Aerolândia
Obra realizada com o apoio da Prefeitura Municipal de Fortaleza, por meio da Secretaria Municipal de Cultura de Fortaleza – Secultfor. Prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio Rodrigues Bezerra Vice-Prefeito de Fortaleza Gaudêncio Gonçalves de Lucena Secretário Municipal de Cultura de Fortaleza Francisco Geraldo de Magela Lima Filho Secretária-Executiva Paola Braga de Medeiros Assessora de Políticas Culturais Nilde Ferreira Assessor de Planejamento Inácio Carvalho de A. Coelho
Coordenador de Criação e Fomento Lenildo Monteiro Gomes Coordenador de Patrimônio Histórico e Cultural Jober José de Souza Pinto
Assessora de Comunicação Paula Neves
Coordenador Administrativo-Financeiro Rosanne Bezerra
Assessor Jurídico Vitor Melo Studart
Diretora da Vila das Artes Claudia Pires da Costa
Coordenadora de Ação Cultural Germana Coelho Vitoriano
Diretora da Biblioteca Pública Dolor Barreira Herbênia Gurgel
Secretário da Regional VI Renato César Pereira Lima
Gylmar Chaves
Aerolândia A Cidade do Ar
Copyright © 2015, Gylmar Chaves
Concepção e Coordenação Editorial Gylmar Chaves Projeto Gráfico e Diagramação Khalil Gibran Revisão Milena Bandeira Fotos da Capa e Contracapa Sheila Oliveira Consultoria Técnica Adson Pinheiro/ Graça Martins Catalogação na Publicação Bibliotecária: Perpétua Socorro Tavares Guimarães CRB 3 /801 V 512 A Chaves, Gylmar Aerolândia / Gylmar Chaves.- Fortaleza: Secultfor, 2015. 80p. (Coleção Pajeú) ISBN: 978-85-420-0583-7
1. Memórias
2. Crônicas
3. Título CDD: 869. 4
Sumário Observando do jardim 11 O itinerário para o bairro da Aerolândia 16 Antes de ser um bairro 20 A escola de dona Detinha e o Grupo Escolar Edith Braga 29 Do Clube Recreativo Aerolândia às Tertúlias 34 Nasceu o comércio 43 Um bairro também sobrevive da saúde 49 Uma líder comunitária e os aparatos sociais 51 O caminhão do seu Silva nos levava aos jogos do Time da Garotada 54 Depois do fim 59 Referências Bibliográficas 62
O subtítulo “Cidade do Ar” é uma designação usada por Raimunda Paula e Silva (dona Raimundinha do Lagamar), incansável militante social em favor dos excluídos do bairro da Aerolândia.
Para meus tios Edgar Chaves e Maria José Nogueira Chaves. Minha carinhosa tia Sarita (Sarah Faheina Nogueira). Meus primos Lauro de Paula Lima e Maria Stela Marques Lima. In memorian de Meu pai José Pessoa Lima, meu irmão Gilson Chaves, meus primos Gerardo José Nogueira e José Hernando de Lima, e minha querida prima Claire Anne Lima Freire de Paiva.
Observando do jardim
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u tinha um ano e oito meses quando estive pela primeira vez no bairro da Aerolândia, em meados de 1961.
Meus pais moravam em Tabuleiro do Norte, e me levaram à capital cearense na boleia de um Misto, uma condução com cabine e carroceria adaptadas para o transporte de passageiros e cargas. Na noite do mesmo dia da chegada, uma médica, atendendo ao pedido da minha querida tia Sarita (Sarah Faheina Nogueira), aplicou-me uma injeção. Estava com o corpo mole e ardia em febre. Desse dia em diante, jamais fiz as pazes com as injeções. No outro dia cedo, depois de um café bem posto sobre a mesa pela tia Maria José, minha mãe me levou para tomar banho de sol no jardim. Deve ter sido o primeiro jardim que usufruí de uma casa. Na cidade que nasci, até então, as casas tinham as fachadas rentes à calçada, com suas portas e janelas abertas para o mundo, de onde costumávamos conversar com os passantes. 11
Anos mais tarde, percebi que o jardim da casa da tia Maria José não era tão grande como ficou cravado em minha memória. O muro divisório com a calçada era baixo, e por ele a gente ficava espiando os moradores do bairro passarem com suas compras, ou descendo do ônibus após retornarem do centro de nossa capital. Nascido próximo às barrancas do rio Jaguaribe, também me intrigava aqueles homens com suas carroças pipas oferecendo água nas portas das casas. Ainda meninote, contou-me minha mãe de eu ter recebido naquela mesma manhã a visita de meus primos prediletos, Nogueira Filho e Paula Neto. Eles trouxeram muitos brinquedos, como um enorme Fort Apache, o qual me deixou com brilho nos olhos, pela extrema novidade lúdica. Não tenho lembrança do dia do regresso à minha cidade natal. Nem do número de vezes que brinquei com meus primos. Algo que muito recordo vem das ruas da Aerolândia. Quase todos os dias passava o vendedor de “chegadinha” – delicioso doce anunciado pela batida forte de uma haste num triângulo, ambos feitos do mesmo metal. O som produzido insistia em permanecer em meus ouvidos. E eu, com a minha musicalidade ainda imatura, assemelhava-o ao do sino da torre da igreja matriz de minha cidade, ecoando nas manhãs cedo de domingo para sinalizar aos fiéis a celebração da missa. 12
O que mais me chamou a atenção foram os aviões a riscarem o céu. Era a impressão que colhia meus olhos. Eles decolavam do antigo aeroporto Pinto Martins, ou do Aeroclube, e vinham ganhando altura sobre as casas, enfiando-se nas nuvens, até a gente não mais ouvir o ronco do motor. As viagens para Fortaleza passaram a ser contínuas, devido ao meu tratamento de saúde. E eu vivia de olhar para o céu, a admirar aqueles aviões com suas asas fixas e frias sustentadas pelo vento. Eles fugiam da gente de modo diferente. Certamente não se assustavam. Foi assim que compreendi a diferença entre passarinhos e aviões. E seus destinos... A primeira vez que andei na Aerolândia foi em 1961. Estava em companhia de meu esposo, José Pessoa Lima, para um tratamento de saúde, devido uma doença que acometeu meu segundo filho, o escritor Gylmar Chaves. Chegamos por volta das 20h, depois de mais de meio dia de viagem. Nesse dia, muitos passageiros lotavam o Misto de Júlio Moreira, além de bastante bagagem. Descemos na BR-116 e fomos com o nosso filho nos braços até a casa de meu irmão, Edgar Chaves, que ainda mora na rua Capitão Clóvis Maia. Achei o bairro muito bom. Nessa rua passavam os ônibus rumo ao centro, onde costumavam se localizar os consultórios médicos. A maioria das 13
ruas ainda era de barro batido. Tinha a mercearia do senhor Joaquim, logo na esquina. Tinha outros familiares naquele bairro, meu primo Gerardo Nogueira, casado com Sarah Faheina. A igreja também ficava próxima, mais acima, como se a gente fosse para os lados do centro. Em 1966, deixamos Tabuleiro do Norte e fomos fixar residência na Aerolândia de Fortaleza, na rua Tenente Roma. Fizemos logo amizade com nossos vizinhos. Do lado direito, o seu Pinheiro e dona Tonheira. Eles tinham muitos filhos que logo se misturaram aos nossos. Aposentado da Base Aérea, o quintal da casa de Seu Pinheiro era grande, onde meu marido acabou montando uma oficina mecânica por uns tempos. Os vizinhos do lado esquerdo eram o senhor Raimundo e dona Ester. Casal com três filhos, também fizeram grande amizades com os nossos. Todas as noites eles brincavam na calçada, e corriam pela rua sem nos despertar algum tipo de medo. Quase não passava carro. Dois anos depois, nos mudamos para outra casa, ela ficava numa esquina da rua Capitão Olavo. Também tivemos vizinhos bons. Rosa Maria, filha de seu Moreira e dona Josira, acabou casando com meu primo Hernando. 14
Nos fundos do nosso quintal, havia uma casa dentro de um grande terreno todo murado. Lá, morava seu Frota (Gerardo Frota), que levava nossos filhos todos os domingos para a praia. Numa pequena vila à rua lateral da nossa nova morada, a Santa Rosa, havia uma pequena vila de sete casas, onde famílias oriundas também do interior criaram laços conosco, como a da dona Ivone. No Grupo Escolar Edith Braga, matriculei você, Gylmar. Era tão pertinho da nossa casa... Lembro que quando chegava um familiar ou outro conterrâneo vindo de Tabuleiro ou de São João do Jaguaribe, que se hospedavam em nossa casa, e não conheciam os aviões de perto, a gente costumava levá-los pela noite, para assistirem o pouso do avião Caravelle. Ainda hoje retorno a Aerolândia para visitar meu irmão. Tenho muitas saudades daquele tempo de moradia. A gente sentava na calçada e ficava em conversas sobre o passado e as novidades do presente...
Margarida Chaves, funcionária pública aposentada.
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O itinerário para o bairro da Aerolândia
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inha mãe me presenteou com uma roupinha do mesmo modelo do uniforme militar usado pelos marinheiros. Era a preferida, para vergonha dela, dada a possibilidade dos demais se convencerem de ser única em nosso guarda-roupa. Costumava chorar compulsivamente quando ela colocava sobre a cama outra que não fosse a náutica. Certa vez, disse-me ela que essa roupa quase não visitou a nossa mala de viagem. E eu tenho alguns resquícios de memória dessa tão surpreendente indumentária do meu gosto. Quem sabe uma forma simbólica do meu desejo precoce de conhecer o mundo... E foi de Tabuleiro do Norte, por motivo de uma paralisia infantil, que acabei indo ao encontro de muitas novidades. Deixei por um bom tempo a lentidão dos dias do sertão para me embrenhar na desconhecida e movimentada vida urbana. A estrada, toda carroçável, parecia-me um cordão comprido que ia se enrolando nos pneus do Misto. Meu pai me transmitia a certeza que, de tanto se enrolar aquele imaginário cordão, chegaríamos ao nosso destino.
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Durante o trajeto, paramos para uma merecida merenda, sendo a penúltima parada em Messejana, onde desceram do Misto alguns passageiros. Na parada do bairro do Alto da Balança, nas proximidades do rio Cocó, com suas periódicas enchentes ainda a invadir as ruas mais baixas da Aerolândia pelo lado leste, outros passageiros desembarcaram. A gente desceu defronte ao Posto Irmãos Campelo, local de encontro de passageiros, motoristas e “caroneiros” oriundos da nossa região, o Vale do Jaguaribe. Malas e sacolas à mão, pegamos à direita pela rua capitão Clóvis Maia, rumo à casa dos meus tios Edgar e Maria José.
Chegamos aqui em maio de 1961. No mesmo dia do nosso casamento. Fomos morar na casa que pertencia ao senhor Raimundo Borges, antigo morador do bairro, à rua capitão Clóvis Maia, 243. Depois de cinco anos construímos nossa própria casa e nos mudamos para a mesma rua, nº 154, onde moramos até hoje. Temos cinco filhos. Todos nasceram e fizeram os primeiros estudos aqui.
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Tudo era diferente. O pão era entregue na porta. O leite a gente pegava na vacaria do senhor Chicó, bem próxima aqui de casa. Nós viemos morar aqui por intermédio do meu irmão, Gerardo Nogueira, que era sargento da Base Aérea. O bairro quase todo era constituído de moradores civis e militares da Base Aérea. Edgar viajava constantemente daqui para Tabuleiro do Norte. Trazia na carga caroço e pluma de algodão da F. Cardoso Dantas. Só depois ele passou a viajar para São João da Barra, no Rio de Janeiro. Trazia para o Ceará o famoso conhaque São João da Barra. Ele guardava o nosso caminhão Chevrolet 1961 no Posto de Gasolina Irmãos Campelo, que ficava entre a BR-116 e a rua Tenente Wilson. Quando Edgar chegava de viagem, a gente costumava frequentar nos finais de semana o Clube Recreativo da Aerolândia – CRA. Lá encontrávamos nossos amigos e outros familiares residentes aqui no bairro. À noite a gente frequentava a casa dos vizinhos que tinham televisão. Ou então sentávamos nas calçadas para conversas a fio. 18
As ruas pareciam a extensão do quintal de nossas casas. Nossos filhos brincavam com total segurança. O número de carros trafegando pela rua era muito pequeno. A violência quase não existia.
Edgar de Lima Chaves e Maria José Nogueira Chaves moradores do bairro.
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Antes de ser um bairro
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a Aerolândia sempre moraram muitos entes da minha família. Tios, avós, tias, primos e primas. A maioria veio tentar a vida na capital e certamente escolheu esse bairro em virtude de ser a porta de regresso ao Vale do Jaguaribe, de onde somos originários. Somente alguns anos depois das várias vezes que me hospedei por lá, vim a perceber seus limites e outros demais indicadores. Com uma área de 68,1 hectares, faz limite ao sul com o bairro Alta da Balança. Ao norte, com o extinto bairro do Atapu, na região onde concentra o cruzamento das avenidas Visconde do Rio Branco e Pontes Vieira. Ao leste, com a margem esquerda do rio Cocó; e pelo oeste, com a BR-116, que atualmente termina quase sobre o viaduto construído sobre a avenida Borges de Melo, em paralelo ao paredão da Base Aérea de Fortaleza. Há registros no livro Aerolândia, seu povo, sua história: de sua origem aos dias atuais, de Francisco Caminha e João Luís Filgueiras, sobre os primeiros moradores do bairro serem pescadores que extraíam o sustento para suas famílias do rio Cocó. Arranchados em choupanas simples, final do século 19 e início do século 20, certamente jamais imaginariam daquela grande extensão de terra, lamaçais e barro batido, à época pertencente ao Alto 20
da Balança. A denominação desse bairro deve-se à instalação pela Secretaria da Fazenda Municipal de uma grande balança na BR-116 para verificar o peso das mercadorias transportadas do interior do estado e do sul do País. Na década de 1930, somou-se aos pescadores considerado número de pedreiros, serventes, carpinteiros e pintores, trabalhadores contratados para a construção do Campo de Aviação do Alto da Balança, primeiro aeroporto da capital, inaugurado em 16 de setembro de 1931. Esses profissionais acabaram se interessando em fixar suas famílias nas imediações do bairro, tanto pela comodidade de estarem próximos ao trabalho, como também por morar à pequena distância de onde pousaria a instigante invenção do mineiro Santos Dumont. No dia da inauguração do aeroporto, feito em terra batida, o primeiro pouso acabou sendo realizado inesperadamente pelo aviador australiano Herbert Hinkler. Detentor de uma verdadeira façanha para a época, ele decolou do Canadá rumo à Nova York, e de lá para a Jamaica, trecho aéreo que fez sem um único pouso. Passou ainda por Venezuela, Guiana Francesa e Brasil, antes de voar pelos mares do Atlântico Sul em direção ao continente africano. Devido ao mau tempo ocasionado durante esse trajeto, nuvens baixas e pesadas deixara o piloto com escassa 21
visibilidade; Hinkler mudou seu plano de voo para pousar em Londres, o que lhe rendeu, pela coragem e determinação de ser o primeiro a atravessar o Atlântico Sul, ganhar o Troféu Segrave, o prêmio Memorial Johnston e o Britannia Troféu, como desempenho de voo mais meritório daquele ano. Até então, a população fortalezense somente assistira pousos aéreos realizados por hidroaviões na Barra do Ceará. Ainda segundo os autores de Aerolândia, seu povo, sua história: de sua origem aos dias atuais, de Francisco Caminha e João Luís Filgueiras, outra memorável figura que também pousou no Campo de Aviação do Alto da Balança foi Amelia Earhart, pioneira da aviação dos Estados Unidos. Defensora ardente dos direitos femininos, ela foi a primeira mulher a receber a condecoração The Distinguished Flying Cross, por ser considerada a precursora do voo solo sobre o oceano Atlântico. Dentre outros recordes, Amelia Earhart também se dedicou a escrever livros sobre suas experiências de voos, essenciais para a formação de organização de mulheres desejosas de desbravarem a imensidão dos céus. Amelia Earhart, ao tentar realizar um voo ao redor do mundo, em 1937, desapareceu no oceano Pacífico próximo à Ilha Howland, um atol desabitado e situadado ao norte do Equador no oceano Pacífico, a 3.100 km a sudoeste de Honolulu. 22
Presume-se que a inauguração do Campo de Aviação do Alto da Balança viabilizou muitas transformações na tão sertaneja Aerolândia. Embora não muito frequentes, dos bairros mais nobres costumavam acorrer curiosos para assitirem aos pousos dos aviões, a fim de recepcionarem passageiros visitantes, como gente famosa, para alguma atividade política ou artística, amigos ou familiares, além de admirarem aquela máquina mais pesada que o ar a voar longas distâncias. O bairro da Aerolândia ganhou também outro equipamento público de grandes proporções, a Base Aérea de Fortaleza, situada na confluência da BR-116, que passa sobre um viaduto à avenida Borges de Melo. O processo de criação deste espaço genuinamente militar foi moroso. Iniciou-se em 15 de março de 1933, com a instalação do 6º Regimento de Aviação, embora suas atividades tenham sido autorizadas somente três anos depois, período em que começou a funcionar como um núcleo da Base Aérea, devido à chegada e permanência em solo cearense de três biplanos modelo WACO CPF 5. No ano de 1941, o 6º Regimento de Aviação passou a ser designado de 6º Corpo de Base Aérea. E somente em 23 de março de 1944 passou a ser definitivamente denominado de Base Aérea de Fortaleza, possivelmente quando aquela faixa de terra que compreende o seu paredão exposto 23
para a BR-116 começou a dar os primeiros passos para se tornar o bairro de Aerolândia. Até então, pertencia ao Alto da Balança. Mesmo que o país estivesse sendo governado por um regime ditatorial simpático ao nazifascismo, o presidente Getúlio Vargas acabou declarando guerra a Alemanha e a Itália em agosto de 1942, conjuntamente com seus adversários, os Países Aliados. O motivo deveu-se ao torpedeamento em fevereiro desse mesmo ano por submarinos alemães e italianos aos navios da Marinha Mercante brasileira. Em represália, o Brasil aderiu aos compromissos da Carta do Atlântico, cujo tratado era o alinhamento automático com qualquer uma das nações americanas, caso fosse atacada por um país de outro continente. Somente quase dois anos depois, em julho de 1944, as Forças Expedicionárias Brasileiras chegaram às trincheiras da guerra. Treinado e equipado pelos americanos, um contigente de 25.000 homens cumpriu algumas missões com sucesso, como a conquista das cidades italianas de Monte Castelo e Montese, denominando dois dos bairros de nossa capital. Nesse período, os norteamericanos montaram bases de apoio em alguns estados do Nordeste. Aqui no Ceará 24
ela foi construída onde hoje se localiza o Campus do Pici. Eles trouxeram aviões de combate com tecnologia mais avançada, sendo vários dos nossos pilotos treinados nesses equipamentos modernos antes de seguirem para o front. Das 117 ruas que atualmente compõem o bairro de Aerolândia, 25 homenageiam militares, mortos em acidentes aéreos no perímetro urbano de nossa capital, e os que foram condecorados como heróis por suas participações durante a segunda guerra mundial. Seus nomes estão gravados nas placas das principais ruas, talvez uma recompensa por perderem suas vidas prematuramente. Há casos de vítimas de desastre aéreo, como ocorreu com o piloto tenente Roma, que foi homenageado com seu nome em uma das principais vias públicas do bairro. As demais ruas são alusivas a comerciantes, políticos, profissionais liberais, e também a denominações que podemos considerar inusitadas. No Conjunto Residencial Cocó, localizado dentro dos limites do bairro, deparamonos com a rua da Monarquia, da República, da Assembleia, do Príncipe, do Reinado, dos Ministérios, do Palácio, do Governo, do Parlamento e do Congresso. No Conjunto Residencial BR-116, encontram-se outras contrastantes denominações, como a rua dos Antares, da Sagrada Família, da Trindade, das Sete Estrelas, da Cinderela, do Livramento, da Ponte Grande, da Santa 25
Joana D’arc, Maringá, Todos os Santos, Monte Cristo, e a inesperada rua Cláudio Coutinho, em homenagem a esse técnico de futebol que causou grandes controvérsias com sua proposta tática. Para ele, todo jogador escalado para a seleção teria mais de uma função em campo, dissipando, dessa forma, as posições tradicionais. A “polivalência”, como ele próprio denominou, não obteve resultados muito positivos, sendo alvo de inúmeras críticas pela crônica esportiva especializada e de obervadores natos do futebol. Para um bairro assomado de ruas com denominações tão marcantes, a família de Cláudio Coutinho, nascido na cidade gaúcha de Dom Pedrito, certamente se sente muito à vontade com a homenagem. O que não se sabe é se ele ao menos pisou no solo fértil e histórico do bairro da Aerolândia. Cheguei à Aerolândia por volta das 21h, procedente de Aracoiaba. Era o ano de 1965. A minha impressão foi de encontrar algo totalmente estranho ao meu dia a dia em Aracoiaba. Tinha sete anos e saía pela primeira vez do convívio de amigos já bastante familiarizados. Chorei muito nos primeiros dias. Saudades dos amigos e da cidade. A casa onde fui morar ficava na rua Tenente Aurélio Sampaio, 206. Uma rua que ainda não tinha calçamento e era bastante esburacada. 26
O Misto que nos trouxe, juntamente com a mudança, quase não chegou à porta da nossa nova casa. Chovia muito, e para completar, ainda faltava luz. Quando se iniciaram as aulas, fui matriculado no Grupo Escolar Edith Braga. Confesso que fiquei um pouco surpreso com o tamanho da escola e seu número de alunos. A fila da merenda era grande, e tínhamos como opções de lanche canja, mingau de milho etc. Com o passar dos dias, fui me adaptando. Fiz novas amizades e as brincadeiras de rua ressurgiram. Algumas delas eram as mesmas de Aracoiaba: pião, sete pecados, triângulo e a famosa arraia. Morei na Aerolândia por mais de quinze anos. Esse bairro ainda é pra mim um local de boas recordações. Tinha o verso de uma música que minha mãe, Dona Antonieta Ramos de Melo, sempre cantarolava depois que nos mudamos de lá: “Ai que saudade me dá...”. Na Aerolândia foi onde despertei para o universo artístico e musical. Meus primeiros acordes nasceram do violão de meu irmão José Maria, quando ele, sentado no muro frontal da casa, costumava tocar para chamar a atenção das meninas que retornavam da escola e de seus passeios.
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Foi da Aerolândia que também saí para conhecer o mar, levado pela família Nobre Façanha, Seu Aldenor e dona Dinair. Eles me tinham como filho. Sempre que posso retorno à rua onde morei. A casa ainda está lá, o colégio, a mesma bodega onde vi meus irmãos jogarem sinuca, beberem cervejas. Conservo muitos amigos dessa época. Ainda grande parte deles se encontram no mesmo local. Morar na Aerolândia continua sendo o maior dos meus orgulhos! Foi onde começou a se fixar em mim a consciência cidadã e onde se desenvolveram meus dons artísticos.
Marcelo Melo, músico e compositor.
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A escola de dona Detinha e o Grupo Escolar Edith Braga
E
xistem vários estabelecimentos de ensino, entre públicos e privados, no bairro da Aerolândia.
Uma das mais antigas escolas do bairro é a Escola de Ensino Fundamental e Médio Estado do Pará, inaugurada em 01 de março de 1948, local onde já funcionou a Escola Campo de Aviação, mantida também pelo governo do Estado. A primeira escola que frequentei no bairro da Aerolândia tinha a orientação pedagógica de dona Detinha (Aldete Rodrigues Marinho). Funcionava numa das salas de sua casa, à rua Capitão Olavo, entre a Capitão Clóvis Maia e a Tenente Roma. Eu estudava pela manhã. E quase sempre sentia saudade de meus primos Nogueira Filho e Paula Neto. Ficava imaginando eles brincando no jardim ensolarado de sua casa, sob a vigia de Tetê (Tereza Pereira Cruz), para não pegarem o sol depois das nove, ao tentarem ampliar os limites da sombra produzida por um lindo pé de Acácia. Tia Sarita era funcionária graduada do Instituto Nacional de Serviço Social – INSS, e, para a nossa alegria, costumava trazer alguns brinquedos comprados na Loja 29
Progresso, que havia na esquina da rua Pedro Pereira com Solon Pinheiro, num dos lados do Parque da Liberdade, mais conhecido por Parque da Criança. Quase sempre no início da noite, tia Sarita chegava do trabalho no Jeep de seu esposo, meu primo Gerardo Nogueira, portando um embrulho com papel de presente. E a gente já sabia do que se tratava. Mais brinquedos. Minha tia Sarita, como é chamada por todos da família, ainda hoje estampa alegria em seu semblante ao lidar com seus filhos e parentes. Para somar ao nosso divertimento, minha mãe também costumava nos presentear. E eu corria para mostrar aos meus primos o presente da vez. A gente trocava os brinquedos. Tomava emprestado. Vivíamos dessa algazarra lúdica. Inventávamos muitos outros brinquedos a partir dos que ganhávamos... Bolas se transformavam em aviões redondos. Carros em navios. O Fort Apache numa nova cidade. Tínhamos a certeza que esses empreendimentos imaginativos podiam a qualquer dia vir a se tornarem reais, e nós, famosos por tê-los inventado. Certo dia elaborei um plano para sair da aula mais cedo e ir brincar com meus primos. Disse a dona Detinha que necessitava tomar uma injeção muito forte. Não há dúvidas que ela percebeu de imediato a minha trama tão carente de versatilidade. Para a minha surpresa, depois de 30
um olhar pensativo, acabou cochichando em meu ouvido: “Que a sua mãe nunca saiba dessa injeção... Você não vai é brincar com seus primos?”. Foi uma glória ter conquistado a simpatia de dona Detinha. Jamais me esqueci dela, com seu olhar terno e compreensivo. Assim, fez-me ser inventivo sem medo. Eu nasci na avenida Mons. Tabosa, próxima à Igreja da Prainha. Fiz o meu primário na Phaternon Santa Luzia, dirigida pela doutora Leirisse Porto. O ginásio foi no Santa Lúcia. Vim com 12 anos residir aqui no bairro. Minha mãe comprou uma casa aqui na Aerolândia. Quando me formei em pedagogia, no Colégio São José, resolvi montar a minha própria escola, no início dos anos 60, a Escola Nossa Senhora de Fátima. Até então só existia aqui a escola da dona Climeide, que funcionava à rua capitão Uruguai. Naquela época a gente exigia muito dos alunos. A tabuada era temida por todos eles. Havia até castigo para quem desobedecesse e não desse de conta das matérias estudadas. Eu só aplicava castigos para aprofundar o conhecimento. Quando eles não cumpriam com as tarefas para fazer em casa, eu mandava que copiassem o mesmo conteúdo do livro várias vezes. 31
Dirigi a escola e ensinei até 1969, quando resolvi me casar e fui morar em Belo Horizonte. Ao retornar, depois de quatro anos, somente me dediquei a criar os filhos. São quatro. Ainda hoje encontro alguns dos meus ex-alunos que aproveitam para me agradecer o que aprenderam comigo.
Professora Detinha (Aldete Rodrigues Marinho), aposentada pelo INSS.
Nogueira Filho e Paula Neto estudavam à tarde na escola de dona Detinha. Dois anos depois foram matriculados no Colégio Cearense. Eu, no Grupo Escolar Edith Braga, inaugurado em 1955. Estudei no Edith Braga no ano de 1966. Lembro-me ainda da minha fascinação por uma bandinha de música que fez uma apresentação para nós, alunos, e tivemos a permissão para pegar nos instrumentos. Eu não sabia qual deles escolhia primeiro para saciar minha curiosidade. Ver aqueles instrumentos todos de perto foi uma grande novidade. Por dias, recontei para meus pais, irmãos e visitas. Aqueles instrumentos construíram certamente em mim o caminho musical... 32
Jamais conseguiremos ser criança por toda a vida. O tempo costuma passar rápido demais com suas lonjuras, para não nos cansar. Sem ao menos esperarmos, trocamos as arraias, o triângulo, os piões, a brincadeira de esconde -esconde, de pega-pega e de manja por outros interesses também sedutores. Nasceram as primeiras paixões.
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Do Clube Recreativo Aerolândia às Tertúlias
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Clube Recreativo Aerolândia (CRA) acomodou em seus bailes memoráveis e primorosas noitadas de confraternização e sortilégio, principalmente quando eram animados por Ivanildo e sua banda, sempre os mais concorridos. A escolha do dia do baile, os comentários a respeito da banda contratada; a corrida de jovens e senhoras às costureiras do bairro com tecidos e modelos de roupa da moda vigente era outro acontecimento. Os preparativos eram tantos. Havia até “olheiras” disfarçadas que se demoravam pelas janelas das residências dessas profissionais da vestimenta e da roupa. Houve casos em que se descobriu a confecção de um mesmo modelo por costureiras distintas. O fato causou grandes constrangimentos e provocou despeita, chegandose até a desavença, principalmente quando uma das envolvidas preferia retornar a suas casas, deixando para trás pretensos namorados a mercê da simpatia de suas rivais. No dia do baile, os homens marcavam presença nas barbearias do senhor Raimundo Barbeiro (à rua Aspirante Mendes), do Antônio (à rua Brigadeiro Vilela, do Bolinha e do Didi da Base. Os dois últimos já faleceram, 34
e suas barbearias funcionavam ao lado do Mercado, enquanto que as mulheres do bairro costumavam frequentar o Salão de Beleza Ester, localizado à rua tenente Roma. A maioria dos moradores seguia a pé e logo se encarregava de adentrar para o interior do clube, permanecendo em sua frente um grande número de curiosos sem condições econômicas necessárias para comprar o ingresso, como também pelo motivo de não serem associados ou de se sentirem parte da sociedade local. Ocupando o espaço onde outrora fora o Sítio Santa Clara, entre a porta de entrada e a BR-116, esse aglomerado de curiosos se restringiam à animação de participar da festa ouvindo simplesmente a música tocada e a saborear o famoso “churrasquinho de gato” para amenizar o teor forte da “bicada” da cachaça. Comum eram as moças e senhoras menos favorecidas social e economicamente a assistir a chegada de suas patroas e filhas vestidas com a nova peça do guarda-roupa, quando no outro dia também colhiam sua observação: “Você acha que me destaquei mais que fulana?...”. Os bailes eram abertos com a fala do presidente do clube, quando este pedia, em tom cerimonioso, pela atenção de todos! Com esse alerta, o silêncio passava a imperar, salvo um ou outro som produzido pela afinação dos instrumentos. 35
O senhor Jerônimo Pereira da Costa, primeiro presidente, costumava nesse momento fazer alguma prestação de contas e anunciar as próximas atrações, como as festividades juninas e a escolha da rainha do bairro, que posteriormente concorria com as escolhidas pelos bairros do São João do Tauape, Pio XII, Jardim Guanabara e Floresta, evento muito propalado que arrebanhava imensas torcidas organizadas ali atentas com faixas e dispostas a retumbantes aplausos ou vaias, conforme suas preferências. Como uma grande largada musical, logo os casais ocupavam o local próprio para a dança, enquanto os jovens, ainda sem pares, ficavam à espreita de suas paqueras, ávidos por se aproximarem e lhes fazer o convite para dançarem. Nem sempre rejeitados, pois seus olhares antes já afirmavam o aceite, nessas noites alegres e fortuitas, firmaram-se muitos casais, ainda hoje moradores do bairro e que deram surgimento à população local. Construído onde hoje funciona a Madeireira Pica-pau, inúmeras foram as tertúlias ao som da vitrola, ou Hi-Fi, como assim também era chamado esse tipo de entretenimento. O CRA foi considerado, em 1955, pela Prefeitura Municipal de Fortaleza, importante recinto social e de lazer para os moradores do bairro, para o qual chegou a transferir aporte financeiro.
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Doze anos após ser fundado, o CRA encerrou suas atividades, deixando para a memória seus bailes e tertúlias. *** Havia também outros locais de entretenimento no bairro da Aerolândia. O Grande Ponto, situado entre a Capitão Olavo e a Djalma Petit, tornava-se convidativo; além da bebida, pelo jogo de sinuca, quando era comum seus frequentadores vararem noites inteiras sob a mira do taco, ganhando ou perdendo as partidas, quando não muito elaboravam alguns pequenos e informais torneios. De acordo com os autores do livro Aerolândia, seu povo, sua história: de sua origem aos dias atuais, de Francisco Caminha e João Luís Filgueiras, existem outros locais de encontro tradicionais nesse festivo bairro, como, por exemplo, o Bar do Genésio onde serve merenda até altas horas da noite; o Bar do Mestrinho e o Bar do Josias que funcionavam nos boxes do Mercado da Aerolândia; além do estabelecimento comercial de dona Josina, frequentado por grande número de negociantes procedentes do interior com o intuito de venderem seus produtores diretamente aos participantes da feira montada às margens da BR-116. *** 37
Sempre com a fama de ser um lugar de gente festeira, a rua Djalma Petit ficou em segundo lugar num concurso promovido durante a Copa do Mundo de 2002, por sua tamanha animação e tão bela decoração, que acabou cravando ainda mais essa imagem sobre os moradores do bairro. Um bar inovador e ousado se destacou na noite da Aerolândia, o The Wall. Fundado na década de 80, arrebatou frequentadores de muitos recantos da nossa capital, devido ao seu excelente repertório e atrações artísticas, principalmente da cantora Joana Angélica e Isaac César. Nos dias dessas apresentações, crescia a disputa por mesas com melhor localização frente ao palco. O Bar The Wall não existe mais. Durante alguns anos funcionou à rua Tenente Roma, nas proximidades da avenida Raul Barbosa, até se mudar para a Washington Soares, onde acabou fechando as portas. E virou memória. Com o tempo, a Aerolândia se voltou novamente para a BR-116, engatada pelo ramo das churrascarias, pizzarias e lanchonetes. A Churrascaria de seu Manoel, localizada onde funciona hoje a Skina do Baião, foi a primeira do bairro. Tem outras. E tem também a Ciclo-Burguer, na esquina da BR-116 com Tenente Wilson.
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Nasceram as paixões ao som das tertúlias... Era comum indagarmos sobre onde seria a do fim de semana. A que a gente mais frequentava era promovida pela Tânia e sua mãe, Bia Pereira Cruz, família muito querida e respeitada entre os vizinhos. E ainda hoje moradoras da rua Capitão Clóvis Maia. Geralmente nos demorávamos um pouco na calçada das casas que promoviam tertúlias, para trocarmos conversas sobre as novidades da semana, aproveitando também para espiar nossas pretensas paqueras, com as quais flertávamos. De acordo com a reação delas, sentíamos ali o passe livre para o convite à dança, muitas vezes sob o ritmo de Grease, nos tempos da brilhantina, lançamento musical costurado por John Travolta e Olivia Newton John, além de outros demais hits dançantes da discoteque. E tudo explodia numa verdadeira apoteose de emoção! Grandes sucessos nacionais também tocavam soltos na radiola, tais como as músicas contidas no LP “Década Explosiva”, Quem é ele, música de lançamento da cantora Miss Lene; Paralelas, do Belchior, também interpretada por Maria Zenaide; Pertinho de você, da atriz Elizangela; Revelação, do Fagner; e Não Chore Mais (No Woman No Cry), de Bob Marley, mas na versão do Gilberto Gil. Elas nos deixavam numa vibração romântica desafiante.
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Por essa época comecei a manter contato mais direto com a realidade brasileira, ao tomar conhecimento da existência de organizações clandestinas e de seus militantes comprometidos com as expressões da liberdade, trancafiados em “aparelhos”, a mercê da tortura nas prisões, do assassinato disfarçado e do banimento involuntário de inúmeros deles do convívio familiar, e do nosso país, promovidos pela ditadura civil/militar. Durante a campanha pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita, ocorrida em 1979, fui conhecendo a existência de outro Brasil. O Brasil da punição arbitrária. E com o regresso de políticos, intelectuais e artistas do exílio, o sentimento de liberdade se exaltou ainda mais em minha consciência. Mas dois anos antes, em 1977, quando saí de Limoeiro do Norte para residir em Fortaleza, a fim de dar continuidade aos estudos, jamais deixei de frequentar as tertúlias da Aerolândia nos fins de semana. Hoje, caminhando por suas ruas, e novamente olhando para suas placas indicativas, percebo mais uma vez a força que o conceito de herói pode influir sobre todos nós, mesmo que essas homenagens a militares da Base Aérea de Fortaleza tenham sido oficializadas em outro contexto histórico. De modo algum desejo me ater aqui ao julgamento de merecimento ou não de qualquer um dos pilotos mortos 40
em acidentes aéreos no perímetro urbano de nossa capital, e aos que foram condecorados como heróis por suas participações durante a segunda guerra mundial. A Aerolândia é um bairro sábio, ensinou-me inúmeras sutilidades... Cheguei para morar na Aerolândia em 1954, com as minhas irmãs Adélia e Vanda. A casa ficava à rua tenente Wilson, 50. Somente passados alguns anos foi que nos mudamos para a rua capitão Clóvis Maia. Em 20 de agosto de 1959 me casei com o sargento da Aeronáutica, Gerardo José Nogueira, e tivemos dois filhos, Gerardo José Nogueira Filho e José Olímpio de Paula Neto. Para mim, existem inúmeros acontecimentos importantes do tempo que morei na Aerolândia. Foi lá que criei meus dois filhos, que convivi socialmente com as pessoas do bairro, as quais ainda prezo muito. Minha casa vivia cheia dos amiguinhos de meus filhos. Eu sempre gostei de muita alegria. Uma vez promovi um casamento junino no quintal lá de casa, que era muito grande, quase um sítio. Tenho ainda fotos dessa festa. Nogueira filho foi o noivo. A noiva foi a Narda, filha do nosso estimado vizinho, seu Plácido Moreira. Muitas crianças do 41
bairro participaram acompanhadas de seus pais. Você, Gylmar, estava lá e era muito pequeno. Sempre com esses seus olhinhos azuis brilhantes. Lembro bastante dos encontros sociais nos finais de semana no Clube Recreativo Aerolândia, com nossos grandes e estimados amigos da rua capitão Clóvis Maia, tais como seu Bessa Nogueira, Adauto Lopes e seu Betinho, todos sempre acompanhados de suas esposas. Eles faziam parte da diretoria do CRA. Por esse tempo eu trabalhava no Instituto de Aposentaria e Pensão dos Comerciários – IAPC, hoje Instituto Nacional de Serviço Social. Era sempre uma alegria retornar para casa no início da noite e encontrar meus filhos brincando nas calçadas em total segurança. Quando retorno ao bairro da Aerolândia, uma grande emoção ainda me invade. Desse querido bairro, com meus filhos já matriculados na universidade, fomos morar na avenida Luciano Carneiro, próximo ao antigo Aeroporto. Nada deixei para trás. Uma parte da minha vida está na Aerolândia. Sarah Faheina Nogueira, aposentada do INSS. 42
Nasceu o comércio
A
principal base de economia do Ceará já foi a cultura do gado. Em muitos dos bairros de nossa capital a produção de leite e carne era comum, e mantinha aceso esse comércio local.
Na Aerolândia existiam alguns currais. E até vacarias. Todos os dias o leite chegava à porta das casas transportado em grandes vasilhames; uma lata de litro servia como medida para o momento da venda. Consta que os mais famosos vendedores a se debruçar na lida diária pelas ruas eram os senhores Chico, Gentil e Antonio Ademir. É o que está registrado na memória dos moradores da comunidade. A carne também se vendia pelo bairro, e era comercializada num precário matadouro de propriedade do senhor Saldanha. O que não se aproveitava de bois e vacas era despejado inescrupulosamente nas margens e no leito do rio Cocó, principalmente no período do verão. Não havia, por essa época, nenhum órgão de fiscalização e uma consciência ecológica e cidadã como nos dias de hoje. Somente depois de alguns anos, o senhor José Lessa montou um açougue, favorecendo melhor higiene 43
no trato com as carnes e a comodidade de compra dos consumidores. Além do leite e da carne, muitos outros produtos de consumo doméstico careciam na Aerolândia. Geralmente, peixes, verduras, frutas e legumes só eram encontrados à venda na feira permanente localizada às margens da BR-116. As feiras livres também passavam pela Aerolândia, às margens da BR-116. Uma infinidade de produtos era vendida, de materiais de construção ao feijão. Bem diferente do consumo do pão, vendido de casa em casa pelas ruas do bairro dentro de um balaio acomodado na garupa de uma bicicleta. Proveniente das padarias centrais, principalmente do Atapu e do Joaquim Távora, o pão da moda era o semolina, feito da farinha granulada extraída do grão de arroz. Os pães eram compridos e certamente continham menos fermento, como os atuais, tão prejudiciais à saúde. No final da década de 1960 e início da década de 1970 muitas bodegas foram abertas onde costumava-se encontrar à venda inúmeros gêneros alimentícios. Algumas chegavam a ter uma verdadeira variedade de produtos, que iam da lamparina, fumo de rolo, passando pela rapadura, cachaça e refrescos, agulhas e botões, até o óleo comestível, a farinha, o feijão e o arroz.
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Por essa época, podemos dizer de maneira romântica, os casais de namorados também foram agraciados. Dona Fausta das Flores montou uma floricultura à rua Jayme Andrade. De grande benefício aos pretendentes pelas moças do bairro e aos apaixonados, essa floricultura foi de grande utilidade, tanto para os dias de finados, como para os casamentos celebrados na igreja local, consagrada a Nossa Senhora do Sagrado Coração, situada à rua capitão Uruguai, na altura do número 300. De muita valia para os fiéis do bairro, na década de 50, vários setores da sociedade aerolandense se envolveram com sua ampliação. Para a aquisição da verba necessária foram realizadas quermesses. Barracas repletas de comidas típicas, escolhas da rainha, leilões e até aluguel do terreno onde se estenderia a reforma fizeram parte da arrecadação. Parques e circos acamparam ali, que além de contribuírem com o pagamento do aluguel pelo período de funcionamento, ainda divertiam a população local e os visitantes. Muitas outras igrejas foram instaladas na Aerolândia para suprir a fé de seus moradores. Consta ainda a Capela de Santo Antônio, diversos templos e congregações evangélicas, e a Instituição Espírita dos Seguidores de Jesus.
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Veio, então, o Mercado da Aerolândia, inaugurado em 27 de março de 1968. Logo se tornou um ícone de nobreza e desenvolvimento local. Sua estrutura em Art Nouveau, que segundo o historiador Tião Ponte, estilo bastante enfeitado que reinou absoluto durante o período da belle époque, foi parte do Mercado da Carne de Fortaleza, tornando-se posteriormente mais conhecido por Mercado de Ferro, devido sua estrutura toda feita de peças de ferro importadas da França. Montado na antiga praça Carolina, nas proximidades onde funcionou a Assembleia Legislativa do Ceará, e atualmente está o Museu do Ceará, em 1937, sua estrutura deu origem a outros dois mercados: o dos Pinhões e do São Sebastião. Alguns anos depois, uma reforma no Mercado São Sebastião levou à afamada estrutura de ferro do Mercado da Carne, ali utilizada para a construção do Mercado da Aerolândia. Constituído de 52 boxes divididos em dois espaçosos corredores que dão para suas portas laterais, o Mercado da Aerolândia dispunha dos mais variados gêneros alimentícios, fornecendo às populações de bairros vizinhos e até de cidades pertencentes à região metropolitana de Fortaleza, principalmente as localizadas no lado sul, grande comodidade. 46
O Bairro, legitimamente integrado às expressões do comércio, da educação, da cultura e do entretenimento, terá no antigo Mercado da Aerolândia, tombado pela Prefeitura Municipal de Fortaleza, e que está em reforma, um centro de cultura e de artesanato. Antes de residir na Aerolândia, eu e minha esposa Stela morávamos num sítio, na comunidade chamada Volta, município de São João do Jaguaribe, onde casamos em 1960. Nasci em 1935, e lá permaneci até 1967. Nesse período, fui motorista do meu pai, de 1951 a 1959, dirigindo um Chevrolet 1943. Em 1959 eu comprei um Misto e passei a transportar passageiros e mercadorias da comunidade do Castanhão para Fortaleza. Depois, vendi o Misto e comprei um caminhão 1961, e fui transportar cargas variadas, tais como banana, oiticica, algodão etc. Em 1962, troquei a carroceria desse caminhão por um tanque de combustível. E continuei transportando banana e oiticica em cima do tanque, quando retornava vazio, após entrega do combustível nos postos da região. Em 30 de março de 1967, vim morar em Fortaleza, no bairro da Aerolândia, à rua Capitão Olavo, 812. 47
Ainda em 1968, comprei um terreno à rua Capitão Clóvis Maia, 405, para guardar meu caminhão. Não sabia, mas ali nascia a Lima Transportes Ltda. Em 1978, fui morar à rua Major Gerardo Mendes, 451 (atual Rua da Asa). Meus filhos nasceram todos no Sítio Volta. E foram todos criados na Aerolândia. São eles os meus principais funcionários, a minha extensão. A Aerolândia me deu esse momento promissor de me fazer na vida, tanto profissional quanto familiarmente. Hoje, tenho onze netos e um bisneto. Amo a minha família! Embora não resida mais na Aerolândia, encontro lá as minhas origens quando da minha chegada em Fortaleza.
Lauro de Paula Lima, empresário do ramo de transportes.
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Um bairro também sobrevive da saúde
E
m seus primórdios, faleciam na Aerolândia muitos de seus moradores, principalmente pela ausência de recursos médicos e clínicos com suportes técnicos disponíveis. Até os anos 1960 e 1970 era comum a notícia de mortes prematuras de crianças e adultos, vítimas do sarampo, caxumba e outras mais. A precariedade da saúde era tão assustadora que a população costumava assistir a enterros de recém-nascidos “transportados em caixas de papelão ou madeira confeccionadas de maneira artesanal até o Cemitério da Messejana, o mais próximo da região”, revela-nos Francisco Caminha e João Luís Filgueiras, em seu livro Aerolândia, seu povo, sua história: de sua origem aos dias atuais. Sobre os serviços relativos à saúde da população, o bairro conta hoje somente com o Posto de Saúde César Cals de Oliveira, que a cada dia se torna insuficiente para as necessidades clínicas e ambulatoriais, além de umas poucas farmácias. Meu pai se chamava João Pereira de Sousa, mas era conhecido como Pererinha. Ele nasceu na cidade de Piancó, na Paraíba, e veio para o Ceará nos idos dos anos 40, para servir o Exército. 49
Depois de sair do exército, foi trabalhar no Departamento Nacional de Estradas e Rodagens; hoje, Departamento Nacional de Infraestrutura e Rodagens, situado no Cajazeiras, bairro mais ou menos próximo daqui da Aerolândia. Ele era enfermeiro prático. E por esse tempo montou três farmácias. O nome de todas elas era Farmácia Aerolândia. A primeira foi aqui na esquina da rua Capitão Vasconcelos com a Capitão Clóvis Maia. A segunda, na esquina da Campo Verde com a José Buson, e a terceira, na avenida Visconde do Rio Branco, 5435. Atuou como farmacêutico durante mais de 50 anos. Em 2005, Deus resolveu levá-lo para junto dEle. Aqui onde ele fundou sua primeira farmácia, acabei montando um bar que funciona até hoje: “Antes aqui se curava, hoje, se mata de cirrose hepática”. Todos dizem que meu pai foi um farmacêutico exemplar. Homem que não media esforços para amenizar a dor de alguém, ou curá-lo de suas doenças.
Francisco Admar Castro de Sousa, filho. 50
Uma líder comunitária e os aparatos sociais
C
om os mesmos propósitos de cidadania, surgiram na Aerolândia inúmeras lideranças comunitárias, dentre as quais aqui destaco dona Raimundinha do Lagamar.
Líder sempre ativa e emblemática, por mais de 50 anos participou de inúmeras lutas em quase todos os setores necessários ao desenvolvimento humano e de comodidade urbana, incluindo a educação, a saúde e serviços sociais do bairro. Pedagoga, sua contribuição era constante nas ações de educação junto às professoras locais. Enfermeira habilidosa, constantemente era procurada para fazer curativos, aplicar injeções e ajudar com o internamento em hospitais da capital de enfermos mais graves. Participou da construção da Igreja de Nossa Senhora do Sagrado Coração, foi uma das primeiras catequistas. Trabalhou incansavelmente junto à Secretaria dos Transportes da Prefeitura de Fortaleza para a ampliação do trajeto da linha de ônibus que trafegava pelo bairro. Empreendeu grandes esforços para a construção do Conjunto Tancredo Neves por motivo da desapropriação dos moradores situados às margens da BR-116. Quando da ocorrência da invasão nas duas margens do rio Cocó, ficando desamparadas inúmeras famílias, dona 51
Raimundinha ajudou na aquisição, junto ao governador, de 838 casas do lado direito do rio Cocó – Conjunto Tasso Jereissati, e organizou em regime de mutirão e construção de 561 casas do lado esquerdo – Conjunto Rio Cocó. Candidata à vereadora em 1992, foi contemplada com dois mil votos. E por ter ficado na suplência, conseguiu assumir o cargo por um período de três meses. No ano de 2007, ela se foi para a morada do Pai, deixando à população local relevantes serviços prestados por ela e muitos outros líderes empenhados em favor do bairro. Hoje a Aerolândia conta com a ação cidadã de inúmeras instituições, Organizações Não Governamentais e associações públicas e privadas. Para citar a convivência de seus habitantes com algumas delas, relacionamos o ABC Lagamar, que também atende comunidades vizinhas e se localiza à rua Monte Cristo, 191; a Fundação Marcos de Bruin, à rua Hermínio Barroso, 160; o Centro de Desenvolvimento Infantil, à rua Capitão Aragão, 863; o Instituto Marinho Palhano, à rua Major Gerardo Mendes, 74; Irmãos de Santa Teresinha e da Santa Madre Maravilhas de Jesus, à rua Capitão Uruguai, 384; o Projeto Criança Mais Vida, à rua Capitão Nogueira, 579; a Rádio Comunitária – FM Sucesso, à rua Coronel Gonçalo, 221; a SOAVIDA – Sociedade de Apoio 52
e Defesa da Vida, à rua Tenente João Albano, 180; a Sociedade de Habitação Popular da Aerolândia, que funciona no Conjunto Habitacional BR-116; além de outras tantas, tais como a Associação das Prostitutas do Ceará – APROCE, à rua Capitão Uruguai, 290; a Associação dos Moradores do Lagamar, à rua Capitão Aragão, s/n; a Associação Cearense da Indústria da Panificação, à rua Capitão Aragão, 400; o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará – SINDIÔNIBUS, à avenida Borges de Melo, s/n; o Centro de Apoio ao Cidadão – CEACI, à rua Capitão Olavo, 897; o Posto de Saúde César Cals de Oliveira, à rua Capitão Aragão, 555; a Frente Beneficente para a Criança, à rua Capitão Uruguai, 393; e a Companhia de Polícia Militar Ambiental, à avenida Raul Barbosa, 6801.
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O caminhão do seu Silva nos levava aos jogos do Time da Garotada
O
domingo me parecia o dia escolhido por Deus para coroar a semana de alegrias. Logo cedo, em companhia de meu irmão mais velho, Gilson Chaves, esperava o momento de seu Frota arrancar com seu caminhão rumo à praia do Ideal. Aquelas areias, as conchas, a beleza das ondas vencendo a quentura do sol, o picolé para dar uma refrescada, o cuidado para não se perder entre os banhistas são memórias que rebentam de vez em quando de minha infância por essa época. E os domingos sempre terminavam com mais emoções. Pela tarde, sobre a carroceria do caminhão de seu Silva, íamos para o Estádio Presidente Vargas assistir jogar o glorioso Fortaleza Esporte Clube, o Time da Garotada. Na parte traseira da cabine do caminhão havia uma janelinha, por onde meu pai, em conversa solta com seu Silva sobre as possibilidades de vitória do iminente jogo, controlava nossos movimentos sobre a carroceria. Meu irmão Gilson e eu, misturados a tantos outros torcedores mirins e adultos que aproveitavam a mesma carona, entretínhamonos com a algazarra durante a viagem sem nos ater às possibilidades de perigo por nos aproximar das grades laterais. 54
Certa feita, até o nosso cachorro foi ao Estádio. Às escondidas, o colocamos entre os torcedores. Meu pai o trouxera para nosso convívio ainda novinho, presente de um amigo tabuleirense que sempre nos visitava. Colocamos o nome dele de Danúbio. Seu pelo era uma mistura do louro com o branco, ninguém conseguia superá-lo a correr solto pelas ruas da Aerolândia. Sempre amistoso com as pessoas, dava a impressão de rir do cotidiano. Todos respeitavam Danúbio. Ao tentar seguir carros e caminhões aos latidos, os motoristas costumavam frear bruscamente para não atropelá-lo. Demonstrava viver bastante feliz com as cachorras da redondeza. Linda e fogosa, uma delas frequentava assiduamente as bandas lá de casa. Por um tempo ela passou por nossa calçada com os olhos bastante espiadores, numa marcha mediana a balançar o rabo serelepe, principalmente se o avistava. Ao que tudo indica, esse namoro canino teve um final prematuro. Não sabemos ao certo a causa do sumiço da sedutora namorada de nosso cachorro Danúbio. Conjecturas entre os vizinhos davam de ter ocorrido uma decepção afetiva, ou até mesmo vítima de morte trágica. Em consequência da ausência dessa formosa cadela, por dias nosso gracioso Danúbio se comportou de maneira estranha, principalmente em relação aos caminhões feirantes. 55
Numa tarde bastante nublada, eu e meu irmão Gilson, sentados na área lá de casa, presenciamos sua desventura, ao ser atropelado por um dos caminhões feirantes que não conseguiu livrá-lo dos pneus traseiros. Danúbio ainda tentou se sustentar em pé mirando em nossa direção. Mas, caminhões são pesados, e o amável Danúbio nos deixou, para a nossa grande tristeza, que perdurou dias, meses, hoje até... sempre ao recordarmos. Quanto ao seu Silva, depois de assistir ao jogo entre o time do Fortaleza e do Palmeiras, onde ocorreu uma variação muito grande de placar, no qual o Tricolor de Aço saiu de campo vitorioso com quatro tentos a favor contra três do Palmeiras, ele retornou para casa cheio de emoção. Como fazia quase todas as noites, sentou numa cadeira de balanço no jardim de sua casa, que não tinha muro divisório com a rua, de onde desfiava conversas com vizinhos e passantes. Nessa mesma noite do jogo, seu Silva resolveu ir fazer parte de outra torcida. Sua predileta cadeira de balanço ficou solitária. Todos foram dormir e seu Silva bem sentado no jardim ali permaneceu. Sem que ninguém pudesse imaginar, ele jamais retornou para o interior de sua casa. Ao alvorecer do dia, em não responder aos cumprimentos de bom dia 56
dos vizinhos e passantes, percebeu-se que levara para o céu a glória da vitória do Fortaleza sobre o Palmeiras. Os desportistas da Aerolândia também tinham outro time para torcer. Era o Calouros do Ar Futebol Clube, embrionário dos vários campos de futebol de areia do bairro. Segundo os autores do livro Aerolândia, seu povo, sua história: de sua origem aos dias atuais, Francisco Caminha e João Luís Filgueiras, tudo começou por volta de 1940, quando um menino, juntamente com seus coleguinhas, José da Silva Porto, resolveu fundar uma agremiação esportista, o América Futebol Clube. Somente em 1952, todos já rapazes formados, decidiram homenagear os aspirantes da Base Aérea de Fortaleza com a criação de um novo time. Assim nasceu o Calouros do Ar com a camisa do uniforme composto de listras verticais grenás, verdes e brancas, calção branco e meias usadas também com as opções brancas ou verdes, foi assumido especialmente por sua torcida organizada Torcida Uniformizada Calouros do Ar – TUCA, como o “Tremendão da Aerolândia”. Usando o símbolo de uma águia, dois dos mais vibrantes orgulhos dos membros do TUCA, e sua torcida em geral, foi obter vitória por 1x0 sobre o Botafogo, considerado à época um dos maiores e mais reconhecidos times carioca e brasileiro, cuja equipe tinha como integrantes os 57
lendários Garrincha, Didi e Nilton Santos. No ano seguinte, em 1955, o Calouros do Ar brindou sua torcida com o campeonato cearense de futebol. Atualmente, sem licença da Federação Cearense de Futebol para o exercício profissional, no ano de 2005 a Base Aérea de Fortaleza requisitou a sede e o campo de treinamento do Calouros do Ar, aterrando-o posteriormente.
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Depois do fim
M
eus parentes e muitos outros moradores que já se foram certamente ficariam surpresos com o atual cotidiano do bairro repleto de inúmeros equipamentos públicos e privados – valoroso naipe de serviços úteis à sobrevivência e ao conforto local, conquistados em nome de todos. Considero a Aerolândia um ícone geográfico e histórico de nossa capital. É também para mim uma seara inesquecível de acontecimentos e recordações. Belas vivências! E a certeza de seu constante movimento coletivo alcançar cada vez mais dias melhores. Saravá, meus primos Nogueira Filho, Paula Neto, Junior e Ângela Chaves. Pedro, Paulo e Laurinho. Olímpio, Hugo, Neiva, Pedro Hélio e José Maria Almeida. Valdécio Paula, Neto, Agrimar e Francisca. Helis, Betinha, João Batista, Lélia, Luís, Fátima, Lenilce e Rita de Cássia Lima Nobre. Guardo boas recordações da mercearia de seus pais, Francisco Concílio Nobre (in memorian) e Maria Mimosa Lima Nobre. Saravá, primo João Aires, sempre esbanjando cordialidade e alegria em nossos encontros. Cada vez mais tenho a convicção de que o convívio e o carinho familiar 59
contribuem em muito para intensificar laços, propiciandome a construir, neste livro, parte da memória do nosso bairro. Durante a pesquisa e construção da narrativa deste livro emergiu ainda mais em meus sentimentos a certeza da eternização que contém muitas das nossas amizades. Saravá, Tânia e Bia (Maria Gomes de Oliveira). As inesquecíveis tertúlias na sala da casa de vocês ainda me alimentam de doces lembranças. Saravá, Luciano Sales Damasceno, Paulo Morais, Marivone Cruz, Maria Salete Cruz e Moises Fernandes Lima. Saravá, Marilza Lima, Edilberto Santos Ferreira, Adonai e Adoníade Martins Aragão. Saravá, Nadir, Francisco de Assis (Tekinha) e José Maria Frota (Frotinha), filhos do saudoso seu Frota. Saravá, aos irmãos Ivone, Ivonete, Lucineide e Raimundo Mateus de Oliveira. Saravá, Graça, Penha, Jorge e Aparecida Pinheiro, filhos dos nossos inesquecíveis vizinhos da rua Tenente Roma, senhor Pinheiro e dona Tonheira, que juntamente com os vizinhos contíguos, seu Raimundo e dona Ester, e seus filhos Luciano, Regina e Maninha, completavam a cordialidade da boa convivência. 60
Saravá, Ana Maria, Luciano, Rosa Maria, Ossian e Afrânio Moreira, filhos de Francisco Moreira da Costa e Josira Bezerra Moreira, pais dedicados e repletos de alegria, nossos vizinhos quando nos mudamos para a rua Santa Rosa, atual Brigadeiro Vilela. Saravá, minha professora Detinha. Sua capacidade de compreender minhas escapulidas no horário da aula rumo às brincadeiras me reforçou a preservar boas lembranças, a entender que os lugares de afeto se tornam históricos, e, possivelmente, sempre atuais! Aerolândia, jamais te esqueço!
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Referências Bibliográficas AZEVEDO, Miguel Ângelo (Nirez). Cronologia Ilustrada de Fortaleza: Roteiro para um turismo Histórico e Cultural. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, Casa José de Alencar, Programa Editorial, 2001. BORZACCHIELLO, José, CAVALCANTE, Tércia e DANTAS, Eustóquio (Org.). Ceará: Um novo olhar geográfico. 2ª. Ed. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2007. CALVINO, Ítalo. As cidades invisíveis. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. CAMINHA, Francisco e FILGUEIRAS, José Luís. Aerolândia, seu povo, sua história – de sua origem aos dias atuais. Fortaleza: INESP, 2008. CHAVES, Gylmar; VELOSO, Patrícia (Org). Viva Fortaleza. Fortaleza: Terra da Luz Editorial, 2011. GIRÃO, Raimundo. Geografia Estética de Fortaleza. Fortaleza: Imprensa Universitária, 1959. JORNAL O POVO. O Povo nos bairros. Fortaleza, página 8, 13/07/2013. LEAL, Ângela Barros A História passa por esta rua, 2º. Volume, Fortaleza: Multigraf Editora/Fundação Demócrito Rocha, Fortaleza, 1993. PONTE, Tião. “Fortaleza Belle Époque – 1880/1925”. In: Ah, Fortaleza! CHAVES, Gylmar; CAPELO, Peregrina; VELOSO, Patrícia (Org.). Fortaleza: Terra da Luz Editorial, 2006.
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Sites http://www.en.wikipedia.org/wiki/Bert_Hinkle http://www.pt.wikipedia.org/wiki/Amelia_Earhart
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Este livro foi impresso em Fortaleza (CE), no outono de 2015. A fonte usada no miolo é Times New Roman, corpo 11/13,5. O papel do miolo é pólen 90g/m², e o da capa é cartão supremo 250g/m².