ACADEMIA PIAUIENSE DE LETRAS – OS FUNDADORES
Em pé, da esquerda para direita, Jônatas Batista, Celso Pinheiro, Lucídio Freitas, Antônio Chaves, Baurélio Mangabeira e Édison Cunhas; sentados, da esquerda para direita, Fenelon Castelo Branco, Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e João Pinheiro.
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ACADEMIA PIAUIENSE DE LETRAS COLEÇÃO 100ANOS
ACADEMIA PIAUIENSE DE LETRAS – OS FUNDADORES 2ª Edição
Teresina – Piauí 2018
XI
JONATAS BAPTISTA E A PAIXÃO PELO TEATRO Teresinha Queiroz* A arte dramática é a arte por excelência do século XIX, do ponto de vista da atração e do gosto populares. No Piauí, de acordo com Higino Cunha, o teatro era diversão verdadeiramente atraente, e esse gosto persistiu na primeira década do século XX, conforme atestado por inúmeros registros da época. Sobretudo entre 1908 e 1925, proliferam os clubes dramáticos em Teresina e é perceptível o envolvimento da sociedade local com as atividades teatrais, na condição de promotores, amadores ou apenas assistentes. Esse período coincide com a mais vigorosa atuação de Jônatas Baptista, como escritor, ator e produtor teatral. A crescente demanda por lazer e por lazer que contemplasse a família burguesa, da incipiente classe média urbana, permite o esforço ora mais, ora menos bem sucedido de produzir e recepcionar grupos e 165
associações diferentes ligados à música, ao teatro, ao cinema e às diversas formas de passeios distintos, do tipo “jardins”, de que em Teresina é expressão maior a Praça Rio Branco, entre a segunda e a quarta décadas deste século. Por outro lado, essa demanda não possibilita a eclosão do interesse pela escritura voltada para o palco. Nesse sentido, Jônatas Baptista é quase o autor único de obras dramáticas no período considerado. Essa exígua produção literária foi identificada em 1921 por Higino Cunha em O Teatro em Teresina, nos termos a seguir: “Como produção literária, pouco há digno de menção entre nós. Os nossos escritores, mesmo os mais cultos e fecundos, como David Caldas entre os mortos, Clodoaldo Freitas e Abdias Neves entre os vivos, não se dedicaram a este gênero de literatura. Além de algumas tentativas malogradas de Licurgo de Paiva, e de um drama religioso sobre o Natal do Dr. Luiz Correia, somente as obras de Jônatas Baptista merecem figurar nesta resenha histórica. O seu drama ‘Jovita ou a heroína de 1865; as suas revistas de costumes, principalmente ‘O Bicho’, os seus monólogos e cançonetas, tão aplaudidos pelo nosso público, já tiveram repercussão lá fora, onde não contamos nenhum teatrólogo, e lhe facilitaram o ingresso na Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, da qual é sócio, o único piauiense que mereceu tamanha honra até hoje”.1 Sem prejuízo de referências a outras formas de atuação de Jônatas Baptista enquanto homem de letras e animador cultural, este artigo pretende destacar sua presença na movimentação teatral de Teresina no início deste século. Conforme já realçado, Jônatas era, segundo depoimento dos que com ele conviveram, um homem de paixões e de iniciativas. Para Yara Neves de Melo, em seu discurso de posse no Cenáculo Piauiense de Letras, em cadeira de que ele era patrono, Jônatas aparece como “espírito militante e pouco submisso” (...) “E, sobretudo, um rebelado” (...) “as suas atitudes levaram o selo de uma franqueza, por vezes rude, foram também marcadas por uma sinceridade sem refolhos, que é bem uma de suas características”. 2 1 2
Higino Cunha. O Teatro em Teresina. Teresina, Tipografia do Correio do Piauí, 1922. S.p. Yara Neves de Melo. Discurso de posse na cadeira Jônatas Baptista. S.n.t.
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Com uma situação pessoal atribulada, “não se deixa prender pela monotonia da vida lucrativa”3. Recusa-se fortemente à acomodação, de que são exemplo suas múltiplas ocupações e suas andanças da maturidade. Entrega-se apaixonadamente às letras, destacando-se menos como poeta, porém especialmente como cronista e dramaturgo. Nascido em 1885 no povoado Natal, atualmente Monsenhor Gil, veio cedo para Teresina, estudar em escolas particulares e posteriormente no Liceu. Interrompeu seus estudos aos dezoitos anos, em virtude da precoce morte do pai, tenente-coronel João José Baptista, conforme registrado pelo próprio Jônatas. “ – falecendo meu pai, em 1903, deixou-me o encargo de uma família numerosa e pobre, composta de minha mãe e nove irmãos, inclusive o Zito Batista, que chegou, anos depois, a se impor no meio intelectual do Rio de Janeiro, como jornalista e como poeta”.4 Sua mãe, Rosa de Jericó Caldas Baptista, era filha de David Caldas. Jônatas identificava-se profundamente com seu avô, tanto no que concernia às adversidades da vida, quanto no gosto pela literatura. No início de sua vida prática assumiu o cargo de Oficial do Registro Civil e foi um dos fundadores do Externato David Caldas, de efêmera duração. Ao mesmo tempo, prestava concurso para a Fazenda Federal, para o qual só parece ter sido convocado durante a década de vinte. Em seu manuscrito intitulado Meu caderno de notas. Inspiração dos outros... Notas de Jônatas Baptista, com o registro Teresina – Piauí e BelémPará,5 entre centenas de trechos e citações diversas de seus autores preferidos, consta a seguinte informação: O meu concurso para a Fazenda Federal foi feito em 1906, na Delegacia Fiscal do Piauí. Fui classificado em 2º lugar, conforme ordem nº 44 da Diretoria do Expediente, publicado no “Diário Oficiar” nº 259 de 9 de novembro do referido ano”.
Yara Neves de Melo, obra citada. Apud Yara Neves de Melo, obra citada. 5 Manuscrito constante do acervo de Maria Rosa Baptista. Capriglione, filha de Jônatas Baptista. 3 4
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Sua faina constante na imprensa, no teatro, nas promoções literárias e musicais convive com esses empregos públicos de pouca expressão. Seu permanente exílio emocional anda ao passo de uma infatigável luta por fazer as coisas culturais acontecerem aqui em Teresina, cidade que ele amava com o mesmo ardor com que nela se aborrecia, se entendiava e se irritava. Essa difícil relação termina por conduzí-lo ao afastamento do Piauí, assim como já o fizera seu irmão Zito Baptista, em 1913, que migrara rumo ao Rio de Janeiro. Seu destino foi o Pará. Foi Promotor Público em Altamira e Secretário da Intendência daquela localidade, onde também exerceu a profissão de advogado-rábula. No final da década de 20 estava estabelecido em Belém, como Escriturário da Fazenda Nacional. Colaborava em diversos jornais e revistas daquela capital. Na década de 30, transferiu-se para São Paulo, onde veio a falecer em 1935, local onde estão radicados seus descendentes. Jônatas Baptista associou ao prosaico da vida uma intensa atividade cultural. Essa busca permanente pela conquista interior o conduz, no final da existência, ao desencanto com suas convicções materialistas. De “alma sem rumo”6, conforme ele mesmo se autodefme, evoluiu para “alma redimida”, voltando-se para a admiração e quiçá aceitação das verdades do espiritismo, como foi possível perceber dos originais de seu livro Maria. Ao longo dos vinte anos em que Jônatas Baptista participou mais ativamente da vida cultural teresinense, as transformações sociais de que a cidade foi palco manifestaram-se não apenas na intensificação do movimento teatral, mas igualmente na música, nos passeios, nas novas modas, no vigor de espetáculos diversos, em novas sociabilidades. As preferências teatrais alçaram as revistas de costumes, as operetas e as cançonetas, todas fortemente marcadas pelos novos ritmos musicais, às culminâncias do bom gosto e do bom tom. Em Teresina, a partir de 1906, surgem com força os clubes musicais – com massiva e valorizada presença feminina – de que o Clube Monteverdi e o Clube Lítero-Musical são os exemplos mais notórios. As novas demandas por lazer, associadas ao cultivo das artes, puderam ser alimentadas por alterações infra-estruturais entre as quais a de maior relevo foi a introdução da iluminação elétrica, que foi instalada 6
Jônatas Baptista. Maria. S.n.t. (Manuscrito).
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no Theatro 4 de Setembro em abril de 1914. Este ano e os seguintes, os anos atormentados da Guerra, foram largamente compensados em Teresina pela efervescente busca de diversões. Essa luta por dotar Teresina de atributos de civilidade ganhara impulso ainda na década final do século XIX, sendo marcada pela inauguração do Theatro em 1894. Antes mesmo de sua abertura ao público, já havia mobilização no sentido de assegurar espetáculos teatrais e outras formas de fruição artística. Segundo Higino Cunha, em dezembro de 1893 foi fundado o primeiro clube dramático para trabalhar no novo teatro. José de Castro Lima era o tesoureiro. Também faziam parte de sua diretoria o Dr. Raimundo Artur de Vasconcelos e José Agostinho Pereira Daltro. Durante o governo de Raimundo Artur (1896-1900), ele próprio um grande entusiasta do teatro, o 4 de Setembro sofreu modificações arquitetônicas e melhoramentos no interior. Atuava nesse período o Clube Dramático União 4 de Setembro, que funcionou por vários anos. Em 1900, Teresina viveu grandes emoções no Theatro, com as representações da Companhia Luso-Brasileira. Apesar da variedade e da qualidade de seus números, desorganizou-se na maior penúria. Entre as peças que representou aqui destacaram-se “Deus e a natureza”, de Artur Rocha e uma revista de costumes locais – “Teresina de relance”, peça escrita em colaboração por Guilhermino Sepúlveda, Higino Cunha, Totó Rodrigues e João Antônio, apresentada com aplausos gerais.7 A partir de 1908 e nos anos seguintes, há maior movimentação no teatro. Em janeiro foi fundado o Clube Dramático 24 de Janeiro, tendo à frente o ator C. Gastão, sua mulher e diversos amadores teresinenses. O Clube foi oficialmente instalado durante as festividades do aniversário da Independência do Piauí, estreando com o drama “Gaspar, o serralheiro”, definido como moderno, de propaganda de ideias novas e de princípios reivindicadores e com a cançoneta “Escorreguei”. Entre outros atores estavam C. Gastão, Jônatas Baptista, Eurípedes Nunes e D. Maria dos Reis. A segunda récita do Clube 24 de janeiro ocorreu a 8 de fevereiro, com 3 comédias e algumas cançonetas. Seguindo as tendências da época, as representações eram curtas e variadas, sendo frequentes as cançonetas. Na avaliação do espetáculo, o redator chamava a atenção para a pequena presença do público, destacando que “a sociedade teresinense não quis 7
Higino Cunha, obra citada,p.9,10 e 13.
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corresponder aos esforços dos jovens amadores”. Convocava as famílias a serem mais amigas do 4 de Setembro, participando não só como espectadores mas igualmente como figurantes, “isso quando se tratasse de pessoal da sociedade local”. Em março, o Clube deu novo espetáculo, desta vez em benefício do ator C. Gastão.8 A partir de junho, temporada da trupe Gonçalves-Avelino e sua mulher Magdail. Público reduzido, apesar dos elogios na imprensa às comédias, à opereta e às cançonetas apresentadas. Na função de 13 de julho, foi representada a peça “A filha do diabo ou A cega de São Paulo”, com a participação, dentre outros amadores, de Jônatas Baptista, que recebeu essas referências: “O nosso estimado amigo Jônatas Baptista, que entre nós, com justa razão, é proclamado entre os primeiros amadores, pela inteligência, cultura e gosto, não estava senhor do seu simpático papel, motivo por que não agradou muito, como sempre acontece. Daqui lhe pedimos (porque apreciamos as sua vitórias): – só vá ao palco quando houver tempo suficiente para os seus estudos, do contrário só terá de perder o muito que tem feito como distinto amador que é. Ainda lembramos a Jônatas a necessidade do disfarce físico. O característico é um dos maiores elementos do palco”. E, entre elogios e críticas, o redator pede desculpas pela interferência e faz sua defesa nesses termos: “na despretensiosa apreciação nada vai com o intuito de melindrar o grupo”...9 Com a continuação da temporada, a correspondência do público aumentou e no espetáculo de 13 de agosto a platéia foi “pródiga em aplausos”. Seguindo costume da época, foi distribuído soneto avulso, de autoria do Padre A. Tomaz, com o título “Lembrança do ator Avelino Gonçalves”. A festa do dia era em seu benefício. Nesse mês e no seguinte, o grupo Gonçalves e os amadores locais se empenharam na montagem de uma revista de costumes teresinenses, escrita por Jônatas Baptista, com a participação dos atores Avelino e C. Gastão, musicada por Pedro de Alcântara Filho. Muita música, pouco sal e pimenta, na avaliação de O Monitor. Teresina, 24 de janeiro de 1908, p.3; O Monitor. Teresina, 30 de janeiro de 1908, p.3. 4; O Monitor. Teresina, 6 de fevereiro de 1908, p.2; O Monitor. Teresina, 13 de fevereiro de 1908, p.2; O Monitor. Teresina, 27 de fevereiro de 1908, p.2. 9 O Monitor. Teresina, 23 de julho de 1908, p.l. 8
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um jornalista. Considerada inocente pela imprensa e pela polícia, a peça representaria o início de nova era no teatro de Teresina. “Teresina de improviso”, como ficou denominada a revista, foi apresentada nos dias 3 e 6 de setembro, envolvendo seis artistas profissionais e doze amadores.10 A revista retomava alguns dos elementos de “Teresina de relance”, representada em 1900 pela Companhia Luso-Brasileira. Temas locais, música de compositores da terra, participação de amadores, escrita sob a responsabilidade de dramaturgo teresinense, se “Teresina de improviso” não inaugura nova fase no teatro, foi importante no que refere à atuação de Jônatas Baptista, que daí até o final da década de vinte, vai movimentar a vida teatral da cidade com muitas peças de sua autoria. Deve ser lembrado que a atuação mais intensa de Jônatas nas lides teatrais já vinha de anos anteriores, como um dos sócios mais destacados do Clube Filhos da Arte, dirigido por João Antonio de Vasconcelos, e que já encenara as peças “O Judeu” (dramalhão), “O tio Padre” (comédia), “O casamento à força” (de Moliére, traduzida por Higino Cunha), “Os dois renegados” (dramalhão), “O aniversário do Compadre Antoninho” (escrita por João da Cruz Monteiro) e “O sorvedouro” (drama socialista).11 A partir de 1911, boa parte das diversões teatrais em Teresina devem ser creditadas à atuação do Clube Recreio Teresinense, que estreou em 1911, e, logo após, aos Amigos do Palco. Jônatas foi sócio e animador desses clubes, em diferentes momentos. Vamos reencontrá-lo em 1913, já definido como “infatigável cultor da arte dramática”. Cuidava da representação do drama histórico “Jovita ou a heroína de 1865”, peça de sua autoria, em 3 atos, o primeiro em Jaicós, o segundo em Teresina e o terceiro no Rio de Janeiro. Segundo A. Tito Filho, a representação do drama se deu a 19 de abril de 1914, sob o patrocínio do Clube Recreio Teresinense.12 Em 15 de novembro, em comemoração ao 24º aniversário da República, houve representação do drama de Segundo Wanderley “Portugueses e Brasileiros”, a cujos ensaios a imprensa deveria assistir, para garantia do público. O espetáculo, sob a responsabilidade do Clube Dramático Amigos do Palco, teria início com a execução do O Guarani, O Monitor. Teresina, 3 de setembro de 1908, p.2; O Monitor. Teresina, 10 de setembro de 1908, p.3. 11 A. Tito Filho. Praça Aquidabã, sem número. Rio de Janeiro. Ed. Artenova, 1975. 12 Correio de Teresina. Teresina, 27 de outubro de 1913, p.3; A. Tito Filho, obra citada, p.71. 10
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pela banda do Corpo Militar de Polícia. O drama foi dedicado à Primeira Companhia Isolada de Caçadores, ao Corpo Militar de Polícia e aos Oficiais da Guarda Nacional. Esse procedimento, assim como os espetáculos em benefício, além das homenagens às personalidades do dia, era garantia de presença de público. Na solenidade houve execução de valsa Amigos do Palco, de Pedro Silva. Participação dos amadores Anísio Veras, João Batista de Sousa Martins, Pedro Silva, José e Manoel Boavista da Cunha, dentre outros. Após essas duas representações, Os Amigos do Palco projetaram a montagem da peça de Luís de Moraes Correia, “O Nascimento de Cristo”, o que ocorreu a 25 de dezembro. Alguns dos intérpretes: V. Siqueira, M. Eurides, J. Boavista, Pedro Silva, M. Boavista. Iniciado por cançonetas e seguido da representação do drama “O Nascimento de Cristo”, o espetáculo do Natal foi assim descrito: “cabal desempenho dos papéis, cenários bem regulares, corretismo da plateia, casa cheia, eis a síntese da festa”. Esse espetáculo ideal foi repetido a 6 de janeiro, precedido de uma opereta. No dia 11, em anúncio assinado pelo Clube, pedia-se às pessoas que haviam comprado ingressos fiado para os dois últimos espetáculos, o favor de pagar com brevidade, para que a instituição pudesse atender a seus compromissos.13 O Clube Dramático Amigos do Palco, provavelmente instituído em 1913, segundo Higmo Cunha, teria resultado de cisão no Recreio Teresinense. As notícias da imprensa da época não corroboram essa informação. O Recreio estaria inativo durante certo período, porém por falta de amadores. Os Amigos do Palco estavam em plena atuação em 1913, tendo o maestro Pedro Silva à frente de suas atividades. Jônatas Baptista aparece em 1914, entre os amadores do Recreio Teresinense. De todo modo, em janeiro de 1914 houve alteração na diretoria dos Amigos do Palco e reativação do Recreio Teresinense. No início do mês, Jônatas Baptista ainda apareceu como vice-presidente dos Amigos do Palco14. A partir daí, passou para a direção do Recreio, enquanto Pedro Silva continuava animando os Amigos do Palco. Em matéria de janeiro de 1914, um redator, depois de evidenciar as dificuldades para o desenvolvimento do teatro em Teresina e elogiar Correio de Teresina. Teresina, 27 de outubro de 1913, p.3; Diário do Piauí. Teresina, 15 de novembro de 1913; Correio de Teresina. Teresina, 8 de dezembro de 1913, p.l; Diário do Piauí. Teresina, 17 de dezembro de 1913, p.4; Correio de Teresina. Teresina, 29 de dezembro de 1913, p.3; Diário do Piauí. Teresina, 11 de janeiro de 1914, p.3. 14 Higino Cunha. O teatro em Teresina, p.20; Correio de Teresina. Teresina, 12 de janeiro de 1914, p.l. 13
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indistintamente os amadores locais, informava que o Recreio Teresinense, por falta de atores, há muito não dava uma récita. Citava alguns nomes de expressão do Clube: Artur Rubim, Charles Jourdan, Anísio Veras, Clímaco Filho e J. Batista de S. Martins. Alguns deles eram sócios dos Amigos do Palco em 1913. Jônatas ainda não aparece entre os nomes do Recreio.15 O Diário do Piauí, do dia 13, traz notícia de reunião convocada pelo Amigos do Palco, em que 3 membros de sua Diretoria haviam pedido desligamento. Não cita os nomes. Jônatas não estava entre os sócios presentes à reunião. Na oportunidade, foram propostos e aceitos 9 novos sócios, além de 3 sócios honorários. Houve nova eleição para a Diretoria Geral e Sebastião A. Ribeiro da Costa foi eleito vice-presidente. Orador oficial, Higino Cunha. A partir da listagem dos sócios de honra, da Diretoria Geral e da Diretoria honorária, infere-se que grande parte da sociedade letrada de Teresina de alguma maneira participava da vida teatral da cidade. Talvez em virtude da reativação do Recreio Teresinense, os dois clubes se movimentaram muito durante o ano de 1914. Em janeiro, os Amigos do Palco preparavam-se para a encenação do drama “A enterrada viva ou Amores de um africano”, enquanto o Recreio preparava sua reestréia, a 24 de janeiro, com a representação do drama “A condenada”, precedido de atos de cançonetas. Do espetáculo do Recreio constou um monólogo “Prá-barro”, escrito e recitado por Jônatas Baptista, agora sócio desse clube16. Houve uma segunda récita de “A condenada”. Os Amigos do Palco promoveram vários eventos. Em 7 de fevereiro, no 4 de Setembro, apresentaram a peça “A filha do marinheiro”, com batalhas de lança perfume nos intervalos e dentro do espírito carnavalesco da temporada. Em março, levaram à cena a revista de costumes locais, “Teresina por dentro”, cujos primeiro e segundo atos passavam-se na praça Rio Branco. A música esteve por conta da banda do Batalhão Policial, da orquestra Ribamar e da banda da Escola de Aprendizes Artífices. Apresentada a 31 de março, na avaliação de vários redatores, não teria agradado, sendo um desastre para a nova associação. O gênero já estaria por demais explorado17. Correio de Teresina. Teresina, 12 de janeiro de 1914, p.2. Diário do Piauí. Teresina, 16 de janeiro de 1914; Correio de Teresina. Teresina, 19 de janeiro de 1914, p. 3; Correio de Teresina, 26 de janeiro de 1914, p. 1. 17 Diário do Piauí. Teresina, 6 de fevereiro de 1914, p.l; Diário do Piauí. Teresina, 31 de março de 1914,p.3; Diário do Piauí. Teresina, 2 de abril de 1914. 15 16
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De um desses críticos, a revista mereceu a seguinte avaliação: Sem a preocupação de sermos agradáveis a este ou aquele, declaramos, com franqueza, que a tal revista, como aliás tem acontecido com as demais levadas à cena, não agradou, chegando mesmo a ser um desastre para a novel e vontadosa associação” Outro jornalista assim se expressou: “Há muita boa vontade por parte dos sócios do Clube Amigos do Palco, em agradar ao público e em parte eles alcançam o que desejam. Mais não se pode exigir de amadores, mas se o trabalho deles é bom, a revista por eles representada não deixa margem para maiores surtos. E o traço geral de todas as revistas escritas aqui, as mesma cenas, os mesmos fatos, os mesmos personagens. Há diferença de palavras e nada mais.” O mais provável é que as revistas de temática local, pelas reações que provocavam, ferissem as suscetibilidades de alguns. Além disso, evidenciava-se também uma questão de gosto. E o gosto moderno sinalizava na direção do movimento, das variações rítmicas, da associação de diferentes espetáculos numa mesma sessão e, tanto quanto possível, de curta duração. A moda internacionalmente difundida era a das operetas, das cançonetas, enfim, das apresentações que associavam música, canto, dança, ou seja, o movimento em diferentes manifestações. Além disso, festejava-se a vida e a alegria era ingrediente fortemente solicitado. Talvez como tendência compensatória, o período da Guerra vai acentuar essas tendências do gosto popular. Mas havia espaço também para a história e para os heroísmos diversos, que passavam para a ordem do dia. Escrita ainda em 1912, dois anos depois o Recreio Teresinense encenava “Jovita ou a heroína de 1865”, de Jônatas Baptista, com grandes elogios tanto ao enredo quanto ao desempenho dos atores. Um redator falava pelo público acerca da “desconfiança que trilhamos de um fracasso igual a outros que o nosso público tem assistido” e que não se confirmara, felizmente. Atores principais: Nena Pimentel, Anísio Veras e o próprio Jônatas. Teatro lotado, fato que estava se tornando raro no 4 de Setembro. 18 Houve 18
Diário do Piauí. Teresina, 21 de abril de 1914, p.3.
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reapresentação da peça, em beneficio do maestro Pedro de Alcântara Filho. Além das promoções dos clubes Amigos do Palco e Recreio Teresinense, a temporada teatral de 1914 contou com artistas de fora. A atração especial foi o grupo Galhardo, com As Americanitas. As apresentações do tenor Frontino Santiago, em geral, receberam críticas desfavoráveis. As performances do Grupo Galhardo tiveram início em maio. Em junho já eram feitas no estabelecimento de diversões Teatro Variedades e Café Familiar, situado na Praça Rio Branco, dirigido pelo Sr. José Galhardo. Segundo um comentarista, era á nota chic dos últimos tempos.19 A Praça Rio Branco era então o centro de convergência das diversões elegantes da capital. As Americanitas apresentavam suas peças, operetas e cançonetas no Teatro Variedades. Às vezes, com alguns contratempos, caso da função de 2 de junho, em que o serviço de luz elétrica foi desligado antes do final do espetáculo. A iluminação elétrica estava recém-inaugurada. As apresentações do Grupo Galhardo continuaram nos meses seguintes, com intervalo durante o qual o grupo realizou tourneé pelos estados do Pará, Maranhão, Ceará e Pernambuco, mas retornando a Teresina para novas apresentações, de que temos notícias em março e abril de 1915. Aliás, o grupo se estabeleceu em Teresina em virtude de sua localização, que facilitava o deslocamento para outras capitais do norte do Brasil. O empresário José Galhardo contratava apresentações anuais em diversas cidades da região. O Teatro Variedades funcionava como “café familiar”, em que eram vendidas finas bebidas – café, leite e chocolate. Na volta, o grupo Galhardo tornou o estabelecimento mais atraente e, portanto, mais movimentada a Praça Rio Branco. Além dos espetáculos – em que As Americanitas eram auxiliadas pelo cantor Pintassilgo – inauguraram-se um cinema familiar e uma máquina de gelo.20 Em 1915, o Recreio Teresinense iniciou suas atividades no domingo de carnaval, apresentando número de cançonetas novas. Em julho organizou festa em homenagem à Revolução Francesa, de cujo 19 20
Diário do Piauí. Teresina, 1 de julho de 1914,p.l. Correio de Teresina. Teresina, 5 de abril de 1915, p.2.
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programa fizeram parte a execução de A Marselhesa e do Hino Republicano Brasileiro, além de nova representação do drama “Jovita”. Participação do francês Charles Jourdan, artista amador e de senhoritas da sociedade local, na parte musical.21 Nesse ano aconteceram vários espetáculos beneficentes em favor de templos da capital, organizados por comissões de senhoras católicas e de filhas de Maria. Em 1916, nos meses de março e abril, ocorreram apresentações da tourneé Pálace-Albuquerque, em cuja programação se incluía um cinema. A primeira parte dos espetáculos constava da exibição de fitas e a segunda de números cômicos.22 Ainda em 1916, houve mudança na diretoria do Theatro 4 de Setembro. Saiu o Coronel José Joaquim de Moraes Avelino e assumiu a direção da casa o Coronel Benjamim do Rego. A principal atração do Theatro no ano de 1917 foi sem dúvida a revista de Jônatas Baptista – “O Bicho” – que estava sendo ensaiada desde maio. Em junho os ensaios já eram feitos no Theatro e a perspectiva era de que a peça fosse encenada em julho. A parte musical estava sob a responsabilidade de Pedro Silva. O 4 de Setembro passava por fase de melhoramentos, agora sob a gestão de Santídio Monteiro. As apreensões que costumavam causar as peças cuja temática eram os costumes, faziam com que um redator adiantasse que os autores pretendiam “fugir das críticas diretas e pessoais que tantos desgostos costumam causar, entre nós, sempre que se levam ao palco peças desse gênero...” A revista estreou a 7 de julho, envolvendo cerca de 40 amadores e com 20 números de música. Foi descrita como: “gênero alegre, mas sem exageros de pimenta ou cenas livres”. As representações a 7 e 10 de julho, teriam sido a nota festiva da semana. Duas casas cheias. Elogios especiais para os amadores Anísio Veras, José Rodrigues da Costa, Napoleão Teixeira e Samuel Cunha. A terceira e última representação de “O Bicho”, mais um “brilhante sucesso”, foi em benefício das crianças pobres das escolas públicas primárias da capital.23 Correio de Teresina. Teresina, 10 de fevereiro de 1915,p.l.; Correio de Teresina. Teresina, 12 de julho de 1915, p.2. 22 Correio de Teresina. Teresina, 28 de março de 1916,p.2.; Correio de Teresina. Teresina, 11 de abril de 1916, p.2. 23 Correio de Teresina. Teresina, 5 de maio de 1917,p.3.; Correio de Teresina. Teresina, 9 de junho de 1917. p.3; Correio de Teresina. Teresina, 23 de junho de 1917, p.2; Correio de Teresina. Teresina, 30 de junho de 1917, p.2; Correio de Teresina. Teresina, 14 de julho de 1917, p.1; Correio de Teresina. Tersina. 21 de julho de 1917, p.3. 21
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Além da peça de Jônatas, foi realizado espetáculo em benefício do altar-mor da catedral, constando das peças “S. Doroteia” e “Disputa entre flores”, envolvendo senhoras e senhoritas da sociedade local. Em setembro, começaram os ensaios de nova revista de Jônatas, musicada por Pedro Silva, “Frutos e Frutas”.24 Representada em 12 de outubro, mereceu severas críticas de um redator do jornal A Notícia, por excessos de ditos e gestos maliciosos.25 Desse mesmo ano foi a revista “Cidade Feliz”, em que além de escrever, atuou num dos papéis principais. Não dispomos de informações acerca dos anos de 1918, 1919 e 1920, transcritas da imprensa periódica. Em 1921, atuava em Teresina a Empresa Teatral e Cinematográfica Silva & Companhia, fundada em 1919, sob a responsabilidade de Pedro Silva. Em janeiro, patrocinada por essa empresa, apresentava-se em Teresina a Companhia Eduardo Nunes, que vinha de uma tourneé pelos estados do Amazonas, Pará e Maranhão. Dentre os números apresentados pela Companhia Nunes destacaram-se a revista “Urucubaca”, a comédia “O rapto de Fernanda” e o drama “O advogado de Laura”. A Companhia montou dois dramas de enredo sacro “A ilha de Pilatos ou A vida de Cristo” e “Os milagres de São Benedito”, atendendo a pedido do público local. Os últimos espetáculos dessa Companhia, no final de fevereiro, teriam acumulado, segundo os jornais, uma série de triunfos. Os espetáculos da última semana incluíram operetas, revistas, cançonetas, etc., e quase todos foram realizados em benefício dos artistas e até do Tiro de Guerra 79.26 No Theatro, já era realizada a Hora Artística Familiar, evento que teve longa duração na história da vida social de Teresina. No início de 1923, ocorriam os ensaios da peça de Jônatas Baptista, “Alegria de viver”, de gênero alegre, com diversos números de música, composição de sua esposa Durcila Baptista e arranjos de Pedro Silva. A representação teria caráter beneficente, com a renda destinada às obras da capela do Colégio Sagrado Coração de Jesus. Essa prática garantia não só a simpatia e presença do público, como o auxílio de pessoas e instituições.27 Não temos evidências de que essa representação tenha de fato ocorrido. A. Tito Filho nada indica nesse sentido.
Correio de Teresina. Teresina, 5 de setembro de 1917, p.3. A . Tito Filho. Praça Aquidabã, sem número, p.76. 26 O Piauí. Teresina, 9 de janeiro de 1921, p.4; O Piauí. Teresina, de janeiro de 1921, p.3; O Piauí. Teresina, 10 de fevereiro de 1921, p.2.; O Piauí. Teresina, 24 de fevereiro de 1921, p.2. 27 O Piauí. Teresina, 26 de fevereiro de 1923, p.l. 24 25
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Nesse ano, existia e atuava em Teresina o Grupo Dramático Talianos, que deveria apresentar-se no Theatro a 21 de abril, feriado nacional. Ao mesmo tempo preparava a revista “Vida cara”, letra de J. Alfredo e música de Alfredo Mecenas, com 19 números musicais. Deveria ser encenada em maio. A comemoração de 21 de abril foi marcada pela apresentação de “Gilberto, o marinheiro ou O lobo do mar”, drama em 4 atos, terminando com apoteose a Tiradentes. Em função desse evento, o teatro estava passando por melhorias.28 Em 1925, os espetáculos de grupos de fora do Estado que mais atraíram a atenção do público foram os da Companhia Ítalo-Colombiana, cujo programa era constituído basicamente de esculturas em barro feitas no palco, de parte lírica, cantos, apresentação de guitarrista, canções regionais da Colômbia e número chamado serrote humano. A trupe era composta de artistas de várias nacionalidades – franceses, portugueses, italianos e colombianos e, segundo os recortes nacionais e estrangeiros apresentados à redação dos jornais, andara a se apresentar por toda a América do Sul. Na terceira função da Companhia houve apresentação de trecho da ópera de Puccini “I Pagliacci”, muito apreciado e elogiado por um redator, que entretanto, referindo-se ao público em geral assim se expressou: “O povo, que não sabe italiano, e que não gosta de músicas clássicas – não compreendeu nem soube apreciar a beleza da peça representada”...29 Nesse caso, aparece o público como incapaz de compreender o espetáculo. Outra crítica que sofreu a Companhia foi a de ter incluído em sua programação fitas cinematográficas, prática que foi considerada extemporânea e desnecessária. Nas décadas anteriores, quando o cinema constituía novidade, era atrativo para os espetáculos. Entretanto, em 1925, Teresina já possuía e possuíra muitas casas cinematográficas, totalmente independentes das representações teatrais propriamente ditas. Havia, na cidade, oferta suficiente dessa forma de lazer. O ano de 1925 foi bastante movimentado em termos de atividade teatral. Em maio circulou folheto com a comédia de Jônatas Baptista, “Astúcia de mulher”, cujo texto foi bastante elogiado pela crítica.30 Comédia em um ato, com dois números de música, compostos por O Piauí. Teresina, 8 de abril de 1923, p.2; O Piauí. Teresina, 6 de maio de 1923, p.l; O Piauí. Teresina, 19 de abril de 1923, p.l. 29 O Piauí. Teresina, 17 de janeiro de 1925, p.l; O Piauí. Teresina, 22 de janeiro de 1925, p.l. 30 O Piauí. Teresina,13 de maio de 1925, p.l. 28
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Durcila Baptista. Nota do autor, constante da publicação do texto da revista, em 1925, dá conta de que essa teria sido representada no TheatroCinema-Pálace, pelas então meninas Dilnah Baptista, filha de Jônatas, e Walmira Campos, com merecidos aplausos. E possível que isso tenha ocorrido em 1919. Segundo A. Tito Filho, em janeiro desse ano teria sido fundado o Clube Dramático Amantes da Cena Viva, que vai estar, nesse período, à frente de várias iniciativas teatrais.31 Em junho, foi instituído o Clube das Vadias, de diversões teatrais, formado por meninas da sociedade. A estreia seria com a peça “A escrava da moda”, com 7 números de música e 2 atos de variedades.32 Na mesma época um grupo de rapazes cogitava da fundação de outra sociedade recreativa – o Clube dos Peraltas.33 Em 1925, Pedro Silva empresariava o Theatro 4 de Setembro, que prometia grande movimentação, com a expectativa de peças a serem representadas pelo Clube das Vadias, Clube dos Peraltas e pelos Amantes da Cena Viva. Dos grupos de fora, destaque para os cançonetistas e dançarinos Los peres, que se apresentaram em junho.34 A peça “A escrava da moda”, do Clube das Vadias, foi encenada a 11 de agosto, às 8 horas da noite, com recado da Diretoria do Clube ao público solicitando total silêncio durante as representações.35 A paixão que Jônatas Baptista ajudara a plantar em Teresina vingara. Quanto a ele próprio, já buscava outros sonhos e outras paragens, que levariam de norte a sul sua alma até então “sem rumo”.
A. Tito Filho, obra citada, p.83. O Piauí. Teresina, 6 de junho de 1925, p.4. 33 O Piauí. Teresina, 16 de junho de 1925, p.1. 34 O Piauí. Teresina, 11 de junho de 1925, p.4. 35 O Piauí. Teresina, 11 de agosto de 1925, p.4. * Teresinha Queiroz – Nasceu em Esperantina (Pi), licenciada em História pela Universidade Federal do Piauí (1977) e bacharela em Ciências Econômicas pela mesma IES (1983). Fez mestrado em História do Brasil (1984), na Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, e doutorado em História Social na Universidade de São Paulo (1992). Professora da UFPI desde 1979, lotada no Departamento de Geografia e História, do Centro de Ciências Humanas e Letras, Leciona no curso de Graduação em História, nas áreas de Teoria e Metodologia da História e Métodos e Técnicas de Pesquisa. No curso de Mestrado em Educação, trabalha com as linhas de pesquisa História da Educação e Ensino de História. Publicou os seguintes livros: Economia piauiense: da pecuária ao extrativismo. Teresina, APeCH/UFPI, 1993; Os literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as tiranias do tempo. Teresina, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994; A importância da borracha de maniçoba na economia do Piauí: 19001920. Teresina, APL/UFPI, 1994; História, Literatura, Sociabilidades. Teresina, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1997. 31 32
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