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"Shakespeare

é o Poeta que mais criou depois de Deus!" Alexandre Dumas


CENTRO DE PESQUISA TEATRAL DO SESC APRESENTA

eN0dE MA\BEth

DE SHAKESPEARE DIREÇÃO: ANTUNES FILHO CENOGRAFIA: J. C. SERRONI FIGURINOS: ROMERO DE ANDRADE LIMA COM GRUPO DE TEATRO MACUNAíMA

E LUIS MELO

Ci)SESC SERViÇO SOCIAL DO COMÉRCIO ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO


ntidade criada, mantida e administrada pelo empresariado do comércio, o SESC em São Paulo, tem implementado sua ação centrado no desenvolvimento sócio-cultural dos trabalhadores e da coletividade em geral. Sua atuação tem incluído iniciativas destinadas a promover e incentivar as diversas modalidades artísticas, caracterizando-se, ao longo do tempo, pela fidelidade permanente a dois aspectos fundamentais. O primeiro é o estímulo à pesquisa e à inovação, no sentido do alargamento e do avanço das perspectivas culturais da sociedade brasileira; o segundo, a concretização de uma efetiva democratização cultural, tanto através de um esforço de incorporação de novos contigentes ao conjunto de pessoas que têm acesso à produção artística e intelectual - em seus vários gêneros, tendências e períodos -, quanto da multiplicação do número e da variedade de eventos que permitam a esse público o contato com bens culturais de reconhecida qualidade. Para isso mantém em permanente atividade oficinas de criatividade, ateliês, grupos de estudo e pesquisa. Na área do teatro, o Centro de Pesquisa Teatral do SESC, criado em 1982, tem-se revelado um núcleo experimental dos mais dinâmicos, voltado à busca de novas alternativas de linguagem para o teatro brasileiro e à difusão, sob a perspectiva educativa, da prática teatral.


Efetivamente, desde sua criação, sempre coordenado pelo diretor Antunes Filho, o CPT vem percorrendo com êxito essas funções, e, em ritmo intenso. "Macunaíma", "Nelson 2 Rodrigues", "Romeu e Julieta", "Velhos Marinheiros", "Os Anjos", "Rosa de Cabr iúna", "A Hora e a Vez de Augusto Matraga", "Xica da Silva", "Paraíso Zona Norte", "A Nova Velha Estória" - são exemplos de espetáculos que confirmam essas intenções e que verdadeiramente se confundem com a história do teatro brasileiro, obtendo o reconhecimento do público e da crítica. Agora com "TRONO DE SANGUE/ MACBETH", traz a público mais um espetáculo, sob a inspiração da obra de Shakespeare, o mais referenciado poeta e dramaturgo do mundo ocidental. Uma realização que reitera nossos propósitos reafirma a inventividade e o talento do Centro de Pesquisa Teatral do SESC e o coloca ainda uma vez, no centro dos grandes acontecimentos cênicos do país. ABRAM SZAJMAN Presidente do Conselho Regional do SESC no Estado de São Paulo


Porque que ainda e sempre Shakespeare?

Será por falta de bons e novos dramaturgos que as obras de Shakespeare

são

atualmente mais do que nunca, representadas

em quase

todos os principais teatros do mundo?

Fragmentos extraídos do livro "Shakespeare For Everyman" de Louis B. Wright.

4

"De todos os escritores do mundo ocidental, William Shakespeare foi o que teve maior reconhecimento e aceitação; e hoje em dia somente a Bíblia ultrapassa, em número de línguas, as publicações de suas obras - mais de 74 línguas, entre as quais o albanês, arrnênio, bengali, chinês, croata, japonês, georgiano, tártaro, turco, ucraniano e o xhosa."

E por que homens e mulheres de todas essas línguas e culturas encontram em Sh.akespeare algo persistente, que o torna integrante de qualquer cultura? Por que é continuamente lido, tanto no seu inglês original como em muitas outras línguas e dialetos? O que proporciona aos leitores de diferentes níveis de cultura? "Ao abordar Shakespeare, devemos nos lembrar que ele escreveu não para um pequeno grupo de intelectuais, mas para todo o mundo, do cortesão ao aprendiz, para o homem da rua, para qualquer um que se sentisse inclinado a pagar alguns centavos para assistir a um espetáculo. Shakespeare escreveu sempre com um olho, ou mesmo com os dois, na bilheteria. "



"Shakespeare continua sempre vivo porque escreveu sobre problemas fundamentais que nos dizem respeito independente da época ou lugar, de maneira lúcida e significativa, raramente desperdiçando tinta em trivialidades e jamais obscurecendo o sentido com a pompa dos jargões da arte poética. Conseguiu sempre dar um sentido de verdade àquilo que revelava dos aspectos da vida. Dentro de um conjunto de circustâncias, Shakespeare explica a maneira pela qual as coisas inevitavelmente acontecem. Em seu teatro poético, nós aprendemos e nos divertimos. Essa feliz comunicação é a mais alta façanha que um autor pode realizar. "

"A sua genial idade manifestou-se de muitas maneiras, na sutileza de suas percepções, no conhecimento instintivo das características de homens e mulheres, na observação precisa do mundo à sua volta, na interpretação desse mundo e na capacidade de transformar palavras em música. De estudo profundo, Shakespeare tinha pouco. "Sabia pouco latim e menos grego ainda", observou Ben Jonson. Mas ele possuía algo mais importante que o conhecimento através dos livros - uma curiosidade inata que o levava a procurar o que precisava, onde quer que fosse: nas conversas com o povo e com os camponeses de Stratford, nas conversas com escritores, marinheiros, garotas e vagabundos que rondavam a Mermaid Tavern em Londres; na observação do homem e da natureza, e na variedade de livros dos quais pudesse extrair uma trama ou um pouco de história de que necessitava. Seus poderes de assimilação eram incríveis e conseguia combinar partes disparatadas, tecendo uma estrutura dramática que resultava efetiva tanto no palco como nas mãos dos leitores. Essa capacidade era evidência de gênio, não de aprendizado." "Shakespeare possuía uma extraordinária compreensão que o habilitava a recriar para o palco personagens que viviam e respiravam como seres humanos reais reconhecíveis pela platéia. Essas personagens eram homens e mulheres genuínas e não meros "dr am at is pe r son ae". Algumas personagens que criou são tão reais, que alguns críticos do século XIX falaram delas como se elas tivessem realmente existido na História. Discutiram suas motivações e suas origens, reconstruiram suas histórias passadas; enfim, trataram-nas como se tivessem tido biografias verídicas. Shakespeare concretizou com sólida realidade, seja no tempo ou no espaço, não somente figuras sombrias, como Macbeth e Rei Lea r , como também personagens como Shylock, Romeu e Julieta e Otelo." "As personagens dão tamanha ilusão de realidade, que um espectador de uma peça de Shakespeare, ou um leitor, é capaz de se iden-


tificar com elas. Pode não esperar ter uma mulher infiel, mas compreende as fortunas de ciúme sofridas por Otelo; pode não ser tão tolo quanto Lear, mas sabe "o quanto mais dolorido que um dente de serpente é ter um filho ingrato". O espectador pode estar hoje velho e decrépito, mas já conheceu um dia de alegria do amor jovem e pôde proferir versos românticos à sua J ulieta como qualquer Romeu; e todo mundo se vê em Hamlet." "Shakespeare preocupou-se com emoções e temas fundamentais do interesse humano em geral, de tal modo que, quaisquer que sejam as ambientações de suas peças, elas são na realidade atemporais e universais." <IA atemporalidade do teatro de Shakespeare não foi alcançada evitando-se interesses locais ou contemporâneos, mas sim por tratar tais interesses de maneira que transcendem as meras preocupações momentâneas, e se tornam observações de um sábio comentarista sobre a vida. N as mãos de um autor menor, Otelo poderia ter-se tornado um relato teatral de um assassinato de uma esposa, ambientado em Veneza, em Londres ou em qualquer outro lugar, mas não deixaria de ser um pouco mais do que um fragmento de uma sensação dramatizada. No tratamento de Shakespeare, Otelo é um estudo sobre a corrosão da alma, pelo ciúme, de um homem simples e essencialmente nobre." "A musa de Shakespeare não era nenhuma contorcionista. O poeta nunca torceu ou emaranhou suas palavras para alcançar um efeito metafísico. Sua dicção é clara e direta e suas figuras de linguagem derivam, não de livros clássicos, mas das coisas simples que seus próprios olhos e ouvidos o ensinaram, das memórias dos campos e florestas de Warwickshire. Não há nada de artificial ou armado nas imagens de Shakespeare; como suas caracterizações, suas imagens baseiam-se na vida inglesa e nas cenas complexas que conheceu. E uma vez que são genuínas e fiéis à vida em qualquer época, elas evocam em nós memórias e cenas e incitam nossa imaginação a recriar, para nós mesmos figuras escondidas nas nossas reminiscências subconscientes."

"THE GLOBE THEATRE" Inaugurado em 1599, esse Teatro serviu de palco para várias obras de William Shakespeare. Podia abrigar cerca de 1.500 espectadores e as apresentações ocorriam a céu aberto. Em 29 dejulho de 1613, "The Globe" foi destruido por um incêndio, durante a apresentação de "Henrique VIII".



~~ uem viu essas encenações certamente não esquece a beleza das concepções cênicas, a aguda percepção da poesia Shakespeareana transformada em imagens e movimentos. Será preferência ou coincidência Shakespeare e Nélson Rodrigues serem os autores mais encenados por Antunes Filho? A resposta pode ser encontrada no projeto teatral de Antunes. Ele lamenta, no entanto, que a despeito da fama de seus espetáculos sobre obras de Nélson Rodrigues, o público não aflui, não chega quantitativa mente nem perto do público que aflui às suas encenações de Shakespeare. Atribui isso ao velho preconceito do nosso público para com Nélson Rodrigues. E pode corroborar sua opinião o enorme interesse das platéias de vários países, incluindo Alemanha, França, Inglaterra, por seus espetáculos rodriguianos. Os teatros lotam. O sucesso que sempre obteve com obras de Shakespeare, no entanto, Antunes espera alcançar agora com a montagem de TRONO DE SANGUE / MACBETH, que realiza no Centro de Pesquisa Teatral-SESC, com o Grupo de Teatro Macunaíma.

Macbeth, íncubos e súcubos A encenação de TRONO DE SANGUE / MACBETH não é aleatória nem motivada por simples interesse de mercado. Surge em resposta às necessidades geradas no interior do projeto teatral que Antunes desenvolve há anos no Centro de Pesquisa Teatral SESC com o Grupo de Teatro Macunaíma. A caça ao "mal-fantasma", como diz Eça de Queirós referindo-se a Macbeth, procede do início da década de 80 com a montagem de Nélson Rodrigues O Eterno Retorno. Começava, então, a pesquisa de mitos e ritos de povos primitivos, apoiada na obra de Mircea Eliade e nas teorias do Inconsciente Coletivo de Jung, com seus simbolos e arquétipos (sobre o universo simbólico de Macbeth ver "Mitos Ritos e o Sobrenatural em Macbeth", na págin~ J O.)

O desenvolvimento das pesquisas induziu a busca do Conhecimento na filosofia e religíões, desembocando no estudo das culturas orientais. Deu-se em seguida, naturalmente, a conexão do taoísmo, budismo, zen budismo e outros ismos orientais à Nova Física, às teorias do universo quântico de Heisenberg, Einstein, Bohr, Sheldrake, etc., tornando o exercício dramático estuário desse vasto conhecimento e apontando nova linguagem cênica. Uma "nova linguagem cênica" não surge de novos conceitos aplicados sobre procedimentos antigos, e, sim, de novos conceitos alterando velhos e gerando novos procedimentos. Assim é que, fundamentado nas pesquisas, misturando yin-yang, wu wei, tai-chi à relatividade, princípio da incerteza, ordem implícita, quarks, foi-se elaborando novo método para o ator dentro de uma nova visão de encenação. O processo se desenvolveu ao longo dos anos e seus vários estágios foram marcados pelas montagens de A Hora e a Vez de Augusto Ma traga , de Guimarães Rosa, Paraíso Zona Norte, de Nélson Rodrigues, e no topo da escalada a Nova Velha Estória - momento de desestruturação total da língua, definido por Antunes como "o caos calculado". Com TRONO DE SANGUE / MACBETH pretende-se um mergulho mais profundo na vertical de Noronha (Sete Gatinhos / Paraíso Zona Norte) e do Lobo Mau (Nova Velha Estória), procurando atingir no abismo a camada espessa das sombras inconscientes. Morada de íncubos e súcubos, escorpiões, morcegos, cobras e bestas inconcebíveis que dilaceram as entranhas de Macbeth. Despenhadeiro sombrio onde cintilam, alí e acolá, pontos luminosos: imagens e palavras de Shakespeare, como estrelas. Para o CPT, afirma Antunes, como estrelas guias. E o ator Luiz Melo - já consagrado no Brasil e em outros países por suas interpretações do Noronha e do Lobo Mau - tem a sua hora e vez com a magistral personagem Macbeth. "Ad majorem Dei gloriam", diz Antunes. Assim seja.

Sebastião

Milaré ~


MITO~, RIIO~ f o ~OBRfNAIURAl fM MACBflH Notas extraídas do ensaio de J. L. Caramés Lage "Macbeth: EI Viage Simbólico deI Caos"

/I

O

primeiro pecado foi a rebelião de Lúcifer, ocorrido no Paraíso, onde Deus Pai está rodeado das hierarquias angelicais. A natureza da falta é recalcada continuamente desde o começo da literatura e nela o símbolo do trono possui uma conotação clara. O trono pode converter-se em símbolo do tirano que usurpa o poder, refletindo assim um paralelismo: DeusLúcifer, Rei-Usurpador." "Shakespeare aceita o mito da rebelião de Lúcifer como arquétipo do pecado e no conjunto da sua obra encontra-se um panorama de pecado, justiça e redenção paralelo à história bíblica ou às lendas gregas sobre Agamenon e Édipo."

"Macbetlt é um homem que começa a cair e a perder a alma, mas acha-se próximo do rei, como Lúcifer achava-se próximo de Deus." "O conteúdo mitológico da lenda de Macbeth simboliza o processo da vegetação - é o mito da vegetação. Entende-se Macbeth como o gigante do inverno, cujo reino chega ao fim ao se aproximar o festival de maio, com o seu verdor."


UMA REPRESENTAÇÃO DE MACBETH NO SÉCULO XVIII

"O visitante (Banquo) pode ser deste ou "Quando o bosque de Birnam se move em direção à fortaleza, Shakespeare cria uma imagem teatral da vitória da vida sobre a morte, ao mesmo tempo, usa o símbolo pagão da fertilidade." "Na obra são identificados não apenas pecado e morte, também pecado com morte individual e coletiva, de povo e de raça, uma vez que o estigma atinge mesmo os "meninos não nascidos". "A morte, a desordem, o fantasma, a crueldade, o vazio, formam tambern uma unidade social banhada na irrealidade. O real é o que as forças primitivas da obra representadas por Lady Macbeth e as bruxas procuram conquistar." "Os valores heróicos se opõem aos primitivos da caverna onde vivem as bruxas. Assim, pode-se falar da não-ética e Lady Macbeth aparecerá como a abstração das três bruxas que, infiltrada no castelo, provocará seu marido e destruirá o conteúdo da palavra justiça." "O tema do bem e do mal está presente de forma absoluta dentro de um microcosmo que é dado por elementos externos ao herói. Suas alterações se refletem nos dois mundos, nos quais as dualidades noite e dia, masculino e feminino, covardia e prudência, desaparecem na realidade que chega a ser aparência." "Lady Macbeth acusa seu marido de carecer de valor e de outras virtudes masculinas. Mas, contra si está a falta de feminilidade e virtudes de mãe. As funções sexuais se confundem e, num momento, Lady Macbeth chega quase a ser um homem."

do outro mundo. Aparece na literatura do século XVII como realidade psicológica produzida pela mente de quem maltratou esse ser. Este aspecto do ritual de Macbeth provém da tragédia grega e das cerimônias religiosas que, apesar de tudo, desejavam racionalizar os poderes sobrenaturais e as ilusões psicológicas." "Outra imagem sobrenatural (demoníaca) é o castelo, que se converte em três: é a residência de Macbeth, a de Forres como rei e a de Dunsinane como defensor da coroa, sempre dentro de um efeito dramático de movimento entre a entrada do inferno - onde se encontram as bruxas - e o interior do mesmo castelo ou inferno. O temporal e o eterno se juntam e se separam em um nível simbólico claramente iconogr áfico. " "As bruxas eram essencialmente trágicas, pois venderam a alma ao demônio para conseguir algum poder. Exerciam canais de comunicação com seus amos e possibilitavam que eles visitassem a algum humano. Os humanos podiam estar possuídos por demônios e, ainda que de forma pouco clara, Lady Macbeth parece uma possessa, pelo menos quando prepara a chegada de Duncan e chama as forças do mal, que entende já terem se apossado do seu marido." "Shakespeare procurou fazer com que as bruxas cobrissem todo esse campo dramático de possibilidades, sobretudo na medida que significam união de contrários." "A viagem da vida do herói trágico, que é Macbeth, simboliza em si mesma o ponto de vista do demônio no mundo." 11


(GRAVURA

INSTIGAÇÃO DO CRIME DE LADY MACBETH DE HAYMAN - SÉCULO XVIII)

"A obra trata de vários planos que viajam paralelamente juntos: do homem, do Estado, da família e do universo físico. Todos viajam para o caos e o demoníaco atua em cada um deles. A viagem de Macbeth e sua destruição refletem a destruição de Satanás, que também atuou contra o seu senhor para ver cumprida a ambição ou o orgulho, o que significa a-rebelião contra Deus e contra a ordem da Natureza." "Em Macbeth é produzido um sacrifício ritual: o de Macbeth, que destruiu a ordem e introduziu a desordem. Deve ser sacrificado para que a antiga ordem volte a reinar ("Os ritos são o meio através do qual o grupo social se reafirma periodicamente" - Durkheim)." "O sacrifício do bom rei ou do sacerdote é um rito proveniente das mais primitivas sociedades e religiões." "Shakespeare estava inconscientemente impregnado de uma tradição de conceitos e histórias de sacrifícios rituais de reis divinos ou serni-divinos, e da função do sangue nos ritos da fertilidade. Isso podemos constatar nas imagens recorrentes do Estado como jardim ou do sangue como renovação." "Mas Shakespeare faz algo mais em Macbeth. Se a obra é uma descida aos infernos, também é um mito da Primavera. A guerra é o Inverno, a obscuridade. O Inverno é um gigante. A Primavera é a mulher indefesa mas poderosa, pois tem ao seu lado o Sol, seu grande aliado. Com os ramos com que os soldados levam o bosque de Birnam até Dunsinane, simbolicamente - como na lenda do bosque que se move presente no festival de maio - a Primavera chega para vencer o rei Grunenwald, que é o gigante do Inverno, no caso, Macbeth. Portanto, quando se diz Macbeth, está se dizendo caos". SONAMBULISMO DE LADY MACBETH (GRAVURA DE HAYMA - SÉCULO XVIII)



~INOP~f Na viagem de volta de uma vitoriosa campanha contra os rebeldes, Macbeth Duncan,

e Banquo, generais de Rei da Escócia, encontram

numa charneca três bruxas, profetizam

que Macbeth

que

se tornará

Senhor de Cawdor e, mais tarde, Rei; e que Banquo,

por sua vez,

será pai de Reis. 'Estimulado

pela profecia

e

instigado pela ambição de Lady Macbeth, Macbeth assassina Duncan , durante uma visita

que este faz

ao seu castelo,

e é coroado Rei da Escócia.

Em seguida,

ele trama o assassinato

Ban quo e do seu filho último escapa. Perseguida Macbeth

Fleance,

de

mas este

pelo remorso,

Lady

perde a razão e morre.

Malcom, filho de Duncan, e Macduff, cu]a família Macbetb também assassinara, enfrentam com um exército o usurp ador . Passando Birnam,

pela Floresta

de

cada soldado corta um galho de

árvore, para camuflagem e assim, todos se aproximam e tomam o castelo, confirmando a profecia que Macbeth nunca será vencido,

a não ser que a

Floresta de Birnam

venha a Dunsinane.

Macbeth , para quem a vida não tem mais atrativos, luta com coragem, mas é morto na batalha por Macduff.


DIRfÇÃO Antunes Filho

GNÁRIO j.c.

Serroni

flGURINm Romero de Andrade Lima

HfNCO Luiz Meio

Macbeth Samantha Monteiro

Lady Macbeth Adifson Azevedo

},:Assassino/nobre/soldado/Siward/soldado ferido André Gotijo

Malcom/ soldado/nobre Roberto Pratusiavicius

Nobre/soldado Carlos Landuci

Lenox Fernando Reinozzo

Angus/ soldado/ nobre Geraldo Mário

Seyton/ soldado Germano Mello

Rosse/Menteith Giácomo Pinotti

Macduff Hélio Cícero

Banquo/médico/soldado Jaime Queiroz

Carregadorlpagémlfilho de Macduff/ aparição José D' Angelo

Bruxa/mensageiros/soldado/nobre/velho Luiz Mario Vicente

Bruxa/nobre/soldado Ondina de Castilho

Lady Macdufflsoldado/velho/nobre/servente Pedro Paulo Eva

Donabai n/ soldado/ nobre/servente Roberto Audio

Soldado/ nobre Valter C. Portella

Duncan/ama/Z; assassino/nobre/soldado


A TRAGÉDIA DE SHAKESPEARE H... A maldade,

por quanto

demonstre

no Mac-

beth uma perigosa energia, não é a rígida ou gélida desumanidade

que encontramos

neril; como no Hamlet, morso.

Enfim,

Shakespeare

ação a fatores puramente precedentes presságios

tragédias; enchem

das suas tumbas,

em Vago ou Go-

essa é perseguida

pelo re-

não restringe

humanos,

mais a

como nas duas

uma vez mais minuciosos

os céus, fantasmas

se levantam

uma luz, não deste mundo se en-

trevê em torno à cabeça do homem predestinado. A particular Macbeth

popularidade

é devida,

racterísticas

e de

destas ca-

N

OPINIO[~[ ~OBR[~H~

ao fascínio do

(... ) que coloca seu olhar relutante

Vago, fixa com admirada porque

de Hamlet a alguma

comuns, especialmente

sobrenatural O leitor

em parte,

mesmo

surpresa

sobre

Lady Macbeth,

que ela seja terrível,

é também

sublime. Toda tragédia pectos,

é sublime

contudo,

toda diferente

do Hamlet.

sonagens principais, sobrenatural,

sob estes e outros as-

o Macbeth

dá uma

impressão

As dimensões

dos per-

a rapidez da ação, o efeito do

a versificação,

o estilo, tudo é muda-

do, mas fica tudo igual. Em muitos

trechos

possui um particular

do Macbeth

a linguagem

peso, importância,

energia,

até violência. ... O Macbeth experiência

é muito mais breve, mas a nossa

em entrar neles é tão profunda

sa que não deixa uma impressão

e inten-

de brevidade

mas

de fúria, mais que das outras grandes tragédias." Andrew

Ceci/ Bradley

"Macbeth é a mais veemente, a mais concentrada, mais tremenda das tragédias de Shakespeare". A.C.

I

Bradley

a

HA respeito da peça, mereceria referência o fato de decorrer em ambiente escuro e pesado, de crimes no meio das trevas, de medo e insegurança. Segundo L. C. Knights, Macbeth é uma afirmação do mal, e na peça fundem-se dois temas principais: o da inversão de valores e o da desordem inatural. (... ) E com esses temas decorre toda a peça, através da qual Macbeth age sempre de modo desleal ou atroz. Apesar disso, a audiência shakespeariana, assinala-o Sir Arthur Quiller - Couch, sentia piedade ou terror, não por causa dos fatos ocorridos, mas com Macbeth, o autor dos fatos sangrentos. E a causa de tal consideração era e é, ainda segundo Quiller-Couch, a majestade da fala do herói da tragédia, que levava o público a sentir que Macbeth era de algum modo um grande homem. Frisa ainda o crítico que, nas fragilidades de Macbeth e de Lady Macbeth qualquer homem ou mulher podia reconhecer-se, agradecendo à providência não estar na situação de ambos." Péricles

Eugênio

da Silva Ramos


A CONFERÊNCIA NA CASA SOMERSET, 1.604, QUANDO SHAKESPEARE ESTEVE DE SERVIÇO COMO CRIADO DA CÂMARA REAL.

[POIM[NTO~ "Ao contrário de Hamlet, que é tragédia de um pensativo num mundo violento, o som e a fúria de Macbeth pareceu esquivar-se à análise. (... ) A obra é a mais intensa que a literatura nos pode oferecer e essa intensidade não declina. Desde as palavras enigmáticas das bruxas que, de maneira bestial ou demoníaca, transcendem a razão dos homens, até a cena em que Macbeth morre encurralado e lutando; o drama nos arrebata com uma paixão ou uma música. ( ... ) A tragédia se impõe aos que a assistem, a frequentam ou a recordam, com a atroz convicção de um pesadêlo."

J.

L. Borges

"A peça Macbeth abre com o despertar de poderes misteriosos, espirituais, auxiliares da aterradora sombra que primeiro rasteja e mais tarde se espalha pelo horizonte moral." Edward Dowden

"Macbeth é o mal-fantasma. Ele não é daqueles lobos que andam, pela noite da história, dilacerando as liberdades e as pátrias. Não. É uma energia inconsciente e fatal. Um pouco mais mergulhado na sombra, seria o igual de Satã. Quando a sua coroa reluz na escuridão parece que as constelações devem seguir aquele reflexo terrível, curiosas de saber que sombria aventura vai ele tentar contra o Homem. Porque é certo que ele provoca a atenção do infinito, e tem misteriosas afinidades da noite. (... ) Este Adão do mal tem uma Eva monstruosa - Lady Macbeth. Lady Macbeth é a serenidade do mal. Ela, com a sua atitude soberana e bárbara, tem a vaga semelhança de uma Juno homérica. Tem em si todas as grandiosas rigidezas, todas as frias austeridades da Natureza do Norte. (... ) Por fim, quando toda a Escócia sangra, porque passou Macbeth esmagando as cidades, assolando os campos, enegrecendo o céu como fumoluto dos incêndios, não são os exércitos que o vencem: a Natureza ouviu as queixas humanas, os brados de justiça que saiam dos postes, das queimadas, das forcas, dos cemitérios; ouviu a alegria estridente dos abutres, dos corvos e dos milhafres, e destaca então uma floresta, que vai com ruído trágico esmagar o homem sinistro. Neste castigo Shakespeare é maior que Ésquílo." Eça de Queiroz

17


"A obra (Macbeth) é, na verdade, um estudo do medo. E uma vez que o medo caminha a par com paixões, Shakespeare, como é seu hábito, pinta a paixão estudada sobre o fundo contrastante do seu contrário. Assim, como em Romeu e Julieta desenvolveu o tema de amor-ódio; em Hamlet o de alegria-dor; em Otelo o amor-ódio produzindo ciúme, desenvolve em Macbeth o estudo do medo sobre o fundo contrastante do seu contrário." Li/y B. Campbell

"A Obra Macbeth pode ser vista como o estudo de um sofrimento mais terrível que a morte, manifestado primeiro no horror do crime, depois no remorso e insônia, em seguida nas alucinações e ansiedade e, finalmente, na compreensão de que tudo "não significa nada". É possível, portanto, sentir compaixão por esse homem cuja mente "está cheia de escorpiões", e que contempla uma velhice vazia de "honra, amor, obediência e muitos amigos". (... ) Aristóteles afirma que sentimos terror por nosso "semelhante desditoso". Quem mais infeliz que Macbeth?" Kera Stevens

1~

e Munira

H. Mutran

AS BRUXAS DE MACBETH ROYAL SHAKESPEARE COMPANY, 1982 DIRETOR: HOWARD DAV1ES

A viagem da vida do herói trágico que é Macbeth simboliza em si mesma o ponto de vista do demônio no mundo. O herói é auxiliado por outros personagens que se introduzem na sua viagem. Macbeth aceita o demoníaco na terceira cena da peça. No segundo ato comete suas ações malvadas e no terceiro submerge profundamente no mar do mal. Por fim, chega à destruição. Macbeth, como Otelo, é um homem potencialmente bom, mas escolhe a queda e a segue lealmente. A viagem de Macbeth e sua destruição refletem a destruição de Satanás, que também atuou contra o seu Senhor para ver cumprida a ambição ou o orgulho, o que significa rebelião contra Deus e contra a ordem da Natureza. Nesta viagem aparece Lady Macbeth que, em princípio, como toda mulher, é símbolo de vida. Mas essa mulher se converte em algo assexuado e abandona suas características. Aqui, a imagem não natural da mulher enfatiza a urgência do que se fala. Aparece a oposição à Natureza. Aparece o/a destruidor/a da vida. Sangue e feminilidade se juntam na viagem. J.L.

Caramés

Lage


"Macbeth não pode descansar, nem guardar silêncio nem dormir, porque sua sobrevivência depende de uma mentira contínua. Há de permanecer vigilante para decifrar e interpretar a cada momento a ambigüidade das bruxas. A mentira o sustenta no trono e lhe preserva a vida. A mentira cria a irrealidade e a irrealidade a insônia. O próprio Macbeth, quando já é tarde para o arrependimento, se dá conta que caiu na armadilha das palavras e emprega o vocábulo chave da obra: "equivocation", equívoco: ... and begin. to doubt th' equivocation of the [iend, that lies like truth. ("Começo a duvidar do equívoco maligno que, mentindo, disse a verdade"). E mais adiante: Accursed be... That palter with us in a double sense; That keep the word of promise to our ear, And break it to our hope. ("Maldito seja quem cria demônios enganosos, que se divertem equivocando-nos com profecias, que dão palavras de promessas aos nossos ouvidos e as quebram contra nossas esperanças'') . Quando Macbeth se vê acossado e só, nas cenas finais, constata que lhe restam somente seus feitos e suas obras: I have no words; My voice is in my sword. ("Não tenho palavras; minha voz está em minha espada"). Dizer. que Macbeth ou Hamlet são tragédias de palavras é uma grave simplificação; não cabe dúvidas, contudo, que a língua é o primeiro fator desencadeante do conflito passional ou de interesse, já que ao projetar tal confronto no contexto social, a língua, como fundamento básico das relações sociais, figura sempre em primeiro lugar onde quer que surja um desequilibrio nas vias normais de comunicação. Shakespeare demonstra sua genialida de intuindo conceitos e funções lingüísticas esquecidos ou ainda não suficientemente explicados no seu tempo." Francisco

García

Tortosa

"Macbeth é, senão a mais profunda, a mais sinistra e sanguinária tragédia do autor. A peça é urna seqüência de combates e violências, de traições e assassínios, que se sucedem da primeira à última cena em ritmo precipitado, implacável. Na opinião de Schlegel, a poesia trágica não havia produzido, depois da Oréstia, de Ésquilo, nada mais grandioso nem mais terrível. Macbeth é, por excelência, a tragédia da ambição." Manoel Bandeira

"Macbeth é a visao shakespeareana mais profunda e madura do mal ( ... ), onde não encontramos meios tons, só negrura total. Quanto à profundidade imaginativa, Macbeth só é comparável a Antonio e Cleópatra. Porém, nesta obra temos a visão ardente de uma consciência paradisíaca, enquanto em Macbeth o que temos é a sombra, o pesadelo e o tormento de um inferno consciente. Mais fantástica e imaginativa do que as outras tragédias de Shakespeare, Macbeth apresenta dificuldade de interpretação aumentada pela implícita confusão de efeitos, por essa inquietante escuridão, essa sombria trama, técnica, estilo. Mesmo os personagens andam às cegas. E, contudo, nos deixam a aterradora impressão de um mal sufocante e vitorioso ... Sabemos que Macbeth nos mostra um mal que não se pode explicar em funções de "vontade" e "causalidade"; que revela sua visão não a um intelecto crítico, mas a uma imaginação que responda ... atuando em funções não de "caráter" nem de qualquer código ético, mas das profundezas abissais do espírito do mundo não harmonizado com a realidade humana. Afasta o telão que cobria as negras correntes que impelem essa consciência do medo, simbolizada em feitos sangrentos. Macbeth é o apocalipse do mal. As conclusões de Otelo e do Rei Lear são importantes: relacionam o problema da obra com o mistério da eternidade. Mas Macbeth começa onde aquelas obras terminam. Macbeth tem que suportar a consciência do "nada"; uma consciência de morte; carrega um simbolismo positivo e ativo de sua experiência nos atos de destruição. A consciência de um nada essencial produz ações niilistas." G. Wilson Knight

1~



UM PAlCO

fll~ABfTANO o palco, platéia,foi

esta caixa para onde o olhar converge quando ocupamos nosso lugar na

pensado como a base de uma pirâmide

cujo ápice é olho do espectador. Seria fatigar

o público recordar, a cada espetáculo, que esta relação espacial não é a única possível. Mas o cenógrafo, por dever de ofício, é obrigado a rememorar porque enfrenta repetidas vezes o desafio de ter que colocar dentro da caixa situações dramáticas suportadas por convenções diversas da dramaturgia

moderna e imaginadas para eSpaços bem diferentes do palco italiano.

Macbeth é uma peça escrita para o palco elisabetano, ambientada na Idade Média e encenada hoje, no limiar do século XXI.

Três véus de tempo se justapõem

formar um único espaço de representação.

para


CONCEPÇÕES DEJ.C. SERRONI PARA OS CENÁRIOS DE "TRONO DE SANGUE MACBETH"

A imagem do medieval é, nesta encenação, a que Shakespeare cria com um olhar retrospectivo, a partir do iluminado patamar do século XVI. A Idade Média é, em Macbeth, um ponto de origem vagamente historicizado, o período heróico conturbado onde se ouvem ainda as vozes dos espíritos do ar e da terra. Criada para o palco elisabetano, a história guarda os resquícios da cena simultânea do teatro medieval onde o espectador peregrinava por diversas moradas. É uma cena que pode comportar castelos, planíces e florestas. Para crer no que lhe contam - dirá Shakespeare - o espectador deverá suplementar a cena com suas próprias paisagens imaginárias. Por último a tarefa de cenografia contemporânea é fazer essa caber matéria difusa, mesclando a história ao maravilhoso, nos contornos do palco italiano que é, na sua origem, um lugar imaginado para abrigar uma imitação da realidade organizada sobre a sucessão temporal. Na cenografia que criou para Macbeth, Serroni entrelaça os três planos. Enquanto criatura de uma era remota, Macbeth se movimenta em um amplo espaço vazio, e os escassos objetos que entram em cena são comandados pela personagem. Não há uma ambientação fixa porque é a ação dramática que organiza e desorganiza o palco. Em parte o vazio sugere também a liberdade das sociedades guerreiras, movidas por impulsos violentos mas ainda inocentes das ambições medíocres da acumulação mercantilista. Essa paixão abstrata, primordial, se expressa na amplidão do espaço na austeridade de linhas e cores. Tonalidades escuras, peso e espessura formam um invólucro arcaico, sem determinação temporal, que deverá ser transtornado pelo crime e pela desordem. Sob esta firme construção há um chão cor de sangue.


Da concepção cenica elisabetana, Serroni aproveitou as varandas, os recortes no fundo da cena e o proscénio, elementos que atenuam o caráter ilusionista da caixa. Pelos vãos entram imagens, luzes e figuras fantásticas, signos da instabilidade em torno do sólido castelo do poder. São esses elementos emprestados do palco elisabetano que sustentam, com maior frequência as imagens inteiramente imaginárias. Através das frestas e do recorte horizontal criado pelas varandas, insinuam-se tudo o que desafia a estabilidade do poder e, por extensão, a aparência de solidez do próprio palco italiano. As grossas paredes têm também a função de limites, muros contra os quais as personagens se chocam e que, talvez, sejam defesas contra o maravilhoso que vive fora do palco. Os elementos marcadamente simbólicos penetram pelos buracos recortes nas paredes ou pelo urdimento. De todos os lados o vazio onde se agita Macbeth é assediado por alguma coisa que está à espreita, pronta para irromper em cena. Dessa forma Serroni cria uma cenografia onde convivem a simultaneidade e a cena sucessiva. Existe ainda, nesta cenografia, um processo de trabalho que já se tornou uma característica do CPT. Nada, na concepção visual de espetáculo, pode ofuscar o relevo da figura humana. Tanto os materiais quanto os objetos de cena são necessários para a ação. As mutações podem ser surpreendentes ou enfáticas, mas não são "mágicas". Há sempre uma indicação, no material e na forma, de que se trata de um trabalho da imaginação sobre a matéria. No CPT é ainda o ator a máquina cênica preferida. Isto, na era da projeção holográfica, pode ser considerada teimosia. É a mesma teimosia de Shakespeare, que atribuiu aos seus atores a tarefa de criar florestas, exércitos, cavalos, espíritos e, no centro de tudo, a alma de um homem. Maria Ângela Alves de Lima

B


j

"O que nos interessa em "MACBETH"

é a indicação de um espaço ambíguo que deixe ao

espectador a possibilidade de montar relações e vislumbrar diversos mundos. Criamos um ambiente opressivo, marcado por altas e pesadas paredes que às vezes encarceram e às vezes protegem os personagens. Elas criam um "cenografia de contorno" que deixa sempre o espaço vazio para ojogo dos atores. Um suposto e internacional naturalismo serve de contraponto para a entrada de elementos que quebram e alteram significativamente

o espaço. Desses elementos o de maior

ruptura é o piso totalmente manchado de sangue."

J.c. Serroni 24


Romero de Andrade Lima é um artista plástico. Em toda a ambiguidade e amplitude do termo. Todos os caminhos que se multiplicaram ao longo desses anos de trabalho, partem e chegam a um só ponto: à obsessiva necessidade do artista de reformar o mundo; dar uma ordem pessoal ao caos que se apresenta para todos nós. Só criando o seu alfabeto particular, a sua linguagem própria, um artista consegue se comunicar com este mundo; e o individual se torna coletivo. Na busca de sua linguagem, Romero experimenta todas as formas e técnicas que lhe chegam às mãos. Nesse processo ele se encanta com a cultura popular pela sua capacidade de guardar, imune à ação do tempo, uma forma de arte primordial e pulsante. Como resultado disto, vemos nos seus trabalhos uma perfeita harmonia entre esta linguagem popular, que o fascina, e a linguagem do universo de onde provém. Esta, portanto, é a sua linguagem: aquela que une, numa mesma obra, os signosdo universo popular aos do universo do artista erudito que é. A descoberta da possibilidade de fundir as artes plásticas às artes cênicas se deu através do contato com os trabalhos feitos por Picasso, Chagal e Miró para montagens que buscavam exatamente o encontro entre as duas artes. O que nem sempre é possível se não se tem a percepção exata de suas diferenças. Romero sabe que teatro é fantasia. Se os personagens são imaginários, a armadura, o vestido, a coroa também podem ser. Por isso, ele vai além do mero uso dos materiais óbvios de cada objeto, \ reproduzindo-os de forma inédita com a utilização surpreendente de um simples pedaço de jornal. O seu trabalho rompe com o próprio conceito de figurino. Não são roupas nem adereços; são figuras completas, esculturas vivas que parecem ter fugido de velhos livros de fábulas, estampas religiosas, cartas de tarô. Mas o primeiro trabalho de fato com o teatro veio com o convite de seu tio Ariano Suassuna, para fazer os cenários e figurinos das "Conchabranças de Quaderna" em Recife. Nesta ocasião o artista pôde exercitar sua linguagem, dando formas e cores próprias às imagens dos espetáculos de rua, dos circos e das procissões. E são nessas manifestações da cultura popular que ele se inspira para povoar seu trabalho de santos, reis, guerreiros, palhaços; bestas. Por isso Shakespeare, por isso Macbeth, por isso personagens quê não são tipos, são arquétipos. Macbeth não é um rei, são todos os reis, com o peso e as seduções que o poder lhes concede. Lady Macbeth não é apenas uma rainha má, é a serpente do paraíso, a Medusa. Os soldados, vassalos e bobos, enfim, são todos os mesmos que gravitam em qualquer tempo ou lugar em torno do poder. É a essas figuras que Romero de Andrade Lima quer dar forma, cor, vida.

Luciana

Buarque

Pigu rinista/H

istoriadora

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I



"No mundo de Macbeth, o mais obsessional dos mundos criados por Shakespeare, o assassínio, a idéia e o medo do assassínio invadem tudo. Nesta tragédia há apenas dois grandes papéis, mas a terceira grande personagem do drama é o mundo. Olhamos mais demorada mente os rostos de Macbeth e de Ladl' Macbeth, e é por isso que é mais fácil lembrarmo-nos deles, mas todos os rostos se apresentam com o mesmo esgar, deformados pelo mesmo espanto. Todos os corpos são torturados de idêntica maneira. O mundo de Macbeth é estanque; ali. não existe subterfúgio. Até a natureza tem o comportamento dum pesadelo, de tal maneira ela é opaca, espessa e viscosa. É feita de lama e de miragens. " Jan Kott

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"No mundo de Macbeth, o mais obsessional dos mundos criados por Shakespeare, o assassínio, a idéia e o medo do assassínio invadem tudo. Nesta tragédia há apenas dois grandes papéis, mas a terceira grande personagem do drama é o mundo. Olhamos mais demoradamente os rostos de Macbeth e de Lad}' Macbeth, e é por isso que é mais fácil lembrarmo-nos deles, mas todos os rostos se apresentam com o mesmo esgar, deformados pelo mesmo espanto. Todos os corpos são torturados de idêntica maneira. O mundo de Macbeth é estanque; ali não existe subterfúgio. Até a natureza tem o comportamento dum pesadelo, de tal maneira ela é opaca, espessa e viscosa. Éfeita de lama e de miragens. " Jan Kott

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SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO ADMINISTRAÇÃO REGIONAL NO ESTADO DE SÃO PAULO DIRETOR REGIONAL: Danilo Santos de Miranda GERENTE DO SESC VILA NOVA: José Menezes Neto COORDENADOR TÉCNICO CPT SESC VILA NOVA: Antunes Filho TRONO DE SANGUE· MACBETH DIVULGAÇÃO - Marimar Chimenes Gil, Célia Moreira dos Santos / ASSISTENTE DE COORDENAÇÃO TÉCNICA - Regina Wilke / PRODUÇÃO EXECUTIVA - Anna Inêz X. Vianna / CARTAZ - Romero de Andrade Lima / FOTO DO CARTAZ E~idio Luisi / Fotograma / COORDENAÇÃO DO NÚCLEO DE CENOGRAFIA - J. C. Serroni / ASSISTENTES DE CENOGRAFIA - Telumi Helen Yamanaka, Gisela Brugnara, Vera Oliveira, Mônica Samori / ADEREÇOS DE CENOGRAFIA - J. C. Serroni, Telumi Helen Yamanaka, Núcleo de Cenografia do CPT e Juvenal I. dos Santos / CENOTÉCNICO - Oswaldo Lisboa / PINTURA DE ARTE E ACABAMENTO DO CENÁRIO - Juvenal I. dos Santos / SERRALHEIRO - Jonas I. Santos / EFEITOS ESPECIAIS DE CENOGRAFIA - Mario Márcio / ASSISTENTES DE FIGURINOS - Cintia Valente, Luciana Buarque / ADEREÇOS DE FIGURINOS - Romero de Andrade Lima, Cintia Valente, Luciana Buarque / TAPEÇARIA - Romero de Andrade Lima / ASSISTENTES DE ILUMINAÇÃO - Hudson R. Gouveia - Waldomiro Luiz Rizzo / OPERADOR DE LUZ - Hudson R. Gouveia / MONTAGEM DE LUZ - Núcleo de Iluminação CPT SESC Vila Nova RAPSÓDIA "TRONO DE SANGUE / MACBETH" Centro Experimental de Música do SESC - (Eduardo Queiróz, participante do Laboratório de Criação Musical) TRILHA SONORA E OPERAÇÃO DE SOM - Raul Teixeira / PREPARAÇÃO DE CORPO E VOZ - Antunes Filho / ASSISTENTE - Samanta Monteiro (Corpo e Voz) - Walter C. Portella (Teoria) / ASSISTENTE TÉCNICO - Marco Antônio Braz /DIREÇÃO DE PALCO Ondina de Castilho - Geraldo Mário / ASSISTENTE DE ELENCO - Valdir Ramos / ADMINISTRAÇÃO E COORDENAÇÃO DO GRUPO DE TEATRO MACUNAÍMA - Walter C. Portella / MANAGER DO GRUPO DE TEATRO MACUNAÍMA Thomas Klein / ILUMINAÇÃO - Davi de Brito / FIGURINOS - Romero de Andrade Lima / CENOGRAFIA - J. C. Serroni / DIREÇÃO E ADAPTAÇÃQ - Antunes Filho CATÁLOGO COORDENAÇÃO - Jesus Vazquez Pereira / PROJETO E EDIÇÃO GRÁFICA: Eron Silva / ARTE FINAL - Cláudia Resende C. Cirillo e Waldemar Bueno / EQUIPE - Maria Cristina M. Costa, Marilu Donadeli G. Silva, Marco Aurélio O. Mendes, Joseneide A. da Silva / FOTOS - Paquito SERVIÇO

SOCIAL

DO

SESC VILA NOVA/TEATRO

COMÉRCIO/ADMINISTRAÇÃO SESC ANCI-IIETA

REGIONAL

NO

- RUA DR. VILA NOVA, 245 - TEL.

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DE SÃO PAULO - AV. PAULISTA,

256-2322/256-2281.

119 - TEL. 284-2111

SÃO PAULO - SI'

MAIO/l992 AGRADECIMENTOS Sr. Harumi Nakashima (Fundação Japão) / Sr. Russio Jo Takahashi (Fundação Japão) / Sr. John Todd - British Consulate General / Sr. Mike Winter - British Consulate General / Sr. Eduardo Alves de Lima / Sr. Klaus Vatter - Instituto Goethe / Prof George Guimarães / Sebastião Milaré / Sra. Mariangela Alves de Lima / Sr. Roberto Muylaert - TV Cultura / Srta. Beth Antunes / Sr. João Moura / Sr. Roque Enrique Severino, Sociedade Brasileira Tai-Chi-Chuan / Sra. Alice Hayashibara Profs Tai-Chi-Chuan / Sr. Fernando Vieira - Profs Mimica / Sr. Nikolas Vlavianos / Sra. Antônia Ávila / Sr. Manoel de Jesus Neto / Sr. Ayrton de Oliveira / Sr. José Milton Vieira Luz, Aldrey M. Silva, Eliana C. Curvello, Geny de Assis Maria, Guadalupe Cecília M. Santucci, José Franklin Araujo, José Ricardo L. da Silva, Miriam Aby Cohen, Maria Fernanda L. Mar tini, Majé Viola, Odevam Canuto dos Santos, Onéssimo Alves Pereira, Ozéas Duarte de Souza, Paula Tauhata Ynemine, Zatti Júnior - do Núcleo de Cenografia do CPT 1992. / Clóvis Garcia


CONSELHO REGIONAL DO SESC DE SÃO PAULO PRESIDENTE Abram Szajman MEMBROS EFETIVOS

MEMBROS SUPLENTES

Aldo Minchillo Augusto da Silva Saraiva Chafic Wady Farhat Filete de Oliveira e Silva Netto Isaac Naspitz Jorge Gabriel José Santino de Lira Filho Juljan Oieter Czapski Laerte Horta Manuel Henrique Farias Ramos Orlando Rodrigues Paulo Fernandes Lucânia Pedro Labate Rui Vieira

Airton Salvador Pellegrino Amadeu Castanheira Ariovaldo Cirelo Fernando Soranz Israel Guinsburg Ivo Dall' Acqua Júnior João Pereira Góes Jorge Sarhan Salomão José Rocha Clemente Luciano Figliolia Mauro Mendes Garcia Nerino Soldera Oswaldo Guarnieri de Lara Walace Garroux Sampaio

REPRESENrANTES JUNTO AO CONSELHO NACIONAL EFETIVOS Abram Szajman Aurélio Mendes de Oliveira Raul Cocito SUPLENTES Olivier Mauro Viteli Carvalho Sebastião Paulino da Costa Manoel José Vieira de Moraes DIRETOR DO DEPARTAMENTO Oanilo Santos de Miranda

REGIONAL



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