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Generation Dead (Geração Morta)
Daniel Waters
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Sinopse: Phoebe Kendall é uma típica garota gótica com uma paixão: ele é forte e calado. E morto. Por todo o país, está ocorrendo um estranho fenômeno. Alguns adolescentes que morreram não continuaram mortos. Mas quando eles voltam à vida, não são os mesmos. Temidos e não compreendidos, ele fazem seu melhor para se misturar em uma sociedade que não os quer. A administração de Oakvale High tenta ser mais acolhedora com os – de diferentes biótipos. Mas os estudantes não os querem em suas classes ou comer na lanchonete ao lado de alguém que não respira. E não há leis que existam para protegê-los – esses vivos vulneráveis – das pessoas que querem fazê-los desaparecer – para sempre. Quando Phoebe se apaixona por Tommy Williams, o líder dos garotos mortos, ninguém pode acreditar; nem sua melhor amiga, Margi, e especialmente seu vizinho, Adam, a estrela da equipe de futebol. Adam tem sentimentos por Phoebe que vão muito além de apenas amizade; ele faria qualquer coisa por ela. Mas o que acontece se proteger Tommy é uma das coisas que a faria feliz?
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CAPÍTULO 1 Phoebe e suas amigas prendem a respiração enquanto a garota morta de saia xadrez passa por sua mesa na lanchonete. Seu movimento levantou uma brisa fresca que parecia assentar-se sobre a pele e ficar presa no ar. Enquanto ela passava, Phoebe quase podia adivinhar o que todos pensavam. Todos, exceto a garota morta. Do outro lado dela, Margi balançou sua cabeça, seus brincos de prata em forma de lágrimas dançavam entre as brilhantes pontas rosa de seu cabelo. — Nem mesmo eu uso saias tão curtas. — ela disse antes de beber seu leite. — Agradeço a Deus por isso. — disse Adam de uma cadeira mais distante. Phoebe arriscou olhar de novo para a garota e suas longas pernas azuladas. As luzes florescentes eram amáveis com os mortos, fazia com que eles parecessem ter sido talhados de blocos de mármore branco. A garota foi até a mesa mais afastada e sentou-se sozinha, sem comida, da forma que os mortos sempre faziam durante o almoço. Às vezes Phoebe brincava que tinha poderes psíquicos. Não os úteis como ser capaz de dizer quando uma criança caía em um poço ou algo no estilo; era mais como ser capaz de prever o que sua mãe preparava para o jantar ou quantos braceletes Margi ia usar nos braços nesse dia. Ela pensava que seus – poderes -, se isso era o que eles eram, eram mais telepatéticos do que telepáticos. Phoebe supôs no momento que viu a garota morta que usava a curta saia que Margi conseguiria passar por um montão de temas relacionados com Zumbis, nenhum dos quais ela realmente queria discutir — Escutei que caiu um olho de Tommy Williams na aula. — disse Margi no exato momento. — Escutei que ele espirrou, ou algo assim, e caiu, puf, sob sua mesa.
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Phoebe tragou e envolveu seu sanduíche novamente no papel manteiga. — Os Zumbis não espirram. — disse Adam, dando uma mordida em uma almôndega. — Os Zumbis não respiram, então não podem espirrar. As garotas abaixam suas cabeças e olham ao redor para ver quem estava perto o suficiente para ouvir a retumbante voz de Adam. Zumbi era uma palavra que já não se podia dizer em público, mesmo se você fosse o jogador principal da equipe de futebol. Ar passou entre os dentes de Margi. — Você não pode dizer Zumbi, Adam. Ele dá de ombros, com seus enormes ombros. — Zumbis, cabeças mortas, cadáveres congelados. Qual é a diferença? Não interessa para eles. Eles não têm sentimentos para que possam sentir-se magoados. Phoebe se perguntava se Tommy Williams e a garota com a saia xadrez realmente não tinham sentimentos. Os cientistas ainda não tinham certeza sobre esse ponto. Ela tentou imaginar como se sentiria perdendo um olho, especialmente perdendo-o em público. E nada mais do que na sala de aula. — Você pode ser expulso por dizer coisas assim, Adam. — disse Margi. — Você sabe que deve chamá-los de Deficientes Vitais. Adam bufa, com sua boca cheia de leite. Há dez anos uma explosão de leite teria sido o cúmulo do grotesco em Oakvale High. Hoje é algo, mais ou menos, pobre comparado com perder um olho na aula. — Deficientes Vitais. — comenta Adam, depois de se recuperar. — Acho que vocês são vivas vulneráveis. Eles só estão mortos. Ele se levanta, com seu enorme corpo projetando uma enorme sombra nos almoços não comidos, e leva sua bandeja vazia ao container para onde se levava os pratos e o lixo. Phoebe só olha seu bonito sanduíche novamente e deseja ter vontade de comê-lo.
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O armário de Phoebe abriu-se na terceira tentativa. Ela acreditava que sua incapacidade para lembrar uma combinação de três dígitos não era bom sinal para sua prova na aula de álgebra, a qual era sempre depois do almoço. Seu estômago roncava, e tentava dizer a si mesma que as pontadas de fome dariam para sua mente mais concentração, como um lince no inverno entre exuberantes caças. Sim, certo, pensa. Tommy Williams estava em sua classe de álgebra. A porta de seu armário tremeu com um som de vibração metálica. Dentro havia fotos de bandas como Creeps, Killdeaths, Seraphim Shade, Rosedales, Slipknot, e os Misfits; bandas que se vestiam como os mortos vivos antes que qualquer morto vivesse. Havia fotografias dela, Margi e Colette em momentos felizes, todas góticas, vestidas de preto, delineador, e botas fora do Cineplex em Winford, na primeira fila, prontas para a estréia de um importantíssimo filme de terror que nem sequer pode lembrar. Phoebe, a mais alta, estava no meio, seu longo cabelo negro escondia um lado de seu rosto, naturalmente pálido, e seus olhos visivelmente fechados enquanto riam de qualquer comentário vulgar que Margi tinha dito. Colette tinha seus olhos como uma princesa egípcia, com uma grossa linha de maquiagem em cada canto. Colette e Margi também estavam rindo. Também havia uma fotografia de seu cachorro, Gargoyle. Gar era um terrier galês e nem metade assustador como seu nome sugeria. Um espelho estava na parte contrária à estante onde estava o livro de álgebra de Phoebe. Em seus lábios havia um reflexo de um escorrido lápis labial violeta. Seu longo cabelo, normalmente preto azeviche, brilhante nas pontas, e desgrenhado, agora estava apagado, liso e sujo. Pensou que parecia assustadora. O lápis labial escorrido era o único erro que parecia ter remédio, assim tirou-o antes de ir para a aula da Sra. Rodriguez no final do corredor. Ela chegou ao mesmo tempo em que Tommy Williams, cujo olho, estava aliviada em ver, ainda estava preso dentro de suas órbitas. Ele a observou, com um olhar em branco característico dos Deficientes Vitais.
7 Phoebe sentiu um frio formigamento dançando entre sua coluna. O olhar era sem fundo. Fez pensar que ela podia cair para sempre nesses olhos, ou que ele poderia ver entre eles até as profundezas de seu coração. Podia ver que ela se perguntava se seu olho realmente tinha caído na sala de aula? Tommy fez um gesto para que ela entrasse primeiro na sala. Ela prendeu sua respiração enquanto ele esticava seu braço, percebendo que outra de suas funções vitais tinha parado, mais especificamente, suas batidas. Sorriu para ele. Foi um reflexo; a cortesia não era muito comum nos corredores de Oakvale High. Entrou na sala, e enquanto fazia isso, estava quase certa que Tommy tentava sorrir. Por acaso não havia uma fraca curva de lábios no canto de sua boca, ou era um lampejo de luz em seus olhos não-mortos? Ela sentou-se, respirando novamente, seu coração batendo outra vez. Não só batia; como batia rápido. Ela não sabia muito sobre Tommy Williams. Sabia que chegou a Oakvale High em Maio passado, só umas semanas antes que a escola o revelasse. Oakvale estava começando a ter uma reputação por ter um bom programa para Deficientes Vitais, o suficientemente bom para que famílias com filhos Deficientes Vitais se mudassem para Oakvale das áreas circundantes. O pai de Phoebe mostrou um artigo do Boletim Winford que dizia que a população de Deficientes Vitais em Oakvale High tinha duplicado em um ano. Pelo menos, havia sete deles em sua classe de aproximadamente cento e vinte. Álgebra não era um assunto que Phoebe tivesse dificuldade; normalmente terminava as tarefas no dia seguinte enquanto a Sra. Rodriguez começava a investigar respostas entre seus lentos e sobrecarregados colegas de classe. Álgebra era uma aula que ela poderia entrar e sair ao som da música de um carro que passava e entrava pela janela aberta da sala. Ela se perguntava como Tommy Williams teria morrido. Olhou a parte de trás de sua cabeça, seu cabelo loiro claro, e seus pensamentos vagaram, outra vez, para o assunto da morte. Começava com o normal – os Deficientes Vitais precisavam cortar o cabelo? (Resposta: Sim. Tanto o cabelo como as unhas podem crescer durante a vida como vulnerável) E continuando com o complexo filosófico – Como é estar morto? Como é ser um vivo vulnerável? Essas perguntas preocupavam Phoebe quando era mais jovem, muito antes que o mundo escutasse sobre os Deficientes Vitais. Ela olhou pela janela e tentou pensar na época antes que os adolescentes mortos começassem a se levantar das macas do necrotério e das camas de doentes. Isso não tinha acontecido há muito tempo; ela tinha catorze anos quando viu sua primeira matéria sobre um Zumbi -
8 uma pessoa viva vulnerável – sentada rigidamente entre seus pais em um programa de entrevistas da CNN. Seus pais sempre a faziam sair do cômodo quando aparecia o vídeo de Dallas Jones. Esse vídeo era o filme Zapruder de sua geração, como mostrava Dallas, o Zumbi original, morria e voltava a – vida. Um cachorro arrastava uma correia quebrada correndo pelo campo em frente da janela da sala de aula, e Phoebe se perguntava por que os Deficientes Vitais pareciam ser um fenômeno exclusivo para adolescentes. Especificamente, adolescentes americanos. Os cachorros não ressuscitavam. Tampouco os macacos, os peixes, os adultos, as crianças. Aparentemente, por alguma razão também não ressuscitavam os adolescentes do Uzbequistão, Burkina Fasso, Suécia ou Papua Nova Guiné. Mas garotos de Oklahoma, Rockaway Beach, a Big Apple, Arkansas, The Big Easy, todos corriam, pelo menos, algum risco de acabar como um vivo vulnerável, na medida em que morriam durante a delicada idade adolescente. A teoria mais nova sobre a Fórmula Frankenstein era que uma mistura certa de hormônios adolescentes e conservantes de fast-food estabelecia as condições apropriadas para viver como vulnerável. A comunidade médica ainda estava provando a teoria, tendo que deixar de lado, de má vontade, fluorocarbonos1 e renovação de padrões cerebrais por uma vida inteira de jogos de ação em primeira pessoa. Lá fora, o cachorro levantou a pata traseira em um estacionamento de bicicletas, onde várias bicicletas estavam acorrentadas. Os mortos iam ao banheiro? Eles não comiam ou bebiam; então a resposta parecia ser não. Então, a Sra. Rodriguez fez algo estranho, o suficientemente estranho para interromper a série de pensamentos de Phoebe. Ela chamou Tommy para resolver um problema embora sua mão pálida não estivesse levantada. Tommy levantou seu olhar dos papéis. Houve uma pausa, onde sugou o ar; sempre havia uma pausa como essa quando chamavam os mortos. Os mortos podiam pensar, e podiam se comunicar. Podiam raciocinar, e de vez em quando, poderiam até mesmo iniciar uma conversa. Mas faziam isso muito, muito lentamente... Uma pergunta, inclusive uma tão simples como a que fez a Sra. Rodriguez, poderia levar um vivo vulnerável dez minutos para processar, e outros cinco para responder. Phoebe tentou calcular secretamente a reação de seus colegas de sala. Alguns ficaram logo absortos em seus livros, fazendo qualquer coisa para evitar a realidade – ou a irrealidade – que os garotos mortos representavam. Outros, como Pete Martinsburg, que assistia álgebra pela segunda vez, e que normalmente só se 1
Compostos organofluorados que contêm apenas átomos de carbono e flúor com fortes ligações com carbono-flúor.
9 interessava por futebol e garotas, estava concentrado. Pete estava olhando para Tommy com a mesma expressão de frenética alegria que usou quando na semana passada fez uma brincadeira com Norm Lathrop e o enviou a uma lata de lixo no refeitório. — Cento e setenta e quatro. — disse Tommy, com voz alta e sem inflexão. Ninguém que escutasse sua voz poderia dizer se pensavam que a resposta de Tommy estava correta ou não, então a maioria da turma olhou para a Sra. Rodriguez, esperando sua reação. Ela parecia satisfeita. — Está correto, Thomas. Phoebe notou que ela sempre chamava os Deficientes Vitais por seus nomes formais. Não era algo que ela fazia com os garotos – normais. Pete Martinsburg era somente – Pete - quando ela dizia seu nome, o que acontecia muitas vezes, normalmente para reprimi-lo. Phoebe estava secretamente encantada ao ver a bofetada no olhar malicioso de Pete. A Sra. Rodriguez continuou com a aula como se não fosse grande coisa fazer um garoto morto responder. Normalmente, o resto da classe reagia do mesmo modo. Mas Phoebe percebeu que Tommy não voltara a olhar seus papéis. Sua cabeça permaneceu levantada pelo resto da aula.
Margi estava esperando-a na porta depois da aula de álgebra. — Como é que você chegou tão rápido? — perguntou Phoebe. Margi pegou seu braço e a levou para um lado. — Shhh. Dominei a arte de estar em dois lugares ao mesmo tempo; na verdade, agora estou me dirigindo à aula de inglês. Phoebe ri. — Eu também. Vamos.
10 — Espera. — diz Margi. — Quero ver esse cara vivo vulnerável por um minuto. — Quem quer que tenha te contado sobre o negócio do olho estava brincando com você. Ele ainda tem os dois. — sussurra Phoebe, e logo Tommy sai da sala, o último a sair. — Tenho algo ainda maior. Escutei que se inscreveu para o teste de futebol. Supõe-se que ele deva começar a treinar amanhã. Phoebe olha para sua amiga, perguntando-se como era que Margi sempre sabia o que acontecia com os garotos mortos. — Não me olhe assim, Pheebes. Escutei o treinador Konrathy discutindo com a diretora Kim. Ele não ia deixar que o garoto morto tentasse, mas Kim o obrigou. — De verdade? — De verdade. Pode acreditar? Jogar com um garoto morto-vivo? Ter que discutir com um deles? Brrr. Os mortos têm que tomar banho? Eles não eram cadáveres decompostos, como nos filmes, e tampouco suavam. Phoebe não achava que eles cheiravam a algo; ao menos, eles não cheiravam como algo morto. — Ele parece como se pudesse jogar. — diz Phoebe, observando-o caminhar lentamente pelo corredor. — O que você quer dizer? — Bem, ele tem compleição atlética para isso. — Phoebe! — diz Margi, fazendo uma careta. — Eca. — Ele tem. Realmente, ele tem..., você sabe; isso eu aposto. — Sim, se não tivesse, tipo, morto. — disse Margi. — Duplo eca. Vamos, temos que chegar à sala. — E a arte de estar em dois lugares ao mesmo tempo?
11 — Não posso fazer isso quando alguém está me fazendo um monte de perguntas. Vamos.
Phoebe fez uma parada após a campainha final antes de ir para o ônibus. Adam estava amontoando livros metodicamente em seu armário, levantando a metade da pilha com uma mão enorme. — Olá. — ela disse. — Escutei que um cadáver congelado vai se meter no seu precioso time de futebol. — Sim. — respondeu, sem afastar os olhos de sua tarefa. — Tanto faz. Contanto que possa jogar. Phoebe sorri. Pensou que era linda a forma com que Adam tentava ser rude com ela. Perguntava-se se ele sabia que estava sendo. — Escuta, — ela diz. — Você estaria disposto a me dar uma carona para casa amanhã? Quero ficar e fazer umas tarefas na biblioteca. — Claro, contanto que possa esperar até que eu termine o treino. — disse ele, fechando seu armário. — E contanto que o PDT não me tire o privilégio de dirigir. PDT era uma expressão de carinho de Adam para seu padrasto, com quem se dá bem, da mesma forma, que se dá bem com a linha defensiva da Academia Winford. — Ótimo. Nós nos vemos. Tenho que pegar o ônibus. Adam assente. Se ele realmente tinha alguma opinião sobre jogar futebol com o vivo vulnerável, de uma ou outra forma, não demonstrou. Adam tinha amadurecido muito durante o verão. Talvez tenha sido por causa do caratê. — Daffy vem? Phoebe riu. Adam era muito maduro com todos, exceto Daffy, o apelido que ele deu para Margi. — Acho que não.
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— De acordo. Nós nos vemos. — Adeus. — ela o observou ir embora. Conhecia Adam desde que ela se mudou para a casa ao lado da dele há alguns anos, mas agora estava diferente - no modo em que caminhava, no modo que falava; no modo em que seu rosto tinha afinado para revelar uma forte e angular mandíbula. Sua parte superior, sempre grande, tinha se ampliado em um grande V a partir de sua cintura estreita. Phoebe sorriu para si mesma. Se era por causa do caratê, era algo bom. Ela quase perdeu o ônibus. Colette já estava sentada sozinha e olhando pelo parabrisa. Phoebe a vê, e a conhecida pontada de tristeza e vergonha brota dentro de seu peito. Ela havia crescido com Colette Beauvoir, pelo menos, até que Colette deixou de crescer quando se afogou no Lago Oxoboxo no verão anterior. Colette teria quinze para sempre, e não era a mesma adolescente que costumava ser. Phoebe tentou falar com ela – uma vez – mas a experiência havia sido muito perturbadora por isso jamais voltou a tentar. Isso foi há meses. Margi era ainda pior; ela se levantava de seu assento e iria embora se Colette entrava na sala. Tão faladora que era Margi, que nem sequer suportava discutir o que tinha acontecido com Colette. A morta sempre se sentava sozinha. A escola os deixava sair cinco minutos antes, assim teriam tempo para ir caminhando até os ônibus. Cada dia de escola desde que Colette morreu, Phoebe atravessava por seu lado e a via ali, sentada sozinha, e se perguntava se ela recordava a diversão que costumavam ter escutando os discos do Cure e Dead Kennedys do irmão mais velho de Colette no sótão. — Colette. — foi a primeira palavra que Phoebe tinha lhe dito desde aquela conversa frustrante. A lembrança de suas lágrimas ainda estava fresca na mente de Phoebe. Colette se virou, e Phoebe gostou de pensar que foi pelo som de seu nome e não somente pelo som que fez com que se virasse. Ela contemplou Phoebe com um olhar vazio. Phoebe considerou sentar-se no banco vazio ao lado da garota morta. Sua boca se abriu para dizer... O quê? Quanto lamentava? Quanto sentia sua falta?
13 Ela perdeu os nervos e se moveu para a parte de trás do ônibus, onde estava Margi, as palavras que queria dizer ficaram presas em sua garganta. A cabeça de Colette se voltou lentamente, como uma porta com uma dobradiça enferrujada. Margi estava concentrada em seu iPod, ou ao menos fingia. Colette era como uma mancha escura no sol para Margi; nunca falou sobre ela ou inclusive teve conhecimento que existia. — Você ouviu que o baixista do Grave Mistake morreu? — ela disse — Ataque cardíaco depois de uma overdose de heroína. — Oh! — disse Phoebe, enxugando seu olho. — Você acha que ele volta à vida? Margi nega com a cabeça. — Acho que é muito velho, como vinte e dois ou vinte e três. — Que azar. Suponho que saberemos em alguns dias. Tommy Williams foi o último a subir no ônibus. Havia muitos assentos vazios. Parou no assento de Colette. Olhou para ela, e logo se sentou com ela. Isso é estranho, pensou Phoebe. Ela ia dizer isso para Margi, mas Margi estava concentrada em seu iPod e tentando com fúria não notar nada sobre sua amiga morta.
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CAPÍTULO 2 Pete Martinsburg desfrutava do sutil silêncio que se instalou no vestiário quando ele e TC Stavis entraram. Ele gostava da forma com que Danny McKenzie, o quarterback2 sênior, se afastava para deixar que Pete passasse quando se aproximava. Gostava da forma como os garotos mais novos o olhavam quando ele olhava em sua direção. Como Alfa atualmente, sabia que não havia melhor lugar para reafirmar sua posição do que o vestiário antes do treino de futebol. — Que garoto mal! — diz Pete, fazendo um enorme espetáculo batendo suas mãos nas costas de Adam enquanto este amarrava seu cadarço. Adam era o garoto maior da equipe, com alguns centímetros e massa muscular inclusive maior do que Stavis, então uma demonstração de força com ele era uma boa forma de mostrar a todos o que significava a hierarquia na equipe. — Qual é a recomendação? Ele sentiu tensos os largos ombros do garoto enquanto Adam dava de ombros. — O mesmo de sempre. E você? — O mesmo, quente como o inferno. — disse Pete. — Você vai me ligar com essa garota louca com quem você passa seu tempo, ou o quê? Morticia Pantynegros? — Não. Pete ri. — Uma noite comigo e ela voltará a usar cores brilhantes. — Não daria certo. — Oh, então está admitindo agora que são amigos?
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Posição do futebol americano.
15 Adam não respondeu, e Pete desfrutava do rubor que apareceu nas orelhas e pescoço do garoto. Tudo se tratava de encontrar os pontos fracos. — Quem é Morticia Pantynegros? — perguntou Stavis. — Está falando da professora nova de arte? — Não, idiota. Phoebe alguma coisa, uma das garotas góticas. Nosso garoto lamentável gosta das pálidas e assustadas. Stavis franziu o cenho, Pete sabia que significava que estava se concentrando. — É a garota magra, de cabelo preto longo, como uma garota da China, ou a pequena com peitos grandes e que usa muita jóia? — A primeira. — disse Pete, desfrutando de que a conversa fez com que Adam parecesse ter mordido um sanduíche de pimenta. — Por quê? Está interessado? — Claro que estou interessado. Sinto-me atraído pelas botas, e ela usa essas com salto todo o tempo. E vestidos. Raios aproveitem a pequena também. Duas por uma. A olhada que Adam deu para Stavis silenciaria os demais no vestiário, mas Stavis, era muito bobo e muito grande para notar ou se importar. Pete dá um soco no ombro de Adam. — Tranquilo, grandão. — disse. — Vocês são muito engraçados. — disse Adam. — Um alvoroço. Pete sorri. — Não acredita que todo o assunto gótico de hoje realmente teve bastante sentido? Ou seja, por que andaria fingindo estar morto quando você pode estar morto e caminhar? — É mais do que isso. — respondeu Adam. — Sim? Como o quê? — Não sei. Música. Aparência, ou o que seja. — A aparência, hein? — disse Pete. — A aparência é uma droga. Ela deveria conseguir um pouco de cor em suas bochechas e começar a se vestir como uma
16 garota normal. Parece um estranho hambúrguer de minhoca, sabia? Um desses Zumbis. — Então, suponho que você não gostaria de perder seu tempo com ela. — O oposto, garoto. Quero converte-la antes que seja tarde demais. Por outro lado, — disse sorrindo para Adam. — Você e eu sabemos que ela é virgem. Pete ri e senta-se ao seu lado, e pelo canto de sua visão vê que o baixinho do Thornton Harrowwood estava os observando. O garoto não tinha jogado no primeiro e no segundo ano. — Em que posso ajudar? — disse Pete, soando tudo menos serviçal. O garoto fez um temeroso movimento com sua desgrenhada cabeça e olhou para o outro lado. Pete riu entre dentes e virou-se para Adam. — Você saiu neste verão, garoto fraco3? — Pete sabia que algo havia mudado durante o verão entre ele e o garoto fraco, mas não tinha idéia do que era. Ele, o garoto fraco, e TC haviam sido amigos na Equipe da Dor durante todo o ensino médio, e agora apenas tiveram uma conversa desde que começaram novamente com o treino de futebol. — Um pouco. Fiz aulas de caratê. — Nota-se, nota-se. É como se você tivesse perdido um pouco de peso e ganhado um pouco mais de forma. Adam assentiu. — Obrigado. Você quer dormir comigo? Pete rui e tirou sua camiseta apertada. Também trabalhou em seu corpo durante o verão, e os resultados mostravam-se na definição de seu peito e abdômen, e as linhas se fundiam pelo intenso bronzeado que havia cultivado. Apertou os músculos de seus braços no caso de que qualquer um dos aspirantes estivesse observando. — Eu faria, mas ainda estou dolorido pelo verão. Dobrou sua camiseta e logo a dobrou outra vez já que na primeira dobrada não parecia ter ficado muito bem. — Não quer escutar o que fiz? 3
Apelido de Pete para Adam.
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— Claro. — disse Adam, suspirando. — O que você fez nesse verão? Foi visitar teu pai outra vez? — Sim. Estive em Cali durante todo o verão, pegando garotas universitárias na praia. — Parece ótimo. — disse Adam, bocejando. — Sim, foi. — disse Pete, tentando ignorar seu desinteresse. — Era como um abastecimento sem fim. Bebendo, em festas, e sexo, sexo, sexo. Falando de um verão sem fim. — Uau. Adam não vê seu cenho franzido, por que aparentemente seus sapatos eram mais interessantes do que as histórias de Pete. Isso irritava Pete, já que desta vez as histórias eram verdadeiras. Pelo menos, parcialmente verdadeiras. As garotas universitárias tinham sido muito amigáveis com ele no verão. Mas Pete deixou um detalhe fora de suas repetitivas histórias; a nova namorada de seu pai, Cammy - uma garota universitária. Ou o que seja. O silêncio de Adam estava começando a frustrá-lo. Levou três tentativas para que conseguisse dobrar sua camiseta do modo que queria. — Sou eu. — disse Pete para o cômodo. — Ou esta fetidez do inferno vai ser invadida por garotos mortos este ano? — Não é você. — respondeu Stavis. — Há cerca de quinze deles este ano. Eu contei. — Bom para você. — disse Pete, golpeando Stavis na parte carnosa de seu ombro. — Mantenha este nível e talvez este ano passe em matemática. O sorriso de TC apareceu em seu rosto flexível. — Este ano há mais garotos mortos. — disse Adam, sem olhar para longe de seus cadarços. — Houve um artigo em um jornal que dizia que esta é uma boa escola para os Deficientes Vitais. Alguns deles vêm de Winford. — Justo o que precisávamos. — disse Pete. — Um monte de cadáveres ambulantes. Talvez este lugar seja realmente o inferno.
18 — Inferno na Terra. — disse TC, metendo seus sapatos e calças no armário. O garoto não tinha jeito, pensou Pete. Um preguiçoso acima do peso cuja carne pendurava-se de seu corpo em forma de barril. — Garotos mortos estão se levantando em todas as partes do país. — acrescentou um garoto do segundo ano, chamado Harris Morgan. Não todos; pensou Pete, dando uma olhada de soslaio. Julie jamais voltará. Harris pegou seu olhar e entrou em pânico. Harris tinha estado espreitando Pete e TC desde que começaram a treinar para as finais de agosto, e Pete pensou que ele estava tentando unir-se a Equipe da Dor. Ele decidiu fazer um favor ao garoto com um sorriso e um rápido movimento de cabeça. Com o garoto fraco agindo como uma mocinha, não faria mal adicionar mais pessoas. — Você viu essa garota morta? — disse TC, sua grande barriga penduravase para frente e nos lados de sua cueca. — A que usava saias? — Sim, eu a vi. — responde Pete. — E acho que eu poderia devolvê-la a vida. TC e Harris soltaram uma risada falsa. — Se os mortos não me repugnassem tanto. Sua platéia, no momento certo, ficou em silêncio. — Ei, Adam. — disse Pete, inclinando-se o suficiente perto para que só Adam pudesse ouvir. — Escutou sobre quem está tentando unir-se a equipe esse ano? — Thorny? O garoto com ele que está com medo? — Não. — disse Pete. Viu que este ano ia ter que trabalhar um pouco em Adam. Ele não estava pegando os sinais do campo posterior como costumava fazer. — Alguém mais. Adam o olhou, esperando. Isso também era algo. Adam costumava ser um garoto nervoso, desajeitado e deselegante, desconfortável com sua própria pele, e agora tinha confiança em si mesmo e uma postura pouco comum na maioria dos garotos de sua idade. Pete pensou que Adam estava ficando como ele. Deu a Adam seu melhor sorriso conspirador, esperando reviver os velhos tempos, como quando Adam lhe entregava uma lealdade inquebrável ao invés de pena. — Alguém morto. — Oh! — disse Adam. Dobrou seu tornozelo e decidiu que não gostava de como tinha amarrado seu cadarço esquerdo.
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— Oh? — disse Pete. — Oh? — olha para Stavis e dá um sorriso universal de “estou lidando com um estúpido”. Stavis sorri e balança sua cabeça. — É tudo o que tem para dizer? — O que você quer que eu diga; Pete? Pete franze o cenho, ali estava outra vez essa atitude. — Não te importa que um garoto morto entre na equipe? — Não tenho nada a dizer sobre isso. Pete tinha um temperamento ruim, mas era bom em lidar com isso, convertendo-o em algo útil. Queria bater no garoto, gigante ou não. Tempos atrás, Pete podia ter batido e Adam teria agüentado. Mas naquele momento, Adam não tinha essa massa muscular, e Pete não estava certo se esse era um bom momento para provar quão forte Adam tinha se tornado. — Bom, o Treinador tem algo a dizer. Grave. Escutei-o discutindo com Kimchi sobre isso. — Kimchi era o seu nome para a Sra. Kim, a adorada diretora de Oakvale High. — Sério? — Sim. Ele tentou de tudo. O que não é justo para os outros garotos, a temporada de treinos já começou, blá, blá, blá. Ela não aceitou. — Bem, então, — disse Adam, levantando. — Suponho que irá jogar. Pete levanta-se com ele. — Bem, suponho que conseguiremos dizer algo sobre isso. Adam esperou que ele terminasse de falar outra vez. Pete dobrou sua mão. — O treinador quer que tiremos este garoto morto. — Ele disse isso? — Não em tantas palavras. — disse Pete. — Mas o significado foi bastante claro.
20 Adam assentiu. — Eu vou jogar. — disse. — Não vou participar de algum assassinato. — Oh? — Pete disse, com um grande sorriso em seu rosto. — Não como no ano passado? Adam olhou-o fixamente, um olhar de fúria queimando através de sua passiva máscara. Pete mostra seus dentes. — Não como com Gino Manetti? Adam não responde. Ele dá um aperto final em cada cadarço e parece satisfeito com o resultado. — Não acredito que possamos passar um tempo este ano, Pete. — diz ele. — Como assim? — Isso mesmo. — Eu disse algo. Está irritado por que falei de Pantynegros? — Não tem muito a ver com as coisas que você diz; Pete. — disse Adam. — Tem mais a ver com quem você é. Pete olha-o e sente a raiva contrair suas mãos em punhos. — Quem sou? — repete ele. — Você quer me explicar? Adam pega seu capacete no banco e empurra Pete com o ombro. Pete chama Adam de sem-vergonha em voz baixa, mas diz o suficientemente forte para que todos escutem. Gino Manetti era a estrela dos corredores dos Guerreiros da Academia Winford. Em um jogo no qual Manetti tinha marcado três vezes sobre o Badger, Adam colocou um fim a sua temporada – e a sua carreira – com um último e ilegal golpe em seu joelho. O Treinador Konrathy havia ordenado o golpe. Não em muitas palavras; pensou Pete, tirando suas calças. Mas o sentido era claro. Ele e Stavis pretendiam machucar os garotos antes que Konrathy pedisse;
21 eles não se chamavam Equipe da Dor por nada. Mas ninguém antes tinha tirado alguém de maneira tão permanente. Pete pensou nesse garoto de Tech que ele tinha deixado inconsciente na última temporada. Riu alto quando leu no jornal sobre o jogo no dia seguinte e descobriu que o garoto tinha quebrado a clavícula. As notícias tinham o inflado por dias. Embora, não Adam. Adam nunca mais foi a mesma pessoa depois de ter golpeado esse garoto, Manetti. — Volta em três, garoto fraco. — disse o treinador, empurrando Adam de volta para o vestiário. Pete notou que se Adam não permitisse ser movido, Konrathy não seria capaz de movê-lo. Adam havia mudado. — Tenho que fazer um anúncio e quero que toda a equipe escute. — disse o treinador. — É sobre o garoto morto, treinador? — perguntou Stavis. — Sim, é sobre o garoto morto. — respondeu o treinador, com seu tom carregado com um nível de sarcasmo que guardava só para os jogadores mais cabeça de vento. — Mas você jamais vai chamá-lo de garoto morto quando ele estiver perto, entendido? Somos obrigados a nos referir a eles como Deficientes Vitais, ok? Não garoto morto. Não Zumbi, ou bufê de verme ou abominável cria do diabo. Deficientes Vitais. Repitam depois de mim. Deficientes Vitais. Pete observa os outros garotos no vestiário repetindo a palavra. — Quero que saibam que decidi incluir esse garoto, — tira o boné do Badger e corre sua mão por seu grosso e curto cabelo. — Esse garoto vivo vulnerável, não tem nada a ver comigo. Fui ordenado em deixá-lo entrar na equipe. Então, aí está. Estará no treino amanhã. Agora se apressem e coloquem seus traseiros no campo. Pete o observa girar em seus calcanhares e subir as escadas. Não queria nenhum sujo garoto morto no vestiário com ele. Não queria garotos mortos ao redor dele em nenhum lugar – não na escola, não em suas aulas, e não no campo de futebol. Queria todos os garotos mortos em suas tumbas, onde pertenciam. Como Julie.
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Talvez se Julie voltasse, pensou. Talvez se voltasse, ele se sentiria diferente e aprenderia a estar com eles apesar de seu olhar vazio e suas lentas e roucas vozes. Mas ela não voltaria a nenhum lugar, exceto seus sonhos. E agora, desde que os mortos começaram a se levantar, quando ela voltava inclusive nesse lugar secreto, voltava mudada - não era a garota da qual segurava as mãos no lago, não era a primeira garota que ele tinha beijado na margem do bosque de pinheiros. Não era seu primeiro e único amor. Ela era um monstro. Era um monstro como aquele que estava prestes a colocar um uniforme, capacete e entrar em campo com ele.
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CAPÍTULO 3 O PDT empurrou o telefone no peito de Adam com a mão que não estava segurando a cerveja. — É uma menina. — disse ele. Adam respirou pelo nariz, agarrando o telefone antes que caísse no chão. Tinha manchas de óleo em sua camiseta nova a partir de onde as juntas de PDT pressionaram contra ele. Adam o viu voltar para dentro da sala de estar, onde a mãe de Adam sentou-se com um de seus irmãos, assistindo séries na Fox. A respiração ajudava. — Olá. — Olá, Adam. ― disse Phoebe. — Como foi o treino? Adam continuou se concentrando em sua respiração quando escutou PDT dizer a sua mãe que fosse buscar umas batatas fritas. As batatas fritas que deixou na cozinha junto com a sua segunda cerveja. Deus abençoe a América. — Adam? — Ola Pheeble4. — disse. — Perdão. Estava tendo um momento doméstico com o PDT. — Oh, sinto muito. — Eu também. Como foi? O treino foi exaustivo. Acabei de chegar em casa. Estava suarento e dolorido jogando em um campo cheio de lodo para um homem que poderia haver sido separado ao nascer do PDT. — O que está fazendo? 4
Pheeble: Jogo de palavras entre Phoebe y Feeble (pessoa fraca)
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Sua mãe passou pela frente dele, sorrindo e dando uma palmada em seu ombro. — Só escutando música, fazendo um pouco de tarefa. Já sabe. — Deixe-me adivinhar: a canção tocando justo agora tem uma das três palavras seguintes no título: triste, chuva, ou morte. Phoebe riu, e o som de sua risada relaxou-o o suficiente para deixar de utilizar a técnica de respiração do mestre Griffin. Pete, Gino Manetti, o perseguidor constante do PDT. Sua risada golpeou o fundo a porta. — Na realidade, ‘As câmaras vazias do meu coração’, de Endless Sorrow. — Estava próximo. — disse. — Me dei conta que a morte é sempre uma de suas três palavras. — Tenho acertado quase sempre com essa. — Adam gostava muito da música que Pheeble e Daffy escutavam, o mais rápido, mais os acompanhamentos marcados, de qualquer forma. Na realidade o heavy gótico não fazia muito por ele além de fazê-lo pensar sobre coisas que não queria pensar. — Isso é provavelmente certo. — disse ela. — Hey, Tommy Williams fez o treino hoje? — Williams? É o menino morto, certo? — Sim, Adam. É o menino morto. — Oh. Não. O treinador disse que começará amanhã. Não está muito contente com a ideia. — Margi disse que o escutou discutindo com a diretora Kim sobre ele. — Também escutei sobre isso. — disse Adam. O carro de seu irmão John rugiu na entrada de carros. — De Pete. — Ah, sim. Pete. Ele é um grande fã da ideia. Estou certa? — Por que diz isso?
25 — Talvez porque tenho visto seu amigo Pete intimidar e rir de quase todo mundo fora você e seu pequeno grupo de amigos desde que se mudou para cá. — Pete tem problemas. — disse Adam. — Não acredito que passaremos muito tempo juntos este ano. Ouviu-a suspirar através do telefone, ou ao menos pensou que o fez. Phoebe parecia de repente tremendamente interessada neste menino morto. Johnny entrou e lhe deu um soco no ombro, no de sua mãe só deu uma palmadinha. Adam o surpreendeu com uma palmada na parte posterior da cabeça enquanto ia se juntar com o resto dos não – homens comuns vendo televisão. — De verdade? Por que não? — Pete e eu estamos em caminhos diferentes. — Adam, eu estou tão contente que fez caratê. ― pôde escutar o sorriso em sua voz. — Sério? Por que isso? — Você está diferente. Não é diferente, de verdade. Sem dúvida mais do que sempre tem sido. Não posso explicar. Ele pensou que havia explicado bem, mas não o disse. — Isso é bom, certo? — Acho que é genial. Talvez agora você seja capaz de me reconhecer nos corredores quando estiver com uma de tua pequena corte de animadoras. — Não conte com isso. — disse. — Minha corte de animadoras tem padrões muito elevados. — Exceto com homens. — disse, e riram. ― Então, pode me levar amanhã? — Sim. — disse, baixando o volume de sua voz. — O PDT me deixa usar a caminhonete. — A coisa velha marrom? Isso é bastante grave vindo dele. O que aconteceu?
26 — Mamãe tem estado se ocupando dele. Creio que lhe disse que é um pouco injusto para nós ter seis veículos e eu ser o único que não conseguia dirigir um. — Sim, teu pátio parece como um lote de carros usados. Ou um lote de carros bem-utilizados, como diz meu pai. Ouviu o acento divertido em sua voz e fechou os olhos para poder imaginar sua expressão, um dos olhos verdes olhando-o por baixo de uma franja do cabelo negro azeviche. — Deve ser muito forte. Somos como um mau clichê. — podia imaginar o Sr. Kendall chegando à casa do trabalho e franzindo o cenho enquanto inspecionava de seus degraus da entrada à colheita desta semana de veículos compostos sujando o caminho de entrada e o pátio. — Está bem, de verdade. Se alguma vez estivermos prontos para nos mudar provavelmente ele pedirá ao PDT para limpar as coisas até que a casa seja vendida. — Phoebe, nunca se mude — disse. — Deve ser a única pessoa sã que conheço. Ela riu. — Então está em mais problemas do que eu pensava. Sete e quinze? — É uma data. — disse, e desligou. Uma data. A ideia de Phoebe se mudando, deixou-o com um sentimento estranho, um sentimento que nada tinha haver com Phoebe sendo a única pessoa sã em seu universo pessoal. — Homem comum! — seu irmão mais velho e mais fraco, Jimmy, chamou da outra habitação. — Larga o maldito telefone! Estou esperando uma ligação. — Bom. — disse Adam, e começou a respirar outra vez antes de se dirigir pelo corredor até seu quarto. — Já era hora. ― disse Jimmy, olhando sobre seu ombro, no seu caminho para o telefone. É patético, pensou Adam. Jimmy era metade de seu tamanho, mas Adam tinha que fingir que estava intimidado por ele para manter a paz na casa de PDT. Adam estava deitado em sua cama e abriu Wuthering Heights5, o primeiro grande castigo do ano escolar, um que se supunha que aguentaria no verão. Fechou-o de novo depois de dois parágrafos. Havia um montão de coisas irritando5
Romance de Emily Brontë
27 o sobre sua vida familiar e a primeira semana de escola, e lhe tomou uns momentos para identificar qual delas estava o incomodando agora, mas logo o teria. Phoebe se importava tanto com o futebol como o fez sobre as irmãs Brontё. Que havia a respeito desse menino morto?
— É um vestido novo? — perguntou Adam, observando Phoebe com uma observação com que só um amigo de infância podia se sair com a sua. Obrigou-se a dizer algo, porque se não o fizesse, sabia que estaria sentado boquiaberto, com o olhar surpreso nela. O vestido ia até os tornozelos, mas de alguma maneira acentuava suas curvas apesar de todo o tecido. Usava botas que chegavam até a panturrilha e uma jaqueta de cor cinza claro, e suas jóias eram todas de prata ou de uma cor prateada. Pensou que parecia com uma vaqueira gótica. Phoebe podia vestir-se um pouco estranho, e às vezes exagerava na maquiagem, mas não disfarçava o quão bonita era. Tinha olhos grandes cor verde avelã que estava alegre não importa quão fúnebre parecesse sua roupa, e seu grande cabelo escuro suavizava um pouco seus traços angulares e os emoldurava de uma maneira que fazia ver seu rosto em forma de coração a distancia. Deu-se conta que podia estar ruborizando. Seu olhar era curioso, e esperava que ela não houvesse percebido a troca cada vez maior no que sentia por ela. Havia uma sensação de vazio em seu estômago apesar de que o havia enchido com ovos e salsicha meia horas antes. A sensação de vazio cresceu quando percebeu que o vestido novo provavelmente tinha mais a haver com Tommy Williams do que com ele. — Sem duvida que é. — disse ela, colocando as mechas de cabelo negro longe de seus olhos. Era um de seus gestos favoritos. — Obrigada por notar. — E preto, um aspecto totalmente diferente para você. — disse ele, refugiando-se na ligeira brincadeira que era tão natural para eles como dormir. — Ha Ha. Vejo que o caratê te fez mais observador também.
28 — Tudo parte de minha interminável busca de ser mais da pessoa que sempre fui. — Excelente. Aplaudo sua dedicação. — disse, e sentiu seu ligeiro toque em seu braço. — E como foi seu encontro com Emily à noite? — Emily? — Brontё. Wuthering Heights? — Oh sim, ela. Temos tido uma espécie de tempo difícil, Em e eu. — Uma pena. Sempre achei que ela podia te ajudar..., já sabe…, a te converter na pessoa que sempre foi. — É justamente isso. — disse, dando um soco de brincadeira no painel. — Continua tentando me mudar! Deram uma boa risada disso, e Phoebe, recuperando o fôlego, apoiou a cabeça sobre seu ombro. Um toque de aroma limpo, alguma ilha floral que Adam não podia identificar, emanava de seu cabelo negro, e a risada morreu na garganta de Adam. — Então. — disse. — Vai sair hoje depois da escola? — Sim. Pensei que deveria terminar algumas coisas na biblioteca. — A biblioteca fecha às quatro. O treino pode ir até muito tarde alguns dias, ainda mais quando o treinador está furioso. E acho que estará furioso hoje. — Por que acha que ele estará furioso? — O garoto morto andante. — Sobre isso, — disse. — Como se sente o resto da equipe? — Oh, eles estão encantados. Quem não quer ir para o chuveiro com um cadáver? — Adam. — disse, e poderia haver uma advertência em sua voz. — Creio que Williams terá um tempo difícil. — disse, tendo cuidado. — Muitas pessoas continuam aterrorizadas com os Deficientes Vitais.
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Phoebe assentiu se abraçando apesar de ter aquecimento na caminhonete. Ele rompeu o gelo; Porque não? — Parece estar interessada em Williams. — disse, fingindo olhar no espelho retrovisor. — Refiro-me a sua situação. Ela assentiu. — Sim estou. Alguns dos garotos Deficientes Vitais que se mudaram este ano à cidade são bastante interessantes, sabe? Como essa menina que vimos ontem na cafeteria. — Sim, com certeza é. — Pervertido. — respondeu. — Mas na realidade, vestir-se como ela, ele tentando jogar futebol..., creio que devem ter uma certa coragem por essa parte, sabe? — Isso é o que te interessa? Sua coragem? — Bom. — disse. — Toda a ideia dos Deficientes Vitais me interessa. Há tantas perguntas, tanto mistério sobre o assunto. — Como com Colette. — disse; e tão rápido como o disse desejou ter continuado com o assunto de Williams. — Como com Colette. — sussurrou Phoebe, colocando sua cabeça sobre seu ombro. Ele esperava que ela não percebesse o quão lento estava dirigindo.
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CAPÍTULO 4
Phoebe esperou por Margi na entrada, depois de chegar à escola com Adam. Ou ao menos era isso que dizia a si mesma que estava fazendo, mesmo enquanto se esforçava para ver por cima de seu texto de História, observando Colette e depois Tommy descer do ônibus. Colette andava com um movimento arrastado de lado a lado, com seus olhos focados em um ponto fixo de algum horizonte invisível. Teve problemas com os degraus do ônibus e depois com os degraus que conduziam a porta, e Phoebe sabia por observações anteriores que o movimento requerido para abrir as portas era bastante complexo para ela. Tommy desceu do ônibus depois dela, mas chegou a escola primeiro. Ele parecia como mais um estudante que havia permanecido acordado até tarde na noite anterior, bebendo refrigerante e comendo pizza, como um – típico – vivo normal. Houve uma pausa entre o movimento de agarrar a maçaneta da porta e o movimento de abri-la. Mas os movimentos em si não eram torpes. Manteve a porta aberta para Colette e um par de garotas vivas, que foram para outra entrada ao invés de permitirem-se ser vítimas da cortesia de Tommy. Observou Tommy entrar no prédio. Estava vestindo uma camiseta pólo azul, calças jeans e tênis de cano alto. Parecia estar mais erguido que os outros meninos que vinham caminhando por ali, mas esse devia ser apenas um efeito secundário de sua estranha forma de caminhar. A camiseta combina com a cor de seus olhos, pensou. Margi foi a penúltima pessoa a descer do ônibus, tendo ficado no assento de trás com seu iPod, com um escuro e sombrio olhar em seu rosto por debaixo de sua franja rosa. Phoebe agitou sua mão esperando animá-la. Não teve sorte. — Oi Margi. — disse. Talvez algo durante o dia a alegrasse.
31 — Não se atreva a me cumprimentar. — disse ela. — Você, a traidora que me abandonou a mercê desse ônibus fatídico. Desejaria que o garoto débil houvesse falhado em seu teste de direção. Vou falhar no meu exame de ortografia hoje. — Ai Deus. Precisa relaxar mulher. — Relaxar nada. — Ônibus fatídico? Vamos. Margi alçou seu braço coberto de braceletes. — Colette está me deixando louca. — Eu sei. Sentaram-se juntos de novo? — Não percebi. — Sim, percebeu sim. Margi esfregou seus olhos e mostrou a língua. — Sentaram-se juntos. Ele recuou para que assim ela pudesse descer do ônibus antes dele. — Que cavalheiro. — Claro. — Claro que sim. Nós temos olhos de poeta, você e eu. — Por favor. Não quero ver nada disso. — Margi. — disse Phoebe, segurando os pulsos de Margi enquanto ela os agitava na sua frente. — Teremos que falar com ela em algum momento. Será melhor. Para todos nós. — Phoebe pensou que a cor das pálidas bochechas de Margi sumia. — Ainda não. — disse. Apenas a olhou por cima da movimentada entrada de outro grupo de estudantes. — Vamos chegar tarde. — disse Margi, e se soltou do agarre de Phoebe antes de dar um débil sorriso. — Vamos.
32 Phoebe pegou sua bolsa do chão e a seguiu até seus armários, depois até a aula.
Apenas contato visual, pensou Pete enquanto se inclinava para trás em sua cadeira, estendendo e encolhendo seus braços. É tudo o que preciso. — Estou te aborrecendo Sr. Martinsburg? — perguntou a Srta. Rodríguez. Ninguém mais além de Stavis e essa vagabunda loira da Holly, que havia saído com o garoto fraco por um tempo, se atreveram a sorrir. — Não estou aborrecido, Srta Rodríguez. — respondeu. — Apenas estou um pouco dolorido pelo treino de ontem. Sinto muito ter te distraído. Srta. Rodríguez balançou a cabeça e voltou para a lousa para discutir sobre uma excitante equação, ou o que quer que seja. Aposto que você também estava distraída, velha bruxa; pensou ele. Não é todo dia que pode ver armas como as minhas. Virou-se rapidamente para a janela, onde a estranha amiga do garoto fraco estava sentada, e ali estava, contato visual. Deu-lhe o olhar que sempre funcionava com as amigas cabeças ocas de Cammy, e se Morticia Pantynegros simplesmente não se derretesse, ao menos sabia que seu coração havia acelerado. Ela olhou para outro lado, rapidamente. Te peguei; pensou ele, fazendo uma nota mental para ocupar-se dela mais tarde. Fez um inventário completo dela, meio esperando que ela voltasse a olhá-lo e veria o olhar cheio de apreciação em seu rosto. Era uma das poucas meninas da sala que usava vestido, e seu liso e escuro cabelo era realmente impactante. Caía sobre seus ombros, e era bastante boa em usá-lo para manter seu pálido rosto na sombra na maior parte do tempo. Bonitos olhos verdes, mas não do tipo falso com lentes de contato. Seu cabelo refletia a luz que vinha através da janela. A Srta. Rodríguez chamou o garoto morto minutos mais tarde – o garoto morto que logo vestiria um lindo e novo uniforme de jogo e capacetes de proteção. Nova equipe, velho garoto morto. Pete queria vomitar. Começou a dar golpezinhos
33 em sua mesa não parou até que o garoto morto respondeu – corretamente, como se a sorte estivesse ao seu lado. Isso era duas perguntas a mais que Pete saberia responder, e não havia passado nem um mês do ano escolar. Pensou que Pantynegros estava observando-o novamente, o que era genial, simplesmente genial. Garoto fraco ficaria realmente nervoso se a seguisse de perto, mesmo se o grandíssimo fraco estivesse muito atrofiado emocionalmente para contar-lhe seus verdadeiros sentimentos por ela. Pete pensou que diria a Adam que terminaria com ela se ele se centrasse de novo no jogo. Talvez. Pete levantou-se quando soou o alarme, pensando que se Pantynegros estabelecesse um pequeno contato visual, ele prosseguiria e faria sua cena bem ali entre as aulas. A viu levantar-se, e gostou da maneira que o vestido agarrava sua cintura – tinha um lindo corpinho debaixo de todos esses trapos. Ela também estava esperando, mas não era a Pete Martinsburg, o pegador de garotas universitárias, por quem ela estava esperando. Era o garoto morto. Caramba! Pensou Pete.
Ela não vai calar a boca, pensou Adam enquanto assentia com a cabeça a cada três ou quatro conclusões que Holly Pelletier chegava, e ainda assim, realmente não estava dizendo nada. Holly deve ter se dado conta da falta de atenção, pois aproximou-se dele o suficiente para que fosse possível sentir o cheiro de seu chiclete. Ou talvez fosse seu brilho labial o que estava sentindo, ou seu gel de cabelo. Adam lembrou-se que houve um tempo que esse cheiro, e a proximidade de Holly, teriam ativado determinadas reações químicas e impulsos em seu corpo, mas agora tudo o que podia pensar era em como esse cheiro era artificial. Sabia que se inclinasse e beijasse Holly, como havia feito antes tantas vezes, não seria o gosto de morango que sentiria e sim alguma versão artificial de morango. E pela primeira vez, a ideia de beijar Holly não era excitante, era enjoativa. O que diabos está acontecendo? Pensou
34 Holly nunca fazia contato visual direto com ele durante seus monólogos no meio do corredor, estava sempre muito ocupada, interessada em quem estava passando. Adam também estava tendo problemas em se manter atento, pois havia visto Phoebe fazendo hora junto a um mural de anúncios no final do corredor, esperando para conversar com ele antes que fosse para o treino. Quase não percebeu a repentina olhada de desgosto que nublou o habitualmente lindo rosto de Holly. Adam voltou-se e viu a quem ela dirigia esse olhar: à bonita garota morta, a da saia curta. — Asqueroso. — disse Holly. — Me sinto tão mal por você, tendo que treinar com esse garotinho morto. Imagina se isso entrasse em nossa equipe? — apontou a menina. — Isso. ― sem importar-se se a escutava. — Imagine. — disse Adam, vendo passar a garota. Ela não se movia como uma garota morta, isso era certo. Adam se deu conta de que suas roupas o havia distraído de outra diferença – tinha um ligeiro, quase imperceptível sorriso em seus lábios. Um sorriso desconcertado, um não muito diferente do que observava as vezes no rosto de Phoebe. A maioria dos outros Zumbis; que havia visto mostrava-se inexpressivos, como se seus músculos faciais houvessem endurecido em seu lugar e houvessem sido selados. Holly observou passar a garota, seus lábios com sabor morango franzidos. — É tão grotesco. Imagina ter que tocá-la? Sinto-me tão mal por ti. Espero que tirem o Zumbi da equipe. Não deveria haver um estorvo morto no campo. Isso é tão ruim. Pode imaginar? Imagino bem. Pensou Adam. Observou Phoebe tirar a vista do mural de anúncios e olhar quando a garota morta se aproximou, viu Phoebe sorrir para ela antes de virar-se novamente e fingir ler o que quer que estivessem anunciando ali.
Phoebe estava segurando alguns livros contra sua cintura, seu ombro oposto com uma bolsa negra de lona lotada de mais livros. — Entende? Um estorvo morto? — dizia Holly. —Aham. Holly; terá que me desculpar. Preciso ir falar com Phoebe.
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Os olhos azuis safira de Holly se contraíram em tal velocidade que Adam pensou que iam saltar. — Phoebe? Quem é Phoebe? — Ela. — disse Adam, gesticulando para onde estava Phoebe apoiada precariamente contra o peso de sua enorme bolsa enquanto ao mesmo tempo batia na parte de trás de sua panturrilha com a ponta de sua bota preta. — É minha melhor amiga. — Ela? — perguntou Holly. — Aquela gótica ali? — Sim. — respondeu Adam. — Te vejo depois. As pessoas abriam espaço enquanto andava pelo corredor para se juntar a Phoebe. Ele não costumava empurrar os garotos como Pete e Stavis faziam, mas havia passado os últimos dois anos convivendo com eles e nunca havia levantado um dedo para impedir seus atos. Essa era outra coisa que teria que mudar, pensou. — Ei Pheeble. — a chamou, um estranho alívio emanado de seu peito. — Oi Adam. — respondeu Phoebe, parecendo surpreendida. Adam tirou a pesada bolsa de livros de seu ombro. Phoebe deu uma olhada ao redor. — Acredito que deve ter feito algo para irritar a ‘como se chama’. Parece disposta a arrancar um pedaço de sua jaqueta. — Sim, acabo de soltar uma bomba. — Verdade? — disse Phoebe enquanto começavam a caminhar em direção a biblioteca. — A pediu em casamento? — deu uma risadinha e Adam sentiu o alívio espalhando-se por seu corpo. — Ou foi algo menos sofisticado? — Ha Ha. E o que te faz pensar que seria eu o que faria o pedido? — Bom ponto. Escutou sua própria voz escapar da brincadeira, e pela primeira vez, não se importou se Phoebe percebia. — Disse a Holly que somos amigos. Você e eu. Phoebe parou. — Verdade? Olhou-a. — Verdade.
36 Ela olhou para baixo, mas quando levantou seu olhar de novo, seus olhos estavam cheios de júbilo. — Não revogaram teus privilégios no clube dos garotos geniais? Começaram a caminhar de novo. — Deixa eles. A verdade me fará livre. Ela o segurou, tentado fazê-lo parar, mas era como uma mariposa tentando perturbar uma árvore. — Adam, eu gostaria que você tivesse feito caratê há alguns anos. — disse. — Cala boca Pheeble. Ou te farei em pedacinhos. — Kii-ya! — exclamou ela, dando-lhe um golpe. Acompanhou até a biblioteca, e depois foi para o campo para praticar com os vivos e os mortos.
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CAPÍTULO 5
Tommy Williams foi o último a terminar a volta em torno do campo de Oakvale. Quando era um calouro, Adam voltava ao ponto de partida automaticamente na parte de trás do grupo, mas o treinador Konrathy não se importava, porque Adam era grande, como dois alunos juntos, e quase tão forte como três. Calouros com 1,95m eram bastante raros, mas um calouro de 1,95m com músculos era como um animal exótico em que os atletas de Oakvale estavam interessados. Mas agora havia um espécime ainda mais exótico no campo. Ou seja, um garoto morto. Nunca antes um Zumbi tinha entrado para qualquer esporte na região. Tommy corria – e que estranha corrida, como se alguém estivesse puxando seu tornozelo para trás a cada passo que dava – com o grupo de jogadores perto do treinador Konrathy. Muitos dos jogadores estavam cobertos de suor sob as ombreiras tentando controlar sua respiração, mas o rapaz morto nem sequer estava ofegante. Ele não respira, Adam lembrou. Adam estava suando muito, mas sua respiração era muito controlada. Manter a forma fora da temporada com musculação e caratê estava tendo benefícios. Sabia que nunca seria o mais rápido, mas não havia motivos para ser o mais fora de forma. O caratê lhe deu algumas técnicas para levar ao longo do campo e também lhe deu alguns truques que não podia esperar para dar a estes bastardos de Winford. A temporada não poderia começar em breve, no que diz respeito a ele. Normalmente, ele gostava da prática e da disciplina, mas a tensão recente com Pete pegou um pouco da reluzente distância – e isso de que o garoto morto se unisse. Adam tentou evitar ser pego nos aspectos filosóficos da nova adição ao time, mas era inegável que a presença de Tommy Williams silenciava sobre o que usualmente era um evento muito ruidoso.
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Adam gostava de ser o primeiro a chegar aos vestiários, mas não hoje. Percebeu que era estranho caminhar até o vestiário e ver o menino sentado no banco, todo o uniforme posto, com os olhos brilhantes e olhando de dentro da sombra de seu capacete. Concentre-se, sussurrou em sua mente o mestre Griffin. Adam pensou que a voz interior estava começando a soar cada vez mais como Yoda, agora que ele tinha cortado suas viagens a academia de artes marciais a uma vez a cada duas semanas, em vez de duas vezes por semana, como tinha feito durante o verão. O mestre Griffin terá de esperar a sua vez atrás do treinador Konrathy e Emily Brontё. E Phoebe. Adam, depois de correr, começou a fazer alguns exercícios de alongamento, sentindo seus músculos se alongar e contrair. Esta era a primeira prática da tarde de Konrathy – ele gostava de fazer alguns na temporada para acostumar o time debaixo das luzes – e Adam ficou feliz com a maneira como seu corpo estava respondendo às mudanças. O treinador Konrathy franziu a testa para Tommy, quando ele se juntou aos outros jogadores. Ele tirou o boné e passou a mão por seu pouco cabelo, e Adam sabia que alguma punição vinha à distância. Vamos começar com alguns exercícios tackles 6. ― disse Konrathy. Adam achava que podia ouvir seus suspiros; parecia que ele precisava fazer a barba e os olhos estavam vidrados. Todos os novatos façam uma fila. Vamos ver como param um golpe. Adam viu Tommy Williams tomar seu lugar no final da linha de novatos. Havia cerca de doze caras tentando entrar para a equipe neste ano, em sua maioria calouros. Oakvale não tinha jogadores suficientes para o campus em ambos os JV e uma equipe dos melhores jogadores, de modo que quase todos os caras novos ao menos conseguiriam um uniforme para ser usado no banco. No entanto, a cada ano, havia alguns poucos que fracassavam, não faziam completamente os treinos, ou decidiam que não gostavam de arranhar a pele em campo com uma dor de cabeça e um nariz sangrento. Adam viu Konrathy examinar seus tackles. Os instintos de Adam na linha levaram-no a ler em todos os sentidos: contato visual, sinais não-verbais, inflexão
6
São componentes da linha ofensiva nas formações de ataque. Como outros offensive linemen, seu trabalho é bloquear, mantendo os adversários longe do seu quarterback até que ele faça o lançamento ou abrir espaço para o running back correr com a bola.
39 de voz do quarterback gritando instruções. Ele viu um olhar passar entre o treinador e Peter Martinsburg. Luce livre, Williams! — gritou o treinador, soltando um sorriso negro para alguns dos seus jogadores veteranos. Adam viu Pete olhar para o treinador como um cão de guarda esperando o sinal para atacar. Pete sorriu antes de colocar o capacete novamente, e depois Adam viu o porquê. A mão esquerda do treinador permaneceu na posição horizontal em sua cintura com o polegar para baixo. Adam não sorriu para ninguém. Pensava na última vez que viu o treinador fazer esse sinal, quando ele terminara com a carreira de Gino Manetti golpeandolhe o joelho. Ele ainda podia ouvir a explosão dos tendões quando o acertou o lado da perna de Manetti com o seu ombro, e ainda podia ouvir o grito agudo de dor do outro rapaz enquanto caía. Foi apenas quando Adam viu Manetti meses mais tarde, no shopping, que ele percebeu o que tinha feito. Manetti, o antigo orgulho, enquanto mancava como os velhos; tinha uma bengala e havia uma garota bonita, provavelmente sua namorada, andando junto com ele, incentivando-o alternadamente, tentando pegar o ritmo ou diminuir a velocidade. Vê-los – o olhar triste de resignação em seu rosto, e o olhar de completa lealdade e solidariedade na sua namorada – Adam pensou, era uma das coisas mais tristes que jamais vira. Ele sabia que logo que ele tinha dado o golpe em Manetti, ele nunca andaria corretamente novamente. Ele tinha certeza que ele nunca voltaria a jogar de novo. Uma semana mais tarde, Adam se inscreveu nas aulas de artes marciais do Mestre Griffin. Lera um pouco sobre o caratê e pensou que o ajudaria com o controle. Ele também esperava que o ajudasse com a sua culpa. Não está mais com raiva de mim, né cara? — disse Pete, acertando Adam nas ombreiras e despertando-o de seu devaneio. Eu não estou bravo com você, Pete .— disse ele, embora quisesse revidar o golpe. Queria culpar Pete por sua parte em criar o idiota que tinha sido durante os últimos dois anos, mas realmente só queria bater em si mesmo. Eu vi. O treinador quer que a gente ataque o menino morto. — disse Martinsburg. As linhas estavam começando o exercício. Adam olhou para ele. Pete apertou seu ombro.
Hora de escolher uma equipe, Adam.
Adam tirou a mão de Pete e se manteve firme sem responder. Stavis e Pete não hesitavam em usar seus punhos – e nem Adam, sim vamos ao assunto – mas esperava não chegar a esse ponto. Esperava que Pete deixasse Adam superar com graça.
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Certo, pensou ele. Por isso vai acontecer. Tome o primeiro golpe, Lelo Man. — disse Martinsburg. cerveja para quem cair fora.
Uma caixa de
Primeiro golpe; Adam pensou. Havia um monte de coisas que os Deficientes Vitais não podiam fazer – coisas normais como respirar e sangrar. Ninguém pensou que não poderiam curar.
O som dos saltos de Phoebe nos degraus de metal ecoou no ar fresco do entardecer, recebendo olhadas de alguns dos espectadores sentados em pequenos grupos e vendo a ação no campo abaixo. A maioria dos observadores eram os pais, namoradas, ou caras da banda esperando para passar. Phoebe estava acostumada a receber atenção. Todo seu vestiário preto, incluindo uma combinação de roupa clássica e da moda, que praticamente garantia olhadas estranhas dos colegas de classe. As botas de salto alto, saias longas retas, cabelo tingido e um xale comprido e largo garantia uma sobrancelha levantada aqui e ali. Não lhe importava. Ela percebeu que seus os olhos repeliam as pessoas com quem não queria falar e atraía aquelas que queria. O visual gótico não era tão popular como antes, provavelmente devido ao surgimento dos Deficientes Vitais, mas para Phoebe isso apenas dava ao estilo um toque sutil de ironia, uma piada privada para ser compartilhada com alguns poucos especiais. Deteve-se um momento, explorando a crista baixa que alcançava atrás das arquibancadas. O campo Kostre, nomeado assim devido a um atleta escolar que estabeleceu recordes de pista e campo para o estado na década de oitenta, estava rodeado nos três lados pela floresta Oxoboxo. Um curto perímetro de grama na altura da cintura percorria cerca de vinte metros da cerca de arame até a borda da floresta, fazendo com que a sombra de uma árvore que atingia o campo no final do dia parecesse uma parede de espectadores. Phoebe sentou-se sozinha. O banco estava frio sob o tecido fino da saia. Ela tirou seu iPod da mochila e colocou os fones de ouvido em suas orelhas. Também pegou um caderno grosso retangular e uma caneta prateada de seu bolso e os colocou no banco perto dela.
41 Pelo menos meus ouvidos estarão quentes, pensou ao ouvir o novo álbum do Creeps e pressionou mais o xale sobre os ombros. Havia algumas garotas vestindo jaquetas estampadas com letras, por cima de seus trajes de líderes de torcida, no final do seu banco, sussurrando e apontando para o campo. Phoebe poderia colocar tudo o que sabia sobre o futebol nas quatro primeiras linhas do seu caderno. A única coisa que entendia fora da ação no campo é que alguns dos rapazes estavam correndo e alguns dos outros rapazes estavam tentando derrubálos. Adam sempre foi fácil de detectar. Era o maior no campo, como também era em qualquer lugar que estava. Olhou em volta procurando Tommy Williams, mas todos os garotos estavam se movendo estranhamente no estofamento e capacetes. Então o viu; seus movimentos duros, mas não por causa do enchimento. Ele estava tomando seu lugar na linha dos meninos prestes a ser demolido. Killian Killgore do Creeps cantava em seu ouvido sobre estar perdido nas planícies e assombrado por uma alma perdida. Phoebe bateu ligeiramente seu caderno com sua caneta prateada, o resto das linhas do seu poema flutuando no ar entre ela e o campo, esperando pela sua captura para anotá-las. Phoebe colocou o caderno em seu colo e abriu-o. A primeira página estava em branco. Olhou para o céu e, logo em seguida, escreveu duas palavras. Então olhou para o que estava acontecendo no campo.
Adam bateu em Williams sem problemas na lateral e tentou tirar a bola de seu alcance. O golpe foi fácil de fazer, porque Williams era muito lento. Caiu, mas Adam pensou que se ele não tivesse lançado o ataque, Williams poderia ter permanecido de pé. Atacar o rapaz morto era como atacar uma parede de tijolos. Peso morto; pensou. Ha Ha. A bola se soltou e rolou por dez jardas no campo. Se fosse o início da temporada e Williams estivesse em campo, ofereceria-lhe a sua mão e o levantaria, mas na pré-temporada, supunha-se que Adam cuspiria perto de sua cabeça e o chamaria de covarde.
42 Williams o olhou fixamente, parado, com os olhos em branco que refletiam a luz do luar. Adam se afastou sem dizer nada. Foi impressionante atacar um Zumbi. Layman! — gritou o treinador. Você brincou com bonecas durante todo o verão? Que tipo de golpe que foi esse? Um limpo, pensou, olhando para seus velhos amigos Pete e TC. Equipe da Dor. Tinha sido divertido quando eram calouros e perceberam que eram mais duros do que 99% da população estudantil; não era tão divertido agora que todos eles eram estudantes do terceiro ano e a dureza não pode ser um dos critérios para o sucesso na vida. TC ainda estava sorrindo, como se tivesse prazer de que ainda poderia ganhar a caixa de cerveja, mas Pete tinha aquele olhar de “O que aconteceu, cara?” que parecia estar em seu rosto quando olhava para Adam nesses dias. Pete sussurrou algo para TC, que assentiu com a cabeça e tomou posição na linha. Adam viu TC bater no rapaz morto pelas costas. Com o seu capacete. O som do impacto ecoou por todo campo. Phoebe podia ouvir o golpe no banco mesmo com o horroroso punk barulhento soando em seus ouvidos. Boa jogada, Stavis! — gritou o treinador. A boca de Layman abriu tanto quanto sua barba permitiu. Um golpe bom? Isso seria lesar, e é suficiente para tirá-lo do jogo, se não de toda a temporada. Uma jogada como essa pode machucar alguém ou aleijar. Pode até matar alguém. TC caminhou em direção ao seu amigo Martinsburg, e se cumprimentaram com seus protetores de ombro. Acho que ele está morto, Jim. — disse Martinsburg, alto o suficiente para que a maior parte da equipe ouvisse. Ele estava rindo. Adam andou até Williams, que nem sequer estava se contorcendo. Pensava que a força do golpe poderia tê-lo apagado, mas o rapaz se levantou da grama pisada com os nós dos dedos de suas mãos, apoiando o joelho debaixo dele. Adam não podia deixar de sorrir quando o rapaz morto passou a bola para o treinador Konrathy. Um golpe como esse e ele agarrou a bola. Essa abordagem merece respeito.
43 O ataque continuou pelo resto dos exercícios. TC e Martinsburg sempre pareciam se alinhar contra o menino morto, ainda que mais defensivos que atacantes. Adam viu Pete atingir os joelhos de Williams em sua próxima jogada, seguido TC envolvendo seus braços de macaco ao redor de Williams para um ataque na região do pescoço. Cada golpe era um golpe sujo, mas a única decepção que o treinador Konrathy mostrou foi quando Williams levantava do gramado após cada golpe. Os exercícios foram interrompidos quando mudaram o padrão. Martinsburg estava prestes a dar um tiro no joelho quando a mão de Williams saiu e bateu no capacete do defensor. O braço rígido enviou Martinsburg de cara no campo enquanto Williams seguia perfeitamente intacto. Adam notou que alguns dos estreantes – que eles mesmos haviam tomado uma surra nos exercícios – estavam tentando suprimir um sorriso malicioso. Fique longe da barra do capacete, Williams! — gritou o treinador. Adam balançou a cabeça. Williams não chegou perto da barra do capacete. Mais tarde, na prática, Konrathy montou um exercício de ataque. Neste momento a maioria dos jogadores novatos; estavam exaustos e ofegantes, todos exceto o menino morto. Adam perguntou se era possível para o sem vida estar fisicamente cansado. O exercício era simples. A linha defensiva deveria começar a empurrar Denny, e a linha ofensiva pararia. O treinador colocou Williams na linha defensiva do outro lado de Adam. Williams, morto ou não, não era um dos garotos mais altos do campo. Tinha 1,78m, talvez, e um físico mais parecido com um receptor do que com um linebacker 7. Layman pensou que era cruel, da mesma forma que todos os golpes da Equipe da Dor eram cruéis. As aulas de caratê ensinaram a Adam muito sobre a honra, e isto em absoluto não era honrável. Mas nem a desonra desculpava o dever. Cruel ou não, tinha que bater em Tommy Williams exatamente como em qualquer outro zagueiro rival. Ele bateu de forma limpa, sim, mas não menos forte. Ninguém chega, Adam pensava enquanto a bola rolava na relva e tomou sua posição. Ninguém.
7
Defensor.
44 Ele jogou a bola para Denny e impeliu para frente, mantendo todos os seus músculos da perna durante o lançamento. Williams era mais lento, mas se aproximava para encontrar o ataque. E o fez. Adam estava vagamente consciente do jogo, deu-se conta das coisas nos cantos de sua visão, como Gary Greene a sua direita escorregando e perdendo o bloqueio. Ele percebeu que ninguém estava ajudando Williams contra ele, algo que as outras equipes sempre faziam, procurando abrir um buraco em sua linha. Também notou que Williams se moveu somente um centímetro. O jogo terminou. O deslizamento de Greene deixou um dos novatos na passagem, e novato pressionou Denny o suficiente para lançar um passe incompleto perto da linha lateral. Adam se desbloqueou de Williams, que silenciosamente se virou e voltou a seu lugar na linha. Santo Deu;, pensou Adam. Williams tinha ido de encontro a ele, sem ajuda, e Adam tinha apenas o movido. Olhou para seus colegas para ver se algum deles percebeu a incrível façanha que apenas Williams acabara de fazer, mas a maioria deles estavam cansados e arrastando seus pés a seus lugares na fila. Adam sabia que poucos deles se mostrariam como qualquer promessa real para além da escola secundária – Mackenzie e Martinsburg eram provavelmente os melhores jogadores além dele – e poucos tinham o “radar de campo” que lhes permitia perceber os detalhes importantes no jogo. Adam olhou para o treinador, cujo rosto redondo estava rosa de raiva, seus olhos reduzidos a fendas. Ele balançou a cabeça com desgosto. Mas foi o que Adam viu além do treinador, fora dos limites do bosque, que realmente chamou sua atenção. Havia algumas pessoas de pé entre as árvores, observando a prática: três ou quatro de pé como estátuas, assistindo. Adam não teria notado nada se não fosse pelo grandão, um menino negro em uma camiseta cinza como casca do carvalho que estava próximo. Adam não podia ver bem os outros, mas sabia pela forma que estavam sem se mover e que eles estavam mortos. Eles olhavam para o menino, pensou, mas nenhum deles parecia familiar. O garoto negro tinha de ser tão grande quanto ele, e não havia maneira de Adam não o ter notado nos corredores.
45 Layman! — gritou o treinador, tirando o boné e batendo-o contra a coxa para o efeito. Você está aqui para jogar ou quê? Adam retornou para a linha. Ninguém parecia ter notado os Zumbis. Pessoas que viviam sem vida; corrigiu-se. Eram horríveis, sim, mas não poderia deixar que sua presença o afastasse da tarefa em questão. Ele ficou na linha e olhou para Williams. Williams olhou para ele com uma calma perturbadora. Ele acreditava em conhecer seus adversários. No golpe seguinte Adam o atingiu com uma força igual e o arrastou por 15 cm talvez. Não havia jeito de Williams passar através ou ao redor dele, mas Tommy não foi derrubado como quase todo mundo com quem Adam jogou contra. A jogada terminou com uma conclusão. O treinador chamou Adam de menina e disse-lhe para colocar algum esforço nisso. No terceiro venceria, Adam pensou, e desta vez quando bateu em Williams mudou seus golpes na forma que havia aprendido com o mestre Griffin. Williams se virou para o lado como uma embalagem de chiclete preso em uma brisa. Denny se lançou pelo buraco do tamanho de Layman e correu pelo campo. Williams voltou de costas. Adam viu a luz – da lua cheia ou as luzes do estádio – refletida em seus olhos planos. Ofereceu sua mão ao Williams, e garoto morto a aceitou.
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CAPÍTULO 06
As linhas que Phoebe escreveu brilharam com um azul elétrico na página branca. Leu as palavras uma segunda vez e a energia fluiu de volta atravessando a ponta de seus dedos. A sensação era algo que raramente havia experimentado enquanto escrevia, apesar das páginas e páginas do caderno que tinha enchido. Mas quando chegou a sensação foi como uma faísca de vida para ela. Realmente não acreditava que Tommy seria capaz de levantar-se do primeiro golpe duro que recebeu. As sucessivas abordagens não foram menos brutais, mas se levantou, sem aparentar cansaço, pelo que pôde ver. Sua resistência parecia enfurecer os tacklers8, que o golpeavam e se estatelavam contra ele com renovado vigor. Quando segurou Pete Martinsburg com uma mão estendida, quase havia começado a aplaudir. Leu seu poema pela terceira vez. Lua Cheia Sobre O Garoto Morto no campo Tratando de nos mostrar O que significa Estar Vivo 8
Jogador de futebol americano. Eles bloqueiam, defendem os zagueiros e abrem o caminho.
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Se as animadoras a viram sorrindo para si mesma e pensaram que ela era estranha, que assim fosse. Valia a pena. O treino terminou com um apito final do treinador Konrathy. Olhou como Adam passava pelas grades. Ele a viu sentada na arquibancada e lhe dedicou a mais imperceptível das saudações. Cumprimentou-lhe de volta como se ele fosse uma celebridade de Hollywood, esperando tê-lo envergonhado. Mas se realmente tivesse dito que ela era sua melhor amiga, não haveria muito mais que pudesse ser feito para melhorá-lo. Phoebe procurou Tommy e o viu de pé na parte mais afastada dos jogadores enquanto eles se moviam em um corredor até os vestiários. Mais lento que a maioria, se arrastou mais e mais longe até que esteve inclusive a uns bons cinco passos por trás de Thorny Harrowwood, que estava mancando depois de ter passado a hora anterior sendo jogado na grama como se fosse a ancoragem de uma tenda. Então Tommy parou, virou e começou a caminhar em direção contrária, até o estacionamento. Ou, pensou Phoebe, até o bosque por trás do estacionamento. Em um impulso repentino, talvez gerado pela faísca elétrica através de seu sangue, levantou-se depois de arrancar a folha de poesia de seu caderno e dobrá-la em um pequeno quadrado. Seu livro, caneta e iPod foram parar em sua mochila, e já estava em movimento. Os sons de seus saltos eram como tiros nas arquibancadas enquanto descia correndo e seguia Tommy através do campo.
48 — Vem aqui, Layman! — gritou o treinador Konrathy, acenando da porta de seu escritório. Adam suspirou, pensando que seria bom ter tirado algo mais da equipe além do capacete. Deu uma fria olhada para Martinsburg enquanto passava, mas Pete lhe devolveu o olhar sem pestanejar. Konrathy fechou a porta violentamente. — O que você esteve fazendo todo o verão? Brincando com bonecas de papel? Layman respirou profundamente. No ano passado, certamente teria lançado o capacete contra a parede se o treinador tivesse gritado dessa maneira. Ali havia a porta de um armário que estava dobrada e retorcida como um pretzel9, encaixada com tanta força que já não se abria. O treinador Konrathy tinha tirado Adam do jogo no ano passado por falhar em um bloqueio que permitiu que Denny Mackenzie fosse expulso pela primeira vez na temporada, então Adam descarregou sua frustração no armário. Mas este era o novo e melhorado Adam Layman, da calma zen. O novo e melhorado Adam que pensava antes de bater. — Não, treinador. — disse sem alterar sua voz, seu pulso e respiração sob controle. — Estava tendo aulas de caratê e fazendo exercícios. O treinador Konrathy levantou as mãos com um gesto exasperado de incredulidade. — Caratê? Caratê? Pensava que o caratê te deixava mais duro, e não um completo covarde.
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O pretzel (Brezel, em alemão) é um pão tradicional alemão, em forma de nó, seco, estaladiço, habitualmente muito cozido e salgado
49 Adam sentiu sua respiração acelerando-se, mas se concentrou e retomou. Não, treinador, ele pensou, o caratê não tem nada a ver com te deixar mais duro, tem a ver com dar mais controle, claridade e centrar sua vida. Centrar. Quando esteve pronto respondeu ao seu treinador com uma pergunta. — Há algo de errado na maneira que eu treinei hoje? O treinador se inclinou sobre a mesa de modo que ficaria a centímetros de distância de Adam, o suficientemente perto como para que este pudesse cheirar as dezenas pastilhas para hálito que ele havia engolido durante o treinamento. — Diga-me, Layman. – disse. — Você acha que há um problema com seu treinamento quando nem sequer consegue repelir um garoto morto? — Empurrei... — Não se inclinou! Você é praticamente dois centímetros mais alto do que ele, e não conseguiu fazer nada mais do que tirar seu equilíbrio! E o ajudou a se levantar! Que demônios você estava pensando? Não ajudamos a levantar os novatos até que eles entrem na equipe, você sabe! Adam convocou a voz calma, mas insistente do Mestre Griffin em sua cabeça. Centre-se, Adam. Centre-se. — É difícil se mover quando seus pés estão plantados. — disse tão bem como pode. — Acho que ele seria bom na linha ofensiva. Konrathy recuou como se Adam tivesse cuspido em seu olho. — Você acha né? Que tal ao invés de unir-se contigo na linha, você não vai se unir a ele na lista de garotos que saíram da equipe? A última coisa que preciso na equipe é de uma atitude problemática.
50 O Mestre Griffin tinha ensinado Adam tudo sobre Chi10 – a força vital no centro de todas as coisas – em seus estudos. Concentrar-se no Chi era bom para a respiração. Era bom para o coração. Também era bom para evitar que Adam agarrasse o treinador Konrathy e apertasse seu grosso pescoço vermelho. Apesar de toda essa confusão, não podia evitar que seu rosto ruborizasse. — Conheço tuas qualidades, Layman. — disse Konrathy, colocando-se novamente na frente do rosto de Adam. — E conheço teu padrasto. Sem o futebol não tem nenhuma possibilidade de entrar ou pagar a universidade. Deixou que suas palavras penetrassem por um momento, e se fundissem, penetrando através da calma protetora que Adam estava tentando manter. — Será melhor que você se corrija e traga seu jogo para o próximo treino, Layman. — disse. — Agora fora do meu escritório. Havia coisas que Adam queria dizer e fazer, mas não fez. O treinador estava certo. Se o futebol não iria para nenhuma parte; acabaria ficando em Oakvale por toda sua vida, trabalhando na oficina do seu padrasto, levantando pneumáticos, entregando chaves para seus meio-irmãos. Oakvale podia ter uma política de todos incluídos – para suas equipes de esporte, o que significava que não tiravam os garotos de suas equipes, mas Adam não podia correr o risco. Muito tempo no banco arruinaria sua oportunidade de uma carreira profissional. Stavis soltou uma risada enquanto caminhava até seu armário. Stavis era outro garoto destinado a ser um morador de Oakvale, e se Adam não entrasse na universidade ficaria preso aqui, trocando óleo e mudando freios para idiotas como ele pelo resto da vida. Pensou que preferia morrer a viver um futuro como esse. Morto sem retorno. Não como o garoto Williams. Permanentemente morto. Seu antigo armário, aquele que quebrou no ano anterior, estava ao lado de seu novo armário.
10
Qi, também grafado como ch'i (na romanização Wade-Giles) ou ki (na romanização do japonês), é um conceito fundamental da cultura tradicional chinesa.
51 Desejava desse modo, de forma que tivesse uma lembrança constante de quem havia sido e de quem estava tentando ser. Respirou por etapas, e seus punhos se relaxaram sem que fosse consciente disso.
Não pensei que os Deficientes Vitais fossem capazes de se mover tão rápido, pensou Phoebe enquanto caminhava através do campo enlameado. Suas botas, tão brilhantes e polidas como pareciam, tampouco estavam ajudando. Havia uma economia de propósito nos movimentos de Tommy, como se estivesse caminhando na linha mais reta possível desde sua anterior posição no campo até seu destino. Sua trajetória o levaria diretamente ao bosque que rodeava o lago Oxoboxo. O controle de Phoebe sobre a topografia local não era espetacular, mas sabia que em algum lugar do outro lado dessas árvores estava sua casa. Também a de Tommy, em algum lugar um pouco mais afastado, a rota do ônibus. Tommy se moveu entre dois carros estacionados e alcançou a curta extensão de grama antes da linha de árvores justamente quando Phoebe entrou na pista na margem do campo de futebol. Diminuiu um pouco da distância, mas não ia pegá-lo antes que entrasse no bosque, como ela esperava. A única hesitação nos passos decididos de Tommy foi quando tirou seu capacete antes de entrar no bosque. A luz da lua cheia brilhou em seu cabelo loiro platinado em um momento antes que a escuridão o tragasse. A respiração de Phoebe a precedeu, inalações de vapor como espíritos dançantes na luz da lua. Não foi até que entrou no bosque e a luz da lua havia desaparecido que se deteve por tempo suficiente para pensar no que estava fazendo.
52
A cobertura do bosque Oxoboxo era praticamente total; o dossel de folhas no alto era como um escudo contra a luz da lua. Que diabos eu estou fazendo? Pensou. Inclusive antes que os garotos mortos começassem a voltar à vida, o bosque Oxoboxo era um lugar de mistério e estranheza, um lugar onde se contavam e diziam histórias de fantasmas, histórias que haviam precedido o povoado e os europeus que pouco a pouco foram se instalando ali. Mas no fundo sabia o que estava fazendo. Tommy Williams estava em sua cabeça, seu rosto branco e anguloso, o fantasma de um sorriso em seus lábios, e a luz pálida de seus olhos azuis pálidos. Sabia que ele permaneceria ali até que ela reunisse a coragem para falar com ele. E então...? Phoebe olhou por cima de seu ombro, de volta para as luzes pálidas do estacionamento através das árvores. Adam logo a estaria procurando, logo depois que tivesse tomado banho e se trocado. Não queria que ele ficasse em pé ao redor da caminhonete de seu padrasto, se perguntando onde demônios ela teria se metido. E se ele chegasse muito tarde, o PDT provavelmente enlouqueceria como costumava fazer e não deixaria Adam sair durante o mês seguinte ou fim de semana, e seria sua culpa. Olhou dentro das formas escuras das árvores na sua frente. Podia ver a vaga e cinza figura das árvores agora que seus olhos haviam se acostumado à falta de luz. Era consciente que não havia pássaros nem insetos fazendo ruídos, e o quão estranho era isso. Suspirou e ficou ali de pé durante um momento, imaginando cada respiração como um pedaço de sua alma, e então imaginou cada fragmento levantando-se para o impermeável teto de folhas e buscando uma saída para o céu mais além. Não havia maneira que pudesse dizer que caminho havia tomado Tommy através do bosque.
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Que diabos eu estou fazendo? Pensou novamente. Uma onda fria de medo a fez estremecer. Decidiu que perseguir Tommy através do bosque Oxoboxo era uma má idéia. Virou-se. E o garoto morto a alcançou, seus olhos pálidos brilhando na escuridão.
Thornton era o único garoto que continuava nos vestiários enquanto Adam amarrava seus sapatos. Estava em pé na frente de seu armário com uma toalha ao redor da cintura, admirando um enorme hematoma vermelho que corria por toda longitude de sua caixa torácica. — Uau. — disse o garoto mais jovem, fazendo uma careta. — Realmente levei uma surra hoje. — Sim, no entanto, você se levantou. — disse Adam. — Isso é o importante. — Sim, acredito que fiz isso. — respondeu Thornton sorrindo de orelha a orelha. O pobre garoto parecia o cara da revista Mad, mas sem o dente que lhe faltava. Adam sorriu para si mesmo, pensando que a temporada estava apenas começando. Thornton foi para o chuveiro assobiando, e Adam pensou que o garoto não estaria mais feliz se lhe dessem uma nota de cem dólares. Com grande poder, pensou. A frase do Homem-Aranha. O Grande Mestre Griffin havia passado todo o verão falando disso, ensinando-o que ser algum centímetro mais alto, ou duas vezes mais forte que qualquer outro não era um direito, e acarretava certas responsabilidades. Ensinou para Adam que ele possuía dons que poderiam ser de grande utilidade para a sociedade ou, se abusasse,
54 podiam causar um grande dano para todos, incluindo ele mesmo. Ainda estava pensando sobre isso quando TC, Pete, e Harris Morgan o detiveram no estacionamento. — Ei, idiota. — disse Pete. — Onde está seu amigo Zumbi? — Não estou com humor. – respondeu, esperando que Pete se afastasse de seu caminho. — Com que equipe você está, grandalhão? — perguntou Pete, aproximandose mais ao invés de se afastar. — Com os vivos ou com os mortos? — Jogo com os Badgers, Martinsburg, assim como você. Saia do meu caminho. — olhou por cima de seu ombro onde sua caminhonete estava estacionada, mas não viu Phoebe, o que era bom. Não queria que ela visse isso. No fundo, sabia que tampouco queria que eles a vissem. — Esse Zumbi vai sair da equipe, de uma maneira ou de outra, Layman. — disse Pete. Adam estava tentando decidir se poderia com os três. TC era o maior, embora Harris e Pete não fossem pequenos, e Harris era ao menos mais rápido do que ele. Percebeu que se chegasse a esse ponto, provavelmente deveria tentar derrubar Pete tão rápido como pudesse, por que então os outros dois poderiam perder a coragem. De fato, Morgan não parecia estar desfrutando, de qualquer forma. Adam estava preparando seu corpo para permanecer relaxado quando Pete, sentindo também onde estava chegando a situação ou já tendo deixado claro seu ponto, se afastou do seu caminho. Adam passou por ele, seus olhos sem deixar o rosto zombador do estudante do último ano enquanto caminhava. Lançou sua bolsa na cabine da caminhonete a dez pés de distância.
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— Escolhe uma equipe! ― gritou Martinsburg. Adam entrou na cabine da caminhonete e fechou a porta. O motor voltou à vida na terceira tentativa de arrancar, e liga o rádio. Esperava que seus três companheiros de equipe já tivessem ido embora quando Phoebe aparecesse. Phoebe tremeu quando a mão do garoto morto tocou seu cabelo e deixou que as mechas negras deslizassem entre seus dedos. Estava imóvel quando ele afastou a mão e a segurou na frente do seu rosto. Suficientemente perto para que pudesse ver a folha que tinha retirado. Agora o único som era de sua respiração. Tommy deixou a folha cair, e ela olhou como pairava momentaneamente antes de desaparecer na escuridão. — Eu..., estava te seguindo. — disse, arrependendo-se instantaneamente depois de ter falado. Seu sussurro soou em suas orelhas como um alarme contra incêndios na metade do silencioso bosque. Ele era um vivo vulnerável, não um idiota. É claro que havia lhe seguido, por qual outra razão teria se escondido e havia se aproximado sigilosamente dela? Perguntou-se se seus olhos - olhos da cor da nuvem de chuva na luz florescente da classe, mas brilhantes, como dos gatos podiam registrar o calor que sentia irradiar de suas bochechas. — Queria falar contigo. ― disse. — Queria dizer que acho que você é muito corajoso por fazer isso. Por jogar futebol, quero dizer. Tommy não disse nada, o que aumentou sua vergonha. Ele era alto, seus ombros amplos. Segurava seu capacete pela grade do lado. Que tipo de idiota era ela para seguir um garoto vivo vulnerável, afinal? Talvez todo seu sentido comum tivesse voado junto com sua respiração. Era consciente, como se estivesse a uma grande distância, de meter a mão no seu bolso e retirar o quadrado de papel do livro. — Também quero te dar isso.
56 Estendeu e o olhou enquanto observava com os olhos brilhantes, seu rosto sem nenhuma expressão. Houve um momento de agonia enquanto olhava o quadrado sem se mover, e tudo o que Phoebe pode pensar foi na vez na sétima série quando Kevin Allier rejeitou seu convite para patinar em dupla em uma festa no Winford Rec Center. Mas então Tommy alcançou e pegou seu poema. Inalou quando suas mãos se tocaram; o odor era como da brisa da manhã a deriva sobre o lago Oxoboxo. Ficaram em pé sem falar por um minuto, cada segundo um momento de incômodo que sentiu extremamente como quando os garotos do campo sentiam seus golpes e batidas. — Bom. ― disse, com as orelhas esquentando como se não fosse mais capaz de aguentar o silêncio. — Tenho que ir procurar a pessoa que vai me levar para casa. Boa noite. Ele não disse nada: nada mesmo. Baixou os olhos quando se virou e começou a caminhar até onde pensava que estava o estacionamento. Mas estar em pé no bosque com Tommy, dar-lhe seu poema, era tão irreal; tão bizarro que não estaria surpresa se o bosque Oxoboxo, incluindo o lago, fossem centrifugados para fora da terra e dentro da estratosfera. Fosse o que fosse a magia elétrica que havia tido estava agora ao redor de uma fria e escura onda de vergonha e medo. Estava a ponto de bater em uma árvore quando lhe pareceu ouvir seu nome. Virou. Tudo o que podia ver era o pálido e brilhante contorno de Tommy e seus olhos, dois discos pálidos de luz de lua, a uns quinze pés de distância. — Acho. — disse; sua voz suave e lisa, mas parecida com a lembrança de um som do que um som em si mesmo. — Que você também é corajosa. As pequenas luas desapareceram e estava só. Havia escuridão em todo o seu redor, mas já não fluía dentro dela. Estava sorrindo quando se uniu a Adam na quente cabine da caminhonete de seu padrasto.
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CAPÍTULO 7 O fim de semana avançou com uma cansada languidez, como se o próprio tempo se transformasse em um vivo vulnerável. Phoebe passou longas horas, sentada em sua cama, escutando músicas com seu caderno e lápis no colo, escrevendo nada e falando com ninguém. A noite de sexta tinha sido confusa de muitas formas, mas parte dela queria segurar um pouco mais essa confusão e analisá-la. Margi ligou no sábado à noite, como de costume, a conversa estava focada principalmente em Margi. Sua tarefa de história, o programa que estava assistindo, os sapatos que planejava usar na segunda, seus pensamentos sobre as novas transferências de Zombiecide. Isso não irritava Phoebe; sempre era divertido ter uma conversa centrada em Margi, e lhe permitia não falar sobre o que estava em sua mente – Tommy... Quase se traiu quando Margi lhe perguntou se tinha conseguido terminar sua tarefa na biblioteca – havia esquecido completamente sua história para se encobrir. — Oh, claro. — disse, mas realmente só tinha desenhado algumas caricaturas em seu caderno e folheou um livro que encontrou sobre a Inquisição Espanhola. — Isso foi convincente. — diz Margi. — Sabe; eu gostaria que você tivesse me convencido a ficar, por que realmente estou tendo muita dificuldade em fazer essa tarefa de história. É claro, o Sr. Adam, garoto fraco, provavelmente não teria me trazido para casa. Juro, Phoebe, ele está apaixonado por você desde a terceira série. — Me mudei para cá na quarta série. — Bom, provavelmente está apaixonado por você desde sua vida passada. Você viu como ele revira seus olhos quando eu os acompanho?
58 — Isso é ridículo, Margi. — Sim, eu sei. Eu sou muito mais atraente do que você. — disse, e então riu. Phoebe já era ciente a um tempo da fascinação de Margi por Adam, que foi o primeiro amigo que Phoebe fez quando se mudou para Oakvale. Haviam simpatizado porque Adam não conhecia garotas que gostassem de histórias em quadrinho, e ela era melhor nadadora e jogadora de Frisbee do que ele. Não se aproveitava por seu tamanho, ou – largura – como Phoebe gostada de lhe incomodar, até o ensino médio. Logo seu gosto pela contextura começou a fazê-lo optar por esportes de contato – esportes que ela não se interessava, apesar de ter um lançamento decente. Adam era um ano mais velho, mas tinha ficado para trás na segunda série, então agora ambos eram juniores. O colegial os fez tomar caminhos diferentes – Adam era um dos populares, Phoebe ficou à margem. Ninguém fez confusão por sua amizade na escola, por que a incongruência disso confundia seu círculo de amizade. Essa incongruência, como a duração de sua amizade, era o que o fazia tão especial. Phoebe ainda sentia que não havia ninguém mais com quem poderia jogar Frisbee ou nadar no Oxoboxo. Era o suficientemente especial que Phoebe sabia que nenhum deles arruinaria isso com sentimentos mais complicados. Pensou que era Margi que estava apaixonada, mas por alguma razão nunca admitiria. — Você é mais bonita do que eu, Margi. — Certo. Há algo por dizer a verdade? Você tem altura, pele boa, bochechas. O que eu tenho? — O vestuário? E... — Não diga. — Bem, você começou. Acho que conseguem mais atenção do que minhas bochechas grandes. Mais brincadeiras, e logo desligariam quando o pai de Margi gritasse para que deixasse o telefone. Phoebe voltaria a rabiscar seu caderno. Adam lhe enviou uma mensagem instantânea no domingo pela noite, quando estava procurando as últimas notícias sobre os Deficientes Vitais. Perguntou-lhe se ela queria que ele a levasse para a escola na segunda, o que era
59 estranho porque ele nunca perguntava isso. Ela respondeu; claro, e acrescentou um emoticon bobão, que era a marca das Irmãs Estranhas, um círculo, carinha sorridente com cílios, uma cauda, e uma língua movendo-se estupidamente com a boca aberta. Ótimo, foi sua mensagem de resposta, sem adornos. Sete? Sim. Deveríamos jogar Frisbee de vez em quando. Em seguida, se desconectou. Isso, pensou, era realmente estranho. Agora o único momento em que eles se lançavam em uma conversa era quando um deles precisava de alguém com quem falar. Havia coisas que Phoebe não podia falar com Margi, e havia coisas que Adam era relutante em compartilhar com alguns de seus amigos da equipe de futebol. Era um estranho par – mas os pares estranhos eram quem mantinham a vida interessante. O sentimento trouxe instantaneamente Tommy a sua mente. Quando apagou a luz imaginou seus olhos brilhando ligeiramente na escuridão de seu quarto, e desta vez não teve medo.
Adam chegou à sua casa as sete em ponto, a caminhonete do PDT ressoava no caminho de entrada, enquanto entrava na cozinha e pegava uma banana. Phoebe, a última a chegar, escreveu um bilhete para sua mãe dizendo que não a esperasse para o jantar, e então fechou a porta na chave. — Obrigado, Adam. Como você conseguiu a caminhonete? — PDT pegou o carro de mamãe hoje. — disse. — Levou-a para o trabalho para poder trocar o óleo. Temos tempo para tomar um café, se quiser. — Estou bem, mas você pode tomar um. Deu de ombros. — Eu gosto das mechas vermelhas. Foi você que fez?
60 Phoebe reflexivamente toca as pontas de seu cabelo e pensa na queda de folhas. — É claro. Obrigada. — De nada. Dá ré na caminhonete para sair do caminho da entrada, e dobra a esquerda, o que significa que ele ia pelo caminho longo, pelo lago. — Assiiiim... — disse. — O que você quer contar? Agora percebeu quão calado tinha estado desde sexta-feira. Naquela noite tinha sido por justa causa. — Ei, Phoebe, o que diabos você estava fazendo na floresta? — mas nunca perguntou. Não havia notado, e Adam notava a maioria das coisas ao seu redor. Ela não se deu conta de que havia estado tão preocupada que nem sequer percebeu quão preocupado ele tinha estado. Ele encolhe seus ombros novamente. — Mais tarde. Só quero dirigir um pouco. — Certo Adam. Dirigir é bom. Cheirar esse ar fresco do lago. Riu, e o conhecia o suficiente para não forçá-lo a falar. Falaria com ela quando estivesse pronto. A floresta do Oxoboxo parecia diferente na luz do dia, e do exterior. Ela sempre pensava que as árvores estavam mais juntas do que nas outras florestas, como se estivessem se agrupando para esconder segredos do mundo exterior de suas fronteiras selvagens. Ela e seus amigos tinham passado bons momentos de suas jovens vidas no bosque e no lago. O Oxoboxo era um lugar onde você nunca se sentia cem por cento segura, e isso era o que o fazia tão emocionante. Emocionante, ao menos, até que Colette morreu ali. — Você não me contou como foi o treino. — disse Phoebe, virando-se para olhar através do parabrisa. — Como foi jogar com um cadáver ambulante? Pretendia dizê-lo como piada, mas viu seu olhar horrorizado cujas palavras haviam chegado exatamente no que estava lhe atormentando. — Oh! — disse. — Pensei que isso não era politicamente correto. Não é isso o que você e Daffy me disseram no outro dia no almoço?
61 — Estou brincando! — estava desafiante e era óbvio, mas se queria algum tempo antes de contar-lhe o que lhe irritava, estava tudo bem. Seus ombros se moveram novamente como faziam sempre que estava nervoso. — Sabe; o garoto morto não era tão ruim. — De verdade? — disse; secretamente contente. — De verdade. É muito forte. Quero dizer, em velocidade é lento. Mas pega rápido. No final do treino tinha encontrado uma forma de rebater meu ataque. Foi muito bem. — Uau, quem teria imaginado? — Eu não. — e isso foi tudo que disse sobre Tommy. Deu a volta no estacionamento de estudantes um tempo depois, e então estavam fora da caminhonete e fazendo a longa caminhada para a escola. — Ei, esta noite eu tenho treino novamente. — disse. — Você precisa ir para biblioteca ou algo assim? Ela sorri. — Quer jogar Frisbee à meia-noite? — Sim. — disse. — Talvez eu precise fazer isso.
Tudo foi normal na segunda. Os vivos continuavam indo rapidamente de classe em classe, conversando sobre os acontecimentos do fim de semana ou uma das centenas de encontros sutis que ocorriam no momento que transcorria a campainha entre a manhã e o almoço, enquanto que os mortos se moviam em linha reta e não compartilhavam seus pensamentos com ninguém, nem sequer com seus pares. Phoebe vagava e procurava Tommy Williams, capturando seu vislumbre de uma distância calculada. Ele podia ter a vantagem na floresta de Oxoboxo com seu sigilo e seus olhos de luz da lua, mas entre os vivos, ela estava à frente. Aqui nos corredores fosforescentes podia observá-lo todo o tempo sem que ele percebesse.
62 Mas isso não significava que o morto era incapaz de surpreender, enquanto Margi provava deixar cair o maior de todos no corredor depois da campainha final. Estava pronta para ir para o ônibus antes que Phoebe sequer tivesse chegado ao armário — tão grande que era. — Desculpe Margi. — disse Phoebe. — Não vou no ônibus hoje, vou para a biblioteca de novo. — Está brincando. — disse Margi. — Tenho que falar contigo. — O que está acontecendo? — O que está acontecendo com você? — foi sua resposta, com uma pitada de acusação em sua voz. — Por acaso são as vinte perguntas, Margi? Não sei o que eu devo dizer, e não quero que você perca o ônibus. Margi olha para Phoebe, com uma mistura de impaciência e compreensão em seu suave e redondo rosto. — Pheebes. — disse. — Você é minha melhor amiga e eu gosto de você. Mas algo está acontecendo. — Certo, já falamos sobre isso. — Então, imploro para que você diga o que está acontecendo? Deixa eu te perguntar algo: alguma vez você já viu um vivo vulnerável desenhar em seu caderno? Phoebe suspira. Deixando Margi com o melodrama. — Não, acho que não. — Alguma vez você contribuiu com o Oakvale Review? — Não. — Ou assistiu aula de artes ou aula de música? — Não. — Tirou uma foto digital ou tem um desejo louco de fazer jardinagem? Ou basicamente fez qualquer coisa criativa?
63 — Não, não que eu saiba. — Nem sequer decorou seu armário? — Margi! Vá direto ao ponto! Ela fez e enfatizou o ponto. — Tommy Williams prendeu um poema em seu armário — disse. — E parece como se tivesse sido escrito com sua letra.
No exato momento em que a boca de Phoebe se abriu para responder a declaração de Margi, o porta-malas de Pete Martinsburg se abriu com um clique de sua chave. O carro tinha apenas um mês de uso, um presente de aniversário do seu querido pai distante. Pete não era suficientemente estúpido para pensar que o presente de seu pai não era mais do que uma expressão para irritar sua mãe. Tudo era sobre vingar-se da ex-esposa. Mas, ei, carro de graça. Levou Adam e TC para o carro. Levou um tempo para convencer o garoto fraco que saísse do vestiário, e inclusive agora o cara fazia um espetáculo de quão aborrecido era aquilo para ele. Pete sabia como ia ser, mas sentiu a necessidade de dar a Adam uma prova final de fé antes de mudar sua estratégia. Foi até a caminhonete e tirou o uniforme de futebol, sob a longa mochila negra havia três bastões arranhados. Pete puxou o de alumínio do porta-malas e o agarrou fortemente com uma mão, fez ranger seus pulsos algumas vezes. Seu sorriso era amplo e frio. — Fiz catorze homes run11 com este bebê em meu último ano na liga PAL. Marquei 313 este ano. 11
No beisebol, home run (denotado HR) é uma rebatida na qual o rebatedor é capaz de circular todas as bases, terminando na casa base e anotando uma corrida (junto com uma corrida anotada por cada corredor que já estava em base), com nenhum erro cometido pelo time defensivo na jogada que resultou no batedor-corredor avançando bases extras. O feito é geralmente conseguido rebatendo a bola sobre a
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Stavis assentiu com atenção, mas Pete podia dizer que Adam estava por um fio de fazer algum comentário espertinho, e seu domínio no bastão se apertou até que os nós dos seus dedos ficaram brancos. — Vamos ensinar outro esporte para o garoto Zumbi depois do treino. — disse, ironicamente. Deixou cair o bastão na caminhonete, onde aterrissou com um ruído surdo, um som não muito diferente do que faria ao bater contra um crânio, pensou Adam. Logo o porta-malas foi fechado com tanta força que o pensamento desapareceu. — Pete. — disse Adam. Nem sequer parecia tão presunçoso, o que fez Pete fortalecer-se para resolver realizar o plano final. — Sim, garoto fraco? — respondeu. — Você tem algo que gostaria de contribuir? — Realmente você não está sugerindo que iremos atrás desse garoto, não é? Pete riu. — Por que não? Não há nenhuma lei contra isso. — Vamos, Pete. Isso é estúpido. — Estúpido? Vou te dizer algo que é estúpido. A sua pequena garota Morticia Pantynegros gostar de um cadáver ambulante, isso é estúpido. — Deixe-a fora disso. Estou falando. — Seu queixo está se mexendo, mas não está falando. Sua garota, por quem tem sentido algo, por quanto tempo? Toda sua vida? Está escrevendo poesias para garotos mortos. Veio para o treino observar um garoto morto. Um garoto morto, Adam. Quão asqueroso é isso? — Cale-se, Pete. — Adam estava vermelho e Pete sorriu. — E você só vai deixar isso acontecer. Nem sequer vai tentar conseguir que jogue na equipe certa, hein? Stavis, que era o suficiente inteligente para captar os sinais, se moveu para o lado esquerdo de Adam.
cerca do campo externo entre os postes de falta (ou fazendo contato com um deles), sem que ela antes toque o chão.
65 — O que está acontecendo, Adam? — disse Pete, baixando o tom de sua voz para um baixo sussurro. — Que parte de você é tão repulsivo que a garota que você tem estado seguindo durante anos se destina a um Zumbi para amar? Adam dá um passo para frente, suas próprias mãos em punhos, mas isso foi até onde chegou. Pete desejava ter se inclinado, por que então poderia estar lançando alguns socos, tirando sangue, e no final disso seriam amigos novamente. Seriam a Equipe da Dor. — Pode ir, Adam, — disse nas costas de Adam. — Mas não terminamos. Não vou deixar que essa encantadora jovem flor se deite com um cadáver. Não enquanto eu viver e respirar. Adam continuou caminhando para a escola.
Pete disse que não tinha acabado, e dizia a sério. O rumor que rolava pela escola como um arbusto queimado era tão absurdo que nem sequer Pete podia entender. Um vivo, respirando, na plenitude dos dezesseis anos, tendo algo com um garoto morto? Era completamente antinatural. Por que não ir e dormir com um animal de fazenda? Ao menos, era um animal vivo. Decidiu que o melhor a fazer era intervir no assunto. Pete a viu na biblioteca. Já estava atrasado para o treino, mas que inferno. O que ia fazer o treinador dispensá-lo? E perder as duas interceptações por jogo? De jeito nenhum. Por outro lado, meter-se sob a saia desta garota valeria as corridas extras. — Ei. — disse, sentando-se na sua frente. Ela levantou seu olhar e tirou um aparelho côncavo da orelha. Alguém grita de dor através do alto-falante, o volume era audível na metade da biblioteca. Ele gostava do modo com que seu delineador preto deixava seus olhos parecendo os de um gato. Provocativos. E a melhor parte era que esta garota não tinha ideia de quão provocativa era. Nem sequer tinha algum amigo do grupo de Pete, as líderes de torcida e outros tipos, as Toris e Hollys e as Cammys com quem ele teria se enrolado até mesmo se fosse o cara mais feio da equipe de futebol.
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Ele lhe deu um sorriso tencionando que ela o sentisse até nos pés. Ter saído com garotas universitárias neste verão lhe abriu alguns mundos novos, a respeito das mulheres. A garota era sinistra, séria, e era aficionada por livros. Imaginou que garotos menos experientes não a olhariam duas vezes, mas para Pete, todos esses fatores eram apenas parte de um doce segredo que as garotas como estas ocultavam, um doce segredo esperando ser contado para todo mundo. — Olá. — voltou a dizer. — Olá? — ela disse, com uma sugestão de pergunta em sua voz. Ele gostava disso. E ela era tímida; sua pele pálida estava ficando rosa até sua garganta. Aproximou-se para observar a cor se estendendo. — Te vi no treino ontem. — disse. Se havia uma coisa que as garotas gostavam era serem notadas. — Viu? — Sim. Olhei para cima e ali estava, nos observando. — Estava esperando. — disse. — Por Adam. Pete sorri por dentro. Morticia no momento estava fora da sua liga. — Layman? Não é seu namorado, é? Ela riu e negou com a cabeça, com um brilho rosa em suas bochechas. Sua pele era a pele dos anjos, pensou, suave e branca. Quase esticou sua mão para acariciar-lhe a bochecha, mas pensou que ela se espantaria. Talvez mais tarde. — Isso é bom. — disse. — Por que Adam é um bom amigo meu, e eu odiaria que ele ficasse com raiva de mim. Parou de rir. — Por que ele ficaria com raiva de você? Agora foi ele quem riu, fez enquanto se inclinava na chiante cadeira da biblioteca, estendendo seus braços para que ela pudesse captar a definição de seus braços. — Por convidar você para sair.
67 Ela voltou a olhar seu livro de história. Pete se inclinou para frente. As garotas pequenas gostam dos garotos grandes, e ele era um; a sombra de seus ombros a cobria como uma manta. — Mas mesmo se ele fosse seu namorado, eu teria te convidado para sair. Ela parecia como se tivesse problemas para respirar. E isso, o fez pensar em outras maneiras de fazê-la ficar sem fôlego. — Preciso estudar. — disse; sua voz acima de um sussurro. Você está fazendo isso, pensou. — Então, é um sim? — perguntou, sua mão sobre seu braço. Ela usava um suéter fino, e ele massageou o tecido preto agrupado em seu cotovelo com seu polegar e indicador. — Posso te levar para casa, se você quiser. Direi para Layman que fizemos alguns planos. Provavelmente, você viu meu carro. — Não. — sua voz era tão suave que ele quase não escutou. — Não, você não viu meu carro? E... — Não. — ela disse. — Não, eu não quero sair com você. — O quê? — Não. — repetiu. — Por favor, pare. As pessoas estão nos observando. — Não entendo. — realmente, não entendia. — Não quero sair contigo, Pete. Obrigada, mas não. — Por que não? — perguntou ele. — Só não quero. Por favor, solte meu suéter. Ele soltou, e se inclinou para trás, a cadeira rangendo com seu peso. Primeiro Layman adotou uma grande atitude, e agora isto. Pete tinha estado escondendo sua raiva desde que seu pai o enviou ao aeroporto sem sequer desejarlhe uma boa viagem, e agora ameaçava romper por todo seu ser. — ‘Não quero’ não é uma razão, certo? — disse; seu rosto se aproximando do dela.
68 — É a melhor razão. — respondeu, e ele se surpreende de quão errado ele a tinha julgado. — Podemos acabar com esta conversa, por favor? Pete força suas mãos a se relaxar e lentamente se afasta da mesa. — Ei, eu sinto muito. — disse. — Pensei que estava percebendo algo que talvez não fosse. Sei que sou um pouco teimoso, provavelmente por que a maioria das garotas com quem saio, são assim. Lamento se te ofendi. Ela se sensibilizou, mas só um pouco. — Está bem. — disse. — Lamento não ter te dado uma resposta mais educada. De verdade, estou lisonjeada. Ele lhe deu um aceno que esperou o ter feito parecer aflito e abatido – como se lhe importasse o que Pantynegros pensa dele. — Bom, não te dei muitas opções, certo? Teimoso, assim sou eu. Ela sorriu. Ele então esticou sua mão. — Amigos? — disse. Ela olhou sua mão, depois seu rosto, e sorriu. — Amigos — disse, e estendeu sua mão para a dele. Ele planejava sair. Mas algo sobre sua fria e fina mão o fez mudar de ideia. Tinha dedos longos e magros, piscou e pensou por um momento, só um momento, que estava segurando a mão de Julie. Não teve uma relação com ninguém desde que Julie morreu. Julie que morreu e não podia, não podia, voltar. A fúria brotou em sua mente. Ainda segurando sua mão, se inclinou para mais perto e sussurrou em seu ouvido. — Layman está te pegando, certo? Então, ela o olhou, com seus olhos mais felinos do que nunca. A cor voltou ao seu rosto e tentou puxar sua mão, mas ele é muito forte. — Ao menos, espero que o garoto fraco esteja te pegando. Por que se descubro que você me rejeitou por uma carne morta, eu me decepcionarei muito. Eu posso ficar tão malditamente decepcionado que a garota que fichei como ninfomaníaca em segredo seja, na verdade, uma necrófila em segredo. Você sabe ao que me refiro? E pessoas, mortas ou não, podem ser feridas.
69 Ela não afastou seu olhar, embora ele esteja apertando sua mão forte o suficiente para tirar lágrimas. Depois de um tempo ele lhe lançou um beijo e ficou de pé, dando-lhe uma gentil carícia em sua mão enquanto a soltava.
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CAPÍTULO 8 Os golpes não param, pensou Adam ao ver como Stavis desequilibrava Williams com um golpe surpresa que teria deixado sem respiração qualquer garoto vivo. Williams perdeu o equilíbrio e Stavis utilizou seu impulso para derrubá-lo com força. Williams não deixou escapar nenhum som; nunca o fazia. O jogo, um passe falso de halfback 12, havia acabado antes do golpe de Stavis e não se desenvolvia próximo de Williams. Adam notava com um aperto no peito que nada tinha haver com suas condições físicas, sim com as mentais que havia desenvolvido durante o verão com o mestre Griffin. Fechou os olhos e pode vê-lo no primeiro dia de aula, com a cabeça raspada refletindo a brilhante luz e com um sorriso apenas perceptível debaixo de seu grosso bigode negro. — Todos nós temos poder. — disse a seus estudantes. Adam comprovou que o mestre se movia pelo colchonete com agilidade, quase como um gato; era como se deslizasse sobre as pontas dos pés. — Todos nós. – seguiu olhando-os um a um. — O importante é o que fazemos com esse poder. Então pediu a Adam que lhe fizesse um combate. O mestre Griffin era mais baixo e compacto que Adam, e muito mais rápido. O garoto foi por ele, confiante, já que fazer combates era o seu forte. Apontou em baixo, para lhe golpear nas pernas. De repente se viu voando pelo ar, ainda foi um vôo curto, porque Griffin o jogou sobre o colchonete, amortecendo sua queda de algum modo. Depois, em vez de soltá-lo, seguiu-lhe agarrando o braço com uma mão, enquanto retirava a livre, disposta para lhe dar um golpe com a palma aberta. Adam poderia romper o nariz 12
O Halfback (HB) é conhecido por ser o Running Back que tradicionalmente carrega a bola. É ele quem toma a responsabilidade de fazer a maior parte das jogadas de corrida do time de ataque.
71 ou esmagar a cara com um só golpe rápido. Contudo, se limitou a lhe dar um golpezinho no peito antes de ajudá-lo a se levantar. — Adam tem poder. ― disse o mestre para a classe. ― Eu tenho poder. Todos o têm. O que vamos fazer com esse poder? Aquele havia sido o único contato físico da primeira sessão; mestre Griffin havia jogado ao solo a seu aluno maior e mais atlético como se jogasse uma meia velha na cesta de roupa suja. Havia passado o resto da classe ensinando-os boas maneiras e falando sobre a responsabilidade pessoal. — Layman. — lhe gritou o treinador Konrathy. ― Acorda e põe sua bunda na linha. Adam obedeceu e pôs sua bunda na linha. Enquanto o fazia, era como se pudesse ouvir a tranquila voz do mestre perguntando-lhe até que ponto estava disposto a jogar essa mesma bunda por suas crenças. O garoto morto se levantou como sempre, devagar, ainda não parecia ferido depois do golpe ilegal de Stavis. Adam tentou meter-se em sua cabeça. Que estava passando ali dentro, se é que passava algo? Porque Williams estava ali? Queria provar algo? Era amor ao jogo? Dava-se conta de que alguns de seus companheiros faziam todo o possível para tirá-lo da equipe..., para sempre? Não parecia ter muito sentido que se entregasse voluntariamente a aquele castigo. E outra ideia se meteu na cabeça, como se fosse chuva através das gretas de um telhado: de verdade Phoebe sentia algo por ele? Como podia ser atraente para ela? Como demônios, podia interessá-la daquela forma um garoto morto? Devia de ter os fios cruzados em alguma parte de sua cabeça. De volta ao vestiário, o repentino silêncio lhe disse que Williams estava passando por ali. O garoto não tomava banho, ao menos não com o resto da equipe nos chuveiros comuns. Não suava, e era tão fácil remover a lama e grama do rosto em casa como nos chuveiros. Adam tirou as ombreiras e observou dissimuladamente a reação de seus companheiros ao passo do morto. A hostilidade descarada do resto da Equipe da Dor era evidente: Martinsburg sussurrava algo a seus tiranos amigos, Stavis e a Harris Morgan, que parecia ser o primeiro na lista de recrutas depois de que Adam renunciou a seu posto. Quase toda a equipe se virou, como se a presença do garoto morto fosse um segredo vergonhoso que ninguém queria reconhecer. Denny Mackenzie, ao que
72 Williams lhe havia salvado o pescoço bloqueando a carga lateral Martinsburg, fingia estar absorto no que dizia Gary Greene. Williams abriu seu armário, tirou a mochila e se dirigiu as escadarias. Tommy Williams jogava para os Oakvale Badgers, mas ninguém parecia gostar da ideia. Konrathy estava apoiado na jamba de seu escritório, observando como o garoto morto caminhava lentamente para a saída. Thornton Harrowwood tinha o armário que estava mais próximo da porta. Estava sentado no banco de madeira com uma toalha úmida rodeando a cintura, guardando o uniforme sujo em uma enorme mochila verde que era quase tão grande como ele. Olhou Williams ao passar e lhe ofereceu a mão entendida, como se fosse a coisa mais normal do mundo; Williams bateu com uma palmada suave, sem deixar de caminhar. Como se fosse o mais normal do mundo. Adam sorriu, mas Konrathy chamou Thornton em seu escritório. Adam estava tão concentrado em tentar averiguar do que falavam do outro lado da porta que quase não se deu conta que seus antigos companheiros da Equipe da Dor saíam do chuveiro e seguiam Williams.
— Está falando com a zorra do terror. — disse TC enquanto cruzavam o estacionamento, em direção à floresta. — Isso não muda nada. — disse Martinsburg. Estava dando voltas ao bastão de alumínio com rápidos giros de seu pulso. — Harris, você se ocupa dela. Se tentar fugir ou interferir, detenha-a. — Ahhh, cara. Eu não vou bater em uma menina. — Te mandei bater? Apenas a detenha. — Martinsburg apontou o bastão para o peito de Morgan Harris. Pete pesava vinte quilos a mais do que Harris, de modo que este deu um passo para trás, ainda mais pela expressão de Pete que pela batida. — A deter, eu entendi. — disse ele.
73 — Se você vai fugir como Layman, é melhor você me dizer agora. Harris sacudiu a cabeça. Martinsburg olhou de novo para sua presa, que tinha virado e estava andando no bosque com a Senhorita Pantynegros. — O que vocês acham que ela vai fazer no bosque? — perguntou, cuspindo entre os dentes. ― Ajudá-lo a tirar as ombreiras? O garoto morto o havia deixado sem respiração nos treinos. Pete estava a ponto de dar com o ombro no quarterback quando o morto se aproximou por seu ponto cego e o atacou deixando-o sem ar nos pulmões. O Zumbi havia se posto de pé sobre ele, enquanto ele, de boca aberta, tentava respirar de novo. O morto o olhou, e Pete sentiu um momento de pânico baixo a fria olhada cinza que surgia do capacete. — Agora sabe o que se sente quando está morto — ouviu a voz do Zumbi dentro da cabeça, e lhe pareceu detectar um pequeno tic em um dos músculos da boca. — Você gosta? Williams o deixou sobre a grama. Pete recuperou a respiração pouco a pouco e, durante todo aquele processo, não pode esquecer a imagem do Zumbi rindo dele. A imagem lhe dava medo, mas o medo só servia para irritá-lo ainda mais. Ninguém, nem vivo nem morto, ria de Pete Martinsburg e saia ileso. — Vamos continuar o caminho e, quando estivermos perto nós nos dividiremos — disse ele. — O quê? — perguntou Stavis, olhando para o seu uniforme, sujo e fedorento. — Você poderia ter tomado banho pelo menos. — disse Pete. — Que fedor. — Harris riu, balançando a cabeça. No estacionamento havia algumas crianças com seus pais, mas ninguém parecia prestar atenção. Pete concordou com a cabeça, olhando seus dois capangas. — Ok; aqui vamos nós. ― o seguiram para dentro da floresta.
74 Phoebe não estava certa de como traria à tona o tema do poema, mas ele a salvou falando primeiro. — Eu tenho o seu poema..., no meu armário. — disse ele. — Depois..., percebi que..., talvez seja um problema. Phoebe balançou a cabeça e tentou pensar em como responder. Tinha graça que a clareza do discurso de Tommy, que falava fluentemente com mais fluidez que os outros Deficientes Vitais a deixasse sem saber o que dizer. — Não, eu acho que me surpreendeu. — Sua amiga, a do cabelo rosa. — Margi. — disse Phoebe, rindo. — Não pensei nas..., consequências. — disse Tommy, tornando a dizer todas as sílabas de uma vez. — Todos..., sabem. Desculpe. Phoebe balançou a cabeça e se aproximou dele. O menino não cheirava a alguém que ficou duas horas metido em um treino de futebol, nem como uma pessoa morta, para falar a verdade. Só lhe chegava o cheiro fresco das árvores de pinhos e folhas de outono. Sua pele era macia e branca, era como uma escultura que tinha recobrado a vida, a versão idealizada de um jovem, sem defeitos ou imperfeições. — Não se desculpe. — disse a ele, tocando seu braço, que parecia de pedra polida. — Queria que ficasse com ele. Ele assentiu com a cabeça quase imperceptivelmente, sem tirar dela aqueles olhos sem fundo. Ele tinha um olhar desconcertante, por assim dizer. Não te seguia quando falava, quando piscava, coisa que não acontecia muitas vezes, dava tempo de contar até três antes de as pálpebras se tocassem. Tommy levantou a mão como se quisesse tocar-lhe o rosto, e Phoebe pensou quão delicado foi quando ele lhe tirou uma folha do cabelo. Surpreendeu-a voltando-se de repente. — É difícil para os..., dois. ― disse ele. ― A amizade..., sempre é. E mais... Phoebe não conseguiu ouvir o resto da frase, porque naquele momento, duas figuras agachadas correram para Tommy. Um deles empunhava um bastão de beisebol, que deu o garoto no peito, batendo-o contra um tronco podre. O capacete saltou duas vezes e caiu no chão perto de Phoebe, que chorou quando viu que uma terceira figura tomou-a por trás e segurou seu pescoço com um bastão. — Shhh. — disse Harris Morgan, sorrindo.
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— Você gosta de esportes, é, Zumbi? — disse Martinsburg. Deixou cair o bastão, que fez um barulho assustador. Phoebe não conseguia ver onde.
Deu-lhe um golpe e os dois caíram, mas acabou deitado de boca aberta, vendo como os ramos das arvores davam voltas em um caleidoscópio de colores outonais. Apenas se deu conta que Harris se levantava, entre palavrões, lambendo o lábio inferior. Então, novamente ouviu o novo som do bastão de Martinsburg ao cair Não foi fácil se sentar, mas ele fez. Martinsburg, sorrindo, fez um gesto para Stavis para que provasse e batesse em Tommy. Phoebe tentou se levantar, mas Harris a deteve colocando a ponta do bastão no peito e ordenou-lhe que se sentasse, sem deixar de xingar. Ela se confortou ao ver que lhe havia tirado sangue ao golpeá-lo com o punho no lábio. Viu Stavis levantando o bastão sobre a cabeça com ambas as mãos. — Não tem ideia do erro que acaba de cometer. A voz profunda, e tranqüila, pertencia a Adam. Phoebe se voltou e o viu no caminho que haviam chegado Martinsburg e seus amigos. Falava com Harris, mais também se voltou para olhar os demais. — Não se meta Layman. ― lhe advertiu Martinsburg, Stavis baixou o bastão e analisou a nova ameaça. Phoebe se deu conta de que era maior e mais pesado do que Adam, ainda não tão alto nem tão rápido, mas supôs que dava na mesma, porque Stavis levava um bastão de beisebol. — Me meto. — respondeu Adam, e deu dois passos adiante, diminuindo a distância. — Te disse que escolhesse uma equipe, garoto fraco. — Pois suponho que já o fiz. ― respondeu ele, sem deixar de se aproximar de Pete.
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— Seria uma pena que machucasse o joelho. ― disse Martinsburg, mas com uma voz aguda e sem a confiança, diferente da que tinha mostrado antes do aparecimento de Adam. — Como aconteceu com seu amigo coxo, Manetti. — Uma pena. — repetiu Adam; estava a meio metro de Pete quando Harris soltou o bastão e se lançou sobre ele. Phoebe gritou para lhe advertir, enquanto corria para pegar o bastão, mas Adam levantou o pé esquerdo e chutou Harris em cheio no peito, puxando-o para trás. Contudo, Stavis não lhe importava tanto como Harris Morgan golpear com um bastão a um companheiro de time, porque justo quando Phoebe se virava, aproximou-se e bateu em Adam no estômago, deixando-o de quatro. Stavis se moveu como se pensasse voltar a golpeá-lo, e ela gritou, lançando-lhe o bastão que Morgan havia soltado; Stavis o esquivou sem jeito, pois esteve a ponto de cair de costas. Phoebe se levantou e enfrentou os dois, enquanto atrás de Martinsburg, Tommy fincava o joelho no solo. Pete captou sua reação e se voltou para o garoto morto. — Fique onde está se não quer que estoure sua namorada a paus. — lhe disse, depois a olhou e cuspiu no chão. — Pode ser que eu o faça de todos os modos. Phoebe viu que Tommy olhava seus atacantes e dava uma de suas piscadas de três segundos. Depois baixou a perna e se ajoelhou na suave terra do bosque. — Sim, isso garoto morto, pode ser que ela não volte. — seguiu Martinsburg, fazendo girar o bastão. Havia tanto ódio naquela voz que Phoebe quase podia sentir isso. Stavis se colocou entre ela e Martinsburg, Adam tinha náuseas. Harris grunhia, mas o ouviu começar a levantar-se. Tommy olhou para Pete, e Pete veio até ele, preparando o bastão. A primeira figura que saiu da floresta era do tamanho de Adam. Para Phoebe, que tinha a cabeça a mil por hora, lhe pareceu se materializar do nada. Atrás das árvores e arbustos surgiram duas figuras (a garota de cabelo platinado que gostava de saias curtas e um cara de cabelo branco com um fio vermelho desbotado), depois mais, até que foram seis pessoas ao redor. Harris, ainda sem seu bastão, e esfregando o peito, como se quisesse remover a marca do sapato de Adam fez outro comentário quando a sétima figura apareceu detrás dele, no caminho.
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Dava calafrios em Phoebe o silêncio com o que os recém chegados haviam aparecido; e sentiu mais calafrios ainda ao ver que outra figura aparecia para se colocar entre Stavis e ela. — Colette? — sussurrou. Martinsburg e seus amigos se agruparam, sem saber bem como reagir ante a nova mudança dos acontecimentos. Havia oito garotos no total, rodeando-os, imóveis como lápides. O gigante, de movimentos lentos, ajudou Tommy a se levantar. Tommy lançou a Pete um olhar que, ainda inexpressível, era uma ameaça inconfundível. O menino estranho se endireitou, e Phoebe viu que era inclusive mais alto que Adam. Erguia-se sobre Stavis e Pete igual às arvores cinzas que os rodeavam; a lua recém saída lançava sua sombra sobre eles, como se fossem uma mortalha. — Pode..., ser..., que..., não..., volte... — disse ele, sua voz cheia de força. O círculo de garotos mortos começou a se aproximar. O gigante falou e todos deram um passo para frente, fechando o cerco. Harris foi o primeiro a escapar, mesmo Martinsburg e Stavis o seguiram rapidamente. Phoebe, com os olhos arregalados, pensou ter visto um sorriso nos lábios de Tommy, mas o momento passou. Correu para Adam, que ainda estava tentando se livrar dos efeitos colaterais do bastão no estômago. — Você está bem? — lhe perguntou, agachando-se ao lado dele. Ele tinha um pé quebrado, além de galhos e folhas por toda parte. Explicar aos seus pais seria divertido. — Como uma Ro-sa. Os meninos mortos começaram a dispersar em silêncio, arrastando os pés de volta à floresta, por onde cada um tinha chegado. Um deles, o garoto de cabelo vermelho, deixou escapar um estranho som agudo, e Phoebe se deu conta de que tentava rir. A menina de minissaia sorriu e se despediu muito alegre e feliz, antes de pular fora ao longo de um caminho coberto de agulhas de pinheiro.
78 Phoebe procurou Colette com seus olhos e a viu justo quando ela dava a volta para desaparecer na floresta. No final, havia apenas Tommy e o Gigante. — Este é Mal. — lhes explicou Tommy. — É..., grande. — Olá Mal! — o saudou Phoebe, e Mal começou a levantar o braço. — Tommy! Está ferido? Meu Deus, eles estavam te batendo com esses bastões de beisebol! Mal terminou de levantar o braço e moveu três dedos. Phoebe se deu conta que a estava saudando. Tommy moveu a cabeça de um lado a outro. — Os golpes não doeram..., tanto..., como a..., intenção..., dos golpes. — Tommy. — disse ela, e Adam tossiu. — Cuide do…, seu amigo. E… — Tommy fez uma pausa, mas algo fez Phoebe pensar que não era a lentidão de morto que o freava, sim a tentativa de encontrar palavras adequadas. ― Agradeça-o..., por mim. Viu como Tommy se metia no bosque com Mal atrás, como se fosse uma sombra enorme.
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CAPÍTULO 9 Phoebe olhou para a floresta pela suja janela da caminhonete de Adam, pensando nos rapazes e se perguntando de onde haviam saído. Não tinha dormido bem, e Adam levá-la para a escola fazia com que os recentes acontecimentos parecessem ainda mais surrealistas. Ontem à noite, Adam não tinha dito nem duas palavra na volta para casa, e aquela manhã era ela que não queria falar. — Você sabe o que aconteceu na noite passada? — Adam perguntou. — O que foi? Nem sequer conhecia a metade dos rapazes. — Colette. — respondeu ela. O coração estava tão rápido que parecia ter triplicado a dose de cafeína pela manhã. — Colette estava lá. — Sim, Colette. — disse Adam, depois de um momento de silêncio. — E a menina na lanchonete, a reconheci. Mas quem era aquele cara negro tão grande e que lhe sorria? De onde saíram todos? — Eu não tenho ideia. — Você sabe? Alguns estavam assistindo ao treino no outro dia. Não vão a nossa escola, né? — Alguns sim, mas Mal não. — Colette não te disse nada, certo? — Não, não me disse nada. Adam balançou a cabeça, como se entendesse o significado daquilo.
80 — Apenas posso dizer-lhe que foi muito estranho. É como se morassem lá ou algo... Bem, como dizer. — Sem falar que te acertaram com um bastão de beisebol. — disse Phoebe, abraçando-se. — Com um bastão de beisebol, Adam. — Sim. Sim, nunca tinha me acontecido. Isso me deixou sem fôlego. Phoebe olhou-o e viu que seu amigo estava sorrindo, como se tivesse sido uma aventura. — Mmm... Adam, o futebol te deixou insensível? Como você pode falar tão calmamente sobre o que aconteceu? — Não é minha primeira briga. — respondeu ele, encolhendo os ombros. Embora seja a primeira com socos. — Isso é tudo o que tem a dizer? Nós vimos como eles batiam em Tommy. Com socos. Acho que tentavam matá-lo. — Ele já está morto, então... — Adam! — ela exclamou em voz alta o suficiente para assustá-lo. — Você me entendeu! — Ok, ok. Sinto muito. Acho que eu não tinha visto desse jeito. — Poderiam também ter feito mal a nós se os amigos de Tommy não tivessem aparecido. — Eu não acho que teriam feito Pheeble. Penso que... — Então, está bom esmagar um Deficiente Vital? — Eu não quis disse isso. Acho que... — Vamos deixar para lá, ok? — ela disse, virando-se para sua janela. — Desculpe. — insistiu ele, depois de um momento. — Acho que nem sequer pensei sobre a ameaça. É que era tudo tão estranho...
81 Phoebe não respondeu e continuou olhando pela janela. A ela também tinha parecido estranho; conforme passavam os quilômetros, menos teria estranhado se um Deficiente Vital saísse de repente da floresta. — Aliás, o que você estava fazendo lá? — perguntou Adam. — Eu prefiro não falar agora, ok? — respondeu ela, fechando os olhos firmemente. — Podemos deixar para depois? — Claro Pheeble. — respondeu ele, tocando-a brevemente no ombro. — Claro. Phoebe não sabia por que tinha vontade de chorar. Abriu os olhos e viu dezenas de meninos mortos andando pela floresta ao longo da estrada. Piscou e desapareceu. Olhou para Adam, tão forte e seguro como um carvalho. Estava tentando me salvar, pensou, e o sentimento de culpa aliviou a raiva. — Antes tivesse conseguido dormir um pouco na noite passada. Bem o que eu precisava, pensou. — Começo a ter visões. — Engraçado, mas eu dormi muito bem. É a violência, sabe? Ir batendo nas pessoas, vivas ou mortas, é bom para minha paz interior. — Você é um idiota, Adam. — disse Phoebe, mas quando o olhou nos olhos, não pôde evitar um riso nervoso. Ela queria tirar um cochilo rápido na caminhonete quente e segura, mas quando voltou a abrir os olhos, Oakvale High já esperava por eles e pelos alunos que saiam dos ônibus estacionados no portão. Adam encontrou um lugar no estacionamento para alunos e foi para o prédio. Chegaram justo quando Tommy Williams saía do ônibus. Ele usava calça jeans novas, sapatos novos e uma camiseta pólo azul marinho. — Ninguém diria que lhe deram uma surra na noite passada. — sussurrou Adam. — Não. — Phoebe concordou. A verdade era que ele estava com a aparência muito boa. Impecável. Tommy os viu e tentou sorrir. Quando os saudou com a mão, Phoebe esqueceu-se do seu cansaço.
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Margi, que não tinha elegância social nem a compreensão de Adam, começou a incomodá-la quando a viu. — O quê aconteceu, Pheeb? Meu Deus, você está horrorosa. — Obrigada, Margi. Eu sempre posso contar com você para melhorar a minha abalada auto-estima. — Phoebe respondeu, rindo. — Não, realmente. — ela insistiu, rodeando o ombro de sua amiga com o braço cheio de pulseiras. — O que foi isso? Aconteceu alguma coisa? — Sim, uma instantaneamente.
coisa
aconteceu.
—
disse
ela,
arrependendo-se
— O quê? O que foi? — Nada. — disse Phoebe, tentando voltar atrás. — Era brincadeira. Seu armário abriu de primeira; ou melhor; sua sorte estava mudando. — Phoebe, fale comigo. Você brigou com seus pais? Com Adam? Ele quer sair com você? Como Phoebe tinha passado milhares de vezes pelo interrogatório de Margi, sabia que, ao final, chegaria na questão do "menino morto". — Colette..., Deus. Ontem à noite eu vi Colette. A estratégia funcionou; era o único tópico que poderia fechar a boca de Margi, e nem mesmo era mentira. Sua amiga estreitou os olhos sob as pontas rosa de sua franja. — Teremos que falar com ela, Margi. Margi mordeu os cantos dos lábios, o mesmo canto que havia perfurado no verão passado.
83 — Você não podia salvá-la. — disse Phoebe, — Ela não morreu por sua culpa, não é culpa de ninguém. — Margi desviou o olhar, enquanto os alunos passavam em seu caminho para a aula. — Nós não reagimos bem. — Eu sei, eu sei. — respondeu Margi afinal. — Mas teremos outra chance. Podemos... — Eu sei. — disse Margi, levantando a voz. — Eu sei, eu sei, eu sei! Mas não posso fazê-lo agora! Virou-se e afastou-se pelo corredor a toda velocidade. Phoebe a observou, perguntando-se porque havia se empenhado em irritar a todos seus amigos em uma única manhã. — Espera Margi! — chamou-a, correndo para alcançá-la. — Nem mais uma palavra. — Meus lábios estão selados. — assegurou-lhe Phoebe enquanto entravam na sala de aula. Poucos minutos depois, a voz da diretora Kim surgiu nos auto-falantes após os anúncios da manhã para informar-lhes que haveria uma assembléia geral, logo depois do tutorial, e que os alunos deveriam dirigir-se sem fazer escândalo, para o auditório. Margi, que não era das mais silenciosas, aproximou-se de Phoebe e agarrou seu antebraço. Ela usava caveiras rosas sorridentes, pintadas sobre as unhas pretas. — Sim. Nós nos livramos da aula de história! Phoebe sorriu de volta, Margi sempre se recuperava rapidamente das brigas, o que era bom para compensar, tendo em conta o seu temperamento. Soou a campainha e foram para o auditório. Os corredores já estavam cheios de alunos. Phoebe viu a cabeça de abóbora de TC Stavis elevar-se sobre o mar de estudantes. O auditório era o dobro do tamanho que o necessário para o número de matriculas de Oakvale High; Margi e ela acabaram em um par de assentos no centro daquela caverna em forma de vaso.
84 — Desce até as primeiras filas. — o Sr. Allen pediu a elas, sem variar a inflexão de sua voz. — Preencha todos os lugares vazios. Phoebe percebeu que havia alguns assentos vazios em torno dos poucos garotos mortos que estavam espalhados pelo auditório. — É pela angariação de fundos? — Margi perguntou. — Espero que não. Se assim for, espero que não queiram vender velas. Quem vai querer comprá-las? Por quinze dólares? Para Phoebe não parecia que tivesse nada a ver com as velas. Viu que a diretora Kim, alegre e enérgica, com sua roupa cor pêssego, conduzia duas pessoas ao palco. A primeira era uma menina vestida com uma roupa azul, era loura, usava os cabelos em um simples rabo de cavalo e tinha óculos de aros escuros e lentes grossas. Uma mulher linda. Ela parou na beira do palco para ajudar seu acompanhante, um frágil e velho homem que segurava seu braço, enquanto o Sr. Hill, o professor de ginástica, ajudava-o pelo outro lado. Para Phoebe era fatal adivinhar a idade das pessoas com mais de vinte anos, mas calculava que aquele homem estaria com uns oitenta. Ele virou-se brevemente para a platéia enquanto subia muito lentamente as curtas escadas, e para Phoebe pareceu familiar o nariz vincado e o cabelo branco penteado. — Quem é o vovô? — Margi perguntou. Como não conseguiu identificá-lo, balançou a cabeça. A diretora Kim pediu silêncio e apresentou os desconhecidos. — Hoje temos entre nós duas pessoas que dedicaram suas vidas a promover a diversidade. Antes dos acontecimentos dos últimos anos, o termo diversidade frequentemente usava-se para descrever as diferentes culturas, religiões, etnias ou orientações sexuais. Hoje, o termo também pode aplicar-se aos diferentes estados do Ser. Alish Hunter e sua filha Angela criaram a Fundação Junter para o Desenvolvimento e Compreensão das Pessoas com Diferente Fator Biótipo e hoje eles estão aqui para falarmos sobre uma excelente oportunidade para os alunos desta escola. Por favor, vamos receber Angela Hunter com aplausos. Os aplausos começaram com pouco entusiasmo, mas aumentou de volume quando os homens do público, com os hormônios alterados, perceberam como Angela Hunter era bonita. Com aquele estudado aspecto de rato de biblioteca, que fez Phoebe se lembrar de uma jovem professora de um vídeo-pesado dos anos
85 oitenta, que rasgava a roupa que a limitavam enquanto começava o solo de guitarra, para revelar um biquíni rosa chiclete e um incrível bronzeado. A Srta. Hunter sorriu formando covinhas, quase um sorriso cúmplice, o que sugeria que havia calculado exatamente a resposta da multidão. — Obrigada, diretora Kim. — disse. — E obrigada, estudantes de High Oakvale, por sua atenção e por me permitir falar-lhes hoje sobre as pessoas com diferente fator biótipo. Nós, os membros da Fundação Hunter; utilizamos a expressão "Diferente Fator Biótipo” para nos referir àqueles aos que vocês e muitos outros chamam Zumbis, cadáveres, cabeças mortas, os não-mortos, comida para vermes, monstros, mortos-vivos, os filhos de Romero e outros apelidos pejorativos projetados para machucar e marginalizar. — Buf. — sussurrou Margi. A inquietude hormonal gerada pela Srta. Hunter desapareceu graças à velocidade e sensatez com a qual havia jogado uma granada mental na sala. Phoebe percebeu que quase todos os alunos estavam tão quietos como... bem, como uma pessoa com diferente fator biótipo. — Na Fundação Hunter nós acreditamos que até o termo “Deficiente Vital", mesmo sendo criado com a melhor das intenções, é pejorativo já que implica em que, as pessoas que apesar de não estarem vivas, continuam entre nós, estão quebradas ou defeituosas. Da mesma forma que o termo "deficiente" acabou considerando-se um insulto às pessoas com capacidades diferentes, o termo Deficiente Vitais também é um insulto para os que levam vidas com diferente fator biótipo. No entanto, na Fundação Hunter nós acreditamos que, para o diálogo sobre a compreensão e a integração das pessoas com diferentes fatores biótipos, seja suficiente para definir os seus termos. Uma coisa é criar a linguagem apropriada para o discurso e outra desenvolver a cultura até alcançar a aceitação e acreditamos que a forma certa de alcançá-lo é utilizando a ciência, tanto a ciência tradicional como as ciências sociais. — O queee? — comentou Margi, mas Phoebe mandou-a se calar. — Acreditamos que as pessoas com diferentes fatores biótipos estejam, na verdade, vivas..., mesmo que ninguém ainda saiba como isso é possível. Parte do nosso trabalho na Fundação consiste em descobrir como funciona uma pessoa com diferente fator biótipo, do ponto de vista biológico. No entanto, queremos também descobrir como eles funcionam a partir de uma perspectiva psicológica. Essas pessoas, por seu fator biótipo, pertencem a um grupo cultural muito reduzido. Eles
86 são uma verdadeira minoria, e a condição de minoria tem, sem dúvida, umas profundas implicações psicológicas. Psiquiatra para os não-mortos; pensou Phoebe. — Outra das funções da nossa Fundação, e a nas quais vocês mais podem nos ajudar, é usar os resultados dos nossos estudos e programas de maneira prática. Nosso objetivo é a integração plena das pessoas com diferente fator biótipo na sociedade. Sonhamos com um mundo em que eles possam caminhar por uma rua movimentada sem medo. Entendemos que, para realizar o nosso sonho, também as outras pessoas dessa rua movimentada devem ser capazes de andar por ela sem medo de seus concidadãos. Para isso, pedimos voluntários para participar de nosso laboratório de treinamento. Seu Instituto é único em Connecticut, já que têm o maior índice de pessoas com diferentes fatores biótipos, portanto, vocês têm tanto a responsabilidade quanto o privilégio de ajudar a ensinar ao resto do país e do mundo que as pessoas com DFB têm para oferecer, e vice-versa. Damos a vocês a oportunidade de aprender mais sobre vocês mesmos e sobre aqueles que não são como vocês. A Fundação Hunter, mesmo que conte com uma economia sólida não desfruta de um grande apoio oficial. A questão dos direitos das pessoas com DFB continua sendo uma bomba política. Compreendemos que unir-se a nós exige certo grau de coragem e força emocional, mas os que estiverem interessados em adotar uma atitude social positiva, com o risco de atacar as normas da sociedade, descobrirão que trabalhar conosco pode ser uma experiência muito gratificante. Temos alguns amigos no campo político e temos tentado a homologação do nosso programa de estágio. Os que se candidatarem receberão crédito de nível avançado, sempre que prestarem toda a sua atenção para o programa. Ela fez uma pausa para que a informação fosse assimilada. Phoebe se perguntou se bastaria a isca de créditos para interessar a alguém. Para muitos dos estudantes na platéia esse assunto os revoltava, então olhou ao seu redor para ver o que os estudantes com diferentes fatores biótipos pensavam sobre o assunto. — As práticas têm duas partes. Em primeiro lugar: vocês teriam que trabalhar. Contamos com vários cargos que precisamos cobrir na Fundação: administração, manutenção e segurança. Será pago por seu tempo. Em segundo lugar: vocês vão participar de uma reunião semanal focada no tema que nos ocupa, em que os estudantes de fator biótipo tradicional encontram-se em uma discussão moderada com os estudantes com DFB. O objetivo será sempre a aceitação; entendemos que o caminho para a aceitação só pode ser atingido graças a compreensão mútua. — fez uma pausa, apreciando o silêncio da sala. — Alguma pergunta?
87 Levantaram-se poucas mãos. Angela sinalizou para uma das primeiras filas. — O que você quer dizer com Diferente Fator Biótipo? Está dizendo que as pessoas mortas estão vivas? Phoebe não via a menina que havia feito a pergunta, mas, sim o sorriso irônico da Srta. Hunter. — Não. — respondeu. — Estou dizendo que eles têm um diferente fator biótipo..., que não vivem da mesma maneira que você ou que um cogumelo, por exemplo. — Phoebe sorriu, e os garotos mais inteligentes da escola riram. — A verdade é que não entendemos a biologia das pessoas com DFB. É um dos campos que a nossa Fundação pretende explorar. — Por que apenas os adolescentes voltam convertidos em Zum... Em pessoas com Diferente Fator Biótipo? — Biótipo. Nós ainda não sabemos, nem tampouco por que o fenômeno só parece ocorrer entre os adolescentes americanos. Sem dúvida, certamente que isso nos dá uma pista, uma das teorias mais populares afirma que os processos de imunização pelos quais passam os adolescentes americanos disparam de alguma forma o processo. A Srta. Hunter sinalizou com a cabeça para uma garota que estava nos assentos próximos dianteira da sala. — Meu pai diz que não é natural que as pessoas voltem da morte. Diz que na Bíblia fala que os mortos se levantarão de seus túmulos, e que isso significa que o mundo vai acabar em breve. A Srta. Hunter franziu a testa, mas para Phoebe pareceu que era mais por concentração do que por chateação. — Com todo o devido respeito pelas crenças de seu pai. — respondeu ela, sem sair do tom. — Em nossos exaustivos estudos não descobrimos nada que sugira que o fenômeno das pessoas com DFB seja um sinal do Apocalipse. Naturalmente, podemos estar errados, mas nós preferimos considerar o assunto como um enigma científico, em vez de um dilema metafísico. Houve um braço pálido entre os poucos levantados e, quando a Srta. Hunter sorriu e o sinalizou, a pergunta demorou a chegar. Phoebe notou que Margi prendia a respiração ao seu lado. Colette.
88 — Também..., podem..., entrar..., pessoas..., mortas? Phoebe pensou que todos os comentários de Colette depois de sua morte cabiam em um único Post-it. A resposta de Angela foi efusiva. — Claro que sim. Como eu disse, Oakvale High tem a honra de ser a primeira Instituição do Estado a criar um programa de estudos sobre as pessoas com DFB. Acho que a experiência será mais gratificante para todos se contarmos com bastante participantes dessas características. — centrou-se em Colette enquanto falava, como se o calor do seu sorriso pudesse devolver-lhe um pouco de cor as suas pálidas bochechas mortas. — Acho que temos tempo para outra pergunta... Sim, o de suéter azul. — Quanto; vocês pagam? — Com certeza você vai ganhar mais no shopping. — a Srta. Hunter respondeu sorrindo. — Mas as práticas educativas serão melhores para a sua solicitação à universidade do que um trabalho de tempo parcial vendendo rolos de canela em Cinnabon13. A diretora Kim se juntou a Angela no palco. A convidada esperou até que acabassem as risadas educadas e disse: — Obrigada a todos por nos dar a oportunidade de falar aqui hoje. Espero ver muitos de vocês na Fundação. A diretora Kim começou a aplaudir e permitiu que os alunos fizessem o mesmo, com relutância, durante alguns minutos antes de falar sobre o funcionamento do processo de candidatura, os requisitos e o número máximo de participantes. — A Srta. Hunter e eu entregaremos os pedidos em frente ao palco, ou, se vocês preferirem, em meu escritório. Tem que devolvê-los antes de sexta-feira. — Bem, apesar de tudo, foi melhor do que história. — comentou Margi. — Pena que não perdemos também inglês. Phoebe..., aonde você vai? Phoebe olhou-a, mas manteve silêncio e se juntou as poucas pessoas com diferente fator biótipo que caminhavam em direção contrária a maré de alunos ansiosos em sair do auditório.
13
Os Cinnamon Rolls ou Cinnamon Buns são muito conhecidos nos Estados Unidos e consistem num rolo de massa lêveda adocicada, recheado com nozes e canela.
89 Viu Tommy, Colette, o menino que tinha visto na floresta na noite passada (Evan) e alguns outros. Adam esperava no final de uma fileira de assentos. — Você vai se inscrever? — perguntou-lhe Phoebe. — Sim, e você? — Ahã. Não havia muitos interessados, mas isso não fez com que vacilasse o quente sorriso de Angela Hunter ao entregar-lhe a inscrição, que consistia de três folhas de papel presas com um grampo cinza. — Poderia levar dois? — perguntou para a cientista. —Talvez eu possa convencer minha amiga a participar. — Leve um bloco inteiro. — respondeu a Srta. Hunter, entregando-lhe mais cópias. — Eu não acho que precisaremos de todas elas. Phoebe passou por Colette no caminho de volta, e Colette pareceu vê-la pela primeira vez desde sua morte. Ela deu a impressão de que tentava sorrir.
Pete Martinsburg não sorria. Ele tinha passado toda a reunião olhando para a loira sexy. Não havia dormido bem desde o fiasco na floresta e, quando conseguia dormir, sonhava com Julie, mas não com a Julie do amor adolescente, os gelados copos de sorvete e os treze anos, e sim com a Julie morta e de volta à vida. Sonhava que passeava com Julie de mãos dadas, mas na realidade não era a mão de Julie, mas a de Tommy Williams. — Ela não pode voltar. — dizia-lhe Tommy no pesadelo. Mas, no sonho, era Pete que se movia lentamente; o Tommy do pesadelo entrou rapidamente no carro que Pete tinha estado dirigindo por todo o verão. O carro em que ele nunca tinha sentado com seu pai.
90 — Agora você já sabe como é... — ouviu dizer a fria e vazia voz em sua cabeça, enquanto o Zumbi arrancava com o carro. — ...estar morto. O carro acelerou a velocidade da luz até uma parede de tijolos que havia surgido do asfalto e se quebrou formando uma nuvem amarela, que explodiu em chamas; Pete acordou com os gritos de Julie e o riso do menino morto ecoando em sua cabeça. Mas, obviamente, Julie, a Julie real, não a Julie cinzenta de olhos vazios que caminhava por seus sonhos, não tinha conseguido gritar. O simpático pai de Pete tinha-lhe dado a notícia com seu tato habitual, pelo telefone, com um continente entre ele e seu filho. Ele havia ligado no Natal, e soltou logo depois de Pete tentar lhe contar que tinha sido um herói futebolístico naquela temporada, os pontos e as intercepções que ele havia conseguido para os Badgers.14 — Ah, ei, Pete. — disse-lhe seu pai. Pete se lembrava da conversa com todo requinte de detalhes, como lembrava todas as conversas que teve com seu pai após a separação. — Ei, lembra aquela garota, Julie, com a que você brincava neste verão? — brincava, como se tivessem brincado às escondidas. — A filha da Marissa? Lembra-se da Marissa, a mulher com a qual saía? — Pete se lembrava dela e seu medo crescia. Seu pai só dava boas notícias quando não dizia nada. — Bom, pois é; sua filha, Julie, morreu duas semanas após voltar para sua mãe. Um golpe. Ela teve um ataque de asma enorme. Dizem que o que desencadeou foi uma picada de aranha ou algo assim. Um golpe. Observou Angela Hunter rir com Layman e Pantynegros, e a caneta com a qual ele tinha estado tamborilando nas costas da cadeira na frente dele, quebrou em sua mão, derramando uma grande bolha de tinta azul. Ele limpou a tinta do assento ao lado. Seu pai não tinha nem ideia do que Pete sentia por Julie, como não tinha nem ideia de que Pete nunca voltaria a sentir nada assim por ninguém. A triste história de Dallas Jones, o primeiro Zumbi, chegou poucas semanas depois que seu pai lhe deu a notícia da morte de Julie. A princípio, Pete havia secretamente se apegado à esperança de que Julie regressasse, mas, quando não o fez, também não se surpreendeu. A pessoa nunca ia completamente da vida de Pete, mas tampouco – voltava – de verdade. 14
Nome do Time. Significa Texugos.
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Sua mão estava azul desde a base do dedo mindinho até o pulso. Os alunos tinham começado a sair do auditório, mas não Morticia Pantynegros, que ainda estava com a loira sexy, tentando entregar formulários de inscrições. Phoebe tinha algo que lhe lembrava Julie. Não tinha certeza do por que Pantynegros provocava-lhe aquela sensação. Julie não tinha absolutamente nada de gótico, nem usava vestidos e botas. No entanto, havia algo... uma expressão, um sorriso. Alguma coisa. Ficou olhando para Phoebe por um tempo e depois foi lavar as mãos no grande banheiro que havia próximo ao auditório. Pôs a água tão quente quanto pôde, jogou seis jatos de sabão rosa para mãos nas palmas e esfregou bem. Então abriu a porta do banheiro e ouviu alguém entrar arrastando os pés. Ele franziu a testa, levantou os olhos e encontrou o rosto cinza azulado de Tommy Williams refletido no espelho manchado. — Pensei que vocês não usariam muito este cômodo — comentou Pete, sorrindo enquanto agitava as mãos na pia. — Tendo em conta que suas “partes” já não funcionam. Não funcionam certo? Observou como Williams abria e fechava os punhos. — Deixe-me..., em paz. — disse o menino morto, e sua estranha voz ecoou nas canos e nos azulejos. — Deixe a... Phoebe..., em paz. Pete pensou em secar as mãos na camiseta do menino morto, mas a ideia de aproximar-se do seu corpo sem as ombreiras e as luvas lhe dava náuseas. — Você é o único que deveria deixá-la em paz, monstro. Tommy deu mais um passo na direção de Pete e Pete se assustou por um segundo, porque a verdade era que não sabia o que poderia fazer se o Zumbi o atacasse ou tentasse pegá-lo. Não o assustava brigar com ninguém da escola, desde Adam para baixo... Desde que fosse alguém vivo, é claro. Já havia tentado uma meia dúzia de maneiras diferentes para feri-lo na prática, mas o Zumbi tinha tirado-o de cima como se fosse uma gota de suor. — Eu sei... o que você está..., pensando. — disse Tommy, levantando o canto da boca, em uma doente tentativa de esboçar um sorriso. — Está pensando..., o que..., faço... , se..., ele me bater? O que..., faço..., se ele..., colocar as..., mãos..., em mim?
92 — Você não pode entrar na minha cabeça. — Pete respondeu, mas viu que Tommy levantava a mão e cobria o interruptor de luz. O menino olhou para a porta, não queria ficar no escuro com o Zumbi, nem naquele banheiro, nem em qualquer lugar, nunca. — Eu já estou em sua..., cabeça. — Tommy respondeu, com um sussurro cortante. Pete sentiu o sopro de ar na bochecha e estremeceu. — Tente o que quiser no treino. Só serve para..., me deixar..., mais forte. Mas não..., ameace..., meus amigos. Embora Pete estivesse prestes a responder, não encontrou palavras para fazê-lo e, então, as luzes se apagaram. Ele jogou seu punho no ar sem bater em nada, e mais outro com o mesmo resultado, depois, cobriu-se, esperando por um turbilhão de socos que não ocorreram. Um segundo depois a porta do banheiro se abriu e o cômodo iluminou-se com a claridade do movimentado corredor. Tateou a parede às escuras e acendeu as luzes antes que Norm Lathrop entrasse. Norm hesitou ao ver Pete, provavelmente se remoendo se devia fugir por onde havia vindo antes que o outro cara pudesse aterrorizá-lo. — Saia do caminho. — disse Pete. Pegou uma toalha de papel do dispenser e enxugou a testa. — Desculpe. — disse Norm, que estava prestes a dar um passo a caminho dos urinóis15. Tenho que fazer algo com esses malditos Zumbis. Pete pensou abrindo a porta do banheiro com um soco.
15
http://www.geberit.pt/geberit/inet/pt/wcmspt.nsf/pages/prod-wcpu-urin-1
93
CAPÍTULO 10
—
Bem. — disse Phoebe, colocando-se no assento da janela. Não havia
muitos estudantes no ônibus, mas Margi e ela costumavam compartilhar um assento duplo. — Bem, o quê? — Bem, o que você acha? — Sobre o quê? — Margi perguntou, estava se fingindo de desentendida. — A reunião, tonta. — Ah, não sei. — respondeu e, em seguida, tirou seu iPod da mochila e começou a revisar a longa lista de bandas. — Eu vou me oferecer. — Phoebe disse com um suspiro. — Se me aceitarem. — Eu já imaginava. — disse Margi. Escolheu uma música do álbum solo de MT Graves, All the Graves are Empty Except Mine16 e aumentou o volume até que as duas pudessem ouvir um fraco gemido sobre o barulho do ônibus. — Vão te aceitar. — Você já imaginava? — Phoebe repetiu, dando com o ombro em sua amiga. — Você e eu contra o mundo, hein, Margi? — Sim. Eu sei por que você tem ficado depois das aulas, Pheebes. Sei que não tem nada a ver com o trabalho de história. — Ah! Mas eu terminei o trabalho.
16
Todos os túmulos estão vazios, exceto o meu.
94 Margi devolveu o toque de ombros, como se agradecesse a ela por não inventar uma desculpa estúpida que envergonhasse a ambas. O olhar de Margi costumava ter um ponto duro, mas naquele momento era carinhoso e parecia assustado. — O que se passa entre vocês dois? Phoebe virou-se para a janela, já haviam chegado às estradas rodeadas de árvores. Não viu nenhum Zumbi balançando-se entre as bétulas e carvalhos (bem, nenhuma pessoa com Diferente Fator Biótipo). — Eu não sei o que acontece entre nós. Não sei se acontece alguma coisa. Há uma ligação, não sei qual. Estamos nos comunicando, e isso não acontece sempre com nenhum de nós dois, com ninguém, esteja vivo ou morto. — É o que temos escolhido; mais ou menos. — Margi coincidiu. — Mais ou menos. Elas ficaram em silêncio por alguns minutos, o que era muito raro em Margi. — Você se inscreverá comigo? — Phoebe lhe perguntou, e Margi encolheu os ombros. — Vamos, Gee. — insistiu. — Somos as irmãs estranhas, certo? — Menos uma. — Margi sussurrou, descansando a cabeça no ombro de Phoebe. — Gee... — Não, eu sei, eu sei. Quem sabe seja bom. Pode ser que eu aprenda a falar com ela ou algo assim. — Com Colette? — Sim, com Colette. — Pode. Pode ser que sim. Isso seria ótimo, né? — Claro. Mas é muito estranho, sabe? Está acontecendo alguma coisa, algo está mudando. Por que não há nenhum rapaz morto no ônibus. Nem Colette, nem seu amigo, nem o outro. Eles não têm um carro. Phoebe olhou em volta. Os meninos mortos nunca perdiam o ônibus de volta. Margi tinha razão, era estranho. — Nem tinha me dado conta.
95 Margi se remexeu sobre seu ombro, como se concordasse. E esfregou os olhos. — Eu não tenho bom cérebro para tudo, você sabe? Eu também vejo coisas. — Eu já sei Gee. — Você me avisará se... Tommy e você se tornarem mais do que amigos? — Eu te avisarei. Nem sequer sei se somos amigos. — Pheebes e Gee contra o mundo, certo? — disse Margi, fungando. — Isso. — afirmou Phoebe, envolvendo-lhe os ombros com o braço. O velho ônibus parou com um grunhido em frente à casa de Phoebe, e Rae, a motorista, anunciou: — Boa noite, senhoritas. Era o que ela dizia sempre que desembarcaram. Rae não discriminava ninguém, despedia-se da mesma forma de todos os estudantes, tanto vivos como mortos. Gargoyle as recebeu na porta, movendo o traseiro com alegria canina quando Margi se inclinou para pegá-lo em seus braços e deixar que lambesse seu rosto. — Tenha cuidado. — Phoebe advertiu. — A maquiagem é venenosa para os cachorros. — Cala a boca grande e pegue alguma coisa para comer. Eu levo o meu menininho bonito na rua. Phoebe ligou o aparelho de som e a casa encheu-se com as músicas de The Empire Hideous.17 Pegou uma cafeteira da geladeira e serviu o café em copos altos com muito creme, muito açúcar e muito gelo, porque era assim que elas gostavam. Havia um saco de batatas fritas, uma caixa de biscoitos salgados e alguns Hummus18. Margi voltou com Gargoyle e começou a cantar com Myke Hideous, sua voz rouca pegava bem com a entonação sombria do cantor. Phoebe sorriu com carinho. — Qual a bebida de hoje? — perguntou Margi, deixando Gar no chão. O cachorrinho foi para o sofá e subiu com um pulo. 17 18
Banda de hard rock que foi criado por Myke Hideous. É um alimento popular em todo o Oriente Médio e outros lugares.
96 — Créme Brulée — Phoebe respondeu, aproximando a bandeja de Margi para que pegasse um dos copos. — Mmmm, está doce.
— Vai ver é por todo o açúcar que eu coloquei. — Sim, boa escolha. Bem, o que faremos, além de..., nos cafeínar? Phoebe levou a bandeja para a mesa de centro e sentou-se ao lado de Gar, que rolou para que esfregasse sua barriga. — Na semana passada, gravei uma coisa. Ocorreu-me que poderíamos vê-lo juntas. — Oh, oh. Meus sentidos aracnídeos19 me dizem que é uma armadilha. — Ow, Margi, estou impressionada. Primeiro; bi-locação e agora clarividência. Seus poderes telepatéticos estão despontando. — É esse vínculo psíquico que compartilhamos, porque, se algo pode ser dito de você, é que você não é previsível. Você ficar caidinha por um menino morto, você não podia prever e nem eu. Phoebe jogou-lhe uma almofada. — O programa foi lançado na CNN. Chama-se: Os Jovens não mortos da América. — Eu começo a ver um padrão nisso. — disse Margi, caindo desajeitadamente ao seu lado, com Gar entre as duas. — Acho que nós não podemos apenas ouvir Empire Hideous e ponto, né? — Não. Hoje vamos desenvolver a nossa consciência social. É alguma coisa de atualidade. Ouvi dizer que as pessoas com diferentes fatores biótipos estão na moda. — Sim, eu também. Phoebe ligou o televisor com o controle remoto enquanto usava o controle do aparelho de som com a outra mão para desligá-lo.
19
Os aracnídeos são as aranhas, ácaros, carrapatos e escorpiões etc.
97 — Se você se dá bem, deveria ter nascido tio. — comentou Margi. — Sou muito bonita. E eu gosto de cheirar bem. O programa começou com uma montagem narrada por alguém que dominava o tom sombrio e monótono. Depois deram um breve resumo do vídeo de Dallas Jones com algumas explicações sobre o início do fenômeno Deficientes Vitais, juntamente com gravações de áudio do Reverendo Nathan Mathers, que parecia pensar que o retorno dos mortos à vida era um sinal claro do Apocalipse. A montagem terminou com o narrador, sugerindo que, como acontece com qualquer nova tendência na sociedade americana, alguém tentaria tirar proveito do fenômeno, depois colocaram um homem bem vestido e com amplo sorriso assinando cópias de um livro chamado: Os mortos não têm vida - O que os pais precisam saber sobre seus filhos mortos. Phoebe esfregou as têmporas. — Poderes telepatéticos em ação. — disse, tentando imitar a voz do narrador: — No que não cabe a dúvida é que o fenômeno dos Deficientes Vitais tem feito tremerem os alicerces da sociedade americana. — E sem de dúvida. — continuou o narrador. — É que a presença dos Deficientes Vitais alterou para sempre o modo de vida americano... Por assim dizer. Margi riu. — Você já viu isso antes, fingida! — Fingida não. — respondeu Phoebe. — Se você visse as notícias de vez em quando, você também poderia prever. E faria voz melhor do que eu. — Falta-lhe a centelha da vida, por assim dizer. — Ele está morto e enterrado, por assim dizer. — Efetivamente, Phoebe tem um vocabulário melhor do que eu. — É assim, Margi, os vizinhos asseguram que estavam chegando. Continuaram bebendo café enquanto começava o vídeo de Dallas Jones. — Eca, que ódio. — disse Margi, conforme avançava a familiar imagem granulada em preto e branco. Dallas Jones entrou na loja, tirou uma pistola do bolso de sua jaqueta de caça e apontou-a para a funcionária. Não se ouvia nada, mas estava claro que ele gritava.
98 Dallas se virou para olhar para a rua, e enquanto o fazia, uma bala o atingiu no peito, levantando uma nuvem de fumaça. O menino foi lançado para trás, a uns cinco metros e meio até dar de encontro com uma prateleira cheia de lanches e uma pirâmide de latas de refrigerante. — Não importa quantas vezes eu veja, eu não me acostumo. — Margi disse. Phoebe assentiu. A imagem do assassinato de Dallas Jones era mais perturbadora do que o que vinha depois, por mais que o depois o trouxesse de volta. Alterou para sempre o modo de vida americano. O homem que havia disparado; o dono da loja; saiu de trás do balcão segurando a mão da funcionária que, além disso, era sua esposa. Ahmad Qurati passaria a vida recebendo críticas pelo risco que correu ao disparar em um ladrão enquanto o homem apontava para a cabeça de sua esposa. Também o criticariam por não aproximar-se de Jones para se certificar de que estivesse morto; o vídeo mostrava como ele saía por onde Jones havia entrado e fechava a porta com chave... Outra ação que não tinha muito sentido. O Departamento de Polícia também havia recebido o seu por demorar duas horas e sete minutos para chegar ao local, apesar dos relatórios deixarem claro que Qurati tinha chamado a polícia uma hora e cinqüenta e três minutos após fechar a porta principal. A CNN pulou a parte da gravação, até chegar ao minuto 109. Jones estava quase escondido pela prateleira de batatas fritas, mesmo que se enxergasse claramente uma perna torcida, parte de um braço e uma poça escura que tinha se estendido sobre o chão durante os primeiros segundos da gravação. No minuto 109, o vídeo voltou à velocidade normal e mostrava como a perna de Dallas se movia. A prateleira caiu no chão, não como se alguém a levantasse e a jogasse, mas sim como se fosse tirada do caminho sem mais nem menos. O braço levantou-se do chão, enquanto, aparentemente, (era difícil saber, porque quase tudo acontecia fora da câmera), Dallas colocou-se em pé. — Meu Deus. — disse Margi. Um minuto depois, Jones apareceu na tela e seguiu caminhando sem levantar as solas das botas de cano alto do chão. A câmera estava apontando para suas largas costas, e percebia-se que a jaqueta estava rasgada e, cheia de penas escuras pelo furo da bala. Caminhou até dar de encontro com a porta de vidro. Não tentou abri-la e, depois de um momento, virou-se e continuou arrastando os pés por onde tinha vindo; em direção à câmera. O narrador começou a falar enquanto avançava o vídeo, contando a triste biografia de Dallas Jones, vândalo adolescente. Phoebe ficou ansiosa, esperando o
99 momento que o havia levado a centenas de teses de doutorados e, quando chegou o momento, a CNN congelou e aumentou a imagem, o que o tornou com o dobro de granulado, mas também duas vezes mais eficaz. Phoebe sempre tinha se perguntado por que Dallas Jones olhou para a câmera no final de sua segunda volta infrutífera pela loja. A imagem cresceu até que seus olhos encheram a tela do televisor, de modo que se distinguiam cada um dos pixels20. — Dallas Jones foi o primeiro. — disse o narrador, e substituíram a imagem dos olhos de Dallas por outras gravações igualmente ruins de outras pessoas mortas, movimentando-se por aí, depois colocaram os relatos de vários repórteres, sem informar in loco21 sobre o retorno de uma dúzia de não mortos. — Não mostram a parte em que a polícia chega. — Margi comentou. Phoebe tinha estudado o vídeo completo; Qurati depois de fazer uma confusão com as chaves abriu a porta da loja, e dois policiais entraram e derrubaram Jones. Quando os serviços médicos chegaram minutos mais tarde, um dos policiais estava coberto de sangue, e não era dele. — Arrependei-vos! — dizia o Reverendo Nathan Mathers. Ele gritava, cuspindo saliva. — Arrependei-vos, por que o fim está próximo. Os túmulos devolvem os seus mortos e, certamente, o Senhor estará em breve, entre nós! — Sinto pena dos que estão na primeira fila. — comentou Phoebe. Margi, ao seu lado, abraçou-se a Gar. — Eu odeio que filmem isso. — disse ela. A imagem seguinte foi ainda mais terrível. O vídeo movia-se como se a câmera estivesse presa a uma criança hiperativa, mas a imagem que oferecia era facilmente distinguida e era aterradora. Dois homens com tambores de gasolina pulverizam com eles uma deficiente vital muito lenta, ao qual primeiro tinham amarrado a um poste de metal cravado no concreto de uma cesta, como a das escolas. A garota ardeu em chamas amarelas e pareceu se agitar com mais força, mas podia ser efeito do fogo que estava ao seu redor. Mathers continuava dando seu discurso de fundo.
20 21
Elemento de (imagem, sendo Pix a abreviatura em inglês para Picture) Significa "no local". Um abraço... Ao vivo, Pessoalmente, no local, etc. Ex: Fui ver a tragédia da TAM in loco.
100 — Meu Deus. — Margi repetiu, e ficaram em silêncio durante o resto do programa, mesmo quando Skip Slydell, o jovem autor, começou a falar sobre como os pais deveriam educar seus filhos com diferente fator biótipo e ajudá-los a integrar-se em uma sociedade que ainda não contava com a legislação necessária para evitar que os queimassem na fogueira.
101
CAPÍTULO 11 Havia treze nomes na lista de estudantes aceitos na Fundação Hunter. Phoebe Kendall era a terceira da lista, logo abaixo de Tommy Williams e Karen DeSonne. Colette ia atrás, seguida de Margi e Adam. Phoebe se virou, muito animada, mas esteve a ponto de topar com os braços de Pete Martinsburg, que a empurrou contra a parede. — Deveria olhar por onde anda Pantynegros. — ele lhe disse ameaçadoramente. Ela carregava livros e ele tinha as mãos livres, a esquerda fechada em punho. — E também deveria ter cuidado com o que faz. As bochechas de Phoebe se esquentaram de raiva e vergonha... E também de medo. No fim, tinha diante dela um garoto que não se importava em bater em um de seus companheiros com um bastão de baseball. Margi já teria lhe arranhado o rosto com as unhas rosa chiclete, bufando como um gato, mas ela tinha medo que lhe fizesse mal e no rosto de Pete via que estava disposto a fazer. — Faz tempo que não via tanta cor em seu rosto. Está assustada, garota morta? — perguntou-lhe, sorrindo. — Faz bem. Phoebe se sentiu encolhendo sob o peso do seu olhar. Usava botas altas até os joelhos, o que seria muito bom se tivesse que golpeá-lo na virilha com elas. Infelizmente, a saia que usava era estreita até os calcanhares e mal lhe permitia andar, então nada de dar chutes. Veio-lhe a cabeça claramente o som do bastão de Martinsburg ao atravessar o ar a caminho da carne de Tommy. Notou que tinha os punhos fechados. Martinsburg arrancou a lista da parede, rompendo o canto que estava preso com fita adesiva; dobrou-a duas vezes e colocou no bolso. — Todos da lista se arrependerão de ter ouvido falar dessa classe. — disse.
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Depois se afastou pelo corredor e Phoebe o observou enquanto lágrimas de frustração se acumulavam nos cantos dos seus olhos. Podia entrar no escritório e contar para alguém o que tinha acontecido; podia procurar Adam, e certamente ele iria conversar com Martinsburg. No final se limitou a secar os olhos e perguntar-se o que faria Martinsburg quando visse o nome de Adam Layman no fim da lista. Margi encontrou Phoebe no corredor. O rubor das bochechas de Phoebe parecia haver desaparecido, por que Margi se comportava novamente como sempre, falando a toda velocidade para contar-lhe a atrocidade cometida pelo senhor McKenna na aula de espanhol naquela mesma manhã; ao parecer havia anunciado um exame surpresa, ou algo parecido. — Por isso se chamam exames surpresa, não? — comentou Phoebe. — Por que é surpresa. — Continuam sem ser justos. Falando de surpresas, quando vão colocar a lista das práticas? Bom, não é que eu queira fazer nem nada, mas sou sua melhor amiga, e acho que ficará bom na solicitação para a universidade. E não serão mais duros com as notas, né? Quer dizer, as notas serão uma formalidade nessas coisas, verdade? Não quero fazer se for me dar uma nota ruim. — Já colocaram a lista. E foi arrancada. — Ah, sim? Quem fez isso? Algum imbecil que não entrou? Bom, melhor me calar, e se eu não tiver entrado? Sabe quem entrou? — Você entrou e, eu também. — Viva. — disse Margi, com falso entusiasmo, batendo palmas para que suas centenas de pulseiras tilintassem seguindo um ritmo suave. — Quem mais? Alguém tão legal como nós? Como se fosse possível... — Tommy, Adam. — respondeu Phoebe, sorrindo ao ver que Margi fazia uma careta. — Colette. Thornton Harrowwood se inscreveu, por algum motivo. Também tem essa deficiente vital... Essa garota com diferente fator biótipo na lista: Karen, a com o sobrenome impronunciável. Só aceitaram treze. — Novamente formamos parte da elite. — respondeu Margi, dando um toquezinho no ombro que Martinsburg tinha acabado de empurrar. — Embora esteja claro que só treze se inscreveram.
103 Os treze tornaram-se doze antes da primeira viagem de ônibus de Oakvale High até a Fundação Hunter, um passeio curto através do bosque próximo a fronteira com Winford. — Eu ouvi que seus pais se negaram em assinar a autorização para que viesse. — comentou Margi sobre a desistência de última hora. — É outra vez clarividência? — perguntou Phoebe. — Ou telepatia? — Quando revela algo que já aconteceu se chama adivinhação. — respondeu Margi, sacudindo a cabeça. — Mas não, na verdade, eu ouvi uma das secretárias da escola dizendo que a Srta. Kim tinha lhe contado. — Bem, que pais mais progressistas. — Vivemos tempos progressistas, Pheebes querida. Na tutoria descobriram que perderam sua sétima aula... Que para Margi era hora de estudo, então ela não gostou muito de ter que ir para uma aula de orientação. Phoebe sentia algo parecido aos dias e horas anteriores ao concurso de talentos do sétimo ano. Às vezes, as mariposas no estômago só serviam para enjoar-se; outras vezes te deixava saber que ia acontecer algo bom. Os garotos mortos estavam esperando quando chegou à biblioteca para a aula de orientação. Os viu através das janelas riscadas, sentados em uma roda irregular de cadeiras dentro da área do lugar de estudo. A diretora Kim esperava junto da porta com uma prancheta. — Olá, Phoebe. — disse, passando a prancheta. — Por favor, assine na linha ao lado do seu nome. Phoebe fez isso. Os garotos mortos já tinham assinado. Como não eram famosos por suas habilidades motoras, as assinaturas eram basicamente letras maiúsculas que pareciam feitas a navalhadas com uma caneta. O nome de Tommy era o único que entrava dentro, das linhas, e as letras eram regulares e de altura uniforme. — Olá, Phoebe — cumprimentou Adam, que a assustou ao tirar-lhe a prancheta. O velho Adam era mais conhecido por sua lerdeza do que seu sigilo, mas lhe encantava dar-lhe sustos. — Sr. Layman, por favor... — começou a diretora Kim.
104 — Assinar sobre a linha pontilhada, sim, senhora. — ele a interrompeu, rabiscando um nome que era muito melhor escrito do que as marcas dos Deficientes Vitais. — Por que não se sentam? Phoebe observou como Adam examinou a sala. Se ele estava inquieto, dissimulava muito bem, embora tenha notado o leve encolhimento de ombros quando fez um gesto para Phoebe para que o seguisse ao interior. Tommy estava sentado em uma das ruidosas cadeiras de madeira da biblioteca, com os ombros para trás e a cabeça reta. Phoebe pensou na última vez que tinha se visto rodeada por Deficientes Vitais, e ela reconheceu alguns: Colette estava sentada em um futon22 acolchoado perto de uma garota de cabelo loiro platinado com mechas; a do bosque. — Olá, Tommy. — disse Phoebe. — Olá, Colette. — cumprimentou com a mão os outros garotos, olhando-os brevemente nos olhos. A garota do cabelo loiro platinado lhe devolveu a saudação quase sem hesitar. — Olá, Phoebe. — respondeu Tommy. — Adam. — Olá, Tommy. Olá para todos. — Adam se sentou na última cadeira verde limão, o que deixou Phoebe com uma das cadeiras de madeira. Sua cadeira rangeu ao sentar-se. Adam riu e ela fez uma careta. Margi entrou no silencioso vestíbulo como um pequeno redemoinho negro e rosa, agitando a saia e movendo as pulseiras. — Oh, meu Deus, foi à aula de história mais longa do mundo. Acho que me transformaram em uma figura histórica no tempo que levou para terminar. Parou em seco, como se percebesse, de repente, onde e com quem estava. Cumprimentou baixinho e suspirou aliviada ao ver entrar Thornton Harrowwood, que chocou os dedos com Adam e Tommy. Houve um momento de tensão em que Tommy ficou olhando a mão de Thorny como se perguntasse para que servia, mas no final bateram as mãos. Thornton havia sido o último a chegar, o que significava que outra pessoa mais havia desistido. A diretora Kim conduziu Angela Hunter e seu pai, Alish, ao 22
http://www.google.com.br/images?hl=pt-BR&q=futon&um=1&ie=UTF8&source=univ&ei=QMGSTJexEYHGlQes6d2nCg&sa=X&oi=image_result_group&ct=title&resnum=4&ved=0CDsQsAQ wAw&biw=1024&bih=520
105 cômodo. A Srta. Hunter usava uma saia azul celeste que chegava a seus joelhos, e Phoebe pensou que aquelas pernas acelerariam o coração até dos mortos. Tommy a observava do outro lado da sala. A cadeira da mulher nem sequer rangeu quando se sentou nela. — Bom. — disse a diretora. — Devo dizer que me surpreendi e fiquei feliz em verificar que temos dois jogadores da equipe de futebol americano no programa. Alegro-me que lhes interesse algo mais do que futebol, e já falei com o treinador Konrathy, então ele sabe que vocês perderão um treino na semana. Adam assentiu; e Thornton se inflou como se tivesse sido nomeado corredor do ano. Phoebe percebeu que Adam não levantava a vista do ponto do tapete e que o contemplava desde que sentou. Ela olhou para baixo. Verde musgo misturado com alguns fios verde escuro. Havia uma mancha que parecia de café perto do pé do futon em que estavam sentadas as meninas mortas, mas Adam não estava olhando para aquilo. — Três. — levantou o olhar. Todos se viram para Tommy, inclusive a diretora. — Aqui há..., três..., jogadores de futebol. — Três. — respondeu a diretora, sorrindo. — Claro que sim, obrigado por me lembrar, Tommy. Em primeiro lugar, deixe-me agradecê-los por nos indicar o que esperamos, seja um programa muito emocionante dentro do sistema escolar de Oakvale. Os Hunters vieram para falar em mais detalhes com vocês sobre o programa e também para deixar claras as expectativas, tanto a de vocês como a da escola da Fundação. — Obrigada, diretora Kim. E, de novo, obrigada por se unir ao programa! Estou ansiosa em trabalhar com vocês! O sorriso de Angela, como suas pernas, podia devolver a vida aos mortos. Margi se agitou no assento ao lado de Phoebe. Alish foi o seguinte a falar, e sua voz era muito apropriada para uma biblioteca: seca, rouca e suave. Ele sorriu, mas seu sorriso não tinha o poder reconfortante como o da sua filha. — Sim. — disse, e Phoebe parece ouvir um S a mais na palavra, como se sibilasse. — Obrigado a todos por decidirem trabalhar com a minha Fundação. Sou Alish Hunter. Espero que o trabalho que farão aqui mude suas vidas e as de todo o mundo, se é possível, tenha um diferente fator biótipo ou não. Estou certo que mudará a minha. — Mais sorrisos dos Hunter. — Tenho aqui seus históricos, mas eu gostaria de ouvi-los. Acredito que alguns são amigos, embora seria interessante
106 para a Fundação que todos nós sejamos. Então, por favor, vamos nos apresentar e, quando fizermos, quero que todos acrescentem, fora seus nomes, um dado pessoal, como nossos passatempos. Começarei eu. Chamo-me Alish Hunter, e eu gosto de colocar um avental de laboratório e fazer experimentos como os cientistas loucos. Aquilo arrancou algumas risadas corteses, sobre tudo de Thornton e Angela, que foi a seguinte. Mas ao contrário do que Phoebe esperava, Angela gostava de correr e não se bronzear em uma tanga na praia da Misquamicut. Thornton gostava de futebol. A garota morta de cabelo loiro platinado se chamava Karen DeSonne (Phoebe tomou nota de que se pronunciava Desoon) e gostava de pintar. Falava quase sem deixar pausa entre as palavras. Adam gostava de caratê. Colette demorou um minuto e meio para dizer ao grupo que se chamava Colette Beauvoir e que gostava de caminhar pelo bosque. Margi gostava de música. Kevin Zumbrowski era quase tão lento quanto Colette e gostava de xadrez, coisa que para Phoebe pareceu muito adequado. Phoebe disse que gostava de escrever, assim como Tommy Williams. — Fantástico. — respondeu Alish Hunter. — Vocês viram? Já encontramos algumas coisas em comum. Evan Talbot, que parecia ter morrido com uns catorze anos, confessou ser fã de ficção cientifica, sobre tudo Star Wars. Usava uma camiseta do Darth Vader e tinha um abundante cabelo alaranjado que parecia um pavio saindo da sua cabeça. Também era muito rápido, muito mais rápido do que Sylvia Stelman, que demorou uma eternidade para dizer ao grupo que gostava de seus dois gatos, Ariel e Flounder. Tayshawn Wade disse para todos que gostava de filmes. — Que filmes? — pergunta Ângela, animada. — Ação. — respondeu Tayshawn, acrescentando uma sílaba a mais na palavra. — E de..., terror. Alish riu como se fosse a coisa mais engraçada do mundo. Phoebe não teria estranhado em ver nuvens de pó saindo da boca, expulsas diretamente dos seus pulmões. — Bom. — disse depois de um momento. — Nosso tempo está acabando. Angela tem uma pasta com informações para cada um. No interior, encontrarão deveres, além de uma folha para seus pais nos autorizarem a transportá-los da escola para a Fundação e vice-versa. Também há um acordo de confidencialidade que vocês devem assinar com seus pais. Há outros formulários que devem olhar. Por favor, leiam tudo e façam com que seus pais também leiam. Se a diretora Kim
107 receber toda a documentação necessária antes que acabe a semana, nos veremos na próxima terça na Fundação. Sairão depois de comer, então se lembrem de deixar tempo para compensar qualquer trabalho que percam. Obrigado, nos vemos na semana que vem. A diretora Kim se levantou e acompanhou a dupla até a porta depois de dizer aos estudantes que podiam ir embora. Margi suspirou ao lado de Phoebe. — Que chato. — Uff. — comentou Thornton, folheando seus papéis. — Temos que escrever uma redação sobre por que queremos fazer as práticas. Uma fina folha de papel rosa escapa de sua pasta. Phoebe viu quando Adam a recolheu no ar com elegância e a devolve para Thornton, justo quando este tirava sua caneta. — Será interessante ver o que algumas pessoas colocam. — comentou Adam, olhando para Phoebe. Karen foi a primeira a se levantar. Pegou uma mochila cor cinza que tinha um cachorrinho rosa de pelúcia pendurado no zíper; o cachorro estava com a língua para fora, também rosa, e os olhos fechados, o que parecia com que parecesse dormindo ou preso em uma coleira. Karen esboçou um sorrisinho. — Não se preocupe. — comentou. — É só uma..., página. Acho que sobreviverá. Phoebe a viu se afastar. As brilhantes luzes da biblioteca lhe davam um aspecto quase suave ao cabelo loiro, e se movia sem o mancar da maioria dos garotos com diferente fator biótipo. Pode até ser que inclusive requebrasse os quadris de um modo intencionado. — É a que usa as saias curtas. — sussurrou Margi. Phoebe assentiu. Viu Tayshawn ajudar Colette a se levantar do futon. — Deveríamos falar com Colette. Margi a agarrou pelo antebraço, com as mãos geladas.
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— Deveríamos e faremos, mas agora não. Quero sair daqui agora mesmo. — insistiu, puxando ela até a porta. Phoebe se virou para despedir-se de Tommy com a mão. Tommy devolveu o gesto.
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CAPÍTULO 12 O primeiro jogo da temporada foi contra o Norwich Fisher Cats, que era um dos rivais mais fortes dos Oakvale Badgers. Phoebe havia lido que este era o primeiro ano de tantos que se jogava este jogo em Oakvale. Por um longo tempo, o jogo tinha se realizado em Norwich, como donos da casa, de acordo com a antiga tradição de dar aos Fisher Cats uma equipe que poderiam demolir para fomentar o espírito da equipe. Mas agora, com Adam na equipe, os Badgers eram competitivos. O pai de Phoebe tinha concordado em levá-la com Margi ao jogo, e Phoebe notou que enquanto ele colocava sua camisa Fordham desgastada e seu antigo gorro favorito, que ele havia estado muito entusiasmado em se oferecer. Sabia quanto gostava de passar tempo com ela, e que gostava ainda mais de passar tempo com ela e Margi – principalmente, por que adorava tentar envergonhá-las. — Traz um pouco de cor a essas bochechas tão pálidas. — era como ele gostava de descrevê-las. — Então, Margi. — disse — Está tão entusiasmada como Phoebe por estar com este tema de Estudo dos Não-Mortos? — Papai! — disse Phoebe. — Estudo pelo Avanço das Pessoas com Diferentes Fatores Bióticos. Você não leu o documento? Olha para mim pelo espelho retrovisor. — Sinto que tudo o que estive lendo nos últimos tempos foram documentos. — Estou com você, Sr. Kendall. — disse Margi. — Muitos papéis. — O jornal chama de Programa de Estudos para Não-Mortos. — disse Phoebe queria que ele só se dedicasse a olhar o caminho. — Não acredite em tudo que você lê. — disse Phoebe.
110 Seu pai ri, e apesar das linhas ao redor dos seus olhos, parecia mais jovem do que seus quarenta anos. Conseguiu desviar o olhar a tempo de ver o sinal de pare mais na frente. — Um bom conselho para todos, eu acho. Margi riu tontamente, Phoebe lhe atingiu com o cotovelo e lhe deu uma olhada assassina. — Acho que será interessante; Sr. Kendall. Um dos mor... Garotos com Diferente Fator Biótico, como nos filmes de terror. — Sério? — ele perguntou. — É bom ter algo em comum. — Claro. — Phoebe se perguntava por que todos pensavam que o comum era a parte principal de todo o assunto do “por que não podemos conviver bem”. Ela podia sentir a seguinte pergunta em seus lábios. Sabia que estava a ponto de perguntar por Colette, mas então dobraram a esquina e ali estava a escola. Havia uma multidão de cerca de vinte pessoas perto da escadaria de entrada, com cartazes. Alguns carros da polícia estavam estacionados na curva onde estariam os ônibus nos dias de aula. — Não parecem fanáticos do futebol. — disse papai. Phoebe leu alguns dos cartazes: OS ESPORTES SÃO PARA OS VIVOS; MORTO = MALDITO; VIDA, LIBERDADE, E A BUSCA DA FELISIDADE; e em letras vermelhas, ENTERRA SEUS MORTOS. — Perfeito. — disse Margi. — Olha, escreveram felicidade errado. — Garotas, talvez esta não seja uma boa ideia. — Não, papai. — disse Phoebe. — Não podemos deixar que pessoas como estas ganhem. — Ganhem o quê? — Por favor, pode nos deixar no estacionamento de estudantes? Iremos andando. — Não sei.
111 — Papai, nós ficaremos bem. São só alguns loucos com cartazes. — ela sabia o que acontecia na cabeça de seu pai. Visões de bombas sob as arquibancadas, revólveres escondidos, frascos de ácido escondidos nos bolsos cheios. — Phoebe. — Papai. — repetiu. — Ficaremos bem. — Talvez eu vá ver o jogo com vocês, afinal. — disse. — Sempre quis saber sobre o Armstrong. — Claro. — pelo menos, conseguiria ver o jogo. Também havia manifestantes dentro do jogo. Muitos deles usavam máscaras de látex, embora para o Halloween ainda faltasse algumas semanas. — Estão cantando ‘Fora da vida, Fora do jogo’? — perguntou Margi. — Acho que sim. — disse Phoebe, escolhendo assentos no centro da seção de reforços de Oakvale. Ela e Margi estariam normalmente agrupadas em um canto, cada uma com seu fone de ouvido conectado no mesmo iPod; mas as pessoas que para elas normalmente pareciam dementes agora pareciam seguras e cômodas, comparadas com as pessoas que agora estavam dementes. — Posso pensar em alguns cânticos melhores. — disse papai. — Por favor, não pense. Phoebe havia visto no ano passado um único jogo, só para dizer para Adam que o havia visto jogar. O papel de Adam parecia ser evitar que a outra equipe abordasse Denny Mackenzie, o quarterback, e pelo que Phoebe poderia dizer, ele era muito bom nisso. Denny não tinha sido abordado no jogo que ela assistiu, exceto em algumas jogadas onde ele tinha corrido até a meta de seus adversários. Com uma indiferente rotina, Adam havia bloqueado ou eliminado, um ou dois jogadores que correram para ele. Uma jovem com um vestido cheio de estrelas, seu cabelo preso em um nó frouxo de cachos loiros, se levanta de seu lugar para cantar o hino nacional, a multidão se uniu com uma espécie de entusiasmo sóbrio. Algumas das vozes gritavam as palavras, enquanto mantinham um significado especial para os dias de competição.
112 O locutor deu as boas-vindas ao honorável Steven Armstrong, representante do estado. Um homem elegante em uma calça cáqui e uma jaqueta azul-marinho caminhou até o microfone onde a pequena Kayla Archambault havia terminado de cantar sobre a terra da liberdade e o lar dos valentes. O aplauso se tornou apático e intercalado com vaias, logo que a menina estava fora de vista. — Um homem do povo. — disse seu pai. — Excelente. — Olha todos os caras nas sombras. — disse Margi, apontando para uma fila de personagens rígidos na beira do campo. — São parte do pessoal de Armstrong? — Os homens de preto. Suponho que estão preparados para os problemas. Talvez pensem que não-mortos pertencem a Roswell. — Papai. — disse Phoebe. Seu pai foi um aficionado por muito tempo pela conspiração e gostava de fazer com que as pessoas pensassem que ele acreditava em discos voadores, mas não acreditava que o homem tinha pisado na lua. — Obrigado. — diz Armstrong, dando um sorriso amplo. — E obrigado aos estudantes e a Faculdade de Oakvale High por me convidar no que seguramente é um acontecimento histórico. Não podemos fazer mais do que pensar nos atletas americanos do passado que superaram os obstáculos da injustiça e do ódio para seguir seu caminho para a grandeza. Estou pensando em pessoas como Jesse Owens. Greg Louganis. Billie Jean King. Estas pessoas estiveram dispostas a lutar ante a adversidade e discriminação por participar dos esportes que amavam, e ao fazer isso, deixaram um legado que é uma inspiração para todos que seguiram seus passos. Phoebe estava maravilhada com quão rápido Armstrong tinha silenciado a multidão, e então alguém gritou — Necrófilo! — rompendo o silêncio. Armstrong continuou falando como se não tivesse escutado. — Por isso quando observarem hoje Thomas Williams no campo, eu lhes peço que não pensem nele como um jovem deficiente vital, por que claramente ele não se considera um deficiente. Peço para aqueles que envergonharam nosso país cantando nosso hino nacional com uma máscara cobrindo seus rostos que não pensem nele como um Zumbi ou um estranho ou qualquer um dos termos cheios de ódio que usariam para marcar este jovem valente. Peço que também esqueçam, por este momento, que ele é de um diferente fator biótipo, só os peço que o considere um atleta, e nisso, ele não é diferente dos outros garotos prontos para jogar no dia de hoje. Obrigado. — Foi bem. — disse o Sr. Kendall, unindo-se aos aplausos das garotas.
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Apesar do magnífico discurso, Tommy não jogou todo o primeiro tempo. Adam fez bem seu trabalho e deu tempo para Denny passar na maioria das jogadas, embora Denny foi expulso por perder em uma jogada onde Adam bloqueou na direita e Denny correu para a esquerda. Pete Martinsburg fez uma interceptação e parecia desfrutar especialmente de empurrar os oponentes nas linhas laterais. Thornton Harrowwood estava destinado a levar a bola em uma jogada e foi esmagado depois de avançar três jardas. — Ouch. — disse Margi. — Espero que se levante. Faz, e desfilou enquanto carregava a bola setenta jardas para um touchdown. — Você tem que admirar sua coragem. — disse Phoebe. — Sim. É um jovem corajoso. Seu pai as olhou, entrecerrando os olhos. — De quem estão falando? No intervalo, a pontuação era dez. Harris Morgan havia feito um passe de treze jardas no canto de uma zona de touchdown, e os Badgers concluíram com um gol de campo justo quando acabou o tempo. Armstrong regressou ao campo depois de uma curta, mas animada apresentação da banda Badger. — Uau, que jogo. — disse. — Um aplauso para estes atletas. — A maioria das pessoas; inclusive os manifestantes, estavam mais interessados em conseguir um cachorro quente ou uma soda do que estavam em reconhecer os êxitos do campo e, novamente, a acolhida de Armstrong à soma foi pouco entusiasta. — Eu gostaria de falar brevemente sobre a Fundação Hunter para o Progresso das Pessoas com Diferentes Fatores Biótipos. Como bem sabem, a Fundação está destinada ao estudo fisiológico, psicológico, e talvez o mais importante, sociológico das pessoas com diferentes fatores biótipos. O objetivo desta Fundação é, através de um estudo científico, ajudar a criar um mundo onde todas as pessoas, sem considerar sua biologia, podem viver e aprender juntos. Animo-os para que mostrem seu apoio para os garotos com diferentes fatores biótipos de todas as partes através de doação de tempo ou dinheiro para a fundação, com escritórios localizados aqui mesmo em Oakvale. Obrigado. Phoebe viu um policial falando com o cara com a máscara do Frankenstein nas arquibancadas do outro lado do campo. A conversa não parecia agradável.
114 — Estou surpreso que o treinador não colocou no jogo o garoto Williams. — disse o pai de Phoebe. O garoto Williams. Pelo menos, não tinha dito o garoto morto, pensou Phoebe. — Não acho que o Treinado Konrathy esteja muito entusiasmado em colocá-lo. — Nós todos estamos. — Esse é o problema. — respondeu Phoebe. — Eu acho que ele precisa colocar o garoto, neste momento. — disse. — Tem a metade da multidão pronta para ter um acesso de raiva, e a outra metade pronta para causar distúrbios, se ele não colocar. Podem sentir como aumenta a tensão. Frankenstein deve ter perdido a discussão, porque estava à frente da polícia descendo as escadas. A cada poucos passos parava, e virava enquanto lançava insultos pelo seu ombro. — Se eu fosse Konrathy. — disse seu pai. — Colocaria no começo do tempo. Mas ele não era Konrathy, e Konrathy o deixaria no banco durante todo o tempo. Oakvale marcou novamente com um chute do quarterback, após uma bela recepção de Harris Morgan. Norwich deu um valente avanço no campo adversário e dentro da zona vermelha, mas Pete Martinsburg pegou um passe oculto e o devolveu dez jardas antes de ser alcançado. Foi a jogada que serviu para assustálos e uma oportunidade para a equipe adversária, mas Phoebe não conseguia se animar. — Essa foi uma boa jogada. — disse seu pai, dando-lhe uma cotovelada. — Pete Martinsburg é mau, Sr. Kendall. — disse Margi. — Ahhh. — respondeu, e deixou de aplaudir. Phoebe deu uma olhada para Margi, assim ela não começaria a explicar-lhe quão mau tinha sido Pete Martinsburg Margi lhe devolveu o olhar e mostrou sua língua.
115 Os Badgers mantiveram a bola no chão, e depois de três jogadas tiveram sua terceira e quarta na sexta jarda por Thornton Harrowwood. Outra vez estava arrasando, e novamente se levantava como se não houvesse sido tocado. — Esse menino é muito forte. — disse o Sr. Kendall, dando um sufocante bocejo. O volume da multidão diminuía e então se elevou de novo quando Tommy Williams apertou a tira de seu capacete e correu para o campo. — Finalmente, o colocou! E esses idiotas estão vaiando. Isto não está certo. — seu pai aplaude mais forte, e Phoebe e Margi se unem. Alguém bate na nuca de Margi com uma batata-frita, e outra passou voando pelo rosto de Phoebe quando ela se virou. Seu pai se levantou e olhou as filas superiores, mas quem quer que tenha feito isso escondeu o resto de seus mísseis fritos. — Covarde. — gritou, e se sentou. — Não vale à pena, papai. — disse Phoebe. — Nunca vale. — disse. — Parece que Williams está na linha ao lado de Adam. Isto vai ser interessante. Mckenzie agarrou um chute e deu cinco passos para trás. Adam e Tommy dão-lhe tempo de sobra, e completa um lance para Harris Morgan, que consegue sair dos limites. A segunda jogada é da mesma forma, mas desta vez com um lance no meio de campo enquanto o tempo passava. Os Badgers estavam além do meio de campo com uma primeira e dez, então correram ao lado de dois jogadores e diminuíram as jardas. A seguinte jogada era uma terceira e uma, e correu um empate onde Denny lançou a bola para Harris, que correu para esquerda atrás de Adam e Tommy. O grande espaço que deixaram era suficientemente grande para conduzir uma van através dele, e Harris correu, superando o agarre de um defensor que teve a oportunidade de fazê-lo, e correu quarenta jardas na zona de touchdown sem ninguém se aproximar. Os admiradores dos Badgers comemoram, mas os jogadores do Badger receberam uma enxurrada de frutas enquanto voltavam para o banco. Uma rajada de dezenas de tomates voava dos níveis mais baixos das arquibancadas, a maioria deles batendo em Adam, que estava na frente de Tommy no momento em que começaram a lançar. Alguém bateu em Konrathy com uma maçã na cabeça. O policial corpulento que antes estava acompanhando Frankenstein para fora se dirigiu para essa seção das arquibancadas, fazendo sinais para um policial
116 do outro lado do ginásio. Havia muitos gritos, e sinalizações e alguns empurrões, mas no momento em que os policiais chegaram lá, toda a evidência estava fora do campo e não parecia que as testemunhas planejavam declarar publicamente. — Isso foi agradável. — disse meu pai, sacudindo sua cabeça. Os Badgers ganharam de 24 – 10. Tommy Williams não voltou a pisar no campo novamente. — Você entende por que eu estou desconfortável com isso. — disse seu pai. — Terei cuidado, papai. — Você sabe que não tem nada a ver com a minha confiança em você. Mas alguns destes idiotas nas arquibancadas... — Eu sei papai. Terei cuidado. — Cuidado não ajuda se algum idiota tem uma arma, ou uma granada. — Eu sei. — disse, perguntando-se quantas pessoas tinham reservas de granadas guardadas em suas garagens para uso diário. Ele a olhou e depois olhou para Margi, que se aproximava lentamente, fingindo não escutar sua conversa. — Não viemos aqui para que Margi pudesse observar Adam, certo? Phoebe sorriu. — Tampouco viemos aqui para que Margi não pudesse observar Adam. — Phoebe, quem... — Voltarei em cinco minutos. — disse. — Prometo. Ele levantou suas mãos em resignação. Ela se afastou para levar Margi até a saída onde os jogadores, recém-banhados, saem da escola. Olhou para trás para seu pai, mas ele já estava entrecerrando os olhos para as pessoas que passavam enquanto ele procurava sinais de um iminente tumulto e destruição. — Meu pai jamais teria me deixado ir. — disse Margi. — Você acha que ele sabe que você tem atração por um Zumbi?
117 — Margi! — Bom, sabe? Ele é muito astuto sobre você. Presta atenção. Acho que eu poderia colocar fogo na minha cabeça na sala de estar e meu pai perguntaria para minha mãe o que tem para jantar. — Tenho um pai ótimo. — disse Phoebe. — E Tommy não me atrai. Só estou..., interessada, isso é tudo. — Tanto faz. — Papai pensa que nós viemos aqui para que você pudesse ficar fascinada com Adam. De fato, foi uma exibição muito convincente, e uma que ele engoliu completamente. Ele é esperto, como você diz. Margi faz um som de desgosto e bateu no braço de Phoebe, e logo a seguiu até a porta dos fundos da escola. — Oh, oh. — disse Margi, enquanto elas viravam na esquina. Os manifestantes tinham se movido para a saída, assim como a caminhonete de notícias do Canal Três. O policial corpulento estava escoltando Adam através da multidão. O repórter de notícias caminhava ao seu lado, gritando-lhe perguntas. — Como é jogar com um garoto deficiente vital? Você se surpreendeu hoje com a reação das pessoas? Adam era quase tão grande quanto o policial. Olhou os manifestantes, mas deixou que o policial o levasse entre a multidão sem parar. Thornton Harrowwood foi o seguinte, e sua aparição com uma jovem mulher policial afastou a atenção de Adam. — Tem algum comentário sobre o jogo de hoje? — pergunta o repórter. — O que você pensa de toda a controvérsia em torno do seu companheiro de equipe? — Corri por dezenove jardas! — disse Thornton, sorrindo para a câmera. Adam agradeceu a polícia e se uniu a Phoebe e Margi. — Olá. — disse. — Você cheira a molho de tomate. — disse Margi.
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— Há, Há. — respondeu. — Eu não acho que vá lavar meu uniforme. Talvez as equipes adversárias pensem que é sangue do meu inimigo. — Onde está Tommy? — perguntou Phoebe. — Como ele está? — Não disse muito. — disse, e logo levantou suas mãos, depois de captar algo na expressão de Phoebe. — Não estou tentando ser engraçado. Nenhuma lamentação ou algo no estilo. Mas estava esvaziando seu armário. — Entãoooo... O quê? O que significa isso? — Não sei Phoebe. Perguntei se ele estava bem, e ele disse que sim. Isso foi tudo. Eles tiraram-no às escondidas por uma das outras saídas para que pudesse evitar tudo isso. — disse, movendo suas mãos para o grupo de agitados manifestantes esperando pela saída de Tommy. Stavis e Martinsburg fizeram seu caminho junto com o policial corpulento, mas os manifestantes não tinham nada para dizer aos outros jogadores. Ouviram perguntar a polícia se iam tirar o garoto morto por outra saída. — Sim. — disse o policial, sorrindo. — Ele saiu há um tempo. — Tenho que sair daqui. — disse Adam. — PDT disse que eu tinha que recolher as folhas. Precisam de uma carona? — Não, obrigada. Meu pai nos trouxe. — Certo. — disse. — Oh, sim, quase esqueci — Tommy Williams me pediu que te desse isso. Entregou-lhe um pedaço de papel fechado em um quadrado irregular. Abriu a nota e leu em silêncio, escondendo-a dos intrometidos olhos de Margi. — Quer saber se eu quero sair alguma noite na próxima semana. — olhou primeiro para Adam, para ver sua reação, mas o que quer que tenha pensado, manteve para si mesmo. — Nojento. — disse Margi. Phoebe bateu nela. — Ouch. Sair, como em um encontro?
119 — Não sei. — Isso é estranho. — Cale-se, Margi. — O que mais disse? — perguntou, tentando pegar o papel. — Nada que te interesse. — respondeu Phoebe, tirando de suas mãos. — Que se divirtam. — disse Adam. — Vou varrer as folhas. Phoebe o observa ir, desejando saber o que Adam pensava sobre ela e Tommy, enquanto ao mesmo tempo sussurrava uma ameaça de morte para Margi, caso ela contasse alguma palavra da nota ao seu pai.
Pete Martinsburg observou o garoto morto fugindo pela porta dos fundos e dirigindo-se para o bosque, esquivando-se dos repórteres e os gênios lançadores de comida das arquibancadas. Pete considerou correr atrás dele, mas havia alguns policiais assegurando que ele saísse sem ser incomodado, então Pete só o observou fugindo, sem ser detectado pelas pessoas que tinham algo que dizer sobre o alimento de vermes jogando na equipe de futebol da escola secundária. No entanto, antes que o garoto morto fosse embora, teve cuidado de se colocar ao lado do armário de Pete, bloqueando-o para pegar seus pertences. Ficou de pé com seu meio sorriso torcido em seu rosto, enquanto dizia para Pete, — O que você pode fazer eu também posso fazer. Ficarei atento. — foi um ponto sutil e dirigido para Pete. Pete fez algo que só havia feito uma vez quando enfrentou uma confrontação: nada. O Zumbi estava em sua cabeça, pisando forte com seus sapatos. Pete só podia ver uma maneira de conseguir tirá-lo de lá. Depois de observar o Zumbi entrando no bosque, Pete caminhou de volta para os vestiários, com a camiseta em sua mão. Alguém tinha lhe lançado um ovo
120 logo antes que acabasse o jogo. Tinha estado de pé na margem, esperando pelo ataque para marcar mais uma vez, assim poderia ferir alguém, quando sentiu o ovo bater em suas costas. O garoto morto nem sequer estava perto dele quando o ovo o acertou. Conseguiu abrir seu armário e lançou sua camisa dentro, onde bateu no fundo antes de deslizar para baixo e deixar um rastro viscoso. — Sim, ne-naaaa! — gritou Stavis, com seu pálido e volumoso corpo quase batendo contra Pete enquanto estava quieto observando o rastro de gema de ovo. — Os Badgers ganham de novo! Idiota, pensou Pete. Stavis segurava uma toalha azul que tinha conseguido — sozinho — para colocar ao redor da cintura. Bateu no ombro de Pete, e Pete se esforçou bastante para não enterrar seus punhos no sorriso de seu rosto redondo. — Pete, você viu o chute que eu dei? — disse Stavis, tirando um desodorante fedido de seu armário. — Marcação surpresa, wham! Coloquei a bola e tudo. — Eu perdi. — disse. — Estava no campo adversário cobrindo um garoto alto. Acho que se chamava Belton. — Sim, você o nocauteou hoje. — respondeu Stavis, batendo novamente no ombro de Pete com a mão que estava segurando a toalha enquanto colocava desodorante de tal modo que Pete pensou que era insuficiente para mascarar ou prevenir qualquer odor. — Quanto você fez? Uma interceptação em todo o jogo? — Duas. — Legal! — disse Stavis, lançando seu desodorante de volta ao armário, onde soou contra as paredes de metal. Logo virou-se e estendeu seus braços por sua cabeça para baterem as mãos. Pete o deixou esperando. — Para trás. — disse. — Quero falar contigo. Traz Harris também. Depois de vestir-se, levou-os para fora e de volta para o campo, sentando nas arquibancadas. Wilson, o zelador, iria se irritar, pensou, havia muita comida e porcaria por todos os assentos e corredores. Assim que os outros se sentaram na arquibancada inferior, Pete começou a falar.
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— Somos a Equipe da Dor, certo? — perguntou. — Claro que sim! — gritou Stavis, e Harris assentiu. Esta foi uma promoção para ele. — E do que se trata a Equipe da Dor? — Infringir dor em nossos inimigos. — disse Stavis, esfregando suas grossas mãos. — Como fizemos hoje. — Correto, TC. — disse Pete, sorrindo. — Como fizemos hoje. Mas não fomos os únicos que causaram dor, certo? TC pareceu confuso, então Harris o ajudou. — A multidão. — disse. — Fui golpeado com uma maldita cenoura. — sacudiu sua cabeça. — Quem lançou uma cenoura? Pete lhe deu um tapinha nas costas. — Eu fui golpeado com um ovo. Não se sinta tão mal. — olha-os em ordem. — Sim, a multidão. Mas por que a multidão estava lançando coisas em nós? — Por causa do garoto morto. — respondeu seus súditos, em uníssono. — Correto. — disse Pete. — O garoto morto. Tirou do seu bolso um papel azul com a lista dos estudantes. Abriu o papel e o alisou na arquibancada entre eles. — Este papel tem os nomes de um monte de garotos mortos, e os vivos simpatizantes. O nome de Adam Layman está aqui, como o da Pantynegros. — Phoebe Kendall. — Sua pequena amiga também está nesta classe. Pinky McKnockers — disse Stavis. — E acho que Thorny também está. — Sim. — disse Harris, assentindo. — O treinador deixará esses dois e William perder o treino uma vez na semana para ir a essa coisa. E nem sequer me deixa ir cedo para a festa de aniversário da minha avó. — Acredite em mim, Morgan, o treinador não está nada feliz com isso. Kimchi lhe ordenou que os deixassem ir. Se fizesse da sua forma, não os deixaria ir,
122 e o Zumbi nem sequer estaria na equipe. — olhou cada um deles, com seus dedos batendo no papel. — E é por isso que precisamos fazer algo sobre o assunto. — Está irritado por que fomos enganados por aqueles Zumbis na floresta, hein, Pete? — disse Stavis. Pete quis bater nele, mas ainda precisava dele, então continuou dando golpes no papel com seus dedos. — Claro, em parte. Não podemos deixar que qualquer um zombe da Equipe da Dor, jamais. Mas é mais do que isso. Precisamos fazer algo por que o que está acontecendo não está certo. Coisas..., mortas andando entre nós, indo para a escola, jogando nos Badgers? Não está certo. Toda esta merda sobre os Deficientes Vitais e de Diferente Fator Biótipo é só merda. Estas coisas nem sequer são humanos. Li umas coisas que diziam que eram demônios ou sinais do fim do mundo ou algo assim, e provavelmente estão certos. Stavis, que, Pete sabia, não tinha oportunidade de pertencer ao raciocínio analítico de seu SAT, assentia com a cabeça. Harris ainda parecia como se estivesse se perguntando para onde ia Pete com tudo isto. — Não acredito que sejam humanos, e certamente não estão vivos. Para ser honesto, só espero pelo dia em que se lancem e comecem a andar tentando comer nossos cérebros. Mas inclusive se isso não acontecer, o que vem a seguir? Hambúrgueres de vermes preparando tua vitamina na Honeybee? Ocupando dinheiro de bolsas que deveriam ser destinadas para garotos com uma vida pela frente? Só espere até que um Zumbi, queira sair com sua irmã, Harris? — Não quero nenhum Zumbi incomodando minha irmã. — disse Harris, e Pete sabia que ele tinha mudado de ideia. — Eu tampouco, amigo, e esse é o porquê temos que fazer algo sobre esta lista. — disse, sacudindo-a na frente dos seus rostos, antes de passá-la para Stavis, que apertou seus lábios e entrecerrou os olhos enquanto lia os nomes. — Temos que fazer algo para..., afugentá-los. Quem quer que sejam. — O que você quer dizer com afugentá-los? — perguntou Harris. — Quero dizer que temos que tirá-los do jogo. — disse Pete. — Permanentemente.
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— Não podemos sair matando pessoas. — disse Harris. — É loucura. — Não estou falando de matar pessoas, homem. As pessoas nesta lista: Adam; Julie e os outros, eu acho que merecem uma boa surra por confraternizar com estes monstros, mas não estou falando de matá-los. — sorriu. — Só os outros. Harris nega com sua cabeça. — Pete, cara... — Espera Harris. Quero que pense nisso. Eles não são pessoas. Não são cidadãos. Não têm direitos. Vocês não ouviram toda a conversa em Washington? O que o senador ou o que seja que ele é disse antes do jogo, é uma MERDA, cara. Eles são como fungo, não há uma lei contra matar um fungo. As pessoas destroem todo o tempo essas coisas e ninguém se importa. É só questão de tempo para que essas coisas comecem a querer meninas reais. E garotos reais. Logo estarão se casando entre eles. Podem imaginar isso? — Tenho duas primas de treze anos. — disse Stavis, coçando sua grande cabeça. — Mataria qualquer Zumbi que fosse atrás delas. — É por isso que todos estes Zumbis estão indo para a floresta para nos atacar. — disse Pete. — Por que essa coisa que chamam de Tommy Williams está tentando meter-se nas calças de Julie. E não podemos deixar que isso aconteça. — Quem é Julie? — perguntou Stavis, levantando o olhar da lista. — O quê? — Eu disse: quem é Julie? Não há nenhuma Julie nesta lista. Pete sente um calor subindo para suas bochechas. — Então, me processe, seu idiota. — disse. — Phoebe, Julie, Jenny, Katie, Hildegard. Qualquer que seja seu nome, temos que protegê-las deles. Temos que protegê-la dela mesma. Stavis devolveu a lista e logo estendeu suas mãos. Pete mantém seu olhar por um momento. — Então, estão comigo nisto? — Absolutamente. — Harris?
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Harris esfrega sua mandíbula com uma mão nervosa. — Sim. Sim, acho que sim. Pete estendeu sua mão e lhes deu um tapa em seus ombros, do mesmo modo que ele tinha golpeado suas ombreiras como se estivessem agrupados no campo. — Bem. Seu grupo se inclina para frente, e ele conta seu plano.
Pela quinta vez, Phoebe lia a nota que Adam tinha lhe entregado. Uma no campo, uma no carro no caminho para casa, outras três vezes durante toda a noite, e a última enquanto estava sentada na frente do monitor de seu computador. Havia um endereço de e-mail no final da nota, Phoebe digita uma resposta curta e clica em ENVIAR.
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CAPÍTULO 13 Na segunda-feira, uma Van azul buscou Phoebe e Karen DeSonne na escola e as levou à Fundação Hunter para que fizessem a parte do trabalho de suas práticas. Trocaram breves saudações, Karen tirou um livro de sua mochila e se começou a ler enquanto Phoebe olhava pela janela. Phoebe espirrou em certo momento, e Karen tossiu um minuto depois, o que levou a primeira a pensar que a garota morta talvez estivesse rindo dela, embora não estivesse segura disso. O livro que Karen lia era Enquanto Agonizo, de William Faulkner. Phoebe estava convencida de que lhe haviam dado o trabalho mais chato de todos: o de escritório. Margi ia trabalhar no laboratório e, ao que parecia, Adam havia conseguido um posto fácil na equipe de manutenção. O plano era que todos trocassem a cada seis meses, mas, depois do primeiro dia, Phoebe soube que seriam muitos. Passaram-se às quatro horas do seu turno abrindo cartas e classificando-as em três montes: mensagens de apoio, mensagem de queixa e lixo. Angela passou por ali com duas grossas pilhas de papel. — Correios. — explicou. — Classifique-os da mesma forma, por favor. Espero que nenhuma das duas se ofenda com facilidade. Phoebe disse que não e, ao se virar, viu que Karen piscava fingindo preocupação; suas pestanas tinham mais movimento que os corpos de muitos Zumbis. Os olhos de Karen tinham uma fina coroa de azul cristalino nas bordas da retina, mas eram da cor dos diamantes na zona próxima as pequenas pupilas. Perguntou-se que aspecto teria quando estava viva. Quase todos os e-mails eram mensagens de ódio e eram até interessantes, ao menos no princípio, quando parecia que havia alguma variedade. Impressionou a criatividade dos escritores. Estimados Necrófilos:
126 O que estão fazendo é pecaminozo; está errado e no fundo, vocês sabem. Se vocês querem tão bem aos mortos, porque não morrem também e ficam com eles? Os mortos são mauvados, demoníacos e deveriam ser queimados, todos. Aproxima-se a chegada de Jesus e ele se desgostará muito quando ao ver o que fazem. Arderão no inferno. Saudação, Uma alma Virtuosa. Ao que parece, a alma virtuosa, não se preocupava tanto com a ortografia quanto em julgar os demais. Havia muitas almas virtuosas que escreviam diferentes avisos e, embora para Phoebe, as cartas davam-lhe arrepios, não eram nada comparadas com a dúzia de mensagens com ameaças de natureza menos metafísica. — Aqui tem uma boa. — disse Karen, aproximando-se com uma folha de papel de caderno amarelo, onde alguém havia escrito com letras maiúsculas. Era uma carta curta: SÃO COMO UMA CLÍNICA DE ABORTOS, MAS PIOR. ROUBAM O DEIREITO À MORTE, COMO ELES ROUBAM À VIDA, E AS BOMBAS TAMBÉM CHEGARÃO A VOCÊS. É SUA ÚLTIMA OPORTUNIDADE. — Deus meu. — disse Phoebe, olhando a pilha de cartas que tinha a sua frente. — Porque não deixa as cartas para mim? — perguntou Karen depois de rir, pegando o monte de cartas da mesa de Phoebe. — Quem sabe que tipo de esporos ou toxinas pode conter nesses..., monstros..., pelo correio? — Obrigada, Karen. — Tranquila. Se te disser que algo cheira engraçado..., você começa a correr. Phoebe sorriu e esperou que estivesse brincando. Ao final do turno tinha dois comunicados, ambos correios eletrônicos, no monte positivo. Um era de um senador de Illinois que acreditava no trabalho que estavam fazendo, e outro de alguém que havia enviado o recibo de um depósito de vinte dólares através de PayPal à Fundação Hunter. Espero poder enviar-lhes minha filha algum dia. Agradeço-lhes a informação que me enviaram pelo correio eletrônico, estamos fazendo o que podemos, mas
127 é difícil desde que meu marido se mudou. Todavia continuamos casados e tentamos ser uma família, mas minha filha mais nova tem muito medo de viver com Melissa nestes momentos. Melissa já pode falar com mais clareza, ainda que nos preocupe, porque quando Jonathan levou Emily, Melissa deixou de falar de repente. Como sempre, lhes agradeceria qualquer conselho. Que Deus os bendiga. Phoebe não sabia por quem sentia mais naquela família destroçada, se pela garota morta, pelos seus pais ou sua irmãzinha. Todos sofriam; cada um a sua maneira, e duvidava que houvesse uma solução simples. Gostaria de poder ler a correspondência anterior para saber por que a senhora do correio estava tão agradecida pelas palavras de Angela ou Alish. Se fosse ensinar a Karen, que não havia levantado o olhar de suas três ordenadas pilhas desde que havia levado o resto dos e-mails, mas então o senhor Davidson, o diretor de operações, entrou para lhe dizer que a Van as esperava para levá-las para casa.
A maior parte das práticas ocupava o grupo de encontro, que Angela dirigia em um cômodo salão com várias cadeiras acolchoadas e sofás dispostos em um semicírculo irregular. Havia mesinhas nas quais normalmente tinha refrescos e sacos de batatas fritas que os estudantes vivos pegavam da dispensa anexa. Em algum momento da orientação, Phoebe havia mencionado que gostava de café, e percebeu que haviam adicionado uma cafeteira. As cadeiras eram muito mais confortáveis (e menos barulhentas) que as da biblioteca, e os sofás grandes o bastante para que duas pessoas sentassem sem se tocar. Na segunda sessão, Phoebe e Margi compartilharam um sofá. — Olá. — saudou Angela. — Como passaram o fim de semana? Ninguém respondeu. Os garotos com diferentes fatores biótipos guardaram silêncio e permaneceram quietos; os vivos, idem, salvo Thornton, a quem custava não se mover. — Os advirto que as perguntas vão sendo mais difíceis. — instituiu Ângela, sorrindo.
128 — O meu foi genial. — respondeu Thornton. — Ganhamos o jogo. — Claro. — disse ela, assentindo. — Havia me esquecido que muito de vocês jogam. — Sim, Tommy foi a estrela, mesmo que apenas por um par de jogadas. — dizia em tom de brincadeira (Thornton não tinha nem um grama de maldade em todo o corpo), mas fracassou. Phoebe tentou interpretar a expressão de Tommy, ainda não via nada reconhecível; desejou poder saber se sentia algo sobre seu iminente encontro: estava nervoso, emocionado, arrependido ou que? — Pois se Tommy houvesse estado na linha comigo, Denny não teria marcado. — interveio Adam. — Não? — perguntou Angela. — Não. É melhor que o garoto que o treinador colocou. — Então, porque o treinador tirou Tommy, Adam? — Ah, porque lhe dava medo que o garoto morto jogasse. — Com Diferente Fator Biótipo. — corrigiu ela, sorrindo. — Um garoto com Diferente Fator Biótipo. Adam encolheu os ombros. — Não. – disse Tommy, e Angela deu a ele um sorriso. — Que não era essa a razão? — lhe perguntou. — Não, com Diferente Fator Biótipo..., não. Morto..., está bem. — Não se importa que te chamem de morto? — perguntou ela, arqueando as sobrancelhas. — De Zumbis também. — adicionou Karen. — Entre nós nos chamamos de Zumbis, com carinho. Parecido com..., as pessoas..., de minorias..., culturais e étnicas... Recupera certos..., apelativos pejorativos..., para utilizá-los entre eles. Angela tamborilou em seu caderno com a caneta e piscou.
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— Entendo. Todos compartilham essa opinião ou consideram o termo Zumbi, uma palavra prejudicial? Evan assentiu lentamente, e Angela perguntou a Tayshawn. —Depende..., de quem..., o diga. E..., de como..., o faça. — o garoto respondeu. — As pessoas vivas falam para machucar. — disse Thornton, e, quando todos se voltaram para olhá-lo, fez cara de desejar não ter aberto a boca. — Quero dizer, às vezes. Não sempre. — Utilizou alguma vez a palavra Zumbi para se referir a uma pessoa viva de maneira negativa? — Não. Era Colette quem havia falado, e Phoebe achou que sua voz não tinha nada a ver com a da garota despreocupada e simples de dois anos atrás. Percebeu que Colette havia demorado todo esse tempo em fazer todo mundo saber que não gostava que a chamassem de Zumbi. — E porque, Colette? Phoebe se afundou no sofá. E se a resposta de Colette era que não gostava que a chamassem de Zumbi porque suas supostas amigas a haviam abandonado, deixando-a sozinha em seu sofrimento. Se Colette tinha tais pensamentos, os guardou para si. — As pessoas..., nos..., odeiam. Angela assentiu transbordante de compaixão. — Obrigada, Colette. Apreciamos sua sinceridade. — olhou durante uns segundos para seu caderno. — Creio que é um bom momento para comentar as regras e o objetivo destas sessões. Começarei dizendo que o objetivo é compreender e assimilar melhor os direitos, as idéias e as preocupações das pessoas com DFB. Nós gostaríamos que todos entendessem melhor a forma de pensar e os sentimentos dos demais membros do grupo. Queremos que, quando saiam daqui, sejam capazes de ver as coisas através dos olhos dos demais, e que eles possam ver também com maior clareza. Para consegui-lo, precisamos criar um ambiente de sinceridade total. Queremos que dêem sua opinião, mas o façam com
130 respeito. Se não entendem o ponto de vista de alguém, por favor, façam perguntas. Não precisam levantar a mão, queremos que o tom seja informal, não como se estivessem em aula, mas queremos que todos tenham sua oportunidade, assim pode ser que interrompam alguns que acompanham o dialogo. — Phoebe teve a impressão que Angela olhava para Karen, embora não tivesse certeza. — Esta é a parte das práticas pelas quais receberão uma nota. As notas dependerão do grau de participação. Há alguma pergunta sobre os objetivos ou as regras de participação? — olhou a todos um a um, mas ninguém falou. — Não? Bem, então tenho uma pergunta para Colette: Porque acredita que as pessoas os odeiem? Colette pareceu atravessá-la com o olhar, sem se parecer afetada por seu brilho. — Por que..., me..., disseram. — Mmm, para alguém mais disseram que lhes odeiam? Ao princípio levantaram-se todas as mãos, menos Phoebe, Margi lhe fez cócegas. — O que? Para mim ninguém nunca disse. — Não com essas palavras. — respondeu Margi. Falava somente com Phoebe, mas Angela aproveitou. — O que você quer dizer Margi? — As pessoas nos dão muitas indiretas, para Pheebes e para mim, porque nos vestimos e atuamos de maneira diferente. — respondeu. Phoebe ficou perplexa com a intensidade de seu olhar. — Odiar, é uma palavra muito forte Margi. — disse Phoebe. Estava surpresa de quão convencida sua amiga parecia. — Mais é a correta. — interveio Adam. — Os garotos odeiam por pouco. As pessoas são assim. — Quem você acredita que te odeia Adam? — Angela lhe perguntou. — Preferiria não dizer. — Me parece justo. Essa é outra regra, claro: se uma pergunta os faz se sentir desconfortável, não têm que respondê-la. Não afetará a nota, sempre que participem em outras ocasiões.
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— A pergunta não me faz sentir desconfortável, é que não quero respondêla. — Ok. — disse Ângela, sem perder seu bonito sorriso. — Ok. — respondeu Adam, abrindo os braços. — Estupendo, me deixem trocar de tema. De todos os que estão aqui, para quantos disseram que os amava? Quase todos levantaram a mão, menos Colette e Sylvia Stelman. — Sylvia? Sylvia fechou os olhos. Um minuto depois, abriu um deles. — Não..., desde..., que..., morri. — respondeu, e abriu o outro olho. Angela fez um ruído de compreensão, mas foi Karen quem falou; seus olhos brancos de diamante pareciam refletir até a pálida luz fluorescente do teto. — Te amo Sylvia. — estava sentada no fim do semicírculo, então se levantou e foi abraçá-la. — E a você também, Colette. Angela fez algumas anotações em seu caderno. Colette não parecia querer soltar Karen. — Vamos fazer uma pequena pausa. Quando voltarmos, leremos alguns jornais e artigos da semana passada sobre as pessoas com DFB. Phoebe viu como Karen abraçava Colette, tragou saliva e se virou, piscando muito depressa.
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CAPÍTULO 14
—
Não posso acreditar que está me fazendo fazer isso.
Phoebe sorriu. ― Eu sei. — Me deve muito por isso, Phoebe. Isso é importante. — Importante. — repetiu Phoebe. Gotas de chuva brilhavam no parabrisa iluminadas pela luz de um carro. — Então. — disse Adam. — É como um encontro, ou algo assim? — Algo assim. Não sei. — Tem sentimentos por ele? — Tenho sentimentos por todos, Adam. — quanto mais Adam falava, mais devagar dirigia. Phoebe supôs que outro carro os ultrapassaria a qualquer momento. A caminhonete do PDT virou no acostamento coberto de grama. ― Sabe que ele está morto, certo? Ela virou-se para ele no assento enquanto palavrões saiam de sua boca. Adam a deteve rindo. — Estava apenas comprovando. ― disse. ― Presta atenção no caminho. ― disse ela, incapaz de reprimir o riso. — Não sei o que á, Adam. Ele está interessado em mim, isso é tudo. ― Não pode estar atraída por ele, ou está? ― voltou-se para ela. — Apenas me diga para calar a boca se quiser.
133 — Não tem que calar a boca. — Ok. Então, ele te atrai? Atrai, atrai? ― De verdade não sei o que me atrai. Não sei. Adam assentiu. Phoebe perguntava-se no que ele pensava sobre o que ela explicava. — Não sai para muitos encontros. ― disse ele. — Não saio para muitos encontros. Não como você, de qualquer forma. Aliás, como se chamava? Encolheu os ombros. ― Ela é quem é. Apenas estou tentando compreender onde está sua cabeça. — Bem, então, onde está a sua? Perguntei como ela se chama. — Boa troca de tema. Não sei. Phoebe sorriu, apoiando sua cabeça na janela. — Bom, aí está. Eu também não sei. Parecia um bom momento para ficarem em silêncio, foi o que fizeram. Uns minutos depois chegaram a entrada da Fundação Hunter no limite da cidade. Esse lugar fez Phoebe pensar em um castelo medieval. Em vez de um fosso, havia uma alta parede de pedras e um caminho que estava fechado por um portão de metal. Adam se aproximou pela janela do carro e pressionou o botão vermelho do interfone. ― Em que posso te ajudar? ― perguntou uma masculina e monótona voz. — Adam Layman e Phoebe Kendall. ― disse Adam. ― Estamos aqui para buscar Tommy Williams. Houve uma breve pausa antes que a voz respondesse. ― Dirija-se ao Edifício Um.
134 Esperaram que o portão se abrisse, o logo da Fundação, um grande e estilizado B e F se dividiram e lentamente se abriu. Adam colocou a caminhonete de PDT em marcha. ― Acredito que esse foi Thorny. ― disse. — Pode ser. Trabalha na segurança com você, certo? Ele assentiu. ― Sim. Mas eles o consideram de fácil manutenção, provavelmente porque tiramos o lixo e podemos golpear os pseudo bioistas sabotadores. ― Quantos golpes você já deu? ― disse, rindo. ― E o que é um bioista? — Zero até agora, mas ainda tenho esperança. E um bioista é como um racista, mas odeia pessoas mortas. ― Ahh. Tem armas? Eu adoraria ver Thorny com uma. ― Sem armas. É suficientemente mau com o telefone. Ainda que Duke carregue uma arma. É uma arma de eletrochoque, se pode acreditar. ― Uma arma de eletrochoque? Quem é Duke? ― Davidson. Esse menino é realmente complicado. Mesmo Zumbrowski tem mais personalidade e calor que esse cara. ― Adam! ― Sinto muito. ― disse. ― Não censuro meus pensamentos contigo. Adam dirigiu até o Edifício Um. Evan Talbot, suas descoloridas mechas de cabelo laranja como finas tiras de cobre, estava de pé na varanda com Tommy. — Evan vem também? — disse Adam. — Ficaremos um tanto apertados. —Não sei. — disse ela, e saiu na chuva. — Olá Tommy. Olá Evan. — Olá..., Phoebe. — demorou um tempo para Tommy dizer seu nome. — Adam pode..., dar uma carona..., a Evan?
135 Adam se inclinou e disse de dentro do carro. ― Olá. Não acho que haja espaço no taxi. Acredito que alguém pode subir na caçamba, mas acho que a chuva está começando a cair mais forte, será uma carona bastante úmida. Tommy assentiu. — Eu vou. — De forma alguma. ― disse Evan. ― Eu..., irei..., atrás. Moveu-se para a parte de trás e começou a subir. Phoebe o observava caminhando torpemente, seus braços e pernas grandes e duros. Moveu-se rapidamente para um garoto morto, e ela perguntava-se qual era a diferença porque alguns como Colette e Zumbrowski pareciam se mover em maior velocidade para os Zumbis, o que era como se mover a ¼ da velocidade normal. Adam saiu da caminhonete e levantou a tampa da caixa de ferramentas que era a base da capa. ― Acho que PDT tem uma lona aqui. Ainda assim vai se molhar, mas deve ser de alguma ajuda. — Meu Deus. ― disse Evan. ― Espero..., não pegar um resfriado. Humor Zumbi; pensou Phoebe. Adam estendeu a lona sobre Evan, quem esperou até que terminasse de colocá-la em cima de sua cabeça. Adam o olhou, alguém de tamanho médio debaixo de uma lona, e sacudiu a cabeça. — Isso é assustador. ― disse. Phoebe viu que o canto da boca de Tommy também estava levantada. Ele a olhou e ela teve a sensação de que seus olhos estavam iluminados. — Gosta..., de dançar? — perguntou. Ela riu. — Acho que sim. ― Genial. Vamos..., a..., um clube. A Casa Assombrada. As sobrancelhas de Phoebe se elevaram e seus lábios se apertaram em concentração. E perguntou-se se como seriam em Tommy aqueles movimentos faciais tão mínimos. Imaginou seu rosto mudando constantemente em impressionantes movimentos e tics. Se Tommy notou sua repentina timidez, não deu sinal.
136 — Não dançamos..., realmente. — disse ele. — Apenas nos..., chacoalhamos. A grossa linha de seus lábios levantou-se em um canto. Phoebe riu.
— Santo Deus. — disse Adam. — Realmente é uma casa assombrada. Estacionaram na entrada livre de uma casa do outro lado de Oxoboxo, branca colonial e antiga, destemida na pálida luz do anoitecer, com grama cinza até a altura da cintura, que se mexia com a suave brisa. Havia uma ampla varanda na frente, o telhado havia caído de um lado. Viu um enorme celeiro um pouco mais longe da rua. Na casa principal, as persianas estavam abaixadas em algumas janelas que não estavam completamente estropiadas. A maioria das janelas estavam quebradas, deixando pedaços de vidro que brilhavam com a luz da caminhonete. As janelas estavam abertas, e podiam escutar música forte e rápida, fazendo a casa tremer. Havia uma tênue luz em alguma parte dentro da casa, apenas algumas brilhavam intermitentemente, ainda que estivessem completamente iluminados por duas ou três velas. — Por favor..., entrem. — disse Tommy. Disse a aranha para a mosca, pensou Phoebe. Tommy saiu da caminhonete, assim como Adam. O lado esquerdo de Phoebe estava duro por ter ficado apertada entre eles; seu lado direito, o que havia ficado contra Tommy, não sentia nenhum calor adicional. Tremeu quando saiu da caminhonete, mas pode ter sido a chuva golpeando sua nuca. Seguiram Tommy pela varanda. A música agora estava a um nível quase absurdo, enquanto mudava de Grave Mistake para um Metal que Phoebe não reconheceu, o ruído dos auto-falantes ameaçavam derrubar o resto do teto. Pôde sentir as vibrações através de suas botas. O ar cheirava a madeira velha e, sutilmente, decomposição. Madeira podre ou talvez o cheiro da vegetação. — Ele está bem ali atrás? — disse Adam, assinalando a caminhonete. Phoebe havia se esquecido completamente de Evan, quem no momento exato, tirou a lona com um amplo sorriso no rosto.
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Era desconcertante. Os mortos não sorriem muito. Ela e Adam trocaram um olhar de ligeira apreensão. Sabia que Adam não demonstraria medo, e estava bastante bem ao ser imperturbável, mas agora estavam em águas desconhecidas. Sentiu o suave toque de Tommy em seu braço. — A música está..., alta? — perguntou Tommy. — Bastante. — A..., abaixaremos. — disse. — Precisa de bastante..., para fazer..., os mortos..., sentirem. — Também deve ser difícil de ouvir. Vivem aqui? — disse Adam por cima de um cover do Iron Maiden. Phoebe o golpeou nas costelas. Demorou um momento para ele se dar conta da razão. — Uhh, é forma de dizer. Tommy sorriu, quase foi um sorriso verdadeiro. — Alguns de nós vive. O seguiram para dentro da casa. Mas depois da entrada havia uma larga sala onde um número de figuras somente reconhecíveis como uns sombrios contornos bloqueavam a tênue luz que havia. — Parem! — gritou Evan. O pulso de Phoebe disparou. — A música! Por um instante, na mente de Phoebe apareceu a cena do filme O retorno dos mortos vivos em que a garota punk tira sua roupa e começa a dançar pouco antes que os Zumbis comecem a sair de suas tumbas e se arrastam por todo o lodo. A música parou, e o único som era o ruído surdo enquanto Tommy golpeava o sorridente Evan na parte de trás de sua cabeça. — Bem vindo a..., Casa Assombrada. — disse Tommy. — Quero que conheçam algumas..., pessoas. Havia muita gente na grande sala, que estava vazia exceto por dois altofalantes no chão e uma pequena lâmpada com uma luz âmbar em cima da lareira. Cabos saindo dos alto-falantes, e a grossa extensão do cabo amarelo iam até outro
138 cômodo adjacente que tinha sofás e cadeiras; havia outros garotos ali, mas o cômodo estava as escuras, apenas penetrava um pouco da luz da sala. Tommy disse. — Zumbis, estes são Phoebe e Adam. Adam e... Phoebe, estes são os... Zumbis. Phoebe saudou-os com a mão. Adam disse. ― Olá Zumbis! ― mas estava muito longe para que ela o golpeasse outra vez. Ela reconheceu vários deles. Sylvia estava ali, como também estava Mal, o garoto de sua pequena aventura no bosque. Ele balançou seus dedos. Tayshawn saiu do cômodo escuro e os cumprimentou. Karen usava um longo vestido branco que parecia feito de luz da lua. Os cumprimentou também. Tommy respondeu a pergunta muda de Tayshawn assentindo com a cabeça. — Mas mais baixo. Pelos nossos..., convidados. Tayshawn desapareceu, e um momento depois uma canção de Slayer encheu a casa em um volume que era um pouco mais alto do que Phoebe escutaria em seu iPod. — De onde obtém a eletricidade? — perguntou Adam, gritando na orelha de Tommy. — Gerador. — respondeu Tommy. — Energia a gás. — E como obtém o gás? Vocês trabalham? Tommy sorriu. — Agora..., sim. Alguns de nós. Phoebe olhou a sala. Alguns garotos estavam tentando dançar, como Tommy havia dito. Os ombros de Evan eram uma espécie de espasmo; Mal, não tão rápido, tentava mover sua cabeça ao som da música, mas apenas alcançava algumas notas. Havia uma menina que movia ligeiramente um só braço, seus dedos pressionados contra a parede para atrair vibrações da música a seu corpo sem vida. — Angel of Death, uh? — disse Adam, repetindo o título da música e cantando o refrão. Não era um garoto de música, e todas as tentativas de Phoebe para mudar esse defeito de personalidade foram recebidas com uma completa resistência. Gostavam de Kenny Chesney e um pouco de rock clássico, e se chamavam de Zumbis entre eles. São bastante irônicos, não?
139 Ela se perguntava se era seu tamanho o que tornava Adam suficientemente confiável para começar a falar, se meter e às vezes ser tão insensível. Mas esse era Adam. Perguntava-se também se ela fosse alta e bonita, ou a menina mais inteligente da escola, se teria esse tipo de confiança. — É um estado irônico o que estamos; não acha? Isso veio de Karen, que havia se aproximado deles. Como um fantasma, pensou Phoebe. Agora, quem era irônico? — Tem que admitir que toda a ideia dos mortos voltando a vida é algo irônico. É uma espécie de contrário a..., cultura gótica, onde os vivos..., idealizam coisas mortas e escuridão. Phoebe sentiu-se ruborizar e perguntou-se se o vermelho em suas bochechas podia ser detectado na fraca luz. Não podia dizer se Karen havia tirado sarro dela de propósito ou apenas estava dizendo a verdade como a via. Karen era a única menina morta que Phoebe podia dizer ser sem dúvida; bonita. Colette, bonita quando viva, perdeu um pouco de seu brilho com a morte, seus olhos escuros agora estavam meio mortos e seu suave cabelo castanho estava quebradiço e bagunçado. Ainda assim Karen era impressionante. O vestido que usava era apertado e terminava pouco abaixo dos joelhos, seus ombros desnudos eram perfeitos, como toda sua pele. Sua voz estava livre da complicação global que todos os outros garotos mortos apresentavam. Estava descalça, e mesmo seus pés eram bonitos. Os de Diferente Fator Biótipo, pensou Phoebe. Os olhos de Karen eram diamantes brancos mesmo na tenebrosa luz. — Rio com a ironia da realidade todos os dias. — disse Karen, seus olhos pareciam atravessar a cabeça de Phoebe. Karen piscou, inclinou-se e beijou Phoebe na bochecha, depois foi embora. Aconteceu tão rápido que Phoebe não teve tempo para raciocinar. Observou Karen do outro lado da sala com Sylvia, que estava imóvel encostada na parede. Pegou uma mão de Sylvia e a levou até o cômodo escuro. Deu-se conta que o vestido de Karen lhe lembrava o que Marilyn Monroe usou naquele filme onde parou em cima do buraco do trem. Os cavalheiros as preferem loiras? Por alguma razão o rastro frio que os lábios de Karen deixaram trouxe calor à bochecha de Phoebe. ― O que foi tudo isso? — disse Adam. Phoebe sacudiu sua cabeça, estava sem palavras.
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— Você..., pensaria. — disse Tommy. — Que Karen..., aceitou-a facilmente..., entre nós. Phoebe assentiu, esperando que ele continuasse. — O contrário..., é o certo. — disse. — Suficientemente irônico. — É incrível. — disse Phoebe. — Temos mais..., pessoas..., se unindo a nós a cada dia. — Sim. — disse Adam. — Percebi. Parece haver mais Zumbis por aqui do que antes. Não tinha ideia de quantos garotos haviam morrido por aqui. Phoebe observou Tommy olhá-lo. — A maioria..., não morreu..., aqui. — Oh! Sério? De onde vieram? Tommy podia estar sorrindo, era difícil dizer com essa luz. — Vem..., de todas..., as partes. E tem..., razões..., para vir. Tayshawn colocou uma música do Misfits, Dust to dust - uma das favoritas de Phoebe; e o repentino rompimento da guitarra cortou a conversa como uma serra. — Vocês..., gostariam..., de ver..., o resto da casa? — Claro. — disse Phoebe. — Adam, você vem? — Não obrigada. Ei, Evan tem algum lanche aqui? Batatas ou algo? Todos o olharam, e para horror de Phoebe, Adam moveu um canto de sua boca em perfeita diversão. Evan fez um som como um pequeno ronco, sua versão de risada. Ela não estava segura de querer que Adam piorasse as coisas — a forma pouco sutil como se afastou dela e Tommy, ou o risco de ofender seus anfitriões. Mas Tommy estava sorrindo. — Vamos. Ela o seguiu por uma escada que terminava em escuridão. — Uhh, Tommy. — disse. — Sabe que não posso ver na escuridão como vocês.
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— Certo. — disse ele, e ofereceu sua mão. Estava fria e suave. Ela estremeceu, em parte por seu toque, e em parte ao pensar que mais alguns passos e estaria em uma completa escuridão, com apenas a mão dele para guiá-la. — Então. — disse, soando nervosa até para ela mesma. — Disse que alguns de seus..., amigos ficam aqui? — Sim. — respondeu. Agora suas costas eram visíveis apenas como um vago contorno. — Alguns..., pais..., não estão de acordo. Mal fica aqui. E Sylvia. Cuidado, este é o último degrau. — Você não? — Não. Fico..., com..., minha mãe. Vivemos em um trailer..., no estacionamento de trailers de Oxoboxo. Dê a volta. Há outro lance de escadas. A escuridão no início do segundo lance de escadas era total. A música vibrava através da escuridão, mas logo não precisavam gritar para ser ouvidos. — Sério? Com sua mãe? — pensou que era conduzida por um corredor que devia ser paralelo as escadas. Tinha medo de que se estendesse sua mão livre não haveria paredes. Sua mão, a que parecia estar morna com a dela, era como uma corda que a levava rapidamente a realidade. — Sério. Aqui. O escutou abrir uma porta, e uma pálida luz alcançou seus olhos, vindo das enormes janelas de uma parede distante. Uma das janelas estava quebrada, e o vento gritava pelo quarto como se fosse ferido pelos cacos de vidro. Estava bastante frio. Tommy não tinha frio. Soltou sua mão e caminhou até a ventania. — Eu amo essa vista. — disse. Abraçando a si mesma pelo frio, se uniu a ele. Estavam altos o suficiente para poder ver o bosque Oxoboxo. As nuvens em cima eram ondulados algodões cinza contra o céu escuro; em alguma parte atrás das enroladas nuvens estava a lua. Houve um clarão, e um raio dividiu o céu.
142 — Uau. — disse Phoebe. O olhou, principalmente para apagar a imagem mental de camponeses carregando tochas para queimar a casa. Ele o olhava a distância com uma intensidade que os vivos jamais alcançariam. — O lago está atrás dessas árvores. — disse. — Nas noites claras, quando a lua está perto, posso vê-lo brilhar. Como as estrelas, só que aqui na terra. — Eu adoraria ver. — a voz de Phoebe tremia a medida que o frio começava a entrar em sua pele. — Está gelada. — disse ele pegando sua mão, e ela quase sentiu como se estivesse mais quente que a dela. Desejava poder dizer-lhe algo inteligente e engraçado como faria Adam, algo como, Sim, por acaso esqueceu que estou viva? ou Todos os garotos mortos dizem que sou frígida, mas descobriu que não podia dizer como faria se estivesse sozinha com Adam e Margi. Tommy a levou para fora. — Quero te mostrar outro quarto. — voltaram ao segundo andar e ao corredor. O sentido de desorientação de Phoebe era total; sabia que as grandes janelas de cima davam para o pátio de trás da casa, mas pensou que haviam virado a direita, o qual os levaria de volta a essa direção. A música era uma pesada vibração de alguma parte longínqua. Tommy parou. — Phoebe. — disse, sua voz fez eco no quarto. — Sim, Tommy? — Confia em mim? Oh, oh! — Porque não confiaria? — Preciso que confie em mim. — Ok. Confio em você. Ele soltou sua mão. — Bom. — sua voz parecia afastar-se na escuridão. — Deite, por favor. — Uhh, Tommy, não sei... — Por favor. — disse ele. — Não é o que você pensa. Confie em mim.
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Phoebe podia escutar sua própria respiração na silenciosa escuridão. Que raios é isso? — No chão? — Por favor. Não podia vê-lo. Perguntava-se se Adam podia ouví-la gritar se chegasse a esse ponto. E o que acontece se seu grito era o sinal para que os Zumbis atacassem Adam em uma emboscada, cortando membro a membro enquanto ela estava na escuridão sozinha com Tommy? — Por favor. — disse ele. — Não..., não..., não..., vou te..., tocar..., se é isso..., de que..., tem..., medo. Ele era difícil de ler, como todos os de diferente fator biótipo. Suas expressões faciais eram mínimas, sua linguagem corporal ilegível, e suas vozes monótonas e sem tom. Não podia vê-lo, mas Phoebe pensou detectar tristeza em suas palavras, tão grande e profundo como o Oxoboxo. — Ok, Tommy. — disse, agachando-se até que a ponta de seus dedos roçaram o chão sujo, o movimento de seu corpo levantava o cheiro de pintura velha e mofada. — Confio em você. Deitou e acomodou sua saia longa sobre suas pernas. Cruzou as pernas nos joelhos e juntou as mãos em seu estômago. Seus olhos estavam abertos, e uma eternidade de escuridão girava a seu redor. — Obrigado. — ele sussurrou. Seus lábios estavam secos. Passou a língua por eles, tremendo. — Já..., volto. — disse ele. — Preciso..., pegar..., uma..., lanterna. — O que? Vai me deixar aqui? — Confia..., em mim. — disse. Ela também podia sentir e escutar seus passos sobre as taboas velhas enquanto se afastava. Phoebe, Phoebe, Phoebe, pensou. Em que se meteu agora?
144 Figuras roxas começaram a sair da escuridão, estranhas formas que irradiavam e davam voltas em cima dela. Desejou ter prestado mais atenção nas aulas de biologia, assim poderia ter alguma explicação racional para o efeito, algum conhecimento de como seus olhos ou o que quer fosse que estivesse causando essas formas roxas que a rodeava. O silêncio do quarto a havia feito se concentrar nos sons do andar de baixo — Michael Graves, talvez. — mas a música ficava cada vez mais débil, como se invisíveis mãos estivessem abraçando-a, mais rápido, levando-a pelo teto até o chão, em alguma parte distante. Tommy, onde você está? Espirrou, a poeira da madeira decomposta chegava ao seu nariz. Suas mãos estavam juntas como que bloqueando seu estômago. Estava completamente congelada, e era como se a escuridão estivesse tirando todo calor de seu corpo. Podia ouvir sua respiração muito rápida. Fechou seus olhos quando o escuro mostrava o que parecia ser rostos e apertos de mão, mesmo quando seus olhos estavam fechados os rostos continuavam ali. — T... Tommy? — sussurrou. Continuou imóvel - até seus tremores pararam. Então soube que jamais devia ter confiado nele, que ele jamais regressaria, que a havia deixado sozinha na escuridão. Quis levantar-se, sair do chão frio de madeira, mas não podia respirar. A poeira cobria seus pulmões, e quis mover-se, mas tinha medo. Porque, o que aconteceria se não podia mais se mover? O que aconteceria se tentava mover-se, mas seu corpo não a obedecia? O que aconteceria se ela e seu corpo já não eram um só porque a escuridão havia absorvido seu espírito como líquido em um vaso? Era assim que eles se sentiam? Perto dali uma luz cortou a escuridão. Ela levantou sua cabeça do chão, pensando ter escutado estralar seu pescoço. E ali estava Tommy com uma lanterna, de pé na entrada. Piscou enquanto ele corria a luz pelo quarto, e a força de sua respiração fez com que a poeira se levantasse e girasse. — Obrigado, Phoebe. Ela observou sua respiração, uma mescla de vapor e pó, circulando em cima dela. — Agora posso me levantar? — Por favor. Quero te mostrar..., algo. Moveu a luz até a parede atrás dela.
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— Olhe. — pediu. Ela se virou. A parede estava coberta com papéis que haviam sido pregados, ou em alguns casos, cravados no despedaçado gesso. Observou os papéis, alguns se agitavam com a corrente de ar. A maioria era fotografias digitais impressas em papel, mas havia umas fotografias mesmo e algumas instantâneas. O olhar em branco de tantos garotos bioticamente diferentes a olhavam como se a acusassem. — Cada um deles..., sentiu..., o que você sentiu agora. O frio. A escuridão. O..., medo. Pôde ver o medo gravado em seus rostos em branco. Um menino jovem com um gorro do Kiss Boston Red Sox afastou seu olhar da câmera, sua expressão como a de um cachorro depois de tanto apanhar, com medo de olhar para os olhos de seu dono. Uma menina cujo rosto estava horrivelmente queimado olhava diretamente para a lente, seus olhos sem pálpebras tinham uma insondável dor. — Cada um deles..., morreu..., e voltou. Havia um garoto com a cabeça cheia de cicatrizes, que havia tirado a camiseta e colocado uma larga faca em seu peito e olhava com uma alarmante calma e quietude na hora que tiraram a fotografia. Outra menina morta em um vestido de baile estava ao lado de um pôster do Castelo da Cinderela na Disneylândia, seu rosto consumido e sem sorriso. — Não..., pode..., saber..., o..., que..., sentimos. Voltou-se para a parede e os tristes garotos nela, escutando a mesma dor em alguma parte de suas monótonas palavras. Havia tantos deles na parede. Dezenas. Talvez centenas. Ela o abraçou, e embora não tenha sido um longo abraço, começou a sentirse mais quente no momento que se uniram aos garotos movendo-se ao ritmo do Heavy Metal no andar de baixo.
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CAPÍTULO 15 Adam chegou com a caminhonete em sua casa uma hora depois. Phoebe agradeceu-lhe, desejou-lhe boa noite e correu pelo pequeno trecho de grama que separava suas casas. Ele a observou afastar-se, e ela deve ter percebido porque se virou para despedir-se com a mão antes de colocar a chave na fechadura da porta da frente. Ele devolveu-lhe o gesto, esperando que um vampiro tentasse cair sobre ela vindo do telhado, ou um par de assaltantes à espreita entre os arbustos saltasse sobre ela, porque assim ele poderia entrar em ação. Atacaria com um turbilhão de chutes e socos com as mãos abertas, prenderia aos criminosos e ela saberia. Saberia que estava protegida e que ele estaria sempre lá para ela. Ela saberia de tudo. Ele bateu no capô do carro, frustrado. Havia apenas três outros carros e a caminhonete na casa do PTD, o que significava que Jimmy e Johnny ainda estavam na rua provocando o caos. Roubar carros, dirigir carros, quebrar carros. Por vezes Adam invejava suas vidas que pareciam muito simples. No interior, o PDT estava acordado e em frente à TV, assistindo um jogo de beisebol e dando uma série de risadas. Ao lado de sua poltrona reclinável, no chão, havia uma fileira de latas vazias. Ele o olhou e acenou com a cabeça. — Olá. — Olá, minha mãe está dormindo? — Sim. — respondeu o homem, ofegando. A camisa de trabalho do PDT estava aberta até o umbigo, e um tufo de pêlos pretos encaracolados saindo do V de sua camiseta, que tinha deixado de ser branca há algum tempo. Ainda tinha as mangas dos braços manchadas de gordura. — Estava muito cansada. Eu acho que seu patrão voltou a chutar-lhe o traseiro esta semana.
147 Adam balançou a cabeça. Sua mãe trabalhava em um banco, e seu chefe era um homem rude e arrogante, que a tinha feito chorar várias vezes. — Como foi seu encontro? Adam procurou sinais de sarcasmo, mas não viu nenhum naquele rosto curtido. O PTD gostava de assistir televisão com as luzes apagadas, e a iluminação azul da tela dava-lhe um aspecto pálido, como o de um garoto com diferente fator biótipo. — Foi bom. Fomos a uma festa. — Ah, é? Beberam cerveja? — Nah. — Bem, você pode pegar uma se quiser. — disse o PDT, olhando-o. — Se me trouxer outra. — Ok Joe. Obrigado. Adam foi até a geladeira e pegou um par de latas de cerveja, uma para ele e outra para o grande Joe Garrity, ou PDT. Joe não era um cara tão ruim depois de tomar a terceira ou quarta cerveja, o que costumava acontecer cerca de uma hora depois do jantar. Adam passou-lhe a cerveja e deitou no sofá, apoiando a lata em seu peito largo. — Você gosta dessa menina, né? — Joe perguntou depois de dar um ruidoso gole. — Sim. Sim, eu gosto. — É a líder de torcida? A loira? — Holly? — Adam perguntou. Os Soxs23 estavam 3x2, mas ainda faltava uma rodada. — Nah, mal a vi desde o verão. Joe deixou escapar um arroto silencioso e se moveu no banco, o qual estava prestes a fazer com que a lata caísse no chão. — É linda, mesmo que não se possa dizer que tenha uma grande personalidade.
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Time de Beisebol.
148 Personalidade; pensou Adam. Seu pai, Bill Layman, também era um alcoólatra, embora sua personalidade ia em direção oposta quando ficava bêbado. Enquanto que PDT se tornava mais tolerável, Hill Layman tornava-se um demônio. Adam bebeu de sua lata, se perguntando por que sua mãe precisava estar com caras que bebiam. Ele também pensou em Phoebe. O PDT soltou um palavrão quando uma bola rasa ricocheteou na luva do jogador da terceira base e acabou com a corrida para a primeira base, que poderia ter significado o empate. — Você está certo. — respondeu Adam depois de um tempo. — Então, quem é sua nova namorada? Enfim, a garota que mora ao lado? A verdade vos libertará. Pensou Adam. Deu outro gole da lata. — Sim. O PDT ficou em silêncio por um momento. O batedor seguinte acertou a bola direto para a segunda base, que terminou com um único duplo jogo. — Parece uma boa garota. — comentou Joe. — Sim. Joe adormeceu na nona rodada, em algum momento entre a detalhada finalização dos lançamentos e a aprofundada análise das mudanças na ordem de rebatedores. Adam ficou ouvindo seus roncos, até que ouviu um de seus irmãos chegando de carro, foi quando ele recolheu as latas vazias, as lavou e jogou-as no lixo para reciclagem. Depois entrou Johnny, cheirando a cerveja e cigarro, deu-lhe um soco no ombro. — Olá, irmãozinho. — cumprimentou-o a caminho para seu quarto. — Olá. — respondeu Adam. Jogou o resto de sua cerveja na pia antes de ir para seu quarto.
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Phoebe pegou o ônibus no dia seguinte, portanto Adam estava sozinho com seus pensamentos durante todo o caminho. Ele sintonizou em uma rádio esportiva, algo que nunca fazia quando Phoebe estava na caminhonete, depois de alguns minutos, lembrou que o agradável charme exibido por Joe na noite anterior não se prorrogaria, já que o Sox acabou perdendo no nono com um home run24 de duas corridas. Adeus, Joe, obrigado pela visita. Olá, PDT. Adam se perguntou se haveria mais garotos cuja vida familiar dependesse em sua maior parte do consumo de álcool e das partidas de jogos do Sox. Chegou cedo ao Instituto. Alguns dos professores ainda estavam entrando e não havia chegado nenhum dos ônibus. Ele entrou no estacionamento para estudantes ao pé da colina e pensou em entrar, mas decidiu parar. Pegou sua carteira, encontrou o gasto exemplar de O Morro dos Ventos Uivantes e jogou-o no assento ao lado, como se pretendesse lê-lo. O apresentador da rádio estava analisando a relativa importância do jogo dos Red Sox no quadro cosmos, e Adam pegou o livro de história porque tinha um exame, então percebeu que a única razão pela qual tinha ficado no carro era para ver Phoebe sair do ônibus e entrar na escola. — Porra. — ele pensou. Colocou de novo O Morro dos Ventos Uivantes na mochila, pegou seu equipamento no tapete na traseira da caminhonete e foi até o prédio. Ele estava na metade do caminho quando viu um familiar carro verde parar perto da curva da parada de ônibus e uma juba de cabelo laranja pálido aparecer acima do teto do carro. Evan despediu-se do motorista com a mão e ficou olhando o carro se afastar. Adam subiu correndo as escadas que faltavam para dar uma boa olhada no motorista, que era uma mulher com os cabelos um pouco mais escuros do que de Evan. A mãe dele, ele pensou. Os garotos mortos podem ter mães. — Olá, Evan! — chamou-o. — Espere!
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No beisebol, home run (denotado HR) é uma rebatida na qual o rebatedor é capaz de circular todas as bases, terminando na casa base.
150 Evan se virou como se esperasse que o grito fosse acompanhado por uma pedra. Adam chamou-o novamente, e então Evan o cumprimentou com a mão e o esperou na porta da escola. — Olá. — disse Adam, as semanas de treinamento lhe permitiam respirar sem problemas. — Obrigado pela noite passada, nós tivemos um grande momento. Ele percebeu que Evan tinha uma chuva de pontinhos bege espalhados pela ponta do nariz e sob os olhos, os fantasmas de suas sardas. Era cerca de duas vezes mais baixo do que Adam, um garoto pequeno e magro, vestido de jeans e uma camiseta que ficava muito grande nele. Olhava para Adam como se esperasse alguma piada. — Foi bom ver onde vocês ficam. Quero dizer, ouvir a música que vocês gostam e outras coisas. — Adam balançou a cabeça e sussurrou: — Isso soa bem idiota, hein? Evan soltou sua estranha risada, que era como um balido de cordeiro. — Quem dera..., ainda pudesse..., gritar..., eu..., tento..., uma e outra vez..., mas não sai. Antes eu era..., genial. — Sério? — Adam perguntou, sem saber bem o que dizer depois e sentindose muito estúpido por ter falado antes. Enquanto Evan tentava dizer algo, um ônibus aproximou-se pelo caminho, e suas palavras se perderam no som gutural do motor. — O quê? — Eu disse..., que Phoebe e..., você..., foram..., as primeiras..., pessoas..., vivas que vieram nos visitar. — Sério? Uau, que honra. Então..., você não..., vai ficar lá? — Estou com a minha..., família. — respondeu. Outro ônibus subiu pela colina, e Adam viu os cabelos com ponta rosa de Margi através de uma das janelas de trás. — Ah, é? Foi sua mãe que te trouxe? — Evan assentiu, e para Adam pareceu detectar a sombra de um sorriso em seu rosto pálido. — Está certo. Então, ei, eu estava pensando... Tenho que lhe fazer uma pergunta, mas não a leve a mal, ok? Não quero insultá-lo, por isso não se sinta insultado, certo? Evan parecia tentar dar de ombros, ainda que um levantasse consideravelmente mais do que o outro.
151 — Manda. — Bem, o que eu me perguntava era... — começou Adam, consciente que atrás dele, os ônibus começavam a soltar os seus passageiros. — Como é? Como é estar morto? Evan olhou-o com seus olhos azuis vazios, sem piscar, por tanto tempo que Adam pensou que, apesar de suas precauções, tinha-o insultado. Mas, então, o garoto falou. — Eu não sei. Como é…, estar vivo? Eles começaram a rir de novo, mas sem nenhuma mudança de expressão, soava como se alguém tivesse pisado em um daqueles cachorros de brinquedo que assobiam ao esmagá-los. Adam sorriu. Olhou para os ônibus exatamente quando Phoebe descia e levantou a mão para saudá-la. Ela não estava olhando, uma cortina de brilhante cabelo preto cobria-lhe o rosto enquanto Margi falava com ela, atravessando o ar com os braços cheios de pulseiras para dar ênfase ao absurdo que estava lhe contando. Tommy estava bem atrás delas. Phoebe riu, e seu cabelo caiu sobre o ombro e expôs sua boca aberta e sua suave pele branca. Adam sorriu, mas então Tommy conseguiu alcançá-las e cobriulhe a visão. — Vamos para a aula, Evan. — Adam disse com um suspiro, jogou sua mochila no ombro e diminuiu um pouco para que o garoto pudesse seguir-lhe o ritmo.
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CAPÍTULO 16
—
Boa tarde para todos. — disse Angela, entrando na sala com passos
rápidos. Ao se aproximar de Phoebe, no caminho para o centro da sala, pôs uma mão macia e quente no seu ombro. Atrás dela vinham Alish e um jovem atlético que Phoebe identificou rapidamente: era Skip Slydell, autor de muitos livros e artigos sobre o movimento dos mortos-vivos. — Hoje temos um convidado especial que vocês reconhecerão do vídeo da CNN na semana passada. Vamos dar boas-vindas a Skip Slydell, por favor. — Obrigado, Alish e senhorita Hunter, por permitir-me estar aqui hoje. — respondeu ele, cumprimentando. — E, sobretudo, obrigado a vocês, estudantes, por aguentar-me durante a próxima hora. Margi olhou para Phoebe e revirou os olhos, já que cada vez que a diretora Kim ou Angela, apresentavam um orador convidado faziam com uma espécie de solenidade eufórica extrema, como se a chegada do convidado fosse uma ocasião alegre e séria ao mesmo tempo. A primeira coisa que Slydell fez foi entregar cartões de visita para todos os garotos. Phoebe viu que Tayshawn agarrava o seu com as duas mãos e levava a poucos centímetros do nariz, ficando vesgo. SKYP SLYDELL ENTERPRISES, dizia o cartão, e se via uma foto da cabeça e dos ombros de Skip sorrindo sobre uma pilha de livros e produtos. EM COLABORAÇÃO COM A FUNDAÇÃO HUNTER. Havia um número de telefone gratuito na parte de baixo do cartão. — Vamos começar; certo? — disse Slydell. — A senhorita Hunter me disse que um dos principais objetivos da fundação em que trabalha e aprende é algo que gosto de me referir como aclimatação de pessoas com diferente fator biótipo na
153 sociedade, assim como a aclimatação da sociedade para que aceitem melhor as pessoas com diferente fator biótipo em seu seio. Tem sentido? Alguma pergunta? — não esperou que respondêssemos a nenhuma das duas questões. Caminhava enquanto falava, agitando suas grandes mãos de aspecto suave, e apontando para um e outro lado para enfatizar suas opiniões. Procurou olhar para os olhos de todas e cada uma das pessoas presentes, e sustentava o olhar um pouco mais quando se tratava de um garoto com DFB. Falava tão depressa que Phoebe pensou que a maioria dos mortos não poderia segui-lo. Para ela também teria sido difícil segui-lo se não houvesse preparado um café ao entrar. — Poderiam todos olhar para cá? Parece certo? — havia duas longas mesas no fundo da sala, as duas cobertas com um pano branco que ocultava o que havia debaixo. Colocou-se diante delas. — Portanto, a pergunta é: como podemos facilitar a aclimatação? Como podemos conseguir isso? O que pretendemos não é fácil. Mudar a cultura. Mudar a cultura é muito, muito difícil, inclusive neste país. Vocês e eu... — começou a dizer, e sustentou o olhar de Sylvia durante uma pausa de quase vinte segundos. — ...vocês e eu não escolhemos o caminho fácil. Absolutamente. Não é fácil transformar a cultura. — apoiou-se na mesa, cambaleando um pouco, como se a enormidade da tarefa houvesse deixado-o sem fôlego. Margi começou a fazer um ruído, como um zumbido; e Phoebe sorriu, por que significava que sua amiga tinha ativado o detector de idiotices. — O que vamos fazer não é simples, mas pode ser feito. Inclusive aqui, nos Estados Unidos. Elvis Presley fez; Martin Luther King fez; Jimi Hendrix; John F. Kennedy; Bill Gates; Michael Jordan; os dois caras que criaram South Park. O coletivo americano de santos; pensou Phoebe. — E nós também podemos fazer. Estão entendendo? O certo é que já se foi feito o maior, o trabalho mais complicado. Sabem por quê? — perguntou, sorrindo. — Por que os mortos-vivos são um fato consumado da vida. Que gracioso, não é? Digam comigo: Os mortos-vivos são um fato consumado da vida. Ninguém se uniu a ele no coro, mais alguns garotos pareciam um pouco incomodados; a expressão mortos-vivos não era considerada muito educada em público, e muito menos em uma sala cheia de mortos-vivos. — O que vocês sentiram com o que acabei de dizer? Pensem por um minuto. Os mortos-vivos são um fato consumado na vida. Como se sentem? Karen, não? Poderia compartilhar conosco seus sentimentos a respeito? Karen piscou e disse: — É claro. — depois piscou outra vez e continuou falando. — Você apresentou uma realidade que nem todos decidem..., aceitar.
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— Bem. — disse Slydell, sorrindo. — Bem. Uma realidade que nem todos decidem aceitar. Bem. Vou escrever. Extraordinário. Obrigado pela contribuição. E a terminologia que usei? O que você acha? — Eu não acho..., nada. Mais me irrita que algumas pessoas utilizem essas palavras para se referir a mim. — No entanto, não te irrita que eu diga, não é? — perguntou ele, tirando o notebook de cima da mesa. Ela sacudiu sua cabeça, fazendo seu cabelo se agitar como cortinas platinadas levadas pela brisa. — Obrigado, significa muito, obrigado. — Ao menos, por agora. — respondeu ela, devolvendo-lhe a olhada, com calma. Evan deixou escapar seu riso de cordeiro. — Parece-me justo. — respondeu Slydell, rindo também. Removeu um dos tecidos, como um mágico prestes a revelar um truque. — Angela me contou que vocês..., os que estão mortos..., também gostam de se chamar de Zumbis. É verdade? Pode me responder qualquer um. — Sim. — respondeu Evan. — Se aplicam as mesmas regras? Vocês podem dizer Zumbis, mas se irritam se alguém..., alguém vivo diz? — Depende. — respondeu Tommy. — De que? — perguntou Skip, assentindo para animá-lo. — Depende de como diga. — Certo. — seguiu Slydell, voltando-se para a outra metade da sala, onde estavam os garotos vivos. — E vocês? Não fiquem aí sentados como Zumbis, enquanto os Zumbis estão me respondendo tudo! O que acham? — Sobre o que? — perguntou Adam, visivelmente irritado.
155 — Sobre a palavra Zumbi! Você já chamou assim alguma vez Tommy Williams? — Não. — Bom, e por que não? — insistiu ele, levantando os braços para o céu. Parecia estar emocionando-se muito com o tema. — Por que respeito Tommy. Não diria nada que pudesse feri-lo. — E você, Williams? — perguntou Slydell, assentindo. — Importa-se como te chama o senhor Layman? Você se irritaria se ele te chamasse de cabeça morta ou Zumbi? Tommy sacudiu a cabeça. — Por quê? — Por que Adam..., é meu amigo. — Aleluia! — Slydell gritou, olhando para o teto. — Vocês vêem? Vocês todos vêem? Nosso amigo Layman não quer chamar de Zumbi seu colega Tommy por que o respeita. E o velho Tommy não se importaria que Adam o fizesse, por que o considera um amigo. Vocês vêem? Entendem aonde quero chegar? — se colocou na frente de Zumbrowski com as mãos nos quadris. — Kevin, Sylvia, Margi, sabem o que estes dois estão fazendo? Esses dois estão transformando a cultura, é disso que se trata. — pegou seus artigos misteriosos da mesa e começou a desdobrar o que pareceu ser uma camisa negra. — Como ficaram amigos, garotos? Foi por causa do futebol? — Sim. — Basicamente. — Então, ele tomou uma atitude radical (um Zumbi colocar ombreiras e capacete) para que isso acontecesse, não é? — Acho que sim. — respondeu Adam. — Você acha? Você acha? Será melhor que saiba, filho, por que Tommy e você estão no mesmíssimo começo de uma nova sociedade. Vocês são essa sociedade. A transformação sempre requer uma atitude radical. Se Elvis Presley não tivesse tomado a radical decisão de cantar um estilo de música
156 tradicionalmente reservado aos negros, pode ser que nunca houvéssemos experimentado a transformação do rock and roll para a sociedade moderna. Se Martin Luther King não houvesse tomado a radical decisão de organizar a causa a favor dos direitos humanos e falar sobre ela, pode ser que nunca houvéssemos passado pela transformação do estado opressor para um estado livre com igualdade de oportunidade para todos. E essa transformação ainda não terminou. Vocês, garotos, tanto os vivos como os mortos, são a prova. — Que decisão radical tomou Michael Jordan? — perguntou Thornton. — Um garoto esperto, hein? — comentou Slydell, sorrindo. — Nenhuma. Simplesmente era radicalmente melhor do que os demais, e só com isso conseguiu transformar o jogo. E isso é o que queremos aqui: transformar o jogo. Phoebe se perguntou como ele podia falar sem parar, sem nem sequer parar para respirar. Pensou no divertido (e cansativo) que seria observar uma conversa entre ele e Margi; mas Margi não estava de bom humor. — Certo. Um pouco mais de filosofia. Depois lhes direi como podem me ajudar. E quando digo que podem me ajudar, na realidade estou dizendo que podem ajudar a sociedade e ajudar a vocês mesmos. Ajudem-me a fazer isso, certo? Agora, vocês dois, Adam e Tommy. São amigos. Você teve algum outro amigo morto antes que Tommy, Adam? — Não, a verdade é que não. — E você, Tommy? Algum saco de sangue que você considera seu amigo? — Alguns. — respondeu ele, olhando para Phoebe. — Alguns. Bom, certo. Mas, neste caso, faz falta uma atitude radical da sua parte para transformar Adam. Sem a atitude radical, a transformação não será produzida. Adam não terá amigos mortos. — Um momento. — interrompeu-lhe Adam. — Não pode supor... — Segue meu raciocínio, Adam. Chegaremos em suas opiniões dentro de um momento. Sem a atitude radical, a transformação não será produzida. Estão todos felizes com essa ação como Adam? Todos deram as boas-vindas para Tommy Williams na equipe de futebol e tudo foi cor de rosa? Não? Não! Pelo que lembro, houve manifestações na rua! Se os jornais não estão errados, como sabemos que acontece muito, houve cartazes, bandeiras e slogans. Atiraram frutas!
157 Phoebe olhou para Adam que tinha se sentado afastado do grupo, como sempre fazia. Tinha as mãos entrelaçadas e os cotovelos sobre os joelhos. Olhava para o chão. — Esse é o segundo ingrediente necessário para a mudança de cultura, gente. A segunda chave da transformação: o conflito. A atitude radical unida a resposta radical. Só então poderemos conseguir uma verdadeira mudança. Utilizei palavras fortes para uma razão, palavras mal-educadas como Zumbis, mortosvivos, e saco de sangue. E a razão não era que eu desejasse soar ofensivo. Utilizeias por que, agora mesmo, são palavras radicais e queria provocar uma reação radical em vocês. Alguns não se importam em usar a palavra Zumbi entre vocês. Outros não gostam de forma alguma deste termo. Com minhas desculpas para Angela, necessito sua ajuda para cunhar um termo que todos nós gostemos, por que pessoas com diferente fator biótipo não nos serve. É muito frio, tem muitas sílabas. Falta estilo. Na verdade, não é bastante sexy. Por outro lado, Zumbi..., pessoalmente, me parece que é uma declaração de princípios. O primeiro passo para transformar uma cultura é dar nomes e definições aos aspectos transformadores da mesma. Vocês são Zumbis, garotos, e tem que usar este termo com orgulho, independentemente da reação que provoque. Phoebe se perguntou se os demais garotos se davam conta que Skip lhes havia dado três primeiros passos em sua conversa. Mas era como um trem que deveria voltar para a estação antes do pôr do sol; Colette havia levantado a mão em certo momento do discurso sobre os aspectos unificadores dos esportes de equipe, e Slydell ainda não tinha a deixado falar. Desdobrou a camiseta que segurava. Era uma camiseta preta básica com as palavras: MORTO... E DESFRUTANDO! Em letras verdes que seguramente brilhavam na escuridão. A palavra, morto estava escrita com uma fonte de filme de terror, e o resto em letras maiúsculas. — O que vocês acham da camiseta? — perguntou Skip. — O que faz vocês sentirem? — Eu acho que está..., legal. — disse Evan, sorrindo. — Bem, para você. — respondeu ele, atirando uma camiseta. — E esta? — era uma camiseta cinza com a manga branca e as palavras: PODER ZUMBI! Escritas com a mesma fonte de filme de terror. A caricatura do punho tinha a pele esticada, de modo que as articulações ficavam completamente visíveis. — Desta tenho algumas. — lançou uma para Tayshawn, outra para Sylvia e outra para Thornton. — Esta é um pouco atrevida. — disse. — Um pouco mais radical. Vejam o que acham. — a camiseta era preta com umas letras sem adornos. Dizia: TUMBAS
158 ABERTAS, MENTES ABERTAS. Em cima de uma imagem estilizada de uma tumba aberta em um cemitério. — Eu gosto. — disse Phoebe, junto com Karen. — Sério? — respondeu Slydell. — Ótimo, tenho dois. Pegou alguns artigos mais: gorros, pulseiras e tatuagens temporárias que também serviam para a pele dos mortos. — Bom; garotos. — disse Skip. — Resumindo: não temam ser quem são. E tampouco tema dizer aos demais quem são. Entendam que o que lhes dei foi desenhado para provocar uma reação nas pessoas, e que essa reação nem sempre será agradável. Tem que ser valentes, por que ser valente é o primeiro passo para a transformação da cultura. Outra vez, pensou Phoebe. Outro primeiro passo. Acariciou o suave pano de algodão de sua camiseta nova. A verdade é que era legal... — Uma última coisa e os deixarei tranquilos. Como sabem, no início da minha palestra disse que necessitava de sua ajuda para conseguir a mudança, e é verdade. Gostemos ou não, uma das formas mais rápidas de conseguir uma mudança cultural é colocar a mensagem nas mãos dos jovens modernos. Em outras palavras, necessito de uma equipe de rua que me ajude a levar a mensagem. Muitos destes produtos serão vendidos nas lojas Wild Thingz! e em algumas lojas de músicas. Também vamos ter um conjunto musical, que terá os Creeps, os Restless Souls e outras bandas que certamente vocês conhecem. Vou dar-lhes funções: o que quero é que pensem e anotem ideias para outros produtos, seja de moda, entretenimento ou o que seja, que acham que ajudará a dar conhecimento para nossa mensagem de transformação radical e começar a mudar de verdade o mundo. Assim que pensarem nisso, nos divertiremos analisando quando a encantadora senhorita Angela voltar a me convidar. Também trarei mais presentes. Podem escrever para skippy@slydellco.com. Adoraria receber suas mensagens. Estou sem tempo, assim que paro agora. Obrigado! Phoebe o viu sair da sala. Alguns garotos aplaudiram e, sem voltar-se, ele levantou a mão por cima da cabeça, como se celebrasse seu triunfo. O salão parecia vazio e sem energia sem suas palavras. — Ainda nos fica tempo. — disse Margi, olhando para o celular com uma cara aborrecida. — Ei, Daffy. — respondeu Adam. — Para você não deram nada.
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Margi encolheu seus ombros. Seguia sendo a mais calada do grupo; falava inclusive menos que Sylvia e Colette, e só fazia quando lhe perguntavam, o que alucinava Phoebe. — Talvez não esteja claro qual é exatamente nossa mensagem de..., transformação. — disse Karen. — Para mim passou. Margi pareceu zangada, como se pensasse que Karen zombasse dela, mas, antes que Phoebe pudesse intervir, Adam disse: — Acho que a mensagem é que podemos chamar a atenção sobre o sofrimento das pessoas com diferente fator biótipo se conseguirmos que nossos amigos comprem camisetas. Evan, que estava usando a camiseta e o gorro negro de beisebol que dizia simplesmente, MORTO, riu com suas gargalhadas abruptas e desconcertantes. Parecia ainda mais pálido com o cabelo vermelho esmagado pelo gorro preto. — Então o caminho para a mudança social nos Estados Unidos passa através do consumismo ostentoso, é? — comentou Karen. — Esse tema de Zumbis está muito batido. — fez uma pausa e piscou para Phoebe. — Mas a camiseta é legal.
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CAPÍTULO 17 Phoebe não gostava de mentir para seus pais, mas às vezes era necessário. Não importava quão progressistas eles diziam ser — e Phoebe tinha que admitir que eles eram bastante progressistas — não havia forma de que a deixassem passar um tempo a sós com um garoto morto. Estava sentada no refeitório com Adam e Margi, ambos a olhavam com uma mistura de preocupação e fúria. — Deus. — disse. — Vocês estão parecendo meus pais, e estão me assustando. — Espero que não. — disse Margi. — Eu gostaria de pensar que você diria a verdade para Lelo Man e para mim. — Agora que você envolveu Daffy e eu em sua impenetrável rede de mentiras. — disse Adam. — Repete o que devemos dizer. Phoebe suspirou. — Fui até Margi para escutar um pouco de música nova — começou. — Ah. O velho recurso. — Correto. Escutamos um pouco de música e, então, chamamos Adam para ver se ele queria ir para o cinema. — Sim, é provável. — disse Adam. — Que filme? Nem sequer sei o que está em cartaz. — Espera um minuto. Por que sairíamos com Adam? Phoebe suspirou outra vez. — Por que precisamos sair de sua casa, caso seus pais falem com os meus.
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— Por que me envolver em primeiro lugar? — disse Margi. — Por que você não diz que estava com Adam? Phoebe encolheu seus ombros. — Não pensei nisso. Sabe como essas histórias escapam do controle. Margi fez um som de desgosto e deixou os restos de seu sanduíche de queijo na mesa. Adam estava movendo sua cabeça. — Então, basicamente, para cobrir seu encontro secreto, tenho que sair da minha casa à noite, para que se teu pai olhe pela janela e não veja a caminhonete do PDT no caminho da entrada. Phoebe se encolheu em seu assento. — Você não tem planos, certo? — Ia adiantar minha tarefa de inglês. Ia ler o Morro dos Ventos Uivantes e tomar um bom banho de espuma. — riem. — Embora, honestamente, espero conseguir a caminhonete. — Então, você vai realmente fazer isso? — disse Margi. — Ir esconder-se no bosque com seus outros amigos Zumbis? — Estava pensando que talvez você e Adam pudessem ir ver um filme. Dessa forma, você pode me contar a história enquanto Adam me leva para casa. Margi piscou e jogou sua sobremesa, um pedaço de bolo confeitado, que ricocheteou no peito de Phoebe. Adam olhou para Margi e logo para Phoebe. — Você paga. — disse para Phoebe.
Margi tinha algumas perguntas a mais para Phoebe no ônibus no caminho para casa.
162 — Não posso acreditar que você queira que eu minta por você. — disse Margi com as pontas de sua franja rosa roçando na janela enquanto se assegurava de não olhar para Phoebe. — Sim, pode. E isso não é o que está te irritando. — Oh, sério, senhorita telepata? Então, o que é que está me irritando? Phoebe fechou um olho e tocou a testa de Margi. — Sinto confusão..., e raiva... e preocupação. — É claro que estou preocupada, tonta! Ele é um garoto morto. — Shhh! — Colette estava sentada a três assentos na frente delas, com Tommy no outro lado do corredor. — Não me faça shhh, Phoebe. É estranho e você sabe. Olha, estou arrepiada. Toca meu braço. Phoebe fez isso. — Sim, você está arrepiada. Ou com um péssimo caso de acne no braço. Ou como chamo um braço acne. No inicio, seu estúpido comentário falhou em gerar a risada que tinha a intenção de conseguir, mas Margi não pôde se conter mais e bufou, movendo a cabeça. Phoebe deu palmadinhas em suas costas. — Por favor, agora você vai ser agradável? É só um amigo e vamos para a casa de sua mãe, certo? Sua mãe chega em casa às quatro. — Um monte de coisas pode acontecer em uma hora. — Por favor. Como se eu pudesse. — dá uma cotovelada nas costas de Margi e Margi ri, deixando-a mais irritada. — É horripilante. — Tenha uma mente aberta. — Asqueroso. — Vá para casa e coloque a camisa ‘Poder Zumbi’!
163 — Não tenho essa. Tenho algumas ‘Meus Melhores Amigos Estão Mortos’, e só por que Angela se assegurou que eu não chegasse em casa com as mãos vazias. — Isso é lamentável. — Bastante. — Eu pensei em umas boas para a próxima semana: ‘A Vida É Só Um Estado Mental’, ‘O Que Morreu Com A Maioria Dos Brinquedos... Está Sentado Ali’. — Divertido. — disse Margi, sem entusiasmo. — Phoebe. — Sim? — Tenha cuidado. A parada de Margi estava próxima. Phoebe se levantou para deixá-la sair.
O ônibus parou aos pés do estacionamento de Trailers Oxoboxo Pines. A grossa areia do caminho de entrada rangia sob as botas de Phoebe, enquanto caminhava ao lado de Tommy, que não havia falado desde que chegaram. — Onde Colette vive? — perguntou Phoebe, dando-se conta do que tinha dito. — Refiro-me a onde ela está morando... Tommy sorriu. Seus lábios ultimamente pareciam mais flexíveis; ao invés do leve movimento de um lado; ambos os cantos se estenderam para cima. — Na Casa Assombrada. — Sério? Quando seus pais se mudaram... — As leis..., nem sempre protegem..., os mortos. E, às vezes, fazem isso. Um pai já não é responsável..., legalmente..., em encarregar-se de seu..., filho morto. Colette foi abandonada. Como muitos de nós.
164 Phoebe pensou nos pais de Colette, em uma viagem que fizeram para praia antes que Colette morresse. Phoebe lembrava que estava no assento traseiro entre Colette e seu irmão ao longo do caminho para Misquamicut. A Sra. Beauvoir passou o dia se bronzeando enquanto Peter jogava Frisbee com ela e Colette, que inclusive então não tinha aptidão para o jogo. O Sr. Beauvoir dormiu em uma espreguiçadeira durante toda à tarde. Depois da morte de Colette, ele conseguiu um trabalho em alguma parte do sul, e se mudaram sem Colette. — Então, como pode se manter sozinha? — disse. — Quero dizer, se eu tentasse viver em uma casa abandonada, me pegariam e me enviariam para um reformatório ou algo assim. — Você não está morta. Chegaram a um trailer com persianas azuis e um jardim bem cuidado. Havia um toldo de plástico sobre o caminho que levava até a entrada. Algumas plantas e flores estavam em vasos no caminho ao longo da terra. Tommy pegou uma chave de seu bolso, um processo que exigia muito mais para ele do que para outro garoto normal. Phoebe o observava, insegura se deveria oferecer a sua ajuda. — Somos..., inapropriados. Ninguém sabe o que..., fazer conosco. Não sabemos o que..., fazer com nós mesmos. Abriu a porta e entraram na sala de estar. Havia um sofá, uma TV e plantas para todos os lados. Havia uma pequena mesa circular com quatro cadeiras no canto próximo a uma cortina de miçangas que separava a sala da cozinha. Um gordo gato preto caminhou até eles e cheirou as botas de Phoebe. Phoebe se inclinou para acariciar o gato, e este arqueou suas costas em agradecimento. — Ele é Gamera. — disse Tommy. — Odeia as pessoas mortas. Gamera gostava que lhe coçassem o pescoço. Phoebe olhou para Tommy, e ele sorriu. — Há um refúgio em Winford em que..., muitos Zumbis..., se hospedam na Missão de São Judas. É dirigido..., por um sacerdote que é amável..., a nossa causa. Colette se hospeda, às vezes, lá e... Kevin. Não é um lar. Para a maioria, a Casa Assombrada é melhor.
165 Phoebe se ajeitou, sacudindo um pouco do pêlo de gato de suas calças. Gamera se enrolava ao redor de suas botas. — Onde se hospedam os garotos da prática estudantil? Karen e os outros? — Karen..., está com seus pais. Evan também. Tayshawn se hospeda com sua avó, mas a situação é..., diferente. Sylvia está..., na Fundação. — Vive lá? — perguntou. Tommy sorriu. — Sabe o que quero dizer. Pensei que você tinha dito que ficavam na Casa Assombrada. — Queremos que fique na Casa Assombrada. Mas se precisa de..., algo. A fundação está..., bem equipada. — Ah. — Sim. — disse. — Nós também temos preocupações. — A quem você se refere com o ‘nós’? É a realeza ‘nós’? Ou o apostólico ‘nós’? Pensou que seu sorriso se ampliou um pouco mais. — Quero te mostrar algo. — disse, e lhe faz sinal para que o seguisse pela cozinha até uma porta fechada, no qual sem dúvida era seu quarto. — Hm, você pode me dizer onde fica o banheiro? — Por esse caminho. A..., direita. — Obrigada. Por uns minutos, deixou sua mão sob a torneira, a água fria lhe fazendo cócegas e a essência floral do sabão enchendo suas fossas nasais. As palavras de Margi faziam eco em sua cabeça, e ficou atrás da porta fechada mais do que o necessário. Voltou. A porta de Tommy estava aberta e sua pele tinha adquirido um tom azul enquanto sentava na frente do computador na escuridão. O quarto dele era uma versão masculina do dela, com uns livros, um som e pôsteres, as diferenças eram que o som era muito mais barato e a parede estava misturada com estrelas esportivas entre os músicos. E o quarto era muito mais bonito. — Quero te mostrar isto. — disse Tommy, e apontou para a tela.
166 Phoebe viu que Tommy estava em um site chamado minhasupostanaomorte.com, a página principal estava decorada com desenhos de Zumbis saindo das tumbas, ameaçando as pessoas modelos, a maioria loira e com muito peito. Também estavam presentes alguns símbolos conhecidos do heavy metal. — O que é isto? — disse, inclinando-se sobre seu ombro. Havia um delicado perfume nele, um que não conseguia identificar completamente. Algo naturalista. Resistiu a necessidade de tocar seu ombro. — Meu blog. — Seu blog? Não é possível. — Sim, é. Tenho cerca de mil seguidores. — Uau. — inclinou-se mais. Quando ele digitava podia ver mover os músculos do seu braço sob sua camisa. Havia vários links bons na página principal: Arquivos, Entradas, Ex Alunos MSCU, Links. — Tento escrever toda..., noite. — Posso ler algo? Ele clica no link de Entradas, e havia um post do dia anterior. Começa a ler. Semana três do experimento necrohumanitário da Fundação Hunter. A classe estava sujeita aos insensíveis, mas persuasivos argumentos do Sr. Stevens – Skip – Slydell, com o qual todos vocês estão bem familiarizados, graças a um bom ano de trabalho no seu blog. As teses principais de Skip parecem ser que a comunidade Zumbi pode criar autenticidade através do consumo e slogans. Repartiu laços decorativos na classe; eu mesmo sou agora um orgulhoso proprietário de uma nova camiseta do Poder Zumbi! Há algo quase simpático em seu descarado charlatanismo, e a forma com que nos diz tem uma certa elegância. Não posso fazer mais do que questionar seus motivos, o qual seguramente são as entradas de dinheiro, mas ao mesmo tempo você não pode fazer mais do que se meter no círculo de transformação positiva. Se há alguma apresentação brega em torno da verdade universal, por acaso a faz menos válida?
167 Em um universo perfeito, não necessitaríamos dos Skip Slydell do mundo para comunicarmos às mensagens que nós mesmos criamos. Mas a verdade é que até que sejamos um grupo capaz de tomar completamente a vantagem da ética de fazê-lo você mesmo que propaga este país, estamos na misericórdia dos Slydells. Até que tenhamos notícia, uma voz, uma parte nos meios de comunicação, precisamos aceitar o que podemos conseguir. Até que possamos ser contratados e tenhamos algum valor monetário, precisamos pegar o que podemos conseguir. Até o momento muitos de nós tem estado morto durante três anos, significando que em termos humanos alguns de nos agora tem dezoito anos e deveriam ter o direito ao voto, mas por causa de nossos certificados de óbito são, para todos os efeitos e propósitos, uma completa revogação de nossos direitos e cidadania. Então trabalharei o melhor que possa com Skip Slydell. Também sei que venderá a todos, incluindo-me, mas esse tipo de traição é necessária para fazer com que mudanças ocorram. No final, havia um anúncio que piscava e dizia: Apoio a Proposição 77. — O que é a proposição 77? — Uma proposta para ter uma remissão governamental de um certificado de renascimento para todos aqueles que regressaram..., da morte. É o que nos concederia alguns direitos e..., cidadania. — Assim vocês poderão ser como os humanos, hein? Ele a olha. ― Má escolha de palavras? — Certo, mas você sabe como somos as bolsas de sangue. Embora, de verdade, Tommy. Isto é incrível. Realmente você é um bom escritor. — Eu gostaria de ser um melhor..., digitador. — disse, sacudindo seus dedos rígidos. Seus olhares se encontram, e Phoebe imagina que sua pele pálida não parecia tão diferente da dele no suave brilho azul do monitor. Phoebe escutou a porta principal se abrindo, e saltou como se tivessem pegado-a fazendo algo errado. Gamera saltou do colo de Tommy e correu para a sala de estar.
168 — Chegueeeei! — uma forte voz se espalhou pelo reboque. Uma mulher loira em um uniforme de enfermeira entrou e pendurou suas chaves em um gancho na parede. — Você deve ser Phoebe. — disse, cruzando a cozinha e tocando os braços de Phoebe. Phoebe pode sentir o calor de suas mãos através da grossa manga de sua blusa. — Eu ouvi muito sobre você. Seja bem-vinda. Phoebe apenas conseguiu dizer olá enquanto a mulher a abraçava. — Phoebe. — disse Tommy. — Minha mãe. — Chame-me de Faith. — disse, seus olhos azuis brilhando nos de Phoebe a ponto que ela se perguntava se a mulher estava preste a chorar. Faith soltou Phoebe e colocou um braço ao redor dos ombros de seu filho, abstendo-se de darlhe um forte beijo úmido na bochecha. — Ei, você. — disse. — Como está? — Diga-me você. Eu só estava mostrando a Phoebe o site. — Meu filho, o escritor. — disse. — Não é fantástico? Phoebe assentiu, ainda em choque. Realmente não tinha sido capaz de analisar a mãe de Tommy, e a grande emoção da pequena mulher não era nada do que ela tinha esperado. — Thomas Williams! ― disse Faith. — Você não deu para a pobre garota algo para comer ou beber. Sabe; alguns de nós ainda precisamos fazer isso. — Sinto muito, mãe. — disse, enquanto sua mãe dava passos para a cozinha e pegava uma sacola com salgadinhos de queijo de vasos das janelas. — O que você quer Phoebe? Tenho Pepsi diet, leite, suco de laranja. Posso fazer café. Devo preparar café? — Escolho café. — Boa garota! — disse. Seu sorriso inclusive fazia o de Angela Hunter parecer enviesado, talvez por que havia uma sinceridade que estava ausente na outra mulher. — Ela simpatizou com você. — sussurrou Tommy.
169 — O que? Escutei isso, Tommy. É claro que eu simpatizei. Por que não o faria? — Phoebe observou Faith hesitar na procura do café perdido, o qual finalmente foi encontrado no congelador. Percebe que Faith estava tão nervosa como ela, mas a mulher também estava tão feliz que a emoção parecia sair dela em ondas. Phoebe sentiu uma profunda apunhalada de culpa dentro dela. — Meus pais não sabem que estou aqui. — soltou. Faith deixou de caminhar e a olhou, com a xícara de café na mão. Seu rosto ficou um pouco mais sério, mas seu sorriso não abandonou seu olhar. Tommy forçou um suspiro por seu nariz. — Falaremos sobre isso, Phoebe. — disse. Sua voz era quente e suave. — Temos tempo. Quer açúcar? Creme? Phoebe aceitou e, então, seguiu Tommy para a mesa a espera do seu café.
— Então. — disse Adam, olhando para sua acompanhante. Margi havia estado sentada com os braços cruzados em seu peito e com uma atormentada expressão em seu rosto pálido desde o momento em que a pegou. Havia estado olhando pela janela sem falar enquanto ele dava voltas ao redor dos montes de Oakvale e nas sinuosas ruas que irradiavam o seu progresso. — O que você quer fazer? — Não posso acreditar que fiz isso. — disse Margi, suas pulseiras tilintando enquanto descruzava seus braços e levantava suas mãos. Adam não se importou que ela ignorasse sua pergunta; estava contente de que estivesse falando. — Você pode acreditar que fiz isso? — Podemos ir para Honeybee se você quiser. — disse. — Ir tomar uns shakes. — Ela é irresponsável, isso é o que ela é. Irresponsável. Por pensar que a cobriríamos para que ela pudesse ir a um encontro com um garoto morto. — Algum filme que você quer ver? — Adam a observou de soslaio, divertido em ver a Typhoon Margi começando a explodir. Sabia que Margi não tinha
170 problemas em mentir para cobrir sua amiga. De fato, normalmente era Margi quem sugeria isso. — E também por te obrigar a fazer isso. — disse, voltando-se para ele como se agora tivesse percebido que estava na caminhonete com ele. — Muito ruim me obrigar a fazer isso, mas você é só a cereja do bolo. Fala sobre a ofensa a injúria. — seus olhos estão abrasadores e selvagens sob sua sombra de olhos rosa. Quase quis continuar com essa linha de pensamento, mas Margi nem sempre era uma fonte confiável de informação, e a última coisa que queria, considerando Phoebe, era desinformação. Então, deixou passar. — Tenho um frisbee se você quiser jogar. — disse. — Phoebe e eu jogamos frisbee de vez em quando. — Phoebe é a sensível. — disse. — Não deveria fazer coisas como essa. Bufou, e Adam percebeu com um crescente sentido de terror que ela estava a ponto de chorar. — Podemos ir para o lago. — disse. — Eu costumava ir lá. Adam assentiu e se dirigiu para o caminho de acesso que os levaria ao Parque Oxoboxo, uma pequena praia pública mantinha areia ao lado da cidade. — Aprendi a nadar aqui. — disse Adam. — O Oakvale Rec costumava dar aulas. — Eu também. — disse Margi, procurando em seu enorme bolso negro e tirando um monte de lenços de papel. — Estava na turma de Colette. Éramos Lebistes25. E, então, soltou soluços. Adam agarrou o volante e apertou o acelerador. Como tudo em Oakvale, o Parque Oxoboxo estava há poucos minutos. A cidade inteira estava formada por um assimétrico centro ao redor do lago e o bosque que a rodeava, e o parque estava onde se juntava o Rio Oxoboxo e o lago. O estacionamento estava fechado por uma corda, então Adam estacionou ao lado da área e avançou frente a caminhonete enquanto Margi chorava um pouco mais. Depois de alguns minutos, devia ter se dado conta que sua maquiagem 25
Uma espécie de peixe.
171 estava completamente arruinada e a única coisa sensível a fazer era tirá-la como poderia. Adam a observou esfregando as bochechas e os olhos com as bolas de lenços de papel. Ele pensou que precisava de um pouco de ar, então abriu a porta do passageiro da caminhonete. — Daffy. — disse. — Por que não sai daí? Vamos conversar. — Não olhe para mim. — disse, através de seu soluço. — Estou horrível. — Não mais que o normal. — respondeu Adam, mas seu soluço indicou que o humor não era a resposta. Olhou para Oxoboxo onde estava a ampla arena que as pessoas tinha colocado há alguns anos e então, reenchido a cada ano. Havia uma fria brisa ondeando a água e fazendo com que golpeasse a margem. Além do tumulto de areia, do outro lado as arvores eram grossas, seus ramos cheios de folhas vermelhas, amarelas, e laranjas que começavam a cair, como se fossem descoloradas pelo céu cinza acima. — Vamos, Daffy. Eu só estava brincando. Para mim você sempre é bonita. Dá uma risada cortante e Adam se vira - em parte por que era educado fazer isso, e em parte por que estava com nojo enquanto uma enorme bolha de saliva saia de sua boca. — Sim. — disse. — Acredito. Gostaria de acreditar. — Daffy... — Você e Phoebe deveriam sair. — disse. — Assim eu não me sentiria tão mal. — Claro. — disse, sem encontrar uma resposta inteligente. — Leve-me para casa, por favor. Não me sinto bem. — Ainda não. — disse. — Você queria vir aqui, estamos aqui. Vamos conversar. Ela o olhou, seus olhos vermelhos de tanto chorar. Então pareceu conter sua respiração e recuperar sua compostura. Adam estendeu sua mão e faz sinais para que ela saísse. Ela esfregou pela última vez seu rosto inchado e então pegou sua mão, permitindo-lhe tirá-la da caminhonete.
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— Bom. — disse. — Suponho que descobrimos que sou uma idiota. Uma completa idiota. — Não. — disse ele. — Você só está afetada. E estava a ponto de me contar o que está te afetando. Ela deixou sair todo o ar de seus pulmões com força, e então se inclinou na cabine para cavar um pouco mais em seu bolso. — Phoebe. Colette. Zumbis. Uau, que frio está o dia de hoje, né? — Por que não começamos com Phoebe. — disse. Pode sentir torcer um músculo em sua mandíbula, e ficou contente quando Margi regressou de sua bolsa com um pacote de goma de mascar. Aceitou um, trocando por sua pesada jaqueta de couro. — Cheira bem. — disse ela, colocando a jaqueta sobre seus ombros. — Que perfume é esse? — Minha essência natural. — disse. — Phoebe? — Só estou preocupada com ela. — disse Margi. — É estranho seu encontro com um garoto morto. Ter que cobri-la. Você não acha que é estranho? — É estranho. — acrescentou ele, colocando a goma de mascar na boca e começando a mascá-la. — Não fala sobre isso, o qual também é estranho. Não está me contando o que sente. Para mim tampouco, pensou ele, mas não viu razão alguma em discutir isso. — Provavelmente não sabe. Nem todos são golpeados por um raio quando acreditam ter sentimentos por alguém. — Eu sei, eu sei. Suponho que acho a ideia..., horripilante. — Tommy é um bom garoto. — disse, esperando que ela não percebesse a cautela que sentiu em sua voz. — Claro. Mas está morto. Onde podem chegar? Ele não tinha uma resposta para isso, assim começou a caminhar para a água.
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— Adam. — disse. — Podemos ir agora? Ele se virou com um sábio comentário em seus lábios, mas captou o tom em sua voz, e viu que ela tremia sobre o abrigo de sua jaqueta. Parecia assustada. — Daffy... — Aqui é onde morreu. — disse; sua voz pouco audível sobre as folhas sussurrando no vento. — Não aqui, mas no outro lado, aonde íamos nos esconder. Éramos as Irmãs Estranhas, éramos tão horripilantes. Horripilaaantes! Tínhamos nossa própria gruta secreta no bosque. Era onde se submergia, logo fora da gruta. — Quem? — disse, sabendo logo que perguntou. ― Colette? Ela assentiu, esfregando seus olhos, fazendo tilintar as pulseiras. — Sabe, pensei que talvez se eu viesse aqui com alguém tão grande como você, não teria medo. Sei que pensa que estou brincando, mas como uma garota pode ter medo se você está com ela? Pensei que talvez poderia caminhar pela água e meter meu dedo polegar e tudo ficaria bem outra vez. Não teria medo. — Margi, nem sequer pensei quando mencionei as aulas. Não sou um garoto muito esperto na maior parte do tempo. — Mas ainda estou. Com medo, quer dizer. Ainda tenho medo. Adam olhou a água e pensou que toda a superfície do lago tinha escurecido, como um gigante anel de humor. — Não voltei desde então. — disse. — Margi. — disse. — O afogamento dela não foi sua culpa. Perdeu a consciência, e teve um ataque ou algo assim. Ninguém teve culpa. — Essa parte não foi minha culpa. — disse; tão baixo que mal foi capaz de entender. Duas lágrimas correram por suas bochechas, deixando rastros cinza em sua pele. — Pode falar com ela. — disse Adam.
174 — Isso também é o que Phoebe diz. — disse. — Mas é tão difícil, Adam. É tão difícil vê-la, observá-la caminhar ou como tenta levantar de sua cadeira quando termina a aula. E o modo com que me olha... — Margi... — Pensei que as aulas pudessem mudar algo, Adam. De verdade, eu pensei. Pensei em alguma mudança radical ou algo assim, e ficar bem com as coisas. Mas não estou. Não estou bem. E quanto mais tempo passo com as pessoas mortas, mais tempo passo pensando em pessoas mortas, e não sei quanto mais posso suportar. Comecei pensando em ser uma pessoa morta. E agora com Phoebe trocando-nos por Zumbis, não sei o que fazer. — Não está nos trocando. — disse Adam. — Não a deixei entrar. — disse Margi. — Ela chamava e eu não a deixei entrar. — Quem chamava Margi? — perguntou. Por acaso era alguma metáfora bizarra de Daffy pelo que estava experimentando com Phoebe? — Realmente eu gostaria de ir para casa, Adam. — disse. — Por favor. Adam assentiu. Seu pranto a deixou, despenteada e como uma criança pequena em sua jaqueta, que a cobria como uma tenda. — Claro menina. — disse, e eles subiram na caminhonete. Retirando-se do estacionamento, se deu conta que ela não tinha olhado para o Oxoboxo durante todo o tempo que estiveram ali, nem sequer quando a única visão do lago estava no espelho retrovisor.
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CAPÍTULO 18
—
Não vem, Pete? Vamos chegar tarde.
Passou pela cabeça de Pete meia dezena de respostas mordazes, mas deixou que evaporassem sem fazer nenhum comentário. — Vá em frente. — respondeu enquanto observava desde o vestíbulo como Williams subia ao ônibus. — Diga ao treinador que tenho diarréia ou algo assim. Eu vou sair em um momento. — Sério? — perguntou Stavis. — Está doente? Pete virou-se para ele e sacudiu a cabeça. O garoto morto se movia muito depressa para ser um Zumbi, muito mais que a garota à qual havia deixado entrar no ônibus na sua frente. — Quer que vá chamar a enfermeira ou alguém? — Não, TC. — respondeu Pete, apertando os dentes. — Não, não quero que vá chamar a enfermeira. O que quero é que saia daqui e vá ao treino dizer ao treinador que estou doente. Diga que sairei para o campo depois de esvaziar o intestino. — Quer que lhe diga isso? — perguntou Stavis. — Não posso dizer isso, ficará irritado. — TC, invente algo. É um cara criativo. — Sim? Você acha? — Sim, acho. Vá agora.
176 Pete deixou a mochila no chão e pegou a lista que havia arrancado da parede do escritório. A folha azul estava enrugada e gasta em algumas partes, e ainda tinha um troço pegajoso de fita adesiva amarela no canto. Havia quatro deles no ônibus: Phoebe Kendall, Margi Vachon, Tommy Williams e..., outra garota morta, ou Sylvia Stelman ou Colette Beauvoir, porque a que tinha pinta de raposa era Karen DeSonne. Uma das garotas, Sylvia ou Colette, buscavam-na todos os dias em um furgão azul no qual também ia outro Zumbi, seguramente Kevin Dumbrowski, porque Evan Talbot era o estranho ruivo que vivia no bairro de Pete, e Tayshawn Wade era o Zumbi negro. Bom, o Zumbi cinza. Isso só deixava Adam Layman e Thornton Harrowwood, que, sem dúvida, estavam se vestindo para irem ao treino com o distraído Stavis. Para Pete, Williams era uma oportunidade perdida. O que Stavis e ele tinham tido a oportunidade de lhe provocar e não tinham conseguido ainda lhe doía. E havia tentado. Cada vez que Williams tocava na bola, cada vez que se dispunha a bloquear ou a cobrir, Pete lhe golpeava com todas suas forças. Por muito que se esforçavam, Stavis e ele, Williams voltava a se levantar como se não fosse nada. Tinha ouvido que o Zumbi deixaria a equipe. Ficou feliz, claro, mas teria se sentido muito mais satisfeito se ele tivesse saído com alguns ossos quebrados e sem possibilidade de cura. — Muita conversa Martinsburg. Isso foi o que o treinador lhe havia dito, e essas palavras continuavam soando-lhe dentro da cabeça como um grito em um ginásio vazio. —Você fala muito, Martinsburg. Vem o tempo todo conversando do quão fantástico que você é, e de todas as meninas que você supostamente pegou. O grande homem. Pete havia ficado no vestiário depois da primeira partida, pós Zumbi. Quase todos os demais jogadores já haviam ido para o ônibus, mas Pete estava jogando conversa fora com Stavis e Harris. Sentia-se muito satisfeito com a sua atuação; havia derrubado um, e conseguido uma intercepção e uns quantos placares importantes detrás da linha de defesa. Na verdade, só havia feito besteira em um jogo, mas, mesmo assim, haviam derrotado ao débil time de Waterford por três touchdowns26.
26
Touchdown (TD) é uma pontuaçao do futebol americano..
177 Algo do que estava dizendo aos seus companheiros deve ter irritado Konrathy, porque este ordenou ao resto dos garotos que fossem para o ônibus e disse a Pete que se encontrasse com ele no corredor. Quando recordava o tom de voz que o treinador havia empregado com ele, sentia que tencionavam seus músculos dos braços. Já havia passado uma semana, e continuava irritado. — Sim, você é todo um Deus para esses tontos, imbecis, como Stavis que não sabe nada. Mas Layman já não engole a tua merda, certo? E esse garoto morto tampouco o fez. — Pete ficou feliz que o treinador houvesse mandado o resto da equipe sair, porque assim não iriam ver como o esmagava. Também se alegrou de que não pudessem ouvir como sua voz falhava ao tentar responder. — Treinador. — disse. — Pelo menos o tiramos da equipe. Konrathy olhou-o como se Pete fosse algo que tivesse preso na sola do sapato. — Você não tirou ninguém. Ele saiu porque quis. Esperava que, ao menos Stavis conseguisse fazê-lo, mas ele também é um inútil. Pete se sentia humilhado. Havia desejado dizer ao treinador que também havia sido uma covardia deixar que Kimchi saísse e não tirara Williams da equipe. Konrathy não tinha direito de criticá-lo por não haver eliminado o Zumbi. Ao menos, ele tentou. O que o treinador havia feito além de dar-lhe o sinal? Passou por debaixo de um enorme banner escrito a mão onde anunciava a próxima partida de boas vindas contra os Ballouville Wildcats e a festa que se celebraria depois. — Você é um boca grande Martinsburg. — havia dito o treinador. — Tenho ouvido discursar sobre a lição que quer dar a esses garotos mortos. Até agora só lhes tem mostrado o covarde que você é. Porra, pensou Pete, tomando sua bebida energética de um gole. Fechou com um golpe o porta mala de seu carro e ali estava ela, a garota Zumbi de minissaia, rumo ao bosque através do estacionamento. Jogou a garrafa vazia contra o capô do carro de algum professor. Pois agora vou dar-lhes mais informação. Pensou, dirigindo-se para as arvores.
178 Sentia uma fúria como se fossem bolhas muito escuras dentro do peito, com tentáculos de raiva que percorriam suas veias. Levava os punhos fechados e sentia a boca seca. Que direito tinha aquela raposa morta de caminhar pelo bosque com suas saias curtas e suas calcas largas, enquanto Julie continuava dentro de sua tumba, em algum cemitério californiano? Porque essa menina tinha a cara de uma boneca de porcelana, de pele branca, enquanto Julie apodrecia sob a terra? Afogou uma tosse apertando as mãos na boca. Não estava seguro do que ia fazer; era como se uma cortina de névoa vermelha nublasse sua visão, e não se dissipava por muito que piscasse. Só sabia que aquela... Zumbi não tinha o direito a perambular pelo bosque. Nenhum direito. O caminho era bastante amplo para que entrasse um carro pequeno ou um par de bicicletas em paralelo, e ondulava como uma serpente que se desenrosca depois de uma inclinada rua descendo. As folhas quebravam sob seus pés. Pensou no seu último passeio por aquele mesmo lugar, quando Williams chamou seus amigos Zumbis para que saíssem de suas tumbas ocultas no bosque. Parou na beira das arvores e a observou caminhar. Viu como a saia xadrez balançava a esquerda e direita. Estava usando uns fones de ouvido, com o cabo conectado em algum rádio escondido dentro de sua mochila cinza. A audácia de usar largas meias brancas e sapatos de couro envernizado o enfurecia. Aonde ia? A alguma gruta secreta de Zumbis no bosque ou a algum ritual de mortos vivos á beira do Oxoboxo? A garota morta era rápida para ser um Zumbi. Passou a encosta e já havia percorrido boa parte do sinuoso caminho. Estava se aproximando de uma pequena clareira de finas videiras cujos ramos inclinavam-se e ocultavam parte do caminho. Os ramos a encobriam da cintura para cima, mas Pete pôde ver brevemente suas suaves pernas brancas. Esperou até deixar de tê-la à vista antes de começar a correr. Supôs que percorreria a distancia que os separava quando chegasse as videiras. Com certeza um Zumbi não poderia correr mais que ele, era um dos atletas mais velozes do Instituto. Vou pegá-la em um segundo. Pensou enquanto acelerava. Uma vez que estava do outro lado das videiras, o caminho continuava em linha reta.
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A garota não estava lá. Pete soltou um palavrão e esfregou os olhos, notando que sua raiva se convertia em outra sensação, completamente diferente. Talvez se não existissem os Zumbis poderia deixar Julie onde devia estar; morta e enterrada. Voltou a soltar um palavrão e, ao se virar, a garota morta (Karen) estava a menos de cinco metros dele, de pé sob as sombras dos galhos das videiras, com as mãos entrelaçadas nas costas. A garota morta ficou olhando-o com a vista baixa; seus olhos estavam tão vazios que Pete estremeceu. Eram como diamantes sem seu brilho. E Karen não piscava. — Estava me seguindo? — ela perguntou. Pete assentiu, sentindo que tremia-lhe um músculo da mandíbula. Perguntou-se se aquele monstro havia metido-lhe na cabeça a imagem da pobre Julie. — Porque me seguia? Ele não respondeu. A garota não parecia assustada, mas, pelo pouco que sabia de Zumbis, estava consciente de que não se tratava de ser muito expressiva. Poderia lançar-se sobre ela e derrubá-la antes que seus lábios mortos fossem capazes de dizer outra palavra. — Queria..., me fazer..., mal? É isso? Pete assentiu. Com precaução, deu um passo adiante, como se a garota fosse um cervo a ponto de fugir ou um cachorro disposto a morder. — Sim. — respondeu sussurrando. — É isso. — Como tentou fazer mal a Tommy. — afirmou ela, assentindo. Havia pintado os lábios de um suave tom pêssego, e Pete pareceu distinguir neles a sombra de um sorriso. Não sabia se ria dele ou se o estava paquerando. — Como tentei fazer mal a Tommy.
180 — Isso faria sentir-se..., melhor? — perguntou ela, deixando escapar uma espécie de suspiro. — Me fazer mal? — Oh, sim. — respondeu ele, dando outro passo. Havia um galho quebrado a um lado do caminho, então o pegou e o rompeu contra o joelho. Isso lhe deixou um galho de um metro de comprimento com uma ponta irregular e afiada. — Acredito que me ajudará. A garota assentiu sem afastar nem um segundo seus olhos de diamante dos olhos de Pete. — Então, me faça mal. — sussurrou. Ele riu e deu mais um passo adiante, apontando com a estaca o V que formava o colarinho da blusa branca da garota. — Mas use uma rocha. — ela acrescentou, apontando com a cabeça para o muro de pedra. — Não somos vampiros. Pete parou e considerou a possibilidade. — É um começo. — respondeu, agarrando o pau em um lugar mais perto da ponta. Ela entreabriu os lábios, como se fosse responder, mas assentiu e desabotoou o terceiro botão da blusa. — Venha. — lhe disse. Vai me deixar fazê-lo realmente, pensou ele. Raposa louca. Levou seu tempo, mas, justo quando ia se lançar ouviu um ruído atrás dele, que por seu tom e volume, eriçou-lhe o pêlo da nunca; era como o rugido de um grande animal pré-histórico. Virou-se e viu duas figuras ao longe, no caminho. Uma delas era o grande Zumbi negro, que fez o ruído novamente; Pete se deu conta que gritava o nome da garota morta. Movia-se o mais depressa que suas pernas mortas lhe permitiam; o que não era muito. A perna direita parecia bloqueada á altura do joelho e a esquerda convulsionava de maneira violenta com cada passo. O efeito global era como observar um velho bêbado que tentava fugir da policia enquanto tinha um infarto. Sem dúvida, o outro dava medo.
181 Movia-se bem; era uma garota com aspecto asiático, cabelo longo preto e uma jaqueta de couro. Quase corria, e sorria, o que ficava estranho, porque os Zumbis raramente sorriam, e menos ainda mostrando os dentes. — Depressa. ― disse a garota morta, e ele se virou, disposto a acabar com ela no mesmo instante, em vez de tomar seu tempo, como haveria preferido. Sem dúvida, viu na cara da garota, que ela não falava com seus amigos Zumbis, mas sim com ele. —Te deixarei para o final, ― lhe disse Pete, segurando o pau. Obrigou-se a caminhar, em vez de correr, de volta pelo caminho para o estacionamento do Instituto.
— Sou eu, ou este é o turno mais longo da historia? — perguntou Thorny, inclinando-se, na cadeira enquanto abria uma barra de cereais com chocolate. — É você. — respondeu Adam enquanto observava os quatros monitores que mostravam imagens em tempo real das aproximadamente doze câmaras de segurança que tinha na instalação. Em cada ciclo, o monitor quatro lhes mostrava o laboratório, onde Alish explicava algo a Kevin e Margi, que usavam suas batas brancas de laboratório com o logo da Fundação Hunter: umas letras H e F douradas sobre um escudo preto. Para Adam parecia um desses símbolos que se colocava nos bonés dos donos dos Iates. Tommy estava sentado ao seu lado, com a camisa de trabalho azul que Thorny e ele também usavam, e que tinha bordado o mesmo emblema no bolso da esquerda. Adam tentava averiguar se Tommy piscava quando os monitores trocavam de câmera. — Não, de verdade. — insistiu Thorny colocando os pés sobre a mesa de Duke Davidson. — Há quanto tempo estamos aqui? Quatro horas? — Três. — Vê o que te digo? — perguntou Thorny. — É uma eternidade.
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— Os turnos passam muito mais depressa quando você não está comigo. — retorquiu Adam. Tommy sorriu por reflexo, mas somente com uma parte do rosto. Levantouse para sair, e para Adam pareceu ouvir como as vértebras lhe estalavam e voltavam a colocar-se em seu lugar. — Você se alonga? — perguntou Thorny, com a boca cheia de cereais. Talvez fosse isso que Adam havia ouvido. — Para que isso te serve? — Ajuda. — Como? — perguntou Thorny e Adam se virou para ele. — Não, sério. Como isso te ajuda? Já não tem problemas de circulação nem nada, não? E... A pergunta morreu em seus lábios quando Duke Davidson entrou na sala e afastou os pés de sua mesa com um empurrão. Quase esteve a ponto de jogá-lo ao chão. Para Adam parecia que o velho Duke se movia bastante depressa, apesar de ser uma versão mais velha e desagradável dos estudantes com Diferente Fator Biótipo de sua classe. — Não tem nada para fazer? — perguntou o homem, falando como se piscasse. — Bom, estamos vigiando os monitores. — respondeu Thorny. Duke o olhou, e seus olhos injetados de sangue fizeram com que Thorny se encolhesse na cadeira e engolisse sem mastigar um pedaço de sua barra de cereal. Adam supunha que Duke havia sido policial. Ou isso, ou preso. Havia lido que muitos presos libertados acabavam em trabalhos de segurança. Para ser tão alto e de extremidades tão largas, Duke se movia com o que o mestre Griffin denominava “equilíbrio centrado”, quer dizer que reservava os movimentos e sempre estava preparado para atuar rapidamente ante qualquer situação. — Vigiando os monitores. — repetiu Duke, inclinando-se sobre ele. — Porque não recolhe o lixo? Thorny esteve a ponto de responder que já o havia feito, mas Adam o cortou antes que sua insolência lhes causasse mais problemas.
183 — Sim, senhor. — disse. — Agora mesmo. — saiu para o corredor com Tommy e Thorny. — Vamos ao laboratório. — O que? — perguntou Thorny, apressando-se para abancá-lo. — O que eu fiz? Adam percebeu que para Tommy não custava segui-lo. — Nada, Thorny. Não fez nada. — Exceto demonstrar certa falta de..., ambição. — acrescentou Tommy. Para Adam continuava tendo graça o senso de humor de Tommy, tão tranquilo e irônico. De morrer. Pensou, sorrindo para si. — O que? — perguntou Thorny, perdido. — Esquece, vamos. — Odeio o laboratório. — Por quê? — Lá..., fazem coisas. — disse, baixando a voz. Adam havia achado graça do comentário de não haver visto cara de medo. — Experimentos. — Bom, são umas instalações científicas. Ao menos no papel. — respondeu Adam. — Sim, mas há mais. — O que..., quer dizer? O garoto olhou para seus dois companheiros e depois para o teto, como se buscasse câmaras ou microfones ocultos. Baixou a voz até convertê-la em um rouco sussurro. — Ouvi Alish e Angela falarem sobre Sylvia e Kevin, sobre tomar-lhes..., amostra. — passou a mão pelo cabelo. — Que tipo de amostras, hein? — Vamos lá. — respondeu Adam, ainda, em certo sentido, não se surpreendia. Se não, como iam pesquisar as coisas sobre os mortos?
184 — Não, de verdade. — insistiu Thorny. — Os ouvi. Diziam que não entendiam porque alguns dos Zumbis podiam andar e falar melhor que os demais. — Em mim..., não me..., picaram com agulhas. — comentou Tommy. — Não se troca turno de laboratório. — disse Thorny. Calou quando Margi saiu para o corredor, carregada com um monte de papéis. — Ainda. — sussurrou Thorny. — Olá garotos. — disse Margi. — Vou tirar cópias. — Que sorte. — respondeu Adam, pensando que parecia um pouco mais feliz do que a Margi granulada que havia visto pelos monitores. Suspeitava que tivesse mais haver com sair do laboratório que com vê-los. — Está levando..., um bom par..., de folhas aí em cima., — disse Tommy. Margi entrecerrou os olhos e continuou caminhando. — Isso foi uma brincadeira? — perguntou Adam. — Estava fazendo graça? — O que..., eu..., disse? — Eu não entendo. — disse Thorny. Mas Tommy sim o entendeu, um minuto depois. Adam quase podia ver como ele ia entendendo pouco a pouco pela expressão de seus olhos. Estava sendo testemunha do mais perto que jamais havia estado de um Zumbi ruborizando, e isso levantou seu ânimo durante o resto do caminho. Sem dúvida, voltou a baixar a moral quando chegaram à porta do laboratório e a encontraram, fechada. Era a única habitação das instalações que não podiam abrir com seus cartões.
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CAPÍTULO 19 Phoebe gostava de ouvir bem alto até a música mais tranquila, então usava os fones de ouvido enquanto lia as palavras de Tommy na tela. Estava escutando um disco do This Mortal Coil, um que havia copiado da grande coleção que o irmão mais velho de Colette havia juntado antes de ir para guerra. Quando ouvia os violinos, era como se os arcos mexessem com as cordas que uniam seu tronco encefálico a sua coluna vertebral. Estremeceu pensando em Tommy, Colette e tudo o que sentia. A pele de seus braços nus era de um branco espectral, ficava suave e luminosa na escuridão do quarto. Como Karen, pensou. Fazemos tratos com o diabo todos os dias, metaforicamente. Sei que há pessoas que dizem que nós fizemos algum trato com o diabo para continuar existindo, mas o trato que fiz com um dos muitos diabos de minha vida foi bastante, literal. Tenho escrito muito sobre as minhas razões para me juntar a equipe de futebol de Oakvale High. Não havia estado em nenhum dos meus objetivos não ter a oportunidade de jogar, e o treinador se recusava a me aceitar. Recebeu pressões internas da administração da escola, e também a mídia o criticou, bem como os poucos políticos que simpatizam com nossa causa. Além do mais, meu diabo era cabeçudo e se recusava a ceder. Então, chegamos a metade da partida, não havia jogado nem um minuto, e não esperava jogar os três minutos e trinta e sete segundos que joguei se não tivesse falado com ele no vestiário durante o intervalo. Ele poderia dizer-lhes o que a muitos seguramente gostariam de escutar: que eu o ameacei; que o assustei com a promessa de uma turma de mortos vivos que o visitariam durante a noite. Claro que não fez isso, até porque me ofereci a sair. Phoebe inclinou-se para ler a última linha pela segunda vez, mas dizia o mesmo: Me ofereci a sair. — Que? — me disse o treinador, que mal suportava olhar-me.
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— Deixarei a equipe se me deixar jogar hoje. Coloque-me para jogar um pouquinho. Ele fez a mesma cara que um cachorro desconfiado faz quando lhe oferecem um pedaço de carne. — Sairá? — Tudo isso desaparecerá. — respondi, assentindo. — Todo o circo. E se alguém me perguntar por que fiz isso, seu nome não aparecerá em nenhuma parte. Ele me observou durante um minuto, cheio de ódio. Não respondeu e, quando passou a meu lado, procurou não me tocar. Deixou-me jogar. Claro, a vida real não é como as novelas, porque a equipe não se uniu ao redor do marginalizado Zumbi, nem tampouco minha espetacular atuação no jogo serviu para mudar radicalmente a atitude dos demais. O garoto que marquei caiu, principalmente porque tinha muito medo... e não posso culpá-lo. Além de suas tentativas para explorar-nos, alguns dos conceitos do senhor Slydell parecem certos. A transformação normalmente é o resultado de uma ação radical, e, no mundo de hoje, um garoto morto jogando um esporte em equipe é uma ação radical. O que Slydell não conta é que muitas ações radicais levam a reações radicais e que a escola fervia com a violência no dia da partida. Não fiquei com medo. Mesmo com as muitas granadas e bombas que os manifestantes pudessem ter lançado, não havia temido por mim. Eu já estou morto. Mas temia por aqueles amigos vivos que estavam ali, os que, deixando de lado o medo, mostraram compaixão. Eu não gostaria de vê-los feridos apenas para provar algo jogando futebol, e isso teria acontecido se eu tivesse continuado na equipe; a violência teria explodido em algum momento, e as pessoas ficariam feridas. Sei que muitos de vocês pensam que recuar foi ruim, que tive a oportunidade de lutar contra o demônio e vacilei. Não vou discutir, ainda que direi que fiz o que pretendia fazer, quer dizer, plantei uma semente. Não queria regar essa semente com o sangue dos vivos. Phoebe empurrou-se para trás e se esticou. Deixou os dedos descansando em cima do teclado. Haviam publicado muitas respostas, a primeira consistia em uma curta e escrita por Todos Mortos, que chamava Tommy de covarde e dizia que apenas através da violência e da morte os sacos de sangue compreenderiam o que significava estar morto em um mundo de vivos. Phoebe umedeceu os lábios. Todos mortos não entendiam o essencial, a decisão de Tommy fez com que o admirasse ainda mais. Começou o processo necessário para registrar-se no blog e poder deixar um comentário, mas o cancelou duas vezes. Queria falar sobre sua própria experiência, sobre ver Tommy das
187 arquibancadas e sentir-se no meio do olho do furação, um furação que soprava na superfície do inferno. Ainda assim, no final, não escreveu nada. Sonhou com Tommy aquela noite. Estava sozinho em um campo de futebol, iluminado por uma grande lua cheia vestido com o uniforme, ainda que sem o capacete. Ela estava nas arquibancadas aplaudindo, mas rodeada de pessoas nervosas que gritavam e vaiavam. Um grupo de garotos mortos esperava na sombra do bosque de Oxoboxo. Tommy a olhava, caminhava até ela pelo campo, e então as pessoas começaram a jogar-lhe comida. Cabeças de alface, cachorros quente, maças, garrafas de refrigerante. Um tomate caiu bem em cima do número de seu uniforme. Phoebe levantou quando alguns deles começaram a gritar. Tinha os braços cheios de poemas que voavam ao seu redor como folhas mortas, enquanto as balas destroçavam o uniforme de Tommy e atravessavam seu corpo. Ele continuava esperando. Uma garrafa com um pano dentro queimando caiu em cima dele e queimou um lado. Os buracos de bala lhe fizeram uma linha no peito; estava mais perto e Phoebe viu os buracos negros em sua bochecha, pescoço e músculos. O fogo começou a derreter a pele. Deu uma passo para as arquibancadas e Phoebe acordou.
A quarta semana da aula de estudos Zumbi (mesmo Phoebe havia começado a chamá-la assim) começou com o relato de Tommy dos atos violentos mais recentes cometidos por todo o país contra pessoas com DFB. Phoebe havia lido quase todas no blog de Tommy, mas ouvi-lo contá-las com sua voz era ainda mais horrendo. — Atropelaram uma garota..., em Memphis. — contava. — Tinha..., treze anos. Morreu..., duas vezes..., em duas semanas. — Terrível. — comentou Angela sacudindo a cabeça com compaixão. Phoebe olhou a seu redor para avaliar a reação de seus companheiros: os garotos mortos permaneciam impassíveis, enquanto que aos vivos custava levantar o olhar do chão, como se houvessem participado de algum modo das atrocidades que Tommy descrevia.
188 Phoebe também sentia aquele mesmo sentimento de culpa, a sensação de ser responsável em certa medida pelos crimes. — Foi relatado outra vez..., a presença de..., um furgão branco..., em Massachusetts. E o assassinato..., de um Zumbi. Os furgões brancos apareciam em muitas das notícias do blog. Tommy tinha a teoria de que muitos dos atos violentos ao azar cometido contra sua gente não eram tão ao azar. Angela, segundo percebeu Phoebe, não aprovava e nem desconsiderava a teoria. — Obrigada, Tommy. — disse a mulher depois que ele descreveu como um dos pais havia encontrado seu filho Zumbi morto no pátio de trás de sua casa, com duas balas de fuzil de alto calibre na cabeça. — Porque acredita que essas histórias nunca chegaram às notícias nacionais? — perguntou ao grupo. — Racismo. — respondeu Thorny. Estava tremendo como um cachorro molhado desde que havia sentado, depois de beber as latas de refrigerante da geladeira. Havia dito a Phoebe e a Adam que tentava se empanturrar de açúcar para ganhar peso. — Quer dizer, bioismo. Isso é uma palavra? O que quero dizer é que há muita gente por aí que odeia os Zumbis, por isso a mídia não conta tudo, como deveriam. — Talvez. — disse Margi. Estava de mau humor, e Phoebe sabia que, quando sua amiga estava assim, podia dizer qualquer coisa. — Ou talvez essas histórias não sejam mais que lendas urbanas. — O que te faz dizer isso, Margi? — perguntou-lhe Angela. Tayshawn soltou uma maldição e Margi o olhou antes de responder. — Apenas..., só queria dizer que me parece muito estranho que estejam matando todos esses Zumb... , quero dizer, todas essas pessoas com DFB e ninguém faça nada para evitar isso. — E porque fariam? — perguntou Karen. — Não é..., ilegal..., matar um Zumbi. — Não sei, não sei. É que não posso acreditar que as pessoas fiquem olhando enquanto assassinam alguém e não façam nada. — Você faria? — perguntou Karen. — Faria alguma coisa?
189 Margi abriu a boca e a fechou de forma abrupta. Ficou com a cara tão rosa quanto seu cabelo. — Claro que faríamos. — respondeu Phoebe, cobrindo sua amiga o melhor que pôde. — Mas é muito estranho que custe a Tommy encontrar essas histórias. Ainda mais sobre o furgão branco. O que acredita que seja? Uma espécie de grupo fanático? — O..., governo. — disse Tayshawn. — Acredita nisso, Tayshawn? — perguntou Angela, e ele assentiu. — Me..., deixaram. — disse Colette de repente. Todas as cabeças, umas mais depressa e outras mais devagar, voltaram-se para ela, ainda que Phoebe olhou para Margi. A garota usava um animalzinho de pelúcia, um gato preto, em um chaveiro, e o estava apertando tão forte que seus dedos haviam ficado brancos. Angela, ao que parecia; muito menos interessada nas conspirações governamentais do que nos sentimentos de Colette, assentiu. — O que te deixaram? — Todos..., me..., deixaram. — respondeu Colette, depois de uma longa pausa. Angela começou a falar, mas se deteve quando se deu conta de que Colette tinha mais coisas a dizer e não precisava de mais perguntas, apenas tempo para verbalizar seus pensamentos. Era sua quarta sessão de grupo, e os Zumbis mais lentos (Colette, Kevin e Sylvia) nunca haviam falado por iniciativa própria..., exceto nesses momentos. — Meus..., pais..., não..., me..., deixaram..., entrar..., em..., casa. Caminhei..., desde o..., depósito..., de cadáveres..., de Winford. Onze..., quilômetros. Phoebe ficou olhando o chão. Se inclinasse sua cabeça o suficiente, seu longo cabelo preto evitaria que os demais vissem suas lágrimas. — Chamei..., na..., porta. Apertei..., a campainha. Minha..., mãe..., gritava..., da..., janela..., para..., que..., eu..., fosse..., embora..., e a janela..., quebrou. Papai..., saiu..., pela garagem... — continuou Colette com o olhar cravado a frente, como se seus olhos fossem portões de outro mundo. — Tinha..., uma..., pá.
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— Meu Deus. — disse Adam. — Fui..., embora. Fiquei..., no..., bosque..., por..., três..., dias. Fui..., a casa... de..., minha amiga. — Estava morta, Colette! — exclamou Margi, saltando do sofá. — O que queria que eu fizesse? Estava morta! — Minha..., amiga..., não..., me..., deixou..., entrar. — olhou para Phoebe. — Nenhuma..., das..., minhas amigas..., me deixou..., entrar. — Eu estava com medo, Colette! — gritou Margi com a voz aguda. — Estava toda..., toda... Tive medo! Phoebe queria dizer algo, mas não podia se mover; a culpa a havia paralisado. Apenas era capaz de chorar, coisa que fez; a maquiagem de seus olhos caía por suas bochechas formando grandes riscos pretos. Colette voltou-se para Margi e depois se levantou. Margi deu um pulo, tropeçou no sofá e esteve a ponto de cair. Saiu correndo da sala. — Pode ser um bom momento para uma pausa. — comentou Adam, mas Angela sacudiu a cabeça. Phoebe encontrou em seu interior a força necessária para levantar, com a intenção de ir atrás de Margi. Mas Colette a chamou por seu nome e a deixou imóvel. — Fique. — disse Colette. Phoebe se virou para ela. Sua amiga parecia impassível, tão fria e lenta. Não tinha expressão alguma em seu rosto, nenhum dos tics nem inflexões na voz que procuravam imitar os garotos mortos. Phoebe teve a impressão de que os negros olhos de Colette atravessavam seu crânio. — Por favor. — Eu irei procurar Daffy. — disse Adam em voz baixa, tocando-lhe o braço antes de sair. Phoebe sentou-se. — O que aconteceu então, Colette? — perguntou Angela. — Me..., escondi. — respondeu ela, sem sentar-se. — No..., bosque. E depois..., no..., lago. Tommy..., me..., encontrou. — É..., um..., dom. — comentou Tommy, subindo o braço esquerdo; sua forma de encolher os ombros.
191 — O que fez quando a encontrou? — quis saber Angela. — Falei..., com ela. Levei-a..., para casa. — Para casa? Sua casa? — Tommy assentiu. — Tua mãe não se importou? — Minha mãe..., me ajudou. — Levou outros garotos com DFB para a casa de sua mãe? — perguntou-lhe Angela, arqueando as sobrancelhas. Tommy assentiu outra vez. — Ficam lá? — Não há espaço. — Para onde vão? — Tommy respondeu com seu encolhimento de ombros parcial. — Colette? Para onde foi depois de ficar com Tommy? — Fui..., embora. Fui..., para..., a..., Casa. — A Casa? — Passou um tempo comigo. — disse Karen. — E também com Evan. — Tem uma casa onde ficam? — Alguns de nós ficamos juntos. — respondeu Tommy. — Onde? — Não seria uma boa ideia que..., todos..., saibam. — Certo. — respondeu Angela. — Mas é claro que pode confiar nas pessoas dessa sala, não é? — Sem dúvida. — respondeu ele, movendo os lábios. Mas não disse nada, e nenhum dos garotos com DFB fez qualquer som. — Muito bem. — disse Angela. — Obrigada por compartilhar sua história, Colette. Estou certa de que foi uma experiência muito dolorosa para você, compartilhá-la, quer dizer. Já quase não nos resta tempo. Phoebe sentia como se houvessem congelado seu coração no peito. Os garotos passaram por ela arrastando os pés. Ela continuava chorando e não podia falar.
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Colette se sentou a seu lado no sofá, e Phoebe a olhou com os olhos ardendo e a visão nublada pela maquiagem que havia tentado limpar. O olhar de Colette era indecifrável. — Colette, eu..., eu... Colette a abraçou na sala vazia.
Phoebe ouviu PDT gritar quando Adam pegou o telefone. — Sim? — Sou eu. — Olá. — Como está Margi? — Não tenho certeza. Não quis falar comigo. Deram-nos permissão para sair antes e a levei para casa. Ela me agradeceu e nada mais. — suspirou. — Como você está? — Bem... — É, já imaginava. Frisbee? — Ok. — Me dê meia hora. Primeiro tenho que fazer umas besteiras para o PDT. — Ok.
193 A noite caiu depressa, então Phoebe sugeriu ir ao campo de futebol, onde poderiam jogar debaixo das luzes. Sentiu-se melhor quando entrou na caminhonete de Adam e, melhor ainda quando ele lançou um reluzente disco amarelo fazendo uma prazerosa espiral no ar. — Não me lembro da última vez que a vi usando tênis esportivo. — Adam disse, olhando seus tênis pretos. — Não acabam com seus pés essas botas que usa o tempo todo? Ela lhe devolveu o disco e fez uma careta ao ver que ia cair rápido. — Não, são bastante confortáveis. E usei tênis na semana passada, quando estivemos aqui. — Oh. — respondeu ele, correndo para pegar o disco e agarrando-o antes que caísse no chão. Adam sabia atirar o disco de vinte formas diferentes, então naquela vez o lançou movendo o braço em paralelo ao chão. Phoebe o pegou atrás das costas. — Muito bonito. Temia que houvesse perdido seu dom depois de passar todos os dias bebendo café e escrevendo poesia gótica. — Oh, ficou sabendo? — Sabendo do que? — repetiu ele com fingida inocência, e correu para trás para pegar o disco que ela havia lançado bem por cima de sua cabeça. — Não se preocupe. — Ok. — Adam lançou o seguinte com um movimento rápido por cima de seu antebraço e girou um pulso. Ela tentou pegá-lo novamente por trás das costas, mas o disco foi para o lado. — Aiii. — disse o garoto, em forma de desculpa. — Bom, o que aconteceu? Phoebe recolheu o disco e o lançou na altura de seu peito, a distância correta. — Colette me abraçou. — Oh. — respondeu ele, lançando da mesma forma. — Isso é bom, não é? — Sim. Eu estava chorando como um bebê.
194 — É comovente que tenha te abraçado. Ainda que também dê um pouco de medo. Phoebe teve que correr para chegar a seu seguinte lançamento e o agarrou com as pontas dos dedos. — Sim, mas veja o medo que ela passou. Ele assentiu, recolhendo facilmente o disco. Movia-se com uma elegância natural pouco comum para alguém do seu tamanho. — Não pode sentir o que sentem os demais. Apenas pode tentar imaginar o que sentem. — A abandonamos, Adam. — Não está falando do lago, certo? Não foi culpa de vocês. O seguinte lançamento foi direto até ela, e Phoebe admirou o efeito do disco. — Não, que tenha se afogado não foi culpa de ninguém. Estou falando de seu regresso. — Oh! — Veio a nossa casa, Adam, e nós lhe demos as costas. — Segundas oportunidades. — respondeu Adam, depois de um bom tempo. — Te abraçou. — Sim. — Margi acabará vendo isso. Jogaram durante 45 minutos, mudando de assunto para deixar descansar um pouco o problema de Margi e Colette. Riram de Thornton, que havia usado na escola uma camiseta escrito “Alguns de meus melhores amigos estão mortos!” e seu professor o havia castigado, ainda que depois a diretora Kim o tenha tirado do castigo. — O que te parece que Tommy deixe a equipe de futebol? — perguntou-lhe Phoebe.
195 — Estou decepcionado. Era bastante bom. — Falou com ele sobre isso? — Não, supus que não queria que os protestos e demais coisas continuassem acontecendo. — Desde quando é um rapaz tão intuitivo, Adam? — perguntou ela, sorrindo, mas ele não lhe deu atenção. — Gosto dessa camiseta. Deveria ir de branco mais vezes. Eu achava que só tivesse roupas pretas. — Não é verdade. Tenho roupas cinzas e cinzas escuros. — Claro, perdão. — respondeu ele entre risadas. — Vamos! A primeira coisa que Phoebe fez ao chegar em casa foi olhar seu e-mail, mas Margi não havia respondido, nem tampouco havia retornado sua ligação no celular. — Papai, Margi ligou? — Me alegra informá-la que não recebeu nenhuma ligação, senhorita. — respondeu ele, afastando o olhar de sua novela. Mas Phoebe não estava alegre, e sim preocupada.
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CAPÍTULO 20 Angela sentou-se no escritório com Phoebe e Karen enquanto as duas meninas faziam seu último turno na seção administrativa. Depois, Phoebe iria ao selvagem mundo da manutenção e Karen iria fazer um trabalho de verdade no laboratório. Phoebe não gostava da mudança, já que não lhe chamava muita atenção passar o tempo com Duke Davidson, a pessoa mais assustadora que havia conhecido. — Eu queria agradecê-las por todo o trabalho que vocês tem feito meninas. — disse Angela. — Vocês têm ajudado muito. — É para isso que estamos aqui, — Phoebe respondeu. — Mas eu gostaria de ter encontrado mais comentários positivos para vocês. — Algum dia. — Angela disse, rindo. — Algum dia nós veremos que as pessoas aceitam a contragosto, o que fazemos. A sociedade terá que crescer. — O que você acha que falta para isso, Srta. Hunter? — Karen perguntou, enquanto endireitava uma pilha de papéis. — Quem dera eu saber com exatidão, Karen. Acho que será uma combinação de várias coisas, mas, acima de tudo, exigirá um grande esforço por parte de pessoas como você. Karen olhou-a com a expressão vazia dos mortos, expressão que Phoebe sabia que podia ligar e desligar a vontade, como uma máscara. — O que você quer dizer? — Karen perguntou. — Desculpe, não queria que você se sentisse deprimida. No entanto, acredito que se as pessoas com Diferente... os Zumbis conseguirão uma aceitação real, será por pessoas como você. — Como eu?
197 — Zumbis mais evoluídos. Você fala com menos pausa, move-se bem, seu rosto é mais expressivo... quando você quer. Phoebe observou Karen para ver sua reação, mas ela manteve o olhar vazio. — Mais evoluídos. — ela repetiu. — Por favor, não leve isso como um insulto. Você já sabe que é diferente da maioria dos alunos com DFB. Você quase poderia... — Passar por humana? — Eu ia dizer que poderia servir de modelo para os demais. — disse Angela. Se ela se sentiu insultada, escondeu-o bem por trás do sorriso. — O grupo com DFB. Na arte da cultura... pessoas como Tommy e como você poderia fazer a diferença. — Porque os demais..., nos veriam como um modelo a seguir. — E porque você pode se comunicar bem. Você pode ser o rosto público das pessoas com DFB. — Pobre de mim. — respondeu Karen, mais ou menos franzindo a testa. — É verdade, Karen — interveio Phoebe. — Você é linda. — E você é um céu, Phoebe. — respondeu Karen, permitindo-se sorrir. Quando Karen sorria, sua beleza acabava sendo quase magnética, mas para Phoebe parecia desconcertante a rápida transição do vazio. — Bem, é verdade. — Dentro de Tommy e de você há algo que os outros ainda não encontraram. — comentou Ângela, assentindo. — Uma criatividade, um espírito... Eu não sei o que é, mas sei que nenhum dos dois o demonstra o suficiente. Especialmente Tommy. — Isso não é verdade... — Phoebe começou a dizer, mas Karen a interrompeu. — Eu agradeço..., o que você disse, mas está..., assumindo..., que os vivos queiram que ajamos, andemos e falemos como eles. Não acho que seja assim.
198 Phoebe escreveu em um pedaço de papel o endereço da página web de Tommy, www.supostamentemorto.com, juntamente com o seu ID de usuário e sua senha. — Você não acha que isso faz com que as pessoas o ouçam? — Algumas pessoas. Acho que para outras, seja mais difícil. Quanto mais agirmos como eles, mais conscientes serão que não o somos. Tornam-se paranóicos. — Sério? — Eu acho que... seria como a chaleira... se eles não puderem... nos diferenciar. — Mmm. — Tommy é muito criativo. — interveio Phoebe. — Com certeza sim, mesmo que não deixe que vejamos. — disse Angela. — Isso não é verdade. Ele tem seu próprio site. — Uma página de Web? — E um blog. Os garotos mortos de todo o país lêem o que ele escreve. Então não acho que deva supor que ninguém é pouco criativo, ou tem pouca consciência social apenas porque não está o tempo todo conversando sobre o assunto em sala de aula. — Sinto muito, Phoebe. — respondeu Ângela. — Você tem razão, eu não deveria fazer esse tipo de suposições. — Sem dúvida, fez uma observação interessante. — disse Karen. — Talvez eu mesma devesse ter mais consciência social. Quero dizer, está claro que os mortos mais jovens me vêem como um exemplo a seguir, de certo modo (pelo menos, Colette e Sylvia), e pode ser que devesse... — Qual é o endereço da página, Phoebe? — Angela perguntou. — www.super... — Quem sabe? Talvez eu deva me apresentar como representante dos estudantes ante o corpo de professores. Como se chama? Corpo Docente? Já vejo as
199 manchetes: KAREN DESONNE ENTERRA SEUS CONCORRENTES EM UMA VITÓRIA ESMAGADORA. É assim? Enterra? Ha, ha. Phoebe olhou para Karen, que não estava apenas falando mais rápido do que qualquer pessoa morta que ela conhecia; como também falava inclusive, mais rápido do que Margi. — Phoebe? — Ângela insistiu. — O endereço? — Supostamentemorto.com Poderia ter jurado que ouvi Karen suspirar, quando dei o endereço, embora, é claro, os mortos-vivos não podiam respirar. Angela continuou esboçando o seu constante sorriso de gato, e Phoebe começava a pensar que talvez tivesse cometido um grave erro.
Adam viu quando Phoebe e Margi atravessavam o refeitório, e Margi levantava a mão, formando um redemoinho de estridentes braceletes de prata, para agarrar sua amiga pelo braço e afastá-la da mesa onde Karen DeSonne sentava-se sozinha, cercada por potes de Tupperware. Karen havia espalhado um guardanapo de pano, e nele havia colocado uma tigela em forma de taça, tais como aqueles usados por meninos para trazer canja de galinha ou macarrão com queijo, e um recipiente redondo menor, uma brilhante maçã vermelha e um iogurte. Ela pegou uma colher de plástico e retirou a tampa do recipiente. Adam se aproximou e viu que dentro havia uma pirâmide cuidadosamente montada de palitos de cenoura. Em outro pote tinha morangos fatiados. Margi afastou Phoebe do piquenique da garota morta e a guiou para o local onde Adam estava sentado, mastigando o segundo sanduíche de carne assada. Adam viu que Phoebe sacudia a mão de Margi antes de sentar-se diante dele. — Oi, Adam. — cumprimentou-o, claramente irritada. Ele acenou com a cabeça. Embora sem deixar de observar Karen, que estava sentada olhando para a mesa que havia preparado com tanta concentração.
200 — Eu não posso suportá-lo. — Margi sussurrou, soltando seu saco de comida na mesa. — É que eu não posso. — Ela está sozinha... — Phoebe começou, mas Margi balançava a cabeça. — Ela tem comida, Phoebe. Comida. Têm comida, e você sabe que eles não comem. Não agüento mais, não está certo, não é natural... — Shhh, baixa a voz, você quer? Margi deu um grande empurrão em sua comida, e uma laranja saiu rolando para fora do saco e caiu no chão. Adam olhou-as por um momento, enquanto mordia o sanduíche para não ter que dizer nada. Phoebe olhou-o, o que significava que tinha que intervir, como se eles dois fossem os pais de Margi, quem estava ocupada ficando histérica. Suas mãos tremiam, não parecia com seu melodrama normal de sempre. — Ei, Daffy, você está bem? — o garoto perguntou, depois de engolir o que estava em sua boca. Margi inclinou-se sobre a mesa, baixando a voz. — Ela tem comida, Adam. Sopa..., e..., e..,. leite... Adam concordou e colocou uma mão sobre a da garota. — Eu sei, montam todo um piquenique, mas não comem. Vê? — ele explicou, apontando para a mesa ao lado com sua cabeça, embora ela não olhasse. — Provavelmente queira apenas ser normal, Margi. Certamente apenas tentar agir como as outras pessoas no refeitório. — Mas não pode! É isso o que eu quero dizer, refiro-me precisamente a isso! — Phoebe olhava para Margi como se ela é quem fosse estranha. Adam encolheu os ombros. — Eu vou deixar a classe. — Margi continuou falando, afastando a mão, de modo que os frios anéis e pulseiras de prata passaram debaixo das pontas dos dedos como do garoto como se fosse água. — Eu preciso falar com a enfermeira — disse, se levantando e saindo correndo do refeitório. — Ok, eu limpo a mesa para a senhora! — gritou Phoebe. — Ela está mal. — comentou Adam. Ele não gostava de ver Phoebe ser sarcástica com sua amiga, não parecia ela mesma. — E não quer me dizer por quê. Dá vontade de matá-la.
201 —Assim poderia conseguir que se sentasse com Karen. — Há mais coisas que ela não me conta. — disse ela, ignorando a piada. — Algo sobre Colette. Eu a convenci a entrar nas práticas, porque acreditava que iria ajudá-la a superar o medo ou o que seja que ela sente por Colette. — É complicado. — disse Adam. Na mesa ao lado, Karen contemplava os alimentos, como se tentasse fazê-lo flutuar sobre a mesa. Martinsburg, que entrava com uma bandeja, virou-se para sua sombra, Stavis, e disse algo que lhe fez rir. — A morte dá medo. — Mas não tem porque, especialmente agora. Aquilo não tinha muito sentido para Adam, mas não disse nada. Observou-a tirar a casca de pão do sanduíche de queijo por alguns minutos antes de mudar o tema do assunto. — Você tem certeza que Margi se juntou ao grupo para superar o assunto sobre Colette? Tem certeza que não fez isso por você? — O que você quer dizer? — perguntou, com tom de irritação. — Eu não sei. — ele respondeu, embora soubesse. Ele tinha se juntado ao grupo por isso. Pelo canto do olho, viu que Stavis e Martinsburg sentavam-se a algumas mesas de distância, sem parar de olhar para Karen, com malícia. — Ei, você quer que sentemos com ela. — perguntou para Phoebe, e ela se animou no mesmo instante. — Claro. Recolheram suas coisas e se aproximaram da garota morta, que estava completamente imóvel. — Podemos nos sentar com você? — Phoebe lhe perguntou, e Karen concordou. Adam olhou significativamente para Stavis e Pete antes de sentar-se. Pete soprou-lhe um beijo. Karen os olhou e voltou a sorrir, como se alguém tivesse ligado um interruptor dentro dela.
202 — Não é lindo? Os morangos vermelhos, sua maneira de brilhar, a cor laranja brilhante das cenouras... Também gosto do meu guardanapo azul marinho. — É muito bonito. — Phoebe disse. — Estou muito feliz por poder continuar vendo as cores, sabe? Quero dizer, às vezes me pergunto se as vejo apagadas, como se algum dos pigmentos dos meus olhos tivessem desgastado ao morrer, mas, pelo menos ainda sei que isso é vermelho e isso laranja, e que o leite é branco. Nem imagino o que seria passar pela vida em preto e branco, e vocês? Em um mundo sem cores? — Nem eu. — respondeu Phoebe, e Adam concordou. — Antes, meus olhos eram azuis. — Agora eles são como diamantes. — disse-lhe Phoebe. — Talvez sejam os mais belos olhos que eu já vi. — Gostaria de poder sentir o cheiro delas. — Karen comentou, aproximando o nariz do pote de morangos. — Às vezes eu acho que posso um pouquinho. Mas depois..., eu me pergunto..., se estou..., lembrando como cheiravam. O que é irônico..., porque dizem que o..., cheiro..., está muito relacionado..., com a..., memória. — A sopa também cheira bem. — disse Phoebe. — A sopa! — Karen exclamou, fazendo um barulho parecido com uma risada. — Sim, lembra a sopa? Deus. Adam não sentia o cheiro da sopa porque Phoebe estava tão perto que eles se tocavam, então só sentia o perfume de seu xampu. Teria gostado de ter um sanduíche para poder dar as suas mãos e boca algo para fazer. Ele tinha a impressão de que Karen estava tirando onda de sua própria maneira, como Margi. Será que nenhuma garota, nem viva e nem morta, era capaz de manter a sanidade durante mais de três horas? — Ainda..., ouço e..., sinto. — disse, sorrindo. — Eu acho. — Adam queria dizer a Phoebe que a abraçasse ou algo assim, mas então, Karen começou a fechar os recipientes. — Obrigada por sentarem aqui. E obrigada Adam, por ser tão protetor comigo. É engraçado pensar em proteger uma garota morta, certo? — deu uma risadinha, e o ruído foi muito mais autêntico do que o anterior. — O que..., você quer dizer?
203 — Oh, vamos. Eu vi esses garotos maus... Sou consciente disso. Hiperconsciente, de fato. Talvez seja porque eu já não posso..., sentir..., tanto quanto antes — tocou-lhe a mão. A mão dela era fria e suave. — Não deixe que machuquem os outros. Querem fazê-lo, sabe? Há algo, algo dentro do garoto bonito. Algo mais do que medo. — De quem? Pete? — Não deixe que machuquem..., os outros. — disse ela, assentindo. — Eu vou tentar. — Eu sei que você vai. Você sempre faz. — disse Karen, dando-lhe algumas palmadinhas na mão. — Bem, Phoebe, aonde Tommy vai te levar no encontro? Phoebe corou até o pescoço. Adam teria rido se não tivesse sentido uma súbita dor no estômago, que não poderia ser aliviada por muitos sanduíches de carne assada que ele comesse.
Pete já tinha quase pensado no espetáculo público que pensava dar com a garota morta, mas então Adam e Pantynegros sentaram-se ao lado dela e se incomodaram com a ideia. Embora Adam não lhe desse medo, não queria que o confronto final com o Menino Bobo acontecesse no refeitório do Instituto. Pete era tão realista como Adam era grande, e sabia que talvez lhe faltasse o necessário para ganhar do grande caipira em uma luta justa, portanto teria que esperar, por uma injusta. Quando o horário do almoço estava quase no fim, Adam se aproximou de sua mesa. — Posso conversar com você um minuto, Pete? A sós? — Quer brigar? — Pete perguntou, sorrindo. — Só se você bater primeiro. — respondeu o Garoto Bobo, balançando a cabeça.
204 — Conversar, né? — repetiu Pete. Sorriu com satisfação para Stavis e seus outros parasitas. — Vamos falar. Eles foram para um canto do refeitório que já começava a ficar vazio. Pete viu que Pantynegros e Zumbina se soltavam, e certificou-se que Adam o vira fazêlo. — Pete, isso tem que acabar. — O quê? — Pete perguntou, sem deixar de olhar para elas, até que saíram para o corredor. — Esta campanha de ódio que você está montando. Ameaçar as pessoas. — Ameaçar as pessoas? — Tommy, Karen. Thornton me contou que você lhe disse que Stavis e você iriam chutá-lo o rabo algum dia. — Não são ameaças, são promessas. — Pete respondeu, sorrindo. O sorriso ampliou-se quando viu que suas palavras penetravam a armadura que cercava Adam. — Pete..., éramos amigos. — Éramos; como você disse. Você escolheu sua equipe. — Tudo porque o treinador pediu-lhe para dar uma surra em um cara e eu não te segui nesse jogo? — Um cara não. Isso é o que você acaba de descobrir. Não é um cara. É um Zumbi, um Zumbi sujo, podre e comida de insetos. Você preferiu isso ao invés de a mim. — Eu não te entendo, por que tanto ódio? Pete lambeu os lábios e estava prestes a contar para Adam sobre Julie. Mas ele nunca tinha contado para ninguém, e ninguém exceto seu pai sabia tudo sobre ela. — É meu dever como cidadão. — disse ele, encolhendo os ombros. — Ele te deixou sem fôlego. E daí? E tivemos uma boa luta na floresta. Vamos deixá-lo lá. Estou disposto a me afastar, se você também estiver.
205 — Adam. — Pete respondeu, rindo. — Eu tenho uma lista no bolso, uma lista com todas as pessoas da sua estúpida espécie de amantes de Zumbis. Eu a levo em todos os lugares e fique sabendo que todos os que estão nela, todos vocês, vão se dar mal. — Você... — Adam estava com tanta raiva que não podia nem falar, o que para Pete estava bom. Estava cansado de ouvir Adam. Naquele momento, a campainha tocou. Pete virou-se e foi com Stavis, que estava observando da porta.
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CAPÍTULO 21 Que incômodo, pensou Phoebe. Estava sentada no assento do passageiro do PT Cruiser de Faith. Tommy estava sentado atrás, tão conversador como uma maleta. Faith os levava para o shopping onde iam ver um filme. A situação ficava cada vez mais incômoda. — Seus pais sabem para onde você vai esta noite? — lhe perguntou Faith. — Bom, sabem que eu vou ao shopping ver um filme. Faith a olhou, mas aquele breve olhar caiu sobre a consciência de Phoebe como se fosse uma tonelada de tijolos. — E sabem como você vai até lá? E com quem você vai? — Bom... — Adoro meu filho, Phoebe, mas esta é a última vez que cubro suas costas. Você tem que dizer aos seus pais o que está fazendo. Não é justo para eles. Tommy fez um ruído no assento de trás como se tentasse clarear sua garganta. Era um ruído horroroso, um que Phoebe não desejava ouvir nunca mais. — Tem razão, eu direi. Faith deu uma palmadinha na mão de Phoebe, e Phoebe notou seu calor. — Sei que fará isso, querida. Você é uma garota valente. Não há muitas garotas de sua idade dispostas a ser amiga de um morto-vivo. Phoebe devolveu o sorriso, embora não se sentisse muito corajosa. Tommy era corajoso. Karen era corajosa. Adam era corajoso por que se arriscava a ser expulso da equipe de futebol por causa de Tommy.
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— Mamãe. — disse uma voz seca, vindo da parte de trás. — Não sou um morto-vivo, sou um Zumbi. — Não seja mau. Já sabe que não gosto desta palavra. — ZzzzzZumbi. — ele respondeu. Phoebe se virou e o pegou sorrindo, enquanto sua mãe sorria. — Pegarei vocês as dez. — lhes diz Faith antes de se afastar, deixando-os na grande entrada de néon do shopping de Winford. Phoebe se sentiu ainda menos corajosa ali de pé, na entrada, com Tommy. Uma mulher passou perto deles e agarrou com força sua bolsa de plástico. Sobre as portas, em letras cursivas de néon rosa, lê-se: “Winford Mall”. Phoebe olhou as letras e franziu o cenho. — Se quiser podemos ir embora. — lhe disse Tommy, levando a mão ao celular, que estava em seu cinturão. Phoebe sacudiu a cabeça, secando o suor frio das palmas nas calças negras. Depois ofereceu a mão para Tommy. — Não, o filme nos espera. Ele a olhou durante um momento; o néon traçava brilhantes listras rosa e laranjas na lustrosa superfície sem vida de seus olhos. Pegou sua mão e entraram no shopping. As pessoas começaram a olhá-los enquanto entravam. Um garoto com uma jaqueta dos Patriots se virou para seu amigo e disse em voz alta: — Ei, olha isso! O amanhecer dos mortos! — Sim, mas ainda não comeu. ― respondeu seu esperto amigo. Compartilham uma gargalhada estridente e Phoebe ruborizou, mas se agarrou com mais força a mão de Tommy, que tinha os punhos fechados e tentava se aproximar. — Não. — ela sussurrou para ele, e continuaram andando.
208 Fora o amanhecer dos mortos, Phoebe sabia que os mortos-vivos de verdade raras vezes entravam em shoppings. Não se viam garotos com DFB passando um tempo no boliche. Não precisavam ir aos restaurantes e, fora Tommy Williams, poucos se viam participando em acontecimentos esportivos ou observando-os. Os Zumbis, no geral, eram garotos caseiros..., pelo menos, os que ainda podiam ficar em suas casas. Percorreram o corredor, passaram ao lado de uma cadeia de restaurantes e uma joalheria, e chegaram a um átrio aberto que de sua grade alta era possível ver o nível inferior. Um grupo de pequenas bétulas de aspecto frágil crescia em um buraco aberto no chão de lajotas brancas. A copa de uma das árvores estava quase da mesma altura que a margem da grade, e viram que os ramos tinham folhas pequenas e escuras. Quando se aproximaram da grade, um passarinho marrom saiu voando das vigas e aterrissou em um ramo próximo. — Um pardal, pobrezinho. — comentou Phoebe. — Sei..., como se sente. — respondeu Tommy. Atrás dele Phoebe viu que uma idosa o olhava com o cenho franzido da porta do Pretty Nails. Tommy se virou no momento em que a mulher fazia um gesto. — Acabou de jogar-nos mal olhado? — perguntou ele. — Acho que sim, ou algo pior. Phoebe olhou ao seu redor. Era imaginação sua ou todo mundo olhava para eles? Talvez estivesse exagerando. Ainda assim, o caminho até o cinema, na outra ponta do shopping, parecia muito longo. Passaram junto a uma loja Wild Thingz!, e Phoebe apontou para um pequeno expositor da fachada que tinha as camisas do “PODER ZUMBI!” e “ALGUNS DOS MEUS MELHORES AMIGOS ESTÃO MORTOS!”, além disso, um par de gorros, lenços e pulseiras com slogans similares de Slydellco. Também havia algumas garrafas e tubos no expositor. Phoebe começou a rir ao perceber o que era. — Meu Deus, produtos de higiene para Zumbis! — havia xampus, loções hidratantes, e dois tipos de pastas de dente diferentes. O que mais gostou foi de um
209 spray prateada em um botão cilíndrico preto. Abaixo se dizia: “PARA O HOMEM MORTO ATIVO”. — Talvez eu devesse comprar um. — comentou Tommy, sorrindo. — Sou bastante..., ativo. — Desculpe. — respondeu ela, sem parar de rir. — Não sei por que achei tão engraçado. Entraram e percorreram as estantes cheias de camisetas e acessórios góticos. O humor de Phoebe melhorou quando ouviu a voz de M.T. Graves sair dos alto-falantes da loja. Perguntaram a vendedora se tinha amostras de Z. A vendedora demorou a reagir. Poderia ter sido a dublê de Margi, embora suas pontas fossem roxas e tinha um grande anel prateado no nariz, combinando com as pulseiras e braceletes de couro no braço. — Nossa, um Zumbi de verdade! ― disse, sorrindo. ― Vamos, fazia tempo que eu esperava que um de vocês entrasse. — Explicou que não tinha amostras, mas que Tommy podia cheirar um pouquinho da garrafa que tinha na vitrine. Ele aceitou a oferta e perguntou a Phoebe o que ela achava. Ela cheirou o ar que o rodeava. O perfume lembrava especiarias, mas com uma forte nota de algo cítrico, talvez lima. — Eu adoro esta porcaria. — comentou a Margi roxa. — Comprei para meu namorado Jason, um frasco, e ele sempre usa. — Obrigado. — respondeu Tommy, olhando para Phoebe. ― Cheira bem? — Eu gosto. — respondeu ela e Tommy comprou um frasco. A amabilidade da vendedora aliviou um pouco a paranóia de Phoebe, assim como a ideia de produtos de higiene para mortos-vivos. No entanto, quanto mais pensava nisso, mas nervosa ficava. Certo, os mortos não suavam e, obviamente, não fediam, o que teria causado graves problemas. Talvez as bactérias que provocavam o odor não podiam sobreviver em sua pele ou algo assim. — Minha mãe disse que eu te levasse para um..., filme de garotas. — comentou Tommy, e ela percebeu que já estavam no cinema. — Hmm. Vira-lata e pranchas de surf ou Mr. Caos. ― disse Phoebe. ― Acho que Vira-lata.
210 Tommy pagou as entradas e lhe comprou um pacote de pipocas e um suco. Faith tinha advertido Phoebe no carro que o garoto pagaria tudo e que não montasse uma cena por que “já estaria montando de sobra”. O garoto sardento do posto de pipocas tinha uma expressão como se tivesse engolido uma rã quando Phoebe se virou e perguntou a Tommy se queria manteiga líquida em suas pipocas. — Antes eu adorava..., mais manteiga. — respondeu. Phoebe riu. Tommy não se importava que esquecesse que estava morto. No filme não havia nenhum Zumbi; era uma comédia leve sobre uma mulher que trabalha em um petshop e sempre acaba encontrando-se com um adorável labrador marrom de um cara que desenhava pranchas de surf. Para Phoebe o filme era chato, e a ideia de estar sentada na escuridão com Tommy comendo pipocas começava a parecer-lhe claramente absurda. Se pudesse voltar à vida, Phoebe Kendall — pensou — certamente passaria vendo as tontas palhaçadas do cachorro Ruffles e esperando pacientemente para que estreasse Viralata e pranchas de surf II. Por algum motivo, a obrigatória cena da cama do filme lembrou-a o momento passado no chão poeirento da Casa Assombrada, na mais completa escuridão. Por sorte, era uma cena de risada; Ruffles saltou em cima da cama durante os festejos, e o garoto surfista quebrou uma lâmpada ao tentar afastar o encantador diabinho. Phoebe olhou para Tommy durante a cena. Olhava para frente sem pestanejar, como só fazem os mortos, e se perguntou o que os dois faziam ali. As luzes do shopping pareciam excessivamente brilhantes as nove da noite. As poucas pessoas que saíam do cinema cambaleavam com cara de sono pelo hall, arrastando-se como os Zumbis tradicionais da história do cinema. — Você gostou do..., filme? — perguntou Tommy. — O cachorro era fofo. — Para mim... — murmurou ele, alargando a palavra. — também. — Tommy, isto é como o futebol para você? Tommy virou sua cabeça, como havia feito Ruffles ao ver a garota dos cachorros tirando-lhe do lugar na cama do surfista naquele horrível filme.
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— Ao que..., você se refere? — Refiro-me a estar comigo. Você se uniu a equipe de futebol para mostrar algo, não por que você gostava do esporte. Por que está comigo? Passaram juntos por uma loja de roupas. Havia menos pessoas que antes e, ao que parece, os que ficaram prestavam menos atenção neles. Talvez os visitantes noturnos aceitassem melhor os garotos com DFB. — Quem disse que eu não gosto de futebol? — perguntou ele, depois de um momento. Estava certamente de brincadeira. Ou não? Era difícil interpretar o humor das pessoas com DFB, assim como era difícil interpretar o verdadeiro significado dos correios eletrônicos enviados na última hora da noite. Justo quando Tommy ia dizer algo mais, viu algo na loja ao lado e apontou com a cabeça. Phoebe seguiu seu olhar até a livraria, onde Margi estava lendo um livro que havia tirado da pilha colocado no expositor próximo à entrada. Viu-os no momento em que eles a viram. — Olá, pessoal. — cumprimentou, deixando o livro onde estava e tentando parecer despreocupada..., coisa que Margi nunca era. O normal para ela era sempre falar sem parar. Phoebe olhou o título do livro que Margi estava folheando: E a terra abrirá suas tumbas e devolverá seus mortos, do reverendo Nathan Mathers. — Mathers? É interessante, Margi? — olhou a contra-capa e começou a ler em voz alta: — Neste estimulante livro de um dos experts mais proeminentes de nossa nação no fenômeno dos Deficientes Vitais, o polêmico reverendo Nathan Mathers utiliza tanto os antigos textos teológicos como os títulos mais atuais para nos oferecer sólidos argumentos que demonstram que a existência destes seres é um sinal da chegada do Apocalipse, e resume como os cristãos devem se preparar para o acontecimento. — Nossa, irão me pegar. — comentou Tommy, mas Phoebe estava esperando que Margi dissesse algo. Ela não disse durante um tempo. Em vez disso, afastou as pontas rosa dos seus olhos, e evitou olhá-la no rosto.
212 — Acho que há muito medo. — respondeu. — Isto é o..., progresso. — respondeu Tommy, olhando o resto dos artigos do expositor. — Olhem, há alguns livros de Slydell. Os mortos..., não tem vida. — leu — O que os pais precisam..., saber sobre seus filhos mortos. Este..., minha mãe tem. — Não deixará realmente as aulas, não é Margi? — perguntou Phoebe. Margi afastou a vista. Para Phoebe esta pergunta lhe deixava mais nervosa do que andar de mãos dadas com um Zumbi. — Tenho que fazer isso, Phoebe. — respondeu Margi, sussurrando para que Tommy não ouvisse..., coisa que era pouco provável, por que o garoto estava dando uma olhada no livro que havia sido escrito por um advogado: O Direito Civil e os mortos-vivos. — Não aguento mais. — O quê? — perguntou-lhe Phoebe, quase gritando. — Margi... — Tenho que ir. — respondeu Margi. Murmurou algo sobre reunir-se com sua mãe e sua amiga e Phoebe não tentou detê-la. — Tommy? — Hmm? — respondeu ele, tirando o nariz do livro para responder. — Margi..., já foi? — Sim. — respondeu ela. Tommy deixou o livro e a olhou durante um momento. — Minha mãe me disse que eu deveria te convidar para um..., milk shake. Disse que..., você gosta de..., milk shake. — Eu gosto de milk shake. — assegurou-lhe ela, desejando poder interpretar melhor suas reações. Foram ao Honeybee Dairy, uma das poucas lojas do shopping que não pertenciam a um grupo. O Honeybee Dairy, era o restaurante favorito de Phoebe; havia passado muito tempo comendo hambúrgueres e bebendo milk shakes com Adam e Margi no estabelecimento original de Oakvale. E com Colette. Colette só ia com eles.
213 Sentaram-se no balcão, em um dos reluzentes tamboretes prateados com assentos de vinil vermelho. Escolheram o balcão por que estava vazio. Em alguns dos reservados havia clientes: um quarteto de adolescentes ruidosos, um jovem casal que Phoebe reconheceu do cinema e um trio de senhoras com o cabelo azulado. Todos pareceram virar para olhá-los quando se sentaram nos tamboretes. — Gostaria de poder te ajudar com..., Margi. Entendo..., o que sente. — Ah, sim? — perguntou Phoebe, embora na realidade pensasse E Colette? — Eu ouvi de algumas pessoas..., da minha página na web. Os mortos..., já viveram..., enquanto que os vivos..., ainda não morreram. — Fala dos mortos como se todos fossem iguais. Realmente é assim? Continuam sendo pessoas individuais, não? — Mas unidas..., por uma experiência comum. — De verdade? Todos vocês viram..., experimentaram ou o que seja..., o mesmo ao morrer? Tommy começou a responder, mas parou. Para Phoebe lhe pareceu que talvez aquela experiência comum não foi, na realidade, tão comum. Como era possível, se Karen era capaz de correr uma maratona e ganhar um concurso de beleza enquanto que Sylvia precisava de dez minutos de vantagem para subir as escadas. Um garoto um pouco mais velho do que eles com uma camiseta da Honeybee e um gorro de papel na cabeça se aproximou para tomar nota dos pedidos. Phoebe pediu seu milk shake com cobertura e noz moscada. Sentiu compaixão pelo garoto, que ficou vermelho como um tomate e começou a gaguejar quando se virou para Tommy. — E..., para..., você, senhor? Tommy esboçou um sorriso torto que Phoebe ainda não tinha se acostumado e sacudiu a cabeça. O garoto correu para pegar o milk shake de Phoebe. — Pelo menos tentou. – ela comenta. Estava mais entediada do que imaginava; lhe parecia que a careta de Tommy tinha algo de condescendente. — A maioria das pessoas que estão aqui gostaria de jogar o miilk shake em cima de nós.
214 — Acha que..., ler meu blog..., ajudaria Margi? — perguntou Tommy, perdendo o sorriso. — Talvez a ajude..., a ver..., que não somos mais que... garotos? Um guardanapo enrolado, atirado pelo quarteto ruidoso, bateu em suas costas, mas não notou, ou fingiu não notar. — Pode ser. Poder ser que sim, na verdade. — fez um gesto ao garoto gaguejador. — Arrume para viagem? — Você tem direito a sentar aqui..., comigo. — respondeu Tommy, sacudindo a cabeça. Havia força em sua voz, a mesma força implacável que percebia nele quando andavam de mãos dadas ou tocava seu ombro. — Não quero discussões, Tommy. Esta noite, não. Ele olhou para a mesa justamente quando um segundo guardanapo bateu em seu ombro. Ouvem-se risadas afogadas do quarteto, mas se calam rapidamente sob o peso do olhar de Tommy. — Sabe? Pensava em meu..., blog..., como uma forma de dar esperança..., aos mortos. Embora talvez seu verdadeiro valor resida em colaborar..., com a compreensão..., dos vivos. O garoto gaguejador levou sua milk shake em um copo de papel fechado. Phoebe ficou um pouco decepcionada, por que parte da experiência do Honeybee era tomar o milk shake em um copo de boca larga, com a taça de metal frio para preencher ao lado. Começa a levantar-se, mas Tommy agarra seu braço. — Tenho uma pergunta antes de nós irmos. — lhe disse, sem dar nenhuma pista em sua expressão. — Como faz para a noz subir pelo canudo? Ela riu e ele sorriu também, um sorriso de verdade, sem segundas intenções. Tommy deixou três dólares no mostrador e saíram para esperar sua mãe.
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— Nada de tochas? — perguntou Faith quando entraram no veículo. — Nem alcatrão com plumas? — Parece..., decepcionada. — respondeu Tommy. — Não sei como pode fazer brincadeiras sobre isso. — disse Phoebe. — Essas coisas acontecem de verdade. — Por isso brincamos. — lhe explicou Tommy. — É uma forma de... agradecer. — Estou sentindo cheiro de noz? — perguntou Faith. — Desculpe. — disse Phoebe, oferecendo-lhe um gole. — Deveríamos ter trazido algo para você. — Não posso. — respondeu Faith, agitando os dedos com as unhas pintadas de cores vivas. — Sigo a dieta do Weight Watchers. Faith deixou Phoebe na estrada, perto da sua casa, do outro lado da de Layman. O caminhão de PDT estava estacionado no caminho, e Phoebe esperava que seus pais não houvessem visto Adam, já que o garoto era seu álibi daquela noite. — Phoebe. — lhe disse Tommy ao sair do carro, no princípio, para sentar na frente. Phoebe percebe que Faith faz todo o possível para parecer interessada nos arbustos, que via pela janela, em seu lado do carro. — Eu tive um tempo muito bom, Tommy. — ela lhe disse, falando muito depressa. — Muito obrigada. — Phoebe. — repetiu ele, antes que pudesse ir. O coração de Phoebe batia como se acabasse de beber um capuccino triplo. O que aconteceria se ele tentasse beijá-la? No entanto, Tommy foi muito respeitoso e deu um passo para trás. — Só..., queria..., que soubesse..., que queria..., sair..., contigo..., por que..., queria sair contigo.
216 Ela sorriu e lhe ofereceu a mão. — Obrigada, Tommy. Eu também. Ele aceitou sua mão. A pele de Tommy era fria, tão fria que ela a envolveu nas suas. — Não me responda agora. — ele disse. — Mas você gostaria de ir ao baile de boas-vindas comigo? Cortou sua resposta levando à boca a mão que tinha livre e apertando os lábios com o dedo indicador como para pedir silêncio. — Não me responda ainda. Por agora..., só quero desfrutar da possibilidade que aceite. Quando Phoebe se soltou e começou a caminhar para sua casa, ainda notava a subida do medo, ou dos nervos ou de ambas as coisas. Não estava muito segura.
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CAPÍTULO 22 Tommy lia o artigo com voz fria e firme. Adam que o observava do outro lado do cômodo, percebia que Tommy estava muito zangado. — Os assaltantes utilizaram escopetas e um lança-chamas contra Dickinson House, um refúgio privado para jovens Deficientes Vitais no norte de Springfield (Massachusetts). Sete Deficientes Vitais e dois empregados morreram no incêndio. Um terceiro empregado chamado Amos Burke afirmou que os assaltantes eram dois homens com uniformes pretos e óculos escuros, e que fugiram em uma van branca. JW também comentou que duas pessoas com DFB que residiam na Dickinson House conseguiram salvar-se da destruição, mas, a julgar pelas queimaduras sofridas é provável que desejem não ter se salvado. ‘Juro que os Zumbis estavam gritando’, continuou Burke, ‘mas não sabia se era de felicidade ou de dor.’ Burke estava no refúgio fazendo trabalhos para a comunidade depois que o juiz o condenara por tentar roubar uma loja de bebidas em Northampton. Tommy deixou o jornal no colo, e a classe ficou em silêncio durante alguns minutos. — Obrigada por compartilhar conosco, Tommy. — disse Angela. — Estou certa que não foi fácil para você ler isso. — Não posso acreditar. — interveio Phoebe. — Por que não saiu na televisão? Meus pais assistem a CNN duas horas todas as noites, normalmente, e não ouviram nada. Karen sacudiu sua cabeça e Adam observou como suas ondas platinas flutuaram de um lado para o outro. — Acontece sempre. Assassinam..., Zumbis por todo o país e quase..., nunca..., sai no noticiário.
218 — É uma loucura. — disse Thorny. — Nem sequer posso acreditar que algo assim acontece nos Estados Unidos. Adam se perguntou se Thorny era realmente tão ingênuo ou se fingia. Também se perguntou, tendo em conta sua última conversa com Pete Martinsburg, onde estaria Sylvia. Duvidava muito que seus compromissos sociais estivessem afastando-a das aulas. — O que os demais acham? — perguntou Angela. — Vocês acreditam que tudo isto está acontecendo realmente? — Algo..., está acontecendo. — respondeu Evan. — Como iam..., colocar..., nas notícias? — Para mim o que interessa é..., por que não colocaram na TV? — respondeu Karen. — O Boletim..., Winford é um jornal pequeno. Por que eles têm a história e The Harl Ford..., Couranto não? — Se você perguntar minha opinião. — acrescentou Tommy. — Eu acredito que alguém está..., matando Zumbis. — Sério? — perguntou Angela.
— Está acontecendo desde..., Dallas Jones. Faz anos que está acontecendo, mas agora parece mais..., sistemático. E olhem como o jornalista sentiu a necessidade de..., desacreditar a testemunha. — Por que não dão mais publicidade para a história? — perguntou Adam, inclinando-se para frente. — Nove pessoas foram mortas. — Foram mortas duas pessoas. — corrigiu Karen, sussurrando. — E sete voltaram a morrer. — O que... — começou a dizer Colette, que estava sentada com Kevin Zumbrowski ao fundo do cômodo; todos se voltam para ela. ― Estão..., fazendo..., pelos..., dois..., que..., sobreviveram?
219 — Entraram em contato conosco e esperamos que possam enviá-los para cá para que a gente tente ajudá-los. — respondeu Angela. — Sofreram queimaduras..., graves..., em mais de oitenta por cento..., do corpo. — disse Tommy. Adam percebeu que a raiva fazia que tivesse mais dificuldade para falar. — Vocês podem sentir dor? — perguntou Thorny. — Sim. — responderam Tommy, Karen, Tayshawn e Evan em uníssono. Angela se dirigiu para Tommy e lhe pergunta: — Sério? Para Phoebe pareceu que sua pergunta era verdadeira. A eterna expressão de calor e empatia de Angela havia dado lugar a expressão de curiosidade, como se pusesse em dúvida uma hipótese bem estabelecida. — Não sentimos..., muito. — respondeu Tommy. — A não ser que o..., estimulo..., seja intenso. — Angela assentiu. — Uma vez..., me..., dispararam..., com uma flecha. Doeu. Agora Phoebe que se surpreendeu. Não havia lido nada sobre o tema no blog. — Sente mais quando é mais..., novo. — diz Karen. — Esperamos poder ajudar esses pobres garotos, assim como estamos ajudando Sylvia. — assegurou Angela, sorrindo para Adam. ― Dickinson House tinha uma reputação maravilhosa por seus trabalhos com garotos com DFB, mas estou certa de que sofrer este trauma lhes fará dar um passo para trás. Adam queria perguntar-lhe quais eram os planos concretos da fundação para aqueles garotos. — O que? — perguntou Angela, e ele percebeu que a estava olhando fixamente. — Adam, você quer acrescentar algo? — insistiu, em um tom um pouco desafiante. — Sim, bem, você mencionou Sylvia, não? — respondeu ele, depois de clarear sua garganta.
220 — Sim. Sylvia não está hoje na turma por que está participando de provas que esperamos que contribua com seu desenvolvimento. — olha para a parte de trás da sala, onde estavam sentados Colette e Kevin. — Se tudo for bem, deve servir para incentivar o desenvolvimento de todos os garotos com DFB. — Isso é genial. — comenta Adam. — Isso é o que nós pensamos. No entanto, enquanto os crimes que Tommy nos contou... Adam assentiu, aliviado de que Pete ainda não tinha cumprido sua promessa. Ao pensar em Pete, lhe ocorreu algo. — Sim, o que eu gostaria de saber é o que aconteceria se realmente houvesse uma espécie de grupo que se dedica a caçar garotos mortos. Como os apanhariam? — Ao que você se refere? — Os garotos mortos..., os garotos mortos já não são cidadãos. — respondeu. — Não tem direitos, verdade? — Adam, você sabe que a Fundação Hunter está comprometida com os direitos... — Sim, sim, sei. Não estava falando sobre isso. Estou dizendo que o cartão da segurança social vence quando se morre; certo? Então ninguém guarda um registro dos garotos mortos, verdade? — Li em algum lugar que pode haver umas três mil pessoas com DFB nos Estados Unidos. — comentou Thorny. — Sim, eu também fiz os deveres da semana passada. — respondeu Adam. — E agora há dois garotos mortos no Canadá; ótimo. Mas são estatísticas, não registros. — Tem razão. — acrescentou Phoebe. — Li por aqui que a documentação sobre os Deficientes Vitais é muito escassa por que começaram a questionar muitas de nossas leis. Apresentou-se um projeto de lei que requeria a inscrição obrigatória...
221 — A lei dos cidadãos não-mortos. — interrompeu Angela. — Um dos muitos projetos de leis inspirados pelo medo que o Congresso rejeitou. O senador Mallory, de Idaho, o apresentou comparando os afetados com os imigrantes ilegais. — Muitos..., pais..., não querem que ninguém saiba..., que seu filho..., está morto. — comentou Evan. — Meus pais..., não deixaram..., que minha morte saísse no jornal. — E não temos, seguro social, há há. — disse Karen. — Nem sequer posso tirar um livro da biblioteca. — Você diz brincando, mas se trata de um assunto sério. — disse Angela. — Não pode sair legalmente do país. Não pode votar, não pode dirigir. — Mas..., querem..., nos recrutar..., de qualquer forma. — disse Tayshawn. — É certo. Existe um projeto de lei que exige o serviço militar obrigatório para todas as pessoas com DFB no prazo de três semanas a partir de sua morte tradicional. — Como podem fazer isso? — perguntou Phoebe. — Alguns só têm três anos, como vamos mandá-los para a guerra? Não tem nenhum sentido. — Tem muito sentido. — respondeu Tommy. — Para se desfazerem de..., nós. — Não acho que o Governo queira esperar que sua organização secreta acabe conosco. — disse Karen. — Suponho que seria mais..., rápido fazer com que todos nos inscrevêssemos em um registro e nos enviar para o Oriente Médio. — Por que você acha que é uma organização do governo? — perguntou Adam. — Quem mais ia ter os fundos ou o interesse necessário? Se o movimento pelos direitos dos não-mortos tiver êxito, se for aprovado a Proposição 77, o Governo terá que gastar uma quantidade considerável de dinheiro dos impostos com..., a criação de infra-estrutura. Certamente seria mais rentável..., comprar alguns trajes pretos e lança-chamas. — Você acha que pode fazer algo a respeito? Parece que pode controlar a situação? — perguntou Angela.
222 — Acho..., que temos que continuar..., lembrando as pessoas..., que estamos aqui. — respondeu Tommy. — Temos que questionar as percepções..., dos vivos. — O que precisamos são de armas. — disse Tayshawn. Adam perguntou-se se era o único que tinha percebido que, de repente, Tayshawn não fazia pausas para falar. — Vamos fazer uma pausa. — sugeriu Angela.
Quando terminou a aula, saíram para um largo corredor cinza que dava para a entrada onde lhes esperava a van da fundação (e se fixou no que era uma van azul e não branca), Phoebe decidiu fazer algo para dissipar um pouco a nuvem que tinha pousado sobre eles. — Ahh, Tommy. — disse, empurrando-lhe com os ombros. Ele a olhou. — Sim? O garoto tardou um segundo em perceber do que queria dizer, mas, quando soube, esboçou um longo sorriso. Ela lhe empurrou outra vez com o ombro antes de sair correndo na frente dele pelo corredor.
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CAPÍTULO 23 Phoebe deu a noticia bomba durante o jantar; em retrospectiva, ela mesma reconhecia que não havia sido uma ideia muito inteligente. — Vou à festa de boas vindas deste ano. — disse. — Com Tommy Williams. Sua mãe estava encantada, mas somente porque não havia visto a reação de seu pai, que estava levando a boca uma colher da sopa de cebola que sua mulher havia feito (uma de suas receitas favoritas) e logo baixou a colher. — Tommy Williams? Não é o garoto morto? Sua mãe afogou uma exclamação. — Agora, todos os chamam de pessoas com Diferente Fator Biótipo, papai — respondeu Phoebe, sem poder evitar levantar a voz. — Não me importa como os chamem, não vai a nenhuma festa com um garoto morto. — O que? — Querida. — interveio sua mãe. — Isso é verdade? Quer ir a um baile com um garoto com Diferente Fator Biótipo? — Que diferença faz..., que Fator Biótipo tenha? — Pelo amor de Deus, Phoebe, ser amigos está bem, pode ser que seja um pouco estranho, mas está bem. — retrucou seu pai. — Mas ter um encontro com ele? O que é isso? Porque não pode ir com o filho dos Ramírez ou algo assim? Ou com Adam? — Porque Tommy me convidou!
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— De verdade, Phoebe? — insistiu sua mãe. — Um garoto com Diferente Fator Biótipo? — Sabia que estava acontecendo algo quando me pediu que te levasse a partida de futebol. — disse seu pai. — Não esta acontecendo nada. Tommy é apenas meu… — Mas, achei que o melhor era seguir o fluxo... — ...meu amigo, somos amigos... —...porque acreditava, que finalmente te interessavam coisas normais e saudáveis. — Coisas normais e saudáveis? — repetiu ela, com um tom de voz mais agudo, apesar das lágrimas. — Sim. — respondeu seu pai, olhando-a com o cenho franzido. — Os garotos, por exemplo. Os garotos vivos. — Phoebe, o olhou, deu um soco na mesa e se levantou. — Volte a sentar agora mesmo, senhorita. — disse ele, mas ela se foi para seu quarto, furiosa. Fechou a porta, esteve a ponto de fazê-lo com força, mas se controlou, porque não queria dar-lhes essa satisfação. Ligou seu estéreo e se jogou na cama. Sua mãe entrou um tempo depois.
— Olá, Phee. — disse, chamando à porta enquanto a abria. — Oi. — respondeu Phoebe, tentando na choramingar. Sua mãe se sentou a seu lado na cama e se pôs a alisar a colcha.
225 — Teu pai não pretendia te deixar assim, mas às vezes acontece. — Sei. — disse Phoebe, rompendo a chorar de novo. — Sei que custa aceitálo, mas de verdade, somos apenas amigos. — Isso está bem, querida. Ficaram em silêncio um instante, e Phoebe fechou os olhos e deixou que sua mãe lhe acariciasse o cabelo. — Eu nunca tive o cabelo tão negro, nem tão reluzente. Sabe que papai só quer o melhor pata ti, assim como eu. — Eu sei mamãe. — Então, entende que nos preocupa que vá a um baile com um…, com um garoto com Diferente Fator Biótipo? É esse o termo? — Suponho que sim. Mas, de verdade, não é mais que um baile. — se sentou e tentou interpretar a expressão de sua mãe. — Phoebe, o colégio é uma época muito especial. Muito especial e muito curta. Têm uns quantos anos bons. Os últimos anos de sua vida, nos que estará realmente protegida. Dentro de muito pouco vai para a Universidade, depois conseguirá um trabalho e quem sabe o que mais. — Phoebe pensou em Colette e nos demais, e se perguntou até que ponto uma pessoa poderia estar protegida. Portanto, ficou em silêncio e deixou que sua mãe chegasse à conclusão que tentava chegar. — Phoebe. Você se imagina repassando seu álbum de fotos dentro de vinte anos para recordar os que, em teoria, foram os melhores anos de sua vida? Imagina-se folheando as fotos da graduação e os anuários e te encontrando ali com um garoto morto vestido de Smoking? — os olhos de Phoebe voltaram a encher-se de lágrimas. Sentia-se, como se lhe houvessem dado uma bofetada. Era quase como se observasse do lado de fora, aquela conversa com sua mãe e, no fundo, sabia que aquele era o momento que ia recordar: a reação de seus pais ante uma das primeiras coisas que lhe importavam de verdade. — Entende o que eu te digo, Phoebe? É essa a recordação que você quer? — Mamãe, eu entendo o que me diz. — Sabia que o faria querida. — Mas acredito que você também precisa entender algo. — acrescentou depois de respirar fundo. — Os melhores anos de sua vida. Esses anos do que me
226 fala… Tommy e os outros garotos, não os terão; você entende? Foi-lhes tirado. Que recordações lhes irão ter? As pedras que seus companheiros lhe atiravam? Que passaram a noite de graduação escondidos por medo de que alguém os arrastasse a campo aberto e lhes ateasse fogo? — Então, o faz por caridade? —Não. Não. É por amizade. É o que estava tentando dizer aos dois, mas não me escutaram. — Phoebe. — disse seu pai, da porta. — Não é somente por isso. Lembra das pessoas do partido? O que acha que farão se souberem que um Deficiente Vital, vai levar uma garota viva a um baile do colégio? Ele não será o único ao que atirarão pedras. Também cairão sobre você. — Papai... — Escute-me por um segundo, Phoebe. Sabe como nos sentiríamos sua mãe e eu se te acontecesse algo? Você já viu essa gente. Estavam loucos. Sabe como nos sentiríamos se te fizerem mal? Phoebe se sentou na cama. De repente, as lágrimas se secaram. — Poderiam me machucar. — seu pai cruzou os braços e se apoiou no batente da porta. — Poderia me acontecer mil coisas diferentes: poderiam me atirar pedras, o ônibus poderia bater, alguém poderia atirar um balde cheio de sangue de porco, e eu poderia fazer explodir o colégio com meus poderes telepáticos. — Phoebe... — Espera papai. Espera. E se me acontecesse algo? E se me matassem? E se eu morresse? — Não fique histérica, Phoebe. — Só estou fazendo uma pergunta. E se eu morresse? Com certeza os pais de Colette, tampouco pensavam que algum dia eles teriam que fazer frente a essa pergunta. — seus pais pareciam incomodados. — E então? Iriam querer que eu voltasse? — Claro que sim. — responderam os dois ao mesmo tempo.
227 Phoebe, não havia tido certeza da resposta, mas, agora que a tinha; se alegrava de haver perguntado. — A mãe de Tommy também queria que voltasse. E ele voltou, e assim é o mundo agora. Podemos fingir, mas não podemos ocultá-lo. E vocês podem fingir que têm o poder necessário para me proteger e me livrar das conseqüências de todas as decisões que eu tome na vida, mas não podem. Todas as ações têm suas consequências. Pode ser que vá ao baile e que o pior que aconteça, seja que Tommy, se sinta normal por um tempo. Pode ser que inclusive, eu me divirta. Ou pode ser que gritem comigo, me deixem de lado e tenha que escapar pela porta dos fundos. Mas, sabem o que? Prefiro viver com as consequências da minha escolha, do que com as consequências do medo. Do medo de vocês. — Bom discurso. — disse seu pai, e Phoebe entrecerrou os olhos. — Não, é sério. Certamente é o discurso que eu teria que ter-lhe dado, em vez de me comportar como um idiota. — Papai. — É uma garota responsável, Phoebe. É boa. Sempre pudemos confiar em que não fizesse nenhuma estupidez. Pode ser que houvesse preferido que tivesse gostos diferentes em roupa e música, mas não parece que isso tenha te prejudicado — fez uma pausa para passar uma mão pelo cabelo, escuro e denso. — Mas, você acha que também colocaria em perigo aos outros garotos? — Não faremos muito alarde, papai. Ninguém tem porque saber, até que cheguemos lá. Se acontecer algo, irei embora. Inclusive te ligarei, se você quiser. — Este..., garoto, não pode dirigir; certo? — Ele vai alugar uma limusine. — Ha. Phoebe sabia que seu pai era bastante justo para perceber que havia outra história detrás de sua contestação, mas também o era, para decidir que já haviam tido muita guerra por uma noite. — Podemos pensar? — perguntou seu pai. — Vai fazê-lo de qualquer maneira. — respondeu ela, sorrindo.
228 Ele a abraçou. Ela se sentia frágil, como se uma palavra equivocada de seus pais, pudesse quebrá-la em mil pedaços. Eles pareciam perceber, ao se levantarem para sair do quarto. — Guardamos sopa para você. — lhe disse sua mãe. — Não tenho fome. — respondeu Phoebe, tentando soar o bastante alegre para que acreditassem. — Lhes parece certo convidar Adam?
O garoto morto esta cantando. Pensou Pete. Incrível. Pete estava agachado detrás de um arbusto com Stavis e Morgan. Harris, ao lado da propriedade do garoto morto, e o garoto morto cantava enquanto trabalhava, berrando a canção com sua aguda voz monótona e sem inflexões. — Wouldn´t it be... nice... if we could wake u. — cantava o garoto ruivo, fazendo pausas para passar a mão pelo cabelo. Pete riu ao vê-lo passar a cortador de gramas ao redor da fossa bem à beira de um circulo de tulipas murchas e marrons, apagadas pelos primeiros frios de outubro. — Pode acreditar, cara? — disse Pete, vendo como passava o ruidoso motor por uma das tulipas, levando uma chuva de confete de pétalas secas. Não se incomodou em sussurrar, porém, Stavis e Morgan, tinham cara de desejar estar em qualquer outra parte. Levantou um pesado machado que tinha a ponta chanfrada de tantos anos cortando madeira. O garoto morto teve que puxar a corda uma dúzia de vezes, para iniciar o corte, e resultava quase doloroso ver como suas mortas extremidades, com seus movimentos entrecortados tentavam devolver a vida para a máquina. Ha, ha. Pensou Pete. Havia demorado semanas planejando. Duas quintas-feiras seguidas, havia se dado conta de que os carros dos Talbot não estavam diante de sua casa, quando
229 voltava do treino, e o padrão se repetia na terceira quinta-feira. Havia visto como o garoto morto fazia as tarefas no pátio nesses mesmos dias; primeiro, recolhia os galhos que haviam caído ou varria as folhas, mas sempre terminava com o corte de ervas daninhas. Adorava aquele utensílio. Pete perguntou a si mesmo se ele poderia sentir as vibrações da máquina através de seus dedos mortos. Os Talbot viviam em uma rua sem saída de Oarkale Heigths, a mais bonita das duas urbanizações principais de Oakvale. Na floresta que havia além de suas casas, havia caminhos que chegavam ao lago, e Pete imaginava se ali, no escuro coração do bosque, havia um ninho de asquerosos Zumbis. Sonhava com eles e, ao despertar, fantasiava em atear fogo as árvores. Um ruído similar a risada, saiu da garganta do garoto morto, quando não conseguiu chegar nem de longe a uma das notas agudas da canção, enquanto passava o motor por uma base de um carvalho. Pete correu até ele, levantando o pesado machado sobre a cabeça.
Adam pegou o Frisbee. — Disse durante o jantar? Phoebe, você não pode ser mais típica. — Eu sei, tão oportuna como sempre. Phoebe estava vestindo moletom preto com capuz, bastante grande para que servisse em Adam, com mangas compridas até a ponta dos dedos. Adam tinha dito a ela que parecia o fantasma do Natal futuro. — O que eles fizeram? Alucinaram? — O que você acha? — ela respondeu, e o Frisbee saltou dos nós dos dedos. — Meu pai estava prestes a colocar a sopa pelo nariz. Sopa de Cebola, nada menos.
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— Bonita imagem. A de sua mãe? — Sim. — Que pena, sua mãe sabe fazer uma sopa estupenda. Ele a viu recolher o disco da relva. Estava chupando os nós dos dedos, que lhe haviam aberto com o golpe do Frisbee. — Sim, certo. — Bom, e isso onde te deixa? Vão dar-lhe permissão para ir? Ela assentiu, mandando o disco com seu lançamento especial, com efeito de retrocesso. Ele pegou sem problemas. — Sim, eu fiz um grande discurso sobre as suas preocupações e blá, blá, blá, e acreditava que minha mãe entendia, mas acho que, agora lhe preocupa que queira colocar na prateleira a minha foto do baile com um menino morto. Além do mais, acredito que insinuou que se preocupava em que eu fosse lésbica. — Buff. — disse ele, devolvendo o disco. — Você é? — Claro, claro. Adam lançou-lhe o próximo bem acima da cabeça para vê-la correr, as mangas compridas do moletom tocavam a grama artificial, enquanto saia em disparada pelo campo. — Mas eles fizeram alguns comentários bons. — continuou, com a respiração suspensa. — Nem sequer passou pela minha cabeça que as pessoas vão me colocar para fora se souberem. — O ressurgir da segregação. Eles têm razão, eu se fosse você, não diria nada. — Você disse ressurgir? — Venho estudando. — respondeu ele. — Foi-me dito que as garotas gostam de vocabulários amplos, e ainda não tenho parceira para a festa. — O que você chama isso?
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— O que acontece ela? Bem, diga-me de uma vez se é sério que você vai com o cara morto ou quê? — Por favor — disse ela, pegando um de seus arremessos com um gancho. — Não siga por aí outra vez. Eu te direi quando o souber, ok? — Ok. — Nós somos amigos. Eu o admiro muito. Trabalha com vontade de ajudar outras pessoas com DFB, sabe? Adam sabia. Quando Tommy falava na aula de estudos de DFB, se transformava em uma espécie de líder carismático dos mortos-vivos. E os alunos, tantos vivos quanto mortos, estavam atentos a cada uma das suas palavras. Era difícil não admirar. — Você acha que eu sou uma pirada, não? — Nah. — disse ele, querendo saber se a resposta significaria muito para ela. O Frisbee quicou na palma da mão, um raro erro. —A verdade é que, se eu tivesse a coragem de fazê-lo, convidaria Karen — não podia ver o olhar de Phoebe, debaixo do capuz. Mas esperava que se sentisse feliz e aliviada. — É boa. Phoebe riu e se ofereceu para convidá-lo para um mexido no Honeybee Dairy, que, curiosamente, parecia o lugar perfeito em uma noite tão fria como aquela. Eles passaram por um par de carros da polícia, correndo na direção oposta, para Heights, com as luzes acesas e sirenes gritando..., algo muito raro na cidade, que sempre foi bastante tranquila. Adam supôs que não provinha de nada bom, mas por agora, foi bom estar com Phoebe e fingir que o tempo que passavam juntos, era algo mais do que na realidade era.
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CAPÍTULO 24 Phoebe teve tempo para introspecção na viagem de ônibus até a escola no dia seguinte. Adam ia de caminhonete, Margi estava escondida na parte de trás do ônibus com os olhos fechados e fones de ouvido e Tommy sentava-se com Colette ao invés de com ela, estava sozinha. Colocou os fones de ouvido e escolheu uma antiga música de The Gathering, enquanto se perguntava se Tommy parecia evitá-la. Teria se arrependido de convidá-la para o baile? No ônibus havia outros garotos, mas todos tendiam a evitar Margi e ela, tanto como a seus colegas de DFB. Alguns estudantes, quase todos do primeiro ano, estavam contando piadas de Zumbis. — O que é um Zumbi em uma jacuzzi? — ouviu um dizer. Phoebe viu que um avião de papel voava até a parte dianteira do ônibus, passando por cima dos assentos de Tommy e Colette. Tommy virou-se, seu rosto que geralmente não transmitia nada, era a viva imagem do ódio. Phoebe endireitou-se em seu lugar e os arruaceiros fizeram silêncio até que chegaram a Oakvale High. Ninguém se moveu em seus assentos até que Colette e Tommy desceram do ônibus. Os viu dirigir-se a escola. Tommy estava muito perto de Colette, quase em cima dela, enquanto subiam as escadas. O viu tirar o sorriso da cara de alguns garotos com apenas um olhar. Phoebe saiu correndo do ônibus e entrou no prédio para tentar alcançá-los. Viu que Tommy levava Colette pelo braço e o seguiu pelo corredor até que a deixou em sua sala. Sabia que, como o grau de desenvolvimento de Colette era baixo, a haviam colocado em uma classe de apoio, apesar de ser a primeira da classe quando estava viva.
233 Desejou tornar-se invisível quando Tommy voltou ao corredor depois de ter certeza que Colette entrara em sua sala. Escondeu-se atrás de um grupo de armários e esperou que passasse. Ele nem sequer se deu conta e continuou caminhando. Phoebe notou que ele estava com os punhos cerrados. O seguiu, o que era fácil, já que os demais estudantes se esforçavam para não tocá-lo. Ele foi até seu armário que se abriu com um golpe, depois de três firmes giros de seu pulso. O poema de Phoebe era a única coisa dentro. Phoebe abraçou seus livros antes de se aproximar dele. — Tommy? — perguntou. Ele não se virou e continuou tirando os livros da mochila e colocando em uma ordenada pilha na parte superior do armário. — Tommy, está bravo comigo? — ele virou-se para ela com uma expressão indecifrável. — A forma com que se comporta, me confunde, Tommy. Fiz algo ruim? — Tommy a olhou, mas não disse nada. — O que aconteceu? É por causa do baile? — as feições de Tommy se suavizaram um pouco. — Mataram..., Evan. — respondeu e fechou a porta do armário com tanta força que o golpe ecoou nos corredores. No início Phoebe não entendeu, mas, quando sua mente compreendeu o que ele havia dito, sentiu um calafrio. — Oh Tommy. — disse, e colocou a mão em sua bochecha, sem se importar com as risadas dos estudantes que passavam por ali e faziam comentários desagradáveis sobre a garota gótica e seu namorado morto. Ela só podia pensar em Tommy, e naquele momento, não importava quem soubesse disso.
O caixão permaneceu fechado durante o segundo funeral de Evan Talbot. Phoebe estava com Adam, Tommy e Karen, olhando a caixa negra antes que o baixassem na cova. Estava apoiada em Adam, agarrada a seu braço, tentando tirar forças dele enquanto chorava sem parar.
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Imaginava Evan abrindo lentamente a tampa do caixão e pedindo ajuda, com sua aguda voz brincalhona ecoando naquela prisão de cetim. Via-o saindo dali com um salto, assim como havia saído de debaixo da lona naquela noite de chuva que haviam ido à Casa Assombrada, com o cabelo laranja grudado em seu rosto sorridente. Mesmo assim, nada disso aconteceu. Olhou os Talbot reunidos diante da pequena multidão que havia se reunido para oferecer-lhes suas condolências. Angela e seu pai, os dois com roupa de cor preta, estavam ao seu lado. Alish apoiava-se em sua bengala, usava um grande cachecol cinza que protegia o magro pescoço do vento gelado. Phoebe tentou imaginar a dor que os Talbot sentiam. Perdeu seu único filho..., outra vez. Como podiam suportar? Neste momento, a senhora Talbot olhou para trás onde estavam Phoebe e seus amigos. Voltou a olhar para frente e se apoiou em seu marido que a sustentou e tentou fazê-la parar de tremer. Não conseguiu. — Os mistérios da morte tem se multiplicado nos últimos anos. — disse o sacerdote. O padre Fitzpatrick era um homem jovem e forte que, segundo Phoebe tinha ficado sabendo, estava responsável pela igreja de St. Jude. O viu olhar a cada membro do funeral, um a um, antes de levantar a vista ao céu. — Ninguém, exceto nosso Senhor, sabe por que Evan Talbot foi tirado de seus pais..., não uma, mas duas vezes. Phoebe se ouviu chorar como se estivesse se vendo de longe. Era como se flutuasse sobre seu corpo e olhasse os assistentes do padre e a superfície do caixão. Viu a diretora Kim, ao fundo, vestida com um discreto traje cinza, secando os olhos com um punhado de papel enrugado. O padre Fitzpatrick seguiu com seu discurso. — Mas agora, eu gostaria de pensar que Evan Talbot contribuiu de algum modo ao plano divino de Deus, ao objetivo que Ele, em sua infinita sabedoria e eterno amor, tem preparado para cada um de nós. Eu gostaria de pensar que Ele não deseja que nos aflijamos pela segunda morte deste menino, mas que possamos refletir sobre sua segunda vida, essa vida que seus pais, talvez iluminados pela sabedoria e amor divino, decidiram aceitá-lo como um presente. Podemos debater
235 sobre se Evan estava vivo de verdade ou não quando voltou para nós. A diferença de muitos, eu acredito que é uma questão espiritual e não científica. Fez uma pausa. A Phoebe pareceu ver seu próprio reflexo na brilhante superfície do caixão e pensou em Margi, que havia sofrido um ataque de histeria junto a seu armário quando Phoebe sugeriu que fossem juntas ao funeral. O reverendo Mathers seguramente aceitaria sem vacilar a ideia do padre Fitzpatrick de que se tratava de uma questão espiritual, ainda que ao contrário de Fitzpatrick, era pouco provável que tivesse algo positivo a dizer a respeito. Havia multidões de líderes religiosos dentro da Igreja Católica que também estavam de acordo com Mathers. Ao celebrar o funeral, Fitzpatrick se arriscava a receber críticas e inclusive censura. O sacerdote deixou cair o punho na palma da mão, e o som trouxe Phoebe de volta a seu corpo. — Ainda assim, há algo que não podemos negar: Evan Talbot decidiu fazer de seu regresso uma benção. Evan Talbot utilizou sua segunda..., oportunidade, ou vida como queremos chamá-la, para tentar que o mundo compreendesse. Utilizou seu regresso para educar aos que não entendem o que está acontecendo com ele e com os outros como ele, e tentou ser um exemplo positivo para os que entendem. O fez através do humor, da alegria, de sua personalidade despreocupada. Impulsionado pelo amor incondicional de sua família e amigos, principalmente de seus pais. Evan tentou fazer a diferença. — continuou dizendo, pontuando cada palavra com outro golpe de seu punho na palma da mão. — E ao fazer a diferença, estou certo que Evan Talbot cumpriu com o plano que Deus tinha para ele na Terra. Phoebe olhou seus amigos através das lágrimas, buscando algum sinal de que acreditavam no mesmo que Fitzpatrick. Custava para ela imaginar um Deus que exigisse semelhante missão (morrer, ressuscitar, e voltar a morrer) a um garoto de quatorze anos. Karen e Tommy pareciam estátuas, e Karen estava com os olhos cobertos por um véu preto. Os secos olhos de Tommy olhavam para frente, para o infinito. Também se perguntava como seria estar ali embaixo na escuridão, com o cheiro de madeira, cetim e podridão no nariz? Ou não tinha que perguntar-se porque para ele bastava recordar? Adam apenas parecia aborrecido e virava-se de vez em quando, como se examinasse as filas de lápides do cemitério de Winford. — Oremos. — disse o padre Fitzpatrick. Phoebe voltou-se e viu que uma lágrima caía por debaixo do véu de Karen.
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Pela segunda vez sentiu que abandonava seu corpo, ainda que desta vez, seus joelhos dobraram-se e caiu no chão, desmaiada.
Adam a levou para a aula no dia seguinte, e quando subiu na caminhonete e arrumou sua longa saia preta pensou que nunca lhe faltaria roupas adequadas para um funeral. Riu, ainda que fosse um riso amargo que ecoou por todo o interior do carro. — Está bem? — perguntou Adam. Como ela não respondeu, ele ligou o rádio. Phoebe o desligou. — Não, não estou bem. — sussurrou ela. — Estou aterrorizada. — Adam assentiu. — É estranho. Sabe; todas essas coisas que não pensa até que não haja remédio. O que significa tudo. — Me assustei quando desmaiou. — Nem sequer caí, graças a você. — respondeu ela, rindo, dessa vez de verdade. — Poderia me lançar por cima do arco do campo de futebol se quisesse, não é? — Sim, sou extremamente forte. Deixou que suas palavras flutuassem pelo ar durante um momento, com a esperança de fazê-la rir. Quando Phoebe desmaiou, não estava simplesmente assustado. Ultimamente a ideia de que acontecesse algo com Phoebe lhe produzia uma dor difusa, uma frustração que não podia aliviar, por mais flexões ou exercícios que fizesse no campo. — Mas, eu também me assusto. — adicionou, suspirando. — Pensei que gostaria de saber. — É um bom amigo, Adam, ainda que se negue a deixar as pessoas te verem conversando comigo na escola.
237 Adam lhe bateu com o ombro..., devagar, para não lançá-la através da porta do carro. — É um bom amigo, Adam — essa era a frase que lhe dava vontade de chorar, quase tanto como o funeral de Evan. — O melhor. E não evito você, evito a Daffy. — Phoebe afastou o olhar. — Estou muito preocupada com ela. Não assimila nada disso (Evan, Colette, Tommy...) e não sei o que fazer, nem o que dizer. — Te entendo. Phoebe deu uma palmada no painel, algo que não era próprio dela. — Quem pode ter matado ele? — perguntou. — A descrição no jornal era horrível. Que classe de monstro é capaz de fazer isso? Por não falar do monstro que escreveu a notícia. Não teriam escrito daquele jeito se ele não fosse um Zumbi. Nem sequer publicaram um obituário. — Eu sei. — respondeu Adam, e o volante rangeu com a força de suas mãos. — Acredito que sei perfeitamente quem matou Evan. Quando ela o olhou, consciente, de repente de quem ele se referia, Adam desejou ter ficado de boca fechada.
Phoebe deixou sua bandeja na mesa e se sentou ao lado de Margi, que comia um cacho de uvas verdes. Estavam no canto da cafeteria, de cara para a parede pintada de cinza industrial. — Bonita vista. — comentou Phoebe. Margi comeu uma uva. — Podemos conversar? — Margi encolheu os ombros. — Olha, sei que Colette te deixou muito nervosa. — começou, sem saber bem o que dizer, mas sua amiga já estava sacudindo a cabeça. — Não é pelo que disse, e sim pelo que fiz. — Pelo que fez? — perguntou Phoebe. — O que fizemos. Eu também lhe dei as costas.
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— Tinha razão no que disse. — disse Margi, assoando o nariz. Phoebe assentiu, colocando um braço no ombro dela. ― Quando as pessoas morrem, sempre nos perguntamos pelo que ela passou, sabe? Nós nos perguntamos no que pensavam. Se; acreditava que as decepcionamos. — E agora sei a resposta. — disse Margi. — Mas a sabia desde o início. — Margi, isso é diferente, tem uma segunda oportunidade. Pode falar com ela se quiser. — ha. — respondeu Margi, não muito convencida. — Ela não te culpa por sua morte, nem a mim, nem a ninguém. Só está chateada pela forma como reagimos quando voltou. Mas nos perdoará, sei que fará. Verá que nenhum amigo é capaz de compreender uma coisa como essa. — Sim. — Sim. Sério? Como em: Sim, é tão sábia e inteligente como sempre, Phoebe. Alegro-me de que me ame, eu também te amo, e seremos grandes amigas para sempre? — Sim. — repetiu Margi, secando os olhos. — Tudo isso. — Ficamos quase duas semanas sem nos falar. — disse Phoebe, e lhe deu um abraço carinhoso. — Senti sua falta. — Eu também. Foi ao enterro? — Sim, com Adam. — Sinto muito não ter ido com vocês. O que Evan deve ter passado é horrível. Não posso nem acreditar. Parecia um garoto simpático. — Foi muito triste. Seus pais pareciam..., pareciam perdidos, sabe? — Também sinto muito ter deixado as aulas. Sou boa em fazer coisas estúpidas.
239 — Tenho certeza que pode falar com Angela, ou com a diretora Kim. Tenho certeza que... — Não sou tão boa em desfazer coisas estúpidas. Angela ligou para meus pais quando saí das aulas, e eles supuseram que não era nada bom para minha saúde mental..., para minha frágil saúde mental. Já sabe como eles são, Phoebe. Nunca entenderam o tema gótico, a música e tal, e minha irmã Caitlyn é uma garota hiper feminina, com Barbies, vestidos rosa e tudo mais. — ficou calada por um segundo. — Suponho que fiquei muito tempo olhando as paredes do meu quarto, então estão preocupados. Querem que eu faça terapia e tudo. — Outra vez? — Outra vez, como funcionou tão bem a anterior..., olha quão estupidamente me adaptei a tudo. Margi pegou uma uva e a colocou na boca. Phoebe pegou duas. — Como estão todos? — perguntou Margi depois de um tempo. — Quero dizer, Tommy e os demais. Como estão levando a morte de Evan? — Hoje será duro. Alguns temos turno essa noite na Fundação, e amanhã é a primeira aula depois... depois de seu assassinato. — Me pergunto em que estarão pensando. Os garotos Zumbis, quero dizer. — Tommy e Karen não têm falado muito sobre o assunto. — Claro. — disse Margi, soltando uma risadinha. — Viu o que vestia hoje? Outra sainha curta, uma blusa branca e meias até os joelhos. Juro por Deus que se tivesse colocado sapatos de couro o look de colegial católica estaria completo outra vez. — Está louca. — concordou Phoebe, rindo. — É como se a morte a houvesse dado licença para agir como quer, para fazer o que quer. A morte parece ter assustado alguns, mas para ela parece ter libertado-a. — Tinha outra maçã, Phoebe. Juro por Deus, a estava comendo. O que é isso? — Está brincando.
240 — Não, de verdade. Para onde vai essa comida? Quero dizer, eu achava que seus corpos não funcionavam nem nada. Acreditava que os cientistas haviam averiguado que era mofo ou algo assim que vivia em seu cérebro e que... — Mofo? Onde ouviu isso? No The Enquirer? — Não, de verdade, ouvi que... Uma sombra caiu sobre elas e Pete Martinsburg deu um tapa na mesa. As duas deram um pulo. O garoto deixou uma folha de papel enrugado em cima e a alisou, procurando não rasgá-la. Inclinou-se sobre a mesa e olhou as duas, primeiro uma, depois a outra. Phoebe tampou mais seus ombros com seu casaco negro. — Olá garotas mortas. — as cumprimentou, tirando uma caneta preta do bolso de sua calça. — Nos deixe em paz, imbecil. — respondeu Margi, fazendo desaparecer qualquer rastro de fragilidade ou insegurança. — Apenas vim expressar minhas condolências. — disse ele entre risadas. Tirou a tampa da caneta e traçou uma única linha na página, mais ou menos na metade. Depois aproximou aos olhos e assentiu, satisfeito. A linha negra era visível através da fina folha. Foi então que Phoebe se deu conta que se tratava da lista de aceitação para a classe de estudos Zumbis. — Não tem coração. — sussurrou ela. Ele encolheu os ombros, tampou a caneta, dobrou a lista e a guardou, deixando depois a mão sobre o bolso da camisa. — Ainda bate; não como a maioria dos seus amigos. Phoebe com os olhos cheios de lágrimas de raiva tentou levantar-se, mas ele a empurrou de volta no banco e deixou suas mãos nela durante um momento. — Não, não se levante, nos veremos logo. Adam deve ter visto do outro lado da cafeteria, porque corria até eles, abrindo espaço por um grupo de estudantes. Pete lhe fez um gesto obsceno e se perdeu no meio da multidão.
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— Está bem? — perguntou Adam a Phoebe. — Te machucou? — Não. — respondeu ela, ainda que não tivesse certeza.
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CAPÍTULO 25 Adam tamborilou com os dedos no volante. Manuseou os controles do ar condicionado, incapaz de encontrar o equilíbrio perfeito entre o ar quente e frio. Olhou pelo espelho retrovisor pela trigésima sétima vez. — Adam, tem algo errado? — Phoebe perguntou. Adam não a olhou. Mesmo o som de sua voz era como uma injeção de açúcar, embora ele tivesse dado como controlado por muitos anos. — Bem, eu não sei. O que poderia estar acontecendo comigo? — Ha, eu ainda não acredito. — respondeu ela, pensando que ele falava de Evan, no entanto, o que realmente estava acontecendo naquele dia, era que a garota por quem ele talvez estivesse apaixonado sentia alguma coisa indeterminada por um Zumbi, e ele estava levando-a a um encontro com o tal Zumbi. — Então, vamos para a Casa Assombrada, certo? — perguntou. — Só para buscá-lo? — Esse é o plano. — disse ela, batendo-lhe no braço. — Ei, eu quase me esqueci, você já tem companhia para o baile de boas vindas? — Sim. — ele respondeu, engolindo o nó na garganta. — Karen? — perguntou ela, dando-lhe outro cutucão. — Você já convidou Karen? Não convidou Margi, não é? Bem, ela teria me dito, eu acho. — Não e não. — Oh. — disse Phoebe, perdendo todo o entusiasmo. — Não chamou? — Adam, assentiu. — Oh.
243 Ele entrou na estrada de terra que conduzia ao camping de casas móveis de Tommy. Tommy estava no pequeno pátio vestido com calça jeans e uma camisa de cambraia. Para Adam, parecia um espantalho muito bem arrumado. — Ali está o seu garoto. — disse ele, mas Phoebe já havia abaixado a janela para saudá-lo. Tommy lhe acenou de volta. Adam viu como sua amiga saia da caminhonete e se aproximava do Zumbi, dando pulinhos. Pensou que ela ia abraçá-lo ou, pior ainda, beijá-lo, mas parou antes de chegar, então engoliu em seco e fechou os olhos com força. No entanto, quando os abriu, Phoebe e Tommy, continuavam lá, juntos. Havia espaço entre eles, mas parecia menor do que o habitual. — Você viu o furgão branco? — perguntou Tommy, olhando para Adam. — Furgão branco? Tommy assentiu, e Adam teve a impressão de que ele estava animado por tê-lo visto. — Há dez minutos atrás, um furgão..., branco deu a volta..., no camping. — Eu não notei. — disse Adam. — A verdade é que ele não estava consciente disso. — Você acha..., acha que poderia ser um daqueles furgões brancos? — Phoebe perguntou, tocando o Zumbi no braço. — Não..., sei. — Acho que nós não cruzamos com nenhum, cara. — disse Adam. — Nós não cruzamos com quase nenhum carro. — Oh, meu Deus. — disse Phoebe. — Acha que sabem sobre a web, certo? Adam virou-se. Algumas portas para baixo havia uma velha mulher com bobs no cabelo e roupão verde jogando comida de um saco grande para o gato, em uma bacia prateada. — É apenas uma questão de tempo. — disse Tommy. — Acho que há..., um furgão branco..., esperando para levar quase todos nós. Quem sabe. A velha levantou o olhar, viu Adam e acenou. Em seu mundo não existiam os furgões brancos. Ou isso, ou era meio cega e não tinha nem ideia de que vivia ao lado de um Zumbi. Ele acenou-lhe de volta.
244 — Adam. — disse Tommy. — Se virmos um furgão branco..., por favor, não vá..., para a Casa Assombrada. — Às suas ordens, capitão. O Zumbi movia-se muito rapidamente quando queria. Chegou primeiro a caminhonete, abriu a porta para Phoebe e a ajudou a subir. Adam tentou não cerrar os dentes enquanto saia com o carro.
Quando chegaram à Casa Assombrada, havia um garoto magro com longos cabelos negros de pé na varanda. Ele usava uma jaqueta de couro com correntes prateadas oxidadas penduradas nos bolsos e remendos com os nomes e logotipos de várias bandas de punk e metal, costurados no couro. Os remendos estavam sujos e a jaqueta de tão gasta, estava lisa e cinza nos ombros e cotovelos. Parecia estudar seus arranhados coturnos27 pretos, por isso seu cabelo caía como uma cortina escura, escondendo-lhe o rosto. — Este é..., Takayuki. — disse Tommy, ao sair da caminhonete. — Tentem..., não deixar que os assuste. Phoebe olhou para Adam, perplexa, e Adam, devolveu-lhe o mesmo olhar com um encolher de ombros. Os dois saíram do carro. Adam viu como sua amiga alcançava Tommy e saudava em tom alegre ao garoto na varanda, quem não se mexeu, aparentemente mais interessado no apagado brilho de suas botas. No entanto, ele levantou a cabeça como uma cobra, quando Phoebe colocou um pé nos degraus da varanda. Phoebe sufocou um grito, e Adam viu o motivo. No garoto, faltava uma boa parte da bochecha direita. Tinha uma fina tira de carne do lado direito da boca e uma manifesta falta de pele, que deixava exposto todos os dentes até alcançar aos últimos. À primeira vista, parecia estar sorrindo, mas, pelo jeito que ele olhava com seus olhos negros, ficava claro que não. — É um erro trazer os corações vivos aqui. — disse o garoto morto, Takayuki; a bochecha oca dava a sua voz, um murmúrio estranho. 27
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245 Tommy ficou na frente de Phoebe. — São..., meus amigos. Cuidado..., com os insultos. — Nós não podemos ter..., amigos, entre os sugadores de ar .— respondeu Takayuki, e Adam viu sua língua cinza através do buraco na bochecha. — Quantas vezes eu tenho que te lembrar? Karen saiu da Casa Assombrada e passou dando pulinhos pelo lado de Takayuki. — Desculpe Tak. Fico feliz em vê-los! Abraçou Phoebe com grande teatralidade. Adam, não se dava muito bem em interpretar a linguagem corporal dos mortos-vivos, mas pelo sutil movimento dos ombros de Tak, ficou claro que as ações de Karen (ou a mesma Karen) tiveram algum efeito sobre ele. — Tak, não se dá muito bem com as pessoas, certo? Por que não Takky? Deveríamos te arrumar uma entrevista de emprego como auxiliar no WalMart — Tak voltou a olhar para suas botas. — Entrem. — disse Karen, pegando o braço de Phoebe e fazendo um gesto para Adam. — Todos estão morrendo de vontade de ver vocês. Adam as viu entrar e captou o olhar entre Tommy e Tak. Aproximou-se mais e viu que o garoto morto estava esquelético, por baixo da pesada jaqueta de couro. Tanto a jaqueta como a camiseta preta tinham buracos, e o ar ao seu redor emanava um odor desagradável. Os outros Zumbis, não cheiravam a nada que Adam soubesse, exceto Tommy e Karen, que colocavam colônia ou usavam xampu. O cheiro que emanava dele não era de putrefação, nem de decomposição, mas sim de algum produto químico. Procurou esbarrar com ombros no garoto morto ao passar junto a ele. — Opa, desculpe Sorriso. — ele disse. — Sorriso. — deu-lhe um olhar de puro ódio. Levantou o braço esquerdo com a mesma velocidade que o professor Griffin, mas depois abriu o punho, como se convidasse Adam a entrar. E então, sorriu de verdade. O efeito foi horrível, os músculos da parte superior da face esticaram para levantar os restos destroçados de pele, que ainda pendiam de seu rosto.
246 Por que eu tive que fazer isso? Pensou Adam, entrando furtivamente pela porta, sem afastar os olhos do rápido Zumbi. Como se já não tivesse inimigos suficientes. Ele virou-se para a sala principal a tempo de ver Phoebe abraçar Colette. Bom para você. Pensou ele, feliz de que Phoebe não tivesse ficado congelada de medo, depois de seu encontro com Tak na varanda. Colette sorriu-lhe de volta, mais ou menos, e Phoebe, tirou uma mecha de lisos cabelos castanhos cinzentos dos olhos. Tayshawn estava lá, e Kevin também, o grande Mal, e a garota com um só braço. Havia caras novas (embora nenhuma tão marcante quanto a de Tak), cerca de treze garotos e garotas mortas no total, aproximadamente. Mas Evan não. Pensou ele. A atmosfera da casa era diferente sem o garoto, o bobo da corte dos mortos-vivos. Adam lembrou-se do garoto na parte traseira da sua caminhonete, protegendo-se da chuva com a lona. Os garotos com DFB, somente emitiam algumas vibrações tristes, mas pareciam mais sombrios ainda sem Evan por lá. — Nós vamos..., começar. — disse Tommy. — Obrigado..., a todos por terem vindo. Eu queria dizer-lhes..., o que aconteceu..., com Evan. Takayuki entrou na casa como uma sombra. Adam ouviu o ranger de sua jaqueta de couro (ou de sua pele), enquanto cruzava os braços sobre o peito. Não tinha certeza, mas dava-lha a impressão de que em Tak, faltava um pedaço de pele no dorso da mão. — Evan..., foi assassinado. — disse Tommy. — Não há outra forma de..., dizer. Eu não sei se foi um..., ato aleatório..., como tantos outros atos violentos contra nós..., ou se fazia parte de..., um plano maior. Adam viu que Phoebe estava olhando-o e pigarreou. — Eu sei quem matou Evan. — disse ele, sentindo um calafrio, quando os olhos dos mortos, cravaram-se nele. — Foi Pete Martinsburg. — Você..., sabe? — perguntou Tommy. — Você tem provas? — Meu coração me diz. — Ele mesmo me disse que o tinha feito. — disse Phoebe, baixando tanto a voz que era apenas um sussurro.
247 — Você confia nesses..., sugadores de ar, em seus grandes..., amigos, e eles te escondem algo assim? — Não escondemos isso... — Phoebe começou a dizer, mas Tommy levantou a mão, interrompendo-a. — O que vamos fazer a respeito, destemido líder? — Tak perguntou. — Nós..., contaremos..., para a polícia. — respondeu Tommy, virando-se para ele. Adam viu que ele tinha perdido parte de sua confiança. — Publicaremos... O Sorriso fez como se fosse cuspir, mesmo que não produzisse nenhuma saliva. — A polícia não fará nada. As palavras..., não farão nada. Quanto tempo vai demorar..., para os sugadores de ar..., como ele...? — disse ele, apontando para Adam, quem se fixou nas longas unhas negras de Tak, que ele imaginava, fossem pintadas, pois os outros garotos mortos, não as tinham daquela cor. — Chegarem a..., exterminar..., todos nós? — A sua solução. — Tommy disse, sacudindo a cabeça. — Fará..., com que nos exterminem..., muito mais rápido. — Alguns tipos de..., morte. — Takayuki respondeu, esboçando seu horrível sorriso. — São melhores que outras. Escreva suas palavras. Talvez alguém lhe..., preste atenção. Os que preferem..., agir..., que venham comigo. Adam viu que Tayshawn, era um dos que preferiram agir. Cerca de mais cinco Zumbis aproximaram-se de Takayuki arrastando os pés. Karen também o fez, e Adam, viu que ela colocava uma mão no braço do amigo. Ele a olhou como se aquela mão tivesse o poder de lhe causar uma verdadeira dor física. — Tak. — Não, Karen. Aproveite o seu..., comitê do baile de formatura. Continue..., fingindo. Adam a viu dar um passo para trás, como se ele tivesse lhe dado uma bofetada, provavelmente teria chorado, se pudesse. Tak levou sua banda da Casa Assombrada.
248 Ficaram em silêncio por alguns segundos, e Adam, olhou pela janela para o pátio, onde os Zumbis viravam a esquina em direção a floresta de Oxoboxo. Ele percebeu que Karen também os observava pela janela. — Minhas..., desculpas..., por Tak. — disse Tommy, para toda a sala, mesmo que se dirigindo principalmente a Phoebe. — Reagimos de forma diferente..., ao contraditório dom..., do nosso retorno. — Claro. — respondeu Adam, vendo que Phoebe, parecia desconfortável. — De uma forma ou de outra, deve ser uma experiência traumática. Para todos vocês. Os mortos concordaram com a cabeça. — Sim, sim. — concordou Tommy. — O que eu queria dizer antes..., era que alguns..., não nos querem aqui. E agora que somos..., muitos..., haverá mais..., vítimas, como Evan Talbot. Temos que ter..., muito cuidado..., quando entramos e sairmos..., desta casa, e de qualquer outro lugar..., onde nos encontrarmos. Eu vi..., um furgão branco..., em Oakvale. Eu não quero que ninguém..., se assuste..., mas os eventos..., que os meios de comunicação..., não querem informar ao mundo..., são muito reais. Temos de ser cuidadosos. — esperou que a mensagem penetrasse antes de falar. — Nós conversaremos sobre..., o baile de boas vindas..., em Oakvale High. Depois faremos uma festa..., aqui..., para todos vocês. Karen..., quer dizer..., algumas coisas. — Sim. — respondeu Karen, afastando-se da janela. — Obrigada, Tommy. Eu conversei com as..., pessoas da missão de St. Jude, e tem vestidos..., e ternos para os que não tenham..., outros meios..., para consegui-los. Então essa era a piada do comitê de baile, pensou Adam, notando que Karen estava um pouco alterada. Por sua forma de falar, ninguém teria dito que Karen era uma garota com DFB, mas as ações do Sorriso tinham tomado seu preço. — Vamos decorar. — continuou ela. — O nosso DJ acaba de ir embora com os outros Garotos Perdidos, mas estou certa de que nós podemos..., convencêlos..., para que venham. Se não, bem..., nós arrumaremos. E, apesar dos votos..., contra..., vamos convidar alguns amigos tradicionais. Tradicionais, refere-se aos com Fator Biótipo Tradicional. Adam piscou-lhe um olho e pareceu que o gesto reavivou o brilho nos olhos de Karen. — Eu vou cuidar dos refrigerantes e dos sacos de batatas fritas. — comentou. Karen e Tommy sorriram, mas a piada não chegou ao resto do grupo, nem mesmo em Phoebe, que parecia embaraçada.
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Adam se arrependeu um pouco e percebeu que usaria mais ou menos o senso de humor maluco de Evan e o seu próprio. — Vou para casa..., pela floresta. — disse Tommy. — Karen e eu..., temos coisas para fazer. Adam virou-se para não ver a cara de decepção de Phoebe. — Sério? — disse a garota. — É um longo caminho e está tarde. Por que vocês não voltam conosco? — Não, obrigado. Estar tarde não significa nada para nós. Nós não nos... cansamos. Não dormimos. — Venha bem para os ensaios. — disse Adam. — Venha chique para o show, como de costume. — Sim. — Você vai ter problemas com o Sorriso? — perguntou Adam, e Phoebe, deu-lhe um soco no braço. — Mais cedo ou mais tarde. — disse Tommy, depois de piscar. Adam já supunha. — Bem, obrigado pelo convite. Até amanhã. — Boa noite. Adam virou-se para não ter que vê-los se beijando, se era isso o que pretendiam fazer. Ouviu Phoebe dizer-lhes boa noite e em um segundo estava ao seu lado, indo para a caminhonete. Sentia a irritação que emanava dela como o calor do sol. — O que foi? — ele perguntou quando entraram no carro, percebendo que sua amiga fechava a porta com mais energia do que o normal. — Você tem que ser sempre tão mal educado? — Mal educado? — perguntou ele, manobrando a caminhonete, antes de voltar para o longo e sinuoso caminho.
250 — Sacos de batatas fritas e refrigerantes? O Sorriso? Deus, Adam, você tinha que dizer isso? Como você acha que faz eles se sentirem? — Com sorte, com vontade de rir. Acho que eles têm senso de humor, como qualquer outro adolescente. — Sorriso? E por que não chamar a garota manca...? — Não diga isso. Nem pense em dizer, porque isso é completamente diferente, e você sabe disso. — E por que é diferente? Ele sabia que tinha que calar a boca, porque com cada palavra que dizia, notava que ela se afastava dele, o que colocaria fim ao Frisbee, aos passeios de carro pela cidade, as visitas aos Laticínios Abelha, as piadas sobre Emily Brontё, e conversar sobre tudo e sobre nada. Phoebe acabaria. Sabia que tinha que calar a boca, mas não conseguiu. — Bem, em primeiro lugar, ela não estava insultando e assustando você. — Ah, então estava me protegendo, certo? — Estava se colocando do seu lado. E do lado dos tradicionais e sugadores de ar do mundo. Deveriam ter lhe dado um pontapé, isso é o que deveriam ter feito. — Sim, ótima ideia. — disse ela, ofegando. — Dar uma surra em todos os outros que não sejam iguais a você. — Desde quando isto tem a ver com ser iguais ou diferentes? Estamos falando de um garoto que se comporta como um imbecil. — Só um? Não ache que seu dever é me proteger, Adam Layman. Tommy estava indo muito bem falando com ele e se colocando do meu lado. — O que você disser. Igual ele te protegeu bem na floresta. — Ah! — ela exclamou. — Como se você tivesse feito isso melhor! Bem, lá estava. A única coisa que evitou que ele batesse com o punho contra o painel; foi a presença de Phoebe, ou quem sabe, o argumento que o professor Griffin havia ensinado.
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Ele chegou a casa em dez silenciosos e raivosos minutos depois, e Phoebe, fechou a porta da caminhonete com força, foi como se fechasse a tampa de um sarcófago e o deixasse preso dentro. Talvez se eu estivesse em um caixão prestasse mais atenção em mim, pensou ele. Sua amiga não lhe desejou boa noite. Ele a viu percorrer apressadamente o gramado que separava os dois pátios. Eles se conheciam há anos e nunca haviam brigado, nem sequer haviam discutido. Algumas piadas, algumas discussões, um insulto de vez em quando, mas nenhuma briga. Aquilo ficava no passado. Tudo tinha mudado. Tudo.
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CAPÍTULO 26 Margi olhou hesitante para Phoebe, considerando a possibilidade de que sua amiga não quisesse que ela se sentasse ao seu lado no ônibus. Aproximouse arrastando seus pés, e ficou ali em pé, como se a houvessem castigado. Com um basta, pensou Phoebe. Fez uma careta e puxou Margi para que se sentasse com ela. — Ei, cuidado! Aparecem hematomas em mim por nada. — protestou Margi. — Pois aguente. — respondeu Phoebe, segurando as lágrimas. — Oh. Meu. Deus! Você está chorando! Minha nossa! Você está horrorosa! Margi começou a procurar lenços de papel em sua bolsa negra, sem dúvida, embolados e com cheiro de patchuli. Phoebe riu e notou que uma grande lágrima desceu por sua bochecha. — O que aconteceu? — lhe perguntou Margi, aproximando-se mais. — Esse garoto morto tentou alguma coisa? Sabia que estava acontecendo algo, só... Phoebe abraçou Margi e lhe mandou fechar a boca. Margi beijou sua bochecha e devolveu o abraço e, surpreendentemente, se calou de verdade. Phoebe sabia que estava com os olhos vermelhos, e nem sequer havia se incomodado em usar delineador e maquiagem pela manhã, embora precisasse após ter passado meia noite chorando. Inclusive tinha chorado por cima de seus deveres de álgebra, por Deus. — Por favor, você poderia voltar para a classe de estudos de DFB? — Deveria deixá-la, Pheebs. Depois do que ele te fez, não pode se sentar na classe com ele. — Não foi ele, foi Adam.
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— Adam? Adam tentou passar a mão em você? — perguntou Phoebe, inclinando-se para trás. — Meu Deus, eu sabia que não estava errada! Eu sabia que ele tinha algo com você! Eu... Margi lhe passou um lenço e Phoebe se desfez com carinho do abraço de sua amiga para esfregar seus olhos. — Não, Margi. Adam não tentou fazer nada. Nós brigamos e foi só isso. — Oh. — disse Margi, decepcionada. Esboçou um sorriso, malicioso. — Bom; isso tem mais sentido. Você não estaria chorando se ele tivesse tentado passar a mão em você. — Margi! — Adam está bem, Pheebs! Reconheça garota. Esse corpo que ele tem é como um experimento perfeito, como se o houvessem fabricado em um laboratório secreto de uma cientista ninfomaníaca. — Uma cientista ninfomaníaca? — Cada vez há mais garotas que se dedicam as ciências puras. Vi no noticiário. As duas começaram a gargalhar. — Você está dizendo isso para me animar. — respondeu Phoebe depois de se recuperar. — Certo. — disse sua amiga, afastando seu cabelo do rosto manchado de lágrimas. — Funcionou? — Sempre. Por favor, volte para a aula. — Meus pais vão perguntar para a diretora Kim se posso voltar. — respondeu Margi, dando umas palmadinhas em seu braço. — Enganei minha terapeuta para que pensasse que eu ficaria bem, o que demonstra que ir para esses lugares é perda de dinheiro, por que faz duas semanas que a convenci que a classe despertava meu instinto suicida. — Você é demais, Margi.
254 — Eu sei. — respondeu ela sentando-se direito. — Então, por que não tenho um encontro para o baile? — Talvez por que você é demais? — Pode ser. A verdade é que Norm Lathrop me pediu. — Norm é simpático. — Norm é um tonto, mas é um bom garoto. Gravou para mim um CD com canções variadas. — Oh, oh. — Eu sei, é um sinal claro de paixão. E acertou com algumas canções que eu gosto, algo de Switchblade Symphony e de... Calou-se quando o ônibus parou para recolher outro passageiro: Colette. A garota cambaleava de um lado para o outro no corredor do veículo, como se o chão fosse um mar agitado. Phoebe a saudou com a mão. Colette se deteve no assento na frente do seu e as olhou; seus olhos eram como uma noite sem estrelas. — Olá... Phoebe. — disse. Fez uma longa pausa antes de conseguir formar as palavras seguintes. — Olá... Margi. Margi respirou fundo e Phoebe teve medo que começasse a hiper-ventilar. — Olá, Colette. — respondeu a garota agarrada ao braço de Phoebe como se fosse uma armadilha para ossos. — Sinto muito, muito por ter sido uma idiota contigo. Prometo tentar melhorar. A antiga Colette, a Colette viva, pareceu surgir como um fantasma através da carne morta de seu rosto durante um breve instante, e uma sombra da bonita e feliz garota com quem tinham passado incontáveis horas às olhou e sorriu. — Não tem..., problema. — respondeu. Depois se deixou cair no assento da frente. Phoebe sentiu vontade de voltar a começar a chorar, agora de felicidade. Margi se voltou para ela e deu de ombros, como se não desse importância a monumental façanha que acabara de conseguir. — Fecha a boca, Phoebe. — disse, soltando seu braço.
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— Margi, não..., não sei o que dizer. Obrigada. Margi apertou sua mão. Ficaram em silêncio durante alguns momentos, e então a cabeça de Colette se levantou como um globo por cima do assento do ônibus, Margi voltou a agarrar o braço de Phoebe, e Phoebe fez uma careta de dor. Era desconcertante enfrentar o olhar inexpressivo de Colette. — Ei..., Margi..., você gostaria..., de vir..., a..., uma..., festa? Margi se soltou um pouco e esfregou o braço de Phoebe, como se tentasse aliviar a dor que tinha infringido. — Eu adoraria. — respondeu.
A manhã de Phoebe acabou em um instante, embora sempre demorasse quando ela tinha que ir para a fundação. Saiu uma hora antes, o que ajudava, mas também contribuía para os nervos pela aula de estudos sobre pessoas com DFB. Ali podia acontecer qualquer coisa, enquanto que no resto de suas aulas, apesar de só ter passado seis semanas na escola, parecia uma rotina aborrecida e previsível. Também passou pelo almoço, que era o momento do dia mais curto, mas que foi eterno por culpa da presença de Adam a algumas mesas dela. Estava sentado como se lhe chamasse, o que fez com que Phoebe se sentisse mais culpada, sem saber por que. — Você já falou com ele? — lhe perguntou Margi enquanto cortava os restos de um pudim de chocolate com sua colher de plástico. — Com quem? — perguntou Karen. Phoebe havia insistido em sentar-se com Karen, e Margi não tinha protestado muito, para variar. — Com Adam. Phoebe e ele brigaram. — respondeu Margi, chupando a colher.
256 — Oh. — disse Karen, enquanto Phoebe deu um tapa em Margi. Karen não havia levado comida, e para Phoebe lhe dava a impressão de que era quase a mesma pessoa despreocupada de sempre. — Não foi uma briga. — explicou Phoebe. — Só discutimos. A gente discute. Karen assentiu e lhe deu uma palmadinha no braço, com seus longos dedos frios, tinha as unhas pintadas de vermelho vivo. — Não percam tempo discutindo. — lhe disse. — A vida é muito curta. Acredite em mim. — Falando nisso. — interveio Margi, comendo a última colherada de pudim. — Por que você acha que voltou? Há um montão de teorias: uma substância na água, nas vacinas dos bebês americanos... — Espório de mofo. — respondeu Karen. ― Não se esqueça da teoria dos espórios de mofo. — Sim, isso! — exclamou Margi, apontando para Phoebe com a colher. — Eu te disse! — Há ideias ainda mais dementes. — respondeu Phoebe. — Como abduções alienígenas. — Sinais do Apocalipse. — acrescentou Karen. — Muito fast food. — Chuva radioativa de Chernobyl. — O poder da oração. — Os jogos de ação em primeira pessoa. Phoebe e Karen olharam para Margi, que levantou os tilintantes braços numa atitude defensiva. — Ei, eu não escrevo as noticias, só as transmito. — O que é um jogo de ação em primeira pessoa? — perguntou Phoebe.
257 — Você sabe; um desses jogos de computador em que você sai por aí arrebentando coisas. — Normalmente Zumbis. — acrescentou Karen. — Não joguei nenhum na minha vida, nem na morte. No entanto..., poderia explicar por Evan e Tayshawn. E por Tak. Mas só estes. — Quem é Tak? — perguntou Margi. Karen fingiu não ouvi-la. — Isto, Karen, como..., uma pessoa com DFB, por que você acredita que voltou? — lhe perguntou Phoebe. Karen sorriu e se recostou na cadeira, esticando-se. Usava um sutiã preto debaixo da blusa branca e semi-transparente. — Bom, falando como uma pessoa com DFB, eu acho que a razão de minha volta e da volta das pessoas com DFB de todo o mundo é muito simples. Só há uma resposta. — E é? — perguntou Margi, e Phoebe lhe deu uma cotovelada. — Magia. — respondeu Karen, piscando um olho. — Qual é. — Digo a sério, Margi. — respondeu ela, e Phoebe não foi capaz de penetrar o suficiente em sua expressão para dizer se o que dizia era a verdade ou não. — É magia. — Bom; obrigada pela informação. — respondeu Margi. — Sinto muito, foi você quem perguntou. — Karen. — disse Margi. — Te importa que eu te faça uma pergunta pessoal? — Sim. — respondeu ela, inclinando-se sobre a mesa para por o rosto a quinze centímetros do de Margi. — Quando uma pessoa viva quer fazer uma pergunta para uma pessoa morta, é uma de duas: ou como morreu? Ou como é estar morta? Phoebe ficou vermelha de vergonha, e inclusive sua franca amiga corou um pouco.
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— Ia começar com a primeira, sim. — Você não é a única com poderes telepáticos, sabia? — disse Karen, inclinando-se novamente para trás. — Se eu feri seus sentimentos, sinto muito. — Ai, céus. — respondeu Karen, acariciando suavemente seu rosto com a ponta dos dedos. Margi conseguiu não se afastar. — Alguns dizem que não temos sentimentos..., assim que não podem feri-los. Sei que você tenta entender, e não fazer mal, então não se preocupe. — Certo. — E vou responder a sua pergunta, a primeira, mas só essa, e depois acaba a entrevista, certo? Phoebe e Margi assentiram, e o rosto de Karen ficou sem expressão. A luz que, às vezes, parece dançar em seus olhos de diamante se apagou. A transformação foi tão repentina e inesperada que Phoebe se assustou. — Tomei..., pílulas. Um frasco..., inteiro. E..., dormi. — respondeu, com a voz cada vez mais fraca, como se estivesse dormindo na frente delas. ― Me..., suicidei. — Oh, não. — sussurrou Margi. Phoebe tocou o braço de Karen como se tentasse amarrá-la a terra, e Karen levantou seu olhar morto para ela; a luz regressou pouco a pouco aos seus olhos. — Eu sei. — disse. Karen levou a mão de Phoebe aos lábios e a beijou enquanto se levantava da mesa. — Não contem a ninguém. Nós nos vemos nos estudos Zumbis. — Meu Deus. — exclamou Margi quando Karen se afastou. — Mal pude acreditar. Phoebe contemplou o batom de cor pêssego que haviam deixado os lábios de Karen no dorso de sua mão. — Você pode acreditar Pheebs? Eu nunca teria imaginado isso de Karen. Além disso, pensei que os suicidas não voltassem.
259 Phoebe não conseguia afastar os olhos do beijo, que era como uma tatuagem sobre sua pele pálida. — Ei, você a ouviu dizer telepatética? Não usei nunca essa palavra com Karen. — Ela disse telepática. — respondeu Margi. — Não, estou bastante certa que ela disse telepatética. Nossa palavra. — Bom, acho que é a primeira vez que tenho uma conversa com ela de verdade, então não ouvi. — Eu sei. — disse Phoebe, resistindo ao estranho impulso de levar o dorso de sua mão aos seus lábios. — Isso é o que eu quis dizer.
Por alguma razão, para Phoebe o fato de que Karen usasse uma das palavras em código que compartilhava com Margi, lhe resultava mais misterioso do que a revelação de seu suicídio. Karen era diferente (de um fator biótipo realmente diferente) do resto das pessoas, quer fossem Zumbis ou não. Meditou sobre ela até que o anúncio da chegada da van da Fundação Hunter a tirou da sexta aula do dia. Viu que Adam já estava no ônibus e que se sentava na parte de trás, fingindo estar absorto em um livro de bolso. O Morro dos Ventos Uivantes, pensou Phoebe. Os três alunos mortos de Oakvale High (Karen, Tommy e Colette) também já estavam lá dentro. Colette; pensou Phoebe, Karen deve ter ouvido de Colette. Alegrava-se de ter resolvido o mistério, embora sentisse que não tinha mais nada com que se distrair de sua briga com Adam. — O último é um ovo podre. — disse Thorny, passando a toda velocidade por ela e subindo as escadas com enérgicos saltos. Phoebe suspirou, entrou no veículo e se sentou ao lado de Tommy, na parte da frente. Todos os demais estudantes, salvo Adam, estavam a poucos assentos de distância entre si, algo que não passou despercebido pelo sempre inteligente Thornton Harrowwood.
260 — Ei, Adam. — gritou, quando fecharam as portas e o motorista se afastou da calçada. — O que está acontecendo? Está em um plano anti-social? Phoebe se virou, mas Adam não afastou seus olhos do livro. — Algo assim. — respondeu. — Está acontecendo algo? — perguntou Tommy para Phoebe. — Não. — respondeu ela, virando-se para ele. — Não muito. Evitou olhá-lo nos olhos; o olhar de Tommy era penetrante inclusive nos dias em que não tinha nada que ocultar.
Quando chegaram a casa dos DFB, na sala só estavam Kevin e Angela. Ao que parece, Sylvia não tinha terminado sua misteriosa “melhora”, Margi ainda não tinha sido readmitida na aula e Evan não retornaria. Phoebe foi pegar café antes de se sentar, e Karen a seguiu até a mesa. — Ei, onde está Tayshawn? — perguntou Thorny. Phoebe virou sua cabeça enquanto preparava seu café com leite e viu que Angela estava com dificuldades de manter seu sorriso. — Em St. Jude me disseram que Tayshawn já está a alguns dias sem ir ao refúgio. Não sabem onde ele está, e ele não se colocou em contato com a fundação. Phoebe deu um gole em seu café e se deu conta de que Karen a olhava. — Você poderia preparar um para mim? — perguntou-lhe a garota morta, apontando para o copo de isopor. — Fique com o meu. — respondeu Phoebe. — Coloquei muito açúcar. — Como quiser. — disse Karen. Pegou o copo com as duas mãos e deu um delicado gole.
261 — Então o que, ele desapareceu? — perguntou Thorny. — Não sabem onde ele está? — Eu temo que não. — respondeu Angela. — Uh, as pessoas caem como moscas. — comentou Thorny. Phoebe terminou de preparar o café justo a tempo de ver como Adam dava um tapa em sua cabeça. — O quê? — Tenha um pouco de respeito. — O que? Do que você está falando? Phoebe se sentiu mal quando viu que o garoto se dava conta pouco a pouco. — Oh. Oh, claro. — disse Thorny, enquanto Phoebe se sentava no sofá entre Colette e Tommy. Angela umedeceu seus lábios, que estavam franzidos. — Bom. — disse. — A primeira coisa que gostaria de tratar hoje é a perda de um de nossos companheiros. Devo dizer que a diretora Kim me surpreendeu ao me informar que nenhum de vocês se inscreveu para receber apoio psicológico. Pensei que a morte de Evan iria deixá-los confusos e com pena, e deveriam saber que a ajuda psicológica de que dispõem os ajudará a enfrentar estes sentimentos. — Nós temos apoio psicológico obrigatório. — respondeu Adam. — Deveria ser um ponto de partida. — disse Angela, que parecia aborrecida. Phoebe olhou ao seu redor. Inoportuno ou não, Thorny tinha razão: caiam como moscas. Ninguém disse nada até que Tommy pigarreou com um chiado estranho. — Eu gostaria que soubessem que Tayshawn..., está bem. — comentou. — Mas não..., voltará às classes. — Você o viu? Sabe onde está? — perguntou Angela. — Sim. — Pode me dizer?
262 — Não. — Pode me dizer por quê? Já sabe que só nos preocupamos com seu bemestar, igual como o de todos vocês. — Eu sei. — respondeu Tommy. — Mas ele tem direito a sua..., intimidade. Angela estava prestes a responder quando Thorny a interrompeu. — Posso fazer uma pergunta? E não estou tentando fazer-me de engraçado. Como você sabe que não vai voltar? — Tayshawn? — Não, Tayshawn não. Evan. Adam levantou a mão por cima da cadeira e voltou a dar um tapa na cabeça de Thorny, gesto que para Phoebe lhe parecia hipócrita depois da pouca sensibilidade que ele havia demonstrado na Casa Assombrada. — Ai, pare agora. — exclamou Thorny, devolvendo o golpe no outro garoto enquanto Angela pedia para que Adam deixasse suas mãos quietas. — Digo a sério, como vocês sabem que Evan não vai voltar outra vez? Já fez isso antes. É possível que aconteça novamente? — Podem nos..., destruir. — respondeu Tommy. — Seja o que seja que..., nos revive..., necessitamos do..., cérebro..., para sobreviver. — Oh. — O cérebro de Evan..., parou. Não é possível..., arrancá-lo novamente. — Ai; sinto muito. Sinto ter perguntado. Phoebe fechou seus olhos, era muito horrível para contemplar. — E o resto dos órgãos internos? — perguntou Adam. — Precisam de coração? Karen sorveu seu café fazendo ruído, e Angela a olhou; aborrecida. — Há várias teorias a respeito disso, Adam. — disse a mulher. — Algumas pessoas com DFB não parecem ter problemas sem os órgãos internos que você e eu
263 precisamos para sobreviver. Na maioria dos casos estudados, esses órgãos já não têm nenhuma função real e, de fato, não podem funcionar. É claro que é difícil saber com certeza, por que não contamos com um grupo de cientistas grande o suficiente. — Estudem a mim. — disse Karen. — A maioria? — interveio Phoebe antes que Angela pudesse responder. — Perdão? — Você disse a maioria. Que na maioria dos casos estudados os órgãos não tem nenhuma função. — Bom. — respondeu Angela, inclinando-se para trás em sua cadeira. — É uma pena que Alish não esteja aqui para comentar sobre isso, por que está mais familiarizado com o trabalho que eu, mas temos alguns casos em que as pessoas com DFB parecem ter ou tido desenvolvido o uso de alguns órgãos. Havia uma garota que tinha um pâncreas funcionando, se bem me lembro. — Eu me pergunto se minha bexiga funcionará. — comentou Karen dando outro gole em seu copo. Phoebe se deu conta que Angela fazia caso omisso de Karen; a deixava nervosa que ela tomasse café. — E..., havia outro garoto cujo coração começou a bater novamente. Havia começado a fabricar glóbulos sanguíneos. — Como essas pessoas movem seus músculos se não há sangue? — perguntou Adam. — Isso é o que faz o processo de melhora? Regenerar sangue e órgãos? — Não, o processo de melhora não está dirigido especificamente a regenerar órgãos. É mais uma melhoria cirúrgica para que as pessoas com DFB desfrutem de uma maior funcionalidade. — Acho que minhas papilas gustativas estão voltando. — comentou Karen. — Posso saborear o açúcar. — afastou o copo vazio, e um fio bege de líquido escorreu por sua mão. — Em que consiste o processo de melhora? — perguntou, com suas claras retinas fixas em Angela, enquanto chupava o café de sua pele.
264 — Tem..., algo a ver com a restauração das vias neurais. Não sei com muita clareza sobre a parte cientifica, deveria perguntar para Alish. — respondeu Angela, e deixou a pasta no tapete perto de seus pés. — Vamos dar uma pausa, certo? Dez minutos? — Mas acabamos de começar. — disse Thorny. A saída de Angela pela porta foi rápida e repentina. Phoebe ouviu o eco de seus saltos sobre o reluzente azulejo do outro extremo do corredor. — O que foi isso? — perguntou Thorny. — O que mordeu ela? — Pergunto-me se eu poderia melhorar. — disse Karen. Phoebe levantou seu copo e se deu conta que ainda tinha a marca de pêssego dos lábios de Karen na pele, desvanecendo pouco a pouco como as imagens na tela de uma televisão. — Eu..., deveria..., fazer..., primeiro. — disse Colette. Kevin, tão imóvel como um manequim no futon estava perto de Karen, assentiu. — Me parece que..., a ciência ainda..., não avançou muito. — respondeu Tommy. — Você acha? — disse Karen. — Nos deixarão ver Sylvia? — Eu irei perguntar. — respondeu Tommy sacudindo a cabeça. — E Tayshawn também. — Talvez também tenham uma van branca na parte de trás. — comentou Adam, e Phoebe lhe lançou socos mentais nas costas quando o garoto se levantou para pegar um suco. Ouvem os saltos de Angela no piso do corredor. — Ei, Thorny. — disse Karen, com olhos brilhantes. — Antes que ela volte você quer ir a uma festa depois do baile de boas-vindas?
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CAPÍTULO 27 Pete viu Julie ao lado do garoto morto esperando com os livros apertados contra o peito, enquanto o Zumbi pegava seus livros do armário, primeiro um e depois o outro. Apoiada na parede com os tornozelos cruzados, olhou para Pete e lhe soprou um beijo. Pete soltou um monte de palavrões e retrocedeu um passo. — Te dão vontade de jogar, verdade? — lhe disse Stavis no ouvido. — A mim também. Pete balançou a cabeça como se espantasse um mosquito. Enfim, não era Julie. Claro que não era Julie, porque Julie estava morta e enterrada a um quilometro de distância. Aquela era a senhorita Pantynegros, e sua expressão de entusiasmo enquanto esperava o Zumbi lhe dava tanto nojo quanto a miragem de sua namorada morta. Williams disse algo a Pantynegros e a garota soltou uma risadinha coquete, baixando os olhos com fingida timidez. Sim, sei onde encontrá-la Pantynegros, pensou Pete. — Tinha que ser ilegal que um garoto como esse e uma garota como essa estivessem juntos. — Porque se aborrece em falar, Stavis? — perguntou Pete no momento em que Williams fechava seu armário, Pete deu-se conta que o Zumbi roçava Phoebe ao passarem juntos pelo corredor. Estava procurando padrões, igual quando vigiava a casa dos Talbot. No fim começariam a surgir. A sexta aula parecia ser seu momento de encontro da semana, sentavam juntos na carteira de Tommy antes da aula de álgebra, iam e voltavam juntos dessa aula e depois percorriam o corredor antes de cada um ir à outra classe. Ainda assim a informação era inútil.
266 Stavis estava magoado, ou tão magoado como podia ficar um garoto gigantesco. — Pete, eu só queria dizer que... — Deixa, vamos para a aula. Pete compartilhava quase todas as suas aulas com Stavis, era muito mais esperto, mas Stavis se esforçava bastante, pois os dois estavam em aulas com um nível ligeiramente mais alto que as aulas de apoio. Iam a aula de Inglês, onde tinham que compartilhar a sala com alguns inúteis. Pete sabia que podia sair daquelas aulas se desejasse, mas para que? Nunca estaria no nível de Pantynegros e sua amiga Rosita Mcmelones, com um cômodo emprego esperando na empresa do pai quando acabasse a universidade. Não tinha sentido esforçar-se tanto. Olhou para cara redonda de Stavis, que estava enrugada em pleno processo de concentração. Recordou-se mentalmente que tinha que ser mais brando com o garoto, como Harris que se sentava atrás, Stavis era uma das únicas pessoas com quem podia contar. — Então, é esse? — perguntou Stavis com um sussurro teatral. — Sim, ou ele ou a noiva cadáver. — É o que saiu correndo a pernadas do bosque, não? — Ele mesmo. — respondeu Pete, muito irritado para tratá-lo como merecia. De qualquer forma tinha a lista, a levava em sua carteira para todas as partes. Depois de expulsar o ruivo morto do bairro, Willians parecia a escolha óbvia. A Zumbi vagabunda podia ficar para o final; certamente ninguém sentiria saudades. Pete imaginava que poderia fazer mais danos aos garotos vivos se primeiro se encarregasse de seus amigos mortos. Poderia dar uma surra no franzino Harrowwood (coisa que já tinha feito) sempre que quisesse, seja nos treinos ou no vestiário. Pete sorriu, pensando no bloqueio que havia falhado contra o Ballouville, seu defensor enorme poderia dar uma de bom menino. Ficou no banco o resto do jogo. Havia uma grande faixa de cartolina sobre o arco do corredor onde anunciava a data e horário do baile de boas-vindas. Ocorreu-lhe que teriam que esperar uma semana para a celebração de Halloween, tendo em conta que muitos dos estudantes viriam fantasiados.
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— Vamos ao baile afinal? — perguntou Stavis. — Não, tenho um plano melhor. — Sério? Qual? — Ouvi sobre uma festa, e vamos de penetras. Por isso era bom ter um linguarudo como Harrowwood nos vestiários, um tipozinho que tinha que usar a língua para compensar suas deficiências. Thorny havia começado a se vangloriar sobre a pós-festa que ocorreria depois do baile, de que não haveria muita gente convidada e blá, blá, blá... Adam havia lhe lançado um olhar assassino, mas já era muito tarde. Pete alcançou Harrawwood no estacionamento e lhe arrancou toda a história sobre a festa a base de tapas. — Que festa? — tapa — Não sei nada sobre festa alguma. — tapa. — Os Zumbis estão montando uma festa para a maioria que não pode ir ao baile. Se nem se quer vão ao colégio... — Aonde? — perguntou Pete, mas era a única pergunta que Thornton não sabia a resposta. — Não quiseram me dizer. — respondeu o rapaz. — Supõe-se que tenho que seguir o Layman. Já tenho tentado um par de vezes. — Se estiver mentindo saberei Thorny. — ameaçou Pete. — Juro que acabará em festas com eles para sempre. — Não minto. — o medo nos olhos do garoto disse a Pete tudo o que ele precisava saber. — Te juro. — Uma festa de Zumbis. — respondeu Pete, imaginando-se em uma casa cheia de hambúrgueres de vermes e imaginando depois a mesma casa queimando. — Não. — Sim. — respondeu, vendo como acendiam as chamas e a fumaça que se espalharia pela luz da lua. Estava sorrindo quando chegaram à aula. Pensava chegar um pouco antes que o resto da manada, o que seria fácil, já que para os
268 fracassados não interessava a pontualidade. Só tinha outra estudante que contemplava a lousa enquanto a professora passava o apagador pela superfície acinzentada; tinha o olhar mais vazio do que se estivesse na escola aos domingos. — Eca. — Stavis disse. Pete lhe sorriu e piscou. Depois agarrou-lhe pelos ombros. — Depois nos falamos; cara. — lhe disse e foi sentar-se com a garota. — Boas. — saudou-lhe sorrindo. — Tenho escutado que haverá uma grande festa depois do baile. Colette virou-se com uma velocidade de um ventilador meio parado e tentou esboçar um sorriso, mas para Pete, de repente, parecia ter todo o tempo do mundo.
Phoebe deu um pulo quando um gato gritou como se houvessem lhe pisado na cauda. Gargoyle saltou da cama e começou a lhe ladrar todo um repertório. Aquele som sobrenatural era a forma que seu computador avisava quando Margi entrava na Internet. O nome Pinkytheghost apareceu ao lado do avatar rosa ao estilo Gasparzinho que se agitava como um lençol estendido junto a primeira mensagem de Margi na noite. Comprei meu vestido hoje. Já tem o seu? Phoebe mandou Gargoyle se calar, ele estava olhando o céu com um grunhido grave, mais simpático do que ameaçador. Yeap, respondeu Phoebe. Prometeu-me que iríamos vestidas de preto. Teu vestido é preto? Phoebe suspirou, Margi teclava como falava, depressa e sem parar. Ela estava lendo a última postagem de supostamentemorto.com e estava tentando decidir como entender aquilo. Porque, ao contrário dos muitos temas sobre os
269 garotos com DFB que tratava, aquele era muito pessoal para ela. O titulo de entrada do blog que Tommy havia publicado poucas horas antes era do Baile de Boas-Vindas. Não, escreveu. Traidora, respondeu Pinkytheghost, e acrescentou: O meu tampouco. Phoebe sorriu e tentou não lhe fazer caso durante alguns minutos, para ver se sua amiga encontrava outro entretenimento pela rede. O que está fazendo? Perguntou Pinky/Margi. A teoria de Phoebe não funcionou. Voltou para a entrada do blog e leu o que Tommy havia escrito. Vou ao Baile de Boas-Vindas do meu colégio. Tenho um encontro de verdade, e quando digo de verdade me refiro a uma garota de verdade, que respira, de fator biótico tradicional. Phoebe franziu o cenho e baixou o volume de Bronx Casket Company que estava escutando em seu MP3, no caso de seus pais entrarem em seu quarto. Não queria que eles vissem a tela. Está aí? Escreveu Pink/Margi. Não, respondeu Phoebe. Seus pais não importavam, não queria que Margi lesse o blog. Nem Adam, nem Karen, nem ninguém mais. Imaginou Tommy circulando pela festa, acenando aos seus amigos mortos e lhes dizendo: — Ei, olhem todos, esta é minha namorada de fator biótico tradicional. — E esquecia seu nome. Não zoa..., escreveu Margi. Meu amiguinho peludo está aí? Phoebe observou o amiguinho peludo de Margi, que voltou a se estirar na cama. Saudações de Ga;, escreveu e voltou ao blog. O baile será nosso primeiro encontro. Já fomos ao cinema no shopping. Já foi também na minha casa e conheceu a minha mãe. Minha mãe gostou muito dela..., e eu também.
270 Isto e logo começará a me escrever poemas, pensou Phoebe com o coração acelerado, e não só pela música. Queria ligar para o Tommy (Tommy ou Faith) e pedir que retirasse o que tinha escrito. E se o bando de fanáticos que seu pai temia; lessem aquilo? E se os anônimos da van branca, vigiassem o blog? Não, sentia-se incômoda com aquilo, de certo modo, era como se um garoto subisse na mesa no meio do refeitório para declarar seu amor a uma garota que mal conhecia. Brega. Muito brega. Beijinhos para meu amiguinho peludo; enviou Margi. Phoebe bufou; o que fez que o amiguinho peludo levantasse a cabeça de sua almofadinha peluda. Ela o olhou e lhe assegurou que não se passava nada. — Mas estaria bem se nossa amiga se calasse de uma vez — comentou entre dentes. Gargoyle voltou a sua posição de descanso, decepcionado. O que pode significar a um garoto com diferente fator biótico (um Zumbi) que gosta de uma menina com fator biótico tradicional? E o que significaria se a garota viva gostasse dele também? Será que os céus se abririam? O falcão ouviria a sua falconer 28? Phoebe esfregou os olhos. Aquilo era um pouco enigmático para Tommy, que era bastante literal, salvo quando especulava sobre a conspiração Zumbi que se estendia pelo país. O que está escutando? Enviou Margi. Quando Phoebe respondeu que BBC, a resposta de Margi foi rápida, apesar de ter mudado o tamanho da fonte e ter colocado em vermelho. Não! Eu tb! Telepatéticas! Sim, pensou Phoebe, não muito emocionada. Não é que se passará. Não é que se passará algo. Não é como se uma multidão de pessoas com fator biótico tradicional com mentes menos abertas arrastarão meu corpo pelo ginásio e me atearão fogo. Só quero de verdade ir a esse baile com ela. Sei apenas que quando estou com ela, há momentos, embora sejam breves, em que me sinto menos como um Zumbi. Há vezes que por um instante esqueço-me que estou morto, que
28
Criador e treinador de Falcões.
271 já não respiro e que meu coração não bombeia sangue pelas minhas veias. Esqueço essas coisas quando estou com ela. Acredito que se dançarmos juntos uma só vez, quase volto a me sentir vivo de novo. Phoebe notou que seus olhos enchiam-se de lágrimas, mas parou para respirar de forma regular para afastá-las. Que bom que não me sinto nada pressionada, pensou, e uma lágrima escapou caindo na tecla de espaço do teclado. Sorriu e secou seus olhos. Havia várias mensagens na caixa de entrada de comentários do dia. O primeiro era de um leitor chamado BRNSAMEDI666, com todas as letras maiúsculas: — VENDIDO! Está claro que os tradicionais não são os únicos que vão se divertir; pensou Phoebe, lembrando a raiva pura na cara de Sorriso (de Takayuki) quando Adam e ela entraram na Casa Assombrada. Como se esperasse o momento oportuno; outra mensagem Pinkytheghost apareceu: Ainda está brigada com Lelo Man? :(
de
Phoebe franziu o cenho, se desconectou e foi sentar-se na cama ao lado de Gar, que virou-se na esperança de receber carinho em sua barriga. Parecia mais fácil que responder a pergunta de Margi.
— Está atrasado. — disse Pete, deixando que Stavis entrasse em seu quarto pela garagem. Tinha todo o porão da casa para ele (um grande rancho), enquanto sua mãe e o Banana ocupavam os cômodos de cima. No porão havia três habitações para seu uso: o dormitório, a sala de exercícios e a sala de recreação, que tinha uma televisão de plasma de trinta e seis polegadas, presente de seu querido papai. Stavis se dirigiu ao pequeno refrigerador no canto e abriu uma lata de cerveja sem pedir permissão. Pete levantou o Fuzil que tinha escondido atrás do sofá e apontou com ele na cabeça de Stavis, enquanto este se voltava.
272 O garoto soltou um palavrão e retrocedeu tropeçando até trombar com o refrigerador, derramando um quarto da lata de cerveja. — Tranquilo, estúpido. — disse Pete, baixando a arma. — Quase se cagou. — Foda-se Pete, quase me mata de susto! — Tranquilo, desfruta da sua cerveja. Pete o observou respirar fundo e tentou não rir. Os olhos de Stavis se esbugalharam do tamanho de discos de hóquei. — Me passa uma. — lhe pediu, com a intenção de lhe distrair antes que lhe urinasse nas calças. — De onde pegou isto? — lhe perguntou TC, entregando a lata para Pete com muita precaução, como se temesse que qualquer movimento em falso acabasse com ele. — É do seu padrasto? — Porra, não. O Banana não gosta de armas. Pensa que deveriam proibi-las, já sabe. — De quem é? De onde você pegou? — É um calibre 22. Tem um cara da nossa rua que a usa para disparar nos guaxinins que saem do bosque e reviram seu lixo. — E ele te vendeu ou alguma coisa assim? — Não sabe que a peguei — respondeu Pete, sorrindo — Não acredito. — comentou TC, tragando o resto da cerveja, e Pete lhe disse que pegasse outra. — Dessa vez vamos somente nós dois. — acrescentou. — Harris deu para trás. Stavis desabou no sofá, afastou o X-box da mesa de centro e deixou ali sua cerveja. — O último foi nojento. — disse e Pete viu que passava a mão pelo seu cabelo, que estava cortado quase zero. — Não imaginava que esses Zumbis
273 tivessem tanta porcaria dentro. Foi como se amassasse uma melancia apodrecida ou algo assim. — Ou algo assim. — repetiu Pete. Stavis ruborizou e começou a suar. — Está comigo nisto, não? — Claro que sim, Pete. — respondeu ele, e soltou um arroto bastante potente para tirar até o pó da tela de plasma. — Já sabe. — Tenho que saber TC, porque vou acabar com outro deles. Willians é o ganhador. — Eu sei cara, eu sei. Estou contigo. — Não são pessoas TC. Você sabe, não? — Quem sabe o que são. — Ninguém cara. Disseram no noticiário que acreditam que seja uma espécie de parasitas que se metem no cérebro e controla seus corpos mortos. Pode ser que sejam perigosos. — adicionou Pete, bebendo sua cerveja. — Ficam numa casa do outro lado do lago. — Como formigas. — disse Stavis soltando outro arroto. — Sim, como formigas. Estavam todos ali, então preciso saber que tenho as costas cobertas. Se Pantynegros ou qualquer outro tentar atrapalhar, terá que se encarregar deles por mim. Pete se pôs nervoso somente com o pensamento. Williams era como o líder extra-oficial dos garotos mortos, igual Pete era o líder extra-oficial de quase todo o secundário. Se Williams caía, seria bastante fácil se desfazer dos outros, e assim também se desfaria de Julie. Era como se tivesse saído de seus sonhos para entrar em sua realidade, lhe havia visto duas vezes desde o incidente no corredor. — Eu te cobrirei as costas, cara. — disse Stavis, batendo sua lata com a de Pete. Perdedor; pensou, mas em voz alta falou: — Genial, cara. já sabe que te agradeço. Olhou Stavis e bebeu de sua lata, pensando na ideia de contar tudo sobre Julie; como haviam se conhecido, o que haviam feito; como havia morrido. Pensou
274 em contar tudo, mas Stavis arrotou tão forte a ponto de arrancar a pintura das paredes. Pete suspirou perdendo a coragem de contar seus segredos mais profundos. — Cara; vamos juntos? Te pego às sete e meia. — Sete e meia. — aceitou TC. — Vai com a Sharon, não? — perguntou Pete sorrindo. — Já sabe que é uma puta. — Oinc, oinc. — disse TC, e Pete riu ao ver que lançava-se a imitar gemidos cada vez mais obscenos. — Já sabe que não vamos ter tempo para isso, certo? Temos que deixar as garotas e ir para a casa dos Zumbis antes que termine a festa, compreende? — Ahh... — respondeu TC, ainda suarento, com cara de decepção. — Não se preocupe. — respondeu Pete. — Te conseguirei um encontro com uma garota de verdade, uma das minhas amigas de Noreich. — Sim! — exclamou TC, aproximando-se para brindar com Pete, que deixou. O garoto amassou a cerveja com aqueles dedos grossos e pequenos, e deixou a lata como se fosse um papel amassado. — Olhe, roubou algumas balas também? — Não. — respondeu Pete, entre risadas. — Comprei uma caixa no WalMart. — No Wal-Mart, que bom. — Sim. — respondeu Pete, pegando o controle remoto. Havia comprado uma caixa inteira de balas, mas só pensava em usar uma.
275
CAPÍTULO 28 No fundo Phoebe queria ir de preto. Margi e ela haviam jurado que nunca participariam de nenhum dos ridículos bailes e acontecimentos sociais que a escola patrocinava no decorrer do ano, mas, por outro lado, tinham o desejo secreto de que, ao menos, alguém quisesse sair com elas. Tinham concordado, sem muito entusiasmo, que se alguma vez fossem, seria com vestidos vaporosos de tafetá negro, com véus e tudo. Irmãs estranhas até o fim. Phoebe deu a volta diante do espelho que cobria a porta de seu armário, admirando a forma em que o tecido brilhante (branco e sedoso) estreitava e marcava sua cintura, para depois cair sobre seus quadris. Voltou-se para olhar-se de frente, contente de ter escolhido no final o vestido branco. O negro lhe caia genial, mas ir ao encontro com um garoto morto vestida para um funeral não parecia o mais apropriado. Tampouco precisava da avalanche de comentários de seus pais. O pior que tinha aguentado até o momento era o de seu pai quanto ao decote do vestido, que supôs que era mais baixo do que gostaria. Felizmente guardou as piadas sobre a noiva de Frankenstein que com certeza lhe Zumbiam a cabeça como vespas inquietas. Examinou-se dos pés a cabeça antes de desafiar-se a um duelo de olhares com seu reflexo. Tinha a pele pálida, porém não doente; não era tão perfeita e uniforme como a de Karen, tampouco apresentava o tom azulado de sua amiga embaixo de certos tipos de luzes. Phoebe era esbelta e apesar de não ter um tipo tão sensacional como o de Karen, era no mínimo atrativa. Jogar frisbee no pátio da escola lhe havia ajudado a dar algumas curvas que a ela pareciam perigosas, e havia adquirido uns braços definidos e pernas que pareciam em falta por ter passado todo seu tempo livre escrevendo poemas góticos. Olhou-se no espelho no profundo de seus olhos, que eram de um tom castanho esverdeado. Gostava de pensar que tinha veias douradas, e, se as velas de seu quarto tilintavam de forma correta, assim era. Deu-se conta de que era bonita, na verdade, podia até ser muito bonita. A ideia formou um nó em sua garganta. Quando se afastou da imagem da bonita garota no espelho, foi para seu caderno roxo de capa peluda e sua caneta que sempre tinha sobre sua escrivaninha; abriu o caderno na primeira página em branco e se pôs a escrever.
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— A limusine foi embora quando o motorista se deu conta que meu filho era um garoto com DFB. — lhes disse Faith, desculpando-se. — Parece que os meninos terão que ir de PT Cruiser. Phoebe escutou-a falar na cozinha enquanto descia as escadas. Seus pais estavam de pé ao lado falando com Faith e seu filho Zumbi, que também parecia incomodado. Estava com um traje azul e gravata. Faith a viu chegar e seu rosto se iluminou. — Phoebe, querida, está preciosa! Preciosa de verdade! — Obrigada. — murmurou. Tinha tanta maquiagem que não era possível distinguir o rubor na face, mas não havia nada o que fazer pela cor que se estendia por seu pescoço e peito. — Ela não está linda, Tommy? — perguntou Faith. Tommy se limitou a olhar Phoebe fixamente. A garota ruborizou, embora lhe devolvesse o olhar. O traje lhe caía muito bem, a forma em que caía sobre os ombros largos acentuava a força e a calma que para ela era muito atrativa. Tommy sorriu. Pelo canto do olho Phoebe viu que seu pai abria a boca e se preparava para envergonhá-la. — Eu dirijo. — disse, surpreendendo inclusive ele mesmo. — Se os garotos não se importarem, claro. Phoebe, espantada por sua repentina generosidade, balançou a cabeça, e seu pai sorriu. — Que mal educados que somos. Podemos oferecer algo para beber, Sra. Williams? Café? — Café, sim, muito obrigada. — respondeu ela sorrindo, e ofereceu a mão primeiro ao pai de Phoebe e depois a sua mãe. — Sou Faith, e acredito que não conhecem meu filho, Tommy. — Não. — respondeu o pai de Phoebe. — Embora o tenha visto jogar futebol. Tommy deu um passo a frente e estendeu-lhe a mão. — Sr. Kendall. — cumprimentou, e Phoebe observou cada vez mais
277 fascinada. Deu-se conta que seu pai provavelmente nunca havia tocado uma pessoa com DFB. Inclusive sua mãe se atreveu a lhe dar a mão. — Tommy. — disse seu pai. — Faith, porque não entram um pouco?
A obrigatória sessão de fotos foi incômoda, e Phoebe via que as mãos de sua mãe tremiam enquanto disparava a câmera digital. Também notou que tiraram poucas fotos. Faith se pôs a disparar como uma louca com sua câmera até que Tommy comentou que era hora de irem. O pai de Phoebe convidou Faith a acompanhá-los, mas ela ficou com a mãe de Phoebe para compartilhar um café com biscoitos, um doce que Phoebe odiava, mas que Margi adorava. Ou melhor dizendo, que Margi adorava dar a Gargoyle, que orbitava ao redor da mesa da cozinha com cara de coitado. Phoebe beijou sua mãe e abraçou Faith, que piscou um olho quando se voltou para despedir-se na porta. Os garotos entraram no grande assento de trás do carro do Sr. Kendall e riram educadamente de suas piadas de motorista. Ela perguntou-se se, de algum modo, havia tido sorte de sair com um garoto com DFB em vez de um normal, porque sabia que, se tratasse de um vivo, seu pai estaria interrogando-o sem parar, interessado em sua linhagem, seu endereço, o lugar de trabalho de seu pai e o que gostava de fazer em seu tempo livre. Com Tommy havia um muro de silêncio, e seu pai era muito educado para rompê-lo. — Phoebe me disse que deixou a equipe de futebol. Uma pena; estava indo muito bem. — Obrigado Senhor. — Me chame de Sr. Kendall. — Obrigado Sr. Kendall. — respondeu Tommy, e piscou lentamente para Phoebe que sorriu. — Imagino que não foi fácil para você colocar o uniforme sabendo que haveria certa..., oposição. — Queria jogar..., isso fez com que fosse muito mais fácil. — Fez bem, muito bem. — afirmou o pai de Phoebe, e Phoebe desejou que dirigisse um pouco mais rápido para chegar ao baile antes de dizer algo estúpido. — E porque saiu então?
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Muito tarde, pensou a garota. — O mundo..., não estava preparado para que um de..., nós..., jogasse na equipe escolar. Ao menos demonstrei que..., podia fazer. — Acredito que é uma verdadeira lástima e uma injustiça. Deve ser muito frustrante para você. — Ser..., um Zumbi..., costuma ser frustrante. — respondeu Tommy. — Então, gostam que lhes chamem de Zumbis? — Oh, olha. — interveio Phoebe. — É um cervo, o que há no terreno dos Palmer? — É que, não sei, parece bastante negativo usar esse nome — continuou seu pai, sem fazer caso. — Zumbi. Os Zumbis nunca tem sido os bons nos filmes, pelo que me recordo, então duvido que o termo os faça ganhar pontos no terreno político, entende o que digo? Phoebe fechou seus olhos com força. Dirija mais rápido, pensou, tentando lhe mandar uma mensagem telepatética a seu pai. Sem sucesso, como sempre, parecia ser imune.
— Não há cruzes queimando. — disse o Sr. Kendall. — E não vejo frutas podres. Suponho que seja um bom sinal. — Obrigada por nos trazer papai. — respondeu Phoebe, saindo do carro como pôde. Havia vários carros estacionados onde o ônibus costumava recolher os alunos todos os dias. Viam-se grupos de estudantes conversando, com jaquetas esportivas e cobertas de laços, sapatos brilhantes e polidos ao máximo. — Divirtam-se garotos. — disse seu pai, enquanto Phoebe lhe dava um rápido beijo na bochecha. — Quase me esqueço, como vão voltar da festa depois? O coração de Phoebe caiu-lhe aos pés e esperou que ele não notasse. Havia se esquecido da festa e, como o serviço de limusines não queria transportar Zumbis, os planos haviam ido por terra. Ao falar do baile com seus pais, havia omitido o pequeno detalhe de que se tratava de uma festa com os garotos com DFB. Phoebe abriu a boca para responder, mas Tommy lhe interrompeu.
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— Chamaremos Adam Layman, Sr. Kendall. Ele nos levará a festa, espero que não se importe. — Adam, hein? Vai ficar meio apertado em sua caminhonete. — Nós nos arranjaremos; Sr. Kendall. Posso ir na traseira. — Não suje seu traje. Certo, garotos divirtam-se. — Adeus, papai. — continuou Phoebe, esperando que não se desse conta de como estava aliviada. Pode ser que Adam fosse o único garoto na face da terra que seu pai confiava, certamente porque Adam tinha ataques aleatórios de pura bondade, como limpar a entrada da casa quando o Sr. Kendall estava viajando e assistir filmes com Phoebe ou comer a sopa de cebola da Sra. Kendall. Adam era o favorito ao posto de genro (apesar da óbvia natureza platônica de sua relação com Phoebe), o único problema era que desgostava da ideia de ter que compartilhar os netos com o PDT. — Volte para casa antes da meia-noite, certo? Não quero que vire uma abóbora. — Sim, papai. — Boa noite, Sr. Kendall. Alegro-me de tê-lo conhecido finalmente. Seu pai lhe deu a mão novamente, e Phoebe notou que o movimento lhe saía de forma natural, sem a vacilação da primeira vez que o havia tocado. Algo era algo. — Eu também Tommy. Divirtam-se. Viram se afastar e Tommy sorrindo; ofereceu-lhe o braço. — Minha mãe tinha razão, está linda. — Você também está muito bonito, Tommy. — respondeu Phoebe aceitando seu braço. Caminharam em direção a entrada. — Sério que o Adam vai nos levar? — Sim, tudo bem? — Sim, mas talvez eu congele na traseira da caminhonete. Adam e eu não estamos nos falando. — Ele me comentou algo. Na verdade ele me disse..., que era você que não estava falando com ele. Ela afastou a vista, pensar em Adam a deixava triste, e não queria estar triste esta noite. Teria gostado de mostrar seu vestido para Adam antes que
280 Tommy chegasse, para que ele lhe dissesse algo bonito e lhe admirasse sem mais. Sempre podia contar com Adam para que a admirasse sem complicações. Para, pensou. Apertou o braço de Tommy, parecia de pedra. Os grupos de estudantes que se agrupavam junto a porta se voltaram para olhá-los, alguns sem prestar muita atenção no resto dos que chegavam. Phoebe pensou que estariam mais interessados em criticar seu vestido do que criticar seu acompanhante. Entraram na escola sem problemas, e Tommy não parecia mais incômodo do que a maioria dos garotos que tiravam as camisas engomadas e as gravatas apertadas. Tommy deu suas entradas a um dos seguranças na porta do ginásio. O ginásio escuro estava enfeitado com serpentinas e globos, e havia vários focos de luz que apontava os estudantes que dançavam na pista baixa montada para a ocasião. Umas bolas de luz apareceram sobre os braços de Phoebe, projetadas por uma grande bola de espelhos que haviam colocado no teto. O ar cálido do interior cheirava a colônia. Era o primeiro baile da escola que Phoebe ia e tudo lhe parecia maravilhoso. Viram a Sra. Rodriguez conversando com a diretora Kim junto a um grupo de pais e professores que protegiam a bacia de ponche. A diretora os viu e se aproximou depois de se desculpar com a Sra. Rodriguez, que os saudou com a mão. Phoebe lhe disse olá. — Karen e Kevin já chegaram; Tommy. — disse a diretora Kim. — Espera algum outro amigo? — Adam..., e Thorn já estão aqui. — respondeu — Se foi capaz de juntar..., o dinheiro..., para pagar o ingresso. — Sinto muito, me referia... — respondeu a diretora, sorrindo com timidez. — Se referia aos meus amigos mortos. — interrompeu ele. Phoebe lhe apertou o braço. — Tommy; já conversamos antes. Sabe que me parece bem que venha qualquer estudante. Sabe que faço apenas o que posso para garantir a segurança de todos em Oakvale High. — Eu sei. Vi os..., carros de polícia..., no estacionamento. — Sempre temos policiais quando há um baile. — Estaduais? O sorriso da diretora não vacilou. Phoebe teve a impressão que Tommy estava chateando-se, impressão que se confirmou quando o garoto afastou o olhar. — Não virá ninguém dos..., outros.
281 — Obrigada, Tommy. E, somente para recordar alguns pontos essenciais de nossa conversa, já que percebo esqueceu-se: se aparecer algum manifestante, o retiraremos daqui rapidamente, a sua acompanhante e todos os demais garotos com DFB que estejam no ginásio — Tommy assentiu, e a diretora Kim sorriu com genuíno carinho. — Bem, agora vão se divertir. — O que foi isso? — perguntou Phoebe quando a diretora se afastou. Tommy se soltou dela e deixou suas mãos caírem para roçar as suas. — Quando nos..., ajudaram... depois do assassinato de Evan. — respondeu, referindo-se as sessões obrigatórias com o psicólogo na escola. — A diretora e um par de advogados que haviam tido que passar todos os membros do grupo de estudantes Zumbis me perguntou o que íamos..., fazer. Disse-lhes que viveria..., minha vida e continuaria trabalhando. Disse-lhes que você e eu iríamos juntos ao baile. Disse-lhes que você e eu..., dançaríamos. Phoebe assimilou as palavras. — Mas ela temia que houvesse um protesto, não? — Ou algo pior. Prometi..., que iríamos embora ao primeiro sinal..., de problemas. — Então converter-se em uma abóbora é uma possibilidade real. — disse Phoebe suspirando. — Como? — Dá na mesma. Phoebe viu Karen atrás de Tommy, estava na borda da pista de dança, movendo-se com uma elegância que qualquer pessoa viva invejaria. Usava um vestido azul que colava-se ao corpo, com um cinto amarelo amarrado na cintura. Quando girava, coisa que fazia frequentemente, a barra do vestido subia a uma altura quase indecente e deixava suas assombrosas pernas a mostra. Kevin estava de pé diante dela com um traje negro estilo saco e uma horrível gravata de cor marrom, movendo-se e balançando os braços a cada sétima e oitava nota. O braço esquerdo parecia mover melhor que o direito. — Olha! — disse Phoebe, mas Tommy já caminhava para eles. — Olá, garotos. — saudou Karen, no momento em que um conjunto de luzes prateadas passava por seu rosto, depois que a bola de espelhos refletiu. — Phoebe, está impressionante. E que bom par encontrou. — seus olhos pareciam mais cristalinos, brilhavam como estrelas embaixo das deslumbrantes luzes do salão. — Obrigada, Karen. — respondeu Phoebe — Acho que você é a garota mais linda que eu já vi na minha vida.
282 Karen riu, acariciando-lhe o braço com uma mão que deslizava ao ritmo da música. — É um encanto. Apenas tentando trazer de volta a vida meu acompanhante — afastou a mão da pele de Phoebe, que notou um formigamento onde a havia tocado. Depois fez um gesto languido que embarcava todo resto dos dançarinos — E a todos os garotos na intenção de deixá-los mortos. — Bom, a verdade é que está linda..., de morrer. — repôs Tommy. — Muito gracioso. — respondeu ela, piscando. — Você tampouco está mal. A experiência de Phoebe em tais assuntos era bastante limitada, mas lhe dava a impressão que estavam flertando diante dela. — De morrer. — adicionou Kevin, e todos gargalharam. Karen agarrou Phoebe pela mão. — Dança comigo. — lhe pediu, e ela o fez. Margi chegou uns vinte minutos depois com um vestido rosa com adereços negros: laços negros atrás, um cinto negro e sapatos negros. Levava uma flor negra presa em seu cabelo rosa. O vestido era ajustado e favorecedor, se para o pai de Phoebe seu decote havia parecido atrevido, não teria deixado Margi sair de casa com o que levava vestido. Phoebe achou que estava genial, e também a Norm, a julgar pela forma que secava o suor da testa com a mão a cada minuto. — O carro do Norm não queira funcionar em casa. — explicou Margi. — Meu pai teve que ajudar. — Norm Lathrop parecia desgarrado e nervoso atrás dela, nadava em seu traje e tinha os olhos muito abertos atrás das grossas lentes de garrafa. Phoebe abriu a boca para responder, mas Margi foi mais rápida e aguda. — Nada de brincadeiras, por favor! Tenho o resto da minha vida para aguentá-las. — Phoebe riu e a abraçou. — Norm, estes são alguns amigos que te falei. Já conhece Phoebe. Tommy, Karen e Kevin, estão todos mortos. Phoebe ficou pasma, mas Kevin cumprimentou-o e Karen lhe lançou um beijinho sem deixar que a brusca apresentação de Margi os incomodasse. Tampouco deixaram de dançar. Norm devolveu a saudação e esticou o braço para aceitar a mão de Tommy e sacudi-la como se fosse uma serpente com intenção de matá-lo.
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— Com cuidado, Norm. — lhe disse Tommy. — Nos rompemos..., facilmente. — Meu Deus; sinto muito! — exclamou Norm, soltando a mão como se tivesse sido mordido. Margi lhe deu um tapa no ombro. — São piadistas, Norm, relaxe. Então colocaram uma música conhecida no baile, e Margi começou a se contorcer, roçando Phoebe com os quadris e depois ao pobre Norm, que parecia a ponto de derreter aos seus pés. — Lembre-se do que te disse Normie: quando está comigo, tem que dançar. Norm fez o que pôde e conseguiu meter-se no irregular círculo de amigos para praticar seus movimentos ao lado de Kevin, certamente porque supõe-se que não podia parecer torpe ao seu lado. Phoebe sorriu ao pensar no equivocado que estava. Meia hora depois ela estava ofegante e suando, enquanto seus amigos pareciam tão frescos e ativos como sempre; no caso de Kevin, não era muito para se dizer, mas Karen e Tommy estavam ótimos. Ela se desculpou e foi em busca de uma cadeira com o resto dos estudantes. O DJ colocou um rap muito popular com um ritmo agressivo, assim a garota se alegrou de ter escolhido aquele momento para se sentar como uma covarde. Achou uma cadeira, e observou como Tommy e Karen compartilhavam uma brincadeira, movendo-se quase, mas não tão bem assim, ao compasso da música..., igual a maioria dos estudantes vivos. Kevin sorria de orelha a orelha, fazia o que podia, mas somente recebia um ou outro empurrão de Norm, que dançava cada vez mais com atrevimento... ou com maus espasmos, segundo quem olhava. Margi saudou Phoebe com a mão e riu de algo que Karen disse, enquanto esta última executava um sinuoso movimento que, sem dúvida, podia devolver a vida aos mortos. Não sabia se estava alegre ou triste em momentos como aqueles, então decidiu que um pouco dos dois. Ao menos estavam ali há quase uma hora e ninguém havia lhes lançado sangue de porco. Olhou ao seu redor em busca de Adam, surpresa por não ter visto ainda seu enorme corpo desajeitado sobre o resto dos estudantes. Nem havia vestígio de seu nome. Adam era muito bom para perder tempo com uma tonta devoradora de balas como ela. Falando de tempo perdido, desejava não ter se desentendido com ele. Não estava sendo justa. Ademais, havia passado apenas uma semana de sua explosão e já estava com saudades. Ele não gostava de estar em um baile e nem sequer viu-o compartilhar uma piada juntos.
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— Olá, Phoebe. — disse uma voz grave atrás das notas altas e de seus pensamentos, era Harris Morgan, o colega de Martinsburg, o garoto que havia feito sangrar o nariz no bosque, deu um passo em direção a ela. — Olá, — repetiu. — Me deixa em paz. — respondeu Phoebe tentando se levantar, mas ele se colocou em sua frente, assim teria que lhe roçar se quisesse sair. A cadeira estava contra a parede e não podia ir a nenhuma parte. — Não é isso. — ele disse. — Então o que é? — se chamasse Tommy, será que ele ouviria por cima da risada de Karen? Se calhar estaria tão entusiasmado observando Karen, embriagado pelo sutil aroma de lavanda que desprendia da pele da garota morta quando girava. — Só queria falar com você para lhe advertir. — Fala. — Acredito que Pete e TC estão tramando algo. — Sério? Estão gabando-se de seu primeiro serviço? — seu tom era depreciativo, mas tinha a certeza de que Martinsburg (e certamente o imbecil que estava em sua frente) eram os responsáveis pela destruição definitiva de Evan Talbot. Decidiu que chamaria Tommy, aconteça o que acontecer. Se Harris inventava algo, se levantaria e lhe daria um empurrão com todas as suas forças. Morgan sacudiu a cabeça e levantou os braços. — Não, não, acredito que estão planejando algo sério. Vão machucar alguém. Seus amigos e você. — E porque se importa? — ela perguntou, levantando-se e afastando seu corpo. Já o havia derrubado antes e podia voltar a fazer, com vestido bonito ou sem ele. Depois iria embora e deixaria que todos os Zumbis vivos e mortos se divertissem como quisessem. — Só queria avisar, nada mais. — respondeu Morgan, sacudindo a cabeça. Depois se virou para partir. — Olhe, está aqui? Pete e o grandão? Estão no baile? — Vão vir. Ficaram olhando-se por um tempo, até que Harris afastou o olhar e voltou ao grupo de estudantes que davam voltas na pista de dança.
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Phoebe desabou na cadeira e não se deu conta de que haviam posto umas luzes mais tênues para a primeira canção lenta do DJ. — Phoebe. — lhe chamou alguém. Era Tommy, e parecia incomodado pela primeira vez àquela noite, abrindo passo entre os garotos que fugiam da pista de dança enquanto outros entravam. — Quer..., dançar comigo? Phoebe sorriu e aceitou sua mão.
— Que nojo. — disse Holly. Adam viu ao que se referia: Tommy Williams levando Phoebe para a pista para dançar uma música lenta, uma canção antiga de Journey. A reação de Adam foi distinta, mas não compartilhou com ela. — O que acontece com a sua amiga? — perguntou Holly. Adam pensou que se tratava de um plano para que lhe tirasse para dançar, só que estava indo muito mal. Nem se molestou em responder. Observou Thorny tirar sua garota, que não parava de soltar risadinhas, para dançar. Embora Haley Rouker fosse do terceiro, era uns trinta centímetros; mais alta que Thorny. A garota era estrela do lançamento da equipe Lady Badgers e Adam tinha a impressão de que formavam um casal estupendo, ao menos pela personalidade. Ela era muito atlética, embora tímida, enquanto Thorny fazia todo o possível por ser atlético e era uma das pessoas menos tímidas que conhecia. Thorny havia tentado aproximar-se de Adam, mas Holly se colocava difícil porque não o aprovava, nem a sua acompanhante. A garota preferia estar com gente como Tori Stewart e Pete Martinsburg, que acabavam de chegar ao baile a cinco minutos. Adam viu como Phoebe colocava suas mãos sobre os ombros de Williams e como o garoto morto apoiava suas mãos nos quadris de Phoebe. Queria afastar a vista, mas não podia tirar-lhes os olhos de cima. Parece contente, pensou. — E porque essa garota vai querer dançar com um garoto morto? — perguntou Holly, que era perfeitamente capaz de manter uma conversa consigo mesma, como bem sabia Adam. — Eu me surpreendo que deixem entrar aqui os mortos, é asqueroso. Esse garoto dança como um bicho pisoteado. E a garota... — Olhe; Holly. — Sim, Adam? — ela perguntou, levantando o olhar. Ao ver que estava na expectativa, Adam sentiu-se um pouco culpado, embora não o suficiente para
286 mudar de ideia. — Acredita que Tori possa te levar para casa? Não me sinto muito bem, acredito que vou embora. Não esperou a resposta, simplesmente se voltou e a deixou ali de pé, com seu bonito vestido amarelo, boquiaberta e muda.
— Bom, já fizemos o ato de presença. Vamos. — disse Pete. — Olhe; o que se passa com o Zumbi? — perguntou TC, lhe dando uma cotovelada nas costelas. TC apontava Williams, que dava voltas lentamente pela pista com Pantynegros. Sharon e Tori soltavam risadas atrás dele, e Pete se arrependeu de lhes dar a garrafa de licor durante a viagem. — Quer ir tocar-lhe os narizes? — perguntou TC alto o bastante para se fazer ouvir acima da música. — Agora não, pronto. Não era somente Williams. A seu lado estava a Zumbi cadela e outro garoto Zumbi da lista, que se movia como um bicho se retorcendo. — Então, garotas. — disse voltando-se para Tori, porque Sharon não tinha muito boa pinta. — TC e eu temos que fazer uma parada que não contávamos. Tori fez beicinho, cambaleando um pouco quando foi lhe beijar. Pete lhe deu um beijo e notou o sabor do licor de menta em seus lábios. TC e Sharon se engancharam como um par de polvos fazendo luta livre. Pete se perguntou se haviam acabado com a garrafa inteira. — Aonde vão, garotos? — perguntou Tori. — Missão especial. — respondeu ele. — Temos que fazer uma brincadeira com alguém. — adicionou TC, soltando-se de Sharon — Vamos ac... — Pegar mais bebida. — disse Pete, e olhou TC firme o suficiente como se fosse acabar com sua bebedeira a golpes. Ele fechou a boca e soltou Sharon. — Nos vemos depois. — concluiu Pete, dando outro beijo em Tori.
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Quando iam, Pete viu Adam do outro lado do salão, aproximando-se deles; Adam os viu e parou em seco. Pete sorriu e apontou o dedo como se fosse uma pistola para Layman, e o grandão pôs uma cara de quem recebeu um soco no estômago. Pete piscou um olho e apertou o gatilho imaginário, fingindo que lhe disparava na cabeça, depois saiu dali com TC.
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CAPÍTULO 29 O plano era se encontrar com Adam na rua as dez, mas Phoebe não o havia visto a noite toda. Seu par estava ali em um canto com duas animadoras de torcida. O que estaria acontecendo? — O que fazemos se Adam não vem? — perguntou a Tommy, que dançava ao seu lado em um círculo composto por Karen, Kevin, Margi e Norm. — Ele veio. Já o vi conversando com sua acompanhante. — Não o vi a noite toda. E é difícil ele passar despercebido. ― de fato não passava despercebido para ela de qualquer jeito, havia estado procurando-o a noite inteira, desejando que estivesse ali dançando ao seu lado. Não o imaginava dançando, mas gostaria de vê-lo. — Norm tem..., carro. — respondeu Tommy. — Thorny também. A sua garota não me lembro. — Vou ver se Adam está lá fora. — disse ela. — Agora mesmo. Oakvale seguia a regra de não permitir que saíssem do baile para evitar o mau comportamento de alguns no estacionamento, mas a diretora Kim amava os garotos tão bem educados e nerds como Phoebe, então após cinco minutos de negociações saiu correndo dali. Havia uma garota sentada nas escadas de pedra chorando baixinho e observando os policiais que vigiavam o lugar. Viu alguns carros estacionados na esquina, e um deles era a caminhonete do PDT. Adam estava retraído no assento, admirando o céu noturno. Encontrá-lo ali sentado, tão firme e confiável, fez com que deixasse de se sentir zangada com ele. Correu para a caminhonete o mais rápido que pode; chamando-lhe.
289 Ele baixou o vidro e o volume do seu CD do Van Halen. — Olá, Phoebe. — lhe saudou com entusiasmo. — O que aconteceu? — Perdi minha acompanhante. — Sério? — Sério. Gostei do vestido, parece a luz da lua. Fantasmal. Pode ser que esteja espectral. Brilhante. — Adulador. — respondeu ela sorrindo. — Obrigada. Olharam-se em silêncio durante um momento e era estranho para Phoebe a distância que se notava entre eles. Quase tinha se esquecido o quão dura e estúpida havia sido com ele. — Olha, Adam... — Sinto muito, Phoebe. — ele interrompeu. Adam era tão grande, tão seguro de si mesmo e tão maduro, que sempre lhe havia parecido muito maior que ela. No entanto, em seus olhos podia perceber algo, um ponto vulnerável que nunca havia visto antes. — Não, Adam, eu fui... — Esqueça. — disse ele sacudindo a cabeça. — E não se preocupe. Mas será melhor que vá ficar com seus colegas mortos, porque estes policiais têm tentado me assediar algumas vezes. — Assediar? — repetiu Phoebe, rindo. Era como se os fortes braços de seu amigo houvessem lhe retirado um peso das costas. — Sério que tem te assediado? — Sim senhora; assediado, como tenho dito. — Tem um vocabulário muito bom para quem não terminou o Morro dos Ventos Uivantes. — Já terminei — respondeu ele, sacudindo o livro que tinha no assento. — Sou um homem culto.
290 — Bom para você. — Sem dúvida. E, olhe, sobre o assédio era brincadeira. Divirta-se o quanto queira. Parecia que estava tendo um bom momento. Havia algo estranho no seu comentário, mas Phoebe não conseguiu identificar. O que tinha visto, e ela não? — Sim, é verdade, os garotos mortos também. Tinha que ver como dançava o Kevin. — Eu vi. Dança melhor que eu. — Eu duvido. Ainda mais depois do caratê e O morro dos ventos uivantes. Prosa romântica e elegância? Será o terror das meninas na pista de dança. — Yep. Algo para se preocupar, agia como na noite em que havia pedido para jogarem Frisbee e não tinha aceitado compartilhar o que o incomodava. No entanto, ela o conhecia bem o bastante para dar-se conta de que, por mais que lhe incomodasse, não partilharia, somente contaria no seu tempo..., se alguma vez o fizesse. — Tudo bem. — disse ela, e deu duas palmadas na porta da caminhonete. — Irei perturbar um pouco ali fora e começar a festa. — Genial, nos vemos daqui a pouco. — Até mais. Estava subindo as escadas quando seus amigos saíram em grupo do prédio. Os ombros de Kevin se moviam e se agitavam como se o ritmo estivesse impregnado nele para sempre. Tommy se adiantou para falar com ela. — Margi disse que Norm gostaria de nos levar. Disse que Norm..., tem inclusive..., menos atitudes sociais que a maioria dos Zumbis. — explicou o garoto, imitando na última parte a forma rápida de falar de Margi. — Que Deus te abençoe. — comentou Phoebe, observando Karen cutucar o pobre Norm por algo que o garoto tinha dito. — Mas Adam está ali. — Oh, eu vou com Adam! — exclamou Karen, despedindo-se com a mão. —
291 Os vejo na Casa Assombrada..., ou não. Kevin pareceu não se importar, era como se tentasse fazer a perfeita versão Zumbi da dança do robô, um espetáculo muito estranho sem música, então Phoebe seguiu Tommy e os demais até o carro de Norm. Phoebe olhou para trás uma vez e viu Karen entrar praticamente aos pulos na caminhonete. Será bom para ele, pensou, embora, na realidade, não estivesse segura. Não estava nada certa do que pensar a respeito. Norm era um motorista muito precavido (e muito menos hábil) que Adam, e provavelmente levar um par de Zumbis no assento de trás o deixou nervoso, mas geralmente não o convidavam para as festas, então conseguiram chegar. Chegaram justo quando Adam e Karen subiam as escadas da varanda. Phoebe foi a primeira a subir e viu Mal, cujo enorme corpo tapava a entrada da porta, saudando-os com um absurdo movimento de quatro dedos. — Como..., foi..., o..., baile? — ouviu-o perguntar. — Genial. — respondeu Karen, agarrando a mão de Adam para colocá-lo para dentro. — Ninguém nos lançou garrafas, nem pedras, nem sequer nos insultaram. É possível que Kevin..., tenha pisado no dedo gordo de uma menina, mas isso foi o mais violento da noite. No lado de dentro os mortos dançavam seguindo o ritmo de uma música no volume máximo que ressoava por toda a casa. Phoebe nunca havia visto antes tantos Zumbis juntos. Devia haver ao menos duas dezenas de garotos balançandose e sacudindo-se embaixo dos enfeites e luzes, e isso somente na entrada e no salão. — Gostou? — perguntou Karen, soltando-se de Adam por um momento. — Pedi ao meu pai para comprar as luzes. E olha a bola de discoteca. Não é..., bonita? — Um grande trabalho Karen. — respondeu Phoebe. Viu Colette dançando sozinha em um canto. Lembrava uma hippie extasiada de uns dos filmes de Woodstock que seu pai a havia; forçado a ver há alguns anos. Karen não esperou uma resposta e agarrou Adam para levá-lo ao centro do Clube Morto e dava voltas ao seu redor, fazendo que a bainha de seu vestido se elevasse de forma provocativa. Para surpresa de Phoebe, Adam começou a
292 movimentar os braços e pernas. — Minha mãe. — disse Norm, que estava tão pálido quanto os garotos mortos na sala. — Respira fundo. — aconselhou Tommy. — Te apresentarei..., a todos. Tommy lhes apresentou algumas pessoas que estavam na entrada, a maioria inexpressiva, e ao parecer pouco interessadas neles. A música era incessante, mas as luzes estroboscópicas percorriam o lugar em ondas intermitentes, o que fazia com que os dançarinos parecessem mais torpes e estranhos. A imagem confundia Phoebe. Saudou e apertou um par de mãos frias, embora tivesse a impressão que alguns Zumbis não estavam muito contentes em vê-la. Por outro lado, Tommy sim parecia muito feliz, presumiu ela. Talvez sejam as luzes e a música, pensou. Alguém agarrou Tommy pelo ombro. — Tayshawn! — exclamou Phoebe. — Com está? Ao invés de responder Phoebe, o garoto falou diretamente com Tommy. — Takayuki..., quer falar..., com você. — disse. — Cada dia..., chegam..., mais. Phoebe viu que Tommy passava de festivo a sério em um milésimo de segundo. — Onde está? — perguntou. — Lá em cima? — Tayshawn assentiu, e Tommy se voltou para ela. — Volto em um instante. Phoebe o viu subir as escadas escuras, imaginando Takayuki pendurado de cabeça para baixo dentro de um armário de um dos quartos. Brrr; pensou e voltou a contemplar os dançarinos. Semicerrava os olhos cada vez que chegava a luz brilhante. Quase todos se moviam, embora fosse difícil saber se se divertiam, porque a maioria deles mantinha sua expressão imperturbável enquanto se retorciam e sacudiam-se. A exceção era Colette, que cada vez sorria com mais naturalidade. Estava no canto conversando com Margi e Norm. Thorny chegou com sua acompanhante quando Tayshawn descia as
293 escadas, sozinho. — Tayshawn! — exclamou, levantando a mão para bater. — Como está, cara? Tayshawn o deixou com a mão pendurada e seguiu andando pela a pista de dança para o outro quarto, onde estava a equipe de som. — Não viu. — disse Thorny, justo antes de ver Phoebe. — Olá Phoebe, conhece Haley Rourke? — perguntou, conduzindo Haley ao interior da habitação. A garota parecia aterrorizada. Phoebe lhe disse olá, mas ela não moveu nem um músculo. — Thorny. — lhe disse Phoebe ao ouvido. — Tinha lhe contado que haveria um monte de garotos com DFB? — Hã? — respondeu ele, movendo os braços ao som de uma canção que começava a tocar. — Eu deveria ter dito? A garota se dispôs a responder, mas viu Tommy e Takayuki descendo as escadas. Tak seguiu caminhando para a porta principal. — Está tudo bem? — perguntou Phoebe a Tommy. — Sim, estão chegando..., mais garotos. Alguns..., para a festa. Outros..., para ficar. — Isso é bom, não? Quanto mais, melhor. — queria perguntar sobre Takayuki, mas não o fez. — Sim, embora pudessem fazer com que se..., fixassem em nós. — Não é isso que quer? Que se fixem? — Ao que se refere? — Ao blog. A jogar futebol e as demais coisas. Sua intenção não era chamar atenção para sua causa? Estava a ponto de adicionar e sair com uma garota tradicional, mas não fazia falta, porque o sentimento era óbvio; parecia flutuar entre eles durante todas suas conversas.
294 — É..., importante que..., as pessoas entendam nossa situação. — respondeu ele, após um momento. — O que acontece conosco. — E isto ajudará? — Se calhar, mas nem todos vêem..., as mesmas oportunidades que eu. — Tak? — Sim. E Tak..., não está sozinho. Naquele momento tocou uma balada, e muitos dos Zumbis presentes ou não, se dirigiram aos seus pares. Phoebe viu alguns Zumbis, um deles um garoto com um traje muito grande, juntar-se em um torpe abraço. Norm estava um pouco inclinado para apoiar a cabeça no ombro de Margi, de maneira que algumas pontas rosa do cabelo da garota se misturava as extremidades do cabelo do garoto e se mexia com os olhos fechados. Haley Rourke se aferrava a Thorny, que era muito mais baixo, como se fosse a última tábua livre em um mar agitado. Olhou Tommy, que examinava a habitação vendo como sua gente se abraçava embaixo da luz apagada da bola de discoteca que tinha acima. Convidou-a para dançar como se ocorresse no ultimo momento. — É melhor irmos a algum lugar para continuar conversando? — Esta casa..., está cheia de Zumbis. — respondeu ele, conseguindo fingir uma expressão de nojo que lhe fez sorrir. — Certo. — Um passeio pelo bosque? Como quando nos conhecemos? — Como quando nos conhecemos. Boa ideia, embora faça um pouco de frio. Tommy lhe deu sua jaqueta, e ela notou um sutil aroma que a princípio lhe custava reconhecer, mas que era Z, a colônia que haviam comprado no shopping... O perfume para o homem morto ativo. Saíram pela porta de trás, em direção ao bosque.
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Adam deu a volta com delicadeza em sua parceira de dança e pôde olhar pela janela do salão e ver Tommy e Phoebe entrarem no bosque de Oxoboxo. Karen o agarrava com força. O garoto conteve a respiração quando desapareceram por trás das árvores, tragados pela escuridão. Perguntou-se se aquilo era o que se sentia ao estar morto. Espero que saiba o que faz; Pheeble, pensou. Não, espera, espero que não tenha nem ideia do que fazer. Espero que... — Ela não sabe, não é? — perguntou Karen, rompendo o fio de seus pensamentos. — O que? Os olhos de diamantes de Karen brilhavam como estrelas. — Phoebe. — continuou. — Não sabe o que sente por ela, certo? — Não, como você sabe? — Sou telepatética. — respondeu a garota, encolhendo os ombros. Baixou as ásperas mãos de Adam, seu corpo parecia vaporoso e frágil, e seus ossos como de um pássaro. Karen apertou o rosto contra o peito de Adam: — Na realidade é por uma combinação de fatos: sua linguagem corporal; a forma que a olha quando está com ela; a forma em que a observa quando ela não sabe que está olhando; sua expressão quando não está com ela; como suaviza essa cara séria que tem quando conversam. Essas coisas. — Ah, minha cara séria. Sempre me trai. — Adam, escuta. — insistiu ela, olhando fixamente com aqueles olhos capazes de cortar diamantes. — Não espere morrer para amar. — Grande conselho. O que quer dizer exatamente? — Quero dizer que tem que encontrar um momento oportuno para lhe dizer o que sente.
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— O momento oportuno para ela ou para mim? — O momento oportuno, no geral. — ela respondeu, e Adam notou o sutil movimento de sua delicada estrutura óssea debaixo de suas mãos. Olhou pela janela, onde as sombras pareciam se mover entre as árvores. — E Tommy? — Tommy é Tommy. — respondeu ela rapidamente. — E o que você sente não é problema do Tommy, não? — adicionou Karen. Adam pareceu notar algo estranho em sua voz. — E seus sentimentos? Sente algo por Tommy? — Sinto algo por muitas pessoas. — respondeu ela, rindo e o abraçando novamente. — Gente morta, gente tradicional, de todos... — É uma garota especial, Karen. — disse Adam rindo e lhe acariciou o cabelo. Sem pensar, colocou uma mecha atrás de sua orelha com a ponta dos dedos e inclinou-se para lhe dar um beijo na bochecha. Foi um ato impulsivo que apenas se deu conta ao notar a fria e suave pele em seus lábios, só então recordou quem era e o que ela era. — Oh. — disse Karen. — Oh, obrigada, Adam. As reluzentes estrelas de seus olhos brilharam novamente, como se não se limitasse em apenas refletir a luz, mas sim projetá-las. — Não, obrigado a você. — respondeu ele, lhe dando um abraço e soltandoa. A canção se tornou mais frenética, e ele abriu passo entre os mortos em direção a porta dos fundos.
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CAPÍTULO 30 Pete não acreditava em sua boa sorte. Embora TC estivesse meio bêbado e cheirasse licor de menta, haviam conseguido encontrar o lugar depois de um curto passeio pelo bosque, depois de deixar o carro escondido aonde iam se encontrar com as garotas. As estradas que rodeavam Oxoboxo estavam repletas de desvios sem saída, e ele conhecia todos. Acabavam de chegar quando apareceu a caminhonete destroçada de Adam e um segundo carro, no qual iam Pantynegros e Williams. Para divertir-se, tinha sacado a arma e havia apontado para o grande Zumbi na varanda, bem na cabeça, para ser mais exato, no Zumbi que parecia ter um pedaço de vela derretida sobre os ombros. Pop, pensou Pete, depois apontou para Karen e Adam enquanto subiam as escada. Então, TC esteve a ponto de delatá-los com um forte arroto. — Cale-se idiota. — disse Pete entre dentes. — Que? — perguntou TC, sorrindo. — A música está no máximo e, de todos os modos, ninguém vai nos ouvir. Pete tinha vontade de romper sua cabeça com a coronha da arma, de socar sua cara sorridente. Voltou-se e vi que Tommy já havia percorrido metade das escadas e estava no centro de um grupo de pessoas. Pantynegros estava com ele, junto com os garotos de sempre. Também um tonto que lembrava vagamente de ter sacudido em algumas de ocasiões. Apontou para Tommy. Enquanto os demais sonhavam acordados com o muito que se divertiriam no grande baile da escola, ele havia passado a semana disparando em latas e a diferentes bichos do bosque atrás de sua casa. Inclusive na chaminé dos Talbot, só para retirar o pó. Tinha o dedo sobre o gatilho, sem apertar.
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Na cabeça, pensou, entrecerrando os olhos. — Porque não atirou? — perguntou TC quando Williams entrou na casa. Pete suava, notava as axilas e o pescoço umedecidos. TC e ele tinham trocado de roupa e usavam jeans e sapatos escuros para a missão. — Não tinha uma visão limpa, estúpido. — respondeu, apoiando as costas em uma árvore. — Então, o que fazemos? — Esperamos. — Mas tenho que urinar. — respondeu TC, choramingando. — Pois vá urinar! Mas não faça barulho! TC se afastou arrastando os pés com a elegância de um alce. Depois esperaram, viram chegar o girino do Harrowwood e sua garota girafa, e depois um cara com pinta de Heavy com um exagerado sorriso de felicidade saiu e se meteu no bosque na direção oposta. Pete achou seu rosto familiar. — Era isso um Zumbi? — perguntou TC. — Não sei, talvez. — Olha! — exclamou TC, levantando-se de um salto. — Que? — Acabaram de sair pela porta de trás! — Quem? Williams? — perguntou Pete, pegando a arma do chão antes de levantar-se. — Sim, e a garota gótica! Meteram-se no bosque. — Ok, tem que ter um caminho por aqui. Nós nos moveremos entre as árvores até que os encontremos. Quando os alcançar, você pega a Julie e eu estouro os miolos do garoto morto.
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— Sem problema. — respondeu TC, mas Pete já estava em marcha, olhando a casa a cada três passos, no caso de mais amantes Zumbis decidirem sair para dar uma volta a luz da lua. — Olhe. — disse TC enquanto davam a volta. — Quem é Julie? Pete tencionou um músculo da mandíbula, mas não respondeu.
A luz da Lua não ajudava muito, porque sua luz refletida projetava uma tenebrosa penumbra através dos ramos nus das árvores, mas não queria pedir a Tommy que lhe desse a mão. Não sabia que sinal devia lhe enviar. Já estava vestida em sua jaqueta, perfumada com Z, e com esse sinal já bastava, apesar que na realidade, somente significava que tinha frio. — Os saltos estão pesados para o bosque. — disse, parando para retirar os sapatos. — Nem as meias. — respondeu Tommy, ela estava de acordo, mas não parecia boa ideia retirá-las. O garoto emitia um brilho tênue. — Te contei alguma vez como morri? — Phoebe negou com a cabeça, embora não estivesse muito segura se podia vê-la. — Em um acidente de carro. Meu pai dirigia. Um motorista bêbado passou um farol vermelho e..., bateu em nós. O bêbado sobreviveu, mas matou o meu pai. — ouviu um ruído que devia ser de uma risada seca ou um suspiro; difícil saber no escuro. — E a mim também. — Sinto muito. — Meu pai morreu instantaneamente. Eu demorei um pouco mais. Uma de minhas costelas havia perfurado um pulmão, então acabei..., afogando-me em meu próprio sangue. — Tommy, isso é horrível. — Não foi um passeio pelo campo, não. — respondeu ele. Pegou sua mão e a levou até um banco de pedra que havia junto da trilha. Ela deixou que lhe guiasse. — Foi a noite, em um..., cruzamento diante de uma grande igreja. Via o campanário
300 através do parabrisa destroçado. Demos várias voltas e acabamos em frente a esse campanário. Levantei o olhar e..., rezei para que meu pai continuasse vivo. Recordo de rezar por isso porque sabia que eu não tinha esperanças e não queria que minha mãe ficasse sozinha. — Phoebe apertou sua mão, sem se importar com os sinais que pudesse enviar. Tommy nunca lhe havia parecido tão vulnerável. — O primeiro que pensei quando..., voltei foi que Deus havia se equivocado. Pensava: Não Deus, eu não, meu pai. Eu te pedi para salvar o meu pai. — Faith deve ter se alegrado muito quando voltou. — disse Phoebe. —Dallas Jones já havia ficado..., famoso e ela disse que sabia que eu..., voltaria. — Faith tem fé. — disse Phoebe. — E você? — Voltar explica..., certas coisas. E converte outras..., em um mistério. Algum dia..., tentarei..., te contar. Phoebe sentiu-se com calor. Afastou o rosto para olhar o bosque escuro, mas ele apertou sua mão com força. — Porque acredita que os... Zumbis..., como Karen e você são tão diferentes dos demais? Quero dizer, porque pode correr e jogar futebol e Karen pode dançar e beber café, enquanto a pobre Sylvia lhe custa até andar? Sua morte foi tão violenta como de qualquer outro. — Acreditava que fosse óbvio. — Certo, mas eu sou um pouquinho lenta. Por quê? — Por amor. — Por amor? — repetiu ela, desejando poder ver melhor seu rosto. — Por amor. Vivo com minha mãe, que me ama. Karen tem seus pais e sua irmã. Os pais de Evan o amavam..., de maneira incondicional. É a única diferença entre os outros garotos como Colette. Seus pais fugiram da cidade quando retornou. — Sim. — disse Phoebe, surpresa e envergonhada por não ter percebido o vínculo. — Sylvia? Tayshawn? — Sylvia estava em St. Jude, junto com Colette e Kevin, e agora estão
301 melhorando com a Fundação. Em St. Jude cuidam deles, mas eu não chamaria de amor. Tayshawn ficou um tempo..., com sua avó em Norwich, mas não funcionou. Phoebe tinha o pulso a mil por hora enquanto buscava a resposta correta. Embora quisesse dizer-lhe algo, algo que o aliviasse, a única resposta que lhe ocorria era a única que não estava preparada para dar. Tinha a impressão que Tommy era consciente disso. — Somente..., acreditava. — disse. — Acreditava que..., se..., se conhecia uma garota..., uma garota de verdade..., que me amasse..., me beijasse..., melhoraria..., muito mais. Lá vamos nós outra vez, pensou Phoebe, voltando-se para ele. Havia dito uma garota, não Phoebe, sim uma garota. — Tommy... — Eu sei. Acredite..., sei..., o que te peço. Voltou-se e olhou em seus estranhos olhos, e ela pensou que podia ver toda a dor e sofrimento no mais profundo de seu olhar. Toda a dor e sofrimento de alguém que havia morrido tão jovem, antes de experimentar as coisas que os jovens vivem. — Acredito. — repetiu, aproximando-se mais dela. — Que se te..., beijasse... Phoebe abriu a boca para responder, mas escutou um ruído no bosque, atrás deles, e notou que alguém levantava atrás do banco.
Estava a ponto de beijá-lo, pensou Pete. A cadela da Julie estava a ponto de entregar-se a este cadáver infestado de vermes. — Como pôde Julie? — sussurrou quando saiu a vista, a poucos metros deles. Havia enviado Stavis por trás, de modo que se dirigia ao esconderijo de Pete quando ouviu um tropeção. Mas Williams e Julie estavam tão entretidos em seu encontro íntimo que nem se quer haviam se dado conta até que fosse tarde demais.
302 — Pete. — disse ela, com a voz aguda e assustada, lutando contra Stavis. O garoto viu como tentava lhe dar um chute na canela ou mais acima, mas Stavis lhe colocou os joelhos nas costas. Pete levantou a arma e apontou no centro da cabeça do Zumbi, que ficou ali parado, olhando com os olhos vazios. — Pete, por favor. — disse a garota. — Estávamos... — Calada. — lhe ordenou Pete. — Pete, por favor, isso é... — Te disse para calar a boca! — gritou Pete, afastando a arma do Zumbi e apontando para ela. A garota abriu muito os olhos e parou de se mexer. — Olhe; Pete. — disse Stavis. — O Zumbi..., acredito que o Zumbi... — Você também, Timothy Colé. — lhe interrompeu Pete. Somente usava o nome completo de Stavis quando queria obediência instantânea. — Ponha-a para baixo e fecha a boca de uma vez. Vem aqui, não quero que respingue em você. Stavis obedeceu rapidamente, tropeçando nos ramos caídos. Pete a observou olhar seu amante Zumbi, o insulto definitivo. Estava cansado dos que riam dele em seus sonhos, dos que riam dele quando despertava. Certamente já estava infectada com a enfermidade Zumbi e, se a deixava partir, infectaria mais pessoas. O cano da arma tremeu, mas se obrigou a permanecer firme. Ela lhe olhou aterrorizada. Na cabeça, pensou. Era a única forma de acabar com os mortos-vivos. — Eu te queria. — sussurrou. E apertou o gatilho.
Adam dava voltas pelas ervas mortas do pátio traseiro, tentando decidir se
303 era o momento oportuno e o que devia dizer. Olhe Pheeble, pensou, antes que beije esse cara morto aí, deveria saber uma coisa: para mim é algo mais que os jogos com o Frisbee e as brincadeiras tontas sobre meu vocabulário. Significa mais para mim que mil palavras, embora passasse reto por você nos corredores durante quase todo tempo que temos estudados juntos. E, Pheeble, se tenho que fazer, eu escutarei aos Restless Dead, Zombicide, os Drumming Mummies; o que seja, me visto de preto e queimarei incenso, caso seja necessário. Irei deixar que leiam as cartas de tarot para mim e prestarei atenção na Daffy como se fosse incrivelmente interessante e inteligente, ao invés de um loro louco. Pode fazê-lo, Pheeble... Phoebe... Então ouviu um golpe em seco e o grito de Phoebe. Correu pelo caminho chamando-a a gritos. A princípio acreditava que Tommy havia feito algo que não devia, mas então viu Phoebe de pé com Tommy e Pete Martinsburg em frente a eles, apontando-lhes uma arma. Apontando para Phoebe. Correu chamando-a a gritos. Correu tão depressa como lhe permitiu suas pernas. Ouviu a tranquila voz do mestre Griffin em sua cabeça: Concentre-se, dizia. O que fará com esse poder? Chegou até Phoebe justo quando Pete apertava o gatilho. Quando tudo terminasse e Phoebe se encontrasse de novo rodeada por pessoas que a queria bem, recordaria o momento de vacilação de Tommy. Pode ser que suas extremidades mortas não tiveram o tempo de resposta necessário para correr e ajudá-la, mas, quando o olhou, Tommy Williams, o líder do movimento Zumbi clandestino, havia vacilado. Pete Martinsburg vacilou, por isso tardou em apertar o gatilho. Adam não vacilou em absoluto, e por isso caiu.
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CAPÍTULO 31 O disparo rompeu o silêncio do bosque. Pete viu que alguém se pôs na frente de Julie e se dobrava como se uma equipe invisível o derrubasse. Adam. Havia atirado em Adam Layman. — Meu Deus, Pete. — gritou Stavis, olhando com surpresa e medo no seu rosto gordo. Saiu correndo pelo bosque. Pantynegros gritou o nome de Adam e se deixou cair ao seu lado. Pete voltou a apontar, mas depois lançou a arma nos arbusto e se pôs a correr. Correu sem pensar, tropeçando e quase rompendo o joelho em um toco baixo; correu até descobrir um dos muitos caminhos sinuosos que rodeavam o bosque de Oxoboxo como serpentes de borracha. Com a respiração entrecortada, freou um pouco sem deixar de trotar, queimando os miolos para averiguar como chegar até o carro. Não tinha nem ideia de onde estava. — Já..., vai..., da festa? — perguntou uma voz atrás dele. Voltou-se; era o cara que havia saído antes da casa, e Pete por fim recordou onde o havia visto: era o Zumbi do dia em que havia deixado partir a cadela morta. O tipo feliz, o heavy. Viu o brilho das correntes que se penduravam nas calças de couro. — Que se..., foda. — respondeu Pete. O outro se limitou a sorrir enquanto se aproximava. Pete virou e tropeçou em uma pedra. Rodou para colocar-se de boca para cima, e o Zumbi se inclinou sobre ele, fazendo que gravasse em seu cérebro a imagem de sua cara destroçada. — Acredita que eu ia te..., matar? — lhe perguntou o Zumbi com sua voz
305 rouca de réptil; o cabelo escuro lhe caia como tentáculos de uma medusa. — A morte..., não é para você. A morte é..., um presente. Pete viu que sorria, embora pudesse ver todos os dentes. Aí foi quando começou a gritar.
Phoebe caiu de joelhos na terra junto ao corpo de Adam, rasgando a borda do bonito vestido branco ao fazê-lo. Adam havia se jogado como se houvesse se lançado em cima de um ser invisível. Havia caído sem respiração e seu grande corpo parecia desinflar-se ao cair no chão. — Adam? Oh, meu Deus. Adam, você está bem? Estava passando suas mãos, e apalpava braços e ombros em busca de feridas, mas, quando chegou ao peito, viu que uma flor rosada se estendia pelo centro da camisa. — Adam! — gritou. — Adam, me escuta? — Tommy estava ajoelhado ao seu lado, com uma mão no ombro do garoto, que havia começado a tremer. Adam abriu e fechou a boca, e se colocou os olhos em branco. Tossiu, e um fio de sangue apareceu na comissura de seus lábios. Phoebe apertou a mancha da camisa com as mãos tremendo e pediu a Deus para ajudar a manter a vida dentro de Adam, dentro de seu corpo até que a ajuda chegasse. — Entrou em estado de choque. — disse Tommy. Phoebe sentia como se a vida de seu amigo escapasse entre os dedos. — Não Adam! Não se vá! Por favor, Deus! Não se vá Adam! Então os olhos de Adam se abriram e a olhou, abriu a boca para falar. Tentava dizer algo, mas se afogava, e ela o deteve.
306 — Shhh, a ajuda esta a ponto de chegar. Ele sorriu, e Phoebe viu que a luz abandonava seus olhos; uma convulsão enorme percorreu o corpo, e Adam morreu. Phoebe conteve o lamento. Adam não se movia. — Não vá. — se ouviu dizer entre soluços, embora parecesse como se estivesse vendo de fora, como se houvesse abandonado seu corpo ao mesmo tempo em que Adam o seu. Olhou-se, derrubada sobre ele, estremecida pelo pranto. Tommy se ajoelhou ao seu lado, com o rosto oculto pelas sombras. Olhou ao seu redor, mas Adam (seu espírito) não estava por nenhuma parte. Então Tommy tocou seu braço e voltou ao seu corpo. A mancha seguia se estendendo por sua camisa branca. Ouviu vozes se aproximando pelo caminho, mas era tarde: Adam havia ido.
Os mortos se reuniram ao redor de Phoebe. Karen, Colette, Mal e Tayshawn, e os que não conhecia (a garota queimada e a garota com um braço só) haviam formado um circulo ao redor de Tommy e ela, que continuavam ajoelhados ao lado do corpo sem vida de Adam. Era como um funeral, mas ao contrário, já que os que rodeavam estava todos mortos e ela, a única pessoa viva, estava a ponto de acabar embaixo da terra. Ao vê-los ali, tão quietos e silenciosos como as árvores, quis gritar que lhe ajudassem, que usassem todos os estranhos poderes que tivessem para trazer Adam de volta. Viu Margi entre os mortos digitando um número no celular com as mãos tremulas. — Como podem ficar aí parados? — perguntou Phoebe, olhando a Colette, a Mal. Tentou levantar Adam colocando o braço dele em seu pescoço, mas era muito pesado. — Por que não me ajudam? Karen, por favor!
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Ouviu Margi falando no telefone e tirou o braço de Adam com esperança renovada, recordando que havia muitos policias ali ao lado na porta da escola. O departamento de bombeiros de Oakvale sempre respondia as emergências a toda velocidade. Voltou a suplicar, levantando o olhar, quando Takayuki se meteu entre seus colegas mortos. — Por favor! — repetiu, tremendo enquanto Tommy tentava ajudar a sentar Adam. — Por favor, ajudem-me! — Já vem. — disse Margi, entre lágrimas. Karen se aproximou e se ajoelhou, colocando uma mão sobre o ombro de Phoebe. Seus olhos de diamante brilhavam como estrelas distantes ao por a outra mão sobre o centro da mancha vermelha na camisa de Adam. — Tenho certeza que pode fazer algo, Karen. — lhe suplicou Phoebe. — Pode, não é? Pode ajudá-lo? Karen pestanejou, apagando por um instante as estrelas, e sacudiu a cabeça. — Sinto muito, Phoebe. Sinto de coração. Pela cabeça de Phoebe passaram mil respostas: a raiva foi a primeira, queria estapear Karen, lhe dar uma bofetada, chamá-la de mentirosa; depois quis abraçála e aferrar-se a ela até que a polícia chegasse para levar o cadáver de Adam. — O..., tenho. — disse Tommy, e Phoebe deixou que o depositasse de novo sobre a terra com muita delicadeza. — Não. — respondeu. Tinha que ter alguma esperança. A polícia estava a caminho, poderiam reanimá-lo. Sem saber que outra coisa fazer, abraçou Adam, tentando mantê-lo aquecido.
Adam abriu os olhos.
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Parecia notar a chuva nas bochechas, mas quando clareou a vista e pode observar melhor, inclusive na penumbra, comprovou que era Phoebe que chorava sobre ele. A observou, e ela conteve seu pranto. — Adam? Ele sorriu e soltou uma piada tonta sobre o mau herói que era: duas viagens ao bosque para salvá-la e as duas vezes acabava com o rabo no chão. Phoebe sorriu e começou chorar com mais força. Adam se deu conta de que estava um pouco enjoado pelo golpe, porque o que tentava dizer e o que acabava saindo eram coisas completamente diferentes. Ela o mandou se calar e pôs um dedo em seus lábios. Era curioso o quente que resultava seu dedo em comparação com os lábios de Karen. Tentou fazer outra brincadeira, mas não havia recuperado a respiração, então só pôde deixar escapar alguns arquejos entrecortados. Não era nada, o haviam deixado sem respiração muitas vezes no campo. Tinha que esperar e relaxar. Além do mais, não gostava de ver Phoebe chorar. Levantou a mão direita com a intenção de limpar as lágrimas e, curiosamente, moveu a mão esquerda. Contemplou como sua mão estremecia e voltava a cair imóvel sobre seu peito. O peito úmido. O peito empapado. Tentou mover a mão da umidade, mas não lhe obedecia. Phoebe lhe afastou as mãos em um gesto que, certamente pretendia reconfortá-lo, embora ao ver as mãos de sua amiga coberta de sangue, seu sangue, o efeito não foi o desejado. Pete; pensou. O imbecil. Phoebe seguia chorando. Adam se deu conta de que havia mais gente ao redor. Tommy e Karen estavam ao seu lado. Daffy estava com o celular, ao que parece não era capaz de se calar por um minuto. Viu que Daffy também chorava, e Karen, quase. Karen olhos de estrela, esse seria seu novo apelido. Seus olhos pestanejavam como pequenas lanternas na escuridão do bosque de Oxoboxo. Claro que não poderia chorar de verdade, embora Phoebe insistisse que tinha visto ela soltar uma lágrima no funeral de Evan.
309 Pobre Evan; pensou, porque gostava daquele moleque. Então Adam imaginou o porquê de todos chorarem, e abriu a boca para dizer-lhes para não se preocuparem. — Estou bem. — disse, ou tentou dizer, já que isso não foi o que os demais ouviram. — Shhh. — disse Phoebe, e se inclinou sobre ele para abraçá-lo. Teria sido fantástico se não tivesse o corpo todo adormecido. — Não tente falar — sussurrou ela, aproximando os lábios do ouvido dele. Tentou de todas as formas antes que pudesse dizer o que sabia que ia dizer, mas o ruído que saiu era como um largo bufar afogado. — Está morto, Adam. — sussurrou Phoebe. Embora o garoto tentasse virar-se, sua carne não estava disposta a permitir. Ouviu como a voz dela se entrecortava ao tentar dizer as seguintes palavras. — Pete te matou. A verdade o golpeou com a mesma força de uma bala. Primeiro pensou em protestar, em dizer-lhe que se equivocava, embora no fundo de seu coração soubesse, no fundo de um coração que já não batia, sabia que ela tinha razão. — Te amo, Phoebe. — disse, enquanto ela chorava, mas o único que saiu de sua boca foram uns ruídos estranhos, afogados, nada parecidos ao linguajar humano.
Phoebe ficou ali com ele até que chegou a polícia. Seu bonito vestido branco, já não era nem branco, nem bonito. A barra estava rasgada e suja, e o sangue de Adam o cobria por completo. Adam havia recebido a bala no peito porque Pete apontava a cabeça de Phoebe. A ideia teria que lhe dar medo, mas só podia pensar em Adam e no diferente que seria entre eles a partir daquele momento. Enquanto o via ali deitado, sem piscar, tentando em vão formar palavras que ela pudesse compreender, o único no que pensava era o mau que havia sido os dias em que havia passado sem lhe falar.
310 Chorava, não podia parar e, embora fosse absurdo, sabia que algumas de suas lágrimas eram por aqueles dias perdidos. Desejava poder rebobinar até o último momento juntos na Casa Assombrado e não haver dito as coisas que disse. A maioria dos Zumbis se dispersou pelo bosque, fundindo-se com a paisagem como fantasmas enquanto as luzes e sirenes da polícia iluminaram a escuridão. Phoebe os viu desaparecer, recordando a noite em que os haviam resgatado, depois de surgir da escuridão do bosque como se fosse parte dele.
Tommy e Karen ficaram com os garotos com fator biótico tradicional até a chegada da polícia. Colette ficou com Margi, e se abraçaram quando Margi terminou de ligar pelo celular. Haley disse que sabia algo de reanimação, mas todos sabiam que não serviria de nada: Adam já havia morrido e revivido. Embora não estivesse segura, Phoebe tinha a impressão de que quase nenhum garoto com DFB havia regressado tão depressa. Somente havia estado morto por alguns minutos, os minutos mais largos da vida de Phoebe, mas talvez aquilo fosse motivo de esperança. Talvez seu veloz regresso das faces da morte significaria que alcançaria o controle da sua voz e seu corpo mais depressa que alguns dos outros. Talvez. Tommy tentou consolá-la, mas ela não queria que a consolassem. Margi e Karen tentaram falar com ela, tampouco queria falar. Adam havia aparecido correndo para salvá-la, e não uma, mas sim duas vezes. Ao vê-lo ali, olhando-a e tentando falar, supôs que havia chegado sua vez de salvá-lo. Respirou fundo e secou os olhos com a sangrenta manga do vestido, o vestido que a ele parecia feito da luz da lua. Pouco depois chegou a ambulância e os paramédicos que colocaram Adam na maca enquanto ele se retorcia e tossia sons ininteligíveis. Durante todo o processo, Phoebe somente podia pensar em uma coisa: em trazê-lo de volta. Em trazer de volta tudo o que fosse possível.
Fim
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PRÓXIMO LIVRO DA TRILOGIA KISS OF LIFE
Créditos Tradução: Carol Silmara Thábata Steρhanie Hay Kelli Revisão: Hay Revisão Final: Thábata Formatação: Hay
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"All Creatures of the night get together After Dark"