Causos de Bichos e de Gentes

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H i s t ó r i a s e Pe r t e n c i m e n t o

Daniela Chindler • Bruna Assis Brasil

Escrito por Daniela Chindler e ilustrado por Bruna Assis Brasil

1ª EDIÇÃO • SINOP - MT • 2017


C539 Chindler, Daniela Causos de bichos e de gentes: histórias do Norte de Mato Grosso / escrito por Daniela Chindler e ilustrado por Bruna Assis Brasil. Rio de Janeiro: Sapoti Projetos Culturais, 2018. 39p. : il.; 21cm. A obra pertence ao projeto: História e Pertencimento. ISBN: 978-85-94449-00-9 1. Literatura infantojuvenil. I. Assis Brasil, Bruna. II. Título. CDD 808.899282


H i s t ó r i a s e Pe r t e n c i m e n t o

Escrito por Daniela Chindler e ilustrado por Bruna Assis Brasil

1ª EDIÇÃO • SINOP - MT • 2017


Onde fica esse tal de meio ambiente? Fica em todo lugar. Em todo lugar onde a gente estiver, existirá um ambiente: uma paisagem, um clima, uma fauna e uma flora, enfim tudo o que nos cerca. E nós vivemos no meio de tudo isso aí. Por isso, nós somos, ao mesmo tempo, consequência e causa do meio ambiente. Até mesmo a palavra que usamos para nos identificar como nação veio da natureza: somos brasileiros porque aqui tinha muito pau-brasil. Aliás, sabia que o nosso país é o único do mundo que tem nome de árvore? Regiões do Brasil também têm seus nomes oriundos da natureza, tanto na língua portuguesa – Mato Grosso, Alta Floresta, Água Boa – quanto nas línguas indígenas: Paraná quer dizer “rio extenso”, Juína é o “rio do gavião” e Itaúba é “árvore de madeira dura como pedra”. O Nortão do Mato Grosso era muito diferente quando chegaram as primeiras famílias, por volta de 1970, que buscavam terras para produzir e uma chance para melhorar de vida. Vinha o pai, encontrava trabalho e trazia a família toda – mulher e filhos. Vinha o namorado, vislumbrava a chance de prosperar e trazia a futura esposa. Vinha um irmão e logo trazia os outros. E assim vieram muitos do Sul, outros do Sudeste e ainda uns tantos do Nordeste. Muitos sabiam plantar, poucos estavam acostumados com a floresta. Achavam que a mata não acabaria nunca, por isso não havia problema em tirar um pouco para aumentar as plantações e pastagens.

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Alguns até achavam que o meio ambiente era um adversário, um inimigo. Onças eram um perigo, os porcos-do-mato comiam o milharal, as antas devoravam a plantação de mandioca, as jararacas entravam nas casas, as chuvas eram intensas, e as distâncias, difíceis de vencer. Essas histórias estão contadas aqui. Mas as coisas mudaram com o tempo: se antes um era paranaense, outro gaúcho, paulista, maranhense… hoje são todos mato-grossenses. Quarenta anos depois, muitas famílias já têm netos nascidos na região e uma identidade comum baseada na memória que liga todos a esse lugar. Vocês já ouviram falar na palavra pertencimento? Significa pertencer a um lugar, fazer parte de um grupo. Nós fazemos parte da paisagem, e ela se altera e se renova em função das nossas necessidades. Que paisagem queremos ao nosso redor? Nossas ações trazem sempre consequências, e já passou o tempo quando se podia achar que a mata, os animais, as plantas, a qualidade do meio, nada disso seria alterado. Muito se perdeu, mas ainda há muito para se preservar, porque dependemos da natureza quando pertencemos a um lugar.

Cadu Young Professor de Economia da UFRJ e pesquisador na área de Economia do Meio Ambiente


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O pai tinha um cavalo que não prestava para nada, vivia descansado, gordo. O bicho era tão preguiçoso que não segurava nem o beiço, ia sempre com a beiçola dependurada. Por isso, a gente lá da casa chamava ele de Dorminhoco. Até os olhos custava a abrir. Um dia, o pai e os vizinhos foram para o mato caçar e pegaram uma onça. Como o bicho era grande e muito pesado, voltaram à fazenda para buscar o Dorminhoco. Puseram no molengão uma cangalha confeccionada em madeira e couro cru, que era para transportar carga pesada. Não era balaio nem lenha que planejavam trazer. A armação que equilibrava a carga, metade para um lado e metade para outro, tinha outro fim.

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Dorminhoco, desavisado, ia meio tropicando de preguiça, meio devagar, desatento de tudo, né? Acontece que cavalo fareja o cheiro de longe. Aí, quando Dorminhoco sentiu o cheiro da bicha, sofreu uma transformação. O beiço, que era largado, pareceu diminuir de tamanho e enrijecer. O cavalo, que era troncho, uuhh, menina, alevantou as orelhas caídas. Veja só, as orelhas ficaram atentas, trocando assim de posição – para frente e para trás –, e os olhos arregalaram. Dorminhoco não queria se aproximar da bicha, os homens tiveram que empurrar, porque o diabo empacou.


Na hora de pôr a onça na cangalha, quem disse que Dorminhoco deixou? Ficou arisco, empinou e começou a bufar e a relinchar. Amarramos ele no tronco, mas de nada adiantou. O danado quebrou o cabresto e vazou no mundo. Fomos achar o dito-cujo muito tempo depois. Sem cangalha, sem nada. Depois que Dorminhoco viu a onça, não quis mais dormir, ficou esperto! Aí, pensa num cavalo que ficou ligeiro! Pois foi esse! Perfume de onça, o remédio que deu jeito no molengão.

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Eram dois Zés, Zequinha e Zé Guilherme, um era corajoso, o outro nem tanto. Os Zés eram parentes e um dia foram para a mata atrás de caça. Zequinha soltou os cachorros veadeiros. Só que, no lugar de veado, aconteceu que os cães cercaram uma onça. Como era uma onça nova, ela correu. A pintada veio na direção do Zé e do Zequinha. O medroso se pôs a tremer, tremia mais que vara verde e não se movia da frente do primo.

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Zequinha dizia para o outro: — Calma, Zé, sai da minha frente, que se eu não atirar, o bicho pega a gente.

E repetia:

Zequinha, imobilizado pelo primo, não conseguiu apontar para canto nenhum. Resultado: a onça passou beirando os dois e, antes de sumir na mata, ainda deu um esturro. Daí Zequinha atirou sem querer para o chão, e o pipoco comeu no pé do ouvido. Zé se mijou todo e, como estava no colo do outro, molhou Zequinha de xixi.

— Calma, Zé, sai da frente.

Mas o Zé Guilherme estava com tanto apavoramento que não se afastava. Então o que estava ruim ficou pior. Zequinha foi armar a cartucheira e o outro Zé pulou no seu pescoço. Aliás, não só fez isso como também trançou as pernas em sua cintura.

A onça foi-se embora, os cachorros voltaram para casa e o Zé proibiu o Zequinha de mencionar essa história. Por isso não contem a ninguém.

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Tinha um homem que trabalhava de operador de trator de esteira, enleirando as matas. Mas a máquina dele era velha e dava muito problema. Era a mangueira de alta pressão que estourava jogando óleo, as marchas encavalando e o radiador que entupia. O tal sujeito não era muito chegado a um banho. Imaginem o mês de agosto, 35 graus, só por Deus para aguentar a poeira subindo, o suor escorrendo e o homem fugindo da água e do sabão. Ele se contentava em passar só um pano no rosto e nos braços. O cheiro de baralho velho ia só acumulando.

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Num certo dia pela manhã, como de costume, lá estava esse homem no pé do eito, na beira do mato, dando uma revisada na máquina. Apertava a tampa do filtro e enrolava umas borrachas nas mangueiras. Alicate, arame e câmara de ar velha de caminhão eram itens certos na sua caixa de ferramentas.

Esse moço, que era operador de máquina de esteira e hoje trabalha como freteiro, alardeia por aí: se eu tomasse banho, a onça tinha me comido! Será que alguém enfrenta a murrinha e divide viagem com ele na mesma cabine do caminhão? Será que alguém aguenta proximidade com o catinguento que nem onça aguentou?

Acontece que, após o mato, onde o homem trabalhava, tinha um rio e depois uma floresta virgem. Lá da floresta veio, sorrateira, uma onça. A bicha atravessou o rio e ficou atrás de uma leira de pau sondando o sujeito, que estava concentrado em seus afazeres. Era ele ali sozinho, sem ninguém para ajudar, agachado de costas para o mato, mexendo na máquina, só ele e Deus. Aperta um parafuso aqui, aperta um outro ali, quando de repente a onça pula em suas costas e o derruba no chão. Era certo seu fim. Os caninos do felino já estavam a caminho de abocanhar o coitado quando a onça farejou seu perfume de gambá. A pintada tentou enfrentar a inhaca do homem, mas não deu conta… E foi-se embora de estômago vazio. 11


Este é o causo de um moço que foi pescar no Teles Pires. Chegando no rio, deu uma boa olhada. Assunta aqui, assunta ali e escolhe a sombra de uma grande figueira na beira do rio, lugar apropriado para pegar uma boa matrinxã. Arma uma tenda cortando umas varas de pindaíba e encaixando na forquilha de um ingazeiro. Uma lona preta passou por cima da vara, puxou e amarrou nas estacas do chão. Pronto, já tinha um teto. Armou o fogareiro, arrumou os apetrechos de pesca e o facão deixou ao lado da rede garimpeira. Tinha consigo tudo que precisava para passar alguns dias.

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Na primeira noite, correu tudo bem; na segunda e na terceira, também, mas na quarta noite sucedeu o que vou contar. O homem se preparava para ir dormir quando tomou um susto. Primeiro ele viu o amarelo dos olhos, depois o corpo robusto da onça. O animal devia pesar mais de 100 quilos! O pescador pensou que sua única saída era a água, já que para correr e chegar ao barco eram mais de trinta, quarenta metros – impossível! Se ele corresse, a pintada agarrava. Vocês sabem, a onça pega o bicho quando o bicho corre. Não tinha condição de ele chegar primeiro que ela.


O pescador passou a noite de prontidão, e a onça só rondando. Quando ela se aproximava um pouco, ele jogava uma coisa e ela se afastava. Aparecia e desaparecia. Ele ficou de pé das dez até quinze para as quatro. Foi nessa hora que apareceu o saruê, aquele gambazinho. Tem gente que chama de micurê. Ele vinha todo dia pegar as sobras de peixe. O saruê é um bichinho abestado e guloso, ele vem de cabeça baixa, não está nem aí se a onça vai comê-lo. Passada mais meia hora, veio uma raposa, um cachorrinho-do-mato. Aí o homem teve certeza de que a onça tinha voltado lá para dentro da floresta. A raposa é diferente do saruê, ela é inteligente, não ia dar bobeira.

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Dorminhoco ficou esperto

Zequinha e José Guilherme

Arisco: animal desconfiado, arredio.

Cachorros veadeiros: cães usados nas caçadas que cercam os veados.

Balaio: cesto grande feito de palha, usado para armazenar ou carregar mantimentos.

Esturro: urro, rugido que a onça faz.

Cangalha: armação de madeira ou de ferro em que se sustenta e equilibra a carga nos animais.

Pipoco comeu no pé do ouvido: barulho de tiro que passou muito perto, de raspão.

Enrijecer: tornar(-se) rijo; endurecer. Relinchar: som que o cavalo faz.

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Fedido ficou vivo Alardeia: que faz alarde, anuncia aos quatro ventos, conta para todo mundo. Catinguento: fedorento; malcheiroso. Enleirando/enleirar lenha: fazer montes organizados para facilitar a carga. Freteiro: aquele que faz transporte de carga, frete. Leira de pau: pequena pilha de madeira. Marchas encavalando: quando duas marchas entram/engrenam ao mesmo tempo, sobrepondo-se uma à outra, e o carro não se move. Trator de esteira: tipo de trator de grande porte que se locomove através de esteiras, usado para trabalhos pesados como derrubada de mata, pois possui grande força.

Cachorrinho-do-mato é garantia Forquilha: utensílio agrícola que possui uma haste de madeira rematada por dois ou mais dentes. Ingazeiro: árvore comum nas margens de rios. Na época em que floresce, exala um cheiro adocicado, seu fruto é uma vagem pequena e grossa que araras, macacos, maritacas, cotias e pacas adoram. Matrinxã: peixe encontrado em água doce e clara, de coloração prateada, corpo alongado e mancha negra na cauda. Muito apreciado na culinária regional. É conhecido como salmão de água doce pela tonalidade avermelhada da sua carne. Pindaíba: espécie de árvore de onde se costuma retirar a vara para pesca. Rede garimpeira: rede muito leve com trama aberta.

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Na gleba Mercedes viviam dois vizinhos: Horácio e Isaías. Seu Horácio tinha uns 60 anos e um Volkswagen, modelo Passat, cor de burro quando foge, caindo aos pedaços, de que queria se desvencilhar. Ele vivia anunciando aquela tranqueira, mas ninguém era trouxa de comprar uma ruína sobre quatro rodas. Acontece que o vizinho Isaías, que tinha nome de profeta, gostava como ele só de fazer rolo. Se não fizesse um negócio por dia, esse homem não sossegava. Foi aí que juntou a fome com a vontade de comer.

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— Vendo por trezentos reais, coisa pouca – anunciou seu Horácio. Isaías espichou os olhos, interessado. Quem o conhecia um pouco sabia que, quando ele se afeiçoava a uma coisa, ficava nervoso lambendo os beiços. Mas achou o preço salgado. Todavia, se a tranqueira era cara em espécie, talvez saísse em conta em uma permuta. Com esse pensamento, Isaías correu para fuçar algo em seus pertences. Garrafa térmica azul de cinco litros, um facão da marca Corneta e uma cavadeira – foi esse o lote que propôs pelo carro. Horácio não achou de todo ruim, porém pediu mais um agrado. Aí Isaías completou o conjunto e pôs a cereja do bolo: uma máquina fotográfica! Uma máquina do tipo rep-rep. A máquina tinha esse apelido porque, depois de bater a foto, era necessário rodar uma manivelinha que fazia o barulho “rep-rep”.


Dizem que foi a Kodak que encantou o coração do seu Horácio. Com a rep-rep e um filme de 24 poses, podia fotografar a família e sua vaca leiteira adquirida com um empréstimo no Banco do Brasil no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar. E na hora devolveu: está feito o negócio! Isaías também ficou bem contente da vida e foi logo passar lá na casa de outros vizinhos para contar a novidade. — Ô Barbosa, comprei o carro do Horácio.

Rapaz, quase que Barbosa dá os pêsames a ele, porque um carro velho daquele não podia ser. Na manhã seguinte, o ferro-velho deu provas de sua inutilidade. Isaías girava a chave, e o diabo nem tossia. Quem sabe não era a bateria? Isaías andou uns quinze quilômetros atrás de bateria, arrumou uma emprestada, tentou dar a partida, mas o carro não pegava de jeito maneira.

Tentou a expertise do Baixinho, amigo eletricista, e nada. Nem com reza brava o veículo se movia do lugar. Foram uns vinte dias, quase um mês, tentando fazer o carro andar sem sucesso. Mas aquilo não podia ficar assim, pelo menos um dia o homem tinha que passear no seu carro novo. Foi assim que, no domingo, Isaías vestiu seu terno e sentou-se ao volante. Na frente do carro, amarrou uma corda que, na outra ponta, estava presa à sela da mula que tinha o nome de Rolinha. E assim, movido à mula, deu uma volta inteira na praça, cumprimentando todos os vizinhos ao volante de seu possante! Depois da volta olímpica, Isaías desmontou o carro e não deu conta de montar de novo. O jeito foi vender algumas peças e largar a carroceria no quintal. Foi assim que o Volkswagen, modelo Passat, virou galinheiro e, no lugar da buzina, tem cacarejo.

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Santo Antônio tem espírito imigrante, nasceu em Lisboa, na capital portuguesa, foi estudar em Coimbra, seguiu para o Marrocos e de lá partiu para a cidade de Pádua, na Itália. Santo Antônio de Lisboa, Santo Antônio de Pádua, Santo Antônio que foi de terras em terras, atravessou o oceano e chegou a Sinop para ser padroeiro da cidade. A primeira missa rezada em Sinop para Santo Antônio foi celebrada no meio da mata, mas logo se ergueu uma igreja de madeira para acomodar o santo no altar e abrigar os fiéis. Em Sinop era tudo estrada de chão, de terra batida. Um sábado, Mari se arrumou cedo, pois frequentava a missa das crianças às nove da manhã, e vestiu uma roupa clara, que não

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ficaria nesse tom por muito tempo. A cinco passos de casa, passou um carro que jogou lama de cima a baixo em seu vestido de missa. A menina teve que voltar para casa e trocar de roupa. E essa foi só a primeira vez que o caminho de barro atrapalhou uma reza sua. Na primeira comunhão, a mãe costurou um lindo vestido branco, com flores bordadas à máquina, que, dessa vez, chegou imaculado à igreja. Mas as chuvas e a lama impediram a mãe de assistir à primeira eucaristia da menina. A mãe cuidava de um irmão com catapora e estava distante 12 quilômetros da igreja, onde com o atoleiro só se passava de trator. Mari não ficou magoada com o santo e, muitos anos depois, pinta os painéis da terceira igreja em homenagem a ele.


A devoção a Santo Antônio é uma das mais importantes do mundo luso-brasileiro. Era comum as pessoas vestirem os seus santos, adorná-los com joias e tratá-los como seres vivos. Isso explica a tradição casamenteira de Santo Antônio e todas as crendices envolvidas para que ele traga um marido. Imaginem, tem moças solteiras que, querendo casar, adquirem uma pequena imagem do santo e tiram o Menino Jesus do seu colo, ameaçando só devolvê-lo quando encontrarem o amor verdadeiro. Outras dão um gelo no santo e falam para a imagem que, enquanto ela não arrumar um namorado, ficará na geladeira. E que, se demorar, irá para o congelador. E há até as que viram a imagem do santo de ponta-cabeça dentro de um copo d'água, dizendo que só o colocarão de pé, novamente, quando arranjarem um amor.

Conhecida é a lenda da moça desiludida que jogou a imagem do santo pela janela e acertou em cheio na cabeça do moço que a desposaria. E tem as moças que não ameaçam o santo e apenas oram: “Santo Antônio, pequenino amansador de burro bravo, amansai (Fulano) para mim e faça com que ele me venha procurar e pedir-me desculpas pelo que me fez e me peça para voltar a ser meu namorado. Que assim seja e assim será”.

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Pensem em um cavalo velhaco! Mas o desse causo era mais. O Preguiceiro era esperto para danar e o dono dele sofria. Seu Josimar ia cedinho no pasto buscá-lo e o malandro, não querendo fazer força, fugia para o mato. O velhaco se escondia no meio das árvores e ainda usava estratégia para que o dono não conseguisse seguir seu rastro. Era tão danado que entrava lá por trás das moitas de ré, daí quem olhava as pegadas achava que o velhaco tinha vindo, mas ele estava indo embora.

Um dia, cansado das estripulias do Preguiceiro, seu Josimar prendeu um cincerro no pescoço dele. Agora ele queria ver se o danado conseguia escapar. Acontece que o cavalo era persistente na sua vontade de ficar à toa. Imaginem que, escondido à sombra das castanheiras, Preguiceiro começou a sentir as mutucas o picarem. Se ele balançasse a cabeça para tentar se livrar das mordidas, o sinete ia chacoalhar e Josimar o encontrava na hora. Então Preguiceiro ficava assoprando assim, fuu, fuu, fuu para mode tentar expulsar as moscas. Afinal, esse cavalo era velhaco, né?

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Benedito era arroz de festa. Não importava a comemoração – aniversário, noivado, baileco, final de campeonato de futebol, bingo, churrasco de domingo, forrobodó –, ele queria fazer parte da confraternização. Benedito gostava tanto de festa que, se estivessem mais de quatro pessoas reunidas, a gente sabia que ele estava junto. Era festeiro o sujeito. E achava convite uma coisa desnecessária. Ele ia de bicão mesmo e ainda levava um ou dois amigos a tiracolo. O negócio era ir entrando com uma bebida debaixo do braço, aí enturmava com os convidados e pronto: estava em casa. Garrava amizade em 3, 2, 1. Benê, como os amigos o chamavam, tinha um colega – o Juarez – que trabalhava no Cine-Teatro Amazonas. Nesse cinema, que ficava na Avenida dos Mognos, passava um tanto de

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filmes de faroeste, e uma vez King Kong ficou em cartaz um tempão. As moças adoravam as comédias de Mazzaropi no papel de um divertido capiau. Eram “O Jeca e a égua milagrosa”, ”Jeca contra o capeta”, “O noivo da girafa” e “No paraíso das solteironas”. Quando chovia, a sala inundava e ninguém podia sentar na primeira fila, pois os pés ficavam dentro d´água. Foi no Cine-Teatro que Juarez encontrou uma relíquia. Esquecida em um baú, estava uma coleção de discos de vinil. Benê teve a ideia de levar os discos mais dançantes, como os do Gaúcho da Fronteira, Fuscão Preto e Trio Parada Dura, para tocar nas festas. Por conta dessa grande descoberta, Benedito mudou a estratégia de ingresso. Agora era mais em conta para o bolso do grupo, nem era preciso despender dinheiro. Benê, Juarez e outros amigos saíam


à noite no Fusca procurando movimento. Aí, quando viam as pessoas aglomeradas em frente às casas, estacionavam o possante e entravam com os discos na mão. Normalmente, o dono da casa ficava contente da vida porque o grupo animava o bailão.

A viúva, pega de surpresa, cantarolou “Como é grande o meu amor por você”, e uma filha ofereceu um lencinho para ela enxugar a lágrima que rolou. Daí Benê disfarçou e saiu com os amigos de fininho, não sem antes provar um pãozinho de milho quentinho que estavam oferecendo.

Mas aconteceu de uma noite o grupo passar na frente de uma casa onde estava estacionado um monte de carros. Aí Benedito pensou com seus botões: é hoje que a noite vai ser boa! Animado, saltou do Fusca. Nessa ocasião estavam, além do Juarez, o Almir da farmácia e o Valdo, irmão dele. Juarez ia com sua coleção de discos. O grupo entrou porta adentro confiante, mas aí deram de cara com um defunto com algodão nas narinas, deitado em cima da mesa. Ops! Os familiares se aproximaram do grupo, curiosos, e um jovem perguntou dos discos. Aí Benê, para sair dessa saia justa, respondeu: — Ô rapaz, tô vendendo os discos. Deixa eu ver aqui, o falecido era fã de Roberto Carlos?

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As primeiras famílias que vieram do Sul para o Nortão enfrentaram muita estrada de terra: o asfalto terminava em Cuiabá, e até Sinop havia mais quinhentos quilômetros de carro sacolejando. Um dia inteirinho de viagem. A família do Ireneu veio de Curitiba, passou por Ponta Grossa, Ourinhos, Campo Grande e Cuiabá. Era muito chão para andar. A viagem toda durou mais de dois dias. Numa Kombi branca, vieram quatro adultos e três crianças e, na Serra do Caixa Quebrada, um novo integrante foi agregado ao grupo, um filhote de veado. Um caboclo ofereceu na estrada o veadinho, que veio de colo em colo. Quando chegaram era uma demarcação de terra, um mundão a perder de vista. Chamava-se Gleba Celeste, não porque fosse o céu na terra, mas porque estava à beira do rio assim

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batizado. A família encontrou uma cidade que se limitava a três ruas, casas de madeira, uma igreja e uma escola. Luz só do sol, da lua cheia e dos lampiões a gás ou querosene, igual lá no Sul, onde Ireneu tinha nascido. Ireneu devia ter lá seus cinco ou seis anos quando o pai, Ervino, contou de uma tal de energia elétrica que iria substituir o lampião de querosene. — Essa luz vai vir por fios, trazida de outra cidade – o pai explicava.

Os meninos pensavam se seriam esses fios furados com pequenos pontinhos para a luz poder passar. A mãe estava receosa porque tinham anunciado que seria uma luz muito clara, pavorosa.


— E se essa luz elétrica cegar a gente?

Finalmente, em um cair de tarde, o pai levou a criançada até a Vila de Itapiranga para ver a novidade. Logo ia escurecer. Mas foi a maior decepção: estava lá o poste de madeira com uma lampadazinha vermelhinha, uma luz pouca e um monte de besouros voando em volta.

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Este é o causo de um homem que gostava de caçar. Ele chegava a passar pimenta-malagueta no cano das espingardas para “envenenar” as armas e deixá-las com a mira certeira. O homem não tinha dó nem remorso.

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Era hábito desse caçador dormir acampado nas árvores em poleiros de seis, sete metros de altura, bem longe do chão. Amarrava uma rede lá no alto e pegava no sono. Não sei como não se distraía e tombava lá de cima. Dormia afastado do chão para não ser ele caçado pelo bicho que queria caçar. Mas tem bichos que sobem ou deslizam pelos troncos. Certa feita, era madrugada, o homem estava cochilando quando pressentiu alguma coisa, abriu os olhos e viu a tempo, deslizando silenciosamente em sua direção, um jararacão-do-brejo. Dessa ele escapou, mas foi por pouco. E se ele escapou, um cateto e duas pobres queixadas não tiveram a mesma sorte.

apesar dos seus 250 quilos, que o caçador achou que era uma paquinha e só soube que animal era quando a iluminou com a lanterna.

É raro, mas às vezes os corações mais endurecidos podem amaciar. E foi assim que se passou. Contam que era meia-noite e esse homem estava de tocaia no poleiro mais baixo, espreitando. Dali a pouco, ele ouviu um barulho, era um bicho que vinha pisando devagarinho: uma anta. A bichinha vinha pisando tão macio,

— Eu não podia matar a anta! Ela come as

A anta, inocente, ficou olhando para o caçador, paralisada, porque a luz embaralhou sua visão. O caçador pôs o dedo no gatilho e não teve coragem. Rapaz, a bichinha era a coisa mais linda do mundo! Aí o caçador pensou no filhote da anta, que é ainda mais lindo, todo listradinho, parecido com uma melancia marrom e branca, e baixou a arma. A anta seguiu o caminho dela atrás das frutas do seu jantar. Ao voltar para casa, o caçador confessou:

frutas, e as sementes saem nas suas fezes, já adubadas, prontas para germinar. A anta é a jardineirinha da floresta!

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Santo Antônio, amarrai quem de mim foge tanto! Amansai: deixar manso.

Motor de uma mula Cacarejo: som que a galinha faz. Cereja do bolo: o detalhe final.

Crendice: coisas em que o povo acredita, como simpatias e superstições. Dar um gelo: ignorar. Devoção: adoração ou culto a Deus ou aos santos. Ergueu: construiu.

Desvencilhar: desfazer-se, livrar-se de algo. Expertise: conhecimento que se adquire pelo estudo, pela experiência e pela prática. Profeta: pessoa que recebe mensagens, profecias e revelações de Deus. Reza brava: uma oração forte, feita como último recurso. Tranqueira: objeto inútil e normalmente velho.

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Cavalo que andava de ré Cincerro: chocalho ou sineta colocado no pescoço do animal através de uma coleira. Estripulia: travessura; molecagem. Mutuca: tipo de mosca grande que costuma picar pessoas e animais.


Bota Roberto na vitrola Arroz de festa: pessoa que está presente em todas as ocasiões. Bicão: penetra, pessoa que não foi convidada. Garrava amizade: fazia amizade facilmente. Possante: [gíria] carro. Saia justa: situação complicada.

Vai ser uma luz pavorosa Demarcação de terra: área ou terreno que tem os limites marcados com balizas, cal, estacas etc.

Jardineirinha da floresta Cateto: porco-do-mato selvagem de pequeno porte. Jararacão-do-brejo: serpente peçonhenta. Paquinha: grilo-toupeira. Poleiro: lugar na árvore onde o caçador dorme como passarinho. Queixada: porco selvagem de médio porte que anda em grandes bandos. Quando se sente acuado, bate os dentes fazendo um estralo ameaçador. Tocaia: ação de alguém se ocultar para caçar.

Receosa: pessoa com medo, receio, temor. Sacolejando: sacudindo.

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Existem coisas que podem arrepiar. Dona Cleonice vivia à beira de um riacho, em uma casinha perto da mata. Uma noite estavam só ela e Deus em casa, quando aconteceu o que vou contar. Dona Cleonice tinha jantado macarrão, tomado um gole de café meio frio, que tinha sido coado no final da tarde, e lavado a panela. Como fazia sempre, apagou o lampião para não

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gastar querosene. Já estava deitada na cama quando Genivaldo, o papagaio, espantou-se. O louro não era de acordar no meio da noite, isso não era comum. Alguma coisa fez arrepiar a espinha de Dona Cleonice. Logo nessa noite o marido tinha que estar viajando com o filho… O melhor era dar uma olhada. Recostada na cama, ela pegou a caixa de fósforos, riscou um palito e acendeu a vela que ficava na mesinha de cabeceira ao lado da Bíblia. A chama azulada iluminou o cômodo e Dona Cleonice viu, então, ali perto da mesa, um vulto escuro deslizando sobre o chão e entrando embaixo do sofá.


Ela não sabe se foi coragem ou curiosidade que a fez chegar perto para espiar o que estava ali escondido. Segurando o pequeno castiçal, aproximou a vela. Foi aí que viu bem o corpo de tonalidade amarronzada que devia ter lá seu metro e meio de comprimento ou mais. Era um jararacão! Dona Cleonice sabia que as jararacas vivem perto de locais úmidos, como a beirada de córregos. Eles que tinham invadido o território dela e construído a casa encostada à margem do rio, mas a comprida tinha que ter ido se esconder da chuva que caía lá fora se enfiando debaixo do seu sofá justo quando ela se via ali sozinha?! O bicho tinha enrolado o corpo para dormir. Mas só um ser ia fechar os olhos naquela noite. O papagaio Genivaldo e Dona Cleonice iriam passar as próximas horas em claro, isso era certo. O jararacão-do-brejo é um dos bichos mais peçonhentos que existem. Outro

dia mesmo, um agricultor não viu um desses escondido no vão da escada, e o pobre deixou viúva na cidade. Dona Cleonice amanheceu o dia de pé na cama, com os olhos estatelados mirando o esconderijo da bicha. Foi só quando o céu já estava todo claro que teve coragem de sair porta afora e pedir ajuda aos vizinhos que moravam mais adiante. Juntos, tiraram duas tábuas da parede para alcançar a venenosa por trás. Não foi preciso arrastar o sofá, o que teria bulido com o animal – o importante era pegá-lo desprevenido. E lá estava o jararacão imóvel, enrolado como uma linguiça. Com uma pá, cataram a cobra, e o louro assobiou de alívio. Dona Cleonice diz que eles soltaram o jararacão lá longe e o bichão ganhou o mundo. Foi o que ela me contou.

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Às vezes o perigo pode estar logo ali ao lado – é o que dizia seu Manoel lá da venda. Viver requer atenção. Pois num dia claro de sol, sem uma nuvenzinha no céu, quatro rapazes saíram para limpar um terreno onde iam, depois, plantar mandioca. Lá pelas tantas, um deles, o Oseias, foi buscar água. Acontece que o moço não deu sorte: ali, na beirada do rio, estava uma sucuri aguardando uma presa. O distraído não viu a cobra e, quando ele passou rente a ela, a feroz enrolou em suas pernas. Esse rapaz, o Oseias, começou a se debater para a perigosa não lhe envolver os braços. O intuito da bichona era levá-lo para o rio, as sucuris são danadas de ágeis na água. Por sorte, ele segurou em uma raiz e conseguiu evitar o pior.

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Oseias pôs-se a gritar a todo pulmão, pedindo socorro. Ele tinha um vozeirão que se ouvia longe, e foi isso que o salvou. Todavia demorou um tanto para alguém vir acudir, pois os companheiros usavam motosserras para limpar o terreno e a barulheira era ensurdecedora. Mas, como Deus é tão maravilhoso, no instante em que o pobre, já exausto, implorou “Alguém me salve, alguém me ajude”, justamente nessa hora, os amigos tinham desligado as máquinas para lanchar e ouviram as palavras do desesperado. Não tardou para que viessem prestar auxílio. Quem ouviu essa história jura que a sucuri estava mordendo os braços do coitado para que ele soltasse da raiz. Esse moço viu a morte nos olhos!


Um dos amigos, que tinha trazido um facão, cortou a cobra ao meio. A sucuri tem essa capacidade impressionante de esmagar as presas, ela abraça com muita força até partir os ossos da vítima. O corpo da comprida, que estava enroscado nas pernas do moço, ainda ficou ali se mexendo por mais um tempo, apertando o pobre que saiu da aventura com uns ossos da perna direita quebrados. Se a cobra tivesse enrolado mais para cima no corpo do Oseias, era certeza que ele teria morrido asfixiado. Só que Deus é tão maravilhoso que isso não aconteceu. E não foi dessa vez que Oseias abotoou o paletó de madeira. Isso é real, não é inventado. Talvez contado com um pouco de exagero, mas assim são as histórias.

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Jararacão-do-brejo

Isso é real, não é inventado

Bulido: agitado, mexido.

Abotoou o paletó de madeira: expressão usada para falar que alguém morreu.

Castiçal: utensílio onde se coloca vela de iluminação. Asfixiado: sufocado. Peçonhento: venenoso, que contém peçonha, substância venenosa. Serpenteando: mover-se como as serpentes, fazendo curvas.

Motosserra: serra elétrica, usada para cortar árvores. Sucuri: serpente da América do Sul.

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Moravam todos na casa da baba, que é como chamam a avó em russo. Naquele tempo era comum velar os falecidos em casa, muitas vezes o caixão ficava em cima da mesa da janta, que era comprida. A menina tinha lá uns 6 anos quando viu seu primeiro morto. Ele, o tio, estava vestido com seu terno de listras marrons, o corpo hirto no caixão. Ao lado da cabeça do morto, duas velas queimavam lentamente. Uma curiosidade meio mórbida faz com que ela se aproxime, passe a mão na madeira lisinha do caixão e balance uma das alças douradas. Uma janela aberta deixa entrar uma brisa que anuncia as chuvas de novembro. No ar, o perfume adocicado das flores no vaso dá um pouco de enjoo. Na ponta dos pés, a menina olha com atenção o cadáver: a meia puída, as unhas das mãos cortadas rentes ao sabugo e o rosto do tio. Daí ela fixa a atenção nas

sobrancelhas grandonas, peludas, e de repente a sobrancelha esquerda começa a levantar. Ai, Senhor! Assombrada, a menina sai correndo e tromba com o pai, que estava no batente da porta, aguardando os familiares e vizinhos chegarem para o velório: o morto se mexia! À noite a menina não pregou os olhos. Só no dia seguinte, a mãe explicou que era o danado do vento fazendo a chama das velas dançar que fazia parecer que as sobrancelhas mexiam. — Filha, pode ficar descansada. Depois que um vai para a terra dos pés juntos, não se aventura mais a levantar sobrancelha ou piscar.

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Esta é a história de um caminhoneiro que só viajava depois que o sol se punha. Não sei bem o que ele tinha a esconder, só sei que era assim. Dormia de dia e saía por aí à noite, igualzinho a morcego e coruja. Dizem que ele roubava madeira, isso não posso comprovar. O que todo mundo sabia é que o homem inventava histórias que eram difíceis de acreditar. Pois ele nos contou que uma noite estava com o Fenemê carregado subindo um morro. Quando já ia chegar ao ponto mais alto, o motorista só escutou o barulhão do diferencial, que é o eixo de tração traseira, estourando – powww –, meu Deus do céu, ele pisa o freio e nada! Perigo na certa. E o Fenemê, ui, começa a voltar de ré. Imaginem a situação, noite escura, breu mesmo, ladeira, e o motorista tentando conduzir só espiando pelo retrovisor. O caminhão vai

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tomando velocidade conforme desce e, para piorar, no final da ladeira tinha uma curva muito fechada, uns noventa graus, complicada de fazer de ré. O caminhoneiro não dá conta de fazer a curva e passa reto. Resultado: com o impulso do barranco e o embalo da descida, o caminhão vai parar em cima da copa de uma árvore. O homem era acomodado e pensou: “Amanhã eu resolvo esse negócio. Chamo o trator para puxar o caminhão. Para que esquentar a cabeça?” Então se acomodou, pôs os pés no painel do caminhão, cruzou as mãos por trás da cabeça e dormiu.


Cinco horas da manhã, um galo cantou longe e o moço acordou. Abriu a porta do caminhão e, no que foi botar o pé para fora, cadê o chão? Imaginem, o caminhão estava em cima de um pé de cajueiro, dava uns trinta metros de altura. Vejam só o tamanho da mentira do linguarudo! Eita misericórdia! 45


Quando Benedita chegou por essas bandas, eram só umas tantas famílias e a natureza. Onça, sucuri, mata fechada, tudo muito diferente da São Paulo que conhecia. Do interior paulista, veio a família toda. O pai, seu Adailson, construiu primeiro uma casinha. Era um homem muito trabalhador, em três anos já tinham um sítio com 28 mil pés de café e um terreirão para secar as sementes. Logo que pôde, o pai deu conforto para os seus, construiu uma casa maior e ergueu no quintal uma pequena capela onde a família ia rezar todo fim de tarde. No pequeno altar, dois santos soberanos: Santo Antônio e São José.

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Naquela época, as chuvas que davam aqui no Mato Grosso eram violentas, uma quantidade de trovões e relâmpagos, vixe, Nossa Senhora! Chovia oito dias seguidos, aí dava uma breve estiada e chovia mais um tanto de dias. Era comum ficar um mês caindo muita água do céu. Teve um ano que choveu trinta dias sem parar, parecia o dilúvio. Esse acontecido que vou contar se deu no cair da tarde do dia 2 de novembro, justo em Finados. Benedita e a irmã, Maria Leocádia, estavam dentro da capela rezando. Lá fora uma tromba


d´água se anunciava. Redemoinhos se formavam no chão de terra, a folhagem chacoalhava naquele chiiii, e o bambuzal estalava. Era certo que uma chuva grossa não tardava a descer. De repente, um raio caiu muito próximo à capela e o barulho do trovão foi ensurdecedor. As irmãs se tremeram todas e foram buscar os santos para se proteger.

tempestade e veio o medo do castigo. De olhos arregalados, as duas cataram rápido as partes quebradas e resolveram arrumar os santos no altar, disfarçando a arte. Mas eram muito tontas essas duas, distraídas, colocaram, imaginem, o corpo de São José com a cabeça de Santo Antônio e Santo Antônio com a cabeça de São José. E depois vazaram da capela.

No corre-corre, Benedita catou o São José e Maria Leocádia se abraçou a Santo Antônio. Caiu outro raio que iluminou brevemente o altar da capelinha, tempo suficiente para Maria ver que segurava Santo Antônio.

No dia seguinte, quem primeiro reparou na confusão foi o pai, que já gritou:

— Benedita do céu, destroca rápido, o seu

Não aparecia quem era o autor da artimanha. As meninas só se olhavam, sem coragem de confessar. A mãe sabia muito bem quem estava na capela na hora da tempestade, mas nunca disse nada ao pai. Ela só voltou as cabeças ao corpo certo e colou. E os santos ficaram lá remendadinhos, quietinhos, guardando esse segredo.

namorado é o Antônio, você tem que pegar o Santo Antônio.

Só que nesse troca-troca as meninas não foram cuidadosas e bateram um santo no outro. As cabeças dos santinhos rolaram no chão. Deus misericordioso! Na hora passou o medo da

— Que marmota é essa? Mulher, vem aqui ver uma coisa. Quem é que fez isso?

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O morto que se mexia Hirto: imóvel, parado, duro. Mórbida: que tem ligação com morte ou doença. Sabugo: parte da cabeça do dedo onde a unha se encrava e adere. Terra dos pés juntos: expressão usada para falar sobre a morte.

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Caminhão de mentiroso Fenemê: marca de um antigo caminhão, sigla popular da antiga Fábrica Nacional de Motores (FNM).


Cabeças trocadas Artimanha: traquinagem, travessura. Dilúvio: inundação de grandes proporções. Estiada: parada temporária da chuva. Terreirão: área, quintal, pátio.

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Era um dia sem sorte; se seu Armir soubesse que seria assim, não teria arrumado a boroca. Também não saberia explicar por que resolveu pescar sozinho, coisa que não costumava fazer. A princípio, a falta de sorte não o preocupou. Chegando no Teles Pires, para cima da boca do rio Preto, embaixo da sombra de uma seringueira, ele armou o anzol e ficou esperando. Aí a trairão veio. Lindona! Armir ergueu o anzol, puxando o peixe para fora d´água, e imaginou os filezinhos, longuinhos assim, que a esposa iria fritar. Mas o homem nem teve tempo de sonhar direito, e a danada da traíra já tinha se debatido e caído de volta no rio. Devia ter uns dez quilos o trairão que Armir ia fisgar naquele dia e escapou. Assim é, pensou ele, resignado: o homem põe e Deus dispõe.

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O que seu Armir não sabia é que o azar anda acompanhado. Armava tempestade, e o pescador resolveu voltar. Só que o pé de vento virou vendaval e seu Armir foi jogado para fora da embarcação. E a coisa só piorava. Mergulhado na água, a marola o cobria e a correnteza o afastava. Custou um bocado para alcançar Minha Linda, a canoa de alumínio. E custou mais ainda para tirar o corpo d´água. Quem disse que conseguia? Suas forças tinham se esgotado. Foi mais de uma hora nessa aflição e, quando finalmente se atirou para dentro do barco, precisou de mais quinze minutos para recuperar o fôlego e botar o motor para funcionar.


Agora o plano era voltar para o acampamento onde estavam os irmãos e o cunhado. Era mesmo um dia sem sorte, e urubu que está de azar, não há pau que o escore. A tempestade apertou e criou um redemoinho que fez o bote rodar por uns quatro quilômetros. Ele rezava e pensava na família em casa, não queria morrer sozinho. Seu Armir já teve dias melhores, mas também não foi de todo ruim. No fim e ao cabo, Minha Linda foi forte e seu Armir conseguiu voltar, senão nem ia ter essa história para contar.

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Quando Chico saía para o rio, levava só farinha de puba, sal e óleo. Os peixes completavam o cardápio. Certa feita, ele foi pescar lá na barra do rio Verde, afluente do Teles Pires. Naquele ponto costumava ser bom demais de pegar peixe. Uma vez pescou naquelas águas uma traíra tão grande que, ao limpá-la, encontrou outros dois peixes na barriga dela. Sorte demais: três em um. Mas dessa vez, rapaz, ele pôs o barco na água e, vixe, não pegava nada. Nem beliscava. Como era possível terem sumido todos os peixes? Chico gastou mais de quatro horas dando banho em isca sem que nenhum peixe tivesse fisgado o anzol. Fazer o quê? Chico voltou conformado para o acampamento.

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Naquela noite, o estômago ia reclamar do pouco de comer, cardápio fraco. Temperou um caldo como se fosse cozinhar o peixe, mas peixe não tinha, e o tomou assim mesmo, aguado, acompanhado só de farinha. No dia seguinte bem cedinho, Chico pegou o barco e desceu o Teles Pires até a entrada do lago Boca Larga. Próximo a uma árvore que servia de dormitório a um bando de garças-vaqueiras, desligou o motor e começou a pescar. De repente a sorte acenou e danou a aparecer peixe. Chico ia jogando grãos de soja, e os peixes, gulosos,

iam se amontoando ao redor da canoa com as boquinhas abertas. Chegou um tanto de peixe que só vendo, era quase uma chuva de pacu. Chico pegou na base de uns 150 quilos de pacu em trinta minutos. Não dava para acreditar. Quando descansou o anzol de lado e olhou, o fundo da canoa estava coalhado de peixe. Mas a felicidade durou nada: quando Chico foi prestar atenção nos peixes, era quase tudo pacu-borracha, uma porcaria de peixe, que quando a gente assa, a carne fica dura, parecendo pneu. Nem se cozinhar aquilo lá amolece. Pensem só na tristeza. Aí Chico teve que soltar os pacus-borrachas de volta na água e tornou à casa com saldo pouco: duas matrinxãs e um pintado – não deu nem para fazer peso no isopor.

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Pacu-borracha Pescador em maus lençóis Boroca: tipo de bolsa. Seringueira: árvore-da-borracha.

Farinha de puba: farinha extraída da mandioca fermentada. Garças-vaqueiras: garças campestres que se alimentam de insetos, peixes e sapos. Pacu: espécie de peixe redondo de água doce, comum em florestas tropicais, alimenta-se essencialmente de frutos e insetos. Prato típico da culinária mato-grossense é a costelinha de pacu frita. Resignado: que suporta um mal sem se revoltar; conformado. Traíra: peixe que vive e se reproduz habitualmente em lagos.

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Conta-se que havia um fazendeiro muito afortunado, Terêncio, que possuía hectares de terra a perder de vista. Terêncio era um bom patrão e tinha empregados fiéis, mas seus melhores animais ele só deixava aos cuidados do vaqueiro Firmino, homem de sua maior confiança.

— Pois vamos! – concordou Terêncio. – Confio de olhos vendados no meu vaqueiro. Se ele for capaz de mentir, eu perco essa disputa e ofereço como pagamento vinte bois reprodutores, trinta vacas leiteiras e cem sacas de milho. E se você for vencido nessa sua desconfiança, paga pela calúnia um

Certa feita, numa roda de amigos, o fazendeiro estava exaltando as qualidades de Firmino, que tinha fama de nunca ter mentido na vida, quando outro fazendeiro um tanto invejoso lhe propôs uma aposta. — Para safar a pele, todo mundo disfarça a verdade. Apostemos como Firmino também pode mentir.

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churrasco para trezentas pessoas, que vão comemorar as virtudes de Firmino.

O fazendeiro invejoso apertou a mão de Terêncio, já com um plano na cabeça. Por dinheiro Firmino não fraquejava, com ameaça, muito menos, mas por amor, quem sabe? O que não fazemos pelo amor de uma mulher?


Firmino era um vaqueiro querido, pintoso, mas muito tímido. Não eram poucas as moças que suspiravam por ele, mas nenhuma tivera até então a coragem de se declarar. O fazendeiro sabia que Rosa, a moça da venda, era uma delas. Então foi até ela e contou que o vaqueiro queria pedi-la em namoro, mas lhe faltava coragem. Caberia a ela tomar a dianteira. E ensinou a moça o que fazer.

— Como vai, Rosa? Tive um sonho e não

No dia seguinte Rosa, com flor no cabelo e vestido arrumado, sentou-se na porteira. Quando Firmino foi passando, tangendo uma boiada, ela sorriu, daí começaram a conversar e, para o namoro e o casório, foi um pulo. Passaram-se alguns meses, e Rosa engravidou. Nessa hora o fazendeiro invejoso pôs em prática a segunda parte do seu plano. Esperou o vaqueiro sair para trabalhar e visitou a moça.

— Vixe, Nossa Senhora! Nada de ruim pode

podia deixar de vir contar. Sonhei que seu filho nascia forte e parrudo porque você tinha comido o fígado do boi Garboso. E tenho para mim que, se você não cumprir o que foi previsto no sonho, alguma coisa de ruim pode acontecer ao menino.

A moça, muito crédula, assuntou.

acontecer ao nosso bebezinho. Hoje mesmo já peço o fígado desse boi ao meu marido. — Faça isso, mas não diga que fui eu quem sonhou, ou ele pode não acreditar. Melhor você dizer que o sonho é seu.

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Quando Firmino chegou em casa e Rosa lhe pediu o fígado do boi Garboso, que era justo o xodó do patrão, o vaqueiro assustou-se.

— Não me diga uma coisa dessa, compadre,

— Esse é o boi de estimação. Escolha outra

Firmino sabia que precisava contar o ocorrido ao patrão, mas cadê coragem? Com os pensamentos que não se aquietavam, pôs o chapéu na cabeça, montou o cavalo e galopou em direção à casa de Seu Terêncio.

rês que eu mato, menos esse, que é a fulô do patrão Terêncio.

Mas de nada adiantaram os argumentos do marido, desejo de mulher grávida é sagrado. Rosa insistiu: — Desculpa, luz da minha vida, mas preciso comer o fígado desse boi assadinho, não serve de outro.

Firmino não teve como ignorar o pedido da esposa. Notícia ruim corre rápido. Nem duas horas depois, o fazendeiro Terêncio já sabia o que havia se passado, um compadre foi à fazenda lhe contar.

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que é uma desgraça! Mas eu lhe afianço uma coisa: se Firmino matou, ele não nega!


Que diria ele do sucedido? Era melhor preparar a conversa. Deu de rédeas, galopou um tanto e ensaiou:

— Boa tarde, Seu Terêncio. — Como vai, Firmino? — Eu vou bem, com a graça do Senhor. — E as vacas?

— Chego e digo assim: Boas patrão. E ele:

— Umas magras e outras gordas!

Como vai, Firmino? E eu: Vou bem, com a graça

— E o boi Garboso?

do Senhor. E ele: E as vacas? Eu: Umas gordas e outras magras. Ele: E meu boi Garboso? E eu: Tenho notícia triste, o boi Garboso caiu na ribanceira e quebrou o pescoço.

Nessa hora Firmino contou toda a história tal qual ela tinha se dado. Disse só a verdade. E o patrão, satisfeito com a virtude do empregado, perdoou-o anunciando:

Firmino inventava, e ele mesmo se punia: — Isso não são palavras do vaqueiro Firmino. Não estou a contar a verdade. — E se digo que o boi se afogou no açude e só consegui salvar o couro? Essas também não são palavras do vaqueiro Firmino.

O tempo gasto no trajeto o fez encontrar o que dizer. Ao chegar à casa do patrão, Firmino desmontou do cavalo, tirou o chapéu e foi ter com o fazendeiro.

— Assim é que se fala, Firmino, esse é o meu vaqueiro!

Nessa mesma semana se organizou um grande churrasco, pago por aquele fazendeiro invejoso. E muito se comeu, muito se dançou, muito se festejou. E eu ia bem trazer uns pedaços de linguiça para vocês que estão lendo esta história, mas aconteceu de eu tropeçar na estrada e as deliciosas caírem pelo chão. Fica para a próxima.

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Cansada de ser enganada pelo macaco, a onça resolveu dar o troco e arquitetou uma vingança. Fez correr a notícia de que tinha morrido. Deitou-se de lado em sua furna, deixando seu ventre de cor branca para cima e a língua áspera para fora, fingindo-se de cadáver. Ficou estirada no meio da gruta, aguardando o lépido macaco. Não tardou para que os bichos viessem conferir a notícia. O macaco também veio, mas, ressabiado, ficou espreitando de longe e, lá da entrada da caverna, gritou: — Minha avó, quando morreu, espirrou três vezes. Espirrar é o verdadeiro sinal da morte.

A onça caiu na armadilha e, para comprovar que estava morta de verdade, espirrou três vezes. O macaco fugiu às gargalhadas. 64

Diz o ditado que não se deve cutucar a onça com vara curta. Furiosa, a pintada pôs em prática nova estratégia. Na beira do lago, ficou de prontidão, vigiando os animais que vinham saciar a sede. Só no aguardo, noite e dia. De longe o macaco via o vulto robusto amarelo-dourado na beira d´água e não ousava se aproximar, só que a sede ia apertando. Ao cabo de dois dias, com a boca seca, a solução veio, pois a necessidade é a mãe do engenho. O macaco buscou uma colmeia e, com o mel das abelhas, untou o seu corpo. Depois, rolou sobre um monte de folhas secas, que se pregaram aos seus pelos e o cobriram todo. Ao cair da tarde, o macaco foi à margem do lago. A onça olhou bem e perguntou:


— Que bicho é você que não conheço? Que bicho é você que eu nunca vi?

O macaco respondeu fazendo uma voz que não era a sua. — Sou o bicho Folharal.

A onça coçou as pintas escuras da sua testa, estava confusa, mas permitiu que o estranho animal saciasse sua sede. O macaco sorvia a água fresca com grande prazer. A onça, vendo aquele bicho beber tão afobado, comentou.

Eram tão grandes o calor e a sede do macaco, que este não prestou muita atenção ao que fazia. Meteu-se n’água fresca, mergulhando o corpo. A água amoleceu o mel, que fazia as vezes de cola. As folhas foram caindo aos bocados, e o macaco permaneceu distraído, sem dar-se conta do perigo que corria. Quando poucas folhas restavam cobrindo o corpo do primata, a onça reconheceu o esperto inimigo e saltou ferozmente sobre ele. Com o susto o macaco pulou e, valendo-se de sua destreza, alcançou um galho alto de um pequizeiro, de onde pulou para um ingazeiro. E assim acabou esta história. Assim que me contaram, e assim eu conto para vocês.

— Quanto bebes, Folharal! Vejo que traz sede de vários dias.

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O vaqueiro valoroso Fulô: forma popular da palavra flor, o que há de mais precioso. Porteira: portão de propriedade rural. Tangendo uma boiada: guiando um grande número de bois. Vaqueiro: pessoa responsável por cuidar de um rebanho de gado.

A necessidade é a mãe do engenho Arquitetou: elaborou, imaginou. Cutucar a onça com vara curta: mexer com algo perigoso, provocar um inimigo mais forte que você. Destreza: agilidade. Engenho: habilidade, criação, invenção. Furna: gruta. Lépido: ligeiro, ágil. Ressabiado: desconfiado.

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As histórias deste livro foram recolhidas nas cidades de Sinop, Sorriso, Ipiranga e nos assentamentos. Daniela Chindler trabalhou como um detetive, só que, no lugar de pistas, buscava bons contos. Nada aqui foi inventado, todas as histórias surgiram durante as entrevistas e são relatos da vida e das aventuras dos moradores da região. E há muitos outros casos que, quem sabe, serão publicados em um segundo volume, como o do lagarto que visitou uma escola e foi confundido com um jacaré. Aguardem!

A autora teve a sorte de encontrar dois contadores de histórias excepcionais: Benedita Ribeiro de Araújo e André Barbosa. Os dois são aquelas pessoas que divertem a família e os amigos lembrando dos acontecidos. ANDRÉ BARBOSA nasceu na cidade de Sorocaba e foi criado em Buri, no estado de São Paulo. Filho de um pequeno produtor rural, desde criança ouvia seu pai falar que iria se mudar para Mato Grosso, mas ninguém da família acreditava nesse plano. Porém, ao saber que as terras eram baratas, André pensou em vender seu cavalo e comprar um alqueire de terra. Comprou e se mudou com 21 anos, em 1999. Colheu e quebrou muito milho na mão e voltou para Buri algumas vezes, onde se apaixonou por uma atendente do Banco do Brasil de lá, a Rejane. Um dia a sorte bateu em sua porta, quando recebeu um pedaço de terra em Sinop. Cansado de andar muitos quilômetros para namorar no orelhão, casou-se com a atendente bonita. Hoje, trabalha como agente de comunicação social na empresa Sinop Energia. São dele os causos “Dorminhoco ficou esperto”, “Caminhão de mentiroso”, “Cavalo que andava de ré” e “Motor de uma mula”.

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BENEDITA RIBEIRO DE ARAÚJO (DITA) nasceu em Flórida Paulista,

São Paulo. Trabalhou desde cedo na plantação de café. Na sua casa, quando uma criança já conseguia carregar uma moringa de água sozinha, estava forte para trabalhar na roça. Dita veio para Sinop em 1975, com 15 anos. Aos 17, tendo cursado apenas até a sétima série, já era professora de uma classe multisseriada na comunidade Branca de Neve. Tinha que caminhar 5 quilômetros para chegar à escola e o mesmo tanto para voltar. No período da chuva, a dificuldade era a lama; na seca, a poeira – e muitas vezes encontrava onças no caminho. Hoje, Dita é professora do Colégio Regina Pacis. Ouvir suas histórias é diversão garantida. São dela os causos “Zequinha e José Guilherme”, “Isso é real, não é inventado” e “Cabeças trocadas”.


Foram entrevistadas cerca de 30 pessoas. Aqui apresentamos um pouquinho da vida dos autores das histórias e de algumas pessoas que colaboraram na produção deste livro.

FRANCISCO DE ASSIS PINTO DA SILVA nasceu em São Matheus do Maranhão. Estava em Alta Floresta quando partiu para Sinop, aos 22 anos. Chegou sem dinheiro para aluguel, levando apenas um caminhão de mudança e uma cachorrinha querida, que, “apesar de não ser muito fortificada”, morreu de velhice. Trabalhou com madeira, plantação e pesca, e hoje está plantando mandioca, melancia e outras frutas. É dele o causo “Dorminhoco ficou esperto”.

LAISE CECILIA SLOBODA nasceu em União da Vitória, no Paraná. Chegou a Sorriso em 1985, trazendo geladeira, televisão e rádio, que foram usados como enfeite. A geladeira foi adaptada como armário de panelas e louças, já que só mais tarde a energia elétrica chegaria à cidade. Formada em Química, Pedagogia e Psicopedagogia, é diretora da Escola Municipal Francisco Donizeti de Lima, em Sorriso. Foi ela que nos contou o causo "O morto que se mexia".

ARMIN RENNER nasceu em Toledo, no Paraná. Lá no Sul, como ele diz, “era ruim de serviço”, por isso seu pai se interessou em conhecer o Mato Grosso. Era o ano de 1979; Armin tinha 26 anos, era casado com Helena, e o casal já tinha três filhos, dos 10 que iriam compor a família. Vieram todos em dois carros, um Ford Corcel e uma Brasília, para a “capital do Nortão”, e a mudança, numa carreta. Em Sinop, Armin foi o primeiro lenheiro da região. A lenha que transportava era usada para acender o forno da padaria e assar o pão e para o cozimento dos tijolos na olaria. Em 2009, ele e sua esposa tornaram-se pescadores profissionais, e ouvi deles a história “Pescador em maus lençóis”. LENI CHIARELLO ZILIOTTO nasceu em Guaporé, no Rio Grande do Sul. Veio morar no Mato Grosso em 2011, na cidade Nova Mutum. Em 2014, mudou-se para Sinop, onde trabalha como coordenadora pedagógica no Colégio Regina Pacis. É autora do livro “As pioneiras de Sinop”, que registra as histórias das primeiras moradoras da região.

MARINA DOS SANTOS VENÂNCIO CELLONI nasceu em Tapira, Paraná. Sempre morou na zona rural. Veio para Sinop em 1998, com 33 anos. No começo, morou no acampamento do MST. Em 2005 participou da marcha Goiânia-Brasília, na qual caminhou por 17 dias para conseguir sair da situação de acampamento para assentamento. Hoje mora no assentamento 12 de Outubro. É dela a história “Jararacão do brejo”.

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MARI BUENO nasceu em Marechal Cândido Rondon, Paraná. Chegou a Sinop em 1979. É artista plástica especializada em Arte Sacra. Pintou o espaço litúrgico da Catedral Sagrado Coração de Jesus (Sinop), os vitrais da Igreja Nossa Senhora da Rosa Mística (Lucas do Rio Verde). É também autora dos mosaicos da Capela São Mateus e da Paróquia Santa Luzia (Sorriso) e da pintura sobre reconstrução facial de Santa Paulina e Santo Antônio.

PAULO ANANIAS DA SILVA nasceu em Águas Pretas, em Pernambuco. Jovem, saiu do Nordeste para o Paraná em busca de trabalho. No Sul, enfrentou Antônio Severo que fazia jus ao nome e não queria deixar um peão pobre namorar sua filha Maria de Lurdes. Mas Paulo era persistente e tinha roubado o coração da moça. O destino estava traçado: depois de quatro anos e muitos bailes, os dois se casaram. Em 2005, vieram para Mato Grosso, para a cidade de Ipiranga do Norte, onde Paulo passou no concurso de gari. Hoje ele trabalha como porteiro da Escola Municipal Nossa Senhora Aparecida.

ALEX GRAZZIOLI BONAMI nasceu na cidade de Peixoto de Azevedo, Mato Grosso. Em 1979, o ouro aflorou no solo peixotense, mas Alex, que nasceu em 1990, só herdou o passivo ambiental da corrida do ouro. Formado em Engenharia de Pesca, transformou as crateras deixadas pelo garimpo em tanques de criação de peixes. Hoje, trabalha como analista socioambiental na empresa Sinop Energia.

LUIZ FERREIRA DOS SANTOS nasceu em Sabará, Minas Gerais. Com 7 anos, veio com a mãe para o Mato Grosso procurar o pai – o casal se reconciliou e nasceram mais seis irmãos. Um dia o pai foi embora, e Luiz teve de trabalhar muito para não deixar a família passar fome. Ficou oito anos no garimpo de Peixoto de Azevedo (de 1985 a 1994) e todo o ouro que conseguiu gastou por lá mesmo. Voltou para Sinop falido, a fim de recomeçar a vida. Foi pescador e hoje tem uma lanchonete. Ele brinca: “Vivo bem tranquilo, se disser que não, é mentira”. É dele o causo "Cachorrinho do mato é garantia”.

ADELIA STÉDILE DE MATOS nasceu SIDNEY PLAZZA MONTEIRO nasceu em Bonsucesso, Paraná. Aos 16 anos, em 1978, mudou-se para Sinop com a mãe e o irmão – o pai havia vindo antes. Trabalhou no Cine-Teatro Amazonas. Na época não havia TV em Sinop, e Sidney fazia a locução dos anúncios, como a propaganda da Loja Paulista no cinema. Também trabalhou em carro de som anunciando Dia das Mães, aniversários e festas. Hoje trabalha para a Prefeitura como coveiro. E diz: “Não me falem mal de Sinop, porque sou feliz aqui”. É dele a divertida aventura “Bota Roberto na vitrola”.

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no Rio Grande do Sul, mas cresceu no Paraná. Desde pequena gostava de ler, e seu pai lhe trazia livros e revistas de presente quando ia a cidade vender café. Adélia mudou-se para Sinop em julho de 1986, acompanhando o marido que foi convidado para trabalhar como mecânico. Como não havia energia elétrica e a noite era uma escuridão danada, muitas vezes, o marido voltava para casa guiando-se pelo som que ela e os filhos faziam quando cantavam ou rezavam. Adélia trabalhou muitos anos como professora. Já aposentada, publicou seu primeiro livro, “Sobre Mulheres e Vida”.


JOSÉ RODRIGUES nasceu em Guaíra,

IRENEU BRUNO JAEGER

São Paulo, onde começou cedo a trabalhar na roça. Com 7 anos já estava no campo, ao lado do pai. Chegou ao Mato Grosso ainda solteiro: “Eu corria de casamento, vazava na braquiara, mas depois não teve jeito, casei com minha esposa, e já estamos juntos há 28 anos”. Seu Zé já tem 40 anos de Mato Grosso, mas passou por muitas cidades até ter seu pedaço de terra: Rondonópolis, Paratinga, Jucimeire (onde foi assentado com mais 26 famílias); e só mais tarde foi transferido para o assentamento Wesley Manoel dos Santos, no município de Sinop, onde vive atualmente.

nasceu em Itapiranga, Santa Catarina. Chegou a Sinop no dia de Natal, em 1977, com a mulher e os filhos, e foi recebido pelo irmão que já morava na cidade. Na noite anterior, a família tinha dormido no Posto Gil, e o filho tocou “Noite Feliz” na flauta. Ele conta que parece que corria sangue de bandeirantes nas veias para desbravar imensidões. Irineu é professor e foi coordenador do campus da Universidade do Estado de Mato Grosso. É também escritor e presidente da Academia Sinopense de Ciências e Letras. Ele nos contou a história “Vai ser uma luz pavorosa”.

DEOMAR CHAVES DINARTE (Gauchinho) nasceu em Santo Cristo,

MARIA VEIGANT nasceu em Porto

Rio Grande do Sul. Veio para Sinop com 10 anos, junto com a família, para trabalhar. De Cuiabá para Sinop, eles levaram uma semana, pois era o período das chuvas e o ônibus atolava. Naquela época, no inverno, chovia seis meses, era muita água. Uma vez, Gauchinho caiu com a bicicleta em uma poça tão funda que ele quase se afogou. Ele foi padeiro, torneiro, eletricista e muitas outras coisas. Formou-se em Direito e trabalhou como oficial de justiça e gestor-geral do Fórum de Sinop.

VERIDIANA PAGANOTTI nasceu em Sinop; filha do Seu Antônio Geraldo e Dona Almerinda, é a caçula de sete irmãos. Cresceu ouvindo histórias dos amigos próximos, algumas divertidas, outras assustadoras, e, claro, os causos dos pescadores eram frequentes. É formada em Pedagogia e Gestão Escolar; já teve oportunidade de estar à frente da gestão de uma Unidade Educativa por quatro anos e atualmente exerce a função de secretária municipal de Educação, Esporte e Cultura.

União, em Santa Catarina, e ainda criança se mudou para um sítio no Paraná. Mais tarde casou-se e foi para Rondônia, mas o medo de contrair malária a fez partir para Roraima e de lá, para o Pará. Em 1922, ela e a família se mudaram para o Mato Grosso, onde vivem até hoje. A viagem do Pará até o Mato Grosso durou 16 dias e 16 noites pelas águas do rio Madeira. No Mato Grosso todos trabalharam muito, mas também colecionaram episódios engraçados, como o da porca Crotilde, que veio no banco de trás da Parati e, numa freada, voou para cima do motorista.

PAULO EDUARDO FURLANETTO nasceu em Jales, São Paulo. Antes de chegar em Sinop ele morou em muitos lugares: Presidente Prudente-SP, MaringáPR e São Paulo, capital. Em 2008 veio para Sinop, porque a namorada, que hoje é sua esposa, estava trabalhando na cidade. É formado em Administração, com pós-graduação na área mercadológica. Paulo é professor universitário e gestor de marketing do Grupo Sinop, empresa que é fundadora da cidade de Sinop.

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DANIELA CHINDLER é carioca da gema, nasceu no Rio de Janeiro e nunca morou em nenhuma outra cidade, mas sua família veio de muitos cantos do mundo. Um bisavô era pianista em Odessa (que fica na Ucrânia), a bisavó nasceu em uma colônia de imigrantes no Sul do Brasil, um avô veio da Romênia (terra do Drácula) e outra avó nasceu em Nova Iorque. Daniela trabalha com projetos educativos em museus, escreve roteiros para o teatro e livros infantis. Sua obra “Bibliotecas do Mundo” ganhou o prêmio de “Melhor livro informativo do ano para crianças e jovens” pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, em 2012. É autora de diversos projetos de incentivo à leitura e foi curadora da programação infantojuvenil da Bienal do Livro do Rio de Janeiro, Bienal do Livro Amazonas e Bienal do Livro da Bahia.

BRUNA ASSIS nasceu em Curitiba. Sua família é um misto de regiões do Sul do Brasil: de Alegrete, no Rio Grande do Sul, a Palmas, no Paraná. Alguns membros da família são descendentes de portugueses, outros, de índios e negros: uma verdadeira mistura brasileira. Bruna se apaixonou pelos livros na infância, mas só anos mais tarde, depois de terminar os cursos de Jornalismo e Design Gráfico, decidiu tornar-se ilustradora. Hoje, Bruna é pós-graduada em Ilustração Criativa pela Escola de Disseny i Art de Barcelona e tem dezenas de livros publicados. Em 2013 e em 2016, foi indicada ao Prêmio Jabuti, na categoria ilustração, e ficou em terceiro lugar na segunda indicação. Em 2016, ilustrou o livro vencedor do prêmio FNLIJ, “Malala: a menina que queria ir para a escola”. Conheça mais de seus trabalhos em: brunaassisbrasil.com.br.



HISTÓRIAS E PERTENCIMENTO Autoria Daniela Chindler – Sapoti Projetos Culturais Produção

Graziela Domingues – Graviola Produções BRUNA ASSIS

DANIELA CHINDLER

ISBN 978-85-94449-00-9

nasceu emExecutiva Curitiba. Sua famíliaExecutiva é carioca da gema, nasceu no Produção e Coordenação éDavar um Projetos mistoCulturais de regiões do Sul Rio de Janeiro e nunca morou do Brasil:dede Alegrete, no Rio em nenhuma outra cidade, Captação recursos Jacqueline do Menaei Marketing Grande Sul,- MaisArte a Palmas, noCultural mas sua família veio de muitos Paraná. Alguns membros da família são descendentes cantos do mundo. Um bisavô era pianista em Odessa Assistentes de Produção Marjory de portugueses, outros, de Rocha índios e negros: uma (que fica na Ucrânia), a bisavó nasceu em uma colônia verdadeira mistura brasileira. de imigrantes no Sul do Brasil, um avô veio da Romênia PesquisaBruna se apaixonou pelos Daniela Chindler livros na infância, mas só anos mais tarde, depois de terminar (terra do Drácula) e outra avó nasceu em Nova Iorque. os cursos de Jornalismo eAssistente Design Gráfico, decidiu tornar-se de Pesquisa Daniela trabalha com projetos educativos em museus, Este livro traz 17 contos do Nortão do Mato Grosso e 2 histórias Fabiana Martelotte ilustradora. Hoje, Bruna é pós-graduada em Ilustração escreve roteiros para o teatro e livros infantis. Sua do folclore. Tem um caminhão que foi parar lá no alto pela de um Criativa Escola de Disseny Revisão i Art de Barcelona e tem obra “Bibliotecas do Mundo” ganhou o prêmio de cajueiro, um homem que escapou de uma onça de tanto que fedia, Marçal Aquino dezenas de livros publicados. Em 2013 e em 2016, “Melhor livro informativo do ano para crianças e jovens” Marcela Lima um morto quedoseLivro mexiaInfantil e muito mais. São indicadapor ao Prêmio Jabuti, na categoria ilustração, pela Fundação Nacional e Juvenil, emhistóriasfoicontadas e ficou em terceiro Projeto lugar Gráfico na segunda indicação. moradores da região. 2012. É autora de diversos projetos de incentivo à Gabriel Victal Em 2016, ilustrou o livro vencedor do prêmio FNLIJ, leitura e foi curadora da programação infantojuvenil Ilustração “Malala: a menina que queria ir para a escola”. Conheça da Bienal do Livro do Rio de Janeiro, Bienal do Livro Bruna Assis mais de seus trabalhos em: brunaassisbrasil.com.br. Amazonas e Bienal do Livro da Bahia. Patrocínio

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