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MARKETING PARA O TERCEIRO SETOR
MARKETING PARA O TERCEIRO SETOR Ana Paula Drumond Guerra Helena Amorin Saraiva João Clemente de Souza Neto Luciana Guerreiro Sabbadini Márcia Baêta Márcia Mello Costa De Liberal Márcia Regina Bull Marco Antonio Figueiredo Milani Filho Mônica Borja Bonilha Rodrigo Augusto Prando Ronaldo Pereira Martins Silvana Grendene Vânia DÂngelo Dohme
© 2006 Ana Paula Drumond Guerra, Helena Amorin Saraiva, João Clemente de Souza Neto, Luciana Guerreiro Sabbadini, Márcia Baêta, Márcia Mello Costa De Liberal, Márcia Regina Bull, Marco Antonio Figueiredo Milani Filho, Mônica Borja Bonilha, Rodrigo Augusto Prando, Ronaldo Pereira Martins, Silvana Grendene, Vânia D’Ângelo Dohme
Coordenação editorial: Déspina Nogueira Capa, projeto gráfico e diagramação: Zeta Design/ Ronaldo Barsotti Imagens: Marco Dias/ ONG Visão Mundial/World Vision Preparação e revisão de texto: Denise Ceron e Maria da Graça FSN
M345 Marketing para o Terceiro Setor / Rodrigo Prando ... [et al.]. – São Paulo : Instituto Presbiteriano Mackenzie, 2006. 160 p. ; 21 cm. Bibliografia. 1. Marketing social. 2. Terceiro setor. 3. Políticas sociais. 4. Captação de recursos. I. Prando, Rodrigo. II. Título. CDD 658.8
Todos os direitos reservados ao Instituto Presbiteriano Mackenzie Rua da Consolação, 930 São Paulo – SP – CEP 01302-907 Tel.: (11) 2114-8666 Fax: (11) 3214-2582 www.mackenzie.br
SUMÁRIO
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Apresentação Sobre os autores
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O que é Terceiro Setor?
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A inflluência das ONGs na formulação de Políticas Sociais
Rodrigo Augusto Prando, Marco Antonio Figueiredo Milani Filho
João Clemente de Souza Neto, Márcia Mello Costa De Liberal
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Voluntariado: mais que uma necessidade, uma razão de ser Vânia D’Ângelo Dohme
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Captar para investir
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Crise de imagem
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Marketing Direto no Terceiro Setor
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O telemarketing a serviço do Terceiro Setor
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Assessoria de imprensa/comunicação
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Importância das ações de Relações Públicas na responsabilidade social
Ronaldo Pereira Martins Mônica Borja Bonilha Márcia Baêta
Silvana Grendene
Ana Paula Drumond Guerra
Luciana Guerreiro Sabbadini
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Direito no Terceiro Setor: o grande desafio
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A Ética como diretriz das ações humanas
Márcia Regina Bull, Helena Amorin Saraiva Márcia Mello Costa De Liberal
APRESENTAÇÃO
A idéia surgiu durante uma reunião. Nós, da Gerência de Comunicação Social do Mackenzie, ainda não havíamos decidido de que forma participaríamos do Dia Mackenzie Voluntário. Por sabermos de sua importância, todas as idéias nos pareciam cair na mesmice, por melhor que fosse a intenção. Como toda área de Comunicação, informar e interagir com pessoas é quesito essencial na nossa formação. Diante desse quadro e depois de muito discutir, não tivemos dúvidas quanto ao teor do nosso trabalho: faríamos um livro que pudesse mostrar o trabalho voluntário, sua importância e as mudanças que promove na vida de milhares de pessoas. Essa proposta, sabíamos, seria a melhor maneira de perpetuar nossa ação. Assim nasceu o livro Marketing para o Terceiro Setor, feito com a colaboração de profissionais que atuam nos mais diversos setores. A dedicação e o empenho de todos diante do nosso pedido demonstrou o quanto crêem no Terceiro Setor e sabem que é uma via que leva os interessados a tomarem consciência da importância da doação. Fazer a diferença é a nossa esperança. Doar tempo, amor, dinheiro ou, simplesmente, acreditar. Atitudes assim podem mudar o curso de uma vida. Os temas abordados comprovam que estamos em busca de alguns objetivos. Objetivos também compartilhados pelos países membros da ONU, que estabeleceram o compromisso de enfrentar os desafios globais mais urgentes nos campos econômico, social e ambiental. Os oito itens a serem atingidos até 2015, e que se tornaram conhecidos no Brasil como Metas do Milênio são:
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Marketing para o terceiro setor
1. Erradicar a extrema pobreza e a fome. 2. Atingir o ensino básico universal. 3. Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres 4. Reduzir a mortalidade infantil. 5. Melhorar a saúde Maternidade. 6. Combater o HIV/AIDS, a Malária e outras doenças. 7. Garantir a sustentabilidade ambiental. 8. Estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. Esses objetivos, se alcançados, certamente contribuirão para melhorar não só a nossa qualidade de vida, mas de todo o planeta. Estamos certos que o livro Marketing para o Terceiro Setor é uma ferramenta a mais nesse longo caminho a percorrer. • • • Agradecemos aos autores que doaram o seu precioso tempo na realização desse livro. O resultado também é conseqüência do empenho de todos que aqui trabalham e que não podemos deixar de citar: Mônica Borja Bonilha, Luciana Guerreiro Sabbadini, Vladimir Cruz, Felipe Eduardo Nery, Karina Inoue, Giovana Zulato, Joana Célia Figueiredo Cunha, Paulo Ricardo Pereira e Alves, Ana Paula Drumond Guerra, Camila Alam Nunes, Déspina Iliadis Nogueira, Iara Lacerda Lemes e a todos da Central de Informações.
• • • Apoio
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Sobre os autores
Ana Paula Drumond Guerra Escritora e Jornalista formada pela UNI-BH e Pós-graduada em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atuou como Jornalista em rádio, TV e jornal impresso. De 2000 a 2006 dedicou-se exclusivamente ao Terceiro Setor como Assessora de Comunicação/Imprensa em diversas ONGs. Atualmente é Assessora de Imprensa do Mackenzie e Diretora da Quintanares Comunicação. Helena Amorin Saraiva Graduada em advocacia pela UNESP e em Ciências Contábeis pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito Tributário pelo IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. João Clemente de Souza Neto Professor de Pedagogia do Centro de Ciências e Humanidade da Universidade Presbiteriana Mackenzie e Coordenador da Pastoral do Menor na Região Episcopal da Lapa. Luciana Guerreiro Sabbadini Relações Públicas formada pela Universidade Metodista de São Paulo. Pósgraduada em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas e em Gestão do Terceiro Setor pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atualmente é Assessora da área de Marketing e Comunicação do Mackenzie. Márcia Baêta Administradora com Mestrado em Administração para ONGs da Eastern University Pensylvannia – USA e atualmente é Diretora de Marketing e Mobilização de Recursos da Visão Mundial/World Vision. Márcia Mello Costa De Liberal Pós-doutora em Ciências Sociais pela PUC-SP e Doutora em Sociologia pela Universidade Técnica de Lisboa. Atualmente coordena o programa de
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Marketing para o terceiro setor
Mestrado em Ciências da Religião e é Professora e pesquisadora na Escola Superior de Teologia do Mackenzie. Márcia Regina Bull Advogada graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, é especialista em Direito Tributário pela PUC – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e professora da Pós-graduação lato sensu – Direito do Terceiro Setor no Mackenzie. Marco Antonio Figueiredo Milani Filho Economista, Mestre em Contabilidade e Doutorando em Contabilidade pela FEA/USP. É professor PPI do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas e Coordenador do Núcleo de Estudos do Terceiro Setor (NETS) da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mônica Borja Bonilha Publicitária, Jornalista, Fotógrafa e Produtora de vídeos-documentários focando temas sociais como crianças com trajetória de rua, combate à violência contra crianças e adolescentes e sobrevivência no semi-árido. Especialização em Marketing para o Terceiro Setor. Atualmente é Gerente de Marketing e Comunicação do Mackenzie. Rodrigo Augusto Prando Cientista Social, Mestre e Doutorando em Sociologia pela UNESP – Facul dade de Ciências e Letras de Araraquara. Atualmente é professor PPI da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Professor responsável pelo curso lato sensu em Gestão em Organizações do Terceiro Setor, Pesquisador do Núcleo de Estudos do Terceiro Setor (NETS) e Coordenador Didático de “Sociologia e Humanidades” do CCSA - Centro de Ciências Sociais e Aplicadas. Ronaldo Pereira Martins Jornalista, Pós-graduado em Marketing, Mestrado em Ciência de Informação pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG e atualmente é Diretor de Comunicação da Visão Mundial/World Vision. 12
SOBRE OS AUTORES
Silvana Grendene Trabalhou em agências de propaganda, rádio e televisão durante 10 anos. Há 15 anos atua no setor de telesserviços em empresas como Hammer, TMKT e Atento Brasil, atendendo diversos segmentos do mercado. De 2003 a 2006 esteve à frente do telemarketing e administração-financeira da ONG ICRIM, que apóia crianças e adolescentes com doenças renais. Atualmente é Gerente de Operações da CSU Cardsystem como especialista em Telesserviços. Vânia D’Ângelo Dohme Formada em Ciências Jurídicas e Sociais e Doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Pós-graduada em marketing pela ESPM, além de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atualmente é Professora do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas e da Pós-graduação lato sensu em Marketing e Gestão de Organizações de Terceiro Setor do Mackenzie.
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O QUE É TERCEIRO SETOR? Rodrigo Augusto Prando e Marco Antonio Figueiredo Milani Filho
Marketing para o terceiro setor
Definir Terceiro Setor é uma questão aparentemente simplória, mas comporta uma resposta de caráter mais complexo. Lidar com o conceito de Terceiro Setor ou, melhor dizendo, de Organizações do Terceiro Setor (OTS) é adentrar num campo de classificações e, portanto, de delimitação das fronteiras teóricas e práticas desse universo abstrato e concreto. Pode-se declarar que a nomenclatura Terceiro Setor se caracteriza por congregar as organizações privadas com finalidades públicas. Diferencia-se, nesse sentido, do Primeiro Setor (composto de organizações governamentais) e do Segundo Setor (formado por organizações não-governamentais com fins lucrativos). Cabe, antes de tudo, salientar que essa é uma visão sistêmica, em que se evidencia clara setorialização da realidade social, dividindo-a num trinômio. Sabe-se, no entanto, que a dinâmica social escapa – muitas vezes – de classificações e que a designação em voga tem apenas e tão-somente a pretensão didática de melhor entender e definir uma dada realidade histórica e concreta. À guisa de conceituação, assumiremos, neste escrito, multi dimensionalidade nas OTS, ou seja, partiremos do pressuposto de que existe amplo gama de dimensões a serem consideradas: dimensão sociológica, dimensão jurídica, dimensão econômica, dimensão administrativa e – não menos importante –, dimensão comunicacional. No que tange à dimensão sociológica – e, portanto, histórica – o termo tem procedência estadunidense (Third Sector). Foi cunhado em 1978 por John D. Rockefeller III, ao descrever a vitalidade cívica de seu país, tratando, no caso, de um setor “invisível”: o Terceiro Setor, que é privado, mas sem fins lucrativos (Montaño, 2005, p. 53). No Brasil, a denominação Terceiro Setor foi introduzida pela Fundação Roberto Marinho e, desde a 16
O QUE É TERCEIRO SETOR?
década de 1990, encontra ampla divulgação nas mídias impressas, radiofônicas, televisas e virtuais. As relações sociais encontram-se mediadas por instituições, e estas têm culturas organizacionais distintas. O Primeiro Setor (Estado), nas esferas municipais, estaduais e federal, com os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, tem por base o monopólio e o uso legítimo da força. Somente o Estado pode, legitimamente, usar da coerção física para a consecução de seus fins. As organizações não-governamentais com fins lucrativos (que formam o Segundo Setor) visam o lucro, isto é, numa sociedade de mercado globalizado, há, sempre, um incremento de capital ao final do processo produtivo, ainda que hoje o capitalismo esteja em sua fase de acumulação preponderantemente financeira. E, por fim, há uma articulação entre indivíduos, grupos e classes na sociedade civil organizada. Às vezes, prevalece um discurso de ineficiência ou mesmo de falência do Estado que pretende levar à paulatina e efetiva substituição das obrigações constitucionais do Estado pelas organizações da sociedade civil. Saúde, educação, cultura, segurança, assistencialismo, caridade, filantropia, responsabilidade social empresarial, cidadania corporativa, movimentos sociais, entre outras dimensões de atuação, são – sem unanimidade dos teóricos – consideradas atinentes ao ambiente do Terceiro Setor. Veicular o discurso de falência do Estado pode constituir-se de erro teórico já que a falência do Estado implicaria no fim do contrato social, ou seja, a preponderância da força ao invés do diálogo e do Estado de Direito. Nestes termos, a dinâmica societária contemporânea depende da conexão entre as várias esferas da realidade social e, cada vez mais, as OTS têm desempenhado um papel senão fundamental ao menos de crescente importância no cenário social contemporâneo. 17
Marketing para o terceiro setor
Vislumbrando um panorama trissetorial, em que os respec tivos setores sejam mutuamente excludentes e coletivamente exaustivos, tem-se:
Figura 1 • Panorama trissetorial
3º Setor ONGSFL
1º Setor
2º Setor
OGSFL
ONGCFL
Primeiro Setor: Organizações Governamentais Sem Fins Lucrativos (OGSFL) Segundo Setor: Organizações Não-Governamentais Com Fins Lucrativos (ONGCFL) Terceiro Setor: Organizações Não-Governamentais Sem Fins Lucrativos (ONGSFL)
Classificar uma organização simplesmente como não-governamental não é suficiente para expressar a sua real finalidade, mas apenas para caracterizá-la como entidade que não pertence nem é dirigida por órgãos e agências do Estado, ou seja: é apenas para diferenciá-la da organização do Primeiro Setor. As empresas privadas (do Segundo Setor) também não são governamentais. Servindo-se de mais um critério de classificação, se a entidade possui (ou não) fins lucrativos, distinguem-se as organizações do Segundo Setor das demais. As entidades do Estado (Primeiro Setor) não têm fins lucrativos. As organizações do Terceiro Setor, portanto, diferenciam-se das do Primeiro Setor por não serem governamentais e das do Segundo Setor por não possuírem fins lucrativos. De outra maneira, 18
O QUE É TERCEIRO SETOR?
pode-se afirmar que essas organizações são não-governamentais e sem fins lucrativos (ONGSFL). A representação dos setores separados pela natureza de suas organizações, conforme a figura 1, é exclusivamente didática, mas não é a única. Conforme o interesse do pesquisador, podem-se incluir novas segmentações; entretanto, o panorama trissetorial é o mais utilizado. Um erro comum é confundir o Terceiro Setor com o setor terciário (serviços), utilizado em outras formas de classificação, particularmente pela ótica econômica. No Brasil, as ONGSFL têm personalidade jurídica de direito privado e podem ser: associações, fundações, organizações religio sas e partidos políticos. Apesar da grande heterogeneidade entre as ONGSFL, como diversidade e diferenças de porte, objetivos específicos, recursos econômicos etc., destacam-se as seguintes características comuns: • Não há proprietários. • Possuem autonomia diretiva. • Suprem parcialmente o papel do Estado no atendimento a determinadas necessidades sociais. • Possuem estrutura e presença institucionais. • São constituídas pelo interesse social; portanto, visam proporcionar benefícios sociais. • São agentes econômicos. • Precisam obter recursos para a própria sobrevivência e a manutenção de suas atividades (esses recursos podem ser públicos e/ou privados). • Não deve haver qualquer distribuição de resultados entre os seus membros ou colaboradores, reinvestindo os superávits obtidos. 19
Marketing para o terceiro setor
• Podem gozar de privilégios fiscais, conforme a legislação vigente. Exemplos de ONGSFL: hospitais filantrópicos, entidades ambientalistas, sindicatos, associações desportivas, organizações religiosas, associações de bairros. As ONGSFL podem, ainda, obter certificados e titulações específicas que reconhecem, oficialmente, sua relevância social e propiciam benefícios fiscais, como: Utilidade Pública, Certificado de Entidade Beneficente e de Assistência Social (CEBAS) – que substituiu o certificado de filantropia, e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). Em relação à dimensão jurídica, não existe uniformidade de conceitos nos mais diversos contextos históricos da Europa, América do Norte e América Latina, principalmente. No Brasil, o artigo 44 do novo Código Civil define as personalidades jurídicas de direito privado, a saber: associações, sociedades, fundações, organizações religiosas e partidos políticos. Excetuando-se as sociedades cuja natureza e finalidade estejam ligadas à geração de lucros, as demais personalidades jurídicas podem ser enquadradas na definição de OTS (desde que atendam aos critérios citados anteriormente). A dimensão comunicacional, por sua vez, enfoca as informações provenientes da relação entre atividades-meio e atividades-fim. As atividades que as organizações desenvolvem devem ser orientadas pela missão, visão e valores que se propõem. A eficiência e eficácia na gestão, ou seja, nas atividades-meio, permitem a concretização dos objetivos das OTS: as atividades-fim. Há, dessa forma, uma necessidade premente de comunicar à sociedade a missão, os valores e a visão da organização. A base da comunicação humana é a relação emissor-mensagem-meio-receptor. As OTS, ao emitir uma mensagem acerca de 20
O QUE É TERCEIRO SETOR?
suas atividades, devem encontrar na sociedade receptores (indivíduos ou grupos sociais mais amplos). A eficiente comunicação das atividades-meio e fins permite à organização a conquista de credibilidade e visibilidade, e estas levam ao reconhecimento social. Não se pode, contudo, desprezar a importância do meio de divulgação das mensagens. Hoje, a comunicação pode ser veiculada nas mais diferentes mídias e, cada vez mais, no ambiente virtual. Nunca foi dada tanta importância à imagem, já que o acesso à informação é em tempo real e de qualquer lugar do planeta. Textos, sons, fotografias, imagens em movimento e com sons estão todas reunidas e acessíveis na internet, ao alcance de um clique. A internet mostra-se, cotidianamente, como um elemento para a divulgação da OTS e, também, para a captação de recursos nas mais diversas fontes. Ser capaz de comunicar com eficiência permite o reconhecimento social. Significa ter uma identidade diante das demais organizações do Primeiro, do Segundo ou do Terceiro Setores. A ética deve permear todos os ambientes e níveis das OTS e todas as relações (entre voluntários, funcionários, atendidos, parceiros, etc.) e, por isso mesmo, a comunicação ética dos objetivos e realizações das OTS são de suma importância para a consolidação do jogo democrático e da cidadania global.
Referência FERNANDES, Rubem César. Privado, Porém Público - O Terceiro Setor na América La-
tina. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1996. HUDSON, Mike, Administrando Organizações do Terceiro Setor.O desafio de Administrar
sem Receita. São Paulo. Makron Books, 1999.
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Marketing para o terceiro setor
MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e questão social: crítica ao padrão emergente de inter-
venção social. São Paulo: Cortez, 2002. TACHIZAWA, Takeshy. Organizações não Governamentais e Terceiro Setor. São Paulo:
Atas, 2002. IOSCHPE, Evelyn Berg. 3º setor: desenvolvimento social sustentável. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1997.
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A INFLUÊNCIA DAS ONGs NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS João Clemente de Souza Neto e Márcia Mello Costa De Liberal
Marketing para o terceiro setor
A preocupação desta reflexão não é conceituar as Organizações Não Governamentais (ONGs), mas problematizar a temática e avaliar sua importância para a construção das Políticas Sociais. Em cada contexto, as ONGs aparecem com diferentes roupagens e sentidos, de acordo com as correlações de forças do momento histórico. De certa forma, expressam os modos de enfrentar a pobreza, a desigualdade social, as injustiças, a crise moral, as diferentes formas de exclusão e os efeitos das catástrofes. Por esse olhar, poderíamos afirmar que as ONGs e suas práticas de solidariedade repercutem na concretização das políticas públicas. É bom salientar que a realidade é mais ampla e a vida é mais dinâmica do que os conceitos. Nos processos de análise, não basta compreender por compreender. É necessário atender aos compromissos com criatividade e ética para superar o já compreendido. A “nossa salvação e a nossa perdição estão no pensamento” (Morin, 1994, p. 130). Toda ação humana pressupõe riscos. Se as práticas de solidariedade ajudam no processo de emancipação, também podem carregar a opressão. Em outros estudos, tivemos a oportunidade de definir a solidariedade por seu caráter de dubiedade. Por essa perspectiva, sua noção e prática devem ser sempre repensadas. Não falamos aqui de um problema especulativo, e, sim, de algo vital para cada um de nós, para todos e, ao mesmo tempo, para a perpetuação do planeta. Poderíamos definir solidariedade com base nas práticas de amizade, uma perspectiva que já se encontra no pensamento grego. No pensamento antigo, um homem não pode ser estranho ao outro. Na atualidade, a idéia de solidariedade se apresenta bastante ligada ao altruísmo, à filantropia e à ética. À medida que as concepções e ações solidárias se vão racionalizando ao longo da história, transformam-se em Políticas Sociais. A solida26
A INFLUÊNCIA DAS ONGs NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS
riedade tem, hoje, nas políticas de atendimento e de assistência, seu foco principal. No decorrer da história brasileira, a solidariedade foi cooptada pelas forças do poder e da exploração para servir como instrumento de dominação dos mais fracos e dependentes. Anteriormente à Constituição vigente no Brasil, sua noção concebia o pobre como um feixe de carências, a ser ajudado e amparado, numa espécie de relação de favores. No ideário atual, solidariedade é entendida como direito, ligada às Políticas Sociais. Essa dinâmica de ambigüidade dificulta elaborar uma única definição de solidariedade e de ONG. Ora elas servem para justificar um processo de alienação e de exclusão de pessoas e grupos, ora contribuem significativamente para a construção de uma cultura de direitos e de uma política de inclusão. É nesse contexto que se torna possível estabelecer uma relação entre as ONGs e a solidariedade. A maioria das ONGs tem como objetivo a busca da justiça social. Na década de 1990, o anseio pela democracia possibilitou o aumento do número dessas organizações, para construir um tecido social favorável à implantação de um projeto democrático no País. As ONGs apareceram “como atores com voz própria, articuladas horizontalmente com as demais instituições que lutam por uma sociedade democrática” (Pontes, Bava, 1996, p. 133). O aumento e a diversidade de associações de natureza filantrópica dificultam sua definição. Encontram-se cadastradas na Receita Federal, aproximadamente, 220 mil dessas associações, tendo em comum, sua natureza de sociedades sem fins lucrativos. No mesmo bloco, estão universidades particulares, hospitais, entidades de classes e organizações que lutam pelos direitos humanos e desenvolvem atividades diretas com usuários privados de 27
Marketing para o terceiro setor
direitos. Essa diversidade tem provocado polêmicas que exigem uma definição mais clara de cada um desses grupos. Uma ONG [...] é considerada parte de um terceiro setor, em contraste com o Estado e o Mercado, e refere-se genericamente a uma esfera da ação, a entidades não-governamentais [...] sem fins lucrativos [...] A própria noção de ONG [...] propende a ser compreendida como parte deste setor. No entanto, mesmo entre os que seguem essa tendência, há distinções quanto ao entendimento [...] a grande preocupação tem sido a de clarificar a noção de terceiro setor, a qual inclui a idéia de entidades/atividades/associações sem fins lucrativos, não-governamentais, voluntárias, filantrópicas, altruístas, dentre outras. Sociedade civil aparece aí como um conceito relacional, isto é, a dimensão do terceiro setor relacionada às demandas por cidadania, democratização e similares (Scherer-Warren, 1994, p. 6).
A definição das ONGs começa, geralmente, pela negação, como aquilo que não é do governo, que não tem finalidade lucrativa. Essa é uma forma de entendimento que confere ao fenômeno certa opacidade. Outro modo de compreendê-las é com base numa tipologia. Há certo consenso em catalogar as ONGs em quatro grupos (cf. Coelho, 2000, p. 63): 1. O grupo da filantropia, que abrange especialmente as áreas da criança, da juventude, da mulher e do idoso, é o que mais cresceu. Atua, geralmente, na prestação de serviços assistenciais e educacionais. 2. O grupo do desenvolvimento sustentável tem como foco o meio ambiente e a economia de forma integrada, empenhando-se no respeito à natureza. 28
A INFLUÊNCIA DAS ONGs NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS
3. O grupo da cidadania atua no campo das reivindicações de direitos e luta pela libertação das opressões e autoritarismos, bem como pela implantação da democracia. 4. O grupo dos ambientalistas discute questões ecológicas e influencia a opinião pública. Sua prioridade é respeitar a diversidade e preservar o sistema. Essa classificação parece oferecer elementos para uma conceituação um pouco mais próxima da realidade. Encontra fundamentos teóricos em Gramsci ou em Tocqueville, que permitem compreender a importância das associações, pois vêem nas relações sociais uma tripeça constituída pelo Estado, pelo mercado e pela sociedade civil. Com base nessa classificação, as entidades assistenciais podem se circunscrever como ONGs integrantes do Terceiro Setor, mas de natureza filantrópica ou caritativa, porque desenvolvem uma assistência social solidária. Essa perspectiva ajuda a separálas das outras entidades sem fins lucrativos, como universidades e hospitais particulares. As entidades assistenciais respondem a situações imediatas, como fornecimento de alimentos, roupas, enxovais para recém-nascidos, abrigos de crianças e idosos, cuidados a deficientes e outras práticas similares. Circunscritas projeto de solidariedade ou democrático, as entidades têm papel importante como facilitadoras do acesso dos empobrecidos aos bens produzidos pela cidade. No contexto dessa visão mais pluralista sobre a realidade, redefine-se o sentido da filantropia. O assistencialismo emergencial aos excluídos do sistema [...] é definido como ação de solidariedade importante na constituição de um movimento cultural com base ética. De fato, a fi29
Marketing para o terceiro setor
lantropia justifica-se aqui como momento de um movimento mais amplo, cujas outras faces são ação para o desenvolvimento e para a cidadania. Portanto, filantropia [...] deixa de ser entendida como mero assistencialismo, para ser justificada como ação solidária dos integrados para com os excluídos, como meio para a construção de uma cidadania mais abrangente e como base ética para a sociedade civil. (Scherer-Warren, 1994, p. 6).
Uma pesquisa da Legião Brasileira de Assistência (LBA) (1989, p. 77), por sua vez, apresenta outra forma de definição. Compreende três tipos de entidades assistenciais: 1. O primeiro bloco, de feição doutrinária, caracteriza-se pelo fundo religioso, cujo eixo condutor é a prática da caridade. 2. O segundo é transclassista, uma classe fazendo benemerência a outra, motivada por interesses diferenciados. 3. O terceiro, de cunho popular, constrói-se com base nos movimentos populares. Mesmo com essas caracterizações, as ONGs continuam apresentando dificuldades para serem definidas por ocultarem freqüentemente, sob a capa da bondade, interesses políticos. A Constituição Brasileira também não as define, mas demarca sua relação com o Estado. O Núcleo de Seguridade e Assistência Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) constata que o Estado [...] não expressa diretrizes claras no que concerne à
proteção daqueles, hoje, classificados como excluídos. A Constituição brasileira reflete essa imprecisão, o que torna mais difícil vincular a concepção de filantropia a 30
A INFLUÊNCIA DAS ONGs NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS
uma dada política de atenção aos excluídos. Ao que parece o conceito de filantropia está associado, na terminologia estatal, a uma forma especial de relação e não a um resultado da ação (in Sposati, 1994b, p. 12).
Essa opacidade nem sempre tem permitido evidenciar a clareza dos seus objetivos, pois essas entidades colocam-se, às vezes, acima do bem e do mal. Destinam-se a prestar atendimento às pessoas carentes, integrá-las na sociedade e oferecer-lhes alimentação, vestuário, tratamento médico, medicamento e iniciação ao trabalho profissionalizante, “independentemente de credo, raça, cor, sexo, idade, e os usuários são atendidos gratuitamente, desde que sejam pobres” (Souza Neto, 1993, p. 140). Partimos do princípio de que as entidades assistenciais podem facilitar a formação e a construção da cidadania. Diante disso, consideramos superada a discussão sobre a compatibilidade da filantropia com a democracia, e sua possível oposição à cidadania. O que se deve imprimir a entidades conhecidas como de benemerência, assistenciais ou filantrópicas é o caráter de res publica. Isso exigiria delas maior publicidade e transparência de interesses. Uma vez que seu fim é responder às necessidades imediatas de determinados grupos, sua própria existência revela a desigualdade social, econômica e política. À medida que adquirirem visibilidade, as ONGs tenderão a colaborar para diminuir a desigualdade social. Por essa razão, são consideradas um “mal necessário”. Nas ONGs de tendência cristã, há uma vertente que compreende a caridade não apenas como ajuda aos pobres, mas também como a convivência com eles, valorizando-os e substituindo o conceito de “classe dominada” pelo de “povo oprimido”. Nessa visão, existe a convicção de que 31
Marketing para o terceiro setor
o sujeito faz a história em sintonia com a “história da salvação”. Essa prática baseia-se “nos princípios de solidariedade, justiça, espírito comunitário e de capacidade crítica dos oprimidos com vista à construção de uma sociedade livre de todas as formas de opressão (Reino de Deus). Esse processo é definido como a ‘caminhada da libertação’ (dos pecados pessoais e sociais)” (SchererWarren, 1994, p. 310). À medida que interagem com organismos governamentais e não governamentais, como Prefeitura, Estado, Secretarias dos Poderes Públicos, Conselhos Municipais, Estaduais e Federal, e entidades que lutam pela melhoria da qualidade de vida, as ONGs estabelecem uma rede de solidariedade que impulsiona a formulação de políticas públicas. A perspectiva de Souza Cabral (2004) e Wanderley (2004) é de conceituar as ONGs como espaços públicos não-estatais, uma vez que reúnem conjuntos de atributos de representatividade de interesses coletivos, democratização, qualidade e efetividade de serviços, visibilidade social, universalidade, cultura pública, autonomia e controle social. Essa contribuição compreende que as ONGs ou o Terceiro Setor colaboram para a ampliação da noção de público não como função, mas como um espaço que pode desenvolver um processo de publicização. Não se trata, nesse caso, de uma substituição do papel do Estado, porém de uma colaboração para caracterizar a publicidade e também indicar alternativas ao Estado. O que parece importante registrar é que a questão das ONGs ou do Terceiro Setor não constitui uma temática recente. Desde o século XVI, já se tem notícia, no Brasil, desse tipo de organização. Hoje, o que faz a diferença é sua metodologia, conteúdo e gestão. Os trabalhos de Pontes, Bava, Coelho, Souza Cabral, Fer32
A INFLUÊNCIA DAS ONGs NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS SOCIAIS
nandes, Landim, Souza Neto, Gohn e Scherer-Warren ajudam a compreender melhor essa história. Em síntese, estamos diante de uma discussão abrangente, difusa e um pouco desarticulada, uma vez que abordamos a questão de experimentações sociais que pretende dar organicidade a um fenômeno ainda indefinido ou não suficientemente definido. O Terceiro Setor, no Brasil, não é uma realidade nova nem pouco importante, ainda que seja precária e bastante recente a consciência que atribui unidade e um sentido relativamente homogêneo às práticas que as abordagens tradicionais identificavam exclusivamente à filantropia ou à solidariedade física. Empresas, Igrejas, Entidades as mais diversas investem, há décadas, em iniciativas cujo impacto social está longe de ser desprezível, mesmo tendo sido quase sempre negligenciado. Para usar uma fórmula caricata e grosseira, mas didaticamente útil: a própria sobrevivência de diversas camadas da sociedade brasileira parece inexplicável quando lemos os dados relativos à renda e à sua absurda distribuição, sem atentar para os laços e canais invisíveis que se estabeleceram e consolidaram ao longo dos anos, propiciando fluxos imperceptíveis de recursos dos mais diferentes tipos, em direções insuspeitadas, criando condições mais humanas e suportáveis para muitos grupos marginalizados e redefinindo o pacto social, reinvestindo na sociabilidade, lançando pontes para a integração ecumênica no campo da cidadania, revalorizando redes e conexões transversais, infundindo renovada e oblíqua legitimidade nas instituições públicas (Coelho, 2000, p. 11).
Na realidade, o que se coloca em jogo são espaços de crescentes disputas de significados da implantação de políticas e pro33
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jetos sociais, que, contudo, podem atuar mais como cooptadores de responsabilidades do Estado do que como instrumentos de construção de uma cultura de direitos. Apesar da ambigüidade das noções e das práticas de Políticas Sociais e das ONGs, elas têm contribuído na construção de um pacto e de um tecido social. Esse movimento tem sido a única estratégia que milhares de pessoas encontram para garantir ou para dar sentido à vida. O grande desafio que permanece é encontrar o fundamento ético dessa relação, para evitar que pessoas inescrupulosas continuem a transformar o sofrimento humano numa indústria. Esse padrão comportamental poderá quebrar os sonhos e as esperanças de grande número de pessoas. Ou retomamos uma ética comprometida com a emancipação da humanidade, ou a barbárie tenderá a se consolidar em nosso meio.
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VOLUNTARIADO: MAIS DO QUE UMA NECESSIDADE, UMA RAZÃO DE SER Vânia D’Ângelo Dohme
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Não é difícil obter a concordância de outras pessoas ao falar que a situação de nosso planeta é crítica. Cada vez se alarga mais o fosso econômico, crescendo grandemente o número de pessoas com pouco e pouquíssimos recursos. Além disso, a escassez de recursos ambientais é patente, o que faz vislumbrar um futuro pouco promissor. E todos estão vendo isso! Todos estão se dando conta! Ou quase todos... Poderíamos dizer que, se não é a maioria da população que entende que esse é um problema também seu, é a maioria que se sensibiliza e, com isso, se coloca em estado “de prontidão” para ter uma participação ativa e construtiva na sociedade. Em setembro de 2000, em Assembléia das Nações Unidas, 191 países estabeleceram um compromisso compartilhado com a sustentabilidade do Planeta. O documento contém os “Objetivos de desenvolvimento do milênio”, um conjunto de oito macro-objetivos a ser atingido pelos países até o ano de 2015, por meio de ações concretas dos governos e da sociedade. No Brasil, essa iniciativa recebeu o nome de “8 jeitos de mudar o mundo”. Estes “jeitos” são iniciativas absolutamente necessárias para reverter a situação de premência inicialmente descrita, como acabar com a fome e a miséria, diminuir a mortalidade infantil, combater doenças que vitimam milhares de pessoas ano a ano. O interesse das metas do milênio é que unificam a direção das ações para os pontos prioritários. Espera-se que essas ações orientem todos os segmentos da sociedade, mediante o estabelecimento de políticas públicas e a concretização de suas ações, o engajamento do setor empresarial e a participação da sociedade organizada, as chamadas organizações não governamentais (ONGs), formadas por setores da sociedade civil que buscam soluções públicas. Assim ocorrerá o 40
VOLUNTARIADO: MAIS DO QUE UMA NECESSIDADE, UMA RAZÃO DE SER
tão propagado fato de os três setores (público, privado e social) trabalharem de forma conjunta. E é aqui que a “disposição para fazer algo” se encaixa. Sabemos que o brasileiro é muito solidário; as pesquisas já mostraram que é grande o número de pessoas dispostas a contribuir com o próximo, porém muitas não sabem como. Para que possamos alavancar essa disposição para uma situação de participação efetiva, devemos considerar que para formar um voluntário são necessários dois componentes: um pessoal e outro social. O pessoal corresponde a uma inquietação interior, uma vontade de construir, uma chama que incendeia realizações, que se encontra dentro das pessoas, felizmente, da maioria delas. O componente social significa ter “olhos para ver”. Está presente nas pessoas que têm olhar crítico para a sociedade que as rodeia, que conseguem discernir, no que está à sua volta, o que está certo, o que não está, o que precisa ser feito para melhorar. É a junção da vontade interior com o olhar crítico que leva à realização de um trabalho construtivo para a sociedade.
E qual é a “receita” de um voluntário?
O voluntário doa seu trabalho, suas potencialidades e talentos numa função que o desafia e o gratifica em prol de uma realização pessoal. Ao analisarmos essa definição, encontraremos quatro elementos: qualificação, satisfação, doação e realização. Vejamos, se bem que rapidamente, cada um deles: Qualificação: o conceito moderno de voluntariado está muito ligado à execução de um trabalho qualificado, que leva em 41
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conta o talento e as habilidades de quem o executa. Não necessariamente essas habilidades são adquiridas formalmente; existem muitas habilidade inatas ou desenvolvidas informalmente que podem fazer grande diferença num trabalho voluntário. Satisfação: o voluntário é um trabalho exercido com prazer, garra, que fascina e dá um sentimento de plenitude para quem o executa. Está de acordo com valores pessoais e tem uma causa alinhada com aquilo que cada um deseja ver e construir no futuro. Doação: a entrega de horas da vida em prol do próximo, da comunidade, é resultado de um amor transbordante, que precisa se materializar por meio da ação. Realização: o trabalhador voluntário tem um compromisso com o êxito, com o sucesso, está determinado a cumprir os objetivos propostos. Em resumo, o trabalho voluntário é uma ação de qualidade, feita com prazer em direção a uma solução que não precisa ser grande, mas deve ser eficiente. É a somatória desses êxitos que fará a diferença em nossa comunidade.
Motivações do voluntário
O que move a disposição para o trabalho voluntário é um sentimento altruísta, mas, até mesmo sem se dar conta, o voluntário espera usufruir algo. As seguintes expectativas podem estar ligadas à decisão de executar um trabalho voluntário: • Desejo de fazer diferença, algo significante: nesse caso é preciso delinear claramente para cada um o que lhe dará maior 42
VOLUNTARIADO: MAIS DO QUE UMA NECESSIDADE, UMA RAZÃO DE SER
•
•
•
•
sensação de realização, o que o levará a sentir que está fazendo diferença. Essa motivação está muito ligada ao tipo de objetivo da organização social. O voluntário sente-se bem em apoiar e trabalhar numa organização que constrói um futuro que coincide com os seus valores pessoais e a visão que ele deseja para a sua comunidade. Uso de habilidades que normalmente não têm lugar na sua vida pessoal: muitas vezes o voluntário está capacitado ou gosta muito de determinada atividade, mas não tem onde exercê-la. Desenvolvimento pessoal: nos dias de hoje é dado muito valor às experiências adquiridas, à situação de receber capacitação para determinada função ou para o exercício da vida em grupo. As pessoas podem estar procurando o trabalho voluntário para exercitar determinada profissão com o fito de estarem mais bem preparadas para o futuro. O voluntário gostaria de adquirir alguma experiência profissional ou estabelecer contatos por meio do serviço comunitário? Sentimento de pertencer a um grupo formado por pessoas que têm o mesmo tipo de pensamento, uma escala de valores semelhante. Identificação com o problema: muitas pessoas apóiam entidades das quais precisaram ou cuja causa identifica-se com problemas que enfrentaram ou atingiram a um parente próximo. Sua visão altruísta do mundo faz com que trabalhem para que outras pessoas não passem pelo mesmo sofrimento pelo qual elas passaram.
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Como o voluntário efetivamente contribui?
O importante é que cada pessoa faça um diagnóstico de suas potencialidades e seu desejo de colaborar. É preciso encontrar um trabalho voluntário que esteja de acordo com o seu projeto de vida, ajudar uma causa que atenda valores concordes com a sua visão de futuro, com aquilo que gostaria de ver transformado. Não existem causas mais importantes do que outras. Uma sociedade fortalecida vai além da saciedade da fome, da educação e da saúde. São importantes a cultura, o esporte, a manutenção das tradições e o cuidado com o meio ambiente. O fato de colaborar com uma causa que vem ao encontro de anseios pessoais fará com que o trabalho seja exercido com mais responsabilidade, uma vez que a adesão aos fins propostos leva a um desejo de vê-los realizados. É importante também que o voluntário sinta-se capaz de exercer a função que lhe cabe, procurando saber de antemão quais são os requisitos que determinada função requer. E, por fim, é importante que cada voluntário procure conhecer a organização em que irá se candidatar ao voluntariado para poder avaliar sua missão, suas estratégias e sua cultura, antevendo quanto e como se adaptará a ela.
Alguns preconceitos a derrubar
Uma análise precipitada pode levar a uma pergunta: o voluntário tira a responsabilidade do Estado de fazer a sua obrigação? A res44
VOLUNTARIADO: MAIS DO QUE UMA NECESSIDADE, UMA RAZÃO DE SER
posta é que o voluntário e ou as organizações sociais não se ocupam daquilo que cabe ao governo, que é suprir as necessidades básicas e essenciais da população. A maioria das ações voluntárias complementam lacunas na medida em que atendem necessidades muito específicas, emergências, em áreas geográficas ou minorias excluídas, e praticam ações impossíveis de serem realizadas coorporativamente, como dar carinho, atenção e amor. Porém ser voluntário, ou melhor, ser um empreendedor social, não implica uma posição passiva, contemplativa; ao contrário, implica atividade, pois o voluntário se posiciona de forma crítica e construtiva na sua comunidade. Assim, o mais correto seria dizer que no bojo do trabalho voluntário, social, encontrase uma atitude reivindicadora dos direitos individuais e sociais. O brasileiro em geral tem uma atuação muito tímida na defesa e na exigência de seus direitos de cidadão, e para isso existem explicações de ordem histórica e sociológica sobre as quais não cabe aqui discorrer. É melhor gastarmos energias refletindo se essa crescente movimentação em assumir a cidadania participativa não levará a maior politização, a maior interesse em acompanhar, influenciar e até interferir nas políticas e práticas públicas. Nessa direção está o exercício da maior prerrogativa da democracia, que é o direito de votar, o qual muitas vezes não usamos corretamente ou, o que é pior, a cuja força não nos damos conta – existem ações simples que podemos fazer com grande significado. Outra falácia é o pensamento: mas as dificuldades sociais são tantas. Como uma pessoa com poucos recursos pode colaborar? É engano achar que somente com grandes projetos é possível conseguir transformações na sociedade. Toda a ação na direção do bem público, inicialmente, resolve aquela situação que estava incomodando, era emergencial ou, talvez, injusta. Mas de cada 45
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ação social, pequena ou não, decorrem outras conseqüências: os assistidos. Uma vez resolvida sua situação de calamidade social, estarão mais fortes para contribuir positivamente ou, na pior das hipóteses, para não contribuir negativamente. Essa ação servirá de exemplo para outras organizações.
Algumas palavras às organizações sociais que desejam receber voluntários
Uma organização social se beneficia muito ao receber um voluntário. Isso não ocorre somente porque ela encontra alguém para prestar serviços sem remuneração. Além de empestar seu tempo, suas habilidades, seus conhecimentos e seu talento na tarefa que executa, o voluntário tem outras motivações que dão qualidade a esse trabalho: • O voluntário exerce o trabalho em completa adesão aos fins propostos, pois, se não concordasse com os objetivos da organização, não trabalharia nela. Isso favorece muito o desempenho. • Ele trabalha em algo de que gosta e que escolheu. O trabalho exercido livre da obrigação ou da necessidade é sempre acrescido de fatores positivos: a criatividade entra em ação e novas soluções são achadas, novos conhecimentos são adquiridos pela constante busca de capacitação por meio de cursos e leitura. A conclusão do trabalho de forma cada vez melhor torna-se saudável desafio a ser conquistado. • Ele adiciona amor ao que faz, sendo mola motivadora ao exercício desse tipo de trabalho: o sentimento caridoso, o amor 46
VOLUNTARIADO: MAIS DO QUE UMA NECESSIDADE, UMA RAZÃO DE SER
ao próximo, e esse sentimento, inquestionavelmente, é um veículo de boas e verdadeiras realizações. A perspectiva de receber novos voluntários pode trazer inquietação para muitas organizações sociais. Sem dúvida os dirigentes sentem que muitas de suas necessidades podem ser supridas pelo trabalho voluntário e, de maneira nenhuma, deixam de reconhecer o seu valor. Porém esse desconforto ocorre e tem várias razões: experiências malsucedidas, falta de organização administrativa ou mesmo falta de tempo para “parar” e atender nova demanda. Embora o trabalho voluntário seja uma ação espontânea, não coagida por qualquer agente ou necessidade externa, não dispensa regras ou organização. E para que a relação de trabalho voluntário ocorra devem-se exigir algumas posturas, decisões e adesões de ambas as partes: do voluntário e da organização social que o acolherá. A organização social deve estar preparada para receber voluntários e ter um programa apropriado para geri-los. Essas providências têm, em alguns momentos, muita semelhança com as de uma empresa (de fins lucrativos) e, em outros momentos, são norteadas de maneira muito diferente. Conhecer esses pontos muito bem é a chave do sucesso do trabalho voluntário. O primeiro ponto é a organização social definir em seu planejamento estratégico se ela realmente deseja incorporar voluntários em seu conjunto de recursos humanos. Essa deve ser uma decisão do conselho diretor depois de analisar, além das vantagens, as responsabilidades que acarretarão. A crença desgastada de que o voluntário executa “milagres”, sem a menor necessidade de supervisão e nunca exigindo nada em troca, é falsa e a maior causa de insucesso. 47
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O voluntário exigirá um trabalho definido, que só contribuirá com o desenvolvimento da organização social se estiver de acordo com um planejamento eficiente. Além disso, o fato de não receber contrapartida financeira não quer dizer que ele não irá exigir nada. Ele exigirá atenção, respeito e, principalmente, motivação. Justamente no que concerne às motivações é que está o ponto que pode causar “reviravoltas” numa organização. Por quê? Porque as motivações envolvem quase tudo: objetivos, atitudes, recrutamento, valores, conduta, moral, visibilidade, reconhecimento, apoio, criatividade, planejamento, organização, prestígio, supervisão, ambiente acolhedor etc. Enfim, a decisão de ter voluntários não pode estar calcada somente na necessidade ou na impossibilidade de pagar um salário a profissionais. Responder às seguintes perguntas poderá ajudar nessa decisão: • • • •
Por quê queremos voluntários? Qual é a nossa visão do programa voluntário? Qual é a nossa expectativa com relação aos voluntários? Acreditamos firmemente que o voluntário irá agregar valor à nossa organização social? • O quê entendemos por contribuição em tempo parcial? Acreditamos que funções desempenhadas em tempo parcial irão ajudar? Estamos dispostos a montar um planejamento que preveja ajudas em tempo parcial? • Existe uma pessoa adequada (ou condições de contratá-la) para se responsabilizar pela gerência desses voluntários? • Quais são as verbas e os recursos com os quais o programa de voluntários pode contar? 48
VOLUNTARIADO: MAIS DO QUE UMA NECESSIDADE, UMA RAZÃO DE SER
• Como poderemos assegurar o envolvimento do voluntário com a organização? A decisão de ter ou não um corpo de voluntários não pode estar solta. Deve estar contida no planejamento estratégico da organização social, mesmo porque irá resultar na definição de um programa de voluntariado que fará parte do planejamento organizacional da instituição. Felizmente hoje existem muitos cursos, congressos e literatura, que podem ajudar a organização social a definir esses passos e tirar bom proveito dos voluntários que se colocam à sua disposição.
E, finalmente
Assumir um trabalho voluntário é muito mais do que encontrar algo para fazer nas horas vagas, é muito mais do que uma forma de exercer efetivamente o amor ao próximo e mais do que assumir uma cidadania responsável. Assumir um trabalho voluntário é não pactuar com as desigualdades sociais, é dizer não a um futuro injusto, é marcar passagem neste território e ter a tranqüilidade de dizer: eu deixei este mundo um pouco melhor do que o conheci!
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CAPTAR PARA INVESTIR Ronaldo Pereira Martins
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A presença cada vez mais marcante das Organizações Não Governamentais (ONGs) na sociedade contemporânea tem relação significativa com o enfraquecimento do Estado, notadamente nas duas últimas décadas do século XX. Diante da dificuldade de financiar os benefícios sociais, diversos países assumiram como definitiva a idéia de Estado mínimo e criaram condições para que a sociedade civil se organizasse a fim de executar ações de combate à exclusão social. Ao assumir as atribuições de um Estado privatizado, as ONGs reivindicaram um novo posicionamento na arena das relações sociais. Constituindo um arranjo inovador de organização social, as associações civis ocuparam os espaços abandonados pelo Estado neoliberal e, executando atividades sociais, econômicas e políticas de grupos particulares, “passaram a reivindicar o caráter público de seus interesses, exigindo reconhecimento, regulação e salvaguardas das suas instituições” (Dupas, 2003, p. ). Contribui ainda para a configuração das ONGs como importantes atores da esfera pública na sociedade de hoje, a crise de representação política deflagrada no contexto da nova ordem mundial. O modelo dominante reservou ao Estado e à classe política o papel de administrar com eficiência, regulando a economia, gerando bons resultados nas contas públicas e cuidando dos serviços básicos para a população. Na perspectiva de Bernardo Sorj (2004, p. ), os partidos, “em vez de portadores de utopias, transformaram-se em administradores de pressões”. Nessa lógica administrativa que confere o status de eficiência somente aos Estados que registram superávits fiscais, parece claro que resta aos governos zelar apenas pela função arrecadadora. Em vez de criar estruturas eficientes para a construção de uma sociedade mais justa, o que seria o objetivo do Estado, as admi52
CAPTAR PARA INVESTIR
nistrações investem seus melhores esforços na tarefa de arrecadar. Entretanto, os recursos arrecadados servem muito mais às demandas da burocracia do que aos projetos sociais. Embora a sociedade civil organizada (ONGs, Oscips, associações etc.) possa atuar na execução de atividades típicas do Estado, não tem a capacidade de impor regras para seus mecanismos arrecadatórios. É por isso que o esforço feito pelas organizações para implementar projetos criativos que sejam de interesse público, tenham base comunitária e ataquem as causas da injustiça social, deve ser acompanhado por um esforço semelhante para a captação de recursos.
A diversificação das fontes
A premissa básica de um trabalho de captação de recursos para organizações sociais está na idéia de que é necessário solicitar os recursos. Parece óbvio, mas não é. De nada adianta criar estratégias de comunicação e utilizar as mais modernas ferramentas de marketing se não for observada a regra de ouro da filantropia: “pessoas doam para pessoas”. Só é possível conseguir os recursos necessários para o desenvolvimento dos projetos se os doadores forem convencidos de que na outra ponta de cada ação executada existem pessoas que precisam de ajuda. Antes de criticar a ineficiência dos processos de comunicação das ONGs ou a pouca consistência dos projetos, devemos considerar que a falta de uma cultura para a formação de doadores no Brasil é a primeira barreira a ser superada no trabalho de captação de recursos. Nos países europeus e na América do 53
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Norte, o voluntariado e a filantropia são muito mais estimulados em todos os grupos da sociedade, o que cria condições para que a mensagem das ONGs gere mais convencimento. A constatação de que as grandes organizações baseiam seus orçamentos em recursos que recebem de outros países deve ser acompanhada de duas observações. Por um lado, demonstra que a nossa sociedade poderia dar uma colaboração muito maior para a mobilização de recursos destinados às causas sociais. Por outro, aponta a existência de muitas oportunidades para o trabalho de captação de recursos. É visível que, a cada dia, as organizações desenvolvem mais capacidades nessa área, profissionalizando as equipes de captação e aprimorando os instrumentos de comunicação e marketing. Vencida essa etapa, percebe-se que um bom trabalho de arrecadação de fundos só adquire sustentabilidade se for baseado na diversificação das fontes de recursos e na retenção dos doadores.
As características dos financiadores
Nenhuma organização da sociedade civil poderá fazer planejamentos de longo prazo se depender de uma mesma fonte de financiamento. Por mais que os doadores estejam comprometidos com a causa proposta, estão sempre sujeitos a suspender os investimentos que fazem nos projetos. O fim do compromisso pode ser causado por problemas econômicos, no caso de indivíduos, ou por mudança de estratégia, no caso de empresas. Para compor o mix ideal de doadores, as organizações devem levar em conta as características de sua forma de atuação e 54
CAPTAR PARA INVESTIR
as vantagens de cada tipo de doador. Na atual conjuntura brasileira, as principais fontes de financiamento para as ONGs são os indivíduos, as empresas e os governos. Quando a organização consegue ter clareza sobre o que pode oferecer para cada um desses grupos, tem a possibilidade de construir melhores estratégias de captação.
Indivíduos
Em quase todo o mundo, os indivíduos são os principais financiadores das organizações da sociedade civil. As estruturas eclesiásticas, da Igreja Católica às denominações evangélicas, são mantidas quase exclusivamente por doações de suas membresias. Os sindicatos e as organizações estudantis também dependem de seus filiados para sobreviver. O mesmo acontece com os clubes esportivos e com as associações de classe. Não é diferente com as ONGs. Sejam as creches comunitárias, sejam as grandes organizações internacionais, todas dependem de doações individuais, em menor ou maior escala. Uma boa estratégia de captação de recursos não pode prescindir das doações dos indivíduos porque eles são os contribuintes mais fiéis. Quando confiam na organização e se identificam com a causa, podem se manter como doadores durante muitos anos. É por isso que uma organização com boa base de doadores individuais pode antecipar planejamentos para o futuro. Embora garantam maior sustentabilidade financeira para as ONGs, os indivíduos nem sempre são a principal fonte de recursos para as pequenas organizações. Isso acontece porque, 55
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geralmente, são necessários mais recursos financeiros para captar e manter os doadores desse grupo. Quando há muitos indivíduos doando pequenas quantias, é possível fazer novos investimentos no esforço de captação. Quando eles são poucos, nem sempre há recursos suficientes para as atividades de convencimento de novos doadores. Sendo assim, como dar os primeiros passos no trabalho de arrecadação de recursos de indivíduos? Ao contrário do que muitos podem pensar, as ferramentas de comunicação de massa (anúncios em TV, spots de rádio ou outdoors) não são as únicas formas eficientes de captação de doadores, embora sejam as que demandem mais investimentos. Com a constituição de redes de apoiadores ou com ações de marketing direto também é possível formar uma base de doadores. O ponto de partida é compreender que cada indivíduo que se aproxima de uma organização, por exemplo, num evento ou numa visita, pode se tornar um doador desde que seja convencido da importância do trabalho desenvolvido. Um esforço de captação de recursos focado em indivíduos deve levar em conta que, na maioria das vezes, esses doadores estão mais preocupados com os resultados concretos das doações para a vida de outras pessoas, do que com as grandes mudanças estruturais que os projetos possam produzir. Por isso, eles se mantêm mais fiéis às causas das ONGs se percebem que o trabalho está sendo realizado da forma que foi prometido. Conclui-se assim, que a retenção dos doadores só alcançará níveis satisfatórios na medida em que houver coerência entre o que se diz dos projetos financiados e o que se realiza na prática.
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CAPTAR PARA INVESTIR
Empresas
Quando passaram a se interessar pelo tema da responsabilidade social, as empresas brasileiras se tornaram importantes financiadoras dos projetos desenvolvidos pelas ONGs. Nesse grupo encontram-se as empresas que percebem na responsabilidade social uma estratégia corporativa e as que vislumbram uma nova possibilidade de marketing por meio de causas sociais. Embora seja possível desenvolver parcerias com os dois tipos de empresa, é necessário ter a capacidade de distinguir as diferenças entre os dois enfoques, o que garante melhor abordagem do possível doador. Ao se associar às causas das ONGs, as empresas que crêem na responsabilidade social como estratégia competitiva, não estão preocupadas com ganhos imediatos de imagem. Elas pretendem investir numa nova maneira de conduzir os negócios, baseada na constituição de relações justas com seus funcionários, fornecedores, clientes e comunidade. Agindo assim, as empresas éticas evitam os passivos trabalhistas, tributários ou ambientais e colocam-se no mercado como opções sólidas de investimento. Portanto, a responsabilidade social é muito mais do que filantropia empresarial; é a nova maneira de competir no mundo corporativo. Já as empresas que associam suas marcas ou produtos aos projetos fazem o que se convencionou chamar de marketing com causa social. Embora possam investir recursos substanciais em projetos relevantes, elas buscam sempre ser reconhecidas como financiadoras das boas causas da sociedade. Como retorno do dinheiro que destinam às ONGs, buscam o reconhecimento público e a publicidade espontânea. Nessa linha de atuação, tem sido muito 57
Marketing para o terceiro setor
comum a realização de campanhas que associam o consumo de determinado produto a doações para entidades filantrópicas. Antes de fazer qualquer abordagem a uma empresa para a captação de recursos é necessário, portanto, investigar a forma de atuação da possível doadora. Além de auxiliar o trabalho de avaliação do comportamento ético do parceiro, as informações pesquisadas ajudam a definir as melhores propostas a serem apresentadas. Desde que atendam aos parâmetros de intervenção das ONGs, tanto as empresas que buscam oportunidades de marketing quanto as que fazem investimentos sociais planejados, podem ser boas financiadoras. Em qualquer das situações, o trabalho de captação de recursos de empresas exige o aprimoramento técnico dos quadros das organizações. Como estão aumentando significativamente a destinação de recursos privados para os projetos sociais, as empresas seguem a tendência de exigir muito mais que a simples execução das atividades propostas. Elas querem que sejam desenvolvidos instrumentos de acompanhamento e prestação de contas, a fim de avaliar a qualidade do investimento que fazem. Assim, o êxito de um trabalho de captação de recursos nesse segmento de doadores depende basicamente de dois fatores: a qualidade dos relacionamentos construídos com as empresas e a capacidade de elaborar propostas com base nos instrumentos acordados com os financiadores. Muitas empresas adotam a prática de lançar editais públicos para o financiamento de projetos sociais nas mais diversas áreas, apresentando detalhadamente as exigências técnicas para as ONGs que desejam lançar mão dos recursos. Participar dos processos de seleção por meio de editais é uma boa forma de se capacitar para o desenvolvimento de parcerias com empresas. 58
CAPTAR PARA INVESTIR
Governos
Seja por opção ideológica, seja pela capacidade limitada de investimentos, os governos no Brasil afirmam que precisam do apoio da sociedade organizada para superar as desigualdades e a pobreza. Se convocam as organizações da sociedade para executar ações que, em tese, seriam de responsabilidade do Estado, os governos devem destinar recursos para o desenvolvimento dessas ações. A transferência de recursos públicos para as ONGs e as Oscips tem se tornado assim, uma prática comum em todos os níveis de governo. Do ponto de vista ideológico, cabe às organizações avaliar se devem buscar esse tipo de parceria com o poder público. Perderiam independência para desempenhar sua vocação básica de defender os interesses da sociedade? Se esse não for um problema, resta compreender os mecanismos de financiamento público, com seus benefícios e seus riscos. Para garantir transparência nos processos e a democratização de acesso aos fundos disponíveis, os governos devem, sempre que possível, optar pelas parcerias estabelecidas por meio de editais públicos. Essa já é uma prática comum no Brasil. Quando querem desenvolver ações complementares às políticas públicas que levam a cabo, os governos lançam editais convidando organizações da sociedade civil para que apresentem propostas de trabalho relacionadas a áreas específicas. Cumprir as exigências dos editais não é tarefa tão simples. Fica claro, dessa maneira, que as organizações devem ter boa capacitação técnica. A mesma capacitação é exigida para a implementação dos projetos com recursos públicos. Quando lança 59
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mão dos fundos de governos, uma ONG fica automaticamente obrigada a cumprir todas as exigências relacionadas com as atividades do setor público, seguindo regras de prestação de contas e licitações, por exemplo. Todo cuidado é pouco para que os recursos oriundos de governos não se tornem uma dor de cabeça. A disponibilidade de financiamento público para as organizações da sociedade civil varia de acordo com as estratégias de cada governo. Pode aumentar ou diminuir em períodos curtos de tempo. Sendo assim, as ONGs não devem ancorar suas atividades nesses fundos. O melhor cenário é trabalhar com o financiamento público somente quando os fundos possibilitarem o desenvolvimento de atividades complementares aos programas já executados pela organização.
A missão em primeiro lugar
Encontrar o caminho da eficiência em captação de recursos parece fácil. Mas se perder por ele também é um risco, quando não se volta permanentemente à missão e aos valores da organização. Para fazer face às exigências desse novo “mercado”, as ONGs passaram a se organizar conforme os paradigmas da administração, considerando como componentes prioritários de sua inserção a profissionalização dos gestores e o estabelecimento de métodos e processos geradores de eficiência empresarial. Em relatório produzido em 2000, o Banco Mundial, uma das instituições financiadoras das ONGs, apontou a eficiência na gestão como um dos principais desafios enfrentados pelas organizações na busca da sustentabilidade: “A postura mais informal e pouco empresarial 60
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precisa ser superada por um estilo de gerenciamento mais profissional e maior especialização técnica” (in Garrison, 2000). Se esse é um pressuposto básico para o êxito das ONGs, sugere-se que as organizações não percam a capacidade de se manter críticas em relação à lógica empresarial. É uma maneira de evitar os riscos apontados por Tenório (2002, p. ): a tensão entre valores empresarias e aqueles já incorporados pela cultura administrativa; a burocratização das atividades, que pode ameaçar a legitimidade das organizações; os conflitos na distribuição de poder. Nenhum esforço de captação de recursos pode desviar uma ONG do cumprimento de sua missão.
Referências DUPAS, Gilberto. Tensões contemporâneas entre o público e o privado. São Paulo: Paz e
Terra, 2003. GARRISON, John. Do confronto à colaboração, relações entre a sociedade civil, o Governo
e o Banco Mundial no Brasil. Banco Mundial, Brasília, 2000. Disponível em: <http:// www.bancomundial.org.br>. Acesso em: SORJ, Bernardo. A democracia inesperada: cidadania, direitos humanos e desigualdade social. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. TENÓRIO, Fernando G (Org.). Gestão de ONGs: principais funções gerenciais. 6. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2002.
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CRISE DE IMAGEM M么nica Borja Bonilha
Marketing para o terceiro setor
No início do cristianismo, era utilizada uma técnica de identificação simples e eficaz. Os cristãos não usavam camisetas, bottoms ou tatuagens; apenas desenhavam peixes no chão de terra ou areia, com os pés ou com a ponta de um dedo. Esse era o símbolo que usavam e hoje seria chamado de identidade visual dos cristãos. Por que o peixe? Poderia ser uma borboleta, um elefante, uma flor ou uma rã. Ou, ainda, o pão, ou o vinho, ou a uva. Mas o símbolo era o peixe. Claro que tudo tem uma explicação: Jesus Cristo um dia convidou alguns pescadores a serem “pescadores de homens”. Mas o mais surpreendente é que esse símbolo perdura por mais de dois mil anos. Ganha em popularidade até da Coca-Cola! Algumas marcas evoluem, muitas desaparecem, outras congelam no tempo e no espaço, mas sempre marcam. Outro dia vi um garoto judeu usando um quipá com a marca da Nike, dois conceitos aparentemente distintos que estavam juntos. O tema deste texto é a importância da imagem para a organização do Terceiro Setor. Primeiramente, vamos falar da identidade: muitas vezes as instituições ainda nem possuem uma, ou seja, ainda não definiram o que fazem exatamente, sua missão, sua visão, seus valores. Por exemplo: uma instituição que trabalha com crianças pode não saber qual é seu objetivo: cuidamos de crianças carentes? Ensinamos crianças? Amparamos crianças? Salvamos crianças? Apoiamos os pais de crianças necessitadas? Como fazemos? Para quem fazemos? O que não fazemos? Vamos tratar agora de um segundo fator, a imagem: como queremos ser vistos? E de que maneira queremos ser reconhecidos? “Quanto mais simples, melhor.” Essa frase vale para quase tudo na vida, até para marcas. Hoje, porém, não falamos de 64
CRISE DE IMAGEM
marcas que atingem apenas o sentido da visão, mas que possam ser percebidas com os outros sentidos. Um ambiente zen, por exemplo, prioritariamente deverá ter incenso, panos caindo do teto, almofadas de seda, música e muito possivelmente um chá. Assim o cliente sempre se lembrará do local pela memória dos cinco sentidos. Falamos ainda de marcas que provocam sentimento: fidelidade, amor, carinho, agressividade ou repúdio. Isso tudo acontece porque construímos um mundo onde estamos suscetíveis a um bombardeio de idéias e valores. Mas o que tem tudo isso a ver com organizações não governamentais (ONGs) e instituições sem fins lucrativos? Em primeiro lugar, não vamos nos esquecer de que existe uma concorrência (caso se prefira, podemos abrandar o nome e chamar esse relacionamento de coleguismo). Para que uma ONG seja mais apreciada e querida que outra, precisa de um trabalho amplo. Marca, imagem, confiança, credibilidade, tudo isso conta, mas, de maneira quase inexplicável, uma ONG pode ser mais amada que outra. Estou utilizando o termo “amada”, que pode parecer excessivamente dramático, mas poderia usar o termo “preferida”. Por que determinada pessoa prefere enviar recursos para a ONG A do que para a ONG B? Telemarketing bem feito? Credibilidade? Tudo isso faz parte da imagem que a ONG constrói ao longo dos anos. A imagem é o maior patrimônio de uma instituição. Uma vez danificada, dificilmente a instituição conseguirá se reerguer. Faça um exercício rápido: • A comunidade do bairro em que sua organização está sediada a conhece? • O quê a organização promove para essa comunidade? 65
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• O quê os beneficiários pensam da organização? • Qual a imagem que os funcionários têm da organização? • E os fornecedores, os bancos, o governo e outras ONGs, o quê pensam da organização?
O capricho
Capricho e zelo são necessários em tudo e a toda hora. Um simples carimbo no final da página reflete organização. Evite tratar de qualquer maneira papéis, correspondências, envelopes ou cartões de natal, pois sua marca está o tempo todo sendo medida e apreciada. Veja bem: não estamos falando de luxo, mas de capricho. Muitas vezes acreditamos que o dinheiro precisa existir para que haja capricho, o que não é verdade. O dinheiro pode muito bem abundar onde não necessariamente exista capricho. Capricho e cuidado são necessários em tudo: na manutenção do prédio, no cuidado com o jardim e até com a violeta velhinha que está meio largada na janela (se os funcionários não sabem cuidar nem de uma violeta, como vão cuidar de idosos, de crianças, de meio ambiente?). São os pequenos detalhes que ajudam a construir uma imagem.
O exagero
Várias ONGs usam apelação para arrecadar recursos. Muitas delas partem para o que chamamos de “pornomiséria” – isso mesmo, 66
CRISE DE IMAGEM
a pornografia da miséria. Ela acontece quando cenas chocantes e extremas são usadas para amolecer o coração dos doadores. Quem não vai doar para uma criança que está subnutrida, com a cabeça ligeiramente jogada para trás, no colo da mãe, em prantos? No cenário, vemos um casebre de taipa, com fogão a lenha e papelão no chão para dormir. A questão é: esse colaborador doa pelo coração, não se interessando pela razão dos fatos, o que chega a ser quase uma esmola. Essa doação comiserada não resolve o problema da criança, nem da mãe, nem da comunidade, nem tampouco do País. A imagem de uma instituição deve levar em consideração o compromisso com a comunidade e com o doador/colaborador/ voluntário. Não pode vender ilusões; deve informar o contexto na qual está inserida e, principalmente, acreditar no trabalho que executa. Por conta do uso-abuso de cenas de miséria, muita gente não acredita mais no trabalho de determinadas instituições e, mais grave ainda, raramente o doador recebe algum retorno ou balanço anual de como foi utilizada sua doação e se, de fato, trouxe algum benefício para a comunidade. Muitas pessoas vão dizer que, se não for assim, não há como to car o doador, pois é preciso chocá-lo. Mas, quando se consegue apenas chocar o doador, não existe conscientização, e sim comiseração.
A dignidade do necessitado
Já assisti a cenas nas quais a instituição me chocou mais do que a real necessidade da comunidade. A falta de dignidade ao retratar 67
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determinada situação de miséria reduz o pobre a um nível de objeto, o qual é meramente usado numa causa, que pode até ser justa, mas não tem respeito pela criança desnuda, pela dor da mãe ou pela vergonha do pai. A linha que divide a propaganda da instituição no que tange à arrecadação de fundos e à dignidade do pobre, é tênue e pode ser facilmente confundida. Como percebemos, são várias as facetas que compõem a identidade de uma organização. Não importa o tamanho, o alcance ou o tipo de trabalho, a identidade é a marca, tanto para quem é atendido quanto para quem é colaborador. Uma ONG não pode calcar sua identidade em imagens da miséria e da indignidade humana, sob risco de parecer que sobrevive à custa do sofrimento alheio, e que precisa dele para se manter erguida. Corre o risco também de assumir para si a relação predadora: “quanto mais famintos existirem, mais recursos teremos para atuar”. Imagens somente não trazem respostas; despertam apenas sentimentos paliativos que são incapazes de resolver a questão. A miséria humana explícita não pode se tornar um substituto para a falta de consciência. Em vez disso, a organização precisa identificar os problemas, denunciá-los, mostrar o que é preciso para saná-los e, a cada verba obtida, prestar contas daquilo que faz. Transparência na lida com os recursos é parte indissociável da boa imagem da organização, principalmente porque o dinheiro, seja qual for sua fonte, a partir do momento em que é destinado a uma organização do Terceiro Setor, passa a ser público. O ideal seria que cada ONG pudesse apenas desenhar um símbolo na areia, no pó da estrada, e fosse identificada como confiável e digna de entrar e participar de transformações numa comunidade. 68
CRISE DE IMAGEM
Boas formas de contar a verdade
A melhor forma de uma ONG promover suas ações é mostrar como sua intervenção contribui positivamente para a comunidade em que atua. Em vez de uma foto em que se explora somente a miséria de uma família, devem-se usar imagens do tipo “antes e depois”, que exibam a realidade modificada. Ou seja, mostre ao seu público que o trabalho de sua organização é humano e eficaz. Em determinadas situações, evite usar “atores” para ilustrar os materiais institucionais. ONGs lidam com a realidade e, por isso mesmo, devem mostrar pessoas que realmente são beneficiadas ou que precisam de apoio. Em muitos casos uma bela foto e um depoimento sincero, aliados a dados e estatísticas oficiais, por exemplo, são suficientes para atingir o público de forma responsável e respeitosa.
Identidade visual
Acompanhei de perto a mudança de identidade visual de uma das maiores ONGs do mundo, presente em mais de 95 países. Para estudar e propor nova logomarca, os especialistas demoraram dois anos visitando os cinco continentes e entrevistando mais de 5 mil pessoas – beneficiados e profissionais. Essa pesquisa não tinha a intenção de mudar a “personalidade” da marca, mas, sim, de identificar a percepção que as pessoas tinham da instituição. Ou seja, com base na pesquisa, os especialistas demonstraram o que a comunidade achava da ONG 69
Marketing para o terceiro setor
e concluíram como deveria ser o novo logo: uma marca que traduzisse essa percepção. Se uma logomarca não nos remete a nada, torna-se ineficiente, não servindo para muita coisa. A marca de uma organização representa parte de seu patrimônio e, por isso mesmo, deve ser respeitada em todos os seus princípios. Não entraremos em detalhes sobre a criação ou desenvolvimento de logomarcas, estudo de cores e grafismos, mas é importante ressaltar que deve haver rigor na reprodução do material: para todas as mídias, a logomarca deve ser sempre feita na mesma proporção, com a mesma fonte, os mesmos elementos gráficos e as mesmas cores. O principal objetivo de uma organização seguir à risca seu programa de identidade visual, é promover amplo fortalecimento e reconhecimento da marca, para os mais diversos tipos de público, sejam eles funcionários, doadores, comunidade ou outros.
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MARKETING DIRETO NO TERCEIRO SETOR Márcia Baêta
Marketing para o terceiro setor
Mobilização de recursos
Segundo pesquisa conduzida em 2002 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Grupo de Instituições Fundações e Empresas (GIFE) e Associação Brasileira de Organizações não Governamentais (ABONG), as Fundações Privadas e Associações Sem Fins Lucrativos no Brasil (FASIL) formam um universo de 276 mil organizações formalmente cadastradas, que empregam cerca de 1,5 milhão de pessoas1. Considerando que as organizações sem fins lucrativos necessitam de dinheiro para financiar seus programas e cumprir seus objetivos, por mais diversos que estes sejam, uma característica é comum a todas elas: necessitam mobilizar recursos. O ideal é que se construa uma plataforma diversificada de mobilização de recursos, que possibilite auto-suficiência financeira, independência e flexibilidade. Em outras palavras, é importante não colocar “todos os ovos numa cesta só”. Das várias fontes de mobilização de recursos, como empresas e fundações, organismos multilaterais, governos e indivíduos, estes são os que sustentam a base da pirâmide de doações de forma mais estável. Possuir centenas ou mesmo milhares de pessoas na base de doadores é, indubitavelmente, a melhor forma de diversificação de fundos que uma organização sem fins lucrativos pode adotar. Na Europa 10% da receita das doações oriundas do setor privado provêm de fundações e organismos, outros 10% provêm
1. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/fasfil/fasfil.pdf>. Acesso em: jul./2006
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MARKETING DIRETO NO TERCEIRO SETOR
de empresas comerciais e os restantes 80%, de doadores indivíduos. Nos Estados Unidos, 11% provêm de fundações e organismos, 5% de empresas e 84% de doadores indivíduos. De acordo com Stephen Kanitz2 o brasileiro é um dos povos que menos doam recursos filantrópicos no mundo. De acordo com dados da Receita Federal sobre o imposto de renda, a média de doações e contribuições é de R$ 23,00 por ano. A razão disso foi concluída por estudos, além de estar sendo vivenciada pelos profissionais da área de mobilização: as pessoas não doam porque ninguém pede, ou seja, onde não há cultura de pedir, não haverá cultura de doar. As quatrocentas maiores entidades norte-americanas mobilizam o equivalente a R$ 94 bilhões de donativos anualmente, enquanto as quatrocentas maiores instituições sem fins lucrativos brasileiras recebem o equivalente a R$ 1,7 bilhão, o que representa apenas 1/55 do total movimentado nos Estados Unidos. Contudo, iniciativas como a do consultor Stephen Kanitz, que concede anualmente o Prêmio Bem-Eficiente às cinqüenta organizações brasileiras sem fins lucrativos mais bem administradas, têm ajudado a minimizar esse quadro, divulgando as ações do Terceiro Setor no Brasil, estimulando a eficácia e a transparência nas organizações, além de abrir espaços para a mobilização de recursos de forma profissional. A propósito, o Terceiro Setor no Brasil necessita com urgên cia de maiores investimentos na profissionalização de sua mão-deobra. A responsabilidade de se fazer um trabalho com excelência é ainda maior do que numa organização com fins lucrativos, pois,
2. Disponível em: <http://www.filantropia.org/QuantoBrasileiroDoa.htm>. Acesso em: jul./2006
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Marketing para o terceiro setor
se algo for mal executado, poderá significar mau investimento do dinheiro do doador, prejudicando, com isso, o beneficiário. Para iniciar, é preciso que o Terceiro Setor se mobilize a fim de mudar a cultura de doações no Brasil. A conotação que ainda se tem do termo “doação” é herança das ações confessionais de “caridade”, que eram realizadas por fiéis de boa vontade que recolhiam donativos passando a cesta de ofertas nas igrejas. Com o contexto de crescimento que o Terceiro Setor vem apresentando na última década, uma “indústria” que gera empregos para cerca de 1,5 milhão de assalariados, as pessoas precisam entender que é imperativo que as organizações invistam no aperfeiçoamento e formação de suas equipes de mobilização de recursos. É preciso que o Brasil siga o exemplo dos Estados Unidos, do Canadá e de alguns países da Europa onde “indústria” de fundraising é tão profissional quanto o Segundo Setor. O Brasil tem ainda muito que aprender com esses países antes de alcançar um nível considerado bom nesse setor.
Corpo a corpo × marketing direto
As técnicas para se solicitar doações de indivíduos são variadas. Podem-se organizar jantares, bazares e shows beneficentes, vender rifas e produtos etc. Cada objetivo de mobilização de recursos requer a técnica adequada. Há um consenso entre grande parte dos mobilizadores com relação à melhor e mais eficiente forma de solicitar uma doação: a abordagem face a face aos seus “pares” (peer-to-peer). Podem ser citados como exemplo: um professor pede ou sensibiliza outro 76
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professor para as necessidades da causa que adotou; um engenheiro faz papel semelhante com outro engenheiro do seu círculo de relacionamento; um empresário pede a outro empresário do mesmo ramo que abrace uma causa, por exemplo, por profissionalização de jovens que uma determinada organização mantém e assim por diante. Pessoas que têm o mesmo perfil, gostos, ideologias, convicções religiosas, condições socioeconômicas etc., são mais facilmente influenciáveis umas pelas outras. Contudo, essa técnica não tem eficiência quando o objetivo é mobilizar centenas ou milhares de pessoas. Qualquer organização que tenha como objetivo a ampliação de sua base de doadores em números que atinjam os milhares, necessita compor a estratégia a ser implementada baseando-se em duas técnicas: face a face aos seus “pares” quando estiverem cortejando grandes doadores indivíduos e/ou organizações e técnicas do marketing direto (MKTD) quando o objetivo for conquistar um grande volume de doadores. O MKTD tem grandes vantagens quando utilizado corretamente pelas organizações do Terceiro Setor. Possibilita ao mobilizador de recursos trabalhar com a comunicação de massa e, ao mesmo tempo, simular as técnicas da abordagem face a face se valendo das mais diversas formas de personalização e interação com o receptor, desenvolvidas pelo MKTD. Outra vantagem é o melhor monitoramento e o controle do investimento possíveis em cada ação, pois, além de utilizarem comunicação de impacto que estimula resposta imediata do receptor, ações bem planejadas de MKTD oferecem um canal de resposta imediata ao receptor, como, por exemplo, um prefixo 0800 num comercial para TV, um cupom de resposta num anúncio em mídia impressa ou um link para resposta imediata pela internet. 77
Marketing para o terceiro setor
Isso possibilita mensuração das ações com acuidade, realização de testes, ajustes e adoção daquelas que oferecerem as melhores respostas e o melhor retorno do investimento (ROI). Além disso, o MKTD permite a construção de um banco de dados, possibilitando que se cumpram dois princípios básicos de mobilização de recursos: conhecer bem o doador e cultivar o relacionamento com ele. As técnicas utilizadas no relacionamento com o doador nos países onde o Terceiro Setor é desenvolvido, com algumas adaptações, são as mesmas do marketing de relacionamento utilizado no envolvimento e retenção de clientes no Segundo Setor. Existe a necessidade de um firme e duradouro relacionamento com o doador, para que as organizações consigam melhorar as arrecadações e gerar receitas que possibilitem a auto-sustentabilidade. Nesse sentido, a melhor forma de prolongar ao máximo o lifetime value (LTV) – valor do doador ao longo do tempo em que ele fica ativo na sua base de dados – é implementar bons programas de mobilização de recursos que privilegiem estratégias de relacionamento. Para isso, é imperativo que se construam planejamentos corretos e monitoráveis que atendam a todos os níveis de envolvimento com o doador e os seus respectivos e diferentes estágios de lealdade. Obviamente, tudo isso requer investimento, mas a lógica é simples: o investimento para captar um novo doador é estimado em várias vezes o custo necessário para manter um doador fiel, em especial num mercado como o brasileiro, no qual ainda é incipiente a cultura de solicitar doações em dinheiro para uma determinada causa.
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MARKETING DIRETO NO TERCEIRO SETOR
Marketing de relacionamento e sete princípios básicos de mobilização de recursos
Adaptado do MKTD e do marketing de relacionamento, o ciclo da mobilização de recursos deve conter estratégias que estabeleçam um fluxo sistemático de contatos, para que se atinja envolvi mento e movimento compensadores na base de dados, como pode ser observado a seguir. Aquisição É a estratégia utilizada na conquista de novos doadores. Antes de sair a campo buscando novos doadores, deve-se pesquisar a atual base e responder às seguintes perguntas: qual é o perfil das pessoas (dados psicográficos e dados demográficos: sexo, endereço etc.) que doam para nossa causa? Onde posso encontrá-las? A seguir, deve se estabelecer metas e resultados esperados. • Objetivo da comunicação: fortalecer a imagem da organização e, ao mesmo tempo, captar recursos, sensibilizando os prospects (potenciais doadores) das necessidades urgentes da sua causa, e as conseqüências negativas do não-atendimento dessas necessidades. • Tática: apelos de impacto veiculados por malas diretas físicas e eletrônicas enviadas a mailings qualificados, encartes e anúncios em mídia impressa, televisão, internet, telemarketing e outras mídias. Sempre que possível potencializar a ação de comunicação por meio de assessoria de imprensa, eventos, além de buscar comprometimento e advocacy da junta diretiva. 79
Marketing para o terceiro setor
Primeiro princípio básico de mobilização de recursos: Pessoas doam para pessoas. Nessa fase o apelo tem que ser ao coração; portanto, fale mais dos beneficiários do que da sua organização. Ativação A ativação é a estratégia utilizada para estimular um doador recémconquistado a fazer sua primeira contribuição. É necessário que os novos doadores estejam informados acerca do trabalho da organização para que se sintam seguros de que estão tomando a decisão correta ao abraçar a causa. Para isso é necessário que se elaborem materiais profissionais, porém simples, com comunicação clara e transmissão de imagens positivas dos trabalhos da organização. • Objetivo da comunicação: informar com clareza seu trabalho e agradecer ao doador a disposição de se envolver e participar, e da sua indispensável ajuda no atendimento das necessidades urgentes apresentadas no primeiro contato com a organização. • Tática: enviar cartas de agradecimento personalizadas e assinadas pelo diretor da organização e materiais informativos, oferecer atendimento personalizado, esclarecer dúvidas e estimular a primeira doação por meio de telemarketing. Segundo princípio básico de mobilização de recursos: Demonstre reconhecimento sempre. Agradeça com freqüência. Manutenção É a estratégia que motiva o doador a fazer a próxima doação. Preste contas e mostre transparência. Dê boas notícias para cons80
MARKETING DIRETO NO TERCEIRO SETOR
truir mais lealdade e um relacionamento de confiança. Conte ao doador a diferença que ele está fazendo na sua causa. Compartilhe as conquistas, mostrando que ele também é protagonista do resultado. • Objetivo da comunicação: prestar contas e construir credibilidade para novas solicitações. • Tática: estabelecer um fluxo de comunicação contínuo que apresente a organização como vital, eficiente, eficaz e confiável, por meio de newsletters físicas e eletrônicas, relatórios e recibos das doações como prestação de contas. Terceiro e quarto princípios básicos de mobilização de recursos: O doador quer saber como o dinheiro dele está sendo investido. O doador se orgulha em saber que é parte do impacto de uma causa importante; portanto, mostre a ele que sua organização está lhe dando essa oportunidade. Cultivation É a estratégia utilizada para criar movimento e cultivar o relacionamento com a base de doadores. Segmente a base utilizando o princípio de recency, frequency & value (RFV) do MKTD: quanto mais recente, maior a probabilidade de renovação da doação; pessoas que doam com mais freqüência são as mais prováveis de continuar doando para a organização. Segmente sua base por histórico de doação, e a previsão de fu turas doações pode ser monitorada numa perspectiva de custo × benefício, a fim de potencializar o retorno sobre investimento (ROI). 81
Marketing para o terceiro setor
Segmente sua base ativa com aqueles que doaram nos últimos 12 meses, e pré-inativa com os que doaram pela última vez num período entre 12 e 24 meses. Comunique-se com eles. Além de cultivar o relacionamento, essa estratégia visa fortalecer a imagem do seu trabalho e oferecer novas oportunidades de doações, fazendo up-grade e/ou cross-selling. Por princípio da clonagem entende-se que as pessoas se relacionam de forma mais íntima com aquelas que têm aproximadamente os mesmos valores, prioridades, princípios, gostos e nível social. Conseqüentemente, há grande possibilidade de que as pessoas do círculo de relacionamento mais próximo dos atuais doadores sejam clones deles e, conseqüentemente, os principais prospects. Portanto, é hora de pedir indicações. • Objetivo da comunicação: renovar doações em dinheiro, solicitar voluntariado e envolvimento como embaixador de sua causa (multiplicador), indicando os familiares e amigos a participarem. Nesse ponto o doador dá o passo mais forte para a lealdade. • Tática: enviar solicitações de novas doações com apelos de impacto por mala direta, e-mail marketing, newsletters, telemar keting ativo, solicitações face a face e desenvolver seu programa member-get-member. Quinto e sexto princípios básicos de mobilização de recursos: Quem doa uma vez doa duas; quem doa duas, doa três com um valor maior, se for solicitado. Clone seu doador: seu melhor prospect é o familiar ou o amigo dele. 82
MARKETING DIRETO NO TERCEIRO SETOR
Retenção É a estratégia utilizada para sistematicamente identificar as principais causas de cancelamento dos doadores regulares, e rapidamente estabelecer ações com o objetivo de retê-los. Com base no princípio de RFV, quanto mais distante o doador ficar da sua última doação, mais você gastará para retê-lo. As razões mais freqüentes de cancelamento são problemas financeiros, desinteresse pela causa, mudança de endereço, problemas com o cartão de crédito, insatisfação com a organização por algum motivo – que deve ser prontamente pesquisado e detectado para que se façam os devidos ajustes. • Objetivo da comunicação: reter doadores que sinalizam estar finalizando seu ciclo com a organização. • Tática: conduzir pesquisas que revelem as razões da descontinuidade das doações. Enviar materiais que façam novos apelos para a causa, e cartas-lembrete sobre o compromisso assumido com a organização, e/ou realizar operação de telemarketing com o objetivo de levantar o mais rápido possível as razões pelas quais o doador está se afastando, e procurar reverter a situação favoravelmente à organização. Convencer os doadores regulares a migrar para formas de pagamento automático, tais como cartões de crédito e débito automático em conta corrente, é uma das melhores táticas para retê-los. Sétimo princípio básico de mobilização de recursos: A maioria dos doadores migra suas doações para diferentes organizações com o passar do tempo. Grande parte deles doa para mais de uma organização ao mesmo tempo. Planeje ações de retenção. 83
Marketing para o terceiro setor
Reconquista É a estratégia utilizada para reconquistar doadores regulares e esporádicos, porém inativos: aqueles que não fizeram nenhuma doação nos dois últimos ciclos, ou seja, um período superior a 24 meses. Suas chances de reconquistar esses doadores a um ROI menor que conquistar novos pode ser grande. Faça suas análises. • Objetivo da comunicação: reconquistar doadores que deixaram de contribuir há dois ciclos ou mais. • Tática: conduzir pesquisas que revelem as razões da desconti nuidade das doações, ajuda a elaborar a melhor tática para reconquistar os doadores inativos. Enviar materiais que façam apelos para que o doador volte a doar para a causa é uma das táticas. Algumas organizações utilizam o mesmo tom de comunicação que adotam para doadores ativos. O mais adequado é testar diferentes táticas, e utilizar a mais apropriada para sua causa. Segmentar pelo histórico de valor da última doação também pode apresentar bons resultados. Reforçando o sétimo princípio básico de mobilização de recursos: A maioria dos doadores migra suas doações para diferentes organizações com o passar do tempo. Planeje ações de reconquista.
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MARKETING DIRETO NO TERCEIRO SETOR
Um diagnóstico a mais
No Brasil. o Terceiro Setor ainda é incipiente se comparado com aquele existente nos países desenvolvidos. Seguindo um raciocínio otimista, o desenvolvimento e o crescimento desse setor dependem de variáveis diversas, destacando-se as seguintes: melhor profissionalização e desenvolvimento dos recursos humanos; abdicação do empirismo e adoção de linguagem e princípios científicos; e, sobretudo, uma séria e competente mudança de paradigmas não somente por parte do cidadão comum (o doador em potencial), mas em especial por parte das pessoas jurídicas que produzem riqueza no País. Como ilustração do conteúdo exposto, fechamos o capítulo com um case da Visão Mundial Brasil, que foi agraciado com o Prêmio Amauta de Marketing Direto 2003 – Bronze – na categoria Fundraising, para a América Latina.
BOUNCEBACK DE NATAL 2002 ORGANIZAÇÃO: VISÃO MUNDIAL BRASIL
“Prêmio Amauta de Marketing Direto 2003 – Bronze – em Fundraising – América Latina” Ferramenta de MKTD: Mala Direta Estratégia de Cultivation • Promove novos apadrinhamentos (doadores regulares mensais), cross-selling e up-grading das doações, lealdade, fortalecimento de imagem e reconquista.
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Marketing para o terceiro setor
Objetivo de levantamento de fundos: Arrecadação de fundos extras com comunicação dirigida aos doadores da base de dados da Visão Mundial Brasil, para serem aplicados em Programa de Colchões para a cidade de São José de Tapera (Al). Resultado: 60% acima do planejado, com 19% de taxa de resposta, equivalente a 1.156 respostas com doações, totalizando uma arrecadação de R$ 47.000,00 e um ROI de R$ 5,00 a cada real investido (www.premioamauta.org).
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O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR Silvana Grendene
Marketing para o terceiro setor
Telemarketing é bom, e eu gosto
Telemarketing, SAC, call center, televendas, deliveries: muitas palavras para uma atividade que é solução para uns, invasão para outros, algumas vezes, solução e invasão para a mesma pessoa. É comum encontrarmos comunidades na internet do tipo “eu odeio telemarketing” ou as famosas e divertidas instruções de como enlouquecer um operador. Mas as mesmas pessoas que se incomodam com o telemarketing ficam satisfeitas de poder ligar para uma empresa ou para um prestador de serviço público a fim de tirar dúvidas, reclamar ou comprar algum produto. Também consideram um bom negócio receber uma ligação com uma oferta interessante. Pois é. Telemarketing é tudo isso e muito mais. É só escolher por qual ângulo você quer olhar. Eu gosto de enxergar todos eles e sempre buscar mais algum. Por exemplo: essa atividade é uma das que mais geram empregos em nosso País, principalmente, o primeiro emprego. Ao contrário de outros setores que tradicionalmente geravam o primeiro emprego no passado, como a construção civil, no telemarketing, os operadores recebem treinamento intensivo, trabalham com tecnologia sofisticada, têm perspectiva de carreira na atividade e recebem um pacote de benefícios muito além do básico. Além de absorver centenas de milhares de jovens que iniciam na vida profissional, o telemarketing emprega o maior número de portadores de deficiências e também de pessoas da terceira idade. As condições de trabalho e as características de algumas operações, proporcionam ótima oportunidade para esses grupos de profissionais. No Terceiro Setor, a contribuição dessa ferramenta de mar keting pode fazer toda a diferença para que uma entidade filan90
O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR
trópica prossiga trabalhando pela causa que lhe deu origem, e aumente o número de beneficiados pelos seus programas. O telemarketing propicia à organização não governamental (ONG) que sabe fazer uso dele, a tão buscada sustentabilidade, na forma de fonte regular e segura de recursos financeiros. A certeza de uma arrecadação mensal que uma operação de telemarketing pode proporcionar permite maior controle, planejamento e investimento na causa da entidade, que assim pode programar seu crescimento com segurança, e ajudar mais e mais os que precisam de sua interferência por não recebê-la do Estado. Além da sustentabilidade, o telemarketing pode ser uma ferramenta importante para arrecadação de recursos adicionais a projetos, mediante campanhas especiais.
Ativo, receptivo ou ambos?
Nem todos os leitores devem estar familiarizados com o jargão do telemarketing. Para esclarecimento, vamos definir rapidamente a principal diferença entre operações de telemarketing ativo e receptivo. O telemarketing ativo é aquele por meio do qual, numa relação de pessoas e telefones, a entidade solicita contribuições. O telemarketing receptivo é aquele mediante o qual a entidade faz uma campanha de divulgação do número de uma central telefônica, para a qual os interessados em contribuir possam ligar. Cada uma dessas operações tem seus prós e contras. No telemarketing ativo, é necessário um esforço para obtenção de nomes a serem abordados e o custo das ligações é da entidade. O esforço pode ser continuado e contribuintes ocasionais, convertidos em 91
Marketing para o terceiro setor
regulares. No receptivo, o custo da ligação é do contribuinte, mas há todo o investimento na criação e divulgação da campanha e o índice de resposta é, em geral, muito baixo, a não ser no caso de grandes campanhas como Criança Esperança e Teleton. Mesmo assim, é um esforço ocasional, pois o custo de manter campanhas contínuas é inviável. Por essas características, acreditamos que as duas operações são adequadas e necessárias ao Terceiro Setor. Aqui cabe uma observação. Entidades do Terceiro Setor não são lucrativas. Por isso, muitas pessoas acham que essas entidades não visam o lucro. Essa é uma percepção errada. ONGs têm custos operacionais. Precisam ter uma sede, equipamentos, contadores, funcionários e fornecedores como qualquer empresa. Alguns dos serviços podem ser prestados por voluntários, mas o atendimento aos seus beneficiados não pode ser exclusivamente baseado em trabalho voluntário. E ONGs também precisam investir na sua causa. Pode ser no aumento de beneficiados atendidos, na construção de hospitais, creches ou casas de apoio, na compra de medicamentos, na doação de equipamentos, ou na formação de profissionais que auxiliem no cumprimento dos seus objetivos. Para investir, elas precisam obter lucro, arrecadar mais do que gastam. A diferença é que uma atividade não lucrativa não distribui lucro aos seus “donos” ou controladores. Para fazer frente aos seus custos fixos, essas entidades precisam garantir uma receita fixa. Algumas recebem doações de bens imóveis que geram receitas fixas com aluguéis, mas são minoria e, mesmo assim, a tendência é os aluguéis se desvalorizarem e as despesas subirem. Para suprir essa necessidade, o telemarketing ativo é bastante adequado. Para angariar fundos a uma finalidade específica, como compra de imóveis ou equipamentos, o telemarketing receptivo pode ser muito eficaz. 92
O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR
Pessoas, pessoas, pessoas...
O Terceiro Setor lida com relacionamentos. Relacionamentos entre pessoas que criam e trabalham em organizações porque sentem necessidade de ter um papel mais ativo na transformação do mundo em que vivem, pessoas que precisam mais do que solidariedade para enfrentar as adversidades que esta vida lhes proporcionou, e pessoas que, na impossibilidade de fazer mais, contribuem financeiramente para que essas organizações cumpram seus objetivos. Relacionamentos são a matéria-prima do telemarketing. O cerne do nosso negócio é a intermediação no relacionamento dos nossos clientes com seus consumidores. Esse relacionamento pode ser tenso, quando o consumidor tem alguma queixa; gentil, quando ele tem alguma dúvida; simples, quando o consumidor responde à uma campanha para comprar algo; ou complexo, quando o consumidor é abordado para comprar algo que ele não solicitou. Mas, qualquer que seja o tipo de operação, o sucesso vai depender da forma como buscamos a qualidade desse relacionamento. Essa é a nossa expertise. E nela está a grande contribuição que o telemarketing pode dar ao Terceiro Setor. Para ilustrar esse ponto, um depoimento pessoal: quando fui trabalhar pela primeira vez para uma ONG, a operação era de telemarketing ativo. Uma coisa que a experiência em telemarketing me ensinou é que toda nova operação que assumimos é um aprendizado. Por mais que eu tenha contribuído para melhorar a performance das operações que gerenciei, tenho certeza de que elas me ensinaram muito mais. E nunca isto foi tão verdadeiro com nesse caso. Com toda experiência que eu tinha, as mesmas dúvidas que as pessoas me expunham depois de assumir me pre93
Marketing para o terceiro setor
ocupavam antes de aceitar: “Mas é assim mesmo? Liga e pergunta se quer dar dinheiro? E as pessoas dão?”. É assim mesmo. Muito obrigada. Mas não tão simples. O que faz os contribuintes colaborarem de forma regular e consistente numa operação de ativo para o Terceiro Setor, é o relacionamento que se estabelece entre eles e os operadores. Testemunhei alguns casos em que operadores e contribuintes trocavam fotos de filhos e netos, via mensageiros. Pessoas que nunca se viram tornam-se amigas, amáveis, de verdade. Aprendi muito também sobre a importância do conhecimento e do envolvimento do operador com a causa. Para muitos contribuintes, o operador é o único canal de comunicação com a entidade. Nos relatos das atividades e dos serviços prestados pela entidade durante o atendimento, é que o contribuinte sente que sua participação vai além da simples contribuição financeira. Com a experiência desses operadores, pudemos desenvolver muitas formas mais eficazes de administrar uma carteira de clientes regulares, como criar scripts flexíveis, que são os mais adequados nesses casos, campanhas para aumentar o ticket médio e novas oportunidades de contribuição. Foi uma grande experiência, da qual compartilharei alguns aspectos com você.
Uma equipe vencedora
Perfil A formação de uma equipe de telemarketing, ativo ou receptivo, começa por traçar o perfil do operador. E, sempre que o assunto 94
O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR
perfil de operador aparece numa roda de conversas ou mesmo em reuniões, surgem opiniões das mais diversas: “Operador é operador e deve trabalhar em qualquer produto”; “Treinamento é tudo”; “Se o operador é inteligente, meio caminho andado”; “Se o gestor sabe motivar, o resto é fácil”; “A boa supervisão faz milagres com um operador”; “Esta consultoria não sabe selecionar” etc. Acredito integralmente que operador com perfil adequado é essencial, sem deixar, é claro, de valorizar o treinamento e o trabalho, importantíssimo, da supervisão. Definir o perfil correto é tarefa de aprendizado constante para qualquer gestor, e existem sutilezas que não podem ser descartadas. Em operações do Terceiro Setor, bom vocabulário, técnicas de atendimento e dedicação não bastam; é preciso abraçar a causa e lutar por ela, para transmitir segurança nas informações. Lembre-se de que essa voz deverá transmitir tudo o que a ONG faz e também o que almeja fazer. Remuneração O próximo passo é definir a remuneração: fixa e variável. As pessoas trabalham porque precisam; logo, devem ser remuneradas da forma mais justa. Novamente vou falar de minhas crenças, que foram forjadas na experiência: o trabalho voluntário não se enquadra numa ação que visa sustentabilidade financeira e que tem de atingir a meta todos os meses. A explicação é bastante simples: voluntarismo pressupõe que não existam vínculos empregatícios; logo, se você é voluntário e é aniversário do seu filho, você pode ficar com ele. Mas pense que, para as crianças, os idosos ou os doentes da instituição que dependem do telemarketing para viver ou sobreviver, cada dia que o operador não está lá, daquele lado da linha, pedindo ou atendendo, pode fazer toda a diferença, não 95
Marketing para o terceiro setor
importa se por causa de um remédio ou uma fralda que não serão comprados, de uma comida que não será oferecida, de um banheiro que não será limpo ou de um atendimento que não será feito. Esse é o compromisso assumido pela entidade e não pode depender exclusivamente do esforço voluntário, que por mais comprometido não corresponde ao de uma equipe que trabalha e é remunerada adequadamente pelo seu esforço. Não compartilhar dessa premissa é dizer a um operador de telemarketing de filantropia que ele deve buscar outro emprego que o sustente. Mas por que não este? É um trabalho como qualquer outro e deve ser remunerado. Estamos falando aqui de trabalho, produção e lucratividade. Como em qualquer empresa de qualquer setor. Minha recomendação é de que a remuneração variável esteja totalmente vinculada à produção em faixas escalonáveis, de forma que o operador, para receber comissão, deva produzir o suficiente para se pagar totalmente, incluindo impostos, provisões, custos fixos e a margem definida para a causa, já que a diretoria de uma ONG não é remunerada. Dessa forma, garante-se que comissão só seja paga se for arrecadado o previsto para manter os serviços para a causa. Treinamento Chegamos agora a um ponto que adoro: treinamento. Todos os operadores precisam ser treinados, e bem treinados. Gostar de dar treinamentos e saber multiplicar são coisas absolutamente diferentes. Se não estiverem juntas, é quase certo que o resultado esperado não seja alcançado. Assisti a treinamentos nos quais os palestrantes fizeram extensa pesquisa, prepararam material riquíssimo, cronometraram o tempo, enfeitaram 96
O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR
a sala, motivaram os treinandos de todas as formas, receberam parabéns e abraços carinhosos ao final, e se decepcionaram com o resultado no dia-a-dia. Para um gestor de telemarketing é necessário, além de dominar o assunto, saber o que quer alcançar. Conhecer a equipe e identificar suas dificuldades logo nos primeiros momentos é imprescindível. No Terceiro Setor não é diferente, mas, além do fator comportamental, das técnicas de venda e da motivação, entra o treinamento sobre a causa, o porquê daquela operação existir. Esse treinamento deve ser ministrado por especialistas que consigam transmitir uma mensagem clara para todos. Lembre-se de que a comunicação correta é responsabilidade de quem fala, e não de quem escuta. Se os especialistas da sua instituição não cumprirem esse quesito, encontre uma forma de outra pessoa ministrar o treinamento formal e, para eles, programe conversas informais com os operadores. Serão momentos descontraídos, nos quais todos poderão falar ao mesmo tempo, perguntar, argumentar e, acredite, terão um valor inigualável e trarão um resultado maravilhoso na arrecadação e, principalmente, no relacionamento com os contribuintes.
Captação de contribuintes
No telemarketing receptivo é necessária a criação de campanhas permanentes e campanhas pontuais. A criação responsável de campanhas, sua manutenção, seu acompanhamento, a utilização da verba arrecadada e, principalmente, a prestação de contas aos contribuintes são imprescindíveis para garantir a idoneidade da instituição. 97
Marketing para o terceiro setor
As “campanhas” estimulam as pessoas a ligarem para contribuir ou doar algum objeto ou outro bem, motivadas por alguma mensagem que chegou até elas, via qualquer mídia ou mesmo alguma ação de telemarketing ativo que também as use como abordagem. Na operação ativa precisamos sobretudo de mailings, qualificados ou não. Normalmente são usados os “não” qualificados, ou seja, a ampla lista telefônica, as familiares Páginas Amarelas ou o site da companhia telefônica. Mailings qualificados exigem investimentos que não são comuns numa ONG. A não ser que um diretor ou contribuinte mais envolvido pague por esse investimento, essa opção está descartada. Uma das formas mais eficientes de conseguir nomes é a solicitação aos departamentos de Recursos Humanos das empresas para fazer uma campanha de arrecadação entre os funcionários. Se a causa for bem apresentada e a autorização concedida, a empresa pode liberar a lista de funcionários e ramais. Cada contribuinte captado deverá ser mantido num banco de dados recuperável. Existem hoje no mercado vários softwares específicos para filantropia que armazenam, recuperam e lançam nomes na tela do operador de ativo de acordo com a periodicidade da contribuição escolhida pelo contribuinte, emitem recibos, fazem a “baixa da cobrança” etc.
Sistemas de arrecadação
Uma característica da contribuição por pessoas físicas me chama muito a atenção: 90% preferem entregar sua contribuição ao mensageiro. Isso mesmo, ao motoboy. Mas todos os que fazem 98
O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR
esse tipo de serviço preferem o termo mensageiro; afinal, são trabalhadores e também abraçam a causa, de uma forma que eu achava não ser possível até levar um grupo a um hospital para conhecer a causa para a qual ele iria trabalhar. A contribuição via boleto sofre o mesmo que todo o mercado que não cobra juros, caso das ONGs: as pessoas a esquece na gaveta. Depósitos em conta corrente ou transferências: depende de ação do contribuinte. Débito em conta corrente: ainda gera resistência em conta de eletricidade, imagine se comprometer com filantropia. Além disso, a instituição precisa manter documentação comprobatória dessa autorização. Assim, amigo, a coleta via mensageiro, buscando sua contribuição com o porteiro do seu prédio, tal qual numa cidade do interior, humaniza a relação com a ONG que você escolheu ajudar. A outra explicação que encontrei é que o mensageiro personifica, consolida, realiza a voz que nos estimulou a contribuir. Isso mesmo. A maioria absoluta dos contribuintes de instituições filantrópicas jamais a visitou nem a visitará.
Performance
Anteriormente falei sobre a operação de telemarketing se pagar. De todo o valor arrecadado por essa operação, se ela for extremamente eficiente, 65% serão para custeá-la (o mais comum é entre 70 e 80%) e 20% serão destinados à causa. Nesses percentuais devem estar incluídos, além do pessoal, custos fixos e variáveis do imóvel e todo o staff necessário, que, no mínimo, será composto de gerente, supervisor do telemarketing 99
Marketing para o terceiro setor
(um para cada 25 operadores), supervisor da cobrança, profissional de informática e aquele profissional completamente imprescindível em qualquer empresa (DP, compras, caixinha, suporte etc).
Gestão
O gerente, gestor desta operação, pode ser também, e normalmente é, administrativo-financeiro. Uma instituição não pode se dar ao luxo de ter um gerente para cada função. Quem faz a opção pelo Terceiro Setor deve ter consciência de que tem trabalho, não emprego. E a gratificação vem a cada dia, a cada mês. Sempre que o resultado do seu trabalho efetivamente ajuda alguém. Não há nada parecido no mundo corporativo. Quanto mais o gestor estiver envolvido na captação para a instituição e em todos os seus projetos, mais efetivo poderá ser seu trabalho e desempenho. Conhecimento em gestão de pessoas é totalmente imprescindível, mas gostar de gente é ainda mais. Impossível criar uma campanha de motivação sem isso. Totalmente inadmissível fazer avaliações mensais de performance sem levar em conta a vida do profissional naquele momento, e como estabelecer as metas para o próximo mês. Sabemos que papel aceita qualquer coisa, mas estamos falando, lidando e tratando com pessoas. Então, se você não gosta de lidar com os aspectos, bons e não tão bons, de todas pessoas, esse não é o lugar que você procura. Pense nisso também se estiver contratando pessoas para a gestão de uma operação de telemarketing. E é para essas pessoas, os operadores de telemarketing, que o gestor fará sua primeira prestação de contas. Não lhe parece justo 100
O TELEMARKETING A SERVIÇO DO TERCEIRO SETOR
que assim seja? Para mim sempre pareceu completamente justo e natural prestar contas para quem exerceu o trabalho. Caberá a ele também uma tarefa de grande importância, que é manter o relacionamento com os contribuintes do telemarketing, as pessoas maravilhosas que confiaram e continuam acreditando numa voz. A manutenção desse relacionamento pode ser feita por email, teasers eletrônicos, cartas, telefonemas ou envio de jornais, se a instituição o tiver. Mas, de todas as formas, é necessário buscar prestar contas do que está sendo feito e sempre, sempre demonstrar o quanto os beneficiários são agradecidos aos contribuintes. Por vezes, tenho a exata noção de quão pouco as pessoas deste mundo agradecem umas às outras. No Terceiro Setor se agradece muito, se valoriza muito, de tal forma que quem não está habituado com isso se emociona e vai às lágrimas. E quem está acostumado também. Saúde e sucesso a todos!
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ASSESSORIA DE IMPRENSA/COMUNICAÇÃO Ana Paula Drumond Guerra
Marketing para o terceiro setor
Noticiar como forma de interferir no mundo
A comunicação é um componente essencial para o bom relacionamento que jamais pode ser comprometido, sob o risco de prejudicar sobremaneira o estabelecimento de bons relacionamentos, sejam eles internos (colaboradores) ou externos (imprensa, organismos governamentais, comunidade, doadores etc.). A organização que se comunica mal geralmente espelha conflitos, falta de planejamento e de gerenciamento, tornando-se incapaz de relacionar-se de forma profícua com seus públicos, quaisquer que sejam eles. A comunicação é basicamente feita por palavras e imagens, e elas são o caminho para o entendimento. Para que o processo comunicacional seja eficiente, é preciso, antes de tudo, que o comunicador, no nosso caso o assessor de comunicação e imprensa, conheça bem todos aqueles com os quais precisa se relacionar e também que não permita que a entidade trate a comunicação como função periférica, à qual se recorre no final de tudo. A comunicação deve participar de todos os passos dados pelas Organizações Não Governamentais (ONGs), sejam eles conceituais ou operacionais. Quando bem feita, bem planejada, a comunicação reflete-se diretamente na confiança da mensagem a ser repassada e, portanto, obtém mais chances de êxito em seu propósito. Para que isso ocorra, o assessor de comunicação/imprensa precisa ter excelente relacionamento com os diversos níveis da organização, independentemente de hierarquia, a fim de manter controle sobre todos os fatos e ações que ali se passam. Somente assim ele terá condições de divulgar tudo o que acontece, certo ou errado, bom ou ruim. Lembre-se de que a primeira característica de uma ONG, depois da seriedade de seus princípios, é claro, deve ser a transparência. So 104
ASSESSORIA DE IMPRENSA/COMUNICAÇÃO
mente assim a organização terá condições de se aprimorar e cada vez mais conquistar e manter a confiança que a sociedade, as empresas parceiras e os organismos governamentais precisam depositar nela. O profissional de comunicação de uma ONG deve respeitar três fatores fundamentais ao promover a entidade por meio de seus veículos de comunicação institucionais: agir eticamente, respeitando a sua profissão de jornalista; promover e respeitar a organização para a qual trabalha sem dispor de informações falsas e levianas; jamais prejudicar ou lesar a sociedade, em nenhuma de suas instâncias.
Comunicar pela imprensa
No mundo incessante de hoje, as fontes dos jornalistas passaram a ser qualquer pessoa ou representante de entidade que produzam notícias cujo teor seja capaz de modificar e interferir na sociedade. O trabalho de divulgar as ações de uma ONG pela imprensa nada mais é que uma forma de prestar contas à sociedade sobre tudo o que está sendo feito, desenvolvido e obtido pela instituição, para que todos tenham conhecimento suficiente para avaliar até que ponto estão ou não de acordo com seus princípios, prioridades e interesses, e decidir se querem ser ou se manter parceiros da organização. Disso pode depender o futuro da ONG. A assessoria de comunicação/imprensa é responsável por uma atividade estrutural que objetiva promover a imagem da organização aos mais diversos públicos: seja criando a imagem, quando ela ainda não existir, seja mantendo, onde já for referência, uma referência positiva, seja transformando, em situações em que estiver presente uma imagem negativa. 105
Marketing para o terceiro setor
Ética e comunicação
É imprescindível salientar que toda e qualquer comunicação de uma ONG deve ser feita tendo a ética como alicerce. Esse valor, diferentemente de outros, é universal e invariável, sendo, portanto, facilmente identificável.
Comunicação no Terceiro Setor
Na última década, o número de ONGs e causas sociais defendidas por elas aumentou exponencialmente. Isso fez da comunicação uma das formas mais eficazes para que muitas delas pudessem manter e expandir suas atividades. A entidade adquire o tamanho proporcional à comunicação que consegue promover, da mesma forma que sua responsabilidade perante a sociedade passa a ser medida em razão desse crescimento. A comunicação é, portanto, o meio que essas entidades têm para que consigam se diferenciar do todo e criar com seus públicos uma relação essencial de confiança: o que a entidade a qual represento faz que outras não fazem? Em que ponto ela avança? Outro aspecto importante da comunicação no Terceiro Setor é: o assessor deve estar em permanente contato com outras ONGs e organismos que gerenciem informações pertinentes às áreas sociais. Deve acompanhar as formas pelas quais essas entidades se apresentam à imprensa e também interagir com elas a fim de não criar guetos na área social. Uma ONG não pode enxergar outra ONG como concorrente. Compartilhar infor106
ASSESSORIA DE IMPRENSA/COMUNICAÇÃO
mações e dados é essencial para a estruturação do Terceiro Setor no País. Os principais motivos pelos quais que se torna essencial a presença de uma organização na mídia são: • Tornar-se ou manter-se referência para seus públicos. • Incrementar a captação de recursos e investimentos por meio da confiança estabelecida. • Ampliar a rede de atuação. • Obter o respeito da mídia, da sociedade e dos formadores de opinião.
O que é notícia
Em geral, notícia é tudo aquilo que foge à ordem natural dos acontecimentos. Quem já não ouviu aquela velha história de que “o cachorro mordeu o homem” não é notícia, enquanto “o homem mordeu o cachorro” é ? Em suma é isto: tornam-se notícia fatos que despertam o interesse de pelo menos uma parcela da sociedade, que sejam atuais e divulgados de forma clara e objetiva. Uma notícia deve ser capaz de narrar um fato e atribuir-lhe algumas causas e conseqüências. Para despertar o interesse da imprensa, uma notícia precisa estar acompanhada de elementos como bons personagens (pessoas que podem ser usadas como fonte e referência para ilustrar o fato em questão), boas imagens (para veículos impressos ou televisivos), além de dados e estatísticas atualizados que possam enriquecer ainda mais o conteúdo a ser noticiado. 107
Marketing para o terceiro setor
Vale dizer que uma notícia publicada de forma isolada não vai transformar a ONG do dia para a noite. Nesse ponto é preciso ter paciência e precisão: manter a imprensa constantemente abastecida de informações é de extrema importância para que a organização conquiste, ainda que a passos curtos, a confiança da sociedade. Para isso, é imprescindível que haja planejamento estratégico e também um plano de comunicação integrada que seja capaz de reunir ações conjuntas a partir de vários veículos institucionais dos quais dispõe a organização. “O que se produz numa etapa determina o que se produz na seguinte, desenvolvendo-se, assim, um ciclo dinâmico de interações”. Para identificar uma boa notícia, é importante que o assessor esteja atento aos fatos que vêm sendo cobertos pela imprensa e também a tudo aquilo que a organização produz e que possa, efetivamente, acrescentar algo novo ao noticiário: eventos, resultados de pesquisas, início de atividades, lançamento de ações e projetos, datas comemorativas, aniversários de fatos históricos etc. Desde, claro, que toda e qualquer informação repassada seja absolutamente verdadeira. O assessor de imprensa normalmente não faz parte da alta gerência de suas organização, mas jamais pode se manter apartado dela, mantendo contato constante com suas principais fontes para explicar o posicionamento público da organização.
O assessor de imprensa
A assessoria de imprensa/comunicação é, na verdade, uma intermediária entre a imprensa e a organização para a qual trabalha. 108
ASSESSORIA DE IMPRENSA/COMUNICAÇÃO
É ela a responsável por dar apoio e complementar o trabalho do repórter, seja enviando uma sugestão de pauta, seja subsidiando o repórter já decidido a pautar a matéria com dados, personagens, fontes e imagens. A assessoria é uma ponte entre as fontes de informação e a imprensa. O assessor de comunicação/imprensa deve ser capaz de ampliar os limites internos da organização, a fim de estendê-los ao conhecimento público. Ele é o responsável por dimensionar a importância dos fatos produzidos pela ONG de acordo com o interesse que a imprensa pode ter pelo tema. Além de atender às demandas urgentes que partem da imprensa (fontes, dados, estatísticas), o assessor deve despertar o interesse para fatos que correm paralelamente ao seu conhecimento. Para isso, deve se manter extremamente bem informado sobre os fatos externos à organização (bairro, cidade, Estado, país, mundo) e que possam suscitar pautas com base em fatos ocorridos em sua organização. Da mesma forma, partes dos fatos internos complementam as informações que já ganharam o noticiário e que são úteis à sociedade em geral.
O que esperar de uma assessoria de imprensa/comunicação
• Leitura crítica diária de jornais e revistas (todas as editorias!) como forma de monitorar os segmentos nos quais atua e dos quais sofre influência. Esse hábito tão salutar cria oportunidades para divulgar fatos pertinentes à organização e também pode servir de alerta para que posicionamentos possam ser 109
Marketing para o terceiro setor
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antecipados, visando a impedir a materialização de um problema que se mostra iminente e que pode afetar a organização ou seu agravamento (gerenciamento de crise). Criação, implementação e desenvolvimento de veículos de comunicação institucional, necessários ao cumprimento das metas e do projeto de comunicação da organização: jornais, revistas, sites, newsletters, house organs, blogs, fotoblogs etc. Divulgação ao seu público, por meio das mídias (internas e externas) julgadas pertinentes, dos fatos gerados pela assessoria. Cobertura de eventos ligados à organização. Organização de entrevistas coletivas, quando necessário. Relacionamento reativo com a imprensa, respondendo prontamente a sua demanda com eficiência e comprometimento. Conversa com os dirigentes da organização acerca de notícias publicadas sobre a entidade, as prováveis repercussões e como antecipar posicionamentos. Procura incessante de oportunidades para colocar a entidade em evidência, seja como fonte, seja como produtora de notícia. Atendimento imediato das demandas da imprensa. Organização e manutenção de atualização de contatos com os jornalistas. Comunicação em rede com entidades afins e órgãos governamentais. Manutenção em destaque de sua missão e seus valores, como meio de mostrar por quê e para quê foram criados. Transparência, compromisso e agilidade na relação com a imprensa. Fornecimento de informações. Jamais sonegar informações. Monitoramento de jornais e da forma como cada veículo costuma trabalhar o tema abordado pela ONG.
ASSESSORIA DE IMPRENSA/COMUNICAÇÃO
• Acompanhamento de entrevistas de seus assessorados (membros da organização): isso permite que o assessor acompanhe o desempenho da fonte e os interesses do jornalista, ajuda a resolver algum problema de última hora, além de evitar armadilhas do repórter e erros do entrevistado. É muito bom também que o assessor acompanhe os resultados da entrevista e forneça retorno ao entrevistado como forma de avaliar o desempenho dele. • Bom gerenciamento. O assessor tem que ser um bom gerente: ter bom relacionamento em todos os níveis da organização, repassar a todos detalhes sobre seus projetos e ações, ter domínio absoluto da história da organização, cumprimento rigoroso de prazos etc. O relacionamento interno deve ser tão eficaz quanto o relacionamento com os veículos de comunicação. • Apoio a eventos: o assessor deve apoiar as Relações Públicas em assuntos que tenham relação direta com a imprensa: horários, temas, convidados, entrevistas coletivas, presença de personalidades. Dependendo do porte do evento, é de extrema importância que se providencie de forma adequada uma sala equipada para a imprensa. Além de tudo isso, o assessor deve cuidar do envio de press-releases, recepção dos jornalistas, entrega de press-kits e produção de fotos e textos sobre o evento para eventuais solicitações posteriores. • Apoio a outras áreas: todas as ações relacionadas à comunicação (marketing, publicidade, assessoria de imprensa/comunicação, Relações Públicas, atendimento ao cliente) integram-se para manter coesa a missão e a identidade visual da organização. Assim, é importante que a assessoria de comunicação atue também na revisão de textos, na avaliação de uso da marca e no desenvolvimento das estratégias de comunicação integrada. 111
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• Arquivo de material jornalístico: currículos e fotos de dirigentes, matérias publicadas há algum tempo, pesquisas e estatísticas, artigos, livros e todo tipo de material que possa servir de respaldo para solicitações (seja do público interno, seja da imprensa) ou até mesmo como referência na produção de materiais pela própria assessoria. • Artigos de boa aceitação pela imprensa. Seu conteúdo é opinativo e, em geral, oferece uma análise sobre assuntos de interesse do público. Pode ser uma demanda que parte dos veículos de comunicação ou uma sugestão da organização para determinados veículos que mantêm espaços específicos para esse tipo de material. Em muitos casos, é a assessoria de imprensa/comunicação que redige esse material em nome de seus dirigentes. • Atendimento à imprensa: os jornalistas precisam e querem ser atendidos com rapidez e presteza. Normalmente eles têm um dead-line curto que precisa ser respeitado sob o risco de a entidade deixar de fazer parte das fontes e referências deles. Para tanto, é importante que o assessor disponha de uma lista de fontes e tenha fácil acesso a todas elas. O assessor precisa também saber explicar aos seus assessorados a importância de se atender às demandas da imprensa no prazo estabelecido. • Banco de dados: é de extrema importância que o assessor conheça e tenha acesso a bancos de dados importantes e que representem diretamente o foco de atuação de sua entidade. Órgãos como o IBGE, o IPEA, a Secretaria de Segurança Pública, os ministérios etc., dão suporte à gestão da entidade e à produção de material informativo por parte da assessoria. • Clipping e análise do noticiário: o clipping tem como objetivo identificar diariamente na imprensa as citações sobre a entidade ou sobre temas correlacionados. 112
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• Notas oficiais: o assessor é o responsável pela redação de notas oficiais, que representem a palavra da alta direção da organização, quando necessária a divulgação à imprensa e ao público externo. • Press-kit: preparo de kits a serem entregues à imprensa, que devem conter um press-release e outros materiais que possam interessar ao jornalista presente num evento organizado pela ONG: fôlderes, balanços sociais, fotos etc. • Release: redação de press-releases que serão enviados à imprensa com o objetivo de divulgar ações e fatos produzidos pela organização. • Site: manutenção sistemática e atualizada de informações relacionadas à organização.
Trabalhando de forma eficaz com a imprensa
O relacionamento salutar entre o assessor de imprensa e os veículos de comunicação, sempre tão melindrado, prescinde de alguns cuidados que visam garantir a eficiência e o interesse mútuo em perpetuar essa convivência tão importante para ambas as partes. Assim, o ideal é que a comunicação com a imprensa seja pautada pelos critérios seguintes. Dicas gerais para o assessor • Defina com a direção da ONG quem serão os porta-vozes oficiais para cada tipo de assunto, ou seja, quem serão as pessoas que poderão conceder entrevistas em nome da organização. 113
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• Ao marcar a entrevista, pergunte ao repórter que tipo de informação ele deseja obter de sua fonte. • Oriente e prepare suas fontes para uma boa entrevista. Se necessário for, prepare um material atualizado sobre o assunto em questão para que a fonte possa ler antes de conceder a entrevista. • Antes da entrevista, assessor e assessorado devem trabalhar em conjunto os seguintes pontos: – Quais os pontos controversos, os conflitos e as críticas que cercam o tema? Como fazer referência a eles? – Será a fonte solicitada pelo veículo a melhor pessoa para responder a essas questões? – Quais as prováveis perguntas que serão feitas durante a entrevista? – Quais são as respostas mais apropriadas? – Deverá haver formalidade na postura diante do repórter ou a postura coloquial é a que melhor pode funcionar? – Que perguntas serão suscitadas pelas respostas? – Como responder a essas questões? – Quais são as mensagens que se deseja inserir ao longo da entrevista? • De acordo com o possível, documente todas as entrevistas concedidas. • Não se desespere diante da possibilidade ou da publicação de notícias negativas, falsas ou levianas. É melhor evitar uma notícia ruim ou negativa. Mas há sempre a possibilidade de exigir espaço para o esclarecimento e para a preservação da imagem.
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Dicas para o relacionamento entre assessor e veículos de imprensa • Não abuse do envio de releases. Seja criterioso ao escolher um tema. Ele deve ser realmente relevante. • O assessor deve conhecer a rotina e os horários de fechamento das redações para que o envio de releases e as eventuais ligações para as redações sejam sempre oportunos. • O jornalista é um profissional que está em busca de informações. Ainda que a relação com ele desperte ansiedade, é importante perceber que o jornalista não é um adversário. Dependendo da relação estabelecida, ele pode tornar-se importante aliado. • Nunca retarde ou protele a concessão de informações aos jornalistas. A imprensa sempre tem urgência no material solicitado e os profissionais estão sob constante pressão de seus editores para liberar a reportagem. A demora desse repasse pode significar a perda do espaço naquele veículo. • Avalie sempre a prioridade de prestar um bom atendimento ao solicitante. Lembre-se de que uma exposição adequada na mídia é sempre muito importante para a organização. • Nunca discrimine veículos de imprensa ou jornalistas. O atendimento independe de o veículo ter um alcance menor ou maior. Tampouco depende de o profissional ser ou não conhecido. Trate todas as solicitações com o mesmo respeito e atenção. Evite preconceitos contra pequenos veículos ou profissionais desconhecidos: todos eles merecem seu respeito! Além disso, é claro, o “mundo dá sempre muitas voltas...”. • Caso receba várias solicitações de veículos diferentes, veja se não é o caso de marcar uma coletiva ou, então, de priorizar aqueles 115
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que têm informativos diários e em horários anteriores. No entanto, jamais deixe um jornalista sem resposta, mesmo que seja para recusar o convite. Sempre que um jornalista entrar em contato com você, peça todos os seus contatos: e-mail, fax e números de telefones fixo e celular. Não se esqueça de informar todos os números nos quais você poderá ser encontrado. O assessor de imprensa é um profissional que fica 24 horas no ar ! Nunca deixe de atender ou retornar o contato de um jornalista. Nem que seja para dizer que precisa de mais tempo para levantar as informações solicitadas. O jornalista precisa ter certeza de que pode (ou não) contar com você. Não dificulte as informações de que os jornalistas necessitam. Dê-lhes nomes completos e grafia correta, fatos completos, citações, números e locais onde possam encontrá-lo após o expediente. Não se esqueça de que a maioria dos jornais fecha sua edição após as 18 horas e, por isso, você precisa estar ao alcance deles. Sempre que um repórter entrar em contato com você, pergunte quanto tempo ele tem para concluir a matéria e ajude-o a cumprir o prazo. Em caso de denúncias que possam envolver a sua organização, faça o possível para que sua versão seja publicada junto da notícia, minimizando o impacto. Caso sua resposta chegue ao repórter dias depois de solicitada (e divulgada), o estrago da denúncia ficará e sua versão perderá a relevância. Nunca crie expectativas para a reportagem a ser exibida ou publicada. O repórter é apenas o primeiro de uma série de profissionais que analisarão a reportagem. Pode acontecer de você conversar horas e horas com o jornalista e, depois, não sair
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publicada uma linha sequer sobre o que vocês falaram. Mesmo assim, seja sempre muito solícito ao contato feito por um repórter (ou pelo mesmo repórter). Lembre-se sempre: a imprensa precisa de informações e boas matérias, mas você também precisa (e muito) do espaço gratuito para divulgar suas ações. Caso a matéria publicada seja infiel aos fatos relatados por você, avalie o impacto que isso pode causar à sua organização. Se o impacto for considerável, entre em contato com o repórter que o entrevistou, ou com o editor da matéria, e peça a oportunidade de o veículo publicar uma “errata”. Em casos extremos, você pode acionar o departamento jurídico de sua instituição para, juntos, verificarem a viabilidade de mover um processo e/ou exigir um direito de resposta. Se esse tipo de fato for recorrente em algum veículo em especial, considere a possibilidade de não mais conceder entrevistas a ele. Não tente interferir na finalização da reportagem. Não peça para ler um texto antes de ser publicado. Proponha-se, isso sim, a fornecer informações sempre que necessário e até o momento final da edição. Sugira enfoques e assuntos a serem abordados, solicite cuidado na abordagem de um determinado assunto, mas jamais diga como e o que deve ser feito. Aproveite sempre o contato de um jornalista para sugerir outros assuntos interessantes que possam ser abordados numa reportagem futura. Sexta-feira não é um bom dia para o envio de releases e sugestões de pauta para a imprensa, principalmente à tarde. Dê sempre preferência ao período da manhã. Caso precise conversar com alguém de redação de TV, lembre-se de NUNCA ligar a partir de uma hora e meia antes da exibição do jornal e até cerca de 30 a 40 minutos depois que o informativo estiver ido ao ar. 117
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• Caso esteja assistindo a um telejornal ou programa de rádio e perceba uma informação errada sobre sua organização, não se intimide de ligar enquanto o programa ainda estiver no ar. Se possível, peça que os responsáveis retifiquem o fato. • Ao descobrir que repassou algum dado errado ao jornalista, entre em contato imediatamente para retificar a informação.
Orientações que a assessoria deve passar para suas fontes (organização)
A fase de preparação • Somente concorde em que um profissional de sua organização compareça a uma entrevista se tiver certeza de que ele realmente domina o assunto e os argumentos a serem utilizados. Esteja também ciente sobre a posição da organização sobre o assunto. • Antes de qualquer entrevista, procure conhecer o perfil do repór ter. Caso seja um profissional reconhecidamente “difícil”, não fuja dele; apenas prepare seu assessorado para o “confronto”. • Antes de uma entrevista, leia primeiro alguns jornais do dia. Pode ser que o repórter interpele o seu assessorado sobre questões recentes. • Em alguns casos, realmente vale a pena declinar de um convite caso a matéria possa comprometer a sua organização. “Falem mal, mas falem de mim” não é a melhor posição a ser adotada quando se está à frente de uma ONG. • Quando a entrevista for para esclarecer uma notícia negativa, oriente sua fonte para que se limite ao tópico abordado e ja118
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mais tente iludir o repórter. Transparência é o melhor caminho para lidar com a imprensa. Tenha sempre à mão dados e estatísticas sobre a organização ou sobre a causa que ela defende. Não se esqueça da fonte dos dados ! Lembre-se de que um mesmo dado pode ser trabalhado de diversas formas, gerando muitas interpretações. Certifique-se, portanto, de que as informações que você está preparando para divulgar tenham interpretação precisa, não sendo capazes de gerar um entendimento diferente daquele que seja o melhor para a organização. Converse sobre isso com seu assessorado. Ajude seu assessorado a preparar exemplos, comparações, parábolas e até mesmo anedotas para simplificar e ilustrar os pontos a serem explanados na entrevista. Isso ajuda a amenizar as respostas e pode gerar um clima de proximidade com o público. Prepare um roteiro da participação de sua fonte. Ajude-a a fazer anotações e peça que ela as leve. Escreva em tópicos, fáceis de ler e de identificar. Isso ajuda a dar mais segurança e evita “saias justas”, caso o entrevistado se esqueça de algum ponto relevante. Garanta a boa imagem de seu assessorado e da organização. Preocupe-se com as roupas que ele estiver usando, gestos e objetos que podem prejudicar seu perfil. Jamais deixe que ele seja filmado ou fotografado com camisas abertas excessivamente, usando bonés ou roupas com merchandising, fumando ou com copos na mão, mesmo que contenham somente água ou refrigerante. Evite barbas por fazer, cabelos despenteados e excesso de suor nas roupas. Oriente sua fonte a nunca conceder uma entrevista em tom exaltado, agressivo ou nervoso, mesmo que tenha todos os 119
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motivos do mundo para isso. Peça-lhe que mantenha a calma e a serenidade. • Sempre que possível, converse informalmente com o repórter antes do início da entrevista e fique atento ao que for falado. • Caso o jornalista não seja especializado no assunto que será abordado, faça uma introdução objetiva para que ele possa conhecer um pouco mais do tema e ganhe a sua confiança. Fique de olho • Cada tipo de mídia tem uma linguagem diferente. Caso a entrevista seja para um jornal ou revista, as frases podem ser mais bem elaboradas. Mas se seu entrevistado falar para uma rádio ou TV, oriente-o para que seja sempre sucinto e tente resumir seu pensamento em frases completas e de efeito. • Não aceite, nem deixe que seu assessorado aceite, bebida alcoólica de boas-vindas ou após a entrevista. • Fique atento à reação do jornalista. Muitas vezes o repórter tenta conduzir a entrevista mostrando-se amigo, paternal ou até mesmo indignado somente para envolver seu entrevistado e “extrair” todo o possível dele. Por isso, antes da entrevista, faça um roteiro e peça-lhe que tente não sair do que foi preestabelecido. • Jamais deixe que seu entrevistado tente desencaminhar ou induzir um repórter ao erro. • Oriente seu assessorado a jamais dar uma entrevista lendo um texto previamente escrito. Isso dá a sensação de despreparo e amadorismo. Juntos, estudem bem o assunto e peça que ele seja o mais natural possível. O melhor, nesse caso, é consultar os apontamentos de forma discreta. 120
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• Seu entrevistado deve estar preparado para dar respostas simples, concisas e facilmente compreensíveis a alguém estranho ao tema. • Analise ao máximo cada informação repassada. Os dados brutos fazem com que a criatividade do jornalista apareça de acordo com a conveniência (muitas vezes errônea) do que de fato acontece. Não se esqueça de que muitos jornalistas adoram trabalhar com notícias ruins ou trágicas. Por isso, repasse informações nas quais esteja tudo “preto no branco”, para não despertar margem de dúvida. • Não fale números complexos, a menos que a precisão seja fundamental. E lembre-se: para usar termos como “cerca, média ou em torno de”, o número deverá estar arredondado. Nós não dizemos “cerca de 10.897 pessoas fizeram inscrição”. Dizemos “15.897 pessoas fizeram inscrição” ou “cerca de 16 mil pessoas fizeram inscrição”. • Parta sempre do princípio de que você e seu entrevistado conhecem mais o assunto do que o entrevistador e o público. • Diga a seu entrevistado que tome a iniciativa de demonstrar, a qualquer hora, seus pontos de interesse na entrevista. • Peça ao seu entrevistado que fale sempre em português claro e simples, para que qualquer um, até os mais leigos, possa entender. • Seu assessorado deve utilizar um vocabulário compreensível ao público geral e, sempre que possível, deve evitar expressões em inglês. O repórter e o público nem sempre estão familiarizados com jargões internos ou abreviações. • Oriente sua fonte para que NUNCA pronuncie expressões politicamente incorretas. Confira a tabela de correlações a seguir para que suas referências estejam sempre de acordo com o usual. Sempre que oportuno, acrescente outros exemplos. 121
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Errado
Certo
Menor
Criança, adolescente, menino, menina, jovem. Ou então “menor de 16 anos”, por exemplo.
Cego
Portador de deficiência visual
Louco, maluco, débil mental etc.
Portador de deficiência mental
Aleijado Prostituição infantil
Portador de deficiência física Exploração sexual infantil
Menores abandonados/ carentes
Crianças ou adolescentes, sem adjetivos.
Presos, detentos Legislação de menores
Recuperandos Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
Juiz de Menores/Juizado de Menores
Juiz da Infância e da Juventude
Crime, delito (quando em referência a crianças e adolescentes)
Atos infracionais
Alcoólatra, drogado Aidético(a)
Dependente químico Portador(a) do vírus HIV
• Peça que seu assessorado não se apresente curvado, como se estivesse acuado. Isso dá a impressão de derrota. Por outro lado, peça a ele que não demonstre autoconfiança em demasia, pois pode conotar arrogância. Presunção sempre causa antipatia. • Seu entrevistado deve se mostrar positivo, demonstrar segurança e jamais se mostrar agressivo, irritado, zangado, provocativo ou cínico. • Estejam ambos preparados para perguntas malfeitas, ruins, capciosas, ou até mesmo agressivas ou indiscretas. Tenham 122
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sempre os objetivos para aquela entrevista em mente e nunca se afastem deles. • Diga ao seu assessorado que tente, ao final da entrevista, arrematar sua participação com uma frase-resumo, que pode ser pensada com antecedência. Cuidado com as armadilhas • A referência a uma idéia, um estudo ou uma autoridade que contradiga o ponto de vista do seu entrevistado, por menor que seja, não deverá ser respondida, nem tampouco questionada. Oriente o entrevistado a dizer apenas que não sabe suficientemente bem sobre o assunto e a ir em direção ao seu objetivo naquela entrevista. • Diante de uma pergunta baseada numa premissa falsa ou enganadora, seu entrevistado deve indicar simplesmente que a premissa não é verdadeira e, em seguida, deve voltar para o assunto objetivado na entrevista. • Fique atento às perguntas capciosas. Diante de uma questão, por exemplo, sobre os “cinco maiores problemas que você percebe em relação a esse assunto”, releve os pontos positivos e os transforme na resposta. Outro exemplo: “a comunidade continua insatisfeita com a falta de medicamento?”. Inverta a tentativa do repórter e responda algo como: “somente no mês de janeiro, 45 crianças foram atendidas pelo médico, e todas elas receberam medicação”. Jamais diga o que o repórter quer induzi-lo a responder. • “E se...”: diante de uma situação hipotética como essa, seu entrevistado não deve se sentir compelido a responder e oriente-o a dizer simplesmente: “Não posso especular sobre esse 123
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assunto, uma vez que ele não é fato”. Caso sua organização tenha exemplos de sucesso ocorridos no passado, vocês podem utilizá-los como argumentação. “Pegadinha”: caso o repórter esteja tentando obter de seu entrevistado determinada resposta (ou confirmação), dispondo insistentemente de perguntas similares, não caia nessa! Oriente sua fonte para que vá direto ao ponto de interesse. Caso perceba que o repórter está tentando confrontar suas respostas, peça ao entrevistado que diga “como já afirmei anteriormente” e discorra normalmente sobre o assunto. “A ou B”: se um repórter tentar direcionar os comentários para um ou dois cenários prováveis, limitando desse modo a escolha de seu assessorado, peça-lhe que indique outros cenários que possam ou não ser possíveis (caso realmente possam, claro!). Instrua sua fonte para que, durante uma entrevista, pare de falar assim que a resposta estiver completa e que somente retome as respostas caso o repórter faça uma nova pergunta. Muitas vezes é no silêncio provocado pelo repórter que “entregamos o ouro ao bandido”. Lembre-se: na maioria das vezes “menos” é “mais”. Sua fonte não pode jamais insinuar nada sobre o que não possa falar abertamente. Reticências sempre podem ser interpretadas indevidamente. Seu assessorado nunca deve dizer: “sem comentários”. É o mesmo que assumir a culpa ou a responsabilidade. Se há o que ser explicado, peça-lhe que o faça. Sua organização, antes de tudo, deve assumir a postura transparente em suas ações. Caso sua fonte seja pega de surpresa com uma pergunta para a qual não tenha certeza da resposta, peça-lhe que não improvise e jamais minta! Ela deve calmamente dizer que não sabe
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a resposta, mas que se empenhará ao máximo para repassar a informação o mais rapidamente possível. E não se esqueça: promessa é dívida! Tão logo retorne ao escritório, providencie a informação pendente ao jornalista. • Não corra o risco de contar em “segredo” um fato ao repórter e depois pedir que ele não o divulgue. Muitos jornalistas, mais que interessados em respeitar suas fontes, querem é dar um “furo” ou promover um escândalo qualquer. Há falta de ética em toda e qualquer profissão, não se esqueça! • Aja sempre, você e seu assessorado, como se a câmera de vídeo ou o microfone estivesse sempre ligado. Não se deixe trair. É nessas horas que muitas pessoas são pegas de surpresa com declarações bombásticas. Entrevistas por telefone • Caso a entrevista seja por telefone, e caso você não conheça o repórter ou o veículo, peça para retornar a ligação em alguns minutos e cheque a identificação de quem lhe telefonou. Peça o auxílio do Departamento de Comunicação. • Durante uma entrevista por telefone, tome todas as providências para que a conversa não seja interrompida: desligue o celular, tire os demais telefones do gancho, ponha bilhetes do lado de fora da porta. Tome um copo de água antes e “aqueça” suas cordas vocais. Entrevistas coletivas • Antes de qualquer coisa, pense muitas vezes se é mesmo necessária a convocação de uma coletiva de imprensa. Eventos 125
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como esses são sempre um risco, uma vez que poucos (ou nenhum) jornalistas podem comparecer. Isso pode comprometer a imagem de sua organização. Outra boa razão para fugir das coletivas é o caso de sua fonte não ter jogo de cintura suficiente para lidar com a imprensa e com imprevistos. Nesse caso, pense na possibilidade de enviar um press-release ou um comunicado. • Caso realmente seja viável a realização da coletiva, jamais a convoque para após as 16 horas, a não ser em casos excepcionais e inadiáveis. O melhor horário para se marcar uma coletiva é por volta de 10 horas da manhã ou até as 15 horas. Isso dará tempo para que o jornalista faça a matéria e a envie ao editor. • O entrevistado de uma coletiva deve começar expondo as questões mais relevantes antes das perguntas. E lembre-se: quem deve coordenar a entrevista é você, nunca os entrevistadores. Quando achar que já rendeu o que devia, diga simplesmente: “acabou, senhores”. Dicas para rádio e televisão • Sempre que possível, acompanhe seu assessorado em entrevistas, principalmente nas televisivas. • Peça-lhe que chegue ao estúdio com, pelo menos, meia hora de antecedência. Isso fará com que ele tenha tempo de conversar com o entrevistador ou com a produção antes da entrevista, além de deixá-lo mais calmo para enfrentar as câmeras e microfones. • Nas entrevistas para rádio ou TV é importante que o entrevistado seja o mais conciso possível, evitando conjecturar, supor, 126
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especular. Frases curtas e bem formuladas são a certeza de que o que ele disser sairá na íntegra e causará efeito. Frases longas fatalmente serão editadas, o que pode causar distorção contextual. Oriente sua fonte: caso não tenha entendido uma pergunta, não hesite: peça ao entrevistador que a esclareça. Numa entrevista de rádio, repita as informações mais importantes. É comum que o ouvinte comece a ouvir a entrevista pela metade. Peça ao assessorado que fale de igual para igual com o ouvinte. Peça ao assessorado que evite usar em excesso palavras de apoio como “né”, “entende”, “então”, “pronto”, “visse”, entre outras usadas coloquialmente. Caso haja participação ao vivo e um ouvinte seja mal-educado, peça a seu entrevistado que não perca a paciência nem a elegância. Caso contrário, poderá ganhar a antipatia dos demais ouvintes. Fale ao seu assessorado que nunca se deixe levar por uma falsa sensação de segurança. Depois de algum tempo de “grandes respostas”, a entrevista pode decair e é justamente nessa hora que as perguntas “maldosas” surgem. E o pior, numa entrevista a última imagem é sempre a que fica. Peça-lhe que se sente ereto, confortável, com as costas totalmente apoiadas na cadeira e com as pernas apoiadas. Orienteo para que não balance as pernas, não fique girando a cadeira nem tamborile os dedos na mesa. Outro detalhe importante: todo cuidado é pouco quando se chama o comercial. Às vezes o áudio fica aberto e algumas bobagens podem ir ao ar. Caso a entrevista seja para a TV, evite que seu entrevistado use roupas listradas, xadrezes, totalmente brancas, vermelhas 127
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ou excessivamente estampadas. Confira se a sua blusa, camisa ou vestido estão em boas condições, se estão devidamente abotoados, limpos e se não contêm propagandas ou qualquer tipo de merchandising. Jamais deve usar chapéu, boné ou maquiagem exagerada. Roupas escuras impõem mais seriedade e maturidade, enquanto as mais claras insinuam transparência, leveza e participação. Avalie o que deseja alcançar. Durante uma entrevista para TV, peça ao seu entrevistado que olhe para o entrevistador, com naturalidade. Sua fonte não precisa ter receio de gesticular naturalmente, evitando, é claro, os excessos. Numa entrevista em pé, peça que sua fonte acomode as mãos à frente ou então que segure uma caneta, mas deve evitar batê-la na mesa ou ficar apertando e desapertando o botãozinho retrátil – aquele que faz um irritante “tec-tec”. Seu assessorado pode sorrir, caso ache necessário, mas, como sempre, evitar os exageros: nada de gargalhadas no vídeo. Peça-lhe que se esforce para encerrar sua resposta sempre em tom positivo.
Relacionamento com outros públicos
Público interno É preciso que cada funcionário da organização, lotado nos mais diversos setores, crie o hábito de repassar as principais informações sobre a atuação de seu setor para a assessoria de comuni128
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cação. Para isso, é importante que o assessor marque reuniões eventuais para colher idéias e sugerir pautas. Com o tempo, esse hábito integra-se à rotina de produção de cada um. Outro ponto importantíssimo: as relações interpessoais são a alma da organização e devem ser levadas em consideração quando ela está em busca de qualidade. O modo como as pessoas aprendem, cooperam, inovam e progridem depende basicamente de seus relacionamentos, pessoais ou profissionais. E acredite: a comunicação não flui bem se a comunicação interna e os relacionamentos organizacionais também não fluírem bem. Por essa razão, a assessoria de comunicação pode e deve juntar todos os esforços com o objetivo de integrar as mais diversas áreas, dispondo de veículos de comunicação interna que sejam capazes de agregar todos os funcionários. Doadores Os esforços de comunicação da organização devem também ter o propósito de despertar a consciência dos doadores e potenciais doadores para a organização em si, suas atividades, o que é fundamental, e os problemas que a entidade procura solucionar por meio de suas ações. Isso porque ninguém doa sem que haja uma solicitação bem convincente. Além disso, é importantíssimo divulgar balanços financeiros, que demonstrem como o dinheiro captado vem sendo utilizado, e também as transformações que a entidade está conseguindo promover na vida de seu público-alvo, exemplificando, sempre que possível, situações “antes” e “depois”. A comunicação feita com doadores, além de demonstrar absoluta transparência da organização, deve também conscientizá129
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los sobre a importância social de suas contribuições, mostrando que, diferentemente de caridade, o que fazem é promover verdadeira transformação socioeconômica na comunidade (país) em que vivem. Essa é mais uma forma de fidelização do doador, uma vez que ele sentirá orgulho de participar desse urgente e necessário processo de transformação. Outras organizações As organizações da sociedade civil, de forma geral, precisam estabelecer uma cultura de intercâmbio: é de suma importância que se mantenha contato constante com organizações afins e entidades vinculadas à mesma causa defendida. Podem-se trocar materiais institucionais, bem como estabelecer contato com empresas (socialmente responsáveis), igrejas, escolas e outras instituições com a finalidade de realizar palestras, reuniões, apresentações ou outras atividades. Além disso, os materiais de comunicação institucional de sua organização podem, sempre que possível, contemplar ações desenvolvidas por esses parceiros. Lembre-se: ONGs e entidades não podem ser consideradas concorrentes umas das outras. Agregar deve ser palavra de lei aqui! Organismos governamentais Uma ONG deve ter claro que jamais poderá suprir a função e o poder do Estado. No entanto, precisa andar a passos uniformes com muitos organismos governamentais a fim de viabilizar políticas públicas e obter apoio de tais entidades. Há duas formas básicas de se estabelecer esse contato: a primeira delas é por meio 130
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de notícias divulgadas pela imprensa (formadora de opinião); a outra parte de um esforço intenso da assessoria de comunicação em manter tais públicos informados sobre o andamento dos trabalhos de sua organização. Pode-se, aqui, dispor do envio de materiais informativos (jornais, boletins, revistas, fôlderes etc), bem como de e-mails e ofícios direcionados a diversas autoridades. Um detalhe importante é O quando a ONG decidir – sozinha ou com outras entidades – entregar algum tipo de solicitação a um governante, é de extrema importância participar a imprensa do fato. Os políticos se sentirão pressionados a, ao menos, dar uma satisfação formal ao pedido. Nesse caso é também indispensável que a assessoria mantenha a imprensa informada de todos os passos posteriores do processo em questão. Veículos de comunicação institucionais As assessorias de comunicação dispõem, hoje em dia, de inúmeros veículos de comunicação institucionais para divulgar suas ações aos mais diversos e distintos públicos. Alguns deles, como revistas e jornais, exigem maior investimento financeiro; outros, como boletins eletrônicos, press-releases e e-mail, absorvem um mínimo custo ao mesmo tempo em que dão visibilidade ao trabalho desenvolvido pelas ONGs. Ou seja, basta querer para que uma organização sem fins lucrativos consiga publicar suas ações e suas conquistas. Antes de optar pelos veículos, é importante que se faça uma análise minuciosa sobre alguns pontos: por quê devemos (ou não) optar por determinada publicação? Qual será o públicoalvo? Qual deverá ser a linha editorial? Como e por quem será feito o projeto gráfico? Qual a periodicidade e como será feita a 131
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distribuição? Quem comporá o comitê editorial da publicação? Qual o orçamento? Essa análise diminui os riscos de se escolher uma publicação que, além de ser custosa para a organização, pode surtir efeitos inócuos para a meta. É importante salientar que todo e qualquer veículo, por mais simples que seja, deve prezar por asseio, qualidade editorial, correção gramatical e pontualidade. Muitos podem ser custeados por entidades ou empresas parceiras, dependendo de como funciona a política de patrocínio da empresa. Por isso, todo cuidado é pouco na preservação da imagem da instituição e da parceria.
Referências DUARTE, Jorge (org.). Assessoria de Imprensa e Relacionamento com a Mídia. São Paulo: Atlas, 2003. MARTINS FILHO, Eduardo Lopes. Manual de redação e estilo de O Estado de S. Paulo. São Paulo: O Estado de S. Paulo, 1995. NASSAR, Paulo. Tudo é Comunicação. São Paulo: Lazuli. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 13/7/1990. PBH. Dicas para você se relacionar bem com a imprensa. Belo Horizonte, 2001. PASTORELLI, Ivanéa Maria. Manual de imprensa e Mídia do ECA. São Paulo: Câmara Brasileira do Livro, 2001. SOBREIRA, Geraldo. Como lidar com os jornalistas. 1. ed. São Paulo: Geração Editorial, 1993.
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IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES DE RELAÇÕES PÚBLICAS NA RESPONSABILIDADE SOCIAL Luciana Guerreiro Sabbadini
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A era da globalização tornou o mundo dos negócios muito mais competitivo, despertando nas organizações a necessidade de rever e adaptar seus valores e princípios, bem como seu envolvimento e os reflexos de suas ações para o público interno e externo e para o meio ambiente. As empresas estão mais conscientes da sua responsabilidade na preservação dos recursos naturais, os quais são considerados patrimônio da humanidade, e, também, da importância de seu engajamento nas questões sociais ligadas à comunidade interna e externa. Vale ressaltar que, apesar das demandas de mercado, existe uma concorrência mercadológica latente e o consumidor está mais exigente com a qualidade dos produtos e/ou serviços oferecidos, tornando, dessa forma, o mercado extremamente competitivo. Com o atual cenário, a empresa que desenvolve sua responsabilidade social tem um diferencial positivo. [...] a Responsabilidade Social Empresarial (RES) tornouse um fator de competitividade para os negócios. Fabricar produtos ou prestar serviços que não degradem o meio ambiente, promover a inclusão social e participar do desenvolvimento da comunidade de que fazem parte, entre outras iniciativas, são diferenciais cada vez mais importantes para as empresas na conquista de novos clientes ou na manutenção dos já existentes (Menezes Neto, 2006).
Sendo assim, o desenvolvimento dos relacionamentos sociais com os públicos internos e externos é cada vez mais necessário. As empresas começam a investir no permanente aperfeiçoamento de suas relações com todos os públicos dos quais dependem e com os quais se relacionam: clientes, forne136
IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES DE RELAÇÕES PÚBLICAS NA RESPONSABILIDADE SOCIAL
cedores, empregados, parceiros e colaboradores. Ao gerir seus negócios de forma ética e assumir compromissos públicos, práticos e efetivos com a sustentabilidade ambiental, participando diretamente do ônus que no passado era exclusivo da esfera pública (Menezes Neto, 2006).
A cidadania empresarial pode ser desenvolvida por meio de ações diretas ou indiretas envolvendo o relacionamento com seus stakeholders (públicos estratégicos – funcionários, consumidores, fornecedores, comunidade etc.). Nesse sentido destaca-se a importância das funções de Relações Públicas no desenvolvimento da responsabilidade social empresarial, estabelecendo políticas de relacionamento que visem à aproximação com os públicos estratégicos. As Relações Públicas têm muito a contribuir no sentido de facilitar o intercâmbio das organizações com os seus públicos, promovendo a comunicação bidirecional. Pois, quando enfatizamos o aspecto de relacionamento, referimo-nos basicamente ao sistema recíproco de comunicação, onde não só se enviam mas também se recebem mensagens, podendo-se medir as reações dos receptores (Kunsch, 1986, p. 45).
A comunicação exerce um papel vital para o desempenho das organizações, tanto no âmbito administrativo como nos relacionamentos com seus públicos. A transparência do conteúdo e a avaliação constante das mensagens enviadas e recebidas são de grande valia para a compreensão mútua entre a empresa e seus públicos-alvos. Para tanto, é necessário que as Relações Públicas desempenhem papel estratégico de administração nos interesses das organizações, sejam eles conflitantes ou não. 137
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Um papel essencial das relações públicas é administrar as relações de conflito entre a organização e seus públicos por meio de uma comunicação simétrica de duas mãos, que busca o equilíbrio e a compreensão. Não se admite, nos tempos de hoje, que elas atuem apenas em prol dos interesses da organização. É preciso ouvir o outro lado, abrindo canais de comunicação com todos os segmentos (Kunsch, 1997, p. 142).
Com a prática dessas funções, partindo da análise dos ambientes interno e externo e, posteriormente, planejando, implantando e administrando políticas de comunicação e de relacionamento, é possível manter a compreensão mútua, fazer que sua qualidade seja mais bem percebida e sua imagem mais valorizada pelos consumidores, tornando assim, a organização mais lucrativa e competitiva mercadologicamente. Para o desenvolvimento, a implantação e a administração de programas de relacionamento com os diversos públicos, citamos algumas ações que podem ser implantadas: • eventos institucionais que promovam conhecimento e cultura aos colaboradores e funcionários. • eventos esportivos e sociais. • campanhas de conscientização de preservação do meio ambiente. • campanhas de incentivo ao voluntariado. • campanhas de segurança e saúde. A função de Relações Públicas, no contexto da responsabilidade social, é sem dúvida de grande importância. As empresas não somente estão voltadas para as questões econômicas, dire138
IMPORTÂNCIA DAS AÇÕES DE RELAÇÕES PÚBLICAS NA RESPONSABILIDADE SOCIAL
tamente ligadas à obtenção dos lucros, mas também estão conscientes do seu papel social. As Relações Públicas podem contribuir, de forma bastante efetiva, na implantação de ações sociais que valorizem a imagem da empresa perante a sociedade. Com a prática de processos comunicacionais ágeis e transparentes, bem como do estabelecimento de relacionamentos éticos, positivos e duradouros com seus públicos estratégicos, as organizações alcançam seu principal objetivo: a construção e o fortalecimento de sua imagem, o quê, apesar de intangível, é um dos melhores resultados que uma organização pode alcançar.
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DIREITO NO TERCEIRO SETOR : O GRANDE DESAFIO! Mรกrcia Regina Bull e Helena Amorin Saraiva
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Para que possamos nos organizar com a finalidade de suprir as lacunas estatais e fazer frente às inúmeras carências da sociedade, a ciência do Direito buscou formas e instrumentalizou-as em leis. As várias associações que se formam constituem verdadeiro termômetro da democracia1, uma vez que mais e mais os indivíduos têm voz, voto e ações concretas, em verdadeiro processo transformador, propiciando melhor qualidade de vida em nosso planeta. No entanto, são os desafios que nos motivam. Escrever para aqueles que têm uma causa social importante e precisam de ferramentas de trabalho vale muito a pena! Importante começarmos pelas expressões Terceiro Setor, organização não governamental (ONG), associação e fundação, para que possamos defini-las e compreender a sua utilidade.
Origens do termo
Como surgiu a denominação Terceiro Setor? Trata-se de uma expressão de procedência norte-americana. Isso porque sua utilização iniciou-se a partir do discurso político de John D. Rockfeller III: Nós, americanos, sempre nos orgulhamos da vitalidade de nosso País. No entanto, freqüentemente deixamos de reconhecer uma das principais razões de nossa vitalida-
1. “Dans les Pays démocratiques, la science de l’association est la science mère; le progrès de toutes les autres dépend de celle-là” (Alexis de Tocqueville, La Démocratie en Amérique, 1840).
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de: o fato de que desenvolvemos, no decorrer dos mais de dois séculos de nossa existência, um notável sistema de três setores (three sector system) [...] (John D. Rockfeller III, EUA, 1978) [...] Dois setores são instantaneamente reconhecíveis para todos: o mercado e o governo. Mas o terceiro é tão negligenciado e tão pouco compreendido, que fico tentado a chamá-lo de “setor invisível”. O Terceiro Setor é o setor privado sem fins lucrativos. Inclui dezenas de milhares de instituições absolutamente indispensáveis à vida da comunidade, através da Nação: Igreja, Hospitais, Museus, Bibliotecas, Universidades e Escolas Privadas, Grupos de Teatro, Orquestras Sinfônicas e Organizações de Assistência Social de vários tipos. Todas elas dependem de contribuições voluntárias de tempo e dinheiro por parte dos cidadãos (apud Landim, 1999, p.70).
De lá para cá, como grande parte da bibliografia utilizada no Brasil foi a norte- americana, passamos a adotar essa terminologia ou a abreviatura ONG, que foi criada pelas Nações Unidas em 1949. Que entidades compõem o denominado Terceiro Setor? Foi no IV Encontro Ibero-Americano do Terceiro Setor que surgiu o primeiro consenso a respeito da definição das entidades que o compõem: “[...] aquelas que são: privadas, não governamentais, sem fins lucrativos, autogovernadas, de associação voluntária” (cf. Acotto e Manzur, 2000, p. 4, apud Montaño, 2002, p. 55). Preferimos dizer que o Terceiro Setor constitui um conjunto de agentes privados com fins públicos, cujos programas visam atender direitos sociais básicos, combater a exclusão social e pro145
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teger o patrimônio ecológico. O conhecido autor Doutor Carlos Montaño2 aponta algumas divergências e falta de rigor entre os teóricos e pesquisadores a respeito da composição do Terceiro Setor, as quais vale a pena conhecer: apenas organizações formais (cf. Salamon, apud Fernandes, 1994, p. 19); atividades informais individuais, ad hoc (Fernandes, 1994, p. 26, 109); fundações empresariais excluídas (Flacso apud Acotto e Manzur, 2000, p. 4); sindicatos, movimentos políticos insurgentes, seitas, ora pertencentes, ora excluídos (Montaño, 2002, p. 55); setor composto de manifestações pacíficas, e não de organizações de luta de maior impacto no enfrentamento (Fernandes, 1994, p. 133). Na realidade, a expressão Terceiro Setor constitui um constructo3 que, antes de esclarecer sobre um “setor” da sociedade, mescla diversos sujeitos, com aparentes igualdades nas atividades, porém com interesses, espaços e significados sociais diversos, contrários e até mesmo contraditórios. Entendemos existir diferentes tipos ou categorias de entidades, não sendo possível colocá-las sob uma só nomenclatura. Esse campo do Direito, ainda em construção, merece estudos aprofundados para que se chegue a definições mais adequadas. Composição do Terceiro Setor O Terceiro Setor não é definido na legislação pátria, mas entende-se que é composto de entes coletivos e pessoas jurídicas de direito privado (associações sem fins econômicos e fundações). Na
2. MONTAÑO, Carlos. “Terceiro Setor e questão social: crítica ao padrão emergente de intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002. 3. O dicionário Houais define constructo como “construção puramente mental.
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DIREITO NO TERCEIRO SETOR: O GRANDE DESAFIO!
tentativa de melhor compreensão das diferentes pessoas jurídicas de direito privado, elaboramos o seguinte quadro:
Quadro 1 • Terceiro Setor (associativo altruísta – sem fins econômicos) × cooperativas (sociedades simples – com fins econômicos) Pessoas Jurídicas de Direito Privado Associações
Fundações(1)
Partidos Políticos(2)
Organizações Religiosas(2)
Fins Econômicos
Fins não Econômicos SA O
Sociedades
Com cunho social
Cooperativas Ltda
N
sindicatos
G S *
Outras
Fundações Privadas
OS
OSCIP
Com cunho meramente associativo
Clubes, etc
(1) há também as fundações governamentais – autarquias fundacionais (2) Lei 10 825 de 2003 (*) denominação genérica
Como se pode observar, as cooperativas são sociedades simples – empresariais4. Não fazem parte do Terceiro Setor, como erroneamente pensam alguns. As cooperativas são sociedades de pessoas, ferramentas úteis ao Terceiro Setor na implementação
4. Regidas pelo art. 1.093 e segts. do Código Civil Brasileiro e pela legislação especial : Lei nº 5.764/71.
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de projetos sociais de geração de trabalho e renda. Promovem a distribuição do resultado econômico de forma eqüitativa, pois o rateio é baseado na produção de cada sócio-cooperado. Possuem carga tributária inferior à das empresas comuns. Recolhem o INSS em nome e por conta dos sócios, e os demais encargos trabalhistas são inexistentes. Já as entidades do Terceiro Setor não distribuem seus resultados aos associados, mas os reinvestem na causa social objeto de sua atividade-fim.
Associações: definição legal, tipos e forma de constituição
As associações são entidades constituídas pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos, consoante o art. 535 do Código Civil. Segundo os ensinamentos da jurista Maria Helena Diniz6: Associação é a forma pela qual certo número de pessoas, ao se congregarem, colocam, em comum, serviços, atividades e conhecimentos em prol de um mesmo ideal, objetivando a consecução de determinado fim, com ou sem capital e sem intuitos lucrativos.
5. Art. 53 - Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos 6. DINIZ, Maria Helena. “Curso de Direito Civil Brasileiro, 1º Volume, Teoria Geral de Direito Civil”. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
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Têm caráter altruístico (por exemplo, associação beneficente), egoístico (por exemplo, associação literária, esportiva ou recreativa) – na medida em que sua atividade-fim seja voltada para a comunidade em geral e de forma gratuita ou apenas para uma categoria de pessoas que remunera a instituição para usufruir de seus préstimos e participar de suas atividades – ou econômico não-lucrativo (por exemplo, associação de socorro mútuo) (cf. Diniz, 2002). Dessa forma pode-se dizer que há dois tipos de associações: associações de cunho associativo (aquelas que dedicam suas ações em benefício de seus quadros sociais) e associações de cunho social (entidades de benefício público, ou seja, aquelas que atuam em favor daqueles que estão fora de seus quadros sociais). Nosso foco, neste capítulo, é apenas esclarecer as formas de constituição de entidades altruísticas. Nessa categoria destacam-se as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), as Organizações Sociais (OS) e as fundações privadas. Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público As OSCIPs, instituídas pela Lei nº 9.790/1999, foram criadas para exigir legalidade, moralidade, impessoalidade, transparência, economicidade e eficiência no segmento associativo, uma vez que o Estado, ao conceder a elas isenções e imunidades fiscais, propicia ao recursos de natureza pública. Uma das inovações e vantagens das OSCIPs está na forma de contratação com o poder público, mediante parcerias e convênios, para a prestação da universalidade de serviços. A qualificação e o registro são tarefas do Ministério da Justiça, o qual vela pela observância de todos os requisitos legais. 149
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Objetivos obrigatórios Entre os objetivos da OSCIP deverá existir um ou mais dos elencados na Lei nº 9.790/1999, art. 3º (vide site: http://www. mj.gov.br/snj/oscip/default.htm) Termos de parceria e convênios Termo de parceria designa a relação que se estabelece entre o poder público e as entidades sem fins econômicos, qualificadas como OSCIPs7. O Decreto nº 3.100/1999 estabelece que a escolha da entidade parceira pode ser feita mediante concurso entre as entidades interessadas8. O termo convênio é empregado para designar um acordo entre pessoas jurídicas de direito público. Designa acordo entre entidades sem fins lucrativos e o poder público. Geralmente, tal termo (em vez de contrato) ressalta que as partes convenentes têm interesse comum, e não interesses opostos, como ocorre na típica relação contratual (por exemplo: o fornecedor quer vender e o poder público quer adquirir material). No convênio, ambas as partes, Estado e entidade social, querem realizar o projeto juntas, cada qual com suas obrigações. Organizações Sociais As OS são modelos estatais de organizações públicas que atuam fora do âmbito da administração pública, permitindo e incentivando sociedades civis sem fins lucrativos a prestar serviços pú-
7. Lei nº 9.790/99 e Decreto nº 3.100/99 8. Qualificadas como OSCIPs
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blicos não exclusivos do Estado. Suas atividades são dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde (art. 1º da Lei nº 9.637, de 15.5.1998)9. Ao ser qualificada como OS, a entidade estará habilitada a receber recursos financeiros e a administrar bens, equipamentos e pessoal do Estado. A OS é obrigada a firmar contrato de gestão com o poder público, no qual são definidas metas que assegurem qualidade e efetividade dos serviços prestados. Em decorrência da qualificação como entidade privada que presta serviço público não exclusivo, as OS têm características públicas e privadas: Características públicas: os órgãos de deliberação superior dessas instituições são formados por representantes do Estado (20% a 40%) e da sociedade; as dotações destinadas à execução dos contratos de gestão integram o orçamento da União; qualquer irregularidade na execução do contrato de gestão deve ser comunicado ao Tribunal de Contas da União. Características privadas: contratação de pessoal nas condições de mercado; adoção de normas próprias para realização de contratos; ampla flexibilidade na execução do seu orçamento; maior autonomia administrativa do que entidades exclusivamente estatais. Quem pode fazer parte de uma OS? Entidades privadas sem fins econômicos (associações, fundações) que atuam nas áreas de saúde, educação, pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente e cultura. Esses
9. Art. 1º O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei.
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serviços, quando prestados por particulares, como é o caso das OS, não se sujeitam ao regime do serviço público, mas ao regime do direito privado.
Estrutura legal das entidades do Terceiro Setor
O Código Civil dispõe, em seu art. 4510, que a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado, aí compreendido o Terceiro Setor, inicia-se com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro. O ato que dá vida legal à entidade é o estatuto social. Para que tal estatuto seja válido, deverá conter: a) denominação, fins e sede; requisitos para a admissão, demissão e exclusão de associados; b) direitos e deveres dos associados; fontes de recursos para sua manutenção; c) modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos; d) condições para a alteração das disposições estatutárias e, ainda, condições para a sua dissolução (art. 54 do Código Civil); e) previsão dos deveres dos administradores: cumprir e fazer cumprir o estatuto da entidade; f ) diligência da probidade e da transparência; lealdade para com a entidade; g) previsão da responsabilidade civil dos administradores (art. 50 do Código Civil – desconsideração da
10. Art. 45 - Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo. Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação e sua inscrição no registro.
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personalidade jurídica); h) previsão para convocação de assembléia geral para: eleger os administradores; destituir os administradores; aprovar as contas; alterar o estatuto (art. 59 do Código Civil); i) previsão dos casos de dissolução das entidades11.
Fundação: definição e constituição
De acordo com o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, fundação é “liberalidade privada por doação ou testamento, que institui uma pessoa jurídica autônoma destinada a fins de utilidade pública ou de beneficência, mediante dotação especial de bens livres”12. As fundações, que integram o Terceiro Setor, são privadas, ou seja, são as subordinadas ao Código Civil, com as derrogações das normas públicas. Formas e modalidades de constituição A criação deverá ser efetuada por seu instituidor mediante escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando a finalidade para a qual a entidade se destina e, se quiser, a maneira de administrá-la (art. 62 do Código Civil). Se os bens destinados para a constituição da fundação apresentarem-se insuficientes, poderão ser destinados a outra fundação,
11. Os Estatutos Sociais anteriores a 11.01.2002 , foram alterados, para cumprir as novas exigências, tais como: necessidade do conteúdo mínimo do Estatuto, previsão dos direitos dos associados, forma de exclusão dos associados; competências privativas da Assembléia Geral, formas de dissolução da associação. 12. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. São Paulo: Editora Positivo. 3ª Ed.,2004.
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desde que esta tenha a mesma finalidade, igual ou semelhante (art. 64 do Código Civil). Elaboração do estatuto O responsável pelo patrimônio deverá formular o estatuto social, nos termos da Lei, submetendo-o à aprovação do Ministério Público com recurso ao juiz (art. 65 do Código Civil). Caso a elaboração do estatuto não seja realizada no prazo máximo de 180 dias, caberá ao Ministério Público promovê-la. O estatuto social deverá conter as seguintes previsões obrigatórias: denominação, sede, duração, fins ou finalidades, patrimônio e administração (composição dos órgãos). A alteração estatutária somente será possível se: deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação; não contrariar ou desvirtuar o fim desta; aprovada pelo órgão do Ministério Público. Caso este a denegue, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado (Art. 67 do Código Civil). Se a alteração não for aprovada por votação unânime, os administradores da fundação, ao submeterem o estatuto ao órgão do Ministério Público, requererão que se dê ciência à minoria vencida para impugná-la, em dez dias (Art. 68 do Código Civil). Velamento pelo Ministério Público A fiscalização das fundações deve ser realizada pelo Ministério Público, consoante Legislação Federal e resolução13.
13. Art. 66 - Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas. § 1º Se funcionarem no Distrito Federal, ou em Territórios, caberá o encargo ao Ministério Público Federal.
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DIREITO NO TERCEIRO SETOR: O GRANDE DESAFIO!
Extinção A fundação, de direito privado, poderá ser extinta se deixar de ser lícita, possível ou útil à sua finalidade, ou se vencido o prazo. Caberá ao Ministério Público ou a qualquer outro interessado, promover a extinção, incorporado o seu patrimônio em outra fundação, designada pelo juiz, com fins iguais ou semelhantes, salvo disposição em contrário.
Quadro 2 • Comparativo – fundação × associação Fatores
Fundação
Associação
Elemento preponderante
Patrimônio
Pessoas
Constituição
Escritura pública/ testamento
Ata de constituição e estatuto registrado no Registro Civil de Pessoas Jurídicas
Velamento
Ministério Público de cada Estado ou do Distrito Federal
Associados e Ministério da Justiça
Finalidades estatutárias
Apenas excepcionalmente mutáveis (art. 67 e seguintes do Código Civil)
Mutáveis
(continua)
§ 2º Se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao respectivo Ministério Público. Resolução DJ de 04 de fevereiro de 2003 Art. 1º A fiscalização das fundações que funcionarem no Distrito Federal, ou em Território, incumbirá ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Art. 2º O § 1º do art. 66 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), não se aplica ao Ministério Público da União.
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(continuação)
Fatores
Fundação
Associação
Relação com o instituidor
Desvincula-se
Mantém vínculo
Observações Finais e Tarefa
Tomar para a si a causa social não constitui tarefa fácil, mas todos os grandes feitos começam pelo primeiro passo. Dê o seu primeiro passo: reúna as pessoas que querem transformar a realidade social de seu bairro, de sua cidade, de nosso País, do nosso planeta. Pequenas ações locais fazem muita diferença. Organize o trabalho de forma jurídica adequada. Construa ferramentas e caminhos para que o próximo possa andar. Aceite este desafio! E conte conosco nessa empreitada!
Referências DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro: teoria geral de Direito Civil. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 3. ed. São Paulo: Positivo, 2004. HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e questão social: crítica ao padrão emergente de inter venção social. São Paulo: Cortez, 2002.
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A ÉTICA COMO DIRETRIZ DAS AÇÕES HUMANAS Márcia Mello Costa De Liberal
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A sociedade contemporânea vive um momento de quebra, ruptura e construção de um novo tecido social. Nesse cenário, emergem novos atores e a recriação das categorias analíticas na tentativa de refazer os laços sociais. A partir dos anos 1980 as Organizações Não Governamentais (ONGs) aparecem como estratégia de conquista da cidadania e respondem a uma exigência da nova noção de solidariedade e, portanto, da ética. O objetivo deste artigo é analisar a importância das ONGs na construção dos laços sociais e como instrumento que contribui para responder às exigências sociais. Acredita-se que no Brasil existam mais de 250 mil ONGs e que milhares de pessoas estejam envolvidas em torno delas. A ética como geratriz das ações comportamentais humanas parece-nos, indubitavelmente, de extraordinária importância. Atua como bússola para traçar os rumos das ações das pessoas que integram essas organizações beneméritas. Elas visam à melho ria das condições de vida da população carente, com base numa reflexão e numa ação que perpassam os caminhos dos valores imateriais, absolutos e relativos, salientando seu importante papel social.
Ética e valores imaterias
Conceituação e importância da ética Ética vem do grego ethos e significa “aquilo que deve ser”, define o bem e o mal. Pode ser conceituada como o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana, e é susceptível de 160
A ÉTICA COMO DIRETRIZ DAS AÇÕES HUMANAS
qualificação do bem e do mal, do ponto de vista de determinada sociedade ou de modo absoluto. Moral vem do latim mor-mores e significa “o conjunto de regras comportamentais”. Moral é a realização da ação, ao passo que ética é a diretriz da realização das ações humanas. A ética é a ciência que estuda e estabelece os fins que serão norteadores de nossas ações. A ética é permanente e universal, ao passo que a moral é temporal e cultural. Para um mais complexo entendimento da ética como fundamentação das ações humanas, citamos Severino (1992, p. 183): [...] o ser humano não age de forma mecânica e sua prá-
tica é sempre intencional, marcada por uma referência a objetivos e fins. [...] ao agir o homem está sempre se referindo a valores de tal modo que todos os aspectos de sua realidade, todos os objetos de sua experiência, todas as situações que vive e todas as relações que estabelece são atravessadas por um coeficiente de valoração.
Ao analisar tal assertiva, compreendemos que em nossas experiências, em nosso agir, somos sempre motivados por valores, os quais determinam os fins de nossas ações e integram o campo da ética. Conforme Severino, a questão da ética tende a ser fundamental, pois nossas ações resultam sempre de nossos juízos valorativos, os quais legitimam e norteiam o nosso comportamento. Quando pensamos em valores éticos, percebemos que, hodiernamente, há um processo de deterioração de valores, para os quais não há referências sólidas. Muitos que eram vigentes antigamente são hoje, muitas vezes, relegados e esquecidos. Um certo olhar sociológico revela uma modernidade que se caracteriza pelo desencanto, conforme enfatiza o pensamento 161
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weberiano. A sociedade atual se apresenta abalada pelo distanciamento das crenças tradicionais, dos valores que costumavam governar as condutas humanas. Hoje, frutificam mais intensamente o individualismo e o utilitarismo como importantes balizas para o comportamento humano. O individualismo, valorizando excessivamente técnicas e competências pessoais, objetiva capacitar o homem para o domínio do ambiente. A preocupação moderna se evidencia em construir uma experiência que seja fruto da conciliação de interesses individuais com princípios éticos muito tênues, prendendo-se por vezes apenas a objetivos hedonistas e comerciais. Percebemos que, nas sociedades atuais, os princípios éticos transcendentes foram, paulatinamente, sendo substituídos pela ação norteada por interesses pessoais e, infelizmente, assistimos à perda de espaço progressivo dos valores imateriais, tanto laicos como religiosos. Vemos, lamentavelmente, um cenário de esvaziamento do sentido ético sem que outros conceitos e valores sejam criados em substituição aos ditames filosóficos da ética e, como conseqüência, apreciamos processos sociais geradores de elevada tensão, violência e agressividade. Urge que se promova o resgate de valores imateriais que digam respeito à construção de uma sociedade mais ética e mais humana. Vejamos como se manifestam alguns pensadores em relação à importância de valores éticos como pilares para a ação humana. O homem, conforme Aranha (1989, p. 62), “é um ser cultural capaz de transformar a natureza a partir de suas necessidades especiais”. Quando escolhe os fins de sua ação, utiliza-se de valores que estão inerentes à sua índole; desde o nascimento o ser humano é cercado por valores. O mundo cultural é constituído por um conjunto de valores que são os determinantes de sua ação. 162
A ÉTICA COMO DIRETRIZ DAS AÇÕES HUMANAS
Há um gama de valores – que podem ser éticos, estéticos, econômicos, lógicos, religiosos, políticos etc. – cujos estudos teóricos surgiram mais especificamente no século XIX, com o nascimento da teoria dos valores: axiologia (do grego axios = valor). Para Martinelli (1996, p. 14), há dificuldade em se conceituar valores, pois estes abrangem um campo extenso – honra, dever, direito, justiça etc. – e, portanto, sua definição deve atender a todas essas categorias axiológicas. A autora conceitua os valores como “uma não-indiferença de alguma coisa com um sujeito ou uma consciência motivada”. Os valores são o alicerce do caráter e repercutem no comportamento humano como algo inerente à personalidade individual. Talvez a violência que grassa atualmente esteja lastreada no esquecimento dos valores éticos, julgados retrógrados e sem utilidade material: [...] sem o exercício dos valores intrínsecos ao ser hu-
mano, andamos por caminhos de dor, deteriorando a qualidade de vida do planeta. Neste século fomos mobilizados por ideologias que inverteram a escala de valores e assim estabeleceram tensões socioeconômicas, gerando perplexidades, individualismo e desalento (Martinelli, 1996, p. 16).
O grande desafio dos povos é o resgate dos valores humanos, pois, conforme afirma Craxi (1995, p. 9), [...] vivemos numa era tecnológica na qual as trocas cul-
turais e a velocidade das comunicações mostram o intercâmbio, a ligação de uns com os outros e assim o ser humano adquire a riqueza moral da humanidade inteira que é representada pelos valores humanos de todas as 163
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tradições religiosas, culturais, éticas, filosóficas e jurídicas do mundo todo.
Por serem os valores éticos imateriais importantes diretrizes da ação humana, julgamos válido destacar alguns que consideramos importantes para a construção de uma sociedade mais ética e justa. Valores absolutos e valores relativos Existem valores absolutos, como a verdade, a retidão e o amor. Para Martinelli (1996, p. 16), [...] a verdade é o princípio da vida, o imperecível dentro
das coisas perecíveis, é a essência por trás de todas as formas de vida; é a energia divina que impregna toda a existência [...]. O amor é energia inesgotável que move o mundo, os universos e os seres. É força de criação, coesão e sustentação da vida. O amor é a energia de unidade e transformação. Vivemos num universo dual entre os pares de opostos e a relatividade; o amor é o impulso de integração.
A retidão, ou ação correta, é entendida como a verdade em ação. As ações corretas trazem benefícios para o ser humano e a sociedade. Agir corretamente é não trair a própria consciência, pois esta tem a percepção do que é bom ou do que é mau. A expansão do sentimento do amor acarreta a paz, que é entendida como estado tranqüilo, harmonia, concórdia. É o alicerce no qual se fundamenta a felicidade do ser humano. Estar em paz é estar em equilíbrio consigo e com os outros. 164
A ÉTICA COMO DIRETRIZ DAS AÇÕES HUMANAS
A combinação dos valores éticos absolutos propiciará a não-violência e a concretização do sentido de responsabilidade individual, a sublimação do respeito ao outro, a emancipação do tangível amor a Deus e ao próximo. Para Martinelli (1996, p. 19), “na experiência da paz é que se processam as profundas transformações da nossa personalidade”. Existem, também, valores éticos relativos, cujo exercício faz vicejar o lado luminoso de nosso temperamento, enfraquecendo o nosso lado sombrio e egocêntrico. Dos valores relativos destacaremos alguns que são importantes para o nosso agir, visando à construção de uma sociedade mais justa. São eles: discernimento, bondade, honestidade, lealdade, justiça, responsabilidade, respeito e fraternidade. Segundo Martinelli (1996, p. 26), discernimento “é a utilização da inteligência e do poder discriminatório do que é certo ou errado para tomar uma posição perante uma circunstância ou fato de acordo com nossa consciência”. Ou seja, nos mostra o valor do certo, do errado, do que é justo ou injusto, do bem e do mal. O discernimento é um valor que aproxima o ser humano da verdade porque une a razão e o sentimento. A bondade é a inclinação de fazer o bem, é ternura, brandura, amabilidade, gentileza. Aquele que a pratica enxerga o bem porque faz o bem e vive no bem. Fazer o bem para os outros traz felicidade e paz. A bondade é a qualidade do sujeito que não escolhe onde nem a quem fazer o bem; é o derramamento de afeto incondicional. A honestidade é a qualidade de quem age com dignidade e lealdade. A vivência desse valor liberta os seres dos disfarces, das inseguranças, das espertezas e das armadilhas das falsas intenções. A honestidade inspira o caráter reto, mesmo diante das tentações mais sedutoras. 165
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Já a lealdade é a qualidade de quem obedece às leis da probidade e da retidão, de quem é sincero, franco e honesto. A lealdade a outros decorre da sinceridade consigo mesmo. Ter consciência de que se é parte do todo faz desaparecer o individualismo e a disputa, e faz surgir a lealdade, a solidariedade e a colaboração. Justiça é a virtude que se traduz por uma vontade constante de dar a cada um o que lhe compete: respeito aos direitos de cada cidadão, poder de sentenciar sobre os problemas da sociedade, premiando ou punindo. Respeitar os direitos e as obrigações cria condições de liberdade, e a prática dos valores promove a justiça. A responsabilidade nada mais é que a obrigação assumida por alguém ou que lhe foi atribuída por outrem. “É responder pelas suas próprias palavras e ações e pelo que lhe foi confiado” (Martinelli, 1996, p. 31). Só o ser humano é responsável pelas suas opções e por seu destino; por isso, pode mudar os rumos da sua conduta, automodificar-se e cooperar para a mudança ou modificação da sociedade. O respeito é um sentimento que leva a tratar alguém com atenção, deferência, consideração, reverência, acatamento, veneração e valor moral. Cultivar as próprias virtudes e buscar a superação das próprias limitações e defeitos, dá condições ao ser humano de respeitar o estágio de evolução do outro. A privacidade e a individualidade alheias devem ser preservadas, sem que se busquem julgamentos intempestivos. Só o ser humano sente respeito por si mesmo, pelos outros, pela natureza e pelo sagrado. A fraternidade é o mesmo que irmandade e solidariedade. O valor da fraternidade está em perceber as aspirações autênticas dos outros seres humanos na razão inversa à da visão individualista. É o laço que nos une ao outro, acudindo-o em suas aspirações e provendo às suas necessidades. 166
A ÉTICA COMO DIRETRIZ DAS AÇÕES HUMANAS
Para muitos autores, a fé é um valor relativo. Na nossa perspectiva, a fé, de acordo com os princípios cristãos, é um valor absoluto. Acreditamos que ter fé é aderir plenamente a um ideal, a uma crença religiosa. É o valor que faz o ser humano acreditar em si mesmo, nos seus semelhantes, nos valores humanos, na vida e em Deus. A fé e o amor embalam o movimento do universo. Vimos que os valores absolutos e relativos são os embasamentos filosóficos da ética e os norteadores do comportamento humano. Sabemos que os valores éticos caracterizam o nosso agir, especialmente quando nos voltamos para o outro ao exercer ação social. Cabe, aqui, uma pergunta: como esses valores éticos permeiam a prática no Terceiro Setor?
A ética em desdobramento no Terceiro Setor
Conceituação e históricos de assistência social Denominamos de Terceiro Setor1 a diversidade de organizações cujos objetivos primordiais são ações sociais e que não podem ser encaixadas na esfera estadual, ou especificamente no âmbito particular ou empresarial. Essas organizações têm objetivos filantrópicos e não buscam lucros econômicos. Abrangem todo um gama de associações de caridade de fundo religioso, comunitário, profissional, artístico ou sindical. O princípio ético que baliza suas ações é a fraternidade.
1. “Diferente das organizações do setor público, primeiro setor, e setor privado, segundo setor, surge uma nova forma de classificação, um terceiro setor” (Hudson, 1999, p. 8).
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As organizações do Terceiro Setor apresentam três características comuns: objetivo social e não lucrativo, independência do Estado e reinvestimento do saldo financeiro nos serviços da própria organização. No Brasil, essas organizações são também conhecidas por Organizações da Sociedade Civil (OCS). A origem do fenômeno social de prestação de serviço ao próximo é muito remota. Ela surgiu pela primeira vez no Egito, cujas leis encorajavam o auxílio ao próximo, há aproximadamente cinco mil anos. O próprio faraó contribuía para fornecer pão e abrigo aos necessitados. Entre os latinos e gregos também já se observava o espírito de caridade, caritas (latim) e filantropia (grego) (Hudson, 1999, p. 12). Através do tempo, o valor ético fraternidade foi ampliado e se concretizou na criação de orfanatos, hospitais, fundos assistenciais e outras entidades, buscando como idéia básica, propiciar a melhora da qualidade de vida dos necessitados. No Brasil, as primeiras notícias oficiais de entidades de apoio aos necessitados, referem-se à Irmandade da Misericórdia, instalada na capitania de São Vicente nos primórdios da colonização, em 1543; posteriormente, foram surgindo várias outras em diferentes regiões do País. Outro fato a ser mencionado foi a criação, em 1938, do Conselho Nacional do Serviço Social, ao qual competia regulamentar a colaboração do Estado às entidades assistenciais. Em 1942 foi criada a Legião Brasileira de Assistência (LBA). A grande expansão das entidades assistenciais ocorreu na década de 1970, período em que surgiram no Brasil as primeiras ONGs. Devemos destacar na década de 1990 o marco inconfundível da “Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida”, projeto idealizado por Herbert de Souza, o Betinho. O 168
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projeto de Betinho despertou os brasileiros para a triste realidade da existência de 32 milhões de pessoas vivendo em situação de miséria no País, e para a necessidade de se consolidar ações que promovessem o bem-estar social. Acreditamos ser esse o marco para o surgimento de várias outras campanhas a nível nacional, tais como: “Campanha da Fraternidade”, “Campanha do Agasalho”, “Criança Esperança”, “McDia Feliz”, “Teleton (Campanha da Associação de Assistência à Criança Deficiente)”, “Natal Sem Fome”, “Projeto Pastoral da Criança” e “Amigos da Escola”. Muitos outros movimentos sociais surgiram, em decorrência da precária assistência oferecida pelos governos, visando amenizar as conseqüências da pobreza. Presenciamos, hoje, uma cooperação ampla entre empresas e organizações sem fins lucrativos. No pensamento de Austim (2001): O século XXI será marcado pelas alianças, que transformarão a filantropia, caracterizada pelo doador benevolente e pelo donatário agradecido, que é mera transferência ou troca de recursos. Criando um processo de geração de valor, com benefícios não somente para os parceiros, mas também para a sociedade, mas os benefícios gerados por uma aliança eficaz costumam ir além do mero fortalecimento das organizações do Terceiro Setor para que suas missões sociais sejam realizadas de forma mais eficaz.
É possível perceber a proliferação das organizações sociais como desdobramento indubitável da busca pelos valores éticos e, especialmente, da ética religiosa ligada aos grupos confessionais.
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Valores éticos norteadores da ação nas ONGs A expressão organização não governamental foi criada na década de 1940, na Organização das Nações Unidas (ONU), para designar entidades não oficiais que recebiam ajuda financeira para executar projetos de interesse social (Meirelles, Al. Aouar, 2002, p. 3). A grande explosão populacional das grandes cidades, ocorrida a partir da metade do século XX, criou complexos problemas sociais. Os êxodos da zona rural, quando houve a mudança do eixo agrícola para o industrial, ocasionaram o nascimento de muitas favelas nas periferias dos grandes centros urbanos. Nas três últimas décadas do século XX, os bolsões de pobreza, localizados nas grandes urbes, bem como em remotos rincões rurais, passaram a chamar a atenção de religiosos e pessoas beneméritas. Criou-se o espaço para as ONGs como forma de minimizar os problemas sociais em decorrência da incapacidade do Estado de atender eficazmente suas obrigações sociais. As lacunas deixadas pelas políticas governamentais passaram a ser supridas pelo aumento das organizações do Terceiro Setor. Por exemplo, com o objetivo de minorar o grave problema das crianças de rua, organizações sur giram com objetivos educacionais, artísticos e esportivos, concreti zando os ideais éticos de solidariedade, fraternidade e justiça social. Atualmente, muitas são as ONGs em território brasileiro, cujo objetivo não é só atender a demandas de carências sociais, mas também melhorar as condições ambientais, oferecer apoio às minorias excluídas (negros, índios etc.) e, ainda, proteger animais abandonados. O desmembramento e a aplicação dos ideais éticos foi a geratriz de grande versatilidade de ONGs que proliferam na busca incessante da erradicação da pobreza. 170
A ÉTICA COMO DIRETRIZ DAS AÇÕES HUMANAS
Existem hoje, segundo o Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor (CEATS)2, por volta de 250 mil organizações sociais com cerca de 1,5 milhão de pessoas empregadas, que contribuem expressivamente à economia brasileira.
Considerações finais
Nunca se falou tanto em responsabilidade social ou em solidariedade como atualmente. Nunca se divulgou tanto, nos meios de comunicação de massa, a necessidade premente de se prestar auxílio aos menos favorecidos, aos oprimidos, às minorias marginalizadas, entre outros. Nunca se ouviram tantas exortações de caráter ético relativas à necessidade de serem resgatados valores como respeito ao outro, fraternidade, solidariedade e justiça social. Inúmeras são as campanhas promovidas, as quais veiculam a importância do auxílio aos desprotegidos, aos que vivem em bolsões de miséria, aos que sofrem e se angustiam por causa das exclusões sociais. Em contrapartida, vivemos tempos conturbados nos quais a violência grassa. e faltam amor ao próximo e respeito pelos direitos humanos. São múltiplos os fatores que tanto nos preocupam. A dualidade dos fatos nos leva a profunda reflexão: estamos fazendo tudo o que podemos para o efetivo resgate de valores éticos? Estamos de fato contribuindo de forma eficaz para que as exortações
2. Informações disponíveis no site: http://www.fundacaofia.com.br/ceats. Acesso em: jul≠≠≠./2006
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de amor ao próximo, de fraternidade, de solidariedade e de justiça social apregoadas, se transformem em realidade? Os movimentos de solidariedade e as práticas das ONGs estão de fato contribuindo para a construção de um tecido social ético? Urge que envidemos ao máximo, esforços para que a utopia de uma sociedade mais justa e mais fraterna se concretize o mais breve possível. As ações das ONGs são fundamentais à medida que suas reivindicações e práticas vão se transformando em políticas públicas. Nesse sentido, elas não substituem o Estado, que é o legítimo produtor de direitos, mas contribuem apontando caminhos. Portanto, é necessário que percebamos a importância da fraternidade e da solidariedade como um canal para minorar as diferenças sociais, possibilitando a construção de uma sociedade melhor, na qual cada um de nós, procurando compreender o outro, possa ampliar seu sentido de humanidade.
Referências ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofia da educação. São Paulo: Moderna, 1989. AUSTIM, James. Parcerias, fundamentos e benefícios para o Terceiro Setor. São Paulo:
Futura, 2001. CRAXI, Antonio. Os valores humanos: uma viagem do “eu” ao “nós”. Trad. Ítala Nandi. São Paulo: MEC, 1995. HUDSON, Mike. Administrando Organizações do Terceiro Setor: o desafio de administrar sem receita. São Paulo: Makron Books, 1999. MARTINELLI, Marilu. Aulas de transformação: Programa de Educação em Valores Humanos. São Paulo: Petrópolis, 1996. MEIRELLES, Elisângela Cabral de, AL. AOUAR, Walid Abbas. O desafio das ONGs ante a minimização do papel do Estado no cenário global. Cadernos de Pesquisa em Administração, São Paulo, v. 9, n. 3, 2002. SEVERINO, Antonio Joaquim. Filosofia. São Paulo: Cortez, 1992.
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