Freela Netflix

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guia mundo em foco extra

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A gigante do conteúdo em streaming A Netflix antes do streaming • Liderança no aluguel de DVDs • Pioneirismo na transmissão on-line • Atravessando as fronteiras dos EUA • Expansão e obstáculos do acervo • Nascem as produções exclusivas



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prefácio

O serviço que revolucionou o acesso ao cinema Quem nasceu depois da década de 1990 não guarda muitas lembranças das videolocadoras. Até o começo dos anos 2000, para assistir a um filme que há pouco havia saído dos cinemas, era preciso esperar que o DVD (ou a fita VHS) chegasse à locadora mais próxima e ainda disputar as cópias com outros clientes – quem chegasse por último, muito provavelmente, teria que aguardar alguma devolução. Alugar um filme era uma verdadeira aventura. Mas tudo isso mudou com o avanço da internet. Hoje, basta ter qualquer aparelho com acesso à rede, criar uma conta e pronto: o usuário tem à sua disposição milhares de vídeos sem precisar levantar do sofá. Essa enorme mudança na forma de consumir filmes se deve em boa parte à empresa norte-americana Netflix. Desde o tempo em que trabalhava somente com o envio de DVDs pelo correio, a Netflix sempre se aliou às novidades tecnológicas para proporcionar aos assinantes uma nova experiência em consumo de conteúdo audiovisual. Neste guia, você conhece a trajetória da Netflix e descobre como a empresa conseguiu revolucionar o mercado de distribuição de filmes pelo mundo. Prepare a pipoca e boa leitura! A redação.

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SUMÁRIO Shutterstock

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Capítulo 1

A ideia que revolucionou a indústria do entretenimento Conheça os criadores da Netflix e como a empresa operava antes do sucesso do conteúdo on-line

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Capítulo 2

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Divulgação/Netflix

Liderança do mercado de videolocação As mudanças e novidades lançadas pela Netflix desbancaram sua principal concorrente, a Blockbuster

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Capítulo 3

O domínio do mercado de streaming Impulsionada pela tecnologia, a empresa começa a explorar a transmissão de conteúdo on-line para os usuários

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A rápida expansão do acervo da Netflix Saiba como foram as negociações com grandes produtoras que permitiram a consolidação da Netflix

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Capítulo 4


SUMÁRIO

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Nasce uma nova Netflix Com o sucesso do modelo de negócio, a Netflix começa a produzir seus próprios conteúdos exclusivos

A empresa que vale mais de US$ 40 bilhões Entenda por que a Netflix decidiu abrir o capital da empresa e como ela atua hoje no mercado financeiro

Capítulo 5

Capítulo 9

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Capítulo 6

Capítulo 10

Netflix pelo mundo Da Califórnia para o mundo, acompanhe o progresso da empresa que conquistou os cinéfilos de diversos países

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Conheça alguns dados e curiosidades sobre a Netflix Acompanhe o sucesso do modelo da Netflix por meio das crescentes cifras da empresa

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Capítulo 7

Quem manda é o assinante Saiba como funciona o principal diferencial da Netflix: o foco na experiência e satisfação do usuário

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Capítulo 8

ficha catalográfica

A revolução da plataforma de streaming Acompanhando as tendências, a Netflix expande seus serviços para SmartTV, celulares, tablet, computadores e videogames

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COMO TUDO COMEÇOU

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a ideia que revolucionou a indústria do entretenimento

Do aluguel de fitas VHS à liderança do mercado de streaming, conheça a trajetória da Netflix e de seu fundador, Reed Hastings 6 - GUIA mundo em foco extra • NETFLIX

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Netflix hoje é uma empresa conhecida mundialmente, líder em distribuição de conteúdo on-line em streaming e referência para quem gosta de séries e filmes. Com a força da internet, a corporação vem revolucionando a forma como as novas gerações


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COMO TUDO COMEÇOU

Tom Hanks e o elenco de Apollo 13, filme que levou à fundação da Netflix

A grande sacada foi investir no conforto e na fidelização do público alvo a cabo. Porém, a trajetória da Netflix começou muito antes da popularização da internet e da distribuição de conteúdo sob demanda, como veremos a seguir.

Divulgação/ Netflix

Muito além dos US$ 40

consomem conteúdo. Ela aposta na oferta conteúdo on-line sob demanda, ou seja, os assinantes podem assistir o conteúdo que quiserem a qualquer hora e em qualquer dispositivo. A popularização do seu formato ganha cada vez mais audiência e já ameaça segmentos de entretenimento antes consolidados, como as TVs aberta e

A Netflix que você conhece hoje começou há 18 anos, em 1997, quando Reed Hastings, atual CEO e presidente da empresa, indignado ao ter que pagar US$ 40 como multa por atrasar a entrega de um VHS na locadora, teve a ideia de criar uma locadora em que os clientes não precisariam mais pagar nenhuma taxa extra para fazer locação de filmes. Mais do que isso, ele decidiu inovar e criou a locadora em ambiente on-line. O filme que Hastings esqueceu de devolver e que indiretamente o levou a criar a Netflix foi “Apollo 13 - Do Desastre ao Triunfo”, dirigido pelo cineasta Ron Howard e com Tom Hanks no elenco. Junto com o amigo Marc Randolph, Hastings criou então a empresa NetFlix – isso mesmo, em sua origem, a letra “F” era escrita em maiúscula. Ao criarem a empresa,

seus fundadores estabeleceram três pilares como base da política da empresa: valor acessível, a conveniência na hora de alugar e devolver o filme e um grande catálogo à disposição dos clientes. Em outubro de 1998 a NetFlix inaugurou o site de sua locadora virtual, com cerca de 925 títulos, e revoluciona o mercado de home video nos Estados Unidos. Se até aquele momento o cliente precisava ir até uma loja física para alugar e devolver um filme, a partir de então essa prática era coisa do passado. Apostando no incipiente mercado de DVDs, Hastings utilizou o correio postal norte-americano para a realização das entregas e recebimentos das películas. Assim, bastava o cliente entrar no site e, em poucos cliques, escolher o filme desejado, que receberia em casa em até cinco dias úteis. Para fazer a devolução, bastava reenviar o DVD para o endereço da empresa. Essa foi a primeira revolução que a NetFlix trouxe para o mercado de home video, conquistando muitos clientes.

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COMO TUDO COMEÇOU O primeiro modelo de negócios desenvolvido pela NetFlix, apesar de inovador, não atingiu o sucesso desejado. À época, cada cliente poderia alugar até três filmes pagando o valor de US$ 4 por unidade, sem taxa por atraso na devolução. Nesse período a empresa já fazia frente às principais redes de locadoras dos Estados Unidos, como a Blockbuster. Mas mesmo com preços similares à concorrência e oferecendo a comodidade de receber os filmes escolhidos em casa, a NetFlix começou a enfrentar a insatisfação dos clientes. No final da década de 90 houve a popularização do formato DVD nos Estados Unidos, fazendo o VHS se tornar obsoleto. Agora não era só a Netflix que apostava nesta mídia, mas também as locadoras físicas e as grandes redes varejistas como Bust By e WalMart, que passaram a vender DVDs em suas lojas. Apesar da expansão e do aumento considerável de sua base de assinantes, o prazo de entrega mais lento da Netflix, que chegava a cinco dias úteis, começava a incomodar sua crescente base de clientes. Para reverter a insatisfação dos usuários, Hastings teve que que mudar seu plano de negócios inicial, transformando seus clientes em assinantes. A partir de 1999, o usuário não pagaria mais pelo valor unitário do filme, passaria a receber em casa o número de DVDs que desejasse, pagando US$ 15,95 por mês a título de assinatura. A sacada de Hastings foi um sucesso e conseguiu, ao mesmo tempo, diminuir a insatisfação dos clientes e se destacar frente à concorrência das grandes redes de home video. Entre os anos de 1999 e 2000, a Netflix passou de uma base de 100 mil assinantes e receitas de US$ 5 milhões para uma base próxima de 300 mil assinantes com faturamento de US$ 36 milhões anuais, provando quando a estratégia de fidelização dos clientes teve sucesso.

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O modelo de negócios

Fundada nos anos 1990, a NetFlix iniciou seus negócios como uma locadora com catálogo virtual

Outro fator importante para o crescimento da empresa foi inserção de um o motor de busca personalizado no site. Por meio dele o cliente poderia fazer uma busca completa dentro do acervo da empresa e escolher qual filme gostaria de ver, fosse por título, diretor ou ator – o que era uma novidade na época. O sucesso foi tamanho que em 2003 a empresa atingia a marca de 1 milhão de assinantes e 100 milhões de DVDs enviados.

Ao gosto do cliente

No começo dos anos 2000, com seu sistema de catálogo on-line e entregas via correio consolidado, a Netflix começou a investir na personalização do sistema de buscam, já que precisava não só oferecer os títulos mais populares, mas também fazer com que o usuário alugasse títulos mais antigos de seu acervo. Isso se dava porque a empresa precisava desafogar a demanda pelos filmes mais conhecidos e dar rotatividade aos títulos adquiridos que ficavam parados no estoque. A primeira experiência nesse campo foi a adição de listas prédeterminadas ao seu motor de busca. O sistema de recomendações da Netflix funcionava da seguinte

forma: ao criar uma conta no site, o usuário deveria responder um pequeno questionário para identificar seus gêneros favoritos de filmes e classificar determinados filmes sugeridos pelo site com valor de um a cinco. Com base no cruzamento das respostas das enquetes dos usuários e da classificação dada aos filmes, o sistema do site oferecia, a usuários com perfis semelhantes, uma listagem de filmes que poderiam interessar na hora da escolha do filme. Além de oferecer a lista de filmes que se encaixavam nos gêneros de interesse dos clientes, o site da Netflix disponibilizava também sinopse, uma descrição com o motivo da recomendação e a opinião de outros assinantes sobre o filme sugerido. Conforme o cliente alugava os filmes, o sistema identificava e personalizava cada vez mais a área de recomendações para se adequar ao perfil de cada usuário. O modelo de sugestão de personalização de conteúdo funcionou tão bem que permanece disponível até hoje nos sites da Netflix, seja para aluguel de DVDs (disponível em mais 50 países) ou para recomendação de séries e filmes na plataforma de conteúdo on-line.


Divulgação/ Netflix

COMO TUDO COMEÇOU

O ambiente descontraído é um dos diferenciais da empresa

Uma organização diferente

Além do modelo de distribuição de conteúdo on-line, a Netflix inova em relação as demais empresas concorrentes por outros fatores, entre eles a sua sede. Diferente das grandes corporações da área de entretenimento que hospedam seus escritórios em prédios espelhando de grandes centros comerciais, a empresa mantém seu centro de decisões em dois prédios de três andares, na pequena cidade de Los Gatos, a 84 quilômetros de São Francisco, na Califórnia. Outra característica organizacional da Netflix é o ambiente descontraído, semelhante a outras empresas nascidas no Vale do Silício. Além de oferecer um ambiente menos formal de trabalho, a empresa adota a cultura da “Liberdade & Responsabilidade”. O funcionário tem total liberdade de definir seu próprio horário de trabalho e qual será seu período de férias – pode sair

quando quisere e por quanto tempo desejare, desde que cumpra as metas definidas pela empresa. É claro que a cultura de manter um ambiente de trabalho mais descontraído e, ao mesmo tempo, transferir para os funcionários a responsabilidade de manter a empresa funcionando e dando lucros têm funcionado para a Netflix, porém não é só isso. A empresa mantém, em seu centro de operação, estações de trabalho com smartTVs, tablets, celulares e videogames de última geração à disposição dos cerca de 1.100 engenheiros, para que eles possam testar, em tempo real, qualquer nova ideia ou modificação que afete a experiência dos usuários nas diversas plataformas em que a Netflix está disponível. Segundo dados publicados na revista Exame, de julho de 2015, estima-se que os algoritmos de funcionamento das plataformas Netflix sofram mudanças em seus

códigos a cada três dias. Ainda conforme a mesma, qualquer mudança que afete a experiência do usuário final, mesmo de formas sutis, são testadas por até 400 mil assinantes. Se as mudanças forem aprovadas pela maioria, a empresa leva a alteração para todos os clientes, como demonstra Todd Yellin, vice-presidente de inovação da empresa em entrevista à mesma revista. “Se um dos grupos tiver um aumento no total de horas de streaming, é sinal de que a mudança funcionou. Aí ela é aplicada a todos os usuários”, disse. A cultura organizacional menos rígida, a preocupação com qualquer detalhe que influencie a experiência do assinante dentro do universo Netflix e a procura por inovação constante são algumas das características que transformaram a empresa em referência mundial quando o assunto é distribuição de conteúdo em plataformas on-line.

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COMO TUDO COMEÇOU

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nidense e as demais culturas do mundo. Durante os dois anos que fez parte da organização, Reed viajou por diversos países do continente africano e ensinou matemática para estudantes do ensino médio em escolas da Suazilândia. Em 1985 ele deixa a “Corpo da Paz” e retoma os estudos, se matriculando no curso de mestrado de Inteligência Artificial (AI) na Universidade de Stanford, onde saiu formado em 1988. O seu primeiro emprego na área de tecnologia foi na empresa Adaptive Corp, em 1990. Lá, ajudou na criação de ferramentas para depuração de softwares (encontrar e corrigir erros em programas de computador). Hastings ficou menos de um ano na Adaptive e, em 1991, após se demitir, resolveu apostar em seu espirito empreendedor e criou sua própria empresa de tecnologia.

A primeira experiência empreendedora

Já com alguma experiência no ramo de tecnologia, Hastings fundou a “Pure Software”, empresa especializada em ferramentas para encontrar

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ocê já sabe que Wilmot Reed Hastings Jr. é um dos fundadores e a principal cabeça por trás das operações da Netflix. O que talvez você não saiba é que a trajetória dele começou muito antes da ideia que revolucionou a indústria do entretenimento. É isso que veremos adiante. Hastings é filho de Joan Amory (Lomis) e Wilmot Reed Hastings. Sua história começou no dia 8 de outubro de 1960 em Boston, no estado de Massachusetts. Nos 37 anos que separam seu nascimento e o da Netflix, muita coisa aconteceu. Em 1981, Hastings começou a treinar no corpo de Fuzileiros Navais norte-americanos (US Marines), passando o verão no mesmo quartel general e escola de candidatos da Marinha em Quântico, Virginia. Em 1983, após se formar em matemática na Bowdoin College, decidiu abandonar a escola do dos Fuzileiros Navais para ingressar na “Corpo da Paz”, organização norte-americana destinada a prestar ajuda a países em desenvolvimento e promover um melhor entendimento entre o povo estadu-

Além da Netflix, outras empresas do Vale do Silício fazem parte da trajetória de Hastings

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Conheça Reed Hastings

Reed Hastings, fundador, CEO e presidente da Netflix

e solucionar problemas em diversos tipos software. O crescimento da empresa no setor de tecnologia da informação foi rápido. Apesar de todo o sucesso de sua primeira investida como empreendedor, a aventura não foi das mais fáceis. Embora tivesse experiência com a engenharia dos produtos, faltava a Hastings experiência na gestão de empresas e pessoas, como o próprio admitiu em


COMO TUDO COMEÇOU Hoje, Hastings mantém ajuda financeira e é conselheiro de diversas organizações no setor de educação como CCSA, DreamBox Learning, KIPP, Pahara e a Hispanic Foundation of Silicon Valley.

Além de gerir a Netflix, Hastings também é conselheiro de projetos que aliam tecnologia e educação

entrevista ao jornalista Jim Hopkins, do USA Today, em 2006. “Conforme a empresa cresceu de 10 a 40 a 120, 320 a 640 funcionários, eu descobri que eu estava definitivamente me afogando e sem controle da situação (...). Eu me concentrava nas águas calmas e no que eu queria que acontecesse. Eu não ouvia os céticos”, disse. Mesmo com todas as dificuldades de gestão enfrentadas, a empresa de Reed mantinha seu crescimento no mercado e, em 1996, se funde à Atria Software, gerando uma nova empresa: a “Pure Atria”. A fusão das empresas integrou a expertise de Hastings com ferramentas para desenvolvedores e as ferramentas de gestão e desenvolvimento de softwares da Atria. Após a unificação, Hastings foi nomeado diretor técnico da nova empresa, cargo que deixaria pouco tempo depois, após a empresa ser vendida para a Rational Software, em 1997, mesmo ano de fundação da Netflix. Hoje, ele acumula o cargo de CEO e presidente da empresa da qual é co-fundador com outras atividades empresariais. Reed faz parte do conselho de administração do Facebook desde 2011, cargo que também ocupou na Microsoft entre os anos de 2007 e 2012.

Filantropia e Educação

Não é só na área entretimento que Hastings se destaca. Ele também se mantém envolvido com o setor de educação nos Estados Unidos. Desde a venda da “Atria Pure”, em 1997, tem dedicado parte do seu tempo a ajudar escolas e projetos educacionais. O primeiro projeto que Hastings participou ativamente foi a reforma educacional do Estado da Califórnia, sendo nomeado membro do Conselho Educacional no período de 2000 a 2004. Durante sua participação como membro do Conselho, Reed chegou a destinar aproximadamente US$ 1 milhão do próprio bolso para ajudar na campanha pela aprovação da emenda 39, que visava implantar o formato de células no sistema educacional californiano. Após muitas divergências com a Assembleia Legislativa da Califórnia, que entre outras coisas, se negava a transformá-lo em presidente do Conselho, Hastings renunciou ao seu cargo e passou a se dedicar a outras atividades na área educacional.

O sucesso profissional de Hastings não fica restrito à Netflix, à Microsoft ou a área da educação. Segundo a revista Forbes, em 2014, seu patrimônio total superou o valor US$ 1 bilhão, tornando-o o mais novo membro do seleto grupo de bilionários do mundo. De acordo com a publicação, a alta valorização de suas ações na empresa de distribuição de conteúdo on-line é responsável por aproximadamente 90% de todo o patrimônio acumulado por Hastings. Sua fortuna pessoal é estimada em aproximadamente US$ 120 milhões. Nem tudo na vida de Reed Hastings se resume a números, recordes de faturamento e assinaturas ou ideias inovadoras. Hoje, ele é casado com Patrician Ann Quillin, de 54 anos, responsável pelo atendimento no Museu de História Natural de Santa Cruz, na Califórnia. O casal tem dois filhos.

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Roda da fortuna

Em 2014, Hastings passou a integrar o estrito grupo dos bilionários do mundo

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Consolidação do modelo

Liderança do mercado de videolocação

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No começo do novo milênio, a Netflix cresce, se consolida e passa a explorar mais a fundo o mercado on-line

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Netflix começou a se tornar referência no setor de entretimento no começo dos anos 2000, e muito desse sucesso se deve a duas inovações em setores primordiais para o modelo de negócios da empresa. O primeiro deles foi a popularização dos aparelhos de reprodução de mídias digitais (CD/DVD). Até 1999, apenas 5% dos lares norte-americanos possu-

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íam esses aparelhos, enquanto em 2000, a penetração da nova tecnologia já fazia parte do cotidiano de 13% das famílias dos Estados Unidos. O aprimoramento da internet banda larga também contribuiu para esse crescimento. Com mais pessoas tendo acesso a essa tecnologia, logo o site da empresa passou a ter mais acessos, a empresa pôde melhorar e suge-


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Consolidação do modelo

Ao contrário das videolocadoras tradicionais, a Netflix enviava o filme para a casa do cliente e não cobrava multa por atraso

rir mais filmes e, por consequência, atrair mais e mais assinantes. A política de oferta ilimitada de filmes no conforto de casa somada ao crescimento do número de aparelhos de reprodução de DVDs fez a empresa cair de vez no gosto dos amantes de cinema, principalmente daqueles que alugavam um grande volume de filmes. Para eles, era mais vantajoso ser assinante da Netflix do que gastar um valor muito maior para ter todos os filmes que quisessem, além de não precisarem mais ir até as videolocadoras tradicionais para procurar o filme desejado. Além da conveniência, os cinéfilos não tinham mais que se preocupar com o valor das taxas de entrega. Outro fator que fez que a Netflix se tornasse um sucesso para o público norte-americano foi a popularização da ferramenta de busca e recomendações. O site tinha o maior sistema de recomendações do mundo, o que fez com os assinantes acreditassem que as indicações de filmes feitas pelo site atendiam melhor aos seus gostos e preferências do que a

indicação dos atendentes das locadoras convencionais. No ano de 2002, a estimativa da Netflix era atingir o número de 500 mil assinantes. Em maio daquele ano, quando decidiu abrir o capital e entrar na bolsa de valores, ela chegava a aproximadamente 700 mil assinantes, mostrando o total sucesso de seu modelo de negócios. De acordo com relatórios da empresa, a Netflix fechou aquele ano com um total de 857 mil assinantes e um faturamento de US$ 152,8 milhões, um crescimento de 88% referente ao arrecadado no ano anterior. Além do faturamento recorde, a empresa dispunha de aproximadamente US$ 104 milhões em caixa para investimentos de curto prazo e para manter seu ritmo de expansão no mercado. Além do crescimento das receitas, o relatório anual da empresa mostrou uma sensível modificação no perfil da base de assinantes. Se em 1998, ano de lançamento do site, a maior parte do público era composto por homens, com muito conhecimento tecnológico, agora mais da metade de seus

assinantes era constituída por mulheres, e a renda familiar das famílias representava um terço do valor da renda dos primeiros usuários do serviço. O rápido crescimento da Netflix continuou nos anos seguintes. De acordo com dados da empresa, a evolução de faturamento e do número de usuários foi de aproximadamente 75% durante o ano de 2003. Nesse ano a empresa faturou US$ 272 milhões e passou a contar com 630 mil novos assinantes. Assim, atingiu 1,5 milhão de usuários, se tornando uma das principais empresas do ramo com envio estimado de 2,5 milhões de DVDs por semana. Com seu crescimento exponencial, a empresa já começava a incomodar as principais corporações do setor de home video. Na visão de Hastings, seus principais concorrentes eram a Amazon.com, Best Buy, Walmart, HBO, Showtine (canais TV a cabo) e principalmente a Blockbuster, que só com suas lojas físicas, atendia a 25% do mercado de DVDs. O ano de 2004 foi marcante em termos de expansão da empresa. Além de superar a marca de 2,5 milhões de assinantes, ela triplicou o faturamento de 2002, atingindo US$ 506 milhões. No mesmo ano, a empresa foi responsável por 80% dos DVDs alugados via internet, nos Estados Unidos, consolidando sua liderança do mercado. Mesmo tendo uma concorrência mais direta da Blockbuster. Um dos filmes mais alugados na época e um dos responsáveis pelo sucesso da empresa foi “Spider Man II”, solicitado por 600 mil assinantes, entrando entre no top 50 dos filmes mais alugados na história do site. Mesmo já líder do mercado de alugueis on-line, a Netflix decidiu apostar em mais uma inovação na experiência do usuário e introduziu a opção friends em seu site. Por meio dela, o usuário poderia compartilhar sua lista de recomendação de filmes com amigos e familiares, ampliando

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Consolidação do modelo

O filme “Spider Man II” foi um dos mais alugados de 2004, ano em que a Netflix conquistou a liderança do mercado

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de conteúdo on-line em streaming para o seu plano de negócio e já prepara a transição para essa nova tecnologia. Em 2007, a empresa fez seus primeiros testes na distribuição on-line de seu conteúdo, disponibilizando para seus assinantes a oportunidade de assistir os filmes direto do site em seus computadores. Nas previsões da empresa era necessário investir US$ 40 milhões para adequar o seu sistema à nova tecnologia. Nasceu ali a Netflix que conhecemos hoje.

Aumento do catálogo

Com o sistema de recomendações funcionando a todo o vapor e um número crescente de assinantes, a Netflix precisou ampliar o catálogo de filmes à disposição. Isso não era uma tarefa fácil, já que a empresa não comprava grandes lotes de fil-

Divulgação/ Netflix

o sentimento de fazer parte de um grupo com os mesmos interesses e proporcionando que um mesmo filme fosse indicado a públicos diferentes. Em 2005, a Netflix chegou a 4,2 milhões de assinantes e a uma biblioteca com cerca de 55 mil títulos diferentes, distribuídos entre 25 milhões de DVDs. Apesar de ter uma liderança estável e estar muito à frente da concorrência, Hastings já começava a prever uma significante mudança de paradigmas no setor de entretenimento. Para ele, cada vez mais as pessoas começavam a fazer download de filmes ou assisti-los on-line, na modalidade conhecida como VOD (Vídeo On Demand). Esse novo mercado tinha como expoentes o YouTube, Movielink e CinemaNow. No seu relatório para os investidores de 2006, a Netflix reconheceu a ameaça real da distribuição

Ted Sarandos, responsável pelo acervo, foi contratado pela Netflix para aproximar a empresa dos grandes estúdios e produtoras


Reprodução/ Hotel Ruanda

Consolidação do modelo conseguido estabelecer convênios com os principais estúdios para a aquisição de filmes. Apesar de conseguir ampliar o catálogo de títulos à disposição e satisfazer os assinantes, a brincadeira não saiu barata. Mesmo adquirindo um número maior de películas, cada filme adquirido custou 20% mais caro do que os US$ 20 que a empresa pagava quando comprava das pequenas distribuidoras. Em contrapartida, dobrou a quantidade de cópias adquiridas anteriormente. Um dado que mostra o rápido crescimento do catálogo da empresa

é que até 2002, o site da Netflix contava com um acervo de 14.500 títulos entre filmes, séries e documentários, ou seja, o usuário tinha muitas opções para explorar. Esse era um fator chave para a expansão da empresa. No ano seguinte, o número de títulos saltou para 18 mil, distribuídos em 12 milhões de DVDs. O relacionamento mais estreito com os produtores, além da satisfação dos assinantes, também trouxe outros benefícios. A Netflix conseguiu diminuir seu custo de filmes considerados lançamentos, que ge-

Os filmes mais alugados

mes, o que a deixava longe do contato direto com os estúdios e grandes produtoras. Até o começo dos anos 2000, a empresa mantinha seu catálogo por meio de contato com pequenos distribuidores de filmes, tendo que escolher cuidadosamente os títulos que ia adquirir, pois os descontos que conseguia na compra de cada DVD eram mínimos. Essa política conservadora na aquisição dos filmes resultava em alguns poucos títulos à disposição no estoque. Com a base de assinantes da empresa em ascensão, a escassez de títulos começou a incomodar os novos clientes, o que forçou a empresa a adotar uma estratégia mais agressiva a busca de novos títulos. O primeiro passo nessa mudança cultural foi a contratação de Ted Sarandos, que viria da Video City – uma grande cadeia distribuidora de filmes – para o cargo de diretor de conteúdo. A principal responsabilidade de Sarandos era aproximar a Netflix dos grandes estúdios e produtoras de filmes, a fim de aumentar o acervo de filmes do site. Alguns meses após a entrada de Sarandos na companhia, ela já havia

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Hotel Ruanda foi o primeiro filme independente a fazer sucesso na plataforma

Em 2010, Sandra Bullock foi premiada no Festival Santa Barbara Int’l Film pela atuação em “The Blind Side”, filme mais alugado da história da Netflix

1º Lugar: Um Sonho Possível - The Blind Side (2009). O filme conta a história de Michal Oher, um garoto que foi abandonado pela mãe e adotado pela família de Leigh Anne Tuohy (Sandra Bullock). Sob os cuidados dessa família rica, Oher consegue se desenvolver e se tornar jogador profissional de futebol americano. Sandra Bullock conquistou o Oscar de melhor atriz por sua atuação nesse filme. 2º Lugar: Crash (2004). 3º Lugar: Antes de Partir - The Bucket List (2007). Fonte: site Hollywood Reporter

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Consolidação do modelo

O primeiro centro de distribuição da Netflix fica em SunnyVale, Califórnia

ralmente despertam maior interesse por parte dos usuários. Agora com um acervo similar ao das grandes redes como a Blockbuster, a Netflix ainda tinha um diferencial. Se nas grandes redes as prateleiras eram ocupadas quase que exclusivamente por lançamentos, no site da Netflix o usuário poderia encontrar com maior facilidade filmes que já tivessem sido lançados há mais de seis meses, portanto não catalogados com o lançamentos e com poucas cópias disponíveis nas locadoras tradicionais. Contando com um catálogo já expressivo de filmes considerados lançamentos e populares, a companhia decidiu apostar na diversificação de seu conteúdo. Além de ser bem vista pelos grandes estúdios como a MGM, por exemplo, ela começou uma aproximação com produtores independentes e menores, se tornando um importante canal de distribuição para filmes considerados “B” (baixo orçamento) ou mais cult. Para os estúdios independentes e menores, era muito importante fazer parte do acervo da Netflix, pois através do sistema de recomendação do site eles conseguiam se tornar conhecidos do grande público mesmo não contando com todo o aporte financeiro e suporte publicitário dos grandes estúdios.

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Um bom exemplo do sucesso que os filmes considerados independentes faziam na plataforma de locação da empresa é o filme Hotel Ruanda – que aborda o genocídio da etnia Tutsi em Ruanda na década de 90 e conta com Dean Cheadle no elenco. Por tratar de um tema complicado, era um filme de difícil comercialização na rede tradicional de locadoras, mas graças ao site da Netflix, muitos usuários tiveram acesso a ele, que é um dos filmes mais alugado da história da plataforma. Mais pessoas haviam assistido ao filme por meio da Netflix do que no sistema tradicional. Em 2006, a Netflix resolveu revolucionar a forma como adquiria os filmes e expandir sua presença no mercado audiovisual com a criação da Red Envelope Entertainment. A nova empresa do grupo passou a ter a responsabilidade de adquirir não só DVDs dos estúdios independentes, mas obter a licença para distribuição desses filmes. A partir de agora, a Netflix não só tinha os filmes em seu acervo, mas era responsável por negociar a distribuição dos filmes independentes com as locadoras. A criação da subsidiária veio para atender outros dois anseios da Netflix. O primeiro era ajudar a

popularização de filmes de estúdios menores, mas que a empresa considerava serem de bons conteúdos. E o segundo era fortalecer a imagem da empresa como um site que prezava não só pela popularidade, mas também na qualidade quando o escolhia um filme para fazer parte de seu acervo. Segundo levantamento da empresa, apenas 10% dos filmes exibidos em respeitados festivais como o de Sundance, na França, chegavam ao grande público. A missão da Red Envelope era adquirir e oferecer para seus usuários do site os outros 90% dos filmes que não chegavam às redes de locadoras.

Centros de distribuição

No início de 2001, a Netflix operava com apenas um centro de distribuição, que ficava na cidade de SunnyVale, Califórnia. Apesar da crescente demanda, ter apenas um centro para controlar a entrega e o recebimento de filmes era suficiente. Esse centro atendia a região da Baía de São Francisco, onde as entregas eram feitas por via terrestre em até um dia. Para as demais regiões do país, como Boston, Nova York, as entregas eram realizadas via correio e poderiam levar até uma semana, tanto para envio ou devolução dos DVDs. Ao perceber que a situação fora da Califórnia era complicada, pois o tempo entre o envio e a volta dos filmes era alto e interferiria na disponibilidade dos filmes a outros usuários, a Netflix decidiu aumentar a quantidade de centros de distribuição nos Estados Unidos para diminuir o tempo que o filme ficava em trânsito. Cada novo centro custou aproximadamente US$ 60 mil, o que, segundo a empresa, era um valor baixo de investimento e que seria recuperado rapidamente. Em seis anos, no início de 2007, a companhia já contava com 44 desses centros espalhados por pelos Estados Unidos, o que possibilitou enviar os


Consolidação do modelo

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Blockbuster, a principal concorrente

Filial da rede de videlocadora Blockbuster, na Califórnia. Empresa foi uma das maiores concorrentes da Netflix

A famosa rede de locadoras foi fundada em 1985 por David Cook, com sua primeira loja inaugurada em 19 de outubro do mesmo ano em Dallas, no Texas. Nascia então a Blockbuster Vídeo. A partir de então, qualquer pessoa poderia assistir ao seu filme favorito em casa, não precisando mais ter, necessariamente, que ir ao cinema. Seu nome se deve à expressão que significa arrasa quarteirão, usada para definir um filme que era sucesso de público. Após dois anos de funcionamento, a empresa já inaugurava sua 19ª loja e não parava de expandir. Muito desse crescimento rápido teve a ver com o novo conceito que ela trouxe para o mercado de home vídeo: a Big Store. Isso consistia em transformar as lojas em grandes centros de convivência. Assim, foram implementadas diversas ações como promoções exclusivas, grande variedade de filmes – principalmente lançamentos –, atendimento diferenciado e a oferta de outros produtos para completar a experiência de assistir a um filme, como pacotes de pipoca e refrigerantes. Em pouco tempo a Blockbuster passou a ter 200 lojas em 1989, se tornando a maior rede de locadoras dos Estados Unidos. Naquele mesmo ano, Cook vende sua rede de lojas para Wayne Huizenga, um milionário que fez fortuna no ramo de limpeza urbana. A mudança de dono inaugurou uma nova fase para a empresa. O primeiro passo de Wayne foi transferir o escritório central do Texas para a Califórnia. Em seguida

a empresa começou sua expansão para outros países, se transformando em uma multinacional do aluguel de filmes. A empresa começava o ano de 1990 com 300 lojas. Ainda em 1989, a Blockbuster inaugurou sua primeira loja fora dos Estados Unidos, após adquirir a loja The Ritz Chain, em Londres. A década de 90 ficou marcada pelo acelerado crescimento da companhia. Nos primeiros quatro anos, ela já havia chegado a Porto Rico, Canadá e começava as operações na Austrália, ao mesmo tempo em que adquira a Errol´s Vídeo, a terceira maior rede de locadoras dos Estados Unidos. A expansão foi tamanha que chamou a atenção da Viacom, uma das maiores produtoras e distribuidoras de filmes do mundo. Em 1994 o estúdio comprou a empresa de Huizenga por um valor estimado de US$ 8,4 bilhões. Naquele mesmo ano a empresa chegou à marca de 4.500 lojas espalhadas pelo mundo. Agora sob o portfólio da Viacom, a Blockbuster começava passar pelas primeiras mudanças estratégicas, a começar pelo nome. Até então conhecida como “Blockbuster Entertainement Corporation ”, em 1996 a mudou seu nome para “Blockbuster Inc”, dando claros sinais de que pretendia ser mais do que uma rede de locadoras. O primeiro grande acordo da nova empresa foi com a Sony para ajudar na difusão do DVD, a nova tecnologia que chegava ao mercado. A nova estratégia deu tão certo que em 1999 a empresa foi considerada a 13 ª mais conhecida dos Estados Unidos.

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Consolidação do modelo

História Brasileira A Blockbuster esteve presente no Brasil por 12 anos. Sua primeira loja foi inaugurada no país em 1995 por intermédio do Grupo Moreira Salles, que havia adquirido o direito de explorar a franquia no país. Em 2007 a rede contava com aproximadamente 127 lojas e foi vendida ao grupo Lojas Americanas por aproximadamente R$ 186 milhões. Após realizar a compra, a Lojas Americanas incorporou o serviço de aluguel à sua rede de lojas, extinguindo as lojas físicas que a Blockbuster tinha até então.

O declínio A chegada das novas tecnologias colocou em xeque o sucesso do modelo de negócios da empresa. Agora ela não disputava o mercado só com as tradicionais locadoras. O usuário tinha a opção de assistir qualquer filme, no conforto do seu lar, através da TV a cabo e por satélite, isso sem contar a banda larga, que proporcionou o crescimento de sua principal rival, a Netflix. Após alguns anos com quedas no faturamento, a ideia das lojas físicas deixou de ser rentável para a corporação, que amargava prejuízos cada vez maiores. Na tentativa de reverter esse quadro, a empresa começou a repensar seu modelo de negócios. A primeira mudança na tentativa de sobreviver a um mercado em intenso processo de inovação foi adotar a estratégia de envio de DVDs por correio. A mudança, apesar de necessária, sofreu grande resistência dentro da Blockbuster, pois segundo seus diretores, ia justamente contra a cultura da empresa. Outro fator que contribuiu para a demora em aderir ao novo modelo foi o financeiro. A essa altura, cerca de 20% do faturamento da empresa vinha dos acessórios comercializado nas lojas. Além disso, 15% do faturamento tinha origem nas multas por atraso na devolução, que chegavam a US$ 600 milhões em 2004. Shutterstock

A nova Blockbuster A demora em se adequar às novas tecnologias foi o que decretou o fim de uma das empresas mais famosas do setor de entretenimento. Nem mesmo

Paul McKinnon / Shutterstock.com

Loja da Blockbuster sendo fechada na Inglaterra. Empresa reduziu o número de lojas, mas a falência foi inevitável

No Canadá, a Blockbuster anunciou que fecharia todas as lojas no final de 2011

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o enxugamento da estrutura com o fechamento de lojas foras dos Estados Unidos e o investimento maciço em sua plataforma on-line foram suficientes para livrar a Blockbuster da falência. Com dívidas inegociáveis na casa dos US$ 1 bilhão, a falência foi decretada. A marca foi adquirida em 2011 pela Dish Network, uma provedora de TV por satélite, pelo valor de US$ 228 milhões. Após comprar a marca, a Dish lançou o serviço de locação à distância “Blockbuster Movie Pass”, que oferecia ao cliente a possibilidade de alugar não só filmes, mas também programa de TV via internet, com a opção de receber, via correio, filmes e jogos alugados. O novo serviço On Demand oferecido tinha seu acervo divido em duas partes: na primeira o usuário tinha à disposição 3 mil títulos para assistir on-line no seu aparelho de TV. Se a opção fosse assistir em dispositivo móvel como computador ou celular, o acervo era de 4 mil títulos. Mesmo com o foco voltado para o consumo em streaming, a “Nova Blockbuster” ainda mantém quase 100 mil títulos em DVD para quem prefere a entrega pelo correio. Hoje, a Blockbuster existe, mas com certeza muito diferente daquela empresa que dominou o mercado de home video por mais de 20 anos, antes da chegada da Netflix.


filmes em até 24 horas para 90% dos seus assinantes. A melhora da estrutura e a agilidade na entrega dos DVDs aliadas aos outros fatores característicos da Netflix como conveniência, preço do aluguel e quantidade de filmes à disposição foram os principais fatores que contribuíram para a expansão da marca. A partir de então ela podia competir em igualdade de condições com as pequenas redes de locadoras físicas, em qualquer parte do território norte-americano. Por considerar que o prazo de envio era um fator chave para atrair e manter os clientes, a empresa buscava sempre aprimorar a logística de envio de seus produtos. Segundo dados da empresa, cada um dos seus centros de distribuição conseguia despachar aproximadamente 800 DVDs por hora, o que proporcionaria o envio de cerca de 1,6 milhão por dia. Um recorde. Além de contar com uma grande rede de distribuição, a empresa ainda mantinha sua parceria com a USPS, o sistema de correio norte-americano. Contando com duas formas de envio e devolução de DVDs, a terrestre e a postal, a agilidade do serviço foi aprimorada. Em vez de o serviço postal devolver o filme para o local de origem, eles poderiam ser entregues no centro de distribuição mais próximo, que contava com múltiplas rotas para seus caminhões para diminuir o tempo de retorno dos filmes, aumentando a oferta e diminuindo o tempo de espera para que o DVD ficasse à disposição.

O mundo antes da Netflix

Talvez poucas pessoas tenham ouvido falar sobre a Blockbuster, mas quem viveu a época do VHS e da chegada dos DVDs, sabe que ela foi uma das maiores redes de locadoras que existiam, com lojas espalhadas em diversos países do mundo. Sem dúvidas, uma referência no setor de home vídeo, pelo menos até o surgimento

da Netflix e o seu plano de negócios lançamentos geralmente tinham um de envio de DVDs pelo correio. prazo de devolução de 24 horas, caso Antes de falar especificamente contrário, o cliente, como punição, da rivalidade entre as duas gigan- pagava uma taxa pelo atraso do filme. tes, vale contar como era a cultura A estratégia que fez com que a do home vídeo antes da chegada da Blockbuster fosse a líder no mercaNetflix. Até o final da década de 90, do de entretenimento foi a abertura quem quisesse alugar um filme para massiva de lojas físicas nos Estados assistir em casa, sozinho ou com os Unidos e, posteriormente, nos princiamigos, deveria fazer um cadastro pais países do mundo. Em 2006, mesna videolocadora mais próxima e mo com o avanço do modelo Netflix, escolher entre as opções disponíveis a tradicional rede de locadoras connas prateleiras o título que mais lhe tava com 5.194 lojas em solo norteagrava, se dirigir ao caixa, fazer a lo- -americano, sendo que 4.255 pertencação, pagar e devolver o filme após ciam à empresa. As demais eram de determinado prazo na mesma loja – o pessoas que pagavam para ter o dimétodo não era nada prático se com- reito de abrir uma franquia da rede. parado às possibilidades que temos Com os critérios adotados na exhoje em dia na era digital. pansão da empresa, estimava-se que No cenário descrito acima, quem 70% da população norte-americana mais se destacava entre as locadoras tinha uma loja Blockbuster a aproera justamente a Blockbuster, pois a ximadamente 10 minutos de casa. A empresa dispunha de uma vasta quantidade de lojas em quase todo território norte-americano. A grande aposta da empresa era no impulso do consumidor, aquele que decidida de última hora passar a noite em casa assistindo um filme e se dirigia à loja para escolher qual filme ver. A vantagem da Blockbuster em relação às demais concorrentes era o vasto acervo de título, sendo cerca de 70% composto por grandes lançamentos do cinema. Por isso, ninguém se importava em pagar o valor de US$ 4 para locar o filme por um prazo determinado. Esse prazo costumava variar de acordo com o dia da semana e quão Antes da Netflix e serviços similares, era preciso ir até uma locadora, se novo era o filme. Os cadastrar e escolher o filme

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Consolidação do modelo


A Netflix entrou no mercado de home video fornecendo um catálogo on-line para que os usuários solicitassem DVDs

Uma ameaça chamada Netflix

Nos primeiros anos da Netflix no mercado, a empresa não era encarada como ameaça ao quase monopólio da Blockbuster. Na visão da empresa, não havia demanda suficiente que suportasse um modelo de

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grande quantidade de filmes à disposição em cada uma de suas lojas também chamava a atenção dos amantes do cinema: no auge, a média era de 2.500 filmes por estabelecimento. O êxito financeiro da Blockbuster estava em dar alta rotatividade aos filmes do seu catálogo, ou seja, qualquer filme que ficasse muito tempo parado na prateleira ou no cliente era considerado prejuízo. Isso explica a política adotada de cobrar multa pelo atraso na devolução dos filmes – lembram da história do Apollo 13 citada no capítulo anterior? Em 2004, a empresa arrecadou mais de US$ 600 com multas por atraso na devolução. Após algum tempo, para aumentar seus lucros, a Blockbuster disponibilizava os filmes com maior tempo de circulação para venda, para recuperar parte do dinheiro investido na compra do filme (ela pagava US$ 18 por filme), e abria espaço em suas prateleiras para a chegada de títulos mais recentes ou com maior demanda. Quando a Netflix fez sua primeira oferta pública na Bolsa de Valores, em 2002, a Blockbuster batia recordes de faturamento e rentabilidade pelo quinto ano seguido, sendo reconhecida com a maior rede de locadoras dos Estados Unidos.

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Consolidação do modelo

A era das videolocadoras começou com o aluguel de fitas VHS. Depois, os DVDs dominaram o mercado

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aluguel, cujo foco fosse o envio de DVDs pelo correio. Não demorou muito para que os executivos da empresa mudassem de opinião e em seu relatório anual para os investidores, em 2002, reconheceram que o modelo criado por Hastings era uma ameaça real para os seus negócios. Até então, seus principais concorrentes eram a Hollywood Entertainment e Movie Gallery que não assustavam, pois ofereciam pouca resistência à sua hegemonia no mercado. Porém, entre 2003 e 2004, a Netflix saltou de uma participação 2% para 7% do mercado de home video, um avanço assustador. No ano seguinte, a Blockbuster começou a desenvolver um sistema de envios pelo correio semelhantes ao da agora rival Netflix. Em 2004, a empresa lançou oficialmente o site “Blockbuster Online”, que oferecia uma quantidade maior de filmes aos clientes do que os disponíveis nas lojas físicas da empresa. Agora a rede de locadoras entrava para valer no mesmo nicho de mercado da concorrente, porém com atraso.


Além de um sistema similar, a Blockbuster adotou uma tática considerada agressiva na tentativa de recuperar o terreno que havia perdido. O sistema de envios pelo correio da empresa era integrado com o sistema das lojas físicas, ou seja, o assinante do novo serviço poderia reservar o filme e retirar na loja mais próxima de sua residência, reduzindo o tempo de espera para o recebimento do DVD. Essa foi a forma encontrada para se distinguir do modelo criado por Hastings e para acelerar o crescimento da nova plataforma. Uma das vantagens que a Blockbuster considerava ter frente à sua principal concorrente era sua rede de distribuição. Enquanto a Netflix operava, em 2004, com 30 centros de distribuição nos Estados Unidos, a rede varejista contava com 35 centros de distribuição e o suporte de mais de 4 mil lojas físicas para atender o assinante, isso gerava um custo de operação mais baixo, na visão da empresa. Para potencializar a nova plataforma e recuperar o terreno perdido para a Netflix, a empresa decidiu acabar com o que considerava o seu ponto fraco em relação à concorrência: a famosa multa por atraso na devolução dos filmes. Porém, a estratégia não deu o resultado esperado. Ao abolir a taxa, a Blockbuster abriu mão de faturar cerca de US$ 600 milhões por ano, porém isso representou um aumento de apenas 5% no número de assinantes e a empresa teve que amargar o prejuízo. No final de 2006, o “Blockbuster Online” contava com cerca de 2,2 milhões de assinantes, um terço do público que a Netflix havia conseguido fidelizar até o momento. Mesmo com o crescimento do novo serviço, a empresa continua sofrendo perdas significativas de faturamento. Por mais que a loja virtual da Blockbuster tivesse alcançado um número expressivo de assinantes e a empresa não medisse esforços financeiros para fazer frente à concorrên-

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Consolidação do modelo

Com o modelo on-line da Netflix, o VHS, o DVD e até mesmo o blu-ray ficaram obsoletos

cia, um fator chave ainda mantinha as duas gigantes do entretenimento distantes: a cultura. Enquanto a rede varejista foi criada, se consolidou e virou referência em um mundo analógico, off-line, a Netflix já nasceu dentro da cultura digital, na era da internet. Essa diferença foi primordial para que a empresa de Hastings se mantivesse a frente da rival, pois conseguia se adaptar mais facilmente às rápidas mudanças tecnológicas que aconteciam no setor de entretenimento e no mundo. A diferença cultural entre as duas organizações não ficou evidente somente na concorrência entre as duas, mas também no que o futuro destinaria para ambas. A Blockbuster sofria para se adaptar às novas tecnologias e, com perdas significativas de faturamento e mercado, foi definhando rumo à falência, que aconteceu em 2011, após a rede varejista acumular dívidas próximas dos US$ 1 bilhão e ter que vender suas últimas 300 lojas físicas.

Um final triste para quem já chegou a contar, no auge, com uma cadeia de distribuição de quase 9 mil lojas. No Brasil, a empresa já havia saído o mercado em 2007, permanecendo apenas alguns postos de locação dentro da rede de varejo das Lojas Americanas. Se o destino foi cruel com a Blockbuster, o mesmo não pode se dizer da Netflix. A empresa nascida de Hastings soube avaliar melhor as mudanças tecnologias e compreender qual seria o futuro da indústria do entretenimento. Já em 2005, a empresa entendia que o futuro do comércio de filmes e séries não seria no DVD ou suas evoluções tecnológicas como o blu-ray. O futuro seria a transmissão de conteúdo on-line, na internet, o famoso VOD (Video On Demand). Em 2007, mesmo sem abandonar o comércio via correio de DVDs, que mantém até hoje, a Netflix já dava os primeiros passados rumo a essa nova tecnologia, e o resultado você verá a partir do próximo capítulo.

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Um novo nicho de mercado

O domínio do MERCADO DE STREAMING Em 2007, a Netflix fez as primeiras experiências on-line e começou a construir seu catálogo de filmes

A

Netflix fechou o ano de 2006 com uma marca expressiva: a empresa tinha alcançado 6,3 milhões de assinantes. Mas nem por isso Hastings achou que tinha atingido o sucesso: ele queria mais. Em 2007, decidiu explorar um novo mercado na área de entretenimento de consumo sob demanda.

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Em janeiro daquele ano, foi feita a primeira experiência da Netflix no campo da transmissão de conteúdo on-line direto na tela do computador. A partir de um acordo com a Microsoft, a empresa disponibilizou em seu site um plugin a ser instalado do tradicional Windows Media Player. Poucos minutos após realizar a instalação, o usuário poderia assistir

a qualquer filme do catálogo disponilizado pela empresa direto em seu computador pessoal. O investimento feito pela empresa no desenvolvimento dessa tecnologia foi de aproximadamente US$ 40 milhões e levou seis meses para ficar disponível para todos os usuários da plataforma, já que Hastings queria ir passo a passo testando o aplicativo


Um dos diferenciais da Netflix é oferecer filmes por um preço fixo e pacotes determinados por horas de consumo

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novo e ajustando os possíveis erros antes de entrar de vez no mercado da distribuição de conteúdo em streaming. Os primeiros 800 assinantes com acesso à nova plataforma contavam com cerca de mil títulos, entre séries e filmes a sua escolha, e tinham um pacote de horas limitadas por mês para ver os filmes. Quem era assinante do plano básico do modelo de envio por correio, que custava US$ 5,99 por mês, tinha acesso a 6 horas de vídeo para assistir no período; já quem era assinante do plano intermediário de US$ 17,99, o acesso era limitado a 18 horas por mês, o que daria, em média, a possibilidade de assistir a 9 filmes. Um dos principais problemas encontrados por Hastings para popularizar o novo modelo entre os assinantes era a capacidade da banda de internet. Para que o usuário conseguisse ter uma experiência válida, sem travamentos na hora de assistir ao filme desejado, era necessário que ele tivesse, no mínimo, uma conexão de internet com 1,5 Mbps, o que era algo raro em 2007. Apesar de toda a dificuldade tecnológica enfrentada para estabelecer seu serviço de VOD (Video On Demand) em streaming, a Netflix decidiu continuar apostando a evolução e melhoria do serviço, pois em seu relatório anual de 2005 já havia identificado que o futuro estaria na transmissão on-line de conteúdo e não mais na oferta por correio de DVDs ou sua evolução tecnológica, como o blu-ray. Hastings tinha certeza que o novo serviço iria crescer conforme a velocidade de tráfego da internet crescesse e chegasse a mais lares norte-americanos. Naquela época, estimava-se que o usuário teria de esperar de 10 a 15 segundos para o carregamento do filme que desejasse assistir. Se até 2006 as principais concorrentes da Netflix eram as videolocadoras e as lojas de venda de DVDs, agora os adversários seriam outros. Apesar de o VOD em streaming ser um mercado ainda novo, a Netflix já identificava as empresas que poderiam se tornar concorrentes, entre

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Um novo nicho de mercado

elas o Ipod e Apple TV da Apple, o Unbox da Amazon e os provedores de busca como Google e Yahoo! e os aplicativos que já faziam a transmissão on-line de conteúdo, como Itunes, Hulu, Vongo e Movielink. No caso dos sites que já usavam a distribuição on-line de filmes, como

o Movielink e a Unbox da Amazon, o usuário poderia baixar qualquer filme à disposição na plataforma por um custo de US$ 3, porém teria o limite de até 48 horas para assistir ao conteúdo escolhido. O fato de oferecer filmes e séries por um custo semelhante (US$ 5,99) e sem qualquer restri-

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Um novo nicho de mercado ção de prazo para visualização fez a Netflix cair no gosto dos usuários, desbancando a concorrência. O sistema de visualização oferecido ao assinante era semelhante ao sistema utilizado por YouTube e Google Vídeo.

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O dispositivo Roku, roteador que permitia conectar TVs à internet

entrada HDMI do televisor, possibilita ao usuário acessar a internet e, consequentemente, o site da Netflix direto do televisor. A novidade dentro de sistema embrionário dentro da televisão foi um sucesso, e após um ano de seu lançamento, o dispositivo já havia sido comprado por cerca de 3 milhões de pessoas, aumentando assim a assertividade da Netflix perante o público consumidor. Com a dificuldade tecnológica contornada, a Netflix tinha outro desafio para vencer: a aquisição de conteúdo. Se ela já tinha um bom relacionamento com os estúdios para a compra de DVDs, o novo mercado

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Além do valor de assinatura mensal ser mais vantajoso que dos novos concorrentes e a programação sem intervalos comerciais, a Netflix tinha mais um fator muito importante para facilitar sua entrada no novo mercado: a base de assinantes. Com uma clientela já consolidada, que acreditava na empresa e já estava adaptada ao modelo de recomendação de conteúdo, ficou mais fácil para a empresa oferecer uma nova experiência no consumo de conteúdo ao seu público fiel do que ter que criar uma demanda para um serviço ainda incipiente e com um acervo não muito abrangente. Uma prova dessa facilidade é que a Netflix fechou o ano de 2007 com a marca de 7,5 milhões de assinantes em seu serviço de envio por correio de DVDs e acreditava que parte dele poderia se interessar por testar a nova tecnologia que a empresa estava implementando. Após um ano de funcionamento do novo serviço em streaming, a empresa começou a investir em tecnologias para popularizar de vez o seu serviço e oferecer aos usuários outras opções para o consumo de filmes além do computador pessoal. No começo de 2008, a Netflix já negociava com a LG Eletronics e outros fabricantes de TVs uma forma de inserir um aplicativo nas Smart TVs, para que o assinante da Netflix pudesse assistir a qualquer filme ou série diretamente em seu televisor, sem precisar estar conectado a nenhum computador. A Netflix não só negociava sua entrada nas Smart TVs, mas também, no mesmo período, desenvolvia um dispositivo próprio para ampliar seu número de assinantes. Ainda em 2008 a empresa lançou o “Roku”, uma espécie de roteador que conectado à

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Um público fiel

trazia consigo uma novidade, um complicador. Para a distribuição on-line, os estúdios podiam licenciar todo ou parte de seu conteúdo para uma só empresa. Nesse momento, por exemplo, a HBO licenciava a maior parte do conteúdo dos estúdios Warner Bros com exclusividade, o que restringia a possibilidade da Netflix adquirir para sua plataforma de streaming a maior parte dos filmes e séries produzidos por esses estúdios. Ao final de 2009, a Netflix atingia a uma base de aproximadamente 12 milhões assinantes ativos e muito desse crescimento teve relação direta com sucesso da sua distribuição de conteúdo em streaming, já que cerca de 50% dos assinantes assistiu a pelo menos 15 minutos de filmes ou sites direto do site e empresa contabilizou à sua base de assinantes aproximadamente 1 milhão de novos usuários no decorrer do ano, a maioria deles na plataforma de streaming. Durante esse ano, a empresa acumulou cerca de 12 mil títulos entre filmes e seriados para colocar à disposição da transmissão on-line. O aplicativo também começava a chegar às mais diversas plataformas tecnológicas, como TVs, computadores,

A parceria da HBO com os estúdios Warner Bros dificultou a aquisição de diversos títulos pela Netflix


A tecnologia que você não vê

Hoje, a Netflix está presente em praticamente todos os dispositivos como celular, tablet, notebook, computadores pessoais, videogames e televisores de última geração. O que você não sabe é que para proporcionar todo esse conforto e chegar a todos os usuários na plataforma, a empresa mantém um grande aparato tecnológico para que o sistema funcione bem. A primeira experiência na reprodução de conteúdo em streaming foi realizada em parceria com a Micro-

soft, que disponibilizava um arquivo de extensão instalável em seu Media Player e seu navegador para que o usuário pudesse acessar sua tela do site da Netflix e escolher qual filme gostaria de assistir naquele momento direto do computador. Porém, de lá para cá, muita coisa mudou. Nos primeiros anos de funcionamento do serviço de vídeos em streaming on-line, a Netflix optou por fazer parceria com três grandes empresas do setor de armazenamento e tráfego de dados para atender à demanda dos assinantes do novo serviço. As empresas Akamai, Limelight e Level 3 ficaram responsáveis por armazenar todo o banco de dados dos filmes e séries e por transportá-los até os dispositivos dos usuários. A principal parceira da Netflix entre os anos de 2007 e 2012 foi a Akamai, que não só ficou responsável por mais de 50% de todo o tráfego de conteúdo do site como era a que cobrava menos pelo serviço: cerca de US$ 1,5 por Gb entregue ao usuário final. Em 2012 a Netflix percebeu que tinha tráfego de dados suficiente para ter o seu próprio centro armazenamento de distribuição e distribuição de dados. Nessa época, o tráfego de filmes e séries de seu site era responsável por 33% de todo o

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notebooks e videogames como o Xbox 360 e o Playstation 3, levando sua plataforma on-line a praticamente todos os aparelhos de entretenimento disponíveis no mercado. A estratégia da Netflix para ampliar ainda mais sua base de assinantes era continuar os dois serviços que dispunha pelo mesmo preço. Pagando a mesma mensalidade o usuário poderia escolher entre assistir a uns filmes disponíveis em streaming, que tinha um catálogo limitado ou continuar recebendo em casa o DVD que tivesse interesse, tendo aproximadamente 75 mil títulos à disposição para escolher. A empresa acreditava que manter seus dois serviços associados criava uma vantagem em relação à concorrência, pois teria mais tempo para avançar na consolidação e implantar melhorias no streaming sem perder um número significativo de assinantes. Porém, segundo estimativas da empresa, em algum momento próximo ela teria que se dedicar mais ao conteúdo em streaming, pois com ofertas de banda larga mais velozes, a maioria dos assinantes ia preferir assistir a filmes direto em seu televisor ou computador pessoal do que em aparelhos de DVD. Por isso, investiu pesado em marketing para divulgar e consolidar sua marca como uma das principais opções de distribuição de conteúdo na internet.

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Um novo nicho de mercado

A Akamai, responsável por armazenar e transportar os filmes, foi a principal parceira da Netflix entre os anos de 2007 e 2012

conteúdo acessado via internet nos Estados Unidos. Com o crescimento do número de assinantes e, por consequência, da quantidade de gigabytes transmitidos, terceirizar a operação de transferência de dados deixou de ser vantajoso para a Netflix. Pois além do aumento de tráfego, as empresas parceiras começaram a aumentar o valor cobrado pela prestação do serviço, já que tinham que investir na melhora da própria infraestrutura para atender a demanda gerada pelo serviço de streaming. Foi então que a empresa começou a construir seu próprio centro de distribuição. Além de baratear o custo

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O primeiro centro de distribuição da própria Netflix, batizado de Open Conet, foi criado em Miami

de armazenamento e distribuição de seu conteúdo, a Netflix viu que se construísse o se próprio CDN – Content Delivery Network – ela poderia ter o controle ponto a ponto de seu negócio, ou seja, desde a aquisição do filme até a chegada dele ao usuário final seriam agora controlados por ela, podendo assim garantir a qualidade da transmissão do serviço sem interferência de outras empresa em seu lucrativo negócio, que em 2012 já era o principal responsável pelo faturamento da empresa. Não foi só o controle ponto a ponto que levou a Netflix a construir o próprio centro de conteúdo: houve também a questão financeira. Além de não querer mais depender de outras empresas para gerenciar o seu tráfego de dados, a construção

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do CDN possibilitou à Netflix diminuir consideravelmente os custos de armazenamento e transferência de dados dentro da rede mundial. Pois, conforme o número de assinantes ia crescendo, ficou inviável manter os valores pagos para os centros terceirizados para atender à demanda de tráfego de dados gerados por seus assinantes. O centro de distribuição da Netflix foi criado em Miami, EUA, e é conhecido como Open Conect. Ele tem a função de ser um servidor global da empresa e a partir dele é feita o controle a destruição dos dados (arquivos) dos filmes e séries para outros pequenos servidores ou empresa de internet, que retransmitem dos dados dos vídeos direto para o dispositivo móvel dos assinantes da plataforma.

Esse centro tem a capacidade de realizar a reprodução, em streaming, de 10 a 20 mil filmes ao mesmo tempo. O Open Conect conta com sua própria tecnologia de armazenamento, feito sob demanda para atender à plataforma de streaming. O CDN conta com um hardware (sistema) com com dois tipos de servidores, um para drives de HD (para conteúdo) e outro com drives de flash (tecnologia necessária para a reprodução dos filmes). Eles foram construídos para armazenarem um alto número de dados e consumirem pouca energia. Além do seu centro de distribuição, a Netflix conta com aproximadamente outros 20 servidores espalhados pelos EUA para transmitir de forma mais barata o conteúdo direto


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Captação de distribuição de conteúdo

ativa todos os dados relativos ao seu famoso serviço de recomendação de conteúdo do site. O centro de distribuição da Netflix conta com cerca de 40 funcionários, divididos da seguinte forma: 20 pessoas trabalham para cuidar do software de armazenamento, 10 engenheiros de TI e outros 10 cuidam da área operacional do centro.

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de seu centro os dispositivos dos usuários. Os HDs desses servidores são colocados na horizontal em discos giratórios para evitar superaquecimento e falha na hora da transmissão dos dados, o que geraria interrupção da reprodução dos filmes e séries. Associado ao seu CDN, a empresa mantém uma parceria com a Amazon. São nos servidores de internet da parceira, o Amazon Web Services, que a Netflix armazena, gerencia, e

O processo de captação dos filmes começa logo após a negociação do direito de transmissão dos filmes direto com as grandes produtoras ou estúdios de cinema. Após concluído esse processo, a Netflix disponibiliza a esses estúdios um servidor em nuvem para armazenamento virtual, por meio dele as empresas sobem os arquivos dos filmes direto nesse HD virtual e de lá a Netflix faz o download desses arquivos e os transforma nos códigos próprios para armazenar e preparar a distribuição do conteúdo para os assinantes. Para se ter uma ideia de como funciona esse processo, após fazer o download de filme ou série, esse conteúdo é convertido em aproximadamente 120 formatos de áudio e vídeo diferentes. Tudo isso é feito para que qualquer usuário possa ter acesso ao conteúdo no dispositivo que preferir e para manter o padrão de qualidade da empresa no momento da reprodução dos vídeos, mesmo em conexões de internet de baixa velocidade. Além disso, há também a adição de legendas para todos os idiomas em que o site está disponível. Trabalhoso, não?

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Dados do usuário

Filmes semelhantes

JAVA API

START-UP

Testes

DADOS DO USUÁRIO

Recomendações

Dados do filme

Reprodução/ Netflix

AUTH

Classificação

FILMES SEMELHANTES

Fonte: Blog de tecnologia da Netflix O API Java faz com que os filmes e outras informações da Netflix possam ser lidos por qualquer dispositivo

Hoje, a biblioteca da Netflix conta com mais de 1 pentabyte em dados, que são reorganizados em servidores com capacidade de 100 Tb (terabytes) durante os períodos de pouco acesso os usuários, para privilegiar e facilitar o tráfego dos filmes e séries que a empresa considera que serão os mais acessados pelo assinante durante o dia posterior. Com isso a empresa reduz o seu consumo de banda larga durante os horários de pico e diminui a espera do usuário para assistir ao filme, já o que carregamento do conteúdo fica mais rápido. Além dos servidores espalhados pelos Estados Unidos, a empresa

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conta com parcerias com servidores de internet (ISPs) em diversos países do mundo. Esses servidores de empresas parceiras são responsáveis por captar o conteúdo e fazer a transmissão de dados para os assinantes daquela região geográfica. Por exemplo, se você for assinante no Brasil, há uma empresa no país que é responsável por todo o tráfego de dados referentes ao site no país. Com essa política de parcerias ao redor do mundo, a Netflix barateia os custos de transmissão dos arquivos, diminui a interferência na transmissão do sinal e consegue manter a qualidade de reprodução dos seus filmes e séries.

O cérebro do sistema

De nada adiantaria a Netflix ter um grande centro de armazenamento e uma sólida rede de destruição se não houvesse um aplicativo que conseguisse ler o pedido do cliente e buscá-lo de forma correta nos servidores da empresa, não é mesmo? Para tornar toda essa transferência de conteúdo possível a empresa tem o seu próprio API. Esse aplicativo seria, digamos, o centro nervoso de todo o sistema da Netflix. Ele é o responsável por decodificar toda solicitação feita pelo usuário, seja por videogame, tablet ou televisor e buscar a informação do filme es-


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O API Java da Netflix consegue ler e codificar as solicitações dos usuários em diversos formatos, entre eles XML, REST, ATOM e RSS. Ele é o responsável por buscar a informação solicitada pelo assinante em seus dispositivos, seja ele TV, videogame ou tablet nos servidores da Netflix e transportá-los de forma correta para reprodução por meio do endereço HTTP, ou seja, é esse API que torna possível você assistir a mais de 100 mil títulos de filmes e seriados e acessar a sua conta Netflix. Ele tem a capacidade de ler as mais de 2 milhões de classificações de filmes em seu banco de dados e 2 milhões de arquivos de filme em um dia típico.

Reprodução

Os primeiros conteúdos

O clássico Intriga Internacional foi um dos primeiros filmes no acervo da Netflix

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colhido nos servidores da empresa e enviá-lo no formato correto para que aos assinantes possam assistir ao filme ou série escolhida no dispositivo correto.

Um dos diferenciais do serviço on-line e em streaming da Netflix em relação à sua concorrência é o vasto acervo de séries e filmes, inclusive com a produção de conteúdo original nos últimos anos. Mas nem sempre foi assim. Os primeiros assinantes do serviço em streaming tinham à disposição para assistir apenas mil títulos, muito pouco se comparado ao acervo de DVDs, que chegava a 90 mil. O principal fator que contribuía para a

quantidade restrita de opções passa pelo novo modelo de negociação entre distribuidoras, grandes estúdios e produtoras de filmes. Se no modelo de negociação para aquisição de conteúdo em DVD a única restrição que existia era respeitar o período de primeira janela, que significa a exibição dos filmes em cinemas (que era exclusivo dos grandes estúdios), agora a restrição de conteúdo partia também das distribuidoras. Por exemplo, no modelo de DVDs, após a primeira janela qualquer distribuidora ou locadora poderia adquirir o título que quisesse para comercialização. Agora no modelo de vídeo sob demanda, qualquer empresa de compartilhamento de conteúdo poderia comprar o direito de transmissão de determinado filme ou série com exclusividade, o que restringia o acesso da concorrência a determinados conteúdos. Uma das principais concorrentes, a HBO, havia adquirido o direto a distribuir grande parte do conteúdo da Warner Bros em seus canais de TV a cabo com exclusividade, limitando bastante o acesso

Saga de animação Toy Story fez parte do catálogo do site durante acordo com a Starz

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das demais empresas do setor, inclusive da Netflix, seja por TV ou on-line. Com algumas restrições na montagem de seus primeiros catálogos on-line, os primeiros vídeos à disposição dos assinantes se concentraram algumas produções da NBC/Universal, Sony Pictures, MGM, Paramount e algumas produções da Warner Bros. Entre os primeiros filmes lançados on-line pela Netflix estavam os clássicos Chinatown, Intriga Internacional, de Hitchcock, A Máquina de Fazer Biquínis e as comédias Loucademia de Polícia 7 e Pare! Senão Mamãe Atira. Segundo o vice-presidente sênior da NBC/Universal, em entrevista ao NY Times, em 2007, o acordo inicial com a Netflix para a distribuição on-line do acervo da empresa abrangeu cerca de 350 títulos, entre eles as séries clássicas Kojak, Columbo e as recentes produções The Office, Law & Order e filmes como O diário de motocicleta, que conta a história de Che Guevara pela América do Sul. Em setembro do mesmo ano a Netflix realizou uma extensão do contrato em vigor com a NBC/Universal para aumentar o número de títulos da produtora disponíveis para seus usuários. Segundo o site Hollywood Repórter, a Netflix pagou por esse novo acordo um valor estimado em US$ 300 milhões por ano, porém com um aumento significativo de oferta dos conteúdos da NBC. Entre os filmes adquiridos nesse novo contrato está, por exemplo, Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, com Jim Carrey. O acordo com a NBC/Universal também garantiu a disponibilidade de forma exclusiva aos seus assinantes de todos os episódios da série Heroes um dia após a exibição no horário nobre do canal de TV. Porém, para os demais conteúdos da rede de televisão, como Saturday Night Live, 30´ Rock ou qualquer outro seriado em exibição, a empresa só

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poderia disponibilizar as temporadas anteriores, ou seja, o conteúdo só chegaria ao usuário da Netflix com um ano de atraso em relação a sua exibição original, como Parenthood, Psych e The Event.

O caso Starz

O primeiro grande contrato de distribuição de conteúdo assinado pela Netflix foi com a empresa Starz, um canal a cabo via pay-per-view, e principal dono dos direitos de transmissão de conteúdo dos estúdios Sony e Walt Disney. O acordo assinando em outubro 2008 garantia o direito de transmitir, por meio de seu site, cerca de 2.500 títulos dos grandes estúdios e produções originais do canal por um período de quatro anos, pelo valor de US$ 30 milhões. Durante a vigência do contrato, a Starz se tornou a principal fornecedora de conteúdo para o acervo que a Netflix mantinha em seu site. Segundo dados do CNN Money, os filmes que eram propriedade da empresa foram responsáveis por manter 2% da base de assinantes on-line no site por grande período de tempo. Entre os principais conteúdos trazidos pela Starz para a Netflix estavam os filmes Scarface, Gangues de Nova York, Toy Story 3 e o clássico dos anos 80 Os aventureiros do Bairro Chinês. Em junho de 2011, houve a primeira crise entre a Netflix e seu principal parceiro comercial. A Sony retirou do ar todo o seu conteúdo disponível no site da Netflix, sob alegação que o contrato entre a Starz e a Netflix havia perdido a validade, pois segundo o estúdio, a empresa de Hastings havia estourado o limite de visualização acertado no contrato entre a Sony e a Starz. Em janeiro 2012 o acordo que a Netflix tinha com o canal Starz chegou ao fim e fez com que a empresa fosse obrigada a tirar de seu catálogo a todos os conteúdos que estavam sob licença do canal premium, o que totalizava cerca de mil

títulos. Um dos principais motivos para esse rompimento foi a questão financeira, já que a empresa detentora da licença de distribuição não estava contente com os valores que o contrato que lhe rendia e planejava conseguir arrecadar dez vezes mais da Netflix, que não concordou com as cifras pedidas, segundo o site “mediacorder.com”. Após o fim do contrato a Starz decidiu lançar seu próprio serviço de streaming.

Acordo bilionário com a Epix

Em setembro de 2010, já sabendo que o acordo com a Starz não seria renovado, a Netflix investiu aproximadamente US$ 1 bilhão para assinar um acordo de cinco anos com os principais estúdios norte-americanos como Lions Gate, Paramount e MGM. O acordo foi feito com a empresa Epix, que é uma empresa de distribuição em streaming de seus conteúdos e é principal detentora dos direitos de transmissão das produções dos três estúdios. A única restrição existente no acordo é que a Netflix só pode disponibilizar para seus assinantes os conteúdos adquiridos da Epix passados 90 dias da primeira exibição no canal concorrente. O diretor de conteúdo da Netflix enalteceu o acordo com a Epix em entrevista ao site Engadget. com, em 2010. “Adicionando Epix para a nossa crescente biblioteca de streaming de conteúdo, como o distribuidor exclusivo on-line desse conteúdo, marca o movimento contínuo da Netflix como um líder em entretenimento entregues através da web”, disse. O presidente da Epix, Mark Greenberg, acrescentou na mesma entrevista que a “Netflix é um serviço extremamente popular e temos o prazer de recebê-los como nosso novo parceiro de distribuição, e somos capazes de continuar a nossa missão de levar os consumidores os filmes onde eles querem vê-los, ao mesmo tempo satisfazer as diferen-


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Um novo nicho de mercado

Sucesso do universo Marvel, Homem de Ferro ficou em cartaz na Netflix durante o contrato com a Epix

tes necessidades de cabo, de telecomunicações e de satélite”. Com o acordo finalizado, a Netflix pôde incluir em seu catálogo filmes como “O Homem de Ferro” e “O Curioso Caso de Benjamim Button”, que foram sucesso e recorde de bilheteria na época. A Netflix aumentou sua biblioteca para 5 mil títulos disponíveis. O contrato com a Epix com duração até 2015 proporcionava a Hastings ter em seu catálogo filmes considerados lançamentos, pois segundo um dos termos do contrato, ele poderia disponibilizar o filme em sua plata-

forma apenas oito meses após o título sair do cinema e 90 dias após ser exibido na TV. Os principais filmes que essa parceria gerou para a Netflix foram O Lobo de Wall Street, Guerra Mundial Z, a trilogia Jogos Vorazes, O Poderoso Chefão, Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida, entre outros. Mesmo com o acordo firmado entre Epix e Netflix, os estúdios Lions Gate, Paramount e MGM continuavam a distribuir seus conteúdos em outras plataformas como o da própria Epix e de venda on-line por meio da Amazon e do iTunes.

Apesar de ser proveitosa, essa parceria acabou em 2015 e não teve o contrato renovado. Um dos motivos do rompimento foi o acordo de exclusividade com os estúdios Disney a partir de 2016, que vai trazer para o catálogo da Netflix todas as produções dos estúdios Disney, Pixar e Marvel, além da decisão da empresa investir pesado em produção de conteúdo próprio, para depender cada vez menos dos grandes estúdios e manter o seu diferencial perante a concorrência cada vez maior no setor de distribuição de conteúdo on-line em streaming.

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Novos títulos

A rápida expansão do acervo da Netflix

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Saiba O QUE a empresa FEZ para expandir rapidamente sua biblioteca de filmes e séries

A

Netflix é considerada pelo mercado e pelo público a principal empresa de distribuição de conteúdo on-line e em streaming. O que a tornou uma gigante no setor de entretenimento foi a reconhecida qualidade e a grande quantidade de filmes e séries oferecidos ao custo de um baixo valor de mensalidade, de US$ 7,99. Entre 2007 e 2013 a companhia investiu pesado na aquisição de títulos dos principais estúdios e produtoras de conteúdo dos Estados Unidos.

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O serviço que começou com um catálogo de mil títulos em 2007, chegou a 2014 com um acervo de aproximadamente 8.103 títulos diferentes, sendo divididos assim: 6.494 filmes comprados de terceiros e 1.609 seriados entre produções próprias e as adquiridas dos principais canais de televisão. Apesar de ter seu crescimento baseado no aumento da quantidade de títulos, a Netflix decidiu mudar sua estratégia global de conteúdos a partir de 2013, quando ao invés de renovar os contratos que

tinha com os estúdios e redes de TV, decidiu apostar na produção de conteúdo próprio. O reflexo disso é que a biblioteca de filmes e séries do site vem diminuindo, chegando a 2016 a com 4.555 filmes e 1.197 séries ou programas de TV.

Os principais contratos

Uma das estratégias da Netflix para expandir seu conteúdo em streaming foi concentrar suas decisões sobre negociações de títulos em sua sede em Beverly Hills, a terra do cinema.


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Novos títulos

O ator Vin Diesel na premiere do filme Velozes e Furiosos 6. Saga foi um dos principais títulos que a Starz trouxe para a Netflix

Mantendo sua divisão de conteúdo em Los Angeles a empresa conseguia ter fácil acesso aos estúdios e grandes produtoras, facilitando muito o contato e os acordos com as divisões comerciais dos estúdios. O primeiro grande contrato assinado foi com a Starz Entertainment LCC, subsidiária do canal a cabo em pay-per-view Starz e responsável por todo o licenciamento de conteúdo junto à Sony e à Disney, de quem era uma das principais parceiras. Esse contrato, com duração de quatro anos, rendeu à Netflix um acréscimo de 2.500 títulos em seu catálogo. Entre os principais filmes que a empresa conseguiu o direito de reprodução estão Karate Kid, a trilogia Velozes e Furiosos, Julie & Julia, Homem Aranha 3 e Onde os Fracos não Têm Vez, além do desenho UP, da Pixar. O acordo com a Starz foi, sem dúvida, muito vantajoso para a Netflix, pois com um investimento da ordem de US$ 30 milhões por ano a empresa

A Sony Pictures foi um dos primeiros estúdios a fazer parte do catálogo on-line da Netflix

teve acesso a dois dos principais estúdios de Hollywood e conseguiu o licenciamento das séries produzidas exclusivamente pelo canal de TV, que quando fez o acordo não enxergava a empresa de Hastings como um concorrente no setor do entretenimento, por isso aceitou um valor tão baixo. No final de 2008, o site da Netflix dispunha de 8 mil títulos em seu serviço de streaming, um crescimento de 800% em relação ao ano anterior. Entre os principais títulos disponíveis estavam: O Bom Alemão, O Dia dos Loucos, O Barco – Inferno no Mar, Anjos do Mal e o desenho A Marcha dos Pinguins. Em 2009 a Netflix continuou a expansão agressiva de seu catálogo adicionando mais 4 mil títulos por meio de diversos acordos com outras produtoras de conteúdo, batendo a marca de 12 mil títulos ao final do ano. O mais significativo deles foi com a MTV Networks, empresa responsável pela marca e por todos os programas exibidos no canal de televisão que leva o mesmo nome. O acordo inicial foi válido até 2011 e renovado por mais dois anos, até 2013, pelo valor de US$ 100 milhões anuais, uma amostra de que a aquisição de conteúdo já não era tão barata.

O acordo com a MTV trouxe ao acervo além do seriado South Park, 400 títulos do canal infantil Nickelodeon e mais 300 episódios dos desenhos ICarly, True Jackson e Bob Esponja, entre muitos outros, mostrando um foco cada vez maior da empresa no público infantil. Após o acordo chegar ao fim em 2013 Hastings decidiu que não iria renovar o contrato, pois queria apenas manter os termos que garantiam a exibição do canal Nickelodeon, importante manter a audiência infantil em seu site, porém não obteve sucesso. Para se ter uma ideia do quanto a construção de uma vasta biblioteca de conteúdo era importante para o novo modelo de negócios da Netflix, a empresa investiu em 2010 aproximadamente US$ 1,3 bilhões em acordos para aquisição de novos títulos para o seu acervo. O alvo da Netflix em 2011 foi fazer um acordo direto com os estúdios Disney para a aquisição de consagrados seriados de televisão. Para isso a empresa ofereceu US$ 200 milhões por um acordo válido por um ano. Dentro desse contrato, a empresa precisou gastar muito mais para adquirir as principais séries que estavam sob licença do estúdio. Por

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O acordo com a Nickelodeon foi uma aposta da Netflix para o público infantil

exemplo, foram gastos US$ 45 milhões para ter a licença sobre todas as temporadas da aclamada série Lost, além de outros US$ 26 milhões para a série Scrubs e outros US$ 12 milhões para Desperate Housewives. Entre os anos de 2012 e 2014, a Netflix teve um crescimento de 86% no número de títulos disponíveis para seus usuários, uma amostra de quão rápida a empresa estava adquirindo filmes e séries dos mais diversos estúdios e canais de televisão para popularizar ainda mais seu serviço de streaming em todo o mundo. Só no Brasil, em 2014, a empresa contava com um catálogo 2.805 títulos, sendo 248 exclusivos. O país ocupava o terceiro lugar no ranking de títulos à disposição na Netflix, ficando atrás somente dos Estados Unidos e do México, se mostrando um mercado promissor para o serviço

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de reprodução de conteúdo on-line e em streaming. O ano de 2013 marcou a ruptura do modelo de investimentos da empresa na aquisição de conteúdo. Segundo a emissora CNN informou em seu site CNN Money, naquele ano a empresa perdeu mais de 1.800 títulos com o final do contrato com os estúdios Universal, MGM e com os canais de televisão Starz e MTV. Diante desse cenário, a empresa decidiu não renovar os acordos que tinha com seus principais parceiros e apostar na criação de conteúdo original e em acordos que privilegiassem a produção de conteúdo exclusivo aos seus assinantes.

As dificuldades do mercado

Até a metade de 2012 a Netflix conseguiu manter lucrativos contratos de licenciamento de filmes e séries

com os estúdios para sua plataforma de conteúdo on-line, entretanto a partir daquele ano essa realidade começou a mudar. Até então os grandes estúdios, produtoras e redes de televisão enxergavam a Netflix como um parceiro de negócios, além de uma oportunidade de popularizar seus títulos junto à crescente audiência da internet, e não como uma ameaça. Por conta disso realizavam acordos de licenciamento de seus acervos por um preço muito baixo para os padrões da indústria do entretenimento. Porém, essa percepção começou a mudar. Os problemas da Netflix para ampliar ou manter seu catálogo de filmes ou séries começaram ainda em 2011 quando a Sony, alegando que a empresa havia extrapolado o limite de visualização de conteúdo estipulado no acordo entre ela e a Starz, reti-


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A Paramount foi um dos estúdios que romperam com a Netflix em 2012

Não foi só a Starz que dificultou a vida de Hastings. Durante as negociações para permanecer com os títulos que estavam sob responsabilidade da Epix, a Netflix enfrentou a concorrência do serviço de streaming Hulu, que aceitou pagar os US$ 200 milhões pedidos pela empresa e adquiriu, de forma exclusiva, todo o conteúdo que ela disponibilizava para os assinantes da Netflix.

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rou todo seu conteúdo da plataforma on-line. Ente os filmes que saíram de cartaz estavam Salt e A Rede Social, filme que conta a história de Mark Zuckerberg, dono do Facebook. Menos de seis meses depois, os contratos que a Netflix tinha em vigência com os grandes estúdios, por meio da Starz e da Epix, donas do licenciamento para distribuição de conteúdo para TV e Web desses estúdios, expirou. Essas empresas tinham sob contrato diversos títulos de estúdios como Sony, MGM, Lions Gate e Paramount. Um exemplo das dificuldades encontradas para a renovação dos contratos foi a arrastada negociação entre a empresa de Hastings e a Starz. O canal de televisão pedia aproximadamente US$ 300 milhões por ano para renovar o contrato, pois considerava o acordo anterior muito baixo para a relevância que seu conteúdo representava para a biblioteca da Netflix. Após meses de negociações as empresas não entraram em acordo e a Netflix teve que tirar todo o conteúdo que tinha dos estúdios Sony e Disney de seu site. Foi um claro sinal que a fase gastar pouco para construir e manter seu acervo havia acabado.

Além das dificuldades impostas pelas distribuidoras dos conteúdos no momento de negociar a renovação dos contratos a empresa, ela também começou a sofrer com as barreira colocadas pelos próprios estúdios de Hollywood. Cientes de que a Netflix já começava a absorver parte de seu público consumidor, eles pediam valores cada vez maiores para liberar a cessão de seus conteúdos, pois na visão deles, os valores que recebiam nas negociações anteriores de contrato não supriam as quantias investidas na produção e divulgação de cada um dos filmes que a empresa de Hastings adquiria. Mas não foi só isso: os estúdios e produtoras dificultavam ao máximo a venda dos direitos de reprodução de conteúdo via internet para a empresa de Hastings porque planejavam ter, em um futuro próximo, seus próprios portais de distribuição de conteúdo para poderem eles próprios atingir cada vez mais o público da internet, que era vital para manter seus negócios. A Netflix começou a enfrentar também a concorrência de outras de empresas que ofereciam o serviço de conteúdo on-line e que disputavam os mesmos assinantes e ago-

A Hulu é a principal concorrente da Netflix no setor de streaming

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reprodução em streaming da Amazon também tinham contratos com os mesmos estúdios e produtoras que companhia de Hastings e, portanto, conteúdo similar em suas bibliotecas. Hastings, então, preferiu investir na produção de conteúdo próprio e exclusivo para manter seu diferencial perante as demais empresas do mercado. Agora que já contava com uma base de assinantes sólida e que crescia a cada ano, Hastings apostou em um primeiro momento em acordos que trouxessem conteúdo diferenciado para a plataforma. O primeiro acordo sob a nova diretriz foi com os estúdios de desenho animado Dreamworks. O contrato no valor de US$ 30 milhões permitiu à Netflix incorporar ao seu catálogo destinado ao público infantil as animações Kung Fu Panda, Madagascar, Gasparzinho e He-Man. Porém a grande sacada do negócio envolvendo as duas empresas foi um acordo uma parceria para produção

Além de ver a diminuição de conteúdo, ele decidiu desmembrar os planos de assinatura de seu serviço. Entre 2007 e 2011 os assinantes pagavam U$$ 7,99 para ter acesso a opção de ver o filme on-line ou receber uma cópia de DVD em casa. Agora com a alteração feita pela Netflix, por US$ 10,99 o usuário só poderia ver filmes direto do site. Se quisesse ter a opção de receber o DVD, teria que assinar o plano completo que custava US$ 17,99 por mês. Nem é preciso dizer que não funcionou e a empresa, seis meses depois, teve que voltar atrás na alteração dos planos.

Mudança de paradigma

A partir de 2013 a Netflix decidiu seguir um caminho diferente na construção do acervo de filmes e séries que colocava à disposição de seus assinantes. Se nos primeiros seis anos de existência do modelo de streaming a estratégia era adquirir o máximo de conteúdo possível, agora a ideia era investir cada vez mais na diferenciação e na exclusividade de seu acervo. A mudança de paradigma tem relação direta com dois cenários do mercado do entretenimento. O primeiro tem a ver com a relação da empresa com os estúdios e canais de televisão, que decidiram endurecer as negociações de renovação dos contratos que tinham em vigência com a Netflix, pois perceberam que ela não era apenas uma empresa de distribuição de conteúdo on-line, mas sim uma concorrente dentro do mercado de entretenimento e, por isso, os produtores de conteúdo pediram cifras elevadas para licenciar suas produções. O outro fator primordial está relacionado à concorrência de outras empresas de distribuição de conteúdo em streaming. Se em 2007 a Netflix era pioneira nesse ramo, agora já havia outras duas grandes empresas brigando pelos mesmos assinantes. A Hulu e a divisão de

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ra os mesmos títulos que ela tinha em seu vasto catálogo. A entrada do Hulu e do seu serviço de streaming nas negociações para licenciamento de conteúdo contribuiu para inflacionar os valores de cada negociação que a empresa de Hastings estava presente, além de aumentar poder de barganha dos estúdios, que viram a oportunidade perfeita para arrecadar quantias estratosféricas pela cessão parcial ou exclusiva de seus títulos. A concorrência de outras empresas do mesmo setor também ajudou a diminuir o poder de barganha da empresa junto aos produtores de conteúdo, pois agora não era a única empresa a se dedicar ao streaming. Nessa mesma época, no final de 2011, os estúdios também estudavam uma nova forma de negociar o licenciamento de distribuição de seus conteúdos. Para eles já não era mais tão vantajoso, mesmo com a subida das cifras postas à mesa durante as negociações, vender seus títulos em forma de lote ou a granel. Eles queriam que um novo modelo de licença fosse feito com um preço base estipulado por título, que poderia variar de acordo com o interesse do público em determinado filme ou série. O fato de não ter mais tanta facilidade de negociação e a perda de conteúdo para os rivais como para o Hulu e para a Amazon, fez com que a empresa começasse a sofrer com reclamações e com a queda expressiva do número de assinantes, um reflexo da diminuição de seu catálogo. Em 2011 a empresa registou uma saída de 800 mil assinantes em sua base de dados, muitos deles foram atraídos pelos títulos disponíveis que eram da Netflix e migraram para a concorrência. Foi nesse momento que Hastings decidiu mudar radicalmente a estratégia de aquisição de conteúdo da empresa. A primeira tentativa de mudança feita por Hastings não deu muito resultado e causou impacto negativo entre os assinantes.

A atriz Krysten Ritter dá vida à famosa heroína Jessica Jones, do Universo Marvel


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A Dreamworks, dona dos direitos do Shrek, é a principal parceira da Netflix para conteúdo infantil

conjunta de conteúdo exclusivo para os assinantes da Netflix. O contrato tem validade até 2018 e permite à empresa de Hastings exibir até 1.200 episódios das séries que serão feitas sob medida pela Dreamworks para a sua plataforma. As primeiras produções entre as empresas entraram em cartaz no site ainda em 2014 e, até o momento, renderam três longas de animação: Turbo, The Croods e Peabody & Sherman. A Netflix continuou sua aposta no crescimento do catálogo para o público infantil e no mesmo ano fechou um acordo de coprodução com a Marvel Entertainment, detentora dos direitos de parte dos personagens do vasto universo da Marvel TV.

Além de adquirir alguns desenhos do universo dos super-heróis, ficou acordado a uma parceira para produção que cinco seriados exclusivos até 2018. As primeiras produções do estúdio para o público da Netflix chegaram aos assinantes em 2015 e conquistaram o público. Os primeiros heróis a terem sua versão para a plataforma on-line foram O Demolidor e Jessica Jones. Nos planos da parceira ainda faltam estrear as séries sobre Luke Cage e Punhos de Ferro. Após o lançamento das quatro séries independentes haverá ainda um seriado reunindo os quatro super-heróis que deve se chamar Os Defensores, que será uma versão de Os Vingadores para os assinantes da Netflix.

Sobre esse acordo de produção conjunta, o presidente da Marvel Entertainment, Alan Fine disse em comunicado oficial à imprensa em 2013: “Este acordo é incomparável em seu escopo e tamanho, e reforça o nosso compromisso de entrega de marca, conteúdo e personagens da Marvel em todas as plataformas de contar histórias. A Netflix oferece uma plataforma incrível para o tipo de narrativa rica, que é a especialidade da Marvel”. A estratégia da Netflix de realizar contratos extensos e de exclusividade com os estúdios e produtores de animação ainda não estava terminada. Logo após selar a parceria com a Marvel e a Dreamworks, Ted Sarandos, diretor de conteúdo da empresa, sentou-se à mesa com o conglomerado Walt Disney e fechou um acordo para ter acesso exclusivo a todo o conteúdo produzido pela Disney e suas subsidiárias. Nos primeiros três anos desse contrato a Netflix continuaria com o conteúdo que já tem em sua biblioteca e a respeitar o período de carência de nove meses entre a chegada do filme no cinema e a sua disponibilidade para os assinantes do serviço de streaming. A grande vantagem para a Netflix é que o contrato assinado em 2013 com o grupo Disney dá à empresa acesso exclusivo a todo o conteúdo do conglomerado a partir de 2016, quando termina o contrato entre o estúdio e o Starz Entertainment, atual detentora do licenciamento para reprodução do conteúdo em ambiente on-line. Além do conteúdo dos estúdios Disney, a empresa terá sob contrato os filmes produzidos pela Pixar, Marvel e LucasFilm, a mais recente incorporação do grupo e responsável pelos direitos de todos os filmes da saga Star Wars. O acordo é válido para a licença de reprodução do conteúdo em streaming e não vale a comercialização dos títulos em DVDs e blu-ray.

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Nasce uma nova Netflix

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Empresa troca a aquisição de filme pela produção de conteúdo próprio

O

ano de 2012 marcou uma radical mudança cultural no modelo de negócios da Netflix. Agora, além de apostar em acordos que rendessem conteúdos exclusivos para seus assinantes, a empresa decidiu investir pesado na produção de conteúdo próprio, como forma de se diferenciar da concorrência que era cada vez maior e se fixar como uma produtora inde-

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pendente de conteúdos de qualidade. Procurando se afastar dos modelos adotados pelo Hulu, Amazon e o novo serviço de streaming da Starz, similares ao seu, a empresa apostou em títulos próprios e se aproximou de outro grande player do mercado de entretenimento, a HBO, criadora da série Game of Thrones. O diferencial entre as duas era somente o canal de distribuição, uma na TV a cabo e outra on-line.

A empresa de Hastings não inovou somente ao adotar a estratégia de produzir o conteúdo que levaria aos seus assinantes, ela revolucionou a produção de séries para a televisão. Até a Netflix entrar nesse ramo, os estúdios controlavam todos os passos da produção de uma série, desde a criação até a edição final dos episódios. A Netflix adotou uma fórmula diferente. Após aprovar o roteiro e o orçamento


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O elenco de Orange Is the New Black no PaleyFest, em 2013

de uma produção, a empresa dava total liberdade para o diretor escolher os seus personagens e conduzir a história como bem entendesse, ou seja, liberdade total para criar. Não foi só na forma de produção das séries que a Netflix mudou o setor do entretimento. A principal característica dos seriados exibidos pelas TVs até então era disponibilizar, em horário nobre, um capítulo por semana, fazendo com que o telespectador acompanhasse o desenrolar de sua história favorita por três ou quatro meses durante o ano. A empresa de Hastings apostou em um modelo diferente, pois disponibilizava toda a temporada de uma vez só, deixando para o usuário do site a liberdade de escolher quantos episódios quisesse assistir, se veria a temporada de uma vez só ou rever os episódios de que mais gostasse quantas vezes e na hora que quisesse.

Conteúdo próprio

Poderíamos enumerar diversos fatores que levaram a Netflix a começar a produzir conteúdo original para oferecer para seus assinantes, como querer se diferenciar da concorrência, criar e fortalecer uma identida-

de própria ou mesmo ter mais independência em relação aos grandes estúdios de Hollywood e produtoras. Porém, houve dois principais fatores que motivaram a mudança estratégica da Netflix: o alto custo de licenciamento de conteúdos e a preocupação em reter sua base de assinantes. O alto valor cobrado pelas detentoras do direito de transmissão de conteúdos como a Starz, Epix e os grandes estúdios fez com que a Netflix desistisse de investir milhões de dólares na aquisição de um filme ou série que suas concorrentes também teriam e optasse por destinar esse valor à produção de conteúdo próprio, pois assim poderia se diferenciar das empresas concorrentes e definir a qualidade do produtor oferecido. Essa atitude tem relação direta com a preocupação da empresa com a perda de clientes. Como não aceitou renovar os contratos que tinha de licenciamento, sua biblioteca diminuiu consideravelmente de tamanho – aproximadamente 2 mil títulos – e gerou reclamação dos assinantes, que já não viam vantagem em pagar um valor de US$ 10,99 para ter acesso a um conteúdo reduzido e que poderiam ter acesso em outros sites.

Foi então que a Netflix investiu pesado nas produções originais, porque agora ela poderia mostrar para o usuário que continuasse fiel ao seu serviço de streaming, que ele teria acesso a uma produção com qualidade superior que não veria em nenhuma outra empresa do mesmo ramo. Como disse Ted Sarandos, diretor de conteúdo da empresa, em entrevista à agência Reuters, a ideia era que a Netflix se transformasse em uma HBO, antes que a HBO se transformasse em uma Netflix. Com certeza a ideia que permeava essa mudança era se preservar no setor de streaming antes que as grandes empresas de mídia resolvessem migrar todo o seu conteúdo para a mesma plataforma e ameaçar a liderança que a empresa de Hastings no setor. Para se ter uma ideia da diferença entre a aquisição de uma licença de distribuição de conteúdo e a produção de um seriado próprio refletiram no caixa da Netflix, vale fazer a comparação. Em 2012 a empresa havia gasto, segundo estimativa da Reuters, aproximadamente US$ 1,3 bilhão para compra dos direitos de transmissão on-line, e a expectativa é que esses valores não parariam de crescer, visto que cada vez mais apareciam novas empresas dispostas adquirir essas licenças. Para produzir uma temporada de House of Cards a empresa investiu aproximadamente US$ 60 milhões, de acordo com números publicados pela revista Variety. Com o valor gasto na aquisição de licenças, a Netflix era capaz de produzir, por ano, 20 novas séries com 13 episódios. A primeira experiência da empresa na produção de conteúdo próprio foi através do resgate da série Arrested Development, produzida pela FOX entre os anos de 2003 e 2006 e que não teve vida longa. A Netflix havia se comprometido apenas a fazer uma temporada e iria estudar de fazer outras, mas sem garantias, já que não era detentora dos direitos da primeira versão da série e encontrava dificuldades para reunir o elenco original, pois

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A atriz Jessica Walter, que interpretou Lucille Bluth, na premiere de Arrested Development, primeira produção original da Netflix

os atores já estavam comprometidos com outros trabalhos. No final de 2011, a empresa lançou duas temporadas de Lilyhammer e a quarta temporada de Arrested Development – a primeira sob sua propriedade. Apesar dessas primeiras experiências, a Netflix demorou um pouco para produzir séries que, além de serem aprovados pela crítica, fosses sucesso de público entre seus assinantes. Entre as produções que conseguiram destaque e receberam indicações aos primeiros prêmios do setor do entretenimento estão: House of Cards, Orange Is the New Black, Better Call Saul, Narcos, Jessica Jones, O Demolidor e o documentário sobre a cantora Nina Simone, um ícone da resistência negra nos Estados Unidos.

Investimento pesado

Quando a Netflix decidiu que iria percorrer o caminho da produção de conteúdo próprio para seus assinantes, ela mostrou que não estava de brincadeira. Mesmo contrariando os mais céticos e os analistas do mercado financeiro, que questionavam se a empresa teria folego financeiro sufi-

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Ambientada na China do século 13, Marco Polo retrata os conflitos durante as expedições do italiano

ciente para sustentar essa aventura, a empresa investiu US$ 1 bilhão na aquisição de direitos e produção e roteiros das primeiras temporadas de Arrested Development, Lilyhammer, House Of Cards e Orange Is a New Black, entre outras. A principal preocupação dos céticos, dos acionistas e do mercado financeiro, era que para sustentar tamanho investimento a longo prazo, a Netflix teria que aumentar consideravelmente o valor de seu plano de assinaturas mensal ou expandir rapidamente sua base de assinantes em curto prazo para cobrir esse novo investimento. Podemos ver que após três anos, a nova iniciativa deu resultado e a serviço em streaming criado por Hastings não para de expandir sua base de assinantes por quase todo o mundo. Muito desse crescimento tem relação com a vontade do público em assistir as séries produzidas com exclusividade pela empresa e que tem a qualidade reconhecida. Outro fator que inspirou a empresa a produzir seu próprio conteúdo foi a qualidade dos filmes e séries à disposição no mercado. Segundo contou Erik Barmack, um dos principais executivos da Netflix, entrevista recente à revista Forbes, uma

das razões por trás da nova investida da companhia é a pouca oferta de conteúdo de qualidade. “A origem da iniciativa de ter conteúdo original foi que descobrimos que o público adorava os produtos Premium da TV a cabo, como as séries Lost e Breaking Bad, por exemplo, mas não achávamos conteúdo similar em quantidade suficiente”, disse. Baseado em cálculos do mercado financeiro estima-se que a primeira temporada de House of Cards tenha custado à Netflix um valor superior a US$ 60 milhões, o que daria um valor próximo aos US$ 4,5 milhões por episódio. Já outra produção, a famosa Orange Is the New Black teve o valor de cada episódio estipulado em US$ 4 milhões, o que daria uma soma total de US$ 52 milhões gastos para produzi-la. Muito abaixo do valor gasto para a compra de conteúdo dos grandes estúdios e canais de TV. Porém a série que a Netflix mais investiu e que até agora não decolou foi Marco Polo, que teve a sua primeira temporada orçada na casa dos US$ 90 milhões, o que daria um valor de US$ 9 milhões por episódios. Em comparação, ela custou o dobro do valor por episódio de House of Cards e não teve a metade do sucesso.


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Ted Sarandos, responsável pelo acervo da Netflix, defende que é importante considerar a qualidade das produções

O gasto da empresa em produção de conteúdo não fica restrito ao universo dos seriados. A empresa investiu, em 2013, mais de US$ 12 milhões para adquirir os direitos de produzir o filme Beasts of no Nation de Cary Fukunaga. Nem é preciso dizer que o investimento valeu a pena, pois o filme estrelado por Idris Elba foi um sucesso inclusive fora do ambiente de streaming on-line, já que o filme concorreu a diversas premiação e Elba ganhou, no início de 2016, o prêmio de melhor ator, segundo a Associação dos Críticos de Arte. A empresa investiu US$ 150 milhões na produção conteúdo original em 2013, ficando dentro da previsão de gastar no máximo 10% de sua receita com novas produções. Em 2014, o orçamento previa um investimento na casa dos US$ 300 milhões para dar continuidade à produção de novas temporadas de suas três principais séries, além de investir na produção de novos títulos para o catálogo. Naquele ano a Netflix lançou série Hemlock Grove, os desenhos feitos em parceria com a Disney e as primeira temporada de O Demolidor, feita em parceria com a Marvel TV. Segundo previsões feitas sem seu relatório anual de 2015, a Netflix

pretende investir aproximadamente US$ 6 bilhões em 2016 na produção de conteúdo original, incluindo novas temporadas das séries já existentes, filmes, documentários e desenhos para o público infantil. O valor é, por exemplo, seis vezes mais do que a HBO separou em seu orçamento para a produção de novos conteúdos para o mesmo período. Dentro desse orçamento de US$ 6 bilhões, estão inclusos, além de novas temporadas das séries já em catálogo, a adição de mais 31 títulos entre séries, filmes, desenhos e documentários. Para os próximos anos, a empresa já tem preparado o lançamento de 10 filmes, 30 programas infantis, 12 documentários e 10 especiais de comédia stand-up, o dobro do que foi produzido em 2015. Para Ted Sarandos, a questão das novas produções vai além da quantidade de títulos que será incluída no acervo on-line da empresa. “Não é apenas um grande volume. Isso é coisa de qualidade”, explicou em conferência aos sócios da Netflix no final de 2015. Apesar de procurar diversificar cada vez mais as opções de conteúdo à disposição de seus assinantes, o foco da empresa se manterá em produzir o máximo de novas séries possíveis, já que o formato parece promissor e tem agradado os usuários da Netflix no mundo. Um exemplo de que a Netflix caminha na direção certa e que vai continuar investindo fortemente na produção de conteúdo original veio da avaliação feita por Sarandos em evento para os investidores da Netflix. “O entusiasmo global pela terceira temporada de Orange Is the New Black mostra a nossa habilidade em criar franquias que atraem novos membros para a Netflix, assim como encanta os atuais. Cerca de 90% dos assinantes já assistiram ao conteúdo original do serviço, um indicativo de que estamos no caminho certo”, disse. Um dos reflexos do maior investimento da Netflix na produção de

conteúdos exclusivos e/ou originais está na nova configuração de sua biblioteca de títulos. Enquanto o catálogo norte-americano da Netflix diminuiu em aproximadamente 31% nos últimos dois anos, o serviço de streaming aumentou a sua produção de conteúdo original em média de 185% ao ano entre 2012 e 2015.

Mercados internacionais

A produção de conteúdo próprio da Netflix não tem se restringido apenas ao território norte-americano. Na busca para conseguir agregar cada vez mais assinantes ao seu serviço e de olho em agradar sua audiência global, a empresa tem apostado cada vez mais em produções internacionais, como os as coproduções Club de Cuervos (México), Suburra (Itália), The Crown (Reino Unido), Marseille (França), Dark (Alemanha) e 3%, o primeiro seriado 100% brasileiro produzido pela empresa. Além da série de ficção científica, a Netflix estuda produzir para o próximo ano (2017) uma série baseada na Operação Lava Jato, que apura os casos de corrupção na Petrobras e que será dirigida por José Padilha, conhecido pelos filmes Tropa de Elite I e II, Ensaio sobre a Cegueira e Narcos. Em entrevista à rede norte-americana CNBC, Hastings disse que o futuro das coproduções e produções originais da Netflix caminha para uma produção local nos países onde o serviço está e a sua distribuição global por meio de sua plataforma on-line, como a série sul-coreana Okja. “Nós estamos apenas adicionando conteúdo em todo o mundo... esperamos produzir conteúdo em todo o mundo. Esse é o futuro para a Netflix: a produção local, distribuição global”, afirmou. Dos quase US$ 6 bilhões que a empresa estima gastar com produção de conteúdo exclusivo para a sua biblioteca, cerca de US$ 1,2 bilhão devem ser destinados a produções realizadas no continente europeu, como Espanha, França, Itália, Reino Unido, entre outros países.

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Gerard Depardieu é o responsável por popularizar a Netflix na França

Umas das principais razões para a Netflix investir na produção de conteúdos locais, respeitando os idiomas de origem das produções, é a manutenção da sua base de assinantes nessas regiões. É uma forma de expandir o conteúdo, de modo a agradar a audiência e produzir conteúdo com temas que causem empatia nos assinantes fora dos Estados Unidos. É também uma forma de contornar as restrições geográficas impostas pela própria plataforma da Netflix e manter uma biblioteca recheada, independente da região do globo onde o site for acessado. A preocupação em produzir conteúdo locais de qualidade fica evidente na escolha dos diretores e dos atores que vão dar vida a essas séries. A francesa Marseille, por exemplo, tem como seu ator principal Gerard Depardieu, figura icônica do cinema francês. A produção alemã Dark, que deve estrear na Netflix ainda em 2016 e que conta a saga de quatro famílias no interior do país, terá entre os produtores Quirin Berg e Max Wiedemann, vencedores do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2007 com o aclamado filme A Vida do Outro. Não são só a Europa e a Ásia que têm recebido atenção especial da Netflix com a produção de conteúdos locais. A América Latina também

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tem seu espaço cativo dentro dos planos de Hastings e Sarandos. Um dos seriados mais visualizados do site é a série Narcos, que conta a vida – e talvez até a morte – do famoso narcotraficante colombiano Pablo Escobar. O respeito à região foi tanto que as cenas foram gravadas na própria Colômbia e contou com atores sul-americanos em seu elenco, como o brasileiro Wagner Moura. A América Latina está tão em alta com os executivos da Netflix que além do sucesso do seu primeiro seriado mexicano El Club de Cuervos, a primeira produção totalmente falada em espanhol, a empresa investe pesado no mercado brasileiro. Antes de escolher qual série produzir para o público do nosso país, a empresa bancou uma pesquisa e identificou que os brasileiros gostavam mais de ficção científica. Foi quando a empresa de Hastings decidiu apostar no projeto da Maria Bonita Filmes, que estava procurando empresas para financiar a sua séria chamada 3%. O elenco contará com os atores globais Bianca Comparato e João Miguel. A produção será dirigida por Cesar Charlone, diretor uruguaio que já trabalhou como diretor de fotografia nos filmes Cidade de Deus, Ensaio Sobre a Cegueira e o Jardineiro Fiel.

Séries premiadas

O sucesso das produções originais da Netflix não reflete apenas no aumento de assinantes globais que empresa vem conquistando ou no número de visualizações que essas produções conseguem no site. Desde que foram ao ar, as séries, documentários e mais recentemente os filmes têm caído também no gosto da crítica especializada. Nos últimos três anos a empresa de Hastings conseguiu mais de 200 nomeações entre as principais premiações do setor do entretenimento. No BAFTA, a principal premiação do Reino Unidos, a Netflix já obteve seis indicações para suas obras, desde as séries como House of Cards e Narcos, até o seu primeiro filme, Beasts of No Nation. Porém, até agora não conseguiu levar nenhum prêmio em território inglês. A premiação em que a Netflix teve mais sucesso até agora foi no Emmy, uma espécie de Oscar da televisão nos Estados Unidos, realizado pela Academia de Televisão e Artes Cênicas do país. Até 2015, a empresa já havia conseguido levar 15 prêmios nas principais categorias, com destaque, novamente, para House of Cards, que levou os prêmios de melhor diretor e melhor série dramática (2013), melhor mixagem de som (2014). Esse ano quem ganhou foi Viola Davis, como melhor atriz em


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Kevin Spacey levou o prêmio de melhor ator em série dramática por sua atuação em House Of Cards

série dramática pela nova How to Get Away With Murder. No Globo de Ouro, considerado uma prévia do Oscar, Robin Wright e Kevin Spacey, que interpretam o casal Claire e Francis Underwood, foram premiados como melhores atores de série dramática em 2014 por sua atuação em House of Cards. Spacey ainda conquistou o prêmio novamente em 2016, dessa vez como ator principal. A série Orange Is the New Black também tem feito bastante sucesso entre os críticos especializados. Em 2014, ano de sua primeira temporada, ganhou os prêmios de melhor série de comédia e de melhor atriz coadjuvante, vencido por Uzo Aduba (Suzanne “Crazy Eyes”). O sucesso continuou e, no ano passado, a série repetiu o prêmio de melhor atriz coadjuvante, agora com Lorraine Toussaint (Vee). Sem dúvida, as séries produzidas pela Netflix têm conseguido ano após ano o reconhecimento das principais associações de ator e produtores do setor do entretenimento mundo afora. Porém, foi o primeiro filme da empresa que balançou de vez a estrutura das premiações do setor do entretenimento. Lançado em 2015, Beasts of No Nation causou um enorme impacto

na mídia e nas principais associações de produtores norte-americanos. Não só por retratar a realidade brutal das guerras entre exércitos clandestinos que acontecem na África, mas também por sido lançado de forma não muito convencional. A Netflix fez o lançamento do filme em um formato multiplataforma. Hastings disponibilizou o filme ao mesmo tempo para os assinantes do serviço de streaming do site e em alguns cinemas estadunidenses e ingleses da rede Landmark, a única a apoiá-lo. Por adotar uma prática diferente da usual, foi acusado pelos grandes estúdios de querer acabar com o cinema, como já havia sido acusado de acabar com o mercado de DVDs. Com toda a polêmica em torno do filme, a produção foi proibida de concorrer ao Oscar, principal premiação do setor. Apesar de todo o boicote, o filme conseguiu levantar uma estatueta: Idris Elba foi eleito o melhor ator coadjuvante na premiação do SAG Awards, prêmio dado pelo sindicato dos atores dos Estados Unidos.

Curiosidades

A série traz algumas curiosidades, já que a maioria dos fatos atribuídos a Pablo Escobar aconteceu de verdade. A explosão do Ministério da Justiça, a construção da própria penitenciária nos arredores de Medelín, a negociação com o grupo revolucionário e a construção de um zoológico particular na Hacienda Nápoles são verídicos. Apesar do filme se passar na América Latina, o idioma mais falado durante a série é o inglês. Em 60% do tempo os diálogos são feitos em língua inglesa. Em outros 40%, em língua espanhola. A música de abertura, chamada Tuyo, é cantada pelo vocalista da banda brasileira dos Los Hermanos, Rodrigo Amarante. A personagem Valeria Velez, jornalista interpretada por Stephanie Sigman, na vida real se chama Virginia Vallejo, e foi uma das mais influentes apresentadoras locais. Hoje, aos 65

anos, a ex-repórter mora em Miami. O nome da personagem foi trocado porque a produção temia enfrentar problemas judiciais se colocasse o nome real. Ela não foi só amante de Pablo Escobar, como também escreveu uma biografia sobre o relacionamento de ambos, chamada “Amando a Pablo, odiando a Escobar”, sem tradução em português. O primo e braço direito de Escobar na série, Gustavo Gavíria, é vivido pelo ator colombiano Juan Pablo Raba. A curiosidade? Um dos tios de Raba estava entre os passageiros do voo 203 da Avianca, que Escobar explodiu em 1989 na tentativa de matar o então presidente da Colômbia, César Gavíria. Apesar da reclamação dos brasileiros quanto ao sotaque de Wagner Moura, o ator, que não falava espanhol, se esforçou para dar vida a Pablo Escobar. Além de se matricular em um curso particular para aprender o idioma, ele morou seis meses na Colômbia para aprimorar o sotaque da região. Ele também engordou 20 quilos para viver o personagem. No auge de seu império, Pablo Escobar chegou a ter sob seu domínio 80% de todo o mercado de cocaína dos Estados Unidos e sua fortuna era estimada em US$ 3 bilhões. Na época, foi considerado o traficante mais rico do mundo. A segunda temporada tem previsão de ficar à disposição dos assinantes da Netflix somente em agosto de 2016. Segundo entrevistas dos produtores da série, não há garantias que o personagem de Wagner Moura faça parte da terceira temporada, já encomendada pela Netflix. A produção de Narcos vem encontrando dificuldades para filmar a cena chave da segunda temporada e da vida de Pablo Escobar. Segundo entrevistas do diretor, a casa onde Pablo foi morto em confronto contra os milicianos não está disponível para filmagens. O atual proprietário do terreno, além de não desejar equipes de filmagem no local, não quer que a propriedade volte a ser ligada à figura do traficante.

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Conteúdo original Conheça as principais produções originais da Netflix

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House Of Cards (2013)

A atriz Robin Wright, vencedora do Globo de Ouro em 2014, no lançamento da 2ª temporada de House of Cards

O seriado de maior sucesso da Netflix, estrelado por Kevin Spacey e que já tem sua quinta temporada garantida, mostra as artimanhas e negociatas de Frank Underwood, um político sem escrúpulos que faz tudo o que estiver ao seu alcance para conseguir cada vez mais poder dentro da estrutura política norte-americana. A série é ambientada dentro dos corredores da Câmara, Senado e da Casa Branca. Através das atitudes e das interações de Spacey com os deputados,

lobistas e com o telespectador, tomamos conhecimento de como funciona o mundo nada perfeito das esferas de poder dentro dos Estados Unidos. As primeiras temporadas do seriado mostram como Underwood usa de métodos nada convencionais e muito menos éticos para subir da hierárquica de poder. A trajetória começa com ele sendo deputado líder da maioria do congresso, mas infeliz com o papel que lhe cabe dentro do processo de decisões do país. Por isso, ele busca todas as formas para conseguir ter o máximo de poder possível dentro da nação mais influente do mundo. Apesar da série ser considerada um conteúdo original da Netflix, o enredo não é tão novo assim. A versão de House of Cards da Netflix é baseada no roteiro de um seriado inglês que foi ao ar nos anos 90 e tem o mesmo nome. A versão inglesa e original da série, que teve apenas quatro episódios, é ambientada no parlamento inglês durante o governo da presidente Margareth Thatcher, na década de 80. A empresa de Hastings fez uma releitura mais atual e adaptou o roteiro para cenário político dos Estados Unidos nos tempos atuais. O maior diferencial de House Of Cards em relação às demais séries está no formato. Ela é a

primeira produção a quebrar o conceito chamado de quarta parede. Na forma utilizada pela Netflix para contar a história, o ator não fica restrito a interação só com os personagens e objetos em cena, ele interage diretamente com o espectador. É comum ver Underwood explicando para quem está assistindo o que está acontecendo, definindo as características de outros personagens ou contando qual estratégia irá usar para resolver um conflito. A série foi o primeiro produto distribuído em plataforma on-line a ganhar um prêmio da indústria do entretimento. Em 2013, conquistou o Emmy de melhor elenco, melhor fotografia e melhor série dramática. A realidade com que a política norte-americana é retratada impressiona, mas isso tem uma explicação simples. O produtor da série, Beau Willimon, trabalhou por muitos anos com políticos renomados, como Hillary Clinton, Charles Schumer e Howard Dean. Ele conhece como poucos como funciona a política por dentro das instituições. Kevin Spacey fez o seu estudo de personagem acompanhando de perto o congressista californiano Kevin McCarthy, o que o ajudou muito a construir um personagem tão factível para o público.

A primeira série rodada na América do Sul foi escrita pelos roteiristas Chris Brancato (Hannibal - a série) e Adam Fierro (The Walking Dead) e conta com a direção do cineasta brasileiro José Padilha, conhecido por dirigir, entre os outros filmes, Tropa de Elite I e II, o Jardineiro Fiel, Ensaio Sobre a Cegueira e mais recentemente a nova releitura de Robocop, um clássico dos anos 80. A primeira temporada do drama narra parte da trajetória de Pablo Escobar, um dos maiores narcotraficantes do mundo, que liderou o maior e mais temido cartel de drogas da América do Sul durante a década de 80, o Cartel de Medellín, na Colômbia. A história aborda a trajetória de Escobar no mundo do crime, desde o tráfico de aparelhos e produtos domésticos até o momento em que ele declara guerra ao governo colombiano e se torna o homem mais procurado do país. Durante os episódios da temporada de estreia vemos Escobar se tornar o barão da

droga quando se torna o responsável pelo transporte de 80% dos entorpecentes que chegam aos Estados Unidos e, ao mesmo tempo, a pessoa mais amada e temida de Medellín. Apesar da série se chamar “Narcos”, o personagem principal não é o traficante colombiano e sim o agente do DEA (uma espécie de divisão de narcóticos estadunidense) Steve Murphy, vivido pelo ator Boyd Holbrook, que tem a missão de encontrar e prender Pablo Escobar de qualquer maneira. Apesar de ter feito sucesso entre o público brasileiro, o seriado não ficou livre de polêmicas. A primeira delas tem relação com a recepção do público brasileiro à interpretação do narcotraficante. Em muitos momentos, os assinantes questionavam e faziam memes de internet com a performance de Wagner Moura no papel de Escobar. As principais críticas ficaram por conta do sotaque e da pronúncia do idioma espanhol pelo ator, que não convenceu parte dos espectadores.

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Narcos (2015)

Cartaz de lançamento com o ator Wagner Moura

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Mas a maior polêmica ficou por conta das críticas pesadas feitas pelo filho de Pablo Escobar, Sebastián Marroquín – nome que adotou após a morte do pai em 1993. Em entrevista aos principais veículos de comunicação, ele sempre questionou o enfoque dado pela série. Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, em 2015, ele declarou estar incomodado com a forma como o pai foi retratado. “É um insulto à história da Colômbia, à memória do meu pai e à de milhares de vítimas que perderam a vida dentro dessa história. É uma maneira muito horrorosa de representar meu pai como o único responsável por tudo o que aconteceu”, desabafou.

A segunda temporada de Narcos vai se concentrar nos últimos 18 meses de vida do traficante. Ela vai mostrar a guerra que Pablo empreendeu contra o DEA, o governo, o exército e as milícias dos cartéis que tentavam tomar o seu lugar, como explicou Wagner Moura em entrevista recente ao jornal O Globo. “A segunda temporada é o Pablo fugindo, tentando manter a família unida, buscando alguma normalidade dentro desse cenário. É a história de uma família contra o mundo. Pablo, Tata, as crianças contra a CIA, o DEA, o exército colombiano e o cartel de Cali. Agora todo mundo quer matar o Pablo, ele é quase a vítima”, resumiu.

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O ator Wagner Moura, que vive Pablo Escobar em Narcos, na premiere de Elysium, em Los Angeles, 2013

Peça de divulgação da segunda temporada em New York

A série que já vai para a sua quarta temporada e tem mais três já encomendadas pela Netflix é baseada no livro Orange Is the New Black: My Year in a Women’s Prison (ou Laranja é o Novo Preto: Meu Ano em uma Prisão Feminina, em tradução livre). O seriado é produzido em parceria com a Lions Gate Produções. A série conta a história de Piper Chapman, interpretada pela atriz Taylor Schilling, uma jovem de classe média que foi condenada a 15 meses em reclusão após ser acusada de tráfico internacional de drogas e assumir ter transportado uma mala com dinheiro que pertencia a sua antiga namora, Alex Vause, interpretada pela atriz Laura Prepon, conhecida por The 70’s Show. Apesar do enredo da trama girar em torno das idas e vindas do relacionamento entre as personagens Piper e Alex, na vida real esssa história é um pouco diferente. Segundo Piper relata no livro, ela e a ex-namorada tiveram um romance antes de serem presas, porém dentro da prisão, em Danbury, Connecticut, o contato entre elas foi breve, cerca de três semanas, antes de Piper completar seu período de reclusão e ser posta em liberdade. A história não fica somente no relacionamento entre as duas detentas. Durante as quatro temporadas, somos levados a conhecer o cotidiano de uma prisão feminina de segurança mínima. As dificuldades de relacionamento entre pessoas de realidades tão diferentes que precisar aprender a viver em confinamento. Segundo o criador

da série, Jenji Kohan, a história de Piper serviu como um gancho para que ele mostrasse a realidade do sistema prisional norte-americano. “Achei muito interessante ter essa garota para nos levar para dentro desse mundo, de forma que pudéssemos contar a história de todas essas outras mulheres, uma vez que estivéssemos dentro da prisão”, contou em entrevista à revista Rolling Stone. Um dos pontos altos da série são os flashbacks, que vão mostrando não só o passado da protagonista, mas também a de todos as personagens que fazem parte do cotidiano do presídio de Litchfield, nos arredores de New York. Por meio deles podemos saber como viviam, o que faziam e quais crimes as elas cometeram antes de pararem ali dentro. Esse tipo de construção nos possibilita ter uma visão mais individualizada e humanizada de cada uma das personagens e entender todo o contexto de vida cada uma. A série quebrou o preconceito de gênero, pois é a primeira produção norte-americana a ter em seu elenco uma atriz, Laverne Cox, assumidamente transexual. A série foi tão bem recebida pelo público e sucesso de crítica que a empresa, em 2016, encomendou à Lions Gate a produção de mais três temporadas, quinta, sexta e sétima, respectivamente, o que garante Orange Is the New Black no catálogo da Netflix pelo menos até 2019, se não houver mais temporadas encomendadas. A série tem um custo estimado de US$ 4 milhões por episódio, ou seja, US$ 52 milhões por temporada.

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Orange Is the New Black (2013)

A atriz Laverne Cox (Sophia Burset) desfila no Mercedes-Benz Fashion Week, em 2015

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Quem acompanhou a saga de Walter White durante as cinco temporadas de Breaking Bad já está familiarizado com o advogado trapalhão e irreverente Saul Goodman. Afinal, ele sempre aparecia para salvar a pele de Walter e seu grupo em momentos delicados. O personagem foi tão bem aceito pelo público que os responsáveis pela história do professor que cozinhava anfetaminas, Vince Gilligan e Peter Gould, decidiram criar uma série para contar a origem de Saul e a trajetória que o levou até Breaking Bad, em uma espécie de spin-off do seriado original. A primeira temporada de Better Call Saul se passa seis anos antes dos acontecimentos de Breaking Bad. Por meio dela descobrimos que o verdadeiro nome do advogado trambiqueiro, interpretado por Bob Odenkirk, é James Morgan “Jimmy” McGill, que luta para conseguir seu próprio escritório e sair da sombra do irmão mais velho, Chuck, um advogado renomado no setor empresarial que faz de tudo para atrapalhar a carreira de Jimmy. A grande sacada da série é nos mostrar como o então inexperiente advogado Jimmy McGill vai se transformando no famoso Saul Goodman: os caminhos, as oportunidades e, principalmente, as mudanças de personalidade que ocorreram durante esse trajeto. Nas aberturas dos episódios também são mostra-

dos acontecimentos posteriores à sua participação em Breaking Bad, ou seja, o telespectador já fica sabendo o final e o começo da história. Resta saber o que se passou entre um evento e outro. A série é ambientada na cidade de Albuquerque, Novo México, o mesmo lugar onde transcorreu a série original. Mas as semelhanças não param por aí. Alguns personagens de Breaking Bad também vão aparecendo aos poucos e nos situam a partir de qual momento a história deles se cruza com a vida de Saul. Até agora, na segunda temporada, já apareceram o ex-policial e segurança de Gus Frings, Mike Ehrmantraut, o primeiro deles a se envolver com Jimmy. A família Salamanca, os traficantes que faziam parte do cartel mexicano e que deram tanto deram trabalho para Saul, também já fizeram suas aparições e especula-se que outros personagens da “série-mãe” poderão aparecer. O sucesso da série foi instantâneo, o que fez a Netflix encomendar a Gilligan, Gould e à produtora AMC a produção de uma terceira temporada para o ano que vem (2017). A boa recepção da trama de Saul Goodman pode ser medida através das nomeações que ela já recebeu. A série foi indicada para os principais prêmios do ramo de entretenimento, como quatro Emmys Primetime, três

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Better Call Saul (2014)

Bob Odenkirk interpreta o icônico advogado Saul Goodman, de Better Call Saul

Writers Guild of America, dois Critics’ Choice Television Awards e um Screen Actors Guild Award. Apesar de ser anunciada como sendo uma produção original Netflix, o desenvolvimento do projeto ficou a cargo dos mesmos responsáveis por Breaking Bad, o canal de TV AMC e o estúdio Sony Pictures. O episódio de estreia no canal a cabo AMC foi visto por aproximadamente 7 milhões de pessoas, um recorde, ainda mais em época de transmissão de conteúdo on-line.

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Marco Polo (2014)

Atriz Zhu Zhu ao lado do pôster oficial durante o lançamento de Marco Polo

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A série Marco Polo, considerada o maior investimento feito pela Netflix na produção de conteúdo original, com o custo de sua primeira temporada estimado em US$ 90 milhões (US$ 9 milhões por episódio), conta as aventuras do famoso mercado e explorado italiano que empresta seu nome ao título do seriado e é interpretado pelo ator Lorenzo Richelmy, em seu primeiro grande papel. Marco Polo foi um dos primeiros exploradores a percorrer a “Rota da Seda” rumo ao Oriente, mais precisamente com destino à China. A produção da Netflix se concentra no período em que Marco trabalhou como espião da corte de Kublai Khan, durante a dinastia Yuan do Império Mongol, que durou de 1.271 a 1.368, em território chinês. Para a crítica especializada, a série é uma espécie de versão da Netflix do seriado Game of Thrones, da HBO, por ter uma temática semelhante e dar bastante foco nas intrigas entre o reino mongol e chinês e conter algumas cenas de sexo. Além da vida do explorador italiano, a série tem também um contexto histórico como pano de fundo: a batalha por território entre os exércitos chinês e mongol durante o começo do século 13. O seriado seria originalmente produzido pelo canal de televisão a cabo Starz, antigo parceiro e agora rival da Netflix. Porém, mesmo após encomendar a produção dos 10 episódios da 1ª temporada, o canal de-


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sistiu de realizar produção alegando não ter conseguido autorização para realizar filmagens na China. Foi então que os criadores de Marco Polo, John Fusco e Dave Erikson (Sons of Anarchy, Low Winter Sun), ofereceram o projeto para Sarandos, que topou realizar o seriado. A primeira temporada tem dez episódios, que foram filmados nos estúdios da Pinewood, na Malásia. O objetivo dos criadores da série é explorar não só dos detalhes da vida de Marco Polo, mas também temas políticos, culturais e sociais

do período em que o explorador italiano passou naquela região do mundo. Apesar de focar em questões da sociedade mongol da época, o seriado dá mais enfoque as cenas de ação, que são muito similares às do filme O Tigre e o Dragão, por isso o personagem é apresentado como sendo um mestre em artes marciais, conhecimento colocado em prática sempre que necessário. A direção de Marco Polo é de Joachim Ronning, Dan Minahan (Game of Thrones) e Espen Sandberg. A produção ficou

a cargo do estúdio de cinema The Weinstein Company (TWC). O seriado já tem uma segunda temporada encomendada pela Netfflix. A série épica terá mais 10 episódios sobre as aventuras do explorador italiano em território chinês. Marco Polo é considerada a primeira produção de época da empresa de Hastings que, apesar de não ter tido o retorno esperado, vai manter o investimento pesado na superprodução, mantendo o seriado como o mais caro de sua biblioteca de conteúdo.

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Beasts of no Nation (2015)

Idris Elba, o Commandant de Beasts of no Nation, no lançamento de Mandela: Long Walk To Freedom, em 2013

Beasts of No Nation é o primeiro filme realizado pela empresa de Hastings e já atingiu o sucesso de público e crítica, inclusive dando a Idris Elba o prêmio de melhor ator coadjuvante no SAG Awards 2016, considerado uma prévia do Oscar. O filme foi escrito e dirigido por Cary Fukunaga, conhecido pelo filme Jane Eyre e a série True Detective. A produção é baseada no livro homô-

nimo do escritor nigeriano Uzodinma Iweala, que relata de forma cruel o cotidiano das crianças-soldado dentro das intermináveis guerras por poder em território africano. A trama de Beast of No Nation gira em torno de Agu, um menino nigeriano de aproximadamente 11 anos, que tem a sua família, pais e irmãos dizimados pela guerra entre as diversas milícias armadas do país e o exército do governo, tudo para conquistar poder e dinheiro. Já sem a família, só resta ao personagem lutar de todas as formas para sobreviver em meio ao caos que se tornou sua vida. Nesse momento ele acaba sendo recrutado por um exército paralelo. A partir de então o espectador é exposto, sem filtros, à dura realidade das crianças que não têm outra saída a não ser fazer parte de um conflito criado pelos adultos. Nas pouco mais de duas horas de projeção percebemos o amadurecimento e a perda precoce da inocência de Agu e todo o mal que a guerra causou em sua vida. Apesar da história forte, a grande polêmica que envolveu a primeira produção cinematográfica da Netflix passou longe da grande tela e se deu pela forma de distribuição escolhida por Hastings. O filme foi produzido em parceria com as empresas Red Crown Productions, Primary Productions e Parliament of Owls e Participant Media e Mammoth Entertainment, que fez um aporte de US$ 6 milhões para que o filme pudesse ser terminado. O filme foi lançado simultaneamente na plataforma on-line da Netflix e nos cinemas de Estados Unidos e Inglaterra, em outubro de 2015. Isso gerou muitas críticas dos estúdios, produtores e salas de cinema Hollywood, pois eles acreditavam que a iniciativa da empresa afastaria o telespectador das salas de cinema do mundo e acusaram Hasting de querer acabar com a indústria do cinema e monopolizar a distribuição de conteúdo cinematográfico. Apesar de sofrer com o boicote da grande parte das redes de cinema, o primeiro filme original da Netflix foi o conteúdo mais visto no site em diversos países como Japão, México, Brasil e o próprio Estados Unidos, chegando à marca de 3 milhões de visualizações durante a semana de lançamento. O recorde de acessos foi comemorado por Sarandos em entrevista ao site Deadline. “Nós estamos simplesmente emocionados com o total de audiência alcançado por este filme, não apenas na América do Norte, mas no mundo. Na semana de lançamento, Beasts of No Nation foi o filme mais visto na Netflix, em cada país em que nós operamos”, afirmou.

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Expansão territorial

Netflix pelo mundo

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A companhia chega a 190 países e firma sua presença em todos os continentes

E

m 1997, a Netflix surgia como uma empresa local de aluguel on-line e entrega de DVDs de filmes pelos correios. Quase 20 anos depois de seu nascimento, a empresa se tornou não só maior companhia de serviço de distribuição on-line de conteúdo em streaming dos Estados Unidos, mas agora tem a sua plataforma espalhada em todos os continentes do mundo, mudando a forma como as pessoas verem suas séries e filmes favoritos. Segundo anúncio feito pelo seu presidente, Reed Hastings, na feira de tecnologia CES, em janeiro de 2016, a empresa que já estava presente em 130 países expandiu

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suas operações para 190 nações, completando o processo de globalização da marca. Entre os mercados que abriram recentemente suas portas para a Netflix estão Rússia e Índia, duas das nações mais populosas do mundo. Há poucos países em que a empresa não opera seu serviço de streaming. Nessa pequena lista se encontram a China (talvez o principal mercado a ser explorado), a Coreia do Norte, a Crimeia e a Síria. No caso chinês, o problema é adequação à legislação de mídia do país, pois a empresa ainda não conseguiu as licenças de operação e nem parcerias com as operadoras de telefonia para definir uma política para a atuação no país.


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Expansão territorial

Hastings, CEO da Netflix, anunciou em janeiro de 2016 que a empresa está presente em 190 países

está diretamente ligada a dois fatores importantíssimos para sustentar o modelo de negócios da empresa: estar sempre à frente da concorrência e ter o máximo de assinantes possível para suportar o alto valor investido na produção de conteúdo original. Com a concorrência cada vez maior de serviços como Hulu, Amazon e Starz no território norte-americano, a Netflix se viu obrigada a buscar no-

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Nos demais países onde ainda não se estabeleceu é porque a situação foge do alcance da companhia. Há severas restrições do próprio governo dos Estados Unidos, por exemplo, que proíbe as multinacionais do país de manter qualquer relação comercial com nações consideradas inimigas, como é o caso de Síria e Coreia do Norte. Na Crimeia, a falta de estrutura, causada pelos conflitos na região dificulta o estabelecimento das operações da empresa. No evento realizado em janeiro, o presidente da Netflix declarou que as adições de mais 100 novos países às operações da empresa triplicaram a sua base de assinantes e comemorou o que chamou de um novo modelo de fazer TV. “Hoje vocês estão testemunhando o nascimento de uma nova rede global de TV pela Internet. Com esse lançamento, os consumidores de todo o mundo – de Singapura a São Petersburgo, de San Francisco até São Paulo – poderão se divertir com programas de TV e filmes ao mesmo tempo. Com a ajuda da internet, estamos colocando o poder nas mãos dos usuários para assistir o que quiserem quando quiserem e onde quiserem”, afirmou. A expansão da Netflix para outros mercados além do norte-americano

vos assinantes para além da fronteira do país. Assim, poderia consolidar sua marca de maneira global antes dos rivais e antecipar o surgimento de novas empresas para ocupar o segmento de distribuição em streaming em áreas estratégicas para a expansão da empresa. Claro que se manter à frente da concorrência e se tornar uma marca com influência mundial pesaram, mas mais do que isso, a Netflix precisava arrecadar cada vez mais dinheiro para poder continuar investindo na produção de conteúdo próprio ou exclusivo para a sua biblioteca. Provavelmente sem a expansão para novos mercados ela não teria conseguido manter seu novo modelo de negócios. O avanço da Netflix no mundo está escorado também na popularização da banda larga em 4G em países da América Latina, Europa e Ásia. Para a empresa Ampere Analysis, que trabalha com análise de dados de vídeo, a popularização do acesso à internet e dos dispositivos móveis pode levar a Netflix a bater a marca de 130 milhões de assinantes mundo até 2020. Hoje a empresa conta com cerca de 70 milhões de usuários.

A Amazon é uma das principais concorrentes da Netflix em solo norte-americano

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Expansão territorial Uma das principais estratégias da empresa para entrar e popularizar seu serviço nos novos mercados é associar a sua marca a grandes empresas de telecomunicações e telefonia. Esse é o caso da parceria com a TIM, na Itália, como contou Marco Patuano, diretor executivo da operadora no lançamento da parceria em 2015: “A oferta da Netflix dá aos nossos consumidores mais uma razão para eles continuarem conosco. Queremos dar aos nossos clientes o máximo de conteúdo premium possível”, afirmou. Apesar do grande avanço da empresa em diversas regiões do mundo, ela ainda sofre algum tipo de resistência para se impor perante as concorrências locais, principalmente na Europa onde os usuários têm preferência por consumir conteúdos locais e já há empresas especializadas no ramo de distribuição de conteúdo on-line. Na Espanha, por exemplo, há a Wuaki-tv, um serviço de vídeo sob demanda que possui uma base de 2,5 milhões de assinantes distribuída pela Europa e tem metade de sua biblioteca preenchida com produções locais. Se na Europa o problema tem sido enfrentar a concorrência de serviços de streaming que oferecem amplo conteúdo local, na Índia, por exemplo, os problemas são a qualidade da banda de internet e a questão econômica. No país, a população está acostumada a pagar centavos para assistir às produções de Bollywood, uma espécie de Hollywood local. Para os analistas presentes na Consumer Eletronics Show, sediada em Las Vegas, o grande desafio da Netflix é convencer os indianos que vale a pena pagar mais caro para ter acesso ao site. De acordo com dados da Reuters, os usuários da Índia costumam pagar 29 rúpias, que convertido em moeda norte americana equivale a US$ 0,44. A assinatura do plano da Netflix no país custa 200 rúpias, ou seja, aproximadamente US$ 22.

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Atuação da Netflix

A Netflix tem atuação global, mas enfrenta restrições na China, Coreia do Norte, Crimeia e Síria


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Expansão territorial

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Expansão territorial

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Canadá

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quantidade de opções era uma das reclamações mais frequentes dos usuários. A outra se referia a questão do idioma, pois todos os filmes e séries só tinha a opção de áudio e legenda em inglês. A população ca-

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O território norte-americano começou a ficar pequeno para a empresa de Hastings, que decidiu então romper as fronteiras e conquistar novos territórios. A primeira experiência internacional da Netflix foi levar seu produto para o vizinho Canadá. O serviço chegou ao país em setembro de 2010 com a garantia que os canadenses teriam acesso a uma vasta biblioteca de vídeo – menor em relação aos EUA – por um valor de US$ 7,99. No evento de lançamento da plataforma, Hastings enalteceu o baixo valor que seria cobrado pela assinatura mensal. “O preço mais baixo e mais agressivo que já tivemos em qualquer lugar do mundo”, disse. O catálogo de filmes e séries foi considerado um problema na chegada da Netflix ao Canadá, pois se estimou que a primeira versão da biblioteca tinha apenas 1.100 títulos no acervo, cerca de 25% do total de títulos disponíveis para o público norte-americano. A pouca

nadense que fala o idioma francês tinha dificuldades para compreender o que estava vendo na tela. Os primeiros títulos em destaque no catálogo canadense da Netflix eram as primeiras três temporadas do seriado Mad Men – a temporada mais recente, na época, não podia ser exibida porque estava sob contrato da HBO –, o seriado ParK Boys e os filmes Superbad, Slumdog Millionaire e The Notebook. A principal reclamação dos usuários é que as séries mais famosas do momento como Glee, Dexter, The Office e Breaking Bad não estavam presentes no acervo da empresa, apesar de estarem disponíveis na biblioteca norte-americana. Para conter as reclamações dos assinantes do novo mercado, Hastings disse que iria trabalhar para melhorar o serviço oferecido. Entre as melhorias ele se comprometeu a adicionar a opção de legenda e áudio em francês o mais rápido possível, bem como aumentar o número de títulos à disposição. Hoje, mesmo aquém da quantidade de 7 mil títulos da biblioteca estaduniden-

Elenco de Breaking Bad, umas das primeiras séries de sucesso disponíveis aos assinantes do Canadá


se, o acervo canadense conta com 4 mil títulos. Outra reclamação ainda recorrente é o baixo número de filmes em determinadas categorias, sempre em comparação com os Estados Unidos. De acordo com dados da imprensa canadense, na categoria drama, uma das que mais desperta interesse nos usuários, nos Estados Unidos os usuários têm acesso a 3.035 títulos nessa categoria, enquanto no Canadá o acervo conta com apenas 829 filmes ou séries desse gênero. Apesar de todos os problemas iniciais, a Netflix conseguiu conquistar de forma rápida o usuário canadense. Em quase dois anos, a empresa havia atingido a marca de 1 milhão de assinantes, número esse que triplicaria até o final de 2013, com aproximadamente 4 milhões de usuários ativos no site.

Dificuldades tecnológicas

A entrada da Netflix no mercado canadense de distribuição de conteúdo não foi fácil. Em partes pelo pouco conteúdo oferecido, mas também houve um fator que fugia ao controle da empresa, a limitação do pacote de dados de banda larga. Diferentemente do que acontece aqui no Brasil, lá os planos de internet banda larga são feitos com limitação do pacote de dados. O usuário tem basicamente dois planos de assinatura que dão respectivamente 40 e 60 gigas de dados para uso durante o mês. Se o limite for ultrapassado o cliente precisa contratar planos adicionais, pagando um valor mais caro. Assim que a Netflix anunciou seus planos para entrada no país, as principais operadoras de telefonia informaram aos seus usuários que haveria redução dos limites de dados nos planos, ou seja, a grande maioria das pessoas não conseguiria assistir aos filmes e séries da Netflix por causa da restrição de uso da banda larga.

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Expansão territorial

No Canadá, uma das barreiras da Netflix é a limitação do uso de banda larga pelos assinantes

De acordo com dados da própria Netflix o seu serviço de distribuição em streaming consome aproximadamente 1 Gb por hora de conteúdo reproduzido, ou seja, o usuário do plano mais básico das operadoras poderia, no máximo, assistir a 15 filmes por mês se usar sua internet de forma exclusiva para isso. Questionado sobre o assunto no lançamento da plataforma do país, Hastings disse que havia muito o que fazer e que a solução viria com o tempo. “Esperamos que isso não seja um problema significativo. Vamos levá-lo mês e mês e ver o que acontece”. E continuou: “É muito difícil de travar o crescimento em tecnologia. A internet vai continuar a se expandir”. Se o fator da política de restrição do uso de banda larga das operadoras foi uma barreira enfrentada pela Netflix em sua chegada ao Canadá, a empresa também desfrutou de vantagens em relação as empresas nacionais do mercado do entretenimento. A empresa de Hastings, por exemplo, não tem que contribuir para o fundo

de produção canadense. Esse fundo foi criado para estimular a produção audiovisual do país e as empresas que operam lá têm que contribuir com uma porcentagem de seu faturamento. Como a Netflix não tem escritório ou estrutura física em território canadense, não precisa pagar o imposto. Outras vantagens que a Netflix tem em relação à concorrência são: não ter que destinar parte de sua programação para programas locais, como devem fazer as TVs por assinatura. Não precisar investir em infraestrutura física para distribuir seu conteúdo, já que seus filmes e séries ficam armazenados em servidores em nuvem das empresas parceiras. Apesar de todos os contratempos enfrentados, sim, entrar no mercado canadense foi lucrativo para a empresa de Hastings. Devido a essas vantagens comerciais que a Netflix desfruta, várias empresas do setor de mídia canadenses a acusam de praticar concorrência desleal e não ajudar no desenvolvimento do setor.

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Expansão territorial

A vez da

Após realizar sua primeira expansão fora dos Estados Unidos para o Canadá, a Netflix mirou sua próxima expansão para o mercado latino americano e, em setembro de 2011, lançou seu serviço de assinatura para 43 países da região. Do México à Argentina, passando pelo Caribe, agora todos os usuários de internet desses países teriam acesso ao serviço de streaming da empresa, inclusive Cuba, que recebeu o serviço da empresa em meados de 2015. O primeiro país a receber o serviço foi o Brasil, no começo de setembro. O plano oferecido por aqui dava acesso gratuito à plataforma durante um mês, a título de degustação. Após esse período, se o usuário quisesse se tornar assinante, deveria pagar R$ 14,99 de mensalidade, o equivalia ao preço básico dos Estados Unidos, de US$ 7,99. Após entrar no mercado brasileiro, ainda no mês de setembro, a empresa foi levando seu serviço aos demais países da região. A cronologia de lançamento do serviço seguiu a ordem: primeiro Argentina, Uruguai e

Paraguai, com preços de assinatura no valor de US$ 7,99. Na sequência vieram Chile, Bolívia, Peru, Colômbia e Equador. O último país a receber o serviço foi o México, no final de setembro. Antes a plataforma foi lançada dos países da América Central e Caribe. Sobre a chegada do serviço à região, Hastings, em comunicado da empresa, disse: “As pessoas em toda a região estão on-line em números cada vez maiores, amam filmes e programas de TV. Estamos orgulhosos de trazer-lhes a experiência Netflix de desfrutar instantaneamente muitos filmes e programas de TV como eles querem, quando eles querem”. A chegada da plataforma na América Latina foi ancorada em uma biblioteca altamente popular entre os usuários da região, pois os filmes e séries do catálogo norte-americano sempre tiveram muita aceitação por aqui. Em pouco mais de três anos, a Netflix atingia aproximadamente 6

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milhões de assinantes, fazendo com que os latino-americanos se tornassem responsáveis por 10% do total de usuários do site no mundo. Nem é preciso dizer que o crescimento na região foi assombroso.

A chegada da Netflix à América Latina País

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América Latina

Data

Preço (em moeda local)

Brasil

5/9/2011

14,99

Argentina

7/9/2011

AR$ 39,00

Paraguai

7/9/2011

US$ 7,99

Uruguai

7/9/2011

US$ 7,99

Bolívia

8/9/2011

US$ 7,99

Chile

8/9/2011

CLP 3,790

Colômbia

9/9/2011

COP 14,000

Equador

9/9/2011

US$ 7,99

Peru

9/9/2011

US$ 7,99

Venezuela

9/9/2011

US$ 7,99

México

12/9/2011

MX$ 99

América Central

12/9/2011

US$ 7,99

Caribe

12/9/2011

US$ 7,99


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Expansão territorial

A empresa creditou o rápido crescimento na região à vasta biblioteca e à melhora da banda larga. Em nota oficial, Hastings afirmou: “O sucesso que tivemos no México e na América Latina nos últimos três anos é o resultado da nossa oferta de conteúdo, incluindo séries originais, o controle que o usuário tem sobre os programas que quer assistir e a melhoria dos serviços de banda larga na região”, relatou. Entre os principais títulos que chegaram aos usuários da América Latina e que ajudaram na rápida popularização do serviço estão as séries originais Marco Polo, House of Cards e Orange is The New Black, além de uma grande variedade de filmes para o público infantil como Rei Julien e As Aventuras do Gato de Botas, todas elas com opção de idioma e legenda em inglês, português e espanhol,

para facilitar a compreensão de todo tipo de público. Além do conteúdo original e exclusivo, a Netflix fechou um acordo para distribuir as séries a CBS e do canal Showtime na região.

Um mercado promissor

O mercado latino americano tinha um fator que dificultava a popularização da Netflix no curto prazo. A pouca penetração da banda larga e a baixa qualidade da internet na maioria dos países da região, visto que para conseguir assistir a um filme ou série da plataforma é necessário ter acesso a uma internet com no mínimo 2 Mb de banda. A média da internet nos países latinos era de 70 kbps em 2011. Os analistas de telecomunicações da Goldman Sachs para a América Latina acreditam que a pouca qualidade da banda de internet poderia

dificultar a popularização do serviço na região, o que demandaria mais tempo e investimento para a empresa se consolidar na região. Mesmo com a dificuldade tecnológica, a América Latina se mostrou um mercado promissor para as ambições de Hastings. O que torna o mercado latino promissor é a falta de concorrentes no serviço de streaming e a crescente cultura da região em consumir conteúdo diretamente na internet, por meio de dispositivos móveis como tablet, celular e notebooks. Não ter concorrentes na região fez com que a Netflix se tornasse a primeira opção e porta de entrada do público para a experiência de consumir conteúdo on-line. A única empresa na região que prestava um serviço similar era a NetMovies no Brasil, porém muito longe de ser popular e ter um público consolidado.

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Expansão territorial Ainda em seu relatório, a Goldman Sachs, ressalta que diferentemente de Estados Unidos e Canadá, onde o serviço de distribuição on-line apareceu no mercado como uma tecnologia complementar ao serviço de TVs por assinatura, por aqui o hábito de assinar um pacote de TV a cabo não era não popular e não fazia parte da cultura da população, o que fez com que a Netflix se sobressaísse. O relatório da empresa do setor financeiro assinala: o serviço de TV por assinatura e pay-per-view é pra-

ticamente inexistente na América Latina, com uma penetração inferior a 25% da população, enquanto nos Estados Unidos esse tipo de modalidade atinge aproximadamente 90% das pessoas. Acreditamos que os consumidores podem facilmente optar pelo serviço de streaming ao invés da TV a cabo. O que contribui muito para corroborar a visão da Goldman Sachs de que a América Latina é um mercado promissor para os planos de expansão da Netflix é que no Brasil, por

exemplo, o valor para de um pacote mediano de TV a cabo é superior a R$ 70, enquanto na Netflix a pessoa por R$ 18 tem acesso a um vasto acervo de opções, podendo assistir quando quiser e no dispositivo que quiser. Isso facilitou a adesão de novos usuários ao serviço oferecido pela Netflix, ou seja, a América Latina é um ambiente muito promissor e não há quase nenhuma concorrência para a Netflix se tornar referência regional no segmento de distribuição de conteúdo on-line em streaming.

Dando continuidade à sua expansão global, a Netflix seguiu em direção à Europa e, em 2012, deu seus primeiros passos no velho continente. A porta de entrada do serviço de streaming foi o Reino Unido (Inglaterra e Escócia) e a Irlanda e os países nórdicos Dinamarca, Suécia e Noruega. Durante todo o seu primeiro ano no continente, a empresa se dedicou a exclusivamente em fortalecer sua presença nesses países, enfrentar a concorrência e a costurar acordos para aquisição de conteúdo que pudessem facilitar sua entrada nos demais mercados europeus. Se na América Latina a Netflix reinava sozinha, nos países do Reino Unido o cenário não era tão favorável assim. Para se consolidar no mercado, ela teve que enfrentar duas concorrentes de peso que já tinham seus serviços de conteúdo on-line popularizados junto ao público. Tanto a rede estatal BBC quanto a Amazon – que entrou no mercado inglês em 2004 – já eram marcas reconhecidas e com grande acervo de conteúdo. Sem dúvidas eles tinham uma enorme vantagem sobre a novata Netflix nesse mercado. Apesar de enfrentar a concorrência de duas grandes empresas, a entrada da Netflix na Europa teve uma boa recepção no setor de entre-

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#Partiu Europa

tenimento, pois com cada vez mais players disputando o mercado de destruição on-line, no caso da empresa de Hastings com um valor de £ 5,99 (cerca de R$ 30) no Reino Unido e € 6,99 (cerca de R$ 28) na Irlanda, foi encarada pelo governo britânico como uma ótima ferramenta para combater a pirataria e o os downloads ilegais de filmes e séries. Entre os primeiros conteúdos que a Netflix disponibilizou em sua che-

gada ao território europeu estavam as séries Prision Break, Damage, Orange is the New Black e Marco Polo, além dos filmes como 3:10 to Yuma e O Paciente Inglês. O acervo com poucos títulos é justificável, pois a Amazon já tinha sob seu domínio os direitos exclusivos para a transmissão dos principais filmes de Hollywood para o Reino Unido. Isso obrigou a empresa de Hastings a assinar acordos pontuais com pequenos


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Expansão territorial

O acervo da Netflix na Europa é restrito porque grande parte dos filmes de Hollywood é licenciada pela Amazon

estúdios enquanto desenvolvia seu conteúdo original. A expansão da Netflix na Europa foi devagar, tanto que os próximos países a terem acesso ao serviço de streaming da empresa foram a Holanda em 2013 e Alemanha, Áustria, Suíça, França, Bélgica e Luxemburgo, em 2014. Nessa época, somando a expansão para o restante da América e na parte ocidental do continente europeu, a Netflix já tinha 27% de todos os seus assinantes localizados fora dos Estados Unidos. Os últimos países do continente a terem acesso ao site da Netflix foram Itália, Portugal e Espanha, já no final de 2015. Para os países fora do Reino Unido, a Netflix adotou a prática de cobrar € 7,99 independente do país e disponibilizar legendas e áudios em idioma local, para aumentar sua fatia do mercado e facilitar a assimilação do público aos conteúdos norte-americanos que a empresa disponibilizava. Em entrevista para o Hollywood Repórter, o analista da IHS Richard Broughton dissecou o cenário do setor entretenimento em que a Netflix acabara de entrar. “A Europa é um mercado atraente para um serviço de assinatura. As pessoas estão dispostas a pagar por assinaturas de TV

e estão mais dispostos ainda a pagar por meios de comunicação em geral. Mas é muito difícil para os novos operadores competirem”, analisou. Segundo projeções do IHS até 2018 a Europa será responsável, sozinha, por mais de 20% da base de assinantes da Netflix no mundo.

Barreiras culturais e mercadológicas

O que contribuiu para o avanço mais lento da Netflix no continente foram alguns obstáculos que a empresa teve que enfrentar. A primeira delas foi a mercadológica, pois no velho continente empresas como Amazon e BBC já tinham direitos de distribuição exclusivos para a Europa de muitos filmes do catálogo norte-americano da Netflix, o que afetava diretamente a pouca amplitude de seu catálogo em um primeiro momento. Para contornar esse problema inicial a Netflix começou a investir pesado em negociações para aquisição de direitos de distribuição. Além de ter de construir uma biblioteca própria para a Europa, a empresa de Hastings percebeu que nem sempre conseguiria negociar em bloco, pois cada país tem suas leis de direitos autorais, distribuição de conteúdo e há também o protecionismo a pro-

dução local de conteúdo. Sobre a concorrência, em entrevista ao Jornal Expresso, de Portugal, Hastings ressaltou que ela é benéfica. “Em todas as geografias para onde vamos há sempre um efeito muito positivo para os consumidores, porque obriga os concorrentes a melhorarem as ofertas”, disse. Para melhorar sua infraestrutura e seu poder de penetração junto ao público, a Netflix fez parcerias com empresas de tecnologias locais como a Boygues Telecom na França, para que ela pudesse disponibilizar seu serviço diretamente nos televisores com uma banda larga que possibilitasse aos assinantes a assistir, por exemplo, House Of Cards em HD. O mesmo expediente foi adotado na Alemanha com o provedor de internet da Deutsche Telekom, o maior do país. A produção local de conteúdo também foi uma barreira para Netflix. A principal reclamação dos produtores locais era que a empresa tinha privilégios na hora de negociar seus contratos, pois pagavam um valor considerado abaixo do mercado para adquirir os direitos de reprodução dos filmes em sua plataforma on-line. Na França, ainda havia a reclamação de que a Netflix, por estar sediada em Amsterdã, não era obrigada a pagar as taxas e contribuições para o fundo francês responsável por apoiar e financiar as produções de cinema nacional, o que aumentava os lucros da Netflix e gerava uma concorrência desleal, na visão deles. Além das barreiras mercadológicas já mencionadas, havia também a resistência cultural. Diferentemente do Canadá ou da América Latina, o europeu de modo geral tem mais apreço por produções locais, que reflitam o contexto em que vive. Muito por conta disso a Netflix resolveu fazer parceiras com estúdios locais e para colocar cada vez mais conteúdo original europeu em sua biblioteca, como as séries Suburra (Itália), The Crown (Reino Unido), Marseille (França) e Dark (Alemanha).

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Expansão territorial

Rumo à A nossa viagem pelo mundo Netflix chegou à África, último continente a ter acesso ao serviço de filmes e séries on-line. A empresa de Hastings demorou seis anos para levar a sua plataforma para o continente africano, mas essa demora tem uma explicação. Enquanto nos demais continentes, mesmo na América Latina, a tecnologia da banda larga de internet já estava consolidada, na África essa tecnologia ainda era incipiente e os dispositivos móveis são raros, o que dificultava a penetração e popularização da plataforma. Demorou, é verdade, mas assim que aportou no continente africano o serviço da Netflix ficou disponível em todos os 54 países da região de uma

só vez. Em países economicamente e socialmente mais desenvolvidos como Nigéria, Quênia, África do Sul e do Norte, que têm seu sistema de banda larga mais rápido, a plataforma teve boa penetração. O problema seria popularizar o serviço em países mais pobres da parte subsaariana da região, onde em muitos locais não há acesso algum à internet.

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África

Números A Netflix está presente em

100% dos países africanos Na Nigéria, um plano de banda larga de

2 Gb custa 4% do salário médio de alguém com ensino superior Com o plano padrão de

2 Gb, o usuário nigeriano

da Netflix só consegue assistir a um filme por mês Nollywood, a versão nigeriana de Hollywood, foi avaliada em

US$ 3,3 bilhões em 2014

A iROKOtv, concorrente da Netflix na Nigéria, avalia que a norte-americana vai conquistar no máximo

1% da população local

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Na avaliação do site especializado em tecnologia Quartz, os principais desafios que Hastings teria que enfrentar ao chegar ao continente seriam a baixa qualidade da conectividade da internet, a pouca quantidade de dispositivos móveis e o valor extremamente caro dos planos de dados da banda larga. Para termos uma ideia de quanto é cara a internet na região, vamos usar a Nigéria como exemplo. Naquele país, uma pessoa com ensino superior recebe um salário médio na base de US$ 500 por mês (quase 2 mil reais), porém um plano de banda larga como 2 Gb custa US$ 20 por mês. O que possibilitava o usuário assistir um filme de Netflix no período, isso se usasse seu plano de dados exclusivamente para acessar a plataforma, o que restringia demais o público que poderia se interessar em assinar o plano oferecido pela empresa de Hastings.


O serviço foi lançado na África no começo de 2016 e a Netflix ainda não sabia qual estratégia mais eficiente adotar para quebrar as barreiras econômicas e tecnológicas para popularizar sua plataforma, principalmente nas regiões mais pobres do continente, como afirmou a empresa em comunicado oficial distribuído logo após a lançar o serviço no continente: “É a primeira semana da nossa disponibilidade na África e na verdade em muitos lugares ao redor do mundo, nós estaremos aprendendo sobre o que está funcionando bem (e o que não), e depois vamos melhorar à medida que avançamos”. O que torna o mercado africano atrativo para a Netflix é que ele deve se tornar promissor a longo prazo. Com o desenvolvimento, mesmo que paulatino da região, os dispositivos móveis como celular, tablet e notebooks estão começando a se popularizar entre os africanos mais jovens dos países que as economias são mais desenvolvidas, ou seja, uma área fértil para que o serviço da empresa vá se popularizando à medida que a tecnologia e a internet evoluam e cheguem a mais pessoas. Mais ou menos o mesmo cenário encontrado pela empresa quando lançou seu serviço na América Latina. Na CES 2016, onde fez o lançamento oficial da expansão da Netflix, Hastings falou como enfrentar os problemas tecnológicos da região. “Nossos engenheiros talentosos são constantemente testando formas para comprimir mais dados por meio de codificação mais avançada. O objetivo é fornecer dados tão rápido e bem em qualquer dispositivo em qualquer condição de banda larga”, disse.

Uma Nollywood no caminho

Se a África guarda semelhanças com a América Latina no quesito do pouco desenvolvimento tecnológico, na questão cultural do consumo de filmes e séries a região se aproxima mais do cenário encontrado na Europa, pois os africanos preferem assistir as produções locais.

Reprodução

Expansão territorial

O conteúdo produzido em Nollywood, na Nigéria, tem a preferência do público africano

A indústria de filmes de Nollywood – versão nigeriana de Hollywood – foi avaliada, em 2014, em cerca de US$ 3,3 bilhões, mesmo com um alto valor de mercado ela enfrenta um sério problema de arrecadação com os filmes que produz. Do total de sua receita anual, apenas 1% vem da venda de DVDs e royalties (diretos) sobre os filmes, já que a pirataria é prática comum na região, principalmente pelos baixos salários, o que leva muitas pessoas a preferirem comprar um DVD pirata do que uma cópia original do filme favorito. Sobre a preferência dos africanos sobre o conteúdo local, o CEO da iROKOtv (serviço similar à Netflix na Nigéria) Jason Njoku analisou a situação em entrevista ao site especializado techcrunch.com. “Os usuários de VOD africanos preferem esmagadoramente o conteúdo de Nollywood e a Netflix não oferece quase nada. A Netflix na Nigéria provavelmente chegará a 1% da população, pois é demasiado caro para a pessoa média, devido ao alto custo do plano de dados.” Além de superar a barreira cultural e a predileção da população africana pelo conteúdo local, a Netflix tem que enfrentar outra questão: a concorrência das empresas de VOD nos países mais desenvolvidos.

Na África do Sul o segmento é dominado pela Naspers, líder em distribuição de vídeos na televisão, uma plataforma similar à da HBO. Já se preparando para a chegada da rival no país, a empresa lançou o seu serviço de streaming chamado Showmax em 2014. Arthur Goldstuck, da World Wide Worx, empresa especializada em pesquisa e estratégia de tecnologia analisou para o jornal Mail & Guardian o cenário do setor do entretenimento que a empresas de Hastings iria enfrentar ao entrar no país sul africano. “Todos esses players de streaming de vídeo sob demanda estão entrando em um pequeno, mas crescente mercado; eles só querem estar lá na linha de frente de tudo.” Outras concorrentes incipientes do mercado de VOD na África são a iROKOtv, na Nigéria, e a Buni.tv, no Quênia. O mercado africano é sem dúvidas promissor para a Netflix no longo prazo, mas a empresa de Hastings vai precisar enfrentar todas essas barreiras se quiser se consolidar como referência no setor de streaming da região. A estratégia deve ser adquirir o máximo de conteúdo local e adaptar o seu valor de assinatura para a realidade da região, mesmo que impacte em seu modelo de negócios.

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Divulgação/ Netflix

O próximo passo do domínio global da Netflix foi rumar ao Oriente. De olho em países como China e Índia, que são os mais populosos do planeta, a empresa começou a abrir caminho no continente pelo Japão, em setembro de 2015. Menos de seis meses depois, na CES 2016, Hastings anunciava a disponibilidade da plataforma na Coreia do Sul, Singapura, Hong Kong, Tailândia, Vietnã e Taiwan. Ao mirar a Ásia, a Netflix viu um potencial enorme para expandir sua base de assinantes. Porém, se consolidar como gigante no setor de distribuição de conteúdo on-line na região não tem sido tarefa fácil e muito menos barata para a companhia de Hastings.

Versão japonesa do site da Netlix. O uso de idiomas locais faz parte da estratégia de prospecção da empresa

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Expresso Oriente


Expansão territorial Ao chegar ao continente, a Netflix se deparou com os mesmos problemas encontrados em outras regiões do mundo, como pirataria, concorrência local, baixa qualidade da banda larga e questões econômicas culturais. No último caso, o problema foi a diversidade de línguas e dialetos falados na região. Mas a maior dificuldade encontrada foram as leis para operação e compra de direitos de distribuição de conteúdo. As questões culturais tendem a favorecer as empresas locais que concorrem com a Netflix, pois elas já estão estabelecidas e não precisam adequar os idiomas do seu catálogo, já que os conteúdos são produzidos na língua local, o que conquista a preferência do público. A barreira cultural, apesar de complicada, é um problema contornável e bem mais simples do que ligar com a legislação e marcos regulatórios dos países, fator que tem emperrado o crescimento da empresa na região. As restrições regulamentares afetam diretamente o principal atrativo que a Netflix tem perante à concorrência: sua biblioteca de conteúdo. Quando a Netflix lançou sua plataforma na Indonésia, ela teve que retirar boa parte de seu catálogo do ar, pois segundo o governo, alguns filmes foram censurados por conter conteúdo considerado violento ou com apelo sexual em suas cenas. Além disso, o Ministério de Comunicações do país só liberou a operação do site após a empresa abrir um escritório local e pagar todas as taxas obrigatórias para o setor de entretenimento. Mas não foram só as taxas governamentais que dificultaram a vida da Netflix: houve também boicote por parte as operadoras de telefonia. A PT Telekomunikasi Indonesia Tbk (Telkom), se recusa a liberar sua rede banda larga até que a Netflix cumpra todos as regulamentações do setor. A respeito desse bloqueio,

Jessica Lee, chefe de comunicação da Netflix na Ásia, declarou à Reuters: “Serviços entregues através da Internet apresentam novas questões para todos, incluindo os políticos, e nossa intenção é cumprir as leis e regulamentos aplicáveis.” Os principais concorrentes da Netflix e que já tem a sua marca reconhecida pelo mercado são a iFlix, na Malásia, a Hooq, em Singapura e a TBO e a Alibaba, na China. Essa última lançou recentemente o seu serviço de streaming. Além dos concorrentes locais, há também as empresas globais de distribuição de conteúdo que já se estabeleceram na região como a Amazon, Hulu, HBO e BBC iPlayer.

China e Coreia do Norte

Se a Netflix opera mesmo com dificuldades e com limitações dos governos locais em praticamente todos os países asiáticos, o mesmo não se pode dizer sobre China e Coreia do Norte. A China é o principal mercado do continente e, segundo avaliação da Forbes, corresponde a 60% de todo o mercado a ser explorado e é vital para o sucesso financeiro da operação na região. Entretanto, a empresa não consegue entrar no país por uma série de restrições impostas pelo governo chinês a empresas estrangeiras. A principal dificuldade encontrada por Hastings é que o setor de entretenimento e transmissão on-line na China é altamente restritivo, não só para a entrada de empresas novas como também ao conteúdo que pode ou não ser disponibilizado, pois antes de ir ao ar ele deve ser aprovado pelo governo. O órgão do governo chamado Administração Estatal de Imprensa, Publicação, Rádio, Cinema e Televisão da China é quem faz toda a regulação do setor audiovisual do país e até meados de 2016, concedeu licença de operação para distribuição de conteúdo na TV ou na in-

ternet para apenas sete empresas. Caso queira operar imediatamente no país, a Netflix tem que realizar uma parceria com alguma das empresas licenciadas e, depois, se essa união ser aprovada pelo governo, distribuir seu conteúdo para as plataformas digitais como TV, tablet, celular e computadores. Sobre as dificuldades encontradas no mercado chinês, Hastings afirmou ao site Wired: “Nós temos um olhar muito a longo prazo. Pode ser uma discussão de muitos anos ou pode acontecer mais rápido do que isso (...). Nós vamos ter o nosso tempo”. Para exemplificar o seu pensamento ele citou a Apple: “O exemplo mais claro é o iPhone, o que levou muitos anos para a Apple para obter a aprovação e agora é um negócio muito grande para a empresa”, disse. Além de uma série de restrições à entrada de empresas estrangeiras no país, a China define regras quanto à aprovação de conteúdo da veiculação. Por exemplo, qualquer empresa que for distribuir conteúdo tem que passar primeiro pela censura prévia do governo. Filmes ou séries que tiverem imagens consideradas violentas, com apelo sexual ou qualquer ofensa ao Partido Comunista Chinês são proibidos de irem ao ar. Na Coreia do Norte a situação é bem mais complicada e a Netflix não deve conseguir operar no país em um futuro tão breve. Diferentemente do que acontece nos demais países do continente, as restrições não partem dos governos locais, mas sim do próprio governo norte-americano. Desde o final da guerra das Coreias, em 1953, o país do Norte é considerado inimigo dos Estados Unidos e qualquer multinacional do país é proibida de fazer negócios com eles. Como eles não devem fazer as pazes tão cedo, dificilmente os norte-coreanos poderão assistir a qualquer conteúdo da plataforma Netflix.

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Expansão territorial

em 14º lugar com 2.092 títulos em sua biblioteca a disposição dos assinantes do país, muito pouco se comparado com o Brasil, que dispõe de 3.560 títulos, e Estados Unidos, que hoje tem cerca de 6 mil opções para o público local. Agora ficou fácil enten-

Divulgação/ Netflix

Nos primeiros seis meses após lançar sua plataforma no continente, a Netflix tinha encontrado um ambiente promissor, pois sua base de assinantes crescia 30% ao mês, atingindo a marca de 2 milhões de usuários no final de 2015. Mas a felicidade durou pouco. Passado o efeito novidade, muitos usuários passaram a reclamar frequentemente do pouco conteúdo disponibilizado no site. Muitos acreditavam que a empresa não dava o valor devido à região, pois sua biblioteca era muito inferior em comparação a dos Estados Unidos e outros países do mundo. Para entender o cenário e o motivo da reclamação de australianos e neozelandeses, é preciso ver o ranking de bibliotecas da Netflix. Segundo publicado pelo jornal NZHerald, a Nova Zelândia é a 15ª colocada em o número de título disponíveis em seu acervo, com aproximadamente 2.042 filmes e séries no acervo local. Já a Austrália vem uma posição à frente,

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Última parada: OCEANIA

Mesmo com configurações personalizadas para a Nova Zelância, a Netflix enfrenta as reclamações dos usuários da região

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der o motivo de tanta reclamação e queda gradual do número de assinantes da empresa na região. Em carta aos investidores no começo de 2016, Hastings disse que o crescimento da base assinantes globais da empresa tem ficado abaixo da meta por


que a Netflix perdeu o fôlego de crescimento nos dois países, pois muitos usuários estão migrando para as empresas concorrentes, o que fez ela perder um número considerável de usuários ver o crescimento estagnar na região. A explicação para um acervo considerado pequeno e que não atende às necessidades dos usuários da plataforma pode ser explicada por uma estratégia da concorrência. Empresas como Presto, Foxtel e Stan, que já atuavam no setor antes da Netflix chegar à Austrália e Nova Zelândia, ao saberem que a empresa tinha planos para levar seu serviço ao continente, adquiriram os direitos de distribuição das principais séries e filmes de sucesso, com a intenção de deixar nova concorrente com poucas opções em seu catálogo e preservarem sua fatia no mercado local. Enquanto a Netflix não construir um catálogo mais robusto e de conteúdo original, a estratégia da concorrência vai continuar funcionando. Essa estratégia afastou a possibilidade de a Netflix colocar em seu conteúdo séries conhecidas como Gotham, que mesmo tendo sua estreia adiada nos países, não poderia ser exibida pela gigante norte-americana. Mas o pior exemplo para a empresa é em relação ao seu conteúdo original, pois Orange Is the New Black tem os seus direitos de transmissão na Austrália pertencentes, de forma exclusiva, à Foxtel. A famosa série Breaking Bad passa por situação semelhante, já que, na Austrália, tem os direitos de reprodução presos, de forma exclusiva à Stan, a maior empresa do ramo no país. Além dela, a Stan também fechou uma parceria com o a CBS e o canal Showtime para distribuir suas produções com exclusividade para o público australiano. Entre os seriados estão Californication, Limitless, Elementar e Under the Dome. A aventura da Netflix nas ex-colônias britânicas não está sendo bemsucedida até o momento e, se quiser se tornar um grande player e referên-

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Expansão territorial

Utilizando o VPN, sistema que burla restrições geográficas na internet, o usuário fica sujeito à atuação de hackers

cia no segmento de entretenimento, a empresa vai precisar de muito trabalho e um conteúdo cada vez mais exclusivo se quiser reverter a rejeição do público local.

A pirataria via VPN

A insatisfação dos públicos da Austrália e Nova Zelândia em relação ao pouco conteúdo disponibilizado para eles fez com que muitos assinantes recorressem a uma espécie de pirataria virtual. Eles têm feito cada vez mais uso de ferramentas que possibilitam acessar a biblioteca norte-americana do serviço. Um exemplo destas ferramentas e principal alternativa encontrada por australianos e neozelandeses é o VPN (Virtual Private Network). O VPN é uma ferramenta que possibilita ao usuário acessar a internet a partir de servidores localizados em outros países. É uma espécie de túnel virtual que liga a PC ou dispositivo móvel do usuário a um servidor em qualquer parte do mundo. Ele foi muito usado no Brasil quando houve o bloqueio do WhatsApp, porém especialistas não recomendam o uso de tal ferramenta, pois dentro desse túnel o usuário fica extremamente vulnerável ao ataque de hackers. Para entender melhor o que levou os assiantes a utilizarem essa ferramenta vale uma rápida explicação de como funciona o sistema da Netflix.

A empresa, devido aos acordos de distribuição de conteúdo que assina, tem certas restrições quanto a disponibilizar determinadas séries ou filmes em algumas regiões do mundo, como mencionado anteriormente, no caso do seriado Breaking Bad. Por esse motivo a empresa impõe restrições geográficas em seu site: por exemplo, um usuário brasileiro não tem acesso às bibliotecas dos Estados Unidos ou Europa. Para burlar essa restrição e terem acesso a séries como House Of Cards e Orange Is the New Black, muitos usuários usaram programas de VPN para logar no site da Netflix e ter acesso à biblioteca norte-americana como se estivessem acessando a internet diretamente de lá. A prática do uso do VPN, além de perigosa para a segurança virtual, é considerada crime de pirataria pela Netflix. Se um assinante for pego utilizando essa ferramenta para burlar as restrições geográficas impostas pelo sistema da Netflix, por exemplo, a empresa costuma bloquear a conta original e proibir o usuário de realizar um novo cadastro no site por um período de seis meses. Para o público da Austrália e Nova Zelândia, o risco de ser expulso da plataforma da Netflix por tentar burlar as leis da empresa tem valido a pena, já que o conteúdo disponibilizado para eles não é muito rico em opções.

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Divulgação/ Netflix

Foco no usuário

Quem manda é o assinante a estratégia da Netflix para manter constante evolução focada em melhorar a experiência do usuário

A

Netflix mudou muito nos seus quase 20 anos de estrada. A empresa que começou como uma locadora on-line com entregas pelo correio não parou de inovar e hoje é considerada a maior empresa do ramo de distribuição de conteúdo em streaming. Apesar de toda essa mudança, duas coisas permanecem intactas na cultura da companhia de Hastings: a inovação constante e, principalmente, o foco em proporcionar a melhor experiência para o usuário.

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A crença da Netflix sempre foi que, para conquistar o público e manter seu assinante satisfeito, qualquer mudança ou alteração em seu plano de negócio deveria privilegiar o usuário, pois sem ele a empresa perdia a razão de ser. Por isso em 2015 a empresa investiu pesado na remodelação de sua plataforma on -line, deixando-a mais funcional, intuitiva e responsiva, ou seja, adaptável ao dispositivo que o assinante escolhesse para assistir sua série ou filme favorito.

Entre as muitas novidades da nova plataforma estão a criação de cinco perfis diferentes em uma mesma conta, o que possibilita uma interação cada vez mais personalizada, a possibilidade de configurar a qualidade de reprodução do vídeo e uma navegação mais fluída pela biblioteca por meio de menus inteligentes. Com a expansão global da empresa, ela percebeu que em muitas regiões a qualidade da banda larga não era das melhores e, por isso, começou a multicompactar seus


Foco no usuário

Divulgação/ Netflix

Recomendação dinâmica

O novo layout responsivo do site da Netflix faz com que o conteúdo se adapte à reprodução em qualquer dispositivo

que o assinante pode escolher a qualidade do vídeo, o que ajuda na hora de economizar a banda larga de seu plano de telefonia. Há muitas outras novidades que a empresa preparara para melhorar o conforto do usuário, que você descobre nesse capítulo.

dennizn / Shutterstock.com

arquivos de áudio e vídeo, transformando-os em formatos menores. Na prática essa nova tecnologia possibilitou que qualquer usuário, independentemente da qualidade de sua internet, conseguisse assistir ao conteúdo escolhido com um mínimo de qualidade e satisfação, além de dar mais rapidez ao carregamento do arquivo no site do usuário. É óbvio que a Netflix mudou bastante durante todos esses anos, porém a ferramenta mais importante para garantir o sucesso do modelo de negócios da empresa continua lá. Essa ferramenta é o algoritmo, ou programa de recomendação de conteúdo. Claro que ele mudou e foi aperfeiçoado para ficar mais preciso e acompanhar a globalização da marca, mas sem ele, talvez a Netflix não tivesse se tornado a companhia que é hoje. A empresa tem planos ambiciosos para o futuro e continua a testar maneiras e mais maneiras de levar a melhor experiência para seu assinante. Está em fase de estudos, por exemplo, a reprodução de trailers automáticos para facilitar a escolha do usuário. Ela também já liberou uma área em

A mais antiga e provavelmente a mais importante ferramenta para garantir uma boa experiência do usuário dentro do ambiente Netflix é o programa que faz a recomendação de filmes e séries baseado nas atividades do usuário no site. A partir de um algoritmo (conjunto de comandos predeterminados) o sistema da Netflix consegue armazenar todas as atividades que o assinante fez no site. Quais filmes pesquisou, quais foram vistos e por quanto tempo o usuário permaneceu assistindo determinado filme ou série. Com base nesses dados, o programa cruza essas informações com as avaliações feitas em cada filme e oferece aquele que possivelmente vai agradar mais o assinante na hora que escolher um filme ou série para passar suas horas de lazer. Por exemplo, se você costuma assistir muitos filmes de ação, a ferramenta vai sempre sugerir filmes ou séries de ação com os atores que você mais gosta e, provavelmente, quase nenhum filme de comédia. Desde sua implantação em 1998, a ferramenta sempre baseou seu sistema de recomendação por meio de

Nova interface Netflix com sistema de recomendação com filmes na horizontal

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Foco no usuário

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cou no blog sobre tecnologia mantido pela plataforma: “Estávamos muito preocupados que a execução de algoritmos que sabidamente funcionavam bem quando chegavam dados de um único país e um único catálogo, se tentássemos através de catálogos de lugares diferentes, a recomendação poderia ser muito ruim”.

Uma ferramenta global

Um dos motivos que levaram a Netflix a atualizar e transformar seu sistema de recomendações em um banco de dados global foi que toda a vez que a empresa entrava em um novo mercado como na Europa ou na Ásia, ela tinha que redesenhar a forma como a ferramenta reconhecia as preferências dos usuários daquela região, pois o sistema recomendava filmes e séries sem ter uma base de dados anterior sobre as preferências dos novos assinantes daquela região, como demonstrou Uribe em recente postagem no blog da empresa. “Quando lançamos o site em novos mercados – Suécia, Alemanha, França, ou qualquer um dos nossos mercados anteriores – tivemos que gastar muito tempo para ajustar as recomendações para os novos usuários”, contou.

Divulgação/ Netflix

coleta de informações locais. Um assinante conectado nos Estados Unidos iria receber recomendações baseada no cruzamento de suas atividades e nas avaliações dos usuários norte-americanos, o que a empresa acreditava refletir melhor o interesse desse assinante. Porém, com a globalização da empresa, esse modelo de recomendações ficou ultrapassado e gerou problemas. O algoritmo trabalha com dois tipos de informação. Se o usuário começou a ver um seriado ou filme e não terminou de ver ou ficou pouco tempo assistindo tal conteúdo, o sistema da Netflix entende que provavelmente ele não gostou do filme, o que influência na aparição de outros filmes do mesmo gênero. O outro tipo de dados refere-se às notas das pela avaliação dos usuários (notas de 1 a 5 estrelas). Quanto melhor avaliado o filme, mais no topo da lista de recomendações ele aparece. A partir de 2016 a Netflix resolveu aprimorar a ferramenta e torná-la global. Ou seja, ao invés de realizar cruzamentos de dados sobre preferências e avaliações com base na localização geográfica do assinante, o algoritmo por trás da plataforma passou a cruzar os dados de todos os assinantes da Netflix no mundo. Agora, por exemplo, um assinante brasileiro que gosta de filmes de terror terá a sua lista de recomendações montada a partir do cruzamento das preferências e dos filmes melhores avaliados por fãs de terror de todo o mundo. A mudança na estrutura do mecanismo de cruzamento de dados parece simples, mas envolveu cerca de 70 engenheiros de tecnologia da informação que trabalharam durante um ano na elaboração e atualização do algoritmo para que ele atendesse às necessidades de todos os usuários da plataforma. Sobre a demora para atualizar a principal ferramenta de interação entre a Netflix e o seu público, Carlos Gomez Uribe, vice-presidente de inovação de produto da empresa publi-

Detalhe do site na Netflix na versão em chinês tradicional

A nova versão no algoritmo não vai apenas globalizar o cruzamento de dados para oferecer uma lista de recomendações aos novos mercados que a Netflix entrar, ela vai fazer também o caminho inverso. Em regiões onde as bases de dados já estão consolidadas como Estados Unidos, Canadá e América Latina, por exemplo, o novo algoritmo irá associar as duas bases de dados, a regional e a global. A expectativa da empresa é levar aos seus assinantes recomendações cada vez mais adequadas ao perfil de cada um deles. A nova ferramenta de recomendação já está ativa dentro da plataforma da Netflix, mas ainda precisa passar por alguns ajustes para tornar a lista de recomendações mais assertiva. O principal ajuste em que os engenheiros da empresa vêm trabalhando para aperfeiçoar o mecanismo de recomendação é referente à linguagem. O site da Netflix opera em 21 idiomas para atender toda a audiência global da empresa, porém o sistema ainda não consegue fazer o rastreamento das preferências em língua nativa. Um dos desafios dos engenheiros é definir qual a melhor forma para o sistema de recomenda-


Reprodução/ Netflix

Foco no usuário

Interface da Netflix antes da reformulação, que criou um layout mais intuitivo

ções funcionar, se ele deve recomendar os melhores filmes avaliados de forma geral ou o melhor filme avaliado no idioma nativo dos usuários. A nova otimização do sistema de recomendações ainda está em fase de testes e não tem previsão para estar disponível para funcionar e organizar as listas de preferência de acordo com o idioma de cada usuário. Mas sem dúvidas essa nova evolução vai deixar o sistema de recomendações ainda mais personalizado e preciso. Uma nova funcionalidade que com certeza vai cair no gosto de exigente público da Netflix. Segundo números da própria Netflix, aproximadamente 800 engenheiros trabalham na sede da empresa para que o sistema de recomendações continue rodando de forma eficiente, pois segundo estimativa, cerca de 75% das atividades feitas pelos assinantes no site são conduzidas pelo seu sistema de recomendação, que sempre tem uma

nova opção de filme ou série para instigar o usuário a permanecer navegando no site.

Interface do usuário

Não é só o afinado sistema de recomendações que é responsável por manter o usuário preso ao site da Netflix por um longo período. Tão importante quanto ele é o que os engenheiros de tecnologia da informação chamam de interface do usuário. É por meio dela que você realiza sua interação com o site, escolhe e assistir ao seu filme ou série favorita. Essa parte do site é crucial para atrair e manter o assinante o maior tempo possível navegando pela extensa biblioteca de conteúdo da empresa. Se o site não fosse atrativo ou a sua navegação fosse difícil, muito provavelmente ninguém permaneceria nele e a companhia perderia público para outros distribuidores de conteúdo que oferecessem uma experiência mais agradável.

Durante os primeiros anos e na mudança do modelo de negócios de videolocadora para distribuidora de streaming, a Netflix pouco tinha mudado a interface de seu site. Apesar de uma repaginada que modernizou o site, o sistema de busca e a forma como a biblioteca era exposta ao usuário era praticamente a mesma. Os filmes e séries ficavam dispostos lado a lado no site, em grupos de 10 por fileira e se o usuário quisesse visualizar o catálogo todo, era necessário fazer a rolagem da tela até encontrar o filme favorito. Dependendo do humor na hora da escolha, o assinante poderia desistir e procurar outro tipo de entretenimento. Em 2015, a empresa resolveu se modernizar e repaginou de forma radical o layout e as funcionalidades de sua plataforma de distribuição de conteúdo. Uma importante novidade implantada na renovação tecnológica do site foi a adição da busca inteligente. Agora basta o usuário digitar as

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primeiras letras do filme, série, ator ou categoria que deseja procurar e o próprio buscador já mostra as principais opções que o site tem à disposição relacionados àquelas palavras. Se os assinantes quiserem, por exemplo, fazer uma busca apenas por produções originais da Netflix, basta digitar o nome da empresa na área de busca que o próprio site já reconhece e mostra todas as produções originais disponíveis no catálogo para escolha. A intenção era deixar a procura e escolha de filme da mais intuitiva e rápida, para que o usuário perdesse menos tempo na hora de escolher o que vai assistir no site. A melhoria da experiência do usuário, tornando-a mais intuitiva não ficou restrita apenas à área de busca do site. Toda a interface da plataforma foi alterada, deixando-a mais funcional. Agora os filmes disponíveis no acervo são mostrados em blocos temáticos como Kids, Populares, Dramas, entre outros. Com rolagem lateral, são mostradas de duas a seis opções por vez para que fique mais fácil o usuário ver os principais filmes de cada categoria. Se o assinante quiser se aprofundar em uma das galerias temáticas, basta clicar sobre o nome da respectiva categoria e será levado para dentro da biblioteca específica daquele tema.

Apresentação individual de conteúdo

A apresentação de séries ou filmes agora ficou mais completa. Assim que o usuário seleciona determinado conteúdo, ele é levado para uma espécie de tela de entrada de conteúdo. Nesta nova tela há uma apresentação completa de tudo o que o usuário vai encontrar ao apertar o play. Na tela de introdução aparecem imagens do programa, sinopse do filme ou do episódio da série, a descrição temática do conteúdo, opção de escolha de capítulos e avaliação e comentários dos demais assinantes sobre o conteúdo. Tudo exposto de forma bastante intuitiva para que o usuário tenha

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Reprodução/ Netflix

Foco no usuário

Tela de título de Beasts of No Nation do aplicativo da Netflix para Windows Phone, um exemplo de apresentação individualizada de conteúdo

todas as informações necessárias antes de optar por assistir ou não o conteúdo selecionado. Além das telas temáticas, a nova plataforma da Netflix traz a tecnologia de memorização. Com ela, o site sempre mostra ao assinante em qual ponto ele parou durante o último acesso. Por exemplo, se ele parou de ver um filme durante a reprodução, é possível que no próximo acesso ele possa assistir ao filme exatamente onde parou. No caso dos seriados, a plataforma avisa qual é o próximo capítulo ou temporada. A vantagem dessa tecnologia é que agora o usuário não precisa mais ficar lembrando qual foi a um episódio ou filme que viu: o sistema faz isso por ele. A disposição dos menus em tela escura, com imagens grandes e o texto em contraste facilitam a leitura das informações por parte dos usuários também são considerados acertos da equipe responsável pelo novo layout mais moderno do site, que agora se tornou responsivo. Ele se adapta automaticamente ao ta-

manho da tela do dispositivo que o assinante estiver usando, seja tablet, celular, PC ou televisão, o usuário terá uma navegação perfeita e verá o filme sem problemas de distorção na imagem. O principal motivo de toda essa revolução no ambiente de interface da plataforma on-line foi facilitar a navegação do usuário, independente do dispositivo usado e, em consequência disso, manter o usuário mais tempo no site desfrutando do conteúdo oferecido. Em uma pesquisa feita pelo site Wired com usuários escolhidos de forma aleatória, a maioria deles identificou como principal ponto positivo a facilidade com que era possível navegar pela biblioteca e trocar de uma categoria para outra, além de fazer pesquisas em subcategorias. Foi um movimento arriscado redesenhar totalmente a interface do usuário, mas sem dúvidas, a maioria dos assinantes da Netflix aprovaram a nova forma com que interagem com os conteúdos da forma em que foram distribuídos no site. A concorrência cada vez mais forte no setor de distribuição de conteúdo on-line em streaming com a chegada de novos players, além dos tradicionais concorrentes como Hulu e Amazon Prime, incentivou essas mudanças. A repaginada no visual e nas funcionalidades da plataforma foram mais uma forma da empresa se manter como líder do mercado em número de assinantes e ainda tentar atrair novos usuários oferecendo uma plataforma mais agradável e mais fácil de navegar.

Cada vez mais pessoal

A radical mudança no visual e nas funcionalidades do site não foram as únicas que a Netflix ofereceu os seus assinantes. A empresa focou também na individualização do conteúdo. Nessa nova plataforma, o assinante pode criar até cinco perfis diferentes para uma mesma conta. Se ele quiser pode criar um perfil para a esposa, para o filho, irmão etc., além de cada


um desses perfis ter um sistema de recomendação, memorização e lista de favoritos próprios e adequados às preferências do usuário. A nova prática possibilitou não só uma experiência cada vez mais pessoal de cada usuário, mas também que o sistema de recomendações atuasse de forma mais precisa e com uma lista que realmente refletisse a preferência do usuário daquele perfil, sem a interferência das preferências de outros usuários da mesma conta.

Em todos os dispositivos

Em comunicado à imprensa no lançamento do novo layout e das novas funcionalidades de sua plataforma de reprodução de conteúdo, a empresa afirmou que o novo formato era global, multiplataforma e estaria, aos poucos, disponível para todos os usuários, porém fez uma ressalva: o novo formato só estaria à disposição dos usuários que usam PC ou notebook para assistirem aos conteúdos se eles tivessem os navegadores mais recentes do mercado. Caso contrário, seria necessário atualizar para versão mais recente do navegador para ter acesso à nova plataforma adotada pela Netflix.

Shutterstock

Foco no usuário

A Netflix implantou um sistema de compactação que permite ao usuário escolher a resolução e reduzir consumo de dados

Para os usuários de usam outros dispositivos como videogames, tablet e Smart TVs, a empresa anunciou outras novidades. Para os assinantes que acessam o site pelo Xbox 360, a Netflix adicionou uma funcionalidade que permite navegar pela plataforma por meio do comando de voz do aparelho, dando mais interatividade à experiência do usuário. Nas Smart TVs, a novidade é a possibilidade de navegação do cursor

do próprio aparelho, ou seja, há uma perfeita integração entre o aplicativo da Netflix e os novos televisores. Apesar das boas notícias, há uma que não vai agradar parte dos assinantes do serviço. Ainda de acordo com o comunicado da empresa, a nova plataforma não estará disponível para os usuários que acessam o site por meio de aparelhos como Xbox One, AppleTv e Wii. A justificativa para a falta no videogame da Nintendo é que o aparelho não suporta o layout em alta definição do site; para a TV da Apple e o videogame da Microsoft, a empresa alega que há restrição de terceiros quanto ao design do aplicativo nesses aparelhos.

Prathan Chorruangsak / Shutterstock.com

Controle da banda larga

As alterações no layout e no funcionamento dos aplicativos ficaram disponíveis para todos os usuários simultaneamente

Pensando não só em melhorar de interação do usuário com a plataforma, a Netflix oferece a seus usuários a possibilidade de controlarem o consumo de dados de seu plano da banda larga. Desde o final de 2015, os usuários podem controlar quanto pretendem gastar do seu plano de dados para assistir a um filme ou o episódio de seu seriado favorito. Para que o usuário possa ter esse controle, em dispositivos móveis, a empresa disponibilizou em seu site a opção de configuração. Para isso, o

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Foco no usuário

Baixo (0,3 Gb por hora) Médio (SD: 0,7 Gb por hora) Alto (a melhor qualidade de vídeo: até 3 Gb por hora para HD e 7 Gb por hora para Ultra HD) Automático (ajusta-se automaticamente para fornecer a melhor qualidade possível, com base na velocidade da sua conexão com a Internet)

Filmes em qualquer lugar

Além do controle do plano de dados dos pacotes de internet, a Netflix passou a adotar a multicompactação dos seus arquivos de vídeo. A estratégia foi adotada pela empresa para poder proporcionar o mínimo de qualidade e satisfação ao usuário que por

algum motivo não tenha acesso a conexões de internet banda larga com muita qualidade, como em muitas regiões da África, Ásia e América Latina, onde o serviço de internet ainda é considerado deficitário. Com a adoção do método de compactação, que condensa o mesmo vídeo em diversos formatos, mas mantém um mínimo de definição, associado ao modo automático (padrão) para reprodução de seu conteúdo, a Netflix garante que qualquer pessoa, independente da localização geográfica ou qualidade de internet possa ter acesso aos principais filmes do catálogo e assistir seu filme ou série sem maiores dificuldades, o que é essencial para manter o plano de expansão global da empresa.

Planos futuros

A Netflix continua em eterno processo de renovação. Depois de melhorar o layout da plataforma e oferecer uma interface mais intuitiva para os usuários, a empresa vem estudando novas formas de melhorar a experiência do usuário de seu serviço de streaming, sempre focando em levar ao assinante o máximo de conforto possível quando ele decidir a sua série ou filme favorito. Entre as novas opções estudadas pela empresa no médio e longo prazo estão, por exemplo, a adoção de um sistema de reprodução automática que funcionaria Otimização do armazenamento em cache

Qualidade de conteúdo

Codificação

Checagem de qualidade

Estúdio Ilustração do sistema de multicompactação de arquivos da empresa

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Netflix

Servidor Open Connect

com a exibição de pequenos trailers dos conteúdos que a empresa tem em seu acervo para ajudar o usuário na hora escolher um filme ou série que quiser assistir. A empresa pensa também em disponibilizar o conteúdo de forma off-line para os usuários. Ela teve essa ideia depois que surgiram os primeiros debates sobre limitação do uso de

QoE Metrics

Dispositivos e aplicativos Netflix Usuário

Comportamento do usuário

Reprodução/ Adaptado do Blog Neflix

assinante precisa ir até sessão “Minha conta”, selecionar configuração e definir com qual qualidade de vídeo seu conteúdo será reproduzido. Cada perfil pode fazer a sua própria configuração de vídeo sem interferir na qualidade de reprodução de outro usuário da mesma conta. De acordo com estimativas publicadas no blog de tecnologia mantido pela Netflix, um filme reproduzido em HD consome aproximadamente 6 gigabytes do plano de dados do assinante. A empresa tem, por predefinição, quatro padrões de qualidade para reprodução dos filmes ou séries de sua biblioteca. São eles:


banda larga pelas empresas de telefonia do mundo. Se as operadoras conseguirem que os governos aprovem leis que as deem liberdade para limitar o uso de dados da banda lagar em pacotes limitados, com certeza o modelo de sucesso da Netflix estará ameaçado. De todas as mudanças previstas para os próximos anos a que já está em fase de testes, a próxima de ser oferecida ao assinante é a adoção do sistema de reprodução automática de trailers com trechos dos principais conteúdos disponíveis no acervo da Netflix. O método utilizado será o seguinte: enquanto o usuário estiver navegando pelo site, a própria plataforma vai abrir um player automático sempre que usuário passar o mouse sobre a imagem de um programa e vai reproduzir um trailer da série selecionada. De acordo com a empresa, os trailers terão aproximadamente dois minutos de duração e mostrarão algumas sequências da série ou filme em questão. É uma forma de a empresa, em pouco mais de 90 segundos,

convencer o usuário de que aquele conteúdo merece ser visto. A intenção da empresa por trás da adoção de propaganda da própria biblioteca, segundo a empresa, é facilitar a vida do usuário, pois através dos trailers, a Netflix acredita que o usuário perderá menos tempo na procura de um filme ou série e poderá dedicar mais tempo de seu período de lazer para assistir o conteúdo indicado. A nova ferramenta já está em fase de testes e está disponível para 300 mil usuários da plataforma. Se o feedback for bom, a empresa deve adotar o sistema de reprodução automática de trailers até o final de 2016. Nos resta aguardar e ver se a moda pega.

vez maior das operadoras de telefonia ao consumo ilimitado de banda larga por parte de seus clientes, o que seria muito problemático para o modelo de negócios adotado pela empresa. Em entrevista à publicação Bussines Insider, o CEO da Netflix, Reed Hastings disse que a empresa precisa estar com a mente aberta a todas as possiblidades no futuro. “Devemos manter uma mente aberta sobre tudo isso [...] à medida que expandimos em todo o mundo onde vemos um conjunto desigual das redes, é algo que devemos manter uma mente aberta sobre”, disse. A principal dificuldade que a empresa teria que enfrentar é a renegociação de todos os seus acordos de distribuição de conteúdo, visto que os atuais não contemplam a oferta de conteúdo off-line para os seus assinantes. O que pode fazer a empresa acelerar a adoção da liberação de seu conteúdo off-line é que uma de suas maiores concorrentes, a Amazon, já adota essa prática através da sua plataforma de Instant Video. Nela, o usuário pode baixar o conteúdo que desejar, porém tem um prazo determinado para assisti-lo. Pode ser uma saída na guerra conta as operadoras de sinal de banda larga e para se manter como líder mundial na distribuição de conteúdo on-line.

Shutterstock

Divulgação/ Netflix

Foco no usuário

Distribuição off-line

A ideia ainda causa certa restrição na Netflix, mas a empresa já começa a considerar liberar o download de seu acervo para os assinantes. A premissa ainda é embrionária dentro da empresa, porém já se começou a discutir essa opção em virtude de o cerco cada

Netflix estuda disponibilizar seu conteúdo para download. Modelo deve ser semelhante ao da concorrente Amazon

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Consumo padrão Netflix

A revolução da plataforma de streaming

Diabluses / Shutterstock.com

Desde o surgimento da plataforma de streaming, o hábito de consumo de conteúdo mudou drasticamente

P

odemos dizer que a forma com que as pessoas consumiam conteúdos de entretenimento mudou bastante desde que a Netflix lançou sua plataforma de distribuição on-line e em streaming. Se até meados de 2007 as pessoas alugavam DVDs ou assinavam planos caros de TV a cabo para terem acesso a 200 canais com uma programação diversificada, que ia de programas de esportes a filmes e documentários,

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para curtirem seu lazer diante da TV, de lá para cá muita coisa mudou, inclusive a forma como nos relacionamos com a televisão. As principais mudanças ocorridas nesses últimos anos vão além da chegada da Netflix: elas têm relação direta com o avanço da tecnologia. Com a invenção e popularização de dispositivos móveis como smartphones, notebooks e tablets e o surgimento da internet banda


Consumo padrão Netflix

ArthurStock / Shutterstock.com

pelas novas empresa de conteúdo em streaming como a Netflix que, por terem nascido já no mundo digital, conseguiram entender melhor as necessidades dos assinantes e hoje já começam a tomar o lugar das grandes corporações de mídia no setor no entretimento. Brad Agate, da consultoria Horizon Media, traçou um diagnóstico do novo cenário do mercado de consumo na TV. “Nos Estados Unidos, o público da TV tradicional está envelhecendo. Alguns anos atrás, a idade média estava na casa dos 40 anos, agora está na dos 50. Os jovens estão em outras plataformas”, disse.

Mudança de hábitos

larga de boa qualidade, já não é mais necessário ficar à frente de um televisor para assistir seu filme ou série favorito durante o período de lazer. Basta estar em um local com conexão à internet que é possível assistir ao programa que quiser, no local e na hora escolhidos. Pode ser em um parque, na casa de um amigo ou mesmo no transporte coletivo a caminho do trabalho. Agora não há mais desculpa para deixar de assistir aquela série ou filme que todos andam comentando. O avanço tecnológico e a chegada do streaming mudaram não só o hábito, mas também toda uma estrutura já consolidada do modelo de TV tradicional. Até a Netflix oferecer seu conteúdo com programação livre, era a emissora que decidida o que o usuário ia assistir. Nesse modelo no qual consumidor assume o protagonismo na hora de definir a sua própria programação, já não cabe mais apenas esperar para assistir o que as emissoras e operadoras de TV ofereciam de acordo com sua conveniência: o controle havia mudado de mãos. Esse, talvez, tenha sido o principal fator para que o modelo de distribuição não linear adotado pela Netflix e suas concorren-

tes tenha feito tanto sucesso entre o pessoal mais jovem. A mudança de toda a cultura de consumo de conteúdo que transformou o usuário em protagonista na hora de definir a programação não afetou somente a relação do usuário com o conteúdo, mas da indústria também. Grandes empresas de comunicação que forjaram seu crescimento e lideranças no mercado de entretenimento durante o período em que detinham o poder sobre o que as pessoas assistiam viram sua hegemonia ser capturada

Reed Hastings profetizou em uma conferência à imprensa, em 2014, que o modelo de TV linear só irá durar até 2030. Segundo ele, a televisão no futuro se assemelhará a um grande aparelho de iPad pendurado na parede, cujo tradicional seletor de canais será substituído por aplicativos dos principais distribuidores de conteúdo via internet. Ainda que demore alguns anos para descobrirmos na prática se a profecia do CEO da Netflix se cumprirá, já podemos perceber uma mudança cada vez mais nítida na forma como as pessoas consomem conteúdo em seu horário de lazer.

Divulgação/ Netflix

Netflix e a tecnologia levam a TV para a palma da mão

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Christopher Penler / Shutterstock.com

Consumo padrão Netflix

Jogo do Super Bowl no estádio Meadowlands, único grande evento que mantém sua audiência na TV dos EUA

A TV tradicional, também conhecida como linear, na qual quem define a programação com os horários e quais programas são exibidos para o público são as empresas de comunicação de acordo com sua conveniência, já está se tornando coisa do passado. No novo modelo trazido pela Netflix e demais empresas do segmento de streaming, quem determina quem o programa (série ou filme) que vai assistir e em qual horário vai fazê-lo é o assinante. Na era da internet, o poder sobre o conteúdo mudou de mão: passou das grandes empresas de comunicação para o público, que não aceita mais não ter o controle do que vai assistir, principalmente as gerações mais jovens. A transferência de poder em relação ao conteúdo é um dos principais fatores que fazem com que a Netflix venha conquistando milhares de assinantes em todos os mercados que entra, ameaçando a hegemonia das grandes empresas de comunicações

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locais. Ao mesmo tempo em que angaria novos assinantes para seu modelo de transmissão de conteúdo em streaming, a empresa vê a audiência dos programas das TVs aberta e fechada caírem quase na mesma proporção. Um número que mostra como as pessoas têm deixado cada vez mais de lado a TV convencional em favorecimento à TV em streaming é que o Oscar, um dos principais líderes de audiência na TV norte-americana, registrou queda de 15% na audiência entre os anos de 2014 e 2016. O único grande evento da TV que mantém a audiência em alta é o Super Bowl, a final do campeonato de futebol americano e o comercial mais caro do mundo. É claro que transferir o poder sobre a programação para o assinante contribuiu para que a Netflix revolucionasse o hábito de consumo de conteúdo de filmes e séries entre as gerações mais jovens, porém, o fato de não veicular propaganda em seu

site ou durante a reprodução de seu conteúdo ajudou a empresa a cair no gosto do público. Quem nunca reclamou, por exemplo, de ter o filme interrompido por conta da propaganda de um determinado anunciante ou quando, na TV paga, o filme demora mais para começar porque o canal decidiu anunciar a estreia de uma superprodução do cinema para o horário mais nobre? A reprodução de conteúdo de forma direta e sem pausas comerciais é sempre lembrada como um dos fatores que fazem os assinantes gostarem ainda mais do modelo da Netflix.

Com auxílio da tecnologia

A Netflix contou com um forte aliado em sua expansão e consolidação como um dos principais players no mercado de distribuição de conteúdo. Não fosse pelo amadurecimento e popularização da banda larga de internet e o surgimento dos disposi-


Annette Shaff / Shutterstock.com

Consumo padrão Netflix

O Wii Channel, da Nintendo, é uma das formas de acessar a Netflix pela televisão

favoritos são os videogames Xbox 360 e Playstation 3 e em seguida o PC. Nenhum deles citou a TV convencional como aparelho preferencial escolhido quando decide alguma produção da indústria do entretenimento. De acordo com um estudo realizado pelo instituto Nielsen, em 2014, nos Estados Unidos os jovens com 18 anos ou mais estão assistindo cerca de 20 minutos a menos de programação de TV por dia, o que mostra o declínio do consumo de conteúdo a partir de um dispositivo fixo. A pesquisa

Conceito de TV na internet

A Netflix é o que podemos chamar de TV moderna. Não só por distribuir o seu conteúdo via internet ou

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tivos móveis como smartphones, tablets e notebooks, talvez a empresa não tivesse revolucionado o mercado de entretenimento e seria apenas mais um canal de TV paga. É claro que não dá para tirar os méritos de Hastings em apostar em um modelo inovador de distribuir o seu conteúdo, porém sua tarefa foi facilitada pela chegada das novas tecnologias. Foi por meio delas que mais pessoas puderam ter contato com a plataforma e ter a experiência de assistir às suas séries e filmes favoritos no local que quisessem, sem ter que ficar presos a aparelhos fixos como o tradicional televisor. O modelo de distribuição de conteúdo que adota a tecnologia móvel como canal de distribuição entre a empresa e o seu público é definido como Flexibilidade e Mobilidade, pois além de proporcionar que os assinantes acessem o acervo a partir de qualquer lugar, sua reprodução se adapta a qualquer dispositivo sem nenhum prejuízo ao conteúdo reproduzido. Um dado que mostra como as novas gerações têm preferido consumir conteúdo em dispositivos móveis vem de uma pesquisa realizada pelo site BetaNews, especializado em tecnologia. Os entrevistados responderam que os principais dispositivos que eles usam na hora de ver sua série ou filmes

confirma as afirmações de especialistas que dizem que as novas gerações estão preferindo cada vez mais o uso de smartphones,iPad ou notebooks na hora de escolherem como querem assistir ao conteúdo desejado. Ainda segundo o mesmo instituto, adultos entre 18 e 34 anos estão usando 32 minutos a mais seus dispositivos móveis para acessar a internet e assistir filmes e séries em sites ou aplicativos de distribuição conteúdo em streaming, seja na Netflix, líder do mercado ou em suas concorrentes como Hulu, HBO GO e Amazon Instant Video. O analista de mercado Todd Bernstein Juenger fez uma análise para o Wall Street Journal sobre o cenário da TV convencional dentro da indústria do entretenimento nos Estados Unidos. Para ele, “a indústria da televisão dos EUA está entrando em um período de declínio estrutural prolongado, causada por uma migração dos telespectadores para plataformas com suporte de anúncios para plataformas com menos anúncios”.

Com a TV da era da internet é possível ver seu conteúdo favorito em qualquer lugar

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Consumo padrão Netflix seu acervo poder ser acessado em um dispositivo móvel. O que faz dela, digamos, a TV do futuro é que ela deixa nas mãos dos assinantes escolher qual conteúdo deseja assistir. Além de dar poder ao usuário, a Netflix também se caracterizou por revolucionar a forma de distribuição de conteúdo. Nas TVs pagas, por exemplo, os seriados são distribuídos durante os meses dentro da programação do canal. No modelo adotado por Hastings, todos os episódios são disponibilizados de uma vez só e cabe ao assinante definir de que forma vai consumi-lo. No modelo de TV em streaming inaugurado pela Netflix e aos poucos adotados pela demais operadoras de

TV como a Globo, que lançou seu serviço em streaming, o Globo Play, o conteúdo completo da biblioteca fica à disposição do usuário para que ele escolha o filme ou série que deseja assistir, sem ficar preso às preferências do canal ao hierarquizar a disponibilização do conteúdo. No formato de TV linear é comum que as emissoras encham a sua programação com propagandas, seja de anunciantes, no caso da TV aberta, ou dos próprios programas no caso da TV fechada. Como a Netflix não exibe propaganda durante a reprodução em streaming, ela adotou uma forma diferente de fazer sua autopropaganda. Ela adotou o sistema de recomendação de conteú-

do, que nada mais é do que promover seus programas para os assinantes, só de que forma mais sutil. Esse formato menos agressivo de fazer propaganda é outra característica marcante da TV da era da internet, e tem sido um dos diferenciais da Netflix perante a concorrência, principalmente as TVs tradicionais, pois elas não dispõem da mesma tecnologia desenvolvida pela empresa de Hastings. Por serem estruturadas dentro de um modelo linear, não tem como as emissoras fazerem propaganda de outra forma que não seja interferindo direto na programação. Mais uma vantagem tecnológica que é característica do novo modelo de TV distribuída pela internet é a possiblidade de personalização de conteúdo. Com o auxílio de sites e monitores de preferência, a Netflix pode oferecer, em forma de lista, um conteúdo mais personalizado para cada cliente. Bem diferente da TV linear, que precisam pensar sua programação de forma que agrade a maioria da audiência, sem chance de oferecer um programa para cada tipo de gosto. Esse é um fator que dificilmente a TV considerada tradicional conseguirá superar devido aos limites tecnológicos impostos pelo modelo de distribuição em que ela está inserida.

Ao contrário da TV convencional, o modelo de streaming da Netflix permite que o usuário monte sua própria grade de horários

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Tudo sob demanda

A restrição tecnológica do modelo de TV convencional, seja a cabo ou aberta, em relação à TV na era da internet não se restringe somente à personalização de conteúdo a ser entregue ao público, mas também a forma como essa entrega é feita. A Netflix trouxe para o ambiente de distribuição de conteúdo o conceito on-demand, que se caracteriza por disponibilizar acesso livre ao usuário para toda a temporada de um seriado, por exemplo. Dentro das limitações impostas pelo modelo antigo de se distribuir conteúdo é impensável imaginar que um canal de TV a cabo disponibi-


Consumo padrão Netflix lize todos os episódios de uma vez sem que isso interfira em sua grande de programação, que tem que ser a mais diversificada possível mesmo dentro de seu segmento, seja ele esportivo, de filmes ou de programas de culinária. Um bom exemplo que podemos usar para ilustrar a diferença existente entre um modelo e outro é o segmento de séries. Na TV por assinatura, principal distribuidora desse tipo de conteúdo, os episódios costumam ir ao ar semanalmente dentro de uma mesma faixa de horário. O intuito do canal é criar e alimentar a expectativa do público sobre o desenrolar da história e

mantê-lo preso ao seriado ao longo dos meses de exibição. Como no modelo adotado pela Netflix não há a limitação de grade ou um horário nobre que precise ser atendido, a empresa decidiu quebrar os paradigmas do segmento dos seriados e lançou de uma vez só, em data predeterminada, todos os episódios de uma mesma temporada de seus dois principais produtos. House of Cards e Orange Is the New Black chegaram aos assinantes de uma vez só e quem escolhia a forma como iria assistir aos conteúdos era o próprio assinante. Percebeu a principal vantagem da Netflix quando o conceito é a grade de programação? Como ela não pre-

cisa, necessariamente, ter conteúdo novo toda semana e nem se limitar às grades de programação que são características da TV convencional, ela tem a liberdade para disponibilizar seus conteúdos da forma que quiser. E isso tem caído no gosto do público e atraído cada vez mais assinantes para a sua plataforma. Um dos reflexos da preferência do público sobre oferta de conteúdo sob demanda em streaming está nos registros de audiência divulgados pela própria TV norte-americana. Entre 2012 e 2016, o setor de TVs pagas nos Estados Unidos registrou queda de 40% na audiência de seus principais programas. E muito dessa fuga da audiência tem a

O domínio do streaming nos EUA em %

50% dos lares dos EUA já consomem conteúdo on-line. A Netflix é responsável por 36% das assinaturas

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ASSINANTES NETFLIX ASSINANTES DE OUTROS SERVIÇOS DE STREAMING

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Hadrian / Shutterstock.com

Consumo padrão Netflix

O HBO Now, operante nos EUA, disponibiliza o conteúdo do canal na internet em tempo real

ver com crescimento de empresas como a Netflix. De acordo com números publicados pelas operadoras de banda larga, estima-se que Netflix e Hulu fecharam 2015 presentes em aproximadamente 50% dos lares norte-americanos, sendo 36% para a empresa de Hastings e 13% para a concorrente. Um número que reflete bem o novo cenário no hábito das pessoas ao escolherem o melhor modelo para consumo de conteúdo é que os principais players de conteúdo on-line nos Estados Unidos estão presentes em quase 50% das residências do país. O alcance da Netflix chega a 36% dos lares estadunidenses em 2015 e o Hulu responde mais outros 13% do mercado de consumo on-line. Os números mostram que assistir programas sob demanda em streamings já está se tornando preferência entre o público norte-americano. É mais um sinal que, de forma rápida, cultura do consumo de entretinimento está mudando da TV convencional para a TV na internet.

A influência do modelo Netflix

A Netflix não chegou ao mercado somente para transformar o modelo de

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TV tradicional em ultrapassado, mas também para mostrar um novo caminho a ser seguido pelas empresas que quiserem sobreviver nesse novo mundo dominado pela internet. Se o novo modelo é considerado bom pelo público, pois o coloca como protagonista, por outro lado as principais empresas do setor de entretenimento não ficaram muito satisfeitas, pois viram sua hegemonia do setor ameaçada pelas empresas de streaming. A principal influência do modelo iniciado pela Netflix em relação às grandes empresas do setor de comunicação e de entretenimento é que elas, percebendo que estavam perdendo terreno para as empresas de streaming, começaram a fazer a migração de seus conteúdos para o universo digital e a oferecer seu conteúdo sob demanda através de sites ou aplicativos específicos. A aposta das principais operadoras de TV paga tem sido atrelar o seu serviço on-demand à assinatura do seu pacote de conteúdo na TV a cabo. Nesse caso, o usuário após assinar o pacote de canais da TV recebe de forma gratuita o acesso aos sites e aplicativos dos canais para ter acesso aos seus principais programas. O diferencial em relação ao modelo ado-

tado pela Netflix é que o assinante só tem acesso, em seu tablet, smartphone ou computador, ao conteúdo depois que ele for exibido pela primeira vez na plataforma da TV paga. Nos Estados Unidos, por exemplo, onde a TV tradicional é mais ameaçada pelo modelo de streaming sob demanda, pois o acesso à internet de banda larga é mais popularizado, um dos principais canais de TV aberta do país já começou a fazer sua migração para o ambiente digital. A CBS lançou em 2015 seu serviço on-line chamado CBS All Acess, que mediante o pagamento de US$ 6 por mês, o assinante tem acesso a 6.500 produções exclusivas do canal, porém com algumas restrições. As transmissões de jogos de futebol americano continuam exclusivamente reservadas para o horário nobre da TV e só os episódios da temporada atual da consagrada série Big Bang Theory é que estão à disposição do usuário. As temporadas anteriores ficam com sua exibição restrita ao público da TV. O canal especializado em filmes HBO também já lançou seu conteúdo no ambiente virtual. A empresa criou dois modelos para concorrer com a Netflix no segmento de streaming. Para os assinantes dos Estados Unidos, a empresa lançou o HBO Now que disponibiliza todo o conteúdo do canal em tempo real em streaming e sua assinatura custa US$ 15 por mês. Para quem já é assinante do pacote de TV a cabo do canal, há a opção HBO GO, que disponibiliza o conteúdo do canal na plataforma on-line logo após a exibição para os assinantes da TV a cabo. O serviço também está disponível para os assinantes do canal no Brasil de forma gratuita, porém para ter acesso ao aplicativo é necessário ter o pacote HBO MAX da TV paga.

Mudanças no Brasil

A chegada do modelo de distribuição de conteúdo da Netflix ao país trouxe uma mudança significativa no modo


Reprodução/ Globo Play

Consumo padrão Netflix

Programação da Rede Globo agora está disponível on-line para assinantes da Globo Play

como as grandes emissoras de comunicação locais entendem a distribuição de conteúdo em streaming em plataforma digital. Até a entrada da empresa de Hastings e a consequente queda da audiência na TV aberta e a cabo, nenhum canal havia se preocupado em disponibilizar sua programação on-line para os usuários. No país, cada emissora de TV aberta tem adotado uma prática diferente para enfrentar a concorrência imposta pela Netflix. A TV Globo, por exemplo, decidiu colocar sua programação on-line através do aplicativo Globo Play, que dá acesso ao conteúdo de seu canal principal e aos programas dos canais a cabo BIS, MultiShow, Canal Brasil, OFF e GNT logo após eles irem ao ar em sua grade normal. O aplicativo tem um período de teste grátis durante sete dias e após esse período é necessário assinar o serviço por R$ 12,90 por mês.

Suas principais concorrentes adotam uma prática diferente na questão de distribuição de conteúdo. A Rede Record disponibiliza em seu site as principais notícias do dia para que o usuário possa assistir, de forma gratuita, as reportagens produzidas pela emissora. Além desse canal direto entre o público e as produções do canal, a empresa sublicenciou os direitos de transmissão do filme “Os 10 Mandamentos” para a Netflix. Na visão de Antônio Guerreiro, executivo da Record, em entrevista à revista Exame, a decisão foi acertada. “Tudo depende de termos um modelo de negócios para essas novas plataformas. Não acredito que a internet canibalize a TV. Mas não podemos entregar nosso conteúdo pela internet sem ter um modelo de receitas claro”, disse. O terceiro maior canal do país, o SBT, seguiu o mesmo caminho adotado pela Record de sublicenciar

a distribuição de conteúdo on-line para a Netflix de produções que estão sob sua licença como as novelas Carrossel e A Feia Mais Bela e o desenho Chaves. Já as TVs Gazeta e Bandeirantes decidiram elas mesmas transmitirem seu conteúdo em streaming. Por meio do site ou do aplicativo lançando pela emissora é possível acompanhar em tempo real a programação do canal, sem maiores restrições. Os canais de TV a cabo do sistema Globosat decidiram apostar, da mesma forma que a HBO, na distribuição de conteúdo em streaming atrelada à aquisição do respectivo pacote na TV paga. O grupo de canais Telecine disponibiliza seu conteúdo on-line por meio do aplicativo Telecine Play, onde o usuário pode assistir todo o conteúdo do canal após sua primeira exibição para o público da TV a cabo. Para ter acesso ao canal,

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Consumo padrão Netflix o usuário precisa ser assinante do pacote de filmes do canal em uma das três principais operadoras de TV paga do país, Claro TV, NET ou Sky. O principal efeito que o modelo Netflix causou é que as principais emissoras abertas ou a cabo resolveram se mexer e começaram a distribuir se conteúdo on-line, seja com programação completa, em tempo real ou disponibilizar notícias, filmes ou séries. Uma coisa é certa: os principais canais de televisão terão no médio ou longo prazo seu próprio aplicativo de distribuição de conteúdo on-line.

Modelo Netflix X Modelo TV a cabo

Na virada do milênio houve uma explosão no número de empresas de TV a cabo no Brasil, que se mostravam uma ótima opção para quem tinha acesso apenas aos tradicionais canais

Desde que chegou ao país, serviço de streaming ameaça televisão aberta e por assinatura

da TV aberta. A oportunidade de ter acesso aos mais diversos canais do mundo, de forma segmentada e com pacotes personalizados, encantou muitas pessoas que logo aderiram ao novo modelo de assistir TV no conforto de casa. Se a TV a cabo se diferenciava da TV aberta pela enorme quantidade de canais que oferecia, com mais de 100 opções, um fator primordial ainda a matinha próxima a sua maior rival na época. Tanto uma quanto outra tinham a limitação da estruturação linear que as obrigava a construir sua programação em grades. Isso não foi problema para consolidar a hegemonia da TV paga até o surgimento dos modelos de distribuição de conteúdo via internet. Com a chegada da internet, dos dispositivos móveis e do modelo da Netflix, o formato a cabo que parecia estar consolidado como única opção de entretenimento passou a encontrar um concorrente à altura. A competição entre os dois modos de distribuição de conteúdo não foi só campo da variedade de conteúdo oferecido, que ainda é maior nos planos a cabo, mas também no plano econômico. O plano mais básico de TV a cabo no Brasil não sai por menos de

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R$ 70,00, enquanto na Netflix o plano básico custa R$ 19,90. Os planos mais baratos e a possibilidade de assistir seu conteúdo favorito em qualquer dispositivo e a qualquer hora do dia foram os principais diferenciais que fizeram a Netflix cair no gosto popular e ameaçar o total domínio das TVs a cabo, que estão sendo obrigadas a repensar seu modelo de negócios para voltar

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a torná-los atrativos e recuperar sua audiência que aos poucos começa a migrar para as empresas do modelo em streaming. Uma outra vantagem dos serviços em streaming em relação às operadoras de TV a cabo é a relação com o cliente. Enquanto nos serviços de streaming é tudo feito on-line, desde a assinatura até o cancelamento do plano, nas operadoras de TV paga o atendimento é feito por telefone e todo o processo para cancelamento do serviço é demorado e muitas vezes cansativo, o que faz o cliente pensar duas vezes antes de adquirir qualquer pacote oferecido pelas empresas. Além de todas as desvantagens citadas, que poderiam ser resolvidas até com certa facilidade, há outros fatores que as empresas a cabo, devido às suas limitações técnicas, não tem como concorrer. A personalização de conteúdo é uma delas. A TV por assinatura oferece uma enorme variedade de canais, mas muitos deles não atendem às necessidades do cliente e só encarecem o valor da assinatura. O outro é a questão da mobilidade, pois, para funcionar, a TV a cabo necessita de um conversor de sinal atrelado ao aparelho de TV fixo, bem diferente da tecnologia móvel utilizada pelas empresas como a Netflix, por exemplo. Segundo relatório da empresa Experian Marketing Services, há uma tendência de que cada vez mais pessoas preferirem o serviço de streaming em detrimento à oferta da TV a cabo tradicional. Hoje, aproximadamente 25% dos jovens norte-americanos entre 18 e 34 anos têm assinatura de um serviço de streaming e não pensam em ter uma assinatura dos planos de TV fechada.

TV a cabo com opção de streaming

Uma das saídas encontradas pelas principais operadoras de TV a cabo foi oferecer o serviço on-demand on-line, similar ao oferecido pela


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Consumo padrão Netflix

Para tentar competir com a Netflix, as empresas de TV por assinatura criam plataformas de streaming

Netflix. A partir de uma mensalidade menor do que o pacote da TV premium a cabo, o usuário pode ter acesso aos mesmos conteúdos que os canais disponibilizavam para seus clientes do cabo, porém com atraso em relação à exibição original. Essa foi a forma encontrada pelos canais para enfrentarem a concorrência da empresa de Hastings no ambiente virtual, enquanto mantêm sua programação nos pacotes de TV a cabo. A permanência dos principais canais nos pacotes de TV a cabo, apesar da concorrência cada vez maior, ainda é rentável para as operadoras. Há muitas pessoas que ainda pagam para ver um filme ou série original produzidas por esses canais, como são os casos das produções originais HBO como Games of Thrones, que vão ao ar primeiro na TV.

Aqui no Brasil, as principais operadoras de TV a cabo como Claro TV, Sky e Net também são detentoras dos serviços de transmissão de internet banda larga, ou seja, para o assinante ter acesso a um bom pacote de internet ele acaba tendo que assinar o pacote de TV a cabo oferecidos pelas operadoras, atrelando um serviço ao outro. Dessa forma, elas mantêm o assinante preso a um combo de opção que é o principal responsável por manter a base de assinantes dos planos das operadoras de TV a cabo. A principal preocupação das operadoras de TV a cabo é que a migração do público jovem para opções como a Netflix parece ser um caminho sem volta. Só no ano passado, cerca de 400 mil norte-americanos trocaram o seu serviço de TV a cabo pelo de streaming, segundo dados da revista Exame. Na mesma proporção que o

número de assinantes da Netflix cresce, o das operadoras diminui. A solução encontrada por muitos canais premium foi oferecer cada vez mais conteúdo original e exclusivo como séries, filmes, documentários e o máximo de programação ao vivo. Por mais que os serviços de streaming já consigam competir em condição de igualdade na área de produção de conteúdo original, plataformas como a Netflix ainda não têm estrutura suficiente para iniciarem a produção de programas ao vivo como telejornais, transmissão de eventos esportivos ou as principais premiações do setor do entretenimento. A TV a cabo ainda mantém uma audiência expressiva, principalmente ao público acima dos 40 anos que já está mais habituado ao formato e dificilmente vai abandonar seu programa favorito na TV, pois muitas

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Consumo padrão Netflix opções não são possíveis de se encontrar nas distribuidoras de conteúdo em streaming. Porém, parece claro que, conforme a tecnologia avança, o modelo de TV transmitida pela internet tem o caminho aberto para se tornar a principal opção de entretimento dentro de pouco tempo.

O novo modelo de distribuição de conteúdo capitaneado pela Netflix avança em um caminho sem volta e a cada dia se populariza mais entre o público mais jovem, porém não sem resistência. No Brasil, os principais provedores de pacotes de TV a cabo pertencem também as empresas de telefonia, que por sua vez, controlam os acessos à internet banda larga no país. SKY, NET, Claro e GVT tem entre seus principais acionistas as multinacionais de telefonia e transmissão de dados via internet Claro e Vivo, além de uma parceria de conteúdo quase exclusiva com o sistema Globo, outra empresa interessada em dificultar a popularização da distribuição de conteúdo em streaming no país e manter sua hegemonia local. As principais operadoras do país registraram queda significativa no número de clientes entre os anos de 2014 e 2015, com perdas registradas pela Anatel de aproximadamente 1 milhão de assinantes. Muitos desses usuários, segundo dados das empresas, deixaram o serviço de assinatura da TV a cabo e migraram para as distribuidoras de conteúdo em streaming como a Netflix. Por isso as operadoras do sistema de TV paga associam a queda em seu faturamento à chegada da empresa de Hastings ao país e tentam de todas as formas restringir ou dificultar a operação da companhia no Brasil. De acordo com matéria publicada na revista Exame, em janeiro de 2016, representantes das principais empresas de telefonia e, por consequência, donas das principais opera-

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Brasil: operadoras em guerra contra a Netflix

Desde que chegou ao mercado, a Netflix enfrenta lobby das operadoras de TV por assinatura

doras de TV a cabo foram ao governo federal pedir que ele estabeleça regras rígidas para que operação da empresa de Hastings no Brasil, já que o segmento de distribuição em streaming não tem legislação específica e nem regulação definida para as empresas atuarem no país. Ainda segundo a matéria, as operadoras acreditam que estão em desvantagem na disputa do mercado por terem que cumprir leis e pagar taxas de incentivo e impostos que a Netflix não precisa pagar, e por isso, o preço de seu serviço é mais caro do que o da concorrente. As operadoras fizeram um documento exigindo que o governo federal adote quatro medidas para tornar a concorrência com a Netflix menos desleal e que, segundo elas, tornaria a disputa pelo mercado mais igualitária. O primeiro ponto é exigir que a empresa de Hastings, como empresa de distribuição, pague a taxa de fomento de cultura nacional, também conhecida como Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional), à agência reguladora do setor, a Ancine. O valor dessa contribuição é estipulado no valor de R$ 3 mil por cada título distribuído no país. Outro ponto exigido pelas operadoras é que a Netflix seja enquadra-

da na lei que determina que qualquer produtor de conteúdo estrangeiro disponibilize de 20% de conteúdo nacional em sua grade de programação. Se entrar em vigor, a empresa de Hastings precisaria ter o percentual equivalente de produções brasileiras em seu acervo, o que hoje a empresa não é obrigada a fazer. Além disso, elas propõem que os Estados cobrem ICMS dos assinantes da plataforma de conteúdo em streaming, como forma de ajudar a encarecer a prestação de serviço da rival.

Por último, o consumidor

A estratégia das principais operadoras é clara. Se o governo adotar medidas de regulamentação do setor de distribuição em streaming e impuser à Netflix a cobrança das taxas, impostos e a adequação de sua video à lei do audiovisual, o valor da assinatura mensal do serviço irá ficar mais caro do que os atuais R$ 19,90 e, na expectativa das operadoras de TV a cabo, se tornar menos atrativa para o consumidor. Além de atacarem as vantagens econômicas que a empresa de Hastings desfruta, as operadoras de telefonia estão fazendo lobby no congresso para que possam criar pacotes de limite para o uso da banda larga. A ideia delas é implantar um


Consumo padrão Netflix comparação, enquanto a Netflix oferece seu serviço em uma faixa de preço de assinatura que varia entre R$ 19,90 e R$ 29,90, para conteúdos em HD, as operadoras de TV a cabo, segundos dados do portal UOL, cobram pelos pacotes de canais valores entre R$ 70 e R$ 300, dependendo da quantidade de canais oferecidos. Talvez essa diferença brutal entre um plano e outro explique o motivo por que as operadoras de TV paga querem encarecer o serviço da Netflix de qualquer maneira. O rápido crescimento da Netflix no Brasil assusta as principais operadoras de TV paga, pois se fosse uma empresa do mesmo segmento, a companhia de Hastings seria a terceira maior do país, com cerca de 4 milhões de usuários, número bem próximo ao da Sky, segunda colocada e que tem uma base de assinantes

um pouco acima do 5,4 milhões de usuários, de acordo com dados da ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura), de janeiro de 2016. A primeira colocada no ranking é a Net, com aproximadamente 10 milhões de assinantes. No Brasil, segundo dados divulgados pela Anatel no final de 2015, o setor de TV paga conta com um total de assinantes de aproximadamente 19 milhões de pessoas, somando todas a operadoras do serviço no país. A Netflix sozinha, com pouco mais de quatro anos de operação no país, já tem mais uma base de assinantes correspondente a 25% do total de clientes das empresas de TV paga. Não é difícil imaginar que, em um futuro próximo, a Netflix supere o número de assinantes da TV a cabo no país, o que já acontece nos Estados Unidos.

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sistema de distribuição de banda larga semelhante ao Canadá, onde o assinante tem acesso a planos de 30 a 60 Gb de dados para usar durante o mês. Se a adoção do sistema canadense de tráfego de internet for aprovado, será um grande baque aos planos da Netflix no Brasil e no bolso do consumidor. Esse pedido das operadoras tem pouca chance de ser aprovado, uma vez que fere as leis de internet livre estipuladas no Marco Civil do setor aprovado em 2014 pelo Congresso. Você já deve ter percebido que a estratégia das operadoras não é brigar com a empresa de Hastings para seduzir o consumidor através da oferta de conteúdos mais atrativos e pacotes de canais mais personalizados, mas tentar tirar toda a atratividade econômica que a Netflix oferece aos seus assinantes, não é? Para

Para tentar parar o crescimento da Netflix, emissoras de TV pressionam o governo para limitar planos de internet no Brasil

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O valor da Netflix

A empresa que vale mais de US$ 40 bilhões

dennizn / Shutterstock.com

Lançamento da plataforma de streaming foi o principal responsável pelo alto valor da empresa

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urante seus quase 20 anos de existência, as inovações da Netflix se refletiram em dinheiro. A empresa capitalizou seu crescimento em forma de novos investidores, no valor de suas ações e em seu valor de mercado, que hoje é estimado em mais de US$ 40 bilhões. Hoje a empresa vale mais, financeiramente falando, do que os grandes conglomerados da indústria do entretenimento mundial como Viacom e Time Warner.

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Mas, ao contrário do que muitos pensam, em seus primeiros anos a Netflix chegou a amargar grandes prejuízos, como entre 2000 e 2002. Uma das grandes baixas durante essa trajetória, que arranhou bastante os negócios da empresa e também mexeu com a sua imagem diante dos investidores, aconteceu em 2011, quando uma decisão arriscada de negócios fez a empresa perder quase 1 milhão de assinantes e suas ações


Divulgação/ Netflix

O valor da Netflix

O número de assinantes é o principal ativo da Netflix, pois sem ele a empresa não se valorizaria tanto

despencarem, trazendo um momento de instabilidade e falta de confiança do mercado financeiro nos rumos que o modelo de negócios da Netflix iria tomar. Com a sua expansão global, a empresa e o aumento significativo de seu principal ativo, a base de assinantes, as ações da empresa se recuperaram e voltaram a crescer. O que mostra que além de ser uma empresa rentável, atualmente, a Netflix tem muito espaço para crescer e se valorizar nos próximos anos, se tornando uma empresa ainda mais valiosa para seus atuais e futuros acionistas.

tablet, televisor de última geração, videogame ou um computador mais potente, por exemplo. No modelo de negócios adotado pela Netflix, seu principal ativo e fator de atração de investimento do mercado de

capitais não são seu site, seu acervo ou seu sistema de recomendações, mas sua base de assinantes. Quanto maior for o número de assinaturas que a plataforma da empresa tiver, mais sólida a ela se torna e se mos-

Toda empresa que trabalha com comércio tem como seu principal ativo e fator de atração de investimentos os produtos que comercializa. Uma empresa de tecnologia tem como principais ativos os produtos que colocam à disposição do público consumidor, seja ela um smartphone,

Divulgação/ Netflix

Usuário: o principal ativo da Netflix

No começo dos anos 2000, a Netflix investiu pesado em centros de distribuição para DVDs nos EUA

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O valor da Netflix um claro sinal para os investidores que a empresa de Hastings era com companhia promissora, com expectativa de manter seu nível de evolução nos próximos anos. Entre 2004 e 2006, último ano em que a empresa se dedicava somente aos negócios envolvendo o aluguel de DVDs on-line, a base de assinantes da Netflix cresceu quase 300%. A empresa fechou o ano de 2004 com 76% de novos usuários em relação ao ano anterior, quando atingiu a marca de 2,63 milhões de assinantes. Registrando um crescimento rápido e consistente no número de assinaturas no começo dos anos 2000, a empresa de Hastings tinha cerca de 6,3 milhões de assinantes quando lançou, em fase de testes, sua plataforma de distribuição de conteúdo em streaming, em janeiro de 2007. Depois que entrou no segmento de distribuição on-line de conteúdo e adotou um modelo híbrido de negócios (streaming junto com o aluguel de DVDs), o crescimento da empresa se manteve acelerado, com a Netflix registrando a entrada de mais de 1 milhão de novas assinaturas por ano. Em 2007, pri-

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tra como um investimento seguro e rentável para o mercado financeiro. Pois quanto mais assinantes, maior é a aceitação da empresa perante o público consumidor. Em 2002, no ano em que fez sua abertura de capital e primeira oferta pública na Nasdaq – Bolsa de Valores voltada para empresas de tecnologia – e ainda se dedicava exclusivamente ao seu primeiro modelo de negócios, o aluguel de DVDs on-line, a Netflix atingia a marca de mais de 850 mil usuários em sua base de assinantes, número considerado expressivo para uma empresa que tinha pouco mais de quatro anos e vida e ainda não atendia a todo o território norte-americano e nem era tão conhecida como é hoje. Após realizar um investimento pesado na melhoria de sua infraestrutura com a construção de novos centros de distribuição, na melhoria da logística de envio e recebimento dos DVDs e na expansão de seu catálogo, com o dinheiro que conseguiu levantar ao vender suas ações na Bolsa, a Netflix registrou um crescimento de 74% do seu ativo, atingindo a marca de 1,5 de assinantes no final de 2003. Foi

A chegada da Netflix aos gadgets e videogames, como o Xbox, impulsionou a popularização da plataforma

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meiro ano com seu modelo de distribuição em streaming apenas em computadores a empresa fechou o ano com 7,5 milhões de assinaturas. Nos dois anos seguintes, a empresa registrou 9,4 e 12,3 milhões de assinante, respectivamente.

Ativos internacionais

O ano de 2010 foi marcante na trajetória da Netflix. Ao mesmo tempo em que decidiu expandir sua plataforma de distribuição de conteúdo on-line em streaming para fora dos Estados Unidos e se tornar uma empresa multinacional, ela registou uma adesão recorde de assinaturas, com a inclusão de 7 milhões de novos usuários à base de assinantes, chegando a marca de 20 milhões de clientes. Um dos motivos que levaram a esse bom de assinatura é que, naquele ano, a empresa começou a se popularizar de vez entre o público norte-americano por meio dos aplicativos para dispositivos móveis e videogames da nova geração, como Playstation e Xbox. No ano seguinte, em 2011, a expansão do principal ativo da empresa teve boas e más notícias. Se por um lado a empresa via sua base de assinantes continuar crescendo após anunciar a chegada de sua plataforma aos mercados da América Latina e Caribe, principalmente no México e no Brasil, a Netflix sofreu com a perda de 800 mil em menos de quatro meses. A queda do número de assinaturas não teve a ver com questões econômicas, mas sim com uma estratégia errada de negócios anunciada por seu CEO e presidente Reed Hastings. Em agosto daquele ano, ele veio a público dizer que a companhia iria desmembrar seus dois modelos de negócios. O serviço em streaming continuaria a se chama Netflix, mas o de aluguel de DVDs seria rebatizado de Qwikster. Porém, a ideia não agradou ao público, que cancelou em massa suas contas nos serviços da


O valor da Netflix Número de assinantes (em milhões) ESTADOS UNIDOS

INTERNACIONAL

80m 70m 60m 50m 40m 30m 26,5 27,6 29,4

33,3

36,3 37,6

40,3

44,4

48,4

50

53,1

57,4

62,3

65,6

69,7

20m 10m 0

1° trim. 2° trim. 3° trim. 4° trim. 1° trim. 2° trim. 3° trim. 4° trim. 1° trim. 2° trim. 3° trim. 4° trim. 1° trim. 2° trim. 3° trim.

2012

2013

2014

2015

empresa. Apesar das oscilações, a empresa fechou o ano com 24,4 milhões de assinaturas. O reflexo real de sua expansão global e do aumento de sua penetração junto ao público americano, após o investimento pesado em conteúdo original, começou a aparecer durante o ano de 2012, quando a empresa atingiu o número de 33 milhões de assinaturas, um crescimento de 37% em relação ao ano anterior. Vale ressaltar que a empresa conseguiu recuperar boa parte dos usuários que haviam cancelado seu plano no ano anterior. Nos últimos três anos, entre 2013 e o final de 2015, a Netflix viu sua agressiva expansão global dar resultado, pois aproximadamente 50% do total de sua base de assinantes são de usuários que acessam o serviço fora dos Estados Unidos. O resultado da internacionalização da empresa é que entre 2012 e 2015,

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Fonte: Netflix

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O valor da Netflix o principal ativo da empresa mais que triplicou de tamanho, registrando 44,5 milhões em 2013, 57,5 milhões em 2014 e fechando 2015 com mais de 75 milhões de assinantes, sendo 17 milhões de novos usuários só no último ano.

O crescimento da Netflix no mundo

Vale lembrar que o expressivo número de 75 milhões de assinantes foi registrado quando a Netflix estava presente em aproximadamente 60 países. Muito provavelmente veremos esse número chegar perto da marca de 100 milhões de usuários até o final de 2016, quando a empresa divulgar o número de assinaturas que conseguiu com lançamento do serviço em mais 130 países em janeiro deste ano, atingindo a marca de 190 países no mundo.

As receitas bilionárias

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O modelo de negócios da Netflix sempre foi considerado um sucesso, desde a inovação no modelo das videolocadoras até a revolução e a consagração do modelo de distribuição de conteúdo on-line em streaming. Do mesmo jeito que a empresa cresceu e continua a expandir sua base de clientes, o seu crescimento de seu faturamento demonstra, em dinheiro, o sucesso as operações na Netflix no mundo. Desde que decidiu abrir o capital da empresa e entrou na bolsa de valo-

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res, em 2002, a Netflix tem por obrigação de publicar anualmente o balancete completo de suas operações financeiras, despesas, investimento, o faturamento e o lucro obtido em cada exercício, que tem duração de um ano. Essa é uma das exigências para se operar na bolsa de valores e mostrar transparência para os possíveis investidores. No primeiro ano em que operou na bolsa de valores, a Netflix ainda se dedicava a explorar o mercado de aluguel de DVDs on-line com entrega pelo correio e, apesar de ser uma empresa ainda nova, mostrava franca evolução no mercado. Em 2002, registrou um faturamento anual de US$ 150,8 milhões. Com investimentos pesados na qualificação e expansão de seu catálogo de filmes, na melhoria do sistema de entrega e devolução de filmes e, consequentemente a expansão de sua base de assinantes, a empresa viu seu faturamento crescer 660% entre 2002 e 2006, último ano em que a empresa se dedicou exclusivamente ao ramo de aluguel de DVDs, fechando o período com faturamento próximo ao US$ 1 bilhão. A partir de 2007, quando a empresa começou a dar seus primeiros

passos no segmento de distribuição de conteúdo em streaming, o gráfico de crescimento de faturamento aumentou em níveis ainda mais rápidos. Nos três primeiros anos do novo modelo de negócios, entre 2007 e 2010, o faturamento da Netflix pulou de US$ 1,250 bilhão para US$ 2,262 bilhões no final de 2010, registrando um crescimento de 80% em apenas três anos, um sinal de que investir no incipiente segmento da distribuição de conteúdo on-line trazia resultados rápidos. O crescimento do faturamento e poder de investimento foram absurdos se pensarmos percentualmente, afinal de contas, em apenas oito anos a empresa de Hastings viu seu faturamento aumentar em 1.500%. Nada mal para uma empresa que começou como locadora on-line e se transformou em umas principais distribuidoras de conteúdo nos Estados Unidos. O crescimento foi rápido, porém o grande boom no faturamento da empresa aconteceu a partir do momento em que a Netflix decidiu ampliar o seu mercado para além do território norte-americano. Em pouco mais de cinco anos de expansão global e com


O valor da Netflix Um modelo de negócios rentável?

Que ano após ano desde seu surgimento os modelos de negócios da Netflix são considerados um sucesso, tudo mundo já sabe. Que a empresa registra recordes em número de assinantes, faturamento e valorização na bolsa de valores, também. Mas a pergunta que fica: será que os modelos de negócios adotados são rentáveis? É o que veremos. Analisando a evolução do gráfico apresentado, podemos perceber que a Netflix nem sempre gerou lucro para seus acionistas. Em 2000, ano em que publicou seu primeiro balancete, a empresa fechou o ano no vermelho, acumulando prejuízo na casa do US$ 58 milhões. Nos dois anos seguintes, 2001 e 2002, a empresa continuou a operar com déficit e registrando saldos negativos de US$ 39 e US$ 21 milhões, respectivamente. O que ajudou a empresa a diminuir o déficit de suas operações e começar a dar lucro a partir de 2002 foi a capitalização realizada com a entrada

da mesma no mercado de capitais, onde arrecadou um valor próximo dos US$ 85 milhões com a venda de suas ações. O rendimento negativo da empresa por três anos seguidos tem relação direta com a expansão de seu modelo de negócios, pois durante esse período a empresa investiu na ampliação do número de centros de distribuição e no aumento significativo de sua biblioteca de conteúdo, além de ter que arcar dos os custos cada vez mais elevados para envio e recebimento de DVDs, que não eram repassados aos seus assinantes. O aumento no custo da logística em torno do modelo de negócios de DVDs pelo correio está relacionado diretamente com o aumento significativo de sua base de assinantes e a maior rotatividade dos títulos do acervo da companhia. Se os primeiros anos de atividade da Netflix não foram os mais rentáveis, a partir da abertura de capital da empresa e a negociação de seus títulos na Bolsa de Valores, o cená-

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seu serviço de streaming espalhado por mais de 190 países em todo o mundo, a empresa viu suas receitas explodirem. Em 2011, ano em que iniciou sua expansão para fora da América do Norte e lançou suas primeiras produções originais, a Netflix obteve um faturamento de US$ 3,204 bilhões. Conforme a empresa ia expandindo suas fronteiras para América Latina, Europa e Japão, seu primeiro país no continente asiático, ela viu sua receita pular dos US$ 3,204 bilhões para US$ 6,8 bilhões no final de 2015, um crescimento de 115% em apenas quatro anos. Tão espantoso quando o rápido crescimento de sua base de assinantes ao redor do mundo. Até o momento da publicação, a estimativa é que a empresa termine 2016 com um faturamento superior aos US$ 7,6 bilhões, pois nesse ano a Netflix começou a operar em mais de 130 países, incluindo quase todos os países da África e Ásia, além de grandes mercados europeus como Portugal, Espanha e França.

Além de chegar à Espanha, em 2016 a Netflix também iniciou operações na África, Ásia, Portugal e França

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O valor da Netflix

Prédio da Nasdaq, bolsa de valores voltada para empresas de tecnologia

rio começou a melhorar. Entre 2003 e 2006 a empresa viu seu lucro saltar de módicos US$ 7 milhões para US$ 49 milhões no final de 2006, um crescimento superior a 600% no período. Quem não gostaria de investir em uma empresa dessas? Nos primeiros anos da era da distribuição de conteúdo em streaming, a empresa viveu uma época de bonança financeira. Como era prati-

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camente a única empresa a apostar nesse modelo de negócios, a Netflix viu seus lucros crescerem de forma exponencial depois de expandir seu serviço rapidamente dentro dos Estados Unidos e no Canadá. Em 2007, ano em que lançou seu serviço de streaming, a Netflix teve um lucro de US$ 66,6 milhões. Esse valor cresceu cerca de 240% até 2011, quando a empresa fechou o ano com

lucro líquido de US$ 226,13 milhões. Porém, devido à malsucedida estratégia de anunciar a divisão de suas duas plataformas de negócios no final de 2011 e ao aumento do valor da mensalidade de seu serviço, somados ao investimento ainda maior na produção de conteúdo original e em tecnologias que permitissem continuar sua expansão global, a Netflix viu seu lucro cair drasticamente em 2012. No encerramento de seu ano fiscal a empresa anunciou lucro líquido de apenas US$ 17,15 milhões, fato que deixou os investidores receosos quanto ao futuro da empresa. Se em 2012 os lucros da empresa registram queda, no último triênio, entre 2013 e 2015, a companhia de Hastings voltou a recuperar sua taxa de lucro e fechou com números expressivos. A Netflix fechou o ano de 2013 com US$ 122 milhões de lucro em suas operações. Em 2014, o lucro apurado foi de US$ 267 milhões, resultado do crescimento de sua base de assinantes e investimento mais lento na expansão mundial de sua plataforma. Em 2015, a empresa de Hastings voltou a registar queda em sua taxa de lucros, que ficou em aproximadamente US$ 122 milhões, porem essa oscilação da taxa de lucro no último ano é reflexo do alto investimento da empresa em tecnologias que suportassem a entrada da empresa em 130 países ao mesmo tempo, como foi anunciado por Hastings na CES 2016 realizada em janeiro. O que podemos perceber é que mesmo com toda a oscilação de sua taxa de lucro nos últimos anos e com a perspectiva de ampliar suas operações nos próximos anos, a Netflix é, sem dúvidas, uma que gera bastante rentabilidade para quem decide apostar na compra de suas ações.

A aventura da Netflix na Bolsa de Valores

A Netflix deu seus primeiros passos no mercado de ações em maio de 2002, quando ainda era uma empresa incipiente no ramo de aluguel


Divulgação/ Netflix

O valor da Netflix

de DVDs on-line com entrega pelo correio. No dia 22 do mesmo mês a empresa anunciou a criação da NFLX – empresa responsável por gerenciar todas as operações do sistema Netflix e que tem suas ações negociadas colocadas no mercado de capitais por meio da disponibilização de suas cotas acionárias para negociação na Nasdaq, uma espécie de Bovespa destinado a investidores que querem negociar ações de empresas de tecnologia. No mesmo comunicado em que avisa aos investidores e ao público sua entrada na Bolsa de Valores por meio da NFLX, a empresa de Hastings anuncia que irá fazer sua Oferta Pública Inicial – do inglês Initial Public Offering (IPO) no dia seguinte, colocando à venda um lote de 5.500 ações ordinárias (com direito a voto) por um valor mínimo de US$ 15 por ação para negociação.

A empresa contou com a assessoria de um consórcio de empresas lideradas pelo banco de investimento Merrill Lynch & Company para fazer a mediação e coordenação das vendas das ações juntos aos investidores interessados em adquirir as ações assim que o pregão fosse iniciado. A entrada da empresa na Bolsa de Valores foi um sucesso, pois suas ações se valorizaram cerca de US$ 1,75 durante a sessão, fechando o dia cotadas em US$ 16,75 a unidade. Com a venda de parte de suas ações, a empresa conseguiu arrecadar US$ 82,5 milhões de dólares para continuar investindo na expansão de seu modelo de negócios. O dinheiro conseguido com a oferta pública foi usado pela empresa quitar US$ 14 milhões de dívidas operacionais e investir pesado em materiais de divulgação da marca.

Um dos principais motivos que fizeram a Netflix ser bem vista aos olhos dos investidores era que a empresa, apesar de nova, contava com uma alta taxa de crescimento, visto que fechou o ano de 2002 com aproximadamente 1 milhão de assinantes e em franca expansão tanto física com a aquisição de novos centros de distribuição quanto em sua representatividade em um mercado que não parava de crescer. Além disso, nessa época, a Netflix começava a desbancar a gigante Blockbuster na preferência do público consumidor. A Netflix tem batido recordes e se valorizado cada vez mais no mercado de capitais, com suas ações chegando a atingir quase US$ 500 a unidade. Desde sua entrada na bolsa de valores, em 2002, o valor de venda de cada ação da empresa oscilou bastante, com momento de alta e

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O valor da Netflix

Imagem do painel oficial da Nasdaq onde os investidores veem os valores das ações

de baixa. No começo do ano de 2004, mais precisamente em fevereiro, quando a empresa registrava um ótimo momento de expansão de sua base de assinantes nos Estados Unidos, a unidade de suas ações chegou a valer US$ 70, uma valorização de mais de 460% em quase dois anos. Nessa mesma época a Netflix, para atrair mais investidores para seu negócio, decidiu desmembrar suas ações. A partir de fevereiro, o número de ações dobrou, porém o valor unitário de cada uma passou a ser de US$ 35, aumentando a liquidez da empresa no setor financeiro. O desmembramento de ações é uma prática comum das empresas que tem ações na bolsa de valores e é conhecida como Split. A principal finalidade dela é atrair novos investidores que possivelmente teriam mais dificuldade para comprar as ações da empresa quando elas ficam muito valorizadas, como foi o caso da Netflix. Por exemplo, se um investidor, sendo pessoa comum ou empresa, quiser comprar uma ação da Netflix, ele pagaria U$$ 70. Após a prática do Split, ela passaria a pagar U$ 35, aumentando o capital

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investido na empresa por meio da chegada de novos investidores. A assombrosa valorização das ações da Netflix no período entre 2009 a 2015, que saltou de U$ 19 em 2009 para US$ 333 no final de 2015, registrando uma valorização de 1750%, está intimamente ligada com a mudança do modelo de negócios da empresa. A partir de 2010, a empresa começou a investir pesado na distribuição de conteúdo em streaming em diversos dispositivos, na produção de conteúdo próprio e aquisição de títulos exclusivos e consolidou sua marca no mundo por meio de sua expansão para outros países e continentes. O movimento expansionista da Netflix chamou a atenção de diversos investidores, que não pensaram duas vezes em adquirir ações da empresa que se tornava referência mundial a distribuição de conteúdo on-line da indústria do entretenimento.

O streaming e a Netflix na Bolsa

O ano de 2009 foi espetacular tanto para a Netflix como para quem decidiu investir nela. No começo do ano, antes de a empresa começar na prá-

tica sua expansão global, cada ação estava avaliada em US$ 29,89. Com o anúncio da parceria com a Sony e demais fabricantes do setor de dispositivos móveis e a demonstração de que pretendiam distribuir seu conteúdo em streaming em todos os tipos de aparelhos como os videogames PS3 e Xbox, smartphones tablets e computadores, a Netflix sinalizou ao mercado sua estratégia agressiva na implantação de um movo modelo de consumo de conteúdo da área de entretenimento. Indicando que o foco de sua expansão não era mais a entrega de DVDs, mas a distribuição em larga escala de conteúdo sob demanda via internet. A notícia da mudança no modelo de negócios da empresa e o acerto com as principais empresas de tecnologia se mostram animadoras para a maior parte dos analistas do mercado financeiro e animou mais pessoas a se tornarem acionistas da empresa. A perspectiva de aumentar seus ganhos através de investimento na nova empresa de Hastigns fez as ações da Netflix dispararem, chegando a dobrar de valor. Em outubro de 2009, cada ação chegou a valer US$ 60. No último dia do ano, a valorização atingiu seu ápice até então, sendo negociadas por US$ 184,33. Durante todo o ano de 2010 até meados de 2011, a Netflix viu suas ações se valorizarem muito acima do acima do normal. O que motivou esse crescimento tão rápido do valor da empresa foram o anúncio por parte da empresa que iria fazer um investimento alto no fechamento e os acordos de exclusividade para distribuição de conteúdo dos principais estúdios norte-americanos como Disney e Warner, além do número altamente positivo das operações da companhia no Canadá e na América Latina e Caribe, onde a empresa acabava de lançar uma plataforma. Com as oscilações do mercado de capitais, a Netflix fechou o ano de 2010 com suas ações cotadas a


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O valor da Netflix

Desde 2002, a Netflix tem suas ações negociadas no mercado de capitais

US$ 175 a ação. Em pouco mais de dois meses, quando a operação da empresa no Canadá já se mostrava exitosa e com a entrada na América Latina cada vez mais próxima, as ações da empresa chegaram a valer US$ 247,55 no final de fevereiro, muito por conta do boom da expansão da empresa e o anúncio de investir na produção de conteúdo próprio.

2011-2012: anos difíceis

A valorização cada vez maior das ações da Netflix no mercado financeiro parecia certa depois de os papéis da empresa terem atingido um valor recorde no primeiro semestre de 2011. Porém, uma atitude errada do CEO da empresa, Reed Hastings, fez o bom momento desaparecer e suas ações entraram em um período de estagnação. No segundo semestre de 2011, Hastings

veio a público anunciar o desmembramento da plataforma on-line, deixando o serviço em streaming no endereço eletrônico Netflix e renomeando a divisão de entregas de DVDs para Qwikster. A iniciativa de separar os dois modelos de negócios não foi bem aceita pelos usuários e fez a empresa perder aproximadamente 800 mil assinantes entre agosto e outubro de 2011. Esse passo errado dado por Hasting impactou entre os acionistas da empresa e na Bolsa de Valores, pois a queda gerou insegurança do mercado quanto aos próximos passos da empresa, o que fez com que muitos investidores pensassem duas vezes antes de investir na empresa. As ações da companhia se desvalorizaram cerca de 75% no penúltimo trimestre de 2011, chegando a serem cotadas para venda em US$ 63,86 a unidade: o patamar

mais baixo desde que a Netflix iniciou sua expansão global. Por causa desse mal momento e a desconfiança dos investidores em continuar apostando no crescimento de seu modelo de negócios, a Netflix passou o final de 2011 e todo o ano de 2012 sem nenhum ganho real em seu valor de mercado. A recuperação foi lenta e, segundo dados da revista Fortune, as ações da empresa fecharam 2012 sendo negociadas a US$ 92,59, bem abaixo dos quase U$$ 250 que valiam dos papéis da companhia em meados de 2011.

A retomada do crescimento da empresa no mercado

Após sofrer com um ano e meio de estagnação entre o segundo semestre de 2011 e todo 2012, a Netflix viu suas ações voltarem a se valorizar de forma expressiva a partir do começo de 2013. No primeiro mês do ano, os

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O valor da Netflix

valores de venda das ações da companhia mostraram uma valorização de 42% em um curtíssimo espaço de tempo. Os papéis da empresa eram negociados por um valor próximo aos US$ 100 no dia 22 de janeiro e dois dias depois, dia 24, eles superaram a barreira dos US$ 140. Uma amostra que os momentos de turbulência Netflix no mercado de capitais havia passado, pois a partir daí o valor das ações não parou mais de subir. Um dos principais motivos que fizeram a valorização da Netflix disparar no começo de 2013 foi o anúncio da parceria da empresa de Hastings com a grupos Disney e Time Warner para a produção de conteúdo exclusivo para seus assinantes e o compromisso de, a partir de 2016, a companhia ser a distribuidora exclusiva de todo as produções do grupo Disney em streaming on-line. A estratégia serviu para mostrar aos investidores e ao mercado financeiro que a empresa estava engajada cada vez mais em fortalecer sua plataforma de streaming que continuava em franca ascensão, aumentando cada vez mais o número

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de assinantes do serviço on-line da empresa ao redor do mundo. Em contrapartida, os números do serviço de entrega da DVDs começavam a cair, mostrando que o futuro seria do streaming. Um indicativo da rápida valorização da empresa na Bolsa de Valores é que em outubro de 2013 as ações da empresa foram negociadas por US$ 354,99 a unidade. Porém, o pico de valorização da Netflix foi visto nos meses seguintes, quando chegou ao último dia do ano com suas ações cotadas em um valor próximo aos US$ 367. Durante o ano de 2014 o valor as ações das Netflix oscilaram bastante, ficando entre US$ 314,21 e US$ 484,39. A empresa fechou 2014 com um valor de mercado acima dos US$ 340 por ação, mostrando que continuava em franca ascensão e obtendo êxitos em seu plano de ser tornar uma multinacional do setor de entretenimento. O começo de 2015 registrou uma nova quebra de recorde no valor as ações da Netflix. A empresa que começou o dia 20 de janeiro com seus papéis cotados a US$ 340 dólares

para venda e, por causa de um crescimento cada vez mais sólido de assinantes, viu uma correria de investidores atrás das suas ações. O resultado dessa alta procura fez o valor delas disparar em muito pouco tempo. A valorização foi tanta que, em abril de 2015, cada ação da empresa superou os US$ 562. A procura por ações da empresa e os valores de mercado não pararam de subir e, em julho 2015, superou todo os prognósticos dos analistas do mercado financeiro e cada unidade de ação foi avaliada em US$ 707,61. Com o valor de cada ação atingindo patamares muito elevados, e por consequência, diminuindo a procura e a atração da empresa junto aos investidores, a Netflix decidiu realizar um novo desmembramento (Split) de suas ações, agora de uma forma mais radical. A empresa anunciou em julho de 2015 que estava realizando o Split de suas ações na proporção de 7 por 1, semelhante ao que a Apple já havia feito para atrair mais liquidez às suas ações alguns anos antes. Com esse movimento, cada ação que custava pouco mais de US$ 700, passou a valer US$ 100 e o investidor viu seu número de ação multiplicar por 7, ou seja, se algum investidor tinha, na época pré-Split, 100 ações da empresa, após o desmembramento passou a contar com 700. Mesmo com o desmembramento radical de suas das ações, a Netflix não conseguiu conter a supervalorização e elas não paravam de subir. No final do mês de novembro do ano passado, 2015, cada ação da empresa foi negociada pelo valor de US$ 126,60. O alto valor fez a procura pelos títulos diminuírem, o que causou uma oscilação no preço de cada ação, que fechou 2015 valendo US$ 114,38 para venda. As ações da Netflix começaram o ano de 2016 registrando quedas significativas em seu valor. No início de fevereiro, o preço de revenda ficou em US$ 82,79, e chegou ao fi-


O valor da Netflix anos atrás se dedicava ao aluguel de DVDs se valorizou e se transformou em uma companhia global da indústria do entretimento. Em abril de 2015, segundo dados publicados pela revista Veja, a empresa de Hastings não comemorava só o aumento expressivo de suas ações na principal Bolsa de Valores para empresa de tecnologia, a Nasdaq. A empresa que contava com mais de 62 milhões de assinantes e estava presente em aproximadamente 60 países foi avaliada em aproximadamente UU$ 33 bilhões, superando de longe outras gigantes do setor como a CBS, principal canal de TV aberta dos Estados Unidos e responsável por produções como Saturday Night Live e Big Bang Theory, que teve seu valor de mercado estipulado em US$ 28,8 bilhões. Outra concorrente da empresa de Hastings, a Viacom, detentora do estúdio Paramount Pictures e dos canais de televisão MTV, BET e Nickelodeon teve seu valor de mercado estimado em US$ 29 bilhões, 7 bilhões a menos que a Netflix.

Superando as gigantes do entretenimento

O crescimento e valorização dos títulos no mercado financeiro mostram como a empresa que até dez

Para se ter uma ideia do tamanho do crescimento do valor de mercado da Netflix nos últimos anos, em maio de 2011 a empresa estava avaliada em 13 bilhões, de acordo com gráfico disponível no site da Nasdaq. Ou seja, a empresa de Hastings depois de os investimentos feitos para aumentar seu ativo – o número de assinantes - se valorizou mais de 300 % em um período de cinco anos. Em 25 de maio de 2016, a Netflix teve seu valor de mercado estipulado pelos indicativos financeiros da Nasdaq em US$ 41,3 bilhões, um aumento de 25% em relação ao levantamento de abril de 2015. O que mostra que, apesar de ter um crescimento menor do que o esperado em sua base de assinantes no Estados Unidos, ainda se mantém mais valiosa do setor de entretimento, patamar em que deve permanecer nos próximos anos devido à sua continua expansão global e ao fato de atrair cada vez mais usuários para sua plataforma com o aumento de seu conteúdo original.

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nal do mês registrando a marca de US$ 91,61. Apesar de sofrer uma queda de mais de 30% em relação ao maior valor registrado pelas ações no ano anterior, o valor das ações mostram uma lenta recuperação. Apesar de enfrentarem um crescimento mais lento de seu principal ativo, o número de assinantes, os títulos da Netflix ainda são considerados bastante atrativos para quem quiser investir na empresa. Ela se encontra em um mercado razoavelmente novo e que ainda tem muito espaço para crescer. Basta lembrar que ainda não conseguiu lançar o seu serviço na China, o segundo maior mercado consumidor do mundo. Quando isso ocorrer, certamente trará muitos novos assinantes para o serviço e fará as ações dispararem de novo. Outro fator mercadológico que faz com a Netflix permaneça atrativa e com ótima perspectiva de crescimento nos próximos anos é que o segmento da produção de entretenimento está em constante renovação e tem um público sempre ávido por novidades, por isso que a produção de conteúdo é o setor da economia que mais cresce no mundo. Além da expansão agressiva no mercado internacional com base no investimento na criação de conteúdo próprio, a Netflix tem a seu favor o fato de ser pioneira e líder em um mercado em constante crescimento. E ser a principal referência de qualidade e inovação nesse segmento ajuda a empresa a conquistar cada vez mais assinantes para a sua base, principalmente agora que a Netflix se encontra presente em mais de 190 países. Qual investidor não estaria interessado em subsidiar o crescimento global da líder mundial de distribuição de conteúdo on-line em streaming?

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Netflix em números

Conheça alguns dados e curiosidades sobre a Netflix

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Fique por dentro das cifras mais interessantes da empresa e saiba as novidades que ela prepara para o próximo ano

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Netflix em números Valor recorde

A Netflix hoje é a empresa mais valiosa do mundo. Se você quiser comprá-la, precisa ter no bolso módicos US$ 42,8 bilhões. Topa?

prio par de meias inteligentes. De acordo com a empresa, a ideia é que a meia sirva como uma espécie de controle remoto que pause a sua série toda a vez que o usuário pegar no sono. Interessante, não?

Maior biblioteca do mundo?

Alguém não será assinante da Netflix?

Segundo projeções do mercado financeiro, a Netflix deve triplicar sua base de assinantes no mundo até 2020. Hoje a empresa conta com 75 milhões de assinantes e, se a estimativa estiver correta, em 2020 ultrapassará a barreira dos 200 milhões de assinantes. Pouco, não?

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Quarto melhor país do mundo São necessárias 2 mil HDs de 512Gb para caber toda a biblioteca da Netflix

Estima-se que o acervo da Netflix seja de 1 Petabyte de dados, ou seja, 1 milhão de gigabytes. Isso equivale a mais de 2 mil HDS de 512 GB.

Maior audiência da Netflix

A série mais vista de todos os tempos da Netflix é “O Demolidor”, que mobiliza 11% dos usuários da Netflix, segundo dados da revista Variety de 2015. O seriado conta a história de Matthew Michael Murdock, um jovem que após sofrer um acidente com um caminhão de lixo tóxico perde a visão, mas ganha poderes especiais como, por exemplo, ter os demais sentidos aguçados. A história do herói foi a primeira produção conjunta entre a Netflix e os estúdios Marvel.

De acordo com dados publicados pela Netflix, o Brasil é o quarto com maior número de assinantes no mundo. Nós só ficamos atrás dos Estados Unidos – país da empresa, Canadá e México. Será que manteremos nossa posição depois da Netflix chegar à China?

O que Sérgio Moro faz na Netflix?

Brincadeiras à parte, a empresa de Hastings anunciou a criação de um seriado baseado na Operação Lava Jato, responsável por apurar os escândalos de corrupção na

Meias inteligentes

Divulgação/ Netflix

Shutterstock

Preocupada em aprimorar cada vez mais a experiência do usuário da sua plataforma, a Netflix criou um tutorial para ensinar aos assinantes como confeccionar seu pró-

Browser da Netflix com a propaganda do seriado “O Demolidor”, líder de audiência

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Netflix em números Petrobras. O elenco ainda não está definido, mas a produção contará com direção de José Padilha, o mesmo diretor dos filmes Tropa de Elite I e II e Robocop, e tem seu lançamento previsto para 2017.

Primeiro seriado 100% brasileiro

O ano de 2016 promete ser especial para o assinante da Netflix no Brasil. A empresa anunciou em março deste ano que irá lançar o primeiro seriado produzido exclusivamente no Brasil. O nome da produção se chamará 3% e contará com atores conhecidos do público, como Bianca Comparato, João Miguel, Zezé Motta, entre outros. O responsável pela série será o uruguaio Cesar Charlone, indicado ao Oscar de melhor fotografia pelo filme Cidade de Deus (2002).

Joe Seer / Shutterstock.com

Séries globais no cardápio

Reprodução/ Netflix

José Padilha na premiére de Robocop, em 2014. Diretor ficará à frente da série sobre a Lava Jato

Não é só o Brasil que será contemplado com uma série 100% nacional pela Netflix. Até o começo de 2017, a empresa deve lançar produções de outros países. Entre as novidades, estão a série política francesa Marseille, a inglesa The Crown, a mexicana Club de Cuervos, a alemã Dark e a italiana Suburra. De todos esses lançamentos previstos, somente Marseille está à disposição dos brasileiros.

Marseille é a única produção da Netflix totalmente francesa disponível para os brasileiros Presidente: Paulo Roberto Houch • Vice-presidente editorial: Andrea Calmon (redacao@editoraonline.com.br) • COORDENADOR de arte: Rubens Martim • Gerente Comercial: Elaine Houch (elainehouch@editoraonline.com.br) • SUPERVISOR DE MARKETING: Vinicius Fernandes • Assistente De marketing: Jose Antônio • CANAIS ALTERNATIVOS: Luiz Carlos Sarra • DEP. VENDAS: (11) 3687-0099 (vendaatacado@editoraonline.com.br) • Vendas a revendedores: (11) 3687-0099/ 7727-8678 (luizcarlos@editoraonline.com.br) • Diretora Administrativa: Jacy Regina Dalle Lucca • Distribuição no Brasil por Dinap • Revista produzida por ECO EDITORIAL (www. ecoeditorial.com.br) • EDIÇÃO: Ana Vasconcelos • REDAÇÃO: Rodrigo Svrcek • ASSISTENTE DE REDAÇÃO: Giovana Meneguim • DESIGN E DIAGRAMAÇÃO: Karina Barbosa • IMPRESSÃO: XXXXXXX • GUIA mundo em foco extra – NETFLIX é uma publicação do IBC Instituto Brasileiro de Cultura Ltda. – Caixa Postal 61085 – CEP 05001-970 – São Paulo – SP – Tel.: (0**11) 3393-7777 • A reprodução total ou parcial desta obra é proibida sem a prévia autorização do editor. Para adquirir com o IBC: www.revistaonline.com.br • VENDAS AOS DISTRIBUIDORES: Tel.: (0**11) 3393-7728 (vendas@editoraonline.com.br).

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nesta edição Netflix em números

DOS DVDS AO MERCADO DE STREAMING DESBANCANDO A CONCORRÊNCIA O USUÁRIO EM PRIMEIRO LUGAR AS DISPUTAS PELO ACERVO PRODUÇÃO DE CONTEÚDO EXCLUSIVO A EMPRESA DE US$ 40 BILHÕES

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