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Cancro do pâncreas: uma nova epidemia

Cancro do PÂNCREAS

UMA NOVA EPIDEMIA

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O CANCRO DO PÂNCREAS JÁ É A QUARTA CAUSA DE MORTE POR CANCRO NA EUROPA E, NOS PRÓXIMOS 10 ANOS, PODE ALCANÇAR A SEGUNDA POSIÇÃO. NO SENTIDO DE CONTRARIAR ESTA TENDÊNCIA, SÃO NECESSÁRIOS MAIS RECURSOS PARA INVESTIGAR E PERCEBER MELHOR OS MECANISMOS BIOLÓGICOS DA DOENÇA, PARA CONSEGUIR DIAGNÓSTICOS MAIS PRECOCES E PARA PODER OFERECER NOVAS PERSPETIVAS DE TRATAMENTO.

DURANTE DÉCADAS, O CANCRO DO PÂNCREAS foi considerado uma doença pouco frequente. Mas nos últimos 20 anos, os números têm aumentado exponencialmente em quase todo o mundo, especialmente nos países mais industrializados. Atualmente, o cancro do pâncreas já é a quarta causa de morte por cancro na Europa e, nos próximos 10 anos, estima-se que o número de novos casos aumente mais de 70% e se possa tornar na segunda causa de morte por cancro na Europa e nos EUA.

CAUSA DIFÍCIL DE IDENTIFICAR

Quando falamos de cancro do pâncreas estamos, habitualmente, a referir-nos ao tipo mais comum, mas existem outros tumores do pâncreas menos frequentes, geralmente com melhor prognóstico, tais como os tumores neuroendócrinos.

Em muitos doentes com cancro do pâncreas, é difícil identificar uma causa ou fator de maior risco, mas a doença está associada ao consumo de tabaco, ao consumo excessivo de álcool, à obesidade ou a outras doenças do pâncreas, como a pancreatite crónica ou alguns tipos de lesões “pré-malignas”. É raro que se identifiquem alterações genéticas hereditárias, mas pessoas com história familiar próxima de cancro do pâncreas têm maior risco de desenvolvimento da doença e, nestes casos, pode justificar-se um seguimento médico mais regular.

Na Fundação Champalimaud, foi desenvolvido um programa para acompanhar pessoas ou famílias com maior risco de cancro, procurando prevenir ou detetar mais precocemente a doença.

Pelo

DR. CARLOS CARVALHO

Diretor da Unidade de Cancros Digestivos da Fundação Champalimaud

DIAGNÓSTICO TARDIO

Infelizmente, não existe um método simples de rastreio, que nos permita o despiste precoce do cancro do pâncreas na generalidade da população. Na fase inicial, o cancro do pâncreas pode ser silencioso ou provocar sintomas pouco específicos, tais como fadiga, perda de peso, falta de apetite, dor abdominal persistente ou o aparecimento de diabetes. A maioria dos doentes só mostra sintomas mais evidentes numa fase tardia e, por isso, cerca de 80% dos cancros do pâncreas só são diagnosticados numa fase avançada.

O cancro do pâncreas pode evoluir rapidamente e de forma agressiva. Atualmente, à altura do diagnóstico, cerca de metade dos doentes têm metástases do tumor noutros órgãos e, mesmo em fases mais iniciais, em que o tumor está mais localizado, nos primeiros anos após a cirurgia continua a existir um risco elevado de células tumorais residuais poderem desenvolver novas metástases.

Nestas fases mais avançadas, o cancro do pâncreas torna-se uma doença mais difícil de tratar e, por isso, a sobrevivência global da doença aos 5 anos após diagnóstico não ultrapassa os 10%, o que torna o cancro do pâncreas um dos tumores malignos com mais elevada mortalidade.

Pensando na importância de conseguir um diagnóstico mais precoce do cancro do pâncreas, alguns investigadores da Fundação Champalimaud têm dado atenção à possibilidade de algumas partículas microscópicas libertadas no sangue pelas células dos tumores – chamadas “exosomas” – poderem vir a ajudar na deteção do tumor e permitir o diagnóstico numa fase mais inicial.

MELHORES RESULTADOS

Nos últimos anos, têm havido avanços significativos no tratamento do cancro do pâncreas. Novos regimes de quimioterapia conseguem obter melhores respostas e têm sido usados em fases mais iniciais da doença, para reduzir o volume do tumor antes da cirurgia e para reduzir a probabilidade de metástases.

Atualmente, com a combinação da quimioterapia e de cirurgia avançada, mais de 40% dos doentes operados sobrevivem, pelo menos, 5 anos. Muitos destes doentes têm, assim, a possibilidade real de cura ou de sobrevivência longa após tratamento.

Quando a doença está localizada, a cirurgia tem um papel fundamental no tratamento do cancro do pâncreas. Mas uma das maiores dificuldades na cirurgia pancreática é a situação profunda do pâncreas, entre o estômago e a coluna vertebral, e muito perto de múltiplos vasos sanguíneos importantes.

Frequentemente, o cancro do pâncreas cresce à volta destes vasos sanguíneos, o que torna tecnicamente difícil ou mesmo impossível a ressecção completa do tumor. Nestes casos, a quimioterapia pode tentar reduzir o tumor e facilitar a cirurgia. Contudo, os cirurgiões pancreáticos podem ainda ter de ressecar alguns destes vasos críticos invadidos pelo tumor, o que requer sempre uma grande especialização.

Novos regimes de quimioterapia conseguem obter melhores respostas e têm sido usados em fases mais iniciais da doença, para reduzir o volume do tumor antes da cirurgia e para reduzir a probabilidade de metástases

Na Fundação Champalimaud, os cirurgiões pancreáticos têm uma enorme experiência nos vários tipos de procedimentos, desde a cirurgia minimamente invasiva e robótica, às mais complexas recessões de vasos envolvidos pelo tumor. E os cirurgiões fazem parte de uma equipa multidisciplinar, em que vários especialistas e investigadores procuram diagnosticar com rigor a doença e oferecer aos doentes com cancro do pâncreas as combinações individuais de tratamento mais adequadas a cada caso.

NOVAS ESTRATÉGIAS

No cancro do pâncreas, uma das maiores limitações tem sido o menor investimento dirigido para a investigação e tratamento.

Apesar de ser um dos tumores malignos com maior crescimento na incidência de novos casos e de poder tornar-se a segunda causa de morte por cancro, mais do que o cancro da mama, do cólon ou da próstata, estima-se que menos de 2% dos fundos de investigação para o cancro sejam dedicados ao cancro do pâncreas.

No Centro Botton-Champalimaud pretendese desenvolver formas de tratamento e ensaios clínicos mais inovadores, capazes de oferecer aos doentes uma esperança mais concreta

São necessários mais recursos para investigar e perceber melhor os mecanismos biológicos da doença, para conseguir diagnósticos mais precoces e para poder oferecer novas perspetivas de tratamento.

E o investimento financeiro tem de ser acompanhado pelo desenvolvimento de equipas multidisciplinares mais dedicadas. Sem mais recursos e sem uma estratégia mais dirigida, o progresso pode continuar a ser demasiado lento para muitos doentes e famílias afetados pela doença.

NOVO CENTRO EM LISBOA

O lançamento em Lisboa do novo Centro de Cancro do Pâncreas Botton-Champalimaud é uma clara resposta à necessidade de promover um investimento mais consistente e dirigido para o melhor conhecimento e controlo da doença.

Este Centro vai reunir um grupo internacional de clínicos e investigadores que trabalhará efetivamente em conjunto, numa mesma equipa e no mesmo edifício. O novo edifício, no campus da Fundação Champalimaud, foi especialmente desenhado e equipado com novos serviços clínicos, blocos operatórios, tecnologias e plataformas de investigação, todos especificamente dedicados ao tratamento dos doentes com cancro do pâncreas.

No Centro Botton-Champalimaud pretende-se, não apenas explorar o conhecimento da biologia e evolução do cancro do pâncreas, mas sobretudo desenvolver formas de tratamento e ensaios clínicos mais inovadores, capazes de oferecer aos doentes uma esperança mais concreta de um melhor controlo da doença.

Mas a batalha contra o cancro do pâncreas, tal como a ciência em geral, requer uma estratégia que implica partilha de conhecimento e cooperação internacional. Neste sentido, o Centro Botton-Champalimaud já iniciou as primeiras colaborações com outros centros oncológicos internacionais na área do cancro do pâncreas.

Espera-se, assim, que se possam abrir novas perspetivas para o conhecimento da doença e para o tratamento dos doentes. Um desafio que só será possível graças à confiança e à colaboração ativa dos nossos doentes que, já hoje, nos cedem pequenas amostras de sangue ou do tecido tumoral, habitualmente colhidas nas biopsias e nas cirurgias a que são submetidos durante o seu tratamento, para a nossa investigação. Em troca, temos a obrigação de descobrir mais sobre a doença, para lhes podermos oferecer melhores tratamentos.

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