Saber-se #03 - Junho de 2019

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Revista de Gestão Pessoal • Ano 1 • número 3 • junho de 2019

O mundo virtual e a solidão

O que aprendi com o tiro com arco

Melhore sua autoeficácia

Quando mudar é imprescindível

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Editorial • Revista de Gestão Pessoal

EXPEDIENTE EDITORIAL Saber-se é uma publicação

Buscamos o autogoverno

da Editora Pragmatha. Todos os direitos reservados.

Somos duais, polarizados e naturalmente guiados pelo senso de opostos nem sempre complementares. Para apreciar o salgado, pre-

Editora

cisamos conhecer o doce. Para nos encantarmos com a noite e suas

Sandra Veroneze

estrelas, precisamos do contraponto do dia. A beleza do sol mostra todo seu esplendor na relativa comparação com um charmoso dia de

MTB 10.210

chuva. As delícias de uma vida adulta estão diretamente relacionadas às carências da infância e terceira idade – e vice-versa. Gostaríamos muito de sermos ‘seres de luz’, porém é inegável a

Colaboradores Eliana Totti

presença e força das sombras em cada um de nós. Ela se manifesta nos

Renata Bento

mínimos detalhes, através daqueles impulsos e inclinações da person-

Yara Leal de Carvalho

alidade nem sempre bem-intencionados. Certa vez um sábio disse que erramos por ignorância e por maldade, e que felizmente na absoluta maioria dos casos é por força do primeiro motivo. Cabe aqui o esforço de não apenas aprender com nosso lado obscuro, mas também governá-lo. Identificou alguma fragilidade? Vale

Juliana Soares Borba Matilde Fuzinatto Andreine Busnello Beatriz Akemi

o esforço de não se deixar governar por ela. Aplica-se nas coisas sim-

Hélio Strassburger

ples da vida: aquela vontade de comer um doce a mais (proibido pelo

Elizabete Borba Avancini

médico), a preguiça de acordar no horário todo dia, aquela vontade

Márnei Consul

de desfilar suas conquistas diante daqueles que torciam contra ou não acreditavam no seu potencial… A lista é infindável… Buscar o Autogoverno de impulsos e inclinações de nossa personalidade. Topa o desafio?

Jorge Neto Luciane Guisso Giulianna Remor Michele Puel Anelise Lopes

Sandra Veroneze | Editora

Endereço Rua Cravinhos, 88 Jardim Paulista São Paulo / SP 01408-020 Junho de 2019 www.saber-se.com


Revista de Gestão Pessoal • Sumário

SUMÁRIO

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Amigos, amigos, negócios à parte Sandra Veroneze................................................................. 05 Melhore sua autoeficácia Eliana Totti........................................................................... 07 O mundo virtual e a solidão Renata Bento....................................................................... 09 Certezas e Convicções Yara Leal de Carvalho.......................................................... 11 A mulher e os dilemas da maternidade Juliana Soares Borba.......................................................... 13 Crise de ansiedade é frescura? Matilde Fuzinatto................................................................ 15 Você é ou você está? Andreine Busnello............................................................... 15 O que aprendi com tiro com arco Beatriz Akemi....................................................................... 19 Texto e contexto Hélio Strassburger............................................................... 21 Conhecer-se para sobreviver Elizabete Borba Avancini.................................................... 23 É preciso prestar atenção em tudo? Márnei Consul...................................................................... 25 O elefante e a corda Jorge Neto........................................................................... 27 Autossabotagem no trabalho Luciane Guisso, Giulianna Remor e Michele Puel ............. 29 Quando mudar é imprescindível Anelise Lopes....................................................................... 31


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Amigos, amigos negócios à parte Sandra Veroneze

Sempre me causou dúvidas a premissa de que amizade e negócios têm regras próprias e que não devem se misturar. Amigos, amigos, negócios à parte? O que isso significa, exatamente? Na minha vida, sempre que ouvi a expressão ela estava relacionada a uma advertência de que não devemos ser condescendentes, benevolentes, pacientes e tantas outras “virtudes passivas” no trato com amigos e conhecidos, quando se tratava de obter lucro e fazer crescer nossas empresas. Oras, se em meu trabalho eu não for bacana com os meus amigos, com quem serei então? Sempre optei em facilitar as coisas para pessoas próximas. Não seria essa colaboração a base para o que de fato é, em essência, uma parceria? Às vezes um pequeno desvio na regra (uma parcela a mais para pagar, um desconto um pouco maior do que a tabela apresenta, um horário diferenciado para atendimento, ou até mesmo a não cobrança) pode fazer toda diferença para o amigo. Para o negócio é um ganho? Nem sempre. Mas será que só se trata de finanças? Precisamos repensar a maneira como fazemos negócios. Às vezes me parece, observando alguns mantras do mundo corporativo, que se trata de uma grande arena, somente com predadores, e que não importa se o oponente é um amigo, um conhecido, ou um completo estranho – mate, devore, acabe com ele! Não se estranha, portanto, aquilo que se convencionou chamar de

‘puxada de tapete’, muito embora possa causar revolta em quem sofre e uma certa satisfação em quem pratica. Há, inclusive, quem não se importe de se apropriar de clientes de parceiros... “É do jogo” – dizem. Mas que jogo é este? E quem se propõe a jogá-lo? É o jogo do sucesso a qualquer preço, dos fins que justificam os meios. Tem sua lógica? Tem. Teu seu valor? Provavelmente. É nele que você quer jogar? É uma escolha. Pessoalmente, tenho observado nos últimos tempos uma nova postura emergir nos negócios, principalmente em setores que lidam com criatividade, inovação e com preocupação ambiental, social, cultural. Ancoradas na colaboração, essas empresas crescem a cada parceria, a cada união, compensando fragilidades umas das outras e se fortalecendo em seus aspectos positivos. O resultado? Mais e melhores soluções para o cliente, que é a fonte do lucro, por sua vez mais e melhor distribuído e portanto gerador de riqueza para mais negócios. No longo prazo, é minha aposta, é o tipo de negócio que sobreviverá. Amigos, amigos, negócios à parte? Mesmo?

* Sandra Veroneze é Jornalista e Ffilósofa clínica


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Melhore sua autoeficácia Eliana Totti Você tem a tendência de ver o copo meio cheio ou meio vazio? Sabe aquela reunião de feedback com o chefe que a gente sai e fica o tempo todo pensando naquele único item de ‘ponto a melhorar’ que foi dito? E aquela prova cuja nota acabamos de receber e corremos para ver o que fizemos de errado? Se você se enxerga nesta lista de situações, a reflexão a seguir vai lhe ajudar. Vivemos numa sociedade que nos cobra a melhorar nossos pontos fracos, como se isso nos levasse à excelência. Há quem diga que a consciência de nossas fraquezas é a chave para uma boa performance. O resultado disso é um volume enorme de pessoas desmotivadas, sem energia e totalmente insatisfeitas. Por conta disso, surgiram muitas teorias, como a Psicologia Positiva, Investigação Apreciativa e a Teoria da Autoeficácia, como maneiras diferentes de entender a relação entre comportamento, desempenho e crenças pessoais. A Teoria da Autoeficácia diz que a maneira como enxergamos nossas habilidades determina como iremos nos comportar. Ou seja, somos agentes das circunstâncias de nossas vidas e não somente produtos delas. Mas o que isso quer dizer na prática? Simples: Na maioria das vezes, as crenças que temos sobre nós mesmos não são acuradas, tampouco assertivas e quando estamos diante de circunstâncias onde isto é posto em prova, tendemos a focar nos nossos erros e aspectos negativos, pois assim fomos treinados, lembra? Considerando que estas crenças são a base da motivação, bem-estar e do senso de realização, podemos afirmar que muitas de nossas dificuldades de relações interpessoais e problemas de desempenho no trabalho, por exemplo, têm origem a partir de distorções cognitivas que criamos a respeito de nós mesmos. É neste aspecto que entra um ponto chave para a mudança dessa crença limitante: o autoconhecimento. Tendo em vista que só mudamos aquilo que (re)conhecemos, a autoconsciência constitui-se fator primordial para o exercício pleno da autoeficácia. Como a autoeficácia não é um traço, que uns possuem e outros não, isso significa que todos nós temos

a capacidade de influenciar nosso funcionamento interno, modificar e criar o nosso entorno, independente do que vivenciamos ou aprendemos no passado. Dr. Albert Bandura, professor de psicologia social da Universidade de Stanford, afirma que existem quatro maneiras de desenvolvermos crenças pessoais positivas e aumentar nossa autoeficácia. A primeira delas é quando conseguimos atingir metas. Alcançar determinados objetivos na vida nos faz desenvolver autoconfiança, o que afeta diretamente nossas crenças pessoais acerca daquilo que somos capazes de atingir e realizar. Quando esta experiência é positiva, temos uma sensação prazerosa de autorrealização, ao passo que quando falhamos ao atingir determinadas metas enfraquecemos a nossa autoeficácia. Outra maneira de desenvolver a autoeficácia é através do que Dr. Albert chama de Experiências Vicárias. Segundo ele, buscamos referências de comportamento em pessoas com as quais nos identificamos e que nos inspiram. Observamos como agem e se comportam, sobretudo em situações desafiadoras, e tendemos a imitá-las. À medida que somos bem-sucedidos neste processo, automaticamente nos sentimos motivados e isso reforça nossa crença de que também somos capazes de agir de determinado modo. A terceira maneira de desenvolver a autoeficácia é por meio da Persuasão Social. Quando recebemos feedback construtivo de pessoas, isto nos faz sentir encorajados e confiantes a respeito de nossas capacidades. Por fim, a quarta maneira de desenvolver a autoeficácia está relacionada ao nosso estado fisiológico e emocional, que exerce um papel extremamente importante na maneira como interpretamos nossas habilidades pessoais. A ansiedade, por exemplo, pode aumentar a insegurança causando um impacto negativo na autoeficácia. Por isso a relevância em se buscar equilíbrio nas emoções de modo assertivo a fim de mitigar o estresse, melhorar o humor e desenvolver a autoconfiança. * Eliana Totti é Psicóloga


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O mundo virtual e a solidão Renata Bento O advento da internet, fenômeno de nosso tempo, abre espaço para inúmeras indagações. É a era da interface, dos relacionamentos virtuais, da rapidez, das redes sociais, dos contatos, dos relacionamentos fugazes, mas nem por isso tão fáceis assim. Paradoxalmente, com todo esse aparato e aparente facilidade, é a era também de uma enorme solidão, uma busca incessante por essa unidade perdida. Surgem novas tecnologias, vários sites e aplicativos para todas as categorias de aproximação. Abre-se numa janela iluminada diante de olhos ávidos que procuram um mundo de oportunidades dos mais diversos tipos possíveis de encontros. Com base em um cadastro, cria-se um perfil e o primeiro contato vai ocorrer de forma virtual, protegidos em suas privacidades geográficas, no conforto de seus refúgios e entre telas de computador ou do smartphone. É nesse ciberespaço que os desconhecidos dissertam sobre suas expectações e projetam em seus perfis ‘on line’ algo como sua expectativa idealizada. Isso ocorre por meio de fotos criteriosamente selecionadas e textos sobre aquilo que se é; que gostaria de ser; e que se acredita que o outro expecta. Nada mais humano do que querer ser amado. No entanto, é preciso que haja encontro, uma ligação, uma conectividade para além das teclas do computador. E a partir disso que ambos queiram superar as dificuldades advindas de se fazer uma relação, que o choque com a realidade, formada de dois indivíduos que vieram de famílias e constituições distintas, se impõe. Quando pensamos na forma de relações que os sujeitos fazem protegidos no mundo virtual observamos que há uma utilização de um espaço, nesse caso uma tela, entre ele e o outro. Nesse contexto, essa relação estaria sendo mediada por um computador. Buscar transformar o mundo desagradável e hostil e tentar ser mais feliz é também fantasiar, sem que possamos nos esquecer de que é na realidade que podemos de fato ser felizes. A internet poderia se configurar em um espaço lúdico onde o exercício da criatividade torna-se mais tolerável. O assunto relacionamento nunca

sai de moda. Os riscos a serem seguidos ao assumir um compromisso parece ser central da atualidade. Ansiedade de viver junto e também de viver separado parece ser uma equação que não fecha. Com a utilização da internet, das formas tecnológicas de relacionamento e a rapidez de informações, torna-se mais simples se conectar e mais fácil ainda desconectar. Se não gosta, ou algo incomoda, é só apertar a tecla ‘deletar (apagar)’ e desligar a máquina. As tecnologias são novas, mas os seres humanos continuam sendo humanos e isto quer dizer que possuem sentimentos e emoções. A modernidade da tecnologia pode ser um facilitador, um recurso para aproximar, desde que os seres humanos não se esqueçam de que são humanos, dotados de seu mundo interno repleto de significados, sentimentos e emoções e necessidade de afeto. O papel de estabelecer laços é feito no exercício diário do próprio relacionar-se. Todo individuo é marcado pelo desamparo primordial e pela falta do objeto para sempre perdido. A solidão tem suas raízes nos primórdios da vida psíquica, mas não tem o sentido de estar só e sim de se sentir ‘mal acompanhado’ do ponto de vista interno, como se carregasse dentro de si mesmo uma sensação ruim. Até porque não é possível estar acompanhado de outra pessoa todo o tempo. É preciso de algum modo se suportar emocionalmente. Parece clichê, mas é de fato importante se conhecer e ter um bom relacionamento consigo próprio primeiro para facilitar o relacionamento com o outro. Afinal, o vazio é comum a todos os sujeitos; sempre falta alguma coisa. Buscar compreender como cada um lida com a falta e com a própria solidão são os primeiros desafios colocados para se relacionar a dois. A tecnologia nos favorece, mas não substitui aquele abraço afetuoso, aquelas palavras na hora certa, ou aquele beijo carinhoso. Fatores humanos como intimidade, afeto e interação continuam sendo ‘coisa’ de gente. * Renata Bento é Psicóloga


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Certezas e convicções Yara Leal de Carvalho

Ultimamente tenho refletido bastante sobre o papel das convicções em nossa vida. Ter certeza sobre as coisas é algo benéfico ou impõe restrições em nossa forma de olhar o mundo? Eis a questão! As certezas nos fazem caminhar por estradas já conhecidas, evitando qualquer atalho, pois um atalho significa algo incerto, desconhecido e potencialmente perigoso, mas por outro lado pode nos reservar ótimas surpresas. Ser convicto sobre algo nos traz a segurança de saber qual é o melhor trajeto, não existem dúvidas, isso é certo e todo o resto é errado. Quando estamos convictos de alguma coisa, estamos afirmando que temos absoluta certeza de que aquilo é correto. As ideologias e religiões são exemplos típicos de crenças que se estabelecem em nossas mentes pelo princípio da fé, ou seja, no acreditar sem questionar. Acreditar dá um certo conforto, facilita a vida, divide as coisas entre o certo e o errado. Então me desgasto menos, penso menos e sou mais autômato. Mas então ter uma religião é automaticamente um limitador para a vida das pessoas? Acredito que não, quando a pessoa mantiver a capacidade crítica, de aceitar algumas coisas e não concordar com outras. Mas a partir do momento em que houver dogmatismo, acredito que isso será um fator limitante para a vida do indivíduo. As certezas são como a terra improdutiva. Tudo que podia nascer dali já floresceu e as dúvidas e questionamentos são como terra adubada. Depois da chuva, existe todo um potencial de produtividade – as possibilidades são amplas! Roberto Crema em sua obra Pedagogia Iniciática expõe a seguinte ideia: “Uma pessoa que recita uma ideologia cega a uma teoria ou método é um ser estupidificado, totalmente previsível e vítima de suas próprias rotinas automáticas. Nessa via viciada e res-

trita, seguimos os trilhos e perdemos as trilhas. Morre o criador, vegeta a criatura, na carência de inovação, criatividade e originalidade.” Penso que é saudável ampliar as opções e não restringi-las. Quanto mais possibilidades enxergamos, melhor podemos fazer escolhas. Portanto, que sejam bem-vindas as perguntas, as dúvidas e os questionamentos, pois tudo isso só irá engrandecer nossa vida. É claro que uma vida cheia de certezas e caminhos únicos pode nos levar a cometer erros por falta de visão ampla, mas por outro lado uma vida sem nenhuma convicção pode nos levar à inação e isso também não é nada bom. Então como já dizia Buda: “Vamos adotar o caminho do meio”. Fernando Pessoa dizia: “Ter opiniões é estar vendido a si mesmo. Não ter opiniões é existir. Ter todas as opiniões é ser poeta.” Durante um processo de Coaching, a ferramenta mais poderosa utilizada pelo Coach são as perguntas, elas ajudam o cliente a enxergar novos ângulos para uma mesma situação e, portanto, as perguntas nos despertam para aquilo que não sabemos. Perguntar é um convite à aventura, a uma viagem de descobrimento. É uma das formas para chegar ao desconhecido. Aí vão quatro perguntas para ampliar perspectivas: 1. É possível saber a verdade sem desafiá-la primeiro? 2. É possível saber, sem dúvidas, o que é bom e o que é mau? 3. Por que religiões que apoiam o amor causam tantas guerras? 4. Se você pudesse dar um conselho para uma criança que acabou de nascer, qual seria? * Yara Leal de Carvalho é Psicóloga, Coach e Consultora


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A mulher e os dilemas da maternidade Juliana Soares Borba

A maternidade não é uma simples fase da vida. É um dom divino, grandioso, concedido às mulheres para cocriação de um novo ser. Criar, gerar, estar junto, mostrar o que se considera certo ou errado, valores, princípios, cultura e educação são algumas responsabilidades da maternidade. E neste lugar de amor há também conflitos internos, com uma dúvida central: manter a vida profissional ou dedicar-se exclusivamente aos filhos. As mães que escolhem por manterem suas carreiras no período inicial de suas maternidades não escolhem uma maneira mais simples de serem mães. Embora queiram e gostem muito de seus filhos, nem sempre todas as mulheres podem abrir mão do trabalho e de suas carreiras. Venho refletindo sobre esse tema há algum tempo, visto que não é fácil o papel da mulher na sociedade hoje. A mulher que é mãe, especialmente, recebe uma sobrecarga em nosso dia a dia. Ao contrário do que acontecia há alguns anos atrás, a mulher de hoje busca autorrealização, igualdade no ambiente de trabalho, realização profissional e ao mesmo tempo assume o papel de mãe, esposa, dona de casa e gerente e financiadora do lar. Segundo dados do IBGE, a maioria dos lares brasileiros hoje são providos por mulheres. Faz-se necessário refletir como nós, mulheres, estamos nos enxergando neste contexto tão sobrecarregado de tarefas e atribuições e qual é o nosso verdadeiro papel nessa sociedade, ou melhor, o papel que queremos de fato desempenhar. Penso realmente na educação, na cultura, no lazer, na qualidade de vida como um todo da mulher brasileira. Antes de ser mãe, tinha algo planejado, pré-estabelecido nos meus moldes, como e quando queria ter meus filhos, achava realmente que tudo poderia se encaixar perfeitamente e sem atropelos, e que todas as situações da vida poderiam ser programadas e agendadas. Errei ao pensar assim, ao pensar em família como algo formatado e que posso simplesmente

programar. Quando nasceu o meu primeiro filho tive a oportunidade de ver o mundo de outra forma, mas especialmente quando ganhei a minha segunda filha entrei em colapso, colapso de ideias, colapso estruturalmente. Hoje tenho três filhos, e essas três crianças, as quais possuem personalidade e comportamentos diferentes, fizeram-me repensar o meu papel como mulher e mãe. Critica-se muito a mulher que exerce o papel de dona de casa hoje em dia, ora porque não trabalha fora, ora porque é sustentada pelo marido e em geral há a crença de que a mulher que está em casa não trabalha e que a organização da casa é algo inferior ao trabalho mercantil. Entretanto, a mulher que exerce diversos papéis, inclusive o de mãe e provedora do sustento do lar, se vê em um contexto adoecedor de pressão social, com uma sobrecarga que tem gerado um desequilíbrio emocional da mulher e a afasta do que é melhor de fato para ela. Nesse quesito tem muita coisa a ser debatida e até absorvida num ambiente em que a mulher tem sido muitas coisas, com muitos papéis, mas tem esquecido muitas vezes o que é ser mulher, sua identidade feminina, e de se ver como mulher. A responsabilidade do cuidado dos filhos também deveria ser mais compartilhada entre o casal. E inclusive o homem, que por séculos teve seu papel definido na sociedade como genitor, patriarca e provedor do lar, tem diante dessa era seu papel em xeque. Afinal, como devem ser vistos esses papéis e qual a solução diante desse conflito de papéis? Acredito que não há uma resposta única e nem uma resposta fácil. Porém, devemos cada vez mais nos perguntar o que queremos, como mulheres. Qual o resultado das minhas escolhas para eu mesma e para aqueles que amo? E ainda questionar se sou feliz com o que busco e se vale a pena buscar algo mais. * Juliana Soares Borba é Administradora e Coach


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Crise de ansiedade é frescura? Matilde Fuzinatto

Só quem já viveu uma crise de ansiedade, também

nema, andar de elevador, sair sozinha de casa, estar

conhecida como ataque de pânico, pode atestar o

em lugares com grande quantidade de pessoas. E isso

quão incapacitante e frustrante é esse momento. Em

passa a ser um limitador na vida da pessoa que sofre

média a crise tem uma duração de 10 a 30 minutos até

de ansiedade, além da preocupação persistente de ter

chegar seu ápice; contudo, para quem a vive, a sensa-

uma nova crise, que é muito elevada, o que agrava a

ção é de uma eternidade.

situação. Contudo, ainda hoje existe o preconceito so-

A crise de ansiedade se dá a partir de gatilhos

bre transtornos mentais onde a vivência da situação

emocionais, que podem ser conscientes ou incons-

de crise ansiedade é tida como “frescura”, “chilique”

cientes, podendo ser pensamentos, cheiros, sensa-

para chamar atenção.

ções, lugares, comidas, enfim, sendo desencadeados

Então, respondendo à pergunta inicial: não, crise

pelos mais diversos estímulos. E no momento em que

de ansiedade não é “frescura”, “chilique”, “fiasco” ou

a pessoa é exposta a esses estímulos, sua reação é o

um comportamento para chamar atenção. Ela é real-

disparo de uma crise. Isso não tem hora, não tem lugar,

mente intensa, muito desagradável e causa mal-estar

ou seja, não se escolhe quando e onde vai acontecer,

muito forte.

assim como também não há uma forma de controle imediato.

A boa notícia é que nos dias de hoje já existe tratamento eficaz para tratamento dos sintomas de

Essa crise tem sintomas físicos e psicológicos,

ansiedade realizados através da combinação de psi-

como angústia, aperto no peito, náusea, respiração

coterapia, realizada por psicólogos e psicofármacos

ofegante, tensão muscular, sensação de sufocamento

(medicação) prescritos pelo médico psiquiatra. Essa

e de incapacidade, medo iminente de morte ou de que

combinação geralmente traz resultados bastante sa-

algo muito ruim vá acontecer com ela, amigos e/ou fa-

tisfatórios e a pessoa tem condições de resgatar sua

miliares, medo de perder o controle, de enlouquecer,

qualidade de vida, retomando às atividades que eram

de ter um ataque cardíaco, coração acelerado, pressão

desenvolvidas antes das crises.

sanguínea elevada e muitas vezes vêm acompanhadas de choro. A pessoa muitas vezes passa a desenvolver medos e se sentir incapaz de realizar ações cotidianas que sempre realizou, como dirigir, andar de avião, ir ao ci-

* Matilde Fuzinatto é Psicóloga Clínica e Organizacional


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Você é? Ou você está? Andreine Busnello

Quantas vezes você falou, mesmo que de brin-

está conseguindo aprender e talvez precise de uma

cadeira, uma frase como “eu sou burro, não aprendo

maneira diferente de estudar. Ser gordo significa que

nada”, “eu sou gordo mesmo, vou comer”, “sou um

você sempre usou manequins grandes e seguirá a vida

caso perdido, não tenho solução”, “sou muito pregui-

se sentindo apertado nas roupas. Estar gordo significa

çoso...” ou qualquer outra do gênero?

apenas que nesse momento você está acima do peso

Várias vezes, não? Afinal, todo mundo fala....

e pode mudar isso iniciando uma dieta e prática de

Pois é, a grande maioria das pessoas fala assim

exercícios.

mesmo e não tem ideia do que acaba gerando com essas simples palavrinhas. Cada vez que você fala desta

Ser implica em identidade, estar implica em estado atual.

maneira, afirmando ser algo, seu cérebro registra essa

Ser é imutável; estar é passível de mudança.

frase, assim como ele registra tudo o que você faz.

Para cada aspecto negativo que você está nesse

E você sabe que quanto mais você pratica um es-

momento, tenho certeza que existe algo que você é de

porte, melhor você fica nele. Quanto mais você can-

verdade que pode combater esse estado. Se você está

ta uma música, mais ela fica decorada na sua cabeça.

preguiçoso, você pode ser determinado e sair desse

Quanto mais você fala uma língua, mais fluente você

sofá. Se você está desempregado, você pode ser cria-

fica nela. É assim que nosso cérebro funciona, criando

tivo e achar uma fonte de renda alternativa. Se você

caminhos neurais que são reforçados com a prática

está desanimado, você pode ser amado e ter muitos

até que você não precise mais pensar para executar

amigos para ajudar a passar por esse momento.

uma determinada tarefa. Quando você começou a dirigir, tinha que pensar

O que é mais fácil mudar? Sua identidade ou um estado atual? O que você vai gravar no seu cérebro?

em cada ação que ia executar, certo? E de repente

Então, talvez faça sentido para você que a partir

você se dá conta que já está dirigindo “no automáti-

de agora não foque mais em ser algo negativo, mas

co”, sem pensar, apenas fazendo. Pois é exatamente

sim positivo. Tome para si o que de melhor você tem,

a construção de caminhos assim no seu cérebro que

as suas características mais fantásticas, as que deixam

você está criando cada vez que repete uma dessas fra-

você com orgulho. Não tem nenhuma? Ora vamos, cla-

ses. A cada repetição fica mais gravado lá dentro da

ro que você tem! Quem sabe você apenas está sendo

sua cabeça que, sim, você é burro, gordo, preguiçoso

pessimista e um pouco míope em relação a você mes-

ou o que quer que seja.

mo. Vamos mudar isso? Você é capaz!

Pois aí vem a minha reflexão para você, sobre a diferença entre ser e estar. Ser burro significa que você nunca conseguiu aprendeu nada e nem vai conseguir aprender. Estar burro significa apenas que nesse momento você não

* Andreine Busnello é Coach e Facilitadora de Aprendizagem


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O que aprendi no tiro com arco Beatriz Akemi Muito mais que um esporte, o Tiro com Arco pode

assim como uma palavra, uma vez dita, não tem volta.

ser considerado uma terapia. Uma terapia sobre rela-

O que torna o tiro perfeito é o resultado de esforço e

xamento, foco, disciplina, postura e autoconhecimen-

dedicação a cada detalhe de uma ação que se iniciou

to. Uma espécie de forma prática e divertida de aplicar

com respirar fundo. Detalhes que, por mais simples ou

os conselhos e lembretes que recebemos, e que por

pequenos que sejam, podem mudar o rumo final da

muitas vezes esquecemos ao longo do dia e, até mes-

flecha.

mo, ao longo da vida.

Pensar de maneira negativa, encarar uma situação

A prática em si é o mais evidente lembrete de como

de forma derrotista, não escolher bem as palavras

se comportar perante um obstáculo. O tiro com arco é

antes de dizer, encolher-se diante de um erro, são os

o esporte que representa com primazia o elo entre um

tipos de detalhes que podem te tirar do rumo quanto

pensamento, uma atitude e uma ação. Assim como na

aos seus objetivos. Em uma competição de Tiro com

vida, devemos pensar de forma positiva sobre os seus

Arco, os arqueiros ficam lado a lado na linha de tiro.

objetivos, sustentar uma postura ideal e executar uma

Em alguns casos, atiram juntos em um mesmo alvo.

ação clara para atingir o alvo.

Mas, apesar de estarem competindo entre si, a compe-

Sabe aqueles momentos conturbados e difíceis,

tição deve ser consigo mesmo.

onde a melhor coisa é parar, respirar e às vezes até

Cada arqueiro deve entender que só é possível ga-

mesmo dar um passo para trás? Não pense que aquela

nhar se der o melhor de si em cada tiro, sem se preo-

sensação de andar para trás é ruim. Veja a flecha: uma

cupar com o público em volta ou com a pontuação do

flecha só pode ser disparada quando puxada para trás,

outro arqueiro – seu foco deve estar em si, sua aten-

para assim poder ser lançada com força suficiente em

ção em seus movimentos e sua consciência em repetir

direção ao alvo.

todos os detalhes anteriores.

Quem nunca ouviu um: “Calma, respira fundo”?

É nesse momento que devemos perceber que se

Pois simples assim, talvez você tenha ouvido o melhor

olharmos muito fixamente lá na frente, podemos nos

conselho para enfrentar situações difíceis. Por mais

esquecer de sermos nós mesmos, ou podemos perder

simples que esse conselho possa parecer respirar fun-

a certeza em nós mesmos, ou se colocarmos mais peso

do envolve relaxar os ombros, oxigenar os músculos e

em etapas ou processos não essenciais, podemos co-

o cérebro, diminuir o ritmo cardíaco, acalmar a mente

locar tudo a perder.

e aumentar o foco – Tudo o que é necessário para atingir um alvo.

Podemos aprender muita coisa observando o tiro de outras pessoas, seus movimentos, seu equipamen-

E se algo der errado durante esse processo? Ten-

to e sua postura, mas em momento algum isso signi-

te novamente. Nunca devemos deixar de tentar. Mas

fica que aquilo dará certo para você. Devemos procu-

tentar não é tão simples como puxar uma flecha em

rar aquilo que nos é confortável e que nos faça sentir

direção ao alvo e largar. Tentar é parar, respirar, admitir

bem. Afinal, cada um deve existir como é.

o erro, analisar, ajustar e planejar uma nova estratégia de ação e aceitar e executar mudanças. Devemos pensar na flecha como uma palavra. E

* Beatriz Akemi é Biomédica e Instrutora de Tiro com Arco


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Texto e contexto Hélio Strassburger

Ao se pensar sobre a essência de uma escritura,

Em cada pessoa existe uma poética que aguarda

logo surgem especulações sobre suas fontes de ins-

seu momento de renascer. Ao resgatar sua circuns-

piração. Quais os subsídios utilizados pela autoria

tância de vida, é possível reagendar sua fonte de uto-

para transgredir ideias na forma escrita. Num esbo-

pias. Um desses lugares onde o sonho e a vida lá fora

ço assim, a cada página é possível entrever um novo

se encontram para transcender impossibilidades.

viés de novidade. Tendo como ponto de partida uma

Nesse sentido, a renovação da linguagem em

vivência singular, algo mais se diz em vocabulário

cada sujeito denuncia um processo único. Com essa

próprio.

lógica de travessia a inspiração, quando não sufoca-

Um texto narrativo indica suas origens através

da, aprecia traduzir seu dicionário de possíveis. Para

das palavras escolhidas para se contar. O discurso

acessar a situação pessoal de onde partiu, o enten-

existencial se descreve ao preencher suas lacunas.

dimento de uma obra pode não bastar, é necessário

Ao conhecer a luz do dia, essas ideias e sensações

compreendê-la em reciprocidade. Seus manuscritos

podem se emancipar de um jeito inédito.

reivindicam uma escuta visionária de seu dialeto.

É possível se reinventar na convivência com uma

A escrita e a leitura, enquanto ritual de autodes-

obra. Sua retórica, ao integrar texto e contexto, apre-

coberta, concede aos envolvidos uma emancipação

senta rotas até então desmerecidas a singularidade.

dos seus horizontes existenciais. A literatura é um

As idas e vindas intelectivas do leitor ao personagem

lugar para se integrar realidade e ficção, com isso

e do personagem ao leitor agregam saber, sabor e

convida a mergulhar numa pluralidade desconhecida

cor. Ao concluir-se uma redação ou uma leitura, pela

de roteiros. Os relatos da singularidade apreciam a

contínua movimentação de seu meio, suas páginas

cumplicidade do leitor para reescrever sua história,

reivindicam novos preenchimentos. Esse conteúdo,

concedendo um significado excepcional a este con-

por seu inacabamento, favorece uma reapresentação

tar. Talvez ler e escrever rime com não morrer.

do mundo. Um sujeito assim constituído, ao reler determinadas páginas, pode avistar um estrangeiro em busca de tradução. A apreensão da escritura pela leitura agrega outros territórios, ampliando o conceito de realidade.

* Hélio Strassburger é Filósofo Clínico


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Conhecer-se para sobreviver Elizabete Borba Avancini

Em um mercado competitivo onde temos tantos

seguras e fidedignas.

desafios para vencer, seja por concorrência ou mera

O Conhecer-se implica em um estudo com plane-

disputa por demanda de oferta de trabalho, fica mais

jamento e acompanhamento. Podemos chamar de PDI

evidente a necessidade das pessoas se conhecerem

(Plano de Desenvolvimento Individual), ou sobre você

e saberem suas reais necessidades tanto de conheci-

e suas reações para desnudar-se em busca de enten-

mento técnico como de autoconhecimento.

dimento sobre suas reações e atitudes nas situações

E aí fica uma pergunta. O que pesa mais hoje nas

mais adversas de sua vida. Através de parte mais pro-

relações pessoais de trabalho é o conhecimento técni-

funda, aquela que você ainda não conhece, mas sabe

co? Ou o autoconhecimento?

da sua existência, ou seja, sabe que está lá no seu in-

Parece simples à primeira vista, porém se formos

consciente.

pensar em alguns anos não muito distantes diriam

Tudo que você tem no consciente você sente, o

os mais talentosos gurus da administração, como por

medo, a dor, o calor, o amor, a saudade, enfim senti-

exemplo Peter Drucker: “As pessoas são contratadas

mentos estão em um nível que você explica com o

por suas habilidades e desligadas por seus compor-

consciente. Porém aquilo que você não conhece sobre

tamentos”. Isso responderia minha pergunta? Sim. E

você está mais interno. Talvez por influência de vivên-

hoje? Hoje mais ainda. As ofertas são muitas e os es-

cias de memórias esquecidas elas podem estar no in-

colhidos estão sendo aqueles que dominam a arte da

consciente. Ainda assim existem ferramentas diversas

boa convivência e do bem viver.

que auxiliam no autoconhecimento, que são podero-

Aliar autoconhecimento ao conhecimento técnico

sas e tão reveladoras de sua personalidade quanto de

é fundamental para mantermos a empregabilidade,

seu perfil ainda adormecido. Os mecanismos utiliza-

porém não esqueçamos que a parte técnica partindo

dos para o autoconhecimento, são pessoais de cada

do pressuposto que somos seres inteligentes e que

indivíduo. São alguns exemplos os processos de Coa-

temos as mesmas oportunidades e condições. Todos

ching, Psicoterapia, Yoga, Meditação etc.

somos capazes de aprender e buscar. Neste caso cabe a nós, interessados, buscarmos boas fontes de aprendizado, cujos conhecimentos técnicos tenham fontes

* Elizabete Borba Avancini é Administradora e Business Coaching


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É preciso prestar atenção em tudo? Márnei Consul

No final de semana passado, estava eu na casa de uma amiga e, para nossa surpresa, pouco havia para o café da manhã. Então, ela pegou tapioca e disse que faria a mesma com ovo. Perguntou se eu comia aquilo. Diante da minha negativa, disse-me que era super fácil e passou a explicar-me. Neste exato momento, eu me desliguei. Isso mesmo, parei de prestar atenção e apenas concordei com a cabeça a cada passo que era dado.

Não estou dizendo que devemos ser alienados do mundo. Mas você já se perguntou: é preciso prestar atenção em tudo? Quando estão a lhe contar uma tragédia horrível, a qual já é passado, o que você poderá fazer a respeito disso? Se seu chefe (ou líder em poucos casos) está esbravejando, e você precisa do emprego, é legal prestar atenção em tudo que é dito, sendo que você não poderá xingá-lo?

Eu gosto de comer, não de cozinhar. Detesto cozinhar. Aliás, não cozinho. Por isso, quando alguém começa a me detalhar como fazer pratos, por mais simples que sejam, eu simplesmente escuto sem gravar nada do que a pessoa fala. Mas por que estou escrevendo essas bobices? Por que estou dando esse exemplo tosco?

Claro, há situações e situações. O que quero dizer é que, quanto mais você conseguir desligar-se de situações ruins, melhor será seu estado de espírito. Trata-se de não absorver tudo que lhe é passado, de ser capaz de filtrar informações e ações, de saber quando ficar ou não ligado, de dar uma trégua ao cérebro que, depois, em casa, deixará ou não você dormir.

Nos dias atuais, as situações que nos levam ao limite são cada vez maiores. Elas ocorrem na família, nos relacionamentos amorosos e de amizade e, principalmente, no trabalho. Às vezes (ou em muitas vezes), é preciso desligar-se. É difícil fazer isso, eu sei. Levei anos para estar apto. No entanto, quando você aprende, é algo fantástico. A pessoa que está incomodando você, enchendo seu saco ou o xingando fica falando, e você consegue apenas balançar a cabeça e desligar-se.

Portanto, já sabem: desliguem-se de vez em quando. Sua paz de espírito agradecerá por isso. A propósito, você se desligou para ler este projeto de texto? Espero que não! * Márnei Consul é Professor e Diretor de Cultura


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O elefante e a corda Jorge Neto

Todos que já foram aos circos antigos, com animais domesticados, ou já viram filmes, ou fotos, se depararam com esta situação, mas não se perguntaram qual o sentido dela. Como é possível que um elefante, de mais de tonelada, esteja preso por uma fina corda que, claramente, pode arrebentar ou ser arrancada da estaca onde está amarrada? A explicação é que, um dia, esse elefante foi um elefantinho. Ele era bonitinho, alegre e curioso. Logo o cuidador ensinou-o a obedecer e ficar preso a corda amarrada em sua pata. Quando pequeno, as amarras o impediam de se locomover para onde queria. Com o tempo ele percebeu que não poderia ir aonde sua vontade, seu desejo e sua curiosidade quisessem. Ele foi deixando de lado esses desejos, até um dia esquecê-los e dar-se conta de que era prisioneiro do cuidador pela corda atada a sua pata. Conforme o elefante cresceu, a corda permaneceu a mesma, mas o poder dela sobre o animal parecia crescer a cada dia. E assim, passou o tempo e ele virou adulto, aprendeu outros truques. Permitiram até que ele cruzasse com uma elefanta. Mas sempre depen-

deu da decisão do cuidador para que soltasse a corda. Da mesma maneira somos nós. Ganhamos várias cordas em nossa pata desde pequenos: regras familiares, pré-conceitos, crenças limitadoras geradas por nós mesmos, regionalismos, nacionalismos e toda ordem de âncoras restritoras. Aprendemos a duras penas (quem não aprendeu, virou o que? Transgressor, insubordinado, animal irracional?) a nos adaptar à corda, negociar com nosso tratador e a praticar os truques para os quais fomos diariamente treinados. Crescemos, nos tornamos adultos responsáveis, independentes, mas sempre presos a uma ridícula cordinha. Por si só, ela não tem força nenhuma para nos prender e restringir nossa liberdade. Mas aprendemos, igual ao elefante enorme e fortíssimo, que uma mísera corda pode nos paralisar, demos muito poder à corda… Assim vivemos, prontos para mais um espetáculo. * Jorge Neto é Psicólogo, Coach e Consultor


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Autossabotagem no trabalho Luciane Guisso, Giulianna Remor e Michele Puel

O que você quer ser quando crescer? Acho que

as experiências pessoais auxiliam na forma como nos

você leva jeito para medicina, como seu pai! Como

relacionamos no trabalho. O chefe pode se tornar a

você é bom em matemática, deve fazer engenharia!

imagem de um dos pais que tivemos mais dificuldade

Acho que não encontrei o trabalho certo ainda! O pro-

de interação na infância. O colega apresenta caracte-

blema é que sempre tem um chefe que resolve atrapa-

rísticas semelhantes de um de nossos irmãos.

lhar meu trabalho, implicando comigo! Tem um colega

Nas relações no trabalho vivenciadas, as experiên-

que faz tudo o que eu faço, ele parece imitar meus

cias já começam distorcidas pelas velhas relações an-

passos!

teriores que foram difíceis e mal resolvidas. As pesso-

Somos confrontados com o mundo do trabalho

as continuam agindo da mesma forma e trazendo para

desde cedo, em função da importância do mesmo em

as relações de trabalho aquela forma de se relacionar

nossa sociedade. Dessa forma desde crianças vamos

em sua vida familiar.

explorando através das brincadeiras e jogos infantis

Sim, levamos nossas experiências pessoais para

por meio da imaginação, o que vamos ser quando

o trabalho! Isso pode gerar tristeza, raiva, medo de

crescermos. Primeiramente imitamos os pais ou pes-

assumir novos desafios, repetições de situações de

soas próximas, já que estes são os exemplos que visu-

trabalho em trabalho. É um sofrimento que parece se

alizamos de trabalho. No entanto, podemos ter sonhos

perpetuar. Trazer à consciência essas repetições e ver

grandiosos, assim como mudar de opinião milhares de

novas formas de elaborar tais questões representa

vezes, até nossa escolha profissional.

uma excelente maneira de perceber e buscar novas

O trabalho pode ser visto como uma maneira de

formas de se relacionar. A psicoterapia auxiliar nesse

ganhar a vida e sobreviver ou uma forma de cresci-

processo de olhar para as histórias pessoais e enten-

mento e realização. Assim, qualquer que seja ele, en-

der as repetições no ambiente de trabalho, proporcio-

quanto escolha da pessoa ou não, esta vai interagir

nado ao sujeito uma compreensão mais saudável de

diretamente ou indiretamente com outros adultos,

sua forma de funcionar no mundo. Acredita-se, desse

sejam eles chefes, colegas de trabalho, clientes. Inde-

modo, que terapia, em muito possa contribuir com as

pendente da capacidade técnica e do prazer no tra-

novas ressignificações das relações pessoais do sujei-

balho, existe a possibilidade de surgirem conflitos no

to, possibilitando ao mesmo um novo olhar e posição

trabalho. Tal fato pode ter estar relacionado ao que

frente aos conflitos relacionais que se apresentam.

aprendemos sobre trabalho e como lidar com os relacionamentos interpessoais. Muitos de nós conhecemos pessoas brilhantes e que não se adaptam a um chefe ou não conseguem se entrosar com a equipe. A essa altura está claro que

* Luciane Guisso, Giulianna Remor e Michele Puel são Psicólogas Clínicas


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Revista de Gestão Pessoal

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Quando mudar é imprescindível Anelise Lopes Muito cedo, numa bela manhã de sol, ao acordar,

via, porém esqueci de uma área muito importante da

ocorreu-me o pensamento: - Como será sua saúde nos

vida - a minha vida que envolvia tudo que não era

próximos 10 anos? E por algum motivo acenderam¬-

trabalho. E tudo isso, aliado a alguns atos cometidos

-se algumas luzinhas internas e comecei a refletir so-

pelos pais e avós (na infância), que não fazem por mal

bre esta questão. Alguns dias se passaram e eu resolvi

(mas acaba prejudicando no futuro) foram se somando

ir a fundo nos questionamentos internos. Foi quando

e o resultado acabou vindo.

comecei realmente a me dar conta de que tudo na mi-

Foram muitas tomadas de consciências e quando

nha vida praticamente dependia de minha saúde, no

isso aconteceu começaram sucessivas “coincidên-

contexto atual de escolhas que havia feito anos an-

cias”. Fui a um médico para ver um sinal que começou

teriores.

a inflamar (cirurgia feita um ano e meio antes) e neste

Sou autônoma, por opção, trabalho no que amo,

dia fui encaminhada para um cirurgião que era espe-

me programo no que posso, mas realmente tinha que

cialista em bariátrica. Achei aquilo muito incrível, pois

mudar algumas coisas e o pensamento que tinha me

eu não havia relatado nada a ninguém e muito menos

dado um alerta naquela manhã fazia todo sentido. Na

para a médica que me direcionou ao especialista.

época eu estava com 109 quilos, com taxa de diabe-

Quando procurei o cirurgião para resolver o pro-

te muito elevada, dores nas articulações, coluna com

blema do sinal, ele fez tudo que precisava em cinco

protusão na lombar, indicação para cirurgia no joelho,

minutos e após começamos a conversar sobre a bariá-

tomando remédios para dor.

trica. Nesta conversa vieram outras constatações que

Neste momento, tomei consciência de que precisava de ajuda e fui buscar sessões de coaching para

me faziam acreditar que eu estava sendo realmente conduzida pela espiritualidade.

entender por que eu havia deixado as coisas chega-

O Universo começou a me mostrar o que a sincro-

rem naquele ponto, já que eu tinha um vasto conheci-

nicidade faz em nossas vidas quando seguimos a in-

mento intelectual e trabalhava diariamente auxiliando

tuição.

pessoas. E durante o processo fui me dando conta do

Foram cinco meses de intenso trabalho e mergulho

que eu havia permitido fazer comigo, ou seja, ques-

no meu Eu. Precisei estar 30 quilos mais gorda para

tões emocionais que eu achava que estavam resol-

me dar conta de tantas coisas que fui deixando passar,

vidas, como ser magoada demais, negligenciar uma

não tendo um olhar mais atento para eu mesma. Em

alimentação mais saudável em função de algo mais

agosto de 2018 foi realizada a cirurgia bariátrica. Foi

rápido e mais prático, não ingerir água o suficiente

incrível, pois a conscientização me fez dizer não para

para hidratar adequadamente o organismo, trabalhar

muitos maus hábitos, não me negligenciar mais.

muitas horas seguidas (em torno de 10 horas), sem me importar muito com lazer, tudo isso estava cobrando seu preço. Ou seja, amava meu trabalho e tudo que o envol-

* Anelise Lopes é Terapeuta, Coaching e Especialista em Gestão de Pessoas


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