Salomão Rovedo - Glosas escabrosas

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Salomão Rovedo, versos Marcelo Soares, gravuras

GLOSAS ESCABROSAS

(poesia erótica e satírica)

Rio de Janeiro 2009


Salomão Rovedo, versos Marcelo Soares, gravuras

GLOSAS ESCABROSAS (poesia erótica e satírica)

Capa: Gravura de Marcelo Soares para o álbum “Erótica”

Rio de Janeiro 2009


Abortado pelo tempo... Esta coleção de poesia erótica e satírica estava enfileirada para sair num tempo que pode ser localizado nos anos 1990. Eu e Marcelo já tínhamos produzidos dois álbuns de gravura e poesia, FOLGUEDOS – com prefácio de Orígenes Lessa (apenas para as gravuras de Marcelo) e ERÓTICA, apresentação de Jos Luyten. Foram edições super limitadas, feitas num prelo manual velho que fazia parte do acervo da Casa São Saruê, ainda nas mãos de seu fundador, o escritor Humberto Peregrino. Tinta, papel e produção eram bancados com recursos próprios – e por isso parcos... Depois desses dois álbuns surgiu a idéia de fazer este que agora aparece, motivado pelos motes que inventávamos e outros já de domínio público. Eu, Marcelo e Zé Andrade vivíamos inventando Motes e Glosas quando nos encontrávamos na antiga feira dos paraíbas, em São Cristóvão. Esse trovar durou bastante tempo, mas nos anos 1990 já estava se esgotando, gasto pela revolução progressista que iria santificar-se com a internet, a informática, os meios múltiplos de reprodução. Por muitos motivos o grupo – que também tinha a presença de Franklin Maxado, Raimundo Silva, Ciro Fernandes e mais alguns amigos e poetas de presença bissexta – se dispersou. Marcelo retornou à Olinda (onde deu oficina de xilogravura) e à Timbaúba (PE), onde fundou sua folhetaria realizando um sonho antigo. Maxado foi chamado aos afazeres de responsa em terras de seus pais e hoje vive rodeado de nelores e guzerás em Feira de Santana (BA). Raimundo Silva foi atraído pelo canto das sereias que freqüentam as praias do litoral potiguar e hoje vive arriado numa rede cercado de bacorinhos... Sobramos eu – que me escondo no Cachambi nas faldas do Méier – e o Zé Andrade – sempre reinando entre as plantas e os pica-paus que povoam Santa Teresa, desafiando o mundo com suas esculturas em miniatura. Agora, com mais tempo e menos dinheiro para gastar, ando mexendo nas velharias empoeiradas que sobreviveram a três filhos roedores de livros e papéis. Foi assim que reencontrei este projeto, ainda inédito. Antes que os netos sintam a mesma fome de saber, resolvi salvar o que sobrou, digitalizando para edições eletrônicas. Também já estou passando para a telinha e disco rígido minha pequena produção de cordel, que em breve estará circulando na rede. Quando essa novela toda acabar, será a minha vez de repetir Macunaíma e findar os dias atracado numa rede à beira do rio, conversando com um louro desbocado que só sabe repetir palavrão. Assim, faço por merecer a minha pequena (mas merecida) eternidade... Rio de janeiro, Cachambi, junho de 2009.



Mote: Jamais esqueço a expressão Dos olhos de Berenice... Glosa: Quando o fogo da paixão Aquilo que a gente quer É acender na mulher Um poderoso vulcão Jamais esqueço a expressão. Foi tesão e foi doidice Se entregando com denguice Escanchada arfando os seios Eu satisfazendo anseios Dos olhos de Berenice...



Mote : Pobre cu que nĂŁo tem sorte Solta um peido a merda vem. Glosa: Um ataque agudo e forte Bem pior que dor-de-parto Rasga violento e farto Pobre cu que no tem sorte. Mais forte que a dor-da-morte E dor-de-viado tambĂŠm Castiga sempre alguĂŠm Como fosse dor-de-corno A tripa faz um contorno Solta um peido a merda vem.



Mote: Peia, Caceta, Mangalho Que nomes tem o Caralho! Glosa : Badalo, Estaca, Piroca Nervo, Manjuba, Ceguinho Fumo, Troรงulho, Zezinho Prego, Sarrafo, Biloca Rola, Binga, Mandioca Peia, Caceta, Mangalho. Ferro, Charuto, Vergalho Lapa, Seringa, Cajado Pra quem nรฃo foi batizado Que nomes tem o Caralho!



Mote : Vi uma mocinha mijar Deixa um buraco no chão! Glosa: Foi para se aliviar Lá no mato tava escuro Estando atrás do muro Posso por tudo jurar Vi uma mocinha mijar. Igual chuva de verão Pororoca da aluvião Faz um enorme barulho Carrega e remove entulho Deixa um buraco no chão!



Mote: Se é do homem ser chifrudo É muito melhor morrer. Glosa: Boa fêmea faz de tudo E sendo gostosa então Parte logo pra traição E põe o macho galhudo Se é do homem ser chifrudo... Sem nada poder fazer Vendo a galhada crescer É por todos apontado - Olha ali o corneado! É muito melhor morrer.



Mote : Xiri, Perereca, Aranha, Que nome a Boceta tem! Glosa: Cona, Xandanga, Buçanha Pixéu, Fenda, Bacorinha Xarifa, Talho, Rosinha Papuda, Lasca, Xiranha Xiri, Perereca, Aranha. Carne-mijada também É o trono do o vai-e-vem Concha, Rocinha, Almofada Maçã, Fruta, Desejada Que nome a Boceta tem!



Mote : Foi-se a ilusão desta vida A minha pica morreu! Glosa: Era a coisa mais querida Que pode um homem ter Perdi o que dava prazer Foi-se a ilusão desta vida. Quem malhava a cona ardida Todo o vigor já perdeu O músculo emurcheceu E de cabeça arriada Não levanta pra mais nada A minha pica morreu!



Mote: Napoleão me flagrou Nos braços de Josefina. Glosa: Um sujeito me contou Tremendo de covardia - Amigo nem faz um dia Napoleão me flagrou... Ao dizer quase chorou Temendo por sua sina Pois o outro não se afina Com quem mexe com seu gado Apois encontrou o coitado Nos bravos de Josefina.



Mote : Meu caralho hoje namora Dois pelancudos colhões. Glosa : A minh'alma triste chora Este fato inusitado Depois de ser muito usado Meu caralho hoje namora. Nem mais o vento deflora Falido de ereções Se gozou aos borbotões Lindos rabos e bocetas Hoje tem como muletas Dois pelancudos colhões.



Mote: Vi a Porteira do Mundo Entre as pernas da mulher. Glosa : Hoje aqui já moribundo Quase ao fim da minha meta Numa visagem de asceta Vi a porteira do mundo. No relâmpago dum segundo Um anjo que Deus não quer Batizado Lucifer Para vingar-se da peta Instalou-se numa greta Entre as pernas da mulher!


OS AUTORES Salomão Rovedo (1942), escritor, textos publicados em: Abertura Poética (Antologia), Walmir Ayala/César de Araújo-1975; Tributo (Poesia)-Ed. do A. 1980; 12 Poetas Alternativos (Antologia), Leila Míccolis/Tanussi Cardoso, 1981; Chuva Fina (Antologia), Leila Míccolis/Tanussi Cardoso, 1982; Folguedos (Folclore), c/Marcelo Soares-Ed.dos AA, 1983; Erótica (Poesia), c/Marcelo Soares-Ed. dos AA, 1984; Livro das Sete Canções (Poesia)-Ed. do A., 1987. Nas décadas 1970/1980 publicou alguns folhetos de cordel, mas hoje é ex-cordelista. Tem e-books disponíveis grátis no site http://www.dominiopublico.gov.br

Marcelo Soares (1955), xilogravador e poeta popular, pernambucano , filho do poeta-repórter José Soares, um dos mais tradicionais poetas populares de Pernambuco, lendário cordelista, que tinha como foco principal de seus folhetos a publicação imediata de fatos cuja ocorrência trazia grande comoção. Marcelo Soares guarda o compromisso de divulgar as tradições culturais pernambucanas. Além de xilogravador de renome, Marcelo Soares cultiva também a produção e edição de folhetos de cordel, tendo fundado uma folhetaria própria, cuja produção ascende a mais de 60 títulos.


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