Pacientes vítimas de complicações por profissionais não médicos

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SOCIEDADE BRASILEIRA DE DERMATOLOGIA

Parecer Jurídico n° 06/2021

EMENTA: ATENDIMENTO

MÉDICO. PACIENTE VÍTIMA DE COMPLICAÇÕES. ROFISSIONAIS NÃO MÉDICOS.

I. DO RELATÓRIO

Serve o presente documento para esclarecer aos médicos associados da Sociedade Brasileira de Dermatologia – SBD quanto aos procedimentos a serem tomados em relação ao atendimento de pacientes que foram atendidos por não médicos e tiveram complicações.

Entre os principais questionamentos quanto a essa matéria, divide-se o presente documento em três principais questões, que são:

1) Há a obrigatoriedade de o profissional médico atender pacientes vítimas de complicação?

2) Caso o profissional médico atenda, deve-se requisitar o pedido de Boletim de Ocorrência (BO) da Polícia Civil?

3) Quais documentos são suficientes para resguardar o profissional médico?

Esta é a síntese do necessário.

II. DO PARECER

1. Há a obrigatoriedade de o profissional médico atender pacientes vítimas de complicação?

Sobre essa questão vale destacar que os médicos têm o direito de recusar um determinado atendimento quando ocorrer fatos que possam prejudicar a relação médico paciente, nos termos do Capítulo I, Inciso VII do Código de Ética Médica de 2019:

VII - O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.

Inclusive, é direito do médico em se recursar a praticar determinadas ações profissionais nos casos em que haja a recusa terapêutica do paciente, conforme art. 7ª da Resolução CFM nº 2.232/2019. Assim vejamos: Art. 7º É direito do médico a objeção de consciência diante da recusa terapêutica do paciente.

O próprio Conselho Regional de Medicina do Estado de São PauloCREMESP já também se posicionou sobre o assunto: Consulta nº 70.582/02- Ementa: O médico tem direito de renunciar o atendimento de paciente, no caso de relacionamento prejudicado com seus familiares, desde que não os abandone, comunicando seu sucessor acerca da continuidade dos cuidados, fornecendo-lhe as informações necessárias.

Outrossim, vale mencionar que o Código de Ética Médico, em seu artigo 5º do Capítulo III, veda ao médico “assumir responsabilidade por ato médico que não praticou ou do qual não participou.”

A partir disso, conclui-se que o profissional médico tem autonomia a não realizar procedimentos que não em desacordo com a sua consciência, com exceção apenas as questões de urgência ou emergência.

2. Caso o profissional médico atenda, deve-se requisitar o pedido de Boletim de Ocorrência da Polícia Civil?

Não há necessidade de o profissional médico requisitar um Boletim de Ocorrência junto a Polícia Civil estadual, tendo em vista há outros meios idôneos para se

comprovar a situação fática Como será visto mais adiante, as fotografias tiradas anteriormente do paciente, informação descrita no termo de consentimento e o previsto no próprio prontuário médico, são considerados meios adequados de comprovação e de resguardo do médico.

Por outro lado, quanto a esse ponto importa salientar que, a depender do caso, o médico terá o dever de comunicar à autoridade competente. Como regra, sabe-se que o médico não poderá revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, conforme artigo 74 e 73 do Código de Ética Médico.

Não obstante, o médico deverá comunicar as autoridades competentes, sob o mando do estrito cumprimento dever legal (III, art. 23, CP), quando for caso de risco à comunidade e com conhecimento prévio da vítima ou do seu responsável. Ademais, o dever do médico restringe-se exclusivamente a comunicar tal fato à autoridade competente, sendo “proibida a remessa do prontuário médico do paciente” (art. 2º. da Resolução CFM n.º 1.605/2000).

3. Quais documentos são suficientes para resguardar o profissional médico?

Inicialmente, é imprescindível que haja um Termo de Consentimento Livre

Esclarecido – TCLE – entre o médico e o paciente. Como se sabe, nos termos da Recomendação CFM nº 1 de 2016, o TCLE consiste no ato de decisão, concordância e aprovação do paciente sob a responsabilidade do médico.

Portanto, o TCLE traz vantagens tanto para ao paciente como para o próprio médico. Para o paciente, ele influencia diretamente no processo de livre escolha, o qual a partir das informações presentes neste documento, decidirá se irá ou não prosseguir com determinado procedimento. Já ao médico, o TCLE é um documento eficaz em resguardar a este profissional os limites de suas responsabilidades.

A partir disso, é importante que, conjuntamente com a instrução ao paciente da sua responsabilidade como médico no atendimento e a informação dos aspectos

médicos e legais relativos ao caso do paciente, deve-se também haver a previsão no TCLE, de forma detalhada, do procedimento anteriormente realizado (deve-se esclarecer, ao menos, as seguintes questões: qual foi o procedimento, em qual local do corpo foi feito o procedimento e por qual tipo de profissional foi executado)

Ademais, documentos outros podem também resguardar ainda mais o profissional médico, assim como fotos do paciente, caso haja o consentimento deste. Se, contudo, o paciente não autorizar que seja tirado fotos suas, o médico poderá se recusar a atendê-lo (conforme tópico anterior) ou pode optar ainda em continuar o atendimento, entretanto, que tal informação esteja disposta em documento à parte ou no próprio TCLE.

Por fim, é de supra relevância que todas essas informações acima estejam registradas no prontuário médico. Neste documento deve haver a previsão, de forma minuciosa, dos aspectos médicos relacionados à causa, de acordo com o artigo 87 do Código de Ética Médico

III. DA CONCLUSÃO

Diante o exposto, conclui-se que é plenamente possível que profissional médico atenda pacientes que sofreram complicações oriundas de atuação de profissionais não médicos. Por outro lado, ressalta-se que o médico possui autonomia profissional, podendo recusar o atendimento de paciente em determinadas situações, desde que não seja casos de urgência ou emergência.

Dito isso, caso o médico entenda em prosseguir com o atendimento, é indispensável que este se resguarde, ao menos, pelos seguintes meios: (i) faça um Termo de Consentimento Livre Esclarecido; (ii) tire fotos do paciente (caso tal autorize); e (iii) registre todas as informações no prontuário.

É o parecer.

S.M.J.

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