A Terceira Idade: Estudos sobre Envelhecimento - Volume 10 - Nº18

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SESC SÃO PAULO



ANOX N° 18 DEZE.MBRO 1999

fmcaRA IDADE

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ASPECTOS PSICOLÓGICOS DA DOR CRÔNICA Uvlra C. Abreu e Mel/o W0911t1

Ü PACIENTE ODONTOGERIÁTRICO De11is1t 1iberl0 Luz

A ÉTICA E A PSICOLOGIA DAS RELAÇÕES ENTRE O TRABALHADOR SOCIAL EOCLIENTE IDOSO J~ Carlos Fefflgno

FUNDAMENTOS PSICOPEDAGÓGICOS PARA AAÇÃO EDUCATIVA EM GERONTOLOGIA SOCIAL V,Jma Marta Bo"eio PoiVIJ

BARREIRAS À INTEGRAÇÃO SOCIAL DO IDOSO José Ramos Queiroz

Ü PAPEL DA UNIVERSIDADE NO PROCESSO DE REINSERÇÃO SOCIAL DO IDOSO Ubia Uma Frondoll

REPENSANDO A ARTE E O LAZER NA TERCEIRA IDADE Maria Ug/a Morr:ondes ~ Camorgo

Publlcaç.lo Tf<:nKa lldlt- PCfo Stffl/lÇI) SCK1AL CIO «:OMEJICIÕ 1!>ESQ Admin,Jtraç.ao "-9tqnal no hlado ~ 5IO Paulo Av Paull..u. tl9 9"andat Cl;POIJtt-110! l,fl J171>-.UTII Sk,P.wk>~ DlrttOfdo~ttatTl$tl0"'9lonal d o ~ OMIIIASAn,o,ct.MlrllndA ~ P f f l o t ~ T ~ W ~ ....,_.,.,p-,w,GcnOMtaci.EnudCK e Pfflg<Amti do T_,., kUde-'. M6r.:.to Antonio s.k,J.CSO COMIS!õÃO tOITC>fllAl.1 "1>,onlo

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ÃO

ABRAM SZAJMAN Presidente do Conselho Regiona l do SESC de São Paulo

Cumprindo recomendações da

internação hospitalar, que além de one-

ONU relativas ao Ano Internacional do

rosa, muitas vezes agrava as condições

Idoso, foram realizados no Brasil diversos

do enfermo. Maciços investimentos no

eventos que, de diversas formas, procura-

atendimento ambulatorial e domiciliar

ram lembrar as aspirações e as carências

são prementes.

dos nossos velhos.

O crescimento desordenado das

Uma das áreas mais vulneráveis à

cidades piora a qualidade de vida, princi-

mudança na estrutuFa etária da socieda-

palmente daqueles que fragilizados pela

de é, sem dúvida, a da Previdência Social.

idade apresentam dificuldades de loco-

Recentemente, ouvimos uma preocu-

moção. Ônibus mais acessíveis e confor-

pante declaração de uma autoridade do

táveis e ruas e calçadas devidamente

Governo Federal de que caso não sejam

pavimentadas facilitam o exercício do

rea lizadas de imediato inúmeras refor-

direito de ir e vir do cidadão da Terceira

mas, o acúmulo de deficits nas contas do

Idade.

sistema previdenciário, inviabilizará opa-

O acesso à Educação, à Cultura e ao

gamento de pensões e aposentadorias a

Lazer é decisivo para uma maior dignida-

milhões de brasileiros, daqui a aproxima-

de no cotidiano dos aposentados. Torna-

damente 5 anos.

se cada vez mais imperiosa a multiplica-

A área da Saúde é também nevrál-

ção de orgãos e entidades governamen-

gica. 60% dos leitos hospitalares são

tais e privadas que se voltem para essas

ocupados por idosos, que sofrem as pe-

atividades.

núrias de um atendimento público de

Poderíamosenumerarumasériede

baixa qualidade. Para agravar o quadro,

necessidades sentidas pelos idosos em

não temos investido em uma política

sua busca por uma melhor qualidade de

preventiva para se evitar ao máximo a

vida. Acred itamos que somente o esfor-


çoconjunto de governo e sociedade pos-

O SESC de São Paulo, que há 36

sa enfrentar desafios de tal magnitude.

anos desenvolve um programação só-

Todavia, essa luta não pode prescindir da participação dos mais diretamente inte-

cio-cultural para esse público, neste Ano Internacional do Idoso, reafirma seu com-

ressados: os próprios idosos. Aliás, temos

promisso para com essa importante ques-

testemunhado com satisfação a crescen-

tão social. Prosseguimos confiantes nes-

te organização desse segmento etário, em Conselhos Municipais e Estaduais

te trabalho, esperançosos de que as no-

espalhados pelo país.

velhice produtiva e participativa.

vas gerações de brasileiros tenham uma


Aspectos

Psicológicos da Dor Crônica ELVIRA C. ABREU E MELLO WAGNER PSICÓLOGA CLÍNICA. COORDENADORA DO CURSO DE GERONTOLOGIA SOCIAL DO INSTITUTO SEDES SAPIENTIAE/SP.

•A evidência da relação entre desamparo, depressão e doença, entre as funções dos hemisférios cerebrais e o papel relatado da imaginação na cura, podem ser compreendidos como um modelo de interação de ambiente, cérebro, sistema imunológico. Consequentemente o tratamento das afecções, e dentre estas a dor crônica, pode se beneficiar da conjugação integrativa de diversas abordagens que têm com foco a pessoa com sua história, em seu mundo, e contando como suas próprias forças."

A TERCEIRA IDADE

s



Oproblema da dor, que aflige e em

o treinamento de feedback.

muitos casos impede as pessoas de exe-

É importante distinguir a sensação

cutar seus trabalhos,afeta milhões de pes-

dolorosa (percepção mental de um estí-

soas, alcançando o nível de cerca de 10%

mulodesagradável) da experiência da dor

da população, sem no entanto merecer a

(a experiência subjetiva total de sofrimen-

mesma atenção de uma epidemia que

to devido à dor). Além disso é preciso

atingisse 5% da população. Enxaquecas,

reconhecer que não há, necessariamente,

dores articulares, lombalgias, nevralgias,

qualquer relacionamento direto entre a

e dentárias, câncer e outras

sensação e a experiência de dor. Solda-

dores custam à nação quantias enormes,

dos, seriamente feridos em batalha, rela-

além de seu custo social e do sofrimento

taram apenas leve desconforto; pois sa-

físico e psicológico.

biam que seriam mandados de volta do

dores faciais

Vivemos em um mundo de mila-

front enquanto durasse a guerra. Em con-

gres médicos; mas a dor ainda é tratada,

traste, dores de membros "fantasmas" fre-

basicamente, com meios desenvolvidos

quentemente produzem dores agonian-

pelas mais antigas civilizações. Pouco ou

tes, mesmo quando o toco está completa-

nada mudou há milhares de anos. Morfi-

mente anestesiado. Se uma dada sensa-

na, cocaína, choques elétricos, acupuntu-

ção se torna dolorosa, este fato depende

ra, ervas, terapias que empregam calor,

da maneira como ela é interpretada pelo

frio, e massagens são conhecidas há pelo

sistema nervoso. Sabe-se hoje que a dor é

menos 5.000 anos. Os métodos modernos

influenciada pela aprendizagem e por pre-

de tratamento da dor com bloqueios neu-

disposições no início do desenvolvimen-

ronais e outras técnicas anestésicas têm

to daquele ser. Também estão documen-

excelente efeito em dores agudas, mas

tadas diferenças sociais, culturais e étni-

não têm o mesmo efeito em dores crôni-

cas na experiência da dor. Certas tribos

cas. Após seis meses a dor é considerada

praticam atos, na iniciação de seus jovens,

crônica; e o que se tem dito aos pacientes

que são considerados verdadeiras tortu-

destes casos é: "nada mais pode ser feito;

ras em outras culturas.

você tem que aprender a conviver com a

Aristóteles foi o primeiro a sugerir que "a dor é uma emoção". O componen-

dor". Recentemente tem se desenvolvi-

te emocional da dor está inexoravelmen-

do, a par de tratamentos tradicionais, uma

te ligado a outros aspectos da experiência

variedade de abordagens que utilizam o

da dor; pois a ansiedade e a agitação,

enorme potencial de cura da mente. Nes-

consequências da dor, dizem aos centros

te caso estão a hipnose, a sugestão, os

mais elevados de cognição que "algo está

relaxamentos, a imaginação conduzida e

errado". Se a dor é aguda, é prontamente

ATUICEIRA IOADE

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identificada e fica mais fácil aplicar a corre-

maneira que o organismo encontra para

ção adequada. No entanto na dor crônica

dizer qual a ação apropriada a ser tomada.

este "algo errado" é vago, impreciso; e o

Quando a mensagem é ouvida, usualmen-

medo da dor continuada eleva ainda mais

te os sintomas desaparecem; pois não são

o nível de ansiedade. Fisiológicamente

mais necessários. Mas, quando se ataca o

há uma aceleração que se manifesta no

sintoma, a mensagem não chega a ser

ritmocardíaco,na pressão arterial, no suor

ouvida e vai provocar outros sintomas, ou

das mãos e pés, e na tensão muscular. Se

fazer ressurgir o mesmo. Cada profissio-

a dor é muscular a tensão aumenta mais

nal tem a tendência de empregar suas

a sensação de dor e de ansiedade em

técnicas com exclusividade; porém a abor-

um círculo vicioso. Esta relação dor/an-

dagem onde entra a colaboração entre os

siedade é bem conhecida dos clínicos,

diferentes profissionais e suas técnicas,

que sabem que é preciso tratar de am-

buscando tratar a pessoa em sua totalida-

bas. Com o tempo esta hiperatividade

de, seria de fato a mais indicada.

se exaure e surgem sintomas e sinais

Existe uma linguagem dos órgãos

vegetativos, tais como sensações de

que se expressa bem na linguagem coti-

desamparo, desespero, desesperança,

diana. Por exemplo: fulano" é uma dorna

irritabilidade, distúrbios do sono e do

nuca" (a pain in the neck);ooutrotem "um

apetite, decréscimo da libido, desgaste

coração partido"; outro sente "borboletas

de relações familiares e de amigos, assim

no estômago; isto ou esta pessoa "me dá

como aumento de queixas de somatiza-

engulhos"; "parece que engoli um sapo";

ções, instalando-se uma depressão reati-

e todos sabem o significado das hemor-

va. Essa depressão pode ser aberta ou

róidas. A dor alerta para o perigo. Não

mascarada, tanto para o paciente como

devemos calar t:!ssa voz, rna~ ~irn ouvir e

para o profissional. É portanto necessário

acionar o que for necessário para acabar

considerar não só a dor, como também a

com a situação que a provoca.

depressão. Portanto não devemos tratar a dor, mas sim a pessoa que sente dor.

Mudanças e transformações são essenciais na vida das pessoas. Há períodos

A dor traz essa insistente mensa-

de disso!ução nos quais os velhos padrões

gem: "algo está errado", e com isso alerta

são destruídos, e novos são formados. Es-

o organismo para se defender de uma

tas fases de transição são dolorosas, mas

lesão maior. Ela é portanto um grande e

necessárias para o crescimento, o avanço

importante auxiliar na sobrevivência do

e o progresso.

organismo. O sistema nervoso está ge-

A dor crônica pode ter também

rando a experiência da dor com um pro-

como componente a necessidade de de-

pósito, por uma razão. Os sintomas são a

pendência exacerbada da pessoa em rela-


ção ao médico ou mesmo em relação a

enfraquecido, interpretam essa solicitude

uma instituição hospitalar, vivenciada

erroneamente como expressão de amor.

como uma instância maternal de prote-

Pelo fato da profissão do médico gozar de

ção e cuidados, ao mesmo tempo boa,

prestígio social, de responsabilidade, co-

porém temível pela sujeição que impõe.

loca-o como um "objeto (na acepção psi-

Na chamada Síndrome de Münch-

canalítica) superior", e portanto altamen-

hausen, a pessoa solicita cuidados por to-

te desejável. A pessoa projeta no médico

dos os meios, inclusive simulação. A ad-

seu "objeto de amor'', mas não diz para si

missão ao consultório, e mesmo ao hospi-

própria "eu o amo", mas sim "ele me ama,

tal, significa ter conseguido através de

só não se atreve a confessar". A única

uma regressão um local protegido onde

atitude correta do médico diante dessa

não precisam mais "suportar o fardo da

situação é não negá-la, e com coragem e

existência". Éuma "fuga na dor, uma fuga

tato aceitar as verbalizações e os senti-

na doença". Obter o status de doente crô-

mentos exageradamente positivos de seu

nico, no qual níveis de consciência e de

cliente, mostrando ao mesmo tempo que

inconsciência se confundem, significa

a realidade de uma relação profissional

obter proteção, ausência de responsabili-

está presente e que a pessoa não pode

dade, dependência a qualquer preço. É

alimentar esperanças em relação ao seu

preciso compreender a imensa miséria

enganado "objeto de amor".

psíquica que os leva a se submeterem a

Na hipocondria há um distúrbio de

tratamentos penosos, demorados e até

sensações corporais que se acompanha

mesmo cirurgias mutilantes. São em ge-

de angústia. As sensações variadas se or-

ral pessoas profundamente deprimidas,

ganizam levando à convicção de haver

com tendências auto-destrutivas muito

doença grave, traduzida por sensações de

acentuadas, que podem levar a equipe

peso, formigamento, queimadura e do-

de saúde à irritação e mesmo ao deses-

res. Estas sensações são vivenciadas como

pero, acabando por ceder às solicitações

um "mau objeto", um perseguidor que

inconscientes e assim contribuir para sua

constantemente as atormenta. A pessoa

destruição.

tem uma convicção íntima, uma espécie

Outroscasosdepessoasquesequei-

de "idéia fixa", de que seus distúrbios se

xam de dores crônicas vêm de sua neces-

originam no corpo. Mostrar-lhes que seus

sidade e busca compulsiva de um objeto

males são devidos a problemas intrapsf-

de amor. O médico, por características de

quicos,aosentimentodequealgoé"mau"

sua ocupação, fornece sinais de interesse

nele, requer tratamento psicoterápico lon-

e preocupação por seu bem-estar. Essas

go e difícil; pois será necessário buscar

pessoas carentes, que revelam um Ego

suas raízes biográficas e psicodinâmicas,a

A TtACEIRA IDAOE

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fim de reconverter suas angústias hipo-

Sternback, Wolf, Murphy e Akeson (1973),

condríacas em angústias mais reais, liga-

examinandopessoascomdorlombarcrô-

das a conflitos presentes e reforçados pela

nica e com dor lombar aguda através do

reminiscência de conflitos passados. As-

MMPI (Minnesota Multiphasic Personalli-

sim não só desaparecerá o sintoma, como

ty lnventory), encontraram um perfil, se-

aparecerá outra visão da vida, uma possi-

melhante em 1Otraços, mas significativa-

bilidade de liberação de energias que po-

mentediferente em 3 traços: histeria (múl-

derão ser utilizadas construtivamente.

tiplos sintomas físicos sem causa física),

Afortunadamente, a maioria de nós

depressão (sentimentos de desesperan-

nunca experimentou verdadeira dor in-

ça) e hipocondria (preocupação imotiva-

tensa e crônica. Essa situação tem sido

da para com sua saúde e sintomas corpo-

descrita como aquela na qual o desespero

rais). Estes 3 traços compõem atríade neu-

e a desesperança sobre o sofrimento sem

rótica e sugerem que, durante os estágios

fim predomina em suas vidas, e na qual

iniciais da afecção, os pacientes com dor

apenas à morte trará alívio. Estas pessoas

crônica poderiam ter tido um perfil mais

frequentemente dizem que poderiam

normal,equeseusdistúrbiosatuais,apon-

aguentar a dor se apenas pudessem ter

tando para a neurose, refletem a preocu-

uma boa noite de sono. Elas declaram que

pação e a extensão dos sintomas da dor.

sentem sua resistência minada pela falta

É importante observar que um

de sono. Jamais se sentem descansadas,

diagnóstico de dor organicamente cau-

mas sim gastas e exaustas. Tornam-se com

sada, não descarta a relevância de variá-

o tempo mais irritadas com familiares,

veis psicológicas. Tanto a dor orgânica

perdem amigos e também quaisquer ou-

como a psicogênica, de fato, doem do

tros interesses. Gradualmente os limites

mesmo modo. A sensação que a pessoa

de seu mundo se encolhem, pois tornam-

experimenta é a de dor. O estilo de vida

se cada vez mais preocupadas com sua

de pacientes com dor orgânica ou não-

dor e cada vez menos interessadas no

orgânica se torna similar com o correr do

mundo à sua volta.Seu mundo se concen-

tempo, na tentativa de lidar com sua afli-

tra na casa, no consultório médico (ou

ção. Os mesmos autores mostraram que

onde pensam que possam obter alívio

pacientes com dor lombar acompanhada

para sua dor), na farmácia e no hospital.

de sinais neurológicos como atrofia mus-

Há alguma evidência de pesquisas

cular, sensação diminuída, reflexos tendi-

que suportam a noção de que as pessoas

nosos diminuídos, e pacientes com dor

com dor crônica apresentam característi-

sem estes sinais mostravam perfís iguais

cas psicológicas distintas, e que estas ca-

no MMPI. Estes dados sugerem que nes-

racterísticas influenciam no tratamento.

tes casos um tratamento exclusivamente

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medicamentoso, e mesmo cirúrgico, pode não prover alívio se de fato a dor já se

vés da capacidade de identificar a causa da dor e poder fornecer alívio para o sofri-

tornou foco central de suas vidas. Blumeti e Modesti (1976) confirmaram esta supo-

mento do paciente. O alvo do cliente no

sição mostrando que pacientes sofrendo de dores intratáveis de coluna, se benefi-

sofredor, apresentando ao médico uma dor indiagnosticável e um sofrimento im-

ciavam menos com a cirurgia se tinham

possível de ser aliviado. Szasz propõe que

obtido altas contagens em histeria e hipo-

é tão irracional esperarqueo cliente desista de sua identidade e carreira como doen-

condria no MMPI. De acordo com Engel (1959) essas pessoas tinham uma ou alguma destas

entanto é confirmar sua identidade como

te, como é pedir ao médico que faça o mesmo.

ocorrências: acentuados sentimentos de culpa, em geral aliviados pela experiência da dor; uma história familiar de violência física que predispõe a pessoa a usar a dor para expiar a culpa do uso da violência; uma história pessoal de sofrimento, derrota, inabilidade para tolerar insucesso e uma tendência a solicitar dor através

O jogo é assim: Cliente: dói, por favor me cure (mas você não consegue). Médico: eu vou curá-lo. Diversos procedimentos são testados, um após outro, e todos falham.

de ferimentos, acidentes. operações e exames dolorosos; muita raiva e hostilidade para com os outros, raramente

Final

expressa direta e frequentemente vol-

Cliente da dor (com justa indigna-

tada para si sob a forma de dor; fortes conflitos sexuais, usualmente incons-

ção): outro incompetente! Médico: outro farsante!

cientes e expressos pelo aparecimento da dor; e finalmente a possibilidade do

Imaginação e Cura

desenvolvimento de uma dor que na realidade reflete a perda de uma pessoa significativa em seu contexto de vida.

"A imaginação é mais importante do

que o conhecimento"... (Albert Einstein).

Thomas Szasz (1968) pela primeira

Por séculos, da antiguidade aos dias

vez usou o termo "dolorização" (pain-

de hoje, as pessoas têm discutido,aprova-

manship) para caracterizara interação que

do e condenado a relação entre a faculda-

ocorre entre pacientes de dor crônica e o

de privativa do homem.a imaginação e as

médico. Neste jogo o alvo do médico é

alterações somáticas que levam à saúde.à

confirmar sua identidade profissional atra-

doença ou em outros casos à cura.

ATERCEIRA IDADE

11


A pesquisa sobre o muito que se

rologistas e hipnotizadores, que a utili-

tem escrito a respeito permite propor um

zam para aliviar sofrimentos físicos e men-

agrupamento que pode levar a uma me-

tais de seus pacientes. Tem sido usado

lhorvisualizaçãoecaracterizaçãodoscon-

corretamente para controlar o peso, parar

ceitas sobre imaginação.

de fumar,evitar complicações pós-opera-

O primeiro grupo é formado pelas

tórias,curar acne, fobias, remoção de den-

abordagens baseadas primordialmente

tes com abcessos.ou tratamento de crimi-

nos modelos de Pavlov e de Skinner. Mos-

nosos sexuais. Não há limitação para a

tram uma relação de superfície entre ima-

criatividade na aplicação da imaginação.

ginaçãoereaçõesemocionais,assimcomo

No entanto existem poucos modelos teó-

o poder das imagens de atuar como estí-

ricos que comprovem o efeito terapêuti-

mulos eficientes para provocar reações

co da imaginação. Freeman, RJ., R.G. propõem um modelo rudimentar que mostra

esperadas. São os condicionamentos. A segunda categoria inclui aborda-

que as diversas técnicas de imaginação

gens clínicas diversas que postulam que

compartilham mecanismos comuns de

as imagens provocam muito eficiente-

cognição, afecção, neuroendócrinos e

mente os indivíduos com uma clara per-

imunológicos. O modelo também diz que

cepção de suas distorções perceptuais e

existe uma interdependência única entre

de como isto os afeta.

mente-corpo, através do integração en-

Uma terceira classe trata basica-

tre as funções diferenciadas dos hemisfé-

mente da atuação da imaginação na saú-

rios esquerdo e direito do cérebro com os

de física e psicológica. Nesta visão não

eventos cognitivos, emocionais e final-

há interpretações complicadas e nem

mente celulares, que se constituem no

teorias, apenas a assunção de que uma imaginação "sadia" levará gradualmen-

processo de cura. Os fatos básicos a propósito da late-

te a pessoa para uma realidade sadia.

ralidade do cérebro mostram, através de

A quarta categoria inclui técnicas de

estratégias de pesquisa as mais diversas,

imaginação "profunda" que levam a cura da psique de volta ao modelo "mágico", o

que os dois hemisférios cerebrais são especializados (ainda que não exclusivos)

qual enfatiza a transformação através de

para as diferentes funções cognitivas.

procedimentos não-racionais ou "irracio-

Além disto sabe-se que cada hemisfério

nais", como sendo opostas às terapias ra-

controla os movimentos da metade opos-

cionais ou reflexivas. O uso da imaginação como técnica

ta do corpo. No meio do século passado Broca,

de cura se espalha hoje entre psicotera-

entre muitos outros neurologistas, mos-

peutas, enfermeiros, tanatologistas, neu-

trou que lesões em determinadas por-

12



ções do hemisfério E produziam afasias.

mordial nos processos de imaginação.

Afasias raramente são observadas em le-

Lesões no hemisfério D frequente-

sões do hemisfério D; daí se conclui que o

mente levam à perda de visualização, de

E era funcionalmente especializado para

memória visual, dos sonhos visuais e da

a maioria dos processos verbais e de lin-

vividez da formação de imagens. A pes-

guagem. Em contraste, o hemisfério D

quisa do CLEM (Conjugated Lateral Eyes

parece ser dominantemente envolvido

Movement), que é um produto do he-

em tarefas viso-espaciais, discriminações

misfério D ativando o E, se correlaciona

sensoriais mais finas como detectar pa-

com o uso preferencial e com a clareza

drões táteis, e seu importante papel em

das imagens, tanto quanto com a execu-

atividades não verbais como música,

çãodetarefasde imaginação. Estudos de

reconhecimento facial (fisiognomia) e

reconhecimento visual de palavras abs-

expressão emocional. Com estas desco-

tratas e concretas apresentadas lateral-

bertas se costuma dizer que cada hemis-

mente indicam uma capacidade do he-

fério tem um "estilo" cognitivo diferente,

misfério D de" ler", armazenar, ou ainda

sendo predominantemente verbal o E e

de mediar o processamento de palavras

não-verbal o D. Os estilos são mais ou

de alta imaginação. Que as palavras po-

menos proficientes ao operar com dife-

dem fazer surgir fortes emoções e vice-

rentes estímulos. Por exemplo o Eé carac-

versa já está fora de dúvida. Uma razão

terizado por um processador lógico, ana-

para esta interdependência pode ser a

lítico e sequencial, no qual palavras são

de que o hemisfério D, predominante-

muito mais eficientes; o hemisfério D se

mente, medeia tanto a imaginação como

caracteriza por um processador holístico,

as afecções (aquilo que afeta).

gestáltico e simultâneo, para o qual as relações espaciais são mais apropriadas.

Novamente, apesar de ainda haver controvérsia sobre a relativa contribuição de cada hemisfério para a percepção da

A imaginação e sua relação com o hemisfério D.

emoção, encontrou-se superioridade do D para reconhecer sons humanos não ver-

Apesar da controvérsia existente

bais como o riso, o choro, o grito; para

sobre se imagens são visuais ou um cons-

identificar tons emocionais na fala e na

tructo que tem um propósito, está surgin -

música (por exemplo sequências tonais

do um consenso de que existe uma rela-

evocativasdediferenteshumoressãomais

ção entre imaginação e lateralidade cere-

facilmente reconhecidas se se ouve com o

bral, e de que a ligação é com o hemisfério

ouvido E). Fotografias e desenhos de fa-

D. Evidências clínicas e experimentais in-

ces, expressando diferentes emoções, são

dicam que o hemisfério D tem papel pri-

mais rápida e acuradamente identifica-

14


dos se apresentados no campo visual E, e

manifestadosem episódios de depressão,

portanto processadas pelo hemisfério D.

estão consistentemente ligados a um con-

Por exemplo, o lado direito da cara e do

junto específico de doenças e particular-

corpo expressam mais as emoções, o que

mente ao câncer. A síndrome clín ica de

fundamenta e comprova teorias psicoló-

depressão incorpora auto-percepção, ou

gicas que atribuem ao lado E da pessoa o

cognições de desamparo, e um estado

seu modo de ser constitucional, enquan-

afetivo de desesperança e de desespero.

to o lado D seria a expressão modificada e

Como Seligman (1976) fa rtamente

controlada do seu modo de ser social.

demonstrou, a exposição repeti da e/ou

Estudos sobre sintomas de histeria de con-

continuada a estressores inescapáveis, no

versão e de manifestações psicossomáti-

caso a dor, desenvolve o senso de desam-

cas encontram d iferenças laterais que

paro e depois a depressão. Mesmo ani-

implicam o hemisfério D. Os resu ltados de

mais expostos a estressores inescapáveis

estudos neuropsicológicos de indivíduos

desenvolvem doenças. É o modelo da

com depressão clínica revelaram indica-

depressão aprendida. Portanto, pode-se

ção de disfunção no hemisfério D. Estudos

supor que esta ligação de desamparo, de

eletrofisiológicos de pacientes psiquiátri-

depressão e de doença, pode na realidade

cos com depressão produziram resulta-

ser observação de um único fenômeno.

dos consistentes com aqueles achados.

Destaexposiçãopode-seassumirque uma

EEGs,onde se estudou amplitude de onda,

relação entre eventos de vida e doenças

revelaram que em sujeitos deprimidos o

requer considerações sobre a habilidade

hemisfério D estava menos ativo que o E,

do sujeito em lidar com estímulos estres-

mostrando desorganização nos padrões.

sores, que poderão ou não produzir es-

Desde que Galeano, no século 2 AC,

tresse (falha em poder fugir da situação,

relatou ser o câncer mais frequente em

em poder evitar o efeito pernicioso da sua

mulheresdeprimidase melancólicas, inú-

exposição). Acuado pelo externo e sem

meros estudos, pesquisas e teorias se de-

recursos internos, o indivíduo pode de-

senvolveram relacionando a maneira

senvolver um senso de desamparo; se

como as pessoas são afetadas e as doen-

deprime e fica doente.

ças queelas desenvolvem.Apesar da gran-

Weiner (1972) chamou o desenvol-

de diversidade de sujeitos, métodos e me-

vimento da doença somática de "o pro-

didas, emerge uma consistência notável:

blema da transdução", ou seja,o mecanis-

uma grande variedade de doenças está

mo pelo qual experiências sociais, cogni-

ligada a dois padrões particulares de afec-

tivas e afetivas influenciam os eventos

ção. Sentimentos de desamparo, de de-

celula resquechamamos doenças. Recen-

sesperança e de perdas, frequentemente

temente se focaliza muito a relação de

ATEft(EIRA IOAOE

IS


doenças que têm a ver com o sistema

damente com a situação, como um antí-

imunológico.

doto contra o sentimento de desamparo

Foi relatado, por exemplo, que a

e de desesperança, como um efeito anal-

atividade diminuída das células Ta pare-

gésico na dor, enfim como formas de bus-

ce após grandes perdas e tristezas; e

car o bem-estar e a cura da pessoa.

também que a atividade natural de ma-

Já discutimos as evidências de como

tar célu las decresce após estresse em

a imaginação e especialmente a impres-

indivíduos que não conseguem lidar

são depressiva são fenômenos primaria-

com situações d ifíceis. As células T, uma

mente do hemisfério D. Desenvolver a

vez sensibilizadas para com um alerge-

imaginação ativa do hemisfério D eleva

no, destroem aquela substância numa

níveis de metabolitos de dopamina e de

segunda exposição. As célu las matado-

serotonina do fluído cerebrospinal, ou seja,

ras naturais destroem células invasoras

o mecanismo inverso da depressão, da

às quais o organismo não havia sido an-

sensação de inexorabilidade do estressor

teriormente exposto. As células T podem

de não poder fug ir do seu ataque e dos

ter ainda um papel especial no despertar

seus efeitos. Ao mesmo tempo essa ativi-

da função do sistema imunológico.

dade do hemisfério D pode reduzir o gas-

Resumindo: estas formas de defen-

to daqueles metabolitos no hemisfério E,

der o organismo estão rebaixadas em es-

e assim diminuir a probabilidade de de-

tados de desesperança e de desamparo,

pressão e doença. Apesar dessa relação

nãosónossereshumanos,comotambém

não ser conjuntura 1,ela sugere um grande

em animais sujeitos a estresse e choque

número de hipóteses potencialmente tra-

inescapável. Há toda uma teoria quedes-

táveis. Por exemplo, verificar imuno-

creve o mecanismo que envolve depres-

competência de indivíduos com lesões

são, catecolaminas, cortisol, norepinefri-

num e noutro hemisfério. Gerschwind

na e dopamina, levando à formação de

(1982) relatou ter encontrado uma inci-

doenças em situações em que o organis-

dência aumentada de certas doenças

mo ou a pessoa não conta com forças

auto-imunológicas em pacientes canho-

internas para reag ir eficientemente.

tos. Do mesmo modo esse modelo su-

A "imaginação combativa" contra-

gere que pacientes com epilepsias fo-

atacaria este esquema, como por exem-

cais lateralizadas do hemisfério D podem

plo propõe Simonton (1976), que encora-

ter realmente mais distúrbios imunológi-

ja seus pacientes com câncer adiantado a

cos do que os que têm focos no hemisfé-

tomar parte ativa em seus tratamentos. A

rio E, na medida em que a presença do

técnica da imaginação pode ser pensada

foco irritativo significa um aumento de

como um mecanismo para lidar adequa-

atividade cortical. Apesar dessa relação

16


ser constantemente encontrada, é verda-

podem ser compreendidos como um

de que nem todos os indivíduos deprimi-

modelo de interação de:ambiente/cére-

dos desenvolvem doenças; apenas aqueles cujo mecanismo bioquímico não rea-

bro/sistema imunológico. Consequentemente o tratamento das afecções, e den-

ge ao ataque externo.

tre estas ador crônica, pode se beneficiar

Resumindo, Ley e Freeman estão

da conjugação integrativa de diversas

propondo que a evidência da relação en-

abordagens que têm como foco a pes-

tre desamparo, depressão e doença, entre

soa com sua história, em seu mundo, e

as funções dos hemisférios cerebrais e o

contando também com suas próprias

papel relatado da imaginação na cura,

forças.

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A. TEJICEIRA IDADE

11



O Paciente Odontogeriátrico DENISE TIBERIO LUZ CIRURGIÃ DENTISTA, ESPECIALISTA EM PERIOOONTIA EGERONTOLOGIA. VICE-DIRETORA 00 GRUPO OE ESTUDOS EM OOONTOGERIATRIA DA ASSOCIAÇÃO PAULISTA OE CIRURGIÕES DENTISTAS

"Muitas das alterações bucais estilo relacionadas com a história de vida, com a manutenção por toda a vida de uma dentição natural, saudável e funcional, incluindo os aspectos sociais e os benefícios tais como o estético, o conforto e a habilidade para mastigar, sentir sabores e falar".

A Jt:A((IAA l()A()E

19


1. INTRODUÇÃO

sistema estomatológico, podemos classificar os idosos em três grupos distintos:

"feliz daquele que morreu novo",

-o grupo dos independentes, consti-

inscreviam os gregos antigos nas lápides

tuído por idosos sadios, que podem apre-

de jovens poupados da velhice. Envelhe-

sentar uma ou duas doenças crônicas não

cer é uma fatalidade biológica da qual

graves e controladas por medicação e/ou

nenhum ser vivo escapa, salvo quando

algum declínio sensorial associado com a

morre antes dos limites fixados pela na-

idade, mas que vivem sem necessitar de

tureza para cada espécie animal. Todas

ajuda;

as funções essenciais à vida acusam, com

- o grupo dos parcialmente depen-

a idade, as desordens de maior ou menor

dentes, constituído pelos idosos que têm

gravidade, sendo algumas transitórias,

problemas físicos debilitantes crônicos,

outras crônicas.

de caráter médico ou emocional e com

Todas as pessoas sofrem, na idade

perda do seu sistema de suporte social,

adulta, uma fase fisiológica de progressi-

fazendo com que sejam incapazes de

va degeneração, que constitui em seu

manter uma tota l independência sem

conjunto o envelhecimento natural, co-

uma assistência continuada;

nhecido como senescência.

- o grupo dos totalmente depen-

Senilidade é o envelhecimento

dentes, constituído por aqueles idosos

acompanhado de patologias. Fatores

cujas capacidades estão afetadas por pro-

como nutrição, vida sedentária, álcool,

blemas físicos debilitantes crônicos, mé-

fumo, podem exacerbar doenças crôni-

dicos e/ou emocionais, que os impossibi-

cas que afetam pessoas na idade adulta,

litam de manter a autonomia; e que ge-

fazendo com que nos dias de hoje, au-

ra lmente necessitam de ajuda perma-

mente a preocupação com medidas pre-

nente.

ventivas, tanto na área de saúde, como

Cada um destes grupos irá exigir

na psicossocial, objetivando assim me-

do profissional estratégias especiais e

lhor qualidade de vida para essas pesso-

conhecimento suficiente para poder su-

as que, fatalmente e num futuro bem

prir as necessidades que um atendimen-

próximo, serão a maior parcela da popu-

to odontológico efetivo requer.

lação mundial.

É de extrema importância conhe-

li. CONHECENDO O PACIENTE

cer o tipo de paciente que teremos adentrando em nossos consultórios. Ba-

Há algum tempo, envelhecer era

seados na habilidade funciona l como ele-

sinônimo de sabedoria. Poucos envelhe-

mento importante para prevenção do

ciam, e aqueles que conseguiam atingir

20


estágios avançados na idade eram consi-

medicamento em dose menor, de co-

derados sábios. Com os avanços tecno-

mum acordo com o médico que está as-

lógicos e as pesquisas na área de saúde,

sistindo ao paciente.

houve uma inversão, pois temos hoje um

- A principal via de eliminação das

grande contingente de idosos que está

drogas do organismo é a excreção renal,

emergindo de forma veloz, principalmen-

que elimina as drogas hidrossolúveis e

te nos países ditos subdesenvolvidos,

metabólicas. A partir dos 30 anos, os rins

exigindo assim mudanças tanto em pro-

mostram um declínio gradual de seu

gramas na área da saúde, como nos pro-

peso, e a taxa de filtração glomerular

gramas das áreas social e econômica.

diminui cerca de 31 % entre os 20 anos e

A odontologia, como qualquer ou-

80 anos. Com isso a eliminação do medi-

tra profissão, também deve estar atenta

camento fica sensivelmente reduzida.

a essas modificações. O profissional, ou-

Essas alterações fazem parte do processo

trora condicionado a ser extremamente

de envelhecimento; podem contribuir

clínico, deve hoje conhecer amplamente

para um aumento da vida média do

o processo de envelhecimento, e assim

medicamento no organismo; e muitas

atingir seus objetivos profissionais.

vezes podem levar a uma interação

O envelhecimento traz alterações

medicamentosa.

que merecem a atenção principalmente

-O timo,glãndula responsável pelo

dos profissionais que têm uma atuação

sistema imunológico, começa a ter sua

efetiva sobre esses pacientes. Apresento

função diminuída a partir dos 50 anos;

alguns itens, pertinentes a esse proces-

daí a necessidade de observar as possí-

so, que podem influenciar a comunica-

veis alterações na cavidade oral.

ção e o desenvolvimento do trabalho de

- Com freqüência, os tecidos e a

profissionais, especialmente o cirurgião

mucosa sofrem desidratação devido ao

dentista:

baixo funcionamento do centro da sede,

- Nos pacientes idosos há mudan-

fazendo com que a pele perca o brilho.

ças no processo de distribuição e excre-

- A audição diminui. Ela é o primei-

ção dos medicamentos; há também uma

ro dos sentidos a ser afetado. Assim sen-

diminuição da massa muscular corpórea

do, é de extrema importância que se fale

com proporcional aumento de gordura

de maneira clara e em tom mais alto,

( 35% ). Isso faz com que certos medica-

porém sem gritar; e que se diminuam os

mentos lipossolúvies fiquem maior tem-

sons secundários dentro do consultório,

po no organismo, podendo tornarem-se

como a música por exemplo. Existem

fator de toxicidade ou overdose; admi-

pacientes com aparelhos de audição, o

nistrando-se quando é necessário, um

que faz com que a frequência dos sons se

ATERCBIA l>ADE


altere. Éde suma importância esclarecer

ne como outros pacientes; o que pode

quando se pode usar certos equipamen-

exigirâo profissional adaptações nas téc-

tos barulhentos, para que estes pacien-

nicas e ajuste nos meios para que ta l

tes ajustem ou diminuam a frequência

higiene se efetue. Nesse momento o

de seus aparelhos, e assim poderem usu-

terapeuta ocupacional e o fisioterapeuta

fruir de maior conforto. Existem pacien-

têm muito a contribuir.

tes que, apesar da dificuldade de audi-

- Em caso de osteoporose, pode

ção, relutam em usar aparelhos auditi -

haver dificuldade em relação ao tempo

vos. Ao se conversar com este tipo de

de espera numa consulta; uma almofada

paciente, é preciso encará-lo de frente e

pode ser de grande conforto.

falar lentament e, pois para muitos ler os

- A doença cardíaca ocorre de for-

lábios é a única forma de comunicação.

ma crônica e com maior incidência nessa

- A acuidade visual também dimi-

população, e os pacientes usam como

nui. Para suprir ta l deficiência torna-se

tratamento cardiovascular uma medica-

necessário uma boa iluminação. Todo

ção anticoagulante. O profissional desa ú-

material impresso a ser distribuído deve

de deve ter cuidado nos procedimentos

ser escrito em letras grandes. Éoportuno

que possam levar ao sangramento. Éde

observar que muitos deles não distin-

grande valia um trabalho multidisciplinar,

guem certas cores, como azul, violeta e

visando uma possível terapia profilática

verde.

para se evitar uma infecção.

-Com relação à memória, a recente

-A hipertensão é a segunda doen-

é a primeira a ser perdida. Por isso, reco-

ça crônica mais comum. Pode ocasionar

menda-se que tudo o que for explicado e

ataque cardíaco, doença coronária ou

ensinado deve ser feito por escrito, para

uma síncope. Tirar a pressão do paciente

que assim o paciente possa ler em casa

em todas as consultas é um hábito reco-

por diversas vezes, facilitando a memori-

mendável. Quando ele tiver uma varia-

zação. As informações devem ser forne-

ção grande, recomenda-se encaminhá-

cidas lentamente. Não se deve apressar a

lo para umaavaliaçãomédica;poissabe-

passagem de um passo para o outro sem

se que muitas drogas podem produzir

que este último estej a totalmente apre-

efeitos colaterais como a xerostomia e a

endido.

hipotensão postural.

- Quanto às doenças crônicas, qua-

- Dentre as desordens no Sistema

tro de cinco pessoas com maisde65anos

Nervoso, destacam-se as doenças cére-

possuem pelo menos uma doença crôn i-

bro-vasculares, a doença de Parkinson,

ca, a artrite. Não se pode esperar que tais

de Alzheimer etc nas quais os pacientes

pacientes tenham habilidades de higie-

afetados podem ter paralisações que


comprometem a habilidade de se movi·

• Varicosites de dorso da língua

mentar ede andar, e provocam dificulda-

p rincipalmente, e de assoalho de boca

de de entender e de se comunicar com os

são de extrema frequência

outros.

idosos.

entre os

- A viscosidade salivar se reduz com a idade.A reduçãodofluxoeconsequente

Ili. ALTERAÇÕES BUCAIS

diminuição da lubrificação dos tecidos orais afetam a mobilidade da língua, difi·

Muitas das alterações bucais estão

cultando a deglutição dos alimentos. A

relacionadas com a história de vida, com

atrofia das glândula salivares não envol·

a manutenção por toda a vida de uma

ve só as células secretoras, mas também

dentição natural, saudável e funciona l,

os duetos.

incluindo os aspectos sociais e os benefí-

- A arcada sofre, com o passar do

cios ta is como o estético, o conforto e a

tempo, um deslocamento paramesial,

habilidade para mastigar, sentir sabores

causado pelas forças oclusais que procu-

e fa lar.

ram compensar o desgaste fisiológico.

Assim como todo o organismo, as

· Os dentes acusam uma metamor-

estruturas orais sofrem a ação do tempo,

fose cromática, tornando-se mais escu-

do envelhecimento. Existem adaptações

ros, por um certo grau de atrição provo·

fisiológ icas, no entanto, que se proces-

cado por mastigação ou hábitos viciosos.

sam durante o ciclo da dentição normal:

• Ocorrem ainda alterações como:

• Decorrente da desidratação e de

perda do elemento denta I em virtude de

alterações metabólicas, a mucosa oral

negli gência na higiene oral, infecções

torna -se atrófica e friável, assumindo um

dentárias, problemas periodontais ou

aspecto brilhante. Ocorre uma diminui-

causas de ordem traumática. Sabe-seque

ção das células queratinizadas, proteto-

das modificações, que ocorrem no apa-

ras, deixando o tecido desprotegido e

relho digestivo, a mais evidente se refere

vulnerável a qualquer tipo de stress.

aos dentes; pois um paciente com prótese

· A língua aumenta detamanhoem

total tem sua capacidade de mastigação

indivíduos edêntu los, provavelmente em

reduzida para 25% , o que fatalmente

decorrência de transferência de algumas

reduz sua ingestão de alimentos.

funções fonéticas e mastigatórias à lín-

• Mineralizaçãodos cana lículos den-

gua, na medida em que os dentes são

ti nários por calcificação progressiva, com

perdidos. O paladar sofre alterações de-

consequente redução da permeabilida-

vido a diminuição dos botões gustativos,

de e aumento no limiar de sensibilidade

principalmente após os 70 anos.

à dor.

ATtftCEIAA IDADE

23


- Redução da câmara pulpa r devi-

lesão periapical, podendo por dissemi-

do à contínua deposição de dentina nas

nação sanguínea afetar locais d istantes

paredes internas da câmara durante toda

da cavidade oral.

a vida de um dente.

O perfil de edentulismo está mu-

- A doença periodontal também

dando. Em 1958, os Estados Unidos pos-

ocorre, apesar de uma variedade de au-

suía 67,3% de pessoas edêntulas acima

tores concordarem que a doença perio-

de 75 anos. Já em 1985, este índice dimi-

dontal não está relacionada com o au-

nuiu para 47,5%. Esse aumento na per-

mento da idade, mas sim com a suscepti-

manência dos dentes coloca o " idoso•

bilidade do paciente à doença, quer seja

em contínuo risco de complicação

ele idoso ou jovem. Cabe aqu i salientar

sistêmica de origem ora l.

que a doença periodontal pode ser mais

Existem estudos que relacionam

prevalente nos idosos, porém como é

patógenos específicos de problemas

uma doença iniciada há muitos anos atrás,

orais, com condições sistêm icas. Como

possu indo períodos de quiescência, de

exemplos temos: candidíase ora l, muito

evolução lenta, provavelmente a agudi -

comum nos idosos com prótese total

zação do processo provavelmente aos

(relacionada com osteomielite vertebral);

80 anos é decorrente de um processo

cárie dental com pneumonia por aspira-

que tenha se iniciado aos 20 anos. Cabe

ção e meningite; periodontite de adulto,

salientar que o processo de envelheci-

com grande prevalência entre os idosos

mento afeta a reação do periodonto fren-

(relacionada com abscesso cerebral).

te à p laca bacteriana, que possui micro-

É importante salientar que o princí-

biota modificada; e que o processo de

pio da desordem sistêmica pode variar

envelhecimento aumenta a susceptibili -

de poucos dias a vários meses após a

dade à doença devido a diminuição da

manipulação dental, e que o idoso tem

reação imunológica.

na maioria das vezes ausência de estado febril devido à alteração do sistema imunológico.

IV. DI SSEMI NAÇÃO SIST ~MICA

Com muita frequência idosos são

COMORESULTADODEINFECÇÃOORAL

admitidos em hospitais devido a infecções. Bàcteremia, uma infecção de ori-

Os tecidos moles e duros da cavi-

gem sanguínea, é um importante fator

dade intra-oral servem como área de ade-

etiológico para morbidade em idosos, e

rência microbiana, que em condições

está associada à maior mortali dade nes-

suigeneris se tornam patógenos,e levam

ta população quando comparada à dos

à cárie, periodontite, gengivite, pulpite,

mais jovens.

"


Ante a possibilidade de se envelhe-

se concentrar no tipo de paciente que irá

cer com maior quantidade de dentes,

encontrar. Éde extrema importância pen-

fatalmente as doenças orais estarão mais

sar num planejamento bem cuidadoso

presentes; o que faz: com que os idosos se

quanto ao tratamento dentário. Planeja

tornem mais susceptíveis aos problemas

mento bem elaborado que não vise so-

sistémicos, pois o seu sistema imunoló-

mente o tratamento em si, mas o pacien-

gico está alterado.

te como um todo. Deve-se trocar conheci-

Justificam-se portanto atitudes pre-

mentos com profissionais de outras áreas

ventivas que objetivem uma melhor qua-

para se chegar a um consenso de quali-

lidade de vida ao segmento da Terceira

dade. De nada vale o planejamento de

Idade.

um trabalho sofisticado de prótese, se necessita de manutenção em casa; ensinarmos uma técnica de escovação sofis-

V. ATITUDES PREVENTIVAS

ticada, se o paciente possui limitação motora que tende a aumentar com o

Devido à grande heterogeneidade

passar dos anos, ou se tem uma tendên-

do grupo da Terceira Idade, fica impossí-

cia à depressão, não mostra interesse e

vel encontrar uma definição geral, ou

nem apresenta motivação para aprender

traçar um plano de tratamento que sirva

técnicas de higiene.

para todo paciente idoso. Além do mais,

O importante é que profissionais

existem complicações derivadas das inú-

troquem conhecimentos e experiências

meras doenças crônicas e medicações

pessoais; sejam consultados para uma

utilizadas por muitos desses pacientes.

efetiva orientação, pois o paciente da

A maioria dos pacientes geriátri-

Terceira Idade possui peculiaridades em

cos, que chegam ao consultório, apre-

todos os segmentos pertinentes à cada

senta doenças periodontais avançada,

área específica. Sabe-se, por exempo, o

grandes perdas dentais, portando próte-

quanto a xerostomia afeta o idoso e é

ses mal adaptadas, e outras anomalias

importante na mastigação e no bolo ali-

decorrentes, quase sempre, da má infor-

mentar além de ser fator etiológico para

mação relativa aos hábitos de higiene

cáries e doenças periodontais, dificultan-

oral e sua importância para a saúde geral

do também a adaptação a aparelhos

dos pacientes que estão em processo de

protéticos. Não se pode, porém, admi-

envelhecimento.

nistrar saliva artificial sem um conheci-

A Odontologia tem crescido muito

mento prévio e mais profundo do paci-

ao resolver problemas dentários através

ente; sobre cárie de raiz ( existe saliva

de pesquisas. A preocupação hoje deve

com fluor); sobre medicação (relacionalS


da com problemas cardíacos); sobre

de clorexidina, e aplicação periódica de

quimioterapia ou radioterapia. Às vezes

fluor devem ser bem indicados, pois po-

a simples indicação de um sialogogo,que

dem exacerbar certas condições patoló-

nada mais é do que um coadjuvante para

gicas. Recomenda-se que os pacientes

que o paciente masque e ative a salivação,

idosos visitem o dentista a cada 3 ou 4

é suficiente para suprir esta falha.

meses. Em cada visita deve-se fazer uma

As atitudes preventivas podem ser

avaliação dos tecidos moles intra e extra

efetivas quando são feitas dentro do con-

oral e os tecidos duros. Quando uma

sultório ou através de atendimento do-

situação de irritação, rubor, sangramen-

miciliar em pacientes que permitam, po-

to, e sensibilidade a mudanças de tem-

rém muitas delas terão efetividade se

peratura persiste por mais de duas se-

puderem dar continuidade num traba-

manas, deve ser melhor investigada pelo

Iho em casa; este prognóstico é crítico de

dentista. É preciso estar atento para o

ser alcançado pois temos diferentes ti-

fato de que o cancer, em estágios iniciais

pos de idosos, com condições físicas, so-

e fáceis de serem tratados, é indolor e o

ciais e psíquicas bastante particulares;

idoso possui alta prevalência para esta

temos que considerar os institucionali-

doença.

zados e mesmos os não institucionalizados mas que vivem com cuidadores nem

VI. CONCLUSÃO

sempre bem treinados. Há que se conscientizar os profissionais que atuam junto

O fator mais importante na utiliza-

com a terceira idade, sobre a i mportancia

ção do serviço odontológico é a presen-

de se conhecer não somente a área de

ça dos dentes. Sabe-se que, atualmente,

atuação mas também áreas afins, não

a maioria dos idosos possui próteses to-

para que se faça uma prescrição, mas

tais. Realidade que mudará num futuro

para que se possa orientar e esclarecer ao

muito próximo, quando o idoso poderá

paciente visando uma melhor qualidade

ter todas as intercorrências, limitações

devida.

própria do envelhecim ento, e os dentes

Em linhas gerais, podemos afirmar

com todos os reflexos do envelhecimen-

que a escovação dentária e o fio dental

to, acrescidos de possíveisconsequências

são os meios mais efetivos para a remo-

sistêmicas de origem oral.

ção da placa dental. A escovação deve

A Medicina,a Odontologia, a Nutri-

ser feita de forma circular, com pastas

ção, a Enfermagem, a Psicologia, o Servi-

contendo ingredientes que removam ou

ço Social, a Terapia Ocupacional, enfim

inibam a formação de placa ou tártaro.

todas as profissões relacionadas com a

Bochechos com fluor ou com gluconato

saúde, têm sido distintamente separa-


das como práticas por mais de um sécu-

desta população emergente e tão cheia

lo. A recente mudança, que se observa

de peculiaridades.

no perfi I demográfico da população, sem

"Assim como um dia bem emprega-

dúvida promoverá mudanças no perfil

do nos trazalegria ao dormir, também uma

destas profissões, que deverão desen-

vida bem aproveitada dá alegria ao mor-

volver mais as atividades de colaboração

rer•. (palavras do octagenário, Leonardo

interprofissional e de educação mútua,

da Vinci, pouco antes de falecer.)

visando melhorar a qualidade de vida

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ATEACEIRA IDADl

27



,

.

A Et1ca e a Psicologia das Relações Entre o Trabalhador Social e o Cliente Idoso JOSÉ CARLOS FERRIGNO PSICÓLOGO EASSISTENTE DA GERÊNCIA DE ESTUDOS E PROGRAMAS DA TERCEIRA IDADE DO SESC DE SÃO PAULO

"O preconceito ao diferente é bastante acentuado em nossa cultura. Tendemos a ser intolerantes para com as diferenças e muito complacentes em relação às desigualdades. Desenvolvemos atitudes discriminatórias a quem pertence a essa ou àquela raça, a quem tem alguma deficiência física ou a quem possui certa idade. Consideramos "natural" que milhões de pessoas não tenham as mínimas condições de sobrevivência, enquanto uma minoria é proprietória de muito mais do que precisa para uma vida digna".

,.


Esta reflexão pretende levantar al-

tanto, podemos supor que as relações,

guns aspectos da relação entre o traba-

por exemplo, entre funcionários de insti-

eo

tuições de saúde e pacientes idosos guar-

cliente idoso. Todavia, uma boa parte das

dam peculiariedades bem diferentes, por

considerações,aquidesenvolvidas,dizem

ocorrerem em um contexto diverso, e pelo

respeitoàs relações interpessoais de modo

fato de serem direcionadas a pessoas do-

lhador de entidades sócio-culturais

geral

e às relações

entre profissionais e

cl ientelas de qualquer faixa etária.

entes ou em processo de recuperação. Claro está que aqueles que frequentam

Somos seres naturalmente gregá-

instituições abertas caracterizam-se por

rios. Em nosso dia a dia dependemos do

uma autonomia consideravelmente mai-

afeto, do amparo e do trabalho de outras

or, já que tal ato é resultado de sua livre

pessoas, sejam familiares, amigos, pres-

escolha.

tadores de serviços, colegas de estudo

Nos últimos anos inúmeras insti-

ou de profissão. Por isso as relações inter-

tu ições públicas e privadas vêm abrindo

pessoais constituem um tema de extre-

suas portas para os idosos. Após a ação

ma importância para todos nós, princi-

pioneira do SESC nos anos 60 e 70, Secre-

palmente para aqueles que trabalham

tarias Municipais e Estaduais, além de

em alguma forma de atendimento ao

Faculdades e Universidades passaram a

público. Entender,ainda que parcialmen-

oferecer programas sociais, culturais

te, os fenômenos da comunicação pes-

de lazer para essa faixa etária. O signifi-

soa a pessoa dentro do universo das rela-

cativo incremento desse tipo de atendi-

ções que mantemos junto à clientela ido-

mento tem envolvido um número cres-

sa, deve ser uma preocupação constante

centede profissionais, formados em áreas

do profissional.

como Educação Física, Serviço Social, Psi-

Éimportante observar que as organizações culturais geralmente lidam com

e

colog ia, Terapia Ocupacional, Educação Artística, entre outras.

um público idoso relativamente saudá-

Uma característica notável do tra-

vel do ponto de vista físico e mental.

balho, desenvolvido por instituições só-

Ainda que apresentem queixas provin-

cio-culturais junto à Terceira ldade,éque

das de um corpo cansado, dolorido e,

a maioria dos profissionais diretamente

portando, restrito; além de queixas de-

envolvidos com essa clientela é formada

correntes de solidão e dificuldades fami-

por jovens na faixa etária dos 20 e poucos

liares, esses idosos mantém uma signifi-

aos 30

cativa autonomia. São capazes de decidir

expressivo o número de recém-forma-

sobre que at ividades participar, e organi-

dos. Como tais atividades, sob a forma de

zar assim a agenda de seu cotidiano. Por-

cursos, oficinas, seminários etc, têm a du-

,o

e poucos anos de

idade, sendo


ração de vários meses e até de alguns

reações ao envelhecimento e com a gran-

anos, vão paulatinamente se formando

de riqueza de comportamentos t ípicos

fortes vínculos emocionais entre profes-

dessa fase da vida, sobre os quais falare-

sores e alunos, apesar da grande diferen-

mos maisadiante. De acõrdo com nossas

ça de idade entre essas gerações.

observações, esse relacionamento inter-

O estreitamento de laços e de sen-

geracional tem sido proveitoso para am-

timentos parece se tornar maior em de-

bas as gerações envolvidas, esta belecen-

corrência de características da própria

do-se o fenômeno que Paulo de Salles

clientela. Isso porque, enquanto os fre-

Oli veira (1) descreve como sendo uma

quentadores mais jovens de entidades

co-educação de gerações: "a co-educa-

como o SESC buscam a instituição quase

ção de gerações supõe, da parte dos que

que exclusivamente para o exercício de

estão envolvidos, uma predisposição para

alguma atividade especifica, os idosos

aceitar as peculiariedades que a diversida-

fazem desses locais um ponto de conví-

de de tempos imprime na formação de

vio onde passam umtemposignificativo,

cada qual. Aquiescer a um tal convite é

conversando antes e após as atividades.

muito mais que tolerância: implica o tra-

Eles valorizam sobremaneira as relações

balho de convergir em busca de relações

com os funcionários dessas entidades,

igualitárias, acatando (e não abolindo) as

sobretudo com os monitores dos cursos

diferenças, pois, é por meio delas que se

e das oficinas.

renovam as possibilidades de modificação

Muitos desses velhos e velhas vi-

recíproca dos sujeitos. Em outras palavras,

vem sós, e por isso se vêem estimulados

é através da percepção do outro como di-

a buscar amizades. Acabam por consti-

ferente que posso, numa dada relação, di-

tu ir novas "familias" nas instituições cul-

visar meu inacabamento, quer dizer, en-

turais e, nesse processo de busca, tor-

xergar as possibilidades que o outro suge-

nam-se também mais receptivos à pes-

re para minha mudança. t um trajetória

soa j ovem, de acordo com o que temos

nada simples, mas que acena com pro-

observado no cotidiano do atendimento

messas luminosas".

institucional. Por outro lado, a maior par-

Como qualquer outra relação in-

te dos instrutores tiveram poucos mode-

terpessoa l, esta possui também uma

los de pessoas idosas, em geral apenas

complexa trama de determinações. Além

seus próprios avós. Nas instituições cu l-

das recíprocas influências das subjetivi-

turais, ao contrário, como decorrência do

dades e dos psiquismos individuais da-

grande número de idosos aí presentes,

q ueles que protagonizam diretamente

os técnicos têm a oportunidade de se

taisconvivências, é preciso levar em con-

defront ar com uma grande variedade de

ta também os fenômenos grupais, e as

A. TtRCEIAA IDADE:

"


relações institucionais e sociais mais am·

conjunto quase infindável de t ipos de pes-

pias que permeiam a chamada relação

soas podemos incluir categorias sociais

técnico-idoso.

como judeu, negro, mulher, homossexu·

É também uma questão importan·

ai, pobre, idoso etc e etc. Paradoxalmen-

te sabercomoaspessoaspercebem umas

t e, verificamos que as minorias somadas

às outras. Como o ser humano percebe

constituem-se na grande maioria da po·

seu semelhante: a partir das semelhan·

pulação! No entanto, ainda que minori·

ças, ou das diferenças para consigo mes-

tários, os padrões de comportamentos

mo? De ambas, certamente. Tomarmo·

eleit os como ideais pela civilização têm

nos como parâmetro para analisar o ou·

um uma força gigantesca e surpreen·

tro parece ser um fato inevitável, embora

dente para quem consegue percebê-los,

frequentemente gere distorções consi·

j á que seu poder reside no ocultamento

deráveis.

de sua gênese e d e sua ação. As influên·

Podemos chamar de representa ·

cias cultura is na formação de est ereóti·

ções ou imagens o conjunt o de percep-

pos são camufladas através de explica -

ções que formamos sobre o outro. Quan·

ções de caráter naturalista ou biológico.

to mais informações tivermos sobre ele,

Assim, é comum a invocação d essas ar-

mais próxima do rea l será tal representa·

gumentações pseudo-científicas para ex-

ção. No entanto, a precisão do juízo que

p licar diferenças de características de

formamos depende não somente da ve-

gênero, raça ou faixa et ária.

racidad e e da quantidade de inform a-

O preconceito ao "diferente" é bas-

ções obtidas, mas principalmente da in·

tante acentuado em nossa cultura. Ten·

terpretação que damos a elas, que por

dem os a ser intolerantes para com as

sua vez dependem da interpret ação dada

diferenças e complacentes em relação às

pela própria cu ltura em que estamos pro·

desigualdades. Desenvolvemos atitudes

fundamente mergulhados. Nesse senti·

discriminatórias a quem pertence a essa

do, os antecedentes dessa relação ten-

ou àquela raça, a quem tem alguma d efi-

dem a ser d eterminantes, tanto para

ciência física ou a quem possui certa id a-

melhor precisar nossos julgamentos,

de. Ao m esmo tempo consideramos "na·

quanto pa ra distorcê-los.

tural" que milhões de pessoas não te-

Adentramos assim no imbricad o

nham as mínimas cond ições de sobrevi·

terreno da formação dos conceitos e dos

vência, enquant o uma minoria é proprie·

preconceitos. Nossa sociedade desenvol·

tária de muito mais do que precisa para

veu pouca tolerância e compreensão em

uma vida digna.

relação aos "diferentes", aos "desvian-

O preconceito tem, entre outras,

tes", ou às chamadas "minorias". A esse

uma nat ureza generalizante. Elege alguns

"


traços de caráter ou de personalidade e

Com isso e graças ao acúmulo de experiên-

os generaliza indevidamente. Como tra-

cias singulares, que somente ele viven-

balhadores sociais ligados à Terceira Ida-

ciou, vai formando uma subjetividade

de, sabemos que os velhos são percebi-

única. Portanto, as idiossincrasias de cada

dos como seres improdutivos e depen-

idoso tendem a se manifestar de modo

dentes, embora, em nossa prática profis-

cada vez mais exuberante. Como decor-

sional verificamos que muitos não têm

rência desse processo de diferenciação

tais características. Prevalece, porém.em

ou de singularização, cada um torna-se

nossa cultura uma nítida imagem negati-

na velhice mais e mais incomparável a

va da velhice.

qualquer outro ser idoso; torna-se com-

Na esfera da sexualidade, por exem-

parável somente a si mesmo. Quem tem

plo, o preconceito em relação aos mais

oportunidade de se relacionar com um

idosos manifesta-se de modo intenso e

grande número de idosos em seu cotidi-

cruel. Segundo Elvira Wagner (2), as pes-

ano de trabalho constata o equívoco de

quisas sobre os estereótipos sexuais re-

expressões do tipo: "velho é assim mes-

velam que, como conseqüência do pro-

mo". No entanto testemunha uma ampla

cesso de envelhecimento físico, as pes-

variedade de reações, que eles apresen-

soas progressivamente vão sendo vistas

tam, frente aos novos valores da socieda -

como não desejáveis, não desejantes, e

de contemporânea, à velhice, ao enve-

incapazes de manter uma vida sexual,

lhecimento e aos próprios preconceitos

contrariando evidências de sexualidade

existentes com relação a eles.

saudável em muitos idosas e idosos.

As diferentes maneiras de se reagir

Essa característica generalizante do

ao envelhecimento acabam constituin-

preconceito torna -se ainda mais insen-

do, assim, diferentes maneiras de se en-

sata em relação aos velhos.Jung (3) iden-

velhecer. De modo bastante esquemáti -

t ifica um importante fenômeno psíquico

co, e conforme Wagner (4), podemos dis-

que faz parte do ciclo da vida humana: a

tinguir três padrões principais de reação

individuação. Fenômeno que pode ser

ao envelhecimento. No primeiro temos

compreendido por um "tornar-se a si mes-

os idosos que não conseguem se adaptar

mo", um "realizar-se a si mesmo". De acor-

de forma alguma a essa etapa da vida.

do com esse autor, a partir da segunda

Isolam-se completamente, "deixam-se

metade da vida o ser humano, progres-

morrer", ou até se suicidam. Profunda-

sivamente, vai mudando sua forma de

mente deprimidos e sem esperança, sim-

orientação no mundo; vai deixando de

plesmente não procuram ajuda, embora

ser orientado externamente para ser ori -

sejam os que mais necessitam de uma

entado cada vez mais pelo seu interior.

vigorosa intervenção psicoterapêutica.

A. TERCEIRA IOADE

33


Um segundo grupo é formado por

res sociais. Ouvem e aprendem com os

idosos que se adaptam apenas parcial-

outros, além de dar sua contribuição. É

mente à velhice. Trata-se de um grupo

claro que sofrem com o declínio do cor-

numeroso. "Defendem-se" em excesso

po e com as restrições socia is, mas, de

dl1<1vé~ e.lo u~o dl.Ju~ivo ue dlgum 111eLd·

algu,nd íorrna, desenvolvern prouulivd~

nismos de defesa do ego*. Por exemplo,

compensações afetivas, além de estraté-

se alguém faz uso intenso do mecanis-

gias inteligentes para a superação das

mo de negação para não se defrontar

crises. Elaboram melhor as perdas reais

com o próprio envelhecimento, pode aca-

do envelhecimento, ao mesmo tempo

bar adotando o hábito de só se relacionar

em que minimizam o efeito das perdas

com gente muito mais jovem, pode pas-

imaginárias sobre a auto-estima.

sar a vestir-se como um adolescente. Atra-

Ao refletirmos sobre a relação técni-

vés do mecanismo da identificação ou-

co-idoso, devemos considerar como é a

tro pode identificar-se com a hostilidade

percepção que um tem em relação ao ou-

social aos velhos e tornar-se também

tro. Podemos ponderar como as pessoas

hostil, agressivo, autoritário e rancoroso.

velhas encaram as novas; que sentimen-

Inversamente pode incorporar um ·atitu-

tos e juízos dirigem aos jovens. Obvia-

de submissa frente aos outros, a partir de

mente, tal percepção dependerá do grau

sentimentos de inferioridade ou de idéias

deadaptabilidadeedeauto-satisfaçãodo

pessimistas de que o velho não presta

idoso. O ser humano desenvolve senti-

para nada. Enfim, poderíamos pensar em

mentos positivos pelos outros e uma ati-

uma série de comportamentos possíveis

tude otimista frente à vida na proporção

decorrentes de uma parcial adaptação a

direta de uma auto-imagem e de uma

essa fase.

auto-estima mais ou menos positiva.

Pertencentes a um terceiro grupo,

Reciprocamente, o técnico dirigirá

há velhos que encontram-se satisfatoria-

um olhar acolhedor ou hostil ao idoso

mente adaptados às transformações de

em decorrência não somente de infor-

si mesmos e da realidade em que estão

mesalheios sobre o velho e sobre o enve-

inseridos. Notabilizam-se por uma pos-

lhecimento, mas sobretudo de sua pró-

tura flexível em relação aos novos valo-

pria história de relações com pessoas mais

• Mecanismo de defesa do ego é um conceito formulado por Freud. Todos nós podemos e devemos lançar mão desse recurso, cuja finalidade é a de proteger nossa integridade psfquica. Em situações de crises emocionais, énormal eesperado que deles façamos uso. Oque vai caracterizar uma personalidade neurótica é, entre outras coisas, sua utilização permanente. As pessoas de alguma forma muito "defensivas~ encontram maiores dificuldades de relacionamento interpessoal e de desenvolvimento de atividades produtivas. Freud elencou uma série de mecanismos de defesa como negação, identificação, racionalização etc, através do estudo rle muitos casos cllnicos.



velhas, incluindo-se aí principalmente as

das quais se manifestam tais relações

figuras paternas e de seus avós. Quanto

transferencia is inconscientes, são mui-

mais positivos tenham sido ta is relacio-

tas; quase tantas quantas nossa imagina-

namentos, mais preservada estará uma

ção pode abranger.

representação de velh ice e de envelhecimento.

Cabe ao técnico, mesmo sem formação teórica sobre o assunto, mas do-

A Psicologia nos ensina muito acer-

tado de suficiente sensibilidade para as

ca do mecanismo da projeção, através

sutilezas do relacionamento interpes-

do qual transferimos nossa realidade in-

soal e de noções básicas a respeito do

terior para fatos, situações e pessoas, que

envelhecimento, perceber e responder

avaliamos e que fazem parte do nosso

adequadamente a essas demandas. Para

cotidiano. O conceito freudiano de trans-

isso convém refletirmos sobre outro im-

ferência** pode seresclarecedor, porque

portante conceito instituído por Freud: a

refere-se ao conjunto de projeções que

contratransferência. Ela tem a ver com

uma pessoa dirige a outra, movida por

nossas reações inconscientes à transfe-

desejos inconscientes. Tal fenômeno não

rência do outro, no nosso caso o cliente

ocorre apenas em uma relação psicanalí-

idoso. Aproveitando os exemplos acima,

tica, mas sim em muitas situações do

uma possível manifestação contratrans-

nosso cotidiano.

ferencial do técnico é a de assumir (in-

O fenômeno transferencial está pre-

conscientemente) a posição de pai ou de

sente na relação técnico-idoso; e se in-

filho, na qual o idoso o coloca inconsci-

tensifica pelas condições especiais dessa

entemente também. O técnico atento a

relação. O técnico é alguém que, de algu-

esses fenômenos não se fixa em tais pa-

ma forma, se propõe a ajudar o velho,

péis. Ao contrário, retira-se da posição

podendo ser visto por este como uma

em que é colocado pelo cliente, e opera

autoridade técnica e moral. Neste caso o

no sentido de desenvolver com esse ido-

idoso pode tratá-lo como um pai ou uma

so uma relação adulta e produtiva, na

mãe que ampara e orienta, ou oposta-

perspectiva da sua independência emo-

mente que recusa afeto. Às vezes o pro-

cional.

fissiona 1,que em geral é ma is jovem, pode

Segundo Bion (5), a dinâmica do

ser percebido como um filho exemplar,

grupo, incluindo-se aí a relação entre duas

ou ao contrário como um filho desaten-

pessoas como um importante tipo de

cioso e impaciente. As formas, através

conformação grupal, é caracterizada por

•• De acordo com Laplonche e Ponta/is, em seu "Vocabulário da Psicanálise", a transferência 'designa

o processo pelo quol os desejos inconscientes se atualizam sobre determinados objetos, no quadro de certo tipo de relação estabelecida com eles... •

,.


um jogo intenso de projeções e de intro-

essa autoridade, que estamos qualifican-

jeções. Ou seja, além de projetarmos sen-

do de técnica, tende a estabelecer uma

timentos sobre o outro, interiorizamos

desigualdade entre técnico e cli ente, im-

outros tantos. A introjeçãoé também um

possibilitando assim o florescimento da-

processo inconsciente sumamente po-

quilo que este autor denomina de Tra ba-

deroso, porque ao incorporarmos impres-

lho Social, ou sej a, um traba lho de pro-

sões alheias a nosso respeito podemos

moção humana.

efetivamente acreditar em sua validade,

Sobre os perigos do autoritarismo,

passando a nos comportar coerentemen-

Guggenbühl-Craig (7) nos diz: "todos os

te com elas. O idoso, por exemplo, pode

que atuam nas profissões sociais, traba-

introjetar a imagem de um ser incapaz,

lhando para ajudar a humanidade, apre-

enquanto que o técnico incorpora a i ma-

sentam motivações psicológicas extrema-

gem de alguém onipotente, que sabe do

mente ambíguas para as suas ações. Em

que o idoso precisa.

sua própria consciência ediante do mundo,

O re lacionamento interpessoal,

o assistente social (o trabalhador social,

tanto em contextos informaisquanto pro-

diríamos nós) vê-se forçado a encarar o

fissionais, é freqüentemente permeado

desejo de ajudar como sendo sua motiva-

por relações de poder e de dominação. O

ção primordial. Mas, nas profundezas de

técnico social está sem dúvida investido

sua alma, o oposto simultaneamente se

de uma certa autoridade, decorrente,

constela - não o desejo de ajudar, mas o de

entre outros fatores, dos supostos co-

terpoderesentir alegria em despotencializar

nhecimentos que detenha e cuja finali-

o cliente". Evidentemente o autor se refe-

dade deve ser a de beneficiar seus clien-

re a processos inconscientes, que têm

tes. Se admitirmos que esse tipo de rela-

infelizment e efeitos devastadores. Por

ção possue uma natureza pedagógica, e

isso é de vital importância que todos

como tal é necessariamente assimétrica

aqueles que se propõem a lidar com pes-

quanto à distribuição de pod er, compre-

soas, p rincipalmente as mais carentes do

enderemos como inevitável e até neces-

ponto de vista afetivo ou material, de-

sária aautoridadequeacabamosde men-

vem estar permanentem ente perscrutan-

cionar. Todavia,a relação t écnico-cliente

do suas mais subterrâneas motivações.

passa a ser anti-pedagógica quando a

Outra questão important e, na con-

autoridade técn ica passa a ser um instru-

formação da relação técnico- idoso, é o

m ento de dominação, ao invés de trans-

fato de o técn ico ser representante de

formação positiva das cond ições de vida

uma instituição. Sua imagem junto ao

do cliente. Assumindo uma posição mais

idoso depende, portanto, da imagem

rad ical, Medina (6) considera que mesmo

atua l que ele tem da entidade na qual

A TCACUV. IDADE

"


trabalha. Portanto, tendo ou não consci-

clientela. A empatia pode ser entendida

ência desse fato, age como mediador da

como intuição daquilo que se passa no

relação idoso-instituição. Deve então co-

outro. Para Carl Rogers (9) a empatia con-

locar-se receptivamente não só frente

siste em captar, com a maior exatidão

aos elogios à entidade e à sua pessoa,

possível.as referências internas e os com-

mas também frente às críticas e às recla-

ponentes emocionais de uma outra pes-

mações concernentes às atividades e ao

soa, e compreendê-los como se fossem

atendimento pessoal oferecido.

nossos. Embora conheçamos a comple-

Vale a pena lembrar a afirmação de

xidade dessa empreitada, nos parece que

Simone de Beauvoir (8): "a velhice é sem-

a boa vontade já representa um grande

pre do outro". Isto é, temos dificuldade de

passo nessa direção, além da coragem

perceber nosso próprio envelhecimen-

para enfrentarmos nossos próprios pre-

to. Assim perdemos também a p reciosa

conceitos. Tal preocupação não serve

oportunidade de vivenciar idéias e senti-

apenas para lidarmos melhor com os ido-

mentos úteis para a compreensão dos

sos; serve principalmente para educar-

velhos, tanto em nossa família, quanto

mo-nos para o exercício do respeito aos

em situação profissional.

nossos semelhantes (que, aliás, têm o

Para concluir, devemos nos empenhar no sentido de desenvolver mais e

direito de ser diferentes) e para a compreensão de nossa p rópria velhice.

mais uma relação empática com a nossa

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (1) OLIVEIRA, Paulo de Salles. Vidas Com-

Instituto Sedes Sapientiae. São Paulo:

partilhadas - o universo cultural nas.relações entre avós e netos. São Paulo: Huci-

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Buenos Aires: Paidós, 1963. (6) MEDINA, C. A. Participação e Traba-

Climatério Feminino. Cadernos do Curso

lho Social - Um Manual de Promoção.Humana. Rio de Janeiro: Vozes, 1981. (7)- GUGGENBÜHL-CRAIG, A. O Abuso do Poder na Psicoterapia, Medicina, Serviço.Social, Sacerdócio e Magistério. Rio

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de Janeiro: Edições Ach iamé, 1978. (8) BEAUVOIR, 5. A Velhice. Rio de Janei-

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ro: Difel, 1976.

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(9) ROGERS, C. A Terapia Centrada no

so de Especialização em Gerontolog ia do

Cliente. São Paulo: Nova Fronteira, 1975.

38


Fundamentos Psicopedagógicos Para uma Ação Educativa em Gerontologia Social VILMA MARIA BARRETO PAIVA PSICÓLOGA, PROFESSORA DE GERONTOPSICOLOGIA DO DEPTO DE PSICOLOGIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ.

"O passado de cada um representa a identidade pessoal e possui um significado subjetivo. Portanto, a experiência acumulada dos alunos da Terceira Idade não deve ser menosprezada, mas valorizada na realização de qualquer tarefa. Assim, o passado ou a história pessoal pode ser um meio para se levantar e discutir questões do presente".

AlEltCEIAA IDADE



No mundo de hoje o avanço tecnológico, cada vez mais, exige das

importantes. Tendo em vista o isolamen· to social comum nessa faixa etária a meta

pessoas atualização e educação permanente. Para Ubaneo (1991) a finalidade

mais importante é o estabelecimento do contato com ou tras pessoas, ficando em

da educação na sociedade é preparar o

segundo lugar a própria rea lização da

aluno para as tarefas da vida social. O

tarefa.Neste sentido a pessoa idosa pode

isolamento social tem sido a conseqüên·

se interessar mais pelo processo de fazer

eia mais freqüente nos grupos que não se

do que pelo produto. Assim, a maneira

atualizam e não participam. Assim, as pessoas da Terceira Idade, principalmen-

como a tarefa é desenvolvida passa a ser mais importante do que seu resu ltado

te aquelas que já se afastaram do proces-

final. Porque isto ocorre? Porque as pes·

so produtivo, vivenciam com mais fre· qüência esse isolamento social.

soas comumente se interessam mais pe·

Talvez por isso um fenômeno so·

las tarefas que têm um significado ou

cial vem se multiplicando nas socieda-

uma função imediata. Muitas vezes ore·

des modernas: a criação de escolas e cur-

sultado proposto é negligenciado, pois é visto como muito distante para ser alcan-

sos destinados a idosos e aposentados. Para lidar com pessoas de faixa etária

çado.

mais avançada, deve-se ter conhecimen -

Devido a experiências repressoras

to de algumas de suas idiossincrasias para

anteriores que algumas pessoas mais

planejar ações educativas mais eficazes.

velhas sofreram tanto nal família como na profissão, elas estão mais interessa·

1. OBJETIVOS

das em vivenciar experiências com liber· dade e gratificação afetivo-emocional,

Em primeiro Iugar, os objetivos, que

principalmente quando estão em grupo,

norteiam qualqueração pedagógica para a Terceira Idade, devem levar em consi-

deixando um pouco de lado a aprendiza-

deração três pontos: · permitir a transmissão de novos conhecimentos e valores;

gem de regras e de normas limitadoras. Nesse sentido, é importante verificar o nível de motivação para a tarefa propos· ta. Comumente as pessoas idosas só se

• atualizar capacidades potenciais;

interessam por tarefas que tenham um

· eliminar o isolamento social e

significado pessoal. É importante verifi·

afetivo.

car o que cada pessoa idosa pretende alcançar com determinada participação

Para se atingir estes objetivos deve-

ou realização.

se atentar para algumas considerações ATCRCEllA IDA()(

41


li. Metodologia para um Trabalho Educativo

da vida; - Os estímulos, que trabalham com a percepção visual, contribuem mais efi-

2.1- Aspectos Cognitivos

cazmente para a aprendizagem do que

Segundo estudos rea lizados

aqueles que trabalham a percepção

(GEIST, 1977, GRIBBIN, 1979), não há

aud it iva. Assim, as atividades que

comprovação de que a inteligência di-

priorizam os r.ecursos auditivos (como a

m inui quando se envelhece. As pesqui-

fala) levam facilmente à dispersão e, por

sas indicam ainda a manutenção das

conseguinte, ao afastamento dos objeti-

aptidões verbais e leve d iminuição das

vos propostos. No entanto, se a fa la é

aptidões numéricas; e também diminui-

associada a figuras, a objetos e a outros

ção na aptidão mnemônica para fatos

recursos visuais, mais facilmente o even -

recentes. A memória do passado, no

to será compreendido e memorizado;

entanto, se mostra intacta.

- Evidencia-se lentidão do raciocí-

No envelhecimento, é possível

nio e das capacidades sensori ais e

identificar ainda outras variáreis, que

motoras, quer para tarefas que exijam

devem ser levadas em conta para a rea-

compreensão, execução ou locomoção.

lização do planejamento metodológico:

Por isso é preciso estabelecer um tempo

a)

lentidão no raciocínio em

função da diminuição dos processos fi. siológicos funcionais; b)

diminuição natural das ca-

pacidades visuais e auditivas; c)

lentidão na mobilidade e nas

capacidades motoras em geral.

maior para a rea lização dessas ta refas. • O passado de cada um representa a identidade pessoal e possui um significado subjetivo. Portanto, a experi ência acumulada dos alunos da Terceira Idade não deve ser menosprezada, mas valorizada na realização de qualquer tarefa. Assim, o passado ou a histó-

De posse dos dados acima cita-

ria pessoal pode ser um meio para se

dos, alguns resultados e conclusões po-

levantar e discutir questões do presente;

dem ser encontrados quando se lida com

- É importante incluir a interação,

alunos de idade avançada: • Constatou-se alguma insegurança diante de situações novas e até mes-

o lazer, a recreação e a d iversão com o meios para se atingir os objetivos edu· cacionais;

mo certa parcimônia na execução de

- Qualquer metodologia escolhi-

tarefas em decorrência do medo de er-

da deve evitar a infantilização da pessoa

rar. É pouco provável, encontrar com-

idosa; experiências ou metodologias in-

portamentos impulsivos nesse período

fantis não servem de modelo para adul-

"


a mensagem de quem está fa lando ou

tos idosos; - Deve-se evitar a superproteção,

expondo. Esta situação conduz à disper-

como por exemplo não ouvir ou tomar

são ou à sonolência. Outro fenômeno às

decisões sem considerar a opinião da

vezes ocorre: a formação de pequenos

pessoa idosa. A superproteção é muito

sub-grupos por proximidade, desestru-

comu m nas relações entre adulto-jovem

turando a formação inicial do grande

e adulto-idoso, mostrando que há, por

grupo. O ideal é o desenvolvimento de

parte do primeiro, negação e desvalori-

atividades em pequenos grupos, levan-

zação da autonomia e da independên-

do ao conhecimento e à interação, e

cia do grupo mais vel ho.

permitindo atividades baseadas na fala e na escuta de todos os participantes,

2.2- Mét od os Pedagógicos

bem como na atenção direta do educa-

Para se traba lhar com alunos de

dor ou do instrutor do grupo;

Terceira Idade os seguintes métodos podem ser utilizados:

d)

de visitas. vivenciando no-

vas experiências, através de passeios e

de exposição oral. desde que

atividades culturais, permitindo a am-

associada a perguntas que estimulem a

pliação de conhecimentos e a aquisição

curiosidade, que verifiquem se o con-

de experiências significativas. Além dis-

teúdo está sendo aprendido, e que se

so. essa atividade contribui diretamen-

associem a recursos audio-visuais;

te para diminuir o isolamento social. fa -

a)

b)

interativo. através de um diá-

logo aberto, fazendo-se uso de leituras, discussões e apresentação de experiên-

cilitando a integração com os diversos grupos sociais a que pertence; e)

Experençial. através de rela-

cia pessoais;

tos de experiências pessoais e/ou emo-

c)

ciona is, dramatizações, simulações e

Grupal. através da troca de

experiências entre os membros do gru-

treinamentos.

po. Nestecasooeducador funciona apenas como um facil itador ou coordena-

Ili.Recursos Ped agógicos

dor, deixando para o grupo a ta refa de

Mais Ut ilizados.

definir objetivos e atribuir tarefas. Éim-

- Cartazes, gravuras e ilustrações,

portante salientar que, em qualquer ati-

quadro e flanelógrafo para facilitar a

vidade grupal de idosos, deve se consi-

memorização de novidades, conheci-

derar o ta manho do grupo; pois, ao par-

ment os. orientações e indicações;

ticipar de atividades em grandes grupos, os idosos com limitações sensoriais

- Leitura e discussão de revistas.

não ouvem e não visua lizam cla ramente

livros e film es para se traba lhar histórias

ATEACEIRA IDADE


significantes e desencadear situações

e promover estimulação sensório-

motivadoras;

motora.

- Objetos e utensílios, que tenham

Quando a atividade educativa for

significado para o cotid iano e para com-

de transmissão de conhecimentos teóri-

preender o passado de cada um (caixas,

cos, ou meramente informativa, deverá

bolas, roupas, objetos para higiene, ob-

priorizar os recursos mais eficazes, como

jetos de cozinha, alimentos etc.);

os audio-visuais e os vivenciais para que

- Músicas atuais e passadas, que

os alunos de idade avançada possam in-

tenham algum significado para a vida de

troduzir sua experiência acumulada, e,

cada um. Músicas cujo obj etivo seja

assim, tornarem-se os agentes do pro-

relembrar, integrar, socializar, divertir,

cesso e não meros expectadores.

melhorar o humor, acalmar, tranqüilizar,

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GEIST. Psicologia e Psicopatologia dei Envelhecimento. Buenos Aires: Paidós, 1977.

GRIBBIN, Kathy. Processos Cognitivos do Envelhecimento. ln Burside "Enfermagem e os Idosos", traduzido para o português por Lauro Blady e Almeida Souza. São Paulo: Andrei, 1979.

..

LIBÂNEO, J. Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1991. TURRA, Clodia Godoy et alii. Planejamento de Ensino e Ava liação- PUCRS. Porto Alegre:197S.


Barreiras à Integração Social do Idoso JOS~ RAMOS QUEIROZ MÉDICO GERIATRA. PROFESSOR DA PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SALVADOR-BA. EX-SUPERINTENDENTE DO INPS E DO INAMPS.

"A preparação para a Terceira Idade deve começar na década

dos 40 anos, prevenindo o envelhecimento rápido ou mesmo precoce e, tanto quanto possível, o aparecimento de doenças. Para um indivíduo com antecedentes normais, espírito aberto e compreensivo, o envelhecimento não trará maiores problemas•.

A lUICEIRA IOAOE



No ciclo biológico do homem a

de instrução e de educação, as modifi-

velhice leva a desvantagem de ser a úl-

cações ecológicas e as alterações urba-

tima fase, a do declínio, a do retorno

nísticas (transporte, segurança etc.).

inexorável à mãe terra. Sustar esse me-

Na rea lidade há interdependência

canismo será, talvez, atentar contra as

desses óbices, de modo a tornar difícil

leis naturais. Torná-lo mais lento, com

caracterizá-los isoladamente. Iremos

razoável manutenção da normalidade

mencioná-los num estudo conjunto,

anátomo-fisiológica, evitando as mani-

tentando esboçar protótipos, para faci-

festações mórbidas, é uma justa aspira-

litar a exposição.

ção do ser humano.

Deixando de lado a especulação

Estamos um tanto distante dessa

de quando se inicia o envelhecimento,

realidade. Múltiplos fatores impedem -na

com a maior expectativa de vida pode-

de se concretizar. Basta uma manifesta-

mos considerar uma pessoa idosa a par-

ção anormal congênita, um desenvolvi-

tir dos 70 anos. A Terceira Idade fica

mento insuficiente na infância e na ado-

como sendo uma fa ixa intermediária

lescência, ou uma seqüela na fase adulta,

entre o estado adulto e a velh ice (matu-

ea velhice poderá ficar irremediavelmen-

ridade ou meia idade, dos 50 aos 69

te comprometida.

anos), em vez dos limites preconizados

De modo genérico, podemos dis-

pela OMS:

tinguir três tipos de idosos: os que enve-

· Meia idade - de 45 a 49 anos

lhecem normalmente, sem maiores al-

· Idoso

terações orgânicas e mentais; os que

· Ancião - de 75 a 90 anos

manifestam precocemente modifica-

· Velh ice extrema - de 90 em dian-

ções somato-psíquicas; e os que acres-

te ( John Piscopo - Washington, 1979)

cem à marcha regressiva um estado pa-

A preparação para a Terceira Ida-

tológ ico.

- de 60 a 74 anos

de deve começar na década dos 40 anos,

A reação desses t ipos será bem

prevenindo o envelhecimento rápido ou

diversa não só ao processo involutivo

mesmo precoce e, tanto quanto possí-

em si, mas igualmente ao ambiente em

vel, o aparecimento de doenças. Para

que vivem, às vezes, tolerante, quase

um indivíduo com antecedentes nor-

sempre indiferente, e em certos casos

mais, espírito aberto e compreensivo, o

hostil.

envelhecimento não trará maiores pro-

Estão constituídas assim as barrei-

blemas.

ras à integração do idoso, das quais par-

Podemos ordenar as dificuldades

ticipam ele próprio, a família, a socieda-

à integração dos idosos como causas

de, a situação sócio-econômica, o grau

físicas, psíquicas, patológicas e sociais.

A TEACORA IOAOE

,,


As transformações normais do organis-

ções que se processam, e assim destruir

mo, tanto na área física quanto na psí-

os t abus ainda existentes.

quica, variam de indivíduo para indiví-

As fases da fisiologia sexual são

duo, não havendo às vezes correlação

bem mais nítidas e definidas na mulher

com a idade cronológica.

do que no homem - menarca, período

Há uma diminuição progressiva

reprodutivo e climatério, onde se desta-

das funções vegetativas e das de rela-

ca a menopausa. No homem a capacida·

ção. Destas, destacamos a audição, a

de de reprodução é bem mais duradou-

visão e a locomoção. Se o idoso não vê

ra. Ainda se discute a propriedade dos

bem, ouve mal e se movimenta lenta-

termos climatério masculino e andro-

mente, deve haver por parte dos que

pausa para indica r o declínio dessa ativi·

lidam com ele compreensão e paciên-

dade. A mulher, entretanto, leva a van-

cia, de modo permanente ou fortuito.

tagem de estar sempre pronta para o

Além dessas alterações o desseca-

ato sexual, mesmo que o realize contra

mento da pele e a queda dos cabelos,

sua vontade, sem nenhuma satisfação.

alterando a fisionomia, preocupam so-

O homem tem que se preparar para o

bremodo as mulheres. A dificuldade na

dito ato; mesmo em plena normalidade,

mastigação implica numa alimentação

uma série de fatores pode interferir de

apropriada, que nem sempre pode ser

modo negativo e ele fica impossibilita·

obtida ou levada em consideração. Os

do de realizá-lo. Quanto maior a idade

fenômenos artrósicos, mormente os da

cronológica, maior a preocupação do

coluna vertebral, podem encurvar o ido-

homem em manter o mesmo ritmo se-

so, dando-lhe uma feição grotesca. A

xua l de quando era jovem. A desilusão

perda progressiva da memória, mor-

não se fará esperar.

mente dos fatos recentes, é outro fator

É preciso convencer o indivíduo

de irritação para o idoso e para os que o

da Terceira Idade que a atividade sexual

ouvem na repetição dos mesmos episó·

pode ser mantida por longo tempo,den·

dios.

tro dos limites da capacidade orgânica, O sexo no idoso está envolto em

preconceitos, delírios de grandeza, com-

e que esse fato não constitui nenhuma diminuição da masculinidade.

plexos e frustrações. Se o organismo vai

Quanto à mulher, é preciso alertar

se modificando como um todo, é claro

que o climatério é um estágio normal da

que o aparelho reprodutor não será uma

vida; orientar quanto às precauções a

exceção. É preciso atentar para as dife·

serem tomadas para mantê-lo nos limi·

renças biológicas entre o homem e a

tes fi siológicos, e o essencial é dizer que

mulher; entender melhor as transforma-

a menopausa não significa o t érmino da

...


atividade sexual; às vezes, ao contrário,

to de perpetuação da linhagem, e sim o

ocorre aumento do desejo e da satisfa-

de completar o ciclo vital ao lado de

ção sexual. A discrição, mais que nunca,

alguém que neutralize as naturais restri-

deve acompanhar essa nova motivação

ções da inexorável marcha do tempo,

que a mulher descobriu e que o homem

tornando-o mais suave e ameno, menos

mantém, para evitar que se tornem ob-

perceptível e inquietante. Não podemos estabelecer critérios

jeto da reprovação e do anedotário irreverente de amigos e conhecidos.

nem normas rígidas para a questão se-

Quando um casal envelhece, vai

xual dos idosos. Cada um deverá resol-

se ajustando às suas novas condições,

vê-la da maneira que lhe parecer me-

inclusive às da área sexual. Se há separa-

lhor

ção ou um deles falece, a situação do

pessoais.

e de acordo com suas condições

sobrevivente é seriamente agravada e

As modificações psíquicas vão des-

ameaçada pelo pior dos males - a soli-

de o aparecimento ou recrudescimento

dão, mormente quando se sente isola-

de manias, de irritabilidade ou de apa-

do, mesmo não estando sozinho.

tia, ditadas pela esclerose progressiva,

É um direito a formação de novo

até manifestações mais graves. Alguns

lar, ea mulher sofre indisfarçável e injus-

desses transtornos poderão ser supera-

ta discriminação, que a compele a uma

dos ou atenuados se o idoso for prepa-

vida por vezes incompatível com seu

rado para isso; do contrário, dificultarão

temperamento e formação, mesmo por-

a convivência e a comunicação. Sabe-

que "viúva não é uma mulher cuja perda

mos que, em certos casos, não é fácil

do marido fica obrigada a dar um novo

distinguir onde termina o processo in-

sentido à sua vida". Aceitar e mesmo

volutivo normal e quando se inicia o

estimular a união entre idosos é salutar.

estado de morbidez. Por isso mesmo a

Ridicularizá-la ou combatê-la, confun-

gerontopsiquiatria é um dos setores

dindo afeto e ternura com aquelas ma-

mais importantes da Geriatria. Ela tenta

nifestações libidinosas da esclerose, é

evitar que aconteça ao idoso um dano

insistir em tornar sinônimos envelheci-

mental irreparável. As desordens men -

mento e doença.

ta is podem até atingir o limite da inca-

Para o idoso o casamento está as-

pacidade legal, transformando o idoso

sente em base primordialmente afetiva,

num ser vegetativo, com deterioração

e além de carinho, entendimento e am-

tota I do intelecto.

paro mútuo, também é sexo, e tão ver-

As barreiras patológicas podem ser

dadeiro no sentimento- o amor-quan-

irremovíveis, se o idoso for acometido

to odo mais jovem.Não há mais o instin-

de doença incapacitante (e dela não se

A TUICEIRA IDA[)(

.


recuperar), como acidente vascular cere-

sant e com seu défi cit habitacional crô-

bral, artrite (em suas diversas modalida-

nico e sem solução à vista. Em outros

des), doença de Parkinson, osteoporose,

países algumas tentativas podem ser

fraturas, insuficiência cardíaca descom-

mencionadas: no Japão, o empréstimo

pensada, além do câncer terminal, etc.

módico para ampliação da residência;

A resistência dos hospitais em acei-

na Suécia, a doação de certa quantia

tar o doente crônico e incapaz, a preca-

com o mesmo fim; na Inglaterra e Aus-

riedade da habitação, a ausência de pes-

trália, anexos às casas ou pisos especiais

soa para cuidar do idoso, a deficiência

nos prédios para construção do "aparta-

de recursos financeiros, são agravantes

mento dos avós", dando maior privaci-

que emprestam um ar de tragédia e de-

dade tanto à família quanto aos idosos;

sespero aos que lidam com esse tipo de

na Iugoslávia, a escolha de uma família

problema. A "nursing home" dos países

para compartilhar com um idoso a sua

desenvolvidos ainda não chegou até

residência, quando ele a possui, medi-

nós, e a perspectiva, nas circunstâncias

ante um contrato especial.

atuais, é reduzir ao mínimo a assistência

A atividade laborativa do indiví-

médica oficial, mormente a hospitalar.

duo term ina, por lei, aos 70 anos, embo-

Enquanto isso, assistência particular só

ra ele possa aposentar-se após 35 anos

é acessível a um grupo privilegiado da

de serviço ou aos 60 e 65 anos de idade,

população.

conforme o sexo. A aposentadoria, por

Esses óbices, sobrevindes às vezes

si mesma ou pela falta de preparação

de modo brusco e inesperado, são os

prévia, pode se constituir em um grave

mais difíceis de transpor, mesmo quan-

transtorno à vida do ex-empregado e da

do há boa vontade, dedicação e desvelo

sua família. Lembremos os três "D" da

por parte de familiares e amigos.

aposentadoria: deslumbramento, de-

Vejamos algumas barreiras sociais, das quais avulta a constituição da fam ília, nela incluída ou não o idoso.

cepção e desespero. A aposentadoria é mais uma barreira para quem chega à Terceira Idade;

Várias tentativas têm sido coloca-

principalmente para quem se sente ca-

das em prática para resolver o problema

pacitado, em plena atividade e exercen-

da habitação. A insuficiência de espaço

do função de chefi a. Os funcionários

para alojar o parente mais velho, princi -

mais jovens ficam contando os dias de

palmente nos apartamentos, pode se

seu afastamento a fim de ocupar sua

transformar em impedimento intrans-

posição. O aposentado julga ser fáci l

ponível em países em desenvolvimen-

encontrar outra atividade, pela sua prá-

to, sendo o nosso país um exemplo fri-

tica, conhecimento, folha de serviço

.




impecável. Pura ilusão: as portas estão

ca r a imagem negativa que tem de si

fechadas para os velhos, mesmo que

mesmo, ou a imagem que a sociedade

sejam "cinqüentões". Para as mulheres

faz dele - fisica mente desgastado, do-

a situação é ainda pior, pois os valores

ente, incapaz, inútil, implicante, negli-

dos atributos físicos da juventude são

gente consigo mesmo, desatualizado

os únicos a prevalecer em nossa socie-

etc. Se o adulto aprende em tempo que

dade. Se o idoso pode sobreviver com o

a velhice é um estado normal da vida, e

que percebe, deve dedicar-se a um ser-

por isso mesmo deve ser bem aceita,

viço voluntá rio, encontrar um hobby,

uma série de complicações e a própria

descobrir uma atividade artesanal que o

doença não aparecerão, desde que me-

ocupe. Deve evitar tornar-se inativo para

didas preventivas sej am tomadas no

evitar o "complexo de inutilidade" e o

devido tempo.

desgaste somático e psíquico oriundos da ociosidade.

Há duas principais situações a evitar: o complexo de inutilidade e a soli-

A pobreza é outra barreira impor-

dão. No primeiro caso, qualquer ativida-

tante, pois torna o idoso dependente da

de, mesmo voluntária, conforme apti-

fa mília, dos amigos, da comun idade e

dão anterior ou preferência pessoal,

do Poder Público. Por menor que seja a

deve ser estimulada; no segundo, se o

contribuição do idoso, esta lhe dá a sen-

idoso vive com familia res deve saber

sação de que não é inútil, nem um peso

adaptar-se aos novos hábitos e costu-

morto, e o transform a num participante

mes, aos modismos e à gíri a da época,

da renda fam iliar.

embora não os aprove ou pratique. Nada

Se ele não tem onde residir por

de pretender impor suas convicções, seu

não ter família, amigos, moradia com

modo de interpretar fatos e aconteci-

outros idosos, terá de recorrer aos abri-

ment os, e de dar a "última palavra". Se

gos governamentais, sobretudo se não

puder, pelo convencimento e persua-

receber numerário de aposentadoria,

são, restringir excessos ou desvios de

pensão etc. Por isso achamos valiosa e

conduta dos jovens, estará tomando

útil a iniciativa do Ministério da Previ-

uma atitude meritória. Se não, deve es-

dência que, em 1974, estabeleceu a ren-

perar que o tempo dê a melhor oportu-

da vitalícia, equivalente à metade do

nidade para ministrar conselhos e ensi-

maior salário mínimo, para pessoas

namentos. 56 assim o idoso, exceto em

com mais de 70 anos ou inválidos,

casos irrelevantes, será estimado e res-

mesmo sem o caráter de segurado ou

peitado, tornando-se o "confessor" da

beneficiário.

família e o ponto de convergência para

O idoso, por sua vez, deve modifiATI;RCflRA IOAOE.

solucionar os seus problemas com exS3


periência e bom senso. É imperativo dis-

sos dias praticamente determinou adis-

sociar a velhice da impertinência, dara-

solução da família tradicional, muita vez

bugice, da incapacidade e do egoísmo.

congregada a um só ramo de atividade,

O idoso precisa também vencer o

transmitida com orgulho a sucessivas

complexo de inferioridade, praticando

gerações. O êxodo rural, a migração in-

esportes, e divertindo-se em clubes e

terna, o imperativo do trabalho diferen-

reuniões sociais sem descambar para o

te para cada membro da família, muita

ridículo e o exibicionismo.

vez fora da profissão escolhida ou pre-

O antagonismo entre as gerações

tendida, transforma pais, filhos e irmãos

ultrapassa os limites da família e atinge

em quase estranhos, entregues aos pró-

a sociedade: o mais moço lutando para

prios pensamentos, atribuições e inte-

conquistar seu espaço, e o idoso tentan-

resses. Éum "entra e sai" constante, sem

do manter-se útil, produtivo, lembrado

hora certa para a refeição ou o repouso.

e respeitado. Nesse confronto não se

Nessa confusão doméstica, em que, às

deve fixar o idoso como o anti-jovem, na

vezes, há apenas margem para um rápi-

expressão de Gilberto Freire, mas dar-

do "oi" no encontro fortuito, à saída ou

lhe condições de bem estar e higidez

entrada de casa, como situar o parente

física e mental sem superproteção, como

idoso?

um valor nacional vivo e atuante, e não

Não é fácil para um indivíduo de

como um objeto de piedade e comise-

outra época, de geração anterior, envol-

ração. Os velhos, no dizer de Paul Ar-

vido em seus próprios conflitos, com

bousse Bastide, devem sentir-se respon-

idéias pré-formadas pela educação re-

sáveis pela memória do futuro.

cebida ou sem ela, conviver com um

A assistente social Zal ly Pinto Vasconcelos de Queiroz distingue dois ti-

ambiente, na aparência, antagônico e, por vezes, hostil.

pos de relacionamento entre os jovens

A posição do idoso pode variar não

e os de idade mais avançada: o afetivo,

só em relação àqueles que com ele con-

geralmente entre idosos e netos, entre

vivem, mas também de acordo com o

sobrinhos e crianças em geral; o compe-

seu próprio comportamento - a perso-

titivo, entre o adolescente, quando co-

nalidade do idoso reflete sua maneira

meça a se sentir adulto e quer decidir

de ser quando jovem, porquanto "tal

sua própria conduta e seu destino, além

como vivemos, assim envelhecemos",

de mais tarde pretender ingressar no

no dizer de Felix Post. O diálogo e a

mercado de traba lho, e o mais idoso que

compreensão mútua, a concordância em

poderá ser o seu concorrente.

ceder aqui e ali, em vez da exacerbação

A crise econômica e social de nos-

de ânimos

que radicaliza e desune,


mantém o equilíbrio da família, ficando

perspectiva de um conhecimento me-

o idoso na condição apropriada à sua

lhor sobre o envelhecimento, para que

idade e estado físico, dentro do seu ní-

haja aceitação da pessoa idosa e para

vel na hierarquia familiar.

que ela possa agir de modo positivo no

O I Encontro Nacional de Idosos,

convívio fam iliar•.

promovido pelo SESC-São Paulo em se-

A permanência do idoso na famí-

tembro de 1982,apresentou conclusões

lia, mesmo vivendo em harmonia, pode

sobre previdência social, saúde, servi-

acarretar problemas quanto às diversas

ços urbanos, educação, participação

obrigações dos seus participantes e ao

comunitária, institucionalização, lazer e

seu direito ao lazer. Assim, quando o

família. Sobre esta e seu relacionamen-

casal precisa sair para o trabalho e os

to com os idosos foi dito que:

filhos para a escola, quem cuidará do

· "é imperiosa a necessidade de

idoso? Nos fins de semana e durante as

conscientização da família para que não

férias, na impossibilidade do idoso os

veja o idoso, mesmo inválido, como um

acompanhar,comofazer? A solução será

ser desprezível e descartável, mas como

o Day Center- Centro de Convivência, o

uma pessoa que precisa, sobretudo, de

Clube ou outra organização que acolha

calor humano";

o idoso durante o dia. Conforme a estru-

· "é preciso que se tome alguma

tura e os recursos, o Centro poderá for-

medida para que os idosos não sejam

necer alimentação, diversões, atividade

levados para o asilo, a não ser em último

laborativa, exercícios físicos e até fisio-

caso, pois acontece que a maioria das

terapia. Se dispuser de quartos, hospe-

famílias os internam para se livrarem

dará temporaria mente o idoso durante

deles";

o período de afastamento da família.

· "os meios de comunicação são

Também se poderá recorrer às clínicas

responsáveis pelo distanciamento cada

de recuperação, residenciais e outros

vez maior entre as gerações, quando

congêneres. Isto acontece na Inglater-

exaltam demasiadamente as qualidades

ra, na França, na Dinamarca etc. Não

dos jovens, ou quando selecionam essa

sabemos quando se generalizará em

fa ixa etária como exclusiva para direcio-

nosso país.

nar a publicidade dos bens de consu-

mo,,;

Esses problemas não são encontrados apenas no Brasil. Nos países mais

· "a educação é uma questão pri-

desenvolvidos, entretanto, há por parte

mordial para o perfeito relacionamento

do Est ado ou por iniciativa particu lar,

familiar. Assim, o processo educativo

tentativas para diminuir ou, mesmo,

deve atingir a família como um todo, na

anular as barreiras contra os idosos.Veja-

ATHICEIRA IJAOE

"


mos alguns exemplos. No Canadá, ou

dificultam a existência dos idosos, pro-

mais precisamente em British Columbia,

porcionando-lhes assim maior comodi-

foi fundada a •sociedade dos Avós Vo-

dade e conforto.

luntários" (1980), subvencionada pelo

Pela primeira vez no Brasil e mes-

Ministério de Recursos Humanos para

mo na América Latina a Terceira Idade

proporcionar aos idosos distantes dos

teve voz e voto, no Encontro de Idosos já

netos a possibilidade de vê-los, ou a es-

mencionado. Uma particu laridade: esse

colha de crianças a quem puderem se

Encontro foi estruturado por um jovem

dedicar. Na Alemanha Ocidental (Hano-

ideali sta, devotado inteiramente à causa

ver - 1979) a organização voluntária "Ku-

da terceira idade, dignificante exemplo

ratorium Deutscher Altershilfe" oferece

para os mais moços: Marcelo Antônio

aos jovens cursos sobre envelhecimen-

Salgado,gerenteda Gerência de Estudos

to. Uma publicação belga - Le Troisieme

e Programas da Terceira Idade do SESC

Age, dirigida por Simone de Nave, resol-

de São Paulo.

veu, durante 3 anos (de 1975 a 1977),

Entre as conclusões gerais, do refe-

chamar a atenção do público em geral

rido certame, está a afirmação de que •o

para um aspecto do programa dos ido-

primeiro passo será levar avante a pro-

sos e sua integração: 1) mostrou a neces-

posta final, apresentada no Encontro e

sidade de um melhor relacionamento

aplaudida portodos:"a fundação de uma

entre jovens. adultos e idosos; 2) procu-

Associação Brasileira de Idosos, com ob-

rou determinar os fatores necessários

jetivos bem definidos, e com a fina !idade

para assegurar a participação contínua

de permitir maior integração do idoso

dos idosos na sociedade; 3) dedicou-se a

com o seu meio socia l".

modificar a imagem que o público em

Aí está o marco inicial da transfor-

geral tem dos mais velhos. Na Alemanha

mação dessa legião de brasileiros, consi-

(Munich, 1981) decidiu-se estimular a

derados improdutivos e, por isso mes-

permuta de residências amplas sub-ocu-

mo, marginalizados e esquecidos, em um

padas entre seus moradores e as famílias

poder atuante; em uma forma de pres-

mais numerosas. Na Austrália, já se cuida

são positiva, sem conotação política ou

de estribo especial nos ônibus; de sinais

de qualquer outra natureza, e com a

de tráfego mais lentos nas avenidas e

finalidade precípua de se fazer ouvir e

ruas largas; do aumento dos caracteres

conseguir afirmar, em alto e bom som:

nas etiquetas de preços nos supermerca-

aqui estamos, vivos; aind a somos gente

dos para maior facilidade de leitura etc.

e podemos ser tão úteis como quais-

Enfim, muitos países procuram di-

quer outros. Será que o Brasil, tão caren-

minuir os inconvenientes e óbices que

te de valores e lideranças.continuará des-



O Papel da Universidade na Reinserção Social do Idoso LÍBIA LIMA FRANCIOLI PEDAGOGA. COORDENAOORA DA UNIVERSIDADE PARA A TERCEIRA IDADE - ULBRATI (RE)FLORESCER, DO INSTITUTO LUTERANO DE ENSINO SUPERIOR DE JI-PARANÁ-RO.

"Acravés do engojomento sociof, os idosos reopropriorom-se dos sonhos e dos objetivos

de vida obandonodos ao longo do caminho por falta de oportunidades e pela descrença na capacidade de alcançá-los•.

ATEACBRA IDADE

"


O têrmo Terceira Idade, adotado para definir uma categoria etária, cujo

já que pode ser retardado ou até mesmo evitado.

fnicio situa-se entre entre os 60 e os 65

Se para o idoso brasileiro tudo - ou

anos de idade, segue a "terminologia

quase tudo - está por ser feito, o nível de

francesa de HUET". Tal delimitação etária

carência da população idosa de Rondô-

é também aceita pela Organiização Mun-

nia -constituída por 57.91 1idosos,4,46%

dial da Saúde como marco inkial caracte-

da população total - é ainda mais grave.

rizadordo envelhecimento.Todavia, esse

Dos 57.911 idosos do Estado (60 anos e

conceito não se aplica à realidade da Re-

mais), 4.495 concentram-se no municí-

gião Norte do país, maisespedficamente

pio de Ji-Paraná, cuja população total é

do Estado de Rondônia, cujas condições

de 94.634 habitantes, representando

climáticas,aliadasàsprecáriascondições

portanto um percentual de 4,75%.

de saneamento e à ausência de medidas

Pouco se conhece dos programas

asseguradoras de uma melhor qualida-

de atendimento ao idoso em Rondônia.

de de vida, fez com que se adotasse a

Sabe-se do trabalho do SESC em Porto

faixa et~ria de 55 a60 anos para ldentifi-

Velho, capital do Estado, que por ser pio-

C<1r os indivíduos que entram Ingressam

neiro tem a maior expressividade. Exis-

nos raros programas de atendimento ao

tem também algumas iniciativas recen-

idoso ai existentes.

tes, constituídas na forma de abrigos

Rondônia, um estado de grandes

governamentais e não governamentais:

dimensões geográficas.cuja colonização

Casas Lares, Fundações, asilos e a predo-

deu-se por pessoas oriundas das mais

minância de Centros Dia, mantidos por

diversas regiões do pais, tem, por isso,

algumas prefeituras. Vale ressaltar que

uma visão diversificada sobre a velhice.

tais iniciativas têm caráter paliativo e as-

Dependendo da cultura e dos costumes

slstencialista, sem o real e necessário

de cada região, os velhos são mal ou bem

aprofundamento que a questão requer.

tratados, integrados ou não à família e à

Não há dúvida, de que, embora tí-

vida social. Apesar de jovem, o Estado detém

midas e paliativas, as ações empreendidas no município, a partir do conheci-

um grande número de idosos, cujoenve-

mento dessa realidade num contexto

lhecimento seguramente não é apenas

bem maior que é o envelhecimento po-

um processo físico natural, mas sim um

pulacional no mundo, têm o mérito de

processo individual com ampla varieda-

despertar em alguns segmentos da co-

de de características, predominando o

munidade Jí-paranaense uma reflexão

chamado envelhecimento social, que ao

mais pragmática em relação a um qua-

contrário do físico, não é uma fatalidade,

dro de necessidades. Éde uma açãocon-

..


ereta de que trata este estudo. Essa pes-

que pode ser este o espaço que propicie

quisa, no amplo universo de investiga-

à sociedade e à clientela específica, a

ção acerca da velhice, deu ênfase à ques-

tomada de consciência da riqueza de sua

tão do envelhecimento social e de seu

vida pessoal e a importt!ncia da comuni-

redimensionamento a partir da criação

cação de sua experiência a outras gera-

de um espaço aberto a uma categoria

ções, desenvolvendo o equilíbrio e a com-

que precisa principalmente de uma orien-

preensão mútua num mundo tão confli-

tação quanto à melhor maneira de supe-

tuoso e dinâmico.

rar suas próprias limitações e, sobretudo,

Dentro desta perspectiva,alinham-

de enfrentar os preconceitos que são

se os seguintes objetivos: 1) permitir às

verdadeiras barreiras ao exercício de sua

pessoas da Terceira Idade que sejam su-

cidadan ia.

jeitos e agentes de sua promoção socia l, uma vez que com o passar dos anos seus

Um programa de educação

papéis e status foram se perdendo. Na

continuada

melhor das hipóteses esses papéis foram sendo substituídos por outros nem sem-

Lançado em junho de 1997, o Pro-

pre desejados ou buscados; 2) propiciar

jeto Universidade para a Terceira Idade

condições para o desenvolvimento do

destina-se a pessoas com idade igual ou

indivíduo e para sua integração na co-

superior a 55 anos. Tem por meta a cria -

munidade, reconhecendo seu potencial

ção de um espaço promotor de novos

de contribuição para a sociedade e seus

conhecimentos, de novas oportunidades

direitos como cidadãos; 3) envolver a

e de resgate da identidade e da cidada-

Universidade deforma interdisciplinar no

nia. Tais objetivos são alcançados através

tratamento da questão da Terceira Ida-

da reflexão da clientela sobre o seu existir

de, abrindo campo de atuação, de ensino

e seu fazer, oportunizando a troca de

e pesquisa.

experiências e valorizando as histórias

Com a implantação do Programa

individuais e coletivas, levando-a, assim,

Universidade para a Terceira Idade, ini-

ao engajamento biopsicossocial".

ciou-se uma investigação sobre os refle-

Trata-sede um Projeto de Extensão

xos que o Programa teria na vida dos

vinculado à Coordenação de Pesquisa e

alunos, com a atenção voltada mais es-

Extensão do Instituto Luterano de Ensi -

pecificamente para a questão do enve-

no Superior de Ji-Paraná - lLES. Faz parte

lhecimento social e de seu possível redi-

do Complexo ULBRA, cuja experiência

mensionamento através do estímulo às

parte do pressuposto de que a Universi-

relações com as pessoas de sua geração

dade tem um importante papel social e

e, também, com as de outras gerações.

A TEACtJAA IOAO(

.,


Essa intervenção previu que, ao final de

sa, cujo processo utilizado para obten-

três anos, fosse possível uma avaliação

ção da amostra foi a freqüência destes às

de alguns resultados deste processo.

atividades oferecidas pelo Programa. Desse grupo foi extraída uma amostra

Método e técnicas de

representativa equivalente a 25% do to-

investigação utilizados

tal, cujos componentes foram selecionados através de sorteio.

O estudo partiu de um processo indutivo que foi se delimitando na explo-

Perfil dos alunos da ULBRATI

ração dos contextos onde se realizou, da observação do grupo estudado e dos

O conjunto dos alunos se situa na

contatos estabelecidos no decorrer da

faixa etária de 55 a 80 anos. A maior con-

experiência com os informantes. Utili-

centração por idade se coloca entre 60 e

zou-se para levantamento de dados, a

75 anos. A amostra se constituiu de um

ficha de matrícula, elaborada de forma

grupo de 45 mulheres e 05 homens. A

que possibilitasse também traçar um

maioria é de viúvos (28). Os demais estão

perfil biopsicosocial do matriculado.Atra-

assim distribuídos: casados, 18, divorcia-

vés dessa ficha, preenchida através de

dos, 03 e 01 solteiro.

entrevista, procurou-se enfocar os aspec-

O número de filhos varia entre 02 e

tos que, segundo o levantamento biblio-

12, predominando o número de 04, 06 e

gráfico e objetivo da pesquisa, fossem

1O filhos, todos maiores de idade e, em

relevantes ao estudo e que pudessem

sua maioria, casados. Dos 18 entrevista-

fornecer elementos básicos para o pri-

dos que são casados, 11 moram com o

meiro diagnóstico da situação, sem pre-

cônjuge e os filhos, mas somente um

tender esgotá-lo, para, assim, subsidiar

casal participa das atividades do Progra-

futuras investigações.

ma juntos; 17 moram e/ou são mantidos

Para um segundo diagnóstico, fo-

pelos filhos, 03 com pais e irmãos, quase

ram gravadas as entrevistas, inferindo-se

sempre como cuidadores desses, e os 12

que, mesmo para os alunos alfabetiza-

restantes moram sozinhos.

dos, as questões escritas seriam de difícil

Quanto ao relacionamento com os

compreensão,considerando-setambém

familiares, somente 04 idosos disseram

a dificuldade de expressão escrita de vá-

ser péssimo. Os demais se relacionam de

rios participantes.

forma satisfatória, muito embora alguns

Dentre os 65 alunos matriculados na Universidade para a Terceira Idade da ULBRATI, 50 participaram desta pesqui62

expressem clara insatisfação quanto ao tratamento recebido. O nível de escolaridade varia entre


oanalfabetismoeosuperiorincompleto,

a participação dos filhos no encaminha-

predominando os níveis mais baixos de

mento ao grupo, influenciando em sua

escolarizações: 22 analfabetos, 14 semi-

decisão de dele participar.

alfabetizados, 13 com nível médio e 01

Tendo como referência as expecta tivas do grupo, a Universidade para a

com nível superior incompleto. Apesar de estarem no grupo etário

Terceira Idade centrou suas ações em

dos que se aposentam, apenas 19 rece-

atividades que viessem contemplar tais

bem tal benefício, 11 são pensionistas,

expectativas. Implantou-se inicialmente

09 são dependentes dos filhos e 03 têm

as atividades físicas

algu m vínculo empregatício com remu-

passaram a acontecer em todos os três

neração fixa. Os demais exercem algum

encontros por semana, no período ves-

t ipo de atividade remunerada, são costu-

pertino.

reiras, vendedoras e lavadeiras.

e

recreativas que

Inicia lmente constrang idos num

Observou-se ainda que de todos os

ambiente onde a maior circulação é de

entrevistados, apenas as mulheres são

adolescentes, preocupavam-se com seus

pessoas ativas, ou seja, mantêm-se ocu-

trajes

padas com os cuidados da casa, dos fi-

iniciais observavam

lhos, dos netos ou, ainda, exercem algu-

pelos jovens.

e inativos, não desenvolvem

e eram observados

Ficamos atentos à percepção que

ma profissão. Os homens, todos aposentados

e sua aparência. Nessas situações

ne-

os jovens poderiam ter do grupo recém

nhum tipo de atividade, seja ela remune-

ingresso em seu espaço. Era comum ver

rada ou não.

os jovens manifestarem um grande interesse e curiosidade, reunindo-se em gru-

Fio condutor das ações

pos para assistirem às aulas dos idosos, ora divertidos, ora surpresos com o que

Além dos dados estatísticos neces-

viam.

sários para traçar o perfil dos alunos, ve-

Da curiosidade inicial, os jovens,

rificou-se também as suas expectativas

irreverentes, vez ou outra, se aproxima-

ao ingressarem no grupo. A resposta pre-

vam dos idosos durante as atividades

dominante foi fuga à solidão, segu ida do

destes, promovendo-se assim uma inte-

desejo de conhecer e conviver com pes-

gração espontânea, que viabilizou não

soas da mesma faixa etária, se ambientar

só a liberdade de circulação dos idosos,

e se sentir valorizados. Alguns disseram

mas também afastou a sensação de ridí-

p recisar preencher o tempo, outros ma-

culo por parte dos velhos por estarem

nifestaram o desejo de aprender a ler e

brincando

escrever e apenas alguns mencionaram

coisas que só os jovens fazem.

AY€ROORA l()ADE.

e jogando, ou

seja, fazendo

63


sos de si mesmos, tornando-se esta uma

atender e entender aqueles que os re-

questão básica para o encaminhamento

peliam do espaço que outrora fora seu e

dos trabalhos conclusivos deste estudo.

onde nem suas repetitivas histórias cabiam

O que significa estar na Terceira Idade e

mais. Vestiam a "roupa de velho" sem se

qual a percepção individual, familiar e

permitirem questionar qual o seu con-

social que se tinha e a que passaram a ter

ceito de velhice, e se realmente sentiam-

após o ingresso no grupo?

se como tal. Enfim, viviam a vida que a

Através de um sorteio, foram convi-

sociedade esboçou para eles.

dados 13 alunos, que constituíram uma

Em alguns depoimentos verificou-

amostragem representativa, que sob a

se a crença de que a dignidade não podia

forma de entrevista foram abordados sobre

fazer parte do dia-a-dia do idoso, pare-

questões como perdas de papéis sociais,

cendo estranho a eles o tratamento dig-

situação familiar e convívio social.

no e respeitoso que receberam no espa-

De manifestações conformistas ini-

ço da ULBRATI, tratamento, que, aliás,

cialmente apresentadas, passou-se a uma

deveria permear todas as formas de rela-

reflexão mais abrangente quanto a ex-

cionamento humano.

clusão familiar. As observações acerca do

Citaram repetidas vezes a existên-

idoso como fardo para a família foram

cia de um mundo paralelo, sem cor e

comuns, levando cada um a refletir sobre

beleza. A qual mundo estariam se refe-

sua própria relação familiar e passando a

rindo? Onde estaria o problema? De que

entender e até compartilhar uma solidão

forma estariam contribuindo para esse

que fora também sua até o encontro com

alheamento? O mundo paralelo, e para

os pares.

eles agressivo, manifesta-se de várias for-

Nos depoimentos, percebeu-se o

mas e é muito difícil acompanhá-lo e

que na fala deles "seria uma estrada sem

assimilá -lo. Referiram-se às sucessivas e

volta': evidenciada no estar cada vez mais

rápidas transformações pelas quais o

em contato consigo mesmos e cada vez

mundo passa, especialmente porque o

menos em contato com os outros. Rela-

mundo contemport!neo - mais que em

taram que, à medida em que foram enve-

qualquer outra época da história, - não

lhecendo viram-se obrigados a corres-

propicia o diálogo intergeracional, que

ponder à imagem estereotipada do ve-

provoca o desengajamento familiar e

lho, mudando sua postura, tornando-se

social, cujas causas fogem à compreen-

curvos, andando menos e mais lentamen-

são daqueles que chegando à velhice,

te, arrastando os pés, carrancudos e tris-

não sabem mais para onde ir. Nesse con-

tes. Foram obrigados a ser compreensi-

texto como imigrantes no tempo e no

vos, subservientes, sempre prontos a

espaço, desconhecem o idioma domi-

ATERCEIAAIOAOE

6S


nante. Assim, passara m a se perceber

tuo fez com que aqueles que no dizer de

como pessoas impossibilitadas de travar

Aida Rufino "se mantinham sentados,

qualquer diálogo, e onde não há diálogo,

psicologicamente sentados", começas-

não há comunicação, e num ambiente

sem a se levantar, assumindo uma atit u-

onde não há comunicação freqüente, vai

de mais ativa, de questionamento frente

se instalando, não só o isolamento, mas

ao próprio envelhecimento, convencen·

sobretudo, a atrofia vital.

do-se de que velhice não é sinônimo de

A cada questão lançada aos entre·

doenças, e que os problemas de saúde,

vistados, viu-se confirmada a idéia de

embora comuns dado o envelhecimento

que a instituição social familiar é que

biológico, não devem ser os determinan-

reproduz o modelo social vigente; no qual

tes da vida.

a figura do idoso é encaminhada ao anonimato e à marginalização.

Em vários momentos, percebeu-se através dos depoimentos que havia uma

Durante muito tempo esses alu·

dicotomia entre o que pensam de si, en-

nos mantiveram-se em casa, cultivando

quanto idosos, e o que pensam da velhi-

sua velhice como processo de desliga-

ce, confirmando que o preconceito em

mento, e, enquanto esperavam a che·

relação à velhice que a sociedade amal-

gada da morte, mantiveram-se passivos

gamou ao longo do tempo, alcança tam-

em relação à vida e em relação à socie-

bém o idoso, pertencente a essa socieda·

dade, sofrendo injustiças tremendas e

de, realçando ainda maisodistanciamen-

agressões extraordinárias, tentando ser

to existente, como se houvesse um anta-

invisíveis, incomodando e falando o

gonismo entre ambos.

menos possível.

O ambiente favorável ao fortaleci-

Contrapondo-se a essa realidade

mento da auto-imagem positiva, inicial-

de quem "já deu tudo o que tinha que

mente restrita à sala de aula, foi aos pou-

dar", passaram a atuar num outro palco,

cos ganhando maiores proporções, per-

onde passaram a ser donos de suas ações,

ceptível em suas atitudes em relação ao

donos de seus desejos e sentimentos,

fato de perceberem que sua condição de

questionando o próprio conceito deve-

alunos da instituição se consolida dia ria·

lhice resignada.

mente e proporciona um novo status.

Écom essa nova visão de si que,aos

Sentem-se novamente parte de um gru·

poucos, eles tem rompido a imagem es-

po social, dentro de um espaço acadêmi-

tereotipada e preconceituosa daqueles

co, que na sua percepção, é composto

que vêem a velhice externamente, não

por "detentores do conhecimento" ou

atingindo sua essência. O convívio com

no mínimo, investigadores deste.

os pares num ambiente de respeito mú66

Através do engajamento social, os


idosos reapropriaram -se dos sonhos e

tação, a ULBRATI (Re)florescer continua

dos objetivos de vida, abandonados ao

atendendoaos65 alunos a que se propôs

longo do caminho por falta de oportuni-

atender inicialmente, pautando suas

dades e pela descrença na capacidade de

ações pelas expectativas e necessidades

alcançá-los.

do grupo, priorizando as atividades físi-

As respostas a ta is indagações

cas, recreativas e sócio-culturais, promo-

apontaram sempre para uma auto-esti-

toras da melhoria da qualidade de vida

ma e uma auto-imagem positivas como

através do movimento e do contato lúdi-

fatores determinantes desse novo olhar

co entre os participantes. O projeto ofe-

que lançavam sobre si mesmos. Passa-

rece também atendimento médico e

ram a sentir-se prontos a demonstrar sua

acompanhamento psicológico, fato que

capacidade de reconhecimento dos pró-

tem efetivamente contribuído para o

prios valores e do fato de serem capazes

crescimento e conscientização do grupo

de trabalhar com eles e gerar a capacida-

em relação ao seu papel de formadores

de de eficiência equilibrada entre as po-

de opinião em relação à velhice, não só

tencialidades e as limitações. Através da

junto à comunidade acadêmica da Insti-

auto-imagem positiva que desenvolve-

tuição, mas principalmente, junto a seu

ram, permitiram-se vivenciar novas ex-

meio social.

periências, até então percebidas como inadequadas.

Os objetivos primeiros do Programa estão sendo gradativamente alcan-

Diante do novo perfil que se deli-

çados, pois ao trabalhar com um grupo

neou, constatou-se que, em decorrência

tão pequeno diante do vasto universo da

da insegurança inicial, pensavam que o

população idosa do município de Ji-Pa-

fato de serem atendidos por uma equipe

raná, o ILES/ULBRA via ULBRATI, tem a

de profissionais jovens, poderiam cedo

preocupação de criar elementos multi-

ou tarde tornarem-se discriminados. Mas

plicadores na pessoa de cada compo-

mesmo assim arriscaram, acreditaram e

nente do grupo. Essas pessoas, trilhando

conquistaram espaços, e é nesse espaço

o caminho de volta, tem levado àqueles

antes ocupado pela insatisfação, tristeza,

que ainda não vislumbraram uma vida

solidão e falta de perspectiva que hoje

mais digna, a oportunidade de perceber

impera a alegria, a solidariedade, o com-

que é pela ação consciente que se prepa-

panheirismo, a produtividade e especial-

ra um caminho menos tortuoso para os

mente a crença em si mesmos.

que estão fadados a assumirem seus lu-

Hoje, dois anos após a sua implan-

A TtRCEIAA KM.OE

gares na sociedade.

.,



Repensando a Arte e o Lazer na Terceira Idade. MARIA LÍGIA MARCONDES DE CAMARGO PROFESSORA DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FISICA DA UFMG. COORDENADORA DOS PROJETOS TERCEIRA IDADE CULTURAL E EDUCAÇÃO FISICA PARA A TERCEIRA IDADE

"Uma das funções da arte é a de possibilitar a reconciliação do homem com suas rafzes mais profundas; como ser fntegro e total, capaz de atingir a plenitude do prazer no fazer e no viver auto-construído. Essa reconciliação é um direito e uma necessidade do ser humano. Incentivar o indivíduo, e em especial o idoso, por meio de processos que possibilitem exercitar a sua sensibilidade artística, é abrir-lhe caminhos de renovação espiritual, através da vitória da originalidade sobre o hábito, da ousadia sobre o conformismo..."

A TEACORA IDADE

..


Esta análise tem por finalidade re-

outros problemas que sorrateiramente

novar os questiona mentas daqueles que

subtraem do velho qualquer possibili-

comungam a idéia de que a aposenta-

dadede auto-realização, mormente pro-

doria não é o "degrau final" da jornada

vocados pela exclusão do mercado pro-

de trabalho da existência humana, mas

dutivo, são engendrados programas

um tempo de lazer construído com cria-

destinados ao tempo de lazer do idoso.

tividade e envolvimento. O resgate de

Essas programações, quer sob a forma

valores transcendentais permite a co-

de atividades físicas, danças, passeios e

municação da rica experiência do idoso,

outras, ainda que possam aparentemen -

através de expressões artísticas criterio-

te amenizar as consequências das fre-

samente estimuladas e abre novas pers-

quentes mazelas da velhice, nem sem-

pectivas de reconstrução de vida. As

pre atendem às reais necessidades ou

opções de lazer estão inseridas no fazer

aos verdadeiros interesses dessa popu-

criativo, como processo dinãmico, pes-

lação.

soal e humanizador.

É bem verdade que a maioria das

Embora ocorra em todos os seres

pessoas que se aposentam, se vê priva-

vivos, o processo biológico de envelhe-

da do ambiente social de trabalho; o

cimento no homem é bastante comple-

que não deixa de ser uma perda. Afirmar

xo, uma vez que vem associado a perdas

porém que a esta perda é acrescentada

de ordem psicológica e social. Essa rea-

também a perda do "status", que o tra-

lidade, desconsiderada ou aparente-

balho ativo confere, não deixa de ser um

mente ignorada por tanto tempo, vem

profundo engano.

ganhando cada vez mais espaços nas

Ao remontarmos à história recen-

colunas de jornais e revistas do mundo

te da humanidade, constatamos que a

inteiro, através de artigos muitas vezes

supervalorização do trabalho foi defla-

impregnados de preconceitos ou de

grada pelo capitalismo, na busca única

opiniões desprovidas de caráter históri-

do lucro através da produtividade. Trans-

co- científico.

formando cada homem em parte ativa

Um desses equívocos está fre-

de um grande mecanismo, no qual a

quentemente vinculado à concepção

liberdade individual de crescimento é

generalizada, que se faz sobre a aposen-

substituída pela submissão assalariada,

tadoria, como o marco final da vida pro-

o capitalismo fragmentou e alienou o

dutiva do trabalhador, tempo implacá-

ser humano de si mesmo e do contexto

vel de condenação do idoso ao isola-

social. Tal fenômeno se dá, principal-

mento e ao ostracismo. Em decorrência

mente, em decorrência da divisão cres-

de idéias como essa e para fazer face aos

cente do trabalho e das limitadoras es-


pecializações. A fragmentação imposta

tem sido garantida por um processo úni-

pelo trabalho impôs sérios limites ao

co no reino animal, de transformação

crescimento do indivíduo como um

contínua do mundo em que gravita so-

todo, subtraindo-lhe também o poder

berano. Primeiramente, através do tra-

de criação. Segundo Fischer(l 983),

balho e das relações sociais que se esta-

"...quanto mais engenhoso e complexo é o processo de trabalho, tanto menos inteligente é o trabalho que se requer do trabalhador individual, e mais ainda é a sua alienação do conjunto•.

beleceram a partir dele, e posteriormenmem transformou, como um mago, a

Essa alienação, ainda que no sécu-

construído instrumentos que desenvol-

lo XX tenha sido responsável pelo pro-

vem a consciência de si mesmo e de

gresso material do ser humano, princi-

suas infinitas possibilidades, sobrepu-

palmente em virtude dos avanços tec-

jando a natureza e transformando-a em

nológicos, não atende aos anseios pro-

objeto de suas necessidades vitais.

te através da criatividade, foi que o horealidade do mundo que o rodeia. Atra vés de suas mãos, o ser humano tem

fundos da natureza humana. Assim, a

A partir desse raciocínio, entende-

alienação deve ser superada, a fim de

se porque a criatividade artística é a sín-

que o homem reencontre a consciência

tese de uma necessidade humana trans-

de si mesmo e o domínio da condução

cendental. Desde os primórdios,a criati-

do produto de seu trabalho, através de

vidade tem sido materializada, ora sob a

novas condições que o libertem do ser-

forma de inovação dos objetos para me-

vilismo produtivo, imposto pelo capita-

lhor se adequarem às suas aspirações

lismo.

naturais, ora como disfarces de animais,

A consciência dessa necessidade

com o objetivo de capturar a presa, ou

torna-se cada vez mais imperiosa, à me-

ainda para a utilização do ritmo do can-

dida em que o indivíduo envelhece, e

to coletivo visando o aumento da pro-

caminha inexoravelmente para a apo-

dução agrícola.

sentadoria, para o tempo que precisa

Arte e trabalho caminharam sem-

ser encarado como condição básica de

pre juntos no processo de desenvolvi-

libertação de um mercado produtivo,

mento humano, especialmente porque

que aliena e escraviza.

a arte é, em si, uma forma manifesta de trabalho e um meio de comunicação so-

Trabalho, Arte, Lazer

cial. O artesão de outrora, além de atender a sua clientela, estabelecia vínculos

O homem sempre foi um criador; e

sociais com ela, ampliando seu círculo de

a sua sobrevivência, através da história,

amizades. O menestrel medieval, percor71


rendo vilas e castelos e fazendo da mú-

venciá-/o, vivenciando a si mesma, cons-

sica meio de sobrevivência, acumulava

ciente e inconscientemente•.

também a missão de transmitir notícias,

Ainda que os percursos da desco-

a exemplo do papel desempenhado pe-

berta e da criatividade sejam intuitivos,

los comunicadores de hoje. Não se pode

uma vez que a indagação, os questiona-

negar que através da arte e da sua ação

mentos ou a apreensão de conhecimen -

libertadora, o homem consegue comu-

tos sejam processos genuinamente

nicar-se, encontrando força e estímulo

humanos,a mobilização interior,através

para transformar e humanizar a realida-

de estímulos externos, induz à experiên-

de social. Quanto maior é a experiência

cia artística, seja como compreensão do

humana, tanto mais rico é o seu acervo

conteúdo de uma obra, ou como desco-

de expressão e comunicação. Este fato

berta das próprias potencialidades di-

não pode ser desconsiderado; princi-

ante dela. A dinâmica da arte, qualquer

palmente quando se trabalha com a po-

que seja sua linguagem expressiva,cons-

pulação idosa, cuja tendência é, mais do

titui sempre um processo construtivo,

que nunca, a de buscar novas possibili-

libertador e humanizador, que confere

dades de envelhecimento, norteadas

auto-estima e dá sentido à vida pelas

por conqu istas sociais e científicas que

profundas implicações com a emoção, a

possibilitem diferentes opções de vida.

cu ltu ra e a história de cada ser. Éatravés

A compreensão dessa realidade,

dela que o indivíduo constrói sua iden-

contudo, só é possível através da criati-

tidade em todos os tempos e idades,

vidade que rompe barreiras e desfaz con-

fortalecendo e socializando o seu mun-

dicionamentos, estabelecendo canais de

do interior, através de uma linguagem

comunicação entre o indivíduo, que cria,

universal mente aceita como experiên-

e a sociedade para quem é destinada a

cia humana. Programas voltados à vi-

criação. A arte é, em si mesma, uma rea-

vência artística, através da música (can-

lidade social; fruto não só da consciên-

to ou prática instrumental), da dança,

cia que o indivíduo tem da sociedade,

ou ainda das artes cênicas ou plásticas,

como também das imposições que esta

constituem sempre processos de cresci-

exerce sobre ele.

mento direcionados ao bem estar físico,

A apreensão desse conhecimen-

psíquico e social do idoso.

to nasce na infância, a partir dos pri-

Uma das funções da arte é a de

meiros movimentos corporais, no mo-

possibilitar a reconciliação do homem

mento em que, segundo Ostrower

com suas raízes mais profundas; como

(1986) •...a criança começa a ensaiar o

ser íntegro e total, capaz de atingir a

espaço, a discernf-lo, a conhecê-lo, a vi-

plenitude do prazer no fazer e no viver

12


auto-construído. Essa reconciliação é um

tais do organismo e sua sincronia•.

direito e uma necessidade do ser huma-

Por essa razão, a criatividade não é

no. Incentivar o indivíduo, e em especial

um apanágio de eleitos, nem tampouco

o idoso, por meio de processos que pos-

algo extraordinário que somente privi-

sibilitem exercitar a sua sensibilidade

legiados conseguem atingir. Assim

artística, é abrir-lhe caminhos de reno-

como o lazer, ela faz parte do comporta-

vação espiritual, através da vitória da

mento humano, de suas aspirações na-

originalidade sobre o hábito, da ousa-

turais de satisfação e de prazer, através

dia sobre o conformismo de tudo o que

do assentimento e da integração har-

viveu e descobriu.

moniosa do seu universo interior com a

Nietzsche (apud Mosquera, 1974)

objetividade da obra concretizada.

referindo-se à criatividade, expressa: •a

Ainda que programas, destinados

pessoa criadora é aquela que investiga

à população idosa, sejam iniciativas vá-

suas possibilidades, discute, vê as possí-

lidas, consideradas como "um passo à

veis soluções, sabe das forças e das fraque-

frente" nas conquistas sociais, elas só

zas do seu comporramenroe, especialmen-

não bastam. É necessário ouvir o idoso,

te, está preocupada em que a sua idéia

perscrutar-lhe a alma, permitir-lhe asa-

germine".

bedoria da palavra e valorizar sua expe-

As sociedades modernas precisam,

riência de vida.

cada vez mais, repensar a vida, princi-

O respeito ao lugar do idoso como

palmente a vida daqueles que avançam

protagonista de sua própria história, e

no tempo, através de ações construtivas

da história de sua comunidade, aliado à

que dignifiquem e valorizem a experiên-

compreensão da licitude de ter sua qua-

cia de cada indivíduo, buscando nas fon-

lidade de vida preservada, facultar-lhe-á

tes inatas da sabedoria humana respos-

o acesso natural ao lazer, sintonizado

tas para suas inquietações e angústias.

com seu poder criador e com suas he-

Uma característica notável da arte, es-

ranças culturais . Segundo BARRETO

pecialmente da música, tem sido a ca-

(1997), •... a valoração do lazer na velhice

pacidade de ser reconhecida nas civili-

não está nas atividades propostas, mas

zações ocidentais e orientais como re-

sim no que significam para cada velho,

curso terapêutico, a despeito de tantas

para as instituições, para as famílias- o

teorias sobre saúde ou terapia, desmen-

lazer do velho é culturalmente construí-

tidas constantemente pela ciência. A

do, historicamente demarcado e psicolo-

esse respeito Graves y Caux (apud. Cos-

gicamente inrrojerado".

ta, 1989) argumentam: "a música facilita

A arte, embora possibilite um "abrir

o restabelecimento dos rirmos fundamen-

de portas" ao ser humano, estabelecen-

"


do a síntese desejável entre a liberdade

É possível que o despertar para

de cada um e a sua convivência em

uma nova consciência, em relação à vida

sociedade, necessita de meios ou po-

dos idosos, transforme e desmistifique

líticas específicas voltadas para a sua

muitos dos conceitos que ora lhe são

viabilização, que não se obtém a curto

atribuídos, reservando-lhes o direito de

prazo. Ela implica uma obstinada e con-

viver e de se manifestar como seres hu-

tínua experimentação; uma concepção

manos, ontologicamente originais e

nem sempre dogmática ou estática.

únicos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARRETO, M. L. F. Lazer e cultura na

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