís Carlos Berrini.
espaço urbano, agora caracterizado pelo crescimento desenfreado.
(CARO, p.1070 e PROGRAMA de Melhoramentos, p.14.) 41. São Paulo
Regina Meyer caracteriza São Paulo no período 50-60 a partir do crescimento. Este seria um dado essencial, “preponderante e definidor dos demais” (MEYER, Metrópole, p.25) “Forma e conteúdo da metrópole são diretamente determinados pelo crescimento” (p.25). Entretanto, São Paulo passaria neste período por uma intensa reqüalificação de seu espaço visando a prepará-la e adequá-la às novas exigências
econômicas
e
sociais
de
uma
sociedade
que
se
industrializava. Entre todos, um fato se destaca: a elaboração do “Programa de Melhoramentos Públicos para a Cidade de São Paulo”, de 1950. Robert Moses, o pai das vias expressas americanas 39, é convidado a elaborar um plano urbanístico para São Paulo. Gozando de imenso 39Robert Moses, era Bacharel em Artes pela prestigiosa Universidade de Yale, Licenciado em Artes, Doutor em Filosofia por Cambridge, Doutor em Direito e Doutor em Engenharia. Atuou no serviço público da cidade de Nova Iorque entre 1924 e 1968 (antes, havia trabalhado de 1914 a 1918, mas teria sido afastado), porém seu período de maior produtividade, e poder, concentrou-se entre os anos de 1945 a 1958, quando Moses literalmente remodelou Nova Iorque com uma rede de vias expressas (expressways)
e parkways, pontes, viadutos e playgrounds, além de determinar muito da paisagem dos arredores da cidade, com seus parques e parkways. Moses estabeleceu um paradigma que influenciou toda a produção urbanística dos Estados Unidos pós 2ª Guerra. Sua rede de vias expressas na cidade de Nova Iorque influenciaria toda a concepção das grandes cidades americanas, tendo Los Angeles como exemplo mais acabado de suas convicções. Era Conselheiro na International Basic Economy Corporation(The Power Broker, p.p. 1-11 e Programa de Melhoramentos, p.5.) 40A Prefeitura do município de São Paulo foi ocupada, desde a revolução de 30, por prefeitos nomeados pelos interventores no Estado de São Paulo. Até 1953, com a eleição direta de Jânio da Silva Quadros, os nomes se sucederam no cargo com muita rapidez, com a exceção de Fábio da Silva Prado (1934 a 1938) e do período de 7 anos em que governou Prestes Maia (1938 a 1945). Entre 1945 e 1955, nove nomes teriam ocupado a Prefeitura, indicando a pouca força política do administrador municipal. 41 Moses, no próprio relatório (p.9), atribui ao Prefeito e à Câmara Municipal a iniciativa de encomendar o plano à International Basic Economy Corporation, dirigida por Nelson Rockefeller. Entretanto, Robert Caro afirma que o relatório teria sido financiado por Rockefeller.(CARO, p.787 e p.1070) ”He had been an ally of Nelson [Rockefeller] himself; not only had they worked together in bringing the United Nations to New York, but in 1948 Nelson’s ‘International Basic Economy Corporation’, building housing projects, factories and supermarkets in Venezuela, had retained him, at a fantastic fee (wich of course he distributed to his ‘muchachos’) to lay-out a highway program for Caracas (So pleased had Nelson been with Caracas-La Guaíra toll highway and other arterials that were a monument to that consultantship that in 1950, with IBEC expanding into Brazil, Moses and ‘muchachos’ had been retained to lay-out a comprehensive city
63
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
teria então aproximadamente 2,2 milhões de habitantes e crescia a
transformações efetivas tenham ficado aquém do pretendido (MEYER,
ritmos superiores que qualquer outra grande metrópole 42..
Metrópole, p.5.).
Segundo Marta Dora Grostein, arquiteta e professora de história do
Segundo
Meyer,
a
equipe
de
Moses
teria
encontrado
uma
urbanismo da FAUUSP, o ‘Relatório Moses’, introduziu uma inédita
municipalidade “fraca, sem autonomia ou representatividade, uma vez
abordagem de conjunto frente à problemática urbana em São Paulo.
que o prefeito era naquele tempo designado pelo governador e não
Combinava análises e diagnósticos sobre diferentes problemas urbanos,
eleito pelo voto popular” (MEYER, Metrópole, p.73). A cidade carecia
incluindo recomendações e sugestões de encaminhamento. Regina
então de instrumentos básicos para a regulamentação urbanística.
Prosperi Meyer identifica no relatório um “ponto de inflexão na
Entre eles, Moses destacaria a falta de uma planta oficial da cidade, a
trajetória das relações entre a metrópole e o urbanismo, que já assumia
ausência de uma regulamentação abrangente de zoneamento e um
sua nova versão: a de planejamento urbano”, significando uma
código adequado e exeqüível de normas para a construção. Esta é a
aproximação entre o projeto e a praxis urbanística, ainda que as
base para a elaboração de um plano de caráter global, porém eminentemente ‘técnico’, emprestando grande importância às obras viárias. É clara sua intenção de dotar a cidade de uma estrutura
plan for São Paulo, and year after year Nelson asked him to return there to check on its implementation (...). (CARO, p.1070). Aracy Amaral registra ,em “Arte para quê?”, a atuação protagonística de Rockefeller na exportação pelos agentes culturais do Departamento de Estado Americano da corrente norte-americana do expressionismo abstrato, destacando seu papel fundamental na realização da primeira Bienal de Arte em São Paulo. “(...)Promoveu a criação em São Paulo de um museu de Arte Moderna, ligado ao seu, de Nova York, iniciou a publicação da custosa revista Esso, que faz propaganda dos seus produtos e, ao mesmo tempo, compromete e corrompe os intelectuais que se deixam envolver.” Fernando Pedreira apud Aracy Amaral, Arte para quê?, p.237. Villanova-Artigas, segundo Aracy Amaral, assinalava o contrato entre a Prefeitura paulistana e o IBEC como exemplo da ‘penetração do imperialismo’ no país, identificando Rockefeller como um dos seus principais agentes. “Nelson Rockefeller, depois de dar entrevista ao Museu de Arte de São Paulo chamando o Brasil de ‘país dos arquitetos’, no dia seguinte assinava (...)um contrato com a Prefeitura para organizar um plano urbanístico para São Paulo.” (Villanova-Artigas, apud Aracy Amaral, Arte para quê, p.363). A conhecida atuação de Nelson Rockefeller no país torna viável a hipótese de que o próprio Plano tenha sido iniciativa sua, porém esta é uma tese que deve ainda ser provada. 42 São Paulo apresentou um crescimento de 68% entre os anos de 40 e 50, enquanto o Rio de Janeiro teria crescido apenas 28% no mesmo período. (MEYER, Metrópole, p.73)
condizente com as novas bases de produção e consumo que se erguiam, propiciando as grandes ligações perimetrais entre as regiões da cidade e a correção de problemas ‘básicos’ da infra-estrutura urbana, como a coleta de lixo, o abastecimento de água e o saneamento. Meyer nota que “É importante lembrar que o racionalismo europeu, aglutinado em torno do Movimento Moderno, havia, desde a década de 20, introduzido tanto a nível de análise como a nível teórico as vantagens de uma visão integral da cidade.” (MEYER, Metrópole, p.87). A urbanista também faz notar que a partir da década de 40, há uma convergência dos pontos de vista dos teóricos europeus, como Le Corbusier e S. Giedion, e as práticas urbanísticas americanas, representadas, entre outros, por Robert Moses. Ambas as correntes
64
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana demonstram ter grande identidade em suas concepções da metrópole
C. Transporte coletivo.
moderna, marcadas especialmente pela importância dada à circulação.
D. Parques e praças de recreio (playgrounds, no original).
(p.88). Na Carta de Atenas, de 1933, esta seria uma das quatro chaves
E. Retificação do Rio Tietê e saneamento e urbanização das várzeas.
do urbanismo moderno. Segundo Meyer, “toda reflexão contida neste
F. Engenharia sanitária.
documento é uma tentativa de conciliação entre as cidades e os meios
G. Sugestões sobre métodos de financiamento para a realização das
de
transporte
mecânicos.”
(p.89).
Le
Corbusier,
convicto
da
obras e serviços públicos.” (PROGRAMA de Melhoramentos, p.8.)
importância do automóvel, fenômeno totalmente novo e perturbador
Além destes, o Programa acrescenta um último ítem, pois considera
da ordem urbana, propõe-se a reorganizar a rede viária das cidades de
“lógica” a sua proposta: um plano de beneficiamento e urbanização do
maneira adequada a seu uso. As expressways de Robert Moses levariam
Canal de Pinheiros e, “a pedido do Prefeito e outros funcionários
ao limite máximo as recomendações da Carta, mas com um conteúdo
municipais, o problema da eliminação dos resíduos urbanos ” (idem,
“gentrificatório” não previsto explicitamente nela 43. No caso do
p.8).
Programa de Melhoramentos, a análise de Meyer enfatiza a circulação
Moses propõe um sistema de vias expressas cortando a cidade e
urbana, que é “privilegiada ao longo de todo o texto, a circulação
conectando as áreas entre si. “Comprometido com o crescimento das
automotora é a meta convergente de todas ou quase todas as
taxas de veículos em circulação na cidade, Moses aponta para as
recomendações” (idem, p.95).
vantagens da via expressa 44“ (MEYER, Metrópole, p.77) Entre as vias
Os objetivos do relatório achavam-se, segundo o próprio Moses,
propostas,
muitas
foram
executadas
ao
longo
dos
anos,
por
claramente indicados no texto do contrato firmado entre o IBEC e a
administrações e planos distintos, mas que na prática chegaram a
Cidade de São Paulo, e regia os seguintes termos: “Um relatório
resultados bastante semelhantes aos propostos por Moses. Estas
minucioso concernente ao planejamento geral de obras públicas para a
aquelas destacam-se as vias expressas do rio Tietê e canal do Pinheiros
Municipalidade
(as Marginais de hoje), a rodovia expressa da Penha, a rodovia expressa
de
São
Paulo,
no
qual
se
incluam
estudos,
recomendações ou planos referentes a:
da Água Funda (Ricardo Jafet/Abraão de Moraes), Rodovia expressa
A. Uma planta geral e um plano de zoneamento. B. Um sistema de artérias(highways, no original em inglês) de tráfego. 43O Livro de Robert Caro traz inúmeros exemplos de como as expressways teria sido usadas como instrumento de ‘limpeza social’ em Nova York.
44”(...)a
‘expressway’ é uma artéria de acesso limitado que facilita o livre movimento dos veículos, sem cruzamento no mesmo nível, sem voltas à esquerda, com sinais de tráfego e direito a entradas somente em certos pontos determinados.” (MEYER, Metrópole, p.77).
65
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
do Aeroporto (23 de Maio/Rubem Berta), Rodovia Expressa do Sul
se tornariam mecânicos, etc.. (p.27) Isto contribuiria para o reforço da
(Av. Dos Bandeirantes), etc.
base
Podemos facilmente verificar que a maioria das propostas de expressways de Robert Moses, visava a criar um anel viário em torno da
industrial
automobilística
que
despontava
na
forma
das
‘montadoras’ de veículos e de pequenas indústrias de insumos necessários para estas montadoras.
parte então mais consolidada da cidade. A única exceção, a expressway
A chegada da indústria automobilística aparece como muito mais
da Penha, teria a função de ligar o Centro da cidade com a Zona Leste,
que uma escolha do capital internacional em busca de menores custos
onde se concentrava o operariado, já que o alargamento da avenida
de produção. O mercado paulistano de automóveis anunciava-se como
Celso Garcia seria demasiado caro em virtude das desapropriações
um dos mais promissores do mundo na segunda metade do século 45.
necessárias.
Num curto espaço de tempo, aproximadamente 12 anos, passa-se de
Paralelamente, Moses apontava as necessidades da modernização
130.000 para praticamente 500.000 veículos, segundo o primeiro censo
dos ônibus responsáveis pelo transporte público, destacando suas
automobilístico, no final dos anos 50. No ano de 65 a cidade atingiria a
vantagens sobre o bonde, cuja substituição pelo ônibus já ocorria em
marca de 1.300.000 veículos, tendo crescido 1100% em 15 anos.
grande escala na América do Norte. (GROSTEIN, p.290). Moses
A introdução do ônibus seria decisiva para o grau de espraiamento
aconselha a compra de 500 ônibus a diesel ao longo de 10 anos
que a cidade adquiriu, pois o bonde tem uma instalação muito mais
(PROGRAMA de Melhoramentos, p.27.), que substituiriam linhas
complexa que aquele, dificultando muito sua expansão na malha
particulares que na época operariam com ônibus antigos, caminhões,
urbana. O ônibus criou a possibilidade de loteamentos a 25 ou 30 km
automóveis e caminhonetes. “As filas de ônibus são emblemáticas dos
do centro da capital.
anos 50” (MEYER, SBM), argumento usado pelo próprio Moses para
Este é um dado fundamental para se entender o urbanismo na
justificar sua sugestão de compra dos 500 ônibus. Entretanto, para
cidade de São Paulo. A resposta imediata a esta substituição do bonde
além de sua preocupação com o transporte público na cidade, o
pelo ônibus foi o início do segundo processo de periferização da
urbanista também previa o crescimento da frota de carros particulares
45
na cidade, com a instalação das montadoras do país. Aconselhou que os novos ônibus fossem montados no Brasil, pois isso significaria, entre outras coisas, a compra de peças a baixo preço, a economia do frete, o emprego de mão de obra local, o treinamento de operários que
Em 1996, as perspectivas parecem não ter mudado. “BMW e Chrysler vão investir US$ 500 milhões numa fábrica de motores na América do Sul, (...) tudo indica que o Brasil será escolhido, não apenas por apresentar melhores condições de infra-estrutura e custos, como também em razão dos incentivos do regime automotivo. (...)Podem incluir a produção dos utilitários Rover(...) A fabricação da linha no Brasil será fácil, uma vez que a linha Rover já é equipada com motores fabricados no Brasil pela Maxion.” OESP:02.10.96, pB16. Os mecanismos descritos na reportagem começavam a ser idealizados já nos anos 50. Ver capítulo Viarismo: A Revolução do Automóvel.
66
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana cidade. O centro fornecia então praticamente 80% dos postos de
das terras ribeirinhas pantanosas. “O projeto de recuperação de terras
emprego fora da indústria, porém os bairros populares podiam agora se
do Pinheiros representa uma parte relativamente pequena do programa
estabelecer em zonas muito mais distantes, com evidentes vantagens
de melhoramentos municipais que propomos; contudo, é um aspecto
para os proprietários de terrenos naquelas áreas e nas áreas
importante e integral dele (PROGRAMA de Melhoramentos, p.13.).
intermediárias. O tema do transporte urbano, pretensamente prioritário
Moses enfatizava a importância de um plano prévio de ocupação das
no estabelecimento das propostas urbanísticas para São Paulo,
áreas assim urbanizadas. Previa uma ocupação industrial para a área,
justificaram em grande parte uma apropriação especulativa do solo
congruente com suas idéias para a urbanização deste tipo de área.
urbano.
Moses lembrava que, contrariamente ao que ocorreria às margens do
Tendo em vista a expansão territorial da cidade, já neste momento
rio Tietê, ali a “The São Paulo Tramway, Light and Power Co.”,
com 1400 km2 de área urbanizada, Moses propõe a criação de um
canadense, teria um acordo com o Estado, em virtude do qual a
sistema de pré-metrô na área da ilhas centrais das avenidas. A urbanista
Companhia, após fazer melhoramentos diversos e reservar direitos de
Regina Meyer considera ‘frugal’ a proposta de Moses para o transporte
passagem para fins públicos, estaria obrigada a dispor, em leilão, de
público paulistano, tendo em vista a magnitude do problema (MEYER,
todas as terras excedentes. Moses questiona a própria realização do
Metrópole, p.77). De fato, segundo a urbanista, “parece inverossímil
acordo,
que as soluções apresentadas pela equipe para o transporte de massa
subdivisões desordenadas do terreno e provavelmente o adiamento
não incluíssem de forma mais decidida o metropolitano em suas
indefinido
considerações” (idem, p.77), especialmente se levando em conta o
Melhoramentos, p.13). Apresenta alternativas, entre elas a modificação
exemplo das cidades americanas da época. A proposta do pré-metrô
do acordo, e o estabelecimento de uma Corporação de Urbanização de
foi bastante discutida, mas as vias acabaram sendo projetadas, como
Terras (‘Canal Development Corporation’, no original.), que teria
sabemos, sem que o espaço da ilha central pudesse comportá-lo. As
poderes para financiar e administrar o programa de urbanização. Nesta
avenidas que mais se aproximam hoje do projeto e das dimensões
Corporação, a ‘The São Paulo Tramway, Light & Power Co.’ teria uma
viárias propostas por Robert Moses são as Av. 23 de Maio e Sumaré,
participação adequada. Os direitos-de-passagem e outros, necessários
ambas propostas por ele.
para melhoramentos públicos, tais como rodovias expressas, pontes,
que
causaria, dos
segundo
melhoramentos
ele,
“especulações
públicos.”
prejudiciais,
(PROGRAMA
de
O “Relatório Moses” tratará da região do Canal do Rio Pinheiros ao
estradas de ferro, linhas de transmissão, áreas de recreio, etc seriam em
propor o aprofundamento e alargamento do rio, e o aproveitamento
parte ou na íntegra reservados para o Município e o Estado. Moses
67
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
acreditava que o custo da construção de tais obras deveria ser coberto,
O Plano de Avenidas de Prestes Maia (1930), já havia proposto a
ao menos em parte, pelo produto da venda das terras do canal, o que
continuação rumo ao sul, da rota do vale do Anhangabaú. O relatório
“constituiria
Moses proporá a retomada destes planos enfaticamente e o estenderá,
uma
contribuição
dos
compradores
beneficiados.”(PROGRAMA, p.13).
propondo uma nova artéria que se prolongaria em direção Sudeste,
Segundo Meyer, “a construção das ‘expressways’ do Pinheiros e do
ligando-se à nova ponte então a ser construída sobre o canal do
Tietê deveria fazer parte de um programa mais geral que teria como
Pinheiros “Assim haveria uma rota expressa desde a área circunvizinha
principal
do
ao canal de Pinheiros, de rápido crescimento, até o centro. Estas é uma
desenvolvimento urbano local.” (MEYER, Metrópole, p.79). Este é um
das poucas vias de comunicação entre o centro da cidade e certas áreas
importante antecedente para a Operação Urbana, idealizada pelo poder
suburbanas importantes que ainda pode ser construída sem a aquisição
municipal paulistano quarenta anos depois, em moldes bastantes
muito custosa de amplos terrenos.(...) Esta rota será um dia a principal
parecidos e com uma filosofia bastante similar. Moses apresenta ainda
via de acesso à cidade da Rodovia Nacional, que rumará ao sudoeste,
outra alternativa, onde seria criada uma corporação pública, com
através de Cotia, para o Uruguai e Argentina”. (PROGRAMA de
membros nomeados pelo Estado ou pelo prefeito. Esta entidade
Melhoramentos, p.42).
meta
cobrir
os
custos
da
construção
através
tomaria conta dos terrenos situados dentro da área de recuperação, e os
urbanizaria
para
logo
vendê-los
gradualmente.
“Os
O
relatório
Moses
contemplará
ainda
alguns
aspectos
do
lucros
planejamento urbano, entre os quais podemos destacar o problema dos
resultantes da venda seriam postos à disposição do Estado ou do
cruzamentos com a linha férrea na área central, o abastecimento de
Município.” Para o autor do Programa, isto implicaria numa extensão
água, rede de esgoto e eliminação do lixo e os parques da cidade.
‘imprópria’ das funções governamentais, indicando preferir a opção anterior. (PROGRAMA, p.14.)
A identidade das propostas de Moses com as proposições do movimento moderno para a circulação na cidade servem de base para a
Vimos como a sobreposição de cargos na Companhia City de
constatação de que houve um esforço consciente para adequar a malha
Urbanização e na São Paulo Railway Co., subsidiária da Light, indicava
viária da cidade ao automóvel, sem que preocupações sociais
uma vinculação entre os projetos de saneamento das terras ao longo do
específicas tivessem o estatuto necessário no projeto. A cidade é vista
Pinheiros e a valorização imobiliária. Ao contrário do sugerido por
como ‘máquina’ de produção, engendrando uma percepção de seus
Moses, a Cia. City terminou por ser a única beneficiária dos acordos
fenômenos que praticamente excluem o sujeito social, em nome de uma
entre a Light e o poder municipal.
suposta universalidade das necessidades humanas e numa concepção de
68
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana ‘progresso’ internacionalizada e isenta. As análises do processo geralmente não levam em conta as especificidades dos projetos do capital: o capital internacional que abre expressways em Nova York é o mesmo que o faz em São Paulo, mas seus objetivos em cada lugar serão dificilmente os mesmos. Ao exportar o modelo que já havia utilizado em Nova York, Moses trabalha para montar uma estrutura de produção que interessava ao capitalismo americano. Seu Programa faz parte de uma estratégia bem delimitada onde Nelson Rockefeller, diretor do IBEC, desempenha um papel central em relação ao Brasil. O “Plano de Avenidas” de Prestes Maia diferia do plano de Moses por seu caráter estético e simbólico e uma visão estrutural mais ligada ao cartesianismo francês. O “Programa de Melhoramentos” cria uma nova representação para a modernidade em São Paulo, através das grandes obras viárias e da utilização do automóvel, que passam a ser o termômetro, no campo do discurso ideológico, de nossa modernidade e progresso. Os dois planos estão na raíz dos fenômenos políticos e econômicos que se calcam sobre a atuação do poder público sobre a malha viária da cidade, o ‘viarismo’, fenômeno que será abordado adiante. Ao acolher a proposta de Moses, São Paulo “escolhia um destino e não uma opção técnica” (MEYER, SBM), já que esta mudança de paradigmas seria essencial na condução de todas as futuras políticas urbanas, determinado irreversivelmente o caráter da cidade até os dias de hoje.
Anos 50: Uma nova fase na industrialização brasileira
A
partir de meados da década de 50 haverá uma mudança
qualitativa
essencial
nas
relações
de
produção no país, e em especial em São Paulo. Este fenômeno
é
engendrado
pela
nova
fase
de
industrialização pesada experimentada pelo país, que
se estenderá, segundo a arquiteta Sueli Schiffer, até aproximadamente 1961. (SCHIFFER, p.29) Estamos sob a presidência de Juscelino Kubitschek, cujas diretrizes desenvolvimentistas
induzirão
o
aceleramento
do
processo
de
unificação do mercado nacional, visando a viabilizar a expansão industrial, culminando no Plano de Metas, elaborado a partir das conclusões da Comissão Mista Brasil - Estados Unidos (1951-1953) e do Grupo Misto BNDE - CEPAL (1953-1955). Passa a predominar um modelo de desenvolvimento dependente do capital internacional, contrário à tendência predominante até 1955, quando as novas elites industriais defendiam um desenvolvimento orientado para o mercado interno. Os dois modelos defendiam a intervenção maciça do Estado na industrialização de base, visando a livrar o país de seus vínculos demasiado fortes com a economia agro-exportadora. De fato, desde a década de 30, a hegemonia econômica e política mudava de mãos,
69
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
passando dos latifundiários para os novos industriais e banqueiros
veículos, aplainado pelas reformas do Plano de Avenidas de Prestes
urbanos.(Ou antes, os latifundiários do Sudeste passam a investir seu
Maia e do Plano Moses.
capital na industrialização.) Vimos como, no caso paulistano, esta
Entretanto, a partir de 1955 a própria divisão doméstica do trabalho
mudança significou um novo padrão de urbanização para a cidade, que
criou condições para que o capital se concentrasse justamente ali onde
tentava deixar para trás uma imagem demasiado provinciana, buscando
já estava implantado o maior parque industrial do país, isto é, na cidade
representar em seus espaços públicos e privados o novo status,
de São Paulo e suas imediações.(SCHIFFER, p.39). 47
cosmopolita e urbano, que refletiria os novos modos de vida das elites paulistanas.
Esta é o campo para o grande incremento nas desigualdades regionais no país, cujas conseqüências foram agravadas pelo não
O Plano de Metas instituía as condições necessárias ao incremento da base industrial no país, em associação estreita com o capital
investimento na região nordestina e seu abandono por vastos contingentes rurais.
estrangeiro 46.
A partir de então, e provavelmente até 1973, quando a euforia
“Entre as medidas que privilegiavam o capital estrangeiro destaca-se
desenvolvimentista arrefecerá no bojo da crise do petróleo, o
a que criava facilidade para a entrada de tecnologia e equipamentos
empresariado
através da Instrução 113 (SUMOC) de 1955, a qual permitia à CACEX
trabalhos pouco qualificados na construção civil e na área metalúrgica,
(Carteira de Comércio Exterior) isentar de taxas de importação as
chegando mesmo a criar postos de recrutamento nos próprios
empresas estrangeiras que investissem em setores julgados de interesse
terminais rodoviários. Grandes contingentes ficarão de fora deste
e sem similar no país.”(SCHIFFER, p.37). Um destes setores seria
recrutamento, criando o chamado “exército industrial de reserva”, cuja
justamente o automobilístico, que encontrará um campo propício à sua
principal função era manter baixos os salários industriais.
instalação
no
ABC
paulista,
próximos
aos
insumos
paulista
buscará
recrutar
estes
trabalhadores
para
industriais
necessários e ao fantástico mercado potencial de consumidores de 46Segundo Schiffer, ojetivava-se impedir o fortalecimento da burguesia nacional. “(..) através do desmantelamento sistemático do desenvolvimento embrionário da indústria, [ no entanto], ciclos sucessivos de substituição de importação são, ainda assim, necessários devido à restrição da balança de pagamentos; quando tal ocorre, as indústrias dinâmicas são entregues ao controle de capitais estrangeiros que não criarão forças internas que desafiariam a posição da elite.” (SCHIFFER, apud DEAK, Csaba, Acumulação entravada no Brasil., São Paulo: FAUUSP/ANPUR, 1989. [mimeo]).
“O levantamento [CIESP/FIESP 1957](...), indicava que num raio de 100 quilômetros da capital paulista concentravam-se 52% dos estabelecimentos industriais e 81% dos operários do estado. Em relação ao valor da produção de manufaturas, pouco mais da metade originava-se na capital e cerca de 14% nos municípios do (...)ABC.” (SCHIFFER, p.103). 47
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
O Lugar da Metrópole SulAmericana: Anhaia Mello x Prestes Maia
70
71
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Uma utopia fora de lugar: Anhaia Mello e o Plano Regional
A
tempo em que propunha um plano para melhorar as condições de infra-estrutura das pequenas cidades e a fundação de novos núcleos do tipo cidade-jardim.(Plano Regional, p.28). Estas propostas configuramse como revolucionárias dentro do quadro de extrema concentração das atividades industriais que caracteriza o período. A nível municipal , suas recomendações são ainda mais surpreendentes, pois pregam a projetos
limitação do crescimento da cidade e a rearticulação das atividades
urbanísticos para São Paulo, será feita por Luiz de
dentro do esquema Residência - Trabalho - Recreio - Circulação.
Anhaia Mello, em seu ‘Plano Regional para São Paulo’
Estende sua proposta para a limitação do crescimento de todas as
. “Partindo da tese de que a Revolução Industrial
cidades e vilas da área regional. As maiores, como Santos, Campinas e
gerou cidades nas quais a distribuição das populações
Santo André, deveriam estacionar, melhorando sua qualidade de vida
no solo está errada, é desumana e anti-social, Anhaia Mello apela para
em vez de crescer. O plano incluiria a criação de novas cidades-jardim
um urbanismo ‘humanitário’, que apresente ou encaminhe novas
e a completa reorganização técnica, econômica e ‘espiritual’ de toda a
soluções.” (MEYER, Metrópole, p.97).
área rural da região. (Plano Regional, p.23).
crítica
deste
processo,
no
campo
dos
“(...) é preciso considerar o problema urbanístico regional, que não
A
urbanista
Regina
a
realidade
o
urbana
nível
de
urbanismo é arte de correlação e integração - problema de função, de
(MEYER, Metrópole, p.102), pois aponta freqüentemente para a
textura, de economia e síntese estética - só pode ser realmente
limitação forçada do crescimento, através de mecanismos ligados ao
praticado no plano regional e na maior de suas regiões - a Nação.”
regionalismo e a polinucleação. É uma proposta de cunho romântico e
(Plano Regional)
utopista: “(...) novas cidades e diferentes deverão ser criadas por uma
incentivando seu estabelecimento em municípios do interior, ao mesmo
com
‘pequeno’
comprometimento
Coprisp 48, a proibição de novas indústrias no município de São Paulo,
plano
considera
se resolve com avenidas, viadutos e pracinhas ajardinadas. Se
Entre outras coisas, Anhaia Mello propunha, através da criação da
do
Meyer
existente
geração mais decidida e mais humana, menos fascinada pelos falsos deuses das finanças.” (Plano Regional) Mello considera que a valorização dos terrenos advinda dos melhoramentos públicos deveria ser taxada, pois aquela seria uma
48Comissão
do Plano da Região Industrial de São Paulo.
valorização proporcionada pelo conjunto da sociedade, beneficiando
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
72
indivíduos muito específicos. A terra deveria ser conservada como
Anhaia Mello toma a região como ‘configuração básica de vida
propriedade pública, havendo o arrendamento dos terrenos por longos
humana’ e aí conduz suas análises e propostas. Propõe uma região
períodos aos indivíduos interessados. Estas concessões, feitas mediante
industrial de raio igual a 100 quilômetros e uma população de
a cobrança de uma taxa, seriam suficientes para o financiamento para a
aproximadamente 4 milhões (Plano Regional, p.23), criando um novo
realização e a manutenção dos serviços públicos e para a melhoria
espaço, externo à própria metrópole. A cidade região impõe novas
constante da qualidade de vida na cidade. (Plano Regional, p.41). Este
escalas e novas funções, criando uma cadeia de papéis novos e
é um importante antecedente, na história do urbanismo brasileiro,
complementares. (MEYER, Metrópole, p105.)
como base de pensamento, para os mecanismos de ‘Solo Criado’ e ‘Coeficiente único de aproveitamento do solo’, dos quais falaremos mais adiante. Os antecedentes para a proposta de Mello encontram-se, segundo Meyer, numa longa tradição de leasing de propriedade urbana desenvolvida na Inglaterra. (MEYER, Metrópole, p.104). Meyer qualificará o Plano Regional de “Utopia Regressiva” e resumirá seus pressupostos: “(...) a teoria e a prática do urbanismo repousam na possibilidade de se promover a descongestão das metrópoles modernas. A retração das dimensões urbanas é o foco em torno do qual giram todas as propostas. A convicção de que existe um tamanho ótimo para as cidades, sustenta a sua teoria da descongestão.” (MEYER, Metrópole, p.105) Esta teoria, no caso do Plano Regional, apoia-se ainda na experiência bem sucedida de Chicago, que havia dividido
seu
território
em
70
‘comunidades
locais’,
de
aproximadamente 50.000 habitantes, cada comunidade dividida em 10 ‘unidades de vizinhança’ de 5.000 habitantes, com equipamento social completo, o que daria a cada uma grande autonomia no conjunto da cidade (Plano Regional, p.57).
73
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Prestes Maia: Crescimento e Progresso da Metrópole
P
Regina Meyer identifica neste embate o próprio centro da discussão característica dos anos 50 nos países periféricos, qual seja, “a organização
e
o
porte
da
metrópole
industrial
dentro
do
subdesenvolvimento”.(MEYER , Metrópole, p.107) Para Prestes Maia, não é questão de limitar o crescimento da metrópole, nem de criar centros secundários, mas de intervir na cidade
restes Maia, incumbido de relatar o trabalho de Anhaia
existente, como sua primeira gestão frente à Prefeitura já havia
Mello à Comissão Orientadora do Plano da Cidade, tece
atestado. Maia acredita num plano de obras como forma de adequar e
considerações para além da simples informação aos
atualizar a cidade para as novas demandas e necessidades. Sua
demais
são
argumentação, segundo Meyer, “é sempre feita no sentido de se
reveladoras de uma mentalidade pragmática e atenta às
esgotarem as potencialidades da metrópole, de se buscar equacionar de
conselheiros.
Estas
considerações
forma ‘econômica’ as dificuldades assinaladas.”(idem, p.108).
características políticas daquela discussão. Sua críticas concentram-se especialmente nas propostas de Mello
O transporte público é encarado de maneira múltipla. Prestes Maia
quanto à contenção do crescimento da cidade, que qualifica de solução
propõe o melhoramento do sistema superficial existente (ou seja, novas
“simplista, derrotista e malthusianista” (MAIA, Prestes et alli, “Notas
intervenções no sistema viário), o recurso às linhas rápidas e vias
sobre o ‘Esquema Anhaia Mello’”, Cogep - Dossiê 001/81, São Paulo.
expressas e a organização dos bairros de acordo com os princípios de
in
‘unidade de vizinhança’ e zoneamento.
MEYER,
Metrópole,
p.107).
“Só
o
caso
das
indústrias
complementares e subsidiárias, às quais a convizinhança é necessária,
Prestes
Maia
concorda
com
Anhaia
Mello
na
questão
do
bastaria para levantar objeções sérias ao caráter absoluto da tese. Para
estabelecimento de industrias em municípios do interior paulista, mas
tão rigorosa proibição precisaria mostrar que não há mais espaço
destaca que estes não contariam com a infra-estrutura necessária para
disponível, nem esperança de abastecimento, de despejo, de energia, de
atrair estas indústrias.
habitações, etc., como aliás é usual nas cidades”.(in “Notas sobre o Esquema Anhaia Mello”).
A questão do plano Diretor para o conjunto da metrópole encontra Mello e Maia novamente em posições diversas. Enquanto Mello acredita
que
somente
a
‘fixação’
da
população
permitiria
a
regulamentação do uso do solo e das estratégias para sua ocupação,
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Maia defende o plano Diretor como um instrumento dinâmico, não um projeto ‘cristalizado’ para a cidade, mas uma ‘forma de ação’, propondo como alternativa ao ‘esquema Anhaia Mello’ as “reformas, as cirurgias, as remodelações de serviços”. (MEYER, Metrópole, p.109). Regina Meyer destaca que, para além de um embate entre duas correntes de pensamento sobre a cidade de São Paulo, estamos também
74
Urbanismo e Transporte de Massa: Prestes Maia e o Sistema Rápido de Transporte Metropolitano.
assistindo ao confronto entre duas vertentes distintas do urbanismo, originárias das teorias e práticas do final do século XIX. Anhaia Mello
intervenções físicas, “acomodar e modificar o ambiente urbano todas
Em
as vezes que as necessidades novas surgissem.” (idem, p.110).
Siciliano, Luiz Carlos Berrini Júnior (que já havia participado da
seguiria a corrente normativa, onde se procuraria criar espaços novos, paralelos à cidade existente, “inteiramente sob o domínio qualitativo e quantitativo dos técnicos urbanistas alinhada a E. Howard e P. Geddes.” (MEYER, Metrópole, p.109). Maia, qualificado por Meyer como uma espécie de herdeiro tropical de Haussmann, representaria a corrente adaptativa e intervencionista, que buscaria, através de
1955, Juvenal Lino de Mattos, então prefeito do município, resolve, após de uma série de reuniões com técnicos da CMTC, estabelecer um conjunto de diretrizes gerais para o
problema do transporte coletivo na cidade de São Paulo. “Uma pequena equipe de engenheiros, integrada por Lauro de Barros
Meyer chama a atenção para a impropriedade de uma proposta de
‘equipe brasileira’ de Robert Moses), Antônio de Voci, Renato de Rego
limitação de crescimento de uma cidade que media seu sucesso
Barros e José Vicente Vicari, sob a presidência de Francisco Prestes
econômico pelo próprio crescimento, num sistema econômico que
Maia, passa a compor a Comissão do metropolitano criada pelo
baseia-se na reprodução permanente do capital. (MEYER, Metrópole,
Prefeito.”(MEYER, Metrópole, p.112). Em 1956, já com Wladimir de
p.110).
Toledo Piza como mandatário municipal, a comissão entrega o “AnteProjeto de um Sistema de Transporte Rápido Metropolitano”. O mesmo Prestes Maia, que em 30 defenderia a criação das avenidas, fará a total apologia do sistema metropolitano de transportes.
75
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Segundo Maia, em 30 a cidade precisava ainda de uma estruturação
urbanísticas (especialmente as viárias) e, por fim, a utilização do metrô
viária e em 55 já estaria madura para uma organização de tipo
propriamente dito. (MEYER, Metrópole, p.114). Não há, para a equipe
metropolitano. A proposta original teria três linhas e uma ênfase
de Maia, nenhuma contradição entre o sistema de expressways e o
absoluta na relação Leste-Oeste 49.
metropolitano, mas antes papéis complementares entre ambos. “No
Há uma oposição importante ao projeto do metropolitano, que se
entanto, uma substituição do metrô por um sistema de vias expressas é
baseia em dois conceitos modernistas em sua argumentação: a unidade
considerada indesejável e inadequada, pois sob todos os pontos de
de vizinhança 50 e a via expressa, entendidos como instrumentos que
vista estas últimas se mostram problemáticas e inferiores.” (MEYER,
‘tornariam obsoletos’ os metrôs. (MEYER, Metrópole, p.114). Maia
Metrópole, p.116). Segundo a equipe, seus custos seriam mais
considera as unidades de vizinhança para a metrópole como idéias
elevados 52, existiria grande dificuldade em traçá-las no interior da
‘românticas’ e ‘cerebrinas’, descartando também a idéia de cidades-
malha urbana, a vazão de passageiros seria menor e finalmente as vias
satélite do tipo inglês 51. A equipe também faz críticas ao zoneamento,
seriam menos democráticas, por privilegiarem o transporte individual,
argumentando que as restrições de densidade demográfica e de
enquanto
crescimento em geral são vistas como insuficientes na luta dos
trabalhadores. (MEYER, Metrópole, p.116).
o
metropolitano
atenderia
sobretudo
à
massa
de
urbanistas contra o congestionamento das áreas centrais. Entretanto, as
Entre as obras viárias propostas estão o alargamento da Avenida do
expressways são parte de seu projeto, dentro de uma ótica que prega o
Estado, pelo menos entre o Parque D. Pedro II e a Avenida Pedro I, a
melhoramento e a racionalização dos transportes através das obras
ligação da Avenida Nove de Julho com a Avenida Ipiranga, a Avenida Nova Ibirapuera e a Avenida Marginal do rio Pinheiros, além da
49Vimos, no entanto, como a Norte-Sul foi primeira linha a ser construída, privilegiando os bairros de classe média deste eixo, em detrimento dos bairros operários da Zona Leste, formados a partir dos anos 40. 50Conceito já assumido por Anhaia Mello, “A subdivisão da cidade em áreas (600x800 à 1.200x1600 metros), não homogêneas, com usos complementares e almejando uma autonomia significativa” seria um “(...)elemento estruturador da metrópole na medida em que a área é envolvida por artérias periféricas principais, que não penetram no interior das unidades. Um zoneamento estrito mantém diferenciada esta área periférica, que é basicamente comercial e compacta, e o núcleo da unidade que deve permanecer residencial e pouco denso. Seu crescimento se faria pela implantação de novas unidades e jamais por ‘alastramento contínuo.’” (MEYER, Metrópole, p.115) 51”No caos paulistano, para enfrentar o aumento da população, tornar-se-iam necessária a cada 10 anos (supondo cidades-jardim de 20.000 a 30.000 habitantes), nada menos que sessenta cidades...”(Ante-Projeto, p.101.)
retomada da proposta da Segunda Perimetral de Prestes Maia. Maia e sua equipe consideram o projeto de metropolitano eficiente
instrumento
de
urbanização,
ou.,
segundo
Meyer,
um de
orientação global da metrópole. As linhas do metropolitano deveriam constituir-se em ‘diretrizes’ para qualquer plano mais amplo. Para
52É
necessário levar em consideração, para as afirmações quanto aos custos, que se fala aqui em metrô de superfície, que trafega principalmente por terrenos públicos ou ainda livres de edificações.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana tanto, “o zoneamento de uso e ocupação mais intensiva ao longo das linhas, com aumento dos gabaritos e coeficiente de ocupação (...)”, e a “(...) utilização pelo Poder Público de sua capacidade de criar empresas a ele filiadas, capazes de adquirir e urbanizar áreas adjacentes às linhas metropolitanas.” (MEYER, Metrópole, p.126)
76
77
A P r o d u รง รฃ o d o Espaรงo Urbano n a N o v a C i d a d e
Aspectos da Metrรณpole Industrial
78
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Cidade clandestina: Cidade esquecida
A
vança a hegemonia da cidade sobre o campo, ainda que por esta época a maioria da população ainda estivesse na zona rural. O extraordinário movimento populacional verificado desde a 2ª Guerra em direção à cidade reforçará os modos marginais de produção
do espaço urbano. A cidade de São Paulo se conformou em grande parte fora de
qualquer regulamentação, configurando o que Marta Dora Grostein chamará ‘a cidade clandestina’. Contudo, é óbvio o papel das teorias urbanísticas na conformação do conjunto da metrópole, ainda que sua importância seja mais claramente identificada na ‘cidade oficial’. A cidade clandestina não é uma entidade separada e independente, mas existe nas bordas e nos interstícios da outra 53. Esta será a opção frente à impotência do Estado diante das novas demandas urbanas. As análises sobre a produção do espaço urbano na cidade de São Paulo tendem a menosprezar sua importância no conjunto da metrópole. Marta Dora Grostein, entre outros, indicará em sua tese de doutoramento a importância dos loteamentos clandestinos e da auto53Talvez seja preciso, entretanto, definir o status de cada uma quanto à sua subordinação ou proeminência.
construção na conformação das periferias paulistanas. Estes fenômenos virão preencher uma lacuna onde o poder público não podia (por falta de verbas) ou não queria (por opção política) investir. A impossibilidade de moradia nas zonas centrais da cidade obrigou vastos contingentes a buscar nestes loteamentos uma opção de moradia. Com pequenas economias era possível comprar um terreno, na maioria das vezes sem qualquer infra-estrutura, onde se construía primeiro uma edícula e em seguida iam-se agregando cômodos, muitas vezes sobre uma laje de concreto que era construída em mutirão. A extraordinária expansão experimentada pela cidade entre as décadas de 30 e 70 encontrou uma solução nestes pequenos empreendimentos
ilegais,
que
foram
sucessivamente
anistiados,
legitimando a ocupação de áreas cada vez mais distantes. O caráter precário e irregular destes loteamentos, que não obedeciam aos regulamentos municipais e nem contavam com o poder público para a instalação de redes de água, esgoto e luz elétrica (estes seriam instalados tão logo o loteamento fosse ‘anistiado’ pela Prefeitura), engendrava um padrão urbanístico baixíssimo, onde inexistiam os espaços públicos de recreação e encontro, além da completa falta de hospitais, postos de saúde, escolas e creches, etc.
79
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
A Anistia aos terrenos e construções irregulares
E
ntre 1972 e 1987, várias leis de anistia aos imóveis irregulares foram aprovadas na cidade. Em 1972, o então Prefeito Figueiredo Ferraz assinou uma lei neste sentido. Seis anos depois, o então Prefeito Olavo Setúbal beneficiou com uma nova lei de anistia mais de
1,2 milhões de imóveis da Capital, considerados ilegais. Reynaldo de Barros assinou duas leis de anistia entre 1980 e 1982. Antônio Salim Curiati enviou à Câmara, em dezembro de 1982, um projeto de lei que legalizou 50 mil residências. Um número igual foi beneficiado na administração seguinte, de Mário Covas, em junho de 1983. Jânio Quadros cobrou uma taxa dos proprietários de 500 mil imóveis em troca de sua regularização. (OESP:01.04.92, p.1) Em 1992, a administração Erundina frente à Prefeitura de São Paulo, propunha a anistia ampla e irrestrita a 1,7 milhão de imóveis irregulares, ou seja, 70% dos 2,3 milhões de edificações irregulares da cidade na época. Esta proposta implicava na anistia automática a imóveis irregulares de até 100 m 2 , desde que os terrenos estivessem regularizados. Os imóveis de 100 a 250 m 2 teriam de encaminhar um requerimento padrão à Prefeitura, que examinaria cada caso, e aprovaria a regularização
mediante o pagamento de uma taxa. Os ‘grandes imóveis’(acima de 250 m 2 ) teriam que pagar em dobro cada m 2 construído a mais. O projeto
incluía como Dispositivos Gerais ainda as seguintes disposições: 1. A regularização da edificação implicaria na regularização do uso, o que na prática significaria anistiar todos os casos de desrespeito à lei de zoneamento. 2. A regularização do imóvel ficaria condicionada ao atendimento dos níveis de ruído e poluição ambiental, e à obediência aos horários de funcionamento, no caso de estabelecimentos comerciais, de acordo com a legislação existente. 3. A regularização poderia ser condicionada à execução de obras de adequação. 4. Ficariam resguardadas as exigências decorrentes da legislação de parcelamento do solo. Isto colocava de fora da anistia a maioria das favelas da capital. Além de ocuparem terrenos irregulares, dos quais a posse era muitas vezes disputada na justiça, as favelas contam com um parcelamento do solo totalmente fora dos padrões estabelecidos. 5. Seria criada uma Comissão Especial de Regularização para dirimir dúvidas, tratar de casos omissos e de edificações e estruturas ‘especiais’. (D.O.M. , 30.04.92, p.59) As críticas ao projeto foram muitas. A principal dizia respeito à falta de critério melhor que estabelecesse que a anistia seria aplicada apenas a famílias de baixa renda. Do contrário, se famílias de renda mais alta fossem beneficiadas, haveria uma contradição, já que estariam sendo desrespeitadas as pessoas que haviam cumprido a lei até então. Também
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana considerou-se inoportuno
80
promover regularizações em grande escala
receber cartas informando que seus imóveis foram anistiados e não
antes que fossem promulgadas as novas leis do Plano Diretor e do
deverão gostar muito de saber que alguns vereadores querem impedir
Código de Obras. Os partidos de oposição exigiam também o perdão às
isso.” (Maurício Faria, PT, OESP:03.07.92, p.2)
multas a imóveis irregulares até então aplicadas e a extensão da anistia às classes mais altas. Para o vereador Arnaldo Madeira (PSDB), que havia proposto, em 1985 o Projeto de Lei que serviria de base para as discussões do Novo Código de Obras da Cidade de São Paulo, o projeto de anistia geral ‘acabaria’ com a lei de zoneamento então em vigor. Ao ver dificultada a aprovação de sua anistia ampla, a administração Erundina tomou a decisão de anistiar, por decreto, 800 mil residências, aproveitando-se de uma lei de 1976, onde Olavo Setúbal previa a anistia para este tipo de imóvel. Estas 800 mil residências, de área não superior a 80
m2
, seriam 45% dos imóveis irregulares na cidade.
A anistia era vista pelos deputados de oposição como uma manobra política
da
administração
petista
(Paulo
Kobayashi,
PSDB,
OESP:03.07.92, p.2) e resistiam a aprová-lo. Vinculando esta anistia ao Novo Código de Obras 54, um projeto originalmente de Arnaldo Madeira (PSDB), especialmente caro aos setores ligados à Construção Civil na cidade, a Prefeitura garantiu a aprovação da anistia. Contudo, manobrou também para que as cartas de notificação aos beneficiados estivessem prontas para só então remeter o decreto à Câmara. “As pessoas vão
54Segundo Paulo Kobayashi, a aprovação do Novo Código de Obras acabaria precipitando a aprovação da anistia, “já que o uso político já era inevitável.” (OESP:03.07.92, p.2)
81
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O ‘Milagre’ “No que diz respeito à casa própria, o município trabalha incessantemente, procurando dotar os trabalhadores de residências condizentes, que são construídas e financiadas por companhia de economia mista, da qual a Prefeitura é a maior acionista, contando
O
período seguinte, de 1961 a 1964 56, foi marcado por uma profunda crise política e econômica que desembocaria, como sabemos, no golpe militar de 1964. A crise se inicia com o curto governo de Jânio da Silva Quadros, que renuncia após 6 meses
de mandato, e se aprofunda na gestão João Goulart. “A crise econômica refletia fatores tanto de natureza cíclica,
com todos os melhoramentos necessários para a vida em comunidade.
associados à conclusão dos altos níveis de investimentos público e
São autênticos novos bairros que vão surgindo em torno de São
privado no quinquênio anterior, como de ociosidade da capacidade
Paulo,
a
produtiva em muitos setores, além dos relacionados às reivindicações
proporcionar aos operários o trinômio casa-trabalho-serviços. Ou
sociais que desafiavam a hegemonia política. Estes fatores influíram na
seja, implantar conjuntos residenciais, em zonas onde haja trabalho
redução do índice de investimento, diminuição da entrada de capital
abundante, dotados de centros de serviço onde os trabalhadores
externo, queda da taxa de lucro e aumento da inflação.” (SCHIFFER,
possam
p.47). Ainda aqui o foco das divergências entre as principais correntes
distribuídos
realizar
após
suas
estudos
compras
acurados,
e
suprir
de
suas
maneira
necessidades
essenciais”.
políticas seria quanto à diretrizes do processo de acumulação interno. Em última instância, seria a disputa sobre a ampliação ou não do
Levy Xavier de Souza in Projeto São Paulo: Desafio na Corrida Mundial pelo Desenvolvimento Econômico e Social, 1970.
55
mercado consumidor interno, complicada por uma queda brusca nos níveis de crescimento e a elevação da inflação (principalmente a partir de 63). “Na verdade, refletia-se entre o Congresso e o Executivo a disputa quanto à primazia do modelo econômico, sendo a elite dominante [cujos interesse estavam ligados ao capital internacional]
55Pérola
do pensamento ufanista brasileiro dos primeiros anos da década de 70, escrito durante o regime militar, com Emílio Garrastazú Médici na presidência e Paulo Salim Maluf na Prefeitura de São Paulo, o livro apresenta suas credenciais na contra-capa: “A presente publicação integra uma série que visa o desagravo contra a solerte e injuriosa onda de falsas notícias e reportagens infundadas contra o Brasil, seu povo e seu governo”.
representada pelo primeiro.” (SCHIFFER, p.49).
56Respeita-se
aqui a divisão sugerida por Sueli Ramos Schiffer em seu texto “As políticas nacionais e a transformação do espaço paulista: 1955-1980.”, 1989.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
82
Esta disputa culminou com o golpe militar, que pôs um fim às diretrizes político-econômicas de Kubitschek, voltando ao modelo expatriador de capitais como meio de impedir a ascensão da burguesia nacional, impondo-se o endurecimento político como meio de controle social. Schiffer qualificará o período entre 1964 e 1967 como o de reimposição da hegemonia da elite sobre os rumos econômicos do país. Houve um acentuamento voluntário da concentração de capitais, agravando a distância entre as regiões mais desenvolvidas do Sudeste e do Sul em comparação com a miséria crescente da região Nordeste, intensamente povoada. Entre 1967 e 1973, o Brasil experimentará uma fase de intenso crescimento econômico e de concentração de renda: houve um relativo controle do déficit público e da inflação, bem como dos salários. Houve uma expansão das atividades das empresas multinacionais, que intensificavam o movimento de realocação de capitais para os países onde a mão de obra era mais barata. As políticas econômicas do período, sob a batuta do poderoso ministro da Fazenda, Antônio Delfim Netto, se concentrarão na dinamização do setor industrial, notadamente aquele produtor de bens de consumo durável, incentivos fiscais à exportação de bens de consumo não-duráveis e produtos primários e a importação de equipamentos e produtos que superassem os pontos de estrangulamento internos aos setores agora dinamizados. Estamos sob o governo do Marechal Costa e Silva (1967-1969) e depois do General Emílio Garrastazú Médici (1969-1974).
A Construção Civil como geradora de riqueza
O
setor da construção civil, principalmente aquele voltado para as classes média e alta, contribuiu sobremaneira para a expansão da economia no período, sendo beneficiado por
políticas especiais de crédito. O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), parte da estratégia do governo para elevar a poupança interna, ainda que de forma compulsória, foi instituído em 1966. Já em 1967 passou a ser empregado no financiamento de habitações. A incremento das atividades da construção civil faria parte de uma estratégia de desenvolvimento específica que visava também à absorção de mão de obra pelos setores secundário e terciário, reduzindo o capital de investimento gerador de emprego pela utilização da habitação como meio de ativar a construção civil, limitando-a à utilização de técnicas intensivas de mão de obra 57. (Mário Trindade, in “O BNH e suas realizações” Brasil Potência, 1971, p.47). Esta absorção de mão de obra propiciou a transferência de milhares de trabalhadores 57De
fato, ainda em 1992 se falava da construção civil como meio de ativar a economia. Fernando Costa Neto, então diretor do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de São Paulo, diria: “existe um consenso no Brasil de que a dinamização da construção civil é uma das portas para sairmos da crise.” Neste ano, este setor da economia gerou 7% do PIB e empregou 1 milhão de trabalhadores só no Estado de São Paulo. (FSP:06.06.92, p.2-D).
83
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
rurais para a cidade de São Paulo, configurando uma mudança induzida
ocupadas sem que tenha havido a produção de ‘cidade’, no sentido
da base econômica e redirecionando o mercado consumidor para os
mais abrangente do termo, isto é, houve a produção de espaço urbano
produtos da indústria.
sem os equipamentos e espaços que o qualificassem como espaço para
Esta é a época do endividamento maciço junto aos governos e
a fruição, lazer e exercício da cidadania. 58 A urbanista Regina Prosperi
organismos internacionais, vinculados à importação maciça de bens de
Meyer identifica nesta “produção de espaço urbano sem cidade” um
capital e à ampliação da capacidade produtiva industrial de bens de
dos principais problemas a serem enfrentados pelos urbanistas neste
consumo, entre os quais o carro ocupava posição de destaque.
final de século em São Paulo.
Paralelamente, a capacidade de investimento dos municípios se viu
Os conjuntos habitacionais da Zona Leste constituiriam a ‘Terceira
bastante reduzida por uma política que visava a “queimar etapas na
Periferia’, segundo Meyer, assim como a região do Brás foi a primeira
construção de suas metas”.
leva de periferização e o ABC a segunda. Esta periferia entra no
O poder municipal, diretamente nomeado pelo poder central, viu sua capacidade de investimento reduzida justamente quando as
contexto da cidade enquanto periferia distante e completamente desequipada.
pressões populacionais atingiram seu ápice e a nova fase de
De fato, nas áreas periféricas os conflitos decorrentes da exclusão
industrialização impunha importantes mudanças no cenário urbano.
social são amplificados por um número extraordinariamente baixo ou
Entretanto, nas décadas e 70 e 80, imensos conjuntos habitacionais
mesmo a inexistência de espaços públicos e equipamentos de lazer.
serão construídos pelo poder público na cidade de São Paulo,
(Ver Mapa “FSP”, 19.08.96, p.1-6).
financiados pelos créditos oriundos do BNH, legitimando a zona Leste da cidade como o setor operário por excelência.
É da segunda metade da década de 60 o início das obras do Metrô na linha Norte-Sul, ocasionando a desapropriação de vastas áreas no
A produção do espaço urbano na Zona Sul será ainda mais precário.
Brás, Jabaquara, etc. Cria-se a EMURB (Empresa Municipal de
Aqui se concentrarão as maiores favelas da capital, indicando um
Urbanização), uma empresa pára-estatal que visa ao lucro, encarregada
padrão social muito mais baixo que aquele da Zona Leste. De maneira
entre outras coisas, de administrar a produção urbana nas áreas
geral, aqui serão alojados os contingentes excluídos do mercado de
desapropriadas. É uma tentativa de trazer para a esfera do Estado a
trabalho formal, e portanto excluídos do processo produtivo. A política habitacional governamental neste período suscita ainda hoje violentas críticas. Argumenta-se que áreas imensas foram
58Aqui,
o termo ‘cidade’ é entendido como espaço plenamente qualificado para a vida urbana, o que incluiria, para além da infra-estrutura necessária, um conjunto de equipamentos e lugares que qualificasse o espaço dando-lhe sentido e significado.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
84
administração de grandes áreas na metrópole. Muitas das áreas
foram loteadas, mas com o cuidado de começar pelas áreas mais
desapropriadas não atenderam às expectativas de adensamento e
distantes, deixando propositadamente vazios que seriam mais tarde
valorização,
preenchidos após uma valorização artificialmente provocada. Os
permanecendo
em
muitos
pontos
à
espera
desta
valorização.
serviços públicos requeridos, reclamados e exigidos pela população já
O urbanista Dr. Cândido Malta Campos Filho, chama a atenção para
então localizada a maior distância e a duras penas fornecidas pelas
um importante aspecto da lógica imobiliária, e que se constituiu num
administrações municipais - mediante também uma pressão política
dos fatores determinantes no espraiamento da cidade. Segundo Malta,
violenta - acabariam por beneficiar as áreas intermediárias, já então
por trás da construção de conjuntos habitacionais da grande porte na
supervalorizadas e prontas para loteamento e venda.” (São Paulo e seu
periferia
Futuro, p.85.)
da
cidade,
implicando
em
grandes
deslocamentos
da
população e em grandes investimentos na implantação de infraestrutura básica, esconde-se um mecanismo de valorização dos terrenos em áreas intermediárias entre as zonas centrais e as periféricas. Ao estender a infra-estrutura urbana para áreas cada vez mais distantes, o poder público favorecia os incorporadores que possuíam terrenos em áreas intermediárias entre a periferia e o centro. Estes terrenos eram “estocados”,
esperando
a
necessária
valorização
resultante
da
instalação de redes de água e energia elétrica, e em seguida incorporados
em
empreendimentos
para
a
classe
média.
Este
mecanismo faz parte de um campo maior de ações e decisões, políticas e mercantis, a mais das vezes conjugadas, e que privilegiam a segregação das classes menos favorecidas em áreas distantes da ‘cidade oficial’. Em
1976, Figueiredo
Ferraz, ex-prefeito
de
São
Paulo, dá
diagnóstico semelhante: “O processo de ocupação do solo nas últimas décadas, se fez com requintes de uma ganância desmedida. As glebas
85
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
A Revolução do Automóvel
D
esde que Robert Moses aconselhou que os novos ônibus comprados pela Prefeitura paulistana fossem montados no Brasil, as montadoras de automóveis tiveram um papel preponderante na formação da base industrial brasileira.
Como vimos, a chegada da indústria automobilística teria sido muito
mais que uma escolha do capital internacional em busca de menores custos de produção, pois São Paulo se configurou rapidamente como um excelente mercado, ajudada pelas ações do poder público que, pelo menos desde a década de 50, privilegiou o automóvel em detrimento de outros meios de transporte, e o transporte particular em detrimento do transporte público. O mercado paulistano de automóveis anunciava-se como um dos mais promissores do mundo na segunda metade do século. Segundo o primeiro censo automobilístico no final dos anos 50 a cidade possuía então 500.000 veículos. No ano de 65 a cidade atingiria a marca de 1.300.000 veículos, tendo crescido 1100% em 15 anos.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Os Planos Diretores de 71 e 90
86
87
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O PDDI-SP, 1971.
Desenvolvimento Integrado (PMDI), de 1970, o primeiro plano em escala regional para a Grande São Paulo. Esse esforço de organização regional deu-se antes da instituição formal da ‘Grande São Paulo’ como
“Por uma dádiva divina, o futuro a nós pertence. Portanto, a desnecessidade do planejamento. Impera uma espécie de livre-mercado urbano. Já nos anos 70, toneladas de relatórios, no essencial, retóricos e vazios: a intervenção autoritária exacerba a segregação e desigualdade econômica. Mais do que antes, São Paulo se torna palco
região metropolitana, o que só viria a ocorrer em 1973. O PMDI teve portanto um caráter meramente indicativo, não chegando a ser aprovado por qualquer ato formal. 59 Este é o cenário em que é proposto o PDDI (Plano Diretor de Desenvolvimento
Integrado)
de
1971
(lei
7.688,
30.12.71),
e,
da espoliação urbana”. 59Mais
Lúcio Kowarick in “A Cidade posta em questão”, Shopping News:08.09.91, p.12
A
.
expansão da mancha metropolitana no ano de 65 chega a 1300 km 2. . Nesta etapa do desenvolvimento paulistano planejadores
torna-se a
urbanisticamente
clara
para
os
urbanistas
impossibilidade
de
se
trabalhar
somente
enquanto
São
Paulo
e
município, ou seja, isoladamente. Em 1967 aparece pela primeira vez a figura da Área Metropolitana
na Constituição Brasileira. O Governo do Estado de São Paulo inicia neste mesmo ano estudos que culminarão no Plano Metropolitano de
tarde, por meio de leis estaduais complementares (em 1974 e 76), grande parte do sistema de gestão metropolitano acabou por ser implantado . “Criou-se o SPAM - Sistema de Planejamento e Administração Metropolitana - formado por uma Secretaria de estado - a de Negócios Metropolitanos, órgão político do sistema , por uma empresa de Planejamento - a EMPLASA - que incorporou e substituiu o CEGRAN - grupo executivo ligado à então Secretaria da Economia e Planejamento, por um conselho consultivo - CONSULTI -, um deliberativo - o CODEGRAN - e por um órgão de financiamento - o FUMEFI.” (PLANO METROPOLITANO, p.18). A implementação do Plano Metropolitano caberia ao órgão técnico este sistema, a EMPLASA, e ,com este fim, procedeu-se à atualização do PMDI. Esta revisão, efetuada entre 1976 e 1977, terminou por não ter nenhum resultado prático e o documento de 1970 acabou permanecendo como plano global para a região. A partir de 1980, com o impulso trazido por um decreto federal que vinculou os investimentos e aplicações federais nas regiões metropolitanas às diretrizes contidas em seus respectivos planos, voltou-se a revisar o PMDI. Assim, a primeira versão do PMDIII, revista e atualizada, foi aprovada em caráter provisório, enquanto se aguardava sua versão final. Entretanto, esta é a versão que seguiu como a única e oficial até 1993, trazendo importantes inconvenientes ao processo de planejamento da Região Metropolitana. Neste contexto foi elaborado o Plano Metropolitano de Planejamento da Grande São Paulo 1993/2010, pela EMPLASA. A título de ilustração, temos o depoimento do engenheiro Rogério Bicalho, da CPTM, que afirma que a constituição da figura jurídica da “Área Metropolitana” com todas as suas implicações administrativas, é essencial para o estabelecimeno de uma malha de transporte público regional, essencial no caso da área metropolitana de São Paulo, que concentra grande número de pequenas cidades dormitório em seu entorno. (Ver “Anexos: Entrevista Engenheiro Rogério Bicalho, CPTM”.)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana aproximadamente uma ano depois, a Lei de Zoneamento. Este seria o plano diretor, ainda que modificado, vigente até 1996.
88
1. A abertura da Marginal Pinheiros e Avenida Nações Unidas propiciou a estruturação de uma nova área de industrialização moderna
Segundo as análises feitas para o projeto do Plano Diretor de 1985 60,
próxima aos centros de tomada de decisão, gerando uma grande
o PDDI-SP-71 teria resultado num considerável avanço no que se
expansão residencial na área de Santo Amaro e Campo Limpo, em
referiria ao controle do solo e à elaboração de leis próprias para alguns
detrimento da Zona Leste. (Sócrates, p.33)
conceitos
urbanísticos
importantes,
a
saber,
a
classificação
de
2. Completar a malha de vias expressas proposta exigiria recursos
categorias de uso do solo, o estabelecimento da hierarquia das vias e
financeiros que o Município não possuía. Sem estas vias, a cidade se
das áreas verdes, a definição do coeficiente de aproveitamento máximo
expandiria ao longo de ‘corredores’, permanecendo a tendência à rádio-
do solo (igual a 4), o início do controle da poluição ambiental, etc. O
concentricidade .(idem, p.34)
PDDI-71 estabeleceu ainda áreas prioritárias de desenvolvimento e
3. Conseqüentemente, as maiores densidades teriam continuado a
renovação urbana, definindo uma quadro de metas para 1981.
ocorrer ao longo destes corredores, opondo-se ao modelo proposto em
(Sócrates, p.34)
1971, de adensamento do interior da malha viária. (Os ‘miolos’ de
Jodete Rios Sócrates defende que a “proposta fundamental do
bairro).
PDDI era a estruturação urbana comunitária, administrativa e do
4. As metas estabelecidas para equipamento social e melhoria da
planejamento em bases físico-territoriais, com instrumentos concretos
qualidade de vida na metrópole não teriam sido atingidas em 1981,
de implantação.” (Sócrates, p.8). Sua proposta teria resultado de um
“pelas
longo processo de conhecimento e ação sobre a cidade, identificando
concentradoras de renda.” (Sócrates, p.34).
problemas
antes
do
planejamento
que
‘problemas
urbanos’
propriamente ditos. (idem).
condições
políticas
impeditivas
de
pressão
social
e
Segundo Sócrates, “a mais conhecida proposta do Plano Diretor (...) é a das vias expressas.(...) (p.73)
Sócrates aponta que, segundo as análises desenvolvidas para a
Os princípios fundamentais de hierarquia de vias, desde expressas
proposta do PD de 1985, o modelo do PDDI-71 não teria sido
até locais, teria sido elaborada já no documento “Planejamento 1957-
realmente implantado pois:
1961” do Depto. de Urbanismo e Secretaria de Obras. Entretanto, o PDDI teria consolidado as diretrizes que conformaram definitivamente
60apud Sócrates, Jodete Rios, PDDI-SP 1971: Uma Oportunidade Perdida. São Paulo: FAUUSP, 1993.
89 o sistema viário atual da metrópole com suas vias expressas 61. Segundo Sócrates, os critérios adotados para este sistema viário seriam: 1. A continuidade das rodovias, que, pelas características de geração
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e Na análise de Sócrates, o Zoneamento, “ por intermédio das hierarquias de zonas, instrumentava a definição e a consolidação das unidades territoriais escalonadas em níveis, bem como a localização
e atração de tráfego na área central, deveriam penetrar na área urbana
dos
equipamentos,
por vias expressas.
predominância, mas convivência de todos os usos em todas as zonas, noções
e
áreas
verdes.
quantificadas
de
Seu
critério
âmbito,
de
2. A possibilidade do fluxo contínuo no sistema.
controlados
3. A compatibilidade das obras com a topografia e a ocupação do
compatibilidade e padrões de incômodos recíprocos (...) facultava a
solo.
por
serviços
ligações,
formação de unidades autônomas, diversificadas e auto-suficientes.”
4. A garantia de acesso a todas as áreas da Grande São Paulo.
(Sócrates, p.73). Somekh indica, entretanto, que a legislação de
“Ao seu abandono [das vias expressas], explicado pela crise do
zoneamento
teria
sido
produzida
profundamente
costumava atribuir a não implantação e a obsolência do Plano.”
contabilizar mais de 31 tipos de zonas em mais de 50 leis. Para
(Sócrates, p.73) A autora indica ainda como causas da não completude
Somekh, o estabelecimento dos índices urbanísticos e a distribuição
deste sistema de vias expressas a desproporção entre o vulto das obras
dos coeficientes de aproveitamento não apresentariam relação alguma
e os recursos municipais disponíveis. (P.73).
com o potencial de infra-estrutura então instalado na cidade.(Somekh, p.335)
01.11.72), seguido, em 1975, do Código de Edificações da Cidade, que
“O
permaneceria em vigor até 1992 63.
zoneamento
trata
‘pontual
toda
a
e
sendo
petróleo e conseqüente mudança de ênfase no transporte individual, se
Somente em 1972 São Paulo terá sua lei zoneamento 62 (lei 7805, de
transformada,
‘tecnocraticamente’,
cidade
casuisticamente’,
de
forma
até
chapada,
bidimensional, sem considerar nem as diferenças geomorfológicas de sua conformação física, nem as diferenças das diversas regiões que a
61Sócrates
indica ainda outros documentos ‘essenciais’ para a compreensão das vias expressas: 1-“Sistema de Vias Expressas: área Metropolitana de São Paulo. Plano Diretor Viário”. GEP, CEGRAN, URBI, SMT, DERMU, DER, São Paulo (Cidade), Metrô, agosto de 1971, São Paulo, 1971.; 2-“Sistema de Vias Arteriais: Diretrizes. COGEP, outubro, 1972. São Paulo (Cidade), 1972.; 3-”Sistema de Vias Principais: Diretrizes”, COGEP, agosto de 1973, São Paulo (cidade), 1973. 62Outras tentativas de zoneamento já haviam sido feitas, mas sempre com caráter pontual, tendo sido esta a primeira vez em que um sistema é elaborado para todo o conjunto da cidade. Já na década de 40, Francisco Prestes Maia falava em zoneamento das ‘áreas mais dignas de proteção’. Segundo o então Prefeito, estas áreas incluiriam,
compõem. Além disso, provoca uma escassez de terra verticalizável através do estabelecimento restrito a 10% da cidade do maior coeficiente de aproveitamento, hoje limitado a 4, o que reforça a
entre outras, o Jardim América, o Pacaembú, o Jardim Europa e as Avenidas Paulista, Angélica e Higienópolis.(MELHORAMENTOS, p.14.) 63Ver Anexos para Código de Obras de 1992.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana diferenciação
urbana
e
provoca
a
supervalorização
fundiária.”
(Somekh, p.335) Esta ‘rigidez’ do Zoneamento refletiu-se na produção do espaço
90
Interligadas. Inicialmente chamada de ‘Lei do Desfavelamento’, a lei, na avaliação de Nádia Somekh, teria vindo atender à pressão do setor imobiliário no sentido de alteração dos índices urbanísticos da
fora da legislação em vastas áreas da cidade, implicando, como já se
legislação, “utilizando-se de um
observou, em sucessivas anistias aos imóveis irregulares, incluindo
(Somekh, p.336). As Operações Interligadas permitiriam a venda de
tanto as infrações relativas ao coeficiente de ocupação do terreno,
coeficientes maiores de construção ou a permissão para a modificação
quanto ao uso do imóvel.
do uso em troca da construção de habitações de interesse social. Suas
A escassez de terra verticalizável apontada por Somekh tem efeitos paradoxais. Num primeiro momento, como observa a autora, reforça as
discurso pretensamente social”
implicações serão discutidas mais adiante, juntamente com outro mecanismo advindo da mesma lógica, a Operação Urbana.
diferenças na cidade e provoca a supervalorização fundiária de algumas
Como destaca Somekh, com a Constituição de 1988 há um
áreas. O controle de usos possíveis, a criação artificial de escassez ou
considerável avanço ao se estabelecer limites para o direito de
abundância de terra e os diferenciais espaciais, reforçados por índices
propriedade na cidade, com a definição da função social do solo
urbanísticos díspares, reforçam estas diferenças no preço do solo.
urbano. Entretanto, esta definição, um tanto vaga, engendrará
Estes mecanismos foram plenamente incorporado pelos agentes
confusões e interpretações distintas.
imobiliários e utilizados como instrumentos para a especulação. Num segundo momento, a atração exercida por algumas áreas de prestígio e a valorização imobiliária produziram pressões para a modificação do zoneamento, especialmente nas regiões limítrofes àquelas onde o zoneamento era mais rigoroso, as Z-1 64. A valorização imobiliária excessiva, em parte engendrada pelas leis de zoneamento, acaba por tornar-se a principal ameaça ao próprio zoneamento. Em 1988, a adm. Jânio Quadros promulga uma lei que na prática permite a modificação institucional do zoneamento: a lei das Operações 64Zonas exclusivamente residenciais, com coeficiente de aproveitamento do terreno igual a 1.
91
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O Plano de 90: Introdução
T
D
esde a implantação do PDDI-71, houve 4 propostas de substituição por novos Planos Diretores 65: O Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado II (PDDI-II), de 1982. O Plano Diretor 1985-2000, de 1985.
O Plano Diretor de 1988, da Administração Jânio Quadros. O Plano Diretor de 1990, da Administração Luíza Erundina. Nenhum deles foi implantado. “por divergências e descontinuidades
políticas, administrativas e técnicas” (Sócrates, p.8). O Plano de 1988 foi aprovado por decurso de prazo, sendo sua validade depois contestada judicialmente. Examinaremos apenas o Plano de 90, pois nele estão contidas muitas idéias e conceitos que efetivamente serão postos em prática (como a Operação Urbana) e paradigmas que balizarão as discussões urbanísticas até o presente.
alvez o aporte mais importante do plano de 90 tenha sido seu caráter ‘democratizante’ das relações entre Poder Público e Sociedade Civil. Sua produção envolveu a participação de
técnicos de órgãos federais e estaduais e da Universidade. A discussão gerada em torno de seminários, grupos de trabalho e de debates abertos, ao longo de uma ano, contribuiu decisivamente para a elaboração do Plano, que resultou inédito do ponto de vista dos mecanismos de participação que propunha, com níveis de gestão centrais e locais. Segundo o urbanista Luiz Carlos Costa, no documento “Decisões a tomar sobre a elaboração do Plano Diretor” (SEMPLA, 1989), seria necessário, quando da elaboração do Plano, “aproveitar os conceitos elaborados nos últimos 10 anos pela equipe técnica da SEMPLA, período em que se considerou fundamental ‘politizar’ a idéia de Plano Diretor, rejeitando concepções tecnocráticas anteriormente vigentes. Segundo um dos conceitos emergentes deste período, o Plano Diretor deveria ser entendido como um plano destinado a orientar o processo global de desenvolvimento físico da cidade em função de objetivos sócio-econômicos e políticos previamente escolhidos, dependentes
O caráter do Plano Diretor de 1990
daquele processo.” (Costa, Decisões a tomar, p.1). Tal concepção do Plano representou um gigantesco passo em direção a um conjunto de leis e regras menos comprometido com a técnica usada como instrumento ideológico, criando a possibilidade de real atuação política no campo da produção do espaço urbano.
65Haveria
um em preparação sob a administração Paulo Maluf.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Ainda que se admitisse a complexidade dos processos de produção, apropriação e uso do espaço urbano, ressaltando a inércia destes processos, o Plano representava a possibilidade de criação de uma base institucional para o exercício da cidadania e da interferência do sujeito na produção da metrópole. Costa falará de um plano de compromisso possível entre as classes e agentes sociais a respeito do futuro da cidade (Costa, Decisões a tomar, p.2). Tal compromisso seria baseado em condições de “objetividade e confiabilidade aceitáveis por todas as forças sociais” (idem). “O atendimento do requisito de objetividade exigirá que o PD seja explicitamente polarizado por objetivos precisos, de profundo e evidente significado para a sociedade como um todo e para as classes populares em luta por melhores condições de vida urbana” (idem). É nossa opinião que tais objetivos ‘de profundo e evidente significado para a sociedade’, característicos talvez das sociedades de concerto, nunca chegaram a maturar na sociedade brasileira. A ausência de um projeto social por parte das elites e de um ‘acordo possível’ entre as forças sociais resultou na rejeição dos instrumentos propostos pelo Plano Diretor. Um ‘acordo possível’ parece só fazer sentido na hipótese de que as elites estivessem prontas a algum tipo de concessão que implicasse na melhor distribuição da renda e dos benefícios sociais, já que parece-nos óbvio que não se pode esperar mais concessões da parte menos privilegiada da população. O sentido das forças hegemônicas na sociedade brasileira, e na metrópole paulistana em particular, indica
92
que estas forças não estão comprometidas com nenhum tipo de concessão que permitisse este ‘acordo possível’.
93
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
‘Os Objetivos do Plano Diretor’
O
Plano
Diretor
visava
especificamente
tendências descontroladas de ocupação, adensamento e valorização geram efeitos danosos para toda a cidade” (idem, p.4). O plano visava objetivamente a induzir os investidores imobiliários a localizar moradias e atividades econômicas nas regiões onde a infraa
engendrar
“transformações da dinâmica do espaço urbano (sócioeconômica e físico-territorial)” (Costa, Decisões a tomar, p.2),
que seriam tomadas como objetivos afim de alterar as tendências históricas de piora das condições da vida na metrópole. Tais ‘tendências
históricas’
seriam:
“a
marginalização
progressiva
da
população de baixa renda em relação aos benefícios da urbanização, notadamente os relativos à moradia, transportes e serviços públicos; o aumento progressivo dos custos da urbanização que tornam a cidade cada vez mais onerosa para a sociedade e inviabilizam a absorção, pelo poder público, dos encargos que lhe cabem na produção e operação dos serviços urbanos; a deterioração crescente do meio ambiente urbano e a destruição do patrimônio natural e cultural.” (Costa, Decisões a tomar, p.2). Entre outros objetivos, o Plano serviria para “condicionar o setor privado (proprietários e empreendedores) a assumir responsabilidades pelas externalidades de sua ação que oneram a coletividade” (idem, p.4), ao mesmo tempo em que reorientaria a distribuição do uso do solo no conjunto do território urbano de forma a otimizar a infra-estrutura, reorientando os processos de urbanização e reurbanização, “cujas
estrutura viária, de energia elétrica, de saneamento, etc estaria subutilizada, impedindo ao mesmo tempo um adensamento indesejável em regiões carentes onde a infra-estrutura fosse insuficiente ou já plenamente utilizada. Visava-se a otimizar o aproveitamento da infraestrutura já instalada e somente permitir o adensamento à medida em que fosse instalada infra-estrutura suplementar. Tal abordagem seria inédita no gerenciamento dos recursos já instalados e por instalar na cidade,
constituindo-se
desenvolvimento
racional
em do
importante espaço
ferramenta
urbano.
Os
para
o
movimentos
imobiliários especulativos estariam doravante à mercê da capacidade de investimento do poder público e da infra-estrutura já instalada, e não justamente o contrário como é hábito. A diminuição do custo efetivo do espaço urbano implicaria, segundo a visão dos elaboradores do Plano, numa maior oferta de moradias e edificações em geral. Tal diminuição do custo adviria da ampliação da zona urbana do município, aumentando a disponibilidade de terra edificável, a elevação da possibilidade de construir em regiões com folga de infra-estrutura e o desestímulo das especulações através da retenção de áreas vazias dotadas de infra-estrutura, através da introdução do I P T U p r o g r e s s i v o .
94
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Por fim, propunha-se a criação de um Fundo de Urbanização
Por outro lado, propunha que o morador de áreas de preservação fosse
destinado a custear inversões em infra-estrutura e em programas
ressarcido pela restrição a seu direito de construir através do
habitacionais, objetivando o reequilíbrio e a reintegração da maioria
mecanismo de T r a n s f e r ê n c i a d o D i r e i t o d e C o n s t r u i r .
marginalizada dos habitantes da metrópole. Os recursos seriam obtidos pelo Poder Público através da venda do chamado ‘s o l o - c r i a d o ’ .
Propunha-se também a fixação de uma rede viária básica e de um sistema intermodal de transporte que priorizasse o transporte coletivo.
Este e outros mecanismos, como a transferência da regulamentação
Entre as muitas propostas do Plano Diretor de 90, destacamos as
do uso do solo e a criação de regras específicas para as Sub-Prefeituras,
mudanças
garantiriam
a
zoneamento então em vigência desconsiderava “o potencial efetivo de
participação direta da população e dos construtores em decisões de
infra-estrutura existente no estabelecimento dos índices urbanísticos
caráter local. De fato, uma das características mais importantes do
que definem a intensidade de utilização da cidade”. (FSP:04.12.90,
Plano proposto seria a democratização da formulação de regras de uso
p.C4.). Além disso, apontava-se para a desconsideração do meio físico
e ocupação do solo, substituindo o ‘emaranhado’ complexo da
sobre o qual o zoneamento deveria legislar. Considerava-se que o
legislação em vigor por um conjunto de regras menor e mais claro,
próprio encarecimento do solo seria resultado da limitação da
facilitando sua utilização pelo ‘cidadão comum’. (FSP:04.12.90, p.C-5).
superfície construível da cidade em 70%. Em apenas 10% da área de
o
respeito
à
diversidade
da
cidade,
facilitando
no
zoneamento.
Para
os
elaboradores
do
Plano,
o
O Plano também visava a fazer respeitar as restrições impostas pelo
São Paulo o Coeficiente de Aproveitamento do terreno poderia chegar
próprio meio natural à ocupação. Isto significaria restringir a ocupação
a 4, reduzindo a possibilidade de adensamento a poucos proprietários,
em áreas sujeitas a enchentes ou desmoronamentos e notadamente as
sem levar em consideração a disponibilidade de infra-estrutura
áreas de mananciais ou de preservação ambiental. A região dos
instalada, resultando em valorizações artificiais e adensamentos
mananciais já era, como vimos, protegida contra a ocupação. Isto não
indesejáveis.
teria impedido a instalação de milhares de moradores às margens das
A ‘rigidez’ e a complexidade do zoneamento vigente eram criticadas
represas, mal servidos de infra-estrutura urbana e freqüentemente
e reconhecia-se o problema da cidade clandestina ao admitir-se que
negligenciados pelo poder público. Nesta área se concentrariam grande
70% da cidade não correspondia ao que determinavam a lei de
parte dos loteamentos clandestinos da cidade. Ao criar mecanismos de
zoneamento e o código de obras, indicando a necessidade de um
regularização das moradias clandestinas, o Plano de 90 visava à
código de obras, de um zoneamento e uma lei de parcelamento do solo
melhoria gradativa das condições urbanísticas da cidade clandestina.
simplificados e mais racionais, mais compreensíveis pela população em
95
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
geral, de mais fácil aplicação e menos sujeitos às ‘práticas de extorsão’
pelo uso, segundo a infra-estrutura existente, que poderia ser
(idem).
comprado da Prefeitura. Este estoque aumentaria de acordo com os novos investimentos em infra-estrutura. A revisão periódica do estoque ficaria a cargo de uma comissão paritária, do poder público e da
‘Instrumentos de Política Urbana’
sociedade civil. Com os recursos arrecadados com o S o l o C r i a d o seria organizado um
Fundo
de
Urbanização
,
cujos
fundos
seriam
aplicados
prioritariamente em obras nas áreas mais necessitadas da cidade. Os
Os
principais instrumentos de Política Urbana seriam o Solo Criado, o Estoque de Área Construída, o Fundo de
recursos seriam fiscalizados por um Conselho formado por membros do Poder Público e da Sociedade Civil. O P a r c e l a m e n t o o u e d i f i c a ç ã o c o m p u l s ó r i o s seria uma forma de
Urbanização, a Transferência do Direito de Construir, o
desestimular a retenção de áreas vazias dotadas de infra-estrutura. Os
Parcelamento ou Edificação Compulsórios e a Operação Urbana. O S o l o C r i a d o , talvez o instrumento mais polêmico de todo o
proprietários que não se dispusessem a promover a edificação em seus
Plano, seria um instrumento que permitiria à Prefeitura “outorgar
lotes estariam sujeitos à tributação progressiva do IPTU, com exceção
onerosamente
a
dos terrenos de até 250 m 2 , único imóvel do proprietário.
estabelecidos
pelo
possibilidade coeficiente
de de
construir
acima
aproveitamento
dos
limites
único
As O p e r a ç õ e s
nas
U r b a n a s seriam “intervenções urbanísticas em áreas
M a c r o z o n a s A d e n s á v e i s ”. As Macrozonas seriam porções do território
aprovadas pela Câmara que poderão ser realizadas com a participação
para as quais seria determinada a quantidade de área que ali poderia ser
de recursos privados, desde que tragam benefícios para a coletividade.
construída, levando-se em consideração a capacidade de infra-estrutura
Esses investimentos estabelecerão novas condições para a intensidade
instalada. As M a c r o z o n a s seriam de dois tipos: adensáveis e não-
de
adensáveis. As M a c r o z o n a s a d e n s á v e i s seriam os locais onde a cidade
macrozoneamento”. (FSP:04.12.90, p.C-5). Veremos, entretanto, como
teria condições de crescer sem acarretar problemas para o conjunto,
as Operações Urbanas seriam utilizadas pela adm. Paulo Maluf como
através da plena utilização da infra-estrutura existente. Todas as zonas
maneira
adensáveis teriam um e s t o q u e d e á r e a c o n s t r u í v e l em m 2 ,
(FSP:04.12.90, p.C-5).
definido
aproveitamento
de
das
valorização
áreas
e
abrangidas,
mercadorização
diferentes
do
solo
do
urbano.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
96
Prefeituras e que teriam por atribuição orientar e definir as propostas do Plano Diretor no âmbito local. Teriam como ponto de partida as
Os Níveis de Gestão
Os
diretrizes
Local. No nível Central, teríamos um Ó r g ã o Planejamento
Centralizado,
responsável pela elaboração de todas as propostas básicas do Plano Diretor, como a
criação das Macrozonas, zonas especiais e áreas de interesse especial, operações urbanas, etc. Caberia também a este órgão analisar os projetos para o controle do impacto urbanístico. O C o n s e l h o d e P o l í t i c a U r b a n a , formado pelo Prefeito, secretários e Subprefeitos, teria a função de deliberar, no plano político, sobre questões preparadas pelas equipes técnicas. A C o m i s s ã o d e D i r e t r i z e s U r b a n í s t i c a s , por sua vez, seria uma comissão mista, formada por representantes da administração municipal, dos órgãos de outras esferas de governo que atuam na cidade e da comunidade que teriam por atribuição analisar e opinar sobre as propostas elaboradas pelo Órgão de Planejamento Centralizado em relação ao Plano Diretor, bem como proceder à revisão do estoque de área construída e avaliar o impacto urbanístico dos grandes empreendimentos. No nível local, seriam implantados Ó r g ã o s
do
Plano
Diretor,
mas
poderiam
acrescentar
regulamentações de interesse local, tais como a distribuição de usos.
níveis de gestão seriam dois, Central e de
gerais
de
Planejamento
D e s c e n t r a l i z a d o , que seriam grupos técnicos alocados nas Sub-
Os plano elaborados teriam de ser aprovados pelos C o n s e l h o s d e R e p r e s e n t a n t e s a serem eleitos nas Sub-Prefeituras.
97
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
As Críticas ao Plano
ferocidade
de
nossas
cidades
pareça
justificá-lo”(Shopping
News:30.06.91, p.10). Para Scherer, o projeto do novo Plano Diretor reduziria seu compromisso de formular uma política de desenvolvimento
“ Parece absurdo a Prefeitura tomar o direito que as pessoas têm
urbano à questão dos adensamentos, falhando na proposta de uma lei de
de construir e depois querer vender !”
zoneamento que substituísse a antiga. O Plano trataria de maneira ‘vaga’ o sistema de transportes e a própria definição da estrutura metropolitana
Samuel Kon, do Secovi, Revista Veja:13.02.91, p.18.
P
para as décadas seguintes. Scherer critica principalmente o afastamento do Plano da história do planejamento paulistano e da história da própria
ara Rebeca Scherer, socióloga, haveria no Plano Diretor
cidade, minimizando o significado das relações das pessoas com o
uma combinação do mais ‘promissor’ com o mais
espaço urbano, em
‘retrógrado’ nos processos de intervenção estatal sobre a
político’. Apesar dos mecanismos de participação, o Plano teria deixado
cidade.(Shopping News:30.06.91, p.10). Como aspecto
nas mãos da burocracia algumas ‘questões políticas fundamentais’. Tal
mais
postura teria surtido o efeito de reunir contra o Plano setores da
promissor,
Scherer
indicava
o
“explícito
compromisso político, evidenciado na exposição dos motivos” (idem). Scherer identificava no Plano a idéia de que a cidade, por sua natureza
nome, segundo a socióloga, de um ‘realismo
sociedade de convicções e anseios completamente díspares. Para o urbanista Cândido Malta Campos Filho, talvez o principal
de produto coletivo, deveria ser comum e eqüitativamente apropriada.
problema
Considerava a outorga onerosa do direito de construir um procedimento
regulamentações específicas para o ‘nível micro’, isto é, a ‘trama de ruas
social ‘justo e tecnicamente adequado’, considerando esta medida
entre as grandes vias de circulação da cidade’. “Um empresário, de
‘indispensável’, tendo em vista as particularidades das cidades brasileiras
acordo com a capacidade de construção calculada para a macrozona
neste final de século, ajudando a estender o direito à cidade às parcelas
pode erguer numa rua estreita e de pouca circulação um grande edifício
da população que não o usufruem. Scherer acreditava, no entanto, que
(só valeriam, para esses casos, os limites impostos pelo Código de
certas particularidades na proposta do Plano indicariam um ‘perigo’ para
Edificações)” (Shopping News:24.02.91,p.3)
do
novo
Plano
seria
a
não
definição
de
limites
e
os direitos de todos os outros grupos sociais da cidade. “É
Malta alertava que o Município estaria deixando nas mãos do
profundamente retrógrado qualquer plano que reduza os direitos
mercado imobiliário, e não dos moradores, o controle dos gabaritos de
urbanos aos direitos das populações de mais baixa renda, por mais que a
altura e localização dos prédios. Os Conselhos de Representantes eleitos
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
98
pelo povo, previstos na implantação das Sub-Prefeituras pela Lei
Luíza Erundina. A maior polêmica girava em torno da adoção de um
Orgânica do Município, teriam, segundo Malta, uma função apenas
coeficiente de aproveitamento único e do mecanismo do ‘solo criado’,
consultiva, já que o poder de decisão final ficaria restrito ao órgão
pelo qual os empreendedores pagariam à Prefeitura para ultrapassar os
central e seu quadro de técnicos, que por sua vez ditariam os critérios
índices de ocupação do terreno permitidos pela Lei do Zoneamento.
para as regulamentações locais. Malta também indagava sobre o
Dentro da ótica de que ‘se o empresário é penalizado, quem sofre é o
estabelecimento dos critérios para a avaliação dos estoques de área
povo’, clamava que “(...) o caminho escolhido [pela Prefeitura] é
edificável
perverso: vai provocar o tumulto e a paralisação do mercado, com o
nas
Macrozonas,
indicando
a
possibilidade
de
congestionamento dos serviços nas áreas centrais.
conseqüente desemprego das próprias pessoas para quem a Prefeitura
Para a então diretora da Secretaria do Planejamento, a urbanista
quer construir as habitações de interesse social. E não vai render nem
Raquel Rolnik, coordenadora geral da proposta do novo Plano, o
pequena do que se pretende.” (Samuel Kon, OESP:06.03.91, p.11).
estabelecimento
um
Samuel Kon, então presidente do Secovi, argumentava que a Prefeitura
a
estaria tornando inviável a construção de prédios na cidade ao reduzir o
participação de quatro órgãos estaduais e municipais ligados aos
índice de ocupação dos terrenos, prejudicando principalmente, segundo
transportes, entre eles a Emplasa e a companhia de Desenvolvimento
Kon, os pequenos proprietários e encarecendo os apartamentos.(Shopping
Habitacional e Urbano (CDHU), que teriam estudado a circulação em
News, 24.02.91, p.3).
minucioso
das
estudo
áreas da
de
adensamento
circulação,
conduzido
teria pela
obedecido CET,
com
toda a área metropolitana em duas fases: a primeira para a distribuição
Esta posição seria compartilhada pelo próprio então presidente da
dos estoques e a segunda para sua avaliação (Shopping News:24.02.91,
Câmara Municipal paulistana, Arnaldo Madeira, do PSDB (Shopping
p.3).
News:28.04.91, p.10). Para Madeira, seria ‘fundamental’ que os debates
Quanto à efetividade dos Conselhos de Representantes, Rolnik
fossem menos ‘ideológicos’ e mais ‘técnicos’. “Não se trata de
argumentava que caberia às Sub-Prefeituras elaborar as regulamentações
despolitizar as discussões, mas de reconhecer que as questões urbanas
locais que seriam submetidas ao poder Legislativo, depois de aprovadas
podem e devem ser tratadas também de uma maneira técnica” (idem). Tal
pelo Conselho de Representantes.
posição estaria em confronto direto com a filosofia do Plano, que visava
Já segundo a iniciativa privada, o Plano representaria uma ameaça aos
a evitar as construções ideológicas baseadas na supremacia da técnica.
ganhos e ao patrimônio. O Secovi, Sindicato das Empresas da Construção
Para Ricardo Yazbek, do Secovi, o Plano traria “ (...)problemas ao
Civil, tomou a dianteira nas críticas ao Plano proposto pela equipe de
mercado imobiliária e à cidade. Encarecerá o produto final e a cidade vai
99
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
se espalhar, gerando problemas de infra-estrutura. Por outro lado,
Considerações finais
causará desemprego na construção civil” (FSP:19.01.91, p.C-3). A
fragilidade
da
argumentação
dos
representantes
do
setor
imobiliário se deu justamente em sua apreciação quase que exclusiva das conseqüências do Plano Diretor proposto na atividade da construção e no lucro das companhias. Os argumentos de que, ao limitar a especulação, e conseqüentemente os lucros, o Poder Público estaria prejudicando justamente as classes menos favorecidas, aparece com freqüência no discurso das elites econômicas, como verificamos ao longo do trabalho.
Os
vários mecanismos de caráter normativo que regem a ocupação das diferentes áreas da cidade parecem ser secundários à ‘lógica do mercado’, com todos os seus efeitos sobre
a
cidade. Longe
de
representar
instrumentos ‘isentos’ de legislação sobre o solo urbano, os vários zoneamentos e códigos de edificação atuais, combinados com outras
Paulo Teixeira, então coordenador estadual da Associação Nacional
ações e políticas, acabem contribuindo justamente para a intensificação
do Solo Urbano, resumia assim o problema: “Mais importante, no
da mercantilização do solo urbano e a concentração da renda advinda
entanto, que saber se o preço do produto ficará maior ou menor, é
deste processo. Alguns urbanistas argumentam que, se por um lado o
questionar a legitimidade política, financeira e ética de permitir que o
zoneamento protege e organiza as áreas de ocupação na cidade,
patrimônio público continue a subsidiar indiscriminadamente o lucro
termina por induzir a concentração de serviços e investimentos, em
privado, especialmente quando voltado à produção de bens para o
detrimento de vastas áreas das periferias, onde se o zoneamento existe,
consumo da população de alta renda”. (FSP:16.03.91, p.4-2)
ele é inócuo. É fácil constatar que as relações de reprodução do capital imobiliário dentro da metrópole paulistana se apóiam exatamente sobre o controle das relações de vantagem e desvantagem de uma porção do território sobre outra, utilizando-se dos mecanismos urbanísticos, bem como do controle das valorizações pela manutenção da dificuldade da acessibilidade dos serviços e espaços da cidade. O direito à vizinhança aqui não é mais que um instrumento de regulagem do valor mercadológico do espaço urbano e a exclusão e a separação de classes
100
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana é sua chave. A violência é um dos resultados desta exclusão e
permitissem ao mais fracos defenderem-se contra as ações arbitrárias
separação, mas também é instrumento para o reforço dos mecanismos
dos mais fortes, instrumentalizando a democracia e seus conflitos
de reprodução do capital (condomínios fechados, shopping centers,
inerentes, admitindo estes conflitos e incorporando mecanismos que
edifícios murados, as indústrias de segurança e de seguros, etc).
tornassem possível a participação das camadas mais pobres no
Ao diferenciar áreas residenciais de baixo coeficiente de ocupação, o zoneamento
atual
empreendimentos
cria
áreas
imobiliários
de de
prestígio alto
e
atração
padrão,
que
para
os
atuam
principalmente na periferia das chamadas Z-1.
processo. Isto poderia ser feito através da multiplicação dos níveis de gestão da cidade. Quanto à questão do metrô, sua extensão pelo território da cidade, acompanhado
de
redes
eficientes
de
transporte
regional
e
Neste sentido, a adoção de um coeficiente único básico de ocupação
intermunicipal, seria talvez uma revolução na distribuição de riquezas
para toda a cidade e do mecanismo do solo criado, ainda que de difícil
pelo território (além do incremento na qualidade de vida, gerado pelo
implantação dada a resistência dos agentes competentes, significaria
abandono da opção automotiva). O fácil acesso aos serviços e espaços
uma possibilidade de efetiva diluição das pressões especulativas sobre
de toda a cidade, diluiria, ainda que não completamente, as vantagens
algumas áreas da cidade e a melhor distribuição dos equipamentos
comparativas de um bairro sobre outro. A acessibilidade e o fluxo sem
urbanos.
impedimentos contribuiria, de qualquer maneira, para o incremento das
Ao tornar-se comum o coeficiente de ocupação em toda a cidade,
relações
de
mercado,
talvez
agravando
alguns
aspectos,
mas
dificilmente terminaria a especulação imobiliária em torno de áreas
distribuindo, em todo caso, mais equanimamente as possibilidades de
mais bem servidas de transportes ou serviços, ou melhor posicionadas
geração e distribuição de riqueza.
dentro ou em torno das atuais Z-1, mas estaria-se contribuindo para que outras áreas pudessem desenvolver potenciais reprimidos pelo zoneamento ou falsamente induzidos por ele. Isto não significa que a proteção às áreas onde a qualidade de vida é julgada alta pelos moradores devesse ser abandonada frente às pressões da realidade econômica. Seria preciso encontrar mecanismos que
101
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Parte 3 : Ideologia, Política e Cidade
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
IPTU: A ideologia em ação O IPTU e a construção ideológica
102
103
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Introdução
A
administração de Luíza Erundina, dentro do âmbito dos mecanismos e regulamentações propostos no Plano Diretor
de
1991,
e
Constituição
de
introduzir
IPTU 66
o
baseada
1988,
na
tentará
progressivo,
sobretaxando os imóveis ‘sem função social’, aqui definidos como aqueles sem
uso
ou
subutilizados.
Isto
representaria um golpe importante
contra as especulações imobiliárias. As reações, debates e conflitos gerados pela proposta extrapolaram
em
muito
qualquer
consideração
‘técnica’
sobre
o
mérito
da
progressividade do IPTU. O estudo deste ‘episódio’ na história da cidade constitui-se em importante fonte de informação e reflexão sobre os processos políticos e ideológicos que regem sua conformação.
66Imposto
Predial e Territorial Urbano
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A ‘Batalha’ do IPTU: a ideologia em ação.
O valores.
Esta
80%, prejudicando, principalmente os pequenos e médios proprietários (que teriam tido aumentos de 120% a 99%). As alíquotas para áreas industriais, comerciais e terrenos teriam sido reduzidas e o valor venal 67 dos apartamentos de classe média elevado. Como resultado, a
ano de 1992 foi dominado pelas discussões em torno do aumento do IPTU paulistano. A Prefeitura de São Paulo, então administrada por Luíza Erundina (PT), havia proposto um aumento médio de 80% no IPTU urbano, alegando uma grande defasagem nos
defasagem,
segundo
a
administração,
beneficiaria
sobretudo os grandes proprietários. Para corrigir esta distorção, o ‘novo IPTU’ incorporava um mecanismo polêmico, a progressividade de valores segundo o valor do imóvel, reservando as maiores alíquotas para os terrenos desocupados. De acordo com o novo mecanismo, os terrenos
não
utilizados
ou
subutilizados
teriam
104
alíquotas
progressivamente mais elevadas, que beneficiava os imóveis que cumprissem ‘função social’ em detrimento dos que permanecessem vazios. Configurou-se um importante, mas polêmico, instrumento contra a especulação imobiliária em áreas bem servidas de infra-estrutura. As imediatas reações contrárias acabaram forçando a diminuição do percentual para 32%. Ainda assim, a mobilização contra o aumento foi inédita. Segundo as análises apresentadas pelos inimigos do ‘novo IPTU’, o aumento médio real para os imóveis residenciais teria sido de efetivos
participação das residências na receita gerada pelo IPTU subiria de 14% em 1991 para 21% em 1992 (18,3% segundo dados da Prefeitura), enquanto os terrenos apresentariam uma queda na contribuição de 30% para 20% 68. Em editorial, o Jornal da Tarde, o principal canal para as vozes contrárias ao aumento, dava o tom do debate e resumia as questões em pauta: “As barganhas feitas na Câmara Municipal para se chegar à aprovação do aumento médio real de 32% do IPTU deixam claro que tanto a prefeita Luíza Erundina como a maioria dos vereadores estiveram muito mais preocupados com seus objetivos políticos imediatos do que com os interesses maiores da população da capital.. (...) A verdade é que no toma lá, dá cá que presidiu as negociações para a aprovação do IPTU, a prefeita conseguiu um aumento substancial desse imposto, de onde tirará recursos para fazer obras de fachada em fim de mandato, destinadas a garantir seu futuro político, enquanto os vereadores obtiveram, em troca, a 67Valor
Venal é a base de cálculo para o IPTU. Na época correspondia a um valor fixado em 70% do valor real do imóvel no mercado. Sobre este valor é que são aplicadas as alíquotas para cálculo do Imposto. A Prefeitura divide a cidade em zonas homogêneas quanto ao valor dos imóveis. Todos os anos, o Conselho Municipal de Valores Imobiliários - formado por especialistas da Prefeitura e representantes do setor imobiliário - se reúne e arbitra tecnicamente um valor para o m 2 da zona. (FSP:02.10.92, p.3-4) 68Os dados são referentes a vários textos publicados na época. A análise se ateve ao contraste destes números com números divulgados pela Prefeitura.
105
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
aprovação de obras para seus redutos, que também lhes renderão gordos dividendos
Numa análise mais aprofundada, veremos como estas idéias,
eleitorais.(...)Além disso, não se pode esquecer que recursos é o que não têm faltado
manipuladas, serviram à montagem de um discurso ideologizado, onde o
à Prefeitura. O ex-presidente da Câmara Municipal, vereador Arnaldo Madeira,
pagamento de um imposto direto por alguns terminou por ser o
estima que a atual administração vem contando com os maiores orçamentos da
“problema terrível de todos”, “injusto confisco” e “ato despótico de um
história de São Paulo. Em 1989, houve o aumento da quota-parte do ICMS (para
governo intrusivo”, indicando um outro ponto importante contido nos
25%) e a criação do Imposto sobre Venda a Varejo (IVV). Isto sem falar nos
editoriais em questão: a reação violenta à proposta petista parece estar
sucessivos aumentos reais de impostos ocorridos nos três anos seguintes. Como se vê,
além do razoável 69. O exagero retórico acabou por desvelar seu fundo
se dona Erundina não consegue fazer uma boa administração, não é por falta de
ideologizado, o qual analisaremos a seguir, seguindo de perto os ‘fatos’ e
recursos. É por incompetência mesmo. Como a prefeita não tem a necessária coragem
os discursos.
para cortar despesas de uma máquina administrativa superdimensionada, ineficiente e perdulária, esta acaba por engolir cada novo sacrifício imposto aos contribuintes” (JT:03.01.92, p.4). O jornal O Estado de São Paulo publicaria editorial análogo, onde apontava que “a necessidade de fazer caixa em ano eleitoral” havia provocado um feito inesperado, um “tiro pela culatra” nas estratégias petistas, referindo-se às fortes reações contra o aumento. Indicava a inconstitucionalidade da cobrança e mencionava o “dever moral da resistência à lei injusta” (OESP:12.02.92, p.3). O editorial ressaltava o grande volume de recursos a serem gerados pela cobrança do IPTU, atrelando estes novos recursos a obras “de fachada, destinadas a aumentar o prestígio do PT, diante de incautos que se dispusessem a votar nessa legenda reacionária por causa da propaganda desencadeada para atraí-los e encilhá-los.” (OESP:12.02.92, p.3) Os editoriais, apresentados aqui resumidamente, enfocam algumas questões de grande interesse para o entendimento da ‘Batalha do IPTU’.
69Muito
além das reações contra o anúncio do aumento efetivo do IPTU pelo Prefeito Paulo Maluf, ou contra a decisão do Tribunal Justiça de permitir a cobrança pela Prefeitura, em 1997, o imposto não arrecadado durante a adm. Erundina em 1992.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A(In)Constitucionalidade do IPTU
“Não
se pode condescender com a lesão às normas legais (...), sob pena de derrocada final da vida em coletividade”. É com esta
frase do desembargador Márcio Martins Bonilha que começa o editorial d'O Estado de São Paulo que declarava morto o IPTU já em fevereiro de 1992.(OESP, 20.02.92, p.3). O Tribunal de Justiça havia votado recurso interposto contra medida liminar concedida pelo presidente daquela Corte de Justiça em ação direta de inconstitucionalidade, sustando o pagamento do IPTU com alíquotas progressivas. A liminar em questão havia permitido ao contribuinte o pagamento do imposto pela alíquota mínima: O,2%, causando uma diminuição considerável sobre os valores arrecadados pela Prefeitura em 1991. A Prefeitura se dispôs a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), pois entendia que a decisão interferia na autonomia do município. Segundo o editorial d'O Estado, Bonilha, em sua sentença, prosseguia : “Somos todos (...) vítimas do Fisco esfaimado, de fome sem fim, que não leva em conta o sofrimento imposto ao povo pela dura realidade da situação econômica do País, onde a sociedade veio a ser inteiramente subjugada pelo gigantismo do Estado.”(idem)
106
Este discurso deve ser entendido no âmbito de uma inflação galopante e de uma fala oficial
70
que insistia em que a redução do
tamanho do Estado e a abertura da economia eram a panacéia para todos os males econômicos do país. É também indício do clima emocional em que ocorreram as votações. Já em 22 de fevereiro de 92, era declarada greve dos motoristas de ônibus por reajustes salariais. A Prefeitura alerta que com a arrecadação diminuída, seria impossível prosseguir com a política de subsídios ao setor. “Se não ficar sem transporte, o paulistano poderá ter de pagar mais por ele.” (FSP:22.02.92, p.3-3). A oposição afirmou que greve seria uma maneira de a Prefeitura pressionar a Câmara e o Judiciário a manter o aumento do IPTU. A imprensa insinuou que a CUT, à qual era filiada o sindicato dos motoristas e cobradores, seria responsável pela greve. (idem) O debate sobre a constitucionalidade da lei que regulava a cobrança do IPTU em São Paulo havia levado às páginas dos jornais vários juristas e intelectuais. O debate entre Ives Gandra Martins, detrator do IPTU, Fábio Konder Comparato e Walter Ceneviva é bastante elucidativo. Ives Gandra, então presidente do Conselho Superior de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, considera que “a progressividade cria um tratamento desigual, que só pode ser adotado se expresso na Constituição”, pois, segundo o jurista, o mecanismo não teria sido previsto em sua forma ampla pelos constituintes, isto é, a Com Fernando Collor de Mello na presidência, a que Roberto Campos chamaria depois de grande precursor da modernidade no país. 70
107
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
progressividade para os impostos territoriais urbanos era prevista na
segundo a situação pessoal do contribuinte, ao contrário do Imposto de
constituição de 1988, mas somente para terrenos que não cumprissem
Renda e também do IPTU. Konder propunha uma revisão na lei, mas
função social 71, atentando contra o princípio de isonomia fiscal adotada
negava sua inconstitucionalidade.
tanto na Constituição federal quanto na Estadual. Fábio Konder Comparato, por sua vez, via na atuação do Tribunal,
Walter Ceneviva, da OAB, argumentava que o IPTU deveria respeita a
capacidade
econômica
do
contribuinte, mas
que
poderia
ser
um grave equívoco jurídico, ainda que sua intenção fosse a defesa do
progressivo. A base de cálculo do IPTU é o valor venal do imóvel, que
contribuinte. O Ministério Público, perpetrador da ação contra o IPTU,
deveria ser igual ao valor de mercado, mas não o é na prática, pois os
identificava no mecanismo de progressividade um mecanismo que feria o
donos de imóveis sempre subvalorizam seus terrenos quando são
princípio de 'capacidade econômica do contribuinte', conforme inscrito
chamados a pagar impostos. 72 Ceneviva argumentava que nenhum
nas Constituições Federal e Estadual. Konder argumenta que a
imposto poderia ser confiscatório, mas que se este não fosse o caso do
progressividade não era incompatível com a noção de 'capacidade
IPTU, este não seria inconstitucional.
econômica', defendendo que as diferenças de alíquotas por razões extra-
O clima emocional criado em torno do novo IPTU culminou com o
fiscais (como a promoção do uso social da propriedade), sempre haviam
apelo do jurista Celso Bastos 73, que conclamava a população a se
existido. Argumentava que a Constituição Brasileira determina que os
organizar
impostos tenham caráter pessoal e que sejam graduados segundo a
(JT:04.01.92,p.7?). Bastos invocava o Artigo 156, parágrafo 1° da
capacidade econômica do contribuinte sempre que possível. Os
Constituição Federal que ditaria que “o IPTU só poderia ser cobrado de
impostos indiretos , como ICMS e o IPI não podem ser graduados
forma progressiva no tempo para assegurar o cumprimento da função
e
queimar
os
carnês
do
IPTU
em
praça
pública.
social da propriedade.” [sic] 71Parágrafo 2o- O imposto previsto no inciso 3o (IR): 1.será informado pelos critérios da generalidade, da universalidade e da progressividade, na forma da lei”, determinando o parágrafo 1o do artigo 156 que: O imposto previsto no inciso 1 (IPTU) poderá ser progressivo, nos termos da lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade, complementado pelo artigo 182, parágrafo 4o: É facultado ao Poder Municipal mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento sob pena, sucessivamente, de: 2. impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo.” (FSP:22.02.92, p.1-3). A questão do condicionamento do imóvel a ser taxado dentro do âmbito do Plano Diretor chegou a ser utilizado como arma para o não pagamento do imposto, pois o estatuto legal do Plano que então regia a cidade (de 1975) era dúbio. O governo Erundina tentava, sem sucesso, aprovar uma proposta própria de Plano, Jânio Quadros já havia feito o mesmo.
72Esta
é uma das razões por que é relativamente fácil pagar baixos valores no caso de desapropriações: o proprietário tendo declarado que o valor venal do imóvel era inferior ao real, por oportunidade das declarações de imposto de renda ou pagamento de IPTU, termina recebendo menos por seu imóvel. 73Professor de Direito Constitucional na PUC-SP, Direito Tributário na UNESP e Diretor Geral do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
108
Dalmo de Abreu Dallari 74, jurista, defendia a competência do
Até o dia 14 de fevereiro de 1992, 880 Ações, entre cautelares,
Superior Tribunal Federal na decisão da Constitucionalidade do IPTU
ordinárias, mandatos de segurança e depósitos, haviam sido remetidas às
progressivo. Lembrava (como fará Marilena Chauí), que o projeto do
12 varas da Fazenda Pública, mais do que o total de ações de todo o ano
IPTU havia sido regularmente aprovado na Câmara da cidade de São
anterior, quando a prefeitura teria enfrentado apenas 787 ações. Os
Paulo, após um longo debate. Invocava o mesmo Artigo 156, par. 1° ,
especialistas acreditavam que cresceria o número de ações a cada ano, se
mas interpretando-o diferentemente de Bastos. Segundo Dallari, o texto
persistisse o critério de aplicação de alíquota progressiva. Previa-se um
rezaria que “o imposto previsto no inciso 1 [IPTU] poderá ser progressivo,
aumento ‘descabido’ dos valores do IPTU, que poderiam mesmo
nos termos da lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função
ultrapassar os valores dos imóveis em questão. O tributarista Ives
social da propriedade.” (FSP:27.03.92, p.1-3), interpretação que difere
Gandra, um dos articuladores do movimento anti-IPTU na imprensa,
totalmente da de Bastos. Dallari invoca também o artigo 182 da
considerava a manutenção da alíquota progressiva um ‘autêntico
Constituição Federal, que trata de política de desenvolvimento urbano.
confisco’. (JT:14.02.92, p.13).
Aí se prevêem medidas que poderiam ser utilizadas em casos de imóveis
Todo este movimento gerou um forte aumento de inadimplência. Até
subutilizados ou não utilizados, ‘que não cumprissem sua função social’,
aquela data esta seria de 20%, enquanto que no ano de 90 teria ficado
com pena de, entre outras medidas, a cobrança de imposto progressivo
entre 5 e 10%, subindo para 15,5% em 1991.
no tempo. (idem). Dallari conclui daí que o ‘problema’ do IPTU não
Apesar do crescimento do ‘calote’, o secretário municipal das
existiria: “Em conclusão, do ponto de vista estritamente jurídico, não
Finanças, Almir Khair calculava que o imposto deveria render aos cofres
existe o problema do IPTU. Esse foi instruído por lei municipal, por critério progressivo, considerando o patrimônio imobiliário como sinal de capacidade econômica, tudo como prevê e autoriza a Constituição Federal.”(FSP:27.03.92, p.1-3.) 75 74Advogado, professor de Direito na Faculdade de Direito São Francisco, ex-Secretário dos Negócios Jurídicos da Prefeitura de São Paulo (Adm. Luíza Erundina) e expresidente da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo. 75A Constituição Brasileira define em seu artigo 156, parágrafo 1° que “O imposto previsto no inciso I [propriedade predial e territorial urbana] poderá ser progressivo, nos termos da lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade”. Este parágrafo estabelece a progressividade, mas não define se
progressividade no tempo ou progressividade de valores. O artigo 182, parágrafo 4, entretanto, é específico: “É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de : I- Parcelamento ou edificação compulsórios; II - Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbano progressivo no tempo.” As análises legais conduzidas basearam-se no artigo 182, enfatizando a inexistência de lei federal que regulasse a progressividade. Entretanto, a progressividade expressa ali é a progressividade no tempo. A progressividade pretendida pela adm. Erundina era a progressividade de valores da alíquotas, que iriam de 0,2% a 5%, no caso de terrenos desocupados. Esta interpretação estaria de acordo com o artigo 156, segundo Dalmo de Abreu Dallari, que distinguia a progressividade para fins de punição para imóveis sem função social (subutilizados) e a progressividade como medida de política tributária(FSP:22.11.96, p.3-10
109
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
públicos cerca de Cr$ 1,4 bilhão (valores de julho de 92). Esta quantia,
Cr$140 bilhões. Entretanto, os mais beneficiados seriam poucos, pois
em termos reais, superaria todas as receitas anteriores geradas pelo
2/3 do IPTU eram pagos por apenas 2% dos imóveis.
IPTU. (FSP:17.02.92, p.1-7) A situação de grande tensão 76 levou a então Prefeita Luíza Erundina a se pronunciar publicamente pela televisão no dia 13 de fevereiro de 1992, quando defendeu o aumento do IPTU. 77 A primeira grande derrota com relação ao novo IPTU foi a liminar concedida pelo Tribunal de Justiça do Estado, determinando valores reduzidos para o IPTU. O Tribunal frisou que sua decisão nada tinha a ver com o mérito do aumento, mas com as conseqüências sociais possíveis. Amir Khair , então Secretário Municipal das Finanças do governo Erundina, via na operação, favorecimento aos ‘poderosos’, os grandes proprietários, cujas alíquotas passariam a meros 0,2%, “quebrando”, segundo o secretário, com a receita da Prefeitura, cuja arrecadação passaria dos previstos Cr$719 bilhões (valores de janeiro de 92), para
76Os altos valores do IPTU causaram cenas de violência ou expressão de insatisfação em muitas cidades brasileiras, independentemente da orientação política de seus mandatários. Este foi o caso de São Vicente(PFL), do Guarujá, de Londrina e de Campinas, onde organizações representativas do empresariado reivindicavam a redução do IPTU para prédios comerciai e industriais, indo contra o aumento da alíquota de 2% para 3,5%, além de reajustes que chegavam, segundo algumas fontes, a 2.000%(JT:14.02.92, p.13) 77Na mesma ocasião, acusou o descontrole inflacionário pela desorganização da economia, descontrole para o qual o IPTU não contribuiria. Afirmou que a campanha movida contra o imposto era ‘sensacionalista’ e tinha um caráter político. Lembrou que tinha dificuldades em conseguir verbas dos governos estadual e federal, fato agravado pela dívida deixada por administrações passadas . Reafirmava a posição de seu governo de que ‘os ricos deveriam pagar mais’.
110
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
“Nós quem, cara pálida?”78 “Mas a impressão que se tem, ao se ouvir as rádios, ao se ler os jornais, é a de que são todos os cidadãos paulistanos que sofreram o aumento de impostos.”
M
arilena Chauí, então secretária da Cultura da administração
Erundina,
viu
no
parecer
do
Tribunal de Justiça do Estado o “desnudamento do compromisso do poder Judiciário estadual com interesses do poder econômico, fato gravíssimo
numa república fundada na separação dos poderes e na imparcialidade da lei.”
Luiz Carlos Bresser Pereira, in “O IPTU e os Ricos”, FSP:17.02.92,
Chauí cria que a “gritaria” em torno do IPTU forjava “a ideologia de
p.1-3.
um coletivo anônimo, o ‘nós lesados’, que conseguiu fazer com que até os isentos do IPTU se sintam ‘revoltados’ com a injustiça feita aos ricos.”(FSP:19.02.92, p.1-3), já que o aumento no IPTU penalizava em
“Parabéns pela manifestação patriótica perfeitamente aplicável aos governos Estadual e Federal. Precisamos realmente nos organizar e dar um basta ao desmando, exploração e falta de respeito com a população.
especial os grandes proprietários e proprietários de terrenos vazios ou sub-ocupados à espera de valorização. Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro da Fazenda no governo Sarney, empresário e professor da FGV indica que, graças à aplicação do
Lidere esse movimento, estou ao seu lado para tudo o que vier,
mecanismo da progressividade no imposto, o novo IPTU incidiria
mesmo que sejamos taxados de subversivos, o importante é que nos
fundamentalmente
rebelemos e façamos um boicote. Um dia os traidores hão de ter
aproximadamente 2.241.000 contribuintes à época, os 500 mil mais
vergonha na cara e lutar por seus direitos.”
pobres estariam isentos e os 50 mil mais ricos pagariam apenas 60% do valor
carta do Sr. Gattaz Gamen Sobrinho, de São Paulo, ao JT:14.02.96, p.14.
total.
“São
sobre
esses
os
50
mil
grandes
que
contribuintes.
protestam
agora,
Dos
falando
indevidamente em nome de 2 milhões.” (FSP:17.02.92, p.1-3). A administração alegava que os 20.000 maiores contribuintes do IPTU (apenas 0,91% do total de 2, 2 milhões), pagariam em torno de 43% do total da arrecadação esperada. Destes, 18,3% viriam de imóveis
78Título
do artigo de Marilena Chauí, FSP: 19.02.92, p.1-3.
111
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
residenciais, 61,75% de comerciais e 19,87% de terrenos livres.
inadimplentes em tempo hábil, já que as execuções judiciais só tomariam
(JT:17.02.92, p.12). A reação das elites se fez imediatamente.
lugar após o término do mandato de Luíza Erundina (JT:19.02.92, p.11).
Seu primeiro passo foi estender o ‘problema’ para as classes médias, indicando a suposta injustiça na taxação de uma classe já excessivamente penalizada pelas altas taxas de inflação da época e atrelando a discussão ao questionamento ético das ações da prefeita. Criou-se uma ‘Brigada de Resistência ao Confisco’, organizada pelos vereadores oposicionistas (PDS, PL, PSDB, PMDB, PTB 79), visando uma redução do IPTU em termos reais. Delfim Netto (então deputado federal pelo PDS-SP) chamaria o aumento de ‘escorchante’, e atentaria para os ‘inevitáveis’ repasses de preços para os aluguéis, o que certamente prejudicaria as classes mais baixas. Estendia a problemática para além dos grandes proprietários, que a prefeitura dizia ser os únicos penalizados. Delfim Netto identificava a ação da prefeitura com um ‘conluio contra a sociedade’, onde se pretendia que o estado fosse ‘senhor’ desta sociedade, e não seu ‘servo’, atribuindo a ação ao compromisso com o pagamento dos salários dos funcionários públicos municipais. (JT:11.02.92, p.16). De fato, tendo a Prefeitura seu cronograma de obras atrelado à arrecadação do imposto (que representava 15% da arrecadação tributária na época) e sendo aquele um ano eleitoral, logo se viu a importância política da questão. Propunha-se a inadimplência em massa como forma de pressão, alegando-se que a Prefeitura não teria como processar estes 79Os partidos de sustentação da administração Erundina na Câmara eram : PT, PTB (dividido), PCB, PCdoB, PMDB(dividido) e PV (que no caso do IPTU, votou contra o projeto municipal).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
‘O IPTU e os ricos’80
L
112
Estudos do Dieese 82 indicam que mais da metade dos impostos incide sobre bens e serviços, representando 40% da arrecadação nacional total (FSP:19.02.92, p.1-3). Estes impostos são pagos pelo contribuinte no ato
uiz Carlos Bresser Pereira, identifica na violenta reação
da compra do produto ou da prestação de serviço. 83 Os trabalhadores
contra o aumento do IPTU uma estratégia das elites, que
são os mais prejudicados, pois gastam boa parte ou a totalidade de seus
seriam
de
salários com a manutenção da vida, enquanto que os investimentos da
impostos, utilizando todos os expedientes legais à sua
classe média em cadernetas de poupança e outros mecanismos, e o
disposição para não fazê-lo. Esta atitude das elites estaria
grande capital dos investidores financeiros, é pouco tributado. Além
profundamente enraizada na cultura brasileira. Bresser chama a atenção
disso, ainda segundo o Dieese, os empregados que ganham de 10 a 15
para um “crescimento excessivo do Estado” o que teria causado
salários mínimos mensais têm carga tributária proporcionalmente maior
distorções no volume de impostos necessários para sua manutenção, mas
que aqueles que ganham 100 salários mínimos, indicando um paradoxo
em última análise acusa as elites pela falência da máquina administrativa,
nas políticas sociais do país.(OESP:09.12.93, p.B-8). Assim, quem ganha
levando-a à ‘insolvência’ com sua recusa de pagar impostos. “E neste
um salário mínimo, gasta até 30% deste com os impostos indiretos,
campo foram os ricos, mais que qualquer outro grupo, que tudo fizeram
enquanto que alguém que ganhe 100 salários mínimos gasta menos de
absolutamente
resistentes
ao
pagamento
para limitar ao máximo sua contribuição fiscal” (FSP:17.02.92, 80Título
p1-3.) 81
do artigo de Bresser Pereira.(FSP:17.02.92, p.1-3). 81Bresser Pereira afirma que, entre 1930 e 1980, a América Latina teria se desenvolvido, apesar de tudo, “utilizando como principal motor do desenvolvimento o Estado. Este, embora não fosse capaz de arrecadar impostos nos volumes necessários, e muito menos de assegurar progressividade ao imposto arrecadado era capaz de obter poupança forçada: 1. Através do confisco de receitas de exportação de produtos primários, como o café; 2. Através da criação de fundos de previdência e capitalização, que nas primeiras décadas de sua existência são estruturalmente superavitários. 3. Através do imposto inflacionário; 4. Através da criação de impostos indiretos especiais vinculados e 5. Através do lucro de empresas estatais monopolistas.” Segundo Bresser Pereira, ao esgotarem-se estas fontes de poupança privada, o velho modelo de desenvolvimento apoiado no Estado teve uma sobrevida graças ao endividamento externo. “Esgotada também essa fonte de receita, sobreveio a crise”. A saída para esta crise seria o pagamento de impostos pelas elites. (FSP:17.02.92, p.1-3) A carga tributária brasileira é baixa se comparada com a de outros países. Enquanto esta carga no Brasil é de aproximadamente 25%, a média nos países desenvolvidos é de 39%. No Brasil, o volume de impostos corresponderia a 23% do PIB, enquanto que na Argentina seriam 25%. Nos países industrializados, esta taxa salta para 43,7% na França, 29,9% nos EUA e 31,3% no Japão. (OESP:09.12.93, p.B-8).
5% com os mesmos impostos. (FSP:19.02.92, p.1-3). Marilena Chauí também aponta para a resistência das elites ao pagamento de tributos diretos, apontando para as altas taxas de sonegação e o grande número de subsídios e incentivos que acabariam ‘devolvendo’ parte dos impostos a estas elites 84 (FSP:19.02.92, p.1-3).
82Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos. países centrais, a maior arrecadação adviria de impostos sobre renda e lucro. Assim, enquanto no Brasil a tributação sobre renda e lucro é responsável por apenas 16,6% da arrecadação, nos EUA ela é responsável por 42% do total, enquanto que nos países onde reinou, até a pouco, o welfare state, como a Austrália, a Finlândia, a Dinamarca, etc, esta taxa passa dos 50%. 84Como no caso dos plantadores de cana no NE. 83Nos
113 A concepção que se fazia a elite sobre o caráter do imposto indicava sua aversão à taxação, desconsiderando qualquer progresso social que pudesse advir da redistribuição da renda por via fiscal: “(...)É imoral e iníqua, do ponto de vista substantivo, quando as alíquotas progressivas
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Inflação e Recessão: instrumentos de chantagem
são distribuídas com a deliberada disposição de transformar o IPTU
“Se a indústria é onerada, o povo é que paga.”
numa espécie de punição de quem, por esforço próprio, conseguiu adquirir um imóvel de melhor qualidade.” (Desembargador Odyr Porto,
Mário Amato, então presidente da FIESP. JT:12.02.92, p.12
JT:20.02.92, p.4).
E
ntre as entidades que contestavam o aumento estavam a Federação do Comércio e das Indústrias do Estado de São Paulo, a Associação Comercial de São Paulo, o Instituto de
Engenharia, o Sindicato da Indústria da Construção Civil e o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de São Paulo (SHRBS). Suas ações incluíram desde sugestões para o parcelamento do valor, descontos para pagamentos à vista, ações na Justiça, até desobediência civil, queima pública dos carnês de pagamento e greve. (FSP:11.02.92, p.4-4). No caso da FIESP, a ameaça de repasse do tributo para os preços representava argumento de grande força numa época onde a inflação beirava os 460% (JT:10.02.92, p.11 e JT:11.02.92, p.16-17.). Mario Amato, da FIESP, escreve advertindo sobre o risco de quebra de empresas, devido à exiguidade dos prazos, o que impediria as empresas de acumular caixa para o pagamento do imposto. Seus argumentos vão desde o desemprego gerado pelo fechamento de indústrias até o
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana “desestruturamento
do
setor
organizado
da
produção”
[sic]
(FSP:19.02.92, p.1-3).
114
É clara a manipulação dos agentes econômicos sobre os fatores psicologicamente mais relevantes para a população: o desemprego, a
A FIESP, a Federação do Comércio, a Associação Comercial e o
recessão e o aumento da inflação já penalizavam por demais os
Sindicato Têxtil de Fiação e Tecelagem do Estado de São Paulo
moradores de São Paulo naquela ocasião. Os artigos de Paulo Maluf e
colocaram seus próprios departamentos jurídicos à disposição dos
Delfim Netto atacavam uma outra questão: o do privilégio e da
associados que quisessem recorrer à Justiça contra o imposto.
ineficácia supostamente reinantes na máquina municipal, de quebra
(JT:12.02.92, p12.).
minando as iniciativas públicas de subsídio ao transporte e reposição
A reação imediata da administração foi parcelar os pagamentos, revisar as freqüentes distorções e erros no cálculo dos valores e
salarial do funcionalismo municipal, bastante devassada durante a gestão Jânio Quadros.
reafirmar sua posição em favor de uma maior taxação dos grandes proprietários, cerrando a fiscalização em torno dos 20 mil maiores contribuintes do IPTU. (JT:12.02.92, p.11). Paulo Salim Maluf, então presidente do PDS, declarava que em lugar de aumentar o IPTU, a prefeitura deveria cortar despesas, citando o caso da CMTC, que segundo Maluf tinha 18 mil funcionários no início da administração, então teria atingido 28 mil funcionários. Para Maluf, ao dar empregos a seus simpatizantes, a prefeitura geraria uma queda de
Na ‘contramão’ das opiniões
S
urpreendentemente, a Associação Paulista de Empreiteiras de Obras Públicas (Apeop), através de seu presidente, afirmava que a correção do IPTU era necessária e justa. Se o aumento da
Prefeitura parecia exagerado, também seria errada a liminar do
produtividade nos serviços públicos. (FSP:17.02.92, p.5-3). A este
presidente do tribunal de Justiça do estado, que havia limitado a
diagnóstico, Delfim Netto emprestaria o peso de seu nome no artigo
correção a um única alíquota, a menor possível. A Apeop defendia uma
“Senhores
solução negociada entre Executivo e Legislativo.
públicos,
escravos
privados”
(JT:18.02.92,
p.7),
onde
deplorava o sentimento estatal corporativista, que, segundo Netto, criava
As empreiteiras estavam operando então com 40% de sua capacidade
‘um dos aspectos mais dramáticos da realidade brasileira atual’, qual seja,
e um número de empregados quase igual ao do início de 1982. A brutal
os “privilégios e altos salários dos empregados do poder público”,
queda na arrecadação prevista pela prefeitura se aprovada a redução do
enquanto o setor privado seria ‘envergonhado e humilhado’ pelo reajuste
IPTU inviabilizaria as obras já contratadas pela administração(entre as
menor dos salários.
quais estavam a pavimentação de 500 km de ruas e o recapeamento de
115
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
mais 400, o maior programa de pavimentação em 20 anos, segundo a
Em defesa do IPTU
própria Apeop). A instituição também previa mais negócios naquele que seria um ano de eleição, mas avaliava que até então a reforma tributária da Constituição de 1988, que havia liberado mais recursos para as prefeituras, só havia servido para ‘inchar a máquina administrativa’ (OESP:18.02.92, p.7), obrigando as empreiteiras a financiar as obras públicas com dinheiro próprio ou a captar recursos no exterior. Paralelamente ao anúncio da Apeop, a administração Erundina paralisava todas as obras e convocava uma reunião com as empreiteiras, buscando seu apoio.(FSP:18.02.92, p.3-4)
Na
análise
de
Ricardo
Semler
(FSP:16.02.92,
p.1-9.),
empresário e industrial, o aumento no IPTU teria sido motivado pela grande defasagem nos valores e por uma
busca de recolocação da taxa em seus níveis históricos, tendo em vista a virtual ‘falência’ do caixa da administração paulistana. Este tipo de imposto representaria de 30 a 50% dos impostos municipais arrecadados em países desenvolvidos, enquanto que no caso paulistano, esse índice não passaria de 7%. Esta necessidade de atualização dos valores é utilizada pelo empresário para justificar o aumento e questionar a idéia de que este teria sido engendrado puramente por motivos eleitoreiros, como alegavam seus detratores. Indicava que as ações até então tomadas contra o IPTU por setores do empresariado e da política tinham como objetivo claro inviabilizar a candidatura de Eduardo Suplicy (PT) à prefeitura de São Paulo. (FSP:16.02.92, p.1-9) 85. De fato, a análise da arrecadação do IPTU entre 1978 e 1992 mostra que o nível de arrecadação proposto por Erundina bastava apenas para 85De
fato, o Jornal da Tarde publicaria mais tarde, em editorial, que: “(...)a prefeita Luíza Erundina errou duas vezes na tentativa de iludir o contribuinte paulistano. O primeiro erro foi ter usado uma questão que interessa de perto aos paulistanos de maneira claramente demagógica, com o único objetivo de conseguir votos para o seu candidato, o senador Eduardo Suplicy, (...)felizmente a manobra foi logo percebida pelos eleitores.” (JT:06.10.92, p.4). Cabe notar que esta lógica encerra também o raciocínio de que, se o IPTU não fosse aprovado, Eduardo Suplicy não seria eleito. A reportagem é de mais de um mês antes do segundo das eleições, quando se decidiu a vitória de Maluf.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
116
colocá-lo próximo aos níveis da administração de Olavo Setúbal (1975-
respondem por 67% da arrecadação do IPTU. Os 33% restantes estão
1978). Nas administrações seguintes, Reynaldo de Barros (79-82), Mário
divididos
Covas (83-85) e Jânio Quadros (86-88), os valores arrecadados decaíram
dezembro de 1992 fez-se um levantamento que demonstrava que o IPTU
continuamente até atingirem os patamares mais baixos entre 1988,
seria um dos impostos que menos pesaria nos gastos familiares da
último ano da administração Jânio Quadros, e 1989, o primeiro ano do
família de classe média paulistana. De fato, o IPTU inicialmente
governo Erundina, para então se recuperarem em ritmo acelerado.
proposto pela administração Erundina tomaria apenas 1,4%
(FSP:13.02.92, p.4-4.)
orçamento familiar. Com a decisão desfavorável do Tribunal Estadual de
Marilena
Chauí
justifica
o
novo
IPTU
da
seguinte
maneira
(FSP:19.02.92, p.1-3):
entre
98%
dos
contribuintes.”
(JT:03.09.92, p.1). Em
do
Justiça este percentual teria caído para menos de 1,2% 86. (FSP:23.12.92, p.3-3).
1- O IPTU é imposto direto e não indireto. Desta maneira, incidiria
Contrariamente às teorias de que o IPTU teria feito parte de uma
de maneira mais justa sobre aqueles que têm real capacidade econômica,
operação de toma-lá-dá-cá na Câmara Municipal, como defendido pelo
sem incidir sobre o salário e tampouco sobre a inflação. (Esta
Jornal da Tarde, a reforma tributária proposta pelo Poder Executivo
justificativa é coerente com a idéia da adm. de Luíza Erundina de que ‘os
municipal teria sido “parte da proposta do orçamento-programa para o
ricos devem pagar mais’.)
ano de 1992. Foi apresentada à Câmara e discutida em 21 audiências
2- Conseqüentemente, o imposto, neste caso, é redistribuidor de recursos. 3- A receita gerada pelo IPTU permanece na cidade, ao contrário de alguns outros impostos, e garante a autonomia do município. 4.- O IPTU seria dividido em 10 parcelas, equiparando-se a tarifas usuais como água ou luz.
públicas com os cidadãos e reformulada a partir das críticas, demandas e reivindicações surgidas. (...) Foi transformada em Projeto de Lei e enviada à Câmara Municipal em setembro de 1991. De acordo com a lei Orgânica do Município, o projeto foi submetido pelos vereadores a novas audiências públicas e só então levado à votação numa sessão pública que durou 27 horas.” (FSP:19.02.92, p.1-3)
5.- Faz com que os benefícios da qualidade de vida possam ser estendidos a todos pelo Poder Público, que investiria na qualidade e na ampliação dos serviços públicos. Além disso, segundo a própria administração, como já foi dito, “entre os 10 milhões de habitantes de São Paulo, apenas 2,2% dos contribuintes
86Uma
família média paulistana gastaria aproximadamente 10,86% de sua renda mensal com as tarifas públicas mais comuns, como água, luz e telefone, segundo a mesma pesquisa. Pesquisa encomendada pela Prefeitura à Research International.
117
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Os resultados de uma estratégia
Uma
O então procurador geral de Justiça, Antônio Araldo Dal Pozzo, foi o responsável pela liminar que congelou a cobrança do IPTU progressivo. Dal Pozzo depois integraria a equipe do Governador Estadual Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB), aumentando as suspeitas de uma
declaração de Walter Feldman, presidente municipal
do
PSDB
à
época,
resume
admiravelmente o caráter de toda a ‘Batalha
do IPTU’: “Vai ganhar esta eleição [para prefeito] quem tiver mais clareza para criticar este aumento”. (FSP:17.02.92, p.1-7). Segundo Feldman, a guerra do IPTU inviabilizaria uma possível aliança entre PT e PSDB. “Queremos distância do PT”. Suas palavras indicam claramente os rumos da estratégia adotada pelos partidos de oposição à administração petista. Ao tomar o IPTU como ‘cavalo de batalha’, visavam criar um fato mobilizador da opinião pública na imprensa, fato catalisador e facilmente identificável pela maioria dos eleitores. Ao fazer parecer que o IPTU seria mais oneroso para as classes médias, reconhecidamente formadoras de opinião, acabou por mobilizar toda a opinião pública contra o projeto da Prefeitura, ainda que o imposto, de fato, fosse mais elevado apenas para uma parcela mínima da população, a mais rica. Esta parcela estaria assustada principalmente com a progressividade do imposto no caso de terrenos vagos, o que dificultaria em muito as operação de especulação imobiliária na cidade.
interferência do Ministério Público no sentido de tirar recursos da administração municipal e impedir que Luíza Erundina fizesse seu sucessor na Prefeitura de São Paulo. (OESP:13.11.96, p.C1). Longe de ser uma manobra que visava apenas deter o aumento de um imposto qualquer, salvaguardando o direito que as elites brasileiras se arrogam de não pagá-los, as ações contrárias ao novo IPTU produziram, na prática: 1-O esvaziamento dos fundos previstos para a realização de obras e manutenção das despesas da Prefeitura num ano eleitoral. Lembremonos que o Ministério Público reduziu a alíquota à menor possível (0,2%), diminuindo efetivamente a arrecadação em relação ao ano anterior. A transferência dos fundos prevista na Constituição de 1988 ainda não havia se completado. 2-A polarização das opiniões contra mais um ‘abuso’ do Poder Público, numa época de grande desprestígio deste em todo o país. Sublinhou-se a mensagem de que o Poder Público ‘só serviria para atrapalhar’ as atividades daqueles que realmente estariam interessados em trabalhar, os empresários, levando a um prejuízo geral, como nos faz
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
118
entrever a frase de Mário Amato 87. Isto contribuiu ao clima geral que
inclusive ‘moralmente’, de ataques contra o não pagamento de impostos,
rezava que o Estado deveria interferir menos na economia.
já que agora isto se justificaria em nome de uma alegada ‘liberdade para
3-Ao ideologizar a questão, ao mesmo tempo em que dizia combater
produzir’.
a “ideologia petista”, forjou um discurso onde o IPTU aparece como
4- Inviabilizou a candidatura Eduardo Suplicy (PT) à Prefeitura de
mais um grilhão fiscal numa sociedade já castigada pela inflação,
São Paulo, abrindo caminho para o discurso liberalizante e anti-estatal
passando ao largo do sentido social do imposto e, de quebra, indispondo
de Paulo Salim Maluf.
a população contra qualquer imposto direto. Estes teriam meramente um caráter confiscatório. Esta operação possibilitou à elite proteger-se,
87“Se a indústria é onerada, o povo é que paga.” (JT:12.02.92, p.12) Um dos canais abertos pelo Jornal da Tarde abertos às vozes contrárias ao IPTU teria sido a ‘campanha’ Menos Imposto e Mais Trabalho, indicando o teor do discurso favorável ‘à produção’. O Jornal da Tarde foi o grande porta-voz daqueles que repudiavam o novo IPTU. (O jornal O Estado de São Paulo também se posicionou contra o imposto, mas suas reportagens tinham um tom bastante menos emocional, Entretanto, focou quase exclusivamente os aspectos desfavoráveis do imposto, adotando a visão das elites sobre ele.) Em algumas ocasiões, suas reportagens adquiriam um tom bastante emocional, como neste exemplo:
“Maria de Lourdes Monteiro, 55 anos, aposentada por invalidez, chegou ontem logo cedo, na Secretaria de Finanças da Prefeitura, atrás de alguém que resolvesse seu problema com o IPTU. Apoiada em uma bengala - ela sofre de esclerose múltipla, doença degenerativa que afeta o sistema nervoso central - a mulher contou a história para o guarda da portaria. O homem foi falando: “Nem adianta entrar que isso não tem solução.” Maria de Lourdes insistiu. Foi até um guichê, repetiu a queixa e até chorou. “Eu estava muito nervosa.”, conta. “A moça que me atendeu foi atenciosa, mas também não me deu nenhuma esperança.” Reportagem de Marinês Campos para o Jornal da Tarde, organizador da campanha “Menos Imposto e Mais salário”, contra o IPTU. JT:14.02.92, p.15.
Milton Santos recorre a Lindbeck para afirmar que “a dramatização que é feita sobre ‘problemas específicos e concretos’ que atraem e fixam a atenção sobre aspectos geralmente menores dos eventos” negando uma visão mais abrangente das coisas e dos fenômenos aos cidadãos comuns. (Santos, p.17).O papel da imprensa, freqüentemente apresentando uma visão fragmentada da realidade, ampliando certos aspectos e desprezando outros, contribuiu para a alienação geral em relação aos aspectos políticos da ‘Batalha do IPTU’.
119
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Uma reviravolta nos discursos
em geral. Em resposta aos protestos, a equipe econômica de Maluf introduz um ‘desconto’ de 400 UFMs (Unidades Fiscais do Município) para o pagamento do imposto (FSP:22.12.92, p.3-4). O ‘desconto’ seria
“Considerando-se que foram exatamente as bancadas do PDS e do
equivalente a uma isenção para 50 % dos imóveis paulistanos, que teriam
PL, juntamente com a do PSDB, as que mais se opuseram à atual
preço de mercado inferior a 400 UFMs 89. Entretanto, a arrecadação,
administração com relação a esse tributo, conclui-se que deve haver
mantida a progressividade, cairia somente 19,6%.
algum engano nessas publicações.”
737 mil proprietários veriam seus impostos aumentados, o que engendrou analises como a de Ricardo Amaral, analista de marketing,
Eduardo Pacheco e Silva in “O Novo Prefeito e os Impostos
que declarou: “Os vereadores não podem aprovar essa proposta, pois ela
Municipais”, OESP:10.12.92, p.2.
vai penalizar a classe média muito mais do que o IPTU que Erundina
Ao
queria cobrar.” (OESP:18.12.92, p.3) De fato, se a proposta de Maluf findar a administração petista, o Prefeito eleito,
deixava fora do pagamento um número maior de contribuintes através
Paulo Maluf, declarou que a arrecadação do
do mecanismo do ‘desconto’, a alíquota de 0,6% incidia também sobre
IPTU em 1992 teria sido ‘pífia’ (apenas 120
um número muito maior de contribuintes, que antes pagariam apenas
milhões) e lançou uma proposta, segundo a qual a
0,2%. 90 Por outro lado, manteve-se as altas alíquotas previstas pela adm.
arrecadação em 1993 atingiria o teto de US$587 milhões, quase 5 vezes a
Erundina para os imóveis de maior valor.
arrecadação de 1991. A proposta da adm. Maluf retomava a idéia da progressividade, com alíquotas que variariam entre 0,6% e 1% 88, propondo a redução da alíquota para uma faixa dos imóveis comerciais. Esta proposta não foi bem recebida na Câmara, e dividiu os vereadores de partidos que antes haviam atacado o IPTU da adm. Erundina, incluindo os próprios aliados de Maluf (OESP:18.12.92, p.3). A avaliação era de que o novo imposto sacrificaria as residências de alto padrão e as médias empresas, beneficiando os imóveis não residenciais 88As
alíquotas propostas por Erundina eram de 0,2% a 1%.
89A
isenção na adm. Erundina era até o teto de 280 UFMs.
90
Proposta de Erundina Alíquotas isentos 0,2% 0,4% 0,6% 0,8% 1%
Total de residências 550 mil 602 mil 435 mil 122 mil 10 mil 7 mil
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana A alíquota de 0,6%, considerada alta, foi vista como uma estratégia da administração para garantir a arrecadação caso a progressividade não fosse
aprovada. Se
a
adm. Erundina
tivesse
podido
aplicar a
120
O ‘Desenlace’
Maluf seria de US$ 349 milhões (60% da arrecadação pretendida
Ao
inicialmente), esta ainda assim triplicaria em relação a 1992, quando
aumento anual da Planta Genérica de Valores, sempre acima dos índices
teriam sido arrecadados apenas US$ 120 milhões.
inflacionários. (OESP:15.11.96, pC5)
progressividade de valores, sua arrecadação teria sido de US$ 500 milhões, a da adm. Maluf, também com progressividade seria de aproximadamente US$ 580 milhões. (FSP:18.12.92, p.3-4). No caso da não aprovação da progressividade, a arrecadação da adm.
assumir a Prefeitura de São Paulo, Paulo Maluf conservou
em
0,6%
a
alíquota
única
para
cobrança do IPTU, sem a progressividade. Porém os valores arrecadados foram superiores ano a
ano, mesmo descontada a inflação. Isso foi conseguido através do
Em junho de 1995, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou negativamente o mérito da ação direta de inconstitucionalidade da Procuradoria Geral de Justiça, que em 1992 havia suspendido a progressividade do IPTU, restabelecendo-a. Somente em novembro de 1996, a Prefeitura de São Paulo, ainda sob adm. de Paulo Maluf, tomou a decisão de cobrar US$ 400 milhões de IPTU relativo a 1992 (adm. Luíza Erundina), valor que representaria a diferença entre o IPTU efetivamente pago em 92 (US$120 milhões) e o valor lançado nos carnês naquele ano (que incluía alíquotas progressivas entre 0,2% e 5%). Segundo a adm. Paulo Maluf, este parecer obrigaria a cobrança, Proposta de Maluf Alíquotas isentos 0,6% 0,8% 1%
Total de residências 850 mil 859 mil 10 mil 7 mil
mesmo retroativa, sob pena de ação judicial do Ministério Público contra a Prefeitura de São Paulo. Somente uma anistia aprovada pela Câmara Municipal poderia reverter esta situação (já que o IPTU de cada
121 exercício
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e é
cobrado
com
base
em
lei
anual
do
município).
(OESP:13.1196, p.C1)
em si, mas, no caso do IPTU, esta dependeria de lei federal 91, ainda não aprovada. (OESP:21.11.96, p.C4).
A bancada situacionista na Câmara paulistana foi contra a cobrança,
O tributarista Ives Gandra Martins, de novo em cena, considerou a
considerando-a ‘contraditória’. O então líder do governo na Câmara,
cobrança ‘ilegal’ e ‘aética’. “Toda a campanha de Maluf foi contra o
Miguel Colasuonno (PPB) descartou a progressividade considerando-a
IPTU progressivo. Cobrar agora é imoral.” (FSP:20.12.96, p.3-1). O
uma tese ‘socializante’ (OESP: 14.11.96, p.C1). Celso Pitta, então
próprio tributarista reconheceria que a eleição de Paulo Maluf para o
candidato à Prefeitura, colocava-se formalmente contra a cobrança, pois
cargo de mandatário municipal deveu-se em grande parte a seus ataques
o IPTU progressivo ‘inibiria a formação de patrimônio’. Entretanto, a
contra o IPTU de Luíza Erundina, atribuindo a Maluf o mote “Votou no
adm. Paulo Maluf não propôs a votação da anistia que evitaria a
PT, tomou no IPTU” 92,). Gandra Martins declarou então “Ora, o mesmo
cobrança alternativa, alegando que a questão ainda estaria ‘sub judice’,
cidadão [Paulo Maluf] que atacara a prefeita Luíza Erundina, sob a
ainda que um ano já houvesse transcorrido desde a decisão do
alegação de que era arbitrária ao querer exigir um IPTU inconstitucional,
TJ.(OESP:13.11.96, p.C1). De fato, a Procuradoria Geral de Justiça
quer agora cobrar aquele mesmo IPTU que a Justiça não permitiu que a
havia entrado com novo recurso junto ao STF, que não havia se
Prefeita cobrasse, ficando com o ‘espólio’ que ajudou a torpedear para
pronunciado especificamente até o final do mandato de Paulo Maluf,
que não caísse em mãos dela durante a campanha de 1992”.
mas que ainda assim havia deixado claríssima sua posição sobre o
(FSP:23.12.96, p.1-3) Gandra Martins delineia a manobra política
assunto.
utilizada pelas forças conservadoras para garantir a eleição de Paulo
O STF já havia julgado inconstitucional a cobrança de IPTU progressivo num processo impetrado por um contribuinte de Belo Horizonte,
município
que
desde
1989
aplicava
o
princípio
Salim Maluf, privar a adm. Luíza Erundina de verbas e garantir verbas para a adm. Celso Pitta.
da
A cobrança do IPTU retroativo aparecia como uma tentativa de ‘fazer
progressividade. O Tribunal alertava que, ainda que aquela decisão não
caixa’ diante da enorme dívida contraída pela Prefeitura no período 93-
fosse válida para os demais municípios, na prática derrubava o princípio
96. O então Secretário das Finanças do Município, José Antônio de
da progressividade, pois as ações neste sentido seriam julgadas de modo
Freitas, negava a necessidade da cobrança para equilibrar as contas da
semelhante no STF. O Tribunal não julgava o mérito da progressividade 91Prevista
no artigo 182 da Constituição. verdade, título do folheto distribuído pelo vice-presidente do PRN em 1992, Walter Bolan (JT:12.02.92, p.11). 92Na
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
122
municipalidade. (OESP:15.11.96, p.C5). Entretanto, a dívida municipal
imediatamente os boletos de cobrança e preparando as medidas judiciais
durante a gestão Maluf havia crescido em cerca de 200% e deveria
de
chegar a R$6,5 bilhões 93. Em 1992, ao final da gestão Erundina, a cidade
procuradoria Geral do Município alertava que já no dia 20 entraria com
devia R$2 bilhões.(OESP:20.12.96, p.C1).
receita gerada pela
63 mil execuções fiscais e outras 974 mil até 31 de dezembro. (idem) Tal
cobrança do IPTU de 1992 permitiria que o novo mandatário tocasse
decisão foi atacada pelo STF, que considerou a atitude da adm. Paulo
algumas obras sem necessidade de recorrer a empréstimos.
Maluf ‘temerária’. O jurista Celso Bastos classificou a medida como
94A
Em 12 de dezembro de 1996, o STF deu parecer favorável a um contribuinte
de
São
Paulo
que
havia
impetrado
ação
execução
das
dívidas
não
pagas
(OESP:19.12.96,
p.C7).
A
‘marota’ e ‘insensata’.
de
inconstitucionalidade contra a cobrança da diferença do IPTU de 1992,
A votação da anistia do IPTU de 1992, incluída na pauta da sessão de
considerando o assunto encerrado, já que a decisão poderia então ser
26 de dezembro de 96 pelo Partido dos Trabalhadores, não se realizou
estendida a todos os contribuintes quando
naquela ocasião, sendo transferida para março de 1997.
julgado
recurso
na
Procuradoria Geral de Justiça do Estado.(OESP:13.12.96, p.C5 e FSP:13.12.96, p.3-6). Entretanto, cada ação movida contra a Prefeitura neste sentido teria de ser julgada individualmente, o que abria brechas para que o poder Municipal prosseguisse com a cobrança. A 18 de dezembro de 1996, a Prefeitura paulistana anuncia que começará a cobrança da diferença do IPTU de 1992, postando O valor do dólar americano equivale ao valor do real quando da redação deste TGI. perfil do endividamento municipal também teria mudado. Na administração Erundina, a maior parte da dívida era em contratos. A adm. Maluf contraiu mais débitos através das LFTMs (Letras Financeiras do Tesouro Municipal). Isto incidiria diretamente sobre os juros que a Prefeitura tem de pagar. Nos contratos assinados com os bancos nacionais e as agências internacionais de financiamento - como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento - os juros geralmente são menores do que os que a Prefeitura paga quando toma empréstimos por intermédio de um leilão de LFTMs. Durante sua administração, Celso Pitta já estaria comprometido com o pagamento de R$4 bilhões do total de 6,5 bilhões que deve a municipalidade. No primeiro ano de sua administração, 1997, 15% dos impostos que arrecadar iriam diretamente para o pagamento de dívidas. (OESP:20,12.96, p.C1) 93
94O
123
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O IPTU de 1997
IPTU prevista para 1997 seria de US$700 milhões.(FSP:27.12.96, p.3-5,
D
etc .)
isputas internas no PPB pela liderança da Câmara atrasaram a votação do IPTU para 1997 (com alíquota única de 6% e aumento na Planta Genérica de Valores de 10%) até o último minuto. As disputas incluiriam
o
atraso
na
votação
como
uma
demonstração de força do grupo ‘rebelde’ do PPB (favoráveis à continuação de loteamento de cargos nas Administrações Regionais). Finalmente, em 27 de dezembro de 1996, a Câmara Municipal aprovou em segunda votação, a alíquota de 0,6% do IPTU para 1997. Embora a alíquota fosse idêntica a de 1996, seria aprovado um reajuste entre 10% e 12% na Planta Genérica de Valores, tabela de índices de valores imobiliários que serve de base sobre a qual é calculado o valor venal de cada imóvel. Esta porcentagem seria equivalente à inflação do ano de 1996 (fixada oficialmente em 9,2% pelo IBGE), sendo o reajuste feito por decreto do poder executivo (a câmara não precisa ser consultada para o reajuste da Planta Genérica) 95.
A arrecadação do
95A imprensa registrou os procedimentos pouco usuais utilizados para a votação do IPTU para 1997: “A votação de ontem foi tumultuada. O presidente da Câmara e dirigente da sessão plenária, Brasil Vita (PPB), aprovou o projeto em questão de segundos. Todas as frases regimentais, obrigatórias durante a votação, foram proferidas por Vita em seguida, sem intervalos para que os vereadores oposicionistas pudessem se manifestar. (...) Parte da oposição afirmou que estudaria a hipótese de recorrer à Justiça para impugnar a sessão. As chances de vitória são remotas. Em casos semelhantes, no passado, a Justiça não julgou esses pedidos por não se sentir ‘apta’ para arbitrar questões regimentais específicas de uma casa legislativa.”(FSP:28.12.96, p3-1).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Parte 4: A Nova Cidade
125
A P r o d u รง รฃ o d o Espaรงo Urbano n a N o v a C i d a d e
A Nova Cidade
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana “(...)A idéia de que nós estamos diante de uma cidade cuja adaptação aos dois grandes momentos do capitalismo que a cidade
126
processo, a que poderíamos chamar simplesmente “o estágio atual do modo de produção capitalista” 96.
viveu, o primeiro surto dos anos 20 e o segundo dos anos 50...e hoje
Há fortes oposições, hoje, sobre a validade da própria expressão
quando a cidade caminha para uma situação terciária, onde a perda
Globalização. É inegável que as acelerações do mundo contemporâneo
de postos industriais parece ser já uma marca importante, a volta
teriam mudado qualitativamente o caráter das transações internacionais,
aos
ainda que, como nos indica Paulo Nogueira Batista Jr, os países centrais
espaços
centrais
se
coloca
como
um
dado
extremamente
importante, fechamento de um ciclo. O aparelhamento da cidade de
não
São
investimentos no 3 o Mundo ou nas suas taxas de importação de
Paulo
para
fazer
parte
desta
constelação
de
Cidades
Mundiais...ela almeja este papel e tem condições para tê-lo.”
tenham
apresentado
variação
percentual
importante
nos
produtos, conservando bem protegidos seus mercados, sua indústria e seu controle sobre as tecnologias.(FSP:17.10.96, p.2-2). Estaríamos, assim, muito longe da descrição apologética que, segundo a análise de
Regina Maria Prosperi Meyer in “BrásMitte: Workshop no Instituto Goethe”, São Paulo, 11 de julho de 1996.
Leda Paulani, reza que a Globalização decorreria, da “extensão, para um mundo
‘sem
fronteiras’,
dos
benefícios
do
círculo
vicioso
da
concorrência-produtividade-crescimento da riqueza.” A Globalização, de qualquer maneira, representaria a falência de um modelo baseado na
Introdução
regulação fordista, no controle keynesiano de demanda efetiva, no
“A
Resenhas:08.11.96, p.5).
desmanche do Estado de Bem-Estar Social, etc. (Paulani, Jornal de
Globalização é filha legítima da lógica e da história
Como nos indica Milton Santos, a ideologia da Globalização serve para
do capital.” Assim José Carlos Braga (FSP:
levar alguns países, entre os quais o Brasil, a se alienar completamente
01.09.96,
da condução de seu destino e da construção de um projeto nacional.
p.5-3),
economista,
define
este
fenômeno que se impõe em quase todos os
(FSP:13.10.96. Cad. Mais! ).
aspectos da vida neste final de século. É portanto na própria lógica interna do sistema capitalista que encontraremos as raízes deste 96Devo
esta definição à Prof a da FAUUSP, Dr a Rebeca Scherer.
127
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
No texto utilizamos a expressão Globalização para definir, como já se disse, não o processo de integração das economias mundiais ‘num mundo sem fronteiras’, mas a construção ideológica que quer dar conta dos fenômenos contemporâneos de enfraquecimento dos Estados e dos projetos
nacionais,
principalmente
nos
países
periféricos,
e
os
fenômenos conectados no campo do trabalho, da produção e da mobilidade do capital. No que tange a construção do espaço urbano, sabemos que os diversos fenômenos que definem a etapa atual da produção capitalista e outros fenômenos correlatos, contribuem para determinar o caráter da metrópole, orientando as políticas públicas e conformando os processos sociais que em última análise são a própria cidade. Tais fenômenos não são de todo inéditos, mas representam de alguma forma a intensificação de processos que vêm conformando a metrópole neste século. A criação de novos espaços é engendrada por estes fenômenos sociais, políticos e econômicos a que se convencionou chamar Globalização, e que, ao contrário do que sugere seu nome, tem grandes especificidades em cada lugar do planeta.
A Aceleração do Mundo Contemporâneo
De
maneira geral, a segunda metade do século XX assiste a uma inédita ‘aceleração’. Milton Santos define as acelerações como ‘momentos culminantes na História’, que abrigariam
‘forças
concentradas,
explodindo para criar o novo’ (A Aceleração Contemporânea, p.15). Nossa época seria caracterizada pela multiplicação e confusão dos signos, “após havermos vivido o tempo dos deuses, o tempo do corpo e o tempo das máquinas.” (idem, p.15). Santos alerta para a tentação de nos tornarmos, como no tempo das máquinas, adoradores da velocidade. Segundo Santos, não deveríamos limitar-nos à velocidade strictu-sensu, pois se a aceleração contemporânea impôs novos ritmos ao deslocamento dos corpos e ao transporte das idéias, teria também acrescentado novos itens à história, como a nova evolução das potências e dos rendimentos, o uso de novos materiais e de novas formas de energia, a expansão demográfica, a expansão
urbana
e
a
explosão
do
consumo,
acompanhada
do
crescimento exponencial do número de objetos e do arsenal de palavras. Santos considera, entretanto, o conhecimento, “causa próxima ou remota de tudo isso”(idem, p.16), a grande maravilha do nosso tempo. A aceleração contemporânea seria, por isso mesmo, um resultado também
128
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana da “banalização da invenção, do perecimento prematuro dos engenhos e de sua sucessão alucinante. São na verdade, acelerações superpostas, concomitantes, as que hoje assistimos.” (idem, p.16). O espaço se adapta à nova era. ‘Atualizar-se’, afirma Santos, seria sinônimo da adoção dos componentes que fazem de uma determinada fração do território o locus das atividades de produção e das trocas de alto nível, por isso consideradas mundiais. Estes lugares seriam os espaços hegemônicos em que se instalariam as forças que regulam a ação em outros espaços. (idem, p.17). Estes conceitos são importantes para o entendimento dos fenômenos que passaremos a descrever e que conformam a chamada Nova Cidade, espaço de trocas de alto nível e de controle da reprodução material do capitalismo tardio num território muito maior.
Mudanças nos Meios de Reprodução do Capital
Em
termos gerais, o final dos anos 70 assistiu à crise dos modos
de
gestão
centrados
no
Estado
e
à
reestruturação da divisão espacial do trabalho,
tornando o desemprego e a insolvência pública o centro das preocupações de muitas sociedades. Houve uma diminuição progressiva na ênfase do consumo de massa e a “energia dos movimentos sociais organizados, direcionada a essas demandas, reflui”. (Refinetti Martins, p.8). A partir da década de 80, haverá uma reação do sistema econômico, que se reorientará em direção a políticas chamadas neoliberais 97, significando especialmente a redução nominal da intervenção Estatal na economia e numa significativa redução do próprio Estado como regulador dos movimentos de troca em detrimento de uma prerrogativa maior para as grandes empresas transnacionais na condução da economia, o que se reflete na desregulamentação progressiva nas 97Paulo
Nogueira Batista Jr, professor da FGV, nota que “Em se tratando de ‘neoliberalismo’, por exemplo, a primeira tarefa da crítica deveria ser a de recusar a mitologia construída em torno de um conjunto de idéias ultrapassadas (...).A própria etiqueta neoliberal é enganosa (...). Confere status de novidade a um fenômeno que representa uma volta ao passado e que não incorpora nada de fundamentalmente novo ao velho liberalismo.” (FSP:05.12.96, p.2-2). Aqui, utilizaremos o termo neoliberal somente para distinguir as idéias liberais inseridas no fenômeno de intensificação e aceleração da reprodução do capital no final do século.
129
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
relações de produção e trabalho, nas privatizações e na relativa abertura
como a pulverização da produção e da pesquisa e a utilização de novas
dos mercados. O panorama econômico hoje estaria dominado pelos
tecnologias e métodos gerenciais inspirados em modelos japoneses 100.
oligopólios mundiais. Estes grupos delimitariam espaços bem definidos,
A utilização destas novas tecnologias, como a automação de linhas de
protegidos da concorrência, mas também espaços de cooperação,
produção, e a adoção de novas táticas gerenciais, como o ‘downsizing 101‘,
quando isto se faz necessário. “Indóceis e fora do alcance das regulações
significaram o corte de muitos postos de trabalho, incrementando uma
e controles nacionais, esses poucos grupos dominam a economia
tendência geral de redução dos quadros de trabalhadores nas indústrias.
mundial, comandam setores inteiros e produzem, pela lógica cega que
O valor do trabalho é substituído por um novo conceito: a produtividad e 102.
preside
por
A redução dos próprios custos do trabalho (seguridade social,
deslocalizações industriais ávidas de custos de mão-de-obra reduzidos e
incentivos, licenças) é um componente importante no conjunto de
a
seus
movimentos,
uma
nova
situação
marcada
desregulados, pelo caráter rentista 98 da riqueza, pela indistinção entre indústria, serviços e finanças e pela dominância inconteste da dimensão financeira de valorização”. (...) “O espaço da economia é o espaço mundial, de modo que os processos econômicos não podem mais ser considerados a partir de suas arenas nacionais” (Paulani, Jornal de Resenhas: 08.11.96, p.5). Ainda que se possa argumentar que há uma grande distância entre a retórica neoliberal e a prática nos países onde essa ideologia teve origem 99, há uma redefinição clara das relações capital-trabalho através da terceirização e da flexibilização da produção, através de mecanismos
98De
‘renda’. Nogueira Batista Jr demonstra que, se houve desregulamentação de mercados, dos sistemas financeiros, privatizações, etc, a presença estatal aumentou na grande maioria dos países desenvolvidos a partir da década de 80. Nos EUA e Japão, por exemplo, o gasto público total passou de 31% do PIB, em 1978-81, para 34% em 199295.(FSP:05.12.96, p.2-2.) 99Paulo
100Michael
Piore e Charles Sabel, do MIT, falam num novo modo de produção que estaria tomando forma: a economia flextech, baseada em conceitos ‘quentes’: descentralização, ‘terceirização’, des-hierarquização, integração de concepção e execução, coordenação espontânea, módulos intercambiáveis, sistemas de aprendizado, etc . (Roberto Campos, FSP:13.10.96, p.1-4) 101 Termo gerencial para o corte do número de funcionários de uma empresa visando elevar sua performance administrativa e a produtividade. 102A ‘produtividade’, intrinsecamente ligada ao conceito de ‘competitividade’. Nos dias de hoje, segundo nos diz Milton Santos, a competitividade toma como discurso o lugar que ocupava o progresso no início do século e o Desenvolvimento, no pós-guerra (A Aceleração Contemporânea, p.p.18-19). Santos alerta, entretanto para o caráter ‘a-ético’ da busca da competitividade. “Antes (...) o debate era filosófico, teleológico. A noção de Progresso, lembra Daniel Halevy, comportava também a idéia de progresso moral. O debate sobre desenvolvimento (...) tinha um forte acento moral.(...) Mas a busca da competitividade, tal como apresentada por seus defensores - governantes, homens de negócio, funcionários internacionais -, parece bastar-se por si mesma, não necessita qualquer justificativa ética, como, aliás, qualquer outra forma de violência.” (A Aceleração Contemporânea, p.p.18-19) No caso brasileiro, e no paulistano em particular, a produtividade vem crescendo continuamente nos últimos anos. O índice de produtividade da indústria paulistana aumentou 45,6% entre janeiro de 1990 e junho de 1996. Isso significaria ganhos de 6,5% ao ano na relação produto por trabalhador, segundo dados do Decon-Fiesp. Segundo o Ipea, este ganho anual estaria por volta de 5%. Entre 1945 e 1980 os índices foram decrescentes. (OESP:26.11.96, pB1). Ainda que os postos de trabalho diminuíssem na indústria automobilística, esta bateu recordes de produção em 1996, caso das fábricas da Volkswagen e GM, que produziram juntas mais de meio milhão de veículos. (FSP:26.12.96, p.2-9)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
130
estratégias que visam a reverter a compressão dos lucros (Refinetti
apenas 6,38% da população economicamente ativa (PEA), segundo
Martins, p.9), o que incluiria também a produção flexível, o ‘downsizing’
dados do IBGE, porém na região metropolitana de São Paulo este
e a terceirização de serviços, etc .
número chegaria a 14% (1996) 103. Este estado de coisas parece ser fator
Leda Maria Paulani, da FEAUSP, define as principais característica da
estrutural do novo padrão de acumulação capitalista: as vendas das 200
atual etapa do sistema capitalista como a destruição do Estado do Bem-
maiores companhias do mundo, todas instaladas em países centrais,
Estar social, o colapso das regulações nacionais, a financeirização da
equivale a mais de 25% da atividade econômica mundial (Instituto de
riqueza, um imenso processo de concentração e centralização de
Estudos sobre Política, EUA). Estas mesmas empresas em conjunto
capitais, desemprego e exclusão social acentuada.(FSP:27.10.96, p.5-5).
oferecem 18,8 milhões de empregos, ou menos de 0,25% da força de
“A menor relevância das fronteiras nacionais e a existência de empresas
trabalho mundial. (OESP:03.11.96, p.A3.). Neste contexto, a competição
sem pátria não teriam como resultado a extensão, para todo o planeta,
entre as cidades para a instalação de sedes de empresas ou mesmo
das benesses do dinamismo e do desenvolvimento material e tecnológico
plantas industriais se vê intensificada ao extremo.
propiciados pela economia de mercado. Decorrentes de um profundo
Paralelamente, prospera o capital de cunho especulativo, com
processo de centralização e concentração do capital em nível mundial e,
aplicações em fusões de empresas e aquisições, empreendimentos
fundamentalmente, decorrentes de modificações substantivas nas formas
imobiliários especulativos e aplicações em bolsas de valores dos
de inserção e operação dos grandes grupos empresariais, tais fenômenos,
chamados “mercados emergentes” (países do Terceiro Mundo com
contrariamente,
de
industrialização relativamente recente), o que teria resultado num
estreitamento e afunilamento, não só dos espaços, mas principalmente
aumento insignificante da base produtiva na maioria destes países. 104 De
das populações que são (ou serão) objeto de um desenvolvimento
fato, Leda Paulani, ao comentar François Chesnais, indicam que “os
material expressivo.” (Paulani, Jornal de Resenhas: 08.11.96, p.5)
traços mais característicos da mundialização, porém, (...)não estão no
estariam
indicando
um
visível
movimento
Este ‘afunilamento’ traduz-se, entre outras coisas, no desemprego.
comércio
internacional,
mas
na
predominância
dos
movimentos
Este tornou-se um dos maiores fantasmas deste final de século: hoje, mais de 1 bilhão de pessoas são excluídas do mercado de trabalho no mundo segundo dados da Organização Internacional do Trabalho. Este número representaria mais de 30% da força de trabalho mundial (OIT, FSP:27.11.96, p1-2, etc ). No Brasil, o desemprego atingiu em 1996
103Este
índice é de 11,3% nos países da Comunidade Européia. Contrastando com o IBGE, o SEADE apontou que em março de 1996, 16% da mão de obra disponível no país estaria inativa. (FSP:30.12.96, p.1-3) 104No caso brasileiro, estes capitais especulativos encontrarão o caminho das Bolsas, extremamente lucrativas. (US$ 8,8 bilhões em 18 dias de negócios em dezembro de 1996. OESP:28.12.96, p.B8) Nelas atuarão os chamados Fundos de Pensão, que passarão a ter participação agressiva nos investimentos financeiros e imobiliários.
131 transnacionais de capital e na hipertrofia da dimensão financeira.” (Paulani, Jornal de Resenhas: 08.11.96, p.5).
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e A Globalização reveste-se de um caráter inequivocamente ideológico ao fazer crer que seus benefícios são igualmente repartidos entre todos
Para Sandra Xavier 105, geógrafa, o capital domina o terciário, a
os países. Afinal, como nos lembra Alain Touraine, “soa mais elegante
produção científica e a difusão das informações, a chamada ‘produção
dizer que a Coca-Cola, a CNN ou a Microsoft são empresas globais,
imaterial’. A desconexão entre as empresas e os países onde estão
antes de ser norte-americanas, o que entretanto elas não deixaram de
instaladas cria uma enorme mobilidade para este capital, facilitando os
ser.” (FSP:14.07.96, p.5-6).
mecanismos de investimento e desinvestimento 106.
Se por um lado houve uma grande expansão do investimento direto 108
Na atual fase do capitalismo, a produção se pulveriza, buscando mão
total, ao ritmo “alucinante” da Globalização dos negócios, como se
de obra mais barata, fácil acesso aos insumos e estabilidade política e
apressam a indicar os defensores da ‘nova ordem’.(FSP:25.09.96, p.2-14),
social. Componentes diversos de um mesmo produto são fabricados em
por outro, do total de US$ 315 bilhões investidos em 1995,
partes diversas do Globo. Numa economia ‘globalizada’, onde o
aproximadamente 68% foram investidos nos próprios países centrais. Os
transporte de mercadorias de um ponto a outro do planeta se faz com
investimentos em países ‘emergentes’ foram de aproximadamente US$
facilidade, as unidades produtivas são cada vez menores, tornando a
100 bilhões (32% do total). “Quando são objetos de tais negócios e
produção mais flexível e competitiva. Isso torna mais fácil a adaptação
quando não se resumem eles a simples operações de aquisição/fusão,
às novas exigências de demanda, com estratégias produtivas como o ‘just
vale dizer, quando se trata efetivamente de investimentos criadores de
in time’ 107.
nova capacidade produtiva no Terceiro Mundo, o que os determina é o
105Sandra
Xavier, Palestra INFURB: Globalização. Agosto de 1996. 106O fenômeno da rápida migração de capitais pelas bolsas de valores mundiais culminou na crise mexicana de 1994, quando a crise de confiança dos investidores no mercado mexicano significou a transferência imediata de bilhões de dólares para mercados considerados mais seguros. Falou-se num efeito em cadeia que significaria a retirada dos investimentos estrangeiros dos mercados latino-americanos, significando a quebra das economias regionais e, em última análise, uma nova grande crise financeira no mundo capitalista, semelhante ao grande ‘crack’ da bolsa nova-iorquina de 29, o que não se concretizou graças à maciça ajuda norte-americana ao mercado mexicano. Hoje, fala-se num efeito preventivo daquela crise, impedindo o surgimento de outras. Entretanto, o governo brasileiro ainda insiste na criação de mecanismos internacionais de controle de fuga de capitais especulativos das bolsas, indicando a fragilidade da situação brasileira neste quadro. 107Produção de bens controlada para atender a demanda imediata, reduzindo os custos com produtos não vendidos ou armazenamento).
nível extremamente reduzido dos custos de mão-de-obra aí existentes.” (Paulani, Jornal de Resenhas: 08.11.96, p.5) Os países centrais são assim a origem e o destino preferenciais dos investimentos diretos. Mesmo a aplicação de capital direto não garantiria sua permanência neste ou naquele país, já que tais investimentos estariam pulverizados 109 108Dinheiro
que segue para o setor produtivo e não para aplicações financeiras. Brasil foi o segundo maior receptor na América Latina, após o México, com investimentos da ordem de US$ 4,9 bilhões, apenas 1 , 5 % do total de investimentos mundiais. Já em 1996, o Brasil assumiria a liderança dos investimentos na América Latina, com investimentos de US$ 7,5 bilhões (FSP:25.09.96, p.2-14). Ângela Bittencourt assina matéria onde alega que os investimentos já anunciados no país, 109O
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
132
e as remessas de capital permaneceriam 110. As grandes empresas não mais
desenvolvimento no país, calculando que o Brasil entraria no próximo
construiriam dispendiosas sedes administrativas, optando por alugar
século com níveis de aplicação industrial comparáveis percentualmente
escritórios ‘inteligentes’, facilitando sua mudança para outra cidade ou
aos países desenvolvidos. Hoje, o setor industrial brasileiro contribui
país em casos onde isso fosse necessário. Quanto às unidades
com 20% da verba para P&D, segundo estudos da UNICAMP, CNPq e
produtivas, a pulverização garantiria a possibilidade de interrupção da
Anpei (Associação Nacional de Pesquisa das Empresas Industriais),
produção e um rápido ‘desinvestimento’ sem grande prejuízo para a
contra 57% da União e 23% dos Estados 112. (FSP:02.01.96, p.2-2).
produção global. Além disso, há um enorme disparate entre as políticas
A crescente terceirização dos serviços contribui para a redução nos
de pesquisa e desenvolvimento e os valores investidos pelas grandes
custos, mas também permite que o peso dos encargos sociais e a
corporações para o desenvolvimento de novos produtos e tecnologias
impopularidade causada pelas demissões em massa não mais atinjam as
nos países centrais e periféricos 111. Francisco Romeu Landi, da FAPESP,
corporações. Demissões e encargos passam a ser responsabilidade de
observa que “a crença em que uma sociedade precisa investir em
uma
pesquisa e desenvolvimento para manter sua competitividade é um dos
pulverização da capacidade de organização dos trabalhadores e uma
paradigmas do breviário do desenvolvimento social”. (FSP:02.01.97, p.2-
diluição das demandas comuns, com a conseqüente diminuição da força
2). Landi é otimista quanto à evolução dos investimentos em pesquisa e
dos sindicatos tradicionais. 113
incluindo empresas nacionais e estrangeiras (nem todos concluídos ou em andamento) seriam da ordem de US$ 141 bilhões. “Os investimentos em infra-estrutura tomam fôlego na esteira dos projetos de setores de produção intensiva. Especificamente na infra-estrutura, sete setores justificam 302 empreendimentos anunciados neste ano, que demandam US$ 52 bilhões. Os dois principais focos de interesse das empresas públicas e privadas que atuam predominantemente em parceria - são telecomunicações e energia elétrica. Em menor escala, mas ganhando corpo, estão os projetos de infraestrutura rodoviária e portos.” (OESP:01.12.96, p.B11). 110Em dezembro de 1996, foram despachados para o exterior US$ 5,4 bilhões, segunda maior taxa registrada. (OESP:28.12.96, p.B8) 111Os gastos com pesquisa e desenvolvimento do setor público nos últimos anos foram de apenas 0,5% do PIB em países da América Latina, contra 2,6% dos países desenvolvidos. No caso do setor privado, os investimentos latino-americanos corresponderam a 36% do total investido pelos países centrais. (FSP:03.11.96, p.2-2). No Brasil, estes investimentos se equipararam a 0,6% do PIB, em contraste com os EUA, onde este valor foi de 2,4% do PIB, Japão (2,7%), Alemanha (2,5%) ou França (2,4%). (FSP:02.01.96, p.2-2)
112Nos
multiplicidade
de
firmas contratadas. Na
prática, há
uma
EUA a indústria contribuiu com aproximadamente 59% da verba de pesquisa e desenvolvimento. 113A fábrica de caminhões da Volkswagen, inaugurada em novembro de 1996 em Resende (RJ) é considerada pelos movimentos sindicais uma ameaça ao atual modelo de representação trabalhista. (FSP:02.01.97, p.2-5). A fábrica incorpora o ‘consórcio modular’, sistema que modifica o processo de fabricação em uso, trazendo para dentro da fábrica os vários fornecedores. Cada empresa é alojada em um local específico da fábrica, assumindo a responsabilidade por sua parte no processo de montagem do veículo. O resultado é uma fragmentação da força de trabalho: dos mil trabalhadores, apenas 20% pertencem à própria Volkswagen. Paulo Bresciani, técnico do Dieese, considera que “O novo sistema radicaliza a terceirização da produção e obriga os trabalhadores a repensarem sua estratégia de atuação”. (idem) Sugere-se a criação do ‘sindicato orgânico’, que reúne todos os trabalhadores em uma única entidade. O cientista político Leôncio Martins Rodrigues, da UNICAMP, considera que tal iniciativa aumentaria em muito o poder dos sindicatos junto aos componentes do sistema decisório: Executivo e Congresso Nacional. (FSP:02.01.97, p.2-5)
133
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O lugar de São Paulo na ‘Globalização’
em 1967) se constituem em dois fatores fundamentais para a ‘financeirização’ do espaço brasileiro, segundo Cordeiro, e sua integração com o espaço financeiro mundial. A partir destes e de outros
fatores
estruturantes,
teriam
se
desenvolvido
na
região
Metropolitana de São Paulo as condições que a capacitaram a exercer o
S
egundo Helena Kohn Cordeiro, nos anos 80 a aceleração das
papel de ponto articulador da rede de ‘cidades mundiais’ em território
conquistas tecnológicas e as novas técnicas gerenciais, entre
brasileiro. “Assim, as grandes redes bancárias paulistanas estão entre as
a
grandes responsáveis por essa ‘financeirização’, pois das duas dezenas
interdependência entre as economias centrais e de alguns países em
de redes que atingiram a escala nacional, 12 estão sediadas no centro
desenvolvimento, entre eles o Brasil. Cordeiro chama a atenção para as
metropolitano de São Paulo.” (A ‘Cidade Mundial’, p.321). Aliada a
diferenças na resolução dos problemas da economia mundial adotadas
este fator, e na esteira da melhor infra-estrutura de comunicação e
pelos diversos países, de acordo com as características internas de cada
transportes, houve um aumento do número de escritórios centrais de
economia, o arranjo institucional entre empresariado e Estado, o
grandes empresas transnacionais.
outros
fatores,
teriam
intensificado
a
solidariedade
e
estágio de industrialização alcançado, etc ...(A ‘Cidade Mundial’ de São
Ao mesmo tempo em que ocorre uma desconcentração relativa do sistema produtivo, ocorre o fortalecimento da concentração do sistema
Paulo, p.320) O setor financeiro teria se tornado, neste período, “o integrador
de gestão do setor transnacional da economia, tendo a região
da
metropolitana paulistana como líder do conjunto metropolitano
transnacionalização do mercado de capitais e da reestruturação do
brasileiro. Como razões para esta liderança, Helena Kohn Cordeiro
capital
destaca:
fundamental em
do escala
sistema global,
econômico através
da
mundial, reciclagem
através do
capital
“a
maior
concentração
populacional
relativa
entre
as
acumulado”.(idem, p.320). o capital financeiro teria vindo a dominar a
metrópoles brasileiras, abrigando uma das maiores massas operárias do
economia internacional, tendo a chamada ‘cidade mundial’ como sua
globo (...), a maior produção nacional brasileira do setor secundário
articuladora básica, isto é, antes da produção propriamente dita.
(...), a maior concentração relativa de sedes das maiores empresas
A reforma do sistema financeiro nacional (1964/65) e a expansão da
nacionais e internacionais de todos os setores da economia (...), a
rede nacional de telecomunicações produzida pela Embratel (fundada
maior concentração relativa das sedes de corporações financeiras nacionais com redes de escala nacional (...), a maior concentração de
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana sedes de instituições financeiras internacionais do país, algumas das quais possuem redes nacionais (...), a maior concentração relativa de investimentos estrangeiros no país (o maior montante do patrimônio líquido de empresas de capital multinacional no país) (...)” , entre vários outros fatores. (A ‘Cidade Mundial’ e São Paulo, pp.322-323).
134
A Globalização e a Metrópole
E
sta reestruturação da produção, com ênfase nas atividades do setor terciário tem impacto imediato sobre o ambiente urbano. A adequação deste ao novo quadro produtivo depende de parcerias entre o poder público e a iniciativa privada, ambos interessados em
dotar a cidade da infra-estrutura de espaços e serviços úteis para o capital. A mudança da base produtiva, com ênfase no setor terciário, gera desemprego e insegurança. “(...) [A ] ampliação da participação do setor terciário (serviços) na composição do emprego tem impacto cada vez mais substancial sobre a organização das cidades. Dentre os serviços, as atividades financeiras apresentam um peso específico, gerando comportamentos econômicos, reestruturações urbanas e mesmo novas formas culturais que não decorrem da flexibilidade industrial.” (Refinetti Martins, p.10). Tal fato adquire uma importância inusitada quando constatamos que a indústria detém hoje somente 23% dos empregos na grande São Paulo. Desde 1989, sua participação na composição do emprego vem caindo, em favor do setor terciário, que hoje teria 48,8% do postos de trabalho 114. (SEADE/Dieese, 1996). 114A
migração do emprego para o setor terciário representa também uma mudança no caráter do próprio vínculo empregatício. O trabalho estável e registrado vai dando lugar a ocupações autônomas ou temporárias de grande rotatividade. “Boa parte das pessoas que perderam emprego na indústria tiveram uma inserção precária no mercado de
135
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
No “rearranjo espacial do sistema capitalista, as grandes corporações
A propósito do Projeto Megacidades, Fany Davidovich destaca que a
localizaram suas subsidiárias principalmente nas metrópoles dos países
inserção de cidades do Terceiro Mundo nesta rede vem acompanhada de
periféricos, onde encontraram as mais favoráveis condições para a
uma vertente ideológica, “na medida em que, para países do Terceiro
reprodução do seu capital. Ao mesmo tempo, aí implantaram as sedes de
Mundo, ela é interpretada como uma garantia de ingresso no Primeiro
gestão dos seus negócios. Formaram-se os elos de uma cadeia seleta de
Mundo”. Tal vertente pode ser encontrada também na defesa de São
metrópoles, onde se realizam o controle e o comando do mercado
Paulo como Cidade Mundial. Esta construção é questionável através da
capitalista no plano global: são as Cidades Mundiais”. (Cordeiro, p.319).
análise de fluxos de capital e de remessas de lucros, que mostram
São Paulo seria uma destas Cidades Mundiais 115.
claramente as relações de subordinação existentes 116. Se Xavier observa
trabalho, no setor de serviços” (Pedro Paulo Martoni Branco, Fundação SEADE, FSP:19.12.96, p.2-1.) Entre 1989 e 1996, foram extintos 350 mil postos de trabalho na indústria metal-mecânica, que hoje emprega 600 mil pessoas na Grande São Paulo, segundo o SEADE. Segundo a entidade, 34,2% dos ex-metalúrgicos migraram para o setor de serviços. Outros ramos da indústria teriam absorvido 14% daquela mão de obra. Dos 30% restantes , metade está inativa ou aposentada. A outra metade vive de ‘bicos, enquanto busca um novo emprego. (FSP:19.12.96, p.2-1) 115Entre as Cidades mundiais podemos destacar: • As Cidades Mundiais de comando: Londres, Nova York, Frankfurt, Tóquio, Paris, Los Angeles, Chicago etc . • As Cidades Mundiais dos países ditos Tigres Asiáticos, vinculadas a capitais japoneses, americanos, britânicos e chineses: Hong Kong, Seul, Taipé, Cingapura, Jakarta, Bangcoc. Tóquio mantém a liderança deste grupo, mas a inserção das diversas cidades não obedece o mesmo padrão. Seul, notadamente, procura independência em relação a Tóquio no tipo de inserção na divisão mundial do trabalho, entretanto os capitais permanecem japoneses. Hong Kong é a capital financeira do Sul da Ásia, servindo de ponte para a economia da China Continental com o resto do mundo. Cingapura é um poderoso entreposto comercial e financeiro. Taipé apoia suas políticas em confrontos com a China comunista e aposta na produção de bens de consumo que inundaram o mundo com a marca Made in Taiwan. Jakarta é a capital de um país populoso e fechado, cujo mercado interessa aos investimentos ocidentais e orientais. • Cidades Mundiais do Terceiro Mundo que comandam grandes mercados, mas são subordinadas aos capitais dos países centrais: Cidade do México (México, América Central e Norte da América do Sul, Zona do Caribe), São Paulo (Centro-Sul da América do Sul, em competição com Joanesburgo pelo controle do Atlântico Sul, o que incluiria os investimentos nas ex-colônias Portuguesas), Bombaim (subcontinente indiano e alguns países limítrofes, ex-integrantes do Império Britânico no
Sub-continente indiano), Cairo.(Norte da África e países árabes membros da Opep), Joanesburgo (África negra). O Rio de Janeiro se insere como metrópole ‘complementar’ a São Paulo, formando com esta a megalópole sul-americana. Buenos Aires parece ter perdido qualquer pretensão ao comando continental, ainda que apareça como centro industrial, artístico e cultural importantíssimo (Recentemente a casa de leilões Christie’s de Londres anunciou a instalação de uma filial nesta cidade, indicando o peso de seu mercado artístico e de comércio de antigüidades, remanescentes do período áureo da capital portenha.) • Outras Cidades Mundiais: Toronto (comando do processo canadense, atrelado aos capitais americanos), Barcelona , Milão, Marselha (centros regionais importantes da Bacia do Mediterrâneo, comandam processos menores. Milão/Turim, no entanto, afirma-se como centro difusor de tecnologia e design. Tel-Aviv divide com o Cairo o comando de alguns processos no Oriente Médio, mas perde para aquela por questões políticas. Santiago, Bogotá e Caracas são centros subordinados na América do Sul, com destaque para Santiago que se firma como ponte com a comunidade dos países do Pacífico. Moscou e Pequim tem papéis sui-generis na condução de processos de capitalização de economias de grande potencial, com destaque para a China, a grande questão do próximo século. A pequena Zurique tem grande comando dos capitais europeus, além de servir de refúgio para as grandes fortunas (algumas vezes ilícitas) do mundo. Claro está que este conceito embute também relações de subordinação, vantagem ou desvantagens comparativas, etc. 116Gilson Schwartz, analisando relatório da OMC (Organização Mundial de Comércio), destaca que o maior receptor de investimentos industriais são os Estados Unidos, seguidos de Grã-Bretanha e França . Schwartz chama a atenção para o fato da ‘Globalização’ em território brasileiro se dar quase que exclusivamente em função das decisões das multinacionais aqui instaladas (remetedoras de capitais para seus paísessede), e não propriamente das políticas federais de câmbio, abertura econômica “ou
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
136
que a ênfase já não está na dominação de uma nação em relação a outra
produção industrial e gestão empresarial. A metrópole não necessita
(como na era dos impérios), mas de certos espaços em relação a outros,
mais ser contínua e compacta, mas heterogênea e polinucleada, graças à
independentemente das fronteiras nacionais, aqueles fluxos de capital
maximização do uso da infra-estrutura, ao adensamento das ‘redes’ de
sugerem a permanência do controle do processo capitalista nos centros
empresas e da infra-estrutura de comunicação.
tradicionais.
Sabemos que São Paulo sempre exerceu um papel central de
Para Xavier, “não se pode pensar a metrópole só do ponto de vista
coordenação dos interesses capitalistas no Brasil, primeiro como
interno. Não se fala mais em território de influência da metrópole, mas em
coordenadora do capital cafeeiro, e mais tarde como sede de empresas
rede de influência de uma metrópole, rede esta que desconhece as fronteiras
multinacionais que aqui produziam seus produtos, mas também com
transnacionais.”
(a
uma rede de suporte a estas indústrias, representada por uma rede
uma
secundária de indústrias de apoio à produção. Na economia globalizada,
‘desterritorialização’ ou desenraizamento. De acordo com esta análise,
onde a figura do Estado Nacional dá lugar às cidades como unidades
São Paulo não deve mais ser entendida somente em referência ao Estado
políticas mais competitivas e menos comprometidas com estratégias
Nacional, mas em relação ao sistema urbano mundial. A função da
nacionais, São Paulo aparece como centro organizador do capital para
metrópole, para Xavier, é ‘integrar’ o país ao processo de Globalização,
toda a América do Sul. Sua estrutura espacial e de serviços se vê
pois as diferenças de São Paulo em relação às demais cidades brasileiras
obrigada a adaptar-se à nova realidade econômica. Torna-se uma Cidade
indica claramente sua primazia sobre elas quanto à natureza de seu setor
Mundial.
informação)
em
(INFURB: redes
Globalização).
dispensa
o
O
território,
fluxo
imaterial
engendrando
terciário e de seu crescente trabalho imaterial.
A questão agora não são as indústrias secundárias de apoio (a
Os fluxos imateriais, o controle de informação gerencial à distância
indústria nacional já ultrapassou em muito esta fase), mas uma rede de
que redefinem sua posição, redesenhariam a Metrópole, acelerando o
serviços e comunicação que torne possível esta coordenação e a otimize.
processo de metropolização. Esta ‘expansão’ urbana vincula-se à atuação
Esta rede inclui não só o suporte físico de infra-estrutura, como
de empresas oligopolistas 117, onde haveria uma divisão territorial entre
aeroportos, heliportos, terminais, etc., como também hotéis, centros de convenção, lazer e moradia para as classes que participam deste
qualquer outro fator de curto prazo”. (FSP:20.10.96, p.2-2). Este quadro indica o pouco ‘enraizamento’ do capital no Brasil e outros países considerados como ‘Global Traders’. 117Oligopólio: Situação de mercado na qual, num limitado número de produtores, cada um é bastante forte para influenciar o mercado, mas não o é para desprezar a reação dos competidores. (Aurélio)
processo 118. A criação de espaços prestigiosos e funcionais onde as 118O
que nos leva a pensar que se antes as classes mais baixas, o lúmpem, na fase do Capitalismo Clássico, tinha o papel de “exército industrial de reserva”, conservando os
137
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
atividades de coordenação possam se desenvolver incorpora-se à lógica de mercado imobiliário e às políticas públicas, que tradicionalmente acompanham
esta
lógica.
“Um
sistema
de
relações
hierárquico,
construído para perpetuar um subsistema de dominação sobre outros subsistemas, em benefício de alguns” (A Aceleração Contemporânea, p.19). Neste contexto, as administrações municipais se configuram como a instância administrativa mais competente para tomar as rápidas decisões necessárias no quadro das rápidas mudanças exigidas pela intensificação dos processos do capitalismo tardio. Poderemos acompanhar estes processos nas ações do poder público municipal na cidade de São Paulo para sua qualificação para o papel de Cidade Mundial.
A G l o b a l i z a ç ã o e os rumos das políticas municipais
Os
novos processos de reprodução material, que
se
expressam
no
fenômeno
da
Globalização, resultam num novo paradigma de desenvolvimento urbano e a grandes mudanças no perfil da administração da
cidade. “O governo local passa, cada vez mais, a investir-se do papel de empresário,
não
se
restringindo,
portanto,
à
mera
função
de
gerenciamento dos serviços. Tais percalços de autonomia se apóiam igualmente nas possibilidades de manter conexões diretas com circuitos financeiros
e
econômicos
mundiais,
sinalizando,
deste
modo,
a
fragmentação em curso do Estado central.” (Davidovich, p.314). Este esforço pela manutenção das ‘conexões diretas’, que se traduzem em investimentos e transferência de tecnologia, toma forma nas ações objetivas dos poderes municipais para adequar a metrópole às novas condições. Em debate promovido pelo jornal “O Estado de São Paulo” no dia 16 de fevereiro de 1993, Paulo Salim Maluf e César Maia, então prefeitos de salários num patamar baixíssimo através da chantagem da instabilidade no emprego, agora esta classe já não encontra função. Parece ser esta a grande pergunta a ser respondida. Que será dela? Esquecida, já é uma ameaça ao próprio sistema que a criou, representando sempre uma ameaça à paz social que o Novo Capitalismo busca para melhor se desenvolver - busca sem fazer concessões.
São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente, convergiram ao defender o aparelhamento de suas cidades para a competição pela liderança econômica na região do Atlântico Sul, posição que estaria sendo
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
138
duramente disputada com Buenos Aires, na Argentina, e Joanesburgo, na
deslocamento em função da oferta de bens culturais.” (OESP: 18.02.93,
África do Sul.
p.p. 1-3, Cad. Cidades).
César Maia buscava a saída no desenvolvimento cultural e tecnológico
Maluf, por sua vez, veria SP e Rio não como duas cidades isoladas,
da metrópole. São Paulo, segundo Maluf, deveria ser ‘exemplo de infra
mas como um eixo que tende a unir-se, reunindo algo em torno de 25%
estrutura de transportes e obras públicas’. “Só a esquerda tradicional é
do PIB brasileiro.
que imagina que se pode conseguir desenvolvimento social sem
Os dois prefeitos condicionavam a redução da miséria nas duas
desenvolvimento econômico”, afirmaria César Maia. (OESP: 18.02.93,
cidades à demonstração, pelo poder Federal, de que há “uma política
p.p. 1-3, Cad. Cidades).
clara para a economia” (Maluf). Para Paulo Maluf, a miséria só seria
O papel de Rio e São Paulo como Cidades Mundiais já aparecia
eliminada com investimento, conseguido através de estabilidade. “E vou
bastante claro para os dois prefeitos, que “(...)com base neste raciocínio
dizer mais: quem corre o risco quando vem investir no Brasil são os
inicial (...) planejaram suas administrações.” (idem, p.2) “Maluf aposta
estrangeiros Então deixa entrar.[sic] Dentro de uma regra básica, com
em investimentos no setor de transporte e obras e em ações conjuntas
uma lei boa que defenda os interesses brasileiros, deixa entrar.” 119
com o Rio no setor cultural, certo de que no futuro, São Paulo, Vale do Paraíba, Baixada Fluminense e Rio serão uma coisa só.” (idem)
Milton Santos, em A Aceleração Contemporânea, identifica no espaço, identificado com o ‘meio técnico científico’(e podemos aqui supor o
Segundo Maia, o mundo se ‘globalizaria’ tendo como base as grandes
espaço urbano) apresenta-se com um conteúdo de racionalidade, graças
cidades, não os países, e esta ‘rede’ de Cidades Mundiais seria ‘finita’.
à “intencionalidade na escolha dos seus objetos, cuja localização mais do
No Rio e em São Paulo se estariam construindo ‘tele-portos’, criando,
que antes, é funcional aos desígnios dos atores sociais capazes de uma
segundo Maia, ‘condições materiais’ para a internacionalização das
ação racional” (A Aceleração Contemporânea, p.17) Esta ‘matematização’ do
cidades. Isto não seria o suficiente, pois a chamada ‘Cidade Global’ teria
espaço, facilmente identificada na fala dos prefeitos carioca e paulistano,
de ser também um “centro de talentos, ‘locus’ de serviços avançados do
tornaria propícia a matematização da vida social, sempre conforme os
terciário superior e com propensão à internacionalização”, exigindo mais
interesses que Santos chama de hegemônicos. Assim se instalariam “não só
que a ‘instalação de circuitos eletrônicos’. “[A metrópole] só se internacionaliza quando é espaço preferencial de deslocamento dos atores relevantes, atores econômicos, atores sociais, atores políticos e atores culturais. E ela só se transforma num espaço preferencial de
119Paulo
Maluf : “(...) Qual a maneira de eliminar a miséria? É evidentemente ter uma política federal onde se olha ao mesmo tempo não os problemas fiscais somente, mas também o creditício, a política cambial, a política trabalhista, a política financeira, a política social, o todo. Há inúmeras políticas e uma coisa ;e certa e objetiva: você só cria o emprego com média US$ 50 mil de equivalente de investimento.” (OESP: 18.02.93, p.p. 1-3, Cad. Cidades).
139
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
as condições de maior lucro possível para os mais fortes, mas também as condições para maior alienação possível para todos.” (idem, p.18) Santos conclui: “Através do espaço, a mundialização, em sua forma perversa, empobrece e aleija”.(idem, p.18) É lícito concluir que as estratégias adotadas pelos prefeitos das duas ‘Cidades Mundiais’ brasileiras (que tendem a fundir-se numa só e espetacular aglomeração 120) inserem-se nesta análise, configurando um quadro onde a racionalização dos meios e maneiras de reprodução material dá lugar a análises ‘matematizadas’ da vida social, que passa a existir em função daquela reprodução. Nos espaços de racionalidade criados, o mercado, segundo Santos, torna-se tirânico e o Estado tende a ser impotente. Entretanto, vimos como, no caso paulistano e carioca, as últimas administrações, longe da impotência, vêm aliando-se ao Capital, ajudando a criar os espaços onde este
habitará
sem
constrangimentos.
Ao
mesmo
tempo,
a
espetacularização e extrema visibilidade das ações municipais ao fazê-lo contribui para a permanência desta ou daquela corrente política no poder. Lembremo-nos que tanto Paulo Maluf como César Maia elegeram seus sucessores nas eleições de 1996 através de estratégias de convencimento da opinião pública que incluíam obras de grande visibilidade e a justificativa do progresso e, antes de mais nada, da competitividade.
120As especulações e projetos sobre uma futura ligação entre São Paulo e Rio de Janeiro através de um trem rápido (TGV) trazem esta possibilidade para a pauta das ações concretas do poder público (e privado) neste sentido.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
140
Uma nova ‘centralidade’ para São Paulo
141
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Introdução
Uma definição para ‘Centro’
C
avançados, de uma infra-estrutura material, de um
P
conjunto de facilidades de comunicação e de um meio
Para a autora, o ‘centro’ é, no espaço metropolitano, o ‘exemplo mais
social que deverão estar associados aos seus centros de
significativo’ da organização micro-espacial daquele sistema.
omo vimos, “o alcance global das empresas exige da ‘Cidade Mundial’ uma ‘rede de serviços tecnicamente
ara Helena Kohn Cordeiro, a metrópole seria privilegiada pela concentração das atividades do sistema transnacional, capazes de organizar o macro-espaço, tornando-se a principal emissora
de decisões e inovações no sentido econômico, social, cultural e político.
prestígio”, (A ‘Cidade Mundial’, p.324). Vimos também como o poder
Mas qual a necessidade do ‘centro’ na sociedade da produção
público mostra-se propenso a se aliar com o capital global para a
imaterial? Cordeiro indica que, “apesar da telemática 121, os momentos de
reqüalificação, e em alguns casos radical transformação, do espaço
‘tomada de decisão’, as discussões de pesquisas científicas, a troca de
urbano para atender àquelas condições.
assuntos confidenciais de negócios são realizados no confronto face-a-
No caso paulistano, a reqüalificação e transformação do espaço
face. Entre outros, esses fatores são responsáveis pelo fortalecimento
urbano para a operacionalidade do capital global alia-se à tendência
recente dos centros metropolitanos e/ou pela criação de novos núcleos
histórica de deslocamento do centralidade da cidade em direção ao
nas metrópoles em expansão. Nesse processo, criam-se equipamentos
Oeste, fenômeno verificável já nas ações de Prestes Maia nos anos 30.
compatíveis com a expansão da cidade de capital concorrencial, ou seja,
Entretanto, veremos como a cidade não abandona seu centro, mas busca
a cidade de capital monopolista ou oligopolista - a Metrópole
novos
corporativa.” (Cordeiro, p.324) O ‘centro’ da Cidade Mundial configura-
espaços
para
a
instalação
controladoras do novo capital.
das
empresas
e
instituições
se assim segundo os ‘avanços das técnicas de manipulação de informações
e
comunicação,
ampliando
as
facilidades
para
a
operacionalização dos custos de decisão’, tornando-se assim o lugar da concentração das sedes do poder econômico. Este esforço é feito, 121De
tele(comunicação) + (infor)mática: Ciência que trata da manipulação e utilização da informação através do uso combinado de computador e meios de telecomunicação.(Aurélio)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana segundo Cordeiro, por e para as grandes empresas hegemônicas, que formariam seu ‘Complexo Corporativo’. (idem, p.324)
142
O ‘Centro’ se desloca
Até
o final da década de 60, as empresas e bancos se concentravam majoritariamente em torno do eixo da rua Barão de Itapetininga, da Praça da República até a
Praça Ramos de Azevedo. No início dos anos 70, período do ‘milagre’, a avenida Paulista toma o lugar do chamado ‘Centro Velho’ como espaço privilegiado para a instalação de sedes empresariais e bancárias, em conjunto com algumas avenidas radiais e perimetrais, como avenida Brigadeiro Luís Antônio, a Rebouças e a Nove de Julho, Brasil e Faria Lima, todas situadas ou levando para o quadrante sudoeste da metrópole. Nos anos 80 assistimos um significativo movimento de empresas em direção à Faria Lima. Mais recentemente, este movimento intensificou-se significativamente em direção à região da avenida Engenheiro Luiz Carlos Berrini, profundamente modificada pelos empreendimentos imobiliários da construtora Bratke e Collet, com a implantação de uma centena de edifícios de alto padrão. De modo geral, é para uma vasta região em torno da Marginal do rio Pinheiros que mudarão sedes de empresas e bancos, grandes escritórios e todo o equipamento urbano necessário para sua atuação, beneficiando-se da proximidade dos bairros residenciais de maior renda no conjunto paulistano e de fatores estruturais como a facilidade de acesso, a proximidade do Aeroporto de Congonhas, a facilidade de acesso ao aeroporto internacional de Guarulhos/Cumbica e a existência de
143 equipamentos importantes como a Cidade Universitária, o Shopping Center Iguatemi (de 1966), o Jockey Club, etc . Cabe destacar a instalação pioneira do Centro Empresarial de São Paulo na Marginal Pinheiros já em 1977. O Complexo Corporativo da Nova Cidade tende hoje a se deslocar para os eixos da avenida Luís Carlos Berrini e da Marginal do rio Pinheiros, onde se estabelecem os centros do controle do capital transnacional. De fato Helena Cordeiro, em pesquisa sobre a origem do capital acionário das empresas aí instaladas (1992), constata que quase metade das sedes empresariais é de grupos internacionais. (Cordeiro, p.326). Isto, segundo a autora, refletiria a importância da metrópole paulistana como Cidade Mundial e como indicativo do impacto das forças externas sobre a organização interna da metrópole (Cordeiro, p.329). As chamadas amenidades urbanas, necessárias ao estar e ao trânsito dos executivos e suas famílias (grandes hotéis, centros de compras, restaurantes de luxo) também se desloca, com destaque para a região da avenida Paulista 122, que concentra a maioria destas amenidades, que começam também a despontar no próprio sistema Marginal/Berrini.
122O número de lançamentos de flats destinados a executivos foi record em 1996 na região da Avenida Paulista).
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Poli-Centralidade
144
Ibirapuera (Sul) para o Parque Dom Pedro, em pleno coração do ‘Centro Velho 123. Aí estão localizadas, entre outras, a sede do Banespa, da Nossa Caixa, a importantíssima Bolsa de Valores de São Paulo, o
“O Teatro Municipal é lindo, por causa do aspecto de prédio
Banco de Boston, além das redações do jornal Diário Popular e da
antigo. Foi a primeira vez que vim ao Centro. É um lugar antigo.
influente Folha de São Paulo (O Estado de São Paulo tendo concentrado
No meu bairro só tem porteiro eletrônico.”
suas atividades numa área ao Norte do centro, sobre a Marginal Tietê), as estatais Telesp e a Eletropaulo. Os tradicionais Othon e Hilton estão
Ana Carolina Góes, 12 anos, moradora da Vila Leopoldina, zona
entre os grandes hotéis da região.
Oeste, in “Vá passear no Centro”, Folhinha Especial, FSP:10.01.97, p.5-
Tal importância se reflete nos recentes projetos de ‘reqüalificação’ do
5.
Velho Centro, tais como o ‘Viva o Centro’, que supostamente visariam
Em
reqüalificar o espaço degradado. 1993, em seu texto ‘A Cidade Mundial de São Paulo’,
O idéia de teria havido um ‘abandono’ do Centro velho parece estar
Helena Kohn Cordeiro observa que o núcleo
ligada a um espaço onde o controle social parece não conseguir se
financeiro que se havia esboçado na Avenida Faria
exercer da maneira como gostariam as elites (em oposição aos bairros
Lima nos anos 70 encontrava-se então ‘abortado’. (Cordeiro, p.325).
murados onde residem). Lugar de investimentos imobiliários exíguos se
Observaremos como, até 1993, os investimentos na Faria Lima, agora
comparados com os da Nova Cidade, o Centro velho, ou Centro
‘saturada’ diminuíram consideravelmente em detrimento da então nova
original, conta com espaços públicos intensamente utilizados e uma
Luís Carlos Berrini.
acessibilidade única entre as várias regiões que compõem a metrópole. A
Mas porque, em São Paulo, as grandes corporações e até parte da máquina pública, teriam afinal ‘abandonado’ o centro?
existência de uma forte rede comercial, voltada para um público de menor renda, aliada às repartições públicas e serviços onde os
Em primeiro lugar devemos notar, como o faz Cordeiro, que as
moradores menos privilegiados da metrópole tratam suas vidas, a
instituições financeiras e algumas outras instituições de peso não
existência de uma rede paralela ou clandestina de pequenos serviços,
abandonaram o Centro Velho. Ainda que o palácio do governo estadual tenha vindo instalar-se exatamente no vetor de maior valorização da Nova Cidade, o Morumbi, a Prefeitura paulistana foi transferida do
123Apenas
uma das ações visando reqüalificar o Centro promovidas pela adm. Luíza Erundina, cujo maior projeto neste sentido terá sido sem dúvida o novo Vale do Anhangabaú.
145
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
oportunidades, lugares e pessoas que oferecem ao sujeito a possibilidade de fruição, interação e vida fazem do centro um lugar privilegiado dentro da metrópole. A mitologia criada em torno da degradação do Centro, nada mais é que a falta de controle das elites sobre o espaço. Mais do que um ‘abandono’ do Centro Velho, parece ter havido um deslocamento e uma repartição das atividades entre os 3 ‘Centros’ paulistanos. À região da Av. Paulista parece ter cabido o suporte
Investimento e Nova Centralidade
esta tendência.). Os aluguéis comerciais na Avenida Paulista são,
De
entretanto os mais altos entre as três avenidas.
outros investimentos públicos. ‘O Metrô vai construir sua 4 a linha, ligando a
cultural, parte do comercial e a uma grande parte dos flats que abrigam executivos por períodos mais longos, além dos hotéis mais prestigiosos da metrópole (Maksoud Plaza, Sheraton e o novíssimo e ambicioso Renaissance. A construção do Cæsar Tower, em 1997, só vem reforçar
modo geral, é na Bacia do rio Pinheiros onde se concentram
os
maiores
investimentos
neste
sentido. “Segundo [Júlio] Neves, a Bacia do rio Pinheiros deve se transformar no novo centro de
São Paulo, não só pelo projeto da avenida [Faria Lima], mas devido a
Tais fenômenos denotam uma característica importante da Nova
Avenida Paulista à Marginal do rio Pinheiros, com uma estação no Largo da
Cidade em torno da Avenida L. C. Berrini, qual seja, a falta de espaços
Batata’, revela. ‘Além disso, a FEPASA está mudando seus trens e deve se
de fruição urbana e de circuitos peatonais, o que levaria os executivos a
transformar numa nova linha do metrô, agilizando o transporte da região.”
preferirem a avenida Paulista como lugar de estadia.
(OESP:25.04.94, p.C1). Para Neves, seria a partir do prolongamento da
Ao
sistema
Complexo
Avenida Faria Lima que se iniciaria o processo de ‘reordenação’ do
espaços
crescimento da cidade, com o exemplo da Operação Urbana. Na região
necessários ao desempenho de São Paulo como Cidade Mundial. Sua
da rua Funchal, a instalação de escritórios de grandes empresas,
qualificação corresponde ao seu “papel no contexto da hierarquia
favorecida pela Operação, daria seqüência e continuidade à tendência
funcional de todos os setores da economia e dos processos de divisão
verificada na Avenida Luís Carlos Berrini. (idem)
Corporativo
Marginal/Berrini
Transnacional,
cabe
o
comando
essencialmente
ligado
do aos
nacional e internacional do trabalho, como epicentro do capitalismo brasileiro
e
líder
do
sistema
internacionais.” (Cordeiro, p.329)
urbano
nacional
e
dos
contatos
De fato, se até 1992 o mercado imobiliário na região da Faria Lima passava por uma certa estagnação, apenas alguns anos mais tarde a
146
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana situação se inverterá radicalmente. A partir da grande intervenção promovida pela adm. Paulo Maluf (1993-96), se resgatará a avenida, agora
prolongada,
e
suas
imediações
para
os
investimentos
imobiliários. Esta estratégia visava inicialmente à ligação da Avenida Faria Lima com a Luís Carlos Berrini, formando o chamado Bulevar Sul, idealizado pelo arquiteto Júlio Neves ainda no começo da década de 90. O Bulevar Sul teria papel importantíssimo na construção da Nova Centralidade e na qualificação da cidade para seu papel como Cidade Mundial, formando com a Marginal Pinheiros um espaço privilegiado. Entretanto, as pressões da comunidade acabaram por frustrar em parte a ligação entre as duas avenidas 124.
Marginal Pinheiros: a Super Avenida
W
alter
Luís
comercial
Monteiro da
Cardoso,
Richard
Ellis
então
diretor
Consultoria
Internacional de Imóveis Comerciais, acreditava que até o final da década, 1,4 milhão m 2 de área útil seriam edificados na região da Marginal do rio
Pinheiros, o dobro do existente até então. “Pelo comportamento histórico, 70% do volume já está na Marginal e deve continuar lá, porque as outras áreas como Avenida Paulista e Faria Lima estão estagnadas.” (FSP:31.01.93, p.8-1.) 125. O desejo das pessoas de trabalhar em locais próximos de casa, deveria “levar o crescimento comercial também para bairros de classe média alta”, segundo Marcos Lopes, diretor da Lopes Consultoria de Imóveis. Uma das regiões onde o mercado deveria acompanhar o crescimento residencial seria na Barra Funda. “Deve haver uma reciclagem da região”, dizia Sérgio Pringler, da Fernandez Mera(idem), indicando a região da futura Operação Urbana Água Branca, diagnóstico confirmado 125Uma
124A
justificativa de Júlio Neves para a modificação do projeto que unia a nova Faria Lima à Luís Carlos Berrini incluía o argumento de que isto acarretaria o congestionamento da Avenida dos Bandeirantes, que então já estaria sobrecarregada com 200 mil veículos diários. A modificação do traçado visaria também a beneficiar a região da rua Funchal.(OESP:25.04.94, p.C-1)
voz apontava para outra direção. Hubert Gebara, 56, membro do conselho superior da Fenadi, achava no entanto que, paralelo ao crescimento da Marginal, deveria haver uma recuperação do Centro da Cidade. “É um fenômeno que já aconteceu em Paris, Londres, e agora em Nova York. No centro está o melhor serviço de transportes e telefonia. Sai mais barato recuperar imóveis lá do que comprar terrenos em outros locais.”(FSP:31.01.93, p.8-1)
147 por Sérgio Pringler, 49, gerente da imobiliária Fernandez Mera, segundo quem “a região da Água Branca e Sumaré também deve sofrer um processo de reciclagem - melhoria no padrão de ocupação - atingindo ainda Campos Elísios, Barra Funda e Casa Verde”. (FSP:31.01.93, p.8-1). A requalificação da Marginal Pinheiros envolveu, em 1995, um processo de licitação contestado pelas próprias entidades do setor de construção civil, que enxergavam favorecimento às megaempreiteiras, em detrimento das pequenas empresas. A reforma das Marginais Tietê e Pinheiros, num total de 74 km, envolveria verbas de aproximadamente US$ 142 milhões (JT:08.03.95, p.?, e outros). Mais um indício da construção desta nova centralidade é o enorme complexo aprovado pela Prefeitura paulistana em 18.12.96 na Marginal do Pinheiros. Trata-se de um complexo empresarial de 300 mil m 2 , que incluiria supermercado, shopping center, parque de diversões, casa de shows, hotel e a nova sede da Rede Globo de televisão na Capital. “Será o futuro centro de São Paulo” afirmou o responsável pelo projeto, arquiteto Júlio Neves. (OESP:19.12.96, p.C7). O principal investidor será o grupo Alcides Diniz, responsável por US$300 milhões. Lair Krahenbuhl, secretário da Habitação (adm. Maluf) afirmou que grandes estacionamentos evitariam os problemas do trânsito.
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
O Birmann 21
Os
edifícios construídos mais recentemente na Marginal do rio Pinheiros contam com tecnologia estrangeira e traduzem
formalmente a suposta pujança das companhias que abrigam. Neste contexto, a construção do edifício Birmann 21 junto à estação Pinheiros de trem, ao lado da futura estação Pinheiros de metrô e de um importante terminal de ônibus urbano, não representa um fato isolado naquele trecho da Marginal. Antes significa o prenúncio de que este tipo de ocupação se estende de sua origem na altura do Brooklin em direção ao norte, pelo menos até o Parque Villa-Lobos, onde já existe um grande empreendimento que conjuga Shopping Center, torre de escritórios (já construída) e edifícios de habitação de alto padrão. (Projeto do arquiteto Júlio Neves). Birmann 21, a nova torre, projeto do escritório norte-americano Owens & Skidmore, em parceria com o escritório brasileiro Kogan, terá facilidades inéditas em edifícios de escritório brasileiros. Contará com 1 restaurante, “health club” 126, salas de conferência, “coffee break”, lojas de conveniência, cafeterias, serviços localizados num edifício exclusivo, onde estarão também as garagens. Estes espaços estarão ligados ao edifício principal, exclusivamente de escritórios, pelo subsolo e por uma passagem coberta. Também contará com sistema de ar condicionado central, heliponto, docas de caminhão, etc. 126As
expressões em inglês são do Sr. Mark Alfred, da Richard Ellis.
148
149
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Vila Olímpia e Morumbi: espaços de privilégio na Nova Cidade
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
‘A Vila Olímpia é fantástica’ “Se depender da torcida do empresário José Romeu Ferraz Neto, 35, as previsões da SEMPLA sobre o crescimento comercial na região da Marginal Pinheiros não vão ficar só no papel. Ferraz neto, dono da construtora RFM, começou a investir em 1985 na Vila Olímpia, que concentra as expectativas do mercado comercial
para
os
próximos
anos.
Hoje,
a
empresa
tem
três
J
150
á em 1993, previa-se para a Vila Olímpia um papel de destaque na dinâmica de valorização imobiliária da ‘Nova Cidade’, papel ligado à valorização da Marginal do rio Pinheiros como centro dos negócios imobiliários comerciais na cidade. O eixo da Marginal Pinheiros, supunha-se, deveria concentrar a maioria deste tipo de lançamento em São Paulo até o ano 2000. (FSP:31.01.93, p.8-1.) A Vila Olímpia, situada no quadrante de maior valorização da cidade, então
empreendimentos na região: um prédio de flats e dois edifícios
com muitos terrenos vagos e servida por uma infra-estrutura pública
comerciais. “ localização É FANTÁSTICA, entre a Marginal, a
invejável, encontrava-se entretanto mal servida de grandes vias.
Juscelino e a Bandeirantes. O acesso é muito fácil.”, afirma.
“Segundo dados da SEMPLA, entre 1980 e 1990 a área teve a metade
Ele também aposta em uma maior valorização da região com o contínuo
crescimento
do
Morumbi,
previsto
pelos
especialistas.
Segundo ele, a tendência de alta no bairro vizinho deve fazer crescer ainda mais os ganhos a médio prazo para os investimentos da marginal.” (FSP:31.01.93, p.8-1).
dos lançamentos da cidade. O potencial da região fica ainda mais evidente diante do fato de que o Sudoeste teve 73% dos lançamentos comerciais em toda a cidade.” (idem) “‘Não posso acreditar que a Câmara vá barrar um projeto que só vai melhorar a cidade”, imagina Reynaldo de Barros, que prevê uma região cheia de charme e sofisticação, com prédios luxuosos, shopping e áreas verdes.”, referindo-se à Nova Faria Lima, que supostamente melhoraria a circulação de automóveis na região. (JT:16.02.93, p.1-26). A Vila Olímpia, bairro de classe média da zona Sul, mobilizou-se quase
imediatamente
após
o
anuncio
pelo
então
Prefeito
do
prolongamento da Faria Lima em direção à Avenida Luís Carlos Berrini.
151
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
A perspectiva mais sombria dizia respeito às desapropriações necessárias
Um novo ‘boom’ no Morumbi
ao prolongamento. “(...) É um urbanismo que destrói para construir um projeto que privilegia apenas os carros, diz [Siegbert] Zanettini.(...). No final da semana passada, a Associação Vila Olímpia Viva lançou a ‘Carta à Cidade de São Paulo’. No documento, denuncia: ‘: “O projeto Bulevar Zona Sul, imposto pela Prefeitura, objetiva atender aos compromissos com as construtoras e empreendedores imobiliários, à custa do patrimômio e da qualidade de vida dos moradores.” (JT:16.02.93, p.1-26)
Os
investimentos viários na Marginal do rio Pinheiros têm um outro sentido, além da criação de uma nova centralidade para a cidade. A conclusão do Complexo Viário Eusébio
Matoso, do túnel sob o rio Pinheiros e da ligação das Avenidas João
Sérgio Carneiro, vice presidente do Movimento Vila Olímpia Viva via
Dias e Giovanni Gronchi, além da construção da Avenida Águas
na Operação uma possibilidade de adensamento indesejável, implicando
Espraiadas apontam também para a intensificação da valorização do
num comprometimento da infra-estrutura. Segundo Carneiro, não
bairro do Morumbi e algumas áreas adjacentes. A maior facilidade de
haveria melhoria do trânsito, mas apenas uma
transposição do rio, por exemplo, elimina um dos maiores obstáculos
descaracterizarão do
bairro, com a indução da ocupação pela grande avenida. (JT:04.03.94, p.8-B)
para a intensificação da ocupação da área. A nova ponte Bernardo Goldfarb é parte de um complexo viário que visava aliviar um dos maiores gargalos de tráfego da América Latina (2.500 automóveis e 500 ônibus por hora, OESP:25.09.93, p.C-6.). O complexo também inclui uma passagem de nível, ligando as Avenidas Waldemar Ferreira e Lineu de Paula Machado, formando, junto com o túnel sob o rio Pinheiros, o chamado Corredor Sudoeste-Centro, facilitando o acesso entre as duas regiões. A ponte recebe grande quantidade de ônibus, enquanto que o túnel recebe exclusivamente automóveis particulares. Em 1993, o então vice-presidente do Secovi 127, Walter Lacemina, previa
a
127Sindicato
transformação
do
Morumbi
no
“caminho
das Empresas de Compra, Venda e Locação de Imóveis.
natural
do
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
152
desenvolvimento de toda a região Sul da cidade” (OESP:25.09.93, p.C-6)
Marginal Pinheiros dentro de uma nova lógica de ocupação da Marginal
e um surto de desenvolvimento, atrelado à construção do túnel sob o
que privilegia grandes equipamentos de caráter privado, acessíveis
rio, que acabaria com o “preconceito de morar do outro lado do rio.”
principalmente por automóvel.
“Pelo túnel, as pessoas não sentirão que estão cruzando Pinheiros, como
A Marginal é um dos eixos ao redor dos quais se ergue a nova cidade
acontece numa ponte.” (idem). Este pequeno artifício psicológico, que
adaptada às exigências da economia globalizada. Neste eixo se concentra
ajudaria a alavancar as vendas imobiliárias numa região já bastante
a grande parte dos investimentos públicos e privados na instalação de
valorizada, custaria aos cofres da cidade alguns milhões de dólares.
infra-estrutura e na construção de grandes e prestigiosos edifícios
Lacemina estimava uma valorização gradual nos terrenos de até 30%com
comerciais e residenciais. Não sem porque, a região começa a servir aos
ênfase
rituais de auto-representação das classes dominantes, tornando-se de
em
‘unidades
multifamiliares
de
baixa
densidade.’
(OESP:25.09.96, p.C-6) Na opinião quase unânime dos especialistas da
fato, um novo ‘centro’ da metrópole. Um dos principais responsáveis área, o Morumbi
por este câmbio, o arquiteto Júlio Neves vê claramente as implicações de
também deve continuar como vedete do ‘boom’ imobiliário. “Até pouco
seus projetos, entre os quais incluem-se, como sabemos, a Nova Faria
tempo, a infra-estrutura deficiente e a falta de acesso inibiam uma
Lima. Enxerga no ‘boom’ imobiliário da Avenida Eng. Luís Carlos
ocupação mais rápida. À medida que esse problemas forem sendo
Berrini um prenúncio desta tendência e atribui à Faria Lima o papel de
sanados, o potencial aumenta”, afirmou o consultor Amir Hayad, 30, em
grande concentradora de opções de lazer e serviços. Neves defende que
1993, quando a Nova Faria Lima já havia sido anunciada pelo novo
a cidade deve reduzir seus deslocamentos e organizar-se em pólos. A
prefeito eleito, Paulo Maluf. Dolzonan da Cunha Matos, da Encol, e
Faria Lima viria reforçar as características do Itaim, que se confirma
Sérgio Pringler, da Fernandez Mera, enxergavam o bairro como o
como um bairro onde se concentram opções de lazer, educação e
‘grande canteiro de obras da cidade’. “O Morumbi vai se consolidar com
trabalho. (FSP:21.10.95, p.3-3).
a duplicação da Eusébio Matoso e o túnel sob o Pinheiros”, afirmava Matos. (FSP:31.01.93, p.8-1).
O urbanista Cândido Malta Campos Filho já apontava a direção desta nova centralidade em sua tese de doutoramento 128.
De grande impacto na paisagem e nas relações do bairro, com reflexos em toda a região, foi a instalação do Shopping Center Eldorado, na esquina das Avenidas Nações Unidas e Eusébio Matoso. Foi um dos primeiros investimentos, no início dos anos 80, de grande porte na
128O
urbanista discorda, entretanto, da atual política de grandes avenidas. Segundo o urbanista, este movimento estaria melhor se fosse baseado em transportes coletivos. Uma das propostas de Malta seria acentuar o adensamento perto do rio, onde está instalada a rede ferroviária, subutilizada naquele trecho. (FSP:21.10.95, p.3-3).
153
A P r o d u รง รฃ o d o Espaรงo Urbano n a N o v a C i d a d e
Aspectos da Nova Cidade
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Nova Cidade Terciária: Trabalho e Exclusão
154
“A Mercedes-Benz pode demitir mais 2.000 trabalhadores na fábrica de caminhões de São Bernardo do Campo em 97.(...) [Ben Van] Schaik diz que a empresa precisa cortar custos e se tornar mais competitiva. (...) Schaik afirma que, para evitar aumento de custos, a Mercedes não descarta a hipótese de transferir a unidade
“A
indústria
1952](...)
está
de
calçados
demitindo
Vulcabrás
este
mês
[fundada
1.100
dos
em
2.300
funcionários da unidade de Jundiaí.(...) “Acredito que o mercado
não
vai
conseguir
absorver
esta
mão
de
obra
dispensada, já que a maioria não é qualificada” (...) “a decisão de demitir foi tomada em função do custo de mão de obra em relação ao de países como a China, cujos produtos chegam ao Brasil com preços mais baixos que a concorrência”. O documento diz ainda que a medida dará à firma melhor condição de competitividade no novo mercado nacional.(...) Os produtos passam a ser produzidos agora pelas unidades de Franca (SP) e Horizonte (Ceará).” “Vulcabrás demite 1.100 funcionários”, FSP:27.12.96, p.2-5
de São Bernardo para outro município ou Estado. Segundo ele, a terceirização de alguns serviços, já efetuada pela montadora, se mostrou insuficiente para reduzir as despesas.” “Mercedes pode demitir mais de 2.000 em 97”, Arthur Pereira Filho, FSP:05.11.96, p.2-7.
155
N
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e uma das primeiras reportagens a consagrarem o termo ‘Nova São Paulo’, ainda em 1994, as jornalistas Irene Ruberti e Marisa Folgato constatam que a saída das indústrias da área urbana estaria transformando o perfil da cidade, tornando-a uma cidade prestadora de serviços e
de comércio especializado. “As grandes fábricas que ajudaram o inexpressivo povoado do final do século passado a se transformar na maior cidade do Hemisfério Sul migram em número cada vez maior para o interior e municípios da Grande São Paulo. Elas querem distância dos altos custos imobiliários, impostos caros, do sindicalismo atuante e das pressões dos ecologistas. (..) Se as unidades de produção estão deixando a cidade, o mesmo não acontece com seus cérebros (...) Afinal, há toda uma infra estrutura de comunicações e de serviços capaz de facilitar o acesso a qualquer parte do estado, do país e do mundo.”(OESP:21.20.94, p.C1). 129 De fato, entre 1988 e 1995, o setor que mais reduziu a oferta de postos de trabalho na região paulistana foi o setor industrial (de 32,1% dos empregados em 1988 para 24,8% em 1995, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea). O desemprego na cidade de São Paulo atingiu 14,5% em novembro de 1996 (SEADE). Diante do grande número de desempregados, os
129Aqui
se indicava também a mudança da centralidade paulistana para a Marginal Pinheiros, Avenidas Faria Lima e Eng. Luís Carlos Berrini.
indivíduos com menor qualificação enfrentam mais dificuldades para empregar-se 130 Segundo a urbanista Raquel Rolnik, este processo engendraria uma polarização social na cidade. “De um lado, pessoas superqualificadas e bem remuneradas e, do outro, as sem nenhuma especialização. Sem meio termo.” (OESP:23.10.94, p.C6.). Esta seria uma tendência geral das cidades globalizadas, com o isolamento das elites e a expulsão das populações pobres para as periferias. Segundo
Edward
Amadeo,
professor
do
Departamento
de
Economia da PUC-Rio, a divisão internacional do trabalho só contribui para aumentar o fosso entre qualificados e desqualificados no mercado do trabalho. Os países ricos tendem a se especializar na produção e dos chamados bens intensivos em mão de obra qualificada. Os países pobres, ao contrário, tendem a se especializar na produção de bens intensivos em mão de obra não qualificada, concorrendo com outros países pobres na exportação deste tipo de produto para os países ricos, perpetuando a demanda por mão de obra pouco instruída e barata.(OESP:26.12.96, p.B2) Segundo Amadeo, a adoção de novas tecnologias, especialmente as tecnologias de informação, tende a alterar o perfil da demanda por mão de obra a favor dos trabalhadores qualificados e contra os menos qualificados. Há, por um lado, a substituição do trabalhador não
130 “Há muitos desempregados com primeiro grau completo. Diante desta oferta, o mercado eleva suas exigências, mesmo para funções que não exigiriam qualificações.”. (Edgard Alves, Ipea, FSP:27.21.96, p.1-8)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
156
qualificado por máquinas ou robôs, e por outro, a operação destas
locus de interações complexas”. (Refinetti Martins, p.10). Maria Lúcia
máquinas que requer trabalhadores mais qualificados.
Refinetti Martins ressalta que a valorização dos espaços, categorias
O Brasil enfrenta uma situação que combina os dois perfis, mas no
sociais e atividades não é, de maneira alguma, um fenômeno geral, mas
caso da metrópole paulistana o perfil de produção com mão de obra
limitado, deixando de fora largas faixas da população e grandes áreas
especializada prevalece. Um quadro social já bastante complexo
da cidade. Outros processos de transformação estariam em curso nas
complica-se ainda mais.
cidades: o reforço da centralidade, o crescente fracionamento sócio-
De fato, o mercado de trabalho paulistano exige cada vez mais
espacial e a segregação urbana, além da elitização dos bairros
qualificação dos trabalhadores. Além disso, há a exclusão dos jovens e
(‘gentrification’) e a expansão da pobreza urbana, gerando o aumento da
dos que tem baixa escolaridade, segundo estudo conduzido por
violência e da marginalização e o aumento das atividades informais 133.
economistas do Ipea, que analisou a evolução do emprego da região da Grande São Paulo entre 1988 e 1995 131. Esta evolução se deveria a uma combinação de aumento no nível geral de escolaridade da população e de
maior
seletividade
por
parte
das
empresas,
favorecendo
trabalhadores com mais qualificação e experiência. “O problema é que essa maior seletividade do mercado está criando uma verdadeira legião de excluídos”, segundo Edgard Alves, do Ipea, diante do fato de que mais da metade dos trabalhadores não teriam primeiro grau completo em 1996. 132(FSP:27.12.96, p.1-8). “Assim, frente à segmentação e relocalização do processo industrial fordista, verificou-se uma re-habilitação econômica da cidade enquanto 131Segundo a pesquisa, 59,1% dos empregados na Grande São Paulo não tinham o primeiro grau completo em 1988, Em 1995, este percentual havia caído para 47,8%. A idade média dos empregados também vem crescendo: em 1988, 30,6% dos ocupados tinha até 24 anos. Em 1995, apenas 25,1%. 132Segundo o censo demográfico do IBGE (1991), 68% da população paulista com idade acima de 10 anos não tinha o primeiro grau completo em 1991. No Brasil, este número sobe para 75%.
133Uma
das conseqüências do crescimento do setor terciário e do desemprego na indústria é o aumento do emprego de mulheres, e o desemprego entre os homens. Isto acaba criando situações familiares inusuais, onde o homem desempregado está e depende financeiramente de sua esposa, empregada em atividade terciária. Por outro lado, as exigências para o mercado terciário são maiores, exige-se mais escolaridade das mulheres e seus salários são muitas vezes menores que os dos homens(FSP:27.12.96, p.1-8.)
157
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
A Nova Realidade Demográfica
São vários os fatores que contribuíram para isso. Em primeiro lugar destaca-se a adaptação das populações rurais ao modo de vida urbano, que não propicia a constituição de famílias numerosas. Houve uma melhoria relativa nos padrões de saúde e informação contraceptiva para
“(...)O Brasil está se tornando um país cada vez mais maduro e estável, principalmente no que se refere à questão demográfica. Este é um fato de grande importância, porque vai possibilitar tanto ao governo quanto à empresa planejar ações a longo prazo, com maior segurança, saindo do terreno fértil para falsos diagnósticos sobre o país.”
as mulheres de mais baixa renda. O poder público também incentivou o controle populacional ao facilitar o acesso às pílulas contraceptivas. Outro
importante
fator
foi
a
disseminação
da
prática
de
esterilização de mulheres. Estatísticas indicam que 40,1% das mulheres brasileiras em idade fértil (15 a 49 anos), casadas ou vivendo com parceiros, foram esterilizadas 135.(FSP:10.10.96, p.1-2.) A imigração das zonas rurais em direção às zonas urbanas também
Editorial do Jornal da Tarde :21.12.94, p.4
diminuiu consideravelmente nos últimos anos. O êxodo rural, responsável pelas altas taxas de crescimento da cidade de São Paulo a partir da 2ª Guerra Mundial, também decresceu ao longo da década de
V
erificamos que nos últimos anos, as taxas de crescimento populacional
na
cidade
declinaram
dramaticamente,
acompanhando uma tendência nacional. Na década de 50, a
média de crescimento era de 5% ao ano na cidade, hoje estaria próxima de 1,8% 134. “Pela primeira vez, constata-se uma desaceleração significativa e generalizada da megapolização que vinha sufocando a administração das localidades que concentram as maiores aglomerações de brasileiros.” (Estudo ONU/FNUAP, FSP:02.01.93, p.1-5.) 134Sumário
de dados da Grande São Paulo, 1993. A renda per capta paulistana era de 4.590 US$ em 1992. 62% da população ativa recebia no máximo até cinco salários mínimos.
90. Estima-se que na década de 80, o êxodo atingiu 10,5 milhões de pessoas, 5,5 milhões a menos que os 16 milhões da década de 70. Na década de 80, os migrantes rurais também teriam passado a dar preferência a outras zonas urbanas, que não São Paulo. Este fenômeno está intimamente ligado à ‘desindustrialização’ da zona metropolitana, cuja oferta de empregos industriais de baixa qualificação tem decrescido continuamente 136. 135Em 1986, a porcentagem era de 26,9%. As pesquisas ainda revelariam que a média de idade em que ocorrem as esterilizações é hoje de 28,9 anos, contra 31,4 em 86. 136A indústria de calçados, por exemplo, tem migrado para o Nordeste do país, em busca de salários baixos e fugindo da pressão dos sindicatos. Para Gustavo Franco, do Banco Central, “rompeu-se a lógica perversa do desequilíbrio regional, que levava o
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
158
Outro fator apontado é a emigração crescente da população
Ao buscar as razões da urbanização de vastas áreas periféricas sem
paulistana. O estudo ONU/FNUAP-93 aponta que aproximadamente
qualquer preocupação com a qualificação do espaço urbano visando a
800 mil pessoas teriam deixado a cidade desde a década anterior.
torná-lo também espaço de fruição e cidadania, perguntamo-nos sobre
(FSP:02.01.93, p.1-5)
as razões da falta de pressão popular para que tal fosse feito. O cenário
Esta nova realidade demográfica é uma das bases para as teorias de adensamento e reqüalificação do espaço urbano paulistano, pois permitiria, segundo algumas análises, o melhor planejamento dos recursos disponíveis e a liberação dos recursos da instalação de infraestrutura básica A cidade caminharia para uma situação terciária, onde a perda de postos industriais seria um dos fatores marcantes. Neste contexto, a volta aos espaços centrais seria um fenômeno de grande importância, incluindo-se no processo de aparelhamento da cidade de São Paulo para a sua inclusão na ‘constelação de Cidades Mundiais’. A vocação paulistana para a Globalização, combinada com uma herança social de imensas desigualdades, demandaria, a nível projetual, uma atitude de ‘reparação’ da cidade. (MEYER, SBM) Esta ‘reparação’ veria no espaço público o elemento estruturador da cidade, e teria um conteúdo ‘expiatório’ e ‘idealista’, “uma grande indenização”. “A imagem da cidade com a qual pretendemos virar o século será muito mais a imagem de seus espaços públicos que a imagem de seus espaços marginais construídos em áreas completamente desurbanizadas.” (MEYER, SBM). nordestino a desembarcar no Rio ou em São Paulo à procura de emprego. (Suely Caldas, OESP:22.09.96, p.B2)
político autoritário da época explica, mas não esgota, o tema.
159
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Do Modelo Periférico ao Metropolitano
S
sem qualidade. “O fenômeno da urbanização sem ‘cidade’ é um fenômeno terceiro-mundista, de uma cidade que, num curtíssimo espaço de tempo, de meados dos anos 50 a meados dos anos 60, abrigou uma migração interna extremamente alta.” (MEYER, SBM)
egundo a urbanista . Regina Prosperi Meyer, se a cidade de São Paulo cresceu, até a década de 90, dentro de um modelo urbanístico chamado ‘periférico’, orientando seu
crescimento
em
direção
às
periferias,
hoje
viveríamos uma nova etapa no processo urbano, dentro de um modelo que a urbanista chama de
‘metropolitano’. No primeiro modelo tivemos um espraiamento e uma diluição da mancha urbana pelo território, um ‘desadensamento’ que engendrou uma densidade populacional de apenas 51 hab. por hectare. No modelo ‘metropolitano’ voltamos à possibilidade de crescimento dentro da malha mais equipada da cidade. O modelo ‘metropolitano’ seria então, basicamente, um adensamento das áreas desocupadas dentro dos limites do território já urbanizado. “Este refluxo para as áreas centrais, a reorganização dos espaços centrais possibilitando o adensamento destas áreas, é fundamental para pensar a
metrópole
contemporânea,
que
tenderá
a
ser
mais
adensada.”(MEYER, SBM). O modelo ‘periférico’ de urbanização teria resultado, num fenômeno específico: a urbanização sem “cidade”, resultado, entre outras coisas, a produção clandestina da cidade e o espaço urbano
A população da área metropolitana teve um aumento dramático no período do pós guerra. Entre 1950 e 1994 (apenas 44 anos), a população passou de pouco mais de 2 milhões e meio de habitantes para cerca de 16 milhões e meio, o que equivale a uma taxa de 13,9 % a ano. (Um crescimento total de 613%). Como sabemos, os fatores que contribuíram para este crescimento vertiginoso industriais
relacionam-se na
área
à
concentração
metropolitana
de
São
dos Paulo
investimentos e
o
grande
desequilíbrio econômico e social com outras regiões do país. Assim, a migração interna configura-se como a grande causa para esta explosão populacional, aliada a altas taxas de fecundidade - vestígio da origem rural das populações imigradas. A imigração internacional, que havia constituído o grosso do aumento populacional na cidade até então, declinou consideravelmente após a 2ª Guerra Mundial, sendo responsável por um aumento mínimo nestes números. Este crescimento vertiginoso da população, aliado à falta de financiamento e, em última análise, a políticas habitacionais para as classes menos favorecidas que as levaram cada vez mais longe na periferia, teriam definido padrões de urbanização extremamente baixos.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Hoje, as taxas de crescimento populacional bastante mais baixas seriam um dos fatores que permitiriam pensar numa ‘requalificação’ da cidade. Segundo Meyer, a grande questão que se impõe hoje para a cidade é sua ‘reconstrução’, isto é, a produção de cidade “ali onde a urbanização sem cidade deixou uma enorme quantidade de espaços para serem ‘construídos’” (MEYER, SBM) 137. Meyer defende a idéia de que estamos diante de um processo de adaptação à uma nova realidade econômico-social, inserida dentro do quadro mais amplo da Globalização.
137Veremos como a questão se colocará de maneira um pouco diferente ao constatarmos que o processo de periferização prossegue em direção aos municípios vizinhos, e a construção de ‘cidades-condomínio’ coloca em questão a organização territorial da Grande São Paulo.
160
161
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O ‘Sul-Maravilha’, como alguns nordestinos costumam se referir a São Paulo, já não é mais o mesmo. Agora, são raras as histórias de migrantes bem-sucedidos. O mais comum é a decepção, a volta - mais pobre do que a chegada”.
“SP deixa de ser o ‘Sul-Maravilha’ para nordestinos”, OESP:06.10.96, p.B-10.
“A existência de vãos e frestas no elevado Costa e Silva (centro) está transformando o local numa verdadeira ‘mocolândia’, ocupada por garotos e moradores de rua. ‘Mocó’ é a denominação utilizada pelos moradores de rua
para
suas
‘moradias’
ou
esconderijos.
O
principal
ponto
de
concentração de moradores de rua é o acesso à rua da Consolação e à ligação Leste-Oeste, embaixo da praça Roosevelt. A população do local é flutuante. Nos dias mais movimentados,
chegam a dormir ali até 15
pessoas em cada buraco de cerca de 20 m2 . Meninos de rua se juntam a viciados em droga e adultos guardadores de carro. Sérgio, 18, um dos pioneiros do ‘mocó’ conta que há cerca de seis meses eles abriram, com a ajuda de um pedaço de ferro, uma das tampas da caixa de manutenção do elevado e se instalaram. De lá para cá, pelo menos outros três vãos foram ocupados.
O
principal
passatempo
é
cola
de
sapateiro,
consumida
continuamente.(...)”
Rogério Wassermann in “Buraco de viaduto vira moradia em SP”, FSP: 10.09.96, p.34.
Metropolização X Periferização
E
studando
dados
recentes,
podemos
identificar
movimentos que indicam que o processo de periferização da cidade está longe de cessar. A análise do crescimento populacional dos bairros das Zonas Leste e Sul da cidade
indicam um grande movimento populacional em direção àquelas áreas, além de um significativo aumento das populações de certos municípios vizinhos ao município de São Paulo, até então identificados com um padrão rural de ocupação. Os distritos paulistanos que mais cresceram entre 1980 e 1991, segundo censo do IBGE, foram Guaianases (8,23%, extremo Leste da Capital), Parelheiros (5,69%, extremo Sul) e Jaraguá (4,61%, extremo Noroeste), muito acima da média registrada na capital para o período, que foi de menos de 2%, congruente com a nova fase demográfica por que passa o país, onde o número de filhos por mulher passou de5,8 em 1970, 4,3 em 1980 e de apenas 2,7 em 1991. O censo revelou também que, apesar das menores taxas de crescimento registradas na cidade, Santana do Parnaíba e Francisco Mourato, municípios da grande São
162
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Paulo,
tiveram
crescimento
‘explosivo’:
274,58%
e
193,95%
respectivamente, entre 1980 e 1991. 138
Estudos demonstraram que, entre 1991 e 1993,
mais 30 mil
paulistanos teriam se mudado para lá (OESP:04.07.93, p.p.1 e 5.). Na
“O avanço da urbanização acontece principalmente em direção aos
década de 80, mais de 200 edifícios de quatro andares, cada um com 30
extremos Sul e Leste do município. Na zona Sul, bairros como Grajaú,
apartamentos, foram construídos pela COHAB, juntamente com
Jardim Ângela, Parelheiros, Capão redondo, Cidade Dutra e Campo
aproximadamente 3 mil casas, explicando a fantástica taxa de aumento
limpo tiveram aumento populacional conjunto de quase 400 mil
populacional. A maioria desta população seria formada por ex-
pessoas entre 1980 e 1991. A expansão é resultado do crescimento de
favelados, migrantes ou pessoas da baixa classe média expulsas das
favelas e loteamentos clandestinos, que avançam sobre a área de
zonas mais centrais pela impossibilidade de pagar aluguéis.
proteção dos mananciais de Guarapiranga e Billings. No extremo Leste, a explosão populacional é semelhante: juntos, os bairros de Lajeado,
No mesmo período, o bairro do Bom Retiro, na região central da cidade teve decréscimo de 2,19% em sua população.
Iguatemi, Cidade Tiradentes, Itaquera, Guaianases e São Mateus
A arquiteta Mariana Fix documentou grandes deslocamentos
também superaram a marca dos 400 mil novos habitantes. O
populacionais patrocinados pela Prefeitura de São Paulo, por ocasião
crescimento populacional de todos os demais bairros da cidade somou
da remoção do conjunto de favelas ao longo do córrego Águas
pouco mais de 300 mil habitantes entre 1980 e 1991”.
Espraiadas. A construção de uma avenida no local, ensejou a
Cidade Tiradentes, a 40 km a leste do centro da cidade, registrou um crescimento de quase 100% ao ano entre 1980 e 1991. O bairro
valorização e a incorporação de largas faixas de terreno pela iniciativa privada 139.
tinha 8 mil habitantes em 1980, segundo o IBGE. Em 1991, a
Segundo Fix, a retirada das favelas significou a expulsão de 50.000
população atingiria o impressionante número de 96 mil pessoas.
pessoas para áreas longínquas do extremo Sul e do Leste da cidade. Uma grande parte deste contingente estabeleceu-se, com o apoio da
138No
caso de Santana de Parnaíba, os ‘migrantes’ eram estimados em 54 mil. A construção de condomínios fechados de alto-padrão, como Alphaville, Tamboré e Aldeia da Serra, era apontada como responsável por aquele acréscimo, ainda que sua população na época não passasse dos 3 mil. A mão de obra necessária para sua construção é que propiciou este grande movimento de população que se estabeleceu naquele município, vizinho aos condomínios. Haveria então em Santana do Parnaíba duas mil famílias em situação de ‘extrema carência’, já que nem a construção civil nem a pequena indústria da cidade tinham capacidade para absorver toda a mão de obra disponível. A Prefeitura daquele município tinha então um programa para a ‘devolução’ das famílias para a região Nordeste, com o pagamento de passagens e encaminhamento para órgãos de triagem na Capital.(JT:02.09.94, 10B).
Prefeitura do município, na área dos Mananciais da represa do Guarapiranga, uma área de proteção ambiental, configurando uma violação à lei por parte do próprio poder público.
139FIX,
Mariana. “O Estado e o Capital às Margens do rio Pinheiros”, TGI apresentado à FAUUSP., 1996.
163
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
De fato, a população moradora em favelas na região é de
das periferias distantes, a falta de transporte público e a violência.
aproximadamente 600.000 pessoas, que não contam com serviços de
(FSP: 22.07.96, p.1-9). Este refluxo tem caráter muito diverso de uma
saneamento básico. 140
possível reqüalificação das zonas mais centrais da metrópole, pois
Entre 1960 e 1970, São Paulo recebeu aproximadamente 1.285.000
implica, no quadro dos investimentos e prioridades governamentais em
imigrantes, principalmente do NE brasileiro e do interior dos Estados
curso, o aumento da submoradia, com o incremento do cinturão de
de São Paulo e Minas Gerais 141. Já entre 1980 e 1990 o saldo entre
cortiços em torno do centro e o aumento das favelas.
imigração e emigração foi de aproximadamente 756.000 indivíduos a
A oferta insuficiente de serviços públicos e infra-estrutura urbana
menos na cidade, sendo a maioria de classes sociais menos favorecidas
nas regiões periféricas, aliada à baixíssima oferta de emprego nestas
expulsas para municípios vizinhos. (Na década anterior, a entrada de
regiões 143, demandam grandes deslocamentos populacionais diários em
migrantes havia superado 1,1 milhão de indivíduos). Isto demonstra
direção às áreas centrais da cidade, tornando sua estrutura viária e de
que, longe de se deparar com uma desorganização social e habitacional
transportes insuficiente face à demanda concentrada.
ocasionada principalmente por altíssimas taxas de imigração e crescimento vegetativo, como no período anterior, São Paulo expulsa seus habitantes mais pobres para periferias cada vez mais distantes, ‘transbordando’ para os municípios vizinhos 142. Paradoxalmente, este fenômeno leva alguns geógrafos a acreditar num refluxo populacional para o centro da cidade, engendrado pela baixíssima qualidade de vida 140Reportagem
de Eduardo Nunomura (OESP, 24.09.96, p.C5) dá conta da piora progressiva na qualidade da água da represa, citando resultados preliminares de pesquisa conduzida pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo que demonstram que toda a água da represa pode ser considerada insatisfatória. Constatouse que o lançamento de esgoto doméstico nos municípios vizinhos à represa - a capital, Embú, Cotia e Itapecerica da Serra - é o principal responsável pelo aumento nos níveis de poluição, seguido do lançamento direto de lixo pelos moradores da área. 141IBGE/SEADE. 142”Enquanto a capital registrou aumento populacional anual de apenas 1,23%, diversas cidades da Região Metropolitana cresceram a um ritmo bem mais intenso. Santana do Parnaíba, por exemplo, registrou índice anual de crescimento da população de 11,95%. Em seguida vieram Francisco Morato, com 9,37% e Itaquaquecetuba, com 7,41%.”(OESP:04.07.93, p.1)
143Na região da República (centro) há 5,16 empregos por habitante, enquanto que na extrema zona leste, em José Bonifácio, a relação é de apenas um posto de trabalho para cada grupo de 10 moradores.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Não-Cidade da Violência
164
pessoas morando irregularmente 144. Este enorme contingente de moradores obviamente não paga impostos e, na maioria dos casos, têm ligações clandestinas de água e luz, impedindo sua tarifação pelas empresas competentes.
“Nos
últimos
anos,
a
Prefeitura
instalou
ali
[em
Cidade
Entretanto, a urbanização de grandes áreas sem que sejam dotadas
Tiradentes] creches, escolas e postos de saúde e aumentou o número
de infra-estrutura, transportes, equipamentos de lazer e transportes,
de ônibus que levam à estação Itaquera do metrô ou ao centro da
tem conseqüências sociais funestas. Entre os bairros mais violentos de
cidade. Apesar disso poucos comerciantes de porte se arriscam a se
São Paulo, estão justamente aqueles onde os equipamentos públicos de
estabelecer no bairro, por medo de assaltos.”
lazer são escassos ou inexistentes. Uma análise do quadro ao lado (FSP: 19.08.96,p.1-6), mostra que
Gerson Penha in “Cidade Tiradentes é recorde em crescimento”,
entre os 10 bairros mais violentos da cidade, 5 estão no extremo Sul da
OESP:04.07.93, p.5.
periferia paulistana e 3 no extremo Leste. (Há duas importantes
C milhões
exceções: Sé e Brás, dois bairros centrais, repletos de equipamentos, omo vimos as atividades ‘clandestinas’ na cidade são freqüentemente subestimadas na sua real importância dentro do conjunto metropolitano. De fato, sabemos que estas atividades movimentam aproximadamente US$291
anualmente,
ou
aproximadamente
5,8%
do
orçamento
municipal de 1993. (FSP,03.05.93, p.3-1). Segundo dados da Secretaria Municipal da Habitação referentes ao ano de 1992, em São Paulo existiriam
mas onde o índice de encortiçamento é o mais alto da cidade .). 145
aproximadamente
3
milhões
de
pessoas
vivendo
irregularmente em cortiços, cuja exploração movimentaria cerca de US$138 milhões anualmente. Segundo o mesmo estudo, entre moradores de favelas e cortiços, a cidade teria cerca de 7 milhões de
144Dos
34,7 milhões de domicílios existentes no Brasil em 1991, cerca de 1,5 milhão estavam em favelas (4,5% do total). No Estado de São Paulo, 4,3% de domicílios estavam em favelas. 28% dos domicílios brasileiros não possuíam instalações sanitárias (banheiros)(IBGE, 1991). 145Pesquisa conduzida por Marcos Drummond, médico do Proaim (Programa do Serviço Funerário do Município), constata que o número de assassinatos dobra durante os finais de semana e feriados . A maioria dos homicídios ocorre no interior ou na proximidade de bares, segundo Jurandir Sant’Anna, delegado assistente da Divisão de Homicídios. Ainda segundo o delegado, estes homicídios estão, em grande parte ligados a motivos fúteis e ao consumo de álcool. Este também é o diagnóstico de Paulo Sérgio Pinheiro, coordenador-científico do Núcleo de Estudos da Violência da USP. Outro motor da violência na periferia de São Paulo é o consumo de drogas, as disputas pelo controle de seus pontos de venda e o não pagamento de dívidas dos consumidores. Nos bairros de classe média, as taxas de homicídios são consideravelmente menores e os incidentes estão na maioria das vezes ligados ao roubo. (FSP:10.08.96, p.1-6)
165
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Em 1994, o Fórum de Assistência Social da Cidade de São Paulo
Como vimos, a violência, as distâncias tornadas maiores pela
elaborou pela primeira vez um ‘Mapa de Exclusão Social’ da cidade.
ineficiência do transporte público e a falta de infra-estrutura urbana
Comparando quantitativamente a qualidade de vida em 15 distritos
começa a expulsar uma parte destas populações de volta para regiões
paulistanos, com a utilização de dados do IBGE e de outras
maios centrais da cidade. Segundo o professor doutor de Geografia
instituições, chegou-se à conclusão de que, entre os bairros analisados,
Urbana da USP, Francisco Capuano Scarlato, “há uma possibilidade de
Anhangüera (periferia Norte), Jardim Helena e Jardim Ângela (periferia
reversão da periferização” .(“FSP”,22.06.96, p.1-9). O geógrafo sugere
Sul) tiveram notas inferiores a 3 numa escala de 0 a 10. O nível de
que o aumento da população de rua no centro de São Paulo pode ser
renda do Jardim Ângela aproximou-se de zero, enquanto Moema (Sul)
um dos sinais deste refluxo, indicando a incapacidade do poder público
teve nota 10. (FSP:08.12.96, p.3-6.)
de fazer frente ao problema.
Sabemos que a violência urbana tem uma origem social complexa,
Ao confirmar-se esta tendência, um dos resultados prováveis seria o
para além da satisfação de necessidades básicas não atendidas. Ainda
‘encortiçamento’ do cinturão intermediário da cidade, já que as opções
que a falta de equipamentos públicos de lazer venha apenas completar
de moradia popular continuam escassas, trazendo a violência urbana
um quadro muito mais complexo de exclusão social, desemprego e
para ainda mais perto das classes médias.
desestruturação social, sua falta indica o descaso e a falta de
A violência é unanimemente considerada como o principal problema
investimentos substanciais do poder público nas áreas periféricas da
da cidade hoje. (FSP:01.09.96. p.3-1). Segundo reportagem de José
cidade 146.
Roberto de Toledo, a questão da segurança foi considerada o principal problema da cidade por 29% dos entrevistados pelo DataFolha 147,
146Pesquisa
realizada pelo Núcleo de estudos da Violência da USP concluiu que vítimas e assassinos das regiões mais violentas da zona sul de São Paulo têm o mesmo perfil: são em sua maioria homens jovens, entre 21 e 25 anos, paulistas e moradores do mesmo bairro. Os crimes cometidos por pessoas comuns, por briga em bares, bebida, cobrança de dívida e briga de casal, representam 48,3% dos casos. Homicídios relacionados ao tráfico de drogas ocupam o terceiro lugar (11,7%) entre as causas mais comuns. “Esses dados mostram que a maioria dos crimes ocorre por motivos fúteis. É a briga no bar ou a olhada para a mulher do outro que leva o ofendido a dar um tiro”, segundo o cientista político, Guaracy Mingardi, coordenador do estudo. Os assassinatos costumam acontecer nos fins de semana. “Nessas regiões as pessoas, criminosas ou não, costumam sair de casa armadas por causa da falta de segurança. Há, portanto, uma cultura de violência, somada a problemas como o excesso não controlado de armas de fogo, a farta venda de bebidas alcoólicas e a presença da droga.” Segundo o mesmo estudo, 83% da população da região não confia na polícia,
superando a preocupação da população com o transporte público coletivo e o emprego. 148 demonstrando a diluição das relações de cidadania, em benefício de uma lógica própria de defesa e retaliação. FSP: 06.09.96, p.3-5. 147Setor de pesquisa e estatística da Empresa Folha da Manhã. 148 O repórter indica que o número de assassinatos não aumentou nos últimos anos, tendo inclusive diminuído. Entretanto, os casos de violência contra a classe média aumentaram, obtendo grande exposição da mídia e influenciando a opinião pública. A pesquisa DataFolha indica que os mais preocupados com a violência são as pessoas brancas (31%), com nível superior (33%), maior renda (36%) e mais idosas ( 35%). O autor do artigo identifica-os com a faixa formadora de opinião da população paulistana.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Ainda que as pesquisas de opinião estejam sujeitas a grandes variações de acordo com acontecimentos muito pontuais da vida na
166
Cavalieri 149, indicando assim um corte dramático nos postos de trabalho das classes menos privilegiadas da cidade.
cidade, é legítimo identificar a violência, o emprego, o transporte e a
De fato, a taxa de desemprego na região metropolitana de São Paulo
saúde como as principais preocupações do paulistano nos dias que
atingiu 7,65% em março de 1996, a maior desde maio de 1984 (7,65%),
correm, como nos mostra o gráfico da evolução das preocupações dos
segundo o IBGE. Para o Instituto, o desempenho da indústria paulista
paulistanos nos últimos dez anos:
foi o principal responsável pela alta no desemprego no país.
O aumento da violência urbana parece estar ligado, estruturalmente, a um quadro cada vez mais grave de esgarçamento das relações sociais, e que encontram seu canal mais visível para as classes médias no consumo e distribuição de drogas, no alcoolismo e no crime contra o patrimônio e contra a vida. O fator decisivo para o aumento da violência urbana parece ser, entretanto, o desemprego crescente, fenômeno que se enquadra no campo da ‘Globalização’ das economias. O sindicalista Paulo Pereira da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, identifica no desemprego o aumento da violência, citando dados do Sinduscom (Sindicato das Empresas de Construção). Segundo tais dados, os postos na construção civil teriam diminuído de
aproximadamente 1.130.000 em 1990 para cerca de
550.000 em 1995. (FSP:02.09.96, p.1-3.) Sabemos que os trabalhadores da construção civil estão entre os menos qualificados do mercado, como afirma o então presidente do Sindicato da Indústria de Construção do Estado de São Paulo, Newton Os jovens (21%), pardos (24%) e paulistanos com menor escolaridade (28%) e renda (27%), principais vítimas violência, são preocupam proporcionalmente menos com a violência. Nas faixas de menor renda a preocupação principal é com o desemprego ( 12% entre os mais pobres e 16% entre aqueles que estudaram somente até o 1° grau.)
149CAVALIERI,
Newton, “Fortes e Fracos diante da Globalização”, FSP: 14.09.96, p.2-2.
167
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
As Torres e Muros da Separação
A
insegurança
gerada
por
A classe média opta, em alguns casos, por ‘excluir’ seus bairros da malha urbana. Este é o caso notório do movimento do bairro de City Boaçava para tornar-se um condomínio fechado. este
rompimento
provável do tecido social resulta, entre outras coisas, na consolidação de um novo tipo de ocupação no Oeste da cidade: os condomínios fechados. A Granja Viana, o primeiro condomínio verde
e murado da Zona Metropolitana tem suas origens na década de 60, mas é somente nas décadas de 80 e 90 que ganharão força Alphaville e Tamboré, os grandes refúgios da classe média-alta que foge dos conflitos da metrópole. As elites econômicas deslocam-se para o que se convencionou chamar de ‘Cidades de Entorno’ (Primeiro a Granja Viana e depois Alphaville e Tamboré, entre outros), que são bairros inteiramente murados e com ingresso controlado, onde o direito à vizinhança é exercido na sua forma mais crua e onde os principais atrativos são a segurança e a garantia da preservação do que se convencionou chamar, no
jargão
imobiliário
“qualidade de vida”.
característico
destes
empreendimentos,
Em suma, houve um movimento de encerramento e ‘fortificação’ dos ‘antigos paulistanos’ contra os ‘novos paulistanos’. Há uma negação do espaço
público,
resultando
numa
experiência
cada
vez
mais
fragmentada do espaço urbano. Numa visão caricaturizada, o sujeito sai diretamente de sua torre de apartamentos ou condomínio fechado para vias expressas e chega a sua torre de escritórios. Sai daí para o Shopping Center ou para a mais nova e gigantesca Academia de Ginástica. O deslocamento é quase sempre, no caso das classes médias e altas, de lugares encerrados e protegidos para outros lugares com as mesmas características. Há uma tendência de agravamento deste quadro, identificada no mercado imobiliário como ‘feudalização’. Este termo refere-se à crescente oferta de serviços (banco, supermercado, academia de ginástica, salão de beleza, etc.) dentro dos condomínios, permitindo que os moradores saiam o menos possível às ruas (VERGARA, FSP:01.09.96. monitoramento
p.3-4).
A
eletrônico
este à
fenômeno
distância
dos
vêem
juntar-se
condomínios,
o com
dispositivos como câmeras de vídeo, alarmes, cercas eletrificadas e botões anti-pânico150. Moradores de condomínios verticais de classe 150O luxuoso edifício ‘Tangará’, no bairro fechado de Panamby, lançado no 2° semestre de 1996, possui, entre outros itens, sala de ginástica e musculação, quadra de
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
168
média organizam-se para instalar redes exclusivas de televisão paga e
Paulista e Plaza Sul). Maria Elizabeth Mantovani Ribeiro, do Shopping
vídeo. (FSP:01.09.96, p.7-13).”Em vez de ter ponte levadiça e jacarés,
Ibirapuera, afirma que a segurança é explorada dentro do “mix de
você tem dispositivos eletrônicos” (Agostinho Pirotello Neto, diretor
marketing” do centro de compras 151.
da Graber, empresa de segurança de condomínios. FSP: 01.09.96, p.34).
Da segurança como produto de marketing, passa-se à segurança como real objeto mercantil. “Infelizmente, a violência urbana é um
Segundo o professor de História da UNICAMP, Jaime Pinsky, “O
ponto de venda”, segundo Carlos Coradi, presidente da empresa
que eu percebo é que as pessoas hoje têm uma sensação de insegurança
Engenheiros Financeiros & Consultores.(OLIVEIRA, FSP:03.09.96,
semelhante à que eu vejo nas narrativas sobre a Idade Média.”
p.2-1). Os lucros das empresas seguradoras teriam crescido 64% no
(FSP:01.09.96, p.3-4).
primeiro semestre de 96 em relação ao mesmo período de 1995
A crescente preocupação com a violência transforma-se em
(enquanto os bancos teriam crescido apenas 13%), aumentando sua
instrumento de marketing para empreendimentos imobiliários e
participação no PIB do país para 2,6%, após ter permanecido no
comerciais em São Paulo. (FSP:01.09.96. p.3-4) É o caso já citado dos
patamar de 1% por 50 anos.
condomínios fechados, mas também dos shopping centers. Esta é
A ‘feudalização’ do espaço engendra conseqüências ainda mais
opinião de duas gerentes de marketing de grandes shoppings da cidade:
graves: a negação do próprio espaço público, orientando as próprias
“Se continuar esta escalada, possivelmente vai chegar um momento em
ações do poder instituído. Estas ações orientam-se geralmente no
que faremos anúncio institucional contando o que temos de segurança
sentido
(...) Shopping sem segurança não existe. (...) tem que enfatizar a
marginalidade crescente. O mendigo, a criança de rua e o adulto
segurança. Isso favorece o comércio e o lazer no shopping.” (Eleonora
marginal são excluídos do corpo social ‘sadio’ e são responsabilizados
de Souza Ramos, gerente de marketing dos shoppings West Plaza,
pela deterioração dos espaços públicos, o que, em tese, justifica seu
de
proteger
um
suposto
‘cidadão
comum’
contra
a
fechamento ou cercamento. Há um outro sentido aparente neste tênis iluminada de tamanho oficial, quadra de squash, piscina semi-olímpica coberta e climatizada, área de spa com sauna seca e úmida, sala de massagem, piscina com hidromassagem, etc... Entre os itens de segurança constam câmaras infravermelhas nos muros externos, detetores de fumaça e gases em todos os ambientes e botões antipânico instalados em pontos estratégicos do apartamento. ( Informações colhidas diretamente junto à Empresa Abyara de planejamento imobiliário. A incorporação é da Birmann Incorporadora e a construção Turner do Brasil, não por acaso as empresas que mais vêem atuando no mercado de imóveis comerciais ao longo da Marginal Pinheiros, com a construção, por exemplo, dos edifícios Centenário e Birmann21.).
cercamento, que visa a conter a desvalorização dos espaços que a classe média abandona em função do aumento da criminalidade, fenômeno que atinge principalmente o centro da cidade. Nesta região viveriam
151FSP:
01.09.96. p.3-4.
169
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
cerca de 7500 mendigos e crianças de rua que representam 1,8% do total de moradores do centro (1996, SEADE), apontados pelos moradores
como
‘causadora
de
insegurança
e
geradora
de
desvalorização imobiliária’. 152 A cidadania é negada a todos: aos novos paulistanos que pouca voz têm para interferir no fazer o espaço urbano e encontram-se no limiar das demandas mínimas que garantam sua subsistência, confinados a distantes periferias carentes dos mais elementares equipamentos que permitiriam alguma participação, ou precariamente alojados em cortiços nas áreas mais centrais da cidade. Aos antigos paulistanos, que não encontra ‘extra-muros’ condições para a fruição do ambiente urbano. O conforto material é um sucedâneo para a grande renúncia à cidade (e à vida social) que se engendra.
152A
propósito do cercamento da praça do Largo Santa Cecília pelo Metrô, seu diretor de operações afirmaria: “Queremos melhorar a freqüência do local. Hoje tem muito mendigo e a praça está totalmente deteriorada”. Na mesma reportagem, o consultor imobiliário João Freire D’Ávila Neto declarará: “Os problemas da segurança e dos moradores de rua fazem as pessoas fugirem do centro. Por isso, os preços dos imóveis nessa região tendem a baixar de 10 a 20%.” FSP: 10.09.96, p.3-4.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Parte 5: O “Viarismo”
171
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O ‘Viarismo’ Um caso de associação entre Estado e Capital na produção do Espaço Urbano.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Introdução
H
o conjunto da cidade e definir uma lógica de apropriação do espaço urbano. As políticas que privilegiam o transporte particular formam a base
enri Lefèbvre chama-nos a atenção para o papel do espaço urbano dentro dos processos que propiciam a hegemonia de uma classe sobre outras e
seu
caráter ‘ativo’, operatório
e
instrumental, no mundo da produção existente (Lefèbvre, p.18). O autor tenta demonstrar que
“o espaço serve [a este processo], e que a hegemonia se exerce por meio do espaço, constituindo [um sistema] por meio de uma lógica subjacente, empregando o saber e a técnica. (...)”(Lefèbvre, p. 18) Vimos como a mudança do paradigma francês de urbanização para o paradigma americano, com a introdução da via expressa pelo urbanista americano Robert Moses, significou também a expansão do mercado automobilístico
na
172
cidade,
alavancando
um
processo
de
industrialização intenso. Dentro desta nova lógica espacial em São Paulo, possuir um veículo particular passou a ser não apenas um símbolo de status e ascenção social, mas uma necessidade objetiva, frente à deficiência do transporte público, com o impacto sabido sobre a produção do espaço. Ainda que apenas uma parte da população possua automóveis, sua importância basta para engendrar políticas, estabelecer prioridades para
para outras ações no campo da produção urbana. Chamaremos a estas políticas de ‘Viarismo’, que se definirá como o privilégio às obras viárias em detrimento de outras questões da cidade, ocultando interesses de valorização comercial e imobiliário, o favorecimento de certos setores da economia, de grupos ou indivíduos, determinando, entre outras coisas, o mercado de automóveis e as áreas de valorização imobiliária. O Viarismo opera, entre outros instrumentos, com uma operação ideológica que torna estas obras viárias aparentemente ‘indispensáveis’ para o conjunto dos habitantes, quando na verdade beneficiam grupos muito específicos.
173
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Viarismo e Valorização Imobiliária
Rebouças e avenida Pedroso de Moraes, os loteamentos do Butantã e Jardim Guedalla pelo prolongamento da avenida Rebouças além do rio Pinheiros e o loteamento do Pacaembú. Ainda da Cia City tornaram-se mais acessíveis a Vila Romana, o Alto da Lapa e Bela Aliança, pela abertura da avenida Dr. Arnaldo e a ligação com a rua Cerro Corá.
O
reflexo das obras viárias na valorização dos terrenos e na verticalização residencial já se havia feito sentir no período 1940-1957, quando o conjunto de obras realizadas nas gestões de Fábio Prado e Prestes Maia
possibilitaram a verticalização primeiro do centro e em seguida de alguns bairros adjacentes, beneficiados com as novas ligações com a área central. (Leme, p.167). Exemplos de novas ligações entre bairros e com o centro, construídas naquele período: a extensão da avenida Rebouças nos dois extremos (além do rio Pinheiros através da ponte construída em associação da Prefeitura com a Light e, no outro extremo, até a avenida Dr. Arnaldo); a avenida Pacaembú, prolongada até o rio Tietê; a avenida Paulista ligando a praça Oswaldo Cruz à Rodrigues de Abreu; a Nove de Julho, prolongada através do Jardim América e do Jardim Europa. “Sem
dúvida,
muitas
destas
obras
tiveram
relação
com
os
loteamentos de classe alta que se abriam nesta época em São Paulo. Da Cia. City foram beneficiados diretamente com as novas avenidas: o loteamento do Jardim América atravessado pela avenida Nove de Julho, o loteamento do Alto de Pinheiros pela abertura da avenida
Outros loteamentos de classe alta são também beneficiados por estas ligações viárias, como por exemplo: o Jardim Europa, a Cidade Jardim, o Sumaré e Perdizes.” (Leme, p.170). Segundo Leme, o tema do transporte urbano nesta época também apresentaria evidentes vinculações com a promoção imobiliária. Segundo a autora, o transporte urbano no início do século era realizado principalmente por bondes (primeiro a tração animal e depois elétricos). Porém os bondes serviam principalmente a dois seguimentos sociais específicos, às classes altas e aos trabalhadores do comércio e serviços. Ao determinar o seguimento social a que serviria, o bonde passou também a atrelar-se aos novos empreendimentos imobiliários para estas classes, que dependiam das decisões da Light em ligá-los ao centro para poderem prosperar. Assim, para além de sua função social ( ainda que restrita ), o bonde servia a interesses comerciais bastante específicos. Já se falou neste trabalho sobre os convênios estabelecidos entre a Cia. City, a Light e a Prefeitura de São Paulo. Mas é na sobreposição de cargos que encontramos as evidências mais claras da vinculação de interesses entre transporte público e valorização imobiliária: Lord Balfour of Burleigh e sir Gerald Smith eram,
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
174
simultaneamente, presidente e diretor da Cia. City e da São Paulo
Prefeitura de São Paulo, Ion de Freitas, desenvolveria teses sobre a
Railway Company, responsável pelos bondes paulistanos. (Leme, p.190).
solução do problema viário paulistano. É notável a afinidade de suas
Neste período, a classe operária servia-se dos pés, do transporte a
idéias com as propostas de Robert Moses, feitas duas décadas antes.
tração animal, ou tinha a opção de utilizar um vagão atrelado ao vagão
Ao mesmo tempo, não há qualquer consideração sobre o impacto
principal do bonde, onde era permitido o transporte de pessoas
social das obras:
descalças, ferramentas e mercadorias. Estes vagões, que funcionavam
“Torna-se
evidente
a
necessidade
da
implantação
em
área
com tarifa reduzida, eram conhecidos por ‘caraduras’. (Leme, p.175).
metropolitana de soluções que possibilitem o mais alto rendimento ao
As regras no trajar e no comportamento em público eram um
longo dos principais corredores de circulação.(...) Sempre entenderam
importante instrumento de separação social, já que um operário mal
os engenheiros rodoviários que as rodovias deveriam evitar as cidades.
vestido ‘jamais poderia’ tomar um bonde.
Sempre entenderam os urbanistas que as cidades deveriam evitar as
O crescimento das atividades no setor terciário e secundário a partir
rodovias. Eis que a prática moderna recomenda a implantação das Vias
dos anos 30 levou ao aumento da demanda por transporte público em
Expressas, isto é, verdadeiras rodovias urbanas nas quais é dado o
São Paulo, arrefecendo a separação social em vigor. De qualquer
atendimento à circulação de longa distância e alta velocidade e à
maneira, nesta época tem início a preferência das classes altas pelo
circulação local de baixa velocidade, ambas se completando.” (Ion de
automóvel particular, mercadoria de luxo importada da Europa ou dos
Freitas, “Vias Expressas: Conceituação e Implantação. Desenvolvendo
Estados Unidos, transformada símbolo de status diferenciado ou de
teses sobre soluções ao problema viário.”, Brasil Potência, 1971, p.92).
ascenção social.
Nos anos 90, o ritmo de crescimento da frota de carros na cidade
Assistimos desde então a ascenção do automóvel como meio de
tem sido, em média, de 200.000 veículos ao ano. A cada dia são
transporte urbano por excelência para as classes médias e altas,
matriculados 1.000 novos veículos nos órgãos competentes. De acordo
culminando com a instalação de várias fábricas de automóveis no Brasil
com a Organização Não-Governamental Greenpeace, citando dados do
já na década de 60.
DETRAN, haveria hoje mais de 5.000.000 de veículos matriculados na
Os critérios técnicos, pretensamente isentos, terão um papel fundamental na elaboração do discurso oficial que procurará impor o
cidade de São Paulo, sendo que 3.500.000 circulam efetivamente todos os dias pelas ruas da capital 153.
Viarismo como solução para os problemas da cidade e como motor do progresso. Num texto de 1971, o então Secretário dos Transportes da
153Dos
circulantes, apenas 12.000 são ônibus (0,35% dos veículos circulantes) e 20.000 caminhões (0,57%).
175
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Das 13.000.000 de viagens realizadas por dia dentro da cidade de
com o Estado nos contratos para as megaobras viárias ou de natureza
São Paulo, apenas 50% são feitas utilizando o sistema público de
infra-estrutural. Somente o poder público teria, no Brasil de hoje,
transporte
possibilidade
(enquanto
a
taxa
de
ocupação
dos
carros
é
de
de
mobilizar
os
maciços
recursos
necessários
às
aproximadamente 1,2 a 1,3 passageiros por veículo.), demonstrando a
megaobras, o que justificaria a existência mesma deste tipo de empresa,
urgência de uma política de investimento massiva no sistema de
configurando um quadro propício ao favorecimento 154.
transporte público.
Entre as principais obras da gestão Paulo Maluf estão a Nova Faria
Data de 1975 o Plano Diretor para o Transporte Público, que entre
Lima, a Avenida Jacú-Pêssego, a Avenida Águas Espraiadas, o
outras coisas previa a integração de tarifas, corredores de ônibus
Complexo Viário Maria Maluf, o Complexo Viário Eusébio Matoso, a
elétrico, ampliação da rede de metrô, etc. Pouco tem sido feito desde
Ponte Transamérica, o viaduto sobre a avenida Bandeirantes, que
então, malgrado as experiências de integração entre os sistemas de
facilita a ligação entre a Nova Faria Lima e a Luís Carlos Berrini, além
ônibus, metrô e trem e os corredores de ônibus já em funcionamento.
dos vários túneis, etc. Estas obras indicam o caráter eminentemente
Paradoxalmente, segundo a avaliação do Arquiteto Paulo Bastos, do
viarista da administração impressa por este Prefeito. De fato, em maio
Movimento Pinheiros Vivo, há dez anos tem curso um ‘desmanche’ dos
de 96, a adm. Paulo Maluf foi acusada de descumprir a lei de Diretrizes
órgãos que poderiam controlar o desenvolvimento e a otimização da
Orçamentárias do Município com base nos demonstrativos de despesas
malha viária da cidade, com disputas sobre a atuação fiscalizatória da
que a Prefeitura apresenta mensalmente à Comissão de Finanças da
CET e outros conflitos (SQVP). Segundo o urbanista Cândido Malta
Câmara Municipal. Tais demonstrativos mostrariam que, nos exercícios
Campos Filho, a estratégia desenvolvida na gestão municipal de Paulo
de 1994, 95 e 96, muitos projetos de construção de escolas e creches
Salim Maluf ao privilegiar as obras viárias, delineia-se claramente como
apontados no texto da lei como prioritários teriam sido ignorados em
de privilégio às empreiteiras e incorporadoras (SQVP). É notável a extrema dependência das grandes empreiteiras em relação aos órgãos públicos, que são seus maiores contratantes. Somente mais recentemente os Fundos de Pensão Privada e Grandes corporações privadas passaram a ser grandes clientes das empreiteiras, especialmente
na
construção
de
complexos
comerciais
e
de
apartamentos para a classe média. Entretanto, não podem competir
154Ӄ
impossível a determinado segmento da economia procurar expansão, principalmente globalização, quando depende apenas da boa vontade política deste ou daquele governante para que medições referentes a obras e serviços executados se realizem e sejam pagas em dia.” Newton Cavalieri, engenheiro e presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada do Estado de São Paulo (FSP, 14.09.96, p.2-2.) Ainda assim, na década de 90, algumas grandes construtoras se especializassem em grandes obras para a iniciativa privada (shopping centers, clubes esportivos, etc) , caso da Racional. (OESP:18.11.96, p.B8). Recentemente, as grandes empreiteiras vêem se associando à instituições financeiras e mesmo aos próprios Fundos de Pensão Privada, caso dos acordos da Encol com o Banco Itaú, por exemplo (OESP:07.11.96, p.A29).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
176
benefício das obras viárias da municipalidade. Estas teriam captado a
para não falar dos próprios problemas do trânsito, foram inócuos ou
maior parte das receitas do município e dos recursos captados em
nulos.
financiamentos (OESP:17.11.96, p.A6) A suplementação de verba 155
Reportagem do jornalista José Roberto de Toledo (FSP:02.09.96,
para o setor viário teria atingido 737,97% em 1994 e 378% em 1995 156.
p.1-6) dá conta da insatisfação dos moradores dos bairros de Moema,
“As leis que estabeleceram as diretrizes orçamentárias da gestão Maluf
Itaim-Bibi e Jardim Paulista com o trânsito da região. Nesta área de
para os exercícios de 1994, 95 e 96 davam prioridade aos investimentos
São Paulo foram construídos os túneis sob o Parque do Ibirapuera, sob
para a área social. Nos três orçamentos o texto é praticamente o
o rio Pinheiros e a passagem de nível sob a avenida Santo Amaro, que
mesmo. Na prática, isso não ocorreu(...).” (OESP:17.11.96, p.A6).
consumiram mais de 20% (US$ 1,2 bilhão) dos gastos municipais totais
Segundo reportagem sobre denúncia apresentada à Câmara por
até julho de 1996.
Odilon Guedes, vereador eleito pelo Partido dos Trabalhadores, (FT:
Segundo pesquisa do jornal Folha de São Paulo, os moradores da
10.03.95,p?), uma única obra do sistema viário de São Paulo, o túnel
região são os mais insatisfeitos da cidade com o trânsito, apontando-o
sob o parque Ibirapuera, teria consumido, nos dois primeiros meses do
como o segundo maior problema após a violência. De fato, se a
ano de 1995, 155,24% a mais daquilo que foi gasto com as Secretarias
velocidade média das vias expressas paulistanas era de 52,04 km/hora
Municipais de Saúde e Educação somadas, segundo dados do Sistema
em 1992, em 1966 teria caído para 44 km/hora. (FSP:30.08.96, p.1-8).
de
A
Execução
Orçamentária,
programa
ligado
à
Empresa
de
Companhia
de
Engenharia
de
Tráfego
aponta
que
os
Processamento de Dados do Município (PRODAM) (FT: 10.03.95). Os
congestionamentos, apesar de todas as obras viárias, aumentaram
avanços no campo urbanístico 157 e na qualidade de vida dos moradores,
19,3% entre 95 e 96. (FSP:26.10.96, p.3-5). Em 1993, 45% dos moradores da Grande São Paulo gastavam mais de duas horas por dia
155Remanejamento
da verba permitido de uma Secretaria para outra. passagem subterrânea Tom Jobim, no Centro da cidade, teria orçamento previsto de US$ 8 milhões. Os registros oficiais apontariam gastos totais de US$ 42,3 milhões, um salto de 529%. 157As 15 maiores obras viárias da adm. Paulo Maluf consumiram 53% do orçamento municipal total da Prefeitura até julho de 1996. Destas obras, 10 localizam-se no quadrante sudoeste da cidade, justamente a área de maior poder aquisitivo da cidade, mostrando a importância de obras em bairros onde a população seja ‘formadora de opinião.’ “Indicativo desta preocupação do Prefeito [a visibilidade] é o casamento das obras com o calendário eleitoral. Em 1994, ele investiu R$ 1,018 bilhão. Só até julho deste ano eleitoral, a Prefeitura já havia dobrado seus investimentos: R$ 2,023 bilhões.” (FSP:30.08.96, p.1-8) 156A
no trânsito, e 21% mais de três horas. (FSP:05.08.96, p.1-6) “Segundo especialistas, seriam necessárias , por ano, cerca de dez novas avenidas como a Faria Lima apenas para absorver os novos autos, ou seja, para manter o atual padrão de tráfego que já é ruim” afirmou o então vereador paulistano Maurício Faria (PT) (JT:04.11.95, p.2). Tal diagnóstico parece provável diante das previsões que indicam que o volume de carros será 50% maior no próximo século, segundo
177
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Ion de Freitas, professor de tráfego da Escola Politécnica - USP 158.
destaque no ranking ainda em 1996, figurando em terceiro lugar. ‘Uma
“No ano 2005 será mais rápido andar a pé do que de carro nas
série de melhorias na região, nos últimos anos, explica facilmente a
marginais Pinheiros e Tietê, principais vias expressas que cortam a
ação do mercado imobiliário e a grande procura de apartamentos na
cidade” (FSP:12.08.95, p.3-3) 159.
localidade,(...)’. Entre os benefícios recebidos pelo bairro e áreas
As Este fenômeno se insere num quadro maior de decisões, que
vizinhas podem ser alinhados a nova ponte do Morumbi, que reduziu o
incluem o incentivo ao automóvel, o desmonte dos órgãos de
problema do tráfego pesado na avenida professor Francisco Morato e
fiscalização e de planejamento urbano, visando sobretudo a beneficiar
as obras concluídas em torno do córrego Pirajussara. ‘Isto sem falar
as indústrias automobilística e de construção civil, abrindo caminho
nos vários túneis, pontes e as obras da Avenida Politécnica’.”
para a especulação imobiliária na cidade.
(OESP:10.10.96, p.I4). Neste mesmo artigo, Luiz Antônio Pompéia, da
Reportagem de janeiro de 1993, logo após a posse do Prefeito Paulo
Embraesp, destaca que “ampliar e melhorar vias de acesso na cidade é
Maluf, alertava: “O mercado imobiliário em São Paulo deve considerar
ponto-chave
para
definir
o
crescimento
imobiliário.”
(idem).
nos próximos quatro anos uma nova variável no cálculo da valorização
Entretanto, o maior impacto se deu na zona Sudoeste da cidade.
e desvalorização: se a Prefeitura cumprir as promessas feitas no início
Trataremos especificamente da região mais adiante.
da nova administração, haverá pelo menos sete grandes obras na
Os sentidos da valorização imobiliária em São Paulo induzida pelas
cidade, que devem mexer com o quadro dos imóveis.” (FSP:17.01.93,
políticas viaristas encontra também base na própria estrutura radial da
p.8-1).
cidade.
Entre outros bairros, o Morumbi, a Vila Olímpia o Butantã e a
De acordo com o urbanista Cândido Malta, poderíamos, a grosso
região da Vila Mariana sofreram um grande impulso imobiliário com as
modo, dividir as grandes artérias da cidade em dois tipos principais:
obras viárias da gestão Maluf: (...)o bairro do Butantã ocupa posição de
radiais e transversais. As avenidas radiais ligariam o centro da cidade à sua periferia e vice-versa, o tráfego de ônibus é grande aí, e os usuários
158O
mesmo que, num texto de 1971, como Secretário dos Transportes da Prefeitura de São Paulo, desenvolveria teses sobre a solução do problema viário paulistano com notável afinidade com as idéias de Robert Moses. 159Uma das soluções apresentadas é a construção de um anel rodoviário metropolitano, ligando as dez grandes estradas que desembocam em São Paulo: Anchieta, Imigrantes, Régis Bitencourt, Castelo Branco, Anhanguera, Bandeirantes, Ayrton Senna, Dutra, Raposo Tavares e Fernão Dias. A proposta é bastante criticada por grupos ambientalistas, que enxergam nela a destruição de duas áreas de preservação ambiental: a Serra da Cantareira e a área dos Manaciais. (FSP:12.08.95, p.3-3)
pertencem, de maneira geral, às classes menos favorecidas. Já as transversais,
fazem
a
ligação
intra-bairros
e
recebem
proporcionalmente mais automóveis particulares, atendendo a um público cuja renda é sensivelmente maior. Assim, é nas ‘transversais’, principalmente do quadrante Sudoeste e Sul (Avenidas Paulista, Brasil,
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
178
Faria Lima, Berrini e a própria Marginal Pinheiros), etc., onde se
comercial, como foi o caso da rua Augusta e mesmo da Pedroso de
concentrariam os maiores investimentos da Prefeitura, acompanhados
Moraes, em Pinheiros.(SQVP)
de
lucros
significativos
da
iniciativa
privada:
construtoras,
Devemos lembrar que o automóvel é um bem privado. O
incorporadoras, imobiliárias e donos de terrenos lucram sem levar em
proprietário do veículo, ao apropriar-se do espaço público, utiliza
conta o desenvolvimento harmonioso da cidade e sem dar a ela
recursos de toda a sociedade. Parte destes recursos é paga pelo próprio
nenhuma contrapartida social.
proprietário, na forma de impostos (IPVA, ICM, impostos incidentes
Cândido Malta, secundado por outros urbanistas, vê na atuação da
sobre os combustíveis, licenciamento junto aos órgãos competentes,
Prefeitura uma segunda estratégia: levar o trânsito para as Zonas
etc.). Dentro da ótica capitalista de função social do lucro, o carro
residenciais, principalmente Z-1, visando a degradar sua qualidade de
também encontra sua ‘função social’ ao criar uma base de produção
vida, forçando mais tarde a mudança do zoneamento e permitindo a
industrial que se propaga por vários níveis, desde a indústria
construção em altura. Isto já acontece em ruas conhecidas, como é o
montadora até a pequena oficina da periferia, dando emprego a um
caso da rua Groenlândia, no Jardim Europa, que leva o trânsito da Av.
grande número de indivíduos 160, além de gerar enormes ganhos para o
Nove de Julho para a Av. Brigadeiro Luís Antônio e Ibirapuera,
setor privado.
cortando o Jardim Europa, estritamente residencial, e modificando seu caráter.
As obras viárias têm cumprido também um papel importante nas estratégias de convencimento e na manipulação do espírito político dos
Roberto Saruê, do ‘Movimento Defenda São Paulo’, aponta uma
moradores de São Paulo. Parece-nos, entretanto, que esta ‘cadeia
contribuição diferente ao afirmar que, se o trânsito é geralmente
virtuosa’ do lucro e da industrialização deveria ser analisada pelo
encarado como fator nocivo em quase todos os aspectos, esquecendo-
prisma do trabalho, da renda, do avanço social e do fortalecimento da
se, ao menos no discurso, suas óbvias utilidades, também pode ser
Sociedade Civil.
encarado positivamente. Bem gerenciado, o trânsito de automóveis
O sentido impresso pelas políticas públicas na cidade de São Paulo
pode direcionar o crescimento e induzir usos de uma maneira positiva.
parece dar à circulação de bens e pessoas baseada no transporte
Já se observou, por exemplo, que a limitação de estacionamento em algumas ruas, o que em tese seria uma das armas para o controle do trânsito, acaba por acelerar a decadência de algumas ruas de caráter
160Este
‘efeito em cadeia’ de propagação na produção, comercialização e exportação é o principal argumento da estratégia para o privilégio à indústria automobilística. “De um lado, os automóveis propiciam o crescimento da siderurgia e petroquímica; de outro, os automóveis puxam os setores de autopeças e plásticos, além de material elétrico.” (OESP:01.12.96, p.B11).
179
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
privado uma importância além de qualquer consideração social. O volume de verbas alocados para as obras viárias ultrapassa várias vezes
A proeminência do automóvel
os valores destinados aos pagamentos de salários ou a projetos de
“Cinco anos depois de um presidente da República ter acusado o
educação, moradia e saúde.
setor automobilístico de produzir carroças, há carros de última
Entretanto, nunca se construiu tanto 161, nem se venderam tantos
geração sendo produzidos, investimentos bilionários sendo efetuados,
carros na cidade de São Paulo. A cada ano são acrescidos 300 mil
e o Brasil se consolidando como um dos grandes fornecedores de
veículos a uma frota estimada (1996) de 4,5 milhões. (idem) No
carros populares nos próximos anos”.
primeiro
ano
do
Plano
Real,
os
financiamentos
(inclusive
de
instituições estrangeiras) e as importações de veículos contribuíram
Luís Nassif in “A revolução do automóvel”, FSP:04.12.96, p.2-3.
para colocar 400 mil novos veículos nas ruas da Capital, o equivalente à frota de uma cidade como Campinas (JT:04.11.95, p2).
“Governar é construir estradas.” Washington Luiz “Governar não é mais construir estradas. A gestão Paulo Maluf provou que o mote do presidente Washington Luiz está superado.(...)Agora, governar é construir túneis e avenidas.(...) O Prefeito aprimorou tanto o novo conceito que, desde o ano passado, a Secretaria de Vias Públicas do município tem obtido um fato inédito: consumir mais dinheiro em obras do que o Ministério dos
O número de lançamentos imobiliários na Região Metropolitana de São Paulo em 1996 vai ser o maior dos últimos 20 anos, de acordo com o diretor da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp).” (OESP:06.10.96, p.I2) “A velocidade do mercado imobiliário prossegue em ascenção contínua e, contra o recorde de 90 apartamentos entregues a cada dia na região metropolitana de São Paulo, em 1995, 1996 apresenta um prognóstico ainda mais surpreendente: média superior a 130 apartamentos prontos a cada 24 horas. O mapeamento das novas moradias indica uma concentração expressiva no bairro do Morumbi (na verdade, o campeão dos lançamentos dos últimos anos), seguido do Tatuapé, Butantã, Penha e Santana.”(OESP:10.10.96, p.I1). 161
Transportes”. Reportagem de José Roberto de Toledo (FSP:09.09.96, p.1-10)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
P
180
ara Philip Gunn 162, haveria uma divisão ‘endógena’
automobilísticas. Estas teriam adotado então uma política agressiva de
na
setores
convencimento da suposta necessidade da abertura de mercados, de
concorrencial, de oligopólios 163 de um lado e, de
ajuste da política cambial, da modificação das relações trabalhistas e do
outro, a indústria automobilística. Segundo Gunn, o
incremento da produtividade. Esta política incluía desde lobbies no
poder
tão
Congresso Federal e filmes institucionais onde eram vendidas imagens
acentuado que as políticas governamentais sempre
da globalização e da eficiência no resto mundo, até o fechamento efetivo
acabariam girando em torno dos interesses das
de plantas, como o ocorrido na fábrica de motores Ford em Taubaté, em
economia
brasileira,
oligopólico
deste
entre
segmento
os
seria
grandes montadoras. (Gunn, p.251) Gunn exemplifica este suporte aos
janeiro de 1990.(Gunn, pp. 251-252).
interesses automotivos com a “utilização de fundos públicos e a
Como vimos, na nova fase de produção capitalista, o papel
regulação da moeda, por via de políticas monetárias cambiais e fiscais e
protagonístico da indústria automobilística no Brasil permanece. Uma
outras políticas, incluindo energia e transportes (...)”, que acabariam
mudança importante na escala desta produção se anuncia, já que o país
influindo na regulação da demanda e na formação dos custos de
parece ter sido escolhido, em virtude de sua infra-estrutura, como um
produção (Gunn, p.251).
dos centros da produção automobilística mundial. Esta escolha
Algumas destas ações são tomadas a nível local, muitas vezes
significará a instalação de várias novas montadoras no país, com
implicando diretamente a reordenação e modificação do espaço
investimentos da ordem de US$ 13 bilhões. 164 A capacidade de produção
construído da metrópole. Outras vezes, são as conseqüências sociais e
permitirá ao Brasil suprir os mercados da América do Sul e de alguns
econômicas destas ações, inseridas num contexto amplo e complexo, que
outros países do 3° Mundo e, esporadicamente, mercados europeus.
acabam conformando o espaço urbano. Este capítulo tratará de alguns aspectos destas ações na produção deste espaço. Segundo Philip Gunn, o final dos anos 80 teria sido marcado por
Entretanto, alguns fatores indicam que a produção estará mais voltada para o mercado interno, já que “(...) no ano 2000, vamos ser o quarto maior mercado para veículos do mundo”, segundo Silvano
tumultos e embates travados entre o poder federal e as indústrias 164Até 162 in A indústria automobilística nos anos recentes: as inflexibilidades de “globalização, ver bibliografia 163 Oligopólio [De olig(o)- + (mono)pólio.] 1. Situação de mercado na qual, num limitado número de produtores, cada um é bastante forte para influenciar o mercado, mas não o é para desprezar a reação dos competidores.(Aurélio)
o ano 2000 o Brasil se transformará no país com o maior número de marcas de automóveis em produção no planeta. A produção, até hoje dominada pela Volkswagen (Alemanha), Fiat (Itália), Ford e General Motors (EUA), (além de Mercedes-Benz, Volvo, etc para caminhões e utilitários), deverá no curto prazo ter fábricas da Honda e Toyota (Japão), Mercedes-Benz e Audi (Alemanha), Chrysler (EUA), Renault (França) e Asia Motors (Coréia do Sul), com investimentos anunciados de aproximadamente US$ 13 bilhões e uma produção esperada de 380 mil carros/ano. (FSP:02.01.97, p.2-1).
181
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Valentino, presidente da Associação Nacional de Fabricantes de
coeficiente de remuneração de capital esteve perto dos 50%, muito
Automóvel (Anfavea) (FSP:02.01.97, p.2-3). Se em 1996 1,73 milhão de
acima de outros setores industriais.
unidades foram comercializadas no mercado interno, para o ano 2000
Ainda
que
os
postos
de
trabalho
diminuíssem
na
indústria
estes números devem chegar a 2,5 milhões de veículos vendidos.
automobilística em 1996, as fábricas da Volkswagen em Taubaté e da
Segundo Valentino, a produção brasileira de automóveis é a que mais
General Motors em São José dos Campos bateram recordes de produção
cresce no mundo entre os grandes produtores, beirando os 10%. (idem)
pelo segundo ano consecutivo em 1996. As duas montadoras teriam
Entretanto, como nos lembram Borges e Bocchi, ao comentar a aparente
produzido mais de meio milhão de veículos em 1996. (FSP:26.12.96, p.2-
incapacidade de desenvolvimento de uma indústria automobilística
9)
verdadeiramente
nacional,
“nos
jactamos
de
uma
produção
de
A General Motors, a maior montadora norte-americana em atividade
automóveis da ordem de 2 milhões de unidades, em que participamos
no país, anunciava para 1997 investimentos de US$ 1,25 bilhão em novas
tão somente com a mão-de-obra-força e não com a mão-de-obra-
unidades no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, além de uma
inteligente, conforme afirmou Jean Lojkine.” (FSP:23.10.96, p.2-2)
estamparia em São Paulo. Esta estratégia é coerente com a tendência de
Segundo a empresa de consultoria Arthur D. Little, que acompanha a
saída do ABC paulistano, conservando as unidades produtivas no Sul do
estratégia de investimentos das montadoras, “o mercado brasileiro tende
país a fins de atender ao mercado da região e do Mercosul, facilitando a
a crescer mesmo sem aumento da renda per capita.(...) Com a moeda
produção coordenada com as unidades argentinas. Os investimentos da
estável, redução dos juros e crédito abundante, a demanda por
GM apenas a igualariam à Volkswagen brasileira, que tem hoje 7
automóveis vai aumentar. Todo mundo quer disputar este mercado.”
unidades operantes no país.(OESP:03.12.96, p.B14).
(FSP:02.01.97, p.2-3).
Tendo em consideração que as grandes montadoras no país são
As políticas industriais federais seguem privilegiando o setor
multinacionais e estão comprometidas com o mercado global e a remessa
automobilístico. Marco Aurélio Bedê defende que a taxa de proteção ao
de lucros para seus países sede (EUA, Alemanha, Japão e Itália, e
regime automotivo em 1996 no Brasil esteve perto de 250% 165, e que o
França, mas também agora Coréia do Sul), o governo brasileiro parece tentar firmar o Brasil no papel de fornecedor de bens de consumo para o
165Refere-se ao índice de proteção em comparação com o que teriam num sistema de livre comércio. Bedê, do IPT, defende que há uma efetiva transferência de renda dos fornecedores e consumidores para a indústria automobilística. Para o pesquisador, há um estímulo enorme à produção interna de automóveis, só comparado ao período préabertura comercial.
mercado mundial, abdicando entre outras coisas, como sabemos, da proteção social e empregatícia aos trabalhadores locais como meio de atrair investimentos. A produção destes bens no Brasil, em particular o
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
182
automóvel, aproxima do significativo mercado consumidor brasileiro
Não se pode analisar estes aspectos fora de um contexto amplo. É
(ainda que pequeno dentro do universo populacional do país) bens pelos
este contexto amplo que determina a produção do espaço urbano. As
quais este mercado anseia. Estas estratégias asseguram a inserção do país
políticas de transportes e automobilística conjugam-se às estratégias de
num esquema de acumulação e reprodução do capital do qual as elites
valorização imobiliária para criar uma cidade de espaços extremamente
locais se beneficiam, mas que por suas próprias características, reforça a
fragmentados, reflexo das relações sociais que os determinam, e de
exclusão de amplas camadas. As relações de entre trabalho, renda e
caráter eminentemente privado, onde o exercício do arbítrio cidadão
participação política adquirem novos contornos. A manutenção e talvez
aparece como uma idéia fora de lugar.
mesmo a ampliação das camadas médias, responsáveis pela produção, comercialização e manutenção dos bens garante um mercado interno suficientemente atrativo para os produtos de uma economia globalizada, mas não garante a distribuição minimamente eqüitativa das riquezas. No caso da cidade de São Paulo, é lícito identificar, para além das atitudes culturais frente ao consumo do automóvel (estas em grande parte induzidas pela mídia), estratégias do poder administrativo que reforçam a opção pelo transporte individual. Estas estratégias, já antigas, como vimos, ajudaram a dar ao país seu papel na divisão internacional do trabalho. Hoje, a manutenção deste papel implica na exclusão, através da substituição da mão de obra por novas tecnologias de produção 166 e na não inclusão de novos segmentos da população.
166 A região do ABC, na grande São Paulo, teve crescimento econômico de 5% em 1996 (6% de crescimento industrial), segundo pesquisa da Prefeitura de Santo André. A região beneficiou-se da produção recorde de veículos no ano (cerca de1,8 milhão de unidades). Em São Bernardo, onde estão instaladas cinco montadoras (Volks, Ford, Mercedes, Scania e Toyota), o crescimento foi de 9% em 96. Em São Caetano, sede da General Motors, o crescimento chegou a 16,7%. Ainda assim, cerca de 25 mil posto de trabalho foram fechados na indústria automobilística do ABC em 1996, devido às reestruturações empresariais.” Os investimentos no comércio não serão suficientes para alterar
significativamente o nível de emprego”, segundo Miguel Heredia de Sá, da Prefeitura de Santo André. (FSP:22.12.96, p.2-12).
183
A ‘Ideologia’ das O bras
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e “ Folha - A i d e o l o g i a , n a s c a m p a n h a s e l e i t o r a i s , a c a b o u ? Luiz Paulo Conde - E x i s t e i d e o l o g i a , m a s a i d e o l o g i a h o j e é d a própria obra, é a realização. Não existe o discurso ideológico abstrato.
“A Faria Lima foi inaugurada em clima de programa de auditório.
Antes havia muita abstração.(...) Acho que hoje ocorre, nas eleições para
“Bom dia, meus amigos!”, gritou o Prefeito, microfone em punho, para
Prefeito, que as pessoas estão percebendo as boas administrações. Nós
uma claque de aproximadamente cem mulheres que não paravam de agitar
estamos fazendo um governo em que a cidade é tingida de obras. Então,
bandeirinhas verdes e amarelas.” (...) As cem mulheres (...) são as
todo discurso que vai contra isso não tem sentido.”
mesmas que acompanham quase todas as inaugurações do Prefeito.(...) São convidadas pela assessoria política do Prefeito. Dizem que não recebem nada da Prefeitura, que querem apenas ‘benfeitorias’ para os
Entrevista do então candidato do PFL à Prefeitura do Rio de Janeiro em 1996, ao repórter Wilson Tosta, Folha de São Paulo, 02.09.96, p.1-9.
bairros. “Nós queremos que São Paulo seja a Nova York do Brasil. Para isso tem de ter Faria Lima”, disse Dagmar Ribeiro [pres. do Clube de Mães de Vila Nova Curuçá], para tentar explicar por que mulheres da zona leste, que não têm carros e que não usam a Faria Lima, foram a Pinheiros, na zona oeste, aplaudir a inauguração da Avenida.”
“ Folha: O S r d i s s e c e r t a v e z q u e a p r o p a g a n d a é p a r a a d e m o c r a c i a o que a violência é para os regimes totalitários. Noam Chomsky: E m g e r a l , é v e r d a d e q u e o p a p e l d a p r o p a g a n d a aumentou na medida em que as sociedades se tornaram mais democráticas. Os EUA são um caso dramático disso. Há uma estrutura de poder
“V.A.” in “Mulheres acompanham inaugurações do Prefeito”, FSP:24.10.95, p.36 167
centralizada e, se você não pode controlar as pessoas pela força, tem de fazê-lo de outra maneira, com publicidade, entretenimento, imprensa e propaganda.”
Entrevista com o lingüista norte-americano Noam Chomsky, FSP:16.11.96, p.4-3. 167Antes, a adm. Paulo Maluf teria sido acusada de manipulação e arregimentação de sem tetos para as manifestações ‘populares’ durante a inauguração da nova Faria Lima. Segundo a denúncia, um grupo de 54 famílias de sem teto da zona Sul teria participado da manifestação em troca da promessa de poder voltar a um terreno da Prefeitura, de onde teriam sido expulsos em julho daquele ano. Tais acusações foram negadas pela Prefeitura.(FSP:28.01.94, p.1-1)
184
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A
negação da metanarrativa marxista pelos pensadores
Paulista com o trânsito da região. Nesta região de São Paulo foram
pós-modernos estaria, de par com a derrocada os
construídos os túneis sob o Parque do Ibirapuera, sob o rio Pinheiros e
regimes socialistas do Leste Europeu e a nova
a passagem de nível sob a avenida Santo Amaro, que consumiram mais
dinâmica capitalista, ocasionando o afrouxamento do
de 20% (US$ 1,2 bilhão) dos gastos municipais totais até julho de 1996.
embate
Tal
Segundo pesquisa do jornal Folha de São Paulo, os moradores da
‘afrouxamento’ parece fazer parte das estratégias de convencimento das
região são os mais insatisfeitos da cidade com o trânsito, apontando-o
elites mundiais e manifesta-se especialmente como fórmula na mídia,
como o segundo maior problema após a violência. De fato, se a
que apregoa a ‘vitória do capitalismo’, e particularmente da sua versão
velocidade média das vias expressas paulistanas era de 52,04 km/hora
liberal. Este fenômeno estaria, entre outros fatores (especialmente as
em 1992, em 1966 teria caído para 44 km/hora. (FSP:30.08.96, p.1-
relações de carência), relacionado ao ‘pragmatismo político’ 169, uma
8)aqueles que as defendem, ‘resolver os problemas de trânsito da
atitude desprendida e apolítica em relação às escolhas democráticas.
cidade’. É óbvia a confusão entre uma política de ‘realizações
entre
socialismo
e
capitalismo 168.
Vimos como os governos municipais vêm se fortalecendo no Brasil, especialmente após a reforma constitucional de 1988, quando viram
concretas’ e a grande visibilidade das obras viárias que rende dividendos eleitorais imediatos.
seus orçamentos consideravelmente aumentados. Este fortalecimento
O filósofo político Jacques Rancière vê a raíz deste fenômeno no
financeiro traduziu-se, no caso paulistano, numa política de grandes
“reino mundial da mercadoria, que é o da confusão total do real e da
obras viárias para a cidade, visando a, segundo Reportagem do
aparência” (FSP:29.09.96, p.5-9), origem da ‘Sociedade do Cartaz’ (uma
jornalista José Roberto de Toledo (FSP:02.09.96, p.1-6) dá conta da
contra-argumentação à ‘Sociedade do Espetáculo’ de Guy Debord).
insatisfação dos moradores dos bairros de Moema, Itaim-Bibi e Jardim
Segundo Rancière, a demanda dos políticos pelos serviços da Publicidade visa à elaboração de uma imagem de marca, que antecipa o
168Tarso
Genro observa que dizer que a distinção entre esquerda e direita hoje não faz mais sentido no plano político nacional, define o emissor como ‘de direita’. “Quer, na verdade, se abrigar no ‘fim das ideologias’ para traficar a sua própria como a ideologia única de uma sociedade uniforme.” (FSP:31.10.96, p.1-3). 169Tarso Genro escreve: “ A diluição da cultura política da esquerda e, de outra parte, a afirmação dos valores democráticos tradicionais (assegurados pelos países capitalistas avançados), terminaram com a credibilidade de pseudo ética que nos atribuía exclusividade para defender a democracia real (afirmadora da igualdade), sem a necessidade de explicitar princípios normativos dotados de flagrante superioridade moral.(...)”. (FSP:20.10.96, p.5-3)
conteúdo da discussão política e suprime de um só golpe sua singularidade.
Nesta
operação,
renunciaria-se
ao
que
Rancière
considera o ‘âmago espetacular do poder’: a retórica pública. “As
ficções
televisuais
são
antificções
que
nos
apresentam
personagens como nós, que evoluem em cenários semelhantes àqueles nos quais nos vemos, e que expõem problemas análogos aos nossos
185
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
(...)” (idem), dando a falsa certeza de que tudo está disponível, por um
resultado de um ‘formidável’ processo de modernização do populismo
preço razoável. Esta Sociedade de Cartaz, que nos apresenta à domicílio
de direita, que estaria em vias de transformar os eleitores em meros
as imagens de guerras sangrentas e os objetos do desejo do mercado,
‘consumidores políticos’, à custa de milhões de dólares empregados em
“a ficção semelhante à realidade e a realidade semelhante à ficção”
propaganda, resultando na criação de ícones virtuais facilmente
(idem), não
dos
vendáveis (como o Projeto Cingapura, o Projeto ‘Fura-Fila’). Pinheiro
governantes, que proclamam haver extinto as sombras da política.
cita especificamente os túneis da Zona Sudoeste “pelos quais a
“Agora não há mais que a realidade, as mercadorias, as pessoas que as
esmagadora maioria
produzem, as vendem e as consomem; não há mais que indivíduos e
passar, pois não tem carro” (idem), ‘virtuais’ talvez para os estes
grupos bem recenseados, bem sondados e bem delimitados, de que a
moradores. Tal operação sinalaria o ‘esvaziamento’ de qualquer
sabedoria dos governos encarrega-se de lançar à massa mundial de
conteúdo político dos programas de governo, anulando o ‘espírito
interesses.”(idem).
cívico’ que teria caracterizado, entre outros, das revoluções nativistas
faria mais que ilustrar o
incansável discurso
De fato, tal fenômeno foi claramente identificado nas eleições
dos eleitores das zonas Leste e Sul jamais vai
do Brasil dos séculos XVIII e XIX até as Diretas Já. Tal fenômeno não
municipais paulistanas de 1996. “Ao contrário das eleições de 1994, em
seria
exclusividade
brasileira,
mas
característica
marcante
que a legislação eleitoral impôs várias restrições à propaganda dos
campanhas políticas nas grandes democracias, como os EUA. (idem)
das
candidatos, desta vez os publicitários tiveram campo livre para usar e
Este repúdio à política pretende tornar inócuos os discursos
abusar da tecnologia ao vender a imagem de seus clientes. Comícios
divergentes da lógica das novas formas de produção capitalista deste
vibrantes apareceram nas telas. Computadores fizeram ônibus e trens
final de século e neutralizar a participação política. A administração do
deslizar sobre a cidade. (...) E Pitta, um desconhecido, virou o favorito
bem público torna-se sujeita às representações publicitárias de um falso
da disputa com poucos dias de exposição no vídeo.” (OESP:30.09.96,
‘bem comum’.
p.A10). Paulo Sérgio Pinheiro 170, vê nesta operação um triunfo do
As imagens televisuais, a propaganda e a realização de obras de
‘simulacro’, já que “Pitta não é um biônico. É algo bem mais sinistro
grande visibilidade (que dão a base para as duas primeiras) confunde-se
(...). O artefato malufista é bem mais perfeito, porque elaborado do
com eficiência administrativa. 171 A ‘despolitização’ do pleito municipal
nada.” (FSP:27.10.96, p.1-3). Pinheiro considera que este seria o
Segundo reportagem do jornal Folha de São Paulo, um grupo de análise qualitativa de uma agência de publicidade foi um dos responsáveis diretos pela própria escolha do candidato do Partido Progressista Brasileiro (direita), numa lista de quatro possibilidades apresentada pelo então prefeito Paulo Maluf (FSP:02.10.96, Cad. Especial Eleições 171
170Professor do Departamento de Ciência Política da USP, coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da USP..
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
186
paulistano refletiu-se na análise do então diretor do Ibope, Carlos
e para que a direita incorporasse temas sociais à sua agenda 172. O
Augusto Montenegro, para quem o “eleitor brasileiro votou para
escritor e jornalista Gilberto de Mello Kujawski, por sua vez, dá uma
Prefeito
prédio”
importância ainda maior (e talvez exagerada) ao ‘papel balizador’ do
(OESP:06.10.96, p.A6), ao avaliar, positivamente, a ausência de
Partido dos Trabalhadores no cenário político brasileiro: “(...)se o PT
questões nacionais nas escolhas municipais.
se fizer, realmente, o campeão de votos do futuro, os outros partidos
como
se
estivesse
escolhendo
o
síndico
do
Neste mesmo contexto, o cientista social, professor de Cambridge,
terão de se reestruturar para competir com ele, adotando o mesmo
David Lehmann declara-se preocupado com o “esvaziamento dos
nível de militância e de consistência ideológica, ou seja, terão de se
discursos
brasileira”
transformar em partidos de verdade.(...)” Esta fala serve, em Kujawski,
(OESP:23.09.96, p.A6). Segundo Lehmann, a “transfiguração das
para justificar uma suposta ‘limitação’ do Partido dos Trabalhadores à
imagens tradicionais” da candidata do Partido dos Trabalhadores,
administração municipal, indicando sua ‘incapacidade’ ou ainda, a
Luíza Erundina e do presidente do Partido Progressista Brasileiro,
‘inconveniência’ de administrações petistas a nível estadual ou
Paulo Maluf, é digna de atenção.
federal.(OESP:12.10.96, p.A-2). Kujawski identifica um recuo do
políticos
bem
diferenciados
da
realidade
Segundo o estudioso, o maior diferencial do mundo político
comprometimento
‘corporativista’
e
uma
extensão
da
brasileiro seria o Partido dos Trabalhadores. O Brasil seria um caso sui
representatividade do Partido dos Trabalhadores, cujo indício maior
generis, pois “em vez de acabar com a esquerda, como todos, inventou
seria seu sucesso administrativo a nível municipal 173. Este ‘papel
uma esquerda da pequena burguesia, ligada ao funcionalismo público” (idem), o que teria contribuído para o balizamento dos discursos, criando o campo para a sobrevivência de uma opção social-democrata,
96.)Na outra ponta, críticas foram feitas ao Partido dos Trabalhadores: “Loducca [Celso Loducca, publicitário paulistano] tentou transformar Erundina em marca. Escondeu o primeiro nome da candidata e fez com que caminhasse entre árvores, quebrando gravetos, em cenas bucólicas de predomínio cor-de-rosa, jamais vermelho. Criou um slogan, ‘o PT que diz sim’, que alienou o partido. Exagerou, tornou Erundina inverossímil e perdeu o emprego. (...) Duda Mendonça e Nelson Biondi, com a ajuda de James Carville, publicitário que elegeu [sic] Bill Clinton, criaram Celso Pitta.(...).” (FSP: 02.10.96, Cad. Especial Eleições96, p.12)
Estas afirmações coincidem com a análise feita pelo colunista Luís Nassif, no artigo intitulado “A Nova Esquerda” (FSP:30.09.96, p.2-3): “(...) Mas é engano julgar que o pensamento de esquerda esteja esgotado. A tradição nacional de solidariedade das esquerdas, depois de revisados alguns dogmas do período anterior, pode ser um dos pilares na montagem da nova sociedade brasileira. Hoje em dia pode-se dizer que existem duas forças dinâmicas no plano econômico e social, que podem ser complementares ou antagônicas. Numa ponta, o movimento de modernização da economia conduzido pelo grande capital. É uma escola que pretende erigir novas economias em cima dos escombros da anterior. Não há a preocupação com os mais fracos, com as pequenas e micro empresas, com políticas compensatórias e com processos de controle social. Em geral, batalha-se apenas pela criação de mecanismos financeiros modernos e de desregulamentações de toda ordem. Na outra ponta, há um movimento de consolidação da cidadania, que deverá ser a pedra de toque da nova esquerda, desde que não se deixe contaminar pelo corporativismo.” 173De fato, o PT havia conseguido apenas 11,9% dos votos para prefeito no estado do Rio Grande do Sul em 1988. Já em 1992 este percentual saltaria para 13,1% e em 1996 172
187
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
balizador’ não impediria a diluição aparente dos discursos tal como
condicionar
aparecem na mídia 174.
favorável. 176
investimentos
a
um
cronograma
de
inaugurações
De maneira geral, David Lehmann identifica no sujeito político brasileiro uma atitude pragmática, que procuraria no poder público o atendimento às reivindicações do momento, e que moveria suas escolhas, o que coincide com a análise de Marilena Chauí. Este pragmatismo e o suposto esvaziamento do antagonismo entre esquerda e direita forçaria os diferentes partidos a buscarem uma posição de ‘centro’ dentro do espectro ideológico, tornando ainda mais opacas as discussões 175. A “ideologia das obras”, resultante da combinação destes vários fatores, não é um fenômeno novo, mas numa sociedade espetacularizada os dividendos políticos de inaugurações festivas e visíveis na mídia parece ter ganho proporções inéditas. Tal fenômeno acabou ganhando status de estratégia essencial de campanha, além de determinar o próprio cronograma das obras e, em última instância,
atingiria 20,2%, na esteira do sucesso de Tarso Genro frente à administração portoalegrense (OESP:12.10.96, pA-2). Não se deve esquecer, entretanto, que o Rio Grande do Sul tem um perfil sócio-econômico e um nível de politização atípico dentro do quadro brasileiro. 174Paul Singer sugere que a confusão não impede a distinção clara entre esquerda e direita. A direita estaria representada no cenário político brasileiro principalmente pelo PFL e pelo PPB; a esquerda pelo PT e PSB e o centro pelo PSDB. O economista sugere que não se pode esperar que todos os eleitores se orientem pela filosofia política dos partidos, mas crê que o debate pré-eleitoral seria suficiente para deixar aflorar algumas questões importantes, “amplificando a consciência política dos votantes”, o que implica na consolidação da democracia através da prática democrática. (FSP:10.11.96, p.5-3) 175Luíza Erundina admitiu, em reportagem de Luís Henrique Amaral (FSP:26.08.96, p.17), que a radicalização de seu discurso na época faria parte da estratégia de campanha, a fim de mobilizar os militantes do partido.
“Com o evento de hoje, Maluf já contabiliza quatro inaugurações de obras viárias em apenas 5 dias. As inaugurações começaram na quinta-feira, com a liberação do Complexo Viário Escola de Engenharia Mackenzie, no Sacomã. (...)Ontem a Prefeitura entregou a avenida Nova Trabalhadores e a canalização do córrego Jacú-Pêssego, na zona leste (...) Segundo o major da PM, Nelson Capeline, cerca de 80 mil pessoas estiveram presentes na inauguração (...). A apresentação dos grupos Katinguelê e Negritude Júnior e da dupla sertaneja Chitãozinho e Xororó durou cerca de quatro horas. (...)O cachê dos artistas foi pago pelas construtoras responsáveis pela obra: CR Almeida S/A e Cowan. (...) cada empresa gastou cerca de R$60 mil no evento.” FSP:09.03.96, p3-11. 176
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Antes e depois de 1988: novos poderes para os municípios
E
ntre
as
muitas
reformas
introduzidas
pela
Constituição de 1988, está o conceito de ‘função social’ do solo urbano, ligado à noção de benefício para a coletividade na forma de uso ou utilidade deste. Este conceito está fundado na crença de que o lucro tem em si função social (gerador de
empregos, impostos coletados, etc) e não no estabelecimento de uma política global de avaliação baseada em conceitos mais amplos de utilidade social. Tampouco tocou-se no estatuto da propriedade do solo urbano. De qualquer modo, este poderia ser um importante instrumento contra a especulação imobiliária, ao criar um instrumento para penalizar os terrenos desocupados aguardando valorização. Porém, um outro aspecto da Constituição, o que contempla a carga fiscal dos municípios, parece ter tido até agora um impacto maior na produção do espaço urbano. Os governos municipais têm se fortalecido continuamente. Além de ser melhor equipados para enfrentar as questões de estruturação e qualificação da cidade para a atual fase do capitalismo, sua receita - e seu poder político - têm aumentado nesta década.
188
Entre 1988 e 1995, a arrecadação municipal no Brasil teve um crescimento real de 191%, num salto proporcional de 1,76% para 3,36% do PIB. (FSP:31.08.96, p1-7). O percentual do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) destinado aos municípios passou de 20% para 25%, tornando-se mais abrangente com a tributação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações. As cidades também passaram a receber 22,5% do Imposto de Renda recolhido pela União, por meio do Fundo de Participação dos Municípios. Antes de 88, essa porcentagem era de 17%. Este ‘repasse’ é calculado, para cada município, com base num coeficiente fixado pelo Tribunal de Contas da União e que leva em consideração o número de habitantes de cada cidade. Quando o coeficiente de um município aumenta, o valor da sua cota também é elevado e a dos demais municípios do mesmo Estado diminui. Os municípios passaram também a contar com a receita do imposto sobre a venda de combustíveis e do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, permitindo o aumento na arrecadação própria. Os municípios já contavam então com o ISS (Imposto Sobre Serviços) e IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Finalmente, recebem 2,5% do IPI (Impostos sobre Produtos Industrializados) e 50% do IPVA (Imposto sobre Veículos Automotores) de automóveis registrados em seus territórios. As transferências entre Federação e Municípios também cresceram 115% no mesmo período, segundo cálculos do economista José
189
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Roberto Afonso, do BNDES 177. Segundo o economista, o aumento foi
Federal teria sido ‘complacente’ 179 na rolagem da dívida municipal
provocado, entre outras coisas, pelas alterações introduzidas pela
paulistana durante a gestão de Paulo Maluf. A dívida, segundo os
Constituição de 1988, além da estabilização da moeda.
defensores do endividamento, “é grande, mas não demasiadamente
No caso paulistano em particular, houve uma mudança brusca na relação entre receita e dívida em relação às administrações de Luíza
grande quando comparada à dívida do governo federal e à do Estado” 180.
Erundina (1989-1992) e Paulo Salim Maluf (1993-1996), com maior
A Constituição de 1988 introduziu também um controvertido
impacto a partir de 1990, quando o total das mudanças constitucionais
mecanismo de emissão de títulos públicos para o pagamento de dívidas
entrou em vigor (FSP:31.08.96, p.1-7).
judiciais. Este mecanismo estaria sendo usado para a captação
O montante arrecadado através de impostos e das transferências federais
descontrolada de recursos, motivando a instauração de uma CPI no
o entanto não foi o suficiente para o financiamento da
Senado federal. O senador Vilson Kleinubing (PFL-SC), previa a
máquina municipal, o que fez com que se buscassem créditos no Banco
criação de uma conta vinculada para impedir que o dinheiro
Interamericano de Desenvolvimento e outras agências financeiras
conseguido desta maneira tivesse outro destino, “como saldar dívidas
internacionais,
com empreiteiras” (OESP:28.11.96, p.A6).
significando
um
aumento
importante
da
dívida
municipal desde o início da década de 90.
Entre os casos mais notórios está o dos títulos emitidos pela
Na administração do Partido dos Trabalhadores, a dívida cresceu
Prefeitura de São Paulo quando Celso Pitta era ainda Secretário das
11% e a receita total 17%, enquanto que na administração do PPB,
Finanças da adm. Paulo Maluf. Em março de 94, a administração
houve um incremento de receita de 56%, enquanto que a dívida chegou
municipal teria arrecadado aproximadamente US$ 540 milhões, dos
a
foi
quais aproximadamente US$ 130 milhões teriam sido usados no
possibilitado também pela emissão de títulos no mercado pela
pagamento de dívidas judiciais. A Prefeitura paulistana parece ter tido
Prefeitura de São Paulo, emissão autorizada pelo Senado Federal em
dificuldades em explicar o destino do restante do dinheiro. Em
função do superávit da Receita Corrente da Prefeitura 178. Nem Jânio
dezembro de 1994, nova emissão de títulos arrecadou US$ 947,4
78,92%
da
receita
do
município
(1996).
Este
aumento
Quadros, nem Luíza Erundina puderam utilizar tal recurso, pois durante seus governos não houve este superávit. Além disso, o Senado 179FSP:16.09.96, 177Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. FSP: 31.08.96. 178Receita Corrente é o que sobra depois de pagas as despesas.
180Álvaro
p.3-11.
p.3-11. Antônio Zanini, professor de economia internacional da USP, FSP:16.09.96,
190
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana milhões, dos quais somente US$ 147 milhões teriam sido usados para o
arquitetos e urbanistas. As mudanças orçamentárias introduzidas
pagamento de dívidas judiciais 181.
gradualmente a partir da Constituição de 1988, atingiram seu ‘ápice’
O Ministério Público do Estado de São Paulo teria arquivado o
entre 1993-1996. De fato, houve um salto orçamental com a introdução
processo que se movia para apurar supostas irregularidades e a CPI do
do Plano Real: de US$ 4,85 bilhões em 1994, os fundos municipais
Congresso Federal acabou só investigando emissões de títulos entre
paulistanos atingiram US$ 6,47 bilhões em 1995 e finalmente US$ 7,6
1995 e 96, deixando as emissões paulistanas de fora.(OESP:28.12.96,
bilhões em 1997.
p.A2 e A5). A emissão de títulos públicos significou importante endividamento
No caso da adm. Paulo Maluf, fundos extras foram conseguidos com a privatização da CMTC e o fim da municipalização dos
da Prefeitura no curto e médio prazos. A Prefeitura de São Paulo terá
transportes.
Tais
verbas
teriam
sido
usadas
principalmente
na
em 1997 o maior orçamento de sua história: cerca de US$ 7,6 bilhões,
consecução de obras viárias, segundo o próprio Prefeito (FSP:13.09.96,
mas também a maior dívida registrada num início de governo, US$ 6
p.1-8).
bilhões, ou cerca de 79% do orçamento. (OESP:17.11.96, p.A6). Do
De fato, durante a adm. Paulo Maluf, foram retirados recursos das
total, US$ 5,8 bilhões (75,5%) deveriam vir de tributos e multas, entre
áreas sociais para o pagamento de dívidas e a realização de obras
eles o IPTU. Outros US$ 1,8 bilhão (24,5%) viriam de empréstimos,
viárias. Entre o início do mandato e junho de 1996, aproximadamente
provocando protestos dos vereadores oposicionistas na Câmara.
US$ 1,7 bilhão foi transferido das Secretarias da Educação, Habitação
O aumento da independência econômica dos municípios em relação
e Bem-Estar Social em benefício da Secretaria de Vias Públicas (US$
ao poder central torna-os protagonistas de um novo papel no jogo
868 milhões) e do pagamento de dívidas e aposentadorias (US$ 912,8
político local e, paradoxalmente, nacional. Os mandatários municipais
milhões). (FSP:13.09.96, p.1-8). Os valores do Orçamento Municipal
aumentaram sua capacidade de realização e, conseqüentemente, seu
(aprovado no ano anterior à sua execução), podem ser remanejados em
poder de barganha política. No caso de São Paulo, significou a volta do
15%. O percentual pode chegar até 30% ao incluírem-se neste teto os
engenheiro Paulo Salim Maluf ao cenário político nacional através de
gastos com reajustes de salários, dívidas e desapropriações (US$ 100
uma política de obras com acentuada visibilidade e popularidade, mas
milhões somente na Operação Urbana Faria Lima). A Secretaria da
extremamente criticadas por alguns setores da sociedade, entre eles
Habitação perdeu, na adm. Maluf, 67,2% de seu orçamento original. Com a Secretaria de Vias Públicas, deu-se o contrário. Os gastos
181Parecer
do Conselheiro do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, Eurípedes Salles. (OESP:28.12.96, p.A5)
previstos
eram
de
US$
997,2
milhões
em
1995,
mas
foram
191 complementados
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e em
US$
309,
7
milhões.
A
suplementação
Parece-nos que, ainda uma vez, uma grande parcela da população não
orçamentária a esta Secretaria chegou a US$ 868,1 milhões em três
encontra
anos e meio de adm. Maluf
permanecendo na sombra dos números estatísticos com que lidam os
182.
(FSP:13.09.96, p.1-8). De fato, os gastos
da Secretaria de vias Públicas têm sido maiores que os do próprio
canais
para
manifestar
seus
clamores
e
necessidades,
planejadores da nova cidade.
Ministério Federal dos Transportes. Enquanto em 1995 o Ministério
Na tentativa de dar algum sentido social às obras viárias, e ao
investiu US$ 1,1 bilhão nas estradas, ferrovias, hidrovias e portos no
mesmo tempo angariar fundos, alguns mecanismos vêm sendo criados,
país inteiro, a Secretaria das Vias Públicas investiu US$ 1,3 bilhão em
como as Operações Urbanas e os Cepacs.
obras como o túnel sob o Parque do Ibirapuera (US$ 746,5 + US$ 30,8 milhões para ligar o complexo à avenida Sena Madureira). Em 1996, as despesas do Ministério dos Transportes foram em média 30% menores que os da Secretaria (FSP:09.09.96, p.1-10). Estabelece-se um embate. De um lado aqueles que pregam uma maior alocação de recursos em áreas como educação, moradia e saúde. De outro, aqueles que argumentam que a cidade precisa ser ‘reformada’, identificando no trânsito seu maior problema atual. Além disso, argumenta-se que o paulistano, como o americano, vê no carro um importante símbolo de status e que políticas que não privilegiem o carro estão fadadas à impopularidade. Observa-se que, ainda que o número de pessoas que possuem carros seja relativamente pequeno em comparação com aquelas que utilizam o transporte público, é justamente nas classes mais favorecidas que se formarão as opiniões. 182A adm. Luíza Erundina tomou o rumo contrário. O orçamento deixado pela adm. Jânio Quadros previa gastos de US$ 1,18 bilhão na Secretaria de Obras Públicas. 65% deste montante foi remanejado para outras áreas, indo principalmente para a Secretaria de Transportes e para o pagamento de dívidas e aposentadorias. Os Transportes, com Erundina, passaram de 2,43% do orçamento total (Jânio Quadros) para 11,3% no final de sua administração (FSP:13.09.96, p.1-8).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Construção Civil e Estratégia Política: uma base para o Viarismo
As
192
No caso paulistano, sabemos que as obras do metrô significaram a parte mais cobiçada das obras públicas durante muito tempo, mas outras obras, especialmente as viárias, também despertaram o interesse das construtoras. Em 1995, três entidades do setor da construção 184 foram à Justiça contra a adm. Maluf. O objeto do litígio seria a licitação para a reforma
empreiteiras e empresas de engenharia e
das Marginais Tietê e Pinheiros, com valores envolvendo cerca de
construção civil tiveram, durante a década de
US$142 milhões . (FSP:07.03.95, p.3-1) 185. Segundo as entidades, o
70, um papel de grande importância nos jogos
edital da licitação teria sido preparado de forma a beneficiar apenas as
de poder e nas estratégias do regime militar
megaempresas, as mesmas que já trabalhavam para a adm. Maluf na
para dotar o país de infra-estrutura pesada,
época. Tais empresas incluiriam a Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez,
tendo seu ponto alto em obras como Brasília, num primeiro momento,
CBPO, Constran e Mendes Júnior. “Existem regras mínimas de
ou a hidroelétrica de Itaipú e a Ponte Rio-Niterói durante o regime
convivência entre os empresários do setor público que devem ser
militar. Estas acabaram simbolizando toda uma era de prosperidade e
respeitadas. Queremos acabar com o dirigismo, com o lobby político em
encarnando o espírito de grandeza com que a ideologia apresentava o
obras públicas. Essa concentração de obras quebras as regras do
Brasil para os brasileiros nos anos 60-70.
mercado.”, afirmou Eduardo Capobianco, presidente do Sinduscon, ao
A extraordinária influência daquelas empresas na política brasileira é notória. Várias seriam as razões para tanto: o Estado, único cliente capaz de arcar com os megaprojetos até pouco tempo, também seria permeável às negociatas e estratégias das empreiteiras e grandes construtoras, principalmente através de ação direta em lobbies políticos e financiamento de campanhas 183. 183Deixaremos de lado, por uma questão metodológica, as suspeitas de subornos, favorecimentos ilegais e outras ações semelhantes. Entretanto, o episódio envolvendo a Secretaria Municipal de Vias Públicas parece ser ilustrativo. O ano de 1995, a Secretaria teria feito um pacote de concorrências para canalização de córregos. Comprovou-se que
justificar os motivos que teriam levado as entidades a entrar com a um artifício matemático fez com que as empresas que se propusessem a realizar o projeto pelo preço que a Secretaria julgava mais ‘conveniente’ tivessem sua pontuação aumentada, finalmente prejudicando as empresas que tivessem oferecido preços mais baixos. As licitações eram por técnica e preço. Um dos Conselheiros do Tribunal de Contas do Município, Antônio Carlos Caruso, teria reconhecido a ilegalidade da fórmula, mas os demais decidiram arquivar o processo, alegando ‘denúncia anônima’. (OESP:05.12.96, p.C1) 184Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção Civil), Sinicesp (Sindicato da Indústria da Construção Pesada) e Apeop (Associação paulista de Empresas de Obras Públicas). 185Lembremo-nos que a construção da nova Faria Lima envolveu pouco mais de US$ 110 milhões, dos quais somente US$ 10 milhões teriam sido utilizados no prolongamento propriamente dito, o restante tendo sido usado para as desapropriações
193
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
liminar. (FSP:07.03.95, p.3-1). De acordo com Capobianco, se as regras
provocada pelas mudanças de zoneamento, que da venda das unidades
fossem mudadas na ocasião, mais de 100 empresas estariam habilitadas
propriamente ditas (idem).
a participar, e não somente 5. Reynaldo de Barros teria atribuído a
Mais recentemente, empresas relacionadas à construção civil foram
denúncia à perseguição política que sofreria o então Prefeito Paulo
as maiores financiadoras da campanha para a Prefeitura de São Paulo
Maluf. (OESP:07.03.95, p.C-1).
em 1996. Do total de valores declarados pelos cinco principais
Recentemente, com a estabilização da moeda e a grande procura por
candidatos, 22,74% vieram da construção civil ( a maior porcentagem
novos imóveis residenciais, a construção e o financiamento de
entre os diversos ramos de atividade) 186. As maiores doações foram
habitações
empreiteiras,
realizadas pela CBPO e Grupo Odebrecht, para a campanha de Celso
instituições financeiras e fundos de pensão. Tal quadro foi facilitado
Pitta (PPB). Entre todos os candidatos, José Serra teria sido o mais
pelo Sistema Imobiliário Municipal, lançado na gestão Paulo Maluf. Tal
favorecido: 20 das 43 empresas da área da construção civil que
sistema estende a companhias privadas o direito de construir uma vez e
contribuíram para as campanhas o escolheram. (25% do total de
meia nas áreas classificadas como Z-2 e Z-9, e de fazer conjuntos
contribuições para sua campanha). (FSP:16.12.96, p.1-6)
residenciais
também
ser
a CBPO, também teria sido responsável pela obra mais cara da
a favorecer a construção de apartamentos de até 55 m 2 , com preço de
administração Paulo Maluf. A Empresa foi encarregada de mais da
até US$ 36 mil, destinados a compradores com renda mensal entre 6 e
metade do projeto do túnel Ayrton Senna, pelo que recebeu US$ 400,4
12
com
milhões do total de 728 milhões gastos na obra (FSP:16.12.96, p.1-6).
propaganda, pois lhes seria fornecida a lista com 450 mil inscritos na
Segundo o Partido dos Trabalhadores, o complexo Ayrton Senna teria
COHAB (OESP:01.02.96, p.C2). “Os empresários estão percebendo
sido superfaturado, gerando um prejuízo para os cofres públicos de
que há um mercado concreto nesse segmento”, segundo o presidente
cerca de US$ 38 milhões (OESP:14.11.96, p.A7)
Conselho
As
construtoras
a
lei
não
só
as
loteamentos de 5 mil m 2 e a construção de casas. Tais medidas visariam
mínimos.
Nestas,
para
No caso de Celso Pitta, a 2ª maior contribuinte para sua campanha,
salários
Z-8/CR100.
atraente
antes
do
nas
passou
permitia
teriam
Regional de Imóveis (Creci), Roberto
gastos
Capuano”.
Curiosamente, Capuano tinha dúvidas sobre a “necessidade de tantas vantagens” (idem). José Eduardo Cardozo, então vereador (PT), indicava que os lucros poderiam advir mais da valorização dos terrenos a curto prazo,
186Outros
financiadores: Bancos:8,53%, Papel: 7,76%, Transporte: 6,87%, Alimentação: 5,72%, Outros: 48,38%. (FSP:16.12.96, p.96)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Os Fundos de Pensão
194
grandes projetos privados: “Hoje em dia quem tem recursos para investir no mercado imobiliário são os Fundos de Pensão. Sem eles não é possível esta operação.” afirmou Roberto Paulo Richter, a propósito
cada vez mais amplo o reconhecimento do papel-
“É
chave que pode vir a ser desempenhado pelos fundos de pensão no financiamento do nosso desenvolvimento econômico” (Luciano Coutinho e Flávio Rabello, OESP:07.10.96, p.B2.)
Os Fundos de Pensão são associações de funcionários de empresas
estatais ou privadas que se reúnem para garantir aposentadorias mais substanciais que aquelas oferecidas pelo sistema previdenciário. Os investimentos dos Fundos no mercado financeiro geram grande volume de recursos que são reinvestidos na compra de empresas ou em empreendimentos imobiliários de grande porte. A importância dos Fundos, segundo alguns economistas, reside entre outras coisas, em seu papel no financiamento de grandes obras, já que a poupança interna não seria suficiente para isso: “Em face da sua estrutura passiva intrinsecamente de longo prazo, e dada a estabilidade de suas fontes correntes, os fundos de pensão são especialmente talhados para financiamentos de longa maturação”. (OESP:07.10.96, p.B2). Os Fundos de Pensão de empresas estatais (e privadas em menor medida) constituem hoje os principais investidores no mercado imobiliário. São considerados os únicos agentes capazes de arcar com
da Operação Urbana Faria Lima (FSP:06.11.95, p.3-5.). A atuação destes Fundos nos grandes empreendimentos imobiliários é notória. Sua formação data de aproximadamente meados da década de 70. Possuem hoje um patrimônio calculado em mais de US$70 bilhões (1996). Isto representa cerca de 10% do PIB brasileiro ou 54% do investimento total de empresas nacionais e estrangeiras no país em 1996 187. Seu patrimônio foi multiplicado por 8 nos últimos 10 anos. O Sinduscon-SP declara em seu informativo (FSP:17.11.96, p.5-7): “Era natural uma aproximação do setor da construção civil, enquanto produtor de bens, dos fundos, enquanto fonte de financiamento de novos projetos.(...)Os construtores já não contam com os mecanismos tradicionais que formavam o Sistema Financeiro de Habitação (cadernetas de poupança e FGTS); os fundos têm todo o interesse em aplicar no mercado imobiliário, onde conseguem retorno rápido e seguro.” Entretanto, o limite de participação dos Fundos no mercado imobiliário
vem
sendo
restringido
pelo
Conselho
Monetário
Nacional 188. Até 1983 os Fundos podiam aplicar 40% dos seus ativos neste tipo de investimento. A partir daquele ano o limite passou para 20%, visando induzir os Fundos a comprar títulos da dívida pública. 187US$130 188Desde
bilhões. Consultoria Simonsen Associados (OESP:30.12.96, p.B1) 30 de outubro de 1996, o órgão regulador dos Fundos.
195
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Segundo novas regras baixadas em outubro de 1996, o limite para
lazer e turismo, setores que oferecem maior taxa de retorno dos
aplicação em imóveis irá caindo um ponto percentual por ano a partir
investimentos (OESP:13.11.96, p.B8).
de 1997, até chegar a 15% em 2002.
Os
O limite atual para aplicação em um único imóvel é de 4% sobre o
fundos
de
empreendimentos
pensão como
o
são
os
World
principais Trade
investidores
Center
São
em
Paulo 189,
patrimônio total, 10% para aplicações em fundos de investimento
constituindo-se em agente importantíssimo na configuração da Nova
imobiliário e 20% por entidade Previdenciária em um mesmo fundo
Cidade.
imobiliário, sendo os Fundos impedidos de atuar como incorporadores. Estas limitações visariam diminuir os riscos de iliquidez para os pagamentos
de
beneficiários
dos
Fundos
e
foram
fortemente
contestadas pelo Secovi e Sinduscom, entre outras entidades. O limite de 15% do total de investimentos representa ainda assim mais de US$ 10,5 bilhões de recursos em tese disponíveis para a aplicação no mercado imobiliário. A Previ (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil), maior fundo de pensão do país, com patrimônio de US$18,2 bilhões em 1996, realizou duas importantes transações imobiliárias que ilustram a participação dos Fundos naquele mercado: em novembro de 1996 adquiriu por US$44 milhões o Hotel Méridien, no Rio de Janeiro, onde pretendia investir US$7 milhões na reforma das instalações e na construção de um centro de convenções e negócios. Na mesma semana adquiriu o Hospital Humberto I em São Paulo. Aqui os investimentos seriam de US$200 milhões, incluindo a construção de um Shopping Center e de um flat para a terceira idade, num total de 166 mil m 2 .A Previ
informava
que
em
1997
seus
principais
investimentos
imobiliários se concentrariam especialmente nos segmentos de saúde,
189Entre
os investidores que tornaram possível a realização do World Trade Center, mega empreendimento imobiliário associado ao capital internacional estarão as seguintes entidades: PREVIRB: Fundação de Previdência Privada dos Servidores do Instituto de Resseguros do Brasil . PREVI-BANERJ: Caixa de Previdência dos Funcionários do sistema Banerj, PREBEG: Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Estado de Goiás, POSTALIS: Instituto de Seguridade Social dos Correios e Telégrafos, PETROS: Fundação Petrobrás de Seguridade Social, TELOS: Fundação Embratel de Seguridade Social, VALIA: Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social, IBM: Fundação Previdenciária da IBM, ARSAPREV: Instituto Arsa de Seguridade Social Autolatina Previdência Privada, entre outros. Fonte: Folheto Publicitário World Trade Center.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Viarismo, Especulação e a Nova Faria Lima
196
197
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
“O mercado imobiliário em São Paulo deve considerar nos
Ao tomarmos partido pela prioridade do sentido social em tais
próximos quatro anos uma nova variável no cálculo de valorização
ações, pretendemos estabelecer um campo para a avaliação destas
e desvalorização: se a prefeitura cumprir as promessas feitas no
políticas.
início da nova administração, haverá pelo menos sete grandes obras na cidade, que devem mexer com o valor dos imóveis.”
Falou-se neste trabalho sobre o papel da cidade como lugar onde o homem busca realizar plenamente suas potencialidades através de um ‘contrato social’ com outros homens. Tal concepção de cidade, ainda
Graziele do Val e Daniela Rocha in “Obras na cidade alteram valor
que possa servir como modelo ideal para o aprimoramento das relações
de imóveis”, FSP:17.01.93, p.8-1, ainda no primeiro mês da
sociais, serve a operações ideológicas que tentam esconder o caráter
administração de Paulo Salim Maluf.
espoliativo das relações atuais de produção na cidade. A ação urbana que se baseia exclusivamente no privilégio às relações mercadológicas, encarando o solo urbano não como bem social, mas como objeto
Introdução
mercantil, trai aquela concepção e denuncia o verdadeiro caráter da
Ao
do restante da sociedade, agindo como moderador entre os vários analisarmos os mecanismos municipais de controle e
atores daquele ‘contrato’, mas parte integrante dos conflitos desta
regulamentação da produção física do espaço urbano,
sociedade, mais um dos agentes. Sua ação não é isenta e nem ética
poderemos fazê-lo apoiados nas relações estabelecidas
acima dos conflitos, mas insere-se num quadro de dominação e
entre o Estado e o Capital, infalível
e
ação pública. Trata-se de reconhecer que o Estado não é coisa separada
transcendente,
tomando a Técnica não como coisa mas
como
Sujeito
as profundas divisões sociais do modo de produção capitalista
Competente para o convencimento e a dominação. O conceito de
impedem a criação de qualquer consenso, e menos nos países onde a
Cidadania, abordado no início deste texto, servirá como base para a
satisfação das carências básicas de grande parte da população ainda não
crítica destes processos e as reflexões sobre o sentido da ação
se fez, como é o caso do Brasil.
municipal na produção do espaço urbano.
instrumento
do
controle da sociedade por algumas de suas partes, pois, como sabemos,
No caso brasileiro, o Estado ocupa-se em regular o restante da sociedade para impedir uma quebra do tecido social, utilizando a carência e a violência engendrada como instrumento de dominação. A
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana ciência e a técnica aparecem como instrumentos pretenciosamente isentos a serviço da dominação. Ao justificar suas ações, o Estado recorrerá freqüentemente aos critérios ‘técnicos’, livrando aquelas ações de seu caráter político e ideológico. Não se trata aqui de desqualificar essencialmente tais critérios, negando sua validade. Porém, é lícito supor que critérios técnicos ‘convenientemente’ escolhidos são utilizados dentro da estrutura de um discurso ideológico específico, legitimando-o. No campo da produção do espaço urbano, estas ações se traduzem na associação do Estado e do Capital, poder político e poder econômico. Vimos como, históricamente, esta associação engendrou, na metrópole, políticas com ênfase quase absoluta nas obras viárias, justificando e propiciando, entre outras coisas, um salto industrial no bojo da expansão do mercado e da indústria automobilística e, em última análise, uma apropriação predatória do solo urbano, encarado como mercadoria e instrumento de lucro.
198
199
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O caso Faria Lima
desta avenida, ligando-a à avenida dos Bandeirantes. Os imóveis do trecho haviam sido declarados de utilidade pública (sujeitos à desapropriação). Cabe notar que a aprovação da lei se deu por decurso
C
omo vimos, há um sentido mais complexo no alto investimento em obras viárias em toda a cidade. Porém, o caso
Faria
Lima
apresenta
algumas
particularidades
importantes, além de servir como paradigma para a análise
de outras intervenções do mesmo caráter na cidade. Ainda em 1991, durante a gestão Luíza Erundina frente à Prefeitura de São Paulo, considerou-se o prolongamento da Avenida Faria Lima até a rua Tabapuã, numa extensão de apenas 400 metros, a um custo total de US$ 10,7 milhões . O projeto era considerado ‘barato’, mas não prioritário, e não havia previsão para sua realização 190. O
prolongamento
da
Avenida
Faria
Lima
defendido
pela
administração Paulo Maluf (1993-96) se justificaria pela interrupção abrupta que a avenida sofreria, resultado de um projeto construído apenas parcialmente, prejudicando o trânsito da região, agora bastante estrangulado. De fato, desde 1968, um projeto já definira o traçado 190O
governo anterior, de Jânio da Silva Quadros, havia investido 38,6 milhões de dólares no projeto do Bulevar da Avenida Juscelino Kubitschek, obras que foram paralisadas pela administração de Luíza Erundina, assim como o túnel sob o Rio Pinheiros, que havia concentrado investimentos de 110 milhões de dólares na administração Quadros. Na administração de Erundina, as prioridades seriam a duplicação da Ponte Eusébio Matoso e a canalização do córrego Águas Espraiadas, com a construção de uma avenida (o que seria finalmente concretizado durante a administração de Paulo Maluf). A duplicação da ponte já estaria licitada desde a gestão Jânio Quadros. Era considerada emergencial para o trânsito da região Sudoeste. Foi concluída durante a gestão Luíza Erundina, com a construção da Ponte Bernardo Goldfaber.
de prazo, num momento delicado da história política do país, e não incluía todo o projeto que acabou sendo construído mais tarde 191. Em 1990, o arquiteto Júlio Neves, a serviço da EMURB, já havia idealizado uma outra solução, que ligaria a Faria Lima à Engenheiro Luís Carlos Berrini, no Brooklin, que já se consolidava como novo núcleo de escritórios na zona Sul, com edifícios de planta livre que permitiam uma maior flexibilidade aos escritórios. Já nesta época o número de desapropriações na Vila Olímpia colocava em cheque a realização da obra. Ao eleger-se em 1992, Paulo Maluf escolheu a Avenida Nova Faria Lima como prioridade. A Avenida foi anunciada como a grande obra de sua gestão frente à Prefeitura de São Paulo. Obra de grande valor simbólico para a cidade “competente”, já que intervém numa de suas áreas
mais
valorizadas,
seria
como
um
cartão
postal
daquela
administração, além de alavancar, como se veria, a candidatura do sucessor de Paulo Maluf, o economista Celso Roberto Pitta. Outros argumentos utilizados para justificar o projeto incluíam sua vinculação à adequação da área à futura 4ª linha do metropolitano e da construção de uma estação intermodal no Largo da Batata; a transferência do
191Alguns
analistas identificaram na apressada utilização da lei de 1968, parte da estratégia da adm. Paulo Maluf de acelerar os procedimentos e fazer da obra um ‘fato consumado’, tornado ‘inevitável’ sua realização. (OESP:11.03.94, p.C-1)
200
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana tráfego de automóveis de passeio da Marginal Pinheiros para o interior da trama urbana, etc.
pois haveria maior adensamento.
Passaram-se dois anos entre o anúncio do projeto, no primeiro mês de 1993, e a sua votação definitiva. Após muitos debates e a resistência das Associações de Moradores dos bairros de Vila Olímpia, Alto de Pinheiros e Pinheiros, foi iniciada a construção da avenida em 1994, tendo como pano de fundo uma política de ‘fato-consumado’, que forçaria a aprovação do projeto na Câmara Municipal. O executivo assumia os custos iniciais da obra, contando com sua irreversibilidade. Os
repórteres
•A médio prazo, o trânsito na região voltaria a ficar congestionado,
Victor
Agostinho
e
Luís
Henrique
•Diversas transversais saturadas, como a rua dos Pinheiros e a rua Teodoro Sampaio, ‘segurariam’ o tráfego da avenida. •A nova avenida descaracterizaria três bairros (V. Olímpia, Pinheiros e Itaim), “consolidados e com boa qualidade de vida”. •A avenida induziria o tráfego, propiciando a maior utilização do transporte particular. •As desapropriações seriam muitas e dispendiosas.
Amaral
•O sistema de captação de recursos da Prefeitura nunca havia sido
(FSP:22.05.94, Especial-1), destacaram o que consideravam ‘pontos
testado, e poderia deixar o município com uma dívida avaliada em US$
positivos’ e ‘negativos’ da Avenida. Os ‘positivos’ seriam:
150 milhões.
•Desafogamento do trânsito, principal argumento das autoridades para a realização da obra. •Promoção de ‘integração’ viária paralela com a ferrovia e com as futuras linhas do metrô. •Reordenação da ocupação do solo, criando um centro de comercial
Neste capítulo discutiremos alguns destes temas à luz das ações posteriores da administração municipal e da documentação existente.
A Operação Urbana
e de serviços, uma opção à Avenida Paulista. •Valorização dos imóveis. •Inauguração do mecanismo de Operação Urbana.
“O
Prefeito
Paulo
Maluf
afirmou
ontem
que
as
obras
de
•A obra teria custo zero, com o mecanismo do Cepac.
extensão da Avenida Faria Lima terão “custo zero”, apesar de as
•Verticalização de um bairro já dotado de infra-estrutura.
mudanças de zoneamento aprovadas na região representarem apenas 10% do custo oficial das desapropriações. ‘O retorno financeiro já
Os pontos ‘negativos’ seriam:
201
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
começou, continuará nas próximas gestões e não só vai cobrir o
os recursos públicos utilizados têm origem em sua maior porção no
c u s t o , c o m o u l t r a p a s s á - l o . ’ , a f i r m o u 192 . ”
contribuinte de baixa renda (ver Bresser Pereira, ‘A Economia Brasileira: Uma Introdução Crítica’, Brasiliense.)” (idem)
Flávio Mello in “Maluf garante que avenida vai ter ‘custo zero’”, OESP:
Malta vê a Operação Urbana como uma forma de ‘captação’ de
21.10.95, p.C-6.
recursos adicionais aos orçamentos públicos, “através da outorga onerosa da parcela adicional de direito de construir a ser gerada na
O
própria operação”, ou seja, a ‘venda’ do direito de construção acima do prolongamento da Avenida Faria Lima está intimamente
que a lei de zoneamento permite num local específico. Segundo o
ligado a duas novas modalidades de gerenciamento do solo
urbanista, esta parcela a ser ‘outorgada onerosamente’ justifica-se
urbano e das obras públicas: a ‘Operação Urbana’ e o
justamente pela ampliação infra-estrutural embutida na Operação. No
‘Cepac 193‘, de tal modo que a implantação destes mecanismos acabou
caso das cidades brasileiras, as obras viárias teriam destaque, pois seria
por confundir-se com as discussões sobre a pertinência do próprio
esta a ‘infra-estrutura’ mais ‘estrangulada’. O mecanismo tornaria
prolongamento.
possível, ‘como exemplo’, abrir avenidas com recursos obtidos através
O urbanista Cândido Malta Campos Filho, numa importante defesa da Operação Urbana, escreve em 1994 o artigo “Faria Lima e o
da própria valorização imobiliária gerada pelas avenidas que assim se ‘autofinanciariam’, minorando os custos para o poder público.
desenvolvimento humanizado” (FSP:02.06.94, p.2-2), em que analisa o
Malta defende que o mecanismo da Operação Urbana reduziria
mecanismo. Segundo Malta Campos, a especulação imobiliária se
enormemente a especulação imobiliária concentradora de renda, pois
constituiria numa das importantes formas de concentração de renda no
reverteria em benefício público o que antes seria benefício privado. “A
Brasil.
classe média, representada pelos proprietários das áreas atingidas (que
“Seu
mecanismo
principal
ocorre
quando,
através
do
investimento público, valoriza-se propriedades imobiliárias, sendo que 192(continuação
da reportagem) “Ele disse que as despesas com as obras de prolongamento da Faria Lima ficarão abaixo do custo previsto inicialmente. O inicial era de R$ 200 milhões e deve ficar em R$ 140 milhões, considerando obras viárias e desapropriações, segundo seus cálculos. O investimento poderá retornar em até 20 anos com a venda do espaço aéreo por meio dos CEPACs e com o reajuste da Planta Genérica de Valores (PGV) em função da valorização dos terrenos e imóveis.” OESP: 21.10.95. p. C-6. 193Certificado de Potencial de Construção.
deixam
de
ganhar
especulativamente
todo
o
montante
a
que
usualmente tem tido acesso), os empreendedores imobiliários (que por isso tenham lucros menores que os usuais) e os compradores finais dos produtos imobiliários (que não receberão mais os subsídios embutidos no não pagamento dos custos infra-estruturais urbanos dos edifícios, hoje pagos pelo povo em seu conjunto), dividirão entre si este
202
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana ônus.”(idem). Ainda segundo Malta, o ‘povo em geral’ se veria livre do
financeira que seria revertida para a própria obra. (JT:12.02.94, p.2.). O
ônus de pagar por avenidas que interessam mais à classe média, pois
que diferencia os Cepacs, segundo seu próprio idealizador, seria sua
estariam nos arredores destas avenidas as melhores chances de sucesso
‘securitização’, termo que define a possibilidade de negociação com
do mecanismo da Operação Urbana.
terceiros, e a possibilidade de sua aplicação em outros setores da
A Operação Urbana é vista, então, como um instrumento legal que
cidade.
permite à Prefeitura mudar as características de uma determinada
Em tese, os Cepacs solucionariam dois problemas: o fornecimento
região da cidade e se capitalizar, compartilhando ônus e distribuindo
de recursos para o financiamento não-tributário dos gastos públicos 194
benefícios. Os empreendedores podem construir mais do que a lei de
e a absorção para a coletividade da renda diferencial gerada por
zoneamento permite, comprando ‘potencial construtivo adicional’. A
investimentos públicos e apropriada por segmentos específicos do
Prefeitura, em princípio, usaria os recursos obtidos para financiar as
setor privado (JT:12.02.94, p.2). Segundo Cintra, é uma forma
próprias obras e também na construção de moradias para os
alternativa de financiamento para investimentos públicos, já que a
desapropriados e para a população carente.
arrecadação
de
impostos
e
os
empréstimos,
domésticos
e
internacionais, estariam esgotados como fontes de recursos, já que “a recessão reduz a arrecadação tributária e a inflação impede a
Os CEPACs
M
arcos
continuidade das operações de crédito a longo prazo.”
195(idem)
O Cepac é considerado pelo poder público como um instrumento de Cintra,
idealizador
do
mecanismo,
define os Cepacs como direitos adicionais de construção autorizados de forma onerosa pela Prefeitura,
dentro
do
perímetro
de
uma
Operação Urbana. Na prática, permitem a mudança do zoneamento para que se construa
para além do permitido pela lei do zoneamento, com a prévia aprovação da Câmara de Vereadores, em troca de uma contrapartida
arrecadação voluntária, em que os recursos captados por sua venda são vinculados por lei a determinado plano de investimento público, tendo seu valor atribuído pelo mercado na proporção do fluxo de benefícios privados que os investimentos públicos geram. No caso da Faria Lima, 194Financiamento
através de outras fontes que não os impostos diretos que o município arrecada. 195Estes argumentos em defesa do Cepac acabaram tornando-se obsoletos, com a estabilização econômica do país a partir de então, mas não tiram sua validade dentro do contexto em que foram concebidos. Como vimos, a transferência da arrecadação de impostos para as prefeituras determinada na Constituição de 1988 e o aumento decorrente das receitas municipais constitui-se no maior argumento contra os motivos expostos por Cintra, mas não esgota a questão.
203
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
10% da arrecadação seria destinada à construção de Conjuntos do
possível esta operação.” afirmou Roberto Paulo Richter (FSP:06.11.95,
Projeto Cingapura, 10% para a construção de unidades multifamiliares
p.3-5.). A atuação destes Fundos nos grandes empreendimentos
para os desapropriados da própria Faria Lima e 80% para o pagamento
imobiliários é notória.
das desapropriações necessárias. (FSP:06.11.95, p.3-5). O
Cepac
foi
sancionado
pelo
Prefeito
para
A aprovação de cada projeto passa pela CNLU (Comissão utilização
no
Normativa de Legislação Urbanística), entretanto, o mecanismo é
prolongamento da Faria Lima no dia 14 de março de 1995. Para as
criticado. Segundo o então vereador Maurício Faria (PT), haveria risco
demais áreas da cidade, seu uso ficava proibido por liminar judicial,
de concentração de investimentos (e de área construída) em áreas
pois o mecanismo não havia passado pelas duas audiências públicas
restritas, ocasionando congestionamento da infra-estrutura. Segundo o
previstas em lei.
vereador, a CNLU deveria exigir RIV (Relatório de Impacto na
Cada Cepac equivale a um número variável de metros quadrados adicionais, conforme a localização do terreno 196.
Vizinhança), para todos os projetos apresentados. (FSP:19.05.95, p.33).
Num primeiro momento, seu valor foi fixado pela CNLU em US$
Sobre a isenção da CNLU pairam dúvidas após a constatação de que
600 e pensou-se em organizar um megaleilão onde se venderiam, de
pelo menos oito projetos de mudanças pontuais de zoneamento na
uma só vez, todos os Cepacs da Operação Urbana Faria Lima.
região de Paraisópolis, no Morumbi, haviam sido propostos pelo
Esperava-se a arrecadação de algo em torno de US$ 300 a 500 milhões.
arquiteto Arnaldo Furquim Paoliello. Paoliello era representante da
Os Cepacs seriam lançados na BMF (Bolsa Mercantil de Futuros), que
Prefeitura na Comissão e preparava um estudo de reurbanização e
por
revalorização que integraria um projeto da Prefeitura chamado
sua
vez
os
lançaria
também
no
mercado
internacional.(FSP:06.11.95, p.3-5). O principal ‘alvo’ nas vendas da Prefeitura seriam os chamados
“Programa São Paulo 2020”, na FGV. Ao mesmo tempo, mantinha um escritório
de
empreendimentos
e
participações
que
prometia
Fundos de Pensão, considerados os únicos agentes capazes de
‘promover’ junto à Câmara Municipal mudanças de zoneamento,
viabilizar a Operação. “Hoje em dia quem tem recursos para investir
mediante pagamento de honorários. (JT:21.03.96, p.A-13)
no mercado imobiliário são os Fundos de Pensão. Sem eles não é
196Na área próxima à avenida Cidade Jardim, um Cepac equivale a 1,5 m 2 de construção além do permitido. Já em Pinheiros, ou em bolsões da Vila Madalena, um Cepac permitiria a construção de até 6 m 2 adicionais.(FSP:06.11.95, p.3-5)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Avenida passo a passo
204
Esta denúncia engendrou a formação, dois dias mais tarde, de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara de Vereadores do Município.
“A Faria Lima será a 5ª Avenida de Nova York” Paulo Maluf, então prefeito da cidade de São Paulo. (JT:16.02.93, p.126) “A avenida vai ser um inferno”. Arquiteto Siegbert Zanettini.(JT:16.02.93, p.1-26)
Em
Paralelamente, ocorre a redução da extensão da avenida, que não se estenderia mais até a Engenheiro Luís Carlos Berrini, mas somente até a avenida Hélio Pellegrino, evitando a desapropriação de 100 imóveis. O Prefeito justificou a decisão argumentando que o preço das 100 desapropriações seria demasiado elevado. A desistência, entretanto, evita o desgaste do Prefeito numa disputa com os moradores num momento bastante delicado, quando as denúncias de favorecimento tomam vulto.
acontecimentos
De fato, o vereador Arselino Tatto (PT) entrou com representação
marcaram a Operação Urbana Faria Lima.
contra Paulo Maluf junto à Procuradoria Geral de Justiça no dia 27 de
Aparecem
favorecimento
julho, tendo em vista a liberação pelo Prefeito de 1 bilhão de dólares
ilícito no vazamento de informações que
para as empreiteiras que o haviam ajudado a eleger-se. (OESP:27.07.95,
julho
de
1995,
dois
denúncias
de
permitiram a pessoas próximas ao Prefeito Paulo Maluf a compra de
p.C5).
imóveis na região da Operação. A imprensa paulistana registrou que o
“Ninguém entende a decisão do Prefeito”, escreve Flávio Mello em
comprador sabia de antemão sobre os planos de modificação da
27 de julho de 1995 (OESP, p.C5). “A decisão do Prefeito (...) deixa
Prefeitura, coordenando seus investimentos com estes planos. 197
todo mundo perplexo” (editorial do Jornal da Tarde:31.07.95, p.4) A decisão é criticada por todos, inclusive pelo idealizador do Projeto,
197MANSO,
Bruno Paes, “Calim Eid é um dos felizardos da Faria Lima.”, OESP:25.06.95, p.C16.: “Região do Largo da Batata esconde Mina de Ouro: Os imóveis da região do Largo da Batata, dominada por casas simples e comércio popular, terão valorização mínima de 100% quando as obras de extensão da Avenida Faria Lima estiverem concluídas. Entre os proprietários que vão se beneficiar com a explosão imobiliária da área está o advogado e empresário Calim Eid, coordenador de duas campanhas eleitorais de Paulo Maluf, e que tem pelo menos 20 imóveis na região, entre apartamentos, casas e terrenos.” OESP: 25.06.95, p.C16.
arquiteto Júlio Neves, para quem a extensão da avenida era ‘muito importante’. O coordenador do Movimento Pinheiros Vivo, arquiteto Roberto Saruê, declara que acha ‘muito estranha’ a decisão do Prefeito, pois
o
trecho
poupado
apresentava
o
menor
desapropriações de todo o projeto (OESP, 27.07.96, p.C5).
número
de
205
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Coincidentemente, o responsável pela aprovação da modificação na
vereadores teriam sido orientados a votar em conjunto, seguindo os
Câmara, deputado Maurício Faria, do Partido dos Trabalhadores, foi
resultados da negociação da Prefeitura com a Associação Vila Olímpia
também o responsável pela abertura da CPI mencionada. Este fato não
Viva,
foi destacado pela imprensa 198.
partido.(FSP:09.03.95, p.3-2).
surpreendendo
as
direções
municipal
e
estadual
do
Faria já havia sido coordenador da negociação entre a Prefeitura e
A atuação de Faria aproximou-o incontestavelmente de algumas
os moradores de Pinheiros, Vila Olímpia e Itaim, por ocasião da
lideranças do bairro. Horácio Galvanese, coordenador do Movimento
aprovação da votação da própria Operação Urbana , em março do
Pinheiros Vivo, uma das principais oposições ao prolongamento da
mesmo ano. Na votação, a Prefeitura recuou do projeto original, e
avenida, tornou-se mais tarde acessor de Faria na Câmara Municipal (A
foram poupados 58 imóveis antes condenados, no que foi visto como
Sociedade Civil Organizada em Pinheiros, p.5).
uma barganha. Além disso, assegurou-se que o zoneamento da região
De fato, se num primeiro momento, o Movimento Pinheiros Vivo
continuaria a ser residencial. Naquela ocasião, Faria ‘monopolizou’ as
estabeleceu oposição frontal ao prolongamento da avenida, com ações
negociações entre Prefeitura e moradores, segundo o depoimento de
agressivas que incluíram a ocupação da Câmara dos Vereadores, num
vereadores do PT descontentes com o apoio do partido ao Projeto.
segundo momento o Movimento foi convencido de que a negociação
Este episódio abriu uma crise na bancada petista na câmara 199. Os
seria a melhor saída. Esta negociação se faria através da apresentação de um ‘plano alternativo’, elaborado pelo urbanista Cândido Malta
198A
utilização de CPIs como instrumento de ‘intimidação’ e negociação na Câmara de Vereadores paulista parece ser de praxe: “As CPIs também acabam sendo usadas como forma de pressão política. Exemplos: durante as negociações para o projeto da Faria Lima, Arselino Tatto tentou emplacar uma CPI que investigasse a EMURB e o escritório do arquiteto Júlio Neves, responsável pelo projeto da Faria Lima. O PT, que era contra o projeto, tentava assim ‘intimidar’ o prefeito. A estratégia petista não vingou.” (FSP: 27.09.96, Especial A-8) 199 Segundo artigo da vereadora petista Aldaíza Sposati (FSP: 20.03.95, p.3-3), a aprovação teria ocorrido por três motivos: “a prevalência da política do fato consumado, executada por Reynaldo de Barros, que demoliu mais de cem imóveis enquanto era discutido o projeto de lei do Executivo na Câmara; a sujeição da mesa e da maioria dos vereadores aos ditames de Paulo Maluf, desrespeitando normas regimentais e legais na tramitação de projetos de lei e, em sentido contrário, a capacidade de luta e pressão de um movimento da sociedade civil que criou condições de construir uma proposta alternativa na região [ numa referência ao plano diretor de bairro elaborado pelo urbanista Prof. Cândido Malta Campos Filho para os Movimentos Vila Olímpia Viva , Pinheiros Vivo e Itaim Vivo ].”
Campos Filho. Segundo avaliação dos autores do texto A Sociedade Civil Organizada em Pinheiros, é partir deste ponto que o Movimento perde força, pois a proposta alternativa acaba sendo pulverizada, servindo para “legitimar o projeto de Júlio Neves, aprovado por unanimidade graças a uma pequena mudança no traçado da Avenida no trecho de Vila Olímpia - o que não alterava em nada sua essência especulativa.” (idem, p.5) Finalmente, em outubro de 1995, é inaugurado o primeiro trecho da Avenida, entre o Largo da Batata e a Avenida Pedroso de Morais. Neste momento a Câmara Municipal ainda não havia regulamentado o
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
206
uso de Cepacs em toda a cidade e a Prefeitura media o interesse da
A construção do shopping é aprovada pela CNLU em dezembro de
iniciativa privada no mecanismo, cujo valor foi inicialmente fixado em
1995, mas logo em seguida a obra é embargada, pois havia
US$600. Paulo Maluf dá entrevista afirmando que “avenida vai ter
irregularidade na posse do terreno. (OESP:09.03.96, p.C10).
custo zero” (OESP: 21.10.95, p.C6).
Até março de 1996,
outra ‘operação’ da Operação Urbana Faria
Os planos municipais são temporariamente frustrados por uma
Lima havia sido bloqueada pela justiça, após ter sido aprovada na
explosão nos preços da nova avenida, cujos terrenos têm valorização
CLNU: um prédio residencial 25 andares na esquina das ruas Pedroso
de
imobiliários
de Moraes e Coropés. O prédio de luxo, projeto do arquiteto Ruy
identificaram um grande exagero nesta elevação de preços, atribuindo-a
Ohtake, teve sua construção embargada, pois o juiz do caso entendeu
à grande expectativa de valorização criada pela própria Prefeitura.
que a CNLU havia desrespeitado as normas da própria Operação
até
100%
(OESP:27.10.95,
p.C5).
Especialistas
No mês seguinte, a Prefeitura de São Paulo tenta articular uma
Urbana. A iniciativa do bloqueio partiu do vereador Maurício Faria
venda massiva de Cepacs aos Fundos de Pensão das companhias
(PT), segundo quem o zoneamento teria sido modificado de Z8-CR1
estatais das grandes estatais, notoriamente os maiores investidores
(corredor comercial) para Z-2, o que não está previsto nas normas.
imobiliários da capital nos dias de hoje, indicando o insucesso do
Entre outras irregularidades, havia um acesso ao edifício a partir da
mecanismo no mercado.(FSP:06.11.95, p.3-5.).
avenida Pedroso de Moraes e o gabarito do edifício, 70 metros, estaria
O primeiro mega-investimento na chamada Nova Faria Lima chega
muito acima do permitido, mesmo numa Z2.(OESP:09.03.96, p.C10.)
aos jornais em novembro de 1995. Júlio Neves propõe a construção de
Ao final do mandato de Paulo Salim Maluf, já agora totalmente
um Shopping Center no terreno da casa bandeirista do Itaim, que seria
terminada, a chamada Nova Faria Lima estava longe de ter custo zero.
restaurada e envolvida por uma enorme estrutura em forma de U. O
Esperava-se, entretanto, que a avenida se pagasse no médio e longo
projeto gera enorme polêmica, pois além de interferir num bem
prazo. Apenas 15 empreendimentos foram aprovados desde junho de
tombado, estaria localizado a menos de 1000 metros do Shopping
95, gerando uma receita para o município de aproximadamente US$31
Center Iguatemi, fazendo-lhe franca concorrência.
200(JT:
30.11.95,
p.6B). 200O projeto seria uma resposta ao empresário Carlos Jereissati, proprietário da rede nacional de Shoppings Iguatemi, que havia recentemente inaugurado o São Paulo Market Place praticamente ao lado do Shopping Morumbi, na zona Sul da cidade., acusação que é rebatida pelo empreendedor.
A polêmica se agrava com a descoberta de que o terreno pertenceria à massa falida da Selecta Comércio e Indústria S.A., de propriedade, entre outros, de Naji Nahas, megainvestidor acusado de fraude falimentar, tornando indisponível a área. Este fato não teria impedido a CNLU de aprovar o investimento comercial, arrecadando para a Prefeitura cerca de US$14 milhões através dos mecanismos da Operação Urbana.(JT:21.12.95, p.2A).
207
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
milhões. Das 15 ‘operações’, apenas uma fica na Avenida, as restantes situam-se em ruas próximas, nas chamadas áreas de influência. A
própria
especulação
imobiliária
estaria
emperrando
os
empreendimentos, já que os proprietários de terrenos estariam pedindo cerca de 900% a mais do que era cobrado antes da extensão da avenida. (FSP: 10.08.96, p.3-4). Até agosto de 1996 nenhum terreno havia sido comercializado, segundo o próprio autor do projeto, arquiteto Júlio Neves. O mercado imobiliário foi unânime em concordar que a sobrevalorização dos terrenos inviabilizava qualquer projeto à época. Segundo o então Secretário Municipal do Planejamento, Roberto Paulo Richter, a existência de muitos terrenos vazios começava a normalizar os preços a partir do 2° semestre de 1996.(FSP:10.08.96, p.3-4).
208
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana “(...)porque
Técnica & Política: Uma construção ideológica “Luíza Erundina: ‘O senhor administra a cidade pensando em empreiteira e lucro, enquanto nós pensamos na melhoria da condição de vida da maioria’. Celso Pitta: ‘A diferença está nisso, D. Erundina: a gente administra a cidade com visão administrativa e não com visão político-partidária’.”
o
compromisso
desta
administração
não
é
com
ideologias, e sim com o povo, com o desenvolvimento e com o futuro de nossa cidade.” Reynaldo de Barros in “Karlmarxstrasse”, FSP:20.04.94, p.1-3.
M
arcos Cintra, então professor da Fundação Getúlio Vargas e vereador paulistano (PL), no importante artigo “A Avenida da Modernidade” (JT:15.06.94, p2) combate as críticas ao prolongamento da Faria Lima,
que atribui aos ‘interesses grupais’. Segundo o vereador, os critérios técnicos seriam evidentes em demonstrar a necessidade da nova
Debate entre Luíza Erundina e Celso Pitta, então candidatos à Prefeitura de São Paulo, na sede do jornal O Estado de São Paulo, em 23 de outubro de 1996. (OESP:24.10.96, p.A8). “Afinal, uma questão técnica precisa de uma solução técnica. Parece-me muito simples, nítido, transparente. Depende do bom senso, equilíbrio, isenção político-partidária, boa-fé e amor à cidade.”
avenida, vinculando sua construção à adequação da área à futura 4ª linha do metropolitano. “Trata-se de permitir a construção de uma grande estação intermodal na área de influência da Faria Lima e melhores condições de transbordo de ônibus na região congestionada do Largo da Batata, em Pinheiros.” O vereador indica que os custos da obra seriam ‘totalmente’ bancados pela iniciativa privada, “desde que a Câmara Municipal aprove a emissão e a venda dos Cepacs”. Quanto à prioridade
dos
ordenamento
Miguel Colasuonno in “A verdade sobre o projeto da nova Faria Lima”, OESP:06.07.94, p.C-4.
de
investimentos, prioridades
Cintra
não
afirma
implicaria
que
alocar
o
simples
os
recursos
disponíveis integralmente ao primeiro colocado. “Em realidade, recursos escassos devem ser distribuídos entre as várias prioridades, de forma que o último cruzeiro alocado em cada uma delas seja igual para todas as atividades públicas.” O então vereador Marcos Cintra, já havia
209 defendido
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e o
projeto
em
artigo
jornalístico,
(FT:12.02.94,
p.2)
de usuários de ônibus no eixo do CEAGESP (zona oeste) até a avenida
afirmando que, para além de toda a pressão oposicionista, a obra seria
dos Bandeirantes (zona sul), ‘eliminando a poluição sonora e
“fundamental para a modernização da cidade”. “E mais, se aprovada a
atmosférica’ que os congestionamentos causariam. O então presidente
operação urbana em torno da Avenida Faria Lima, São Paulo estará
da EMURB lembra que a obra teria sido proposta por Luíza Erundina,
dando um exemplo internacional de modernidade urbanística.”
em seu mandato, em companhia de Paul Singer, então secretário
Reynaldo de Barros, engenheiro, ex-prefeito de São Paulo (19791982), então secretário municipal do Desenvolvimento Urbano e
municipal do Planejamento e alega que os custos seriam zerados através do mecanismo do Cepac.
presidente da EMURB, escreve, em abril de 1994, “Karlmarxstrasse”
Miguel Colasuonno, economista, ex-prefeito de São Paulo e então
(FSP:20.04.94, p.1-3). No artigo, Barros dá conta da ‘enxurrada’ de
presidente da Câmara de vereadores, escreve o artigo “A verdade sobre
representação,
de
o projeto da nova Av. Faria Lima”(OESP:06.07.94, p.C-4), onde
inconstitucionalidade, protestos e passeatas patrocinados ou com o
identifica a ‘confusão’ entre ‘técnica’, ‘política’ e ‘ideologia’, em
apoio da OAB, CUT, Greenpeace, PCdoB e PT. Passando por cima da
detrimento das evidentes vantagens econômicas da Operação urbana
representatividade destas instituições, afirma que “poucas vezes na
em questão. “E o curioso é que, nesta confusão de valores, até a mídia
história de São Paulo uma questão urbana foi tão ideologizada e
é levada em sua boa fé e, conseqüentemente a opinião pública.”
ações
populares,
ações
cautelares
e
mistificada.”(idem). Barros considera elitistas os argumentos de que a
No artigo “O Falso Dilema” (FSP:23.06.94, p.3-2), o então
obra seria cara, antiecológica, não prioritária e ‘perturbadora da paz da
deputado estadual pelo PMDB, João Oswaldo Leiva, argumenta que a
pacata Vila Olímpia’, atribuindo à dinâmica econômica da cidade, e não
discussão
à ação do prefeito, a determinação das mudanças nos bairros
prolongamento da Avenida Faria Lima se constituiria num ‘falso
residenciais da cidade, separando ação política de ação econômica. A
dilema’: o prolongamento, visto como a ‘única’ opção face a um
necessidade de racionalizar o desenvolvimento, cuja dinâmica seria
trânsito de automóveis cada vez mais caótico, esconderia um problema
‘caótica em si mesma’, teria levado ao projeto Faria Lima. Sob esta
mais amplo, ligado à falta de um planejamento global da cidade e a
ótica, a pressão imobiliária pela verticalização no Itaim e Vila Olímpia
investimentos na área do transporte público. “Se desde a gestão
seria a responsável pela verticalização, aparentemente inelutável
Reynaldo de Barros a cidade tivesse ao menos um esboço de Plano
condicionada a um só fator: ‘dinheiro’. Barros classifica a avenida
Diretor, hoje a questão da Faria Lima seria discutida dentro de um
como prioritária, pois geraria 20 mil empregos e beneficiaria 2 milhões
quadro racional e mais amplo de desenvolvimento.” (idem)
que
então
se
travava
em
torno
da
prioridade
do
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Leiva aponta um outro caminho na distribuição de benefícios e ônus de
obras
públicas:
“Com
planejamento
antecipado,
210
Marcos Cintra, ex-secretário municipal do Planejamento e líder do
analisamos
governo na Câmara Municipal em 1993, parece ter sido o mentor
alternativas e definimos prioridades. Antecipando decisões todos
intelectual da estreita vinculação da nova avenida com os mecanismos
lucram. O dono do imóvel evita construir num local que será
da Operação Urbana e depois o Cepac, conforme demonstram seus
desapropriado e mesmo fazer reformas dispendiosas. A Prefeitura
inúmeros artigos publicados na imprensa 202. Esta vinculação visava a
prepara processos desapropriatórios sem malabarismos, com tempo
legitimar o projeto frente a uma oposição ferrenha.
para buscar acordos que não prejudiquem os expropriados e as batalhas
Segundo a arquiteta Rita Gonçalves, uma das responsáveis pela
judiciárias são evitadas.”(FSP:23.06.94, p.3-2). Ao contrário de Malta,
Operação Urbana na EMURB, pretende-se, com a venda do potencial
Leiva não vê a inevitabilidade da construção das avenidas, desprezando
construtivo adicional nos terrenos adjacentes à Nova Avenida Faria
seu fabuloso poder catalisador de opiniões, útil nas disputas políticas e,
Lima, conseguir fundos para a construção de moradias populares,
principalmente, a influência da classe média nas decisões do poder
especialmente para o Projeto Cingapura.
público. Malta dá como ‘inevitáveis’ as novas avenidas, sem jamais
Sobre uma possível semelhança entre os mecanismos da Operação
abdicar das negociações e das propostas pela melhoria do transporte
Urbana e do chamado “Solo Criado”, definido na Proposta de Plano
público, e busca minorar o impacto negativo dos investimentos
Diretor de 1991, a Arquiteta Rita Gonçalves, uma das responsáveis
privilegiadores 201.
pela Operação Faria Lima na EMURB, afirmou que as idéias são semelhantes, mas não idênticas. Na verdade, o “Solo Criado” pretende
201Um dos pontos altos da ‘contra-reação’ aos protestos gerados pelo anúncio do prolongamento da Avenida Faria Lima foi a publicação, em março de 1994, do Manifesto “Em defesa de São Paulo”, onde personalidades políticas e intelectuais, geralmente identificadas com posições de direita, atacavam as ações que visavam a “obstruir a qualquer preço - inclusive com ações violentas (...) - as atividades administrativas regulares e em articular ações e projetos inovadores.” (OESP:25.03.94, p.A-1), apoiando os projetos de ‘racionalização’ e ‘modernização’ que o então prefeito vinha ‘prosseguindo ou iniciando’, apelando para a população, “sem prejuízo do saudável pluralismo de suas opções políticas e eleitorais, (...) rejeitando ações de confrontação radical e irracional” . O Manifesto foi assinado por: Abreu Sodré, ex-governador e chanceler, Abram Szajman, então presidente da FCESP, Luís Antônio de Medeiros, sindicalista, Miguel Colasuonno, Lincoln da Cunha Pereira, presidente da Associação Comercial de São Paulo, Marcos Arbaitman, presidente da Associação hebraica, Ricardo Yazbek, presidente do Secovi, Falcão Bauer, presidente do IFBQ, José Roberto Bernasconi, presidente da Unicon, Antônio Soares Amora, presidente da Academia Paulista de Letras, João Scatimburgo, da Academia Brasileira de Letras, Manoel Pires da Costa, presidente da BM&T, Fábio
fazer um inventário do “estoque” de potencial construtivo dentro de uma região dada, para em seguida vendê-lo à iniciativa privada em troca de verbas para a construção de moradias ou melhoria da infraestrutura urbana. A cidade veria seu coeficiente de aproveitamento do
Magalhães, diretor do MASP, Mauro Sales, publicitário, Roberto Dualibi, publicitário, Alfredo Mário Savelli, presidente do Instituto de Engenharia, Enílson Simes, sindicalista, Paulo Queiroz, presidente do Sindicato dos Bancos, Edison Musa, presidente da associação Brasileira de Escritórios de Arquitetura, João Batista Gatti, presidente da Abecip e Luiz Eduardo Pinto Lima, vice-presidente do Unibanco. 202Ver “Cronologia dos fatos na imprensa”.
211
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
solo nivelado ao fator 1 de aproveitamento do solo
203(o
Zoneamento
óbvio da abertura da nova Avenida, mas pelos próprios mecanismos
prévio cessaria), e todo excedente seria de propriedade do poder
adotados na Operação, que permitirão às incorporadoras a construção
público.
de edifícios comerciais de grande porte. 204
Na Operação Urbana, a lei de Zoneamento é mantida. Não se faz
Segundo Cândido Malta (FSP:02.06.94, p.2-2), “ao propor tal
um inventário de estoque de potencial construtivo por bairro ou
operação urbana o arquiteto Júlio Neves, através de empresas de
região, mas pretende-se, na periferia das grandes intervenções do poder
consultoria imobiliária de grande experiência, estimou o retorno a ser
público, vender potencial construtivo a ser revertido para a construção
obtido na forma de recursos públicos, na venda de potencial
de moradia popular em outras regiões ou capitalizar a própria obra.
construtivo, na ordem de US$200 milhões, se bem que a médio prazo”.
Este potencial construtivo é expresso em metros quadrados e significa
A folga de recursos advinda da diferença entre previsão de gastos e
a possibilidade de se construir para além do que o zoneamento
capital gerado pela Operação 205 poderiam ser utilizados, segundo o
permitia até então.
arquiteto Júlio Neves, na abertura de outras vias para a própria classe
No caso da Operação Faria Lima, os terrenos não imediatamente
média que ‘daria origem aos recursos’, ou como “ressarcimento dos
lindeiros à Avenida, são considerados “indiretamente beneficiados”,
investimentos públicos historicamente beneficiadores das [classes] mais
pois sofrerão o impacto do novo empreendimento. Também aí será
ricas.” (idem).
possível comprar potencial construtivo extra. Isso inclui toda a região
A expectativa de arrecadação com a operação variam. Em maio de
batizada neste trabalho ‘Baixo Pinheiros’, onde, como sabemos, o
95, esperava-se aprovar o equivalente a 300 edifícios, arrecadando mais
zoneamento (Z-2), é restritivo à verticalização e há predomínio de
de 1 bilhão de dólares. Este valor, certamente bastante otimista,
pequenas casas de classe média (‘sobrados’), e galpões comerciais nas
baseava-se no cálculo da ‘venda’ pela Prefeitura de 2.250.000 m 2 de
ruas mais movimentadas. O arquiteto Fábio Mariz Gonçalves considera um erro esta avaliação, já que a maior parte da verticalização se dá em Z-2, citando o exemplo do próprio Itaim. A Operação Urbana Faria Lima representa assim uma valorização concreta e imediata dos terrenos próximos, não somente pelo fato
203Coeficiente
que permite a construção de área equivalente à metragem do terreno.
204A
Arquiteta Gonçalves chama a atenção para uma área na Vila Olímpia, contígua à Nova Faria Lima, onde a Operação Urbana não será posta em prática. Aí, os moradores preferiram ficar de fora da Operação, fazendo grande pressão sobre a Prefeitura, na mídia e na câmara dos vereadores. Na prática isto significa que o bairro não sofrerá modificações tão drásticas quanto nos trechos pertencentes à Operação, os terrenos não se valorizarão da mesma maneira, já que o potencial construtivo continuará o mesmo. “É o pior de dois mundos”, diz a arq. Rita, “já que todos os efeitos negativos da nova Avenida já estão presentes, sem nenhum benefício em contrapartida. A verdade é que estas pessoas foram muito mal orientadas.” Ver Anexo : “Entrevistas”. 205Diferença avaliada em aproximadamente US$ 50 milhões em 02.06.94 (FSP:p.2-2)
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana área edificável além do que permitiria a Lei de Zoneamento. Este dinheiro seria destinado às obras de prolongamento, principalmente o pagamento das desapropriações necessárias. Na mesma época, seria aprovado o primeiro projeto pela CNLU 206 um prédio de 27 andares na rua Professor Artur Ramos, no Itaim 207 (FSP:19.05.95, p.3-3). De fato, reportagem de junho de 1995 dá conta da ‘euforia’ que dominou o mercado da incorporação e construção: Romeu ChapChap, da construtora homônima, Renato Genioli Jr., da Concyb, além de Sérgio Mauad, presidente do Conselho Consultivo do Secovi - SP
212
As Desapropriações
U
ma das conseqüências da Operação Faria Lima foi a desapropriação de aproximadamente 374 imóveis (de 500 originalmente previstos 208), a um custo de aproximadamente US$ 100 milhões (FSP:10.08.96, p.3-3. e OESP:13.08.96, p.C5),
Pagar aos desapropriados, em dinheiro, o valor de mercado dos seus
(Sindicato que reúne as imobiliárias da cidade), davam o testemunho de
imóveis era uma das premissas básicas do projeto da Nova Faria Lima
seu entusiasmo com a possibilidade de novos negócios na região.
(FSP:03.06.93, p.3-2), premissa que, ao que parece, não teria sido
Mauad previa a instalação majoritária de escritórios, inclusive de
cumprida.
empresas que se transfeririam da região da Avenida Paulista. (FSP, 11.06.96, p.3-9).
Os imóveis teriam sido inicialmente avaliados por uma comissão formada por representantes do Secovi, do Instituto de Engenharia, do Instituto
Brasileiro
de
Avaliação
Imobiliária,
do
Sindicato
de
Corretores de Imóveis e da EMURB (OESP:26.05.93, p.5). Em meados de março de 94, os primeiros desapropriados começaram a receber as indenizações em juízo. Os valores correspondiam ao valor venal dos imóveis, muitíssimo inferior ao seu valor no mercado. O juiz encarregado do caso nomearia um perito para avaliar novamente os imóveis pelo seu valor de mercado e exigiria a complementação do 208As 206Comissão
Normativa de Legislação Urbanística, formada por representantes do governo e da sociedade civil. 207Trata-se de um prédio residencial de luxo, empreendimento da Kauffmann, que desembouçou cerca de US$ 1.100.000 para adquirir uma área potencial de construção de 4.000 m 2 .
previsões para o número de imóveis desapropriados e para o custo total da obra variaram muito ao longo do projeto e da construção. Em 25 de abril de 1994 eram estes os números para as desapropriações: • Trecho 1-Largo da Batata-Pedroso de Morais: 106 imóveis. • Trecho 2-Cidade Jardim-Juscelino Kubistchek: 208 imóveis. • Trecho 3-Vila Olímpia: 58 imóveis. (OESP:25.04.94, p.C-1)
213 pagamento. (OESP:19.03.94, p.G1). Entretanto, juristas já alertavam que este procedimento faria com que o processo se arrastasse, podendo demorar anos até que os desapropriados fossem convenientemente ressarcidos. Em alguns casos, o valor pago pela Prefeitura correspondeu a 1/5 do valor do imóvel, impossibilitando a compra de um imóvel do mesmo nível: “Para o corretor de imóveis Roberto Capuano, o valor de mercado do sobrado de Cestari está entre US$ 30 e US$ 35 mil [contra cerca de US$ 6,4 mil pagos pela Prefeitura]. Pelo valor venal, ele só conseguiria comprar uma casa menor na ‘alta periferia’, como Mauá ou Ferraz de Vasconcelos. Em São Paulo não dá para comprar nem um terreno’, afirma(...).” (OESP:19.03.94, p.G1).
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Estado e Capital: Parceria ou apropriação ?
Os
vetores determinantes no estabelecimento de políticas urbanas têm sido, históricamente, a relação
entre
Capital
e
Estado,
visando
a
qualificar a cidade para a produção, circulação e
consumo de mercadorias e, na nova fase capitalista, o equipamento da cidade com os serviços e espaços que permitem a instalação e o funcionamento de uma nova economia global. Entretanto, no caso dos países em desenvolvimento, fala-se sobre um significado específico da cidade em sociedades profundamente desiguais: a inserção social através dos benefícios urbanos. Neste quadro, algumas ações urbanas teriam, ou poderiam vir a ter, um significado social intrínseco ao distribuir a renda e contribuir para a formação do indivíduo, habilitando-o a atuar dentro da atual ordem econômica. Ainda que estas ações possam, em alguns casos, ser incluídas no rol das ações paternalistas do Estado, visando a atender carências imediatas dos sujeitos e mantendo-os ao largo da ação política, também podem significar, dentro de um quadro mais amplo de ações, uma possibilidade de inserção social. Enquanto a discussão concentra-se na eficácia ou não da Operação Urbana, esquecem-se os motivos iniciais alegados pela Prefeitura para
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
214
o prolongamento da Avenida. Paradoxalmente, a primeira justificativa
estudos recentes mostram que o trânsito não vem se deslocando para a
(de caráter puramente estrutural), não conseguiu ocultar o caráter da
Faria Lima, que permanece ociosa.(SQVP) 210
Operação, que visou criar um espaço privilegiado de investimento
Entretanto, o presidente da CET, Gilberto Lehfeld, considera a
imobiliário na cidade, ainda que houvesse uma ‘contrapartida social’.
Avenida uma alternativa de ligação entre zonas oeste e sul, já que a
De fato, esta ‘contrapartida social’ só fez por tornar mais aceitável aos
nova via, em conjunto com a malha viária pré-existente, significaria 13
olhos da opinião pública uma operação que, em essência, tinha por
km de vias paralelas à Marginal.
objetivo favorecer a concentração de capitais nas mãos dos grandes
Segundo pesquisas da CET, os motoristas utilizam a Marginal para
empreendedores imobiliários e das empreiteiras envolvidas na execução
viagens de, em média, 6 km de extensão. Os que a utilizam para
do projeto.
viagens curtas estariam tirando ‘espaço’ daqueles que a utilizam para
Resta o fato de que os maiores prejudicados com o prolongamento, os
proprietários
dos
terrenos
desapropriados,
tiveram
viagens mais longas.
uma
Entretanto, segundo o Sr. Mark Alfred da Richard Ellis Consultoria
contrapartida financeira proporcionalmente muito aquém dos lucros
de Imóveis 211, a Faria Lima está sujeita a uma grande concorrência
das empreiteiras e incorporadoras, ou mesmo da própria Prefeitura. Os
imobiliária nos próximos anos. O restante do bairro do Baixo-
35 milhões arrecadados até agosto de 1996 serviram para pagar uma
Pinheiros tem Zoneamento restritivo, que permitiria somente a
pequena parte daquelas desapropriações. Os projetos ‘sociais’ da
construção de edifícios muito baixos. Segundo Alfred, nem a Pedroso
Prefeitura não se beneficiaram de maneira nenhuma.
de Moraes, uma avenida de porte, estaria sujeita a grandes mudanças.
Voltemos à questão estrutural (ou técnica). O arquiteto Paulo
Estas mudanças, em menor escala, poderiam ocorrer nas ruas Butantã e
Bastos lembra a atual política da Prefeitura 209,de tirar veículos
outras de grande tradição comercial. A Avenida Faria Lima teria a
particulares da Marginal Pinheiros, dando-lhes opção de trânsito no
vantagem de contar com o dispositivo dos CEPACs, além de ser uma
interior da cidade, o que justificaria a construção da Nova Faria Lima.
avenida de grande ‘prestígio’. No entanto, as grandes mudanças, do
Bastos considera a justificativa oficial totalmente improcedente, já que
ponto de vista imobiliário, ocorreriam no extremo oposto da nova Avenida, do lado da Vila Olímpia, em direção à Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini.
209Descrita neste trabalho, entre outros, no relatório de entrevista com a Arquiteta Gonçalves, da EMURB.
210
“Faria Lima deve desafogar Marginal”, FSP: 23.10.95, p. A-1. entrevista com Mark Alfred (nome fictício?)
211Ver
215
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e Constituição Brasileira. Entretanto, a carta prevê este tipo de ação, em
Considerações sobre a nova Faria Lima
A
nome do bem comum. Todavia, sabe-se alguns setores (incorporadores, construtores e proprietários de terrenos lindeiros) lucraram mais que qualquer outro segmento da sociedade, mesmo aqueles que se beneficiaram mais diretamente com a abertura da nova avenida e um contestável desafogamento do trânsito na região.
questão
das
desapropriações
suscitou
algumas
No caso dos proprietários de terrenos lindeiros, o lucro teria sido
considerações importantes, que extrapolam a validade
maior devido à implantação do mecanismo da Operação Urbana, que
‘técnica’ ou ‘legal’ da questão e se expandem para outros
teria valorizado enormemente aqueles terrenos. Não entraremos aqui
campos da produção do espaço urbano paulistano.
no mérito das denúncias do favorecimento direto e ilícito a indivíduos
No caso da Avenida Nova Faria Lima, alguns proprietários
conheciam a lei de 1968 que declarava parte da área como de utilidade
ligados à máquina administrativa do município, ainda que este favorecimento tenha sido documentado.
pública para a desapropriação 212. Entretanto, quase 30 anos se passaram
Qual seria, portanto, a maneira mais justa de remuneração àqueles
entre a promulgação da lei e a efetiva desapropriação. Neste período,
que foram desapropriados? Falou-se em ressarcimento integral do valor
os imóveis não estiveram inseridos dentro de um processo ‘normal’ de
do imóvel, mais um bônus de 50% do valor do imóvel sob a forma de
valorização e desvalorização. Ainda que
CEPACs. Ainda assim, o que justificaria, na outra ponta, o enorme
estivessem numa área
potencialmente valorizada, muitas áreas permaneceram estritamente
lucro imobiliário gerado ?
horizontais e, em muitos casos, de caráter predominantemente
Do lado das construtoras e incorporadoras, tal lucro reverteria em
residencial. A comercialização dos imóveis residenciais tornou-se difícil
parte para a cidade na forma de remuneração pelo direito de construir
após 68. Isto implica num prejuízo não quantificável dos proprietários
metragens
dos imóveis.
implantado com a Operação Urbana. Aqui, existiriam aspectos não
além
das
permitidas
pelo
zoneamento,
mecanismo
Ao prejudicar francamente ‘alguns’, ainda que para o benefício de
quantificáveis, e portanto não tributáveis, da valorização do solo
‘muitos’, a Prefeitura estaria atentando contra direitos inscritos na
causada pelo prolongamento de uma avenida de grande prestígio, como a Faria Lima. Tal valorização, induzida e, como sabemos, restrita a uma
212Novas
áreas, não previstas naquela lei, tenham sido incorporadas ao projeto.
área específica da cidade, traz uma outra dimensão aos aspectos éticos
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana da desapropriação. De mais a mais, o prolongamento da avenida insere-se num quadro bastante claro de privilégio dos investimentos públicos na zona Sudoeste da cidade, o que restringe o número dos beneficiados pela avenida (a parcela mais rica da população). Como
vimos,
foram
criados
mecanismos
que
permitem
aos
investidores comprar área verticalizável da Prefeitura, indo além dos limites estabelecidos pelo zoneamento. As áreas lindeiras à nova Avenida Faria Lima foram divididas em áreas de adensamento comercial ou residencial. Em tese, a comissão estabelecida pela CNLU deverá decidir sobre cada caso, evitando desta maneira o adensamento excessivo, o que comprometeria a infra-estrutura. Entretanto,
a
abertura
de
avenidas
parece
ser
uma
solução
paradoxalmente negativa para o problema do trânsito em São Paulo. Contando com o financiamento dos Cepacs, o poder público em busca de verbas para o pagamento de uma dívida pública gigantesca e de financiamento para as obras viárias que lhe dão visibilidade, tende a permitir o adensamento das áreas ‘beneficiadas’ pela Operação Urbana. As expectativas de arrecadação com o Cepac da própria Prefeitura implicam
em
adensamento.
empreendimentos
comerciais,
Este
adensamento,
tende
a
atrair
geralmente mais
com
automóveis
particulares, congestionando o trânsito e ‘exigindo’ mais obras viárias, formando, como se vê, um círculo vicioso bastante lucrativo para empreiteiras, construtoras, investidores imobiliários (entre eles os Fundos de Pensão) e a indústria automobilística.
216
217
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Um compromisso possível?
regulamentações para os investidores privados. Isto foi particularmente
Se
verificável no caso da Operação Urbana Faria Lima. A Operação Urbana insere-se no quadro, defendido por alguns, de
os mecanismos da Operação Urbana e do Cepac
‘compromisso possível’ entre o Capital e as forças sociais que o Estado
podem
suas
supostamente representa ao propor a Operação. Porém, sabemos que o
estratégias de desenvolvimento, planejamento e
Estado brasileiro carece de um verdadeiro caráter público, expressando
rearranjo estrutural da metrópole, podem ter
de maneira inequívoca seu compromisso com a adequação da cidade
também um caráter fragmentador e excludente ao
para a produção e a reprodução do capital e o controle das massas
servirem a um Estado que procura ferramentas para facilitar as
urbanas. Certas camadas urbanas, condenadas à carência perpétua,
operações do Capital, sem considerações maiores pela cidade entendida
enfrentam enormes dificuldades na universalização dos resultados de
como espaço da cidadania.
suas lutas, restringindo-se a uma ação política de ‘curto fôlego’, que
servir
ao
Poder
Público
em
Ao constatarmos o sentido geral das ações do poder público no
visa tão somente o atendimento de suas necessidades mais básicas.
Brasil, torna-se difícil justificar a Operação Urbana como instrumento
Vimos como o controle de certas camadas pelas elites se dá pelo
‘isento’ de política urbana, já que os lucros gerados através das obras
convencimento ideológico e pela manutenção das carências, sem
viárias tornadas possíveis pela Operação, ou justificadas por ela,
qualquer concessão à distribuição de renda, à educação e aos direitos
terminam por concentrar-se nas mãos dos poucos empreendedores e
civis.
proprietários mais diretamente beneficiados. A ‘contrapartida’ para a
Que tipo de ‘compromisso possível’ (no sentido que se utiliza para
sociedade acaba obscurecida pela constatação de que tais obras seriam
justificar a Operação) pode advir de tal quadro, onde os elos mais fortes
realizadas
maior
não querem compromissos ou concessões e os elos mais fracos não
possibilidade de lucro, e não necessariamente onde as obras seriam
estão em condições de impor quase nenhuma condição? Que tipo de
mais necessárias ou oportunas.
‘compromisso’ pode ser proposto por um Estado inteiramente
ali
justamente
onde
o
interesse
privado
vê
Resta que uma suposta ‘função social do lucro’ ajudou a tornar
comprometido com os interesses dos mais fortes? No caso específico
aceitável a própria idéia da Operação, ao justificar a transferência, ainda
da Nova Faria Lima, a Operação Urbana configurou-se em imposição e
que onerosa, da posse do direito legal de construir para além das
instrumento do capital para a realização de mais lucro.
218
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Neste quadro, a luta política de ‘curto fôlego’ dos elos mais fracos acaba se dando principalmente através da violência, que acaba reforçando as separações sociais e termina por tornar-se, por sua vez, objeto mercantil e fator importantíssimo nas relações de produção do espaço urbano 213. Os processos descritos e suas contradições éticas são precípuos à dinâmica capitalista de produção do espaço urbano na cidade de São Paulo.
Considerações sobre a atuação dos Movimentos de Bairro
Os prolongamento
da
Movimentos Vila Olímpia Viva e Pinheiros Vivo surgiram entre os moradores de classe média e tinham como objetivo básico proteger o caráter daqueles Avenida
bairros Faria
contra
Lima,
que
o
projeto
incluía
de
inúmeras
desapropriações. Temos poucos subsídios para analisar todos os aspectos que envolvem a atuação dos Movimentos nas muitas negociações que empreenderam com a Prefeitura. Tentaremos tecer apenas algumas considerações sobre alguns aspectos de sua atuação e seus resultados. Sua ação incluiu: A recusa do projeto original do arquiteto Júlio Neves, que implicaria em grandes desapropriações e alteração da qualidade de vida do bairro. A proposta de alternativas, elaboradas ou sugeridas por alguns arquitetos, com destaque para a proposta de Plano Diretor de Bairro, elaborado especialmente para os Movimentos pelo urbanista Cândido Malta Campos Filho. A negociação com o poder municipal, num segundo momento, visando minorar as perdas com o prolongamento, agora fato consumado. Concentraremo-nos sobre este último aspecto. 213Como
no caso da preferência pelos apartamentos em detrimento das casas, em nome da segurança, o apelo dos lugares fechados e protegidos, como os shopping centers e condomínios fechados de todo tipo, as indústrias da ‘segurança’e dos seguros, etc.
219
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Segundo depoimento prestado por Horácio Galvanese, coordenador do
democracia é assim, tem os seus papéis, tem o cara que diz sim, o que
combativo Movimento Pinheiros Vivo, após a derrubada da igreja
negocia, e o que diz não. Nós deveríamos ter sido o não. Quando a gente
japonesa de Pinheiros e da elaboração de uma proposta alternativa à de
fazia o papel do ‘não’, saiu uma pesquisa dizendo que 55% dos
Júlio Neves pelo urbanista Cândido Malta Campos Filho, “Nós ficamos
paulistanos eram contra a avenida. Depois que a gente cedeu este índice
no dilema se era melhor deixar que o Maluf acabasse com tudo ou salvar
mudou.” (A Sociedade Civil Organizada em Pinheiros, p.40)
um pouco. Nós preferimos salvar um pouco”. (A Sociedade Civil Organizada em Pinheiros, p.40).
Lembremo-nos que há uma grande diferença entre a desapropriação do imóvel, ainda que seu proprietário acabe sendo ressarcido de acordo os
Vimos como as negociações com a Prefeitura incluíram pressões
valores de mercado (o que não aconteceu no caso) e conservar um
políticas com a abertura de uma CPI, logo depois desativada, pelo
terreno, ainda que pequeno, próximo a uma Avenida que trará certamente
vereador petista Maurício Faria. A CPI nada tinha a ver com o
grande valorização imobiliária.
prolongamento, mas pode-se inferir que houve intenção de pressão por
Os resultados da ação, para além dos discursos, indicam que tudo foi
parte do vereador. Este havia tomado as rédeas da negociação entre os
feito para que menos moradores fossem desapropriados, certamente
Movimentos e a Câmara, criando descontentamento dentro de seu próprio
diminuindo o impacto imediato da avenida, mas reduzindo as conquistas a
partido, como foi registrado pela imprensa.
vitórias estritamente locais. Deve-se destacar que uma pequena área da
A associação de moradores de um bairro para a consecução de fins
Vila Olímpia escapa deste esquema, pois ali os moradores preferiram não
específicos neste caso insere-se num quadro pouco efetivo no campo da
se beneficiar do dispositivo da Operação Urbana, mantendo as
luta pelos direitos gerais da sociedade. Sua ação, por mais que seu
características gerais de ocupação. Galvanese, entretanto, chama a atenção
discurso buscasse incluir toda a comunidade paulistana contra o
para o fato de que os diferentes objetivos da Associação Vila Olímpia
prolongamento da Avenida Faria Lima, não estendeu suas poucas vitórias
Viva e do Movimento Pinheiros Vivo acabaram facilitando a aprovação da
para além do campo da defesa da propriedade dos moradores. Sua ação,
Operação. “Na Vila Olímpia o que estava em jogo era a preservação da
seguindo aqui o pensamento de Milton Santos, não visou a reduzir os
Z9, porque no projeto original a avenida fazia uma curva e cortava todo o
efeitos da sociedade de consumo, neste caso o consumo do solo urbano.
bairro. Quando chegou a negociação, eles realmente conseguiram
Ao contrário, visou inseri-los ainda mais na dinâmica reinante. Segundo
preservar a Z9 e a avenida passou ao lado. (...) Pinheiros sempre foi
Horácio Galvanese, o Movimento Pinheiros Vivo
jamais deveria ter
contra a negociação nas condições que eles colocavam. Mas para o pessoal
aceito a negociação, “deveria ter sido intransigente até o final. A
da Vila Olímpia era diferente, eles queriam preservar a Z9. Então os
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana vereadores de oposição acabaram votando a favor da Avenida desde que a Z9 fosse mantida.” (A Sociedade Civil Organizada em Pinheiros, pp.41-42)
220
Considerando-se o espaço uno e global, mas a sociedade múltipla e fragmentada, devemos buscar qual o significado da ação de Associações
Conforme observa Milton Santos, a respeito das Sociedades de
ou Movimentos de Bairro no sentido de aprofundar esta fragmentação,
Moradores, “Cada qual no seu nível se defende dos outros, mas é para
buscando vitórias, concessões ou alianças com o mercado. Estas são
obter uma posição melhor no mercado. As sociedades de moradores têm
necessariamente pontuais e limitadas. Ao conseguir privilégios e
um inegável papel organizativo, mas não têm fôlego para ultrapassar o
estabelecer alianças, um grupo aprofunda sua diferença com os outros
funcional, deixando intacto o estrutural.” (Santos, p.75) Ainda que os
grupos da cidade, tornando-se inimigos na concorrência por mais alianças
movimentos em questão não sejam exatamente associações de amigos de
e privilégios e reproduzindo na escala local um fenômeno que hoje se dá
bairro, isto foi justamente o que aconteceu quando não se buscou
entre as Cidades Mundiais.
generalizar as reivindicações para os mecanismos de produção do espaço,
Tal competição sugere que as idéias sobre a descentralização do
da tramitação política ou da participação pública. Seu papel se esgotou
governo municipal devem ser analisadas também sob o aspecto do reforço
com o atendimento de algumas de suas reivindicações e a Faria Lima,
à competição e a fragmentação. De fato, tal competição é um estímulo às
afinal, foi prolongada, com todas as suas implicações para a cidade.
concessões sem contrapartida ao capital. Por outro lado, administrações
Outras intervenções baseadas no mecanismo da Operação Urbana
regionais mais independentes não seriam mais concentradoras de
estariam a caminho.
investimentos que a administração de Paulo Maluf, entre outros.
Milton Santos considera que, no caso das associações de moradores, “Trata-se
de
uma
ação
política
puramente
espacista,
mas
Vimos como, no caso do município de São Paulo, as administrações
não
públicas são especificamente voluntariosas ao planejar melhoramentos
propriamente espacial. O espaço é uno e global, funcionando segundo um
públicos que beneficiarão o setor produtivo privado, sempre com o
jogo de classes que tem sua demarcação territorial. Agir sobre uma fração
dinheiro da coletividade, canalizando recursos para o quadrante sudoeste
do território sem que a ação seja pensada de maneira abrangente, pode
da cidade. Há, na verdade, uma reconcentração da renda e não sua
oferecer soluções tópicas e de eficácia limitada no tempo, servindo
distribuição através do emprego gerado por estes investimentos, como se
sobretudo ao reforço dos dados estruturais contra os quais se imaginava
supõe.
combater.” (Santos, p.75) 214 214Milton Santos cita R. Guidicci: “(...)nada pode estar mais errado, visto a grande dimensão, que agir somente ao nível da pequena (dimensão), quebrando iniciativas que
somente em determinada escala podem fazer sentido e obter eficácia no mundo moderno.” (R. Guidicci, 1980, p.174, apud Santos, p.75).
221 No caso da área metropolitana de São Paulo, podemos identificar esta competição em áreas como Alphaville, que oferece qualidade de vida, serviços e segurança (e mais recentemente, até mesmo emprego), em competição com outros condomínios, como Tamboré, para não dizer competição, num patamar específico, com todos os bairros paulistanos. Esta competição se dá visando a atrair o maior número de empresas ou indústrias, principalmente aquelas que utilizam mão de obra especializada, além de atrair também moradores de renda mais alta que seguramente pagarão mais impostos (IPTU, IPVA, etc ). Populações de alta renda e pólos de indústrias de alta tecnologia atraem investimentos em infraestrutura por parte do governo estadual ou federal. Com orçamentos aumentados e ausência de problemas sociais, aumenta o cacife político de prefeitos e vereadores das cidades onde se instalam os condomínios fechados. Ainda que a maioria dos bairros de entorno estejam localizados em municípios vizinhos à Oeste de São Paulo, acabam condicionando também os investimentos locais em infra-estrutura viária, para atender o imenso trânsito entre estes municípios e a cidade de São Paulo, já que boa parte deste trânsito é escoada justamente pela Marginal Pinheiros e vias adjacentes.
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Parte 6: O ‘Baixo-Pinheiros’
222
223
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O ‘Baixo-Pinheiros’ e a Metrópole
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Configuração Primitiva de Pinheiros
224
Em 1560, assolada pela febre amarela, é extinta a vila de Santo André da Borda do Campo e sua população transferida para São Paulo de Piratininga, que oferecia melhores condições para a defesa e deveria servir então como base para fixação de colonos portugueses e posto de comando no processo de colonização do interior. A Coroa Portuguesa
“(...) É desta onda que reflui das recordações que a cidade se embebe, como uma esponja e se dilata. Uma descrição de Zaira tal como é hoje deveria conter todo o seu passado. Mas a cidade não o conta, contém-no como as linhas da mão, escrito nas esquinas das ruas, nas grades das janelas,
nos corrimãos das escadas, nas
antenas dos pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada segmento marcado por sua vez de arranhões, riscos, cortes e entalhos (...).” Ítalo Calvino, i n A s C i d a d e s I n v i s í v e i s , p . 1 4
O
bairro de Pinheiros estruturou-se nos seus primórdios como um povoado independente, o que explica em grande parte seu caráter dentro do conjunto dos bairros paulistanos. “Pinheiros se apresenta, para quem se
preocupa com sua origem e evolução, com aspectos que lhe conferem indiscutível originalidade (...). Tal fato decorre (...) de Pinheiros ter origens remotas, dado que seu embrião data do século XVI.” (AGBP).
recomendava a separação de colonos e nativos em povoações distintas. Pinheiros foi o primeiro de uma série de aldeamentos jesuíticos implantados nos arredores do núcleo principal, com o intuito de proteger o núcleo principal e abrigar os índios da região em processo de catequização 215. A escolha do sítio, nas proximidades do rio Jeribatuba (Pinheiros), em uma plataforma elevada sobre a larga várzea inundável, foi condicionada à organização territorial indígena preexistente e à estratégia colonial portuguesa, pois naquele ponto a travessia do rio era facilitada por seu estreitamento. Tal escolha, condicionada pelo sítio geográfico e pelas atividades coloniais que aí se desenvolviam, refletiu-se no desenvolvimento da ocupação de uma vasta área da metrópole hoje existente. Retomaremos este tema, e suas conseqüências, mais adiante. Nos primeiros anos, o aldeamento de Pinheiros representou um posto avançado que permitia a aproximação sucessiva dos colonizadores com a população nativa. “Diminuía-se o impacto do processo 215A esse Miguel, n. São José, Conceição
grupo teriam pertencido, além de Pinheiros, os aldeamentos de Barueri, São Sra. Da Escada, N. Sra. Da Conceição dos Guarulhos, São José do Perohybe, N. Sra. Da Ajuda de Itaquaquecetuba, Embú ou M’Boy., Itapecerica e de Itanhaém. (AGBP)
225
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
colonizador e preparava-se o índio para ser aproveitado mais adiante
abastecimento dos núcleos urbanos mais distantes. Pinheiros deixava de
como mão de obra servil .” (Zanetti).
ser um aldeamento e passava a assumir o papel de lugar de passagem dos
O transcorrer do séc. XVII, com a retirada dos jesuítas do comando
tropeiros e viajantes. Deste modo, em contrapartida ao refluxo
do aldeamento e a continuidade no recrutamento de mão de obra servil
populacional, mantinha e consolidava sua posição estratégica na
para as Bandeiras, marcou o esvaziamento do aldeamento dos Pinheiros,
travessia do rio Pinheiros, uma espécie de porta de entrada e saída do
que em 1680 contava com 16 índios (Eram 600 em 1590). Este
burgo
esvaziamento coincidiu com a fase de descobertas de ouro em Minas
tempos.(Zanetti).
Gerais e o desenvolvimento do Ciclo do Ouro, que atravessou todo o
demográfico de Pinheiros no decorrer do século XVII e na primeira
século XVIII.
metade do séc. XVIII não prejudicou, todavia, o caráter de permanência
colonial,
papel “A
que
a
região
instabilidade
conservaria
que
através
caracterizou
o
dos
efetivo
Durante este período , os índios eram retirados de suas aldeias para
do núcleo. Este lhe vinha, antes de mais nada, de sua condição de porta
servirem nas picadas que entravam pelo território ou para trabalhar nas
de entrada (...) Que esse papel de porta de entrada fosse importante,
minas. O desfalque populacional foi tamanho que a própria coroa
prova-o, o cuidado que já se tinha em relação à ponte sobre o rio
portuguesa se encarregou de proibir a saída daqueles índios da aldeia dos
Pinheiros. (...) O caráter de permanência vinha-lhe também de sua
Pinheiros.
primitiva igreja (...) elemento de atração de povoadores, inclusive
Os centros de maior atenção da coroa portuguesa eram nesta época a região mineira e a nova capital colonial, o Rio de Janeiro. Os interesses
europeus.
Além
disso,
transformou-se
em
local
de
romarias,
interessando à população paulistana” (AGBP).
econômicos estão alhures. Desta época, poderíamos dizer que a única
A construção da primeira ponte de madeira (segunda década de
coisa que restou foram os caminhos, que conformaram o primeiro
XVIII) e da posterior ponte de estrutura metálica de 1865, sempre
núcleo do bairro, e a implantação da igreja católica, que ainda hoje situa-
mantendo a mesma posição na travessia do rio, revelam a permanência
se num importante eixo.
da relação entre o sítio geográfico e os caminhos: a ponte e os caminhos
Durante o desenvolvimento do ciclo do ouro, a capital paulistana continuou
a
ser
um
importante
ponto
de
articulação
para
as
comunicações terrestres entre as diversas regiões do interior do país. A rede de caminhos que partia de São Paulo e tinha levado os colonizadores ao interior do continente agora era utilizada para o
caracterizam a localidade dos Pinheiros 216. 216”O caminho dos Pinheiros ou antiga estrada de Sorocaba teve fundamental importância para a estruturação territorial da área de estudo. Além de permitir a saída para as regiões mais distantes ao sul e , a oeste, garantia o acesso às propriedades rurais dos colonos que ocupavam os arredores de São Paulo. Além do caminho radial, caracterizado pela estrada dos Pinheiros-estrada de Sorocaba, a chamada estrada da Boiada, que cortava as chácaras e sítios situados entre a Lapa, Pinheiros e Vila Clementino ( onde ficava o Matadouro Municipal ), foi fundamental para a futura organização territorial urbana” (ZANETTI).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Naquele período, além da ponte, cabia aos moradores da região a manutenção dos caminhos que, da beira do rio e atravessando as matas do Caaguaçu, chegavam ao centro da Vila de Piratininga. Este caminho acompanhava as terras mais altas e menos alagáveis, correspondendo à atual rua Butantã, e depois de atravessar o Largo de Pinheiros acompanhava o traçado da atual rua Cardeal Arcoverde, daí seguindo pelas Estradas do Araçá e de Pinheiros, atual rua da Consolação. Em 1779, Pinheiros é elevada à categoria de “Freguesia” e em 1789, a Câmara decretou a construção de uma estrada que ligasse o caminho de Pinheiros aos campos de Santo Amaro, caminho que corresponde aproximadamente ao traçado da atual Avenida Faria Lima. “(...) tal evolução verificou-se sem que seus antigos habitantes tivessem passado a viver melhor, tanto que, findando-se o século, os infelizes indígenas, descendentes dos antigos donos das terras, não possuíam quase mais nada.”
217.
O último quarto do século XVIII representa o fim desta fase no povoamento de Pinheiros. A Freguesia agora é habitada pelos descendentes dos antigos habitantes, já mesclados com o colonizador. “ [Pinheiros] (...) vai se transformando em um medíocre povoado ‘caipira’, de onde saem muitos daqueles agricultores que, utilizando animais, transportam o produto de seu trabalho para vendê-lo em São Paulo.” (AGBP).
226
Pinheiros se consolida e se desenvolve
A
construção da ponte metálica em substituição à antiga ponte de madeira em 1865, e a construção de uma nova capela em 1870 indicam claramente o início de uma nova etapa histórica.
“A capela, um ponto focal da vida comunitária, representava o renascimento do núcleo urbano, ou seja, o momento de sua segunda fundação, e a ponte, com o uso da tecnologia do aço, contemporânea da era industrial, representou um primeiro contato com o mundo industrial que se desenvolvia do outro lado do Atlântico.” (Zanetti). O ano de 1870 marca a intensificação do processo de urbanização na cidade de São Paulo, como conseqüência do Ciclo Econômico do Café. Novos papéis são definidos para o núcleo urbano principal e para seus satélites. A cidade conserva, no entanto, um caráter de urbanização ligado a suas origens coloniais, distinto da relativa sofisticação, ligada a padrões de urbanismo mais próximos dos então em voga na Europa. Este ano marca, em Pinheiros, a construção de uma capela dedicada a São João Batista e Nossa Senhora do Monte Serrat, exatamente onde hoje se ergue a Igreja dedicada a esta última, no Largo de Pinheiros. (Reale, p.67). Pinheiros já dispunha então de “uma cadeira de instrução pública primária para ambos os sexos”, além de “uma barreira
217MADRE DE DEUS, Frei Gaspar da, Memórias para a História da Capitania de São Vicente, 3ª ed., São Paulo: Wiszflog, 1920. apud AGBP .
227
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
estabelecida para a cobrança do imposto de taxa de passagem”, era um
do bairro. 219 Pinheiros tem então um duplo papel comercial: voltado para
“pequeno arraial da paróquia da Consolação . (AGBP).
a demanda local e ligado à sua posição de ponto de chegada e de
O bairro, nesta época, é ainda um núcleo sem importância 218, mas a
intermediação dos produtos produzidos na região e que seriam
construção da capela e as outras melhorias atestam sua consolidação,
consumidos na aglomeração paulistana. É portanto um núcleo urbano
após décadas de quase abandono.
em expansão, em meio a chácaras e olarias e próximo da extensa várzea
Instalou-se no Largo de Pinheiros um coreto onde, a partir de 1890,
cortada pelo leito do rio Pinheiros, que fornecia areia para a construção
apresentava-se a banda de música do bairro, criada e mantida por Amaro
em São Paulo. Esta tomava impulso com a mão de obra européia, que
Cavalheiro, homem de grande influência no bairro e que hoje dá nome a
erguia novas construções de tijolos e cimento, substituindo os métodos
uma de suas ruas (Reale, p.68). Cabe destacar a importância do Largo de
tradicionais de taipa de pilão.
Pinheiros como ‘centro’ do bairro e congregador das atividades cívicas, papel hoje em parte perdido.
É desta época a origem da atual configuração urbana da cidade de São Paulo. Com 60 mil habitantes nos últimos anos do século, a cidade entra
Pinheiros, ao contrário de outros sítios cortados pela ferrovia, terá
no
século
XX
já
com
480
mil
habitantes.
Num
período
de
seu desenvolvimento mais lento que aqueles. “Foi o único dos grandes
aproximadamente 15 anos, experimentou um crescimento populacional
vales paulistanos a permanecer estranho ao sistema ferroviário da
inédito, devido especialmente ao incremento da imigração européia e a
metrópole, daí advindo a ausência de indústrias e a definição do caráter
seu novo papel de coordenação das atividades econômicas ligadas ao
residencial da área.” (Reale, p.63). Em 1890 é criado o loteamento da
capital cafeeiro, em detrimento de Campinas, assolada pela febre amarela
Villa Cerqueira César, transformando a Chácara Água Branca dos
ao final do século anterior.
Pinheiros e o Sítio do Rio Verde em arruamentos. A cidade como um
“Neste momento a cidade é densa e concentrada, com um padrão
todo prossegue em ritmo de transformações aceleradas, havendo um
‘citadino’ pré-metropolitano de crescimento”. (MEYER, SBM). A
incremento geral das atividades produtivas.
indústria, que teve seu primeiro impulso a partir de 1870, está apenas
Em
Pinheiros
agricultura,
desenvolvem-se
indústria,
artesanato
em e
paralelo
comércio.
as
atividades
Olarias,
de
chegando, e o café continuará como grande propulsor da economia até
carvoarias,
os anos 20 e 30. Apenas em 30, a indústria, ainda associada ao capital
comércio de mulas e instalação para tropeiros caracterizarão a economia
218Tinha cerca de apenas 200 casas, distribuídas em 6 ou 7 ruas. (Reale, p.67)
219Neste ano é aberta a primeira padaria de Pinheiros, a padaria do Alemão, na rua do Comércio , atual Butantã (Reale, p.68). Este fato ilustra o crescente caráter urbano da região, onde aos poucos abandonam-se os hábitos agrícolas (como a produção de pão para consumo próprio).
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
228
cafeeiro, passará a determinar os ritmos e costumes desta “Nova York
primeiras olarias no bairro, que se beneficiam da composição do solo
nanica”, como a chamará o escultor ítalo-germânico Ernesto de Fiori,
para produzir tijolos e cerâmicas 221.
em 1936 220.
Neste período define-se também o ‘esqueleto’ da malha viária de
Em Pinheiros, a chegada do bonde (1902) à rua Teodoro Sampaio
Pinheiros. “Baseou-se principalmente na presença de uma série de
(esquina com a rua Capote Valente), aliada à instalação do ‘Mercado
radiais definidas em função dos antigos caminhos. Seu eixo principal foi
Caipira’, futuro Mercado de Pinheiros (1907), consolida a vocação do
representado por seção da antiga estrada de Sorocaba, compreendendo
bairro como entreposto para os produtos agrícolas produzidos tanto nas
as ruas Pinheiros e Butantã; cruzando-o tivemos um caminho de boiadas
chácaras da região como nos municípios a Oeste, e sela a vocação de
que ligava a Lapa (...) à Vila Clementino e que, passando por Pinheiros,
conurbação entre os dois núcleos. O atual Mercado de Pinheiros situa-se
compreendia principalmente a Estrada Grande das Boiadas, rua Fernão
a apenas uma quadra do antigo Mercado Caipira, origem também da
Dias, a própria rua Pinheiros, rua Groenlândia, rua das Boiadas (Vila
Cooperativa Agrícola de Cotia (constituída oficialmente em 1927). Como
Nova Conceição) e outras, a eles acrescentavam-se a rua Paes Leme para
nos lembra Flávio Vilaça, “Não é à toa que o Largo é conhecido como
o Porto Veloso, a atual Cardeal Arcoverde, para o Araçá e a Teodoro
Largo da ‘Batata’ e que aí está a sede da Cooperativa Agrícola de Cotia!”
Sampaio, em função dos bondes. O conjunto constituiu-se (...) no
(SQVP).
arcabouço da estrutura de Pinheiros.”(AGBP, p.101).
“Sua presença [do Mercado] revestiu-se de um significado particular, pois permitiu uma melhor definição da função de Pinheiros como núcleo receptor de uma produção agrícola interessando áreas ao longo das estradas para Itapecerica, Cotia e Itú. Talvez resida na precocidade da presença do Mercado a própria origem de Pinheiros como centro de comércio atacadista.” (AGBP, p.100). Em 1908 o bonde chega até o Largo de Pinheiros, marcando a progressiva incorporação do núcleo urbano dos Pinheiros à expansão residencial que se verificava na cidade. É desta época o surgimento das
220ZANINI, Walter. História Geral da Arte no Brasil, 1983.
221Já no século anterior registravam-se a presença de louceiras na região.(Reale, p.66) Em algumas reportagens colhidas por Ebe Reale, poderemos perceber o caráter do bairro de então. Em 1910, o Diário Popular publicava: “(...)No rio Pinheiros existe um número avultado de lanchas e canoas que fazem o transporte do produto das olarias. Há grande tráfego de barcas carregadas de lenha e carvão que aportam em Pinheiros, vindas das matas do Morumby. “.(“Diário Popular”:06.08.1910, in Reale, p.p. 69-70.)
229
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Um novo padrão de urbanização: a Cia. City e as elites no Oeste
o serviço de água encanada. Há um grande impacto na valorização dos terrenos e o estímulo à ocupação da região. A retificação do rio Pinheiros, um longo processo que dura de 1928 a 1943 empreendido principalmente pela Light and Power Co., é fundamental para a valorização da área e a incorporação de novas áreas ao processo de urbanização. A Cia. City, cujos diretores eram os mesmos
Em
1915, a Cia. City, empresa urbanizadora vinculada ao
da Light, foi a grande beneficiária, pois havia adquirido, em 1912,
capital
América,
grandes áreas nas várzeas e nas encostas do vale, entre Pinheiros e Lapa.
paradigma para a urbanização dos bairros nobres da
O Prefeito Prestes Maia declara, em 1942, a importância dos terrenos
cidade. É deste ano também o primeiro serviço de iluminação pública, a
liberados para o mercado imobiliário (MELHORAMENTOS, p.14) e
gás. Apenas dez anos depois, em 1925 a mesma companhia lançaria o
Robert Moses, em 1950, incluirá a área em suas propostas para a cidade,
Alto de Pinheiros, causando um grande impacto na urbanização do
prevendo sua importância na estruturação do espaço urbano paulistano.
internacional,
lança
o
Jardim
quadrante sudoeste da cidade, como veremos. Observou-se que: “O
Já em 1930 pode-se considerar completo o processo de incorporação
significado não decorre tanto do que esse loteamento pudesse implicar
de Pinheiros à malha urbana da cidade, malgrado os espaços vazios entre
como crescimento espacial de Pinheiros, dado que só muito mais tarde,
aquele e o núcleo principal. Abre-se a Avenida Rebouças e há o
especialmente na década de 50, é que começou a interessar um casario
prolongamento e posterior alargamento da rua Pedroso de Moraes. O
relativamente denso. Sua importância está, principalmente, no fato de
Jardim Paulistano e o Alto de Pinheiros se firmavam como opções
que uma grande empresa imobiliária já via, na ocasião, possibilidade de
residenciais, ainda que este último só se consolidasse definitivamente na
aplicar capitais confiando no desenvolvimento da área.” (AGBP, p.102)
década de50.
A instalação da Sociedade Hípica Paulista, em 1921, no antigo Sítio
Em 1931 a Faculdade de Medicina e o Instituto de Higiene são
do Capão, num retângulo formado pelas ruas Teodoro Sampaio,
transferidos para a Avenida Dr. Arnaldo, estimulando ainda mais a
Mourato Coelho, Arthur de Azevedo e Pedroso de Moraes, sugere um
ocupação da encosta do vale do rio Pinheiros. Em 1940 ergue-se o
movimento para dotar a região de serviços e equipamentos para as
Jockey Club (primeiro grande empreendimento no além rio) e em 1944 é
classes altas. Em 1929, algumas casas pinheirenses passam a contar com
aberto o Hospital das Clínicas.
230
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Pinheiros configura-se como um bairro estrategicamente posicionado no sítio urbano que, além de suas funções residenciais, abrigaria uma série de atividades, ligadas à escala da cidade, nova metrópole industrial e, mais tarde, metrópole industrial e terciária 222. Em 1941 muda-se a Sociedade Hípica Paulista e a área remanescente é arruada e urbanizada. Aí se constróem prédios de três andares e algumas casas e o colégio estadual Fernão Dias, marcando o adensamento da rua Teodoro Sampaio. A extensão das quadras do bairro favorece o aparecimento das vilas, muito numerosas aí.
Pinheiros na Cidade Industrial
O
período do pós-guerra marcou o início de mudanças drásticas no cenário paulistano, cujo crescimento se intensifica com a concentração de capitais industriais na cidade. O antigo eixo industrial beneficiado,
avança entre
em outros
direção
ao
fatores,
ABC,
por
sua
posição estratégica entre São Paulo e seu porto, Santos. Em Pinheiros, há o progressivo vencimento dos grandes obstáculos representados pelas inundações
periódicas
e
pela
precária
articulação
do
sistema
viário.(Problemas que persistiriam através do tempo, como sabemos) Já nos primeiros anos da década de 50 a malha urbana torna-se contínua entre o núcleo mais antigo da cidade e o bairro de Pinheiros . O centro histórico do bairro intensifica suas funções de intermediação entre o centro da cidade e uma vasta região periférica, que ia deixando de ser exclusivamente rural para se constituir em periferia urbana, graças ao incremento do uso do automóvel e, principalmente, do ônibus. A publicação “Aspectos Geográficos de um Bairro Paulistano” chega a qualificar aqueles bairros periféricos como “satélites pinheirenses” (idem, p.104). A década de 50 assiste a novos melhoramentos urbanos no bairro, como o calçamento de ruas, canalização de córregos, alargamento do 222 Veremos como os urbanistas Cândido Malta Campos Filho e Flávio Vilaça explicam este fenômeno diferentemente.
Largo de Pinheiros e urbanização da Praça Benedito Calixto.
231 A partir de meados da década de 60, coincidindo com um período de grandes mudanças na economia brasileira, há uma intensa reedificação promovida pelos empreendedores imobiliários e pelas intervenções do poder público, que procuram adequar a estrutura urbana do bairro em função da dimensão metropolitana da cidade atual. É de 1966. o primeiro Shopping Center brasileiro, o Iguatemi., na Avenida Faria Lima. Desde então, este vem sendo o centro de compras de maior prestígio na cidade, atendendo aos setores médios e altos da população, indicando o prestígio da área. Por esta época, o Largo da Batata já haveria se firmado como centro de transbordo de passageiros entre a cidade e as periferias a Oeste. De certa maneira, esta configuração manteve o caráter popular daquela área, em oposição ao caráter geral da Avenida Faria Lima. A década de 70 vê o alargamento da rua Iguatemi (Faria Lima) e da avenida Henrique Schaumann. Valdir Zonta Zanetti comenta:- “As marcas da intervenção e da difícil conciliação entre o espaço urbano gerado pelo alargamento (...) ainda estão presentes. (...) O significado de projetos como esse transcende a uma proposta de restruturação viária e esbarra na questão da memória histórico-urbana da cidade, bem como da revalorização e renovação das áreas antigas da capital”.(ZANETTI)
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
O resultado de escolhas específicas
P
inheiros do final do século XX é certamente o resultado de escolhas políticas e urbanísticas de outras épocas, mas as rupturas aparecem freqüentemente. As primeiras escolhas, entre elas a de São Paulo de
Piratininga como núcleo coordenador do povoamento do interior do Brasil, determinaram o papel de Pinheiros dentro de um esquema territorial específico. Este esquema territorial renova-se a cada nova etapa histórica, sem que seus elementos se percam totalmente na mudança. Assim, poderíamos falar num papel estável deste lugar dentro do território: um “porto-urbano” (de acordo com a terminologia inspirada em Pirènne), ou “localidade-ponte” (AGBP, p.23); passagem, entreposto comercial, mas também moradia. Lembra-nos o urbanista Flávio Vilaça que o bairro estruturou-se, num primeiro momento, como um povoado independente, e que isto explica seu caráter atual, de uma quase pequena cidade dentro da metrópole, inclusive com vários vestígios rurais (SPQV). No entanto, como observou a Arquiteta Rita Gonçalves, da EMURB, o uso misto e a presença de uma população tradicional que estabelece com o ambiente e entre si relações de vizinhança sólidas, impede que o bairro transforme-se num mero lugar de passagem.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
232
outra estrutura social, origem bastante mais tardia e uma estrutura
A Área em Estudo
A
cidade de São Paulo conta com 20 Administrações Regionais, unidades administrativas que congregam um número variável de
distritos 223. De maneira geral, os distritos identificam-se com a figura do ‘bairro’, mas nem sempre seus limites coincidem. A Administração Regional de Pinheiros possui quatro distritos: Alto de Pinheiros, Pinheiros, Itaim-Bibi e Jardim Paulista. Adotaremos aqui como convenção o termo ‘Baixo Pinheiros’ para indicar o núcleo mais antigo de ocupação do distrito de Pinheiros, cujo centro poderíamos localizar no Largo de Pinheiros. Para efeitos do TGI, delimitaremos uma área entre as Avenidas Prof. João Hermann Jr., Pedroso de Moraes/ Faria Lima, Eusébio Matoso e Nações Unidas/ Marginal Pinheiros. Este é, historicamente, “o bairro de Pinheiros propriamente dito 224“. Esta escolha justifica-se pelo caráter homogêneo dos aspectos sociais, morfológicos e históricos existentes na área. Ainda que os bairros vizinhos, como Cerqueira César e Alto de Pinheiros, venham a ter sua formação intimamente ligada ao desenvolvimento de Pinheiros, não guardam com este a identidade mencionada. Entre outras coisas, têm
223A Lei 10.932/91 estabelece um total de 96 distritos na cidade. 224Urbanista Flávio Vilaça, FAUUSP. (SQVP).
morfológica diversa. Estes limites coincidem também com a parte pinheirense da ‘Operação Urbana Faria Lima’.
O lugar do Baixo-Pinheiros na Nova Cidade: Pólo e Encruzilhada
V
imos como a posição do núcleo urbano original de Pinheiros em relação à vila de São Paulo de Piratininga fez com que desde muito cedo suas vocações se revelassem. Esta posição
conferiu-lhe, neste século, o papel de porta de entrada para a metrópole, servindo as populações do Noroeste e Sudoeste da capital e suas periferias, além de constituir-se em entreposto para os produtos agrícolas das regiões periféricas a Oeste. Os caminhos que ligavam São Paulo ao Sul do país também encontravam aí um ponto importante de aproximação da metrópole e, mais tarde, seu ponto de articulação com a malha viária da cidade. Estas características fazem de Pinheiros um grande porto urbano 225, uma
225Poderíamos considerar os pontos de chegada e partida das populações, as estações de ônibus, de trem, etc. como portos urbanos, de acordo com terminologia inspirada em Henri Pirènne (A Cidade Medieval).
233
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
importantíssima encruzilhada de caminhos, além de pólo de serviços e
metrópole e seu Centro, constituindo-se em importante ponto de
emprego da cidade de São Paulo. Pinheiros conserva seu papel de
passagem para aqueles que vão do Centro e Oeste para o Sul da cidade e
entreposto
território
vice-versa. A malha viária tem sido em grande parte reformulada, como
metropolitano e no interior do Estado. Neste sentido, o maior indício da
sabemos, tendo em vista uma reqüalificação da região para um novo
importância de Pinheiros ainda é a Sede da Cooperativa Agrícola de
papel de centralidade na cidade. Entretanto, vimos como estas
Cotia. A Cooperativa, hoje falida, ainda teve fôlego para erguer as
reformulações têm um significado para além de uma suposta melhoria
estruturas de um futuro Shopping Center, jamais concluído, no Largo da
estrutural, interferindo na vida dos habitantes do lugar e servindo de
Batata.
base para a valorização comercial dos terrenos da região.
para
os
produtos
agrícolas
produzidos
no
As especificidades da região dialogam com um contexto maior que
O bairro hoje se destaca como centro regional de serviços terciários e
seus limites legais ou tradicionais. As soluções para seus “problemas”,
empregos, atraindo diariamente uma população considerável. Pinheiros
isto é, as sugestões de tomada de posição frente a suas questões
configura-se como um pólo de grande e múltipla atração : trabalho,
específicas, demandam sucessivas aproximações e afastamentos. As
consumo e serviços. [desenvolver]
questões que o bairro suscita necessitam portanto ser trabalhadas em diferentes escalas, tomando a cidade e o território como um todo orgânico e dinâmico, evitando as análises ‘fotográficas’ 226. Hoje, com aproximadamente 16 milhões de habitantes 227, a região metropolitana de São Paulo tem em Pinheiros um entroncamento importante para as comunicações terrestres entre as regiões NO e SO da 226Por ‘análise fotográfica’ entenderemos a análise puramente formal, que não dá conta dos fenômenos sociais, econômicos e políticos que caracterizam a vida urbana. Este tipo de análise atém-se geralmente à forma urbana entendida como forma positiva, isto é, uma forma que existe por si, configurando um espaço objetivado, claro e pretensamente apreensível em todas as suas facetas. O espaço, neste caso, reduz-se a uma construção meramente geométrica. Nesta diretriz objetivista excluem-se os conflitos, contradições, indeterminações e ambigüidades que constituem os fenômenos urbanos. Vimos como esta exclusão é parte importante das operações ideológicas produzidas no espaço urbano, e como tais operações engendram aproximações equivocadas do ‘fenômeno urbano’. 227IBGE, 1995, estimativa.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
‘Uma ilha popular cercada de riqueza por todos os lados’.
234
Vimos também como a Companhia City, responsável por este novo padrão de urbanização, os bairros-jardim, foi a principal beneficiária quando da retificação do rio Pinheiros (1928-1943), que liberou vastas áreas para a incorporação, áreas estrategicamente adquiridas anos antes pela Companhia.
De
acordo com o diagnóstico apresentado pelos urbanistas Flávio Vilaça e Cândido Malta durante o seminário ‘Pinheiros e a Qualidade de Vida’ 228, a dinâmica de ocupação do quadrante Sudoeste
da cidade pelas classes altas deixou um ‘resíduo’, uma área com características totalmente distintas do seu entorno imediato: o bairro de Pinheiros. Vimos como, graças a seu desenvolvimento como povoado e depois vila separada de São Paulo, Pinheiros guardou características próprias, com traços de cidade do interior. Sua dinâmica de ocupação não obedeceu aos mesmos esquemas do núcleo principal, ainda que estivesse largamente subordinada a estas. O núcleo pinheirense já estava consolidado quando as classes altas começaram a abandonar o Centro tradicional em direção Oeste; a área já estava ocupada quando são lançados os empreendimentos de alto padrão do Jardim América, Cidade Jardim ou Alto de Pinheiros.
Segundo Malta Campos e Vilaça, é mais do que provável que algumas áreas do núcleo mais tradicional do bairro sejam profundamente modificadas, incorporadas ao mercado imobiliário mais lucrativo da cidade, de prédios de classe média, mas principalmente, nesta região, pequenos ou médios prédios de escritórios. Isto significaria a expulsão de sua população tradicional, mudando radicalmente o caráter do bairro. Uma possível retirada dos terminais de ônibus que se encontram hoje no Largo da Batata levaria consigo a clientela do comércio daquela região, preparando o terreno para uma “limpeza social” e posterior ocupação da área pela classe média, com lucros óbvios para a incorporação imobiliária. Tal retirada é descartada pela EMURB, mas há planos para a transferência de parte das linhas para a área contígua à futura estação Pinheiros do Metrô (linha amarela), junto à Marginal Pinheiros. Há propostas para a transferência das linhas para o outro lado do rio, junto à nova estação de Metrô Vital Brazil. Tais pressões partem de uma parcela dos moradores e dos comerciantes, reunidos em torno da Associação Comercial de Pinheiros, e que identificam nos terminais de ônibus focos de atração para os ‘indesejáveis’ camelôs. Quanto à capacidade de mobilização e organização dos moradores,
228Seminário ‘Pinheiros e a Qualidade de Vida: Um debate das propostas do PT para a cidade e a região’. Auditório da Rede A de Jornais de Bairro, 1996.
tivemos exemplos bastante significativos da capacidade de resistência da
235
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
população dos bairros de Vila Olímpia e Alto de Pinheiros, quando se
que alguns identificam fatalisticamente como o ‘progresso’, necessário,
viram ameaçados por projetos viários de grande impacto e que
inevitável e terrível.
certamente afetariam sua qualidade de vida. Segundo o relato do Sr. Luís
Sob a ótica de Gonçalves, não aceitar a contrapartida oferecida pela
Rodolfo , presidente da Associação dos Amigos de Pinheiros, o bairro
Prefeitura seria perder a oportunidade de minorar os males inevitáveis
de
do
que suas políticas acarretariam, como no caso do citado trecho no bairro
prolongamento da Avenida Faria Lima, ainda que as transferências e
da Vila Olímpia, cortado pela Faria Lima, onde a Operação Urbana não
desapropriações tenham sido reconhecidamente traumáticas. É sabido
foi implementada (e portanto a verticalização possível e a valorização
que
dos terrenos, não se aplica).
Pinheiros
o
não
movimento
ofereceu
contra
a
a
mesma
Faria
resistência
Lima
naquela
quando
região
foi
consideravelmente menos expressivo. Cabem algumas questões.
Segundo a lógica da apropriação imobiliária, transformar zonas
Sabe-se que o impacto na região foi grande. Segundo o arquiteto
residenciais de prestígio em áreas verticalizáveis é um grande negócio.
Paulo Bastos, a Faria Lima “enterrou uma boa parte de Pinheiros
Vimos
histórico”. Qual a capacidade de organização dos habitantes do lugar
transformação, em benefício da iniciativa privada. Neste contexto, a
para a defesa da qualidade de vida do bairro? A Associação dos Amigos
Nova Faria Lima mudou, e continuará mudando o perfil da região,
de Pinheiros não foi este veículo, mas a Associação Pinheiros Vivo,
graças à valorização dos terrenos próximos, à especulação imobiliária
integrada por moradores do Alto de Pinheiros.
resultante, ao incremento do trânsito e do comércio, ligando o bairro à
Entretanto pode-se entrever uma negociação bem sucedida entre a
as
estratégias
do
poder
público
para
promover
esta
Avenida Eng. Luís Carlos Berrini, ao Sul.
Prefeitura e alguns grupos do bairro. Haveria uma fronteira entre a
O significado deste projeto distancia-se cada vez mais daquele
remoção inaceitável e um ressarcimento aceitável? Negociação ou falta
inicialmente previsto, 30 anos atrás. Mais do que um prolongamento
de alternativas?
“lógico e necessário” dentro da malha urbana, entre outras coisas para
A
arquiteta
Rita
Gonçalves
(EMURB),
diagnostica
um
“desafogar o trânsito das Marginais” 229, a Nova Faria Lima aparece como
“sentimentalismo bobo” nos paulistanos, que se apegariam demais aos
um espaço funcional para a Nova Cidade, e lucrativo para o mercado
seus bairros, sem perceber que no atual esquema da metrópole, deveriam
imobiliário local, além de representar uma das faces da estratégia política
valorizar mais a mobilidade, já que assim poderiam estar mais perto do
de visibilidade a todo custo promovida pela administração de Paulo
trabalho e da escola. Pode-se identificar aí uma visão puramente ‘técnica’ dos processos de expropriação e destruição das relações de vizinhança,
229Ver entrevista com Rita Gonçalves, EMURB. Capítulo Entrevista.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
236
Salim Maluf. Entretanto, segundo avaliação da própria EMURB e de
A área estudada neste trabalho situa-se, dentro do quadro de
pelo menos uma grande imobiliária que atua na região 230, as profundas
transformações por que passa a cidade, numa situação sui generis: o
modificações não ultrapassarão os limites da periferia da Avenida, pois
quadrilátero que corresponde ao “Baixo Pinheiros” ( A Ilha Popular)
existe uma população estável de classe média ocupando terrenos de
situa-se apenas nas bordas das áreas onde estes investimentos
estrutura fundiária “difícil” para a incorporação. Isto é, as barganhas e
provocam mudanças mais dramáticas. De um lado, a Nova Faria Lima
negociações para a incorporação destes terrenos são dificultadas pelo
representa a inclusão da área numa ‘Operação Urbana’ 231 que permitirá
tamanho dos lotes e tipo de ocupação da área. Há, no entanto, áreas
um câmbio importante no tipo de ocupação hoje existente. De outro, a
onde estas negociações poderiam ocorrer com mais facilidade, isto é,
Marginal do Rio Pinheiros representa uma nova fronteira nos
áreas de galpões de depósitos, grandes áreas pouco adensadas.
empreendimentos imobiliários da cidade. Ambas, Faria Lima e
O representante da imobiliária Richard Ellis justificou esta não
Marginal Pinheiros, trazem para as fronteiras do bairro importantes
incorporação do ‘miolo’ do bairro por problemas com o zoneamento,
mudanças, que certamente afetarão uma área onde as relações de
demasiado restritivo. Todavia, é preciso lembrar que a totalidade da área
vizinhança, de trabalho e de uso merecem ser preservados e onde o
em questão encontra-se dentro dos limites da Operação Urbana Faria
sentido de continuidade histórica tende a se perder em meio a
Lima, com o status de “Área Indiretamente Beneficiada”, isto é, a atual
megaobras.
Lei de Zoneamento fica ‘atenuada’ e poderá ser modificada através dos mecanismos da Operação Urbana.
Como confluência e porto urbano, cercado por bairros de alto poder aquisitivo, como Alto de Pinheiros, Jardim América, Cidade Jardim etc.,
Por outro lado, o setor mais próximo à Marginal Pinheiros,
articulado com outros sub-centros metropolitanos através de novas
tradicionalmente ocupado por galpões, começa a mudar no bojo das
linhas de metrô e trem, novos projetos de terminais e corredores de
profundas modificações por que passa a Marginal, centro de um novo
ônibus, além da sua localização privilegiada junto à Marginal Pinheiros,
tipo de ocupação, tornando-se, já na última década deste século, um
indicam mudanças mais dramáticas aí que alhures.
centro de serviços de alcance regional. O maior exemplo deste processo é o Edifício Birmann21.
230Ver entrevista com o Sr. Mark Alfred, da imobiliária Richard Ellis. Anexo: Entrevistas.
231Os termos ‘Nova Cidade’, Operação Urbana’ e ‘Globalização’ serão retomados mais adiante.
237
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Considerações sobre o ‘BaixoPinheiros’
As
primeiras escolhas, entre elas a de São Paulo de Piratininga como núcleo coordenador do povoamento do interior do Brasil, determinaram o papel de Pinheiros
dentro de um esquema territorial específico. Este esquema territorial renova-se a cada nova etapa histórica, sem que seus elementos se percam totalmente na mudança. Assim, poderíamos falar num papel estável deste lugar dentro do território: um “porto-urbano” (de acordo com a terminologia inspirada em Pirènne), ou “localidade-ponte” (AGBP, p.23); passagem, entreposto comercial, mas também moradia. Lembra-nos o urbanista Flávio Vilaça que o bairro estruturou-se, num primeiro momento, como um povoado independente, e que isto explica seu caráter atual, de uma quase pequena cidade dentro da metrópole, inclusive com vários vestígios rurais (SPQV). No entanto, como observou a Arquiteta Rita Gonçalves, da EMURB, o uso misto e a presença de uma população tradicional que estabelece com o ambiente e entre si relações de vizinhança sólidas, impede que o bairro transforme-se num mero centro de serviços, um lugar de passagem, (um Não-Lugar, na acepção estrita do termo) e se degrade. Ao analisar a história do desenvolvimento do bairro do Baixo-
considera a história do Baixo-Pinheiros como um movimento ‘longo’ e contínuo dentro do âmbito da história da metrópole. As rupturas históricas, engendradas por mudanças nos modos de produção e nos níveis tecnológicos, não foram suficientes para embaralhar o sentido geral deste movimento. A permanência deste ‘sentido geral’ engendraria, tomando os termos de Pedro Geiger 232, uma crescente individualização do homem, que acompanharia a crescente complexidade do mundo sem se diluir. Este longo movimento significaria também a formação de laços de solidariedade nas diversas instâncias. Fany Davidovich faz a distinção entre ‘espaços históricamente sedimentados’,
os
territórios,
e
os
espaços
de
uma
economia
mundializada, representados sobretudo por fluxos e redes tecnológicas. “Todos
os
lugares
internacionalizados’,
estariam
assim
submetidos,
se
embora,
convertendo a
em
diferentes
‘lugares
formas
e
intensidades, de acordo com suas aptidões em absorver esse processo. Sob tal enfoque, o ‘esvaziamento’ de territórios pode ser interpretado como uma superação de condições históricas de apropriação e de consumo do espaço geográfico. Tratar-se-ia, portanto, de uma mudança de conceito, a partir da transformação do território em partes do espaço mundializado” (Davidovich, p.311). Esta superação das condições históricas engendrada pelas transformações produtivas do Capitalismo, acompanhadas de fenômenos culturais e
Pinheiros contra o fundo do desenvolvimento da Metrópole, poderíamos 232In “Mapa do mundo Pós-Moderno”. Ver biblio.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
238
mentais precípuos, reflete-se na teoria de que hoje, na metrópole, o
população da cidade, e mesmo muitos moradores de Pinheiros, foram
sujeito experimenta (ou deveria experimentar) uma total mobilidade,
convencidos da necessidade da avenida em nome do ‘progresso’ e de
livre de considerações ‘românticas’ pelo lugar.
uma suposta melhoria no trânsito de automóveis).
A superação das
condições históricas implica no desapego ao lugar. Como nos lembra a
É nossa opinião que o desenvolvimento da cidade deve conter o
arquiteta Rita Gonçalves, da EMURB, “não aliar-se ao sentido geral das
sentido desta permanência das formas e funções urbanas, especialmente
rupturas engendradas pode significar ‘perdas reais’” 233, dentro da ótica
quando estas se inserem numa trama temporal longa, adquirindo para os
de reprodução do capital tendo como instrumento o solo urbano. Onde
habitantes do lugar e aqueles do resto da metrópole uma pregnância e
se darão agora a cultura e a cidadania, se o território já não apresenta
um significado de conjunto inequívocos. O novo brotando do velho, e
uma coerência reconhecível?
não a imposição violenta de novos sentidos.
Falou-se de períodos históricos relativamente longos ou curtos na
Isto não significa que as formas urbanas devam ser ‘congeladas’. Ao
vida da metrópole. Falou-se também de idéias como a da ‘permanência’
contrário, o dinamismo e a mudança fazem parte do próprio espírito da
das formas urbanas, sua pregnância simbólica e seu significado na
metrópole. Para Max Weber, a cidade seria um conjunto de relações
construção da identidade e da cidadania.
sociais que encorajariam a ‘individualidade e a inovação, constituindo-se
Neste contexto, o bairro do Baixo-Pinheiros aparece como um
assim em instrumento de transformação histórica’ 234. A ruptura e a
exemplo significativo de permanência das formas e das funções urbanas
quebra com os esquemas do passado também fariam parte de um
através do tempo. A permanência, neste caso, não se refere às
suposto ‘espírito metropolitano’, como enfatizam alguns pensadores
edificações, mas especialmente aos caminhos e aos lugares.
pós-modernos. Contudo, é possível pensar em continuidades, vocações e
No caso de Pinheiros e Vila Olímpia, a abertura da Avenida Faria Lima significou a quebra abrupta e imposta, produzida pela força (muitos
habitantes
não
desejavam
abandonar
suas
casas),
significados preservados. Haveria uma diferença fundamental entre a ruptura engendrada pelas
pela
condições e situações próprias do lugar e de seus habitantes, em oposição
necessidade (ao utilizar a política de ‘fato consumado’, a adm. Paulo
a rupturas externas, impostas pela força, pela necessidade ou pelo
Maluf não deixou escolha para muitos) e pelo convencimento (a
convencimento. O novo, neste caso, advém de um saber estranho ao
233Referimo-nos aqui à teoria de que aqueles que não aderiram à Operação Urbana na Vila Olímpia, visando preservar as características do bairro, têm hoje todas as desvantagens de uma grande avenida às suas portas, sem nenhuma das vantagens (i.e., a valorização de seus terrenos).
lugar, uma competência que se impõe como melhor e única, ‘moderna’
234Max
Weber, apud MALTA, Cândido, Cidades Brasileiras: seu controle ou o caos, p.14)
239
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
em oposição à competência ‘arcaica’ do lugar. Talvez devêssemos pensar
As ações urbanísticas na cidade neste século tiveram quase sempre o
o novo como resultado do fermento do antigo, incorporando também as
mesmo caráter de saber externo imposto sobre a metrópole, condizente
experiências externas, mas jamais em relação de subordinação.
com as atitudes de uma ex-colônia. A cidade de São Paulo erigiu um
O Capital Transnacional Global, por suas próprias características de
novo ‘centro’ a cada nova fase do capitalismo em que adentrava, e isto é
extrema mobilidade e migração facilitada, não tem qualquer espécie de
parte de seu sucesso como líder na condução do processo capitalista
consideração para com o lugar urbano, fora de sua origem e destino
brasileiro, criando uma poli-centralidade (já que, como vimos, não houve
final. Como que pairando sobre o território, mas jamais nele fincando
‘abandono’ do Centro Velho, nem do Núcleo da Paulista) 235. A Nova
raízes, cria e destrói espaços à medida de suas necessidades imediatas de
Cidade é, porém, um fenômeno novo.
reprodução. Pode-se argumentar que este fenômeno é inerente ao Capital
como
tal.
Entretanto,
a
Globalização
representou
Configura-se aí um espaço ‘internacional’, por que Não-Lugar, espaço
uma
de trocas de alto nível, da produção imaterial, das migrações
intensificação desta característica, produzindo rupturas muito mais
instantâneas do capital e da criação de uma Nova Cidade, não em
traumáticas.
substituição à antiga, mas apesar desta. A Nova Cidade é resultado de
Este Capital Global encontra sua expressão urbana nos projetos e
um saber imposto e não internalizado pela metrópole.
ações que visam qualificar a cidade para sua produção, trânsito e
Ao ‘convidar’ Robert Moses para traçar um plano de expressways, as
reprodução. No caso paulistano, estas ações e projetos geralmente
elites da cidade de São Paulo escolhiam submeter-se ao Capital
resultaram de saberes exteriores.
Internacional sem crítica, como já haviam feito antes, convencidas de
Não se trata aqui de discurso nacionalista ou xenófobo. Como nos
que este seria seu passaporte para a modernidade e o progresso sem
diz Marilena Chauí, o saber é um trabalho, uma negação reflexionante, isto é,
fronteiras. Aceitou-se um modelo externo ao próprio saber e experiência
“uma negação que por sua própria força interna transforma algo que lhe
da cidade, com suas particularidades, história e cultura. Ainda que se
é externo, resistente e opaco” (Cultura,p.4). O saber nasce de um
argumente que Moses contou com uma equipe de engenheiros brasileiros
trabalho interno, através da reflexão e da crítica. Por isso mesmo, ao buscar respostas para a inserção cidadã, pensamos num saber criado a partir do saber do sujeito tornado incompetente e não na imposição de idéias e valores do sujeito competente. Parece-nos que esta noção poderia ser transposta também para o campo urbanístico.
235Neste
sentido, as declarações do arq. Júlio Neves, no sentido de que a Bacia do Pinheiros deveria se transformar num Novo Centro (OESP:25.04.94 p.C-1 e outros) parecem indicar que este Novo Centro seria compartilhado por todos os habitantes da cidade, o que não é verdade. A noção clássica de Centro da Cidade parece não ter muito sentido em São Paulo, já que aqui cada segmento social tem seu próprio Centro, mostrando o grau de separação em que vivemos. Deve-se mesmo observar que, para moradores da Periferia distante, o Largo 13 de Maio, o Largo da Batata ou a o Largo da Lapa são os ‘centros’ da cidade.
240
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana para a elaboração de seu projeto, isso não muda o fato de que o modelo
localizadas nas várzeas do rio), foi e segue sendo um espaço de prestígio,
proposto é resultado de um modelo estranho à nossa realidade e de uma
totalmente
ação externa e ideologizada, inserida num processo claro de instalação
históricamente. As escalas mudaram, os usos foram substituídos, houve
do capital internacional na metrópole. 236
ruptura, mas não a ponto de tornar a avenida um lugar estranho aos
inserido
no
contexto
urbano,
tanto
estrutural
como
Neste contexto, a Avenida Eng. Luís Carlos Berrini aparece também
moradores. Ao contrário, os novos modos de acessibilidade e os usos ali
como o espaço de instalação do Novo Capital Global. Neste caso, pouco
existentes a tornam ainda mais parte viva do cotidiano de uma grande
importa que Bratke e Collet seja um escritório brasileiro. A configuração
parte dos paulistanos, que a escolheram em anos passados como seu
da avenida, este enorme braço que vai do nada para o nada, obedece às
próprio símbolo.
localizações exigidas pela elite empresarial internacional e nacional: áreas
A Avenida Faria Lima constituiu-se num esforço de dar algum
livres e baratas para a incorporação imobiliária de enormes conjuntos de
significado estrutural à Nova Cidade, ao mesmo tempo em que ‘abriu’
escritórios, proximidade dos bairros de residências destas elites, acesso
uma vasta área à incorporação.
fácil
aos
serviços
da
nova
Marginal
Pinheiros
(Shoppings,
Parece-nos que Sérgio Carneiro, sociólogo e vice-presidente da
Hipermercados, Parques, etc), acesso fácil aos aeroportos de Congonhas
Associação Vila Olímpia Viva, formulou corretamente o problema ao
e Guarulhos, etc .
indagar, referindo-se à Nova Faria Lima: “Em que proposta de estrutura
Se a metrópole tem uma lógica espacial clara e até de certo modo
urbana
fundamenta-se
tamanha
intervenção
no
desenho
e
no
compartimentada, denunciando seu caráter de separação de classes, é no
aproveitamento desse espaço da metrópole? O município de São Paulo
quadrante Sudoeste que encontraremos as rupturas maiores com os
não dispõe de um plano atualizado de desenvolvimento como em outras
períodos longos da história metropolitana.
cidades mundiais, tais como Tóquio ou Paris, que oriente a concepção
Pode-se argumentar que a própria Avenida Paulista já seria uma
de projetos coerentes e eficazes. Por que nossa cidade precisa estar
ruptura no sentido em que falamos aqui, assim como boa parte das
sempre à disposição dos interesses específicos e circunstanciais de
avenidas que hoje cortam a cidade. Porém, a Avenida Paulista surgiu
empresários do setor imobiliário, sem que estes adeqüem seus
dentro de um contexto territorial claro (ao contrário das novas avenidas
necessários investimentos aos interesses maiores de um progresso estrategicamente formulado?” (FSP:13.02.94, p.10-2)
236Neste sentido, poderíamos questionar a formação daqueles engenheiros, e nossa própria formação, muitas vezes voltada exclusivamente para modelos externos, deixando de lado a reflexão crítica.
A idéia de que é preciso formar um saber próprio sobre o gerenciamento da metrópole e de seus fenômenos apela para o conceito
241
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
do Plano Diretor de Bairro. De fato, a busca de soluções globais e locais exigiria uma articulação de propostas e escalas muito díspares, porém esta parece ser uma saída para o fato de que os Planos Diretores não têm sido satisfatórios porque não têm base numa ‘problemática local’. O
espaço
existente
entre
um
conjunto
de
leis
urbanísticas
tecnicamente ‘ideais’ e a realidade da cidade, que se produz a mais das vezes fora dos esquemas contemplados por aquelas leis, seria bastante diminuído por uma aproximação ao mesmo tempo globalmente compreensiva e localmente fundada.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
Parte 7: Considerações Finais
242
243
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Um tipo de inserção no Mundo do Capital
“Mostrar como verdade inexorável aquilo que é discutível é prática costumeira em situações tais, pois acaba por mascarar aquilo que de fato está em jogo.” Leda Maria Paulani, in “A fraqueza da social-democracia”,
“Em certos momentos, certas categorias sociais viram desvão da história. Os excluídos não são necessariamente portadores do futuro, como pensa a esquerda vulgar.” Fernando Henrique Cardoso in “Para lembrar o que ele escreveu”, entrevista a Vinícius Torres Freire, FSP:13.10.96, 5-4.
FSP:08.12.96, p.5-3. Sobre a política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso.
Ao
buscar subsídios para o entendimento das ações dos agentes produtores do espaço urbano em São Paulo através da sua
história, deparamo-nos com os instrumentos que nos ajudarão a entender este pensamento hoje. Cremos ter esclarecido algumas
“Minha recente viagem ao Brasil, Argentina e Uruguai (...)
divergências com o pensamento ‘neo-liberal’, ou ‘neo-esquerdista’
confirma uma nova realidade. Formou-se através do hemisfério um
(como o chamam seus perpetradores) presente no discurso de alguns
consenso (...): mercados abertos funcionam, o governo democrático é
teóricos.
justo e ambos, trabalhando juntos, oferecem a melhor oportunidade para melhorar a vida dos povos.”
Tais teóricos dizem acreditar na inelutabilidade de certos processos histórico-econômicos e numa ‘aliança possível’ entre Sociedade Civil e Capital Internacional, visando criar a base material sobre a qual se
Thomas Mack McLarty, assessor presidencial norte-americano, em
edificariam políticas de redistribuição de renda e de acordo social
carta ao jornal The Whashington Post, (OESP:05.01.97, p.A25).
fundadas num Estado não-interferente. Para alguns destes teóricos, os ‘projetos nacionais’ seriam relíquias nacionalistas que só atrapalhariam a regulação da economia pelo mercado 237.
237Devo
estas reflexões ao artigo de Leda Maria Paulani, FEAUSP, entre outros: FSP:27.10.96, p.5-3.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana Segundo
Luiz
Gonzaga
Belluzzo,
economista,
a
crença
244
na
Esta ‘imposição do capital’ encontrou no cenário nacional solo fértil
inevitabilidade de uma inserção ‘passiva’ das economias nacionais no
para se desenvolver. Fábio Konder Comparato indica que com o
processo de Globalização advém do pressuposto de que este processo
esgotamento do ciclo da industrialização substitutiva de importações,
ocorre de forma impessoal, acima da capacidade de reação das políticas
as oligarquias locais buscaram uma ideologia política aceitável aos seus
decididas no âmbito dos Estados Nacionais. (FSP:29.12.96, p.2-4) Esta
interesses 238.
crença resulta, na prática, na administração dos recursos públicos
liberalismo” seria previsível numa sociedade onde as grandes massas
visando à ‘melhor’ inserção possível naquele processo.
são facilmente manipuladas pelos meios radiotelevisivos, submetendo-
Comparato
lembra
que
esta
“rentrée
triunfal
do
Alain Touraine, por sua vez, chama-nos a atenção para a operação
se facilmente à dominação. 239 (FSP:12.11.96, p.1-3). A idéia de ‘função
ideológica embutida na confusão entre admitir-se o triunfo da
social do lucro’, do ‘imperativo categórico’ do equilíbrio fiscal (dentro
sociedade de mercado e a crença de que a sociedade deve ser regulada
do âmbito das ficções dos ‘sacrifícios necessários’) e das virtudes do
como um mercado, de maneira ‘liberal’ (ou seja, reduzindo tanto quanto
mercado como regulador das relações, desembocando nas diversas
possível as intervenções ‘centralizadas e voluntaristas’ do Estado, dos
desregulamentações, são parte deste discurso que visa a tornar
monopólios, da Igreja, etc). (O canto da sereia da Globalização,
palatável o atual estágio das relações produtivas em nossa sociedade.
FSP:14.07.96, p.5-6).
Se o Estado retira-se de alguns setores da economia, afina seu papel
De fato, Leda Maria Paulani segue um caminho semelhante ao negar
como agente facilitador da reprodução capitalista, pois longe de
que as ações do governo federal signifiquem ‘apenas’ um plano de
envolver a Sociedade Civil, aquelas alianças se dão, como observamos
‘estabilização’, visando acabar com a inflação e buscando, com as
desde longa data, entre o Estado e o Capital.
alianças, criar uma base material para a inclusão social. Para Paulani,
O Estado, refinando agora seu papel de legitimizador das ações que
estas ações não seriam mais que uma “imposição determinada pelas
permitem aplainar o terreno para a produção, desenvolve novos
novas
mecanismos que visariam a facilitar esta tarefa, entre as quais
condições
de
circulação
e
valorização
dos
capitais.”
(FSP:08.12.96, p.5-3). “Em poucas palavras, o Plano Real e seus apensos tratam de remover do espaço que lhes compete os entulhos da época do Estado planejador. Daí que o crescimento, o emprego, a diminuição das desigualdades, a conquista da cidadania para todos os brasileiros, etc, não estejam em seu horizonte.” (idem)
238Francisco de Oliveira indica que os grupos hegemônicos no Brasil teriam esperado desde Getúlio Vagas pelo surgimento de uma força condutorae articuladora destes grupos. Esta força seria hoje Fernando Henrique Cardoso, que aglutina em torno de um ‘projeto neo-liberal’ várias forças hegemônicas antes antagônicas. FSP:10.02.97, p.1-4). 239Como exemplo, lembremo-nos das características ‘publicitárias’ das eleições municipais paulistanas em 1996.
245
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
poderíamos citar as várias modalidades de parceria e as privatizações.
Roberto Campos falará de uma ‘resposta liberal’ às ‘alternativas
Segundo Francisco de Oliveira, sociólogo, ao Estado brasileiro hoje
socializantes’. Esta seria a da ‘solidariedade racional’ que, preservando no
cabe a articulação dos grupos dominantes, após anos de conflito que
possível a eficiência econômica, procuraria transferir recursos dos mais
teriam impedido a hegemonia de um grupo que soldasse as diferenças
bem aquinhoados para os mais carentes, e assegurar assim o acesso,
sociais para ‘aplainar’ o caminho da inserção brasileira no capitalismo
sob a forma de bens públicos, a certos bens e serviços que lhes dessem
mundial 240.(FSP:10.02.97, p.1-4).
um ‘ponto de partida decente’. (FSP:13.10.96, p.1-4). Entretanto, o
O pensamento neo-liberal dedica-se a demonstrar a inutilidade do
economista logo adverte: “As pessoas têm interesses distintos, talvez
discurso que questiona a eficácia social da associação Estado/Capital,
egoísticos, e de qualquer forma freqüentemente conflitantes pela
num contexto mundial de dinâmica inequivocamente liberalizante das
simples razão de que as demandas possíveis são sempre muito maiores
relações econômicas. Tal inutilidade se consubstanciaria na oposição e
do que os meios de satisfazê-las. A sociedade democrática dá aos seus
na luta, perdida de antemão, do ‘arcaico’ contra o ‘moderno’. O
membros o direito de expressarem suas divergências. Não tenta obrigar
pensamento neoliberal quer nos fazer crer que as alternativas à opção
ninguém a amar o próximo como a si mesmo. O que pode fazer é, sem
neoliberal
econômico,
violências nem expropriações, oferecer a todos um adequado leque de
subdesenvolvimento, subcapitalismo, modelo africano, etc.), que
bens públicos.” (idem) De fato, esta universalização do acesso aos bens
inviabilizam a discussão. 241
e direitos se traduz na “realização capitalista de um sonho socialista”,
seriam
tão
obscuras
(atraso
segundo o mesmo Roberto Campos 242. (FSP:20.10.96, p.1-4). Segundo 240Oliveira aponta a distinção entre hegemonia e dominação. “Pode-se dominar politicamente, economicamente, mas só há hegemonia quando você faz o dominado pensar como você”. (FSP:10.02.97, p.1-4) 241 Seriam tão duvidosas as alternativas possíveis? Tarso Genro, prefeito de Porto Alegre entre 1993 e 1996 pelo Partido dos Trabalhadores, identifica nas falas presidenciais, tomadas como paradigma para a análise do discurso neo-liberal brasileiro, os seguintes argumentos:1.A esquerda brasileira é herdeira do corporativismo, e o corporativismo é conservador.2.A Globalização determina um certo tipo de inserção internacional, que não deixa margem a escolhas.3.A esquerda não tem propostas, só críticas.4.O Estado atual deve ser reformado e enxugado. Admitindo a argumentação da validade destas proposições através de dados empíricos, Genro ainda assim acredita poder apontar outros dados que demonstram que:1.A direita e as classe privilegiadas no Brasil, que sustentariam seu governo, são ainda mais corporativas que a esquerda.2.A Globalização arma vários blocos de poder internacional, cujos interesses contraditórios permitem várias alternativas.3.A direita não tem nenhuma proposta consistente, pois a situação social piora a cada dia no
Campos, o “universo restrito de funcionários e políticos manipuladores mundo.4.O Estado atual deve ser reformado, mas para ampliar seu caráter público.(FSP:20.10.96, p.5-3) De fato, ao afirmar que a Globalização é a ‘saída’, além de única alternativa, seus defensores desconsideram todas as suas peculiaridades nos diversos países. Gilson Schwartz, jornalista, considera que “talvez a ‘Globalização’ seja a ideologia que se criou para colocar no lugar da ‘guerra fria’, que , na sua época, explicava e era explicada por tudo o que acontecia no mundo.” (FSP:20.10.96, p.2-2). Estudos realizados pela OMC indicam que longe de ser um processo homogêneo, a Globalização das economias se dá do centro para as periferias (os EUA são o destino da maioria dos investimentos internacionais, seguidos da Inglaterra e da França) e dependem em grande medida das estratégias de investimento das empresas multinacionais.(FSP:20.10.96, 2-2) 242Roberto Campos é citado aqui para mostrar alguns paralelos entre o pensamento da ‘nova-esquerda’ e da direita tradicional.
246
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana das estatais é substituído pelo universo mais amplo de acionistas na
O fenômeno da Globalização das economias é encarado então como
Bolsa ou beneficiários dos fundos de pensão (os mesmos fundos
um meio de inserir o Brasil na modernidade, apoiando-se no tripé
considerados por Roberto Paulo Richter os únicos capazes de
‘Estado - Empresa Estrangeira - Empresa Nacional’.
movimentar o mercado imobiliário de São Paulo com grandes projetos.). Tal construção, surpreendentemente ‘franca’ em alguns aspectos, permite entrever o papel do Estado como regulador das relações algo
Entretanto, a construção de Roberto de Campos não encontra legitimação alguma dentro do espectro das ações ‘públicas’ estudadas neste texto. Nada confirma sua validade no campo das ações do Estado.
selvagens entre os homens, coibindo a exploração e as violências dos
É ao considerarmos o Estado como o instrumento de dominação de
mais fortes contra os mais fracos e provendo, ao mesmo tempo,
uma classe sobre outras, e não como uma entidade isenta pairando
condições mínimas para que os homens pudessem se desenvolver
sobre esta sociedade e ‘regulando’ um suposto ‘contrato social’ 245, que
plenamente 243. Tais condições mínimas só poderiam existir, de acordo
entenderemos o verdadeiro caráter desta associação. Este caráter vem
com o pensamento neoliberal, como já se observou, a partir de uma
sendo definido pelas elites brasileiras, como vimos, desde longa data.
base material sólida 244. Esta, por sua vez, só seria possível num sistema
Os
processos
engendrados
por
esta
associação
na
era
da
de produção e reprodução do capital condizente com o sentido geral
Globalização implicam em que vastas parcelas da população, os
do Capital no mundo.
‘excluídos não portadores de futuro’ (nas palavras de Fernando H. Cardoso) tenham que ser definitivamente jogadas para fora da ‘História’. A crença na infalibilidade do mercado e no sistema
243Abram
Szajman, presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo define assim as funções ‘básicas’ do Estado: “(...) promotor do desenvolvimento social, guardião da vida e da propriedade, além de árbitro dos contenciosos surgidos no âmbito da sociedade.” (FSP:30.12.96, p.1-3) ao defender a retirada deste Estado do setor produtivo, afastando-o do papel de “concorrente privilegiado da iniciativa privada e de empregador sem qualquer compromisso com eficiência e produtividade”. (idem). 244 “Se não houver uma política econômica bem dirigida, se nós não tivermos condições de crescimento da economia, é claro que estes projetos [do programa Brasil em Ação] não terão, também, condições de êxito. Há uma relação entre esses distintos níveis da ação governamental.” Trecho do discurso do presidente Fernando Henrique Cardoso na solenidade de apresentação do sistema de gerenciamento do programa Brasil em Ação. OESP:24.10.96, p.B13.
democrático tal como se encontra nos livros produzem, entre outros, diagnósticos como o do funcionário do Departamento de Estado norte-americano, Thomas M. McLarty 246, segundo quem “os mercados abertos funcionam, o governo democrático é justo”. É lícito perguntar:
245Antônio Negri, cientista social italiano, lembra que Fernand Braudel dizia que “o capitalismo triunfa somente quando identificado com o Estado, quando s e t o r n a o Estado.” (FSP:20.10.96, p.5-3). 246Citação no começo do capítulo.
247 Os mercados funcionam para quem? Os governos são justos com quem?
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e Tal operação ideológica visa a apresentar-nos o projeto do grupo ‘neo-esquerdista’ (neoliberal, liberal, ou como se queira classificá-lo)
Ainda que seja difícil negar o impacto da ‘Globalização 247’ em
como um projeto de todos (tendo em vista que o lumpesinato não
muitíssimos aspectos do cotidiano e, mais especificamente, nos
importa, nem mesmo na construção do discurso) 250, generalizando
processos de produção do espaço urbano, sua utilização por estes
aspirações profundamente fragmentadas e tornando ‘de todos’ o
teóricos insere-se no campo da montagem de um discurso fortemente
projeto de hegemonia das elites, agora melhor articuladas.
ideologizado 248.
Este
discurso
reduz
a
sociedade
a
um
objeto
facilmente
A fala neo-liberal leva-nos a pensar numa sociedade que luta para
manipulável, onde os interesses do “sujeito incompetente” (tomado
sair do atraso e inserir-se no ‘moderno’, e que o projeto de eliminação
aqui como categoria) ‘desaparecem’ ou tornam-se anacrônicos, e são
dos abismos sociais seria meramente uma utopia romântica, já que
finalmente
“provavelmente na dinâmica atual não há força para incorporar todo
hegemônica,
mundo.” ( Fernando Henrique Cardoso, FSP:13.10.96, 5-4.). A palavra
discussão do conflito entre classes de “ultrapassada”, visando a
de ordem desta que se denomina a ‘Nova Esquerda’ é a universalização
imobilizar o debate acadêmico, desautorizando-o desde a raíz. Desta
do acesso aos bens e direitos. (FSP:13.10.96, p.5-4 249), mas não mais no
feita, o próprio discurso das esquerdas torna-se por sua vez ‘fora do
sentido marxista. A universalização de Fernando Henrique equivale sim
tempo’ e deslocado historicamente.
às ficções ‘racionalistas’ de Roberto Campos.
substituídos tornada
pelos
aqui
interesses
pretensamente
de
uma
‘universal’.
competência Taxa-se
a
No caso da metrópole, parece óbvio que o sentido geral das dinâmicas capitalistas neste final de século leva a um aumento geral dos conflitos, aumento das competições, aumento das eficiências, aumento
247As aspas indicam a construção ideológica em torno do termo, como se viu em capítulos anteriores. 248Gabriel Cohn in “Solucionar a modernização é a questão comum ao intelectual e ao político”, sobre entrevista de Fernando Henrique Cardoso comenta “Impossível não perceber aqui o sutil jogo que se estabelece entre condicionantes e ações, entre determinação objetiva e vontade, entre o possível e o efetivo, entre o limite e a invenção. Sutil demais, dirá o meu taciturno interlocutor imaginário. Tão sutil que fica difícil distinguir o provável do meramente possível, a invenção da concretude dos fatos. A ênfase no confronto de interesses e no conflito é abrandada pela busca obstinada de relações mais finas.”, FSP:13.10.96, p.5-8. 249FREIRE, Vinícius Torres, Caderno Mais!, FSP:13.10.96, p.5-4. Introdução a entrevista com o Presidente Fernando Henrique Cardoso.
das produtividades e finalmente o aumento do lucro daqueles que detém as rédeas do processo, deixando de fora os que habitam à margem. O lumpesinato morreu no discurso destas “novas-esquerdas”, 250Fernando Henrique Cardoso deixa claro, entretanto, que este é um projeto que NÃO inclui toda a sociedade. Os ‘pobres’, o lumpesinato, não seriam simplesmente ‘portadores de futuro’. O caráter desta ‘revelação’ de FHC não abole a operação ideológica que se processa em outras instâncias, onde o projeto que se mostra é o projeto para TODA a sociedade, tornando viáveis, por exemplo, certos discursos sobre o urbano apresentados neste TGI.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
248
não por que tenha desaparecido de fato, mas por que sua utilidade
fizéssemos estaríamos nos rendendo à propagada, e ideologicamente
como exército industrial de reserva, regulador de salários e relações de
confortável, diluição do debate entre as forças políticas da esquerda e
trabalho
da direita.
(sempre
em
benefício
da
dominação),
terminou.
Foi
substituída pela tecnologia e por novas relações produtivas e de
A nível ‘doméstico’, as elites brasileiras parecem ter em mente um
consumo, gerando uma atitude fortemente questionável do poder
tipo de inserção internacional que não leva em consideração qualquer
constituído frente a estas camadas. Estas são, no máximo, objeto de
possibilidade de cidadania real. O idéia de que “não há força para
atitudes paternalistas ou ‘caridosas’ por parte de um poder público
incorporar todo mundo” na sociedade formal traz embutida a renúncia
interessado em suas cédulas eleitorais.
a qualquer forma efetiva de solidariedade social (e conseqüentemente
A médio prazo, como aponta o filósofo francês Claude Lefort no seminário ‘A Globalização, o Estado e o Indivíduo’ 251, aquelas atitudes
de um Estado legítimo), ao dar como inevitável a não inserção de boa parte da população no âmbito do Estado de Direito e da Cidadania.
podem criar um ambiente favorável ao surgimento de políticas
Qual é a opção à cidadania? É possível coexistirem duas sociedades
regressivas e antidemocráticas, tais como o nacionalismo populista e o
‘paralelas’, uma ‘inserida’ e outra ‘excluída’? Qual o destino reservado à
fascismo. Na melhor das hipóteses, estas atitudes podem resultar numa
parcela excluída nas teorias neoliberais?
crise de governabilidade, já que, como nos indica o sociólogo
Parece-nos que a sociedade dos excluídos, a não-sociedade, servirá
português Boaventura de Souza Santos, “o aumento da polarização
sempre como garantia à exceção do Estado de Direito. Negar a
social
de
cidadania efetiva a uma parcela da população, ainda que com a
institucionalização dos conflitos sociais (políticas sociais, negociação
desculpa de colocar o país num patamar superior no quadro das
coletiva, concentração social), que os limites da governabilidade podem
nações, significa penhorar a cidadania como um todo, e condicioná-la
ser rapidamente atingidos.” (OESP:30.09.96, p.A2)
às mitologias dos ‘sacrifícios necessários’, visando exclusivamente ao
está
a
fragilizar
de
tal
modo
os
mecanismos
Desejo tornar clara minha posição. Ainda que seja difícil elaborar
controle. O projeto de inserção do país na ‘Globalização’ reduz o ator
estratégias com vistas a negar os novos processos econômicos que tão
social ‘incluído’ a mero ‘produtor e consumidor’, fragmentando a
presentes se fazem em nossas vidas, ou questionar sua inevitabilidade
cultura, o território, as relações sociais.
de fato, não devemos abdicar da crítica constante a este processo. Se o
No caso dos ‘excluídos’, tira-os da arena social, o que não ameniza as violências do conflito social de fato (vide a violência nas grandes
251Souza
Cruz, Rio de Janeiro, novembro de 1996.FSP:24.11.96, p.1-17
cidades e os conflitos fundiários no campo). Em poucas palavras, tal
249
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
projeto “reduz a sociedade civil ao mercado, e os cidadãos a consumidores
ou
indigentes”
(Boaventura
de
Souza
Santos,
OESP:30.09.96, p.A2), com as violências previsíveis e de fato. À esquerda brasileira, talvez longe ainda de tomar as rédeas na condução das políticas sociais do país, cabe, nas palavras de Tarso Genro, propor um “‘programa de transição’, que aponte para a democratização e a desburocratização do Estado atual, combinadas com políticas públicas integradoras do ponto de vista social.” (OESP:30.12.96, p.A2) Segundo Genro, tais políticas deveriam ser capazes de proporcionar vínculos de interesse entre os excluídos e a sociedade formal, “produzindo não só uma nova cultura política, mas também novas formas de solidariedade.” (idem). O ex-prefeito de Porto Alegre avalia que isto não seria possível sem romper o modelo neoliberal e sem reformar o Estado, “para que ele exerça plenamente sua capacidade indutora, a partir do controle da sociedade civil sobre suas políticas públicas estratégicas.” (idem) Em nossa opinião, o objetivo principal destas estratégias devem ser o de resgatar aqueles que Fernando Henrique Cardoso coloca no “desvão da História”, tornando-os sujeitos competentes de sua própria história.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
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Índice das notícias utilizadas na elaboração do trabalho
258
259
Índice das notícias utilizadas na elaboração do trabalho
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e 2 - À ordenação cronológica dos artigos, segundo o modelo: (ano, mês, dia da publicação), AUTOR, “Título”, Publicação 252, data, página.
O
s artigos utilizados foram recolhidos durante o ano de 1996 e início de 1997. As fontes de pesquisa incluem os jornais O Estado de São Paulo , Folha de São Paulo, J o r n a l d a T a r d e , Shopping News, Revista Veja, etc. Foram utilizadas notícias publicadas entre 1990 e início de 1997. A metodologia adotada para a pesquisa foi: 1 -Recolhimento sistemático de artigos publicados nos 2 primeiros jornais mencionados, durante todo o ano de 1996. 2 -Para a pesquisa dos artigos anteriores a 1996, foi consultada a coleção do Cesad-FAUUSP. A coleção é sistematicamente organizada, com ênfase em assuntos de interesse para o estudo dos vários fenômenos urbanos. Foi conduzida pesquisa, abrangendo notícias recolhidas entre 1991 e 1995. Para a classificação procedeu-se: 1 - À separação dos artigos por assunto ou área de estudos.
252OESP:
O Estado de São Paulo FSP: Folha de São Paulo JT: Jornal da Tarde
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana
A Metrópole
260
“Para onde vai o centro?”, FT:08.11.94, p.4-A. (96.05.19), FSP, “Área da Berrini liderou expansão em 95: Sem áreas livres (94.11.08), FT,
para construir, Paulista e Faria Lima cresceram 2%, contra 22% da avenida da zona sul.” FSP:19.05.96, p.3-6.
Marginal Pinheiros/Nova Centralidade/Nova Cidade
(96.10.18), FSP, “Maluf quer ‘Ibirapuera’ zona Oeste: Prefeitura anuncia construção de parque de 111 mil metros quadrados em Cidade
(93.01.31),
FSP,
“Marginal
Pinheiros
é
grande
'hit'
comercial.”,
(96.10.18), OESP, “CEF e Prefeitura assinam convênio para criar parque”,
FSP:31.01.93, p.8-1. (93.01.25), DUARTE, Luiz Carlos,
“Estudo projeta São Paulo no ano
FSP,
“Marginal Pinheiros é grande ‘hit’ comercial.”,
FSP:31.01.93, p.8-1. (93.03.26), FOLGATO, Marisa, “Grandes obras viárias afligem Pinheiros: duplicação
da
ponte
Pinheiros,
além
da
OESP:18.10.96, p.C7. (96.10.18),
2000”, FSP:25.01.93, p.3-1. (93.01.31),
Jardim”, FSP:18.10.96, p.3-7.
Eusébio anunciada
Matoso
e
extensão
túnel da
sob Faria
o
“Maluf
entrega
trecho
ampliado
da
Marginal”,
OESP:18.10.96, p.C7.
A Nova Cidade/A Globalização e a Cidade
rio
Lima,
(93.08.30), PENHA, Gerson, “Estratégia da elite garante a posição de hegemonia de SP”, OESP:30.08.93, p.7.
complicarão trânsito na área”, OESP:26.03.93, p.1. (93.04.04), DUARTE, Luiz Carlos,
OESP,
“Marginais antecipam arquitetura do ano
(93.07.16), FOLHA de São Paulo,
2000”, FSP:16.07.93, p.3-3.
2000”, FSP:04.04.93, p.4-8. (93.09.25), SILVA, Mauro Carvalho da, “Obras devem trazer novo ‘boom’
Giovanni Gronchi derrubarão barreiras e valorizarão áreas”,
“Revolução Pós-Industrial transforma a
(94.10.93), FOLGATO, Marisa.,
cidade”,Cad. Cidades. OESP: 23.10.94, p.C6.
ao Morumbi: conclusão do complexo Eusébio Matoso, do túnel sob o rio Pinheiros e da ligação das Avenidas João Dias e
“Vida na cidade deve melhorar no ano
A Questão Demográfica
OESP:25.09.93, p. C6. (93.09.27),
LANCHA,
Fernando,
“Zoneamento muda para criação de
shopping”, OESP:27.09.93, p.C-1. Financiamento
de
“Prefeitura retoma obra no
US$100
milhões
permitirá
canalização do Córrego das Águas Espraiadas”, OESP:10.05.94, p.C-3.
FSP,
“Ritmo
de
FSP:02.01.93, p.1-5.
(94.05.10), QUEIRÓZ, Luiz Roberto de Souza., Brooklin:
(93.01.02),
crescimento
diminui
nas
metrópoles”,
261
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Centro Velho/ Viva o Centro
Isolamento (93.05.14),
MELLÃO
Neto,
João,
“Dar
identidade
a
São
os
mendigos
que
dormem
nas
4.
Periferia/Expulsão/Crescimento na Periferia/Violência
“Líbero Badaró vive revolução silenciosa:
alguns prédios tradicionais passam por reformas e estão se
(93.03.25),
tornando ‘inteligentes’”, OESP:10.01.97, p.Z12. RIGOUT,
espantar
“Centro Velho e Novo: A cidade, como
era, está renascendo”, JT:13.07.94, p.3A.
(97.01.10),
tenta
proximidades de Santa Cecília e do Paraíso.”, FSP:10.09.96, p.3-
Paulo”,
OESP:14.05.93, p.2. (94.07.13), BRANCO, Frederico., (97.01.10), ALVES, Tarcísio,
“Metrô vai cercar 2 estações com grades:
(96.09.10), GENTILE, Rogério.,
Fabrizio,
“A história que sobrou no centro”,
PAHIM
Jr.,
“Prefeitura criará pólo econômico”,
Fábio,
JT:25.03.93, p.7.
“SP ‘clandestina’ arrecada US$291 mi:
(93.05.03), LOZANO, André.,
Folhinha, suplemento infantil, FSP:10.01.97, pp.5-4 a 5-7.
Atividades irregulares desviam quantia equivalente a 5,8% do orçamento da Prefeitura.”, FSP: 03.05.93, p.3-1.
Violência/Segurança/Fechamento
(93.07.04),
PENHA,
“Cidade
Gerson,
Tiradentes
é
recorde
em
crescimento”, OESP:04.07.93, p.5.
“Fim de semana em bairros pobres e sem lazer concentra homicídios.”: FSP: 19.08.96, p.1-6. (96.09.01), FOLHA de São Paulo, “Grupos abatem preço de TV paga e telefone.”, FSP: 01.09.96, p.7-13.) (96.09.01), TOLEDO, José Roberto de , “Violência é o pior problema da cidade”, FSP: 01.09.96, p.1-6. (96.09.01), VERGARA, Rodrigo, “Segurança vira instrumento de vendas”, (96.08.19), TOLEDO, José Roberto de ,
FSP: 01.09.96, p.3-4. (96.09.03),
OLIVEIRA,
João
PENHA,
Gerson,
“Big Bang urbano faz periferia de SP
crescer”, OESP:04.07.93, p.1. (93.08.28),
OESP,
“Prefeitura
lança
plano
para
Zona
Leste”,
OESP:28.08.93, p.6. (94.07.31), LIMA, Thomaz Pinto.,
“As oportunidades de negócios na Zona
Leste”, FT:31.07.94, p.I-10. (94.12.08), FERRAZ, Paulo.,
“Mapa mostra desigualdade social por bairro:
Pesquisa elaborada com dados do IBGE revela que distrito de Carlos
de
Oliveira,
“Real e violência
favorecem seguradoras: Moeda estável e insegurança em áreas urbanas fizeram lucros das empresas crescerem 64% no 1° semestre.” FSP: 03.09.96, p.2-1.) (96.09.06), LOZANO, André,
(93.07.94),
“Vítimas e assassinos são homens jovens:
pesquisa da USP conclui que, nas regiões mais violentas, perfil dos acusados e dos mortos é o mesmo.”, FSP: 06.09.96, p.3-5.
Anhagüera
(zona
norte)
tem
pior
qualidade
de
vida.”,
FSP:08.12.94, p.3-6. (95.06.24), FOLHA de São Paulo,
“Zona Leste ganha avenida em outubro”,
FSP:24.06.95, Especial A-1. (95.11.13), FOLHA de São Paulo,
“Zona Leste ganha trecho de avenida”,
FSP:13.11.95, Especial A-1.
262
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana “Periferia de SP ‘transborda’ e exporta moradores para as cidades vizinhas.”, FSP: 22.06.96,
Fundos de Pensão
p.1-9.
(95.11.06), AGOSTINHO, Victor, “Prefeitura articula ...: secretaria do
(96.06.22), TOLEDO, José Roberto de.,
A Anistia aos imóveis irregulares
Planejamento sonda fundos de pensão para ve...”. FSP:06.11.95, p.3-5. (96.10.07), OESP, “Fundos de pensão, alavanca para o desenvolvimento”,
(92.04.01) LANCHA, Fernando,
“Câmara quer anistia ampla para imóvel
irregular: Projeto da Prefeitura recebeu vários substitutivos dos
(96.11.06), SECOVI-SP, “Fundos de pensão: decisão equivocada”, Coluna
vereadores, ampliando ainda mais as vantagens a 1,7 milhão de
SECOVI-SP,
proprietários”, OESP:01.04.92, p.1.
OESP:06.11.96, p.C5.
São
Paulo,
06.11.96,
Ano
XIV,
n°756,
“Um perdão aos imóveis: quase todos os vereadores apóiam a anistia a imóveis irregulares”,
(96.11.09), FERREIRA, Alcides et al., “Fundos passam a exigir lucro de
JT:04.04.92, p.13.
(96.11.13), VELLOSO, Eliane, “Previ vai vender participações acionárias”,
(92.04.04) TEIXEIRA, Regina Helena,
empresas”, OESP:09.11.96, p.B12.
“Parecer 921/92 da Comissão de Admistração Pública sobre o projeto de lei n° 469/91”, Diário Oficial do Município
(96.11.17), SINDUSCON, “O papel real dos fundos de pensão”, Opinião do
(D.O.M.), São Paulo, 37(80), quinta-feira, 30 de abril de 1992,
Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São
p. 59.
Paulo”,
(92.04.30) PMSP,
(92.07.03)
OESP:07.10.96, p.B2.
LANCHA,
Fernando,
“Câmara quer votar anistia logo”,
OESP:03.07.92, p.2. (92.07.03) OESP,
“Prefeita quer dar anistia a 800 mil casas por decreto”,
OESP:03.07.92, p.1.
OESP:13.11.96, p.B8.
Publicidade,
São
Paulo,
17.11.96,
Ano
3,
n°
140,
FSP:17.11.96, p.5-7. (96.12.20), OLIVEIRA, Ribamar, “Um jogo de cartas marcadas: Fundos de pensão
de
estatais
podem
ser
coniventes
no
esquema
dos
precatórios”, OESP:20.12.96, p.B2. (96.12.30), NICOLETTA, Costábile, “Investimentos somaram US$ 130 milhões em 96: negócios anunciados por empresas nacionais e estrangeiras
ficaram
OESP:30.12.96, p.B1.
40,43%
acima
do
valor
de
95”,
263
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Valorização Imobiliária/ Especulação/ Lançamentos (96.10.06), AIRES, Lauro, “Lançamentos na RMSP vão bater recorde em 1996: até setembro foram colocadas no mercado 30.586 unidades,
Legislação/ Uso do Solo/ Administração Pública
maior número em 20 anos”, OESP:06.10.96, pI2. (96.10.10), OESP, “Lançamentos nos bairros que são destaque em São
Plano Diretor de 1990
Paulo”, OESP:10.10.96, p.I2. (96.10.10), OESP, “Obras direcionam novos prédios: melhorias nas vias de acesso
estimulam
OESP:10.10.96, pI4.
ampliação
das
áreas
residenciais”, (90.12.08), LANCHA, Fernando, “Plano Diretor vai desvalorizar os imóveis de SP, dizem empresários”, FSP:08.12.90, p.C-1. (90.12.16), CAMPANILI, Maura, “Uma cidade sem zoneamento?”, Shopping News:16.12.90, p.9. (91.01.19), FSP, “Plano Diretor desagrada construtores e sem-teto”, FSP:19.01.91, p.C-3. (91.02.06), KOSIN, Lígia, “São Paulo: a nova forma de usar o solo”, JT:06.02.91, p.17. (91.02.13), VEJA, “O debate do futuro: começa a discussão do direito de construir”, VEJA-SP:13.02.91, p.18. (91.02.24), Shopping News, “Preços poderão disparar”, Shopping News:24.02.91, p.3. (91.03.03), Shopping News, “Plano Diretor. E novas promessas de transportes”, Shopping News:03.03.91, p.? (91.03.06), KON, Samuel, “s.título” [Sobre a diminuição do preço dos terrenos], OESP:06.03.91, p.11. (91.03.16), TEIXEIRA, Paulo, “O Plano Diretor e a Prancheta”, FSP:16.03.91, p.4-2. (91.04.13), SILVA, Eduardo Pacheco e, “Plano Diretor da cidade”, OESP:13.04.91, p.24.
264
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (91.04.20), FSP, “Cidades vizinhas podem ser alvo de investimentos”, FSP:20.04.91, p.9-4.
Um Plano Diretor para São Paulo (Plano Diretor na administração Paulo Maluf)
(91.04.24), GERMANOS, Paulo, “Plano diretor encarece moradia”, OESP:24.04.91, (93.03.28), OESP, “Planejamento é a solução para a metrópole”, OESP:28.03.93, p.2.
p.11. (91.04.24), OESP, “Sérgio Mauad [presidente do Secovi-SP] é recebido em audiência
(93.09.05),
(91.04.24), TEIXEIRA, Paulo, “O que é bem para São Paulo”, FSP:24.04.91, p.4-2.
de
desmistificar
o
Plano
Diretor”,
p.3-2. OESP:10.10.96, p.I5.
(91.06.09), CURY, Pedro, “Projeto não estabelece diretrizes de crescimento”, Shopping News:09.06.91, p.12. (91.06.16), CAMPANILI, Maura, “Plano Diretor quer aproximar casa e trabalho”, Shopping News:16.06.91, p.9. (91.06.23), CAMPANILI, Maura, “Empresários temem fim do zoneamento”,
Novo Código de Obras (92.01.14)
Rebeca,
“Avanços.
Com
retrocessos”,
Shopping
News:30.06.91, p.10. (91.08.18), BERNASCONI, José Roberto, “A cidade que queremos”, Shopping News:18.08.91, p.12. Lúcio,
“A
cidade
posta
em
questão”,
Shopping
News:08.09.91, p.12. (...), CAMPANILI, Maura, “Empresários apóiam. Com restrições: a Prefeitura e os empresários da construção civil discutiram esta semana o projeto do novo Plano Diretor (...)”, Shopping News:s.d., p.3.
“Código de Obras: por que a demora?” Boletim Semanal do Sindicato de Imóveis no Estado de São Paulo. Ano II, n°74,
Shopping News:23.06.91, p.10.
KOWARICK,
hora
(96.10.10), BOTTI, Alberto, “Para desmistificar conceitos do Plano Diretor”,
p.10.
(91.09.08),
“É
(93.11.10), ROLNIK, Raquel, “Quem tem medo do Plano Diretor”, FSP:10.11.93,
(91.04.28), MADEIRA, Arnaldo, “Em busca da sintonia”, Shopping News:28.04.91,
SCHERER,
Alberto,
OESP:05.09.93, p.6.
em Brasília”, OESP:24.04.91, p.11.
(91.06.30),
BOTTI,
14.01.92.
“Um grande acordo a favor de São
(92.03.28) MARICATO, Ermínia,
Paulo”, FSP:28.03.92, p.3-3. (92.05.20)
FALANGA,
“Código
Edson,
de
Obras
e
Incoerência”,
FSP:20.05.92, p.3-4.
“Código de Obras é aprovado em 1ª discussão na Câmara”, OESP:21.05.92, p.2. (92.05.23) FARIA, Lia Ancona de, “A coerência do Código de Obras”, (92.05.21) OESP,
FSP:23.05.92, p.3-3. (92.06.05)
OESP,
“Vereadores
aprovam
novo
Código
de
Obras”,
OESP:05.06.92, p.12. (92.06.09) FOLHA de São Paulo,
“Nova lei é medíocre, diz presidente do
IAB, Carlos Bratke”,FSP:09.06.92, p.3-1. (92.06.09)
MARICATO,
Ermínia,
“Código de Obras: paternidade e
eleição”, FSP:09.06.92, p.3-3.
265
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
(92.06.26) SILVA, Mauro Carvalho,
“Novo Código de Obras facilita
Orçamento Municipal
construção e reforma do imóvel: exigências absurdas, como autorização
para
uma
simples
troca
de
piso,
acabam.”,
OESP:26.06.92, p.1. (92.09.24) FOLHA de São Paulo,
FSP:31.08.96, p.1-7.
“Código que simplifica obras entra em
(96.08.31), SOUSA, Vivaldo de , “Total de mudanças entrou em vigor a
vigor: A nova lei que substitui um,a vigor desde 1975, diminui burocracias
e
“Arrecadação municipal cresceu 191%”.
(96.08.31), SOUSA, Vivaldo de.,
facilita
construções
em
São
Paulo.”,
FSP:
24.09.92, p.3-6.
partir de 90”, FSP:31.08.96, p.1-7. (96.09.02), FSP, “1988 explica 1996”, FSP:02.09.96, p.1-2. (96.09.16), AGOSTINHO, Victor,
“Dívida de Maluf corresponde a 79% da
receita anual do município”, FSP: 16.09.96, p.3-11.
Operação Urbana/Cepac
(96.09.16),
PATÚ,
Gustavo,
ULHÔA,
Raquel,
“Senado
facilita
o
endividamento das cidades”, FSP:16.09.96, p.3-11. (93.09.22),
OESP,
“Prefeitura quer burlar lei para construir casas”,
(96.11.07),
OESP:22.09.93, p.C-3. (93.10.27), OESP,
“Pitta e as suspeitas ‘paulistinhas’”, “Suplicy faz de tudo, mas não obtém
(96.11.15), COSTA, Rosa, et al.,
documento”, OESP:15.11.96, p.A7
OESP:27.10.93, p.C-6.
“Câmara aprova projeto para Água
Branca”, OESP:28.10.94, p.C4. (94.11.21), OESP,
Paulo,
FSP:07.11.96, p.1-3.
“Maluf veta controle do zoneamento pela Câmara”,
(94.10.28), FONTOURA, Cláudia.,
SANDRONI,
“Reurbanizar sem esquecer os pormenores: A Operação
Água Branca, na Zona Oeste, vai definir o novo perfil urbano da Capital paulista.”, OESP:21.11.94, A-3. (96.03.21), GENTILE, Rogério, “Ex-assessor de Maluf: nova denúncia:
(96.11.17),
GRANATO,
“Maluf deixa dívida recorde para
Fernando,
sucessor: Pitta terá maior orçamento da história da cidade, R$ 7,6
bilhões,
mas
R$
6
bilhões
de
débitos
a
pagar”,
OESP:17.11.96, p.A6. (96.11.17), GRANATO, Fernando, pesquisa
em
“Prefeito descumpre lei orçamentária:
ocumentos
de
despesas
revela
que
projetos
arquiteto encaminhou projetos de alteração de zoneamento em
prioritários foram praticamente ignorados, programas sociais
área para a qual tem um plano de reurbanização”, JT:21.03.96,
deram lugar a obras viárias”, OESP:17.11.96, p.A6.
p.A-13.
(96.11.28), HORTA, Nilton.
“Senado estuda como impedir desvio de
dinheiro”, OESP:28.11.96, p.A6. (96.11.28), OESP,
“A CPI dos precatórios”, Editorial, OESP:28.11.96,
p.A3. (96.11.28), OLIVEIRA, Ribamar,
“Prefeitura de São Paulo fica fora de
investigação: requerimento que cria CPI limita apuração a títulos emitidos em 1995 e 1996”, OESP:28.11.96, p.A5.
266
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (96.12..28), GENOÍNO, José, CARDOSO, José Eduardo,
“Os precatórios e
progressivo”,
o endividamento irresponsável”, OESP:28.12.96, p.A2.
municipal
FSP:22.02.92,
que
regula
a
p.1-3(
Tendência
cobrança
do
e
IPTU
Debates: em
São
“A Paulo
lei é
constitucional?”).
A Batalha do IPTU
(92.02.22), COMPARATO, Fábio Konder, “A quem cabe legislar: com a suposta intenção de defesa do contribuinte, cometeu-se neste episódio grave
(92.01.03), JT, “Sacrifício Inútil”, JT:03.01.92, p.4.
equívoco jurídico”, FSP:22.02.92, p.1-3( Tendência e Debates: “A lei
(92.02.10), TEIXEIRA, Regina Helena, “Povo se une contra IPTU”, JT:10.02.92,
municipal
que
regula
a
cobrança
do
IPTU
em
São
Paulo
é
constitucional?”).
p.11. (92.02.11), FERREIRA, Wanise, TEIXEIRA, Regina H., “FIESP diz: não paguem
(92.02.22), MARTINS, Ives Gandra da Silva, “Isonomia e progressividade: a progressividade cria um tratamento desigual, que só pode ser adotado
IPTU”, JT:11.02.92, p.16.
se expresso na Constituição”, FSP:22.02.92, p.1-3( Tendência e
(92.02.11), FOLHA de São Paulo, “Comércio pede moratória para pagar IPTU”,
Debates: “A lei municipal que regula a cobrança do IPTU em São Paulo
FSP:11.02.92, p.4-4.
é constitucional?”).
(92.02.11), ROCHA Filho, Milton F. da, “Um assalto: Delfim chama o IPTU de
(92.02.22), TEIXEIRA, Mauro, “Sem IPTU, Erundina enfrenta ameaça de greve:
escorchante”, JT:11.02.92, p.16)
motoristas e servidores querem reajustes e acenam com paralisaçõs;
(92.02.12), CALDEIRA, Kássia, “O povo vai ao Ibirapuera”, JT:12.02.92, p.12.
Prefeita argumenta que arrecadação caiu.”, FSP:22.02.92, p.3-3.
(92.02.12), FREIRE, Vera, “IPTU: Erundina não cede”, JT:12.02.92, p.11. (92.02.12), OESP, “IPTU: o tiro pela culatra”, OESP:12.02.92, p.3. (92.02.14), OESP, “Arrecadação supera previsão”, OESP:14.02.92, p.2. (92.02.16), SEMLER, “IPTU, o cacete”, FSP:16.02.92, p.1-9. (92.02.17), PEREIRA, Luiz Carlos Bresser, “O IPTU e os ricos”, FSP:17.02.92,
(92.03.27),
DALLARI,
Dalmo
de
Abreu,
“O
falso
problema
do
IPTU”,
FSP:27.03.92, p.1-3. (92.06.02), FSP, “Prefeitura ignora liminar do IPTU. Nova cartela mantém alíquota progressiva
e
não
alerta
para
necessidade
de
refazer
cálculo”,
FSP:02.06.92, p.3-1.
p.1-3. (92.02.17), FREIRE, Vera, “Prefeita recorre da liminar”, JT:17.02.92, p.12.
(92.06.03), FSP, “IPTU de Erundina lesa contribuinte”, FSP:03.06.92, p.3-1.
(92.02.19), AMATO, Mário, “Imposto ou Punição?”, FSP:19.02.92, p.1-3.
(92.06.04), DALLARI, Dalmo de Abreu, “IPTU sem leviandades”, FSP:04.06.92,
(92.02.19), CHAUÍ, Marilena, “Nós quem, cara pálida?”, FSP:19.02.92, p.1-3. (92.02.20), JT, “Veredicto definitivo no caso do IPTU”, Editorial, JT:20.02.92, p.4. (92.02.20), OESP, “O IPTU derrotado”, Editorial, OESP:20.02.92, p.3. (92.02.20), SINGER, Paul, “Já começaram as mentiras”,FSP:20.02.92, p.1-3. (92.02.22), CENEVIVA, Walter, “Não dá para ser maniqueísta: o IPTU deve respeitar a capacidade econômica do
contribuinte,mas pode ser
p.1-3. (92.06.10), MARTINS, Ives Gandra, “O IPTU em face dos tributos”, FSP:10.06.92, p.1-3. (92.06.12), JT, “Erundina é derrotada: STF mantém 0,2% para IPTU. Mas decisão não é definitiva”, JT:12.06.92, p.11.
267
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
(92.06.12), LAVORATI, Liliana, “Para STF, Justiça estadual deve julgar IPTU:
classe
Erundina perde batalha no Supremo por sete votos a quatro, imposto continua a ser pago com alíquota de 0,2%”, FSP:12.06.92, p.3-4.
(92.09.03), Poder Executivo Municipal, “Resposta ao JT”, Direito de resposta publicado em atendimento a ordem judicial, JT:03.09.92, p.1. (92.10.01), FSP, “Desvalorização de imóveis afeta arrecadação de imposto em SP”, FSP:01.10.92, p.3-3. (92.10.01), MAGALHÃES, Thélio de, “Juiz condena IPTU progressivo. Decisão vale para o imposto de 1991 e quem entrar na Justiça receberá seu dinheiro corrigido”, JT:01.10.92, p.14. (92.10.02), FSP, “Prefeitura quer reduzir IPTU comercial: projeto entregue à Câmara propõe diminuição da alíquota e base de cálculo do imposto para imóvel não residencial”, FSP:02.10.92, p.3-4. (92.10.06), JT, “O IPTU na berlinda”, Editorial, JT:06.10.92, p.4. (92.12.10), SILVA, Eduardo P., “O novo Prefeito e os impostos municipais”, OESP:10.12.92, p.2.
será
prejudicada
e
falam
numa
nova
proposta”,
OESP:18.12.92, p.3. (92.12.18), FSP, “IPTU da classe média pode aumentar 200%”, FSP:18.12.92, p.3-
(92.06.27), MAGALHÃES, Thélio de, “IPTU: Prefeitura vencida. Primeira decisão sobre o mérito anula as alíquotas progressivas”, JT:27.06.92, p.13.
média
4. (93.12.09),
SILVA,
Salete,
“Pobre
paga
mais
imposto,
apura
o
Dieese”,
OESP:09.12.93, p.B-8. (96.11.13), AUGUSTO, Cláudio, “IPTU pode ser cobrado duas vezes em 97: liminat permite que prefeitura cobre agora R$ 400 milhões que deixaram de ser arrecadados em 1992, quando o Tribunal de Justiça concedeu
liminar
contra
a
cobrança
do
imposto
progressivo”,
OESP:13.11.96, p.C1. (96.11.14), AUGUSTO, Cláudio, “Vereadores são contra IPTU duplo em 97: líder do governo garante que o imposto predial de 1992 não vai ser cobrado”, OESP:14.11.96, p.C1. (96.11.14), OESP, “O uso político do IPTU”, OESP:14.11.96, p.A3. (96.11.15), OESP, “Bancada governista pedirá anistia de IPTU a Maluf: projeto é a única forma para não cobrar R$400 milhões não recolhidos do imposto de 1992”, OESP:15.11.96, p.C5.
(92.12.17), JT, “Maluf propõe aumento do IPTU: alíquota mínima vai subir de
(96.11.21), FSP, “STF proíbe cobrança de IPTU progressivo: decisão se refere só a
0,2% para 0,6%. A principal atingida é a classe média”, JT:17.12.92,
Belo Horizonte, mas abre precedente para o caso de São Paulo, ainda
p.14.
indefinido”, FSP:21.11.96, p3-8.
(92.12.17), DUARTE, Luiz Carlos, “IPTU de Maluf ataca bolso da classe média”, FSP:17.12.92, p.B-1. (92.12.17), FSP, “Proposta amplia número de imóveis isentos: habitações de até Cr$ 154,2 mi não pagam, mas aumento é de até 200% para construções acima deste valor”, FSP:17.12.92, Especial p.B-2. (92.12.17), LANCHA, Fernando, “Maluf quer aumentar o IPTU de 737 mil”, OESP:17.12.92, p.1. (92.12.18), LANCHA, Fernando, “IPTU de Maluf causa revolta e pode ser revisto: até aliados de Maluf se assustam com a reação negativa, admitem que a
(96.11.21), MENDES, Vannildo, “IPTU progressivo depende de lei federal”, OESP:21.11.96, p.C4. (96.11.22), FSP, “Prefeitura diz que pode cobrar IPTU de 1992, apesar do STF”, FSP:22.11.96, p.3-10. (96.11.22), AUGUSTO, Cláudio, “Decisão sobre IPTU não vale para SP”, OESP:22.11.96, p.C3. (96.11.27), MARTINS, Ives Gandra da Silva, “IPTU e progressividade: eficácia da lei tributária foi suspensa de maneira irrecuperável para 1992”, OESP:27.11.96, p.B2.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (96.12.13), FSP, “STF julga IPTU progressivo inconstitucional: decisão só vale
(96.12.20), FSP, “Contribuinte não deve pagar”, FSP:20.12.96, p.3-1.
para empresa que ajuizou recurso; interessados no benefício têm de
(96.12.20), FSP, “Cobrança vale até ano 2000”, FSP:20.12.96, p.3-1.
entrar na Justiça”, FSP:13.12.96, p.3-6.
(96.12.20), FSP, “Anistia não está na pauta”, FSP:20.12.96, p.3-1.
(96.12.13), MENDES, Vannildo, “STF julga IPTU progressivo inconstitucional”,
(96.12.21), FREITAS, Silvana de, “Diferença do IPTU não poderá ser cobrada:
OESP:13.12.96, p.C5.
decisão do STF suspendendo cobrança de alíquota progressiva de
(96.12.14), OESP, “O grande desastre nacional: a Constituição obriga o STF a impedir
qualquer
tentativa
de
racionalização
administrativa”,
empresa vai valer para todo o contribuinte”, FSP:21.12.96, p.3-5. (96.12.23), MARTINS, Ives Gandra da Silva, “Traquinagens de um alcaide”,
OESP:14.12.96, p.A3. (96.12.19),
UCHÔA,
Luciana,
FSP:23.12.96, p.1-3. “Prefeitura
começa
a
cobrar
IPTU
de
92:
(96.12.23), UCHÔA, Luciana, “Contribuinte não deve ir à Justiça pelo IPTU;
contribuintes receberão semana que vem boletos com diferença causada
Prefeitura quer cobrar diferença de 92, mas convém esperar decisão
por polêmica judicial sobre progressividade do imposto; vallores médios
final do Supremo”, OESP:23.12.96, p.S2.
vão de R$40 a R$80; receita será de R$400 milhões”, OESP:19.12.96,
(96.12.24), FSP (RF), “Câmara faz hoje primeira votação do IPTU: projeto enviado
p.C7. (96.12.19),
268
UCHÔA,
pela Prefeitura prevê manutenção da alíquota de 0,6% sobre o valor do Luciana,
“Administração
já
propõe
execução
penal”,
OESP:19.12.96, p.C7.
imóvel”, FSP:24.12.96, p.3-4. (96.12.25), AGOSTINHO, Victor, SCHIVARTCHE, Fábio?, “Câmra aprova 0,6%
(96.12.20), MENDES, Vannildo, “Ministro do STF ataca cobrança do IPTU de 92”, OESP:20.12.96, p.C1. (96.12.20), RYDLE, Carlos, “Medida é ‘pouco ética’ e ‘marota’, afirmam juristas: ex-presidente do TJ critica ‘equívoco’de iniciar execução fiscal, que pode ser impugnada”, OESP:20.12.96, p.C1. (96.12.20), AUGUSTO, Cláudio, “Iniciativa quebra promessa de campanha: antes da eleição, Maluf assegurou várias vezes que o IPTU de 1992 não seria cobrado”, OESP:20.12.96, p.C1. (96.12.20), AUGUSTO, Cláudio, “Receita [do IPTU] pode atenuar crise financeira: dívida cresceu mais de 200% na gestão Maluf e deve chegar a R$6,5 bilhões neste exercício”, OESP:20.12.96, p.C1. (96.12.20), FREITAS, Silvana de, “STF critica Maluf por cobrar IPTU de 92: ministro afirma que cobrança é indevida e que outros prefeitos vão ter de restituir dinheiro aos contribuintes”, FSP:20.12.96, p.3-1. (96.12.20), FSP, “Prefeitura diz que Justiça a obriga a cobrar”, FSP:20.12.96, p.3-1.
de IPTU”, FSP:25.12.96, p.3-3. (96.12.26),
FSP
(RF),
“Câmara
pode
aprovar
IPTU
e
Orçamento
hoje”,
FSP:26.12.96, p.3-1. (96.12.27), FELTRIN, Ricardo, “Disputa por cargo adia votação do IPTU: disputa por posto de presidente da Câmara causa adiamento; projetos podem ser votados hoje”, FSP:27.12.96, p.3-5. (96.12.27), NUNOMURA, Eduardo, “Disputa pela Câmara adia votação do IPTU: PPB está dividido entre Brasil Vita e Nelo Rodolfo, Orçamento tem de ser aprovado até 2ª feira, OESP:27.12.96, p.C1. (96.12.28), FSP, “IPTU éaprovado e aumenta 10% em 97: vereadores não votaram projeto de anistia do imposto de 1992, que deve voltar ao plenário só em março”, FSP:28.12.96, p.3-1. (96.12.28), RYDLE, Carlos, “Reajuste de 10% do IPTU passa em 1 minuto”, OESP:28.12.96, p.C3.
269
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Mananciais (96.09.24), NUNOMURA, Eduardo.,
“Pesquisa alerta para poluição na
Guarapiranga”, OESP:24.09.96, p.C5.
Questões macroeconômicas/ Globalização/ Indústria/ Mundo do trabalho Poder Econômico e Política/Viarismo/Regime automotivo/Especulação imobiliária (93.01.17), DO VAL, Graziele, ROCHA, Daniela, “Obras na cidade alteram valor dos imóveis”, FSP:17.01.93, p.8-1. (93.04.30), FAGÁ, Marcelo, “Obras darão cara nova à Capital do Futuro: São Paulo ganhará um outro perfil se todos os novos projetos anunciados
pelos
governos
municipal
e
estadual
forem
concretizados”, OESP:30.04.93, p.6. (95.03.07),
AGOSTINHO,
“Empreiteiras
Victor,
enfrentam
Maluf”,
FSP:07.03.95, p.3-1. (95.03.07), FSP,
“Para construtores, edital ajuda megaempresas”, FSP:
07.03.95, p.3-1. (95.03.07),
RYDLE,
Carlos,
“Reforma nas Marginais é contestada”,
OESP:07.03.95, p.C1. (95.03.08), JT,
“Sete empreiteiras disputam a milionária reforma das
marginais”, JT:08.03.95, p.? (95.03.10), JT, “Túnel Ibirapuera é prioridade: Prefeito gasta com a construção do túnel mais do que com saúde e educação”, JT:10.03.95, p.4B. (95.03.22),
ALIPRANDI,
Elvio.,
FSP:22.03.95, p.3-2.
“Um anel viário contra o caos”,
270
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (95.08.12), LOZANO, André, “Volume de carros será 50% maior em 2005”,
(96.10.26), GENTILE, Rogério, “Congestionamentos aumentam 19% e
FSP:12.08.95, p.3-3. (95.10.07), MELLO, Flávio, “Túnel sob o Ibirapuera será inaugurado às
atrapalham o transporte coletivo”, FSP:26.10.96, p.3-5. (96.11.07),
9h”, OESP:07.10.95, p.C3. (95.10.24), AGOSTINHO, Victor, “Mulheres acompanham inaugurações do
Prefeitura, centrado em sistemas viários para automóveis, não melhora o conjunto do trânsito”, JT:04.11.95, p.2. (96.02.01), MELLO, Flávio, “Programa de Maluf favorece construtoras”, OESP:01.02.96, p.C2.
“Troca de ônibus por carro deixa o trânsito cada vez mais lento”, FSP:05.08.96, p.1-6.
(96.08.05), TOLEDO, José Roberto de,
(96.08.30), TOLEDO, José Roberto de, CARVALHO, Mário C., “Obras de
Publicitário:
(96.11.16),
Encol,
MACEDO,
“Ex-procurador
Fausto,
vira
advogado
de
empreiteiras”, OESP:16.11.96, p.A8. (96.11.18), NICOLETTA, Costábile, “Racional se concentra na construção civil”, OESP:18.11.96, p.B8. (96.11.21), ZORZAN, Patrícia et al.,
“Maior doador de Pitta fez maior obra
de SP”, FSP:21.11.96, p.1-8. (96.12.01), OLMOS, Marli,
“Estudo mostra proteção às montadoras”,
OESP:01.12.96, p.B15.
“A revolução do automóvel”, FSP:04.12.96, p.2-
(96.12.04), NASSIF, Luís,
(96.12.05), AUGUSTO, Cláudio,
(96.09.09), SCHIVARTCHE, Fábio, “Maluf inaugura nova avenida com
Solução
p.A7.
“Moradores reclamam do trânsito onde Maluf mais gastou com obras viárias.”, FSP: 02.09.96, p.16.
Condomínio:
“PT entra com ação contra Maluf”, OESP:14.11.96,
Maluf priorizam áreas ricas”, FSP:30.08.96, p.1-8. (96.09.02), TOLEDO, José Roberto de ,
“Plano
Financiamento Itaú”, OESP:07.11.96, p.A29. (96.11.14), OESP,
Prefeito”, FSP:24.10.95, p.3-6. (95.11.04), Faria, Maurício, “As obras e o trânsito: o programa de obras da
Anúncio
3.
“Prefeitura puniu quem ofereceu preço
baixo”, OESP:05.12.96, p.C1. (96.12.16), ZORZAN, Patrícia,
show”, FSP:09.09.96, p.3-11.
SP:
“Vias Públicas de SP gasta mais que Ministério dos Transportes”, FSP:09.09.96, p.1-10.
declarados pelos cinco principais candidatos”, FSP:16.12.96,
(96.09.09), TOLEDO, José Roberto de.,
(96.09.13), CARVALHO, Mario César, “Maluf tira R$ 1,7 bi de áreas socias para tocar obras e compensar dívidas”, FSP:13.09.96, p.1-8. (96.09.18), PEREIRA, Paula, “Maluf prepara megadesapropriação na Zona Sul: área de 35 mil metros quadrados no Jabaquara será para prolongar Anedia Água-Espraiada”, OESP:18.09.96, p.C1. (96.09.24), SCHIVARTCHE, Fábio, “Maluf vai deixar de entregar dois terminais”, FSP:24.09.96, p.3-5.
empresas
p.1-6.
do
“Construção Civil foi a maior doadora de setor
financiaram
22,75%
dos
recursos
271
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
Indústria Automotiva
(96.07.14),
TOURAINE,
Alain,
“O
canto
de
sereia
da
globalização:
processo de liberalização da economia esconde seus interesses
“Montadoras venderam 22,7% mais veículos em outubro do que em 95”, OESP:05.11.96, p.B5. PEREIRA F., Arthur, “Mercedes pode demitir mais 2.000 em 97”, FSP:05.11.96, p.2-7. ALMEIDA, Maria Regina, “Volks e GM batem recorde de produção”, FSP:26.12.96, p.2-9. MONTEIRO, Tânia et al., “GM investirá US$ 1,25 bilhão em 3 fábricas”, OESP:03.12.96, p.B14. OLMOS, Marli, “Meta é liderança no Mercosul”,
ideológicos”, FSP:14.07.96, p.5-6.
(96.11.05), OLMOS, Marli, (96.11.05), (96.12.26), (96.12.03), (96.12.03),
“GM construirá três fábricas até 1998”,
FSP:03.12.96, p.2-1. (97.01.02), PEREIRA Filho, Arthur,
“País deve ter maior número de
marcas: até o ano 2000, Brasil pode estar produzindo 14 marcas e
passar
os
EUA,
atual
líder,
que
hoje
produzem
11”,
FSP:02.01.96, p.2-1. (97.01.02), FSP,
(96.09.25), SEIDL, Antônio Carlos, “Investimento no mundo tem alta de 40%”, FSP:25.09.96, p.2-14. (96.10.06), OESP,
“SP deixa de ser o ‘Sul-Maravilha’ para nordestinos”,
OESP:06.10.96, p.B-10. (96.10.20),
SCHWARTZ,
Gilson,
“Globalização
não
é
processo
homogêneo”, FSP:20.10.96, p.2-2. (96.10.23), BORGES, Maria Angélica, BOCCHI, João Ildebrando, “Pobreza made in Globalização”, FSP:23.10.96, p.2-2.
OESP:03.12.96, p.B14. (96.12.03), FRANÇA, William,
(96.09.22), CALDAS, Suely, “O saldo da abertura”, OESP:22.09.96, p.B2.
“Montadoras vão investir US$ 13 bilhões”, FSP:02.01.96,
p.2-3.
“Montadoras venderam 22,7% mais veículos em outubro do que em 95%”, OESP:05.11.96, p.B5. (96.11.05), PEREIRA Filho., Arthur, “Mercedes pode demitir mais 2.000 em 97”, FSP:05.11.96, p.2-7. (96.11.16), DECIA, Patrícia, “Chomsky chega ao Brasil para palestras”, (96.11.05), OLMOS, Marli,
FSP:16.11.96, p.4-3. (96.11.26), AGUIAR, Isabel Dias de, (96.11.26), FSP,
Globalização e Emprego
“Produtividade industrial cresceu 45%
desde 90”, OESP:26.11.96, p.B1.
“Planeta tem 1 bilhão sem emprego: relatório da OIT
estima que 30% da força de trabalho no mundo nã tem emprego ou está sub-empregada”, FSP:26.11.96, p.2-1.
“Maluf e Maia vêem eixo SP-Rio como futuro pólo do Atlântico Sul”, OESP:18.02.93, p.1 (Caderno Cidades).
(93.02.18), OESP,
(94.12.21), JT, Editorial[Demografia], JT:21.12.94, p.4.
“O Futuro da Cidade”: FSP, 27.06.1995. (OFC, FSP). (96.03.03), Caderno Mais!: “Trabalho sem futuro, futuro sem trabalho.”: (95.06.27),Caderno
FSP, 03.03.96.
(96.11.26), OESP,
“Desemprego no mundo atinge 1 bilhão de pessoas”,
OESP:26.11.96, p.B14.
“Desemprego Mundial”, Editorial, FSP:27.11.96, p.1-2. (96.12.01), PINHEIRO, Liliana, “Redução de custos une patrões e empregados”, OESP:01.12.96, p.B1. (96.12.19), LÍRIO, Sérgio, “Indústria tem só 23% dos empregos”, (96.11.27), FSP,
FSP:19.12.96, p.2-1.
272
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (96.12.22),
FSP-ABCD,
“ABC registra crescimento restrito em 96”,
(96.09.14),
“ABC fecha ano com crescimento de 5%:
(96.10.20),
investimento na indústria automobilística provocou resultado positivo, segundo levantamento da Prefeitura”, FSP:22.12.96, LEMGRUBER,
Antônio
OESP,
“Inflação
C.,
e
desemprego”,
CAMPOS,
Roberto,
“A
democratização
capital”,
do
amplia
demissões
em
dezembro”,
GENRO,
Tarso,
“A
síndrome
FHC
da
intelectualidade:
‘Realismo do discurso presidencial despreza as desigualdades da realidade”, FSP:20.10.96, p.5-3.
“Tecnologia e distribuição de renda: tem
(96.10.24), Íntegra do Discurso Presidencial por ocasião da solenidade de
crescido diferencial de renda entre trabalhadores mais e menos
apresentação do sistema de gerenciamento do programa Brasil em
educados”, OESP:26.12.96, p.B2.
Ação, OESP:24.10.96, p.B13.
FSP
-
Campinas,
“Vulcabrás demite 1.100 funcionários”,
(96.10.27), PAULANI, Leda Maria, “A ‘franqueza’ da social-democracia:
FSP:27.12.96, p.2-5. (96.12.27), FSP,
‘verdades’ de FHC e Gustavo Franco são um travestimento do
“Mulher trabalha e metalúrgico faz bico”, FSP:27.12.96,
p.1-8.
credo liberal”, FSP:27.10.96, p.5-3. (96.11.03),
SACCOMANDI,
Humberto,
“Mercado
exclui
joves
e
desqüalificados: estudo mostra evolução da ocupação na Grande FSP:27.12.96, p.1-8. FSP,
“Fábrica
da
“O
custo
social
do
novo
modelo
de
produção”,
(96.11.03), SCHWARTZ, Gilson, “Cepal lança almanaque para a região”, FSP:03.11.96, p.2-2. (96.11.04), ROSSI, Clóvis, “Ricúpero diz que falta a FHC um ‘projeto
Volks
desafia
modelo
sindical:
unidade
inaugurada no ano passado em Resende (RJ) radicaliza processo de terceirização”, FSP:02.01.97, p.2-5. (97.01.05), RAYMONT, Henry,
OESP,
OESP:03.11.96, p.A3.
São Paulo entre 1988 e 1995 e aponta ‘legião de excluídos’”, (97.01.02),
da
estimular exclusão”, OESP:20.10.96, p.A17. (96.10.20),
“Indústria
(96.12.26), AMADEO, Edward,
(96.12.27),
diante
FSP:20.10.96, p.1-4.
OESP:25.12.96, p.B3.
(96.12.27),
fracos
defende redistribuição de renda, mas acha que programas podem
OESP:23.12.96, p.B2. (96.12.25),
e
(96.10.20), OESP, “Belga alerta para risco de dependência: professor
p.2-12. (96.12.23),
“Fortes
Newton.,
globalização”, FSP: 14.09.96, p.2-2.
FSP:22.12.96, p.2-14. (96.12.22), ZANINI, Fábio,
CAVALIERI,
“Escândalos podem marcar o 2° mandato
[de Bill Clinton]”, OESP:05.01.97, p.A25.
Globalização/Questões macroeconômicas e estruturais
nacional’”, FSP:04.11.96, p.1-4. (96.11.08),
PAULANI,
Leda
Maria,
“Transformações
no
sistema
capitalista”, Jornal de Resenhas: 08.11.96, p.5. (96.11.10), SINGER, Paul, “O jogo democrático das ideologias: introdução do segundo turno proporciona a educação política do país”, FSP:10.11.96, p.5-3. (96.11.12), COMPARATO, Fábio Konder, “Um rumo para o Brasil”,
(96.09.01), BRAGA, José Carlos de Souza., capitalismo”, FSP, 01.09.96, p.5-3.
“O espectro que ronda o
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reformas
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está
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recorde
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Gilberto
de
Mello,
“A
estrela
sobe”,
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Nogueira,
“Lula
e
a
‘globalização’”,
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Gilberto
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Mello,
“A
estrela
sobe?”,
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(91.08.18), Shopping News, “Prolongamento da Faria Lima é obra barata: O prolongamento da Avenida Brigadeiro Faria Lima até a rua Tabapuã, para descongestionar o cruzamento com a Avenida Cidade Jardim, custaria cerca de 10,7 milhões de dólares. Somente no projeto do bulevar da Juscelino Kubitschek - que foi enterrado e abandonado sem modificar o local
-
o
município
gastou
38,6
milhões
de
dólares.”
Shopping
News:18.08.91, p.5. entre Prefeitura e empresas possibilita a construção de áreas maiores que as permitidas por lei”, FSP:05.04.92, p.8-3.
(93.05.06), OESP, “Moradores repudiam novo traçado da Faria Lima: para presidente da Associação Vila Olímpia Viva, novo projeto para a avenida, já aprovado por Maluf, é pior que o anterior”, OESP:06.05.93, p.4. (93.05.08), FAGGIN, Carlos, “Agonia na Faria”, FSP:08.05.93, p.3-2. (93.05.12), FSP, “BC autoriza títulos para a Faria Lima”, FSP:12.05.93, p.3-4. (93.05.19), FSP, “Movimento apoia obra na Faria Lima”, FSP:19.05.93, p.3-6. (93.05.26), CAMARGO, Judith M., “Avenida Faria Lima”, carta publicada,
(93.01.17), VAL, Graziela do, ROCHA, Daniela, “Obras na cidade alteram valor de imóveis”, FSP:17.01.93, p.8-1.
OESP:26.05.93, p.2. (93.05.26), OESP, “Comissão avaliará imóveis da Faria Lima, diz arquiteto”,
(93.02.16), CAMPOS, Marinês, “Guerra na Faria Lima”, JT:16.02.93, p.1-26. (93.03.05), OESP,”Secretário fala sobre projeto e desmente Maluf”, OESP:05.03.93, p.4
OESP:26.05.93, p.5. (93.05.30), DUARTE, Luiz Carlos, “Projeto quer evitar ‘efeito Pinheiros’: Prefeitura pretende dividir região em duas áreas de influência; projeto disciplina uso
(93.03.19), FSP, “Justiça notifica desapropriado: peritos do judiciário vão agora avaliar as casas para extensão da Avenida Faria Lima”, FSP:19.03.93, p.p.3/3-2. FOLGATO,
pronto”, FSP:06.05.93, p.3-10.
(93.05.12), FREITAS, Ives de, “A Avenida do desperdício”, FSP:12.05.93, p.3-2.
(92.04.05), ALBEA, Rodrigo, “Construtoras trocam áreas por casa popular: acordo
(93.03.26),
de Barros diz que até terça-feira o edital de licitação para a obra estará
diferente para bairros”, FSP:30.05.93, p.4-8. (93.06.03), OLIVEIRA, José Carlos de, “Faria Lima: Esclarecimentos”, FSP:03.06.93, p.3-2.
Marisa,
“Grandes
obras
viárias
afligem
Pinheiros”,
OESP:26.03.93, p.1. (93.04.05), MARICATO, Ermínia, VILLAÇA, Flávio, “Campanha para os pobres, governo para os ricos”, FSP:05.04.93, p.?
(93.06.04), CINTRA, Marcos, “Os bônus da avenida Faria Lima”, FSP:04.06.93, p.22.
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TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (93.06.20), BONALUME Neto, Ricardo, “Arquitetos rivais colidem na Faria Lima:
(93.07.07), FSP, “Câmara adia votação sobre a Faria Lima: bancada governista
concepções e prioridades diferentes de urbanismo moldam o debate sobre
impede debate sobre mudança orçamentária que pede verbas para realizar
projeto de extensão da avenida”, FSP:20.06.93, p.4-8.
a obra”, FSP:07.07.93, p.3-5.
(93.06.22), JT, “Parecer rejeita a Nova Faria Lima”, JT:22.06.93, p.12.
(93.07.07), OESP, “Adiada votação do orçamento”, OESP:07.07.93, p.2.
(93.06.22), OESP, “Promotores consideram ilegal projeto de avenida: parecer diz que
(93.07.08), OESP, “Liminar impede votação de obra na Faria Lima”, OESP:08.07.93,
projeto ‘apresenta desvio de finalidade e de poder’”, OESP:22.06.93, p.2. (93.06.23),
OESP, “Projeto da Nova Faria Lima mudará de novo: Maluf tentará
(93.07.10), JT, “Maluf abre caminho na Faria Lima: ele já conseguiu os votos
prolongar avenida com auxílio da lei de Benfeitorias, para fugir de veto às
necessários para aprovar na Câmara a liberação de verbas para as
obras, feito pela promotora Iolanda Leite”, OESP:23.06.93, p.6.
desapropriações”, JT:10.07.93, p.11.
(93.06.23), FSP , “Painel fará pressão contra obra na Faria”, FSP:23.06.93, p.3-1. (93.06.24),
p.3.
(93.07.10), OESP, “Maluf garante votos para ampliar Faria Lima: acordo com PFL
RODRIGUES, Jacqueline, “Ampliação da Faria Lima será tema de
permitirá aprovação da emenda que libera Cr$1
plebiscito [organizado pelo colégio Equipe]”, FSP:24.06.93, p.3-2.
desapropriações”, OESP:10.07.93, p.1.
(93.06.25), FSP , “OAB [SP] pede rejeição de projeto Faria Lima”, FSP:25.06.93,
(93.07.11), FSP, “Arquitetos criam traçados para a Faria Lima; projeto de
p.3-3.
prolongamento da avenida já está pronto, mas técnicos continuam
(93.06.28), FSP, “Estudantes organizam plebiscito e rejeitam ampliação da avenida”, FSP:28.06.93, p.3-4. órgão vinculado à Secretaria de Planejamento; projeto agora vai a votação na Câmara”, FSP:29.06.93, p.3-5. empresários aprova o prolongamento da avenida sob protestos dos moradores”, JT:29.06.93, p.11. “Comissão
aprova
RYDLE, Carlos, “Faria Lima vai hoje a votação: em sessão extraordinária, vereadores decidirão se liberam verbas para ampliação da avenida”, JT:13.07.93, p.14.
(93.07.13), AMARAL, Luís Henrique, “Dinheiro para Faria Lima deve ser negado”,
(93.06.29), JT, “Projeto será entregue à Câmara: comissão de trabalhadores e
OESP,
‘sonhando’ com alterações”, FSP:11.07.93, p.4-3. (93.07.13),
(93.06.29), FSP , “Prefeitura ganha parecer a favor da extensão: estudo foi feito por
(93.06.29),
trilhão para as
FSP:13.07.93, p.3-3. (93.07.13), OESP, “Adiada votação de verbas para ampliar Faria Lima: liminar que impedia análise pela Câmara caiu no final da tarde”, OESP:13.07.93, p.1.
projeto
da
nova
Av.
Faria
Lima”,
(93.07.13), OESP, “Tumulto marca audiência sobre projeto na Câmara: sem teto e
(93.07.05), OESP, “Painel vai mostrar como projeto será votado na Câmara”,
(93.07.14), OESP, “Moradores festejam mudança no caso Faria Lima: obra voltará à
OESP:29.06.93, p.4. OESP:05.07.93, p.4. (93.07.06), AMARAL, Luís H., “Câmara vota hoje recursos para a Faria Lima: Prefeitura deve encontrar dificuldades para aprovar pedido de Cr$ 1 trilhão, que seria captado para a obra”, FSP:06.07.93, p.3-6. (93.07.06), OESP, “Cartaz critica projeto Faria Lima”, OESP:06.07.93, p.2.
funcionários da saúde também agitaram sessão”, OESP:13.07.93, p.3. Câmara como projeto independente, o que exigirá
mais votos”,
OESP:14.07.93, p.6. (93.07.14), RYDLE, Carlos, “Projeto Faria Lima é adiado: votação da readequação orçamentária, que liberava recursos para ampliação da avenida, fica para agosto.”, JT:14.07.93, p.12.
277
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
(93.07.16), JT, “Faria Lima”, JT:16.07.93, p.13.
(94.02.13), CARNEIRO, Sérgio, “Operação Faria Lima: questão de Planejamento”,
(93.07.16), OESP, “Maluf promete desapropriar menos na Faria Lima: Prefeito diz que desapropriações para o prolongamento da avenida, a principal obra de
FSP:13.02.94, p.10-2. (94.02.28), JT, “A nova Faria Lima em discussão: moradores lutam, na reunião de
seu governo, vão cair de 500 para apenas 58”, OESP;16.07.93, p.16.
hoje, para impedir a aprovação do projeto pelo Conselho Municipal do
(93.07.16), OESP, “Novo projeto será enviado dia 3 para os vereadores: com menos desapropriações, Maluf espera aprovação na Câmara”, OESP:16.07.93,
Meio Ambiente”, JT:28.02.94, p.16. (94.03.01), JT, “Faria Lima já pode ser ampliada: a aprovação ambiental foi dada ontem. Maluf terá de construir uma ciclovia e desapropriar mais 30 mil m 2
p.2. (93.08.13), FSP, “Veto à Faria Lima foi unânime”, FSP:13.08.93, p.3-4. (93.08.15),
SAVELLI, Alfredo Mario, “A Faria Lima de que São Paulo precisa: a
para áreas verdes”, JT:01.03.94, p.4B. (94.03.01), JT, “Prefeitura tenta aprovar novo projeto”, JT:01.03.94, p.4B.
extensão da avenida com base no mecanismo das operações urbanas pode
(94.03.04), JT, “Tudo o que muda com a Avenida pronta", JT:04.03.94, p.8-B.
resultar num novo modelo de administração urbana”, OESP:15.08.93, p.6.
(94.03.11),
(93.08.25), FSP , “Moradores fazem protesto contra projeto da Faria”, FSP:25.08.93, p.3-6. (93.10.06), FSP , “Operações interligadas terão de ser votadas: operação permite que empreendedores contornem a lei de zoneamento em troca de casas populares”, FSP:06.10.93, p.3-6. (93.10.14),
OESP, “Movimento contra a extensão da Faria Lima mostra fotos antigas [no Museu da Casa Brasileira]”, OESP:114.10.93, p.3-8.
(93.11.05), FSP , “Parecer critica ‘bônus’ para a Faria Lima”, FSP:05.11.93, p.3-4. (93.11.05),
JT, “Parecer condena projeto: especialista da USP considera ilegal a forma de financiamento”, JT:05.11.93, p.6B.
(94.01.28), AMARAL, Luís Henrique, “Prefeitura nega acusações dos sem-teto:
FAGÁ,
Marcelo,
“Definidas
desapropriações
na
Faria
Lima”,
segunda
feira”,
OESP:11.03.94, p.C1. (94.03.12),
OESP,
“Câmara
discute
desapropriações
na
OESP:12.03.94, p.C8. (94.03.19), JT, “Prefeitura começa a avaliar imóveis: valor das indenizações assusta moradores da região da Faria Lima”, JT:19.03.94, p.6B. (94.03.19), RUPERTI, Irene, “Justiça dá palavra final, mas demora”, OESP:19.03.94, p.G1. (94.03.19), RUPERTI, Irene, “Prefeitura paga 1/5 do valor de casa na Faria”, OESP:19.03.94, p.G1. (94.03.20), RUPERTI, Irene, “Desapropriados desconhecem como será paga a indenização”, OESP:20.03.94, p.C6.
assessoria de Maluf não quis comentar denúncias; Secretário da Habitação
(94.03.25), FSP, “Ação tenta suspender obras na Faria Lima”, FSP:25.03.94, p.3-4.
também nega conhecer acordo”, FSP:28.01.94, p.3-3.
(94.03.25), JT, “Moradores reagem com duas ações”, JT:25.03.94, p.12.
(94.01.28), AMARAL, Luís Henrique, “Sem-teto acusa farsa pró Faria Lima: parte dos manifestantes que protestaram ontem a favor da obra diz que foi ‘enganada’”, FSP:28.01.94, p.1-1. (94.01.28), FSP, “Relatório é favorável à obra”, FSP:28.01.94, p.3-3. (94.02.12), CINTRA, Marcos, “Os Cepacs da avenida Faria Lima” JT:12.02.94, p.2.
(94.03.25), V.A., “Em defesa de São Paulo”, Manifesto publicado. OESP:25.03.94, p.A-1. (94.04.15), FONTOURA, Cláudia, “Vizinhos impedem 1ª demolição na Faria Lima”, OESP:15.04.94, p.C4. (94.04.20), BARROS, Reynaldo de., “Karlmarxstrasse”, FSP:20.04.94, p.1-3.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (94.04.25), LANCHA, Fernando, “Prefeitura define perfil da Nova Faria Lima”,
(95.03.08),
OESP:25.04.94, p.C1. p.C1 AGOSTINHO,
MAGALHÃES, Thélio de, “Negada liminar contra licitação de obras: Com a decisão de juíza, concorrência para remodelação das Marginais
(94.04.25), OESP, “Prefeitura define perfil da Nova Faria Lima”, OESP:25.04.94, (94.04.29),
278
continuará.” OESP:08.03.95, p.C3. (95.03.08), MELLO, Flávio, “Maluf recua e projeto Faria Lima é aprovado: Prefeito
Victor,
“Primeiro
desapropriado
pede
prazo
cedeu à pressão dos moradores da Vila Olímpia e orientou vereadores da
maior:Proprietário reivindica na Justiça dois meses para deixar casa em
situação a aprovar substitutivo que altera o projeto original, preservando
Pinheiros pela qual recebeu US$ 60 mil.”, FSP:29.04.94, p.3-5.
58 imóveis antes condenados à demolição.” OESP:08.03.95, p.C3.
(94.05.22), AGOSTINHO, Victor, AMARAL, Luís Henrique, “Projeto cria ‘Paulista
(95.03.09),
de 15 km’”, FSP:22.05.94, Especial 1. (94.06.02), CAMPOS Filho, Cândido Malta., “Faria Lima e o desenvolvimento humanizado”, FSP:02.06.94, p.2-2.
projeto original.” JT:09.03.95, p.8B. (95.03.10),
(94.06.15), CINTRA, Marcos., “A avenida da modernidade”,JT:15.06.94, p.2. (94.06.23), LEIVA, João Oswaldo., “O falso dilema”, FSP:23.06.94, p.3-2.
(95.03.15), DUARTE, Luiz Carlos, “Arquiteto cria nova opção para a Faria Lima: Carlos Bratke apresenta alternativa para ampliação da avenida; proposta
a tarefa de fazer cessar a política de fatos consumados empreendida pela prefeitura”, JT:02.07.94, p.2. a tarefa de fazer cessar a política de fatos consumados empreendida pela
desapropria apenas terrenos”, FSP:15.03.95, p.3-3. (95.03.15), OESP, “Prefeito sanciona Cepac para Faria Lima”, OESP:15.03.95, p.C-8. (95.03.20), SPOSATI, Aldaíza, “O projeto alternativo”. FSP:20.03.95, p.3-3. (95.05.19), FSP, “Secretário espera aprovar 300 prédios: prefeitura deve arrecadar
prefeitura”. JT:02.07.94, p.2.
mais de R$ 1 bilhão, construções poderão ultrapassar limite da lei de
(94.07.06), COLASUONNO, Miguel., “A verdade sobre o projeto da nova Av. Faria Lima”, OESP:06.07.94, p.C-4.
JT, “Filho de Maluf compra imóveis perto da Faria: Escritórios de Flávio, quase 1000 m 2 ”, JT:10.03.95, p.4B.
(94.07.02), FARIA, Maurício., “Muito além das pranchetas: cabe à Câmara Municipal
(94.07.02), FARIA, Maurício., “Muito além das pranchetas: Cabe à Câmara Municipal
JT, “Faria Lima: Maluf saboreia vitória. Prefeito evitou o desgaste de enfrentar moradores da Vila Olímpia e não precisou alterar muito o
zoneamento”, FSP:19.05.95, p.3-3. (95.06.11),
AUGUSTO, Claúdio, “Operação Faria Lima muda a cara da cidade:
(94.08.19), LEITE, Paulus Magnus P., “A nova Faria Lima”, FSP:19.08.94,p.3-2.
venda do espaço aéreo atrai construtoras e inicia ‘cirurgia plástica’ no
(94.09.15), OESP, “Perigo para o contribuinte”, OESP:15.09.94, p.A-3.
Itaim, em Pinheiros e na vila Olímpia. FSP:11.06.95, p 3-9.
(94.10.09), ALBANESE, Ronaldo., “Classe média se organiza como os sem-teto”.
(95.06.11), AUGUSTO, Claúdio, “Operação Faria Lima muda a cara da cidade:
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Venda do espaço aéreo atrai construtoras e inicia ‘cirurgia plástica’ no
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Itaim, em Pinheiros e na vila Olímpia. FSP:11.06.95, p 3-9. (95.06.17),
ALBANESE, Ronaldo, “Desapropriados da Faria Lima: Moradores do
(95.01.12), AMARAL, Luís Henrique, “Prefeitura desacata Estado e derruba igreja:
trecho Vila Olímpia reclamam da ‘falta de respeito da Prefeitura’ e dizem
Paroquianos e o secretário estadual da Cultura tentaram impedir que a
que não poderão se mudar para imóveis similares aos seus com o dinheiro
prefeitura demolisse a paróquia São João”. FSP:12.01.95, p.3-2.
recebido pela desapropriação.” OESP:17.06.95, p.C8.
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A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e
(95.06.17), ALBANESE, Ronaldo, “Desapropriados da Faria Lima...: Moradores do
(95.09.15), FOLHA de São Paulo, “Decreto facilita obras de prédios na Faria Lima.”.
trecho Vila Olímpia reclamam da ‘falta de respeito da Prefeitura’ e dizem que não poderão se mudar para imóveis similares aos seus com o dinheiro
FSP:15.09.95, p.3-2. (95.09.15), FSP, “Decreto facilita obras de prédios na Faria Lima”, FSP:15.09.95,
recebido pela desapropriação.” OESP:17.06.95, p.C8. (95.06.25), MANSO, Bruno Paes, “Calim Eid é um dos felizardos da Faria Lima:
p.3-2. (95.10.21), AUGUSTO, Cláudio. “Malta quer transporte coletivo”, FSP: 21.10.95,
Coordenador das campanhas de Maluf tem pelo menos 20 imóveis na região beneficiada.” OESP:25.06.95, p.C16.
p.3-3. (95.10.21), MELLO, Flávio, “Trecho da Faria Lima ainda terá alterações: algumas
(95.06.25), MANSO, Bruno Paes, “Calim Eid é um dos felizardos da Faria Lima:
modificações
Coordenador das campanhas de Maluf tem pelo menos 20 imóveis na região beneficiada.” OESP:25.06.95, p.C16.
(95.06.28), MELLO, Flávio., “Câmara vota hoje abertura de CPI sobre Faria Lima: requerimento para apurar se obra favoreceu empresários precisa do apoio de 28 vereadores” OESP:28.06.95, p.C-3. (95.06.28), MELLO, Flávio., “Câmara vota hoje abertura de CPI sobre Faria Lima: Requerimento para apurar se obra favoreceu empresários precisa do apoio de 28 vereadores.” OESP:28.06.95, p.C-3. (95.07.27), AUGUSTO, Cláudio, “Maluf reduz extensão da Faria Lima: avenida não vai mais até a Berrini; trecho Pinheiros será concluído no mês de setembro”, FSP:27.07.95, p.3-1. (95.07.27), FSP, “Moradores comemoram redução da nova avenida: Dona de casa escapa de desapropriação de parte do terreno”, FSP:27.07.95, p.3-2. (95.07.31), JT, “Escorregão na Faria Lima”. JT:31.07.95, p.4.
ainda
dependem
da
Câmara
p.A-1. secretário”, FSP:24.10.95, p.3-6. (95.10.24), AGOSTINHO, Victor, “Mulheres acompanham inaugurações do
trará ganho para grupos empresariais ou investidores, com base em Maluf, Calim Eid, tem 20 imóveis na região.” OESP:27.06.95, p.C-3.
região
(95.10.24), AGOSTINHO, Victor, “Só Deus sabe quanto custa a Faria Lima’’, diz
Maluf, Calim Eid, tem 20 imóveis na região” OESP:27.06.95, p.C-3.
reportagem do ‘Estado’ mostrando que coordenador de campanhas de
da
obra será alternativa de ligação entre as zonas oeste e sul” FSP:23.10.95,
trará ganho para grupos empresariais ou investidores, com base em
(95.06.27), MELLO, Flávio, “Pedida CPI sobre be...: Vereador quer apurar se obra
trânsito
(95.10.23), “Faria Lima deve desafogar Marginal: segundo o presidente da CET, nova
(95.06.27), MELLO, Flávio, “Pedida CPI sobre be...: Vereador quer apurar se obra reportagem do ‘Estado’ mostrando que coordenador de campanhas de
no
Municipal”, OESP:21.10.95, p.C6.
Prefeito”, FSP:24.10.95, p.3-6. (95.10.27),
MELLO, Flávio, “Preços na região da Faria Lima explodem: Possível interesse de incorporadoras em construir prédios comerciais na região leva donos de imóveis e terrenos a aumentar preços em até 100%; especialistas vêem precipitação e exagero.” OESP:27.10.95, p. C5.
(95.10.27), MELLO, Flávio, “Movimento comercial está voltando ao normal: Estabelecimentos esperam conquistar clientes com ligação entre avenidas no trecho Pinheiros”, OESP:27.10.95, p.C5. (95.11.06), AGOSTINHO, Victor, “Prefeitura articula ...: secretaria do Planejamento sonda fundos de pensão para ve...” FSP:06.11.95, p.3-5. (95.11.10), MELLO, Flávio., “Prefeitura entrega via na Zona Oeste”, OESP:10.11.95, p.C-4. (95.11.30), GENTILLE, Rogério, “Área tombada pode abrigar shopping: Prefeitura decide hoje se aceita proposta de empreendedores. Centro ficaria a mil metros do Iguatemi.” JT:30.11.93, p.6B.
TGI 2. Considerações sobre o papel do Estado e do Capital na configuração da Zona Sudoeste Paulistana (95.12.14), ROCHA Filho, Milton F. da, “Novo Shopping abre guerra total no setor: Multiplan investe US$ 200 milhões na instalação de 138 metros quadrados na Faria Lima”, OESP:14.12.95, p.B22. (95.12.21),
MAGALHÃES, Thélio, “Projeto de Shopping sob suspeita: Prefeitura autorizou alteração de zoneamento, apesar de terreno no Itaim pertencer a empresa falida.” JT:21.12.95, p.2A.
(96.01.16),
OESP, “Prefeitura começa demolição de escola estadual no Itaim: Extensão da avenida Faria Lima vai passar no local”, OESP:16.01.96, p.A2.
(96.05.19),
FSP, “Área da Berrini liderou expansão em 95: Sem áreas livres para construir, Paulista e Faria Lima cresceram 2%, contra 22% da avenida da zona sul.”, FSP:19.05.96, p.3-6.
(96.05.19),
FSP, “Prédio ‘inteligente’ encarece Faria Lima : Inovações elevaram preço de imóveis em 50%”, FSP:19.05.96, p.3-5.
(96.07.27), MACEDO, Fausto, “Empresas do caso Pau-brasil têm 1 bilhão em obras: vereador entra hoje na Procuradoria-Geral de Justiça com representação contra Maluf e Reynaldo: documento denuncia benefícios a nove empreiteiras que contribuíram para esquema de eleição do prefeito” OESP:27.07.96, p.C5. (96.07.27), MELLO, Flávio, “Maluf desiste do trecho final da Faria Lima: Preço das cem desapropriações necessárias para fazer a ligação com a Luís Carlos Berrini ficaria muito caro, segundo o prefeito; arquiteto, no entanto, continua achando as obras necessárias”, OESP:27.07.96, p.C5. (96.08.10), FOLHA
de São Paulo, “Especulação emperra empreendimentos:
Proprietários estariam pedindo cerca de 900% a mais do que era cobrado antes das obras de extensão.” FSP:10.08.96, p.3-4. (96.09.09), SCHIVARTCHE, Fábio., “Maluf inaugura nova avenida com show”, FSP:09.09.96, p.3-11. (96.09.22), MELLO, Flávio., “Câmara tem agido como fiel aliada de Maluf.”, OESP:22.09.96, p.A5.
Lista dos presentes à apresentação do TGI, 06 de março de 1997, FAUUSP. Adriana Sá Adriana Sbampato Adriana Shima Iwamizu Aguinaldo Canas Silva Alessandro Sbampato Alexandre Effori de Mello Alexandre Hodapp Amália Giacomini Ana Cláudia Barone Ana Cláudia Castro Ana Gabriela Godinho Lima Ana Paula Hirata Tanaka Anderson Kazuo Nakano Beatriz Kara José Caio Santoamore de Carvalho Carlos Eduardo Gomes Carneiro Carolina Lefèvre
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281 Cleiton Honório de Paula Cynthia Ayres Guimarães Daniela Martins Büchler Daniela Sandler Diogo Zeni Elísio Yamada Eudina Agar de Freitas Barata Fabiana Luz Tannuri Fábio Goldfarb Fábio Mariz Gonçalves Flávia Barata Flávia Cancian Irotilde Gonçalves Pereira Jefferson Lafaiette Keese Joana M. C. Silva José Maria Barata Luciana Royer Luiz Antônio Barata Luiz Augusto Barata Márcio Wanderley Maria do Carmo Figueiredo Mariana Fix Mariana Kara José Patrícia Soffiatti Patryck A. Carvalho Pedro Fiori Arantes Roberta Pinheiro Asse Roberto Zocchio Torresan
A P r o d u ç ã o d o Espaço Urbano n a N o v a C i d a d e Rogério Akamine Roseli K. Mendes Silvana Olivieri Valéria Berti Contessa