Textos de apoio 7º módulo: Públicos da cultura 25 e 26 de novembro
Thereza Penna Firme Gustavo Venturi Maria do Rosário Ramalho
Sesc São José dos Campos Fundação Cultural Cassiano Ricardo 2014 1
A avaliação dos projetos culturais em sintonia com os avanços da avaliação no século XXI Thereza Penna Firme, Ph.D.
A cultura é uma realidade multidimensional e suas características devem ser respeitadas nas suas especificidades em termos de valores, ideais, costumes, manifestações artísticas, descobertas científicas, necessidades e perspectivas, entre outros. Um projeto cultural depende, substancialmente, de uma avaliação competente que sustente seu planejamento e desenvolvimento, sob a responsabilidade de um avaliador culturalmente competente e sensível que se apoia na competência cultural dos integrantes do projeto cultural. Nessa conexão, é que se constrói o processo de transformação e o aperfeiçoamento pleno de um empreendimento cultural de grande alcance. Entender e apreciar cada contexto e inovação cultural é um desafio inadiável. O conceito de avaliação evoluiu aceleradamente nas duas últimas décadas e a prática da avaliação não tem acompanhado esse avanço, o que tem gerado distorções de métodos e resultados. Nesse sentido, a capacitação do educador no que se refere aos padrões da verdadeira, é crucial e urgente para que a avaliação cumpra o seu propósito de promover a transformação. Avaliar pode ser um empreendimento de sucesso, mas também de fracasso; pode conduzir a resultados significativos ou a respostas sem sentido; pode defender ou ameaçar. Ou avançamos na mudança de século, ou tropeçamos. A decisão clama pelo desafio porque as aceleradas inovações teórico-metodológicas na avaliação, como disciplina, estão em descompasso com a prática educacional que, lamentavelmente, salvo algumas exceções, se perde na contramão da trajetória ascensional das grandes tendências que os estudiosos apontam nesses 100 anos de história da avaliação, desde a simples mensuração à negociação de juízos de valor, critérios, procedimentos e resultados. Autores como Guba e Lincoln , Patton , Stufflebeam , Fetterman , Cronbach , Worthen, Sanders e Fitzpatrick , sustentam esses avanços. Dessa desafiadora concepção da avaliação resulta, como imprescindível, a capacitação de educadores, líderes, dirigentes e profissionais, nos vários âmbitos disciplinares, para a melhor utilização da avaliação. Mais especificamente, a formação
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do avaliador é um desafio conseqüente para a avaliação do novo século. É, pois, na medida em que avaliados e avaliadores dialoguem, instituições e sistemas se sintonizem e inteligências múltiplas se complementem, que a avaliação irá emergindo com as suas características
mais
notáveis
de
propulsora
das
necessárias
transformações
educacionais, sociais e culturais e advogada na defesa dos direitos humanos. Assim, o grande desafio nesta era contemporânea da informação não é a capacidade de produzir, armazenar ou transmitir informações, mas sim reconhecer o que é importante saber e, de fato, utilizar essa informação .Nessa perspectiva, a questão crucial é descobrir o que é preciso fazer para criar e desenvolver avaliações que sejam realmente utilizadas para reduzir incertezas, melhorar a efetividade e tomar decisões relevantes. Por isso mesmo, a grande meta da avaliação é a ação. Seu significado maior está em fortalecer o movimento que leva à transformação, nele intervindo sempre que necessário. A preocupação dos estudiosos da área em definir padrões de excelência para a avaliação tal como foi dito anteriormente, gerou um substancial conjunto de critérios agrupados em quatro categorias encabeçadas pela dimensão utilidade, o que significa que uma avaliação não deverá jamais ser realizada se não o for para ser útil. Segue-se a dimensão viabilidade, segundo a qual ela terá que, além de útil, ser conduzida considerando aspectos políticos, práticos e de custo-efetividade. Em sintonia com tais características, e não menos importante, é a ética com que deve ser realizada, no respeito aos valores dos interessados, incluindo grupos e culturas. E, finalmente, se for possível desencadear uma avaliação útil, viável e ética, então será importante considerar a característica precisão, no que tange às dimensões técnicas do processo. Mais recentemente, um novo critério ou standard emergiu e se refere à accountability, traduzido como prestação de contas e se refere à responsabilidade demonstrada no uso de recursos, atividades ou decisões, na realização da avaliação. Tais critérios de excelência clamam, portanto, por avaliações sensíveis à responsabilidade situacional, metodologicamente flexíveis, dinâmicas no entendimento político e substancialmente criativas para integrarem todas essas dimensões na direção do desenvolvimento e do aperfeiçoamento de seu objeto seja ele um projeto, um programa, uma instituição, um sistema ou indivíduos. Cada avaliação deve, pois, revestir-se de características próprias em sintonia com o contexto social, político, cultural e educacional onde se realiza e de forma tal que o avaliador é essencialmente um historiador , que descreve, registra e interpreta a história singular de cada cenário.
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Nessa concepção, que representa um enfoque mais amplo e amadurecido de avaliação, característico da década que vivemos, são levados em consideração os valores, as preocupações e as percepções dos interessados em relação ao objeto da avaliação. É com essa abordagem que a avaliação atinge um clímax de responsabilidade e de participação como facilitadora de um processo de fortalecimento do seu objeto de atenção. Nesse sentido, ela intervém para reforçar potencialidades e sucessos, em vez de meramente registrar dificuldades e fracassos. No concerto dos vários atores e harmonizando a inter-subjetividade na formulação dos juízos de valor, o processo avaliativo terá que adentrar o mérito de seu objeto enquanto valor interno, implícito e independente de quaisquer aplicações; e mais amplamente descobrir sua relevância , enquanto é útil nos seus resultados, repercussões e impactos. É também necessário levar em consideração a importância do processo em questão. A avaliação no significado mais amplo é, pois, um desafio e, para alcançá-lo, a criatividade e a sensibilidade, a objetividade e a subjetividade estão presentes e atuantes, sempre que necessário, para responder com propriedade às indagações e facilitar a ação de aperfeiçoamento. Lamentavelmente, porém, a boa intenção de projetos e programas educacionais, sociais e culturais não basta para sustentar seu desenvolvimento e mais crítico ainda, seus resultados mais relevantes. O campo é desafiador e clama por múltiplas inteligências, profunda sensibilidade e articulada comunicação entre os envolvidos nas complexas dimensões e implicações, que são a marca mais contundente dos problemas sociais que agridem todos os níveis e espaços de uma sociedade. E a nossa não está isenta. Os estudiosos mais atualizados da avaliação têm sido pródigos e criativos na diversidade de concepções teóricas e metodológicas e na busca de abordagens mais capazes de análise, compreensão e intervenção, para o efetivo desencadeamento de impactos. Nessa gama de abordagens e modos de ver, a avaliação vai adquirindo diferentes enfoques sem, contudo, mostrar conflitos ou divergências substanciais. Em síntese, porém, um fator sumamente crucial e que está presente neste momento atual de avanços na avaliação é o respeito à participação efetiva de todos os interessados no processo ou stakeholders e que independente de sua condição social, econômica acadêmica ou outras, são elementos cruciais que devem atuar no processo, desde sua concepção até seus resultados. Somente assim, a avaliação será útil nas necessárias transformações que os programas e projetos sociais, educacionais e culturais pretendem alcançar.
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Thereza Penna Firme é doutora em Educação e Psicologia da Criança e do Adolescente pela Stanford University, Estados Unidos. Atualmente, é coordenadora do Centro de Avaliação da Fundação Cesgranrio. E-mail: therezapf@uol.com.br
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Públicos da cultura - pesquisa nacional Gustavo Venturi Universo: população brasileira (16 anos e mais), residente nas áreas urbanas. Técnica: survey nacional. Amostragem probabilística nos primeiros estágios (sorteio dos municípios, dos setores censitários, dos quarteirões e dos domicílios), combinada com controle de cotas de sexo e idade para a seleção dos indivíduos (estágio final). Amostra: 2.400 entrevistas, com distribuição geográfica em 139 municípios de 25 estados, das cinco regiões que compõem o país (Sudeste, Nordeste, Sul, Norte e CentroOeste), estratificada por localização do domicílio (capitais, regiões metropolitanas e interior) e pelo porte dos municípios (divisão em tercis regionais: pequenos, médios e grandes). Abordagem: aplicação de questionário estruturado em entrevistas pessoais e domiciliares (tempo médio de 45 minutos/ entrevista). A amostra foi dividida em duas sub-amostras espelhadas, aplicando-se a cada uma um questionário específico (A ou B), sendo parte das perguntas comum a ambos, outra parte com perguntas diferentes. Margens de erro: até ± 2 pontos percentuais para os resultados com o total da amostra, até ± 3 p.p. para os resultados das perguntas apenas nas sub-amostras, ambas com intervalo de confiança de 95%. Data do campo: Coleta dos dados de 31 de agosto a 8 de setembro de 2013. Iniciativa e realização: Sesc e Fundação Perseu Abramo (FPA). Coordenação operacional: Núcleo de Estudos e Opinião Pública (FPA) e ECO Assessoria em Pesquisas, sob a orientação do sociólogo Gustavo Venturi (USP).
PRINCIPAIS RESULTADOS LAZER, ATIVIDADES CULTURAIS E USO DO TEMPO Em relação aos principais hábitos de lazer, aproximadamente metade dos entrevistados afirmou que nas horas livres dos fins de semana se dedica a atividades dentro de casa e/ou faz atividades de lazer/entretenimento, como ir a restaurantes, shoppings, sair com amigos, etc. Já entre segunda e sexta-feira, enquanto as atividades
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dentro de casa são mencionadas por 66% dos pesquisados, as atividades de lazer e entretenimento se reduzem a 23%. Considerando-se o total de horas gastas em atividades ao longo da semana, as que fazem as pessoas gastarem maior tempo são: os cuidados pessoais com a própria saúde, incluindo alimentação e tempo dormindo, a realização de algum trabalho remunerado, os afazeres domésticos, assistir TV e o deslocamento de um lugar a outro. Já aos fins de semana, a presença da TV sobe para o segundo lugar, seguida dos afazeres domésticos, passeios e o trabalho remunerado. É importante salientar que o trabalho remunerado está presente nos finais de semana para 31% dos entrevistados. O público-alvo pesquisado, no entanto, tem nas viagens e na companhia da família as atividades mais valorizadas. Quando perguntados sobre quais atividades gostariam de fazer nas horas livres se pudessem escolher livremente, sem a preocupação com o tempo, dinheiro ou permissão, mais da metade citou o desejo de viajar, enquanto 41% citaram a companhia da família, 24% a vontade de cuidar de si mesmo(a) e outros 18% a intenção de descansar e não fazer nada. Os principais locais visitados quando desejam fazer alguma atividade cultural nos fins de semana são os shoppings, cinemas, parques, igrejas, teatros, restaurantes e outros espaços de alimentação e praças. A maior parcela se dedica, nos lugares citados, a atividades de entretenimento e atividades culturais, com uma pequena participação de atividades esportivas e religiosas. É importante salientar, no entanto, que na percepção de 51% dos entrevistados nenhuma atividade cultural é feita por eles aos fins de semana. Essa proporção chega a 85% entre segunda e sexta-feira, de forma que a principal atividade cultural citada passa ser a ida a igrejas e outros locais religiosos. Não obstante, se pudessem escolher, 60% fariam alguma atividade cultural no fim de semana e outros 50% nos dias de semana. Entre os principais locais citados para essas atividades, destacam-se o cinema, o teatro, os parques e praças e o shopping center.
PÚBLICOS DE CULTURA E GOSTOS Em termos gerais, é pequeno o leque de atividades culturais realizadas pelos pesquisados: 89% nunca foram a um concerto de ópera ou música clássica em sala de espetáculo e 83% em qualquer outro local; 75% nunca foram a espetáculos de dança ou balé no teatro; 71% nunca estiveram em exposições de pintura, escultura e outras artes em museus ou outros locais; e 70% nunca foram a uma exposição de fotografia. Além disso, outras atividades, como ver uma peça de teatro em qualquer local (61%), a uma
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peça no teatro (57%) e a um show de música em uma sala de espetáculo foram outras atividades cuja maioria dos entrevistados afirmou nunca ter realizado. Dentre as principais razões citadas para não realizarem mais atividades culturais, os motivos se dividem entre impossibilidades objetivas – como a inexistência de equipamentos correspondentes em seus municípios (salas de cinema, de teatro ou de espetáculos), ou a inacessibilidade aos mesmos, por distância ou custo – e impedimentos de natureza subjetiva, relativos à não formação de repertório e gosto, alegando falta de hábito ou costume, não acharem interessantes/importantes alguns desses tipos de atividades, ou simplesmente por não gostarem. Por outro lado, as únicas atividades cuja maior parte das pessoas pesquisadas afirmou já ter realizado foram: assistir a um filme em casa ou outro lugar diferente do cinema (91%), dançar em bailes e baladas (80%), ir ao cinema (78%) e ao circo (72%), ler um livro por prazer (69%), assistir a um show de música em casa ou outro local diferente de casas de espetáculos (69%) e a ida a bibliotecas (58%). A maior parte dos entrevistados realiza essas atividades com amigos e/ou com cônjuge/companheiro(a). Por fim, os principais meios pelos quais os entrevistados se informam sobre as atividades culturais a que costumam ir são as sugestões de amigos, parentes e colegas (41%), a divulgação na mídia (36%) e a internet (25%). Com relação à primeira atividade cultural com a qual os entrevistados tiveram contato (ainda na infância ou mais tarde), o circo (29%), o cinema (16%) e o teatro (11%) foram, com grande distância, os mais citados. Embora não seja desprezível a porcentagem de pessoas que realizaram essas atividades pela primeira vez já na adolescência ou fase adulta, a maioria dos entrevistados teve o primeiro contato com elas ainda na primeira infância (ou, no máximo, até os 10 anos de idade). Enão é pequena a proporção de pessoas que dizem se envolver em alguma atividade cultural. Cerca de 15% cantam e 13% dançam, individualmente ou em grupo; 10% tocam algum instrumento, 7% fazem fotografias, 5% fazem algum tipo de pintura, escultura ou desenho e somente 4% fazem algum tipo de escrita criativa ou compõem músicas. No que se refere aos gostos culturais, a maioria das pessoas entrevistadas afirma gostar de observar os principais elementos culturais e artísticos da cidade, tais como parques (89%), arquitetura em geral (73%), luzes artísticas e decorativas (70%), monumentos e estátuas (68%), propaganda e publicidade (54%) e grafites/murais (49%). Com relação aos gostos musicais, os gêneros mais mencionados foram o sertanejo, MPB, Forró, Gospel e Pagode; e as principais danças foram Forró, Dança de
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Salão, Samba e Street Dance/Rap. No que diz respeito aos gêneros de teatro, o preferido, com grande distância, é a comédia, bem como os principais tipos de apresentação que gostam de ver são o circo, as comédias stand up e os teatros de bonecos. É importante ressaltar que 26% dos entrevistados afirmam que não gostam de exposições artísticas e outros 26% que não sabem ou nunca foram a uma. A maior parte das pessoas (58%) não leu nenhum livro nos últimos 6 meses e os que leram possuem uma média de apenas 1,2 livros lidos neste período. O segundo tipo de livro lido mais citado, depois de romance, foi a Bíblia. No que concerne à TV, 62% afirmam assistir apenas aos canais abertos e 28% tanto a TV aberta quanto a por assinatura. Os principais produtos culturais vistos na TV são as novelas (54%), filmes (52%) e os jornais de notícias (44%). Entre os filmes prediletos, estão os de aventura (39%), comédia (38%) e romance (29%), com preferência pelo cinema americano (45%) e menos pelo nacional (33%). Cerca de 65% das pessoas vêem filmes nacionais de vez em quando, enquanto 22% sempre e 14% disseram nunca assisti-los.
MEIOS DE COMUNICAÇÃO É bastante significativa entre as pessoas pesquisadas a utilização da TV aberta como meio principal de adquirir informação sobre o que acontece em sua cidade, no Brasil e no mundo. Ela se destaca em todas as regiões do país (embora com menos força no Sul) e portes de município. A internet foi citada, neste aspecto, por um terço dos entrevistados (superando a TV aberta e se destacando como principal meio apenas nos estratos de renda acima de 5 salários mínimos), seguida de conversas entre amigos, rádio, jornais impressos e TV por assinatura. Apenas pouco mais da metade das pessoas pesquisadas afirmou que usa computador e internet (predominantemente em casa), aumentando significativamente a proporção conforme cresce a escolaridade e a renda familiar mensal (entre os que possuem ensino superior e renda acima de 5 salários mínimos, as porcentagens são de 94% e 85% respectivamente). As principais finalidades do uso do computador e da internet se concentram no entretenimento e pesquisa: conhecer pessoas e entrar em salas de papo (35%), buscar notícias (28%), utilizar sites de busca (22%) e enviar emails ou mensagens (14%). Pouco mais de 8 em cada dez pesquisados possuem telefone celular, mas ainda é baixa a proporção de pessoas que o utilizam para outras finalidades que não a de fazer e receber ligações, como comunicar-se por SMS (34%), fotografar/filmar (17%), usar internet (17%), ouvir música (16%), conectar-se às redes sociais (12%) e jogar (8%).
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Essas outras finalidades não atingem a maioria dos entrevistados nem mesmo entre os mais escolarizados e com maiores níveis de renda.
PERFIL SÓCIODEMOGRÁFICO A maioria das pessoas pesquisadas declara ser de cor branca ou parda. A maior parcela não está estudando e é composta por pessoas que completaram o ensino médio ou superior, seguida dos que possuem ensino fundamental incompleto. No que diz respeito aos aspectos ligados ao trabalho, a maior parte dos pesquisados está inserida na População Economicamente Ativa (PEA), mas é significativa a porcentagem de inativos (em sua maioria formada por aposentados e pessoas donas de casa) e por desempregados: mais de 4 em cada 10 entrevistados estão em uma dessas duas situações. Também merece destaque a proporção de pessoas pesquisadas que estão no chamado mercado informal, composto em sua maioria por assalariados sem carteira assinada, conta-própria, temporários e auxiliares sem remuneração fixa. Entre os entrevistados que estão empregados formalmente, destacam-se os assalariados com carteira assinada, servidores públicos e os trabalhadores por conta-própria/autônomos que recolhem ISS. Mais de 7 em cada 10 pessoas pesquisadas trabalham no ramo dos Serviços (45%) ou do Comércio (29%). No que concerne ao perfil socioeconômico, por fim, mais da metade dos entrevistados está inserida nos chamados estratos médios (EM), cuja renda mensal domiciliar per capita é situada entre R$ 290,00 e R$ 1.018,00. Embora a maior parcela esteja localizada no baixo ou médio EM, é significativa a proporção de pessoas que estão nos altos estratos médios (20%) e nos estratos altos (16%), cuja maior concentração se dá no Sul e Sudeste. Um dado interessante diz respeito à comparação dos perfis de escolaridade dos entrevistados com os dos seus pais. Quase 9 em cada 10 pessoas pesquisadas tiveram algum tipo de mobilidade geracional em relação ao perfil de escolaridade da família, sendo a imensa maioria (73%) composta por pessoas que ascenderam e conquistaram maiores níveis de escolaridade que seus pais. A maior parcela é casada (54%) e é seguidora de alguma religião, com destaque para a católica (57%) e a evangélica (28%).
Gustavo Venturi é doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Atualmente, é professor do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da mesma universidade. E-mail: gventuri@usp.br
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Programa VAI – uma política pública construída a muitas mãos Maria do Rosário Ramalho O Programa para Valorização de Iniciativas Culturais – VAI – da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, é resultado de diferentes escutas de jovens e de organizações que atuavam na cidade no início dos anos 2000. A Comissão da Juventude da Câmara Municipal, por meio de visitas a projetos desenvolvidos por jovens e de debates que visavam conhecer os problemas e interesses daquele segmento, trouxe à pauta diversos temas, destacando-se a cultura pela necessidade de ser reconhecida como direito da juventude, espaço de sociabilidade, experimentação e autonomia. Muitas vezes os jovens eram vistos de maneira negativa, pelo envolvimento nos índices de violência, especialmente nas áreas periféricas. A maior parte das propostas existentes estava associada à prevenção do uso de drogas, à idéia de tirá-los da rua, ao trabalho precário, entre outras. Havia ainda os debates sobre mecanismos de financiamento à cultura, cujas principais referências eram as leis de incentivo, que excluíam importantes segmentos culturais de qualquer possibilidade de apoio à sua produção. É nesse contexto que surge o VAI, em 2003, como política pública destinada a fomentar grupos não profissionais, prioritariamente entre 18 e 29 anos, que já desenvolvem - ou querem desenvolver - atividades culturais na cidade, sobretudo em áreas periféricas com sérios problemas de infraestrutura urbana e de baixo acesso a bens e serviços culturais. O Programa, de autoria do vereador Nabil Bonduki, foi criado pela lei 13540, com objetivos de estimular a criação, o acesso, a formação e a participação do pequeno produtor e criador no desenvolvimento cultural da cidade; promover a inclusão cultural; estimular dinâmicas culturais locais; e a criação artística. Dentre as marcas do VAI estão a diversidade de ações que abarca e a capilaridade no território da cidade. Espraiam-se espetáculos e performances de teatro, dança e música; exibição e produção de vídeos e gravação de cds; oficinas, eventos de rua e em espaços fechados; festivais, cultura indígena, cultura popular, capoeira, rádio, hip hop, produção
de jornais, revistas e livros, saraus, contadores de histórias,
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biblioteca, videoteca, memória, formação de produtores culturais, cultura digital, desenho, entre outros. A seleção dos projetos é anual, com ciclos completos, do edital à conclusão dos mesmos. Todo o processo é acompanhado de pesquisa sobre origem dos candidatos, idade, condição escolar, trabalho, região de moradia e desenvolvimento dos projetos, custos, etc. Esses dados alimentam a gestão do programa, que baliza sua atuação nas informações obtidas e no diálogo constante com os envolvidos. A Comissão de Avaliação e Acompanhamento é composta por membros do governo e da sociedade civil, indicados pelo Secretário de Cultura, dentre entidades com atuação cultural, principalmente com a juventude. Além da escolha de projetos, a Comissão reúne-se periodicamente com a equipe do Programa para acompanhar seu andamento e fazer sugestões de aprimoramento. A equipe do VAI elabora o edital em conjunto com a Comissão e responde por todas as etapas, das inscrições à prestação de contas final. A formação dos participantes na gestão dos projetos e dos recursos tem grande importância, razão pela qual a equipe dá assessoria aos grupos desde a divulgação dos resultados, orientando-os quanto a eventuais necessidades de revisão de projetos e de composição de orçamento. Acompanha o seu desenvolvimento, identifica dificuldades e busca junto aos responsáveis as formas de superação. As orientações ocorrem na forma de reuniões gerais, atendimentos individuais e de grupo, visitas e intercâmbio de experiências. Nestes onze anos de existência e com mais de 1300 projetos realizados, o VAI tornou-se referência de política pública para juventude, contribuindo para a criação de programas similares em outras localidades. Com o passar do tempo, verificou-se uma forte articulação entre os participantes e a consolidação de um circuito cultural periférico. Muitos projetos passaram a ter como objetivo a conexão ou o fortalecimento de redes, o que modificou o cenário cultural da cidade. A parceria com o poder público e a apropriação dessa política por parte dos envolvidos é visível: há grande presença dos grupos em debates do orçamento, de novas políticas públicas, de lutas por melhorias ou criação de novos equipamentos culturais na cidade, pelo direito de interferir na programação e na gestão dos equipamentos existentes. Em 2013 foi aprovada a lei 15897, que modifica o Programa e cria o VAI II. A partir da mobilização dos interessados e da inexistência de programas similares que
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permitissem a continuidade das ações nas áreas periféricas, o Programa foi dividido em duas modalidades: o VAI I continua atendendo jovens, de 18 a 29 anos, com projetos de até R$ 30 mil. O VAI II apóia projetos de até R$ 60 mil, pressupõe experiência de atuação cultural em áreas periféricas, sem limite etário. Em sua primeira edição, subsidiou 60 projetos. A gestão da SMC vem ampliando sua atuação nesse campo, com a implantação do Programa Cultura Viva/Pontos de Cultura e o Programa Bolsa Cultura/Agente Comunitário de Cultura, que libera bolsas mensais a articuladores culturais regionais. É o VAI fazendo história na periferia de São Paulo.
Maria do Rosário Ramalho é assessora de cultura do gabinete do vereador Nabil Bonduki, que instituiu o VAI em São Paulo, programa para Valorização de Iniciativas Culturais, uma política pública de fomento à produção cultural.
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