A TECTÔNICA DA NATUREZA INCORPORADA:
Experimentações e projeto a partir de elementos naturais para constituir outras atmosferas no Pinheiral
Trabalho de conclusão de curso apresentada ao Censo Universitário Senac - Santo Amaro como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.
RODRIGO QUEIROZ NUNEZ
Orientador: Prof. Doutor Ricardo Luis Silva
São Paulo | 2020
AGRADECIMENTOS Agradeço a todos os amigos que me ajudaram e apoiaram durante esse ano; especialmente a Jéssica Silva por ter me apresentado o Pinheiral, objeto de estudo deste trabalho, e me orientado sobre suas entradas, caminhos e espaços. Agradeço também ao Ricardo Luis Silva, meu orientador, que me acompanhou e me ajudou durante todo o processo de desenvolvimento do projeto E um agradecimento especial a minha namorada, Martina Ovies, por sempre me ajudar e estar comigo nas horas difíceis, me incentivando a continuar e não desistir.
SUMÁRIO p. 10 Resumo p. 11 Abstract p. 12 Contexto p. 14 Introdução p. 16 Manifesto p. 18 Mimetistmo p. 19 Sinergia p. 20 Tectônica p. 21 Processo p. 22 Natureza p. 23 Fenomenologia p. 24 Estratégias Chave p. 26 Construir atmosferas na arquitetura p. 30 Estudos de caso p. 30 A trufa p. 32 Termas de Vals p. 34 Experimentos p. 40 O Pavilhão p. 42 O Abrigo p. 44 A Ponte p. 46 O Pinheiral p. 52 Trajeto p. 60 Projeto p. 66 Espaço de convívio p. 76 Memorial p. 92 Mirante p. 100 Espaço sagrado p. 110 Anfiteatro p. 120 Infraestrutura p. 132 Referências
RESUMO
ABSTRACT
A superficialidade da construção atualmente é reforçada por um senso de enfraquecimento da materialidade, é comum utilizar nas construções produtos que passam por diversos processos industriais para alcançar determinado acabamento ou aumentar a durabilidade. No entanto, esses materiais não passam de simulações, que estimulam nossa visão a enxergar o “belo” e ignoram os outros sentidos, limitando nossas experiências espaciais entre o corpo e o espaço. Já os materiais naturais como a madeira ou a pedra, permitem que nossa visão penetre em sua superfície nos convencendo de sua veracidade, expressam sua idade, além de nos contar suas origens e seu histórico de uso pelos humanos. Tendo essas questões em mente, o projeto é composto por um conjunto de elementos arquitetônicos distribuídos numa área com forte presença da natureza, conhecido como Pinheiral, localizado no extremo sul de São Paulo.
The superficiality of the construction is currently reinforced by a sense of weakening of the materiality, it is common to use in buildings products that go through various industrial processes to achieve a certain finish or increase durability. However, these materials are nothing more than simulations, which stimulate our vision to see the “beautiful” and ignore the other senses, limiting our spatial experiences between the body and space. Natural materials like wood or stone, on the other hand, allow our vision to penetrate its surface, convincing us of its veracity, express its age, in addition to telling us its origins and its history of use by humans. Bearing these issues in mind, the project consists of a set of architectural elements distributed in an area with a strong presence of nature, known as Pinheiral, located in the extreme south of São Paulo.
PALAVRAS CHAVE
KEYWORD
Arquitetura | Atmosfera | Experimentação | Memória | Corpo | Natureza
Architecture | Atmosphere | Experiment | Memory | Body | Nature
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CONTEXTO O trabalho a seguir foi desenvolvido em meio a um cenário tenso e preocupante, em função da disseminação da COVID-19 (Novo Coronavírus) pelo mundo, que teve início na China no final de 2019. O novo Coronavírus foi descoberto em Wuhan, cidade chinesa com 11 milhões de habitantes, por conta de uma série de casos de pneumonia com origem desconhecida. Depois de muita pesquisa, foi descoberta a COVID-19, doença causada pelo novo Coronavírus, se espalhando exponencialmente pelo mundo. Segundo o Ministério da Saúde, a doença chegou ao Brasil em Janeiro de 2020, até o momento que em este texto foi escrito já passam dos 5.000.000 de casos confirmados e mais de 100 mil mortes, além das pessoas que não estão contabilizadas, o número de recuperados é grande e torcemos para que esse número suba cada vez mais. Essa doença nos afeta de muitas formas, e mesmo aqueles que não foram contaminados sofrem quando amigos e familiares são alvos do vírus, nossos pensamentos não funcionam direito e as possibilidades nos atormentam, torcendo por uma boa notícia. Para impedir a contaminação, foram tomadas medidas de segurança como usar máscaras, lavar as mãos, evitar contato físico e o mais importante: isolamento social. Contudo , a ignorância e falta de respeito pelo próximo é grande entre as pessoas, piorando ainda mais a situação. O cenário de isolamento no qual vivemos afetou o desenvolvimento do trabalho, impossibilitando visitas ao local de estudo, a utilização da oficina, dos laboratórios e da biblioteca do Senac, tornando os experimentos limitados. Para que o trabalho não ficasse estagnado durante o primeiro semestre do ano, os objetivos foram direcionados para o embasamento teórico e para a produção dos primeiros modelos experimentais, para entender alguns processos, que foram aplicados no projeto final.
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INTRODUÇÃO O trabalho a seguir, trata-se de uma investigação sobre como a arquitetura que incorpora características da natureza carregando as marcas, as texturas, os significados e memórias afeta nossos sentidos por meio de atmosferas criadas, ao ponto de permitir uma experiência do mundo pelo nosso corpo. O interesse pelo assunto foi surgindo aos poucos, desde o quarto semestre, quando me deparei com questões funcionalistas muito presentes nas aulas de projeto, estimulando a busca por um caminho oposto ao discurso modernista. A princípio busquei no trabalho de alguns arquitetos teóricos que seguem uma linha de pensamento contraditório ao famoso “menos é mais”. Após ler “Complexidade e contradição em arquitetura” de Robert Venturi, tive a oportunidade de refletir sobre questões que nortearam o projeto do centro de cultura entregue no quinto semestre. O terreno escolhido para implantar o centro de cultura, era um lote quadrado que foi dividido em duas partes triangulares por uma avenida prevista na Operação Urbana Água Espraiada. Para evidenciar a invasão da via, o edifício foi amassado de acordo com a projeção da avenida formando dois volumes similares espelhados, com três faces, sendo duas em vertical e uma em diagonal que conformou na cobertura inclinada que chega ao chão, se tornando uma extensão do espaço público para ser ocupado livremente. O programa estava distribuído pelos dois volumes conectados pela área expositiva embaixo da avenida. Com exceção do administrativo e as salas de oficinas enterradas embaixo das praças de cada lado terreno, entre esses ambientes e os volumes principais foi gerado um vazio que conformou duas praças rebaixadas que afasta o visitante do barulho cotidiano. Durante o sétimo semestre, foi proposto o exercício de projetar um pequeno espaço sagrado, desta vez, a grande referência foi o livro “Pensar arquitetura” de Peter Zumthor, trazendo reflexões sobre uma arquitetura que carrega a memória e estimula a experiência por meio dos sentidos. Tendo isso em mente, o projeto foi desenvolvido considerando sua implantação a partir de uma escavação no topo do Monte Roraima, para chegar ao local, o visitante, deveria subir o grande tepui por uma trilha conhecida como passo das lágrimas, que segundo alguns locais, a montanha chora devido a uma antiga transgressão do homem contra uma árvore sagrada que nasceu naquela região. O espaço sagrado foi pensado para ser totalmente escuro, com pouca iluminação. Os pontos de luz eram, uma abertura zenital no fundo do ambiente, que devido a localização da montanha, projetava um pilar de luz ao meio dia, como se fosse invadido por uma presença divina no local, e na parte frontal há uma parede com uma fresta na altura de uma pessoa ajoelhada, para que durante uma oração, possa olhar por essa abertura e observar a imensidão do mundo. Assim como nos casos anteriores, o trabalho tem como intenção relacionar a arquitetura com o local inserido, além da questão puramente funcional, propondo uma relação mais íntima e “simbiótica”, imaginando situações ou significados, que consiste no ato de habitar. Desta forma, podemos alcançar uma arquitetura estruturada por valores, crenças e costumes de cada indivíduo ou grupo.
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MANIFESTO
Mimetismo Sinergia TectĂ´nica Processo Natureza Fenomenologia
MIMETISMO
O mimetismo é a capacidade que algumas espécies de animais e plantas possuem, muito utilizada como mecanismo de defesa por organismos que tentam se proteger de seus predadores, geralmente imitam cores, padrões e até mesmo o comportamento de espécies semelhantes, dando a impressão de serem venenosos ou terem um sabor ruim. No entanto, alguns predadores utilizam desta habilidade para que suas presas não sintam o perigo, e sejam devorados facilmente. Outra habilidade interessante e que se assemelha ao mimetismo, é a camuflagem, no qual a espécie consegue se misturar ao ambiente em que ela vive, deixando os animais quase despercebidos ao olho.
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SINERGIA
Representa a união das partes para alcançar um objetivo em comum. Quando um conjunto de organismos que ocupam diferentes nichos de especialização, trabalham de forma coletiva, se complementando e pensando juntos, podem alcançar resultados surpreendentes. É comum exemplos de coletividade na própria Natureza. Um exemplo interessante a ser destacado é o caso dos estorninhos, uma espécie de pássaros que ao voarem em grupo desenham formas peculiares no céu, quase como esculturas efêmeras. Com o objetivo de confundir seus predadores, criam a ilusão de ser um corpo enorme, para isso, deslocam-se a grande velocidade, seguindo regras muito precisas que os impedem de colidir uns com os outros.
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TECTÔNICA
A teoria da tectônica surgiu durante o séc. XIX, um período que já havia intensos debates no campo da arquitetura, muitas vezes envolvendo novos materiais e novas tecnologias. No geral, a intenção da tectônica é relacionar a arquitetura como artefato cultural e o saber fazer, sendo a ação humana sobre o objeto, que é passado de geração em geração pelos mestres de obras, de tal forma que evidencie a cultura e a identidade de um povo ou lugar. Dentre toda a complexidade presente na teoria da tectônica, algumas especificidades serão consideradas, sendo elas: a concepção se trata de uma representação geral, relacionando desde o volume até os condicionantes da herança tectônica; a materialidade, que trata dos materiais utilizados e como serão aplicados no local até a maneira como dialoga com outros materiais; e a técnica, que diz respeito a forma como será executado e as tecnologias aplicadas.
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PROCESSO
Cabe registrar todo o processo experimental, mesmo que algumas peças deem errado ou que façam parte do projeto final. Todos são extremamente importantes como componentes de aprendizado para alcançar a forma final das estruturas que irão definir cada espaço. Ao controlar os processos com mais precisão que os resultados, será cada vez mais fácil encontrar a lógica no desenvolvimento. Ao lidar com os elementos primários, é possível configurar arquiteturas específicas que emergem em harmonia com a natureza, aprendendo com sua lógica de formação diferentes técnicas e processos de transformação geológica, retém memória e as marcas do seu local de origem, permitem habitação e a relação com o meio ambiente sem exploração.
Uma arquitetura que não é experimental, é inútil. Solano Benítez
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NATUREZA
A natureza está há milhares de anos evoluindo por erros e acertos, podendo até ser considerada como um grande laboratório de soluções tecnológicas rico em biodiversidade. Em muitos casos, podemos incorporar a sabedoria inerente aos processos do design para criar uma arquitetura capaz de se mimetizar ao local inserido como parte do ecossistema. A conexão com as forças da natureza nos permitirá evoluir e coexistir com todas espécies.
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A natureza é uma designer de 3.8 bilhões de anos Marko Brajovic
FENOMENOLOGIA
A fenomenologia é o estudo filosófico que retoma o conhecimento dos fenômenos da consciência, direcionado a pesquisa e a fase de concepção para propor atmosferas que permitem a percepção multissensorial do ambiente e a reação que poderá ser provocada em cada sujeito ao estimular os sentidos físicos, levando em consideração parâmetros como o calor da luz, volumetrias orgânicas, o peso das estruturas, as marcas do local, a passagem do tempo e outras características que podem tornar a experiência mais marcante na memória, tanto de espírito quanto pelo corpo através do sistema Háptico, que se refere a inclusão de todo o corpo e não apenas os instrumentos do tato ao tocar um objeto.
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ESTRATÉGIAS CHAVES CONSTRUIR ATMOSFERAS NA ARQUITETURA
ESTUDOS DE CASO A TRUFA TERMAS DE VALS
CONSTRUIR ATMOSFERAS NA ARQUITETURA
Para construir uma atmosfera na arquitetura, nos baseamos na relação entre o ser que habita e o espaço habitável, evidenciando os estímulos recebidos pelo corpo, que provocam emoções e caracterizam o lugar, guardando-os na memória e nos conectando com o mundo. É possível perceber que as primeiras construções eram tratadas como uma extensão do corpo no espaço, seja para se protegerem de climas intensos ou de predadores. A partir do século XV, o desenvolvimento das artes pictóricas influenciou a importância da esfera visual em relação ao resto do mundo sensorial. Em culturas tradicionais, a arquitetura está intimamente ligada ao conhecimento tátil, sua construção é orientada pelos sentidos do corpo. Com a transição da capacidade de sentir para o controle da visão, a plasticidade e as sensações se perdem. “A atual produção industrial em massa do imaginário visual tende a afastar a visão do envolvimento emocional e da identificação, e a tornar o imaginário em um fluxo hipnótico sem foco ou participação.” (Pallasmaa, 2011, p. 22). Com a chegada do modernismo, o desejo pela função se sobrepõe à emoção, privilegiando o sentido da visão e empobrecendo o espaço habitado pela sociedade, resultando na mera cenografia plana e estática da vida. Como consequência, a arquitetura de nosso tempo tende a criar contextos apenas para nossos olhos. Enquanto a combinação entre a materialidade e experiências sensoriais evocam a profundidade temporal do continuum do tempo. O fato do vocabulário modernista em geral não ter conseguido penetrar na superfície do gosto e dos valores populares parece ser resultado de sua ênfase visual e intelectual injusta; a arquitetura modernista em geral tem abrigado o intelecto e os olhos, mas tem deixado desabrigados nossos corpos e demais sentidos, bem como nossa memória, imaginação e sonhos. (Pallasmaa, 2011, p.19)
Os arquitetos modernos tendem a apresentar um ar de eternidade em suas obras, como se os edifícios fossem perpétuos, desconectando-os dos traços do tempo e do uso pelas pessoas. A falta de ornamentação e a busca por formas racionais e puras até fez sentindo durante o período do pós-guerra, já que as cidades estavam destruídas e precisavam ser reconstruídas rapidamente. No entanto, os prédios se tornaram vulneráveis aos efeitos negativos do tempo. Eles não estavam preparados para mudanças, já que a arquitetura é um reflexo da sociedade na qual vivemos. A igreja de Santa Sofia em Istambul por exemplo, foi construída originalmente para ser a catedral do império Bizantino, se converteu numa catedral católica, foi mesquita, serviu como base militar e reabriu como um museu. Já em cidades modernas, tem se tornado cada vez mais comum ter edifícios com a mesma aparência, quase como um amontoado de “caixas de fósforos” espalhados pela cidade, ao compararmos cidades como Nova York e Pequim fica claro como o skyline das duas cidades são semelhantes entre si. Este modelo de cidade tem como principal objetivo competir por densidade, espaço e eficiência, ou seja, são símbolos do capital e poder, com sua arquitetura cúbica, mais barata e rápida de se construir.
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Além disso, essas cidades possuem um senso enfraquecido de materialidade. Quando optamos por materiais naturais, nossa percepção consegue penetrar em sua superfície nos revelando sua idade e história. Por exemplo a madeira, que nos conta de suas duas vidas, a primeira quando nasce e cresce como uma árvore, e a segunda quando se torna um objeto manipulável por um artesão ou carpinteiro. E a pedra que nos conta de sua origem geológica, sua durabilidade e permanência intrínseca. Aos poucos a arquitetura tem se interessado pela profundidade, opacidade, peso, patina e envelhecimento dos materiais. De acordo com a investigação fenomenológica do imaginário poético apresentada por Bachelard, as imagens que surgem da matéria projetam experiências, recordações, associações e emoções mais profundas e significativas do que as imagens evocadas pela simples forma. Durante uma palestra em 1936, Alvar Aalto argumenta que a compreensão puramente visual de uma obra arquitetônica é algo pobre. Mas tudo aquilo captado por todos os nossos sentidos pode ser considerado arte. Tanto a materialidade quanto o senso de tradição evocam experiências benevolentes. Enquanto a arquitetura visual tenta parar e se desprender do tempo, a arquitetura tátil torna nossa experiência confortável e prazerosa, ela torna seus traços e suas marcas aceitáveis. “Meus olhos já esqueceram o que viram outrora, mas meu corpo ainda se lembra.” (Pallasmaa, 2018, p.19). Os sentidos têm um papel fundamental na criação de atmosferas quando são estimulados em conjunto. Ao evidenciar um ou outro sentido passamos a ignorar os demais, a potência do espaço se perde, tornando sua percepção limitada. No entanto, é possível observar que os sentidos passaram por evoluções físicas, sociais e culturais distintas, sofrendo enfraquecimentos ou intensificações e dificilmente se equiparando em grau de importância entre eles. Pode-se dizer que a arquitetura é uma extensão da natureza, direcionando nossa percepção e experiência para horizontes mais amplos. As características de espaço, matéria e escala são percebidas por nossos olhos, ouvidos, nariz, pele, língua, esqueleto e músculos. Envolvendo diversas esferas da experiência sensorial que interagem entre si e reforçando nossa sensação de pertencer ao mundo. Embora a arquitetura tenha sido tratada como uma disciplina visual, os espaços e edificações projetadas estimulam experiências multissensoriais, confrontando todos os nossos sentidos. Essa interação é definida por Gaston Bachelard como “a polifonia dos sentidos”. Para J.J.Gibson, os sentidos funcionam como mecanismos de busca agressiva e não como meros receptores passivos. Ele definiu cinco sistemas sensoriais: sistema visual, sistema auditivo, sistema paladar olfativo, sistema de orientação e sistemas hápticos; sendo os dois últimos os que mais influenciam nossa compreensão da tridimensionalidade. O sistema de orientação é responsável pela percepção do que está acima ou abaixo, nos dando a consciência do plano fundamental e equilibrando os estímulos dos nossos sentidos. Já o sistema háptico faz com que todo o corpo se torne um objeto tátil, incluindo todas as sensações; além disso é possível estender nossa percepção utilizando instrumentos como extensão do nosso corpo, com uma bengala ou óculos, que permitem que nossos sentidos alcancem uma distância maior. O sistema háptico é responsável por sentir a temperatura, a pressão e a dor, permite a percepção do espaço e o movimento do corpo, além de prever lesões. Essas informações podem vir de receptores nos músculos, tendões e articulações conhecidos como sensação sinestésica. Todo nosso corpo é preenchido com a pele e qualquer contato
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com ela provoca um estímulo tátil que registra as temperaturas, a pressão e a dor. RECEPTORES DE TEMPERATURA – Existem receptores específicos para o frio e para o calor, mas quando recebem um estímulo muito intenso podem ser ativados ao mesmo tempo, por isso ocorre a sensação de queimação quando entramos em contanto com algo muito gelado. RECEPTORES TÁTEIS – Temos receptores sensíveis na pele que respondem a diferentes tipos de pressão sobre ela. Existe também uma quantidade maior de tecidos cerebrais nos dedos e língua do que em outras regiões, como as costas por exemplo. Por isso um objeto possui maior compreensão ao ser sentido pelas mãos do que em outras partes do corpo. RECEPTORES DA DOR – Os receptores da dor não estão limitados apenas a nossa pele, estão em todo o nosso corpo e existem dois tipos. Quando sentimos qualquer sintoma de dor, nosso corpo ativa sensores conhecidos como fibras rápidas que levam a informação para nosso cérebro, responsáveis por dores agudas e rápidas. Quando temos um dano na pele, o ferimento irá provocar uma dor constante, servindo como alerta para evitar que utilizemos aquela parte do corpo para uma melhor recuperação, essas informações são transmitidas por fibras lentas. O antropólogo americano Edward T. Hall (1977) divide os sentidos em dois grupos relacionados ao espaço no livro “A dimensão oculta” – O remoto, composto pelo espaço visual, o espaço auditivo e o espaço olfativo, que fica além do alcance dos braços, onde nossa interação é reduzida a mera contemplação. E o próximo, destinado ao espaço tátil e o espaço térmico, quando a percepção espacial não é satisfatória à distância, exige uma investigação mais íntima, ao ponto de permitir a compreensão do lugar. O espaço remoto O espaço visual – A capacidade de detectar informações muito rapidamente e de longe nos permite a percepção de profundidade e possibilita a capacidade espacial. No entanto, nosso cérebro sente dificuldade em perceber certos detalhes de texturas a longas distâncias, este efeito também ocorre em situações inversas, quando nosso corpo se aproxima muito de um objeto ele tende a deformar impedindo uma análise detalhada. O espaço auditivo – A audição é capaz de despertar a atenção com mais eficácia que a visão, além de evocar memórias profundas. Apesar da poluição sonora das cidades, nosso cérebro é capaz de filtrar os sons que não são desejados. A qualidade sonora de um lugar influencia mesmo de forma inconsciente a vida das pessoas. O espaço olfativo – Apesar de ser tratado como um sentido secundário, o olfato é capaz de despertar muito mais memórias que a audição. Os cheiros e sabores conseguem trazer recordações materiais ligados a objetos e lugares, enquanto os sons estão mais ligados a situações e eventos. Os três receptores à distância se complementam ao despertarem memórias de experiências em diferentes níveis de profundidade, por conseguirem captar informações distintas entre si. Por exemplo, ao caminhar pela rua podemos observar anúncios enquanto inconscientemente focamos em um determinado barulho e ao mesmo tempo conseguimos captar algum cheiro.
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O espaço próximo O espaço tátil – A capacidade de tocar e manipular objetos tem mais relevância durante os primeiros anos da vida de uma pessoa, quando estamos aprendendo e descobrindo o mundo. Na fase adulta, esta habilidade é perdida para os sentidos remotos em conjunto do intelecto. Contudo, ao considerar um mundo mais sintético, o tato é capaz de recuperar sua importância na exploração material dos objetos. O espaço térmico – A pele pode ser considerada um aparato bivalente, ela é capaz de identificar sensações táteis e térmicas. A percepção das mudanças de temperatura pertence a ambos os espaços tratados até agora – o remoto, ao sentir o calor irradiado pelo sol; e o próximo, quando tocamos uma rocha fria de um espaço úmido. Sendo o sentido mais recorrente quando os outros não satisfazem nossa curiosidade. Cada sentido possui qualidades importantes para nossa percepção do mundo, cada um individualmente já é potente mas ao serem estimulados juntos, um complementando o outro, é possível perceber uma grande complexidade de informação e recuperar memórias. Essas memórias servem para materializar e preservar a passagem do tempo e nos estimulam a recordar e imaginar, além de definir nossa identidade; somos o que lembramos. A própria construção pode ser um instrumento para evocar memórias ou sentimentos específicos como é o caso dos túmulos, memoriais e museus. Os edifícios conseguem preservar os diversos tipos de sensações, registrando e sugerindo narrativas. Sem as grandes obras como as pirâmides do Egito ou templos de culturas antigas, nossa percepção do tempo e espaço seria mais pobre. Por meio das construções também somos capazes de lembrar dos lugares que vivemos em nossa infância. Peter Zçumthror fala que ao projetar um edifício surgem imagens em sua mente, algumas relacionadas com sua formação e trabalho como arquiteto, outras tem a ver com sua infância, mesmo antes conhecer a arquitetura ele já a vivenciava indiretamente, ao recordar da maçaneta gelada de metal da casa de sua tia que dava acesso ao jardim. Nossas recordações são memórias espaciais e situacionais, sempre conectadas a um lugar ou evento. Ao comparar duas fotografias, uma de um lugar vivenciado e outra de um lugar nunca visitado, a primeira imagem terá mais impacto em nossas mentes do que a segunda. Não só fotografias, mas todo e qualquer objeto serve como centro de condensação para nossas memórias, esses objetos que colecionamos reforçam nossa identidade e nosso mundo das memórias, além desse, podemos reconhecer o mundo da existência, formado pela capacidade de lembrança, fantasia e imaginação. E nós vivemos em um mundo mental, onde o material e o espiritual, o vivenciado e o lembrado se fundem. Ou seja, pode-se dizer que vivemos em um mundo “acientífico” se forem levados em consideração os critérios da ciência empírica ocidental. Um edifício altera e condiciona uma experiência humana, ou seja, as experiências surgem a partir de ações e nunca de objetos, a arquitetura se fundamenta em verbos e não em substantivos. Por exemplo, uma janela não é simplesmente uma esquadria, mas o ato de olhar de um lugar ao outro e contemplar uma vista, a porta não é apenas uma folha de madeira, mas o ato de atravessar de um ambiente a outro. As verdadeiras experiências acontecem quando exploramos e confrontamos o edifício, muito mais do que a simples apreensão das formas.
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ESTUDOS DE CASO
A TRUFA Ensamble Studio
Em 2010, o escritório espanhol Ensamble Studio, iniciou uma série de experimentações que deu origem ao projeto chamado de “A Trufa”, implantado na Costa da Morte ao Noroeste da Espanha, um dos pedaços mais bonitos da Península Ibérica, repleto de aldeias e praias desertas. Além de ser uma das zonas mais ricas da Europa em exemplares da cultura megalítica, com estruturas de grande valor histórico e cultural. Assim como as estruturas megalíticas, a Trufa se torna um fragmento da natureza construída com terra repleta de ar. Ela se camufla na paisagem ao emular os processos de formação mineral e se integra ao local. O projeto faz parte de um manifesto, de pensar com as mãos priorizando o processo ao invés dos resultados e buscar na origem dos materiais a inspiração para criar algo além dos padrões. Para construir a Trufa foi necessário cavar e amontoar a terra extraída de seu perímetro até que se formasse um dique de contenção natural. Em seguida, o ar foi materializado com volumes de fardos de palha, que aos poucos foi preenchendo os espaços vazios enquanto o cimento envolvia o ar e o protegia da terra. Após um tempo, a terra foi removida revelando uma forma amorfa que se assimilava a uma rocha natural. Esta forma surgiu a partir da relação mútua entre a terra e o concreto, que compartilharam suas propriedades entre si. A terra cedeu sua cor, sua textura e sua essência, o concreto cedeu sua estrutura e resistência. Mas ainda não era arquitetura, após alguns cortes para acessar seu núcleo, o feno serviu de alimentação para a bezerra Paulínea durante um ano até que o local ficasse totalmente vazio. A arquitetura surpreendeu revelando sua ambiguidade entre o natural e o construído. Enquanto o lado externo se mimetiza ao local implantado, o interior era conformado por espaços definidos pela organização dos fardos de feno, conferindo sua textura e ordem as paredes verticais, contrastando com a irregularidade do teto que evoca as ondas do mar enquadrado pela abertura voltado ao oceano Atlântico, resultando na única linha tensa do espaço interno. A Trufa é um pequeno exemplo de como podemos nos conectar com a natureza por meio de sua materialidade.
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TERMAS DE VALS Peter Zumthor
Durante os anos de 1960, um empresário decidiu construir um complexo hoteleiro de 270 quartos distribuídos em 5 edifícios. Em 1985, a comissão organizadora decidiu encomendar a construção de um centro termal para atrair mais clientes ao local, porém não tinham uma ideia clara da função ou forma que o novo prédio deveria ter, apenas que ficaria entre os 5 volumes existentes, local onde surgia a água. E Peter Zumthor foi escolhido para projetar as termas, a arquitetura do spa combina a experiência sensorial com a topografia, dando origem a uma casa de banho que nasce na montanha. Para não atrapalhar a vista dos clientes hospedados no hotel principal, Zumthor enterra parte do volume na encosta. O telhado plano é revestido com terra e grama, integrando o edifício na paisagem. A fachada principal é constituída por pedras finas retiradas de uma pedreira local, muito utilizada nos telhados das casas da região devido a sua forte resistência às mudanças de temperatura. Sendo composta por grandes janelas e terraços, não há portas para acessar as termas, o visitante precisa passar por um corredor que atravessa a montanha no subsolo do hotel principal. Todo o espaço é organizado em torno de duas grandes piscinas de forma irregular, uma coberta e a outra descoberta. A piscina externa é cercada por grandes muros de pedras como se fosse esculpida na montanha, com bancos no nível da água que se assemelham as margens de um rio. A água é aquecida naturalmente e ao transitar pelas piscinas é como passar do claro para o escuro devido ao contraste da luz. O projeto é composto por 15 volumes rígidos agrupados, há uma junta de vidro entre a cobertura de cada módulo, criando frestas de luz no interior das termas. O espaço íntimo contrasta com o exterior, utilizando a cor do concreto manchado nas paredes e rompendo com o cinza da fachada, a água encena uma sensação sempre única em cada bloco. Na parte mais quente onde a água chega a 42 graus, a cor se torna vermelha. Em outros blocos é possível encontrar pétalas de flores na água, saborear a água e até mesmo ouvir a música da água sobre as pedras. O caminho entre cada módulo é livre, aceitando qualquer narrativa que o visitante ouse experimentar, os blocos possuem 5 metros de altura dando a sensação de estar dentro de uma caverna que foge da escala humana. As paredes são constituídas por pedras de um metro de comprimento e alturas diferentes conferindo textura e movimento, além da preocupação do arquiteto em organizar as pedras sempre juntando três tamanhos diferentes para formar um módulo de quinze centímetros de altura, mantendo presente a escala da mão de uma pessoa. O espaço se torna mais potente durante a noite, quando a água passa a iluminar os blocos de pedra e as paredes são dominadas pela projeção das ondas em movimento de forma cenográfica. Peter Zumthor, ao projetar as termas, criou um espaço que provoca os sentidos em conjunto, nunca de forma isolada, o íntimo e o sublime escondidos pela simplicidade, uma arquitetura que surpreende os visitantes e que vai além da sua função.
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EXPERIMENTOS O PAVILHÃO O ABRIGO A PONTE
EXPERIMENTOS
Em função da quarentena que ocorreu nos primeiros meses do ano, para dar continuidade ao trabalho foram desenvolvidos um conjunto de modelos físicos, que não tinham como objetivo serem implantados no Pinheiral pela falta de conhecimento do território, até o momento que pudéssemos voltar a sair de casa. Mas permitiram uma série de reflexões sobre o comportamento, resistência e capacidade plástica do material, tendo sido escolhido o concreto devido a facilidade de se encontrar o produto. Contudo, havia a premissa de explorar outros materiais como a resina, caso não houvessem certas limitações durante o ano. Para produzir cada peça, foram incorporados elementos da natureza, ou seja, diferente dos projetos tradicionais onde o arquiteto possui uma consciência prévia de como será a estética do edifício, neste trabalho, esse método se perde, dando lugar para o inesperado e a incerteza. No entanto, são definidos parâmetros que ao serem combinados e introduzidos no espaço podem nos surpreender com algo diferente. Segundo Pallasma (2018, p.78) “A sensação de certeza fecha os processos de curiosidade e investigação, enquanto a incerteza os mantém constantemente abertos.” Naturalmente os resultados serão imprevisíveis, e dominando o processo haverá cada vez menos espaço para o erro, cujo o objetivo será propor uma arquitetura tátil e muscular, capaz de estimular nossos sentidos ao passo em que o corpo ao experienciar uma atmosfera criada, possa despertar memórias e reconhecer sua presença no mundo. De acordo com Pallasmaa (2011, p.68) A arquitetura é a arte de nos reconciliar com o mundo, e esta mediação se dá por meio dos sentidos.
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O PAVILHÃO
O pavilhão foi a primeira estrutura a ser produzida simulando o processo de erosão da terra, foi escavado um buraco de forma despretensiosa, forrado com uma camada de plástico coberto por cimento, como resultado, emergiu do solo uma estrutura amorfa, carregando as marcas de seu local de origem, apoiada em quatro pontos, que poderia servir como um grande pavilhão natural ou em uma escala reduzia, um banco para descansar e se reunir com outras pessoas.
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O ABRIGO
No protótipo do primeiro abrigo, havia a intenção de entender a capacidade do cimento em absorver a cor e texturas do local, diferente do anterior onde a massa foi aplicada na terra forrada por uma camada de plástico, agora o cimento foi aplicado diretamente no “solo”, em seguida as duas placas geradas foram apoiadas de tal modo que conformaram um abrigo. Os outros dois abrigos nasceram de uma falha, cujo o experimento deveria ter sido um corpo fechado e vazio por dentro, contendo algumas aberturas, mas a peça não resistiu e se quebrou. Os pedaços maiores, dava para serem reaproveitados como o modelo anterior.
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A PONTE
Para produzir o último modelo da primeira fase deste trabalho, foi simulado o processo de derretimento do solo utilizando uma garrafa PET de dois litros deformada com calor até que atingisse uma forma peculiar, após acrescentar o cimento, foi gerado uma ponte, apoiada sobre dois blocos de concreto que também foi produzido durante as experimentações.
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O PINHEIRAL
TRAJETO
O PINHEIRAL
O pinheiral, como é conhecido pelas pessoas que moram nas proximidades, é um local afastado do cotidiano urbano e, ao mesmo tempo está muito próximo de um pequeno bairro do extremo sul da cidade de São Paulo. Localizado no Jardim SIlveira, distrito de Parelheiros, por estar tão escondido em meio a mata, é mais conhecido pelos moradores locais, sendo pouco visitado. Geralmente, as pessoas vão até o local para conversar, fazer luaus com os amigos, observar as estrelas, acender fogueiras e, principalmente o lugar é entendido como um refúgio para aqueles que desejam passar um tempo a sós com o próprio pensamento. Algumas pessoas vão para ler em meio ao som relaxante do vento balançando os pinheiros, e há aqueles que procuram um pouco de inspiração para escrever ou desenhar. É um lugar que está vivo na mente das pessoas, que pode ser ocupado de acordo com a vontade de cada um, que possibilita experiências e imaginação para realizar atividades sozinho ou acompanhado. Para chegar no Pinheiral há duas trilhas: uma na Estrada do Pedro Rocha A Colina, e a outra na Estrada da Colônia, sendo esse o acesso mais difícil, devido a ponte improvisada com troncos de árvore apoiados sobre as margens do córrego. Quem passa pela Estrada da Colônia, enxerga apenas o campo de futebol de várzea no pé da montanha, rodeado por mato e árvores, mas, para aqueles que adentram na vegetação, o pinheiral se revela um espaço incrível, com pedras enormes, grandes árvores, e praticamente livre do barulho dos automóveis. O vazio entre os pinheiros geram pequenos enquadramentos do bairro à frente, podendo observar o cotidiano das pessoas .tão perto mas, ao mesmo tempo, tão distante O marrom da terra e dos troncos das árvores em contraste com a grande variação de verde presente em cada vegetação, cria uma paisagem incrível e selvagem, muito difícil de se encontrar numa cidade como São Paulo. Em cada estação, a paleta de cores do local muda, revelando atmosferas e climas únicos para cada época do ano. Encontrar o Pinheiral foi de grande sorte, no começo da procura, poderia ser qualquer lugar no meio do mato, mas ao observar fotos em comum de algumas pessoas, a curiosidade por saber que lugar era esse se intensificava. Ao conhecer mais sobre o Pinheiral, por meio de conversas e por uma breve visita, o lugar revelou seu potencial para imaginar uma arquitetura experimental que surge da natureza como uma extensão dela.
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TRAJETO
Para chegar até o Pinheiral, existem dois acessos - o primeiro se inicia na Estrada do Pedro Rocha, e o segundo na Estrada do Colônia, muito próximo a um campo de futebol improvisado. Independente do percurso, todo o trajeto para cruzar de um lado ao outro dura em torno de meia hora caminhando. Durantes as visitas, as caminhadas tiveram início pela Estrada do Pedro Rocha, o percurso pode assustar um pouco por parecer um local isolado, porém é bem tranquilo, e são necessários poucos minutos andando até o início da trilha.v
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Muito próximo da estrada, fica o primeiro espaço utilizado pelas pessoas, o local é caracterizado por muitas árvores que contrastam com o céu, concebendo um efeito visual de cheios e vazios, além de alguns troncos derrubados que são utilizados como bancos pelos visitantes. Outro aspecto interessante do lugar, são as bases das árvores que foram cortadas. É possível ver a natureza se apropriando e gerando uma nova vida, seja por fungos ou pequenas plantas que se adaptam no local.
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Ao seguir pela trilha, podemos escolher entre 3 direções, o caminho da esquerda nos leva a um pequeno espaço mais afastado. Aparentemente utilizado para acampamentos, o local é cercado por alguns troncos deitados, no centro há um resto de fogueira e entre duas árvores existe um fio de aço preso como um varal improvisado.
O caminho central leva até a parte mais alta da montanha, porém é necessário tomar cuidado com alguns obstáculos pelo trajeto - como passar por cima de alguns troncos de árvores. Além do espaço dedicado para uma fogueira, é possível ter uma visão no nível da copa das árvores, além de poder enxergar parte do bairro a frente.
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Descendo pela direita, somos levados para o maior espaço do pinheiral, nele há pequenas planícies espalhadas. Em alguns locais houve o deslocamento da terra formando crateras e algumas árvores tombadas, outra característica é presença de rochas quase da altura de uma pessoa.
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Seguindo mais adiante, chegamos ao fim do Pinheiral, neste local há um campo de futebol, muito menor do que o campo principal ao lado da avenida, ao passar por ele temos acesso a ponte que cruza o córrego para chegar até a estrada do Colônia.
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PROJETO
Espaรงo de convivio Memorial Espaรงo Sagrado Mirante Anfiteatro Estruturas de saneamento
PROJETO
O projeto será composto por um conjunto de elementos arquitetônicos distintos: sendo o espaço de convivio, o memorial para as árvores que foram incendiadas ou derrubadas, um mirante, um espaço espiritual, o anfiteatro e toda a infraestrutura de banheiros e bebedouros. Cada projeto possui uma aproximação com o local e suas principais características, como as cinzas deixadas pelo fogo, os padrões encontrados nas plantas e troncos de árvores, além do efeito da luz que atravessa o vazio entre folhas. Todos os detalhes se tornam uma nova referência para transformar o lugar em um espaço existencial habitável que se estrutura na base de significados, valores e experiências refletidos por cada indivíduo ou grupo. Para complementar a percepção do visitante, cada espaço foi pensado para estimular os sentidos em conjunto. Esses sentidos serão representados pelos ícones abaixo, que correspondem aos sentidos da audição, olfato e visão, responsáveis pela percepção remota; o tato e a mucosa, responsáveis pela percepção próxima, serão representados pelo mesmo ícone por serem ativados pelo toque das mãos ou contato com a pele. Espaço de convivio Memorial Mirante Espaço Sagrado
Anfiteatro
AUDIÇÃO
OLFATO
VISÃO
TATO / MUCOSA
Infraestrutura Observação:
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
Em alguns estudos havia a pretensão de escanear geometrias para desenvolver algumas peças em 3D, no entanto, devido às atuais dificuldades que o mundo enfrenta e os pré-requisitos que o equipamento pede, como uma distância mínima do objeto, este caminho do desenvolvimento do trabalho foi impossibilitado.
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ESPAÇO DE CONVÍVIO
Em todo o Pinheiral há bases de troncos que restaram das árvores que foram derrubadas, onde a natureza foi capaz de se adaptar e gerar uma nova vida em seu interior. As formas dessas bases isolam as plantas formando um microssistema, e ao replicar esses espaços aumentando sua escala, é possível obter um ambiente de encontro e permanência para as pessoas formado por estruturas orgânicas.
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
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Esse espaço seria composto por um conjunto de elementos: a vegetação existente, as faces voltadas para o interior revestidas com espelhos para ampliar a sensação de estar na fl oresta mesmo dentro de um pequeno núcleo, a circulação cruzada permitindo o acesso por quatro aberturas e assentos para permanência e interação das pessoas.
VEGETAÇÃO
Para construir as estruturas, cada base precisa ser escaneada por um equipamento sofi sticado que consiga fazer o levantamento das formas com precisão e salvá-las como uma nuvem de pontos para que possam ser exportadas para um software de modelagem 3D, onde é possível alterar a escala e defi nir a volumetria fi nal de cada corpo para que seja reproduzido em tamanho adequado.
ESPELHOS
Para esse estudo foi utilizada a base de uma garrafa PET de dois litros, devido as protuberâncias que ela possui, mas ainda faltava obter uma forma orgânica que se aproximasse formalmente dos vestígios encontrados no Pinheiral. O segundo passo foi recortar a base em 4 totens e submeter todos ao calor, deformando-os aleatoriamente. Após as geometrias dos totens serem estabelecidas, cada peça foi preenchida com concreto para que ganhassem corpo e rigidez.
CIRCULAÇÃO
CONVIVÊNCIA
IMPLANTAÇÃO
0
8
PLANTA
0
2
MEMORIAL
No dia 28 de Julho de 2020 houve um incêndio no Pinheiral, queimando boa parte dele. Ninguém soube dizer se foi intencional ou um acidente, mas mesmo depois de dias ainda era possível sentir o cheiro das cinzas que exalava no local e boa parte do cenário mudou completamente, o preto e o cinza tomaram conta do espaço que antes pertencia ao verde. Esse evento se tornou o ponto de partida para projetar o espaço em memória às árvores que foram queimadas no incêndio e também para aquelas que por algum motivo haviam sido derrubadas.
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
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A ideia de trabalhar com os negativos das árvores é uma tentativa que conectar aquilo que se foi com o que ainda está vivo.
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Para produzir as estruturas do memorial foi necessário acomodar os troncos derrubados num molde, deixando as laterais livres para assentar o concreto.
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Foram produzidos oito conjuntos de totens.
IMPLANTAÇÃO
0
20
ELEVAÇÃO
0
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MIRANTE A forma do mirante surge a partir dos padrões encontrados nos troncos das árvores, ele é composto por dois espaços que se complementam. O primeiro é uma praça rebaixada no topo da montanha, onde os degraus evocam um desenho topográfico criando uma cratera, em alguns momentos são mais estreitos e em outros são mais largos, desta forma podem ser utilizados para se sentar ou deitar, além da área livre no centro ocupada por bancos de concreto espalhados pela área; o segundo espaço é o próprio mirante, que se estende pelo penhasco aproximando o visitante da copa das árvores, onde é possível escutar de perto o barulho do vento balançando os galhos e ter uma visão das casas no horizonte.
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
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Para produzir o modelo de estudos, foi utilizada uma espuma aquecida com um maçarico simulando o processo de derretimento do solo, como resultado surgiram dois volumes: o volume menor definiu a praça, porém como ela foi rebaixada foi utilizado o seu negativo para gerar a cratera no espaço; já o volume maior conformou o mirante que fica ancorado no topo da montanha
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A
IMPLANTAÇÃO
A
0
20
CORTE A
0
8
ESPRAÇO SAGRADO
Ao contrário do Memorial, que é destinado à morte, este espaço se refere à vida. Apesar de ser um local escuro e úmido, as aberturas no teto projetam pilares de luz como se divindades pousassem no seu interior trazendo a vida. É um lugar calmo, os únicos sons presentes são da própria natureza se comunicando. A luz que entra no local, além de simbólica, faz com que o corpo sinta seu calor e proporciona um cenário dramático. A cobertura foi criada a partir de uma casca de árvore que foi retalhada em vários fragmentos, em seguida eles foram organizados e reorganizados até que assumissem a forma final para que essa fosse preenchida com concreto e depois retirados formando as aberturas, a peça seria escaneada e convertida em um volume maior.
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
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A
B
B
A
IMPLANTAÇÃO
0
4
CORTE A
0
2
CORTE B
0
2
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ANFIETATRO
O anfiteatro é uma estrutura que desprende o volume arquitetônico do solo, uma característica que esteve por muito tempo associada à ideologia de Le Corbusier e seu discurso do uso de pilotis. Atualmente na arquitetura essa estratégia visa libertar o terreno do domínio da arquitetura, promovendo um vazio arquitetônico que forma um espaço real definindo a relação entre arquitetura e território.
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
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A cobertura se encontra apoiada em dois pilares de concreto que se assemelham a grandes rochas; ela acontece em três níveis diferentes, que vão abaixando conforme se aproxima do espaço de apresentações, onde há um recorte na laje que definiu o desenho do palco. Os desníveis do piso remetem ao desenho de curvas de níveis, como se a topografia direcionasse o visitante até o espetáculo.
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IMPLANTAÇÃO
0
40
PLANTA DE COBERTURA
0
8
A A
PLANTA
0
8
CORTE A
0
8
INFRAESTRUTURA
Como último projeto, foi proposto um sistema de infraestrutura para que as pessoas possam utilizar o banheiro ou beber água. Essa estrutura foi pensada para ser distribuída pelo Pinheiral em três pontos diferentes, como um espaço intermediário entre os principais destinos e sem se firmar como um agente dominante que pudesse se transformar em convenção de uso. Embora a estrutura tenha sido pensada para se repetir, cada uma assume uma forma diferente devido ao método construtivo, onde há camadas que servem como molde para o espaço interno, que aos poucos vai sendo coberto por concreto até confinar totalmente o volume, em seguida, são feitos os devidos recortes da entrada e abertura zenital.
LOCALIZAÇÃO
SEM ESCALA
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B
PLANTA DE COBERTURA
0
2
PLANTA
A
0
B
A
2
CORTE A
0
2
CORTE B
0
2
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REFERÊNCIAS
BIBLIOGRAFIA
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LIVROS DISSERTAÇÕES
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LISTA DE IMAGENS Capa: Produção do autor P: 6-7, 15, 16-17, 20, 21, 22, 23, 24-25, 34-35, 37, 38-39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46-47, 48-49, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60-61, 64-65, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74-75, 77, 78-79, 80, 81, 83, 84, 85, 86-87, 88-89, 90-91, 93, 94, 95, 96, 97, 98-99, 101, 102, 103, 104, 105, 107, 108-109, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 117, 118-119, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 129, 130-131, 132-133, 136-137, 138-139, 140-141, 142-143, 144-145, 146-147: Produção do autor P: 18: <https://www.eldiestro.es/2017/01/los-nuevos-partidos-son-los-mismo-que-los-antiguos/> editado pelo autor P: 19: <https://www.schumachercollege.org.uk/news/alumuni-gather-to-create-the-schumacher-network > editado pelo autor P: 31: https://www.ensamble.info/thetruffle P: 33: https://www.archdaily.com.br/br/798132/termas-de-vals-de-peter-zumthor-nas-lentes-de-fernando-guerra?ad_source=search&ad_medium=search_result_all P: 77 – Imagem do Incêndio: Jéssica Silva. Imagens de localização: Base Google Earth e editado pelo autor Ícones dos sentidos: <http://flaticon.com/> editado pelo autor
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